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ENSAIO | ESSAY 23

Diálogo Aberto: a experiência finlandesa e


suas contribuições
Open Dialogue: the finnish experience and its contributions

Luciane Prado Kantorski1, Mario Cardano2

RESUMO O Diálogo Aberto é um método desenvolvido na década de 1980, na Finlândia, para


o enfrentamento da crise psicótica. Este artigo é um ensaio teórico que tem como objetivo
apresentar o Diálogo Aberto em seus princípios e enquanto prática de saúde mental desins-
titucionalizante, enfatizando seu potencial terapêutico, seus resultados e suas contribuições
para outros países. Conclui-se que, para a implementação do Diálogo Aberto em outros con-
textos, é necessária uma mudança organizativa na estruturação dos serviços e uma substanti-
va mudança cultural no interior da equipe e da comunidade.

PALAVRAS-CHAVE Saúde mental. Transtornos psicóticos. Família.

ABSTRACT The Open Dialogue is a method developed in the 80’s, in Finland, to the confrontation
of the psychotic crisis. This article is a theoretical essay that aims to present the Open Dialogue
in its principles and as a deinstitutionalizing mental health practice, emphasizing its therapeutic
potency, results and contributions for other countries. It is concluded that, for the implemen-
tation of the Open Dialogue in other contexts, it is necessary an organizational change in the
structuring of services and a substantive cultural change within the team and the community.

KEYWORDS Mental health. Psychotic disorders. Family.

1Universidade Federal de
Pelotas (UFPel), Faculdade
de Enfermagem – Pelotas
(RS), Brasil.
kantorski@pq.cnpq.br

2 Università Degli Studi di


Torino, Dipartimento di
Culture, Politica e Società –
Torino, Itália.
mario.cardano@unito.it

DOI: 10.1590/0103-1104201711203 SAÚDE DEBATE | RIO DE JANEIRO, V. 41, N. 112, P. 23-32, JAN-MAR 2017
24 KANTORSKI, L. P.; CARDANO, M.

Introdução reuniões, valorizando a construção conjunta


de entendimentos e saídas (SEIKKULA; ALAKARE;
O método do Diálogo Aberto foi desenvolvi- AALTONEN, 2001).
do por Jaakko Seikkula e sua equipe, no início O Diálogo Aberto ganhou atenção inter-
da década de 1980, na Finlândia, na região nacional porque seu uso no tratamento de
oeste da Lapônia, para o enfrentamento da pessoas com primeiro episódio de psicose é
crise psicótica. O Diálogo Aberto engloba associado, na literatura científica, à redução
uma filosofia e um conjunto de práticas que da incidência do desenvolvimento de sinto-
se diferem radicalmente das convencionais, mas crônicos e de incapacidades decorrentes
contribuindo significativamente para o pro- da psicose e ao uso mínimo de medicação psi-
cesso de desinstitucionalização naquele país cotrópica (SEIKKULA ET AL., 2003; SEIKKULA ET AL., 2006;
e que podem vir a contribuir em outros con- AALTONEN; SEIKKULA; LEHTINEN, 2011; SEIKKULA; ALAKARE;
textos (SEIKKULA; ALAKARE; AALTONEN, 2001; SEIKKULA, AALTONEN, 2011; THOMAS, 2011). Ainda, são encontra-
2011; SEIKKULA, 2014). dos os estudos de Skalli e Nicole (2011), Gromer
O Diálogo Aberto é baseado em sete prin- (2012) e Lakeman (2014), que são os três estudos
cípios. O primeiro consiste na ‘ajuda imedia- de revisão de literatura sobre o Diálogo
ta’, que pressupõe que haja uma equipe de Aberto, que enfocam, particularmente, os
atenção à crise à disposição, de modo que o êxitos obtidos no tratamento de pessoas com
primeiro atendimento ocorra nas primeiras diagnósticos de crises psicóticas.
24 horas após o primeiro contato, prefe- Extrapolando a especificidade do mundo
rencialmente no domicílio do usuário, com acadêmico, os movimentos de usuários e as
o objetivo de prevenir a hospitalização. O redes de saúde mental, que, mundialmente,
segundo princípio trata da ‘inclusão da rede fazem a crítica ao uso abusivo de psicofár-
social do usuário’, como a família, os amigos macos e apontam seus malefícios, também
e vínculos significativos em todas as reuniões contribuíram de modo determinante para
de tratamento, sem que nenhuma decisão que os olhares se voltassem para o Diálogo
seja tomada fora delas. O terceiro princípio Aberto como alternativa a tal realidade.
está relacionado com a ‘flexibilidade’, que Robert Whitaker, em seu livro que se
deve ser garantida através da adaptação do tornou um best seller, ‘Anatomy of an epi-
tratamento às necessidades específicas de demic: Magic bullets, psychiatric drugs,
cada caso. O quarto princípio é a ‘respon- and the astonishing rise of mental illness in
sabilidade’, considerando que o técnico que America’, fala dos danos que foram produzi-
atende primeiramente o usuário organizará dos na América do Norte pelo uso massivo de
as reuniões sucessivas. O quinto princípio é o psicofármacos em resposta a situações de es-
da ‘tolerância à incerteza’, que pressupõe en- tresse. Whitaker passou um ano e meio pes-
contros iniciais frequentes (até diários) nos quisando para a escrita do livro. Ele mantém
primeiros 10-12 dias de tratamento, como um um site na internet listando alguns estudos
empenho para evitar decisões precipitadas. relevantes sobre o tema. Essas pesquisas na
Por exemplo, o uso de neurolépticos não é literatura apoiaram a escrita do livro, que
iniciado na primeira reunião. Em vez disso, tem um caráter de jornalismo investigati-
a sua pertinência deve ser discutida em, pelo vo, tendo sido premiado nessa categoria em
menos, três reuniões antes da introdução. O 2010. O autor faz uma crítica contundente ao
sexto princípio é o da ‘continuidade psicoló- uso inadequado de psicofármacos, eviden-
gica’, que é garantida em todas as etapas do ciando, além dos danos e perturbações que
tratamento. O sétimo princípio é o dialogis- eles podem causar no cérebro, o aumento
mo, sendo garantido como foco do tratamen- de gastos do Estado com pagamento de
to a geração de diálogo entre as pessoas nas auxílio por incapacidade produzida pelo uso

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abusivo dessas drogas. Em contraposição, desinstitucionalizante, enfatizando seu po-


o autor apresenta a experiência finlande- tencial terapêutico, seus resultados e suas
sa do Diálogo Aberto como um tratamento contribuições para outros países.
eficaz, que reduz o uso de psicofármacos e
produz ótimos resultados no enfrentamento
das psicoses, questionando os motivos de O Diálogo Aberto e seu
sua escassa replicação em outros contex- potencial terapêutico
tos. O autor conheceu a experiência in loco,
pois teve a oportunidade de acompanhar O Diálogo Aberto surge como uma prática
um grupo da Lapônia. Em seu best seller, de saúde mental em que o cuidado à crise
Whitaker faz uma descrição das bases do é organizado durante as 24 horas sucessi-
método e apresenta alguns resultados das vas ao primeiro contato, e o paciente e sua
pesquisas do grupo de Seikkula, que com- família são convidados a participar não só do
provam a eficácia do mesmo (WHITAKER, 2010). primeiro encontro, mas de todas as reuniões
Sem dúvida, a repercussão do livro de Robert de tratamento. Como mencionado anterior-
Whitaker promove uma ampliação da divul- mente, o seu idealizador é Jaakko Seikkula,
gação da experiência do grupo de Seikkula na psicólogo clínico que começou a trabalhar
Finlândia e fortalece o questionamento acerca no hospital de Keropudas, em Tornio, em
da necessidade de aprofundamento científico 1981 (SEIKKULA, 2011; SEIKKULA, 2014).
dos conhecimentos sobre as potencialidades e Na Finlândia, a prática psicoterápica vem
os limites do Diálogo Aberto e de sua replicabi- sendo uma parte da saúde pública importan-
lidade em outros contextos. te desde o final dos anos 60, com o trabalho
O contato mais efetivo com o tema do do professor Yrjö Alanen e sua equipe, ini-
Diálogo Aberto se iniciou no ano de 2015, ciando com a psicoterapia psicodinâmica
durante o estágio sênior de um dos autores individual. A equipe de Turku já enfatizava,
acompanhando o projeto ‘Il dialogo aperto no final de 1970, que cada processo de tra-
un approccio innovativo nel trattamento tamento é único e deveria ser adaptado às
delle crisi psichiatriche d’esordio – defini- diferentes necessidades de cada paciente. O
zione e valutazione degli strumenti ed or- Diálogo Aberto consiste numa modificação
ganizzativi per la trasferibilità del Dialogo da ‘Need-Adapted Treatment of Psychosis’,
Aperto’, coordenado pela Dra. Maria desenvolvida por Alanen (BORCHERS, 2014).
Chiara Rossi e Dr. Giuseppe Salamina do A filosofia do Diálogo Aberto é o desen-
Departamento de Prevenção (ASL TO1 volvimento de relações entre as pessoas que
– Azienda Sanitaria Locale di Torino 1), estão enfrentando problemas, a família e a
que envolve oito Departamentos de Saúde rede social envolvida e a oferta de apoio à
Mental da Itália (2 em Turim, 1 em Savona, pessoa em casa, em vez de instituições ou
1 em Trieste, 1 em Modena, 1 na Catania e locais de reabilitação. São mais valorizadas
2 em Roma). A integração ao projeto de ca- as habilidades dos envolvidos de gerar diá-
pacitação e pesquisa permitiu a realização logos em reuniões conjuntas, mantendo a
de seminários e cursos, inclusive com Jaako comunicação aberta entre as partes, respei-
Seikkula, professor de psicoterapia do tando as vozes de todos os participantes, a
Departamento de Psicologia da University paciência de ouvir e de não tomar decisões
of Jyväskylä, que consistiu em uma aproxi- precipitadas, a capacidade de constantemen-
mação muito rica com o Diálogo Aberto. te enfatizar a situação familiar e as questões
Este artigo tem como objetivo apre- da vida cotidiana (SEIKKULA, 2003; BORG ET AL., 2009;
sentar o Diálogo Aberto em seus princí- ARNKIL; SEIKKULA, 2012).
pios e enquanto prática de saúde mental Nas primeiras iniciativas de reuniões

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abertas na Lapônia, esse espaço era simples- diálogo precisa criar uma linguagem em que
mente um fórum para organizar o tratamen- todas as vozes possam ser ouvidas, tanto a do
to, em vez de baseá-lo em ideias dialógicas. paciente quanto daqueles mais próximos a
No entanto, a partir do contato com os escri- ele (SEIKKULA, 2002; SEIKKULA; ARNKIL; ERIKSSON, 2003;
tos de Bakhtin, os profissionais perceberam SEIKKULA, 2008).
que o autor parecia descrever a mesma ex- Alguns estudos (SEIKKULA; ARNKIL; ERIKSSON,
periência em romances de Dostoiévski que 2003; SEIKKULA, 2008; HOLMESLAND ET AL., 2010; OLSON
aquelas vivenciadas nas reuniões polifôni- ET AL., 2012; SEIKKULA; LAITILA; ROBER, 2012; BORCHERS,
cas com os pacientes, as famílias e a equipe. 2014)ressaltam a importância da polifonia de
Havia sempre muitas vozes presentes nas vozes em abordagens dialógicas e terapias
reuniões, e, como evidencia Bakhtin, em uma familiares, no sentido de evidenciar a eficá-
reunião polifônica, a posição de cada partici- cia do dialogismo no tratamento de proble-
pante, especialmente do autor, muda radical- mas psicóticos, na depressão, e destacam
mente. O Diálogo Aberto reforça que a única a mudança do monólogo para o diálogo em
maneira de proceder é gerar o diálogo entre situações diversas. Reiteram que, no sistema
todas as vozes dos participantes, e, nessa po- psicossocial finlandês, essa questão implica a
lifonia, nenhuma voz pode ser mais impor- transformação dos papéis profissionais, além
tante do que a outra (BAKHTIN, 1997). do que, a equipe deve trabalhar com todos os
Conforme afirma Bakhtin (1997), o autor casos, incluindo os mais difíceis. Essa nova
de um romance polifônico não pode contro- situação aumenta nos profissionais o inte-
lar a ação dos personagens, e a única maneira resse por métodos que contribuam para a
de sobreviver é estar em diálogo com eles. Os resolução de situações complexas, incluindo
profissionais tinham um papel importante no a busca de cooperação ao longo das frontei-
tratamento, mas não podiam mais definir os ras e convidando pessoas da rede pessoal do
passos, os métodos, as intervenções para supri- paciente para participar da resolução de pro-
mir sintomas ou mudar o sistema familiar. Eles blemas, contribuindo para uma mudança de
passaram a integrar as vozes desse diálogo e paradigma.
essa construção conjunta (SEIKKULA, 2011). A partir de uma perspectiva dialógica, a
Na era da medicina baseada em evidên- resposta do terapeuta pode vir no sentido
cias, tudo isso soa muito radical, porque de um esforço para alargar a zona de desen-
desafia a ideia de que os terapeutas devem volvimento proximal (SEIKKULA; TRIMBLE, 2005).
escolher o método correto de tratamento A ideia de Vygotsky de zona de desenvol-
e centra-se na ideia de que o diagnóstico vimento proximal consiste no espaço me-
emerge do diálogo que ocorre em reuniões tafórico entre o estudante, que se esforça
conjuntas. O processo de entendimento, ou para aprender novas habilidades um pouco
seja, chegar a uma compreensão prática de além dos limites de sua capacidade atual, e
uma forma dialógica por todos os interessa- o professor, que, já tendo dominado as habi-
dos do que o paciente tem, do que aconteceu, lidades, oferece-se para apoiar o desenvol-
por si só, pode ser um processo muito tera- vimento das habilidades no aluno. No caso
pêutico (SEIKKULA, 2011). do Diálogo Aberto, a experiência da equipe
A abordagem dialógica visa a um processo oferece segurança ao paciente e aos membros
em que o paciente começa a desempenhar da rede para identificar suas habilidades em
um papel mais importante na determina- sustentar a conversa sobre as mais difíceis
ção de como proceder. Evidencia o risco experiências (SEIKKULA; TRIMBLE, 2005). O fato de
de negligenciar a fala da pessoa com um os membros da equipe não terem participa-
transtorno psicótico e não conseguir romper do dos eventos passados, e que moldaram
com seu isolamento, reforça que o próprio a atual crise, torna-os menos vulneráveis,

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e isso, somado à experiência acumulada de rede social e equipe envolvida no problema,


outras situações, contribui para ofertar segu- que buscavam gerar o novo entendimen-
rança ao grupo e gerar diálogo. to através do diálogo. Em segundo lugar, o
Na fase inicial de tratamento, as decisões fornecimento dos princípios básicos para a
são adiadas em favor de expandir a conversa, organização de todo o sistema de tratamento
permitindo ao sistema tolerar a ambiguida- psiquiátrico na Lapônia com base no Diálogo
de, o que possibilita o surgimento de novas Aberto (SEIKKULA, 2011).
ideias para resolver o problema. O importan-
te no processo são as trocas emocionais. Um
ou mais membros da equipe podem condu- Estudos de avaliação de
zir a reunião, que deve ser iniciada com uma resultados das práticas de
questão aberta, partindo de informações que
eles podem ter sobre o problema e que devem
Diálogo Aberto
ser expressas em linguagem simples. O líder,
então, oferece uma pergunta aberta a quem Os estudos de resultados da aplicação do
gostaria de falar. A forma das perguntas não Diálogo Aberto em pacientes em primeira
é pré-planejada; cada próxima pergunta crise psicótica e em tratamento com esse
parte da resposta anterior, da repetição da método são estudos de follow up, em dois,
palavra, e se faz lentamente, assegurando o cinco e dez anos, incluindo grupos de con-
ritmo e o lugar de fala de cada participante. A trole (SEIKKULA ET AL., 2003; SEIKKULA ET AL., 2006;
reunião é concluída com uma síntese do que AALTONEN; SEIKKULA; LEHTINEN, 2011; SEIKKULA; ALAKARE;
foi discutido e das decisões tomadas (SEIKKULA; AALTONEN, 2011).
TRIMBLE, 2005). Os estudos demonstram que os pacientes
Para o desenvolvimento da prática dialó- que se utilizaram do Diálogo Aberto ficaram
gica, são elencados doze elementos-chave hospitalizados por menor número de dias,
tomados enquanto critérios de fidelidade que os psicofármacos foram utilizados em
para que se efetive o Diálogo Aberto: par- menor número de casos e que a maioria (82%)
ticipação de dois (ou mais) terapeutas na dos pacientes não tinha sintomas psicóticos
reunião; envolvimento da família e rede residuais em 2 anos (SEIKKULA ET AL., 2003).
social; usar perguntas abertas; responder No seguimento de 5 anos, constatou-se
às coisas ditas pelo paciente; enfatizar o que 86% retomaram os seus estudos ou
momento; solicitar múltiplos pontos de empregos em tempo integral; 17% recaíram
vista; usar o foco relacional no diálogo; res- durante os primeiros 2 anos e 19% durante
ponder aos problemas dialógicos e compor- os três anos seguintes; e que 29% fizeram uso
tamentais com um estilo concreto e atento de medicação neuroléptica durante alguma
aos significados; enfatizar as palavras usadas fase do tratamento (SEIKKULA ET AL., 2006).
pelo paciente e sua história, não os sintomas; Houve uma diminuição da incidência
a conversa entre profissionais (reflexões) anual média da esquizofrenia, sendo que o
deve ocorrer nas reuniões de tratamento; número de novos pacientes esquizofrênicos
ser transparente; tolerar a incerteza (OLSON; de longa permanência caiu para zero no con-
SEIKKULA; ZIEDONIS, 2014). texto estudado (AALTONEN; SEIKKULA; LEHTINEN, 2011).
O nome Diálogo Aberto foi usado pela Durante um período de dez anos, além
primeira vez em 1995, para descrever a abor- de surgirem menos pacientes esquizofrêni-
dagem à crise através do diálogo, engloban- cos, sua idade média foi significativamente
do a família inteira e o tratamento centrado menor, e mais de 70% dos pacientes não
na rede social. Isso incluiu dois aspectos: tiveram nenhum retorno. Esse resultado
primeiro, as reuniões com paciente, família, permaneceu o mesmo por um período de

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dez anos, envolvendo pacientes diferentes pessoa: as práticas de cuidado centradas na


(SEIKKULA; ALAKARE; AALTONEN, 2011). pessoa, planejadas nos Estados Unidos, e o
Os resultados das pesquisas de avaliação modelo finlandês do Diálogo Aberto, desta-
da experiência desenvolvida ao longo das cando seus resultados exitosos por manter o
últimas décadas na Finlândia comprovam foco no indivíduo (BORG ET AL., 2009).
a necessidade de dedicar tempo, trabalho A partir de uma crítica à falta de acesso
e estudos sobre o Diálogo Aberto. É impor- das pessoas nos Estados Unidos a trata-
tante reconhecer que o Diálogo Aberto tem mentos alternativos à prática padrão de
se mostrado potente no enfrentamento do tratamento da psicose, é feita uma revisão
problema de pessoas em crise psicótica, pro- narrativa do modelo de tratamento da
piciando um manejo mais adequado dos psi- psicose, adaptado às necessidades do pa-
cofármacos e contribuindo para a inserção ciente, e do Diálogo Aberto desenvolvido na
social dessas pessoas. Finlândia. A análise dos resultados de sete
pesquisas mostrou que os resultados do tra-
tamento com o Diálogo Aberto são equiva-
O diálogo aberto e suas lentes ou superiores àqueles do tratamento
contribuições para o mundo padrão. Particularmente, o Diálogo Aberto
foi associado a um melhor funcionamento
O Diálogo Aberto, nascido na Finlândia, e os social, a mais emprego, menos dias de hos-
impressionantes resultados obtidos no trata- pitalização e menos sintomas para pessoas
mento da psicose têm despertado o interes- com primeiro episódio de psicose. Estudos
se de outros países, como Estados Unidos, mais recentes apontam para uma associa-
Reino Unido, Itália, Polônia, Noruega, ção do Diálogo Aberto com poucos dias de
Bélgica, Austrália, entre outros. permanência no hospital, o que mostra uma
Retomam-se, a seguir, alguns estudos e evolução na abordagem e um certo refina-
relatos de experiências de pesquisadores mento dessa prática (GROMER, 2012).
de diversos países que fizeram um acompa- Outra pesquisadora da Bélgica fez um se-
nhamento das atividades do Diálogo Aberto guimento da experiência da Lapônia exami-
na Finlândia e vêm propondo formas de nando, também, a natureza do diálogo (OLSON
adesão a essa prática, reafirmando a efeti- ET AL., 2012). Em um outro estudo autoetnográfi-
vidade desse método e a necessidade de sua co, a pesquisadora descreve as mudanças de
replicabilidade. pensamento ligadas à sua experiência com o
Harlene Anderson, de Houston (Estados Diálogo Aberto, relacionando essa trajetória
Unidos), realizou um acompanhamento da à micropolítica dos Estados Unidos na gestão
experiência da Lapônia e relatou em seu de cuidados de saúde mental; à prática de
artigo que, na prática, esse trabalho represen- dialogicidade no Diálogo Aberto; e às mu-
ta um significativo desafio às crenças e tradi- danças históricas, culturais e científicas que
ções de psicoterapia e abordagens nucleares estão incentivando a adaptação do Diálogo
à psicose. Isso porque ele consiste em uma Aberto nos Estados Unidos. Menciona,
abordagem dialógica na qual o terapeuta deve ainda, a participação de Douglas Ziedonis,
respeitar e aprender sobre os pacientes e suas Jaakko Seikkula e Mary Olson na liderança
experiências e entendimentos, considerando de um projeto de pesquisa subvenciona-
que isto deve ter precedência sobre a compre- do sobre Diálogo Aberto do Departamento
ensão do terapeuta (ANDERSON, 2002). de Psiquiatria da Escola de Medicina da
Também, num estudo de pesquisadores Universidade de Massachusetts. Evidencia
da Noruega e dos Estados Unidos, são des- as iniciativas de treinamento de equipes em
critos dois modelos de cuidado centrados na cuidados comunitários que fazem parte de

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novas iniciativas públicas experimentais, do acompanhamento, foram identificados


estruturadas prevendo avaliação dos resul- cinco programas, todos escandinavos: o
tados, demonstrando um interesse crescen- projeto Paraquedas, na Suécia; o projeto es-
te pelo Diálogo Aberto nos Estados Unidos quizofrenia Danish National, na Dinamarca;
(OLSON, 2015). o projeto Opus, também na Dinamarca;
No Sul da Noruega, entre 1998 e 2008, projeto Soteria Nacka, na Suécia; e o projeto
foram implementados três programas para Diálogo Aberto, na Finlândia. Os programas
a promoção do Diálogo Aberto na região, e mostraram resultados encorajadores em
Jaakko Seikkula participou de todos eles, termos de diminuição de recaídas, dimi-
quais sejam: 1) ensinando a base para abrir nuição do tempo de internação e redução
diálogos; 2) supervisionando clinicamente do uso de antipsicóticos, principalmente na
terapeutas locais e usuários de serviços de fase ativa. Porém, um período de tratamen-
saúde mental; 3) concepção de pesquisa e to de dois anos não é tempo suficiente para
projetos. Segundo a análise desses progra- permitir aos pacientes manter as melhorias
mas, os dez anos de implementação dessas obtidas durante a fase ativa de um tratamen-
práticas dialógicas no sul da Noruega produ- to integrado (SKALLI; NICOLE, 2011).
ziram resultados positivos relativos à execu- O Diálogo Aberto despertou o interesse
ção, à educação e ao aumento de pesquisas e da Austrália, país onde se investiu fortemen-
projetos sobre o tema (ULLAND ET AL., 2014). te em equipes de especialistas para inter-
No Reino Unido, o interesse pelo Diálogo venção na psicose, modelo que vem sendo
Aberto vem crescendo continuamente com questionado considerando-se as altas taxas
conferências e experiências pontuais de de consumo de psicofármacos por pessoas
pequena escala. Um movimento muito sig- diagnosticadas com psicoses e as altas taxas
nificativo começou para intervir nos ser- de mortalidade relacionadas a esse consumo.
viços no sentido de implantar o Diálogo Um artigo de revisão publicado na Austrália,
Aberto. Determinadas cidades, como Leeds em 2014, aponta resultados exitosos do tra-
e Nottingham, possuem grupos de usuários tamento com o Diálogo Aberto para inter-
e serviços capacitados no Diálogo Aberto, venção na crise psiquiátrica com o mínimo
que estão disponíveis para ensinar e esti- de uso de medicação antipsicótica e com
mular as pessoas a tal prática. Além disso, melhores respostas, sugerindo sua adoção
até sete serviços nacionais de saúde mental para realidades que precisam enfrentar tal
da Inglaterra estão estabelecendo equipes- problemática (LAKEMAN, 2014).
-piloto de Diálogo Aberto em cada um dos
seus territórios, a fim de participar conjunta-
mente de um estudo multicêntrico aleatório Conclusões
sobre o tema (RAZZAQUE; WOOD, 2015).
O Diálogo Aberto é apresentado por pes- Na Finlândia, na experiência de mais de
quisadores da Polônia como uma aborda- trinta anos do oeste da Lapônia, algumas es-
gem alternativa que pode contribuir para a colhas estratégicas foram adotadas visando
redução do uso de neurolépticos e consti- a assegurar a continuidade dos cuidados.
tuir-se como recurso complementar aos tra- Foram constituídos serviços de internação
tamentos usuais da esquizofrenia (KŁAPCIŃSKI; com 30 leitos psiquiátricos hospitalares
WOJTYNSKA; RYMASZEWSKA, 2015). de cuidados agudos e 5 clínicas ambulato-
Em um estudo de revisão sistemática des- riais onde o Diálogo Aberto é a filosofia de
crevendo diferentes serviços especializados prática, e, em cada unidade, equipes móveis
de tratamento de primeiro episódio psicóti- para atendimento à crise estão disponíveis.
co e seus resultados em diferentes momentos A maioria dos profissionais foi treinada (por

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cerca de três anos) em terapia familiar sistê- uma consistente mudança organizativa em
mica (BORG ET AL., 2009). termos de estruturação de serviços, com
O questionamento que necessita ser feito equipes para atenção à crise disponíveis 24
consiste nos desafios de colocar em prática em horas, garantia de continuidade psicológi-
outros países uma abordagem desinstituciona- ca, tolerância à incerteza, protelamento do
lizante que tem enfrentado com êxito o grave uso de neurolépticos, um criterioso proces-
problema de pessoas em crise psicótica no so de capacitação das equipes, entre outras
seu domicílio, com o princípio do diálogo e da iniciativas. Além disso, torna-se indispen-
atenção em rede. Ao mesmo tempo, esse novo sável uma substantiva mudança cultural,
método propõe uma mudança significativa, que implica rever seriamente as relações
ao fazê-lo de modo que nenhuma decisão seja de poder entre os profissionais da equipe e
tomada sem a participação do paciente e sua destes com pacientes e familiares. Respostas
rede, reduzindo o consumo de psicofármacos e efetivas a problemas complexos, como é o
obtendo resultados muito promissores. caso de pessoas em crise psicótica, dificil-
Destaca-se que implementar o Diálogo mente podem ser dadas sem que mudanças
Aberto consiste num desafio que requer significativas sejam feitas. s

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Recebido para publicação em outubro de 2016
1998-2008. Adm Policy Ment Health, Nova York, v. 41, p. Versão final em março de 2017
Conflito de interesses: inexistente
410-419, 2014.
Suporte financeiro: Projeto financiado pelo Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) – processo nº
6458/2014-09

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