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Jesus de Nazaré.

Humanamente
divino e
divinamente
humano
Faustino Teixeira
O Jesus de Pagola

E mais:
Carlos Palacio
Humanamente divino e divinamente humano Deífilo Gurgel:
>>
Lembranças de Dona
Militana: a maior
336
Ano X
Jacques Schlosser
Jean-
Pierre
romanceira do Brasil

Jesus: o profeta da Galileia >>Religiões do mundo: a ética


06.07.2010
ISSN 1981-8469 mundial ao alcance de todos
Jesus de Nazaré.
Humanamente divino
e divinamente humano
Jesus. Aproximação histórica é um livro que suscitou uma enorme polêmica da Europa, espe-
cialmente na Espanha. O autor do livro é José Antonio Pagola, teólogo, autor de diversas obras
de teologia, pastoral e cristologia. Mais de 50 mil exemplares do livro foram vendidos na Espanha.
Duramente questionado pela Conferência Episcopal Espanhola, o livro já foi traduzido em diversas
línguas e acaba de ser publicado, no Brasil, pela Editora Vozes.

O debate suscitado pelo livro foi amplamente reproduzido pelas Notícias do Dia, publicadas dia-
riamente na página do Instituto Humanitas Unisinos – IHU.

A última edição deste semestre da IHU On-Line discute o tema do livro de 652 páginas.

Foram entrevistados Andrés Torres Queiruga, teólogo, professor da Universidade de Santiago


de Compostela, na Espanha, Jacques Schlosser, exegeta, professor na Faculdade de Teologia de
Strasbourg (Université Marc Bloch), Carlos Palacio, teólogo, superior provincial da Companhia de
Jesus no Brasil, Francisco Orofino, teólogo, professor no Seminário Paulo VI, de Nova Iguaçu, Rio de
Janeiro, Faustino Teixeira, professor e pesquisador do PPG em Ciências da Religião da Universidade
Federal de Juiz de Fora e José Ignacio González Faus, do Centro de Estudos “Cristianismo e Justiça”.

A Faustino Teixeira, parceiro do IHU, agradecemos, mais uma vez, a importante contribuição
que deu na elaboração da pauta desta revista.

Recentemente faleceu Militana Salustino do Nascimento (1925 -2010), conhecida como Dona
Militana, natural de São Gonçalo do Amarante/RN, que cantou romances, modinhas, coco, xácaras,
moirão, toadas e boi, aboios e fandangos. Uma entrevista com o folclorista Delfídio Gurgel contri-
bui para um melhor conhecimento da sua importância para a cultura popular brasileira.

Sob o título “Religiões do Mundo: a ética mundial ao alcance de todos”, Moisés Sbardelotto nar-
ra algo do trabalho do escritório brasileiro da Fundação Ética Mundial.

“Mídia e educação: a necessidade de refletir sobre sua regulamentação” é o título do artigo de


Paola Madeira Nazário, membro do Grupo de Pesquisa Comunicação, Economia Política e Sociedade
– Grupo Cepos/Unisinos.

A revista IHU On-Line volta a circular no próximo dia 02-08-2010.

A todas e a todos uma ótima leitura e uma excelente semana!

IHU On-Line é a revista semanal do Instituto Humanitas Unisinos – IHU – Universidade do Vale do
Rio dos Sinos - Unisinos. ISSN 1981-8769. Diretor da Revista IHU On-Line: Inácio Neutzling (inacio@
Expediente

unisinos.br). Editora executiva: Graziela Wolfart MTB 13159 (grazielaw@unisinos.br). Redação: Márcia
Junges MTB 9447 (mjunges@unisinos.br) e Patricia Fachin MTB 13062 (prfachin@unisinos.br). Revisão:
Vanessa Alves (vanessaam@unisinos.br). Colaboração: César Sanson, André Langer e Darli Sampaio, do
Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores – CEPAT, de Curitiba-PR. Projeto gráfico: Bistrô de De-
sign Ltda e Patricia Fachin. Atualização diária do sítio: Inácio Neutzling, Greyce Vargas (greyceellen@
unisinos.br), Rafaela Kley e Cássio de Almeida. IHU On-Line pode ser acessada às segundas-feiras, no
sítio www.ihu.unisinos.br. Sua versão impressa circula às terças-feiras, a partir das 8h, na Unisinos.
Apoio: Comunidade dos Jesuítas - Residência Conceição. Instituto Humanitas Unisinos - Diretor: Prof.
Dr. Inácio Neutzling. Gerente Administrativo: Jacinto Schneider (jacintos@unisinos.br). Endereço: Av.
Unisinos, 950 – São Leopoldo, RS. CEP 93022-000 E-mail: ihuonline@unisinos.br. Fone: 51 3591.1122
– ramal 4128. E-mail do IHU: humanitas@unisinos.br - ramal 4121.
Leia nesta edição
PÁGINA 02 | Editorial

A. Tema de capa
» Entrevistas
PÁGINA 05 | Andrés Torres Queiruga: “Em Jesus se realiza o melhor de nós”
PÁGINA 07 | Faustino Teixeira: O Jesus de Pagola
PÁGINA 10 | Francisco Orofino: Jesus: um apaixonado por Deus e pelas pessoas
PÁGINA 12 | José Ignacio González Faus: A humanidade de Jesus como divindade e amor
PÁGINA 15 | Jacques Schlosser: Jesus: o profeta da Galileia
PÁGINA 18 | Carlos Palacio: Humanamente divino e divinamente humano

B. Destaques da semana
» Memória
PÁGINA 24 | Haroldo Gomes: Dona Militana: o canto que vem de Oiteiro
PÁGINA 25 | Deífilo Gurgel: Lembranças de Dona Militana: a maior romanceira do Brasil
» Coluna do Cepos
PÁGINA 30 | Paola Madeira Nazário: Mídia e educação: a necessidade de refletir sobre sua regulamentação
» Destaques On-Line
PÁGINA 32 | Destaques On-Line

C. IHU em Revista
» Eventos
» IHU Repórter
PÁGINA 38| Simone Blume

SÃO LEOPOLDO, 06 DE JULHO DE 2010 | EDIÇÃO 336 


 SÃO LEOPOLDO, 06 DE JULHO DE 2010 | EDIÇÃO 336
“Em Jesus se realiza o melhor de nós”
Para o teólogo espanhol Andrés Torres Queiruga, ao olharmos Jesus, reconhecemos o me-
lhor de nós mesmos enquanto criaturas criadas, sustentadas e habitadas por Deus

Por Graziela Wolfart e Cleusa Andreatta

D
esafiado a definir quem foi Jesus, o teólogo espanhol Andrés Torres Queiruga responde que foi
“aquele que conseguiu a culminação insuperável da acolhida de Deus na história humana (...) e
que conseguiu revelar e viver para Deus como amor infinito e perdão incondicional, preocupado
apenas com nosso bem e nossa salvação, convocando-nos a colaborar com Ele para que isto seja
possível para todos”. Na visão de Queiruga, “não é possível pensar uma meta maior e sempre
poderemos estar caminhando até ela”. Na entrevista que segue, concedida, por e-mail, à IHU On-Line, ele
ainda fala sobre as transformações que a Teologia vem sofrendo em nossa sociedade. E afirma: “É uma te-
ologia que progrediu e fez muitas mudanças, mas que, no entanto, não tem tocado nas questões de fundo.
Foram feitas reformas, mas, em questões fundamentais, é preciso uma ‘mudança de paradigma’”.
Andrés Torres Queiruga é professor da Universidade de Santiago de Compostela, na Espanha. É licencia-
do em Filosofia e Teologia pela Universidade de Comillas, Espanha, doutor em Filosofia pela Universidade
de Santiago de Compostela, Espanha, e doutor em Teologia pela Pontifícia Universidade Gregoriana, Itália.
Entre suas obras publicadas em português, citamos Creio em Deus Pai. O Deus de Jesus como afirmação
plena do humano (São Paulo: Paulinas, 1993); O cristianismo no mundo de hoje (São Paulo: Paulus, 1994);
A revelação de Deus na realização humana (São Paulo: Paulus, 1995); e Repensar a ressurreição (São Paulo:
Edições Paulinas, 2004). No livro A teologia na universidade contemporânea, organizado por Inácio Neutzling
e publicado pela Editora Unisinos, 2005, Queiruga é autor do artigo A teologia a partir da modernidade.
Confira a entrevista.

IHU On-Line - Como entender a gran- Deus? nele se realiza o melhor de nós,
de atração provocada pela pessoa de Andrés Torres Queiruga – Nunca o aquilo a que aspiramos sem alcançar
Jesus? saberemos completamente. Adivi- totalmente. Por isso, Rahner dizia
Andrés Torres Queiruga – Como disse nhamos seu mistério na transparên-  Karl Rahner (1904-2004): importante teólogo
católico do século XX, ingressou na Companhia
o Concílio: em seu mistério se revela cia total à presença de Abba; em de Jesus em 1922. Doutorou-se em Filosofia e
nosso mistério; olhando Ele, reconhe- seu viver radical e sem fissuras “a em Teologia. Foi perito do Concílio Vaticano
cemos o melhor de nós mesmos en- partir de Deus”, como de seu pão II e professor na Universidade de Münster. A
sua obra teológica compõe-se de mais de 4 mil
quanto criaturas criadas, sustentadas de cada dia; em sua disponibilida- títulos. Suas obras principais são: Geist in Welt
e habitadas por Deus, que nos chama de plena ao chamado que constitui (O Espírito no mundo), 1939, Hörer des Wor-
à confiança n’Ele e na radical fraterni- seu ser enquanto saído do Pai, até o tes (Ouvinte da Palavra), 1941, Schrifften zur
Theologie (Escritos de Teologia), 16 volumes
dade com as outras pessoas. ponto em que podemos dizer que ver escritos entre 1954 e 1984, e Grundkurs des
e escutar Ele é ver e escutar o Pai. Glaubens (Curso Fundamental da Fé), 1976.
IHU On-Line - Como explicitar o lugar Em 2004, celebramos seu centenário de nas-
cimento. A Unisinos dedicou à sua memória o
decisivo dado à compaixão na missão IHU On-Line - Como nós, hoje, no sé- Simpósio Internacional O Lugar da Teologia
histórica de Jesus? culo XXI, podemos entender de for- na Universidade do século XXI, realizado de
Andrés Torres Queiruga – Porque o ma racional a pessoa de Jesus? 24 a 27 de maio daquele ano. A edição número
102, da IHU On-Line, de 24-05-2004, dedicou
amor, como a água, sempre tende a des- Andrés Torres Queiruga – Tudo o a matéria de capa à memória do centenário
cer até onde estão a carência, a margi- que foi dito no ponto anterior vale, de nascimento de Karl Rahner, disponível para
nalização e o sofrimento: os “pobres”, em diferente, mas real medida, para download em http://www.ihuonline.unisinos.
br/uploads/edicoes/1158261608.85pdf.pdf.
no íntimo e amplo sentido evangélico. nós: nosso ser “ressoa” em seu en- Os Cadernos Teologia Pública publicaram o
contro e podemos “imitá-lo” e “se- artigo Conceito e Missão da Teologia em Karl
IHU On-Line - Qual é a singularida- gui-lo”. Por isso, a melhor maneira Rahner, de autoria do Prof. Dr. Érico João
Hammes. Confira esse material em http://
de da intimidade filial de Jesus com de compreendê-lo é reconhecer que www.ihuonline.unisinos.br/uploads/edicoes/

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que a Cristologia é a culminação da em todos os homens e mulheres, em
Antropologia (eu concreto: a pes- todas as culturas e religiões; só limi-
soa vista desde a criação por amor). tado pelo respeito divino à liberdade
Definitivamente, Jesus é “igual a humana e pela limitação inevitável
nós, mas diferente; diferente, mas de nossas capacidades. No campo
igual”. Por algum motivo, nos con- prático, uma maior, mais fraterna
vida a orar como ele: “Pai nosso”. e igualitária, participação de todos
— homens e mulheres sem nenhum

http://twitter.com/_ihu
IHU On-Line - Como o senhor res- tipo de discriminação — na vida da
ponde hoje à pergunta: quem foi Igreja: neste sentido, uma “demo-
Jesus? cratização” radical: os primeiros,
Andrés Torres Queiruga – Aquele últimos; o que manda, serve.
que conseguiu a culminação insupe-
rável da acolhida de Deus na história IHU On-Line - O que se entende hoje
humana, aprendendo dela (sobretu- como uma “teologia pluralista”?
do através do Antigo Testamento e Andrés Torres Queiruga – Na visão
das culturas e religiões presentes do interior da Igreja, é o respeito às
em seu gênesis, assim como também diferentes teologias na comunhão da
das culturas de seu tempo, helenista fé comum. Do ponto de vista das de-
e romano), mas a levando à radica- mais religiões, é o reconhecimento
lidade insuperável desde sua própria da presença salvadora e reveladora
experiência que lhe permitiu romper de Deus nas distintas medidas de sua
o último “muro”. Em síntese: Aquele acolhida histórica. Isso não impede
que conseguiu revelar e viver para confessar que em Cristo se alcançou
Deus como amor infinito e perdão a culminação insuperável em si mes-
incondicional, preocupado apenas ma, ainda que perfectível em nossa
com nosso bem e nossa salvação, responsabilidade de atualizá-la no
convocando-nos a colaborar com Ele caminho da história. Aí as demais
para que isto seja possível para to- religiões podem ajudar também, na
dos. Não é possível pensar uma meta medida em que nós lhes oferecemos
maior e sempre poderemos estar ca- o que foi conquistado em Cristo.
minhando até ela.
IHU On-Line - Como as demandas de
IHU On-Line - Como o senhor avalia a uma teologia pluralista impactam na
situação da Teologia diante das gran- teologia da revelação?
des mudanças que caracterizam o Andrés Torres Queiruga – Tornando-
contexto atual? a mais aberta, humilde e fraternal
Andrés Torres Queiruga – É uma teo- como atitude; nada literalista na
logia que progrediu e fez muitas mu- interpretação da Bíblia e da tradi-
danças, mas que, no entanto, não tem ção; mais teocêntrica desde Deus tal
tocado nas questões de fundo. Foram como se revelou em Jesus, o Cristo.
feitas reformas, mas, em questões
fundamentais, é preciso uma “mudan-
ça de paradigma”.

IHU On-Line - Quais as principais


questões colocadas à Teologia pelo
pluralismo cultural, religioso e de va- Leia Mais...
lores vigentes em nossa sociedade? >> Andrés Torres Queiruga já concedeu
Andrés Torres Queiruga - No aspec- outras entrevistas à IHU On-Line:
to teórico, uma nova concepção da
* Teologia, pós-modernidade e universidade. En-
revelação: o amor infinito de Deus trevista publicada na IHU On-Line número 103,
manifestando-se o máximo possível de 31-05-2004, disponível para download em
http://bit.ly/bcvPx8
1158261608.85pdf.pdf. A edição 297, de 15- * Teologia e modernidade: a busca de novos pa-
06-2009, intitula-se Karl Rahner e a ruptura radigmas. Entrevista publicada na IHU On-Line
do Vaticano II, disponível para download em número 92, de 15-03-2004, disponível para down-
http://www.ihuonline.unisinos.br/uploads/ load em http://bit.ly/aeglE3
edicoes/1245168975.3888pdf.pdf. (Nota da
IHU On-Line)

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O Jesus de Pagola
Faustino Teixeira faz uma análise da obra de Pagola, ressaltando que concorda com o
autor quando afirma que não há como aproximar-se de Jesus sem sentir-se atraído e
fascinado por sua pessoa, pelo carinho, delicadeza e ternura com que trata os outros,
independente de seu gênero, etnia ou religião. “O que fala mais alto em Jesus é o seu
testemunho de vida”, afirma

Por Graziela Wolfart

P
ara o teólogo mineiro Faustino Teixeira, o livro Jesus. Aproximação histórica (Petrópolis: Vozes,
2010), de José Antonio Pagola tem uma tripla destinação: é dirigido “aos cristãos e cristãs que
perderam o contato com a mensagem viva de Jesus, aos que muito ignoram a seu respeito e aos
que se decepcionaram com o cristianismo real e buscam outros caminhos de afirmação de senti-
do”. Na entrevista que segue, concedida à IHU On-Line por e-mail, Teixeira destaca que, “com
base nos recursos da investigação moderna e contemporânea, e o apoio interdisciplinar, Pagola busca apro-
ximar-se historicamente da figura de Jesus. O seu objetivo é facultar o ‘contato vivo com sua pessoa’, sem
cair em abstrações metafísicas, ainda que sublimes, sobre o seu ser. Assinala sua dificuldade em crer ‘num
Cristo sem carne’, ou acessar a Jesus como mistério que dá vida só mediante a doutrina. Adverte sobre o
risco de converter Jesus Cristo, de forma exclusiva, a um ‘objeto de culto’, enquanto ‘ícone venerável’, mas
destacado de sua condição de profeta do reino de Deus. Esse é o risco de um Jesus sem reino, de que fala
também Jon Sobrino . Não há como acessar ao verdadeiro significado de Jesus destacando-o de sua relação
com o reino de Deus. Como indica Pagola, ‘o que ocupa o lugar central na vida de Jesus não é Deus simples-
mente, mas Deus com seu projeto sobre a história humana’.
Faustino Teixeira, parceiro do IHU, é doutor e pós-doutor em Teologia pela Pontifícia Universidade Grego-
riana, de Roma. É professor-associado e pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Religião
da Universidade Federal de Juiz de Fora (PPCIR-UFJF), em Minas Gerais. É autor e organizador de diversos
livros. Ao lado de Renata Menezes, é organizador de Catolicismo plural: dinâmicas contemporâneas (Petró-
polis: Vozes, 2009). Colabora organicamente com o IHU nas Orações Inter-religiosas publicadas semanalmen-
te no blog do IHU com ilustrações de Pulika. Elas podem ser acessadas em http://migre.me/UI0a. Confira a
entrevista.

IHU On-Line - A quem se destina esse sias sobre o livro de Pagola, publicada em já manifesta o seu fascínio por Jesus. Su-
Jesus de Pagola? 17/3/2010 e disponível em http://migre.me/ blinha que ele “é o melhor que a huma-
Faustino Teixeira - Na apresentação UH2c; nidade produziu. O potencial mais ad-
- A matéria O basco Pagola e o norte-america-
desta nona edição de seu livro, Pagola no John P. Meier, publicada em 11/3/2010 e mirável de luz e de esperança com que
 José Antonio Pagola (1937): sacerdote, te- disponível em http://migre.me/UH3M; nós seres humanos podemos contar”.
ólogo e biblista espanhol, autor do best-seller - A matéria Pagola. Roma quer ‘esfriar’ a po- Argumenta que recuperar essa memó-
Jesús, aproximación histórica (Ed. PPC), lan- lêmica, publicada em 10/3/2010 e disponível
çado agora em português pela Editora Vozes, em http://migre.me/UH58; ria de Jesus é fortalecer o horizonte da
de Petrópolis-RJ. É licenciado em Teologia - A matéria “Bem-aventurados sereis quando história, que ficaria muito empobrecido
pela Universidade Gregoriana de Roma, em vos perseguirem”, publicada em 6/3/2010 e com o seu esquecimento. O que o au-
Sagrada Escritura pelo Instituto Bíblico de disponível em http://migre.me/UH7L;
Roma, e diplomado em Ciências Bíblicas pela - A matéria Clero de San Sebastián toma parti- UHcQ;
Escuela Bíblica de Jerusalén. Veja o que já foi do a favor de Pagola, publicada em 6/3/2010 - A matéria Dom Uriarte: ‘É um obra honesta e
publicado no sítio do IHU sobre o livro Jesus. e disponível em http://migre.me/UH8E; documentada’, publicada em 2/3/2010 e dis-
Aproximação histórica: - A matéria “Pagola é honesto em sua apro- ponível em http://migre.me/UHeT;
- Uma resenha de autoria de Faustino Teixei- ximação histórica”, publicada em 2/3/2010 e - A matéria Em defesa do livro “Jesus” de José
ra, em 11/3/2010, intitulada O segredo de um disponível em http://migre.me/UHbB; A. Pagola, publicada em 2/3/2010 e disponí-
fascinante galileu, disponível em http://mi- - A matéria Bispos espanhóis censuram o livro vel em http://migre.me/UHgf; (Nota da IHU
gre.me/UH0b; “Jesus” do teólogo José Pagola, publicada em On-Line)
- A matéria Brigando por Cristo. Controvér- 2/3/2010 e disponível em http://migre.me/

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tor intenta fazer nesta excelente obra é sofrem. Fazer nossos seus sofrimentos e
buscar uma aproximação histórica com “A maneira peculiar aspirações. Assumir sua defesa”.
base no “Jesus recordado”, ou seja, na
lembrança que ele deixou no núcleo de com que falava aos IHU On-Line - Um dos traços novidadei-
seus seguidores. Sua intenção com a ros do Jesus de Pagola é a forma como
obra é colocar Jesus à disposição de to- outros sobre Deus trabalha o tema de Jesus e as mulhe-
dos, pois sua vida, atuação e mensagem res, inclusive sublinhando o papel pro-
não são propriedade exclusiva dos cris- e seu projeto de vida tagônico das mesmas no seu discipu-
tãos, mas constituem um “patrimônio lado. Há nesse âmbito um campo rico
da humanidade”. É uma obra que tem, provocava entusiasmo para o trabalho de reflexão?
portanto, uma tripla destinação. É dirigi- Faustino Teixeira - De fato, Pagola re-
da aos cristãos e cristãs que perderam o e paixão nos setores serva um lugar de grande destaque às
contato com a mensagem viva de Jesus, mulheres no discipulado de Jesus. A viva
aos que muito ignoram a seu respeito e mais simples da Galileia” imagem que passa em sua obra é a de
aos que se decepcionaram com o cris- Jesus como amigo das mulheres, e num
tianismo real e buscam outros caminhos a de que “Deus já está aqui buscando tempo em que elas viviam uma precária
de afirmação de sentido. Pagola assinala uma vida mais ditosa para todos”. Tudo situação, de rejeição e exclusão. Jesus
que sua opção em favor de uma perspec- isso foi motivo de impacto e sedução lança um olhar diferente sobre elas, tor-
tiva narrativa da vida de Jesus intencio- em seu tempo. A maneira peculiar com nando-as visíveis e presentes. A palavra
na “aproximar o leitor de hoje, crente que falava aos outros sobre Deus e seu chave aqui é a acolhida. Pagola mostra
ou não, à experiência vivida pelos que projeto de vida provocava entusiasmo e como as mulheres fizeram parte do gru-
se encontraram com Jesus, e ajudá-lo paixão nos setores mais simples da Gali- po dos discípulos desde o início, perma-
a sintonizar com a Boa Notícia que des- leia. Era mesmo o que precisavam ouvir: necendo todo o tempo fiéis a Jesus e à
cobriram nele”. E não há como aproxi- a notícia de que “Deus se preocupa com sua causa. O autor sugere que elas esti-
mar-se desse “poeta da compaixão” sem eles”. Jesus não era somente o “poeta veram também presentes na última ceia
sentir-se profundamente atraído por ele da compaixão”, mas também “curador e assumiram um papel protagônico na
e convocado ao seu seguimento. da vida”. Trata-se de um curador singu- origem da fé pascal. Muito rica também a
lar, pois despertava nos outros a vontade reflexão do autor sobre Maria Madalena
IHU On-Line - Jesus aparece na obra de viver com dignidade e sinalizava uma (Maria de Mágdala), a melhor amiga de
de Pagola como o “poeta da compai- relação distinta com o mistério do Deus Jesus. Ele desfaz preconceitos a respeito
xão”, o “curador da vida” e o “de- que abre novos caminhos. Na verdade, e resgata a imagem de Madalena como
fensor dos últimos”. É possível veri- como bem expressa Pagola, Jesus con- “seguidora fiel de Jesus e testemunha
ficar aí o segredo de seu fascínio? tagia saúde, vida e alegria: “Seu amor eminente do Senhor ressuscitado”, tão
Faustino Teixeira - Não há dúvida algu- apaixonado à vida, sua acolhida afetuosa viva na Igreja do Oriente.
ma sobre isso. O autor consegue apre- a cada enfermo ou enferma, sua força
sentar com imensa felicidade essa fa- para regenerar a pessoa a partir de suas IHU On-Line - Em artigo publicado
ceta extraordinária de Jesus como um raízes, sua capacidade de transmitir sua em 1993, Jon Sobrino afirmara que
buscador singular de Deus, mas de um fé na bondade de Deus. Seu poder de o maior receio do terceiro mundo é
Deus que tem entranhas de compaixão despertar energias desconhecidas no ser um “Cristo sem Reino”, ou seja, uma
e misericórdia. Isso me faz lembrar uma humano criava as condições que torna- concentração no mediador que rele-
reflexão de Roger Haight, em seu livro vam possível a recuperação da saúde”. ga a segundo plano as exigências da
Jesus símbolo de Deus (1999). Dizia ali Outro importante traço de Jesus é a sua mediação do Reino. Em semelhante
que Jesus era teocêntrico, mas que iro- acolhida aos pobres. Identifica-se como linha de reflexão, Pagola assinala
nicamente o que ele apresentava ao “defensor dos últimos”. Na perspectiva que na vida de Jesus o lugar central
mundo era um Deus antropocêntrico, de sua peculiar atuação, sinaliza que o foi ocupado não por Deus simples-
ou seja, um Deus “intrinsecamente inte- caminho que leva a Deus “não passa ne- mente, mas “Deus com seu projeto
ressado e preocupado com o bem-estar cessariamente pela religião, pelo culto do reino de Deus”. Como explicitar
de suas criaturas”. Pagola sublinha em ou pela confissão de fé, mas pela com- melhor essa questão?
seu livro que a melhor metáfora para paixão para com os ‘irmãos pequenos’”. Faustino Teixeira - Com base nos recur-
expressar a ideia de Deus é a do “Deus Trata-se da “grande revolução religiosa” sos da investigação moderna e contem-
compassivo”. A profunda paixão de Je- provocada por Jesus, que abre uma via porânea, e o apoio interdisciplinar, Pago-
sus pelo reino de Deus, que é o centro nova de acesso a Deus, que passa pela la busca aproximar-se historicamente da
referencial de sua vida, faz com que ele acolhida e compromisso com o outro ne- figura de Jesus. O seu objetivo é facultar
traduza na história, em gestos efetivos, cessitado, sobretudo o mais pobre. E le-  O IHU publicou uma série de matérias sobre
a Boa Notícia que ele recebeu de seu var a cabo o seguimento de Jesus, como Maria Madalena, que podem ser encontradas
em www.ihu.unisinos.br, entre elas uma entre-
Pai. Animado pela experiência do Deus lembra Pagola, é também “pôr no centro vista com Bernard Sesboüé, intitulada “Jesus e
da vida, Jesus anuncia a todos uma notí- de nosso olhar e de nosso coração os po- Maria Madalena”, publicada na edição número
cia que traduz mudança de perspectiva: bres. Situar-nos na perspectiva dos que 199, de 09-10-2006, disponível em http://mi-
gre.me/UIeN (Nota da IHU On-Line)

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o “contato vivo com sua pessoa”, sem IHU On-Line - É plausível fazer uma de esperança e poesia. O que busca tra-
cair em abstrações metafísicas, ainda aproximação do livro de Pagola com zer é uma Boa Notícia, de uma alegria
que sublimes, sobre o seu ser. Assinala as obras inaugurais da teologia da li- que será para todos. Enquanto a missão
sua dificuldade em crer “num Cristo sem bertação no âmbito da cristologia? do Batista estava vinculada à questão do
carne”, ou acessar a Jesus como misté- Faustino Teixeira - Essa comparação pecado, o projeto de Jesus tinha como
rio que dá vida só mediante a doutrina. surge de forma imediata. Todos os que objetivo algo mais amplo e universal:
Adverte sobre o risco de converter Jesus fomos formados na perspectiva da teolo- aplacar o sofrimento dos mais excluídos
Cristo, de forma exclusiva, a um “objeto gia da libertação sentimos grande fami- e necessitados, anunciando-lhes uma
de culto”, enquanto “ícone venerável”, liaridade com a reflexão apresentada por Boa Notícia. Isso é o que era mais de-
mas destacado de sua condição de pro- Pagola. Os temas e o enfoque são muito terminante para ele. Isso não significa,
feta do reino de Deus. Esse é o risco de comuns. Não há como deixar de recordar como admite Pagola, que o pecado não
um Jesus sem reino, de que fala também as clássicas passagens de Jesus Cristo Li- o preocupasse, mas para ele o pecado
Jon Sobrino. Não há como acessar ao bertador, de Leonardo Boff ou de Jesus mais grave e de maior resistência ao
verdadeiro significado de Jesus desta- na América Latina, de Jon Sobrino. A lei- anúncio do reino “consiste precisamente
cando-o de sua relação com o reino de tura do livro de Pagola traz novamente à em causar sofrimento ou tolerá-lo com
Deus. Como indica Pagola, “o que ocupa baila reflexões que marcaram decisiva- indiferença”.
o lugar central na vida de Jesus não é mente a formação de inúmeros teólogos
Deus simplesmente, mas Deus com seu e teólogas latino-americanos e nos pro- IHU On-Line - Como podemos res-
projeto sobre a história humana”. voca a todos para um exercício teológico ponder hoje à  pergunta: quem foi
 Jon Sobrino: teólogo espanhol, jesuíta, mais ousado e corajoso nesse tempo de Jesus?
que em 27-12-1938 entrou para a Companhia encurtamento eclesial. Faustino Teixeira - Jesus foi alguém
de Jesus e em 1956 e foi ordenado sacerdote apaixonado pelo reino de Deus e que vi-
em 1969. Desde 1957, pertence à Província da
América Central, residindo habitualmente na IHU On-Line - Em sua obra, Pagola veu em profundidade a dinâmica de aco-
cidade de San Salvador, em El Salvador, país busca distinguir a ação de Jesus com lhida, hospitalidade e compaixão pelos
da América Central, que ele adotou como sua respeito à missão de João Batista. outros. Foi alguém que trouxe à tona a
pátria. Licenciado em Filosofia e Letras pela
Universidade de St. Louis (Estados Unidos), em Como sinalizar essa diferença? possibilidade da alegria e da esperança
1963, Jon Sobrino obteve o master em Enge- Faustino Teixeira - Essa foi uma den- em tempos propícios à apatia e exclu-
nharia na mesma Universidade. Sua formação tre outras questões que provocaram a são. Sua mensagem ou Boa Nova colocou
teológica ocorreu no contexto do espírito do
Concílio Vaticano II, a realização e aplicação reação ao livro de Pagola. Sabemos das no centro do cenário a bem aventurança
do Vaticano II e da II Conferência Geral do resistências impostas ao livro pela Co- dos pobres e a exigência de partilha de
Conselho Episcopal Latino-Americano, em Me- missão Episcopal para a Doutrina da Fé sua causa. Concordo literalmente com
dellín, em 1968. Doutorou-se em Teologia em
1975, na Hochschule Sankt Georgen de Frank- da Conferência Episcopal Espanhola. Em Pagola quando afirma que não há como
furt (Alemanha). É doutor honoris causa pela nota a respeito, publicada em junho de aproximar-se dele sem sentir-se atraído
Universidade de Lovain, na Bélgica (1989), e 2008, essa comissão apontou algumas di- e fascinado por sua pessoa, pelo carinho,
pela Universidade de Santa Clara, na Califórnia
(1989). Atualmente, divide seu tempo entre as ficuldades percebidas pelos bispos, uma delicadeza e ternura com que trata os
atividades de professor de Teologia da Univer- das quais tocava a questão do “obscu- outros, independente de seu gênero, et-
sidade Centroamericana, de responsável pelo recimento da realidade do pecado e do nia ou religião. O que fala mais alto em
Centro de Pastoral Dom Oscar Romero, de di-
retor da Revista Latinoamericana de Teologia e sentido do perdão”. Para os bispos da Jesus é o seu testemunho de vida, e é
do Informativo “Cartas a las Iglesias”, além de Comissão, a contraposição estabelecida este que devemos buscar seguir em nos-
ser membro do comitê editorial da Revista In- por Pagola entre a missão de João Batis- sa trajetória existencial. É importante
ternacional de Teólogia Concilium. A respeito
de Sobrino, confira a ampla repercussão dada ta e Jesus acabou silenciando sobre a re- sublinhar também que o segredo desta
pelo site do IHU em suas Notícias do Dia, bem alidade do pecado. Mas não é assim que atuação profética está na forma singu-
como o artigo A hermenêutica da ressurreição Pagola percebe as coisas. Há que enten- lar de sua relação amorosa com Deus. É
em Jon Sobrino, publicada na editoria Teolo-
gia Pública, escrita pela teóloga uruguaia Ana der esta distinção com base no âmbito Deus mesmo, com seu projeto, que está
Formoso na edição 213 da IHU On-Line, de 28- geral da obra e de seu objetivo. De fato, no centro de sua vida, como Presença
03-2007, disponível para download em http:// Pagola estabelece uma diferença entre que o transforma interiormente e facul-
migre.me/UHJB. A IHU On-Line também pro-
duziu uma edição especial, intitulada Teologia as duas atuações. Assim como o profeta ta a tonalidade de sua vida de abertura,
da Libertação, no dia 02-04-2007. A edição 214 João Batista, que o precede, Jesus bus- acolhida e compromisso gratuito com os
está disponível em http://migre.me/UHKa. ca captar a vontade de Deus, mas num outros. E Jesus apresenta-nos um Deus
Sobre a censura do Vaticano a Sobrino, confi-
ra: Teólogos espanhóis criticam a condenação horizonte distinto. Seu estilo de vida é profundamente interessado pelos huma-
de Jon Sobrino, disponível em http://migre. festivo, marcado pelo tônus da alegria. nos, um Deus de entranhas de compai-
me/UHKF, ‘Jon Sobrino, com o tempo, será Vai dedicar-se “a algo que João nun- xão, um Deus que não é propriedade de
reabilitado’, afirma Ernesto Cavassa, dispo-
nível em http://migre.me/UHL3, Notificação ca fez: curar os enfermos que ninguém religião alguma pois é Pai de todos, um
a Jon Sobrino. Teólogos apelam por reforma curava, aliviar a dor de pessoas abando- Deus que é movimento e transformação.
da Congregação para a Doutrina da Fé, dispo- nadas, tocar leprosos que ninguém to- Todos podem invocá-lo como Pai, assim
nível em http://migre.me/UHLk, O caso Jon
Sobrino como sintoma. Um artigo de Andrés cava, abençoar e abraçar crianças”. As como o fez Jesus. Está acessível a qual-
Torres Queiruga, disponível em http://migre. palavras de Jesus não traduzem a “dura quer um, manifestando-se abertamente
me/UHLN. (Nota da IHU On-Line) linguagem do deserto”, mas é envolvida a partir do segredo do coração.

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Jesus: um apaixonado por Deus e pelas pessoas
Na visão do biblista Francisco Orofino, Jesus veio mostrar que todos nós podemos nos
tornar divinos. Mas o caminho de nossa divinização exige de nossa parte a mais profunda
humanização

Por Graziela Wolfart

“C
reio que sempre é difícil para alguém perceber que sua proposta de amor, perdão, justi-
ça, igualdade e fraternidade encontrou uma grande resistência por parte daqueles que
falam e agem em nome de Deus. Jesus fez, antes de tudo, um enfrentamento religioso
com as autoridades religiosas de sua época. E isso nunca é fácil. Ele teve que enfrentar a
religião institucional nos lugares em que passava, defendendo as pessoas marginalizadas
pela religião. Quando será que ele chegou à conclusão de que as práticas religiosas de seu tempo afastavam as
pessoas de Deus? E que a Teologia oficial legitimava a exclusão de grande parte do povo dos serviços religiosos
no Templo? E, uma vez tendo chegado a estas conclusões, quando será que ele decidiu partir abertamente para
o confronto (cf Lc 9,51)? Tais conclusões com as respectivas atitudes práticas também não foram fáceis para
Jesus”. A reflexão é do teólogo biblista Francisco Orofino. Na entrevista que segue, concedida por e-mail à IHU
On-Line, ele afirma que, sem dúvida, o momento mais difícil na vida de Jesus “foi perceber para onde este
confronto desigual o estava conduzindo e, mesmo assim, sabendo que havia uma cruz na virada do caminho,
manter-se fiel ao projeto de Deus e às esperanças daqueles e daquelas que o seguiam, sem cair na tentação de
fugir”. E acrescenta: “a grande escola de Jesus foi a casa familiar, a Palavra na comunidade e a história de seu
povo vivida numa época de grande turbulência social, política e religiosa”.
Francisco Orofino ministra aulas para leigos no Seminário Paulo VI, em Nova Iguaçu, Rio de Janeiro. É
também biblista e educador popular. Assessora grupos populares e comunidades de base nos municípios da
Baixada Fluminense. É autor de vários livros e leciona em Institutos de Teologia voltados para a formação de
leigos. É assessor nacional do CEBI (Centro de Estudos Bíblicos). Fez doutorado em Teologia Bíblica na PUC-
Rio (2000). Confira a entrevista.

IHU On-Line - Como o senhor descre- e sob forte influência materna. Jesus mente quando Jesus saiu de Nazaré.
ve o processo de aprendizagem de viveu muito tempo neste ambiente O evangelho de Marcos insinua que
Jesus, na condição de ser humano? familiar e comunitário. E neste am- ele teve moradia em Cafarnaum (Mc
Francisco Orofino - Temos que en- biente comunitário, profundamente 2,1). De qualquer forma, os evan-
tender o processo de aprendizado religioso, a leitura e a vivência da gelhos são unânimes em dizer que
de Jesus dentro da vida cotidiana de Palavra eram muito importantes. Se a vida pública de Jesus começa de-
uma aldeia da Galileia no primeiro de fato Jesus sabia ler e escrever, pois que João Batista foi preso. Isso
século da Era Cristã. Ao nascer, uma deve-se à escola dos escribas que mostra que a inserção de Jesus nos
criança pertencia à mãe. A mãe era funcionava junto às sinagogas. Mas movimentos populares proféticos
a única professora, catequista, mes- a vida familiar de Jesus é muito con- de sua época, como o movimento
tra que uma criança tinha. Assim, flitante. Depois que começou sua do Batista, foram importantes em
competia à mãe ensinar a língua, a itinerância, os parentes pensam que sua formação humana. Em resumo,
religião, as tradições religiosas, as ele ficou maluco e queriam que ele a grande escola de Jesus foi a casa
tradições familiares, enfim, tudo voltasse para casa (cf. Mc 3,20-21). familiar, a Palavra na comunidade e
que fosse importante na vida da- Nazaré era uma pequena aldeia, com a história de seu povo vivida numa
quela criança: andar, falar, comer, horizontes muito limitados e fortes época de grande turbulência social,
vestir-se, conviver, rezar, trabalhar, preconceitos. Jesus deve ter sido política e religiosa.
pensar... Temos que entender que a motivo de vergonha para alguns de
formação de Jesus começa em casa, seus parentes. Não sabemos exata- IHU On-Line - Quais os fatos históri-

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cos mais significativos dos 30 anos de a Jesus toma uma conotação negati-
Jesus em Nazaré?
“Jesus viveu um dos va, de sofrimento doloroso. E de um
Francisco Orofino - Creio que os fa- sofrimento necessário e pedido por
tos históricos mais significativos na
períodos de maior Deus. Como se Jesus só poderia de-
vida de Jesus estão relacionados com monstrar sua divindade assumindo o
a ocupação romana e a administração
turbulência política e sofrimento humano. Eu penso que te-
herodiana feita em nome de Roma. mos que recuperar a palavra “paixão”
Logo após a morte de Herodes, o Gran-
religiosa da história da em Jesus de maneira muito positiva:
de (4 aC) explodiram muitas revoltas Jesus era antes de tudo um apaixona-
na Judeia e na Galileia. Este clima de
Palestina” do por Deus e pelas pessoas. E trou-
violências e de revolta vai durar até xe, em seus gestos e palavras, uma
a grande guerra judaica contra Roma, é difícil para alguém perceber que proposta de um Deus amoroso e apai-
entre 66 e 73 d.C. Portanto, Jesus vi- sua proposta de amor, perdão, justi- xonado. E aqui temos que entender a
veu um dos períodos de maior turbu- ça, igualdade e fraternidade encon- dor de Jesus. Nada dói mais do que a
lência política e religiosa da história trou uma grande resistência por parte gente perceber que nossa proposta de
da Palestina. Quando da grande revolta daqueles que falam e agem em nome amor apaixonado está sendo rejeita-
após a morte de Herodes, a capital da de Deus. Jesus fez, antes de tudo, um da pela pessoa amada. Como lembra
Galileia, Séforis, distante uns 8 km de enfrentamento religioso com as auto- o evangelho de João: “veio para os
Nazaré, foi totalmente arrasada e sua ridades religiosas de sua época. E isso seus, mas os seus o rejeitaram!” (cf.
população escravizada. Neste período, nunca é fácil. Ele teve que enfrentar Jo 1,11). Rejeição dói. Rejeição de
em Nazaré, o menino Jesus, “crescia a religião institucional nos lugares em um amor livre e gratuito dói mais ain-
em sabedoria, tamanho e graça diante que passava, defendendo as pessoas da. Manter-se fiel a este amor, mesmo
de Deus e dos homens” (cf. Lc 2,52). marginalizadas pela religião. Quan- se sabendo rejeitado, revela algo do
Estas revoltas que surgem depois da do será que ele chegou à conclusão rosto divino de Jesus.
morte de Herodes mostram que o povo de que as práticas religiosas de seu
está à procura de um rumo. Surgem tempo afastavam as pessoas de Deus? IHU On-Line - Quais as característi-
muitos líderes apontando a realização E que a Teologia oficial legitimava a cas humanas mais interessantes de
das antigas promessas feitas por Deus exclusão de grande parte do povo dos Jesus?
ao povo ao longo da história. O povo serviços religiosos no Templo? E, uma Francisco Orofino - Creio que a prin-
começa a seguir muitos líderes popu- vez tendo chegado a estas conclusões, cipal característica humana de Jesus
lares como Judas, o Galileu e Teudas quando será que ele decidiu partir era a de ele ser uma pessoa absoluta-
(cf. Atos 5,36). Esta movimentação abertamente para o confronto (cf Lc mente normal. Jesus não era um asce-
popular aumentará sempre mais a re- 9,51)? Tais conclusões com as respec- ta, como esperamos de qualquer líder
pressão romana. Esta tensão político- tivas atitudes práticas também não religioso. Ele não fazia retiros prolon-
religiosa sem dúvida foi marcante na foram fáceis para Jesus. Mas, sem dú- gados, nem jejuns penitenciais. Pelo
vida de Jesus. Como estes fatos chega- vida, o momento mais difícil foi perce- contrário, era um festeiro. Por isso era
vam e repercutiam numa pequena al- ber para onde este confronto desigual conhecido como “comilão e beberrão”
deia como Nazaré, fica difícil de dizer o estava conduzindo e, mesmo assim, (Mt 11,19). Este espírito de festa, de
e de imaginar. O que podemos deduzir sabendo que havia uma cruz na virada acolhida e de convivência, principal-
é que num determinado momento de do caminho, manter-se fiel ao proje- mente com as pessoas marginalizadas,
sua vida, Jesus sai de Nazaré e vai tra- to de Deus e às esperanças daqueles e deve ter causado muito impacto na
balhar em Cafarnaum. Pode ter sido daquelas que o seguiam, sem cair na vida das pessoas simples da época. É
mesmo por questões de trabalho e tentação de fugir. como se Jesus dissesse: é impossível
de sobrevivência. Em Cafarnaum tem ser amigo desta gente toda e ao mes-
uma proximidade muito grande com as IHU On-Line - Qual a importância do mo tempo ser conivente com o siste-
colônias de pescadores. Dos seus doze sofrimento humano de Jesus para a ma religioso que os marginaliza. Esta
apóstolos, cinco são pescadores, pro- compreensão de sua divindade? cordialidade de Jesus para com todos,
vavelmente gente sem instrução. De lá Francisco Orofino - A palavra que ge- especialmente com as mulheres, cau-
Jesus se insere no movimento popular ralmente define este sofrimento hu- sou estranheza nos próprios discípulos
do Batista. Depois da prisão do Batis- mano de Jesus é a palavra “paixão”. (Jo, 4,27).
ta, Jesus começa sua pregação. Seus Ora, nos relacionamentos humanos, a
primeiros discípulos também saem do palavra “paixão” é muito positiva. De- IHU On-Line - Como podemos enten-
movimento do Batista (cf. Jo 1,37). fine um sentimento gostoso e intenso. der melhor as frases “Jesus é hu-
Quem já sentiu e viveu uma grande mano, muito humano, ‘tão humano
IHU On-Line - Quais os momentos paixão sabe disso. Como canta Vini- como só Deus pode ser humano’”
mais difíceis vividos pelo Jesus ho- cius de Moraes “quem nunca curtiu (Papa Leão Magno); e “Ele veio nos
mem? uma paixão, nunca vai ser nada não!” mostrar o caminho para quem quer
Francisco Orofino - Creio que sempre Ora, a palavra “paixão” relacionada ser divino: antes de tudo ser profun-

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“Para Jesus, mais
importante que o
relacionamento com A humanidade de Jesus como
Deus é o relacionamento divindade e amor
com as pessoas”
José Ignacio González Faus acredita que depois de Jesus fica
damente humano!”. (Fl 2,6-11)? muito claro e normativo que toda a moral se condensa no amor
Francisco Orofino - Estas frases que- desinteressado ao próximo
rem nos ajudar a entender o mistério
da Encarnação de Jesus. Desde a re-
velação de Deus a Moisés no Sinai (Ex Por Graziela Wolfart
3,7) fica claro que na proposta religio-

N
sa judaico-cristã não é o ser humano
que se eleva, mas é Deus que desce. a entrevista que aceitou conceder por e-mail para a IHU On-Line,
E esta descida de Deus, que atinge o teólogo jesuíta González Faus alerta que o risco de deixarmos
seu ponto máximo na encarnação de de lado a humanidade de Jesus “é que daí ficamos com um Deus
Jesus, é provocada pelo grito do po- falso, porque a humanidade de Jesus é a única imagem, ou o úni-
bre, do marginalizado, do excluído, co rosto que temos de Deus”. E explica: “por ter desatendido a
do escravizado. A mais antiga refle- humanidade de Jesus, boa parte da teologia tradicional eliminou por comple-
xão que temos sobre a encarnação de to o caráter ‘revelador de Deus’ em Jesus, e ficou só com seu caráter ‘reden-
Jesus é o hino que Paulo transcreve tor’. Isso foi fatal, ainda que possa compreender-se como o pedágio pago pela
na carta aos filipenses. Paulo consta- inculturação do cristianismo no mundo grego. E hoje é imprescindível superar
ta que o movimento natural dos seres isso porque senão estaremos anunciando a um deus falso: ao deus de Platão
humanos é querer ascender, atingir o
ou de Aristóteles, mas não ao Deus de Jesus”. González Faus ainda acrescenta
topo, suplantando todos ao redor. Ao
que “a fé em Jesus Cristo implica hoje uma conversão não só de nossa dimen-
apresentar o hino, Paulo lembra que
Jesus estava no topo. Era de condição são ‘pagã’ ou incrédula, como também de nossa dimensão religiosa”.
divina. Mas não se apega a esta posi- José Ignacio González Faus é jesuíta, doutor em Teologia, e foi professor
ção e começa a descer. E esta desci- de Teologia Sistemática na Faculdade de Teologia de Barcelona e na UCA, de
da só acaba na execração pública da San Salvador. Além disso, lecionou como professor convidado em vários países
crucificação. Mas baixo do que isso, da América Latina. Atualmente é responsável acadêmico do Centro de Estudos
impossível. Mas é exatamente quan- “Cristianismo e Justiça”. Entre as suas obras mais importantes, citamos: A Hu-
do Jesus atinge este ponto máximo manidade Nova - Ensaio de Cristologia, e Acesso a Jesus. Confira a entrevista.
de humilhação que o Pai o exalta e
o eleva. Fica claro então os inúmeros
paradoxos de Jesus: “quem quiser ga-
IHU On-Line - Como o senhor des- entranhas comovidas pela dor dos ho-
nhar a vida vai perder... quem souber
creve o rosto humano de Jesus? mens. Essas entranhas comovidas são
perder a vida por amor, vai ganhar...”
José Ignacio González Faus - Pode- a fonte da liberdade e da autoridade
(cf. Mc 8,35 e paralelos). Jesus veio
mos nos valer das duas expressões que com que atua.
mostrar que todos nós podemos nos
mais são ditas sobre ele nos evange-
tornar divinos. Mas o caminho de nos-
lhos: “lhe comoveram as entranhas”; b.- A palavra eksousía não traduzi
sa divinização exige de nossa parte a
“se admiravam de sua eksousía” porque em grego significa liberdade e
mais profunda humanização. Temos
(palavra que traduzirei em seguida); autoridade. O Novo Testamento a usa
que nos abrir para a convivência com
e de outras duas que aparecem ex- com ambos os significados, às vezes
os outros. Para Jesus, mais importan-
clusivamente em sua boca: se auto- mudando em um mesmo texto: Jesus
te que o relacionamento com Deus é o
denominava “O Filho do Homem”, e chama a atenção por uma liberdade
relacionamento com as pessoas. Este
acusava a muitos homens religiosos que é fonte de sua autoridade, não
deve ter sido um dos pontos centrais
de seu tempo de “hipócritas”. fala nem atua segundo os clichês ofi-
na pregação de Jesus. Assim registra
ciais, mas segundo sua experiência
de maneira radical a Primeira Carta
a.- Jesus viveu pela terra com as da vontade de Deus. E certamente,
de João: quem não ama seu irmão é
creio que não há maior fonte de liber-
assassino! (1Jo3,15).  Exousia: poder, autoridade, liberdade. dade que uma experiência profunda
(Nota da IHU On-Line)

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de Deus, de Jesus e que essa liberda- “A fé em Jesus é uma cipar o céu na terra. E digo apenas
de engendra sempre uma autoridade antecipar, não traduzir ou substituir o
que não é exterior (como a de nossas dura crítica a esse céu pela terra, porque isso só leva a
autoridades que Santa Teresa chamava criar infernos.
“postiças”), mas que brota de dentro. niilismo descafeinado de
IHU On-Line - Quais os principais im-
c.- Além disso, Jesus se qualifica- nossa pós-modernidade pactos que Jesus provocou na socie-
va a si mesmo como “O Homem” (com dade de sua época?
uma expressão aramaica ambígua que utiliza o desengano José Ignacio González Faus - É pre-
– “Filho do Homem” - que pode sig- ciso expressá-los de maneira dialéti-
nificar simplesmente “ser humano”, como desculpa para a ca: a esperança e o desconcerto (que
mas pode ser também um título de terminam na pergunta: quem pode ser
dignidade: se autodefine desde essa própria preguiça” este?); a sedução e a subversão (que
ambiguidade de homem que inclui a põem em marcha o seguimento com
pequenez e a grandeza máximas). E, seus riscos); e a irradiação e as dificul-
sendo judeu até a medula, entra às liberta os cativos, dá vista aos cegos, dades (que convertem o “ir com Ele”
vezes em conflito porque também seu sustenta aos que sucumbem, ama aos em “tomar a cruz de cada dia”).
povo havia caído no que é a máxima justos, acolhe aos peregrinos, recebe
tentação de toda religiosidade: usar a o órfão e a viúva, e transforma o ca- IHU On-Line - Como a postura huma-
Deus em proveito próprio. minho dos malvados”. Em uma situa- na do nazareno influi na base moral
ção assim, diz o salmo 145 que então do cristianismo?
d.- Jesus costumava chamar isso de “Deus reina”. E isso era o que Jesus José Ignacio González Faus - Depois
hipocrisia, palavra que vem do teatro anunciava. de Jesus fica muito claro e normativo
grego (e que, segundo alguns críticos, que toda a moral se condensa no amor
Jesus pode ter aprendendido em Sé- IHU On-Line - Em que sentido a rea- desinteressado ao próximo e que toda
foris, cujo teatro parece haver esta- lidade do Jesus histórico pode inter- moralidade à margem desse amor (não
do em construção ou remodelação na ferir nas origens da fé cristã? digamos contra ele) deixa de ser mo-
época de Jesus e onde alguns suspei- José Ignacio González Faus - Na fé ralidade e se converte em fariseísmo.
tam que pode ter ido vender suas pe- cristã interferem decisivamente não Isto pode não ser de todo novo, mas
quenas manufaturas). Essa hipocrisia só a realidade do Jesus histórico an- agora se explicita e se reafirma muito
volta aos homens enormemente “ce- tes esboçada, mas seu destino. Jesus mais. Pois bem: o amor chega muito
gos” (outra palavra que também apa- fracassou historicamente; e triun- mais além que a “lei”: obriga menos,
rece muito nos lábios de Jesus). fou meta-historicamente: sua mor- mas pode pedir mais. Isso abrirá a por-
te na cruz foi a “desautorização de ta para que, devendo haver uma moral
IHU On-Line - Como o senhor respon- sua pretensão” (Moltmann), feita em “racional” comum a todos e útil para
de hoje à pergunta: quem foi Jesus nome de Deus. E sua ressurreição é a viver na comunidade humana, pode
(do ponto de vista histórico)? confirmação desta pretensão da parte haver demandas e responsabilidades
José Ignacio González Faus - Se tem de Deus, com alguns alcances insus- maiores precisamente para os cris-
escrito milhares de páginas para res- peitos: porque sua ressurreição inclui tãos. (Devo acrescentar com dor que
ponder a essa pergunta. O que direi a todos nós em um duplo sentido: a) às vezes a Igreja oficial parece proce-
deverá ser muito simples. Jesus era inclui a todo o gênero humano, além der ao contrário).
um judeu até a medula que, não obs- do judaísmo, com o que a chegada do
tante, entrou em conflitos muito sé- Messias (o do Reino) significa para a IHU On-Line - Quais os riscos de se
rios com o setor mais poderoso do ju- universalização da promessa, mais deixar de lado a humanidade real de
daísmo de seu tempo. Era um homem que seu cumprimento absoluto. E b) Jesus?
até o tutano, o que resulta conflituoso afeta não só a vítima (e n’Ele a todas José Ignacio González Faus – O ris-
(e sedutor também) para todo o gê- as vítimas da história), como tam- co é que daí ficamos com um Deus
nero humano. Deduzia como iminente bém aos carrascos e cúmplices da- falso, porque a humanidade de Jesus
a chegada de uma nova situação hu- quele destino. Eu costumo dizer que é a única imagem, ou o único rosto
mana que ele qualificava, com o léxi- a páscoa ilumina a cruz, mas não a que temos de Deus. Por ter desaten-
co de seu tempo, como “reinado de elimina. Não a elimina porque a cruz dido a humanidade de Jesus, boa
Deus” e que significa duas coisas: a) é histórica e a páscoa meta-histórica. parte da teologia tradicional elimi-
uma situação na qual nenhum poder Mas a ilumina porque a Meta-história nou por completo o caráter “reve-
terreno reina sobre o homem (o que é o fundamento de uma história com lador de Deus” em Jesus, e ficou só
mais tarde chegará a conflitos com o sentido e concebida como progresso. com seu caráter “redentor”. Isso foi
Imperador) e b) uma situação na qual O céu do além não elimina esta terra, fatal, ainda que possa compreender-
se torna claro que Deus “faz justiça mas a ilumina: porque não pode haver se como o pedágio pago pela incul-
aos oprimidos, dá pão aos famintos, fé cristã sem uma tentativa de ante- turação do cristianismo no mundo

SÃO LEOPOLDO, 06 DE JULHO DE 2010 | EDIÇÃO 336 13


grego. E hoje é imprescindível su- “A interpelação do de tudo, Deus é mais forte que seus
perar isso porque senão estaremos perseguidores e continua tendo a úl-
anunciando a um deus falso: ao deus homem Jesus sobre a tima palavra sobre a história. Logo
de Platão ou de Aristóteles, mas não passa para a linguagem eclesiástica
ao Deus de Jesus. Com muita razão identidade entre amor, desde a visão neoplatônica de Deus
escreveu Bonhoeffer em suas cartas que difunde o chamado Pseudodio-
da prisão que “o Deus que se revela misericórdia e nísico. E quero acrescentar que isto
em Jesus põe do avesso tudo o que tem consequências importantes: já
o homem religioso espera de Deus”. liberdade e sobre a no século II, Santo Ignacio de Antio-
E daí que a fé em Jesus Cristo impli- quia, em uma de suas cartas, critica
que hoje uma conversão não só de sacralidade de ‘pobres os que negavam que o messias veio
nossa dimensão “pagã” ou incrédu- “na carne” (onde a palavra carne
la, como também de nossa dimensão e enfermos’, vale para não tem só o sentido neutro de ma-
religiosa. téria, mas um sentido mais negativo
todos os homens” de pouquidade humana). E a crítica
IHU On-Line - Em que medida co- que lhes faz é: precisamente por
nhecer melhor o Jesus homem pode isso não se preocupam dos pobres,
contribuir para a construção da so- identidade, a seguir a Jesus, ain- nem do órfão, nem da viúva, nem do
ciedade e da cultura pós-moderna e da que não sejam chamadas a crer amor aos irmãos... A Humanidade de
para o diálogo inter-religioso? n’Ele. A interpelação do homem Je- Jesus nos força a buscar a Deus não
José Ignacio González Faus - a.- Pri- sus sobre a identidade entre amor, em uma suposta “verticalidade” abs-
meiro: creio que a fé em Jesus poderia misericórdia e liberdade e sobre a trata, mas em uma horizontalidade
libertar toda a Modernidade da qual sacralidade de “pobres e enfermos”, transformada e agraciada pela pre-
viemos, da converção em “maldição vale para todos os homens, em minha sença de Deus nela. Com uma frase
da lei” que – como já dizia Pedro no opinião. O cristão não poderá pedir dita muitas vezes: Deus se encarnou
“concílio de Jerusalém” - acaba im- aos homens de outras religiões que para que não lhe buscássemos nas
pondo cargas insuportáveis, e que olhem a cruz de Jesus como “mor- igrejas, mas nos irmãos. Se vamos,
gerou a reação pós-moderna, tão de- te de Deus”, mas sim que a erijam se devemos ir, à Igreja não é para
senganada dos ideais de nossa Moder- às vítimas da terra e da história no encontrar a Ele, mas para buscar a
nidade como podia estar o “fariseu “controle de qualidade” que deve luz, o calor e a força que nos permi-
irrepreensível” (Paulo) de sua antiga atravessar toda fé em Deus venha de tam encontrá-lo nos irmãos.
militância fariséia. Mas, a fé em Je- onde vier e sem negar nenhuma das
sus é uma dura crítica a esse niilismo verdades que possa aportar. Neste IHU On-Line - O senhor leu o livro de
descafeinado de nossa pós-modernida- sentido, gostaria de dizer que, mais José Antonio Pagola Jesus. Aproxi-
de que utiliza o desengano como des- que teocentrismo, cristocentrismo maciones históricas? Qual o segredo
culpa para a própria preguiça, e que ou eclesiocentrismo, o ponto comum singular de Jesus que transparece
ficou só com o progresso tecnológico a todas as religiões deve ser um an- nessa obra de Pagola?
da Modernidade, e com a redução dos tropocentrismo pneumatológico. José Ignacio González Faus - O que
direitos humanos a só “meus próprios aconteceu com seu livro (deixando
direitos” (que acabam sendo meus IHU On-Line - Qual a importância da de lado dolorosas iniciativas de au-
próprios egoísmos). Neste sentido po- humanidade de Jesus para a compre- topromoção e de carreira eclesiás-
deria se dar, desde Jesus, algo que ensão de sua divindade? tica em algum perseguidor) é que a
se tem reclamado tanto desde o cris- José Ignacio González Faus – A hu- humanidade de Jesus é hoje também
tianismo como desde fora dele: uma manidade de Jesus nos leva a compre- uma ameaça para a instituição ecle-
crítica séria da Modernidade, feita de ender a divindade não como poder, sial, igual a que foi para a “igreja”
dentro dela mesma. mas como amor. O balanço de todo o judia de seu tempo. E isto assus-
Novo Testamento foi a frase da pri- tou muitas autoridades. Ao contrá-
b.- Segundo: entendo o diálogo meira carta de João “Deus é Amor”, rio, muita gente afastada ou sem fé
como diálogo da vida: convivência e não: Deus é poder. E a chamada (porque só viam na igreja oficial um
e colaboração; não como diálogo no onipotência de Deus deve ser enten- Cristo luminoso, mas sem rosto, que
sentido intelectual que (a meu modo dida como o poder débil do amor. servia para justificar muitas preten-
de ver) é algo que só pode aconte- Sintomático deste esquecimento me sões pouco evangélicas de poder),
cer quando já existe deveras o outro parece a constante presença, nas descobriram no livro de Pagola o
diálogo da vida, sob pena de conver- orações da Igreja, do adjetivo “Deus aspecto sedutor da humanidade de
ter-se em um exercício pouco útil de Todo Poderoso”. Esse adjetivo está Jesus. Isso foi tudo. E desgraçada-
esgrima intelectual. A partir daqui, ausente na Bíblia: só se acalenta no mente tem sido causa de muitos so-
contestaria: Todas as religiões po- Apocalipse, para apoiar os cristãos frimentos que a autoridade eclesiás-
dem ser chamadas, sem perder sua perseguidos recordando que, apesar tica nunca deveria infringir.
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Jesus: o profeta da Galileia
Para o historiador e exegeta francês Jacques Schlosser, os evangelhos do Novo Testamen-
to permanecem como fontes essenciais à disposição dos historiadores

Por Graziela Wolfart | Tradução Benno Dischinger

N
a entrevista que aceitou conceder por e-mail à revista IHU On-Line, o professor Jacques Schlos-
ser explica que “a relação entre o retrato histórico de Jesus e a cristologia afirmada nas comuni-
dades após a Páscoa pode ser compreendida como uma passagem do implícito ao explícito”. Em
suma, destaca ele, “entre Jesus, o profeta cuja história nos dá uma imagem de traços relativa-
mente nítidos e o Cristo da confissão cristã, os elementos de continuidade não faltam”.
Jacques Schlosser é exegeta, professor na Faculdade de Teologia Católica de Strasbourg (Université Marc
Bloch). De sua vasta produção bibliográfica, citamos La Recherche De La Parole: etudes D’exegese Et De Theo-
logie Biblique (Paris: Editions Du Cerf, 2006), The Catholic Epistles And The Tradition (Leuven: Peeters Pub &
Booksellers, 2004), Le Dieu De Jesus: etude Exegetique (Paris: Editions Du, 1987) e Le Regne De Dieu Dans Les
Dits De Jesus (Paris: J. Gabalda, 1980). Confira a entrevista.

IHU On-Line - Quem foi o Jesus, pro- ao Novo Testamento confirmam a atu- to ou, em outras palavras, aquelas
feta da Galiléia, do ponto de vista alidade da figura do profeta e preci- que não estão contidas no cânon das
histórico? samente, sob diversos aspectos, que Escrituras. Trata-se essencialmen-
Jacques Schlosser - Encontro, em sua ela serviu de chave aos contemporâ- te de evangelhos ou de fragmentos
questão, o essencial da resposta. Jesus neos para compreender Jesus. Tem-se evangélicos classificados como “apó-
foi efetivamente um profeta da Gali- disso um belo eco em duas passagens crifos”, mas que seria melhor chamar
leia. Seu pertencimento incontestado de Maré que relatam a concepção do simplesmente “não canônicos”. Após
à Galileia impeliu certos pesquisado- povo. Pouco a pouco, Jesus é identi- um período de excessiva admiração,
res a explicações ousadas da figura de ficado com João Batista ressuscitado, durante o qual se tentou valorizar es-
Jesus. Uma pretendida helenização com Elias, com um dos profetas (Mc 6, sas fontes outrora negligenciadas, vol-
massiva da Galileia e, correlatamen- 14-15 e 8, 28). tou-se a uma apreciação mais sóbria
te, uma suposta ruptura da Galileia e mais crítica, concedendo um lugar
com Jerusalém, a cidade do templo IHU On-Line - Como podemos compor particular ao Evangelho de Tomás, que
e o coração de Israel, forneceram a um retrato cientificamente histórico permanece como fonte válida quando
esses pesquisadores o pano de fundo de Jesus? considerado caso a caso. Ao lado das
que permitia transformar a figura de Jacques Schlosser - A história não é fontes arqueológicas que aguçaram
Jesus para dela fazer um filósofo ou uma ciência exata cujo andamento singularmente, nesses últimos anos,
um sábio cínico. Esta tese ousada pa- chegaria a uma proposição incontes- nosso conhecimento do contexto am-
rece estar sendo agora abandonada, tável baseada em provas irrefutáveis. biental de Jesus e dos discípulos, os
o que não é razão suficiente para que O método do historiador comporta evangelhos do Novo Testamento per-
se dissocie totalmente Jesus da figu- aspectos que fazem dele, ao mesmo manecem como fontes essenciais à
ra social do sábio. Mas, a figura social tempo, uma arte. Por conseguinte, a disposição dos historiadores. Mas, o
que “cola” melhor com os dados dis- história é uma disciplina que tem suas que é um evangelho? Uma espécie de
poníveis é a do profeta. Ela era muito regras, um método rigoroso, tanto na biografia escrita à luz da fé pascal e
atual no país dos judeus no primeiro investigação das fontes como em sua destinada a fazer nascer ou a confor-
século da era cristã, como sabemos interpretação. No caso particular do tar a fé junto ao leitor. Dois evange-
graças ao testemunho de Flávio Jose- estudo histórico de Jesus, as fontes lhos o dizem claramente: não se trata
fo, historiador judeu. Um dos profetas profanas são raras e sua contribuição de um escrito que informa de maneira
mencionados por Josefo não é senão muito reduzida. Recentemente foi neutra sobre a carreira de Jesus, mas
João Batista, que de certo modo foi preciso clarear a questão das fontes do testemunho de um crente que quer
o mentor de Jesus. Os dados internos cristãs exteriores ao Novo Testamen- suscitar a fé (Lc 1,4; Jo 20,30-31). Há

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casos bastante claros em que os evan- nos informam sobre a mensagem de
gelistas atribuem a Jesus um discurso
“A originalidade de Jesus Jesus é seu silêncio quase completo
em função de uma situação que não sobre o reinado ou reino de Deus. Tal
existia como tal durante sua vida. Mt
é de recorrer é, com efeito – e por uma vez há con-
18, 15-17 é um exemplo disso difícil de senso entre os especialistas – o cer-
contestar. Em vista disso, o historiador
frequentemente às ne da proclamação de Jesus e ele é
deve examinar a questão com mais massivamente apresentado nos evan-
atenção para valorizar, em primeiro
palavras reinado/reino gelhos sinóticos. Jesus situa-se muito
lugar, aquelas palavras e gestos de Je- claramente na herança de Israel que,
sus que oferecem uma base sólida.
de Deus” se ele não fala com muita frequência
do “reino de Deus”, reconhece muito
Critérios de confiabilidade sado como exaltado junto a Deus e se claramente a realeza de Deus sobre Is-
compõe, na ocasião, hinos que cantam rael e utiliza de bom grado a propósito
Para realizar esta tarefa a crítica sua condição divina, isto é, sua pree- de Deus o verbo reinar. A originalidade
bíblica elaborou pouco a pouco cri- xistência, pondo-se o acento no cará- de Jesus é de recorrer frequentemen-
térios de confiabilidade. Um deles ter salvífico e redentor de sua morte. te às palavras reinado/reino de Deus.
responde a uma prática constante Começa-se mesmo a lhe atribuir o qua- Esta realidade era esperada para o
dos historiadores, a convergência das lificativo “Deus”. A distância parece, futuro na apocalíptica judaica. Jesus
fontes independentes. Quanto mais pois, ser muito grande entre a riqueza compartilha desta convicção e desta
fontes convergentes houver, mais o da cristologia após a Páscoa e os dados esperança. Ele é mais original quando
julgamento crítico está assegurado. dos evangelhos sobre Jesus, o profe- sublinha que, através de sua pregação
Falar-se-á, pois, de atestação múltipla ta da Galileia. E, no entanto, encon- e sua ação, o reino de Deus se mani-
quando Mc, a dupla tradição, a fon- tram-se pedras de toque notáveis nos festa desde agora. A palavra “reino”
te particular de tal ou tal evangelho relatos dos evangelhos. Sublinha-se, deve, então, ser tomada como con-
(Mt e/ou Lc), e o evangelho de João na ocasião, a proximidade particular ceito dinâmico, isto é, ele designa o
atestam juntos a mesma palavra ou a de Jesus com o que ele chama seu Pai, exercício de um poder. Segundo Jesus,
mesma ação de Jesus. O critério vale de sorte que o título “filho [de Deus]”, o poder divino que ele vê em obra é
em princípio desde que duas fontes in- muito corrente na tradição judaica benéfico, a ponto de “reino de Deus”
dependentes convirjam. Outro critério para diversos personagens, toma agora ser a categoria salvífica privilegiada
se baseia sobre o embaraço que tal ou uma dimensão nova e particular. Jesus de Jesus. Compreende-se melhor, en-
tal elemento acabou criando nas co- sustenta, na ocasião, que a posição to- tão, a conexão estabelecida por Jesus
munidades, por exemplo, a injúria fei- mada em relação à sua pessoa é deter- entre a vinda presente do reino e sua
ta a Jesus em Lc 7.35, ou o fato de que minante para a salvação futura. De ma- própria atividade. O agir libertador de
Judas fez parte dos Doze. Em suma, neira global dir-se-á que Jesus exprime Jesus constitui uma parte importante
há coisas que não se inventam e que, uma pretensão de autoridade, fazendo de seus milagres. Ele se faz em be-
portanto, nos fazem atingir o primeiro prova de grande liberdade ou inventi- nefício dos enfermos e daqueles que
nível. Um trabalho de investigação ri- vidade em relação à tradição judaica. o espírito mau retinha em seu poder.
gorosa deve ser feito para que o histo- Segundo um modelo que muitos histo- Por outro lado, esta dimensão salví-
riador possa pronunciar-se de maneira riadores não reconhecem como válido, fica aparece claramente quando se
válida e integrar tal ou tal elemento mas que me parece fundado, esta rei- visa o que eu chamo de bom grado os
em sua apresentação global. vindicação de autoridade implica uma “clientes” do reino de Deus ou seus
cristologia. A relação entre o retrato hóspedes prioritários. Detecta-se sua
IHU On-Line - Quais as principais di- histórico de Jesus e a cristologia afir- presença nas palavras de Jesus, ao
ferenças entre o personagem históri- mada nas comunidades após a Páscoa mesmo tempo em que ela aparece em
co Jesus e o Cristo da fé cristã? pode, então, ser compreendida como seus contatos com o povo. Em Jesus,
Jacques Schlosser - Os evangelhos fo- uma passagem do implícito ao explí- Deus assume o poder de socorrer os
ram escritos muito tempo após as pri- cito. Em suma, entre Jesus, o profeta pobres e situa entre os beneficiários
meiras expressões da fé que a luz da cuja história nos dá uma imagem de de sua ação os publicanos e as prosti-
Páscoa pôs em destaque. Bem depois, traços relativamente nítidos e o Cris- tutas, ou seja, esses “menos” que são
por exemplo, que Paulo desenvolvera to da confissão cristã, os elementos de as crianças e os que se lhes asseme-
sua rica cristologia baseando-se ele continuidade não faltam. lham, sem esquecer o grupo mirrado
próprio em elementos que recebeu e receoso dos discípulos. Através de
de comunidades como a de Antioquia. IHU On-Line - Qual a principal men- Jesus, os desfavorecidos e os margi-
Nessa primeira geração cristã que pre- sagem e as ações mais marcantes do nalizados são os beneficiários inespe-
cede a escritura dos evangelhos afir- profeta da Galileia? rados da ação graciosa de Deus. Se a
ma-se muito claramente a messianida- Jacques Schlosser - A razão pela qual participação no reino não depende de
de de Jesus, pois lhe é dado o nome o evangelho de João não pode ser pos- algum mérito, mas da livre iniciativa
muito forte de Senhor; ele é confes- to no primeiro lugar das fontes que divina em Jesus, se pode entrever um
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elo possível com a doutrina paulina “O agir libertador de lhos. Para esse tipo de testemunho as
da justificação, e chega-se, assim, à cartas de Paulo são particularmente
questão precedente. Jesus constitui uma importantes, já que, por sua data, são
todas mais antigas do que os evange-
IHU On-Line - Por que Jesus é consi- parte importante de seus lhos. Paulo se torna, assim, um teste-
derado uma das figuras mais seduto- munho independente dos evangelhos.
ras da história? milagres. Ele se faz em Ele atesta, pois, que certas palavras
Jacques Schlosser - Quase não ouso de Jesus circulavam nas comunidades
responder a uma questão tão vasta. benefício dos enfermos bem antes de Marcos, o evangelho
De um lado, a simpatia que se atribui mais antigo. Encontram-se em Paulo
a Jesus deve ser devida ao testemu- e daqueles que o espírito pelo menos dois casos claros: a sen-
nho em palavras e em atos que dão, tença de Jesus sobre o divórcio em
através da história, os que se referem mau retinha em seu 1Cor 7,10-11 e a regra do missionário
a ele na fé. Suspeito que, por outro em 1Cor 9,14.
lado, o resplendor de Jesus é devido poder. Por outro lado,
ao seu gênio poético. Dificilmente se IHU On-Line - Como o senhor define
esquece alguém que sabe convencer esta dimensão a experiência histórica dos primeiros
utilizando sabiamente imagens sim- cristãos a partir da ressurreição de
ples e eficazes, como o é, por exem- salvífica aparece Jesus?
plo, o pequeno desenvolvimento sobre Jacques Schlosser - Primeiramente é
a trave e a palha em Mt 7, 1-5, ou a claramente quando se preciso sublinhar que a ressurreição
palavra incisiva “quem põe a mão no abre para o além da história e não
arado e depois olha para trás, não é visa o que eu chamo de pode, por isso, em princípio ser dire-
feito para o Reino de Deus” (Lc 9,62). tamente objeto de uma investigação
Muitos daqueles que não aderem a Je- bom grado os ‘clientes’ histórica. Entende-se bem que certos
sus pela fé são provavelmente seduzi- historiadores consideram metodologi-
dos pela atenção prestada por ele, em do reino de Deus ou seus camente correto encerrar sua pesqui-
sua prática social, aos marginalizados sa com a morte de Jesus. Eu observo
e desclassificados e pela nobreza de hóspedes prioritários” que nossas fontes mais antigas não
seu ensinamento ético, tal como ele atestam nenhuma testemunha que te-
pode ser descoberto nos materiais ria assistido em pessoa à cena da res-
se este ser é o filho de Deus” (NO nº
postos em forma no sermão da mon- surreição. É, pois, preciso reformular
1522, 6 de agosto a 12.01.1994).
tanha (Mt 5-7). Admira-se também sua em parte a questão e perguntar sobre
notável insistência no perdão. Como em que experiência se apóiam os tes-
IHU On-Line - Como o senhor avalia
eu já fiz por diversas vezes, pronun- temunhos que atestam que Jesus não
os relatos do novo testamento sobre
ciando conferências sobre o Jesus da permaneceu sob o poder da morte.
o Jesus histórico?
história, para concluir minha resposta Nossas fontes nos fazem duas proposi-
Jacques Schlosser - Respondi a uma
sobre este ponto inesgotável, cito um ções: a descoberta do túmulo vazio e
parte essencial desta questão a pro-
texto de Jean Daniel, editorialista da as aparições pascais. No que concerne
pósito dos evangelhos. Para o resto do
revista Le Nouvel Observateur: “Já ao túmulo, os testemunhos da primei-
Novo Testamento, a messe é bastante
que estou nisso, quero concluir sobre ra geração cristã se reduzem a poucas
magra. Mas Jesus não é esquecido. Ele
Jesus, o Judeu de Nazaré. Sua histori- coisas. A menção do túmulo se encon-
se beneficia mesmo de uma bela pro-
cidade, para mim, não é nada reduto- tra somente na fórmula de fé que o
moção, quando o nome do profeta da
ra. Ela é mesmo exaltante. O homem próprio Paulo recebeu e que reprodu-
Galileia é associado de maneira inde-
que fundou o direito (“Que aquele que ziu em 1Cor 15,3-5: “ele foi colocado
lével à confissão dos crentes em inu-
jamais pecou jogue a primeira pedra”) na sepultura [ou: foi sepultado]” (v.
meráveis fórmulas para as quais, pela
e a separação da religião e do Esta- 4). Mas, nenhuma precisão é dada e
força do hábito, não se tributa mais
do (“Daí a César o que é de César”) a própria descoberta do túmulo vazio
a devida importância: “Jesus Cristo”,
espanta por sua modernidade. Ele é passada sob silêncio. Os evangelhos
o “Senhor Jesus”, etc.... Palavras de
funda, ele inaugura, ele anuncia. Ele são mais prolixos na matéria quando,
Jesus são evocadas cá e lá. Assim, a
clareia em todos os problemas atuais em relatos que divergem amplamen-
interdição do juramento numa versão
do integrismo e da confusão entre o te entre si pelos detalhes, atestam
talvez mais primitiva do que aquela
temporal e o espiritual. Quanto àque- unanimemente que o túmulo de Jesus
do evangelho de Mateus (c. Mt 5, 34-
le que quis compartilhar o sofrimento foi encontrado vazio (Mc 16,1-8 par.).
37). Ou então a palavra “há mais fe-
dos homens, ele é seguramente hoje, Mas, observo de passagem, os próprios
licidade em dar do que em receber”,
neste início de 1994, o ser mais indis- evangelhos não consideram a sepultu-
atribuída ao “Senhor Jesus” em Atos
pensável com que a humanidade ja- ra vazia como prova, já que evocam o
20,35, mas desconhecida dos evange-
mais sonhou. Cabe a cada um decidir roubo ou o deslocamento do cadáver
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“Através de Jesus, os
desfavorecidos e os
marginalizados são os Humanamente divino
beneficiários e divinamente humano
inesperados da ação
Para Carlos Palacio, a recuperação da dimensão humana de
graciosa de Deus” Jesus trouxe um grande enriquecimento para fé e a experiência
cristã, mesmo à custa de muitos sofrimentos e mal-entendidos
como explicações possíveis de um tú-
mulo agora vazio. As aparições pascais,
que podemos chamar visões quando Por Graziela Wolfart
nos colocamos do lado do beneficiá-

“P
rio humano, abundam nos evangelhos.
Mas deve-se, sobretudo, relevar sua ara um conhecimento aprofundado de Jesus é tão ou mais
presença nas tradições e testemunhos importante o testemunho e a interpretação dos seguido-
da primeira geração cristã. Além de res de Jesus do que os dados que possa levantar a pesqui-
1Cor 15,3-5 pode-se realçar precisões sa historiográfica. De fato a pergunta de quem é Jesus é
autobiográficas de Paulo no seguimen- inseparável do que ele suscitou e deu a viver, ou seja, do
to desse texto, mas também em 1Cor que dizem dele os que o seguem. Por isso, os escritos do Novo Testamento,
9,1; Gl 1,15-16. Continua evidente- reconhecidamente ‘testemunhos de fé pós-pascal’, são igualmente importan-
mente difícil precisar o que foi esse tes fontes literárias e históricas para o conhecimento de Jesus”. A afirmação
tipo de experiência. Proponho sim- é do padre jesuíta Carlos Palacio, em entrevista concedida por e-mail à IHU
plesmente algumas observações.
On-Line. Para ele, Jesus “transmitia uma afirmação incondicional da vida,
uma capacidade ilimitada de acolher, respeitar e acreditar nas pessoas e
A surpreendente experiência pascal
uma sensibilidade extrema de sintonia e compaixão diante do sofrimento.
Diversamente das visões ordiná- Atitudes essas que revelavam Jesus como uma pessoa que se sentia amada
rias, a experiência pascal não apare- e unificada no amor (...) e por isso capaz de amar e dar-se aos outros (amor
ce como o produto de uma fé ou de derramado)”.
uma expectativa anterior. Ela surpre- Carlos Palacio, SJ, é atualmente o Provincial do Brasil da Companhia de
ende. Ela comunica um novo olhar so- Jesus. Nasceu em Pedreña, diocese de Santander, na Espanha. Ingressou na
bre Jesus, de modo que ela pode ser Companhia de Jesus em 20 de setembro de 1958 e veio para o Brasil em 1959.
qualificada simultaneamente como É naturalizado brasileiro. Cursou as humanidades (juniorado) em Itaici e o cur-
objetiva e subjetiva. O recurso à lin- so de Filosofia, em Nova Friburgo. Exerceu o estágio de Magistério no Colégio
guagem muito particular do “ele se Loyola, de Belo Horizonte, de 1965 a julho de 1967. Daí partiu para Bélgica (Lo-
fez ver” (1Cor 15,5-8; Lc 24,34) que
vaina) onde estudou Teologia de 1967 a 1971. Neste meio tempo foi ordenado
põe tão fortemente o acento na inicia-
sacerdote em Valladolid, Espanha, em 1970. Cursou em Roma estudos de Teo-
tiva do personagem transcendente, e
a diferença feita por uma destas tes- logia de 1973 a 1975, doutorando-se em Cristologia. De seus livros, destacamos
temunhas, Paulo, entre a cristofania e Cristianismo e história (São Paulo: Loyola, 1982) e Deslocamentos da Teologia,
as “visões e revelações” (2Cor 12,1), Mutações do Cristianismo (São Paulo: Loyola, 2001).
levam a contar com uma experiência
singular. Segundo as testemunhas, al-
IHU On-Line - Do ponto de vista his- fontes literárias para conhecer Je-
guma coisa lhes adveio do exterior, de
tórico, quem foi Jesus? sus são os evangelhos, que não são
maneira inopinada e gratuita. O ter-
Carlos Palacio - Digamos, em pri- “biografias” no sentido moderno,
mo “aparição” é de natureza a evocar
meiro lugar, que ninguém se atre- mas oferecem as coordenadas bá-
uma manifestação desse gênero e, por
veria hoje a pôr em dúvida a exis- sicas – temporais, geográficas e
falta de algo melhor, o vocabulário da
tência histórica de Jesus, (como históricas – para situá-lo. Há igual-
objetividade pode convir para ela. O
foi o caso em séculos passados). mente testemunhos fora do âmbito
historiador que se atém aos seus pró-
O interesse pela sua figura histó- cristão como os do historiador ju-
prios métodos pode estabelecer a re-
rica não tem cessado de aumentar deu Flávio Josefo, os de escritores
alidade dessa convicção, mas ele não
nas últimas décadas. As principais
pode ir mais longe.
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romanos como Tácito, Suetônio e “Ninguém se atreveria mãos dos romanos, vivia; e disso
Plínio, o Jovem, cujas referências eles eram testemunhas. Para um co-
têm grande valor documental. Muito hoje a pôr em dúvida a nhecimento aprofundado de Jesus é
valiosos igualmente para o conheci- tão ou mais importante o testemu-
mento do contexto da vida de Jesus existência histórica de nho e a interpretação dos seguidores
são os resultados das pesquisas ar- de Jesus do que os dados que possa
queológicas e as diversas aborda- Jesus” levantar a pesquisa historiográfica.
gens sociológicas e antropológico- De fato a pergunta de quem é Jesus
culturais da figura de Jesus, como é inseparável do que ele suscitou e
a abandonar a sua família em Nazaré
também a aproximação entre Jesus deu a viver, ou seja, do que dizem
e a começar uma atividade itinerante
e o judaísmo propriamente dito. Não dele os que o seguem. Por isso, os
como profeta que anunciava o “reino
seria, pois, exagerado dizer que hoje escritos do Novo Testamento, reco-
de Deus”. Durante três anos escassos
possuímos mais dados sobre a pes- nhecidamente “testemunhos de fé
Jesus percorreu caminhos e povoados
soa de Jesus do que os cristãos do pós-pascal”, são igualmente impor-
da Galiléia, com incursões na Samaria
primeiro século. A partir desse acú- tantes fontes literárias e históricas
e passagens por Jerusalém. A sua ma-
mulo de informações e de um ponto para o conhecimento de Jesus.
neira de falar de Deus como “Abba”,
de vista estritamente histórico hoje
paizinho, e de proclamar o que ele
é possível esboçar com segurança os IHU On-Line - Qual a interpretação
designava como “Reino de Deus”, cha-
principais traços da figura histórica mais marcante que se fez da história
mou poderosamente a atenção dos
de Jesus e do seu itinerário, desde real de Jesus?
seus contemporâneos. Era uma “boa
a data do seu nascimento (entre os Carlos Palacio - A interpretação da
notícia” que dava novo sentido à vida
anos 6 e 4 antes da nossa era) até pessoa de Jesus que se impôs na
das pessoas. O povo percebia que a
a sua execução na cruz “sob Pôncio história cristã (que é a história do
sua “autoridade” não vinha dos livros,
Pilatos” (provavelmente em abril do cristianismo universal) é a interpre-
mas da coerência com o que ele vivia.
ano 30). tação da fé cristã que os discípulos
O “Reino de Deus” não era uma teoria;
proclamaram à luz da páscoa: esse
nos “atos e palavras” de Jesus, Deus
Contexto geográfico homem Jesus é o “Cristo”, isto é,
tocava as pessoas nas situações mais
um ser enviado e “ungido” por Deus,
concretas da vida (o que os evangelhos
Jesus era um judeu da Galiléia; pro- o próprio Filho de Deus, a expressão
chamam as curas miraculosas). Eram
vinha de Nazaré, uma aldeia na qual foi humana, encarnada, do próprio Deus
“sinais” do que poderia ser a vida hu-
criado e que lhe deu o nome pelo qual (do que Ele é para nós) e da respos-
mana em sociedade se Deus fosse de
era conhecido: Jesus de Nazaré. Sua ta que um ser plenamente humano
fato o “senhor da vida”, se a vida hu-
língua materna era o aramaico, com as como Jesus pôde dar a Deus. Duran-
mana fosse organizada segundo o que
características daqupaela região (Pe- te muitos séculos, praticamente dois
Deus sonha para os seus filhos e filhas
dro, por exemplo, foi reconhecido na milênios, essa síntese entre fé e his-
(reinado de Deus).
casa de Caifás pelo seu sotaque). Em tória foi vivida de maneira espontâ-
Nazaré viveu Jesus a maior parte da nea e pacífica; os evangelhos foram
A animosidade contra Jesus
sua vida, filho de artesão e trabalhan- lidos, interpretados e vividos como
do com toda probabilidade no mesmo sendo a tradução imediata da histó-
A fama e autoridade de Jesus
ofício do pai. Por volta dos 30 anos ria real de Jesus, como verdadeiras
cresceram rapidamente entre o povo
teve contato com o movimento reli- “biografias” do acontecido com ele.
que o admirava e um grupo reduzi-
gioso em torno de João Batista; foi no Foi a partir do século XVIII, com a
do de discípulos que o seguia. Mas
Jordão que teve uma experiência espi- crítica racionalista aplicada a todos
esse impacto despertou logo suspei-
ritual decisiva na sua vida que o levou os âmbitos do saber, que se operou
tas entre as autoridades religiosas
uma mudança progressiva na manei-
 Públio (Caio) Cornélio Tácito (55 - 120 dos judeus, tanto na Galiléia como
d.C.): historiador romano, foi questor, pretor, ra de abordar os textos do Novo Tes-
em Jerusalém. A animosidade con-
cônsul, procônsul da Ásia e orador. É conside- tamento como textos literários, aos
rado um dos maiores historiadores da Antigui- tra Jesus foi crescendo até que, por
quais se podia e devia aplicar tam-
dade. (Nota da IHU On-Line) ocasião de uma festa da Páscoa, as
 Caio Suetónio Tranquilo (69 – 141 d. C.): es- bém a crítica literária e histórica.
autoridades judaicas confabularam
critor latino, dedicou-se às armas e às letras. Os chamados métodos exegéticos
Escreveu sobre os Doze Césares tendo sido contra ele diante do poder político
histórico-críticos propriamente di-
contemporâneo na idade adulta apenas do úl- romano até conseguirem a sua exe-
timo de seus biografados, Domiciano. Viveu a tos só viram a luz no início do sécu-
cução. Historicamente, é importan-
era dos cinco bons imperadores (Nerva, Tra- lo passado. A partir desse momento
jano, Adriano, Antonino Pio e Marco Aurélio). te notar que logo depois da morte
em muitas instâncias exegéticas e
(Nota da IHU On-Line) de Jesus o movimento daqueles que
 Caio Plínio Cecílio Segundo (61 ou 62 - 114): teológicas se introduziu uma ruptu-
seguiam o seu caminho, os cristãos,
também conhecido como Plínio, o Jovem ou o ra entre o chamado “Jesus históri-
Novo, foi orador, jurista, político, e adminis- anunciaram por todo o império ro-
co” e o “Cristo da fé”, como se fos-
trador imperial na Bitínia (111-112). (Nota
���������
da mano que esse Jesus, morto em
IHU On-Line) se possível separá-los a não ser do
SÃO LEOPOLDO, 06 DE JULHO DE 2010 | EDIÇÃO 336 19
ponto de vista metodológico. Mas ao gioso a fé cristã tem que voltar sobre
opor o chamado “Jesus histórico” ao
“O modo de Jesus si mesma para tomar consciência da
“Cristo da fé”, o que poderia ser vá- sua “diferença”, daquilo que consti-
lido como distinção metodológica se
viver o amor opera uma tui a sua especificidade. Ao mesmo
transformou numa espécie de dogma tempo, tem que ter lucidez crítica
teológico: a história em oposição à
reviravolta na nossa para discernir, à luz dessa diversida-
fé; o verdadeiro Jesus seria o “Je- de de culturas e religiões, o que na
sus histórico” (entenda-se: o que a
maneira humana de sua experiência histórica vem da fé
exegese possa afirmar como certeza ou da sua identificação com a cultura
histórica) em contraste com o “Cris-
pensar o amor” ocidental. O reconhecimento da par-
to da fé” eclesial. ticularidade desta cultura torna pos-
desvio herético negar que Jesus tives- síveis outras inculturações da mesma
O Jesus real foi muito mais se vindo “na carne”, como diz S. João. fé e abre o caminho para o diálogo
Para os primeiros cristãos era tão im- entre a fé cristã e as outras religi-
Essa separação ou ruptura radical portante reconhecer Jesus como Filho ões. Sem abdicar para isso da pró-
foi prejudicial tanto para a exegese de Deus do que confessá-lo vindo na pria especificidade. É grande hoje a
como para a teologia. O “Jesus histó- carne e plenamente humano. Insepa- tentação de conceber o diálogo como
rico”, assim entendido, acabou sendo ravelmente. Por ser algo decisivo para um debate gentil dentro de um ter-
um resíduo extremamente frágil do a imagem e a experiência cristã de reno “neutro”, no qual cada uma das
que a crítica exegética podia afirmar Deus, assim como para compreender o partes cederia um pouco até chegar
com toda certeza a respeito de Jesus. ser humano à luz de Jesus Cristo. Ora, à elaboração comum de uma mística
Na verdade o Jesus real, o que experi- é preciso reconhecer que a dimensão trans-religiosa. É o que poderia suge-
mentaram e viram do Jesus da história humana de Jesus tinha ficado na pe- rir a pergunta tal como está formula-
os que com ele conviveram, foi muito numbra da fé, ofuscada pela afirma- da: elaborar um discurso sobre o Je-
mais do que ficou registrado ou do que ção da sua condição divina. Por isso, sus humano que seja compatível com
a exegese possa desentranhar dos tex- a recuperação da dimensão humana a diversidade. Esse caminho não leva
tos. Por outro lado, o Cristo da fé cris- de Jesus trouxe um grande enriqueci- longe. Mesmo que pareça paradoxal
tã não foi nem pode ser uma abstração mento para fé e a experiência cristã, só haverá diá-logo, abertura e pos-
separada do Jesus da história. Tudo o mesmo à custa de muitos sofrimentos sibilidade de enriquecimento mútuo
que a fé cristã afirma de Jesus o afirma e mal-entendidos. indo até o fundo das identidades e di-
da história concreta desse homem de ferenças de cada interlocutor. Cabe à
Nazaré. É inegável que a problemática IHU On-Line - Como elaborar um dis- fé cristã mostrar que o para-doxo por
da crítica histórica repercutiu sobre a curso sobre o Jesus humano que seja ela anunciado e sobre o qual repousa
maneira de ler os evangelhos e de fa- compatível com a diversidade cultu- – a pessoa de Jesus Cristo, em si mes-
zer teologia e indiretamente sobre o ral e religiosa da atualidade? mo humano e divino, particular e uni-
povo cristão. Mas, tomada no seu con- Carlos Palacio - A diversidade cultural versal – é potencialmente uma “boa
junto de mais de dois séculos, o seu e religiosa, o intercâmbio e mesmo o notícia” que todo ser humano pode
resultado foi benéfico para a fé cristã: encontro entre as diversas culturas e escutar dentro do seu mundo cultural
ao provocá-la e desafiá-la, a exegese religiões é um fato característico do como palavra que ilumina o desejo
crítica a obrigou a purificar-se. Hoje nosso mundo globalizado e da mobili- oculto da sua busca religiosa. Jesus
sabemos ler os evangelhos não como dade e deslocamento das populações. Cristo é, pois, mais uma vez, “sinal
biografias, mas como relatos do senti- Os modernos meios de comunicação e de contradição”, pedra de escânda-
do da vida de Jesus à luz da fé. E dis- a rapidez dos transportes nos tornam lo, isto é, tropeço, causa de queda
tinguimos com clareza o que pertence potencialmente testemunhas ocula- para uns e de reerguimento para ou-
ao conteúdo da fé e o que foram as res de qualquer evento e trazem até tros, como diz Lucas no início do seu
suas interpretações teológicas ao lon- nós essa diversidade cultural, étnica evangelho.
go da história. e religiosa. A diversidade é tão antiga
como a humanidade; a novidade está IHU On-Line - Como foi vivida pelo
A dimensão da figura nessa simultaneidade pela qual o “di- homem Jesus a questão do amor?
humana de Jesus ferente” passa a ser um dado cotidia- Carlos Palacio - O estudo de qualquer
no da vida de qualquer pessoa. Essa personalidade histórica suscita mais
Uma das grandes riquezas dessa tu- irrupção do “outro” na nossa vida nos cedo ou mais tarde a curiosidade pelo
multuada história foi ter obrigado a fé faz tomar consciência do caráter li- seu mundo interior: como entendeu a
cristã a voltar-se definitivamente para mitado da nossa própria experiência sua vida? Como explicar a força da sua
a dimensão da figura humana de Jesus cultural e religiosa, e nos obriga a personalidade? Qual o seu perfil psi-
e a sua significação para a vida do cris- refletir sobre essa diferença. Nesse cológico, etc.? A resposta a esse tipo
tão e para a história humana. Desde os contexto de encontro entre as diver- de perguntas tem diante de si dois
primórdios, a fé cristã considerou um sas culturas e de diálogo inter-reli- caminhos: o de ater-se com todo res-

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peito ao que as fontes disponíveis nos ter se casado. Como explicar essa
permitem concluir, ou o de enveredar
“A recuperação da opção num homem que soube valo-
pelo gênero da ciência-ficção com re- rizar a mulher numa sociedade que
construções subjetivas que projetam
humanidade de Jesus as excluía e em cuja vida houve um
sobre a pessoa a visão ou os interesses entorno de amizades femininas que
do autor. Este tem sido o caso muitas
Cristo e a sua mostram em Jesus uma integração
vezes no que concerne a pessoa de Je- positiva dessa dimensão? O conjunto
sus. É surpreendente que, à margem
reelaboração teológica da vida e comportamento de Jesus,
de uma investigação técnica e res- a capacidade de viver e valorizar a
ponsável em âmbitos complementares
foram uma conquista da vida, de celebrar, de alegrar-se, etc.
do conhecimento histórico, tenham nos impedem interpretar essa opção
surgido nas últimas décadas numero-
maior importância para de maneira negativa, como manique-
sas publicações sobre Jesus – tipo O ísmo ou como pura ascese. A expli-
código da Vinci; A história secreta de
a espiritualidade e cação teria que ser buscada no que
Jesus; Jesus e Maria Madalena e outros constitui os dois pólos articuladores
– totalmente desprovidas de serieda-
experiência cristã” da vida de Jesus: a referência ao Pai
de e objetividade científica, nas quais e o horizonte do “Reino de Deus”. No
predomina uma fantasia desvairada, O comportamento de Jesus suscitou fundo se trata de um mesmo e único
além de interesses não confessados. É também oposição e hostilidade, mas absoluto: a construção de um amor
supérfluo dizer que a imagem de Je- é inegável que todos os que dele se em família foi absorvida na vida de
sus transmitida por esses autores nada aproximavam sem preconceito fica- Jesus pela dedicação apaixonada ao
tem a ver com o Jesus da história e vam fascinados pelo que irradiava da Pai e ao Reino, transformados na sua
menos ainda com o da fé cristã. sua pessoa. Numa palavra poderíamos vida em “boa notícia” encarnada
dizer que, na relação com as pessoas, para as pessoas. Esse “sinal” não era
O amor tem um lugar privilegiado na Jesus transmitia uma afirmação in- fácil de ser entendido. Nem naquela
vida de Jesus condicional da vida, uma capacidade época nem hoje. Há indícios de que
ilimitada de acolher, respeitar e acre- foi o que aconteceu com Jesus. A sua
Situada, pois, corretamente, a ditar nas pessoas e uma sensibilida- opção não foi bem compreendida. E
questão levantada é de extremo in- de extrema de sintonia e compaixão sempre há os intrigantes de plantão.
teresse, embora exija muito cuidado diante do sofrimento. Atitudes essas Assim como foi acusado de comer
para não cairmos na tentação criti- que revelavam Jesus como uma pes- e beber e ser amigo de prostitutas
cada. De fato, a incursão no mundo soa que se sentia amada e unificada e pecadores, parece que o chama-
interior das pessoas (mesmo daquelas no amor (é toda a sua experiência do ram de “eunuco”, isto é, castrado.
cuja vida está bem documentada sob Pai como raiz e fundamento da vida) Ao que Jesus respondeu de maneira
estes aspectos) é sempre um ato ar- e por isso capaz de amar e dar-se aos gráfica com esta afirmação recolhida
riscado, porque o mundo íntimo das outros (amor derramado). nos evangelhos: “há homens impos-
pessoas escapa em parte à análise dos sibilitados de casar-se porque nasce-
historiadores. Nem por isso devería- Os preferidos de Jesus ram assim; outros foram mutilados
mos recuar diante de uma pergunta pelos homens; e há outros ainda que
instigante como esta. O amor, de fato, Não é por acaso que (entre a va- se tornaram assim por causa do rei-
tem um lugar privilegiado na vida de riedade de pessoas e relações que no dos céus. Quem puder entender,
Jesus. Não só porque constitui um (se- tecem a vida de Jesus) os preferidos entenda”.
não o) eixo central da mensagem de de Jesus, os que de maneira quase
Jesus (“amai-vos como eu vos amei: instintiva o percebem como uma IHU On-Line - Quais os desafios que o
nisto conhecerão que sois meus dis- “boa notícia” para as suas vidas, Jesus humano apresenta para o estu-
cípulos”; o amor a Deus e ao próximo são os que os evangelhos chamam os do da cristologia?
é o resumo de toda a Escritura cristã, “pequenos”: pobres, doentes, peca- Carlos Palacio - A recuperação da hu-
segundo Jesus), mas porque o modo dores, prostitutas, enfim todos os manidade de Jesus Cristo e a sua re-
de Jesus viver o amor opera uma revi- excluídos do convívio social e reli- elaboração teológica foram uma con-
ravolta na nossa maneira humana de gioso com os quais Jesus convive e quista da maior importância para a
pensar o amor. A primeira resposta ao se senta à mesa para devolver-lhes a espiritualidade e experiência cristã, e
que foi a vivência do amor por Jesus dignidade e integrá-los na vida. Essa para a reflexão teológica. Não é, por-
nos é dada pelo impacto produzido é uma primeira aproximação que ilu- tanto, a descoberta da humanidade de
por Jesus nas pessoas que entravam mina a questão de como Jesus viveu Jesus que se torna problema para a
em contato com ele. Trata-se da pes- o amor: numa vida realizada na en- cristologia, mas a necessidade de ree-
soa de Jesus na sua unidade, não só trega aos outros. Mas esse estilo de laborá-la teologicamente com todas as
do “Jesus humano”: ele era humana- vida está relacionado com outro as- suas implicações. Em si mesma, a re-
mente divino e divinamente humano. pecto da vida de Jesus: o fato de não descoberta da humanidade de Jesus é

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o reencontro com a mais lídima tradi- salvação definitiva do ser humano e da caso, através de uma rigorosa investi-
ção da fé cristã. E a riqueza do seu im- história. O conteúdo da cristologia não gação dos estudos exegéticos contem-
pacto consiste em perceber o alcance é, em primeiro lugar, formado pelos porâneos. É por isso que o livro de Pa-
que essa perspectiva tem, tanto para enunciados dogmáticos, mas os “acta gola é, ao mesmo tempo, existencial,
o método e o conteúdo da cristologia et passa” de Jesus, ou seja, os acon- vivo, de um inegável alcance pastoral
contemporânea, quanto para a antro- tecimentos da sua vida, morte e res- e, por outro, uma leitura exigente e
pologia, a vida cristã e a presença do surreição. Por isso, do ponto de vista minuciosa de documentos áridos mui-
cristão no mundo. As dificuldades que metodológico, a cristologia contempo- tas vezes, mas indispensáveis. O autor
surgiram do esquecimento desta di- rânea é mais indutiva do que dedutiva. mostra um vasto e fundamentado co-
mensão se fizeram sentir, por um lado, Mas a reflexão cristológica não pode se nhecimento da investigação exegética
no modo de enfocar a reflexão cris- contentar com repetir os resultados a atual sobre a história de Jesus e apóia
tológica tradicional e, por outro, no que pode chegar à exegese moderna as suas reflexões e tomadas de posição
distanciamento sempre maior entre a sobre Jesus. Ela tem que mostrar em no confronto das diversas opiniões.
investigação exegética histórico-críti- que consiste a novidade escatológica Trata-se de um livro cuja leitura em-
ca e a teologia dogmática. de Jesus, isto é, o que há nele de de- polga e que será de grande ajuda para
finitivo. Por isso a cristologia hoje tem as pessoas que não desanimarem com
Uma cristologia dogmática que trabalhar simultaneamente com o seu volume. A sensibilidade pastoral
uma abordagem bíblica e exegética de Pagola, que ele manifestou não só
Ao perder a sua inserção na história adequada, para mostrar a partir des- nos seus escritos, mas na acolhida que
concreta de Jesus, a cristologia se tor- sa base a conexão que existe entre a têm as suas atividades pastorais, con-
nou cada vez mais “dogmática”, isto Escritura e o dogma cristológico. Assim segue com este livro fazer acessível
é, uma reflexão especulativa e abstra- poderá, finalmente, justificar o caráter a pessoa de Jesus aos homens e mu-
ta sobre os enunciados conciliares da único e exclusivo da figura de Jesus. lheres de hoje, cristãos que buscam
fé cristológica. Por sua vez o distancia- aprofundar e fundamentar a sua fé no
mento entre exegese e teologia operou IHU On-Line - Como define o livro de meio da cultura pós-moderna, ou sim-
uma ruptura mortal entre a pesquisa José Antonio Pagola, Jesus. Aproxi- plesmente pessoas que procuram um
exegética sobre o Jesus histórico e o mação histórica? sentido para a vida. Sendo um livro sé-
chamado Cristo da fé; ruptura mor- Carlos Palacio - Conheço o livro de Pa- rio e consistente, o objetivo do mesmo
tal porque a fé cristã não pode viver gola e os antecedentes que o prepara- não é só acadêmico; o anseio profundo
nem subsistir fora do acontecido em e ram, tais como Jesucristo. �����������
Catequesis do autor não é só informar as pessoas,
com Jesus. O grande desafio, contudo, cristológicas (1975) e Jesús de Naza- mas levá-las a um encontro pessoal e
não é só voltar à história de Jesus e ret. El hombre y su mensaje (1981). existencial com Jesus. O segredo do
recuperar a significação que ela tem Tendo seguido de perto o itinerário do livro de Pagola é ter conseguido trans-
para os conteúdos da cristologia, mas autor não é difícil definir esta sua obra mitir ao leitor a sua paixão por Jesus
mostrar como e em que há algo de ir- maior: é o fruto maduro de um cristão Cristo, de tal maneira que através da
repetível na história singular de Jesus apaixonado pela pessoa à qual se di- leitura deste livro sentimos que chega
que faz com que a fé cristã possa ver rige a sua fé, a quem quer conhecer a nós a “boa notícia” contagiante que
nele a revelação definitiva de Deus e a mais e melhor, inclusive, como neste ele era e transmitia.

XII Simpósio Internacional IHU – A


25 a 28 de outubro de 2010 Experiência Missioneira: território,
cultura e identidade

Data de início: 25 2010


de outubro de
Local: Unisinos • Anfiteatro Pe. Werner
Av. Unisinos, 950 • São Leopoldo • RS
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SÃO LEOPOLDO, 06 DE JULHO DE 2010 | EDIÇÃO 336 23
Memória
Dona Militana: o canto que vem de Oiteiro
O texto é de Haroldo Gomes, parceiro do IHU, em Natal, RN, e publicado nas Notícias do
Dia 24-06-2010, disponível para download em http://migre.me/UHyU.

O
romance popular é um breve poema,
em versos simples, baseado em epi-
sódios dramáticos ou fatos históricos,
destinado a ser cantado e transmitido
oralmente. Parente bem próximo da li-
teratura de cordel.
Pois bem. Militana Salustino do Nascimento (1925
-2010), conhecida como Dona Militana, natural de
São Gonçalo do Amarante/RN, foi uma das princi-
pais representantes desse gênero literário no Brasil.
Ouviu, gravou. “Meu pai cantava e eu escutava por
trás do algodoal, foi assim que aprendi”, diz Mili-
tana à Revista Preá nº 22, publicação da Fundação
José Augusto.
Costumava dizer: “tenho mais de 55 romances
aqui no quengo”.
Militana cantou romances, modinhas, coco, xá-
caras, moirão, toadas e boi, aboios e fandangos. Na
década de 90 do século passado, o folclorista Deífilo
Gurgel tornou pública sua musicalidade. E Militana
saiu do anonimato, ganhou o mundo. Logo se tornou
figura requisitada em grandes eventos culturais de
cunho nacional ao lado de artistas como Elba Rama-
lho e Antonio Nóbrega. Nunca se soube ao certo de
onde vinha a arte de suas palavras:
“Vim de uma cultura dos pés rachados do sol. Eu
tinha que pular nas sombras para aliviar a quentu-
ra do roçado. E hoje sou ‘inventadeira’ das coisas.
Para mim, a vida é um grande moinho, cheio de coi-
sas novas”.
Recebeu até a Comenda Máxima da Cultura Po-
pular, em Brasília, em 2005, das mãos do presidente
Lula.
Porém, o canto de Militana não a livrou de uma
vida repleta de graves problemas financeiros, sem
ter sequer um plano de saúde. Em 2009, apenas, é
que a Prefeitura de São Gonçalo do Amarante veio
lhe conceder uma “pensão vitalícia”. No último sá-
bado (19/06/2010), Dona Militana faleceu. 

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Lembranças de Dona Militana: a maior romanceira do Brasil
Dona Militana aprendeu a cantar com o pai, enquanto trabalhava no roçado, na comuni-
dade do Oiteiro, no Rio Grande do Norte, onde vivia com a família. Segundo o professor
Deífilo Gurgel, ela era “uma pessoa consciente do seu valor e quando ‘dava uma pala-
vra’, tinha de mantê-la até o fim”

Por Patricia Fachin

D
eífilo Gurgel estuda e documenta o folclore nordestino há mais de três décadas. Poeta, escritor e
professor, ele descobriu a maior romanceira do Brasil, Dona Militana, no Rio Grande do Norte, na
década de 90, ao realizar uma pesquisa sobre romanceiros do país. Reconhecida, inclusive, pelo
governo federal, ela recebeu a medalha de mérito cultural brasileiro.
Na entrevista a seguir, concedida, com exclusividade, à IHU On-Line, por telefone, o pesqui-
sador conta que Militana era uma lavradora do Rio Grande do Norte e sabia cantar “um romance que ninguém
conhecia no Brasil, nem em Portugal”. Segundo ele, em Natal, muitas pessoas cantam romances ibéricos,
mas não na quantidade conhecida por Dona Militana. “Viajei por todo o nordeste e não consegui encontrar
outra pessoa que soubesse cantar todas essas versões”, enfatiza. A maioria das letras dos romances cantados
por Dona Militana já haviam sido registrados em livros, mas ninguém nunca havia musicado esse material. Por
esse motivo, destaca, “ela é de uma importância transcendental e merece todas as homenagens que foram
prestadas em vida e continuam sendo prestadas depois da morte”.
Dona Militana Salustino do Nascimento nasceu no sítio Oiteiros, na comunidade de Santo Antônio dos
Barreiros, em 19 de março de 1925. Ela gravou na memória os cantos executados pelo pai. São romances
originários de uma cultura medieval e ibérica, que narram os feitos de bravos guerreiros e contam histórias
de reis, princesas, duques e duquesas. Além de romances, Militana canta modinhas, coco, xácaras, moirão,
toadas de boi, aboios e fandangos. Ela faleceu no dia 19-6-2010, aos 85 anos.
Deífilo Gurgel nasceu em 1926, em Areia Branca/RN. Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Facul-
dade de Direito de Natal, exerceu as funções de diretor do Departamento de Cultura da Secretaria Municipal
de Educação e Cultura - SMEC, de Natal; diretor de Promoções Culturais da Fundação José Augusto - FJA;
professor de Folclore Brasileiro na Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN. Poeta e jornalista,
Deífilo Gurgel publicou várias obras relacionadas ao folclore. Citamos Danças Folclóricas do Rio Grande do
Norte (1995, 5ª ed.); Manual do Boi Calemba (1985); João Redondo; Teatro de Bonecos do Nordeste (1986)
e Romanceiro de Alcaçuz (1993).
Consta que Deífilo, poeta na adolescência, somente aos 40 anos “descobriu” o folclore, passando a dedi-
car-se integralmente ao assunto. Residindo em Natal desde 1944, em suas pesquisas, ele tem se aprofundado
nas raízes históricas do povo potiguar, o que resultou em descobertas inéditas, como as de 1985, quando
coletou exemplos do romanceiro popular ainda não registrados por qualquer outro pesquisador brasileiro,
merecendo menção o “Cavalo Moleque Fogoso”, de Fabião das Queimadas. Confira a entrevista.

IHU On-Line – O senhor é tido como a mim todas as jornadas de um fandango marujo, dançam formando duas alas
pessoa que “descobriu” Dona Milita- que ele possuía e, que, aquela altu- e cantam as jornadas. Essa apresenta-
na, na década de 90. Como foi esse ra, já estava desativado. O fandango ção demora em torno de duas horas.
encontro? do nordeste é diferente do fandango No sul, é uma dança folclórica dança-
Deífilo Gurgel – Em 1975, entrevistei o do Rio Grande do Sul. No Rio Grande da por um grupo de pessoas formando
pai dela, seu Atanásio Salustino do Nas- do Norte, ele é um auto popular. Os uma roda.
cimento, e pedi para ele cantar para dançarinos vestem o traje típico de Passou-se o tempo e, em 1985, ini-

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ciei, na Universidade Federal do Rio “Às vezes, ela dizia que morando para servir o jantar, e uma
Grande do Norte – UFRN, uma pesquisa romanceira da Paraíba perguntou se
sobre romanceiros ibéricos e brasilei- não sabia os romances. Dona Militana gostaria de jantar em
ros. Durante 10 anos, viajei pelo esta- seguida, e ela respondeu: “Não es-
do do Rio Grande do Norte, coletando Naquela época em que tou pedindo nada para a senhora. Não
versões de romances ibéricos, recebi- precisa, não.” Ela era assim; não ti-
dos de Portugal, e romances brasilei- eu a entrevistei para nha panos mornos - como costumamos
ros, criados na área da pecuária e do dizer -, o que ela tinha a dizer, dizia
cangaço. Em 1981, quando a pesquisa gravar o Cd, o povo quase logo na cara da pessoa. Nesse mesmo
estava em plena realização, me lem- dia, pessoas do mundo todo assistiram
brei de que quando entrevistei seu não cantava mais esses a apresentação dela, ficaram encanta-
Atanásio, ele cantou alguns romances. dos e a aplaudiram de pé. Em seguida,
Então, fui procurá-lo e fiquei sabendo romances. Ela começou ela gravou um cd chamado Romances
que já havia falecido, mas suas filhas e Cantadores.
disseram que Maria José - nome pelo cantando isso, talvez,
qual Dona Militana era conhecida na IHU On-Line – Que atividades Dona
época -, entendia de romances. O como cantiga de Militana exercia antes de ser consi-
povo do Rio Grande do Norte é muito derada uma romanceira famosa?
inibido, então, precisei conversar com trabalho” Deífilo Gurgel – Não sei. Na época em
ela para convencê-la a cantar alguns que a conheci, ela deveria receber a
romances e, por fim, cantou 33 ver- com dona Maria José e descobriram o pensão que o governo paga para as
sões de romances ibéricos e brasileiros nome dela, certamente acharam que pessoas idosas, que o povo chama de
para eu gravar. era mais bonito esse nome medieval aposento ao invés de chamar de apo-
Nessas minhas viagens, conhecia de Militana. Aí, eu tive de me render sentadoria. Essas são uma das coisas
informantes romanceiras e ficava feli- a ela e deixar o nome Maria José de que se vê por aqui. O carnê para rece-
císsimo quando uma delas cantava 10 lado. ber a aposentadoria, eles chamam de
romances. Mas conseguir 33 versões carneiro. O povo é uma beleza e tem
com uma única pessoa foi a glória. Fi- IHU On-Line – Como foi essa experi- umas coisas ótimas.
quei contente com a descoberta dela ência de trabalhar com Dona Militana
e, a partir daí, sempre mantivemos as na gravação desses 33 romances? Ela IHU On-Line - Qual a importância e
melhores relações de amizade. era muito tímida? o significado de Dona Militana para o
Deífilo Gurgel – Não foi muito fácil folclore e para a cultura brasileira?
IHU On-Line – O senhor disse que porque, às vezes, ela dizia que não Deífilo Gurgel – Uma importância incrí-
Dona Militana teve dois nomes. Pode sabia os romances. Naquela época em vel. Ela cantava romances palacianos,
contar essa história? que eu a entrevistei para gravar o cd, romances religiosos e romances ple-
Deífilo Gurgel – A mãe dela pediu a o povo quase não cantava mais esses beus, de Portugal. Também cantava um
uma comadre para registrar a meni- romances. Ela começou cantando isso, romance religioso chamado O Milagre
na no cartório e deu o nome de Ma- talvez, como cantiga de trabalho. Ela do Trigo. Quando ela cantou esse ro-
ria José. A comadre da mãe de Dona e o pai dela eram lavradores e traba- mance, vi que se tratava de algo muito
Militana achou que Maria José era um lhavam no roçado que eles tinham na importante e, imediatamente, telefo-
nome muito comum e a registrou como comunidade do Oiteiro. Enquanto Ata- nei para amigos que pesquisam roman-
Militana Salustino do Nascimento. násio plantava, cantava os romances, ceiros no Brasil. Conversei com Bráulio
Quando a entrevistei pela primeira e a filha aprendeu. Ele tinha uma voz do Nascimento, Jackson da Silva Lima
vez, conheci o irmão dela, que tinha maravilhosa e sabia muito mais do que e outros. Perguntei se eles conheciam
o apelido de São Bento. Na ocasião, Militana. Eu não tive a oportunidade esse romance. O único que conhecia,
perguntei o nome completo dela e de gravar esses romances com ele. em parte, era Bráulio do Nascimento,
estava certo de que iria responder: Consegui apenas gravar o fandango, mas ele conhecia o texto em forma de
“Maria José Militana Salustino do Nas- que tem 24 jornadas. Recentemente, conto popular e não na forma poetiza-
cimento”. Mas ela disse: “é Militana enviei essas fitas para o Ministério da da, versejada e musicada.
Salustino do Nascimento”. O irmão Cultura, e eles regravaram tudo. Em seguida, participei de um semi-
dela, imediatamente disse: “Nossa! Militana não tinha um tempera- nário sobre cultura medieval, e lá en-
Seu nome é esse, mas como eu nunca mento muito dócil. Era uma pessoa contrei com o professor J. J. Dias Mar-
soube, se sou seu irmão e convivi com consciente do seu valor e, quando ques, da Universidade do Algarve. Ele
você desde menino?” Aí ela explicou o “dava uma palavra”, tinha de mantê- não conhecia esse romance em Portu-
que tinha ocorrido. O pessoal só a co- la até o fim. Houve um episódio inte- guês, mas me disse que, na biblioteca
nhecia por Maria José, e ela aceitava ressante quando fomos a Aracaju fazer do Algarve, existiam algumas versões
esse nome. Quando a Fundação Cultu- uma apresentação sobre romanceiros em castelhano e, posteriormente, me
ral Hélio Galvão começou a trabalhar do Rio Grande do Norte: estavam de- enviou o material. Então, quer dizer,

26 SÃO LEOPOLDO, 06 DE JULHO DE 2010 | EDIÇÃO 336


uma pobre lavradora do Rio Grande do “Em certa ocasião, gentil e cultíssimo.
Norte sabia um romance que ninguém IHU On-Line - Qual foi a contribuição
conhecia no Brasil, nem em Portugal. perguntei se ela do Prefeito Djalma Maranhão na va-
Na região litorânea de Natal, muitas lorização dos movimentos culturais
pessoas sabem cantar os romances conhecia histórias de em Natal?
ibéricos, mas não na quantidade co- Deífilo Gurgel – Muito grande. Apesar de
nhecida por ela. Viajei por todo o nor- trancoso, contos de fada, eu não ter tido muita aproximação com
deste e não consegui encontrar outra Djalma Maranhão, ele me tratava com
pessoa que soubesse cantar todas es- e ela disse que sabia um muita cordialidade. Tenho uma admira-
sas versões. ção muito grande por ele, é tanto que,
Cascudo realizou uma pesquisa an- bocado de histórias. Mas, em um livro que escrevi, dediquei um
terior, publicada no livro Flor de Ro- capítulo para grandes figuras do folclo-
mances Trágicos, contando a vida de infelizmente, a morte re do Rio Grande do Norte e entre elas
cangaceiros, e transcrevendo roman- está Djalma Maranhão. Sempre que há
ces desse pessoal, mas ele registrou chegou primeiro do que a oportunidade de eu falar sobre ele,
apenas a letra. Dona Maria José sabia teço os maiores elogios, não só pelo
tudo: a letra, a música. Por isso ela é eu, e ela foi embora apoio que ele deu à cultura, mas pelo
de uma importância transcendental e desenvolvimento que ele deu à educa-
merece todas as homenagens que fo- levando tudo isso” ção do Rio Grande do Norte. Na adminis-
ram prestadas em vida e continuam tração dele, foi desenvolvido um proje-
sendo prestadas depois da morte. to chamado “De pé no chão também se
Ela é a maior romanceira do Brasil. Deífilo Gurgel – Deixa um legado mui- aprende a ler”. Esse projeto teve uma
Tive a oportunidade de conferir que é to grande. Nesta pesquisa que fiz so- importância muito grande para a popu-
a informante que cantou o maior nú- bre os romanceiros, encontrei uma lação pobre da cidade, que tinha mui-
mero de romances, e pelo fato de can- romanceira chamada Juvina Monteiro. ta facilidade para aprender. As crianças
tar romances inéditos no Brasil, e de o Ela cantou 23 romances para mim, e a aprendiam não só a ler, mas também
governo federal ter reconhecido a im- voz dela é mais bonita que a de Dona sobre a cultura do Rio Grande do Norte.
portância dela e ter concedido a ela a Militana. Tenho esse material gravado Djalma foi um administrador fabuloso. A
medalha do mérito cultural brasileiro, e datilografado porque pretendo pu- população de Natal tem por ele a maior
não podemos deixar de dizer que era blicar um livro. Tenho 84 anos, mas admiração. Uma multidão acompanhou
e continua sendo a maior romanceira antes da minha viagem definitiva, pre- o sepultamento dele, apesar de ter sido
do Brasil. tendo deixar publicado esse trabalho cassado pela Revolução.
com romanceiros do Rio Grande do
IHU On-Line – Além dos romances, Norte. Além dessas duas romanceiras, IHU On-Line - Que influência teve o
ela conhecia outros aspectos da cul- coletei material com outros romancei- encontro com o Bumba Meu Boi na
tura popular? ros como Raimundo Fabião, neto de sua formação de folclorista?
Deífilo Gurgel – Em certa ocasião, uma figura lendária de nosso estado, Deífilo Gurgel – A minha formação de
perguntei se ela conhecia histórias de chamado Fabião das Queimadas. folclorista é interessante. Eu não gos-
trancoso, contos de fada, e ela disse tava de folclore, não tinha aversão,
que sabia um bocado de histórias. Mas, IHU On-Line - O senhor conviveu mas não me interessava absolutamen-
infelizmente, a morte chegou primei- com outro grande folclorista brasi- te. Nasci numa cidade do Rio Grande
ro do que eu, e ela foi embora levando leiro: Luís da Câmara Cascudo. Que do Norte, que fica próxima do Ceará,
tudo isso. lembranças têm do contato com Cas- e morei lá até os 12 anos. É uma das
cudo? cidades mais distantes dos Centros
IHU On-Line - Que legado Dona Mi- Deífilo Gurgel – Cascudo era uma pes- Culturais. Lá eu via o Bumba Meu Boi
litana deixa para a cultura popular soa encantadora. Fui aluno de Direito e achava uma brincadeira pobre, não
brasileira? dele, e o que ele menos ensinava era tinha a riqueza de outros Bumba Meu
algo sobre Direito. Nas aulas, falava Boi.
0 Luis da Câmara Cascudo (1898 – 1986): his- sobre o folclore e a história de Natal
toriador, folclorista, antropólogo, advogado e Na época em que Djalma Maranhão
jornalista brasileiro. Passou toda a sua vida em sem nenhum desmerecimento porque foi prefeito da capital, por volta da
Natal e dedicou-se ao estudo da cultura bra- ele sabia essa história de ponta a pon- década de 60, ele fazia promoções
sileira. Foi professor da Universidade Federal ta. Quando terminei o curso de Direito
do Rio Grande do Norte – UFRN. Pesquisador natalinas com apresentação de gru-
das manifestações culturais brasileiras, deixou e fui ser professor de folclore brasi- pos folclóricos na rua, montava pre-
uma extensa obra, inclusive o Dicionário do leiro na universidade, sempre levava sépios e árvores de Natal. Quando eu
Folclore Brasileiro. A edição 126 dos Cader- meus alunos na casa dele para conhe-
nos IHU Ideias é intitulada Câmara Cascudo: terminava meu trabalho e passava no
um historiador católico, e pode ser lida em cê-lo e ouvi-lo dar uma aula. Os alu- centro da cidade, via aquelas apresen-
http://migre.me/UHIk. (Nota da IHU On- nos saiam encantados com Cascudo. tações e pensava: “Precisa ter muita
Line) Ele era um homem fabuloso, educado, paciência, muito saco – com licença da
SÃO LEOPOLDO, 06 DE JULHO DE 2010 | EDIÇÃO 336 27
“É um folclore rico,
“Lá nos Barreiros onde eu nasci,
bonito, mas não tem
Em São Gonçalo onde eu me criei,
ainda o valor que deveria
Eu vou voltar pra meu sítio Oiteiro,
ter. Um cineasta gravou Adeus Rio de Janeiro, adeus.”
umas imagens de Dona
Militana e reclamou dos Poema cantado por Dona Militana

cineastas do Rio Grande


IHU On-Line – O folclore é muito va- IHU On-Line - Como avalia a situação
do Norte pelo fato de lorizado no Rio Grande do Norte? dos estudos sobre folclore no Brasil,
Deífilo Gurgel – Infelizmente, não. É atualmente? Que estado brasileiro
eles nunca terem um folclore rico, bonito, mas não tem mais valoriza o folclore?
ainda o valor que deveria ter. Um ci- Deífilo Gurgel – Em São Paulo, na cida-
demonstrado interesse neasta gravou umas imagens de Dona de de Olímpia, realiza-se anualmente
Militana e reclamou dos cineastas do um festival de folclore. Eles publicam,
em gravar imagens dela” Rio Grande do Norte pelo fato de eles inclusive, um anuário do folclore bra-
nunca terem demonstrado interesse sileiro. Essa é uma contribuição muito
má palavra -, para as pessoas ficarem em gravar imagens dela. boa para o folclore, mas, infelizmen-
horas e horas vendo a chateação des- Não sei se o governo do Maranhão te, os grupos que se apresentam são
ses grupos, essa lenga-lenga.” Pensava prestigia o folclore maranhense, mas o pára-folclóricos, ou seja, não são fol-
isso porque, normalmente, as cantigas povo prestigia. Quando os bois do Ma- clóricos autênticos.
de fandango e chegança são lentas. ranhão saem para dançar, a multidão O estado que tem preservado me-
No ano de 1970, fui nomeado Se- acompanha. No Rio Grande do Norte, lhor as suas manifestações folclóricas
cretário de Cultura da Prefeitura Mu- não há esse interesse. Quando veem um é Sergipe. Infelizmente eu não tenho
nicipal de Natal. Por conta disso, re- Boi, o pessoal até trata com menospre- viajado para lá em função da minha
tomamos os festivais folclóricos de zo. Atualmente, por conta da universida- idade e também pelo medo que sin-
Natal. No setor que eu dirigia, tinha de, o folclore está sendo um pouco mais to em viajar de avião. Nesses lugares
um velho batalhador do folclore do Rio valorizado. distantes, tem de ir de avião, se não,
Grande do Norte chamado Joaquim O folclore do Rio Grande do Norte leva um mês. Por isso, não poderia dar
Caldas Moreira. Ele tinha trabalhado tem duas coisas fabulosas que não são um panorama exato de como estão os
com Djalma Maranhão e conhecia o levadas na devida consideração: uma estudos e a situação atual do folclore
pessoal dos grupos folclóricos. Certo é o nascimento de Câmara Cascudo no pelo Brasil.
dia, fui com ele visitar o Bumba Meu estado, que é considerado, por muitos, A Fundação Cultural do Rio Gran-
Boi. Quando chegamos, o boi já estava como o maior folclorista brasileiro; a de do Norte está planejando, para o
dançando na praça. Vi os postes com segunda é a atitude que Câmara Cas- mês de agosto, um festival de folclo-
luminárias de mercúrio focando em cudo teve de convidar Mário de Andra- re. Existem alguns grupos autênticos
cima dos enfeitados do grupo – como de para visitar o Rio Grande do Norte, de Bumba Meu Boi, em diversas cida-
o povo chama -, com aquelas fitas es- em 1929. Ele ficou no estado durante des; o fandango e a chegança são dois
voaçantes, com os espelhos refletindo um mês e quinze dias, num tempo em grupos espetaculares. A dança é longa,
a luz dos postes e, aí, não teve jeito, que não havia gravador e, documento mas vale à pena enfrentar o enfado e
me apaixonei de uma vez por todas em letra e em música, os nossos qua- assistir do princípio ao fim.
pelo folclore e, principalmente, pelas tro autos populares: boi, chegança, O deputado Fernando Mineiro (PT)
danças. A dança deles é muito viva. fandango e cocos. É uma pesquisa que tem dado muita importância ao fol-
Quando fui ser professor na universi- está publicada numa obra dele chama- clore e apresentou um projeto de lei
dade, estudei o folclore e publiquei da Danças Dramáticas do Brasil, orga- para beneficiar grupos e mestres fol-
livros sobre o assunto. O meu principal nizado por Oneyda de Alvarenga. clóricos. O projeto considera todo o
livro se chama Espaço e tempo do fol-  Oneyda Paoliello Alvarenga (1911-1984): universo folclórico como patrimônio
clore potiguar (Natal: Prefeitura Mu- jornalista, ensaísta e folclorista brasileira. vivo. Essa iniciativa está começando.
nicipal/FUNCART, 1999), no qual dou Especializou-se em crítica musical, sendo uma
grande referência na documentação da origem Vamos aguardar os resultados.
uma panorâmica do folclore brasileiro e do folclore da música Brasileira. Foi aluna
e, detalhadamente, do folclore do Rio e colaboradora próxima de Mário de Andrade
Grande do Norte. em suas investigações sobre a música popular rânea. (Nota da IHU On-Line)
em sua perspectiva antropológica contempo-

28 SÃO LEOPOLDO, 06 DE JULHO DE 2010 | EDIÇÃO 336


Confira as publicações do
Instituto Humanitas Unisinos - IHU

Elas estão disponíveis na página eletrônica


www.ihu.unisinos.br

SÃO LEOPOLDO, 06 DE JULHO DE 2010 | EDIÇÃO 336 29


Mídia e educação: a necessidade de
refletir sobre sua regulamentação
Por Paola Madeira Nazário*

Refletir sobre uma “Educação para Nessa perspectiva, é importan-


a Mídia” e as suas diferentes aborda- te um posicionamento governamen-
gens é essencial em tempos de digi- tal, como também dos movimentos
talização, onde a marginalização tec- sociais ligados à democratização da
nológica toma uma dimensão abismal, comunicação, no encaminhamento
intensificada pelo forte fluxo de inova- de proposta de leis educativas com o
ções tecnológicas convergentes, fenô- objetivo amplo de capacitar os alunos
meno que se percebe em uma grande tanto para a apropriação dos avanços
fatia de determinadas classes sociais tecnológicos quanto dos conteúdos
brasileiras, as quais vivem à periferia difundidos pela mídia; para, assim,
de uma rotina inclusiva nas e com as favorecer e incentivar sua participa-
novas tecnologias de comunicação. ção social, promovendo a democra-
O sistema educacional brasileiro cia e a justiça social. Entende-se que
deve ampliar a noção de uma alfabe- tanto a comunicação quanto a educa-
tização digital, no espaço escolar, que ção são responsáveis por grande parte
integre análise e produção, bem como das aprendizagens que os indivíduos
a crítica das relações entre os meios de assimilam e adotam, assumindo pa-
comunicação, a informação e o poder. pel decisivo na organização da atu-
Atualmente, vive-se em uma socieda- al sociedade. Imersa nesse cenário,
de complexa em constante transfor- em especial a televisão, presente
mação social e tecnológica, que alte- em quase todos os lares brasileiros,
ra os processos midiáticos e todos os constrói realidades, legitima valores
sistemas de mediações das interações e estimula comportamentos, através
profissionais e pessoais, provocando de seus conteúdos e modos de produ-
e maximizado desigualdades. Numa ção, atuando, especialmente, como
perspectiva ampla, que considera as agente de socialização.
relações específicas entre os fenô- Diante desse fato, a escola, como
menos comunicacionais e educativos, lugar específico de ação e reflexão,
compreende-se a televisão como um assume papel primordial na tarefa
meio de comunicação historicamente de proporcionar um espaço favorá-
imbricado na trajetória da educação, vel a estes questionamentos. Isto se
tendo em vista sua grande força como dá através do que se denomina uma
produtora de sentidos e significados. “Educação para a Mídia”, que discu-

* Publicitária e mestre em Ciências da Comunicação pela Universidade do Vale do Rio dos Si-
nos (UNISINOS). Atualmente, é docente e coordenadora executiva no curso de especialização
em Estratégias e Processos em TV digital e, como membro do Grupo Cepos, auxiliar de pes-
quisa no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação (PPGCC-UNISINOS). E-mail:
madeira_nazario@hotmail.com

30 SÃO LEOPOLDO, 06 DE JULHO DE 2010 | EDIÇÃO 336


te a mídia, especialmente a televi-
são, contribuindo no processo ensino-
“A escola, como lugar e compreendendo a educação como
base para uma formação qualificada
aprendizagem, no âmbito do ambiente
escolar, para auxiliar na construção de
específico de ação e para o trabalho, e a elevação do nível
escolar como fator fundamental para
novos conhecimentos, capazes de co-
laborar na formação de cidadãos mais
reflexão, assume papel o cidadão alcançar melhores chances
no atual mercado de profissões, que
conscientes.
Os fundamentos convergentes
primordial na tarefa de se apresenta altamente competitivo,
é relevante a reflexão do papel da mí-
para uma política de responsabilida-
de social, que são encontrados tanto
proporcionar um dia na sociedade. Tenha visto que, ela,
mídia corporativa e oligopolista, for-
no campo da Comunicação quanto no
campo da Educação, constituem-se
espaço favorável a estes ma opiniões, costumes, crenças, bem
como legitima padrões, valores e ide-
nos termos legais da Carta Magna de
1988, na LDB de 1996; assim como no
questionamentos. Isto ologias, fato que merece uma atenção
especial do campo da Educação.
Decreto 4901/2003 sobre o Sistema
Brasileiro de TV Digital Terrestre. Essa
se dá através do que se Nessa direção, apropriar-se das
mídias como recurso pedagógico na
aproximação entre educação escolar
e comunicação social se faz presente
denomina uma ‘Educação escola, passa, necessariamente, pela
ampliação da consciência de todos os
também nas diretrizes da Confecom
de 2009, com propostas nessa direção,
para a Mídia’, que envolvidos no processo, especialmen-
te porque as informações, disponíveis
no entanto, ainda incipientes.
Observa-se que, sobre a digitaliza-
discute a mídia, nos meios de comunicação, fazem
parte do processo de construção dos
ção, os objetivos primeiros do Decreto
4901/2003 do SBTVDT remetem a: I -
especialmente conhecimentos dos cidadãos. Sendo
assim, contemplar, em especial, a
promover a inclusão social, a diversida-
de cultural do país por meio do acesso
a televisão, programação televisiva nos planos de
estudos e propostas educativas das
à tecnologia digital, visando à demo-
cratização da informação; e II - propi-
contribuindo no processo escolas, requer algumas reflexões por
parte dos docentes. Estas apontariam
ciar a criação de rede universal de edu-
cação à distância. E, no seu Artigo 3,
ensino-aprendizagem” para uma viabilidade dos processos
de ensino e aprendizagem positivos,
referente à abertura de novos canais, na dimensão de uma proposta de
contempla o “Canal de Educação: para Considerando as políticas citadas “Educação para a Mídia”, pois, com
transmissão, destinado ao desenvolvi- os constantes avanços tecnológicos,
trizes para a transição do sistema de transmissão
mento e aprimoramento, entre outros, analógica para o sistema de transmissão digital experimentamos um processo de mu-
do ensino à distância de alunos e capa- do serviço de radiodifusão de sons e imagens e dança de tal ordem de grandeza, que
citação de professores.” do serviço de retransmissão de televisão, e dá noções tradicionais, sobre o papel e
outras providências. Disponível em: <https://
 BRASIL. Presidência da República. Decreto www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004- os modelos da educação, precisam
nº 5.820, de 29 de junho de 2006. Dispõe so- 2006/2006/Decreto/D5820.htm>. Acesso �����������
em: ser fortemente questionadas.
bre a implantação do SBTVD-T, estabelece dire- 30 out. 2009.

SÃO LEOPOLDO, 06 DE JULHO DE 2010 | EDIÇÃO 336 31


Destaques On-Line
Essa editoria veicula entrevistas que foram destaques nas Notícias do Dia do sítio do IHU.
Apresentamos um resumo delas, que podem ser conferidas, na íntegra, na data correspondente.

Entrevistas especiais feitas pela IHU On-Line e disponíveis Confira nas Notícias do Dia de 02-07-2010
nas Notícias do Dia do sítio do IHU (www.ihu.unisinos.br) de Disponível no link http://migre.me/TNXG
29-6-2010 a 05-7-2010. O pesquisador analisa a cultura hegemônica do país e o perfil
do voto do povo brasileiro e, ainda, reflete sobre as alianças
Qual o limite da propriedade da terra? que estão sendo feitas pelos dois principais candidatos, Serra
Entrevista com Gilberto Portes, secretário executivo do e Dilma, para as eleições de 2010.
Fórum Nacional pela Reforma Agrária e Justiça no Campo
Confira nas Notícias do Dia de 29-06-2010 Entendendo o vazamento de petróleo nos EUA
Disponível no link http://migre.me/TNR7 Entrevista com Gerson Fauth, geólogo, professor
Em setembro deste ano, será realizado o Plebiscito Popular da Unisinos
pelo limite da terra que visa pressionar o Congresso Nacional Confira nas Notícias do Dia de 03-07-2010
para limitar o tamanho máximo da propriedade e uso dela Disponível no link http://migre.me/UHPi
por estrangeiros. Além disso, a revisão dos índices de produ- As informações que chegam à população são de que pelo
tividade é importante para a efetiva realização da Reforma menos cinco mil litros de óleo vazam diariamente do “buraco”
Agrária no país. do poço de petróleo que sofreu acidente no Golfo do México.
Este volume é cinco vezes maior do que o estimado quando a
O Bullying começa em casa plataforma que extraia óleo deste poço afundou.
Entrevista com Ana Beatriz Barbosa Silva, psiquiatra
Confira nas Notícias do Dia de 30-06-2010 Teologia Pluralista e Teologia da Revelação
Disponível no link http://migre.me/TNTl Entrevista com Faustino Teixeira, teólogo, professor da Uni-
No livro Bullying - mentes perigosas nas escolas (Rio de Ja- versidade Federal de Juiz de Fora (UFJF)
neiro: Editora Fontanar, 2010), a médica analisa o perfil dos Confira nas Notícias do Dia de 04-07-2010
agressores que cometem Bullying. Mas não é apenas no am- Disponível no link http://migre.me/UHVv
biente escolar que o agressor pode ser reconhecido: no ambi- A teologia do pluralismo e do diálogo inter-religioso e a in-
ente doméstico, mantém atitudes desafiadoras e agressivas. fluência da teologia latino-americana para a construção da paz
mundial são debatidos pelo teólogo. De acorco com ele, “não
Estudo de Baixo Carbono Brasil: uma reciclagem do discurso há meio termo nessa luta essencial: ou formamos essa nova
dos velhos atores aliança global para cuidar de nosso planeta e lutar contra a dor
Entrevista com Lúcia Ortiz e Camila Moreno, ambientalistas dos humanos ou arriscamos nossa própria destruição”.
do Núcleo Amigos da Terra Brasil
Confira nas Notícias do Dia de 01-07-2010 Pecuária e vegetarianismo no RS
Disponível no link http://migre.me/TNVS Entrevista com Valério de Patta Pillar, ecólogo, e Eliane Car-
Lançado recentemente, o Estudo de Baixo Carbono Brasil, manin Lima, psicóloga
trata do uso de solo para agropecuária e florestas. A pesqui- Confira nas Notícias do Dia de 05-07-2010
sa fez o cálculo do investimento e custos totais por tonelada Disponível no link http://migre.me/UHYm
de carbono que pode ser evitado com a intensificação do uso Campanhas como a “Segunda-feira sem carne” têm se
de pastagens pela pecuária bovina e pelo restauro florestal propagado e gerado muitas discussões em torno da pecuária
necessário para eliminar o passivo de reserva legal. no mundo. O metano, gás liberado principalmente pelo gado,
é um dos principais causadores do fenômeno do aqueci-
O voto do brasileiro: uma análise da cartografia eleitoral mento global, e a diminuição do consumo da carne, segundo
Entrevista com Cesar Romero Jacob, cientista político e his- alguns especialistas, traria muitos benefícios para o meio am-
toriador biente.

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SÃO LEOPOLDO, 06 DE JULHO DE 2010 | EDIÇÃO 336 33
Eventos
“Religiões do Mundo”: a ética mundial
ao alcance de todos
Em 2010, o Escritório da Fundação Ética Mundial no Brasil, no IHU, em parceria com o Centro de Pesquisa
e Apoio aos Trabalhadores – CEPAT, do Paraná, e o Centro Burnier Fé e Justiça, do Mato Grosso, realizou
novas edições do programa “Religiões do Mundo”

Por Moisés Sbardelotto | Imagens Daniel Fagundes

Neste primeiro semestre de 2010, o zadores, a composição do público foi di- Bodisatva do Paraná (Budismo); Profª.
Escritório da Fundação Ética Mundial no versificada, com a participação de mui- Ms. Marcilene Garcia de Souza (Religi-
Brasil, no Instituto Humanitas Unisinos tos estudantes de filosofia e teologia. ões Tribais); e Prof. Ms Rodrigo Wolff
– IHU, levou o debate sobre as “Religiões “Conhecer minimamente elementos de Apolloni (Religiões Chinesas).
do Mundo” para outras regiões do país. outras religiões que não a sua foi a mo- Além dos vídeos, também foi mon-
Em parceria com o Centro de Pesquisa tivação que levou a maioria das pessoas tada a exposição “Religiões do Mundo”,
e Apoio aos Trabalhadores – CEPAT, do a participar do evento”, afirmou César composta por 15 banners que resumem,
Paraná, e o Centro Burnier Fé e Justiça, Sanson, membro da equipe de organiza- de forma didática e atrativa, os conte-
de Mato Grosso, foram realizados encon- ção do CEPAT. údos dos vídeos. Os painéis foram ex-
tros e debates a partir da série de do- Para ele, pôde-se perceber três si- postos no saguão de acesso ao auditório
cumentários apresentados pelo teólogo tuações ao longo dos encontros. “A da PUC-PR, e, nos intervalos, o públi-
suíço-alemão Hans Küng, presidente da primeira delas é o profundo desconhe- co aproveitava para ver a exposição e
Fundação Ética Mundial. cimento sobre os princípios, caracterís- também fazer anotações de seu conte-
O projeto “Religiões do Mundo” ticas e elementos da história das reli- údo. Grande parte do público, poste-
contempla as três maiores correntes giões. Muitas das perguntas elaboradas riormente, entrou em contato com o
religiosas presentes no Planeta: as re- para os assessores nos debates mani- Escritório da Fundação Ética Mundial
ligiões da sabedoria de origem chinesa festavam interesse por curiosidades e no Brasil para adquirir cópias dos docu-
(Confucionismo e Taoísmo), as religi- aspectos específicos das religiões”, co- mentários, valorizando a qualidade e a
ões da mística de origem indiana (Hin- mentou. Além disso, ficou clara a exis- clareza pedagógica do material.
duísmo e Budismo) e as religiões da tência de uma “cultura da intolerância Já no Mato Grosso, os encontros es-
profecia de origem no Oriente Médio religiosa”, mesmo que minoritária. tão sendo realizados desde o dia 06 de
(Judaísmo, Cristianismo e Islamismo), “Em alguns debates, intervenções mais maio, com encerramento no próximo
além das Religiões Tribais africanas e duras exprimiram a falta de tolerân- dia 08 de julho, organizados pelo Cen-
australianas. Os documentários foram cia para com outros grupos religiosos. tro Burnier Fé e Justiça, em Cuiabá.
gravados nas grandes capitais religio- Várias vezes, o debate ficou acalorado Todas as noites de quinta-feira, um
sas do mundo. A partir dos vídeos, entre posições um pouco mais extre- grupo de pessoas interessadas tem se
especialistas convidados ajudaram a madas”, disse. Mas, principalmente, reunido para conhecer um pouco mais
refletir sobre a ética comum, presente viu-se também “uma profunda abertu- sobre como o ser humano busca o di-
em todas as religiões. ra às outras religiões, uma grande von- vino em diversos pontos do planeta. O
Em Curitiba, a realização do ciclo tade de conhecê-las e entendê-las”. videofórum tem o apoio do Conselho
“Religiões do Mundo” superou as ex- Os palestrantes convidados foram o Nacional de Igrejas Cristãs no Brasil,
pectativas de público. Os encontros Prof. Ms. Ignacio Dotto Neto (Judaís- no Mato Grosso (Conic-MT), o Centro
ocorreram entre os dias 10 de abril e 29 mo); Prof. Dr. Jamil Skandar, da PUC- de Estudos Bíblicos, em Mato Grosso
de maio, na Pontifícia Universidade Ca- PR, e Gamal Oumairi, do Instituto Bra- (CEBI-MT), além dos movimentos Cír-
tólica do Paraná – PUC-PR, com o apoio sileiro de Estudos Islâmicos do Paraná culo da Paz e Um Grito pela Paz.
da Pastoral da Universidade. A exibição (Islamismo); Prof. Dr. Cesar Kuzma, da Em Cuiabá, também há uma novida-
dos documentários esteve praticamente PUC-PR (Cristianismo); Prof. Dr. Pe. de: além dos sete documentários da sé-
com lotação esgotada em todas as sete Joachim Andrade, da Faculdade Vicen- rie “Religiões do Mundo”, os organizado-
sessões, atraindo mais de 250 pessoas tina do Paraná (Hinduísmo); Milton Eiti res incluíram outros dois documentários
em cada encontro. Segundo os organi- Sato, do Centro de Estudos Budistas sobre as religiões afro-brasileiras e as

34 SÃO LEOPOLDO, 06 DE JULHO DE 2010 | EDIÇÃO 336


religiões indígenas do Mato Grosso. do” foi organizado pela primeira
Mais de 300 pessoas já participaram vez entre agosto e outubro de
do evento ecumênico, que ocorre no 2009, tendo reunido líderes reli-
Colégio Isaac Newton (CIN). giosos que comentaram os docu-
Para o padre João Inácio Wen- mentários apresentados por Hans
zel, coordenador do Centro Bur- Küng no IHU, em São Leopoldo, e
nier Fé e Justiça, “a realização na Casa de Cultura Mário Quinta-
deste videofórum ajuda a estender na, em Porto Alegre. Além da exi-
as fronteiras do diálogo religioso e bição dos vídeos, foram também
cultural para além de nossas fron- organizados dois momentos gas-
teiras. Aproxima pessoas, abre os tronômicos no Bistrô da Gastrono-
olhos para ver o que não se via e mia, no campus da Unisinos, em
os ouvidos para escutar outras me- parceria com o curso de Gastrono-
lodias que trazem tons de alegria mia. Neles, os participantes pude-
e de paz”. Para ele, “o sentido da ram degustar pratos e belisquetes
vida aparece como pano de fundo relacionados às tradições religio-
em todos os documentários”. Wen- sas apresentadas.
zel destaca ainda que “a janela da Como indica César Sanson, do
contribuição em processos de paz CEPAT, o programa “Religiões do
é o enfoque dos documentários, e Mundo” permite compreender
a contribuição que podemos dar “que as religiões são decisivas
neste processo tem orientado os para a construção da paz entre as
debates”. nações que são portadoras de pa-
As sessões começaram com o drões éticos universais. Para que
documentário sobre Judaísmo, no isso de fato possa acontecer, um
dia 6 de maio. O convidado foi o primeiro passo necessário é co-
médico cirurgião judeu Jairo Lew. O nhecer as religiões – caminho para
padre espanhol José Cobo, mestre o início do diálogo”.
em Teologia, comentou o vídeo so- O Escritório da Fundação Ética
bre Cristianismo. O encontro sobre Mundial também já foi contatado
Islamismo contou com a presença do pelo Centro Loyola de Fé e Cultu-
xeique egípcio Amer Hikal, líder isla- ra da PUC-Rio e pelas instituições
mita no Mato Grosso, e do cirurgião maçônicas Grande Oriente do Bra-
dentista muçulmano Omar Hussein sil – Paraná, Grande Oriente do Pa-
Hallak. As Religiões Chinesas foram raná e Grande Loja do Paraná para
comentadas pelo teólogo Luiz Au- organizar os encontros “Religiões
gusto Passos, professor da Universi- do Mundo” em suas sedes, na se-
dade Federal de Mato Grosso – UFMT. gunda metade deste ano.
Ivan Deus Ribas, da Associação Medi-
tar de Cuiabá, participou do debate As Religiões do Mundo
sobre Budismo. Já a Dra. Darcy Go- e a Ética Mundial
mes Neto, professora aposentada da
UFMT, falou sobre o Hinduísmo. As Para Hans Küng, existem traços
Religiões Tribais foram comentadas comuns na ética de várias religiões
pelo pastor Teobaldo Witter, históri- e na filosofia. Um exemplo dessa
co militante pelos direitos humanos constante nas religiões é a chama-
no Mato Grosso. Edézio Lima Fer- da “regra de ouro”, que perpassa
nandes, do Movimento Negro, abor- os fundamentos das grandes tra-
dou as Religiões Afro-Brasileiras. E dições religiosas mundiais. Essa
na próxima quinta-feira, dia 08, a ideia está fundamentada na obra
mestre Darlene Yaminalo Taukane do teólogo “Projeto de ética mun-
comentará o documentário sobre as dial” (Paulinas, 2001), em que se
Religiões Indígenas do Mato Grosso. desenvolve, de maneira programá-
tica, a ideia de que as religiões do
Novas edições mundo só podem contribuir com
a paz da humanidade se tiverem
O programa “Religiões do Mun- presente o que já lhes é comum
no âmbito da ética: se chegarem a

SÃO LEOPOLDO, 06 DE JULHO DE 2010 | EDIÇÃO 336 35


Na página anterior,
imagens do evento
Religiões do Mundo,
em Curitiba-PR. Ao
lado, fotos do evento
em Cuiabá-MT

um consenso básico com relação a por pessoas religiosas e não-reli-


valores obrigatórios subsistentes, giosas.
parâmetros inamovíveis e atitudes
pessoais básicas. Subsídios didáticos
Em 1993, em Chicago, o Parla-
mento das Religiões Mundiais assi- Ao rastrear as pegadas e as
nou a “Declaração de ética mun- marcas das religiões mundiais
dial”, elaborada pelo teólogo, em seus quatro milênios de his-
mediante um processo inter-reli- tória, o projeto “Religiões do
gioso de consultas. Desde então, Mundo” nos ajuda a compreen-
essa declaração é o documento der, por meio dos sete vídeos e
fundamental para o desenvolvi- dos 15 painéis didáticos, a fé dos
mento dessa concepção da ética diversos povos do mundo, para a
mundial. Por meio da declaração, construção de uma ética comum
representantes de todas as religi- em busca da paz. Além desses
ões alcançaram um acordo sobre materiais, o site do IHU contém
princípios para uma ética global diversos materiais referentes ao
e se comprometeram com quatro diálogo inter-religioso e à Ética
diretrizes irrevogáveis, que se Mundial, seja nas Notícias Di-
concretizam através de: árias, nas edições das revistas
- Compromisso com uma cultura IHU On-Line ou em suas demais
da não-violência e do respeito à publicações, todas disponíveis
vida gratuitamente on-line.
- Compromisso com uma cultura O Escritório da Fundação Ética
da solidariedade e uma ordem Mundial no Brasil disponibiliza esse
econômica justa material para o público interessa-
- Compromisso com uma cultura do, colaborando com a formação
da tolerância e uma vida de au- cultural e religiosa. Ao longo de
tenticidade 2010, dezenas de pessoas de todo
- Compromisso com uma cultu- o Brasil entraram em contato com
ra da igualdade de direitos e do o Escritório para solicitar suas có-
companheirismo entre homens e pias, que poderão, assim, ser usa-
mulheres. das em eventos religiosos, salas
O projeto de ética mundial de aula e também como opção de
apoia-se, por isso, em quatro con- material de formação para grupos
vicções básicas: não há paz entre e movimentos em geral.
as nações, sem paz entre as religi- Os materiais podem ser utiliza-
ões; não há paz entre as religiões, dos como opção didática no estudo
sem diálogo entre as religiões; das grandes tradições religiosas do
não há diálogo entre as religiões, mundo. Para os interessados que
sem padrões éticos globais; não desejam solicitar o empréstimo ou
há chance de sobrevivência para a cópia dos subsídios, basta entrar
nosso planeta, sem uma ética glo- em contato pelo e-mail <etica-
bal, uma ética mundial, apoiada mundial@unisinos.br>.

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Cadastro de Pós-Graduados
A Comissão para a Doutrina da versas de conhecimento. Esse cadas- ou assessores, segundo a necessida-
Fé da Conferência Nacional dos Bis- tro possibilitará melhor visibilidade e de de quem procura. É possível, por
pos do Brasil - CNBB, está estimula- aproveitamento dos estudos de cada exemplo, localizar:
no o cadastro de pessoas pós gradu- um e, consequentemente, um me- * Todos os cadastrados que pos-
adas, especialmente entre o clero, lhor serviço à Igreja. suem doutorado em uma determina-
religiosos e profissionais vinculados É importante que essa iniciativa da área de conhecimento.
à Instituições Eclesiásticas. As in- seja amplamente divulgada entre o * Quem possui mestrado, numa
formações são de Wilson Angotti, clero, nos seminários, nas universi- Diocese ou Regional específicos.
padre, assessor da Comissão para a dades e em outras instituições de * Quais são os professores que
Doutrina da Fé. A notícia foi publi- ensino ligadas à Igreja a fim de que lecionam esta ou aquela matéria, no
cada originalmente nas Notícias do se realize o cadastro dos clérigos Estado.
Dia 06-07-2010, no site do Instituto que possuam especialização, mes- * Ou fazer uma pesquisa por no-
Humanitas Unisinos – IHU, disponível trado ou doutorado e também de mes ou dioceses.
em http://migre.me/UImB. Eis as religiosos e leigos, nestas mesmas * Pesquisas podem ser realizadas
informações. condições, que atuam em institui- gratuita e livremente por qualquer
ções de ensino da Igreja. pessoa, independentemente de ser
O porquê do cadastro ou não cadastrada.
de pós-graduados Utilidade desse registro: * Aos cadastrados, conservan-
do-se a senha utilizada é possível,
A Comissão Episcopal para a Dou- Esse sistema nos oferece facili- posteriormente, corrigir, completar,
trina da Fé, da Conferência Nacional dade de acesso a informações sobre atualizar e consultar os dados regis-
dos Bispos do Brasil (CNBB), pretende as pessoas e suas áreas de conhe- trados.
com esse serviço oferecer um banco cimento e também identificar as * O acesso é feito pelo site da
de dados, dinâmico e atualizável, áreas em que mais faltam pessoas CNBB, através da página da Comis-
sobre pessoas ligadas à Igreja que preparadas. Facilita a identificação são para a Doutrina da Fé ou pelo
tenham pós-graduação em áreas di- e localização de professores, peritos link http://migre.me/UN3U.

Seminário Jogue Roayvu: História


e Histórias dos Guarani
Data de início: 12/08/2010 Data de término: 14/10/2010
informações em www.ihu.unisinos.br

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IHU Repórter

Simone Blume
Por Márcia Junges e Patricia Fachin | Fotos Arquivo Pessoal

S
ecretária da Reitoria, Simone Blume é funcionária da Unisinos pela se-
gunda vez. Formada em Relações Públicas, ela planeja retomar os es-
tudos com um MBA em Gestão de Projetos. Mãe do casal João Paulo, 9
anos, e Mariana, 8, ela revela que investe seu tempo com eles, brincan-
do, lendo, preparando lanches gostosos e ensinando-lhes o quanto é bom
e bonito viver em harmonia com as pessoas. O suporte oferecido pelos pais de
Simone é fundamental para que ela consiga criar a dupla sem a presença do pai,
com a cara e a coragem de uma mulher que sabe o valor da sinceridade e de dizer
o sente em seu coração. Confira.

Origens – Nasci em São Leopoldo, e depois fui chamada por uma petro- A maternidade é uma nova fase da
em 14 de setembro de 1969. Aqui cres- química para atuar como RP. Lá foram minha vida. Eu nunca me imaginava
ci e estudei. Meus pais, Armando e Loi- mais quatro anos de trabalho com res- mãe, achava que não tinha perfil para
va. Eles são o meu tesouro. Tenho uma ponsabilidade social, uma veia que isso. Vivo uma maternidade mais rea-
irmã um pouco mais jovem do que eu, descobri e que me encantou. A seguir, lista, que não está só dentro de casa.
a Fátima. Hoje ela vive em São Paulo. a Unisinos chamou-me novamente. Nesse sentido, meus filhos são muito
companheiros meus. Discutimos bas-
Relações Públicas - Cursei Rela- Funcionária da Unisinos - Come- tante, “de igual para igual” como não
ções Públicas na Unisinos. É bem o cei a trabalhar na Unisinos em 1987, poderia ser diferente, são muito críti-
meu perfil, pois gosto muito da comu- e fiquei até final de 1996, também na cos. Como eles não têm mais o pai por
nicação e interagir com as pessoas. reitoria. Saí e voltei após 14 anos. No perto, pois ele voltou para o Peru, sou
Concluí meu pós em Administração de dia 17 de junho de 2010 completou um a grande referência deles. Fazemos
Recursos Humanos também na mesma ano do meu regresso à Universidade, uma avaliação semanal de como foi
instituição. Apesar de ser secretária como funcionária. Atuei por dez meses nosso comportamento, e nós três dize-
por muitos anos, meu “lado RP” fala no doutorado e mestrado na área 4, mos o que foi bom e o que não foi tão
mais alto. Penso em fazer um MBA em no Direito. Depois, fui transferida para bom. Meu filho andava muito rebelde,
Gestão de Projetos. a recepção da Reitoria. Nessa função e aí me questionei o que poderia estar
atual, estou conhecendo muita gente, acontecendo. É que as crianças são o
Experiência no exterior - Em 1997 algo instigante. reflexo dos pais... Eles perguntavam
casei-me e fui morar no Peru. Lá vivi por que eu estava sempre braba, cor-
por quatro anos. Voltei em outubro de Filhos - Tenho um casal de filhos, rendo, porque não ficava mais com
2000, quando nasceu meu filho João o João Paulo, de 9 anos, e a Mariana, eles. Por isso, tentei compreender o
Paulo. Meu ex-marido é peruano, por de 8. Eles são a coisa mais divina da que estava havendo. Quando me dei
isso larguei tudo e fui para o país dele. minha vida. Moramos juntos, próximos conta que eles sentiam falta de mim
Lá trabalhei e tive oportunidade de aos meus pais. Se não fosse minha fa- porque eu trabalhava muito tempo
estudar também, foi uma experiência mília eu não teria como trabalhar e fora, à noite, viajando por semanas,
enriquecedora cultural e pessoalmen- cuidar de duas crianças. Meio turno e quando em casa, não dava a atenção
te. As manias que se tem e as tolerân- eles ficam com os avós, e no outro, que eles mereciam, resolvi mudar de
cias que não se tem, são totalmente vão para a escola. À noite e nos finais trabalho e horário.
colocadas em xeque numa situação de semana, é tudo comigo. Ambos par-
dessas. Quando voltei para o Brasil, ticipam de um grupo de escoteiros, e Orgulho de mãe - Há alguns dias
trabalhei em duas grandes indústrias adoram essa atividade. fui pegar o boletim deles, da escola, e

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Valores – Não faço aos outros
aquilo não quero que façam para
mim. Isso é algo que sempre passo
para meus filhos. Além disso, não
podemos ter medo de demonstrar
para as pessoas o que sentimos
por elas. Depois, por algum mo-
tivo, essas pessoas nos deixam e
perdemos a chance de dizer a ela
aquilo que gostaríamos. Digo isso
a eles a toda hora: é preciso dar
muito abraço, muito beijo no Vô
e na Vó,nas pessoas que amamos
e que são importantes para nós,
sem medo de parecer brega.

Atividade física – Raramente


Simone com os filhos no Zoológico faço atividade física. Sorte que
sou magra. No verão, mais por fins
a professora disse, feliz, que deles Religião – Sou católica de for- de socialização, faço hidroginásti-
só se podiam falar coisas boas. O mação. Acredito em Deus, e reza- ca. Mas o que gosto mesmo é de
João, disse ela, é muito compene- mos coletivamente em casa. Pen- andar de pés descalços, na terra.
trado. A Mariana vai pelo mesmo so que devemos agradecer pela
caminho. São preocupados com a nossa vida. Minha espiritualidade Cozinha - Não gosto de cozi-
qualidade do que estão fazendo. não exige que eu esteja dentro de nhar, mas meus filhos adoram o
Eles tiveram que aprender por uma igreja, mas traz à tona a luz que eu preparo. Aos domingos,
eles mesmos, na época em que que existe dentro de mim. Certa- é o dia que cozinho o que eles
eu trabalhava na petroquímica mente estamos na Terra com um gostam: massas e lasanha. Nor-
e ficava pouco com eles. O João propósito, e precisamos ter a hu- malmente, cozinho pouco. Curto
adora ler, e já “devorou” toda a mildade de aprender e pedir des- mesmo é fazer pães de queijo,
coleção do Harry Potter. A Mariana culpas. Procuro falar para meus fi- bolo, pastéis e docinhos.
ainda não gosta tanto de leitura, lhos que todos somos espíritos de
pois não tem muita paciência. luz e que estamos nesta vida para Unisinos – Gosto mais da Unisi-
brilhar e sermos felizes. nos agora. A universidade está mais
Lazer – Quando não estamos dinâmica, mais profissional, como
num parque, ao ar livre, andando Sonhos – Já realizei muitos as empresas. Hoje há outra dinâ-
de bicicleta, estamos em casa, brin- dos meus sonhos,a maternidade mica em relação ao passado. Antes,
cando e fazendo bagunça,cinema foi algo que não tinha sonhado, havia um perfil mais paternalista,
é outra pedida. Gosto de uma boa e que realizei. Agora, sonho que que também era gostoso, mas que
leitura antes de dormir. Sou bem eles sejam felizes, que encon- nos fazia acomodarmos. Hoje, há
dorminhoca. Felizmente, meus fi- trem o caminho deles. Não se um constante estímulo ao cresci-
lhos também tiram boas sonecas trata de bens materiais, viagens, mento, à busca, à qualificação.
comigo. Aos domingos, curtimos mas algo bem superior. Minha
todos juntos, com meus pais. Pas- missão na Terra, agora, é guiá-los IHU – Eu sempre “roubava” a
samos muito tempo reunidos, dei- para que eles atinjam a felicida- revista do IHU, que acho interes-
tados no sofá, vendo TV e jogando de, tendo amor por eles próprios santíssima. Ali há ideias muito ins-
videogame. O João e a Mariana fi- e os demais, por que acredito tigantes, e o Instituto inteiro vai
cam loucos comigo porque eu não que no momento que somos fe- nessa linha. O IHU faz pensar que
sei jogar aqueles jogos. “Mãe, tu lizes, seremos profissionais com- as verdades não são apenas aquilo
só perdes!”, eles me dizem... E ca- petentes, enfim, pessoas do bem que os outros nos dizem. Nós po-
ímos na risada. que só querem o bem. demos ajudar a construí-las.

www.ihu.unisinos.br
Destaques
Erwin Kräutler na Unisinos
A Amazônia estará em debate nos dias 5 e 6 de agosto, na Unisinos. A construção
da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, seus impactos socioambientais, os desafios
dos projetos de desenvolvimento sobre a vida e a cultura das populações indíge-
nas e a presença e atuação da Igreja na região na Amazônia são temas a serem
discutidos por D. Erwin Kräutler, bispo do Xingu e presidente do Conselho In-
digenista Missionário – CIMI. O evento é uma promoção do Instituto Humanitas
Unisinos – IHU e será realizado na Sala Ignacio Ellacuría e companheiros e no
Teatro Municipal de São Leopoldo. Para saber mais acesse http://migre.me/
UKN8

Ciclo de Filmes debate políticas de identidade


e saúde mental
O Ciclo de Filmes e Debates - Subjetividade e Normalização: Discutindo
políticas de identidade e saúde mental na sociedade contemporânea
será um pré-evento ao XI Simpósio Internacional IHU: O (des)governo bi-
opolítico da vida humana. O ciclo se realiza de 17-08 a 09-09 e tem como
objetivo discutir as estruturas de sentimento que emergem nas experiências
dos atores sociais contemporâneos. No primeiro encontro, dia 17 de agosto,
será exibido o filme Minha vida em cor de rosa (da Bélgica), com debate
posterior conduzido pela Profa. MS Claúdia Weyne Cruz, da Escola de Saúde
Pública de Porto Alegre. Mais informações em http://migre.me/UKLw

A história dos Guarani em debate


No próximo dia 12 de agosto inicia o Seminário Jogue Roayvu: História e Histórias dos Guarani. Trata-
se de um pré-evento do XII Simpósio Internacional IHU: A Experiência Missioneira: território, cultura e
identidade. Este seminário busca apresentar uma síntese sobre a história dos Guarani no sul do Brasil, a
partir de múltiplas abordagens, tais como a arqueologia, a etnohistória e a etnografia. Além de filmes, as
conferências do seminário serão ministradas pela Profa. Dra. Maria Cristina Bohn Martins, Prof. Dr.Jairo
Rogge, Prof. Dr. Walmir Pereira, Prof. Dr. Pedro Ignácio Schmitz, pro-
fessores da Unisinos, Egon Heck, coordenador regional do Conselho
Indigenista Missionário (Cimi) do Mato Grosso do Sul – MS e por uma
liderança indígena guarani. Saiba mais em http://migre.me/UKMv

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