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Medicina--- Legal
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Eduardo Roberto Alcântara Del^Campo^
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Coleção Curso è? Concurso
Medicina Legal
4a edição
2007
Edito ra
S a r a iv a
IS BN 9 7 8 -8 5 -0 2 -0 5 9 4 3 -2 obra completa
IS BN 9 7 8 -8 5 -0 2 -0 6 3 8 3 -9
D ados Internacionais de C a talog ação na Publicação (C IP )
(C â m a ra Brasileira do Livro, SP, Brasil)
07-2550 G D U -3 4 0 .6 (8 1 )
E d ito ra
ca ' S a ra iva
Av. Marquês de São Vicente, 1697 — CEP 01139-904 — Barra Funda — São Paulo-SP
Vendas: (11) 3613-3344 (lei.) / (11) 3611-3268 (fax) — SAC: (11) 3613-3210 (Grande SP) / 0800557688
(outras localidades) — E-mail: saraivajur@editorasaraiva.conn.br — Acesse: www.saraivajur.com.br
vn
DSM Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturba
ções Mentais
ECA Estatuto da Criança e do Adolescente
ECD exame de corpo de delito
g grama
HLA human leucocyte antigen
IC Instituto de Criminalística
HRGD Instituto de Identificação Ricardo Gumbleton Daunt
IML Instituto Médico-Legal
JTACrimSP Jurisprudência do Tribunal de Alçada Criminal de
São Paulo
kg quilograma
kgf quilograma-força
km quilômetro
km/h quilômetros por hora
lb. libra
LCP Lei das Contravenções Penais
LEP Lei de Execução Penal
m metro
mm milímetro
m/s metros por segundo
n. número
OMS Organização Mundial de Saúde
p. ex. por exemplo
s. seguintes
SIDA Síndrome da Imunodeficiência Adquirida
SNC sistema nervoso central
STF Supremo Tribunal Federal
Súm. súmula
SVO Serviço de Verificação de Óbitos
vm
Í n d ic e
Abreviaturas................................................................................... VII
Capítulo 1 — IN T R O D U Ç Ã O ........................................ 1
1. Conceito de medicina le g a l.................................................. 1
2. Escorço histórico.................. ................................................. 3
2.1. Período a n tig o ................................................................ 3
2.2. Período ro m a n o ........................... .................................. 4
2.3. Período da Idade Média ................................................ 5
2.4. Período canônico............................................................ 6
2.5. Período moderno ou científico..................................... 7
3. Classificação................... ....................................................... 9
3.1. M edicina legal g e ra l....................................................... 10
3.2. M edicina legal esp ecial................................... ............. 11
4. M edicina legal, criminalística e crim inologia................... 12
5. Perícias e peritos..................................................................... 15
5.1. C o n ceito ............................. ............................................. 15
5.2. Classificação das perícias.............................................. 15
5.3. Peritos, classificação, investidura enumero necessário .. 17
5.3.1. Investidura............................................................ 19
5.3.2. Número de peritos............................................... 19
5.4. Coipo de delito e exame de corpo de d elito ............... 20
6. A Polícia Científica no Estado de São P aulo..................... 21
6 .1 .0 Instituto M édico-Legal.............................................. 22
6.2. O Instituto de C rim inalística........................................ 24
6 . 3 .0 Instituto de Identificação Ricardo Gumbleton D aunt.. 24
7. Documentos m édico-legais.................................................. 24
7.1. Conceito e características.............................. ............... 24
7.2. Classificação ................................................................... 25
7.3. Atestados ou certificados m éd ico s.............................. 25
7.3.1. Atestados clín ico s............................................... 25
IX
7.3.2. Atestados para fins previdenciários ................. 27
7.3.3. Atestados de óbito............................................... 27
7.4. Notificações com pulsórias............................................ 31
7.4.1. Doenças de notificação compulsória................ 32
7.4.2. Comunicação de acidente do trabalho — CAT 34
7.4.3. Comunicação da ocorrência de crime de ação
penal publica incondicionada............................ 35
7.4.4. Comunicação da ocorrência de morte encefálica . 36
7.4.5. Ocorrências induzidas ou causadas por alguém
não m édico........................................................... 36
7.4.6. Violência contra a m u lh er................................. 37
7.4.7. Esterilizações cirúrgicas............................ ........ 38
7.4.8. A ocorrência de maus-tratos contra criança ou
adolescente........................................................... 38
7.4.9. A ocorrência de maus-tratos contra id o so ....... 38
7.4.10.Tortur a ................................................................ 39
7.5. Relatórios m édico-legais............................................... 39
7.6. Pareceres ou consultas m édico-legais......................... 40
7.7. Q uesitos............................................................................ 40
7.8. Falsa perícia — divergência entre p erito s.................. 41
7.9. Prazo para realização das perícias e entrega dos laudos.. 42
7.9.1. Realização da p e ríc ia ......................................... 42
7.9.2. Prazo para entrega dos relatórios..................... 43
7.9.3. R esu m o ............. ................................................... 44
7.10. Suspeição, incompatibilidade e im pedim ento......... 45
7.10.1. Suspeição.......................................................... 45
7.10.2. Incompatibilidade e im pedim ento................ 46
8 . Principais dispositivos legais relacionados......................... 47
X
6 . Regiões da face anterior do membro superior direito....... 56 -
7. Regiões das faces palmar e dorsal da mão d ire ita ........ 57
8. Regiões da face anterior do membro inferior direito........ 57
9. Regiões anatômicas do p erín e o ........................................... 58
10. Regiões auditivas e oculares externas........................... 58
Capítulo 3 — A N TR O PO L O G IA F O R E N SE ............ 59
1. Identidade e identificação.................................................... 59
1.1. H istórico.......................................................................... 59
1.1.1. Métodos mais recentes....................................... 61
1.2. Requisitos técnicos dos métodos de identificação .... 63
1.3. Identidade m édico-legal......................................... ...... 64
1.4. R a ç a s ........................................ ....................................... 65
1.5. S ex o ................................................................................. . 66
1.6. Id a d e................................................................................. 67
1.7. Características particulares físicas naturais................ 67
1.8. Características particulares físicas adquiridas........... 68
1.9. Características p síq u icas................................ .............. 68
2. B iom etria................................................................................ 68
2.1. C aracterísticas................................................................ 69
2.2. Principais sistemas biom étricos................................... 69
3. Sistema datiloscópico de V ucetich...................................... 72
3.1. Atribuição e term inologia............................................ 74
3.2. Gênese dos desenhos p a p ila re s.................................... 75
3.3. Term inologia................................................................... 76
3.4. Tomada de impressões dígito-papilares em locais de
crime — reveladores...................................................... 78
3.5. Tomada de impressões dígito-papilares da p esso a.... 82
3.5.1. Tomada de impressões na pessoa v iv a............ 82
3.5.2. Tomada de impressões no cadáver................... 84
3.6. Boletim de Identificação Criminal — BIC ................ 85
3.7. Classificação — o sistema de Vucetich....................... 88
3.7.1. Elementos da impressão d ig ital........................ 88
3.7.2. Linhas albodatiloscópicas e albodatilograma . 89
3.7.3. Pontos característicos......................................... 89
XI
3.7.4. P o ro s ..................................................................... 89
3.7.5. D e lta s.................................................................... 89
3.7.6. Tipos fundam entais............................................ 91
3.7.7. Fórmula datiloscópica— os sistemas de arquivos 93
3.7.8. A comparação — pontos característicos......... 95
3.8. Impressões palmares e plantares.................................. 97
3.9. Poroscopia....................................................................... 99
3.10. A nom alias..................................................................... 99
C apítulo 4 — TRAUM ATO LO G IA F O R E N S E ...... 102
1. Conceito................................................................................... 102
2. Energias de ordem m ecânica................................................ 102
2.1. Classificação dos instrumentos mecânicos ................ 103
2.2. Instrumentos perfurantes ou punctórios..................... 104
2.3. Leis de Filhós e L an g er................................................. 104
2.4. Instrumentos co rtan tes.................................................. 106
2.5. Instrumentos contundentes........................................... 108
2.6. Conformação das lesões co n tu sas............................... 111
2.7. Instrumentos perfurocortantes................... .................. 112
2.8. Instrumentos perfurocontundentes.............................. 113
2.9. Instrumentos cortocontundentes..................... ............. 114
2.10. Instrumentos lacerantes ou dilacerantes................... 114
3. Energias de ordem fís ic a ...................................................... 116
3.1. Lesões produzidas pelo c a lo r...................................... 116
3.2. Lesões produzidas pelo calor frio ................................ 117
3.3. Lesões produzidas pelo calor quente........................... 117
3.3.1. Term onoses................................. ........................ 118
3.3.2. Queimaduras ................................................. 119
3.3.3. Etiologia da morte pelas queim aduras........... 121
3.4. Lesões produzidas pela p re ssã o ................................... 122
3.5. Lesões produzidas pela eletricidade....................... . 124
3.6. Lesões produzidas pela radioatividade....................... 126
3.7. Lesões produzidas pela lu z ........................................... 127
3.8. Lesões produzidas pelo so m ......................................... 128
4. Energias de ordem q u ím ica.................................................. 130
xn
4.1. Monóxido de c a rb o n o ............................................ ...... 132
5. Energias de ordem físico-quím ica....................................... 135
5.1. M orte por enforcam ento.............................................. . 137
5.2. Estrangulam ento............................................................. 142
5 .3 . E sganadura...................................................................... 143
5.4. Sufocação......... ;.............................................................. 144
5.5. Colocação da vítima em meio líquido — afogamento 145
5.5.1. Afogado azul e afogado b ranco......................... 145
5-5.2. Fases da m orte por afogam ento........................ 146
5.5.3. Principais sin ais................................................... 147
5.6. Imersão em atmosfera de gases irrespiráveis............ 148
6 . Energias de ordem bioquím ica............................................ 150
6.1. Inanição................................. .......................................... 150
6.2. Doenças carenciais......................................................... 152
6.3. Intoxicações alim entares.... ......................................... 157
6.4. A uto-intoxicações.......................................................... 157
6.5. Infecções ...................................................................... . 157
7. Energias de ordem biodinâmica — choque.................... . 158
8 . Energias de ordem m is ta ...................................................... 160
8.1. F ad ig a............................................................................... 160
8.2. Doenças parasitárias...................................................... 161
8.3. S ev ícias............................................................................ 162
8.3.1. Síndrome da criança m altratada....................... 162
8.3.2. Síndrome do ancião m altratado....................... 164
8.3.3. Tortura................................................................... 165
xm
6.2. C arab in a........................................................................... 172
6.3. R ifle.................................................................................. 172
6.4. F uzil.................................................................................. 173
6.5. M osquetão........................................................................ 173
7. Calibre das armas de f o g o .................................................... 173
7.1. Calibre das armas de alma raiada, de seus cartuchos
de munição e projéteis................................................... 174
7.2. Calibre das armas de alma lisa, sua munição e projéteis . 175
8. M unição................................................................................... 177
8.1. Partes do cartucho de m unição..................................... 177
9. Ferimentos produzidos por projéteis de arm a de f o g o .... 177
9.1. Ferimentos de en tra d a ................................................... 178
9.2. Ferimentos de saíd a........................................................ 178
9.3. Ferimentos produzidos porprojéteis múltiplos (balins).. 179
9.4. Ferimentos produzidos por projéteis unitários.......... 180
9.5. Orlas ou halos de contusão, enxugo e escoriação ..... 181
9.6. Zonas de chamuscamento, esfumaçamento e tatuagem.. 184
9.7. Disparos encostados...................................................... 188
9.8. Disparos em o s so s ........................................... .............. 189
9.9. Determinação da distância de disparo......................... 189
C a p í t u l o 6 — S E X O L O G IA F O R E N S E ....................... 192
1. Conceito de s e x o ............................ ................................... 192
2. Sexo gen ético ...................................... ................................... 192
2.1. Síndrome de T u m er........................................................ 194
2.2. Síndrome de K linefelter................................................ 194
2.3. Polissomia dos cromossomos sexuais......................... 195
2.3.1. Aneuploidias aütossômicas ................................ 195
2.4. Síndrome de D o w n . ..................................................... 196
2.5. Síndrome de E d w ard s................................. ................ . 196
2.6. Síndrome de P atau ................................................. ........
s.
197
3. Sexo endóçrino........... ........................................................... 198
4. Sexo m orfológico................................................................... 199
5. Sexo psicológico.............................. .-..................................... 199
6 . Sexo jurídico............................................................................ 199
XIV
7. Distúrbios do instinto sex u al................................................ 200
7.1. E ro tism o.......................................................................... 201
7.2. Lubricidade sen il............................................................ 201
7.3. A nafrodisia...................................................................... 202
7.4. F rig id e z ............................................................................ 202
7.5. E rotom ania...................................................................... 202
7.6. Auto-erotismo ou aloerotism o...................................... 202
7.7. Erotografia ou erotografom ania.................................. 202
7.8. E xibicionism o................................................................ 203
7.9. Narcisism o....................................................................... 203
7.10. Mixoscopia ou voyeurism o......................................... 203
7.11. Fetichism o..................................................................... 203
7.12. Gerontofllia ou crono-inversão................................. 203
7.13. Cromo-inversão ......................... ................................... 203
7.14. Etno-inversão................................................................ 204
7.15. Topo-inversão................................. ............................. 204
7.16. Troca de casais ou troca interconjugal...................... 204
7.17. O nanism o....................................................................... 204
7.18. Edipism o........................................................................ 205
7.19. Pedofilia e hebefilia..................................................... 205
7.20. Pigm aüonism o.............................................................. 205
7.21. Frotteurism o....................................................... 205
7.22. Pluralismo ou trio lism o......... ..................................... 206
7.23. V am pirism o............................................................ .. 206
7.24. R iparofília...................................................................... 206
7.25. U rolagnia....................................................................... 206
7.26. Coprofilia....................................................................... 206
7.27. C oprolalia...................................................................... 206
7.28. Bestialismo, zoolagnia, zoofilismo, zoofilia e zooe-
ra stia ............................................................................... 207
7.29. N ecrofilia...................................................................... . 207
7.30. S ad ism o .......................................................................... 207
7.31. M asoquism o.................................................................. 207
7.32. Sadom asoquism o.......................................................... 207
7.33. Flagelatismo ou flagelação......................................... 207
7.34. H om ossexualism o....................................................... 208
8 . Gravidez, parto e puerpério.................................................. 208
8.1. Desenvolvimento se x u a l............................................... 208
8.2. G ravidez.......................................................................... 210
8.3. Diagnóstico da gravidez................................................ 211
8.4. Nascimento...................................................................... 213
8.5. Puerpério e estado puerperal........................................ 213
9. Perícias relacionadas.......... ................................................... 214
9.1. Sedução............................................................................ 214
9.2. Estupro e posse sexual mediante fraude..................... 216
9.3. Atentado violento ao pudor e atentado ao pudor m e
diante frau d e.................... ............................................... 217
9.4. A b o rto .............................................................................. 218
9.5. Infanticídio...................................................................... 220
10. As im pótências....................................................................... 223
11. Investigação de paternidade................................................. 224
11.1. Provas mendelianas não sangüíneas.......................... 226
11.2. Provas mendelianas sangüíneas.................................. 227
11.3. Sistema A B O ................................................................ 228
11.4. Fatores M N .................................................................... 230
11.5. Fatores Rh e r h ............................................................:. 230
1 1.6 . Outros fato res............................... :............................... 231
11.7. Sistema H L A ................................................................. 231
11.8. D N A ................................................................................ 233
XVI
2.3.3. Livores cadavéricos e hipóstases..................... 242
2.3.4. D esidratação........................................................ 243
2.4. Fenômenos cadavéricos transform ativos................... 244
2.4.1. Autólise (transformativo destrutivo)................ 244
2.4.2. Putrefação (transformativo destrutivo) ............ 245
2.4.3. Maceração (transformativo destrutivo)............ 247
2.4.4. Saponificação ou adipocera (transformativo
conservador)............................................ ........... 247
2.4.5. M umificação (transformativo conservador) ... 248
2.4.6. Calcificação (transformativo conservador)..... 248
2.4.7. Corificação (transformativo conservador)...... 248
3. Fauna cadavérica.................................................................... 249
3.1. Fauna ao ar liv re ............................................................. 249
3.2. Fauna dos túm ulos......................................................... 251
3.3. Fauna aquática............................................. ......... ........ 252
4. Primoriência e com oriência.................................................. 252
5. Diagnóstico jurídico da morte — aspectos g erais............ 252
5.1. M orte suspeita súbita e morte por inibição (reflexo
d eH erin g )........................................................................ 253
5.2. Morte suspeita de violência o cu lta.............................. 255
5.3. M orte suspeita de violência indefinida....................... 255
5.4. M orte suspeita de violência definida.......................... 255
5.5. M orte de infortúnio do trab alh o .................................. 255
6 . O exame m édico-legal.................................................... ...... 256
6.1. N ecropsia(autópsia)...................................................... 256
6.1.1. T écnica................................. ............................... 256
6.1.2. Necropsias brancas ............................................. 257
X V H
4.2. Benzodiazepímcos.......................................................... 266
4.3. A nfetam inas.................................................................... 266
4.4. Ecstasy (M D M A )........................................................... 267
4.5. Special K (K etam ina).................................................... 268
4.6. GBH ou “Líquido X ” .................................................... 268
4.7. Ó p io .................................................................................. 269
4.8. M orfina............................................................................. 270
4.9. H eroína........................................ .................................... 270
4.10. C ocaína........................................................................... 270
4.11. M aco n h a......................................................................... 271
4.12. M escalina........................................................................ 271
4.13. L S D -2 5 .......................................................................... 272
4.14. Esteróides ou anabolizantes........................................ 272
4.15. Inalantes.......................................................................... 273
4.16. Tabaco............................................................................. 274
4.17. Cafeína...................... ..................................................... 275
4.18. P oppers.......................................................................... 275
5. A lcoolism o.............................................................................. 276
5.1. Alcoolismo agudo — em briaguez................................ 277
5.2. Alcoolismo agudo — embriaguez patológica........... 282
5.3. Alcoolismo crô n ic o ........................................................ 283
5.4. Psicoses alcoólicas com sintomas psiquiátricos........ 284
5.4.1. Delírio a lco ó lico .............................. .................. 284
5.4.2. Depressão alcoólica ag u d a....:........................... 284
5.4.3. Alucinose auditiva aguda................................... 284
5.4.4. Paranóia alcoólica — delírio de ciúm es........... 284
5.4.5. D ipsom ania.................................................. ....... 285
5.5. Psicoses alcoólicas com sintomas psiquiátricos e neu
rológicos ........... .............. .................. .............................. 285
5.5.1. Psicose polineurftica de K orsakoff.................. 285
5.5.2. Encefalopatia de W em icke................................. 286
5.5.3. Encçfalopatia porto -cav a................................... 286
5.5.4. Síndrome de M archiafava................................. 286
5.5.5. Epilepsia alco ó lica............. ................................ 287
5.5.6. Demência alcoólica............................................ 287
XVIII
5.6. Exame de avaliação de dependência de drogas......... 287
5.6.1. Procedimento para realização do e x a m e ......... 291
5.6.2. Prazo para realização da perícia........................ 291
5.6.3. Q uesitos................................................................ 292
5.7. Tratamento médico e medida de segurança................ 293
5.7.1. Inim putabilidade................................................. 294
5.7.2. Espécie de tratamento a ser aplicado................ 295
5.7.3. Sem i-im putabilidade.......................................... 296
5.8. Tratamento médico no-ECA...................................... 297
XIX
8 . Fatores psiquiátricos.............................................................. 313
8.1. Estados dem enciais........................................................ 314
8.2. Retardos mentais (oligofrenias)..................... ............. 314
8.3. Esquizofrenias e outros transtornos psicóticos ......... 316
8.3.1. Psicoses — transtornos bipolares .................... 317
8.3.2. Transtornos da personalidade (personalidades
psicopáticas).......................................... . v.......... 318
.8.3.3. Personalidade paranóica ou paranóide............ 318
8 .3.4. Personalidade esquizóide................................... 319
8.3.5. Personalidade esquizotípica.............................. 319
8.3.6. Personalidade anti-social ou dissociai (socio-
patas)............. ....................................................... 319
8.3.7. Transtorno de personalidade com instabilidade
emocional (borderline e im pulsivo)................. 320
8.3.8. Personalidade narcisista..................................... 320
8.3.9. Personalidade histriônica................................... 321
8.3.10. Personalidade obsessivo-compulsiva (anan-
cástica)............................................................... 321
8.3.11. Personalidade ansiosa (esquiva)..................... 321
8.3.12. Personalidade dependente (astênica)............. 321
8.3.13. Pers onalidades psicopáticas............................ 322
8.3.14. Síndromes psicopáticas .................................... 325
8.4. Transtornos diversos — neuroses ............................... 326
9. Fatores m esológicos.............................................................. 328
9.1. Civilização — silvxcolas ............................................... 328
9.2. Psicologia das m ultidões............................................... 329
10. Fatores legais — reincidência p en al.................................... 329
11. Temperamento............................................. .......................... 330
Bibliografia.............. ............... ..................................................... 333
XX
C a p ít u l o 1
IN T R O D U Ç Ã O
1. C O N C E IT O D E M E D IC IN A L E G A L
Apesar do infindável debate teórico para encontrar uma defini
ção precisa sobre o que é o direito, é possível inferir que ele nasce das
necessidades básicas da sociedade e para ela é voltado como condi
ção precípua de sua sobrevivência. Esta é a razão pela qual todos os
campos do conhecimento humano têm repercussão na esfera jurídica
e vice-versa.
Com as ciências médicas não seria diferente, pois inúmeras ques
tões levadas aos nossos tribunais acabam por abranger discussões
técnicas puramente afetas à área médica, tomando indispensável a
intervenção de profissional qualificado.
D aí a necessidade de delimitar um subconjunto de conheci
mentos comuns a essas áreas do saber humano (jurídico e médico), e
com ele procurar conceituar medicina legal.
Doutrinariamente encontramos três correntes que procuram de
limitar o campo de abrangência e conceituar medicina legal (Flamínio
Fávero, Medicina legal: introdução ao estudo da medicina legal, 1975,
p. 13-16):
corrente restritiva
{ corrente extensiva
corrente intermediária ou eclética
2
particularidade, esquecendo-se de outras de interesse. O mais impor
tante é demonstrar a íntima relação entre os conhecimentos de natu
reza m édica e biológica colocados a serviço da justiça para esclareci
mento de questões com repercussão no universo jurídico.
2. E S C O R Ç O H IS T Ó R IC O
A história da medicina legal confunde-se, um pouco, com a da
própria medicina e pode ser dividida em cinco períodos (Dicionário
Déchambre, apud Gomes, 1989, p. 17):
• período antigo;
• período romano;
• período da Idade Média;
• período canônico; e
• período moderno ou científico.
3
a.C.), na Babilônia, que previa alguns dispositivos regulamentadores
da relação médico/paciente.
Os hebreus, já no livro de Moisés e posteriormente no Talmude,
registram a descrição de costumes e obrigações relacionados com a
atividade sexual, assim como causas médicas de nulidade de matri
mônio e divórcio (Gisbert Calabuig, Medicina legal y toxicología,
1998, p. 8).
O Código de Manu Manusrti (200 a.C. a 200 d.C.), na índia,
assentava que crianças, velhos, embriagados, deficientes mentais e
loucos não podiam ser ouvidos como testemunhas (Hygino de Car
valho Hércules, História da medicina legal, Revista Acadêmica da
UFRJ, 1988, p. 53).
N a Pérsia antiga (atual Irã), as leis previam um a classificação
das lesões corporais por ordem de gravidade, com o objetivo de fixar
multa por parte do agressor.
D a Grécia antiga vêm os fundamentos da medicina legal do tra
balho, particularmente da obra de Platão (427 a 347 a.C.), que des
creve as deformações experimentadas por artesãos em razão de seu
ofício.
Ainda na Grécia, importante salientar os trabalhos de Hipócrates
(460 a 377 a.C.), considerado o pai da antiga medicina. A ele são
atribuídos estudos relacionados com o. prognóstico de enfermidades,
articulações e fraturas, feridas na cabeça, partos prematuros e regras
para o exercício da medicina, encabeçadas pelo célebre juramento,
até hoje realizado pelos médicos no início de sua atividade profissional.
A China deu os primeiros passos no que toca ao exame pericial
dos locais de crime, com a obra denominada Si-yuan-lu, atribuída a
Song T s’eu, publicada em 1248, onde encontramos algumas regras
gerais a serem seguidas no exame de um local em que ocorreu um
delito, assim como regras para distinção de lesões produzidas em
vida e post mortem.
5
barra candente, sendo inocentado na hipótese (remota) de não sofrer
queimaduras; ou o ordálio da água, geralmente aplicado às mulheres
adúlteras, que eram lançadas no rio com uma pesada pedra amarrada
ao pescoço, ficando inocentadas se flutuassem.
Na França, Felipe, “o audaz”, emite as Cartas Patentes, em 1278,
criando a figura de cirurgiões juramentados junto à coroa.
A obrigatoriedade de perícia médica em casos de morte violen
ta, entretan to , só teve lu g ar com a p ro m ulgação do C ódigo
Bambergense, em 1507 (Hércules, 1988, p. 54).
6
meiro passo no sentido de tom ar obrigatória essa prática (Hércules, '
1988, p. 55).
7
quisadores e papiloscopistas do IIRGD. As atribuições específi
cas de cada um desses ramos serão mais bem analisadas no capí
tulo seguinte.
deontologia médica
geral
diceologia médica
10
normas a serem observadas pelos médicos em suas relações com pa
c ie n tes, colegas e com a sociedade em geral, como, por exemplo,
exercício legal e ilegal, segredo médico, ética e responsabilidade
médicas.
A diceologia médica é parte que trata dos direitos do profissio
nal da medicina, por exemplo, honorários, horário de trabalho, repre
sentação e tratamento protocolar.
11
tente em colocar os pulmões do infante morto em água para determi
nar se houve ou não nascimento com vida (respiração).
Em 1710, Johann Bohn publica o trabalho De renunciatione
vulnerum, em que é proposta uma classificação das lesões e um rotei
ro para o diagnóstico diferencial daquelas produzidas em vida e após
a morte.
Em 1722, Hermann Friedrich Teichmeyer lança o livro intitulado
Institutiones medicinae legalis velforensis.
Foi no final do século XIX e início do XX, porém, que a medi
cina legal se estabeleceu definitivamente.
A França desponta com nomes como José Boaventura Orfila
(“pai da toxicologia” — 1821), Philippe Pinei (1745 a 1826, psiqui
atria forense), Alphonse Devergie (1798 a 1879), Ambroise Auguste
Tardieu (1818 a 1879), Alphonse Lacassagne (1843 a 1924), Paul
Camille Hippolite Brouardel (1869 a 1906), Edmond Locard (1877 a
1966) e Camile Simonin (1891 a 1961). Na Alemanha, Carlos Liman
(1818 a 1891) e Richard Ebing (1840 a 1902). Na Inglaterra, John
Gordon Smith, que, em 1821, publicou o primeiro livro de medicina
legal, Harvey Littlejohn e John Glaister. Na Itália, houve uma mescla
entre médicos-legistas e penalistas, podendo ser citados: Cesare
Lombroso (1835 a 1909), Barzelloti, Martini, Perrone, Garófalo,
Virgílio, Nicéfaro, Falconi e Ferri. Na Rüssia, Balk, Sergie Gromov,
S. G. Georguieff, Dragendorffe Pirogoff.
N a Áustria, Hoffinann e B em t criam em Viena o primeiro insti
tuto médico-legal, em 1818, desenvolvendo a ciência juntamente com
Haberda, Schneister e Paltauf.
De registrar, também, no período, a proliferação dos cranio-
logistas e frenologistas, como Franz Joseph Gall, que, apesar de pro
curarem revestir suas atividades de aparência científica, apresenta
vam métodos e conclusões de discutível eficácia.
\
No Brasil a mediçina legal só se desenvolve a partir do Período
Colonial, com alguns documentos esparsos. Apenas em 1832, com a
regulamentação do processo penal, é que passam a ser reconhecidos
alguns regramentos.
Apesar disso, os autores brasileiros desfrutam de considerável
prestígio nos meios internacionais. Podemos citar nomes como
Alcântara Machado, Álvaro Dória, Delton Croce, Flamínio Fávero,
Garcia Moreno, Genival Veloso de França, Hélio Gomes, Hilário
Veiga de Carvalho, Oscar Freire e inúmeros outros.
3. CLASSIFICAÇÃO
Classifica-se a medicina legal segundo três critérios: histórico,
profissional e didático (França, 1998, p. 5).
Sob o ponto de vista histórico, divide-se a medicina legal de
acordo com suas quatro fases evolutivas:
9
quisadores e papiloscopistas do IIRGD. As atribuições específi
cas de cada um desses ramos serão mais bem analisadas no capí
tulo seguinte.
deontologia médica
geral
diceologia médica
10
normas a serem observadas pelos médicos em suas relações com pa
cien te s, colegas e com a sociedade em geral, como, por exemplo,
exercício legal e ilegal, segredo médico, ética e responsabilidade
médicas.
A diceologia médica é parte que trata dos direitos do profissio
nal da medicina, por exemplo, honorários, horário de trabalho, repre
sentação e tratamento protocolar.
11
j) tanatologia médico-legal ou forense — estuda o morto e a
morte, assim como os fenômenos dela decorrentes;
1) toxicologia médico-legal ou forense — estuda os efeitos das
diversas substâncias químicas no organismo, particularmente os cáus
ticos, os venenos e os tóxicos (álcool e drogas em geral);
m) traumatologia médico-legal ou forense — estuda as lesões
corporais e as energias causadoras dessas lesões; e
n) vitimologia — estuda a vítima e seu comportamento na ocor
rência e desenrolar dos delitos.
Há autores que se referem, ainda, a uma medicina legal social,
cujo objeto de estudo subdivide-se em medicina do trabalho, medicina
legal preventiva e medicina legal securitária (Maranhão, 2002, p. 30).
12
fenômeno social, procurando em sua gênese a melhor forma de pre
venção.
Segundo Sutherland, a criminologia “é a ciência que estuda os
fenômenos e as causas da criminalidade, a personalidade do crimino
so, sua conduta delituosa e a maneira de ressocializá-lo” (Edwin H.
Sutherland, Principies o f criminology, 1960, p. 27).
A partir de 1970, inicialmente nos Estados Unidos e na Ingla
terra e depois se irradiando para outros países da Europa, surgiu um
movimento, de forte inspiração marxista, ao qual se convencionou
chamar de nova criminologia, criminologia radical ou criminologia
crítica, que buscava na desigualdade social e no sistema de produção
capitalista a gênese da criminalidade.
Num segundo momento, essas teorias iniciais cederam lugar às
três distintas tendências da criminologia moderna: o neo-realismo de
esquerda, o chamado direito penal mínimo e o abolicionismo.
Os neo-realistas de esquerda defendem a idéia de que a carên
cia leva à inconformidade e que a ausência de soluções políticas con
duz ao delito. Propugnam uma modificação do Direito Penal, substi
tuindo os tipos sancionadores atuais por outros que melhor tutelem
os direitos das classes trabalhadoras, mas aceitam a idéia do cárcere
para situações extremas.
Os defensores do direito penal mínimo fazem uma releitura da
teoria da rotulação social (labelling approach) e propugnam uma
redução e uma readaptação do Direito Penal em prol dos menos favo
recidos. “Deve-se deixar de atribuir relevo aos pensamentos tradicio
nais da criminalidade de massas ou criminalidade de rua (furto, rou
bo etc.) para pensar uma ‘criminalidade dos oprimidos’: racismo,
discriminação sexual, criminalidade de colarinho-branco, crimes eco
lógicos, belicismo etc.” (Shecaira, Criminologia, 2004, p. 343).
Finalmente, os partidários do abolicionismo propõem a elimi
nação do sistema punitivo atual sob o argumento de que o Direito
Penal não tem feito mais que justificar as desigualdades e injustiças
sociais (Shecaira, Criminologia, cit., p. 345) e que a sociedade deve
organizar-se de modo diferente para superar esses conflitos.
A essas teorias se contrapõem os movimentos radicais ditos de
13
direita, como, por exemplo, os movimentos “lei e ordem” e “tolerân
cia zero”.
A criminalística é a ciência que estuda os vestígios deixados
j pelo crime no local do fato, objetivando a sua comprovação e a
identificação do criminoso. Embora tenha muitos pontos em co-
\ mum com a medicina legal, é ciência autônoma, com objeto e mé-
\ todos próprios.
A diferença básica entre a medicina legal e a criminalística pode
ser aquilatada no conceito de Del-Picchia, segundo o qual esta últi
ma “é a disciplina que cogita do reconhecimento e análise dos vestí
gios extrínsecos relacionados com o crime ou com a identificação de
seus participantes”. “O exame e a análise dos vestígios intrínsecos do
corpo humano (da pele para dentro)” são da alçada médico-legal (José
Del-Picchia Filho e Celso Mauro Ribeiro Del-Picchia, Tratado de
documentoscopia, 1976, p. 5).
O esquema a seguir dá uma boa demonstração das diferenças
existentes entre as mencionadas ciências e os ramos do conhecimento
humano.
14
5. PERÍCIAS E PERITOS
5.1. Conceito
4■f ' Todos os exames levados a efeito por profissionais da medicina
i
(clínicos, laboratoriais ou necroscópicos) e que são destinados a uso
I
' judicial denominam-se perícias médico-legais.
\
Da mesma maneira, todos os exames elaborados por profissio
nais de outras áreas do conhecimento humano, que não médicos, desde
que destinados a uso como meio de prova em juízo, são denomina
dos, simplesmente, perícias.
Como as questões levadas a juízo são muito variadas, a na
tureza da perícia depende da natureza do exame considerado,
requerendo um profissional especializado que poderá ou não ser
um médico. Tratando-se de m atéria médica o profissional deve
rá ser médico, e o exame produzido, uma perícia médica. Em
caso de m atéria referente, por exemplo, à construção civil, o
perito indicado deverá ser engenheiro ou arquiteto, e o exame
produzido, uma perícia de engenharia, portanto, afeta à área da
criminalística.
f Peritos, pois, são todos aqueles técnicos, de nível superior ou
não, concursados ou não, mas especialistas em determinada área do
1 conhecimento humano e que, por designação da autoridade compe-
| tente, prestam serviços à justiça ou à polícia a respeito de fatos, pes-
soas ou coisas.
15
psiquiátrica
necroscópica
traumatológica
sexológica
etc.
segundo a matéria
contábil
de engenharia
química
não médicas
física
balística
etc.
Classificação das
perícias
segundo o modo cotno se realiza o exame inthreta
cível
( criminal
trabalhista
de retratação — percipiendi
Í interpretativa — deduciendi
opinativa
retrospectiva
quanto ao momento de realização
{ prospectiva
16
A perícia interpretativa ou deduciendi é a que se realiza por
intermédio de um processo científico de interpretação dos fatos ou de
suas circunstâncias, no qual o perito, após analisar todos os elemen
tos encontrados em seu objeto de estudo, lança uma conclusão técni
ca relacionada com o fato colocado à sua apreciação.
Perícias op inativas são aquelas em que são exarados pareceres
dos especialistas sobre determinado assunto.
No que toca ao momento de sua realização, as perícias podem
ser retrospectivas ou prospectivas. As retrospectivas constituem exa
mes realizados no presente, mas relacionados com fatos passados,
com o objetivo de perpetuar os elementos de prova. Constituem a
maior parte das perícias.
As perícias prospectivas objetivam o exame de situações pre
sentes cujos efeitos deverão ocorrer no futuro. É o caso, por exem
plo, do exame de cessação de periculosidade, previsto no art. 775 do
Código de Processo Penal.
Peritos
17
juiz poderá, mesmo na esfera penal, nomear pessoas idôneas, de ní
vel superior, para a realização da perícia. É o que dispõe o § 1Qdo art.
159 do Código de Processo Penal.
Tais peritos são também chamados de peritos leigos ou ad hoc e
^deverão ser sempre profissionais de curso superior.
CPC
Art. 421. O juiz nomeará o perito, fixando de imediato, o prazo para a entrega do
laudo.
CPC
Art. 434. Quando o exame tiver por objeto a autenticidade ou a falsidade de
documento, ou for de natureza médico-legal, o perito será escolhido, de prefe
rência, entre os técnicos dos estabelecimentos oficiais especializados. O juiz au
torizará a remessa dos autos, bem como do material sujeito a exame, ao diretor
do estabelecimento.
18
5.3.1* Investidura
Os peritos oficiais são designados para atuar neste ou naquele
processo ou procedimento por determinação ou do diretor da reparti-
rãn pública a que estão ligados ou do Poder Judiciário e prestam
compromisso uma única vez, ao assumir o cargo.
, Em havendo nomeação de peritos ad hoc, por inexistência dos
J oficiais, nos termos do § l c do art. 159 do Código de Processo Penal,
o compromisso deverá ser prestado. É o que dispõe o § 2a do mesmo
^dispositivo:
CPC
Art. 422. O perito cumprirá escrupulosamente o encargo que lhe foi cometido,
independentemente de termo de compromisso. Os assistentes técnicos são de
confiança da parte, não sujeitos a impedimento ou suspeição.
CPP
Art. 159. Os exames de corpo de delito e as outras perícias serão feitos por dois
peritos oficiais.
Tal exigência, como grande parte das leis no Brasil, por total
ausência de recursos humanos e materiais, deixa de ser cumprida. Os
exames continuam sendo realizados por um único perito e assinados
19
por um segundo, a título de revisor, que na maior parte das vezes é
mero subscritor, em confiança, de trabalho alheio.
Por outro lado, se houver nomeação de peritos não oficiais, nos
termos do § 1- do art. 159 do Código de Processo Penal, o número de
peritos deverá ser necessariamente dois, conforme a Súmula 361 do STF:
CPC
Art. 431-B, Tratando-se de perícia complexa, que abranja mais de uma área de
conhecimento especializado, o juiz poderá nomear mais de um perito e a parte
indicar mais de um assistente técnico.
Lei n. 5.584/70
Art, 3a Os exames periciais serão realizados por perito único designado pelo juiz,
que fixará o prazo para entrega do laudo.
Parágrafo único. Permitir-se-á a cada parte a indicação de um assistente, cujo
laudo terá que ser apresentado no mesmo prazo assinado para o perito, sob pena
de ser desentranhado dos autos.
20
maioria dos delitos patrimoniais, deixam modificações no mundo
material que podem ser percebidas por nossos sentidos ou por apare
lhos especiais (delicta facti permanentis). Nesses casos é necessária
a realização do exame de corpo de delito, cujo resultado será posteri
ormente apresentado sob a forma de minucioso relatório.
Para José Lopes Zarzuela, a expressão “corpo de delito”
corresponde “à somatória de elementos vestigiais encontradiços nos
locais de fato, no instrumento relacionado com a prática de uma in
fração penal, no exame das peças ou na pessoa física, viva ou morta,
deixados pelo sujeito ativo da infração penal, que serão apreciados,
interpretados e descritos em laudo pericial” (conceito ministrado em
aula proferida na Academia de Polícia do Estado de São Paulo).
Assim, distingue-se o corpo de delito, que, nas palavras de
Fernando Capez, constitui “o próprio crime em sua tipicidade”, do
exame de corpo de delito, que é todo exame realizado no local dos
fatos, nos instrumentos relacionados e, inclusive, nas pessoas envol
vidas (Fernando Capez, Curso de processo penal, 1998, p. 254).
Exame de coipo de delito não é apenas o exame realizado na pessoa, mas todo
exame relacionado com o fato criminoso, inclusive aquele feito no local e os
exames laboratoriais subseqüentes.
21
6.1. O Instituto Médico-Legal
O Instituto Médico-Legal (IML) tem por finalidade a elabora
ção das perícias médico-legais e toxicológicas.
Aos médicos legistas ficam afetas as necropsias, exumações
e exam es na p esso a h u m an a. Ôs exam es to x ico ló g ico s e
laboratoriais, relacionados, embora realizados no IML, não são
da alçada dos médicos-legistas,.mas sim de peritos criminais ali
alocados.
O quadro a seguir elenca os exames de corpo de delito privati
vos dos médicos-legistás (apud José Lopes Zarzuela, M inoru
Matunaga e Pedro Lourenço Thomaz, Laudo pericial — aspectos
técnicos e jurídicos, 2000, p. 230 - 231):
22
Perícia Núcleo responsável
Exame de sanidade física Seção de Clínica
Embriaguez Seção de Clínica
Acidente do trabalho Seção de Clínica
Lesões corporais Seção de Clínica Médica
Verificação de idade cronológica Seção de Clínica-Sede
Exame de sanidade mental Seção de Psiquiatria
Determinação de personalidades
psicopáticas, psicóticas, dissociais, Seção de Psiquiatria
neuróticas e oligofrênicas
Averiguação da ausência ou da
Hospital de Custódia e Tratamento
persistência da periculosidade do
Psiquiátrico
condenado
Necropsia Seção Técnica de Necropsia
Exame cadavérico Seção Técnica de Necropsia
Exumação Seção Técnica de Necropsia
Dosagem alcoólica em material biológico Seção Técnica de Pesquisa e dosagem de
de pessoas vivas ou mortas Álcool
Estado puerperal Seção Técnica de Psiquiatria
Exames radiológicos Seção Técnica de Radiologia
Verificação de aborto recente Seção Técnica de Sexologia Forense
Verificação de gravidez Seção Técnica de Sexologia Forense
Exame de conjunção carnal recente Seção Técnica de Sexologia Forense
Estupro recente Seção Técnica de Sexologia Forense
Verificação de contágio venéreo Seção Técnica de Sexologia Forense
Atentado ao pudor Seção Técnica de Sexologia Forense
Parto recente Seção Técnica de Sexologia Forense
Determinação do sexo em casos de estados
intersexuais quando interessam aos Seção Técnica de Sexologia Forense
inquéritos policiais e/ou processo penal
Perícias em ossos em geral, dentes e pêlos Setor Técnico de Antropologia
Determinação da espécie animal em ossadas Setor Técnico de Antropologia
Determinação da estatura por meio de
Setor Técnico de Antropologia
perícias em ossos longos
Determinação da raça Setor Técnico de Antropologia
Pesquisas bacteriológicas de materiais
orgânicos, sangue, pus, esperma, urina,
fezes, mecônio, colostro, leite, pêlos de Setor Técnico de Biologia Forense
origem humana oriundas do vivo e do
cadáver
23
6.2. O Instituto de Criminalística
O Instituto de Criminalística (IC) subdivide-se em diversas se
ções e setores, realizando perícias tanto em locais de crimes como
em documentos e peças relacionadas. A gama de exames realizados
pelo Instituto de Criminalística é enorme, atingindo a maioria das
áreas do conhecimento humano, como, por exemplo, as perícias em
documentos, som e imagem, balística, crimes contra a pessoa, contra
o patrimônio, acidentes de trânsito etc.
7. DOCUMENTOS MÉDICO-LEGAIS
7.1. Conceito e características
Documentos médico-legais ou médico-judiciários são todas as
informações de conteúdo médico, apresentadas por médico, verbal
mente ou por escrito, que tenham interesse judicial.
São características dos documentos médico-legais:
• ser elaborado por médico devidamente habilitado na forma da
legislação vigente;
• decorrer de exame que corresponda a ato médico específico,
assim entendidos aqueles próprios do exercício da medicina, com
exceção dos pareceres, em que o profissional poderá valer-se de dou
trina preexistente;
• apresentação verbal ou por escrito; e
objetivar o esclarecimento de questão colocada perante a justiça.
7.2. Classificação
oficiosos
atestados ou
( administrativos
judiciários
certificados médicos
atestados para fins previdenciários
atestados de óbito
oficial
clínico
25
constitui uma obrigação do médico, de acordo com o art. 112 do
Código de Ética Médica (Resolução n. 1.246/88 do Conselho Fe
deral de Medicina).
Art. 39. Receitar ou atestar de forma secreta ou ilegível, assim como assinar em
branco folhas de receituários, laudos, atestados ou quaisquer outros documentos
médicos.
Art. 110. Fornecer atestado sem ter praticado o ato profissional que o justifique,
ou que não corresponda à verdade.
26
Atestados oficiosos são destinados a justificar fatos do dia-a-
dia, como ausência às aulas ou ao trabalho, sem qualquer cunho de
oficialidade.
Atestados administrativos são aqueles apresentados no serviço
público para abono de faltas ou obtenção de aposentadoria e relacio
nam-se com o exercício de determinada função pública.
Atestados judiciários são os destinados a uso pela justiça.
Para Delton Croce, “somente os atestados judiciários consti
tuem documentos médico-legais” (1998, p. 29). É bem verdade que a
validade jurídica de tais atestados, principalmente pela ausência de
formalidades legais, é questionável, mas podem ser classificados como
documentos médico-legais, em sentido amplo, se utilizados como
princípio de prova de fatos de relevância jurídica.
27
O atestado de óbito será clínico quando a morte for natural e
tiver ocorrido com assistência médica. O fornecimento do atestado,
nessas condições, é dever do médico, como determina o art. 115 do
Código de Ética Médica.
Nesses casos, a declaração de óbito deve ser fornecida preferen
cialmente pelo médico que vinha prestando assistência (art. 22, 1, n ,
a, da Resolução n. 1.779/05 do Conselho Federal de Medicina).
Na hipótese de paciente internado sob regime hospitalar, o ates
tado pode ser fornecido pelo médico assistente ou substituto perten
cente à instituição (art. 2-, 1, ET, b, daRes. n. 1.779/05).
Se o paciente estava em tratamento sob regime ambulatorial, o
atestado deve ser fornecido pelo médico designado pela instituição que
prestava assistência ou pelo SVO (art. 2S, 1, n , c, da Res. n. 1.779/05).
A declaração de óbito do paciente em tratamento sob regime
domiciliar (Programa Saúde da Família, internação domiciliar,
homecare e outros) deverá ser fornecida pelo médico pertencente ao
programa ao qual o paciente estava cadastrado, ou pelo SVO, caso o
médico não consiga correlacionar o óbito com o quadro clínico
concernente ao acompanhamento do paciente (art. 2°, 1, II, d, da Res.
n. 1.779/05).
“Em caso de morte fetal os médicos que prestaram assistência à
mãe ficam obrigados a fornecer a declaração de óbito do feto, quan
do a gestação tiver duração igual ou superior a 20 semanas ou o feto
tiver peso corporal igual ou superior a 500 (quinhentos) gramas e/ou
estatura igual ou superior a 25 cm” (art. 2S, 2, da Res. n. 1.779/05).
Se o óbito foi natural, mas sem assistência médica ao falecido,
ou sendo a morte violenta ou suspeita (não natural), o médico não
poderá fornecer o atestado.
Nas mortes naturais não assistidas o corpo deverá ser encaminha
do preferencialmente para o Serviço de Verificação de Óbitos (SVO) ou,
na sua ausência, para médicos do serviço público de saúde (art. 2S, 1, 1, a
e b, da Res. n. 1.779/05). . -
No caso de mortes violentas ou suspeitas, ao IML, onde serão
realizados exames destinados a comprovar a causa mortis (art. 2S, 3, da
Res. n. 1.779/05).
Também deverão ser encaminhadas ao IML as ocorrências em
que a morte possa ter decorrido dé “alguma medida com intenção
diagnóstica ou terapêutica indicada por agente não-médico ou realiza
da por quem não esteja habilitado para fazê-lo” (art. I 2da Resolução n.
1.641, de 12 de julho de 2002, do Conselho Federal de Medicina).
28
Código de Ética Médica
É vedado ao médico: (...)
Art. 114. Atestar óbito quando não o tenha verificado pessoalmente, ou quando
não tenha prestado assistência ao paciente, salvo, no último caso, se o fizer como
plantonista, médico substituto, ou em caso de necropsia e verificação médico-
legal.
Art. 115. Deixar de atestar óbito de paciente ao qual vinha prestando assistência,
exceto quando houver indícios de morte violenta.
30
VI - lacrar as umas funerárias que se destinam ao Exterior, nos casos de morte
natural;
VH - fazer as necessárias comunicações à fundação Sistema Estadual de Análise
de Dados — SEADE e, quando solicitado, a outros órgãos interessados, nos ca
sos em que, após exames complementares, for modificado ou completado o diag
nóstico da causa básica da morte.
Parágrafo único. As atribuições a que se referem os incisos IV e VI, quando se
tratar de morte violenta, serão de competência do IML.
31
• maus-tratos contra criança ou adolescente (ECA, arts. 13 e 245);
• maus-tratos contra idoso (Lei n. 10.741/03, art. 19); e
• tortura (art. 53, parágrafo único, do Código de Ética Médica)
(Resolução CFM n. 1.246/88).
Lei n. 6.259/75
Art. 7a São de notificação compulsória às autoridades sanitárias os casos suspei
tos ou confirmados:
I — de doenças que podem implicar medidas de isolamento ou quarentena, de
acordo com o Regulamento Sanitário Internacional;
II — de doenças constantes de relação elaborada pelo Ministério da Saúde, para
cada Unidade da Federação, a ser atualizada periodicamente.
§ Ia Na relação de doenças de que trata o inciso II deste artigo será incluído item
para casos de “agravo inusitado à saúde”.
§ 2a O Ministério da Saúde poderá exigir dos Serviços de Saúde a notificação
negativa da ocorrência de doenças constantes da relação de que tratam os itens I
e H deste artigo.
32
VI. Difteria
VII. Doença de Creutzfeldt-Jacob
Vm. Doenças de Chagas (casos agudos)
IX. Doenças Meningocócicas e outras Meningites
X. Esquistossomose (em área não endêmica)
XI. Eventos Adversos Pós-Vacinação
XH Febre Amarela
Xm. Febre do Nilo Ocidental
XIV. Febre Maculosa
XV. Febre Tifóide
XVI. Hanseníase
XVÜ. Hantaviroses
XVffl. Hepatites Virais
XIX. Infecção pelo vírus da imunodeficiência humana — HIV
em gestantes e crianças expostas ao risco de transmissão
vertical
XX. Influenza humana por novo subtipo (pandêmico)
XXI. Leishmaniose Tegumentar Americana
XXII. Leishmaniose Visceral
XX m . Leptospirose
XXIV. Malária
XXV. Meningite por Haemophilus influenzae
XXVI. Peste
XXVII. Poliomielite
XXVIÜ. Paralisia Flácida Aguda
XXIX. Raiva Humana
XXX. Rubeola
XXXI. Síndrome da Rubéola Congênita
XXXII. Sarampo
XXXHI. Sífilis Congênita
33
XXXIV. Sífilis em gestante
XXXV. Síndrome da Imunodeficiência Adquirida— AIDS
XXXVI. Síndrome Febril íctero-hemorrágica Aguda
XXXVII. Síndrome Respiratória Aguda Grave
XXXVIU. Tétano
XXXIX. Tularemia
XL. Tuberculose
XLI. Varíola
CLT
Art. 169. Será obrigatória a notificação das doenças profissionais e das produzi
das em virtude de condições especiais de trabalho, comprovadas ou objeto de
suspeita, de conformidade com. as instruções expedidas pelo Ministério do Tra
balho.
34
Lei n. 8.213/91
Art, 20. Consideram-se acidente do trabalho, nos termos do artigo anterior, as
seguintes entidades mórbidas:
I — doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exer
cício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva rela
ção elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social;
n — doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em fun
ção de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione
diretamente, constante da relação mencionada no inciso I.
35
7.4.4. Comunicação da ocorrência de morte encefálica
A Lei n. 8.489, de 18 de novembro de 1992 (revogada), já estabele
cia, em seu art. 12, a obrigatoriedade de comunicação, em caráter
emergencial, dos diagnósticos de morte encefálica ocorridos nos hospi
tais públicos e privados, de maneira a permitir o transplante de órgãos.
Mais recentemente a Lei n. 9.434, de 4 de fevereiro de 1997,
que trata especificamente dos transplantes de órgãos, no mesmo sen
tido, estabeleceu que:
Lei n. 9.434/97
Art. 13. É obrigatório, para todos os estabelecimentos de saúde, notificar, às cen
trais de notificação, captação e distribuição de órgãos da unidade federada onde
ocorrer, o diagnóstico de morte encefálica feito em pacientes por eles atendidos.
Lei n. 9.434/97
Art. 22. As instituições que deixarem de manter em arquivo relatórios dos trans
plantes realizados, conforme o disposto no art. 3a, § l 2, ou que não enviarem os
relatórios mencionados no art. 3a, § 2a, ao órgão de gestão estadual do Sistema
Unico de Saúde, estão sujeitas a multa, de 100 a 200 dias-multa.
§ 1BIncorre na mesma pena o estabelecimento de saúde que deixar de fazer as
notificações previstas no art. 13.
Art. 4a Nos casos mencionados nos arts. Ia c 2a deve ser feita imediata comunica
ção ao Conselho Regional de Medicina local.
Lei n. 10.778/03
Art. I2 Constitui objeto de notificação compulsória, em todo o território nacional, a
violência contra a mulher atendida em serviços de saúde públicos e privados.
§ Ia Para os efeitos desta Lei, deve-se entender por violência contra a mulher
qualquer ação ou conduta, baseada no gênero, que cause morte, dano ou sofri
mento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto no âmbito público como no
privado.
§ 22 Entender-se-á que violência contra a mulher inclui violência física, sexual e
psicológica e que:
I — tenha ocorrido dentro da família ou unidade doméstica ou em qualquer outra
relação interpessoal, em que o agressor conviva ou haja convivido no mesmo
domicílio que a mulher e que compreende, entre outros, estupro, violação, maus-
tratos e abuso sexual;
II — tenha ocorrido na comunidade e seja perpetrada por qualquer pessoa e que
compreende, entre outros, violação, abuso sexual, tortura, maus-tratos de pes
soas, tráfico de mulheres, prostituição forçada, seqüestro e assédio sexual no
lugar de trabalho, bem como em instituições educacionais, estabelecimentos de
saúde ou qualquer outro lugar; e
m — seja perpetrada ou tolerada pelo Estado ou seus agentes, onde quer que
ocorra.
§ 3a Para efeito da definição serão observados também as convenções e acordos
internacionais assinados pelo Brasil, que disponham sobre prevenção, punição e
erradicação da violência contra a mulher.
37
7.4.7. Esterilizações cirúrgicas
A Lei n. 9.263, de 12 de janeiro 1996 (Planejamento familiar),
em seu art. 11, determina sejam comunicadas as esterilizações cirúr
gicas para a direção do Sistema Único de Saúde, prevendo figura
penal em caso de descumprimento:
Lei n. 9.263/96
Art. 16. Deixar o médico de notificar à autoridade sanitária as esterilizações ci
rúrgicas que realizar.
Pena — detenção, de seis meses a dois anos, e multa.
ECA
Art. 245. Deixar o médico, professor ou responsável por estabelecimento de aten
ção à saúde e de ensino fundamental, pré-escola ou creche, de comunicar à auto
ridade competente os casos de que tenha conhecimento, envolvendo suspeita ou
confirmação de maus-tratos contra criança ou adolescente:
Pena — multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em
caso de reincidência. \
38
Lei n. 10.741/03
Art. 19. Os casos de suspeita ou confirmação de maus-tratos contra idoso serão
obrigatoriamente comunicados pelos profissionais de saúde a quaisquer dos se
guintes órgãos:
I — autoridade policial;
II — Ministério Público;
TTT— Conselho Municipal do Idoso;
IV — Conselho Estadual do Idoso;
V — Conselho Nacional do Idoso.
7.4.10. Tortura
O Código de Ética Médica (Resolução CFM n. 1.246/88) prevê
a comunicação obrigatória, para a autoridade competente, dos atos
lesivos à personalidade ou à saúde física ou psíquica do paciente sob
cuidado médico.
39
• preâmbulo ou intróito — onde o perito fornece dados gerais,
como autoridade requisitante, objeto do exame, data etc.;
• histórico ou anamnese — com um resumo dos antecedentes
do caso de interesse pericial;
• descrição — todas as etapas, o mais pormenorizadamente pos
sível, dos exames realizados;
• discussão — dos achados e exames complementares;
• conclusões — as ilações e ponderações decorrentes do exame;
• resposta aos quesitos — aos quesitos oficiais (ver) e aos de
mais, quando formulados;
•fecho ou encerramento.
7.7. Quesitos
Quesitos são perguntas específicas, dirigidas pelo juiz ou pelas
partes aos peritos, objetivando esclarecer determinado ponto referen
te ao exame realizado.
Os quesitos, além de ajudar a esclarecer pontos obscuros, ser
vem de orientação ao perito para a elaboração de seu relatório, uma
vez que terá de dirigir seus trabalhos no sentido de responder às ques
tões formuladas.
Não se pode esquecer que os peritos, embora especialistas na
sua área de atuação, não têm, em regra, conhecimento jurídico. Daí a
necessidade de que respondam a determinadas perguntas, relevantes
para o direito, mas aparentemente sem importância para um técnico
de outra área do saber humano.
40
Na área penal existem quesitos-padrão, chamados oficiais, na
dependência do tipo de exame realizado. São exemplos de quesitos
oficiais na área médico-legal:
No exame cadavérico;
• Houve morte?
• Qual a causa da morte?
• Qual o instrumento ou meio que produziu a morte?
• Foi produzida por meio de veneno, fogo, explosivo, asfixia,
tortura ou outro meio insidíoso ou cruel?
Na lesão corporal:
• Houve ofensa à integridade física ou à saúde do paciente?
• Qual o instrumento ou meio que produziu a ofensa?
• A ofensa foi produzida por meio de veneno, fogo, explosivo,
asfixia, tortura ou outro mexo insidioso ou cruel?
• Resultou incapacidade para as funções habituais por mais de
30 dias?
• Resultou perigo de vida?
• Resultou debilidade permanente ou perda de membro, sentido
ou função?
• Resultou incapacidade para o trabalho, enfermidade incurável
ou deformidade permanente?
• Resultou aceleração de parto ou aborto?
Na área cível não há quesitos previamente estabelecidos, o que
permite ao juiz e às partes formulá-los livremente de acordo com as
particularidades específicas do caso.
41
§ Ia As penas aumentam-se de um sexto a um terço, se o crime é praticado me
diante suborno ou se cometido com o fim de obter prova destinada a produzir
efeito em processo penal, ou em processo civil em que for parte entidade da
administração pública direta ou indireta.
§ 2“ O fato deixa de ser punível se, antes da sentença no processo em que ocorreu
o ilícito, o agente se retrata ou declara a verdade.
CPP — Art. 168. ...§ Ia N o exame complementar, os peritos terão presente o auto
de corpo de delito, a fim de suprir-lhe a deficiência ou retificá-lo.
42
CPP
Art. 6a Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade
policial deverá:
I — dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e con
servação das coisas, até a chegada dos peritos criminais;
| CPP— Art. 161. O exame de corpo de delito poderá ser feito em qualquer dia e
I a qualquer hora-________________________ .
CPP
Art. 162. A autópsia será feita pelo menos seis horas depois do óbito, salvo se os
peritos, pela evidência dos sinais de morte, julgarem que possa ser feita antes
daquele prazo, o que declararão no auto.
Art. 168....
§ 2S Se o exame tiver por fim precisar a classificação do delito no art. 129, § Ia, I,
do Código Penal, deverá ser feito logo que decorra o prazo de trinta dias, contado
da data do crime._______________________________________________________
43
Há prazos especiais, como, por exemplo, aquele designado pelo
juiz para a verificação da cessação da periculosidade (art. 777, § 2S,
do CPP) ou o do exame decorrente do incidente de insanidade (art.
150, § l2, do CPP), que não pode ultrapassar 45 dias.
No Código de Processo Civil os prazos são fixados pelo juiz,
que deverá atentar para a data da audiência de instrução e julgamento
(arts. 421 e 433 do CPC), tendo os assistentes técnicos o prazo co
mum de 10 dias para a apresentação de seus pareceres, depois de
intimadas as partes da apresentação do laudo (art. 433, parágrafo único,
do CPC).
CPC
Art. 421. O juiz nomeará o perito, fixando de imediato o prazo para a entrega do
laudo.
Art. 433, O perito apresentará o laudo em cartório, no prazo fixado pelo juiz,
pelo menos vinte dias antes da audiência de instrução e julgamento.
Parágrafo único. Os assistentes técnicos oferecerão seus pareceres no prazo co
mum de dez dias, após intimadas as partes da apresentação do laudo.
Caso o prazo fixado pelo juiz não seja suficiente para a realiza
ção da perícia, poderá ser prorrogado uma única vez:
CPC
Art. 432. Se o perito, por motivo justificado, não puder apresentar o laudo dentro
do prazo, o juiz conceder-lhe-á, por uma vez, prorrogação, segundo o seu pru
dente arbítrio.
7.9.3. Resumo
regra — o mais rápido possível
para o exame
regra — 10 dias
44
paia o exame — logo após a nomeação pelo juiz
7.10.1. Suspeição
A suspeição nada mais é que a argüição de que o juiz, em decor
rência de interesses ou sentimentos pessoais (amor, ódio, medo etc.),
não poderá julgar a causa com a isenção e imparcialidade necessárias
à aplicação da justiça.
As hipóteses de suspeição estão elencadas no art. 254 do CPP:
CPP
Art. 254. O juiz dar-se-á por suspeito, e, se não o fizer, poderá ser recusado por
qualquer das partes:
I — se for amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer deles;
II — se ele, seu cônjuge, ascendente ou descendente, estiver respondendo a pro
cesso por fato análogo, sobre cujo caráter criminoso haja controvérsia;
i n — se ele, seu cônjuge, ou parente, consangüíneo, ou afim, até o terceiro grau,
inclusive, sustentar demanda ou responder a processo que tenha de ser julgado
por qualquer das partes;
45
IV — se tiver aconselhado qualquer das partes;
V — se for credor ou devedor, tutor ou curador, de qualquer das partes;
V I— se for sócio, acionista ou administrador de sociedade interessada no processo.
CPP
Art. 280. É extensivo aos peritos, no que lhes for aplicável, o disposto sobre
suspeição dos juizes.
CPP
Art. 252. O juiz não poderá exercer jurisdição no processo em que:
I — tiver funcionado seu cônjuge ou parente, consangüíneo ou afim, em linha
reta ou colateral até o terceiro grau, inclusive, como defensor ou advogado, órgão
do Ministério Público, autoridade policial, auxiliar da justiça ou perito;
II— ele próprio houver desempenhado qualquer dessas funções ou servido como
testemunha;
m — tiver funcionado como juiz de outra instância, pronunciando-se, de fato ou
de direito, sobre a questão;
IV — ele próprio ou seu cônjuge ou parente, e consangüíneo ou afim em linha
reta ou colateral até o terceiro grau, inclusive, for parte ou diretamente interessa
do no feito.
Art. 253. Nos juízos coletivos, não poderão servir no mesmo processo os juizes
que forem entre st parentes, consangüíneos ou afins, em linha reta ou colateral
até o terceiro grau, inclusive.
46 ........ ....................
e impedimento nos arts. 134 e 135, estendendo
in c o m p a tib ilid a d e
sua aplicação aos peritos por expressa disposição do art. 138, m .
Como bem salienta Tourinho Filho (Processo penal, 1987, p.
493 ), a distinção entre incom patibilidade e im pedim ento é
despicienda e sem qualquer cunho prático, pois, quer se trate da
quela, quer se trate deste, os atos processuais realizados são como
se não existissem.
276, 278,
421, § 1a. I, 422, -
Assistentes técnicos — 428,429, 431-B,
433, § único,
435, 446, 452
Contraprova — — 340
47
CPP CP C CPPM
Fatos que não demandam 167, 184 420, § único, I a III, 315, § ünico
perícia 427
48
CPI3 CPC CPPM
H on orário s d o s peritos — 33 —
incêndio — — 343
Insalubridado — — —
interdição — 1.183 —
Laudo pericial 153, 160, 165, 218, § 1a, 421,429, 50, § único, c,
169,178, 432, 433, 436, 607, 160,162,
179, § único, 681, 722, § 1a, 319,322,
180, 181,182, 878, 957, 976, 323, 325,
277, § único, c, 978, 1.009, 1.011, 326,
527, 528, 529, 1.036, §§ I a e 2a, 600, § único
775, li 1.045, 1.066, § 2a,
1.183, 1.186,
1.207
49
CPP CPC CPPM
Natureza da prova pericial — 420 330
50
CPP CPC CPPM
Preservação do local 6a, I, — 339
169, caput
Realização de outras —
— 158
diligências
Vistoria 420 —
51
C a p ít u l o 2
BREVE ESTUDO DAS REGIÕES
CORPÓREAS
Ao elaborar seu relatório, o perito deve reportar-se às regiões coipóreas
para localização de um ferimento ou lesão. Embora existam algumas pe
quenas variações, as principais regiões são as a seguir expostas:
1. R E G IÕ E S ANATÔM ICAS A N T E R IO R E S DO C O R PO
HUM ANO
A n t e r io r d a m ã o
A n te r io r d o a n te b r a ç o
C u b lta l a n te rio r
B r a q u ia l a n te r io r ta l
A u r f c u la r
líd o m a s tú íd e a
T r fg o n o la te r a l d o p e s c o ç o
ila r
A c r o m ia l
10 d e lto p e llo r a l
S u b t ia v í c u la r
□ e ltó ld e a
i$ d e d o s d a s m ã o s
q u lro d á c tílo a
U ngueal
D o rs a l d o s d e d o s d o p á
Ou d o s p e d a r tle u lo s
52
2 . R E G IÕ ES ANATÔMICAS PO STE R IO R E S D O CORPO
HUMANO
53
3. REGIÕES ANATÔMICAS ANTERIORES DO TRONCO
54
4. REGIÕES ANATÔMICAS DA FACE LATERAL DIREITA
DO TRONCO
5. REGIÕES ANATÔMICAS DA CABEÇA E PESCOÇO
d o pescoço
56
7 . REG IÕ ES DAS FACES PALM AR E DORSAL DA MÃO
DIREITA
F a la n g e t a o u
Falange ou
falange prqximal
(no polegar não há
falange mádla)
I — Polegar ou 1* quirodáctilo
II — Indicador ou 2» quirodáctilo
III — Dedo média ou 3Dquirodáctlto
IV Dedo anular ou 4* qulrodáctllo
V — Mínimo ou 5®quirodáctito
Dorso do pé
Vj^Calcânea
Artelho:
Face mediai do pé
57
9. REGIÕES ANATÔMICAS DO PERÍNEO
Pudenda
Arco superciliar
58
C a p ít u l o 3
ANTROPOLOGIA FORENSE
^ 'í~ A antropologia forense é o ramo da medicina legal que, utili-
J zando-se de conhecimentos da antropologia geral, ocupa-se princi-
) palmente com as questões relativas a identidade e identificação.
1. IDENTIDADE E IDENTIFICAÇÃO
Identidade é “o conjunto de caracteres próprios e exclusivos
^ ) das pessoas, dos animais, das coisas e dos objetos. É a soma de si-
nais, marcas e caracteres positivos ou negativos que, no conjunto,
j individualizam o ser humano ou uma coisa, distinguindo-os dos de-
1.1. Histórico
A história da identificação e de seus processos remonta aos
caldeus e babilônios. No Código de Hammurabi já havia menção a
amputações de partes do corpo como forma de individualização. Nessa
época, o processo de identificação confundia-se com a própria puni
ção, e os meios empregados visavam mais identificar aqueles que
59
haviam sido condenados do que propriamente conferir alguma segu
rança social.
Outro exemplo foi a aplicação do ferrete, que consistia em mar
car as pessoas com ferro em brasa, sempre em locais visíveis.
Esses sistemas, que confundiam pena e identificação, foram uti
lizados por muito tempo, até a Idade Média, existindo países que,
ainda hoje, adotam tais punições.
Em termos de métodos de identificação, historicamente valem
menção:
a) assinalamento sucinto ou sumário — ainda utilizado atual
mente, no Boletim de Identificação Criminal — BIC, por exemplo,
consiste na simples anotação das principais características do identi
ficando, como raça, estatura, idade, cabelos, presença de tatuagens,
sinais particulares etc.;
b) sistema dermográfico de Bentham — idealizado pelo jurista
inglês Benjamin Bentham, preconizava a identificação pela tatuagem
de todas as pessoas no nascimento, possibilitando, destarte, fácil iden
tificação;
c) sistema de Icard — previa a injeção de parafina em determi
nadas regiões não visíveis do corpo, de maneira a criar pequenos
tumores perceptíveis ao tato. Se fossem extirpados, restaria, inequí
voca, a cicatriz cirúrgica;
d) sistema craniográfico de Anfósso — baseava-se na tomada
de algumas medidas padronizadas do crânio (ver biometria);
e) sistema otométrico de Frigério — procurou a identificação
pelos desenhos variados dos pavilhões auriculares e suas medidas
(ver biometria);
f) sistema oftométrico de Capdeville — pretendia a identifica
ção pela coloração e medidas dos olhos, como curvatura das córneas,
distância interpupilar e outras (ver biometria);
g) sistema oftalmoscópico de Levinsohn — recomendou a iden
tificação na comparação de fotografias do fundo do olho (ver
biometria);
h) sistema radiológico de Levinsohn — preconizava a identifi
cação na m edida dos ossos do carpo, tom adas por imagens
radiográficas;
60
i) sistema onfalográfico de Bert e Viamay — pretendia a identi
ficação pela conformação variada da cicatriz umbilical;
j) sistema palmar de Stockes e Wild — baseou-se na grande
variação dos desenhos formados pelos sulcos palmares;
k) sistema flebográfico de Tamassia — procurou estabelecer a
identificação das pessoas pelos desenhos formados pelas veias no
dorso das mãos (ver biometria);
1) sistema flebográfico de Ameuille — similar ao anterior, pro
curou a identificação pelos desenhos formados pelas veias da fronte
(ver biometria);
m) sistema antropométrico de Bertillon— fundava a identifica
ção na tomada de sinais particulares e de algumas medidas prefixa
das, como diâmetro ântero-posterior da cabeça, comprimento do an
tebraço, estatura e outras. Essas medidas e sinais eram classificados e
arquivados, permitindo assim a comparação posterior dos dados (ver
biometria);
n) sistema odontológico de Amoedo — preconizou a identifica
ção na arcada dentária. Derivações desse método são hoje bastante
utilizadas, principalmente em situações como desastres aéreos, em
que outros métodos de identificação tomam-se ineficazes;
o) sistema geométrico de Matheios — pouco utilizado, era ba
seado na comparação de fotografias e na tomada de medidas sobre
fotos anteriores e atuais do identificando (ver prosopografia);
p) sistema poroscópico de Locard — pretendia a identificação
pelo desenho e imutabilidade dos poros da pele;
q) sistema dactiloscópico de Vucetich — pela sua utilização e,
ainda, atualidade, será estudado separadamente.
61
perfil, sempre do mesmo tamanho, para posterior comparação. Vari
ações desse sistema são ainda utilizadas em alguns países (foto
reproduzida com autorização e por cortesia da TSL — Tecnologia e
Sistemas Ltda.);
unicidade ou individualidade
imutabilidade
Requisitos técnicos perenidade
praticabilidade
classificabilidãde
63
perenes, como, por exemplo, o número de dentes, considerando-se as
duas dentições;
d) praticabilidade — o método deve ser prático, permitindo àque
les que irão colher os dados de identificação uma tomada segura e
rápida, que não cause constrangimento aos identificandos e permita
um bom grau de segurança e confiabilidade. Alguns métodos preco
nizados pelos antigos pesquisadores, e que se mostravam impraticá
veis à época, hoje, com o advento da computação, estão sendo repen
sados (vide biometria — item 2);
e) classificabilidade — o método escolhido deve permitir a com
paração entre os dados de forma sistemática e precisa, de maneira a
rapidamente apontar o identificado em uma população.
64
raça
gerais (de um grupo de indivíduos) -| sexo
idade
peso e conformação
estatura
sinais particulares
malformações genéticas
naturais características gerais
Características grupos sangüíneos
impressões papilares
particulares exame do DNA
tatuagens
cicatrizes
adquiridas
sinais particulares
mutilações
psicológicas
1.4. Raças
Raças são subdivisões de uma mesma espécie; no nosso caso, a
humana. Em termos genéticos, são populações que se diferenciam na
freqüência de seus genes ou na estrutura de seus cromossomos, em
deconrência de um processo gradual de diversificação das populações
naturais em razão da multiplicidade de fatores culturais e ambientais.
Existem várias classificações de raças. A mais comum é a de Salvatore
Ottolenghi (1861 a 1934), que aponta para cinco tipos fundamentais:
tipo caucásico
tipo mongóLico
Raças tipo negróide
tipo indiano
tipo australóide
65
ovalado. O perfil facial é ortognata (possui o ângulo da face quase
totalmente reto) e levemente prognata (maxilar inferior proeminente);
' b) tipo mongólico — tem pele amarela. Os cabelos são lisos e
castanhos; a face é achatada da frente para trás; o nariz é curto e
; largo; os olhos são amendoados e os maxilares pequenos e salientes;
c) tipo negróide — tem pele de tonalidade castanho-escuro, quase
negra; os cabelos são bastante crespos e o crânio é dolicocéfalo (alon-
\ gado com diâmetro transversal menor do que o diâmetro ântero-pos-
terior). Apresenta prognatismo acentuado e o nariz curto e largo;
d) tipo indiano — a pele é amarelada, tendendo ao avermelhado.
A estatura é elevada; os cabelos são Usos e pretos; os olhos, acasta-
' nhados. O crânio é mesocéfalo (índice médio de crânio entre largura
V e comprimento), tem orelhas pequenas, nariz saliente, longo e estrei-
; to e maxilar inferior bastante desenvolvido;
^ e) tipo australóide — estatura alta, pele amarelada ou trigueira;
' os cabelos são pretos, ondulados e longos; o nariz é curto. Apresenta
prognatismo e maxilar inferior desenvolvido.
A classificação tem interesse apenas histórico. Depois do
seqüenciamento do genoma humano, a definição de raça, como um
grupo de indivíduos geneticamente distinto de outro, não mais se
sustenta. Isso porque o conceito foi sempre baseado em traços físi
cos, como a cor da pele, dos olhos ou peculiaridades faciais, ignoran
do o fato de que pessoas fenotipicamente semelhantes podem apre
sentar carga genética significativamente diversa. É possível, entre
tanto, separar as pessoas em grupos similares, de acordo com alguma
característica genética específica (portadores de anemia falciforme,
por exemplo), para finalidades terapêuticas.
2.5. Sexo
A determinação do sexo na pessoa viva ou no cadáver íntegro
geralmente não oferece maior dificuldade. Entretanto, esta surge quan
do se deve examinar partes de um corpo ou mesmo um corpo em
adiantado estado de decomposição ou carbonizado.
f Na ausência da genitália externa ou de órgãos internos, como o
útero, a diferenciação é feita por intermédio do esqueleto, dando-se
; especial atenção àbacia, que apresenta grandes diferenças anatômicas
\ do homem para a mulher.
1.6. Idade
A determinação da idade também é de fundamental importân
cia. As principais fases da vida humana são:
2. BIOM ETRIA
Com o advento da computação e o aumento da capacidade e
velocidade do processamento de dados, muitos dos antigos métodos
de identificação, que eram impraticáveis na época, voltaram a ser
reconsiderados.
O sistema de identificação biométrico é, basicamente, um método
automatizado de reconhecimento de padrões que busca a identidade de
uma pessoa por algumas de suas característiCas/&icíis ou comportamentais.
Dependendo do grau de confiabilidade, ou mesmo do de discri
minação da característica considerada, os sistemas biométricos podem
ser classificados como de verificação ou de identificação (David Maltoni
e outros, Handbook offingerprint recognition, 2003, p. 3).
Os sistemas biométricos de verificação comparam os dados de
uma pessoa com seus padrões, anteriormente gravados no sistema. É
68
uma comparação do tipo um para um, cuja única finalidade é respon
der se a pessoa questionada é realmente quem diz ser.
Os sistemas biométricos de identificação procuram o reconhe
cimento do indivíduo varrendo toda uma base de dados. É uma com
paração do tipo um para muitos, cuja finalidade é responder quem é a
pessoa pesquisada.
2.1. Características
Como características principais, além daquelas já apontadas para
os métodos de identificação em geral' (unicidade, imutabilidade, pe
renidade, praticabilidade e classificábilidade), os sistemas biométricos
devem ainda considerar outras específicas de módulos informatizados,
como performance, universalidade, aceitação e segurança.
A performance refere-se aos requisitos de precisão, velocidade,
robustez e confiabilidade que deve ter o sistema.
Universalidade significa que todas as pessoas devem ter as ca
racterísticas pesquisadas de maneira a permitir a comparação.
A aceitação diz respeito à privacidade ou ao grau de intrusão
que as pessoas estão dispostas a aceitar em seu dia-a-dia.
A segurança indica a possibilidade de fraude dos sistemas, refle
tindo suá facilidade de burla.
69
condiçSes de uso conduzir a um de alteração em
por toda a vida. falso negativo. razão de luz ou
temperatura do
ambiente. Tais
casos, entretanto,
são bastante
raros.
70
Reconhecimento Moderada a alta. Moderada a alta. Baixa. A
de assinatura Para algumas Dependendo da tecnologia
pessoas a assinatu posição em que empregada sofre
ra é altamente for feita a pouquíssima
suscetível de assinatura, influência das
alteração, podemos ter alterações
principalmente grandes alterações ambientais.
com o decorrer do no padrão.
tempo.
71
• veias da mão;
• dinâmica dos movimentos labiais;
•modo de andar (“ginga”).
Praticabilidade
Universalidade
Imatabilidade
Performance
oi
Unicidade
Aceitação
tu
Identificador biométrico S
«3
U
s.
Oi
í»
DNA A A A B A B B
Escaneamento da orelha M M A M M A M
Escaneamento da face A B M A B A A
Termograma facial A A B A M A B
Impressões digitais M A A M A M M
Modo de andar M B B A B A M
Geometria da mão M M M A M M M
Veias da mão M M M M M M B
Escaneamento de íris A A A M A B B
Dinâmica da digitação B B B M B M M
Odor corporal A A A B B M B
Escaneamento da retina A A M B A B B
Assinatura B B B A B A A
Voz M B B M B A A
72
ciência e, em terceiro lugar, pela segurança fornecida em termos de
identificação pessoal.
Os desenhos digitais, segundo Edmond Locard, apresentam três
características fundamentais que os tomam importante elemento de
identificação: a perenidade, a imutabilidade e a variedade {Venquête
crimínelle et les mêthodes scientifiques, 1933, p. 104).
perenidade
ír f
j Características dos desenhos papilares (segundo Locard) imutabilidade
L variedade
perenidade
imutabilidade
Características dos desenhos papilares variedade
classificabilidade
73
de c o m p a r a ç ã o automatizados que não levam em considera
to d o s
ção toda a impressão, mas apenas seus fragmentos. A título de exem
plo, D . Costello, em artigo publicado no Wall Street Journal
(Families: the perfect deception: identical twins, 1999), menciona
a possibilidade de as impressões digitais de gêmeos idênticos se
rem 95% similares.
digitais ou dígito-papilares
( palmares (das mãos)
plantares (dos pés)
74
3.2. Gênese dos desenhos papilares
A pele possui duas camadas, uma mais superficial, denomi
nada epiderme, e outra, a ela adjacente, mais profunda, a que
ch am am os de derme. As cristas papilares, cujas ondulações for
mam os desenhos papilares, nada mais são que circunvoluções
da epiderme que se estendem sobre as cadeias paralelas de glân
dulas, terminais nervosos e vasculares existentes na derme. A
altura das projeções nas regiões palmares e plantares oscila en
tre 110 p (cento e dez micrà) e 225 p (duzentos e vinte e cinco
micra).
Admite-se que uma das funções das papilas é aumentar a zona
de contato entre a derme e a epiderme, trazendo maior resistência à
pele, razão pela qual são mais freqüentes nas áreas sujeitas a maio
res pressões e atritos (Junqueira e Carneiro, Histologia básica, 1973,
p. 346).
A pele contém um grande número de glândulas sudoríparas
e sebáceas. As sudoríparas localizam-se na derme, conforme in
dica o esquema a seguir, e sua secreção, o suor, permite a perda de
calor pelo m ecanism o da evaporação (vide m ecanism os de
regulação da temperatura). Possuem um longo dueto excretor que
atravessa a epiderme e abre-se na superfície da pele por intermé
dio do poro. Existem particularmente na palma das mãos e planta
dos pés, sendo também encontradas em outras regiões, como axi
las e genitais.
É exatamente a secreção das glândulas sudoríparas que, depo
sitadas sobre as cristas e sulcos papilares, irá constituir a “tinta bi
ológica” que permite sejam deixadas as impressões do desenho di
gital sobre os vários suportes.
As glândulas sebáceas também estão localizadas na derme,
mas não existem nas regiões palmares e plantares e por isso têm
pouca importância em sede de papiloscopia. São geralmente en
contradas nos folículos pilosos, e sua secreção serve para lubrificar
pele e pêlos.
75
3.3. Terminologia
Primeiro é preciso distinguir entre desenho papilar e impressão
papilar.
Como vimos, na epiderme há um conjunto de sulcos e cristas,
• que assumem configurações variadas, ao qual denominamos dese
nho papilar. Particularmente, no caso das pontas dos dedos, iremos
falar em desenho digital.
Esse desenho papilar, deixando sua impressão sobre um supor
te, dará origem ao que chamamos de impressão papilar, ou, no caso
das pontas dos dedos, impressãgjdigital.
A impressãopapilar é, pois,
o reverso do desenho papilar, e a
impressão digital', o reverso do
desenho digital (figura).
As impressões papilares
(digitais, palmares ou planta-
res) inteiras ou apenas seus
fragmentos podem ser encon
tradas nos locais de crime, em objetos ou instrumentos relacio
nados. v
De acordo com o suporte em que são deixadas e também depen
dendo da maneira como são impressas, sobre esses suportes, as im
pressões papilares em locais de crime podem ser classificadas como:
76
visíveis
( moldadas
latentes
Impressões visíveis são aquelas deixadas com tinta, graxa, san
gue ou outros pigmentos e que podem ser visualizadas a olho nu.
Essas impressões podem ser fotografadas diretamente pelo pesquisa
dor (foto reproduzida com autorização e por cortesia da TSL —
Tecnologia e Sistemas Ltda.).
As impressões moldadas ou
modeladas são as deixadas sobre
suportes plásticos, como sabão, mas
sa de vidraceiro ou qualquer outro
de consistência pastosa ou mode-
lável.
Tais impressões podem ser fo
tografadas diretamente pelo pesqui
sador. Entretanto, é de observar que
nas impressões moldadas os sulcos
correspondem às cristas e vice-
versa.
As impressões latentes, mais
comumente encontradas, são aquelas deixadas por dedos, mãos ou pés
limpos, e que não podem ser visualizadas a olho desarmado. Para
procurá-las o pesquisador deve utilizar reveladores especiais, como ve
remos a seguir. A fotografia mostra impressões latentes, deixadas em
__ .77
papel e já reveladas por vapores de nimdiiiià (foto reproduzida com
autorização e por cortesia da TSL — Tecnologia e Sistemas Ltda.).
78
c u r a r inicialmente as impressões visíveis e moldadas para, em segui
cor do suporte
Fatores que influenciam na escolha do revelador natureza do suporte
idade da impressão
negro de fumo
negro de marfim
de cor única bem clara -
grafite
pós magnéticos
claros óxido vermelho de cobre
antraceno (branco)
fluorescentes fluoresceína (marrom)
Suportes eosina (vermelho)
carbonato de chumbo
carbonato de cálcio
escuros <
carbonato de magnésio
pós magnéticos
79
I
Os pós magnéticos devem ser aplicados com pincéis próprios, |
que nada mais são que verdadeiros ímãs, permitindo a aspersão do |
pó sobre a superfície sem contato físico do pincel. A ilustração se- J
guinte mostra a maneira como o pó adere ao pincel e pode ser espa- |
lhado sobre a superfície a ser pesquisada (foto reproduzida com au- 3
torização e por cortesia da TSL — Tecnologia e Sistemas Ltda.). A
%íi
Os reveladores fluorescentes somente mostram as impressões fg
quando iluminados por luz ultravioleta. ||
80
Identificação, onde serão realizadas a classificação e a comparação
pelos papiloscopistas.
Normalmente o levantamento das impressões é feito com a apli
cação de fitas adesivas de boa qualidade, que, depois, são coladas em
lâminas de vidro e identificadas para permitir o transporte seguro
(foto reproduzida com autorização e por cortesia da TSL— Tecnologia
e Sistemas Ltda.).
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Polegar lootcador M édio Mfnlmo
1
1
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S
i
3
83
Além do entintamento dos dedos, uma outra técnica, que não é
muito difundida, é o digitofotograma (Croce, 1998, p. 88), idealiza
do patAntonio Lázaro Valeriani Martins, e que consiste em embeber
os dedos com revelador radiológico e depois colocá-los sobre chapas
radiográficas veladas, exercendo rápida pressão. Em seguida embe
be-se a chapa com fixador e tem-se uma imagem nítida de todo o
desenho digital.
Modernamente os antigos métodos vão sendo substituídos pe
los aparelhos e programas para digitalização, coleta e arquivamento
das impressões digitais. Um bom exemplo são os escâneres utiliza
dos para fichamento de estrangeiros nos aeroportos (ver biometria—
item 2).
d o d e d o do c a d á v e r
85
tam a correta individualização do identificado, tais como cútis, cor
dos olhos, cor e tipo de cabelo. São anotadas, ainda, a presença de ^
deformidades, cicatrizes, tatuagens, amputações e outras peculiari
dades físicas.
86
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87
3,7. Classificação — o sistema de Vucetich
Conquanto existam vários outros sistemas para classificação e
comparação das impressões dígito-papilares {sistemas datiloscópicos),
no Brasil o adotado foi aquele idealizado por Juan Vucetich, desde
1903. O quadro abaixo indica alguns criadores de sistem as
datiloscópicos adotados em outros países:
Brasil e Argentina Juan Vucetich
Cuba Steegers
Egito Harvey Pachá
França e Bélgica Alphonso Bertillon e Locard
Holanda Spillet
índia Conlay
Inglaterra e Estados Unidos Henry
Itália Gastí-Ottolenghi
Portugal Alberto Pessoa e Valadares
cristas papilares
sulcos papilares
linhas albodatíloscópicas
Elementos da impressão digital
pontos característicos
poros
delta
88
3.7.2. Linhas albodatiloscópicas e albodatilograma
Por vezes é possível identificar linhas transversais, que não acom
panham as cristas papilares. São as chamadas Unhas albodatiloscópicas
ou linhas brancas. São tidas como alterações patológicas do desenho
digital, geralmente ligadas a atividade profissional (digitadores, p. ex.).
Não são perenes, podendo surgir ou desaparecer durante a vida e, por
isso mesmo, não servem como elemento de classificação.
As impressões que contêm grande número dessas linhas são
comumente chamadas de albodatilogramas.
3.7.4. Poros
Poros são as aberturas dos canais sudoríparos, localizados so
bre as cristas papilares. Há cerca de 94 poros por cm2de pele e são
eles os responsáveis, juntamente com as glândulas sebáceas, pela
perspiração da pele, que, em última análise, constitui a “tinta” com
que a natureza imprime os desenhos digitais nos variados suportes.
3.7.5. Deltas
Os deltas, em datiloscopia, têm recebido várias definições, en
tre as quais a de serem “pequenos ângulos ou triângulos formados
89
pelas cristas papilares” ou “pontos de encontro dos três sistemas de
linhas” (Álvaro Placeres de Araújo, Manual de dactiloscopia, 1960,
p. 109), e constituem um dos elementos mais significativos da im
pressão digital, pois é por intermédio de sua presença (ou não) e de
sua localização que podemos classificar os vários desenhos digitais.
90
0 sistema marginal é formado pelas linhas que estão acima do
ramo superior das linhas diretrizes.
91
o delta à esquerda, se olharmos diretamente no dedo, na polpa digital
correspondente, o delta estará à direita.
O arco é, pois, tuna das figuras fundamentais que não apresenta
delta, por isso chamada de figura adelta ou adéltica.
Na presilha externa o delta está â esquerda do observador, en
quanto na presilha interna está à direita.
Finalmente, no verticilo temos dois deltas, um à direita e outro à
esquerda. O verticilo é também chamado de figura bidelta ou bidéltica.
As figuras abaixo dão um bom exemplo dos tipos fundamentais das
impressões digitais segundo a classificação proposta por Juan Vucetich.
93
A figura mostra uma cicatriz que compromete o nú
cleo da impressão e impede sua correta classificação,
devendo ser assinalada, na fórmula datiloscópica, com
um X.
E 2 3 3 3 E 2 3 3 3 E 3 3 3 3
I 2 2 2 2 I 3 2 2 2 I 2 2 2 2
E 3 3 3 3 V 4 4 ■4 3 V 4 4 4 4
I 3 2 2 2 V 4 4 '4 2 I 4 4 4 4
94
plano
angular
arco bifurcado à direita
bifurcado à esquerda
destro-apresühado
sinis Lro apresilhado
normal
presilhas invadida
Classificação dos desenhos digitais
dupla
ganchosa
circular
espiral
ovoidal
verticilo
sinuoso
duvidoso
ganchoso
96
País Número de pontos
França 17
Inglaterra 12 a 16
Suíça 12 a 14
Áustria 12
Espanha 10 a 12
U.S.A. 8 a 12
Alemanha 8 a 12
97
Não se podem confundir pegadas com impressões plantares. O
que se encontra com grande profusão nos locais de crime são pega
das, que têm ampla utilização na investigação criminal, mas não se
confundem com a identificação pela comparação dos desenhos dei
xados pelas cristas papilares.
Uma aplicação bastante usual para as impressões plantares é a
identificação sistemática e obrigatória dos recém-nascidos nas ma-
temidades (ilustração).
PRÓ M A TR E P A U L IS T A L TD A .
14 A T f qN IO * 0 t I Ap,> ....I
AI, Jw qtrin Ett^tnie d« Um*, 30? - S. P*tl»
Pnujontsta j
ECA
Art, 10, Os hospitais e demais estabelecimentos de atenção à sadde de gestantes,
públicos e particulares, são obrigados a: : ^
98
O mesmo estatuto legal prevê que a ausência da identificação
constitui crime:
EGA
Art. 229. Deixar o médico, enfermeiro ou dirigente de estabelecimento de aten
ção à saúde de gestante de identificar corretamente o nconato e a parturiente, por
ocasião do parto, bem como deixar de proceder aos exames referidos no art. 10
desta Lei:
Pena — detenção de seis meses a dois anos.
Parágrafo único. Se o crime é culposo:
Pena — detenção de dois a seis meses, ou multa.
3.9. Poroscopia
A poroscopia é o estudo dos poros para a identificação crimi
nal. Foi idealizada como sistema de identificação em 1883 por Artur
Kolman, por apresentar as mesmas características de perenidade,
imutabilidade e variabilidade que os desenhos papilares.
Atualmente é utilizado como um sistema auxiliar ao datilos-
cópico, e a identificação é feita com base no número de poros,
sua posição, dimensão e forma. Estudos têm demonstrado, con
tudo, que não é possível a identificação em grande escala pelos
poros.
3.10. Anomalias
Anomalias nada mais são que certos defeitos que atingem os
dedos das mãos ou dos pés. Podem ser congênitas ou adquiridas,
como, por exemplo, as amputações. As anomalias congênitas mais
comuns são:
99
polidactilia ou hiperdactilia
(
ectrodactilia
sindactilia
Anomalias - alteração microdactilia
de volume macrodactilia
quanto à forma dos dedos
{=
alteração no braquidactilia
comprimento {■megalodactilia
100
merecem maiores considerações. Podem, por outro lado, servir como
importante fonte de identificação em juízo, nos casos em que teste
munhas eventualmente citam determinadas características físicas do
agente, como dedos muito longos ou deformados, descrições essas
inconfundíveis.
i Ectrodactilia Sindactilia
Anomalias quanto ao volume
Microdactilia Macrodactilia
Megalodactilia Braquidactilia
101
C a p ít u l o 4
TRAUMATOLOGIA FORENSE
1. CONCEITO
Segundo Genivctl França (1998, p. 55), “a traumatologia estu
da as lesões e os estados patológicos, imediatos ou tardios, produzi
dos por violência sobre o corpo humano”.
! ' t ,- ... ”w ce ( 1998, p. H 5 ), “é o capítulo da Medicina
estudam as lesões corporais resultantes de
\ traumatismos ae ordem material ou moral, danosos ao corpo ou à
saúde física ou mental” .
Os danos pessoais podem ser decorrentes da ação de vá
rias form as de energia sobre o corpo hum ano (França, 1998,
p. 55):
de ordem mecânica
de ordem física
de ordem química
Energias de oídem físico-química
de ordem bioquímica
de ordem bíodinâmica
de ordem mista
102
naturais — mãos, pés, cabeça, o próprio corpo,
enfim
armas propriamente ditas — armas de fogo, punhais,
soco inglês, cacetete, funda etc.
A g en tes das e n e rg ia s J
eventuais — faca, navalha, machado, foice
de ordem mecânica } V
M'
Meio passivo
103
A gravidade da lesão vai depender da intensidade com que a
energia mecânica atingiu o corpo, da sede e natureza da lesão e, ain
da, da maior ou menor resistência tecidual.
Conforme a superfície de contato, o modo de ação e as caracte
rísticas das lesões, os instrumentos classificam-se em:
perfurantes ou punctórios
de ação simples cortantes
contundentes
perfurocortantes
de ação composta perfurocontundentes
cortocontundentes
104
tecidos e, em razão das linhas de tensão da pele, assumirá a confor
mação de um fenmento produzido por um instrumento perfurocor
tante de dois gumes.
105
2.4. Instrumentos cortantes
Os instrumentos cortantes agem por m eio de pressão e
deslizamento sobre a pele ou tecido dos órgãos. Os melhores exem
plos são as lâminas de bàrbear, as navalhas e o bisturi. As facas, quando
atuam pelo deslizamento da lâmina, podem ser consideradas instru
mentos cortantes.
/)0[
?/■
á As lesões produzidas pelos instrumentos cortantes são denomi-
Jnadas lesões incisas e têm. as seguintes características:
l
margens Usas e regulares
ausência de região de contusão
Lesões incisas geralmente mais largas e profundas na porção média
existência freqüente da cauda de escoriação ou de saída
hemorragia geralmente abundante
\
capitação, a separação da cabeça do corpo. A ilustração a seguir mostra
casos de decapitação.
107
J
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U S «
"-
í 1
108
As lesões contusas, segundo Delton Croce (1998, p. 189— 200),
englobam :
esconaçoes
equimoses
contusões < hematomas
bossas hcmáticas
bossas línfáticas
comoção cerebral
contusão cerebral
no cramo <
compressão cerebral
síndrome pós-concussão
Lesões contusas
na coluna vertebral
no tórax
feridas contusas no abdome
nas artérias
contusão óssea
nos ossos
nas articulações
1entorse
109
Essa evolução é muito importante em casos de violência do
méstica e maus-tratos, principalmente envolvendo crianças, pois a :|
presença de inúmeras lesões de coloração variada atesta pela conti
nuidade das sevícias, afastando a alegação, bastante comum por par- í ||
te da defesa, de ferimentos produzidos por um único acidente.
Uma outra importante característica médico-legal das equimoses
é o fato de constituírem reações vitais por excelência, não sendo en
contradas no cadáver em lesões produzidas após a morte.
O quadro a seguir mostra a evolução do espectro equimótico:
Espectro equimótico
Tempo Coloração Molécula de hemoglobina
Ia dia vermelho escuro hemoglobina
Do 2a ao 3a dias violeta
D o 4a ao 6a dias azulado hemossiderina
Do 7“ ao 10a dias verde escuro hematoidina
D o l l s ao 12a dias verde-amarelado hematina
Do 12a ao 17a dias amarelado
A partir do 22“ dia desaparecem os vestígios da equimose
110
Contusão cerebral — decorre de uma lesão microscópica do
encéfalo que pode ou não estar localizada próximo à área traumatizada.
Aos sintomas da comoção cerebral, podem-se acrescentar as convul
sões e espasmos.
Compressão cerebral — é provocada por hemorragia da artéria
meníngea média ou veia cortical subaracnóidea e pode, na dependên
cia do volume hemorrágico, vir a determinar o que se chama de inter
valo lúcido, ou seja, um período aparentemente assintomático logo
após o trauma. Pode levar à morte por compressão cerebral e anoxia
do centro da percepção e da consciência.
Síndrome pós-concussão — o termo concussão indica comoção
violenta, abalo, choque. Na verdade, a síndrome pós-concussão pode
aparecer sempre que há um traumatismo craniano. Ocorre em lesões
de pequena monta, em que não há sinais de dano. Caracteriza-se por
algumas alterações da personalidade, como irritação, inquietude,
desconsideração pelas pessoas etc.
Contusões ósseas — são microfraturas e pequenas hemorragias
decorrentes da ação de instrumentos contundentes sobre os ossos,
sem que haja ruptura do tecido ósseo.
Fraturas — são soluções de continuidade, parciais ou totais, do
tecido ósseo.
Luxação — é o deslocamento de dois ou mais ossos em relação
à sua articulação pelo rompimento da cápsula articular.
Entorse — é a lesão dos ligamentos pela realização de um mo
vimento que vai além dos limites fisiológicos da articulação.
111
2.7. Instrumentos perfurocortantes
\
112
Quando atingem a região abdominal podem levar h evisceração.
Tam bém podem dar origem às chamadas lesões em acordeão (plaies
en accordéon), mencionadas por Lacassagne (Précis de médecine
légale, 1906, p. 415), em que instrum entos perfurantes ou
perfurocortantes de lâminas curtas, por compressão da parede abdo
minal, produzem lesões bastante profundas.
113
2.9. Instrumentos cortocontundentes
/>'■ f Os instrumentos cortocontundentes são aqueles que atuam por
| pressão exercida sobre uma linha, produzindo lesões denominadas
cortocontusas. São exemplos o machado, um golpe de facão desferi-
-do com a lâmina, o cutelo etc.
A distinção entre os ferimentos cortocontusos e os incisos faz-
se pela zona de contusão, que existe ao longo das bordas do primeiro
e inexiste no segundo.
114
Essa espécie de ferimento é freqüentemente encontrada em aci
dentes de trânsito ou em precipitações.
A ção In str u m e n to L e sã o E x e m p lo
temperatura
pressão
eletricidade
Energias de ordem física
radioatividade
luz
som
calor frio
J insolação
difuso — termonoses
| intermação
Lesões produzidas calor quente
pelo calor
direto — queimaduras
oscilações de temperatura
116
3 2. Lesões produzidas pelo calor frio
1
117
A forma de calor difuso produz os quadros conhecidos como
compreendendo a insolação e a intermação. Alguns au
te rm o n o s e s ,
tores citam, ainda, câimbra térmica, brotoeja, síncope térmica e de
sidratação (Gomes, 2003, p. 254).
O calor direto produz as chamadas queimaduras, que podem ser
simples, quando produzidas apenas pelo calor, ou complexas, quando,
além do calor existem outros fatores, como nas queimaduras por eletri
cidade, atrito, agentes químicos etc.
3.3.1. Termonoses
Insolação
Í
Intermação
3.3.2. Queimaduras
Queimaduras são lesões corporais produzidas pelo calor agin
do diretamente sobre o organismo em qualquer de suas formas. As
mais comuns são aquelas causadas pelo fogo, líquidos em ebulição e
metais incandescentes.
Quanto à gravidade, existem diversas classificações para as quei
maduras. As mais comuns são as propostas por Lussena/Hofinann,
que admite quatro graus, e a de Dupuytren, que prevê seis graus,
conforme a intensidade da lesão produzida.
119
Um velho ou uma criança que apresentem de 5% a 10% da área
corpórea atingida podem ser considerados grandes queimados, en
quanto para um adulto o percentual é de 20 % ou mais.
M anife Elias Zacharias, para avaliar a extensão das queimadu
ras, propõem a divisão em pequeno, médio e grande queimado, con
siderando, sob o ponto de vista clínico, a gravidade, os riscos experi
mentados pelo paciente, a percentagem do corpo atingida e a faixa
etária (Dicionário de medicina legal, 1991, pág. 402).
120
Na carbonização o corpo reduz em volume e peso, podendo ocor
rer exposição da arcada dentária e abertura dos olhos. Os membros
geralm ente se flexionam, dando ao cadáver a posição de boxeador.
121
Teoria das intoxicações — a destruição acentuada dos tecidos
produziria alta concentração de toxinas no sangue levando o indiví
duo à morte.
Teoria das alterações sangüíneas — trata-se de uma teoria não
mais aceita modernamente, pela qual as células do sangue sofreriam
alterações nos locais atingidos e, em razão disso, produziriam trombos
letais, que dariam causa a embolias e infartos.
Na verdade, o que ocorre é uma deficiência circulatória, na de
pendência da extensão das lesões, que pode levar à perda de plasma,
hemoconcentração e choque.
Teoria da toxemia infecciosa — como as queimaduras são fa
cilmente suscetíveis a infecções, particularmente as produzidas por
germes oportunistas, são freqüentes infecções severíssimas, que se
instalam particularmente nas 48 horas que sucedem o evento e que
podem levar a vítima ao óbito.
122
Quando não há tempo de adaptação suficiente para o incremen
to do número de hemácias, ocorrem aumento de batimentos cardía
cos, náuseas, epistaxe e otorragia, desmaios e, eventualmente, mor
te. Normalmente, tais sintomas são observados em altitudes entre
4.600 m e 6.100 m. Aciraa disso há rápida perda do controle muscu
lar e morte.
123
O segundo, e que demanda maior cuidado, é que o nitrogênio
presente no ar atmosférico é absorvido pelos tecidos em maior quan- .
tidade, podendo levar à chamada narcose por nitrogênio a altas
pressões.
Da mesma maneira, é possível a ocorrência de intoxicações tam
bém pelo próprio oxigênio e gás carbônico.
. , | fulminaçao — morte
natural ou cósmica -! _
fulguraçao — lesoes corporais
Eletricidade
eletroplessão — acidental \
artificial p 1 lesoes corporais
ou industrial
eletrocussão — execução de um condenado
124
A eletricidade natural ou cósmica (raios), agindo sobre o corpo
humano, pode causar a morte (Julminação) ou lesões corporais
(julguraçãó). Externamente as lesões tomam aspecto arboriforme,
denominadas sinal de Lichtemberg, decorrentes de fenômenos
vasomotores, que podem desaparecer com o tempo em caso de so
brevivência.
Internamente as lesões podem traduzir-se por hemorragias, con
gestão dos diversos órgãos e até fraturas ósseas.
A eletricidade arti
ficial produz, no local de
entrada, uma lesão que
com freqüência assume a
forma do condutor elétri
co que originou a descar
ga. É um ferimento de
bordas elevadas e colo
ração amarelo esbran
quiçada e indolor, que re
cebe a denominação de marca elétrica de Jellinek.
Além da marca elétrica, que é o sinal de entrada da corrente
elétrica no corpo, é possível encontrar as queimaduras elétricas,
decorrentes do calor produzido pela passagem da corrente pelo
corpo.
Tanto nos casos envolvendo eletricidade natural como artificial
é possível encontrar ferimentos de saída, indicando o local onde a
descarga elétrica deixou o corpo. A maioria dessas lesões encontra-
se nos pés.
Três teorias procuram explicar a morte em decorrência da pas
sagem da corrente elétrica: —
125
Na morte pulmonar, o óbito decorre da tetanização dos múscu
los respiratórios e dos fenômenos vasomotores decorrentes, como
edema pulmonar e congestão. A morte pulmonar é observada em ten
sões entre 120 e 1200 volts.
A morte cardíaca sobrevem da fibrilação cardíaca produzida
pela passagem da corrente elétrica. Ocorre nas tensões menores, ge
ralmente abaixo de 120 volts.
A morte cerebral é observada nas tensões acima de 1200 volts e
apresenta como lesões a hemorragia das meninges e demais estrutu
ras do cérebro.
126
3.7. Lesões produzidas pela luz
A luz, dependendo da intensidade, também pode ocasionar
lesões no corpo humano, particularmente relacionadas com alte
rações ou até mesmo perda da visão por dano irreversível no ner
vo ótico.
A luz tem forte influência sobre o psiquismo humano, razão
pela qual a polícia lamentavelmente utilizou, durante longo período,
o chamado terceiro grau, técnica de interrogatório em que o interro
gando era colocado debaixo de um holofote que lhe ofuscava a visão.
Há um tipo raro de epilepsia, denominada fotossensível, que
pode ser desencadeada pela exposição da pessoa a variações intermi
tentes de luz, como a tela de uma televisão, luz estroboscópica ou
mesmo raios de sol passando por folhas de árvores.
Não se deve esquecer, também, que os raios laser, bastante uti
lizados em cirurgias, nada mais são que feixes coerentes de luz de
alta intensidade e podem produzir lesões.
127
3.8. Lesões produzidas pelo som
As ondas sonoras, ou ondas de pressão, são as propagações de
um distúrbio mecânico através de um meio elástico como o ar.
As ondas sonoras compreendem:
Ambiente dB
Limite de audição 1
Ruído da respiração 10
Restaurante tranqüilo 50
Conversa em tom normal 60
Tráfego normal 70
\
Oficina mecânica 90
Avião a hélice na decolagem 120
Jato na decolagem 150
128
Segundo o anexo n. 1 da NR-15, os limites de tolerância para
ruído contínuo ou intermitente (assina considerados os que não sejam
de impacto) são:
129
4. ENERGIAS DE ORDEM QUÍMICA
Energias de ordem química são aquelas que atuara nos tecidos
vivos através de substâncias que provocam alterações de natureza
somática, fisiológica ou psíquica, podendo levar inclusive à morte.
Compreendem os cáusticos e os venenos.
[cáusticos ou corrosivos
Energias de ordem química j venenos ou tóxicos
130
líquidos
quanto ao estado físico sólidos
gasosos
animal
vegetal
quanto à origem
mineral
sintético
óxidos
ácidos
inorgânicos
sais
bases
hidrocarbonctos
Venenos ou
álcoois
tóxicos quanto às funções acetonas
químicas aldeídos
ácidos orgânicos
orgânicos
ésteres
aminas
íumnoácidos
carboidratos
alcalóides
domésticos
agrícolas
industriais
quanto ao uso
medicinais
cosméticos
venenos propriamente ditos
gasosos
voláteis
metálicos
álcalis e ácidos cáusticos
Venenos ou tóxicos
pesticidas
alcalóides e ptomaínas afins
psicofármacos e psicotrópicos
outros
131
Os envenenamentos, dependendo do tóxico considerado, podem
ter etiologia acidental, homicida ou suicida, devendo ser considera
dos todos os elementos à disposição do perito, particularmente no
exame do local, para que possa ter subsídios suficientes para a deter
minação da etiologia jurídica da morte.
Com relação aos venenos de origem alimentar, é preciso dife
renciar os envenenamentos das intoxicações alimentares.
No caso dos envenenamentos de origem alimentar a vítima in
gere, como se alimentos fossem, substâncias químicas nocivas ao
organismo, experimentando sintomas que variam de acordo com a
qualidade e a quantidade do princípio tóxico ingerido. É o caso, por
exemplo, da mandioca brava ou do peixe baiacu (o Logocephalus
laevigatus, tão lembrado nas crônicas de João Ubaldo Ribeiro).
Nas intoxicações alimentares o alimento em si não apresenta
qualquer princípio nocivo ao organismo, mas está contaminado com
substâncias ou microorganismos prejudiciais à saúde. As intoxica
ções alimentares serão melhor analisadas no tópico das energias de
ordem bioquímica.
7 co
Carboxiemoglobina
í>
133
tando que peça socorro. Seguem-se perda dos reflexos e coma pro
fundo e prolongado, podendo estender-se por até 36 horas.
Nos casos fulminantes, em que não há propriamente sintomas, são
suficientes poucas inalações para produzir a morte, podendo a vítima
sentir apenas vertigens e fraqueza para logo cair em coma profundo. -
Como a ligação entre a hemoglobina e o monóxido forma um
composto extremamente estável, é possível a intoxicação cumulativa
ou crônica, que ocorre quando a pessoa é submetida, de forma inter
mitente, a uma atmosfera com relevante concentração de monóxido
de carbono por dias seguidos. Essa forma de intoxicação é comum
em cozinheiros, churrasqueiros ou foguistas.
A pessoa morta por monóxido de carbono parece dormir. Sua
pele é rosada, seus lábios têm uma tonalidade também rosada e não
se instala a cianose comum dos asfixiados. Apresenta rigidez cadavé-
rica precoce, sangue fluido e rosado, manchas hipostáticas claras,
edema cerebral e putrefação tardia. O diagnóstico deve ser confirma
do com a pesquisa do monóxido de carbono no sangue, particular
mente pela micróespectroscopia.
O tratamento das intoxicações agudas e crônicas é relativa
mente simples, sendo suficiente que se retire a pessoa da atmosfera
saturada pelo monóxido de carbono, colocando-a em uma atmosfe
ra rica em oxigênio. Por vezes será preciso a transfusão sangüínea.
A existência ou não de
seqüelas lim ita-se a
transtornos de origem
nervosa ou psíquica e
dependerá do tempo
que o sistema nervo
so central ficou priva
do da oxigenação. O
gráfico (elaborado
pela COMGAS) mos
tra a relação entre o
tempo de exposição,
as diferentes concen
trações e os sintomas
observados.
134
.
5 ENERGIAS DE ORDEM FÍSICO-QUÍM ICA
Sob o título de energias de ordem fifsico-quúnica iremos anali
sar a asfixiologia forense, ou capítulo da medicina-legal que estuda
as asfixias.
Asfixia, do grego asphuksia, indica “falta de pulso” e é utilizado,
pelo costume, para indicar a supressão da respiração. O termo, no entan
to, é abrangente e pode englobar várias causas de morte. Segundo Almeida
Júnior, para a medicina legal somente irão interessar as asfixias que apre
sentem três características (Lições de medicina legal, 1996, p. 186):
enforcamento
por constrição do pescoço -I esganadura
estrangulamento
135
As asfixias são consideradas pelo direito penal como meio
cruel, principalmente pelo tempo necessário à produção da mor
te, cerca de três minutos ou mais, levando a vítima a grande sofri
mento físico e mental.
Odon Maranhão (2002, p. 319) indica como características ge
rais das asfixias mecânicas os seguintes sinais:
137
O sulco no enforcamento tem as seguintes características: nor
malmente é oblíquo, descontínuo, sendo interrompido na altura do
nó, e desigualmente profundo. Nos enforcamentos típicos, o nó si
tua-se na região posterior do pescoço. Nos atípicos, pode aparecer na
região anterior ou lateral do pescoço. Por vezes nem sequer existe o
nó, bastando que o meio constritivo pressione os vasos laterais do
pescoço com pressão suficiente para interromper a circulação.
138
Os gráficos e fotografias a seguir demonstram posições possí
veis para a morte por enforcamento e a conformação dos sulcos ob
servados.
Suspensão incompleta
139
O sulco, no enforcamento, assume sem
pre a Característica do meio mecânico que
deteiminou a constrição do pescoço, seja
decorrente de suicídio, sej a em caso de mor
te acidental.
\ í ' A morte no enforcamento pode ocorrer por três mecanismos:
^ a)pela asfixia mecânica — a constrição do pescoço pode obliterar
J: as vias respiratórias produzindo a morte;
| b) por inibição — a constrição lesa os nervos vagos e os seios
í carotídeos, determinando a parada cardiorrespiratória e a conseqüen-
! te morte;
141
c) por obstrução da circulação — como vimos, uma pequena
pressão no pescoço pode determinar a interrupção da circulação para ■
o cérebro, ocasionando a morte.
5.2. Estrangulamento
!t J O estrangulamento pode ser definido como a constrição do pes-
I coço por baraço mecânico (corda ou cordel) acionado por força es-
[ tranha ao peso do próprio corpo.
É meio utilizado, geralmente, por homicidas, podendo muito
raramente ser encontrado em suicídios (a vítima aplica um torniquete
no próprio pescoço). Também já foi utilizado como forma de execu
ção (garrote vil, p. ex.).
5.3. Esganadura
A esganadura é a asfixia mecânica
pela constrição ântero-lateral do pesco
ço produzida pela ação direta das mãos
do agente.
Não há sulco, que cede seu lugar
para marcas ou estigmas ungueais (mar
cas de unhas) e diversas escoriações,
equimoses e hematomas. Com certa fre
qüência é notada a fratura do hióide (Go
mes, 2003, p. 349).
A esganadura é essencialmente
homicida, sendo bastante comum no
infanticídio (foto) e nos crimes sexuais.
A doutrina é unânime em afastar o suicídio por essa forma de asfixia.
A etiologia da morte por esganadura tem sido explicada mais
pelos fenômenos de inibição nervosa decorrentes da compressão do
pescoço (inibição vagai ou
choque vagai) que pela as
fixia propriamente dita.
A morte por obstrução
da circulação não tem sido
relacionada pela literatura
médica, até porque o tem
po necessário para a sua
instalação é bastante dila
tado.
143
O quadro a seguir mostra as principais diferenças entre as três
modalidades de asfbdas mecânicas por constrição do pescoço.
Lesões no pescoço
5.4. Sufocação
/') 7 j A sufocação é a asfixia mecânica decorrente do bloqueio dire-
' V to ou indireto das vias respiratórias, impedindo a penetração do ar.
1 Compreende:
v
obstrução dos orifícios externos respiratórios
direta obstrução das vias respiratórias
Soterramento s
Sufocação
Confinamento
144
A obstrução das vias respiratórias é com freqüência acidental e
ocorre pela aspiração de corpos estranhos (alimentos, próteses, pe
quenos brinquedos, chicletes etc.).
O soterramento é a asfixia que resulta da obstrução das vias
respiratórias pela colocação da vítima em meio sólido ou poeirento.
É normalmente acidental, sendo encontrado nos desabamentos e ava
lanchas.
O confinamento ocorre quando a vítima fica presa em ambien
tes reduzidos e fechados impossibilitando a troca de ar. A morte ocorré
por esgotamento do oxigênio e aumento das concentrações de gás
carbônico.
A sufocação indireta decorre da compressão da caixa torácica,
impedindo os movimentos respiratórios e levando à morte por asfi
xia. Esse tipo de sufocação é encontrado em acidentes, em que há
compressão do tórax, ou tem etiologia homicida. Foi utilizado, na
Idade Média, como meio de execução, particularmente para as mu
lheres acusadas de bruxaria, que eram colocadas sob uma tábua, em
cima da qual eram depositadas pedras, até que sobreviesse a morte.
145
5.5.2. Fases da morte por afogamento
A morte por afogamento desenvolve-se em três fases:
a) fase de resistência — nela a vítima tenta conter a respiração o
máximo possível; if
b) fase de exaustão — na qual, por reflexos bulbares, a vítixná
passa a inspirar o líquido profundamente; e %
c) fase de asfixia— que comina com perda da consciência, con-í
vulsões e morte.
Galabuig, baseando-se nos trabalhos de Ponsold, descreve cin
co fases para o afogamento (1998, p. 428): “Quando uma pessoa cai
na água, sua primeira reação é efetuar uma inspiração profunda, an
tes de afundar (I). Depois há uma apnéia voluntária (II) até que o
aumento da concentração de C 0 2 e diminuição da de 0 2 a obrigam a
uma inspiração forçada (EI). Logo a inalação de água continua e po
dem aparecer convulsões (IV). A respiração pára e se instala uma
anoxia cerebral irreversível que provoca a morte (V)”.
I II III IV V
146
5.5.3- Principais sinais
Odon Maranhão (2002, p. 325) e Delton Croce (1998, p. 293 -
296) elencam, como principais sinais, internos e externos, encontra
dos nos afogados:
Sinais externos
Cianose da face Aparece na maior parte de todas as asfixias.
"pele anserina Ou “pele de galinha”, corresponde ao eriçamento
dos pêlos — sinal de Bemt.
Maceração da pele A epiderme fica infiltrada de água, principalmen
te as mãos e os pés (vide ilustração).
plâncton nas mãos e unhas Pela presença desses materiais no meio líquido
onde ocorreu a imersão.
Lesões de arrasto (Simonin) Pelo embate do corpo no leito do curso de água
(vide ilustração).
Retração dos mamilos, Pela baixa temperatura da água e choque térmico
testículos e pênis provocado.
Rigidez cadavérica precoce
Procidência da língua Que não é um sinal exclusivo dos afogados, mas
aparece com freqüência nas asfixias mecânicas.
Cabeça de negro A cabeça dos afogados em adiantado estado de
putrefação adquire uma coloração verde-escuro.
147
Sinais internos
Diluição do sangue A ingestão de grande quantidade de água acaba
por fluidificar o sangue em razão do equilíbrio
osmótico rompido.
Cogumelo de escuma O plasma sangüíneo passa para o alvéolo e há
grande formação de escuma, que preenche a ár
vore respiratória e sai pela boca.
Manchas de Paliauf Produzidas pela ação hemolítica da água sobre as
hemorragias pleurais {Tardieu). Nada mais são que
as manchas de Tardieu acompanhadas de um halo
hemolítico.
Plâncton e água nas vias res
piratórias e digestivas Pela aspiração e ingestão de grande quantidade
Presença de líquido no ou de líquido.
vido médio
amoníaco
domésticos
{ monóxido de carbono
vários
vaporesprodutos voláteis de limpeza doméstica
nitrosos
metano ou gás dos pântanos
profissionais fumos de metais, como antimônio,
alumínio ou chumbo
clorofórmio
éter
anestésicos cloreto de etila
protóxido de nitrogênio
óxido nitroso — gás hilariante
149
A classificação não é exaustiva, mas apenas exemplificativa,;
havendo inúmeros outros produtos que podem produzir atmosfera
incompatível com a respiração.
inanição
negativas
doenças carenciais
Energias de ordem bioquímica ^
V.
6.1. In a n içã o
Para sobreviver e ter um desenvolvimento completo e sadio, o
ser humano precisa de uma alimentação balanceada, rica em nutrien
tes fundamentais, quais sejam:
• carboidratos;
• proteínas;
• gorduras;
• vitaminas; s
• sais minerais; e
• água.
A ausência prolongada de um ou mais desses nutrientes pode
levar a transtornos irreparáveis para a economia orgânica. Como re
150
gra, a fome manifesta-se após um período médio de 24 horas sem
alimentação, podendo uma pessoa normal resistir até 7 dias ingerin
do apenas água.
Para uma boa nutrição não basta ingerir grandes quantidades de
alimento, é também preciso selecionar categorias e qualidade.
As Leis de Escudero (apud Croce, 1998, p. 307) dão bem uma
idéia dos princípios básicos que regem uma boa alimentação:
a) Lei da Qualidade — o regime deve conter alimentos comple
tos em sua composição;
b) Lei da Quantidade — a quantidade de alimentos deve ser
suficiente para cobrir as exigências calóricas do organismo e manter
o equilíbrio do balanço nutritivo;
c) Lei da Harmonia — as quantidades dos diversos princípios
que integram a alimentação devem guardar entre si uma relação de
proporção; e
d) Lei da Adequação — a finalidade da alimentação está subor
dinada à sua adaptação ao organismo.
A inanição é, pois, o enfraquecimento extremo por falta ou re
dução exagerada de alimentos imprescindíveis à manutenção dos fe
nômenos biológicos. Pode ter etiologia acidental, voluntária, econô
mica ou criminosa.
A inanição acidental é rara, mas pode ocorrer em casos em que
a vítima fica presa por vários dias em algum lugar onde não tem
acesso a alimentos e ou água. A inanição voluntária constitui hoje
forma de protesto tanto de presos como de ativistas políticos e é de
corrente da chamada greve de fome. A inanição econômica é obser
vada em larga escala em países do terceiro mundo, onde a fome e a
miséria são uma constante, e milhares de seres humanos são literal
mente abandonados à própria sorte pelos países mais desenvolvidos.
Trata-se, em verdade, de uma forma omissiva de assassinato em mas
sa que certamente a história irá debitar a todos nós.
Mais rara, a inanição criminosa pode ser observada particular
mente em situações em que crianças, velhos e enfermos são deixados
sem alimentos e socorro no aguardo de que a natureza siga seu curso
natural (crimes de infanticídio e abandono material).
151
Quando, além da falta de alimento, ocorre também a privaçãd
de água, o óbito sobrevêm rapidamente. O grau máximo de inanição
é denominado caquexia, que normalmente evolui para a morte. g
De qualquer modo, uma abstenção total de alimentos por uni
período superior a 10 dias pode levar ao óbito ou a lesões irreversíveis;:
como a síndrome demencial.
Necessidade
Vitamina diária do Função Carência
adulto
153
blem as cardíacos
ou hepáticos.
Notas:
• Xeroftalmia— oftalmia caracterizada pelo ressecamento de cór
e conjuntiva, devido à deficiência de vitamina A. O quadro mórbido ini
154
cia-se com cegueira noturna e secura anormal nos olhos, evoluindo para
queratom alácia (forma avançada de espessamento da córnea).
• Escorbuto — doença aguda ou crônica, provocada por deficiência
de vitamina C, caracterizada por hemorragias, alterações das gengivas e
pouca resistência a infecções. Também chamada de mal dos marinheiros.
• Pelagra — doença provocada pela deficiência de vitamina B 3
(Niacina), caracterizada por dermatite, distúrbios gastrintestinais e
psíquicos.
Também com relação ao metabolismo dos sais minerais pode
mos observar doenças carenciais:
Necessidade
Mineral diária do Função Carência
adulto
155
lécula de hemoglobina,
participando também da
composição de algumas
enzimas oxidativas. É
fundamental, portanto,
para o transporte de oxi
gênio às células e para a
manutenção dos sistemas
oxid ativos intracelulares.
156
6.3. Intoxicações alimentares
Vimos que nos envenenamentos de origem alimentar a vítima
ingere, como se alimentos fossem, substâncias químicas nocivas ao
organismo, enquanto nas intoxicações alimentares o alimento em si
não apresenta qualquer princípio nocivo ao organismo, mas está con
taminado com substâncias ou microorganismos prejudiciais à saúde.
As toxinfecções mais comuns são a salmonelose, o botulismo e
estafilococose, que têm como sintomatologia comum vômitos incoer-
cíveís, diarréia, podendo chegar a sintomas neurológicos e à morte.
A etiologia mais comum de intoxicação alimentar é a acidental,
quando a vítima ingere alimentos contaminados sem perceber que já
não se encontram próprios para o consumo. Também comum é a for
ma culposa, em razão da ganância de certos comerciantes que insis
tem em manter à venda produtos que já deveriam ter sido recolhidos.
A forma dolosa é praticamente inexistente.
6.4. Auto-intoxicações
As auto-intoxicações ou intoxicações endógenas decorrem de
anormalidades no funcionamento de alguns órgãos, particularmente
em relação à excreção de catabólitos.
Como é sabido, várias das reações químicas do organismo pro
duzem substâncias nocivas à economia orgânica, substâncias essas
que devem ser excretadas rápida e eficientemente.
A falha nesses sistemas de excreção, ou mesmo o aumento exa
gerado na produção de catabólitos, pode gerar quadros tóxicos e até
o êxito letal. É o organismo lutando contra o próprio organismo.
Uma das intoxicações endógenas mais comuns é pela uréia
(uremia), em casos de insuficiência renal.
6.5. Infecções
Infecções são perturbações causadas por organismos pato
gênicos, bactérias, fungos ou vírus, podendo produzir desde peque
nas alterações no coxpo até o óbito.
A maior parte das infecções é de origem acidental. A' forma
dolosa existe e constitui o crime descrito nos arts. 130 (perigo de
157
contágio venéreo) ou 131 (perigo de contágio de moléstia grave),
ambos do Código Penal.
cardiogênico
obstrutivo \
Choque
quanto a origem J hipovolêmico o
septicêmico ou infeccioso
periférico
-158
Quanto ao momento em que se instala, o choque pode ser pri
mário ou secundário. Será primário se a síndrome se manifestar ime
diatamente após a ocorrência da causa e secundário se, entre o fator
determinante do choque e o início dos sintomas caracterizadores da
síndrome, existir um lapso de tempo significativo.
Quanto à origem o choque pode ser cardiogênico, obstrutivo,
fiipovolêmico ou periférico. O choque cardiogênico ocorre normal
mente no infarto do miocárdio e é caracterizado por uma rápida di
minuição na capacidade de bombeamento do coração.
O choque obstrutivo advém de um bloqueio da circulação de
retomo como, por exemplo, nas tromboses, obstrução das veias ca
vas, alguns tumores, embolias e aneurismas.
O choque hipovolêmico é resultante da redução abrupta do vo
lume sangüíneo total, quer seja por hemorragia (perda de sangue —
choque hemorrágico), perda de plasma (choque plasmogênico — nas
supurações, v.g., em queimaduras graves) ou de líquido extracelular
(ichoque hidropênico — nas desidratações).
O choque periférico compreende várias modalidades, de acor
do com a etiologia. Será septicêmico se resultar de processos infec
ciosos agudos causados por germes que, liberando endotoxinas, le
vam a um desequilíbrio da circulação periférica.
O choque (periférico) anafilático ê observado em pessoas por
tadoras de hipersensibilidade alérgica a determinadas substâncias, com
liberação de histamina e violenta vasodilatação periférica.
O choque (periférico) neurogênico pode ser desencadeado por
fortes distúrbios emocionais, dor intensa, esforço excessivo ou em
decorrência de ação reflexa, v.g., nos traumatismos de coluna ou du
rante anestesias raquidianas.
Alguns autores mencionam, ainda, o choque por embolismo do
líquido amniótico (Croce, 1998, p. 312). Trata-se de uma modalida
de de choque obstrutivo que ocorre particularmente em recém-nasci
dos por aspiração de líquido amniótico ou mecônio, levando a um
quadro de cor pulmonale agudo.
159
pois a incapacidade de eficiente resposta cardíaca em face de exercícios ou estí
mulos. Os sintomas dependem do grau de comprometimento do músculo cardía
co, mas incluem dispnéia, tosse, fadiga e grande produção de secreção pulmonar.
fadiga
doenças parasitárias
Energias de ordem mista *
8.1. Fadiga
Por fadiga deve-se entender o conjunto de sintomas experimen
tados pelo organismo submetido a um regime de trabalho ou esforço
que vai além de sua capacidade normal de resistência.
Pode ser aguda ou crônica. Na. fadiga aguda a vítima realiza
atividades físicas em excesso, de forma mais, ou menos contínua, até
exceder os limites orgânicos. Um bom exemplo é o do soldado grego
que, no ano de 490 a.C., correu do campo de batalha das planícies de
Maratona até a cidade de Atenas (uma distância superior a 35 km),
para anunciar a vitória dos gregos sobre os invasores persas, morren
do logo após dar a auspiciosa notícia.
Na fadiga crônica não há propriamente excesso de atividade
em cada seção; o que ocorre é que a vítima não permite ao seu corpo
o tempo de repouso e recuperação necessários, minando a resistência
orgânica até a perturbação da homeostase (estabilidade do meio in
terno do organismo). A fadiga crônica é também chamada de stress,
estresse ou estafa. '•
Os sintomas são variados e incluem desde taquicardia e palpita
ções até depressão, insônia, impotência e diminuição dá capacidade
mental.
160
A etio lo g ia ju ríd ic a é g e ralm en te de o rd em acidental ou culposa.
Interessa mais ao ramo da in fo rtunística.
161
É comum que ectoparasitas funcionem como reservatórios na
turais ou vetores de endoparasitas. Como exemplo, a pulga do rato
Çíenopsylla cheopis), transmissora da peste (Pasteurella pestis), ou
o mosquito {Aedes aegypti), transmissor da filariose (Wuchereria
bancrofti).
Os sintomas são muito variados e dependem de cada tipo de
parasitose considerada. Embora constituam um achado comum de
necropsia, as infestações parasitárias raramente apresentam interesse
jurídico, podendo ser objeto de análise no campo das doenças profis
sionais.
8.3. Sevícias
As sevícias são analisadas dentro do capítulo destinado às ener
gias de ordem mista em razão de que nelas, quase sempre, estão pre
sentes várias modalidades de agressão.
163
criança maltratada, acrescidos do choro renitente, que parece ser um
dos principais fatores desencadeantes da agressão.
A síndrome da morte súbita infantil (sudden infant death
syndrome), também conhecida como “morte do berço”, ocorre nos
primeiros 4 meses de vida e é caracterizada pela morte abrupta e
aparentemente sem causa. A etiologia ainda é discutida, existindo
várias teorias que procuram explicar as ocorrências, como anomalias
do sistema nervoso e imunológico e malformações congênitas. É cla
ro que, nesse caso, não há que falar em maus-tratos.
164
Dessa forma, o perito deverá procurar observar sinais de efetivo
abandono e de maus-tratos recorrentes para poder firmar, com segu
rança, seu diagnóstico.
8.3.3. Tortura
O conceito moderno de tortura, para a maior parte dos países,
indica um envolvimento de natureza pública. Procura-se entender a
tortura como algo que, sistematicamente, é aplicado ou conduzido
por uma autoridade pública, e as diversas legislações de natureza penal
buscam traduzir essa peculiaridade.
A preocupação explica-se pelo absurdo número de relatos de
tortura em praticamente todo o mundo, ocorrido mesmo atualmente.
Entretanto, ainda que tal fato espelhe preocupação legítima com o
aumento da violência estatal, o conceito médico-legal não deve res
tringir-se ao âmbito da tortura patrocinada pelos poderes públicos.
No Brasil, a Lei n. 9.455, de 7 de abril de 1997, definiu em seu
art. Ia o crime de tortura, apresentando conceito um pouco mais am
plo, que fugiu da limitação do horizonte estatal. Apesar de mais
abrangente, a redação tem sido criticada severamente por constituir
tipo penal por demais aberto, uma vez que não indicou de maneira
clara o tipo de sofrimento físico ou mental constitutivo da tortura.
Lei n. 9.455/97
Art. P Constitui crime de tortura:
I — constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-
lhe sofrimento físico ou mental:
a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de ter
ceira pessoa;
b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa;
c) em razão de discriminação racial ou religiosa;
II — submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, cora emprego de
violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de
aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo.
Pena — reclusão, de dois a oito anos.
§ Ia Na mesma pena incorre quem submete pessoa presa ou sujeita a medida de
segurança a sofrimento físico ou mental, por intermédio da prática de ato não
previsto em lei ou não resultante de medida legal.
§ 22Aquele que se omite em face dessas condutas, quando tinha o dever de evitá-
las ou apurá-las, incorre na pena de detenção de um a quatro anos.
165
A capacidade de parte da humanidade em infligir dor e sofri-;
mento a outros semelhantes é quase tão antiga como sua própria his-;
tória, e a tortura é aplicada não apenas em nome da lei ou do Estado,
como também por motivos étnicos, religiosos, sociais ou simples-:
mente por puro prazer pessoal.
A perícia médica é difícil e os achados muito variados, pois
dependem do processo a que foi submetida a vítima.
Para os que sobrevivem, as seqüelas físicas e psíquicas são
inimagináveis e vão desde debilidades funcionais até a perda com
pleta de função ou sentido.
Em nível psicológico temos a síndrome pós-tortura, caracteri
zada por imagens recorrentes dos suplícios aplicados, desorientação,
irritabilidade, isolamento e, em muitos casos, tendências suicidas.
A etiologia jurídica da tortura é, na esmagadora maioria das
vezes, criminosa, não se podendo descartar eventuais casos de
autoflagelação. A ilustração mostra uma espécie de instrumento de
tortura vulgarmente conhecido como pau-de-arara ou cambau.
166
C a p ít u l o 5
BALÍSTICA FORENSE
1. CONCEITO
Balística forense é a disciplina que estuda basicamente as armas
de fogo, as munições, os fenômenos è os efeitos dos disparos dessas
annas, a fim de esclarecer questões de interesse judicial.
Eraldo Rabello conceitua a disciplina como “a parte do conhe
cimento criminalístico e médico-legal que tem por objeto especial o
estudo das armas de fogo, da munição e dos fenômenos e efeitos
próprios dos tiros destas armas, no que tiverem de útil ao esclareci
mento e à prova de questões de fato, no interesse da justiça tanto
penal como civil” (Balística forense, 1995, p. 19).
O estudo da balística é de maior interesse para a criminalística.
Entretanto, alguns conceitos serão necessários para que se possam
estudar as lesões decorrentes dos disparos das armas de fogo.
2. AS ARMAS DE FOGO
Armas de fogo são engenhos mecânicos destinados a lançar pro
jéteis no espaço pela ação da força expansiva dos gases oriundos da
combustão da pólvora.
A principal característica das armas de fogo é a de aproveitar a
grande quantidade de gases oriundos da reação química de combus
tão do propelente (pólvora), para obtenção de energia mecânica, con
sistente no arremesso do projétil.
167
proposto por Eraldo Rabello (1995, p. 40), dá uma noção dos princi
pais grupamentos considerados:
lisa
' quanto ao número f pares
quanto à alma de raias 1 ímpares
do cano raiada «
dextrogiras
quanto ao sentido
{sinistrogiras
de antecarga
quanto ao sistema de carregamento
extrínseca
{de retrocarga
quanto ao
Armas de fogo * percussão <
sistema de [ central [ direta
intrínsecaA , i .
inflamação I radial Iindireta
elétrica
de tiro unitário
automática
fixas
Í semiportáteis
portáteis
168
determina^0 número de ressaltos e cavados, dispostos de forma heli-
coidal, cuja finalidade principal é imprimir ao projétil um movimen
to de rotação ao redor de seu próprio eixo centro-longitudinal. A ilus
tração mostra o raiamento no cano da arma e as correspondentes
marcas deixadas no projétil.
169
Para a realização de um segundo disparo, o atirador deve presl
sionar novamente a tecla do gatilho. Essa pressão terá dois efeitos!
concomitantes, ou seja, o de rotacionar o tambor para alinhar com cf
cano outra câmara de combustão (com novo cartucho) e, ao mesmo4
tempo, afastar o cão para um novo tiro.
Tam bor
Alça de mira .
Chave do tambor
Corpo da arma
Haste do extrator
Gatilho
Guarda-m ato
170
No revólver essa força é perdida, uma vez que a culatra é fixa e
serve apenas para impedir que o estojo saia pela parte de trás, atin
gindo o atirador.
Para aproveitar essa considerável energia, surgiram as armas de
repetição semi-automâticas, que utilizara a força dos gases (exercida
sobre o estojo) para realimentação, e as armas de repetição automá
ticas, que utilizam a força expansiva dos gases para realimentação e
deflagração de novos disparos.
As pistolas semi-automáticas, portanto, podem ser definidas
com o armas que aproveitam a força expansiva dos gases para sua
alimentação, dependendo, entretanto, cada disparo, do acionamento
do gatilho pelo atirador.
Da mesma maneira que os revólveres, as características gerais,
com o número de raias, direção do raiamento, tamanho da armação,
capacidade do pente e tipo de mecanismo, variam de arma para
arma e são particularidades que servem para a sua identificação
genérica.
Massa de mira
Ferrolho Alça de mira
Cão
Registro de
segurança
Cabo
Pente
171
6. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRÉ AS ARMAS LONGAS;
Armas longas são aquelas que, em razão do comprimento d o ;
cano e da coronha, possuem grande dimensão longitudinal, exigindo
para seu uso o apoio do ombro e ambas as mãos do atirador.
Dentre as armas longas e portáteis, distinguem-se a espingarda
e a escopeta, a carabina, o rifle, o fuzil e o mosquetão.
espingarda e escopeta
carabina
Principais armas longas portáteis < rifle
fuzil
mosquetão
6.2. Carabina
De origem italiana, o termo carabina designa armas de fogo
portáteis, de repetição, cano longo e alma raiada. O cano das carabi-
nas mede entre 18” e 20” (de 45 cm a 51 cm), e é exatamente pelo
comprimento, menor, que diferem do(s rifles, que têm canos maiores.
A alimentação e o carregamentp das carabinas são feitos geral
mente pelo sistema de bomba (pump action) ou de alavanca (lever
action). ’■
6.3. Rifle ■■
Os rifles são armas de fogo longas, portáteis, de carregamento
manual (não automáticos) ou de repetição, cano longo e alma raiada.
gua diferença em relação às carabinas reside exatamente no compri
mento maior do cano, que atinge 24” (61 cm). Possuem um ou dois
canos, e o sistema de carregamento pode ser por ferrolho, alavanca,
bom ba ou semi-automático.
6.4. Fuzil
Fuzil é uma arma de fogo longa, portátil, automática, com alma
raiada, calibre potente e que normalmente tem uso militar, podendo
ser utilizado para caça de grande porte. É uma arma automática, que
apresenta uma cadência de tiros entre 650 a 750 disparos por minuto.
6.5. Mosquetão
Da mesma forma que o fuzil, o mosquetão é uma arma de fogo
longa, portátil, de repetição, com alma raiada. O carregamento é
manual, pelo sistema de ferrolho, que é recuado manualmente pelo
atirador.
173
de alma lisa
das armas
de alma raiada
Calibre
, ... f para armas de afma lisa
dos projeteis i , , . ,
r J I para armas de alma raiada
174
considerada. Isso ocorre para que não exista perda de pressão quando
o projétil é impulsionado através do cano pelos gases em expansão.
Essa característica faz com que a marca do raiamento fique impressa
nos projéteis (e sirva, posteriormente, para identificação da arma).
175
Existem algumas exceções, como, por exemplo, o calibre 410,
que corresponde a uma indicação do diâmetro interno do cano (0,410
de polegada) e eqüivale ao calibre 36. O quadro a seguir dá uma idéia
da relação entre o calibre nominal e o calibre real (diâmetro interno
do cano) das armas longas de alma lisa:
Resumindo, temos:
176
8. MUNIÇÃO
Pelo vocábulo munição podemos designar projéteis, pólvoras e
demais artefatos explosivos com que se carregam armas de fogo.
estojo
espoleta
Cartucho de munição pólvora
projétil
embuchamento - ■armas de alma lisa
Fechamento
Projéteis (balins)
Tubo (plástico ou papelão)
Bucha
Pólvora (propelente)
Propelente Estojo de metal
Iniciador Base
Espoleta Espoleta
177
O estuda das lesões produzidas pela ação de projéteis de arma
de fogo, sejam eles unitários ou múltiplos, apresenta relevância espe
cial, primeiro porque constituem número expressivo de ocorrências,
em grande núm ero de etiologia crim inosa. Além disso, pela
multiplicidade de facetas e características, geralmente fornecem ele
mentos preciosos à investigação, determinação da causa jurídica do
evento ou ainda da possível autoria.
Na análise dos ferimentos produzidos por projéteis de arma de
fogo, quatro são os pontos que devem merecer atenção do perito:
a) determinação e descrição dos ferimentos de entrada e saída;
b) a trajetória do projétil no interior do corpo, bem como a des
crição das lesões internas;
c) a orientação do disparo em relação à posição do corpo; e
d) a distância provável do disparo.
. . . _ . [projétil urnco
do tipo de mumçao empregada -< ... . ,
As características Iprojéteis múltiplos
do ferimento de
entrada dependem do ângulo de incidência
da distância em que foi efetuado o disparo
180
pelo diâmetro da lesão, visto que, em razão da elasticidade da pele e
das linhas de tensão, o orifício de entrada pode ser menor, maior ou
igual ao diâmetro do projétil que lhe deu origem.
O ferimento de entrada tem geralmente bordos invertidos,
invaginados, voltados para o interior do corpo, característica contrá
ria à dos ferimentos de saída, que possuem as bordas evertidas, le
vantadas, indicando claramente o sentido de sua trajetória.
Como exceção, temos a câmara de Hoffmann ou câmara de
mina, observada nos tiros encostados em regiões que recobrem tá
buas ósseas, em que o ferimento de entrada tem os bordos evertidos,
voltados para fora. Falaremos dessa espécie de ferimento mais
detalhadamente à frente.
Além do aspecto morfológico, ao redor dos ferimentos de en
trada produzidos por projéteis de arma de fogo, podemos observar
algumas espécies de orlas (ou halos) e zonas, fenômenos que se apre
sentam de fundamental importância tanto para a caracterização da
natureza do ferimento como para a determinação da distância em que
foi realizado o disparo.
As orlas (ou halos) são regiões circunscritas, regulares, que cir
cundam o ferimento como pequenas auréolas, dando-lhe característi
cas especiais que permitem diferenciar as lesões produzidas por pro
jétil de outras determinadas por instrumentos diversos.
As zonas compreendem áreas maiores, irregulares, que podem
ou não estar presentes e que terão importância fundamental na deter
minação da distância do disparo.
escoriação-
orlas ou halos contusão
enxugo
Ferimento de entrada de projétil
esfumaçamento
zonas chamuscamento
tatuagem
181
diato pelo embate do projétil. A segunda, a derme, mais elástica, acom
panha o projétil encapsulando-o parcialmente antes de se romper
para depois voltar à posição original.
Orla de contusão
182
aoa
l!«'
!P"
A maior parte dos autores costuma agrupar as orlas de contu
são e de escoriação como se formassem uma única, apresentando,
também, como sinônimos os termos orla erosiva (Piedelièvre e
Desoille), orla desepitelizada {França) e anel de Fisch (Croce, 1998,
p. 231). ;i.j ’■
Orla de contusão
Orla de enxugo
Orla de escoriação — derme
Ferimento de entrada
Orla de contusão
183
Essas três orlas estão presentes na quase-totalidade dos
ferimentos de entrada produzidos por projéteis de arma de fogo, in
dependente da distância em que o disparo foi efetuado. É claro que,
se for à curta distância, as zonãs de chamuscamento, esfumaçamento
e tatuagem, que estudaremos a seguir, certamente irão impedir a
visualização das orlas, o que não significa sua ausência.
Os halos de escoriação e contusão não são exclusivos dos
ferimentos produzidos por projéteis de arma de fogo, podendo ser
observados em lesões determ inadas por outros instrum entos
perfurocontusos. A orla de enxugo de coloração enegrecida é mais
característica e, com segurança, indica ferimento de entrada de pro
jétil de arma de fogo.
As fotos a seguir mostram o aspecto de ferimentos de entrada
produzidos por projéteis unitários de arma de fogo, decorrentes de
disparos efetuados à distância.
184 “
Esses componentes são impelidos juntamente com o projétil,
mas, como têm massa infinitamente menor, não possuem energia
cinética para ir além de uns poucos centímetros da boca do cano da
arma, podendo não atingir o alvo, na dependência da distância, da
arma, tipo e idade da munição utilizada.
Se o disparo for efetuado muito próximo do alvo, algo em tomo
de 5 cm, poderemos ter a zona de chamuscamento, que nada mais é
que uma região onde a pele é literalmente queimada pela chama que
sai pela boca do cano da arma.
185
Finalmente, e exatamente porque têm massa maior que as partí
culas de fuligem, restam os grãos de pólvora e as partículas metálicas
decorrentes da abrasao do projétil no cano da arma, que incidem so
bre o alvo como verdadeiros projéteis secundários, por vezes incrus
tando-se na pele de tal maneira que formam verdadeiras tatuagens
(zona de tatuagem).
-------------- 187
9.7. Disparos encostados
Nos disparos encostados temos de diferenciar duas situações
distintas: os disparos que atingem unicamente tecidos moles e os que
incidem sobre partes do corpo que recobrem ossos planos, como, por
exemplo, os do crânio.
Quando o disparo encostado atinge unicamente tecidos moles,
além do projétil, todos os demais elementos penetram no ferimento,
causando um a lesão interna de grande m onta. As zonas de
chamuscamento, esfumaçamento e tatuagem ficam todas no interior
do corpo, mas o orifício de entrada permanece com sua configuração
circular ou elíptica.
Por vezes, na dependência da força com que a arma foi pressio
nada sobre a região atingida, é possível evidenciar a marca do cano
sobre apele (foto). Esses ferimentos são freqüentemente observados
em suicídios.
188
9.8. D isparos em ossos
Nos ossos longos os disparos freqüentemente produzem fratu
ras, podendo as esquírolas ósseas constituir verdadeiros projéteis se
cundários. Dessa forma, é possível, inclusive, que exista mais de um
ferimento de saída. Nos ossos planos ou chatos, como no crânio, é
facilmente diferenciável o ferimento de entrada (A) ào ferimento de
saída (B) em razão do cone de dispersão formado pelos fragmentos
ósseos (sinal do funil de Bonnet).
189
da a arma em relação ao alvo. A questão tem particular relevância
nos casos em que se discute, por exemplo, se a própria vítima poderia '
ter feito uso da arma (suicídio) ou não (homicídio). '/>-
Para que o perito possa manifestar-se com um certo grau dc
precisão, irá necessitar da arma e da munição utilizada. Munido des
se material, deverá efetuar disparos experimentais no estande de tiro
e comparar os resultados obtidos com as zonas deixadas no corpo ou
vestes da vítima.
Os resultados procuram comparar distâncias não superiores a
50 cm. Acima desse patamar o disparo é sempre dito à distância, não
se podendo diferenciar um efetuado a 1 m de outro realizado a 10 m
ou mais.
O quadro a seguir dá uma noção das distâncias em que é possí
vel observar cada uma das orlas e zonas.
Orlas Zonas
Distância
Chtunusca- Es&uoaça- Tatuagem
Contusão Escoriação Enxugo
mento mento
A té 5 cm X X X X X
De 5 a 10 cm X X X X X
De 10 a 30 cm X X X X X
Até 50 cm X X X X
+ de 50 cm X X X
190
Nos disparos decorrentes de projéteis múltiplos de arma de fogo,
com o vimos, a distância pode ser determinada de acordo com a aber
tura do cone de dispersão. Também, e principalmente nesse caso, o
perito somente poderá opinar se tiver em mãos a arma utilizada para
a realização de disparos experimentais e de comparação.
Sem a arma para análise, o máximo que o perito poderá infor
mar é que se trata de disparo realizado encostado, à curta ou longa
distância, nada mais que isso.
C apítulo 6
SEXOLOGIA FORENSE
A sexologia forense é o ramo da medicina legal que se dedica
ao estudo dos fenômenos relacionados com a reprodução humana,
desde a concepção até o puerpério.
Segundo Bonnet (1993, p. 1007), a sexologia é a disciplina
científica que estuda as questões relacionadas com o sexo em seus
aspectos médicos, jurídicos, filosóficos e sociológicos. Para o mes
mo autor, a sexologia médico-legal ou forense nada mais é que o
ramo da medicina legal que estuda a solução dos problemas jurídi
cos que o sexo pode suscitar
1. CONCEITO DE SEXO
Na verdade não podemos mais falar em sexo ou sexos sem ter em
mente um conceito integrado com vários fatores parciais. O sexo, pois,
deve ser analisado em seus diversos aspectos, segundo o quadro abaixo:
endócrino
f
Sexo - propriamente dito
moifológíco <
dinâmico ou copulãtivo
psicológico
jurídico
2. SEXO GENÉTICO
O ser humano possui 46 cromossomos, divididos em 22 pares
autos sômicos e um sexual, que determinam as seguintes fórmulas
genéticas:
Homem 44A + X Y
Mulher 44A + XX
Óvulos 22A + X
22A + X
Espermatozóides
22A +Y
1 2 3 4 5 8 7 8
9 10 t1 12 13 14 15 16
ff U !}f! ^ k as | s
17 13 13 20 21 72 X Y
193
2.1. Síndrome de Tumer
Atinge as pessoas do sexo fe m in i n o , embora os afetados não
possuam cromatina sexual. É caracterizada pela presença de 45
cromossomos, sendo <jue, do par dos cromossomos sexuais, há ape
nas um X (44A + X). E uma anomalia rara, atingindo uma a cáda três
mil mulheres normais. ;5
São mulheres geralmente estéreis, de ovários atrofiados, baixai
estatura e que não desenvolvem os caracteres sexuais secundários!
por deficiência de estrógenos, Não costumam apresentar desvios de-
personalidade.
195
2.4. Síndrome de Down
A síndrome de Down ou trissomia do cromossomo 21 é, sem
dúvida, o distúrbio autossômico mais comum e a mais freqüente for
ma de deficiência mental congênita, ocorrendo na proporção de unj
para cada setecentos nascimentos normais. O portador da síndrome
de Down possui 47 cromossomos, sendo o cromossomo extra ligado
ao par 21 (44A + XX + 21 ou 44A + XY + 21).
1 2 3 4 5 6 7 B
9 tO 11 12 13 14 15 16
w -| —t ~
22 X y
196
O afetado apresenta microcefalia, com a região occipital ex
trem am ente alongada. O pavilhão d as orelhas é dismórfico e d e im
plantação baixa. A boca é pequena. O pescoço é curto. Estão pre
sentes deficiências visuais severas. Há uma grande distância entre
os mamilos (intermamilar). Os genitais externos são anômalos. O
dedo indicador é maior do que os outros e flexionado sobre o dedo
médio. Os pés têm as plantas arqueadas. As unhas costumam se r
incompletas (hipoplásticas). A idade materna avançada tem sido
um dos fatores apontados como causa determinante da ocorrência
da síndrome.
1 2 3 4 5 6 7 8
9 10 11 12 15 14 15 16
« h w | a -
17 \ 18 / 19 20 21 22 X Y
197
3. SEXO ENDÓCRINO
O sexo endócrino 6 determinado basicamente pelas gônadas ou
glândulas reprodutoras e por outras glândulas, como a tireóide e a
hipófise, que, em menor grau, também interferem nos fenômenos
orgânicos relacionados com o sexo.
O sexo gonádico aparece logo no início da vida intra-uterina, ao
redor dos 40 a 45 dias, em decorrência da transformação masculina
ou feminina determinada pelo sexo cromossômico sobre a gônada
inicial indiferenciada (Bonnet, 1993, p. 1011).
Antes da determinação do sexo gonádico, o embrião é sempre
morfologicamente feminino, e o processo de masculinização depen
de da produção hormonal do testículo ainda na fase fetal.
O quadro a seguir mostra a constituição hormonal básica de
cada sexo (apud Bonnet, 1993, p. 1012).
Glândulas Sexos
M asculino Feminino
Estrógeno
Ovários ... — Progesterona
Andrógenos urinários
Testículo Tèstosterona —
17 Cetosteróides 17 Cetosteróides
Supra-renal Corticosteróides Corticosteróides
Andrógenos urinários Andrógenos urinários
Lóbulo anterior da hipófise Gonadotropina Gonadotropina
4. SEXO M O RFOLÓGICO
A morfologia ou aparência dos órgãos genitais internos e exter
nos nos indivíduos normais é bastante evidente e diferenciada, não
dando margem a erros. Há, entretanto, estados patológicos
(intersexuais), em que podem surgir dúvidas.
Bonnet (1993, p. 1015) fala ainda em diferenças relacionadas
com a mecânica da cópula, que o autor denomina sexo dinâmico ou
copulativo, indicando que as fases do ato sexual diferem sensivel
mente de acordo com o sexo, e que a insuficiência ou ausência entre
essas etapas pode levar ao insucesso da conjunção carnal.
Homem Mulher
Excitação Excitação
Ereção Apresentação e lubrificação
Penetração Recepção
Movimento Ereção
Orgasmo Movimento
Ejaculação Orgasmo
Relaxamento Relaxamento
6. SEXO JURÍDICO
Sexo jurídico ê aquele constante do registro civil, normalmente
baseado em declaração dos pais e testemunhas, podendo ocorrer erros
provocados dolosamente ou mesmo em decorrência da presença de
estados intersexuais, como o pseudo-hermafroditismo, por exemplo.
199
7. DISTÚRBIOS DO INSTINTO SEXUAL
satiríase
( ninfomaiiia ou
uteromama
quantidade
lubricidade senil
j anafrodisía
diminuição 1 frigidez
erotomania
auto-erotismo ou aloerotismo
erotografia ou erotografomania
exibicionismo
narcisismo
mixoscopia ou voyeurismo
fetichismo
desvios do gerontofilia ou crono-inversão
instinto cromo-inversão
etno-inversão
topo-inversão
troca de casais
onanismo
edipismo
Distúrbios do pedofília e hebefilia
instinto sexual pigmalionismo
frotteuiismo
qualidade
pluralismo ou triolismo
vampirismo
riparoftlia
urolagnia
coprofiüa
aberrações coprolalia
sexuais bestialismo ou zoolagnia
necrofiüa
sadismo
masoquismo
sadomasoquismo
flagelatismo ou flagelação
200
Não há um consenso entre os autores a respeito de quais sejam
as aberrações e quais os desvios do instinto sexual. O quadro acima
mostra algumas das posições mais comuns, com a ressalva no senti
do de que o homossexualismo é quase sempre apontado como uma
aberração sexual, não obstante exista uma tendência atual no sentido
de considerar que a orientação sexual, por si só, não deve ser vista
como um transtorno (CID-10, F 66 — nota ao tópico dos transtornos
psicológicos e comportamentais associados ao desenvolvimento se
xual e à sua orientação).
De obsèrvar, ainda, que a classificação apresentada e as nomen
claturas utilizadas são arcaicas. O DSM — IV, da Associação Psi
quiátrica Americana, apresenta como parafilias (distúrbios psíqui
cos que se caracterizam pela preferência ou obsessão por práticas
sexuais socialmente não aceitas) apenas exibicionismo, fetichismo,
frotteurismo, pedofilia, masoquismo, sadismo e voyeurismo, colo
cando todas as demais como parafilias sem outra especificação.
Em razão de ser citada por toda a doutrina existente, utilizare
mos a classificação tradicional, mais ampla.
7.1. Erotismo
O erotismo é o aumento exagerado do apetite sexual, caracteri
zado pela satiríase no homem e pela ninfomania ou uteromania na
mulher. No satirismo há ereção e ejaculação por diversas vezes. Não
deve ser confundido com o priapismo, que é uma ereção patológica
que não desemboca no prazer sexual. Ao contrário, o priapismo é
doloroso e funda-se quase sempre em causas psíquicas.
Não deve ser confundido também com o dom-juanismo, que é a
tendência a proceder de maneira sedutora e libertina. Uma preocupa
ção excessiva do sexo masculino com a conquista amorosa que o leva
a ensejar relacionamentos inconsistentes.
201
Como bem salienta Hélio Gomes (2003, p. 465), a importância;
da lubricidade senil vem do fato de poder conduzir os idosos, que
outrora mantiveram uma vida sexual saudável, à prática de atos libi
dinosos, atentados ao pudor, tomando-os, da mesma forma, presa
fácil de extorsões e ataques de prodigalidade.
7.3. Anafrodisia
É a diminuição do instinto sexual do homem, levando-o ao qua
se total desinteresse pelo sexo oposto. Normalmente vem associado
a alterações glandulares ou psicológicas.
7.4. Frigidez
É a diminuição do instinto sexual na mulher, freqüentemente
associada a desequilíbrios emocionais ou glandulares ou ainda como
decorrência do vaginismo, Nos casos mais extremados pode levar à
androfobia, apándria ou misandria, termos que designam o horror
ao sexo masculino.
7.5. Erotomania
Na erotomania não há o desejo carnal. Ao contrário, o erotômano
perde-se em uma espécie de amor platônico bastante profundo que
preenche integralmente sua vida e por vezes pode levá-lo ao ridículo.
Os erotômanos são quase sempre virgens e castos.
7.9. Narcisismo
Mais comum nas mulheres, o narcisismo nada mais é que o
culto exagerado do próprio corpo. Alguns autores afirmam que o
narcisismo nas mulheres é constante e normal, desde que não impor
te em aversão ao ato sexual.
Uma forma de narcisismo masculino é atualmente denominada
metrossexualidade. O termo metrossexual, cunhado em 2003, é utili
zado para definir o homem urbano de grande senso estético e que
gasta boa parcela de seu tempo e dinheiro (mais de 30%) com sua
aparência e estilo de vida.
7.11. Fetichismo
Excitação anormal e predileção por determinadas partes do cor
po do parceiro ou ainda por objetos e pertences da pessoa amada,
como suas peças íntimas.
7.13. Cromo-inversão
Atração sexual por pessoas de cor diferente. Não se tomando uma
obsessão, não pode sequer ser considerada desvio da sexualidade.
______ __ 203
7.14. Etno-inversão
Trata-se de uma variedade de cromo-inversão em que a pessoa
sente atração sexual exacerbada por determinadas raças. Também não
tem grande interesse médico-legal, salvo na forma obsessiva.
7.15. Topo-inversão
Prazer sexual pela prática de coito ectópico ou atos eróticos di
versos da conjunção carnal, como sexo anal, oral, praticado entre as
coxas, dedos dos pés, mamas etc.
Dentre as várias modalidades de sexo ectópico, são considera
dos normais, como jogos sexuais que antecedem ao coito, afellatio
in ore e o cunnilingus.
7.17. Onanismo
Incorretamente derivado do chamado “coito solitário de Onan”,
personagem bíblico que, na verdade; para não ofender os costumes
hebraicos, praticava o coito interrompido com Tamar, a viúva de seu
irmão. O onanismo nada mais é que a masturbação.
A masturbação pode ser considerada normal na puberdade ou
mesmo quando praticada pelo casal (heteromasturbação), desde que
não venha a substituir ou representar aversão ao coito.
Estudos recentes apontam a masturbação, mesmo na idade adulta,
como preventiva dos tumores de próstata, por aliviar a glândula de
secreções cujo acúmulo seria fator predisponente. Segundo o pesqui
sador Graham Giles, do Cancer Council Victoria, era Melboume,
um homem na faixa dos 20 anos, ejaculando mais de cinco vezes por
semana, diminuiria em três a possibilidade de desenvolver tumores
malignos na próstata (Douglas Fox, Can masturbating each day keep
the doctor away? New Scientist, 2003, p. 15).
7.18. Edipismo
Tendência ao incesto, à prática de relações sexuais com paren
tes muito próximos. São relativamente comuns as relações de pais
com filhos e entre irmãos.
7.20. Pigmalionismo
Excitação por estátuas. Alguns autores descrevem o pigmalio
nismo como sendo uma modalidade rara e menos severa de necrofilia
(Croce, 1998, p. 593).
O termo deriva do mito de Pigmalião, escultor da ilha de Chipre
que se apaixonou perdidamente pela estátua de mulher que esculpira.
Desesperado, pediu a Afrodite que encontrasse uma mulher seme
lhante. A Deusa, sensível aos apelos, deu vida à própria estátua, nas
cendo Galatéia, que se tomou esposa de Pigmalião.
7.21. “Frotteurismo”
Distúrbio do comportamento sexual caracterizado pela necessi
dade de tocar ou esfregar-se em outra pessoa. A prática ocorre geral
mente em locais públicos ou de grande concentração de pessoas, em
205
que pode passar despercebida. É mais freqüente entre os 15 e os 25
anos de idade.
7.23. Vampirismo
Prazer sexual obtido pela ingestão do sangue do parceiro. Mui
tos homens têm predileção por praticar sexo oral com mulheres du
rante o período menstruai, exatamente porque atingem o êxtase se
xual ao ingerir o sangue da companheira.
7.24. Riparofilia
Atração sexual por pessoas com péssimos hábitos de higiene,
de baixa condição social. Há homens, por exemplo, que manifestam
predileção por mulheres no período menstruai (ver vampirismo).
7.25. Urolagnia
Prazer sexual em contemplar ó parceiro no ato da micção ou em
apenas ouvir o barulho da urina caindo no vaso sanitário. Delton Croce
acrescenta que a “associação de idéias sexuais com água, incluindo
urina e micção, é denominada de ondinismo”, termo derivado de
Ondina, ninfa do amor na mitologia nórdica que vive nas águas.
7.26. Coprofilia
\
7.27. Coprolalia
Prazer sexual ligado a palavras de baixo calão. Algumas pes
soas, para atingir o prazer sexual, precisam que o parceiro antes ou
durante o ato utilize expressões chulas, típicas de um vocabulário
bastante baixo.
7.29. Necrofilia
Trata-se de um dos mais sérios distúrbios sexuais, manifestado
pela compulsão da prática sexual com cadáveres.
7.30. Sadismo
Caracteriza-se pelo excesso de crueldade e prazer sexual obtido
pelo sofrimento imposto ao parceiro. O termo deriva de Donatien
Alphonse François de Sade (1740-1814), o “Marquês de Sade”, au
tor francês cujas obras, ainda hoje consideradas por alguns como
obscenas, descrevem toda a sorte de desvios sexuais ligados à humi
lhação e ao tormento do parceiro.
7.31. Masoquismo
O termo deriva das obras de Leopold von Sacher-Masoch (1835-
1895), que descrevem variadas fantasias eróticas ligadas à dor e ao
sofrimento. O masoquismo representa, assim, o prazer sexual obtido
pelo sofrimento físico ou moral.
7.32. Sadomasoquismo
Similar às formas anteriores, o sadomasoquismo conjuga em
um único indivíduo a satisfação sexual por provocar no parceiro e
também experimentar a dor.
207
7.34. Homossexualismo
A origem da homossexualidade, tanto masculina como femini
na, é variável. Para alguns autores, é educacional, para outros,
psicogênica ou ainda hormonal. De qualquer modo, todos concor
dam que o homossexualismo é uma severa alteração da personalida
de normal, trazendo conseqüências irreparáveis quer de natureza fí
sica, quer psicológica.
É preciso diferenciar, entretanto, o homossexual do intersexual,
do transexual e do travesti.
No intersexualismo o indívíduo, por alterações geralmente de
origem genética ou hormonal, não tem sexo definido. Apresenta a
genitália externa ou interna indefinida e é comumente estéril.
O transexualismo é uma alteração psicológica bastante grave
que conduz o indivíduo (geralmente homem) a querer pertencer ao
sexo oposto. Com freqüência o transexual adota os trajes do outro
sexo e tudo faz para sentir-se como tal, chegando inclusive à transfor
mação sexual cirúrgica. O transexual é um inconformado com o seu
estado sexual e não admite ser homossexual.
No travestismo o invertido sente prazer em utilizar as vestes do
sexo oposto e tem forte tendência ao homossexualismo. Ao contrário
do transexual, o travesti tem perfeita noção do sexo fenotípico a que
pertence e não deseja a mudança.
208
Na mulher, o início da vida sexual adulta começa ao redor dos 8
anos de idade com o aumento da produção de gonadotrofinas e o
evento da primeira menstruação (menarca), entre 11 e 15 anos.
Ao redor dos 45 e 50 anos os ciclos vão-se tomando irregulares
(climatério feminino) para cessar por completo em tomo dos 60 anos
de idade.
Assim como no homem, o aumento dos estrogênios durante a
puberdade é responsável pelo desenvolvimento dos caracteres sexuais
primários (aumento dos genitais e mamas etc.) e secundários (dis
tribuição da gordura corpórea, de pêlos etc.).
O gráfico mostra as taxas de testosterona e estrogênio nas dife
rentes idades (Guyton, 1973, p. 908 e 924).
Taxa de secreção de testosterona em diferentes fcJa- Secreção de estrogênios durante a vida sexual
des, medida pelas concentrações de androsterona
j i d plasma
209
0 4 14 28 4 14 za
Dias do ciclo menstruai
8.2. Gravidez
\
210
A gestação humana normal dura, em média, 280 dias ou 40 se
manas. Para que haja sobrevivência do feto, sem cuidados especiais,
é preciso que dure um mínimo de 196 dias ou um máximo de 294,
inexistindo observações de nascidos depois de 300 dias do coito fe-
cundante (Bonnet, 1993, p. 116).
Tomando por fundamento os dados biológicos, o Código Civil
(Lei n. 10.406, de 10-1-2002) estabeleceu como causa suspensiva do
m atrim ônio, para a mulher, o prazo de 10 meses, contados do dia em
que ocorreu a viuvez ou desfez-se a sociedade conjugal (CC, art.
1.523,11).
Quanto à paternidade, presumem-se concebidos na constância
do casamento os filhos “nascidos cento e oitenta dias, pelo menos,
depois de estabelecida a convivência conjugal” (CC, art. 1.597,1) e
os filhos “nascidos nos trezentos dias subseqüentes à dissolução da
sociedade conjugal, por morte, separação judicial, nulidade e anula
ção do casamento” (art. 1.597, II, do CC).
Dessa forma, em relação à gestação, o prazo legal mínimo é de
180 e o máximo de 300 dias.
cessação da menstruação
modificações nas mamas
presença de secreção láctea
surgimento de manchas no rosto (más
cara gravídica)
sinais de
Principais aumento de volume do ventre
probabilidade
métodos (mais precoces)
para sinal de Klüge
clínico
diagnóstico sinal de Osiander
da alterações sinal de Puzos
na genitália sinal de Jacquemien
gestação
sinal de Budin
211
ultra-sonografia pélvica
radiografia (cm desuso)
instrumental
Principais ressonância magnética
métodos laparoscopia— para os casos de gravidez ectópica
para
diagnóstico testes químicos
da testes biológicos — usam animais de laboratório
gestação (interesse histórico)
testes imunológicos
estudo das alterações celulares da mucosa vaginal
8.4. Nascimento
O parto corresponde ao conjunto de fenômenos mecânicos e
fisiológicos que levam à expulsão do feto com vida e seus anexos do
corpo da mãe. Inicia-se com o rompimento da bolsa e finda com a
expulsão da placenta (dequitação). Pode ser a termo, se finda a ges
tação, ou prematuro, se ela foi antecipada; natural ou cirúrgico (ce
sariana); em vida ou post mortem.
213
Por outro lado, é sempre possível que estados mentais patológi
cos preexistentes sejam agravados pelo parto e, com isso, levem à
prática do infanticídio. Tem-se demonstrado que este ocorre mais
nesses casos, em que a patologia existe, mas é revelada somente em
decorrência do parto.
De qualquer maneira o perito deverá observar:
a) a recenticidade do parto;
b) se o parto transcorreu de form a a provocar sofrimento
incomum na parturiente;
c) se a parturiente recorda-se do ocorrido;
d) se a parturiente apresenta histórico de psicopatia anterior;
e) se existe comprovação de que, em razão do parto, surgiu al
guma perturbação mental capaz de levá-la ao crime.
9. PERÍCIA S RELACIONADAS
9.1. Sedução
Nota im portante: A Lei n. 11.106, de 28 de março de 2005, em
seu art. 52, revogou expressamente o art. 217 do Código Penal. Sendo
assim, não mais deverá ser realizada perícia por sedução. Mantive
mos, entretanto, as considerações a respeito da integridade do hímen
por ser de interesse médico-legal em outras perícias."
O hímen é uma membrana mucosa, colocada entre a vulva e a
vagina, encontrada nos primatas, nos eqüídeos e em alguns outros
mamíferos, estando ausente na maioria das espécies animais.
Pode ser pequeno, limitando-se a uma orla bastante estreita, ou
obliterar toda a luz vaginal. Geralmehte possui um ou mais orifícios
por onde sai o fluxo menstruai, mas pode apresentar-se impeifurado.
Afrânio Peixoto classifica, os him ens em com issurados,
acomissurados e atípicos, conforme apresentem comissuras ou séptos
dividindo o orifício himenal (Sexologia forense, 1934, p. 70).
Oscar Freire baseia sua classificação na forma e número dos
orifícios e divide-os em himens com orifício, himens sem orifício e
atípicos (apud França, 1998, p. 182).
Delton Croce (1998, p. 494) classifica os himens segundo o
quadro a seguir:
ausentes
imperfurados
resistentes
complacentes semilunares
Himens perfurados anulares
não complacentes ou rompíveis
septados
labiados
atípicos f, , , f pendentes
, J. fenestrados com apendice -i „
múltiplos 1 salientes
215
A cícatrização é rápida e ocorre em tomo de 21 dias, razão pela
qual a perícia deve ser realizada o mais rápido possível.
Jmperfurado Compíacenie
216
Na posse sexual mediante fraude não há o elemento violência, e
a perícia médica será voltada quase exclusivamente para a compro
vação da cópula.
Importante lembrar que a Lei n. 11.106, de 28 de março de 2005,
alterou a redação do art. 215 do Código Penal para suprimir o ele
mento normativo relativo à honestidade da mulher no crime de posse
sexual mediante fraude. Agora, qualquer mulher pode, em tese, ser
vítima do crime em questão.
217
coito anal, a presença de esperma poderá fornecer elemento de certe
za ao perito médico.
Importante lembrar que a Lei n. 11.106, de 28 de março de 2005,
alterou a redação do art. 216 do Código Penal, substituindo a expres
são “mulher honesta” pelo vocábulo “alguém”. Assim sendo, agora
tanto o homem quanto a mulher, honesta ou não, podem ser sujeitos
passivos do crime em apreço.
9.4. Aborto
Abortamento, segundo Bonnet (1993, p. 1138), “é a morte do
produto da concepção em qualquer momento da gravidez”. Para
Tardieu consiste na “expulsão prematura e violentamente provocada
do produto da concepção independentemente de todas as circunstân
cias de idade, viabilidade e mesmo de formação regular” (apud Fran
ça, 1998, p. 223).
Alguns autòres costumam diferenciar os termos abortamento e
aborto, atribuindo ao primeiro o significado do ato de abortar e ao
segundo o produto do abortamento. Tal separação, entretanto, não é
técnica, sendo a palavra aborto também utilizada para designar o ato
de abortar.
O aborto doloso é repelido por nosso ordenamento jurídico-pe-
nal, excluindo-se algumas situações em que é legal e, portanto, per
mitido (art. 128 do CP).
218
c) que a interrupção da gestação faça cessar o risco da gestan
te; e
d) que a interrupção da gravidez seja o único meio de salvar a
vida da gestante.
Apenas como cautela, recomenda-se que o médico confirme sua
decisão com a opinião de dois outros colegas.
Recentemente, em polêmica decisão, o Supremo Tribunal Fe
deral, por liminar concedida pelo Ministro Marco Aurélio Mello,
garantiu a possibilidade de interrupção da gestação de fetos com com
provada anencefalia (que não têm cérebro e chances de sobrevivên
cia). A liminar foi cassada, mas a decisão, que se favorável criará
nova hipótese de aborto legal, ainda está pendente de julgamento
(Médico pode pôr fim à gestação de feto sem cérebro, O Estado de S.
Paulo, 2-7-2004, p. A14).
Aborto sentimental — é o aborto praticado por médico quando
a gestação decorre de estupro.
Muito embora o art. 128, n , do CP fale em estupro, a jurispru
dência tem entendido que o dispositivo é aplicável também quando a
gestação decorre de atentado violento ao pudor (analogia in bonam
partem).
Não existem outras modalidades de aborto legal no Brasil. O
chamado aborto eugênico, eugenético ou eugenésico, que permite a
interrupção da gestação por anomalia fetal, ainda não é admitido por
nossa legislação, embora exista proposta nesse sentido no anteproje
to da nova parte especial do Código Penal.
Dividem-se os meios empregados para a prática do aborto em
medicamentosos (ou tóxicos) e mecânicos.
A perícia no aborto criminoso é bastante difícil e requer al
guns cuidados por parte do perito. São observadas eventuais le
sões no períneo, lesões decorrentes do meio utilizado (muitas ve
zes são encontrados vestígios do próprio meio empregado, como
sondas ou outros instrumentos), lesões uterinas e ainda exames
laboratoriais.
219
No aborto examina-se, também, o feto, muito embora em inú
meras situações não se consiga chegar à mãe, uma vez que o produto
da concepção é atirado em terrenos baldios (vide fotos), rios, ou mes
mo depositado em vasos sanitários.
Na existência de possíveis suspeitas, o exame clínico e even
tualmente uma análise de DNA poderá determinar com segurança a
maternidade.
A foto a seguir mostra os instrumentos cirúrgicos geralmente
encontrados em uma clínica destinada à realização de abortos.
9.5. Infanticídio
O crime de infanticídio vem descrito no art. 123 do Código Penal:
220
CP
Art. 123. Matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o
parto ou logo após.
feto nascente
no produto da concepção para saber
infante nascido
se nasceu com vida
Perícia no infanticídio < recém-nascido
221
Docimasia diafragmática de Abertura da cavidade tóracoabdominal e observa
Ploquet ção do diafragma. Quando não houve respiração o
diafragma mostra-se recolhido, convexo e voltado
para o interior do tórax. Quando já ocorreu a respi
ração ele está mais plano, menos abaulado.
Docimasia óptica ou visual Simples observação visual do pulmão. O que não
de Bouchut respirou tem aparência mais compacta, sólida, e
o que respirou apresenta o desenho alveolar mais
evidente.
D ocim asia tátil de N erio No pulmão que respirou, à palpação sente-se um leve
Rojas crepitar, que é ausente naquele que não respirou.
D ocim asia radiológica de Inspeção radiográfica dos pulmões. Os que res
Bordas piraram mostram-se desenvolvidos, ao passo que
os que não respiraram estão colabados.
Docim asia hidrostática de Consiste na imersão dos pulmões ou de fragmen
Galeno tos deles em uma cuba com água. Se houver
flutuação é porque houve respiração. Esta é a pro
va mais comumente utilizada no dia-a-dia pericial.
D ocim asia histológica de Baseia-se no exame microscópico do pulmão e
Balthazard e Lebrun nas alterações anatomopatológicas que diferen
ciam aquele que respirou do que não respirou.
Docimasia gastrointestinal de Comprovação da existência de ar no trato gastro
Breslau intestinal.
D o cim a sia auricular de Presença de ar na caixa do tímpano.
Wreden-Wendt-Gélé
Docimasia siálica de Souza Pesquisa a presença de saliva no estômago.
Diniz
Docimasia do nervo óptico Baseia-se na mielinizaçâo do nervo óptico, que
de Mirto se inicia cerca de 12 horas após o nascimento.
Docimasia epimicroscópica Baseia-se na análise microscópica de fragmen
pneum oarquitetônica de tos do pulmão pelo ultra-opak.
Hilário Veiga de Carvalho
Docimasia Óptica de Icard Esmagam-se pequenos fragmentos do pulmão do
recém-nascido entre lâmina e lamínula. Ao mi
croscópio, observam-se pequenas bolhas de ar.
D o cim a sia plêurica de Constatação da pressão negativa na cavidade
Placzec pleural do infante que não respirou.
Docimasia pneumo-hepática Baseia-se na comparação entre o volume sangüí
de Puccinotti neo do pulmão e do fígado.
Docimasia hematopneumo- Comparação e análise da hemoglobina do pul
hepática de Severi mão e fígado.
222
Prova hemato-arteriovenosa B aseia-se na comparação entre as taxas de
de França oxiemoglobina do sangue venoso e arterial, em
busca de comprovação da hematose e, por conse
qüência, da respiração.
Docimasia supra-renal fisio Funda-se na análise dos efeitos da adrenalina so
lógica bre a musculatura lisa e cardíaca.
10. AS IM POTENCIAS
A incapacidade em manter uma relação sexual é denominada
impotência coeundi no homem e acopulia na mulher, podendo dar
causa a anulação do casamento.
A impossibilidade de gerar filhos é chamada de impotência
generandi, ou esterilidade masculina, e impotência concipiendi, ou
esterilidade feminina, e não implica causa de anulação do matrimônio.
A doutrina entende que apenas a impotência coeundi e a
acopulia podem constituir erro essencial por ignorância de defeito
físico irremediável passível de anular o casamento (art. 1.550, III,
c/c o art. 1.557, UI, do CC). Note-se que, mesmo nesses casos, o
casamento somente será anulável se o fato era ignorado pelo outro
cônjuge.
impotência generandi —
223
impotência concipiendi — esterilidade feminina
Transtornos da na mulher
reprodução orgânica
acopuha j ps£quica
224
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I
As provas não genéticas são meramente de orientação e, no máxi
mo, servem para direcionar o perito quando da realização de seu trabalho.
As provas genéticas pré-mendelianas têm interesse apenas his
tórico. Com o adverte Ayush M orad Am ar, “a confrontação
fisionômica, o retrato falado, o estudo das impressões digitais, da cor
da pele, das variações pigmentares, os exames mais especializados,
como o craniom étrico, o cranioscópico, o odontom étrico, o
prosoposcópico etc., quase nada oferecem de valor prático: as Leis
de Mendel evidenciam a possibilidade de se encontrarem, na prática,
indivíduos nada semelhantes aos seus ascendentes” (Investigação de
paternidade — aspectos médico-legais, 1987, p. 17).
Dessa forma, atualmente, mostram-se de valor probatório, no
campo da investigação de paternidade, apenas as provas mendelianas,
não sangüíneas e, principalmente, as sangüíneas.
226
Daltonismo Também é uma doença hereditária ligada ao sexo
(cromossomo X), caracterizada pela incapacida
de de distinguir cores. Filhos de pais genetica
mente sadios não podem ser daltônicos.
Orientação dos cabelos A orientação no redemoinho dos cabelos é deter
minada por um fator dominante (orientação
dextrogira) e outro recessivo (levogira).
Cor da pele Acredita-se que cinco pares de genes estejam
envolvidos na determinação da tonalidade da pele
humana, que vai desde o preto até o branco puro.
Os filhos devem ter sempre uma tonalidade de
pele intermediária à dos pais. A presença de um
filho mais claro ou mais escuro levanta suspeita
sobre a paternidade.
sistema ABO
fatores M e N
fatores Rh e rh
228
Grupo sangüíneo dos pais Filhos possíveis Filhos impossíveis
AXA A eO B e AB
AXB O, A, B e AB nenhum
AXAB A, B e AB O
AXO AeO B e AR
BXB B eO AeAB
BXAB A, B e AB O
BXO B eO AeAB
ABXAB A, B e AB O
ABXO AeB O e AB
OXO O A, B e AB
--------------- 229
11.4. Fatores MN
Descobertos em 1927, por Landsteiner e Levine, os aglu-
tin o g ê n io sM e N levam à formação de três grupos sangüíneos dis4
tintos: í
Grupo sangüíneo Genótipos possíveis
M MM
N NN
MN MN
11.5. Fatores Rh e rh
Em 1939 Philip Levine e R. E. Stetson descreveram a presença
de um antígeno no soro de gestantes à que denominaram Rho ou D.
Em 1940, Landsteiner e Wiener descobriram que glóbulos verme
lhos, provenientes do macaco Rhesus, quando lavados e inoculados
em coelhos, levavam à produção defuma espécie de anticorpos que
reagia com 85% dos indivíduos de raça branca. A esse fator foi dado
o nome d qfator rhesus ou fator Rh, indicando genericamente por Rh
(Rh positivo) os indivíduos reagentes e por rh (Rh negativo) os não
reagentes.
230
Em termos médico-legais a importância do fator Rh está ligada
ao cuidado necessário nas transfusões sangüíneas, podendo eventuais
acidentes caracterizar negligência médica, especialmente em ques
tões relativas à prevenção da eritroblastose fetal (doença hemolítica
do recém-nascido).
No campo da exclusão da paternidade, o fator Rh pode operar
como auxiliar e, mesmo assim, com baixo percentual de eficácia,
uma vez que a análise do fator Rh em combinação com o sistema
ABO pode excluir a paternidade em menos de 30% dos casos
alegados.
231
HLA-A HLA-B HLA-C HLA-D
4 11.8. DNA
nJ A partir de meados da década de 80, com a descoberta, pela
§ equipe de Alec Jeffreys, de regiões variáveis do genoma humano, a
habilidade dos laboratórios periciais em identificar autores de crimes
I a partir de amostras de seus fluidos orgânicos cresceu enormemente.
O DNA (deoxyribonucleic acid) ou ADN (ácido desoxir-
0 ribonucléico), em português, é uma longa molécula, em forma de
a dupla hélice, encarregada da transmissão de informações genéticas
< de todos os seres vivos.
z
Ü A molécula do DNA é formada por duas longas fitas de susten
Q tação, compostas por uma pentose (um açúcar — desoxirribose) e
LU
um grupo fosfato (P 0 4), qué se sucedem alternadamente. Unindo as
fitas de sustentação, temos quatro bases nitrogenadas, duas purinas
(adenina e citosina) e duas pirimidinas (timina e guanina), que, li
gando-se entre si, dão a conformação de uma escada em espiral com
cerca de três bilhões de degraus.
Apenas uma pequena porção da molécula de DNA é responsá
vel pela transmissão de nossas características genéticas. A maior par
te, entretanto, não tem função conhecida (junk DNA).
Nessa ampla faixa de DNA de função indefinida existem pe
quenas regiões, denominadas microssatélites ou minissatélites, for
madas por pequenas seqüências de dois a seis pares de bases
233
nitrogenadas (nucleotídeos), que se repetem inúmeras vezes do co
meço ao fim (short tandem repeat — STR).
Essas regiões apresentam um polimorfismo bastante acentua
do, permitindo sua aplicação nos métodos de identificação com utili
dade na área forense.
A análise começa com a extração do DNA da amostra. Como
geralmente a quantidade de DNA obtida é muito pequena, é preciso
multiplicar a amostra com um método conhecido como reação em
cadeia de polimerase (polymerase chain reaction) ou PCR.
Uma vez multiplicada a amostra, as cópias são submetidas à
eletroforese em gel de agarose e separam-se de acordo com os tama
nhos. Para tornar os fragmentos visíveis usam-se marcadores radioa
tivos, que sensibilizam uma chapa radiográfica, produzindo faixas
paralelas horizontais, similares a um código de barras, correspon
dentes às frações identificadas pelas sondas.
No campo da identificação criminal, compara-se a amostra reti
rada do local do crime com aquela obtida da pessoa suspeita. Se as
bandas forem correspondentes, a identificação é positiva.
Para a investigação de paternidade a questão é um pouco mais
complexa.
É sabido que o filho recebe metade de seu DNA da mãe e meta
de do pai, visto que os garaetas (óvulo e espermatozóide) são células
haplóides (possuem a metade do número de cromossomos das de
mais células do organismo).
Ao colocarem-se, lado a lado, as amostras de mãe, pretenso pai
e filho, cada fração existente no DNA do filho deve ser proveniente
do DNA da mãe ou do pai. Caso exista alguma faixa sem correspon
dência, o exame terá excluído a paternidade.
Para a afirmação da paternidade, quando todas as. frações são
coincidentes, calcula-se o percentual de cada fração na população,
estabelecendo-se um cálculo estatístico de probabilidade.
No quadro abaixo temos, à direita, um quadro de probabilida
des, ou seja, todas as frações identificadas no filho vieram do pai ou
da mãe. No quadro à esquerda, temos algumas frações que não
encontram correspondência nem na mãe, nem no indigitado pai
234
(setas pretas), o que leva à conclusão de que este é outra pessoa que
não o investigado.
235
C a p ít u l o 7
TANATOLOGIA
A tanatologia médico-legal ou forense é o ramo da medicina
legal que estuda o morto e a morte, assim como os fenômenos dela
decorrentes.
1. CONCEITO DE M O RTE
Ainda que para nós, seres humanos, a morte se apresente como
um evento único, determinado, que ocorre em um instante preciso,
na verdade ela engloba uma série de transformações sucessivas que
se prolongam no tempo. A morte é um processo dinâmico e prolon
gado.
Para Simonin, a morte constitui um processo que se inicia nos
centros vitais cerebrais ou cardíacos e se propaga, progressivamente,
a todos os órgãos e tecidos, ocorrendo inicialmente a morte funcional
e depois a morte tissular (apud, Zarzuela. O perito e as mortes violen
tas, Revista da Faculdade de Direito das Faculdades Metropolitanas
Unidas, 1991, p. 222).
O conceito mais simples de morte (morte clínica) e que não
mais corresponde à realidade é o de “cessação total e permanente das
funções vitais”, isto porque, no grau de desenvolvimento atual da
medicina, é possível, em várias situações, reverter o quadro e trazer
de novo à atividade um organismo cujas funções vitais haviam cessado.
Atualmente temos dois conceitos de morte mais precisos: a morte
circulatória, que corresponde à parada cardíaca irreversível, e a mor
te cerebral, definida como a morte encefálica geral e não apenas da
porção cortical, ainda que o coração esteja em atividade. O conceito
de morte cerebral passou a ter grande importância com o advento
dos transplantes de órgãos e tecidos.
O Comitê de Ressuscitação e Transplante de Órgãos da Socie
dade Alemã de Cirurgia, em trabalho de 1968, concluiu que há três
236
condições para determinar-se a realidade da morte (apud Zarzuela,
1991, p. 223):
“A. O cérebro está morto quando:
a) observam-se os sinais clássicos da morte ou
b) a depressão circulatória tenha provocado uma parada respira
tória ou cardíaca que não responde a tratamento, no final de uma
doença incurável e progressiva ou no curso de uma perda gradual das
funções vitais;
B. a morte cerebral pode produzir-se antes que cessem os
batimentos cardíacos (traumatismos cerebrais); considerar-se-á que
o cérebro está morto depois de 12 horas de inconsciência com falta
de respiração espontânea, midrxase bilateral e EEG isoelétrico, ou
quando o angiograma revela cessação da circulação intracraniana
durante 30 minutos;
C. pode ocorrer que o coração pare e o sistem a nervoso cen
tral esteja intacto ou com possibilidade de se recuperar. Convém
então iniciar a ressuscitação; se os batimentos cardíacos não
reaparecerem, pode-se dar por m orto o paciente; porém, se rea
parecerem, inclusive sem se restabelecer a consciência ou a res
piração espontâneas, deve-se seguir, aplicando as normas usuais
de assistência intensiva, até que fique demonstrada a morte ce
rebral”.
Fala-se ainda em morte aparente, anatômica, histológica, rela
tiva, intermédia e real.
A morte aparente é o estado em que na verdade o indivíduo
apenas parece morto em razão de baixa atividade metabólica e cir
culatória. Há inconsciência, relaxamento muscular, respiração dimi
nuída ou apnéia (falta de respiração). Para evitar o sepultamento aci
dental nessas condições, a lei exige o decurso de 24 horas antes da
inumação.
Morte anatômica é a parada total e permanente de todas as fun
ções orgânicas.
Morte histológica é a morte das células que compõem os vários
tecidos e órgãos. Como a morte ê um fenômeno que se protrai no
------- 237
tempo, é perfeitamente normal encontrarmos células vivas no cadá
ver mesmo dias após a inumação.
M orte relativa é o estado de parada cardíaca reversível, em
que o organismo ainda não ultrapassou o “ponto de não retor
no” , podendo, se subm etido à m assagem cardíaca oportuna,
retornar à vida.
Morte intermediária ou intermédia é a cessação progressiva das
atividades orgânicas sem que seja possível a recuperação da vida.
Morte real ou absoluta é a morte na acepção técnica da palavra,
a cessação de toda atividade biológica do indivíduo.
Na falta de aparelhagem especial para a determinação do
“momento da morte”, utiliza-se o conceito clássico de que ela
ocorre com a parada irreversível da respiração e circulação (morte
clínica).
2. TANATOGNOSE E CRONOTANATOGNOSE
Denominam-se tanatognose à parte da tanatologia forense que
estuda a realidade da morte e cronotanatognose à que se ocupa da
determinação do tempo em que ela ocorreu. Tanto uma como a outra
baseiam-se nos chamados fenômenos cadavéricos.
238
perda da consciência
imobilidade
relaxamento muscular
relaxamento dos esfíncteres
imediatos
parada cardíaca
ausência de pulso
parada respiratória
abióticos
insensibilidade
resfriamento do corpo
Fenômenos rigidez cadavérica
cadavéricos consecutivos hipóstases
livores cadavéricos
desidratação
autólise
{ putrefação
transformativos maceração
mumificação
saponificação
conservadores
] calcificação
corificação
l
2.2. F enôm enos cadavéricos abióticos im ediatos
Os fenômenos cadavéricos abióticos imediatos não são si
nais de certeza em que pode basear-se o médico para afirmar a
ocorrência de morte. Há várias manobras preconizadas por inú
meros autores para, nessa fase, obter-se o diagnóstico de morte
recente ou im ediata. As m ais com uns são a auscultação, a
eletrocardiografia e a prova de fluoresceína de Icard (injeção de
certa quantidade de fluoresceína por veia endovenosa. Se ainda
houver vida, após alguns minutos a pele e as mucosas adquirem
coloração amarelada).
Ainda, como fenômeno abiótico imediato, temos a fácies
hipocrática, face hipocrática, ou máscara da morte, para indicar
o aspecto do rosto e a expressão fisionômica do cadáver, em de
corrência da perda do tônus muscular, descrita como “fronte
239
enrugada e árida, olhos fundos, nariz afilado com orla escura, têm
poras deprimidas, vazias e enrugadas, orelhas repuxadas para cima,
lábios caídos, maçãs deprimidas, queixo enrugado e seco, pele
seca e lívida, cílios e pêlos do nariz e das orelhas semeados por
poeira brancacenta, semblante carregado e desconhecido” (Fran
ça, 1998, p. 307).
240
Temperatura retalI ] _ ^TemperaturaretalncA
Tempo '
média = 37 °C J “ tmomento do exame j
1,5
aproximado da
morte em horasj
241
Há, finalmente, uma espécie de rigidez que pode ser observada
ainda em vida, nos casos de intoxicação por estricnina, nos vitima
dos por tétano ou ainda quando a morte decorre de grandes lesões do
sistema nervoso central.
242
Na raça negra os livores cutâneos são dificilmente observados
à vista desarmada, sendo constatados somente com o uso de
colorímetro. Em recém-nascidos as hipóstases cutâneas costumam
ser muito evidentes, o que, freqüentemente, faz com que leigos, ao
visualizar o corpo da criança, pensem, que ela sofreu agressões por
parte dos genitores.
2.3.4. Desidratação
A evaporação da água que integra o organismo vivo, com o pas
sar do tempo, leva a uma perda gradativa de pesô, que varia de indi
víduo para indivíduo, e é mais acentuada nos recém-nascidos, osci
lando de 8 g a 18 g por quilo de peso ao dia.
Observa-se, também, em decorrência da desidratação, o
pergaminhamento da pele, a dessecação das mucos as e uma diminui
ção do tônus do globo ocular. Na esclerótica surge uma mancha
enegrecida denominada livor esclerorotinae nigrencens ou sinal de
Sommer & Lacher.
2.4. Fenômenos cadavéricos transform ativos
autólise
Fenômenos transformativos
Í putrefação
maceração
mumificação
saponifícaçao
conservadores calcificação
corificação
244
2.4.2. Putrefação (transformativo destrutivo)
A putrefação começa logo após a autólise pela ação de germes
aeróbicos e anaeróbicos. Inicia-se, geralmente, no intestino grosso,
dando origem à chamada mancha verde abdominal, e espalha-se pelo
organismo.
Embora exista uma variação muito grande na marcha da putre
fação, dependendo do local em que o cadáver está colocado ou mes
mo da causa mortis, a putrefação obedece 4 fases:
fase da coloração
Putrefação fase gasosa
fase coliquatíva
esqueletização
245
Protusão
Circulação póstuma da língua
de Brouardel
Agigantamento
Flictenas
putrefativoa
Inchaço dos
genitais
Mancha verde
abdominal
246
As fotos mostram corpos mis fíiscs de csqueletização c gasosaf
respectivamente.
247
2.4.5. M u m ific a ç ã o (transformativo conservador)
A mumificação é um processo
conservativo que pode ser natural ou
artificial.
N a m um ificação artificial,
os corpos são subm etidos a pro
c e sso s e sp e c ia is d e stin a d o s à
conservação do corpo, como, por
exem plo, as m úm ias dos faraós
egípcios.
O processo n atu ral ocorre
quando as condições clim áticas
favorecem uma rápida desidrata
ção do corpo, im pedindo a ação
das bactérias que levam à putre
fação.
248
Preservado o corpo da decomposição, a pele assume a colora
ção e o aspecto de couro curtido. As vísceras e a musculatura perma
necem conservadas, mas amolecidas (França, 1998, p. 314).
3. FAUNA CADAVÉRICA
249
Ordem Gênero Espécies encontradas Época
Sarcophaga chrysostoma
Sarcophaga georgina
Sarcophaga Sarcophaga tesselata
Diptera Synthesiomyia Synthesiomyia brasiliana
(moscas e Chrysomyia Chrysomyia macellaria
mosquitos) Lucillia Lucillia eximia
Ophyra Lucillia pútrida
Lucillia segmentaria
Ophyra senescens
Hister Hister sp
Hexapnda Saprinus Saprinus azureus
(insetos) Dermestes Dermestes sp
Coleóptera
Necrobia Necrobia ruficollis
(escaravelhos)
Silpha Necrobia rufipes
Deltochium Silpha cayannensis
Deltochium brasiliensis
Lepdoptera
Aglossa Aglossa cuprealis
(mariposas)
Hymenoptera
(insetos com asas Camponotus Camponotus abdominales
membranosas)
Arachnoidea
(aranhas, Grande quantidade de ácaros similares
Acari
ácaros e àqueles encontrados nos corpos insepultos
escorpiões)
251
3 .3 . Fauna aquática
Os corpos encontrados imersos em água doce ou salgada costu
mam apresentar inúmeras lesões produzidas por mamíferos (lontras
e eventualmente ratos), aves (urubus e gaivotas), peixes (diversas es
pécies) e crustáceos (lagostas, caranguejos e siris).
cc
Art, 8a S e dois oa mais indivíduos falecerem na mesma ocasião, não se podendo
averiguar se algum dos comorientes precedeu aos outros, presumir-se-ão simul
taneamente mortos.
252
A s mortes flagrantemente violentas também são de fácil diag
nóstico. A dificuldade repousa nos casos em que a violência não é
evidente (mortes suspeitas) e, por tal, reclamam exame mais acurado.
Canger Rodrigues propõe vim quadro sinótico com as possíveis
ocorrências (Morte súbita e morte suspeita em medicina legal, Ciên
cia Penal 1 , 1973, p. 9-53):
253
importantes ocorrências de morte súbita é a cha
U m a d a s m a is
mada morte reflexa por inibição vagai (reflexo de Hering), em que o
óbito ocorre de forma absolutamente inesperada, em decorrência de
inibição cardiorrespiratória, sem que se possa encontrar uma causa
determinante convincente.
Sabe-se que existem algumas pessoas com maior predisposição
ao fenômeno por exacerbação dos reflexos inibidores e que é preciso
alguma excitação externa, de natureza física, química ou psíquica, agin
do sobre os centros nervosos através de algumas áreas do corpo deno
minadas zonas reflexógenas ou zonas-gatilho (Rodrigues, 1973, p. 33).
Para que se considere a morte com tendo possível causa inibitó-
ria, são necessárias três condições:
a) morte súbita e inesperada de pessoa sadia, geralmente por
parada cardiorrespiratória;
b) traumatismo ou irritação periférica, de pequena monta, sobre
certas partes do corpo; e
c) ausência de lesões capazes de justificar o óbito.
O quadro a seguir mostra as principais zonas reflexógenas:
Vias aéreas superiores:
• inalação de gases irritantes
• penetração súbita de liquido nas narinas
Cavidade torácica:
• excitação da pleura e corpos aérticos.
Cavidade abdominal:
•tração de atças intestinais sob anestesia superficial
• excitação do peritânio nas mesmas condições
Genitais:
• compressão ou golpes nos testículos:
• lavagens vaginais.
• manobras aborlivas
254 -------
A morte por inibição é quase sempre acidental (quedas, mano
bras cirúrgicas), podendo, eventualmente, ter origem criminosa (es
trangulamento, esganadura, golpes de artes marciais etc.).
255
6. O EXAME M ÉDICO-LEGAL
A técnica tanatológica compreende várias fases, que vão des
de a análise do local onde ocorreu o óbito até os exames
laboratoriais complementares, com o objetivo de determinar a
causa mortis e, se possível, contribuir para o esclarecimento da
natureza jurídica do evento (morte natural, acidental, suicida ou
criminosa).
H ilário Veiga de Carvalho descreve as fases do exame
tanatológico da forma como segue:
história do fato
história da vítima
pennecroscopia < história do suposto agressor
exame do local (peritos
criminais)
Exame
Diagnóstico
tanatológico
necroscopia completa
histológicos
exames complementares químicos
outros
6.1. 1. Técnica
Na necropsia médico-legal procede-se, inicialmente, a uma mi
nuciosa inspeção externa, em que são analisados sexo, compleição
física, estado de nutrição, presença de cicatrizes e tatuagens, defor
midades, ferimentos externos etc.
256
Durante a inspeção externa, as vestes devem receber especial
atenção, principalmente em relação a manchas, orgânicas ou não, e
soluções de continuidade.
No caso de existirem ferimentos produzidos por projéteis de
arma de fogo, o perito deve verificar se resíduos do disparo chegaram
a depositar-se sobre as peças de vestuário.
Em seguida, passa-se para a inspeção interna, com o exame das
cavidades torácica e abdominal, órgãos do pescoço (laringe, traquéia,
tireóide e esôfago), cavidade vertebral, cavidade craniana e cavida
des acessórias da cabeça (órbitas, fossas nasais, ouvidos e seios fron
tais, maxilares e esfenoidais).
Os diversos sistemas orgânicos são examinados individualmen
te e, sendo necessário, colhidas amostras dos órgãos e fluidos orgâni
cos para exames laboratoriais complementares.
Finalm ente, depois de minucioso exame e coleta de mate
rial, o corpo é recomposto para ser entregue aos familiares e
inumado.
257
Abertura das cavidades
torácica e abdom inal por Retirada do plastrão condroestemal
incisão mento-pubiana para acesso aos órgãos da
cavidade torácica
258
VI Incisão bímastóídea vertical
e rebatlmento do couro cabeludo.
259
C apítulo 8
TOXICOLOGIA FORENSE V
j?
1. CARACTERÍSTICAS GERAIS
Vimos que os tóxicos (ou venenos) podem ser conceituados como
substâncias de qualquer natureza que, uma vez introduzidas no orga
nismo e por ele assimiladas e metabolizadas, podem levar a danos na
saúde física ou psíquica, inclusive à morte, na dependência da dose e
via de administração utilizada.
Drogas tóxicas ou substâncias psicoativas são aquelas “subs
tâncias químicas, naturais ou sintéticas, que têm a capacidade de
agir sobre o sistema nervoso central, com tendência ao tropismo
pelo cérebro que comanda o corpo, alterando a normalidade mental
ou psíquica, desequilibrando a conduta e a personalidade” (Croce,
1998, p. 546).
Os termos toxicomania e toxicofilia definem o hábito do uso
regular de drogas. Segundo o Comitê de Peritos da Organização
Mundial de Saúde, compreendem “um estado de intoxicação crô
nica ou periódica, prejudicial ao indivíduo e nociva à sociedade,
pelo consumo repetido de determinada droga, seja ela natural ou
sintética” .
Atualmente usam-se os termos drogadito e drogadição, lamen
táveis estrangeirismos derivados do inglês drug addict, para desig
nar, respectivamente, o toxicômano e a toxicomania. Note-se que,
desde 1964, a Organização Mundiàl de Saúde já recomendava o uso.
das expressões dependência (dependence) e drogas que induzem de
pendência (dependence producting drugs) em substituição a adição
(addiction) e hábito (habituation).
As toxicofilias têm as seguintes características gerais:
260
a) com pulsão — necessidade invencível de consumo do.
fármaco;
b) tolerância — tendência a aumentar paulatinamente a dosa
gem para a obtenção dos mesmos efeitos;
c) dependência —■física ou psíquica, com tendência ao
desencadeamento de crises de abstinência ante a privação da
droga.
2 . FARMACODEPENDÊNCIA
A farmacodependência ou simplesmente dependência, segun
do a Organização Mundial de Saúde, pode ser definida como “um
estado psíquico e às vezes físico causado pela interação entre um
organismo vivo e um fármaco; caracteriza-se por modificações do
comportamento e outras reações que compreendem sempre um im
pulso irreprimível para tomar o fármaco, em forma contínua ou pe
riódica, afim de experimentar seus efeitos psíquicos e, às vezes, para
evitar o mal-estar produzido pela privação. A dependência pode ser
ou não acompanhada de tolerância. Uma mesma pessoa pode depen
der de um ou mais fármacos”.
É um verdadeiro estado de escravidão da pessoa à droga, po
dendo ser de natureza/zjica ou psíquica.
A dependência psíquica é caracterizada pela compulsão em con
sumir a droga de maneira periódica ou contínua, quer para a obten
ção de prazer, quer para alívio de um mal-estar.
A dependência física é marcada pelo surgimento de transtornos
de natureza física ou pela síndrome de abstinência, quando a droga
não é consumida.
3. CLASSIFICAÇÃO
Drogas, entorpecentes ou psicotrópicos são compostos quími
cos, naturais ou não, que, agindo sobre o cérebro, produzem estados
de excitação, depressão ou alterações variadas no psiquismo.
261
A Lei n. 1 1 .3 4 3 , de 2 3 de agosto de 2006, alterou a tradicional
expressão “substância entorpecente ou que determine dependência
física ou psíquica” pelo termo “drogas” (art. I 2, parágrafo único),
alteração, aliás, que já havia sido introduzida pela revogada Lei n.
10.409, de 11 de janeiro de 2002, mas que não chegou a ser utiliza
da em razão do veto ao Capítulo III, que tratava dos crimes e das
penas.
Lein. 11.343/06
Art. 1“ ...
Parágrafo único. Para fins desta Lei, consideram-se como drogas as substân
cias ou os produtos capazes de causar dependência, assim especificados em lei
ou relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da
União.
263
secobarbital
amobarbital
barbitúricos
hipnossedativos fenobarbital
pentobarbital
azaciclonol
tranqüilizantes
nnorrelaxarites com [
atividade neurossedativa | ciOIidiaZepóxido
pipradrol
Psicanalép ticos
Í metilfenidato
facetoperano
psicotônicos tó b id o ^ s d a i S á ?
monoamwoxidase j feúUm iropiM clraím a
derivados r~ ,
oxazolidíaicos J f? ox‘!zo f _
e canfânicos jeülannno-feml-norcanfano
cafeína
acetato de desoxicorticos-
outros compostos terona
deanol
centrofenoxina
264
álcool
ópio, heroína e morfina
euforizantes <
cocaína
óxido nitroso
mescalina
psicodislépticos
bufotenina
adrenolutina
alucinógenos ou
psilocibina
despersonalizantes
estramônio
maconha
LSD 25 (dietilaniida do ácido lisérgico)
clorprotixeno
Fampsicotrópicos
{ trimeprina
4. PRINCIPAIS DROGAS
Algumas drogas, pela sua importância, merecem rápido destaque.
4.1. Barbitáricos
Barbitúricos são substâncias químicas derivadas da composi
ção sintética entre uréia e ácido malônico (maloniluréia), psicolépticos
de ação depressora sobre o sistema nervoso central, destacando-se,
entre outros: barbital (Veronal), alobarbital (Dial), amobarbital
(Am ital), fe n o b a rb ita l (G ardenal), secobarbital (Seconal),
pentobarbital (Nembutal) e tiopental (Pentotal).
Clinicamente são indicados no tratamento de quadros epilépti
cos, ansiedade e insônia òu como anestésicos de eleição para entubação
e procedimentos cirúrgicos rápidos.
Utilizados nas doses terapêuticas recomendadas e sob supervi
são médica, não costumam causar qualquer problema ao paciente.
Entretanto, usados indiscriminadamente, podem induzir tolerância e
dependência física e psíquica.
As intoxicações agudas são geralmente de origem suicida, e a
dose letal é cerca de vinte vezes superior à habitualmente usada. Os
sintomas incluem sonolência, hipotensão arterial, coma e morte
(Zacharias, 1991, p. 54).
265
-
Nas intoxicações crônicas, toxicomania ba.rbitu.rica, há uuia.
com pleta transformação do viciado, que se tom a apático e passa a
descuidar da aparência e higiene pessoais. Nos casos mais avança
dos, temos incoordenação motora, perda de memória, dificuldade na
fala (disartxià), confusão mental, inconsciência, convulsões e even
tualmente morte.
4.2. Benzodiazepínicos
Os benzodiazepínicos pertencem a um grupo de substâncias uti
lizadas como tranqüilizantes e ansiolíticos e foram introduzidos no
m ercado farm acêutico como uma alternativa mais segura aos
barbituricos. Estão entre os medicamentos mais utilizados no mundo
todo, sendo considerados um problema de saúde pública nos países
mais desenvolvidos.
Como exemplos de medicamentos à base de benzodiazepínicos
poderíamos citar: Aniolax, Bromazepam, Calmociteno, Clorazepam,
Diazepam, Dienpax, Flunitrazepam, Flurazepam, Frontal, Lexotan,
Lorazepam, Lorax, Nitrazepam, Psicosedin, Rohypnol, Somalium,
Valium etc.
Mesmo quando consumidos em doses terapêuticas, a interrup
ção abmpta pode provocar síndrome de abstinência em até 50% das
pessoas tratadas por 6 meses ou mais.
Os efeitos terapêuticos dos benzodiazepínicos incluem indução
do sono, tranquilização e redução da ansiedade (ansiolíticos).
Entre os sintomas provocados pela abstinência poderíamos ci
tar insônia, initação, perda da memória e, muito raramente, alucina
ções. Fisicamente podemos observar sudorese intensa, palpitações,
náuseas e perda do apetite.
Nos Estados Unidos o uso de alguns benzodiazepínicos (como o
Rohypnol) está intimamente ligado a casos de abusos sexuais, porque,
quando diluídos em álcool, esses fámiacos têm seus efeitos potencializados,
tomando a vítima absolutamente indefesa. Por essa razão recebem a deno
minação de date rape drugs (drogas de encontro com o estupro).
4.3. Anfetaminas
As anfetaminas, popularmente conhecidas por bolinha, cristal
266
ou co-piloto, são aminas simpaticomiméticas que pertencem a três
categorias de drogas sintéticas, quimicamente semelhantes: a
anfetamina propriam ente dita (Benzedrine e Bifetam ina), a
dextroanfetamina (Dexamil eDexedrine) e a metanfetamina (Desbutal,
Desoxyn, Methedrine e Obedrin), todas elas com poderosa ação esti
mulante sobre o sistema nervoso central.
Entre os principais efeitos terapêuticos poderíamos citar: au
mento da confiança e do estado de alerta, diminuição do sono e perda
de apetite, este último responsável pelo seu uso generalizado como
tratamento anti-obesidade.
Em razão da resposta estimulante, as anfetaminas começaram a
ser utilizadas por esportistas com o objetivo de incrementar sua capa
cidade física, indo, por vezes, além dos limites de segurança e resis
tência orgânicas. Mais recentemente, pelo seu baixo custo e facilida
de de aquisição, tomaram-se drogas amplamente consumidas em raves
e discotecas (clubber drugs), principalmente nas fonnas de ecstasy
(metileno-droxi-metanfetamina) e Ice (metanfetamina).
O uso prolongado e indiscriminado do fármaco pode levar à
psicose “toxicoanfetamínica” (Sandrim e Penteado, Drogas —
imputabilidade e dependência, 1994, p. 30), caracterizada por insô
nia, loquacidade, irritação, diminuição da capacidade mental e even
tualmente alucinações. No plano físico são descritos: anorexia (per
da do apetite), aumento da pressão arterial, taquicardia, tremores
musculares, lesões irreversíveis no sistema nervoso central, convul
sões, coma e morte.
A droga pode ser ingerida por via oral em cápsulas ou compri
midos, consumida por via intravenosa (diluída em água destilada),
aspirada na forma de pó e fumada com auxílio de um cachimbo
artesanal. Pode, também, ser diluída em bebidas alcoólicas.
As anfetaminas não causam dependência física, apenas psíquica.
267
Seu consum o é feito por via oral, sob á forma de comprimidos,
ou por aspiração do pó, como a cocaína (mais raro).
Os efeitos correspondem a uma abertura emocional seguida de
desinibição e euforia. Cessados os efeitos estimulantes, observa-se
forte depressão nos usuários (“aterragem”), podendo levar ao suicídio.
O uso contínuo leva a um decréscimo nos níveis de serotonina,
com conseqüente queda na libido, crises de pânico e depressão crôni
ca. Foram observadas lesões no cérebro (coordenação e memória),
coração e fígado.
268
O uso inadequado iniciou-se pelos físiculturistas, como estimu
lante do crescimento muscular. Mais recentemente, e geralmente uti
lizado em combinação com outras drogas como o ecstasy ou o special
%, surgiu nas raves e discotecas, com o nome de “líquido X”.
É consumido na forma de tabletes, cápsulas, pó branco ou líqui
do incolor. Além de apresentar baixo custo, a droga pode ser prepara
da em casa, a partir de um composto químico utilizado para limpeza
de placas eletrônicas.
Por não ter odor e ser praticamente sem sabor (levemente salga
do), pode ser misturado em bebidas alcoólicas (que potencializam o
efeito) sem que a vítima perceba, o que faz do GBH uma outra droga
utilizada para a prática de abusos sexuais (date rape drugs).
Cerca de 5 a 10 minutos após a ingestão da dose usual (entre 0,5
g e 1,5 g), a pessoa experimenta leve relaxamento e sensação de bem-
estar, acompanhados de desinibição e excitação sexual.
Os efeitos colaterais incluem cefaléia, náuseas, perda de memó
ria e torpor. Já foram relatados inúmeros casos de óbito por overdose.
4.7. Ópio
O ópio é uma mistura de alcalóides extraídos dos frutos ou cápsu
las verdes da papoula (Papaver somniferwri), do qual derivam outras
drogas, como a heroína, a morfina e a codeíaa (utilizada contra a tosse).
Originariamente tem aparência de um xarope leitoso, que, colo
cado para secar por aproximadamente 2 meses, transforma-se em uma
pasta acastanhada de sabor amargo.
A forma mais usual de consumo é a aspiração da fumaça resultante
de sua queima na forma de cigarro, mas pode ser ingerido ou injetado.
Graças ao seu principal efeito, uma potente ação analgésica e
depressora sobre o sistema nervoso central, os opiáceos foram utili
zados durante muitos anos em clínicas médicas, valendo citação os
preparados: Láudano de Sydenham, o Pó de Dover e o Elixir
Paregórico, todos atualmente em desuso.
O viciado experimenta uma fase inicial de excitação, inclusive
com incremento das funções psíquicas, para depois cair em depres
são e prostração profunda que o impedem de qualquer atividade.
As form as derivadas, heroína e morfina, são mais utilizadas que
o próprio ópio-
4.8. Morfina
A morfina é um alcalóide fenantrênico derivado do ópio. Origi-
nariamente tem o aspecto de um líquido incolor, cuja via de adminis
tração é a injeção intramuscular.
Em clínicas médicas utiliza-se a forma de cloridrato de apomor-
fina, um sal hidrossolúvel com aparência de um pó branco e cristali
no de sabor amargo.
Sua ação principal é narcótica, produzindo apatia, analgesia e
sonolência com delírios eróticos prolongados. A dependência insta
la-se após duas semanas de uso contínuo e pode levar o morfinômano
à morte por debilidade geral do organismo.
Há relatos de dependência após a primeira dose.
4.9. Heroina
A heroína é um derivado sintético da morfina, denominado
diacetilmorfina. Tem a forma de um pó branco e cristalino, cujos
efeitos são similares aos da própria morfina, mas cerca de cinco ve
zes mais potentes.
A via de administração é geralmente hipodérmica, e a depen
dência instala-se com maior facilidade.
4.10. Cocaína
A cocaína é um alcalóide estimulante extraído das folhas da
coca ou epadu (Erythroxylum coca). Fisicamente, caracteriza-se por
ser um pó branco e cristalino de sabor amargo (farinha, neve ou hran-
quinha).
A maneira mais usual de utilizá-la é pela aspiração nasal do pó (pita-
daoaprise), ou pela via subcutânea, com o uso de uma seringa hipodérmica.
A cocaína também pode ser fumada em cachimbos improvisa
dos (maricás), quando iia forma de crack (pedra) ou merla (melado).
Tanto o crack como a merla são subprodutos da cocaína, obti
dos a partii da mistura da pasta básica com bicarbonato de sódio. O
270
crack tem a forma de pedra, enquanto a merla, de uma pasta viscosa.
Por serem mais baratos, tomaram-se as drogas de eleição entre os
usuários de baixo poder aquisitivo.
O consumo de cocaína leva à sensação de ausência de cansaço, pro
longamento do estado de vigília e euforia intensa. Após a excitação segue
nma depressão profunda que pode levar o cocainômano ao suicídio.
No Brasil, a cocaína é a droga mais utilizada pelos usuários de
fármacos injetáveis. O hábito de compartilhar seringas, a baixa auto-
estima e os péssimos hábitos de higiene acabam por levar ao contá
gio de várias enfermidades como a hepatite, a dengue e a SIDA.
4.11. Maconha
Conhecida também por inúmeras outras denominações, como
erva, fumo, haxixe, marijuana e pacau, a maconha é uma substância
tóxica constituída pelas inflorescências dos exemplares femininos da
Cannabis sativa ou cânhamo da índia.
Seu princípio ativo é o 9-gama-transtetrahidrocanabinol (THC),
um composto fenólico encontrado na resina das plantas femininas, e
cuja concentração é bastante variada.
A via de administração é basicamente o fumo, sob a forma de
toscos cigarros denominados baseados.
Age no sistema nervoso central produzindo algumas alucina
ções, alteração da percepção temporal e certo grau de sonolência.
Diminui a sensibilidade à temperatura e à dor.
Não causa dependência física, mas pode levar à dependência
psíquica, se consumida por tempo prolongado.
O viciado crônico, como bem descreve Zacharias (1991, p. 286),
“toma-se uma figura facilmente reconhecível: desnutrido, emaciado,
ostenta na fisionomia expressão aparvalhada; o rosto é pálido, apele
sem viço, os olhos aprofundados nas órbitas, o olhar mortiço, a voz
rouca, as mãos trêmulas, o caminhar incerto”.
4.12. Mescalina
A mescalina é um alcalóide extraído do cactopeiote (.Lophophora
williamsii), cujo princípio ativo é o 3,4,5-trimetoxifeniletilamina.
271
A administração pode ser oral ou parenteral por injeção
endovenosa.
Os efeitos são alucinatórios e despersonalizantes, similares aos
do LSD, com uma duração prolongada (12 horas).
Não causa dependência física, mas pode levar a danos
irreparáveis no sistema nervoso.
4.13. LSD-25
O LSD-25, ou dietilainida do ácido lisérgico, cuja sigla deriva
do alemão Liserber Saure Diethylanid, é um produto semi-sintético
formado pela aglutinação de uma dietilamida com o ácido lisérgico,
extraído do fungo Clavicepspurpurea (esporão do centeio). O núme
ro 25 indica a vigésima quinta experiência de uma série.
Fisicamente é um pó incolor, inodoro e sem sabor, que pode ser inge
rido sob a forma de comprimidos ou aplicado por injeções endovenosas.
Os efeitos, que perduram por 6 a 12 horas, são alucinatórios e
despersonalizantes. As chamadas viagens levam o usuário a ter a er
rônea sensação que alcançou outros planos de existência, chegando
mesmo a sentir que o espírito abandonou o corpo.
Embora não cause dependência física, não raro pode desenca
dear crises psicóticas, em pessoas predispostas, e comportamentos
abeirantes, que podem levar à prática de crimes ou mesmo do suicídio.
Foram relatadas malformações físicas e mentais nos filhos de
usuários, levando à conclusão de um efeito teratogênico cumulativo.
272
Além da fraude em si, pelo uso de substâncias sintéticas em
competições esportivas, que leva à desclassificação do atleta, o abuso
desses produtos pode causar sérias alterações físicas e psicológicas,
como aumento da agressividade, redução da produção de espenna,
impotência, ginecomastia (crescimento das mamas) e predisposição
a tumores hepáticos.
Usados por mulheres, levam ao surgimento de caracteres se
xuais secundários masculinos, como crescimento de pêlos e en-
grossamento da voz, além de atrofia dos ovários e esterilidade.
Embora o uso de anabolizantes não leve ao consumo de outras
drogas, há relatos de dependência aos próprios esteróides, em razão
de sintomas físicos e psíquicos desagradáveis provocados pela su
pressão da droga.
4.15. Inalantes
Inalantes são hidrocarbonetos, tais como cloreto de etila (lança-
perfume), butano, n-hexano, propano, tolueno, tricloroetileno, xilol etc.,
encontrados em um sem-número de produtos comerciais comuns, como
esmaltes, colas, tintas, removedores, gasolina, vernizes e outros, cujos
vapores e gases podem ser inalados proposital ou acidentalmente.
A importância toxicológica dessas substâncias reside exatamente
no fato de serem produtos comerciais comuns, não vedados pela le
gislação. Por apresentarem baixo custo, facilidade de aquisição e de
utilização, constituem drogas de eleição das crianças, principalmente
meninos de rua, abrindo caminho ao consumo de outros fármacos.
A inalação acidental pode levar à configuração de acidente do traba
lho (em indústrias de calçados, oficinas de pintura, postos de gasolina etc.).
Os efeitos físicos são similares aos dos anestésicos e incluem
sensação de torpor e bem-estar que pode durar alguns minutos. Há
também uma sensação de saciedade temporária, o que faz com que
sejam utilizados por crianças carentes para minimizar a fome.
Se inalados em altas concentrações, conduzem à sufocação, pa
rada cardíaca e morte. Outros efeitos, observados com o uso contí
nuo, são perda de peso, incoordenação motora, lesões hepáticas e
renais, perda da memória, danos no sistema nervoso central irre
versíveis, coma e morte.
273
E stu d os recentes indicam que essas substâncias atuam nas mes-
mas regiões do cérebro que a cocaína (Jornal Saúde, Cola de sapatei- If!
ro afeta cérebro de forma igual à cocaína, advertem cientistas__ Tâl
www.saudeemmovimento.com.br). >
O uso prolongado por levar à dependência física e psíquica (mais *.
comum). %
Especificamente entre nós, as colas de sapateiro (Cascola, Patex, ~
Brascoplast etc.), por conterem tolueno ou n-hexano em suas com
posições, acabam por ser a droga mais usada entre meninos de rua e -
estudantes da rede pública de ensino (CEBRID, Solventes ou inalantes
— www.saude.inf.br/cebrid).
Embora o tolueno não esteja incluído entre as drogas de uso
proibido, é possível responsabilizar as pessoas que vendem o produ
to para crianças com base no art. 243 do ECA, que teve a pena am
pliada pela Lei n. 10.764, de 12-11-2003.
ECA
Art. 243. Vender, fornecer ainda que gratuitamente, ministrar ou entregar, de
qualquer foima, a criança ou adolescente, sem justa causa, produtos cujos com
ponentes possam causar dependência física ou psíquica, ainda que por utilização
indevida:
Pena — detenção de dois a quatro anos, e multa, se o fato não constitui crime
mais grave.
4.16. Tabaco
O tabaco é uma planta do gênero Nicotiana com mais de 50
espécies diferentes, dentre as quais se destacam a Nicotiana tabacunii
a Nicotiana langsdotffii e a Nicotiana rústica, consumidas em cigar
ros, charutos e cachimbos, artesanais ou industriais.
Na combustão do tabaco produzem-se milhares de substâncias (ga
ses, vapores orgânicos e compostos libertados em forma de partículas) que
são transportadas pelo fumo até os pulmões. Dentre os inúmeros princípi
os ativos, destacam-se a nicotina, diversos agentes irritantes e o alcatrão.
A nicotina é o alcalóide responsável pela maior parte dos efei
tos do tabaco e pela ^dependência física. Dentre os irritantes, pode
mos mencionar: acroleíúa, amoníaco, fenóis e ácido cianídrico, res
ponsáveis péla irritação brônquica e tosse dos fumantes. O alcatrão
responde pelos efeitos altamente cancerígenos do fumo.
274
Tido durante muitos anos como símbolo de satisfação e status
social, ainda que, ao contrário de outras drogas, o hábito de fumar seja
socialmente aceito e não altere significativamente o relacionamento
social do viciado, os danos à saúde são inegáveis, como, entre outros,
bronquite e enfisema pulmonar, câncer no pulmão e em outros órgãos
(boca, laringe, faringe, esôfago, pâncreas, rim, bexiga e colo de útero),
doenças vasculares (trombose e derrame cerebral), úlceras gástricas,
impotência sexual, complicações na gestação e malformações fetais.
4.17. Cafeína
A cafeína é uma substância estimulante do sistema nervoso cen
tral, presente em plantas como café, chá e cacau, bem como em algu
mas bebidas à base de cola.
O consumo excessivo de cafeína pode levar à ocorrência de
gastrite, vômitos, intranqüilidade, ansiedade, insônia, tremores mus
culares e depressão.
Ainda que o uso moderado da cafeína, por seu efeito estimulan
te, possa ser benéfico ao organismo, o consumo exagerado pode le
var à dependência física. Sua interrupção abrupta produz uma espé
cie de síndrome de abstinência caracterizada por dores de cabeça,
irritabilidade, sonolência e diminuição da capacidade intelectual.
4.18. “Poppers”
Os poppers (nitrato de amila ou butila) são vasodilatadores ori
ginalmente empregados no tratamento da angina.
Distribuídos em pequenas garrafas de vidro, são normalmente
consumidos por inalação graças à extrema volatilidade do produto à
temperatura ambiente. Basta abrir a garrafa, colocá-la junto às narinas
e aspirar os gases. O efeito é imediato e corresponde a uma sensação de
estímulo provocada pelo maior afluxo de sangue no cérebro e coração,
que dura cerca de dois minutos.
Ao lado do efeito vasodilatador estimulante, causa o relaxamento
de todos os músculos do corpo, inclusive do esfíncter anal, razão
pela qual é muito utilizado pela comunidade homossexual, porque
favorece o intercurso sexual, não obstante dificultar a ereção.
Apesar de não causar dependência, o uso prolongado pode pro
vocar danos ao sistema cardiorrespiratório pelo aumento exagerado
275
d o trabalho cardíaco. T am bém são relatados e fe ito s relacion ad os coni
im u n o ssu p ress ão.
S. ALCOOLISM O
Apesar de não ter seu uso proibido e constituir, de certa forma
um hábito socialmente aceito, o alcoolismo é tão ou mais nocivo à
saúde e à sociedade que as demais toxicofilias, traduzindo-se em ver
dadeiro problema de saúde pública.
O álcool pode agir no organismo de várias formas, produzindo
desde uma simples embriaguez episódica até a psicose alcoólica (afual
transtorno psicótico induzido por álcool). O esquema a seguir resu
me os principais quadros da intoxicação alcoólica, segundo a termi
nologia clássica:
subagudo
delírio agudo (delirium
Alcoolismo alcoólico tremens)
superagudo
com sintomas
psiquiátricos
depressão alcoólica aguda
alucinose auditiva aguda
crônico
paranóia alcoólica— delírio de ciúmes
(psicoses
dipsomania
alcoólicas)
psicose polineurítica de Korsákoff
com sintomas encefalopatia de Wemicke
■.psiquiátricos é encefalopatia porto-cava
neurológicos síndrome de Màrchiafava
epilepsia alcoólica
demência alcoólica
276
A nomenclatura dos transtornos mentais relacionados com o uso
de álcool foi significativamente alterada pelo DSM — IV da Asso
ciação Psiquiátrica Americana:
• transtornos por uso de álcool:
— dependência de álcool;
— abuso de álcool;
• transtornos induzidos por álcool:
— intoxicação por álcool;
— abstinência de álcool;
— delirium por intoxicação com álcool;
— delirium por abstinência de álcool;
— demência persistente induzida por álcool;
— transtorno amnésico persistente induzido por álcool;
— transtorno psicótico induzido por álcool;
— transtorno do humor induzido por álcool;
— transtorno de ansiedade induzido por álcool;
— disfunção sexual induzida por álcool;
— transtorno do sono induzido por álcool.
Por questões didáticas e por ser mais conhecida, neste trabalho
comentaremos a terminologia clássica.
277
F in alm en te, o éhdo não mais consegue manter-se em pé e cai %.
em sono profundo, que, na dependência da quantidade de álcool W?
ingerida, pode acarretar coma e morte (fase siderativa ou com atosà'^^
ou do porco).
H á certa discrepância entre os diversos autores quanto à
alcoolemia necessária para determinar cada fase, até porque existem
grandes variações individuais. O quadro a seguir, baseado em similar ’%
proposto por C. Simonin (Medicina legal judicial, 1962, p. 587), dá á
uma noção das dosagens em cada fase.
278
O tempo de eliminação também varia de pessoa para pessoa,
influindo não apenas a quantidade de álcool ingerido, como também
o tipo de bebida, o consumo conjunto de alimentos, a compleição
física, a idade, o sexo etc.
O Código de Trânsito Brasileiro (Lei n. 9.503, de 23-9-1997),
em seu art. 276, adotando critério objetivo, entendeu que a concen
tração de 0,6 g de álcool por litro de sangue já é suficiente para com
prometer a direção de veículo automotor. Note-se que essa concen
tração encontra-se abaixo da necessária para detecção de início de
embriaguez ( 1,12 g/l de sangue — vide gráfico).
Código de Trânsito
Art. 276. A concentração de seis decigramas de álcool por litro de sangue com
prova que o condutor se acha impedido de dirigir veículo automotor.
Presunção de culpa
A boa técnica jurídica determina que alcoolemia, assim como
qualquer outra condição orgânica constatável, seja determinada por
279
interm éd io de perícia. Entretanto, a Lei n. 11.275, de 7 de fevereiro
de 2006, alterou a redação do art. 277 do Código de Trânsito Brasi
leiro , para admitir, no caso de recusa do motorista em se submeter à
perícia ou ao teste do “bafômetro” (etilômetro), que o estado de
embriaguês possa ser comprovado mediante a obtenção de outras
provas em direito admitidas (§ 2a).
Código de Trânsito
Art. 277. Todo condutor de veículo automotor, envolvido em acidente de trânsito
ou que for alvo de fiscalização de trânsito, sob suspeita de dirigir sob a influência
de álcool será submetido a testes de alcoolemia, exames clínicos, perícia ou ou-
tro exame que, por meios técnicos ou científicos, em aparelhos homologados
pelo CONTRAN, permitam certificar seu estado.
§ Ia Medida correspondente aplica-se no caso de suspeita de uso de substância
entorpecente, tóxica ou de efeitos análogos.
§ 2a N o caso de recusa do condutor à realização dos testes, exames e da perícia
previstos no caput deste artigo, a infração poderá ser caracterizada mediante a
obtenção de outras provas em direito admitidas pelo agente de trânsito acerca
dos notórios sinais de embriaguez, excitação ou torpor, resultantes do consumo
de álcool ou entorpecentes, apresentados pelo condutor.
280
Resolução CONTRAN n. 206/06
I. Quanto ao condutor:
a. Nome;
b. Número do Prontuário da CNH ou do documento de identificação;
c. Endereço, sempre que possível.
II. Quanto ao veículo:
a. Placa/ÜF;
b. Marca.
DL Quanto ao fato:
a. Data;
b. Hora;
c. Local;
d. Número do auto de infração.
IV. Relato:
a. O condutor:
i. Envolveu-se em acidente de trânsito;
ii. Declara ter ingerido bebida alcoólica;
Em caso positivo, quando:
iii. Declara ter feito uso de substância tóxica, entoipecente ou de efeito análogo.
Em caso positivo, quando:
iv. Nega ter ingerido bebida alcoólica;
v. Nega ter feito uso de substância tóxica, entorpecente ou de efeito análogo;
b. Quanto à aparência, se o condutor apresenta:
i. Sonolência;
ii. Olhos vermelhos;
iii. Vômito;
iv. Soluços;
v. Desordem nas vestes;
vi. Odor de álcool no hálito.
c. Quanto à atitude, se o condutor apresenta;
i. Agressividade;
ii. Arrogância;
iii. Exaltação-,
iv. Ironia;
v. Falante;
vi. Dispersão.
d. Quanto à orientação, se o condutor:
i. sabe onde está;
ii. sabe a data e a hora.
e. Quanto à memória, se o condutor;
i. sabe seu endereço;
ii. lembra dos atos cometidos;
f. Quanto à capacidade motora e veibal, se o condutor a p r e se n ta :__________
281
i. Dificuldade no equilíbrio;
íi. Fala alterada;
V. Afírmaç2o expressa de que:
D e acordo com as características acima descritas, constatei que o condutor (nome
do condutor) do veículo de placa (placa do veículo), (está/não está) sob a influência
de álcool, substância tóxica, entorpecente ou de efeitos análogos e se recusou a
submeter-se aos testes, exames ou perícia que permitiriam certificar o seu estado.
VI. Dados do Policial ou do Agente da Autoridade de Trânsito:
a. Nome;
b. Matrícula;
c. Assinatura,
282
Agressiva ou violenta o alcoólatra apresenta grande agressividade com
pequenas doses da substância, podendo, inclusive,
praticar crimes.
Excitomotora inquietação e fúria destrutiva, com acessos de rai
va e destruição.
Convulsiva além dos impulsos destruidores, seguem-se episó
dios convulsivos, epileptiformes.
Delirante delírios com idéias de auto-acusação e tendência
ao suicídio.
283
5.4. Psicoses alcoólicas com sintomas psiquiátricos
5.4.1. Delírio alcoólico
O delírio alcoólico pode ser subagudo, agudo ou superagudo.
No delírio alcoólico subagudo, também conhecido como
encefalose alcoólica subaguãa (apud Vargas, 1990, p. 242), o alcoó
latra apresenta sinais de irritação e insônia, agitação, sudorese inten
sa e delírios que se traduzem por comportamentos e falas com seres
imaginários.
São freqüentes os relatos de visões de animais assustadores
Czoopsias), como cobras ou aranhas. Os ataques costumam ocorrer
no final da tarde para a noite e acometem, preferencialmente, os al
coólatras com idade superior a 40 anos.
No delírio alcoólico agudo ou delirium tremens, o viciado apre
senta sintomas muito semelhantes aos do delírio subagudo, apenas
mais acentuados. A qualidade e a quantidade das alucinações aumen
tam significativamente, sendo comum a procura pelo suicídio.
No delírio alcoólico superagudo, além da mesma sintomatologia
delirante, instala-se um completo estado de desagregação mental,
caracterizado pela total insensibilidade ao meio ambiente e perda da
capacidade de julgamento e raciocínio.
284
ixúliar. O alcoólatra desenvolve um sentimento doentio e não fundamen
tado de desconfiança em relação ao companheiro {delírio de ciúmes), a
quem passa a perseguir, vigiar e acusar de traição indiscriminadamente.
O descuido com a higiene pessoal, uma impotência moderada e
a diminuição da libido podem acentuar o quadro, na medida em que
o parceiro passa a desenvolver certa repulsa aos contatos sexuais,
fazendo com que a desconfiança do alcoólatra aumente.
Não raro, em razão das violentas crises que pode despertar, o
viciado pode ser levado ao cometimento de crimes.
5.4.5. Dipsomania
Embora, no passado, tenha sido descrita com certa freqüência
na literatura médica, a dipsomania é atualmente um quadro raro que
se caracteriza por crises em que o alcoólatra sente uma necessidade
incontrolável de consumir bebidas alcoólicas em grande quantidade.
Interessante é o fato de o dipsômano permanecer absolutamente
abstêmio entre as crises, que são cíclicas, de duração bastante variá
vel e geralmente precedidas de sintomas depressivos, como tristeza
profunda, insônia ou inapetência.
Quando não encontra a bebida, o dipsômano chega a ingerir
álcool puro ou mesmo gasolina.
285
os fatos mais recentes de sua vida. Desorientação no tempo e no es
paço, criação de relatos imaginários (fabulação) e falsos reconheci
mentos são também sintomas comuns.
Fisicamente a síndrome manifesta-se por paralisias e paresias
(perda parcial da mobilidade), acompanhadas de atrofias e dores
musculares que atingem preferencialmente os membros inferiores,
dificultando a movimentação do doente.
O prognóstico é reservado, pois a evolução conduz quase sem
pre à demência alcoólica. A recuperação, quando ocorre, é bastante
lenta, podendo os sintomas perdurar por vários anos.
287
A L ei n. 11.343, d e 2 3 de agosto de 2 0 0 6 , trouxe algum as altera
çõ es im portantes. Primeiro, porque fe z nítida separação entre o usuário e
o traficante, dependentes ou não, colocando-os, in clu sive, em títulos di
versos, e, em segundo lugar, porque m ultiplicou as figuras penais:
Lein. 11.343/06
Art. 5 6 ....
§ 2a A audiência a que se refere o caput deste artigo será realizada dentro dos 30
(trinta) dias seguintes ao recebimento da denúncia, salvo se determinada a reali
zação de avaliação para atestar dependêncíà de drogas, quando se realizará em
90 (noventa) dias (grifo nosso). ,
-288 -
Lein. 11.343/06
Art. 45. É isento de pena o agente que, em razão da dependência, ou sob o efeito,
proveniente de caso fortuito ou força maior, de droga, era, ao tempo da ação ou
da omissão, qualquer que tenha sido a infração penal praticada, inteiramente
incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com
esse entendimento.
Parágrafo único. Quando absolver o agente, reconhecendo, por força pericial,
que este apresentava, à época do fato previsto neste artigo, as condições referidas
no caput deste artigo, poderá determinar o juiz, na sentença, o seu encaminha
mento para tratamento médico adequado.
Art. 46. As penas podem ser reduzidas de um terço a dois terços se, por força das
circunstâncias previstas no art. 45 desta Lei, o agente não possuía, ao tempo da
ação ou da omissão, a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de
determinar-se de acordo com esse entendimento.
Art. 47. Na sentença condenatória, o juiz, com base em avaliação que ateste a
necessidade de encaminhamento do agente para tratamento, realizada por profis
sional de saúde com competência específica na forma da lei, determinará que a
tal se proceda, observado o disposto no art, 26 desta Lei.
289
g) o agente, sob o efeito de droga, proveniente de caso fortuito
ou de força maior, era parcialmente incapaz de entender o caráter
ilícito do fato (art. 46 da Lei n. 11.343/06);
h) o agente, sob o efeito de droga, proveniente de caso fortuito
ou deforça maior, era parcialmente incapaz de determinar-se de acor
do com o entendimento sobre o caráter ilícito do fato (art. 46 da Lei
n. 11.343/06).
Nas quatro primeiras, temos a inimputabilidade, com a conse
qüente isenção de pena. Nas quatro últimas, as hipóteses de semi-
imputabilidade como causa de redução de pena.
Note-se que não se trata de semidependência, figura inexistente
na anterior (Leí n. 6.368/76) e na atual legislação brasileira sobre
tóxicos, más sim de semi-responsabilidade.
O dependente pode, ao tempo da ação ou omissão, ser total
mente capaz, parcialmente capaz ou incapaz de entender a natureza
ilícita de sua conduta e ou de agir de acordo com essa compreensão.
Em geral, os dependentes leves são imputáveis, já que perfeita
mente capazes de entender o caráter ilícito dos atos praticados e de
determinar-se de acordo com esse entendimento.
A dependência moderada pode levar à semi-imputabilidade, com
conseqüente redução da pena (art. 46 da Lei n. 11.343/06), e a depen
dência severa, à inimputabilidade (art. 45, caput, da Lei n. 11.343/
06), excluindo a responsabilidade penal.
290
cidade cognitiva do autor, é sempre necessário que ocorra a conjun
ção de três fatores (Mendonça e Carvalho, 2007, p. 176):
a) a causa biológica, ou seja, a constatação de que o agente era
dependente ou que agiu sob efeito de droga em razão de caso fortuito
ou força maior;
b) a conseqüência psicológica, consistente em determinar se,
em razão da causa biológica, era o agente inteira ou parcialmente
incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de
acordo com esse entendimento; e
c) o elemento temporal de a conseqüência psicológica existir no
instante da prática do ato.
A perícia, entretanto, na maioria dos casos, só poderá afirmar a
dependência e o eventual comprometimento psíquico do autor do
fato incriminado. Se estava ele sob o efeito da droga no momento do
crime, se podia entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se
segundo tal entendimento naquele exato momento são questões que
precisam ser complementadas por outros meios de prova.
291
p rin cíp io , se ria aq u ele p recon izad o p e lo art. 150, § l 2, d o Código d e
P ro c esso P en al (4 5 d ias), sa lv o dem onstrada n e c e ssid a d e d e dilação.
L ein. 11.343/06
Art. 4 8 ....
§ 2a Tratando-se da conduta prevista no art. 28 desta Lei, não se imporá prisão
em flagrante, devendo o autor do fato ser imediatamente encaminhado ao juízo
competente ou, na falta deste, assumir o compromisso de a ele comparecer, la
vrando-se termo circunstanciado e providenciando-se as requisições dós exames
e perícias necessários.
Lein. 11.343/06
Art. 56. Recebida a denúncia, o juiz designará dia e hora para a audiência de
instrução e julgamento, ordenará a citação pessoal do acusado, a intimação do
Ministério Público, do assistente, se for o caso, e requisitará os laudos periciais.
§ 2aA audiência a que se refere o caput deste artigo será realizada dentro dos 30
(trinta) dias seguintes ao recebimento da denúncia, salvo se determinada a reali
zação de avaliação para atestar dependência de drogas, quando se realizará em
90 (noventa) dias.
5.6.3. Quesitos
Os quesitos mais comuns, baseados no texto de lei, continuam
sendo os mesmos:
1) era o examinado, ao tempo da ação ou omissão, dependente
de droga(s)? De qual(is) droga(s)?
2) em caso de resposta afirmativa ao quesito anterior, a depen
dência era física ou psíquica?
292
3) era o examinado, ao tempo da açao ou omissão, em razão da
dependência de droga(s), inteiramente incapaz de entender o caráter
ilícito do fato ou de determinar-se segundo esse entendimento?
4) era o examinado, ao tempo da ação ou omissão, em razão da
dependência de droga(s), parcialmente capaz de entender o caráter
ilícito do fato ou de determinar-se segundo esse entendimento?
5) era o examinado, ao tempo da ação ou omissão, em razão de
estar sob o efeito de droga, inteiramente incapaz de entender o cará
ter ilícito do fato ou de determinar-se segundo esse entendimento?
6) era o examinado, ao tempo da ação ou omissão, em razão de
estar sob o efeito de droga, parcialmente capaz de entender o caráter
ilícito do fato ou de determinar-se segundo esse entendimento?
7) necessita o examinado de tratamento? Qual o indicado?
8) em caso de resposta afirmativa ao quesito anterior, é necessá
ria a internação hospitalar do examinado para tratamento? Por quê?
Lei n. 11.343/06
Art. 4 5 .... (inimputabilidade)
Parágrafo único. Quando absolver o agente, reconhecendo, por força pericial,
que este apresentava, à época do fato previsto neste artigo, as condições referidas
no caput deste artigo, poderá determinar o juiz, na sentença, o seu encaminha
mento para tratamento m édico adequado.
Art. 47. Na sentença condenatória, o juiz, com base em avaliação que ateste a
necessidade de encaminhamento do agente para tratamento, realizada por profis
sional de saúde com competência específica na forma da lei, determinará que a
tal se proceda, observado o disposto no art. 26 desta Lei.
293 ^
A grande novidade, entretanto, fica por conta do encaminha
mento facultativo ao tratamento, mesmo aos inimputáveis.
Pela sistemática da revogada Lei n. 6.368/76, uma vez reconhe
cida a dependência e a inimputabilidade, o juiz era obrigado a deter
minar o tratamento em regime de internação ou ambulatorial (arts.
10 e 29). Ao dependente com capacidade diminuída, o magistrado
impunha a pena e dispensava tratamento médico em ambulatório in
terno do sistema penitenciário (art. 11).
Art. 10.0 tratamento sob regime de internação hospitalar será obrigatório quan
do o quadro clínico do dependente ou a natureza de suas manifestações
psicopatológicas assim o exigirem.
§ Ia Quando verificada a desnecessidade de internação, o dependente será sub
metido a tratamento em regime extra-hospítalar, com assistência do serviço soci
al competente.
Art. 11. Ao dependente que, em razão da prática de qualquer infração penal, for
imposta pena privativa de liberdade ou medida de segurança detentiva será dis
pensado tratamento em ambulatório interno do sistema penitenciário onde esti
ver cumprindo a sanção respectiva.
294
No caso dainimputabilidade por dependência o tratamento con
tinua sendo obrigatório.
Alguns autores têm entendido que, mesmo que o magistrado
determine o encaminhamento para tratamento, este será facultativo e
só poderá ser implementado com a concordância do agente (ver Men
donça e Carvalho, 2007, p. 179).
Ousamos discordar.
Se, por um lado, é bem verdade que o tratamento é facultativo
no tocante à possibilidade de o m agistrado, ao reconhecer a
inimputabilidade, decretá-lo ou não, por outro, no caso de ser o trata
mento necessário, a regra é a da obrigatoriedade de sua aplicação.
Note-se que o parágrafo único do art. 45 diz que o juiz “poderá
determinar, na sentença, o seu encaminhamento para tratamento
médico adequado”. Encaminhar, aqui, tem o sentido de conduzir, le
var, fazer com que, e não o de simplesmente mostrar um caminho
que pode ou não ser seguido.
Entendimento diverso levaria ao absurdo de se permitir que um
toxicômano severo, que tenha cometido vários homicídios em razão
da dependência, possa ser absolvido e escolher se deseja o tratamen
to ou prefere continuar consumindo o fármaco e matando impune
mente.
Nesse sentido o magistério de Greco Filho e Rassi: “O juiz não
poderá determinar o tratamento se se tratar de absolvição em razão
de caso fortuito ou força maior, hipótese em que não há o que se
tratar. Se, porém, a absolvição decorre da dependência que, como já
se expôs, é doença mental, a única e inafastável conseqüência é a da
imposição de medida de proteção social, que é, no caso, o tratamen
to, porque, tendo sido praticado crime em razão da dependência, há
perigo social que não pode simplesmente ser desconsiderado. Enten
der o contrário seria suicídio jurídico, social e moral” (2007, p. 151).
295
D e qualquer form a, a medida não comporta prazo mínimo e será
aplicada por tempo indeterminado, persistindo até que seja constatada
a cessação de periculosidade por laudo médico (CP, art. 97, § l 2).
5 .7 3 . Semi-imputabilidade
Comrelação aos semi-imputáveis, a situação é um pouco diversa,
pois a nova Lei de Drogas, seguindo a orientação anterior, previu uma
exceção ao sistema vicariante do Código Penal, segundo o qual aos
semi-responsáveis pode ser aplicada pena reduzida ou, por substitui
ção, medida de segurança (CP, art. 26, parágrafo único, c/c o art. 98).
Já na revogada Lei n. 6.368/76 (art. 11), ao reconhecer a semi-
responsabilidade, o magistrado devia aplicar a pena reduzida, mas
decretava, também, tratamento médico em ambulatório interno do
sistema penitenciário.
O mesmo sistema foi adotado pela Lei n. 11.343/06, porém de
forma mais clara, afastando qualquer dúvida de interpretação.
Reconhecendo que o agente, em razão de dependência ou sob o
efeito de droga, proveniente de caso fortuito ou força maior, não pos
suía, ao tempo da ação ou da omissão, a plena capacidade de enten
der o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse
entendimento, o juiz aplicará a redução de um a dois terços na pena
correspondente (art. 46). Entendendo, porém, que existe a necessida
de de tratamento, poderá, cumulativamente, determinar “que a tal se
proceda” (art. 47), observado o disposto no art. 26:
L ein. 11.343/06
A rt 46. As penas podem ser reduzidas de vim terço a dois terços se, por força das
circunstâncias previstas no art. 45 desta Lei, o agente não possuía, ao tempo da
ação ou da omissão, a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de
determinar-se de acordo com esse entendimento.
Art. 47. Na sentença condenatória, o juiz, com base em avaliação que ateste a
necessidade de encaminhamento do agente pará tratamento, realizada por profis
sional de saúde com competência específica na forma da lei, determinará que a
tal se proceda, observado o disposto no art. 26 desta Lei.
Art. 26. O usuário e o dependente de drogas.que, em razão da prática de infração
penal, estiverem cumprindo pena privativa de liberdade ou submetidos a medida
de segurança, têm garantidos os serviços de atenção à sua saúde, definidos pelo
respectivo sistema penitenciário.
296
5.8. Tratamento médico no ECA
A Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do
Adolescente), não previu tratamento médico ou ambulatorial para o
dependente como conseqüência da prática de ato infracional, mas
apenas as medidas protetivas constantes do art. 101, V e VI, que po
dem ser aplicadas ao infrator ou a qualquer criança ou adolescente
em situação de risco (art. 98 do ECA):
ECA
Art. 98. As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre
que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados:
I — por ação ou omissão da sociedade ou do Estado;
II — por feita, omissão ou abuso dos pais ou responsável;
III — em razão de sua conduta.
Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a autoridade
competente poderá determinar, dentre outras, as seguintes medidas:
297
C a p ít u l o 9
PSICOPATOLOGIA FORENSE
2. NORMALIDADE E ANORMALIDADE
Porot definia personalidade como “a síntese de todos os ele
mentos que concorrem para a conformação mental de uma pes
soa, de modo a comunicar-lhe fisionomia própria” (Maranhão,
2002, p. 339).
298
A constituição biopsicológica de um indivíduo é bastante com
plexa, nela influenciando inúmeros fatores que oscilam desde a pró
pria conformação física até o conjunto de experiências pessoais
vivenciadas.
Assim, não se pode dizer que exista uma “personalidade nor
mal”, não há um limite rígido, uma linha divisória clara entre o que
se convencionou chamar de normalidade e anormalidade.
O que se procura estabelecer, entretanto, é se o indivíduo carre
ga ou não os sinais patológicos que são característicos das principais
moléstias mentais conhecidas, ou seja, o conceito de normalidade
vem por exclusão. É normal todo indivíduo que não tem sinais pró
prios de nenhuma enfermidade mental catalogada e que, por isso,
consegue viver em sociedade de forma harmônica.
CP
Art. 26, É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento
mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteira
mente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo
com esse entendimento.
Parágrafo único. A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em
virtude de perturbação da saúde mental ou por desenvolvimento mental incom
pleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato
ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
299
Da leitura atenta do texto de lei deduz-se que:
inteiramente doença mental
incapaz de desenvolvimento mental
discernir o incompleto
caráter ilícito desenvolvimento mental
do fato retardado
inimputáveis
inteiramente doença mental
incapaz de
determinar-se
de acordo com
o entendimento
Í desenvolvimento mental
incompleto
CC
Art. 3a São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente ós atos da vida civil:
I — os menores de dezesseis anos; ■-
II — os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário
discernimento para a prática desses atos;
m — os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade.
\
300
TTT— os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo;
IV — os pródigos.
Parágrafo tínico. A capacidade dos índios será regulada por legislação especial.
retardos mentais
epilepsias
Doenças mentais neuroses
psicopatias
psicoses (inclui a esquizofrenia)
301
Sendo assim, e em se tratando de obra destinada a concursos
públicos, optamos por apresentar a nomenclatura atual, proposta pela
Associação Psiquiátrica Americana (DSM — IV), associada, quando
possível, à terminologia referida pelos principais autores, ainda que
desatualizada.
Apenas para conhecimento, transcrevemos, a seguir, as classifi
cações dos transtornos mentais, segundo o CID — 10 e o DSM — IV.
O CID — 10 agrupa os transtornos mentais e comportamentais
em onze categorias distintas, conforme o esquema a seguir:
• transtornos mentais orgânicos, inclusive os sintomáticos;
• transtornos mentais e comportamentais devido ao uso de subs
tância psicoativa;
• esquizofrenia, transtornos esquizotípicos e transtornos deli
rantes;
• transtornos do humor (afetivos);
• transtornos neuróticos, transtornos relacionados com o stress
e transtornos somatoformes;
• síndromes comportamentais associadas a disfunções fisioló
gicas e fatores físicos;
• transtornos da personalidade e do comportamento do adulto;
• retardo mental;
• transtornos do desenvolvimento psicológico;
• transtornos do comportamento e transtornos emocionais que
aparecem habitualmente durante a infância ou a adolescência;
• transtorno mental não especificado.
O DSM — IV divide os transtornos mentais em dezesseis cate
gorias:
• transtornos geralmente diagnosticados pela primeira vez na
infância ou adolescência:
— retardo mental; s
— transtornos da aprendizagem;
— transtornos das habilidades motoras;
— transtornos da comunicação; transtornos invasivos do desen
volvimento;
— transtornos de déficit de atenção e do comportamento
diruptivo;
— transtornos da alimentação da primeira infância;
— transtornos de tique;
— transtornos da excreção;
— outros transtornos da infância e da adolescência;
• delirium, demência, transtorno amnéstico e outros transtornos
cognitivos:
— delirium;
— demência;
— transtornos amnésticos;
— outros transtornos cognitivos;
• transtornos mentais devido a uma condição médica geral;
• transtornos relacionados a substâncias:
— transtornos relacionados ao álcool;
— transtornos relacionados à anfetamina;
— transtornos relacionados à cafeína;
— transtornos relacionados à cannabis;
— transtornos relacionados à cocaína;
— transtornos relacionados a alucinógenos;
— transtornos relacionados a inalantes;
— transtornos relacionados à nicotina;
— transtornos relacionados a opióides;
— transtornos relacionados à fenciclidina;
— transtornos relacionados a sedativos, hipnóticos ou
ansiolíticos;
— transtornos relacionados a múltiplas substâncias;
— transtornos relacionados a outras substâncias ou substâncias
desconhecidas;
• esquizofrenia e outros transtornos psicóticos;
• transtornos do humor;
— transtornos depressivos;
— transtornos bipolares;
303
• transtornos de ansiedade;
• transtornos somatoformes;
• transtornos factícios;
• transtornos dissociativos;
• transtornos sexuais e da identidade de gênero:
— disfunções sexuais;
— parafilias;
— transtornos da identidade de gênero;
• transtornos alimentares;
• transtornos do sono:
— transtornos primários do sono;
— transtornos do sono relacionados a outro transtorno mental;
• transtornos do controle dos impulsos não classificados em outro
local;
• transtornos da personalidade;
• outras condições que podem ser foco de atenção clinica:
— fatores psicológicos que afetam a condição médica;
— transtornos dos movimentos induzidos por medicamentos;
— problemas de relacionamento;
— problemas relacionados ao abuso ou negligência;
— condições adicionais que podem ser um foco de atenção clí
nica.
Há uma tendência atual no sentido de considerar, além da
sintomatologia em si, a quantidade e a qualidade desses sintomas
para fixação do diagnóstico. Assim, um mesmo conjunto de sinto
mas pode caracterizar um transtorno menos ou mais severo, na de
pendência do grau de comprometimento do psiquismo do paciente.
\
304
toda pessoa que não apresentar limitadores ou modificadores da ca
pacidade civil ou imputabilidade criminal.
O quadro a seguir, adaptado de similar proposto por Delton
Croce (1998, p. 530), indica os principais limitadores e modificadores
da responsabilidade civil e imputabilidade penal:
raça
idade
sexo
biológicos emoção e paixão
agonia
epilepsia
cegueira
dissonias
transtornos parassonias —
do sono sonambulismo
estados demenciais
retardos mentais (oligofrenias)
esquizofrenias'e outros transtornos
psiquiátricos psicóticos
f(neuroses)
transtornos diversos
^(psicoses)
,, . f civilização
meso gicos psieologta das multidões
305
O quadro acima, principalm ente no que toca aos fatores
psicopatológicos e psiquiátricos, é meramente exemplificativo, pois
há um sem-número de transtornos mentais que podem levar ao com
prometimento da capacidade civil ou da imputabilidade penal e que
não são normalmente abordados pela literatura médico-legal.
Neste trabalho, iremos nos ater aos tópicos mais usuais, adap
tando, como salientado, a nomenclatura ultrapassada às classifica
ções modernas.
6 . FATORES BIOLÓGICOS
6.1. Raça
O fator raça não é inclufdo no quadro original apresentado por
Delton Croce (1998, p. 530), mas há autores, como Genival França
(1998, p. 344), que incluem esse conceito apenas para análise.
A raça em si não pode ser considerada fator modificador da
capacidade civil ou imputablidade penal. Já ficou amplamente de
monstrado que não existem raças inferiores ou superiores, o que há
são características culturais e econômicas que em dado momento his
tórico podem favorecer esta ou aquela comunidade ou grupamento
étnico. Existem trabalhos, entretanto, como o polêmico The bell cur
ve (A curva do sino), de Richard J. Herrnstein e Charles Murray, que
pretendem afirmar a diferente habilidade intelectual ou a tendência
inata de determinadas raças para a criminalidade.
Ver considerações do item 1.4.
6.2. Idade
A idade tem aparecido como fator determinante tanto em rela
ção à imputabilidade penal quanto à capacidade civil. Os menores de
18 anos são considerados inimputáveis, em razão de desenvolvimen
to mental incompleto, e, portanto, não se sujeitam às sanções da lei
penal, ficando apenas adstritos às medidas protetivas e socio-
educativas previstas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.
Os maiores de 18 anos e menores de 21 anos, considerados à
época do fato, devem ter suas penas necessariamente reduzidas (art.
306
65, I, do CP), sendo os prazos prescricionais contados pela metade
(art. 115 do CP).
A idade avançada também foi considerada pelo legislador penal
como atenuante genérica (art. 65,1, do CP), merecendo o maior de 70
anos, à época da sentença, o mesmo tratamento do menor de 21 quanto
à redução dos prazos prescricionais.
Além disso, os maiores de 70 anos beneficiam-se do sursis etário
(art. 77, § 2fi, do CP), que permite sejam suspensas condenações de
até 4 anos, e da prisão albergue domiciliar (art. 117,1, da LEP).
Pela lei civil, os menores de 16 anos são absolutamente inca
pazes (art. 32,1, do CC) e os menores de 18 anos relativamente incapa
zes (art. 4a, I, do CC), podendo os maiores de 16 anos ser emancipa
dos nas hipóteses previstas no art. 5a, I, do CC.
A lei civil também se preocupou com os valetudinários, preven
do, por exemplo, a aposentadoria compulsória aos 70 anos ou res
tringindo o regime matrimonial para as pessoas maiores de 60 anos
(art. 1.641, D, do Código Civil).
O Estatuto do Idoso, Lei n. 10.741, de l 2 de outubro de 2003, é
também um bom exemplo do reconhecimento, pelo ordenamento ju
rídico, de que o idoso, em razão de suas peculiaridades físicas, deve
receber tratamento especial do Estado.
6.3. Sexo
O sexo, na lei penal, é apenas considerado como atenuante no
crime de infanticídio. Mesmo assim, não se pode considerar que a
atenuação decorra em razão do sexo, mas, como vimos, de um parti
cular estado mental da parturiente.
Há, por outro lado, algumas alterações do psiquismo relaciona
das com períodos críticos da evolução do organismo feminino, como a
gestação, a lactação, o climatério, ou mesmo ligadas ao ciclo menstru
ai. Tais alterações, entretanto, se por um lado podem traduzir modifica
ções de humor ou emotividade, salvo em casos absolutamente anor
mais, não devem influir na capacidade ou imputabilidade da mulher.
A tendência atual, aliás, é a de suprimir qualquer diferença de
tratamento entre os sexos. Nesse sentido, por exemplo, o atual Códi
go Civil igualou a idade núbil do homem e da mulher em 16 anos
(art. 1.517 ■— antigo art. 183, XII) e estabeleceu o limite de 60 anos
para a a d o çã o obrigatória do regime matrimonial de separação de
bens, independente do sexo dos nubentes (art. 1.641, II — antigo art.
25 8 , parágrafo único, II).
6.5. Agonia
A agonia pode ser definida como o conjunto de fenômenos que
aparecem na fase final de doenças agudas ou crônicas e prenunciam a
morte.
Na verdade não é a proximidade da morte que leva à invalidade
dos atos praticados, mas-sim a possibilidade de o paciente não poder
expressar livremente a sua vontade.
308
Como o agônico depois da morte não mais poderá ratificar ou
retificar os seus atos, para que as ações praticadas pelo moribundo
possam ter algum valor, é normalmente recomendada a presença de
testemunhas.
6.6. Epilepsia
Remotamente denominada “mal sagrado”, a epilepsia é uma das
doenças mais antigas da humanidade. O termo deriva do grego e sig
nifica “surpreender”, em razão das crises que se instalam de maneira
súbita e inesperada.
Não é uma “doença mental”, mas uma afecção do sistema ner
voso central, de caráter normalmente crônico, e que se manifesta por
alterações sensitivas, motoras ou psíquicas, como perda dos senti
dos, amnésia e convulsões.
Se provocados entre os ataques, os epilépticos podem reagir de
modo desmedido, dando causa a crimes bastante violentos.
6.7. Cegueira
A cegueira, por si só, não pode ser considerada um fator
modificador da imputabilidade penal ou da capacidade civil.
Entretanto, há situações em que o cego experimenta algumas
limitações legais.
É o caso, por exemplo, da incapacidade para depor como teste
munha quando a ciência dos fatos depender do sentido da visão (art.
405, § l s, IV, do CPC), ou da necessidade do testamento público (art.
1.867 do CC).
CPC
Art. 405. Podem depor como testemunhas todas as pessoas, exceto as incapazes,
impedidas ou suspeitas.
§ Ia São incapazes;
IV — o cego e o surdo, quando a ciência do fato depender dos sentidos que lhes
faltam.
309
cc
Art. 1 .867. Ao cego só se permite o testamento público, que lhe será lido, em voz
alta, duas vezes, uma pelo tabelião ou por seu substituto legal, e a outra por uma
das testemunhas, designada pelo testador, fazendo-se de tudo circunstanciada
menção no testamento.
7. FATORES PSICOPATOLÓGICOS
311
7.2. Transtorno misto da linguagem receptivo/expressiva —
surdimutismo
O Código Civil de 1916, em seu art. 5fi, UI, indicava, como ab
solutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil,
os surdos-mudos que não pudessem exprimir a sua vontade.
Com extrema felicidade, o novo Código Civil, atento aos avan
ços da psicologia e psiquiatria, substituiu a redação anterior para con
siderar como absolutamente incapazes todos aqueles que, mesmo por
causa transitória, não podem exprimir sua vontade (art. 3S, UI).
A nova redação ampliou, destarte, o rol de possibilidades, para
englobar não apenas os portadores de transtornos da linguagem (en
tre os quais os surdos-mudos), como também os que exibam outras
perturbações que comprometam e viciem o seu consentimento.
De qualquer modo, tanto a inimputabilidade quanto a incapaci
dade somente podem ser reconhecidas por exame pericial para averi
guação da possibilidade de expressão livre da vontade e capacidade
de compreensão dos fatos.
312
A prodigalidade é uma forma de transtorno compulsivo em que
a pessoa, sem qualquer justificativa, dilapida seu patrimônio de for
ma desordenada, chegando a comprometer a própria subsistência.
Os pródigos são tidos como relativamente incapazes (art. 49, IV,
do CC), podendo praticar certos atos da vida civil, desde que devida
mente assistidos por um curador.
Alguns outros transtornos obsessivos, como, por exemplo, a
oniomania (compulsão para comprar tudo que vê) e a cibomania
(compulsão para o jogo), se forem capazes de comprometer todos os
haveres do paciente, podem dar margem à interdição civil (Gomes,
2003, p. 524).
8. FATORES PSIQUIÁTRICOS
Dentro do capítulo dos fatores psiquiátricos como modificadores
da capacidade civil e imputabilidade penal, estudam-se as chamadas
doenças mentais, “termo inadequado, utilizado para compreender
todas as alterações mórbidas da saúde mental, qualquer que seja a
sua origem” (Vargas, 1990, p. 195).
Como bem salienta Genival França (1998, p. 355), a expressão
doença mental “não se ajusta bem ao que se quer atingir, porque se
entende como sinônimo de enfermidade da mente. Não sendo a men
te algo material, tecnicamente não admite uma doença. A mente não
é local do corpo, mas uma atividade, uma função. Ademais, doença
mental não pode ser igual a doença do cérebro. Enfermidade do cére
bro é, a saber, um tumor, uma esclerose múltipla, uma neurossífilis.
313
E, na hora em que as enfermidades denominadas mentais demons
tram doença, os pacientes começam a ser transferidos da psiquiatria
para outros setores. O retardo mental para a Pedagogia; a neurossífilis,
para a Neurologia; o delírio das doenças infecciosas, para a Medicina
Interna”.
Assim, embora na literatura jurídica ainda seja de uso corrente,
a tendência atual é sua substituição pela expressão “transtorno men
tal” (vide Lei n. 10.216, de 6-4-2001).
Dentre os fatores psiquiátricos de interesse médico-legal, se
gundo a classificação do DSM — IV podemos citar:
• estados demenciais;
• retardos mentais (oligofrenias);
• esquizofrenias e outros transtornos psicóticos;
• transtornos diversos (neuroses).
315
mesma forma, devem ser tidos como absolutamente incapazes para
os atos da vida civil.
Os portadores de retardos mentais leves e moderados (débeis
mentais) podem, com certas limitações, exercer atos da vida civil,
sendo considerados relativamente incapazes. Na esfera penal, devem
ser rotulados como semi-imputáveis, por não serem inteiramente ca
pazes de entender o caráter ilícito dos atos praticados ou de determi
narem-se de acordo com esse entendimento.
indiferenciada (simples)
desorganizada (hebefrênica)
Esquizofrenia catatônica
paranóíde
residual
316
Na forma desorganizada ou hebefrênica, além da debilidade do
psiquismo, surgem outras manifestações, como idéias absurdas, alte
rações de ânimo violentas que vão desde a apatia ou o sentimentalis-
mo até a ira extrema. Freqüentemente assumem posições de salvado
res do mundo ou enviados dos céus.
Na forma catatônica os esquizofrênicos costumam permanecer
por tempo prolongado parados na mesma posição. Raramente apre
sentam delírios, mas são bastante impulsivos, podendo chegar ao
homicídio ou até à autolesão.
Na forma paranóide, o esquizofrênico sente-se arrebatado, do
minado por forças externas que não consegue explicar. Predominam
as alucinações e os delírios. Normalmente desconfiam de tudo e to
dos, apresentando acusações generalizadas e infundadas, como se o
mundo conspirasse contra eles.
Na forma residual há registro de pelo menos um episódio de
esquizofrenia, mas o quadro clínico por ocasião do exame não apon
ta sintomas positivos próprios, como alucinações, delírios, discurso
ou comportamento desorganizado. Existem apenas evidências carac
terizadas pela presença de sintomas negativos, como afeto embota
do, discurso pobre e vontade diminuída.
Genival França (1998, p. 356) lembra que a “esquizofreniapode
levar a uma variedade muito grande de delitos, exóticos e incompre
ensíveis pela sua inutilidade. Os mais graves sãó decorrentes da for
ma paranóide. Em regra, o crime desses pacientes é repentino, ines
perado e sem motivos”.
318
caráter desconfiado, tendência a distorcer os fatos interpretando as
ações imparciais ou amigáveis dos outros como hostis ou de despre
zo; suspeitas recidivantes, injustificadas, a respeito da fidelidade se
xual do esposo ou do parceiro sexual; e um sentimento combativo e
obstinado de seus próprios direitos. Pode existir uma superavaliação
de sua auto-importância, havendo freqüentemente auto-referência
excessiva” (CID — 10, p. 351). Também chamada de personalidade
expansiva, fanática ou querelante.
319
vio considerável entre o comportamento e as normas sociais estabe
lecidas. O comportamento não é facilmente modificado pelas experi
ências adversas, inclusive pelas punições. Existe uma baixa tolerân
cia à frustração e um baixo limiar de descarga da agressividade, in
clusive da violência. Existe uma tendência a culpar os outros ou a
fornecer racionalizações plausíveis para explicar um comportamento
que leva o sujeito a entrar em conflito com a sociedade” (CID — 10,
p. 352). Também chamada de personalidade amoral, associai ou
sociopática.
320
ção sobre si; têm tendência à dramatização e consideram os relacio
namentos mais íntimos do que realmente são (conceito adaptado do
DSM — IV, p. 620).
321
funções intelectuais ou perturbação das emoções; tendência freqüen
te a transferir a responsabilidade para outros” (CID — 10, p. 354).
Nota necessária
Como salientamos no item 4, foram implementadas profundas
modificações na nomenclatura e classificação dos transtornos men
tais. As personalidades patológicas, mencionadas no item anterior,
refletem a posição atual da Organização Mundial de Saúde (CID —
10) e da Associação Psiquiátrica Americana (DSM — IV) a respeito
do tema.
Como a quase-totalidade dos livros de medicina legal mantém a
classificação antiga e considerando que boa parte dos laudos psi
quiátricos ainda faz uso da nomenclatura tradicional, apresentamos,
a seguir, um breve resumo do que a doutrina entende por personali
dades psicopáticas.
322
Há várias classificações, como as de KraepeUn e Kurt Schneider.
Segundo Kraepelin as personalidades psicopáticas classificam
se em irritáveis, instáveis, instintivas, tocadas, mentirosas e
fraudadoras anti-sociais e disputadoras (Croce, 1998, p, 560),
Para Kurt Schneider, as personalidades psicopáticas divi
dem-se em:
psicopatas Mpertímicos
psicopatas depressivos
psicopatas sem sentimentos, amorais ou perversos
psicopatas anancásticos ou inseguros de si mesmos
Classificação das psicopatas fanáticos
personalidades psicopáticas . psicopatas necessitados de valorização ou carentes
segundo Kurt Schneider de afeto
psicopatas lábeis de estado de ânimo
psicopatas explosivos, irritáveis ou epileptóides
psicopatas abúlicos ou de instintividade débil
psicopatas astênicos
324
8.3.14. Síndromes psicopáticas
Alguns autores, ao largo das classificações tradicionais, prefe
rem falar em síndromes psicopáticas, com sintomas comuns, mais
relacionados com o transtorno de personalidade anti-social ou
dissociai (psicopatas sem sentimentos, amorais ou perversos). São
exemplos os roteiros de H. Cleckley, Gray e Hutchison e W. MacCord
e J. MacCord (in Maranhão, 2003, p. 86):
Síndromes psicopáticas
H. Cleckley Gray e Hutchison MacCord e MacCord
Encanto superficial e boa inteli É emocionalmente ima
gência. turo.
Ausência de delírios ou outros
sinais de pensamento ilógico.
Ausência de manifestações psi-
coneuróticas.
Inconstância.
Infidelidade e insinceridade.
Falta de remorso ou vergonha. É incapaz de sentir cul Sente escassos sentimentos
pa. de culpa.
Falta-lhe senso moral.
Conduta anü-social inadequada Falta-lhe controle sobre É altamente impulsivo.
mente motivada. os impulsos. As ações dos psicopatas ca
recem de planejamento.
Falta de ponderação e fracasso Não aprende pela expe Movido por desejos incon-
em aprender pela experiência. riência. trolados.
Egocentrismo patológico e inca É egocêntrico. Desviada capacidade de
pacidade de amar. amar.
Pobreza geral nas relações afe E incapaz de estabelecer É associai.
tivas. relações significativas.
Falta específica de esclarecimen A punição não lhe alte
to interior (insight). ra o comportamento.
Irresponsabilidade nas relações Falta-lhe senso de res
interpessoais. ponsabilidade.
Tendência a conduta fantástica É agressivo.
com ou sem uso de álcool.
Raramente suicidas.
Vida sexual impessoal, trivial e
pobremente integrada.
Incapacidade de seguir um pla É crônica ou periodica Cada momento é uma fração
no de vida. mente anti-social. de tempo desvinculada das
demais.
325"
É claro que qualquer dos dados, considerado isoladamente e sem
continuidade no tempo, não pode levar a um diagnóstico. Apenas quando
analisados em conjunto e persistentes é que podem caracterizar uma
eventual síndrome psicopática (Maranhão, 2003, p. 138).
326
— hipocondria,-
• transtornos dissociativos:
— amnésia dissociativa;
— fuga dissociativa;
— transtorno dissociativo de identidade;
— transtorno de despersonalização;
• transtornos do humor:
— transtornos depressivos;
• transtornos factícios:
Não obstante apresentarem-se sob as mais variadas formas, se
gundo Porot (in Maranhão, 2003, p. 64), as neuroses têm sintomas
relativamente comuns que se caracterizam por:
a) perturbação afetiva, mais ou menos consciente, que se ex
pressa por uma hiperemotividade parasita;
b) comportamento de inadaptação à realidade e ao meio social,
por impossibilidade de desviar o interesse de si mesmo e usar a ativi
dade para objetivo da vida prática;
c) sensação de insuficiência afetiva e sexual (em sentido amplo),
por incapacidade de sobrepujar os conflitos da via moral íntima;
d) uma insatisfação vital que se traduz por:
I — desordens neurovegetativas;
I I — fuga dos objetos simbolicamente relacionados ao conflito;
TTT— atos mágicos de anulação do conflito;
IV — conversão da tensão emocional em expressões corporais.
Juridicamente, é bastante discutível se esses quadros (neuroses)
deveriam ser incluídos entre os modificadores da imputabilidade pe
nal e capacidade civil.
Raramente os neuróticos se tomam criminosos, e quando isso
acontece em poucas ocasiões é possível ligar o comportamento cri
minoso ao transtorno mental.
Heber Vargas (1990, p. 199) apresenta um quadro comparativo
entre os transtornos classificados como neuróticos e psicóticos:
327
Neurose Psicose
Comportamento geral Leve grau de descom Elevado grau de d es
pensação da personalida compensação da perso
de, não sendo atingidos nalidade; o contato com
o contato com a realida a realidade é muito atin
de e a situação social. gido. O psicótico fica
impossibilitado de atua
ção social.
Natureza dos sintomas ' Grande amplitude de sin Grande amplitude de sin
tom as p sic o ló g ic o s e tomas psicológicos, com
somáticos. Não há, po d elírios, alu cin ações,
rém, alucinações ou ou embotamento emocional
tros desvios extremos no e outros comportamentos
pensamento, sentimento anormais.
ou ação.
Orientação Raramente perde a orien Geralmente perde a ori
tação ambiental. entação ambiental.
Autoconhecimento Tem geralmente certa Raramente tem compre
compreensão da natureza ensão da natureza de seu
de seu estado psíquico. estado psíquico.
Aspectos sociais Raramente o seu com Freqüentemente o seu
portamento social é pre comportamento é preju
judicial ou perigoso para dicial ou perigoso para si
si e para a sociedade. . e pata a sociedade.
Tratamento médico Raramente necessita de Geralmente precisa de
internação hospitalar. internação hospitalar.
Tratamento j uiídico Salvo em situações espe- Em geral é penalmente
cialíssimas, é imputável inimputável e incapaz ci-
e capaz. vilmente.
9. FATORES M ESOLÓGICOS
9.1. Civilização — silvícolas
“índio ou silvícola é todo indivíduo de origem e ascendência
pré-colombiana que se identifica e é identificado como pertencente a
um grupo étnico cujas características culturais o distinguem da so
ciedade nacional” (art. 3a da Lei n. 6.001/73).
Quanto ao grau de integração, os índios podem ser considera
dos isolados, em vias de integração ou integrados (art. 4a da Lei n.
328
6.001/73). Os não integrados ficam sujeitos a um regime tutelar pre
visto na Lei n. 6.001, de 19 de dezembro de 1973 (Estatuto do índio).
O Código Penal não faz referência expressa aos silvícolas. En
tretanto, os índios não aculturados ou inadaptados podem ser consi
derados semi-imputáveis, porque o choque de culturas muitas vezes
não permite por parte do silvícola a intelecção do caráter ilícito do
ato praticado, fazendo jus a uma atenuação da pena (art. 56 da Lei n.
6.001/73). Os índios aculturados ou adaptados, por outro lado, têm
desenvolvimento mental suficiente para compreender o caráter ilíci
to do ato praticado e, portanto, devem ser tidos como imputáveis.
CP
Art. 61. São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem
ou qualificam o crime:
I — a reincidência;
Art. 63. Verifica-se a reincidência quando o agente comete novo crime, depois de
transitar em julgado a sentença que, no País ou no estrangeiro, o tenha condena
do por crime anterior. ______________________________________________
329----
11. TEM PERAM ENTO
Entende-se por temperamento “a tendência constitucional do
indivíduo para reagir de certo modo ao meio ambiente” (Campbell,
Dicionário de psiquiatria, 1986, p. 600). De acordo com os estí
mulos externos, algumas pessoas são mais tranqüilas, outras mais
vigorosas, algumas mais recatadas, outras mais impulsivas etc.
Essas tendências pessoais podem ser reconhecidas desde a infân
cia e não se confundem com o caráter, que é um conceito mais amplo.
A maior parte dos autores considera o temperamento como fa
tor irrelevante em termos de modificação da imputabilidade penal e
da capacidade civil. Genival França (1998, p. 347), ao contrário, en
tende que o temperamento deve ser considerado, pois não é possível
colocar em uma mesma balança delitos cometidos por pessoas com
temperamentos impulsivos, que agem de inopino, e os praticados por
pessoas com temperamentos tranqüilos, que perpetram o crime de
modo estudado, planejado, com precisão e frieza.
As classificações mais comuns, em medicina legal, relaciona
das com o temperamento são as de Emest Kretschmer e de W. Sheldon,
que procuram estabelecer uma relação entre a constituição física do
indivíduo e a sua personalidade.
O primeiro imaginou quatro tipos básicos de indivíduos:
a) picnico, caracterizado por um corpo de contornos arredon
dados, com amplas cavidades corporais, ao qual se associa uma
tendência à personalidade ciclotímica, alternando estados de eufo
ria e hiperatividade com outros de depressão, tristeza e inatividade;
b) leptossômico, portador de um corpo delgado ao qual se asso
cia uma tendência à personalidade esquizotímica, ou seja, que tende
à esquizofrenia, que mostra reações desproporcionais às situações
vividas;
c) atlético, possuidor de um Corpo bem desenvolvido ao qual
corresponde tendência a uma personalidade viscosa, maçante; e
d) displástico, caracterizado por um corpo que não se enquadra
em nenhum dos três tipos anteriores e que demonstraria também uma
tendência à personalidade ciclotímica (a maioria dos autores ignora
esse quarto tipo, incluindo suas características no picnico).
330
Classificação de Kretschmer
Tipo Variáveis
Tipo
morfológico Sensibilidade Ritmo psíquico Psicomotilidade temperamental
Explosivo Estimulável,
Atlético X Mantém mas lento Viscoso
fleugmático
Tipologia de Sheldon
Constituição Temperamento
Endomorfismo Visccrotonia
Mesomorfismo Somatotonia
Ectomorfismo Cerebrotonia
331
Finalmente os ectomorfos e cerebrotônicos seriam aqueles de
frágil com pleição física e cuja personalidade é m arcada pela
introversão e predomínio da atividade mental sobre a física.
332
B ib l io g r a f ia
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