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Estudo Artigos:
Constrangimento ilegal, Ameaça, Sequestro e cárcere privado, Redução a condição análoga
à de escravo, Violação de domicílio, Violação de correspondência, Correspondência
comercial, Divulgação de segredo, Violação do segredo profissional
EUNÁPOLIS-BA
2019
Rejane Soares Magalhães
Estudo Artigos:
Constrangimento ilegal, Ameaça, Seqüestro e cárcere privado, Redução a condição análoga
à de escravo, Violação de domicílio, Violação de correspondência, Correspondência
comercial, Divulgação de segredo, Violação do segredo profissional
EUNÁPOLIS-BA
2019
Sumário
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 1
Dos Crimes contra a Liberdade Individual ......................................................................... 2
Art. 146. Constrangimento ilegal ........................................................................................ 2
Introdução ........................................................................................................................................ 2
Classificação doutrinária ............................................................................................................. 3
Objeto material e bem juridicamente protegido..................................................................... 3
Sujeito ativo e sujeito passivo .................................................................................................... 4
Consumação e tentativa ............................................................................................................... 4
Elemento subjetivo ........................................................................................................................ 4
Modalidades comissiva e omissiva ........................................................................................... 4
Causas de aumento de pena ....................................................................................................... 4
Concurso de crimes ...................................................................................................................... 5
Causas que conduzem à atipicidade do fato .......................................................................... 5
Vítima que é constrangida a praticar uma infração penal................................................... 6
Vítima submetida a tortura a fim de praticar um fato definido como crime ................... 7
Suicídio como comportamento ilícito, porém atípico .......................................................... 8
Consentimento do ofendido ........................................................................................................ 8
Vias de fato em concurso com o constrangimento ilegal ................................................... 8
Constrangimento exercido para impedir a prática de um crime ....................................... 8
Constrangimento exercido para satisfazer uma pretensão legítima................................ 9
Uso indevido de algemas ............................................................................................................ 9
Revista pessoal em empregados e constrangimento ilegal ............................................... 9
Constrangimento ilegal no Código Penal Militar ................................................................. 10
Constrangimento ilegal no Código de Defesa do Consumidor ....................................... 10
Constrangimento ilegal e Estatuto do Idoso ........................................................................ 10
Art. 147. Ameaça ................................................................................................................ 10
Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de
causar-lhe mal injusto e grave: Pena – detenção, de 1 (um) a 6 (seis) meses, ou multa.
p.ú Somente se procede mediante representação. ......................................................... 10
Introdução ...................................................................................................................................... 11
Classificação doutrinária ........................................................................................................... 14
Objeto material e bem juridicamente protegido................................................................... 15
Sujeito ativo e sujeito passivo .................................................................................................. 15
Consumação e tentativa ............................................................................................................. 16
Elemento subjetivo ...................................................................................................................... 17
Ameaça de mal futuro ................................................................................................................. 18
Legítima defesa e o crime de ameaça .................................................................................... 19
Verossimilhança do mal prometido ........................................................................................ 19
Ameaça supersticiosa................................................................................................................. 19
Pluralidade de vítimas................................................................................................................. 19
Ameaça proferida em estado de ira ou cólera...................................................................... 19
Ameaça proferida em estado de embriaguez ....................................................................... 20
Ameaça e Lei Maria da Penha ................................................................................................... 22
Ameaça e palavra da vítima....................................................................................................... 22
Ameaça no Código Penal Militar .............................................................................................. 23
Ameaça no Código de Defesa do Consumidor .................................................................... 23
Art. 148. Sequestro e cárcere privado ............................................................................. 23
Introdução ...................................................................................................................................... 23
Classificação doutrinária ........................................................................................................... 24
Objeto material e bem juridicamente protegido................................................................... 24
Sujeito ativo e sujeito passivo .................................................................................................. 24
Consumação e tentativa ............................................................................................................. 25
Elemento subjetivo ...................................................................................................................... 25
Modalidades comissiva e omissiva ......................................................................................... 26
Modalidades qualificadas .......................................................................................................... 26
Se o crime é praticado mediante internação da vítima em casa de saúde ou hospital.
........................................................................................................................................................... 26
Se a privação da liberdade dura mais de 15 (quinze) dias................................................ 26
Consentimento do ofendido ...................................................................................................... 27
Subtração de roupas da vítima ................................................................................................. 27
Participação ou coautoria sucessiva ...................................................................................... 28
Sequestro e lesão corporal........................................................................................................ 28
Diferença entre cárcere privado e constrangimento ilegal ............................................... 29
Art. 149. Redução a condição análoga à de escravo ...................................................... 29
Introdução ...................................................................................................................................... 29
Classificação doutrinária ........................................................................................................... 30
Objeto material e bem juridicamente protegido................................................................... 30
Sujeito ativo e sujeito passivo .................................................................................................. 31
Consumação e tentativa ............................................................................................................. 31
Elemento subjetivo ...................................................................................................................... 31
Causa de aumento de pena ....................................................................................................... 31
Pena, ação penal e competência para julgamento .............................................................. 32
Art. 150. Dos Crimes contra a Inviolabilidade do Domicílio ........................................... 33
Introdução ...................................................................................................................................... 33
Classificação doutrinária ........................................................................................................... 36
Objeto material e bem juridicamente protegido................................................................... 36
Sujeito ativo e sujeito passivo .................................................................................................. 36
Consumação e tentativa ............................................................................................................. 37
Elemento subjetivo ...................................................................................................................... 37
Modalidades comissiva e omissiva ......................................................................................... 37
Modalidade qualificada ............................................................................................................... 37
Causa de aumento de pena ....................................................................................................... 38
Exclusão do crime ....................................................................................................................... 39
Pena, ação penal, competência para julgamento e suspensão condicional do
processo ......................................................................................................................................... 39
Concurso de crimes .................................................................................................................... 40
Posse de drogas e violação de domicílio .............................................................................. 40
Art. 151. Dos Crimes contra a Inviolabilidade de Correspondência............................... 40
Classificação doutrinária ........................................................................................................... 41
Objeto material e bem juridicamente protegido................................................................... 41
Sujeito ativo e sujeito passivo .................................................................................................. 41
Consumação e tentativa ............................................................................................................. 41
Modalidade qualificada ............................................................................................................... 42
Causa de aumento de pena ....................................................................................................... 43
Elemento subjetivo ...................................................................................................................... 43
Pena e ação penal ........................................................................................................................ 43
Interceptação de correspondência de presos ...................................................................... 43
Violação de correspondência entre marido e mulher ........................................................ 44
Crime impossível .......................................................................................................................... 44
Art. 152. Correspondência comercial ............................................................................... 45
Introdução ...................................................................................................................................... 45
Classificação doutrinária ........................................................................................................... 46
Objeto material e bem juridicamente protegido................................................................... 46
Sujeito ativo e sujeito passivo .................................................................................................. 47
Consumação e tentativa ............................................................................................................. 47
Elemento subjetivo ...................................................................................................................... 47
Modalidades comissiva e omissiva ......................................................................................... 47
Pena, ação penal, competência para julgamento e suspensão condicional do
processo ......................................................................................................................................... 47
Art. 153. Dos Crimes contra a Inviolabilidade dos Segredos ......................................... 48
Classificação doutrinária ........................................................................................................... 48
Objeto material e bem juridicamente protegido................................................................... 48
Sujeito ativo e sujeito passivo .................................................................................................. 48
Consumação e tentativa ............................................................................................................. 49
Elemento subjetivo ...................................................................................................................... 49
Modalidades comissiva e omissiva ......................................................................................... 49
Modalidade qualificada ............................................................................................................... 49
Pena, ação penal, competência para julgamento e suspensão condicional do
processo ......................................................................................................................................... 49
Divulgação a uma única pessoa .............................................................................................. 50
Art. 154. Violação do segredo profissional ...................................................................... 51
Introdução ...................................................................................................................................... 51
Classificação doutrinária ........................................................................................................... 54
Objeto material e bem juridicamente protegido................................................................... 54
Sujeito ativo e sujeito passivo .................................................................................................. 54
Consumação e tentativa ............................................................................................................. 54
Elemento subjetivo ...................................................................................................................... 55
Modalidades comissiva e omissiva ......................................................................................... 55
Pena, ação penal, competência para julgamento e suspensão condicional do
processo ......................................................................................................................................... 55
Violação de Segredo Profissional no Código Penal Militar .............................................. 55
Violação de segredo profissional e Lei de Segurança Nacional ..................................... 55
Advogado e segredo profissional............................................................................................ 56
Art. 154-A. Invasão de dispositivo informático .................................................................... 56
154-B. Ação penal ........................................................................................................................ 57
Introdução ...................................................................................................................................... 57
Modalidade equiparada .............................................................................................................. 60
Modalidade qualificada ............................................................................................................... 61
Causas especiais de aumento de pena .................................................................................. 61
Classificação doutrinária ........................................................................................................... 62
Objeto material e bem juridicamente protegido................................................................... 62
Sujeito ativo e sujeito passivo .................................................................................................. 62
Consumação e tentativa ............................................................................................................. 62
Elemento subjetivo ...................................................................................................................... 63
Modalidades comissiva e omissiva ......................................................................................... 63
Pena, suspensão condicional do processo, competência para julgamento, ação
penal ................................................................................................................................................ 63
Concurso de causas de aumento de pena ............................................................................ 64
Marco civil da internet................................................................................................................. 64
Invasão de dispositivo informático e violação de correspondência eletrônica .......... 64
Art. 10 da Lei Complementar nº 105, de 10 de janeiro de 2001 ........................................ 65
Jurisprudências:........................................................................................................................... 66
Art. 146 CP - Constrangimento ilegal ............................................................................... 66
Art. 147 CP - Ameaça ......................................................................................................... 66
Art. 148 CP - Seqüestro e cárcere privado ....................................................................... 66
Acórdão STJ REsp-939.888............................................................................................... 67
Art. 149 CP – Redução a condição análoga à de escravo............................................... 67
Acórdão STJ CC-110.697................................................................................................... 67
150 CP - Violação de domicílio ................................................................................................. 68
Acórdão TJRS ACm-70.028.812.782 .......................................................................................... 68
Art. 151 - CP Violação de correspondência ..................................................................... 69
Acórdão TRF4 CC-200.804.000.113.747 ................................................................................... 69
Art. 152 CP - Correspondência comercial .............................................................................. 69
Art. 153 CP - Divulgação de segredo ............................................................................... 70
Art. 154 CP - Violação do segredo profissional ............................................................... 70
CONCLUSÃO...................................................................................................................... 72
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 73
1
INTRODUÇÃO
O presente tem como objetivo fazer o estudo dos artigos 146 á 154 CP, onde será
abordado conceito, a classificação doutrinária, o Objeto material e bem juridicamente
protegido, o Sujeito ativo e sujeito passivo, será abordado também quando á
Consumação e se é cabível a tentativa, o Elemento subjetivo, serão estudadas
também a Modalidade, se é comissiva ou omissiva, as Causas de aumento de pena,
a possibilidade de Concurso de crimes, como também as Causas que conduzem à
atipicidade do fato. O estudo demanda pesquisa e base doutrinária, sendo assim,
cada artigo trará o riquíssimo conhecimento de Rogério Greco e Cleber Masson.
2
Introdução
Também prevê o art. 146 do Código Penal uma violência entendida como imprópria,
vale dizer, quando o agente, por qualquer outro meio que não a violência ou a grave
ameaça, reduz a capacidade de resistência da vítima.
Classificação doutrinária
Crime comum com relação ao sujeito ativo, bem como quanto ao sujeito passivo;
doloso; material (pois que a sua consumação somente ocorre quando a vítima não faz
o que a lei permite ou faz aquilo que ela não manda); de forma livre, podendo ser
praticado comissiva ou omissivamente (desde que, nesta última hipótese, o agente
goze do status de garantidor); instantâneo; subsidiário monossubjetivo;
plurissubsistente; de dano; transeunte.
Qualquer pessoa pode ser sujeito ativo bem como sujeito passivo do delito, desde que,
neste último caso, possua capacidade de discernimento.
Consumação e tentativa
Consuma-se o delito quando a vítima deixa de fazer o que a lei permite ou faz aquilo
que ela não manda. Na qualidade de crime material e plurissubsistente, o
constrangimento ilegal admite a tentativa.
Configura-se o delito de constrangimento ilegal na forma tentada se o acusado foi
perseguido desde o momento em que subjugou a vítima, impedindo-lhe a liberdade
de ação ou inação e tolhendo-a na capacidade de fazer ou deixar de fazer (RT 577,
p. 384).
Elemento subjetivo
O dolo é o elemento subjetivo do delito de constrangimento ilegal, seja ele direto ou,
mesmo, eventual. No delito de constrangimento ilegal o dolo do agente é forçar a
vítima a fazer algo ou impedir que ela aja de determinada maneira, utilizando-se, para
tanto, de violência ou grave ameaça.
Concurso de crimes
O entendimento doutrinário predominante é de que no § 2º do art. 146 do Código
Penal houve a previsão do chamado concurso material de crimes, uma vez que,
segundo a sua redação, além das penas cominadas ao constrangimento ilegal serão
aplicadas, também, aquelas que dizem respeito à violência praticada.
Entretanto, permissa venia, não acreditamos ser essa a melhor posição. Isso porque,
como é cediço, para que se possa falar em concurso material ou real de crimes é
preciso, de acordo com o art. 69 do Código Penal, que o agente, mediante mais de
uma ação ou omissão, pratique dois ou mais crimes, idênticos ou não.
Dessa forma, embora a regra a ser aplicada, conforme a determinação legal, seja a
do cúmulo material, tecnicamente, estaremos diante do chamado concurso formal
impróprio ou imperfeito, previsto na segunda parte do art. 70 do Código Penal.
Apesar da autoridade do renomado autor, não entendemos ser essa a melhor posição.
Isso porque, para que se pudesse chegar à conclusão de que os comportamentos
previstos nos incs. I e II do § 3º do art. 146 são causas de justificação, excluindo a
antijuridicidade, seria preciso, primeiro, superar a barreira da tipicidade, o que não se
consegue no caso em exame, dada a redação constante do mencionado parágrafo.
Não houvesse tal disposição, ainda assim poderíamos concluir pela atipicidade dos
fatos, caso aplicássemos o raciocínio correspondente à tipicidade conglobante que,
somada à tipicidade formal, faz surgir a chamada tipicidade penal.
Pena, ação penal, competência para julgamento e suspensão condicional do
processo; A ação penal é de iniciativa pública incondicionada.
Assim, por exemplo, em um lugar aberto ao público, no qual seja permitido fumar, um
frequentador fisicamente mais forte do que a vítima, incomodado com o cheiro da
fumaça do cigarro, impede que a vítima continue a fumá-lo. Naquele local era
permitido fumar, entretanto, a vítima foi impedida de fazê-lo. Fumar ou não fumar não
se configura como qualquer infração penal. Essa é a ideia do delito de
constrangimento ilegal.
Entretanto, pode ser que a vítima, por exemplo, seja constrangida a praticar algum
crime. Seja forçada a isso dada a coação moral exercida pelo agente, que ameaça
matá-la caso não cumpra suas determinações. Imagine-se o caso daquele que é
obrigado, em virtude das ameaças sofridas, a matar alguém, pois, caso contrário, ele
é quem seria morto. Não podendo socorrer-se às autoridades, que não dão crédito à
sua palavra, não tendo outro recurso, pois que não tem condições de se esconder do
agente, a vítima cede à pressão, à coação moral que recaía sobre a sua pessoa e,
finalmente, termina por matar alguém.
O coator, ou seja, aquele que constrangeu alguém a matar a vítima, além do delito de
homicídio, também deverá ser responsabilizado pelo constrangimento ilegal?
A doutrina se posiciona nesse sentido, conforme lições de Aníbal Bruno: “Se a força
é irresistível e o resultado obtido constitui crime, por ele responde não o coagido, a
quem falta, na ação, vontade juridicamente válida e, portanto, culpabilidade, mas o
coator, que sofrerá a agravação da pena e responderá concorrentemente pelo
constrangimento ilegal.”
Consentimento do ofendido
A liberdade, seja física ou psíquica, é um bem disponível. Assim considerada, torna-
se perfeitamente possível o consentimento do ofendido no sentido de afastar a ilicitude
do comportamento praticado pelo agente, desde que presentes todos os requisitos
indispensáveis à sua validade.
Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de
causar-lhe mal injusto e grave: Pena – detenção, de 1 (um) a 6 (seis) meses, ou
multa. p.ú Somente se procede mediante representação.
11
Introdução
O art. 147 do Código Penal aponta os meios pelos quais o autor pode levar a efeito o
delito de ameaça. Segundo o diploma repressivo, a ameaça pode ser praticada por
meio de palavras, escritos ou gestos. Como regra, o delito de ameaça é mais
comumente praticado por meio de palavras. O autor, por exemplo, diz à vítima que irá
matá-la quando ela menos esperar.
Entretanto, também não é incomum a ameaça feita por escritos, a exemplo de cartas
ou mesmo bilhetes que prenunciam um mal injusto que recairá sobre a vítima. Da
mesma forma, o gesto traz com ele o recado necessário para que a vítima entenda o
que lhe está sendo prometido.
Assim, aquele que, olhando para a vítima, passa a “faca” da mão no pescoço,
dando -lhe a ideia de que será degolada, consegue, com esse comportamento,
transmitir a mensagem de morte. Como a imaginação das pessoas é fértil e não tendo
o legislador condições de catalogar todos os meios possíveis ao cometimento do delito
de ameaça, o art. 147 do Código Penal determinou que fosse realizada uma
interpretação analógica, ou seja, após apontar, casuisticamente, alguns meios em
virtude dos quais poderia ser cometido o delito de ameaça, vale dizer, após uma
fórmula exemplificativa – palavra, escrito ou gesto –, a lei penal trouxe uma fórmula
genérica – ou qualquer outro meio simbólico.
Pode-se ameaçar por palavras, escritos, gestos, postura ou outro meio. Se a ameaça
foi suficiente para atemorizar a vítima no momento, a intimidação está demonstrada
(TJDFT, APR 20040110027576, Rel. Sandra de Santis, 1ª T. Crim., DJ 3/3/2008, p.
110).
Assim de acordo com as lições de Hungria, podemos concluir que a ameaça pode ser:
a) direta;
b) indireta;
c) explícita;
d) implícita.
Contudo, deve-se ter cuidado no que diz respeito à ameaça condicional, quando a
realização do mal prometido depender da prática de algum comportamento – positivo
ou negativo – da vítima, uma vez que poderá se configurar, nessa hipótese, como
delito de constrangimento ilegal, sendo a ameaça, nesse caso, considerada tão
somente um elemento que integra aquela figura típica. Assim, por exemplo, se o
agente disser à vítima: Se voltar amanhã à escola eu acabo com você!, não estará
praticando o delito de ameaça, mas, sim, o de constrangimento ilegal, pois que estará,
13
por meio da ameaça, constrangendo a vítima a não fazer o que a lei permite, isto é,
de estudar normalmente no local onde se encontra regularmente matriculada.
Exige a lei penal, para fins de configuração do delito de ameaça, que o mal
prenunciado pelo agente seja injusto e grave. Resta caracterizado o delito do art. 147
do Código Penal, evidenciado que as intimidações do acusado, ameaçando as vítimas
foram sérias e idôneas, infundindo-lhe verdadeiro receio de vir a sofrer mal injusto e
grave (TJSP, Ap. Crim. 1099 3793000, Rel. Des.Wilson Barreira, reg. 24/9/2007).
Dessa forma, não há que falar em ameaça quando estivermos diante da presença da
promessa de um mal justo. Assim, aquele que ameaça o seu devedor dizendo que irá
executar o seu título extrajudicial, caso não seja quitado no prazo por ele indicado,
está prometendo um mal. Entretanto, esse mal prometido é justo, razão pela qual
restaria afastado o delito de ameaça.
Além de injusto, o mal deve ser grave, ou seja, deve ser capaz de infundir temor à
vítima, caso venha a ser efetivamente cumprida a promessa. Não há gravidade no
mal prometido, por exemplo, quando o agente diz que irá cortá-la do seu círculo de
amizades, que não a convidará para sua festa de casamento etc.
Como sabido, nos crimes de ameaça, para a caracterização do mal injusto e grave, é
preciso que seja algo nocivo à vítima, além de se constituir em prejuízo grave, sério,
verossímil e injusto. Inexiste ameaça quando o mal anunciado é improvável, isto é,
liga-se a crendices, conspirações e fatos impossíveis. Por outro lado, é indispensável
que o ofendido efetivamente se sinta ameaçado, acreditando que algo de mal lhe pode
acontecer (TJ-RJ, RSE 0027643-70.2015.8.19.0205, Rel. Des. Luiz Zveiter, DJe 1º
/09/2016).
O crime de ameaça é delito de mera conduta, que se perfaz com a prática do ato, não
havendo materialidade passível de ser comprovada. Para tanto, exige-se a presença
de elementos essenciais, tais como:
d) dolo
Caracteriza crime de ameaça a conduta do agente que diz à vítima, com quem
mantém antigas desavenças, que sua vida será curta, sendo certo que a existência
do delito é reforçada pelo fato de a expressão estar inserida num contexto de
inimizade (TJSP, Ap. 1095757/1, Rel. Lagrasta Neto, j. 29/7/1998).
Para existência do crime de ameaça, pouco importa que o agente não tenha o
propósito de executar o que promete. Basta o propósito de intimidar, traduzido por
palavras ou atos capazes de provocar a mentsi trepitatio (TJDF, Ap. 7321, Rel. Mariz
de Barros, j. 24/1/1947).
Ainda que o agente não seja explícito ao fazer a ameaça, tipifica-se o delito do art.147
do CP se pelo contexto é possível aferir a intimidação que incute medo na vítima
(TJMG, AC 119607-0, Rel. Kelsen Carneiro).
Classificação doutrinária
Crime comum quanto ao sujeito ativo, bem como quanto ao sujeito passivo, devendo
ser ressalvado, neste último caso, que a vítima deve possuir capacidade de
discernimento; doloso; formal (pois que a infração penal se consuma mesmo que a
vítima não se sinta intimidada); de forma livre (uma vez que o tipo penal somente
exemplifica alguns meios em virtude dos quais o delito poderá ser praticado);
comissivo (podendo ser praticado omissivamente, desde que o agente goze do status
de garantidor); instantâneo; monossubjetivo; unissubsistente ou plurissubsistente
(dependendo da forma como é praticada a infração penal); transeunte ou não
transeunte (dependendo do fato de a infração penal deixar ou não vestígios). O crime
15
À primeira vista, qualquer pessoa também pode ser sujeito passivo do crime de
ameaça. Entretanto, para que possa gozar desse status, o sujeito passivo deve ter
capacidade para discernir a promessa de mal injusto que é proferida contra a sua
pessoa, uma vez que com o delito de ameaça se busca proteger a sua liberdade
psíquica. Por essa razão, afirma Maggiore que qualquer pessoa pode ser sujeito
passivo, “contanto que seja capaz de sentir a intimidação”.
16
Assim, as crianças, até certa idade, os doentes mentais, as pessoas jurídicas, por
exemplo, não possuem discernimento para entender a promessa de mal injusto que
lhes é proferida.
Consumação e tentativa
Crime formal, a ameaça se consuma ainda que, analisada concretamente, a vítima
não tenha se intimidado ou mesmo ficado receosa do cumprimento da promessa do
mal injusto e grave. Basta, para fins de sua caracterização, que a ameaça tenha a
possibilidade de infundir temor em um homem comum e que tenha chegado ao
conhecimento deste, não havendo necessidade, até mesmo, da presença da vítima
no momento em que as ameaças foram proferidas.
Elemento subjetivo
O delito de ameaça somente pode ser cometido dolosamente, seja o dolo direto ou
mesmo eventual. A ameaça que configura o tipo penal do art. 147 do Código Penal
contém uma promessa de mal injusto e grave. O dolo específico desse crime se
caracteriza pela intenção de provocar medo na vítima, exteriorizada de
forma fria pelo agente (TJDFT, APJ 20060 910020037, Rel. José Guilherme, 1ª T.
Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do DF, DJ 21/11/2007, p. 260).
Aquele que, por exemplo, querendo tão somente assustar, agindo com animus jocandi,
vier a entregar à vítima uma publicação em um jornal, veiculando um aviso fúnebre,
no qual constava, justamente, o seu nome, não comete o delito em estudo. Mesmo
que o agente não pretenda, efetivamente, levar a efeito o mal prometido, no momento
em que profere a ameaça, deve agir como se fosse realizá-lo, infundindo temor na
vítima, ou, pelo menos, mesmo que ela não fique atemorizada, que tenha a
18
A ameaça constante do mencionado art. 147 deve ser cuidada de forma distinta
daquela que é prevista como elemento de diversos tipos penais, a exemplo do
constrangimento ilegal e do roubo. Nesses crimes, o mal prometido poderá ser
imediato.
Assim, aquele que determina que alguém “cale a boca”, sob pena de ser agredido,
em tese, pratica o delito de constrangimento ilegal. A promessa do mal injusto e grave
foi feita de modo a acontecer imediatamente. A vítima foi impedida, em razão da
19
ameaça sofrida, de fazer aquilo que a lei permite, devendo o agente, portanto, ser
responsabilizado criminalmente por ter cometido o delito de constrangimento ilegal.
Da mesma forma, se o agente, armado com uma pistola, aponta a arma para a cabeça
da vítima dizendo-lhe para passar todo o dinheiro senão irá morrer, também está
utilizando a ameaça para que possa ter sucesso na subtração.
Ameaça supersticiosa
Há pessoas fragilizadas que acreditam em crendices, simpatias, macumbas ou coisas
parecidas. Pode ser que o agente, conhecendo essa particularidade da vítima, a
ameace dizendo que fará uma “macumba” para que ela morra em um desastre de
automóvel ou seja atropelada por um veículo qualquer.
Dessa forma, entendemos que a ameaça que se vale de meios supersticiosos é capaz
de ofender ao bem juridicamente protegido pelo art. 147 do Código Penal, razão pela
qual o agente deverá ser responsabilizado penalmente pelo delito em questão.
Pluralidade de vítimas
Havendo um comportamento único, que tenha por finalidade ameaçar mais de uma
pessoa, aplica-se a regra do concurso formal impróprio ou imperfeito, previsto na
segunda parte do art. 70 do Código Penal.
Nesse sentido, afirma Carrara:“As ameaças proferidas no ímpeto da cólera não são
politicamente imputáveis, e devem ser consideradas como meras expressões
jactanciosas.” Também assevera Fragoso que não há crime “se a ameaça constituir
apenas uma explosão de cólera, não revelando o propósito de intimidar”.
Como vimos, para que se caracterize a ameaça, não há necessidade de que o agente,
efetivamente, ao prenunciar a prática do mal injusto e grave, tenha a intenção real de
cometê-lo, bastando que seja capaz de infundir temor em um homem normal.
Se o agente estiver embriagado a ponto de não saber o que diz, não teremos
condições de identificar o dolo em seu comportamento. Entretanto, se a embriaguez
foi um fator que teve o poder de soltar os freios inibidores do agente, permitindo que
proferisse a promessa de um mal injusto e grave, pois que pretendia infundir temor à
vítima, não podemos descartar a caracterização do delito.
Assim, somente aquele estado de embriaguez que torne ridícula a ameaça feita pelo
agente é que poderá afastar a infração penal, em razão da evidente ausência de dolo;
ao contrário, se o agente, mesmo que sob os efeitos do álcool ou de substâncias
análogas, tiver consciência do seu comportamento, deverá responder pelas ameaças
proferidas.
21
Ameaça reflexa
A ameaça pode ser direta ou indireta, explícita ou implícita e, ainda, condicional.
Direta, quando dirigida imediatamente à pessoa do sujeito passivo ou seu patrimônio;
indireta quando, embora dirigida ao sujeito passivo, o mal não recaia sobre a sua
pessoa ou o seu patrimônio, mas, sim, no de terceiros que lhe são próximos,
geralmente por uma relação de afeto; explícita quando o agente diz exatamente qual
o mal prometido; implícita quando deixa entrever, pelo seu comportamento (palavras,
escritos, gestos ou qualquer outro meio simbólico), o mal a ser produzido; condicional,
quando depende de determinado comportamento para que possa se realizar o mal
prometido pelo agente.
pais de uma criança de apenas 1 ano de idade dizendo que matará seu filho, na
verdade, o mal não recairá somente sobre o sujeito passivo, mas, sim, reflexamente
sobre terceiro a ele ligado por uma relação afetiva.
Portanto, ameaça reflexa e ameaça indireta querem traduzir a mesma situação, com
denominações diferentes.
mantida. Apelo parcialmente provido. Unânime (TJRS, Ap. Crim. 70048284848, Rel.
Aristides Pedroso de Albuquerque Neto, j. 30/8/2012).
Introdução
O art. 148 do Código Penal inicia sua redação com a seguinte expressão: Privar
alguém de sua liberdade. Liberdade, aqui, tem o sentido de direito de ir, vir ou
permanecer, ou seja, cuida-se da liberdade ambulatorial, física.
24
Quando a lei penal usa o termo sequestro e a expressão cárcere privado, à primeira
vista temos a impressão de que se trata de situações diferentes. No entanto,
majoritariamente, entende-se que sequestro e cárcere privado significam a mesma
coisa. A única diferença que se pode apontar entre eles, para que se possa aproveitar
todas as letras da lei, é no sentido de que, quando se cuida de sequestro, existe maior
liberdade ambulatorial; ao contrário, quando a liberdade ambulatorial é menor, ou seja,
o espaço para que a vítima possa se locomover é pequeno, reduzido, trata-se de
cárcere privado.
Classificação doutrinária
Crime comum com relação ao sujeito ativo, bem como quanto ao sujeito passivo, à
exceção das modalidades qualificadas previstas nos incs. I e IV do § 1º do art. 148
do Código Penal, em que os sujeitos passivos deverão ser as pessoas por ele
determinadas; doloso; comissivo ou omissivo impróprio; permanente (uma vez que a
consumação da infração penal se perpetua no tempo); material (já que a conduta do
agente produz um resultado naturalístico, perceptível por meio dos sentidos, que é a
privação da liberdade da vítima); de forma livre; monossubjetivo; plurissubsistente
(como regra, uma vez que, dependendo da hipótese, poderá haver concentração de
atos, quando, então, passará a ser entendido como unissubsistente).
Consumação e tentativa
Consuma-se o delito de sequestro ou cárcere privado com a efetiva impossibilidade
de locomoção da vítima, que fica impedida de ir, vir ou mesmo de permanecer onde
quer.
Deve ser ressaltado que, para fins de caracterização do crime em estudo, não há
necessidade de remoção da vítima, podendo se consumar a infração penal desde que
esta, por exemplo, se veja impedida de sair do local onde se encontra. Assim, aquele
que tranca a vítima dentro de sua própria casa, impedindo-a de sair, pratica o crime
de sequestro.
Elemento subjetivo
O dolo, seja ele direto, seja eventual, é o elemento subjetivo do delito de sequestro e
cárcere privado, não havendo previsão para a modalidade de natureza culposa. O
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elemento subjetivo dos crimes previstos no art. 148 do Código Penal é a vontade livre
e consciente de privar a vítima de sua liberdade de locomoção.
Modalidades qualificadas
Os §§ 1º e 2º do art. 148 do Código Penal trouxeram modalidades qualificadas de
sequestro e cárcere privado, sendo que a hipótese prevista no § 2º pune mais
severamente do que a do § 1º.
Consentimento do ofendido
A liberdade é um bem de natureza disponível. Dessa forma, poderá a vítima dispor do
seu direito de ir, vir e permanecer, desde que presentes todos os requisitos
necessários à validade do seu consentimento.
Não há que se falar em cárcere privado se a detenção da suposta vítima em
determinado lugar se dá com o seu consentimento, ainda que tácito (TJMG, Processo
1.0024.01.075511-4/001[1], Rel. Kelsen Carneiro, pub.
2/8/2005).
outro lugar) sem grave perigo pessoal, ou, como diz Florian, ‘ sem um
esforço de que não seja normalmente capaz’.
É reconhecível o crime até mesmo no caso em que a vítima não possa livrar-
se por inexperiência ou ignorância das condições do local, ou por estar sob
vigilância, ou no caso, sempre figurado, da mulher [...] que é deixada, sem as
vestes, num compartimento aberto ou à margem do rio em que se banhava.”
Introdução
Após a modificação havida na redação original do tipo do art. 149 do Código Penal,
que dizia, tão somente, reduzir alguém a condição análoga à de escravo, podemos
identificar quando, efetivamente, o delito se configura. Assim, são várias as maneiras
que, analogamente, fazem com que o trabalho seja comparado a um regime de
escravidão. A lei penal assevera que se reduz alguém a condição análoga à de
escravo, dentre outras circunstâncias, quando: a) o obriga a trabalhos forçados; b)
impõe-lhe jornada exaustiva de trabalho;
30
Assim, trabalho forçado diz respeito àquele para o qual a vítima não se ofereceu
volitivamente, sendo, portanto, a ele compelido por meios capazes de inibir sua
vontade. Não só trabalhar forçosamente, mas também impor a um trabalhador jornada
exaustiva de trabalho, isto é, aquela que culmina por esgotar completamente suas
forças, minando sua saúde física e mental, se configura no delito em estudo.
Classificação doutrinária
Crime próprio com relação ao sujeito ativo, bem como quanto ao sujeito passivo (haja
vista que somente quando houver uma relação de trabalho entre o agente e a vítima
é que o delito poderá se configurar); doloso; comissivo ou omissivo impróprio; de
forma vinculada (pois que o art. 149 do Código Penal aponta os meios mediante os
quais se reduz alguém à condição análoga à de escravo); permanente (cuja
consumação se prolonga no tempo, enquanto permanecerem as situações narradas
pelo tipo penal); material; monossubjetivo; plurissubsistente.
Consumação e tentativa
Consuma-se o delito com a privação da liberdade da vítima, mediante as formas
previstas pelo tipo do art. 149 do Código Penal ou com a sua sujeição a condições
degradantes de trabalho. Sendo um delito plurissubsistente, será possível a tentativa.
Nos termos do consignado no acórdão a quo, o crime de redução a condição análoga
à de escravo consumasse com a prática de uma das condutas descritas no art. 149
do CP, sendo desnecessária a presença concomitante de todos os elementos do tipo
para que ele se aperfeiçoe, por se tratar de crime doutrinariamente classificado como
de ação múltipla ou plurinuclear (STJ, HC 239850/PA, Rel. Min. Gilson Dipp, 5ª T.,
DJe 20/8/2012).
Elemento subjetivo
O dolo é o elemento subjetivo do delito tipificado pelo art. 149 do Código Penal,
podendo ser direto ou, mesmo, eventual. Não se admite a modalidade culposa.
vítima à condição análoga à de escravo foi o seu preconceito relativo a raça, cor, etnia,
religião ou origem.
Nesses casos, a prática do crime prevista no art. 149 do Código Penal (Redução à
condição análoga a de escravo) se caracteriza como crime contra a organização do
trabalho, de modo a atrair a competência da Justiça federal (art. 109, VI, da
Constituição) para processá-lo e julgá-lo.
33
De acordo com o relatório sobre tráfico de pessoas feito pela Organização das Nações
Unidas – ONU, no ano de 2014, foram identificadas mais de 150 vítimas de diversas
nacionalidades, espalhadas por mais de 120 países no mundo. Dos aliciadores e
recrutadores, 72% eram homens e 28%, mulheres. No que diz respeito às vítimas,
49% delas eram mulheres adultas, 18% eram homens, 21%, crianças e adolescentes
do sexo feminino e os 12% restantes eram crianças e adolescentes do sexo
masculino147.
Conforme, ainda, com o aludido relatório, 53% das vítimas do tráfico de pessoas são
exploradas sexualmente, sendo 40% destinadas ao trabalho escravo, 0,3%
destinadas à remoção de órgãos, dividindo-se o percentual restante entre as demais
formas dessa espécie de criminalidade.
Introdução
O caput do art. 150 do Código Penal traduz as hipóteses em virtude das quais se
poderá considerar como violado o domicílio de alguém, perturbando lhe a
tranquilidade do lar. A lei penal, portanto, trabalha com dois núcleos, vale dizer, os
verbos entrar e permanecer. Entrar, aqui, no sentido empregado pelo texto, significa
invadir, ultrapassar os limites da casa ou suas dependências. Pressupõe um
comportamento positivo. Permanecer, ao contrário, deve ser entendido no sentido de
34
À primeira vista, poderíamos pensar que a violação de domicílio somente poderia ser
praticada quando o ingresso ou a permanência em casa alheia ou em suas
dependências fosse clandestino ou astucioso. Na verdade, os ingressos clandestinos
ou astuciosos traduzem algumas modalidades de cometimento da violação de
domicílio, pois que também se consideram típicos os ingressos forçado e ostensivo.
Assim, imagine-se a hipótese daquele que, inconformado com o término do namoro,
contra a vontade expressa de sua ex-namorada, ingressa forçosamente na casa dela,
almejando convencê-la a manter o relacionamento amoroso.
Como se percebe pelo exemplo fornecido, o ingresso na residência não foi clandestino,
tampouco astucioso, mas, ainda assim, configura- -se como hipótese de violação de
domicílio. A entrada ou a permanência deverá, ainda, nos termos do caput do art. 150
do Código Penal, ocorrer contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito.
Vontade expressa é aquela manifestada claramente por aquele que detém o poder de
permitir ou recusar o ingresso de alguém em sua residência. Vontade tácita é aquela
de natureza presumida, seja no sentido de permitir, seja no de não tolerar o ingresso
de alguém em sua casa.
Para que seja mais bem entendida a expressão de quem de direito, utilizada pelo art.
150 do Código Penal, é preciso esclarecer que existem dois regimes que devem ser
observados, para fins de identificação daquele que detém o poder de permitir ou negar
o ingresso de alguém em sua casa, vale dizer: a) regime de subordinação; b) regime
de igualdade.
Classificação doutrinária
Crime comum com relação ao sujeito ativo, bem como quanto ao sujeito passivo;
doloso; de mera conduta; de forma livre; comissivo (na modalidade entrar) e omissivo
(na modalidade permanecer); instantâneo ou permanente (pois a sua consumação se
perpetua enquanto houver a violação do domicílio com a permanência do agente em
casa alheia ou em suas dependências); monossubjetivo, podendo, também, ser
visualizado como unissubsistente
(se houver concentração de ato, como ocorre com a modalidade permanecer), ou
plurissubsistente (como acontece, como regra, com a modalidade entrar); de ação
múltipla ou de conteúdo variado (podendo o agente entrar e ainda permanecer em
casa alheia ou em suas dependências, devendo ser responsabilizado por uma única
infração penal).
Sujeito passivo é aquele identificado pelo tipo do art. 150 do Código Penal por meio
da expressão de quem de direito. Na verdade, não somente a pessoa a quem a lei
atribui a faculdade de negar ou consentir o ingresso em sua casa pode ser
considerado sujeito passivo do crime de violação de domicílio. Isso porque, como no
delito em estudo se procura proteger a paz doméstica, a tranquilidade no lar, a
liberdade que todos nós temos o direito de exercer dentro de nossa casa, qualquer
morador poderá figurar como sujeito passivo da referida infração penal,
37
Consumação e tentativa
O delito de violação de domicílio se consuma quando há o efetivo ingresso do agente
na casa da vítima ou em suas dependências, ou no momento em que se recusa a sair,
quando nela havia ingressado inicialmente de forma lícita.
Elemento subjetivo
O dolo é o elemento subjetivo característico do delito de violação de domicílio, seja
ele direto ou mesmo eventual, não tendo sido prevista a modalidade culposa.
Modalidade qualificada
O § 1º do mencionado art. 150 enumera situações que fazem com que a pena para
a violação de domicílio seja excessivamente aumentada, quando o crime é cometido:
a) à noite;
b) em lugar ermo;
c) com o emprego de violência;
d) com o emprego de arma;
e) por duas ou mais pessoas.
Noite é o período que começa depois do pôr do sol, até a aurora, ou seja, quando o
sol começa a nascer no horizonte. O emprego de violência, que qualifica a violação
de domicílio, é aquele exercido contra a pessoa, ou seja, a chamada vis corporalis,
não qualificando a violação de domicílio a violência dirigida à destruição da coisa para
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O emprego de arma, que pode ser própria ou imprópria, deve ser utilizado no sentido
de intimidar a vítima, fazendo com que se sinta ameaçada pelo agente.
Segundo Fragoso:
“bastará, todavia, a intimidação tácita, que se verifica quando o agente porta
a arma ostensivamente. A ofensa à liberdade individual é, nestes casos,
maior, pela intranquilidade que gera o emprego da arma, não sendo de se
desprezar a circunstância do maior perigo que acarreta”.
Por funcionário público devemos entender aquele que goza do conceito previsto pelo
art. 327 do Código Penal. Obviamente que o funcionário público deve agir de acordo
com as determinações legais.
Em muitas situações, cumprindo os deveres que lhe são impostos pela lei, pratica
comportamentos que podem não ser agradáveis às pessoas, a exemplo do oficial de
justiça que, executando um mandado de busca e apreensão, ingressa em residência
alheia, mesmo contra a vontade expressa do proprietário, a fim de procurar e
apreender o bem constante do mandado que fora expedido pela Justiça.
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Deve o funcionário público, portanto, ater-se aos precisos limites impostos pela lei, a
fim de que não leve a efeito atos arbitrários ou, até mesmo, criminosos.
Exclusão do crime
Dessa forma, a competência, pelo menos ab initio, para julgamento da infração penal
prevista pelo tipo fundamental da violação de domicílio será do Juizado Especial
Criminal, o mesmo acontecendo com sua modalidade qualificada, cuja pena máxima
cominada em abstrato não ultrapassa dois anos, desde que o crime não seja cometido
por funcionário público, nos termos do § 2º do art. 150 do diploma repressivo,
aplicando- -se, outrossim, todos os institutos previstos pela Lei n º 9.099/1995
(transação penal, suspensão condicional do processo).
A ação penal é de iniciativa pública incondicionada.
Concurso de crimes
A modalidade qualificada de violação de domicílio, prevista pelo § 1º do art. 150 do
Código Penal, prevê uma pena de detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, além
da pena correspondente à violência. Inicialmente, devemos destacar que a violência
aqui referida é tão somente aquela praticada contra a pessoa, e não também contra a
coisa, como entende a doutrina majoritária, pelos motivos já expostos acima. Nesse
caso, teremos duas infrações penais, vale dizer, a violação de domicílio e a lesão
corporal ou homicídio, por exemplo. Assim, havendo concurso de crimes.
A correspondência deve ter sido dirigida a outrem, ou seja, deve ter sido indicado o
seu destinatário. Afirma Hungria: “Se não é sobrescritada a pessoa alguma, ou o
endereço não permite a identificação de pessoa certa, não incide sob a tutela penal”.
Classificação doutrinária
Crime comum em relação ao sujeito ativo, bem como quanto ao sujeito passivo;
doloso; de mera conduta; de forma livre; comissivo ou comissivo por omissão (desde
que o agente se encontre na posição de garantidor); monossubjetivo;
plurissubsistente; instantâneo, podendo ser de efeitos permanentes na hipótese de
destruição; de dupla subjetividade passiva (pois tanto o remetente quanto o
destinatário são considerados sujeitos passivos do delito em tela).
Consumação e tentativa
42
Cada uma das infrações penais previstas pelo art. 151 do Código Penal, bem como
pela legislação extravagante (Lei n º 6.538/1978 e Lei n º 4.117/1962), possui
momentos consumativos diferentes.
Assim, no que diz respeito à figura contida no caput do art. 151 do Código Penal, cuja
redação é idêntica àquela contida no art. 40 da Lei nº 6.538/78, o delito se consuma
quando, efetivamente, o agente tomar conhecimento do conteúdo, total ou
parcialmente, de correspondência fechada dirigida a outrem.
Modalidade qualificada
Há controvérsia doutrinária sobre a possível revogação do § 3º do art. 151 do Código
Penal. Luiz Regis Prado, posicionando-se pela revogação, afirma:
Pará nós, como já afirmamos em notas explicativas, o art. 151 do Código Penal está
revogado, pois a falta de caput gera um defeito irremediável com relação aos seus
parágrafos.
Elemento subjetivo
O dolo é o elemento subjetivo inerente a todas as infrações penais, não se admitindo,
aqui, a punição por qualquer comportamento praticado a título de culpa.
Crime impossível
Se o agente não possui a menor possibilidade de conhecer o conteúdo da carta, a
exemplo daquela escrita de forma cifrada, ou em língua completamente desconhecida,
o fato deverá ser cuidado como hipótese de crime impossível.
45
Introdução
Com a rubrica correspondência comercial, o art. 152 do Código Penal pune aquele
que abusa da condição de sócio ou empregado de estabelecimento comercial ou
industrial para, no todo ou em parte, desviar, sonegar, subtrair ou suprimir
correspondência, ou revelar a estranho seu conteúdo.
Como se percebe pela redação da figura típica, o abuso praticado pelo sócio ou
empregado é dirigido no sentido de desviar, sonegar, subtrair ou suprimir
correspondência, ou ainda, revelar a estranho o seu conteúdo. Aqui, vale a ressalva
levada a efeito por Aníbal Bruno191 191de que somente aquele comportamento que
tiver alguma potencialidade de dano à empresa comercial ou industrial é que poderá
ser considerado típico.
Assim, não é, por exemplo, qualquer revelação de correspondência que deverá ser
entendida como criminosa, mas tão somente aquela com o potencial de causar danos
à empresa. Revelar a alguém uma correspondência recebida pela empresa que
continha um anúncio imobiliário não lhe causa qualquer dano. Ao contrário, mostrar a
46
Conjugado ao núcleo abusar, a lei penal aduz outros que dizem respeito ao especial
fim de agir do agente. Dessa forma, o abuso pode ser dirigido a: desviar, sonegar,
subtrair ou suprimir correspondência, ou revelar a estranho o seu conteúdo.
Desviar deve ser compreendido no sentido de alterar o destino, desencaminhar;
sonegar, como ocultar, encobrir, esconder; subtrair no sentido de tomar para si, retirar;
suprimir entendido como fazer desaparecer a correspondência; e revelar quando o
agente torna conhecido, divulga o conteúdo da correspondência a estranho.
Classificação doutrinária
Crime próprio quanto ao sujeito ativo, bem como quanto ao sujeito passivo (pois que
o tipo penal exige que o sujeito ativo seja sócio ou empregado de estabelecimento
comercial ou industrial, sendo este último o sujeito passivo da infração penal); doloso;
de forma livre; de ação múltipla ou conteúdo variado (uma vez que o agente pode
praticar as várias condutas previstas no tipo penal, somente respondendo, contudo,
por uma única infração penal); comissivo ou omissivo impróprio (devendo o agente,
neste caso, gozar do status de garantidor); instantâneo (podendo ser instantâneo de
efeitos permanentes, como na hipótese de supressão de correspondência);
monossubjetivo; plurissubsistente.
Consumação e tentativa
O delito se consuma com a prática dos comportamentos previstos pelo art. 152 do
Código Penal, vale dizer, quando o sócio ou empregado de estabelecimento comercial
ou industrial desvia, sonega, subtrai, suprime ou ainda quando revela a estranho
conteúdo de correspondência comercial. Por se tratar de crime plurissubsistente, a
tentativa é perfeitamente admissível.
Elemento subjetivo
Os comportamentos previstos pelo art. 152 do Código Penal somente podem ser
realizados dolosamente, seja o dolo direto ou mesmo eventual, não tendo sido
prevista a modalidade culposa.
Classificação doutrinária
Crime próprio quanto ao sujeito ativo (pois que o tipo penal exige uma qualidade
especial, vale dizer, a de destinatário ou detentor do documento particular ou de
correspondência confidencial) e comum quanto ao sujeito passivo (uma vez que
qualquer pessoa pode vir a ser prejudicada com a divulgação indevida); doloso;
formal; instantâneo; comissivo (podendo, no entanto, ser praticado omissivamente,
desde que o agente se encontre na condição de garantidor); monossubjetivo;
unissubsistente (como regra, podendo, contudo, ser também considerado como
plurissubsistente, dependendo da maneira como o delito é praticado, haja vista a
possibilidade de fracionamento do iter criminis).
Somente podem ser considerados sujeitos ativos do delito previsto no art. 153 do
Código Penal o destinatário e o detentor do documento particular ou da
correspondência confidencial. Sujeito passivo, segundo a parte final contida no caput
do referido artigo, é aquele que, com a divulgação do conteúdo do documento
particular ou da correspondência confidencial, corre o risco de sofrer dano, mesmo
49
que este não venha a efetivamente se concretizar, podendo, até mesmo, ser o próprio
remetente.
Consumação e tentativa
Consuma-se a infração penal com a efetiva divulgação a terceiros do conteúdo de
documento particular ou de correspondência confidencial, desde que, com essa
divulgação, se consiga visualizar a potencialidade de dano a outrem, cuidando-se,
portanto, de crime de natureza formal, cujo resultado previsto no tipo não precisa se
configurar para fins de consumação do delito. Será possível a tentativa.
Elemento subjetivo
Somente a divulgação dolosa de segredo importa ao art. 153 do Código Penal, seja o
dolo direto, seja mesmo o eventual. Não houve previsão legal da modalidade culposa.
Modalidade qualificada
A Lei nº 9.983, de 14 de julho de 2000, criou, por intermédio do § 1º-A, uma
modalidade qualificada de crime de divulgação de segredo, dizendo: § 1º. A. Divulgar,
sem justa causa, informações sigilosas ou reservadas, assim definidas em lei,
contidas ou não nos sistemas de informações ou banco de dados da Administração
Pública: Pena – detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
renomados autores, ousamos deles discordar, uma vez que o núcleo divulgar, de
acordo com nosso entendimento, não exige coletividade. Basta que seja dado
indevido conhecimento a alguém, como no caso do caput do art. 153 do Código Penal,
sobre o conteúdo de documento particular ou de correspondência confidencial, sendo
dela destinatário ou detentor, e que, devido a essa divulgação, haja uma
potencialidade de dano, moral ou material, a outrem.
Portanto, com a devida venia das posições em contrário, o núcleo divulgar não exige,
para sua configuração, a extensão pretendida pela primeira corrente, bastando,
portanto, que com o comportamento do agente seja visualizada uma potencialidade
de dano, mesmo que a divulgação, sem justa causa, do conteúdo do documento
particular ou da correspondência confidencial seja feita a uma só pessoa.
Revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão de função,
ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem: Pena –
detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa. Parágrafo único. Somente se
procede mediante representação.
Introdução
Podemos extrair os seguintes elementos da redação contida no art. 154 do Código
Penal, que constituem o delito de violação de segredo profissional: a) a existência de
um segredo; b) o fato de ter esse segredo chegado ao conhecimento do agente em
virtude de sua função, ministério, ofício ou profissão; c) revelação a alguém; d)
ausência de justa causa; e) potencialidade de dano a outrem.
Para que o fato possa se subsumir à figura típica em estudo, é preciso que o segredo
tenha sido revelado por alguém que o soube, por intermédio da própria pessoa
52
Profissão diz respeito a toda atividade que, como regra, tenha a finalidade de lucro,
exercida por quem tenha habilitação. Dissemos como regra porque, em algumas
situações, mesmo que exercendo um trabalho voluntário, aquela determinada
atividade somente poderá ser exercida por um profissional, como é o caso, por
exemplo, dos médicos e advogados.
O art. 154 do Código Penal, da mesma forma que o artigo que lhe é anterior, usa a
expressão sem justa causa querendo denotar que a revelação não foi amparada por
um motivo justificado.
Noronha esclarece que:
“em regra, a justa causa funda-se na existência de estado de necessidade: é
a colisão de dois interesses, devendo um ser sacrificado em benefício do
outro; no caso, a inviolabilidade dos segredos deve ceder a outro bem-
interesse. Há, pois, objetividades jurídicas que a ela preferem, donde não ser
absoluto o dever do silêncio ou sigilo profissional”.
‘não estará preso ao segredo profissional, devendo, entretanto, guardar sigilo pericial’
(art. 87 do Código de Ética Médica) (STF, RE 91218/SP, Rel. Min. Djaci Falcão, 2ª T.,
RTJ 101-02, p. 676).
Classificação doutrinária
Crime próprio quanto ao sujeito ativo (uma vez que o tipo delimita a prática da infração
penal àqueles que tiverem tomado conhecimento do segredo em razão de função,
ministério, ofício ou profissão), sendo comum no que diz respeito ao sujeito passivo;
doloso; formal; instantâneo; comissivo (podendo ser praticado omissivamente
somente pelo agente que goze do status de garantidor); de forma livre;
monossubjetivo; unissubsistente ou plurissubsistente (dependendo da forma com que
a infração penal é levada a efeito, pois os atos podem ser concentrados ou diluídos
pelo iter criminis).
Consumação e tentativa
Consuma-se o delito tipificado no art. 154 do Código Penal quando o segredo
potencialmente lesivo é revelado a outrem, mesmo que tal revelação, como já
55
afirmamos, tenha sido feita a uma única pessoa. Embora exista controvérsia
doutrinária, entendemos ser admissível a tentativa.
Elemento subjetivo
O crime de violação de segredo profissional somente pode ser praticado dolosamente,
seja o dolo direto ou, mesmo, eventual. Não se admite a modalidade culposa.
Artigo 154 do CP: violação de sigilo profissional. Fotos íntimas juntadas em processo
criminal por médico e ex-amante da apelada, com a intenção de comprovar uma
obsessão amorosa sofrida por ele em razão da conduta permanente dela. Inexistência
do dolo para a configuração do crime. Ato lamentável, mas que não adentra na esfera
criminal (TJ-RJ, AC 0286709-95.2013.8.19.0001, Rel.ª Des.ª Rosana Navega Chagas,
DJe 20/04/2016).
Modalidades comissiva e omissiva
A revelação pode ocorrer de forma comissiva, bem como omissivamente, desde que,
nesta última hipótese, o agente seja considerado garantidor da guarda do segredo
que lhe é revelado em razão de função, ministério, ofício ou profissão.
Introdução
Originalmente, a internet teve utilização militar. Porém atualmente, os delitos
praticados por meio da informática podem ser de difícil apuração.
Lucrecio Rebollo Delgado destaca três características muito importantes, que lhe são
peculiares, dizendo que todas as atuações ilícitas cometidas no âmbito informático se
realizarão:
“Com celeridade e distância no tempo e no espaço. O conceito de realização
delitiva se encontra truncado com estas novas formas. É frequente pensar
que qualquer um pode praticar um homicídio, mas este requer a proximidade
espacial e temporal de sua vítima. Sem embargo, no âmbito informático, o
suposto delinquente não necessita para a comissão delitiva nem a presença
física, nem temporal. Ademais disso as facilidades no tratamento e processo
da informação, com a possibilidade de realizar programas que atuem de
forma retardada ou controlada no tempo, aproveitando as funções do sistema
operativo do computador, permitem ativar ou desativar determinadas ordens
na máquina, de maneira dinâmica, inclusive flexível.
Desta forma, dependendo de uma ou outra circunstância prevista de antemão,
assim como a utilização das comunicações, para poder, em tempo real e fora
do alcance ou controle do operador do computador, atuar na forma desejada,
permitem preparar ações dolosas em prejuízo do outro, em tempo e espaços
distantes. Facilidade de encobrimento. É característica praticamente
inseparável da atividade ilícita informática, a facilidade com que se encobrem
os fatos. É muito fácil, por exemplo, modificar um programa para que realize
uma atividade ilícita em benefício do autor e estabelecer logo o que se
denomina uma rotina software que volte a modificar o programa de forma
automática. Dessa forma, não fica rastro da possível prática do delito. Se,
posteriormente, fosse realizado um estudo do programa, seria impossível
detectar a forma em que se cometeu o fato. Tenhamos em mente a ideia de
que é possível realizá-lo, mas não teremos nenhuma prova de que se realizou.
Dificuldade probatória. A dificuldade em atribuir a autoria do fato vem em
grande medida determinada pela dificuldade probatória que rodeia a ilicitude
informática. Isso se deve à própria dinâmica do processamento informático,
que impede detectar uma determinada atividade ou processo posteriormente
58
Dessa forma, presentes os demais elementos exigidos pelo tipo, poderá ocorrer a
infração penal em estudo com a invasão de um dispositivo informático alheio, como
ocorre com um computador, que pode não estar ligado a qualquer rede e ser acessado
via internet. Assim, se alguém, percebendo que seu vizinho havia esquecido o
computador, que havia levado para uma festa de que ambos participavam, o invadir,
mediante violação indevida de mecanismo de segurança, com a finalidade de destruir
dados ou informações sem autorização expressa ou tácita do titular do dispositivo,
poderá ser responsabilizado pelo tipo penal previsto pelo caput do art. 154-A do
Código Penal.
Para que ocorra a infração penal sub examen, exige o tipo penal, ainda, que a conduta
seja levada a efeito mediante violação indevida de mecanismo de segurança. Por
mecanismos de segurança podemos entender todos os meios que visem garantir que
somente determinadas pessoas terão acesso ao dispositivo informático, a exemplo do
que ocorre com a utilização de login e senhas que visem identificar e autenticar o
usuário, impedindo que terceiros não autorizados tenham acesso às informações nele
contidas.
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Enfim, são inúmeros os códigos maliciosos por meio dos quais se poderá praticar o
delito de invasão de dispositivo informático, sendo que, sem nenhuma dose de
exagero, a cada dia surgem diferentes formas de ataques.
A parte final do caput do art. 154-A do Código Penal prevê, ainda, que, para que se
configure a infração penal em estudo, o agente poderá atuar no sentido de instalar a
vulnerabilidade, a fim de obter vantagem ilícita, que pode ou não ter natureza
patrimonial.
Direito penal. Furto qualificado. Subtração de valores de conta-corrente. Fraude pela
internet. Litispendência não verificada. Desclassificação para invasão de dispositivo
informático alheio. Art. 154-A do CP. Não ocorrência. Não há falar em desclassificação
para o art. 154-A do Código Penal, pois os réus, mediante sua conduta, não apenas
“invadiram dispositivo eletrônico alheio para obter vantagem ilícita”, tendo
efetivamente subtraído a quantia de R$ 3.046,97 (três mil e quarenta e seis reais e
noventa e sete centavos) pertencentes à empresa vítima. Incide, por óbvio, o art. 155,
§ 4º, do CP (STJ, REsp 1.484.289, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe
08/04/2016).
Modalidade equiparada
Diz o § 1º do art. 154-A, verbis: § 1º Na mesma pena incorre quem produz, oferece,
distribui, vende ou difunde dispositivo ou programa de computador com o intuito de
permitir a prática da conduta definida no caput.
Produzir significa criar, gerar, fabricar; oferecer importa em ofertar, gratuita ou
onerosamente; distribuir tem o sentido de partilhar, repartir; vender tem o significado
de transferir (o dispositivo ou o programa de computador) mediante um preço
determinado; difundir diz respeito a propagar, divulgar, espalhar.
Todas essas condutas, vale dizer, produzir, oferecer, distribuir, vender ou difundir,
dizem respeito a dispositivo ou programa de computador. O art. 1º da Lei nº 9.609, de
19 de fevereiro de 1998, traduz o conceito de programa de computador: Art. 1º.
Programa de computador é a expressão de um conjunto organizado de instruções em
linguagem natural ou codificada, contida em suporte físico de qualquer natureza, de
emprego necessário em máquinas automáticas de tratamento da informação,
dispositivos, instrumentos ou equipamentos periféricos, baseados em técnica digital
ou análoga, para fazê-los funcionar de modo e para fins determinados.
Conforme o disposto na parte final do § 1º do art. 154-A do Código Penal, as condutas
acima narradas devem ser cometidas com o intuito de permitir a prática da conduta
definida no caput do citado dispositivo legal, ou seja, o agente produz, oferece,
distribui, vende ou difunde dispositivo ou programa de computador, no sentido de
permitir que terceira pessoa invada dispositivo informático alheio, conectado ou não à
rede de computadores, mediante violação indevida de mecanismo de segurança e
com o fim de obter, adulterar ou destruir dados ou informações sem autorização
expressa ou tácita do titular do dispositivo ou instalar vulnerabilidades para obter
vantagem ilícita.
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Com essas hipóteses, quis a lei, portanto, punir de maneira independente, aquele que,
de alguma forma, auxilia para que terceiro tenha facilitada a prática do tipo penal
constante do caput do art. 154-A do diploma repressivo.
Modalidade qualificada
Diz o § 3º do art. 154-A do Código Penal:
§ 3º Se da invasão resultar a obtenção de conteúdo de comunicações eletrônicas
privadas, segredos comerciais ou industriais, informações sigilosas, assim definidas
em lei, ou o controle remoto não autorizado do dispositivo invadido: Pena – reclusão,
de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa, se a conduta não constitui crime mais grave.
Inicialmente, incidirá na modalidade qualificada o agente que, com a invasão de
dispositivo informático, obtiver o conteúdo de comunicações eletrônicas privadas. De
acordo com as alíneas b e c do art. 4º do Capítulo II, da Convenção das Nações
Unidas sobre o uso de comunicações eletrônicas nos contratos internacionais, cujos
conceitos podem ser utilizados na interpretação do dispositivo penal em exame,
embora o § 3º do art. 154-A mencione comunicações eletrônicas privadas: “(b)
‘Comunicação eletrônica’ significa qualquer comunicação feita pelas partes utilizando-
se de mensagens eletrônicas; (c) ‘Mensagem eletrônica’ significa uma informação
criada, enviada, recebida ou armazenada por mecanismo eletrônico, magnético, ótico
ou similar, incluindo, mas não se limitando, a intercâmbio eletrônico de dados, correio
eletrônico, telegrama, telex ou telecópia; [...]”.
Da mesma forma, ocorrerá o delito qualificado se da invasão resultar na obtenção de
segredos comerciais ou industriais, informações sigilosas, assim definidas em lei.
No que diz respeito ao § 2º do art. 154-A do Código Penal, é importante frisar que o
aumento de um sexto a um terço somente será aplicado às hipóteses constantes do
caput, bem com de seu § 1º, tendo em vista a situação topográfica, devendo-se aplicar
a regra hermenêutica que determina que os parágrafos somente se aplicam às
hipóteses que lhe são anteriores.
Além disso, o aumento somente será possível no critério trifásico, previsto pelo art. 68
do Código Penal, se ficar comprovado que o comportamento praticado pelo agente
trouxe, efetivamente, prejuízo econômico à vitima. Conforme determina o § 4º, na
hipótese do § 3º.
Classificação doutrinária
Analisando a figura típica fundamental, prevista no caput do art. 154-A do Código
Penal, crime comum, tanto com relação ao sujeito ativo quanto ao sujeito passivo;
doloso; formal (uma vez que a simples violação indevida de mecanismo de segurança,
com a finalidade de obter, adulterar ou destruir dados ou informações sem autorização
expressa ou tácita do titular do dispositivo, ou instalar vulnerabilidades para obter
vantagem ilícita já configura o crime, independentemente destes resultados); de dano;
de forma vinculada (pois somente poderá ser praticado mediante violação indevida de
mecanismo de segurança); instantâneo; monossubjetivo; plurissubsistente;
transeunte ou não transeunte (dependendo da hipótese concreta).
Consumação e tentativa
Tratando-se de um crime formal, o delito tipificado no caput do art. 154-A se consuma
no momento em que o agente consegue, efetivamente, invadir dispositivo informático
alheio, conectado ou não à rede de computadores, mediante violação indevida de
mecanismo de segurança, com o fim de obter, adulterar ou destruir dados ou
informações sem autorização expressa ou tácita do titular do dispositivo ou instalar
vulnerabilidades para obter vantagem ilícita.
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Elemento subjetivo
O dolo é o elemento subjetivo previsto pelo tipo penal sub examen, não havendo
previsão para a modalidade de natureza culposa. Há, ainda, o que doutrinariamente
é reconhecido como especial fim de agir, configurado nas expressões com o fim,
prevista no caput do art. 154-A do Código Penal, e com o intuito de, existente no § 1º
do mesmo artigo.
A ação penal, conforme determinação contida no art. 154-B, incluído também pela Lei
nº 12.737, de 30 de novembro de 2012, será de iniciativa pública condicionada à
representação, salvo se o crime é cometido contra a administração pública direta ou
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Jurisprudências:
Data do Julgamento:01/03/2016
Data da Publicação:09/03/2016
Órgao Julgador:T6 - SEXTA TURMA
Relator:Ministro NEFI CORDEIRO (1159)
CONCLUSÃO
O estudo proporcionou bastante conhecimento, uma vez que foi necessário leitura e
bastante estudo, pois, mesmo sendo um mero estudo de artigos, fica comprovado sua
importância através das jurisprudências e da materialização na vida e no cotidiano de
nós enquanto cidadãos. Nos trouxe também a reflexão de quanto é necessário
levarmos a sério cada etapa deste curso, pois, foi visto na prática que ministros falam
esta linguagem a qual estamos tendo o privilégio de conhecer e ter, nos traz a reflexão
também que este conhecimento adquirido aqui, fará a diferença na vida das pessoas
quando estivermos na seara profissional. Demais, foi bastante enriquecedor conhecer
um pouco mais, sobre cada crime e suas particularidades.
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REFERÊNCIAS
Greco, Rogério. Código Penal: comentado / Rogério Greco. – 11. ed. – Niterói, RJ:
Impetus, 2017.
Masson, Cleber, Direito penal: parte especial: arts. 121 a 212 / Cleber Masson. – 11.
ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, São Paulo: MÉTODO, 2018.
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