Documente Academic
Documente Profesional
Documente Cultură
CONSTRUTIVISMO SOCIAL
155
tel. O sistema foi projetado para distribuir informação de acordo
com as previsões de uma “idade da informação” pós industrial,
mas transformou-se em algo inesperado à medida que os utiliza-
dores o redirecionavam para a comunicação humana. A primeira
grande rede de computadores desvia-se, portanto, claramente
das teorias que eram a sua razão inicial. Um olhar mais cuidado
sobre este caso mostra o papel da agência dos utilizadores no
contraponto ao enviesamento tecnocrático da conceção dominan-
te da sociedade pós industrial.
O terceiro capítulo foca-se no Japão, o primeiro país não oci-
dental a modernizar-se. O Japão representa um caso de teste para
a universalidade dos sucessos modernos. Este capítulo mostra a
relevância da experiência japonesa através da análise de vários
exemplos de transferência de tecnologia e através de uma discus-
são de Kitaro Nishida, o principal filósofo japonês do período
anterior à guerra. O capítulo introduz os conceitos de desenvol-
vimento tecnológico por “ramificação” (b) e por “camadas” (c) e
aplica-os à teoria do “lugar” de Nishida (basho). O caso japonês
não resolve as nossas questões acerca da natureza da modernida-
de, mas mostra que a racionalidade tecnológica assume formas
complexas que são culturalmente relativas. Precisamos de globa-
lizar a nossa conceção de tecnologia, que não se pode continuar a
identificar exclusivamente com os feitos ocidentais.
156
Capítulo IV
TEORIA CRÍTICA DA TECNOLOGIA:
UMA VISÃO GERAL
TECNOLOGIA E CULTURA
Nas explicações padrão da tecnologia, a eficiência serve como
princípio de seleção entre as iniciativas técnicas bem e mal
sucedidas. Porque a eficiência é uma quantidade calculável, a
tecnologia aparece dotada das virtudes da necessidade e
universalidade geralmente atribuídas à racionalidade científica. A
teoria crítica da tecnologia desmistifica esta imagem ao apontar
que a tecnologia não é meramente instrumental para fins
específicos, mas conforma um modo de vida. Este impacto mais
amplo pode ser intencional ou não; pode resultar de escolhas
específicas no projeto ou de efeitos laterais. De qualquer forma, o
impacto da tecnologia não é uma quantidade, mas sim uma
qualidade, e nada tem a ver com racionalidade universal. Precisa
de um tipo muito diferente de explicação.
A sociologia construtivista da tecnologia mostra que
diferentes configurações dos recursos podem resultar em versões
157
CAPÍTULO IV
158
TEORIA CRÍTICA DA TECNOLOGIA: UMA VISÃO GERAL
159
CAPÍTULO IV
160
TEORIA CRÍTICA DA TECNOLOGIA: UMA VISÃO GERAL
AUTONOMIA OPERACIONAL
Para muitos críticos da sociedade tecnológica, Marx agora é
um autor irrelevante, um advogado de teorias económicas
ultrapassadas. Mas Marx teve contributos importantes para a
filosofia da tecnologia, que não se devem perder em conjunto
com a sua desacreditada abordagem económica. Ele focou-se de
uma forma assim tão exclusiva sobre a economia porque, no seu
tempo, a produção era o principal domínio de aplicação da
tecnologia. Com a penetração da mediação técnica em todas as
esferas da vida social, as contradições e os potenciais semelhantes
aos que ele identificou na fábrica tiveram o mesmo destino.
Na visão de Marx, o capitalista é, em última instância,
alguém que se distingue não só por deter a posse da riqueza, mas
também pelo controlo das condições de trabalho. O proprietário
tem interesse técnico, tanto quanto económico, no que acontece
dentro da sua fábrica. Reorganizando o processo de trabalho,
pode aumentar a produção e os lucros. O controlo do processo de
trabalho, por sua vez, dá origem a novas ideias para a
maquinaria, e daí segue-se, a curto prazo, a mecanização da
indústria.
Ao longo do tempo, isso conduz à invenção de tipos
específicos de maquinaria que desqualificam trabalhadores e que
exigem gestão. A gestão age tecnicamente sobre as pessoas,
estendendo a hierarquia dos sujeitos e objetos técnicos às relações
humanas, na procura da eficiência. Afinal os gestores
profissionais representam, e em certo sentido substituem, os
proprietários no controlo das novas organizações industriais.
Marx denomina isto de “dominação impessoal” inerente ao
capitalismo, em oposição à dominação pessoal das anteriores
formações sociais. Materializa-se no projeto de máquinas e na
organização da produção. Num estádio final, que Marx não
antecipou, as técnicas de gestão e organização e os tipos de
tecnologia inicialmente aplicadas no setor privado são exportadas
161
CAPÍTULO IV
162
TEORIA CRÍTICA DA TECNOLOGIA: UMA VISÃO GERAL
163
CAPÍTULO IV
164
TEORIA CRÍTICA DA TECNOLOGIA: UMA VISÃO GERAL
165
CAPÍTULO IV
166
TEORIA CRÍTICA DA TECNOLOGIA: UMA VISÃO GERAL
167
CAPÍTULO IV
168
TEORIA CRÍTICA DA TECNOLOGIA: UMA VISÃO GERAL
169
CAPÍTULO IV
ESTRATÉGIAS DE RECONTEXTUALIZAÇÃO
As sociedades pré-modernas e modernas atribuem pesos
relativos diferentes à sistematização e à mediação. Nas
sociedades pré-modernas, como assinala Latour, as redes técnicas
eram relativamente curtas e os seus nós ligados de forma frágil
(Latour 1993). No entanto, mediações valorativas muito
elaboradas controlam todos os aspetos da vida técnica; aqui, a
técnica é inseparável daquilo que nós, modernos, chamamos arte
e religião. Logo, armas tribais e palhotas podem ter um mesmo
simbolismo, mas não estão sistematicamente relacionados por
especificações técnicas de grande precisão, tal como estão as
tecnologias modernas. Como resultado, as sociedades pré-
modernas têm um alcance espacial limitado - as suas redes
confinam-se a regiões locais - mas conquistam o tempo, no
sentido em que podem ser reproduzidas com sucesso ao longo de
milhares de anos.
As sociedades modernas enfatizam a sistematização e
constroem redes de grande dimensão através de ligações fortes a
grandes distâncias entre tipos muito diferentes de coisas e
pessoas. Isto exige que o artefato seja despojado da maior parte
das mediações valorativas. O excesso resultante de ênfase, sobre a
instrumentalização primária e a sistematização, torna possível
tanto as organizações hierárquicas de grande dimensão como as
disciplinas técnicas. Mas, a despeito do poder sobre os seres
humanos e sobre a natureza, ou talvez por causa disso, as
sociedades modernas têm tão pouco controlo do tempo que é
incerto se irão sobreviver para além este novo século.
Até há pouco tempo, era moda os críticos sociais
170
TEORIA CRÍTICA DA TECNOLOGIA: UMA VISÃO GERAL
171
CAPÍTULO IV
172
TEORIA CRÍTICA DA TECNOLOGIA: UMA VISÃO GERAL
TECNOLOGIA E DEMOCRACIA
A teoria crítica da tecnologia é uma teoria política da
173
CAPÍTULO IV
174
TEORIA CRÍTICA DA TECNOLOGIA: UMA VISÃO GERAL
175
CAPÍTULO IV
176
TEORIA CRÍTICA DA TECNOLOGIA: UMA VISÃO GERAL
177
CAPÍTULO IV
CONCLUSÃO
Toda a tecnologia aponta para um operador, por um lado, e
para um objeto, por outro lado. Quando tanto o operador como o
objeto são seres humanos, a ação técnica é um exercício de poder.
Onde, para além disto, a sociedade se organiza em torno da
tecnologia, o poder tecnológico é a principal forma de poder na
sociedade. Realiza-se por projetos que reduzem o leque de
interesses e preocupações e que podem ser representados pelo
funcionamento normal da tecnologia e das instituições
dependentes. Este estreitamento distorce a estrutura da
experiência e causa sofrimento humano e danos ao ambiente
natural.
O exercício do poder técnico evoca resistências de um novo
tipo, imanentes ao sistema técnico unidimensional. Os excluídos
do processo de projeto sofrem eventualmente as consequências
indesejáveis da tecnologia e protestam. Abrir a tecnologia para
um leque mais amplo de interesses e preocupações levaria a um
novo esforço de projeto com vista a uma maior compatibilidade
com os limites e poderes humanos e naturais. Uma
transformação democrática, a partir da base, pode reduzir os
ciclos de retroalimentação a partir dos prejuízos nas vidas
humanas e na natureza e dirigir uma reforma radical da esfera
técnica.
Uma compreensão adequada da substância da nossa vida
comum não pode continuar a ignorar a política da tecnologia. A
maneira como vivemos é largamente moldada pela forma como
configuramos e projetamos cidades, sistemas de transportes,
meios de comunicação e a produção industrial e agrícola.
Estamos a fazer, cada vez mais, escolhas sobre saúde e
conhecimento ao projetarmos as tecnologias de que dependem a
medicina, a investigação e a educação. Para além disso, os tipos
de coisas que parece plausível propor como avanços ou
178
TEORIA CRÍTICA DA TECNOLOGIA: UMA VISÃO GERAL
179
Capítulo V
DA INFORMAÇÃO À COMUNICAÇÃO:
A EXPERIÊNCIA FRANCESA COM VIDEOTEXTO
INFORMAÇÃO OU COMUNICAÇÃO?
Noções como “sociedade pós-industrial” e “era da informa-
ção” são antecipações - ficções da ciência social - de uma ordem
social baseada no conhecimento (Bell 1973). O antigo mundo do
carvão, do aço e dos caminhos de ferro vai-se evaporando numa
nuvem de fumo industrial à medida que vai nascendo um mun-
do novo baseado nas comunicações e nos computadores. Os vul-
garizadores desta visão rejubilam com muitas das mesmas
tendências que são lamentadas pela crítica distópica, tal como os
níveis cada mais elevados de organização e integração da econo-
mia e a importância crescente das especialidades.
Os computadores têm um papel especial nestas antevisões,
porque a gestão das instituições sociais e das vidas humanas de-
pende cada vez mais do acesso fácil a dados. Os computadores
não só arquivam e processam dados, como também podem ser
ligados em rede para distribuir os dados. No futuro pós-industri-
181
CAPÍTULO V
182
DA INFORMAÇÃO À COMUNICAÇÃO: A EXPERIÊNCIA FRANCESA COM VIDEOTEXTO
183
CAPÍTULO V
184
DA INFORMAÇÃO À COMUNICAÇÃO: A EXPERIÊNCIA FRANCESA COM VIDEOTEXTO
MODERNIZAÇÃO
A questão da modernidade está muito viva em França, de
uma maneira que é difícil de imaginar nos Estados Unidos. Os
americanos experimentam a modernidade como um direito de
nascença; a América não se esforça pela modernidade, antes defi-
ne-a, ou pelo menos eles assim acreditam. Por isso os Estados
Unidos não tratam a sua própria modernização como uma ques-
tão política, mas antes confiam no caos criativo do mercado.
A França, pelo seu lado, tem uma longa tradição de preocu-
pações teóricas e políticas com a modernidade. Primeiro na som-
bra da Inglaterra, e depois da Alemanha e dos Estados Unidos, a
França tem lutado por se adaptar, por si mesma, a um mundo
moderno que sempre sentiu, em certa medida, como sendo um
desafio externo. O extraordinário atraso do seu sistema telefónico
era um símbolo desse conservadorismo em geral e, por isso, a sua
modernização rápida, sob o presidente Giscard d’Estaing, signifi-
cava uma vontade de ir ao encontro do desafio. Este é o espírito
do famoso Relatório Nora-Minc, que Giscard encomendou a dois
quadros públicos de topo, para definir os meios e objetivos de
uma política concertada de modernização da sociedade francesa
nos últimos anos do século (Nora e Minc 1978).
Nora e Minc apelaram para uma ofensiva tecnológica em
“telemática”, o termo que cunharam para descrever o casamento
185
CAPÍTULO V
VOLUNTARISMO
Assim concebido, o projeto caíu naturalmente nas mãos do servi-
ço público. Mas a escolha, que pode parecer estranha para os
186
DA INFORMAÇÃO À COMUNICAÇÃO: A EXPERIÊNCIA FRANCESA COM VIDEOTEXTO
187
CAPÍTULO V
OPOSIÇÃO
Tal como foi inicialmente concebido, o Teletel estava desenhado
para trazer a França para a idade da informação através de uma
grande variedade de serviços. Mas será que aquilo que cada uma
das habitações precisa é realmente de mais informação (Iwaasa
1985, 49)? E quem estava mais qualificado para oferecer serviços
de informação numa democracia (Marchand 1987, 40ff)? Essas
questões receberam uma variedade de respostas antagónicas du-
rante os primeiros anos do videotexto francês.
A modernização através do serviço nacional define o progra-
188
DA INFORMAÇÃO À COMUNICAÇÃO: A EXPERIÊNCIA FRANCESA COM VIDEOTEXTO
189
CAPÍTULO V
COMUNICAÇÃO
Surpreendentemente, embora os subscritores de telefones esti-
vessem agora equipados para a era da informação, fizeram rela-
tivamente pouco uso da riqueza de dados disponíveis no Teletel.
Consultavam regularmente o diretório eletrónico, mas não muito
mais. Mas, em 1982, os piratas(e) transformaram um serviço cha-
mado “Gretel” num sistema de mensagens (Bruhat 1984, 54-55).
Depois de uma resistência inicial fraca (ou talvez simulada), os
operadores deste serviço institucionalizaram a invenção dos pi-
ratas e fizeram uma fortuna. Logo se seguiram, rapidamente, ou-
tros serviços com nomes como “Désiropolis”, “La Voix de
Parano”, “SM”, “Sextel”. As mensagens “cor-de-rosa” tornaram-
se famosas pelas conversas picantes e pseudo anónimas em que
190
DA INFORMAÇÃO À COMUNICAÇÃO: A EXPERIÊNCIA FRANCESA COM VIDEOTEXTO
191
CAPÍTULO V
192
DA INFORMAÇÃO À COMUNICAÇÃO: A EXPERIÊNCIA FRANCESA COM VIDEOTEXTO
O SISTEMA
Embora ninguém tivesse planeado previamente todos estes ele-
mentos, eventualmente acabou por emergir um sistema coerente
a partir do jogo das várias forças. Composto de elementos cor-
rentes, formou um todo único que finalmente rompeu as barrei-
ras da aceitação pública da CMC.
O sistema caraterizava-se por cinco princípios básicos:
1. Escala. Só um governo, ou uma empresa gigante, teria os
meios para iniciar uma experiência como o Teletel, com uma es-
cala suficiente para garantir um teste adequado do sistema. Pro-
jetos piloto mais pequenos soçobraram todos num dilema do ovo
193
CAPÍTULO V
194
DA INFORMAÇÃO À COMUNICAÇÃO: A EXPERIÊNCIA FRANCESA COM VIDEOTEXTO
O CONFLITO DE CÓDIGOS
Estas interpretações do Teletel contradizem os pressupostos de-
terministas acerca do impacto social dos computadores, que ins-
pirou Nora, Minc e muitos outros teóricos do pós-industrialismo.
A lógica da tecnologia simplesmente não ditou uma solução níti-
da para o problema da modernização; em vez disso, foi um pro-
cesso muito confuso de conflitos, negociação e inovação, que
produziu um resultado socialmente contingente. Quais eram es-
ses fatores, e como é que influenciaram o desenvolvimento da
CMC em França?
CONSTRUTIVISMO SOCIAL
A evolução do Teletel confirma a abordagem do construtivismo
social, introduzida nos capítulos precedentes. Ao contrário do
determinismo, o construtivismo social não explica o sucesso de
um artefato pelas suas caraterísticas técnicas. De acordo com o
“princípio da simetria”, há sempre alternativas que poderiam ter
sido desenvolvidas em vez da alternativa que teve sucesso. O que
195
CAPÍTULO V
196
DA INFORMAÇÃO À COMUNICAÇÃO: A EXPERIÊNCIA FRANCESA COM VIDEOTEXTO
197
CAPÍTULO V
198
DA INFORMAÇÃO À COMUNICAÇÃO: A EXPERIÊNCIA FRANCESA COM VIDEOTEXTO
199
CAPÍTULO V
200
DA INFORMAÇÃO À COMUNICAÇÃO: A EXPERIÊNCIA FRANCESA COM VIDEOTEXTO
O SUJEITO ESPECTRAL
O Teletel foi apanhado numa disputa sobre qual o tipo de experi-
ência pós-industrial que deveria ser projetado tecnologicamente
através da computação doméstica. Como vimos, a definição de
interatividade, em termos de um código técnico racionalista, en-
controu uma resistência imediata a partir dos utilizadores que ig-
noraram o potencial de informação do sistema e que, em vez
disso, o utilizarampara fins de comunicação humana e anónima.
Esta aplicação inesperada revelou toda uma outra dimensão
da experiência do dia-a-dia nas sociedades pós-industriais, mas-
carada pela utopia positivista. Como o hiato entre pessoas indivi-
duais e o papel social se vai alargando, e os indivíduos são a-
panhados pelas “massas”, a vida social reorganiza-se cada vez
mais à volta de interações impessoais. O indivíduo facilmente
desliza entre papéis diferentes e não se identifica inteiramente
com nenhum deles, entra e sai diariamente de várias massas ou
multidões, e não pertence completamente a qualquer uma das co-
munidades. A solidão da “multidão solitária” consiste numa mul-
titude de encontros ambíguos e triviais. Os códigos simplificados
de interação no “sistema” oferecem poucas possibilidades de au-
to expressão pessoal ou de ligação aos outros. O anonimato tem
um papel central nesta nova experiência social e dá origem a fan-
tasias de sexo e violência que estão representadas na cultura das
massas e que, em menor grau, se realizam nas vidas individuais.
Tal como o videotexto permite ao indivíduo personalizar
uma pergunta anónima a uma agência de planeamento de carrei-
ras ou a uma burocracia governamental, agora também a relação
com textos eróticos, até aqui não articulada, pode agora alcançar
uma personalidade, e até mesmo reciprocidade, graças ao Mini-
tel. A privacidade da habitação assume agora funções previa-
mente atribuídas a espaços públicos, como bares e clubes, mas
com uma alteração importante: o écran não liga apenas os inter-
locutores, mas também protege as suas identidades.
201
CAPÍTULO V
202
DA INFORMAÇÃO À COMUNICAÇÃO: A EXPERIÊNCIA FRANCESA COM VIDEOTEXTO
203
CAPÍTULO V
204
DA INFORMAÇÃO À COMUNICAÇÃO: A EXPERIÊNCIA FRANCESA COM VIDEOTEXTO
205
CAPÍTULO V
206
DA INFORMAÇÃO À COMUNICAÇÃO: A EXPERIÊNCIA FRANCESA COM VIDEOTEXTO
207
CAPÍTULO V
REDES AMBIVALENTES
Assim desenhado, o Minitel é um objeto paradoxal. Com o seu
disfarce telefónico, pensado como necessário para o sucesso nas
casas, introduz ambiguidades na definição da telemática e convi-
da para aplicações comunicacionais não antecipadas pelos proje-
tistas (Weckerlé 1987, I, 14-15). Para eles, o Minitel continuaria
208
DA INFORMAÇÃO À COMUNICAÇÃO: A EXPERIÊNCIA FRANCESA COM VIDEOTEXTO
209
CAPÍTULO V
210
DA INFORMAÇÃO À COMUNICAÇÃO: A EXPERIÊNCIA FRANCESA COM VIDEOTEXTO
211
CAPÍTULO V
212
Capítulo VI
TECNOLOGIA NUM MUNDO GLOBAL
INTRODUÇÃO
O Japão sempre foi visto como o caso de teste para a universali-
dade da cultura ocidental. Os japoneses foram o primeiro povo
não ocidental a modernizarem-se com sucesso. Construíram uma
economia poderosa baseada na ciência e na tecnologia. Mesmo
assim, a sociedade japonesa continua significativamente diferente
dos modelos ocidentais que imita. Estas diferenças não são meros
vestígios superficiais de uma tradição moribunda, mas são visí-
veis na própria estrutura da ciência e da tecnologia japonesas
(Traweek 1988). O Japão é suficientemente diferente para se qua-
lificar como uma “modernidade alternativa”? Refuta ou confirma
as reivindicações do universalismo? São questões que o Japão nos
levanta, hoje em dia. Uma primeira resposta a essas questões vem
do próprio Japão. Nos anos trinta, o fundador da moderna filo-
sofia japonesa, Kitaro Nishida, propôs uma teoria inovadora para
a modernidade multicultural. Neste capítulo irei considerar o ca-
213
CAPÍTULO VI
214
TECNOLOGIA NUM MUNDO GLOBAL
215
CAPÍTULO VI
216
TECNOLOGIA NUM MUNDO GLOBAL
217
CAPÍTULO VI
218
TECNOLOGIA NUM MUNDO GLOBAL
A GLOBALIZAÇÃO DO DESENVOLVIMENTO
Ramificação e estratificação são dois padrões fundamentais do
desenvolvimento. As suas relações alteram-se à medida que a
globalização continua. Noutro local descrevi dois tipos de proje-
tos correspondentes a diferentes estádios deste processo. O está-
dio inicial carateriza-se por um “projeto centrado na mediação”,
em que cada nação desenvolve a sua tecnologia de uma forma
relativamente independente das outras (1). O peso esmagador das
tradições nacionais específicas garante que as ideias, mesmo as
ideias de origem estrangeira, são incorporadas de modo diferente
nos dispositivos, em contextos diferentes. Estas diferenças são
devidas, em larga medida, a mediações éticas e estéticas, que são
específicas de cada país, e que moldam o projeto. Portanto, cada
projeto exprime o fundo nacional contra o qual se desenvolve.
A globalização impõe um padrão muito diferente, a que cha-
mo “projectado centrado no sistema”. A economia globalizante
desenvolve-se em torno de um mercado internacional de bens de
capital, onde cada nação procura os elementos que precisa para
construir as tecnologias de que necessita. Este mercado mo-
vimenta módulos construtivos como engrenagens, eixos, fios elé-
tricos, chips de computadores, etc., que podem ser montados em
muitos padrões diferentes(2).
O mercado dos bens de capital é um recurso de tal modo
formidável que, uma vez intensificadas as trocas entre as nações,
rapidamente se torna indispensável. Mas quando o projeto se ba-
seia na montagem de partes pré-fabricadas, deixa de poder aco-
modar as diferentes culturas nacionais com facilidade. Em vez de
exprimir um contexto cultural, os produtos tendem cada vez
219
CAPÍTULO VI
220
TECNOLOGIA NUM MUNDO GLOBAL
221
CAPÍTULO VI
222
TECNOLOGIA NUM MUNDO GLOBAL
223
CAPÍTULO VI
224
TECNOLOGIA NUM MUNDO GLOBAL
225
CAPÍTULO VI
226
TECNOLOGIA NUM MUNDO GLOBAL
227
CAPÍTULO VI
228
TECNOLOGIA NUM MUNDO GLOBAL
229
CAPÍTULO VI
230
TECNOLOGIA NUM MUNDO GLOBAL
231
CAPÍTULO VI
232
TECNOLOGIA NUM MUNDO GLOBAL
233
CAPÍTULO VI
234
TECNOLOGIA NUM MUNDO GLOBAL
235
CAPÍTULO VI
tações irracionais.
Mas, tal como vimos, os valores entram nas escolhas técnicas
através de outras formas mais subtis, que eram invisíveis para os
ocidentais, mas tornaram-se imediatamente óbvias quando a tec-
nologia ocidental foi transferida para o Japão. A tecnologia oci-
dental foi conformada pelas sistematizações que eram os fun-
damentos de uma forma de vida incorporada no seu próprio
projeto, e este modo de vida era muito diferente do modo de vida
japonês. A suposta pureza da racionalidade técnica não precisava
de uma desmistificação elaborada no Japão, porque era obvia-
mente falsa. A interpretação culturalista da tecnologia, de Nishi-
da e Miki, fazia perfeito sentido nesse contexto e antecipou as
conclusões dos estudos contemporâneos da tecnologia. A síntese
dos valores orientais e da tecnologia ocidental, que eles imagina-
ram, tem o seu paralelo, hoje em dia, na estratificação da tecnolo-
gia com os objetivos ambientais, democráticos e outros, que
foram excluídos do processo original de projeto.
Hoje, quando o Ocidente se confronta com as limitações da
sua própria tecnologia, é como se todo o mundo começasse a pa-
recer-se com a modernização no Japão. Estamos ameaçados pela
nossa tecnologia de formas que não podemos mais ignorar e con-
frontados com a nossa própria responsabilidade e também com
poderes insuspeitos, numa inversão surpreendente de pressu-
postos até então óbvios. A ameaça é sistemática e resiste aos mo-
dos familiares de crítica contra a superstição, que temos usado
desde o iluminismo. Precisamos de novas formas de compreen-
der e criticar a tecnologia que nos permitam separar o centro ra-
cional dos nossos sucessos tecnológicos e dos aspetos
indesejáveis que poderiam ser eliminados sob um diferente ar-
ranjo político. O crescimento de uma esfera técnica pública abre
novas possibilidades para intervenções democráticas no desen-
volvimento tecnológico. A filosofia da tecnologia assume toda a
sua significância nesta situação sem precedentes.
236