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Antes de mais nada cabe contatar como o fez Roland Barthes: a retórica está morta. Pelo
menos o monumento retórico que sobreviveu ao menos até o limiar da época moderna e no
qual a retórica era arte, estudo e técnica e um dos saberes mais relevantes das Universidades e
demais instituições de ensino então existentes, ao ponto de estar, na Idade Média, no mesmo
patamar da Filosofia e da Teologia.
Ora, não é surpresa nenhuma que a retórica pós-moderna seja tão dependente da
exploração da imagética. O bom retor sempre foi aquele que conseguiu disseminar imagens
verossímeis na mente de seu público, aliás, comunicar-se é essencialmente projetar imagens,
mimetizar, inventar significados. Ideias, conceitos, projetos, se constroem a partir de imagens,
as mesmas tem uma enorme potência em relação a mente humana. Os jesuítas sabiam disso,
os exercícios espirituais de Loyola demonstravam fixação com a projeção de imagens na mente
dos exercitantes, imagens sacras que fossem capazes de contribuir com a alcance da ascese. Os
budistas igualmente o sabiam e por temer a sedução da imagem recomendavam que se
mantivesse a mente vazia, fitando o nada, transcender as seduções da imagem era essencial à
iluminação.
Então o que difere nosso período dos demais? Bem, na pós-modernidade a imagem
pode ser disseminada numa proporção nunca antes imaginada, sobretudo, com o advento do
vídeo. Assim, o guru está no YouTube, a propaganda está na televisão e as imagens estão em
toda parte, comunicando, difundindo ideias, satirizando, ironizando, enfim, mimetizando. Aliás,
não ao acaso vivemos a era dos memes, essas imagens carregadas de significados de pronta
disseminação, não apenas empregados como peças humorísticas, mas, igualmente como
recurso para promover uma ideia, despertar a curiosidade do leitor a respeito de um tema e até
reforçar ethos coletivos.
A retórica pode estar morta, mas seus fantasmas nos assombram, extenuados num
ponto, ressurgem no outro, uma legião de espectros impossível de exorcizar. Ironicamente é
morta que a retórica se torna mais poderosa, o poder do espectro, do desconhecido, o público
com frequência não percebe que seu orador utiliza de técnicas para lhe convencer, aliás, a
emulação da fala humilde, simplória, destituída de técnica é um excelente meio de convencer
determinados grupos. Barthes diria a este respeito que deveríamos estudar a retórica, não mais
como uma técnica a ser aplicada, mas, a fim de compreender o que foi este monumento e
identificar as formas análogas do mesmo em nosso tempo.
A luxúria começa pelos olhos, vivemos na época da sedução da imagem, a nova retórica
é precisamente a do domínio da imagética, da arte de a partir da mesma cunhar significados
capazes de convencer, vender, cativar. A nova retórica é a retórica do meme, do vlog, do púlpito
televisionado, live da palestra, de quem domina melhor as operações miméticas. Nesta nova
retórica, mesmo o tornar-se um meme, pode ser um meio de ascender, quem sabe até de se
tornar presidente.