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24/04/2019 Lucrecia Martel: "A pobreza do cinema latino é não representar a sociedade" | Mulher no Cinema

Lucrecia Martel: “A pobreza do cinema latino é não representar a sociedade”


entrevistas por Luísa Pécora - 29 de março de 2018

Lucrecia Martel não é o que se chamaria de uma cineasta prolí ca. Aos 51 anos, tem quatro longas-metragens
de cção no currículo, sendo que o mais recente, Zama, estreia nesta semana no Brasil após um intervalo de
quase dez anos em relação ao anterior, o ótimo A Mulher Sem Cabeça. Num mundo que supervaloriza a
produtividade e nem tanto a memória, não deixa de surpreender que a diretora argentina se mantenha como
uma referência tão forte, principalmente no cinema latino-americano. Por que, a nal, não nos esquecemos
de Lucrecia Martel?

Ela mesma tem seu palpite: “Meus lmes não apostam no argumento”, a rmou, em entrevista ao Mulher no
Cinema durante passagem por São Paulo (SP). “Antes do argumento, já entreguei ao espectador um montão
de coisas pelas quais ele pode navegar, pensar. Isso faz com que o público trabalhe muito mais a cabeça, e
também a memória.”

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24/04/2019 Lucrecia Martel: "A pobreza do cinema latino é não representar a sociedade" | Mulher no Cinema

Zama é o primeiro lme de época da diretora, bem como o primeiro protagonizado por um homem (Daniel
Giménez Cacho) e adaptado de um livro. É, também, o primeiro que não se passa em sua cidade natal, Salta, e
que troca os interiores das casas de famílias argentinas por paisagens ao ar livre. Apesar das diferenças, o
longa dialoga com os trabalhos anteriores de Martel – além de A Mulher Sem Cabeça, A Menina Santa (2004)
e O Pântano (2001) -, no minimalismo narrativo, na atenção dada ao som, na história que se revela aos poucos
e no protagonista que parece fora de lugar.

Foi durante uma viagem de barco que a diretora leu o romance de Antonio Di Benedetto sobre Don Diego de
Zama, o cial da Coroa espanhola alocado em um povoado argentino durante o século 18. Há muitos anos
longe de casa, ele espera por uma transferência que sempre lhe é prometida, mas nunca chega, e atura o
presente pensando no futuro. Martel reconheceu em Zama o que vê como um mal dos tempos atuais: “Me
parecia que a obra falava sobre o mundo da classe média da colônia, que não sei como se chamaria, mas que
tem os mesmos problemas da classe média da Argentina hoje”, disse. “A classe média está sempre pensando
em outro lugar, outro modelo, e não consegue se conectar com o que está à volta.”

Daniel Giménez Cacho em cena de “Zama”, novo lme de Lucrecia Martel

Filmar o longa não foi tarefa fácil: para levantar o orçamento de cerca de US$ 2,5 milhões (mais de R$ 8
milhões), foi preciso reunir quase 30 produtores, que incluem Pedro Almodóvar, Gael García Bernal, Julia
Solomonoff e a brasileira Vania Catani, dona da Bananeira Filmes. A lmagem levou nove semanas e, durante
a pós-produção, Martel foi diagnosticada com câncer. Foram vários cortes até que o lme chegasse ao Festival
de Veneza no ano passado e, agora, aos cinemas brasileiros.

Na entrevista ao Mulher no Cinema, a diretora argentina falou sobre Zama, fez críticas à Net ix e defendeu a
necessidade de políticas públicas para a construção de uma produção audiovisual que inclua mais mulheres e
minorias: “A maior pobreza do cinema latino-americano, hoje, é que a sociedade está subrepresentada.”

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24/04/2019 Lucrecia Martel: "A pobreza do cinema latino é não representar a sociedade" | Mulher no Cinema

Por que você quis adaptar este romance?


Quando li a obra, as coisas que aconteciam ao personagem me pareceram muito próximas, e não algo do
século 18. A leitura me deu grande euforia, e senti que podia fazer um lme com essa euforia. Não era tanto
uma questão de levar o livro ao cinema, porque isso é algo absurdo, mas de levar ao cinema o que o livro
tinha feito em mim. Me parecia que a obra falava sobre o mundo da classe média da colônia, que não sei
como se chamaria, mas que tem os mesmos problemas da classe média da Argentina hoje – e tenho certeza
de que no Brasil ocorre o mesmo. A classe média está sempre pensando em outro lugar, outro modelo, e não
consegue se conectar com o que está à volta.

Em entrevista ao British Film Institute você disse que trabalhar o personagem de Zama fez com que
se aproximasse do pior que existe em você. De que forma?
Justamente por isso, por perseguir as coisas futuras e depreciar um pouco o tempo presente. Acho que é um
mal da época, generalizado. Estamos sempre trabalhando para o futuro e não para o presente.

A Argentina em especial é conhecida pela nostalgia, pela valorização de um suposto tempo que não
tinha tantos problemas quanto o presente. Mas seu lme mostra um passado bastante problemático,
sobretudo em relação ao tratamento de índios e negros. Foi sua intenção romper com essa ideia
nostálgica do passado argentino?
Acho que ninguém realmente acredita que houve um passado melhor. Em que momento? Não sei que ano foi
melhor! Se queremos que haja um tempo melhor, precisa ser um tempo em que pensemos mais
generosamente sobre o nosso país. A Argentina pensa muito sobre si mesma, e quando digo “Argentina”
estou falando de uma porção mínima, porque o resto da população tem outros problemas, assim como aqui
no Brasil. Toda essa história heróica do século 19, essas coisas da independência, todas essas ideias…
acreditamos nelas, mas elas não são corretas. Os índios seguem igual ou pior do que antes. Os negros não são
escravos, mas quase são. Acreditamos e contamos uma história que não se re ete na realidade.

“Toda essa história heróica do século 19, essas coisas da


independência, todas essas ideias…acreditamos nelas, mas elas
não são corretas. Os índios seguem igual ou pior do que antes. Os
negros não são escravos, mas quase são. Acreditamos e contamos
uma história que não se re ete na realidade.”

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Cena de “Zama”, dirigido por Lucrecia Martel

Tem se falado muito sobre a representação das mulheres e das minorias, tanto em frente quanto por
trás das câmeras. Você acredita que existe uma nova oportunidade de se criar um cinema latino-
americano que seja mais parecido com a sociedade latino-americana, ou seja, um cinema menos
branco, masculino e de classe média alta?
A maior pobreza do cinema latino-americano, hoje, é que a sociedade está subrepresentada. Não é toda a
sociedade que tem acesso a produzir imagens e narrativas audiovisuais, é uma minoria de classe média alta e
branca. Isto é uma pobreza. A vida dos nossos países é muito complexa, e precisamos que exista muita gente
olhando e pensando a partir de muitos setores. Se não atingirmos isso, nunca vamos ter uma ideia sobre
quem somos. É preciso ajudar o cinema de outros lugares a aparecer. E tem de ser com políticas culturais que
permitam o nanciamento de projetos pequenos, de outros setores. Os projetos existem, as pessoas com
vontade de fazer existem. Faltam existir as vias para se conseguir nanciamento.

Mas isso está mudando?


Vai mudando cada vez mais, inevitavelmente, porque as pessoas não são tontas. E também porque, não sei
como é aqui no Brasil, mas na Argentina há uma quantidade gigantesca de mulheres no cinema. Penso que,
em números, são maioria. E vai ser assim porque trata-se de uma atividade ideal para as mulheres.

Por quê?
Primeiro porque para fazer cinema é preciso conversar muito, e nós gostamos de conversar. E também
porque somos muito resistentes à ideia de fracasso, e o cinema cria várias situações em que é preciso lidar
com o fracasso.

“Não é toda a sociedade que tem acesso a produzir imagens e


narrativas audiovisuais, é uma minoria de classe média alta e
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branca. Isto é uma pobreza. A vida dos nossos países é muito


complexa, e precisamos que exista muita gente olhando e
pensando a partir de muitos setores. Se não atingirmos isso, nunca
vamos ter uma ideia sobre quem somos.”

Lucrecia Martel no set de “Zama”

Mulheres diretoras ainda são pouco citadas em cursos e livros sobre a história do cinema. Quando
começou sua carreira, você tinha alguma referência de cineasta mulher?
Meu incentivo para fazer cinema foram minhas avós, não porque queriam que trabalhasse nisso, mas porque
tinham a coisa da conversa, e eu venho muito da tradição oral. Mas, curiosamente, quando era adolescente o
lme mais bem-sucedido da Argentina era Camila: O Símbolo de uma Mulher Apaixonada, que estreou em
1984 e era produzido e dirigido por mulheres [Lita Stantic e María Luisa Bemberg]. Na minha fantasia, pensei
que era uma atividade para mulheres. Por engano! [risos].

Na sua trajetória, enfrentou di culdades por ser mulher?


Tenho certeza que sim, mas não me dei conta.

Muito se falou sobre como Zama marca novidades na sua obra, mas para mim ele dialoga bastante
com seus outros lmes. Você vê conexões e semelhanças entre este trabalho e os anteriores?
Fiz todos da mesma maneira. Entendo que Zama pareça diferente para as pessoas pelo fato de ter mais
cenas exteriores. Tem mais exteriores porque requeria mais exteriores. Tem mais gente. Tem mais gurino
[risos]. Mas não o z de outra forma e para mim também se parece muito [com os trabalhos anteriores].

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“Não tenho aquele entusiasmo de fazer outro lme logo em


seguida. Para mim, as ideias não são assim. E para que tanto lme?
Para que mais lmes? Já existem tantos lmes que não são vistos,
para que acrescentar outros?”

Você não lança muitos lmes, mas continua sendo um nome forte do cinema latino-americano. Na sua
opinião, porque seus trabalhos cam com as pessoas? Por que não esquecemos de você?
Porque não acredito no argumento. Meus lmes não apostam no argumento. Antes do argumento, já
entreguei ao espectador um montão de coisas pelas quais ele pode navegar, pensar. Isso faz com que o
público trabalhe muito mais a cabeça, e também a memória. Você não sai do cinema e liga para o seu amigo
para dizer: “Vá ver Zama agora!”. Ninguém sai eufórico dos meus lmes. E veja, o lugar que tenho no cinema,
com poucos longas, [conquistei] com o tempo, não foi imediatamente. Não é que as pessoas viram os lmes e
falaram “sim”. Isso nunca aconteceu comigo. Sempre houve pouca gente que disse “sim, este lme é bom”
logo naquele momento. O reconhecimento foi com o tempo.

Estes intervalos entre os lmes são importantes para você e o seu processo?
Não sinto os intervalos porque sempre estou fazendo coisas. Mas o que não tenho é aquele entusiasmo de
fazer outro lme logo em seguida. Para mim, as ideias não são assim. E para que tanto lme? Para que mais
lmes? Já existem tantos lmes que não são vistos, para que acrescentar outros?

Em entrevista ao El País você disse que as séries de televisão eram um retrocesso. Queria saber o que
você acha da Net ix e de outras plataformas de streaming especi camente no caso do cinema. Há
muita discussão, por exemplo, sobre se estes lmes devem concorrer em festivais e ao Oscar. Como
vê esta outra forma de fazer cinema?
A Net ix é a mesma coisa que no passado eram MGM, Paramount ou United Artists: megaempresas que não
estão em busca de que os países expressem suas culturas e seus con itos, mas, sim, em fazer negócio. O que
penso sobre a Net ix é que ela não me importa. Estou interessada no que os governos pensam sobre como
incentivar a produção de cinema. A Net ix é uma empresa e pensa como uma empresa. O que quer? Fazer
dinheiro. Não está pensando na cultura. Me dá muita pena ver gente jovem desesperada para fazer uma série
e apresentar à Net ix. Porque a maioria dessas pessoas trata de atender ao que a Net ix busca, e não ao que
de fato quer fazer e à sua relação com mundo. Acredito em produzir lmes para os espectadores, não para a
Net ix. Não me importo nem um pouco com a Net ix. Me parece muito medíocre tudo o que está lá. Creio
que um lme meu está [no catálogo], mas da mesma forma, me parece uma plataforma medíocre.

“A Net ix é uma empresa e pensa como uma empresa. O que


quer? Fazer dinheiro. Não está pensando na cultura. Me dá muita
pena ver gente jovem desesperada para fazer uma série e
apresentar à Net ix. Porque a maioria trata de atender ao que a
Net ix busca, e não ao que de fato quer fazer e à sua relação com
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mundo. Acredito em produzir lmes para os espectadores, não


para a Net ix. Me parece muito medíocre tudo o que está lá.”

Imagem de “Zama”, dirigido por Lucrecia Martel

Então, para você, o caminho a se seguir está mais ligado ao incentivo do governo?
Veja, os Estados Unidos protegem sua indústria, e sempre zeram isso no caso do cinema. Estamos cegos se
pensamos que o livre mercado é livre. A única forma de os cinemas nacionais crescerem, se fortalecerem e
encontrarem seus próprios caminhos é que os governos tomem medidas inteligentes e criem políticas
culturais. Aqui no Brasil foi tomada uma medida inteligente, não sei se durante o governo de Lula ou Dilma, de
apoiar a produção audiovisual das diferentes regiões. E dá para ver o resultado.

Uma produção audiovisual menos concentrada em apenas uma parte do país.


Claro. E isso só pode acontecer com políticas culturais inteligentes. Quem fala contra a intervenção ou o
posicionamento do Estado a respeito do cinema tem a fantasia de que a indústria norte-americana não está
protegida.

Que conselho você daria para as mulheres que querem ser diretoras?
Em primeiro lugar, que há muitas coisas a se fazer no cinema, não só dirigir. Há roteiristas, gente que trabalha
na parte elétrica, na fotogra a, na produção…E que con em nesta ideia de conversar e de se juntar com
pessoas com as quais se entendem. As equipes se formam da mesma maneira que os grupos de amigos, não
com mesquinharia ou con itos. E nisto acredito que temos muita prática: as mulheres sabem lidar com suas
famílias, são as que mais trabalham as relações de casais. Temos o treinamento perfeito para fazer cinema.

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diretora Lucrecia Martel favoritos no acervo da Criterion americanas em SP e RJ
20 de fevereiro de 2017 Collection 21 de setembro de 2016
Em "vídeos" 1 de outubro de 2018 Em "notícias"
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