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Monografia
IMPORTANTE:
Rio de Janeiro
Abril/2010
UNIVERSIDADE GAMA FILHO
COORDENAÇÃO DE PÓS-GRADUAÇÃO E ATIVIDADES COMPLEMENTARES
DEPARTAMENTO DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
COORDENADORIA DE CURSOS DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU
Rio de Janeiro
Abril/2010
UNIVERSIDADE GAMA FILHO
COORDENAÇÃO DE PÓS-GRADUAÇÃO E ATIVIDADES COMPLEMENTARES
DEPARTAMENTO DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
COORDENADORIA DE CURSOS DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU
Prof. _________________________
Membro
Prof. _________________________
Membro
Este trabalho investiga todo o processo de coordenação das Ofertas Públicas follow-ons,
demonstrando os inúmeros conflitos de interesses que existem, tanto por parte do
Coordenador como por parte da empresa emissora, durante a atividade de coordenação
de uma oferta. Interesses que muitas vezes explicam as distorções que ocorrem nas
cotações das empresas, semanas antes e semanas depois da realização dessas ofertas.
Chegando a constatar que, muitas vezes, esse processo ocorre de uma forma sem
compromisso algum por parte da empresa emissora e com falta de diligência do
Coordenador da oferta. Sendo utilizada única e exclusivamente como artifício de captação
de dinheiro fácil para as empresas emissoras, como de ganhos fáceis para os
Coordenadores, preferencialmente a preços sobrevalorizados, indo contra os interesses
dos investidores. Casos tão escusos, que muitas vezes pode-se colocar em dúvida até
que medida ocorreu manipulação de mercado ou uma atuação legítima do Coordenador.
Conclusão.. ........................................................................................................................ 54
Esta pesquisa foi realizada com intuito de analisar os inúmeros movimentos que
ocorrem durante uma oferta pública follow-on, relacionando-os às forças de compra e
venda do mercado e à coordenação da oferta.
Nesta pesquisa, fez-se ampla análise do material usado como referência na área
econômico-financeira, entre eles: a Apostila do Curso de Formação de Operador no
Mercado de Ações, elaborada pela própria ANCOR/BM&FBovespa, o livro de Mercado de
Capitais da própria Comissão Nacional de Bolsas, as duas grandes “bíblias” de Mercado
Financeiro dos tão conceituados Alexandre Assaf e Eduardo Fortuna. Infelizmente,
constatou-se que em todas as publicações existem grandes equívocos quando se referem
a Oferta Pública, Processo de Abertura de Capital e suas demais etapas.
1
Formação de preço referente a Oferta Pública. Esse procedimento será abordado mais tarde.
2
Estratégia de investimento de longo prazo, onde o investidor fica posicionado (segurando) um ativo por um longo período,
com interesse não só na sua valorização, mas em seus dividendos, juros por capital, bonificações e demais proventos.
Capítulo 1: Processo de Oferta Pública
Com o ganho de liquidez nas bolsas de valores mundo afora especialmente nas
bolsas emergentes como China, Brasil, México e com a globalização e integração entre os
mercados, o papel do mercado acionário passou a ser fundamental na economia de todos
os países. Globalmente, a bolsa passou a ser, senão o principal, um dos principais
mecanismos de captação de recursos destinados a investimento produtivo.
3
http://www.cvm.gov.br/port/estagio/MateriasobreaCVMeoMVM.asp
4
Fonte: O Estado de São Paulo – http://www.mzweb.com.br/mz/web/arquivos/MZ_IPOS_Passaram_Teste_20071205_ port.pdf
– Publicada em 05/12/2007. Acesso em: 01 mar. 2010.
poupança (capital livre) e investimento, no sentido de mobilizar recursos da poupança e
transferi-los para investimentos. São eles:
Aqui cabe ressaltar um fato que é a prova mais concisa de que o Brasil se tornou
um dos grandes players mundiais no seguimento de ofertas públicas. Mesmo depois da
crise que ocorreu no final de 2008, em um ano extremamente cauteloso, o Brasil foi o país
que registrou a maior oferta pública do mundo, no ano de 2009. Foi a oferta pública da
unidade brasileira do banco espanhol Santander, onde o Santander Brasil passou a ter
suas units6 listadas na BM&FBovespa e na bolsa de Nova Iorque (NYSE – New York
Stock Exchange), ao mesmo tempo. A oferta captou um pouco mais que R$14,1 bilhões
(U$ 8,06 bilhões).
Por se tratar de uma Oferta Primária (definição na pág. 13), todos os R$14,1
bilhões captados foram investidos na empresa. Com isso o Santander
5
Lei no 10.303, de 31 de outubro de 2001.
6
Certificados de depósito de ações, que no caso do Banco Santander representam cada uma, 55 ações ordinárias e 50 ações
preferenciais – a grosso modo, é como se cada unit correspondesse a um pacote de 55 ações ordinárias e 50 ações
preferenciais do Banco Santander Brasil. Unit: Combinação de valores mobiliários, negociados como se fossem uma unidade.
Exemplos: a) 1 unit = 12 ações mais 4 bônus de subscrição. b) 1 unit = 1 ação ordinária mais 4 ações preferenciais.
passou a ser a quinta maior empresa por valor de mercado do país, passando de R$81,6 bilhões para
R$95,7 bilhões – valor 22,5% superior ao do Banco do Brasil (R$78,1 bilhões) e 4,6% menor ao do
Bradesco (R$100,1 bilhões), de acordo com levantamento da consultoria Economatica7. (TERRA
NOTÍCIAS, 2009).
Além disso,
segundo o Banco Central, as reservas internacionais do País aumentaram em US$5,021 bilhões entre os
dias 7 e 8 de outubro e chegaram ao recorde de US$231,589 bilhões, dado que reflete as compras
realizadas pela autoridade monetária no dia 6, quando houve a entrada da maior parte dos dólares
relacionados à oferta do Santander Brasil. (TERRA NOTÍCIAS, 2009).
São exatamente todas as etapas desse processo que serão descritas e detalhadas
abaixo. E, assim que se entender todos os mecanismos de uma oferta, será abordada: a
forma de coordenação dessas ofertas.
7
http://www.economatica.com.br/
8
Valores mobiliários.
9
Atividade de distribuição pública feita pelos bancos, corretoras e distribuidoras e valores mobiliários.
companhia emissora. Também é possível termos subscrições privadas, onde uma
empresa consegue emitir ações e captar recursos sem ter que realizar uma oferta pública.
A oferta pública pode ser de dois tipos: uma oferta primária ou secundária.
Oferta Primária: Oferta pública cujo objetivo é a venda de novas ações com a
captação de recursos para a empresa investir nela mesma (seja para expansão, compra
de máquinas, pagamento de dívidas, ou qualquer outro fim).
Também podemos ter uma Oferta Pública mista, ou seja, uma Oferta Pública
Primária e Secundária ao mesmo tempo.
IPO: Iniciais para a sigla em inglês Initial Public Offering (Oferta Pública Inicial). É
realizada quando a empresa vende suas ações através de uma oferta pública, seja
primária, secundária ou mista, para colocação na Bolsa de Valores pela primeira vez. Só
então as suas ações passam a ser listadas (existir) dentro da Bolsa de Valores. Só pode
haver uma IPO, pois não se pode listar pela primeira vez ações de uma empresa que já
se encontra listada. A única possibilidade de haver mais de uma IPO da mesma empresa
é quando a empresa lista suas ações na bolsa, depois retira as suas ações da bolsa
(possivelmente através do fechamento de seu capital) e volta a listar novamente. Temos
como exemplo a Cremer, que fechou seu capital em 2004 e voltou a abrir em 2007.
Mantega: oferta de ações da Petrobras será de US$ 50 bi, a maior da história do capitalismo.
"Para este ano, nós deveremos fazer o maior IPO da história do capitalismo, que será a
capitalização da Petrobras"
- O Brasil está fazendo IPOs importantes. No ano passado, foi um dos poucos países que fizeram
IPOs, abertura do capital de empresas. Chegamos a fazer o segundo maior IPO do mundo aqui no
Brasil, do Santander. Para este ano, nós deveremos fazer o maior IPO da história do capitalismo, que
será a capitalização da Petrobras. Será o maior IPO, a maior abertura de capital da história do
capitalismo, em torno de US$ 50 bilhões. O mercado de capitais brasileiro está preparado para isso, está
sólido, tem regras, credenciais. Estamos preparados para atrair capital - disse o ministro, em palestra a
empresários de Belo Horizonte nesta quarta-feira.
Apesar dos termos usados por Mantega, o analista do setor de petróleo da corretora Ágora, Luiz
Otávio Broad, explica que uma oferta de ações só é um IPO quando a empresa vende, pela primeira vez,
papéis no mercado de ações, o que não é o caso da Petrobras, que já tem ativos negociados na Bolsa
de Valores de São Paulo. Portanto, a capitalização que a empresa fará tampouco pode ser classificada
como uma abertura de capital.
Segundo Mantega, a oferta da Petrobras significa "que ela terá mais capacidade de captação de
recursos para fazer os investimentos que ela precisa fazer".
O ministro afirmou que o Banco Santander fez no Brasil, ano passado, o segundo maior IPO do
mundo (oferta pública inicial, na sigla em inglês), e o país está preparado para o passo a ser dado pela
estatal.
- Embora seja uma empresa grande, o empreendimento que nós temos pela frente, essa
exploração é de grande envergadura. Com a captação, ela terá recurso próprio e continuará pegando
dinheiro no mercado - explicou.
Entre os investimentos necessários, o ministro citou a compra de 40 sondas de US$ 1 bilhão
cada. Além disso, a empresa terá de investir em navios e melhorias de infraestrutura. (FABRINI;
SCHREIBER, 2010, O Globo Online, grifo nosso)
Esta é uma operação financeira na qual só pode ser intermediada pelos bancos de
investimentos, corretoras de valores mobiliários e distribuidoras de valores mobiliários.
São essas instituições que intermedeiam o lançamento e distribuição do ativo objeto a ser
subscrito ou distribuído para sua negociação no mercado de capitais. A instituição
financeira que realiza operações de underwriting é chamada de underwriter10.
Para uma empresa fazer um underwriting ela deve passar por diversos ajustes em
setores como jurídico, organizacional, financeiro, etc, podendo contratar profissionais
especializados para otimizar tal processo. Dentre eles podemos listar: adaptação do
Estatuto Social para se adequar a eventuais exigências de mercado ou de segmentos
especiais de negociação; promoção de cisões e incorporações de forma a viabilizar a
adequação da empresa à abertura; designação do Diretor de Relação com os
Investidores; contratação de auditoria independente, etc.
10
Os termos se confundem. O termo é utilizado nos EUA para as instituições responsáveis pela colocação dos títulos
mobiliários no mercado. Ou seja, seriam os coordenadores de uma Oferta, seja ela primária ou secundária. Apesar de que, se
traduzirmos ao pé da letra, underwriter, seria “subscritor”. O que nos leva a pensar, equivocadamente, que só poderia se
aplicar à uma Oferta Primária (onde seria a única forma possível de se subscrever, de fato, as ações). Nesse caso, talvez a
melhor “tradução” para underwriter seja distribuidor/coordenador e não subscritor.
Segunda Etapa – Contratação da Instituição Financeira Coordenadora
Grande parte das informações requisitadas nas Instruções acima deve fazer parte
do prospecto de emissão. Sobre o prospecto, a Lei 6.404/76 (Art. 84) afirma que o
documento deve apresentar, precisa e claramente, as bases da companhia e os motivos
que justifiquem a expectativa de bom êxito do empreendimento e outros fatores como o
valor do capital social a ser subscrito; as obrigações assumidas pelos fundadores; as
vantagens particulares, a que terão direito os fundadores ou terceiros e a solução prevista
para o caso de excesso de subscrição. Nele você encontra praticamente todas as
informações relevantes sobre a empresa emissora. É um raio-x da empresa. É com base
no Prospecto que os investidores avaliam e decidem se irão ou não participar da oferta e
que preço estão dispostos a pagar para subscrever as ações da empresa emissora.
Para que a ação possa ser negociada em bolsa ou mercado de balcão organizado
(mercado secundário) é necessário que se obtenha registro para que o valor mobiliário
seja listado.
11
Instrução CVM no 480, de 7 de dezembro de 2009 e os arts. 21 e 22 da Lei nº 6.385, de 7 de dezembro de 1976.
Sétima Etapa - Formação do Pool de Distribuição
14
Prática de comprar ativos no dia do lançamento por oferta pública, e vendê-los em curto prazo, normalmente 24 a 48 horas,
quase sempre com lucro substancial.
favoravelmente sobre a empresa. Nos Estados Unidos, por exemplo, um designer de
moda realizou um road show com modelos famosas.
Apesar dos brindes e das modelos obterem destaque, a equipe do road show
também conta com analistas que emitirão opiniões positivas sobre a rentabilidade futura
da empresa. Entretanto, ninguém que esteja envolvido com a empresa pode falar
publicamente sobre algo que não esteja no prospecto durante o período que antecede a
oferta pública. Esse período é conhecido como Período de Silêncio.
Essas são as etapas para a organização de uma oferta pública. É desta forma que
as ações (ou outros valores mobiliários) são distribuídos ao público em geral. O investidor
se cadastra em uma corretora (que intermediará a operação), terá acesso a todas as
informações relevantes da empresa (através do Prospecto) e tomará a sua decisão de
investimento. Ele pode optar em não participar da oferta ou em participar. Se participar, o
investidor tem que definir as suas intenções de investimento.
Para participar de uma oferta pública, o investidor deve efetuar um pedido de
reserva junto a da sua corretora. No pedido de reserva, ele irá especificar qual o
montante financeiro ele está disposto a investir e qual o preço máximo ele está disposto a
pagar por ação. Isso não garante que ele irá conseguir participar da oferta, pois o preço
da ação pode ser estabelecido acima do preço que ele estava disposto a pagar, ou, pode-
se ter uma demanda muito grande de investidores querendo reservar (comprar) a oferta e
não ter ações (ou outros valores mobiliários) suficientes para atender a todos os pedidos
de reserva. Nesse caso, tem-se um rateio e, nem todos os investidores conseguem
comprar todo o montante que gostariam. Muitas vezes um investidor faz uma reserva de
R$300.000,00 e acaba levando menos de R$50.000,00 da oferta. Todas essas
peculiaridades são definidas dentro de um processo de formação de preço chamando de
bookbuilding.
Cada investidor indica quantas ações ele quer reservar (comprar) e qual o preço
que está disposto a pagar. O coordenador tabula estas informações por ordem crescente
de preço, de forma a obter qual seria a quantidade acumulada a determinado preço. Por
exemplo, se somente 10 investidores colocaram ordens de 2 milhões de ações, cada, a
R$15,00 por ação, este não deve ser o preço da oferta.
Isso ocorre, pois, o total de ordens seria de 20 milhões de ações (10 investidores x
Reservas de 2 milhões de ações cada) a um preço de R$15,00, o que totaliza um total de
R$300 milhões – que fica abaixo dos R$500 milhões que estão sendo ofertados pela
empresa XYZ. A solução é baixar o preço, de forma que outros investidores participem da
oferta. Assim, o coordenador analisa o livro de oferta e atinge o patamar de preço pelo
qual R$500 milhões possam ser vendidos confortavelmente.
No caso acima teríamos rateio, pois tivemos mais demanda que oferta. A oferta é
de R$500 milhões, e tivemos uma demanda de R$630 milhões ao preço de R$14,00 a
ação. Uma demanda em torno de 25% superior. A grosso modo, quem efetuou uma
reserva em torno de R$1 milhão, vai acabar levando algo em torno de R$750 mil (25% a
menos).
15
Considerando valores aproximados.
milhões que a empresa deseja captar, provavelmente o coordenador diminuiria ainda
mais o preço, fazendo testes em 13,90, 13,80, 13,70, até chegar em um valor que
conseguisse atender o valor da oferta.
Este procedimento é utilizado tanto para ofertas de ações como também para
emissões de títulos de renda fixa, como debêntures, Eurobonds, bônus globais e outros.
O ponto em comum é sempre o mesmo: identificar a que preço a quantidade de títulos
oferecidos pode ser vendida de forma que a operação seja bem-sucedida.
Antigamente esse era um processo manual, com listas de papel no qual o interesse
dos investidores era anotado a lápis. Hoje, por exemplo, a BMF&Bovespa disponibiliza e-
Bookbuilding, ferramenta para a apuração de intenções de compra de ativos via Internet.
Este sistema permite a realização de processos de bookbuilding de colocações primárias
ou secundárias de ações, debêntures, notas promissórias e quotas de fundos.
Capítulo 2: Estratégias e Operações Referentes às Ofertas Públicas
Agora que já conhecemos todas as etapas de uma oferta pública podemos nos
aprofundar nas inúmeras estratégias que podem ser montadas em cima delas. Temos que
ter a ideia de que agora em diante iremos realizar uma análise somente em cima de
ofertas públicas follow-on – as quais são realizadas por empresas que já possuem os
seus títulos cotados em bolsa de valores ou balcão.
Também devemos saber que uma oferta é a venda de um grande número de ações
e, só este fato, já é o suficiente para fazer com que o preço (bookbuilding) da oferta seja
um preço descontado.16 Ou seja, a precificação da oferta follow-on será sempre
vantajosa, pois sairá, em regra, abaixo da cotação atual do ativo na bolsa ou no mercado
de balcão.
A oferta pública seria exatamente esse último exemplo. Ou seja, se você possuísse
10 chocolates no armário do seu quarto, e não pretendesse comê-los até o final da
semana, sabendo-se que irá ter uma oferta de 1.000 chocolates no próximo sábado, qual
seria a melhor atitude a ser tomada, financeiramente?
Certamente a melhor atitude a ser tomada no exemplo anterior seria você vender
os seus 10 chocolates, agora, ao preço de mercado, a R$10,00 e recomprá-los na oferta
16
Preço abaixo do preço de mercado.
a R$9,00. Parece um exemplo banal. Tão simples que não parece ser algo concreto, que
realmente aconteça no mercado acionário. Mas, quando pararmos para analisar, veremos
que é exatamente isso que acontece durante uma oferta pública de valores mobiliários.
17
Possuem em carteira (custódia).
18
Comprados em um determinado ativo sem a finalidade de vender no curto prazo. Investimento de longo prazo.
É verdade que, como geralmente acontece em lançamentos19, foram alugados20 cerca de 9
milhões de Brookfield on (BISA3) da semana passada para cá, possivelmente vendidos acima de R$7,
para serem devolvidos por R$6,80 que foi o preço de subscrição das novas ações agora lançadas. Um
lucro modesto, em torno de uns R$4 milhões para essa arbitragem21, nada comparável com lucros de
futuros de dólar comprados em cima de uma dica do que o Governo ia fazer com o IOF. Muitas das
quedas que ocorrem quando uma subscrição é anunciada se explicam por operações dessa natureza
pelos que têm lotes garantidos no respectivo underwriting. (JAYME GHITNICK, 2009)
Exemplificando, você vende um valor mobiliário que você não possui em carteira
(custódia) e irá entregá-lo em uma data futura. Nesse caso você tem lucro, se o seu preço
cair e tem prejuízo se o preço subir. Por exemplo: o investidor vende uma barra de
chocolate, que ele não possui, a R$10,00, esperando que seu preço, no mercado, caia.
No momento que ele vende, ele se compromete a entregar a barra de chocolate ao
comprador. Se ele for ao mercado e conseguir comprar a mesma barra por R$8,50, ele
obteve um lucro de R$1,50. Vendeu a R$10,00 dias antes, sem possuir barra alguma,
recomprou a R$8,50 e entregou para quem comprou dele a R$10,00. Por outro lado, se
ele for ao mercado semanas depois e só conseguir comprar a barra por R$12,00, ele
obteve um prejuízo de R$2,00. Vendeu a R$10,00 dias antes, sem possuir barra alguma,
recomprou a R$12,00 e entregou para quem comprou dele a R$10,00. Por mais estranho
que pareça, para quem não vive no mundo das bolsas de valores, essa é uma operação
totalmente legal e, até comum.
19
Ofertas Públicas.
20
Mecanismo utilizado para transferir a custódia de valores mobiliários para quem alugou, poder permanecer em uma posição
vendida por mais de 2 dias e evitar multa de 0,2% ao dia, pela CBLC.
21
Operação de compra e venda de valores mobiliários, realizada com o objetivo de ganhos econômicos sobre a diferença de
preços existente, para um mesmo ativo. Trata-se de uma operação sem risco (ou de risco reduzido) em que o arbitragista
aproveita o espaço de tempo existente entre a compra e a venda (em que o preço do ativo ainda não se ajustou) para auferir
lucro. Fonte http://pt.wikipedia.org/wiki/Arbitragem_%28economia%29.
22
Câmara Brasileira de Liquidação e Custódia. www.cblc.com.br.
Em geral, na Bovespa, o investidor só pode permanecer dois dias vendido.23 Ou
seja, o investidor teria que recomprar o valor mobiliário em, no máximo, dois pregões. A
CBLC, ao verificar que o investidor não possui o valor mobiliário na sua custódia, irá
multar o investidor em 0,2% ao dia. Como só se pode ficar dois dias com a posição
vendida, a multa máxima aplicada poderá ser de 0,4%. Por isso que, semanas antes do
bookbuilding de uma oferta pública, se percebe um volume enorme de aluguel dos valores
mobiliários referentes à oferta. Pois, quando o investidor aluga o valor mobiliário de outro
investidor (que realmente possui o ativo), ele paga uma taxa pequena de aluguel
(geralmente bem menor que 0,2% ao dia de multa cobrada pela CBLC – costuma ser
menos de 0,8% ao mês) e, principalmente, porque o aluguel equivale como se o investidor
que alugou possuísse o ativo em custódia. Com isso o investidor não só evita a multa de
0,2% ao dia, como consegue permanecer em uma posição vendida por quanto tempo
quiser (o tempo que estiver alugando o ativo). Assim, caso não haja rateio, o investidor
pode cobrir24 sua posição descoberta recomprando o ativo na própria oferta pública, não
sendo necessário ele recomprar no mercado secundário. Em caso de rateio, ele seria
obrigado a comprar a preço de mercado, para extinguir a sua posição vendida.
Em uma oferta pública, esse tipo de operação é tão comum que, quanto mais perto
do bookbuilding da oferta, mais escassa fica a oferta dos títulos da oferta pública, e os
aluguéis vão ficando cada vez mais caros. Muitas vezes, dois ou três dias antes do
encerramento do bookbuilding, já não se encontram mais títulos para alugar e, quando os
encontram, se encontra com uma taxa bem acima do normal.
Abaixo temos como exemplo uma tabela (Tabela 1) com a Fixação de Preço
(encerramento do bookbuilding) de todas as ofertas do ano de 2009. Nela há o preço da
cotação de fechamento do ativo dois dias antes do encerramento do bookbuilding (D-2),
seguido pelo fechamento de um dia anterior ao encerramento do bookbuilding (D-1) e, o
preço de fechamento do ativo no mesmo dia de encerramento do bookbuilding25 (D-0).
Nas demais colunas temos uma simulação percentual de ganho, caso tivesse ocorrido
23
Sem possuir o valor mobiliário na sua custódia para entregar ao comprador.
24
Eliminar uma posição; Zerar posição. Em caso de posição comprada, seria o mesmo que vender os ativos para sair de uma
posição positiva e ficar com saldo 0. Em caso de posição vendida, seria o mesmo que comprar os ativos para sair de uma
posição negativa e ficar com saldo 0.
25
O Encerramento do bookbuilding (definição do preço da Oferta Pública) se dá sempre à noite, após o fechamento do
mercado.
uma venda descoberta de qualquer investidor e este tivesse seu pedido de reserva
integralmente atendido (preço de bookbuilding).
Tabela 126:
Book
Dia do Fech. Fech. Fech. Variação Variação Variação
Código – Empresa (Preço da
Book. D-2 D-1 D-0 Book / D-2 Book / D-1 Book / D-0
Oferta)
08/12/09 AEDU11 – Anhanguera Educacional 23,66 23,25 22,90 22,50 +5,16% -3,33% 1,78%
24/11/09 ENBR3 – Energias do Brasil 30,00 28,80 29,10 28,50 +5,26% +1,05% +2,11%
11/11/09 MRFG3 – Marfrig 20,50 20,30 19,60 19,00 +7,89% +6,84% +3,16%
27/10/09 CYRE3 – Cyrela 24,30 24,07 22,40 22,00 +10,45% +9,41% +1,82%
22/10/09 IGTA3 – Iguatemi 30,90 30,50 29,00 28,50 +8,42% +7,02% +1,75%
21/10/09 CCRO3 – CCR Rodovias 35,60 33,60 33,25 33,00 +7,88% +1,82% +0,76%
20/10/09 BISA3 – Brooksfield 7,90 7,50 7,01 6,80 +16,18% +10,29% +3,09%
08/10/09 GOLL4 – Gol 18,15 17,83 17,06 16,50 +10,00% +8,06% +3,39%
01/10/09 PDGR3 – PDR Realty 14,69 14,70 14,30 14,00 +4,93% +5,00% +2,14%
01/10/09 RSID3 – Rossi Residencial 14,60 14,25 13,30 12,50 +16,80% +14,00% +6,40%
24/09/09 MULT3 – Multiplan 26,25 26,50 27,00 26,50 -0,94% 0,00% +1,89%
30/07/09 NATU3 – Natura 26,20 26,48 26,85 26,50 -1,13% -0,08% +1,32%
21/07/09 PRGA3 – Brasil Foods 42,50 41,60 40,59 40,00 +6,25% +4,00% +1,48%
13/07/09 LIGT3 – Light 27,65 26,62 25,05 24,00 +15,21% +10,92% +4,38%
14/07/09 HYPE3 – Hypermarcas 23,58 23,75 23,50 23,00 +2,52% +3,26% +2,17%
01/07/09 BRML3 – BR Malls 15,44 14,90 15,25 15,00 +2,93% -0,67% +1,67%
23/06/09 MRVE3 – MRV Engenharia 25,99 25,01 25,00 24,50 +6,08% +2,08% +2,04%
24/03/09 RDCD3 – Redecard 25,33 24,71 25,04 24,50 +3,39% +0,86% +2,20%
Nela podemos analisar o reflexo da proximidade de uma oferta pública, dias antes
do encerramento do seu bookbuilding. Se o investidor efetuasse uma venda descoberta
26
Informações sobre bookbuilding foram consultados nos sites da CVM (www.cvm.gov.br), CBLC (www.cblc.com.br),
BM&Fbovespa (www.bovespa.com.br) e nos Prospectos disponíveis principalmente nos sites das empresas emissoras das
ações. Cotações dos preços das ações foram obtidos no site Infomoney (www.infomoney.com.br).
com o intuito de cobrir a sua posição com o seu pedido de reserva da oferta, e, se este
fosse atendido integralmente, ele teria um lucro médio de 7,07% caso efetuasse a venda
dois dias antes da fixação do preço da oferta ou um lucro médio de 4,84% caso efetuasse
a venda um dia antes, o que dá uma boa margem para alugar os títulos a fim de realizar
uma operação de venda descoberta, como foi comentado acima.
Tabela 228:
Book
Variação Variação
Dia do Fech. Fech. (Preço Variação Variação
Código - Empresa Ibov. 2 Ibov. 1
Book. S-2 S-1 da Book / S-2 Book / S-1
semanas semana
Oferta)
08/12/09 AEDU11 – Anhanguera Educacional 22,10 25,01 22,50 +1,81% +0,61% -10,04% -0,99%
24/11/09 ENBR3 – Energias do Brasil 30,96 32,42 28,50 -7,95% +1,53% -12,09% -0,13%
11/11/09 MRFG3 – Marfrig 20,11 21,60 19,00 -5,52% +10,42% -12,04% +3,94%
27/10/09 CYRE3 – Cyrela 26,49 25,32 22,00 -16,95% -2,30% -13,11% -3,28%
22/10/09 IGTA3 – Iguatemi 29,84 31,7 28,50 -4,49% +3,72% -10,09% -0,85%
21/10/09 CCRO3 – CCR Rodovias 33,29 32,91 33,00 -0,87% +4,54% +0,27% -1,08%
20/10/09 BISA3 – Brooksfield 7,65 7,76 6,80 -11,11% +4,20% -12,37% +1,02%
08/10/09 GOLL4 – Gol 17,98 17,80 16,50 -8,23% +6,18% -7,30% +5,46%
01/10/09 PDGR3 – PDR Realty 13,70 14,05 14,00 +2,19% +0,37% -0,36% +0,69%
01/10/09 RSID3 – Rossi Residencial 13,30 14,02 12,50 -6,02% +0,37% -10,84% +0,69%
24/09/09 MULT3 – Multiplan 24,39 26,45 26,50 +8,65% +2,58% +0,19% -0,32%
30/07/09 NATU3 – Natura 27,88 27,60 26,50 -4,95% +4,93% -3,99% +0,42%
21/07/09 PRGA3 – Brasil Foods 40,00 40,85 40,00 0,00% +7,64% -2,08% +8,92%
13/07/09 LIGT3 – Light 24,30 24,75 23,00 -5,35% -5,04% -7,07% -1,18%
27
Índice que representa o mercado acionário brasileiro, em geral. Composto por mais de 50 ativos, onde se encontram os
ativos mais líquidos da Bovespa.
28
Contém a amostra de todos os ativos que realizaram distribuição pública (da forma follow-on) no ano de 2009.
Book
Variação Variação
Dia do Fech. Fech. (Preço Variação Variação
Código - Empresa Ibov. 2 Ibov. 1
Book. S-2 S-1 da Book / S-2 Book / S-1
semanas semana
Oferta)
14/07/09 HYPE3 – Hypermarcas 27,75 28,28 24,00 -13,51% -5,66% -15,13% -2,84%
01/07/09 BRML3 – BR Malls 15,41 16,20 15,00 -2,66% +0,98% -7,41% +3,77%
23/06/09 MRVE3 – MRV Engenharia 23,85 24,40 24,50 +2,73% -3,97% +0,41% -0,31%
24/03/09 RDCD3 – Redecard 23,90 25,10 24,50 +2,51% +6,91% -2,39% +4,97%
- Média -3,87% 2,11% -6,97% 1,05%
Analisando a tabela acima, fica claro que há uma distorção em ativos que estão em
processo de oferta pública, e que estes tendem a se desvalorizarem cada vez mais, com
a proximidade do encerramento do bookbuilding da oferta. Fica claro que este é um fato
isolado dos ativos que se encontram neste processo, pois, o índice Ibovespa representa o
mercado como um todo e, este apresentou um comportamento bem divergente dos ativos
que se encontravam em processo de distribuição pública.
Aqui fica claro que os investidores podem realizar inúmeras operações antes da
fixação de preço de uma oferta. Para os mais conservadores, pode-se realizar até mesmo
uma operação de arbitragem, onde ele vende descoberto os ativos que estão em
processo de oferta pública e compra o índice Ibovespa. Realizando essa operação de
venda de ativo e compra de índice uma semana antes, o investidor não só teria um lucro
de 8% (diferença entre os dois), como ainda estaria “protegido”, no caso de uma
valorização anormal do mercado.
Capítulo 3: Coordenação da Oferta e Estabilização de Preços
A principal forma de remuneração dos bancos que estruturam uma oferta pública é
através da coordenação da oferta, onde são cobradas comissões da empresa emissora.
“No Brasil, a comissão média cobrada nos IPOs a partir de 2004 é de 4,5%” (LIMA, 2009,
p. 14). Essa média se estende para as demais ofertas (follow-ons).
29
SANTOS, Rafael Liza; SILVEIRA, Alexandre Di Miceli da; BARROS, Lucas Ayres. Underwriters fuelling going public
companies? Evidence of Conflict of interest in the Brazilian 2004-2007 IPO Wave. 2009.
30
Empréstimos que tendem a “melhorar” os resultados da empresa que pretende realizar uma Oferta Pública no curto prazo.
será abordado, com o foco nos conflitos de interesses que esses empréstimos geram
entre os coordenadores da oferta, os emissores de ações e os investidores da oferta.
Além da descrição acima dos custos estimados da Oferta Global, exceto pelos ganhos
decorrentes da atividade de estabilização pelo Coordenador Líder, não há qualquer outra
remuneração decorrente da Oferta Global devida aos Coordenadores da Oferta Brasileira e aos
Coordenadores da Oferta Internacional. Os lucros decorrentes da estabilização serão divididos entre os
Coordenadores da Oferta Brasileira na proporção definida no Contrato de Estabilização.
Contrato de Estabilização
O Coordenador Líder da Oferta Brasileira, por intermédio do Itaú Corretora de Valores S.A.,
poderá, a seu exclusivo critério, conduzir atividades de estabilização do preço das Ações ordinárias de
nossa emissão, no prazo de até 30 dias contados a partir do primeiro dia útil (inclusive) após a de
publicação do Anúncio de Início. As atividades de estabilização consistirão em operação de compra e
venda em bolsa de Ações de nossa emissão e serão regidas pelas disposições legais aplicáveis e pelo
Contrato de Estabilização, que será previamente aprovado pela CVM, nos termos do artigo 23, parágrafo
3º, da Instrução CVM 400.
Nas ofertas analisadas entre 2004 e 2007, constatou-se que em 16% das ofertas
realizadas existiam bancos de investimentos atuado simultaneamente como coordenador
e acionista relevante31. Entre todas as ofertas desse período 28% das companhias
receberam empréstimos dos coordenadores (ex-ante). De todas as empresas que
realizam ofertas públicas nesse período, 47% escolheram como coordenador de suas
ofertas bancos de investimentos com quem já tiveram algum tipo de serviço financeiro
prestado e, 75% das ofertas foram coordenadas por bancos com as quais a companhia
possuíam laços comerciais ou financeiros.32
Os dados acima evidenciam o grande interesse que um banco pode ter por trás de
um empréstimo pré-IPO (equity kicker). O empréstimo acaba se tornando uma forma do
31
Foram considerados Acionistas Relevantes, os bancos que possuíam participação superior a 5% das ações da empresa.
32
SANTOS, SILVEIRA, BARROS, 2009, Underwriters fuelling going public companies? Evidence of Conflict of interest in the
Brazilian 2004-2007 IPO Wave..
banco estreitar as suas relações com a futura empresa emissora. Assim o banco acaba
se tornando um “ótimo” candidato a ser, ele mesmo, o futuro coordenador da futura IPO a
ser realizada pela empresa. O problema é que muitas vezes os bancos podem induzir a
empresa a abrir capital antes da hora, a preços fora da realidade, sem estar estruturada, a
fim de terem seus empréstimos pagos em um menor espaço de tempo além de
receberem logo as suas comissões pela coordenação da oferta. Tais conflitos ficam mais
evidentes com parte da reportagem abaixo:
Os maiores riscos do equity kicker estão em seu potencial para criar incentivos errados. Ao
turbinar o caixa de uma companhia com empréstimos, o banco amplifica o valor do IPO sem qualquer
compromisso com o que virá depois da injeção de capital. Por isso, faz-se frequentemente a alusão à
ideia de “embelezar a noiva”. O empréstimo pode não passar de uma maquiagem com efeitos de
curtíssimo prazo, incapaz de sustentar a beleza aparente por um tempo maior. Tal situação, afirmam os
pesquisadores da USP, diminui o espaço de ganho do acionista no período pós-IPO. (LOUREIRO, 2009,
p. 45).
A análise das revisões de preço também sugere o uso oportunista dos empréstimos pré-IPO, já
que ofertas deste tipo têm em média revisões de preço menores, o que sugere menor esforço dos
coordenadores. Entre duas ofertas que partem da mesma faixa de preço inicial e cuja única diferença é a
33
Levando-se em conta que o banco que cedeu o empréstimo será o coordenador da oferta da empresa.
presença de empréstimos pré-IPO, aquela com empréstimos tem suas ações vendidas a um preço
inferior ao preço das ações da oferta sem empréstimos pré-IPO. Em particular, a revisão média em
ofertas sem empréstimos pré-IPO é de -2,20%, enquanto a revisão média em ofertas com empréstimos
pré-IPO é de -7,91%. Em um modelo multivariado que inclui outros determinantes da revisão do preço
de oferta e que controla a possível endogeneidade da escolha de empréstimos pré-IPO, o efeito desses
empréstimos sobre a revisão é ainda mais pronunciado, reduzindo a revisão esperada da oferta mediana
de 28,58% para -16,22%.
Ou seja, em casos onde se têm os famosos equity kickers, quanto maior for a
revisão de preço, menor será o preço da oferta. Logo, é muito mais conveniente ao
coordenador não as realizar. No trecho da reportagem abaixo seguem exemplos práticos
do que ocorreu em algumas ofertas:
ENTRE AS ARTIMANHAS desenvolvidas para levar empresas à bolsa, uma das mais polêmicas
é a concessão de empréstimos que inflam seus resultados meses antes da abertura de capital. O banco
que empresta o dinheiro é sempre o mesmo que coordena o IPO, e o objetivo é dar à companhia
musculatura para conseguir um prêmio maior no dia da estreia. Com o dinheiro captado, a empresa paga
o empréstimo. A incorporadora de imóveis Inpar é um dos exemplos que mais chamaram a atenção. A
companhia dava prejuízo e não fazia lançamentos de imóveis desde 2003, histórico que dificilmente
atrairia o interesse dos investidores. A solução encontrada foi tomar um empréstimo de 100 milhões de
reais no Credit Suisse e, com o dinheiro, sair à cata de terrenos. Em maio, a Inpar captou 670 milhões de
reais com sua abertura de capital e quitou a dívida. Embalados pela euforia com o setor imobiliário, os
investidores decidiram apostar na Inpar. As ações subiram 18% desde a estreia, em junho, mês de seu
IPO34. Segundo os especialistas, porém, esse é um caso clássico de investimento arriscado no médio
prazo. O motivo é simples: os bons números apresentados pela companhia não são resultado de sua
excelência administrativa, mas consequência de um arranjo financeiro.
34
Hoje as ações se encontram a um preço de R$3,00. Levando-se em conta que elas foram lançadas no dia 06/06/2007 a
R$17,50, foi uma queda de 82,85%. Um ano depois da abertura de capital as ações estavam cotadas a R$10,85, 38% abaixo
da sua emissão, o que corrobora com LIMA; SANTOS; SILVEIRA e BARROS, de que as empresas que iniciam suas Ofertas
com empréstimos pré-IPO, analisadas 1 ano depois, costumam ter um deságio médio na cotação de suas ações de 39% (LIMA
considera deságio de 36% e SANTOS, et al. 42%) contra um ágio de 6% para as ações das firmas sem empréstimos pré-IPO.
Fonte de cotações: www.infomoney.com.br.
operação foi um desastre completo", diz Emanoel Pereira, sócio da GAP Asset Management. "O que eles
fizeram não é ilegal, mas era preciso deixar isso claro no prospecto."
Casos como o da CR2 pegaram até mesmo a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) de
surpresa. Recentemente, a autarquia passou a recomendar que a empresa que vai à bolsa deixe claro se
os sócios controladores pretendem participar do processo de formação de preço para listagem na bolsa,
o bookbuilding. A CVM também passou a exigir que os prospectos das ofertas de ações sejam mais
claros. Hoje, os calhamaços de 500 páginas trazem todos os detalhes sobre o perfil da empresa, mas o
texto é escrito num "juridiquês" impenetrável. "Esse documento ainda é mais um mecanismo de proteção
da empresa e do banco coordenador", diz Felipe Claret, responsável pelo registro de empresas na CVM.
"Deveria proteger também o investidor." A autarquia passou a exigir mais detalhes sobre eventuais
empréstimos concedidos pelos bancos coordenadores, informações sobre a idoneidade dos principais
executivos e um alerta caso o acionista majoritário esteja oculto. A última exigência se deve ao inusitado
IPO da Brasil Ecodiesel -- a companhia foi à bolsa sem revelar seu dono. (CAMARGOS, 2007, Portal
Exame).
O exemplo do BIC Banco ilustra bem como funciona o equity kicker. Em outubro de 2007, a
instituição lançou R$822 milhões em ações, sendo R$492 milhões relativos à oferta primária. O montante
quase dobrou o patrimônio líquido da instituição em relação a 2006, quando a mesma linha do balanço
estava em R$552 milhões. Cinco meses antes do IPO, o BIC havia recebido um empréstimo de R$400
milhões do banco suíço UBS, equivalente a 70% de seu patrimônio. Se o risco pareceu ser grande, a
remuneração não deixou por menos. O UBS, além de credor do BIC, foi também o coordenador líder da
oferta. Pelo contrato, o BIC era obrigado a pagar um prêmio de R$69,5 milhões ao UBS caso a
cotação do papel no IPO fosse de R$11,5 — e o preço de estreia foi exatamente esse. Havia também a
comissão de R$17,8 milhões aos intermediários.
Existe outra interpretação para os empréstimos pré-IPO observados. As firmas podem estar
buscando financiamento adicional ou antecipação de recursos do IPO para realizar investimentos
lucrativos. Nesta interpretação, os empréstimos não são necessários para a ocorrência da oferta e outros
bancos, além dos coordenadores, estariam dispostos a concedê-los. O interesse dos bancos ao ofertar
esses empréstimos é tanto participar do IPO quanto criar com a firma um relacionamento de longo prazo
que lhes permita participar de emissões futuras, já que essas firmas têm maior chance de sobreviver e
então voltar a utilizar serviços de coordenação.
Estratégia 1:
35
No Brasil, esta operação é conhecida como “equity kicker”. Porém, “equity kicker” também se refere a operações nas quais o
credor, ao fornecer empréstimos, recebe uma garantia de participação acionária na empresa tomadora de crédito.
importância para o sucesso da oferta. Se os empréstimos pré-IPO são investimento em relacionamento,
comissões menores devem ser cobradas, já que existe a expectativa de reutilizar as informações
adquiridas em novas emissões de ações.
Porém, qualquer que seja a motivação dos empréstimos pré-IPO, o menor custo de aquisição de
informação incorrido pelos coordenadores (que utilizam informações específicas sobre as firmas em dois
produtos diferentes, crédito e coordenação) deve reduzir as comissões (Drucker e Puri, 2005). Assim, se
os empréstimos pré-IPO são investimentos em relacionamento de longo prazo, são esperadas menores
comissões nas ofertas com esses empréstimos. Por outro lado, se eles são utilizados para deixar a firma
mais atrativa para o IPO, não há previsão sobre o comportamento das comissões, pois o aumento na
comissão devido ao risco de perda de reputação pode tanto compensar quanto ser compensado pela
redução causada pelo menor custo de aquisição de informação.
Estratégia 2:
A segunda estratégia utiliza o esforço de venda dos coordenadores, medido pela revisão do
preço de oferta (Cooka, Kieschnichb e Ness - 2006). Se os empréstimos pré-IPO são utilizados de forma
oportunista pelas firmas, os bancos que coordenam essas ofertas devem proteger sua reputação não
dispensando grande esforço em convencer investidores da qualidade da oferta, e obtendo assim uma
menor revisão do preço da oferta. Por outro lado, se empréstimos pré-IPO são instrumentos pra investir
em relacionamento de longo prazo com a firma, deve existir maior esforço em prestar serviços de
qualidade durante o IPO, o que resultará em uma maior revisão de preço. (LIMA, 2009, p. 2-4).
O flipping consiste na compra de ações durante a distribuição pública, seguida de sua venda
quase imediata. O flipping é prejudicial a uma distribuição ordenada pois o excesso de oferta tende a
reduzir o valor das ações, particularmente logo após a distribuição, situação que vai contra os interesses
do mercado. Os players do mercado de capitais desenvolveram, ao longo dos anos e, em geral, com a
benção dos agentes reguladores, diversos mecanismos para estabilizar o mercado de ações neste
período critico. O objetivo dos mecanismos é coibir a flutuação prejudicial do valor dos ativos nos
momentos iniciais de uma oferta de ações. O mais notável é o overallotment, junto com o green shoe36.
O green shoe, por sua vez, é a opção de compra concedida ao banco líder no contrato de
colocação, que pode ser exercida pelo banco para comprar um lote suplementar de ações depois do
fechamento da oferta, em geral dentro de um prazo de 30 dias.
Dessa forma, o green shoe funciona para cobrir eventual overallotment na distribuição pública e
foi estruturado para proteger o mercado em geral contra o excesso de vendas no mercado secundário.
Inicialmente, a aceitação do mecanismo foi controversa, vez que se trata, na essência, da “manipulação”
do mercado. Hoje é pratica normal e, portanto, regulamentada nos principais mercados, inclusive no
Brasil.
36
No Brasil não se encontra a expressão greenshoe nos Prospectos de Distribuição Pública. Aqui o sinônimo para greenshoe
é: Opção de Ações Suplementares.
Outro mecanismo, também fundamental, é o lock-up37, que consiste no compromisso, por parte
de detentores de lotes consideráveis de valores mobiliários, de não vender tais valores por determinado
período de tempo. O lock-up é, portanto, uma obrigação de “não-fazer” contraída pelos principais
acionistas da companhia emissora dos valores mobiliários. Entre outras funções, ele também é
mecanismo de estabilização, na medida em que assegura que determinadas ações não entrarão em
circulação nos momentos iniciais da colocação. Sendo assim, a oferta será reduzida e será mais difícil
ocorrer uma desvalorização acentuada das ações nos momentos iniciais em decorrência do flipping.
E o que tem isso a ver com sapatos verdes? Pouco. O green shoe recebeu esse nome pois a
primeira companhia a utilizar-se do recurso, em 1963, foi uma empresa de sapatos, The Green Shoe
Manufacturing Company, durante uma oferta de ações nos Estados Unidos. Uns anos depois, a empresa
mudou seu nome para “Stride Rite”, ou seja, “andar bem”, que, por ironia, é a função da estabilização.
(LEFOSSE ADVOGADOS, 2006, Revista Capital Aberto).
Em uma parte da tese de Pinheiro e Carvalho, fica bem claro como esses
mecanismos podem ser usados:
Segundo Ritter (1998), os prováveis motivos que levam o underwriter a construir uma posição a
descoberto e subsequente recompra da posição a descoberto são: 1) a demanda total para manutenção
do preço pode ser maior se mais ações forem alocadas inicialmente; 2) a recompra de ações pode ser
uma maneira de favorecer apenas clientes preferenciais; 3) o underwriter está sinalizando que o ativo
37
Em geral o período de lock-up é um período de 180 dias.
38
Overallotment.
39
Neste último caso o lucro ao se vender descoberto pelo preço de subscrição (overallotment) e a recompra por um preço
menor vai direto para o coordenador. Lembrando-se que, para esse lucro acontecer, não poderia ter o exercício do greenshoe.
Caso contrário, o coordenador subscreveria o greenshoe e ficaria com os ativos em sua custódia.
não está superavaliado e que, portanto, outros investidores têm interesse em comprá-lo ao preço de
oferta. Segundo Muscarella, Peavy e Vetsuypens (1992), outro motivo que pode levar o underwriter a
assumir uma posição inicial a descoberto é que isto é um importante mecanismo na alocação inicial das
ações: o underwriter aloca ações durante o processo de bookbuilding antes da data efetiva de início das
negociações e neste meio tempo alguns investidores podem retirar ou reduzir a quantidade de ações que
querem adquirir adquiridas. Em face desta situação, o underwriter pode efetivamente incorrer em perdas
caso venha a ser obrigado a vender as ações não adquiridas durante o bookbuilding no mercado
secundário a preços menores que o da oferta inicial (Principalmente quando o regime de colocação é o
de garantia firme, regime este majoritário nas emissões brasileiras, pois neste caso o underwriter é
obrigado a adquirir as ações não vendidas inicialmente. Apenas a emissão da Renar Maçãs em 2005 foi
contratada no regime de Melhores Esforços). A posição inicial descoberta elimina este potencial
problema ao permitir que o underwriter venda as ações em excesso antes da data de início de
negociações. (PINHEIRO; CARVALHO, 2008, p. 7-8).
Não podemos prever se existirá um mercado de negociação ativo e líquido para nossas Ações
Ordinárias ou se o preço das Ações Ordinárias irá variar. O mercado brasileiro é substancialmente
menor, menos líquido e potencialmente mais volátil que os mercados de ações nos Estados Unidos e em
outros países desenvolvidos.
Vale notar que, o coordenador pode exercer sua Opção de Ações Suplementares
(greenshoe) a qualquer momento, dentro de um prazo de 30 dias contados do início da
oferta pública (2 dias após o bookbuilding, quando se publica o Anúncio de Início da
Oferta), como consta no Prospecto Preliminar de Distribuição Pública Primária de Ações
Ordinárias de Emissão da Gafisa (2010, p. 66):
Tabela 340:
Book Exercí
Cotação Variação Cotação Variação
Dia do (Preço Variação Variação cio
Código - Empresa 1 sem. Ibov. 2 sem. Ibov.
Book. da S+1 S+2 greens
depois S+1 depois S+2
Oferta) hoe
08/12/09 AEDU11 – Anhanguera Educ. 22,50 23,20 +3,11% 2,34% 24,75 +10,00% -0,46% 100%
24/11/09 ENBR3 – Energias do Brasil 28,50 32,49 +14,00% 1,62% 34,99 +22,77% 0,61% 100%
11/11/09 MRFG3 – Marfrig 19,00 19,35 +1,84% 0,13% 19,39 +2,05% 2,24% 100%
27/10/09 CYRE3 – Cyrela 22,00 23,55 +7,05% -0,82% 24,25 +10,23% 4,97% 100%
22/10/09 IGTA3 – Iguatemi 28,50 26,00 -8,77% -3,65% 27,55 -3,33% -1,99% 39,22%
21/10/09 CCRO3 – CCR Rodovias 33,00 33,80 +2,42% -8,13% 35,39 +7,24% -2,40% 100%
20/10/09 BISA3 – Brooksfield 6,80 6,80 0,00% -3,28% 6,83 +0,44% -4,07% 100%
08/10/09 GOLL4 – Gol 16,50 19,30 +16,97% 4,62% 18,61 +12,79% 3,72% 100%
01/10/09 PDGR3 – PDR Realty 14,00 15,37 +9,79% 5,46% 16,95 +21,07% 10,33% 100%
01/10/09 RSID3 – Rossi Residencial 12,50 13,60 +8,80% 5,46% 14,22 +13,76% 10,33% 100%
24/09/09 MULT3 – Multiplan 26,50 27,32 +3,09% 0,69% 27,82 +4,98% 6,18% 100%
30/07/09 NATU3 – Natura 26,50 27,65 +4,34% 2,34% 29,30 +10,57% 4,71% 100%
21/07/09 PRGA3 – Brasil Foods 40,00 41,20 +3,00% 2,33% 41,00 +2,50% 5,27% 100%
13/07/09 LIGT3 – Light 23,00 23,70 +3,04% 8,92% 24,47 +6,39% 11,46% 100%
14/07/09 HYPE3 – Hypermarcas 24,00 24,88 +3,67% 8,07% 24,38 +1,58% 10,90% 100%
01/07/09 BRML3 – BR Malls 15,00 15,05 +0,33% -4,59% 16,45 +9,67% -0,48% 100%
23/06/09 MRVE3 – MRV Engenharia 24,50 27,15 +10,82% 0,82% 26,75 +9,18% -3,11% 100%
24/03/09 RDCD3 – Redecard 24,50 28,05 +14,49% -1,33% 25,00 +2,04% 5,66% 100%
- Média +5,44% +1,17% +8,00% +3,55%
40
Contém a amostra de todos os ativos que realizaram distribuição pública (da forma follow-on) no ano de 2009.
Na tabela acima nota-se que há uma distorção em ativos que estão em processo
de oferta pública, e que estes tendem a se valorizarem semanas após o encerramento do
bookbuilding da oferta. Fica claro que este é um fato isolado dos ativos que se encontram
neste processo, pois, o índice Ibovespa representa o mercado como um todo e, este
apresentou um comportamento bem divergente dos ativos que se encontravam em
processo de distribuição pública.
41
Empresas que ainda não estariam inteiramente estruturadas para abrir seu capital.
42
Queda abaixo do preço fixado na Oferta (bookbuilding).
coordenador com a oferta e com os investidores da oferta, e o seu interesse único e
exclusivo nas comissões que irá receber pela coordenação.
Em geral, como visto no decorrer dos anos, essa equação não vale a pena para o
coordenador, tendo a sua reputação um peso muito mais importante. Por isso, o interesse
destes em manterem os preços das ofertas acima dos preços de bookbuildings, muitas
vezes deixando de “forçar a barra” para que os bookbuildings sejam fixados em um preço
um pouco acima, para receberem uma comissão maior, e sim se preocupando em realizar
um bookbuilding “mais justo”, onde se consiga manter, semanas depois da oferta, a
cotação acima do preço de bookbuilding. Desta forma o coordenador pode deixar de
ganhar alguma comissão a mais, mas, por outro lado, garante a sua reputação perante os
investidores e as empresas emissoras, e, principalmente, garante enormes chances de
coordenar outras ofertas futuramente.
Esse “custo de reputação” é tão importante, que, até mesmo, cabe ao coordenador
ponderar em usar o seu lucro sobre a coordenação para manter e estabilizar o preço da
oferta. Ou seja, usar o dinheiro que iria ganhar pela coordenação para “garantir” uma
oferta “tranquila”. Podemos ter uma noção maior sobre o custo de uma reputação em
trechos retirados do texto “Estabilização em IPOs com Disclosure Ex-Post: Evidências do
Brasil”:
Os underwriters têm a opção, porém não a obrigação de realizar a estabilização. Assim, apesar
da não existência de posições de venda descoberta no caso brasileiro, não incorrendo o underwriter em
alguns riscos financeiros no caso do modelo descrito, é evidente que se os mesmos não realizam o
suporte quando necessário há uma perda de capital ligada à sua reputação. Por exemplo, o mercado
pode receber tal sinal como uma deficiência na capacidade do underwriter em apreçar corretamente a
emissão, cujo prejuízo para o mesmo pode ser bem maior que um eventual excesso de comissão que ele
tenha recebido decorrente do maior apreçamento.
Portanto, o underwriter estabilizará o IPO se a perda esperada em tal operação for menor que a
perda de capital ligada à sua reputação. A perda na operação pode efetivamente ocorrer no caso
brasileiro se o mesmo realiza a estabilização acima do preço de oferta ou até mesmo acima do preço
líquido, ou seja, já descontada a comissão (devido ao custo de oportunidade em não recomprar o ativo e
receber a comissão).
A ideia de que um baixo risco do IPO favorece os emissores (maiores preços), underwriters
(maiores comissões absolutas decorrentes dos maiores preços) e investidores (menor variabilidade do
preço no mercado secundário) já é antiga e defendida por autores tais como Carter e Manaster (1988) e
Rock (1986).
A possibilidade de estabilização, conforme já discutido anteriormente, assemelha-se a uma
opção de venda do ponto de vista do investidor que adquire ações em um IPO, assim, caso a
performance da mesma não seja a esperada o mesmo acredita que pode revendê-la ao underwriter ao
preço da emissão após o início das negociações. (PINHEIRO; CARVALHO, 2008, p. 12-13).
Independentemente dos fatores de risco, podemos esperar que um ativo com forte demanda, ao
nível de preço estipulado pelo underwriter, dificilmente sofrerá estabilização, uma vez que a ação dos
flippers será compensada pelo interesse remanescente do mercado pelo ativo. (PINHEIRO; CARVALHO,
2008, p. 13).
Com relação às variáveis resposta, é também importante frisar que uma emissão pode sofrer
queda no mercado secundário e o underwriter não realizar a estabilização, uma vez que ações adicionais
não foram vendidas no momento do início das negociações devido à fraca demanda observada durante o
processo de bookbuilding. Portanto a realização da estabilização está condicionada não somente ao
preço ex-post da emissão, mas principalmente à decisão do underwriter em ajustar o preço de tal forma
que provoque um excesso de demanda ex-ante (Este é o caso da emissão da empresa CR2
coordenada pelo Unibanco, onde em apenas 3 dias após o início das negociações a perda
acumulada alcançou 14,05% e onde não ocorreu estabilização de preço.) suficientemente grande
para provocar demanda por ações além daquelas inicialmente ofertadas. Além disso, o greenshoe
também pode ser exercido parcialmente no início das negociações pelo mesmo motivo. (PINHEIRO;
CARVALHO, 2008, p. 18-19, grifo nosso).
A CR2, outra companhia do ramo imobiliário, deixou de informar que seus controladores
subscreveram um terço da oferta de ações. A atitude revoltou os investidores, já que o preço de estreia
na bolsa reflete a procura pelos papéis nas semanas anteriores. Ao comprar um terço das ações, os
sócios puxaram o valor delas para cima. Quando a manobra foi descoberta, o Unibanco, coordenador da
operação, teve de dar aos investidores a opção de desistir da compra dos papéis. Mais de 60% deles
abriram mão das ações da empresa. "A operação foi um desastre completo", diz Emanoel Pereira, sócio
da GAP Asset Management. "O que eles fizeram não é ilegal, mas era preciso deixar isso claro no
prospecto. (CAMARGOS, 2007, Portal Exame).
A percepção dos investidores foi tão ruim que o Unibanco (coordenador da oferta)
permitiu que os investidores da oferta desistissem da sua subscrição, mesmo com suas
negociações das ações já iniciadas. Na ocasião, bastava você enviar um e-mail para a
sua corretora, informando o prejuízo obtido na oferta, até uma data limite, que o Unibanco
se comprometeu a ressarcir os prejuízos. Uma atitude inédita nas ofertas realizadas no
Brasil. Esse exemplo só demonstra o quanto a reputação e a transparência de um
coordenador são importantes para o mercado. Provavelmente foi uma operação onde o
próprio coordenador, além dos inúmeros transtornos sofridos, teve um prejuízo financeiro
considerável.
Segundo Lima:
Uma das funções dos coordenadores é influenciar a demanda dos investidores externos pelas
ações à venda. Isso pode ser feito através da busca de investidores que valorizem mais a empresa, da
criação de um sentimento de excesso de demanda pelo IPO ou da promessa de recompensar
futuramente o investidor pelo seu interesse no IPO (como, por exemplo, através da alocação
preferencial de ações em IPOs em que há grande interesse).
Na análise acima verificamos que o coordenador tem inteira noção sobre o peso e
o valor da sua reputação. Pois quando este efetua o equity kicker apenas com o intuito
oportunista, sem realmente acreditar que a oferta em qual está coordenando seja uma
boa oportunidade de investimento a longo prazo, este não tenta influenciar a demanda de
investidores com quem têm um bom relacionamento, sem realizar grande esforço de
venda (sugerir a oferta como um bom investimento para seus melhores clientes). Desta
forma o coordenador não coloca a sua reputação em risco. Mantendo assim um bom
relacionamento com seus investidores institucionais. E, podendo contar com tais
investidores, quando for preciso.
Por outro lado, se foi um empréstimo sem o intuito de apenas realizar mais uma
IPO a fim de faturar sua comissão de coordenação, é sinal de que o banco de
investimentos realmente acredita na empresa. Este empréstimo teria sido concedido de
forma diligente e com intuito real de investimentos. Pode ser um empréstimo focado na
maturidade da empresa a fim de realizar uma futura oferta, um empréstimo com intuito de
poder ter uma participação acionária relevante dentro da empresa, entre outros motivos.
Mas, o que importa é que, no caso de ser realizada uma oferta, o coordenador realizará
um esforço de vendas bem maior, oferecendo um “produto de qualidade” para os
investidores com quem mantém um bom relacionamento.
Esse ciclo é importantíssimo, pois, sem demanda, não há oferta. Sem oferta não há
coordenação. E sem coordenação não há comissão. O coordenador tem o
relacionamento com um pool limitado de investidores. Investidores estes que não são
importantes apenas para a realização de uma oferta pública, mas sim, para a realização
de inúmeras outras ofertas. Logo, o coordenador não pode indicar uma “oferta ruim” para
os investidores de quem ele dependerá no futuro. Pois serão estes mesmos investidores
que irão investir nas próximas ofertas que ele coordenará. A relação entre essas duas
partes tem que ser de total confiança. E, o coordenador, por sua vez, não pode ter a sua
reputação abalada por causa de ofertas ruins.
EM ALGUNS CASOS, O NOME DO DONO da empresa que vai à bolsa é toda a informação que
o investidor tem à disposição na hora de investir. É o que acontece com as empresas que surgem no dia
da abertura de capital, conhecidas como start-ups. Seu objetivo é começar as operações justamente com
o dinheiro levantado na bolsa. A BrasilAgro e a MMX são dois exemplos recentes. A primeira, criada para
investir no agronegócio, tinha entre seus controladores o bilionário Elie Horn, dono da Cyrela. Já a MMX
foi criada pelo empresário Eike Batista. Como não têm rigorosamente nenhum histórico, companhias
como essas são consideradas um investimento de altíssimo risco. Em julho, a Invest Tur, criada para
adquirir participações em empreendimentos turísticos, juntou-se ao grupo. "Quando um banco traz uma
companhia ao mercado, estabelece uma sociedade moral entre essas duas partes", diz José
Olympio Pereira, diretor do Credit Suisse, banco que inaugurou esse tipo de transação no país,
com a BrasilAgro. "Se lançarmos um negócio ruim no mercado, ninguém vai querer saber da
empresa que estamos vendendo no próximo IPO." (CAMARGOS, 2007, Portal Exame, grifo nosso).
Fica claro o valor que a reputação tem não só para o coordenador, como para o
mercado em si. Sem dúvida, um coordenador com uma ótima reputação, é um fator que
agrega valor não só para o próprio coordenador, como para a própria empresa que irá
emitir ações. O que, muitas vezes, acaba formando um ciclo virtuoso. Quanto melhor a
reputação, maiores as chances de ser uma oferta “de qualidade”. E, quanto melhor a
oferta, maior a sua demanda. Por sua vez, quanto maior o interesse, maior será o preço
fixado na oferta e, maior será a comissão do coordenador. Sem contar nas futuras
emissões que o coordenador fará.
Nele mostra-se que o número de ofertas vem crescendo nos últimos anos e que as
cotações de empresas que estão prestes a realizar a oferta pública follow-on costumam
desvalorizar dias antes da fixação do preço da oferta. Fato este que abre a possibilidade
das mais diversas operações, tanto para os investidores que estão posicionados nas
ações destas empresas como para investidores que não estão posicionados e pretendem
apenas especular no curto prazo, sejam estes investidores pequenos ou grandes.
Também foi observado que, depois da fixação do preço da oferta, essa tendência de
queda se inverte e as cotações, em um curto prazo de tempo (de 1 a 2 semanas),
costumam valorizar rapidamente, o que também abre o leque para realizar-se outras
operações.
Fica claro que em vários momentos o coordenador pode atuar sem diligência. O
único problema é o quanto a sua falta de diligência irá refletir na sua reputação. Se ele
envolveu seus melhores clientes e investidores dentro de uma operação sem
fundamentos e na qual ele não irá realizar grandes esforços de estabilização, fica claro
que o prejuízo com a sua reputação será bem maior. Por outro lado, se ele não envolveu
seus maiores clientes e investidores (não realizou grandes “esforços de vendas”), esse
impacto na reputação poderá mudar. Certamente temos um ponto em que essa relação
passa a ser positiva. Mas, somente o coordenador pode decidir de que forma irá
realmente atuar.
Como em geral as ofertas follow-ons costumam ter seus preços valorizados após o
bookbuilding e as IPOs que têm underpricing costumam voltar ao seu preço original de
bookbuilding, o que se deduz é que os coordenadores se preocupam, o mínimo, em
garantir uma certa “segurança” durante as ofertas. O que confere boas chances para o
investidor vender suas ações no lucro ou sem prejuízo, durante os 30 dias de
coordenação da oferta. O que já pode ser o suficiente para garantir um longo ciclo de
ofertas, o que é de extremo interesse para todos os players envolvidos neste processo.
Em que medida isso é manipulação de mercado ou atuação legítima do coordenador é algo que
cabe à CVM decidir. Espero que este trabalho possa incentivar uma análise pelo regulador.
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