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34 Sábado, 16 de junho de 2012

OGLOBO

HISTÓRIA

Marrano, muito prazer


Novas pesquisas desmistificam a origem dos sobrenomes de judeus convertidos no Brasil
Reprodução
Daniela Kresch
ciencia@oglobo.com.br
Especial para O Globo

N
a Bahia do século XVII, o pro-
fessor de um colégio jesuíta
perguntou o sobrenome de
um de seus alunos. A respos-
ta foi inusitada: “Qual deles, o de den-
tro ou o de fora”? A história, contada
pela historiadora da USP Anita No-
vinsky em sua dissertação “O mito
dos sobrenomes marranos”, exempli-
fica o dilema dos cristãos-novos brasi-
leiros, nos primeiros séculos do país.
Expor ou não o sobrenome da família
fora de casa, sob risco de ser identifi-
cado pela Inquisição e acusado do cri-
me inafiançável de “judaísmo”? O te-
mor e a delicadeza do tema fizeram
com que a genealogia dos descenden-
tes de judeus portugueses no Brasil
fosse envolta, por séculos, numa bru-
ma de mitos e ignorância. Nos últimos
anos, no entanto, pesquisadores têm
revelado surpresas sobre os sobreno-
mes marranos no Brasil.
No final do século XV, os judeus
compunham entre 10% e 15% da po-
pulação de Portugal — somando os
cerca de 50 mil locais e os quase 120
mil que cruzaram a fronteira em 1492,
quando os Reis Católicos Fernando e
Isabela expulsaram toda a população
judaica da Espanha. Nos primeiros
dois séculos depois do Descobrimen-
to, o Brasil recebeu boa parte dessa
população, os chamados cristãos-no-
vos (ou “marranos”, pelo apelido pe-
jorativo da época), convertidos ao
cristianismo à força, por decreto de
Dom Manuel I, em 1497. Historiado-
res concordam que um em cada três
portugueses que imigraram para a
colônia era cristão-novo.


Pistas nos arquivos NO DESENHO ‘Caminhada dos prisioneiros para o auto de fé’, de A. Shoonebeck, um retrato da perseguição aos judeus que não se convertiam ao cristianismo

da Inquisição
n
Reprodução

l Até recentemente, acreditava-se


a Osmaissobrenomes
usados
que esses judeus conversos aban-
donaram seus sobrenomes “infiéis” l NO BRASIL: Na história da
para adotar novos “inventados” ba-
seados exclusivamente em nomes
A Inquisição anotava inquisição no Brasil, os so-
brenomes atribuídos a cris-
de plantas, árvores, frutas, animais
e acidentes geográficos. Assim, se-
todos os nomes tãos-novos no país eram co-
muns entre os portugueses:
ria fácil. Todos os portugueses com dos detidos Rodrigues, Nunes, Henri-
os sobrenomes Pinheiro, Carvalho, ques, Mendes, Correia, Lo-
Pereira, Raposo, Serra, Monte ou Ri- cuidadosamente, pes, Costa, Cardoso, Silva,
os, entre outros, que imigraram pa-
ra o Brasil após 1500 devem ter sido
como se fosse Fonseca, Paredes, Álvares,
Miranda, Fernandes, Azere-
marranos, certo? Errado. a Gestapo nazista do, Valle, Barros, Ximenes e
— Em minhas investigações, não en- Furtado.
contrei prova documental de que no- Anita Novisnky, historiadora
mes de árvores, animais, plantas ou l NOBREZA: A coroa portu-
acidentes geográficos tenham perten- guesa autorizou que certos
cido apenas ou quase sempre a marra- Ser marrano é ser sobrenomes utilizados pela
nos — afirma Anita Novisnky, uma das nobreza fossem também ado-
maiores autoridades no assunto. judeu por dentro e tados por cristãos-novos: No-
O que causa confusão, segundo No- ronha, Meneses, Albuquer-
vinsky, é o fato de que os sobrenomes católico por fora que, Almeira, Cunha, Pache-
adotados pelos cristãos-novos eram co, Vasconcelos, Melo, Silvei-
Luciano Canuto de Oliveira, médico
os mesmos usados por cristãos-ve- ra e Lima.
lhos, alguns por nostalgia, outros por
medo de perseguições. Afinal, no Bra-
sil, os marranos foram perseguidos
Não havia nenhum l FAUNA E FLORA: Muitos
marranos optaram por so-
por 285 anos pela Inquisição portugue- sobrenome exclusivo de brenomes simbólicos na tra-
sa. Quem demonstrasse apego à antiga dição portuguesa, lembran-
religião poderia ser condenado à mor- cristãos-novos. Até do fauna e flora, como Leão,
te na fogueira dos “autos de fé”, as ceri- Carneiro, Lobo, Raposo, Coe-
mônias de penitência aos infiéis. porque eles mudavam lho, Pinheiro, Carvalho, Pe-
Como identificar, então, quem era
marrano? A mais importante pista está
sempre que podiam reira e Oliveira.

justamente nos arquivos da Inquisi- Avi Gross, historiador


lACIDENTES GEOGRÁFICOS:
ção. Aproximadamente 40 mil julga- Outros cristãos-novos preferi-
mentos resistiram ao tempo, 95% deles PRIMEIRA MISSA no Brasil, de Vitor Meireles: novos nomes para a nova religião ram adotar nomes de aciden-
referentes a crimes de judaísmo. Anita tes geográficos como Serra,
Novinsky encontrou exatos 1.819 so- clusivo de cristãos-novos. Até porque mentos dentro da família). não comer certos alimentos como car- Monte, Rios e Valle.
brenomes de cristãos-novos detidos, eles mudavam sempre que podiam, Para os aficionados em genealogia, ne de porco, não misturar carne com
só no século XVIII, no chamado “Livro além de adotarem nomes compostos. um novo site na internet, o “Name your leite, vestir a melhor roupa na sexta- l CIDADES: Alguns judeus
dos Culpados”. Os sobrenomes mais Muitos irmãos e esposos adotavam até roots” (que tem versão em português), feira, enterrar corpos em “terra limpa” convertidos preferiram ado-
comuns dos detidos eram Rodrigues mesmo sobrenomes diferentes, só pa- pode ajudar a descobrir as raízes. No (envolto apenas numa mortalha), re- tar sobrenomes que designa-
(citado 137 vezes), Nunes (120), Henri- ra confundir — explica o historiador is- portal, criado há três meses por dois zar numa língua estranha e colocar pe- vam cidades ou vilas portu-
ques (68), Mendes (66), Correia (51), raelense Avi Gross. religiosos israelenses, é possível obter dras em túmulos. guesas: Miranda, Chaves,
Lopes (51), Costa, (49), Cardoso (48), O historiador paulistano Paulo Va- explicações e bibliografia gratuitamen- — Depois de conviver com comuni- Bragança, Oliveira, Santa-
Silva (47) e Fonseca (33). ladares, autor do “Dicionário Sefara- te sobre sobrenomes marranos co- dades do interior do país, percebi co- rém e Castelo Branco.
— A Inquisição anotava todos os no- di de Sobrenomes”, no qual destaca muns no Brasil. mo os descendentes de marranos pra-
mes dos detidos cuidadosamente, co- 14 mil sobrenomes oriundos de ju- Mas Paulo Valadares alerta que é ticam tradições judaicas no dia a dia — l APARÊNCIA FÍSICA: Famí-
mo se fosse a Gestapo nazista e manti- deus da Península Ibérica, aponta preciso ir além: identificar se há ante- conta Luize , que lança, em agosto, o lias de cristãos-novos tam-
nha uma relação de bens de cristãos- para mais uma complicação: o da passados portugueses que chegaram romance “O segredo do oratório” (Re- bém adotaram sobrenomes
novos para confiscar — diz Anita. mestiçagem brasileira. A grande ao Brasil nos séculos XVI ou XVII ou se cord), contando a saga de uma família que denotam aparência físi-
Isso não quer dizer, no entanto, que maioria dos cristãos-novos se mis- foram citados nos anais da Inquisição de cristãos-novos no Brasil. ca, outra tradição em Portu-
todas as famílias com esses sobreno- turou depois de uma ou duas gera- até o século XVIII, se a família se esta- O médico paraibano Luciano Canu- gal: Moreno, Negro, Branco.
mes eram marranas. Nas investiga- ções com outras culturas e raças. beleceu em alguma região específica e to de Oliveira, que voltou ao judaís-
ções, sob tortura, os detidos diziam tu- — Poucos conseguiram manter as se guarda tradições “estranhas”. O do- mo depois de descobrir suas origens lRELIGIÃO: Sobrenomes reli-
do o que os inquisidores queriam ou- tradições judaicas por muito tempo. cumentário “A estrela oculta do Ser- marranas, define sua identidade de giosos também foram escolhi-
vir, acusando vizinhos, empregados e Algumas famílias tentaram, se iso- tão”, de Elaine Eiger e Luize Valente, modo parecido com a resposta do dos pelos cristãos-novos para
parentes “inocentes”. Fora isso, os so- lando em algumas áreas do país, traz exemplos de algumas dessas tra- aluno do colégio jesuíta, há quatro sé- despistar a Inquisição: Cruz,
brenomes eram realmente comuns. principalmente no Sertão nordesti- dições, que ainda sobrevivem no Nor- culos: “Ser marrano é ser judeu por Jesus e Espírito Santo.
— Não havia nenhum sobrenome ex- no, e praticando a endogamia (casa- deste: olhar a primeira estrela no céu, dentro e católico por fora”. n

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