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CURSO DE HISTÓRIA
(Elis Regina)
Breve histórico
Deixe-me trabalhar, deixa-me ir, deixe-me passar1. Laissez-nous faire é uma máxima
tradicionalmente atribuída ao comerciante Legendre abordando Colbert em algum momento no
final do século XVII, perguntando: “Que faut-il faire pour vous aider? (O que posso fazer para
ajudá-lo?). Legendre teria respondido Nous laisser faire (Deixe-me trabalhar) ”.
Quando cabeças pensantes no século XVII se debruçaram horas a fio, às noites, a base
de bebidas estimulantes como cafés e chás, elaborando ideias e projetos, uma centelha acendia-
se sobre a Europa e o restante do mundo. Chamas lumiaram as trevas da estática sociedade,
proporcionando um vislumbre sobre o futuro e uma perspectiva jamais esperada da
inquestionável vida que se reproduzia incansavelmente monótona por séculos.
O mercado transformou-se, os princípios e jurisdições territoriais aprimoraram-se
evoluindo para consagrar a propriedade privada, e para tal desobstruções foram feitas a fim de
garantir os direitos particulares de tais mentes que incansavelmente panejavam o devir
progressista.
A revolução, antes tida como aspecto puramente científico, metodológico e observável
por poucas pessoas e que tratava de conceber as voltas do planetarium no sistema solar, voltar-
se-ia, no século XIX sobre esta mesma época (séc. XVII, XVIII) para descrever o
funcionamento e os embates econômicos e sociais, como agora define o Dicionário Houaiss:
1
“laissez faire, laissez aller, laissez passer” é a expressão francesa para o liberalismo econômico.
2
A vicissitude
No decorrer de todo esse tempo, vemos, como num dejavù, que os mesmos eventos se
repetem de forma inquestionavelmente semelhantes: Revolução Francesa, na Primavera dos
Povos, na Revolução Russa, na eleição do Partido Nacional Socialista Alemão, nas Revoluções
Socialistas/Comunistas latino-americanas, e assim sucessivamente, ao longo da história.
Homens e mulheres, jovens, crianças, velhos, pobres, bens-de-vida, ricos, juntam-se por uma
causa em comum ainda que visando os próprios interesses.
Koselleck, no início do seu livro Crítica e Crise, afirma que: “a atual crise mundial
resulta da história europeia. A história europeia expandiu-se em história mundial e cumpriu-se
nela, ao fazer com que o mundo inteiro ingressasse em um estado de crise permanente.3”
Keynes, anteriormente, em seu ensaio sobre The end of Laissez-faire, principiava em seu texto:
A disposição para assuntos públicos, que convenientemente resumimos como
individualismo e laissez-faire, proveu sustento a muitas e diferentes vertentes de
2
Dicionário Houaiss da língua portuguesa, Editora Objetiva;
3
Crítica e crise. Rio de Janeiro: UERJ, s/d;
3
“Pretérito Imperfeito”?
Existe uma conexão que possamos fazer entre o desdobrar das movimentações
republicanas, a crise política atual e o passado utópico no Dezoito? Se sim, qual é?
A conexão se encontra nas ideias e nas condições sociais. Onde o movimento das ideias
tem ligação direta com as condições sociais, ou seja, para que qualquer transformação tenha
início, seria necessário ao menos duas premissas: a primeira, deve partir de uma situação, um
fato social, algo que seja o ponto de partida para uma segunda premissa – uma contestação –
que se manifesta sob a forma de revolta; do conflito entre estas duas resulta uma revolução, ou
tende à isso. Podemos citar várias revoluções ao longo da história, a partir da Grande
Revolução: a Revolução liberal do Porto (1820); a Primavera dos Povos (1848); a Revolução
4
KANT, Immanuel. Resposta à pergunta: “O que é o Iluminismo? ”.
4
Russa de 1905 (que abriu caminho para – A Revolução Russa de 1917 e 1918); a Revolução
Mexicana (1915); Revolução Chinesa (dividida em três períodos – o primeiro em 1911, o
segundo em 1949, o terceiro chamado “Cultural” em 1966); a Revolução Ucraniana (1917-1921
– recentemente retomada); a Revolução Espanhola (1936-1939); a Revolução Egípcia (1952);
a Revolução Cubana (1953-1959); a Revolução Húngara (1956); a Revolução Iraquiana de 14
de Julho (1958); a Primavera de Praga (1968); a Revolução dos Cravos (1974); a Revolução de
Saur (1978); a Revolução Iraniana (1979); o Outono das Nações ou a Queda do Comunismo
(1989); a Revolução Bulldozer (2000); a Revolução Rosa (2003); a Revolução Laranja (2004-
2005); a Revolução das Tulipas (2004); a Primavera Árabe (2011 até a atualidade); a Primavera
Asiática ou Revolução dos Guarda-Chuvas (de 2014 até os dias atuais)5.
A experiência brasileira
Para além das revoluções internacionais estão as que se desenrolaram dentro da
jurisdição territorial brasileira. Elas também se baseiam no modelo francês e americano e são:
a Conjuração Carioca (1794-1795); a Conjuração Baiana (1796); a Revolução Pernambucana
(1817); a Revolução Farroupilha (1835-1845), sem contar outras experiências revoltosas em
menor escala. Estas mesmo não tiveram seu fim no século XIX, mas retornam sempre que as
condições sociais encontram terreno favorável para a proliferação das ideias, e estas últimas
quando aliadas às primeiras sedimentam ideologias partidárias e classistas, que no Brasil fazem
nascer constantemente novos partidos políticos com inclinações das mais diversas e sobre os
fundamentos mais absurdos.
A experiência republicana brasileira corrobora o aspecto da vicissitude revolucionária
burguesa em pleno século XXI, a partir das Manifestações do dia 20 de Junho de 2013, que
inicialmente surgiram para contestar os aumentos nas tarifas de transporte público
principalmente nas principais capitais. Foram as maiores mobilizações no país desde as
manifestações pelo impeachment do então presidente Fernando Collor de Mello em 1992,
chegando a contar com até 84% de simpatia da população6. Em seu ápice, milhões de brasileiros
protestaram nas ruas não apenas pela redução das tarifas e a violência policial, mas também por
uma grande variedade de temas como os gastos públicos em grandes eventos esportivos
5
<https://pt.wikipedia.org/wiki/Lista_de_revolu%C3%A7%C3%B5es> Acesso em 10/04/2016;
6
"Manifestações agradam a 84% dos brasileiros, diz pesquisa Ibope". R7.
<http://noticias.r7.com/brasil/manifestacoes-agradam-a-84-dos-brasileiros-diz-pesquisa-ibope-06082013>.
Acesso em 10/04/2016;
5
7
<http://www.pewglobal.org/2014/06/03/brazilian-discontent-ahead-of-world-cup/> Acesso em 10/04/2016;
8
<http://epoca.globo.com/tempo/noticia/2015/03/bmanifestacao-anti-dilmab-entra-para-historia.html> Acesso
em 10/04/2016;
9
"Paulista reúne maior ato político desde as Diretas-Já, diz Datafolha". Folha de S.Paulo. 15 de março de 2015.
<http://www1.folha.uol.com.br/poder/2015/03/1603271-paulista-reune-maior-ato-politico-desde-as-diretas-ja-
diz-datafolha.shtml> Acesso em 10/04/2016
10
<http://especiais.g1.globo.com/politica/mapa-manifestacoes-no-brasil/13-03-2016/contra/>
11
Vide o “O verde-amarelismo” na obra de Marilena Chauí “Brasil: mito fundador e sociedade autoritária”;
6
“Os homens fazem a sua própria história, mas não a fazem segundo a sua livre vontade;
não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam
diretamente, legadas e transmitidas pelo passado.” (MARX, 2011:6).
REFERENCIAS
FURET, François. A Revolução em debate. São Paulo: EDUSC, s/d;
KANT, Immanuel. Resposta à pergunta: “O que é o Iluminismo? ”. Königsberg na Prússia,
30 de Setembro de 1784.
KEYNES, John Maynard. The end of laissez-faire. 1926.
<http://www.panarchy.org/keynes/laissezfaire.1926.html>. Acesso em 10/04/2016;
KOSELLECK, Reinhardt. Crítica e crise: uma contribuição à patogênese do mundo
burguês. Rio de Janeiro: UERJ, d/d;
MARX, Karl. O 18 Brumário de Luís Bonaparte.
<https://www.marxists.org/portugues/marx/1852/brumario/cap01.htm> Acesso em
10/04/2016;