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Cidades- Comunidades e Territórios

Dez. 2002, n.0 5, pp. 127-138

Ensaios

Urbanidade e Cosmopolitismo de Lisboa

Vítor Matias Ferreira*

Lisboa em Exposição poderia ser um modo cabo, a "intenção" deste texto é a de poder mostrar,
ilustrativo de titular este ensaio, tendo em conta a ainda que parcialmente, algumas condicionantes
origem e a " i ntenção" deste mesmo texto, mas também algumas virtualidades históricas,
assumidamente experimental1• A cidade de Lisboa sociais e culturais da contemporaneidade de
em exposição portanto, ensaiada contudo no seu Lisboa.
contexto dominantemente urbano, o que de algum Duas constatações iniciais, na sua aparente
modo implica restringir essa visão tendo em conta banalidade, permitem-nos ajudar a situar o
a sua contemporânea configuração metropolitana. enquadramento de partida. Constatamos pois, de
Mas uma tal restrição sócio-espacial vai de par com imediato, Lisboa como capital de Portugal, mas
a própria natureza exploratória deste texto (tal como também como cidade europeia. Afirmações que
referimos na nota anterior), centrada assim numa sugerem, contudo, dois pressupostos: a cidade, no
abordagem mais propriamente cultural do urbano seu contexto metropolitano, é "demasiado" grande
e ao questionar precisamente a urbanidade e o em relação ao país que representa; o país, na sua
cosmopolitismo de Lisboa enquanto ilustração territorialidade, é "demasiado" pequeno em relação
paradigmática daquele específico contexto urbano. à Europa de que faz parte. Pressupostos banais,
Trata-se por isso de apresentar um conjunto de sem dúvida, mas que não deixam de sugerir
observações de algum modo sistematizadas sobre diversas interrogações: estamos perante uma
Lisboa - no sentido de "ver" e de "dar a ver" a contradição geopolítica? Uma desigualdade
cidade- procurando construir; deste modo, um feixe territorial e social? Uma macrocefalia, sobretudo
de olhares sobre aquela urbanidade e sobre aquele de ordem doméstica? Uma das consequências do
cosmopolitismo. Em certa medida, estamos perante processo económico à escala global? Uma
uma certa mudança de registo analítico, no sentido condicionante histórica à expressão cultural da
de ensaiar agora uma visão impressionista da cidade cidade? E as perguntas, ainda que um tanto óbvias,
no contexto urbano daquela dupla projecção porque simplificadas, poderiam continuar, se tal
histórica e sociológica da cidade e na abertura para fosse o caso. Mas, como é evidente, não estará em
a sua contemporaneidade. Urbanidade e cosmo­ causa encontrar (?) respostas para as perguntas
politismo constituem assim os dois referentes formuladas, mas, pelo contrário, parece mais
principais que poderão ajudar a expor essa mesma fecundo manter aquelas constatações de partida em
visão de Lisboa, através dos referidos olhares e aberto, como pressupostos implícitos de
pontos de vista, orientados contudo por uma interrogação da cidade, não na direcção das
determinada historicidade urbana e pelos múltiplas dim ensões que aquelas questões
respectivos modelos sociais e culturais que sugerem, mas através dos ditos olhares sobre a
progressivamente a vão configurando. Ao fim e ao urbanidade e o cosmopolitismo de Lisboa.

' Catedrático de Sociologia do ISCTE. Contacto: vitoderreira@iscte.pt


1 Realmente, este texto constitui uma versão simplificada de uma «nota de intenção, para uma Exposição sobre Lisboa, a realizar pelo Pare la
Villette em Paris, em Outubro de 2003. Correspondeu assim a um documento base, a convite daquela instituição, a partir do qual fosse então
possível dar a ver, expor precisamente a cidade de Lisboa. Como se compreenderá, a lógica discursiva daquele documento (que sem dúvida irá
reflectir-se no texto aqui publicado), procura seguir a própria lógica de um guião de exposição, neste caso da cidade de Lisboa, o que, como
sabemos, não é necessariamente coincidente com a «exposição» de uma específica abordagem analítica. Deste modo, enquanto guião de uma
exposição, estará mais centrado num quadro metodológico expositivo, do que na explanação de diversos materiais empíricos justificativos de
uma eventual opção analítica. Refira-se, finalmente, que uma versão ligeiramente diferente deste texto será integrada numa obra do autm; cuja
publicação está prevista para este ano de 2003.

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Lisboa, Finisterra Atlântica e Matriz “cidade de duas margens”, não constitui (ou poderá
Mediterrânea vir a constituir) um dos próprios fundamentos do
imaginário da Metrópole de Lisboa!3
Comecemos, então, por sublinhar a condição Mas a cidade de água de Lisboa tem, ainda,
determinante de Lisboa enquanto Cidade de Água, uma dupla condicionante histórica e cultural, na
na sua estreita relação com o Mar Urbano que lhe medida em que ela se constituiu, simultaneamente
esteve na origem e que lhe conferiu uma identidade (?), como uma cidade atlântica, ainda que de matriz
muito particular, tal como noutros momentos mediterrânea. Assim, aquelas condicionantes,
tivemos ocasião de destacar2. Esta mesma condição, sobretudo de ordem histórica e geográfica, conferem
pela força da sua materialidade e pelo projecto à cidade de Lisboa um quadro societal bastante
identitário que representa (ou que pode vir a heterogéneo, agregando assim, numa “mistura”
representar) no imaginário urbano e metropolitano complexa, múltiplos e variados comportamentos
de Lisboa, constitui, sem dúvida, um primeiro (e individuais, distintos modos e estilos de vida social
imediato) olhar de apresentação de Lisboa. e diferenciadas referências culturais, que no
Recordemos então, sucintamente, a trilogia referido magma societal acabam por se assumir
analítica que sustenta esta fundamental condição como bastante atípicos para qualquer um dos
de Lisboa. Com efeito, partindo da constatação que respectivos modelos de civilização urbana, tomados
as frentes de água de cidades marítimas ou fluviais isoladamente.
constituem os próprios paradigmas das cidades de Efectivamente, Lisboa, como cidade atlântica,
água, aquela trilogia abre-se, assim, para uma é, em termos metafóricos, como uma personagem à
fronteira territorial (que não deve ser vista beira de uma ravina, pronta a “partir” ou a “chorar”
propriamente como um “obstáculo”), configurando os que já partiram! É, sem dúvida, uma frágil
uma determinada simbologia identitária e condição: aparentemente, só existe em situação de
assumindo uma projecção histórico-cultural, num ruptura, como se “tanto mar fosse demais...”! Mas
conjunto de dimensões que, globalmente, permitem uma tal situação de finisterrae (adiante voltaremos
uma caracterização determinante daquelas frentes a este ponto), é também uma marca territorial,
de água. Dimensões articuladas entre si, natu- uma referência identitária, naquela fragilidade de
ralmente, em cujo contexto são tecidos os laços partir e de ficar. A pulsão da partida confronta-se,
patrimoniais das cidades históricas e portanto, assim, com a atracção das suas raízes identitárias.
também, da cidade de Lisboa. Justificámos uma Lisboa atlântica tem, portanto, esta “ondulação”
tal afirmação recordando igualmente que muito de partir e de regressar, como se fosse uma “terra
embora as cidades históricas, marítimas ou fluviais, de ninguém”, em que as ondas marítimas,
tenham atravessado, muitas vezes, situações de participando naquela identificação territorial,
crise, sobretudo no quadro económico e político, o imprimem um movimento de abandono, de volú-
mesmo não terá acontecido ao nível da sua própria pia e de reconquista! Numa tal alegoria, está
identidade histórica e cultural, cuja perenidade implícito ainda o “desígnio” da emigração além
acabou por sedimentar e projectar os traços atlântico, que quase sempre se projecta com o
patrimoniais, identitários realmente, daquelas desejo do regresso... mesmo que, em muitos casos,
mesmas cidades históricas. Uma tal materialidade ele acabe por não se cumprir!
imagética, levou-nos mesmo a questionar se aquele Mas Lisboa é também, ainda que de modo
Mar Urbano, que identifica e que simboliza esta mais difuso, uma cidade mediterrânea, pelo seu

2
Uma das primeiras referências à abordagem das cidades de água, reporta-se a uma comunicação apresentada no Colóquio Comemorativo dos
450 anos da Cidade de Ponta Delgada (Universidade dos Açores, Março de 1997). Por outro lado, essa mesma comunicação acabou por
desenvolver um texto inicial, apresentado no Festival do Imaginário (Associação Palha de Abrantes, Abrantes, Novembro de 1996). De referir
que ambas as comunicações foram posteriormente publicadas. Finalmente, uma versão ligeiramente reformulada e desenvolvida, foi publicada
em 1998. Mais recentemente, o autor apresentou uma versão do presente texto num Ciclo de Conferências «O Valor da Água», 2002, organizado
por PROACT. O conjunto dessas reflexões, desenvolvidas em diversas direcções e reorganizadas na base de algumas pesquisas empíricas sobre
as frentes de água urbanas e metropolitanas de Lisboa, deverá vir a ser integrada na obra do autor a publicar em 2003, tal como referimos na
primeira nota.
3
Em virtude desta visão de Lisboa como cidade de água já ter sido suficientemente ilustrada, julga-se, em anteriores publicações (tal como
referimos na nota anterior), limitamo-nos, neste momento, a assinalar muito esquematicamente essa específica condição da cidade que, em
todo o caso e tal como sublinhámos, constitui sem dúvida um primeiro olhar sobre Lisboa e uma das visões mais marcantes de expor e de dar
a ver essa mesma cidade!

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clima, pela sua luz e, sobretudo, pela sua cultura. Trata-se, pois, de uma demarcação com
Uma tal percepção é mais evidente na subtileza profundas raízes culturais e civilizacionais e cuja
dos seus materiais e das suas cores, no delineado expressão geográfica aparece relativamente bem
do edificado e do tecido urbano, na confecção dos delineada. Orlando Ribeiro estabeleceu com rigor
seus sabores e na oscilação dos seus humores, essa demarcação que, sob o ponto de vista físico,
enfim, muito mais visível na própria cultura desenha uma “fronteira” oblíqua em pleno centro
material do que no quadro dos comportamentos do continente português, ao longo do rio Mondego.
sociais, demasiado “confundidos” e em parte Realmente, “o Mondego pode considerar-se o limite
integrados nos fluxos permanentes de “outras entre as duas regiões assim demarcadas. Ao Sul
gentes”, dada a grande abertura cultural da cidade deste rio, o domínio árabe foi mais duradouro e
ao “exterior” e aos forasteiros, não tanto por profundo, a reconquista mais tardia e lenta: aqui
influências estritamente turísticas, mas em grande começa o Portugal feito já em parte pelos
medida por razões económicas e sociais. portugueses do Norte, que deles tomou as
Mas donde vem, então, esta dupla condição instituições, os usos, a língua e algumas tintas de
societal urbana, histórica e cultural – numa uniformidade. Contraste de civilização, contraste
dialéctica desigual, certamente – veiculada pelo de clima e de paisagens” (O. Ribeiro, 1945, 90).
que poderíamos considerar como uma certa Em páginas anteriores, o autor era ainda mais
“dominação” atlântica, mas também, num outro explícito quando afirmava que “o contraste entre
plano, pelo que sem dúvida constitui uma espécie as serranias e fundos vales do norte e os monótonos
de “resistência” mediterrânea? No contexto do plainos meridionais condiciona duas vocações
continente português e tendo em conta o próprio humanas. De um lado, o isolamento e o localismo
quadro civilizacional e cultural em que ele se de uma população densa, ensimesmada e esparsa,
insere, é possível registar uma demarcação onde apenas se inscreve uma forte acção histórica
territorial bastante precisa, que como é óbvio não – a romana; do outro, caminhos fáceis e abertos,
é exclusivamente de ordem física, entre o norte e o gente pouco numerosa em grandes núcleos
sul do país continental. É uma tal demarcação que afastados. Foi sempre aqui a larga porta de entrada
nos permite sustentar a influência de uma cultura de todas as influências culturais mediterrâneas
atlântica, sobretudo no norte do país, enquanto que,
(...)” (op. cit., 86). E, sem dúvida, acrescentaríamos
no sul, uma tal influência se reporta, dominan-
nós, Lisboa não deixou de constituir uma dessas
temente, a uma cultura mediterrânea, sobretudo de
portas de entrada, não só daquela influência
matriz islâmica.
mediterrânea, mas, ao fim e ao cabo, daquela dupla
Historiadores, como José Mattoso, geógrafos,
corrente civilizacional!
como Orlando Ribeiro, arqueólogos, como Cláudio
Esta mesma constatação vai ao encontro do
Torres, entre outros, ajudam-nos a estabelecer
posicionamento apresentado pelo historiador e
aquela demarcação, colocando a cidade de Lisboa,
arqueólogo Cláudio Torres, ao acentuar, no quadro
de certo modo, num espaço central de mediação
dos encontros, mas também dos desencontros de
entre aquela dupla influência civilizacional. A este
diversas civilizações, um conjunto significativo de
nível, portanto, tais influências foram plasmadas,
certamente, pelas respectivas componentes consequências da demarcação territorial acima
religiosas, o que levou José Mattoso a afirmar que mencionada, mas agora no próprio contexto da
aquela demarcação, não implicando uma Península Ibérica. Assim, aquele maciço
diferenciação exclusiva, ficou marcada por duas montanhoso “que muitos geógrafos romanos
importantes formações político-religiosas, a cristã chegavam a imaginar como um prolongamento dos
e a islâmica e, mais tarde, também pela formação Pirinéus” (…) define uma grande fronteira natural
judaica (J. Mattoso et al., 1992). E muito embora, entre o Norte e o Sul da Península Ibérica. É uma
ainda segundo o mesmo autor, a partir de 1147, barreira (…) atravessada em quatro pontos
com a Reconquista de Lisboa aos Árabes, aquelas principais, abertos desde sempre aos movimentos
influências religiosas se tenham podido alargar para militares e às caravanas de almocreves”. E se cada
outras crenças, sabemos que, ao fim e ao cabo, a uma destas “quatro grandes passagens-porto” irá
religião judaico-cristã acabará por ser dominante, constituir “a espinha dorsal das quatro nações
ainda que com graduações de certo modo distintas, medievais que decidirão o futuro político da
a norte e a sul do país continental. Península” (recordadas pelo autor como constituin-

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do os reinos de Aragão, Castela, Leão e Portugal), diferenciadas influências culturais, de resto


aquela quarta e última passagem liga, testemunhadas por sucessivas descobertas
precisamente, “os caminhos da Galiza à via de arqueológicas. Ao fim e ao cabo e à semelhança do
Lisboa-Santarém” (C. Torres, 1992, 364), estando que referimos a propósito das supostas crises
assim na origem da formação do reino de Portugal. identitárias das cidades de água, também a este
Porta de “entrada, “passagem-porto”, como nível a ambivalência civilizacional, atlântica e
não ver, então, Lisboa, enquanto referente histórico mediterrânea de Lisboa, continua a alimentar a
e cultural, como mediação territorial naquela dupla própria matriz cultural da cidade, para além de uma
influência civilizacional, atlântica e mediterrânea, certa “anomia” do presente e de eventuais
em cujas origens ancestrais a geografia terá tido, vicissitudes do seu futuro.
portanto, um papel determinante? Por outro lado, Mas Lisboa situa-se também, já o dissemos,
uma tal influência é largamente ilustrada através numa finisterrae, num território de “fronteira”,
das “narrações” (cuja fiabilidade histórica não atlântica sobretudo do ponto de vista geográfico (a
parece estar em causa) dos Cruzados Osberno e não identificar com a geografia física), mas também,
Arnulfo (op. cit., 1936), aquando da conquista de como acabámos de ver, mediterrânea no sentido de
Lisboa, depois de uma longa permanência árabe uma específica demarcação histórica e cultural. Por
(mais de quatrocentos anos) nesse mesmo lugar. isso, Lisboa confronta-se com diversas “fronteiras”,
Poderemos admitir, certamente, alguma fantasia materiais nesta condição de finisterrae, simbólicas
testemunhal por parte daqueles narradores, quando no paradigma das suas frentes de água oceânica,
transcrevem supostos diálogos entre os sitiados e marítima e fluvial, imaginárias nos processos
os conquistadores, mas não interessando, para o identitários de uma cidade de “duas margens”. Uma
que aqui está em causa, discutir esses graus de “fronteira” que condensa, ao fim e ao cabo, aquela
veracidade, as observações que acabam por ser condição terrestre com a projecção aquática da
relevantes são, precisamente, as que se reportam cidade, numa simbiose da terra com a água, em
aos conteúdos culturais e civilizacionais daquele que a condição histórica e cultural de “partir” e de
confronto (cuja leitura se aconselha vivamente). “voltar” se constitui, em última instância, como
Nessa medida, aquelas “narrações”, enquanto uma metáfora de quem vive, efectivamente, numa
referência documental e iconográfica, ajudam-nos terra finita – isto é, onde a terra acaba… – mas
a compreender a referida matriz de duas culturas também onde a vida se acaba!…4
originalmente bem distintas entre si, que embora
não exclusivas estão presentes em múltiplas
formulações linguísticas, no quadro de valores, Do Intersocial ao Multicultural –
comportamentos e representações sociais, no Lisboa a preto e branco
domínio das crenças e dos “destinos”, enfim, numa
simbiose cultural que, contudo, se torna hoje difícil A voo de pássaro, Lisboa abre-se, realmente,
destrinçar da sua matriz original. perante um mar imenso que lhe configura uma
Num tal contexto, aquelas múltiplas imagem global muito forte, como sublinhámos atrás.
influências culturais exprimem-se, do ponto de Contudo, àquele nível, Lisboa é também, diz-se,
vista social, de modo relativamente subtil como já uma “cidade branca”, instalada em sete colinas e
o afirmámos, estando profundamente interiorizadas coberta de casas “com várias cores”, no dizer do
algures num “inconsciente colectivo” de Lisboa. poeta Álvaro de Campos. A voo de pássaro,
Ou, por outras palavras, em diversas zonas da portanto, Lisboa surge assim como um amontoado
cidade são sobretudo as “pedras”, isto é, o quadro de casas, rasgado pelos alinhamentos das ruas e
edificado, o alinhamento das vias, o próprio tecido unido pelos seus viadutos, num tecido de matizes
urbano, para além de uma infinidade de elementos brancas e atijoladas. Trata-se, curiosamente, de
ditos monumentais, que acabam por ilustrar aquelas uma imagem colorida, porque a voo de pássaro, de

4
No texto inicialmente produzido, como «nota de intenção» da referida exposição sobre Lisboa, foram acrescentadas diversas observações sobre
os movimentos migratórios, em que Lisboa tem sido, desde pelo menos meados do século passado, uma importante 1 (com «saída» assegurada,
sobretudo nas últimas décadas, para a maior parte das periferias da cidade!...). Dado tratar-se, contudo, de situações relativamente conhecidas
entre nós, não se julgou importante retomar aqui tais observações. Em todo o caso, adiante teremos ocasião de tecer alguns comentários sobre
essa «miscigenação» social e cultural, sobretudo na cidade contemporânea.

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resto a face mais aberta e visível, presente na maior vimos, Lisboa parece apresentar aquelas duas faces
parte dos guias turísticos. Uma tal imagem foi-se de um modo bastante distinto, mas trata-se,
insinuando, progressivamente, em várias descrições efectivamente, de uma imagem efémera e
da cidade, dando origem ao surgimento de diversos finalmente enganadora. Pelo contrário, olhando a
mitos, um dos quais é, sem dúvida, o daquela cidade com maior proximidade, as imagens são
“cidade branca”. Como se, paradoxalmente, cada quase sempre mistas, vestidas de “branco” e de
habitante de Lisboa fosse conduzido a ter uma dupla “negro”, simultaneamente. Por isso, o desafio, que
imagem da cidade, como um sintoma de eventual não se pretende necessariamente dialéctico, é o de
esquizofrenia: uma delas corresponde ao seu dar a ver a cidade através de múltiplas imagens,
quotidiano urbano, vivido entre blocos de cimento digamos a preto e branco, que são ainda as cores
e parqueamentos compactos de veículos, entre as que mais próximas se parecem da realidade de
novas urbanizações e manchas de casas aban- Lisboa!
donadas, mergulhado num espaço de qualidade Em todo o caso, sabemos que Lisboa mudou
muito desigual e na ausência de um espaço público bastante nos últimos quinze anos. Mudou ao nível
abusivamente privatizado; em aberto contraste, da sua estrutura urbana, dos seus equipamentos,
surge uma outra imagem, ilustrada e colorida, vista do quadro edificado em geral. Mas mudou também
algures apressadamente nas mãos de um turista ou do ponto de vista da sua composição social e
num luminoso cartaz de publicidade e que o cultural, num processo estreitamente associado às
lisboeta distraído acredita ser a sua cidade! mudanças económicas e políticas (do país e
Mas, por momento, os Corvos da Cidade (os naturalmente também da sua capital). Tais
símbolos emblemáticos de Lisboa) deixam de voar! transformações implicaram, assim, importantes
É altura para corrigir a visão, sobrepondo aquelas mudanças nos comportamentos colectivos, nos
perspectivas distintas e contrastadas, como se se modos de apropriação urbana, nos estilos de vida,
tratasse do “negativo” e do “positivo” de uma nas relações culturais. Num tal contexto, as imagens
mesma imagem fotográfica. Uma tal imagem da cidade (no plural) mudaram e diversificaram-
adequa-se melhor ao “passado glorioso” da cidade, se igualmente, repartidas em direcções muito
mas também ao “realismo incerto” do presente de variadas, por vezes contraditórias, mas sempre
Lisboa, mais próximo, ao fim e ao cabo, do que relativamente abertas e dependentes, obviamente,
pode vir a ser o seu futuro. Cidade Branca, Cidade dos olhares sobre essas mesmas mudanças.
Negra (ou vice-versa), numa alegoria urbana Numa homologia com as observações an-
jogando, assim, com o “impressionismo romântico” teriores, sobre o “branco” e o “negro” de Lisboa,
de Alain Tanner (no século vinte), com a sua aquelas imagens levam-nos então para uma outra
“cidade branca”, mas onde também parece surgir distinção, que não deixará de nos encaminhar para
o “expressionismo (neo)realista” de George Sand outros retratos da cidade. Cidade de Dia, Cidade
(no século dezanove) com a sua “cidade negra”. de Noite, distinguindo, literalmente, os dois
Trata-se, realmente, de uma alegoria, dialogando momentos de uma mesma jornada urbana, abrem-
assim, simultaneamente, com as duas faces de uma se, assim, para imagens urbanas diferenciadas,
mesma condição urbana. muito polarizadas pelo vivido na cidade, através
São, também, as duas faces de Lisboa do ponto de acções e de comportamentos colectivos de
de vista social e urbanístico, duas faces apropriação urbana de Lisboa. Haverá, certamente,
contraditórias que fazem parte da mesma cidade. uma distinção importante, ainda que um tanto
Isso não significa, contudo, que se esteja perante arbitrária, entre os residentes de Lisboa e os
uma realidade dicotómica, num modo maniqueísta “utentes” da cidade, que estará na origem de uma
de ver a cidade, como se tivéssemos, de um lado, a diferenciada projecção de imagens (relevando da
face “branca” da cidade e, do outro, a face “negra” cidade, da metrópole e do seu próprio exterior),
de Lisboa. Ou como se fosse possível distinguir o mas que acabam por se cruzar e por se articular de
“branco” urbanístico, do “negro” social, ou vice- modo distinto, durante o dia e ao longo da noite.
versa! Realmente, o que a alegoria nos permite Decorrente da composição social e da agregação
antever é que estaremos sempre perante distintos cultural daqueles múltiplos agentes e actores, nos
planos de observação, diferentes escalas de leitura dois momentos da jornada urbana, é possível
e de vivência da cidade. A voo de pássaro, como identificar, assim, a produção de diferentes práticas

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urbanas, de distintos estilos de vida, de variados mistificadas, pode-se admitir que a transfiguração
modos culturais que, em conjunto, configuram uma do dia para a noite de Lisboa é emblemática em
determinada tipificação, de algum modo estratifi- relação a alguns dos efeitos acima indicados, em
cada e por vezes conflitual, de grupos sociais, de particular ao nível da relevância de certos
comportamentos colectivos e de modos de apro- acontecimentos e na própria manifestação de
priação da cidade. A partir de uma tal tipificação, diversos tipos de comportamentos colectivos.
seria possível referenciar, então, os protagonistas Seria possível, assim, referenciar certas zonas
principais da “noite para o dia” de Lisboa5. de Lisboa, na generalidade situadas no interior da
É certo que em relação aos protagonistas do parte mais antiga da cidade, ou seja, no contexto
“dia” da cidade, a sua referenciação decorre, do centro histórico de Lisboa, em que quase sempre
sobretudo, da respectiva estrutura social e da se passa “alguma coisa”, constatando-se, no
correspondente dinâmica cultural, na medida em entanto, que tais vivências são bastante
que aquela cidade é, ao fim e ao cabo, a cidade heterogéneas sobretudo do ponto de vista social.
“normal” de todos os dias... Nessa medida, é Sublinhar esta heterogeneidade não significa
possível alcançar uma melhor especificação do ignorar a existência de determinadas tendências
perfil daqueles protagonistas através dos fluxos de ou polarizações sociais, ainda que num quadro
mobilidade urbana que por múltiplas razões cruzam urbano de acentuada intersocialidade. Pelo
a cidade, desenhando, desse modo, uma intrincada contrário, ao nível propriamente cultural
malha de relações que do ponto de vista social (nomeadamente se introduzirmos uma ponderação
aparenta ser bastante indiferenciada. Sabemos que étnica, de nacionalidade ou similar), é possível
a um nível mais geral, digamos metropolitano, referenciar locais, acontecimentos ou comporta-
aquela mobilidade é bastante estruturada por aquilo mentos que, de algum modo, parecem apelar a uma
que, tecnicamente, se designa de “movimentos assumida homogeneidade local, identificada a
pendulares”, parecendo direccionar, assim, aquela partir de certas especificidades culturais, que como
malha de relações. Contudo, no quadro quotidiano tais são entendidas, pelo menos no quadro do
da cidade de “todos os dias”, é ainda aquele magma imaginário dos “outros”!
de relações que, sobretudo em determinadas zonas Referimos atrás importantes mudanças da
cidade, potenciam uma intensa dinâmica urbana, cidade, nos últimos quinze anos, em especial no
socialmente indistinta mas culturalmente que se refere aos respectivos comportamentos de
compósita. apropriação da cidade. Num tal quadro de
De certo modo, é sobretudo a cumplicidade mudança, é possível referenciar, assim, lugares
da “noite” na cidade que é mais propícia ao urbanos que sempre (?) foram da “noite” de Lisboa
surgimento de acontecimentos relevantes ainda que – mesmo se, durante o dia, a vida da cidade segue
muitas vezes efémeros, à possibilidade de (quase) como sempre... – registando-se, simulta-
agregações colectivas tantas vezes por simples neamente, a “descoberta” de novos locais, em
adição, à formação de afinidades várias embora especial os situados junto ao Tejo ou mesmo nas
ocasionais, à imaginação de comportamentos por frentes de água de Lisboa. É certo que a intervenção
vezes inovadores, enfim, a um conjunto muito urbanística na zona oriental da cidade (a propósito
heterogéneo de acções de algum modo da Exposição em 1998), permitiu o relançamento
“transgressoras” face à “normalidade” do dia-a- desta proximidade entre a cidade e o seu rio (um
-dia da/na cidade. Talvez seja um tanto abusivo falar mar urbano, como tivemos ocasião de enfatizar).
de movida no contexto de Lisboa, estabelecendo Em todo o caso, é bom ter presente que esses tipos
comparações com algumas cidades de Espanha de intervenção, procurando inverter a longa
(nomeadamente, Madrid e Barcelona), hoje um situação de uma cidade que se expandiu “de costas
pouco generalizadas a diversas cidades europeias, para o rio”, têm alguns antecedentes, nomea-
sobretudo do sul de influência mediterrânea. damente em Alcântara, para além de acções mais
Independentemente de tais influências, um tanto pontuais na margem esquerda de Lisboa. Por isso,

5
Permito-me recordar, uma vez mais, os objectivos do presente texto, enquanto «nota de intenção» de uma exposição sobre Lisboa. Em tais
condições, pretende-se, sobretudo, desenhar o fio condutor dessa eventual exposição e não propriamente apresentar resultados de uma hipotética
pesquisa empírica.

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no contexto dos presentes “olhares” sobre a cidade, numa efemeridade consequente, ao fim e ao cabo,
a generalidade deste tipo de intervenções nas com aquela mesma abertura ao “exterior”!6 Em
frentes de água, hoje relativamente consolidadas, última análise, seja ao nível de um certo arcaísmo
parece apontar para o que designaríamos como uma linguístico, seja na sua formulação mais actual,
cultura das docas, no quadro da qual a fruição do estaremos sempre, aparentemente, perante um
rio constitui, sem dúvida, um modo muito particular quadro urbano histórica e culturalmente seme-
de fruição da própria cidade. lhante, no contexto metafórico daquela multipli-
Uma tal postura cultural leva-nos a concluir cidade de sentidos e de significados.
que a vivência da “noite” em Lisboa é mais pública Ao nível mais propriamente empírico,
do que privada, ainda que essa vivência se possa contudo, Lisboa apresenta-se em termos menos
processar em espaços com alguma privacidade (mas metafóricos e mais “realistas”. Com efeito, aquele
de uma privacidade muitas vezes ocasional) ou quadro urbano, que é também de projecção
mesmo “reservados”, sendo que, na maior parte metropolitana como se sabe, é diariamente cruzado
das situações, pressupõem quase sempre um por intensos e compactos fluxos de utentes,
generalizado acesso público. Como se compreen- originando na cidade “intra muros” um puzzle de
derá, não é propriamente o estatuto jurídico da diferenciados estratos sociais, mas também de
propriedade desses espaços que aqui está em causa. distintos padrões culturais. Naturalmente, uma tal
Uma vez mais, a matriz mediterrânea de Lisboa, diversidade social e cultural tem matrizes históricas
que atrás assinalámos, pode ajudar-nos a entender e antropológicas relativamente bem demarcadas,
aquele modo muito particular de “publicitação” da tanto nas suas origens como nos seus projectos.
vida quotidiana, que certamente estará na origem Contudo, num contexto de acentuada agregação
daquilo que determinada literatura designa de (mantendo, quase sempre, as respectivas distâncias
“cultura de rua” (cfr., entre outros, Isaac Joseph, sociais e culturais…), aquele magma social e
1998), numa abordagem estreitamente articulada cultural actua numa espécie de “reacção em
com a própria problemática dos espaços públicos cadeia”, na medida em que ele se vai estruturando
urbanos. Por sua vez, esta mesma problemática é através de um processo progressivo e recíproco de
indissociável do próprio debate, mais de ordem efeitos de socialização e de aculturação.
filosófica, sobre a condição pública da cidade que, Recordemos, assim, que uma boa parte da
sem sofismas, apela desde logo à raiz pública população (sobretudo a mais idosa), habitando no
daquela condição urbana, decorrente, de resto, de espaço metropolitano de Lisboa, mas trabalhando
um entendimento mais profundo da própria noção na cidade “central”, é oriunda de outras regiões
de cidade. Num tal enquadramento, portanto, é do país, tendencialmente do centro de Portugal, a
através daquela cultura de rua, que embora não que habita na margem norte da Metrópole de Lisboa
específica da “noite” de Lisboa, se projecta com e em grande parte do Alentejo a que acabou por se
maior exuberância as múltiplas vivências públicas instalar na respectiva margem sul. Em aberto
na cidade. contraste e amiúde com sublimadas conflituali-
Invocámos atrás a intersocialidade dos modos dades, a generalidade das novas gerações resul-
de apreensão e de apropriação de Lisboa (e de certo tantes desses “rurais desenraizados” (no dizer de
modo também do próprio país). Efectivamente, pelo Raymond Ledrut, 1968), acabou por viver pro-
menos desde o século XVI, Lisboa aparenta ser uma cessos de significativa mobilidade social e por vezes
“cidade de mui e desvairadas gentes”, na célebre também espacial, constituindo, em grande medida,
afirmação de Luís de Camões em meados desse as novas camadas das ditas classes médias – de
século. “Desvairadas gentes”, realmente, na sua inserção urbana, na conclusão de F. L. Machado e
multiplicidade de sentidos e de significados, A. F. da Costa (1998) – habitando assim em espaços
sublinhando o mosaico social e cultural de uma mais “qualificados” da Metrópole de Lisboa.
cidade aberta a vários “espantos” e “desvarios”, É certo que, em período mais recente, se
mas também a diferenciadas “perdas” e “paixões”, registou uma nítida transformação na composição

6
No original (em francês), permitimo-nos um certo jogo etimológico e linguístico, a propósito daquele termo «desvairadas», desdobrando assim
aqueles sentidos e significados em torno de «effarements» (espantos, assombros, …), «affolements» (loucuras, desvarios, …) e «egarements»
(perdas, extravios, …)!

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CIDADES Comunidades e Territórios

social e cultural da população da Metrópole de padrões de referência. Para além daqueles


Lisboa. Desde logo, com o regresso progressivo de condicionamentos de ordem económica e política,
emigrantes vindos do estrangeiro, em que é possível que permitem medir a fluidez da mobilidade social,
assinalar uma socialização mais “modernizada” o mosaico final é já suficientemente misto – uma
(sobretudo dos regressados da Europa), visível mixité urbaine, tal como Roselyne de Villanova
através de modos de vida muito diferentes face ao (2001) a nomeou – impedindo assim uma leitura
quadro social e cultural demasiado “fechado” autónoma, independente daquelas componentes
donde emigraram. Mas transformação social e sociais e culturais. Deste modo, a composição social
cultural, ainda, devido à maciça chegada, em e cultural dos habitantes da Metrópole de Lisboa
meados dos anos de 1970, de “retornados” das ex- joga, simultaneamente, com uma condição
colónias portuguesas em África (dos quais, cerca intersocial e com uma projecção multicultural, cujo
de metade acabou por se instalar naquele espaço resultado final não deixa de contemplar, em cada
metropolitano de Lisboa) e cuja aculturação é momento, uma certa contraditoriedade ao nível
atravessada por profundas ambiguidades, não só social e mesmo alguma conflitualidade de ordem
devidas à nostalgia de um espaço em que cultural.
socialmente tinham “importância”, mas também Num tal contexto, não parece possível concluir
alimentadas pela “raiva” de um tempo definitiva- que a cidade de Lisboa vive na “paz social” daquele
mente terminado! quadro societal – sendo certo, contudo, que em
Realmente, aquela conjuntura marcou termos mais directamente económicos e políticos,
profundas transformações na composição social e a conflitualidade é, por vezes, bastante mani-
cultural da população do país e, portanto, no espaço festa!… Por outro lado, as modalidades de
metropolitano polarizado pela sua capital. Assim, segregação social e espacial são, por vezes,
a partir daquela década de 1970, Lisboa passa a relativamente subtis. Em todo o caso, se não parece
ser, também, um local de chegada de imigrantes adequado falar propriamente de “guetos” (no
vindos sobretudo de África – primeiro de Cabo sentido forte do termo) para certas camadas sociais
Verde e mais tarde de outros países de língua oficial ou grupos étnicos mais frágeis, é possível, contudo,
portuguesa, nomeadamente, de Angola, Guiné e demarcar na cidade determinadas zonas com
Moçambique. A partir daquela conjuntura, a conotações simultaneamente sociais e culturais
imigração para Lisboa passou a intensificar-se, num muito específicas, que não deixam de estar ou de
processo que não deixa de apresentar semelhanças se assumir como segregadas face ao “exterior”.
importantes, cerca de quarenta anos antes, com E se, em princípio, na cidade não há propriamente
outras cidades europeias, como foi o caso de Paris zonas “interditas”, no sentido de não ser possível
que chegou a ser, naqueles anos 70, a “segunda sequer a sua “visita” – o que não se poderá dizer o
maior cidade” de Portugal! Mais recentemente, mesmo em relação a diversas áreas nos espaços
aqueles novos migrantes chegam sobretudo do metropolitanos envolventes! – da parte da
Brasil, mas também de diversos países do leste generalidade dos residentes de Lisboa existe a
europeu (ucranianos, russos, moldavos, etc.), sendo percepção, contudo, que certas zonas são de
contudo duvidoso se Lisboa funciona como um “evitar”. É o caso, por exemplo, das zonas de grande
“ponto de chegada” ou como uma “encruzilhada concentração de habitação dita “social” ou mesmo
de hipóteses”, face a outros destinos possíveis… de alguns lugares dominantemente ocupados, quer
Como é evidente, todo este puzzle de pessoas, ao nível da residência quer nos respectivos espaços
de comportamentos, de movimentos e mesmo de envolventes, por determinadas comunidades
“cores”, não é homogéneo do ponto de vista social. étnicas relativamente fechadas – e, nestes casos,
Ao fim e ao cabo, haverá certamente uma espécie pode-se sempre questionar quem decidiu que
de “sobredeterminação” económica e política aqueles espaços são, efectivamente, “fechados”!
estruturando uma matriz societal com diferentes Tais são, pois, alguns dos pontos de
graus de liberdade. Não se tratando, naturalmente, referenciação desta dupla face de Lisboa,
de um esquema determinista, será numa tal matriz estreitamente marcada pelas respectivas valências
que se irão jogar significativas especificidades de sociais e culturais dos que produzem a cidade e
ordem cultural, multiplicando e diferenciando dos que dela se apropriam, em moldes
comportamentos colectivos, marcas identitárias, diferenciados como vimos. Chegados aqui, portanto,

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Ensaios

e do ponto de vista de dar a ver a cidade intersocial nos impede de discutir aquele espaço urbano sem
e multicultural, seria possível assinalar, no mapa estabelecer as relações com os respectivos actores
de Lisboa, os lugares mais emblemáticos daquela sociais que, precisamente, vão produzindo, de modo
dupla ponderação societal, procurando cruzar, no diferenciado e discriminado, como vimos, aquele
entanto, essa localização demasiado rígida, com a mesmo espaço da cidade de Lisboa. Será talvez uma
própria dinâmica urbana de um espaço claramente definição um tanto académica, mas é bom recordar
metropolitano. E se, a propósito do puzzle que que a cidade é um espaço socialmente construído,
falámos atrás, as múltiplas visões da cidade nos seus múltiplos significados, nomeadamente no
parecem decorrer, neste caso, da recomposição sentido teórico, empírico e mesmo metafórico de
social e cultural das “peças” daquele jogo, as uma tal enunciação. O que nos permite evitar uma
“apostas” a fazer (no pressuposto de dar a ver a leitura das identidades urbanas de Lisboa no
cidade) não poderão deixar de manter suficien- sentido estritamente físico do respectivo espaço
temente abertas as respectivas “regras do jogo”, urbano, tal como não parece possível reduzir as
na presunção, ao fim e ao cabo, que se está perante representações sociais da cidade a um elenco de
uma realidade social e cultural em permanente papéis de simples representação (como meros
processo de reconstrução! “figurantes”, portanto) dos diversos agentes
urbanos.
Identidades, Representações, Imagens Como princípio metodológico de leitura da
– uma mitologia de Lisboa? referida trilogia, centremo-nos, então, nos diversos
lugares genericamente designados de bairros da
Continuamos, portanto, no contexto cidade, enquanto demarcação urbanística, mas
“impressionista” de uma exposição sobre Lisboa, decorrente sobretudo das respectivas especifi-
no sentido anteriormente referido, procurando cidades de ordem social e cultural e não pro-
explicitar agora alguns dos materiais expositivos priamente ao nível administrativo. Constituem,
que poderão suscitar um conjunto de olhares sobre assim, lugares emblemáticos de polarização
a presente trilogia, jogando assim com identidades, sociocultural, cuja referenciação identitária, não
representações e imagens da cidade. Certamente sendo espacialmente imutável, introduz uma
que o percurso anterior, entendido em termos dinâmica urbana subtil mas significativa em relação
textuais, mas também expositivos (no duplo sentido àquela trilogia. Diversos estudos recentes, nos
do termo, isto é, como “descrição”, mas também domínios da sociologia e da antropologia, têm vindo
como “exposição”, propriamente dita), acabará por a fundamentar esses processos urbanos, quer ao
estar presente neste momento, na medida em que nível analítico, aprofundando a trilogia de partida,
a trilogia das identidades, representações e imagens quer em termos empíricos, ilustrando as dinâmicas
de Lisboa apela, ela própria, para correspondentes identitárias, os processos de representação social
“chaves de leitura” de boa parte dos referidos e, ao fim e ao cabo, a trama de relações dos diversos
materiais expositivos. Dito de outro modo, a actores sociais dos correspondentes lugares,
presente abordagem é agora transversal às entretanto estudados. Ressalve-se, contudo, que a
anteriores perspectivas sobre Lisboa, que embora generalidade desses estudos se reporta à cidade
parcelares e sem dúvida parciais, deverão ser, “central” – ou, noutros termos, ao Centro Histórico
assim, integradas numa mesma leitura que, de Lisboa – o que, sem dúvida, limita eventuais
simultaneamente, contemple as cores da cidade generalizações, nomeadamente no quadro
(a “preto e branco”, como vimos), os tempos de uma metropolitano da capital do país.
mesma jornada (através dos contrastes do “dia para Sem preocupações de exaustividade, refira-
a noite”) e a condição urbana de referência (na se desde já um estudo centrado no bairro de Alfama
sua dupla valência intersocial e multicultural). (um dos bairros mais “visitados”, e não só pelos
Tais visões impressionistas, como temos vindo turistas de Lisboa, o que não significa que seja dos
a sublinhar, não são contudo inocentes do ponto de mais “conhecidos”!). O título do estudo, de
vista analítico, como parece evidente. Por isso A. Firmino da Costa (1999), é já uma “tese” de
sabemos que as identidades urbanas de Lisboa abordagem das identidades urbanas e das
remetem, de imediato, para as representações representações sociais de Lisboa – estudo esse que
sociais da cidade, numa situação homóloga à que o autor designou de sociedade de bairro, mas com

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CIDADES Comunidades e Territórios

a precisão de que se trata das “dinâmicas sociais identitária de Lisboa, recusando por isso identificar
da identidade cultural” daquele espaço de a cidade com uma suposta “essência” singular,
observação. Não estando em causa, como é ideia que contudo ainda hoje é admitida por muitos
evidente, recensear a obra em causa, retenhamos, “pensadores” da cidade!7 Por outro lado, tratando-
no entanto, aquela noção de “sociedade de bairro”, se de imagens tendencialmente “localizadas”, elas
que postula uma hipótese expositiva de Lisboa apelam, permanentemente, a referentes mais
extremamente fecunda, no sentido precisamente de globais, o que pressupõe remeter aquelas imagens
dar a ver as diversas “sociedades” – que, repete- para o quadro de sinais e de significações daquele
se, são organizadas a partir das dinâmicas sociais cruzamento de “sociedades” e de “lugares”, face
das respectivas identidades culturais – constituti- à cidade-metrópole de Lisboa.
vas realmente da heterogeneidade social e cultural De acordo com o esquema expositivo que
de Lisboa, que abordámos atrás. temos vindo a seguir, aqueles referentes tenderão
Uma tal hipótese expositiva pode ainda ser a uma explicitação permanente, enquanto “jogos
complementada a partir de um outro estudo, de de imagens” (que não “jogos de espelhos”!), através
Graça I. Cordeiro (1997), que situando-se a partir dos quais se vão estabelecendo códigos de leitura
da antropologia urbana, analisa o quotidiano, a dos materiais em exposição. Por outro lado,
memória e as representações de um outro bairro postulámos atrás que esta última leitura da cidade,
da cidade, neste caso, o bairro da Bica. No quadro em torno das identidades, representações e imagens
daquela abordagem, a autora constatou uma de Lisboa, não deixaria de ser transversal às
diferenciada percepção, por parte dos habitantes observações e aos olhares entretanto percorridos.
desse espaço urbano, em relação aos limites e à Isso mesmo leva-nos a admitir, agora, que aqueles
respectiva configuração do respectivo bairro, ou referentes podem ser formulados a partir de uma
melhor, em relação aos próprios processos de tripla referenciação, de algum modo expressa ou
“identificação com o bairro”, o que a levou a implícita nas leituras (e nos olhares) anteriores.
concluir, de modo sem dúvida paradoxal, pela Concretamente, o mar, a cidade e a metrópole, ainda
existência de diversos “bairros”, quando estão em que relativamente genéricos na sua simples
causa distintos processos identitários e de enunciação, parecem constituir três pólos de
representação dos lugares de referência. E se a referenciação determinante, tendo em conta o
autora acabou por titular o seu estudo como “um contexto expositivo em causa.
lugar na cidade”, não será, propriamente, para Desde já, o mar. Não será necessário,
assinalar “um sítio”, no sentido geográfico do certamente, retomar as observações anteriores sobre
termo, mas para sublinhar até que ponto aqueles a condição, aparentemente paradoxal, de um rio
“lugares de referência” acabam por ser construções tornado mar, não só pela sua projecção dita
colectivas, decorrentes dos jogos identitários, das ribeirinha (numa visão demasiado localizada), mas
redes de representação, enfim, do respectivo ao fim e ao cabo efectivamente marítima, como
magma social e cultural em estreita interacção com também pelo seu papel aglutinador (ou estruturante,
os correspondentes lugares de referência. numa linguagem mais técnica) de uma cidade de
Estamos ainda perante um “puzzle” expo- “duas margens”. Com efeito, o caracter impressivo
sitivo muito heterogéneo, cruzado por “sociedades do estuário do Tejo, não tanto pelas suas dimensões,
de bairro” e por “lugares de referência”, num mas sobretudo pela sua assunção como um mar
mosaico sociocultural e urbano portador e criador “interino” (e de algum modo também “uterino”,
de múltiplas imagens da cidade. Uma tal plura- se tivermos em conta o seu papel na formação
lidade de imagens, certamente contrastadas ainda originária da cidade!), constitui não só uma imagem
que articuladas entre si, permite sublinhar, uma muito forte de identificação de Lisboa, como se
vez mais, aquela mesma heterogeneidade social e projecta, de modo incisivo ou subtil, no próprio
cultural, mas demonstra sobretudo a não unicidade imaginário da cidade. Como vimos noutro momento,

7
Refira-se, a propósito, um primeiro estudo colectivo realizado no Centro de Estudos Territoriais do ISCTE – Uma Aproximação às Identidades
de Lisboa, 1992 (em que o autor deste texto participou, juntamente com outros investigadores, entre os quais precisamente A. Firmino da Costa,
para além de Isabel Guerra, Maria Calado, J. Pais de Brito e J. Luís Casanova), no qual se procurou fundamentar uma postura de análise sobre
a problemática das Identidades no sentido que acabámos de enunciar. Para uma aproximação sucinta àquele primeiro estudo (que por vicissitudes
várias não teve seguimento), cfr. V. Matias Ferreira e Isabel Guerra, 1994.

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Ensaios

um tal imaginário – que participa amplamente nos cidade com o seu rio. Que aquela mesma pedagogia
processos identitários e de representação dos tenha acabado por ser um tanto mistificada (porque
lisboetas, materializável, nomeadamente, em associada a uma suposta operação de “requa-
formas literárias e poéticas, mas também em termos lificação urbana”, cujos limites sociais e urba-
plásticos – joga numa dupla valência de nísticos tivemos ocasião de analisar noutro
referenciação, urbana e metropolitana. Deste modo, momento – cfr. V. Matias Ferreira e Francesco
no primeiro caso, aquele “mar urbano” articula-se Indovina, eds., 1999), é algo que permite enfatizar,
fortemente com a cidade, rompendo então, como antes, os níveis de rentabilidade económica e o grau
vimos, os limites estreitos e simplesmente fluviais de ambiguidade política associados àquelas frentes
da respectiva zona ribeirinha, para se jogar de água, que não propriamente em relação às
plenamente naquelas “frentes urbanas” e assim potencialidades da sua apropriação social e
configurando Lisboa como uma Cidade de Água! cultural.
Num quadro identitário homólogo, a segunda Mas as imagens urbanas de Lisboa e os seus
valência decorre do referido papel aglutinador jogos simbólicos, podem ainda ser referenciados,
daquele estuário, constitutivo de uma “cidade de tal como sugerimos atrás, em relação à própria
duas margens”, conferindo assim, a essa imensa cidade, por mais difuso que possa ser um tal
massa aquática, a condição de um “mar referente! De algum modo, poderíamos mesmo
metropolitano” que como tal se projecta, qual considerar uma tal afirmação como redundante, se
utopia, no próprio imaginário da Metrópole de não mesmo tautológica, uma vez que, ao fim e ao
Lisboa! cabo, são as próprias imagens da cidade que aqui
O rio e o estuário do Tejo desdobram-se, estão em causa. Contudo, no contexto expositivo
assim, em diversas frentes urbanas e metropo- que estamos seguindo, aquele referente assume
litanas, mas sempre frentes de água, multiplicando pertinência, julga-se, se considerarmos a cidade
as imagens da cidade e diferenciando social e ao nível simbólico do seu próprio enunciado, para
culturalmente os modos de vivência e de além, portanto, dos seus limites territoriais, dos seus
apropriação desses espaços de “fronteira” problemas sociais e urbanos, das suas contradições
identitária, porque de ambiguidade territorial, como políticas.
então procurámos ilustrar. E vimos, então, como Numa tal referenciação simbólica, a cidade
aqueles novos modos de apropriação das referidas situa-se muito mais no quadro de um potencial
frentes de água se conjugam, igualmente, com as imaginário colectivo, do que em imagens que ela
mudanças registadas, nos últimos anos, nos estilos possa ter de si mesma, em grande medida
de vida urbana e nos sinais exteriores da vida parcializadas porque tendencialmente “locali-
cultural na cidade – a não confundir com a cultura zadas”. Em certo sentido, é a este nível que mais
urbana, enquanto tal, isto é, enquanto cultura da se estreita e se confunde a relação entre as imagens
cidade! – num conjunto de efeitos circulares que, da cidade e a simbólica urbana, num jogo tentador
em última instância, acabam por sublinhar o do que poderíamos designar de imaginários
caracter emblemático daquela íntima relação da simbólicos de Lisboa8. Não estaremos certamente
terra com a água! A experiência cultural, no sentido em condições, neste momento, para avançar nesta
da criação de “imaginários urbanos”, desenvolvida hipótese expositiva, nomeadamente porque ela
ao longo da realização da Exposição de Lisboa, em apela a um discurso claramente pluridisciplinar (da
1998, que referimos atrás – exposição intencional- sociologia e da antropologia, sem dúvida, mas
mente instalada numa zona, entretanto recuperada, também da história e da filosofia), remetendo, em
da frente de água de Lisboa – não deixou de exercer última análise, para o que já foi designado de
alguma pedagogia sobre aquela íntima relação, mitologia portuguesa – em relação à qual a
acentuando, assim, as formas de aproximação da referência a Eduardo Lourenço (nomeadamente,

8
Sem se situar exclusivamente no quadro dos imaginários simbólicos de Lisboa, mas como introdução à problemática em causa (embora num
contexto anterior ao debate sobre o projecto da modernidade), refira-se a obra colectiva editada pelo ACARTE, 1989.

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CIDADES Comunidades e Territórios

1999) é sem dúvida primordial e paradigmática! – portanto), na referida metrópole. Em todo o caso,
a partir da qual seria necessário explorar, então, o que parece ser suficientemente ilustrativo – no
uma eventual mitologia lisboeta!9 quadro de uma eventual exposição sobre Lisboa –
Eis nos chegados, assim, a um último é o de admitir a multiplicidade daqueles “projectos
referente de discussão daquelas imagens da cidade de cidade”, a partir da construção e reconstrução
e da simbólica urbana de Lisboa – e que se reporta, (desconstrução?) de uma importante e eventual-
precisamente à respectiva metrópole. Tendo em mente heterogénea pluralidade de imaginários
conta os diversos olhares sobre a cidade, entretanto simbólicos da metrópole de Lisboa. Ao fim e ao
percorridos, este referente parece articular-se, cabo, o que aqui ficaria em causa, isto é, em
estreitamente, com a própria dimensão política e exposição, seria o próprio debate sobre a utopia
ideológica dos diversos projectos de cidade10, que urbana – a que não seria estranha a incidência de
no quadro daqueles imaginários simbólicos, se uma hipotética Mitologia de Lisboa – enquanto
jogam, de modo explícito ou no inconsciente proposição, também metafórica, do futuro da
colectivo dos actores em presença (e em acção, cidade, ou seja do futuro da Metrópole de Lisboa!

Referências Bibliográficas
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181-186.

9
Não vem ao caso recensear uma bibliografia, limitada que fosse, sobre esta eventual «mitologia lisboeta», sendo que a obra citada de Eduardo
Lourenço constitui, sem dúvida, a referência primeira de uma tal bibliografia. Mas se não secoloca, realmente, a questão de um tal recenseamento,
refira-se contudo, a título meramente ilustrativo, os diversos estudos levados a cabo pelo antropólogo J. Pais de Brito, nomeadamente as
investigações realizadas sobre o fado em Lisboa (cfr., nomeadamente, o catálogo de uma exposição sobre o Fado, comissariada por aquele
antropólogo, editada em 1994).
10
A literatura sobre «projectos de cidade» é já relativamente ampla, não vindo ao caso, no entanto, a sua expressa referenciação neste momento.
Contudo, no contexto da presente «nota de intenção» de uma exposição sobre Lisboa, aqueles «projectos» devem ser tomados no seu sentido
literal, não se colocando também aqui a questão técnica da sua «tradução» para efeitos meramente expositivos.

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