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FORMAÇÃO DO LEITOR
CURSOS DE GRADUAÇÃO – EAD
Metodologia do Ensino: Formação do Leitor – Prof.ª Ms. Célia Gaia e Prof.ª Marina
Aparecida Facirolli Goulart
METODOLOGIA DO ENSINO:
FORMAÇÃO DO LEITOR
Batatais
Claretiano
2013
© Ação Educacional Claretiana, 2010 – Batatais (SP)
Versão: dez./2013
028.9 G131m
Gaia, Célia
Metodologia do ensino: Formação do leitor / Célia Gaia, Marina Aparecida
Facirolli Goulart – Batatais, SP : Claretiano, 2013.
176 p.
ISBN: 978-85-8377-085-5
CDD 028.9
Preparação Revisão
Aline de Fátima Guedes Cecília Beatriz Alves Teixeira
Camila Maria Nardi Matos Felipe Aleixo
Carolina de Andrade Baviera Filipi Andrade de Deus Silveira
Cátia Aparecida Ribeiro Paulo Roberto F. M. Sposati Ortiz
Dandara Louise Vieira Matavelli Rodrigo Ferreira Daverni
Elaine Aparecida de Lima Moraes Sônia Galindo Melo
Josiane Marchiori Martins
Talita Cristina Bartolomeu
Lidiane Maria Magalini
Vanessa Vergani Machado
Luciana A. Mani Adami
Luciana dos Santos Sançana de Melo
Luis Henrique de Souza Projeto gráfico, diagramação e capa
Patrícia Alves Veronez Montera Eduardo de Oliveira Azevedo
Rita Cristina Bartolomeu Joice Cristina Micai
Rosemeire Cristina Astolphi Buzzelli Lúcia Maria de Sousa Ferrão
Simone Rodrigues de Oliveira Luis Antônio Guimarães Toloi
Raphael Fantacini de Oliveira
Bibliotecária Tamires Botta Murakami de Souza
Ana Carolina Guimarães – CRB7: 64/11 Wagner Segato dos Santos
Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução, a transmissão total ou parcial por qualquer
forma e/ou qualquer meio (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação e distribuição na
web), ou o arquivamento em qualquer sistema de banco de dados sem a permissão por escrito do
autor e da Ação Educacional Claretiana.
CRC
Ementa––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Breve histórico da leitura no Brasil. Concepções de leitura e leitor. A formação
da competência leitora. A leitura na escola e a inevitável mediação do professor.
Leitura e construção do conhecimento. Possibilidades de leitura e perspectivas
dialógicas com outras linguagens. Considerações sobre a leitura do texto escrito.
Por que e como ler textos literários. O leitor entre o impresso e o eletrônico. Es-
paços para gostar de ler.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
1. INTRODUÇÃO
É nossa intenção que este Caderno de Referência de Conteúdo
ofereça uma contribuição efetiva aos professores, ajudando-os a
repensar questões básicas e fundamentais para o aprofundamento
da reflexão sobre o ensino e a aprendizagem da leitura, questões
essas que preocupam a todos que se dedicam a ela.
É possível ensinar a ler? Em que consiste o Ensino da Leitu-
ra? Qual a importância da leitura na formação básica dos alunos?
Como os alunos aprendem a ler? Que processos cognitivos estão
implicados no ato de ler?
8 © Metodologia do Ensino: Formação do Leitor
Abordagem Geral
Neste tópico, apresenta-se uma visão geral do que será estu-
dado neste Caderno de Referência de Conteúdo. Aqui, você entrará
em contato com os assuntos principais deste conteúdo de forma
breve e geral e terá a oportunidade de aprofundar essas questões
no estudo de cada unidade. No entanto, essa Abordagem Geral
visa fornecer-lhe o conhecimento básico necessário a partir do
qual você possa construir um referencial teórico com base sólida
– científica e cultural – para que, no futuro exercício de sua profis-
são, você a exerça com competência cognitiva, ética e responsabi-
lidade social.
Destacamos alguns conceitos fundamentais nos quais é im-
portante que você, caro aluno, focalize sua atenção. Orientamos
para que procure sistematizar as concepções de leitura apresen-
tadas bem como as implicações pedagógicas desas concepções no
cotidiano escolar.
Outro conceito importante para o qual deve ficar atento é de
leiturização, termo empregado por Foucambert, como fundamen-
tal para que você perceba a importância da criação de espaços e
tempos no contexto escolar como forma de inserir a leitura num
contexto sociocomunicativo mais amplo que o da sala de aula. Ob-
servamos, também, a importância de se compreender que a leitu-
ra precisa fazer parte de um contexto real, sempre que possível, a
fim de se desescolarizar as práticas leitoras. Ressaltamos, ainda, a
importância da mediação docente na abordagem do texto escrito,
tomando como foco as estratégias cognitivas como base à meta-
cognição, ou seja, o processo de leitura autônoma.
© Caderno de Referência de Conteúdo 11
Glossário de Conceitos
O Glossário de Conceitos permite a você uma consulta rá-
pida e precisa das definições conceituais, possibilitando-lhe um
bom domínio dos termos técnico-científicos utilizados na área de
conhecimento dos temas tratados em Metodologia de Ensino:
Formação do Leitor. Veja, a seguir, a definição dos principais con-
ceitos:
1) Discurso:
O discurso se concretiza no texto, mas se diferencia dele na medida
em que ultrapassa seus limites. O texto é o conjunto de regras or-
ganizadas e estruturadas segundo as normas da Língua, [...] permi-
tindo diferentes interpretações. O discurso é a idéia do enunciador
emanada do e pelo texto, lançada em direção ao enunciatário, per-
mitindo a ele relacioná-la a um determinado momento ou aconte-
cimento na constituição de um sentido1 (CANONICO, 2010, p. 24).
leva alguns a serem leitores e outros não, pois estes últimos não
precisam da leitura para estabelecer seus modos de vida e suas
atividades. Fazer que todos sejam leitores é lhes oportunizar uma
vida que inclua a leitura e, para isso, é preciso um projeto políti-
co de democratização da sociedade. Assim, os professores devem
atuar no sentido de tornar a escola um espaço cultural que inclua a
leitura como uma de suas estratégias fundamentais para a inclusão
de todas as crianças e jovens neste universo. Por considerar que o
estatuto de leitor e o status social estão intimamente ligados, en-
tende que o não leitor é excluído das redes de comunicação escrita
por razões sociais e não técnicas, e seus não saberes fazem eco a
essa situação de exclusão. "Ou seja, é impossível tornar-se leitor
sem essa contínua interação com um lugar onde as razões para
ler sejam intensamente vividas" (FOUCAMBERT, 1994, p.31). Logo,
"para aprender a ler, o não-leitor deve relacionar-se com os textos
que leria se soubesse ler, para viver o que vive" (FOUCAMBERT,
1994, p.31), ou seja, participar de um processo de leiturização.
FORMAÇÃO DO LEITOR
LEITURA
CONCEPÇÕES IMPLICAÇÕES
PROCESSO PEDAGÓGICA
S S
DECODIFICAÇÃO
ASCENDENTE ORALIZAÇÃO
LEITURIZAÇÃO LETRAMENTO
O MEDIAÇÃO
Questões Autoavaliativas
No final de cada unidade, você encontrará algumas questões
autoavaliativas sobre os conteúdos ali tratados. Responder, dis-
cutir e comentar essas questões e relacioná-las com a prática do
ensino Metodologia de Ensino: Formação do Leitor pode ser uma
forma de você autorregular sua aprendizagem por meio da siste-
matização dos conceitos fundamentais do assunto tratado, o que
favorecerá sua preparação para a prova final, que será dissertati-
va. Mais ainda: é uma maneira privilegiada de você construir seu
conhecimento como um sujeito autônomo e responsável pela sua
formação profissional.
Bibliografia Básica
É fundamental que você use a Bibliografia Básica em seus
estudos, mas não se prenda só a ela. Consulte, também, as biblio-
grafias complementares.
Dicas (motivacionais)
O estudo deste Caderno de Referência de Conteúdo convi-
da você a um olhar mais apurado da educação como processo de
emancipação do ser humano. Procure ficar atento para as explica-
ções teóricas, práticas (do senso comum) e científicas presentes
nos meios de comunicação, e partilhe com seus colegas seus co-
mentários. Ao compartilhar o que observamos com outras pesso-
as, temos a oportunidade de perceber o que nós e os outros ainda
não sabemos, aprendendo a ver e notar o que não tínhamos per-
cebido antes desenvolvendo discriminações. Observar é, portanto,
uma capacidade que nos impele à maturidade.
Você, como aluno dos Cursos de Graduação na modalidade
EAD e futuro profissional da educação, necessita de uma forma-
ção conceitual sólida e consistente. Para isso você contará com a
ajuda do tutor a distância, do tutor presencial e, principalmente
da interação com seus colegas. Sugerimos que organize bem o seu
tempo, realize as atividades nas datas estipuladas.
É importante que você anote suas reflexões em seu caderno
ou no Bloco de Anotações, pois no futuro poderá utilizá-las na ela-
boração de sua monografia ou de produções científicas.
Leia os livros da bibliografia indicada, para que você amplie
seus horizontes teóricos. Coteje com o material didático, discuta a
unidade com seus colegas e com o tutor e assista às videoaulas.
© Caderno de Referência de Conteúdo 19
3. E-REFERÊNCIAS
OLIVEIRA, Mariana Morais de. As colunas de atualidades – um gênero do discurso.
Disponível em: <http://www.filologia.org.br/viiicnlf/anais/caderno05-06.html>. Acesso
em: 1 jul. 2010.
1
1. OBJETIVOS
• Compreender a construção histórica das práticas de lei-
tura.
• Entender as implicações sócio-culturais no processo de
construção do leitor.
• Reconhecer as diferentes funções da leitura por meio dos
gestos e olhares do leitor.
• Compreender como se deu a formação do leitor brasileiro
mediante marcas deixadas nas narrativas literárias.
• Analisar os desafios que se impõem ao mediador da leitu-
ra nos dias atuais.
2. CONTEÚDOS
• Surgimento da escrita e os olhares desconfiados para a
palavra.
22 © Metodologia de Ensino: Formação do Leitor
4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
Tal como o próprio ato de ler, uma história da leitura salta para fren-
te até nosso tempo — até mim, até minha experiência como leitor
— e depois volta a uma página antiga em um século estrangeiro
e distante. Ela salta capítulos, folheia, seleciona, relê, recusa-se a
seguir uma ordem convencional (MANGUEL, 1997, p. 37).
não há nação desenvolvida que não seja uma nação de leitores. Ou-
vimos também que a sociedade informatizada e globalizada precisa
de leitores capazes não só de assimilar e compreender informações,
mas também de processá-las em novos conhecimentos.
Você já deve ter percebido que há uma grande diferença
entre o "ledor" e o "leitor". E, para que não fiquemos no óbvio,
propomos a você, durante o desenvolvimento das unidades, a re-
flexão sobre alguns pontos importantes, pois não podemos formar
leitores se desconhecemos as concepções de leitura, os processos
pelos quais os "sujeitos" se apropriam desse ato, as condições e
políticas para essa formação.
Nesta primeira unidade, apresentaremos alguns pontos da
história da leitura, pois refazê-la integralmente seria impossível para
os objetivos deste curso. Como diz a nossa epígrafe, os dados não
são lineares e não obedecem a uma lógica convencional. São dados
que selecionamos em uma perspectiva individual de leitoras.
6. GESTOS DE LEITURA
Para além da desconfiança e da rejeição, muitos amaram a
leitura. Seus instantes e gestos de leitura foram retratados na arte,
mostrando o quanto ela pode envolver inteiramente o ser humano
em seus instantes de isolamento, em seus diálogos com o outro,
em seus estudos, em suas imagens mentais.
Em contraposição aos filósofos vistos anteriormente, o escri-
tor Jorge Luis Borges considerava o livro uma extensão da memória
e da imaginação. Valorizava a biblioteca como a memória da hu-
manidade e como um local mágico que despertava a imaginação
humana. Aconselhava os alunos a não lerem críticas, e sim as pró-
prias obras em questão. Dizia que talvez compreendessem pouca
coisa, mas que sentiriam um prazer único e estariam ouvindo a voz
de alguém, já que cada autor tem a sua voz. "E, sobretudo, pedia
que lessem somente o que lhes agradasse, afinal a leitura atenta
e concentrada é uma das ‘formas de felicidade’." (cf. PASCHOAL,
2007. Disponível em: <http://www.ndc.uff.br/portaldereferencia/
noticias.asp?cod=1205>. Acesso em: 15 jul. 2008).
Também, Manguel (1997), em seu livro A história da leitura,
relata poeticamente os gestos de leitura que observa em diferen-
tes quadros de arte (ilustrações, pinturas, fotos etc.). Seleciona-
mos alguns para você, pois queremos que participe da aventura
prazerosa de ler com os olhos e com o coração.
Macabéa ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Clarice narra que Macabéa ao acordar não sabia mais quem era. Sentia-se uma
"cadela" toda vadia numa cidade toda feita contra ela. Uma cidade que a ignora-
va. "Ninguém olhava para ela na rua, ela era café frio. Assoava o nariz na barra
da combinação. Não tinha aquela coisa delicada que se chama encanto. Só eu a
vejo encantadora. Só eu, seu autor, a amo. Sofro por ela."
O que cabe a esta datilógrafa que não entende o que datilografa? A tia lhe dera
um curso rápido de como bater à máquina e ela copia lentamente letra por letra,
numa simples atividade mecânica de datilografar. O que cabe a essa mulher que
depende do rádio para sua ligação com o mundo? Sua simplicidade faz com que
se encante com a da palavra "efemérides", palavra esta que também não enten-
de. A audição freqüente da Rádio Relógio tem por objetivo não só para saber as
horas, mas aprender curiosidades que acham lindas.
A falta de consciência de sua situação física ou psicológica faz com que seja
consumida pela sociedade moderna: gosta de colecionar anúncios; ouve rádio,
gosta de cachorro-quente e coca-cola. Observe que aí estão todos os elementos
da modernidade que a personagem consome inconscientemente. Cabia-lhe ape-
nas aceitar a existência sem a possibilidade de entendê-la.
Como diz o narrador do livro: "Não se tratava de uma idiota, mas tinha a felicida-
de pura dos idiotas. (...) Ela era subterrânea e nunca tinha tido floração. Minto:
ela era capim". Nesse contexto de exclusão, ela não tinha a mínima possibilidade
de dignidade. Ela é "a vida que grita por si mesma, independente da opressão
e da marginalização social." (Disponível em: <http://www.livrosparatodos.net/
livros-resumos/a-hora-da-estrela.html>. Acesso em: 15 jul. 2008).
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Vamos refletir um pouco sobre Macabéa e transpô-la para
os dias atuais:
Como você pode ver, cada parcela da sociedade tem seu pa-
pel na formação de leitores. É interessante ler as conclusões e ob-
servar alguns gráficos, pois eles nos ajudam a enxergar melhor a
realidade. Não deixe de acessar o site!
12. CONSIDERAÇÕES
Chegamos ao término da primeira unidade de Fundamentos
e Métodos de Ensino I: Formação do Leitor! Nesta unidade, co-
nhecemos alguns pontos da história da leitura.
A situação da leitura no Brasil enfrentou e enfrenta proble-
mas decorrentes do processo sócio-cultural: a tardia introdução da
imprensa no Brasil, a nossa tradição oral, a valorização dos livros
didáticos pelo mercado, a insuficiente preparação dos professores,
o pouco acesso dos alunos aos livros de ficção etc.
Ainda não fomos capazes de formar uma massa crítica de
leitores. Ainda temos que enfrentar a rejeição à leitura diante
de ideias preconceituosas de que ler é para pessoas diferentes e
talvez problemáticas. Ainda não aceitamos e incluímos a escrita e
seus diferentes suportes informatizados. Ainda não conseguimos
vencer a leitura escolarizada tão distante da vida em seus gestos e
imagens. Ainda lutamos pela conquista do leitor que tem que ser
guiado pelos narradores nas obras literárias. Ainda precisamos de
políticas governamentais que levem a cultura e a leitura a todos os
segmentos sociais. Ainda ... e ainda ...
13. E-REFERÊNCIAS
ABRAMOVICH, F. Formação do leitor. Disponível em: <http://www.leiabrasil.org.br/pdf/
material_apoio/FannyAbramovich.pdf>. Acesso em: 24 jun. 2010.
CONDINI, P. Afinal, a formação de que leitor? Disponível em: < http://www.leiabrasil.org.
br/pdf/material_apoio/paulocondinni.pdf>. Acesso em: 24 jun. 2010.
FIORE, O. de. A formação do leitor: uma tarefa. Disponível em: <http://www.leiabrasil.
org.br/pdf/material_apoio/OttavianoFiore.pdf>. Acesso em: 24 jun. 2010.
FOLHA ONLINE/ 2009. Retratos da leitura no Brasil vira livro. Disponível em: <http://
www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u58816.shtml>. Acesso em: 18 jun. 2009.
INSTITUTO PRÓ-LIVRO. Retratos da leitura no Brasil. Disponível em: <www.prolivro.org.
br/ipl/publier4.0/dados/anexos/48.pdf>. Acesso em: 1 jul. 2010.
LISPECTOR, C. A hora da estrela. Disponível em: <http://www.livrosparatodos.net/livros-
resumos/a-hora-da-estrela.html>. Acesso em: 15 jul. 2008.
PASCHOAL E. J. Carta maior: arte & cultura. Disponível em: <http://www.ndc.uff.br/
portaldereferencia/noticias.asp?cod=1205>. Acesso em: 14 jul. 2008.
PASSIANI, E. Na trilha do Jeca: Monteiro Lobato e a formação do campo literário no Brasil.
Disponível em: <http://www.ifcs.ufrj.br/~nusc/enio.pdf>. Acesso em: 24 jun. 2010.
Sant’Ana, A. de R. Leitura: das armadilhas do óbvio ao discurso duplo/2006. Disponível
em: <http://www.gargantadaserpente.com/artigos / affonsoromano9.shtml>. Acesso
em: 14 jul. 2008.
SILVA, E. T. A formação do leitor no Brasil: novo/velho desafio. Disponível em: <http://
www.leiabrasil.org.br/pdf/material_apoio/ezequiel.pdf>. Acesso em: 24 jun. 2010.
Chamada numérica
1 – FOLHA ONLINE. Leitura no Brasil é uma "vergonha", diz "The Economist". Disponível
em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u58816.shtml>. Acesso em: 1
jul. 2010.
Lista de figuras
Figura 1 – Dois estudantes islâmicos por um ilustrador anônimo. In: MANGUEL, 1997, p.
13.
Figura 2 – Menino Jesus pregando no templo por discípulos de Martin Achongauer. In:
MANGUEL, 1997, p. 14.
Figura 3 – Uma cena na floresta por Hans Toma. In: MANGUEL, 1997, p. 17.
Figura 4 – Jorge Luís Borges por Eduardo Comesafia. In: MANGUEL, 1997, p.
2
1. OBJETIVOS
• Identificar as concepções de leitura e suas implicações na
prática pedagógica.
• Compreender a importância do leitor na construção do
sentido.
• Reconhecer o papel mediador do professor na formação
da capacidade leitora.
• Refletir sobre aspectos da leitura como objeto de ensino
e aprendizagem.
2. CONTEÚDOS
• Concepções de Leitura.
• A Leitura e o processo interativo: autor-texto-leitor- con-
texto.
• Reflexões sobre a Leitura como objeto de ensino.
52 © Metodologia do Ensino: Formação do Leitor
4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
Só aprendi a escrever muito tempo depois, aos sete anos de idade.
Talvez pudesse viver sem escrever, mas não creio que pudesse viver
sem ler. Ler — descobri — vem antes de escrever (MANGUEL, 1997,
p. 20).
5. O QUE É LEITURA?
Ler é uma palavra que tem origem no latim "legere". Segun-
do Graça Paulino (2001, p. 11-12), há três maneiras de defini-la: a
primeira significa "contar", "enumerar as letras", a segunda "co-
lher" e a terceira "roubar".
Na primeira, soletramos, repetimos os fonemas agrupando-
os em sílabas, palavras e frases. É o ato primeiro da leitura, o pri-
meiro estágio.
Na segunda, "colher" implica na ideia de algo já pronto, com-
preendendo a tradicional interpretação de texto em que se busca
um sentido determinado.
Na terceira, há uma ideia de subversão, não se rouba com o
conhecimento do proprietário, logo essa leitura se faz à revelia do
autor, ou seja, acrescenta aos textos novos sentidos, a partir das
marcas presentes nele. O leitor constrói o seu próprio caminho.
Segundo Koch e Elias (2006), a concepção de leitura decorre
da concepção de sujeito, de língua, de texto e de sentido. É por
meio da consideração de um elemento ou outro que damos res-
postas diferentes a questões básicas relacionadas à leitura: O que
é ler? Para que ler? Como ler?
Os autores nos apresentam três focos principais que revelam
diferentes concepções de leitura: foco no autor, no texto e na inte-
ração texto-autor-leitor.
Foco no autor
Nesta abordagem o sujeito-autor é visto como um ego que
constrói uma representação mental e deseja que essa representa-
ção seja captada pelo interlocutor da maneira como foi mentaliza-
da. Assim, temos uma concepção de língua como representação
do pensamento de quem escreve e de texto como um produto
lógico do pensamento do autor. Diante desse entendimento, cabe
ao leitor captar passivamente essa representação mental, sem se
levar em conta as suas experiências e os seus conhecimentos, a
interação autor-texto-leitor com propósitos constituídos sócio-
cognitivo-interacionalmente. O leitor é um captador das intenções
do autor.
Foco no texto
Se partirmos de uma concepção de língua como código pré-
determinado a que os leitores se sujeitam, o texto é visto como
simples produto da codificação de um emissor a ser decodificado
pelo leitor/ouvinte, bastando a este, para tanto, o conhecimento
do código utilizado. Ler, nesta perspectiva, é reconhecer o que está
dito no texto, o sentido das palavras e a estrutura do texto. Tanto
nessa perspectiva, quanto na primeira, a leitura é uma atividade
de reconhecimento e reprodução.
Leituras de Mundo–––––––––––––––––––––––––––––––––––––
"Ler as letras de uma página é apenas um de seus muitos disfarces. O astrôno-
mo lendo um mapa de estrelas que não existem mais; o arquiteto japonês lendo a
terra sobre a qual será erguida uma casa, de modo a protegê-la de forças malig-
nas; o zoólogo lendo os rastros de animais na floresta; o jogador lendo os gestos
do parceiro antes de jogar a carta vencedora; a dançarina lendo as notações do
coreógrafo e o público lendo os movimentos da dançarina no palco; o tecelão
lendo o desenho intrincado de um tapete sendo tecido; o organista lendo várias
linhas musicais simultâneas orquestradas na página; os pais vendo no rosto do
bebê sinais de alegria, medo ou admiração; o adivinho chinês lendo as marcas
antigas na carapaça de uma tartaruga; o amante lendo cegamente o corpo ama-
do à noite, sob os lençóis; o psiquiatra ajudando os pacientes a ler seus sonhos
perturbadores; o pescador havaiano lendo as correntes do oceano ao mergulhar
a mão na água; o agricultor lendo o tempo no céu — todos eles compartilham
com os leitores de livros a arte de decifrar e traduzir signos.
"[...] Todos lemos a nós e ao mundo a nossa volta para vislumbrar o que somos
e onde estamos. Lemos para compreender, ou para começar a compreender.
Não podemos deixar de ler. Ler, quase como respirar, é nossa função essencial.
Só aprendi a escrever, muito tempo depois, aos sete anos de idade. Talvez pu-
desse viver sem escrever, mas não creio que pudesse viver sem ler. Ler — des-
cobri — vem antes de escrever."
(MANGUEL, 1997, p. 19-20, grifo nosso).
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
© U2 – Concepções: leitura e leitor 57
em branco entre as palavras que compõem o texto. Para extrair uma mensa-
gem desse sistema de sinais brancos e pretos, apreendo primeiro o sistema de
uma maneira aparentemente errática, com olhos volúveis, e depois reconstruo
o código de sinais mediante uma cadeia conectiva de neurônios processadores
em meu cérebro, cadeia que varia de acordo com a natureza do texto que estou
lendo e impregna o texto com algo – emoção, sensibilidade física, intuição, co-
nhecimento, alma — que depende de quem sou eu e de como me tornei o que
sou. ‘Para compreender um texto’, escreveu dr. Merlin C. Wittrock na década de
1980, ‘nós não apenas o lemos, no sentido estrito da palavra: nós construímos
um significado para ele’. Nesse processo complexo, ‘os leitores cuidam do texto’.
Criam imagens e transformações verbais para representar seu significado. E o
que é mais impressionante: eles geram significado à medida que lêem, construin-
do relações entre seu conhecimento, sua memória da experiência, e as frases,
parágrafos e textos escritos’. Ler, então, não é um processo automático de cap-
turar um texto como um papel fotossensível captura a luz, mas um processo de
reconstrução desconcertante, labiríntico, comum e, contudo, pessoal."
(MANGUEL, 1997, p. 53-54, grifo nosso).
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
A descoberta da leitura–––––––––––––––––––––––––––––––––
"Aos quatro anos de idade descobri pela primeira vez que podia ler. Eu tinha vis-
to uma infinidade de vezes as letras que sabia (porque tinham me dito) serem os
nomes das figuras colocadas sob elas. O menino desenhado em grossas linhas
pretas, vestido com calção vermelho e camisa verde (o mesmo tecido vermelho
e verde de todas as outras imagens do livro, cachorros, gatos, árvores, mães
altas e magras), era também, de algum modo, eu percebia, as formas pretas e
rígidas embaixo dele, como se o corpo do menino tivesse sido desmembrado
em três figuras distintas: um braço e o torso, b; a cabeça isolada, perfeitamente
redonda, o; e as pernas bambas e caídas, y. Desenhei os olhos e um sorriso no
rosto redondo e preenchi o vazio do círculo do torso. Mas havia mais: eu sabia
© U2 – Concepções: leitura e leitor 61
que essas formas não apenas espelhava o menino acima delas, mas também
podiam me dizer exatamente o que o menino estava fazendo com os braços e as
pernas abertas. O menino corre, diziam as formas. Ele não estava pulando, como
eu poderia ter pensado, nem fingindo estar congelado no lugar, ou jogando um
jogo cujas regras e objetivos me eram desconhecidos. O menino corre.
E contudo essas percepções eram atos que podiam acontecer com um estalar
de dedos — menos interessantes porque alguém os havia realizado para mim.
Outro leitor — minha babá, provavelmente — tinha explicado as formas, e, ago-
ra, cada vez que as páginas revelavam a imagem daquele menino exuberante,
eu sabia o que significava as formas embaixo dele. Havia um prazer nisso, mas
cansou. Não havia nenhuma surpresa.
Então, um dia, da janela de um carro (o destino daquela viagem está agora es-
quecido), vi um cartaz na beira da estrada. A visão não pode ter durado muito;
talvez o carro tenha parado por um instante, talvez tenha apenas diminuído a
marcha, o suficiente para que eu lesse grandes, gigantescas, certas formas se-
melhantes as do meu livro, mas formas que eu nunca vira antes. E, contudo, de
repente eu sabia o que eram elas; escutei-as em minha cabeça, elas se meta-
morfosearam, passando de linhas pretas e espaços brancos a uma realidade só-
lida, sonora, significante. Eu tinha feito tudo aquilo sozinho. Ninguém realizara a
mágica para mim. Eu e as formas estávamos sozinhos juntos, revelando-nos em
um diálogo silencioso e respeitoso. Como conseguia transformar meras linhas
em realidade viva eu era todo-poderoso. Eu podia ler"
(MANGUEL, 1997, p. 17-18).
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Felicidade Clandestina–––––––––––––––––––––––––––––––––
Ela era gorda, baixa, sardenta e de cabelos excessivamente crespos, meio ar-
ruivados. Tinha um busto enorme, enquanto nós todas ainda éramos achatadas.
Como se não bastasse, enchia os dois bolsos da blusa, por cima do busto, com
balas. Mas possuía o que qualquer criança devoradora de histórias gostaria de
ter: um pai dono de livraria.
Pouco aproveitava. E nós menos ainda: até para aniversário, em vez de pelo me-
nos um livrinho barato, ela nos entregava em mãos um cartão-postal da loja do
pai. Ainda por cima era de paisagem do Recife mesmo, onde morávamos, com
suas pontes mais do que vistas. Atrás escrevia com letra bordadíssima palavras
como "data natalícia" e "saudade".
Mas que talento tinha para a crueldade. Ela toda era pura vingança, chupando
balas com barulho. Como essa menina devia nos odiar, nós que éramos imper-
doavelmente bonitinhas, esguias, altinhas, de cabelos livres. Comigo exerceu
com calma ferocidade o seu sadismo. Na minha ânsia de ler, eu nem notava as
humilhações a que ela me submetia: continuava a implorar-lhe emprestados os
livros que ela não lia.
Até que veio para ela o magno dia de começar a exercer sobre mim uma tortura
chinesa. Como casualmente, informou-me que possuía As reinações de Nari-
zinho, de Monteiro Lobato. Era um livro grosso, meu Deus, era um livro para
se ficar vivendo com ele, comendo-o, dormindo-o. E, completamente acima de
minhas posses. Disse-me que eu passasse pela sua casa no dia seguinte e que
ela o emprestaria.
Até o dia seguinte eu me transformei na própria esperança de alegria: eu não
vivia, nadava devagar num mar suave, as ondas me levavam e me traziam.
No dia seguinte fui à sua casa, literalmente correndo. Ela não morava num so-
brado como eu, e sim numa casa. Não me mandou entrar. Olhando bem para
meus olhos, disse-me que havia emprestado o livro a outra menina, e que eu
voltasse no dia seguinte para buscá-lo. Boquiaberta, saí devagar, mas em breve
a esperança de novo me tomava toda e eu recomeçava na rua a andar pulando,
que era o meu modo estranho de andar pelas ruas de Recife. Dessa vez nem
caí: guiava-me a promessa do livro, o dia seguinte viria, os dias seguintes seriam
mais tarde a minha vida inteira, o amor pelo mundo me esperava, andei pulando
pelas ruas como sempre e não caí nenhuma vez.
Mas não ficou simplesmente nisso. O plano secreto da filha do dono da livraria
era tranqüilo e diabólico. No dia seguinte lá estava eu à porta de sua casa, com
um sorriso e o coração batendo. Para ouvir a resposta calma: o livro ainda não
estava em seu poder, que eu voltasse no dia seguinte. Mal sabia eu como mais
tarde, no decorrer da vida, o drama do "dia seguinte" com ela ia se repetir com
meu coração batendo.
E assim continuou. Quanto tempo? Não sei. Ela sabia que era tempo indefinido,
enquanto o fel não escorresse todo de seu corpo grosso. Eu já começara a adi-
vinhar que ela me escolhera para eu sofrer, às vezes adivinho. Mas, adivinhando
mesmo, às vezes aceito: como se quem quer me fazer sofrer esteja precisando
danadamente que eu sofra.
Quanto tempo? Eu ia diariamente à sua casa, sem faltar um dia sequer. Às vezes
ela dizia: pois o livro esteve comigo ontem de tarde, mas você só veio de manhã,
de modo que o emprestei a outra menina. E eu, que não era dada a olheiras,
sentia as olheiras se cavando sob os meus olhos espantados.
© U2 – Concepções: leitura e leitor 73
Até que um dia, quando eu estava à porta de sua casa, ouvindo humilde e silen-
ciosa a sua recusa, apareceu sua mãe. Ela devia estar estranhando a aparição
muda e diária daquela menina à porta de sua casa. Pediu explicações a nós
duas. Houve uma confusão silenciosa, entrecortada de palavras pouco elucidati-
vas. A senhora achava cada vez mais estranho o fato de não estar entendendo.
Até que essa mãe boa entendeu. Voltou-se para a filha e com enorme surpresa
exclamou: mas este livro nunca saiu daqui de casa e você nem quis ler!
E o pior para essa mulher não era a descoberta do que acontecia. Devia ser a
descoberta horrorizada da filha que tinha. Ela nos espiava em silêncio: a potên-
cia de perversidade de sua filha desconhecida e a menina loura em pé à porta,
exausta, ao vento das ruas de Recife. Foi então que, finalmente se refazendo,
disse firme e calma para a filha: você vai emprestar o livro agora mesmo. E para
mim: "E você fica com o livro por quanto tempo quiser." Entendem? Valia mais
do que me dar o livro: "pelo tempo que eu quisesse" é tudo o que uma pessoa,
grande ou pequena, pode ter a ousadia de querer.
Como contar o que se seguiu? Eu estava estonteada, e assim recebi o livro na
mão. Acho que eu não disse nada. Peguei o livro. Não, não saí pulando como
sempre. Saí andando bem devagar. Sei que segurava o livro grosso com as duas
mãos, comprimindo-o contra o peito. Quanto tempo levei até chegar em casa,
também pouco importa. Meu peito estava quente, meu coração pensativo.
Chegando em casa, não comecei a ler. Fingia que não o tinha, só para depois
ter o susto de o ter. Horas depois abri-o, li algumas linhas maravilhosas, fechei-o
de novo, fui passear pela casa, adiei ainda mais indo comer pão com manteiga,
fingi que não sabia onde guardara o livro, achava-o, abria-o por alguns instan-
tes. Criava as mais falsas dificuldades para aquela coisa clandestina que era a
felicidade. A felicidade sempre ia ser clandestina para mim. Parece que eu já
pressentia. Como demorei! Eu vivia no ar... Havia orgulho e pudor em mim. Eu
era uma rainha delicada.
Às vezes sentava-me na rede, balançando-me com o livro aberto no colo, sem
tocá-lo, em êxtase puríssimo.
Não era mais uma menina com um livro: era uma mulher com o seu amante.
LISPECTOR, Clarice. In: "Felicidade Clandestina" - Ed. Rocco - Rio de Janeiro,
1998.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
9. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS
Sugerimos que você organize um quadro no qual registre as
principais ideias que foram discutidas nesta unidade:
Concepção de Leitura Fundamentos teóricos Implicação pedagógica
Modelo ascendente/ decodificação
Modelo descendente/leitor-texto
Interação autor-texto-leitor-
contexto
Leitura: atividade discursiva
Seu tutor não irá corrigir essa atividade, será apenas uma
forma de você sistematizar o que estudou. A autoavaliação pode
ser uma ferramenta importante para você refletir sobre seu pró-
prio processo de aprendizagem.
10. CONSIDERAÇÕES
Neste nosso percurso, destacamos a importância da leitu-
ra como uma atividade que solicita a intensa participação do lei-
tor na construção do sentido, ou seja, que pressupõe a interação
autor-texto-leitor-contexto. Contudo, compreender não precisa,
necessariamente, ser um ato em que os conhecimentos do texto
e do leitor coincidam, mas, sim, um ato no qual possam interagir
dinamicamente.
A leitura não acontece fora da realidade social do leitor, pois,
como vimos na unidade anterior, ler possui diferentes concepções
de acordo com o contexto cultural e histórico no qual este ato está
envolvido, pois os elementos envolvidos na leitura (autor-texto-
-leitor-contexto) estão contextualizados numa determinada situa-
ção, momento histórico, campo ideológico e crença etc. Num ato
de leitura, uma pessoa pode entender mais do que outra, já que a
compreensão dependerá também dos conhecimentos individuais
que cada sujeito construiu ao longo de sua história de vida.
Desse modo, é abrindo espaços para uma leitura interativa e
discursiva que a escola pode formar leitores capazes de "atos de lei-
tura", e não simplesmente leitores com "hábitos de leitura" que, por
serem mecanizados, são abandonados logo que deixam a escola.
11. E-REFERÊNCIAS
LARROSA, Jorge. La Experiência de La Lectura. Barcelona: Laertes, 1996, p. 16. In: SILVA,
Ezequiel T. A formação do leitor no Brasil: o novo/velho desafio. Disponível em: <http://
www.leiabrasil.org.br/doc/doc_suporte/doc_simposio/defesa_soledad.doc>. Acesso
em: 24 jun. 2010.
MORTATTI, M. R. L. Armadilhas discursivas da leitura: contra a ditadura da idiotia.
Disponível em: <www.alb.com.br/anais16/conferencias/07mariadorosariomortatti.
pdf>. Acesso em: 24 jun. 2010.
PEREIRA. Discutindo a leitura de alunos surdos. Disponível em: <http://cape.edunet.
sp.gov.br/textos/textos/4.doc>. Acesso em: 1 jun. 2010.
SILVA. Wagner Rodrigues. Resenha. Disponível em: <www.abralin.org/revista/RV6N2/13_
resenha_wagner.pdf>. Acesso em: 2 jul. 2010
© U2 – Concepções: leitura e leitor 77
2. CONTEÚDOS
• Importância da leitura no contexto familiar.
• Análises práticas de leituras desenvolvidas em sala de
aula.
• Possibilidades de atuação docente na mediação da leitura.
80 © Metodologia do Ensino: Formação do Leitor
4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
[...] o leitor é caçador que efetua saques em campos alheios, ten-
tando assim acalmar sua fonte de sentidos e significações. A errân-
cia é seu destino já que onde vislumbra novos sentidos lá está ele
pronto para um novo saque. (CERTEAU; PERROTTI, 1999, p. 32).
5. FAMÍLIA E LEITURA
Sabemos que é primordial a influência da família na aprendi-
zagem e na formação do indivíduo como ser social. A família exer-
Entourage––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Entourage: as pessoas que nos rodeiam, com quem convivemos; esfera ou meio
em que se vive; roda (Cf. Aurélio, 2004).
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
sobretudo e para sempre, de como eu torcia por aquele herói que queria conser-
tar todos os erros do mundo, ajudar todos os sofredores, defender todos os opri-
midos. Em seu esforço para lutar pela justiça e garantir a liberdade, o fidalgo não
hesitava em enfrentar os mais tremendos monstros, os mais pérfidos feiticeiros
e os mais poderosos encantamentos. Nunca desanimava, mesmo tomando cada
surra terrível, quando esses perigos ameaçadores se revelavam apenas alguma
coisa comum, dessas que a gente encontra a toda hora no mundo. E então as
pessoas achavam que Dom Quixote era maluco, riam dele...
Eu não ria. Metade de mim queria avisar o cavaleiro: "Fique quieto no seu canto,
não vá lá não, não, porque não é nada disso que você está pensando..." A outra
metade queria ser igual a ele. Até hoje.
(MACHADO, 2002, p. 7-10)
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Biblioteca Verde–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Papai, me compra a Biblioteca Internacional
de Obras Célebres
São só 24 volumes encadernados
em percalina verde.
Meu filho, é livro demais para uma criança-
Compra assim mesmo, pai, eu cresço logo.
Quando crescer eu compro. Agora não.
Papai, me compra agora. É em percalina verde,
só 24 volumes. Compra, compra, compra.
Fica quieto, menino, eu vou comprar.
Passo de cágado
Vagarosamente, a passo de cágado, vão sendo instaladas as condutas reprodu-
toras da leitura: a imitação, a contemplação passiva, a cópia, o recolhimento na
solidão, o ócio descompromissado, a ficha padronizada, a resposta ao questio-
nário (igual à do livro didático). A passo de cágado e na tortura da redundância,
os estudantes passam a detestar qualquer tipo de leitura. O retalho de texto, o
texto sem contexto, só um tipo de texto, o texto e o teste, a lição sem o texto ou
só com gravura, o texto fino, o texto curto, tudo isso como pretexto para o consu-
mo rápido, acrítico e asséptico de doses homeopáticas de informações. A leitura
sem substância, sem significado, sem seqüência, sem unidade e sem aprofunda-
mento. A passo de cágado, o leitor fornece passivamente respostas a estímulos
a fim de contentar as exigências das provas bimestrais e "ai de quem não ler!". A
passo de cágado, de série para série, de ano para ano, e na monotonia curricular
cotidiana, irrompe paulatinamente e a pauladas a morte da curiosidade do leitor.
© U3 – Formação da capacidade leitora: família e escola 93
Passo incerto
Se não se estriba na muleta chamada livro didático, não sabe o que fazer na
sala de aula. Se não se repete sempre as mesmas ladainhas ou mazelas peda-
gógicas, as gramatiquices, as fichas padronizadas de leitura, as interpretações
cristalizadas no tempo, os protocolos autoritários da leitura escolar, não sabe o
que colocar no lugar. Algumas reflexões recentes apontam para o fato de que
o professor lê muito menos do que os alunos. Passo incerto... O repertório de
leitura do professor ou parou no tempo por falta de condições de atualização,
ou nunca se formou ao longo de sua própria escolaridade. Passo incerto... Em
uma visita que fiz recentemente ao curso noturno de uma faculdade particular,
o professor responsável me perguntou se existia um método milagroso para dar
aula prática de língua portuguesa a uma classe de "apenas" 130 alunos. Passo
incerto: a leitura escolar oscila entre nada e coisa nenhuma, institucionalizando a
ignorância — os cursinhos que o digam! Daí talvez o grande sucesso da Editora
Brasiliense ao lançar aquela coleção chamada Primeiros passos... dos passos
incertos, cegos e ignorantes, aos primeiros passos — isso parece um bom mo-
vimento na medida em que já aponta para a superação do passo de ganso e do
passo de cágado, mencionados anteriormente.
Passos largos
Outros propósitos devem orientar a leitura no contexto escolar: parar de ler para
memorizar normas gramaticais ou conteúdos cristalizados ou superficializantes
e, a passos largos, começar a ler para compreender esta nossa sociedade e para
nos compreendermos criticamente dentro dela; parar de ler somente às vésperas
de exames ou datas comemorativas a fim de reproduzir comportamentos fecha-
dos e não criativos e, a passos largos, começar a ler para descobrir os porquês
dos diferentes aspectos da vida. A passos largos, ir desautomatizando, ir desro-
tinizando os protocolos conservadores que regem a leitura em todos os graus de
ensino deste país. E tudo isso deve estar ancorado numa concepção de leitura
que não veja como simples resposta passiva e mecânica, bem à moda behavio-
rista, mas, a passos largos, considere-a enquanto um processo dinamizador da
produção de sentidos por um grupo de pessoas, enquanto transação ou intera-
ção entre leitor e diferentes tipos de texto. A passos largos é preciso que se saiba
traduzir essa concepção de leitura em programas significativos de ensino, que
resultem na transformação, na emancipação, na libertação dos leitores. A passos
largos devem-se combater com todas as forças a tendência corrente de entender
o ato pedagógico unicamente como sinônimo de leitura. O ato pedagógico envol-
ve, sim, leitura da realidade e de textos que expressam a realidade, mas esse ato
não pode ser entendido de forma tão mesquinha ou estreita. O ato pedagógico
é muito mais abrangente e complexo. Tem, na base, o diálogo entre professor e
aluno e, no horizonte, os vários campos da cultura e do conhecimento. A leitura,
sem dúvida, ajuda nas caminhadas em direção àquele horizonte, mas leitura não
é tudo. A passos largos, temos de imediatamente construir uma atmosfera de
interlocução nas salas de aula, para que as atividades de ler não ofusquem as
atividades de falar, discutir, contar, debater, ouvir, escrever, etc. Atividades que,
frontalmente e a passos largos, podem destruir a pedagogia do silêncio em nos-
sas escolas e permitir que as vozes dos sujeitos estudantes possam ser cruza-
das, intercambiadas em esquemas de comunicação autêntica, menos artificiais,
postiços, conservadores e autoritários."
(SILVA, Ezequiel Theodoro da. Produção da Leitura na Escola. São Paulo: Ática,
2004, pp. 11 a 14. Palestra apresentada na I Jornada Estadual de Educação,
promovida pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras Imaculada Conceição.
Santa Maria (RS), 27-10-1989. ).
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
O autor francês Daniel Pennac nos diz que o verbo LER não
suporta imperativos, ou seja, é impossível obrigar alguém a ler. Ele
levanta um questionamento básico para o professor: "Como é que
a gente obriga alguém a amar, a gostar?".
Dentro dessa visão, ele nos apresenta os direitos imprescri-
tíveis do leitor:
Os direitos do leitor––––––––––––––––––––––––––––––––––––
"Em matéria de leitura, nós, os leitores, nos concedemos todos os direitos, a
começar pelos que recusamos a essa gente jovem que pretendemos iniciar na
leitura:
O direito de não ler.
O direito de pular páginas.
O direito de não terminar um livro.
O direito de reler.
O direito de ler qualquer coisa.
O direito ao bovarismo.
O direito de ler em qualquer lugar.
O direito de ler uma frase aqui e outra ali.
O direito de ler em voz alta.
O direito de calar. (...)
Porque, se quisermos que um filho ou uma filha ou que os jovens leiam, é urgen-
te lhes conceder os direitos que proporcionamos a nós mesmos.
O direito de não ler
Como toda enumeração de "direitos" que se preze, esta dos direitos a leitura
deveria começar pelo direito de não ser usado — no caso, o direito de não ler —,
sem o que não se trataria de uma lista de direitos, mas uma viciosa armadilha.
A maior parte dos leitores se concede cotidianamente o direito de não ler.
Sem macular nossa reputação, entre um bom livro e um telefilme ruim, o segun-
do muitas vezes ganha, mesmo que preferíssemos confessar ser o primeiro.
Além disso, não lemos continuamente. Nossos períodos de leitura se alternam
muitas vezes com longas dietas, em que até a visão de um livro desperta os
miasmas da indigestão."
(PENNAC. In: Programa de Formação de Professores Alfabetizadores, 2003,
Módulo I, M1U4T6).
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
9. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS
Como vimos, ler exige posicionar-se sobre o lido numa pos-
tura compreensiva e responsiva. Utilize suas anotações (de acordo
© U3 – Formação da capacidade leitora: família e escola 103
10. CONSIDERAÇÕES
Nesta unidade, compreendemos como o papel da família e do
professor são de fundamental importância na formação do leitor.
Pais e filhos podem partilhar experiências afetivas em rela-
ção à descoberta do mundo dos livros. Por meio de atividades lú-
dicas de folhear livros, ouvir e contar histórias, a criança percebe
desde muito cedo que o livro é uma coisa boa e que dá prazer. O
partilhar experiências de leitura no contexto familiar pode fazer
parte de momentos especiais em que a fantasia de "curtir juntos"
uma história desperte um prazer de ler duradouro e significativo.
Em contrapartida, pais que, às vezes, não têm condições de
desfrutar o prazer da leitura com seus filhos podem mudar seu
comportamento se forem apoiados e incentivados pela escola, por
projetos sociais e governamentais.
A escola, embora tenha dentre as suas funções a de capaci-
tar o aluno para a leitura e de transmitir conhecimento, precisa ul-
trapassar a leitura escolarizada em que o texto é entendido como
possuidor de um sentido único e considerar outras possibilidades
11. E-REFERÊNCIAS
ABRAMOVICH, F. Formação do Leitor. Disponível em: <http://www.leiabrasil.org.br/
index.aspx?leia=publicações_livros>. Acesso em: 23 nov. 2007.
ANDRADE, C. D. Disponível em: <http://br.geocities.com/ poesiaeterna/poetas/brasil/
carlosdrummonddeandrade.htm#Biblioteca%20Verde>. Acesso em: 4 nov. 2007.
PRADO, I. G. A. Para formar leitores na escola. Disponível em: <www.leiabrasil.org.br/
index.aspx?leia=publicacoes_livros>. Acesso em: 28 nov. 2007.
ROCCO, M. T. Leitor, leitura, escola: uma trama plural. Disponível em: <www.leiabrasil.
org.br/index.aspx?leia=publicacoes_livros>. Acesso em: 28 nov. 2007.
Chamada numérica
1 – BRASIL. Programa de formação de professores alfabetizadores. Disponível em: 2 jul.
2010.
2 – BACICHETTE, H. C. C. A importância do professor-leitor na formação do aluno-leitor .
Disponível em: <www.caxias.rs.gov.br/_uploads/educacao/midiateca_523.pdf>. Acesso
em: 2 jul. 2010.
2. CONTEÚDOS
• A leitura do texto escrito e sua mediação.
• Objetivos da leitura.
• Estratégias de leitura.
108 © Metodologia do Ensino: Formação do Leitor
4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
Eu começaria a dizer que o texto é uma "peça" de linguagem, uma
peça que representa uma unidade significativa (ORLANDI, 1996, p.
52).
O conhecimento prévio
Para que tenha êxito na leitura, o leitor deve acionar todos
os esquemas de conhecimento pertinentes a um texto concreto:
seu conhecimento do assunto, da situação comunicativa (interlo-
cutores, canais, objetivos, finalidades etc.), da organização do gê-
nero, da estrutura linguística etc. Um dos primeiros aspectos en-
volvidos na compreensão de um texto é o "conhecimento prévio"
do leitor, tanto sobre o escrito quanto sobre o mundo. Kleiman
(2004) define-o como todo o conhecimento adquirido ao longo da
vida, especificando-o em:
• Conhecimento linguístico
O conhecimento linguístico tem um papel fundamental na
compreensão de um texto. Embora implícito, pode ser aquele que
temos como falantes nativos de uma língua, abrangendo desde "o
conhecimento sobre como pronunciar o português, passando pelo
conhecimento de vocabulário de regras da língua, chegando até o
conhecimento sobre o uso da língua" (KLEIMAN, 2004, p. 13). Co-
lomer e Camps (2002) especificam esses conhecimentos como: o
conhecimento sobre a situação comunicativa, sobre o texto escrito
(paralinguísticos; das relações grafofônicas; morfológicos, sintáti-
cos e semânticos; textuais).
© U4 – Aspectos envolvidos na compreensão do texto escrito 111
do, este existe. Por exemplo, a leitura de um poema pode ter como
objetivo simplesmente o prazer estético.
• Conhecimento de mundo
O conhecimento de mundo pode tanto ser adquirido infor-
malmente quanto formalmente. Se um aluno já possui vivências
ou informações sobre um determinado assunto tratado em um
texto, sua compreensão fica facilitada. Kleiman (2004, p. 23) afir-
ma que "O conhecimento parcial, estruturado que temos na me-
mória sobre assuntos, situações, eventos típicos de nossa cultura
é chamado de esquema". Essa autora observa que a existência
desse esquema influencia diretamente em nossa compreensão,
exemplificando que já sabemos o que vamos encontrar em um su-
permercado ou em um livro de suspense.
Afirmam Schank e Abelson (1977) apud Colomer e Camps
(2002, p. 54):
As pessoas necessitam de uma grande quantidade de conhecimen-
tos para poder compreender. [A compreensão é] um processo pelo
qual as pessoas relacionam o que vêem ou ouvem [ou leem] com
grupos de ações pré-armazenadas que experimentam previamen-
te. [...] A nova informação é entendida nos termos da antiga.
Texto proposto––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Os dois garotos correram até a entrada da casa.
—- Veja, eu disse a você que hoje era um bom dia para brincar aqui – disse
Eduardo. — Mamãe nunca está em casa na quinta-feira — ele acrescentou.
Altos arbustos escondiam a entrada da casa; os meninos podiam correr no
jardim extremamente bem cuidado.
— Eu não sabia que sua casa era tão grande – disse Marcos.
— É, mas ela está mais bonita agora, desde que meu pai mandou revestir com
pedras essa parede lateral e colocou a lareira.
Havia portas na frente e atrás e uma porta lateral que levava à garagem, que
estava vazia, exceto pelas três bicicletas com marchas, guardadas ali. Eles
entraram pela porta lateral. Eduardo explicou que a porta sempre ficava aberta
para suas irmãs mais novas entrarem e saírem sem dificuldade.
Marcos queria ver a casa, então Eduardo começou a mostrá-la pela sala de
estar. Estava recém-pintada, como o resto do primeiro andar. Eduardo ligou o
som. O barulho preocupou Marcos.
— Não se preocupe, a casa mais próxima está a meio quilômetro daqui.
Marcos se sentiu mais confortável ao observar que nenhuma casa podia ser
vista em qualquer direção, além do enorme jardim.
A sala de jantar, com toda a porcelana, prata e cristais, não era lugar para
brincar; os garotos foram para a cozinha onde fizeram um lanche.
Eduardo disse que não era para usar o lavabo porque estava úmido e mofado,
uma vez que o encanamento arrebentara.
— Aqui é onde meu pai guarda suas coleções de selos e moedas raras — disse
Eduardo enquanto eles davam uma olhada no escritório. Além do escritório,
havia três quartos no andar superior da casa.
Eduardo mostrou a Marcos o closet de sua mãe cheio de roupas e o cofre
trancado onde havia jóias. O quarto de suas irmãs não era tão interessante,
exceto pela televisão e o Atari. Eduardo comentou que o melhor de tudo era que
o banheiro do corredor era seu desde que um outro foi construído no quarto
de suas irmãs. Não era tão bonito como o de seus pais que era revestido de
mármore, mas para ele era a melhor coisa do mundo.
Extraído do livro:
KLEIMAN, Ângela. Texto e Leitor: aspectos cognitivos da leitura. Campinas/ SP:
Pontes, 2004, p. 31 e 32.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Agora procure lembrar-se do que leu. Do que conseguiu lem-
brar-se? Nada? Alguns aspectos relevantes do texto? Você deve
ter se lembrado de poucos detalhes do texto. Essa proposta de
leitura sem objetivo, descompromissada foi de propósito para que
perceba a importância de uma leitura guiada por um objetivo. Va-
mos propor a você uma outra forma de leitura.
• 2ª Proposta: faça uma leitura do mesmo texto, posicio-
nando-se como um possível comprador da casa descrita.
O texto é uma descrição da casa que pretende comprar,
enviada a você pelo seu corretor. Retorne ao texto e faça
uma nova leitura. Procure identificar e guardar na memó-
ria o que seria relevante para a compra da casa. Não con-
tinue seus estudos sem antes realizar essa tarefa.
Que dados observou? Na pesquisa, observa-se que o grupo
que leu o texto com esse objetivo conseguiu lembrar-se do tama-
nho da casa, do número de cômodos, do tamanho do jardim, do
revestimento de pedra, da lareira, da pintura nova, do número de
banheiros, do mármore no banheiro, do closet no quarto do casal,
da garagem etc. Como deve ter percebido, lembrou-se de muitos
mais dados que na leitura sem objetivo.
• 3ª Proposta: agora, leia o texto colocando-se no lugar de
uma pessoa que tem interesse em assaltar a residência.
© U4 – Aspectos envolvidos na compreensão do texto escrito 119
7. SEQUÊNCIA DIDÁTICA
Antes da Leitura:
c) Durante a leitura:
Os objetivos que o leitor tem com a leitura mobilizam diferentes
estratégias de abordagem do texto.
Algumas "dicas" de um leitor mais experiente podem ser valiosas
para ajudar um leitor iniciante a construir os sentidos do texto.
Estimular a compreensão global do texto em contextos de leitura
autônoma ou compartilhada, a partir da observação de indicadores
como o léxico, a situação enunciativa, as conexões entre os enun-
ciados, as relações intertextuais etc.
Identificar a organização composicional do gênero a que pertence
o texto (RASGA, 2010).
1º momento: –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Cheguei em casa carregando a pasta cheia de papéis, relatórios, estudos, pes-
quisas, propostas, contratos. Minha mulher, jogando paciência na cama, com um
copo de uísque na mesa de cabeceira, disse, sem tirar os olhos das cartas, você
está com um ar cansado. Os sons da casa: minha filha no quarto dela treinando
impostação de voz, a música quadrifônica do quarto do meu filho. Você não vai
largar essa mala?, perguntou minha mulher, tira essa roupa, bebe um uisquinho,
você precisa aprender a relaxar.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Antecipações e inferências:
• Você pode deduzir a classe social dessa família?
• Como você acha que o pai se relaciona com a mulher? E
com os filhos?
• Observe que o homem vem carregado de papéis e a mu-
lher está jogando paciência. O que você pensa disso?
• As pessoas estão cada uma num espaço da casa. Como
você imagina que seja o relacionamento da família?
2º momento––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Fui para a biblioteca, o lugar da casa onde gostava de ficar isolado e como sem-
pre não fiz nada. Abri o volume de pesquisas sobre a mesa, não via as letras e os
números, eu esperava apenas. Você não para de trabalhar, aposto que os teus
sócios não trabalham nem a metade e ganham a mesma coisa, entrou minha
mulher na sala com o copo na mão, já posso mandar servir o jantar?
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Verificando as hipóteses anteriores e levantando novas hipóteses:
• E aí? Que ideia sua se confirmou?
• Já é a terceira vez que o autor cita a bebida e o copo na
© U4 – Aspectos envolvidos na compreensão do texto escrito 125
3º momento––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
A copeira servia à francesa, meus filhos tinham crescido, eu e minha mulher es-
távamos gordos. É aquele vinho que você gosta, ela estalou a língua com prazer.
Meu filho me pediu dinheiro quando estávamos no cafezinho, minha filha me
pediu dinheiro na hora do licor. Minha mulher nada me pediu, nós tínhamos conta
bancária conjunta. Vamos dar uma volta de carro?, convidei.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Checando as hipóteses anteriores e levantando novas:
• Acertou ou errou o que estava pensando?
• O que é servir à francesa? Essa expressão já nos permite
dizer que se trata de uma família de classe alta?
• Que dados do texto nos permitem dizer que os membros
da família não se relacionam afetivamente?
• O marido convida a mulher para um passeio. Será que a
mulher vai passear com ele? Será que vão discutir sobre
onde passear? Será que ela vai querer ir a um bar? O que
acham?
4º momento––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Eu sabia que ela não ia, era hora da novela. Não sei que graça acha em passear
de carro todas as noites, também aquele carro custou uma fortuna, tem que ser
usado, eu é que cada vez me apego menos aos bens materiais, minha mulher
respondeu.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
5º momento––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Os carros dos meninos bloqueavam a porta da garagem, impedindo que eu tiras-
se o meu. Tirei os carros dos dois, botei na rua, tirei o meu, botei na rua, coloquei
os dois carros novamente na garagem, fechei a porta, essas manobras todas
me deixaram levemente irritado, mas ao ver os para-choques salientes do meu
carro, o reforço especial duplo de aço cromado, senti o coração bater apressado
de euforia. Enfiei a chave na ignição, era um motor poderoso que gerava a sua
força em silêncio, escondido no capô aerodinâmico.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Checando hipóteses e levantando novas hipóteses:
• Parece que esse carro tem um para-choques bem resis-
tente e um motor potente. Por que seu para-choques tem
um reforço especial de aço cromado? Para que ele precisa
de um carro com o motor poderoso? Será que ele é um
corredor?
• O narrador parece ter adoração pelo carro. Por que será
que ele está tão eufórico? Aonde vai esse homem, depois
de um dia de trabalho, com um carro tão poderoso? E o
capô aerodinâmico?
6º momento––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Saí, como sempre sem saber para onde ir, tinha que ser uma rua deserta, nesta
cidade que tem mais gente que moscas. Na avenida Brasil, ali não podia ser,
muito movimento.
© U4 – Aspectos envolvidos na compreensão do texto escrito 127
Cheguei numa rua mal iluminada, cheia de árvores escuras, o lugar ideal. Homem
ou mulher? Realmente não fazia grande diferença, mas não aparecia ninguém
em condições, comecei a ficar tenso, isso sempre acontecia, eu até gostava, o
alívio é maior.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Levantando hipóteses e inferências:
• Homem ou mulher? O que vocês estão pensando? Seria
ele um homossexual?
• Você sabe onde fica a Avenida Brasil?
• Por que o que ele vai fazer não pode ser em lugar movi-
mentado? Por que uma rua mal iluminada seria o ideal?
• O que seria uma pessoa em condições? Condições de
quê? Por que será que ele está tenso?
7º momento––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Então vi a mulher, podia ser ela, ainda que mulher fosse menos emocionante
por ser mais fácil. Ela caminhava apressadamente, carregando um embrulho de
papel ordinário, coisas de padaria ou de quitanda, estava de saia e blusa, andava
depressa, havia árvores na calçada, de vinte em vinte metros, um interessante
problema a exigir uma dose de perícia.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Sem esclarecimentos ainda dos fatos, vamos a reformulações de
hipóteses e inferências:
• E agora? O que pensam que este homem vai fazer? Por
que mulher é mais fácil?
• É uma mulher fina? Observem que ela carrega embrulho
de papel ordinário, coisas de padaria.
• Por que as árvores de 20 em 20 metros seriam um pro-
blema? Que perícia seria essa que essa distância entre as
árvores exige? Será que ele vai convidar a mulher para
entrar no carro? Vocês acham que ela aceita?
8º momento––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Apaguei a luzes do carro e acelerei. Ela só percebeu que eu ia para cima dela
quando ouviu o som da borracha dos pneus batendo no meio-fio. Pequei a mu-
lher bem acima dos joelhos, bem no meio das duas pernas, um pouco mais
sobre a esquerda, um golpe perfeito, ouvi o barulho do impacto partindo os dois
ossões, dei uma guinada rápida para a esquerda, passei como um foguete rente
a uma das árvores e deslizei com os pneus cantando, de volta para o asfalto.
Motor bom o meu, ia de zero a cem quilômetros em nove segundos. Ainda deu
para ver que o corpo todo desengonçado da mulher havia ido parar, colorido de
sangue, em cima do muro, desses baixinhos de casa de subúrbio.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
9º momento: –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Examinei o carro na garagem. Corri orgulhosamente a mão de leve pelos parala-
mas, os parachoques sem marca. Poucas pessoas, no mundo inteiro, igualavam
minha habilidade no uso daquelas máquinas, A família estava vendo televisão.
Deu sua voltinha, agora está mais calmo?, perguntou minha mulher, deitada no
sofá, olhando fixamente o vídeo. Vou dormir, boa noite a todos, respondi, ama-
nhã vou ter um dia terrível na companhia.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
roto assustado puxado por seu pai, um guarda com uma velhinha e
um rapaz tranquilo que aparentemente me conhecia, pois disse um
"oi, tudo sob controle aí?" e foi embora.
Nesse momento, comecei a entender como o trágico mora perto
do cômico! Aos poucos, consegui chegar a uma padaria que rece-
bia quase todo mundo que escapava. Tomei um conhaque e, como
bom brasileiro, fiquei trocando idéias e procurando soluções para
os problemas do mundo com meus novos amigos...
(HAILER. In: CÓCCO;1995, p. 38).
Fragmentos textuais–––––––––––––––––––––––––––––––––––
(10) "Para não carregar nas tintas do pessimismo, dizendo que este País é, ou
está, inteiramente desacreditado, convém dizer, simplesmente, que se trata de
um País incrível. Em termos freudianos, o oswaldiano país sem pecado deliberou
reger-se pelo princípio do prazer, arredando a todo custo e preço as interferên-
cias do princípio da realidade. O único mal é que há limite para esse bovarismo,
para a abertura do ângulo entre o sonho e a realidade: Além dele, corre-se o risco
de mergulhar nos terrores da esquizofrenia e da alienação".
(11) "É uma miniatura urbanística: a rua, a praça, os edifícios. Rígida ossada
alvacenta de concreto, ruínas cenográficas construídas para o presente, certa-
mente servirá de cenário para muito filme. D. W. Griffith o teria adorado, para ele
rodar, de um balão cativo, as cenas babilônicas de seu "Intolerância"; e Wyler
não teria hesitado em transformá-lo naquele Circo Máximo romano, onde Charl-
ton Heston/Bem Hur se celebrizou numa emocionante corrida de quadrigas.
(12) Trata-se de uma arquitetura nostálgica, dos anos 50, especialmente o seu
repuxo congelado, de gosto duvidoso, nascido dos muitos arcos que naquele
período enfeitaram, ou enfeiaram, cidades e feiras internacionais. Uma obra cuja
concepção estática do espaço físico, escultura útil-urbanística, ignora a dinâmica
do espaço atual, estruturado mais segundo vetores de natureza eletrônica, do
que segundo nervuramentos sólidos."
KLEIMAN (2004, p. 57)
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
© U4 – Aspectos envolvidos na compreensão do texto escrito 133
Leitura colaborativa
A leitura colaborativa é uma atividade em que o professor lê um texto com a clas-
se e, durante a leitura, questiona os alunos sobre os índices lingüísticos que dão
sustentação aos sentidos atribuídos. É uma excelente estratégia didática para
o trabalho de formação de leitores, principalmente para o tratamento dos textos
que se distanciem muito do nível de autonomia dos alunos. É particularmente
importante que os alunos envolvidos na atividade possam explicitar os procedi-
mentos que utilizam para atribuir sentido ao texto: como e por quais pistas lingü-
ísticas lhes foi possível realizar tais ou quais inferências, antecipar determinados
acontecimentos, validar antecipações feitas etc. A possibilidade de interrogar o
texto, a diferenciação entre realidade e ficção, a identificação de elementos que
veiculem preconceitos e de recursos persuasivos, a interpretação de sentido fi-
gurado, a inferência sobre a intenção do autor, são alguns dos aspectos dos
conteúdos relacionados à compreensão de textos, para os quais a leitura colabo-
rativa tem muito a contribuir. A compreensão crítica depende em grande medida
desses procedimentos.
Leitura em voz alta pelo professor
Além das atividades de leitura realizadas pelos alunos e coordenadas pelo pro-
fessor, há as que podem ser realizadas basicamente pelo professor. É o caso da
leitura compartilhada de livros em capítulos que possibilita ao aluno o acesso a
textos longos (e às vezes difíceis) que, por sua qualidade e beleza, podem vir a
encantá-lo, mas que, talvez, sozinho não o fizesse.
A leitura em voz alta feita pelo professor não é prática comum na escola. E, quan-
to mais avançam as séries, mais incomum se torna, o que não deveria acontecer,
pois, muitas vezes, são os alunos maiores que mais precisam de bons modelos
de leitores.
Leitura programada
A leitura programada é uma situação didática adequada para discutir coletiva-
mente um título considerado difícil para a condição atual dos alunos, pois permite
reduzir parte da complexidade da tarefa, compartilhando a responsabilidade. O
professor segmenta a obra em partes em função de algum critério, propondo a
leitura seqüenciada de cada uma delas. Os alunos realizam a leitura do trecho
combinado, para discuti-lo posteriormente em classe com a mediação do pro-
fessor. Durante a discussão, além da compreensão e análise do trecho lido, que
poderá facilitar a leitura dos trechos seguintes, os alunos podem ser estimulados
a antecipar eventuais rumos que a narrativa possa tomar, criando expectativas
para a leitura dos segmentos seguintes. Também durante a discussão, o pro-
fessor pode introduzir informações a respeito da obra, do contexto em que foi
produzida, da articulação que estabelece com outras, dados que possam con-
tribuir para a realização de uma leitura que não se detenha apenas no plano do
enunciado, mas que articule elementos do plano expressivo e estético.
Leitura de escolha pessoal
São situações didáticas, propostas com regularidade, adequadas para desenvol-
ver o comportamento do leitor, ou seja, atitudes e procedimentos que os leitores
assíduos desenvolvem a partir da prática de leitura: formação de critérios para
selecionar o material a ser lido, rastreamento da obra de escritores preferidos
© U4 – Aspectos envolvidos na compreensão do texto escrito 139
Projetos
O trabalho com projetos possibilita a inclusão da leitura num
contexto mais amplo e permite uma contextualização dessa prá-
tica numa atividade sociocomunicativa significativa para o aluno.
Traz como vantagens: ter um objetivo compartilhado por todos os
envolvidos, que se expressa num produto final em função do qual
todos trabalham; permitir dispor do tempo de uma forma flexível;
permitir o planejamento de suas etapas com os alunos. Ressalta-
se que este planejamento permite que a leitura se constitua em
situações linguisticamente significativas, nas quais faz sentido, por
exemplo, ler para escrever, escrever para ler, ler para decorar, es-
crever para não esquecer, ler em voz alta em tom adequado.
O documento cita, também, alguns exemplos de projetos de
leitura:
[...] produção de fita cassete de contos ou poemas lidos para a bi-
blioteca escolar ou para enviar a outras instituições; produção de
vídeos (ou fitas cassete) de curiosidades gerais sobre assuntos estu-
dados ou de interesse; promoção de eventos de leitura numa feira
cultural ou exposição de trabalhos (CONSTRUIR NOTÍCIAS. Projetos
de leitura. Disponível em: <http://www.construirnoticias.com.br/
asp/materia.asp?id=1212>. Acesso em: 3 jul. 2010).
11. CONSIDERAÇÕES
Se o objetivo da escola é formar leitores capazes de com-
preender a diversidade de gêneros que circulam socialmente, faz-
se necessário que o aluno tenha a possibilidade de, na escola, ter
contato com materiais de leitura e com professores leitores capa-
zes de desenvolver estratégias adequadas que promovam o cida-
dão leitor, e, não, o ledor.
A escola pode ser a única oportunidade de grande parte dos
alunos terem contato com uma leitura mais subjetiva que não seja
apenas a leitura para a resolução de pequenos problemas do coti-
diano. Assim, o texto literário não pode ser esquecido. Não se for-
mam bons leitores solicitando aos alunos que leiam apenas textos
informativos, ainda que eles devam estar presentes nas atividades
de leitura. É por meio da diversidade textual e da exploração das
inúmeras funções da leitura que se pode formar a competência
leitora.
12. E-REFERÊNCIAS
CONSTRUIR NOTÍCIAS. Projetos de leitura. Disponível em: <http://www.construirnoticias.
com.br/asp/materia.asp?id=1212>. Acesso em: 3 jul. 2010.
MELENDES, M. F; SILVA, R. J. A formação do leitor no ensino fundamental: os parâmetros
curriculares nacionais e o cotidiano das escolas. Disponível em: <http://web.unifil.br/
docs/revista_eletronica/educacao3/Artigo5.pdf>. Acesso em: 2 jul. 2010.
UNIVERSIDADE TIRADENTES. Leitura, texto e sentido. Disponível em: <http://www.
proead.unit.br/professor/linguaportuguesa/arquivos/textos/Leitura.doc>. Acesso em: 2
jul. 2010.
YOUNG, Fernanda. Revista Cláudia, julho de 2007. (In: Kuhn, T. Z. & Flores, V. N. Letras de
Hoje, Porto Alegre, v. 43, n. 1, p. 69-76, jan./mar. 2008).
Chamadas numéricas
1 – ARTIGONAL. Concepções de leitura. Disponível em: <http://www.artigonal.com/
educacao-artigos/concepcoes-de-leitura-1863644.html>. Acesso em: 2 jul. 2010.
2 – RASGA, K. Tecendo leituras, primeiros fios... Disponível em: <http://sites.google.com/
site/kattyrasga07/tecendoleitura>. Acesso em: 2 jul. 2010.
5
1. OBJETIVOS
• Refletir sobre o uso do livro didático nas práticas de lei-
tura.
• Reconhecer as possibilidades de trabalho com o texto li-
terário na formação do leitor.
• Perceber a importância de se ler as mídias audiovisuais,
sem excluir o trabalho com o livro impresso.
• Reconhecer as características do texto eletrônico e suas
implicações na leitura.
2. CONTEÚDOS
• Leitura no livro didático.
• Espaço da literatura na sala de aula.
• Implicações das mídias audiovisuais na leitura.
• Leitura virtual.
144 © Metodologia do Ensino: Formação do Leitor
4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
Minhas mãos, escolhendo um livro que quero levar para cama ou
para a mesa de leitura, para o trem ou para dar de presente, exa-
mina a forma tanto quanto o conteúdo. Dependendo da ocasião e
do lugar que escolhi para ler, prefiro algo pequeno e cômodo, ou
amplo e substancial. Os livros declaram-se por meio de seus títulos,
seus autores, seus lugares num catálogo ou numa estante, pelas
ilustrações em suas capas; declaram-se também pelo tamanho
(MANGUEL, 1997, p. 149).
Todo livro didático, por melhor que seja, deve ser comple-
mentado. Por ser um material padronizado, ele limita o atendi-
mento às diferenças e diversidades de interesses dos alunos, o
professor precisa preparar com cuidado seus modos de utilização.
Ainda segundo Lajolo (2008), o problema é que não há livro que
seja à prova de professor: o pior livro pode ficar bom na sala de
© U5 – Suportes, espaços e tempos de leitura 149
truir o leitor; deve-se olhar para cada leitor de uma forma diferente,
considerando o que cada um coloca. As leituras são diferentes por-
que nós, leitores, somos diferentes (CECCANTINI, 2004, p. 322).
Uma pergunta a ser feita por nós educadores é: até que pon-
to as bibliotecas levam ao hábito da leitura?
Em uma entrevista, Perrotti (2008) responde a esse questio-
namento:
Eu participei de uma pesquisa feita com as crianças usuárias das
redes de biblioteca que ajudei a implantar no estado de São Paulo.
Queríamos saber se elas estão incorporando a leitura a sua prática
de vida e não apenas como lição de casa. Qual é a constatação?
Houve um grande avanço e as crianças se mostram muito mais
familiarizadas com os livros, mas infelizmente ainda não usam as
novas competências para trocas culturais. Por exemplo: não têm
o hábito de comprar e emprestar livros. A prática escolar não se
transferiu para a prática cultural (PERROTTI. Disponível em: < www.
leiabrasil.org.br/index.aspx?leia=publicacoes_livros>. Acesso em:
28 nov. 2007).
de diálogo sobre as suas leituras, pois muitas vezes não têm com
quem trocar suas experiências leitoras.
É preciso que se formem "círculos de leitura" nos quais haja
troca harmoniosa de ideias entre os leitores depois de saborearem
textos. Perguntar, comentar, lembrar vivências, associar textos e
contar seus próprios casos, são experiências importantes para en-
tender a leitura como forma de compreensão de si, do outro e da
realidade que o cerca. Os leitores tornam-se coautores na constru-
ção do sentido.
Esses círculos não só preenchem as lacunas encontradas nos
textos, mas também dão oportunidade de desenvolver uma prá-
tica leitora que privilegia a "inscrição do leitor no texto, promo-
vendo sua projeção como agente no ato de ler e no processo de
valorização das diferentes linguagens" (GURGEL. In: CECCANTINI,
2004, p. 209).
Os PCNs de Língua Portuguesa sugerem para a formação de
um acervo para o início de uma biblioteca de sala de aula o seguin-
te:
[...] quando houver oportunidade de sugerir títulos para serem ad-
quiridos pelos alunos, optar sempre pela variedade: é infinitamen-
te mais interessante que haja na classe, por exemplo, trinta e cinco
diferentes livros — o que já compõe uma biblioteca de classe — do
que trinta e cinco livros iguais. No primeiro caso, o aluno tem opor-
tunidade de ler trinta e cinco títulos, no segundo apenas um (PCN,
1997, p. 59).
rão ser lidos ao sol como um jornal, na escuridão com uma peque-
na luz USB, tal como se portássemos um livro de papel.
Essa nova geração de equipamentos oferece vantagens mil,
segundo diversos sites da internet e alguns programas de televisão,
pois esses novos leitores portáteis não fazem barulho, ligam-se à
internet, têm WiFi, possuem portas USB e Ethernet (redes locais);
"podem descarregar e enviar virtualmente qualquer ficheiro; têm
uma grande capacidade de memória, permitindo o armazenamen-
to de centenas de e-books no leitor portátil". E, ainda mais: "os
textos dos e-books podem ser comentados, sublinhados, anota-
dos" com uma caneta digital. Pode-se até "preencher formulário,
responder a questionários assim como tomar notas e guardá-las
juntas com o texto" que se está lendo1 (ROBIN GOODS MASTER
NEW MEDIA, 2010).
E nós cá pensando: ainda não tivemos acesso a nenhum des-
ses brilhantes equipamentos que têm produzido filas imensas pela
Europa para comprá-los!
Nesse contexto, cai por terra a ideia de que o livro eletrôni-
co não pode ser carregado numa viagem, não pode ser lido num
ônibus, não pode ser levado para a cama e de que é difícil ler na
tela. Diante dessa nova tecnologia, não vale mais a afirmação tão
linda da escritora Ruth Rocha, ou melhor, não vale para alguns pri-
vilegiados, mas valerá para muitos de nossos alunos durante um
bom tempo.
Leitura e tecnologia––––––––––––––––––––––––––––––––––––
"Computador é bom. É. Faz coisas fantásticas!
Mas não faz as coisas que um livro faz.
E depois, livro não enguiça, como disse o Millôr Fernandes.
E computador, como disse o Ziraldo, não se leva pra cama. E não se põe uma
violeta dentro dele.
O livro guarda tesouros!
E o computador, não guarda?
Ah, guarda.
© U5 – Suportes, espaços e tempos de leitura 169
Mas, acontece que os tesouros que o livro guarda são complementares com a
nossa fantasia. E o processo de leitura possibilita essa operação maravilhosa
que é o encontro do que está dentro do livro com o que está guardado na nossa
cabeça."
Estímulo à leitura––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Você talvez conheça um adolescente que não se "amarre" muito em livro didá-
tico, mas curta vídeo, videogame e livros do Marcos Rey. Quando se fala em
estímulo à leitura, fico com vontade de contar experiências que deram certo.
Mas, infelizmente, não há fórmulas mágicas: os interesses de leitura variam com
o tempo e o próprio interesse pela leitura. Já li fotonovelas e histórias de faroeste,
como já iniciei a leitura de clássicos, sem terminar...
Nenhuma leitura é descartável: quando a gente se cansa, percebe a redundân-
cia de certos textos, busca novos desafios. Mas, seguramente, não dá para de-
senvolver o gosto pela leitura tentando enfiar os autores goela abaixo. Nunca
ninguém me obrigou a ler Horácio. Um dia, quando senti interesse, procurei uma
tradução em português e, como gostei, procurei outras traduções em português,
e também traduções em francês e espanhol e – imagine! –confrontei as tradu-
ções com o original em latim (e eu não sei latim).
SANT’ANNA, Affonso de Romano.IN: LAJOLO, Marisa. LIVRO DIDÁTICO: um
(quase) manual de usuário. In: disponível em: <http://www.inep.gov.br/download/
cibec/1996/periodicos/ em_aberto 69.doc>. Acesso em: 14 jul. 2008).
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
sumir o desafio de fazê-los ler, seja em que mídia for. Ainda temos
que construir nossa tradição de leitura.
11. CONSIDERAÇÕES
Nesta unidade procuramos dar uma visão geral da leitura
nos diversos espaços e tempos que permeiam nossa atualidade e
interferem, queiramos ou não, no trabalho pedagógico. Uma visão
mais ampla da leitura é fundamental para que o professor que en-
sina Português possa atuar na convergência das linguagens e seus
suportes, sem desconsiderar os textos escritos no suporte conven-
cional que é o livro.
O suporte da leitura vem mudando através dos tempos, mas
a palavra sobrevive com sua capacidade narrativa e condutora do
pensamento, assim como também sobrevive a leitura da literatura
que se cria por meio dessa linguagem. Historicamente, partimos
da oralidade para a visualidade da imprensa e hoje para a sineste-
sia das novas tecnologias. No entanto, a leitura permanece. Mu-
dou apenas a forma de se ler: a leitura memorizada do contador,
a leitura dos sinais impressos no papel e a leitura nos ambientes
virtuais.
Procuramos, ao longo do desenvolvimento das unidades,
contextualizar e inserir posicionamentos de diversos autores, com
o intuito de trazer até você outras "falas", pois, para a formação
12. E-REFERÊNCIAS
LAJOLO, M. Livro didático: um (quase) manual de usuário. In: disponível em: <http://
www.inep.gov.br/download/cibec/1996/periodicos/em_aberto_69.doc>. Acesso em: 24
jun. 2010.
MARCUSCHI, Luís Antônio. Exercícios de Compreensão ou Copiação nos Manuais de
Ensino deLíngua? In: Revista Em aberto. Brasília, ano 16, jan/marc, 1996. Disponível
em: www.publicacoes.inep.gov.br/arquivos/%257B5F8D6FDF-2BF0-476F-9271-
88ADE36BAD1A%257D_Em_Aberto_69.pdf. Acesso em: 10 jul. 2008.
MUANIS, F. Televisão. Texto publicado originalmente na revista TXT – Leituras
Transdisciplinares de telas e textos – da UFMG. Disponível em: <http://www.letras.ufmg.
br/atelaeotexto/revistatxt/felipe2.html>. Acesso em: 10 jul. 2008.
PENZ, R. The e-book is on the table. Disponível em: <http://www.comunidadenews.com/
colunista/rubem-penz/the-e-book-is-on-the-table-5292> . Acesso em: 3 jul. 2010.
PERROTTI, E. Leitores, ledores e outros afins (apontamentos sobre a formação do
leitor). In: PRADO, J; CONDINI, P. (Org.). A formação do leitor: pontos de vista. Rio
de Janeiro: Argus, 1999. p.31-40. Disponível em: <www.leiabrasil.org.br/index.
aspx?leia=publicacoes_livros>. Acesso em: 10 jul. 2008.
______. Revista Escola. Disponível em: <http://revistaescola.abril. uol.com.br/ edicoes/
0193/ aberto/mt_139439.shtml>. Acesso em: 10 jul. 2008.
RAMOS, R. Disponível em: <http://docedeletra.com.br/dl/0203fatores. shtml>. Acesso
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ROCCO, M. T. Leitor, leitura, escola: uma trama plural. Disponível em: <www.leiabrasil.
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ROCHA, R. Livros x computador. Disponível em: <http://www.leiabrasil.org.br /index.
aspx?leia=publicacoes_livros>. Acesso em: 10 jul. 2008.
SANTAELLA, Maria Lúcia. Leitura fora do livro. Disponível em: <http://www.pucsp.br/
pos/cos/epe/mostra/santaell.htm>. Acesso em: 24 jun. 2010.
© U5 – Suportes, espaços e tempos de leitura 175
Chamada numérica
1 – ROBIN GOODS MASTER NEW MEDIA. Adeus PDF: a próxima revolução nos e-books
– uma entrevista com Antonio Tomboli. Disponível em: <http://www.masternewmedia.
org/pt/entrega_e_distribuicao_de_conteudos/leitor-e-book/adeus-pdf-proxima-
revolucao-nos-e-books-uma-entrevista-com-antonio-tombolini-20070406.htm>. Acesso
em: 3 jul. 2010.
______. A contribuição do livro didático. In: A leitura e o ensino da literatura. São Paulo:
Global, 1988.
______. (Org.). Leitura em crise na escola: as alternativas do professor. Porto Alegre:
Mercado Aberto 1982.