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AVALIAÇÃO DA

APRENDIZAGEM

autoras
ANDREA ROSIN
LETÍCIA FONSECA

1ª edição
SESES
rio de janeiro  2016
Conselho editorial  luis claudio dallier, roberto paes e paola gil de almeida

Autoras do original  andrea rosin e letícia fonseca

Projeto editorial  roberto paes

Coordenação de produção  paola gil de almeida, paula r. de a. machado e aline


karina rabello

Projeto gráfico  paulo vitor bastos

Diagramação  bfs media

Revisão linguística  bfs media

Revisão de conteúdo  lucia helena porto

Imagem de capa  fabiobalbi | shutterstock.com

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida
por quaisquer meios (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em
qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Editora. Copyright seses, 2016.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (cip)

R821a Rosin, Andrea


Avaliação da aprendizagem./Andrea Rosin; Letícia Fonseca.
Rio de Janeiro: SESES, 2016.
128 p: il.

isbn: 978-85-5548-349-3

1. Avaliação. 2. Aprendizagem. 3. Pedagogia. I. Fonseca, Letícia. II. SESES.


III. Estácio.
cdd 371

Diretoria de Ensino — Fábrica de Conhecimento


Rua do Bispo, 83, bloco F, Campus João Uchôa
Rio Comprido — Rio de Janeiro — rj — cep 20261-063
Sumário

Prefácio 5

1. Histórico e conceitos de avaliação 7


1.1  Avaliação: compreendendo os contextos das práticas avaliativas 8
1.1.1  A relevância da avaliação para o processo educativo 9
1.2  História da avaliação na sociedade moderna 18
1.3  Avaliação da aprendizagem e o sistema de avaliação no Brasil 21

2. As políticas de avaliação da educação básica 41

2.1  Sistema de Avaliação Educação Básica 42


2.1.1  Fatores determinantes para a adoção das políticas de avaliação
da educação básica em nosso país 42
2.2  Avaliação no Ensino Superior 46

3. As dimensões da avaliação 59

3.1  Ensino e aprendizagem: As dimensões/funções da avaliação no


contexto das tendências pedagógicas na sociedade moderna 60
3.1.1  Avaliação da aprendizagem no contexto da progressão
continuada 68
3.2  Dimensões da avaliação: instrumentos e estratégias da avaliação
da aprendizagem. 72
4. A produção do fracasso escolar na sociedade
moderna 87

4.1  Diferentes compreensões da noção de erro na educação brasileira 88


4.2  O erro pode ser compreendido como forma de inclusão ou
exclusão do aluno no/do processo de ensino e aprendizagem 99

5. A avaliação e as práticas cotidianas escolares 103

5.1  Planejamento e avaliação: ações relacionadas na prática docente 104


5.2  A avaliação precisa ser planejada 111
5.3  A avaliação do processo ensino-aprendizagem 117
5.4  Reflexões sobre a avaliação 118
Prefácio
Prezados(as) alunos(as),

Neste livro convidamos você para uma conversa sobre os conceitos, ideias e
perspectivas acerca da temática avaliativa. Assim, iremos dialogar sobre a ava-
liação, dentro de um panorama histórico, contemplando criticamente as práti-
cas avaliativas em nosso cotidiano, vislumbrando a compreensão da avaliação
para aprendizagem.
No capítulo 1, buscaremos compreender sobre os desafios a serem enfren-
tados pelas práticas pedagógicas nas Instituições de Ensino, principalmente
ao que se refere à avaliação da aprendizagem e ao sistema de avaliação adotado
pelo Estado brasileiro. No capítulo 2, apresentaremos alguns aspectos relativos
ao conceito de avaliação no contexto das políticas avaliativas da Educação Bási-
ca, abordando perspectivas de avaliação institucional e de avaliação da apren-
dizagem em nosso país.
No capítulo 3, iremos dialogar sobre as concepções de aprendizagem, os
objetivos de ensino e a proposta das tendências pedagógicas na sociedade mo-
derna que envolvem a prática avaliativa atual.
No capítulo 4 iremos analisar a historicidade do erro em nossa cultura e a
problemática do erro no processo de ensino e aprendizagem entendendo tal
problemática sob a óptica de diferentes teorias da educação. Também iremos
dialogar sobre a compreensão da produção do fracasso escolar na sociedade
moderna e capitalista e refletir criticamente as teorias científicas sobre o fra-
casso escolar. Por fim, compreenderemos a Avaliação Nacional e do Programa
Internacional de Avaliação de Alunos (PISA) e faremos breves considerações.
No capítulo 5, compreenderemos as relações entre a avaliação e o planeja-
mento; a importância do referencial na avaliação e, por fim, discutiremos algu-
mas práticas de avaliação no contexto das práticas cotidianas escolares atuais.
Esperamos poder construir coletivamente o conhecimento sobre a avalia-
ção da aprendizagem e ampliarmos as discussões a partir desse material que
apresenta um conjunto de temáticas pertinentes.

Bons estudos!

5
1
Histórico e
conceitos de
avaliação
1.  Histórico e conceitos de avaliação
Neste capítulo iremos refletir sobre os conceitos da avaliação, dentro de um pa-
norama histórico, contemplando criticamente as práticas avaliativas em nosso
cotidiano. Além disso também buscaremos compreender sobre os processos
acerca dos desafios a serem enfrentados pelas práticas pedagógicas nas Ins-
tituições de Ensino, principalmente ao que se refere à avaliação da aprendiza-
gem e ao sistema de avaliação adotado pelo Estado brasileiro.

OBJETIVOS
Neste capítulo esperamos que você possa:
•  refletir criticamente sobre as práticas avaliativas em nosso cotidiano;
•  entender o processo histórico da avaliação;
•  analisar criticamente a história da avaliação na sociedade moderna;
•  refletir sobre a prática do planejamento e da avaliação em nosso cotidiano.

1.1  Avaliação: compreendendo os contextos das práticas avaliativas

Avaliação pode ser considerada, atualmente, um dos fatores mais relevantes


para a compreensão e a análise da educação, por constituir-se em um elemento
fundamental do ensino.
No entanto, vários são os elementos que contribuem para o estabelecimen-
to de uma compreensão efetiva e esclarecedora do processo avaliativo, conhe-
cimentos estes nem sempre disponíveis para os educadores brasileiros e de
fundamental importância para a consecução de qualquer proposta inovadora
de educação.
Neste sentido, a não compreensão ou até mesmo o desconhecimento das
teorias em avaliação podem comprometer significativamente as propostas de
mudanças almejadas pelo setor educacional contemporâneo, dificultando,
desta forma, as possibilidades de uma educação democrática e de um trabalho
profissional de qualidade.
Por isso, é preciso conhecer e analisar criticamente os principais mode-
los de avaliação presentes atualmente no cenário educacional brasileiro, bem
como os principais fatores associados à sua real concretização.

8• capítulo 1
Além disso, a avaliação está inserida no próprio cotidiano escolar, como
uma forma de subsidiar o planejamento educacional realizado pelo professor
durante o ano letivo, ou seja, faz parte do processo educativo como um todo,
contribuindo, desta forma, para a efetividade da proposta pedagógica da escola.
Com o objetivo de contextualizar as afirmações citadas, apresentamos di-
versos elementos que poderão auxiliar o(a) aluno(a) a compreender a avaliação
como um instrumento de auxílio ao desenvolvimento da prática pedagógica do
profissional da educação, como um elemento essencial no processo educativo
e que pode contribuir ainda mais para o estabelecimento de uma práxis renova-
da e coerente com as necessidades sociais e educativas de nossos alunos.

1.1.1  A relevância da avaliação para o processo educativo

De acordo com Libâneo (1994), a avaliação é uma tarefa didática necessária e


permanente do trabalho docente, que deve acompanhar passo a passo o pro-
cesso de ensino-aprendizagem. Por meio dela, os resultados que vão sendo ob-
tidos no decorrer do trabalho conjunto do professor com os alunos são compa-
rados com os objetivos propostos, a fim de constatar progressos, dificuldades
e reorientar o trabalho para as correções necessárias. Assim, a avaliação não é
apenas o final de um processo, mas o início, o meio e também o fim de cada
momento do ensino. A avaliação é uma reflexão sobre o nível de qualidade do
trabalho escolar tanto do professor quanto dos alunos.
Fazendo referência direta aos estudos de Libâneo (1994), podemos dizer
que a avaliação configura-se numa tarefa complexa que não se resume à reali-
zação de provas e atribuição de notas. A mensuração apenas proporciona dados
que devem ser submetidos a uma apreciação qualitativa. A avaliação cumpre,
assim, funções didáticas de diagnóstico e controle, as quais recorrem a instru-
mentos de verificação do rendimento escolar.
Conforme Libâneo (1994), podemos definir avaliação escolar como um
comprovante do processo de ensino que visa, por meio da verificação e quali-
ficação dos resultados obtidos, determinar a correspondência destes com os
objetivos propostos e orientar a tomada de decisões em relação às atividades
didáticas conseguintes.
Nos diversos momentos do processo de ensino, têm-se as seguintes tarefas
da avaliação.

capítulo 1 •9
Coleta de dados sobre o aproveitamento dos alunos através
VERIFICAÇÃO de provas, exercícios e tarefas ou de meios auxiliares como
a observação do desempenho, entrevistas.

Comprovação dos resultados alcançados em relação aos


QUALIFICAÇÃO objetivos e atribuição de notas ou conceitos.

APRECIAÇÃO Avaliação propriamente dita dos resultados, referindo-se ao


QUALITATIVA padrão de desempenho esperado. (LIBÂNEO, 1994, p. 196)

A prática da avaliação em nossas escolas tem sido criticada, sobretudo, por


reduzir-se à sua função de controle, mediante a qual se faz uma classificação
dos alunos relativa às notas que obtiveram nas provas. Os professores não têm
conseguido usar os procedimentos de avaliação para atender à sua função edu-
cativa. (LIBÂNEO, 1994)
Alguns equívocos muito comuns quando se fala em avaliação em sala
de aula.
1. Tornar a avaliação unicamente um ato de aplicar provas, atribuir notas
e classificar os alunos. O professor reduz a avaliação à cobrança daquilo que o
aluno memorizou e usa a nota somente como instrumento de controle.
2. Usar a avaliação como uma forma de recompensa aos bons alunos e pu-
nição para os desinteressados e indisciplinados. As notas se transformam em
armas de intimidação e ameaça para uns e prêmios para outros.
3. Por confiar demais no seu “olho clínico”, o professor dispensa avalia-
ções parciais no decorrer das aulas.

O entendimento correto da avaliação consiste em considerar a relação mú-


tua entre aspectos quantitativos e qualitativos. A escola cumpre uma função
determinada socialmente, a de introduzir as crianças e os jovens no mundo da
cultura e do trabalho, e a avaliação deve prestar-se a mediar a busca deste obje-
tivo. (LIBÂNEO, 1994)
A avaliação escolar possui muitas e importantes características. Vamos pen-
sar em algumas delas.
A avaliação escolar é parte do processo de ensino-aprendizagem, e não uma
etapa isolada. Há uma exigência de que esteja concatenada com os objetivos,

10 • capítulo 1
os métodos e conteúdos expressos no plano de ensino e desenvolvidos no de-
correr das aulas. Um aspecto particularmente importante é a clareza dos obje-
tivos, pois os alunos precisam saber para que estão trabalhando e no que estão
sendo avaliados.
O levantamento das condições prévias dos alunos para iniciar nova maté-
ria, os indícios de progresso ou deficiências detectadas na construção de co-
nhecimentos, as verificações parciais e finais são elementos que possibilitam
a revisão do plano de ensino e o encaminhamento do trabalho docente para a
direção mais adequada.
Não apenas nas aulas, mas também nos contatos informais o professor vai
conhecendo dados sobre o desempenho, o aproveitamento escolar e o desen-
volvimento dos alunos. A avaliação ajuda a tornar mais claros os objetivos que
se quer atingir.
Todas as atividades avaliativas concorrem para o desenvolvimento intelec-
tual, social e moral dos alunos, e visam diagnosticar como a escola e o professor
estão contribuindo para isso.
O objetivo dos processos de ensino e de aprendizagem é que todos os alunos
desenvolvam suas capacidades físicas e intelectuais, seu pensamento indepen-
dente e criativo, tendo em vista o preparo para o exercício da cidadania.
Somos todos diferentes, e a avaliação deve considerar essas diferenças indi-
viduais, pensando em questões de desenvolvimento cognitivo, moral e afetivo.
A avaliação deve ter caráter objetivo, buscando comprovar os conhecimen-
tos construídos de acordo com os conteúdos e os objetivos trabalhados.
Constitui-se também como um termômetro dos esforços do professor.
Ao analisar os resultados do rendimento escolar dos alunos, o professor ob-
tém informações sobre o desenvolvimento do seu próprio trabalho.
Ao assumirmos que o ato de avaliar faz-se presente em todos os momentos
da vida humana, estamos admitindo que ele também esteja presente em todos
os momentos vividos em sala de aula. O dia a dia da sala de aula é um rico mo-
mento do cotidiano de cada uma das pessoas que ali se encontram. A avaliação
constitui-se, portanto, em uma dinâmica que orienta a prática. Como processo
de investigação permanente, todas as atividades devem ser discutidas, plane-
jadas, executadas e servir de impulso para novas realizações. O processo ava-
liativo percorre, como fio condutor e propulsor, cada um desses momentos de
interação professor/aluno e de conhecimentos a serem trabalhados no espa-
ço escolar.

capítulo 1 • 11
Na interação proporcionada pelas atividades pedagógicas, alunos e profes-
sores avaliam tudo e todos, permanentemente. São formulados juízos provisó-
rios que orientam a tomada de decisões e a definição das tarefas e atividades a
serem realizadas. É preciso ter consciência de que avaliar é uma ação constante
em toda a interação didática; o processo avaliativo é circulante em todo o espa-
ço escolar e na busca da construção do conhecimento.
É preciso manter sempre uma atitude avaliativa em sala de aula, estar per-
manentemente pensando sobre o desenvolvimento de nossos alunos e na bus-
ca por nossos objetivos.
A avaliação escolar é um meio e não um fim em si mesma; está delimitada
por uma determinada teoria e por uma determinada prática pedagógica. (No
capítulo 3 veremos sobre as formas e as funções da avaliação, complementan-
do nossa discussão.)
Ela não ocorre num vazio conceitual, mas está dimensionada por um mode-
lo teórico de sociedade, de homem, de educação e, consequentemente, de ensi-
no e de aprendizagem, expresso na teoria e na prática pedagógica. (CALDEIRA,
2005 apud CHUEIRI, 2008, p. 51)
Considerando, então, que a avaliação é delimitada por determinada teoria e
está delimitada por uma prática pedagógica, conheceremos alguns pressupos-
tos da avaliação escolar.
Em primeira instância, precisamos considerar que avaliar não é uma ativi-
dade neutra ou meramente técnica, ou seja, é dimensionada por um modelo
teórico de mundo, de ciência e de educação, traduzida em prática pedagógica.
Como segundo pressuposto da avaliação escolar, é importante considerar
que ela ocorre por meio da relação pedagógica que envolve intencionalidades
de ação, objetivadas em condutas, atitudes e habilidades dos atores envolvidos.
O professor, na condição de avaliador desse processo é responsável pela
atribuição de sentidos e significados à avaliação escolar, uma vez que “o profes-
sor interpreta e atribui sentidos e significados à avaliação escolar, produzindo
conhecimentos e representações a respeito da avaliação e acerca de seu papel
como avaliador, com base em suas próprias concepções, vivências e conheci-
mentos” (CHUIERI, 2008, p. 52).
Ao considerar a condição do professor enquanto avaliador, Chuieri (2008)
preocupa-se em investigar em que concepções pedagógicas subjazem à atual
prática de avaliação do processo de ensino-aprendizagem.

12 • capítulo 1
Para buscar a resposta, resgata o significado de avaliação nas concepções
pedagógicas dominantes no contexto escolar a partir dos séculos XVI e XVII,
pois é neste período que surge a prática dos exames escolares.
Num segundo momento, decorre a análise desses dados buscando res-
ponder em que medida tais concepções encontram-se presentes ainda hoje
nas práticas de avaliação do processo de ensino e de aprendizagem no contex-
to escolar.
Para analisar a relação entre concepções pedagógicas e os significados da
avaliação, a autora utiliza-se de quatro categorias. Em um primeiro momento
encontra-se a ideia de que avaliação e exame se equivalem, consenso encontra-
do na chamada Pedagogia Tradicional. Num segundo momento, Chuieri (2008)
identifica a concepção de avaliação como medida, muito recorrente durante o
auge da Pedagogia Tecnicista.
Em seguida, trabalha com a ideia de avaliação como instrumento para a
classificação e regulação do desempenho do aluno e, num quarto e último mo-
mento, aborda a concepção qualitativa de educação.
O artigo “Concepções sobre a avaliação escolar”, de Mary Stella Ferreira
Chuieri, é realmente bastante elucidativo quanto à análise da relação das con-
cepções pedagógicas de avaliação e os significados assumidos pela avaliação
no contexto escolar. Vejamos o trecho do artigo em que a autora apresenta suas
considerações quanto às quatro categorias que levanta para analisar a relação
entre as concepções pedagógicas e os significados de avaliação.
As categorias são as seguintes:
•  Avaliar para examinar;
•  Medir para avaliar;
•  Avaliar para classificar ou regular;
•  Avaliar para qualificar;
•  Examinar para Avaliar.

Avaliar para examinar

Numa perspectiva diacrônica, podemos remontar às práticas de avalia-


ção sob a forma de exames e provas, usadas em colégios católicos da Ordem

capítulo 1 • 13
Jesuítica e em escolas protestantes, a partir do século XVI. Conforme Luckesi
(2003):

A tradição dos exames escolares, que conhecemos hoje, em nossas escolas, foi
sistematizada nos séculos XVI e XVII, com as configurações da atividade pedagógica
produzidas pelos padres jesuítas (séc. XVI) e pelo Bispo John Amós Comênio (fim do
séc. XVI e primeira metade do século XVII). (p. 16)

No entanto, há registros de que tal prática antecede a esse período, pois, na


China, três mil anos antes de Cristo, já se usavam os exames para selecionar
homens para o exército. Todavia, os exames escolares, como praticados hoje
em nossas escolas, foram sistematizados com o advento da modernidade e sua
consequente prática educativa (LUCKESI, 2003, p. 16).
A prática dos exames atinge o seu apogeu com a ascensão e consolidação da
burguesia, uma vez que desprovida dos privilégios garantidos por nascimento
e da fortuna da aristocracia recorre ao trabalho e aos estudos como forma de
ascensão social. Contudo, torna-se importante ressaltar que a introdução gene-
ralizada do exame de admissão para o serviço público foi um grande passo na
democratização do Estado e na configuração de uma sociedade meritocrática.
Mediante o desenvolvimento do modo de produção capitalista, o exame
continuou a ser “uma das peças do sistema” e, nesse sentido, Afonso (2000)
sustenta:

É, portanto, ao longo do século XIX que se assiste à multiplicação de exames e


diplomas, pondo em evidência o contínuo controle por parte do Estado dos processos
de certificação. Como Karl Marx observou, o exame passa a mediar as relações mais
amplas da cultura com o Estado, constituindo-se num vínculo objetivo entre o saber
da sociedade civil e o saber do Estado. (p. 30)

Defendendo a tese de que, ainda hoje, na escola brasileira, pública e par-


ticular, do ensino básico ao superior, praticamos exames escolares em vez
de avaliação da aprendizagem, Luckesi (2003, p. 11) afirma: historicamen-
te, passamos a denominar a prática de acompanhamento da avaliação da
aprendizagem do educando de “avaliação da aprendizagem escolar”, mas, na

14 • capítulo 1
verdade, continuamos a praticar “exames”. Por essa razão, o autor denomina
de Pedagogia do Exame essa prática que, segundo ele, ainda se faz presente em
nossas escolas. Para esse autor, também podemos verificar os resquícios dessa
Pedagogia do Exame em algumas práticas nacionais de avaliação, tais como o
Exame Nacional do Ensino Médio – Enem e o Sistema Nacional de Avaliação da
Educação Superior – Sinaes (o extinto “Provão”), e que, segundo ele, mais refor-
çam a cultura do exame do que a cultura da avaliação (p. 8).
Embora o autor reconheça a utilidade e a necessidade dos exames nas situa-
ções que exigem classificação, como os concursos, e naquelas que requerem
certificação de conhecimentos, para ele, a sala de aula é o lugar onde, em ter-
mos de avaliação, deveria predominar o diagnóstico como recurso de acompa-
nhamento e reorientação da aprendizagem, em vez de predominarem os exa-
mes como recursos classificatórios (LUCKESI, 2003, p. 47).
Essa breve análise a respeito da prática de exames possibilitou-nos identifi-
car uma primeira concepção sobre a avaliação ainda presente em nossas esco-
las, ou seja, a de que avaliar é examinar.
Outro conceito dominante é o de que avaliar é medir o desempenho e, nessa
perspectiva, será discutido a seguir.

Medir para avaliar

A concepção de avaliação como processo de medida teve sua origem no iní-


cio do século XX, nos Estados Unidos, com os estudos de Thorndike acerca dos
testes educacionais. Tais estudos prosperaram muito e resultaram no desen-
volvimento de testes padronizados para medir habilidades e aptidões dos alu-
nos. Paralelamente, há de se considerar, no início do século XX, a contribuição
da Psicologia à avaliação educacional.
Essa contribuição pode ser vista sob dois ângulos. O primeiro diz respeito
aos testes psicológicos, com base nos estudos de Sperman (1904, 1907, 1913)
sobre a Psicometria, e de Binet e Simon (1905), que criaram o primeiro teste de
inteligência para crianças e adultos.
Essa possibilidade de mensuração de comportamentos por meio de testes
propiciou a expansão de uma cultura dos testes e medidas na educação e, por
essa razão, Dias Sobrinho (2003) afirma que, nas primeiras décadas do século
passado, avaliar se confundia com medir:

capítulo 1 • 15
Embora consideremos hoje importante distinguir avaliação e medida, naquele momen-
to, esses termos se tomavam um pelo outro. A avaliação era eminentemente técnica,
consistindo basicamente em testes de verificação, mensuração e quantificação de
resultados. (p. 17)

O segundo ângulo por meio do qual se pode focalizar a contribuição


da Psicologia à avaliação educacional refere-se aos estudos da Psicologia
Comportamental sobre a aprendizagem. Essa abordagem considera que a
aprendizagem pode ser quantificada e, portanto, medida.
Tais estudos fundamentam a chamada Pedagogia Tecnicista, conforme ex-
plica Caldeira (1997):

A Pedagogia Tecnicista busca sua concepção de aprendizagem na Psicologia


Comportamental. Esta sempre buscou adquirir o status de ciência, libertando-se da
introspecção e fundamentando-se na lógica científica dominante que lhe garantisse
a objetividade das ciências da natureza. Seu principal foco de preocupação são as
mudanças comportamentais que possam ser cientificamente observadas, portanto,
quantificadas. (p. 53)

A ideia de avaliar, não só para medir mudanças comportamentais, mas tam-


bém a aprendizagem, portanto para quantificar resultados, encontra-se apoiada
na racionalidade instrumental preconizada pelo positivismo. Coerente com essa
visão de quantificação de resultados, a avaliação é conceituada como a sistemá-
tica de dados por meio da qual se determinam as mudanças de comportamen-
to do aluno e em que medida estas mudanças ocorrem (BLOOM et al., 1975, p.
23). Portanto, ela visa comprovar o rendimento do aluno com base nos objetivos
(comportamentos) predefinidos e, desse modo, a avaliação é reduzida à medida e
separa o processo de ensino de seu resultado (CALDEIRA, 2000, p. 23).

PERGUNTA
Mas, afinal, o que é uma medida?

16 • capítulo 1
Segundo Hadji (2001), medir significa atribuir um número a um aconteci-
mento ou a um objeto, de acordo com uma regra logicamente aceitável (p. 27).
Para esse autor, a ideia de que a avaliação é uma medida dos desempenhos dos
alunos encontra-se fortemente enraizada na mente dos professores e, frequen-
temente, na mente dos alunos, e a dificuldade para a superação dessa concep-
ção reside na suposta “confiabilidade” das medidas em educação e nos parâ-
metros “objetivos” utilizados pelos professores para atribuir notas às tarefas
dos alunos:

Uma medida é objetiva no sentido de que, uma vez definida a unidade, deve-se ter
sempre a mesma medida do mesmo fenômeno. Certamente, um erro é sempre pos-
sível, devido às imperfeições da instrumentação, pois ele resulta então das condições
de operacionalização dos instrumentos. Ele provém da operação de medida. Por essa
razão, pode ser calculado e, portanto, neutralizado. (p. 27)

Desse modo, para o referido autor, reduzir a avaliação à medida ou mais


especificamente à prova implica aceitar a confiabilidade da prova como instru-
mento de medida e desconsiderar que a subjetividade do avaliador pode inter-
ferir nos resultados da avaliação. Em razão disso, ele nos alerta:

(...) registraremos aqui o fato de que hoje se sabe que a avaliação não é uma medida
pelo simples fato de que o avaliador não é um instrumento, e porque o que é avalia-
do não é um objeto no sentido imediato do termo. Todos os professores avaliadores
deveriam, portanto, ter compreendido definitivamente que a “nota verdadeira” quase
não tem sentido. (p. 34)

Gostou de conhecer a pesquisa desenvolvida por Chueiri (2008)? Já apresentamos


aqui o trecho em que a autora tece sua análise acerca das concepções de Avaliar
para Examinar e Avaliar para Medir.
O artigo “Concepções sobre a avaliação escolar”, de Mary Stella Ferreira Chuieri, pu-
blicado em 2008 pela Revista Estudos em Avaliação Educacional, pode ser encontra-
do na íntegra no site da Fundação Carlos Chagas.

capítulo 1 • 17
Podemos afirmar que o trabalho docente é uma atividade consciente e sis-
temática, voltada para a aprendizagem dos alunos, e que planejar é parte fun-
damental da ação educacional, devendo anteceder toda atividade avaliativa,
sendo uma atividade complexa que não se restringe à sala de aula. Como um
processo mais amplo, necessita, então, de organização e coordenação de ações,
ou seja, de planejamento.
Assim, ressaltamos a importância de um planejamento efetivo, que seja reali-
zado em etapas coletivas e individuais, visando garantir dentro do contexto insti-
tucional, diversos aspectos a partir da perspectiva crítica e reflexiva que abarque
a importância do compromisso pedagógico, político com o ensino e a aprendi-
zagem, pois, toda atividade avaliativa deve ser instrumento para o planejamento
docente, para além de avaliar o aluno, oferecer ponto de partida para organização
do trabalho bem como um panorama do que já foi conquistado.

Planejar e pensar andam juntos. Ao começar o dia, o homem pensa e distribui suas
atividades no tempo: o que irá fazer, como fazer, para que fazer, com o que fazer etc.
Nas mais simples e corriqueiras ações humanas, quando o homem pensa de forma a
atender suas metas e seus objetivos, ele está planejando, sem necessariamente criar
um instrumental técnico que norteie suas ações. Essas observações iniciais estão
sendo expressas, apenas para chamar atenção sobre o aspecto cotidiano da ação
de planejar e como o planejamento faz parte da vida. Aquele que não mais planeja,
talvez já tenha robotizado suas ações, portanto, quem sabe, não tem a consciência do
que está fazendo, nem se ainda pode construir alguma coisa. Alguns até dizem: “Nem
preciso mais pensar, vou fazendo o que me mandam fazer... Eu não necessito planejar,
já vou fazendo, porque sei onde vai dar...”. E assim por diante.

LEAL, Regina Barros. Planejamento de ensino: peculiaridades significativas


Revista Iberoamericana de Educación .ISSN: 1681-5653.

1.2  História da avaliação na sociedade moderna

Em geral, muitos profissionais aceitam a ideia de que a avaliação tem a função


de “medir” o conhecimento dos alunos, de maneira a selecionar e classificar de
acordo com os resultados apresentados, sobretudo através de provas e exames.
Nesta concepção de avaliação, não há grandes preocupações com o processo de
aprendizagem, as considerações se baseiam quase exclusivamente por aquilo

18 • capítulo 1
que o aluno nos apresentou naquele momento, naquela situação formal de ava-
liação, que é por vezes traumática para o aprendiz.
Apesar de parecer uma concepção normal e inclusive naturalizada pela so-
ciedade em geral, é importante ressaltar que a avaliação pode apresentar-se de
maneira diferenciada no contexto educacional e que ela pode possuir diferen-
tes finalidades e concepções.
É evidente que, historicamente, a avaliação está relacionada à ideia de me-
dida, sendo inclusive uma das mais “antigas” definições de avaliação.
Segundo Stuffebeam et al (1980 apud HADJI, 1994), a definição de avalia-
ção como medida apresenta algumas vantagens, pois esta definição apresenta
noções de objetividade e fidelidade, que podem apresentar dados suscetíveis
de serem desenvolvidos matematicamente. Porém, tal relação apresenta como
maior inconveniente o fato de fazer sair do campo da avaliação tudo o que não
pode ser mensurável diretamente.
Diante de tal fato, podemos nos questionar sobre o que fica então? Aquilo
que foge à captação dos instrumentos de medida deverá então, de início, ser
negligenciado pelo avaliado? Este fato não estaria reduzindo de maneira abu-
siva o objeto da avaliação, ao desconsiderar o imenso campo qualitativo, e sua
metodologia, ao utilizar somente a instrumentalização rígida? (HADJI, 1994)
Vários são os questionamentos que surgem nesta perspectiva e que nos le-
vam a refletir sobre o papel da avaliação no contexto atual da educação. Grande
parte das atitudes e dos valores presentes no cotidiano das escolas brasileiras
é reflexo dos fenômenos históricos que guiaram durante décadas as práticas
pedagógicas e avaliativas no setor educacional.
Por isso, há, de forma geral, grande resistência dos professores ao consi-
derar novos procedimentos educacionais, sobretudo avaliativos. As mudanças
necessárias precisam de um longo processo de adaptação e compreensão, de
forma a possibilitar um processo de ressignificação da prática escolar.
Um dos fatores de vital importância neste processo é considerar e conhecer
as diferentes dimensões da avaliação educacional. Os estudos sobre o tema não
são recentes e vários especialistas já se defrontaram com esta questão, dentre
eles podemos destacar as contribuições de Ralph Tyler, Michael Scriven, Daniel
L. Stuffebeam e Charles Hadji.
A avaliação educacional, com as características e a abrangência que possui
atualmente, surge na década de 1940 com os trabalhos de Tyler, que conce-
beu a avaliação como um procedimento que permite verificar se os objetivos

capítulo 1 • 19
educacionais estão sendo atingidos pelos programas de ensino, comparando o
desempenho dos alunos aos objetivos previamente definidos.

CONEXÃO
Uma leitura que virá a contribuir com a construção do conceito de avaliação pode ser en-
contrada no texto “Avaliação: construindo o conceito”, do professor Luiz Carlos de Freitas. O
artigo foi publicado pela Revista Ciência & Ensino, em 1997. Esse texto está disponível em:
<http://prc.ifsp.edu.br/ojs/index.php/cienciaeensino/article/view/24/31>.

Neste contexto, Tyler (1942) apresentou a avaliação “... como um processo


de estabelecimento da comparação entre os desempenhos e a concretização de
objetivos instrucionais predefinidos...” (VIANNA, 2000, p. 26).
A dimensão de julgamento de valor na avaliação foi introduzida por Scriven
(1967), evidenciando certo ecletismo conceitual e metodológico, a avaliação,
nessa perspectiva, é considerada como um processo pelo qual os professores
buscam e usam informações de diferentes fontes para chegar a um julgamen-
to de valor sobre o aluno ou sobre algum aspecto particular dele (SACRISTÁN,
1998).
Esse autor destacou a avaliação como “... um processo de levantamento de
dados para análise e posterior determinação do valor de certo fenômeno...”
(VIANNA, 2000, p. 26).
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Figura 1.1  – 

20 • capítulo 1
Deste modo, nota-se que os posicionamentos de Scriven influenciaram di-
versos teóricos da avaliação, inclusive Stuffebeam et al (1971). Estes desenvol-
veram uma teoria baseada na ideia de que “... a avaliação visa à tomada de deci-
sões, ou seja, é um processo de identificar e coletar informações que permitam
decidir entre várias alternativas...” (VIANNA, 2000, p. 26).
Com base em tais perspectivas, percebe-se que essa maneira de conceber a
avaliação evidencia a complexidade da prática de avaliar, pois envolve processa-
mento, análise, interpretação e julgamento da informação coletada.
Assim, faz-se importante ressaltar, segundo Hadji (1994), que a avaliação é:

[...] o ato pelo qual se formula um juízo de valor, incidindo num objeto determinado (indi-
víduo, situação, ação, projeto etc.) por meio de um confronto entre duas séries de dados
que são postos em relação: – dados que são da ordem do fato em si e que dizem res-
peito ao objeto real a avaliar; – dados que são da ordem do ideal e que dizem respeito a
expectativas, intenções ou a projetos que se aplicam ao mesmo objeto (p. 31).

No item a seguir, dando sequência às reflexões feitas até o momento, vamos


conhecer um pouco acerca das avaliações que compõem de sistema de avalia-
ção brasileiro, articulando suas funções e objetivos.

1.3  Avaliação da aprendizagem e o sistema de avaliação no Brasil

Apenas se vê bem com o coração, o essencial é invisível para os olhos”


Antoine de Saint Exupéry. O Pequeno Príncipe.

Visando articular olhares acerca da qualidade do sistema educacional brasi-


leiro, os governos em suas instâncias estadual e federal, vêm buscando desen-
volver – em parceria com os órgãos responsáveis pela educação e sistemas de
medidas (MEC e INEP) – avaliações para analisar diversos pontos que envolvem
a educação brasileira.
Neste contexto avaliativo, encontram-se os objetivos de um sistema de ensi-
no que estão subordinados aos anseios e às necessidades da sociedade, devendo
ser expressos por aqueles que formulam as políticas educacionais brasileiras.

capítulo 1 • 21
Dentro dos objetivos e pressupostos educacionais, que são considerados
ao buscar avaliar o sistema, estão a universalização do acesso à escola, a busca
pela equidade e o oferecimento de qualidade. Diante disso, são estabelecidas
metas e estratégias para o alcance dos objetivos propostos.
A definição das estratégias a serem utilizadas, determinam as condições em
que o processo de ensino e aprendizagem devem ocorrer, considerando os pa-
drões mínimos para a qualidade do processo de ensino que também é parte dos
objetivos do sistema educacional.
Um sistema de avaliação deve fornecer informações que possam auxiliar na
orientação das políticas educacionais. Deste modo, os indicadores de qualida-
de devem mostrar o quanto o sistema educacional está caminhando em conso-
nância com o sistema nacional de avaliação, ou seja, se os sistemas estão con-
seguindo relacionar os resultados observados aos desejados. Apenas a partir
dessa comparação é que podem ser levantadas hipóteses para atribuir causas
aos efeitos encontrados no que se refere à qualidade educacional.
Deste modo, as informações geradas por um sistema nacional de avaliação
educacional permitem verificar de maneira longitudinal, a eficiência e a eficá-
cia do sistema de ensino e, ao mesmo tempo, procurar possíveis explicações, e
soluções sobre o que possa ter influído nos resultados observados.
Nessa perspectiva, o sistema nacional de avaliação, busca propiciar, através
das informações produzidas, uma comparação dos resultados obtidos (nestas
avaliações) entre escolas. Tais resultados ainda consideram e apontam áreas
geográficas, sistemas de ensino, bem como sinalizam situações específicas,
que poderão ser alvo de uma política especial.
Sabemos que embora o objetivo divulgado pelo sistema nacional de avalia-
ção seja o de melhoria da qualidade do ensino, existem outras preocupações re-
lacionadas ao sistema avaliativo. Assim, vale ressaltar que tais avaliações nem
sempre medem com clareza as reais situações em que as escolas se encontram,
devido a uma multiplicidade de fatores que acabam não sendo considerados na
análise da avaliação.

CONEXÃO
Aprofunde a reflexão sobre os resultados do IDEB através da leitura do artigo: “IDEB,
mais que uma fábrica de rankings” de Ana Lígia Scachetti na Revista Nova Escola
<http://novaescola.org.br/politicas-publicas/ideb-mais-fabrica-rankings-716706.shtml>.

22 • capítulo 1
Sabe-se que nos dias atuais a educação conta como uma proposta de univer-
salização do acesso. No entanto ainda estamos buscando um sistema nacional
de avaliação que possa oferecer uma análise real da qualidade que é oferecida
nos espaços de aprendizagem.
Assim, o sistema nacional de avaliação deverá preocupar-se em medir a qua-
lidade do ensino, através de indicadores de qualidade, proporcionando uma
discussão que amplie o acesso para continuidade e qualidade.
Para a efetivação destas avaliações, existe atualmente um sistema avaliativo
nacional que conta com padrões mínimos para realização, que são resultados
de estratégias que visam atingir os objetivos do sistema e podem ser considera-
dos como indicadores indiretos de qualidade.
Outro ponto é o desempenho, medido através de testes padronizados, que
é apontado como um indicador da qualidade do produto, ou seja, da aprendi-
zagem adquirida.
Assim, a hipótese que se tem é de que a presença de padrões mínimos de
qualidade no processo de ensino possibilita a melhoria da aprendizagem dos
alunos. No entanto, sabemos que não é possível esperar que um sistema de ava-
liação comprove com total clareza e fidedignidade esta hipótese.
O papel do sistema avaliativo neste sentido acaba sendo o de verificação,
sem muitas vezes considerar todas as nuances que envolvem, ou seja, todos os
fatores que corroboram para um resultado específico, deste modo, cremos não
ser completamente possível acompanhar o desempenho do sistema educacio-
nal e produzir pesquisas e melhorias qualitativas na mesma direção.
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Testes

Figura 1.2  – 

capítulo 1 • 23
Partindo de uma perspectiva mais objetiva, nota-se que nos últimos anos,
a educação brasileira vem passando por uma série de avaliações elaboradas
por instituições dos mais variados níveis: de organismos internacionais, como
a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico),
elaboradora do PISA (Programa Internacional de Avaliação de Alunos), ao
MEC (Ministério da Educação), elaboradora da Prova Brasil (Avaliação do
Rendimento Escolar), do Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica).
Além dessas avaliações, de âmbito nacional e internacional, diversos
Estados e Municípios brasileiros também realizam suas próprias avaliações
para medir a qualidade de ensino locais, utilizando avaliações elaboradas pelos
profissionais que atuam nestas redes específicas, ou empresas terceirizadas,
contratadas para organização destas provas.
Uma destas avaliações organizadas pelo governo federal é a Prova Brasil,
que tem como um de seus objetivos produzir informações sobre o ensino ofere-
cido pelas escolas públicas brasileiras.
No entanto, sabe-se que existem críticas acerca da neutralidade dos dados
obtidos, uma vez que as escolas nem sempre realizam tais provas seguindo de-
vidamente as orientações, trazendo resultados nem sempre fidedignos ao que
foi feito. Assim, trata-se de um instrumento que vai muito além de uma simples
avaliação de ensino, configurando-se como uma forma de o Estado brasileiro
verificar se o direito constitucional à educação foi ou não atendido, uma vez
que as informações obtidas pela Prova Brasil devem ser usadas pelas escolas e
pelos sistemas educacionais como uma avaliação da qualidade de seus proces-
sos educacionais.
Os resultados da Prova Brasil, assim como do Saeb (Sistema Nacional de
Avaliação da Educação Básica) são utilizadas para o cálculo do IDEB (Índice de
Desenvolvimento da Educação Básica) que combina a média das notas obtidas
pelos alunos na Prova Brasil ou no Saeb à taxa de aprovação. Esse modelo é im-
portante porque coloca o aprendizado do aluno no centro da análise e une um
critério de desempenho a um de rendimento.
Sobre o IDEB, a divulgação de resultados, através de combinações de pro-
vas, abre espaço para o debate sobre as interpretações e o uso do índice para a
melhoria da qualidade da educação.
Vale ressaltar que, da forma como vem sendo divulgado e debatido, o IDEB
não vem sendo compreendido sob as melhores perspectivas, uma vez que não
tem contribuído diretamente para a melhoria da educação como se esperava.

24 • capítulo 1
Tem-se um panorama, através de números, mas não se avança quanto pode-
ria, pois nem sempre estes números são direcionados para pesquisas e efeti-
vas ações.
Isso não significa que o IDEB é dispensável, mas podemos afirmar que ele
é um instrumento importante e, como tal, deve sempre ser avaliado e ajustado
para que sua análise permita intervir e melhorar a qualidade do ensino, ao em
vez de gerar apenas números e classificações.
A partir dos dados quantitativos levantado nestas provas e pelo IDEB di-
vulgado, a comunidade escolar terá uma noção do nível de aprendizagem dos
alunos, podendo assim estabelecer metas e intervenções pedagógicas com
o objetivo de melhorar qualitativamente o ensino e a aprendizagem. No en-
tanto, precisamos estar atentos que nem sempre um alto IDEB significa me-
lhor qualidade.

CONCEITO
O QUE É O IDEB?
O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) foi criado em 2007 para medir
a qualidade de cada escola e de cada rede de ensino. O indicador é calculado com base no
desempenho do estudante em avaliações do INEP e em taxas de aprovação. Assim, para
que o IDEB de uma escola ou rede cresça é preciso que o aluno aprenda, não repita o ano e
frequente a sala de aula.
Para que pais e responsáveis acompanhem o desempenho da escola de seus filhos,
basta verificar o IDEB da instituição, que é apresentado numa escala de zero a dez. Da
mesma forma, gestores acompanham o trabalho das secretarias municipais e estaduais pela
melhoria da educação.
O índice é medido a cada dois anos e o objetivo é que o país, a partir do alcance das me-
tas municipais e estaduais, tenha nota 6 em 2022 – correspondente à qualidade do ensino
em países desenvolvidos.

Prova Brasil e Saeb


O Sistema de Avaliação da Educação Básica é composto por duas avalia-
ções complementares.
A primeira, denominada Aneb – Avaliação Nacional da Educação Básica, abrange de
maneira amostral os estudantes das redes públicas e privadas do país, localizados na área
rural e urbana e matriculados no 5º e 9º anos do ensino fundamental e também no 3º ano

capítulo 1 • 25
do ensino médio. Nesses estratos, os resultados são apresentados para cada Unidade da
Federação, Região e para o Brasil como um todo (no estado de São Paulo: Saresp).
A segunda, denominada Anresc – Avaliação Nacional do Rendimento Escolar, é aplicada
censitariamente aos alunos de 5º e 9º anos do ensino fundamental público, nas redes esta-
duais, municipais e federais, de área rural e urbana, em escolas que tenham no mínimo 20
alunos matriculados na série avaliada. Nesse estrato, a prova recebe o nome de Prova Brasil
e oferece resultados por escola, município, Unidade da Federação e país que também são
utilizados no cálculo do IDEB.
As avaliações que compõem o Saeb são realizadas a cada dois anos, quando são aplica-
das provas de Língua Portuguesa e Matemática, além de questionários socioeconômicos aos
alunos participantes e à comunidade escolar.
O Saeb
O Saeb, que significa Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica, é um conjunto
de provas e questionários aplicados de 2 em 2 anos desde 1990, em escolas localizadas
nos 26 estados do Brasil e no Distrito Federal. O Saeb mostra o que os alunos sabem em
diversos momentos da vida escolar. No último Saeb, foram avaliadas 360,4 mil estudantes
da 4a e 8a séries do Ensino Fundamental e da 3a série do Ensino Médio das escolas públicas
e privadas em 2.145 municípios. Os testes foram aplicados nas matérias Língua Portuguesa,
Matemática e Ciências. Também, são verificadas através de questionários as características
de infraestrutura das unidades escolares, o perfil do diretor e os mecanismos de gestão
escolar, o perfil e a prática docente, as características socioculturais e os hábitos de estudo
dos alunos.
Os resultados dos testes permitem que o Ministério da Educação (MEC) e as secretarias
estaduais e municipais acompanhem a evolução do ensino brasileiro e definam as ações, po-
líticas e programas necessários para corrigir os problemas e falhas identificadas, diminuindo
assim as desigualdades ainda existentes no sistema educacional brasileiro.
Além disso, a realização periódica de avaliações e a divulgação dos resultados é uma forma
de o governo prestar contas da sua atuação e do dinheiro que gasta, a alunos, pais, professores
e à sociedade em geral. Os resultados são divulgados tanto em nível nacional quanto sepa-
rados por região, estado, localização (capital, interior), zona geográfica (urbano, rural), esfera
administrativa (estadual, municipal, federal e particular). Os resultados incluem tanto aqueles
relacionados ao desempenho dos alunos quanto aqueles referentes às caraterísticas da escola,
do diretor, do professor e dos hábitos de estudo e condições socioculturais dos alunos.
Os resultados obtidos no Saeb 99, que foi realizado entre os dias 25 e 29 de outubro do
mesmo ano, e divulgados no dia 28 de novembro 2000, mostraram uma queda na qualidade
de ensino em todo Brasil, especialmente nas escolas particulares. Segundo os dados da
avaliação, na disciplina de matemática por exemplo, a pontuação média obtida pelos alunos

26 • capítulo 1
da 4ª série da educação fundamental, em todo o país, caiu de 190,80 pontos para 181. No
caso de português, a queda da pontuação média nacional dos alunos de 4ª série foi ainda
pior, passando de 186,5 para 170,7 pontos.
A secretaria de educação de São Paulo diz que a universalização de acesso ao ensino
público provocou a queda, mas na medida em que os alunos mais carentes vão se adaptando
à nova realidade da escola, esses resultados tendem a recuperar-se. Algumas mães enten-
deram que a secretaria estava culpando os pobres pelos maus resultados, porém os índices
mostram que os resultados melhoram de acordo com a qualidade do professor. O que você
acha, quem é culpado pela baixa qualidade do ensino brasileiro? Leia mais sobre o Saeb no
site do INEP, disponível em: <http://www.inep.gov.br/Saeb/Saeb99/default.htm>.

Prova Brasil
Definição geral: PROVA BRASIL
A Prova Brasil é o instrumento de medida
das competências leitora e matemática, apli-
cado em praticamente todas as crianças e
jovens matriculados na quarta e oitava séries
(quinto e nono ano).

A Prova Brasil e o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb) são ava-
liações para diagnóstico, em larga escala, desenvolvidas pelo Instituto Nacional de Estudos
e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP/MEC). Têm o objetivo de avaliar a qualidade
do ensino oferecido pelo sistema educacional brasileiro a partir de testes padronizados e
questionários socioeconômicos.
Nos testes aplicados na quarta e oitava séries (quinto e nono ano) do ensino fundamen-
tal e na terceira série do ensino médio, os estudantes respondem a itens (questões) de língua
portuguesa, com foco em leitura, e matemática, com foco na resolução de problemas. No
questionário socioeconômico, os estudantes fornecem informações sobre fatores de contex-
to que podem estar associados ao desempenho.
Professores e diretores das turmas e escolas avaliadas também respondem a questioná-
rios que coletam dados demográficos, perfil profissional e de condições de trabalho.
A partir das informações do Saeb e da Prova Brasil, o MEC e as secretarias estaduais
e municipais de Educação podem definir ações voltadas ao aprimoramento da qualidade da
educação no país e a redução das desigualdades existentes, promovendo, por exemplo, a
correção de distorções e debilidades identificadas e direcionando seus recursos técnicos e
financeiros para áreas identificadas como prioritárias.

capítulo 1 • 27
As médias de desempenho nessas avaliações também subsidiam o cálculo do Índice de
Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), ao lado das taxas de aprovação nessas esferas.
Além disso, os dados também estão disponíveis a toda a sociedade que, a partir dos re-
sultados, pode acompanhar as políticas implementadas pelas diferentes esferas de governo.
No caso da Prova Brasil, ainda pode ser observado o desempenho específico das escolas
públicas urbanas do país.
Os dados dessas avaliações são comparáveis ao longo do tempo, ou seja, pode-se acom-
panhar a evolução dos desempenhos das escolas, das redes e do sistema como um todo. Em
2011, as escolas rurais de ensino fundamental com mais de 20 alunos nas séries avaliadas
também fizeram a Prova Brasil.

Provinha Brasil

A Provinha Brasil é o instrumento elaborado para oferecer aos professores e aos gesto-
res das escolas públicas e das redes de ensino um diagnóstico do nível de alfabetização dos
alunos, ainda no início do processo de aprendizagem, permitindo assim intervenções com
vista à correção de possíveis insuficiências apresentadas nas áreas de leitura e escrita. Essa
avaliação é um instrumento pedagógico sem finalidades classificatórias.
A Provinha Brasil é uma avaliação diagnóstica do nível de alfabetização das crianças ma-
triculadas no segundo ano de escolarização das escolas públicas brasileiras. Essa avaliação
acontece em duas etapas, uma no início e a outra ao término do ano letivo. A aplicação em
períodos distintos possibilita aos professores e gestores educacionais a realização de um
diagnóstico mais preciso que permite conhecer o que foi agregado na aprendizagem das
crianças, em termos de habilidades de leitura dentro do período avaliado.
A partir das informações obtidas pela avaliação, os gestores e professores têm condi-
ções de intervir de forma mais eficaz no processo de alfabetização aumentando as chances
de que todas as crianças, até os oito anos de idade, saibam ler e escrever, conforme uma das
metas previstas pelo Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação.
A Provinha Brasil é elaborada pelo INEP, e distribuída pelo MEC/FNDE para todas as
secretarias de educação municipais, estaduais e do Distrito Federal. Assim, todos os anos
os alunos da rede pública de ensino, matriculados no segundo ano de escolarização, têm
oportunidade de participar do ciclo de avaliação da Provinha Brasil.

28 • capítulo 1
O Saresp
O Saresp, que significa Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de
São Paulo, foi criado em 1996 e segundo a Secretaria de Educação, visa estimular a incor-
poração de uma cultura de avaliação do ensino dentro do Estado. As informações obtidas
através destas provas anuais devem ser usadas para implementar as medidas necessárias
para melhorar a qualidade do ensino, por exemplo, através da capacitação permanente dos
professores. O sistema Saresp é um conjunto de provas e questionários que deveriam ser
aplicadas em todas as escolas do Estado (ambos ensino fundamental e médio). Através de
questionários suplementares, o Saresp também serve para identificar o perfil dos alunos
avaliados; as opiniões de seus pais ou responsáveis; e os dados e informações sobre cada
escola e sua forma específica de ensinar. Em princípio, o Saresp é bastante similar ao Saeb
(Sistema Federal de Avaliação do Ensino Básico) mas em vez de trabalhar com apenas uma
amostra de escolas e de alunos, o Saresp abrange toda a população das escolas da rede
estadual de São Paulo. Também, diferentemente do Saeb, as provas do Saresp são aplicadas
anualmente, o que permite analisar a evolução dos mesmos alunos em anos sucessivos e
consecutivos (é o chamado estudo longitudinal). A prova tem mudado bastante desde 1996
principalmente para que os resultados possam ser comparados com as provas nacionais
organizadas pelo governo federal (Saeb/ Prova Brasil) e também para representar um dos
critérios usados para medir o Idesp – Índice de Desenvolvimento da Educação do Estado de
São Paulo (veja a nota do Idesp da sua escola clicando no seguinte endereço: <http://idesp.
edunet.sp.gov.br/boletim_escola.asp>)
Segundo a SEE, em 2008, o Saresp testou o desempenho dos alunos da 2ª, 4ª, 6ª e 8ª
séries do EF e da 3ª série do EM em Língua Portuguesa e Matemática. Também aconteceu
uma prova de Ciências para a 6a e a 8a séries do EF, e Ciências da Natureza (Química, Físi-
ca e Biologia), para o EM. A prova é realizada obrigatoriamente por os mais de 1.800.000
alunos da educação básica em todas as 5.166 escolas estaduais. A participação das redes
municipais e particulares é facultativa.
Cada aluno responde a três blocos de cada disciplina avaliada – Língua Portuguesa, Ma-
temática, Ciências e Ciências da Natureza. As provas de Ciências serão aplicadas somente
aos alunos da 6a e da 8a séries do Ensino Fundamental. Os alunos da 3a série do Ensino
Médio, por sua vez, serão avaliados também na área de Ciências da Natureza (Física, Química
e Biologia). Haverá provas em braile ou ampliadas para os alunos portadores de deficiência
visual. Quanto aos demais portadores de necessidades especiais a escola deverá proceder
da maneira como atua no dia a dia.
INEP

capítulo 1 • 29
LEITURA
Pátio Revista Pedagógica. Ano VI, nº 22, Qualificando o dia a dia na sala de aula, Julho a Agosto de
2002.
A avaliação a serviço dos alunos: utopia ou realidade?
Charles Hadji

Falar de utopia promissora é afirmar que a perspectiva de uma avaliação mais formativa
é realista, na medida em que a meta é legítima e claramente identificável. Mas é também
recusar a crença ingênua de que essa meta poderia ser atingida sem esforço, como se bas-
tasse decretar a passagem a uma avaliação formativa para que esta se produzisse de súbito.

Charles Hadji, uma referência importante no campo educacional, é diretor e professor


do Departamento de Ciências da Educação da Universidade Pierre-Mendès-France-
Grenoble II e autor dos livros A avaliação desmistificada e Pensar e agir a Educação,
ambos com publicação no Brasil.

Tomar consciência da dimensão das apostas


Já há alguns anos, a importância das práticas de avaliação nos processos de ensino
-aprendizagem é facilmente aceita. As apostas, de fato, estão longe de ser anódinas. Me-
diante essas práticas, coloca-se em jogo, em primeiro lugar, o destino dos escolares ou dos
universitários, cuja avaliação pode contribuir para inscrever em uma espiral de êxito ou de
fracasso. Pesquisas realizadas no campo da psicologia social (MONTEIL, 1989) mostraram
claramente a grande influência das categorizações iniciais e o impacto das posições e dos
papéis afetados socialmente sobre os comportamentos futuros de um sujeito. Assim, o êxito
ou o fracasso não decorrem apenas, como é evidente, do mecanismo dos exames e das ava-
liações ditas somativas, que conduz (ou não) a um certificado, mas também do mecanismo da
avaliação no dia a dia. Esta confere já de início status (de bom ou de mau aluno) que mode-
lam o comportamento de aprendizagem e dos quais será muito difícil livrar-se. Pesquisas com
crianças de 6 a 12 anos mostraram que, quando se trata de prever um nível de êxito (seja em
tarefas de instrução, seja em exercícios cognitivos), os bons alunos são sensivelmente mais
otimistas que os maus (julgamento sobre si). Além disso, supõe-se sempre que os bons alu-
nos terão mais êxito que os maus (julgamento sobre os outros), seja qual for o tipo de tarefa.
(PERRON, 1991). Quando se deixa o sistema educacional, o julgamento avaliativo emitido
por ocasião do exame final sela um destino escolar que, portanto, os primeiros julgamentos

30 • capítulo 1
avaliativos realizados no âmbito do sistema terão contribuído em grande medida para cons-
truir. Assim, a responsabilidade dos avaliadores é muito grande. Eles podem ou desencadear
o êxito, conduzir ao fracasso.
Em segundo lugar, as práticas escolares de avaliação, dado o seu peso, são suscetíveis
de condicionar, em parte, a avaliação das práticas pedagógicas ou didáticas. Sem querer
superestimar o papel da avaliação no processo de ensino-aprendizagem, é preciso consi-
derar que existe uma forte ligação entre a natureza das práticas de avaliação adotadas e a
natureza das práticas de ensino nas quais elas se inserem. Os autores da obra dirigida por
Huberman (1988) demonstraram claramente a possibilidade de avançar no sentido de uma
verdadeira “pedagogia da aprendizagem” por meio do desenvolvimento de práticas de avalia-
ção mais formativas. Posteriormente, Perrenoud (1998) insistiu nessa aposta: passar de uma
Pedagogia do Ensino a uma Pedagogia da Aprendizagem, substituindo a lógica da regulação
das aprendizagens por uma lógica da produção da excelência. Para todos esses autores, a
emergência de uma avaliação verdadeiramente formativa deveria ser um fator decisivo de
evolução no sentido de práticas de ensino e de formação mais satisfatórias, visto serem mais
úteis e eficazes.
É por isso, enfim, que é também o futuro de cada país que está em jogo.
Sendo a escola encarregada, de fato, de uma função de orientação e de seleção, as
escolhas do futuro realizam-se a partir da escola e pela escola. Assim, ela determina o fu-
turo social dos alunos em um clima de competição exacerbado pela relativa desvalorização
dos diplomas, que é um efeito secundário da democratização do ensino e uma espécie de
reverso do seu êxito. Os estudos são cada vez mais longos, e o ensino já não assegura as
perspectivas de um emprego que se esperava dele (PROST, 1982). Nesse contexto, em que
o avaliador atribui um rótulo social, a avaliação deveria ter as características de um “contrato
de confiança”.
Porém, existe aí um verdadeiro desafio: como tornar objetiva e digna de confiança uma
operação que se efetua em um clima de competição seletiva suscetível de aumentar o peso
dos condicionamentos sociais que recaem sobre ela e de exacerbar os fenômenos de cate-
gorização social? E como, então, tornar a avaliação mais formativa para que ela pelo menos
sirva tanto ao desenvolvimento dos indivíduos (regulação das aprendizagens) quanto à regu-
lação social (produção da excelência), bem como participe da construção de “destinos” esco-
lares individuais marcados mais pelo êxito do que pelo fracasso? O desejo de pôr a avaliação
a serviço dos alunos pode ser mais do que uma aspiração irrealizável?
Dissipar alguns mal-entendidos para poder responder à questão que acaba de ser colo-
cada, a primeira coisa a fazer é dissipar alguns mal-entendidos relacionados à própria noção
de avaliação formativa.

capítulo 1 • 31
Em primeiro lugar, o reconhecimento da necessidade de uma avaliação mais formativa
fez com que, já de início, alguns opusessem radicalmente avaliação formativa e avaliação
somativa, como se cada uma dessas duas “figuras” somente pudesse existir em detrimento
da outra. No limite, a emergência de uma (a avaliação formativa) deveria significar a morte da
outra (a avaliação somativa).
Entretanto, se essas duas modalidades distinguem-se, é em razão de sua função social
dominante. A avaliação formativa é destinada aos atores do processo educativo (professo-
res e alunos), os quais ela tem como função esclarecer. A avaliação somativa é destinada
à comunidade social, para a qual ela atesta um nível de saber ou de competência. Contudo,
uma não se opõe à outra. E promover a primeira não leva de modo algum a denegrir ou de-
sacreditar a segunda. A avaliação somativa é uma necessidade social. Será sempre indispen-
sável apreciar os resultados da ação educativa e certificar um nível individual de domínio das
competências visadas por essa ação. Portanto, é preciso acabar com as “lutas tribais” entre
partidários da avaliação formativa e partidários da avaliação somativa.
Esse combate não tem o menor sentido. A existência e a persistência de uma avaliação
somativa não são contraditórias com a emergência de uma avaliação formativa.
Alguns afirmam que a avaliação das aprendizagens se tornará mais formativa desde que
seja menos normativa. É preciso então dissipar o mais rapidamente possível um segundo
mal-entendido, pois a expressão avaliação normativa é particularmente ambígua. Podem-se
distinguir nela três sentidos possíveis.
Em um primeiro sentido (técnico), é normativa uma avaliação que opera classificações
(entre sujeitos). Normativo opõe-se, nesse caso, a criterioso; é criteriosa uma avaliação que,
em vez de julgar um comportamento com referência ao de outros sujeitos (como nos testes
psicométricos), julga-o pela distância em relação a uma meta que serve de referente. É fácil
compreender aqui que o julgamento da distância em relação a um modelo-meta será mais
esclarecedor para um sujeito que a constatação de sua distância em relação aos outros.
De resto, essa última operação supõe a primeira. Por isso, seria bom desconfiar, como nos
sugere Cardinet (1989), de uma avaliação que tivesse como única preocupação comparar e
classificar. E já se pode concluir, nesse ponto, que uma avaliação não comparativa será mais
suscetível de ajudar os alunos a aprender.
Contudo, pode-se entender ainda em outros dois sentidos a expressão avaliação normati-
va. Em um segundo sentido, é normativa uma avaliação que impõe modelos, desempenhando o
papel de normas de comportamento. No entanto, nesse segundo ponto de vista, toda avaliação
é necessariamente normativa, na medida em que avaliar consiste em julgar uma situação real
com referência a uma situação desejada (HADJI, 1989, 1997a). A situação (ideal) do aluno

32 • capítulo 1
que sabe resolver equações com duas incógnitas, por exemplo, é considerada preferível à do
aluno que não é capaz de fazer isso, justamente porque essa “capacidade” é objeto de uma
aprendizagem obrigatória. Uma avaliação formativa será aqui, como todas as outras, normativa.
Se, então, a esperança de uma avaliação que não seja normativa é quimérica, isso não impede
absolutamente de esperar a emergência de uma avaliação mais formativa.
Pode-se, finalmente, designar como normativa uma avaliação que impusesse normas ile-
gítimas. É óbvio, então, que se interrogar sobre a legitimidade das normas que impõe, de fato,
cada ato de avaliação (questão tanto mais delicada na medida em que existe um currículo
oculto) é uma exigência de ordem ética, da qual o avaliador não poderá subtrair-se (HADJI,
1997b). Se essa interrogação não é suscetível de tornar a avaliação não normativa (no se-
gundo sentido), ao menos pode esclarecer o avaliador sobre a realidade de suas normas de
referência, permitindo-lhe, assim, descartar normas cuja legitimidade pareça-lhe contestável.
É por isso que esse trabalho de questionamento sobre o referente é, em si, um meio útil
de progressão para práticas de avaliação mais formativas, uma vez que tornará mais trans-
parentes, pelo menos aos olhos do professor, os objetivos de aprendizagem e de desenvol-
vimento que a avaliação tem como missão verificar se foram alcançados. Tudo o que avança
na direção da transparência (do uso social da avaliação, de seu objeto específico, de suas
modalidades, de seus critérios e de seus indicadores) pode contribuir para tornar a avaliação
mais útil para os alunos.
Localizar os obstáculos e tentar superá-los. Sendo assim, como fazer efetivamente da
avaliação formativa uma perspectiva realista? Por um lado, compreendendo melhor seu es-
tatuto de utopia promissora.
Por outro lado, identificando os obstáculos que se opõem à emergência de práticas
de avaliação e, a partir disso, produzindo efeitos benéficos para os aprendizes a que elas
se referem.
Defender uma avaliação mais formativa não é ser vítima de um modismo nem exprimir
uma ideologia contestável. É inscrever-se em uma vontade de coerência e de eficácia. Es-
sencialmente, pode ser qualificada como formativa uma avaliação que apresente três carac-
terísticas. Em primeiro lugar, a de ser uma avaliação informativa. É nesse sentido que Cardi-
net (1989) preconizava uma avaliação “descritiva”, que não tivesse como primeira ambição
“demarcar constantemente a posição dos alunos”, mas multiplicar os “retornos de informa-
ção” em todos os âmbitos.
Daí a definição que ele propõe: “a avaliação formativa desejável é um retorno de informa-
ção multidirecional, dirigida ao aluno, em vez de referir-se ao aluno”. Tal avaliação não pres-
supõe nem julgamento de valor nem escala de valor. Esta é a sua segunda característica: a
avaliação formativa inscreve-se no projeto de ajudar os alunos, esclarecendo-os. Trata-se de

capítulo 1 • 33
ajudar o aluno a tomar consciência das dificuldades que encontra, a reconhecer e a corrigir
ele próprio seus erros. Ao mesmo tempo, trata-se de esclarecer o professor/avaliador sobre
os efeitos reais, em termos de aprendizagem, de sua ação de ensino. É para todos os atores
do “cenário pedagógico” (HADJI, 1992b) que a avaliação deve ter “virtude informativa”. Nos
dois casos (trabalho de aprendizagem do aluno, trabalho de ensino do professor) – e esta é a
terceira característica – visa-se a uma melhor regulação, conferindo à avaliação uma função
“corretiva”. Cada um no seu nível terá mais condições de ajustar suas atividades de aprendi-
zagem (os alunos) ou de ajuda à aprendizagem (os professores).
Desse modo, querer uma avaliação mais formativa significa querer que a avaliação in-
tegre ativamente o processo de formação no qual se inscreve. Trata-se de uma questão
de coerência.
É evidente que esse modelo é um modelo ideal. O que define a avaliação formativa é
menos da ordem dos fatos que das intenções. Por isso, nunca se está seguro de praticar
uma avaliação infalivelmente formativa. Nenhum dispositivo pode pretender garantir pôr em
prática as intenções. Porém, no fim das contas, é a vontade de ajudar que instala a atividade
avaliativa em um registro formativo. O modelo de avaliação com intenção formativa não é
nem um modelo científico, que descreve rigorosamente uma prática identificável de fora,
nem um modelo de ação do qual decorrem regras técnicas imediatamente aplicáveis. Ele
é um modelo regulador que indica a meta (colocar a avaliação a serviço dos alunos), e não
diretamente o caminho.
Falar de utopia promissora é, enfim, afirmar que a perspectiva de uma avaliação mais for-
mativa é realista, na medida em que a meta é legítima (no quadro de uma busca de coerência
no seio da escola) e claramente identificável. Mas é também recusar a crença ingênua de
que essa meta poderia ser atingida sem esforço, como se bastasse decretar a passagem a
uma avaliação formativa para que esta se produzisse de súbito. Será sempre necessário lutar
para transformar as práticas no sentido desejado.
Uma prática jamais se transforma pelo golpe de uma varinha mágica.
Para que se avance na direção dessa meta, a de uma avaliação que se inscreva na con-
tinuidade e na dinâmica de uma ação pedagógica de facilitação das aprendizagens; para que
se coloque deliberadamente a serviço da finalidade que lhe dá sentido (educar e formar);
para que se proponha a contribuir para uma transformação positiva daqueles a que diz res-
peito, será necessário superar muitos obstáculos. Identificamos três principais:

1. A existência de representações inibidoras, visto que inadequadas


Continuar acreditando, por exemplo, que a avaliação é uma medida que condena os
avaliadores ao imobilismo. Desse modo, ou se perde a coragem ao tomar consciência das

34 • capítulo 1
aquisições da docimologia1, ou se desgasta em vão, ignorando essas aquisições, na busca
da verdadeira nota que uma prova ou uma tarefa mereçam. Como se sabe, as aquisições
da docimologia são particularmente desoladoras. “O que a ciência dos exames revela em
primeiro lugar é que o exame não é uma ciência” (HADJI, 1992a, p. 83). Os inúmeros traba-
lhos experimentais apenas confirmaram o que a observação do funcionamento da atividade
avaliativa, particularmente no caso dos exames, já havia estabelecido de forma incisiva: a falta
de confiabilidade das notas é um fato marcante no âmbito escolar. Os examinadores não cor-
rigem da mesma forma. As mesmas provas são avaliadas de modo diferente por corretores
diferentes, com variações às vezes impressionantes. Para um mesmo examinador, as notas
variam no tempo.
Os parâmetros não são uma garantia e não resolvem nada. Constatou-se que em mate-
mática, sem parâmetros impostos, em geral as diferenças de notação são menos significati-
vas. E a multicorreção não é mais uma garantia de objetividade.
Uma demonstração disso foi feita pelo absurdo (PIÉRON, 1963, p. 22-23). A partir da
ideia de que se poderia compensar as flutuações multiplicando os corretores, pesquisadores
calcularam o número mínimo de examinadores competentes necessário para obter uma no-
tação que merecesse confiança. Os resultados desse cálculo são conhecidos: seria preciso
13 corretores em matemática e 127 em filosofia. De acordo com trabalhos mais recentes,
esses números deveriam ser multiplicados por 6 (HADJI, 1989).
Pode-se concluir que a avaliação não se tornará mais segura tentando, por meios técni-
cos, entre eles a multicorreção, aproximar-se da “nota verdadeira” de uma produção do aluno,
mas, ao contrário, livrando-se do mito da nota verdadeira: “a busca de um nível de desem-
penho ‘verdadeiro’ parece um empreendimento desprovido de sentido” (CARDINET, 1989).
Devemos pensar, então, que as coisas funcionarão melhor substituindo-se as notas por
letras ou apreciações? A mera passagem das cifras às letras não muda nada fundamen-
talmente. E as apreciações escritas só têm interesse se oferecem informações confiáveis.
O que garante isso? A única perspectiva realista é inserir sua atividade no quadro de seu
“elemento estrutural constante” (HADJI, 1989, 1992a, 1997a), deixando claro, em primeiro
lugar, o que se julga legitimamente no direito de esperar da realidade avaliada e, a partir daí,
buscando fatos ou elementos concretos suscetíveis de serem tomados como índices da sa-
tisfação dessas expectativas. Em suma, adotando um procedimento que vai da especificação
de critérios à busca de indicadores. Somente essa coerência no procedimento (das inten-
ções às ferramentas) pode tornar a avaliação mais objetiva. É preciso compreender e admitir
tal fato para avançar no sentido de uma avaliação mais formativa.

capítulo 1 • 35
2. A falta de referencial interpretativo adequado
Este é um segundo grande obstáculo. Allal (1979) mostrou a importância da fase de
interpretação das informações recolhidas, interpretação esta que permite operar um diag-
nóstico das dificuldades eventualmente encontradas pelos alunos, tendo em vista adaptar
as atividades de ensino-aprendizagem. Portanto, para conduzir de forma correta o conjunto
do que será assim uma sequência formativa (levantamento de informações/diagnóstico in-
dividualizado/ajuste da ação), é necessário dispor de um quadro teórico que oriente a in-
terpretação dos dados e o diagnóstico dos problemas de aprendizagem. Esse referencial
teórico, especifica Allal, deveria levar em conta múltiplos aspectos (cognitivo, afetivo, social)
das aprendizagens e das interações no processo de ensino-aprendizagem.
Entretanto, não obstante o progresso da psicologia cognitiva, de um lado, e das didáticas,
de outro, ainda não se dispõe de um quadro de referência exaustivo, embora os quadros
conceituais existentes já permitam orientar de maneira bastante efetiva a ação pedagógica.
Além disso, não se trata de conhecer por conhecer, de interpretar para saber, mas de com-
preender para agir. Mais uma vez, a vontade de ser útil é que é essencial. Nesse sentido, os
diagnósticos, mesmo que sumários, fundados, por exemplo, em tipologias de erros comuns,
poderão permitir uma adaptação adequada da ação do professor e constituirão apoios sóli-
dos para uma solução eficaz (HADJI, 1997a).

3. O medo ou a inércia dos professores


Eles não ousariam arriscar diagnósticos ou imaginar soluções. Porém, esse terceiro obs-
táculo não me parece dizer respeito particularmente aos professores brasileiros. O que vi
nos estabelecimentos de ensino que tive oportunidade de conhecer (Escola da Vila, em São
Paulo, e Colégio Apoio, em Recife, por exemplo) alertaram-me duplamente sobre a importân-
cia essencial das convicções e da vontade dos atores educativos e sobre a possibilidade de
êxito, mesmo em contextos muito difíceis.
Por isso, pode-se afirmar que o entusiasmo e a vontade de agir dos professores poderão
contribuir muito para fazer com que a avaliação formativa passe do estatuto de esperança
quimérica ao de perspectiva realista: a perspectiva de uma avaliação que, sem esquecer nem
negar que está necessariamente a serviço da sociedade (sob a forma de avaliação somativa
certificadora), daria mais peso, interesse e tempo à sua função de assistência à aprendiza-
gem (sob a forma de avaliação formativa).

Nota
1. Do grego dokimê (prova). A docimologia é a ciência que estuda os diferentes meios
de controle dos conhecimentos.

36 • capítulo 1
HADJI, C. ‘A avaliação a serviço dos alunos: utopia ou realidade?’ In: Pátio – Revista Pedagógica, Ano.
VI, n. 22 jul/ago 2002. Artmed. Porto Alegre. Charles Hadji é professor da Universidade de Pierre
Mendès France Grenoble 2.

Referências

ALLAL, L. et al. L’évaluation formative dans un enseignement différencié. Berne: Peter Lang, 1979.
CARDINET, J. Evaluer sans juger. Revue Française de Pédagogie, n. 88, p. 41-42, 1989.
HADJI, C. L’évaluation, règles du jeu. Paris: ESF éditeur, 1989.
___. L’évaluation des actions éducatives. Paris: PUF, 1992a.
___. Penser et agir l’éducation. Paris: ESF éditeur, 1992b.
___. L’évaluation démystifiée. Paris: ESF éditeur, 1997a.
___. Pour une éthique de l’agir évaluationnel. Mesure et évaluation en éducation, v. 20, n. 2, p. 7-26,
1997b.
HUBERMAN, M. Assurer la réussite des apprentissages scolaires? Les propositions de la
pédagogie de maîtrise. Neuchâtel et Paris: Delachaux et Niestlé, 1988.
MONTEIL, J.M. Eduquer et former: perspectives psycho-sociales. Grenoble: PUG, 1989.
PERRENOUD, Ph. L’évaluation des élèves. Bruxelles: De Boeck Université, 1998.
PERRON, R. Les représentations de soi. Toulouse: Privat, 1991.
PIÉRON, H. Examens et docimologie. Paris: PUF, 1963.
PROST, A. L’école et l’évolution de la société. Esprit, p. 11-12, p. 17- 24, 1982.

ATIVIDADE
(...) registraremos aqui o fato de que hoje se sabe que a avaliação não é uma medida pelo
simples fato de que o avaliador não é um instrumento, e porque o que é avaliado não é um
objeto no sentido imediato do termo. Todos os professores avaliadores deveriam, portanto,
ter compreendido definitivamente que a “nota verdadeira” quase não tem sentido. (SOUZA,
2008, p. 34)

De acordo com o trecho anterior, retirado do texto de Clarilza Prado de Souza “Avaliação
escolar: limites e possibilidades” da PUC/SP (Série Ideias n. 22), disponível na página eletrô-
nica do Centro de Referência Mário Covas, reflita:
Alguma vez você já pensou que a avaliação fosse parecida com um remédio? Ideia es-
tranha, não é? Mas, neste texto, você vai perceber que a avaliação, assim como os remédios,

capítulo 1 • 37
tem propriedades, pode produzir reações adversas e efeitos colaterais. E ainda mais: que de-
vem ser tomadas precauções ao utilizá-la, que existem indicações e contraindicações, assim
como há uma maneira correta de empregá-la (posologia).

01. Confira o texto e faça uma reflexão sobre a forma como você tem utilizado esse remédio.
Registre suas impressões aqui.

REFLEXÃO
Pensar nas práticas de avaliação é pensar em um processo reflexivo que precisa ser cons-
tantemente observado.
Assim, se “ (...) reflexão envolve relacionar-se com os outros, ouvi-los e ser ouvido”, como
apontado por Paige- Smith & Craft (2010), torna-se fundamental analisar os processos ava-
liativos através de práticas reflexivas que envolvam as perspectivas de todos os envolvidos
na prática avaliativa.
Deste modo, avaliar pressupõe “olhar” atentamente para o que se pretende com a avalia-
ção, para assim realizar escolhas devidas, e pensar a avaliação como um instrumento funda-
mental para repensar caminhos.

LEITURA
•  Leiam o texto:
“Indicadores de qualidade do ensino e seu papel no sistema nacional de avalia-
ção” dos autores: João Batista Gomes Neto e Lia Rosenberg (1995).
Este texto possibilitará uma importante reflexão sobre os instrumentos avaliativos e suas
funções em nossa sociedade e prática educativa.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AFONSO, Almerindo Janela. Avaliação Educacional: Regulação e Emancipação. São Paulo:
Cortez, 2000.
BLOOM, B. S.; HASTINGS, J. T. MADAUS, G. F. Evaluación del aprendizagen. Argentina: Troquel,
1975.

38 • capítulo 1
BRASIL. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). O que é
IDEB? Brasília. Disponível em < portal.inep.gov.br> Acesso em: 22 de fev. 2016.
CALDEIRA, Anna M. Salgueiro. Ressignificando a avaliação escolar. UFMG – PAIUB. Belo
Horizonte, p. 122-129, set-out. 2000.
CHUEIRI, Mary Stella Ferreira. Concepções sobre a avaliação escolar. Estudos em Avaliação
Educacional. São Paulo: v. 19, n. 39, p. 49-64, jan./abr., 2008.
DIAS SOBRINHO, José. Avaliação: Políticas e reformas da educação Superior. São Paulo: Cortez,
2003.
HADJI, Charles. A avaliação desmistificada. Porto Alegre: Artmed, 2001.
HAYDT, Regina Célia Cazaux. Curso de didática Geral. São Paulo: Ática, 2006.
LIBÂNEO, José Carlos. Didática. 28. ed. São Paulo: Cortez, 2008.
LOURENÇON, B. N.; MALAGOLLI, G. M. M. Organização, planejamento e avaliação dos anos
iniciais do Ensino Fundamental. Uniseb Interativo. Ribeirão Preto. 2015.
LUCKESI, Cipriano. Avaliação da aprendizagem na escola: reelaborando conceitos e recriando a
prática. Salvador: Malabares Comunicação e Eventos, 2003.
SOUZA, Clarilza Prado de. Avaliação escolar: limites e possibilidades. In: Série Ideias n. 22. São Paulo:
FDE, 1994.

capítulo 1 • 39
40 • capítulo 1
2
As políticas de
avaliação da
educação básica
2.  As políticas de avaliação da educação
básica

Neste capítulo apresentaremos alguns aspectos relativos ao conceito de ava-


liação no contexto das políticas avaliativas da Educação Básica, abordando
perspectivas sobre a avaliação da aprendizagem em nosso país. Buscaremos
dialogar com importantes especificidades e características que envolvem os
processos avaliativos além de refletir sobre as diferentes funções da avaliação
diante de objetivos específicos dentro das diretrizes que orientam o sistema de
avaliação da educação básica brasileira.

OBJETIVOS
Neste capítulo esperamos que você possa:
•  analisar os fatores determinantes para a adoção das políticas de avaliação da educação
básica em nosso país;
•  compreender a proposta do Sistema de Avaliação Educação Básica;
•  compreender os fatores determinantes para a adoção das políticas de avaliação no ensi-
no superior;
•  refletir criticamente a proposta do Exame Nacional dos Cursos;
•  rntender as mudanças qualitativas promovidas pelo Sistema Nacional de Avaliação da Edu-
cação Superior.

2.1  Sistema de Avaliação Educação Básica

2.1.1  Fatores determinantes para a adoção das políticas de avaliação da


educação básica em nosso país

Sabemos que a avaliação está presente em todos os contextos educacionais, vi-


sando ora analisar o rendimento do sistema, ora dos alunos, medindo assim o
processo de ensino-aprendizagem, de modo a contribuir com a qualidade da
educação oferecida. Deste modo, a necessidade de avaliação de conhecimen-
tos, desde a educação básica até o ensino superior, se faz presente para que seja

42 • capítulo 2
possível refletir acerca de como os currículos e seu aproveitamento estão sendo
aplicados no dia a dia das instituições escolares.
Sendo assim, a avaliação no sistema educacional, desde a educação básica
ao ensino superior vem ocupando importante espaço nos debates atuais sobre
educação. No entanto, percebe-se que a avaliação, comprometida com as prá-
ticas inovadoras reveste-se de uma necessidade constante de revisão do fazer
pedagógico, para que assim, seja evidenciada a partir dos reais objetivos que
ela tem.
Neste cenário avaliativo, o sistema de ensino da educação brasileira apre-
senta seus objetivos de forma subordinada aos anseios da sociedade, assim tais
objetivos devem expressar questões sociais na formulação das políticas educa-
cionais. Neste panorama encontram-se como pressupostos que envolvem a ava-
liação a universalização do acesso à escola, bem como a equidade e a qualidade.
É no conjunto dessas políticas que o sistema se planeja e operaliza suas
ações avaliativas.
Após a definição dos objetivos é possível estabelecer metas e estratégias
para atingi-los de modo a considerar as melhores estratégias para tanto.
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Um sistema nacional de avaliação deve, portanto, acompanhar os resulta-


dos atingidos, tanto no que se refere às metas como aos padrões. Sendo assim,
os indicadores avaliativos podem aferir quantidades para que o sistema de
avaliação possa estabelecer comparações entre o que foi planejado e o que foi
observado, visando assim constatar ou não a eficiência da política educacio-
nal adotada.
Como vimos no capítulo 1, no Brasil o principal marco da avaliação educa-
cional é o Saeb (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica).

capítulo 2 • 43
Este sistema teve seu início no final da década de 1980 e se constituiu hoje no princi-
pal sistema de avaliação diagnóstica da educação brasileira. O Saeb é a conjunção de
teses de desempenho aplicados aos estudantes com questionários, sobre fatores e
associados a tais resultados, endereçados a diferentes atores que compõem a escola.
O Saeb foi idealizado para conter amostras e de turmas representativas do país, das
regiões e dos estados, para as escolas públicas e privadas (FERNANDES E GRE-
MAUD, 2009, p. 10).

Ressalta-se que o Saeb é compreendido de maneira positiva em muitos es-


tudos sobre este tema. De acordo com autores citados anteriormente, os dados
apresentam que o Saeb garantiu qualidade e confiabilidade às avaliações rea-
lizadas no Brasil e que através deste sistema avaliativo foi possível introduzir e
consolidar uma cultura de avaliação no país. No entanto, os autores afirmam
que, com o Saeb foi possível detectar dificuldades com a qualidade da educação
brasileira, mas que, devido ao seu caráter amostral, ele não respondia a todas
as necessidades de informação e não apreendia toda a diversidade educacional
do país, principalmente frente à ampla descentralização e municipalização que
caracterizou a educação brasileira após os períodos de redemocratização.
Devido a esta constatação, o MEC em parceria com o INEP organizou outra
proposta avaliativa - a Prova Brasil que surgiu em 2005, visando complementar as
informações do Saeb, como avaliação diagnóstica, permitindo que todos os siste-
mas educacionais públicos do Brasil se sentissem contemplados nas avaliações.
A principal diferença entre o Saeb e a Prova Brasil, está no fato de a Prova
Brasil ser censitária e o Saeb amostral, ambas realizadas através de adesão vo-
luntária das escolas de ensino fundamental do Brasil.
Já em relação ao Ensino Médio, contamos com o Enem (Exame Nacional do
Ensino Médio) que foi criado em 1998 em caráter voluntário pelos estudantes
que estavam terminando esta etapa. Com o passar do tempo, muitas institui-
ções de ensino superior foram adotando os resultados deste exame como cri-
tério, parcial ou exclusivo, para seleção de alunos em seus cursos. Desde 2005,
o Enem é utilizado inclusive para critério de concessão de bolsas, de âmbito
federal, do Programa Universidade para Todos (ProUni).
O que se percebe então, é que os indicadores, como Saeb, Prova Brasil, entre
outros, são importantes instrumentos avaliativos, que precisam ser compreen-
didos de maneira crítica dentro do que se propõem a realizar.

44 • capítulo 2
Sendo assim, como aponta Rosenberg (1995):

O objetivo central de um sistema de avaliação é fornecer informações que possam


orientar as políticas educacionais de modo a apoiar ações que visam à melhoria da
qualidade do ensino. Sua principal preocupação está relacionada com os pressu-
postos do sistema e, deverá verificar se eles estão sendo respeitados (...). Seu papel
é acompanhar o desempenho do sistema educacional e não produzir pesquisa em
educação, embora deva fomentá-la (p. 13).

Como aponta Fernandes e Gremaud (2009), “é preciso reconhecer que to-


das as medidas utilizadas em avaliações educacionais são imperfeitas, por não
levarem em conta todos os aspectos que se gostaria de considerar e por medir
com erros (sistemáticos e/ou aleatórios) os aspectos que elas se propõem ava-
liar” (p. 4).
Sendo assim, tais instrumentos devem ser devidamente compreendidos a
partir de seus objetivos e metas, sendo instrumentos de avaliação que não pos-
suem fim em si mesmo, mas que objetivam acompanhar a qualidade da educa-
ção brasileira em suas nuances.
Com este olhar teremos um melhor aproveitamento dos processos avalia-
tivos que constituem o sistema educacional brasileiro, vislumbrando avanços
nas políticas educacionais, e de diversos fatores determinantes para a devida
escolha e adoção das políticas subjacentes à educação básica em nosso país.
Vale mencionar que as avaliações realizadas com tais objetivos não podem
ser confundidas, ou mesmo aplicadas, com fins avaliativos individuais ou es-
pecíficos de um grupo. Para avaliações escolares, planejadas e aplicadas pelos
docentes, a discussão se estende no capítulo 3, que dialoga sobre as dimensões
da avaliação no espaço escolar, pensando na relação estabelecida diariamente.

CONEXÃO
Conheça as diretrizes da LDBEN 9.394/96 sobre a avaliação na educação básica . BRASIL.
Senado Federal. Lei n° 9.394 de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases
da Educação Nacional. Brasília/DF, 1997.

capítulo 2 • 45
2.2  Avaliação no Ensino Superior

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Os métodos de avaliação ocupam, sem dúvida, espaço relevante no conjun-


to das práticas pedagógicas aplicadas aos processos de ensino e aprendizagem
em todos os níveis de ensino.
No ensino superior é constante perceber que as avaliações anteriores tra-
zem marcas, positivas ou negativas nos alunos, que se deparam neste novo ci-
clo educativo com práticas avaliativas de sala de aula universitária que carre-
gam algumas percepções nem sempre reflexivas.
Nota-se que no meio acadêmico há uma busca constante para reflexão em
torno do processo avaliativo, principalmente pelos educadores que objetivam
realizar uma prática diferenciada de avaliação, abarcando formas mais refle-
xivas de avaliar. Contudo, os caminhos ainda não estão muito claros e fáceis,
uma vez que nem sempre esta ideia apresenta consonância com toda a Unidade
Acadêmica.
Assim, Mason (1998, apud SANTANA, 2010),

Destaca a importância da interatividade no processo de aprendizagem dentro do novo


contexto educacional, influenciando diretamente o ensino na educação superior. As
discussões sobre avaliação há muito tempo estão presentes dentro das universida-
des, a reflexão teórica sobre as questões pedagógicas, mais especificamente sobre
o processo de ensino-aprendizagem em cursos superiores é debatida principalmente
nas universidades públicas, o que caracteriza esta questão, como uma questão não
tão nova (p. 8).

46 • capítulo 2
Santana (2010), ressalta ainda que, em seus estudos alguns autores de-
fendem que na educação superior a avaliação tem uma função conformativa
da escola, em que as notas e conceitos são decisivos para a continuidade dos
estudos, determinando assim o seu sucesso ou o seu fracasso acadêmico, o
que impede uma prática reflexiva conforme proposto pelo PCN (Parâmetros
Curriculares Nacionais).
Com base nos PCN (Brasil, MEC; 1997) o termo avaliação pretende superar
sua concepção tradicional, compreendendo-a como parte integrante e intrín-
seca do processo educacional sendo esta contraposta à avaliação tradicional,
que é considerada restrita ao julgamento sobre sucessos ou fracassos do aluno
(SANTANA, 2010).
Os projetos políticos pedagógicos das instituições de ensino superior, em
suma, preconizam o apoio a formação de um cidadão, sendo culto, profissional
competente, e capacitado para resolução de problemas pertinentes a uma ou
mais áreas de conhecimento. No entanto, ao avaliar, nota-se uma dificuldade
estrutural em considerar tais aspectos e inserir nas práticas didáticas diferen-
tes formas de avaliação coerentes com a reflexão crítica que se propõe na teoria.
Neste sentido, é preciso ter em mente que avaliar não é apenas um instru-
mento baseado em práticas mecânicas do conceito formal e estatístico, ou seja,
não é, simplesmente, atribuir notas e medidas obrigatórias para a decisão de
avanço ou retenção em determinada disciplina.
É assim, fundamental representar as avaliações, compreendendo-as como
instrumentos imprescindíveis à verificação do aprendizado efetivamente reali-
zado pelo aluno, mas que também forneça subsídios ao trabalho docente, pro-
porcionando reflexões sobre as escolhas e os caminhos seguidos. Desta forma,
a avaliação poderá direcionar o esforço empreendido no processo de ensino e
aprendizagem buscando contemplar a melhor abordagem pedagógica, os mé-
todos didáticos adequados à disciplina e os objetivos que se pretendem atingir
com um modelo avaliativo em determinado momento.
A partir disso, a avaliação deve contemplar uma concepção mais ampla,
uma vez que envolve a apreciação de aspectos qualitativos, ela deve ser com-
preendida como uma ação reflexiva do processo da aprendizagem, pois é um
instrumento essencial no desenvolvimento social, afetivo e cognitivo.
No sistema educacional, a avaliação deve acontecer de forma organizada e
planejada de acordo com as normas que regem o sistema de ensino.
Bloom (1975) esclarece que a avaliação pode ser considerada como um mé-
todo de adquirir e processar evidências necessárias para melhorar o ensino e a

capítulo 2 • 47
aprendizagem, incluindo uma grande variedade de evidências que vão além do
usual de "papel e lápis". Sendo um auxílio para clarificar os objetivos significa-
tivos e as metas educacionais, um processo para determinar em que medida os
alunos estão se desenvolvendo dos modos desejados, um sistema de controle
da qualidade, pelo qual pode ser determinada, etapa por etapa do processo en-
sino-aprendizagem, a efetividade ou não do processo e, em caso negativo, que
mudanças devem ser feitas para garantir sua efetividade.
Assim, a avaliação pode ser compreendida também como um instrumen-
to para a prática educacional visando verificar se os procedimentos escolhidos
para o processo de ensino-aprendizagem são de fato efetivos ao alcance de um
conjunto de fins educacionais.
Assim sendo, os mecanismos avaliativos devem buscar verificar, principal-
mente, a qualidade do processo de ensino-aprendizagem, mostrando as difi-
culdades dos alunos e reorientando o trabalho do professor, proporcionando
uma sintonia entre os aspectos qualitativo e quantitativo.
Para a avaliação dos estudantes do ensino superior atualmente, nota-se
uma necessária reformulação, para o uso excessivo dos aspectos quantitativos
nas avaliações, pois à medida que se busca evitar, que o aluno transforme-se em
um mero copiador e um depósito de conteúdos, transformando-se em um ser
pensante, crítico e reflexivo, as avaliações precisam ser coerentes.
É fundamental, portanto, que as práticas avaliativas contemplem a visão so-
bre o aluno como um ser social e político, dotado de experiências e em confor-
midade com o senso crítico, sujeito de seu próprio desenvolvimento.
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Pensando nesta direção, dentre as avaliações que são realizadas no ensino


superior encontra-se a avaliação institucional, que muitas vezes é encarada

48 • capítulo 2
como uma estratégia para a regulação da qualidade mas também como um re-
curso para a autonomia das instituições.
As primeiras articulações no Brasil, executadas com o objetivo de discutir a
educação foram realizadas pelo Instituto Nacional de Ensino e Pesquisa Anísio
Teixeira – INEP – que teve seu início em 1937, produzindo assim indicadores e
um sistema de informações quanto ao processo de regulamentação, exercido
pelo MEC. Assim o INEP passou a ser o primeiro órgão nacional a se estabele-
cer de forma duradoura como fonte primária de documentação e investigação,
com atividades de intercâmbio e assistência técnica.
A natureza da regulação em educação superior envolve uma perspectiva
de avaliação da condição ou do nível de desempenho do objeto regulado, ou
mesmo da ação para modificar essa condição ou nível. Assim, o conceito inclui
medir o desempenho quando comparado com as expectativas definidas, bus-
cando a certificação da qualidade.
Pode-se afirmar que a avaliação institucional nesta óptica vem se consti-
tuindo em um tema central das políticas públicas de educação em geral, pas-
sando a contribuir de forma cada vez sistemática para a regulação dos padrões
de qualidade educacional que se busca tanto no Brasil como no mundo.
De acordo com as normatizações o documento que orienta do Sistema
Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes), desde 2004, aponta ser o
Estado o órgão que deve supervisionar a educação superior no que se refere ao
planejamento e a garantia de qualidade do sistema. Portanto,

cabe estabelecer clara e democraticamente a sua política e, para viabilizá-la, os seus


aparatos normativos de controle, fiscalização supervisão, vem como o meio para im-
plementá-los. Seu papel não se limita à regulação no sentido do controle burocrático
e ordenamento; compete-lhe também avaliar a educação superior de modo a fornecer
elementos para a reflexão e propiciar melhores condições de desenvolvimento. Cabe
aos organismos de governo e às instituições educativas elaborar diagnósticos gerais
sobre a qualidade, a relevância social e científica, a equidade, a democratização do
acesso, o desenvolvimento da produção científica, artística e tecnológica, a formação
segundo critérios do trabalho e da cidadania etc., no âmbito da educação superior
(BRASIL/INEP/SINAES, 2004, p. 87).

capítulo 2 • 49
Deste modo, a importância e a relevância da avaliação institucional implica
qualidade da educação superior, utilizando como instrumentos a modalidade
de autoavaliação institucional ou de exames voltados para a quantificação dos
resultados da aprendizagem de estudantes.
Os instrumentos que contribuem para a produção de indicadores de quali-
dade e os processos de avaliação de cursos desenvolvidos pelo Inep são o Exame
Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade) e as avaliações in loco realiza-
das pelas comissões de especialistas.
Na avaliação do Enade, os alunos ingressantes e concluintes dos cursos es-
colhidos para a avaliação, realizam uma prova de formação geral e formação
específica objetivando verificar as condições de ensino, em especial aquelas
relativas ao perfil do corpo docente, as instalações físicas e a organização didá-
tico-pedagógica (ver tabela a seguir sobre o conceito Enade).
Sabe-se que para uma avaliação dos cursos superiores é estabelecido pe-
los órgãos responsáveis uma realização periódica de três tipos de avaliação.
Esses três tipos envolvem a autorização, o reconhecimento e a renovação de
reconhecimento conquistado. Estas formas de avaliação são de suma impor-
tância, dado que todas as informações obtidas são utilizadas pelas Instituições
de Ensino Superior, tanto para orientação da sua qualidade institucional como
para real efetividade acadêmica e social, à medida que tais resultados obtidos
visam orientar a organização de políticas públicas e auxiliar estudantes, pais de
alunos, instituições acadêmicas e público em geral, sobre as decisões quanto à
realidade dos cursos e das instituições. (INEP, MEC, online 2010).
Neste sentido, Popkewitz, (1997) menciona que, a avaliação institucional
de ensino superior não se constitui em ação isolada, mas sim como parte de
um grande projeto de reforma de políticas públicas que na educação aponta a
avaliação como um meio para solucionar os problemas existentes, pois suben-
tende-se que avaliação diante de todos os aspectos que a cerca, proporciona
mudanças qualitativas no sistema educacional.

CONCEITO
Explicando melhor o Enade:
O Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade) avalia o rendimento dos
alunos dos cursos de graduação, ingressantes e concluintes, em relação aos conteúdos
programáticos dos cursos em que estão matriculados. O exame é obrigatório para os alu-

50 • capítulo 2
nos selecionados e condição indispensável para a emissão do histórico escolar. A primeira
aplicação ocorreu em 2004 e a periodicidade máxima da avaliação é trienal para cada área
do conhecimento.
Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade) é um dos procedimentos de
avaliação do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes). O Enade é rea-
lizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP),
autarquia vinculada ao Ministério da Educação (MEC), segundo diretrizes estabelecidas pela
Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior (Conaes), órgão colegiado de coor-
denação e supervisão do Sinaes.
O Enade é componente curricular obrigatório aos cursos de graduação, conforme deter-
mina a lei nº 10.861/2004. É aplicado periodicamente aos estudantes de todos os cursos
de graduação, durante o primeiro (ingressantes) e último (concluintes) ano do curso. Será
inscrita no histórico escolar do estudante somente a situação regular em relação a essa
obrigação, atestada pela sua efetiva participação ou, quando for o caso, dispensa oficial pelo
Ministério da Educação, na forma estabelecida em regulamento.
O Enade tem como objetivo o acompanhamento do processo de aprendizagem e do
desempenho acadêmico dos estudantes em relação aos conteúdos programáticos previstos
nas diretrizes curriculares do respectivo curso de graduação. Seus resultados poderão produ-
zir dados por instituição de educação superior, categoria administrativa, organização acadê-
mica, município, estado, região geográfica e Brasil. Assim, serão construídos referenciais que
permitam a definição de ações voltadas à melhoria da qualidade dos cursos de graduação
por parte de professores, técnicos, dirigentes e autoridades educacionais.
Disponível em: <http://portal.inep.gov.br/>

O que é “Conceito Enade”?


O Conceito Enade é um indicador de qualidade que avalia o desempenho dos estudantes
a partir dos resultados obtidos no Enade.
Ele é divulgado anualmente para os cursos que tiveram estudantes concluintes partici-
pantes do Enade. O seu cálculo, no entanto, não é necessariamente realizado por curso, mas
por Unidade de Observação.
A Unidade de Observação consiste no conjunto de cursos que compõe uma área de
enquadramento específica do Enade de uma Instituição de Educação Superior em um de-
terminado município.
As Unidades de Observação com apenas um ou sem nenhum concluinte participante
não obtêm o Conceito Enade, ficando Sem Conceito (SC).

capítulo 2 • 51
Para um entendimento detalhado de como o cálculo do conceito Enade é feito, consulte
a Nota Técnica referente ao ano desejado.
O Conceito Enade é calculado desde 2004 e os resultados estão disponíveis para
download.
Fonte: http://portal.inep.gov.br/

ATIVIDADE
“Desista de informar e “enformar”, liberte o seu aluno, e se liberte com ele, da escravidão dos
dados estatísticos. Nem tudo pode ser comprovado estatisticamente (...). Valorar faz parte da
caminhada? Sim. E rotular, estigmatizar, ferrar, marcar, massificar? Não. Jamais esqueça de
conjugar: Eu sou, tu és, nós somos humanos”.
Ilza Martins Sant’anna

01. Sobre a afirmação anterior, reflita: Como podemos pensar um processo avaliativo que
não “deforme” os conhecimentos e saberes dos alunos? Comente a respeito.

REFLEXÃO
Avaliação do aluno e/ou avaliação da instituição que oferece educação, são formas de com-
preender como está ocorrendo o processo de ensino e aprendizagem. São maneiras de
repensar os caminhos escolhidos e se fazem importantes nos mais variados momentos em
que são realizados... Porém... devemos enfatizar que a avaliação é muito mais do que aplica-
ção de testes, levantamento de medidas, formas de seleção ou classificação de alunos e/
ou instituições. É preciso sempre ter em mente que a avaliação aplicada não deve ser usada
apenas como instrumento de medida, mas também deve ser utilizada através da sua função
norteadora, possibilitando localizar acertos e erros... deslizes e possibilidades de recomeços,
ou seja, localizar onde estão as deficiências da instituição, do corpo docente e dos procedi-
mentos metodológicos adotados que apontaram tal resultado.

52 • capítulo 2
LEITURA
Leia o artigo indicado e reflita sobre a avaliação da aprendizagem realizada no ensino superior.
“A avaliação da aprendizagem no ensino superior” Adriana Lima Abreu. Disponívem
em: <http://meuartigo.brasilescola.com/educacao/a-avaliacao-aprendizagem-no-ensino-
superior.htm>.
Além deste artigo, leia o artigo: “O sistema nacional de avaliação: características,
dispositivos legais e resultados” de Isabelle Fiorelli Silva.Disponível em:<http://www.fcc.
org.br/pesquisa/publicacoes/eae/arquivos/1602/1602.pdf>.

LEITURA COMPLEMENTAR
A avaliação da educação básica no Brasil:
dimensão normativa, pedagógica e educativa

Dirce Nei Teixeira de Freitas Campinas, SP: Autores Associados, 2007, 224 p.

Escrito originalmente como tese de doutoramento da autora, o texto aborda o complexo


tema da avaliação da perspectiva de sua utilização no campo da política pública para a edu-
cação básica, no Brasil, no período 1988-2002.
A atualidade e importância acadêmica dessa abordagem são inegáveis. A produção so-
bre a avaliação em larga escala no país mostra-se não só escassa, mas polarizada entre a crí-
tica da sua lógica economicista e a afirmação da necessidade de aprimorá-la e bem utilizá-la
como ferramenta de regulação do Estado.
Neste segundo polo, as abordagens descritivo-analíticas são comuns, enquanto no pri-
meiro estão as análises voltadas à crítica ideológica e política das iniciativas estatais. Sem
cair nessa polarização, a autora oferece elementos para o leitor pensar o Estado-avaliador
brasileiro como síntese do Estado-regulador e do Estado-educador. Analisa como se deu a
emergência e a afirmação da avaliação em larga escala na regulação da educação básica no
país e como ela operou enquanto ação educativa estatal. Orienta os seus procedimentos no
sentido de conhecer o processo, sua razão de ser, sua força normativa, natureza pedagógica
e suas implicações educativas.
No primeiro capítulo, por meio de uma retrospectiva histórica institucional, a autora mos-
tra como, no caso brasileiro, a avaliação veio a se tornar uma importante ferramenta de po-
lítica pública no campo da educação básica, explicitando as vias utilizadas, as articulações

capítulo 2 • 53
estabelecidas, os fatores impulsionadores, as “razões de Estado”, bem como a posição dos
agentes e interlocutores estratégicos na relação entre Estado, sociedade e educação.
A autora observa que somente ao término dos anos 1980 o interesse estatal pela avalia-
ção culminaria numa prática mais sistemática e de larga escala que, coerente com o projeto
de modernização da administração estatal, se distancia do debate acadêmico sobre educa-
ção e democracia desse período.
No contexto da crescente internacionalização do trato das questões educacionais, ela
seria um “dispositivo” útil na mediação entre o local e o global. A retrospectiva termina cha-
mando a atenção para peculiaridades do Estado brasileiro do período 1930-1988, que se-
riam importantes para a compreensão da ação reguladora e educadora do Estado. Afirma a
autora que essa ação se configura na inexistência de um projeto hegemônico (econômico e
político), o que enseja reformismo com uma agenda restritiva para a área social.
No caso da educação básica, a estratégia de descentralização conjugada com o controle
centralizado passa a ter na avaliação externa e em larga escala importante ferramenta. No se-
gundo capítulo, a autora trata do processo de montagem e instituição do complexo de regula-
ção “medida-avaliação-informação” da educação básica brasileira, no período 1988-2002, cujo
intuito seria vencer a falta de equidade, qualidade e eficiência na educação brasileira.
Nessa direção, por meio de um competente tratamento descritivo e analítico-crítico do
processo normativo legal, mostra como se deu a afirmação da avaliação como ferramenta
da nova regulação educacional no país. O Estado brasileiro, segundo a autora, cuidou não
apenas de estabelecer normas jurídico-legais e político-administrativas com vistas às mu-
danças pretendidas, mas agiu operacionalmente por meio da avaliação em larga escala e da
concentração da informação educacional. Com isso, ocorreu [...] acentuada subordinação do
CNE ao MEC, com o que a ação normativa desse órgão reforçou a regulação central [...]. Em
contrapartida, o INEP concentrou poder decisório e operacional, tornando-se o órgão “men-
surador-avaliador” da educação no país.
Esses caminhos ensejaram uma ampliação extraordinária do aparato de regulação do
Estado central. (p.120) Para evidenciar sua constatação, Freitas apresenta (p.128-132) dois
quadros nos quais elenca as normas, as ações e os eventos realizados como fórum de dis-
cussão e mobilização das ações governamentais para a educação básica no Brasil.
No entanto, a montagem do aparato para medir-avaliar-informar, sua expansão e contí-
nua calibração têm, segundo a autora, relativo êxito na regulação da educação básica, pois
“[...] a realidade escolar insiste em descortinar os estreitos limites dentro dos quais tal aparato
opera, bem como as análises reducionistas que propicia” (p. 98). Para Freitas, o desafio pas-
sa pelo estabelecimento de políticas públicas que contemplem a “escola real”, que comparti-
lha cotidianamente com alunos e professores o “mal-estar social” que vigora numa sociedade
e Estado minimamente comprometidos com o bem-estar social.

54 • capítulo 2
No terceiro capítulo, a autora passa para o seu propósito final: o funcionamento do com-
plexo de regulação educacional pelo qual o Estado-educador se manifestou e operou como
Estado-avaliador. Tendo passado em “revista” a dimensão normativa do Estado brasileiro no
que diz respeito à avaliação da educação básica, a autora caminhou para evidenciar como se
deu a tessitura das dimensões pedagógica e educativa da ação estatal.
Para isso busca os princípios, os meios e as formas de atuação do Estado que caracteri-
zam a dimensão pedagógica e configuram os aspectos formativos do agir estatal. Apoiando-se
na noção “Estado-educador” de Gramsci, as análises da autora podem ser questionadas por
algum marxiano de “plantão” que assevera ser o “[...] Estado que necessita [...] uma educação
severa” (MARX, 1975, p. 56). Todavia, tal discussão não cabe no momento, importa lembrar
que, “[...] tendo natureza histórica, o Estado-educador e o Estado-avaliador emergem do con-
texto histórico que define e emoldura o próprio Estado e a sua relação com a sociedade” (p.
134). De fato, a reestruturação da organização e gestão do sistema educacional na América
Latina ocorrida nos anos 1990 trouxe, em graus diferenciados, a mudança do caráter regu-
lador do Estado com a crescente importância das redes de informação e comunicação, para
facilitar e fortalecer a capacidade de gestão nos diferentes níveis do sistema.
No Brasil, o Estado-avaliador resultaria do empenho do Estado-educador em difundir
[...] determinados conhecimentos, valores e visões de mundo, signos e símbolos da cultura
hegemônica, tendo sido ela condicionada por uma “agenda globalmente estruturada para a
educação”. Isso se deu especialmente por meio de fixação de parâmetros e diretrizes curricu-
lares nacionais, de certo controle editorial, de um “novo” modelo de gestão e de mecanismos
e de práticas de controle e de avaliação.
No avanço do Estado-avaliador, a avaliação “[...] passou a ser uma das mediações impres-
cindíveis e valorizadas num planejamento cuja conformação tem-se dado [...] na/pela relação
entre âmbitos internacional, nacional e local [...]” (p. 140). Assim, o Estado-avaliador se firmou
e ascendeu “[...] pelo rearranjo institucional e administrativo estratégico para que o projeto de
modernização conservadora da sociedade brasileira lograsse ser hegemônica no País” (p. 148).
Ninguém melhor do que a própria autora poderia sintetizar a conclusão de sua pesquisa,
que, aliás, deve figurar como obrigatória na bibliografia sobre avaliação da educação básica: “re-
conhece-se a legitimidade e a indispensabilidade do Estado-educador para qualificar a educa-
ção básica brasileira, como, também, a possibilidade de que o Estado-avaliador se constitua em
uma mediação profícua para tanto” (p. 151). Ou seja, a rigor, a autora conclui pela preservação
da atuação estatal como o agente habilitado para gerenciar os destinos da educação básica,
contudo, aponta algumas condições necessárias para que se impeça o desvirtuamento que
ocorre no interior do Estado, como, por exemplo, “[...] a atuação efetiva de um Estado provedor
do direito à educação de todos, sem exceções e sem soluções precárias [...]” (p. 151).

capítulo 2 • 55
Finalmente mister se faz deixar claro que apresentamos apenas um “trailer” do riquíssimo
estudo realizado pela autora à guisa de um convite para que o leitor, especialmente aqueles
interessados na avaliação da educação básica, confira, na íntegra, a contribuição da autora.
Contudo, alertamos: o texto não contém “receitas” de alcance limitado e até duvidoso, trata-se
de uma reflexão teórica densa recomendada como fonte de consulta.
Melhor dizendo, sem querer separar os aspectos teóricos e as aplicações práticas, o
estudo de Freitas não se configura “um manual de avaliação”, isto é, um livro no qual os
educadores “aprenderiam” a avaliar seus alunos. O que os formadores e os “formadores de
formadores” nele encontrarão são os fundamentos da avaliação em larga escala e sua utiliza-
ção como estratégia de governo, com o fito de reger e controlar a educação básica no Brasil.
Assim, poderão esclarecer a seus alunos, e futuros educadores, o que representa no
cotidiano da escola e na avaliação de sala de aula o Sistema Nacional de Avaliação da Edu-
cação Básica (Saeb) e o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e outros. Em suma, não
se trata de uma leitura fácil, nem poderia, visto ser resultado de uma tese de doutoramento,
mas certamente quem se dispuser a ler, mesmo que por diletantismo, se surpreenderá com a
excelente qualidade do texto. A autora, como ocorre com os grandes escritores, leva a sério
o seu assunto.
Ainda há, nesse livro, um último aspecto que deve ser ressaltado, a autora parece não
temer o debate. Com ousadia e contra uma tendência quase hegemônica no interior da inte-
lectualidade brasileira, Freitas afirma e argumenta a improcedência da tese de se atribuir a
iniciativa do Estado brasileiro de introduzir a regulamentação avaliativa na educação básica
desde a imposição de organismos internacionais, embora não seja ingênua a ponto de negar
a nítida influência deles em tal iniciativa.
A coragem da autora vai além ao afirmar que é igualmente improcedente a tese de se
atribuir ao Governo FHC (1995-2002) a exclusiva responsabilidade pela criação das con-
dições potencializadoras da força normativa do Estado na educação básica. Enfim, entre o
risco do “adesismo” e o risco de expor teoricamente, preferiu o último. A nosso ver, uma boa
escolha, pois assim seu trabalho será um estímulo ao debate e à pesquisa na área. Além do
excelente nível de produção acadêmica, o texto é um exemplo de trabalho metodologica-
mente fecundo e rigoroso, e, ao mesmo tempo, historicamente rico e desafiador, pois aponta
possibilidades para novas pesquisas.
Nilce Aparecida da Silva Freitas Fedatto Professora Doutora do Programa de Pós-
-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Grande
Dourados/MS nfedatto@globo.com

56 • capítulo 2
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira (INEP). O Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes). Brasília: INEP,
2004.
BRASIL, Ministério da Educação. Parâmetros curriculares Nacionais. Disponível em: <http://portal.
mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro01.pdf>. Acesso em fev. 2016.
BLOOM, B. S.; HASTINGS, J. T. MADAUS, G. F. Evaluación del aprendizagen. Argentina: Troquel,
1975.
FERNANDES, R. GREMAUD, A. Qualidade da educação: avaliação, indicadores e metas. In: VELOSO,
F. et al. (Org.). Educação básica no Brasil: construindo o país do futuro. Rio de Janeiro: Elsevier,
2009.
LOURENÇON, B. N.; MALAGOLLI, G. M. M. Organização, planejamento e avaliação dos anos
iniciais do Ensino Fundamental. Uniseb Interativo. Ribeirão Preto. 2015.
NETO, J. B. G. e ROSENBERG, L. Indicadores de qualidade do ensino e seu papel no sistema
nacional de avaliação. Aberto: Brasília, ano 15, n. 66, abr/jun. 1995.
POPKEWITZ, T. S. Reforma Educacional: uma política sociológica – poder e conhecimento em
educação. Traduzido por Beatriz Affonso Neves. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
SANT'ANNA, I. M. Por que Avaliar? Como Avaliar?: Critérios e Instrumentos. Petrópolis: Vozes,
1995.
SANTANA, M. T. A importância da avaliação no ensino superior: As várias formas de avaliação.
Maringá, 2010.

capítulo 2 • 57
58 • capítulo 2
3
As dimensões da
avaliação
3.  As dimensões da avaliação
Neste capítulo iremos dialogar sobre as concepções de aprendizagem, os objeti-
vos de ensino e as tendências pedagógicas na sociedade moderna que envolvem
a prática avaliativa atual. Buscaremos compreender criticamente as dimensões
da avaliação e os diferentes tipos de instrumentos e estratégias da avaliação da
aprendizagem, pensando a avaliação numa perspectiva diagnóstica e dialoga-
da entre os sujeitos envolvidos no processo de ensino e aprendizagem.

OBJETIVOS
•  Analisar e compreender a concepção de aprendizagem, atrelada aos objetivos de ensino
e as tendências pedagógicas que apoiam as dimensões/funções da avaliação na socieda-
de moderna;
•  Compreender criticamente as dimensões da avaliação e os diferentes tipos de instrumen-
tos e estratégias da avaliação da aprendizagem;
•  Refletir sobre a prática avaliativa centrada numa perspectiva diagnóstica em relação à prá-
tica dialogada entre os sujeitos envolvidos no processo de ensino e aprendizagem.

3.1  Ensino e aprendizagem: As dimensões/funções da avaliação no


contexto das tendências pedagógicas na sociedade moderna

Sabemos que avaliar é uma tarefa complexa, que não se restringe à quantifica-
ção e valoração dos resultados obtidos pelos alunos. Avaliar, portanto, é uma
tarefa didática necessária e permanente.
Ao contrário do que muitas vezes ela se apresenta, as tendências pedagógi-
cas mais atuais apontam como a avaliação deve acompanhar todo o processo
de ensino e aprendizagem, para que, por meio dela, se possam delimitar ações
e constatar avanços, progressos, dificuldades, definindo assim novos cami-
nhos e reorientações que se mostrarem necessárias.
Considerando algumas definições de avaliação, podemos perceber aspectos
amplos que perpassam a questão. Como apontado por Sant'anna (1995, p. 7),

60 • capítulo 3
A avaliação escolar é o termômetro que permite avaliar o estado em que se encon-
tram os elementos envolvidos no contexto. Ela tem um papel altamente significativo
na educação, tanto que nos arriscamos a dizer que a avaliação é alma do processo
educacional. (...) O que queremos é sugerir meios e modos de tornar a avaliação mais
justa, mais digna e humana.

Portanto, há necessidade de repensarmos efetivamente os referenciais para


o processo avaliativo, indo além da proposta de verificação da aprendizagem de
conteúdos ou atividades através dos instrumentos tradicionais (provas e notas
como registros), que embora façam parte desse processo, não podem ter im-
portância central no processo avaliativo, devendo ser compreendidos como o
que de fato são: instrumentos e formas de registro.
Dentro desta perspectiva partiremos da afirmação de que não existe um
processo avaliativo que não seja uma atividade essencialmente reflexiva. E é
nesta direção que vamos refletir aqui sobre avaliação.
O ensino brasileiro está passando por diversas mudanças, ao menos teori-
camente, sobre os papéis que a avaliação possui em relação à educação dos alu-
nos e, também, em relação à melhor maneira de avaliá-los, levantando, desta
forma, questionamentos sobre as práticas avaliativas realizadas até então.
Ao resgatarmos lembranças da escola, de acordo com nossas vivências nes-
te período, muitos de nós, adultos, associamos a avaliação a uma experiência
gratificante, construtiva, mas para outros, ela significa justamente o contrário,
uma sequência de humilhações. Quando pais, os antigos alunos têm a esperan-
ça ou o temor de reviver as mesmas situações através da experiência escolar de
seus filhos (PERRENOUD, 1999). Durante várias décadas, prevaleceu e ainda
talvez prevaleça a avaliação somativa no ensino brasileiro, mas podemos iden-
tificar a existência de outros tipos de avaliação que podem ter grande significa-
do para o processo de ensino-aprendizagem, como as avaliações diagnóstica
e formativa.
É claro que, lentamente, a escola muda. Grande parte dos sistemas de ensi-
no declara agora o favorecimento a uma pedagogia diferenciada e uma maior
individualização das trajetórias de formação dos alunos. Por isso, a avaliação
também evolui. As notas desapareceram em determinados graus, em certos ti-
pos de escolas... Falar de avaliação formativa não é mais “apanágio de alguns
marcianos” (PERRENOUD, 1999). A avaliação diagnóstica objetiva avaliar

capítulo 3 • 61
conhecimentos prévios e pré-requisitos dos alunos. A mesma ocorre no início
de um processo didático e pode ser pouco formalizada/instrumentalizada e
não deve ser traduzida em notas ou conceitos. A avaliação somativa, por sua
vez, almeja determinar níveis de rendimentos e decidir se houve ou não êxito
em relação ao aprendizado ao final de uma etapa. Portanto, é retrospectiva e
sua finalidade é a classificação e a promoção ou retenção dos alunos.
A avaliação somativa, conduzida ao final de um programa de avaliação pos-
sibilita, ao futuro usuário, elementos que permitem ao mesmo julgar a sua im-
portância, o seu valor, o seu mérito. Ao analisarmos, por exemplo, a avaliação
somativa de um currículo, pode ser usada para determinar a eficácia desses
currículos, a partir da análise dos dados de uma amostra de escolas, alunos
e professores. A conclusão é a de que a avaliação somativa torna-se indispen-
sável para os possíveis usuários de qualquer currículo, programa ou material
(VIANNA, 2000).
Segundo Perrenoud (1999), pode-se sustentar que a existência de uma nova
lógica, mais formativa, já é uma excelente conquista. Quase todos os sistemas
educativos modernos declaram progredir para uma avaliação menos seletiva,
menos precoce, mais formativa, mais integrada à ação pedagógica cotidiana. A
avaliação formativa almeja intervir no processo de aprendizagem e fornecer aos
alunos informações sobre sua aprendizagem e ao professor para que o mesmo
possa realizar, se for o caso, a melhoria do ensino. Não é somente verificação
de conhecimentos, é a interrogação de um processo. Seu sentido é justamente
o de orientar, informar, regular e melhorar. Neste contexto, não é necessária a
atribuição de notas e conceitos; ela deve ser descritiva, qualitativa e contínua.
O caráter formativo não está nas técnicas utilizadas, mas sim, na intenção de
quem a realiza e na intervenção subsequente. Outro aspecto interessante sobre
a avaliação formativa diz respeito à sua utilização no desenvolvimento de um
programa, projetos e produtos educacionais, visando proporcionar informa-
ções úteis para que os responsáveis possam aprimorar o que está sendo objeto
de implementação. As discussões ocorridas entre especialistas, no decorrer do
desenvolvimento de um programa, apontaram que a aplicação de diferentes
instrumentos de mensuração em grupos de crianças ou adolescentes etc. se-
riam práticas envolvendo a dimensão formativa da avaliação. Ressaltando que,
no decorrer de um projeto a avaliação formativa deve ser constante, para que
os responsáveis possam, a partir das informações, realizar as mudanças que se
fizerem necessárias (VIANNA, 2000).

62 • capítulo 3
No entanto, ainda Vianna (2000), aponta que é preciso que o avaliador tenha
cautela, pois sem a avaliação formativa, o processo de desenvolvimento, seja
neste caso, de um programa, projeto ou material, ficará incompleto e totalmen-
te ineficiente. A utilização isolada de uma avaliação somativa tem a possibilida-
de de, muitas vezes, constatar o fracasso de um projeto.
Segundo Hadji (2000), a avaliação que se situa no centro da ação de forma-
ção é chamada de formativa, pois sua função principal é – ou, pois tudo encon-
tra-se aí, deveria ser logicamente – contribuir para uma boa regulação da ativi-
dade de ensino (ou de formação, em seu sentido amplo). Trata-se, portanto, de
levantar informações úteis à regulação do processo de ensino-aprendizagem.
Assim, a avaliação formativa implica, por parte do professor, flexibilidade e
vontade de adaptação, de ajuste. Esta com certeza é um dos únicos indicativos
capaz de fazer com que se reconheça de fora uma avaliação formativa: o aumen-
to da variabilidade didática. Uma avaliação que não é seguida por mudanças
das práticas do docente tem poucas chances de vir a ser de fato formativa.
Além disso, compreende-se por que é frequente ouvirmos que a avaliação
formativa é, antes, contínua (HADJI, 2000). De acordo com Cardinet (1977 apud
PERRENOUD, 1999), uma avaliação é formativa se, pelo menos na mente do
professor, contribuir supostamente para a regulação das aprendizagens em
curso no sentido dos domínios visados. Tal linguagem abstrata define a regu-
lação por meio de suas intenções, sem se fechar de saída em uma concepção
particular dos objetivos, da aprendizagem ou da intervenção didática.
Podemos afirmar, de certo modo, que o principal instrumento de toda ava-
liação formativa é, e continuará sendo, o professor comprometido em uma in-
teração com seu aluno (PERRENOUD, 1999). Linda Allal já indicara de maneira
muito clara já em 1979 que a atividade de avaliação desenvolve-se em três eta-
pas: a coleta de informações, que se referem aos progressos realizados e às difi-
culdades de aprendizagem dos alunos, acrescenta-se uma interpretação de tais
informações, visando a um diagnóstico das eventuais dificuldades, tudo isto
levando para uma adaptação das atividades de ensino-aprendizagem – coleta
de informação/diagnóstico individualizado/ajuste da ação, constituindo-se as-
sim, a sequência formativa (HADJI, 2000).
Desta forma, segundo Hadji (2000), a ideia de avaliação formativa corres-
ponde ao modelo ideal de uma avaliação: – colocando-se de forma delibera-
da a serviço do fim que lhe dá sentido: tornar-se um elemento, um momento
determinante da ação educativa; – propondo-se a contribuir para a evolução

capítulo 3 • 63
do aluno, como também, a dizer o que, atualmente, ele é; – inscrevendo-se na
continuidade da ação pedagógica, em vez de se limitar simplesmente a uma
operação externa de controle, cujo agente poderia, neste caso, ser totalmente
estrangeiro à atividade pedagógica.
A afirmação segundo a qual se trata de um modelo ideal repousa, de acordo
com o autor, sobre duas séries de dados: 1. O que a define é menos da ordem
dos fatos, objetivamente observáveis, que das intenções, que por sua vez, não
podem ser apreendidas na exterioridade das práticas. “... É em sua destinação,
no sentido do projeto no âmbito do qual ela se inscreve que se 'lê' a 'formativi-
dade'” da avaliação (HADJI, 2000, p. 21). 2. Partindo de tal fato, cabe ressaltar
que o modelo ideal não é diretamente operatório. “... Ela é uma possibilidade
oferecida aos professores que compreenderam que podiam colocar as consta-
tações pelas quais se traduz uma atividade de avaliação dos alunos, qualquer
que seja sua forma, a serviço de uma relação de ajuda. É a vontade de ajudar
que, em última análise, instala a atividade avaliativa em um registro formativo”
(HADJI, 2000, p. 22).
O que importa, de fato, é não se afastar de um aspecto fundamental das
práticas, que é a distância entre o que se quer fazer e o que se faz realmente.
Ao tratarmos de uma abordagem descritiva das práticas de avaliação, deve-se
buscar compreender as intenções e as representações do professor, de forma a
delimitar o modelo de regulação que o mesmo usa mais ou menos consciente e
posteriormente tentar definir as regulações efetivas.
Portanto, para Perrenoud (1999), a definição de avaliação formativa, refere-se
mais às intenções do que aos efeitos atestados. A opção contrária também se-
ria possível.
Uma avaliação mais formativa não toma menos tempo que uma avaliação
“tradicional”, mas ela oferece informações, identifica e explica erros, sugere
interpretações em relação às estratégias e atitudes dos alunos. Enfim, este tipo
de avaliação alimenta diretamente a ação pedagógica, ao passo que o tempo e
a energia gastos na avaliação tradicional desviam sua preocupação da invenção
didática e da inovação (PERRENOUD, 1999). Dificilmente haverá mudanças
significativas e consistentes nas práticas de avaliação formativa sem uma teoria
que, para além de enquadrá-las ao nível dos fundamentos ontológicos, episte-
mológicos e metodológicos, contribua também para a clarificação conceitual
sobre quais práticas deverão apoiar e desenvolver.

64 • capítulo 3
Para mudar e melhorar práticas de avaliação formativa faz-se necessário
que o seu significado seja claro para os professores, tanto mais que são muito
fortes e complexas as suas relações com os processos de ensino e de aprendiza-
gem (FERNANDES, 2006).
A avaliação que ocorre nas salas de aula não é uma questão técnica ou uma
mera questão de construção e utilização de instrumentos nem um exercício de
encaixar conhecimentos, capacidades, atitudes ou motivações dos educandos
numa categoria qualquer com a ajuda de uma taxonomia qualquer.
Ela é um processo desenvolvido por e com seres humanos para seres hu-
manos, que envolve valores morais e éticos, juízos de valor e problemas de na-
tureza sociocognitiva, sociocultural, antropológica, psicológica, como também
política (FERNANDES, 2006). Para melhor contextualização sobre o assunto,
apresentaremos a seguir três resultados de uma investigação empírica sinte-
tizados por Paul Black e Dylan Wiliam (1998), citados por Fernandes (2006):
1. Os educandos que frequentam salas de aula em que a avaliação é essencial-
mente de natureza formativa aprendem significativamente mais e melhor do
que aqueles que frequentam aulas em que a avaliação é sobretudo somativa.
2. Os alunos que mais se beneficiam do uso deliberado e sistemático da avalia-
ção formativa são os alunos que possuem mais dificuldades de aprendizagem.
3. Os educandos que frequentam aulas em que a avaliação é formativa conse-
guem melhores resultados em exames externos do que os alunos que frequen-
tam aulas em que a avaliação é somativa.
No entanto, apesar de tais resultados e da sua sólida base empírica, o fato é
que continua sendo difícil aos professores dos mais diferentes sistemas educa-
tivos desenvolverem, em suas salas de aula, práticas de avaliação formativa. Tal
situação, em geral, é atribuída a razões tais como (FERNANDES, 2006):
a) limitações da formação dos professores;
b) dificuldades na gestão do currículo;
c) concepções errôneas dos professores sobre a avaliação formativa;
d) inadequações na organização e funcionamento das escolas;
e) pressões da avaliação externa;
f) extensão dos programas escolares.
No artigo de Fernandes (2006), que é de origem portuguesa, partiu-se do
pressuposto de que uma das razões que também pode estar na origem de tais
dificuldades é a ausência de clareza conceitual e de um sólido referencial teóri-
co em que as práticas de avaliação formativa possam se apoiar.

capítulo 3 • 65
Nessas condições, o autor sugere a designação avaliação formativa alter-
nativa para que fique claro que o mesmo se refere a uma avaliação realmente
formativa, alternativa quer a avaliação formativa de matriz psicométrica, beha-
viorista, quer a todo tipo de avaliações ditas formativas que, na verdade, são
avaliações de intenção ou de vontade formativa.
É importante ressaltar que atualmente no Brasil este termo ainda não é am-
plamente divulgado e conhecido. Porém, é importante que o profissional da
educação esteja atento e informado para as possíveis mudanças conceituais em
torno das teorias que embasam os processos avaliativos e que tentam aprofun-
dar/minimizar possíveis lacunas em relação ao conhecimento já existente.
A avaliação formativa, como era compreendida nos anos 60 e 70 do século
XX (SCRIVEN, 1967; BLOOM, HASTINGS & MADAUS1971) pouco tem a ver com
a avaliação formativa nos dias de hoje (EARL, 2003; TORRANCE & PRIOR, 2001
entre outros). No primeiro caso, deparamo-nos com uma visão mais restritiva,
muito centrada em objetivos comportamentais e nos resultados obtidos pelos
alunos, e, por este motivo, normalmente realizada após determinado período
de ensino e aprendizagem. No segundo caso, encontramos uma avaliação bem
mais complexa e, num certo sentido, mais sofisticada ou mais rica do ponto de
vista teórico.
Trata-se de uma avaliação interativa, centrada nos processos cognitivos dos
alunos aos processos de feedback, de regulação, de autoavaliação e de autorre-
gulação das aprendizagens (FERNANDES, 2006).
Por isso, é necessário realizar um esforço de clarificação para que saibamos
de fato de qual tipo de avaliação estaremos realmente a falar quando utilizamos
designações como avaliação formativa ou avaliação somativa (FERNANDES,
2006). Atualmente sabemos que pode estar ao alcance das escolas, dos profes-
sores e dos alunos melhorar o que se aprende e, mais importante ainda, como
se aprende.
A avaliação formativa, não sendo a panaceia para os males dos sistemas
educativos, é com toda convicção um processo pedagógico essencial para
apoiar milhões de crianças e jovens que, ano após ano, experimentam a frus-
tração, o desânimo, o abandono escolar e até mesmo a exclusão social. É por
este motivo que temos forçosamente que desbravar e aprofundar a ideia de ava-
liar para aprender se quisermos enfrentar questões mais prementes e urgentes
da educação contemporânea. E tal fato passa pela investigação empírica e pela
construção teórica (FERNANDES, 2006). A avaliação formativa não pode ser

66 • capítulo 3
considerada nem um modelo científico nem um modelo de ação diretamente
operatório. Aqueles que acreditam na necessidade de uma avaliação formativa
afirmam a pertinência do princípio de acordo com o qual uma prática – avaliar
– deve tornar-se auxiliar da outra – aprender.
A avaliação, em um contexto educacional, tem o objetivo legítimo de contri-
buir para o êxito do ensino, ou seja, para a construção de tais saberes e compe-
tências pelos alunos (HADJI, 2000). É preciso, em qualquer projeto de reforma,
em qualquer estratégia que vise a alguma inovação, levar em consideração o
sistema e as práticas de avaliação, integrá-los à reflexão e modificá-los para per-
mitir que haja a mudança (PERRENOUD, 1999). Apesar da existência de outros
enfoques avaliativos, podemos ressaltar as avaliações diagnóstica, somativa e
formativa como estando no centro de discussões das práticas educativas em
nosso sistema de ensino.
Pelo exposto, podemos compreender a predominância da avaliação somati-
va durante grande parte da história do ensino brasileiro e que ainda apresenta
grande influência em relação aos profissionais da educação, por constituírem
parte de sua história e consequentemente, de sua prática avaliativa.
No entanto, este modelo de avaliação apresenta algumas limitações, que
por sua vez, vêm sendo questionadas, sobretudo pela forte característica de se-
leção e classificação dos alunos, contrariando inclusive a proposta dos ciclos,
existente atualmente em várias redes de ensino do país.
Neste contexto, a avaliação formativa acaba por ganhar um importante pa-
pel em relação às funções que a avaliação possui, bem como, quais suas reais
contribuições para o desenvolvimento dos alunos e para o estabelecimento de
uma educação de qualidade a todos. No entanto, nem sempre a proposta de
uma avaliação formativa é compreendida de maneira clara e precisa, dificultan-
do ainda mais a aceitação do professorado brasileiro, além do aspecto cultural
que possui grande influência em relação à aceitação das inovações.
O papel do professor neste contexto é de vital importância para que haja a
possibilidade de mudanças nas práticas avaliativas, assim como, do desenvol-
vimento educacional de seus alunos, pois sem o envolvimento e a disponibili-
dade do mesmo para conhecê-lo, o ensino acaba por se limitar a uma sucessão
de fatos, sem necessariamente estar relacionado com a sociedade em que vive-
mos atualmente.

capítulo 3 • 67
3.1.1  Avaliação da aprendizagem no contexto da progressão continuada

Como o leitor deve ter observado, sobretudo através das mudanças na avaliação
propostas pela atual LDB (9.394/96), o ensino brasileiro tem passado por uma
série de modificações nos últimos anos em relação à sua forma de organiza-
ção. Grande parte das escolas no Brasil tem adotado o regime de Ciclos com
Progressão Continuada, caracterizando a necessidade de alterações signifi-
cativas em relação à estrutura escolar como um todo, ou seja, em relação ao
currículo, organização dos tempos e espaços escolares, mudanças avaliativas
e a compreensão e participação de todos os envolvidos no desenvolvimento do
processo educacional.
Podemos evidenciar a complexidade da proposta e ressaltar algumas difi-
culdades encontradas em sua realização, como a ausência de um projeto pe-
dagógico coerente com os princípios educativos, rotatividade dos professores,
inadequada estrutura escolar, entre outros elementos que possam comprome-
ter a efetividade da proposta.
Apesar de algumas referências sobre o assunto em leis anteriores, foi a par-
tir da promulgação da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDB n. 9.394/96), que a organização do ensino em ciclos passou a fazer parte
da trajetória escolar de milhares de alunos e profissionais da rede educacio-
nal brasileira, realidade esta que tem gerado diversas discussões e indagações
quanto à sua implantação, objetivos e consequências (BRASIL, 1996).
A nova LDB criou condições legais e estratégias para viabilizar a universali-
zação da educação básica, já prevista na Constituição de 1988. Dentre as prin-
cipais diretrizes da nova lei, destacam-se as que se referem à flexibilização da
organização do ensino fundamental como o regime de ciclos e a progressão
continuada (BRASIL, 1996). Atualmente os ciclos têm recebido diversas deno-
minações, estando associados às propostas de progressão continuada, promo-
ção automática, avanços progressivos. (BARRETTO; SOUSA, 2004)

Os ciclos têm a ver com a intenção de regularizar o fluxo de alunos ao longo da esco-
larização, a fim de assegurar que todos possam cumprir os anos de estudo previstos
para o ensino obrigatório, sem interrupções e retenções que inviabilizem a aprendiza-
gem efetiva e uma educação de qualidade. (BARRETTO; SOUSA, 2004, p. 3)

68 • capítulo 3
No entanto, para melhor compreensão sobre o tema, cabe aqui uma dife-
renciação entre Promoção Automática e Progressão Continuada. Na primeira,
a criança permanece na escola, independentemente de progressos escolares; já
na segunda, a criança avança por ter-se apropriado de novas maneiras de pen-
sar, sentir e agir (SÃO PAULO, 1998d, apud FREITAS, 2003).
Muitas vezes confunde-se o sistema de progressão continuada com promo-
ção automática ou até mesmo com ausência de avaliação, o que é um grande
equívoco, pois esta nova sistemática de organização exige justamente uma
atenção redobrada do professor em relação aos progressos dos seus alunos
(CAMARGO,1999 apud ANDRÉ; PASSOS, 2001).
A ideia de progressão continuada foi apresentada na literatura educacional
brasileira na década de 1950 – sob a denominação de promoção automática.
Leite ([1959]1999) registra as consequências negativas da reprovação para a
criança e o adolescente, sendo elas: sentimento de incapacidade, perda da no-
ção de seu nível de realização e não reconhecimento dos valores veiculados pela
escola. Os ciclos escolares, como propostas de inovação, surgiram em alguns
Estados brasileiros a partir da década de 1960, apesar de alguns de seus pressu-
postos serem defendidos desde os anos de 1920, correspondendo à intenção de
regularizar o fluxo de alunos no decorrer do período de escolarização, almejan-
do eliminar ou limitar a repetência. (BARRETTO; MITRULIS, 2001)
Cabe, ainda, ressaltar que a questão referente à permanência dos alunos na
escola era, é e ainda é uma grande preocupação social, sobretudo pelo fato de
a escola pública estar alicerçada em um sistema de reprovação caracterizado
pelo uso de vários mecanismos seletivos, como os exames, os testes de conheci-
mentos, os testes psicológicos, a organização curricular etc.
Assim sendo, apesar de os alunos terem acesso à escola, os processos sele-
tivos que a envolvem acabam por dificultar a trajetória escolar dos mesmos, de
forma a ampliar o número de repetências e evasões (GLÓRIA; MAFRA, 2004).
A questão relativa aos custos educacionais é um fator de grande importância
na implementação dos ciclos, pois a repetência e a evasão geram altos custos
para o Estado, ou seja, o ensino não se apresenta como um fator isolado dentro
desse processo.
É claro que o fator econômico não pode ser ignorado, no entanto, quando
estamos tratando de educação, tal visão não é suficiente (FREITAS, 2003). Sobre
a repetência, podemos inferir que está ligada a fatores culturais e históricos, e
não necessariamente com a competência. O que se observa é que os sistemas

capítulo 3 • 69
que mais reprovam são os que também possuem maior abandono, este sim
constituindo indicador de eficiência interna. (GOMES, 2005)
De acordo com a bibliografia disponível sobre os ciclos, os dados estatísti-
cos existentes ainda são imprecisos, pois os instrumentos de coleta são inade-
quados para registrar, precisamente, as informações sobre os vários tipos de
organização do sistema escolar, especialmente pelo fato de que existem escolas
com organização mista, pois adotam séries e ciclos, configurando, dessa for-
ma, a heterogeneidade da proposta (BARRETTO; SOUSA, 2004).
Embora com a mesma denominação – ciclos –, a rede pública de ensino
mantém essa diversidade de arranjos adotados, o que pode evidenciar orienta-
ções e motivações diferenciadas dos gestores das políticas educacionais, como
pode ser observado na tabela que se segue (BARRETTO; SOUSA, 2004).

DURAÇÃO DE CADA CICLO EM ANOS


Nº DE CICLOS 1º CICLO 2º CICLO 3º CICLO 4º CICLO Nº DE REDES
1 2 4
1 4 4
2 2 2 4
2 2 4 1
2 4 4 6
3 3 3 3 6
3 2 2 2 1
3 3 3 2 1
4 3 2 2 2 3
4 2 2 2 2 7

Tabela 3.1  –  Número de ciclos e tempo de duração em redes públicas – 2000. Fonte: Sou-
sa e Alavarse (2003, p.79 apud BARRETTO; SOUSA, 2004, p. 5). Dados de estudo com
amostra abrangendo 37 redes públicas pelo NEPP/Unicamp, 2001.

O regime de ciclos com progressão continuada rompe com a estrutura de se-


riação, de forma a valorizar a avaliação contínua do processo de ensino-apren-
dizagem, devendo a recuperação ocorrer de forma contínua e paralela, a partir
dos resultados demonstrados pelos alunos.
Este caminho coloca em destaque, portanto, a avaliação formativa, que ga-
nha cada dia mais espaço à medida que a escola vai sendo redefinida com a
implantação de tais inovações (ANDRÉ; PASSOS, 2001).
A ideia de cortes temporais, típicos da avaliação somativa e classificatória
praticada no ensino seriado, deu lugar, no regime de ciclos, à ideia do conhe-
cimento como processo. Desta forma, a escola, e, sobretudo os professores são

70 • capítulo 3
levados a uma profunda revisão dos significados, crenças e valores que per-
meiam suas práticas, como também o desenvolvimento de avaliações mais pro-
cessuais, formativas, voltadas para o diagnóstico e a intervenção constante no
processo de ensino-aprendizagem. Tal fato permite que os professores façam
atribuições e qualifiquem o aluno e seu trabalho cotidianamente.
Neste sentido, a avaliação interna realizada pelo professor constitui o eixo
fundamental de sustentação do sistema de ciclos (OLIVEIRA, 1998; SOUSA,
2000).
Neste contexto, a avaliação deixa de ter um caráter seletivo e classificató-
rio, havendo, desta forma, maior preocupação com os aspectos mais globais do
processo, almejando identificar os problemas e avanços e redirecionar a ação
educativa.
Com a nova sistemática de avaliação, decorrente da proposta atual de ensi-
no, há também uma ampliação da responsabilidade e do poder de decisão do
professor, pois, no regime de ciclos com progressão continuada, cabe a este
profissional a tarefa de acompanhar o desenvolvimento de cada aluno, identifi-
cando quais foram os ganhos de aprendizagem e o que falta alcançar, definin-
do ainda as medidas necessárias para o progresso contínuo. É possível que o
professor divida com seu aluno esta tarefa, tornando-o partícipe do processo de
julgamento e análise de sua própria evolução (ANDRÉ; PASSOS, 2001). Segundo
Freitas (2003), os ciclos estão inseridos em uma perspectiva de mudança edu-
cacional mais ampla, sendo que sua importância está relacionada mais à resis-
tência à lógica da escola seriada e à função excludente de tal instituição do que
ao seu uso como solução pedagógica.
Em seus estudos Barretto e Mitrulis (2001) ressaltam que, apesar das pro-
postas de modificação no ensino brasileiro, a grande motivação para os estu-
dos continua sendo a obtenção de notas, a competição e o medo da reprovação.
Neste sentido, é relevante destacar que os educadores acreditam cada vez
mais que aprender não é somente transmitir conhecimentos, mas sim um pro-
cesso que envolve a construção de significados que ocorre na interação entre
professores e alunos. Nesse contexto, a aprendizagem só ocorre de forma eficaz
se a motivação adequada para aprender for desenvolvida nos alunos desde o
início.
Os efeitos positivos e duradouros na motivação para aprender só serão alme-
jados em conjunto com mudanças nas crenças dos profissionais da educação,
no clima desenvolvido na sala de aula e na filosofia das escolas, como um todo
(BORUCHOVITCH, 2001). Cabe ressaltar que, para a efetiva implementação

capítulo 3 • 71
desta nova organização do ensino, são necessárias diversas mudanças, tanto de
ordem estrutural como de compreensão, respeito ao nível de desenvolvimen-
to dos alunos, flexibilização dos tempos e espaços escolares, participação dos
pais e profissionais da educação na consecução do projeto político-pedagógico
da escola, avaliações mais processuais, formativas etc.
No entanto, apesar das adversidades, tal proposta constitui-se em um im-
portante passo rumo a uma educação mais democrática, que se coloca de
maneira contrária ao ensino seletivo e autoritário, trazendo à reflexão grande
parte dos profissionais da educação, que por sua vez, são fundamentais neste
processo.

3.2  Dimensões da avaliação: instrumentos e estratégias da


avaliação da aprendizagem.

Avaliar na perspectiva construtivista/sociointeracionista de educação significa,


verificar o valor que o processo de ensino aprendizagem tem, buscando se ter
ideia de como este processo está ocorrendo, servindo assim, como um instru-
mento para dar informações sobre ações pedagógicas que precisam ser repen-
sadas, melhoradas, reforçadas e ajustadas.
Assim, a avaliação é o indicador da qualidade do processo educativo que
não tem um fim em si mesmo, mas que deve ser um meio de compreender os
processos de ensino e aprendizagem.
Acreditando que o professor tem como principal função mediar e facilitar
o processo de aprendizagem dentro da interação, a avaliação nesta perspectiva
deve ser coerente com a forma de ensinar, ou seja, dentro de uma proposta de
construção do conhecimento.
Desta forma, para realizar a avaliação é preciso considerar as seguin-
tes questões.
•  O que é avaliar?
•  Como avaliar?
•  Por que avaliar?
•  Para que avaliar?

Diante disso, fica mais clara a escolha do tipo de avaliação a se realizar – o


instrumento de avaliação a ser utilizado.
Buscando classificar a atitude avaliativa, é comum dividi-las de acordo com
seus objetivos didáticos, assim como suas perspectivas. Sendo assim é possível

72 • capítulo 3
compreender a prática avaliativa em três momentos complementares, sen-
do eles:
1. Avaliação inicial/diagnóstica: consiste em conhecer o que o aluno sabe, de
acordo com o conteúdo a ser avaliado. Este é o ponto de partida que deve servir de
referência para a elaboração de atividades e tarefas que poderão favorecer a apren-
dizagem. Esta forma de avaliação pode ser utilizada antes e durante o processo
ensino-aprendizagem, sendo usada para diferentes finalidades. Se realizada antes
do processo, tem como foco sondar se o aluno apresenta os conhecimentos neces-
sários para que a aprendizagem possa ser iniciada. Se ocorrer durante o processo,
será utilizada para identificar as causas das falhas de aprendizagem e possibilitar a
implementação de recursos para corrigi-las. De acordo com Luckesi (2003),

Para que a avaliação diagnóstica seja possível, é preciso compreendê-la e realizá-la


comprometida com uma concepção pedagógica (...) A avaliação diagnóstica não se
propõe e não existe uma forma solta isolada. É condição de sua existência e articula-
ção com uma concepção pedagógica progressista (p. 82).

2. Avaliação reguladora/formativa – é a percepção permanente do pro-


fessor durante o desenvolvimento das atividades ligadas a cada tema; esse é o
principal momento da avaliação, pois é a partir do rendimento da turma que
serão direcionadas as próximas atividades. Realizada enquanto se desenvolve
o plano previsto, durante o ano letivo e de acordo com as respostas dos alunos.
Existe a necessidade de se introduzir novas atividades, gradativamente mais
desafiadoras, assim como ir promovendo uma intervenção mais contingencial.
Para a Avaliação Reguladora ou Formativa, é fundamental o conhecimento de
como cada aluno aprende ao longo do processo de ensino-aprendizagem.
3. Avaliação final/somativa – também chamada de avaliação recapitulati-
va. É aquela que quase todos os professores aplicam no final de cada processo e
serve apenas como um registro do que foi ou não aprendido. Usada para conhe-
cer a situação de cada aluno e tomar as medidas educativas pertinentes, é pre-
ciso sistematizar o conhecimento do progresso seguido, o que requer apurar
os resultados e analisar o processo e a progressão que cada aluno seguiu, para
continuar sua formação.

No caso de empreender um bom trabalho junto à avaliação formativa, a ava-


liação final pode apenas registrar o sucesso da turma, pois toda a adaptação

capítulo 3 • 73
foi detectada e realizada durante o processo de construção do conhecimento,
visando ao bom desenvolvimento da turma e atingindo, assim, os objetivos pro-
postos no plano de ensino.
Compreendendo a avaliação como mais uma ferramenta do trabalho peda-
gógico, o professor poderá realizar um acompanhamento próximo na constru-
ção dos conhecimentos, e assim a avaliação terá como função:
•  facilitar o diagnóstico;
•  melhorar a aprendizagem e o ensino;
•  estabelecer situações individuais de aprendizagem;
•  interpretar resultados

É de fundamental importância, portanto, lembrarmos que a avaliação es-


colar não acontece em momentos isolados do trabalho pedagógico, uma vez
que deve iniciar, permear e concluir todo o processo. Diante das possibilidades
e funções avaliativas apresentadas, podemos afirmar que a técnica avaliativa
precisa estar relacionada com o objetivo pretendido, e este, ao conteúdo e às
competências que pretende desenvolver.

Os momentos de avaliação diagnóstica e formativa são importantes na medida em


que permitem ao aluno conhecer seus avanços e suas necessidades. Essa concep-
ção de avaliação é fundamentalmente orientadora porque orienta tanto o estudo do
aluno como o trabalho do professor (HAYDT, 2006). Teremos ainda oportunidade de
abordar essa temática com maior atenção nas próximas unidades.

Assim, a avaliação é apresentada como um instrumento que ajuda o pro-


fessor a tomar decisões sobre o seu trabalho, permitindo um replanejamento
e redirecionamento do trabalho com os conteúdos e também dos processos
avaliativos.
Para que esta proposta de avaliação faça sentido, propõe-se uma reestrutu-
ração interna na escola no que se refere à forma de avaliação. Uma avaliação
contínua, formativa, na perspectiva do desenvolvimento integral do aluno é,
portanto, primordial para que se estabeleça mais do que uma quantificação da
aprendizagem, mas uma maior qualificação de todo o processo educacional.
Pensando por este ângulo é necessário que o educador se questione, ao or-
ganizar uma atividade avaliativa, sob vários aspectos, como:

74 • capítulo 3
•  O que os meus alunos sabem em relação ao que quero ensinar?
•  Que experiências tiveram?
•  O que são capazes de aprender?
•  Quais são seus interesses?
•  Quais são seus estilos de aprendizagem?

Partindo disso, o processo avaliativo será ressignificado e avaliar será com-


preendido dentro de uma óptica de desenvolvimento.

ATIVIDADE
Você já ouviu falar em profecia autorrealizadora? Muitas vezes os professores afirmam cons-
tantemente na frente de seus alunos o quanto alguns deles são “fracos” ou indisciplinados
e esta baixa expectativa acaba sendo internalizada pelo aluno, que não se sente motivado a
melhorar. Leia os textos a seguir, refletindo sobre este assunto e comente com seus cole-
gas sobre como a profecia autorrealizadora pode se tornar um empecilho às atividades de
avaliação.

Leia os textos a seguir:.


Texto 1 - Avaliação
(GAVALDON, 1997, p.56)

Crístian, nove anos, 3ª série, entra em casa muito feliz: – Mãe, tirei A na prova de Ciên-
cias! A professora na saída me deu os parabéns! Acertei tudo! – Que maravilha! Parabéns! Os
conceitos de Crístian giram sempre em torno de A e B. É um menino muito ativo e inteligente.
Mais tarde, na hora do jantar, quando a família está reunida, ele resolve dar uma demonstra-
ção de seus conhecimentos: – Mãe, você sabe o que é germinação? – Sei, mas fala você. – É
a transformação de uma semente numa nova planta da mesma espécie.
– Ah! É a transformação de uma semente numa planta da mesma espécie. – Não, mãe.
É a transformação de uma semente numa NOVA planta da mesma espécie. Neste momento,
a mãe lembra que, numa avaliação anterior, quando ele deveria ter colocado “folhas mortas
em decomposição” , colocou “folhas em decomposição” e sua questão foi “cortada”, valendo
meio ponto. A mãe continua a conversa: – E o que é transformar a semente numa NOVA
planta da mesma espécie? – Não sei, mãe; – Como não sabe? Você não acertou na avalia-
ção? – Acertei porque fiz como a professora queria, igualzinho ao livro. Crístian, germinação é
vida, vida que explode, vida que gera vida, é amor acontecendo, mas isso não lhe ensinaram!

capítulo 3 • 75
Houve muita preocupação para que você escrevesse direitinho, mas a sua cabecinha não
vibrou, não reconheceu, não percebeu o milagre da vida. Que pena! Quantas coisas você
ainda vai escrever certo, mas não vai viver, não vai sentir! Vai continuar tirando A no papel,
e espero que algum dia tire A na vida. Que apareça alguém que também se preocupe com
você, você gente, você ansioso para conhecer a vida, pelas explosões, pelas descobertas,
pelas coisas lindas que existem! Quantos alunos são preparados para avaliações corretas, só
para preencherem papéis. Ainda o papel é mais importante, deixando para segundo plano a
vida. Como se nós fôssemos viver papel! Como se nós tivéssemos a certeza de que realmen-
te o que está no papel, automaticamente, está inserido na vida, no dia a dia. Quanta coisa
nós tivemos durante a nossa vida escolar de “aprender” e “devolver” em avaliações, em que
alguma palavra trocada significava um corte na nota. Quantos pontos decorados. E hoje, o
que sobrou? Como fazemos quando não nos lembramos de algo? Ou será que retemos tudo?
O que estamos realmente usando de tudo aquilo? O que valeu? O que continua valendo? O
que estamos vivendo? Vamos pensar... APRENDER... O QUÊ? POR QUÊ? PARA QUÊ? AVA-
LIAR... O QUÊ? POR QUÊ? PARA QUÊ?

Texto 2 – Música “Estudo Errado” - Gabriel O Pensador


Composição: Gabriel, O Pensador

Eu tô aqui pra quê?


Será que é pra aprender?
Ou será que é pra sentar, me acomodar e obedecer?
Tô tentando passar de ano pro meu pai não me bater
Sem recreio de saco cheio porque eu não fiz o dever
A professora já tá de marcação porque sempre me pega
Disfarçando, espiando, colando toda prova dos colegas
E ela esfrega na minha cara um zero bem redondo
E quando chega o boletim lá em casa eu me escondo
Eu quero jogar botão, vídeo-game, bola de gude
Mas meus pais só querem que eu “vá pra aula!” e “estude!”
Então dessa vez eu vou estudar até decorar cumpádi
Pra me dar bem e minha mãe deixar ficar acordado até mais tarde
Ou quem sabe aumentar minha mesada
Pra eu comprar mais revistinha (do Cascão?) Não. De mulher pelada
A diversão é limitada e o meu pai não tem tempo pra nada
E a entrada no cinema é censurada (vai pra casa pirralhada!)

76 • capítulo 3
A rua é perigosa então eu vejo televisão (Tá lá mais um corpo estendido no chão)
Na hora do jornal eu desligo porque eu nem sei nem o que é inflação – Ué não te ensi-
naram? – Não.
A maioria das matérias que eles dão eu acho inútil
Em vão, pouco interessantes, eu fico pu..
Tô cansado de estudar, de madrugar, que sacrilégio (Vai pro colégio!!)
Então eu fui relendo tudo até a prova começar
Voltei louco pra contar: Manhê! Tirei um dez na prova!
Me dei bem tirei um cem e eu quero ver quem me reprova!
Decorei toda lição!
Não errei nenhuma questão! Não aprendi nada de bom... Mas tirei dez (boa filhão!)
Quase tudo que aprendi, amanhã eu já esqueci
Decorei, copiei, memorizei, mas não entendi
Quase tudo que aprendi, amanhã eu já esqueci
Decorei, copiei, memorizei, mas não entendi
Decoreba: esse é o método de ensino
Eles me tratam como ameba e assim eu não raciocino
Não aprendo as causas e consequências só decoro os fatos
Desse jeito até história fica chato
Mas os velhos me disseram que o “porque” é o segredo
Então quando eu num entendo nada, eu levanto o dedo
Porque eu quero usar a mente pra ficar inteligente
Eu sei que ainda não sou gente grande, mas eu já sou gente
E sei que o estudo é uma coisa boa
O problema é que sem motivação a gente enjoa
O sistema bota um monte de abobrinha no programa
Mas pra aprender a ser um ingonorante (...)
Ah, um ignorante, por mim eu nem saía da minha cama (Ah, deixa eu dormir)
Eu gosto dos professores e eu preciso de um mestre
Mas eu prefiro que eles me ensinem alguma coisa que preste – O que é corrupção?
Pra que serve um deputado?
Não me diga que o Brasil foi descoberto por acaso!
Ou que a minhoca é hermafrodita
Ou sobre a tênia solitária.
Não me faça decorar as capitanias hereditárias!!
(...) Vamos fugir dessa jaula!

capítulo 3 • 77
“Hoje eu tô feliz” (matou o presidente?) Não. A aula
Matei a aula porque num dava
Eu não aguentava mais
E fui escutar o Pensador escondido dos meus pais
Mas se eles fossem da minha idade eles entenderiam (Esse num é o valor que um aluno
merecia!)
Íííh... Sujô (Hein?)
O inspetor! (Acabou a farra, já pra sala do coordenador!)
Achei que ia ser suspenso mas era só pra conversar
E me disseram que a escola era meu segundo lar
E é verdade, eu aprendo muita coisa realmente
Faço amigos, conheço gente, mas não quero estudar pra sempre!
Então eu vou passar de ano
Não tenho outra saída
Mas o ideal é que a escola me prepare pra vida
Discutindo e ensinando os problemas atuais
E não me dando as mesmas aulas que eles deram pros meus pais
Com matérias das quais eles não lembram mais nada
E quando eu tiro dez é sempre a mesma palhaçada
Refrão
Encarem as crianças com mais seriedade
Pois na escola é onde formamos nossa personalidade
Vocês tratam a educação como um negócio onde a ganância, a exploração, e a indife-
rença são sócios
Quem devia lucrar só é prejudicado
Assim vocês vão criar uma geração de revoltados
Tá tudo errado e eu já tou de saco cheio
Agora me dá minha bola e deixa eu ir embora pro recreio...
Juquinha você tá falando demais assim eu vou ter que lhe deixar sem recreio!
Mas é só a verdade professora!
Eu sei, mas colabora se não eu perco o meu emprego.

01. Relacione o texto “Avaliação”, presente na obra de Galdovan (1997), e a letra da música
“Estudo Errado” de Gabriel, O Pensador. Ambos os textos apresentam críticas a um sistema
avaliativo bastante recorrente em nossas escolas. Pense em quais são as implicações do mes-
mo e leve suas considerações acerca da questão para os nossos plantões e fóruns on-line.

78 • capítulo 3
CONEXÃO
Você pode ver e ouvir Gabriel, O Pensador interpretando a música “Estudo Errado”, gravada
no álbum intitulado “Ainda é só o começo” (1995). Faça uma busca no You Tube e confira.

REFLEXÃO
Após esta atividade, foi possível refletir o quanto é necessário que o professor analise sua
prática escolar e compreenda efetivamente como está sendo realizado o processo avaliativo
em sua escola, em sua sala de aula, ou seja, em sua comunidade. Nota-se que é importante
que possamos substituir nas práticas avaliativas, a simples verificação da aprendizagem por
um processo mais amplo e efetivo, que é a avaliação escolar, aproveitando o momento da
avaliação para evoluir e melhorar o processo de ensino e de aprendizagem.

LEITURA
Complementando este assunto, um trecho do artigo a seguir: A avaliação na educação
básica entre dois modelos refere-se a uma versão reformulada de trabalho originalmen-
te apresentado por Elba Siqueira de Sá Barretto no GT “Estado e Política Educacional” da
Anped, durante a 24 ª Reunião Anual da Entidade, em Caxambu, Minas Gerais, em setembro
de 2000. Neste texto, publicado pela Revista Educação e Sociedade em 2001, a Professora
da Faculdade de Educação da USP e da Fundação Carlos Chagas discute dois modelos
propostos para a avaliação no ensino básico no país: uma avaliação com potencial emancipa-
tório e outra com função reguladora. Vamos conhecer partes deste artigo abaixo. Para leitura
na íntegra, o link está disponível em: <www.scielo.br/pdf/es/v22n75/22n75a05.pdf>

A avaliação na educação básica entre dois modelos


Elba Siqueira de Sá Barretto
(Educ. Soc. v. 22 n. 75 Campinas ago. 2001)

O texto explora algumas constatações de estudo realizado sobre a produção acadêmica


acerca da avaliação na educação básica no Brasil, publicada em dez periódicos nacionais en-
tre 1990 e 1998 (BARRETTO & PINTO, 2000), e a elas acrescenta outras reflexões, feitas
com base em fontes de natureza diversa. Entre os poucos mais de 200 textos localizados no

capítulo 3 • 79
referido estudo, chama a atenção a presença majoritária de artigos que versam sobre ideias,
conceitos, pressupostos, tendências da avaliação, revelando uma preocupação da área com
o esclarecimento dos significados da avaliação no contexto educacional brasileiro. Desses
artigos emergem fundamentalmente dois modelos que vêm povoando o discurso sobre a
avaliação entre nós. A avaliação da qualidade do ensino: pressupostos multirreferenciados. A
mais numerosa produção da literatura examinada sobre o ensino básico dedica-se a discutir
questões ligadas ao estatuto científico da avaliação da qualidade do ensino. A escassez de
teorias sobre avaliação propriamente dita não impede o esforço de elucidar pressupostos da
filosofia e de ciências como a Sociologia, Psicologia, Antropologia e da própria Pedagogia, às
quais se filiam concepções de educação de que derivam, por sua vez, diferentes concepções
de avaliação. É frequente que critiquem genericamente o paradigma positivista predominante
na tradição de avaliação brasileira, sendo que a partir de várias vertentes teóricas, nem sem-
pre claramente explicitadas e nunca aprofundadas, acabam por esboçar características de
um novo modelo de avaliação apresentado como desejável. Tais características são bastante
convergentes, indicando haver já um amplo consenso na área. Elas passam pela defesa de
uma abordagem historicamente situada, que, em relação ao aluno, leve em conta não apenas
a dimensão cognitiva, mas a social, a afetiva, seus valores, motivações e até mesmo a sua
própria história de vida. A busca da possibilidade de avaliar a qualidade do ensino faz recair
a ênfase nas variáveis do processo, muito mais do que no produto da educação, sendo que
a sua natureza deve ser eminentemente dialógica e dialética, voltada para a transformação,
tanto no plano pessoal como no social. A avaliação deve ter um caráter contínuo, que supõe
trocas constantes entre avaliador e avaliado, o que pode implicar, dependendo do nível de
ensino, maior interação com as próprias famílias dos educandos, especialmente no caso das
crianças menores. As mudanças em relação ao indivíduo apontam na direção da autonomia
e, em relação ao social, na direção de uma ordenação democrática e, portanto, mais justa
da sociedade.
O eixo da avaliação deixa de girar exclusivamente em torno do aluno e da preocupação
técnica de medir o seu rendimento. Passa a centrar as atenções em torno das condições em
que é oferecido o ensino, formação do professor e suas condições de trabalho, currículo, cul-
tura e organização da escola e, ainda, postura de seus dirigentes e demais agentes educacio-
nais. Essa mudança de enfoque, que explora sobretudo as relações intermediárias entre as
análises macroestruturais e as abordagens micro, vem possibilitando a paulatina superação
da tradição crítico-reprodutivista. Esta última tradição, muito tendo contribuído para elucidar
os condicionantes estruturais da educação e o papel da avaliação na manutenção da ordem
social vigente, gerou, como já assinalaram estudos anteriores, uma produção sobre o tema
com acentuada conotação de denúncia, mas pouco subsidiou a proposição de enfoques al-
ternativos. Entre os textos que trazem o foco da avaliação para a escola e, em menor propor-

80 • capítulo 3
ção, para o professor e outros atores educacionais, incluem-se algumas proposições acerca
das análises institucionais. Assim como em relação ao aluno e aos agentes educacionais, a
proposta de avaliação institucional enfatiza o diálogo, a participação, a elaboração coletiva
das propostas de mudança, o estabelecimento de relações menos fortemente hierarquizadas
e mais democráticas entre as instâncias. O paradigma emergente de avaliação qualitativa
não tem uma densidade teórica própria. Ele empresta elementos de várias vertentes de pen-
samento, constituindo-se numa formulação multidisciplinar. Os textos que a ele se referem,
embora não se pretendam prescritivos, representam, no mais das vezes, afirmações de princí-
pios genéricos acerca de orientações que se desejam ser adotadas, sendo pouco frequentes
aqueles que refletem sobre ações desenvolvidas sob tais princípios ou orientações. A sele-
ção de alguns excertos de artigos representativos da bibliografia pesquisada pode oferecer
ideia mais precisa das formulações sobre o modelo. Luckesi (1991,1992,1996), autor muito
citado entre os educadores a propósito do tema, procura contribuir para a elucidação dos
pressupostos filosóficos e educacionais das práticas avaliativas no ensino básico, insistindo
na necessidade de qualificar a avaliação não em função dela mesma, mas do fim a que se
destina, e mostrando que esta, ao conquistar ao longo dos tempos espaço tão amplo nos
processos de ensino, condicionou a prática pedagógica ao que ele chama pedagogia do exa-
me. Discute ainda a relação entre planejamento, avaliação e projeto pedagógico da escola,
ressaltando a dimensão política que possuem essas atividades e preconizando um trabalho
de equipe em que todos decidem o que e como fazer para elaborar uma proposta coerente
com as necessidades da clientela.
Maria Laura Franco (1990) faz, por sua vez, uma caracterização sumária das matrizes
epistemológicas dos modelos de ciência que privilegiam seja o objeto, seja o sujeito. Trans-
postos para a avaliação educacional, tais modelos teriam representado um avanço e nortea-
ram a geração de paradigmas mais complexos e abrangentes. No entanto, como em ambos
os casos a visão do indivíduo se apresenta de forma abstrata, a autora dá ênfase à neces-
sidade de que a avaliação educacional tenha como unidade de análise o vínculo indivíduo-
sociedade numa dimensão histórica. Daí ser fundamental para a avaliação da aprendizagem
em todos os níveis o entendimento da atividade humana, da ação prática dos homens, o que
pressupõe a análise do motivo e da finalidade dessa ação. Em outro ensaio, Franco (1994)
aponta ainda para a complexidade do conceito de qualidade do ensino, considerando-o como
um produto histórico e social que reflete um posicionamento político e ideológico orientado
por diferentes expectativas, que incorporam demandas diversificadas e mutáveis ao longo
do tempo. Ao discutir critérios de avaliação e indicadores de qualidade, questiona a validade
daqueles que são pensados em função do mito da modernidade, que os elege sobretudo
pelas exigências da produção. Um considerável número de textos, ao acentuar os aspectos
políticos e histórico-sociais da avaliação, apoia-se predominantemente nos referenciais de

capítulo 3 • 81
Habermas para propor a avaliação do tipo emancipatório dentro de um paradigma dialético.
Entre eles os mais representativos são os de Pedro Demo. Tendo em conta o fato de que
os aspectos políticos da educação têm a ver com o exercício da cidadania, esses textos
propõem uma estratégia de formação de sujeitos sociais, dotados de capacidade para se
autodefinirem, bem como para determinarem o seu destino histórico, de modo tal que logrem
conceber e construir sua emancipação política e econômica, assim como o seu projeto de
desenvolvimento como povo. Demo (1990), após admitir que a quantidade e a qualidade
constituem aspectos integrantes e indissociáveis da educação, na tentativa de definir con-
ceitos e critérios de avaliação da qualidade, distingue a qualidade formal – ligada ao domínio
tecnológico –, da qualidade política – voltada para a cidadania –, entendendo que uma não
pode ser entendida sem a outra, nem tampouco pode ser substituída pela outra.
(...)
Uma série de outros textos aborda a avaliação do ponto de vista de suas implicações
sociais mais amplas e das relações entre a educação e a sociedade abrangente, valendo-se,
para tanto, do referencial crítico-reprodutivista, da pedagogia dos conteúdos, ou da pers-
pectiva que privilegia a instituição escolar e sua cultura como fulcro de análise, e que tem
chegado até nós sobretudo pelos escritos de Antonio Nóvoa, Philippe Perrenoud e Gimeno
Sacristán. Esposando este último enfoque, Marli André (1990) considera que a estrutura
de poder vigente nas escolas reflete as relações de poder dos órgãos decisórios. Ela é a de
um poder predominantemente centralizador, exercido via de regra pelo diretor da unidade, e
tende a reproduzir-se tal e qual na organização do ensino na sala de aula. Para que a prática
docente possa ser redimensionada, tornando-se mais justa e mais democrática, recomenda
que se implante nas escolas uma sistemática de trabalho menos hierarquizada, mediante a
criação de espaços coletivos de reflexão, em que professores e orientadores possam analisar
conjuntamente o fazer pedagógico, espaços esses que podem ser utilizados para acompa-
nhamento, avaliação e reformulação do processo de ensino-aprendizagem visando ao seu
aprimoramento. A autora discute também a questão do poder e da função social da avaliação
escolar, ressaltando a necessidade de analisar as mediações presentes no ato de avaliar.
Toma como ponto de partida o conceito de fabricação da excelência escolar de Perrenoud,
segundo o qual as normas e os critérios definidos pela escola como de excelência, a des-
peito de serem frutos de uma dada construção social, são difundidos como a única forma
de conceber a realidade. Trabalhar no sentido de uma avaliação mais democrática implica
trabalhar simultaneamente nos campos da didática, da relação professor-aluno e da organi-
zação pedagógica da escola. Envolve também a adoção de uma pedagogia diferenciada que
assegure a possibilidade de o aluno ser reconhecido pelo grupo independentemente de suas
competências escolares e de seu nível cultural. A diferenciação envolve o acompanhamento
dos processos e dos caminhos de aprendizagem, a busca de estratégias para trabalhar com

82 • capítulo 3
os alunos mais difíceis, sendo a avaliação formativa a sua principal fonte de informação. Com
forte ênfase nos aspectos qualitativos da aprendizagem, o papel desse tipo de avaliação é
o de contribuir para esboçar um plano de atuação (1996). Menga Ludke (1995) parte da
discussão crítica dos modelos de avaliação comprometidos com a busca de instrumentos
de medida “válidos” e “fidedignos”, propugnando uma concepção de avaliação fortemente
integrada ao próprio processo de ensino-aprendizagem, como base para o desenvolvimento
de propostas que venham ao encontro das necessidades de alunos e professores. Menciona
formas e tentativas de avaliação associadas a esta última concepção. Refere-se ainda à
maior confiança que deve ser atribuída à avaliação feita pelos professores e pelos próprios
alunos. A despeito de admitir a maior carga de trabalho envolvida nesse tipo de avaliação,
reconhece que ela constitui fator de crescimento que, contudo, não substitui a avaliação ba-
seada em testagens que permitem a comparação de alunos e de instituições, possibilitando
a visualização de problemas não apreendidos no nível da sala de aula. Um grupo de autoras,
a saber: Mere Abramowicz (1995), Vera Tavares de Souza (1994), Mirian Grinspun (1994
e 1996) e Vera Werneck (1996), propõe uma avaliação holística do aluno, que não se res-
trinja aos aspectos cognitivos, procurando contemplar sua condição existencial, sentimentos,
motivações, valores. Ela deve manter o caráter dinâmico e interativo do processo e aponta
para um paradigma denominado crítico-humanista. Entre os artigos com enfoque psicope-
dagógico, observa-se que a utilização da teoria psicogenética para analisar a avaliação dos
resultados da aprendizagem escolar ocorre dentro de uma perspectiva mais ampla do que
em décadas anteriores.
(...) Embora a avaliação externa, como definida neste texto, seja uma variável crucial no
desenho das reformas educacionais em curso em um bom número de países, na transposi-
ção do modelo para a América Latina, tanto as justificativas, como as práticas de avaliação,
têm, várias vezes e, em certa medida, tentado minorar os aspectos que exacerbam o caráter
competitivo da proposta original, dando maior ênfase ao papel compensatório do Estado.
Em documento preparado para a Orealc, um grupo de pesquisadores chilenos, ao propor no
começo dos anos 1990 – portanto após o processo de redemocratização do país –, que a
região adote sistemas de medição da qualidade da educação básica, busca associar um novo
significado às medidas e à avaliação. Nesse caso, o foco está em que a comunidade de ato-
res emita juízos sobre os fenômenos de aprendizagem em que está envolvida e que, a partir
deles, desenvolva as ações remediativas que julgar convenientes. Ao lado das medidas pa-
dronizadas de aferição de resultados de aprendizagem, buscam contemplar estratégias para
a realização de uma avaliação formativa e, partindo do pressuposto de que os recursos são
escassos para solucionar problemas de grande magnitude, advogam a importância da avalia-
ção para identificar áreas vulneráveis em que é preciso intervir prioritariamente para melhorar
a qualidade do ensino (FILP et al., 1990). A pretensão é a de transformar a avaliação em um

capítulo 3 • 83
instrumento de mudança da realidade educacional, substituindo porém as políticas de corte
universalista pelas estratégias particularistas, que visam a atenção à grupos específicos e
que vêm se tornando a regra nas políticas da área. Considerando particularmente a expe-
riência brasileira, vale observar que os aspectos concorrenciais característicos da lógica de
mercado podem ser mais facilmente atribuídos aos procedimentos ligados à avaliação de
alunos dos cursos superiores, que vêm acompanhados da publicização de resultados e estão
fortemente associados aos processos de autorização de funcionamento e ao credenciamen-
to desses cursos. (...) Quando os sistemas de avaliação incorporam elementos importantes
da cultura escolar e os professores sentem que esta é feita a seu favor e não contra eles,
como na Suécia, os procedimentos utilizados terminam sendo assimilados pelos docentes
como um indicador importante para a melhoria do seu trabalho. Nesses casos, a insistência
no caráter complementar das duas modalidades de avaliação, a saber, a padronizada, mais
precisa e com condições de comparabilidade, mas necessariamente restrita, e a do professor
e da escola, que contempla aspectos mais abrangentes da formação do aluno, parece vir
contribuindo para reafirmar junto ao magistério a sua dignidade profissional. Na América
Latina, as pressões dos organismos internacionais e as linhas de crédito abertas com a fina-
lidade expressa de implantação de sistemas de avaliação padronizada do rendimento escolar
têm levado frequentemente a um superdimensionamento das possibilidades de impacto do
uso de informações desse tipo na melhoria da qualidade do ensino. Diante da escassez de
recursos e dos altos custos envolvidos na montagem desses sistemas, que não dispensam
pesadas contrapartidas dos países que recebem tais financiamentos, tem-se por vezes assis-
tido à retração do financiamento às pesquisas educacionais, capazes de trazer aportes não
menos valiosos à melhoria do sistema escolar. Em face da grande quantidade de informa-
ções já coletadas em alguns países, seja mediante pesquisas, seja por meio de avaliações
padronizadas realizadas em diferentes âmbitos e circunstâncias, pergunta-se também sobre
a capacidade efetiva que teriam os aparatos públicos de ensino de apreciar esses dados e
implementar medidas de amplo alcance em decorrência da sua análise.

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capítulo 3 • 85
86 • capítulo 3
4
A produção do
fracasso escolar na
sociedade moderna
4.  A produção do fracasso escolar na
sociedade moderna

Nesse capítulo, iremos apresentar as ideias de diferentes autores que discutem


a noção do erro no contexto escolar e o fenômeno do fracasso escolar. Sob dife-
rentes ópticas conceituais, iremos analisar criticamente a compreensão desses
dois fenômenos e por fim dar ênfase no papel do professor diante das dificul-
dades escolares dos estudantes.

OBJETIVOS
•  Compreender a historicidade do erro em nossa cultura;
•  Analisar criticamente a problemática do erro no processo de ensino e aprendizagem;
•  Discutir sobre a problemática da compreensão do fracasso escolar nas teorias da educação;
•  Descrever a produção do fracasso escolar na sociedade moderna e capitalista.

4.1  Diferentes compreensões da noção de erro na educação


brasileira

A discussão sobre o erro no contexto escolar é bastante histórica e tem influên-


cia da diversidade de concepções pedagógicas presentes na Educação. Vários
autores, dentre eles Júlio Groppa Aquino, Maria Helena de Souza Patto, entre
outros, têm investido em pesquisar sob diferentes perspectivas a compreensão
do erro e do fracasso escolar.
Segundo Nogaro e Granella (2012) o significado atribuído ao verbo “errar”
nos remete a uma interpretação contextual de fracasso, além disso, o erro só
pode ser considerado como algo insatisfatório, na solução de um problema, se
tomarmos como acerto uma forma, um padrão, a ser seguido. Para os autores,
“sem um padrão não há erro”, dessa forma, qualquer ação pode estar satisfató-
ria ou insatisfatória se comparada ao padrão, além disso, na busca de alcançar
os objetivos e estar mais próximo do padrão a pessoa pode ser bem ou malsuce-
dida. Desta forma não há erro, mas sucesso ou insucesso.
Para Nogaro e Granella (2012) diante da aprendizagem escolar, pode ocorrer
erro quando um aluno, em uma prova ou prática, manifesta não ter adquirido

88 • capítulo 4
determinado conhecimento ou habilidade através de uma conduta que não
condiz com o padrão existente. Neste caso, ocorre um erro em relação ao pa-
drão escolar. A instituição escolar associa o erro a um tipo de avaliação em que
o professor analisa os trabalhos dos alunos e os classifica como certo ou errado,
segundo padrões predefinidos. Sendo assim, é considerada errada a resposta
que não satisfaça os padrões culturais que tenham sido ensinados aos alunos.
Pode-se perceber que o percurso histórico dos estudos sobre o erro e o fra-
casso escolar evidenciam três teorias psicológicas existentes na educação na
explicação dos professores sobre o erro: passa a ser entendido como um fato
inaceitável e necessário de ser punido, temos o empirismo-associacionismo;
se o educador aceitar que o erro é fruto de um acontecimento natural, que será
corrigido pelo passar do tempo, temos o romantismo; se o educador tiver uma
concepção problematizada do erro, temos o construtivismo, em que o erro não
é tratado como uma questão reduzida ao resultado da operação (se acertou ou
errou), mas sim de invenção e de descoberta (NOGARO, GRANELLA, 2012).
Em um mundo cada dia mais dinâmico, repensar conceitos é inevitável e
imprescindível assim como é preciso que questionamentos, divergências e dis-
sonâncias surjam e venham ao encontro das escolhas do dia a dia. Para Nogaro
e Granella (2012), o “erro” deve ser considerado como uma forma construtiva
do saber, como uma fonte de crescimento, e não como uma ferramenta de ex-
clusão. Cabe à escola, ao professor, como meios diretos da formação de identi-
dades críticas e não conformidades, dar o passo maior em busca de uma edu-
cação que valorize as vivências de cada um e que tenha por objetivo primeiro a
conscientização do ser humano, enquanto ser social, da importância que cada
um tem na formação de uma sociedade mais justa, menos excludente e mais
interessada no ser, não no fazer.
Os erros de aprendizagem são motivos de muitas discussões e encaminha-
mentos para atendimentos externos à escola. Em geral, são apontados como
algo que seja de ordem cognitiva, mas há aí a implicância de uma gama muito
ampla de fatores para explicá-los. Segundo Nogaro e Granella (2012) por tratar-se
do aprendizado, do conhecimento humano, o erro escolar envolve uma série
muito grande de fatores para que ele ocorra. O ser humano é dotado de uma
diversidade biológica, estrutural, social, cognitiva, afetiva etc., muito variada,
assim sendo são variados, também, os motivos e as soluções propostas na aná-
lise do erro escolar.

capítulo 4 • 89
Para o professor, é muito desconcertante analisar a questão do erro pois
muitas vezes, esse professor percebe sua fragilidade no processo de ensinar ou
até mesmo em compreender como o aluno aprende. Persiste então a dualidade
no processo de culpabilização pelo erro ou pela produção do fracasso escolar, já
que há uma tendência em encontrar um único culpado por tal problema. Sobre
esse ponto de vista Mello (1985, p. 95), faz a seguinte consideração: “Dado o
envolvimento afetivo que o professor acaba tendo com sua prática profissional,
é inevitável que o fracasso de seus alunos acabe por atingi-lo em sua autoima-
gem, colocando em questão sua própria competência”. Contudo, existem mui-
tos fatores e teorias para explicar o “erro”, o fracasso escolar e a responsabili-
dade que tem o educador em repassar seus conhecimentos. Todas essas teorias
não se sustentam se não forem analisadas, em primeiro lugar, as diferenças
entre desenvolvimento e aprendizagem (NOGARO E GRANELLA, 2012).
Ainda para essas autoras, diante do fenômeno do erro no contexto escolar, o
educador pode adotar algumas estratégias tais como: a punição, a complacên-
cia ou construir a possibilidade de aprender. Para Angelucci, Kalmus, Paparelli
e Pato (2004) essa interpretação é bastante simplista pois para compreender o
fracasso escolar é preciso ter clareza da concepção teórica e metodológica sub-
jacente às concepções de educação, ensino e aprendizagem e das relações com
a produção do conhecimento.
Um estudo que buscou atualizar a literatura nessa área e trazer uma refle-
xão mais crítica sobre as produções nessa área foi o trabalho publicado por
Angelucci, Kalmus, Paparelli e Pato (2004) O estado da arte da pesquisa sobre o
fracasso escolar: um estudo introdutório em que as autoras buscaram disserta-
ções e teses entre 1991 a 2002 que tratavam do fracasso escolar na rede pública
de ensino fundamental.
Vamos ler alguns dos achados das autoras (p. 59 a 63)

Concepções de fracasso escolar

A leitura na íntegra de uma amostra do total de relatos levantados possi-


bilitou uma análise mais aprofundada da pesquisa recente sobre o fracasso
escolar. A leitura inicial e a análise foram norteadas pelas seguintes questões:
qual o objeto do trabalho? Qual a teoria que o fundamenta? Qual o método de
pesquisa adotado? Há coerência entre teoria e método? Quais as concepções
de escola e de fracasso escolar subjacentes à pesquisa? Quais as relações da

90 • capítulo 4
pesquisa analisada com o conhecimento já produzido? Que novos aspectos do
tema são abordados ou anunciados nas linhas e entrelinhas dessas pesquisas?
No cerne dessas perguntas, duas questões fundamentais: quais teorias, mé-
todos e concepções de fracasso escolar predominantes? A resposta pode revelar
a maneira pela qual o objeto da pesquisa é compreendido e estudado.

a) O fracasso escolar como problema psíquico: a culpabilização das


crianças e de seus pais
Uma das vertentes da pesquisa recente parte do princípio de que o fracasso
escolar se deve a prejuízos da capacidade intelectual dos alunos, decorrentes
de “problemas emocionais”. Entende-se que a criança é portadora de uma or-
ganização psíquica imatura, que resulta em ansiedade, dificuldade de atenção,
dependência, agressividade etc., que causam, por sua vez, problemas psico-
motores e inibição intelectual que prejudicam a aprendizagem escolar. Não
se trata da tese tradicional de que as crianças das classes populares têm ren-
dimento intelectual baixo por carência cultural, mas de afirmar uma inibição
intelectual causada por dificuldades emocionais adquiridas em relações fami-
liares patologizantes.
Nesses trabalhos pode haver menção à implicação da escola no fracasso
escolar, mas, por uma questão de “recorte de pesquisa”, ela não é levada em
conta. Esta decisão revela a compreensão que neles se tem de fracasso escolar:
como um fenômeno que pode ser estudado sem que se considere a existência
concreta da escola. As dimensões nomeadas nesses textos como “culturais”,
“sociais” e “econômicas” não se articulam com a dimensão “interna” ou subje-
tiva, que pode ser analisada isoladamente, por suposto sem qualquer prejuízo
para as conclusões da pesquisa. Sob o argumento da necessidade de “recorte”,
isola-se o aluno que “não aprende” da escola que o ensina.
A escola pode também comparecer reduzida à relação professor-aluno; nes-
ses casos, atitudes dos professores ou técnicas de ensino por eles utilizadas são
a causa principal das dificuldades de aprendizagem. Nessas teses, pode-se afir-
mar que o fracasso escolar tem relação com fatores de ordem “política e social”,
mas ao mesmo tempo negar que estes estejam presentes na “cultura da organi-
zação educacional”. Desse modo, as explicações centradas na tese da carência
cultural acabam sendo a reposta a pobreza dos alunos (como fator exterior à
escola) é a principal causa do seu insucesso escolar.

capítulo 4 • 91
Predomina uma concepção de escola como lugar harmônico em que o po-
tencial de cada um encontra condições ideais para se desenvolver. A tarefa da
criança, nesse contexto, é desenvolver suas capacidades egoicas para lidar com
uma realidade inquestionável. É a partir dessa concepção que alguns pesquisa-
dores estabelecem uma relação direta entre desempenho escolar e saúde men-
tal. Cabe ao aluno adaptar-se, com a contribuição de professores e psicólogos.
No interior de uma concepção de normalidade como adaptação, o não ajusta-
mento à escola ou a insatisfação com características do ambiente escolar são
incapacidade individual de orientar-se pelo princípio de realidade.
Entre as pesquisas que atribuem o fracasso escolar a problemas emocio-
nais individuais, há uma forte presença do emprego de grupos controle e expe-
rimental. É interessante ressaltar que elas chegam a resultados inconciliáveis.
Em uma delas, os membros dos grupos controle e experimental obtêm um bom
rendimento nas avaliações intelectuais, mas as avaliações de personalidade in-
dicam problemas de natureza emocional; o que diferencia o grupo experimen-
tal, portador de queixa escolar, é o não acolhimento de suas angústias pelos
pais e a consequente inibição intelectual. Em outra, tanto o grupo experimental
quanto o grupo controle apresentaram baixo desempenho intelectual; assim
sendo, o que explica o sucesso escolar dos integrantes do segundo grupo é o
fato de eles terem maturidade emocional suficiente para lidar com dificulda-
des escolares resultantes do baixo nível de inteligência. Sem diálogo entre elas
(uma das pesquisas foi defendida em 1993 e a outra em 1998), fica a seguinte
questão: até que ponto os resultados de uma pesquisa são entendidos de modo
a confirmar as hipóteses do pesquisador?
Nessa modalidade de pesquisa, a revisão bibliográfica por vezes assume ca-
ráter meramente burocrático, e se limita a listar o maior número possível de
pesquisas realizadas sobre o tema, sem atenção às diferenças de concepções,
procedimentos e resultados encontrados, como se fossem equivalentes. Dessa
forma, o avanço do conhecimento sobre o objeto de estudo fica seriamen-
te comprometido.

b) O fracasso escolar como um problema técnico: a culpabilização


do professor
Outra perspectiva encontrada é a que concebe o fracasso escolar como efei-
to de técnicas de ensino inadequadas ou de falta de domínio da técnica correta
pelo professor. Permanece nessas pesquisas o pressuposto de que as crianças

92 • capítulo 4
das classes populares trazem para a escola dificuldades de aprendizagem, mas
o foco muda de lugar: não se localiza nos problemas individuais dos alunos,
mas na técnica de ensino do professor. Nesse sentido, leva-se em conta a es-
cola na produção dos reveses da aprendizagem, mas reduzida a uma relação
dual abstrata em uma escola abstrata, ou seja, desvinculadas da sociedade que
as inclui.
Mesmo quando faz referência ao “descaso das autoridades” para com a es-
cola pública, as teses dessa vertente continuam dentro da lógica tecnicista, pois
o descaso é reduzido ao fato de as autoridades não proporcionarem formação
técnica adequada aos professores. Afirma-se que o fracasso escolar é produzido
na e pela escola, mas reduz-se esta produção à sua inadequação técnica. Na ver-
dade, continua-se a compreender o fracasso escolar como resultado de variá-
veis individuais, embora nessas teses a variável independente investigada seja
a capacidade profissional do professor.
Marcado pela tese da carência cultural, um dos relatos analisados dá con-
tinuidade à versão que marcou a pesquisa do fracasso escolar nos anos 1970:
os professores estão preparados para escolarizar crianças ideais, mas não os
usuários predominantes da escola pública primária — as crianças pobres.
Está presente nessa produção o pressuposto de que os alunos possuem
dificuldades de ordem emocional, cultural etc., que podem ser sanadas pelo
professor se ele utilizar a técnica de ensino adequada. O construtivismo é a al-
ternativa mais comumente apresentada; o professor deve dominá-lo, acreditar
na capacidade de desenvolvimento da criança e atuar mediante intervenções
psicopedagógicas. Por meio desses procedimentos, prevê-se o ajustamento da
criança a uma escola que, baseada na técnica correta, proporcionaria condi-
ções propícias ao desenvolvimento das potencialidades dos aprendizes.
O acento técnico dessa concepção de fracasso escolar fica patente na preo-
cupação com a eficácia da prática pedagógica. Nesse contexto, ser bom pro-
fessor significa ter formação técnica adequada; refletir sobre a prática; plane-
jar as intervenções; estar motivado. Se todos esses critérios forem garantidos
e, ainda assim, houver crianças que não aprendem, aí sim se pode afirmar a
presença de dificuldades psíquicas individuais que devem ser encaminhadas
a especialistas.
A partir do entendimento do fracasso escolar como resultado de técnicas de
ensino inadequadas ou mal digeridas, pesquisadores se propõem a aplicar eles
mesmos técnicas em grupos de crianças com queixa escolar a fim de provar a

capítulo 4 • 93
sua tese, melhorando o desempenho escolar ou, pelo menos, as respostas da-
das pelos sujeitos da pesquisa no contexto experimental. Também nessas pes-
quisas, os casos que contradizem a hipótese inicial são tomados como indicati-
vos de deficiências individuais que necessitam de acompanhamento especial,
e não como resultado que problematiza a hipótese de que o simples emprego
da técnica adequada é suficiente para reverter as dificuldades de escolarização.
Essas pesquisas consideram a crítica às concepções psicologizantes ou me-
dicalizantes do fracasso escolar quando se referem à necessidade de se com-
preender as origens e significados da “queixa escolar”, em vez de simplesmente
atribuí-la a dificuldades do aluno. No entanto, acabam por voltar à redução que
criticam, ao restringirem-se à avaliação da criança e à intervenção na criança.

c) O fracasso escolar como questão institucional: a lógica excludente da


educação escolar
Há pesquisas que entendem a escola como instituição social que contradi-
toriamente reproduz e transforma a estrutura social. Partem do princípio de
que o fracasso escolar é um fenômeno presente desde o início da instituição
da rede de ensino público no Brasil. A análise dos processos institucionais que
levam à produção do fracasso deve considerar a escola como instituição inseri-
da em uma sociedade de classes regida pelos interesses do capital, sendo que
a própria política pública encontra-se entre os determinantes do fracasso esco-
lar. Assim, a reversão desse quadro requer, da política educacional, resistência
aos interesses privatizantes e compromisso com a construção de uma escola
pública capaz de distribuir com mais igualdade habilidades e conhecimentos
que lhe cabe transmitir.
Ao inserirem a produção do fracasso escolar no âmbito de condições esco-
lares objetivas, fazem do contato direto do pesquisador com a vida escolar — o
que, normalmente, pressupõe uma longa permanência no campo — e das re-
lações não objetificantes entre pesquisador e pesquisados os principais instru-
mentos de pesquisa.
Tais princípios não impedem, entretanto, uma compreensão parcial das
teorias críticas da escola nas pesquisas que as têm como referência: ao mes-
mo tempo em que afirmam que, para pensar a escola e seus resultados, é pre-
ciso tomá-la como instituição seletiva e excludente, retomam o tecnicismo ao
admitirem a possibilidade de pôr sob controle o fracasso escolar por meio da

94 • capítulo 4
adequada implementação de políticas educacionais “progressistas”, com espe-
cial ênfase na política de ciclos de aprendizagem. O insucesso de reformas e
projetos nesta direção encontra explicação no conservadorismo dos professo-
res que, pela resistência à inovação, prejudicam a sua implementação. A saída
apontada é o investimento na formação intensiva dos professores, de modo a
levá-los a conhecer em profundidade as propostas governamentais e, assim, ga-
rantir a realização do objetivo final de reformas e projetos oficiais: a reversão do
fracasso escolar.
Essas pesquisas podem diferir também quanto à definição dos responsá-
veis pela reformulação da política educacional. Há pesquisadores que pressu-
põem a construção coletiva dessa política, com a participação de educadores
e movimentos sociais, até o limite do possível nas condições históricas atuais;
outros entendem que, para garantir a formação intelectual das classes popula-
res, essa política deve ser elaborada por especialistas e informada por teorias
de desenvolvimento, da aprendizagem e do ensino — entre os autores citados,
destacam-se Piaget e Vygotsky. Ao defenderem essa posição, as teses e disserta-
ções defendem a divisão entre “planejadores” e “executores”.
d) O fracasso escolar como questão política: cultura escolar, cultura po-
pular e relações de poder
Por fim, há uma vertente que enfatiza a dimensão política da escola. Assim
como as pesquisas que se debruçam sobre a lógica excludente da educação es-
colar, analisadas no item anterior, aqui também se compreende a escola como
uma instituição social regida pela mesma lógica constitutiva da sociedade de
classes. O foco, entretanto, incide nas relações de poder estabelecidas no in-
terior da instituição escolar, mais especificamente na violência praticada pela
escola ao estruturar-se com base na cultura dominante e não reconhecer — e,
portanto, desvalorizar — a cultura popular.
Ao considerarem os determinantes sociopolíticos do ensino, partem da crí-
tica às concepções tradicionais de fracasso escolar e trazem novos elementos
que contribuem para a sua superação. Fazem a crítica à tese de que as crianças
das classes populares são carentes de cultura ou possuem deficiências cogniti-
vas e emocionais; à relação pedagógica concebida como processo individual; às
tentativas de superação do fracasso escolar por meio de medidas técnico-peda-
gógicas de inclusão nos sistemas escolar e social, todos eles centrados na ideia
de escola como entidade abstrata.

capítulo 4 • 95
Essas pesquisas criticam as relações causais lineares entre “problemas
individuais” e “problemas de aprendizagem” para explicar as dificuldades de
escolarização dos alunos oriundos das classes populares, porque questionam
a polarização entre indivíduo e sociedade e compreendem a constituição do
sujeito nas condições concretas de existência num determinado lugar da hie-
rarquia social.
Ao debruçarem-se sobre a realidade social em que se dá a escolarização
das crianças pertencentes às classes subalternas, desconstroem os fenôme-
nos nomeados pelos profissionais da escola e pelos formuladores de políticas
educacionais como “não aprendizado”, “problema emocional”, “indisciplina”,
“carência cultural”, etc. Essas categorias abstratas são ressignificadas e enten-
didas não mais como fenômeno individual, sintoma de conflitos intrapsíqui-
cos, ou como expressão reativa da resistência a práticas escolares inadequadas,
mas em sua positividade, como expressão do conflito de classes no interior da
escola. Sob essa óptica, a indisciplina escolar pode ser tentativa de participação
dos alunos no mundo da escola, a partir de seus próprios referenciais culturais.
Também é comum a esses trabalhos a construção de perguntas e procedi-
mentos de pesquisa para respondê-las que querem implicar ativamente os pes-
quisados, ou seja, transformá-los de objetos de pesquisa em sujeitos sem os
quais é impossível produzir conhecimento. Há, portanto, uma ruptura episte-
mológica: do conhecimento sobre a “criança fracassada”, o “professor incom-
petente”, as “famílias desestruturadas” para o conhecimento que incorpora a
fala dos alunos, dos profissionais da escola, das famílias das classes popula-
res, numa proposta de resgate da legitimidade de seus saberes, experiências
e percepções.

LEITURA
Para aprofundar os estudos sobre essa temática é importante conhecer obras como:
•  PATTO, M.H.S. A produção do fracasso escolar: histórias de submissão e rebeldia. São
Paulo: T.A. Queiroz, 1991, p. 385.
•  AQUINO, Júlio Groppa. Confrontos na sala de aula: Uma leitura institucional da relação
professor-aluno. São Paulo: Summus, 1996.

96 • capítulo 4
MULTIMÍDIA
Para ampliar o conhecimento assistam as videoaulas
•  “A construção do fracasso escola: mecanismos do não aprender e desafios do
professor” : disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=MeFrmYjyp58>.
•  “ A criança que não aprende” - Com Silvia Colello (USP) e Maria Teresa Montoan (UNI-
CAMP): disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=pcJscN9RYPI>.

Compreender as possíveis relações da aprendizagem/fracasso escolar/erro,


algumas questões podem orientar, tais como: como a escola tem lidado com as
questões das aprendizagens e do desenvolvimento dos alunos? Para Nogaro e
Granella (2012), a resposta está vinculada à análise de como, do ponto de vis-
ta da instituição escolar, a aprendizagem é transmitida sem que haja uma real
preocupação com a compreensão pelo aluno. Deste ponto de vista, a escola não
dá oportunidade para que o aluno desenvolva sua autonomia e mais, a escola
acredita que cumpre sua missão apenas transmitindo conhecimentos para o
aluno memorizar. Porém, o ensino assim realizado, faz pouca associação com
a realidade de vida do estudante.
Nogaro e Granella (2012) sugerem que o aluno deve ser desafiado, deve ser
estimulado a levantar ideias e hipóteses sobre aquilo que pretende que ele
aprenda. O professor, por sua vez, deve procurar conhecer seus próprios limi-
tes e tentar superá-los. A escola deve oportunizar trocas de experiências e de
conhecimentos entre os alunos de diferentes turmas de forma a integralizar a
aprendizagem e democratizar o ensino.

É preciso insistir que tudo quanto fazemos em aula, por menor que seja, incide em
maior ou menor grau na formação de nossos alunos. A maneira de organizar a aula,
os tipos de incentivos, as expectativas que depositamos, os materiais que utilizamos,
cada uma destas decisões veicula determinadas experiências educativas, e é possível
que nem sempre estejam em consonância com o pensamento que temos a respeito
do sentido e do papel que hoje em dia tem a educação. (ZABALA, 1998, p. 29)

Para Nogaro e Granella (2012) não podemos perder a oportunidade de


aproveitar as insuficiências ou fragilidades nas produções escolares como

capítulo 4 • 97
possibilidade de avaliarmos o trabalho a ser realizado, focando-o de acordo
com as suas necessidades. A natureza e a origem das fragilidades devem ser
determinadas, coisa que geralmente escapa ao professor. É necessário que o
educador tome uma posição diante da evidência do erro e da postura que tem
em relação a eles: punição, complacência ou possibilidade de aprender.
O educador pode ter uma concepção problematizada do erro, temos o
construtivismo, em que esse não é tratado simplesmente como uma questão
reduzida ao resultado da operação, mas sim, de invenção e de descoberta. Sob
este enfoque, buscamos a compreensão do erro não apenas da perspectiva do
aluno, como também, na atuação docente em sala de aula. Neste caso, aluno e
professor integram o processo de ensino-aprendizagem e os erros cometidos
são produzidos tanto individuais como coletivamente. O erro construtivo está
associado ao conhecimento lógico-matemático, ou seja, o conhecimento em
que o sujeito se utiliza de relações mentais para criar hipóteses cognitivas e que
traz uma hipótese acerca de qualquer conhecimento (matemático, linguístico,
social, entre outros).

LEITURA
Para amplia o conhecimento leia:
•  AQUINO, Júlio Groppa. O erro e fracasso na escola. São Paulo: Summus, 1996.

Entretanto, não basta entendermos o erro se não pensarmos em desenvol-


ver mecanismos para que o professor possa intervir, junto ao aluno, e auxiliá-lo
a construir outras hipóteses para um determinado conhecimento.
Nogaro e Granella (2012) defendem a ideia de que o aluno constrói o seu
conhecimento na interação com o meio em que vive, concepção interacionista,
construtivista, por isso suas experiências são muito importantes para ajudá-lo
a ultrapassar determinados estágios de desenvolvimento e dar-lhe capacidade
de estabelecer relações cada vez mais complexas e abstratas. Os entendimentos
dos alunos são decorrentes do seu desenvolvimento próprio frente a umas e
outras áreas do conhecimento. Em vista disso, fazemos o seguinte questiona-
mento: poderá a escola entender como possível a formação de turmas homogê-
neas? Poderemos conceber um grupo de alunos como “iguais” em sua maneira
de compreender o mundo? Poderão os professores encontrar critérios precisos

98 • capítulo 4
e uniformes para avaliar o desempenho de muitas crianças? Corrigir tarefas
por gabaritos únicos?
A questão é como transformar o erro em uma situação desafiadora em que
aluno e professor precisam buscar soluções, um diálogo e por fim uma situa-
ção de aprendizagem. Tradicionalmente, a escola tem procurado por respostas
certas, uniformes para medir o nível de conhecimento e aprendizagem dos alu-
nos e estes “brindam” seus educadores com várias respostas possíveis e lógicas
para as “charadas” apresentadas, uma vez que se trata de indivíduos diferentes,
oriundos de realidades diferentes, vivendo, cada um, sua própria experiência
de vida. Devemos levar em conta que há também, as várias interpretações das
respostas (dos alunos) pelos professores a partir do seu jeito de perceber as coi-
sas (NOGARO, GRANELLA, 2012).
Nogaro e Granella (2012) vão afirmar de forma enfática que é necessário
que a escola e os educadores entendam que o erro, na aprendizagem, é a ma-
nifestação de uma conduta não aprendida, que emerge a partir de um padrão
de conduta cognitivo, e que serve de ponto de partida para o avanço, na medida
em que são identificados e compreendidos positivamente, em direção à apren-
dizagem do aluno, possibilitando a sua correção de forma hábil e inteligente.
Isso significa uma forma consciente e elaborada, na conduta docente, em in-
terpretar o erro na aprendizagem como uma possibilidade de crescimento e de
valorização do aluno bem como um passo à frente na relação professor-aluno.

4.2  O erro pode ser compreendido como forma de inclusão ou


exclusão do aluno no/do processo de ensino e aprendizagem

Para Nogaro e Granella (2012) o erro deve ser encarado como o ponto de partida
para o avanço na investigação ou na busca da satisfação de uma necessidade,
serve de ponto de partida para o avanço, na medida em que é identificado e
compreendido, e sua compreensão é o passo fundamental para sua superação.
Compreendido nessa perspectiva, o erro passa a ser usado como fonte de
virtude ou de crescimento, necessita de efetiva verificação, para ver se estamos
diante dele ou da valorização preconceituosa de um fato; e de esforço, visan-
do compreender o erro quanto à sua constituição (como é esse erro?) e origem
(como emergiu esse erro?).
Hoffmann (1998, p. 14) faz a seguinte consideração: “[...] sucesso e fracas-
so em termos de aprendizagem parece ser uma perigosa invenção da escola.”

capítulo 4 • 99
Para ela, são questionáveis os indicadores desses dois conceitos que, em geral,
costumam associar perigosamente o certo ao bom e verdadeiro e o errado ao
ruim e fracassado. Nesta visão, os conceitos sucesso e fracasso tendem a pro-
vocar uma oposição entre as práticas avaliativas e o respeito a crianças e jovens
brasileiros no seu direito constitucional à educação. As escolas tendem a tornar
objetivos e precisos os indicadores de sucesso-acerto e fracasso-erro e negam a
individualidade de seus alunos em razão de parâmetros avaliativos perversos
e excludentes.
Como vimos, para Nogaro e Granella (2012) a preocupação com o fracas-
so escolar é constante entre muitos pesquisadores e educadores e até hoje, es-
tudos, diagnósticos, denúncias e propostas têm estado presentes no discurso
político sobre a educação no Brasil. Discurso este, que é inspirado, historica-
mente, nos ideais democrático-liberais: o objetivo é a igualdade social, e a de-
mocratização do ensino é vista como instrumento essencial para a conquista
deste objeto. Entretanto, ao longo do tempo, esse discurso sobre a democrati-
zação do ensino ora toma uma direção quantitativa, em defesa da ampliação de
ofertas educacionais – aumento do número de escolas populares, obrigatorie-
dade e gratuidade do ensino elementar –, ora se volta para a melhoria qualita-
tiva do ensino – reformas educacionais, introdução de novas metodologias de
ensino, aperfeiçoamento de professores. “A escola pública não é, como erro-
neamente se pretende que seja, uma doação do Estado para o povo; ao contrá-
rio, ela é uma progressiva e lenta conquista das camadas populares, em sua luta
pela democratização do saber, através da democratização da escola” (SOARES,
1988, p. 9).
Soares (1988, p.9) faz uma profunda reflexão sobre as causas do fracasso
escolar das camadas populares brasileiras”. A escola que existe é antes contra
o povo que para o povo”. A autora expõe pesquisas em que os dados demons-
tram que não há escola para todos e que em muitos Estados brasileiros cerca
da metade da população entre 7 e 14 anos está fora da escola. As altas taxas de
repetência mostram que os que conseguem entrar na escola, não conseguem
aprender ou nela não conseguem ficar. A repetência, a não aprendizagem e a
evasão constroem a chamada “pirâmide educacional brasileira”. Esta constru-
ção se dá através da rejeição, pelas escolas, das camadas populares, ou seja, a
escola que seria para o povo é, na verdade, contra o povo.

100 • capítulo 4
Nogaro e Granella (2012) reforçam que respeitar as diferenças entre os alu-
nos é uma tarefa que exige, sobretudo, sensibilidade, humanidade e coopera-
ção entre os professores. Se na educação mantivermos a visão de discriminação
e exclusão acerca do “erro”, da diferença, não será possível percebê-lo como
fonte de crescimento e a avaliação.
Para as autoras, é preciso questionar os princípios que fundamentam as prá-
ticas avaliativas nas escolas. Tais práticas, cada vez mais estreitas e padroniza-
das, impedem de vermos e sentirmos o aluno em seu desenvolvimento integral
e singular, negando-lhe a humanidade e limitando o acesso à escola apenas aos
que se aproximam ou se submetem a expectativas rigidamente determinadas por
ela. É necessário que repensemos acerca do comprometimento dos educadores e
das escolas, com os juízos de valor emitidos e as decisões que tomam em relação
às possibilidades e necessidades de cada estudante; o respeito entre os alunos;
a permanência do aluno na escola, ou seja, o compromisso em favorecer o seu
acesso a outros níveis de saber, a outros graus de ensino, compromisso em garan-
tir-lhe uma formação democratizada de fato (NOGARO; GRANELLA, 2012).
É preciso mudanças, mas estas não podem ser impostas. Devem ser cons-
truídas quotidianamente de modo que a visão democrática vá impregnando
as práticas, sendo incorporada pelo senso comum, convencendo as pessoas e
se constituindo como um consenso. Essas transformações devem ser resulta-
do do diálogo, da comparação entre opiniões e conhecimentos diferentes. O
diálogo tem que estar enlaçado com o debate sobre a função social da escola e
do conhecimento. Erros e acertos não podem determinar o processo de apren-
dizagem, bem como não podem ser parâmetros para a inclusão ou exclusão
(NOGARO; GRANELLA, 2012).

ATIVIDADES
01. Segundo Nogaro e Granella (2012) há três teorias psicológicas existentes na educação
na explicação dos professores sobre o erro, quais são elas e como entendem o fenômeno
do erro?

02. Quais são os achados de Angelucci, Kalmus, Paparelli e Pato (2004) no texto “O estado
da arte da pesquisa sobre o fracasso escolar: um estudo introdutório” sobre a questão da
produção do fracasso escolar?

capítulo 4 • 101
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANGELUCCI, C., B.; KALMUS, J.; PAPARELLI, R. ; PATO, M. H. S. O estado da arte da pesquisa
sobre o fracasso escolar: um estudo introdutório. Educação e Pesquisa, São Paulo, v.30, n. 1, p.51-
72, jan/abri, 2004.
AQUINO, J.G. (org.) Erro e fracasso na escola - alternativas teóricas e práticas. 2. Ed. São Paulo:
Summus, 2001.
HOFFMANN, J. Avaliação Mediadora. 2. Ed. Porto Alegre: Mediação, 2003.
LUCKESI, C. C. Avaliação da Aprendizagem Escolar. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2001.
NOGARO, A E GRANELLA, E. (2012). O erro no processo de ensino e aprendizagem. <www.
revistas.fw.uri.br/index.php/revistadech/article/download/244/446+&cd=2&hl=
pt-BR&ct=clnk&gl=br>. Acesso em: 2 fev. 2016.

102 • capítulo 4
5
A avaliação e as
práticas cotidianas
escolares
5.  A avaliação e as práticas cotidianas
escolares

Nesse capítulo iremos dialogar sobre a importância do planejamento do pro-


fessor na atividade da docência, é por meio do planejamento que o professor
consegue acompanhar sua própria prática sabendo o que ele já foi capaz de
implementar e o que precisa ainda ser trabalho, mas é fundamental também
que no planejamento estejam claras propostas de avaliação. Afinal, quais são
as concepções de avaliação que estão amparando as práticas avaliativas dentro
da escola? E por fim, vamos compreender as práticas avaliativas que vem sendo
requeridas no cotidiano escolar atual.

OBJETIVOS
•  Compreender as relações entre a avaliação e o planejamento;
•  Apresentar a importância do referencial na avaliação;
•  Dissertar sobre as práticas de avaliação no contexto das práticas cotidianas escola-
res atuais.

5.1  Planejamento e avaliação: ações relacionadas na prática


docente

A atividade de planejamento faz parte de muitos momentos da vida das pes-


soas. Antes da realização de qualquer atividade, em geral, é desejável que as
pessoas organizem seus pensamentos e suas ações em diferentes situações
para posteriormente tomar decisões e concretizar suas ideias, seja em relação
ao dia a dia o que vai fazer primeiro, como vai fazer tal coisa, até situações que
demandam mais tempo para se organizar como a compra de um imóvel, a data
do casamento e, não é diferente o fazer pedagógico do professor, pelo contrário
o planejamento é necessário dentro do processo educativo.
Luckesi (1998) destaca que no caso específico do processo de ensino e
aprendizagem, o ato de planejar exige a definição sobre :
•  O que se deseja em relação à educação;
•  Qual sua filosofia da educação;

104 • capítulo 5
•  Qual conhecimento você tem sobre o aluno;
•  O que a comunidade escolar espera da escola;
•  Quais conteúdos científicos serão trabalhados e como eles serão
organizados.

O planejamento é uma maneira de ordenar a ação tendo em vista os fins


almejados, e na educação, a base deve ser sempre os conhecimentos historica-
mente produzidos que possam dar suporte objetivo à ação educativa.
Além disso, Luckesi (1998) acrescenta também a necessidade de atenção
plena no planejamento, bem como, o fato de que o planejamento da atividade
pedagógica consiste em uma atividade coletiva, que envolve ensinar e aprender
num constante processo de troca de saberes. Por fim, não podemos deixar de
inferir sobre a necessidade de que aquilo que foi planejado precisa ser executa-
do com as mesmas habilidades: conhecimento, entrega, ato coletivo.
Não basta que o profissional se utilize da história, sociologia, psicologia e
a ciência específica somente no ato de planejar. Importa que no dia a dia se
verifique o verdadeiro auxílio de tais conhecimentos nos atos de ensinar e de
aprender. Para que isto possa acontecer, é necessária a entrega ao desejo. É a
ação com paixão. Por fim, o planejamento coletivo só poderá ser colocado em
prática pela conjugação das forças de todos; a execução deve também ser cole-
tiva. Os profissionais que atuam numa prática escolar necessitam da parceria
entre si, investir comumente em um objetivo (LUCKESI, 1998).
Entretanto, neste contexto, cabe-nos salientar algumas especificidades que
compõem este cenário.
De acordo com Luckesi (1998), ao tratarmos especificamente da educação,
a prática do planejamento em nosso país tem sido conduzida como se fosse
uma atividade neutra, sem comprometimentos. Por vezes, o planejamento é
realizado como se tivesse um fim em si mesmo; em outros momentos, é as-
sumido como se fosse uma maneira de definir a aplicação de técnicas efetivas
para conseguir resultados, não importando a que preço.
Para o autor, em geral, o planejamento nas escolas tem sido uma maneira
de operacionalizar o uso de recursos (materiais, financeiros, humanos, didáti-
cos). As chamadas semanas de planejamento, que acontecem no início de cada
ano letivo, têm consistido em um momento de preencher formulários para se-
rem arquivados na gaveta do diretor ou de um profissional que seja intermediá-
rio do processo pedagógico, como o coordenador ou supervisor, por exemplo.

capítulo 5 • 105
Portanto, é de fundamental importância que tais práticas sejam revistas,
por não se constituírem efetivamente em um planejamento como o descrito,
mas em um simples processo burocrático de preenchimento de formulários,
que em muitos casos se baseiam em cópias dos conteúdos de livros didáticos.
O processo de planejamento realizado de forma burocrática e autoritária não
contribui para a reflexão sobre o processo de ensinar e de aprender, desta for-
ma, não cria condições para a mudança tão necessária na educação brasileira.
A consciência, por parte dos profissionais da educação, de que a utilização
de procedimentos educativos envolve diversas concepções subjacentes ao en-
sino, sejam elas políticas ou sociais, é de grande importância. Além disso, o
envolvimento do docente na busca de melhores formas de ensinar e de avaliar
a aprendizagem, intervindo sobre as necessidades de mudança só serão possí-
veis se os educadores dialogarem sobre suas práticas.
Há um senso comum que predomina, sobretudo na atividade educativa,
de que o ato de planejar é um ato simplesmente técnico ou um ato burocráti-
co. Alguns educadores assumem essa postura e ao planejarem suas ações, em
grande parte das vezes, não se questionam a que resultados políticos podem
conduzir suas ações nem mesmo o quanto essa postura contribui para a estag-
nação da educação (LUCKESI, 1998).
Por isso, o planejamento deverá ser compreendido como um ato ao mesmo
tempo político-social, científico e técnico: político-social, na medida em que
está comprometido com as finalidades sociais e políticas; científico, pois não
se pode planejar sem um conhecimento da realidade; por fim, técnico, pois o
planejamento exige uma definição de meios eficientes para se alcançar os re-
sultados (LUCKESI, 1998).
O momento político que vivemos, marcado pelo esforço de democratização
da sociedade, exige a necessidade de se repensar as metodologias de formula-
ção das políticas públicas, de maneira a definir com clareza as responsabili-
dades e áreas de atuação do Estado, nas esferas federal, estadual e municipal,
e da sociedade civil, por meio de suas organizações (KUENZER, CALAZANS,
GARCIA, 2003).
Segundo Roger Garaudy (1978), citado por Luckesi (1998), a função princi-
pal da educação já não é mais adaptar a criança a uma ordem existente, fazen-
do com que assimile os conhecimentos e o saber destinados a inseri-la nesta

106 • capítulo 5
ordem, como fizeram as gerações anteriores, mas, ao contrário, auxiliá-la a viver
em um mundo que se transforma em ritmo sem precedente histórico, tornan-
do-a desta forma, capaz de criar o futuro e de inventar possibilidades inéditas.
Neste contexto, podemos conceber a educação como um momento de vital
importância para o desenvolvimento dos alunos, mas a partir de uma lógica di-
ferenciada e comprometida com o aluno enquanto sujeito capaz de agir diante
desta sociedade e passível de mudanças de diferentes ordens. Por isso, não é
suficiente pensar nos meios, nas técnicas e na sofisticação dos recursos tecno-
lógicos, mas principalmente aprender a projetar os fins e os valores que devem
orientar a educação.

Planejamento =
Previsão +
Organização +
Avaliação
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Figura 5.1 – Planejamento Escolar.

Então, os meios serão selecionados tendo em vista os fins. Precisamos de


eficiência, mas não eficiência para qualquer finalidade, mas que nos auxilie a
dar conta das perspectivas de vida sadia para os seres humanos. Portanto, é ne-
cessário que a prática de planejar, seja ela educacional, curricular e de ensino,
ganhe a dimensão de uma decisão política, científica e técnica. Desenvolvido
desta maneira, o ato de planejar deixará de ser um simples estruturar de meios
e recursos, para tornar-se o momento de decidir sobre a construção de um fu-
turo (LUCKESI, 1998).
É claro que este tipo de planejamento deve ser resultado da contribuição de
todos que compõem o corpo profissional da escola. É preciso que todos deci-
dam, de forma conjunta, o que fazer e como fazer. Na medida em que é o conjun-
to de profissionais da escola que forma o seu corpo de trabalho, o planejamento

capítulo 5 • 107


das atividades também deve ser seu ato, ou seja, coletivo. Decisões isoladas e
individuais não são suficientes para construir resultados de uma atividade que
é coletiva (LUCKESI, 1998).

Atividades individuais e isoladas são insuficientes para produzir resultados significa-


tivos no coletivo. Por isso, são necessárias ações individuais e coletivas, ao mesmo
tempo.

Neste sentido, a avaliação poderia ser entendida como uma crítica do per-
curso de uma ação, seja ela curta ou prolongada. Enquanto o planejamento di-
mensiona o que vai ser construído, a avaliação subsidia tal construção, porque
fundamenta novas decisões. Desta forma, a avaliação será uma maneira pela
qual podemos tomar genericamente dois tipos de decisão (LUCKESI, 1998).
Uma delas está relacionada com a dimensão do próprio projeto de ação. A
avaliação subsidia a própria produção do projeto, bem como, o seu redimen-
sionamento, já que o mesmo pode ter ficado defasado em virtude das novas di-
mensões da realidade e das novas exigências do momento atual; pode ter sido
muito pretensioso, precisando de novo treinamento; pode também ter sido in-
compatível com o meio onde estamos atuando (LUCKESI, 1998).
Outro tipo de decisão que a avaliação subsidia diz respeito à construção do
próprio projeto pedagógico da escola. A versão preliminar pode até já estar pla-
nejada; agora o importante é dar-lhe forma real, contribuições que vão delinear
esse projeto para aquela comunidade atual, real, utilizando-se para isto todos
os recursos definidos. Nesse nível, a avaliação é um constante olhar crítico so-
bre aquilo que está sendo feito. Esse olhar permite que se decida sobre como
pode ser melhorada a construção do projeto pelo qual se está trabalhando. A
avaliação contribui para a identificação dos impasses e a encontrar os cami-
nhos para superá-los; ela subsidia o acréscimo de soluções alternativas, caso
sejam necessárias, para determinado percurso de ação, entre outros (LUCKESI,
1998).
Fica evidente a importância da avaliação no contexto educacional, inclusive
ao tratarmos do planejamento escolar, pois esta se constitui como parte inte-
grante de todo este processo, conforme nos referimos no início do material.
É importante ressaltar que a possibilidade de existir a “avaliação crítica ao
percurso de ação”, segundo Luckesi (1998, p. 117), significa:

108 • capítulo 5
que a avaliação opera na identificação das condições políticas e sociais do próprio
projeto, o que permite dimensioná-lo de forma mais adequada. De outro, é o processo
pelo qual nós temos à nossa frente um objetivo – no caso, a construção do nosso pro-
jeto – e estamos investidos de sua efetiva construção. Crítica, então, não será um ato
acusatório de responsabilidades não assumidas por este ou por aquele profissional
(pode até ser isso também), mas sim o modo comum de analisar e verificar onde está
havendo estrangulamento de um curso de ação e como ele pode ser superado, com
o comprometimento dos profissionais que dela participam. A avaliação crítica aponta
alternativas de melhorias.

Para que ela seja crítica do percurso, é preciso que todos aqueles que este-
jam envolvidos na construção de um projeto comum possam contribuir, anali-
sando, observando pontos de estrangulamento, sugerindo, comprometendo-se
(LUCKESI, 1998).
O compromisso e a responsabilidade com a educação devem partir da atua-
ção de todos os atores envolvidos neste cenário, de maneira a possibilitar um
trabalho coletivo e comprometido com a qualidade educacional. A avaliação
atravessa o ato de planejar e de executar; desta forma, ela contribui em todo o
percurso da ação planificada.
Ela se faz presente na identificação da perspectiva político-social, na sele-
ção de meios alternativos e na execução do projeto, almejando com isto a sua
construção, ou seja, ela é crítica de percurso, é uma ferramenta importante ao
ser humano no processo de construção dos resultados que planificou produzir,
como também no redirecionamento da direção da ação. A avaliação constitui
em uma ferramenta da qual o homem não se livra; ela faz parte de sua ma-
neira de agir e, por isso, é preciso que seja utilizada da melhor forma possível
(LUCKESI, 1998).
Portanto, planejamento e avaliação são atos que estão a serviço da constru-
ção de práticas educativas mais eficazes e capazes de promover a aprendizagem.
Enquanto o planejamento desenvolve previamente os caminhos, a avaliação visa
subsidiar os redirecionamentos que se façam necessários no percurso da ação. A
avaliação é um ato de investigar a qualidade dos resultados, sejam eles interme-
diários ou finais de uma ação, subsidiando sempre sua melhora (LUCKESI, 1998).
No entanto, em vez de a avaliação ser utilizada para a construção de resultados
satisfatórios, ela tornou-se um meio de classificação dos alunos e de decidir sobre os

capítulo 5 • 109
seus destinos. A avaliação deve deixar de ser utilizada como um recurso de autorida-
de e assumir o papel de auxiliar o crescimento, condição esta necessária para que a
avaliação da aprendizagem cumpra seu verdadeiro significado, assumir a função de
subsidiar a construção da aprendizagem bem-sucedida (LUCKESI, 1998).

“Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina”


Cora Coralina

A forma como o professor trata seus alunos, como ele organiza o processo de ensi-
no-aprendizagem, terá relação direta no rendimento destes e possibilitará uma nova
forma de gerar o conhecimento. Em conjunto e democraticamente.
©© PIXABAY.COM

Figura 5.2  –  Professor e o aluno.

O ato de avaliar também exige entrega, entrega à construção da experiência


satisfatória com o aluno, ao desejo de que o mesmo cresça e se desenvolva, de
maneira a possibilitar ao educador o envolvimento com o processo do aluno,
estando atento às suas necessidades (LUCKESI, 1998).
Os educadores precisam conceber o processo que envolve o planejamento
fazendo relação com a avaliação, pois são atos que estão a serviço da educação
e se complementam nesta perspectiva, fica muito complicado quando, em al-
gumas situações, a avaliação não tenha impacto direto no trabalho educativo,

110 • capítulo 5
subsidiando o planejamento desenvolvido, mas é utilizada somente como for-
ma de classificar e selecionar os alunos.
É preciso que cada vez mais os profissionais da educação compreendam
seus reais significados e os incorporem ao cotidiano escolar, tendo em vista o
desenvolvimento de práticas educativas de fato comprometidas com o futuro
dos educandos e com a educação.

5.2  A avaliação precisa ser planejada

O planejamento das avaliações precisa ser discutido no coletivo de docentes


e também apresentado aos alunos tendo como foco a discussão de como as
avaliações podem ser elaboradas visando a um resultado mais real possível do
desempenho dos educandos. Esta deve ser uma grande preocupação dos pro-
fessores que, muitas vezes, dedicam-se a maior parte do seu tempo preparando
o que vão ensinar e acabam aplicando provas ao final do processo que podem
prejudicar o aluno e, principalmente, fragilizar o processo de aprendizagem do
mesmo.
Neste contexto, ao planejar uma avaliação é necessário considerar o que es-
tará sendo foco da avaliação, se será somente a aprendizagem do aluno, qual
seria então a melhor forma de avaliar? Se o que se pretende é avaliar a aprendi-
zagem do aluno e poder oferecer condições para que ele aprenda o que ainda
não ficou claro, a avaliação precisa ser durante o processo.
Além disso, o planejamento de uma avaliação tem também outro objetivo
bastante explícito, que é o de promover a amplitude do pensamento sobre o
fenômeno avaliado. É claro que as conclusões retiradas dos dados coletados
são importantes, mas o que é realmente relevante é que a avaliação possa ser
utilizada como um estímulo para o pensamento na busca de conhecimentos
que levem à solução dos problemas educacionais (VIANNA, 2000).
Krasilchik (2001) sugere alguns cuidados que podem auxiliar o professor a
evitar erros e melhorar a validade dos resultados:
•  Organizar e sistematizar os dados provenientes da observação contínua
com o registro de aspectos e incidentes significativos realizados pelo professor
que podem ser incluídos em fichas de observação;
•  Preparar instrumentos de avaliação e garantir que os alunos adquiram fa-
miliaridade com eles;

capítulo 5 • 111
•  Utilizar diferentes tipos de instrumentos de maneira a atender às carac-
terísticas dos alunos, além da importância de obter vários tipos de dados para
compor um amplo quadro do real desempenho dos alunos;
•  Preparar e planejar provas com antecedência.

Além disso, a autora aponta também algumas considerações sobre o tipo


de questão de que o professor deve fazer uso, que devem estar de acordo com
seus objetivos e das condições do ensino. Por exemplo: questões de múltipla
escolha são melhores para avaliar o conhecimento abrangendo amplamente
o conteúdo ensinado. Questões de resposta livre solicitam que os educandos
apresentem, com suas próprias palavras opiniões, soluções de problemas, sín-
tese de conhecimentos, aprendam a se expressar e a colocar as ideias no papel.
Elas são elaboradas com mais facilidade se comparamos com as de múltipla es-
colha, mas sua correção é mais trabalhosa e, além disso, exige que o professor
defina anteriormente os critérios utilizados em sua aplicação, visando evitar
variações de notas por diferentes examinadores ou até mesmo do mesmo exa-
minador em situações diferenciadas (KRASILCHIK, 2001).
É importante que o professor não se limite a um tipo de prova para todas
as avaliações, pois tal fato pode viciar o processo e não dará condições ao pro-
fessor de compreender às características das dificuldades dos alunos e, con-
sequentemente, possibilitará suprir as deficiências que os diferentes tipos de
instrumentos podem ter (KRASILCHIK, 2001).

Após o estabelecimento dos resultados, o profissional da educação deve ter


a preocupação de definir com antecedência a quem deve comunicá-los e qual
a maneira de apresentar tais resultados. É evidente que o aluno tem prioridade
na comunicação de seu desempenho, independentemente de ser nota, concei-
to ou comentário do professor. Fica em destaque, o acesso ao desempenho dos
colegas pela classe, dependendo, é claro, da maneira como for realizada pode
contribuir para um progresso geral (KRASILCHIK, 2001)
Portanto, além de os docentes obterem dados sobre o rendimento escolar
dos alunos, é preciso também traduzi-los em linguagem significativa para os
interessados. Comentários verbais e detalhes sobre a classe, dizendo o que deve
ser feito para melhorar, indicando aspectos específicos tanto dos acertos como
dos erros dos alunos, têm um efeito muito maior nos resultados finais do que
uma simples comunicação fria das notas ou conceitos (KRASILCHIK, 2001).

112 • capítulo 5
Sendo assim, ao realizar o planejamento de sua avaliação, o professor deve
considerar diversos fatores que poderão auxiliá-lo na efetividade de sua propos-
ta avaliativa. As notas, que em geral são supervalorizadas, acabam por diminuir
a importância de outros elementos fundamentais para este contexto.
É possível o estabelecimento de alguns procedimentos que o professor
pode utilizar para melhorar sua avaliação, segundo Krasilchik (2001):
•  Escolha de uma multiplicidade de instrumentos e métodos para tornar o
processo mais significativo como elemento de aprendizagem;
•  O profissional deve fornecer informações sobre o que pretende de manei-
ra clara, pois tal atitude tem influência positiva no desempenho dos alunos e
nas relações humanas na escola;
•  Ouvir os alunos e seus argumentos quando houver discordâncias sobre os
resultados que não devem ser expostos dogmaticamente, de forma a impedir a
busca de consensos que em muitos casos são inatingíveis devido às complexas
finalidades educacionais;
•  Estar atento para a identificação de aspectos incomuns, que merecem
atenção e valorizar o processo em vez de considerar apenas o produto final;
•  Acompanhar a trajetória de cada aluno para conseguir dados que possam
evidenciar seu progresso e as perspectivas de seu sucesso;
•  Incentivar nos alunos a realização da autoavaliação a partir dos elementos
selecionados pelos mesmos como significativos. Tal processo tem um duplo
valor: primeiramente porque envolve o estudante e o professor em um exercício
de conhecimento mútuo com proveito para ambos.

A relevância da avaliação no processo de ensino e aprendizagem dos alunos


e dos diversos fatores que contribuem para sua eficácia pode ser discutida an-
teriormente. Além disso, a relação com os educandos no contexto da avaliação
pode contribuir para um progresso geral dos alunos, desde que professores e
alunos construam uma relação positiva com avaliação, evitando situações frias
e situações que afastem cada vez mais os discentes de uma prática educativa
que os priorize enquanto sujeitos e principais interessados no desenvolvimen-
to das práticas avaliativas.
Os tipos de avaliação a serem utilizados e a maneira de prepará-los também
são fundamentais, sobretudo ao considerar os objetivos reais de cada profes-
sor e do próprio projeto pedagógico da escola em que está inserido. É preci-
so, portanto, que os professores reflitam e ressignifiquem suas concepções

capítulo 5 • 113
de avaliação, de maneira a possibilitar que os alunos, bem como a sociedade,
compreendam este processo de forma mais ampla e comprometida com o de-
senvolvimento da aprendizagem dos educandos.

A Lei de Diretrizes e Bases da


Educação Nacional (LDB 9.394/96) já
veio trazendo uma contribuição para
se pensar a avaliação de maneira cons-
trutiva. Nesse documento a avaliação
é concebida como avaliação diferen-
ciada, que não se baseia na exclusão
e punição dos alunos, mas que consi-
dera o processo avaliativo envolvendo
o acompanhamento da aprendiza-
Figura 5.3  –  <http://edu-candoconstruin- gem com vistas a propostas de recu-
dosaber.blogspot.com.br/2013/04/nova-l- peração e ampliação da concepção da
db-939496-atualizada-2013-entra.html>. avaliação.

Na LDB, a questão da avaliação é tratada da seguinte forma:


Artigo 24, Inciso V: “A verificação do rendimento escolar observará os se-
guintes critérios:
a) Avaliação contínua e cumulativa do desempenho do aluno, com pre-
valência dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos resulta-
dos ao longo do período sobre os de eventuais provas finais;
b) Possibilidade de aceleração de estudos para os alunos com atra-
so escolar;
c) Possibilidade de avanço nos cursos e nas séries mediante verifica-
ção do aprendizado;
d) Aproveitamento de estudos concluídos com êxito;
e) Obrigatoriedade de estudos de recuperação, de preferência paralelos
ao período letivo, para os casos de baixo rendimento escolar, a serem disci-
plinados pelas instituições de ensino em seus regimentos” (BRASIL, 1996).

114 • capítulo 5
Segundo André e Passos (2001), as propostas de mudanças somente deixa-
rão de se constituir em intenções, quando as pessoas envolvidas diretamente
no cotidiano das escolas se convencerem da importância de sua realização, e
compreenderem por que as estão realizando, além da importância de orienta-
ção e meios para concretizá-las.
André e Passos (2001) destacam outras condições para o estabelecimento
de um modelo de avaliação pautado em princípios democráticos. Uma delas se-
ria não negar a história, as crenças e valores dos sujeitos envolvidos no cotidia-
no escolar. Valorizar as diferenças étnicas, culturais e religiosas, seu currículo,
projeto pedagógico, formas de trabalho e modo de organização.
Há ainda o fortalecimento do trabalho dos professores, a colaboração entre
eles, a integração dos pais e demais integrantes da equipe escolar nas discus-
sões e decisões sobre uma nova forma de se pensar a avaliação e, especialmen-
te, o incentivo a uma prática educativa mais direcionada para a participação e
menos para a competição (ANDRÉ; PASSOS, 2001).
Apesar da grande influência e importância das indicações colocadas pela
atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB 9.394/96), é de fun-
damental relevância que outros aspectos sejam considerados ao se analisar a
efetividade da proposta na educação. Um dos fatores principais diz respeito à
compreensão e aceitação dos atores envolvidos no processo educacional em re-
lação a esta nova forma de se praticar a avaliação da aprendizagem dos alunos.
Por este motivo, é preciso não só tempo, mas também condições para que estes
profissionais possam efetivamente conhecer como pode ocorrer seu desenvol-
vimento em sala de aula, como também, as mudanças necessárias para sua im-
plantação no contexto escolar de alunos e professores.

As determinações da LDB de 1996

A LDB – Lei Darcy Ribeiro determina no artigo 11 inciso III que os municí-
pios incubir-se-ão de “baixar normas complementares para o seu sistema de
ensino” e, em relação à avaliação, prescreve que as escolas promovam meios
para a recuperação dos alunos, além da responsabilidade pelo cumprimento
da frequência, dos dias letivos e da carga horária (Artigo 12, incisos III, IV, V
e VII).

capítulo 5 • 115
Art. 12. Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as
do seu sistema de ensino, terão a incumbência de:

III – assegurar o cumprimento dos dias letivos e horas-aula estabelecidas; IV – velar


pelo cumprimento do plano de trabalho de cada docente; V – prover meios para a
recuperação dos alunos de menor rendimento. VII – informar os pais e responsáveis
sobre a frequência e o rendimento dos alunos, bem como a execução de sua proposta
pedagógica.

As determinações legais sobre avaliação envolvem também os docentes que


deverão ser responsáveis pela aprendizagem e recuperação dos alunos que não
apresentem bom rendimento (Artigo 13, incisos III e IV).

Art. 13. Os docentes incumbir-se-ão de:


III –zelar pela aprendizagem dos alunos;
IV –estabelecer estratégias de recuperação para os alunos de menor rendimento.

Entre as regras comuns para a Educação Básica, a lei diz que a verificação
do rendimento escolar deverá observar a avaliação contínua e cumulativa do
desempenho do aluno, com “prevalência dos aspectos qualitativos sobre os
quantitativos”, além de maior valorização dos resultados ao longo do período
“sobre os de eventuais provas finais”. (Artigo 24, inciso V). A Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional determina que as escolas façam essa recuperação
durante todo o ano letivo.
A recuperação final é simplesmente aquela possível solução, quando todos
os demais recursos já foram utilizados. O importante é que as escolas tenham
em seus respectivos projetos político-pedagógicos, uma proposta de recupera-
ção durante todo o período letivo, a qual realmente prepara melhor o aluno. Se
já no primeiro trimestre, o aluno não teve o desempenho que era esperado, há
uma oportunidade de a partir daí, entrar no ritmo desejado, se forem feitos os
ajustes pedagógicos necessários, através de projetos de apoio pedagógico ela-
borados pelos professores, com o apoio da coordenação pedagógica e da dire-
ção da escola.

116 • capítulo 5
Não existem dois alunos iguais nem dois seres humanos iguais. Há interfe-
rências na aprendizagem que podem ter relação com as características da famí-
lia do aluno ou do próprio espaço comunitário onde a escola se insere, que pre-
cisam ser vistos no processo pedagógico. Por exemplo, as crianças das escolas
de algumas comunidades que ficam fechadas devido a problemas de violência,
estão em uma sociedade com clima de tensão. Mesmo que, no dia seguinte, a
escola abra e, aparentemente, tudo esteja normal, a comunidade escolar está
emocionalmente afetada. Isso vai se refletir na aprendizagem.
Cada escola tem que encontrar o seu próprio caminho, organizar este as-
pecto em seu projeto político-pedagógico. Há escolas que constituem classes de
apoio. Outras recebem estudantes universitários de cursos de formação de pro-
fessores. Há ainda as que organizam um projeto em que os alunos do terceiro
ciclo ajudem os colegas do segundo e dos primeiros ciclos, o que tem criado, em
diferentes experiências, grupos de amigos dentro da escola. Podemos ainda citar
os Centros de Estudo (CEST), as atividades de monitoria e os reagrupamentos de
alunos. Com relação ao controle da frequência do aluno, a lei também é clara,
quando determina no Artigo 24, inciso VI, que “fica a cargo da escola, conforme
o disposto no seu regimento e nas normas do respectivo sistema de ensino, exigir
a frequência mínima do total de horas letivas para aprovação”. Como podemos
concluir, diferentemente da Lei 5.692/71, o percentual máximo de faltas permiti-
do está vinculado ao tipo de organização dos anos escolares (em séries, em ciclos,
em períodos etc.) que o respectivo sistema de ensino adotar. Outra determinação
legal relativa à frequência se refere à responsabilidade da escola, após contatos
malsucedidos com a família do aluno, de notificação do fato ao Conselho Tutelar
do Município (LDB, artigo 12, incisos VII e VIII).
Os caminhos permitidos pela atual LDB para melhorar os processos avalia-
tivos são vários, cada escola tem que encontrar os seus, juntamente com toda
a comunidade escolar e devidamente discutidos e registrados em seu Projeto
Político Pedagógico.

5.3  A avaliação do processo ensino-aprendizagem

A avaliação não é algo externo ou separado do processo ensino-aprendizagem


ou um procedimento isolado, mas um conjunto de fases que se condicionam
mutuamente e formam um sistema. A tradicional avaliação da aprendizagem
do aluno que tem como alvo apenas o julgamento e a sua classificação precisa

capítulo 5 • 117
ser revista. O principal papel da avaliação é fornecer informações sobre o de-
senvolvimento dos alunos, sobre o processo pedagógico, permitindo aos do-
centes realizarem intervenções e ajustes necessários, que garantam a aprendi-
zagem de todos.
A avaliação, como parte do processo ensino-aprendizagem, torna-se ainda
mais importante e deixa de ser apenas a avaliação do aluno, e passa a ser a ava-
liação de todos: do processo pedagógico, das metodologias utilizadas, do rela-
cionamento professor-aluno e do projeto político-pedagógico da escola.
As estatísticas brasileiras, levantadas pelas pesquisas do INEP, mostram
que os alunos que repetem não são melhores alunos que os que estão pela pri-
meira vez na série. A repetência desestrutura emocionalmente a criança ou o
adolescente. Não é bom, psicologicamente, para o aluno e pouco contribui para
melhorar o seu desempenho escolar, propiciando a evasão.
A avaliação não pode ser utilizada para controlar o comportamento, a dis-
ciplina dos alunos. É uma forma de verificar erros no processo de ensino ou
no projeto educativo da escola. É um processo complexo que precisa ser dinâ-
mico, justo, criativo e coerente, envolvendo não apenas o aluno, mas também
os professores.
Charles Hadji, Diretor e Professor do Departamento de Ciências da
Educação da Universidade de Grenoble, na Suíça, e considerado um dos maio-
res pesquisadores do mundo no campo da avaliação da aprendizagem, afirma
que a avaliação “deve estar a serviço de uma pedagogia dinâmica”. E esclarece:

Antes de tudo, o professor precisa deixar claro a seus alunos, aonde ele quer chegar
com cada uma das tarefas propostas. Esse é um dever ético na nossa profissão: expor
aos estudantes para que serve o aprendizado. (HADJI, 2001, p.25)

5.4  Reflexões sobre a avaliação

Para os educadores, a avaliação que se faz dos alunos e de seu trabalho peda-
gógico precisa ter objetivos bem claros, para que se possa responder a algu-
mas questões:
•  O que o professor tem feito para ajudar nossos alunos a aprender?
•  Como o professor tem utilizado as vivências de nossos alunos para melho-
rar o nosso trabalho educativo?
•  Como o professor tem avaliado os alunos?

118 • capítulo 5
Acreditar, por exemplo, que todas as crianças oriundas de meios sociais
desfavorecidos têm dificuldades de aprendizagem escolar não tem sustenta-
ção em provas concretas. Não é fácil, no entanto, desmenti-la, pois possui uma
estrutura horizontal que a vincula a outras crenças, dá a ela uma validação
oriunda de preconceitos semelhantes de outras pessoas e torna-a resistente à
mudança. É preciso que todos os professores tenham certeza de que todos os
alunos podem aprender. Compete a ele encontrar a melhor metodologia para
que isto se concretize.
Mais uma vez, afirmamos que a avaliação não é algo externo ou separado do
processo ensino-aprendizagem ou um procedimento isolado, mas um conjun-
to de fases que se condicionam mutuamente e têm uma ordenação sequencial
forma um sistema. A avaliação da aprendizagem, que, tradicionalmente, tem
apenas como alvo o julgamento e a classificação do aluno, precisa ser revista.
A finalidade principal da avaliação é fornecer informações sobre o proces-
so pedagógico que permitam aos agentes escolares decidir sobre intervenções
e ajustes que se fizerem necessários, em face da proposta educativa, definida
coletivamente e registrada no projeto político-pedagógico da escola, compro-
metida com a garantia de êxito do aluno.
Ao considerarmos a avaliação como parte do processo ensino-aprendiza-
gem, ela se torna mais abrangente e ganha maior importância: deixa de ser
apenas a avaliação do aluno, e passa a ser a avaliação de todos.
A avaliação inclui variáveis distantes do ambiente escolar e do docente, que
muitas vezes são desconsideradas pela escola, mas que possuem influência e
exercem impacto sobre as atividades curriculares, inclusive a avaliação, em que
se envolvem alunos e docentes. É o caso de variáveis econômicas, políticas e
socioculturais, que apesar de aparentemente estarem distantes, refletem-se no
dia a dia do ambiente de uma instituição de ensino. São incluídas neste gru-
po, ainda, as variáveis institucionais, referentes ao sistema de ensino, à escola
e a todos os atores institucionais, que fazem parte do processo ensino-apren-
dizagem. A avaliação da aprendizagem do aluno deve seguir etapas, para ser
bem-sucedida:
1. Definição do propósito ou objetivo da atividade avaliativa;
2. Definição do conteúdo (ou conteúdos) a serem avaliados;
3. Escolha da estratégia (atividade através da qual a avaliação
será realizada);
4. Realização da atividade avaliativa.

capítulo 5 • 119
5. Análise dos resultados face aos objetivos inicialmente definidos e com
os padrões estabelecidos no sistema de avaliação utilizado;
6. Replanejamento da ação pedagógica.
Em nossas escolas, é preciso que a avaliação da aprendizagem deixe de as-
sumir características punitivas ou meramente classificatórias. Vários são os er-
ros cometidos no processo de avaliação dos alunos. Os mais comuns são:
•  Avaliação incoerente com o processo ensino-aprendizagem desenvolvido.
•  Uso da avaliação para controlar o comportamento dos alunos ou para punir.
•  Autoavaliação do aluno e do professor ignoradas.
•  Falta de prática da avaliação continuada.
•  Critérios e padrões de avaliação não esclarecidos previamente.
•  Avaliação dos conteúdos e dos resultados, desconhecendo o processo
de aprendizagem.
•  Destaque dos aspectos negativos sem dar relevo aos aspectos positivos.
•  Avaliação apenas quantitativa ou apenas qualitativa.
•  Uso repetitivo de instrumentos de avaliação inadequados.
•  Desconsideração pelo contexto que envolve o processo ensino-
-aprendizagem.

É preciso ficar claro que a avaliação educacional é um processo complexo,


porém indissociável do binômio ensino-aprendizagem. Ela não é uma arma de
disciplinamento dos alunos, mas uma forma de aprimorar o planejamento, o
trabalho pedagógico e o projeto educativo de cada instituição e, consequente-
mente, da aprendizagem ali realizada.
Quanto à avaliação institucional – a avaliação da escola como um todo –, as
discussões surgem quando se inicia a preocupação com a melhoria do trabalho
desenvolvido, com a democratização do cotidiano escolar. A avaliação institu-
cional da escola tem um papel extremamente importante na melhoria da qua-
lidade dos serviços prestados e das relações sociais, humanas e interpessoais,
além de contribuir para o aperfeiçoamento continuado de seus integrantes,
sejam eles os professores da escola, os alunos, os funcionários, a comunidade.
A avaliação institucional é indispensável para o planejamento, a gestão e as de-
mais atividades que constituem o currículo da instituição de ensino, devendo
basear-se em uma visão crítica, porém compreensiva de suas partes compo-
nentes, das relações desenvolvidas e das articulações entre elas, formando um
“todo institucional”.

120 • capítulo 5
CONEXÃO
Conheça o pacto e seu impacto no processo avaliativo, disponível em: <http://pacto.
mec.gov.br/avaliacoes>.

LEITURA
Acesse <http://pacto.mec.gov.br/images/pdf/Formacao/caderno_avaliacao.pdf>, e co-
nheça a proposta de avaliação para concretizar a alfabetização nos três primeiros anos
do fundamental.
O Pacto reúne três componentes principais:
•  Avaliações processuais, debatidas durante o curso de formação, que podem ser desenvol-
vidas e realizadas continuamente pelo professor junto aos alunos.
•  Os professores terão acesso a um sistema informatizado no qual deverão inserir os resulta-
dos da Provinha Brasil de cada criança, no início e no final do 2º ano. Através deste sistema,
docentes e gestores poderão acompanhar o desenvolvimento da aprendizagem de cada alu-
no de sua turma, e fazer os ajustes necessários para garantir que todos estejam alfabetizados
no final do 3º ano do ensino fundamental.
•  •Ao final do 3º ano, todos os alunos farão uma avaliação coordenada pelo INEP. O objetivo
desta avaliação universal será avaliar o nível de alfabetização alcançado pelas crianças ao
final do ciclo. Esta será mais uma maneira de a rede analisar o desempenho das turmas e
adotar as medidas e políticas necessárias para aperfeiçoar o que for necessário.
O Ministério da Educação assumirá o custo dos sistemas e das avaliações externas.
Disponível em: <http://pacto.mec.gov.br/avaliacoes>. Acesso em: 18 fev. 2016.

ATIVIDADE
01. Entreviste um professor das séries iniciais do ensino fundamental e dialogue sobre
o que ele tem feito diante da proposta de avaliação escolar presentes no texto da LDB
9.394/96. O intuito é analisar em que medida o disposto na legislação tem sido incorporado
nas práticas pedagógicas do professor. Refletindo: será que a avaliação praticada por este
professor é determinada apenas por ele? Quais são os demais elementos que devemos con-
siderar para compreendermos sua prática?

capítulo 5 • 121
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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CARVALHO, A.M.P. de (orgs). Ensinar a ensinar: Didática para a escola Fundamental e Média. São
Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2001. p.177-195.
BARRETTO, E. S. de S.; MITRULIS E. Trajetória e desafios dos ciclos escolares no país. Estudos
Avançados. São Paulo, v.15, n.42, p. 103-140, ago., 2001.
BARRETTO, E.S. de S.; SOUSA S. Z. Estudos sobre ciclos e progressão escolar no Brasil: uma
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BZUNECK, J. A. (Orgs). A motivação do aluno: contribuições da psicologia contemporânea.
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D.F, 20 dez. 1996.
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LEITE, D.M. Promoção automática e adequação do currículo ao desenvolvimento do aluno.
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para a avaliação escolar na rede pública do sistema municipal de ensino da Cidade do Rio de Janeiro e
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122 • capítulo 5
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fala sobre educação. São Paulo: FEUSP, 2000. p. 34-43.
VIANNA, H.M. Avaliação educacional: teoria-planejamento-modelos. São Paulo: IBRASA, 2000.

GABARITO
Capítulo 1

01. A atividade proposta pressupõe uma reflexão sobre a relação que o instrumento da
avaliação tem, metaforicamente, com um remédio. Como uma prescrição médica, a avaliação
deve ser aplicada/utilizada com cautela.
A partir da leitura do texto proposto, o aluno deve perceber que a avaliação, assim como
os remédios, tem propriedades, podem produzir reações adversas e efeitos colaterais. E ain-
da mais, que devem ser tomadas precauções ao utilizá-la, que existem indicações e contrain-
dicações, assim como há uma maneira correta de empregá-la (posologia).
Deste modo, espera-se que o aluno faça uma reflexão, partindo de tais pressupostos,
sobre a forma estamos utilizando esse “remédio”.

Capítulo 2

01. Após a leitura e reflexão do trecho oferecido: “Desista de informar e “enformar”, liberte
o seu aluno, e se liberte com ele, da escravidão dos dados estatísticos. Nem tudo pode ser
comprovado estatisticamente (...). Valorar faz parte da caminhada? Sim. E rotular, estigmati-
zar, ferrar, marcar, massificar? Não. Jamais esqueça de conjugar: Eu sou, tu és, nós somos
humanos” (Ilza Martins Sant’anna)
O aluno deverá estabelecer uma reflexão acerca de como podemos pensar um processo
avaliativo que não “deforme” os conhecimentos e saberes dos alunos. Comentando o fato de
o processo avaliativo estar atrelado a um momento necessário na prática educativa, como
uma das possíveis maneiras de repensar os caminhos escolhidos. Enfatizando que a avalia-
ção é muito mais do que aplicação de testes, levantamento de medidas, formas de seleção
ou classificação de alunos e/ou instituições. É preciso sempre ter em mente que a avaliação
aplicada não deve ser usada apenas como instrumento de medida, mas também deve ser uti-
lizada através da sua função norteadora, possibilitando localizar acertos e erros em diversos
setores do processo de ensino e aprendizagem.

capítulo 5 • 123
Capítulo 3

01. Nesta atividade é fundamental que o aluno possa perceber que a relação entre os textos
apresentados: “Avaliação”, presente na obra de Galdovan (1997), e a letra da música “Es-
tudo Errado” de Gabriel, O Pensador, apresentam críticas a um sistema avaliativo bastante
recorrente em nossas escolas. Pensando nas implicações que tais práticas avaliativas podem
disseminar nos meios escolares, como rotulações, que levam a dificuldades de diversos âm-
bitos, bem como um ensino engessado, que não contempla o que na teoria propõe: reflexão
e desenvolvimento.

Capítulo 4

01. Uma das vertentes da pesquisa recente parte do princípio de que o fracasso escolar se
deve a prejuízos da capacidade intelectual dos alunos, decorrentes de “problemas emocio-
nais”. Entende-se que a criança é portadora de uma organização psíquica imatura, que resulta
em ansiedade, dificuldade de atenção, dependência, agressividade etc., que causam, por sua
vez, problemas psicomotores e inibição intelectual que prejudicam a aprendizagem escolar.
Não se trata da tese tradicional de que as crianças das classes populares têm rendimento
intelectual baixo por carência cultural, mas de afirmar uma inibição intelectual causada por
dificuldades emocionais adquiridas em relações familiares patologizantes.
A escola pode também comparecer reduzida à relação professor-aluno; nesses casos,
atitudes dos professores ou técnicas de ensino por eles utilizadas são a causa principal das
dificuldades de aprendizagem. Nessas teses, pode-se afirmar que o fracasso escolar tem
relação com fatores de ordem “política e social”, mas ao mesmo tempo negar que estes
estejam presentes na “cultura da organização educacional”. Desse modo, as explicações
centradas na tese da carência cultural acabam sendo a reposta: a pobreza dos alunos (como
fator exterior à escola) é a principal causa do seu insucesso escolar.
Entre as pesquisas que atribuem o fracasso escolar a problemas emocionais individuais,
há uma forte presença do emprego de grupos controle e experimental. É interessante res-
saltar que elas chegam a resultados inconciliáveis. Em uma delas, os membros dos grupos
controle e experimental obtêm um bom rendimento nas avaliações intelectuais, mas as ava-
liações de personalidade indicam problemas de natureza emocional; o que diferencia o grupo
experimental, portador de queixa escolar, é o não acolhimento de suas angústias pelos pais
e a consequente inibição intelectual. Em outra, tanto o grupo experimental quanto o grupo
controle apresentaram baixo desempenho intelectual; assim sendo, o que explica o sucesso
escolar dos integrantes do segundo grupo é o fato de eles terem maturidade emocional su-
ficiente para lidar com dificuldades escolares resultantes do baixo nível de inteligência. Sem

124 • capítulo 5
diálogo entre elas (uma das pesquisas foi defendida em 1993 e a outra em 1998), fica a
seguinte questão: até que ponto os resultados de uma pesquisa são entendidos de modo a
confirmar as hipóteses do pesquisador?
Outra perspectiva encontrada é a que concebe o fracasso escolar como efeito de téc-
nicas de ensino inadequadas ou de falta de domínio da técnica correta pelo professor. Per-
manece nessas pesquisas o pressuposto de que as crianças das classes populares trazem
para a escola dificuldades de aprendizagem, mas o foco muda de lugar: não se localiza nos
problemas individuais dos alunos, mas na técnica de ensino do professor.
Marcado pela tese da carência cultural, um dos relatos analisados dá continuidade à
versão que marcou a pesquisa do fracasso escolar nos anos 1970: os professores estão
preparados para escolarizar crianças ideais, mas não os usuários predominantes da escola
pública primária — as crianças pobres.
Está presente nessa produção o pressuposto de que os alunos possuem dificuldades
de ordem emocional, cultural etc., que podem ser sanadas pelo professor se ele utilizar a
técnica de ensino adequada. O construtivismo é a alternativa mais comumente apresentada;
o professor deve dominá-lo, acreditar na capacidade de desenvolvimento da criança e atuar
mediante intervenções psicopedagógicas. Por meio desses procedimentos, prevê-se o ajus-
tamento da criança a uma escola que, baseada na técnica correta, proporcionaria condições
propícias ao desenvolvimento das potencialidades dos aprendizes.
Essas pesquisas consideram a crítica às concepções psicologizantes ou medicalizantes
do fracasso escolar quando se referem à necessidade de se compreender as origens e sig-
nificados da “queixa escolar”, em vez de simplesmente atribuí-la a dificuldades do aluno. No
entanto, acabam por voltar à redução que criticam, ao restringirem-se à avaliação da criança
e à intervenção na criança.
Há pesquisas que entendem a escola como instituição social que contraditoriamente
reproduz e transforma a estrutura social. Partem do princípio de que o fracasso escolar é um
fenômeno presente desde o início da instituição da rede de ensino público no Brasil. A análi-
se dos processos institucionais que levam à produção do fracasso deve considerar a escola
como instituição inserida em uma sociedade de classes regida pelos interesses do capital,
sendo que a própria política pública encontra-se entre os determinantes do fracasso escolar.
Assim, a reversão desse quadro requer, da política educacional, resistência aos interesses
privatizantes e compromisso com a construção de uma escola pública capaz de distribuir com
mais igualdade habilidades e conhecimentos que lhe cabe transmitir.
Ao inserirem a produção do fracasso escolar no âmbito de condições escolares objetivas,
fazem do contato direto do pesquisador com a vida escolar — o que, normalmente, pressupõe

capítulo 5 • 125
uma longa permanência no campo — e das relações não objetificantes entre pesquisador e
pesquisados os principais instrumentos de pesquisa.
Por fim, há uma vertente que enfatiza a dimensão política da escola. Assim como as
pesquisas que se debruçam sobre a lógica excludente da educação escolar, analisadas no
item anterior, aqui também se compreende a escola como uma instituição social regida pela
mesma lógica constitutiva da sociedade de classes. O foco, entretanto, incide nas relações
de poder estabelecidas no interior da instituição escolar, mais especificamente na violência
praticada pela escola ao estruturar-se com base na cultura dominante e não reconhecer — e,
portanto, desvalorizar — a cultura popular.

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ANOTAÇÕES

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ANOTAÇÕES

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