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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS

Apostila Digital Licenciada para Veronica Jesus Dos Santos - jonathan139@yahoo.com.br (Proibida a Revenda) - www.apostilasopcao.com.br
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APOSTILAS OPÇÃO

Quando a quantidade de animais e alimentos aumentou


muito, a correspondência um para um não atendia mais às
necessidades de contagem e comparação, pois, por muitas
vezes, quem comparava se perdia nas representações que fazia
das quantidades. O homem passou a registrá-las a partir de
grupos com pequenas quantidades (de pedras, de traços, de
nós) de forma a auxiliar na visualização e nas comparações.
Foi contando objetos com outros objetos que a humanidade
começou a construir o conceito de número. Para o homem
1. A construção dos primitivo, o número cinco, por exemplo, sempre estaria ligado
a alguma coisa concreta: cinco dedos, cinco ovelhas, cinco
conhecimentos matemáticos e peixes, cinco animais, e assim por diante. A ideia de contagem
científicos pela criança estava relacionada aos dedos da mão. Assim, ao contar o
rebanho, o pastor separava as pedras em grupos de cinco. Do
mesmo modo os caçadores contavam os animais abatidos,
traçando riscos na madeira ou fazendo nós em uma corda,
ENSINO APRENDIZAGEM – MATEMÁTICA também de cinco em cinco.
Ao agrupar as quantidades em pequenos grupos e registrá-
1. Como o conhecimento sobre esse campo de las a partir dessa lógica, usando marcas, os homens acabaram
experiência foi construído historicamente criando diferentes símbolos que lhes auxiliaram na percepção
das quantidades que representavam. Esses registros
Como construção social, a Matemática possui uma história, contribuíram para o homem compreender e desenvolver as
que está associada à forma como o homem estabeleceu noções de número, pois, ao comparar coleções de objetos
relações com a natureza e com a cultura, numa tentativa de diferentes que possuíam a mesma quantidade, começou a
compreender e intervir no mundo. perceber que os registros dos agrupamentos eram os mesmos
O homem primitivo era nômade, organizava-se em tribos e e que poderia, então, associar o mesmo símbolo a essas várias
vivia do extrativismo. Como os animais e alimentos foram coleções.
ficando raros, as tribos tinham a necessidade de calcular as Da necessidade de estocagem dos alimentos surgiram os
quantidades de animais que atenderiam as necessidades de controles de estoque com registros que possibilitaram o
todo o grupo. Como ainda não havia números convencionados, desenvolvimento do cálculo, os sistemas de medida, a
registravam nas cavernas quantos animais a tribo tinha caçado representação com números e os sistemas de numeração.
ou quantos deveriam caçar de forma a atender a necessidade Centurión1 destaca cinco sistemas de numeração: o
da tribo. Nas cavernas encontramos registros usando egípcio, o babilônio, o romano, o chinês e o indo-arábico.
desenhos e outras marcas que podem ser interpretados como Destes, apenas três são de base 10: o egípcio, o chinês e o indo-
quantificação de animais. A ideia de quantidade e, arábico. O nosso sistema é o indo-arábico que foi construído a
posteriormente, de número surgiu dessa necessidade de partir das necessidades culturais dos hindus (± 300 a.c.) e
contar objetos e coisas. difundido pelos árabes.
Em vez de apenas caçar e coletar frutos e raízes o homem Esse sistema utilizava-se de um princípio posicional de
passou a cultivar algumas plantas e a criar animais, passando base 10, o que significa que, a cada dez símbolos iguais,
do nomadismo para o sedentarismo, o que provocou um trocam-se esses símbolos por outro dez vezes maior. Uma das
aumento na variedade de alimentos dos quais o grupo poderia transformações mais significativas, nesse sistema, foi a criação
dispor. Mas como controlar a quantidade plantada? Como do zero, que não existia nos primeiros registros hindus. A
controlar o rebanho adquirido? como ter certeza de que necessidade de representar o vazio para garantir o valor
nenhum animal havia fugido ou sido devorado por algum posicional dos algarismos dentro de um número levou os
animal selvagem? a descoberta da agricultura e o aumento na homens a criarem o zero.
produção provocaram a necessidade de novos conhecimentos. A criação do zero possibilitou que a humanidade saísse do
O uso de termos, como muitos, poucos, igual a, não se cálculo realizado somente por meio do ábaco para o
adequava às necessidades de comparação entre as várias desenvolvimento de registros das contas, de forma que fosse
coleções que o homem lidava no seu dia a dia, o que provocou possível visualizar as estratégias utilizadas para se chegar aos
a necessidade de ampliação do universo numérico. resultados esperados. Centurión2 destaca algumas
Um dos artifícios desenvolvidos, a partir dessa características desse sistema que o levam a ser aceito e
necessidade humana de contar, de comparar coleções e obter utilizado por quase todo o mundo:
maior exatidão nas quantificações foi a correspondência de um
para um. Uma forma que o homem passou a utilizar para A) Ter apenas 10 símbolos,
controlar o seu rebanho foi contar os animais com pedras. B) Ser de base 10 (agrupamentos feitos de 10 em 10),
Assim, cada animal que saía para pastar correspondia a uma C) Ser posicional (o símbolo assume um valor 10 vezes
pedra dentro de um saquinho. No fim do dia, à medida que os maior ou menor de acordo com a posição que ocupa no
animais entravam no cercado, ele ia retirando as pedras do número),
saquinho. Essa simples estratégia foi um avanço, pois D) Ser aditivo (o número é resultado da adição dos valores
possibilitou ao homem comparar se havia mais ou menos posicionais).
animais no rebanho; se faltavam pedras ao retornarem, havia
mais animais; se sobravam pedras, havia menos. Esse homem Essa construção histórica não se deu apenas em relação ao
jamais poderia imaginar que milhares de anos mais tarde, conceito de número e sistema de numeração, mas pode ser
haveria um ramo da matemática chamado cálculo, que, em observada em todos os eixos da matemática. No que se refere
latim, quer dizer contar com pedras. às grandezas e medidas, Soares3 contribui para nossas
reflexões ao nos fazer a seguinte proposta: imaginemos um ser

1 CENTURIÓN, Marilia. Números e Operações, 2 ed. São Paulo: Scipione, 1995. 3 SOARES, Eduardo Sarquis. Múltiplas linguagens e formas de interação da
2 CENTURIÓN, Marília. Assim nasce a ciência dos números. In: CENTURIÓN, criança com o mundo natural e social, conhecimentos do mundo social e natural.
Marília. Conteúdo e metodologia da matemática: números e operações. São 2007.
Paulo: Scipione, 1994, cap. 1. (Coleção: Série Didática – Classes de Magistério).

Conhecimentos Específicos 1
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que descobriu que poderia utilizar um galho de árvore para dos sujeitos. De acordo com Soares4, a matemática está
alcançar uma fruta impossível de ser colhida sem o auxílio do presente no nosso cotidiano desde o nascimento. as crianças,
galho. Ele teria que, primeiro, avaliar a distância que lhe em geral, crescem em ambientes onde as pessoas falam de
faltava. Depois, teria de memorizar essa distância e sair em números, de medidas, fazem operações, interpretam figuras
busca do galho apropriado. Essa atitude inteligente estaria na geométricas que transmitem mensagens, regras de trânsito
base das primeiras experiências relacionadas ao ato de medir. são sinalizadas com desenhos geométricos; telefones e placas
Para atender à necessidade humana de medir, o homem de casas e veículos são numerados; notas e moedas contêm
desenvolveu estratégias para calcular distâncias, para valores impressos; os meios de comunicação mostram preços
registrar o tempo, o volume, a área, o peso. Os primeiros e porcentagens; gráficos e tabelas que apoiam previsões,
instrumentos de medida usados foram as partes do corpo desenhos arquitetônicos; pessoas utilizam balanças e fitas
como, por exemplo, o dedo polegar (polegada), a mão métricas para diversos fins; enfim, há uma infinidade de
espalmada (palmo), a prancha do pé (pés), da ponta do nariz à informações que se expressam em linguagem matemática.
ponta do polegar com o braço estendido (jarda), a abertura de Assim, a matemática precisa ser vista e trabalhada com as
uma passada (passo), os dois braços estendidos (braça). Por crianças como uma manifestação cultural de vários povos, ao
volta de 3500 a.c., na Mesopotâmia e no Egito começaram a ser longo dos tempos, é importante mostrar que a matemática
construídos os primeiros templos, e os projetistas tiveram de estudada nas escolas é apenas uma das muitas formas
encontrar unidades mais uniformes e precisas. Adotaram a desenvolvidas pela humanidade. Outro ponto a ser discutido
longitude das partes do corpo de um único homem com as crianças é que a matemática é indispensável, em todo o
(geralmente o rei) e com essas medidas construíram réguas de mundo, por consequência do desenvolvimento científico,
madeira e metal, ou cordas com nós, que foram as primeiras tecnológico e econômico que estamos vivendo.
medidas oficiais de comprimento.
Com a evolução do comércio, não era possível uma 2. O que é esse campo de experiência e qual o seu
negociação adequada com tantas e irregulares medidas, uma significado?5
vez que o corpo humano é variável de pessoa a pessoa. Logo,
fazia-se necessária uma uniformidade de pesos e medidas. A palavra matemática é de origem grega e significa aquilo
Para medir com eficiência tornou-se necessário o uso de que se pode aprender, é composta dos termos matema que
unidades padronizadas e universais que foram criadas a partir significa explicar, entender, conhecer, aprender para saber e
da revolução francesa e, até hoje, têm sido discutidas e fazer, e tica ligada à palavra techné, técnica, que se traduz em
refinadas, de acordo com as necessidades atuais. habilidades, artes e técnicas. A Matemática é, então, uma
Portanto, a ação de medir foi sempre praticada pela ciência que busca explicar o mundo por meio da reflexão e da
humanidade, primitivamente nas trocas de mercadorias, na observação, utilizando, para tanto, de uma linguagem
contagem de seus objetos, na astrologia e em todas as específica.
situações da vida onde as variações de grandezas se faziam Quando falamos em matemática, as primeiras imagens que
presentes. vêm à cabeça são: Números e contas. Só em segundo plano
Quanto às formas e orientações espaço-temporais é pensamos em formas geométricas; medidas de distância,
também possível remontarmos a história de como o homem comprimento, valor, capacidade, gráficos, tabelas, entre
foi construindo esses conhecimentos sobre a geometria a outros. Ao associarmos essas imagens à vivência escolar, a
partir de sua ação no mundo. A geometria tem origem lembrança que temos, muitas vezes, é da dificuldade de
provável na agrimensura ou medição de terrenos, segundo o aprendermos esses conceitos, suas relações e procedimentos
historiador grego Heródoto (séc. V a.c.). O termo “geometria” em função da falta de sentido que tinham para nossa vida. Isso
deriva do grego geometrein, que significa medição da terra gerou uma imagem negativa da matemática vista como difícil,
(geo=terra, metrein=medição). As origens da geometria, do abstrata e distante da realidade.
grego medir a terra, parecem coincidir com as necessidades do É considerado um dos campos de conhecimento mais
dia a dia. Partilhar terras férteis às margens dos rios, construir aplicados em nosso cotidiano, basta um simples olhar ao nosso
casas, observar e prever os movimentos dos astros são redor e nos certificaremos da presença da matemática nas
algumas das muitas atividades humanas que sempre formas, nos contornos, nas medidas. As operações básicas são
dependeram de operações geométricas. Documentos sobre as utilizadas constantemente e cálculos complexos estão
antigas civilizações egípcia e babilônica apresentam presentes no nosso dia a dia quando, por exemplo, calculamos
conhecimentos sobre o assunto, geralmente ligados à a área de uma parede para ser azulejada ou quando
astrologia. Apesar desses documentos, é na Grécia que a fracionamos ingredientes em uma receita. Nosso cotidiano
geometria ganha a forma que se aproxima da atualidade. consubstancia, nesse sentido, uma cultura matematizada.
Quanto ao tratamento da informação, desde a antiguidade Desde que nasce, a criança está imersa nessa cultura
vários povos já registravam o número de habitantes, de matematizada na qual, de acordo com Dias; Faria6 vivencia ou
nascimentos, de óbitos, faziam estimativas das riquezas presencia situações em que se torna necessário contar, ler
individuais e sociais, distribuíam equitativamente terras ao números, quantificar, numerar, fazer operações de soma,
povo, cobravam impostos e realizavam inquéritos subtração, multiplicação e divisão, utilizar medidas diversas
quantitativos por meio de processos que, hoje, chamaríamos de tamanho, de peso, de valor, de distância, de tempo, de
de estatística. A palavra estatística foi introduzida no século capacidade, organizar-se ou estruturar-se espacialmente, além
XVIII pelo economista alemão Gottfried Achmmel e deriva do de se utilizar de gráficos e tabelas.
latim statisticum, que significa “negócios do estado”. Pois se Nesse sentido, é fundamental pensar num trabalho com o
colhiam informações geralmente para atividades religiosas, conhecimento matemático que o torne significativo para as
bélicas ou para cobrar impostos. crianças, que considere seu modo de ser, que está intimamente
Entender essa história nos permite perceber que a ligado à sua classe social, origem étnico racial, gênero e
matemática vem se desenvolvendo, se transformando, cultura.
evoluindo e que o conhecimento matemático presente no É importante considerar, nesse contexto de construir um
cotidiano é construído por meio de práticas culturais e sociais trabalho com a matemática que seja significativo para a

4 Idem 6 DIAS, Fátima Regina Teixeira de Salles; FARIA, Vitória Líbia Barreto de. Como a
5 Texto adaptado: Contagem. Minas Gerais. Prefeitura Municipal. Secretaria criança constrói o conceito de número? In: Caderno AMAE, nº. 1, p. 18-25, 1991.
Municipal de Educação e Cultura. A criança e a matemática/ Prefeitura
Municipal de Contagem. - Contagem: Prefeitura Municipal de Contagem, 2012.

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criança, que o conhecimento matemático não se constitua num relações espaciais e da geometria. De acordo com Araújo7 as
conjunto de fatos a serem memorizados. Aprender números, formas na geometria são todas as possibilidades de
por exemplo, é muito mais do que contar, muito embora a representação da realidade, seja ela uma realidade concreta,
contagem seja importante para a compreensão desse conceito, externa, real, seja uma realidade interior ao indivíduo,
assim como saber o nome de figuras geométricas não significa subjetiva, imaginária. É importante salientar que as
trabalhar com espaço e forma. experiências das crianças em relação a esses aspectos,
Especificamente em relação ao conceito de número, ocorrem prioritariamente na atividade exploratória do espaço
estudos realizados por Jean Piaget e seus colaboradores e por meio de jogos e brincadeiras.
afirmam que a criança constrói o conceito e que o fato de Considerando que o processo de aprendizagem da criança
aprender a contar verbalmente não significa apropriação acontece a partir das relações que ela estabelece com o mundo
desse conhecimento. Esse processo envolve o e com a cultura, explorar o espaço envolve organizar
amadurecimento biológico da criança, as interações sociais, a deslocamentos, traçar caminhos, estabelecer referências,
manipulação de objetos, nas várias experiências vividas. identificar posicionamentos e comparar distâncias. Ao fazer
Implica estabelecer relações, pois o conhecimento não provém isso, a criança não lida só com o espaço físico, mas também
simplesmente da manipulação de tampinhas ou botões, mas com o espaço social em que ela está inserida e com o espaço
sim da coordenação de ações em que a criança ordena, reúne, afetivo, representado por todas as relações que ela estabelece
estabelece correspondência, entre outras, possibilitando, com o outro. O conceito de espaço é, então, amplo e tem como
dessa forma, a elaboração das ideias de totalidade, de referencial inicial o corpo do próprio sujeito. As noções de
quantidade e de equivalência. corpo, espaço e tempo estão intimamente ligadas. O corpo
O estabelecimento dessas relações envolve quatro outras coordena-se, movimenta-se continuamente dentro de um
operações mentais básicas: classificação, seriação, espaço determinado, em função do tempo, em relação a um
correspondência biunívoca e conservação, que possuem como sistema de referência. É por essa razão que possibilitar
significado: A classificação é a operação lógica em que a experiências de orientação e estruturação espaço-temporal é
criança agrupa segundo um critério; A seriação significa fundamental para o processo de aprendizagem e
colocar em série, em ordem, materiais diversos; A desenvolvimento da criança.
correspondência biunívoca é a correspondência um a um, ou Para melhor entender as relações envolvidas na
seja, cada elemento de uma coleção deverá corresponder a um construção desses conceitos, é importante trabalhar três
e somente a um elemento de uma segunda coleção; Já a relações espaciais: as relações topológicas, projetivas e
conservação é o processo em que a criança reconhece que o euclidianas.
número de elementos de um agrupamento não varia, Chamamos de relações topológicas as que não
quaisquer que sejam as maneiras como se agrupam esses necessitam de rigor formal para serem representadas.
elementos. Envolvem as noções de dentro e fora, interior e exterior,
No processo de construção do conceito de número, a fronteira e região. Tomemos como exemplo uma sala de
criança realiza também inúmeras operações aritméticas, atividades. Uma criança pede para ir ao banheiro. Para a
apropriando-se de noções de cálculo, ao mesmo tempo em que criança que saiu ela está fora da sala de atividades e, para as
constrói esse conceito. Assim, na busca de resolver problemas outras crianças da turma que permaneceram na sala, ela
de seu cotidiano, ela junta, retira, separa, reparte quantidades, também está fora. As localizações que podemos fazer
estabelecendo várias relações mentais. utilizando estas relações não variam de acordo com o ponto de
Todas essas relações dizem respeito ao que Piaget vista do observador. As relações topológicas envolvem a
denominou de conhecimento lógico matemático. Para que construção de conceitos de vizinhança, ordem, separação,
possamos compreender melhor o que significa esse tipo de contorno e continuidade.
conhecimento, é necessário fazer a distinção entre os três tipos Já as relações projetivas admitem localizações que
de conhecimento, por ele apontados: variam de acordo com o observador. São elas as noções de
direita e esquerda, em cima, em baixo, na frente, atrás e outras.
A) Conhecimento físico: É o conhecimento das Continuando com o exemplo da sala de atividades, para uma
características do objeto. A cor e a forma são exemplos de criança colocada à frente de uma mesa, um objeto (lixeira)
propriedades físicas e podem ser conhecidas pela observação. aparece à esquerda, para uma criança colocada atrás da mesa,
A fonte desse conhecimento é externa ao indivíduo. o mesmo objeto aparece à direita. As relações projetivas são
B) Conhecimento lógico-matemático: É a coordenação de uma complexificação das topológicas. Exigem que o sujeito
relações criada mentalmente por cada indivíduo entre os conserve as posições relativas dos objetos no espaço, uns em
objetos. Por exemplo, quando comparamos duas bolas de relação aos outros e de todos estes com relação a um
tamanhos diferentes, a diferença que existe entre elas não se observador. A exploração das relações projetivas conduz à
encontra nem em uma, nem em outra, mas sim na relação que última categoria de relações: a euclidiana, esta surge a partir
criamos mentalmente entre elas. A fonte do conhecimento da articulação de duas referências: uma horizontal e uma
lógico-matemático é interna. vertical, gerando um eixo de coordenadas. As relações
C) Conhecimento social: É o conhecimento adquirido por euclidianas necessitam de medidas para realizar localizações.
meio das convenções sociais, sendo sua fonte externa ao Por exemplo, as coordenadas geográficas, que nos permitem
indivíduo. localizar um ponto qualquer no planeta, a partir dos paralelos
e dos meridianos.
A notação numérica (representação do número) e o Quanto a grandezas e medidas, uma ideia básica que lhes
sistema de numeração são conhecimentos construídos e dá sustentação é a ideia de comparação. Medir significa
convencionados historicamente pela humanidade e são comparar grandezas da mesma natureza, por exemplo,
transmitidos socialmente. No entanto, para que a criança comparar o tamanho de duas crianças ou utilizar um pedaço
compreenda e signifique o conceito de número, ela necessita de barbante ou uma fita métrica para medir uma criança. A
reconstruir esse conhecimento, pois envolve uma série de construção de noções relativas a grandezas e medidas pelas
relações mentais. crianças envolve o estabelecimento de relações, tais como
Quanto ao trabalho com as formas e as orientações ordenação, estimativa e previsão. É possível salientar três
espaço temporais, diz respeito ao desenvolvimento das aspectos fundamentais do processo de medição: escolher um

7 ARAUJO, Renato Srbek. Refletindo o Ensino de Geometria. 2008.

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objeto para servir de unidade de medida; comparar essa (representação numérica), mas por meio das possibilidades
unidade com o objeto, verificando quantas unidades de proporcionadas pelos seus pares ou pelos adultos de
medida “cabem” no objeto; e expressar o resultado da medição estabelecer as relações necessárias para construir o conceito.
por meio do número ou de outro tipo de registro. Nesse aspecto, tanto o adulto como as crianças mais
Em relação às unidades de medida, as crianças devem, com experientes podem ajudar as outras a estabelecerem essas
o tempo, perceber que a escolha dessa unidade é relações, de modo informal, em situações do cotidiano e em
completamente arbitrária. Podemos comparar o peso de um brincadeiras.
estojo de lápis utilizando borrachas como unidade de medida.
Naturalmente, por razões sociais e pela necessidade de 4. A validação do conhecimento em Matemática
comunicação entre as pessoas, no decurso da história, foi
necessário o estabelecimento de um sistema unificado de Outra característica importante do conhecimento
medidas, adotando-se uma unidade padrão. Além desse matemático está relacionada a seu método científico de
padrão, foram criados instrumentos de medida para validação. Os homens recorreram, nas atividades matemáticas,
apresentar o resultado dessas medidas com precisão. a diversos métodos para validar e organizar o conhecimento
Perpassando os eixos desse campo de experiência, temos o nesse campo do saber. Entre esses, o método axiomático-
tratamento da informação, que se refere ao trabalho com dedutivo, em especial, desde a civilização grega, predomina na
estatística, com coleta e organização de dados. Essa forma de Matemática e assume a primazia de ser o único método aceito,
tratar as informações é uma necessidade social, uma vez que na comunidade científica, para a comprovação de um fato
faz parte do nosso cotidiano, aparecendo constantemente em matemático. Os conceitos de axioma, definição, teorema e
jornais, revistas, livros, internet. Desenvolver o tratamento da demonstração são centrais nesse método e, por extensão,
informação em todos os eixos da matemática nos possibilita passaram a ser, para muitos, a face mais visível da Matemática.
coletar, organizar, interpretar e tomar decisões frente aos A esse respeito, no entanto, várias ressalvas se impõem.
dados e às situações, utilizando, para tanto, de gráficos, Primeiramente, o próprio conceito de rigor lógico nas
quadros e tabelas como formas de representar ou interpretar demonstrações mudou, no decorrer da história, mesmo no
as informações matemáticas, sejam elas numéricas, espaciais âmbito da comunidade matemática. Em segundo lugar, trata-
ou de medidas. se de um método de validação do fato matemático, muito mais
Enfim, o trabalho com a matemática na educação infantil é do que um método de descoberta ou de uso do conhecimento
rico de possibilidades, pois ela está presente na arte, na matemático. Na construção efetiva desse conhecimento, faz-se
música, nas histórias, nas brincadeiras, na dança, no mundo uso permanente da imaginação, de raciocínios indutivos,
natural e social. as crianças estão vivendo a matemática plausíveis, de conjecturas, de tentativas, de verificações
quando descobrem coisas iguais e diferentes, organizam, empíricas, enfim, recorre-se a uma variedade complexa de
classificam e criam coleções, estabelecem relações, observam outros procedimentos.
os tamanhos das coisas, brincam com as formas, ocupam um Além desses aspectos, embora a validação pelo método
espaço. lógico-dedutivo seja privilegiada na Matemática, as questões
de ensino e aprendizagem, associadas a tal método, estão
3. Como a criança aprende, se desenvolve e torna-se longe de terem sido resolvidas. São conhecidas as dificuldades
progressivamente humana, por meio desse campo de didáticas quando se busca, gradualmente, estabelecer a
experiência? diferença entre os vários procedimentos de descoberta,
invenção e validação e, em particular, procura-se fazer o
Entender a forma como as crianças se apropriam dos estudante compreender a distinção entre uma prova lógico-
conhecimentos matemáticos significa discutir como, a partir dedutiva e uma verificação empírica, baseada na visualização
de suas especificidades, elas vão interagindo com essa de desenhos, na construção de modelos materiais ou na
matemática que está no seu cotidiano. Ou seja, como já vimos, medição de grandezas.
a criança já nasce em um mundo repleto de produções
culturais do qual o conhecimento matemático é parte 5. Os campos de conteúdos da Matemática escolar
integrante, enquanto um objeto de uso social.
De acordo com Dias e Faria8, para que a criança se aproprie Na cultura escolar, nas duas últimas décadas, os conteúdos
desse conhecimento é fundamental que ela seja incentivada a matemáticos a serem ensinados e aprendidos têm sido
elaborar hipóteses, a estabelecer relações, a dialogar com organizados em grandes campos. Embora se observem
adultos e com outras crianças em um ambiente algumas variações, há razoável concordância entre as várias
matematizador. Nesse sentido, o trabalho com a matemática propostas de classificação desses conteúdos. Neste texto
deve possibilitar à criança vivenciar e perceber, de forma adotam-se cinco campos: números e operações; geometria;
significativa, os usos e as funções da matemática na sociedade, álgebra; grandezas e medidas; estatística, probabilidades,
por meio da interação, das brincadeiras, da imitação, da combinatória.
experimentação, da exploração que são as formas como ela Esses agrupamentos têm tido um efeito positivo ao
aprende e se desenvolve. facilitarem o trabalho pedagógico, entretanto, é indispensável
Assim, é fundamental que observemos no dia a dia como as que tais campos não sejam vistos como blocos estanques e
crianças brincam e que atividades desenvolvem, pois as autossuficientes. Além disso, é preciso considerar que a
crianças, enquanto brincam, estão experimentando sua força, aprendizagem é mais eficiente quando os conhecimentos são
tomando consciência do espaço que ocupam e das revisitados, de forma progressivamente ampliada e
possibilidades de explorar o ambiente com suas pernas e com aprofundada, durante todo o percurso escolar. Ao mesmo
todo o corpo. Além disso, vão tomando contato com as tempo, é fundamental reconhecer que a elaboração desses
capacidades dos colegas, aprendendo sobre as diferenças. conhecimentos não ocorre de maneira espontânea, mas como
Essas aprendizagens vão ajudá-las a compreender os consequência da mobilização de recursos metodológicos
processos de comparação, de medição e de representação do adequados.
espaço.
Evidentemente a criança não vai aprender o conceito de
número e suas relações apenas com nomeações e simbologias

8 Idem

Conhecimentos Específicos 4
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6. Matemática e Linguagem currículo em disciplinas justapostas e estanques, que


competem por seu espaço e seus objetivos particulares,
Outro aspecto importante da Matemática é a diversidade distanciando-se do diálogo com outras disciplinas.
de formas simbólicas presentes em seu corpo de A prática da interdisciplinaridade ainda é rara. Para ser
conhecimento: língua natural, linguagem simbólica, desenhos, efetivamente praticada e ampliada, ela requer transformações
gráficos, tabelas, diagramas, ícones, entre outros, que amplas, que se estendam a todo o sistema educacional: os
desempenham papel central, não só para representar os currículos, as modalidades de avaliação, a organização do
conceitos, relações e procedimentos, mas na própria formação tempo e dos espaços na escola, o livro didático, entre outros.
desses conteúdos. Por exemplo, um mesmo número racional Essa prática exige, em especial, mudanças nas formações
pode ser representado por símbolos, tais como ¼, 0,25, 25%, inicial e continuada dos educadores, que exercem inegável
ou pela área de uma região plana ou, ainda, pela expressão “um papel na moldagem de suas concepções.
quarto”. Convém observar, no entanto, que interdisciplinaridade
Uma função pode ser representada, entre outras não deve implicar uma diminuição da importância das áreas
possibilidades, por uma tabela, por um gráfico cartesiano ou específicas do conhecimento. Ao contrário, uma perspectiva
por símbolos matemáticos. interdisciplinar adequada nutre-se do aprofundamento nas
várias áreas do saber.
7. Habilidades matemáticas mais gerais Para o diálogo interdisciplinar, é necessário que cada área
específica contribua com saberes consistentes e
Indicar um conjunto de habilidades matemáticas mais aprofundados, que não sejam meras justaposições de
gerais a serem construídas no decorrer da formação escolar é conhecimentos superficiais, mas que favoreçam conexões
sempre uma tarefa difícil. Por isso, adverte-se que a relação significativas entre esses conhecimentos.
que se indica a seguir deve ser encarada com cautela. Seu Para tanto, é necessário um duplo movimento: em um
caráter abstrato torna indispensável que sua concretização sentido, procurar interligar vários saberes; buscar temas
seja fruto de um trabalho pedagógico para que essas comuns a diferentes campos do conhecimento; tentar
habilidades sejam incorporadas, em cada situação, levando em construir modelos para situações complexas presentes na
conta as características do contexto educacional em questão, a realidade; em outro, buscar aprofundar o conhecimento
maturidade cognitiva dos estudantes e seus conhecimentos disciplinar; construir modelos para um recorte específico da
prévios. realidade. Encontrar a organização e o tempo pedagógicos
Além disso, tais habilidades não se realizam num vazio, para garantir esse conjunto de ações constitui em um dos
mas apoiadas nos conhecimentos matemáticos a que estão maiores desafios para a concretização da perspectiva
intimamente associadas e sobre os quais serão tecidas interdisciplinar na escola atual.
considerações mais adiante, neste texto. Convém mencionar que várias experiências têm sido
Assim, sem esquecer as interdependências entre elas, propostas para incorporar a interdisciplinaridade na escola,
pode-se propor a seguinte relação de habilidades gerais para a como a pedagogia de projetos, o trabalho com temas
formação matemática do estudante: integradores e com temas transversais.

A) Interpretar matematicamente situações presentes nas 9. Metodologias de Ensino e Aprendizagem


diversas práticas sociais;
B) Estabelecer conexões entre os campos da Matemática e A) Transformações no saber a ensinar
entre esta e as outras áreas do saber; A contextualização não deve ser vista como a simples
C) Raciocinar, fazer abstrações com base em situações inserção de elementos das práticas sociais na formação
concretas, generalizar, organizar e representar; matemática, mas como instrumento que permita ao estudante
D) Comunicar-se utilizando as diversas formas de estabelecer relações entre os diferentes conhecimentos,
linguagem empregadas na Matemática; construídos historicamente, com os quais ele entrará em
E) Resolver problemas, criando estratégias próprias para contato. Mesmo tendo sua origem nas práticas e nas
sua resolução, que desenvolvam a iniciativa, a imaginação, a necessidades sociais, o conjunto de conhecimentos que servirá
criatividade e a capacidade de avaliar as soluções obtidas; de motor para as aprendizagens escolares precisará passar
F) Utilizar a argumentação matemática apoiada em vários por algumas transformações. Ele deverá ser submetido, pelo
tipos de raciocínio: dedutivo, indutivo, probabilístico, por conjunto do sistema educacional, a um processo de
analogia, plausível, entre outros; descontextualização, no qual se afasta das práticas sociais que
G) Empregar as novas tecnologias de computação e lhe deram origem. Tal processo toma corpo nos referenciais
informação (TIC). curriculares e de avaliação, nos livros didáticos, entre outras
H) Desenvolver a sensibilidade para as ligações da formas. Chegando à escola, esse conjunto de conhecimentos
Matemática com as atividades estéticas nas criações culturais deverá sofrer uma nova adaptação, para que possa ser
da humanidade; ensinado pelo professor e aprendido pelo aluno. Nesse
I) Perceber a beleza das construções matemáticas, momento, dois caminhos são possíveis.
presente na simplicidade, na harmonia e na organicidade de No primeiro, o professor apresenta para os alunos o objeto
suas construções; de conhecimento descontextualizado, tal como chegou à porta
J) Estabelecer conexões da Matemática com a dimensão da escola. No segundo, ele busca realizar uma contextualização
lúdica das atividades humanas. desse objeto de conhecimento. Em qualquer dos casos, supõe-
se que seu objetivo final é o estudante ser capaz de, ao final do
8. Ligações entre a Matemática e outras disciplinas: A processo de aprendizagem, reunir um conjunto de
Interdisciplinaridade conhecimentos que lhe permita desenvolver as habilidades
necessárias à resolução das situações e dos problemas que
Em anos recentes, têm se multiplicado as análises sobre a enfrentará não somente na continuidade de seus estudos, mas
maneira como as disciplinas escolares estão organizadas e o também em suas práticas sociais e cotidianas.
papel que desempenham no ensino e na aprendizagem, com
destaque para a necessária incorporação da perspectiva da B) O foco na transmissão do conhecimento
interdisciplinaridade. Nesse debate, critica-se a fragmentação O primeiro dos caminhos acima mencionados, no entanto,
do saber ensinado nas escolas, alimentada pela organização do reflete a concepção do professor como emissor do

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conhecimento e o aluno como receptor. Ou seja, o professor Diante deles, o estudante deve realizar tentativas de
ensina, geralmente por meio de seu discurso, e o aluno deve resolução, estabelecer hipóteses, testá-las e validar seus
aprender, por meio de uma escuta atenta do discurso do resultados.
professor. Essa escolha metodológica se baseia, geralmente,
em três etapas: a apresentação do objeto de conhecimento, a E) Modelagem matemática no ensino e aprendizagem
oferta de exemplos de aplicação e uma extensa bateria de Em anos recentes, os estudos em Educação Matemática
exercícios de fixação do conteúdo estudado. têm posto em evidência a ideia de modelagem matemática: “a
A opção por esse caminho demanda estudantes bastante arte de transformar problemas da realidade em problemas
motivados e com grande capacidade de concentração, o que matemáticos e resolvê-los interpretando suas soluções na
não parece ser o caso na maioria de nossas escolas, linguagem do mundo real”.
particularmente com estudantes de menor idade. Na verdade, A modelagem matemática pode ser entendida como um
a predominância desse tipo de ensino em nosso sistema método de trabalho científico. Nessa perspectiva, há coerência
escolar tem sido apontada na literatura educacional como uma desse método com os pontos de vista expostos neste texto
das causas das sérias dificuldades na aprendizagem. sobre as características da matemática como fonte de modelos
para o conhecimento dos fenômenos da natureza e da cultura.
C) O estudante como sujeito ativo da aprendizagem No entanto, neste momento, é a modelagem matemática
No segundo caso, cabe ao professor promover uma como estratégia de ensino e aprendizagem que convém
recontextualização do conhecimento em jogo na relação destacar, pela estreita conexão dessa estratégia com ações
didática, ou seja, promover uma situação de aprendizagem em envolvidas na resolução de problemas abertos e de situações-
que o conhecimento que se deseja que o estudante aprenda problema.
apareça na forma de uma situação a ser enfrentada, a qual se De fato, quando a modelagem matemática propõe uma
apresenta de maneira contextualizada. É como se, em certa situação-problema ligada ao mundo real, com sua inerente
medida, o estudante fosse levado a ‘reconstruir’ ou ‘reinventar’ complexidade, o estudante é chamado a mobilizar um leque
o conhecimento didaticamente transposto para a sala de aula. variado de conhecimentos e habilidades: selecionar variáveis
Ao adotar esse caminho, os papéis docente e discente que serão relevantes para o modelo a construir;
invertem-se de maneira significativa. Enquanto ao professor problematizar, ou seja, formular um problema teórico, na
cabe o papel de criar situações que levem os estudantes na linguagem do campo matemático envolvido; formular
direção da aprendizagem, estes devem realizar uma espécie de hipóteses explicativas do fenômeno em causa; recorrer ao
reconstrução do objeto de conhecimento. Essa escolha conhecimento matemático acumulado para a resolução do
metodológica caminha no sentido inverso à anterior: nesse problema formulado (o que, muitas vezes, requer um esforço
caso, o professor não parte da apresentação do conhecimento de simplificação, pelo fato de que o modelo originalmente
matemático, mas de uma situação previamente elaborada para pensado pode revelar-se matematicamente muito complexo);
que, no processo de resolução, o aluno construa seu próprio validar, isto é, confrontar as conclusões teóricas com os dados
conhecimento. Resumindo, o estudante assume, nessa empíricos existentes, o que, quase sempre, leva à necessidade
proposta metodológica, um papel essencial e ativo no de modificação do modelo, que é essencial para revelar o
processo, que se dará por meio da vivência de situações aspecto dinâmico da construção do conhecimento.
preparadas pelo professor. Evidencia-se, além disso, que a estratégia de modelagem
O segundo caminho tem sido defendido, frequentemente, matemática no ensino e na aprendizagem tem sido apontada
nos estudos em Educação Matemática, que têm colocado em como um instrumento de formação de um estudante:
evidência três escolhas metodológicas coerentes com essa comprometido com problemas relevantes da natureza e da
opção: a resolução de problemas, a utilização da modelagem e cultura de seu meio; crítico e autônomo, na medida em que
o trabalho com projetos. toma parte ativa na construção do modelo para a situação
problema; envolvido com o conhecimento matemático em sua
D) Resolução de problemas dupla dimensão de instrumento de resolução de problemas e
De início, é preciso diferenciar a ideia de problema de acervo de teorias abstratas acumuladas ao longo da
associada à metodologia em que se enfatiza a transmissão do história; que “faz Matemática”, com interesse e prazer.
conhecimento daquela ligada à metodologia em que o
estudante é colocado em situação de ator principal no 10. Matemática na Educação Infantil
processo de aprendizagem. Na primeira escolha metodológica,
é privilegiado o problema fechado, que se caracteriza por uma A manutenção do interesse por matemática entre alunos
aplicação de conhecimentos já supostamente aprendidos pelo de 4 e 5 anos vem do atendimento de suas necessidades atuais,
estudante. Nesse caso, já de antemão, o estudante é conduzido e não da preparação para o futuro, assim, como conseguir
a identificar o conhecimento a ser utilizado em sua resolução, despertar e manter o desejo de saber matemática?
sem que haja maiores estímulos à construção de Um dos princípios de Piaget9 é que ensinar matemática na
conhecimentos e à utilização do raciocínio matemático. educação infantil vai muito além de ensinar a contar, para o
O uso exclusivo desse tipo de problema consegue mascarar autor, os fundamentos para o desenvolvimento matemático
a efetiva aprendizagem, à medida que, ao antecipar o das crianças estabelecem-se nos primeiros anos. A
conhecimento em jogo na situação, o estudante atua de forma aprendizagem matemática constrói-se através da curiosidade
mecânica e, muitas vezes, sem construir significado, na e do entusiasmo das crianças e cresce naturalmente a partir
resolução do problema. das suas experiências. A vivência de experiências matemáticas
Em contraposição ao problema fechado, estudos em adequadas desafia as crianças a explorarem ideias
Educação Matemática têm colocado em evidência o trabalho relacionadas com padrões, formas, número e espaço duma
com problemas abertos e situações-problema. Apesar de forma cada vez mais sofisticada.
apresentarem objetivos diferentes, estes dois últimos tipos de Consequentemente, com o intuito de proporcionar uma
problemas colocam o estudante, em certo sentido, em situação educação infantil que atenda aos princípios de Piaget ligados à
análoga àquela do matemático no exercício de sua atividade. curiosidade, entusiasmo e o desafio das descobertas, O
planejamento curricular para as creches e pré-escolas busca,
hoje, romper com a histórica tradição de promover o

9 PIAGET, J. Psicologia e Pedagogia. Rio de Janeiro. Forense Universitária, 1976.

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isolamento e o confinamento das perspectivas infantis dentro construindo algumas representações nesse campo, atribuindo
de um campo controlado pelo adulto e com a significado e fazendo uso das expressões que costumam ouvir.
descontextualização das atividades que muitas vezes são Esses conhecimentos e experiências adquiridos no âmbito
propostas às crianças. O novo contexto educacional para a da convivência social favorecem a proposição de situações que
educação infantil requer estruturas curriculares abertas e despertem a curiosidade e interesse das crianças para
flexíveis. continuar conhecendo sobre as medidas.
Neste sentido o Referencial Curricular Nacional para
Educação infantil10 afirma que é preciso ressaltar que esta Espaço e forma:
organização possui um caráter instrumental e didático, Este bloco envolve a explicitação e/ou representação da
devendo os professores ter consciência, em sua prática posição de pessoas e objetos, exploração e identificação de
educativa, que a construção de conhecimentos se processa de propriedades geométricas de objetos e figuras, representações
maneira integrada e global e que há inter-relações entre os bidimensionais e tridimensionais de objetos, identificação de
diferentes âmbitos a serem trabalhados com as crianças. pontos de referência e descrição de pequenos percursos e
Dessa forma, fazer matemática é expor ideias próprias, trajetos.
escutar a dos outros, formular e comunicar procedimentos de As primeiras considerações que o homem faz da geometria
resolução de problemas, confrontar, argumentar e procurar parecem ter sua origem em simples observações provenientes
validar seu ponto de vista, antecipar resultados de da capacidade humana de reconhecer configurações físicas,
experiências não realizadas, aceitar erros, buscar dados que comparar formas e tamanhos. Inúmeras circunstâncias de vida
faltam para resolver problemas, entre outras coisas. Dessa devem ter levado o homem às primeiras elaborações
forma as crianças poderão tomar decisões, agindo como geométricas como, por exemplo, a noção de distância, a
produtoras de conhecimento e não apenas executoras de necessidade de delimitar a terra, a construção de muros e
instruções. moradias e outras. Podemos afirmar que na origem de
problemas geométricos concretos com os quais o homem se
A) Os conteúdos da Matemática na Educação Infantil envolve desde suas atividades práticas, está a necessidade de
No que diz respeito à Matemática, o Referencial Curricular controlar as variações de dimensões com as quais se defronta
Nacional para Educação Infantil11 destaca três blocos de ao delimitar seu espaço físico para morar e produzir.
conteúdos a serem trabalhados:
11. Matemática e a Formação para a Cidadania
Números e sistema de numeração:
Este bloco envolve contagem, notação e escrita numérica e A convivência na complexa sociedade atual tem sido
as operações matemáticas, assim, contar é uma estratégia marcada por graves tensões sociais, geradas por persistentes
fundamental para estabelecer o valor cardinal de conjuntos de desigualdades no acesso a bens e serviços e às esferas de
objetos. Isso fica evidenciado quando se busca a propriedade decisão política, e pela supervalorização das ideias de mercado
numérica dos conjuntos ou coleções em resposta à pergunta e de consumo, entre outras razões. Além disso, ainda prevalece
“quantos?”. É aplicada também quando se busca a propriedade no mundo uma ordem social contrária aos princípios da
numérica dos objetos, respondendo à pergunta “qual?”. solidariedade e da igualdade de oportunidades para todos.
Nesse caso está também em questão o valor ordinal de um Essa é uma situação indesejável, que precisa ser superada, e
número, na contagem propriamente dita, ou seja, ao contar devemos buscar encontrar o papel da formação matemática
objetos as crianças aprendem a distinguir o que já contaram que contribua para superá-la.
do que ainda não contaram e a não contar duas (ou mais) vezes Uma formação que valorize a participação efetiva do
o mesmo objeto, descobrem que tampouco devem repetir as estudante na sua aprendizagem e que incentive a sua
palavras numéricas já ditas e que, se mudarem sua ordem, autonomia, certamente, colabora para a construção da
obterão resultados finais diferentes daqueles de seus cidadania. O estímulo ao diálogo permanente entre todos que
companheiros, percebem também que não importa a ordem atuam na sala de aula ― estudantes e professor ― e o incentivo
que estabelecem para contar os objetos, pois obterão sempre ao trabalho coletivo são outras ações que favorecem o
o mesmo resultado. desenvolvimento da capacidade de conviver harmonicamente
Podem-se propor problemas relativos à contagem de em sociedade e de respeitar as diferenças entre as pessoas. A
diversas formas. É desafiante, por exemplo, quando as sala de aula de Matemática não é só um local para
crianças contam agrupando os números de dois em dois, de aprendizagem dessa disciplina e para a interação entre os
cinco em cinco, de dez em dez, etc. estudantes, propiciada e mediada pelo professor; ela deve ser
sempre uma oportunidade valiosa para o cultivo de condutas
Grandezas e medidas: coletivas importantes para a vida social.
Este bloco envolve a exploração de diferentes É preciso defender uma formação que reconheça saberes e
procedimentos de comparação de grandezas, introdução às práticas matemáticas dos cidadãos e das comunidades locais –
noções de medida de comprimento, peso, volume, marcação que são aptidões prévias relativamente eficientes – sem que se
do tempo e experiências com dinheiro. abdique do saber matemático mais universal.
As medidas estão presentes em grande parte das É preciso defender uma formação que reconheça saberes e
atividades cotidianas e as crianças, desde muito cedo, têm práticas matemáticas dos cidadãos e das comunidades locais
contato com certos aspectos das medidas. O fato de que as que são aptidões prévias relativamente eficientes. Essa
coisas têm tamanhos, pesos, volumes, temperaturas diferentes formação deve-se abdicar do saber matemático mais
e que tais diferenças frequentemente são assinaladas pelos universal.
outros (está longe, está perto, é mais baixo, é mais alto, mais
velho, mais novo, pesa meio quilo, mede dois metros, a Questões
velocidade é de oitenta quilômetros por hora etc.) permite que
as crianças informalmente estabeleçam esse contato, fazendo 01. (Prefeitura de Maria Helena/PR - Professor -
comparações de tamanhos, estabelecendo relações, Educação Infantil - FAFIPA) No ensino da matemática, o
professor pode utilizar diversos jogos para as crianças se

10 BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Referenciais Curriculares 11 Idem


Nacionais de Educação Infantil. vol. 3. Brasília: 1998.

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apropriarem do conceito de número. São jogos matemáticos (D) O ensino de matemática por meio de jogos e materiais
apropriados a esse ensino, EXCETO: concretos garante às crianças aprenderem de forma
(A) Ábaco. significativa.
(B) Quebra-cabeça. (E) A Matemática não deve ser olhada de forma isolada de
(C) Material Dourado. outras áreas, é questão de praticá-la, analisá-la e relacioná-la
(D) Trilha matemática. para que os alunos aprendam.

02. (SEDUC/AM - Professor de Educação Especial - 05. Dentre as alternativas abaixo, qual não integra os
FGV) A “resolução de problemas é um caminho para o ensino conteúdos da matemática na Educação Infantil?
de Matemática que vem sendo discutido ao longo dos últimos (A) Números e sistemas de numeração.
anos”. (PCN - Matemática, 1997, p. 32). (B) Espaço e forma.
A respeito da resolução de problemas, assinale a afirmativa (C) Grandezas e medidas
incorreta. (D) Números e operações
(A) O ponto de partida da atividade matemática não é a
definição, mas o problema. Gabarito
(B) O problema certamente não é um exercício em que o
aluno aplica, de forma quase mecânica, uma fórmula ou um 01.B / 02.E / 03.C / 04.A / 05.D
processo operatório.
(C) Aproximações sucessivas ao conceito são construídas
para resolver um certo tipo de problema. 2. Desenvolvimento das
(D) O aluno não constrói um conceito em resposta a um
problema, mas constrói um campo de conceitos que tomam noções de tempo e espaço pela
sentido num campo de problemas. criança
(E) A resolução de problemas é uma atividade a ser
desenvolvida em paralelo ou como aplicação da
aprendizagem, não como uma orientação para esta. A) Introdução

03. (Prefeitura de Patos/PB - Professor de Matemática O dia a dia das creches e pré-escolas é repleto de atividades
- PaqTcPB) Dentre os objetivos gerais para o Ensino organizadas por educadores que, de uma maneira ou de outra,
Fundamental que constam nos PCN de Matemática, lidam com o espaço e o tempo a todo o momento. Como
encontram-se os seguintes itens, EXCETO organizar tempos de brincar, de tomar banho, de se alimentar,
(A) fazer observações sistemáticas de aspectos de repousar de crianças de diferentes idades nos espaços das
quantitativos e qualitativos da realidade. salas de atividades, do parque, do refeitório, do banheiro, do
(B) selecionar, organizar e produzir informações pátio? É tarefa dos educadores organizar o espaço e o tempo
relevantes, para interpretá-las e avaliá-las criticamente. das escolas infantis, sempre levando em conta o objetivo de
(C) verificar a presença dos conjuntos numéricos, tais proporcionar o desenvolvimento das crianças.
como os números complexos, na realidade da vida do aluno. Barbosa e Horn (2001)12 pesquisam a organização do
(D) estabelecer conexões entre temas matemáticos de espaço e do tempo na escola infantil e afirmam que organizar
diferentes campos e entre esses temas e conhecimentos de o cotidiano das crianças da Educação Infantil pressupõe
outras áreas curriculares. pensar que o estabelecimento de uma sequência básica de
(E) sentir-se seguro da própria capacidade de construir atividades diárias. É importante que o educador observe o que
conhecimentos matemáticos. as crianças brincam, como estas brincadeiras se desenvolvem,
o que mais gostam de fazer, em que espaços preferem ficar, o
04. (SEE/SP - Professor - Ensino Básico - VUNESP) que lhes chama mais atenção, em que momentos do dia estão
Analise as respostas de alguns professores para a pergunta: mais tranquilos ou mais agitados. Este conhecimento é
como ensinam matemática para as crianças? fundamental para que a estruturação espaço-temporal tenha
I. A professora Adriana afirma que primeiro explica, depois significado. Ao lado disto, também é importante considerar o
passa exercícios no caderno, depois faz a revisão para ver se contexto sociocultural no qual se insere e a proposta
entenderam. pedagógica da instituição, que deverão lhe dar suporte.
II. A professora Cristiane afirma que usa material concreto Para as pesquisadoras, no que se refere à organização das
para ensinar matemática e depois propõe aos alunos muitos atividades no tempo, nas escolas de Educação Infantil, são
exercícios para que repitam muitas vezes o que ensinou, necessários momentos diferenciados, organizados de acordo
depois dá exercícios de fixação. com as necessidades biológicas, psicológicas, sociais e
III. A professora Vera afirma que ensina os conteúdos com históricas das crianças (menores ou maiores). Nesse sentido, a
muito reforço e muitos exercícios, curtos, repetidos, cálculos organização do tempo nas creches e pré-escolas deve
para que as crianças se exercitem por várias horas seguidas. considerar as necessidades relacionadas ao repouso,
As afirmações dessas professoras parecem revelar que elas alimentação, higiene de cada criança, levando-se em conta sua
compartilham uma conhecida concepção de ensino e faixa etária, suas características pessoais, sua cultura e estilo
aprendizagem. Qual das alternativas revela essa concepção? de vida que traz de casa para a escola. Assim como o tempo, o
(A) Ensinar matemática consiste em explicar, aprender espaço também deve ser organizado levando-se em conta o
consiste em repetir ou exercitar o ensinado até reproduzi-lo objetivo da Educação Infantil de promover o desenvolvimento
fielmente. integral das crianças.
(B) Ensinar matemática consiste em partir do princípio de Horn (2004)13, escreve que o olhar de um educador atento
que as crianças são capazes de aprender muitas coisas a partir é sensível a todos os elementos que estão postos em uma sala
de sua experiência cotidiana. de aula. O modo como organizamos materiais e móveis, e a
(C) Ensinar matemática de forma compartimentada evita forma como crianças e adultos ocupam esse espaço e como
confusões e permite à criança aprender melhor.

12 BARBOSA, M. C. S.; HORN, M. G. S. Organização do espaço e do tempo na escola 13 HORN, M. G. S. Sabores, cores, sons, aromas. A organização dos espaços na
infantil. In: CRAIDY, C.; KAERCHER, G. E. Educação Infantil. Pra que te quero? Educação Infantil. Porto Alegre: Artmed, 2004.
Porto Alegre: Artmed, 2001.

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interagem com ele são reveladores de uma concepção Ainda de acordo com Tuan (1980)17, a percepção que o
pedagógica. [...] Ela traduz as concepções de criança, de indivíduo terá de determinado objeto é influenciada pela sua
educação, de ensino e aprendizagem, bem como uma visão de própria cultura, isto é, está sujeita à sua interpretação
mundo e de ser humano do educador que atua nesse cenário. subjetiva, a qual é mediada por experiências e vivências
Portanto, qualquer professor tem, na realidade, uma anteriores aliada ao processo de significação apreendido em
concepção pedagógica explicitada no modo como planeja suas seu grupo social. O espaço, uma vez vivenciado e
aulas, na maneira como se relaciona com as crianças, na forma experienciado, passa a ser reconhecido como ambiente. A este
como organiza seus espaços na sala de aula. Por exemplo, se o último, as sensações vividas determinarão sentimentos e lhe
educador planeja as atividades de acordo com a ideia de que atribuirão valores; desta forma, o espaço, antes sem
as crianças aprendem através da memorização de conceitos; identidade, passa a ser compreendido como lugar.
se mantém uma atitude autoritária sem discutir com as O que começa como espaço indiferenciado transforma-se
crianças as regras do convívio em grupo; se privilegia a em lugar à medida que o conhecemos melhor e o dotamos de
ocupação dos espaços nobres das salas de aula com armários valor as ideias de “espaço” e “lugar” não podem ser definidas
(onde somente ele tem acesso), mesas e cadeiras, a concepção uma sem a outra. A partir da segurança e estabilidade do lugar
que revela é eminentemente fundamentada em uma prática estamos cientes da amplidão, da liberdade e da ameaça do
pedagógica tradicional. espaço, e vice-versa.
Assim, a pedagogia se faz no espaço realidade e o espaço, Pode-se dizer então que a experiência é o fenômeno de
por sua vez, consolida a pedagogia. Na realidade, ele é o retrato transformação do espaço em lugar. Segundo Norberg Shulz
da relação pedagógica estabelecida entre crianças e professor. (1995)18, “o lugar é um fenômeno qualitativo total que não se
Ainda exemplificando, em uma concepção educacional que pode reduzir a nenhuma de suas propriedades, como as
compreende o ensinar e o aprender em uma relação de mão relações espaciais, sem que se perca de vista sua natureza
única, ou seja, o professor ensina e o aluno aprende, toda a concreta.
organização do espaço girará em torno da figura do professor. Torna-se relevante então, observar como os ambientes de
As mesas e as cadeiras ocuparão espaços privilegiados na sala Educação Infantil estão sendo experienciados e percebidos por
de aula, e todas as ações das crianças dependerão de seu seus usuários, principalmente as crianças, uma vez que suas
comando, de sua concordância e aquiescência. características estarão influindo diretamente essa percepção e
indiretamente contribuindo ou não no sucesso da função
B) Pressupostos Teóricos formadora e educadora da creche ou pré-escola.
O espaço adquire assim identidade, passa a ser
Os ambientes vivenciados pelo ser humano desde a mais reconhecido como ambiente, através da atribuição de um valor
tenra idade possuem uma variedade de características que ao simbólico, que a este é referido por quem o experiência; este
serem observadas e sentidas, promovem diferentes ambiente interage com o indivíduo e a ele proporciona
impressões. Cada indivíduo é um ser único, com suas identificação, segurança, equilíbrio e orientação; ou
particularidades e individualidades, ao mesmo tempo que é sentimentos adversos como não apropriação, medo,
parte de um grupo social, assim afirma Blower (2008)14. insegurança, desequilíbrio e desorientação.
A projeção de espaços que serão habitados e vivenciados
pelo ser humano, é tarefa do arquiteto, porém é necessário que C) O ambiente físico da creche influenciando o
as informações técnicas incluídas nos programas processo saúde/doença na primeira infância
arquitetônicos sejam enriquecidas com contribuições de
outras áreas, dando humanidade ao ato de projetar, O ambiente físico, tanto familiar como escolar, é um
consolidando a interação indivíduo e ambiente vivenciado. potencial determinante das condições de vida e saúde da
Essas contribuições trazem observações importantes com criança, sendo que ambos os ambientes podem oferecer
relação à vivência do homem no ambiente. condições favoráveis ao surgimento de doenças e acidentes,
Vygotsky (2007)15 descreve as funções psicológicas bem como a prevenção dos mesmos.
superiores do homem, no processo de desenvolvimento, como Segundo Yamamoto (1999)19, a criança, indivíduo em
um movimento em que o indivíduo deixa de utilizar marcas permanente modificação biopsiquíca devido aos fenômenos
externas (dos outros) e passa a adotar signos internos do crescimento e desenvolvimento, mantém-se exposta a
próprios, as chamadas representações mentais, que presença de fatores ambientais dentro e fora de sua casa.
substituem os objetos reais na internalização do pensamento. Especialmente, em nosso meio, as doenças do aparelho
O uso das representações mentais liberta o homem do respiratório, do trato digestivo e as doenças dermatológicas
espaço e do tempo presentes e são, segundo Oliveira (1995)16, são exemplos frequentes de alterações da saúde infantil
o principal mediador a ser considerado na relação do homem decorrentes da hostilidade do ambiente de vida.
com o meio ambiente. É através da Percepção Ambiental e da As crianças, na primeira infância, fase compreendida entre
mediação da interação social que o ser humano toma o primeiro e sexto ano de vida, necessitam de maior cuidado e
consciência do meio com o qual está interagindo. A forma atenção, no intuito de alcançarem um crescimento e
como o vivencia, numa relação de troca e reciprocidade, o fará desenvolvimento favorável. Entretanto, o fato de se
estabelecer relações que virão a influenciar seu encontrarem em fase de maturação dos sistemas orgânicos,
comportamento. bem como adquirindo habilidades locomotoras e manuais, são
Por meio das diversas percepções (relativas aos sentidos e consideradas mais propensas a adquirirem doenças dentre as
às informações socioculturais), o espaço é vivenciado, a quais podemos citar a diarreia e as infecções respiratórias
percepção ambiental dará lugar às sensações provocadas por agudas, que são as principais causas de morbimortalidade
elas e que, conjuntamente, farão parte da concepção do infantil em países em desenvolvimento. Nesta fase, são
ambiente interiorizado pelo indivíduo.

14 BLOWER, Hélide C. S. O Lugar do Ambiente na Educação Infantil: Estudo de 17 TUAN, Yi-Fu - Topofilia: Um Estudo da Percepção, Atitudes e Valores do Meio
Caso na Creche Doutor Paulo Niemeyer. Dissertação de Mestrado. ambiente. Ed. Difel, São Paulo, 1980.
PROARQ/FAU/UFRJ: Rio de Janeiro, 2008 18 NORBERG SHULZ, C. Existência, espaço y Arquitetura. Ed. Blume
15 VIGOTSKY, Lev S. A Formação Social da Mente. São Paulo: Martins Fontes, Barcelona,1975.
2007. 19 YAMAMOTO, R. M. Ambiente físico. In:ISSLER, H.; LEONE, C.; MARCONDES; E.
16 OLIVEIRA, Martha K. de - Vygotsky: aprendizado e Desenvolvimento, Um Pediatria na atenção primária São Paulo: Sarvier, 1999.
Processo sócio histórico. Scipione, São Paulo/SP,1995.

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comuns, também, outros tipos de afecções, tais como: No que diz respeito a quedas foi constatado a presença de
dermatoses, otites, distúrbios nutricionais e acidentes. alguns fatores de risco para tal acidente. Dentre estes,
Para Araújo e Vieira (2002)20 o acidente coloca a família, podemos citar principalmente o banheiro das crianças. No
dirigentes escolares e os responsáveis por crianças momento do banho, são reunidas por volta de 10 crianças e
acidentadas, em contato com situações difíceis de entender, apenas duas professoras auxiliares. Uma dá o banho nas
muitas vezes, com graves repercussões e, não raro, frente às crianças e a outra as enxuga, impedindo de que as mesmas
ocorrências irreversíveis como o êxito letal. Os fatores de risco consigam dar toda atenção as demais crianças que se
presentes no ambiente escolar podem comprometer o encontram no banheiro. Além de que, o piso é de cerâmica e
desenvolvimento da criança contribuindo para desencadear não há tapetes antiderrapantes e nem barras de proteção nas
diversos tipos de acidentes. paredes, as quais são revestidas com azulejos, o que pode
Ao ser inserida no ambiente escolar, a criança precisa ter favorecer a quedas. E ainda há um outro agravante, que é o
um lugar que possa promover o seu desenvolvimento, próprio comportamento das crianças durante o momento do
proporcionando-lhe um ambiente físico, afetivo e social banho, que ficam empurrando e batendo umas nas outras.
satisfatório. Contudo, Rezende e Silva (2002)21 referem que de É oportuno salientar que muitas crianças durante o
um modo geral, as creches e pré-escolas em nosso país vêm período de 01 a 03 anos encontram-se em fase de aquisição e
sendo nada mais do que locais de guarda da criança enquanto aprimoramento da locomoção, refinando sua coordenação
sua mãe trabalha, ou na melhor das hipóteses, locais nos quais motora e equilíbrio postural, conforme Sigaud e Veríssimo
a criança pode se alimentar e entrar em contato com algumas (1996)25, o que pode implicar diretamente em desequilíbrio
atividades pedagógicas. durante o banho, pois não tem apoio nas paredes, e o próprio
Além disso, a creche muitas vezes pode favorecer a piso é deslizante.
aquisição de novas afecções para a criança, pois o contato com Outro fator que podemos destacar é que, em sala de aula,
novas situações que podem modificar o seu estado de saúde algumas crianças fazem suas necessidades fisiológicas na
como o convívio social com outras crianças, a exposição a roupa durante o dia, e o piso fica molhado, levando-as a
patógenos, condições hidro sanitárias do ambiente e estrutura brincarem muitas vezes com os dejetos, principalmente a
física, são fatores contribuintes para o processo saúde/doença urina, podendo escorregar, e causar traumas, fraturas, dentre
da mesma, assim afirmando por Whaley e Wong (1999)22. outros. Este tipo de comportamento é natural, pois, segundo
Diante disso, há que se observar aspectos determinantes Whaley e Wong (1999), são durante os 18 a 24 meses de idade
no processo saúde/doença da criança, como estrutura física da que a criança irá apresentar condições para controlar os
creche, higiene, rede de abastecimento e tratamento da água esfíncteres anal e vesical, estabelecendo primeiramente o
utilizada, alimentação consumida, acessibilidade a produtos controle das evacuações, devido sua regularidade e pelo fato
químicos, de limpeza - e o mais importante de todos, a atenção de serem previsíveis com sensações mais fortes, e
direcionada à criança, já que, a mesma permanece o tempo posteriormente conseguem controlar as suas micções.
integral na creche, podendo apresentar situações que possam As divisórias de sala de aula apresentam uma estatura
trazer agravos à saúde da criança. baixa, possibilitando que as crianças subam e pulem para a
outra sala, podendo perder o equilíbrio e caírem.
D) O Ambiente Escolar (creche) x Fatores de Riscos Segundo Araújo e Vieira (2002)26, as quedas registram
para Acidentes números elevados de atendimentos ocasionando, desde
escoriações superficiais, fraturas de membros até culminar
O ambiente escolar (creche) tem um relevante papel para com o inevitável óbito, decorrente de traumas cranianos
promoção da saúde e prevenção de doenças na criança. severos.
Contudo, o contexto escolar pode repercutir de forma Com relação à sufocação, os fatores de risco observados
diferenciada, podendo trazer alguns danos à saúde da criança. foram os brinquedos pequenos e desmontáveis em peças
Os acidentes são uma das principais causas de menores e outros pequenos objetos ao alcance das crianças.
morbimortalidade infantil e estes são condicionados por Durante o período na creche, as crianças quando estão
vários fatores, que podem estar inseridos na própria estrutura brincando, levam, muitas vezes, os brinquedos à boca, e muitos
física do ambiente, bem como, o próprio comportamento das destes são pequenos, o que pode resultar na aspiração dos
crianças, que muitas vezes pode predispor as mesmas a mesmos, causando obstrução das vias respiratórias por corpos
vivenciarem situações de risco, podendo levá-las a acidentes estranhos. Apesar das professoras estarem presentes no
no contexto escolar (creche). ambiente em sala de aula, existe um número significativo de
Bessa e Vieira (2001)23, em estudo sobre danos de crianças crianças, em média 15 a 20 crianças para uma professora,
do pré-escolar e escolar, verificaram que todos os educadores facilitando, de sobremodo, este tipo de acidente, pois se torna
tinham presenciado na escola situações de acidentes nos pré- impossível uma adequada supervisão das crianças em sala de
escolares e escolares. Barros (2002)24 identificaram como aula.
principais fatores de risco para acidentes entre crianças de 04 Deve-se ter inicialmente, o cuidado com o ambiente onde a
a 05 anos de idade, dentre outros: crianças do sexo masculino, criança mais permanece, evitando-se pequenos objetos
presença de irmãos menores, frequência em creche e/ou jogados pelo chão ou em outros lugares ao alcance da mesma,
escola e residência na periferia urbana. tais como pregos, parafusos, tampas de canetas e similares.
No caso deste estudo, investigamos alguns fatores de risco Deve-se selecionar os brinquedos segundo a idade; para
condicionantes a quedas, queimaduras, cortes, sufocação e crianças mais novas, por exemplo, aqueles que não contenham
envenenamento no ambiente escolar. Contudo, constatamos partes pequenas removíveis.
que o ambiente apresenta um número mais significativo de Sendo assim, as crianças que se encontram na primeira
fatores de risco que podem propiciar a quedas e sufocação. infância, podem ser consideradas como um dos grupos mais
vulneráveis para acidentes, devido às limitações que

20 ARAÚJO, K. L.; VIEIRA, L.J E. de S. A criança e os fatores de risco no ambiente 24 BARROS, F. et al. Fatores de risco para injúrias acidentais em pré-escolares.
domiciliar e escolar: um ensaio reflexivo. v.11, n.3, p.83-87, set./dez., 2002. Jornal de Pediatria.v.78, n.2, p.97-104, 2002.
21 REZENDE, M. A., SILVA, C. V. Cuidado em creches e pré-escolas segundo os 25 SIGAUD, C.H. S.; VERÍSSIMO, M. D. L. O. R. Enfermagem pediátrica: o cuidado
pressupostos de Mayeroff. Acta Paul. Enf., v.15, n. 4, p.73-78, 2002. de enfermagem à criança e ao adolescente. São Paulo: EPU, 1996.
22 WHALEY, L.F; WONG, D. L. Enfermagem Pediátrica - Elementos essenciais à 26 ARAÚJO, K. L.; VIEIRA, L.J E. de S. A criança e os fatores de risco no ambiente
intervenção efetiva. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1999. domiciliar e escolar: um ensaio reflexivo. Texto Contexto Enfermagem. v.11, n.3,
23 BESSA, A.G.; VIEIRA, L.J.E. de S. Acidentes em crianças no contexto escolar; p.83-87, set./dez., 2002.
uma visão do educador. Rev. Cient. Ciências e saúde. v.14, p.15-20, dez., 2001.

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apresentam com relação aos aspectos físicos, sensoriais, de higiene e falta de recursos adequados no preparo de
psicomotores e cognitivos, os quais serão desenvolvidos com alimentos e desinformação.
o tempo. Vale salientar que muitos dos problemas gastrintestinais
Logo, os comportamentos que foram evidenciados pelas podem levar à criança a apresentar diarreia, e
crianças da creche ocorreram devido à própria fase de consequentemente condicionando-a muitas vezes à
desenvolvimento, caracterizada pela experimentação ativa, desidratação e desnutrição, por isso, o mais importante é
curiosidade, a falta de noção de perigo, e o seu pensamento desenvolver uma atitude crítica e reflexiva dos cuidados que
mágico, de que é o todo poderoso, e por tanto, nada poderá devem ser dispensados à criança para que possa aprender a
acontecer consigo mesma, o que só vem a intensificar neste desenvolver comportamentos que promovam sua saúde.
período da primeira infância a riscos de acidentes,
repercutindo diretamente na saúde física, mental, social e Questões
emocional das crianças.
01. É correto afirmar que organizar o cotidiano das
E) O ambiente escolar (creche) x fatores de riscos para crianças da Educação Infantil pressupõe pensar que o
doenças estabelecimento de uma sequência básica de atividades
diárias.
A creche pode apresentar alguns fatores de risco que ( ) Verdadeiro ( ) Falso
podem causar agravos externos à saúde das crianças que
permanecem em tempo integral, podendo levá-las a 02. Dentre os aspectos determinantes no processo de
apresentar problemas dermatológicos, respiratórios e saúde/doença da criança, pode-se destacar:
gastrointestinais. Que, segundo Whaley e Wong (1999), são as (A) Estrutura física da creche e água tratada.
afecções que mais acometem as crianças inseridas no contexto (B) Água tratada, higienização correta dos alimentos,
escolar. estrutura física e acessibilidade à produtos químicos.
No que diz respeito aos problemas dermatológicos, (C) Acessibilidade à produtos químicos, higienização
observamos que muitas das crianças apresentavam algumas correta dos alimentos e estrutura física
destas afecções, desde piodermites, escabiose, pediculose, larva (D) Estrutura física, água tratada, higienização correta dos
migrans e molusco contagioso, verificando a presença não só alimentos, acessibilidade à produtos químicos e higiene.
de fatores de risco para estes tipos de doenças, mas também, (E) Estrutura física da creche, higiene, água tratada,
constatando atitudes principalmente dos educadores para higienização correta dos alimentos, acessibilidade à produtos
uma maior aquisição destes problemas entre as crianças. químicos e o mais importante de todos, a atenção direcionada
O compartilhamento dos utensílios de higiene pessoal, à criança.
como toalhas, sabonetes, pentes, escovas de cabelos, entre
todas as crianças, pode causar tais doenças. Apesar de no início 03. Em relação aos problemas gastrintestinais, pode-se
do ano letivo, ser solicitado como item de material escolar um afirmar que os fatores de risco está intrinsecamente
kit para higiene pessoal, é comum professoras não utilizam o relacionado com as atitudes das crianças.
utensílio individual para cada criança, pelo contrário, fazem o ( ) Verdadeiro ( ) Falso
uso do mesmo em todas as crianças, repondo à medida que vai
acabando, o que facilita a proliferação dos microrganismos Gabarito
entre as crianças, intensificando os problemas dermatológicos
nas mesmas. 01.Verdadeiro / 02.E / 03.Falso
De acordo com Collet e Oliveira (2002)27 as doenças da
pele, geralmente, originam-se de contato com agentes nocivos,
tais como microrganismos infecciosos, compostos químicos
tóxicos, traumas físicos, fatores hereditários, doenças 3. O cotidiano na
sistêmicas cujas lesões sejam manifestações cutâneas. As construção do conhecimento
dermatites, os eczemas e as infecções bacterianas de pele são
os problemas dermatológicos mais comuns na infância.
histórico e geográfico
Vale salientar que quando for constatado que as crianças
estão acometidas por algum tipo de doença dermatológica,
ocorre a separação dos utensílios destas crianças. Mas isto, não A) Uma visão sociológica do cotidiano
impede que a transmissão dos patógenos já tenha acontecido,
pois tal atitude só é feita quando se constata a presença de Estudar o cotidiano, pelo viés da sociologia, pressupõe o
sinais mais evidentes pelas professoras. conhecimento das relações sociais em seus ambientes e na
Com relação aos problemas gastrintestinais, percebemos forma em que realmente elas acontecem. Diferentemente do
que os fatores de risco estão intrinsecamente relacionados conceito de fato social, estudado por Durkheim, através do
com as atitudes das crianças e dos próprios educadores que qual os fenômenos sociais são tratados de forma organizada e
precisam enfatizar comportamentos preventivos e, mensurados. Pode-se dizer que o estudo do cotidiano se
consequentemente saudável para prevenção destas doenças estabelece, justamente, no conhecimento da desorganização
no âmbito local. dos fatos sociais, conforme Maffesoli, (1988)29. É, portanto,
De acordo Ribeiro (1996)28 vários fatores podem levar à considerar o que aparentemente não tem importância,
criança a apresentar doenças gastrintestinais, dentre estes, conforme o autor denomina como “resíduos” nos estudos da
podemos citar: a idade, pois as crianças menores são mais sociedade, o qual as análises macro estruturais não conseguem
susceptíveis, por causa da imunodeficiência de anticorpos, alcançar.
principalmente a Ig A, a constituição anatômica e fisiológica da De acordo com Balandier (1983)30, o campo da sociologia
criança, a desnutrição, clima quente, falta de água potável, falta do cotidiano possibilita compreender, além das interações

27 OLLET, N.; OLIVEIRA, B. R. G. Enfermagem pediátrica. Goiânia: AB, 2002. 29 MAFFESOLI, Michael. La connaissance ordinaire. Paris: Librairie des
28 RIBEIRO, M. O. A criança com diarreia aguda. In: SIGAUD, C.H. S.; VERÍSSIMO, Méridiens, 1988.
M. D. L. O. R. Enfermagem pediátrica: o cuidado de enfermagem à criança e ao 30 BALANDIER, G. Essai d’identification du quotidien. Cahiers Internationaux
adolescente. São Paulo: EPU, 1996. de sociologie, vol. LXXIV, Paris: Puf, 5-12, 1983.

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sociais, os dispositivos que regulam a vida cotidiana, assim faz que a socialização produz na realidade social são os interesses
reaparecer o sujeito face às estruturas sociais, valorizando o principais deste autor. Assim, ele a sociedade não é possível
efêmero, o contingente, o fragmento, o relativo e o múltiplo. senão como conjunto de configurações e de combinações de
Desse modo, nos estudos do cotidiano, o que parecia não ter elementos que, longe de serem harmoniosos e coerentes,
importância, é resgatado e assume um lugar central nas representam o resultado de um processo de objetivação da
análises acerca da sociedade. vida coletiva e de civilização. O cotidiano, através das
Tratar do cotidiano como campo de análise é, sobretudo, construções dos costumes e ações, reflete de maneira exata a
entrar em um debate ainda muito pouco definido e com limites estrutura do quadro que engloba do conjunto de indivíduos
muito tênues. Algumas correntes que trabalham com o que o habitam. Desta maneira, a estrutura da vida cotidiana
cotidiano ou vida cotidiana, seguem por rumos diferentes, o torna-se parte integrante de tal ou qual camada social, na
que nos leva a perceber apenas alguns pontos de partida. A medida em que esta camada não seja vista de maneira isolada
tese marxista, por exemplo, de que o conhecimento deve partir das estruturas de poder da sociedade global. Nesta
dos homens e da sua vida real, contribuiu para o perspectiva, Elias defende a indissociabilidade entre vida
desenvolvimento de um campo de abordagem, que de certa cotidiana e as mudanças estruturais da sociedade, a divisão do
forma, nos leva a muitos caminhos que vão ao encontro dos trabalho e os processos que envolvem as orientações estatais.
estudos do cotidiano. Além dessas abordagens inspiradas no Entretanto, foi Goffman (1999), outro membro do grupo de
marxismo, existem outras que não se denominam estudos do interacionismo simbólico da Escola de Chicago,
propriamente de estudos do cotidiano, mas que, de uma forma quem mais se popularizou no meio acadêmico e dirigiu os seus
ou de outra, o privilegia, seja pela ótica do mundo da vida a estudos, mais especificamente, para a área da sociologia. A
partir de Schutz, seja pelo viés pós-moderno de Maffesoli. grande preocupação do autor residia no fato de entender o que
Muitos teóricos da área da sociologia e da antropologia, representa a relação face a face dos indivíduos numa
principalmente após a segunda guerra, desenvolveram interação, ou melhor, perceber como as pessoas em
estudos que, de certa maneira, envolveram os aspectos determinadas situações de interação desenvolvem seus
comuns da sociedade, presentes nas relações e inter-relações “papéis” que, aparentemente, lhes são pré-determinados. As
sociais. situações de interação, segundo o autor, constituem unidades
Durkheim talvez tenha sido a fonte principal de inspiração delimitadas num tempo e numa rede de relações de poder e de
do campo sociológico do cotidiano e das representações formas sociais institucionalizadas que transcendem a
sociais, pode parecer um pouco estranha tal dedução, contingência das situações interacionais.
sobretudo, pelo fato dele ter uma preocupação inversa ao que De acordo com Gouldner (1970)33, o modelo dramatúrgico
se propõem os estudos do cotidiano. Porém, é nessa de Goffman nos deixa a impressão que falta uma interpretação
inversibilidade que, justamente, os acontecimentos comuns do mais geral da motivação das rotinas da vida cotidiana, pois se
cotidiano aparecem em suas obras. Nesse sentindo, o autor os indivíduos são apenas atores num palco, escondendo-se em
buscava em seus estudos entender os processos macro seus papéis, em seus “eus” atrás da interpretação que adotam
estruturais da sociedade para deduzir, a partir daí, as relações para a ocasião, o mundo social (enquanto palco/cenário
cotidianas. O que ele busca nessa relação é a frequência dos maior) estaria, em grande parte, vazio em substância. Parece-
acontecimentos sociais para que sejam determinadas, a partir nos que, de certo modo, para Goffman, a realidade social é
daí, as leis empíricas e universais. Os fatos sociais, deste modo, formada por diversas micro experiências as quais compõem o
são percebidos por ele como coisas e com grande poder de nível macrossociológico deixando de lado, de certo modo,
coercitividade. Descartando, desse modo, qualquer alusão que questões importantes a serem consideradas em grandes
por ventura possa ser feita com relação às questões escalas como a organização dos sistemas sociais, mudança
individuais ou subjetivas do ponto de vista psicológico ou das social e a história.
interações sociais. Maffesoli (1985)34 considera o cotidiano como lugar por
Simmel (1981)31 também, em certa medida, aproximou-se excelência para a análise do social porque é nele que se
do campo da sociologia do cotidiano analisando as “formas” constitui a sociabilidade. O conhecimento do coletivo, para ele,
sociais a partir do primado da interação. Para ele, uma análise é primordial para a compreensão da realidade pois é nele que
sociológica deve remontar às ações e reações dos indivíduos se constitui a “teia de significações insignificantes, efêmeras e
na situação em que se encontram. Assim, acredita que não é polissêmicas que constrói a força e a permanência da vida
possível conhecer a realidade social sobre uma base de cotidiana”. De acordo com autor, para conhecer a realidade
oposição entre indivíduo e sociedade. A sociedade, segundo o social torna-se necessário superar, em todos os sentidos, o
autor, é o resultado de uma formalização social, na qual as racional e lançar mão do nosso conhecimento comum, da
regras e obrigações, que nela estão contidas, são entendidas intuição, do presente e da participação. Ato que exige novos
como meios e não como fins, o que permite a compreensão de procedimentos de investigação que conviva com a pluralidade
que os indivíduos participam do processo de construção da de abordagens, sejam de que ordem for para elaboração de
realidade social. A realidade social para o autor é constituída uma descrição de um momento ou de um dado espaço que seja
por processos interativos que são processos de socialização. o menos enganoso possível.
Esses processos abrem sempre novas vias em direção à Ao que nos indica, Maffesoli considera que o cotidiano se
sociabilidade. Essas vias são múltiplas e são produtos das autoproduz desvinculado das referências apriorísticas da
ações dos indivíduos que as percorrem buscando estrutura e dos sistemas de racionalidade que lhe são
constantemente novos espaços no sentido de afirmação de sua subjacentes. Embora defenda a ideia de integrar os fatos
personalidade e de constituição de novos grupos. Os processos cotidianos numa “compreensão global”, pode-se inferir que as
de sociabilidade, apresentados por Simmel, põe em evidência suas análises estão ligadas a um certo relativismo, no qual ele
situações que ocorrem no dia a dia de pessoas comuns, através considera tudo válido, o que corre o risco de ignorar e, de certo
das quais pode-se visualizar relações do cotidiano. modo até acabar com a consciência das contradições e dos
Um conjunto de trabalhos que, de certo modo, considerou conflitos. Muitas críticas feitas ao autor residem no fato de ele
o cotidiano como elemento de análise da sociedade histórica ser adepto às análises do local, do micro social sem ter em
foi o de Elias (1983)32, onde os processos e as configurações conta os grandes movimentos e as grandes tensões do mundo

31 SIMMEL, George. Sociologie et épistemologie. Paris: PUF, 1981. 33 GOFFMAN, Erving. A representação do eu na vida cotidiana. 8ª ed.
32 ELIAS, Nobert, Sur le concept de vie quotidienne. In: Cahiers Internationaux Petrópolis: Vozes,1999.
de sociologie, vol. 99, Paris: Puf, 1983. 34 MAFFESOLI, Michael. La connaissance ordinaire. Paris: Librairie des
Méridiens, 1985.

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econômico e da história. Além da falta de rigor metodológico, escolhe consciente e autonomamente. Quando o ser individual
a contestação ao racionalismo da sociedade moderna, também passa para o humano genérico encontra-se na plenitude, esta
é considerada um dos pontos críticos na sua abordagem. Por passagem (suspensão da vida cotidiana) denota que o homem
outro lado, ele chama a atenção para a realidade social, singular se reconhece como integrante da totalidade e dessa
valorizando as transformações e as especificidades que o forma ganha a consciência e possibilidade de transformação
cotidiano nos oferece para o conhecimento da sociedade. do cotidiano singular e coletivo.
A vida cotidiana está mais vulnerável à alienação pelo fato
B) A influência do pensamento marxista nos estudos de existirem sucessivas atividades heterogêneas. Essa
sobre o cotidiano alienação ocorre quando as formas necessárias de
pensamento e ação se absolutizam e deixam pouca margem
Como já havíamos nos referido anteriormente, alguns para o movimento ou manipulação da individualidade. Na
teóricos do pós guerra renovaram algumas ideias de Marx, sociedade capitalista, segundo Heller, a divisão social do
principalmente as que estão contidas nas suas primeiras trabalho é um elemento concreto de perda da objetividade do
obras, através de trabalhos sobre o cotidiano. A filósofa indivíduo, com tendências a se tornar um eu particular
húngara Agnes Heller desenvolveu uma sociologia da vida fragmentado.
cotidiana baseada nos estudos de Lukács principalmente na Essa percepção do cotidiano e da cotidianidade da autora,
tese da “insuprimibilidade” da vida cotidiana. Heller tem seus deixa explícita a sua preocupação central na questão do
fundamentos ontológicos centrados na ideia de homem como trabalho e na sua hierarquização, que, por sua vez, reflete na
ser prático e social produzindo-se por meio de suas prática da vida cotidiana. A busca pelo homem genérico,
objetivações, considerando o ponto de vista de classe, da significa a superação do homem enquanto ser mergulhado em
categoria de totalidade, de mediação, de negação e de uma cotidianidade alienada e alienante capaz de deixar
contradição. “imóvel” as grandes transformações históricas da sociedade.
O cotidiano, de acordo com Heller (1972)35, é a vida de Desta forma, o cotidiano enfocado pela autora vai além das
todos os dias e de todos os homens em qualquer época relações face a face e está intimamente ligada a uma hierarquia
histórica que possamos analisar. Segundo a autora, não existe entre as diferentes atividades que constituem a cotidianidade.
vida humana sem o cotidiano e sem cotidianidade. As Lefebvre, em sintonia com algumas ideias de Heller,
atividades do dia a dia promovem a reprodução do indivíduo chamou a atenção para os grandes temas da modernidade - O
singular e, por consequência, a reprodução do social. A nacionalismo, a cotidianidade, o estruturalismo, o urbanismo,
condição humana, desta forma, depende do cotidiano, porém, o estatismo e o neoliberalismo. Analisou o econômico dentro
não se limita a ele, pois nessa relação estão presentes, das relações sociais e considerou o Estado como um mediador
sobretudo, a intersubjetividade dos sujeitos, os significados do entre o econômico e o social.
mundo e as instituições que ordenam a experiência do vivido. Segundo Martins (1996)36, “Lefebvre trouxe Marx para o
Para a autora, o cotidiano possui três dimensões objetivas, nosso tempo criticamente como era próprio do pensamento
a primeira é a objetivação em si mesma (regras de linguagem, marxiano”. Através de seus trabalhos sobre cotidiano, uniu a
maneira de utilizar os objetos, normas de interação humana e etnografia e o marxismo, fez uma sociologia de análise
costumes) e para si mesma, a qual está na esfera dos dinâmica, na qual privilegiou os espaços urbanos, a moradia,
significados, das generalizações, das narrativas, da as festas etc.
constituição, da manifestação e do retorno da vida cotidiana Lefebvre (1961)37, afirma que o cotidiano é um nível de
como totalidade humana. A outra objetivação está no nível realidade social que se relaciona com outros níveis, como o
intermediário. A objetivação por e em si mesma é a esfera da econômico, o político, o cultural e o psicológico. As análises
divisão do trabalho que, no mundo moderno, tem como base à individuais dos níveis de realidade apresentam, por sua vez,
especialização. A diversidade das instituições e as conteúdos de outros níveis, os quais nos mostram que, ao
especializações estratificam os indivíduos fazendo-os adaptar- mesmo tempo em que estamos mergulhados em um nível de
se e integrar-se ao cotidiano. realidade, estamos também fora dele.
Para compreender a estrutura da vida cotidiana é Concomitante às questões históricas, econômicas e
importante partir de alguns pressupostos que, de acordo com culturais que interferem no cotidiano, são os sujeitos sociais
Heller, são imprescindíveis. O sujeito humano considera seu que dão vida e que fazem a prática cotidiana. Cada realidade é
ambiente como algo já dado, já feito, que se apropria única e são os homens e as mulheres os responsáveis pela
espontaneamente de seu sistema de hábitos e técnicas; seu construção da vida cotidiana, tornando-as singulares nas suas
comportamento é pragmático direcionado ao êxito da realizações.
atividade; seu conhecimento não é medido por critérios de Para o autor, o conceito de cotidiano é global, ele se refere
opinião. Na vida cotidiana a heterogeneidade das atividades e questiona a totalidade no curso do seu desenvolvimento. As
está em correspondência de modo imediato com a práxis particularidades que compõem a vida cotidiana, devem ser
humana total. analisadas com cuidado para não se correr o risco de tratar os
A práxis humana total está relacionada com o ser elementos que fazem parte dessa “globalidade” de maneira
particular e o genérico. Para Heller (1972), “O indivíduo singular.
contém tanto a particularidade quanto o homem genérico que A homogeneização do cotidiano pode ser percebida
funciona consciente e inconscientemente no homem”. Essa através das leis e da ordem estabelecida, das tarefas repetidas
coexistência do ser genérico e particular na humanidade só linearmente, da tendência geral de organizar a vida cotidiana
acontece em sua plenitude no cotidiano, embora nela, apenas como uma empresa, das representações estereotipadas e
se perceba o singular. A passagem do homem “inteiro” para o outros. Os fatores de fragmentação interrompem a linearidade
"inteiramente homem" acontece quando se rompe a da homogeneização provocando rupturas e descontinuidades:
cotidianidade, quando um projeto, uma obra ou um ideal as separações e segregações, a organização sindical, o público
convoca a inteireza de nossas forças e então suprime a e o privado. Todos esses fatores devem ser entendidos dentro
heterogeneidade. Neste momento ocorre a homogeneização, de uma abordagem totalizadora e não apenas no específico.
porém, apenas ocorre quando o indivíduo concentra toda a sua O público e o privado tomados como individual e coletivo,
energia e a utiliza numa atividade humana genérica que nas análises de Lefebvre, de maneira geral, nos fazem perceber

35 HELLER, Agnes. O cotidiano e a história. São Paulo: Paz e Terra, 1972. 37 LEFEBVRE, Henry. Critique de la vie quotidienne II. Paris: L’Arche, 1961.
36 MARTINS, José. DE S., org.) Henri Lefebvre e o retorno à dialética. São Paulo:
Hucitec, 1996.

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que não existe o individual singular, isento do coletivo. E sim das operacionalizações dessas práticas cotidianas, considera-
uma vinculação entre eles, a qual um interfere no outro. se três aspectos. Primeiro o caráter estético que se trata da
Os fatores de hierarquização tomam forma através da arte de fazer. Essa dimensão diz respeito à questão do estilo, a
hierarquia das funções, dos trabalhos, dos salários, do saber e maneira específica de fazer, de praticar alguma coisa. O
da burocracia. Existem também os fatores de centralidade, segundo é o caráter ético, quando as práticas cotidianas se
subjetividade e de sociabilidade que integram o cotidiano e constituem em uma recusa do sujeito em se identificar com a
que se opõem à homogeneização. Eles representam elementos ordem tal como ela se impõe. De alguma forma existe uma
de força que atuam de maneira dialética. Esses movimentos ordem que não pode ser mudada, porém, quando não se segue
podem, por sua vez, provocar mudanças no nível de realidade. tal qual a essa lei configura-se aí um aspecto essencialmente
Às representações integram-se as ações na composição do ético. É o abrir de um espaço. Um espaço que não é fundado
cotidiano na sociedade moderna. É a partir das representações sobre a realidade existente, mas, sobre a vontade de criar
que se forma o ideário teórico de uma época, que vai alguma coisa. Na multiplicidade dessas práticas cotidianas,
influenciar as ações do cotidiano. Segundo Lefebvre, as dessas práticas transformadoras da ordem imposta, há
representações formam-se entre o vivido e o concebido, ao constantemente um elemento ético. Por fim existe o aspecto
mesmo tempo em que estes se diferenciam entre si. polêmico. São as práticas que representam a defesa da vida
Entretanto, estudar o cotidiano, de acordo com Lefebvre, que estão inscritas como intervenções de conflito permanente
vai além de observar os fatores que o compõe. É sobretudo em uma relação de força.
analisar, conjuntamente com as ações, as representações Considerando estes elementos que compõem as práticas
construídas pelos atores sociais, buscando captar, através das cotidianas, Certeau (1982) esclarece que as práticas devem ser
representações, o pensamento acerca dessas ações. analisadas enquanto operações, como manifestação de táticas
De certo, Heller e Lefebvre contribuíram muito para o e de estratégias. Para tal é importante verificar se algumas
desenvolvimento de uma sociologia do cotidiano, sobretudo, delas encontram- se mais reunidas em determinados locais
pelo fato de deslocar as análises estáticas da vida social para a que em outros, se são mais específicas de determinados meios
análise das relações em movimento. Lefebvre, principalmente, ou de determinada conjuntura na qual algum indivíduo se
trouxe o cotidiano para a sociologia conjuntamente com as encontra.
mudanças que a sociedade estava passando. Essas Até certo ponto, Certeau (1990) retoma a estratégia de
transformações alteravam, segundo o autor, as ocupações dos Bourdieu, mas sem obedecer ao seu esquema de circularidade,
espaços urbanos e privados que através das relações sociais no qual as estratégias utilizadas pelos sujeitos possuem um
desenvolvidas naquele e em outros espaços, poderiam certo automatismo. O autor propõe tratar as práticas
também causar alterações em espaços cada vez mais amplos. cotidianas também como grupos de estratégias, sem
Associar as mudanças estruturais da sociedade moderna com desconsiderar, também, os aspectos estruturais da sociedade.
as relações cotidianas é uma das grandes contribuições deste Porém, essas estratégias são produzidas e recriadas pelos
autor. sujeitos através das práticas cotidianas que, por sua vez,
Porém, outras análises também seguiram os passos de possuem sua própria lógica.
Lefebvre e Heller oferecendo outros enfoques nos estudos De acordo com Certeau, a lógica das práticas cotidianas não
sobre o cotidiano, principalmente pelo viés da história e da se apresenta apenas através do que é realizado em forma de
antropologia, como Michel de Certeau. ação em um determinado ambiente. A lógica da ação, de
Segundo Certeau (1990)38, o cotidiano pode ser entendido acordo com o autor, é toda uma rede de operações nas quais
como um ambiente onde se formalizam as práticas sociais que, envolvem as relações de força que consiste em construções de
por sua vez, sofre influências exteriores. De certo modo, o táticas de ações “próprias” desenvolvidas pelos sujeitos em um
autor concorda com Lefebvre quando este considera que as determinado ambiente que, todavia, se estabelece quando as
instituições econômicas interferem nas ações e pensamentos ações se transformam em práticas cotidianas e em práticas
dos indivíduos, porém, é também claro em afirmar que não se discursivas, tornando-se, portanto, indissociáveis.
pode resumir as análises sociais ao determinismo econômico. Certeau (1990) considera importante a análise das
Certeau (1985)39 acredita que, na maior parte dos trabalhos, práticas cotidianas conjuntamente com as práticas
quando se leva em consideração a questão da produção discursivas. As práticas discursivas, as quais ele se refere,
econômica capitalista nas análises social, olha-se demasiado estão relacionadas com os “atos de fala”, ou melhor, com a
com o olhar do poder centralizador que esmaga quase que utilização social da linguagem. Considerar que os atos de fala
completamente o consumidor e que o cotidiano, por sua vez, são formas de práticas sociais requer uma compreensão de
reproduz as influências do poder econômico nas suas relações linguagem diferente do conceito saussuriano. Para Certeau
sociais. Desse modo, resta para os “consumidores oprimidos” (op. Cit.), a linguagem não se analisa de maneira isolada do
reproduzir ou superar essa situação. social, ela está integrada aos contextos sócio culturais e
Para Certeau nesta questão existe um outro lado, que para econômicos da mesma forma que as práticas enquanto
ele, do lado do consumidor existe também uma produção, puramente formas operacionais. Quando se analisa a forma
muito embora pareça invisível, em que ele transforma o operacional de um determinado grupo considera-se que essas
espaço que lhe é imposto, ele se transforma em um caçador formas são organizadas da mesma forma que a linguagem.
furtivo, o qual circula, caça, faz uma produção, que não é Portanto, para Certeau (1985), os “atos de fala” são
marcada pela criação de novos produtos, mas, que ele se serve constitutivos das práticas cotidianas. Os documentos, as leis, o
de um léxico imposto para produzir algo que lhe seja próprio. ato de conversar, de cumprimentar, de ordenar e de convencer
Dessa forma o consumidor pode ser visto também enquanto fazem parte de todo um processo social no qual estão em jogo
criador, produtor ou praticante. as relações de força em um determinado espaço social.
A partir dessas questões, o autor chama atenção para o A partir da proposta de análise das práticas cotidianas de
pressuposto de considerar as práticas cotidianas enquanto Certeau (1985), podemos perceber que ele se distancia de
práticas. Podemos entender que, as relações sociais são Heller e Lefebvre quando não evidencia conceitos centrais
formadas por práticas que são construídas, são “fabricadas”, a desses autores como homogeneidade, heterogeneidade,
partir das diversas atividades que se exercem na vida fragmentação, superação, individual, coletivo, particular e
cotidiana - profissionais, sociais, políticas e culturais -. A partir genérico. O conhecimento das práticas cotidianas, de acordo

38 CERTEAU, Michel de. L’ invention du quotidien 1: arts de faire. Paris: 39 CERTEAU, Michel de. Teoria e método no estudo das práticas cotidianas. In:
Gallimard, 1990. Cotidiano, cultura popular e planejamento urbano. Anais. São Paulo:
FAUUSP.1985.

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com Certeau (1985), centra-se muito mais na busca dos indivíduos interagem entre si e com o conhecimento. O
aspectos estéticos, éticos e polêmicos da criação de cada pressuposto epistemológico da etnometodologia da educação
realidade construída através das ações e discursos dos sujeitos proposta por Coulon está baseado na fenomenologia de
sociais, do que na identificação e estruturação dos conceitos Schutz. Segundo o autor, a vida da escola é organizada e
nas múltiplas realidades. Os espaços sociais, para ele, não são produzida pelos membros em sua rotina, padronização,
dados, como afirma Heller, e sim construídos e reconstruídos. disciplinamento, acontecimentos, atividades, competências e
As orientações e normas impostas, para Certeau (1990), não socializações. Dessa forma a escola é vista como ambiente em
são simplesmente reproduzidas e sim “fabricadas” a partir das que se produzem “realidades” que devem ser compreendidas
diferentes realidades sociais. e interpretadas.
Pode-se inferir que, o que Certau (1985;1990) propõe, A etnometodologia da pesquisa educacional, de acordo
através dos estudos do cotidiano, é uma análise mais com o autor, traz uma gama de elementos (noções) para se
etnológica e menos filosófica da vida cotidiana, embora, em analisar os processos que ocorrem no interior da escola. Esses
análise mais aprofundada, pode-se perceber elementos de elementos, por sua vez, como no interacionismo, estão
Heller e Lefebvre nos seus escritos. De acordo com Martins concentrados nas relações pessoais, não valorizando as
(1998), estes dois autores, quando tratam da reprodução questões macro estruturais, bem como as tensões que
social, não se referem apenas do capital, mas das contradições ocorrem a partir das relações de poder dentro e fora da escola.
sociais, referem-se também à questão da criação da História Régine Sirota (1988)43 também privilegiou o cotidiano de
pelo homem, pontos em que, sob diversos aspectos, uma escola primária para entender os processos da relação
convergem com Certeau. entre professor em sala de aula. No seu trabalho de análise da
divisão da palavra entre mestre e alunos, a autora considerou
C) Os estudos do cotidiano da escola os elementos estruturais da sociedade como integrantes do
cotidiano escolar.
Como afirma Petitat (1991)40, “por volta da metade dos Sonia Pennin (1995)44, em seu trabalho “O Cotidiano e a
anos 70 a estrela da macro teoria começou a empalidecer”, Escola”, também chamou atenção para a utilização da análise
dessa forma, os trabalhos na sociologia da educação que micro sociológica no estudo da educação. Tratando o cotidiano
analisava a escola com base nos problemas estruturais e nas escolar à luz da teoria do sociólogo Lefebvre (1961), a autora
suas relações de dominação, passou a dividir espaço com as procura compreender a gênese e a natureza do processo
novas abordagens que tiveram, inicialmente, influência educativo, através das ações cotidianas e das representações
sobretudo do interacionismo simbólico, principalmente, dos dos sujeitos que estão envolvidos - professoras, diretores e
trabalhos de Goffman. Desse modo, a escola passou a ser pais -, tentando identificar os elementos transformadores da
estudada por dentro, isto é, a partir das relações sociais que escola.
acontecem no seu interior. Com base na abordagem etnográfica da pesquisa científica,
O estudo das interações sociais na escola colocava em o trabalho de Pennin focalizou o cotidiano escolar procurando
evidência tanto os problemas sob ponto de vista da relação descobrir os fatores de homogeneização, heterogeneização e
entre o professor e o aluno em sala de aula, como da relação fragmentação, bem como de superação, presentes no dia a dia
destes com o conhecimento. De acordo com André (1995)41, da escola, através das ações e representações (do vivido e do
algumas observações críticas acerca deste tipo de estudo em concebido) dos sujeitos. Este é um trabalho de grande
educação foram desenvolvidas já em meados dos anos 70. Elas importância na área da educação porque chama a atenção para
se concentravam, principalmente, no fato destes estudos a vida diária escola, não apenas de maneira restrita ao
utilizarem instrumentos de observação que procuram reduzir ambiente da sala aula, mas, principalmente para a o seu
os comportamentos da sala de aula a elementos de tabulação e funcionamento como um todo, sua organização, as atividades
mensuração e, desta forma, pouco contribuir para a de rotina, a utilização do tempo escolar, entre outros.
compreensão do real processo ensino e aprendizagem. A partir do exposto, podemos afirmar que o cotidiano,
Na tentativa de superar esses problemas, passou-se a ainda pouco explorado ou valorizado como aporte teórico dos
utilizar os pressupostos da etnografia, que decorre da estudos sobre a escola, oferece uma gama de elementos para
abordagem antropológica, com vistas a captar as relações se conhecer o que até então, considerou-se sem importância,
desenvolvidas no âmbito da escola, no seu próprio mas, que pode conter elementos fundamentais para se
desenvolvimento. Com isso começou-se a valorizar o contexto compreender melhor a dinâmica das unidades escolares,
das interações que ocorrem na sala de aula associada a uma sobretudo a partir da utilização das táticas e estratégias
gama de significados culturais que estão presentes nesse proposta por Certeau como forma de interpretação da
processo. realidade escolar.
Como nos próprios estudos da escola de Chicago, este
trabalho centrou-se preferencialmente na dimensão pessoal, D) Relações de poder no cotidiano escolar
das relações face a face, não considerando a dimensão
institucional ou macro estrutural. Alguns autores acreditam A natureza da relação entre o aluno e a escola, mais
que estes problemas decorrem, justamente, pelo especificamente da relação professor-aluno, consiste em
desconhecimento dos pesquisadores dos princípios básicos da fatores importantes para o processo educacional. Entre o
etnografia, como também da falta de clareza do papel da teoria professor e o aluno existe uma relação de poder, de natureza
na pesquisa científica. desigual. A relação professor-aluno torna-se fundamental para
O estudo etnometodológico da escola realizado por Alain o processo educacional, para a construção da história escolar
Coulon (1993)42, de certa forma, apresenta uma proximidade e de vida do aluno, pois são, também, nestas relações que o
com o interacionismo simbólico da escola de Chicago. Tendo aluno constrói sua subjetividade.
como base os estudos de Garfinkel, a etnometodologia da Paulo Freire (1996)45 diz: “O professor autoritário, o
educação propõe um mergulho no interior da escola para professor licencioso, o professor competente, sério, o
compreender e interpretar o processo social no qual os professor incompetente, o professor irresponsável, o

40 PETITAT, André. Intinerário de leitura de um sociólogo da educação. In: 43 SIROTA, Régine. L’École primaire au quotidien. Paris: PUF, 1988.
Teoria e educação. Rio Grande do Sul: Pannonica, 1991. 44 PENIN, Sonia. Cotidiano e escola: a obra em construção. 2a ed. São Paulo:
41 ANDRÉ, Marli. E. D. A.de. A etnografia da prática escolar. São Paulo: Papirus, Cortez, 1995.
1995. 45 FREIRE, P. Pedagogia da autonomia. Saberes necessários à prática educativa.
42 COULON, Alain. Ethnométhodologie et education, Paris: PUF, 1993. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

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professor amoroso da vida e das gentes, o professor mal alunos eram repreendidos, ou seja, sem liberdade de
amado, sempre com raiva do mundo e das pessoas, frio, expressão de seus anseios, dificuldades e necessidades.
burocrático racionalista, nenhum desses passa pelos alunos A educação restringia-se ao ambiente da sala de aula, com
sem deixar sua marca”. a utilização dos recursos do quadro-negro e giz, o professor
Na década de 1950, o espaço delimitado pela sala de aula transmitia o conteúdo como verdade absoluta e de forma
apresenta-se na forma retangular, possuindo quadros-negros autoritária, e o aluno assumia um papel passivo no processo
na frente da sala e em uma das laterais, um armário ao fundo, educacional, sendo uma relação em que o professor era o único
as carteiras eram de madeira nobre maciça, com banco e mesa detentor do conhecimento e o silêncio na sala de aula fazia-se
acoplados, enfileiradas, dispostas em duplas, fixas ao chão e necessário para que a transmissão do saber fosse efetuada
voltadas em direção ao professor, de forma que não com sucesso.
possibilitava uma disposição diferente. Esse modelo de Nas salas de aula há uma determinada disposição espacial
carteiras duplas, conforme Souza (1998)46 foi o adotado na das mesas, carteiras e armários, à frente da sala possui um
maioria das escolas paulistas, pois sendo móveis fundamentais espaço destinado à mesa do professor cuja disposição
da sala de aula, favoreciam uma economia de recursos encontra-se à frente das carteiras dos alunos, que geralmente
financeiros. estão dispostas em filas, e esta relação na organização do
Além dos objetos constituintes da sala de aula e da mobiliário já define uma visão de como é o processo de ensino
organização na disposição das carteiras, verifica-se, também, e aprendizagem. O professor situa-se num lugar de destaque,
que as crianças estão condicionadas a determinados às vezes ainda mais alto que o restante da sala, o que lhe
comportamentos exigidos em função do tempo, lugar e da confere, espacialmente, uma visibilidade geral e,
relação exercida pelo adulto. Elas apresentam-se com perfis de consequentemente, autoridade para poder controlar, vigiar e
seriedade e respeito, isentas de quaisquer demonstrações de disciplinar por meio de um simples olhar, além de representar
alegria, sentadas numa posição adequada para não agredir a e diferenciar quem sabe e deve ensinar de quem deve
coluna, com os braços cruzados, uniformizadas e portando aprender. Esse controle inicia-se com a chamada nominal, para
cabelo curto. Esta situação revela atos de submissão das saber quem está ou não na sala de aula. O sucesso do poder
alunas em relação ao professor, detalhes que sugerem a escola disciplinar, como observa Foucault, acontece por meio de
como um espaço para o condicionamento comportamental mecanismos simples: “o olhar hierárquico, a sanção
mediante uma rigorosa disciplina, ordem, higiene, obediência normalizadora e sua combinação num procedimento que lhe é
e silêncio. específico, o exame.”
Entretanto, mais tarde, na década de 1970, a disposição Um intenso elemento disciplinar é a fila, presente no
das carteiras encontra-se em formato individual e dispostas arranjo das carteiras nas salas de aula e caracterizada, ainda,
em filas únicas. No início do século XX, nos grupos escolares, em várias outras situações escolares, como na disposição dos
as carteiras individuais foram enfatizadas como as melhores alunos para cantar o hino nacional, no momento de receber a
do ponto de vista pedagógico, moral e higiênico. A carteira merenda, no trânsito entre os corredores da escola durante
individual constituía um dispositivo ideal para manter a entrada dos alunos para a sala de aula e para a sua saída. A
distância entre os alunos, evitando o contato, a brincadeira, a organização por fileiras define a forma de repartição dos
“distração perniciosa”. Sem contato com outros corpos, isolado estudantes. A posição que um aluno ocupa na fila torna-se
cada aluno no seu espaço, a disciplina, a moral e a higiene unidade, na qual representa um movimento permanente onde
ficavam garantidas. Ainda, conforme Foucault (1999)47, um substitui o outro num espaço.
determinando lugares individuais torna-se possível o controle Assim, por meio de uma disciplina pode-se produzir um
de cada um e o trabalho simultâneo de todos, gerando padrão de aluno que responda satisfatoriamente e
economia no tempo da aprendizagem e transformando a disciplinarmente às demandas da instituição, para isso é
escola não apenas numa máquina de ensinar, mas também de necessário tornar o corpo produtivo, disciplinando-o quanto a
vigiar e de hierarquizar. horários, modos e atividades. Isto é revelado por meio de
Outros atos de submissão coletiva em que o espaço escolar pesquisas, o caráter alienante da dinâmica dos corpos e dos
determina padrões nos modos e usos do corpo, numa situação objetos, na medida em que serve para educar um cidadão
em que os alunos aparecem com os braços estendidos sobre a eficiente para o Estado, mas com liberdade e autogestão
carteira e olhar atento. Esse exagero na disposição dos corpos negados, na medida em que seu corpo, seu ser todo, pertence
simula o retrato da disciplina escolar. Ali tudo inspira ordem e ao Estado. É o ápice do ideal republicano, na medida em que o
disciplina. A separação dos alunos, também é uma forma de poder precisa de todos os corpos, úteis, para se sustentar.
evitar a troca de ideias sem o controle do professor. Destaca-se, também, a implicação que a relação entre o
Observamos assim o culto da ordem e da disciplina, tempo e o espaço escolares resultava na racionalidade da vida
comum na política e nas instituições públicas, bem como o social e na construção da temporalidade urbana. O tempo
culto à hierarquia. O poder era exercido por meio de sinais escolar, se expressa também como tempo disciplinar:
visíveis, na organização do espaço, na disciplina das roupas, respeitando e cumprindo horários, de forma precisa e no
materiais, comportamentos e gestos. Os corpos, propriedade momento adequado. Configurando-se numa forma de a
do Estado, também devem comportar posturas, cujas aulas de criança aprender a concepção cultural do tempo que
Educação Física não têm como intuito o exercitar livre dos regulamenta a vida social.
corpos, mas é mais uma maneira de educação disciplinar do Todas as atividades que compõem a dinâmica do cotidiano
corpo, por meio do estabelecimento de posturas e gestos. A escolar estão determinadas pelo horário. Um controle rígido e
disciplinarização dos corpos se associa à organização do contínuo do horário de chegada e de saída, de início e de
espaço. Assim é a escola, espaço do sistema capitalista e término. Há horário para a entrada e saída da escola e para o
corporativo que se apropria do corpo e do tempo do estudante. recreio (intervalo), início e fim de cada aula, cada atividade ou
Como observa Souza: “ordem, limpeza e disciplina são período. Na escola há tempo para tudo, para estudar, brincar
componentes primordiais para uma boa organização escolar, e, sobretudo, o maior tempo é de estudar. O professor, na sala
fazem parte de um conjunto de dispositivos de contenção de de aula, fiscaliza e pressiona, afastando aquilo que possa
gestos, dos instintos e das emoções”. Era uma época em que os comprometer a qualidade do tempo. Esse controle funciona
como correção e prevenção, como uma economia do poder.

46 SOUZA, R. F. Templos de civilização: a implantação da escola primária 47 FOUCAULT, Michel. Em defesa da sociedade: Curso no College de France
graduada no Estado de São Paulo: (1890-1910). São Paulo: Fundação Editora (1975-1976). São Paulo: Martins Fontes, 1999.
da UNESP, 1998.

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Para Foucault (1999), mediante o mecanismo da aprendizagem, mas podem também ser mera demonstração
disciplina, o poder tem a função de adestrar corpos e mentes de autoritarismo, em que se procura deixar claro ‘quem é que
nas sociedades atuais, para se apoderar ainda mais dos gestos, manda na escola’”.
gostos e modos de pensar dos sujeitos, impondo limitações, A avaliação representa outro elemento de constante
proibições ou obrigações. Constitui-se num poder modesto presença na rotina escolar, pois sempre quando o professor se
que funciona de forma calculada e permanente, produzindo faz presente ela acontece, desde a mera observação e
indivíduos como objetos e instrumentos de seu exercício. acompanhamento dos alunos durante as atividades, sem
Na organização do trabalho escolar, o diretor representa a dúvida, a professora espera uma postura ideal de todos os
autoridade máxima da escola, pois ocupa a posição hierárquica alunos. Nesse contexto, percebe-se que os alunos estão muito
mais elevada, regendo a todos na escola. Logo em seguida, em mais espontâneos, demonstrando emoções e gestos.
nível hierárquico inferior, está o professor, autoridade Para tanto, a avaliação que deveria ser aplicada com
imediatamente superior aos alunos. O reconhecimento dessas caráter pedagógico, em benefício do aluno, durante muito
autoridades é percebido diante da interação entre os corpos tempo foi utilizada pela escola como instrumento para
de níveis hierárquicos distintos. Por exemplo, quando o garantir a disciplina, como um ritual para controlar, qualificar,
professor adentra a sala de aula, imediatamente, acontece uma classificar e punir. O comportamento do aluno era considerado
mudança na exposição dos corpos, tornando-se mais contidos como um dos critérios de avaliação, e a este era atribuído uma
e silenciosos. O respeito é conquistado por meio de uma teia nota. Dessa forma, a aprovação do aluno estava condicionada,
de disciplina de poder que amedronta, com o diretor e o além de seu rendimento e frequência, à sua disciplina. Nesse
professor, sempre distantes e se relacionando de modo contexto, as provas vinculavam a formação do saber com o
desigual e nada humano. No entanto, isto não significa que exercício do poder, que é exercido sem ser percebido, cuja
neste momento da escola os alunos eram mais educados, pois individualização, que é mensurada e comparada, encontra-se
seus corpos e emoções eram muito mais contidos. registrada em diários de classes, boletins e nos relatórios de
Como uma escola, assim, poderia produzir cidadãos conselhos de classe e série.
conscientes, livres e com capacidade de autogestão? Nunca, Muitos alunos, devido à reprovação, abandonavam a escola
nem era sua intenção, pois o Estado quer controlar os corpos. e outros, em razão de inúmeras reprovações sucessivas eram
Hoje este controle é feito de modo mais sutil e pernicioso. considerados pela escola, inaptos ao estudo. A avaliação, de
Parece que o Estado cede demais, mas na verdade seu controle acordo com Souza, possuía “uma dupla finalidade: pedagógica
só tem aumentado. e disciplinar. Os exames aperfeiçoaram o sistema de
A rotina escolar compõe um conjunto de deveres e classificação dos alunos em classes e séries e, ao mesmo
atividades em que muitas vezes a liberdade encontra-se fora tempo, tornaram-se mecanismos de punição, controle e
da sala de aula, em outros espaços intersticiais como hierarquização”. Além disso, o exame combina as técnicas da
corredores e o pátio. Para Souza, “não obstante, ir ao sanitário hierarquia que vigia e as da sanção que normaliza. É um
poderia consistir em um passaporte para o refúgio, um controle normalizante, uma vigilância que permite qualificar,
momento para gazear”. classificar e punir. Estabelece sobre os indivíduos uma
Todavia, mesmo diante de uma disciplina rígida, havia atos visibilidade através da qual eles são diferenciados e
indisciplinados, ou seja, aqueles que não estavam em sancionados. É por isso que, em todos os dispositivos de
correspondência com as leis e normas da escola, pois “a escola, disciplina, o exame é altamente ritualizado.
ao produzir disciplina, está também produzindo sua Atualmente, não se pode garantir que a punição do corpo
indisciplina”. A indisciplina torna-se então um sintoma do não ocorra mais nas escolas, mas não é legitimada com a
comportamento individual, é a inobservância, tudo o que está mesma natureza e intensidade como anteriormente,
inadequado à regra e o que se afasta dela, ou seja, um desvio. principalmente a partir de 1990 com a regulamentação do
A indisciplina, nada mais é, neste sentido, do que uma Estatuto da Criança e do Adolescente. No entanto, é comum
manifestação da individualidade num ambiente de dura flagrarmos nas escolas, estudantes sendo punidos por meio de
repressão. Na escola, [...] funciona como repressora toda uma advertências, repreensões, suspensões e transferências
micropenalidade do tempo (atrasos, ausências, interrupções compulsórias. Portanto, a disciplina não deixou de estar
das tarefas), da atividade (desatenção, negligência, falta de presente e ainda hoje as escolas continuam por meio do poder
zelo), da maneira de ser (grosseria, desobediência), dos moldando os corpos dos alunos.
discursos (tagarelice, insolência), do corpo (atitudes Este poder de moldar os corpos das crianças também
‘incorretas’, gestos não conformes, sujeira), da sexualidade esteja fora da escola, pois seus corpos e gestos são moldados
(imodéstia, indecência). sim, veja a padronização do modo de falar, de vestir, de andar...
Quando o poder demonstra os corpos afastando-se das Mas quem cuida desta parte agora é a indústria cultural - meios
normas, a punição faz-se necessária. O castigo disciplinar tem de comunicação de massa - que produz padrões e os vende e
a função de reduzir os desvios, sendo essencialmente os inculca sem freio. A escola vem perdendo este poder, pois
corretivo. Esse poder oculto nas relações cotidianas não tem mais este apelo, como tinha antes.
controladas é responsável por práticas produtoras de sujeição, O professor, utilizando a sua autoridade, impede que
comparação, hierarquização, diferença, homogeneização e ocorram falhas e conduz o processo de ensino e aprendizagem,
exclusão, ou seja, ele normaliza. De acordo com Souza, “por sendo o corpo considerado objeto e alvo do poder e pode ser
meio de prêmios e castigos, como o elogio perante a sala, submetido a adestramento para obedecer e responder a
cartões de boa nota, nome do aluno no quadro de honra, exigências. O dispositivo que possibilita produzir uma
admoestação particular, notas baixas, privação do recreio, individualidade obediente é a disciplina. Logo, a escola é uma
entre outros, as crianças apreenderiam as condutas instituição em que o poder disciplinador faz-se presente. Isso
desejáveis”. evidencia que a educação contemporânea ainda tem sua base
Recordo-me que, quando aluno, no final da década de na dominação, pois ocorre por meio da normalização.
1980, era comum a prática de castigos aplicados pelos As relações de poder em que os alunos são submetidos nas
professores aos alunos que não correspondiam à disciplina instituições escolares os direcionam a uma educação para a
exigida pela escola. A disciplina, muitas vezes, era conquistada obediência, construindo indivíduos submissos não só no
por meio da punição do corpo, com castigos físicos ou ambiente escolar, como também, para os diversos âmbitos de
situações vexatórias, ridicularizando o aluno perante os sua vida, inibindo a formação de um sujeito crítico e
demais. “Esses comportamentos têm razão de ser e podem até autossuficiente.
ajudar no encaminhamento sério das questões de

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Os procedimentos disciplinares presentes no cotidiano Questões


escolar predeterminam a conduta do aluno, neutralizando sua
vontade individual. Assim o professor, além de ensinar, molda 1. Alguns teóricos do pós guerra renovaram algumas ideias
o aluno conforme um padrão exigido pela instituição, sendo o de Marx, principalmente as que estão contidas nas suas
aluno constantemente controlado, manipulado em função da primeiras obras, através de trabalhos sobre o cotidiano. É
ordem, da disciplina - atos esperados pelos próprios pais dos correto afirmar que: O cotidiano, de acordo com Heller (1972),
alunos. é a vida de todos os dias e de todos os homens em qualquer
Existem muitas tentativas de democratizar o espaço época histórica que possamos analisar.
escolar, e principalmente as relações no interior da sala de ( ) Verdadeiro ( ) Falso
aula, mas isso, normalmente, fica só no plano teórico, pois,
apesar do empenho de alguns professores, a relação que se 2. No final da década de 1980, a prática de castigos
estabelece de fato, na maioria das vezes, é a da imposição da aplicados pelos professores aos alunos que não
autoridade, que deve ser mantida. Muitos pais até desejam que correspondiam à disciplina exigida pela escola era comum.
isso aconteça, isto é, que os(as) professores(as) façam com Atualmente, com o advento do Estatuto da Criança e do
seus filhos o que eles não querem ou não conseguem fazer. Adolescente em 1980, legitimou práticas como a punição como
Assim, ainda que o professor seja o detentor do poder na parte do processo de disciplina dentro da escola.
relação com o aluno, atualmente essa relação encontra-se cada ( ) Verdadeiro ( ) Falso
vez mais fragilizada, pois com a diminuição dos castigos
disciplinares, ao mesmo tempo em que houve uma redução no 3. É correto afirmar que para Lefebvre(1961) afirmava que
domínio dos pais sobre os corpos de seus filhos em casa, os o cotidiano é um nível de realidade social que não se relaciona
professores na escola, muitas vezes, são sujeitados a conviver com outro níveis, como por exemplo, nível econômico, político
e a conter um universo muito maior de eventuais desvios e cultural.
disciplinares dos alunos, decorrentes da escassa educação ( ) Verdadeiro ( ) Falso
recebida pelos pais. Aí está: este poder saiu da mão dos pais e
da escola, e está na mão dos meios de comunicação de massa. Gabarito
Porém, não são eles que têm que lidar com os jovens, e não
sentem a consequência da massificação desenfreada. 1.Verdadeiro / 2.Falso / 3.Falso
Ultimamente a escola tende a uma tentativa de
democratização no ato de educar, a partir da interação do
aluno no processo de ensino e aprendizagem, no qual o 4. O lúdico na
professor assume um papel de orientador e o aluno é aprendizagem
percebido em sua singularidade. No entanto, devido ao
excesso de alunos nas salas de aula, o empenho do professor
em atender cada aluno individualmente, conforme as suas Para falarmos sobre o lúdico na aprendizagem, desafio-lhe
especificidades e necessidades, tem sido prejudicado e, isento a responder quais foram os seus melhores momentos lúdicos.
de opção, o professor acaba por ministrar a mesma aula a Onde chegar com essa resposta? É fácil, a maioria das pessoas
todos da turma, ignorando a heterogeneidade dos alunos. vão puxar suas memórias infantis, quando sonhava, imagina e
Porém, se ele pode ter esse espaço para a criatividade e a nem sabia o que de fato era ser um adulto.
diversidade na sala de aula, então o(a) professor(a) estará As expressões, sentimentos das crianças se exteriorizam
ampliando as possibilidades de esse aluno criar, ser inventivo, com o brincar, uns mais calmos, outros, por sua vez bem
questionar, enfim, participar do processo de transformação da agitados, isso não é um defeito, mas sim à formação da
sociedade em que vive, não só naquele espaço, mas em personalidade. Brincar é cada vez mais uma necessidade para
qualquer outra situação. o desenvolvimento infantil, que para os dias atuais vem se
Se nas salas de aula atuais, o aluno ainda não adquiriu uma tornando algo meio impossível face a tecnologia “sem freios”,
postura de protagonista na construção do próprio deixemos isso de lado, não é assunto por hora....
conhecimento, sendo livre para expressar e participar, As brincadeiras nas ruas, parques e escolas são relevantes
posicionando de forma crítica perante as situações do para a inserção social, devendo para tanto existir uma parceria
cotidiano escolar, existe ao menos muito mais liberdade, por entre pais e escola. Para o real desenvolvimento da criança é
meio dos risos e da postura desordenada dos corpos dos fundamental essa parceria.
alunos. Embora prevaleça o formato da carteira individual, Nas escolas é necessário que haja profissionais capacitados
evidencia-se uma diferença em sua qualidade, sendo em repassar a aprendizagem através do lúdico, mas muitas
fabricadas de compensado de madeira ou plástico, as carteiras vezes temos o profissional, entretanto há uma barreira dos
e cadeiras apresentam-se menos duráveis e muito mais estabelecimentos de ensino que vivem engessados, não
frágeis. Percebem-se, também, mudanças na organização apreciando currículos de professores que fujam do padrão.
espacial da sala de aula, acabando com a rigidez na disposição Ao mesmo tempo que a pré-escola deve ser um lugar para
das carteiras enfileiradas e voltadas para o professor. As brincadeiras é ali que se estimula a comunicação, afetividade,
carteiras apresentam-se na forma individual e móvel, enfim os sentimentos trocados entre professores e alunos.
permitindo a realização de atividades diversificadas, com Imaginemos uma pré-escola que enriqueça o desenvolvimento
disposição da classe em diferentes formas, como em grupos ou infantil, com valor significativo para as crianças, elas podem
círculos, adequando-se à necessidade da situação e à proposta ter um bom desenvolvimento no reconhecimento e
de desenvolvimento da atividade, sob a orientação da representação dos objetos, como ainda em sua rotina do dia a
professora, que se desloca para todas as partes da sala para dia.
atender as necessidades específicas de cada aluno. A brincadeira faz com que se dê novos significados para a
realidade que se vive.
Para Velasco48, o brinquedo é capaz de estimular a criança
a desenvolver muitas habilidades na sua formação geral e isso
ocorre espontaneamente, sem compromisso e

48 VELASCO, Cacilda G. Brincar, o despertar psicomotor. Rio de Janeiro: Sprint,


1996.

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obrigatoriedade. A brincadeira faz parte da infância de toda recreação, sendo ainda maior a sua abrangência. Assim, pode-
criança e quando usada de modo adequado na Educação se dizer que o lúdico é como se fosse uma parte inerente do ser
Infantil produz significado pedagógico, estimula o humano, utilizado como recurso pedagógico em várias áreas
conhecimento, a aprendizagem e o desenvolvimento de estudo oportunizando a aprendizagem do indivíduo. Dessa
Quando a criança passa pelo momento pré-operatório, que forma, percebem-se as diversas razões que levam os
vai dos 02 aos 07 anos, ela usa bastante o seu lúdico, de modo educadores a trabalharem no âmbito escolar as atividades
que o jogo simbólico misturado com a fantasia, faz com que a lúdicas.
criança tenha imagens mentais, mesmo que o objeto não esteja Como vemos Gilda Rizzo diz o seguinte sobre o lúdico: “…
ali materializado. Nesse período a criança vive o animismo, A atividade lúdica pode ser, portanto, um eficiente recurso
dando vida a objetos inanimados, geralmente as bonecas e aliado do educador, interessado no desenvolvimento da
carrinhos ganham vida. inteligência de seus alunos, quando mobiliza sua ação
É através do jogo simbólico que a passar começa a ter intelectual”.
capacidade de representar suas ações de forma simbólica, Diante de tal pensamento que a estudiosa coloca, observa-
quando por exemplo usam suas bonecas como irmãs, mães, se que o principal papel do educador é estimular o alunado à
fazendo que esses objetos parecer fazer parte do mundo real. construção de novos conhecimentos e através das atividades
Essa brincadeira, esse real imaginário é que faz com que as lúdicas o aluno acaba sendo desafiado a produzir e oferecer
crianças mantenham seu emocional equilibrado, reduzindo soluções às situações-problemas impostas pelo educador. Pois
sua carga de ansiedades agitações. o lúdico é um dos motivadores na percepção e na construção
de esquemas de raciocínio, além de ser uma forma de
A Importância do Lúdico na Aprendizagem, com aprendizagem diferenciada e significativa.
Auxílio dos Jogos Convém ressaltar que o educador deve ter cuidado ao
desenvolver uma atividade trabalhando o lúdico, por ser uma
A educação para obter um ensino mais eficiente tarefa dinâmica, o professor fica na condição de estimulador,
aperfeiçoou novas técnicas didáticas consistindo numa prática condutor e avaliador da feitura da atividade, no entanto o
inovadora e prazerosa. Dentre essas técnicas temos o lúdico, educador é o elo entre o lúdico e os alunos.
um recurso didático dinâmico que garante resultados eficazes Da mesma forma deve ater-se na quantidade de atividades
na educação, apesar de exigir extremo planejamento e cuidado lúdicas, pois utilizada exageradamente acabam tornando-se
na execução da atividade elaborada. O jogo é a atividade lúdica rotineira e transformando-se numa aula tradicional.
mais trabalhada pelos professores atualmente, pois ele Nylse Cunha acredita que a ludicidade oferece uma
estimula as várias inteligências, permitindo que o aluno se “situação de aprendizagem delicada”, ou seja, que o professor
envolva em tudo que esteja realizando de forma significativa49. precisa nutrir o interesse do aluno, sendo capaz de respeitar o
Através do lúdico o educador pode desenvolver atividades grau de desenvolvimento das múltiplas inteligências do
que sejam divertidas e que, sobretudo ensine os alunos a mesmo, do contrário a atividade lúdica perde completamente
discernir valores éticos e morais, formando cidadãos sua riqueza e seu valor, além do mais o professor deve gostar
conscientes dos seus deveres e de suas responsabilidades, de trabalhar esse novo método sendo motivador a fazer com
além de propiciar situações em que haja uma interação maior que os alunos gostem de aprender, pois se o educador não se
entre os alunos e o professor numa aula diferente e criativa, entusiasmar pelo que ensina o aluno não terá o interesse em
sem ser rotineira. Palavras Chaves: educação, ensino, lúdico, aprender.
jogo, dinâmico, educador, valores. Celso Antunes argumenta da seguinte forma: “Um
A princípio, a explanação desse trabalho tem como professor que adora o que faz que se empolga com o que
objetivo mostrar a importância de se trabalhar o lúdico na ensina que se mostra sedutor em relação aos saberes de sua
esfera escolar para a obtenção de qualidade no processo disciplina, que apresenta seu tema sempre em situações de
educacional. E para que essa aprendizagem aconteça de forma desafios, estimulantes, intrigantes, sempre possui chances
significativa e dinâmica, o professor tem como apoio a técnica maiores de obter reciprocidade do que quem a desenvolve
dos jogos. com inevitável tédio da vida, da profissão, das relações
São muitos os estudiosos do assunto, e para este trabalho humanas, da turma…”.
foram consultados autores que relatam a importância do A atividade lúdica mais trabalhada atualmente nas escolas
lúdico e do uso dos jogos em atividades didáticas para pelos professores é o jogo, principalmente nas salas de aula do
fundamentar ainda mais os pontos principais e melhor afirmar ensino fundamental por ter sua clientela na maioria das vezes
o que foi explanado, são eles: Airton Negrine, Celso Antunes, formada por crianças. Sendo importante dizer que a palavra
Gilda Rizzo e Helena Nylse Cunha. “jogo” foi utilizada para se referir ao “brincar”, se tratando de
A educação tem por objetivo principal formar cidadãos forma lúdica, levando em conta que o indivíduo não apenas se
críticos e criativos com condições aptas para inventar e ser diverte jogando, mas também aprende.
capazes de construir cada vez mais novos conhecimentos. O A palavra “jogo” etimologicamente origina-se do latim
processo de Ensino/Aprendizagem está constantemente “iocus”, que significa brincadeira, divertimento. Em alguns
aprimorando seus métodos de ensino para a melhoria da dicionários da Língua Portuguesa aparece com definição de
educação. O lúdico é um desses métodos que está sendo “passatempo, atividade mental determinada por regras que
trabalhado na prática pedagógica, contribuindo para o definem ganhadores e perdedores”.
aprendizado do alunado possibilitando ao educador o preparo Numa de suas palestras Airton Negrine cita o seguinte: “…
de aulas dinâmicas fazendo com que o aluno interaja mais em a palavra “jogo” apresenta significados distintos uma vez que
sala de aula, pois cresce a vontade de aprender, seu interesse pode ser entendida desde os movimentos que a criança realiza
ao conteúdo aumenta e dessa maneira ele realmente aprende nos primeiros anos de vida agitando os objetos que estão ao
o que foi proposto a ser ensinado, estimulando-o a ser seu alcance, até as atividades mais ou menos complexas…”.
pensador, questionador e não um repetidor de informações. Pode-se dizer então que a palavra “jogo” apresenta
É preciso ressaltar que o termo lúdico etimologicamente é significados variados, desde uma brincadeira de criança com
derivado do Latim “ludus” que significa jogo, divertir-se e que fins restritos em diversão até as atividades mais complexas
se refere à função de brincar de forma livre e individual, de com intuito de adquirir novos conhecimentos.
jogar utilizando regras referindo-se a uma conduta social, da

49 Texto adaptado de LISBOA, M.

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Gilda Rizzo diz que “os jogos, pelas suas qualidades uma aprendizagem significativa que ocorre gradativamente e
intrínsecas de desafio à ação voluntária e consciente, devem inconscientemente de forma natural, tornando-se um grande
estar, obrigatoriamente, incluídos entre as inúmeras opções aliado aos professores na caminhada para bons resultados.
de trabalho escolar”. E que é dever do professor mudar os padrões de conduta
Pois o objetivo principal do jogo como atividade lúdica é em relação aos alunos, deixando de lado os métodos e técnicas
proporcionar ao indivíduo que está jogando, conhecimento de tradicionais acreditando que o lúdico é eficaz como estratégia
maneira gratificante, espontânea e criativa não deixando de do desenvolvimento na sala de aula.
ser significativa independente de quem o joga, deixando de Espera-se que esta proposta de abordagem vá de encontro
lado os sistemas educacionais extremamente rígidos. com o que foi proposto realizar, e essencialmente, que seja de
Trabalhar com os jogos na sala de aula possibilita diversos suporte para professores que já atuam no ambiente escolar, e
objetivos, dentre eles, foram pontuados os seguintes: aos futuros professores a tornar suas aulas mais dinâmicas
- Desenvolver a criatividade, a sociabilidade e as fazendo com que a sala de aula se transforme num lugar
inteligências múltiplas; prazeroso, construindo a integração entre todos que a
- Dar oportunidade para que aprenda a jogar e a participar frequentam.
ativamente;
- Enriquecer o relacionamento entre os alunos; Sobre as atividades lúdicas e sua função no
- Reforçar os conteúdos já aprendidos; desenvolvimento interno de cada um
- Adquirir novas habilidades;
- Aprender a lidar com os resultados independentemente do Há três possibilidades de usos das atividades lúdicas na
resultado; vida do ser humano, a partir de três abordagens diferentes:
- Aceitar regras; psicanalítica, piagetiana e biossistêmica. Poderiam ser outras
- Respeitar essas regras; --- tais como as de Wallon, de Vigotsky e outros ---, porém
- Fazer suas próprias descobertas por meio do brincar; escolhi estas três, que a meu ver, são suficientes para dar corpo
- Desenvolver e enriquecer sua personalidade tornando-o à compreensão que estamos estabelecendo de ludicidade50.
mais participativo e espontâneo perante os colegas de classe; A compreensão sobre as atividades lúdicas, especialmente
- Aumentar a interação e integração entre os participantes; sobre a sua constituição sócio-histórica e sobre os seus papéis
- Lidar com frustrações se portando de forma sensata; na vida humana, tem origem em várias áreas do conhecimento.
- Proporcionar a autoconfiança e a concentração. Assim, existe uma história do brinquedo, uma sociologia do
brinquedo, um estudo folclórico do brinquedo, um estudo
Nota-se também um entusiasmo maior sobre o conteúdo psicológico do brinquedo. Desses estudos, retiramos algumas
que está sendo trabalhado por haver uma motivação dos conclusões que nos ajudaram e nos ajudarão a compreender o
educandos em expressar-se livremente, de agir e interagir em papel e uso das atividades lúdicas na vida humana, que
sala de aula. Mas lembrando de sempre que os jogos devem estamos em busca de compreender como, possivelmente, pode
está devidamente associado aos conteúdos e aos objetivos dar-se e operar internamente no sujeito a vivência das
dentro da aprendizagem, auxiliando a parte teórica, tornando experiências lúdicas.
o ensino mais prazeroso apresentando opiniões para crescer
ainda mais o trabalho dos profissionais da área da educação. As heranças freudianas
Diante de tal objetivo, os jogos escolhidos pelos Freud compreendeu que o brinquedo é o caminho real
educadores para trabalhar precisam ser estudados para o inconsciente da criança, assim como o sonho é o
intimamente e analisados rigorosamente para serem de fato caminho real para o inconsciente do adulto. Ou seja, a
eficientes, porque os jogos que não são testados e pesquisados experiência do brincar tem seu lado interno; que se expressa
não terão seu exato valor, tornando-se ineficazes, obviamente, no externo. A meta de Freud, como sabemos, foi desvendar e
uma atividade lúdica nunca deve ser aplicada sem que tenha compreender as operações do inconsciente através de suas
um benefício educativo. O professor pode criar seus próprios manifestações externas.
jogos, a partir dos materiais disponíveis na instituição de A partir daí, o próprio Freud e seus discípulos próximos e
ensino em que leciona ou até mesmo na sala de aula, porém distantes, tais como Ana Freud (filha de Freud), Melanie Klein,
precisa atentar para a forma de como serão trabalhados, não Bruno Bettelheim, D.W. Winnicott, Arminda Aberastury,
esquecendo os objetivos e o conteúdo a ser desenvolvido. O André Lapierre e tantos outros produziram diversas
educador precisa ter muito mais força de vontade, compreensões psicanalíticas e possibilidades de usos das
criatividade, disponibilidade, seriedade, competência que atividades lúdicas.
dinheiro para construir um jogo. A Psicanálise, em sua atuação terapêutica, aposta na
Celso Antunes (2003) cita o seguinte sobre o jogo: “O jogo restauração do passado e na construção do presente e do
é o mais eficiente meio estimulador das inteligências, futuro. Freud afirma que temos em nós duas forças
permitindo que o indivíduo realize tudo que deseja. Quando fundamentais: as forças regressivas, que nos atém fixados no
joga, passa a viver quem quer ser, organiza o que quer passado e as forças progressivas, que nos mantém voltados
organizar, e decide sem limitações. Pode ser grande, livre, e na para o futuro. As forças regressivas são aquelas que tem como
aceitação das regras pode ter seus impulsos controlados. seu epicentro as nossas fixações neuróticas ou traumáticas do
Brincando dentro de seu espaço, envolve-se com a fantasia, passado, que nos impedem ou dificultam o nosso viver fluído
estabelecendo um gancho entre o inconsciente e o real”. no presente, assim como nossas aberturas para o futuro. Elas
De acordo com Celso Antunes, pode-se afirmar que a se manifestam por nossas respostas emocionais automáticas
ludicidade do jogo proporciona momentos mágicos e únicos na do dia a dia, que nos dificultam o estar bem conosco mesmos
vida de um indivíduo, pois no mesmo instante que diverte, (intrapessoalmente) e em nossos relacionamentos
ensina e desenvolve o raciocínio e a criatividade além de obter (interpessoalmente). As forças progressivas, por outro lado
responsabilidade diante da situação colocada a ele. são aquelas que nos chamam para o futuro, para as nossas
Diante de tudo que fora mencionado, pode-se dizer sem possibilidades de organização pessoal e de ser.
sombra de dúvida que o lúdico é importante sim para uma No caso, nos interessa imediatamente, a questão dos
melhoria na educação e no andamento das aulas, provocando brinquedos, como caminho real para o inconsciente da criança.

50 Adaptado de: Luckesi, Cipriano Carlos. Ludicidade e atividades lúdicas uma


abordagem a partir da experiência interna.

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Nesse contexto, a prática das atividades lúdicas pelas crianças, mãe e a alegria pelo seu retorno. A experiência interna
de um lado, revela como elas estão, a partir de suas histórias revelava-se em uma manifestação externa. E foi a partir desse
pessoais, assim como revela o que sentem sobre o seu presente ponto que Freud fez sua leitura interpretativa da experiência
cotidiano, seus medos, seus não-entendimentos do que está (certamente válida) da criança.
ocorrendo, o que está incomodando; porém, de outro lado, Mas, o ato de brincar não só é revelador do inconsciente,
essa prática revela, também, a construção do futuro. Muitas ele também é catártico, ou seja, ele é liberador. Enquanto a
atividades lúdicas das crianças são de imitação do adulto, criança brinca, ela, ao mesmo tempo, expressa e libera os
outras não imitam, mas constroem modos de ser. Meio pelo conteúdos do inconsciente, procurando a restauração de suas
qual as crianças estão, por uma parte, tentando compreender possibilidades de vida saudável, livre dos bloqueios
o que os adultos fazem, e, de outra, experimentar as impeditivos. E, por vezes, os bloqueios já estão tão fixados, que
possibilidades de sua própria vida, o que quer dizer que, eles impedem a criança até mesmo de brincar; fato este que
através das atividades lúdicas, estão construindo e estará nos sinalizando para uma atenção mais cuidadosa para
fortalecendo o seu modo de ser, a sua identidade. esta criança.
Neste contexto, por exemplo, ao brincar de “pai e mãe”, as Por outro lado, as atividades lúdicas são instrumentos da
crianças, colocando-se nesses papéis, estão tentando saber o criação da identidade pessoal, na medida em que elas, nessa
que é isso de “ser pai e mãe”; ou, ainda outro exemplo, uma perspectiva, estabelecem uma ponte entre a realidade interior
criança que passou por uma experiência de hospitalização, e a realidade exterior. Esse é o lado construtivo das atividades
possivelmente, por um certo período, após sair do hospital, ela lúdicas. Pelas atividades em geral e pelas atividades lúdicas em
praticará brinquedos e brincadeiras que tenham como específico, a criança aproxima-se da realidade, criando a sua
conteúdo algum flash de sua experiência passada recente. identidade. O princípio do prazer equilibra-se com o princípio
Possivelmente, brincará de médico, de enfermeira, de hospital, da realidade, na criança, através das atividades lúdicas. Elas
de ambulância e tantas outras coisas, que poderão estar são o meio pela qual as crianças fazem o trânsito do mundo
auxiliando a sua compreensão do que ocorreu com ela. O subjetivo simbiótico com a mãe para o mundo objetivo da lei
mesmo ocorrerá com seus desenhos, com suas falas, com as do pai, criando o seu modo pessoal de ser e estar no mundo,
estórias que inventa. Contudo, se, por outra via, for anunciada criando sua identidade pessoal; ou se se quiser, sua
a uma criança que, em breve, ela será hospitalizada para uma individualidade. Assim sendo, o brincar, para as crianças, não
intervenção qualquer, é bastante provável que ela inicie a usar será só o caminho real para o inconsciente doloroso, mas
brinquedos e brincadeiras relativos à saúde e àquilo que vai também para a construção interna da identidade e da
ocorrer em sua vida (que são os procedimentos de individualidade de si mesmo.
hospitalização), na tentativa de compreender o que foi Será que as atividades lúdicas seriam o caminho real só
anunciado a ela. Todavia, essas manifestações do inconsciente para a inconsciente e a identidade e individualidade da
nas atividades lúdicas poderão também estar, e certamente criança, ou do adulto também? Vivenciar atividades lúdicas é
estarão, vinculadas a experiências mais antigas, em termos de também um caminho tanto para o inconsciente quanto para a
história de vida pregressa. construção de identidade e individualidade saudável dos
David Grove, um pesquisador norte-americano que criou adultos.
uma técnica específica para trabalhar com traumas através das Essa abordagem, a partir das contribuições da Psicanálise,
metáforas, diz que estas (as metáforas) são as expressões se integra na visão de ludicidade como possibilidade de
visíveis e observáveis dos traumas que estão fixados em nosso vivência da plenitude da experiência? Tomando por base os
inconsciente; como, por exemplo, “eu tenho um nó na fundamentos do pensamento de Wilber, que expusemos
garganta”, “carrego o mundo nas costas”, ou coisas acima, podemos compreender que o que ocorre dentro da
semelhantes. Eu acredito que as atividades lúdicas infantis são criança configura-se no quadrante superior esquerdo, na
as metáforas, que expressam a sua intimidade; elas falam de dimensão do EU, a dimensão interna. O que ocorre nessa
sua realidade interior através de um caminho metafórico. dimensão, nós, de fato, não podemos saber, a menos que a
Se prestarmos atenção em nossos filhos e filhas, ou nossos criança, de alguma forma, nos revele. É a sua experiência
netos e netas, ou nossos alunos na escola, ou crianças em geral, interior. Os atos externos poderão ser descritos
observaremos que seus atos, sempre, estarão comunicando comportamentalmente, mas a experiência interna é de quem a
alguma coisa. Para entender essa comunicação, importa estar vive e nós só podemos nos aproximar dela, da forma mais
atento para o que elas querem dizer. David Boadella diz que apropriada, pela partilha e, mais distantemente, por uma
“como ponto de partida, é necessário reconhecer que é analogia com a nossa própria experiência. Então, tendo vivido
impossível um indivíduo não se comunicar”. Por vezes, será experiências semelhantes, podemos compassiva e
bastante fácil descobrir o significado dessa comunicação, por empaticamente, sentir o que se passa dentro do outro.
outras vezes, será exigido mais atenção e esforço de nossa Seremos, então, ressonantes à experiência do outro e, deste
parte para proceder essa compreensão. E, mais que isso, para modo, poderemos, aproximadamente, compreender o que está
aceitar a comunicação que está vindo através de uma ocorrendo em seu interior. Ou pela interpretação, a partir de
brincadeira, pois que nem sempre estamos preparados e um olhar externo sobre as manifestações da criança ou do
dispostos para acolher o que está ocorrendo. Por vezes, as adulto, enquanto vivencia sua experiência; mas, aí, será
brincadeiras de nossas crianças nos desagradam, mas o que sempre uma interpretação externa, ainda que, se for realizada
será que elas estão nos revelando, nos dizendo ou querendo com cuidado e amorosidade, poderá ser muito útil no
nos dizer? É isso que a Psicanálise nos ensina: observe como acompanhamento do processo de desenvolvimento do outro.
as crianças estão brincando, seus atos estão revelando o seu Assim sendo, cada criança, adolescente, ou adulto,
interior. enquanto vivencia uma experiência lúdica, a vivencia como
Existe um famoso relato de Freud, onde ele relata a experiência plena dentro de si, em seu interior, contudo,
experiência de ter ido visitar um amigo e enquanto estava a sós externamente, podemos descrevê-la, o que não
com uma criança pequena, observou que ela atirava um necessariamente nos permitirá nos apropriarmos daquilo que
carretel de linha e, a seguir, puxava-o; quando atirava o se deu ou se dá nessa experiência plena interna do indivíduo.
carretel, fechava o semblante e, quando o trazia de volta, abria
em sorriso. Após, atentamente, observar essa experiência, As heranças piagetianas
Freud realizou a seguinte leitura: a criança estava tentando Em Piaget, os jogos são compreendidos como recursos
compreender como a mãe desaparecia e, depois, aparecia fundamentais dos quais o ser humano lança mão em seu
novamente; e o sentimento de tristeza pelo afastamento da processo de desenvolvimento, possibilitando a organização de

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sua cognição e seu afeto, portanto a organização do seu mundo que o autor denomina de pré-operatória. Nesse período, dão-
interior na sua relação com o mundo exterior. se os jogos simbólicos, onde predomina a assimilação. São os
O tema que Jean Piaget sempre se colocou, ao longo de sua jogos da fantasia, período em que as crianças gostam muito de
vida de pesquisas sobre a inteligência humana, foi: como se dá brincar de “faz de conta”. O mundo exterior, então, é
o conhecimento? Como se constrói, no ser humano, o processo permanentemente “assemelhado” ao mundo interior. Não
do conhecer? E sua resposta permanente foi: através das importa, assim, a realidade como ela é; o que importa é o que
atividades. O ser humano, como um ser ativo, aprende por ela pode parecer que é. Um lápis, que, na realidade, é um lápis,
meio de sua ação. Age e compreende, por meio de uma pode ser muitas coisas na fantasia: um cavalo, um ônibus, um
dialética de assimilação e acomodação em suas relações com o carro, um avião, um barco, ou simplesmente um objeto para
mundo exterior. Assimilar significa tornar o mundo exterior ser mastigado. É também nesse período que as crianças
semelhante ao mundo interior e acomodar significa apropriar- gostam muito das estórias, dos contos de fada, das estórias
se dos elementos do mundo exterior, evidentemente, como imaginadas; mas, também, fabulam muito, constroem suas
eles podem ser apropriados com realidade pela ótica do próprias estórias. Criam e recriam personagens e estórias.
sujeito. É nessa dialética que se aprende e se desenvolve. Esse é o período em que Piaget diz que predominam os jogos
Evidentemente que os processos de assimilar e acomodar simbólicos.
não são tão lineares e mecânicos quanto as definições, acima Os jogos de regras vão predominar a partir dos seis/sete
colocadas, parecem indicar. São processos profundamente anos de idade para a frente, período denominado, inicialmente
complexos, pelos quais cada criança, cada adolescente e cada de operatório concreto (sete aos doze anos) e, depois, de
adulto estabelece o seu modo de relações e constrói o seu operatório formal (a partir aproximadamente dos doze anos).
modo de agir e reagir, estando situado seja no contexto de sua É o período da aproximação e da posse da realidade. Em torno
intimidade, seja em determinada realidade natural e/ou sócio- dos cinco, seis e sete anos, a criança vai se aproximando mais
histórica. A assimilação é o meio pelo qual tornamos o mundo da realidade, onde se defronta não mais com as fantasias, mas
exterior semelhante ao nosso mundo interior, aos nossos sim, com os próprios dados do mundo real, o que implica em
sentimentos, aos nossos fantasmas, aos nossos regras reais que dão forma ao mundo. É nesse período que
conhecimentos. A acomodação é o processo que nos permite Freud situou, especialmente, a manifestação mais plena do
desvendar o que não sabemos e que não dominamos do mundo Complexo de Édipo, período onde fortemente as regras e
externo a nós mesmos e nos possibilita apreendê-lo, cognitiva, papéis sociais colocam para a criança os limites das relações
mas, ao mesmo tempo, emocionalmente. A dialética entre sociais. É por essa idade que meninos e meninas iniciam a
esses dois processos permite-nos a construção de nós mesmos brincar com elementos que exigem regras definidas: brincar
e nosso modo de ser na vida e no mundo, relacionados a nós de casinha, pai mãe, médico, advogado, enfermeira, etc. Ainda
mesmos, aos outros e a mundo material e cultural que nos que em forma de brincadeira, são os elementos da vida real
envolve. que vem à tona. Daí para frente as crianças, os pré-
Os processos de assimilação e acomodação, usualmente adolescentes, os adolescentes e os adultos jogarão jogos de
operam dialeticamente, o que quer dizer que assimilamos para regras. Esses, como os anteriores jogos auxiliarão a criança, o
acomodar e acomodamos para assimilar. Por exemplo, ao adolescente e o adulto aprender a operar com os
adquirir um novo aparelho de som para minha casa, uma parte entendimentos dos raciocínios abstratos e formais.
de como fazê-lo funcionar, eu já sei; assim sendo, assimilo Nessa sequência de possibilidades de jogar - exercício,
(assemelho) elementos desse objeto a elementos que já simbólico e de regras -, a aquisição das habilidades menos
detenho como conhecimento. Porém, tem uma parte que eu complexas servirão de base para as que exigem elementos
não sei; então, aprendo; é isso que é acomodar-se, ou seja, mais complexos para o agir. Assim, quem só possui a
integrar a parte do mundo exterior que ainda não está capacidade para praticar os jogos de exercício, por si, não terá
integrada em mim, nessa experiência. Esse processo condições de praticar os outros tipos de jogos, que exigem
possibilita, permanentemente, um aprofundamento do estruturas mentais e lógicas mais desenvolvidas e complexas.
conhecimento cada vez que me detenho no objeto, com nova Todavia, aquele que já chegou ao estágio dos jogos simbólicos
assimilação e nova acomodação. poderá, perfeitamente, praticar os jogos do estágio anterior
Em seu livro A formação do símbolo na criança, Piaget (os jogos de exercício). O mesmo ocorrendo com as outras
trabalha com os jogos como os recursos ativos dos quais o ser etapas do desenvolvimento e seus respectivos jogos. Isso quer
humano se serve em sua vida para construir-se a si mesmo, dizer que quem pode o menos não pode o mais; porém, quem
aprendendo a relacionar-se com o que está fora e em torno de pode o mais, pode o menos também.
si. É nesse contexto, que Piaget estabelece o entendimento de A partir dessas rápidas noções sobre os jogos em Piaget,
que as atividades desenvolvidas pelo ser humano, em seu podemos concluir que, para este autor, os jogos, como
processo de desenvolvimento, podem ser compreendidas atividades lúdicas, servem de recursos de
como jogos e classificados em três tipos: jogos de exercício, autodesenvolvimento. Piaget vê os jogos como atividades que
jogos simbólicos e jogos de regras. vão propiciando o caminho interno da construção da
Entre o nascimento e os dois anos de idade, período em que inteligência e dos afetos, na medida em que manteve-se atento
Piaget situa a fase sensório-motora do desenvolvimento, dão- a sua permanente pergunta: como o conhecimento se dá, ou
se os jogos de exercício, que são atividades funcionais, que tem seja, como é construída a capacidade do conhecer, que é
sua origem na capacidade reflexa com a qual o ser humano interna?
nasce. São propriamente todas as atividades que a criança Tendo por base a compreensão piagetiana dos jogos,
realiza para tomar posse de si mesma na sua relação com o podemos perceber a sua significação para a vida das crianças,
mundo; mexer os braços, pernas, emitir sons, pegar, agarrar, para os pré-adolescentes, para os adolescentes e para os
puxar, empurrar, rolar, se arrastar, engatinhar, levar objetos adultos, na perspectiva de subsidiar o desenvolvimento
na boca, imitar. Até os dois anos de idade predominam esses interno, que significa a ampliação e a posse das capacidades de
jogos na atividade da criança, que, segundo Piaget, é o período cada um. Assim sendo, podemos e devemos nos servir das
de nossas vidas onde predomina a acomodação, em função do atividades lúdicas na perspectiva de obtermos resultados
fato que a criança predominantemente imita o que os outros significativos para o desenvolvimento e formação dos nossos
fazem, especialmente os adultos; ou seja, ela está mais voltada educandos. Conhecendo a teoria e as suas possibilidades
para apreender o mundo exterior. práticas, temos em nossas mãos instrumentos fundamentais
A seguir, aproximadamente, entre os dois e os seis anos de para dirigir a nossa prática, propiciando oportunidades aos
idade, a criança dedicar-se- aos jogos simbólicos; essa é a fase nossos educandos de internamente se construírem. Com essa

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teoria em nossas mãos, podemos saber o que fazer com as cabeça se liga ao tronco através do pescoço, especialmente
atividades lúdicas em cada fase de desenvolvimento de uma pela nuca; a cabeça se liga com o abdômen via garganta, parte
criança, um adolescente ou um adulto. Piaget nos ajuda a não interna do pescoço; e o tronco se liga ao abdômen através do
colocar o carro antes dos bois. Faz-nos compreender que é diafragma. Todavia, nem sempre, ou quase nunca, essas partes
preciso estar atentos ao tempo e às possibilidades de realizar funcionam harmonicamente, fato que também se expressa
e incorporar uma determinada ação. através dos nossos desequilíbrios entre sentir, o pensar e o
Enquanto Freud esteve atento mais aos processos agir.
emocionais trabalhados pelo brinquedo e pelo jogo, Piaget A cabeça, quando está separada do corpo, através de
esteve mais atento aos aspectos cognitivos trabalhados por bloqueios energéticos na nuca, pode ter duas consequências:
esses mesmos recursos, sem que tenha descuidado dos de um lado, se a energia se concentrar na cabeça, pensar em
aspectos afetivos e morais. Enquanto a psicanálise esteve mais excesso e rigidez na conduta; se a energia se concentrar no
atenta (não exclusivamente) à reconstrução da experiência corpo, hiperatividade descontrolada, na medida em que a ação
emocional, Piaget esteve mais atento ao processo de passa superficialmente pela reflexão, assim como pelos
construção dos conhecimentos e da afetividade. Todavia, sentimentos.
ambos são de fundamental importância para quem deseja A cabeça, quando está separada do abdômen, também,
trabalhar com atividades lúdicas, seja na educação familiar, na pode apresentar duas consequências opostas: ou engole as
educação escolar, na educação extraescolar, seja na terapia. emoções, deixando-as presas no abdômen, sem poder
Aqui, também, podemos observar que a atividade lúdica só expressá-las pelo rosto, ou expressa muita emoção pelo rosto,
poderá trazer a sensação de experiência plena, na dimensão do sem estabelecer contato com o centro do corpo; então a
sujeito que a vivencia. Praticar jogos de exercício, jogos emoção emerge como se fosse vomitada para aliviar a pressão
simbólicos ou jogos de regras só poderá ser pleno para quem interna.
os pratica, mas parece que todos os que os praticam com Por último, o tronco pode estar separado do abdômen pelo
inteireza, integridade e presença, chegam a esse cume de diafragma, cujas consequências opostas podem ser: de um
sensação de plenitude, o que nos permite admitir que as lado, quando a energia se concentra mais no tronco, a
atividades lúdicas podem e devem ser utilizadas como respiração fica quase que imperceptível, o que conduz a
recursos para a busca de um crescimento o mais saudável manifestação de quase nenhuma emoção; ou, por outro lado,
possível. quando a energia se concentra mais no abdômen, num
processo de estado emocional intenso, emerge a ansiedade,
Atividades lúdicas e a restauração do equilíbrio entre que não encontra um modo de expressão por um movimento
as camadas embrionárias constitutivas do ser humano harmônico. A respiração é ativa, porém, o sistema muscular é
pouco ativo51.
Para tratar sobre essa parte é necessários os Em nossa vida, o ideal seria crescer com o equilíbrio
conhecimentos originários da Biossíntese, que é uma área de interno dessas três camadas e, consequentemente, das três
conhecimentos criada por David Boadella, um psicoterapeuta qualidades básicas do ser humano, a elas relacionadas: sentir,
somático inglês, no decorrer da década de setenta, e vem pensar e agir. Nosso crescimento, em parte, se faz de modo
sendo permanentemente recriada por ele nesses últimos harmônico, mas uma grande parte dele, infelizmente, tem se
trinta anos. A Biossíntese não trata de ludicidade, porém feito pelo caminho do desequilíbrio entre essas camadas e
permitem compreender o significado interno da vivência de essas qualidades. Esses desequilíbrios, manifestados pelas
experiências lúdicas. qualidades opostas acima indicadas, que são e/ou foram
O ser humano é constituído, embrionariamente, por três adquiridos no decorrer da própria experiência da vida de cada
camadas, denominadas germinativas: endoderma, mesoderma um, poderão ser restaurados para novas formas de equilíbrio,
e ectoderma. Em torno do décimo quarto dia após a concepção, através de atividades terapêutico-educativas ou educativo-
as células do novo ser, que até esse momento eram terapêuticas, que restabeleçam o fluxo energético entre as
indiferenciadas, especializam-se, formando cada uma dessas partes componentes do ser humano, assim como entre as suas
três camadas; o que implica que decidem por compor um ou qualidades de sentir, pensar e agir, equilibradamente. Para
outro conjunto de órgãos constitutivos do ser humano, entrar no contato mais profundo consigo mesmo, o ser
relativos a cada uma dessas camadas. humano tem necessidade de estar em contato com o visceral,
O endoderma dará origem a todos os órgãos internos moles com o sentimento, que, posteriormente, é compreendido e
do tórax e do abdômen, órgãos aos quais se vinculam nossos elaborado no pensamento e atuado ou realizado pelo
sentimentos. O mesoderma constituirá todo nosso sistema de movimento. Estabelecer e/ou restaurar o equilíbrio entre os
sustentação e movimento: o esqueleto, a musculatura, o órgãos originários das camadas germinativas do ser humano
sistema circulatório. O ectoderma constituirá o sistema significa, também, restaurar o equilíbrio entre o sentir, o
nervoso central e todo o sistema de comunicação do ser pensar e o agir; mas o contrário, também tem sua verdade: a
humano com o mundo exterior; ou seja, dá origem ao sistema experiência de restaurar o equilíbrio entre o sentir, o pensar e
nervoso central e a todas as suas ramificações, que se o agir, através da transformação de crenças, também podem
estendem para todas as partes do corpo, como também para atuar e atuam na reequilibração das camadas biológicas
os órgãos dos sentidos, que nos colocam em comunicação com constitutivas do ser humano.
o mundo externo a nós mesmos. Essas três camadas Usualmente, em nossa sociedade, nós damos pouco lugar
germinativas dão origem a três modos de ser de cada um de aos sentimentos. Em função de nossa herança iluminista,
nós: sentir, pensar e agir. Sentimento, pensamento e queremos aprender e ensinar somente pelo processo
movimento são três componentes de nosso estar no mundo, na cognitivo e, em função de nosso comprometimento com a
medida em que, ao exercitar cada um desses modos de ser, ao produtividade, buscamos sempre mais e mais atividades. Com
mesmo tempo, estamos exercitando os outros dois. isso, nossa experiência de sentir permanece relegada ao
Esses três conjuntos de órgãos manifestam-se em três segundo plano; ou ao terceiro, quarto, último plano! Portanto,
partes distintas do corpo: a cabeça (ectoderma), o tronco e nosso caminho predominante é viver no desequilíbrio dos
membros por extensão (mesoderma) e o abdômen nossos elementos constitutivos, psíquicos e corporais, ao
(endoderma). E essas partes se ligam entre si por pontes: a mesmo tempo.

51 Para uma melhor compreensão dessa temática, pode-se ver, também, com
muito proveito, o livro Anatomia Emocional, da autoria de Stanley Kelman, S.P.,
Sumos Editorial.

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Que isso tem a ver com atividades lúdicas? As atividades importantes para nossa compreensão das coisas, mas só o
lúdicas, por serem atividades que conduzem a experiências sujeito, enquanto vivente, poderá experimentar a ludicidade
plenas e, consequentemente, primordiais, a meu ver, como experiência plena em seus atos; e como essa experiência
possibilitam acesso aos sentimentos mais indiferenciados e pode nos tornar criadores e recriadores de nossa vida, de uma
profundos, o que por sua vez possibilita o contato com forças maneira mais saudável.
criativas e restauradoras muito profundas, que existem em
nosso ser. A vivência dessas experiências, vagarosamente, Questões
possibilita a restauração das pontes entre as partes do corpo,
assim como a restauração do equilíbrio entre os componentes 01. (Prefeitura de Fortaleza/CE - Pedagogia -
psíquicos-corporais do nosso ser. Na atividade lúdica, o ser Prefeitura de Fortaleza - CE) Em relação à ludicidade e ao
humano, criança, adolescente ou adulto, não pensa, nem age, uso de jogos e brinquedos na educação escolar, assinale a
nem sente; ele vivencia, ao mesmo tempo, sentir, pensar e agir. alternativa correta:
Na vivência de uma atividade lúdica, como temos definido, o (A) Os jogos de regras, segundo Henry Wallon, vão
ser humano torna-se pleno, o que implica o contato com e a predominar a partir dos seis, sete anos de idade, período
posse das fontes restauradoras do equilíbrio. denominado, inicialmente, de operatório concreto (dos sete
No caso, agir ludicamente, de imediato, conduz para o aos doze anos) e, depois, de operatório formal (a partir
contato com o sentimento, que se situa, fisiologicamente, nos aproximadamente dos doze anos).
remanescentes do endoderma em nosso corpo, o local do (B) Enquanto Freud esteve atento mais aos processos
contato com as sensações e sentimentos mais profundos de emocionais trabalhados pelo brinquedo e pelo jogo, Piaget
cada um de nós, que por sua vez, abre as portas do ectoderma esteve mais atento aos aspectos cognitivos trabalhados por
e do mesoderma, garantindo o pensar e o agir. Os alquimistas esses mesmos recursos, sem que tenha descuidado dos
definiam o nosso abdômen como a fornalha, onde tudo se aspectos afetivos e morais.
transforma. É para aí que as atividades lúdicas nos conduzem; (C) As atividades ou os brinquedos, segundo Cipriano
para a fornalha dos nossos sentimentos e das nossas emoções, Luckesi, trazem em si um saber ou uma possibilidade que
aos quais serve nosso pensamento e nossa ação. É nessa encerram potencialidades que poderão ser ativadas ou não
fornalha que encontramos as fontes restauradoras da vida, por quem os vivencia. Assim, as atividades lúdicas só podem
porque ainda muito primordiais, primais, básicas. ter como suporte objetos comuns de uso cotidiano.
Como as atividades lúdicas, desde que vivenciadas, podem (D) Jean Piaget compreendeu que o brinquedo é o caminho
ser um suporte na construção ou na restauração do equilíbrio real para o inconsciente da criança, assim como o sonho é o
energético do ser humano? David Boadella diz que nós seres caminho real para o inconsciente do adulto, ou seja, a
humanos somos constituídos por polaridades e a principal de experiência do brincar tem seu lado interno, que se expressa
todas as polaridades é a que se refere ao interior e ao exterior. no externo. A meta de Piaget, como sabemos, foi desvendar e
O interior é nossa Essência, o Âmago do ser nosso, o centro dos compreender as operações do inconsciente através de suas
anseios, de nossa alma. O exterior é o nosso corpo, nossa manifestações externas.
personalidade, é o campo da energia. O âmago é o Âmago, ele
não pode ser manipulado; ele é o que É. Com ele, nós só 02. (Prefeitura de Itaquitinga/PE - Professor - Ensino
podemos manter contato e esse contato é curativo, quando Fundamental - IDHTEC) Numa reunião pedagógica, os
ocorre, devido estar para além de todo pensamento, de todo professores discutiram como tema a utilização de jogos no
julgamento, de todo “ego”. Nossa essência é curativa porque é processo ensino aprendizagem. Ao expor as experiências com
divina. Mas a energia, que é externa, é força e nos permite viver a temática a professora Ana afirmou que o uso dos jogos no
e agir; ela é um potencial, que, quando atualizada em nossas ensino de alguns conteúdos vinha apresentando bons
experiências cotidianas, pode estar ordenada ou desordenada. resultados, inclusive gerando mudança positiva nas atitudes
Ela necessita de ser ordenada para permitir nosso contato com de alguns estudantes. A experiência socializada pela
nossa Essência. Assim sendo, caso ela seja só um potencial, professora Ana indica que o uso de jogos no processo
ainda, podemos construí-la ordenadamente pela educativo pode promover, EXCETO:
aprendizagem e pela educação; caso ela já esteja construída de (A) Integração
alguma forma, ordenada ou desordenadamente, podemos (B) Socialização
reconstruí-la de forma mais adequada e funcional, tendo em (C) Autoconfiança
vista nos possibilitar um suporte externo para entrarmos em (D) Apatia
contato com nossa Essência, nosso Âmago. (E) Motivação
Quando ordenamos ou reordenamos nosso campo
energético, ele permite um contato com nosso Âmago, com 03. (Prefeitura de Juatuba/MG - Professor de Educação
nossa Essência. E esse contato, como dissemos é curativo, na Básica I - CONSULPLAN) Estudos recentes apresentam várias
medida em que ele, desde que estabelecido, reverbera para contribuições que o lúdico pode propiciar ao processo de
todas as nossas experiências de vida. E esse contato com ensino‐aprendizagem. Considerando a afirmativa anterior, é
Âmago, na maior parte das vezes, será rápido e fugaz, mas será INCORRETO afirmar que
um contato e a partir dele, nossa vida vai se transformando e (A) os jogos promovem fatores diagnósticos do nível de
tornando-se o que necessita de ser. As atividades lúdicas aprendizagem ou de eventuais dificuldades de aprendizagem
ordenam ou reordenam o campo de nossa energia e, por isso, e proporcionam novas experiências afetivas, social e cognitiva.
em momentos fugazes ou mais duradouros, nos permitem um (B) o brincar favorece uma aprendizagem significativa e
contato com nossa Essência, por menor que seja. Com o tempo prazerosa, capaz de promover a construção de aspectos
e com repetidas experiências plenas, para além do ego, vamos reflexivos e críticos, além de possibilitar ao educador a
podendo manter um contato mais permanente com nossa elaboração de uma proposta didática eficaz.
Essência, vamos sendo capazes de sustentar essa experiência. (C) as brincadeiras possibilitam métodos de aprendizagem
A ludicidade é vista como oportunidade de experiência incapazes de proporcionar um ambiente propício à produção
plena interna, podendo-se observar que quem terá que fazer o do conhecimento e a uma facilitação do trabalho docente, pois
percurso da experiência lúdica, para que ela seja plena, é o geram competição e discordâncias entre os alunos.
próprio sujeito da ação. (D) o lúdico facilita a visão da relação dos alunos sobre o
Objetivamente, poderemos ter muitas descritivas e social, promove o resgate das influências culturais e torna a
análises das atividades lúdicas, que são profundamente escola um espaço de resgate cultural, de valorização social, de

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reprodução do conhecimento adquirido em gerações contribuir com a educação do indivíduo, a recreação tem uma
passadas, além de transpor a emoção do imaginário infantil. função compensadora pois lhe dá uma satisfação pessoal,
possibilitando o reencontro com os movimentos, com alegria,
Gabarito à descontração necessária à vida, na qual não temos mais
tempo pra pensar, pra rir ou sonhar, então, vamos nos recrear,
01.B / 02.D / 03.C divertir, recobrar o ânimo com a recreação.
Sendo assim, a recreação é importante não só na infância,
mas em todas as fases da vida. Essas atividades devem ser
espontâneas, prazerosa. De tudo que foi pesquisado percebe
5. A recreação e os jogos no se a influência da atividade recreativa no aprendizado infantil
desenvolvimento infantil já que é um momento voltado para o lazer, satisfação, alegria
fazendo com que as crianças adquiram conhecimentos de
forma lúdica.
A respeito do tema proposto, pode se verificar opiniões
Recreação e o desenvolvimento infantil52 posta de forma diferente, que por fim acabam no mesmo
A educação traz com ela muitos desafios a serem sentido, como a respeito da recreação que vem do latim
trabalhados. Quando se pensa em educação imagina o ser em recreare e significa “criar novamente” no sentido positivo,
sua totalidade, gestos e preferências. ascendente e dinâmico. É um momento onde o indivíduo sacia
Os educadores almejam alunos que queiram mais seus anseios voltados para o lazer. Como complemento desse
aprendizagem, porém isso não acontece, já que o que conceito, pode dizer que a recreação contempla um conjunto
encontramos são alunos desestimulados para executar de atividades de caráter lúdico e recreativo, que se destinam a
algumas atividades escolares inclusive nas aulas de educação promover o entretenimento e o divertimento.
física. A recreação vai além da ludicidade, extravaso,
Nas escolas percebe-se a preocupação em ensinar todo satisfação e prazer de fazer alguma atividade motivadora.
o conteúdo proposto, imaginando assim que quanto mais Recrear é educar, pois a recreação permite criar e
conhecimento transmitir ao aluno, mais ele irá se satisfazer o espírito estético do ser humano, ricos em
desenvolver, mas sabe se que isso não é verdade, já que os possibilidades culturais, permite escapar do desagradável,
alunos só assimilam as coisas quando fazem sentidos a eles. utilizando excesso de energia ou diminuindo tensão
As crianças por serem naturalmente lúdicas, ao emocional.
praticar atividades recreativas explorando a si mesma e o A recreação também contribui na formação motora e
ambiente ao seu redor, expande suas emoções organizando possibilita expressar sentimentos além de desenvolver
assim a relação ao seu redor. também o lado cognitivo.
As atividades físicas das moderadas as mais agitadas são Recreação significa satisfação e alegria naquilo que faz.
comuns no cotidiano das crianças e na educação física escolar. Retrata uma atividade que é livre e espontânea e na qual o
Essas atividades podem ser decisivas no processo de formação interesse se mantém por si só, sem nenhuma coação interna
do desenvolvimento e aprendizagem infantil. O ou externa de forma obrigatória ou opressora, afora e prazer.
desenvolvimento da criança acontece através do lúdico. Ela
precisa do brincar para crescer, precisa do jogo como Por tanto através da recreação pode-se haver divertimento
equilibração para o mundo. e aprendizagem podendo essa prática também ser utilizada
Os gestos lúdicos encontrados nas atividades recreativas dentro da sala de aula.
permitem à criança a capacidade de se adaptar a novos A recreação traz inúmeros benefícios, fazendo com que
desafios, aumentando sua integração física e social, melhora de todos participem com grande satisfação de atividades, sem
valores éticos e morais, desbloqueando sua timidez, além de melindre e com muita criatividade independente dos recursos
descobrir suas habilidades através da ludicidade, aumentando disponíveis, além de permitir que haja aprendizagem com as
com isso sua capacidade mental de raciocínio. O brincar pessoas que estejam envolvidas nas tarefas e desenvolve
implica uma dimensão evolutiva. Crianças de diferentes muitas habilidades como equilíbrio, propriocepção, confiança,
idades, com características específicas tem formas diferentes lealdade, força, atenção, agilidade em tomar decisões e
de brincar”. principalmente adquirir bons hábitos na convivência social
Constatou-se na sociedade uma mudança no estilo de vida que é de grande importância na fase infantil, já que ao criar as
cultural das crianças dentro de seu cotidiano e como atividades é importante estar atento ao objetivo, respeitando
consequência vem diminuindo as práticas de atividades físicas cada etapa e interferindo quando necessário e ressaltando que
e lúdicas que ocorriam com mais frequência antigamente, e as crianças façam observações e explorações para melhor
como resultado vem diminuindo todos os benefícios que esses descoberta privilegiando com isso a aprendizagem. São
movimento proporcionavam. justamente as regras que fazem com que a criança se comporte
Embora haja pouco estudo comprovado em relação à de forma mais avançada do habitual para sua idade.
ligação entre a recreação, o desenvolvimento infantil e seu Sendo assim a recreação tem grande influência não só na
comportamento, isto tem sido bastante observado por infância, mas em todas as fases da vida, sendo essencial que
investigadores de diversos tipos de comportamento dos haja esse momento de lazer. As atividades devem ser
humanos, com foco nas crianças. Pesquisas recentes espontâneas trazendo prazer em executá-las, pois a mesma
demonstram interesses na relação entre as atividades lúdicas traz grande benefício na aprendizagem. Para a criança, brincar
e o aspecto de desenvolvimento cognitivo, afetivo, motor e é viver. A própria história da humanidade nos mostra que as
social. crianças sempre brincaram, brincam hoje e certamente
A ludicidade como ferramenta pedagógica é extremamente continuarão brincando.
valiosa, uma vez que traz inúmeros benefícios para o São muitos aspectos a serem desenvolvidos através da
desenvolvimento da criança, por estimular a criança a crescer recreação, sendo considerado como principais a integração do
na linha de socialização, aumentando sua criatividade, indivíduo no meio social, conhecimento mútuo e participação
expressão corporal, a autoafirmação e participação no em grupo independente da afinidade, fazendo com que o
processo de aprendizagem. Afirma que em se tratando de sujeito desenvolva maior relação interpessoal, deixando o ser

52 Texto adaptado de Mádelin Evelyn Santos.

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mais desinibido fazendo com de descubram e desenvolvam exclusão dos menos habilidosos ou que tenham com algum
sua comunicação, habilidade lúdica, adaptação emocional e tipo de deficiência, já que todos podem participar, bastando
extravase sua energia contida aumentando com isso sua haver boa vontade do professor e dos alunos, pois tanto adulto
capacidade intelectual. quanto a criança precisa desse momento de prazer, e isso é
Ao falar da recreação como fator educacional, em relação facilmente encontrado na Recreação que além de aprender,
às instituições escolares de um modo geral verifica-se o lúdico desenvolvendo outras capacidades, nos divertimos
não é tão valorizado, ou seja, quer dizer que na concepção dela, esquecendo nossos problemas, diminuindo stress e tensão do
esta atividade é considerada como algo improdutiva, que não cotidiano. Os jogos e brincadeiras se tornam um facilitador
traz lucro e não produz nenhum valor. Porém novas para que tudo aconteça de forma natural e melhor ainda de
concepções vem se formando para transformar a criança num forma "lúdica”. É necessário ter um objetivo a ser trabalhado,
ser globalmente desenvolvido, ou seja, um ser mental afetivo e para que assim elas se desenvolvam e mostrem seu potencial,
social. não apenas no "brincar" e sim educando, com essas
Há uma grande diferença entre uma aula e um momento de ferramentas úteis e significativas na vida das crianças fazendo
recreação durante a aula, pois na aula estará sempre o objetivo com que o lúdico de modo construtiva abre a portas para a
cultural e formativo, enquanto a recreação, tem como apenas melhores amplitudes do conhecimento.
o fato de recrear. Neste caso, o espírito é muito mais lúdico,
realizando atividades simples em busca do prazer e diversão. Aspectos Históricos da Recreação53
Como forma de enriquecimento para o desenvolvimento
da criança no momento da recreação, através desta atividade A recreação teve sua origem na pré-história, quando o
ocorre a evolução. Por saber que o brincar é a principal homem primitivo se divertia festejando o início da temporada
atividade da criança, quando ela não está dedicada a uma de caça, ou a habitação de uma nova caverna, já que as
atividade que seja muito necessário como se alimentar, dormir atividades se caracterizavam por festas de adoração,
e outros. Todas as crianças brincam se não estão cansadas, celebrações fúnebres, invocação de deuses, o vencimento de
doentes ou impedidas. um obstáculo, com alegria, caracterizando assim um dos
Alguns autores afirmam que o brincar tem um papel principais intuitos da recreação moderna. As atividades, jogos
importante, inclusive sinalizando quando a criança tem algum coletivos dos adultos em caráter religioso foram passadas de
tipo de problema motor, cognitivo dentre outros. Assim, o geração em geração às crianças em forma de brincadeiras,
lúdico transforma-se em uma das formas mais importante do quer dizer já era uma constante na vida do homem, sendo que
comportamento humano, desde o nascimento até a morte. É era manifestada através das danças primitivas de adoração,
absolutamente essencial a sobrevivência e a estruturação o rituais fúnebres e invocação de deuses, destacando-se seu
processo do desenvolvimento humano. aspecto recreativo de alegria e vencimento de obstáculos. A
O fato de brincar tem grande valor na infância, já que isso criança ao nascer, após todo o impacto sofrido pela diferença
estimula criando possibilidade para o meio social e através de ambiente, adaptando-se a medida que o sistema nervoso se
dessa ludicidade a criança associa a ilusão e sua imaginação desenvolve, tornando-a capaz de movimentar-se, começa
com a realidade. As brincadeiras ocorridas na escola têm que então a recrear-se, mexendo as mãos, pegando os pés, entre
estar sempre buscando alcançar um objetivo, seja para a outros movimentos, isto vem afirmar que a recreação é algo
alfabetização, seja para o repasse de boas maneiras, ou com instintivo do ser humano.
quaisquer fins educativos. Isto porque, a brincadeira, em seu Começando com a criança em forma de brincadeiras, a
todo, é um período de aprendizagem significativa para a recreação chega até o adulto como fator social, que surgiu nos
criança, independentemente de onde ocorra. fins do século passado.
O movimento da recreação sistematizada iniciou-se na
Alemanha em 1774 com a criação do Philantropinum por J. B.
Basedow, professor das escolas nobres da Dinamarca. Lá as
atividades intelectuais ficavam lado a lado às atividades físicas,
como equitação, lutas, corridas e esgrima.
Na Fundação Philantropinum havia cinco horas de
matérias teóricas, duas horas de trabalhos manuais, e três de
recreação, incluindo a esgrima, equitação, as lutas, a caça,
pesca, excursões e danças. A concepção Basedowiana
contribuía para a execução de atividades a fim de preparação
física e mental para as classes escolares maiores.
Froebel contribuiu criando os Jardins de Infância onde as
crianças brincavam na terra. Nos EUA (Estados Unidos da
América) o movimento iniciou-se em Boston, em 1885 com a
Referindo se aos autores mencionados, as opiniões foram criação de jardins de areia para as crianças se recrearem. Com
consideradas semelhantes em relação a Recreação, desde o o tempo, o espaço tornou-se pequeno isto que os irmãos mais
conceito, até suas diversas possibilidades de velhos vinham também se recrearem nos jardins, Criavam-se
desenvolvimentos comportamentais, integrações sociais, então os Playgrounds em prédios escolares, chamados
dentre outros, mostrando que a aprendizagem e a atividade também de pátios de recreio.
recreativa podem seguir o mesmo caminho, beneficiando o No ano de 1892, em Chicago acontecera o 1º HULL HOUSE,
desenvolvimento infantil. área para jogos, aparelhos de ginástica e caixa de areia.
Prevendo a necessidade de atingir um público de diferente
Considerações finais faixa etária, como os jovens e adultos, e também devido à
A Recreação bem como às aulas de Educação Física, são crescente importância do tempo de lazer, o termo playground
muito importantes para um bom desenvolvimento cognitivo, foi mudado para “recreação", com um conceito mais amplo de
motor, social, afetivo da crianças, além de ser uma maneira de brincadeiras para crianças e outras atividade para os adultos,
trabalhar a interação, fazendo com que não haja espaço para a a partir daí foram criados os centros recreativos, que

53 Texto adaptado de Almir Ribeiro de Arruda e Terezinha Andrade Moura,


disponível em http://www.def.unir.br/

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funcionavam o ano todo. Eram casas campestres com sala de - Social, porque, estreitando o convívio de crianças de
teatro, de reuniões, clubes, bibliotecas e refeitórios. Havia várias origens, tem por fim eliminar-lhes o preconceito de
estruturas semelhantes às de hoje em dia, caixas de areia, classes, despertarem nestas o amor e respeito pelos humildes,
escorregadores, quadras e ginásio para ambos os sexos com e naquelas o hábito e as maneiras das que já foram
vestiários e banheiros, balanços, gangorra, entre outros. Para beneficiadas pela educação no lar e nas escolas.
orientação das atividades existiam os líderes especialmente De acordo com Vinicius Ricardo Cavallari e Vany Zacharias
treinados. as principais características das atividades recreativas são:
No Brasil, a criação de praças públicas iniciou-se em 1927, (2007)
no Rio Grande do Sul com o professor Frederico Guilherme - Deve ser desenvolvida de forma espontânea, sem esperar
Gaelzer. O evento chamava "Ato de Bronze", onde foram resultados ou benefícios específicos. Para tanto a opção por
improvisadas as mais rudimentares aparelhagens. Pneus sua prática deve ser livre, atendendo os interesses de cada
velhos amarrados em árvores construíam um excelente meio indivíduo;
de recreação para as crianças. - A prática das atividades recreativas deve levar as pessoas
Em 1929, aparecem as praças para a Educação Física, a “estados psicológicos positivos”, se realizando em um clima
orientadas por instrutores, pois não havia professores e com uma atitude predominantemente alegre e entusiasta;
especializados. A partir daí foram surgindo novas praças, - Deve ser um estímulo para a criatividade, um benefício
parques e os Centros Comunitários Municipais, sendo que o para a formação pessoal e para as relações sociais, dando lugar
primeiro chefe desse serviço foi o professor Gaelzer. à liberação de tensões da vida cotidiana, resgatando os valores
Em 1972, foi criado o "Projeto RECOM" (Recreação - essenciais para uma auto realização.
Educação -Comunicação), pelo prefeito Telmo Thompson A atividade recreativa tem sua essência na organização
Flores, com o Secretário Municipal de Educação e Cultura Profº própria dos jogos e brincadeiras, segundo KISHIMOTO (2005),
Frederico Lamacchia Filho, juntamente com o professor o jogo, aqui entendido em seu sentido amplo, ou seja, também
Gaelzer. Porto Alegre foi a pioneira desse tipo de projeto, denominado como brincadeira, tem por excelência duas
realizou atividades recreativas e físicas promovendo o funções:
aproveitamento sadio das horas de lazer e a integração do 1. Função lúdica: propicia diversão, prazer e até o
homem com sua comunidade. desprazer, quando escolhido voluntariamente;
Funcionavam no RECOM uma tenda e um carrossel de 2. Função educativa: ensina qualquer coisa que complete
Cultura, desmontáveis e de fácil remoção. A tenda é uma casa o indivíduo em seu saber, seus conhecimentos e sua apreensão
de espetáculos. O carrossel foi criado para apresentações do mundo.
externas e espetáculos ao ar livre. Há de se ressaltar que os jogos e as brincadeiras podem ser
Ressalvando a importância da recreação, a Alemanha a aplicados nas diversas faixas etárias, sem distinção, mas que
introduziu nas escolas e criou os parques infantis. Os EUA cada um deles vai sofrer alterações e interferências nos seus
criou os playgrounds equipados revolucionando a recreação procedimentos de aplicação, nos recursos que serão utilizados
pública. O Rio Grande do Sul pelo pioneirismo e a implantação ou na metodologia de organização e aplicação de suas
do "RECOM" com a recreação móvel. estratégias.
Mesmo com estas características genéricas e ao mesmo
Conceito e Definição de Recreação unificantes, ao se deparar com a necessidade de um correto
planejamento de ações recreativas, torna-se fundamental
A palavra recreação provém do verbo latino “recreare”, conhecer e entender as características e necessidades
que significa recrear, reproduzir ou renovar. A recreação pode, específicas das faixas etárias com as quais poderemos estar
desta forma, compreender as atividades espontâneas, nos envolvendo no momento da aplicação dos jogos e
prazerosas e criadoras, que o indivíduo busca para melhor brincadeiras. Desta forma, queremos destacar alguns
ocupar o seu tempo livre. A recreação tem como objetivo elementos motores, psicológicos e sociais, que podem
principal criar as condições necessárias para o interferir no processo formativo e educacional das faixas
desenvolvimento integral das pessoas, além de promover a etárias em estudo:
participação de forma coletiva e individual em ações que
possam melhorar a qualidade de vida das pessoas; possui Considerações Gerais sobre a Recreação
ainda o caráter educacional, auxiliando na preservação da
natureza e na afirmação dos valores imprescindíveis à A Educação Física nas séries iniciais é considerada como
convivência social e profissional. uma aula de atividade recreativa que segundo a autora Verderi
Recreação ocorre à ideia de prazer, de espontaneidade, de (1999), não deve ser considerada como uma atividade
livre escolha. De acordo com a opinião de vários autores, desorganizada, mas sim uma atividade natural que ocorre em
segundo Cavalcante (apud Canto 2004, p. 11). Recreação é uma um processo contínuo de desenvolvimento.
atividade física ou mental a que o indivíduo é naturalmente No pensamento de Verderi (1999), os educadores de
impelido para satisfazer necessidades de ordem física, Educação Física são formadores de seres que interagem com o
psíquica e social de cuja realização lhe advém prazer e que é mundo, são responsáveis não só pelas capacidades físicas,
aprovada pela sociedade. mas, pelo cognitivo e sócio emocional. Afirma, ainda que se
Partindo desta definição é possível compreender que a pode fundamentar as aulas recreativas em teóricas e práticas,
recreação busca desenvolver capacidades do ser humano de maneira que na realização de brincadeiras e atividades de
numa totalidade. Uma vez que, permite divertimento e oferece recreação venham promover condições de reflexão, lazer e
benefícios para a pessoa, despertando então, um interesse pela construção de conhecimentos, aprimorando a corporeidade,
sua importância e necessidade para a prática na sociedade. promovendo a auto-organização, estabelecendo relações
É hoje pacífico que a recreação constitui um processo equilibradas e construtivas com os outros, fazendo-os
eficiente de educação: reconhecerem que são elementos integrantes da sociedade e
- Higiênica, porque o jogo ao ar livre é condição que são cidadãos com responsabilidades, direitos e deveres.
indispensável ao seu desenvolvimento físico; A recreação pública se propõe como uma ação educativa
- Intelectual, porque servindo para lhes dar hábitos de na escola, ocupando de maneira sadia e orientada, oferecendo
cálculo, reflexão e previdências, constitui para formação de uma variedade de atividades: esportes, teatro, pesquisas,
sua mentalidade; e músicas, danças, jogos recreativos, brincadeiras, entre outras.

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APOSTILAS OPÇÃO

Segundo o CONFEF (Conselho Federal de Educação Física), Uso das forças mentais – Será que em recreação se
para que a educação física seja de qualidade nas escolas é emprega tal fator? E por que razão? A força mental está
indispensável que tenha práticas esportivas e jogos em seu presente em todas atividades recreativas, não só em jogos
conteúdo, possibilite ao aluno uma variedade considerável de mentais, porém também em jogos motores e sensoriais. Se for
experiências, vivências e convivências no uso de atividades praticado um jogo, qualquer que seja, a mente está em ação. Só
físicas e no conhecimento de sua corporeidade e constitua-se quando o jogo não mais é interessante, então, cessa a força
num meio efetivo para conquista, de um estilo de vida, ativo mental.
dos seres humanos. Experiência Emocional – Se em prática recreativa,
qualquer que seja, não se sente satisfação, então é evidente que
Valores Específicos da Recreação não houve recreação, pois, se o conceito da recreação é tudo
aquilo que ocasiona sensação de prazer, bem estar, pelo qual,
Segundo Gaelzer (1979), a recreação apresenta valores sempre se anseia, então, em caso negativo a recreação deixou
para as fases da vida humana: de existir.
Pedagógica, é essencialmente a finalidade na idade infantil Prazer da Beleza – O senso do belo é o que proporciona a
e na adolescência; alegria de viver e admiração pelo que é bom, é ver mais além,
Formativa, na juventude, recreando e reafirmando os bons é citar o provérbio popular “Quem ama o feio, bonito lhe
hábitos, canaliza as tendências antissociais, favorece o parece”, é o amor, a recreação encontra no amor o estudo da
equilíbrio emocional, age como elemento integrador e beleza.
unificador e amplia as oportunidades do desenvolvimento Sensação de Utilidade – Quem não se sente bem, feliz, em
cultural; servir, ajudar, em ser útil a alguém? Esta sensação também
Compensadora, na idade madura, levando o indivíduo à está bem integrada na recreação.
praticar correspondente à suas necessidades; cria estímulos Inúmeros são os exemplos que podem ser citados.
novos, oportuniza e revigora o sentimento de participação Ninguém de bom senso faz alguma coisa visando o mal, mas,
social; encontram na prática regular motivações para a sua sim, o bem, este bem, que é beleza, que é revertido em amor
saúde e bem estar geral. pelo seu semelhante, pela humanidade.
Segundo Cavalcanti (apud Canto – 2004), as atividades Repouso – Esta sensação recreacional, é tão diversificada,
recreativas são inúmeras proporcionando satisfação como: O quanto forem os interesses das pessoas. São preferenciais
prazer da criação – é algo por demais importante. Desde contraditórias ao trabalho ou descanso, na total expressão da
criança o ser humano demonstra suas tendências para a palavra. Descanso é intervalo no trabalho, repouso, é
criatividade. Em seus desenhos, as crianças procuram externar recuperação das forças.
os seus pensamentos. Realizam coisas interessantes com areia
da beira-mar. Com argila e massa, formam coisas maravilhosas Aspectos Gerais do Brincar
que, tendo sempre oportunidade de dar trabalho às mãos,
tornam-se verdadeiras artistas. E definem, ou talvez tendem Brincar, segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais –
para uma profissão: desenhista, pintor, arquiteto, etc. PCN’s (1998): A brincadeira é uma ação que pode ocorrer da
É muito comum que os pais fiquem tristes quando tendo imaginação. Para brincar é preciso apropriar-se da realidade e
ofertado aos seus filhos, brinquedos caríssimos, e dias depois, poder atribuir a novos significados, por meio de articulações
veem os mesmos espedaçados. E por que eles fazem isto? – é o entre a imaginação e a imitação no plano das emoções,
poder da criatividade. Eles querem desmontar o brinquedo surgindo ideias criativas de uma real vivência.
para refazê-lo, se não igual, mas, criando outro tipo. No brincar a criança tem a oportunidade de interagir com
Psicologicamente falando, o brinquedo surgiu, não para pessoas e objetos, liberar a criatividade, podendo também se
enfeitar a prateleira ou paredes e sim, para as crianças beneficiar de uma qualidade de vida.
brincarem. Daí, necessário é, que os adultos lhes oportunizem O brincar faz parte do ser humano, e para a criança a
o prazer, a sensação de criar e recriar. Isto acontece não só com brincadeira representa a capacidade de compreender a
as crianças, mas, dia a dia o adulto se depara e sente realidade que vive.
necessidade de tal. Conforme o Referencial Curricular Nacional de Educação
Todas as atividades recreativas, mesmo feitas Infantil (1998): Desde muito cedo a criança se comunica por
individualmente, serão mais completas, se transmitidas, meio de gestos e sons desenvolvendo sua imaginação. Brincar
comentadas, do companheirismo. Este fator recreacional é uma das atividades fundamentais para o desenvolvimento da
abrange a maior parte das atividades recreativas nas reuniões identidade e autonomia.
comunitárias, nas festas, nos bailes sociais, nos jantares, nas Na brincadeira as crianças podem desenvolver algumas
excursões, nos jogos e até mesmo nas conversações. capacidades importantes, tais como a atenção, a imitação, a
O espírito de aventura - é algo sensacional, que tende a memória, a imaginação. As capacidades de socialização da
levar o homem a obter novas experiências e ao sucesso. criança amadurecem, por meio da interação e da utilização e
Implica em curiosidade, ansiedade, pelo novo, por experimentação de regras e papeis sociais.
descobertas, conseguindo novos conhecimentos, sempre de O brincar representa um dos modos pelos quais a criança
utilidades para si e para humanidade. pode aprender sem ninguém ensinar. O adulto deve
Sensação de Realização – Será que existe sensação oportunizar brincadeiras diferentes e variadas possibilitando
melhor que a de sentir o valor de uma vitória, o sucesso em que as crianças criem outros tipos de atividades a partir delas.
alcançar o desejado? Isto é impulsionado pelo desejo de O brincar pode ser visto como a própria essência da infância,
vencer, de aprender algo, isto é, de sentir-se realizado, sendo que ação promove o crescimento, permitindo a criança
satisfeito com o conseguido. explorar o mundo e o ambiente do qual faz parte.
Bem estar Físico – Quando o indivíduo se sente A motivação parece ser algo que antecede e mantém o
fisicamente sadio, a satisfação de bem estar, é notório e brincar. Pode ser classificada como: automotivação, que vem
transmissível nos outros. Sim, porque se está bem disposto, dentro da criança e a motivação externa, que deriva de algo
fisicamente, a alegria transparece no semblante e contagia motivador, da curiosidade, do estímulo do adulto, dos
facilmente ao ambiente onde está. Um exemplo bem prático e materiais disponíveis, do ambiente. A imaginação da criança é
real, se alguém praticar alguns minutos de ginástica logo ao infinita, é fácil estimulá-la, oferecendo-lhe opções variadas.
levantar, vai se sentir disposto fisicamente durante o resto do
dia.

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A Concepção de Jogo e Jogar convívio em grupo e desenvolver habilidades motoras como


equilíbrio, força e flexibilidade.
O brincar, a brincadeira e o jogo em determinados O jogo é o vínculo que une a vontade e o prazer durante a
momentos se confundem, pode-se dizer que o jogo é uma realização de uma atividade. O ensino que utiliza o lúdico cria
atividade livre, pode-se inventar, conforme a necessidade e a um ambiente agradável e gratificante servindo como estímulo
criatividade de quem está brincando. Segundo Kishimoto para o desenvolvimento integral da criança.
(apud. Borges - 2006). A mesma autora afirma que se pode De acordo com Passerino (apud José/Saulo/Terezinha –
considerar o jogo como: 2004), o jogo é necessário no processo de desenvolvimento da
- o resultado de um sistema linguístico que funciona em um criança, com a função vital de proporcionar ao indivíduo forma
contexto social; de assimilação da realidade, além de ser culturalmente útil à
- um sistema de regras; e sociedade como expressão de ideias.
- um objeto. Na verdade os jogos não devem ser vistos apenas como
A escola, segundo Oliveira (1996), vê o jogo como recurso pré-condição para o aprendizado do esporte, pois o mesmo
metodológico capaz de propiciar uma aprendizagem está presente em várias atividades humanas.
espontânea e natural, podendo ser reconhecido como uma das Estudos recentes destacam: BRACHT (1992), FREIRE
atividades pedagógicas mais significativas. (1992), MARCELINO (1990), TAVARESA (1994) destacam que
Segundo os PCN’s (1997), as situações lúdicas, o ensino dos jogos deve assegurar uma aprendizagem que
competitivas ou não, são contextos favoráveis de resgate a história cultural, o lúdico e o significado humano e
aprendizagem. O jogo constitui momentos de interação social social do jogo, garantindo a criança uma prática
bastante significativo, às questões de sociabilidade contextualizada, com origem, fantasia, prazer, alegria, sentido
constituindo motivação suficiente para que o interesse da e significado para sua formação, enquanto construtor e
criança pela atividade seja mantido. produtor deste saber. (Meneses) apud Cristina, Mirian e Sheila,
Nos jogos, ao interagirem, os alunos podem desenvolver graduadas em Ed. Física – UFJF.
respeito mútuo, buscando participar de forma leal, sendo
fundamental que se trabalhe em equipe, em que a Classificação das Atividades Recreativas
solidariedade pode ser exercida e valorizada. (PCN´s 1997).
Moraes (apud. Borges - 2006), sustenta que o jogo envolve Segundo o professor Maurício Leandro (Choquito - 1988),
ordem, tensão, movimento, mudança, solenidade, ritmo, o objetivo da classificação das atividades recreativas além da
entusiasmo, características presentes no jogo didático. Tais padronização, é evidenciar a funcionabilidade dessas
características, de atividades como o jogo, denominadas de atividades dentro de uma programação ou de um programa de
lúdicas, manifestam-se em dramatizações, músicas, atividades lazer e recreação.
individuais e/ou em grupos, possibilitando não só o brincar, Para que seja escolhida uma determinada atividade
mas também o aprender. Nesse sentido, a Educação Física, devendo fazer parte de uma programação, é necessário saber
utilizando-se de jogos e brincadeiras como recurso, pode ser suas características e classificações. De acordo com os
considerada como atividade lúdica e oportunidade de objetivos aos quais é proposto alcançar, ai sim, é escolhida
aprendizagem. uma determinada atividade recreativa.
É enaltecido o valor e a importância da leitura e da
A Concepção do Lúdico pesquisa como fonte de aquisição de conhecimento. Então será
abordada aqui uma compilação de dados, extraídas de boas
De acordo com Oliveira (1996) palavra lúdico vem do latim literaturas, mas sem expressão do seu conteúdo na íntegra,
ludus e significa brincar, incluindo os jogos, brinquedos e com isso é importante a leitura, para que se busque nos livros
divertimentos, sendo também, que brinca e que se diverte. as informações necessárias e completas.
O lúdico é muito abrangente, nele estando contidos o jogar Segundo Ferreira (2003), a classificação das atividades é:
e o brincar, nos quais as relações entre o lúdico são muito Grandes jogos – grande números de participantes. Difícil de ser
próximas. O dia-a-dia, a prática e a literatura demonstram que dominado.
os jogos e as atividades lúdicas, não só atraem as crianças, mas Pequenos jogos - extrai dos participantes características
também adultos, pois são atividades necessárias para a individuais como: velocidade, destreza, força. Revezamento ou
constituição psíquica do ser humano. Estafetas - constitui-se pelo revezamento dos participantes
Do ponto de vista de Borges (2006), pode-se sugerir a para a realização de tarefas. É uma atividade em grupo que
utilização de atividades lúdicas nas escolas, contribuindo para preza pelas potencialidades individuais. Indicado para a
o melhor rendimento e aproveitamento dos alunos, infância.
auxiliando-os a obter melhores resultados no processo ensino Jogos combinados (exigem mais de uma aptidão física),
aprendizagem. O lúdico estabelece uma ponte entre o prazer e correr, saltar, giros.
a aprendizagem. Aquáticos - jogos realizados dentro da água, com excelente
valor terapêutico por diminuir o impacto causado pelo solo.
O Jogo como Recurso Pedagógico Jogos sensoriais - utilizam os sentidos (tato, visão, audição,
etc). Esses jogos desenvolvem o pensamento, diminui a tensão.
A utilização de jogos educativos no ambiente escolar traz Jogos Sociais de Mesa - jogos que são realizados na mesa,
muitas vantagens para o processo de ensino aprendizagem. O com caráter educativo, sem estimular os jogos de azar.
jogo favorece a aquisição de condutas cognitivas e Segundo Veríssimo de Melo (1981), ficariam em:
desenvolvimento de habilidades como coordenação, destreza, Jogos de Seleção - utilizada para a separação de equipes
rapidez, força, concentração, etc, contribui para a formação de e/ou participantes (par ou ímpar, palitinho);
atitudes sociais. Jogos Gráficos - realizado em cima de algum desenho ou
Através do jogo, a criança obtém prazer, realiza esforço traçado (amarelinha, xadrez);
espontâneo e voluntário para atingir o objetivo. O jogo é uma Jogos de Competição - disputa física entre os participantes
atividade que tem valor educacional intrínseco, mediante a (pegas, cabo de guerra);
qual a criança constrói a realidade. Jogos de Salão - motricidade fina em locais restritos e/ou
Por meio dos jogos é possível exercitar a imaginação, fechados (baralho, quebra - cabeça);
estimular a independência e a espontaneidade, promover o Jogos com Música - com ritmo (catinga de roda, karaokê).

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Segundo Mian (2003), os jogos são classificados em: Jogos quanto à dificuldade de execução:
Pequenos - regras fáceis e em menor quantidade, menor Pequenos - duração pequena e de regras fáceis e flexíveis -
número de participantes e locais restritos; combinadas;
Médios - com regras pré - estabelecidas, em locais maiores Grandes - duração de 10 a 20 minutos com as primeiras
como quadras ou piscina; regras preestabelecidas - preparam para os desportos e
Grandes - com regras pré - estabelecidas e complexas, em destina-se para alunos de 4ª série em diante.
maior quantidade e em locais grandes e abertos, com maior
números de participantes. Quanto à participação nas Atividades Físicas:
Segundo Guerra (1988), quanto a Forma de Participação: Ativa; Moderada; Calma;
Recreação Ativa e Recreação Passiva.
Psicomotricidade
Ativa:
Atividades Motoras - Exigência maior do físico. Ex. Jogos Psicomotricidade é a integração das funções motrizes e
Infantis e Esportes em Geral; mentais sob o efeito da Educação e do desenvolvimento do
Atividades Intelectuais - A mente é mais utilizada. Ex. sistema nervoso.
Xadrez e Quebra-cabeça; Fonseca (1988) comenta que a psicomotricidade é
Atividades Artísticas ou Criadoras - Ex. pintura, desenho, atualmente concebida como a integração superior da
carpintaria, escultura, teatro, música, etc. motricidade, produto de uma relação inteligível entre a criança
Atividades de Risco - Ex. àquela na qual o praticante coloca e o meio. É um instrumento privilegiado através do qual a
à prova sua integridade. Ex. paraquedismo, mergulho consciência se forma e se materializa.
profundo, voo livre etc. A educação psicomotora é a educação da criança através
do seu próprio corpo e do seu movimento proporcionando
Passiva: gradativamente o controle até o domínio dos movimentos
Atividades Sensoriais - Tem uma participação interativa mais complexos.
com a atividade. Segundo Fonseca (1988), são objetivos das atividades
Ex. Torcida no estádio - grita, balança os braços, salta psicomotoras:
participando emotiva e fisicamente. - vivenciar estímulos sensoriais para discriminar as partes
Atividades Transcendentais - Confunde-se com o Ócio pela do próprio corpo e exercer um controle sobre elas.
participação de espectador. Ex. Ver pinturas no museu, - Vivenciar através da percepção do próprio corpo em
contemplar o pôr-do-sol, relaxamento tranquilizante. relação aos objetos, a organização espacial e temporal.
- Aquisição dos pré-requisitos necessários à aprendizagem
Quanto à Faixa Etária as Recreações podem ser: da leitura e da escrita.
Adulta - para maiores de 18 anos; A aplicação dos conteúdos deverá respeitar a
Infanto-juvenil - para crianças de 8 a 12 anos; individualidade e o desenvolvimento psicológico da criança.
Juvenil - para Jovens acima de 12 anos;
Infantil - para crianças até os 7 anos; Coordenação Motora
Mista - para várias faixas etárias - como pais e filhos juntos;
Terceira Idade ou Idade Especial - para idosos. É a ação de combinar diversos grupos musculares, através
do sistema nervoso central, para a execução de uma série de
Quanto ao espaço as recreações podem ser internas e movimentos e ações com o máximo de eficiência e economia
externas: de energia.
Segundo Newell (1986), a coordenação envolve
Internas: necessariamente relações próprias múltiplas entre diferentes
Salas de Festas; Ginásios Esportivos; Salas de Ginásticas, componentes, definidas em uma escala espaço-temporal. Um
de Musculação; de Danças Modernas ou Clássicas; Salas de padrão “ótimo” de coordenação é estabelecido pelo controle
Música; de Leitura; de Projeção; da interação das restrições da tarefa, do organismo e do
Piscinas Térmicas, Saunas, Duchas; Salões de Jogos - ambiente.
sinuca, bilhar, tênis de mesa, totó, bilhar, boliche; Salões de Falhas na coordenação motora podem ser acusadas pela
Jogos de Mesa - buraco, biriba, paciência, xadrez, dama; deficiência de movimentos na primeira infância. Devemos
Estandes Fechados - tiro ao alvo e arco e flecha; Sala de Jogos oferecer o máximo de experiência de movimentos
Eletrônicos. coordenados à criança.
Entre todas as qualidades físicas, podemos situar a
Externas: coordenação motora como de grande importância para a
Campos - Futebol, beisebol, golfe; Quadras poliesportivas atividade escolar.
– esportes individuais e coletivos; Playgrounds infantis;
Piscinas; Pátios para comemoração de datas especiais; Pistas Coordenação motora fina
de Atletismo; Hortos com pistas diversas, quadras, lagos,
ciclovias entre outros. Segundo Rocha (2007), é a capacidade de usar de forma
eficiente e precisa os pequenos músculos, produzindo assim
Quanto ao ambiente: movimentos delicados e específicos (complexos). Este tipo de
Atividades Terrestres; coordenação permite dominar o ambiente, propiciando
Atividades Marinhas, Náuticas ou Aquáticas; manuseio dos objetos.
Atividades Aéreas. É uma coordenação segmentada normalmente com a
utilização das mãos exigindo precisão nos movimentos para a
Classificação de jogos por séries - de acordo à faixa etária; realização de tarefas complexas.
Quanto ao Local: - recortar
Jogos de Campo - com bolas, jogos de correr, jogos de - colar
agilidade; - encaixar peças
Jogos de Salão - Sensoriais, motores, psíquicos - completar figuras seguindo a numeração
(intelectuais e afetivos) para dias de chuva; - escrever o nome de dois tipos de letras, etc.

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Coordenação viso-motora de brincadeiras, explicam as condições de vida a que estão


submetidas e seus anseios e desejos.
É a habilidade de coordenar a visão com movimentos do Quando se assiste crianças brincando, o que mais sobressai
corpo. E segundo Cabral (2007), na ausência de uma adequada é o prazer que elas experimentam ao participarem das
coordenação viso-motora, a criança se mostra desajeitada em atividades. Sinais de alegria, risos, certa excitação, são
todas as suas ações apresentando dificuldades na escola. O componentes desse prazer, embora a contribuição do brincar
desenvolvimento de uma boa coordenação motora geral é vá bem mais além do que propiciar a descarga das tensões
indispensável como pré-requisito. internas ou à satisfação de impulsos parciais. Em verdade,
- tentar acertar alvos fixos e móveis. brincar obedece a um princípio de prazer e a um princípio de
- Correr, lançar e receber objetos durante a corrida. realidade, na medida em que constitui um modo de satisfação
- Rolar, conduzir objetos em corrida e por entre obstáculos. elaborado e diferente no qual a criança age física e
mentalmente.
Coordenação motora grosseira A atividade lúdica é um poderoso instrumento para o
equilíbrio psicológico, pois, procurando lutar contra a
De acordo com Cabral (2007), a coordenação motora angústia, o ego explora cada um dos mecanismos ligados à
grossa ou geral é aquela que visa utilizar os grandes músculos realização dos desejos. E graças a um processo complicado e
(esqueléticos) de forma mais eficaz tornando o espaço mais que mobiliza todas as energias do ego, os brinquedos das
tolerável à dominação do corpo. crianças transformam a angústia em prazer.
Para as crianças é mais fácil fazer movimentos simétricos A vivencia concreta de situações transferidas da vida real
e simultâneos, pois só numa segunda etapa é que ela para o plano lúdico pela criança, embora de modo elementar,
movimentará os membros separadamente. representa um conjunto de aquisições de grande utilidade
- Saltar e saltitar sobre objetos. para o futuro adulto. Além disso, as diversas transições do
- Corrida lateral e cruzando as pernas. processo evolutivo do indivíduo encontram na atividade
- Rolar para frente e para trás. lúdica um elemento suavizador dos problemas que surgem.
- Executar sequências de movimentos com braços e pernas
simultâneos ou não, numa segunda fase, de forma lenta até
realizá-los em velocidade.
A Educação Física tem como tarefa resgatar a brincadeira 6. O papel das Artes na
infantil transformada em movimentos. Nesse sentido, Freire
(1997), enfoca que no 1º e 2º ciclo do Ensino Fundamental os educação infantil
atos motores são indispensáveis não só na relação com o
mundo, mas, na compreensão dessas relações.
Ao utilizar os sentidos, estimulando a percepção, a criança
escolhe o que pode criar, adquirindo noções de espaço, de Em relação à arte na educação, é importante destacar as
tempo, lateralidade, coordenação motora, atenção e equilíbrio, possibilidades de aprendizagem e a importância da arte na
que levam a uma aprendizagem, capacitando-os para a educação. Antes de ser preparado para explicar a importância
vivência social. da arte na educação, o professor deverá estar preparado para
entender e explicar a função da arte para o indivíduo e a
A criança e o movimento sociedade54.
O papel da arte na educação é grandemente afetado pelo
Segundo os PCN’s (1997), crianças de oito a dez anos modo como o professor e o aluno veem o papel da arte fora da
apresentam raciocínio concreto e abstrato, memória, escola.
capacidade de reflexo e o convívio grupal que é imprescindível. Como diz Barbosa, 1975: “A arte não tem importância para
As recreações através das atividades de jogos e brincadeiras o homem somente como instrumento para desenvolver sua
são favoráveis para o desenvolvimento da criança, recomenda- criatividade, sua percepção, etc.; mas tem importância em si
se também atividades de ação e raciocínio. Considera-se que a mesma, como assunto, como objeto de estudos”.
faixa etária de seis a doze anos como período em que há nas Ao enfatizar que o professor de arte deve assumir em suas
crianças grande necessidade de movimentarem-se. De dez a aulas um conceito central forte, vinculado às referencias
doze anos especialmente é a fase decisiva para aptidão artísticas, e que a sua principal finalidade deve ser evolução do
esportiva. É importante permitir à criança vivência de domínio dos procedimentos estéticos.
movimentos diversificados já que a faixa etária em estudo Para repensarmos e realizarmos cursos de Arte na escola,
apresenta grande interesse e necessidade de movimentação. Vicente Lanier nos lembra que: Evidentemente, cada aluno em
particular – criança ou adulto – terá seus próprios interesses
Atividade lúdica infantil estéticos, ponto a partir do qual pode ser levado para um
envolvimento mais amplo. Para um, poderá ser a colcha da
A infância é, por excelência, a idade do jogo. A criança nele vovó, para outro, posters de aristas. Devemos explorar esses
coloca seu próprio nível de competência na vida, querendo ser interesses pessoais. Entretanto, os currículos são
bem sucedida em sua execução. É um período crítico em que normalmente planejados para grupos e não para indivíduos e,
ela começa a tomar consciência de suas limitações e de suas portanto, é importante identificar ou prever aquelas artes
capacidades pessoais. CDOF (2207). populares que podem servir como o dominador comum mais
Segundo os RCN/Infantil (Brasil, 1998: p. 21). As crianças abrangente do interesse da juventude. [...] Contudo, mesmo o
possuem uma natureza singular, que as caracteriza como seres mais contemporâneo conteúdo de curso não irá garantir o tipo
que sentem e pensam o mundo de um jeito muito próprio. Nas de crescimento que nossa ideia de conceito central forte
interações que estabelecem desde cedo com as pessoas que lhe sugere, se não estiver implementado por procedimentos
são mais próximas e com o meio que as circunda, as crianças adequados em sala de aula. Se reduzirmos o currículo de Arte
revelam seu esforço para compreender o mundo em que ao bordados, produção de filmes ou vídeo – teipes, desenho ou
vivem, as relações contraditórias que presenciam e, por meio recriação de espaços urbanos, produção de histórias em
quadrinhos, m suma, desenvolvendo todas essas atividades de

54 Texto adaptado de GARCIA, J. F. D. e LOPES, L. F.

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ateliê, de que os professores gostam muito, mesmo incluindo profissionais da educação, no intuito de perceber os aspectos
o folclore, a arte popular e a média, o mais provável é que frágeis com relação a arte no contexto escolar, diagnosticando
nossos alunos estarão essencialmente limitados no a realidade para construir coletivamente novas proposições.
crescimento que poderíamos provocar neles. Assim, tem surgido a necessidade de novos constructos
O trabalho com arte na escola tem uma amplitude limitada, para a arte na educação infantil, no sentido de desenvolver
mas ainda há possibilidades dessa ação educativa ser práxis nas quais haja a total integração do profissional da
quantitativa e qualitativamente bem feita. Para isso, seu educação infantil, do profissional da arte na educação, das
professor precisa encontrar condições de aperfeiçoar-se crianças, da instituição e da comunidade. Esta abordagem tem
continuamente, tanto em saberes artísticos e sua história, se mostrado eficiente e consolidada para a educação infantil na
quanto em saberes sobre a organização e o desenvolvimento Itália, sendo disseminada em outros países. Obviamente,
do trabalho de educação escolar em arte. entende-se que cada espaço possui especificidades próprias
Para a realização de cursos de arte com qualidade, Libâneo, que devem ser respeitadas. Portanto, a ideia não é a de adotar
1991, diz: Não é suficiente dizer que os alunos precisam modelos estrangeiros, mas de tê-los como possibilidade de
dominar os conhecimentos, é necessário dizer como fazê-lo, referência.
isto é, investigar objetivos e métodos seguros e eficazes para a Nesta perspectiva, entende-se por novos constructos
assimilação dos conhecimentos. [...] O ensino somente é bem propostas que partem de uma visão de currículo não linear ou
sucedido quando os objetivos do professor coincidem com os sistêmico, considerando o contexto histórico-social, as
objetivos de estudos do aluno e é praticado tendo em vista o necessidades e interesses das crianças, no qual educadores,
desenvolvimento das suas forças intelectuais. [...] Quando crianças, instituição e comunidade desenham um currículo
mencionamos que a finalidade do processo de ensino é que parte do trabalho coletivo.
proporcionar aos alunos os meios para que assimilem Apresentam objetivos educacionais gerais, mas não
ativamente os conhecimentos é porque a natureza do trabalho formulam objetivos específicos para cada projeto ou atividade
docente é a mediação da relação cognitiva entre o aluno e as de antemão. Em vez disso, formulam hipóteses sobre o que
matérias de ensino. (1991). poderia ocorrer com base em seu conhecimento das crianças e
das experiências anteriores.”
Propostas de ensino A partir dessa visão, especificamente para a arte na
educação infantil está o educador em arte, que atua em
A linguagem da arte na educação infantil tem um papel consonância com os demais educadores da instituição,
fundamental, envolvendo os aspectos cognitivos, sensíveis e aprofundando conceitos e linguagens da arte. A função do
culturais. Até bem pouco tempo o aspecto cognitivo não era profissional em arte na educação não é simplesmente
considerado na a educação infantil e esta não estava integrada ministrar aulas fragmentadas de arte, mas, sobretudo de
na educação básica. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação organizar um espaço de cultura que possibilite a ampliação das
9.394/96 veio garantir este espaço à educação infantil, bem expressões e das linguagens da criança.
como o da arte neste contexto. Como historicamente pode-se observar, a arte na educação
Para compreender a arte no espaço da educação infantil no infantil possuía um perfil de recreação e de desenvolvimento
momento atual, mesmo que brevemente, é preciso situar o emotivo e motor. Hoje, a arte na educação infantil está em
panorama histórico das décadas de 80 e 90. Os referenciais processo de rupturas e transformações, exigindo das políticas
que fundamentavam as práxis do profissional da educação educacionais, dos cursos de Formação de Professores,
infantil eram os Cadernos de Atendimento ao Pré-escolar, especialmente das Licenciaturas em Arte, um
criados pelo Ministério da Educação e Cultura – MEC. Os textos comprometimento com os aspectos cognitivos, sensíveis e
destes Cadernos para aquele momento histórico tiveram culturais. Cabe então, a todos os profissionais que atuam direta
contribuição fundamental como subsídio para as ações dos ou indiretamente com o ensino da arte, uma reflexão não
educadores atuantes na educação infantil. Entretanto, vale somente dos processos de sala de aula, mas também do seu
ressaltar que eles priorizavam pouco conhecimento, papel como cidadãos, protagonistas de uma história.
centrando-se apenas nas questões emocionais, afetivas e
psicológicas e nas etapas evolutivas da criança. Com relação à Questionamentos sobre a arte na educação infantil
arte na educação, os pressupostos eram muito mais voltados à
recreação do que às articulações com a arte, a cultura e a Arte! O que é arte? Com certeza já ouvimos mães e
estética. Como exemplo, é possível citar a ênfase em exercícios professoras dizerem: esse menino/menina é muito arteiro/a,
bidimensionais que priorizava desenhos e pinturas chapadas. mas será que arteiro tem alguma coisa haver com arte? Bem,
Ou seja, os conceitos sobre arte resumiam-se a simples arteiro segundo minhas pesquisas significa alguém levado, que
técnicas. faz traquinagens, travesso etc. E a arte? Bem, segundo o
De acordo com Pillotto: É interessante observar que esse AULETE (dicionário digital), e a capacidade e aptidão do ser
Caderno, embora tenha uma fundamentação teórica voltada às humano de aplicar conhecimentos e habilidade na execução de
concepções do ensino da arte modernista, na sua essência é uma ideia, de um pensamento. É também uma atividade
muito mais tecnicista no que diz respeito aos exercícios criadora do espírito humano, que busca representar as
repetitivos, mecânicos e sem a preocupação com a reflexão dos experiências coletivas ou individuais através de uma
conceitos. impressão estética, sensorial, emocional, cognitiva, sociais,
Na década de 90, o MEC lança o Caderno do Professor da éticas e estéticas. Bom, então a uma íntima relação entre arte
Pré-Escola, com uma abordagem contextualizada, na qual a e arteiro. Isso me leva a dizer todo/a artista é arteiro, pois,
arte deixa de ser tratada apenas como atividade prática e de quão “chatas” seriam as músicas, pinturas, danças, literatura
lazer, incorporando o ato reflexivo. Apesar dessas etc. Seria tudo muito monótono quase sem vida.
transformações, a arte permanecia ainda com foco em Assim, a arte é um fenômeno eminentemente humano.
abordagens psicológicas e temáticas. A arte na educação Através dela damos sentidos e significados ao mundo que nos
infantil nesta década ainda buscava uma consistência teórica, rodeia, que aprimore estranho e sem sentido, ao poucos, por
conceitual e metodológica. A partir de 2000 as discussões meio da arte, de suas dimensões simbólicas, ganham poder
reflexivas sobre a arte na educação infantil ganham novos expressivo de representar ideias através de linguagens
espaços na literatura, nas propostas curriculares e particulares, como a literatura, a dança, a música, o teatro, a
especialmente na pesquisa. O objetivo é avaliar reflexivamente arquitetura, a fotografia, o desenho, a pintura, entre outras
as ações dos programas de educação continuada para formas expressivas. Deste modo, a arte, vai tornando este

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mundo que o humano o transformou em um lugar de exclusão De acordo com Leão, 2008: Sendo a escola o primeiro
e morte em um ambiente mais belo e prazeroso de se viver. espaço formal onde se dá o desenvolvimento de cidadãos, nada
Mas o que tudo isso tem a ver com educação e melhor que por aí se dê o contato sistematizado com o
especialmente com a educação infantil? Para responder a esta universo artístico e suas linguagens: artes visuais, teatro,
indagação, farei um breve retrospecto da educação infantil e dança, música e literatura. No entanto, é perceptível que o
com base nos dados analisarei o papel da arte, sua trato dado à arte (ou o ensino da arte) sempre fica em segundo
importância, seu lugar, e sua relevância. plano e seu fazer é reduzido a mera atividade de lazer e
Na Idade Média, no regime feudalista, a criança era recreação em um processo extremamente mecânico.
considerada um pequeno adulto, que executava as mesmas Com relação a como fazer isso dentro da sala de aula ou na
atividades dos mais velhos. A partir do século XVI com o escola, vai estar diretamente atrelado ao que está exposto
advento da burguesia, surgem neste momento duas atitudes acima. Desse modo os/as educadores/as em primeiro lugar,
contraditórias no que se refere à concepção de criança: uma a precisam acreditar nas crianças. Acreditar que elas, mesmo
considera ingênua, inocente e é traduzida pela paparicação diante das mais diversas dificuldades, tanto de materiais como
dos adultos; enquanto a outra a considerava imperfeita e de recursos humanos são capazes de produzir, de criar, de
incompleta e é traduzida pela necessidade do adulto moralizar representar, de pensar sobre.
a criança. Assim, ainda na sociedade burguesa ela passa a ser Sem essa percepção inicial por partes dos/as
alguém que precisa ser cuidada, escolarizada e preparada para educadores/as poderemos ter todos os recursos possíveis e o
uma atuação futura. fazer artístico ficará ainda reduzido às atividades de
Por outro lado a avanços interessantes, na visão de coordenação motora, de passa tempo, de conotação
Rousseau a criança não poderia ser meramente considerada decorativa, etc.
como um adulto em miniatura, “mas que ela vive em um Nesse sentido, a arte não pode reduzir-se num elemento
mundo próprio cabendo ao adulto compreendê-la.”. Já em decorativo e festeiro. A arte valoriza a organização do mundo
meados do século XX com alguns movimentos de renovação da criança, assim como o relacionamento com o outro e com o
pedagógica que caminhavam em direção ao que denominamos seu meio. Estimular o ensino da arte nesta perspectiva tornará
“movimentos das escolas novas”, podemos observar assim, a escola um espaço vivo, contribuindo assim para o
algumas sensíveis mudanças. A educação da criança que era desenvolvimento pleno de seus educandos.
extremamente formalista baseada nos estudos tradicionais de
livros e textos começava a se voltar para os interesses e
necessidades das crianças. 7. A rotina na educação
No entanto, a sociedade capitalista, através da ideologia
burguesa, caracteriza e concebe a criança como um ser a -
infantil
histórico, acrítico, fraco e incompetente, economicamente não
produtivo, que o adulto deve cuidar.
No século XX devido ao grande hiato existente entre ricos Rotina
e pobres surgem as políticas compensatórias para suprir as
deficiências de saúde, nutrição, educação e as do meio sócio É praticamente impossível a reflexão sobre a organização
cultural. Por causa disso, foi instituída a educação pré-escolar do tempo na Educação Infantil sem incluir a rotina pedagógica.
(chamada educação compensatória) para crianças de quatro a Entretanto, é importante enfatizar que a rotina é apenas um
cinco anos e tinha como objetivo suprir as carências culturais dos elementos que compõem o cotidiano, como veremos a
existentes na educação familiar da classe baixa a fim de que seguir. Geralmente, a rotina abrange recepção, roda de
elas se preparem para um trabalho e tenham oportunidade de conversa, calendário e clima, alimentação, higiene, atividades
ascensão social. de pintura e desenho, descanso, brincadeira livre ou dirigida,
Com relação à criança como sujeito de direitos a narração de histórias, entre outras ações. Ao planejar a rotina
Constituição de 1988 faz referência a direitos específicos das de sua sala de aula, o professor deve considerar os elementos:
crianças e define como direito da criança de 0 a 6 anos de idade materiais, espaço e tempo, bem como os sujeitos que estarão
e dever do Estado o “atendimento em creche e pré-escola”, e envolvidos nas atividades, pois esta deve adequar-se à
em seu artigo 227 define, mais amplamente, os direitos da realidade das crianças55.
infância brasileira. Segundo Barbosa a rotina é “a espinha dorsal, a parte fixa
É dever da família”, da sociedade e do Estado assegurar à do cotidiano”, um artefato cultural criado para organizar a
criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à cotidianidade. A partir dessa premissa, é importante definir
vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à rotina e cotidiano: Rotina - É uma categoria pedagógica que os
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à responsáveis pela educação infantil estruturaram para, a
liberdade e a convivência familiar comunitária. partir dela, desenvolver o trabalho cotidiano nas instituições
Deste modo, neste pequeno recorte não tem como objetivo de educação infantil. [...] A importância das rotinas na
abarcar toda a complexidade da temática em foco, pois, não educação infantil provêm da possibilidade de constituir uma
seria possível diante das dimensões deste trabalho, mas visão própria como concretização paradigmática de uma
apenas captar como eram vistas e pensadas a criança ao longo concepção de educação e de cuidado (Barbosa). Cotidiano – [...]
da história, o papel das instituições de ensino e as políticas refere-se a um espaço-tempo fundamental para a vida
públicas, bem como sua influência nos processos pedagógicos humana, pois tanto é nele que acontecem as atividades
na contemporaneidade. Como vimos, as crianças foram repetitivas, rotineiras, triviais, como também ele é o lócus
pensadas de muitas maneiras e sempre pela ótica do adulto e onde há a possibilidade de encontrar o inesperado, onde há
pelos mecanismos ideológicos que sempre viram as crianças margem para a inovação [...]. José Machado Pais afirma que não
pelo que elas não eram, sem nunca compreender o que eram. se pode reduzir o cotidiano ao rotineiro, ao repetitivo e ao a-
Portanto, pensar a educação infantil sem mensurar as histórico, pois o cotidiano é o cruzamento de múltiplas
construções sócio históricas que foram construídas em torno dialéticas entre o rotineiro e o acontecimento (Barbosa).
das crianças é incorrer em possíveis erros. Bem elaborada, a rotina é o caminho para evitar a atividade
pela atividade, os rituais repetitivos, a reprodução de regras,

55 Texto adaptado produzido pela Secretaria de Estado de Educação do Distrito


Federal, disponível em http://www.sinprodf.org.br/wp-
content/uploads/2014/03/2-educacao-infantil.pdf

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os fazeres automáticos. Para tanto, é fundamental que a rotina essencial abrir espaço e reservar tempo para as brincadeiras,
seja dinâmica, flexível, surpreendente. Barbosa aponta que a sejam livres, sejam dirigidas.
rotina inflexível e desinteressante pode vir a ser “uma Não se pode ignorar o fato de que muitas das ações da
tecnologia de alienação”, se não forem levados em rotina estão pautadas nas relações de trabalho do mundo
consideração o ritmo, a participação, a relação com o mundo, adulto. Os horários de lanche, almoço, limpeza das salas,
a realização, a fruição, a liberdade, a consciência, a imaginação funcionamento da cozinha, as atividades das crianças estão
e as diversas formas de sociabilidade dos sujeitos nela sintonizadas de acordo com a produtividade, a organização e a
envolvidos. A rotina é uma forma de organizar o coletivo eficácia que estão implicadas em uma organização capitalista.
infantil diário e, concomitantemente, espelha o projeto Por vezes, as crianças querem ou propõem outros elementos
político-pedagógico da instituição. A rotina é capaz de que transgridam as formalidades da rotina, das jornadas
apresentar quais as concepções de educação, de criança e de integrais ou parciais, dos momentos instituídos pelos
infância se materializam no cotidiano escolar. Com o profissionais, sejam no sono, na alimentação, na higiene, na
estabelecimento de objetivos claros e coerentes, a rotina “hora da atividade”, nas brincadeiras, entre outros.
promove aprendizagens significativas, desenvolve a A partir da observação, é possível detectar como as
autonomia e a identidade, propicia o movimento corporal, a crianças vivem o cotidiano da instituição. Esses sinais das
estimulação dos sentidos, a sensação de segurança e confiança, crianças ajudam a apontar possibilidades que não se limitam
o suprimento das necessidades biológicas (alimentação, às rotinas formalizadas e dão subsídios para trazer à tona a
higiene e repouso). Isto porque a rotina contém elementos que valorização da infância em suas relações e práticas. Os
podem (ou não) proporcionar o bem-estar e o profissionais, em muitos momentos, percebem no contato
desenvolvimento cognitivo, afetivo, social, biológico. diário com as crianças que entre elas coexistem necessidades
De acordo com o Referencial Curricular Nacional para e ritmos diferentes. Mostram-se preocupados em não
Educação Infantil (1998), a rotina deve adequar-se às conseguir atender essa diversidade para que as crianças
necessidades infantis e não o inverso. Ao observar e possam vivenciá-la. Oscilam entre cumprir a tarefa que é
documentar uma rotina (diária ou semanal, por exemplo), ordenar e impor a sincronia e, ao mesmo tempo, abrir espaço
algumas reflexões emergem: para deixar aparecerem as individualidades, a simultaneidade,
- Como as atividades são distribuídas ao longo do dia? E da a “desordem” (BATISTA).
semana? Desta forma, vivem cotidianamente um dilema, que é o de
- Com que frequência, em que momento e por quanto respeitar e partilhar a individualidade, a heterogeneidade, os
tempo as crianças brincam? diferentes modos de ser criança ou seguir a rotina
- Quanto do dia é dedicado à leitura de histórias, inclusive estabelecida, cuja tendência é a uniformização, a
para os bebês? homogeneidade, a rigidez que por vezes permeia as práticas
- A duração e a regularidade das atividades têm assegurado educativas. Assim, o grande desafio dos profissionais que
a aquisição das aprendizagens planejadas? atuam na Educação Infantil é o de preconizar novas formas de
- A criança passa muito tempo esperando entre uma e intervenção, distinta do modelo de educação fundamental e,
outra atividade? consequentemente, com sentido educativo próprio
- Como é organizado o horário das refeições? Onde são (BATISTA). Cresce a relevância do planejamento cuidadoso,
feitas? flexível, reflexivo que minimiza o perigo da rotina “cair na
- E os momentos dedicados ao cuidado físico, são previstos rotina”, no pior sentido da expressão: ser monótona,
e efetivados com que frequência e envolvem quais materiais? impessoal, sem graça, vazia, sem sentido para as crianças e até
- Como o horário diário de atividades poderia ser para os profissionais. Para tanto, conflito e tensão são
aperfeiçoado, em favor de uma melhor aprendizagem? elementos que estarão presentes e contrapõem-se a uma
- Há espaço para o imprevisto, o incidental, a imaginação, o prática pedagógica idealizada. Como diz a poeta Elisa Lucinda:
fortuito? “O enredo a gente sempre todo dia tece, o destino aí acontece
- As crianças são ouvidas e cooperam na seleção e (...)”.
organização das atividades da rotina?
- Como as interações adulto/criança e criança/criança são Datas comemorativas
contempladas na organização dos tempos, materiais e A exploração das datas, festejos, eventos comemorativos
ambientes? no calendário da Educação Infantil está bastante naturalizada
No caso da jornada em tempo integral, no período da nas instituições da Educação Infantil. Essas datas são
manhã devem ser incluídos momentos ativos e calmos, dando geralmente, a “tradição cívica, religiosa ou escolar”.
prioridade às atividades cognitivas. As crianças, depois de uma Entretanto, a tradição não pode obscurecer a necessidade da
noite de sono, estão mais descansadas para ampliar sua reflexão acerca da comemoração de “dias D”. Sousa adverte ser
capacidade de concentração e interesse em atividades que fundamental que “as escolas, professores e pais tenham muito
envolvem a resolução de problemas. É interessante, também, claro que é preciso priorizar sempre e entender qual o
incluir atividades físicas no período da manhã, observando o significado do conjunto dessas experiências para a vida das
tempo e a intensidade de calor e sol ou frio. Já o período da crianças – de todas e de cada uma delas. E não me refiro ao
tarde, em uma jornada de tempo integral, geralmente acaba futuro da criança apenas, mas principalmente ao seu
por concentrar atividades como sono ou repouso, refeições, presente”. Não nos cabe interditar ou eliminar a comemoração
banho, ou seja, as práticas sociais. O que não significa que as de datas especiais e a realização de festas. No entanto,
Interações com a Natureza e a Sociedade, as Linguagens Oral e propomos que, ao destacá-las no calendário escolar, façamos
Escrita, Digital, Matemática, Corporal, Artística e o Cuidado algumas reflexões. Entre elas:
Consigo e com o Outro não estejam presentes por meio de - Por que a instituição acredita ser válida a mobilização
atividades planejadas para surpreender e motivar em uma para celebrar este ou aquele dia?
sequência temporal que corre o risco da monotonia ou da - Por que é necessário realizar atividades acerca das datas
“linha de montagem”. comemorativas, todos os anos, com poucas variações em torno
Nas jornadas de tempo parcial, por serem mais curtas, as do mesmo tema?
práticas sociais aparecem com menor frequência, ainda que - As atividades relacionadas à temática ampliam o campo
também estejam presentes. As Linguagens, as Interações com de conhecimento das crianças?
a Natureza e a Sociedade e o Cuidado Consigo e com o Outro - Foram atividades escolhidas pelo professor, pelo coletivo
são geralmente o foco do trabalho pedagógico. Também é da instituição educacional, pela família ou pelas crianças?

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- Os sentimentos infantis e aprendizagens são levados em longo do ano, utilizar os materiais produzidos pelas
conta? próprias crianças para colorir e significar o espaço da sala
- O trabalho desenvolvido em torno das datas está de aula.
articulado com os objetivos relacionados às aprendizagens?
- Será que as crianças são submetidas, ao longo dos anos Organização do trabalho pedagógico – materiais,
escolares, às mesmas atividades, ações, explicações? ambientes, tempos, atividades.
- Consideramos as idades das crianças, seus interesses e Para mediar as aprendizagens promotoras do
capacidades ao elegermos as datas comemorativas? desenvolvimento infantil, é preciso tencionar uma ação
- Fazemos diferentes abordagens para diferentes faixas educativa devidamente planejada, efetiva e avaliada. Por isto,
etárias? é imprescindível pensar o tempo, os ambientes e os materiais.
- Interrompemos trabalhos em andamento para incluir Ressalte-se, entretanto, que o que determina as aprendizagens
datas comemorativas? não são os elementos em si, mas as relações propostas e
- Quais são os critérios para a escolha das datas? Algumas estabelecidas com eles.
são mais enfatizadas que outras? Por quê?
- Os conteúdos e as atividades são problematizados pelos Materiais: os materiais compõem as situações de
adultos e crianças? aprendizagem quando usados de maneira dinâmica,
- Expomos as crianças, ainda que não intencionalmente, à apropriada à faixa etária e aos objetivos da intervenção
“indústria das festas”? pedagógica. Assim, materiais são objetos, livros, impressos de
- Incentivamos, ainda que não intencionalmente, a cultura modo geral, brinquedos, jogos, papéis, tecidos, fantasias,
do consumo? tapetes, almofadas, massas de modelar, tintas, madeiras,
- Como são tratados os aspectos culturais destas datas? Sob gravetos, figuras, ferramentas, etc. Podem ser recicláveis,
qual enfoque? Com qual aprofundamento? industrializados, artesanais, de uso individual e ou coletivo,
- Quais valores, conceitos, ideologias atravessam essas sonoros, visuais, riscantes e/ou manipuláveis, de diferentes
celebrações? tamanhos, cores, pesos e texturas, com diferentes
Coletivamente, promover a crítica e a reflexão em torno propriedades. Entretanto, a intencionalidade pedagógica não
das datas comemorativas auxilia na problematização de pode ignorar ou ir além da capacidade da criança de tudo
experiências curriculares que, em um primeiro momento, transformar, de simbolizar, de desprender-se do mundo dos
podem parecer “inquestionáveis”. O que importa é tornar adultos e ver possibilidades nos restos, nos destroços, no que
datas e festas significativas e lúdicas para a criança, é desprezado. Significa dizer que as crianças produzem cultura
priorizando-a como centro do planejamento curricular, suas e são produto delas, de modo que a interpretação e releitura
aprendizagens e seu desenvolvimento, sua cidadania. que a criança faz do mundo e das coisas que estão a sua volta
Retomando: ao organizar tempo, ambientes e materiais, o reverte-se em possibilidades de novos conhecimentos e
profissional deve ter em mente a criança concreta. O aprendizagens. Um objeto, um livro, um brinquedo podem
planejamento curricular deve considerar a riqueza e a oportunizar diferentes ações, permitir a exploração e
complexidade da primeira etapa da Educação Básica. propiciar interações entre as crianças e os adultos. Para tanto,
O campo de aprendizagens que as crianças podem realizar é fundamental que os materiais:
na Educação Infantil é muito grande. As situações cotidianas - provoquem, desafiem, estimulem a curiosidade, a
criadas nas creches e pré-escolas podem ampliar as imaginação e a aprendizagem; fiquem ao alcance da criança,
possibilidades das crianças viverem a infância e aprenderem a tanto para serem acessados quanto para serem guardados;
conviver, brincar e desenvolver projetos em grupo, expressar- - estejam disponíveis para o uso frequente e ativo;
se, comunicar-se, criar e reconhecer novas linguagens, ouvir e - não tragam danos à saúde infantil;
recontar histórias lidas, ter iniciativa para escolher uma - sejam analisados e selecionados em função das
atividade, buscar soluções para problemas e conflitos, ouvir aprendizagens e dos possíveis sentidos que as crianças
poemas, conversar sobre o crescimento de algumas plantas possam atribuir-lhes;
que são por elas cuidadas, colecionar objetos, participar de - estejam adequados às crianças com deficiência visual,
brincadeiras de roda, brincar de faz de conta, de casinha ou de auditiva ou física, com transtornos globais, com altas
ir à venda, calcular quantas balas há em uma vasilha para habilidades / superdotação;
distribuí-las pelas crianças presentes, aprender a arremessar - contemplem a diversidade social, religiosa, cultural,
uma bola em um cesto, cuidar de sua higiene e de sua étnico-racial e linguística;
organização pessoal, cuidar dos colegas que necessitam de - possam ser colhidos e explorados em diversos ambientes,
ajuda e do ambiente, compreender suas emoções e sua forma para além das salas de atividades, mas também em pátios,
de reagir às situações, construir as primeiras hipóteses, por parques, quadras, jardins, praças, hortas etc;
exemplo, sobre o uso da linguagem escrita, e formular um - sejam analisados e selecionados em função das
sentido de si mesmas (OLIVEIRA). O que caracteriza uma aprendizagens e de acordo com a idade.
instituição de Educação Infantil, que se diferencia de outros de
locais de convivências, sejam públicos ou privados, é Ambientes: quando planejamos, algumas questões nos
justamente a intencionalidade do projeto educativo, a norteiam: que tipos de atividades serão selecionadas, em que
especificidade da escola como agência que promove as momentos serão feitas e qual o local mais adequado realizá-
aprendizagens (FERREIRA). las? A depender do espaço físico, podem ser mais qualitativas
as aquisições sensoriais e cognitivas das crianças. O espaço é
Dica: Sempre devemos considerar, na montagem das elemento fundamental para o desenvolvimento infantil. E qual
salas de Educação Infantil, os diferentes conhecimentos e a relação entre espaço e ambiente? Espaço e ambientes são
linguagens que compõem o currículo, entre eles a leitura, elementos indissociáveis, ou seja, um não se constitui sem o
escrita, matemática, artes, música, ciências sociais e outro. Dessa forma, apreende-se do termo espaço como as
naturais, corpo e movimento. Ter material adequado, possibilidades de abstração feita pelo ser humano, sobre um
intencionalmente selecionado para as atividades, contribui determinado lugar, de modo a torná-lo palpável. Já ambiente é
significativamente para o aprendizado. É Importante constituído por inúmeros significados, que são ressignificados
também ter os nomes das crianças em destaque como na pelo sujeito de acordo com suas experiências, vivências e
latinha de lápis de cor ou giz de cera, assim como o varal de culturas. Os ambientes da Educação Infantil têm como centro
alfabeto, a tabela numérica e o calendário e sempre, ao a criança e precisam ser organizados em função de suas

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necessidades e interesses, inclusive com mobiliário adequado. atividades, temas geradores, projetos, vivências e outras
É interessante que permitam explorações individuais, grupais, práticas sejam res-significadas, sejam objetos de reflexão,
simultâneas, livres e/ou dirigidas pelos profissionais. Para colocando as crianças em “situação de aprendizagem”
tanto, é fundamental que os ambientes sejam organizados para (JUNQUEIRA FILHO). Interessa, portanto, dialogar
favorecer: historicamente com essas práticas, reexaminá-las e restituí-las
- construção da identidade da criança como agente que na organização do trabalho pedagógico.
integra e transforma o espaço; Existem muitas possibilidades de organização do trabalho
- desenvolvimento da independência. Por exemplo: tomar pedagógico ao longo da jornada diária, semanal, bimestral.
água sozinha, alcançar o interruptor de luz, ter acesso à Elegemos quatro situações didáticas que podem
saboneteira e toalhas, circular e orientar-se com segurança integrar/articular as linguagens não somente em cada turma,
pela instituição; mas também no coletivo escolar. Em qualquer uma das
- amplitude e segurança para que a criança explore seus situações didáticas, cabe levar em consideração os objetivos,
movimentos corporais (arrastar-se, correr, pular, puxar conteúdos, materiais, espaços / ambientes, tempos, interesses
objetos, etc.); e características das crianças. Ou seja, ter sempre em mente:
- possibilidades estimuladoras dos sentidos das crianças, onde está a criança nas situações de aprendizagem propostas
em relação a odores, iluminação, sons, sensação tátil e visual, pelos professores?
entre outros; Atividades permanentes: ocorrem com regularidade
- observância da organização do espaço para que seja um (diária, semanal, quinzenal, mensal) e têm a função de
ambiente estimulante, agradável, seguro, funcional e propício familiarizar as crianças com determinadas experiências de
à faixa etária; aprendizagem. Asseguram o contato da criança com rotinas
- garantia da acessibilidade a crianças e adultos com visão básicas para a aquisição de certas aprendizagens, visto que a
ou locomoção limitada; constância possibilita a construção do conhecimento. É
- organização que evite, ao máximo, acidentes e conflitos; importante planejar e avaliar com a criança e todos os
- renovação periódica mediante novos arranjos no envolvidos no processo de como o trabalho foi realizado.
mobiliário, materiais e elementos decorativos. Sequência de atividades: trata-se de um conjunto de
propostas que geralmente obedecem a uma ordem crescente
Tempo: as aprendizagens e o desenvolvimento das de complexidade. O objetivo é trabalhar experiências mais
crianças ocorrem dentro de um determinado tempo. Esse específicas, aprendizagens que requerem aprimoramento com
tempo é articulado. Ou seja, o tempo cronológico – aquele do a experiência. Os planejamentos diários, geralmente, seguem
calendário - articula-se com o tempo histórico – aquele essa organização didática.
construído nas relações socioculturais e históricas, - visto que Atividades ocasionais: permitem trabalhar com as
as crianças carregam e vivenciam as marcas de sua época e de crianças, em algumas oportunidades, um conteúdo
sua comunidade. E ainda podemos falar do tempo vivido, considerado valioso, embora sem correspondência com o que
incorporado por nós como instituição social e que regula nossa está planejado. Trabalhada de maneira significativa, a
vida, segundo Norbert Elias, quando a criança tem a organização de uma situação independente se justifica, a
oportunidade de participar, no cotidiano, de situações que exemplo de passeios, visitas pedagógicas, comemorações,
lidam com duração, periodicidade e sequência, ela consegue entre outras.
antecipar fatos, fazer planos e construir sua noção de tempo. É Projetos didáticos: os objetivos são claros, o período de
importante que o planejamento e as práticas pedagógicas realização é determinado, há divisão de tarefas e uma
levem em conta a necessidade de: avaliação final em função do pretendido. Suas principais
- diminuir o tempo de espera na passagem de uma características são objetivos mais abrangentes e a existência
atividade para outra; de um produto final56.
- evitar esperas longas e ociosas, especialmente ao final da
jornada diária; Questões
- flexibilizar o período de realização da atividade, ao
considerar os ritmos e interesses de cada um e/ou dos grupos; 01. O autor Zabalza, traz em seu livro a definição da
- distribuir as atividades de acordo com o interesse e as palavra “espaço” fazendo referência deste com o espaço
condições de realização individual e coletiva; escolar. Para o autor a palavra espaço está relacionada:
- permitir a vivência da repetição do conhecido e o contato I. Extensão definida, meio sem limites que contém todas as
com a novidade; extensões finitas;
- alternar os momentos de atividades de higiene, II. O espaço é como algo físico, ligado aos objetos que são
alimentação, repouso; atividades coletivas (entrada, saída, os elementos que ocupam o espaço;
pátio, celebrações, festas); atividades diversificadas III. Para as crianças pequenas o espaço é o espaço equipado
(brincadeiras e explorações individuais ou em grupo); com móveis, objetos, cores e etc.
atividades coordenadas pelo professor (roda de conversa, São corretas as afirmações:
hora da história, passeios, visitas, oficinas etc); atividades de (A) Apenas I e II.
livre escolha da criança, ainda que supervisionadas pelos (B) Apenas I e III.
profissionais. (C) Apenas II.
Aqui, cabe uma breve consideração sobre as possíveis (D) Apenas II e III.
denominações que um currículo pode comportar em relação à
organização do trabalho pedagógico: atividades, temas 02. (Zabalza) o ambiente escolar contempla quatro
geradores, projetos, vivências, entre outras. É plausível insistir dimensões, são elas: dimensão temporal, dimensão funcional,
que o importante é que essas estratégias adquiram sentido dimensão física, dimensão relacional. Entretanto, a dimensão
para a criança e não sirvam apenas para mantê-la ocupada, temporal e a dimensão relacional se referem respectivamente:
controlada, quieta, soterrada por uma avalanche de tarefas. (A) À organização do tempo e às diferentes relações
Não interessa banir essas denominações (e seus usos) de estabelecidas na sala de aula;
nosso vocabulário e cotidiano. Interessa fazer com que as

56 Documento produzido pela Secretaria de Estado de Educação do Distrito


Federal, disponível em http://www.sinprodf.org.br/wp-
content/uploads/2014/03/2-educacao-infantil.pdf

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(B) À forma de utilização dos espaços e às diferentes pessoas com algum tipo de deficiência ou necessidade
relações estabelecidas na sala de aula; especial, visando resgatar o respeito humano e a dignidade, no
(C) Ao aspecto material do ambiente e à organização do sentido de possibilitar o pleno desenvolvimento e o acesso a
tempo; todos os recursos da sociedade por parte desse segmento.
(D) Às diferentes relações estabelecidas na sala de aula e Movimentos nacionais e internacionais têm buscado o
ao aspecto material do ambiente. consenso para a formatação de uma política de integração e de
educação inclusiva, sendo que o seu ápice foi a Conferência
03. Ao se apropriar do espaço, a criança desenvolve a Mundial de Educação Especial, que contou com a participação
inteligência prática, denominada por Wallon de: de 88 países e 25 organizações internacionais, em assembleia
(A) Inteligência Emocional. geral, na cidade de Salamanca, na Espanha, em junho de 1994.
(B) Inteligência Espacial. Este evento teve como culminância a "Declaração de
(C) Inteligência Sócio afetiva. Salamanca", da qual transcrevem-se, a seguir, pontos
(D) Inteligência Abstrata. importantes, que devem servir de reflexão e mudanças da
realidade atual, tão discriminatória.
04. Marque (V), se a assertiva for verdadeira, ou (F), se a A inclusão escolar, fortalecida pela Declaração de
assertiva for falsa. Salamanca, no entanto, não resolve todos os problemas de
O objetivo da escola é o ensino e a aprendizagem dos marginalização dessas pessoas, pois o processo de exclusão é
alunos; a organização, a gestão, as condições físicas e materiais anterior ao período de escolarização, iniciando-se no
são meios para se atingir esse objetivo. nascimento ou exatamente no momento em aparece algum
( ) FALSA. tipo de deficiência física ou mental, adquirida ou hereditária,
( ) VERDADEIRA. em algum membro da família. Isso ocorre em qualquer tipo de
constituição familiar, sejam as tradicionalmente estruturadas,
05. Em uma sala de aula do Ensino Fundamental, a sejam as produções independentes e congêneres e em todas as
professora tem encontrado dificuldades para manter a classes sociais, com um agravante para as menos favorecidas.
organização dos materiais e a limpeza da sala após a realização O nascimento de um bebê com deficiência ou o
das atividades diárias. Para desenvolver a autonomia e a aparecimento de qualquer necessidade especial em algum
cooperação entre os alunos na organização do espaço e membro da família altera consideravelmente a rotina no lar.
materiais, a professora deve Os pais logo se perguntam: por quê? De quem é a culpa? Como
(A) Preparar uma lista com regras para organização da sala agirei daqui para frente? Como será o futuro de meu filho?
e materiais e fixa-la na parede da sala. O imaginário, então, toma conta das atitudes desses pais ou
(B) Realizar reuniões com os pais frisando a importância responsáveis e a dinâmica familiar fica fragilizada.
de que seus filhos adquiram hábitos de limpeza e organização Imediatamente instalam-se a insegurança, o complexo de
dentro e fora da sala de aula. culpa, o medo do futuro, a rejeição e a revolta, uma vez que
(C) Organizar a sala e os materiais e solicitar que os alunos esses pais percebem que, a partir da deficiência instalada,
observem como a sala deve estar ao final do dia. terão um longo e tortuoso caminho de combate à
(D) Solicitar que a faxineira e a auxiliar da classe a ajudem discriminação e ao isolamento.
na organização do espaço e materiais.
(E) Conversar com os alunos e estabelecer combinados e Nosso Momento Atual58
ajudantes diários para a organização do espaço e materiais.
A escola se entupiu do formalismo da racionalidade e
Gabarito cindiu-se em modalidades de ensino, tipos de serviço, grades
curriculares, burocracia.
01.D / 02.A / 03.B / 04.V / 05.E Uma ruptura de base em sua estrutura organizacional,
como propõe a inclusão, é uma saída para que a escola possa
fluir, novamente, espalhando sua ação formadora por todos os
8. Educação inclusiva na que dela participam.
A inclusão, portanto, implica mudança desse atual
educação infantil paradigma educacional, para que se encaixe no mapa da
educação escolar que estamos retraçando.
E inegável que os velhos paradigmas da modernidade
Segundo Maciel57, hoje, no Brasil, milhares de pessoas com estão sendo contestados e que o conhecimento, matéria-prima
algum tipo de deficiência estão sendo discriminadas nas da educação escolar, está passando por uma reinterpretação.
comunidades em que vivem ou sendo excluídas do mercado de As diferenças culturais, sociais, étnicas, religiosas, de
trabalho. O processo de exclusão social de pessoas com gênero, enfim, a diversidade humana está sendo cada vez mais
deficiência ou alguma necessidade especial é tão antigo quanto desvelada e destacada e é condição imprescindível para se
a socialização do homem. entender como aprendemos e como compreendemos o mundo
A estrutura das sociedades, desde os seus primórdios, e a nós mesmos.
sempre inabilitou os portadores de deficiência, Nosso modelo educacional mostra há algum tempo sinais
marginalizando-os e privando-os de liberdade. Essas pessoas, de esgotamento, e nesse vazio de ideias, que acompanha a
sem respeito, sem atendimento, sem direitos, sempre foram crise paradigmática, é que surge o momento oportuno das
alvo de atitudes preconceituosas e ações impiedosas. transformações.
A literatura clássica e a história do homem refletem esse Um novo paradigma do conhecimento está surgindo das
pensar discriminatório, pois é mais fácil prestar atenção aos interfaces e das novas conexões que se formam entre saberes
impedimentos e às aparências do que aos potenciais e outrora isolados e partidos e dos encontros da subjetividade
capacidades de tais pessoas. humana com o cotidiano, o social, o cultural. Redes cada vez
Nos últimos anos, ações isoladas de educadores e de pais mais complexas de relações, geradas pela velocidade das
têm promovido e implementado a inclusão, nas escolas, de comunicações e informações, estão rompendo as fronteiras

57 MACIEL, MA. R. C; Portadores de Deficiência a questão da inclusão social, São 58 MANTOAN, M. T. E. Inclusão escolar: o que é? Por quê? Como fazer? São Paulo:
Paulo Perspec. vol.14 no.2 São Paulo Apr./June 2000. Moderna, 2006.

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das disciplinas e estabelecendo novos marcos de compreensão discriminar os alunos que não damos conta de ensinar.
entre as pessoas e do mundo em que vivemos. Estamos habituados a repassar nossos problemas para outros
Diante dessas novidades, a escola não pode continuar colegas, os “especializados” e, assim, não recai sobre nossos
ignorando o que acontece ao seu redor nem anulando e ombros o peso de nossas limitações profissionais.
marginalizando as diferenças nos processos pelos quais forma Segundo proclama a Declaração de Salamanca:
e instrui os alunos. E muito menos desconhecer que aprender
implica ser capaz de expressar, dos mais variados modos, o "Escolas inclusivas devem reconhecer e responder às
que sabemos, implica representar o mundo a partir de nossas necessidades diversas de seus alunos, acomodando ambos os
origens, de nossos valores e sentimentos. estilos e ritmos de aprendizagem e assegurando uma educação
O ensino curricular de nossas escolas, organizado em de qualidade a todos através de um currículo apropriado,
disciplinas, isola, separa os conhecimentos, em vez de arranjos organizacionais, estratégias de ensino, uso de recursos
reconhecer suas inter-relações. Contrariamente, o e parceria com as comunidades. (...) O desafio que confronta a
conhecimento evolui por recomposição, contextualização e escola inclusiva é no que diz respeito ao desenvolvimento de uma
integração de saberes em redes de entendimento, não reduz o pedagogia centrada na criança e capaz de bem sucedidamente
complexo ao multidimensional dos problemas e de suas educar todas as crianças, incluindo aquelas que possuam
soluções. desvantagem severa. O mérito de tais escolas não reside somente
Os sistemas escolares também estão montados a partir de no fato de que elas sejam capazes de prover uma educação de
um pensamento que recorta a realidade, que permite dividir alta qualidade a todas as crianças: o estabelecimento de tais
os alunos em normais e deficientes, as modalidades de ensino escolas é um passo crucial no sentido de modificar atitudes
em regular e especial, os professores em especialistas nesta e discriminatórias, de criar comunidades acolhedoras e de
naquela manifestação das diferenças. A lógica dessa desenvolver uma sociedade inclusiva."
organização é marcada por uma visão determinista,
mecanicista, formalista a reducionista, própria do pensamento Um dos princípios norteadores da Lei de Diretrizes e Bases
científico moderno, que ignora o subjetivo, o afetivo, o criador, Nacionais da Educação – LDB 9.394/96 é o da igualdade de
sem os quais não conseguimos romper com o velho modelo condições para o acesso e a permanência na escola. A LDB
escolar para produzir a reviravolta que a inclusão impõe. reconhece a educação infantil como direito e prevê a garantia
Se o que pretendemos é que a escola seja inclusiva, é de condições adequadas à escolarização de jovens, adultos e
urgente que seus planos se redefinam para uma educação trabalhadores, a qualidade de ensino em todos os níveis e
voltada para a cidadania global, plena, livre de preconceitos e modalidades educacionais, além de outros direitos e
que reconhece e valoriza as diferenças. obrigações (Título III, Artigo 5 I – IX).
Chegamos a um impasse, como nos afirma Morin59, pois, A reafirmação de identidades étnicas e o desenvolvimento
para se reformar a instituição, temos de reformar as mentes, de educação escolar bilíngue e intelectual aos povos indígenas
mas não se pode reformar as mentes sem uma prévia reforma são apontados em diversas proposições. A LDB rompe com o
das instituições. modelo assistencial e terapêutico operante, até então, no que
diz respeito ao tratamento dispensado a educandos com
Inclusão Escolar deficiência e necessidades educacionais especiais. Tais
proposições nos permitem inferir que os pilares fundamentais
A escola brasileira é marcada pelo fracasso e pela evasão da LDB podem favorecer a concretização de projetos flexíveis
de uma parte, privações constantes e pela baixa autoestima e inovadores referenciados no ideal de uma escola inclusiva.
resultante da exclusão escolar e da social — alunos que são
vítimas de seus pais, de seus professores e, sobretudo, das Mudanças na Escola
condições de pobreza em que vivem, em todos os seus
sentidos. Esses alunos são sobejamente conhecidos das Para atender a todos e atender melhor, a escola atual tem
escolas, pois repete as suas séries várias vezes, são expulsos, de mudar, e a tarefa de mudar a escola exige trabalho em
evadem e ainda são rotulados como mal nascidos e com muitas frentes. Cada escola, ao abraçar esse trabalho, terá de
hábitos que fogem ao protótipo da educação formal. encontrar soluções próprias para os seus problemas. As
As soluções sugeridas para se reverter esse quadro mudanças necessárias não acontecem por acaso e nem por
parecem reprisar as mesmas medidas que o criaram. Em Decreto, mas fazem parte da vontade política do coletivo da
outras palavras, pretende-se resolver a situação a partir de escola, explicitadas no seu Projeto Político Pedagógico (PPP) e
ações que não recorrem a outros meios, que não buscam novas vividas a partir de uma gestão escolar democrática.
saídas e que não vão a fundo nas causas geradoras do fracasso É ingenuidade pensar que situações isoladas são
escolar. suficientes para definir a inclusão como opção de todos os
Esse fracasso continua sendo do aluno, pois a escola reluta membros da escola e configurar o perfil da instituição. Não se
em admiti-lo como sendo seu. desconsideram aqui os esforços de pessoas bem-
A inclusão total e irrestrita é uma oportunidade que temos intencionadas, mas é preciso ficar claro que os desafios das
para reverter a situação da maioria de nossas escolas, as quais mudanças devem ser assumidos e decididos pelo coletivo
atribuem aos alunos as deficiências que são do próprio ensino escolar.
ministrado por elas — sempre se avalia o que o aluno A organização de uma sala de aula é atravessada por
aprendeu, o que ele não sabe, mas raramente se analisa “o que” decisões da escola que afetam os processos de ensino e de
e “como” a escola ensina, de modo que os alunos não sejam aprendizagem. Os horários e rotinas escolares não dependem
penalizados pela repetência, evasão, discriminação, exclusão, apenas de uma única sala de aula, o uso dos espaços da escola
enfim. para atividades a serem realizadas fora da classe precisa ser
E fácil receber os “alunos que aprendem apesar da escola” combinado e sistematizado para o bom aproveitamento de
e é mais fácil ainda encaminhar, para as classes e escolas todos, as horas de estudo dos professores devem coincidir
especiais, os que têm dificuldades de aprendizagem e, sendo para que a formação continuada seja uma aprendizagem
ou não deficientes, para os programas de reforço e aceleração. colaborativa, a organização do Atendimento Educacional
Por meio dessas válvulas de escape, continuamos a

59 MORIN. E. A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento. 4.


ed. Trad. Eloá Jacobina. Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 2001.

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Especializado (AEE) não pode ser um mero apêndice na vida privada, sem fins lucrativos. Tais centros, contudo, devem
escolar ou da competência do professor que nele atua. estar de acordo com as orientações da Política Nacional de
Um conjunto de normas, regras, atividades, rituais, Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva e com
funções, diretrizes, orientações curriculares e metodológicas, as Diretrizes Operacionais da Educação Especial para o
oriundo das diversas instâncias burocrático-legais do sistema Atendimento Educacional Especializado na Educação Básica
educacional, constitui o arcabouço pedagógico e (MEC/SEESP).
administrativo das escolas de uma rede de ensino. Trata-se do Na perspectiva da educação inclusiva, o processo de
que está INSTITUÍDO e do que Libâneo60 e outros autores reorientação de escolas especiais e centros especializados
analisaram pormenorizadamente. requer a construção de uma proposta pedagógica que institua
Nesse INSTITUÍDO, estão os parâmetros e diretrizes nestes espaços, principalmente, serviços de apoio às escolas
curriculares, as leis, os documentos das políticas, os para a organização das salas de recursos multifuncionais e
regimentos e demais normas do sistema. para a formação continuada dos professores do AEE.
Em contrapartida, existe um espaço e um tempo a serem Os conselhos de educação têm atuação primordial no
construídos por todas as pessoas que fazem parte de uma credenciamento, autorização de funcionamento e organização
instituição escolar, porque a escola não é uma estrutura pronta destes centros de AEE, zelando para que atuem dentro do que
e acabada a ser perpetuada e reproduzida de geração em a legislação, a Política e as Diretrizes orientam. No entanto, a
geração. Trata-se do INSTITUINTE. preferência pela escola comum como o local do serviço de AEE,
A escola cria, nas possibilidades abertas pelo já definida no texto constitucional de 1988, foi reafirmada pela
INSTITUINTE, um espaço de realização pessoal e profissional Política, e existem razões para que esse atendimento ocorra na
que confere à equipe escolar a possibilidade de definir o seu escola comum.
horário escolar, organizar projetos, módulos de estudo e O motivo principal de o AEE ser realizado na própria escola
outros, conforme decisão colegiada. Assim, confere autonomia do aluno está na possibilidade de que suas necessidades
a toda equipe escolar, acreditando no poder criativo e inova- educacionais específicas possam ser atendidas e discutidas no
dor dos que fazem e pensam a educação. dia a dia escolar e com todos os que atuam no ensino regular
e/ou na educação especial, aproximando esses alunos dos
O Atendimento Educacional Especializado (AEE) ambientes de formação comum a todos. Para os pais, quando o
AEE ocorre nessas circunstâncias, propicia-lhes viver uma
Uma das inovações trazidas pela Política Nacional de experiência inclusiva de desenvolvimento e de escolarização
Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva é o de seus filhos, sem ter de recorrer a atendimentos exteriores à
Atendimento Educacional Especializado - AEE, um serviço da escola.
educação especial que "[...] identifica, elabora e organiza
recursos pedagógicos e de acessibilidade, que eliminem as A Formação de Professores para o AEE
barreiras para a plena participação dos alunos, considerando
suas necessidades específicas" (SEESP/MEC).61 Para atuar no AEE, os professores devem ter formação
O AEE complementa e/ou suplementa a formação do específica para este exercício, que atenda aos objetivos da
aluno, visando a sua autonomia na escola e fora dela, educação especial na perspectiva da educação inclusiva. Nos
constituindo oferta obrigatória pelos sistemas de ensino. É cursos de formação continuada, de aperfeiçoamento ou de
realizado, de preferência, nas escolas comuns, em um espaço especialização, indicados para essa formação, os professores
físico denominado Sala de Recursos Multifuncionais. Portanto, atualizarão e ampliarão seus conhecimentos em conteúdo
é parte integrante do projeto político pedagógico da escola. específico do AEE, para melhor atender a seus alunos.
São atendidos, nas Salas de Recursos Multifuncionais, A formação de professores consiste em um dos objetivos
alunos público-alvo da educação especial, conforme do PPP. Um dos seus aspectos fundamentais é a preocupação
estabelecido na Política Nacional de Educação Especial na com a aprendizagem permanente de professores, demais
Perspectiva da Educação Inclusiva e no Decreto N.6.571/2008. profissionais que atuam na escola e também dos pais e da
- Alunos com deficiência: aqueles [...] que têm comunidade onde a escola se insere. Neste documento,
impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, apresentam-se as ações de formação, incluindo os aspectos
intelectual ou sensorial, os quais em interação com diversas ligados ao estudo das necessidades específicas dos alunos com
barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na deficiência, transtornos globais de desenvolvimento e altas
sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas habilidades/superdotação. Este estudo perpassa o cotidiano
(ONU)62. da escola e não é exclusivo dos professores que atuam no AEE.
- Alunos com transtornos globais do desenvolvimento: À gestão escolar compete implementar ações que
aqueles que apresentam alterações qualitativas das interações garantam a formação das pessoas envolvidas, direta ou
sociais recíprocas e na comunicação, um repertório de indiretamente, nas unidades de ensino. Ela pode se dar por
interesses e atividades restrito, estereotipado e repetitivo. meio de palestras informativas e formações em nível de
Incluem-se nesse grupo alunos com autismo, síndromes do aperfeiçoamento e especialização para os professores que
espectro do autismo e psicose infantil (MEC/SEESP). atuam ou atuarão no AEE.
- Alunos com altas habilidades/superdotação: aqueles que As palestras informativas devem envolver o maior número
demonstram potencial elevado em qualquer uma das de pessoas possível: professores do ensino comum e do AEE,
seguintes áreas, isoladas ou combinadas: intelectual, pais, autoridades educacionais. De caráter mais amplo, essas
acadêmica, liderança, psicomotricidade e artes, além de palestras têm por objetivo esclarecer o que é o AEE, como ele
apresentar grande criatividade, envolvimento na está sendo realizado e qual a política que o fundamenta, além
aprendizagem e realização de tarefas em áreas de seu de tirar dúvidas sobre este serviço e promover ações conjuntas
interesse (MEC/SEESP). para fazer encaminhamentos, quando necessários.
Para a formação em nível de aperfeiçoamento e
A matrícula no AEE é condicionada à matrícula no ensino especialização, a proposta é que sejam realizadas ações de
regular. Esse atendimento pode ser oferecido em Centros de formação fundamentadas em metodologias ativas de
Atendimento Educacional Especializado da rede pública ou aprendizagem, tais como Estudos de Casos, Aprendizagem

60 LIBÂNEO, J. C., OLIVEIRA J. F.; TOSCHI, M. S. Educação Escolar: políticas, 62 Organização das Nações Unidas - ONU. Convenção sobre os Direitos das
estrutura e organização. São Paulo: Cortez, 2003. Pessoas com Deficiência. Nova Iorque, 2006.
61 MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Decreto No 6.571, de 17 de setembro de 2008.

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Baseada em Problemas (ABP) ou Problem Based Learning compreensão do problema; apresentação de propostas de
(PBL), Aprendizagem Baseada em Casos (ABC), Trabalhos com soluções para o problema em foco; elaboração do plano de
Projetos, Aprendizagem Colaborativa em Rede (ACR), entre atendimento; socialização; reelaboração da solução do
outras. problema e do plano de atendimento; avaliação.
Essas metodologias trazem novas formas de produção e A proposta de formação ACR prepara o professor para
organização do conhecimento e colocam o aprendiz no centro perceber a singularidade de cada caso e atuar frente a eles.
do processo educativo, dando-lhe autonomia e Nesse sentido, a formação não termina com o curso, visto que
responsabilidade pela sua aprendizagem por meio da a atuação do professor requer estudo e reflexões diante de
identificação e análise dos problemas e da capacidade para cada novo desafio. Finalizada a formação, é importante que os
formular questões e buscar informações para responder a professores constituam redes sociais para dar continuidade
estas questões, ampliando conhecimentos. aos estudos, estudar casos, dirimir dúvidas e socializar os
Tradicionalmente os cursos de formação continuada são conhecimentos adquiridos a partir da prática cotidiana. Para
centrados nos conteúdos, classificados de acordo com o contribuir com estas ações, a internet disponibiliza várias
critério de pertencimento a uma especificidade, tendo sua ferramentas de livre acesso que podem ser utilizadas pelos
organização curricular pautada num perfil "ideal" de aluno que professores.
se deseja formar. Estes modelos de formação estão sendo cada As tecnologias de informação e comunicação - TICs, em
vez mais questionados no contexto educacional e algumas especial as tecnologias Web 2.0, possibilitam aos usuários o
metodologias começam a surgir com a finalidade de romper acesso às informações de forma rápida e constante. Elas
com esta organização e determinismo. Tais metodologias permitem a participação ativa do usuário na grande rede de
rompem com o modelo determinista de formação, computadores e invertem o papel de usuário consumidor para
considerando as diferenças entre os estudantes e usuário produtor de conhecimento, de agente passivo para
apresentando uma nova perspectiva de organização agente ativo, o que pode ampliar as possibilidades dos
curricular. programas de formação pautados em metodologias ativas de
Zabala63 defende uma perspectiva de organização aprendizagem.
curricular globalizadora, na qual os conteúdos de Estas e outras ferramentas possibilitam viabilizar a
aprendizagem e as unidades temáticas do currículo são construção coletiva do conhecimento em torno das práticas de
relevantes em função de sua capacidade de compreender uma inclusão e, o mais importante, socializar estas práticas e fazer
realidade global. Para Hernandez64, o conceito de delas um objeto de pesquisa.
conhecimento global e relacional permite superar o sentido da
mera acumulação de saberes em torno de um tema. Ele propõe Conclusões Finais
estabelecer um processo no qual o tema ou problema Embora possa assustar pelo grande número de mudanças
abordado seja o ponto de referência para onde confluem os e pelo teor de cada uma delas, a inclusão é como muitos a
conhecimentos. apregoam “um caminho sem volta”.
É neste contexto que surgem as metodologias ativas de Nunca é demais, contudo, reafirmar as condições em que
aprendizagem. Elas requerem uma mudança de atitude do essa inovação acontece, marcando, grifando na nossa
docente. Uma delas refere-se à flexibilidade diante das consciência de educadores o seu valor para que nossas escolas
questões que surgirão e dos conhecimentos que se construirão atendam à expectativa dos alunos de nossas escolas, do ensino
durante o desenvolvimento dos trabalhos. Este processo infantil à Universidade.
permite aos professores e aos alunos aprenderem a explicar as A escola prepara o futuro e de certo que, se os alunos
relações estabelecidas a partir de informações obtidas sobre aprenderem a valorizar e a conviver com as diferenças nas
determinado assunto e demonstra respeito às diferentes salas de aula, serão adultos bem diferentes de nós que temos
formas e procedimentos de organização do conhecimento. de nos empenhar tanto para entender e viver a experiência da
Essas propostas colocam o aprendiz como protagonista do inclusão!
processo de ensino e aprendizagem e agrega valor educativo O movimento inclusivo, nas escolas, por mais que seja
aos conteúdos da formação. Os conteúdos não se tornam à ainda muito contestado, pelo caráter ameaçador de toda e
finalidade, mas os meios de ensino. As metodologias ativas de qualquer mudança, especialmente no meio educacional,
aprendizagem têm como característica o fato de se convence a todos pela sua lógica e pela ética de seu
desenvolverem em pequenos grupos e de apresentarem posicionamento social.
problemas contextualizados. Trata-se de um processo ativo, Ao denunciar o abismo existente entre o velho e o novo na
cooperativo, integrado e interdisciplinar. Estimula o aprendiz instituição escolar brasileira, a inclusão é reveladora dos
a desenvolver os trabalhos em equipe, ouvir outras opiniões, a males que o conservadorismo escolar tem espalhado pela
considerar o contexto ao elaborar as propostas das soluções, nossa infância e juventude estudantil.
tornando-o consciente do que ele sabe e do que precisa O futuro da escola inclusiva depende de uma expansão
aprender. Motiva-o a buscar as informações relevantes, rápida dos projetos verdadeiramente imbuídos do
considerando que cada problema é um problema e que não compromisso de transformar a escola, para se adequar aos
existem receitas para solucioná-los. novos tempos.
Entre as diversas metodologias, a Aprendizagem Se hoje ainda esses projetos se resumem a experiências
Colaborativa em Redes - ACR, construída a partir da locais, estas estão demonstrando a viabilidade da inclusão, em
metodologia de Aprendizagem Baseada em Problemas, foi escolas e redes de ensino brasileiras, porque têm a força do
desenvolvida para um programa de formação continuada a óbvio e a clareza da simplicidade.
distância de professores de AEE. Seu foco é a aprendizagem A aparente fragilidade das pequenas iniciativas tem sido
colaborativa, o trabalho em equipe, contextualizado na suficiente para enfrentar, com segurança e otimismo, o poder
realidade do aprendiz. da velha e enferrujada máquina escolar. A inclusão é um sonho
A ACR é composta de etapas que incluem trabalhos possível.
individuais e coletivos. As etapas compreendem a
apresentação, a descrição e a discussão do problema;
pesquisas em fontes bibliográficas para favorecer a

63 ZABALA, A. A Prática Educativa. Porto Alegre: Artmed, 1998. 64 HERNANDEZ, F; VENTURA, M. A Organização do Currículo por Projetos de
Trabalho: o conhecimento é um caleidoscópio. Porto Alegre: Artmed, 1998.

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Questões “Adaptações Curriculares” que insere-se na concepção da


escola inclusiva defendida na Declaração de Salamanca.
01. (FUNCAB - EMSERH - Pedagogo) A Escola Inclusiva é Assinale a alternativa correta:
uma tendência internacional do final do século XX. O principal (A) Apenas a I.
desafio dessa escola é: (B) I, II e IV.
(A) Desenvolver uma pedagogia centrada na criança, capaz (C) I, III e IV.
de educar todas, sem discriminação, respeitando suas (D) Todas estão corretas.
diferenças. (E) Nenhuma das alternativas.
(B) Dar conta da diversidade das crianças oferecendo
respostas adequadas às suas características e necessidades, 05. (FCM - IFSudeste/MG - Técnico em Assuntos
solicitando apoio de instituições e especialistas somente Educacionais) A escola inclusiva é aquela que:
quando a família exigir. I- atua em coletividade, prezando o indivíduo,
(C) Fortalecer uma sociedade democrática, justa e reconhecendo sua identidade e subjetividade.
economicamente ativa. II- está preparada para receber os alunos, tendo a garantia
(D) Garantir às crianças com necessidades especiais uma da acessibilidade física, metodológica, comunicacional e
convivência participativa com outras crianças com as mesmas tecnológica.
necessidades especiais. III- tem o poder de acabar com as mazelas sociais, com a
(E) Desenvolver o princípio da integração previsto na produção das desigualdades sociais.
Declaração Municipal. IV- defende a inserção de alunos com deficiência com
comprometimentos mais severos para o ato de socialização.
02. (CESPE - SEDF - Conhecimentos Básicos/2017) Com São corretas as afirmativas:
relação à educação especial/inclusiva e ao atendimento (A) I e II.
especializado, julgue o item que se segue. (B) I e III.
A educação especial/inclusiva tem caráter complementar (C) II e III.
ou suplementar, conforme o caso concreto. (D) III e IV.
( ) Certo ( ) Errado (E) I, II, III e IV.

03. (CESPE - SEDF - Conhecimentos Básicos/2017) Com Gabarito


relação ao planejamento escolar e à educação
especial/inclusiva, julgue o próximo item. 01.A / 02.Certo / 03.Certo / 04.C / 05.A
O plano de ensino deve ter coerência quanto a seus
objetivos e aos meios para alcançá-los.
( ) Certo ( ) Errado
9. Literatura infantil
04. (Big Advice - Prefeitura de Martinópolis - Professor
PEB I - Educação Especial/2017) A noção de necessidades
educacionais especiais entrou em evidência a partir das
discussões do chamado “movimento pela inclusão” e dos O desenvolvimento das habilidades de leitura e escrita
reflexos provocados pela Conferência Mundial sobre Educação de palavras, frases e textos em sala de aula
Especial, realizada em Salamanca, na Espanha, em 1994. Nesse
evento, foi elaborado um documento mundialmente O processo de compreensão da natureza alfabética do
significativo denominado “Declaração de Salamanca” e na qual sistema de escrita desenvolve nas crianças mecanismos de
foram levantados aspectos inovadores para a reforma de leitura e de escrita de palavras. Apesar de muitas delas
políticas e sistemas educacionais. aprenderem esses mecanismos com relativa facilidade, o
De acordo com a declaração: desenvolvimento das habilidades relacionadas à leitura e à
I. O conceito de “necessidades educacionais especiais” escrita de palavras leva tempo e requer treino por parte das
passará a incluir, além das crianças portadoras de deficiências, crianças. Para isso, um conjunto de atividades de leitura e
aquelas que estejam experimentando dificuldades escrita de palavras e frases deve fazer parte do planejamento
temporárias ou permanentes na escola, as que estejam pedagógico das professoras desde o primeiro ano do Ensino
repetindo continuamente os anos escolares, as que sejam Fundamental.
forçadas a trabalhar, as que vivem nas ruas, as que vivem em Como foi dito anteriormente, o reconhecimento das
condições de extrema pobreza ou que sejam desnutridas, as palavras é muito importante para o desenvolvimento das
que sejam vítimas de guerra ou conflitos armados, as que crianças como leitoras. Simultaneamente, elas terão ainda que
sofrem de abusos contínuos, ou as que simplesmente estão desenvolver a capacidade de ler e interpretar textos com
fora da escola, por qualquer motivo que seja.” autonomia. As habilidades de leitura e produção de textos
II. A Declaração de Salamanca estabeleceu uma nova envolvem o conhecimento de elementos que compõem os
concepção, extremamente abrangente, de “necessidades textos escritos, os seus estilos, a identificação do autor, da
educacionais especiais” que provoca a secessão dos dois tipos finalidade e do contexto de circulação do texto. Esses
de ensino, o regular e o especial, na medida em que esta nova conhecimentos são construídos na prática cotidiana de leitura
definição implica que todos possuem ou podem possuir, e escrita. É preciso prática e orientação adequada para
temporária ou permanentemente, “necessidades educacionais desenvolver uma postura de leitor crítico.
especiais”. Nos contextos sociais em que os adultos fazem uso da
III. Dessa forma, orienta para a existência de um sistema língua escrita em suas ações cotidianas, desde muito cedo as
único, que seja capaz de prover educação para todos os alunos, crianças começam a lidar com textos escritos por meio da
por mais especial que este possa ser ou estar. observação e do acompanhamento dessas situ- ações de
IV. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), prática de leitura e escrita. Elas começam, mesmo antes de
elaborados com base na Lei de Diretrizes e Bases da Educação terem domínio do sistema de escrita, a conhecer as
(LDB), de 1996, orientam a respeito de estratégias para a especificidades dos gêneros textuais, apreendendo não apenas
educação de alunos com necessidades especiais. Para isso, o sentido das atividades de leitura e escrita, mas também a
estabeleceu um material didático-pedagógico intitulado maneira como os textos devem ser interpretados.

Conhecimentos Específicos 41
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Como vimos na dimensão “O letramento”, as práticas de demonstrar comportamentos e habilidades de leitores e


leitura e escrita em sala de aula se concretizam de diferentes escritores mesmo quando ainda não dominam o sistema de
maneiras, dentre as quais, naquelas situações em que as escrita.
professoras preparam um texto para ser lido e discutido com Para as crianças de seis anos, a mediação das professoras
as crianças, ou seja, quando o texto se torna objeto de análise é muito necessária. Não apenas porque elas não conseguem
e conhecimento. Por meio de Situações de aprendizagem que ainda escrever e ler textos com autonomia, mas também
tomam o texto como objeto de ensino, as crianças devem ter porque para elas a interação por meio da língua escrita é uma
oportunidade de compartilhar com as professoras suas situação que apresenta condições de produção ainda
estratégias, seus conhecimentos, suas habilidades de leitura e desconhecidas, como, por exemplo, a de ter o interlocutor
escrita. ausente no momento da produção. Por isso é importante que a
Essa abordagem começa pela seleção dos textos que farão professora sirva de leitor e escriba em diferentes situações em
parte do repertório do trabalho analítico. É preciso ter cuidado sala de aula, principalmente nas atividades específicas para o
com o vocabulário e a extensão dos textos trabalhados em sala desenvolvimento das habilidades de leitura e escrita de textos.
de aula. As professoras devem realizar um reconhecimento Outro aspecto dessa dimensão que merece atenção das
das habilidades já desenvolvidas por seus alunos por meio de professoras de crianças de seis anos diz respeito à necessidade
uma avaliação diagnóstica para traçar as metas de de se deixar claro o objetivo das atividades e como elas
aprendizagem para a turma. Cabe assinalar que não é preciso deverão ser realizadas, ou seja, como as crianças devem
esperar que as crianças escrevam convencionalmente para proceder para realizá-las. Ao conduzir as Situações de
realizar atividades que visem desenvolver habilidades, aprendizagem que abordam o texto escrito em classes de seis
estratégias e comportamentos de leitura e de escrita de textos. anos, a professora deve prever formas de fazer com que as
No caso de a turma ou parte dela ainda não escrever crianças fiquem atentas aos aspectos que estarão sendo
convencionalmente, podem ser pensadas diferentes abordados nas propostas de leitura ou de escrita dos textos,
estratégias. Uma delas é a professora exercer o papel de consequentemente, as crianças ficarão atentas também à
escriba da classe, produzindo os textos coletivamente, ou o forma como a atividade será realizada.
papel de leitora, lendo para todos o texto escolhido. Outra A aquisição do sistema de escrita e o desenvolvimento
estratégia é permitir e estimular que as escritas espontâneas da consciência fonológica
sejam produzidas em sala. Também é possível aproveitar a Quando as crianças iniciam o processo de alfabetização,
diversidade da turma e agrupar os alunos de forma que buscam compreender o que a escrita representa, ou seja, o que
aqueles que já decodificam e codificam possam servir de aqueles sinais gráficos representam e como eles se organizam
leitores ou de escribas para os colegas. Qualquer que seja a formando um sistema de representação. Dessa forma, elas
estratégia adotada, a professora pode propor às crianças que: começam a lidar com a diferenciação dos dois planos da
• Reescrevam o texto com palavras mais simples para linguagem: o plano do conteúdo (dos significados), que diz
expressar seu conteúdo. respeito aos significados e sentidos produzidos quando
• Marquem partes dos textos lidos de acordo com a usamos a língua oral ou escrita, e o plano da expressão (dos
informação requerida ou com o objetivo da leitura. sons) que diz respeito às formas linguísticas. A compreensão
• Grifem palavras de acordo com o que se quer ressaltar. da natureza alfabética do sistema de escrita e o
• Façam resumos do que está escrito. desenvolvimento da consciência fonológica integram esse
• Façam anotações sobre o texto. processo e são impulsionados por aprendizagens que
• Realizem leituras individuais ou em duplas (um aluno estimulam o desenvolvi- mento infantil à medida que
que já se apropriou do funcionamento do sistema de escrita promovem a competência simbólica das crianças. Vejamos a
pode ler para outro que ainda não o faz), seguir, conforme esclareceu o construtivismo psicogenético,
• Realizem leituras teatralizadas de textos ou de trechos de como os aprendizes vão elaborando hipóteses e resolvendo
textos. questões para os problemas que eles mesmos se colocam, num
• Realizem leituras com pausas planejadas e movimento de reconstruções, no qual antigos conhecimentos
contextualizadas, com perguntas que orientem a interpretação vão dando lugar a novas formulações.
das crianças.
• Realizem leituras seguidas de conversas orientadas por Os níveis conceituais da escrita
questões previamente planejadas pela professora. Desde os primeiros contatos da criança com marcas
• Produzam textos em pequenos grupos ou em duplas gráficas impressas em livros, cadernos, cartazes, inicia-se um
(também se podem agrupar as crianças de forma que aquelas longo processo de construção de esquemas conceituais10 cujo
que já são capazes de codificar e decodificar se façam de primeiro desafio consiste em distinguir o que é desenho do
escribas do grupo). que é escrita. Nesse primeiro momento, ainda sem fazer essa
• Produzam textos com apoio de roteiros definidos pelo distinção, a criança se propõe a imitar o ato de escrever. Como
coletivo. num jogo, ela crê que poderia ou deveria escrever certo
conjunto de palavras imitando a ação de escrever. O resultado
Há, ainda, as atividades que ampliam o trabalho com o dessas primeiras “escritas” infantis pode aparecer, desde o
conteúdo dos textos. São aquelas atividades planejadas, como ponto de vista figural, como linhas onduladas ou quebradas
ampliação do momento de leitura e de escrita. Em geral, (zig-zag), contínuas ou fragmentadas, ou como uma série de
envolvem, dentre muitas possibilidades de trabalho, a elementos discretos (séries de linhas verticais ou bolinhas).
produção e a apresentação de peças teatrais, pesquisas e Conforme salienta Ferreiro (2003), tradicionalmente,
estudos de aprofundamento, leitura de livros ou de outros eram considerados, tanto por educadores, quanto por
textos sobre o mesmo assunto. pesquisadores, os aspectos figurativos da escrita infantil, ou
À medida que se vai trabalhando os textos com as crianças, seja, aqueles aspectos relacionados a elementos formais, tais
é possível observar como elas passam a considerar as como: a qualidade do traçado, a distribuição espacial das
orientações da professora no momento em que entram em formas, a orientação predominante (da esquerda para a
contato com novos textos. Por exemplo, quando vivenciam direita, de cima para baixo), a orientação dos caracteres
situações de aprendizagem em que a professora destaca certos individuais (inversões, rotações), etc. Os chamados aspectos
elementos textuais, estando diante de um novo livro, a criança construtivos da escrita costumavam ser ignorados pelas
busca identificar os mesmos elementos, como, por exemplo, o professoras e pesquisadores interessados em compreender o
sumário do livro, seu autor, seu título. Elas passam a fenômeno da alfabetização. Tais aspectos construtivos têm

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relação com o que o sujeito quer representar e os meios que necessariamente sabe que se trata de uma representação da
emprega para criar diferenciações entre as representações. linguagem e, menos ainda, dos aspectos formais da fala.
Não são, portanto, os aspectos figurais que designam se houve Portanto, as primeiras questões a serem resolvidas são “o que
ou não uma escrita. Quando ocorre essa intencionalidade por é que a escrita representa” e “qual é a estrutura desse modo de
parte da criança, ou seja, quando constatamos a presença de representação”.
aspectos construtivos, é que consideramos que houve uma Para responder a essas questões, a criança tenta
produção escrita. estabelecer a distinção entre desenho e escrita, e formula uma
Em relação aos aspectos construtivos, como veremos a primeira ideia de que ambos formam uma unidade, e que,
seguir, a escrita infantil segue uma linha regular de evolução juntos, expressam o sentido de uma mensagem gráfica.
que, conforme comprovaram as investigações de Ferreiro e Também quando passamos da interpretação de um texto
Teberosky (1991), independem da procedência dos sujeitos para a produção, deparamos com o mesmo fato: “a criança
quanto a meios culturais, situações educativas, línguas etc. espera que a escrita - como representação próxima, ainda que
diferente, do desenho - conserve algumas das propriedades do
Aspectos centrais da evolução psicogenética da língua objeto a que substitui”. (FERREIRO E TEBEROSKY, 1991, p.
escrita 261). É o que se chamou “realismo nominal”. Por exemplo, aos
Na linha da evolução psicogenética, identificam-se três objetos grandes corresponde uma escrita proporcional a seu
grandes períodos distintos entre si, dentro dos quais cabem tamanho. É que, para a criança, o signo que expressa um objeto
múltiplas subdivisões: não é a escrita de uma forma sonora. Isto é, a escrita, assim
- Primeiro período: Caracteriza-se pela distinção entre o como o desenho, expressa simbolicamente o conteúdo de uma
modo de representação icônico e não icônico; mensagem e não seus elementos linguísticos.
- Segundo período: Ocorre a construção de formas de A primeira indicação explícita da distinção entre imagem e
diferenciação; o aprendiz busca exercer um controle texto consiste em eliminar os artigos. Trata-se da chamada
progressivo das variações sobre os eixos qualitativo e “hipótese do nome”, isto é, o texto retém somente um dos
quantitativo; aspectos potencialmente representáveis, o nome do objeto ou
- Terceiro período: Marcado pela fonetização da escrita, objetos que aparecem na imagem. Ainda que não signifique
que se inicia com um período silábico e culmina em um que a criança já compreendeu a escrita como a expressão
período alfabético. gráfica da linguagem, ao representar “os nomes”, ela dá um
passo importante nessa direção.
1. O primeiro período: a distinção entre o modo de Evidentemente, antes de a criança ser capaz de distinguir
representação icônico e não icônico escrita de desenho, ela não pode dedicar-se a considerar as
Neste primeiro período, a criança alcançará duas propriedades do texto. As primeiras propriedades que a
distinções básicas que sustentarão as construções criança começa a observar no texto são exatamente as
subsequentes: de um lado, a diferenciação entre as marcas variações quantitativas, tais como: quantidade de linhas, de
gráficas figurativas e as não figurativas; de outro, a partes ou fragmentos numa mesma linha. Ao atribuir nomes
constituição da escrita como um objeto substituto. Vejamos, a de objetos grandes a trechos maiores, a criança começa a
seguir, cada uma delas. considerar as propriedades do texto.
Em relação à primeira distinção, é importante esclarecer A consideração de propriedades qualitativas, tais como:
que as marcas gráficas figurativas são aquelas que observar tipos e formas de letras, diferenciar números de
reproduzem aproximadamente o contorno ou a figura do letras, sinais de pontuação, etc., aparece muito posteriormente
objeto representado. As não figurativas, por sua vez, são e depende do conhecimento de modelos socialmente
aquelas que não conservam nenhuma semelhança figural com transmitidos, como as letras do próprio nome ou de outras
o objeto representado. De forma simplificada, podemos dizer pessoas. Entretanto, para que se alcance esta possibilidade, é
que, neste período, as crianças serão capazes de distinguir preciso haver superado minimamente a etapa descrita acima,
desenho de escrita e ainda compreender que a escrita substitui na qual qualquer escrita serve para atribuir o significado
e não reproduz algo. desejado.
Se formos capazes de entender que essa distinção requer
da criança um enorme esforço cognitivo, seremos igualmente 2. O segundo período: a construção de formas de
capazes de atribuir à diferenciação entre desenho e escrita um diferenciação
papel central no processo de apropriação do sistema de escrita Resolvida a questão da diferenciação entre escrita e
pelo aprendiz. O desenho está no domínio do icônico e, neste desenho, a criança passa a considerar as características
domínio, as formas dos grafismos importam porque formais específicas do escrito. Sua busca é a de definir “o que
reproduzem a forma dos objetos. Entretanto, a escrita está fora serve para ser lido” e, para tanto, ela estabelece condições
do icônico, ou seja, a forma dos grafismos não guarda nenhuma gráficas que a ajudam a construir formas de diferenciação
relação com a forma dos objetos, nem sua ordenação espacial entre as escritas. Essas condições gráficas buscam responder à
reproduz o contorno destes. Essa é uma das grandes sua indagação: “para que algo possa ser lido, o que é que deve
descobertas que a criança deve ser capaz de fazer: possuir”. Para ela, para que algo seja lido, deve cumprir dois
“Diferenciar a atividade de desenhar da atividade de critérios: possuir uma quantidade suficiente de letras e
escrever é importante porque a escrita, para as crianças respeitar uma variedade interna de caracteres. Isso significa
pequenas, recupera o que se pode desenhar: o nome do objeto que, para a criança, não basta que haja letras para que algo
desenhado (‘hipótese do nome’). Esta ideia também lhes serve possa ser lido. Se há poucas letras e algumas se repetem
para interpretar os textos que aparecem acompanhados de demasiadamente, tão pouco se pode ler. Ferreiro (1991)
imagens. A escrita por si mesma não é suficiente para garantir o denominou esse princípio de “variação interna”: com uma só
significado e por isso as crianças costumam desenhar antes de letra não se obtém algo legível, mas tão pouco se pode obter
escrever. A imagem, por outro lado, é a que permite interpre- tar algo legível com uma série composta pela mesma letra
a escrita (pelo menos como uma tentativa)” (FERREIRO, 2003). repetida três ou mais vezes.
A maioria das crianças, muito antes de completar os seis Evidentemente, tais critérios são exigências
anos de idade, já foi capaz de resolver esse primeiro problema: especificamente infantis, que não encontram respaldo nas
a escrita, mais do que uma marca, é um objeto que substitui regras do sistema escrito. Como sabemos, a escrita
algo, é uma representação de algo externo à escrita como tal. convencional do português apresenta inúmeras situações nas
Apesar de saber que a escrita representa algo, a criança não quais se pode ler apenas uma letra, bem como existe uma

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variedade grande de palavras em que as letras se repetem. escrita, a criança terá que resolver problemas tanto de
Portanto, tal elaboração infantil não foi fruto de informações correspondência quantitativa, quanto de correspondência
recebidas por usuários do sistema. Trata-se, pois, do resultado qualitativa.
de uma intensa atividade cognitiva, fruto da tentativa da No mesmo período, mas não necessariamente ao mesmo
criança de se apropriar deste sistema de representação. tempo, as letras podem começar a adquirir valores sonoros
Aqui cabe discutir e analisar a diferença entre o processo (silábicos) relativamente estáveis, estabelecendo-se
de elaboração de hipótese, que, como vimos, é fruto de um correspondências sobre o eixo qualitativo. As partes sonoras
intenso trabalho cognitivo do aprendiz, e o aprendizado de similares entre as palavras começam a expressar-se por letras
determinadas informações oriundas do meio social. Ambos os semelhantes. Como veremos a seguir, essa hipótese gera
aspectos estão presentes no processo de apropriação da também formas particulares de conflito.
linguagem escrita, entretanto, é importante que a professora Os conflitos antes mencionados, aos quais se agrega às
faça essa distinção no processo educativo. O reconhecimento vezes a ação educativa, vão desestabilizando
da grafia e do nome dos números, letras e sinais de pontuação, progressivamente a hipótese silábica, até que a criança se
assim como também o reconhecimento da orientação comprometa com um novo processo de construção. O sistema
convencional da leitura e da escrita (da margem esquerda para de escrita que a criança encontra no mundo circundante não
a margem direita e de cima para baixo) são exemplos de se acomoda a este esquema por ela construído. Apesar de
conhecimentos socialmente transmitidos. Sem que memorize compreender o que faz, a criança não consegue explicar o que
essas informações, a criança não será capaz de aprendê-los. os outros fazem. Também não é capaz de compreender a
Não se trata, portanto, de uma construção ou reconstrução informação que recebe. Toda a informação vinda do meio
cognitiva. Sua aquisição requer condições sociais específicas, ambiente é altamente perturbadora neste momento. Ferreiro
tais como manipular objetos próprios ao universo da escrita, (2003), mencionando Piaget, descreve três tipos possíveis de
interagir com informantes para deles receber informações reação frente a uma perturbação: pode-se deixá-la de lado,
pertinentes e adequadas sobre esses conhecimentos formais. pode-se compensar localmente ou pode-se assimilá-la.
Importa destacar, como já o fizemos anteriormente, que as Assimilar uma perturbação, na concepção piagetiana, requer
crianças não dedicam seus esforços intelectuais a inventar compensá-la inteira- mente, modificando, para tanto,
letras novas. Elas recebem a forma das letras da sociedade e as esquemas assimilatórios prévios, alcançando, assim, um novo
adotam tal e qual. Por isso o uso dessas formas convencionais nível de equilibração. Quando são capazes de fazer isso, as
costuma aparecer muito precocemente. O que lhes ocupa o crianças abandonam a hipótese silábica e começam a
pensamento e lhes exige a formulação de hipóteses são as reconstruir o sistema de escrita sobre bases alfabéticas. Mas
questões: o que a escrita representa e como fazer para antes de fazê-lo, tratarão de toda maneira de conservar os
representar algo por meio da escrita. esquemas assimilatórios que tanto trabalho lhes custou
construir (FERREIRO, 2003).
3. O terceiro período: a fonetização da escrita
Como vimos, nos dois primeiros períodos descritos O período silábico-alfabético marca a transição entre os
anteriormente, para o aprendiz, até esse momento, o que se esquemas prévios em vias de ser abandonados e os esquemas
escreve não se regula por diferenças ou semelhanças entre os futuros em vias de ser construídos. Quando descobre que a
significantes sonoros. É exatamente essa atenção às sílaba não pode ser considerada como uma unidade e sim que
propriedades sonoras do significante o que marca o ingresso ela é realizável em elementos menores, a criança ingressa no
no terceiro grande período desta evolução. último passo da compreensão do sistema socialmente
A criança tenta fazer coincidir a escrita e o enunciado oral. estabelecido. A partir daí, descobre novos problemas. Por um
Essa primeira relação entre fragmentos escritos e unidades lado quantitativo, se não é suficiente uma letra por sílaba, tão
orais se estabelece no nível da sílaba. Sobre o eixo quantitativo, pouco pode estabelecer alguma regularidade duplicando a
isso se expressa na descoberta de que a quantidade de letras quantidade de letras por sílabas (já que há sílabas que se
com que se vai escrever uma palavra pode corresponder à escrevem com uma, duas, três ou mais letras). Pelo lado
quantidade de partes que reconhecem na emissão oral. Essas qualitativo, enfrentará os problemas ortográficos: a
partes da palavra são inicialmente suas sílabas. Desta forma se identidade de som não garante a identidade de letras nem a
inicia o período silábico, que evolui até chegar a uma exigência identidade de letras, a de sons.
rigorosa: uma sílaba por letra, sem omitir sílabas e sem repetir
letras. O desenvolvimento da consciência fonológica
A hipótese silábica é extremamente importante por duas Quando as crianças chegam ao Ensino Fundamental,
razões: permite à criança ter um critério geral para regular as possuem um bom domínio da língua materna: sabem utilizá-la
variações na quantidade de letras que devem ser escritas e para fins de comunicação, sabem sua estrutura sintática e têm
centra sua atenção sobre as variações sonoras entre as um adequado conhecimento do léxico. Sobre a escrita,
palavras. Entretanto, a hipótese silábica cria suas próprias podemos dizer que as crianças chegam à escola sabendo suas
condições de contradição. Uma delas se estabelece entre o funções (para que as pessoas leem e escrevem) e sua estrutura
controle silábico e a quantidade mínima de letras que uma em muitos gêneros textuais, reconhecem os sinais gráficos, são
escrita deve possuir para ser interpretável. Seguindo essa capazes de fazer o reconheci- mento de algumas palavras etc.
lógica, a escrita de um monossílabo deveria possuir apenas O trabalho pedagógico desenvolvido na escola busca ampliar o
uma letra, mas a essa hipótese se sobrepõe a noção da desenvolvimento cognitivo e cultural das crianças.
“quantidade mínima”: um escrito com apenas uma letra “não Uma das capacidades das crianças que são desenvolvidas
pode ser lido”, ou seja, não é interpretável. na escola, ao iniciarem o processo formal de alfabetização, está
Outra contradição se estabelece entre a interpretação relacionada à análise do sistema fonológico da língua que elas
silábica e as escritas produzidas pelos adultos que, quase aprenderam a falar desde muito cedo. Os estudos sobre a
sempre, possuem mais letras do que a hipótese silábica relação entre consciência fonológica e alfabetização vêm
permite antecipar. Neste momento da sua evolução, as demonstrando o importante papel das habilidades
crianças estão resolvendo o problema de quantas letras são metafonológicas no processo de aquisição da leitura e da
necessárias para uma palavra dada. Entretanto, não estão escrita num sistema alfabético. No entanto, pode-se dizer que
aptas a resolver outro problema relacionado, mas diferente: essas habilidades se desenvolvem concomitante- mente a esse
quais letras devem servir para escrever uma palavra dada. processo; e, não, previamente.
Para caminhar no seu processo de apropriação do sistema de

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Os estudos sobre o desenvolvimento da consciência passar de ações concretas com objetos para ações com outros
fonológica das crianças pequenas sugerem a necessidade de significados. Por meio do jogo de faz de conta, os significados
uma abordagem sistemática do sistema fonológico ao longo do e as ações relacionadas aos objetos convencionalmente podem
processo de alfabetização. Ao elaborar a proposta de ensino, é ser libertados, possibilitando avançar em direção ao
preciso considerar diferentes níveis de abordagem através da pensamento abstrato.
atividade pedagógica: Nesta perspectiva, a brincadeira e o jogo de faz de conta
- Análise das variações linguísticas que constituem a são considerados como espaços de compreensão do mundo
linguagem oral; pelas crianças, na medida em que os significados que ali
- Análise das diferentes unidades fonológicas da língua transitam são apropriados por elas de forma específica. Essas
oral; linguagens devem ser compreendidas, no cotidiano de uma
- Reconhecimento das correspondências entre unidades proposta educativa voltada para a infância, como inerentes ao
fonológicas e unidades do sistema de escrita. processo de trocas e de experiência de cultura. São tantas
possibilidades quanto é permitido que as crianças imaginem e
O desenho e a brincadeira - formas de linguagem a ajam guiadas pela imaginação, pelos significados criados,
serem exploradas no processo de alfabetização combinados e partilhados com os parceiros nos momentos das
A criança vivencia, experimenta e apreende o mundo por brincadeiras, dos desenhos, dos jogos de faz de conta etc.
meio de diferentes formas de interação com o outro e com os Conforme esperamos ter demonstrado, desenho e brincadeira
objetos. O uso de diferentes linguagens é o que lhe permitirá são atividades que levam diretamente à escrita, porque a
comunicar-se e compreender ideias, sentimentos e a organizar divergência entre o campo do significado e o da visão se repete
seu pensamento. O desenho, a brincadeira, a pintura, a no início do processo de alfabetização, quando a criança
linguagem corporal, dentre outras, são formas de linguagem percebe que pode desenhar também a fala.
que lhe permitirão o acesso aos símbolos e signos culturais e a
possibilidade de construção de novos símbolos e signos que Um diálogo com práticas pedagógicas de alfabetização
orientarão seu comportamento, sua maneira de ver, sentir e e letramento de crianças de seis anos
viver. Ouvir, ver, ler histórias: narrativas verbais e visuais
Como vimos, na visão de Vygotsky (1998), a cultura em práticas de letramento literário na infância
impregna nosso modo de pensar, sentir e aprender. Duas motivações me levam a tratar da temática deste texto.
Compreendendo a cultura como os modos de um povo, A primeira vem da surpresa com que me deparei com a
comunidade ou grupo fazer, ver, ser, sentir e estar no mundo expressão hoje usada pelo mercado editorial ‘livros para
e, portanto, como um sistema de significação, não podemos bebês’; e a segunda advém dos problemas de natureza
percebê-la como algo pronto e estático, e sim como um conceitual gerados pelos gêneros da literatura endereçados a
processo dinâmico construído pelos diferentes grupos crianças ainda não alfabetizadas ou a crianças que iniciam o
culturais aos quais pertencemos. Esses sistemas de seu processo de alfabetização, gêneros bem diferentes
significação ou sistemas simbólicos constituem e são, ao daqueles que tradicionalmente se reconhecem como literários.
mesmo tempo, os meios pelos quais transmitimos e Hoje se vê o crescimento da produção para crianças não só dos
comunicamos, uns para os outros e para nós mesmos, as ideias anos iniciais do Ensino Fundamental, mas também da
e os sentidos compartilhados do mundo cultural no qual educação infantil, fruto de discussões sobre a necessidade de
estamos inseridos. Assim, as formas particulares de linguagem inserção deste segmento na formação docente, com projeções
(a palavra, o gesto, a arte e o desenho, dentre outros) são em programas de aquisição de livros pelo governo.
instrumentos de apropriação da cultura pelas crianças, Nos dias atuais, as concepções de alfabetização se
permitindo-lhes a decifração do mundo e, consequentemente, vinculam a duas fortes tendências. Uma para a qual a
orientando suas ações e suas manifestações sobre o meio em aprendizagem da língua escrita e seus usos sociais não se
que vivem. diferenciam, e, por isso, não se vê a necessidade de empregar
Nesta publicação, elegemos o desenho e a brincadeira a palavra “letramento” para designar esses usos; outra que
como foco da proposta de ensino não apenas por sua considera a importância de reconhecer a concomitância de
proximidade com o trabalho frequentemente desenvolvido na dois processos: o primeiro destaca especificidades da
maioria das escolas de Ensino Fundamental, mas, sobretudo, alfabetização ligadas ao domínio da tecnologia da escrita; o
pela importância que adquire para o desenvolvimento das segundo diz respeito ao letramento, ou seja, aos usos sociais
habilidades relacionadas à apreensão do sistema de escrita da escrita e da leitura. Este texto tem como proposta tratar da
enquanto sistema simbólico. leitura literária na fase em que as crianças estão aprendendo a
Ambos, desenho e brincadeira, ajudam a criança a ler e a escrever. Procuro mostrar como a segunda tendência é
compreender o caráter da representação. O desenho é uma aquela que fornece melhores respostas quando se busca
manifestação simbólica da criança que tem uma estreita compreender as apropriações da literatura por crianças que
relação com o gesto. A representação gráfica tem origem na iniciam ou consolidam seu processo de alfabetização. Parte-se,
fixação do gesto no papel. A criança, ao desenhar ou ao assim, do pressuposto de que a experiência com textos
apreciar uma ilustração ou desenho, vai compreendendo que literários pode anteceder a alfabetização, fazendo valer o que
aquilo que ela vê no mundo exterior pode ser representado. ensina Magda Soares: é possível participar de práticas de
Conforme salientamos no primeiro texto desta publicação, letramento mesmo sem ter o domínio do sistema da escrita
ao discutirmos a importância da atividade lúdica, a brincadeira (SOARES, 1998).
ou o jogo de faz de conta, pela reversão do significado dos Para me aproximar do tema da autonomia e da mediação
objetos (uma caixa de papelão pode representar um carro ou na leitura literária por crianças, o qual proponho com este
um avião), é considerada por Vygotsky um simbolismo de texto, lançarei mão de uma estratégia para evitar me perder no
segunda ordem. No jogo do faz de conta, a criança destaca o emaranhado de livros que se produzem ano a ano para a faixa
objeto de seu significado e da sua função, atuando com ele no etária que se pretende alcançar. Assumindo uma proposta
plano imaginário como se fosse outro. Dessa forma, a criança mais modesta, analisarei três livros de uma escritora de
liberta-se do plano imediato de sua percepção, criando um carreira já consolidada por obras dirigidas a esse público
novo plano de ação, com novas fronteiras de significação. especial, com o objetivo de levantar aspectos sobre elementos
Assim, a brincadeira é uma atividade propícia ao processo de relevantes que compõem os gêneros, e que, em grande parte,
significação por envolver uma flexibilização na forma de se caracterizam pelo equilíbrio entre narrativa visual e
compreender os signos e suas relações. Ela ajuda a criança a narrativa verbal. A autora é Eva Furnari e foi escolhida por

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trazer, no conjunto de sua obra, muitos exemplos de livros que literários que produz, nos quais se manifesta uma visível
propiciam diferentes modos de interação com as crianças, aversão a estereótipos temáticos, linguísticos, formais,
cumprindo bem o trânsito entre a leitura autônoma e a leitura imagéticos etc. Tratarei aqui, inicialmente, de três livros que
mediada, que, neste texto, denomino: histórias para ler exibem a harmonia entre a visualidade das ilustrações e a
sozinho e histórias para ouvir. exploração dos aspectos linguísticos da narrativa/ poesia
As histórias que ficam da infância não são somente aquelas verbal, propiciando modos diferentes de interação com os
que lemos por conta própria, mas também aquelas que nos pequenos leitores. Em seguida, focalizarei um desses livros -
foram contadas. Neste caso, a memória guarda, além da uma narrativa construída apenas por imagens - que foi lida por
história e seus personagens, a voz de quem contou, sua uma criança que se encontrava em fase de alfabetização e
entonação, seus gestos, sua emoção. Ao contrário do que se achou por bem escrever a história que as imagens lhe
imagina, os dois modos de conhecer as histórias são contavam.
experiências que prosseguem pela vida afora, mesmo depois Esses livros podem apresentar interessantes elementos
que se aprende a ler. Quando se pensa na formação do leitor, para a reflexão sobre o que estamos compreendendo por
ouvir e ler narrativas literárias são atos que mais comumente leitura autônoma ou leitura mediada, na fase em que a criança
localizamos no aprendizado inicial da leitura, embora os inicia ou desenvolve o processo de alfabetização. Estamos
encontremos, de modo menos frequente, em outras etapas da entendendo este processo em sua relação com o processo de
escolaridade. Não vamos refletir, aqui, sobre os atos de ler e letramento, tal como o propõe Magda Soares (1998; 2003), em
ouvir histó- rias em toda essa abrangência, mas, sim, sobre o recentes trabalhos em que trata da necessidade de
que significa a interação com o texto literário quando ainda “reinventar” a alfabetização, quando sugere a conciliação entre
não se tem o amplo domínio do código alfabético, fase em que alfabetizar e letrar. Supõe-se, assim, um leitor que enfrenta as
a mediação é necessária e está em relação direta com a dificuldades próprias do processo de aquisição do código, mas
atividade de ler sozinho, que significa a conquista da que, simultaneamente a esse enfrentamento, convive com
autonomia. práticas de letramento, entre as quais as literárias, no contexto
A entrada da criança no mundo da escrita é responsável escolar e no contexto social mais amplo.
pela abertura de inúmeras portas, antes acessíveis a ela Ressalta-se, ainda, como justificativa desse recorte, terem
somente pela mediação do outro. Na infância, a presença do sido os primeiros livros de Eva Furnari as narrativas de
outro - nas interações com a linguagem escrita, ainda não imagens, conhecidas como ‘livros de imagens’. Só depois de
totalmente familiar à criança pequena -, faz-se constante. passar por essa experiência, essencialmente imagética, a
Quando começa a ler, a criança convida o leitor adulto mais escritora “aprendeu” a escrever textos verbais que
experiente a participar com ela nos processos de construção dialogassem com as imagens visuais. Isso talvez explique o fato
de sentidos, em situações de leitura de livros, placas, outdoors, de não haver, nos livros da autora, compostos por texto verbal
jornais, rótulos e tantos outros textos, que ela passa a ver/ler e texto visual, uma predominância de uma linguagem sobre a
de modo diferente do que até bem pouco tempo via, quando outra. O equilíbrio configura-se, assim, perfeito.
não lia.
É importante reforçar, assim, que, na infância, mais que em Algumas considerações finais
outras fases da formação do leitor, ler é atividade partilhada, Pavimentar bem o caminho do letramento literário antes e
na qual se confirmam sentidos e funções da leitura, no início do processo de alfabetização pode ser a mais
construídos pela curiosidade de quem descobre que a letra diz importante tarefa à qual as professoras deveriam se lançar, se
o mundo. Com a literatura não poderia ser diferente. No início descobrirem a tempo o que significa o contato com bons livros
do processo de alfabetização, pode haver uma convivência da literatura para a vida, para a formação humana. Por mais
harmoniosa entre diferentes maneiras de interagir com o texto fáceis e simples que sejam as histórias, elas sempre requerem
ficcional ou poético - o texto em prosa ou em verso - que se faz algum ensinamento, que vai desde o modo como pegar o livro,
ora pela escuta, ora pela leitura individual ou silenciosa. Este passar as páginas; desde as indicações sobre a direção da
texto pretende mostrar que, embora muitas vezes as crianças escrita nos livros, sobre a ordenação sequencial que indica um
ainda não tenham o domínio da tecnologia que lhe dará fluxo narrativo - seja livro de imagens, seja texto verbal e visual
suporte para ler textos mais complexos, a alternância entre - daí a aposta, no que a princípio parece ser um exagero, em se
textos mais simples e textos mais complexos é importante para produzirem livros para bebês.
a construção da progressiva autonomia. A autonomia do leitor é uma conquista contínua, que não
se separa definitiva- mente das mediações. Por mais
Do simples ao complexo; do complexo ao simples experientes que sejam os leitores, eles sempre participam de
Parte-se do pressuposto de que a experiência da narrativa processos mediados, condição movida pelos desafios que os
ficcional e da poesia deveria anteceder a aquisição do código textos - e aqui nos interessam de perto os literários - nos
da escrita. Antes de saber ler, a criança já pode conhecer - se colocam. O simples, na literatura infantil, não pode ser
lhe são contadas histórias, recitados poemas, cantadas confundido com o banal, que segue os moldes de uma
cantigas - alguns gêneros da literatura. Este é um dado produção que não respeita a inteligência infantil, em nome do
importante quando se pensa na formação de leitores, favoreci- mento de leitura autônoma, sem a mediação de um
sobretudo na faixa que se estende da Educação Infantil aos adulto. Sem repetir fórmulas ou facilitar a linguagem, a
primeiros anos do Ensino Fundamental, quando se dá o simplicidade na literatura para crianças pode propor desafios
processo de alfabetização propriamente dito. em direção a uma travessia para a autonomia, ao produzir
Nesses segmentos da escolaridade, os livros da literatura estímulos que assegurem a continuidade do processo de
que chegam até as bibliotecas escolares, e que supostamente formação de leitores apenas iniciado.
chegam aos leitores, compreendem narrativas e poesias de
diferentes níveis de complexidade. Temos desde livros que Alfabetizar letrando a partir da literatura infantil
preveem um leitor com um nível mais avançado de capacidade As atividades relatadas foram desenvolvidas na Escola
de leitura, mas que já agradam às crianças, até livros cujos Municipal Dona Marucas, da rede municipal da cidade de
textos oferecem menos dificuldade para os aprendizes. Daí a Lagoa Santa/MG, com crianças de 5/6 anos, ao longo do ano de
escolha dos livros de Eva Furnari para tratar desse assunto, 2008, em uma turma com 22 alunos, pela professora Juanice
por apresentarem uma variedade no que diz respeito aos de Oliveira Vasconcelos, e com o apoio e a colaboração da
níveis de complexidade que queremos focalizar. A escritora foi professora participante do Núcleo de Alfabetização e
escolhida para esta análise também pela qualidade dos textos Letramento do município, Eliana Pereira Araújo.

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Partimos do princípio da importância do trabalho com a A personagem seguinte, no livro O carteiro chegou, é
literatura na infância e da contribuição que esse trabalho traz Cinderela; o carteiro entrega a ela um ofício de uma editora
para a aquisição da leitura e da escrita. Procuramos, sempre, que pretende publicar um livro com a história dela, vindo junto
incentivar o manuseio de livros de diferentes gêneros textuais o livrinho, para que ela dê sua autorização. A turma propôs
e o convívio com diferentes portadores de textos, para melhor escrever também um livro, e escolheu a história de Cachinhos
compreensão do uso social da escrita. Dourados para confecção de um livrão, com desenhos e texto
Em nossa sala de aula, temos um cantinho de leitura com deles, o que foi feito.
diversos porta- dores: convites, calendário, guia comercial da A seguir, o carteiro entrega ao Sr. Lobo Mau uma carta do
cidade, histórias em quadrinhos, livros de receitas, fábulas, advogado de Chapeuzinho Vermelho e dos Três Porquinhos,
poesias, contos de fadas, livros de imagem e muitos outros, que comunicando providências que iam ser tomadas contra as
os alunos podem manusear, ler, explorar durante o período de maldades que ele tinha praticado. Desta vez, votamos em sala
aula. Além desse cantinho, todos os dias as crianças ouvem qual a pena que o Lobo deveria cumprir por todas as maldades
uma história, ora lida, ora contada, ora gravada em CD. cometidas, e escrevemos uma carta para ser enviada ao Lobo;
Observando a turma, percebemos que, mesmo tendo desta vez, demos uma atenção especial à escrita do
contato com uma variedade de material escrito, os alunos endereçamento no envelope.
ainda não conseguiam identificar o objetivo e as A última carta que o carteiro entrega é um cartão de
características de outros gêneros textuais que não fossem aniversário que Chapeuzinho Vermelho envia para Cachinhos
histórias. Resolvemos, então, trabalhar com o livro O carteiro Dourados, que está comemorando mais um ano de vida, e junto
chegou, de Janet & Allan Alberg, da editora Companhia das manda uma nota - um “dinheirinho” - como presente. Os
Letrinhas, que proporciona diversas situações de uso de alunos trouxeram várias notas com as quais trabalhamos
diferentes gêneros aliados aos contos de fadas, o que números e quantidades; além disso, construímos uma receita
possibilitaria às crianças, de uma forma muito prazerosa, o de gelatina que seria uma guloseima a ser servida na festa de
contato com uma variedade de textos que circulam na aniversário.
sociedade. A segunda etapa do trabalho com o livro O carteiro chegou
A primeira etapa do trabalho foi uma sondagem para saber foi a pintura das histórias em tecido. Cada história foi dividida
se todos os alunos conheciam todas as histórias citadas no em três partes: o início, o meio e o fim, o que levou as crianças
livro; percebemos que nem todas eram conhecidas e que a perceberem a estrutura de uma narrativa. Votamos cenas
algumas crianças conheciam finais diferentes para a mesma para serem desenhadas e pintadas para cada parte. Cada
história. criança recebeu um quadrado de tecido, desenhou e depois
Decidimos, então, recontar as histórias, discutindo os pintou sua cena com tinta para tecido; levamos os quadrados
diferentes finais, à medida que íamos realizando a leitura do para uma costureira que juntou os retalhos na ordem
livro O carteiro chegou; para isso, quando contávamos ou adequada, colocou uma borda com uma chita bem colorida e
relembrávamos uma história, procurávamos fazê-lo usando alegre, formando, assim, uma linda colcha para a nossa sala:
diferentes versões. Depois de cada história, abríamos o todas as vezes que buscávamos livros no nosso cantinho de
envelope com a correspondência entregue pelo carteiro à leitura, nós a utilizávamos para forrar o chão e deitávamos
personagem da história. sobre ela.
O primeiro envelope é uma carta de Cachinhos Dourados A terceira e última atividade com base no livro O Carteiro
pedindo desculpas à família dos ursos. Analisamos a estrutura Chegou foi a criação de uma outra versão para a história de
da carta e sua intencionalidade; logo surgiu a vontade de Chapeuzinho Vermelho, levando as crianças a participarem da
escrevermos nós também uma carta para a turma vizinha, pois escrita de um livro. A história começa quando Chapeuzinho
os alunos, em um outro momento, tinham manifestado o Vermelho recebe uma carta da vovó, comunicando que ela não
desejo de cantar para aquelas crianças a música “De olhos estava muito bem de saúde. A partir daí, surgiu um livro com:
vermelhos” de que eles gostavam muito, e a carta foi vista a lista das guloseimas de que a vovó mais gostava; um cartaz
como um recurso para comunicar o interesse de apresentar a informativo que Chapeuzinho encontra no meio do caminho,
música, sugerindo o dia e a hora. Assim foi feito. na floresta; um mapa para chegar à casa da vovó; um bilhete
A próxima história no livro é a de João e Maria; o carteiro que a vovó deixara na porta de sua casa para Chapeuzinho; a
entrega à bruxa um panfleto de propaganda de artigos para lista de telefones que Chapeuzinho consultou para pedir ajuda;
bruxa. A partir dele, fizemos uma lista de objetos que uma a lista de convidados que iriam participar da festa de
bruxa usa e, ao compararmos a lista com os artigos oferecidos comemoração da prisão do lobo; a receita do delicioso bolo da
no panfleto, vimos que a loja não oferecia chapéu de bruxa. vovó; e, finalizando, uma nova versão da música cantada por
Criamos, então, o nosso panfleto de oferta de chapéus de Chapeuzinho Vermelho. O resultado foi surpreendente! Do
bruxa, com diversos modelos. início ao fim da história, as crianças tinham uma situação a
Em relação à história de João e o pé de feijão, o carteiro leva resolver e uma nova possibilidade de escrita.
para o gigante um cartão postal enviado por João, em viagem Em síntese: foi desenvolvido um trabalho com textos
de turismo com o dinheiro fornecido pela galinha de ovos de literários, em que os contos de fadas foram também base para
ouro. Trabalhar com o cartão postal não foi fácil, porque é um o conhecimento e o uso de vários gêneros e portadores de
gênero e portador muito ausente na vida das crianças; levou textos, e as crianças tiveram a oportunidade de vivenciar
algum tempo para que compreendessem seus objetivos e experiências em que desempenharam o papel ora de leitores,
características, mas quando isso aconteceu, foi mágico! ora de escritores, mesmo antes de estarem convencionalmente
Nessa mesma ocasião, estávamos, em outros momentos, alfabetizadas.
trabalhando com o poema “As Borboletas”, de Vinicius de
Morais, e as crianças tinham feito muitas borboletas que foram O Jogo Linguístico: brincando com as hipóteses das
espalhadas pelo jardim da escola; tínhamos tirado algumas crianças
fotos, e quando as crianças contemplaram, em sala, a “obra de Em meados dos anos 90, tive a oportunidade de estudar
arte” que tinham feito, uma delas propôs fazermos com uma Linguística por meio de uma ação de formação continuada
das fotos um cartão postal para enviarmos às crianças de uma desenvolvida pela Universidade Federal de Minas Gerais.
creche da rede, para mostrar a elas como era bonita e legal a Nesse processo de formação, aprofundei meus conhecimentos
nossa escola, já que a maioria das crianças dessa creche são sobre Fonética e Fonologia, o que me levou a pensar na
direcionadas para a nossa escola. possibilidade de elaborar um procedimento de ensino voltado

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para o processo de alfabetização, apoiado nos estudos sobre palavras, e compreender as regras de funcionamento do
análise fonológica. sistema de escrita, aplicando-as em suas práticas de escrita.
Iniciei, então, uma investigação didática, planejando um Outra ideia que orienta o encaminhamento do Jogo Linguístico
roteiro de perguntas direcionadas a um grupo de crianças que junto às crianças diz respeito à necessidade de se promover a
apresentavam diferentes hipóteses sobre o sistema de escrita. interação entre as crianças para que elas tenham
As crianças foram reagrupadas por níveis próximos de acordo oportunidade de socializar e refletir sobre as hipóteses que
com suas hipóteses e conhecimentos sobre a língua14, constroem ao longo do processo de aquisição da língua escrita.
formando-se, assim, pequenos grupos: o grupo de crianças que Durante a realização do Jogo, a professora faz perguntas sobre
revelavam hipótese pré-silábica, o grupo de crianças que a escrita de palavras, considerando o conhecimento que cada
revelavam hipóteses silábicas e o grupo de crianças que grupo tem a respeito do funcionamento do sistema de escrita.
revelavam hipótese alfabética. Essas perguntas geram “problemas” a serem resolvidos
Para cada grupo de crianças eram dirigidas perguntas cooperativamente entre os membros de uma equipe. Desta
sobre sílabas orais (iniciais, finais e mediais) e letras (sons das forma, elas estimulam as crianças a refletir sobre conflitos que
letras: iniciais, finais e mediais), dentro de uma determinada integram o aprendizado da língua escrita. Ao mesmo tempo, é
palavra. Por exemplo, crianças que ainda não faziam relação importante assegurar que as regras sejam respeitadas e que os
entre aliterações, rimas e não percebiam a pauta sonora das integrantes das outras equipes respeitem o processo e a
palavras eram questionadas com as seguintes perguntas: capacidade das demais equipes.
- Há o som PA ou MA na palavra MALA?
- Há o som TÉ ou FÉ na palavra CAFÉ? A produção de textos e o desenho na sala de aula
- Há o som MI ou LI na palavra COMIDA? O relato apresentado a seguir descreve e analisa algumas
Observe que as perguntas apresentadas às crianças situações de aprendizagem propostas pela professora Miriam,
demandavam uma análise fonológica das sílabas, mediada que leciona em uma escola da Rede Municipal de Belo
pelas atividades de comparação destas. Depois que as crianças Horizonte. Por meio desse relato, buscaremos refletir sobre as
apresentavam suas respostas, as palavras eram registradas no concepções e as intervenções subjacentes à sua prática em sala
quadro para que elas pudessem ser analisadas na perspectiva de aula.
de suas formas escritas. Para a professora Miriam, uma das ações pedagógicas mais
Para as crianças com hipóteses mais avançadas sobre a significativas na prática de ensino junto às crianças de seis
língua escrita, como, por exemplo, as crianças que anos é a atividade de desenho. Ao falar sobre a organização do
apresentavam hipóteses silábicas de escrita, o foco das seu trabalho, no início do ano, a professora afirmou que
perguntas passava a ser a letra (correspondência letra/som) contava com a participação de todas as crianças para compor
na mesma sequência de abordagem: letra inicial, final e medial. os painéis da sala. Na sua forma de ver, o ambiente da sala de
- Há a letra F ou L na palavra FOCA? aula não pode ser organizado exclusivamente pelo professor
- Há a letra I ou U na palavra TATU? alfabetizador. A professora explicitou essa concepção ao
- Há a letra T ou B na palavra CABELO? comentar sobre a organização do espaço escolar no momento
Para o grupo de crianças com hipóteses nos níveis silábico- em que as crianças são recebidas no início do ano letivo:
alfabéticos e alfa- béticos, as perguntas tinham como unidade “No início do ano nós tivemos uma semana antes para
de análise os fonemas surdos e sonoros, as consoantes nasais decorar, arrumar, que no meu entender, com a minha
e algumas regularidades. experiência, precisamos sim de uma organização anterior para
- Há a letra T ou D na palavra TOMATE? conhecer pelo menos o que está escrito na ficha do aluno15.
- Há a letra M ou N na palavra CANETA? Quem são esses alunos, onde eles moram, que experiências eles
- Há ou não há a letra R na palavra CARTA? têm, mas o acontecimento, a organização da sala, ah..., isso é
- Há ou não há a letra N na palavra CANTA? com eles. (...) Quando eu recebo os meninos, juntos, nós vamos
compondo esse ambiente que é nosso...”
Após realizar o Jogo Linguístico com pequenos grupos de No início do ano letivo, para compor o ambiente da sala de
crianças, iniciei o processo de aplicação em turmas de crianças aula, a professora envolveu as crianças em produções de
com agrupamento heterogêneo. Pude, então, observar com desenhos. Ela orientou as atividades de modo que as crianças
mais cuidado a forma como as crianças lidavam com essa situ- soubessem o que e o para que desenhar, deixando claro para a
ação de aprendizagem. Essa observação me permitiu turma qual era a função ou o destino dos desenhos que eles
aprimorar os encaminhamentos em sala de aula e a propor um produziriam. Os desenhos poderiam compor capas de
jogo por meio do qual as crianças seriam desafiadas a superar trabalhos ou de algum projeto, como também cartões,
suas hipóteses, cada uma de acordo com seu nível conceitual. convites; poderiam ser expostos em painéis da escola, tanto na
sala de aula quanto na área externa da sala, no pátio. Essa
Em que consiste o Jogo Linguístico atitude se constituiu como condição importante que orientava
O Jogo Linguístico é uma atividade didática que tem como as crianças. Temos, aqui, o sentido da tarefa, o por que, o para
objetivo estimular o processo de compreensão por parte das que e o para quem desenhar, objetivos que precisam ser
crianças acerca da língua escrita enquanto sistema de previstos no planejamento pedagógico. A professora ressaltou
representação. Apesar de ser um procedimento de ensino que que as crianças pediam constantemente para desenhar:
emprega uma estratégia lúdica, não pode ser visto apenas “(...) eles têm pedido muito desenho, eu acho que eles já vêm
como um “jogo de brincar”. O Jogo Linguístico exige um muito com essa cultura de colorir o patinho, o gatinho, assim
rigoroso processo de planejamento por parte da professora. A tudo pronto, e eu não quero... Em hipótese alguma eu dou um
organização metodológica do jogo, o roteiro prévio a ser desenho para meu aluno colorir a troco de nada”.
elaborado, a rotina com que é proposto em sala de aula, a Havia, também, algumas propostas em que o desenho era
sequência e a progressão que caracterizam o seu livre, embora estas não fossem as situações mais recorrentes
encaminhamento junto às crianças, a avaliação e o registro são na turma da professora Miriam. Mesmo nestas situações, o
elementos fundamentais que devem fazer parte do desenho não era visto como uma mera tarefa sem significado.
planejamento pedagógico desse jogo. Desenhar tinha um sentido para as crianças e para a turma
A proposta baseia-se na ideia de que a tarefa de analisar naquele momento específico. A professora acreditava que a
palavras orais e escritas deve propiciar ao aprendiz um expressão das crianças, por meio do desenho, poderia ser
trabalho cognitivo que o leve a comparar, identificar e limitada, caso oferecesse apenas desenhos prontos para
classificar as unidades sonoras e gráficas que constituem as colorir:

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“Dependendo das experiências anteriores, vivenciadas pelas questionamentos e alguns desafios. Sabemos que também as
crianças em outros espaços institucionais, elas podem professoras, ao assumirem, no Ensino Fundamental, as
manifestar se interesse ou mesmo dizer que não sabem desenhar crianças dessa idade, enfrentam desafios e inúmeras
e, em alguns casos, é possível perceber também que têm apenas dificuldades.
o hábito de colorir as matrizes prontas reproduzidas.” Ao pensarmos nesses desafios e dificuldades, não podemos
Um enfoque que caracteriza a forma como a professora negligenciar o fato de que esse público pertenceu à educação
Miriam incorporava a prática do desenho no cotidiano escolar infantil, uma etapa de ensino com concepções de criança,
das crianças diz respeito ao fato de as atividades de desenho aprendizagem, conhecimento, tempos e espaços
ocorrerem quase sempre em situações contextualizadas. O diferenciados. Estamos, pois, dando prosseguimento a algo
trabalho que realizou com o poema “Gato da China”, de José que se iniciou há muito tempo e que traz em si uma dimensão
Paulo Paes, da editora Ática, é um exemplo de uma situação em sempre presente na história da educação deste País: a luta pelo
que a atividade de desenhar esteve presente de forma direito a uma educação de qualidade. Nessa perspectiva, as
contextualizada. experiências, saberes e conhecimentos construídos na
O trabalho realizado com o poema se configurou como uma educação infantil acerca dessa criança precisam mais do que
situação voltada para o eixo da leitura. Priorizou-se o aspecto ser considerados, devem, sobretudo, servir de parâmetro para
lúdico do texto, o prazer em ler e a sua compreensão. Outro as práticas e as intervenções pedagógicas que se pretende
aspecto importante na exploração do poema “Gato da China’ construir com elas no novo Ensino Fundamental.
pela professora Miriam foi a entonação de sua leitura para as Uma questão a ser considerada refere-se ao respeito a essa
crianças. Por meio da sua estratégia de leitura oral, a criança e a seu tempo de vida. A escolarização obrigatória não
professora fez com que as crianças percebessem as rimas, os pode dar excessiva centralidade aos conteúdos pedagógicos
sons finais das palavras no poema. em detrimento do sujeito e de suas formas de socialização.
Sabemos que, na leitura de textos rimados, é importante Essa proposição ganha especial destaque, principalmente se
chamar a atenção para a percepção das rimas, pois, por meio consideramos as características das sociedades
delas, as crianças podem identificar os sons semelhantes, contemporâneas. Quer pelas exigências de uma formação
evidenciando-se, assim, aspectos sonoros da língua. Como educacional futura; quer pela escassez ou ausência de espaços
veremos a seguir, a mediação da professora, assegurando a públicos adequados, tendo em vista a redução e, em alguns
percepção sonora das palavras, foi fundamental para a casos, o desaparecimento do espaço da rua como local de
realização da tarefa posterior. socialização; quer pela diminuição das situações de troca entre
A tarefa proposta consistia em identificar as palavras que irmãos e primos acarretada pela redução das taxas de
faltavam no texto, no momento em que a professora lia natalidade, a infância contemporânea encontra na escola um
pausadamente. “Era uma vez, um gato...” Nesse momento, as espaço importante para sua manifestação.
crianças deveriam completar respondendo: “chinês”. O Por outro lado, não podemos perder de vista o direito
preenchimento dos espaços com as respectivas palavras desse segmento da população ao conhecimento, em particular,
ocorreu após todo o trabalho da percepção sonora. A o direito de acesso à linguagem escrita. Como argumentamos,
professora destacou as palavras no quadro, promovendo a criança pequena é um sujeito que interage com outros
situação de leitura de cada uma delas, seguindo a ordem do grupos sociais e com suas produções simbólicas e a linguagem
texto. escrita é uma dessas produções com as quais as crianças têm,
A proposta de fazer um desenho contextualizado no tema desde muito pequenas, uma familiaridade e uma curiosidade
do poema foi apresentada às crianças no dia seguinte, como para conhecer e dela se apropriar. Entretanto, as famílias e os
uma maneira de se ampliar a atividade de leitura do poema. profissionais da educação sabem que assegurar o aprendizado
Assim, após uma releitura coletiva do texto, a professora pediu da leitura e da escrita tem sido um dos maiores desafios para
às crianças que produzissem um desenho que representasse o a escola, principalmente considerando as trajetórias de
que elas tinham achado de mais curioso ou o que elas fracasso na apropriação desse conhecimento por parte de um
passaram a imaginar a partir da leitura do poema. segmento importante da população.
O desenho é uma forma de representação que permite à Para que as crianças se apropriem desse objeto do
criança demonstrar os seus conhecimentos e sentimentos. conhecimento humano sem serem desrespeitadas na sua
Assim ela pode representar o modo como percebeu a situação condição, é preciso mudar a história da escola. Ainda estamos
vivenciada, nesse caso, um poema lido pela professora. no caminho da construção de uma educação formal que
Garantir às crianças a apresentação dos desenhos, seja respeite os direitos da criança, e essa publicação não é a
individualmente ou no coletivo, em situações de interação, resposta para todas as questões. Muito pelo contrário, ela foi
torna-se relevante, pois se configura como um momento de (esperamos) mais um pequeno passo nessa direção. Nossa
expressão oral. Este é um momento real de interlocução com preocupação central foi a de elaborar um instrumento que
os pares, uma atividade contextualizada e que tem sentido auxiliasse as professoras a percebem a criança como um
para o grupo. Quando as atividades são previamente sujeito que sabe algo sobre o mundo da escrita e, sobretudo,
planejadas e acompanhadas, a professora pode reconhecer o alguém que deseja se apropriar desse objeto do conhecimento.
processo evolutivo de cada um. Quando as crianças expõem Buscamos, ainda, elaborar um material que respaldasse
seus desenhos, na roda de conversa, expressam seus desejos, teoricamente as opções metodológicas das professoras.
argumentam, discorrem sobre as suas produções, situação que Finalmente, com essa publicação esperamos ter contribuído
se configura como um momento de ouvir e falar de modo para a ampliação de importantes conceitos e, sobretudo, ter
organizado. proporcionado reflexões acerca do processo de apropriação da
Vale ressaltar que a proposta de desenhos não se vincula linguagem escrita pela criança de seis anos de idade.
apenas ao trabalho com os gêneros textuais. Ela também pode Esperamos, ainda, que a língua escrita possa a ser
se concretizar e se aliar aos conhecimentos de outras áreas, compreendida como uma ferramenta que deve interagir com
tais como as ciências naturais, a história, a geografia e a o universo infantil, com a maneira de a criança se apropriar do
matemática, trabalhados ao longo do ano letivo. mundo e não como um conteúdo escolar a ser aprendido para
ser usado no futuro, nas próximas etapas escolares.
Considerações Finais: professoras, crianças de seis anos
e o prazer de ler e escrever para aprender
A tarefa de escrever sobre o trabalho pedagógico com
crianças de seis anos nos possibilitou diferentes

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possibilidades e limites. A escola, por meio do cerceamento


das ações corporais e espontâneas e do desenvolvimento de
10. Corporeidade e atividades repetidas e rotineiras, busca o disciplinamento e
aprendizagem na educação controle, impondo pensamentos, ritmos, posturas e
infantil movimentos padronizados.

Segundo Silva na escola para a transformação, terá que


existir liberdade de movimentos, de expressão, de exploração
A educação desenvolvida nas escolas públicas está a de material concreto, de convívio grupal, de vivência do corpo.
merecer uma reflexão, um repensar das ações em busca de Além disso, acreditamos que, assim como Freire propõe que o
novos caminhos. Tem-se verificado, de forma generalizada nas alfabetizador tome como ponto de partida o universo
diversas áreas de conhecimento, que os professores que ali vocabular da população com que ele trabalha, o educador
trabalham não se interrogam sobre o que fazem, para que e a transformador deve partir do conhecimento corporal concreto
quem interessa essa educação. Seria, talvez, desnecessário de seus alunos.
dizer que não fogem à regra as ações que se envolvem Leal em suas experiências com alfabetização em uma
diretamente com o corpo, como é o caso da Educação Física. 65 escola na favela da Rocinha/RJ observou que as brincadeiras
Torna-se bastante difícil falar do corpo, pois esquecemos das crianças são uma de suas principais manifestações
ou fomos levados a nos esquecer que somos corpo, de que espontâneas. Através delas, articulam todo o seu universo: os
nossas comunicações cotidianas com o mundo ocorrem seus desejos, a sua sexualidade, o seu desespero, a vida e a
através dele e com ele. Mas é fundamental que se pense a morte. Constatou ainda que, enquanto na favela elas
questão do corpo na educação, procurando desvelar as conseguiam se organizar para brincar e jogar, mas na escola
concepções e valores, bem como os reais significados que não conseguiam fazer o mesmo.
estão implícitos nas ações escolares, visto que, como fala Paulo De nossa parte, também observamos que, no recreio, elas
Freire que: são capazes de se organizar, seguindo, por exemplo, nas
brincadeiras e jogos, as regras por elas estabelecidas de
"A conscientização não pode existir fora da 'práxis', ou comum acordo. Entendemos que as crianças, na sala de aula,
melhor, sem o ato ação-reflexão. Esta unidade dialética não conseguem se organizar como no recreio porque o
constitui, de maneira permanente, o modo de ser ou de professor centraliza todas as decisões, não permitindo que
transformar o mundo que caracteriza os homens". elas exercitem seus conhecimentos, decidam e se organizem.
Soma-se a isso o fato de que as representações e os
Observando o cotidiano das práticas pedagógicas, significados que a escola e os adultos em geral têm sobre as
começamos a nos interrogar sobre os porquês de brincadeiras e jogos são diferentes daqueles das crianças.
determinados procedimentos, atitudes, posturas assumidas, Segundo Oliveira, enquanto para o adulto brincar significa
pelos professores, alunos e pais. Nas conversas, olhares, entreter-se com coisas amenas, esquecer, ainda que de
reuniões ou comportamentos diante de situações concretas, maneira passageira, as desilusões e momentos de tensão, a
pode perceber que o corpo faz parte daquilo que Paulo Freire criança, através do brinquedo, fazem sua incursão no mundo,
denominou cultura do silêncio, onde o corpo segue ordens de trava contato com os desafios e busca saciar sua curiosidade
cima. Pensar é difícil; dizer a palavra, proibido. A escola de tudo conhecer. Esse autor afirma ainda que, no brinquedo
silencia a ação corporal-verbal que não esteja de acordo com infantil, práticas e interpretações sociais estão representadas,
as normas estabelecidas. Assim procedendo, está criando um e sua análise nos propicia uma incursão nos problemas
homem, uma mulher para a passividade, para a submissão, econômicos, socioculturais e políticos existentes em nossa
para aceitar as regras do jogo”. sociedade.
As atividades propostas pelos professores não despertam
a criatividade, a curiosidade, o interesse pelas descobertas; Na medida em que estamos cientes de que para qualquer
não é estimulado o gosto pela pergunta. transformação social é preciso ir além do senso comum,
Os alunos são induzidos a responderem aquilo que o buscamos neste estudo fazer uma reflexão crítica sobre nossas
professor quer ouvir, geralmente uma resposta que ele já sabe. constatações do cotidiano escolar. É neste sentido que, a
Duvidar, criticar as atividades tidas como corretas é visto até seguir, procuramos contextualizar historicamente as ações
como um ato de indisciplina e, muitas vezes, aqueles que se que se exercem sobre e no corpo, a forma como têm sido
atrevem a resistir e contestar são punidos, discriminados e interpretados as brincadeiras e jogos na educação e,
rotulados de maus alunos. conhecendo seus reais significados e sua importância para o
Além disso, assim como na família, o corpo é envolto de desenvolvimento das crianças, descobrirem como podemos
mistérios: muitas coisas que dizem respeito a eles são resgatar a corporeidade.
proibidas; não se fala e quase não se toca em determinadas
partes do corpo. Reforçam-se os tabus que têm passado de Algumas concepções de corpo
geração em geração, sem que as maiorias dos educadores se
preocupem em questioná-los em profundidade. Medida fazendo um relato histórico de como o corpo tem
Freire, com procedência, diz que os educandos são sido visto através dos tempos, propõe algumas interrogações:
transformados em seres passivos, que recebem os conteúdos, o que é verdadeiramente o corpo? Como a humanidade o
os conhecimentos, de forma autoritária: muitas vezes concebeu através dos tempos?
impostos pelas Secretarias de Educação às escolas, que, por A partir dessas interrogações expõe o pensamento dos
sua vez, os impõem aos professores, e estes aos alunos, de grandes filósofos da Antiguidade e medievais, que viam o
maneira completamente desvinculada da realidade daqueles a corpo como instrumento da alma (doutrina da instrumentação
quem se destinam. do corpo). Essa concepção conforme Medina foi abandonada
Essa passividade se expressa, regularmente, também a com Descartes, que desenvolveu uma forma de dualismo
nível corporal. É com o corpo que entramos em contato com o "onde o corpo e a alma são substâncias diferentes e
mundo, o experienciamos, conhecendo seus detalhes, independentes". Para ele, o homem é fundamentalmente

65 FIGUEIREDO, M. X. B. A corporeidade na escola: brincadeiras, jogos e desenhos


- Pelotas: Editora Universitária-UFPEL, 2009.

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espírito, o que fica expresso na afirmação: Penso, logo existo. alunos. Ao determinar que eles executem as ações definidas
O pensamento cartesiano continua a vigorar em nossa por ele, influi também na criação de um homem disciplinado,
sociedade, o que pode ser percebido em determinadas cumpridor de ordens que, ao chegar ao sistema de produção,
atividades através da valorização a elas dada, como é o caso do como trabalhador, possa cumprir o que este lhe reserva:
trabalho manual e intelectual, sendo este mais valorizado. produção com o máximo rendimento, de preferência sem
Já em nosso século, o filósofo Merleau Ponty vai se interrogações.
contrapuser a essa posição, com a afirmação "Eu sou meu Medina afirma que na determinação de nossa
corpo" - existo, logo penso. E, ainda, Cruz mostra que: corporeidade há marcada influência da infraestrutura
socioeconômica.
Merleau Ponty considera que a alma e o corpo, que Se vivemos num sistema capitalista, dependente,
ingenuamente Descartes separou e cuja separação influenciou o altamente hierarquizado em níveis sociais, não só a escola
pensamento universal, não podem ser novamente reunidos por como também o homem, o corpo e suas manifestações
um simples decreto exterior que faça um, objeto do outros. Esta culturais, serão produto ou subproduto das estruturas que
união na verdade se expressa em cada um dos movimentos ao caracterizam este sistema.
longo de nossa existência. No entanto, o autor chama a atenção para o fato de que as
relações ocorrem de forma dialética e jamais
Mas foi a partir de Marx que o corpo pôde ser visto com descontextualizada historicamente. É preciso que se veja em
outras dimensões, passando a revelar determinados dramas que níveis os fenômenos acontecem, quais são os
da existência humana. Através de sua análise sobre as relações determinantes e quais são os determinados nessas relações.
de trabalho, ele trouxe à tona, de maneira indireta, a questão
do corpo. Brincar e jogar: o resgate da corporeidade
Durante o feudalismo, quando a classe explorada tinha
como propriedade o sujeito que ela explorava, os Ao falarmos sobre brincadeiras, brinquedos e jogos,
trabalhadores estavam presos a terra. Já no capitalismo o procuraremos estabelecer algumas diferenças entre estes
processo foi alterado: os trabalhadores foram libertos da terra, termos para que se possa compreender os seus significados no
mas isto implicou dupla dependência do capital - são livres contexto deste trabalho.
para vender a força de trabalho e subordinados ao comércio Bettelhem e Oliveira são dois dos autores que se
de produtos necessários à sua sobrevivência. O homem, em preocupam com esses conceitos, porém têm posições não
última instância, ao vender a sua força de trabalho, vende o seu totalmente convergentes. O primeiro estabelece uma distinção
corpo ao capitalista, que paga uma quantidade mínima para entre brincadeira e jogo: brincadeira não é pautada por regras,
repor as energias gastar e continuar no processo de produção. a não ser aquelas que a própria criança impõe às atividades
A sociedade capitalista moderna, para atingir as podendo alterá-las a qualquer momento; os jogos possuem
finalidades, dirige a energia dos homens para o trabalho em regras e estrutura definidas e aspectos competitivos que se
proporções sem precedentes, levando-os a tornarem-se aproximam mais do jeito do adulto passar o tempo. Este autor
alheios ao seu mundo, à natureza, às coisas e às pessoas que afirma ainda que, ao brincar, a criança busca um equilíbrio
rodeiam, bem como a si próprios. O que interessa à dentro de si mesmo, enquanto, no jogo, ela procura
organização industrial é um corpo com movimentos eficientes, harmonizar-se em conformidade com a estratégia de seu
úteis, funcionais, treinados e ritmados para a produção. É oponente. A criança na brincadeira estabelece uma ordem
desinteressante como mostra, que o corpo fale e que se interna e no jogo aceita e trabalha com a ordem externa, a fim
expresse, que se comunique, mas interessa que produza, de atingir seus objetivos. Já Oliveira entende que tanto as
obedeça aos ritmos que são impostos, adaptando-se às brincadeiras quanto os jogos são prática coletiva, que exigem
necessidades da produção, sem questioná-las. uma série de conhecimentos e regras que estabelecem uma
A sociedade em que vivemos é gestada em longo processo diferença entre o brinquedo e a brincadeira.
de instituições que moldam o indivíduo articulando-o Trata-se, primeiramente, de um objeto palpável, finito e
ideologicamente à ordem, reprimindo as suas manifestações materialmente construído, podendo-se construir segundo
anormais e recompensando as normais. A escola, como parte formar variadas de criação, desde aquelas artesanais até as
da sociedade onde se insere, está marcada por essas ações. inteiramente industrializadas, sendo que o brinquedo separa-
se da brincadeira e do jogo, de vez que ambos se expressam
O corpo na escola capitalista muito mais por uma ação do que propriamente por um objeto.
Nunca será demais insistir que essa associação do brinquedo
Alves afirma que Marx, em seus escritos, dizia que o ao objeto e do jogo e da brincadeira à ação não é mutuamente
capitalismo é uma educação do corpo, que é ensinado a se excludente, tanto a manipulação de um brinquedo qualquer
esquecer de todos os seus sentidos eróticos, sendo implica necessariamente uma ação, enquanto um jogo ou
transformado apenas no local de um sentido - sentido da posse brincadeira socorre-se de objetos, suportes materiais para se
- onde a sociedade transforma o desejo de ter e de usar na realizarem.
principal preocupação do homem. Por outro lado, Piaget não estabelece tais distinções,
A escola utiliza-se de uma variedade de situações em seu denominando jogo toda a atividade lúdica infantil. Porém ele
cotidiano para fazer tal educação. Podem-se notar, através dos realiza uma classificação dos jogos, de acordo com a
programas, conteúdos, dos horários, dos deslocamentos em complexidade de suas estruturas: o jogo de exercício, que é o
filas, uma infinidade de modelos de ações que devem ser que não supõe qualquer técnica particular; o jogo simbólico,
seguidos e cumpridos por todos. Nesse sentido, Foucault e que implica a representação de um objeto ausente, e o jogo de
Guimarães afirmam que um dos objetivos da escola é controlar regra, que supõe relações sociais ou interindividuais.
o corpo, através de atitudes de submissão e docilidade que De nossa parte, neste estudo, nos inclinamos pelos estudos
ocorrem nos exercícios que esquadrinham o tempo, o espaço, estabelecido por Piaget, mas entendemos que as brincadeiras
os movimentos, gestos e atitudes dos alunos. As ocupações possuem regras definidas pelas próprias crianças, enquanto o
ocorrem de maneira determinada, por meio de ritmos jogo tem regras definidas "oficialmente", mas do jeito do
coletivos e obrigatórios: aquisição dos mesmos adulto de jogar.
conhecimentos, os mesmos tipos de provas e exames. O
professor, que possui um poder aparente nas decisões, exerce
na sala de aula um poder concreto ao nível do corpo dos

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As brincadeiras e jogos no desenvolvimento da criança atividades lúdicas; brincar é sua linguagem secreta, que
devemos respeitar mesmo se não a entendemos.
Huizinga teorizando sobre os jogos, afirma que, além das Como exemplo dessa linguagem secreta, vários autores
funções de homo sapiens, que é raciocinar, e a do homo faber, esclarecem a importância que as repetições das brincadeiras
que é de fabricar objetos, há nos homens e animais uma têm para as crianças. Enquanto para os adultos estas ações são
terceira, a do homo ludens, onde o jogo é quem propicia a sua percebidas como coisa chata e irritante, para ela executar mais
realização e se caracteriza como: uma vez a sua brincadeira expressa que ela está procurando
...uma atividade livre, conscientemente tomada como 'não compreender o que está fazendo. Bettelheim apresenta como
seria' e exterior à vida habitual, mas ao mesmo tempo capaz de significado:
absorver o jogador intensa e totalmente. É uma atividade A repetição verdadeira nos padrões de brinquedo é um
desligada de todo e qualquer interesse material, com a qual não sinal de que a criança está lutando com questões de grande
se pode obter lucro, praticada dentro de limites especiais e importância para ela, e de que, embora ainda não tenha sido
temporais próprios, segundo uma certa ordem e certas regras. capaz de encontrar uma solução do problema que explora
Promove a formação de grupos sociais com a tendência a através da brincadeira, continua a procurá-lo.
rodearem-se de segredos e a sublinharem sua diferença em
relação ao resto do mundo por meio dos disfarces em outros Já Benjamim afirma ser esta uma lei fundamental
meios semelhantes. desenvolvida pela criança antes das leis particulares e regras
que regem a totalidade de seus brinquedos:
É através do corpo que a criança, desde os primeiros dias
de vida, realiza brincadeiras que são fundamentais para o seu (...) para a criança ela é a alma do jogo; nada a alegra mais
desenvolvimento e crescimento. Bandet & Sarazanas afirmam do que 'mais uma vez'. O ímpeto obscuro pela repetição não é
que o corpo é o primeiro brinquedo que a criança utiliza para aqui no jogo menos poderosos, menos manhoso do que o impulso
brincar. sexual no amor(...) A criança volta a criar para si o fato vivido,
começa mais uma vez do início (...). A essência do brincar não é
“O primeiro brinquedo da criança, objeto de sua atenção e 'fazer como se', mas 'fazer sempre de novo', transformação da
espanto, é realmente o corpo humano, quer se trate do seu experiência mais comovente em hábito.
próprio corpo, quer se trate do corpo de sua mãe".
Chateu vê a repetição no jogo como um esboço de ordem:
Se observarmos a criança num berço, notaremos que ela Alguns jogos tornam-se verdadeira obsessão, uma criança
não vê os brinquedos que lhe são oferecidos prematuramente. de oito anos bate até cem vezes as teclas de um piano, sem se
Ela brinca com os dedos, mexendo uns após os outros, cruza, cansar, outra não para de abrir uma caixa (...). Um aluno da
puxa os da mão esquerda com a mão direita, olha para a mão. escola maternal é ainda muito voltado para a repetição,
Aproximadamente até os três meses, ela brinca quase podendo, por exemplo, subir cem vezes seguidas os três degraus
exclusivamente com os dedos, cabelos, orelhas. A partir daí de uma escada (...). Os ritmos são uma repetição ainda mais
começa a ter interesse pelo mundo exterior, descobre agora o precoce. Pode-se falar de ritmos vitais como o ritmo do sono, o
corpo da mãe, passa-lhe a mão pelo rosto, puxa-lhe os cabelos, da febre (...). Não é de se espantar que também os jogos das
enfia-lhe os dedos nos olhos e nariz. Os acessórios da roupa da crianças sejam sempre comandados por esse amor ao ritmo e à
mãe despertam-lhe a curiosidade. repetição.
À medida que a criança amplia suas experiências, o seu
corpo já não lhe basta, e aparece, então, o primeiro brinquedo. É por tudo isso que não podemos conceber a criança sem
Através das brincadeiras e jogos, constrói esquemas motores, risos e sem brincadeiras. Como disse Chateau se as crianças de
exercita-se os repetindo, integra-os a novos tipos de uma hora para outra parassem de brincar, os pátios das
comportamentos, avança em novas descobertas. No entanto, escolas ficassem silenciosos, as vozes, os gritos fossem
como nos lembra Chateau que: desajeitados, silenciosos e sem inteligência. Aquelas crianças
(...) barbante, vara, traço são símbolos menos carregados de que não brincam podem sofrer interrupções intelectuais, pois
sentido do que o corpo: com o seu corpo a criança pode deixam de exercitar processos mentais importantes para o seu
representar um mundo de objetos. Em primeiro lugar, seres desenvolvimento.
humanos, evidentemente; também seres vivos, coelhos, ursos, Se para a própria criança, ela brinca apenas porque isso lhe
etc. Até objetos inanimados (...). dá prazer, na verdade, como nos esclarece Bettelheim a
Os adultos, na maioria das vezes, não reconhecem a atividade lúdica é uma necessidade que tem sua fonte na
importância da brincadeira infantil, que é vista como um mero pressão de problemas não resolvidos.
passatempo, destituída de significação. No entanto, na Carta (...) brincar é uma atividade com conteúdos simbólicos que
dos Direitos da Criança, está escrito O direito de brincar, as crianças usam para resolver, num nível inconsciente,
justamente porque, como nos demonstram vários problemas que não têm condições de resolver na realidade;
especialistas, é através das brincadeiras que ela busca através da brincadeira adquirem um sentimento de controle que
entender o mundo: por exemplo, Bettelheim nos lembra que no momento estão longe de possuir.
ao brincar imitando os adultos, a criança tenta compreendê-
los. É assim que, representando as suas fantasias no mundo do
faz de conta, a criança vai construindo uma ponte entre a sua
Através de uma brincadeira de criança, podemos subjetividade e o mundo exterior, ao mesmo tempo em que
compreender como ela vê e constrói o mundo - o que ela aprende a ter respeito pelas limitações que a realidade lhe
gostaria que ele fosse quais as suas preocupações e que impõe.
problemas a estão assediando. Pela brincadeira, ela expressa o
que teria dificuldade de colocar em palavras. Nenhuma criança Da "morte" para a vida do brincar e jogar na escola
brinca espontaneamente só para passar o tempo, se bem que
os adultos que a observam possam pensar assim. Mesmo A criança, ao ingressar na escola, enfrenta uma série de
quando entre numa brincadeira, em parte para preencher imposições dos adultos que levam a uma grande quebra no
momentos vazios, sua escolha é motivada por processos ritmo de sua atividade lúdica. Ela, que passa a maior parte do
íntimos, desejos, problemas, ansiedades. O que está tempo a brincar e jogar passa, agora, várias horas imobilizadas
acontecendo com a mente da criança determina suas e presas às cadeiras, executando tarefas que não exigem quase

Conhecimentos Específicos 52
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nenhum movimento. Na maioria das vezes, o brincar passa a consciência de como o sistema age sobre o corpo, tornando-o
ser condicionado à realização das tarefas escolares: Só brinca um objeto.
se realizar os deveres. As atividades da escola são vistas como Assim procedendo, o educador tem como principal
"coisa séria", enquanto que brincar e jogar ficam em um plano objetivo fazer com que os indivíduos desenvolvam elementos
secundário. fundamentais à sua cidadania, onde as diferenças sociais, os
No entanto, Chateau afirma que dos jogos origina-se outra preconceitos, as inabilidades não fiquem escamoteados e
atividade: o trabalho. Para ele, jogar é uma tarefa que exige um camuflados. Simbolicamente, o jogo representa o indivíduo e
determinado esforço e se impõe como um trabalho. Ao aceitar sua vida em sociedade. Tendo o jogo tais características, é
participar de um grupo de jogo, a criança também aceita um preciso que essas representações ocorram em liberdade, que
determinado código lúdico, como um contrato social implícito, as condições se explicitem claramente. Denunciá-las, refletir
diz que: sobre elas, aprendê-las e superá-las é o papel da educação
Para o grande, o jogo é cumprir uma função, ter lugar na transformadora.
equipe; o jogo, como o trabalho, é, por conseguinte, social. Por
ele, a criança toma contato com as outras - se habitua a Questões a serem articuladas pela leitura do cotidiano
considerar o ponto de vista de outrem, e sair de seu
egocentrismo original. O jogo é a atividade do grupo. A partir de nossa prática com trabalhos que envolvem
Este mesmo autor relata que, em uma pesquisa realizada diretamente o corpo, observamos que nas escolas os
em escolas elementares de Viena, foi constatado que 80% das conhecimentos que os alunos têm de seus ritmos e
crianças da 1ª série fracassaram porque não tinham movimentos e suas formas de expressão não são valorizados.
desenvolvido a atitude de trabalho em seus jogos antes de O fato constatado por outros autores de que a escola impõe, de
ingressar na escola. forma autoritária, uma variedade de atividades estranhas à
Mas cabe aqui uma pergunta: Por que, mesmo tendo vários realidade concreta deles, atinge também a corporeidade.
autores escritos sobre a importância dos jogos e brincadeiras A ação pedagógica da escola, baseando-se no princípio de
na vida das crianças, a escola quase concretiza a hipótese de que as crianças da periferia não têm conhecimentos, lhes
Chateau fazendo com que elas parem de brincar de uma hora impõe atitudes corporais - as boas maneiras no falar,
para outra, deixando os seus pátios e suas salas de aula caminhar, sentar-se, alimentar-se, brincar, etc. -, que são
silenciosa? completamente diferentes de suas experiências vivenciadas
fora da escola. Aquelas que não aceitam as imposições da
Como já vimos, a escola capitalista mais que propiciar o escola, que não se deixam levar pela passividade e submissão,
desenvolvimento das crianças da classe trabalhadora tem que resistem em defesa de sua corporeidade, são
como objetivo discipliná-las para tornar o seu trabalho cada discriminadas de muitas maneiras: são rotuladas como maus
vez mais produtivo e lucrativo. É neste sentido que alunos, bagunceiros; recebem notas baixas; assinam
concordamos plenamente com Thomaz (1986, p. 6) e outros caderninhos; seus pais são chamados, sofrem suspensões e até
quando afirmam que: mesmo são expulsos da escola.
Seria ilusão pensar que bastaria recomendar que os Enquanto educadores preocupados e comprometidos com
professores propusessem jogos e exercícios diferentes. A questão a transformação real e efetiva do sistema escolar, entendemos
exige a formação de novos conteúdos práticos, exige também a que é necessário que se articulem todos os caminhos possíveis
veiculação de compromissos por todos os canais que conduzem para a sua concretização. E, nesse sentido, podemos afirmar
para onde possa agir como força de pressão. que a corporeidade na educação sistemática e nas brincadeiras
Os autores apontam os papéis que um jogo pode e jogos estão a merecer uma compreensão de uma dimensão
estabelecer quando proposto pelo professor às crianças como mais ampla.
um pacote, com regras, técnicas, táticas, organização, Neste estudo, abordaremos a problemática da
materiais prontos. À criança ficara como alternativa jogar, corporeidade na escola envolvendo as seguintes questões:
exercitando-se segundo as determinações do professor, em - Como a escola, através da educação sistemática, tem
habilidades mais desenvolvidas, até atingir as determinações construído uma corporeidade (gestos, movimentos, ritmos,
do professor, em habilidades mais desenvolvidas, até atingir pensamentos, etc.)?
uma performance julgada satisfatória também pelo professor. - Que corporeidade as crianças constroem e/ou expressam
Quando o apito soa, é sinal que não está havendo atuação através de brincadeiras e jogos?
conforme o estabelecido pelo sistema. As recompensas e - Como a corporeidade construída e expressada nas
punições são maneiras de estabelecer o condicionamento das brincadeiras e jogos das crianças poderá contribuir para a
crianças, buscando a disciplina, a ordem e a hierarquia que transformação da escola?
devem ser obedecidas, ocultando as relações de poder que se
expressam nestas ações. Aqui ocorre o desenvolvimento à A Sala de Aula: Espaço de Controle da Corporeidade
subserviência, mas não a inteligência: desenvolve-se a das Crianças
obediência às regras, mas não a compreensão de normas de
respeito individual e social. Procura-se certa habilidade Agora, convidamos o leitor a entrar conosco neste
motora, mas não a criatividade. estranho espaço - lugar das coisas sérias, do não, do só depois...
- que o cotidiano inevitável nos faz parecer corriqueiro, sem
No entanto, vejamos: se a alternativa fosse jogar, seguindo novidades, e que é, para as crianças, um lugar onde é sempre a
uma orientação geral, trabalhando com as crianças a mesma coisa ou tem que cópia do quadro e fazer os trabalhos.
elaboração de regras, das técnicas, os resultados seriam Sem pretensão de esgotar a análise dessa realidade que, como
completamente diferentes. bem nos lembra Morais, contém muitas realidades,
Frei Betto, por exemplo, quando na prisão, percebendo o abordaremos como e porque o controle da espontaneidade das
poder que esta instituição exerce sobre o corpo, desenvolveu crianças recai principalmente sobre os seus corpos.
um trabalho com os presidiários, tendo como princípio A sineta anuncia um novo momento. Filas se formam: de
pedagógico de sempre fazer um trabalho a partir dos um lado, meninos; de outro, meninas. Corpo de sexos diferente
elementos fornecidos pelas experiências vitais anteriores. não pode ficar perto. Novo portão, este no interior da escola,
Realiza exercícios, expressão corporal e teatro. A partir da se abre. Enfileiradas, as crianças sobem as escadas,
boca, utilizada como órgão de expressão - trabalho de acompanhadas pelas advertências da professora: Não corram!
descontração da palavra -, levava os presos a tomarem Não saiam do lugar! Não falem!

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O último cadeado é aberto e eis a sala de aula. As crianças, na sala de aula, enquanto realizam as tarefas
Assim como Freitas, encontramos na sala de aula vários escolares, falam de seu cotidiano, de suas brincadeiras. Poucas
mecanismos do controle disciplinar analisados por Foucault: a vezes se referem ao que estão fazendo; pelo contrário,
divisão do tempo, o quadriculamento do espaço, a distribuição geralmente, contam o que fez no dia anterior ou planejam o
dos corpos em fila, a constante vigilância, as sanções que farão após saírem da escola. O brincar está no centro de
normatizadoras. seus desejos. Sempre que podem, transformam uma situação
A organização da sala de aula foi aparentemente da sala de aula em brincadeira. Nas sacolas e nos bolsos
modificada, passando das filas de carteiras a classes carregam pequenos brinquedos... Além disso, elas criam
aglutinadas, de tal forma que, sentando-se em círculo, as comportamentos de resistência ao controle da professora. Um
crianças se dispõem como se trabalhassem em grupo. No deles é pedir para ir ao banheiro ainda que sob reclamos dela:
entanto, a ideia de que algo mudou não resiste além da Por que não foram antes? É lógico que as crianças querem se
primeira impressão, pois as relações sociais estabelecidas na levantar, caminhar, brincar. Quando saem da sala de aula eles
sala de aula não se alterariam em sua essência. Cada aluno ficam brincando de escorregar no corrimão da escada. Em
possui um lugar e um grupo fixos, determinados pela outras palavras, podemos dizer que o brincar é a atividade que,
professora. Os critérios de disposição das crianças prolongam para a criança, tem significação, a tal ponto que um menino
as discriminações existentes em nossa sociedade: as brancas chegou a dizer:
separadas das pretas; as crianças do morro não andam com as “Na escola fico sem fazê nada, só escrevo. Para ser melhor
da vila. Embora as crianças estejam divididas especialmente teria que escrever e brincar de escrever em aula, depois eu ia
em grupos, o trabalho coletivo não existe. Até mesmo a ajuda para o recreio”.
mútua entre as crianças não é permitida, como fica
evidenciado no exemplo abaixo: Assim, o ato de escrever está tão distante de seu mundo
Cuida do teu nariz, senão ele cresce. infantil que equivale a nada fazer. Com isso não estamos
querendo dizer que a escola não deva ensinar as crianças a
Quando as crianças saem dos seus lugares, a professora, às escrever e deixá-las em seu mundo do faz-de-conta. O que
vezes de maneira sutil, outras, veemente, chama a atenção estranhamos - e nos perguntamos por quê - é a forma como a
para que elas permaneçam sentadas. Um das formas de escola introduz as tarefas escolares na vida da criança. Nas
controle observadas se constata pelo seguinte episódio: salas de aula, a brincadeira não entra; é o lugar das coisas
“Uma criança está caminhando pela sala. A professora sérias. No que diz respeito especialmente à escrita, vemos a
pergunta elevando a voz: “Já fizeste o tema” ?!” Se a criança criança, quando fora da escola, rabiscando no papel, riscando
responder que fez, ela então diz: “Me traz aqui para eu ver”. Se o chão com gravetos, pedras, etc. - riscos e rabiscos cheios de
responder que não, ela diz: “Então senta para fazer”. significados; na sala em que são propostos exercícios
Olhem aqui é outra maneira utilizada para chamar a mecânicos e repetitivos de traçar sobre linhas pontilhadas que
atenção das crianças que estão se distraindo com atividade não lhe dizem nada. São os chamados exercícios preparatórios.
como: brincar, movimentar-se pela sala, conversar. A Mas preparatórios para que? Certamente não é para aprender
corporeidade da professora altera-se: seu olhar torna-se a ler e escrever, sobretudo tendo em vista as páginas e páginas
insistente, o rosto contrai-se, a voz passa da fala clama para os escritas por diversos autores a respeito do assunto, onde
gritos: afirmam que não é o treinamento de habilidades que levam as
crianças a assimilarem esse objeto social, que é a língua
“Olha aqui! Não grita!”. escrita. Ferreiro é uma das autoras que defende que:

Na sala de aula, a mesa da professora está em uma posição (...) as crianças devem resolver sérios problemas
espacial, de tal forma que, através de um único olhar, ela possa conceituais para chegarem a compreender quais são as
manter o controle de todas as crianças. Este é o olhar do características da língua que a escrita alfabética
aparelho disciplinar, descrito por Foucault que diz: representa e de que maneira apresenta estas
características. A repetição e memorização têm pouco ou
“(...) olho perfeito a que nada escapa e centro aos quais todos nada a ver com a superação destas dificuldades.
os olhares convergem”.
Pelo contrário, autores como Vigotsky, por exemplo, nos
Outra expressão, também muito usada pela professora relata brincadeiras onde os objetos são transformados em
para controlar a espontaneidade das crianças, é: Agora não, só símbolos de outras crianças, atividade fundamental para
depois. O depois, geralmente, não acontece, porque não há aquisição da língua escrita.
tempo. O presente é sempre jogado para o futuro. A prioridade Num outro jogo, pegamos o relógio e, de acordo com novos
é sempre dada às tarefas escolares, e aquilo que as crianças procedimentos, explicamos: ‘Agora isto é uma padaria’. Uma
querem realizar é permanentemente postergado: criança imediatamente pegou uma caneta e, colocando-a
atravessada sobre o relógio, dividindo-o em duas metades,
“Gente! Olhem aqui! Primeiro façam o tema para depois disse: ‘Tudo bem, esta é a farmácia e esta é a padaria’. O velho
conversar”. significado tornou-se assim independente e funcionou como
uma condição para o novo(...) Assim, um objeto adquire uma
A escola leva as crianças a controlarem seus desejos, função de signo, com uma história própria ao longo do
impondo-lhes outros, que nunca é o presente, o agora, mas desenvolvimento, tornando-se, dessa fase, independente dos
alguma coisa que acontecerá no futuro, o depois. Existirá gestos das crianças. Isso representa um simbolismo de
forma mais eficaz de transformar crianças “impulsivas” em segunda ordem e, como ele se desenvolve no brinquedo,
alunos dóceis e obedientes? consideramos a brincadeira do faz-de-conta como um dos
grandes contribuidores para o desenvolvimento da linguagem
Escrevo para poder passar. escrita - que é um sistema de simbolismo de segunda ordem.
Estudo para quando crescer ensinar de professor. As observações na sala de aula respaldam a opinião desses
Aprendo para passar, para quando ser grande, ser alguém. autores:

Mas quais seriam os genuínos desejos das crianças? “Um dia as crianças se opunham à ‘escrever’ e copiar do
quadro, ao passo que, quando foram para o pátio, com pedaços

Conhecimentos Específicos 54
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de giz, escreveram e desenharam durante longo tempo as mais não há lugar para os conhecimentos em forma de pacotes,
variadas formas de mensagens”. onde o poder de decisão fica centrado no professor, sendo o
aluno um ser passivo que executa ordens, aonde as regras,
Conforme vimos anteriormente, segundo Foucault e técnicas, táticas, organização e outros materiais vêm todos
Guimarães a escola, na sociedade capitalista, possui como um elaborados. Às crianças resta como alternativa, jogar, brincar,
dos objetivos controlarem o corpo das crianças da classe desenhar, obedecendo às determinações do professor,
trabalhadora, de maneira sistemática, impondo-lhes uma conforme as exigências por ele julgadas pertinentes.
variedade de comportamentos que futuramente servirão de Aqui está se desenvolvendo uma criança para submeter-se
sustentáculo ao sistema de produção. Assim, ao chegarem à às regras e não para compreendê-las como necessárias ao
escola, as crianças são condicionadas a obedecerem ao toque convívio social. Neste processo a ser instaurado, o professor
da sineta. É hora de iniciar a produção. Na sala de aula, os seus terá que possuir a sensibilidade para estar atento às iniciativas
corpos passam a ser imobilizados, ficando longo tempo presos das crianças e, sempre que possível, desenvolver um processo
às cadeiras, tal qual o operário fica preso à sua máquina. Freire de desequilíbrio para que elas avancem na aquisição de novos
com muita prioridade nos dá a exata dimensão da violência conhecimentos. Terá que intervir nas discussões, fazer
que isso significa: perguntar, fornecer pistas que ajudem no encaminhamento de
soluções para os problemas surgidos, mas sempre, como
Da para imaginar o que representa para uma criança, que propõe João Batista Freire, o ponto de partida deve ser o
passou sete anos se movimentando, ser subitamente ‘amarrada’ conhecimento das crianças. Porém, para partir do
e ‘amordaçada’ para, como se diz, ‘aprender’ o que é, para ela, conhecimento das crianças, o professor deverá mudar a sua
uma linguagem, às vezes, totalmente estranha? A linguagem da forma de relação com as crianças e com o conhecimento; já não
imobilidade e do silêncio? Seria o mesmo que pegar um professor mais será o detentor de um saber pronto e acabado, mas agora
idoso, que há muito deixou de praticar atividades físicas, a não o conhecimento e as relações serão construídos coletivamente
ser as mais triviais, e obrigá-los a correr por alguns quilômetros pelo grupo.
em ritmo acelerado. A violência seria idêntica. O interessante é
que nós, professores, não suportamos a mobilidade da criança, Os significados do corpo na cultura e as implicações
mas queremos que ela suporte nossa imobilidade. para a Educação Física

A escola detém a mobilidade espontânea dos alunos para Na área da educação física fala-se muito, atualmente, sobre
racionalizar os seus movimentos, enfatizando a produção de o corpo. Juntamente com esse substantivo, imprime-se uma
gestos mecânicos e estereotipados. Nesse sentido, série de adjetivos. Podemos aqui citar alguns: esbelto,
concordamos com Silva quando diz que a escola faz um saudável, bonito, sensual, livre, flácido, feio, reprimido, firme,
treinamento de iniciação ao taylorismo: mole, natural, holístico, moderno, consciente, inteiro,
Fragmenta-se inicialmente, ao máximo, o processo de repugnante, prazeroso, gordo, magro, etc. Os profissionais da
trabalho a fim de torná-lo mais rentável para no fim recompô- educação física trabalham com o ser humano sobre e através
lo. Assim, por exemplo, fragmentam-se a escrita em suas do seu corpo e lidam, por extensão, com os adjetivos impressos
unidades mínimas, os traços, verticais, horizontais... que no corpo. Por isso, torna-se importante a reflexão sobre o
compõem as letras. Treinam-se mesmos até seu perfeito tema. 66
domínio, para depois recompô-lo nas letras. Gostaríamos, inicialmente, de colocar algumas questões:
A partir dessa análise fica evidente que a educação vigente Como definir um corpo esbelto? Como definir um corpo bonito,
na sala de aula tem como base não o prazer, a alegria e as ou um corpo atraente, ou um corpo consciente? Como saber se
emoções da descoberta, mas sim o sofrimento e a dor com que o corpo já chegou ao estágio de liberdade tão sonhado? O que
o trabalhador deve se acostumar para produzir. Com o passar dizer, então, de um corpo feminino flácido, gordo, considerado
do tempo, essa dor e sofrimento são vistos como naturais. deselegante nos dias de hoje, mas que era, há não muito tempo,
Assim, por exemplo, vimos crianças que censuravam as considerado sensual e inspirava pintores renomados? O que
brincadeiras, considerando preguiçosos aqueles que só dizer do conceito de saúde, associado antigamente a um corpo
querem brincar. Eis aqui a origem da representação ideológica robusto, até mesmo gordo, c atualmente relacionado a um
- que permanece ao longo de séculos de que a criança aprende corpo magro? (Como se magro fosse sempre sinônimo de
através do castigo. O diálogo entre a professora e o avô de um saudável!) E o corpo já não tão jovem, sobre o qual são
aluno ilustra a atualidade disso: impostos uma série de "consertos" e "reparos" para parecer
(não para ser) novo, tais como plásticas, cremes antirrugas,
- Como está o Rodrigo? dietas rejuvenescedoras, ginásticas, esportes? Quem define
- Impossível! Só quer brincar e brigar. Não faz nada! esses atributos a respeito do corpo? Quem determina os
- A Senhora pode fazer qualquer coisa para ele aprender, critérios para se classificar o corpo num ou noutro grupo? Para
pois, quando eu estava na escola, ficava de castigo ajoelhado em discutir com mais profundidade estas questões, estamos
grãos de milho. utilizando um referencial cultural.
- O senhor sabe, eu não posso bater nas crianças. Mas o seu Não podemos imaginar um ser humano que não seja fruto
neto teve por que puxar? da cultura e também não podemos imaginar um corpo natural.
- É. Eu era terrível na escola, aprontava em aula. Mas não Portanto, qualquer adjetivo que se associe ao corpo é fruto de
diga nada. Ele não sabe disso. uma dinâmica cultural particular, e só faz sentido num grupo
específico. O homem só chegou ao seu estágio aluai de
A partir das constatações acima, faz-se necessário que desenvolvimento devido a um processo cultural de
todas aquelas práticas desenvolvidas nas escolas, sobretudo, apropriação de comportamentos e atitudes que, inclusive,
aquelas que trabalham diretamente com o corpo - a educação foram transformando o seu componente biológico. Não é
física -, que aqueles educadores comprometidos com uma possível desvincular o homem da cultura. O que o diferencia
práxis transformadora, partem do conhecimento e da de outros animais, principalmente, é a sua capacidade de
organização das próprias crianças. Um processo educativo que produzir cultura. Cultura essa que não é um ornamento, um
gere contradições na busca de conscientização. Neste caso, já algo a mais que se sobrepôs à natureza animal.

66 DAÓLIO. J. Os significados do corpo na cultura e as implicações para a


Educação Física. Movimento - Ano 2 - N. 2.

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A cultura foi a própria condição de sobrevivência da como natural e, consequentemente, entender a natureza do
espécie. Portanto, pode-se dizer que a natureza do homem é homem como anterior ou pré-requisito da cultura. Santos
ser um ser cultural. Infelizmente, no meio acadêmico e critica os que propõem a volta a um suposto corpo natural não
profissional da educação física, essa problemática ainda não é atingido pela cultura. Segundo ele, não se pode esquecer da
compreendida no âmbito de um conhecimento antropológico. natureza necessariamente social de uso do corpo, sendo
A ênfase na formação profissional em educação física ainda se possível somente pensar em novos usos do corpo, já que a
refere ao homem e ao seu corpo como entidades cultura é passível de reinvenções e recriações. Rodrigues
primordialmente biológicas. Temos ouvido comentários sobre afirma que "(...) nenhuma prática se realiza sobre o corpo sem
o corpo que embutem uma noção que separa a natureza da que tenha, a suportá-la, um sentido genérico ou específico". É
cultura. Quando se defende a procura por um corpo natural, justamente esse sentido específico que incide sobre toda e
está se falando que é possível encontrar um corpo pré-cultural, qualquer atividade corporal o que impede de pensar o corpo
ou que seja imune à cultura. Quando se fala do corpo livre, como um dado biológico. O que define corpo é o seu
parece que se busca um corpo que não seja escravizado ou significado, o fato dele ser produto da cultura, ser construído
moldado pelas regras sociais. Ouvimos até certos excessos diferentemente por cada sociedade, e não as suas semelhanças
como "liberar o lado animal do corpo. Como se o corpo e o biológicas universais. Fica evidente, portanto, que o conjunto
homem não fossem eminentemente culturais. Como se se de posturas e movimentos corporais representam valores e
quisesse achar um corpo ainda não atingido pela cultura ou princípios culturais.
anterior a ela. O corpo é uma síntese da cultura, porque Consequentemente, atuar no corpo implica em atuar sobre
expressa elementos específicos da sociedade da qual faz parte. a sociedade na qual este corpo está inserido. Todas as práticas
O homem, através do seu corpo, vai assimilando e se institucionais que envolvem o corpo humano - e a Educação
apropriando dos valores, normas e costumes sociais, num Física faz parte delas - sejam elas educativas, recreativas,
processo de incorporação (a palavra é significativa). Mais do reabilitadoras ou expressivas, devem ser pensadas neste
que um aprendizado intelectual, o indivíduo adquire um contexto, a fim de que não se conceba sua realização de forma
conteúdo cultural, que se instala no seu corpo, no conjunto de reducionista, mas se considere o homem como sujeito da vida
suas expressões. Cada gesto que fazemos, a forma como nos social.
sentamos, a maneira como caminhamos, os costumes com o Entretanto, os profissionais de educação física,
corpo da gestante (a mensagem hoje é que ela se movimente, cotidianamente, utilizam o termo técnica não no sentido que o
ao contrário de poucos anos atrás), os cuidados com o bebé... fez Mareei Mauss, de um ato cultural, mas como um conjunto
tudo é específico de uma determinada cultura, que não é de movimentos considerados sempre correios, precisos,
melhor nem pior que qualquer outra. A forma de chutar, os melhores do que outros. Nas aulas, o aluno melhor é aquele
cuidados higiênicos com o corpo, os esportes que se praticam que chega mais próximo da técnica considerada certa pelo
numa determinada época, num determinado local, são professor. Falamos de um andar correto, de um correr
influenciados pela cultura. adequado, de uma postura melhor, de um corpo perfeito,
As brincadeiras, os tipos de ginástica, os cuidados estéticos desconsiderando, muitas vezes, que os movimentos são
com o corpo... enfim, tudo é influenciado pela cultura. Numa também culturais. A especificidade de raça humana é se
multidão, pode-se notar certos comportamentos corporais apresentar e se dispor através de grandes diferenças. Embora
comuns, que caracterizam e padronizam um determinado se apresentando diferentemente, os homens não perdem a
povo. Aliás, como relata Rodrigues, pode-se reconhecer um condição de membros da espécie humana. Acreditamos já ser
brasileiro num outro país pela sua forma de andar e gesticular, possível pensar no duplo sentido do termo Cultura Corporal.
sua postura, seus movimentos corporais. Duas seleções de No primeiro, que rebatemos, se pressupõe uma única técnica
voleibol, jogando com as mesmas regras e técnicas, e com sobre o corpo; a palavra cultura acaba sendo usada como
sistemas táticos similares, possuem estilos diferentes, um jeito sinônimo de treinamento, adestramento do corpo. É neste
característico de praticar o voleibol ou o futebol, que reflete sentido que termos como culturismo e fisioculturismo são
tradições culturais distintas. Ao se pensar o corpo, pode-se utilizados, constituindo-se em mais um discurso sobre o corpo,
incorrer no erro de encará-lo como puramente biológico, um apenas uma das técnicas sobre ele colocadas. Não a única, nem
patrimônio universal, já que homens de nacionalidades a melhor.
diferentes apresentam semelhanças físicas. Entretanto, para O sentido de Cultura Corporal que utilizamos parte da
além das semelhanças ou diferenças físicas, existe um definição ampla de Cultura e diz respeito ao conjunto de
conjunto de significados que cada sociedade escreve nos movimentos e hábitos corporais de um grupo específico. E
corpos dos seus membros ao longo do tempo, significados nessa concepção que se pode afirmar que não existe um
estes que definem o que é corpo de maneiras variadas. discurso puro do corpo. O corpo não fala sobre o corpo, será
Estamos falando das técnicas corporais, que Marcel Mauss, um apenas mais um discurso sobre o corpo. Em uma dada época,
antropólogo francês, definiu, já na década de 30, como as num determinado contexto, um discurso prevalece sobre o
maneiras de se comportar de cada sociedade. Mauss outro. Em outros termos, não há corpo livre, mas discursos
considerou os gestos e os movimentos corporais como sobre corpo livre; não há corpo consciente, mas discursos
técnicas próprias da cultura, passíveis de transmissão através sobre corpo consciente. Kofes discutiu de forma pertinente
das gerações e imbuídas de significados específicos. Técnicas esta questão do discurso do corpo X discurso sobre o corpo,
corporais culturais, porque toda técnica é um hábito afirmando que é necessário manter as seguintes indagações
tradicional, que passa de pai para filho, de geração para quando se aborda esse tema: "(...) o que a sociedade está
geração. Segundo ele, só é possível falar em técnica, por ser afirmando dos corpos? que corpos? que individualidades? que
cultural. Kofes, reforçando esse ponto de vista, afirma que o sociedades?". Na Educação Física brasileira, atualmente,
corpo é expressão da cultura, portanto cada cultura vai se começa a ser utilizado o termo Cultura Corporal em sentidos
expressar através de diferentes corpos, porque se expressa próximos daquele por nós defendido. No livro Metodologia do
diferentemente enquanto cultura. É nesse contexto que Ensino de Educação Física encontramos a seguinte referência:
Damatta pôde afirmar que existem tantos corpos quanto há "(...) a materialidade corpórea foi historicamente construída e,
sociedades. portanto, existe uma cultura corporal, resultado de
O corpo humano não é um dado puramente biológico sobre conhecimentos socialmente produzidos e historicamente
o qual a cultura impinge especificidades. O corpo é fruto da acumulados pela humanidade (...)". Pereira fala de uma cultura
interação natureza/cultura. Conceber o corpo como física como "(...) toda a parcela da cultura universal que
meramente biológico é pensá-lo - explícita ou implicitamente - envolve o exercício físico, como a educação física, a ginástica, o

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treinamento desportivo, a recreação físico-ativa, a dança etc.". cultura corporal humana e o fazem utilizando uma atitude
Betti lembra que Feio já se referiu a uma cultura física como lúdica.
parte de uma cultura geral, que contempla as conquistas A Educação Física tem uma história de pelo menos um
materiais e espirituais relacionadas com os interesses físico- século e meio no mundo ocidental moderno, possui uma
culturais da sociedade. tradição e um saber-fazer e tem buscado a formulação de um
A pesquisa antropológica, embora incipiente na área, pode recorte epistemológico próprio.
ser útil na medida em que se preocupar com os discursos sobre Assim, a área de Educação Física hoje contempla múltiplos
o corpo, ou, melhor dizendo, com as representações sociais conhecimentos produzidos e usufruídos pela sociedade a
que suportam as várias concepções de corpo, concepções essas respeito do corpo e do movimento. Entre eles, se consideram
que justificam e orientam determinadas práticas profissionais fundamentais as atividades culturais de movimento com
num grupo específico e numa dada época. Qual é a finalidades de lazer, expressão de sentimentos, afetos e
representação de corpo que os professores de Educação Física emoções, e com possibilidades de promoção, recuperação e
possuem? Que conjunto de significados a respeito do corpo manutenção da saúde.
possuem os frequentadores de academias de ginástica? Qual é Trata-se, então, de localizar em cada uma dessas
o universo simbólico a respeito do corpo que técnicos manifestações (jogo, esporte, dança, ginástica e luta) seus
esportivos possuem? Essas perguntas somente agora benefícios fisiológicos e psicológicos e suas possibilidades de
começam a ser formuladas, ainda não sendo possível utilização como instrumentos de comunicação, expressão,
respondê-las de forma mais profunda. A intenção destas lazer e cultura, e formular a partir daí as propostas para a
reflexões foi somente a de alertar que os profissionais de Educação Física escolar.
educação física, por trabalharem com o homem através do seu A Educação Física escolar pode sistematizar situações de
corpo, estão trabalhando com a cultura impressa nesse corpo ensino e aprendizagem que garantam aos alunos o acesso a
e expressa por ele. Portanto, mexer no corpo é mexer na conhecimentos práticos e conceituais. Para isso é necessário
sociedade da qual esse corpo faz parte. O profissional pode mudar a ênfase na aptidão física e no rendimento padronizado
fazer isso de forma explícita, atento para as consequências do que caracterizava a Educação Física, para uma concepção mais
seu trabalho, ou de forma implícita e inconsequente. Parece- abrangente, que contemple todas as dimensões envolvidas em
nos evidente tentarmos estar atentos e conscientes em relação cada prática corporal.
ao papel do corpo na cultura. É fundamental também que se faça uma clara distinção
entre os objetivos da Educação Física escolar e os objetivos do
A educação física como cultura corporal67 esporte, da dança, da ginástica e da luta profissionais, pois,
embora seja uma referência, o profissionalismo não pode ser a
O ser humano, desde suas origens, produziu cultura. Sua meta almejada pela escola. A Educação Física escolar deve dar
história é uma história de cultura, na medida em que tudo o oportunidades a todos os alunos para que desenvolvam suas
que faz está inserido num contexto cultural, produzindo e potencialidades, de forma democrática e não seletiva, visando
reproduzindo cultura. O conceito de cultura é aqui entendido seu aprimoramento como seres humanos. Nesse sentido, cabe
como produto da sociedade, da coletividade à qual os assinalar que os alunos portadores de deficiências físicas não
indivíduos pertencem, antecedendo-os e transcendendo-os. podem ser privados das aulas de Educação Física.
“É preciso considerar que não se trata, aqui, do sentido Independentemente de qual seja o conteúdo escolhido, os
mais usual do termo cultura, empregado para definir certo processos de ensino e aprendizagem devem considerar as
saber, ilustração, refinamento de maneiras. No sentido características dos alunos em todas as suas dimensões
antropológico do termo, afirma-se que todo e qualquer (cognitiva, corporal, afetiva, ética, estética, de relação
indivíduo nasce no contexto de uma cultura, não existe homem interpessoal e inserção social). Sobre o jogo da amarelinha, o
sem cultura, mesmo que não saiba ler, escrever e fazer contas. voleibol ou uma dança, o aluno deve aprender, para além das
É como se se pudesse dizer que o homem é biologicamente técnicas de execução, a discutir regras e estratégias, apreciá-
incompleto: não sobreviveria sozinho sem a participação das los criticamente, analisá-los esteticamente, avaliá-los
pessoas e do grupo que o gerou. eticamente, ressignificá-los e recriá-los.
A cultura é o conjunto de códigos simbólicos reconhecíveis É tarefa da Educação Física escolar, portanto, garantir o
pelo grupo: neles o indivíduo é formado desde o momento da acesso dos alunos às práticas da cultura corporal, contribuir
sua concepção; nesses mesmos códigos, durante a sua infância, para a construção de um estilo pessoal de exercê-las e oferecer
aprende os valores do grupo; por eles é mais tarde introduzido instrumentos para que sejam capazes de apreciá-las
nas obrigações da vida adulta, da maneira como cada grupo criticamente.
social as concebe.
A fragilidade de recursos biológicos fez com que os seres Cultura corporal e cidadania
humanos buscassem suprir as insuficiências com criações que
tornassem os movimentos mais eficazes, seja por razões A concepção de cultura corporal amplia a contribuição da
“militares”, relativas ao domínio e uso de espaço, seja por Educação Física escolar para o pleno exercício da cidadania, na
razões econômicas, que dizem respeito às tecnologias de caça, medida em que, tomando seus conteúdos e as capacidades que
pesca e agricultura, seja por razões religiosas, que tangem aos se propõe a desenvolver como produtos socioculturais, afirma
rituais e festas ou por razões apenas lúdicas. Derivaram daí como direito de todos o acesso a eles. Além disso adota uma
inúmeros conhecimentos e representações que se perspectiva metodológica de ensino e aprendizagem que
transformaram ao longo do tempo, tendo ressignificadas as busca o desenvolvimento da autonomia, a cooperação, a
suas intencionalidades e formas de expressão, e constituem o participação social e a afirmação de valores e princípios
que se pode chamar de cultura corporal. democráticos. O trabalho de Educação Física abre espaço para
Dentre as produções dessa cultura corporal, algumas que se aprofundem discussões importantes sobre aspectos
foram incorporadas pela Educação Física em seus conteúdos: éticos e sociais, alguns dos quais merecem destaque.
o jogo, o esporte, a dança, a ginástica e a luta. Estes têm em A Educação Física permite que se vivenciem diferentes
comum a representação corporal, com características lúdicas, práticas corporais advindas das mais diversas manifestações
de diversas culturas humanas; todos eles ressignificam a culturais e se enxergue como essa variada combinação de
influências está presente na vida cotidiana. As danças,

67 http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro07.pdf

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esportes, lutas, jogos e ginásticas compõem um vasto estádios que podem levar à morte de torcedores favorece a
patrimônio cultural que deve ser valorizado, conhecido e construção de uma atitude de repúdio à violência.
desfrutado. Além disso, esse conhecimento contribui para a Em determinadas realidades, o consumo de álcool, fumo ou
adoção de uma postura não-preconceituosa e discriminatória outras drogas já ocorre em idade muito precoce. A aquisição
diante das manifestações e expressões dos diferentes grupos de hábitos saudáveis, a conscientização de sua importância,
étnicos e sociais e às pessoas que dele fazem parte. bem como a efetiva possibilidade de estar integrado
A prática da Educação Física na escola poderá favorecer a socialmente (o que pode ocorrer mediante a participação em
autonomia dos alunos para monitorar as próprias atividades, atividades lúdicas e esportivas), são fatores que podem ir
regulando o esforço, traçando metas, conhecendo as contra o consumo de drogas. Quando o indivíduo preza sua
potencialidades e limitações e sabendo distinguir situações de saúde e está integrado a um grupo de referência com o qual
trabalho corporal que podem ser prejudiciais compartilha atividades socioculturais e cujos valores não
A possibilidade de vivência de situações de socialização e estimulam o consumo de drogas, terá mais recursos para
de desfrute de atividades lúdicas, sem caráter utilitário, são evitar esse risco.
essenciais para a saúde e contribuem para o bem-estar
coletivo. Sabese, por exemplo, que a mortalidade por doenças Questões
cardiovasculares vem aumentando e entre os principais
fatores de risco estão a vida sedentária e o estresse. 01. (Prefeitura de Patrocínio/MG - Professor -
O lazer e a disponibilidade de espaços para atividades FUNDEP) São orientações pedagógicas para o ensino das
lúdicas e esportivas são necessidades básicas e, por isso, práticas corporais na escola, EXCETO
direitos do cidadão. Os alunos podem compreender que os (A) dar autonomia aos alunos para que escolham os temas
esportes e as demais atividades corporais não devem ser de sua preferência.
privilégio apenas dos esportistas ou das pessoas em condições (B) analisar os valores que orientam e interferem na sua
de pagar por academias e clubes. Dar valor a essas atividades prática.
e reivindicar o acesso a elas para todos é um posicionamento (C) conhecer sobre seus riscos e benefícios.
que pode ser adotado a partir dos conhecimentos adquiridos (D) situá-las histórica e socialmente.
nas aulas de Educação Física.
Os conhecimentos sobre o corpo, seu processo de 02. (IF/SC - Professor - Educação Física) O Ministério da
crescimento e desenvolvimento, que são construídos Educação apresentou, no mês de setembro de 2015, uma
concomitantemente com o desenvolvimento de práticas versão inicial para amplo debate que poderá se constituir, após
corporais, ao mesmo tempo que dão subsídios para o cultivo discussão e aprovação pelo Conselho Nacional de Educação, a
de bons hábitos de alimentação, higiene e atividade corporal e Base Curricular Comum. Nesse documento, a referência
para o desenvolvimento das potencialidades corporais do central para estruturação dos conhecimentos em Educação
indivíduo, permitem compreendê-los como direitos humanos Física são as práticas corporais.
fundamentais. Sobre a proposta para Educação Física na Base Curricular
A formação de hábitos de autocuidado e de construção de Comum, todas as alternativas abaixo estão corretas, EXCETO
relações interpessoais colaboram para que a dimensão da UMA, assinale-a.
sexualidade seja integrada de maneira prazerosa e segura. (A) Trabalhar na perspectiva das práticas corporais
No que tange à questão do gênero, as aulas mistas de demanda três desafios importantes a serem superados:
Educação Física podem dar oportunidade para que meninos e desafios de legitimação ético-política, desafios curriculares e
meninas convivam, observem-se, descubram-se e possam desafios interdisciplinares.
aprender a ser tolerantes, a não discriminar e a compreender (B) As práticas corporais estão organizadas nas seguintes
as diferenças, de forma a não reproduzir estereotipadamente manifestações da cultura corporal: brincadeiras e jogos,
relações sociais autoritárias. esportes, exercícios físicos, ginásticas, lutas, práticas corporais
No âmbito da Educação Física, os conhecimentos alternativas, práticas corporais de aventura e práticas
construídos devem possibilitar a análise crítica dos valores corporais rítmicas.
sociais, tais como os padrões de beleza e saúde, que se (C) A formulação dos objetivos, para cada uma das práticas
tornaram dominantes na sociedade, seu papel como corporais, articula, de forma indissociável e simultânea, oito
instrumento de exclusão e discriminação social e a atuação dos dimensões de conhecimento que permitem sua tematização
meios de comunicação em produzi-los, transmiti-los e impô- como saberes escolares.
los; uma discussão sobre a ética do esporte profissional, sobre
a discriminação sexual e racial que existe nele, entre outras (D) Em termos de progressão de conhecimentos da
coisas, pode favorecer a consideração da estética do ponto de Educação Física, na Educação Básica, deve-se considerar que
vista do bem-estar, as posturas não-consumistas, não todas as práticas corporais podem ser objeto de trabalho
preconceituosas, não-discriminatórias e a consciência dos pedagógico em qualquer etapa e modalidade de ensino, mas,
valores coerentes com a ética democrática. ainda assim, alguns critérios de progressão devem ser
Nos jogos, ao interagirem com os adversários, os alunos considerados.
podem desenvolver o respeito mútuo, buscando participar de (E) A vivência das práticas corporais não é um meio para
forma leal e não violenta. Confrontar-se com o resultado de um se aprender outros conteúdos, mas, sim, uma forma de
jogo e com a presença de um árbitro permitem a vivência e o perceber o mundo e a si mesmo de um modo singular.
desenvolvimento da capacidade de julgamento de justiça (e de
injustiça). Principalmente nos jogos, em que é fundamental 03. O sentido de Cultura Corporal que utilizamos parte da
que se trabalhe em equipe, a solidariedade pode ser exercida e definição ampla de Cultura e diz respeito ao conjunto de
valorizada. Em relação à postura diante do adversário podem- movimentos e hábitos corporais de um grupo específico.
se desenvolver atitudes de solidariedade e dignidade, nos ( ) Certo ( ) Errado
momentos em que, por exemplo, quem ganha é capaz de não
provocar e não humilhar, e quem perde pode reconhecer a 04. (SEDUC/RJ - Professor Docente I - CEPERJ)
vitória dos outros sem se sentir humilhado. Castellani Filho (1998) defende uma concepção de Educação
Viver os papéis tanto de praticante quanto de espectador e Física que integra a cultura do homem e da mulher brasileiros
tentar compreender, por exemplo, por que ocorrem brigas nos como uma totalidade formada pela interação de distintas
práticas sociais, tais como a dança, o jogo, a ginástica e o

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esporte que se materializam e ganham força por meio das Esse quase silêncio imposto à educação infantil, observado
práticas corporais. Compete à área dar tratamento pedagógico nas preocupações com a avaliação educacional, pode ser
a seus temas, reconhecendo-os como dotados de significado e identificado, também, em vários outros temas, principalmente
sentido, porquanto construídos historicamente. Corresponde quando educação infantil significa não só pré-escola, mas
à concepção defendida pelo autor a cultura: também, e, sobretudo, creche. Se retornarmos às primeiras
(A) física formulações da Lei de Diretrizes e Bases da Educação- LDB
(B) de movimento (Brasil, 1996) e às versões iniciais da Lei do Fundo de
(C) dialógica Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de
(D) corporal Valorização dos Profissionais da Educação – Fundeb é possível
(E) motora observar a resistência em incluir a creche como sub- etapa da
educação básica.
Gabarito Percebe-se, então, no momento atual, um movimento
duplo: o de incorporação da educação infantil na política de
01.A / 02.A / 03.Certo / 04.D avaliação da educação básica, talvez em ritmo mais lento; e
outro, mais intenso, que busca a incorporação da avaliação
como tema/problema evocando uma atenção específica para a
política de educação infantil.
11. Avaliação na Educação
Infantil Processo de Avaliação
Avaliar é mais do que só observar as crianças
aleatoriamente, mais do que observar aleatoriamente padrões
comportamentais, culturais, de interação entre outros, pois a
Infância e Avaliação Infantil intenção pedagógica avaliativa dará condições para o
professor(a) criar objetivos e planejar atividades adequadas,
A Educação Infantil vem a cada dia se solidificando na tornando a observação significativa, uma vez que torna
legislação e nas políticas públicas brasileiras como dever do possível afunilar o leque de padrões a serem observados
Estado e direito de todas as crianças de 0 a 5 anos de idade. A dando base para uma observação precisa dos fatores a serem
Constituição Federal Brasileira determina no seu artigo 7º, considerados. Sendo assim, torna-se clara a necessidade de se
inciso XXV, como direito social dos pais trabalhadores urbanos construir conhecimentos e reflexão por parte de
e rurais, a assistência gratuita aos filhos e dependentes, desde professores/educadores acerca do processo avaliativo formal
o nascimento até 5 (cinco)anos de idade em creches e pré- na Educação Infantil70.
escolas68. A avaliação tem por objetivo obter informações e subsídios
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação determina que a que favoreçam o desenvolvimento das crianças e ampliação de
Educação Infantil é parte integrante do sistema educacional seus conhecimentos. Nesse sentido, avaliar não é apenas
brasileiro, constituindo-se a primeira etapa da Educação medir, comparar ou julgar. Muito mais do que isso, a avaliação
Básica. Seu objetivo é o desenvolvimento integral da criança apresenta uma importância social e política fundamental no
de 0 a 5 anos de idade no que diz respeito aos seus aspectos fazer educativo.
físico, intelectual, social, linguístico e afetivo complementando A avaliação na educação infantil deve ser processual e
a ação da família e da comunidade (Art. 29). Como o primeiro destinada a auxiliar o processo de aprendizagem, fortalecendo
espaço de educação coletiva da criança, fora do ambiente a autoestima das crianças. No que se refere às crianças, a
familiar, insere-se na base da construção da cidadania e de avaliação deve permitir que elas acompanhem suas
uma sociedade democrática, livre, justa, solidária e implicada conquistas, suas dificuldades e suas possibilidades ao longo de
na preservação do meio ambiente, como prevê a Constituição seu processo de aprendizagem.
Federal de1988. A avaliação formativa em contrapartida da avaliação
No que fiz respeito à Avaliação na educação infantil somativa pode ser considerada como um “passo a frente”, pois
existem, por sua vez, iniciativas do Governo Federal para ela possibilita que o aluno ao invés de apenas receber
Avaliação Básicas que embora se apresentem como informações do educador, passe a elaborar seus próprios
direcionadas à avaliação da educação básica, não contemplam conhecimentos a partir da preparação do professor para isto,
a educação infantil - creche e pré-escola −, etapa integrante assim, a avaliação formativa não tem como pressuposto a
deste nível de ensino desde 1988, com a promulgação da punição ou premiação, ela prevê que as crianças possuem
Constituição Federal. ritmos e processos de aprendizagem diferentes e isto deve ser
considerado no processo de aprendizagem.
Política de Avaliação da/na Educação Infantil Portfólio, dossiê, relatórios de avaliação, todas essas
Observa-se ao longo dos anos que o campo de investigação, nomenclaturas se referem, no sentido básico, à organização de
políticas e práticas de avaliação deixa à margem sua uma coletânea de registros sobre aprendizagem do aluno que
preocupação com a educação infantil, apesar de uma das obras ajuda o professor (a), os próprios alunos/as e as famílias a
mais referidas na bibliografia brasileira contemporânea sobre terem uma visão evolutiva do processo.
avaliação, a de Jussara Hoffman, tratar do tema na pré-escola. É importante que a cada dia, seja feito pelo menos um
A falta de atenção da produção em avaliação para com a registro, pois isso possibilita ao professor/a e ao aluno/a um
educação infantil já fora notada por Barretto e colaboradores retrato dos passos percorridos na construção das
na exaustiva revisão "Avaliação na Educação Básica nos anos aprendizagens. Essa forma de registrar diariamente a
90 segundo os periódicos acadêmicos", quando informam que, caminhada do aluno/a tem o objetivo de mostrar a
dentre os poucos artigos que focalizam apenas uma etapa importância de cada aula, de cada passo, como uma situação
educacional, muito raros são "aqueles que focalizam a de aprendizagem.
avaliação em relação à educação infantil"69.

68 Texto adaptado do Documento produzido pelo Grupo de Trabalho instituído 70 Texto adaptado de:
pela Portaria número 1.147/2011, do Ministério da Educação. http://www.moodle.ufba.br/mod/book/view.php?id=9945&chapterid=9308
69 Texto adaptado de Fúlvia Rosemberg:
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-
15742013000100004&lang=pt

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A organização de um dossiê ou Portfólio torna-se Perrenoud afirma que a ideia de avaliação formativa
significativo pelas intenções de quem o organiza, não há sistematiza em levar o professor a observar mais
sentido em coletar trabalhos dos alunos e alunas para mostrá- metodicamente os seus alunos, a compreender melhor suas
los aos pais/mães somente como instrumento burocrático. Ele maneiras de ser.
precisa constituir-se em um conjunto de dados que expresse Observamos em Brasil que: Educar significa, portanto,
avanços, mudanças conceituais, novos jeitos de pensar e de propiciar situações de cuidados, brincadeiras e aprendizagens
fazer, alusivos à progressão do estudante. orientadas de forma integrada e que possam contribuir para o
desenvolvimento das capacidades infantis de relação
Assim sendo, a avaliação da aprendizagem precisa interpessoal, de ser e estar com os outros em uma atitude
servir como base para a construção de uma aprendizagem básica de aceitação, respeito e confiança, e o acesso, pelas
bem-sucedida, ou seja, ela deve possibilitar ao educador a crianças, aos conhecimentos mais amplos da realidade social e
eficácia de seu trabalho, garantindo avanços e isso só é cultural. Neste processo, a educação poderá auxiliar o
possível se a avaliação deixar de ser usada como um desenvolvimento das capacidades de apropriação e
recurso de autoridade que decide sobre o destino do aluno, conhecimento das potencialidades corporais, afetivas,
e, passar a ser vista como uma ferramenta auxiliar ao emocionais, estéticas e éticas, na perspectiva de contribuir
crescimento deste. para a formação de crianças felizes e saudáveis.
Para que o professor possa propiciar situações de
As linhas existentes para Avaliação Infantil aprendizagem, é necessária a observação. É muito importante
Existem algumas linhas de avaliação para a Educação o professor observar sempre o seu aluno, pois essas
Infantil que se distinguem de acordo com seu foco e método e observações podem proporcionar um novo aprendizado.
que serão abaixo descriminadas71: Assim cabe ao professor, criatividade para que possa criar
A Avaliação Formativa é contínua, e ocorre diariamente ao situações e experiências que permitam a ele observar e avaliar
longo do ano, através do acompanhamento pelo professor da seus alunos.
criança, no decorrer de suas atitudes, nessa concepção de Segundo Brasil, a avaliação formativa, não deve avaliar a
avaliação, o professor ajuda o aluno a desenvolver suas criança, mas as situações de aprendizagem que foram
capacidades cognitivas, detectando suas dificuldades e oferecidas a elas e perceber se as suas aprendizagens estão
ajudando a superá-las fornecendo informações que a criança vinculadas às oportunidades e experiências vivenciadas. O
utilizará ao longo de sua vida. professor deve fortalecer o interesse do aluno na busca de
Segundo Perrenoud, a avaliação é formativa quando o novos conhecimentos, propondo caminhos e incentivando-os
professor contribui para a regulação das aprendizagens no para seus novos aprendizados.
sentido de domínio, numa concepção particular dos 21 Perrenoud afirma que “avaliação formativa apresenta-se
objetivos, da aprendizagem ou da intervenção didática, não sob a forma de uma regulação interativa, isto é, de uma
esquecendo que é preciso de um aprendiz, um professor para observação e de uma intervenção em tempo real, praticamente
organizar e gerir as situações didáticas. indissociáveis das intervenções didáticas propriamente ditas”.
Então, avaliar numa visão formativa não é apenas avaliar Nesta avaliação a observação é primordial, sendo a base
em um momento, mas é uma ação que deve ser feita no dia a para o professor poder ajudar a criança a aprender e se
dia no âmbito escolar, diante das atividades propostas pelo desenvolver, participando desse processo no sentido
professor, onde o professor acompanhe a criança em seu educativo.
desenvolvimento, conhecendo os avanços e limites no Nesta concepção de avaliação busca-se desenvolver uma
processo de aprendizagem. educação de qualidade proporcionando oportunidades e
Vemos em Perrenoud, que é considerada como formativa, respeitando as crianças, sendo tratadas todas iguais e
toda prática de avaliação contínua que pretende contribuir ajudando-as suas dificuldades e preparando-as para o futuro.
para melhorar as aprendizagens em curso, qualquer que seja o Outro tipo de avaliação é a Avaliação Classificatória que é
quadro e qualquer que seja a extensão concreta da o tipo mais utilizado nas escolas a fim de medir a capacidade
diferenciação do ensino. da criança através da “nota” para verificar se a criança atingiu
Essa aplicação corre o risco, de um ponto de vista o resultado esperado. A avaliação classificatória é uma
prescritivo, de fazer com que a ideia de avaliação formativa perspectiva de avaliação na qual a nota verifica a existência de
perca seu rigor, essa ampliação autoriza a dar contas das padrão de rendimento. Desta forma, as crianças são
práticas correntes de avaliação como contínua sob o ângulo de comparadas entre si, através do desempenho de cada uma.
sua contribuição almejada ou efetiva para a regulação das Segundo Hoffmann “a avaliação classificatória se resume à
aprendizagens durante o ano escolar. decisão de enunciar dados que comprovem a promoção ou
Esse tipo de avaliação não tem como objetivo classificar ou retenção dos alunos”.
selecionar a criança como a “melhor”, mas contribuir em seus Este tipo de avaliação não leva a criança a aprender para a
processos de aprendizagens significativas. Devemos avaliar o vida, mas sim, a dar importância a uma aprendizagem
que se ensina, encadeando a avaliação no mesmo processo de memorizada, na qual estuda somente para realizar uma prova
ensino-aprendizagem, contribuindo para o desenvolvimento ou um trabalho. A intenção dessa concepção de avaliação é
da capacidade dos alunos. O professor deve conhecer melhor a classificar a criança para aprovação ou reprovação.
sua criança, conhecer seus interesses e adequar o seu processo Conforme Melchior, no entanto, a escola exige um
de ensino, com as informações que obtém dela durante o resultado e ele passa a preocupar-se com a avaliação apenas
processo, só assim, o professor sabe o grau de conhecimento com a função de controle. Assim, a finalidade da avaliação fica
daquela criança, com isso faz sua avaliação de forma contínua, descaracterizada. Avalia-se para atribuir um resultado e o
e a ajuda quando apresenta mais dificuldades. aluno estuda para obter uma nota. A consequência desse ciclo
Ao término de uma atividade, cabe ao professor fazer uma é o temor que os estudantes, em geral, têm de avaliações e
análise e reflexão sobre o sucesso alcançado em funções dos especialmente, de testes escolares. Pois, quando a avaliação é
objetivos previstos em seu planejamento, verificando se esses feita apenas com função de controle, são considerados
objetivos foram alcançados pelas crianças. somente os momentos avaliativos, representados por um
teste, trabalhos em grupo ou individuais. Ou o que é ainda pior:

71 Texto adaptado de Maeli Sorato Manarin disponível em


http://www.bib.unesc.net/biblioteca/sumario/000041/000041FD.pdf

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o professor atribui-lhe um valor qualquer, sem uma varie de pessoa para pessoa, nos seus métodos de análise, ela
fundamentação, sem que o aluno tenha a mínima ideia de é também influenciada e/ou regida pelo momento político,
como foi avaliado. social e econômico do país e dos interesses vigentes. Mesmo
A preocupação dos professores nessa concepção não é dentro de um contexto comum, nossas análises podem
avaliar os seus processos de aprendizagens, e verificar as suas privilegiar aspectos diferenciados.
dificuldades para uma possível mudança, mas sim, as suas Considerando essa subjetividade humana, do olhar
preocupações são de como avaliar para atribuir uma nota de individual, quando se trata de avaliar para intervir – que é o
acordo com o desempenho da criança nos dias de provas e nosso caso na Educação Infantil -, temos que ser consistentes,
trabalhos, podendo o professor utilizar o método da sistemáticos e frequentes. Podemos trabalhar utilizando
observação para verificar seu aprendizado todos os dias variados métodos de registros de modo a captar e incluir os
durante o decorrer das aulas. diversos olhares sobre o fenômeno pedagógico
Melchior afirma que o professor que não se preocupa em (desenvolvimento do cotidiano) e de desenvolvimento e
fazer registros dos desempenhos (eu/ou dificuldades) de seus aprendizagem infantis.
alunos, durante o processo, não terá condições de ser justo na As diferentes formas de olhar para a criança é que dão a
emissão de um resultado para cada aluno. riqueza da interpretação da realidade em questão e a
Assim, a avaliação realizada de forma desvinculada do diversidade que a compõe. Assim, avaliar as ações na Educação
processo, além de, não cumprir suas funções didático- Infantil necessita também uma análise desses diferentes
pedagógicas e de diagnóstico, ainda pode cometer injustiças, olhares, sempre visando ao enriquecimento do processo de
atribuindo resultados que não correspondem aos construção de novas situações para as crianças.
desempenhos dos alunos. Esse fato acontece também quando consideramos a
Se o professor faz seu registro diário, fica mais fácil avaliação e o acompanhamento dos processos de
verificar se a criança está aprendendo, principalmente na desenvolvimento, crescimento e aprendizagem das crianças
educação infantil. Na avaliação formativa, é utilizado o registro no contexto da Educação Infantil. Assim sendo, a avaliação
diário a fim de verificar se seu aluno está progredindo ou tendo deve sempre ser planejada, organizada e também requer uma
dificuldades para um novo aprendizado. Com base nesse definição prévia dos objetivos desta avaliação.
método, o professor tem um acompanhamento de como foi o Considerando que as crianças têm maneiras próprias de
desenvolvimento das crianças, durante o ano inteiro, ou seja, pensar e interagir com o mundo e são sujeitos ativos desde o
quais foram suas facilidades e dificuldades. Na visão da momento em que nascem, precisamos educar o nosso olhar
avaliação classificatória esse método não seria utilizado, pois para que ele seja o mais amplo e perspicaz possível.
ela exerce uma função de controle de selecionar os alunos em Gostaríamos de chamar a atenção para o fato de que ao
“bons e ruins”. acompanhar e avaliar as crianças em pleno crescimento
De acordo com Brasil a intervenção do professor é devemos considerar um conjunto de aspectos que compõe um
necessária para que, na instituição de educação infantil, as todo. Isto é, a criança não pode ser considerada de maneira
crianças possam, em situações de interação social ou sozinhas, fragmentada. Seu desenvolvimento acontece de maneira
ampliar suas capacidades de apropriação dos conceitos, dos integrada. A avaliação é um mecanismo dinâmico e deve ser
códigos sociais e das diferentes linguagens, por meio da planejada de maneira a nos possibilitar a visualização de cada
expressão e comunicação de sentimentos e ideias, da criança, suas características, modos de estar no mundo e a sua
experimentação, da reflexão, da elaboração de perguntas e participação no contexto do grupo ao qual pertence.
respostas, da construção de objetos e brinquedos etc. Para O processo de avaliação deve envolver uma observação
isso, o professor deve conhecer e considerar as singularidades cuidadosa de cada criança, levando em consideração tanto as
das crianças de diferentes idades, assim como a diversidade de dimensões do desenvolvimento infantil, isto é, físico-motora,
hábitos, costumes, valores, crenças, etnias etc. das crianças cognitiva, linguística, emocional, social e política, quanto as
com as quais trabalha, respeitando suas diferenças e oportunidades oferecidas para elas no cotidiano da creche ou
ampliando suas pautas de socialização. pré-escola. Chamamos a atenção para uma avaliação que leve
Na instituição de educação infantil, a intervenção do em consideração os diversos aspectos (condições de trabalho,
professor é essencial para que se verifique em que os alunos concepções e valores explicitados no Projeto Político
têm dificuldades e como fazer para ajuda-los a desenvolver Pedagógico, Projeto Pedagógico Anual e nos planejamentos
suas capacidades de interagir com o meio social. cotidianos), a organização do trabalho com as crianças, as
Diante da avaliação classificatória, não podemos usá-la relações implicadas, pois como já explicitado, a criança não é
como referência, pois ela é um meio de rotular a criança, não fragmentada e seu desenvolvimento acontece sempre de
servindo como instrumento didático, uma vez que não maneira contextualizada.
interfere no desenvolvimento das crianças e em seu É preciso que o tema seja abordado no Projeto Político
crescimento para a autonomia. Pedagógico (PPP) da unidade, indicando como a equipe
É importante pensar nas formas avaliativas, pois a maior concebe a avaliação das crianças e como pretende sistematizar
preocupação ao desenvolver sua ação pedagógica, é conseguir o processo avaliativo. Achamos importante que a equipe de
com que o professor possa propiciar momentos de interação cada unidade, ao refletir sobre o acompanhamento pedagógico
entre professor/aluno, nos quais o professor possa entender e do trabalho com as crianças, discuta a sua proposta a partir de
contribuir no desenvolvimento das crianças de forma cinco perguntas clássicas (Souza, 2001, pág. 25):
significativa. 1 – Para que vamos avaliar? (finalidade)
2 – O que avaliar? (objetos; aspectos)
A Avaliação na Educação Infantil72 3 – Quem avalia? (sujeitos)
4 – Como avaliar? (procedimentos)
Convém ressaltar que a importância que damos aos 5 – Quando avaliar? (periodicidade)
diversos aspectos daquilo que é objeto de informação e A proposta aqui é a inclusão de uma sexta pergunta: para
avaliação depende da visão de quem observa. Isso é valido quem ela será feita? Ou quem será o nosso interlocutor? Estas
para todas as esferas de avaliação inclusive na educação perguntas são relevantes na medida em que nos permitem
infantil, pois, ainda que este olhar (observação e registro) clarificar qual será o uso da avaliação. Permitirá um retorno

72 Texto adaptado da Gerencia de Educação Infantil da Prefeitura da cidade do


Rio de Janeiro em A Avaliação da Educação Infantil.

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das ações à equipe? Servirá para informar os pais sobre o Fundamental); IV –documentação específica que permita às
percurso educacional da criança? Ou possibilitará à criança famílias conhecer o trabalho da instituição junto às crianças e
acompanhar as nossas ações e refletir sobre o seu percurso na os processos de desenvolvimento e aprendizagem da criança
educação infantil? O uso das informações registradas deve ser na Educação Infantil; V –a não retenção das crianças na
igualmente discutido com o grupo da unidade com indicações Educação Infantil. As Diretrizes sugerem estratégias múltiplas
claras sobre sigilo, encaminhamentos e novos planejamentos, para o acompanhamento da criança e do trabalho pedagógico
assim como refletir sobre como estas informações serão lembrando a importância de se ter claro para quem
passadas para pais e comunidade (quando for o caso). escrevemos estes relatórios de avaliação.
A discussão sobre estas perguntas deve principiar a Em 2009, o MEC republicou um importante documento
construção do Projeto Pedagógico Anual (PPA) e a revisão das sobre os critérios para um atendimento em creches,
estratégias de acompanhamento e avaliação das crianças deve ressaltando que estes devem partir do respeito aos direitos
ser constantemente realizada, sempre em grupo, para que o fundamentais das crianças tanto no âmbito da instituição
objetivo da avaliação seja de fato promotor de mudanças quanto no das políticas públicas. Os direitos são extensivos
positivas para todos os envolvidos. para crianças de pré-escola também, pois entendemos que
Desta forma, é muito importante que a avaliação seja feita todas elas têm direito à brincadeira, à atenção individual, ao
de maneira a ser significativa, tanto para a equipe pedagógica ambiente aconchegante, seguro e estimulante, ao contato com
da unidade quanto para responsáveis e crianças. É preciso a natureza, à higiene e saúde, a desenvolver sua curiosidade,
haver consenso sobre as ferramentas que serão utilizadas para imaginação e capacidade de expressão, ao movimento em
a avaliação, o acompanhamento das crianças e do trabalho espaços amplos, à proteção, ao afeto e à amizade, a expressar
pedagógico da creche e pré-escola como um todo. seus sentimentos, a uma especial atenção durante seu período
É muito importante que esta avaliação seja também de adaptação à creche (e pré-escola), a desenvolver sua
compartilhada com as crianças a partir da exploração de seus identidade cultural, racial e religiosa. Estes são bons
próprios trabalhos, falas e contribuições. Incluir a criança no parâmetros para a construção de uma avaliação que não
processo de avaliação é muito rico, tanto para ela que pode considere a criança isoladamente e permita visualizá-la a
sentir-se valorizada com a atenção que o professor lhe destina, partir da proposta oferecida e do grupo ao qual pertence. Se
quanto para a equipe pedagógica que se sentirá subsidiada estes direitos estiverem adequadamente cobertos, as crianças
para o planejamento de novas ações e intervenções. Para os terão contextos fomentadores de desenvolvimento integral e
pais, os quais poderão acompanhar mais facilmente o saudável e aprendizagens significativas.
desenvolvimento e aprendizagem da criança, também é muito A trajetória das crianças na Educação Infantil deve ser
importante que participem e compartilhem das avaliações. acompanhada de forma planejada, sistemática e intencional,
Deve-se atentar, no decorrer do processo avaliativo, para assim como devem ser pautadas sempre as nossas ações
que não haja a apresentação de uma imagem destorcida sobre pedagógicas. O olhar atento e cuidadoso do educador não tem
a criança, de modo a influenciar negativamente seu a intenção de rotular ou segregar crianças por resultados pré-
desenvolvimento em quaisquer aspectos avaliados, assim, a determinados, mas desvela, sobretudo, a intenção de
avaliação na Educação Infantil é um processo que possibilita enriquecer todo o ambiente que se transveste em palco para o
melhorias e mudanças em benefício da criança e pressupõe desenvolvimento e a aprendizagem das crianças pequenas.
atitudes e relações positivas que favoreçam todos os Neste sentido, conforme Moro “avaliar as crianças pequenas é
envolvidos. enfrentar o desafio de revelar o universo infantil singular, em
Os documentos oficiais brasileiros para a educação infantil transformação, frente a experiências educativas enriquecidas
têm abordado tal assunto indicando a importância da e oferecidas às crianças”.
avaliação. Eles explicitam que ela é necessária e deve ser parte Queremos ressaltar que o ponto de partida será sempre a
do processo pedagógico, não tendo, no entanto, como um de criança e suas relações no ambiente da Educação Infantil. Por
seus objetivos, a promoção. Conforme a alteração da Lei de isso, ela se encontra no centro da nossa atenção e preocupação.
Diretrizes e Bases da Educação, na seção II, em seu artigo 31, Queremos observar como ela se insere neste contexto
inciso I, Lei nº 12.796/2013, referente à Educação Infantil,"(...) organizado para que seu desenvolvimento e aprendizagens
a avaliação mediante o acompanhamento e registro do seu ocorram de maneira plena e significativa. A reflexão sobre as
desenvolvimento, sem o objetivo de promoção, mesmo para o questões que permeiam a aprendizagem e o desenvolvimento
acesso ao ensino fundamental "e ainda no inciso V, sobre o infantil é de total relevância. Hoffman defende que a avaliação
registro da avaliação, “expedição de documentação que em Educação Infantil precisa resgatar urgentemente o sentido
permita atestar os processos de desenvolvimento e essencial do acompanhamento do desenvolvimento infantil,
aprendizagem da criança”. Já o Referencial Curricular Nacional de reflexão permanente sobre as crianças em seu cotidiano
para Educação Infantil define a avaliação como o conjunto de como elo da continuidade da ação pedagógica.
ações que auxiliam o professor a refletir sobre as condições de Sendo assim, exige-se dos profissionais da Educação
aprendizagem oferecidas e a ajustar sua prática às Infantil, por testemunharem o processo de desenvolvimento e
necessidades colocadas pelas crianças. aprendizagem das crianças durante este rico período da vida
Mais recentemente, as Diretrizes Curriculares Nacionais delas, um trabalho intencional que articule as ações de cuidado
para a Educação Infantil (Dezembro de 2009), em seu artigo e educação sempre em benefício da criança. Observar,
10º postula que “as instituições de educação infantil devem acompanhar e monitorar o desenvolvimento das crianças,
criar procedimentos para acompanhamento do trabalho além de expressar o respeito de que elas são merecedoras, é,
pedagógico e para avaliação do desenvolvimento das crianças, acima de tudo, tarefa dos profissionais da Educação Infantil. As
sem objetivo de seleção, promoção ou classificação, oportunidades que cada criança tem, as culturas em que vivem
garantindo: I –a observação crítica e criativa das atividades, e as interações que fazem, trazem diferentes oportunidades
das brincadeiras e interações das crianças no cotidiano; II - para a trajetória de desenvolvimento das crianças. Esta
utilização de múltiplos registros realizados por adultos e trajetória –educacional e desenvolvimental -nos interessa, e
crianças (relatórios, fotografias, desenhos, álbuns, etc.); III –a agir durante este percurso para ampliar as possibilidades é a
continuidade dos processos de aprendizagens por meio da nossa meta principal. Sensibilizar-nos para a trajetória de cada
criação de estratégias adequadas aos diferentes momentos de criança e do grupo é o primeiro resultado prático do processo
transição vividos pela criança (transição casa/instituição de avaliativo.
Educação Infantil, transições no interior da instituição, É comum observarmos que cada criança, ao longo de seu
transição creche/pré-escola e transição pré-escola/Ensino percurso de desenvolvimento, apresenta diferenças em

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relação aos outros colegas da mesma faixa etária. É neste os processos de mudança significa criar uma movimentação
sentido que ela é única, ela tem sua individualidade que sistemática de avaliação. O movimento da avaliação é
interage com os ambientes e as pessoas produzindo igualmente dinâmico, além de revelador e desencadeador de
expressões, interesses e relações singulares. Neste sentido, novas relações e interações. A avaliação deverá ser
comparações e julgamentos que visem classificar esta ou fomentadora de práticas desejáveis na Educação Infantil. Agir
aquela criança como “capaz ou incapaz” ou que “atingiu ou não com intenções claras e planejadas, avaliar a nossa ação e
atingiu os objetivos propostos” não são as desejáveis. No lugar visualizar a participação das crianças confere movimento à
desta visão classificatória e excludente, colocaríamos prática de avaliação. A figura A, logo abaixo, nos mostra que o
observações atentas com interações positivas que enriquecem processo pedagógico –planejar, agir e avaliar –deve ser
as relações, aprendizagens e desenvolvimento. São estas contínuo e cíclico, não deixando nunca de refletir cada passo
observações que formam a base da avaliação. Ao invés de dado em torno das relações entre adultos e crianças
insistirmos na visão classificatória, tornaríamos a nossa estabelecidas na Educação Infantil. A figura B demonstra a
análise mais crítica e construtiva se observássemos as dinâmica da avaliação dando sustentação ao processo
diferentes maneiras de as crianças de atuarem em grupo, se pedagógico. As relações entre crianças e adultos são o foco da
relacionarem e se expressarem como indivíduos. Educação Infantil e, portanto, foco da avaliação.
Por outro lado, vemos também que as crianças têm
semelhanças e muitas vezes parecem apresentar
comportamentos e atitudes típicas de determinadas idades ou
fases. Neste caso, quando uma criança não segue um “padrão”,
ao invés de rotulá-la, devemos nos aproximar dela com o
objetivo de compreender os caminhos de seu
desenvolvimento, os interesses e aprendizagens para os quais
ela se direciona. Muitas vezes, ela nos ensina sobre o que é ser
criança, quando nos instiga a investigar melhor as suas reações
e interesses, o que nos leva a planejar novas situações na sala,
para o grupamento em questão. Dos bebês às crianças de cinco
anos, a dinâmica da avaliação se repete: interagir, dialogar,
observar reações, intervir, dialogar novamente, registrar e
acompanhar as crianças. No Caderno Pedagógico, volume 1, intitulado “O
A prática avaliativa, como um processo constitutivo da Planejamento na Educação Infantil”, ressalta-se que “o
prática pedagógica, deve ser contínua e o foco é a criança que planejamento, seja ele de qual nível for, depende, para seu
se encontra em desenvolvimento, vivenciando mudanças e sucesso, de avaliações constantes das ações de todos os
evoluções importantes para sua vida. Por isso, é essencial envolvidos no ambiente educativo. Acompanhar com olhar
identificarmos as conquistas das crianças. No entanto, mais crítico e avaliativo contribui para tomadas de decisão
importante é lembrar que as crianças se encontram em pertinentes com o que se entende como ação pedagógica. Ao
processo de desenvolvimento e, portanto, sujeitas a contínuas longo do percurso, é importante manter uma revisão das
mudanças que ocorrem ao longo do tempo em que estão na metas da Educação Infantil, assim como das metas
Educação Infantil. A avaliação deve ter caráter dinâmico por institucionais. A avaliação das nossas ações, assim como o
ser um processo em aberto, e deve respeitar as especificidades monitoramento dos avanços das crianças, ajuda-nos a planejar
do desenvolvimento e aprendizagens infantis. Acompanhar as com responsabilidade, criatividade e pertinência.”
mudanças que ocorrem nesta etapa da vida exige agilidade e, Assim, devemos considerar a importância de a ação
portanto, métodos claros e que deem conta de demonstrar as pedagógica ser intencional e planejada. Atentamos também
mudanças. A avaliação parece ter, portanto, um caráter para o fato de que nossas ações na Educação Infantil têm metas
também interativo. que podem até passar por revisão à medida que nos
Agir em favor do desenvolvimento integral da criança apropriemos dos diferentes estágios de desenvolvimento das
significa oferecer interações e experiências significativas para crianças. De mesma forma, defendemos que acompanhar as
ela. Somente por meio de observações sistemáticas e crianças ao longo da Educação Infantil significa observar
planejamento pedagógico consistente é que promoveremos atentamente os percursos de seu desenvolvimento e
estas experiências. É nesta perspectiva que também se revela aprendizagens, e, utilizando parâmetros de acompanhamento,
a avaliação mediadora. Hoffman discute a avaliação mediadora registrar suas ações, conquistas e interesses. Isto quer dizer
defendendo que a mediação é um “estado de alerta que é muito importante que os profissionais da Educação
permanente” do educador que observa e acompanha o Infantil se preocupem em ampliar os seus conhecimentos
desenvolvimento da criança e sua história. É a observação e o sobre o desenvolvimento infantil e os utilizem de forma crítica
acompanhamento da criança, de forma a mediar o e responsável. Este conhecimento nos ajuda a compreender as
desenvolvimento, o seu contexto, o planejamento do educador crianças e situa melhor as nossas ações.
e a construção do conhecimento que fará sentido para a Aprofundar o entendimento relativo ao desenvolvimento
Educação Infantil. infantil nos permite ampliar a compreensão sobre os
O nosso desafio agora é ressignificar a avaliação na diferentes estágios em que se encontram as nossas crianças. E,
educação infantil, afastando o risco de comparar, classificar e com base nesse entendimento, situar melhor as nossas ações.
rotular as crianças de forma restrita e descontextualizada. Estes instrumentos auxiliam o profissional a identificar
Avaliar implica em acompanhar a aprendizagem, visualizar e áreas que merecem maior atenção individualizada ou para
dar visibilidade à individualidade de cada criança, suas todo o grupo em questão. Podem funcionar como
interações, produções e contribuições para o grupo. É utilizar coadjuvantes, contribuindo com uma avaliação que inclua
a nossa observação como mediadora do processo de aspectos das relações e do contexto institucional. Permitem
desenvolvimento, aprendizagem e socialização nesta etapa da que se potencialize a avaliação realizada na Educação Infantil,
vida. É demonstrar um processo constantemente em assim como o seu significado. É importante lembrar que o
andamento, cujo produto final está sempre em aberto, passível desenvolvimento da criança acontece de forma integrada e
de mudanças, complementações e novas criações. contextualizada, e que, de forma didática, muitas vezes
A dinâmica de desenvolvimento, aprendizagem e relações observamos as crianças dando maior ênfase aos diferentes
das crianças comanda o movimento da avaliação. Acompanhar aspectos do desenvolvimento, como, por exemplo, o

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desenvolvimento cognitivo, emocional, linguístico e etc. No sob o ponto de vista pedagógico, feita ou não a partir de um
entanto, esta avaliação só faz sentido se levada a termo para roteiro, deve ser capaz de revelar as características da criança
compreender melhor as inserções das crianças nas diferentes em relação àquilo que foi desenvolvido com e para ela.
situações pedagógicas e relacionais. O desenvolvimento das crianças e dos bebês está
Quando uma criança começa a dar os primeiros passos, permeado de explorações sobre o meio em que elas estão
não só desenvolve o aspecto motor como também a inseridas. Eles descobrem sons, objetos, reações das pessoas e
capacidade de explorar o ambiente para descobrir novas maneiras de dialogarem com o mundo de forma original e
coisas e parceiros. Ela constrói gradativamente a sua criativa, construindo novos significados. Acompanhar o
autonomia, até ser capaz de andar e se movimentar com desenvolvimento destas vivências e explorações, conhecendo
segurança, atendendo aos seus próprios interesses e aos de como a criança constrói sua relação com o mundo e estabelece
seus pares. É possível perceber, em várias situações do sentidos, faz parte do processo avaliativo.
cotidiano da Educação Infantil, que os aspectos do Desta maneira, é importante identificar e demonstrar
desenvolvimento não acontecem isoladamente, mas em também os objetivos e metas designados para o
conjunto. Movidas por interesses diversos, as crianças buscam, desdobramento das atividades. Há que priorizar também a
no ambiente educativo, novas formas de interagir com o promoção de experiências para as crianças, quando relatamos
mundo e nós, professores e educadores, podemos, a partir de sobre a contribuição de cada uma delas para os processos
uma compreensão aprofundada sobre os caminhos complexos desenvolvidos no grupo onde está inserida, assim como sobre
do desenvolvimento humano, melhor fomentá-la. Dar suas participações e construções durante o período
oportunidade às crianças de exercitarem seu desenvolvimento compreendido pela avaliação.
motor amplo e fino simplesmente programando atividades de Podemos fazer a avaliação das crianças de diversas
correr e recortar, por exemplo, não garante a apropriação das maneiras. Desde relatórios previamente estruturados a
referidas habilidades de maneira significativa e relatórios mais complexos tais como o portfólio e a
enriquecedora. Estas habilidades só têm sentido se forem documentação pedagógica. O mais importante é que estes
acrescentar ao repertório das crianças novas estratégias para relatórios sejam redigidos de forma clara para todos –
lidar com as situações de vida e de aprendizagem. As professores, pais e crianças. Para os professores, responsáveis
atividades e experiências que lhes oferecemos e pelo relato, que ele venha a subsidiar suas ações e
disponibilizamos devem oferecer um retorno aos interesses planejamentos futuros. Para os pais, que lhes permita
infantis. identificar seus filhos na descrição feita por outrem e que
O objetivo da Educação Infantil é garantir um espaço que ainda agregue informações construtivas sobre eles. E,
promova experiências importantes para potencializar o finalmente, para as crianças, que, por meio da leitura e exame
desenvolvimento Infantil, o crescimento das crianças e a feitos em conjunto por responsáveis e professores, possam
ampliação de sua inserção no mundo. Supondo que a explorar e admirar sua própria produção, assim como a sua
Educação Infantil hoje é espaço de encontros e interações, contribuição para o grupo em que estão inseridas.
interessa-nos saber o que as crianças pensam, planejam, A leitura destes relatórios com as crianças pode ser feita ao
sabem e, principalmente, o que desejam saber. É a partir dos longo da construção dos mesmos. Isto é, dissertando com as
comentários, contribuições e opiniões das crianças que crianças sobre seus trabalhos, contribuições e projetos,
podemos conhecê-la melhor. Ou seja, a participação da criança resgatando suas opiniões sobre as mais diversas situações do
quanto mais efetiva se faça, mais nos permitirá conhecer como cotidiano da creche, EDI e pré-escola. O estímulo à reflexão
elas aprendem e se socializam. virá a auxiliá-las a contemplar os caminhos do
O processo avaliativo na Educação Infantil deixa então de desenvolvimento por elas percorridos, assim como os passos
se preocupar exclusivamente com a percepção que possamos seguintes. Falar sobre si e sobre suas produções aumenta o
ter sobre o desenvolvimento e o comportamento das crianças autoconhecimento e auxilia na resolução de problemas, tanto
para abranger as práticas e os contextos educativos. O nosso os mais íntimos, quanto os inerentes ao processo de
esforço atual é o de afastar a prática superficial de preencher aprendizagem e, por outro lado, influencia as decisões frente a
fichas e/ou construir pareceres ou relatórios padronizados, novas situações de aprendizagem.
tendo como panorama único uns poucos resultados visíveis. Mais importante do que dizer que a criança consegue pular
Segundo Moro “a partir da última década do século XX, desta ou daquela maneira, é dizer se determinada maneira de
passa a haver uma disseminação maior sobre as diferentes pular a favorece em seus projetos ou nos planos que pretende
dimensões a serem avaliadas e começa a se revelar uma desenvolver.
mudança em relação ao entendimento e às intenções para com Mais importante do que dizer que a criança reconhece
a avaliação na Educação Infantil”. Estas dimensões, contexto e algumas letras ou números, é dizer se ela já coloca este
relações dão significado à avaliação no contexto da creche e conhecimento a serviço de seus projetos ou planos individuais,
pré-escola. Seguindo a linha da história, podemos dizer que há em pequenos grupos ou na coletividade. Ou seja, precisamos
várias maneiras de construir a avaliação da Educação Infantil. observar se a criança utiliza o conhecimento em suas
Da avaliação da aprendizagem (focada no conhecimento atividades e experiências.
adquirido) e do desenvolvimento (baseada nas habilidades e Mais importante do que dizer que a criança consegue
conquistas feitas pelas crianças) à avaliação mais abrangente executar uma tarefa verbal (como levar um recado simples
dos ambientes educativos, temos diferentes possibilidades. para alguém), é dizer se ela é capaz de relatar os projetos que
Há duas grandes vertentes na avaliação que norteiam o contam com a sua participação ou situações outras que assistiu
trabalho. A primeira centrada na visibilidade dos resultados em diferentes espaços. Mais relevante é verificar se ela
atingidos, identificando as habilidades adquiridas. A segunda consegue se expressar com clareza em situações diferenciadas.
voltada para a descrição dos processos educativos, com o foco Mais importante do que dizer que a criança consegue usar
no movimento das crianças em interação com seus pares, um pincel ou um lápis, é dizer se ela busca representar suas
adultos e ambientes (incluindo materiais e brinquedos). ideias, pensamentos, planos, opiniões desenvolvendo
Neste sentido, a avaliação das crianças deverá estar linguagens e expressões em situações diversas e utilizando
ajustada à prática pedagógica, buscando as singularidades das diferentes recursos.
crianças, assim como os contextos educativos. Mais importante do que dizer que a criança consegue
Desta forma, as avaliações das crianças devem jogar luz aceitar as sugestões do grupo, é dizer se ela se expressa
sobre os respectivos processos de desenvolvimento e sua emocionalmente de maneira a demonstrar que está
inserção junto aos pares. Isto quer dizer que a nossa descrição, confortável (ou não) em relação ao que lhe é proposto. Há que

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observar se ela consegue identificar suas emoções e auto impostos. São situações como estas as mais relevantes
sentimentos quando se frustra ou se alegra, diante das experiências de aprendizagem para as crianças pequenas. O
situações dispostas pelo coletivo ou por ela mesma. mesmo pode acontecer com os bebês, quando se aventuram a
Entendemos que as dimensões motora, afetiva, social e descobrir como as coisas funcionam ou com as crianças de 2 e
cognitiva são indissociáveis e não podem ser observadas de 3 anos, quando insistem em criar algo para complementar uma
maneira desigual ou isoladamente. Isso significa que esta brincadeira solitária ou com os seus pares.
etapa da vida requer atenção e cuidados para que tais Para exemplificar os instrumentos que auxiliam na
dimensões, de fato, se desenvolvam constante e avaliação infantil sugerimos o registro do desenvolvimento da
equilibradamente. Portanto, nossa função educativa nos criança no processo de aprendizagem através de pequenas
obriga a conhecê-las e estudá-las, pensando cada vez mais nas anotações habituais. É possível, em alguns momentos, lidar
intervenções que podemos fazer, nas interações e mediações com algumas crianças individualmente e, em outros
que devemos desenvolver e nas experiências que devemos momentos, elencar outro pequeno grupo de crianças, a serem
oferecer. norteados pelos objetivos gerais (ação intencional do
Falar sobre cada criança, seus fazeres e sua inserção no educador) e pela ação das crianças, ao interagirem com as
grupo, incluindo as ações dos adultos, compõem a avaliação propostas planejadas para elas (habilidades).
das crianças. A descrição de situações que envolvem a Ao pensarmos este documento, privilegiamos o diálogo
interação e os diálogos entre os adultos e as crianças, por com as “Orientações Curriculares para a Educação Infantil” e
exemplo, pode favorecer a visualização e o melhor com o “Caderno de Planejamento“, pois consideramos que os
entendimento dos processos vivenciados nos contextos da EI. mesmos devem servir como norteadores das práticas
É uma boa ideia incluirmos no formato de avaliação das pedagógicas nas creches e nas pré-escolas.
crianças um espaço com anotações mais particularizadas, As “Orientações Curriculares” descrevem, por exemplo, as
como os diálogos e planos das crianças que se expandiram e se rotinas diárias e as diferentes dimensões que devem ser
tornaram mais complexos. Moro ressalta que “o sentido da trabalhadas. Além disso, nele estão relacionados os objetivos e
avaliação no contexto da Educação Infantil é a investigação e as habilidades na ordem da criança menor à criança maior,
não o julgamento”. para facilitar a compreensão do texto. O “Caderno de
Vejam, abaixo, a descrição de uma professora de uma Planejamento na Educação Infantil” relaciona as metas a
situação: serem alcançadas durante o processo de aprendizagem na
“Carlos é uma criança de quatro anos que decidiu fazer um Educação Infantil. Parafraseando o documento: “Acreditamos
carro de corridas com blocos de madeiras grandes e tapetes que a Educação Infantil faz a diferença na vida da criança e de
pequenos. Precisava de uma alavanca para fazer as marchas do suas famílias: e, por isso, acompanhá-las a partir de
carro, mas já não havia mais blocos. Foi ver na área da parâmetros nos possibilita intervir de modo a garantir o seu
expressão plástica (arte) e encontrou alguns tubos de rolo de bem-estar, assim como o processo de aprendizagem de cada
papel de cozinha. Para conseguir o comprimento que queria, uma delas”.
precisava de dois tubos, mas não sabia como faria para colar Baseando-se nestes elementos que norteiam a sua prática,
um no outro. Um dos professores disse-lhe para falar como o educador pode utilizar instrumentos de observação que
Cris, que é o nosso especialista em fitas colantes (durex ou fita possibilitem maior clareza e a sistematização da observação.
adesiva). O Cris ajudou o Carlos a fazer uma alavanca para Existem vários tipos de registros de aprendizagem da criança
fazer as marchas do carro com os dois tubos para atingir o na Educação Infantil que podem ajudar o educador, a escola e
comprimento correto e necessário. Para resolver este a família a ter uma visão geral de acompanhamento deste
problema – a confecção da alavanca para as marchas -Carlos desenvolvimento. Este registro pode se dar por meio da
teve que pensar nas características que queria dar a alavanca apreciação da evolução da aprendizagem, através de
e, depois, teve que encontrar os respectivos materiais –neste atividades e trabalhos produzidos pela criança (desenhos,
caso, materiais compridos e estreitos. Teve ainda o problema pinturas, escrita), ou documentos viabilizados pelo educador,
de imaginar uma forma de juntar um tubo ao outro. Nenhum como: fotos, filmagens e textos. Todo esse acervo pode
destes exercícios de resolução de problemas teria ocorrido se documentar a trajetória da aprendizagem, colocando em
existisse na sala um desses brinquedos de plástico que imitam evidência o nível de desenvolvimento e as hipóteses
o interior dos carros, com volante e quadro de bordo.” levantadas.
(inspirado, no caso apresentado, na página 156, do livro Por fim, é possível depreender se os objetivos alcançados
“Aprendizagem Ativa”, de Nancy Altman Brickman e Lynn pela criança foram incialmente os propostos, assim como
Spencer Taylor. detectar o que precisa ser replanejado. Em qualquer formato,
O mais importante neste relato não é propriamente não as anotações do professor são importantes. Mas cabe dar
haver brinquedos de plástico que dariam às crianças a maior ênfase aos detalhes e às descrições minuciosas, com as
experiência de um carro, mas o fato dos professores terem falas e atitudes das crianças, assim como as do próprio
percebido e registrado a trajetória de Carlos ao construir um mediador.
plano e, a seguir, executar seu plano de montar um carro com Uma vez concluída a avaliação, os resultados obtidos
marchas e tudo o mais. Ressaltam ainda hipóteses para o tipo deverão ser utilizados para favorecer o desenvolvimento
de raciocínio que a criança encaminhou para “resolver” os integral da criança.
impasses deste projeto de construção. Ali, estão marcados os Sendo assim, concebida a avaliação como ferramenta de
passos, os materiais, a parceria com outros, e o produto final mediação e acompanhamento da trajetória da criança, torna-
desta atividade que envolveu completamente esta criança de se possível perceber os caminhos que ela percorre em suas
quatro anos com intenções claras e desejo forte de concluir a aprendizagens e, ao mesmo tempo, possibilita ao professor
sua “obra”. É por meio destes registros que verificamos como ressignificar a sua própria prática pedagógica, de maneira
as crianças aprendem e usam o seu conhecimento, assim como contínua e reflexiva. Não há sentido em colecionar trabalhos
as relações possíveis. dos alunos para mostrá-los aos pais, somente como uma
É importante, no entanto, ressaltar, que materiais como documentação daquilo que a criança produziu durante
blocos de tamanhos variados, pedaços de tecidos grossos e período determinado. Também não há contribuição efetiva em
finos, material reciclado (tais como os rolos utilizados nessa registrar o que a criança consegue ou não fazer, se não
situação) e possibilidades na área das artes plásticas podem contextualizarmos as informações. A avaliação e o
incrementar o pensamento e os planos das crianças, revelando acompanhamento do desenvolvimento das crianças em
assim sua capacidade de lidar com os desafios propostos e/ou atividade precisam se constituir em um conjunto de dados que

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expressem avanços, mudanças e novos jeitos de pensar e de


fazer, relacionando-o ao desenvolvimento da criança. A Ultimas considerações sobre a Avaliação Infantil
avaliação deve sempre ser inspiradora de novas práticas. Há consenso de que a avaliação é essencial para conhecer
Souza questiona se, a avaliação da aprendizagem, neste e aperfeiçoar aquilo que se faz. As opiniões e convicções se
caso, dos avanços obtidos pelas crianças na educação infantil, dividem na escolha dos meios e na forma de avaliar73.
se constitui em um instrumento de promoção do Na educação infantil, a avaliação tem especificidades
desenvolvimento de todas as crianças. Ao ponderar sobre o derivadas das características etárias das crianças, nos
uso da avaliação na Educação Básica, acrescenta que: aspectos físicos, psicológicos e sociais, correlacionadas às
Conforme já mencionamos anteriormente, acompanhar o formas culturais em que se dá sua formação humana,
desenvolvimento individual da criança é importante para que dependentes das finalidades e objetivos que a sociedade
possamos planejar situações relevantes para cada uma delas, determina para essa etapa da educação, dos ambientes e
ao longo da Educação Infantil, favorecendo o desenvolvimento espaços em que ela se realiza e das interações que se
da autonomia. Nosso intuito com a avaliação, portanto, mais estabelecem entre crianças e entre crianças e adultos. Não
do que propriamente identificar as dificuldades de pode ser tratada, por isso, da mesma forma como o é a
aprendizagem, busca trabalhar com as crianças de maneira a avaliação do ensino fundamental, médio ou superior.
incentivar a resolução de problemas na perspectiva de Cinco questões-chave devem ser postas previamente:
proporcionar o enfrentamento de desafios e conflitos. Ao (a) a concepção de criança, que implica subjetividade,
vermos as crianças conseguirem realizar as atividades com diversidade, etapa da vida com valor-em-si-mesmo e dinâmica
sucesso e demonstrarem empolgação com suas descobertas, de desenvolvimento tendente a níveis de crescente
consideramos estas realizações como aprendizagens efetivas. complexidade,
Isto é, ao vermos as crianças utilizando conceitos nas suas (b) concepção de infância e infâncias, contextualizadas
ações, atividades e relações, registramos esta conquista como histórica e culturalmente,
sendo, de fato, aprendizagem. (c) a política nacional de educação infantil,
Avaliar é ação inerente a todo processo educativo. No (d) a caracterização dos espaços (estabelecimentos) e
entanto, mais importante ainda é saber utilizar as informações tempos em que ela é realizada e
coletadas sobre todos os envolvidos na Educação Infantil. (e) as transições internas da educação infantil e desta ao
Utilizar tais informações e registros têm sentido quando estes ensino fundamental num processo que mantém unidade no
nos guiam para avançarmos no processo de aprendizagem e interior da criança enquanto sujeito e autora de seu
crescimento. Quando passamos a utilizá-los para subsidiar as desenvolvimento e da aprendizagem.
nossas ações, por meio de reflexões e mudanças importantes As concepções teóricas e análises de práticas em curso
para o processo educativo, chegamos à razão última da sobre avaliação em educação, internacionais e nacionais, nos
avaliação. recomendam alerta e a tomada posição clara nos seguintes
Nunca é demais lembrar que informações sobre as pontos:
crianças devem ser utilizadas com o devido respeito e sigilo, (a) uma cultura de testes vem tomando espaço cada vez
compartilhando com os outros da mesma maneira, maior na educação a ponto de serem os grandes, senão os
respeitosamente. E, para finalizar, segundo Moro, devemos únicos, referenciais da qualidade da educação. A educação
“avaliar sem padronizar": parece que vai se estruturando ao redor deles: “é preciso
“Isso é um modo de evitar a padronização e a alcançar tal metas no IDEB, melhorar a posição no PISA,
normatização, comuns a muitas formas de avaliar. Fora isso, atenção para o peso que cada edição do PISA atribui a uma das
deve-se valorizar o envolvimento da criança neste processo, três áreas ou disciplinas avaliadas (língua, matemática e
ampliar a comunicação com as famílias, compartilhar com elas ciências), valorização, com prêmio, dos professores cujos alunos
e com a comunidade educativa o trabalho desenvolvido na alcançam notas mais altas...”. Essa cultura dos testes é uma
instituição. Tal postura fortalece o aspecto profissional da franca inversão nos processos pedagógicos, colocando os
Educação Infantil.” (Moro). meios no lugar dos fins.
Assim sendo, quando uma criança nasce, seus pais (b) diagnóstico e avaliação vêm sendo confundidos e até
preocupam-se em registrar, através de álbuns de fotografias, a tomados como se fossem a mesma coisa.
história de seus bebês. Alguns adolescentes escrevem em seus (c) aplicação de testes de conhecimento ou habilidades na
diários, outros deixam suas pistas nas páginas da internet. educação infantil, ainda em pequena escala, mas com
Desde os tempos mais remotos, o homem já se preocupava em tendência a se expandir, é prejudicial às crianças. Testes criam
deixar as suas marcas nas cavernas. Tais registros constroem situação de tensão. Artificializam a expressão do
nossa história. Precisamos do registro, porque este exercício conhecimento e do saber fazer. Não avaliam valores, atitudes,
nos faz diferentes dos animais. caráter. Não avaliam persistência, esforço, alegria na
Os anos passam e o cotidiano nos consome. Vivências e descoberta, significados internos de coisas feitas. Priorizam a
experiências se perdem em nossa trajetória. Momentos memória de informações. Recortam um processo dinâmico de
ímpares que deveriam ser documentados passam ao largo, desenvolvimento, retiram dele uma amostra e generalizam
substituídos por tarefas que nem sempre são tão essenciais. E, para todo o ser da criança. Tendem a classificar, quantificar,
por vezes, deixamos de observar o mais importante: o comparar – senão com outras crianças, pelo menos com uma
aprendizado da criança. média considerada “padrão”. Sabendo os professores quanto
O professor deve voltar os seus olhos para onde quer um mau desempenho nos testes de seus alunos repercute em
chegar. Para ver o caminho percorrido, precisa recorrer à sua avaliação, são induzidos a treiná-los para se saírem bem na
memória resguardada nestes materiais. Registrar não prova. Professores que almejam prêmio pelo bom
significa amontoar papéis. Significa procurar instrumentos desempenho de seus alunos tendem a cobrar deles acertos e
efetivos que sintetizem da melhor forma os progressos e os notas altas nos testes estandardizados.
obstáculos, para que, durante todo o processo, possam O foco do ensino e da aprendizagem muda do
acontecer as intervenções necessárias. Hoje, temos a conhecimento para o reconhecimento, ou seja, da construção
tecnologia em nossas mãos, o que nos auxilia na recuperação do conhecimento para a sua demonstração social. Os testes
desta memória, tornando-a visível em fotos, filmagens e blogs.

73Texto adaptado de Vital Dionet de A7%C3%A3o%20na%20Educa%C3%A7%C3%A3o%20Infantil%20-


http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/Educacao/Doutrina/Avalia%C3% %20Vital%20Didonet.doc

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medem as coisas com uma visão estreita e em circunstâncias comparativamente com as outras crianças; O objetivo da
delimitadas, muito diferentes da vida real. avaliação é melhorar a forma de mediação do professor para
(d) o estabelecimento de ranking segundo pontos, notas, que o processo de aprendizagem alcance níveis sempre mais
conceitos ou juízos valorativos, de crianças, turmas, escolas, elevados.
municípios, países é pernicioso. Há consenso de que a Sendo assim os resultados advindos da avaliação devem
avaliação é essencial para conhecer e aperfeiçoar aquilo que se ser utilizados a fim de acompanhar a criança em suas
faz. As opiniões e convicções se dividem na escolha dos meios progressões, bem como auxilia-la nas suas dificuldades
e na forma de avaliar. visando um pleno desenvolvimento dos diferentes aspectos,
Como são perniciosas comparações usando resultados de comportamentais, sociais, de aprendizagem, motores entre
testes de diagnóstico ou de avaliação. Essa posição encontra outros de forma a não discriminar a criança, utilizando os
similaridade com a de outras organizações educacionais, tais resultados comparativamente, mas sim, favorecer o seu
como a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições desenvolvimento geral, bem como servir de instrumento para
Federais de Ensino (Andifes), “que não reconhece rankings de auxiliar pais e professores74.
avaliação das universidades federais” ou do MEC, que
“também não comenta sobre rankings, pois não são a melhor Questões
forma de avaliar a educação” (comentário a propósito da
avaliação feita pela Quacquerelli Symonds University Ranking 01. Quanto ao processo de avaliação na educação infantil,
- QS, instituição britânica especializada em avaliação de analise as assertivas, e em seguida, assinale a alternativa que
desempenho de instituições de ensino superior (Jornal A aponta a(s) correta(s).
Tarde). Os critérios para conferir pontos e fazer os ranks são I. A expectativa em relação à aprendizagem da criança deve
discutíveis. Se eles são questionáveis no ensino superior, estar sempre vinculada às oportunidades e experiências que
imagine-se na educação infantil, que atende crianças na fase da foram oferecidas a ela.
vida em que estão se constituindo sujeitos, quando as II. Deve-se ter em conta que não se trata de avaliar a
estruturas cognitivas, sociais e afetivas da personalidade criança, mas sim as situações de aprendizagem que lhe foram
começam a se formar e consolidar. oferecidas.
Somos, no entanto, favoráveis à avaliação: III. Será necessária uma observação cuidadosa das
a) da aprendizagem e desenvolvimento das crianças, nos crianças, buscando compreender as situações e planejar
termos do art. 31 da LDB: acompanhamento do situações que contribuam para superação das dificuldades.
desenvolvimento, por meio de observações e registro, usando (A) Apenas I.
diferentes formas. As observações e registros devem ser (B) Apenas II e III.
contextualizados, isto é, tomando as crianças concretas, em (C) Apenas I e III.
suas histórias de vida, seus ambientes sociais e culturais. E (D) I, II e III.
devem ser variados, tais como a escrita, a gravação de falas,
diálogos, fotografias, vídeos, os trabalhos das crianças etc. As 02. Sobre a avaliação na Educação Infantil, podemos
professoras anotam, por exemplo, o que observam: as afirmar que ela:
impressões e ideias que têm sobre acontecimentos, descrevem (A) deve ser baseada em julgamentos.
o envolvimento das crianças nas atividades, as iniciativas, as (B) avalia-se para quantificar o que foi aprendido.
interações entre as crianças etc. E usam esses registros para (C) faz parte do processo de aprendizagem e é essencial
refletir e tirar conclusões visando a aperfeiçoar a prática conhecer cada criança.
pedagógica. (D) considera o “erro” como parte do resultado final.
As crianças devem ser envolvidas na avaliação das
atividades, da ação da professora, das coisas feitas pelas 03. Sobre avaliação assinale a alternativa incorreta:
crianças. A professora conversa com elas, ouve suas (A) Para que possa se constituir como um instrumento
dificuldades, registra a percepção que elas têm sobre e com voltado para reorientar a prática educativa, a avaliação deve
elas combina formas mais agradáveis, mais eficientes, mais se dar de forma sistemática e contínua, tendo como objetivo
desafiadoras nas próximas vezes. principal a melhoria da ação educativa. O professor, ciente do
b) dos componentes da oferta de educação infantil, é a que pretende que as crianças aprendam, pode selecionar
avaliação do “serviço”, de como ele está sendo posto para as determinadas produções das crianças ao longo de um período
crianças. Os parâmetros e os critérios de qualidade são as para obter com mais precisão informações sobre sua
referências, a política de educação infantil em todos os seus aprendizagem.
âmbitos, resultados de testes de diagnóstico ou de avaliação. (B) Na educação infantil, a avaliação quantitativa é um
A RNPI (Rede Nacional Primeira Infância) reafirma o que excelente instrumento avaliativo e se preocupa com a
propôs no PNPI (Plano Nacional pela Primeira Infância) sobre promoção e a retenção dos alunos.
a avaliação na educação infantil afirma que: A avaliação ocorre (C) A avaliação mediadora exige a observação individual
permanentemente e emprega diferentes meios, como a de cada aluno, atenta ao seu momento no processo de
observação, o registro, a reflexão sobre o desenvolvimento das construção do conhecimento.
atividades e projetos, sobre as hipóteses e descobertas das (D) As situações de avaliação devem se dar em atividades
crianças e nunca como ato formal de teste, comprovação, contextualizadas para que se possa observar a evolução das
atribuição de notas e atitudes que sinalizem punição – (pois crianças. É possível aproveitar as inúmeras ocasiões em que as
esses são) processos externos e artificiais que bloqueiam a crianças falam, leem e escrevem para se fazer um
manifestação livre e espontânea da criança; A avaliação será acompanhamento de seu progresso. A observação é o principal
sempre sobre a criança em relação a si mesma e não

74 Documento produzido pelo Grupo de Trabalho instituído pela Portaria Trabalho apresentado por Maeli Sorato Manarin em Criciúma/2009. Disponível
número 1.147/2011, do Ministério da Educação. Disponível em: em http://www.bib.unesc.net/biblioteca/sumario/000041/000041FD.pdf
file:///C:/Users/Usuario/Downloads/educacao_infantil_sitematica_avaliacao.pdf Gerencia de Educação Infantil da Prefeitura da cidade do Rio de Janeiro em A
Artigo publicado por Fúlvia Rosemberg em Cad. Pesqui. vol.43 no.148 São Paulo Avaliação da Educação Infantil.
Jan./Apr. 2013. Disponível em: Texto adaptado de Vital Dionet. Disponível em:
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100- http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/Educacao/Doutrina/Avalia%C3%
15742013000100004&lang=pt A7%C3%A3o%20na%20Educa%C3%A7%C3%A3o%20Infantil%20-
Livro divulgado pela Equipe Clorophila- Elmara. Disponível em %20Vital%20Didonet.doc
http://www.moodle.ufba.br/mod/book/view.php?id=9945&chapterid=9308

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instrumento para que o professor possa avaliar o processo de - iniciado em 1959 com a Declaração Universal dos Direitos da
construção da linguagem pelas crianças. Criança e do Adolescente e instituído no país pelo artigo 227
da Constituição Federal de 1988 e pelo Estatuto da Criança e
04. (SEE-AC- Professor de Ciências Humanas- FUNCAB) do Adolescente (Lei 8.069/90) - tornou-se referência para os
“A avaliação escolar tende a ser organizada de forma a movimentos sociais de “luta por creche” e orientou a transição
identificar o conhecimento nos moldes da compreensão de do entendimento da creche e pré-escola como um favor aos
como este conhecimento acontece. Independentemente de socialmente menos favorecidos para a compreensão desses
como esta avaliação é organizada, ele terá basicamente três espaços como um direito de todas as crianças à educação,
etapas.” (MALHEIROS, Bruno T.Didática Geral. Rio de Janeiro: independentemente de seu grupo social.
LTC, 2012, p. 182). O atendimento em creches e pré-escolas como um direito
São elas: social das crianças se concretiza na Constituição de 1988, com
(A) medição, qualificação e testagem. o reconhecimento da Educação Infantil como dever do Estado
(B) testagem, quantificação e atribuição de notas. com a Educação, processo que teve ampla participação dos
(C) apreciação, quantificação e testagem. movimentos comunitários, dos movimentos de mulheres, dos
movimentos de redemocratização do país, além,
(D) verificação, qualificação e apreciação. evidentemente, das lutas dos próprios profissionais da
(E) qualificação, quantificação e verificação. educação. A partir desse novo ordenamento legal, creches e
pré-escolas passaram a construir nova identidade na busca de
05. (SEE-AC- Professor de Ciências Humanas- FUNCAB) superação de posições antagônicas e fragmentadas, sejam elas
Luckesi (2007) define avaliação como um julgamento assistencialistas ou pautadas em uma perspectiva
qualitativo sobre o processo de ensino-aprendizagem. Esse preparatória a etapas posteriores de escolarização.
julgamento deve existir para: A Lei nº 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação
(A) medir as informações que o aluno foi capaz de reter Nacional), regulamentando esse ordenamento, introduziu
(B) decidir o grau de dificuldade de testes e provas. uma série de inovações em relação à Educação Básica, dentre
(C) auxiliar o professor na tomada de decisão quanto ao as quais, a integração das creches nos sistemas de ensino
seu trabalho. compondo, junto com as pré-escolas, a primeira etapa da
(D) atribuir notas aos alunos Educação Básica. Essa lei evidencia o estímulo à autonomia das
(E) revelar o nível de aprovação/reprovação de uma unidades educacionais na organização flexível de seu currículo
escola. e a pluralidade de métodos pedagógicos, desde que assegurem
aprendizagem, e reafirmou os artigos da Constituição Federal
Gabarito acerca do atendimento gratuito em creches e pré-escolas.
Neste mesmo sentido deve-se fazer referência ao Plano
01.D / 02.C / 03.B / 04.D / 05.C Nacional de Educação (PNE), Lei nº 10.172/2001, que
estabeleceu metas decenais para que no final do período de
sua vigência, 2011, a oferta da Educação Infantil alcance a 50%
12. Diretrizes Curriculares das crianças de 0 a 3 anos e 80% das de 4 e 5 anos, metas que
Nacionais para a Educação ainda persistem como um grande desafio a ser enfrentado pelo
país.
Infantil Frente a todas essas transformações, a Educação Infantil
vive um intenso processo de revisão de concepções sobre a
PARECER CNE/CEB Nº: 20/200975 educação de crianças em espaços coletivos, e de seleção e
fortalecimento de práticas pedagógicas mediadoras de
REVISÃO DAS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS aprendizagens e do desenvolvimento das crianças. Em
PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL especial, têm se mostrado prioritárias as discussões sobre
como orientar o trabalho junto às crianças de até três anos em
I - RELATÓRIO creches e como garantir práticas junto às crianças de quatro e
cinco anos que se articulem, mas não antecipem processos do
1. Histórico Ensino Fundamental.
Nesse contexto, as Diretrizes Curriculares Nacionais para a
A construção da identidade das creches e pré-escolas a Educação Infantil elaboradas anteriormente por este Conselho
partir do século XIX em nosso país insere-se no contexto da (Resolução CNE/CEB nº 1/99 e Parecer CNE/CEB nº 22/98)
história das políticas de atendimento à infância, marcado por foram fundamentais para explicitar princípios e orientações
diferenciações em relação à classe social das crianças. para os sistemas de ensino na organização, articulação,
Enquanto para as mais pobres essa história foi caracterizada desenvolvimento e avaliação de propostas pedagógicas.
pela vinculação aos órgãos de assistência social, para as Embora os princípios colocados não tenham perdido a
crianças das classes mais abastadas, outro modelo se validade, ao contrário, continuam cada vez mais necessários,
desenvolveu no diálogo com práticas escolares. outras questões diminuíram seu espaço no debate atual e
Essa vinculação institucional diferenciada refletia uma novos desafios foram colocados para a Educação Infantil,
fragmentação nas concepções sobre educação das crianças em exigindo a reformulação e atualização dessas Diretrizes.
espaços coletivos, compreendendo o cuidar como atividade A ampliação das matrículas, a regularização do
meramente ligada ao corpo e destinada às crianças mais funcionamento das instituições, a diminuição no número de
pobres, e o educar como experiência de promoção intelectual docentes não-habilitados na Educação Infantil e o aumento da
reservada aos filhos dos grupos socialmente privilegiados. pressão pelo atendimento colocam novas demandas para a
Para além dessa especificidade, predominou ainda, por muito política de Educação Infantil, pautando questões que dizem
tempo, uma política caracterizada pela ausência de respeito às propostas pedagógicas, aos saberes e fazeres dos
investimento público e pela não profissionalização da área. professores, às práticas e projetos cotidianos desenvolvidos
Em sintonia com os movimentos nacionais e junto às crianças, ou seja, às questões de orientação curricular.
internacionais, um novo paradigma do atendimento à infância Também a tramitação no Congresso Nacional da proposta de

75http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/pceb020_09.pdf

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Emenda Constitucional que, dentre outros pontos, amplia a Batatais; PUC-RIO; UNIRIO; UNICAMP; UFC; UFPA; UFRJ; UERJ;
obrigatoriedade na Educação Básica, reforça a exigência de UFPR; UNEMAT; UFMG; UFRGS; UFSC; UFRN; UFMS; UFAL,
novos marcos normativos na Educação Infantil. UFMA, UEMA, UFPE.
Respondendo a estas preocupações, a Coordenadoria de
Educação Infantil do MEC estabeleceu, com a Universidade 2. Mérito
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), convênio de
cooperação técnica na articulação de um processo nacional de A revisão e atualização das Diretrizes Curriculares
estudos e debates sobre o currículo da Educação Infantil, que Nacionais para a Educação Infantil é essencial para incorporar
produziu uma série de documentos, dentre eles “Práticas os avanços presentes na política, na produção científica e nos
cotidianas na movimentos sociais na área. Elas podem se constituir em
Educação Infantil: bases para a reflexão sobre as instrumento estratégico na consolidação do que se entende
orientações curriculares” (MEC/COEDI, 2009a). Esse processo por uma Educação Infantil de qualidade, “ao estimular o
serviu de base para a elaboração de “Subsídios para as diálogo entre os elementos culturais de grupos marginalizados
Diretrizes Curriculares Nacionais Específicas da Educação e a ciência, a tecnologia e a cultura dominantes, articulando
Básica” (MEC, 2009b), texto encaminhado a este colegiado necessidades locais e a ordem global, chamando a atenção para
pelo Senhor Ministro de Estado da Educação. uma maior sensibilidade para o diverso e o plural, entre o
A proposta do MEC foi apresentada pela professora Maria relativismo e o universalismo” (MEC, 2009b).
do Pilar Lacerda Almeida e Silva, Secretária de Educação As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação
Básica do MEC, na reunião ordinária do mês de julho do Infantil, de caráter mandatório, orientam a formulação de
corrente ano da Câmara de Educação Básica, ocasião em que políticas, incluindo a de formação de professores e demais
foi designada a comissão que se encarregaria de elaborar nova profissionais da Educação, e também o planejamento,
Diretriz Curricular Nacional para a Educação Infantil, desenvolvimento e avaliação pelas unidades de seu Projeto
presidida pelo Conselheiro Cesar Callegari, tendo o Político-Pedagógico e servem para informar as famílias das
Conselheiro Raimundo Moacir Mendes Feitosa como relator crianças matriculadas na Educação Infantil sobre as
(Portaria CNE/CEB nº 3/2009). perspectivas de trabalho pedagógico que podem ocorrer.
Em 5 de agosto, com a participação de representantes das
entidades nacionais UNDIME, ANPED, CNTE, Fórum Nacional 3. A identidade do atendimento na Educação Infantil
de Conselhos Estaduais de Educação, MIEIB (Movimento
Interfóruns de Educação Infantil do Brasil), da Do ponto de vista legal, a Educação Infantil é a primeira
SEB/SECAD/MEC e de especialistas da área de Educação etapa da Educação Básica e tem como finalidade o
Infantil, Maria Carmem Barbosa (coordenadora do Projeto desenvolvimento integral da criança de zero a cinco anos de
MECUFRGS/2008), Sonia Kramer (consultora do MEC idade em seus aspectos físico, afetivo, intelectual, linguístico e
responsável pela organização do documento de referência), social, complementando a ação da família e da comunidade
Fulvia Rosemberg (da Fundação Carlos Chagas), Ana Paula (Lei nº 9.394/96, art. 29).
Soares Silva (FFCLRP-USP) e Zilma de Moraes Ramos de O atendimento em creche e pré-escola a crianças de zero a
Oliveira (FFCLRP-USP), o relator da Comissão apresentou um cinco anos de idade é definido na Constituição Federal de 1988
texto-síntese dos pontos básicos que seriam levados como como dever do Estado em relação à educação, oferecido em
indicações para o debate em audiências públicas nacionais regime de colaboração e organizado em sistemas de ensino da
promovidas pela Câmara de Educação Básica do CNE, União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. A
realizadas em São Luis do Maranhão, Brasília e São Paulo. incorporação das creches e pré-escolas no capítulo da
Este parecer incorpora as contribuições apresentadas, Educação na Constituição Federal (art. 208, inciso IV) impacta
nestas audiências e em debates e reuniões regionais todas as outras responsabilidades do Estado em relação à
(encontros da UNDIME - Região Norte e do MIEIB em Educação Infantil, ou seja, o direito das crianças de zero a cinco
Santarém, PA, ocorrido em agosto de 2009; o debate na ANPED anos de idade à matrícula em escola pública (art. 205), gratuita
ocorrido em outubro de 2009), por grupos de pesquisa e e de qualidade (art. 206, incisos IV e VI), igualdade de
pesquisadores, conselheiros tutelares, Ministério Público, condições em relação às demais crianças para acesso,
sindicatos, secretários e conselheiros municipais de educação, permanência e pleno aproveitamento das oportunidades de
entidades não governamentais e movimentos sociais. Foram aprendizagem propiciadas (art. 206, inciso I).
consideradas também as contribuições enviadas por Na continuidade dessa definição, a Lei de Diretrizes e
entidades e grupos como: OMEP; NDI-UFSC; Fórum de Bases da Educação Nacional afirma que “a educação abrange
Educação Infantil do Pará (FEIPA); Fórum Amazonense de os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar,
Educação Infantil (FAMEI); Fórum Permanente de Educação na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino
Infantil do Tocantins (FEITO); Fórum de Educação Infantil do e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da
Amapá; Fórum de Educação Infantil de Santa Catarina sociedade civil e nas manifestações culturais” (Lei nº
(contemplando também manifestações dos municípios de 9.394/96, art. 1º), mas esclarece que: “Esta Lei disciplina a
Jaguaré, Cachoeiro e Vitória); Fórum Paulista de Educação educação escolar que se desenvolve, predominantemente, por
Infantil; Fórum Gaúcho de Educação Infantil; GT de Educação meio do ensino, em instituições próprias” (Lei nº 9.394/96,
Infantil da UNDIME; CEERT; GT 21 da ANPEd (Educação das art. 1º, § 1º). Em função disto, tudo o que nela se baseia e que
Relações Étnico-Raciais); grupo de estudos em Educação dela decorre, como autorização de funcionamento, condições
Infantil do Centro de Educação da UFAL conjuntamente com de financiamento e outros aspectos, referem-se a esse caráter
equipe técnica das Secretarias de Educação do Município de institucional da educação.
Maceió e do Estado de Alagoas; alunos do curso de Pedagogia Fica assim evidente que, no atual ordenamento jurídico, as
da UFMS; CINDEDI-USP; representantes do Setor de Educação creches e pré-escolas ocupam um lugar bastante claro e
do MST São Paulo; técnicos da Coordenadoria de Creches da possuem um caráter institucional e educacional diverso
USP; participantes de evento da Secretaria de Educação, daquele dos contextos domésticos, dos ditos programas
Esporte e Lazer de Recife e do Seminário Educação Ambiental alternativos à educação das crianças de zero a cinco anos de
e Educação Infantil em Brasília. Ainda pesquisadores das idade, ou da educação não-formal. Muitas famílias necessitam
seguintes Universidades e Instituições de Pesquisa fizeram de atendimento para suas crianças em horário noturno, em
considerações ao longo desse processo: FEUSP; FFCLRP-USP; finais de semana e em períodos esporádicos. Contudo, esse
Fundação Carlos Chagas; Centro Universitário Claretiano tipo de atendimento, que responde a uma demanda legítima da

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população, enquadra-se no âmbito de “políticas para a suas vidas, vivenciam o mundo, constroem conhecimentos,
Infância”, devendo ser financiado, orientado e supervisionado expressam-se, interagem e manifestam desejos e curiosidades
por outras áreas, como assistência social, saúde, cultura, de modo bastante peculiares.
esportes, proteção social. O sistema de ensino define e orienta, A função das instituições de Educação Infantil, a exemplo
com base em critérios pedagógicos, o calendário, horários e as de todas as instituições nacionais e principalmente, como o
demais condições para o funcionamento das creches e pré- primeiro espaço de educação coletiva fora do contexto
escolas, o que não elimina o estabelecimento de mecanismos familiar, ainda se inscreve no projeto de sociedade
para a necessária articulação que deve haver entre a Educação democrática desenhado na Constituição Federal de 1988 (art.
e outras áreas, como a Saúde e a Assistência, a fim de que se 3º, inciso I), com responsabilidades no desempenho de um
cumpra, do ponto de vista da organização dos serviços nessas papel ativo na construção de uma sociedade livre, justa,
instituições, o atendimento às demandas das crianças. Essa solidária e socioambientalmente orientada.
articulação, se necessária para outros níveis de ensino, na A redução das desigualdades sociais e regionais e a
Educação Infantil, em função das características das crianças promoção do bem de todos (art. 3º, incisos II e IV da
de zero a cinco anos de idade, se faz muitas vezes Constituição Federal) são compromissos a serem perseguidos
imprescindível. pelos sistemas de ensino e pelos professores também na
As creches e pré-escolas se constituem, portanto, em Educação Infantil. É bastante conhecida no país a desigualdade
estabelecimentos educacionais públicos ou privados que de acesso às creches e pré-escolas entre as crianças brancas e
educam e cuidam de crianças de zero a cinco anos de idade por negras, moradoras do meio urbano e rural, das regiões
meio de profissionais com a formação específica legalmente sul/sudeste e norte/nordeste e, principalmente, ricas e
determinada, a habilitação para o magistério superior ou pobres. Além das desigualdades de acesso, também as
médio, refutando assim funções de caráter meramente condições desiguais da qualidade da educação oferecida às
assistencialista, embora mantenha a obrigação de assistir às crianças configuram-se em violações de direitos
necessidades básicas de todas as crianças. constitucionais das mesmas e caracterizam esses espaços
As instituições de Educação Infantil estão submetidas aos como instrumentos que, ao invés de promover a equidade,
mecanismos de credenciamento, reconhecimento e supervisão alimentam e reforçam as desigualdades socioeconômicas,
do sistema de ensino em que se acham integradas (Lei nº étnico-raciais e regionais. Em decorrência disso, os objetivos
9.394/96, art. 9º, inciso IX, art.10, inciso IV e art.11, inciso IV), fundamentais da República serão efetivados no âmbito da
assim como a controle social. Sua forma de organização é Educação Infantil se as creches e pré-escolas cumprirem
variada, podendo constituir unidade independente ou integrar plenamente sua função sociopolítica e pedagógica.
instituição que cuida da Educação Básica, atender faixas Cumprir tal função significa, em primeiro lugar, que o
etárias diversas nos termos da Lei nº 9.394/96, em jornada Estado necessita assumir sua responsabilidade na educação
integral de, no mínimo, 7 horas diárias, ou parcial de, no coletiva das crianças, complementando a ação das famílias. Em
mínimo, 4 horas, seguindo o proposto na Lei nº 11.494/2007 segundo lugar, creches e pré-escolas constituem-se em
(FUNDEB), sempre no período diurno, devendo o poder estratégia de promoção de igualdade de oportunidades entre
público oferecer vagas próximo à residência das crianças (Lei homens e mulheres, uma vez que permitem às mulheres sua
nº 8.069/90, art. 53). Independentemente das nomenclaturas realização para além do contexto doméstico. Em terceiro lugar,
diversas que adotam (Centros de Educação Infantil, Escolas de cumprir função sociopolítica e pedagógica das creches e pré-
Educação Infantil, Núcleo Integrado de Educação Infantil, escolas implica assumir a responsabilidade de torná-las
Unidade de Educação Infantil, ou nomes fantasia), a estrutura espaços privilegiados de convivência, de construção de
e funcionamento do atendimento deve garantir que essas identidades coletivas e de ampliação de saberes e
unidades sejam espaço de educação coletiva. conhecimentos de diferentes naturezas, por meio de práticas
Uma vez que o Ensino Fundamental de nove anos de que atuam como recursos de promoção da equidade de
duração passou a incluir a educação das crianças a partir de oportunidades educacionais entre as crianças de diferentes
seis anos de idade, e considerando que as que completam essa classes sociais no que se refere ao acesso a bens culturais e às
idade fora do limite de corte estabelecido por seu sistema de possibilidades de vivência da infância. Em quarto lugar,
ensino para inclusão no Ensino Fundamental necessitam que cumprir função sociopolítica e pedagógica requer oferecer as
seu direito à educação seja garantido, cabe aos sistemas de melhores condições e recursos construídos histórica e
ensino o atendimento a essas crianças na pré-escola até o seu culturalmente para que as crianças usufruam de seus direitos
ingresso, no ano seguinte, no Ensino Fundamental. civis, humanos e sociais e possam se manifestar e ver essas
manifestações acolhidas, na condição de sujeito de direitos e
4. A função sociopolítica e pedagógica da Educação de desejos. Significa, finalmente, considerar as creches e pré-
Infantil escolas na produção de novas formas de sociabilidade e de
subjetividades comprometidas com a democracia e a
Delineada essa apresentação da estrutura legal e cidadania, com a dignidade da pessoa humana, com o
institucional da Educação Infantil, faz-se necessário refletir reconhecimento da necessidade de defesa do meio ambiente e
sobre sua função sociopolítica e pedagógica, como base de com o rompimento de relações de dominação etária,
apoio das propostas pedagógica e curricular das instituições. socioeconômica, étnico-racial, de gênero, regional, linguística
Considera a Lei nº 9.394/96 em seu artigo 22 que a e religiosa que ainda marcam nossa sociedade.
Educação Infantil é parte integrante da Educação Básica, cujas
finalidades são desenvolver o educando, assegurar-lhe a 5. Uma definição de currículo
formação comum indispensável para o exercício da cidadania
e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos O currículo na Educação Infantil tem sido um campo de
posteriores. Essa dimensão de instituição voltada à introdução controvérsias e de diferentes visões de criança, de família, e de
das crianças na cultura e à apropriação por elas de funções da creche e da pré-escola. No Brasil nem sempre foi
conhecimentos básicos requer tanto seu acolhimento quanto aceita a ideia de haver um currículo para a Educação Infantil,
sua adequada interpretação em relação às crianças pequenas. termo em geral associado à escolarização tal como vivida no
O paradigma do desenvolvimento integral da criança a ser Ensino Fundamental e Médio, sendo preferidas as expressões
necessariamente compartilhado com a família, adotado no ‘projeto pedagógico’ ou ‘proposta pedagógica’. A integração da
artigo 29 daquela lei, dimensiona aquelas finalidades na Educação Infantil ao sistema educacional impõe à Educação
consideração das formas como as crianças, nesse momento de

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Infantil trabalhar com esses conceitos, diferenciando-os e estabelecem com o mundo material e social mediadas por
articulando-os. parceiros mais experientes.
A proposta pedagógica, ou projeto pedagógico, é o plano Assim, a motricidade, a linguagem, o pensamento, a
orientador das ações da instituição e define as metas que se afetividade e a sociabilidade são aspectos integrados e se
pretende para o desenvolvimento dos meninos e meninas que desenvolvem a partir das interações que, desde o nascimento,
nela são educados e cuidados, as aprendizagens que se quer a criança estabelece com diferentes parceiros, a depender da
promovidas. Na sua execução, a instituição de Educação maneira como sua capacidade para construir conhecimento é
Infantil organiza seu currículo, que pode ser entendido como possibilitada e trabalhada nas situações em que ela participa.
as práticas educacionais organizadas em torno do Isso por que, na realização de tarefas diversas, na companhia
conhecimento e em meio às relações sociais que se travam nos de adultos e de outras crianças, no confronto dos gestos, das
espaços institucionais, e que afetam a construção das falas, enfim, das ações desses parceiros, cada criança modifica
identidades das crianças. Por expressar o projeto pedagógico sua forma de agir, sentir e pensar.
da instituição em que se desenvolve, englobando as Cada criança apresenta um ritmo e uma forma própria de
experiências vivenciadas pela criança, o currículo se constitui colocar-se nos relacionamentos e nas interações, de
um instrumento político, cultural e científico coletivamente manifestar emoções e curiosidade, e elabora um modo próprio
formulado (MEC, 2009b). de agir nas diversas situações que vivencia desde o nascimento
O currículo da Educação Infantil é concebido como um conforme experimenta sensações de desconforto ou de
conjunto de práticas que buscam articular as experiências e os incerteza diante de aspectos novos que lhe geram
saberes das crianças com os conhecimentos que fazem parte necessidades e desejos, e lhe exigem novas respostas. Assim
do patrimônio cultural, artístico, científico e tecnológico. Tais busca compreender o mundo e a si mesma, testando de alguma
práticas são efetivadas por meio de relações sociais que as forma as significações que constrói, modificando-as
crianças desde bem pequenas estabelecem com os professores continuamente em cada interação, seja com outro ser humano,
e as outras crianças, e afetam a construção de suas identidades. seja com objetos.
Intencionalmente planejadas e permanentemente Uma atividade muito importante para a criança pequena é
avaliadas, as práticas que estruturam o cotidiano das a brincadeira. Brincar dá à criança oportunidade para imitar o
instituições de Educação Infantil devem considerar a conhecido e para construir o novo, conforme ela reconstrói o
integralidade e indivisibilidade das dimensões expressivo- cenário necessário para que sua fantasia se aproxime ou se
motora, afetiva, cognitiva, linguística, ética, estética e distancie da realidade vivida, assumindo personagens e
sociocultural das crianças, apontar as experiências de transformando objetos pelo uso que deles faz.
aprendizagem que se espera promover junto às crianças e Na história cotidiana das interações com diferentes
efetivar-se por meio de modalidades que assegurem as metas parceiros, vão sendo construídas significações
educacionais de seu projeto pedagógico. compartilhadas, a partir das quais a criança aprende como agir
A gestão democrática da proposta curricular deve contar ou resistir aos valores e normas da cultura de seu ambiente.
na sua elaboração, acompanhamento e avaliação tendo em Nesse processo é preciso considerar que as crianças aprendem
vista o Projeto Político-Pedagógico da unidade educacional, coisas que lhes são muito significativas quando interagem com
com a participação coletiva de professoras e professores, companheiros da infância, e que são diversas das coisas que
demais profissionais da instituição, famílias, comunidade e das elas se apropriam no contato com os adultos ou com crianças
crianças, sempre que possível e à sua maneira. já mais velhas. Além disso, à medida que o grupo de crianças
interage, são construídas as culturas infantis.
6. A visão de criança: o sujeito do processo de educação Também as professoras e os professores têm, na
experiência conjunta com as crianças, excelente oportunidade
A criança, centro do planejamento curricular, é sujeito de se desenvolverem como pessoa e como profissional.
histórico e de direitos que se desenvolve nas interações, Atividades realizadas pela professora ou professor de brincar
relações e práticas cotidianas a ela disponibilizadas e por ela com a criança, contar-lhe histórias, ou conversar com ela sobre
estabelecidas com adultos e crianças de diferentes idades nos uma infinidade de temas, tanto promovem o desenvolvimento
grupos e contextos culturais nos quais se insere. Nessas da capacidade infantil de conhecer o mundo e a si mesmo, de
condições ela faz amizades, brinca com água ou terra, faz-de- sua autoconfiança e a formação de motivos e interesses
conta, deseja, aprende, observa, conversa, experimenta, pessoais, quanto ampliam as possibilidades da professora ou
questiona, constrói sentidos sobre o mundo e suas identidades professor de compreender e responder às iniciativas infantis.
pessoal e coletiva, produzindo cultura.
O conhecimento científico hoje disponível autoriza a visão 7. Princípios básicos
de que desde o nascimento a criança busca atribuir significado
a sua experiência e nesse processo volta-se para conhecer o Os princípios fundamentais nas Diretrizes anteriormente
mundo material e social, ampliando gradativamente o campo estabelecidas (Resolução CNE/CEB nº 1/99 e Parecer
de sua curiosidade e inquietações, mediada pelas orientações, CNE/CEB nº 22/98) continuam atuais e estarão presentes
materiais, espaços e tempos que organizam as situações de nestas diretrizes com a explicitação de alguns pontos que mais
aprendizagem e pelas explicações e significados a que ela tem recentemente têm se destacado nas discussões da área. São
acesso. eles:
O período de vida atendido pela Educação Infantil
caracteriza-se por marcantes aquisições: a marcha, a fala, o a) Princípios éticos: valorização da autonomia, da
controle esfincteriano, a formação da imaginação e da responsabilidade, da solidariedade e do respeito ao bem
capacidade de fazer de conta e de representar usando comum, ao meio ambiente e às diferentes culturas, identidades
diferentes linguagens. Embora nessas aquisições a dimensão e singularidades.
orgânica da criança se faça presente, suas capacidades para Cabe às instituições de Educação Infantil assegurar às
discriminar cores, memorizar poemas, representar uma crianças a manifestação de seus interesses, desejos e
paisagem através de um desenho, consolar uma criança que curiosidades ao participar das práticas educativas, valorizar
chora etc., não são constituições universais biologicamente suas produções, individuais e coletivas, e trabalhar pela
determinadas e esperando o momento de amadurecer. Elas conquista por elas da autonomia para a escolha de
são histórica e culturalmente produzidas nas relações que brincadeiras e de atividades e para a realização de cuidados
pessoais diários. Tais instituições devem proporcionar às

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crianças oportunidades para ampliarem as possibilidades de 8. Objetivos e condições para a organização curricular
aprendizado e de compreensão de mundo e de si próprio
trazidas por diferentes tradições culturais e a construir Os direitos da criança constituem hoje o paradigma para o
atitudes de respeito e solidariedade, fortalecendo a autoestima relacionamento social e político com as infâncias do país. A
e os vínculos afetivos de todas as crianças. Constituição de 1988, no artigo 227, declara que “É dever da
Desde muito pequenas, as crianças devem ser mediadas na família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao
construção de uma visão de mundo e de conhecimento como adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde,
elementos plurais, formar atitudes de solidariedade e à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à
aprender a identificar e combater preconceitos que incidem cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência
sobre as diferentes formas dos seres humanos se constituírem familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda
enquanto pessoas. Poderão assim questionar e romper com forma de negligência, discriminação, exploração, violência,
formas de dominação etária, socioeconômica, étnico-racial, de crueldade e opressão”.
gênero, regional, linguística e religiosa, existentes em nossa Nessa expressão legal, as crianças são inseridas no mundo
sociedade e recriadas na relação dos adultos com as crianças e dos direitos humanos e são definidos não apenas o direito
entre elas. Com isso elas podem e devem aprender sobre o fundamental da criança à provisão (saúde, alimentação, lazer,
valor de cada pessoa e dos diferentes grupos culturais, educação lato senso) e à proteção (contra a violência,
adquirir valores como os da inviolabilidade da vida humana, a discriminação, negligência e outros), como também seus
liberdade e a integridade individuais, a igualdade de direitos direitos fundamentais de participação na vida social e cultural,
de todas as pessoas, a igualdade entre homens e mulheres, de ser respeitada e de ter liberdade para expressar-se
assim como a solidariedade com grupos enfraquecidos e individualmente. Esses pontos trouxeram perspectivas
vulneráveis política e economicamente. Essa valorização orientadoras para o trabalho na Educação Infantil e
também se estende à relação com a natureza e os espaços inspiraram inclusive a finalidade dada no artigo 29 da Lei nº
públicos, o respeito a todas as formas de vida, o cuidado de 9.394/96 às creches e pré-escolas.
seres vivos e a preservação dos recursos naturais. Com base nesse paradigma, a proposta pedagógica das
instituições de Educação Infantil deve ter como objetivo
b) Princípios políticos: dos direitos de cidadania, do principal promover o desenvolvimento integral das crianças
exercício da criticidade e do respeito à ordem democrática. de zero a cinco anos de idade garantindo a cada uma delas o
A Educação Infantil deve trilhar o caminho de educar para acesso a processos de construção de conhecimentos e a
a cidadania, analisando se suas práticas educativas de fato aprendizagem de diferentes linguagens, assim como o direito
promovem a formação participativa e crítica das crianças e à proteção, à saúde, à liberdade, ao respeito, à dignidade, à
criam contextos que lhes permitem a expressão de brincadeira, à convivência e interação com outras crianças. Daí
sentimentos, ideias, questionamentos, comprometidos com a decorrem algumas condições para a organização curricular.
busca do bem estar coletivo e individual, com a preocupação
com o outro e com a coletividade. 1) As instituições de Educação Infantil devem assegurar
Como parte da formação para a cidadania e diante da a educação em sua integralidade, entendendo o cuidado
concepção da Educação Infantil como um direito, é necessário como algo indissociável ao processo educativo.
garantir uma experiência bem sucedida de aprendizagem a As práticas pedagógicas devem ocorrer de modo a não
todas as crianças, sem discriminação. Isso requer fragmentar a criança nas suas possibilidades de viver
proporcionar oportunidades para o alcance de conhecimentos experiências, na sua compreensão do mundo feita pela
básicos que são considerados aquisições valiosas para elas. totalidade de seus sentidos, no conhecimento que constrói na
A educação para a cidadania se volta para ajudar a criança relação intrínseca entre razão e emoção, expressão corporal e
a tomar a perspectiva do outro - da mãe, do pai, do professor, verbal, experimentação prática e elaboração conceitual. As
de outra criança, e também de quem vai mudar-se para longe, práticas envolvidas nos atos de alimentar-se, tomar banho,
de quem tem o pai doente. O importante é que se criem trocar fraldas e controlar os esfíncteres, na escolha do que
condições para que a criança aprenda a opinar e a considerar vestir, na atenção aos riscos de adoecimento mais fácil nessa
os sentimentos e a opinião dos outros sobre um faixa etária, no âmbito da Educação Infantil, não são apenas
acontecimento, uma reação afetiva, uma ideia, um conflito. práticas que respeitam o direito da criança de ser bem
atendida nesses aspectos, como cumprimento do respeito à
c) Princípios estéticos: valorização da sensibilidade, da sua dignidade como pessoa humana. Elas são também práticas
criatividade, da ludicidade e da diversidade de manifestações que respeitam e atendem ao direito da criança de apropriar-
artísticas e culturais. se, por meio de experiências corporais, dos modos
O trabalho pedagógico na unidade de Educação Infantil, em estabelecidos culturalmente de alimentação e promoção de
um mundo em que a reprodução em massa sufoca o olhar das saúde, de relação com o próprio corpo e consigo mesma,
pessoas e apaga singularidades, deve voltar-se para uma mediada pelas professoras e professores, que
sensibilidade que valoriza o ato criador e a construção pelas intencionalmente planejam e cuidam da organização dessas
crianças de respostas singulares, garantindo-lhes a práticas.
participação em diversificadas experiências. A dimensão do cuidado, no seu caráter ético, é assim
As instituições de Educação Infantil precisam organizar orientada pela perspectiva de promoção da qualidade e
um cotidiano de situações agradáveis, estimulantes, que sustentabilidade da vida e pelo princípio do direito e da
desafiem o que cada criança e seu grupo de crianças já sabem proteção integral da criança. O cuidado, compreendido na sua
sem ameaçar sua autoestima nem promover competitividade, dimensão necessariamente humana de lidar com questões de
ampliando as possibilidades infantis de cuidar e ser cuidada, intimidade e afetividade, é característica não apenas da
de se expressar, comunicar e criar, de organizar pensamentos Educação Infantil, mas de todos os níveis de ensino. Na
e ideias, de conviver, brincar e trabalhar em grupo, de ter Educação Infantil, todavia, a especificidade da criança bem
iniciativa e buscar soluções para os problemas e conflitos que pequena, que necessita do professor até adquirir autonomia
se apresentam às mais diferentes idades, e lhes possibilitem para cuidar de si, expõe de forma mais evidente a relação
apropriar-se de diferentes linguagens e saberes que circulam indissociável do educar e cuidar nesse contexto. A definição e
em nossa sociedade, selecionados pelo valor formativo que o aperfeiçoamento dos modos como a instituição organiza
possuem em relação aos objetivos definidos em seu Projeto essas atividades são parte integrante de sua proposta
Político Pedagógico. curricular e devem ser realizadas sem fragmentar ações.

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Um bom planejamento das atividades educativas favorece momentos em que exercitam sua capacidade de intervir na
a formação de competências para a criança aprender a cuidar realidade e participam das atividades curriculares com os
de si. No entanto, na perspectiva que integra o cuidado, educar colegas. Isso inclui garantir no cotidiano da instituição a
não é apenas isto. Educar cuidando inclui acolher, garantir a acessibilidade de espaços, materiais, objetos e brinquedos,
segurança, mas também alimentar a curiosidade, a ludicidade procedimentos e formas de comunicação e orientação vividas,
e a expressividade infantis. especificidades e singularidades das crianças com deficiências,
Educar de modo indissociado do cuidar é dar condições transtornos globais de desenvolvimento e altas
para as crianças explorarem o ambiente de diferentes habilidades/superdotação.
maneiras (manipulando materiais da natureza ou objetos,
observando, nomeando objetos, pessoas ou situações, fazendo 3) As instituições necessariamente precisam conhecer
perguntas etc) e construírem sentidos pessoais e significados as culturas plurais que constituem o espaço da creche e da
coletivos, à medida que vão se constituindo como sujeitos e se pré-escola, a riqueza das contribuições familiares e da
apropriando de um modo singular das formas culturais de agir, comunidade, suas crenças e manifestações, e fortalecer
sentir e pensar. Isso requer do professor ter sensibilidade e formas de atendimento articuladas aos saberes e às
delicadeza no trato de cada criança, e assegurar atenção especificidades étnicas, linguísticas, culturais e religiosas
especial conforme as necessidades que identifica nas crianças. de cada comunidade.
As práticas que desafiam os bebês e as crianças maiores a O reconhecimento da constituição plural das crianças
construírem e se apropriarem dos conhecimentos produzidos brasileiras, no que se refere à identidade cultural e regional e
por seu grupo cultural e pela humanidade, na Educação à filiação socioeconômica, étnico-racial, de gênero, regional,
Infantil, pelas características desse momento de vida, são linguística e religiosa, é central à garantia de uma Educação
articuladas ao entorno e ao cotidiano das crianças, ampliam Infantil comprometida com os direitos das crianças. Esse
suas possibilidades de ação no mundo e delineiam fundamento reforça a gestão democrática como elemento
possibilidades delas viverem a infância. imprescindível, uma vez que é por meio dela que a instituição
também se abre à comunidade, permite sua entrada, e
2) O combate ao racismo e às discriminações de gênero, possibilita sua participação na elaboração e acompanhamento
socioeconômicas, étnico-raciais e religiosas deve ser objeto da proposta curricular. Dessa forma, a organização da
de constante reflexão e intervenção no cotidiano da proposta pedagógica deve prever o estabelecimento de uma
Educação Infantil. relação positiva com a comunidade local e de mecanismos que
As ações educativas e práticas cotidianas devem garantam a gestão democrática e a consideração dos saberes
considerar que os modos como a cultura medeia as formas de comunitários, seja ela composta pelas populações que vivem
relação da criança consigo mesma são constitutivos dos seus nos centros urbanos, ou a população do campo, os povos da
processos de construção de identidade. A perspectiva que floresta e dos rios, os indígenas, quilombolas ou
acentua o atendimento aos direitos fundamentais da criança, afrodescendentes.
compreendidos na sua multiplicidade e integralidade, entende Na discussão sobre as diversidades, há que se considerar
que o direito de ter acesso a processos de construção de que também a origem urbana das creches e pré-escolas e a sua
conhecimento como requisito para formação humana, extensão como direito a todas as crianças brasileiras remetem
participação social e cidadania das crianças de zero a cinco à necessidade de que as propostas pedagógicas das
anos de idade, efetua-se na interrelação das diferentes práticas instituições em territórios não-urbanos respeitem suas
cotidianas que ocorrem no interior das creches e pré-escolas e identidades.
em relação a crianças concretas, contemplando as Essa exigência é explicitada no caso de crianças filhas de
especificidades desse processo nas diferentes idades e em agricultores familiares, extrativistas, pescadores artesanais,
relação à diversidade cultural e étnico-racial e às crianças com ribeirinhos, assentados e acampados da reforma agrária,
deficiências, transtornos globais do desenvolvimento e altas quilombolas, caiçaras, nas Diretrizes Operacionais para a
habilidades/superdotação. Educação Básica nas Escolas do Campo (Resolução CNE/CEB
A valorização da diversidade das culturas das diferentes nº 1/2002). Essas Diretrizes orientam o trabalho pedagógico
crianças e de suas famílias, por meio de brinquedos, imagens e no estabelecimento de uma relação orgânica com a cultura, as
narrativas que promovam a construção por elas de uma tradições, os saberes e as identidades dessas populações, e
relação positiva com seus grupos de pertencimento, deve indicam a adoção de estratégias que garantam o atendimento
orientar as práticas criadas na Educação Infantil ampliando o às especificidades dessas comunidades - tais como a
olhar das crianças desde cedo para a contribuição de flexibilização e adequação no calendário, nos agrupamentos
diferentes povos e culturas. Na formação de pequenos etários e na organização de tempos, atividades e ambientes -
cidadãos compromissada com uma visão plural de mundo, é em respeito às diferenças quanto à atividade econômica e à
necessário criar condições para o estabelecimento de uma política de igualdade e sem prejuízo da qualidade do
relação positiva e uma apropriação das contribuições atendimento. Elas apontam para a previsão da oferta de
histórico-culturais dos povos indígenas, afrodescendentes, materiais didáticos, brinquedos e outros equipamentos em
asiáticos, europeus e de outros países da América, conformidade com a realidade da comunidade e as
reconhecendo, valorizando, respeitando e possibilitando o diversidades dos povos do campo, evidenciando o papel
contato das crianças com as histórias e as culturas desses dessas populações na produção do conhecimento sobre o
povos. mundo. A Resolução CNE/CEB nº 2/2008, que estabelece
O olhar acolhedor de diversidades também se refere às Diretrizes complementares, normas e princípios para o
crianças com deficiência, transtornos globais de desenvolvimento de políticas públicas de atendimento da
desenvolvimento e altas habilidades/superdotação. Também Educação Básica do Campo e regulamenta questões
o direito dessas crianças à liberdade e à participação, tal como importantes para a Educação Infantil, proíbe que se agrupe em
para as demais crianças, deve ser acolhido no planejamento uma mesma turma crianças da Educação Infantil e crianças do
das situações de vivência e aprendizagem na Educação Ensino Fundamental.
Infantil. Para garanti-lo, são necessárias medidas que A situação de desvantagem das crianças moradoras dos
otimizem suas vivências na creche e pré-escola, garantindo territórios rurais em relação ao acesso à educação é conhecida
que esses espaços sejam estruturados de modo a permitir sua por meio dos relatórios governamentais e por trabalhos
condição de sujeitos ativos e a ampliar suas possibilidades de acadêmicos. Não bastasse a baixíssima cobertura do
ação nas brincadeiras e nas interações com as outras crianças, atendimento, esses relatórios apontam que são precárias as

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instalações, são inadequados os materiais e os professores (livros de literatura, brinquedos, objetos e outros materiais),
geralmente não possuem formação para o trabalho com essas de manifestações artísticas e com elementos da natureza.
populações, o que caracteriza uma flagrante ineficácia no Junto com isso, há necessidade de uma infraestrutura e de
cumprimento da política de igualdade em relação ao acesso e formas de funcionamento da instituição que garantam ao
permanência na Educação Infantil e uma violação do direito à espaço físico a adequada conservação, acessibilidade, estética,
educação dessas crianças. Uma política que promova com ventilação, insolação, luminosidade, acústica, higiene,
qualidade a Educação Infantil nos próprios territórios rurais segurança e dimensões em relação ao tamanho dos grupos e
instiga a construção de uma pedagogia dos povos do campo - ao tipo de atividades realizadas.
construída na relação intrínseca com os saberes, as realidades O número de crianças por professor deve possibilitar
e temporalidades das crianças e de suas comunidades - e atenção, responsabilidade e interação com as crianças e suas
requer a necessária formação do professor nessa pedagogia. famílias. Levando em consideração as características do
Em relação às crianças indígenas, há que se garantir a espaço físico e das crianças, no caso de agrupamentos com
autonomia dos povos e nações na escolha dos modos de criança de mesma faixa de idade, recomenda-se a proporção
educação de suas crianças de zero a cinco anos de idade e que de 6 a 8 crianças por professor (no caso de crianças de zero e
as propostas pedagógicas para esses povos que optarem pela um ano), 15 crianças por professor (no caso de criança de dois
Educação Infantil possam afirmar sua identidade e três anos) e 20 crianças por professor (nos agrupamentos de
sociocultural. Quando oferecidas, aceitas e requisitadas pelas crianças de quatro e cinco anos).
comunidades, como direito das crianças indígenas, as Programas de formação continuada dos professores e
propostas curriculares na Educação Infantil dessas crianças demais profissionais também integram a lista de requisitos
devem proporcionar uma relação viva com os conhecimentos, básicos para uma Educação Infantil de qualidade. Tais
crenças, valores, concepções de mundo e as memórias de seu programas são um direito das professoras e professores no
povo; reafirmar a identidade étnica e a língua materna como sentido de aprimorar sua prática e desenvolver a si e a sua
elementos de constituição das crianças; dar continuidade à identidade profissional no exercício de seu trabalho. Eles
educação tradicional oferecida na família e articular-se às devem dar-lhes condições para refletir sobre sua prática
práticas socioculturais de educação e cuidado da comunidade; docente cotidiana em termos pedagógicos, éticos e políticos, e
adequar calendário, agrupamentos etários e organização de tomar decisões sobre as melhores formas de mediar a
tempos, atividades e ambientes de modo a atender as aprendizagem e o desenvolvimento infantil, considerando o
demandas de cada povo indígena. coletivo de crianças assim como suas singularidades.

4) A execução da proposta curricular requer atenção 8. A necessária e fundamental parceria com as famílias
cuidadosa e exigente às possíveis formas de violação da na Educação Infantil
dignidade da criança.
O respeito à dignidade da criança como pessoa humana, A perspectiva do atendimento aos direitos da criança na
quando pensado a partir das práticas cotidianas na instituição, sua integralidade requer que as instituições de Educação
tal como apontado nos “Indicadores de Qualidade na Educação Infantil, na organização de sua proposta pedagógica e
Infantil” elaborados pelo MEC, requer que a instituição garanta curricular, assegurem espaços e tempos para participação, o
a proteção da criança contra qualquer forma de violência - diálogo e a escuta cotidiana das famílias, o respeito e a
física ou simbólica - ou negligência, tanto no interior das valorização das diferentes formas em que elas se organizam.
instituições de Educação Infantil como na experiência familiar A família constitui o primeiro contexto de educação e
da criança, devendo as violações ser encaminhadas às cuidado do bebê. Nela ele recebe os cuidados materiais,
instâncias competentes. Os profissionais da educação que aí afetivos e cognitivos necessários a seu bem-estar, e constrói
trabalham devem combater e intervir imediatamente quando suas primeiras formas de significar o mundo. Quando a criança
ocorrem práticas dos adultos que desrespeitem a integridade passa a frequentar a Educação Infantil, é preciso refletir sobre
das crianças, de modo a criar uma cultura em que essas a especificidade de cada contexto no desenvolvimento da
práticas sejam inadmissíveis. criança e a forma de integrar as ações e projetos educacionais
das famílias e das instituições. Essa integração com a família
5) O atendimento ao direito da criança na sua necessita ser mantida e desenvolvida ao longo da permanência
integralidade requer o cumprimento do dever do Estado da criança na creche e pré-escola, exigência inescapável frente
com a garantia de uma experiência educativa com às características das crianças de zero a cinco anos de idade, o
qualidade a todas as crianças na Educação Infantil. que cria a necessidade de diálogo para que as práticas junto às
As instituições de Educação Infantil devem tanto oferecer crianças não se fragmentem.
espaço limpo, seguro e voltado para garantir a saúde infantil O trabalho com as famílias requer que as equipes de
quanto se organizar como ambientes acolhedores, educadores as compreendam como parceiras, reconhecendo-
desafiadores e inclusivos, plenos de interações, explorações e as como criadoras de diferentes ambientes e papéis para seus
descobertas partilhadas com outras crianças e com o membros, que estão em constante processo de modificação de
professor. Elas ainda devem criar contextos que articulem seus saberes, fazeres e valores em relação a uma série de
diferentes linguagens e que permitam a participação, pontos, dentre eles o cuidado e a educação dos filhos. O
expressão, criação, manifestação e consideração de seus importante é acolher as diferentes formas de organização
interesses. familiar e respeitar as opiniões e aspirações dos pais sobre
No cumprimento dessa exigência, o planejamento seus filhos. Nessa perspectiva, as professoras e professores
curricular deve assegurar condições para a organização do compreendem que, embora compartilhem a educação das
tempo cotidiano das instituições de Educação Infantil de modo crianças com os membros da família, exercem funções
a equilibrar continuidade e inovação nas atividades, diferentes destes. Cada família pode ver na professora ou
movimentação e concentração das crianças, momentos de professor alguém que lhe ajuda a pensar sobre seu próprio
segurança e momentos de desafio na participação das mesmas, filho e trocar opiniões sobre como a experiência na unidade de
e articular seus ritmos individuais, vivências pessoais e Educação Infantil se liga a este plano. Ao mesmo tempo, o
experiências coletivas com crianças e adultos. Também é trabalho pedagógico desenvolvido na Educação Infantil pode
preciso haver a estruturação de espaços que facilitem que as apreender os aspectos mais salientes das culturas familiares
crianças interajam e construam sua cultura de pares, e locais para enriquecer as experiências cotidianas das crianças.
favoreçam o contato com a diversidade de produtos culturais

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Um ponto inicial de trabalho integrado da instituição de saberes, fazer amigos, aprender a cuidar de si e a conhecer
Educação Infantil com as famílias pode ocorrer no período de suas próprias preferências e características, deve-se
adaptação e acolhimento dos novatos. Isso se fará de modo possibilitar que elas participem de diversas formas de
mais produtivo se, nesse período, as professoras e professores agrupamento (grupos de mesma idade e grupos de diferentes
derem oportunidade para os pais falarem sobre seus filhos e idades), formados com base em critérios estritamente
as expectativas que têm em relação ao atendimento na pedagógicos.
Educação Infantil, enquanto eles informam e conversam com As especificidades e os interesses singulares e coletivos
os pais os objetivos propostos pelo Projeto Político- dos bebês e das crianças das demais faixas etárias devem ser
Pedagógico da instituição e os meios organizados para atingi- considerados no planejamento do currículo, vendo a criança
los. em cada momento como uma pessoa inteira na qual os
Outros pontos fundamentais do trabalho com as famílias aspectos motores, afetivos, cognitivos e linguísticos integram-
são propiciados pela participação destas na gestão da proposta se, embora em permanente mudança. Em relação a qualquer
pedagógica e pelo acompanhamento partilhado do experiência de aprendizagem que seja trabalhada pelas
desenvolvimento da criança. A participação dos pais junto com crianças, devem ser abolidos os procedimentos que não
os professores e demais profissionais da educação nos reconhecem a atividade criadora e o protagonismo da criança
conselhos escolares, no acompanhamento de projetos pequena, que promovam atividades mecânicas e não
didáticos e nas atividades promovidas pela instituição significativas para as crianças.
possibilita agregar experiências e saberes e articular os dois Cabe à professora e ao professor criar oportunidade para
contextos de desenvolvimento da criança. Nesse processo, os que a criança, no processo de elaborar sentidos pessoais, se
pais devem ser ouvidos tanto como usuários diretos do serviço aproprie de elementos significativos de sua cultura não como
prestado como também como mais uma voz das crianças, em verdades absolutas, mas como elaborações dinâmicas e
particular daquelas muito pequenas. provisórias. Trabalha-se com os saberes da prática que as
Preocupações dos professores sobre a forma como crianças vão construindo ao mesmo tempo em que se garante
algumas crianças parecem ser tratadas em casa - descuido, a apropriação ou construção por elas de novos conhecimentos.
violência, discriminação, superproteção e outras - devem ser Para tanto, a professora e o professor observam as ações
discutidas com a direção de cada instituição para que formas infantis, individuais e coletivas, acolhe suas perguntas e suas
produtivas de esclarecimento e eventuais encaminhamentos respostas, busca compreender o significado de sua conduta.
possam ser pensados. As propostas curriculares da Educação Infantil devem
garantir que as crianças tenham experiências variadas com as
9. A organização das experiências de aprendizagem na diversas linguagens, reconhecendo que o mundo no qual estão
proposta curricular inseridas, por força da própria cultura, é amplamente marcado
por imagens, sons, falas e escritas. Nesse processo, é preciso
Em função dos princípios apresentados, e na tarefa de valorizar o lúdico, as brincadeiras e as culturas infantis.
garantir às crianças seu direito de viver a infância e se As experiências promotoras de aprendizagem e
desenvolver, as experiências no espaço de Educação Infantil consequente desenvolvimento das crianças devem ser
devem possibilitar o encontro pela criança de explicações propiciadas em uma frequência regular e serem, ao mesmo
sobre o que ocorre à sua volta e consigo mesma enquanto tempo, imprevistas, abertas a surpresas e a novas descobertas.
desenvolvem formas de agir, sentir e pensar. Elas visam a criação e a comunicação por meio de diferentes
O importante é apoiar as crianças, desde cedo e ao longo formas de expressão, tais como imagens, canções e música,
de todas as suas experiências cotidianas na Educação Infantil teatro, dança e movimento, assim como a língua escrita e
no estabelecimento de uma relação positiva com a instituição falada, sem esquecer da língua de sinais, que pode ser
educacional, no fortalecimento de sua autoestima, no interesse aprendida por todas as crianças e não apenas pelas crianças
e curiosidade pelo conhecimento do mundo, na familiaridade surdas.
com diferentes linguagens, na aceitação e acolhimento das É necessário considerar que as linguagens se inter-
diferenças entre as pessoas. relacionam: por exemplo, nas brincadeiras cantadas a criança
Na explicitação do ambiente de aprendizagem, é explora as possibilidades expressivas de seus movimentos ao
necessário pensar “um currículo sustentado nas relações, nas mesmo tempo em que brinca com as palavras e imita certos
interações e em práticas educativas intencionalmente voltadas personagens. Quando se volta para construir conhecimentos
para as experiências concretas da vida cotidiana, para a sobre diferentes aspectos do seu entorno, a criança elabora
aprendizagem da cultura, pelo convívio no espaço da vida suas capacidades linguísticas e cognitivas envolvidas na
coletiva e para a produção de narrativas, individuais e explicação, argumentação e outras, ao mesmo tempo em que
coletivas, através de diferentes linguagens” (MEC, 2009a). amplia seus conhecimentos sobre o mundo e registra suas
A professora e o professor necessitam articular condições descobertas pelo desenho ou mesmo por formas bem iniciais
de organização dos espaços, tempos, materiais e das de registro escrito. Por esse motivo, ao planejar o trabalho, é
interações nas atividades para que as crianças possam importante não tomar as linguagens de modo isolado ou
expressar sua imaginação nos gestos, no corpo, na oralidade disciplinar, mas sim contextualizadas, a serviço de
e/ou na língua de sinais, no faz de conta, no desenho e em suas significativas aprendizagens.
primeiras tentativas de escrita. As crianças precisam brincar em pátios, quintais, praças,
A criança deve ter possibilidade de fazer deslocamentos e bosques, jardins, praias, e viver experiências de semear,
movimentos amplos nos espaços internos e externos às salas plantar e colher os frutos da terra, permitindo a construção de
de referência das turmas e à instituição, envolver-se em uma relação de identidade, reverência e respeito para com a
explorações e brincadeiras com objetos e materiais natureza. Elas necessitam também ter acesso a espaços
diversificados que contemplem as particularidades das culturais diversificados: inserção em práticas culturais da
diferentes idades, as condições específicas das crianças com comunidade, participação em apresentações musicais,
deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas teatrais, fotográficas e plásticas, visitas a bibliotecas,
habilidades/superdotação, e as diversidades sociais, culturais, brinquedotecas, museus, monumentos, equipamentos
étnico-raciais e linguísticas das crianças, famílias e públicos, parques, jardins.
comunidade regional. É importante lembrar que dentre os bens culturais que
De modo a proporcionar às crianças diferentes crianças têm o direito a ter acesso está a linguagem verbal, que
experiências de interações que lhes possibilitem construir inclui a linguagem oral e a escrita, instrumentos básicos de

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expressão de ideias, sentimentos e imaginação. A aquisição da avaliação do trabalho pedagógico e das conquistas das
linguagem oral depende das possibilidades das crianças crianças.
observarem e participarem cotidianamente de situações A avaliação é instrumento de reflexão sobre a prática
comunicativas diversas onde podem comunicar-se, conversar, pedagógica na busca de melhores caminhos para orientar as
ouvir histórias, narrar, contar um fato, brincar com palavras, aprendizagens das crianças. Ela deve incidir sobre todo o
refletir e expressar seus próprios pontos de vista, diferenciar contexto de aprendizagem: as atividades propostas e o modo
conceitos, ver interconexões e descobrir novos caminhos de como foram realizadas, as instruções e os apoios oferecidos às
entender o mundo. É um processo que precisa ser planejado e crianças individualmente e ao coletivo de crianças, a forma
continuamente trabalhado. como o professor respondeu às manifestações e às interações
Também a linguagem escrita é objeto de interesse pelas das crianças, os agrupamentos que as crianças formaram, o
crianças. Vivendo em um mundo onde a língua escrita está material oferecido e o espaço e o tempo garantidos para a
cada vez mais presente, as crianças começam a se interessar realização das atividades. Espera-se, a partir disso, que o
pela escrita muito antes que os professores a apresentem professor possa pesquisar quais elementos estão
formalmente. Contudo, há que se apontar que essa temática contribuindo, ou dificultando, as possibilidades de expressão
não está sendo muitas vezes adequadamente compreendida e da criança, sua aprendizagem e desenvolvimento, e então
trabalhada na Educação Infantil. O que se pode dizer é que o fortalecer, ou modificar, a situação, de modo a efetivar o
trabalho com a língua escrita com crianças pequenas não pode Projeto Político-Pedagógico de cada instituição.
decididamente ser uma prática mecânica desprovida de A avaliação, conforme estabelecido na Lei nº 9.394/96,
sentido e centrada na decodificação do escrito. Sua deve ter a finalidade de acompanhar e repensar o trabalho
apropriação pela criança se faz no reconhecimento, realizado. Nunca é demais enfatizar que não devem existir
compreensão e fruição da linguagem que se usa para escrever, práticas inadequadas de verificação da aprendizagem, tais
mediada pela professora e pelo professor, fazendo-se presente como provinhas, nem mecanismos de retenção das crianças na
em atividades prazerosas de contato com diferentes gêneros Educação Infantil. Todos os esforços da equipe devem
escritos, como a leitura diária de livros pelo professor, a convergir para a estruturação de condições que melhor
possibilidade da criança desde cedo manusear livros e revistas contribuam para a aprendizagem e o desenvolvimento da
e produzir narrativas e “textos”, mesmo sem saber ler e criança sem desligá-la de seus grupos de amizade.
escrever. A observação sistemática, crítica e criativa do
Atividades que desenvolvam expressão motora e modos de comportamento de cada criança, de grupos de crianças, das
perceber seu próprio corpo, assim como as que lhe brincadeiras e interações entre as crianças no cotidiano, e a
possibilitem construir, criar e desenhar usando diferentes utilização de múltiplos registros realizados por adultos e
materiais e técnicas, ampliar a sensibilidade da criança à crianças (relatórios, fotografias, desenhos, álbuns etc.), feita ao
música, à dança, à linguagem teatral, abrem ricas longo do período em diversificados momentos, são condições
possibilidades de vivências e desenvolvimento para as necessárias para compreender como a criança se apropria de
crianças. modos de agir, sentir e pensar culturalmente constituídos.
Experiências que promovam o envolvimento da criança Conhecer as preferências das crianças, a forma delas
com o meio ambiente e a conservação da natureza e a ajudem participarem nas atividades, seus parceiros prediletos para a
elaborar conhecimentos, por exemplo, de plantas e animais, realização de diferentes tipos de tarefas, suas narrativas, pode
devem fazer parte do cotidiano da unidade de Educação ajudar o professor a reorganizar as atividades de modo mais
Infantil. Outras experiências podem priorizar, em contextos e adequado ao alcance dos propósitos infantis e das
situações significativos, a exploração e uso de conhecimentos aprendizagens coletivamente trabalhadas.
matemáticos na apreciação das características básicas do A documentação dessas observações e outros dados sobre
conceito de número, medida e forma, assim como a habilidade a criança devem acompanhá-la ao longo de sua trajetória da
de se orientar no tempo e no espaço. Educação Infantil e ser entregue por ocasião de sua matrícula
Ter oportunidade para manusear gravadores, projetores, no Ensino Fundamental para garantir a continuidade dos
computador e outros recursos tecnológicos e midiáticos processos educativos vividos pela criança.
também compõe o quadro de possibilidades abertas para o
trabalho pedagógico na Educação Infantil. 11. O acompanhamento da continuidade do processo
As experiências que permitam ações individuais e em um de educação
grupo, lidar com conflitos e entender direitos e obrigações, que
desenvolvam a identidade pessoal, sentimento de autoestima, Na busca de garantir um olhar contínuo sobre os processos
autonomia e confiança em suas próprias habilidades, e um vivenciados pela criança, devem ser criadas estratégias
entendimento da importância de cuidar de sua própria saúde adequadas aos diferentes momentos de transição por elas
e bem-estar, devem ocupar lugar no planejamento curricular. vividos. As instituições de Educação Infantil devem assim:
Na elaboração da proposta curricular, diferentes arranjos a) planejar e efetivar o acolhimento das crianças e de suas
de atividades poderão ser feitos, de acordo com as famílias quando do ingresso na instituição, considerando a
características de cada instituição, a orientação de sua necessária adaptação das crianças e seus responsáveis às
proposta pedagógica, com atenção, evidentemente, às práticas e relacionamentos que têm lugar naquele espaço, e
características das crianças. visar o conhecimento de cada criança e de sua família pela
A organização curricular da Educação Infantil pode se equipe da Instituição;
estruturar em eixos, centros, campos ou módulos de b) priorizar a observação atenta das crianças e mediar as
experiências que devem se articular em torno dos princípios, relações que elas estabelecem entre si, entre elas e os adultos,
condições e objetivos propostos nesta diretriz. Ela pode entre elas e as situações e objetos, para orientar as mudanças
planejar a realização semanal, mensal e por períodos mais de turmas pelas crianças e acompanhar seu processo de
longos de atividades e projetos fugindo de rotinas mecânicas. vivência e desenvolvimento no interior da instituição;
c) planejar o trabalho pedagógico reunindo as equipes da
10. O processo de avaliação creche e da pré-escola, acompanhado de relatórios descritivos
das turmas e das crianças, suas vivências, conquistas e planos,
As instituições de Educação Infantil, sob a ótica da garantia de modo a dar continuidade a seu processo de aprendizagem;
de direitos, são responsáveis por criar procedimentos para d) prever formas de articulação entre os docentes da
Educação Infantil e do Ensino Fundamental (encontros, visitas,

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reuniões) e providenciar instrumentos de registro - portfólios com apoio no Parecer CNE/CEB 20/2009. De acordo com esse
de turmas, relatórios de avaliação do trabalho pedagógico, Parecer, “A Educação infantil deve trilhar o caminho de educar
documentação da frequência e das realizações alcançadas para a cidadania, analisando se suas práticas educativas de
pelas crianças - que permitam aos docentes do Ensino fato promovem a formação participativa e crítica das crianças
Fundamental conhecer os processos de aprendizagem e criam contextos que lhes permitem a expressão de
vivenciados na Educação Infantil, em especial na pré-escola e sentimentos, ideias, questionamentos, comprometidos com a
as condições em que eles se deram, independentemente dessa busca do bem estar coletivo e individual, com a preocupação
transição ser feita no interior de uma mesma instituição ou com o outro e com a coletividade". Gabriela entendeu,
entre instituições, para assegurar às crianças a continuidade corretamente, que tais atributos referem-se aos princípios
de seus processos peculiares de desenvolvimento e a (A) filosóficos.
concretização de seu direito à educação. (B) psicológicos.
(C) estéticos
Questões (D) políticos.
(D) éticos.
01. (Prefeitura de Goiânia/GO - Auxiliar de Atividades
Educativas - CS-UFG) De acordo com o Parecer CNE/CEB n. 05. (Prefeitura de São José dos Campos/SP - Agente
20/2009, o período de vida atendido pela educação infantil Educador - VUNESP). Luciana passou no concurso de agente
caracteriza-se por marcantes aquisições, dentre elas, educacional promovido por um município paulista e foi
encontra-se: designada para trabalhar em unidades escolares, participando
(A) a formação da imaginação e da capacidade de fazer de do planejamento, da execução de procedimentos e de
conta. vivências relacionadas à Educação Infantil (do berçário até a
(B) a formação do conceito de causalidade entrada no ensino fundamental). Como ingressante na função,
(C) a capacidade de realizar abstrações, envolvendo o Luciana foi convocada para um treinamento, no qual teve a
conceito de ordem. oportunidade de debater o currículo da Educação Infantil e as
(D) a aprendizagem da escrita por meio da mera práticas do cotidiano escolar dessa etapa da Educação Básica,
decodificação do escrito. com apoio no Parecer CNE/ CEB n° 20/2009, o que
possibilitou a ela compreender, corretamente, que o currículo
02. (Prefeitura de Fortaleza/CE - Assistente da da Educação Infantil deve ser concebido como
Educação Infantil Substituto - Prefeitura de Fortaleza - CE) (A) ações da instituição voltadas a cumprir as metas
Segundo o Parecer CNE/CEB nº 20/2009, a proposta pretendidas para o desenvolvimento dos meninos e meninas
pedagógica, ou projeto pedagógico, é: que nela estão matriculados, de modo a atingirem, aos cinco
(A) o plano orientador das ações da instituição e define as anos, o autocuidado.
metas que se pretendem para o desenvolvimento dos meninos (B) um conjunto de práticas que buscam articular as
e meninas. experiências e os saberes das crianças com os conhecimentos
(B) o currículo de atividades direcionadas ao cuidado e que fazem parte do patrimônio cultural, artístico, científico e
educação da criança na creche ou pré-escola. tecnológico.
(C) o projeto de práticas desenvolvidas pelas secretarias (C) práticas desenvolvidas pelos educadores e cuidadores,
de educação de cada município e repassadas às instituições de com a finalidade de neutralizar as relações sociais negativas
Educação Infantil. que os pequenos estabelecem com familiares, pois elas
(D) o documento que rege o funcionamento de cada escola atrasam as aprendizagens.
de Educação Infantil e regulamenta o papel dos professores e (D) ações planejadas com a intenção de estruturar as
funcionários. rotinas do cotidiano das crianças dessa etapa, visto que as
mesmas são fundamentais na formação de hábitos necessários
03. (Prefeitura de São José dos Campos/SP - Agente ao trabalho escolar.
Educador - VUNESP) Geraldo é agente educador de um centro (E) atividades que expressam o projeto pedagógico da
educacional de educação infantil municipal de uma cidade da instituição em que se desenvolvem, destinadas a substituir as
Grande São Paulo. Para estudar a avaliação relativa à faixa experiências vivenciadas pela criança fora da escola, por
etária com a qual atua, consultou o Parecer CNE/CEB n° outras instrutivas.
20/2009 e constatou corretamente que a avaliação, na
educação infantil, Gabarito
(A) é instrumento de reflexão sobre a prática pedagógica
na busca de melhores caminhos para orientar as 01.A / 02.A / 03.A / 04.D / 05.B
aprendizagens das crianças.
(B) pode acompanhar o desenvolvimento integral do
pré-escolar, fazendo uso de provinhas que verificam seu
desempenho global.
(C) precisa recorrer à retenção dos educandos ao final da Anotações
pré-escola, quando estes não estão prontos para ingressar no
Ensino Fundamental.
(D) deve utilizar instrumentos que meçam a prontidão das
crianças e as selecionem para a organização de turmas
homogêneas.
(E) tem como objetivo primordial observar a criança
pequena para selecionar a que requer atendimento
especializado precoce.

04. (Prefeitura de São José dos Campos/SP - Agente


Educador - VUNESP). Gabriela é agente educadora num
centro municipal de educação infantil e, com outros colegas,
está debatendo os princípios que orientam a educação infantil,

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