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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ
PRÓ REITORIA DE ENSINO DE PÓS-GRADUAÇÃO
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E LETRAS – CCHL
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA DO BRASIL – PPGHB
Campus Universitário Ministro Petrônio Portela, Bairro Ininga, Teresina, Piauí, CEP 64049-550
Telefones: (86)3215 5973 – E-mail: mhistbrasil@gmail.com

História e Música:
A construção da identidade nordestina na produção musical e na trajetória
artística de Catullo da Paixão Cearense e João do Vale

Linha de Pesquisa: História, Cultura e Arte

RESUMO
Esta pesquisa visa, por meio da análise das letras e dos elementos musicais das canções de
Catullo da Paixão Cearense e João Batista do Vale, desvelar táticas de discurso capazes de
expressar marcadores identitários territoriais e de sujeito nordestino. Partimos da hipótese de
que a sonoridade destes dois poetas ostenta a potencialidade de expressar um sentimento de
nordestinidade que reverberou e encontrou ressonância em seus ouvintes/receptores. Neste
sentido, esta pesquisa será desenvolvida na perspectiva da História Cultural, buscando
discorrer sobre a produção musical e a trajetória artística dos compositores Catullo e João do
Vale como forma de verificar os processos de invenção e instituição de marcadores
identitários territoriais da região Nordeste, pela interrelação entre racionalidade universal e
local. Como fundamentação teórica basilar, o presente trabalho dialoga com os escritos de
Peter Burke (2005), Stuart Hall (2001), Canclini (2003), Oliveira (1991), Albuquerque Júnior
(2001), Tatit (2002), Haroldo Costa (2009), Mário de Andrade (1991), Marcio Paschoal
(2000). O presente estudo trata-se de uma averiguação na relação da História com a Música,
tendo como hipótese a ideia de que as canções dos artistas elencados contribuíram para os
processos de instituição identitária de Nordeste.

Palavras-chave: História-Música; Nordestinidade; História Cultural; Catullo da Paixão


Cearense; João do Vale.

CPF: 776.434.963-15

Teresina-Piauí
2018
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SUMÁRIO

1. Apresentação da problemática de estudo................................................................... 3

2. Justificativa ................................................................................................................... 4

3. Objetivos........................................................................................................................ 7

3.1. Objetivo Geral .............................................................................................................. 7

3.2. Objetivos Específicos.................................................................................................... 7

4. Fundamentação Teórica – Revisão de literatura....................................................... 7

5. Hipóteses...................................................................................................................... 12

6. Metodologia e Fontes de Pesquisa............................................................................. 13

7. Referências .................................................................................................................. 14
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1. Apresentação de problemática de estudo

O objetivo deste estudo é investigar se os discursos em letras e sonoridades dos


cancionistas Catullo da Paixão Cearense (1863-1946) e João Batista do Vale (1933-1996)
instituíram uma identidade da espacialidade nordestina. A pretensão desta pesquisa perpassa
pela discussão da sonoridade (dicção) como marcador identitário, instituidor de identidades
(HALL, 2001) e instrumento de negociação na composição dos fatos históricos.
Luiz Tatit (2002, p. 09), explica que o cancionista é um compositor que, através de sua
sensibilidade, consegue equilibrar a letra na melodia e a melodia no texto, compatibilizando
coerentemente o sentido destes dois componentes (literário e musical) formadores da canção.
Para o cancionista o que importa não é o que é dito, mas sim a maneira de dizer, e, essa
forma peculiar de se expressar está pautada em seu gesto oral elegante, em sua narrativa na
junção entre a melodia e as palavras, onde reside o ápice da tensividade. Este termo diz respeito
à sensação de: tensão (pergunta, inquietação); suspensão (não-tensão e não-repouso, um
momento de espera); e de repouso (resposta, conclusão); no que diz respeito aos períodos
melódicos e/ou harmônicos de uma canção. Tatit (2002, p. 09-10) afirma que as tensões
linguístico-melódicas ou locais (que distinguem as canções) tornam-se mais importantes que
as tensões harmônicas (que apelam para o sistema tonal), até mesmo porque as últimas estão a
serviço das primeiras e colaboram no processo da sua geração de significados.
Estes dois cancionistas maranhenses marcam a cena artística na capital do Rio de Janeiro
se tornado cancionistas significativos por comporem obras em uma dicção diferenciada, já que
trazem o sertanejo para o centro do seu discurso, forjando uma identidade nordestina. Partimos
da hipótese de que produção destes poetas assume a potencialidade de expressar um sentimento
de nordestinidade que reverberou e encontrou ressonância em seus ouvintes/receptores.
Para Tatit (2002, p. 10), a dicção está relacionada à maneira peculiar que o cancionista
utiliza para expressar a sua obra, seu jeito de cantar, sua forma de gravar, de compor. A questão
primordial da dicção está na forma que o artista encontra para expressar a sua ideia. E esse jeito
peculiar de “dizer” uma mensagem através da arte é que faz com que um intérprete tenha um
gesto mais convincente e eficaz. Isso é que faz a diferença, é o que torna uma obra cancional
mais valorizada na interpretação vocal de um cantor em especial.
Segundo Jairo Severiano (2013, p. 66-67), Catullo foi “o letrista brasileiro de maior
popularidade no início do século XX”, poeta maranhense (de São Luís) que marcou a história
da música brasileira ao introduzir o sertão na canção brasileira. Em relação a João do Vale,
também maranhense (de Pedreiras), constata-se que chegou à cena do Rio de Janeiro em 1950
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– poucos anos após a morte de Catullo – tornando-se um dos porta-vozes, um representante da


sonoridade nordestina ao lado de Luiz Gonzaga e Jackson do Pandeiro (PASCHOAL, 2000;
BARRETO, 2012, p. 48).
Este trabalho apresenta uma proposta de estudo dos dois compositores com produções
musicais (músicas, letras e sonoridades) e culturais distintas, relacionadas com os processos de
“invenção”, institucionalização, e territorialização do Nordeste. Essa pesquisa busca analisar a
produção desses dois compositores evidenciando o universo cultural recriado artisticamente
pelos mesmos que foram problematizados em suas obras, permitindo visualizar ou não uma
relação de continuidade ou descontinuidade na invenção de uma tradição ou identidade
nordestina por meio de suas obras cancionais compostas ao longo do século XX. É importante
salientar que, para Hobsbawn & Ranger (2006, p. 9):

O termo tradição inventada é utilizado num sentido amplo, mas nunca


indefinido. Inclui tanto as tradições realmente inventadas, construídas e
formalmente institucionalizadas, quanto as que surgiram de maneira mais
difícil de localizar num período limitado e determinado de tempo – às vezes
coisa de poucos anos apenas – e se estabeleceram com enorme rapidez.

Partindo dessas premissas, é na perspectiva da História Cultural (BURKE, 2005) que


se deseja desenvolver um estudo que desvele as diferenças, as convergências e os conflitos entre
a produção cancional dos compositores elencados que reside a proposta da presente pesquisa.
Para isso, deve-se salientar que a hibridização (CANCLINI, 2003) musical das obras dos
compositores Catullo da Paixão Cearense (Poeta do Sertão) e João do Vale (Poeta do Povo)
será compreendida em suas temporalidades, levando em conta a interrelação entre a
racionalidade universal e local.
O presente estudo trata-se, portanto, de uma averiguação na relação da História com a
Música, tendo como resultado a constatação se as canções dos artistas elencados contribuíram
para os processos de (des)instituição identitária de Nordeste.

2. Justificativa

No Brasil, a partir do final dos anos de 1980, ampliaram-se as pesquisas no campo


historiográfico, o que levou os historiadores a buscarem novas formas, novas linguagens e
novas abordagens para a produção do conhecimento histórico. Dessa forma, a documentação
sonora constitui uma significativa ampliação para o campo historiográfico e “aparece aos olhos
do historiador como evidência de um conjunto de conteúdos que ele procura compreender e
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revelar com sua pesquisa” (NEVES, 2004, p. 70). O documento musical se torna imprescindível
para a reconstituição histórica dos sujeitos sociais no seu cotidiano,

Nesse mesmo sentido, a produção musical se apresenta como um corpo


documental particularmente instigante, já que por muito tempo constitui um
dos poucos documentos sobre certos setores relegados ao silêncio, centrando-
se na expressão de sentimentos e abordando temáticas tão raras em outros
documentos. Trata-se de uma documentação muita rica e pouco explorada
pela análise histórica, com grande potencial para revelação do cotidiano, das
sensibilidades e das paixões, (MATOS, 2005, p. 29-30)”.

Nesse mesmo viés, “a história, no seu frenesi contemporâneo por novos objetos e novas
fontes, tem se debruçado sobre o fenômeno da música popular. Mas esse namoro é recente, ao
menos no Brasil” (NAPOLITANO, 2005, p. 7). Em muitas produções acadêmicas o documento
música popular é analisado de forma fragmentada, não se fazendo articulação entre letra e
música, estética e ideologia. Como também muitas vezes separa-se a realidade social vivida por
seus compositores da conjuntura social do momento. O presente estudo propõe-se a criar
rupturas nessa tradição de fragmentar letra, música, estética e ideologia, partindo da produção
de Catullo e João do Vale no conjunto da música brasileira de seu tempo.
O fato é que a canção popular se consagrou como um importante veículo de expressão
de ideias e ideologias, refletindo a pluralidade cultural brasileira. De acordo com Marcos
Napolitano (2005, p. 11), “a chamada ‘música popular’, ocupa no Brasil um lugar privilegiado
na história sociocultural. Ela se interpõe como um lugar de mediações, fusões, encontros de
diversas etnias, classes e religiões”, formadoras da utopia social de uma cultura-arte-música
nacional brasileira (NAPOLITANO, 2005, p. 7). O autor segue dizendo que a canção brasileira:

adensou heranças estéticas e culturais complexas, potencializando o fenômeno


da mediação cultural na mesma proporção em que foi galgando
reconhecimento e ocupando circuitos socioculturais cada vez mais
valorizados. (NAPOLITANO, 2005, p. 09).

Por este motivo é que a canção popular tornou-se um dos temas mais fecundos da
atualidade, fazendo-se presente em livros, artigos, monografias, dissertações, teses, despertando
um grande interesse a partir dos anos 70, tendo atingido um ápice destas pesquisas na década
de 1980, no Brasil. Contudo, Napolitano (2005, p. 7-8) pondera que, apesar dos muitos
trabalhos já desenvolvidos, ainda há muitas peculiaridades a investigar sobre esta temática.
As obras de Catullo da Paixão Cearense e de João do Vale, ambos compositores
maranhenses de vertente sertaneja, despertaram (e continuam despertando) a atenção dos
estudiosos da História e da Música brasileira. Analisando as produções dos historiadores que
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trabalham com a história social da música, verificou-se que suas pesquisas abordaram a obra
destes dois cancionistas pela sua vertente estritamente historiográfica, ignorando sua forte
inclinação musical. Por outro lado, os pesquisadores da música tendem a ignorar questões que
envolvem o universo do discurso histórico. Esse fato faz com que tenhamos uma visão
unilateral, e muitas vezes empobrecedora, das obras destes dois poetas da canção, visto que ela
é pautada por uma tensão estilística construída pela presença de elementos tanto do discurso
musical, como do histórico. Portanto, propomos um estudo que leve em consideração as
relações e inter-relações entre História e Música, abordando tanto os aspectos históricos quanto
musicais de maneira dialógica, isto é, sem perdas para nenhuma área do conhecimento, sem
suprimir determinados aspectos em detrimento de outros.
Catullo da Paixão Cearense foi o primeiro representante do sertão e do Nordeste em
âmbito nacional através de suas composições (COSTA, 2009; FRAZÃO, 2014). Assumiu uma
identidade de artista regional, colocando-se como representante de um “Nordeste”
essencializado, homogeneizado. Não só letras e sonoridades instituíram essa homogeneização
identitária de Nordeste, o compositor criou signos de performance musical expressas através da
utilização do violão - que passou a ser considerado um instrumento nacional (TABORDA,
2007), tendo em vista que era considerado um instrumento marginalizado - e de uma voz
robusta e bem impostada, que veio a ser uma dicção que se tornou um tipo de padrão
amplamente utilizado pelos cantores da “dor de cotovelo” até meados do século XX.
Enquanto João do Vale se notabilizou de início pela inserção de suas canções (nos
gêneros forró e baião, e depois música popular brasileira) no repertório de artistas consagrados
pela crítica nacional. O artista de Pedreiras traz em seu arcabouço musical toda uma construção
estilística de compor a partir de uma variada temática de modo mais documental (VELOSO,
1997, p.23). Segundo Barreto (2012, p. 49-50), a consagração do Poeta do Povo aconteceu em
duas esferas: 1- a das canções de “temas regionais do Nordeste” e 2- a esfera que recebeu o
título de “canções de protesto”. Sua obra se destaca, quer pelo viés do engajamento político,
quer pela estética da simplicidade e exaltação da cultura nordestina.
Espera-se que este estudo possa contribuir significativamente para uma maior
compreensão sobre a participação dos dois cancionistas no repertório estético nacional e suas
importâncias na Música Popular Brasileira (MPB). Desse modo, pretende-se articular
conhecimentos históricos e musicais em uma perspectiva dialógica em que a relação entre essas
áreas do conhecimento seja fértil em suas abordagens e proposições. Efetivamente, é partir das
relações entre História e Música que se ancora esse trabalho. O objetivo precípuo do trabalho
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também é servir como fonte de pesquisa para pesquisadores que queiram se aprofundar nas
temáticas aqui abordadas.
.
3. Objetivos
3.1. Objetivo Geral

Analisar a questão da invenção da identidade e territorialidade nordestina expressa na


produção musical (toda a produção cancional registrada) de Catullo da Paixão Cearense e João
do Vale, isso será feito pelo viés da hibridação.

3.2. Objetivos Específicos

I) Analisar a partir das obras e da trajetória artística de Catullo da Paixão Cearense e


do João do Vale a existência de continuidades e/ou descontinuidades da identidade nordestina.

II) Identificar as estratégias de linguagem musical que os dois compositores adotaram


para construir ou desconstruir uma imaginária nordestinidade.

III) Analisar até que ponto a produção musical dos dois compositores representa uma
forma de resistência cultural ao ideário imaginário discursivo de regionalização do país.

4. Fundamentação Teórica – Revisão de Literatura

Esta pesquisa está focada nos estudos culturais e nas reflexões propostas pela História
Cultural, bem como em abordagens teóricas das Artes, Ciências Humanas e Sociais. Entende-
se que a compreensão teórica deste estudo veio com a mobilidade da historiografia ao longo do
tempo. É importante também destacar que a ampliação do campo epistemológico da história
contribuiu significativamente para o rompimento das fronteiras acadêmicas. Nessa ampliação
e na interconexão com outras áreas do conhecimento, emerge a música como forte interlocutora
da história. Com os estudos da cultura, novos objetos e problemáticas ganharam
visibilidade/dizibilidade na produção do conhecimento histórico (BURKE, 2005, p. 15-16).
Muitos pesquisadores em vários países têm se interessado em construir suas pesquisas
por meio da História Cultural. Nesse sentido, muitos historiadores que discutiam em seus
trabalhos temáticas econômicas e sociais passaram a dar maior atenção às questões culturais.
Assim, historiador que centraliza suas produções nos estudos da cultura “dedica-se às
diferenças, aos debates e conflitos, mas também aos interesses e tradições compartilhados”
(BURKE, 2005, p. 7).
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A pesquisa terá como universo de investigação a musicalidade. A música é uma arte,


é uma forma de linguagem que “[...] atravessa certas redes defensivas que a consciência e a
linguagem cristalizada opõem à sua ação e toca em pontos de ligação efetivos do mental e do
corporal, do intelecto e do afetivo” (WISNIK, 1989, p. 28). Assim, compreende-se que a música
é arte do significante que, ao se relacionar com a linguagem, transforma-se em significado.
Partindo dessa premissa, cabe enfatizarmos que canção se configura como um gênero
músico-literário repleto de significantes e significados que podem levar à compreensão do
cotidiano dos atores sociais nos processos históricos. Segundo Moraes (2000, p. 204):

[...] a canção é uma expressão artística que contém um forte poder de


comunicação, principalmente quando se difunde pelo universo urbano,
alcançando ampla dimensão da realidade social. [...] aparentemente as canções
poderiam constituir-se em um acervo importante para se conhecer melhor ou
revelar zonas obscuras das histórias do cotidiano dos segmentos subalternos.
Ou seja, a canção e a música popular poderiam ser encaradas como uma rica
fonte para compreender certas realidades da cultura popular e desvendar a
história de setores da sociedade pouco lembrados pela historiografia.

Assim, vale salientar “o que denominamos de música, portanto, pressupõe condições


históricas especiais que na realidade criam e instituem as relações entre som, criação musical,
instrumentista e o consumidor/receptor”. É no movimento da tradição e da história que a canção
brasileira se constituiu num mosaico complexo e explicativo das identidades nacionais. Dessa
forma, a música popular produz significados na memória coletiva do ouvinte/receptor, cria
sociabilidades e interage como um elemento de aprendizagem cultural no cotidiano.
Ao produzir conhecimento histórico, os que trabalham com o documento sonoro – que
é uma linguagem musical – tomam-no como fonte e enfrentam as condições excessivamente
subjetivas, a imaterialidade de parte do objeto, a expressão localizada e temporalizada própria
do autor e de seu universo cultural. Além disso, geralmente, uma nova leitura é realizada pelo
intérprete/instrumentista.
São riscos que não invalidam o documento sonoro como fonte de pesquisa, visto que
todas as formas de analisar as fontes são subjetivas e, ao mesmo tempo, também objetivas.
Assim, partir do documento sonoro este estudo enfrentará esse risco, ao definir como lugar de
investigação da história as musicalidades em processos de produção de identidade. A situação
de risco provém de várias origens, inclusive do fato de o documento sonoro não se constituir
em objeto palpável. Ao utilizar a música com fonte sonora/documental para produção do
conhecimento histórico é preciso analisar que “[...] a música, além de seu estado de
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imaterialidade, atinge os sentidos do receptor, estando, portanto, fundamentalmente no universo


da sensibilidade” (MORAES, 2000, p. 211).
A música, enquanto síntese desses processos cognitivos particulares de uma cultura e
de seu amadurecimento em contexto social, é “o som organizado humanamente” (PELISKI,
1995, p. 10) que há milhares de anos homens e mulheres utilizam para se comunicar:

[...] Aqui música não é entendida apenas a partir de seus elementos estéticos,
mas, em primeiro lugar, como uma forma de comunicação que possui,
semelhante a qualquer tipo de linguagem, seus próprios códigos. Música é
manifestação de crenças, de identidades, é universal quanto à sua existência e
importância em qualquer que seja a sociedade. Ao mesmo tempo é singular e
de difícil tradução, quando apresentada fora de seu contexto ou de seu meio
cultural (OLIVEIRA PINTO, 2001, p. 2).

Nesse sentido, vale esclarecer que, ao se tomar a música como linguagem fundante
dos tecidos sócio-históricos e culturais e como arte carregada de sentido e de estratos extra-
sonoros, procura-se entender os processos históricos nos quais emergiram a categoria Nordeste
como sequência de uma dinâmica que se instaurou, a partir da segunda metade do século XIX,
na discussão sobre a regionalização do país, à medida que se dava a construção da nação e que
a centralização se caracterizava como estratégia política do Império.
Para se compreender a instituição representativa do Nordeste na música popular
brasileira, questiona-se como os discursos sobre a seca aparecem historicamente e socialmente
nos órgãos oficiais do governo brasileiro. Em princípio, pode-se afirmar que a seca – principal
símbolo do Nordeste – exerceu grande influência na institucionalização dessa região.

Nordeste [...] vasta região ensolarada, cheia de vida, de calor humano e de


musicalidade, espaço sócio-político diferenciado e contrastante, carente,
pesado, responsável pela existência de tantos problemas, misérias e conflitos
(RAGO apud ALBUQUERQUE JÚNIOR, 2001, p. 13).

O discurso regionalista não é apenas ideológico, que canaliza uma pretensa essência do
Nordeste ou de outra região. O discurso sobre a regionalização institui uma “verdade” sobre a
região. Com base nisso, pretende-se investigar até que ponto a obra de Catullo e João do Vale
contribuíram para a (des)legitimação da ideia institucionalizada de Nordeste.
Vale considerar que a definição da atual regionalização do Brasil é recente. E que, por
volta da segunda década do século XX, os termos Norte e Nordeste ainda são usados como
sinônimos, o que demonstra que ocorre neste momento uma transição porque para muitos
nordestinos o discurso de regionalização ainda não havia consumado, persistindo numa
dicotomização discursiva entre Norte e Sul do país. O território nordestino foi uma produção
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imagética-discursiva construído historicamente, formado a partir de um sentimento cada vez


mais específico, em relação a uma dada área do país.
Considera-se ainda que a identidade não é essência, mas uma construção histórica e
social, constatando que “o sujeito previamente vivido como tendo uma identidade unificada e
estável, está se tornando fragmentado; composto não de uma única, mas de várias identidades,
algumas vezes contraditórias ou não-resolvidas” (HALL, 2001, p. 12).
Com este trabalho, procura-se entender como se instituiu a visibilidade/dizibilidade do
Nordeste e a identidade nordestina. Compreendendo dizibilidade como forma de dizer e
visibilidade, como forma de ver, entendendo a música como uma manifestação de identidades.
Neste trabalho busca-se compreender em que medida as produções musicais de Catullo
e João do Vale instituíram ou não as imagens fixas e cristalizadas do espaço e da identidade
regional nordestina, compreendendo que não há uma identidade fixa, essencial ou permanente.
“A identidade torna-se uma celebração móvel” (HALL, 2001, p. 13). Isso implica em dizer que
nossa identidade é definida e construída historicamente, e não biologicamente.
Esta investigação procurará analisar os discursos da linguagem musical nas letras,
música e sonoridades de Catullo e João do Vale, que instituem as identidades de Nordeste e de
ser nordestino, como forma de evidenciar o universo cultural recriado artisticamente para saber,
efetivamente, se existe nas obras destes cancionistas uma relação de continuidade ou
descontinuidade nas construções imagéticas da identidade nordestina.
A noção de território ou de territorialidade adotada para o presente estudo é
caracterizada pelo que é vivido por membros de uma coletividade (RAFFESTIN,1980, p.158).
Considerando que as fronteiras e territórios se situam em planos históricos, criações históricas
multiformes, móveis, dinâmicas, descontínuas, produzindo a ressignificação de território como
algo fixo para uma espécie de desterritorialização. O espaço é produto “[...] de uma rede de
relações entre agentes que se reproduzem e agem com dimensões espaciais diferentes”
(ALBUQUERQUE JÚNIOR, 2001, p. 25).
Nessa perspectiva, este estudo busca apreender de que forma a produção musical de
autores nordestinos, como Catullo e João do Vale, contribui ou desloca uma imagem de
nordeste subjetivada ao longo do século XX. Imagem essa institucionalizada pelo discurso
oficial marcadamente caracterizado pela ideia de seca e carência.
A territorialização nordestina foi apresentada dentro do país como espaço da seca, da
miséria, da dor, do cabra-da-peste. No contexto da musicalidade, o Nordeste está expresso nos
gêneros musicais “nordestinos” como território de dor, mas também de alegria. São símbolos
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desta, por exemplo, a dança no forró pé-de-serra, o chiado do chinelo, no contato da pele suada
em consequência da dança e o ritmo musical do “xaxado” – “onomatopeia do rumor xa-xa-xa
das alpercatas de rabicho arrastadas no chão” (OLIVEIRA, 1991, p. 55). Esses ritmos e sons da
linguagem musical provocam no ouvinte toda uma representação simbólica de nordeste:

As músicas agenciam, na verdade, diferentes experiências visuais e corporais,


produzindo diferentes decodificações, diferentes nordestes [...] a identificação
do baião com o Nordeste é toda uma estratégia de conquista de mercado e, ao
mesmo tempo, é fruto desta sensibilidade regional [...] (ALBUQUERQUE
JÚNIOR, 2001, p. 155).

A noção teórica sobre hibridação (ou hibridismo) constitui outro instrumento de


operação para se entender a música popular e, sobretudo, o repertório discursivo da tradução e
tradição artística dos compositores Catullo e João do Vale. O híbrido torna-se componente
fundamental para se derrubarem noções estanques sobre a cultura popular, que não se reduz ao
que é único, mas tende a se mostrar por várias faces, não se expressando na busca da origem
das coisas, nem na busca linear da história. Ou seja, há múltiplas funções que movem o híbrido.
A música brasileira se constituiu no terreno sinuoso do hibridismo cultural. O exemplo
disso é a própria obra de Catullo, visto que ele transita por duas dicções (uma erudita, advinda
da tradição europeia, e outra popular, oriunda da influência dos cantadores do sertão nordestino)
e a obra de João do Vale, que abarca vários ritmos e sonoridades do Nordeste que sofreram
efeitos da hibridação. O que é híbrido se realiza pelas misturas de gêneros, nesse sentido, parte
do repertório de Catullo e as canções de João do Vale fizeram fusões musicais. A composição
de Catullo dialoga com elementos do que se convencionou chamar de música erudita e popular
ou folclórica. O forró, os xotes, o baião e outros gêneros compostos por João do Vale são
resultado de misturas com outros gêneros regionais e até nacionais. Nesse viés teórico recorre
ao esclarecimento sobre a categoria hibridação que:

[...] abrange diversas mesclas interculturais – não apenas raciais, às quais


costuma limitar-se o termo ‘mestiçagem’ – e porque permite incluir as formas
modernas de hibridação melhor do que ‘sincretismo’, fórmula que se refere
quase sempre a fusões religiosas ou de movimentos simbólicos tradicionais
(CANCLINI, 2003, p. 19).

Nas últimas décadas, a categoria hibridismo se movimentou intensamente no campo


da intelectualidade da América Latina. Essa discussão foi motivada:

[...] pelos estudos sobre a pós-modernidade e, especialmente, sobre a cultura


latino-americana. Ele pode vir indicado por sinônimos mais ou menos
próximos como mestiçagem, miscigenação, sincretismo e mulatismo; ou
12

ainda englobando idéias tais como mescla, mistura, amálgama, fusão,


cruzamento, relação etc. A rigor, aplicados à cultura e à arte, todos esses
termos remetem a uma mesma noção: a de que está em jogo um processo de
misturas que rompe a identificação com algum referencial teórico imediato,
seja estético ou histórico, ou modelo único de análise. Numa obra estética de
perfil híbrido, não há somente um elemento em questão, mas um leque efetivo
de determinantes, referentes e configurações que funcionam de forma
complexa (VARGAS, 2007, p. 19-20).

Ainda sobre este assunto, Mário de Andrade já (1991, p. 11-31) afirmou em termos
gerais que a musicalidade brasileira se constitui como um lugar complexo de interseção entre
os vários elementos ameríndios (o batuque místico de muitas tribos de nativos brasileiros),
afrodescendentes (o incenso ou a religiosidade de muitos povos negros descendentes de
africanos), assim como de várias culturas de brancos europeus (as tradições “eruditas” de vários
países da Europa). Essa dialética cultural é a marca da formação do Brasil enquanto nação.
A investigação proposta sobre Hibridação Musical e a construção de marcos identitários
territoriais de nordestinidade na música de Catullo da Paixão Cearense e João do Vale ganhará
concretude no estudo desses dois compositores da música popular brasileira: Catullo,
responsável pela introdução da temática sertaneja na nascente Música Popular Brasileira e por
representar através de sua sonoridade e de sua dicção a espacialidade nordestina, instituindo
uma territorialidade e com ela uma identidade regional. E João do Vale, por sua singularidade
e expressão com uma obra que adquiriu conotações tanto sociais quanto políticas, que
impulsionou ruptura com fronteiras locais, regionais e nacional, sendo um compositor que
provocou inquietações ao regime militar no Brasil.

5. Hipóteses

Consideramos, de maneira hipotética que a obra cancional destes dois poetas ostenta a
potencialidade de expressar um sentimento de nordestinidade e que esse fato reverberou
encontrando ressonância em seus ouvintes/receptores. Em outros termos, acreditamos que a
obra de Catullo da Paixão e de João do Vale ajudou – por meio de elementos literários, musicais
e históricos – a construir uma identidade nordestina. Buscaremos a comprovação desta hipótese
por meio da leitura e da análise de variadas fontes de pesquisa disponíveis: teses, dissertações,
artigos, livros, periódicos impressos ou digitais, documentos, arquivos audiovisuais das canções
editadas, manuscritos dos autores, entrevistas com conhecidos e/ou familiares, acervos físicos
ou digitais.
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6. Metodologia e Fontes de Pesquisa

No que se refere aos elementos metodológicos, realizarei a revisão do projeto, o


levantamento bibliográfico de obras que abordem os assuntos e teorias base do trabalho de
pesquisa na perspectiva de produzir fichamentos. Farei um planejamento de conversa de
orientação com o professor-orientador e, sobretudo cursarei as disciplinas do programa. No
segundo ano de curso, continuarei a cursar as disciplinas do programa, bem como realizarei a
pesquisa documental na perspectiva de coletar as fontes e documentos relacionados à pesquisa.
Boa parte dos documentos e fontes poderão ser coletados na internet e nas visitas em museus:
da imagem do som do Rio de Janeiro e de São Paulo, bibliotecas, arquivos do Estado de São
Paulo, do Rio de Janeiro e Acervo João Mohana do Arquivo Público do Estado do Maranhão,
em São Luiz. No terceiro ano de curso, uma atividade pertinente para o referido ano será,
realizar entrevistas com familiares e amigos dos cancionistas, além de iniciar a construção do
texto da tese. Para o quarto ano de doutorado, continuarei com a escrita da tese, realizarei o
exame de qualificação, com isso, farei a revisão da primeira versão da tese; no segundo semestre
do mesmo ano, construirei o texto definitivo e consequentemente realizarei a defesa pública.
Para efeito da pesquisa, a significativa produção dos compositores (Catullo e João do
Vale) será analisada e abordada a partir de procedimentos teóricos e metodológicos,
observando-se as temáticas nas canções e os aspectos musicais. Nessa perspectiva, a pesquisa
lança mão de diversas fontes – além das letras e dos sons – tais como: fotografias, capas de
LP’s, depoimentos orais, programas de rádio, matérias de jornais, revistas, imagens de cinema.
Essas fontes e documentos servirão como matérias-primas para a construção deste
trabalho, em que se procura analisar a produção de Catullo e João do Vale e suas trajetórias
artísticas numa relação entre história e música. O material coletado será selecionado a partir
dos objetivos da pesquisa e das suas categorias norteadoras, que, destarte, servirão como guia
de análise. Depois de selecionado, o material será sistematizado em quadros analíticos que
permitiram leitura vertical e horizontal. A leitura vertical possibilitará compreender uma mesma
categoria nas várias letras, ritmos e imagens. E a leitura horizontal permitirá estabelecer
relações entre as várias categorias, o que orientará a definição do percurso teórico/analítico do
material coletado. A pesquisa se restringirá na amostra e análise a partir das temáticas
relacionada à identidade nordestina das composições musicais (todas as canções registradas) de
Catullo e de João do Vale. Assim analisaremos as composições e outras indicadas pela
orientação. Ao investigar a musicalidade (música, letra e sonoridades) como linguagem,
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procura-se apoiar nas temáticas suscitadas pelas canções. Essas análises serão realizadas a
partir de uma seleção minuciosa das composições dos dois artistas.
Pelo viés da hibridação utilizar-se-á como critério para a seleção das letras e canções
a relação do conteúdo com a produção de “identidade”, ou seja, o sentido que a musicalidade
dá às práticas socioculturais que produz a chamada “identidade nordestina”. Compreende-se
que a linguagem é denunciante. Os signos linguísticos utilizados nas composições e na
performance de Catulo e João do Vale vinculados à territorialidade nordestina atuaram como
linguagem denunciante e anunciante da institucionalização identitária da região Nordeste.
Procurará utilizar os seguintes procedimentos para a elaboração da pesquisa: seleção e estudo
de materiais que tenham afinidade com a temática, livros revistas e jornais leitura de outras
fontes bibliográficas sob a colaboração do orientador.
Também serão realizadas consultas sistemáticas ao museu da Imagem e do Som (do Rio
de Janeiro e de São Paulo), ao Centro de Cultura de São Paulo e ao Acervo João Mohana do
Arquivo Público do Maranhão, por serem considerados espaços fundamentais para a pesquisa
em que serão digitalizados documentos, depoimentos e coletâneas dos LP´s.
Cronograma
ATIVIDADE ANO
2019 2020 2021 2022
Revisão do projeto. X
Levantamento bibliográfico e leituras teóricas X
Realização de disciplinas X X
Pesquisa documental X X
Construção do texto da tese X X
Exame de Qualificação X
Revisão da primeira versão da tese X
Elaboração do texto definitivo. X
Defesa Pública X

7. Referências

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