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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO: MESTRADO


FUNDAMENTOS DA EDUCAÇÃO

A ARQUITETURA ART- DÉCO NO GOVERNO VARGAS:


A CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

FRANCISCO JOSÉ PERALTA

MARINGÁ
2005
Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)
(Biblioteca Central - UEM, Maringá – PR., Brasil)
Peralta, Francisco José
P426a A Arquitetura art-déco no governo Vargas : a construção
de uma identidade nacional / Francisco José Peralta. --
Maringá, 2005.
137 f. : il. figs.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Silvina Rosa.


Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual de
Maringá, Programa de Pós-Graduação em Educação, 2005.

1. Arquitetura - Art-déco. 2. Processos educacionais -


Período Vargas. 3. Processos civilizatórios - Arte. 4.
Arquitetura moderna brasileira - Século 20 - História. 5.
Design industrial. 6. Arquitetura Moderna Brasileira -
Crítica. I. Rosa, Silvina, orient. II. Universidade
Estadual de Maringá. Programa de Pós-Graduação em Educação.
III. Título.

CDD 21.ed. 724.6


UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO: MESTRADO
Fundamentos da Educação

A ARQUITETURA ART- DÉCO NO GOVERNO VARGAS:


A CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

Dissertação apresentada por FRANCISCO


JOSÉ PERALTA, ao Programa de Pós-
Graduação em Educação, Área de
Concentração: Fundamentos da Educação, da
Universidade Estadual de Maringá, como um
dos requisitos para a obtenção do título de
Mestre em Educação.

Orientadora:
Profa. Dra.: SILVINA ROSA

MARINGÁ
2005
FRANCISCO JOSÉ PERALTA

A ARQUITETURA ART- DÉCO NO GOVERNO VARGAS:


A CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL

BANCA EXAMINADORA

Profª. Dra. Silvina Rosa (Orientador) – UEM

Profª. Dra. Lízia Helena Nagel – CESUMAR - Maringá

Prof. Dr. Sezinando Luiz Menezes – UEM

Data de Aprovação
06/04/2005

3
Para João, João e Nena

4
AGRADECIMENTOS

Agradeço à minha orientadora Silvina Rosa, pela paciência e apoio.

5
Se adotássemos novamente a rótula, a taipa ou a
estilharia de pedra, deveríamos também voltar para a
soletração, a palmatória e o decurião.
Arquiteto José Maria da Silva Neves
1936

6
PERALTA, Francisco José. A ARQUITETURA ART- DÉCO NO GOVERNO
VARGAS: A CONSTRUÇÃO DE UMA IDENTIDADE NACIONAL. 137 f.
Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Estadual de Maringá.
Orientador:Silvina Rosa. Maringá, 2005.

RESUMO

Considerado no mundo todo, ora como uma variante do estilo Art Nouveau, ora
como uma mera antecipação ou mesmo uma deterioração do Movimento
Modernista, o Art-Déco não tem merecido, por parte dos estudiosos brasileiros, com
algumas exceções, abordagens mais profundas do que a simples reprodução de
fotografias “pitorescas” ou rápidos comentários reprovadores da “leviandade
estética”. No entanto, esse quase-movimento artístico esteve ligado no Brasil, como,
aliás, em todos os lugares onde vicejou, à ascensão da burguesia industrial, porém
com uma particularidade: teria recebido incentivo oficial do Estado, principalmente
durante o primeiro governo do Presidente Getúlio Vargas. A introdução do estilo no
país acontece concomitantemente com as primeiras manifestações do Movimento
Moderno, também ele reivindicante da personificação espacial da sociedade
industrial e da oposição ao tradicionalismo. A arquitetura Art-Déco, devido à sua
flexibilidade quanto à ornamentação, permite o uso dos elementos nacionais, como
os ornamentos de inspiração Marajoara, sem perder seu vínculo com progresso
industrial e urbano. Assim, pelas possibilidades de se constituir uma arte simples e,
ao mesmo tempo, monumental, é, por um curto espaço de tempo, preferida em
relação às manifestações do movimento moderno, em especial na arquitetura. Esta,
considerada por demais abstrata e internacionalista, somente a partir dos anos 40,
quando se torna Arquitetura Moderna Brasileira, será reconhecida pelo Estado como
estilo oficial. Deste modo, a apropriação do Art-Déco pelo Estado na década de 30
pode ter sido facilitada pelas possibilidades do estilo já mencionadas e, direta ou
indiretamente relacionada ao processo de industrialização e às novas determinações
do mercado mundial. Além disso, parece ter sido objeto de um planejamento político
e educacional do governo de Getúlio Vargas, no sentido de fortalecer a identidade
nacional. Esse raciocínio é desenvolvido através de quatro capítulos, cuja linha de
análise passa por uma discussão teórica sobre o papel social da arte, pela
sistematização de algumas idéias sobre a relação entre industrialização,
nacionalismo, arquitetura e educação e, por fim, por uma exposição sobre a
trajetória do Art-Déco. O objetivo é contribuir para o esclarecimento de mecanismos
geradores de escolhas e mudanças comportamentais, já que o homem se educa
socialmente e não apenas nos bancos escolares.

Palavras-chave: Processos Educacionais. Processos Civilizatórios. Arquitetura. Arte.


Art-Déco

7
PERALTA, Francisco José. ARCHITECTURE ART-DECO IN VARGAS
GOVERNMENT: BUILDING A NATIONAL IDENTITY. 137 f. Dissertation (Master in
Education) – State Univercity of Maringá. Supervisor: Silvina Rosa. Maringá, 2005.

ABSTRACT

Considerate in the whole world sometimes as a variant of the Art Nouveau style,
sometimes as a mere anticipation or deterioration of Modernist Movement, Art-Déco
has not been object of deeper approaches by Brazilian scholars, with some
exceptions, than the simple reproduction of "picturesque" images or superficial
disapproving comments of an "aesthetic frivolity". However, that artistic “quasi-
movement” was related, in Brazil, to the ascension of the industrial bourgeoisie, as in
fact, in every place it flourished. In this country, with a particularity: it would have
received official encouragement of the State, mainly during President Getulio
Vargas's first government. The introduction of the style in the country takes place
concomitantly with the onset of the Modern Movement. Both were a vindication of the
spatial embodiment of industrial society as also opposite movements to
traditionalism. The Art-Déco architecture, due to its flexibility of ornamentation, allows
the usage of national elements, as the inspired in Marajoara ornaments, without
losing its connection with industrial and urban progress. Therefore, by the
possibilities to constitute both a simple and monumental art, at the same time, it was,
for a short period, preferred in opposition to the manifestations of modern movement,
especially in the architecture. Modern movement was considered too much abstract
and internationalist. Only by the 1940s, when it is born the so called Brazilian Modern
Architecture, it would be recognized by the State as an official style. Thus, the
appropriation of Art-Déco's by the State, in the 1930s, may has been facilitated by
the mentioned possibilities of such style and, direct or indirectly, related to the
industrialization process and the new world market determinations. Moreover, it
seems to have been object of a political and educational planning of Getulio Vargas's
government, to strengthening the national identity. This argument is developed
through four chapters, which analysis line goes by a theoretical discussion on the
social paper of the art, and the systemization of some ideas about the relationship
among industrialization, nationalism, architecture and education and, finally, for a
presentation on Art-Déco’s path. The purpose of this paper is to contribute for the
explanation about mechanisms that generates behavioral choices and changes,
since the individual is educated socially and not only in the school benches.

Keywords: Educational Processes. Civilizing Processes. Architecture. Art. Art-Déco.

8
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 10

1. O PAPEL DA ARTE 17

1.1 – ARTE COMO PRODUTO SOCIAL 17


1.2 – ARTE COMO REPRODUÇÃO DA VIDA OU ARTE PELA ARTE? 20

2. INDUSTRIALIZAÇÃO E NACIONALISMO 26

2.1 – A INDÚSTRIA NO BRASIL E O PAPEL CIVILIZATÓRIO DA


EDUCAÇÃO 26
2.2 – A QUESTÃO NACIONAL E A ARTE MODERNA 41

3. SAMBA CAFÉ E ARQUITETURA 52

4. ART DÉCO: O QUASIMODERNO ECLETISMO 65

4.1 – EXPOSIÇÕES UNIVERSAIS: AS VITRINES DO CAPITAL 65


4.2 – A EXPOSITION DES ARTS DÉCORATIFS ET INDUSTRIELS
MODERNES DE PARIS: O DÉBUT DO ART DÉCO 75
4.3 – A REPÚBLICA ANTROPOFÁGICA DOS ESTADOS UNIDOS DO
BRASIL 94

5. CONCLUSÃO 127

REFERÊNCIAS 130

9
INTRODUÇÃO

Pois o que precisamos não é apenas de um artista


criador, mas também de um público compreensivo.
Como consegui-lo? O único meio é um poderoso
processo educacional que transmita, desde a mais
remota infância, uma vivência visual. [...] a participação
ativa [...] fortalece o senso de responsabilidade individual
que une uma comunidade, mobiliza seu poder de
imaginação e desenvolve seu orgulho pelo ambiente que
logrou criar.
Walter Gropius

O Art Déco, nascido entre a Primeira e a Segunda Guerra mundiais, como


uma reação ao último dos grandes estilos decorativos dentro da arquitetura, o Art
Nouveau – embora nele se inspirasse – é geralmente considerado um desvio de
curso do Movimento Moderno, especialmente na arquitetura. Em todas as suas
manifestações artísticas, desde cedo exibiu características de imponência,
ostentação e monumentalidade, bem ao gosto da alta burguesia européia. A
composição baseada nos padrões clássicos, a utilização de pó de mica (cujas
partículas, misturadas à argamassa de revestimento refletiam a luz do sol) e o uso
ostensivo do granito, principalmente no embasamento, que tratava de elevar o
edifício, e nas quase infalíveis escadarias de acesso às portarias, sempre
valorizadas com portas de verticalidade realçada, conferiam à construção a
“iconografia” necessária à elaboração da nova imagem buscada pela classe
dominante.

Destaca-se que a verticalidade expressiva e as linhas retas eram marcantes


nas fachadas, de coroamento freqüentemente escalonado vertical ou
horizontalmente, e realçadas pelo uso de uma iluminação cinematográfica que
oferecia espetáculos inimagináveis à luz do sol (SEGAWA, 1998). As camadas
trabalhadas de argamassa, numa mescla de “decorativismo” extraído de outras
culturas (índia, asteca e a egípcia, que entrava na moda com as descobertas das
escavações do túmulo de Tutankhamon), exigiam a presença de artífices,
verdadeiros artistas, cujas mãos estabeleciam a diferença entre a obra de “classe” e

10
o edifício comum, caracterizado por apliques florais e grades metálicas pré-
fabricadas e baratas, tão queridas do Art Nouveau. Assim, da concepção geral ao
menor detalhe do mobiliário, menos que satisfazer imposições técnicas, os edifícios
Art Déco tinham a preocupação de oferecer uma “moldura” ao estilo de vida da
classe dominante.

A opção pelo Art Déco como objeto desta dissertação deve-se à necessidade
de explicar o papel formativo da arquitetura, tendo em vista a função social e mesmo
pedagógica da arte e seus vínculos com as necessidades sociais dos diferentes
momentos históricos. Neste caso específico, pretende-se relacionar a adoção do
estilo por Getúlio Vargas com as necessidades do nacionalismo. Evidentemente, um
trabalho que procure estabelecer este tipo de relação entre arquitetura, educação e
nacionalismo na década de 30 ressente-se de algumas dificuldades, tanto no que diz
respeito às fontes como ao próprio campo de análise.

Ao contrário das artes plásticas em geral que, ao menos aparentemente,


possuem farto material analítico, a arquitetura padece, por sua própria natureza
ambígua de ser concreto, mas de significação abstrata, da falta de uma leitura
histórica para além das questões de caráter puramente funcionalista, em especial
quando o estudioso é um arquiteto. Na literatura voltada para esse profissional há a
falta, quando não do material, de uma análise crítica na apresentação da história da
arquitetura brasileira, restringindo-se, certos livros, por exemplo, ao falar sobre o
período de nossas investigações neste trabalho, a era Vargas, a considerações
apologéticas acerca da equipe do Ministro Gustavo Capanema e da construção do
prédio do Ministério da Educação e Saúde Pública.

Já as abordagens feitas por historiadores da arte sobre os primeiros decênios


do século XX, se têm o mérito de aprofundar estudos sobre o papel da pintura,
escultura, teatro e literatura modernistas, não fazem mais que comentar
superficialmente o papel da arquitetura. Em geral, as referências ao tema proposto
são apenas pontuais.

A historiografia da arquitetura em geral manifesta uma ideologia liberal em


que os autores optam por uma “teoria sociopolítica do equilíbrio e da ordem”. É o
caso do clássico autor Leonardo Benévolo, por exemplo, cujos

11
pressupostos acerca da mudança social são os de quebra de um
equilíbrio a que a sociedade procura retornar (ou refazer em novas
bases) logo que possível. [...]. Há [em suas posições] uma
concepção mecânica da mudança social (o crescimento da demanda
exigindo a criação da indústria mecanizada ou o crescimento
populacional gerando excesso de mão-de-obra e, portanto, a
pobreza dos trabalhadores) e uma concepção em que a vontade
humana tem força para transformar a história (a ética e a razão de
alguns obrigando o Estado a intervir sobre a espontaneidade das leis
de mercado). (SZMRECSANYI, 1994, p.147, grifo do autor).

Benévolo (1976), em sua História da Arquitetura Moderna, classifica algumas


poucas obras Art Déco dentro ora do Art Nouveau ora do Neoclassicismo, ora do
Modernismo. Embora isso seja compreensível, já que o termo só seria cunhado na
década de 60 do século XX, é perceptível seu desdém para com as manifestações
que não consegue classificar, atribuindo-lhes um alto grau de irracionalidade por não
se “comportarem” como seria esperado, como se fosse possível que elas não
refletissem a sociedade em que se expressavam. Yves Bruand (1981, p. 94) também
não reconhece qualquer mérito nas obras Art Déco brasileiras, limitando-se a
comentar uma breve incursão de Marcelo Roberto, um dos famosos irmãos
arquitetos do escritório MM Roberto, no campo da decoração, inspirado pelo “estilo
fluido e afetado, posto em prática pela Exposição Internacional de Artes Decorativas
de Paris em 1925”.

Uma referência deve ser feita a uma notável exceção, Hugo Segawa, com
seu livro Arquiteturas do Brasil, que não cai na armadilha da mera exaltação do
Movimento Moderno, mas, antes, faz uma leitura histórica, diferencia os diferentes
estilos produzidos nessa época e percebe suas relações com a emergência da
burguesia industrial. Por esta razão, podem-se destacar as contribuições deste autor
para a consecução dos objetivos que se busca alcançar nesta pesquisa.

O período tratado neste trabalho corresponde, em grande parte, ao do


governo de Getúlio Vargas, que se caracterizou por extrema personalização do
poder e que buscava uma forma de fortalecer a identidade nacional inclusive através
da construção de edifícios públicos. Como os demais líderes totalitários da época,
ele não tolerava a arquitetura moderna por ser por demais internacionalista. Na
Alemanha da época “terminava a ambigüidade dos nazistas em relação às
vanguardas históricas e [...] um neoclassicismo medíocre e pequeno burguês foi
assumido como arte oficial” (MACHADO, 1996, p.153), desprezando

12
[...] o fato de que um estabelecimento de vida curta, que começou
principalmente como centro de vanguarda política e artística, veio a
dar o tom na arquitetura e nas artes aplicadas de duas gerações. Foi
a Bauhaus, ou a escola de arte e desenho de Weimar e depois
Dessau na Alemanha Central (1919-33), cuja existência coincidiu
com a República de Weimar – acabou dissolvida pelos nacional-
socialistas pouco depois de Hitler tomar o poder (HOBSBAWM,
1998, p.185).

Isso provocou uma verdadeira diáspora dos artistas modernos, como Walter
Gropius, Paul Klee, Marcel Breuer, etc., pelo mundo. Stalin também adotou
oficialmente o Neoclassicismo em oposição ao Modernismo “degenerado”. Mesmo
Mussolini, que tinha Marinetti a seu lado, adota o neoclassicismo como o estilo
fascista. Na verdade, Marinetti já abandonara os princípios do futurismo para
enfileirar-se com a geração mais jovem que “não se reconhece mais, efetivamente,
nessas fórmulas e volta-se para o passado, onde espera encontrar regras
constantes, valores certos e permanentes” (BENÉVOLO, 1976, p.542).

Gustavo Capanema afirmava que Vargas, porém, sempre procurou uma


proximidade com o modernismo nas artes plásticas e na literatura, conforme sugere
abaixo:

No campo das artes, o século XX vem se caracterizando, todo ele,


pelo choque entre tendências tradicionais e renovadoras, estas em
crescente e natural expansão. Se o governo não pode, por sua
natureza, adotar esta ou aquela concepção estética, assiste-lhe,
contudo, o dever de não ficar indiferente à revisão das formas do
gosto. Cumpre-lhe antes estimular a pesquisa artística, sem sombra
de sectarismo. (SHWARTZMAN, 1983, p.374).

Da parte das artes plásticas em geral, esse aparente desalinhamento em


relação ao espírito totalitário não deve causar nenhum espanto, pois elas tinham, no
Brasil, um caráter altamente nacionalista e com tendência para o monumental, como
no caso de Portinari que “expusera no Rio em 33 e em São Paulo em 1934 e, dono
de uma técnica de virtuoso, captara a inclinação populista do governo de Getúlio
Vargas transpondo para o mural, de forma monumental, o trabalhador brasileiro”
(AMARAL, 1975, pp.315-317).

A busca de Getúlio Vargas de marcar de forma contundente a diferenciação


entre o Brasil anterior, liberal e “viciado” e o novo país que ele propunha entregar à
população, ou a mudança de uma “sociedade rural-oligárquica para uma sociedade
urbano-industrial” (OLIVEIRA, 1982, p.28), passou pela adoção de orientações que

13
constituíram processos educacionais, de maior ou menor explicitação, formais ou
não, em virtude da premência do objetivo a ser alcançado e a construção de prédios
públicos compõe o conjunto destes mecanismos.

Podemos dizer que, no confronto com outras nações, a consciência


de nação atrasada fornece justificativas para a defesa do papel
predominante do Estado. O aumento da capacidade de ação do
Estado sobre a sociedade tornaria possível a superação do gap entre
o Brasil, país atrasado, e as nações desenvolvidas. Esta
modernização, esta aceleração do ritmo histórico deveria ter lugar
dentro da ordem (Ibid., p.28).

E, também:

A proposta do “novo” vem associada às condições da realidade


nacional. O país teria sido obscurecido pela influência das idéias
importadas, quanto da feitura do pacto republicano. O novo regime
deveria voltar-se para as nossas origens, para as raízes brasileiras,
verdadeira matéria prima nas mãos do novo artesão (Ibid., p.33)

Embora o projeto cultural de Vargas tenha sido objeto de diversas


interpretações, não parece ter recebido atenção suficiente a fetichização das
relações de classe presente nos edifícios desse governo. O papel civilizatório da
educação (entendida como todo processo que objetive uma mudança de
comportamento do homem) parece estar bastante claro nos vários aspectos da vida
cultural brasileira. Falta, porém, obter uma imagem mais nítida do papel da
arquitetura neste processo.

Esse trabalho procura contribuir com parte de um esforço necessário para


começar a preencher essa evidente lacuna nos estudos da história cultural da era
Vargas e, talvez com mais urgência, da história da arquitetura brasileira, do que se
ressentem alunos e professores da área. Essa lacuna se dá, parcialmente, devido à
dificuldade de encontrar fontes bibliográficas referentes ao estilo objeto desse
estudo, o Art Déco, no Brasil, mas, talvez, também pela falta de material iconográfico
reunido e analisado de forma sistematizada. Em outras palavras, essa dissertação
busca responder à necessidade de fornecer os primeiros subsídios necessários a
futuros estudos que contemplem o tema com o mesmo enfoque proposto, uma vez
que se volta para terreno ainda pouco explorado – se desconsiderarmos os
enfoques baseados no mito da genialidade de indivíduos que “mudam o rumo da
história” – os estudos do período em destaque, o segundo quarto do século XX.

14
Este, bem como futuros estudos, poderá vir a mostrar como a arquitetura se
inseria no projeto político-ideológico de fortalecimento do Estado no governo de
Getúlio Vargas, como um instrumento de fortalecimento do sentimento nacional. Via
de regra, a monumentalidade própria do estilo tratava de suprir atitudes mais visíveis
na imposição da nova ordem burguesa. Com a ascensão da arquitetura moderna, as
novas construções oficiais passaram a oferecer traços mais simples e ausência de
decoração, mas permaneceu a monumentalidade como forma de assinalar o orgulho
pelo país e a confiança no futuro. Podem vir a mostrar também que havia uma
“profunda necessidade de afirmação por meio de realizações espetaculares,
partilhada por uma clientela ávida de publicidade e por arquitetos felizes em explorar
uma oportunidade dessas para satisfazer sua vocação mais profunda” (BRUAND,
1981, pp.376- 377).

As fontes da pesquisa foram: obras históricas e historiográficas que


contextualizem o período compreendido entre os primeiros anos do século XX até
fins da década de 1940, revistas, teses e dissertações e fotografias constantes do
material bibliográfico.

Os resultados da pesquisa serão apresentados em quatro capítulos. O


primeiro deles é uma discussão sobre o papel da arte, a partir de abordagens
relacionadas ao produto social, à reprodução da vida ou, ainda, à arte pela arte. Sua
função é introduzir a idéia de que a obra arquitetônica tem um caráter pedagógico,
pois, ao mesmo tempo em que representa a sociedade e expressa o que existe de
comum entre os homens de sua época, é também uma arte utilitária. Por todas
essas razões, ela não se consente arte pela arte.

No segundo capítulo, cujo fim é uma contextualização histórica, destaca-se o


processo de industrialização do Brasil, ao qual são inerentes a questão educacional
ou civilizatória e a questão do nacionalismo.

Quase obrigatória, nesse trabalho de contextualização, é a elaboração de um


capítulo destinado ao papel que a arquitetura desempenha, ou que lhe é atribuído,
no processo de modernização do país. A polêmica entre arquitetura eclética e
neocolonial e, posteriormente, entre esta e a moderna expressa o embate entre o
Brasil “arcaico” e o Brasil “moderno”.

15
Por fim, o quarto capítulo é dedicado ao estudo do estilo Art Déco,
considerado uma “monstruosidade” por muitos historiadores da arquitetura. Procura-
se, em consonância com tudo o que foi afirmado nos capítulos anteriores, traçar sua
trajetória, desde sua origem, passando pelo lugar ocupado após o esvaziamento das
Exposições Universais até suas manifestações no Brasil.

16
1. O PAPEL DA ARTE

tygre! tygre! brilho, brasa / que à furna noturna abrasa,


que olho ou mão armaria / tua feroz symetria?
em que céu se foi forjar / o fogo do teu olhar?
em que asas veio a chama? / que mão colheu essa
flama?
que força fez retorcer / em nervos todo o teu ser?
e o som do teu coração / de aço, que cor, que ação?
teu cérebro, quem o malha? / que martelo? que fornalha
o moldou? que mão, que garra / seu temor mortal
amarra?
quando as lanças das estrelas / cortaram os céus, ao vê-
las,
quem as fez sorriu talvez?
1
quem fez a ovelha te fez?
William Blake

1.1 – ARTE COMO PRODUTO SOCIAL

A partir do ponto de vista de alguns comentadores da obra de Karl Marx em


relação à arte, já que este, embora demonstrasse interesse pessoal pelo tema, não
chegou a desenvolver qualquer teoria sistemática a respeito, é possível fazer um
exercício de entendimento do conceito da capacidade criadora do homem,
objetivando explicitar o materialismo histórico como orientação metodológica deste
trabalho.

Na há, de fato, escritos marxianos específicos sobre a produção artística, mas


apenas diversos pequenos comentários reflexivos sobre a natureza do trabalho
criativo espalhados por várias obras, a partir dos quais, outros grandes autores,

1
O Tygre, poema de William Blake, em tradução de Augusto de Campos publicado em :
Poesia – 1949-1979. São Paulo: Editora Brasiliense, 1986.

17
como Walter Benjamim, Theodor Adorno e, principalmente, Georg Lukács,
procuraram construir uma estética especificamente marxista, de caráter humanista,
baseada na “idéia de que todo trabalho não alienado é criativo e, portanto,
intrinsecamente igual ao trabalho artístico” (BOTTOMORE, 1988, p.138). Essa
classificação pode ser percebida, por exemplo, “quando Marx fala, em O Capital (I,
cap. V, 1) sobre o caráter essencialmente humano do trabalho, comparando o
arquiteto e a abelha”, sendo “significativo o fato do arquiteto ser lembrado
simplesmente como exemplo de trabalhador humano e não como uma categoria
privilegiada de artista” (Ibid.).

De qualquer maneira, tais considerações de Marx e Engels limitaram-se


quase que exclusivamente à literatura, raramente referindo-se às artes plásticas,
apesar de Marx ter sido “o primeiro a dar o alarme sobre a alienação artística, em
sua vigorosa análise das condições que envolvem o artista” (MÉSZARÓS, 1981, p.
171) e, mesmo não considerando a arte como “algo a ser atribuído à esfera ociosa
do ‘lazer’ e, portanto, de pouca ou nenhuma importância filosófica”, embora só
apresente “valor na medida em que haja uma necessidade humana que encontre
realização na criação e no gozo de obras de arte” (Ibid., p. 172).

Apesar do acúmulo de estudos acerca da estética e da produção artística,


parece existir, ainda hoje, e mesmo entre autores consagrados, uma “noção
romântica da arte como uma criação de ‘gênio’, que transcende a existência, a
sociedade e a época”, sem perceber que ela é antes “a construção completa de
vários fatores reais, históricos” (WOLFF, 1982, p. 13). O artista não é um ser a-
social, esperando a divina inspiração e alheio às regras normais do intercâmbio
social. Nas palavras de Engels (1989, p. 38),

Somos nós próprios que fazemos a nossa história, mas antes de


tudo, com dados e em condições bem determinadas. Entre todas
essas condições, as econômicas, são por último, as determinantes.
Mas as condições políticas, etc., mesmo a tradição que percorre o
cérebro dos homens, representam um papel, embora não decisivo.

A propósito da idéia de “indivíduo excepcional”, em relação ao lugar do artista


na sociedade (BOTTOMORE, 1988, p.18), Marx argumenta em A Ideologia Alemã,
vol. I, III, 3, que:

18
A concentração exclusiva do talento artístico em determinados
indivíduos e sua supressão correlata entre a massa do povo é uma
conseqüência da divisão do trabalho [...]. Na sociedade comunista
não há pintores, mas, no máximo, pessoas que, ente outras coisas
também pintam.

E, ainda,

na sociedade comunista, onde ninguém tem uma esfera exclusiva de


atividade, mas todos podem se tornar completos nos ramos que
desejarem, a produção como um todo é regulada pela sociedade,
tornando com isso possível fazer uma coisa num dia e outra coisa
amanhã, caçar pela manhã, pescar à tarde, cuidar do gado ao
entardecer e dedicar-se à crítica depois do jantar, sem que, por isso,
o indivíduo deva tornar-se caçador, pescador, pastor ou crítico.

Mesmo se se considerar o texto acima como uma construção utópica, é


forçoso compará-lo com Wolff (1982, p.30) quando afirma que

crescente desumanização do trabalho humano em geral e a erosão


do seu aspecto potencialmente criador, sob a divisão do trabalho e,
em particular, sob as relações de produção da sociedade capitalista,
obscureceu a natureza real do trabalho pela sua forma pervertida.
[...] Assim, o trabalho realizado por artistas, músicos e escritores,
ainda não integrado pelas relações capitalistas e pelo domínio do
mercado, nem por eles afetado, passa a ser visto como uma forma
ideal de produção, porque aparece como livre, de uma maneira que
outras produções não mais são. A similaridade potencial das duas
áreas – arte e trabalho – perdeu-se na medida em que o segundo foi
reduzido à sua forma alienada.

Certamente, não é possível ao artista manter-se alheio à alienação que o


avanço do capitalismo vai exigir dele e se hoje ele está livre de patronos não se vê
qualquer possibilidade de sobrevivência a partir desse tipo de trabalho “não
alienante” e acaba por sucumbir às leis gerais da produção capitalista e o resultado
de seu trabalho passa a ser considerado como mercadoria (Ibid., p.31).

Com respeito ao papel que a arte-trabalho passa ter representado na


evolução do homem, Marx chega a teorizar sobre o caráter histórico e social dos
órgãos dos sentidos, estabelecendo, por exemplo, uma relação entre o objeto e o
olho, que se torna humano “quando seu objeto se tornou objeto social humano,
vindo do homem e destinado ao homem” (MARX; ENGELS, 1989, p.48), ou
demonstrando como a mão humana, empenhada em uma atividade criativa prática -
a transformação do ambiente material - atingiu um tão alto grau de especialização,
tornando-se não só um órgão do trabalho, mas também o produto do trabalho.

19
Por fim, a tese do trabalho criador pode ser entendida na comparação que
Marx (1989, p. 52) faz, conforme citado na introdução, entre a abelha e o arquiteto:

O nosso ponto de partida é o trabalho sob uma forma que pertence


exclusivamente ao homem. Um aranha faz operações semelhantes
às de um tecelão e a abelha confunde, pela estrutura das suas
células de cera, muitos arquitetos hábeis. Mas o que, logo de início,
distingue o pior arquiteto da abelha mais destra é que ele construiu a
célula na cabeça antes de a construir na colméia. O resultado a que
chega o trabalhador preexiste, idealmente, na imaginação do
trabalhador.

Embora possa ter se valido da figura do arquiteto como uma síntese da


capacidade criativa do homem, vale lembrar novamente que Karl Marx aqui não está
falando de arte, e sim da natureza do trabalho humano em geral. Mas, conforme
Vasques (apud WOLFF, 1982, p.29),

a semelhança entre a arte e o trabalho está [...] na sua relação


comum com a essência humana, isto é, são ambos atividades
criativas por meio das quais o homem produz objetos que o
expressam, que falam por ele e sobre ele. Não há, portanto, uma
oposição radical entre arte e trabalho.

1.2 – ARTE COMO REPRODUÇÃO DA VIDA OU ARTE PELA ARTE?

Quando tudo que se chamava arte se paralisou, o


fotógrafo acendeu sua lâmpada de 1.000 velas e,
gradualmente, o papel sensível à luz absorveu o
negrume de alguns objetos de consumo.
2
Tristan Tzara

J. Plekanov coloca o problema da relação da arte com a vida social em dois


sentidos contraditórios: ou se atribui à arte o papel de contribuidora do

2
Apud Walter Benjamin, p. 105.

20
desenvolvimento da consciência humana, como apontado no item anterior, e da
melhoria da vida social ou se toma a arte pela arte. Defensores da primeira teoria
conceberiam a arte como parte da superestrutura, “reproduzindo e explicando a vida
e, a miúdo, com um sentido de juízo sobre as manifestações da vida” (PLEKANOV,
1945, p.10), conferindo-lhe, então um caráter utilitário. Para Nikolai Bukharin, por
exemplo, “a arte seria um produto da vida social tanto quanto a ciência ou qualquer
outro reflexo da produção material” só podendo “desenvolver-se quando as forças
de produção alcançam certo nível” (Ibid. p.12).

Mesmo que se aceite a teoria da arte pela arte, é preciso verificar, antes de
tudo, em que condições sociais se fortalece nos artistas tal tendência, assim
expressa por Pushkin, poeta russo do século XIX, a respeito do trabalho de poeta e
em resposta ao povo que exige do artista que melhore com seus cantos os
costumes sociais, citado por Plekanov (Ibid., p. 27):

Não nascemos para as agitações da vida,

nem para o lucro, nem para o combate,

mas para a inspiração,

para os doces sons e orações.

Outro defensor da arte pela arte digno de referência é o escritor francês,


Teófilo Gautier, que advertia com estas palavras os defensores da concepção
utilitarista da arte, novamente em citação de Plekanov (Ibid., p.37):

Não, imbecis; não, cretinos e ignorantes; não se faz com livros sopa
de geléia. Uma novela não é um par de sapatos sem costura, nem
um soneto, uma seringa; um drama não é uma estrada de ferro,
coisas todas civilizadas e que fazem a humanidade trilhar a senda do
progresso. Pelas barrigas de todos os papas passados, presentes e
futuros, não, e duzentas mil vezes não... Eu, ainda que não agrade a
esses senhores, sou dos que acham o supérfluo necessário e
apreciam melhor as coisas e pessoas, na razão inversa dos serviços
que me prestam.

Para ele, a poesia não demonstraria nem relataria nada dependendo a beleza
do verso apenas de sua musicalidade e do ritmo (Ibid, p.49). Portanto, em oposição
à capacidade e mesmo o dever de emitir um juízo sobre os fenômenos da vida,
existiria uma aparentemente confortável posição de neutralidade e autonomia. Mas
talvez não se deva vislumbrar nesta posição um alheamento às questões da

21
sociedade que rodeia o artista: mais adiante Plekanov (Ibid, p.39) de certa forma
suscita a crença na firmeza de caráter de Gautier, quando descreve e interpreta o
grupo de artistas que o cercava:

Os românticos procuravam exprimir seu desacordo à mesura e


pontualidade burguesas, não somente em suas obras artísticas, mas
até em seu aspecto. Já sabemos através de Gautier que os jovens
que tomaram a platéia do teatro francês [...] tinham cabeleira
comprida. Quem não ouviu falar do colete vermelho de Gautier, que
causava horror às “pessoas decentes”? Os trajes fantásticos, como
os cabelos compridos, serviram aos jovens românticos como meio de
te: PEREIRA, 1999)

A autora salienta que essa arquitetura padronizada com


o de expressão. Foi como um protesto à sociedade burguesa.
Parece claro que os românticos estavam em desacordo com a sociedade
burguesa que os rodeava, embora isso não representasse nenhum perigo para as
relações sociais burguesas, mesmo porquê, aos círculos românticos pertenciam
jovens burgueses que nada tinham contra essas relações, mas se indignavam com a
trivialidade da existência numa tal sociedade. Portanto, quanto aos artistas e sua
preocupação exclusiva com a forma denotando um absoluto indiferentismo político
social, sua produção sempre exprime, exatamente, uma determinada e absoluta
dissociação dos seus autores em relação ao ambiente social e essa dissociação
expressa, de uma forma ou de outra, um conteúdo ideológico. Não há, então, obra
artística isenta de conteúdo ideológico e, ao falar sobre a maneira como os homens
são condicionados pelo modo de produção de sua vida material, Marx fornece a
fundamentação para essa afirmação:

A produção de idéias, de representações, da consciência, está, de


início, diretamente entrelaçada com a atividade material e com o
intercâmbio material dos homens, como a linguagem da vida real. O
representar, o pensar, o intercâmbio espiritual dos homens,
aparecem aqui como emanação direta de seu comportamento
material. O mesmo ocorre com a produção espiritual, tal como
aparece na linguagem da política, das leis, da moral, da religião, da
metafísica, etc. de um povo (MARX; ENGELS, 1989b, p.36)

A forma fragmentária e pouco sistematizada das reflexões de Marx e Engels a


respeito da estética gerou diversas interpretações diferentes e diametralmente
opostas, como se viu, com as conseqüentes controvérsias. Algumas leituras
dogmáticas trouxeram grande prejuízo à arte no mundo todo e, em especial na
antiga União Soviética, onde Stalin e Jadanov impuseram o chamado “realismo

22
socialista” como cânone oficial, baseado na idéia de que o proletariado necessitaria
de uma arte realmente dirigida a ele, rejeitando a existente. Essa posição enfrentou
forte resistência de intelectuais como Brecht, Benjamim e Adorno que defendiam o
“modernismo”, em oposição ao que consideravam uma simples transposição do
“realismo burguês” do século XIX, apenas com um novo conteúdo (BOTTOMORE,
p.19). Hobsbawm (1998, p.178) destaca que, por volta dessa época, “praticamente
tudo que se pode chamar de ‘modernismo’ já se achava a postos: cubismo;
expressionismo; abstracionismo puro na pintura; funcionalismo e ausência de
ornamentos na arquitetura; o abandono da tonalidade na música; o rompimento com
a tradição na literatura”. O fato de Hitler ter chegado a fechar a Bauhaus, centro de
vanguarda política e artística de Weimar, acusada de subversiva, convida à reflexão
sobre o papel da arte, não só como representação mas, também, de motor da
transformação social.

O caráter utilitário da arquitetura, ou seja, sua produção jamais se destina a


ser experimentada apenas esteticamente, não é suficiente para admitir supor que
esta poderia se manter alheia à discussão do papel da arte na vida social por ser,
aparentemente, óbvio demais. Como exposto anteriormente, a arte é um produto do
trabalho, “a materialização de um pensamento”, portanto uma “expressão material
do sujeito (PULS, 1998, p.229). Ocorre que uma arte que se define como
organizadora do espaço e se exprime através da construção e que, portanto, como
refere Coelho Netto (1993, p.21), apropria-se dos produtos da natureza e lhes dá
“uma forma adequada às necessidades humanas”, não permite considerar aquele
sujeito apenas como um indivíduo. Na arquitetura, como no cinema, no teatro e na
música,

a obra final é o resultado de um trabalho coletivo, e não apenas


individual. No entanto, mesmo quando a obra resulta do trabalho
individual, o artista não a produz isoladamente. [...] Cada indivíduo
integra um grupo social determinado, e sua obra não é apenas a
expressão de sua individualidade, mas essencialmente a expressão
de sua classe social, de sua sociedade. [...] O sujeito artístico se
determina como tal ao expressar objetivamente a subjetividade de
um grupo social particular (uma fração de classe, uma classe, uma
sociedade): o sujeito artístico é uma coletividade. Senão, a obra não
encontraria ressonância social: os contempladores não se
reconheceriam nela. O objeto artístico é sempre o espelho do sujeito
coletivo (PULS, 1998, p.229).

23
Assim, é preciso ultrapassar o puro objeto arquitetônico e reconhecer “os
valores e o mundo que o edifício torna visível” e do qual é devedor. Quando Le
Corbusier propunha a casa como uma “máquina de morar” expressava a admiração
pela era industrial e a sociedade moderna:

Ninguém nega hoje a estética que exala das criações da indústria


moderna. Cada vez mais, as construções, as máquinas se afirmam
com proporções, jogos de volumes e de matérias tais que muitas
dentre elas são verdadeiras obras de arte, porque comportam o
número, isto é, a ordem. Ora, os indivíduos da elite que compõem o
mundo da indústria e dos negócios e que vivem, em conseqüência,
nessa atmosfera viril onde se criam obras inegavelmente belas, se
acreditam muito afastados de toda atividade estética. Não têm razão,
pois eles estão entre os mais ativos criadores da estética
contemporânea. (LE CORBUSIER, 1994, p.59).

E também:

Uma grande época começa.

Um espírito novo existe.

A indústria, exuberante como um rio que rola para seu destino, nos
traz os novos instrumentos adaptados a esta época nova animada de
espírito novo.

[...]

Os primeiros efeitos da evolução industrial na “construção”


manifestam-se através dessa etapa primordial: a substituição dos
materiais naturais pelos materiais artificiais, dos materiais
heterogêneos e duvidosos pelos materiais artificiais homogêneos e
provados por ensaios de laboratórios e produzidos com elementos
fixos. O material fixo deve substituir o material natural, variável ao
infinito (LE CORBUSIER, 1994, pp.159-165).

Tal profissão de fé nos benefícios e na superioridade da indústria não aparece


apenas em seus escritos, mas também em sua arquitetura. A obra arquitetônica tem
um caráter pedagógico inegável por carregar em si, explicitamente, a representação
da sociedade em que se manifesta e é por isso, e não por se tratar a arquitetura de
uma arte utilitária, que ela não se consente arte pela arte. Talvez se possa comparar
os edifícios modernos, as máquinas de morar, de trabalhar, etc., com outras
máquinas surgidas da aplicação da ciência à tecnologia, produtos da sociedade
industrial, como o telefone, o cinematógrafo, a locomotiva e o barco a vapor.

24
Mercadorias destinadas a encantar a humanidade, símbolos do
progresso técnico dos “novos tempos”, não eram simples produtos
postos à venda, mas corporificavam idéias que buscavam impor-se
com a força das certezas: o sistema capitalista trouxera o progresso
à humanidade, a máquina era voltada para a satisfação das
necessidades humanas, a ordem burguesa instaurava a sociedade
do bem-estar, o futuro era previsível, o trabalho disciplinado tinha
possibilidades redentoras, a propriedade não era apenas desejável e
justa, como era uma meta a ser alcançada por todos, etc., etc.
(PENSAVENTO, 1997, p.21).

Nesse sentido, os arquitetos brasileiros que trabalharam em conjunto com


Vargas no esforço de modernização do país, mesmo que o fizessem por ver no
amparo do Estado a oportunidade de fazer arte pela arte, livre das imposições
mercado e com grandes possibilidades de experimentação, produziram uma arte
que cumpriu um papel civilizatório, produzindo uma alegoria do orgulho nacional.

25
2. INDUSTRIALIZAÇÃO E NACIONALISMO

Somente com o amadurecimento dos meios de


civilização, com a perfeita possibilidade de
riqueza, conforto e higiene, é que o homem
pode pensar em ser livre [...]. Ora, o que
sucede no Brasil? Mal civilizado, mal
cristianizado, o Brasil se conservou alheio à
grande disciplina social que organizou a nossa
civilização ocidental no período pré-industrial.
Veio depois a ciência e vem a máquina, e a
civilização entrou nas formas novas que
somente agora vão se revelando.
Anísio Teixeira3

2.1 – A INDÚSTRIA NO BRASIL E O PAPEL CIVILIZATÓRIO DA


EDUCAÇÃO

Fosse a hora que haver ou a que


havia
A mão que ao Occidente o véu
rasgou,
Foi a alma a Sciencia e corpo a
Ousadia
Da mão que desvendou4
Fernando Pessoa

3
A entrevista, em que elogia o vanguardismo, o nacionalismo e o “bandeirismo intelectual e
artístico” de Tarsila do Amaral e dos modernistas brasileiros, foi concedida ao Correio Paulistano de
São Paulo e publicada em 28/11/1929. Está transcrita no Livro de Aracy A. Amaral, Tarsila – Sua
Obra e seu Tempo. São Paulo: Perspectiva, 1975, p. 460 - 463.
4
2º. Verso do poema O Occidente de Fernando Pessoa, publicado em O Eu Profundo e os
Outros Eus. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980, p.56.

26
O segundo quarto do século XX e mesmo o primeiro, tem recebido dos
historiadores e intelectuais em geral os mais diversos adjetivos: trágico, terrível,
catastrófico, violento. Nunca tranqüilo. O período entre as duas grandes guerras foi
agitado não só pela maior crise que o capital vivera até então, mas também pela
articulação da classe operária e por uma intensa agitação revolucionária, em
especial na Europa Central, lutas sindicais, a fundação da Terceira Internacional
Socialista (1919), etc. Na realidade, é impossível compartimentar nossa história,
toda ela marcada pela necessidade de produzir para o mercado, ou seja, produzir
valor de troca. Assim, as bases deste cenário já estavam lançadas muito antes deste
período, quando as “atividades econômicas de uma parcela crescente da
humanidade passaram a comportar-se como elementos interdependentes de um
conjunto articulado” com o fortalecimento do sistema de economia mundial baseado
na divisão internacional do trabalho, sob a hegemonia de países em avançado
estágio de capitalização. Além da

criação de uma rede de transmissão do progresso técnico,


subsidiária do sistema de divisão internacional do trabalho; essa rede
facilita a exportação de capitais e, ao mesmo tempo, promove a
difusão dos novos bens finais de consumo que brotam no centro do
sistema, à medida que avança a acumulação e a tecnologia
(FURTADO, 1976, p. 51-54).

Esse caráter cosmopolita que a classe burguesa imprime à produção e ao


consumo em todos os países é uma condição para sua sobrevivência. “Impelida pela
necessidade de mercados sempre novos, a burguesia invade todo o globo.
Necessita estabelecer-se em toda parte, explorar em toda parte, criar vínculos em
toda parte” (MARX e ENGELS [1985], p.24-25). Ela não pode “estacionar”! O rápido
aperfeiçoamento dos instrumentos de produção e o constante progresso dos meios
de comunicação terminam por “civilizar” a força todas as nações, obrigando-as a
adotarem o modo burguês de produção.

Nesta época a educação no Brasil, como no resto do mundo e da história,


desempenhou um papel essencial na “preparação” dessa civilização. Houve um
maciço e exaustivo processo educativo iniciado ainda em meados do século XIX,
objetivando nos habituar ao consumo e à produção de mercadorias industrializadas.
A falta de uma classe burguesa organizada no país, essencialmente agrário, fez com
que intelectuais se encarregassem de liderar a criação, através da educação, de um

27
ambiente adequado para o surgimento de uma burguesia industrial, pois “enquanto a
burguesia de cada nação conserva ainda interesses nacionais particulares, a grande
indústria criou uma classe cujos interesses são os mesmos em todas as nações e
em que toda a nacionalidade está já destruída” (MARX; ENGELS, 1989, p. 95).

Foi o caso de Francisco Joaquim Bethencourt da Silva, conhecido por ter


estabelecido no Rio de Janeiro a Sociedade Propagadora das Bellas Artes, em
1856, com o objetivo de criar uma escola que formasse uma mão-de-obra capaz de
transformar a matéria prima de que o país dispunha em produtos manufaturados.
Segundo o intelectual, essa meta poderia ser atingida através do ensino do
desenho, uma linguagem universal e fácil de ler habilitando o futuro operário fabril a
entender instruções simples ou complexas. Além disso, a intimidade com o desenho
teria a capacidade de refinar atenção do trabalhador, sendo, mesmo, um instrumento
civilizador, assertiva que teve muita força entre os legisladores e educadores
brasileiros que tornaram tal disciplina obrigatória nas escolas a partir da segunda
metade do século XIX. Buscando sustentação teórica às suas proposições,
Francisco Joaquim Bethencourt da Silva se refere a este instrumento, que qualifica
como um “meio poderoso, enérgico e persuasivo de estudar, de conhecer e de
produzir” (MURASSE, 2001, p.155, grifo nosso), reproduzindo um trecho extraído
dos trabalhos apresentados pela comissão francesa, liderada pelo Barão Carlos
Dupin, durante o maior evento que procurava mostrar para o mundo a riqueza
industrial das nações, a Exposição Universal de 1851 (ver item 4.1 do Capítulo 4),
em Londres, como segue:

...A proporção dos prêmios de primeira ordem conferidos aos povos


estrangeiros, era de oito por mil por expositores; para os franceses
porem essa proporção se elevava a trinta!! - Os espíritos mais
eminentes da comissão real procuraram nas instituições francesas o
segredo de uma tão grande desigualdade – e o acharam, (vêde bem,
meus senhores) e os acharam, nas nossas Escolas de desenho
artístico e geométrico em Lyon, em Nimes e em Paris; nas nossas
escolas de artes e officios, que apresentam hoje as mais ricas
colleções, e o ensino mais completo das sciencias applicadas às
artes úteis (MURASSE, 2001, p.155).

Bethencourt pretendia um liceu de artes e ofícios “em que os nossos


artesãos, operários e mais concidadãos estudem em lições nocturnas o desenho
geométrico, industrial, artistico e architectonico” (MURASSE, 2001, p.156) e, neste

28
intento, ao nível mundial não era pioneiro. Muito antes, Adam Smith em seu A
Riqueza das Nações, publicado já em 1776, considerava que, se

[...] os livros com os quais se ensina as crianças a ler fossem um


pouco mais instrutivos do que comumente o são, e se, ao invés de
um pequeno verniz de latim, que às vezes ali [nas pequenas escolas
de caridade da Inglaterra] se ensina aos filhos das pessoas comuns
– e que dificilmente poderá ser-lhes de alguma utilidade –, se
ensinasse os rudimentos da geometria e da mecânica, a educação
literária dessa classe popular talvez fosse a mais completa possível.
É raro encontrar uma atividade comum que não ofereça algumas
oportunidades para se aplicar nelas os princípios da geometria e da
mecânica e que, portanto não exercitem e aprimorem as pessoas
comuns nesses princípios que constituem a propedêutica necessária
para as ciências mais e levadas e mais úteis (SMITH, 1983, p.215-
216).

Em um pequeno trecho de seu discurso, Bethencourt, não irrefletidamente,


deixa entrever o motor de seu propósito:

Não se riam também os ignorantes de todas as côrtes, ante a face de


Colombo, quando elle lhes fallava de um novo mundo? Não
classificaram de louco ao inventor do vapor, a uma das maiores
intelligências que há visto a terra? O próprio Christo não foi
vilipendiado pelos impios que não podiam comprehender a grandeza
de sua missão? Então porque hesitar? (MURASSE, 2001, P.158).

Aqui é inevitável apontar o encadeamento lógico que Bethencourt estabelece


ao invocar uma tal “tríade” de notáveis: nas palavras de Marx ([1985?], p.23), “a
grande indústria criou o mercado mundial preparado pela descoberta da América” e
se, no Velho Mundo, a questão religiosa, por esta época já estava resolvida, pois a
burguesia afogara “os fervores sagrados do êxtase religioso”, ela ainda era pungente
no Brasil. Desta maneira, o orador parece colocar, quase que hierarquicamente nos
seus devidos pódios, os predecessores da revolução industrial, encimando a
alegoria com a figura do próprio filho de Deus.

Embora possa parecer despropositado que indivíduos aparentemente não


diretamente identificados com a classe burguesa e, ainda mais, em um país com um
desenvolvimento industrial incipiente, demonstrem tamanho engajamento, é preciso
analisar de um ponto de vista histórico para entender que as relações de produção
no Brasil, apesar de o estabelecimento do modo de produção capitalista ter se dado
pela via colonial, eram as mesmas da Europa. Para Marx,

29
é evidente que a grande indústria não alcança o mesmo grau de
desenvolvimento [em todos os países e nem] em todas as
localidades de um mesmo país. [...]. Do mesmo modo, os países em
que se desenvolve uma grande indústria influem sobre os países
mais ou menos não industriais, na medida em que estes últimos são
compelidos pelo comércio mundial à luta universal da concorrência
(MARX e ENGELS, 1989, p. 95 e 96).5

Michael Löwy (1994, p.101-103) faz uma interessante análise do


entendimento de Marx a respeito de ciência e dos intelectuais que chamam a si a
causa do capital. A burguesia seria “a classe que ‘cria e forma’ as visões sociais de
mundo (‘superestruturas’), mas estas são sistematizadas e desenvolvidas por seus
‘representantes políticos e literários’, isto é, seus ideólogos [...]”. Ainda segundo
Löwy, para Marx, os clássicos, como Ricardo “produziram a ciência por interesse
científico, ainda que tivessem cometido erros; [...]” enquanto que os vulgares, aos
quais atribui má-fé e “os chama por termos carregados de indignação e desprezo:
‘vendidos’, ‘sicofantas’”, “pelo contrário, procuraram ‘acomodar a ciência aos
interesses que lhes eram estranhos e exteriores.’”

Para José Veríssimo (1985, p.36-37) “no fundo das idéias morais há um
elemento social e histórico” e a atividade intelectual teria “um poder superior para
dirigir e transformar os outros gêneros de atividade”, abrindo caminhos à ação,
dirigindo as demais funções sociais. A força do indivíduo seria então determinante
na transformação social:

O homem de gênio é freqüentemente aquele que traduz as


aspirações de sua época em idéias: pronuncia a palavra, um povo
inteiro o segue. As grandes revoluções morais, religiosas, sociais,
realizam-se quando os sentimentos, por muito tempo represados ou
apenas conscientes, chegam a formular-se em idéias e palavras:
abriu-se o caminho, o fim aparece com os meios, efetua-se a seleção
e, a um tempo, todas as vontades se dirigem no mesmo sentido,
como uma torrente que achou o ponto pelo qual é possível a
passagem (Ibid. , p.36)

É preciso ter em mente que essas iniciativas individuais ou de pequenos


grupos só adquirem força e se tornam movimentos e ganham mais adeptos se
encontram respaldo na sociedade e isso só vai acontecer se as tendências refletirem

5
O texto entre parênteses foi suprimido no manuscrito.

30
as necessidades dessa sociedade. Fernando de Azevedo (1964, pp.470-472) chama
a atenção para o declínio que as artes no Brasil sofreram durante o fim do Império
graças, em parte, ao “sistema de proteção individual e de subvenções aos artistas”
que substituiu o antigo costume de contratar missões artísticas e culturais. Dom
Pedro II preferiu mandar, às suas expensas, os artistas aperfeiçoarem seus estudos
“no estrangeiro”, criando

com esse sistema “um movimento artificial e estéril”, pois, na justa


observação de Eduardo Prado, “não é enviando à Europa meninos
mais ou menos prodígios ou gênios mais ou menos incompreendidos
que se conseguirá encorajar a arte brasileira”, cujos progressos
estão menos ligados a alguns artistas excepcionais que ao
desenvolvimento, por todos os meios, da educação artística do país
(Ibid., p. 472).

Para ele, tanto a instrução geral da nação, “que em última análise não
depende senão de sua civilização e de sua riqueza”, quanto a artístico-profissional
não constituíam ainda, e Azevedo escreve no início dos anos quarenta do século
XX, um sistema suficientemente desenvolvido “em altura e extensão para produzir
grandes resultados”. Para o desenvolvimento das artes em geral observava que o
que faltava era o ensino técnico e profissional que se reduzia, no início da
República, a “dois liceus de artes e ofícios, o do Rio de Janeiro, fundado em 1856
por Bethencourt da Silva e o de São Paulo” (Ibid., p.472).

Na Europa, diversos movimentos de configuração semelhante ao que


Bethencourt pretendia aconteciam, quase simultaneamente, e lá os intelectuais
tivessem o apoio dos industriais ou, o que no limite é a mesma coisa, o
financiamento dos conselhos municipais. Foi o que aconteceu na Alemanha, ainda
que só no início do século XX ( portanto muito depois da organização pretendida por
Bethencourt), com a Deutscher Werkbund que redundaria, posteriormente na
Bauhaus, comentada na nota de rodapé 7, uma associação criada por iniciativa de
intelectuais e empresários tendo à frente Hermann Muthesius, que reunia artistas e
artesãos com a indústria com o objetivo específico criar e manter a qualidade da
produção industrial do país. Algo parecido acontece com o movimento Arts and
Crafts inglês, criado por William Morris como reação ao que chamava de mau gosto
dos produtos industrializados até então. Também, são célebres os escritos do
arquiteto Le Corbusier a respeito da estética da máquina, sobre a necessidade-tipo,
“as conseqüências inquietantes das novas técnicas”, a maneira como “a indústria,

31
exuberante como um rio que rola para seu destino, nos traz os novos instrumentos
adaptados a esta época nova animada de espírito novo” e suas expressões “é
preciso criar o estado de espírito da série”, referindo à necessidade da
estandardização fabril (LE CORBUSIER, 1981). Apesar da ênfase nas “forças de
organização modernas”, o arquiteto não estava alheio ao mercado em si e,
claramente, tentava formar a mentalidade do consumidor. Ademais, como é possível
depreender do discurso pronunciado por Bethencourt perante os membros
fundadores da Sociedade Propagadora da Bellas-Artes do Rio de Janeiro,
instituições semelhantes espalhavam-se pela Europa, em especial na França,
Inglaterra e Alemanha.

Apesar de não abordado aqui, outro fator – também manifesto no texto


analisado, embora menos claramente – que, sem dúvida, determina essa orientação
dos processos educativos é o uso da educação como instrumento para a
manutenção da ordem social, numa reação da burguesia do período em questão, às
primeiras crises do capital. Na Exposição Universal de Paris de 1855, por exemplo,
foi discutida a educação dos trabalhadores e na de 1867, também em Paris, já havia
um setor reservado para amostra de programas educacionais para operários (ver
item 4.1 do Capítulo 4, nota).

Evidencia-se, dessa maneira, que a educação não é autônoma e, mesmo que


os discursos tentem, o tempo todo, fazer parecer o contrário, ela não conduz a
transformação da sociedade, mas antes, segue atrás e acomoda-se às mudanças
em curso, tendo “como objetivo vital fazer com que uma nova época histórica entre,
de um modo intencional, portanto consciente, nas mentes dos indivíduos”
(FIGUEIRA, 1995, p.13). A educação fez parte – e é inegável que continua fazendo -
do processo de expansão do capital. Sua história é simplesmente a história dos
homens

Apesar dessa atmosfera reformadora que o mundo respirava, Bethencourt,


certamente em função da falta de apoio da classe – já existente, mas não
organizada ainda, como exposto anteriormente –, a quem mais interessaria o projeto

32
e também em virtude de o Estado ainda estar mais comprometido com a economia
agrícola6, não logrou pleno êxito em seu objetivo. No Brasil, seu pioneirismo ainda
não havia sido plenamente incorporado ao pensamento nacional, a despeito de já
carregar “a enorme força de expansão das forças produtivas e de implantação do
mercado mundial” que marcaria a virada do século XIX para o XX, com “formulações
de cunho liberal, acirrados debates em torno do progresso nacional, movimentos em
favor da República, críticas à escravidão, proposições em torno da educação
nacional [...]” (TULLIO, p.12). Assim, apesar da acolhida que obteve junto ao
restante dos intelectuais da época, o mesmo não aconteceu junto à nascente classe
burguesa e, assim, as oficinas que seriam imprescindíveis para treinar o estudante-
operário simultaneamente com as aulas teóricas para que, além de adquirir o
conhecimento e destreza manual possibilitassem o conhecimento dos materiais e
dos processos de fabricação, requeridos pela nova organização do trabalho, e que
deveriam funcionar em integração com as indústrias, só viriam a ser criadas em
1911, portanto mais de meio século depois da fundação do liceu de artes e ofícios
vinculado à Sociedade Propagadora das Belas Artes7. Pior era a situação de vários
outros liceus em outras províncias que fecharam por falta de alunos.

6
É interessante notar como havia uma maior preocupação do Estado para com o setor que
julgava – e até então não se enganava – ser preponderante. Mesmo os trabalhadores de cada setor
recebiam tratamento diferenciado, como acentua Ricardo Antunes (1988, p.65-66). Embora aqui se
refira aos anos imediatamente anteriores à revolução de 1930, a prática já era comum antes; apenas
não se apresentava de forma tão nítida: “Tratando de forma diferenciada os vários segmentos da
classe trabalhadora, o Estado tinha, perante os trabalhadores vinculados às atividades fundamentais
para a exportação do café, como ferroviários e portuários, um tipo de relacionamento bastante distinto
daquele dispensado aos operários industriais vinculados à burguesia industrial que como se sabe,
não constituía uma fração politicamente dominante. Se com relação aos marítimos e portuários havia
uma relação integradora e conciliadora, a atenção dispensada aos trabalhadores fabris não foi muito
além da conhecida repressão.”
7
É digno de nota que um sistema análogo, se bem que muito mais organizado e
fundamentado, que se estabeleceria na Alemanha, em 1919, iria revolucionar completamente a
relação arte-técnica. Era a Bauhaus, criada visando superar o método empírico, incapaz de responder
às exigências da racionalização industrial. Contava com 12 oficinas que estabeleciam o elo entre a
escola e a indústria, integrando “os conhecimentos teóricos dos materiais e do processo produtivo
com os conhecimentos técnico-operacionais. [...] Embora sendo uma instituição estatal, jamais
recebeu grande apoio financeiro e político e freqüentemente completava o orçamento fornecendo
para a indústria, que era seu desaguadouro natural, modelos projetados por docentes e alunos em
estreita colaboração” (CARISTI, 2000, p. 229-233).

33
Mas a mobilização de forças da elite intelectual do país para consolidar a
educação formal como elemento preponderante no processo de formação do
cidadão trabalhador para a indústria não arrefeceu. Segundo Guaraciaba Aparecida
Tullio (Ano ?), José Veríssimo é um exemplo representativo da consciência que os
homens produzem no início do século XX a respeito daquele período e assim se
expressa acerca do atraso em que se encontrava o país, principalmente em relação
à Europa, que atribuía à educação cívica “pervertida” que recebíamos:

Nunca tivemos vida comercial, porque o comércio esteve sempre e


está ainda hoje em mãos estrangeiras; nunca tivemos vida industrial,
porque não temos indústrias: nunca tivemos sequer vida agrícola,
porque a agricultura eram os escravos que a faziam; [...] e,
finalmente, nunca tivemos vida intelectual, porque nunca tivemos
movimento científico, movimento literário ou movimento artístico e
esses, a um tempo fatores e resultantes da civilização, a Ciência,
a Arte, a Literatura foram apenas apanágio de uma limitada minoria
antes afastada que intrometida no movimento geral da Nação [...]
(VERÍSSIMO, 1985, p. 62, grifo nosso).

Aos poucos começam a aparecer por todo o país escolas que pretendem se
encarregar da educação artística profissionalizante. São empreendimentos da
iniciativa privada, quase sempre visando suprir as deficiências causadas pela
omissão oficial e fornecer a mão de obra necessária à indústria cada vez mais
necessitada de operários especializados:

[...] com a vitória do federalismo, produziu-se, embora lentamente, no


domínio das artes, acompanhando o fenômeno da descentralização
política, um movimento de irradiação, de que são as primeiras
manifestações as novas escolas profissionais artísticas, que vão
surgir nos Estados, por iniciativa particular, como a Escola de
Desenho e Pintura, de Curitiba, o Instituto de Belas-Artes de Manaus,
fundada por Joaquim Franco, a de Belém do Pará (1918), a de Belo
Horizonte. O Liceu de artes e Ofícios do Recife e a Escola de Belas-
Artes de São Paulo (1925) que já se vinha transformando, desde os
fins do século XIX, no maior foco de cultura artística depois do Rio de
Janeiro. A Academia de Belas-Artes da Bahia, - instituição particular
que procedia do Império (1877), reformada em 1899, tomou então
um novo impulso (AZEVEDO, 1964, p.472, grifo nosso).

É somente com o governo do presidente Getúlio Vargas que o Estado


começa a assumir o papel de mediador das demandas da burguesia industrial,
principalmente a partir de 1937 quando imprime novos rumos à política escolar e
inaugura

34
A fase mais brilhante e fecunda no domínio da educação profissional,
em seus diversos graus e em todas as formas. Os discursos do
Presidente Getúlio Vargas mostram com lucidez, em vários trechos
incisivos e de um alcance que não é preciso encarecer, essas
tendências como a sua própria orientação pessoal, dirigida
francamente para a educação técnica e profissional do país. (Ibid.,
p.739).

Além disso, consagra na própria Constituição de 10 de novembro de 1937, no


artigo 129, a nova orientação educacional, estabelecendo medidas para a
organização do ensino profissional e seu desenvolvimento, tanto na esfera pública
como na privada, para a qual concederá subvenções8. Objetiva, com isso, obter a
cooperação das fábricas – e dos sindicatos – na educação profissional, “pela criação
e manutenção, nos estabelecimentos abris, de escolas para aprendizes e de cursos
de aperfeiçoamento industrial para adultos e menores”. Azevedo (1964, pp.739-740)
ainda observa a importância das “escolas técnicas que tem têm fim a formação do
técnico, elemento intermediário entre o artífice e o engenheiro”. Dessa forma, a
educação se adaptava às mudanças sociais,

decorrentes do desenvolvimento das indústrias, da divisão e


racionalização do trabalho, da multiplicação das profissões, da
organização dos sindicatos e, portanto, às necessidades novas dos
indivíduos. As modificações nas condições industriais, tais como o
aperfeiçoamento e a extensão do trabalho da máquina e o emprego
de processos de fabricação científicos, alteraram as necessidades
profissionais que não podiam ser atendidas com as escolas
profissionais de velho tipo, sem articulação estreita com as indústrias
(Ibid., p.739).

Mesmo antes da Revolução de 30, Getúlio Vargas já destacava o papel da


educação como preparadora de mão de obra em seus discursos durante a
campanha para as eleições de 1º. de Março de 1930, em que seria derrotado. A
plataforma da Aliança Liberal, coligação que o apoiava, mesmo podendo ser
qualificada segundo Fonseca (1989, pp. 107-123) como um documento vago, “mais
com promessas do que com definições”, e embora traga como centro das

8
Como parte do plano de incentivo ao ensino industrial, “já haviam sido contratados em 1941,
na Suíça, 44 especialistas a que se reunirão para completarem o quadro de técnicos estrangeiros, 25
engenheiros ou técnicos, contratados nos Estados Unidos para o fim especial de orientar o ensino
industrial, nas próprias indústrias, e dirigir seções ou reger cursos na primeira escoa técnica a ser
instalada na capital do país” (AZEVEDO, 1964, pp.740-741).

35
preocupações o setor primário, com ênfase na defesa da cafeicultura cuja produção
representaria 70% das exportações brasileiras, não esqueceu a indústria, que
aparece citada de forma diluída em três tópicos diferentes do documento.
Conquanto o autor defenda por isso, que os “aliancistas” não possuíam uma
ideologia industrializante por não atenderem as reivindicações imediatas da
burguesia industrial, admite que a plataforma inclua pontos de longo prazo que a
beneficiariam como classe, como a siderurgia e a educação profissionalizante.

Até então o ensino era meramente teórico e preparador das elites


(centrado no estudo das línguas, como português, latim, e francês e
de ‘humanidades’, como história e filosofia) e, no nível médio,
basicamente o curso clássico. A plataforma postulou que se fizessem
alterações tanto no ensino médio como no superior visando a
atualizá-los. Pregou-se a necessidade de fomentar cursos de
especialização, assim como as ciências econômicas e as disciplinas
financeiras e administrativas, entre outras. O ensino deveria ser
substituído por outro, mais pragmático e preparador de mão-de-obra.
Seria necessário introduzir cursos técnico-profissionais, os quais,
preparariam mais ao trabalho que a cultura especulativa. Este ponto
atendia aos industriais que reclamavam da inexistência de mão-de-
obra especializada, tanto para a produção como para a
administração, o que lhes impunha muitas vezes estrangeiros. Iam,
portanto, ao ideal de tirar para fora da fábrica parcial ou totalmente o
custo de treinamento e especialização; a escola, portanto, deveria
acompanhar os novos tempos [...] (FONSECA, 1989, p.124).

Apesar de todo esforço civilizatório anterior à revolução de 1930, o principal


papel do Brasil na rede da divisão internacional do trabalho continuava sendo o de
fornecedor de matéria prima para os países altamente industrializados e, como sua
economia permanecia, por isso, essencialmente baseada na agricultura (embora não
apenas nela, como se verá adiante), a crise de 1929, com sua violenta deterioração
nos preços dos produtos primários no mercado internacional, atingiu dimensões
catastróficas entre nós, já que a América Latina, dentre as regiões subdesenvolvidas
era “uma das que mais se haviam integrado no sistema de divisão internacional do
trabalho” (FURTADO, p.60-63). Nosso principal produto, o café, cujo volume de
exportação correspondia a algo entre dois terços e três quartos do mercado mundial
sofreu uma forte queda de demanda internacional motivando a destruição dos
grandes estoques encalhados. Conforme Eric Hobsbawm (1995, p.97-99), a partir
deste acontecimento o Brasil se tornaria “um símbolo do desperdício do capitalismo
e da seriedade da Depressão, pois seus cafeicultores tentaram em desespero
impedir o colapso dos preços internacionais queimando café em vez de carvão em

36
suas locomotivas a vapor”. Diante do desemprego em massa que se alastrou pelo
mundo inteiro e do colapso dos preços agrícolas, sem que houvesse qualquer
possibilidade aparente de solução “dentro do esquema da velha política liberal que
tornou tão dramática a situação dos tomadores de decisões econômicas” ficou
evidente que a Grande Depressão havia conseguido destruir as estruturas do
liberalismo econômico mundialmente, impelindo as políticas de Estado dos governos
ocidentais a priorizar as considerações sociais em detrimento das econômicas,
engendrando mecanismos de abrandamento das pressões sociais, como concessão
de subsídios agrícolas, políticas de pleno emprego, sistemas previdenciários, etc.,
tentando-se evitar com isso os perigos “demasiado ameaçadores” da radicalização –
da esquerda e da direita.

Era preciso agora assegurar as condições para o pleno desenvolvimento da


indústria nacional que não era, em especial a paulista, de modo algum incipiente
“nem irrelevante para o processo econômico e político; muito pelo contrário, traça e
efetiva seu projeto de hegemonia” criando, em 1928, a partir de uma cisão interna da
Associação Comercial, o Centro de Indústrias do Estado de São Paulo (CIESP). Tais
indústrias foram criadas a partir do capital mercantil-financeiro acumulado com a
exportação do café, inicialmente invertido, não casualmente, para a criação de
indústrias que se vinculavam originariamente à própria produção cafeeira, como as
de sacaria e para a infra-estrutura de serviços – transporte e aparelhamento urbano
(DE DECCA, 1984, passim). Essa indústria inicialmente voltava-se para a produção
de bens de consumo assalariado, que requeria um volume de investimentos menor,
com tecnologia pouco sofisticada e disponível no mercado internacional. Não se
tratava de indústria pesada cujos bens de produção envolviam riscos altíssimos para
o investimento por demandar “uma tecnologia muito mais complexa e não disponível
no mercado internacional, naquele momento de disputas imperialistas” (ANTUNES,
1988, p.41).

Foi a partir de 1920 que se registrou a maior evolução industrial, no


Brasil, e particularmente em São Paulo. O que foi o crescimento da
produção fabril, neste período de 1919 a 1938, pode-se avaliar pelos
seguintes dados estatísticos. A produção industrial em papel-moeda
quase quadruplicou no Brasil, quintuplicou em São Paulo. O número
de operários, que atingia a 293.673, segundo o recenseamento de
1920, elevou-se em 1940, a 781.185. (AZEVEDO, 1964, p.112).

37
No início da década de 30 foram implementadas conquistas sociais dos
operários, como a redução da jornada de trabalho e direitos trabalhistas, e embora
enfrentassem a resistência dos industriais individualmente, De Decca (1981, p. 176)
argumenta que a posição contrária que o CIESP adotava em relação a essas leis
parece ser o que chama de “medida de ocasião”, pois a grande indústria precisava
contemplar em seu discurso a maioria das pequenas e médias indústrias que
poderiam ter suas taxas de lucro comprometidas por medidas como a Lei de Férias
e o Código de Menores. O objetivo era o de unificar a burguesia industrial, formando
um bloco único nas disputas com o proletariado.

Apenas para citar um exemplo, as indústrias de F. Matarazzo


possuíam, em 1928, máquinas apropriadas para menores, utilizando
essa força de trabalho sob forma intensiva. Evidentemente, essas
grandes indústrias, apesar disso, poderiam arcar com os ônus das
leis sociais e logo em 1931 já elogiavam através da FIESP essa nova
regulamentação estatal, levando com elas toda a massa de
pequenos e médios empresários (ibid., p.175).

A necessidade de mecanismos que amenizassem as precárias condições de


vida do trabalhador era destacada desde 1921 por Roberto Simonsen, obstinado
defensor da idéia da indústria como único instrumento capaz de resolver as mazelas
nacionais e introdutor do taylorismo no Brasil com a publicação do livro O Trabalho
Moderno:

Compete, portanto, aos industriais, no seu próprio interesse, evitar


que de seus principais colaboradores se forme uma massa hostil
buscando remédios para o seu mal-estar em conquistas políticas
perturbadoras da produção. Essa evitação seria conseguida pela
justa paga do ‘verdadeiro rendimento do trabalho’ – estabelecida de
modo a premiar com eqüidade o esforço pessoal e as desigualdades
fatais da produtividade de um homem para outro. Teríamos desse
modo individualizado o operário, interessando-o diretamente na
produção, tornando-o um fator crescente da riqueza e incorporando-o
na sociedade por meios econômicos [...] (SIMONSEM, 1921 apud DE
DECCA, 1981, p. 176).

Simonsen foi um dos maiores difusores da idéia da industrialização no país,


mas, preocupado com a situação de tensão das relações entre capital e trabalho na
Europa iniciada com as primeiras crises do capital, sempre procurou alertar os
industriais brasileiros para as lutas sociais que por lá se travavam, colocando em
risco a própria sobrevivência da burguesia.

38
Segundo [Ortega y Gasset], assistimos nos últimos tempos, nos
meios europeus, o espetáculo de uma transbordante maré de
multidões, que tudo invade, desde os estabelecimentos de diversões
até os recintos sociaes, por sua natureza, reservados a uma minoria
da elite. O grande crescimento da população da Europa [...], a
democracia liberal, a experimentação scientifica e o industrialismo,
produziram o surto extraordinario que teve a civilização no século
XIX. [...] O ensino foi se especialisando e tomando um caracter de
pratica para se vencer facilmente na vida, com um certo abandono
da formação e do aperfeiçoamento da sensibilidade espiritual. Surgiu
um typo que Gasset chama de “homem massa” (SIMONSEN, 1933,
p. 36).

Alarmado com a possibilidade dessa “massa” com sua, como se refere


Simonsen, “mentalidade perigosa” e “incapaz de submeter-se à dominação de
minorias superiores”, por “erro de orientação” ameaçar a civilização de um
retrocesso, dedicou seus esforços no sentido de alertar a elite industrialista para a
necessidade de conciliar os interesses do capital e do trabalho, não pregando a
igualdade das classes, algo em que não acreditava, mas buscando mecanismos
para conter a indocilidade daquelas massas que não se manifestaria apenas no
terreno político, mas no terreno intelectual e na própria técnica:

Na esphera intellectual subleyam-se quanto á existencia de normas


orientadoras e julgadoras; no terreno político reagem contra os
processos de acção indirecta da democracia liberal, lançando mão
dos meios violentos da acção directa. No campo da thecnica, o
excesso de especialização foi constituindo um sêr incpaz de te uma
idéa de conjunto sobre quasi todos os problemas que interessam a
sua existencia de homem civilisado, enquanto que o proprio avanço
da especialisação lhe dá o estimulo de uma pretensão excessiva
para lidar com os demais problemas sociaes que não são de sua
alçada (Ibid., p. 39).

Certamente já eram conhecidos de nossos intelectuais os alertas emitidos por


Aléxis de Tocqueville (1977, p. 579-582) em seu célebre discurso à Câmara dos
Deputados francesa, em 27 de Janeiro de 1848, manifestando seu “temor em
relação ao futuro”, sentimento que dizia não lhe ser particular, mas, ao contrário, se
espalhava por todo o país “o instinto da instabilidade, esse sentimento precursor de
revoluções, que muitas vezes a anuncia, que às vezes as faz nascer”. Advertia ainda
que entre a população trabalhadora se espalhava a opinião de que a divisão do bens
feita até então era injusta e que a propriedade repousaria em bases desiguais.

39
Não vedes que pouco a pouco se propagem em seu seio opiniões,
idéias, que de modo nenhum irão apenas derrubar tal lei, tal ministro,
mesmo tal governo, mas a sociedade, a abalá-la sobre as bases nas
quais hoje repousa? Não ouvis que entre elas se repete
constantemente que tudo o que se acha acima delas é indigno de
governá-las? (TOCQUEVILLE, 1977, P. 582)

Alerta então que idéias como essas, se se propagassem ente o comum do


povo, penetrando profundamente nas massas certamente acarretariam as mais
temíveis revoluções: “Creio que dormimos, no momento em que estamos, sobre um
vulcão”.

Para que o país atingisse o estágio de desenvolvimento industrial por que se


empenhava Simonsen e grande parte da burguesia nacional sem que isso
implicasse, por outro lado na criação de uma massa revolucionária, seria necessária
a interferência do Estado em todos os níveis. Essa busca do fortalecimento da
organização da burguesia nacional, ao mesmo tempo em que se refreava o
liberalismo, teve na figura do então Presidente da República, Getúlio Vargas, um
enérgico patrocinador. Sempre apresentado como homem de natureza controversa,
característica que demandaria os mais diversos conceitos para sua definição:
“populista, bonapartista, autoritário, fascista, totalitário”, Vargas se mostra bastante
determinado ao se propor a ser o agente mobilizador da necessária “transição da
sociedade tradicional para a moderna (implicando um deslocamento do campo para
a cidade, do agrário para o industrial)”, do modelo agroexportador para o modelo
nacional desenvolvimentista (CAPELATO, [?], p. 185-186), enfim, da consolidação
da burguesia brasileira. Como parte do processo, Vargas começava a atender às
reivindicações pertinentes dos articuladores dos movimentos culturais (portanto,
educacionais) brasileiros, propiciando o alargamento e a ampliação da participação
da classe artística e intelectual e extensão das reformas no ensino, já iniciadas e que
visavam formar o cidadão, o trabalhador, para todo o país como refere Antônio
Cândido (1984, p.27).

Mas o papel de Vargas não se limitou a atitudes conciliatórias. O país já


contava com um proletariado organizado capaz de conquistas sociais e que já
começava a se manifestar no sentido de garanti-las e, segundo Edgar De Decca
(1981, p. 174-176), “apareciam aos olhos da burguesia industrial como uma
demonstração clara de fraqueza do Estado frente à luta de classes”. Como uma

40
forma de resposta do Estado é criada, em 1935, a Lei de Segurança Nacional, um
instrumento legal com o objetivo de abafar principalmente as intensas manifestações
do proletariado. “É o Partido Comunista clandestino, são os trotskistas em uma
forma de fração bolchevique, são os anarquistas individualmente ou em sindicatos
que denunciam todo o regime existente” (CARONE, 1978, p. 58). Alguns de seus
artigos manifestam claramente o seu escopo:

São crimes contra a ordem social, além de outros definidos em lei:

Art. 14. Incitar diretamente o ódio entre as classes sociais. [...]

Art. 15. Instigar as classes sociais à luta pela violência. [...]

Art. 17. Incitar ou preparar atentado contra pessoa, ou bens, por


motivos doutrinários, políticos ou religiosos. [...]

Art. 18. Instigar ou preparar a paralisação de serviços públicos, ou de


abastecimento à população. [...]

Art. 19. Induzir empregadores ou empregados à cessação ou


suspensão do trabalho, por motivos estranhos às condições do
mesmo.

Art. 20. Promover, organizar ou dirigir sociedade, de qualquer


espécie, cuja atividade se exerça no sentido de subverter ou
modificar a ordem política ou social por meios não consentidos em
lei. [...]

§ 1º. Tais sociedades serão dissolvidas e seus membros impedidos


de se reunir para os mesmos fins,

§ 2º. Será punido com metade da pena quem se filiar a qualquer


dessas sociedades. (Ibid., p. 61).

2.2 – A QUESTÃO NACIONAL E A ARTE MODERNA

[...]que catedrais tendes no pensamento? Aqui


aprendereis a construí-las duas vezes: aprendereis da
nova técnica e ajudareis na criação de novos símbolos.
Vilanova Artigas

41
O conceito de nação é relativamente novo. Surge na era moderna, quando da
formação dos primeiros Estados, que passam a se chamar Estados Nacionais,
nascidos da reunião de pessoas de diversas origens, “tendo ou não religião comum,
pertencendo ou não a diferentes etnias” que passam a se sentir identificadas com
uma determinada região, sendo que a homogeneidade do povo de cada país
somente depois é construída. É a existência do Estado que agrupa esses indivíduos
“em um povo que se sente um unificado por origens comuns”, passa a falar a
mesma língua e aprender uma história comum, sentindo-se dono de uma herança
comum. Passa a haver uma homogeneização e padronização dos habitantes de
uma nação cujas fronteiras verdadeiras passam a ser a língua nacional, escrita ou
falada, compreensível para a massa. Ao longo do tempo, uma memória nacional é
criada: a bandeira, o hino e os feriados nacionais organizam esses indivíduos
dando-lhes um sentido de pertencimento, de identificação e familiaridade diante de
uma imagem representada (OLIVEIRA, 1998, pp.185-186).

As coisas novas precisam estar relacionadas à experiência anterior


para que sejam aceitas como fatos verdadeiros. A veracidade se
obtém pela associação do novo com imagens já existentes no
arquivo de experiências. O processo de identificação liga
experiências novas a experiências antigas, produz familiaridade e/ou
estranhamentos e distinções por meio da linguagem oral, escrita,
visual. Assim, as identificações são dominadas pela semelhança
versus diferença, e pela igualdade versus hierarquia. Nós e eles,
igual e superior sintetizam esse processo. A nação é uma das formas
de construção de identidade, como o lugar de origem, a família, a
religião, a etnia (Ibid., p. 186).

Essa familiaridade afastaria a atitude de manter-se estrangeiro, inspirando a


ordem e a solidariedade. Não à toa, no Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova
(AZEVEDO et al, 1932, pp.2-6) lamentava-se a inexistência no Brasil de uma “cultura
própria” que convencesse os brasileiros da “existência de um problema sobre
objetivos e fins da educação” e propunha a solidariedade e a disciplina como valores
permanentes:

O trabalho, a solidariedade social e a cooperação, em que repousa a


ampla utilidade das experiências; a consciência social que nos leva a
compreender as necessidades do indivíduo através das da
comunidade, e o espírito de justiça, de renúncia e de disciplina, não
são, aliás, grandes “valores permanentes” que elevam a alma,
enobrecem o coração e fortificam a vontade, dando expressão e
calor à vida humana? (Ibid., p.6)

42
Segundo Max Weber (1999, p.517), o moderno Estado industrial pressupõe o
nacionalismo e a legitimação do poder desse Estado. “Da aliança forçada entre o
Estado nacional e o capital nasceu a classe burguesa nacional – a burguesia no
sentido moderno da palavra. É, portanto, o Estado nacional que garante ao
capitalismo as possibilidades de sua subsistência e, enquanto não cede lugar a um
império universal, subsistirá também o capitalismo”.

O Estado, do mesmo modo que as associações políticas


historicamente precedentes, é uma relação de dominação de
homens sobre homens, apoiada no meio da coação legítima (quer
dizer, considerada legítima). Para que ele subsista, as pessoas
dominadas têm que se submeter à autoridade invocada pelas que
dominam no momento dado. Quando e por que fazem isso, somente
podemos compreender conhecendo os fundamentos justificativos
internos e os meios externos nos quais se apóia a dominação ( Ibid.,
p. 526).

A nação seria, então, portadora de uma missão civilizatória, devendo “gestar


uma ordem social interna e externa que fosse adequada ao pleno desenvolvimento
de sua suposta natureza”. Desse modo afirmaria, “através do Estado os seus
interesses de expansão, justificados pela superioridade racial ou cultural frente a
outros povos”, freqüentemente considerados como ameaçadores ou simplesmente
inferiores, restando-lhes apenas a submissão. Desse modo, glorificava-se a
desigualdade como lei superior da vida social, exercendo-se uma “xenófoba e elitista
exclusão do estrangeiro, do inferior, do mais fraco, assim como dos nacionais que
não aceitavam o modelo de sociedade proposto ou que não se enquadravam dentro
dos critérios definidores do nacional”. Esses mecanismos de exclusão não
necessariamente deveriam ser violentos, estando presentes no Brasil, por exemplo,
nas práticas assimilacionistas aparentemente democráticas que, pregando a
mestiçagem como uma forma de desvanecer a cultura do estrangeiro ou do
diferente, suprimindo-o da paisagem social. Em geral, a nação era vista como
possuidora de vontade e consciência próprias que estaria acima da soma da
vontade da maioria de sues membros. A consciência desse corpo nacional, com
interesses considerados acima do interesse individual, freqüentemente seria
interpretada por um partido único ou por um líder carismático (TEIXEIRA;
MEDEIROS; VIANNA, 1999, p.317).

Uma das justificações internas (Weber considera que existem três em


princípio), isto é, fundamentos da legitimidade de uma dominação é “a autoridade do
43
‘eterno ontem’, do costume sagrado por validade imemorável e pela disposição
habitual de respeitá-lo: dominação ‘tradicional’ [...]”. Outra é

a autoridade do dom de graça pessoal, extracotidiano (carisma): a


entrega pessoal e a confiança em revelações, heroísmo ou outras
qualidades de líder de um indivíduo: dominação ‘carismática’, tal
como a exercem o profeta ou – na área política – [...] o grande
demagogo e o chefe de um partido político. Por fim, a dominação, em
virtude de ‘legalidade’, da crença na validade de estatutos legais e da
competência objetiva, fundamentada em regras racionalmente
criadas, isto é, em virtude da disposição de obediência ao
cumprimento de deveres fixados nos estatutos: uma dominação
como a exercem o moderno ‘servidor público’ e todos aqueles
portadores de poder que com ele se parecem neste aspecto (Ibid.,
p.526).

Essa centralização política viria, segundo Marx e Engels (1985, p.25), como
conseqüência da supressão cada vez maior pela burguesia da dispersão dos meios
de produção, agora centralizados, da propriedade, que passa a se concentrar em
poucas mãos e da população, que precisa ser aglomerada:

Províncias independentes, apenas ligadas por débeis laços


federativos, possuindo interesses, leis, governos e tarifas aduaneiras
diferentes, foram reunidas em uma só nação, com um só governo,
uma só lei, um só interesse nacional de classe, uma só barreira
alfandegária (Ibid., p. 25).

No Brasil, desde o início da Primeira República, os debates sobre a questão


nacional eram acalorados e as posições se dividiam entre dois modelos de
identidade nacional, uma considerando nosso passado colonial e imperial como
positivo, que “acreditava na excelência de nossas tradições, fruto da colonização
portuguesa e da ação da Igreja Católica” e, por isso se negava a aceitar como
modelo a sociedade americana, de colonização inglesa e inspiração protestante e
outra, de forte conteúdo antilusitano, a dos republicanos que “via a República como
a ruptura necessária com o passado português corporificado no regime monárquico”,
pregando o total rompimento com o passado histórico e a integração com o mundo
americano, identificado com a modernidade. A nacionalidade, para os últimos, se
estabeleceria com a “construção de uma nova sociedade organizada pelos nacionais
e na qual as classes empresariais teriam lugar de destaque” (OLIVEIRA, 1998,
p.186-187). Entre os dois modelos havia em comum a necessidade de adequação
ao mercado mundial, buscando, ambos, descobrir quais seriam os caminhos da
modernização, indispensável para o desenvolvimento da produção, seja ela agrícola

44
ou industrial. Uma terceira visão nacionalista, talvez apenas uma exacerbação das
anteriores, seria a ufanista que, “em suas formas de ver e interpretar a nação deitou
raízes na cultura brasileira e se fez presente em inúmeras construções simbólicas
que pretenderam marcar a identidade nacional”, e para a qual

a nacionalidade é pensada não como resultado dos regimes político,


mas sim como fruto das condições naturais da terra. A natureza
prodigiosa e abençoada garantiria um futuro promissor para além e
independentemente dos regimes políticos e das querelas partidárias.
O ufanismo [...] – juntando às qualidades da terra os valores das três
raças originárias – operava assim a paz dos espíritos prometendo
dias melhores no futuro, já que a natureza dava fundamentos a tais
esperanças (Ibid., p.187).

O tema da miscigenação como forma como forma de exclusão do estrangeiro


e, portanto de fortalecimento da identidade nacional, conforme visto anteriormente,
transparece na descrição de Fernando de Azevedo “dos diversos elementos que
entram na composição do povo brasileiro”, ao notar o enfraquecimento da imigração
branca no país:

A esse fato de grande importância para a formação nacional, de ter


permanecido relativamente fraco o número dos estrangeiros em
relação ao núcleo primitivo, é preciso acrescentar, para compreender
o fenômeno brasileiro, a mobilidade da população, cujo movimento,
agindo como instrumento de assimilação, concorreu para a
interpenetração e assimilação de raças e culturas diversas
(AZEVEDO, 1964, p.73).

E, ao lembrar que o povo brasileiro é um “amálgama de várias raças” sugere


que daí poderia sair um futuro melhor, pois seria certo que

45
todos os povos que marcham à frente da civilização, como lembra
Jean Finot, possuem o sangue mais rico em elementos
heterogêneos, e todos cujas origens foram estudadas, fazem ver a
mesma riqueza de elementos étnicos que, entrecruzados,
contribuíram para formar a sua unidade nacional”. E, a ser verdadeira
a hipótese de Schneider, é sempre 500 a 600 anos depois de um
intenso mestiçamento que se produzem os principais surtos culturais
[...]. Assim, no Brasil, país novo, em plena fase de crescimento e, por
isto mesmo, pelas riquezas e imensidade de seu território, grande
foco de atração de imigrantes, esse caldeamento e mistura de raças,
desde os albores de sua vida, pode estar preparando o humo
biológico para florir uma nova civilização. Por outro lado, [...] se nos
faltou a integridade racial dos tipos formadores e nos sobraram as
mestiçagens dissolventes (branco e negro), outros elementos físicos
e sociais, como os fatores mesológicos, a vitalidade do primitivo
núcleo ibérico, a rápida fusão de raças, a comunidade de língua, de
costumes e de tradições constituíram, no Brasil, para criar um tipo
nacional, essa fôrça empolgante que nos Estados Unidos [...]
plasmou e absorveu as correntes adventícias, transformando-as
ràpidamente no tipo sui-generis e inconfundível do americano (Ibid.,
p.73).

Não se deve pensar, no entanto, que Azevedo se encontrava entre os que


Alfredo Bosi, considera como de consciência “encalhada nas ‘leis’ positivistas da
raça e do clima (de onde o peso excessivo dado à mestiçagem e ao trópico)”, mas
sim faria parte daqueles já abertos “à reflexão dos fatores sociais e culturais”. Para
ele, na década de 30

[...] a consideração daqueles últimos fatores iria assumir o devido


lugar com o advento de pesquisas antropológicas sistemáticas: uma
nova visão do Brasil sairia dos ensaios de Arthur Ramos, Roquette
Pinto, Gilberto Freyre, Caio Prado, Sérgio Buarque de Holanda,
Fernando de Azevedo. Persistiria, no entanto, o interêsse de detectar
as qualidades e os defeitos do homem brasileiro, ou seja, o caráter
nacional, noção cheia de ciladas enquanto projeta estereótipos e os
maneja com os instrumentos de uma enferrujada “psicologia dos
povos”.

O desencanto com a República que, segundo José Veríssimo (1985, p.41),


apregoava-se capaz de regenerar o país, e logo mostrou sua incapacidade de
modernizá-lo como a sociedade industrial exigia, pode explicar a nova postura,
principalmente entre os intelectuais, sobre a forma de alcançar aqueles objetivos.

46
O fato da mudança de forma de governo, maiormente por causas
onde não sei se o futuro historiador descobrirá alguma insigne
inspiração desinteressadamente patriótica, não é, entretanto, de per
si mesmo bastante para facultar-nos uma nova era de regeneração.
As formas de governo têm um valor relativo, mesmo porque,
conforme o demonstra a História e o ensinam os mais alumiados
pensadores, a força progressista das nações atua de baixo para cima
e não de cima para baixo. É no povo que reside e é a soma de seus
esforços, em qualquer ordem de fenômenos, que produz a
Civilização e o Progresso (VERÍSSIMO, 1970, pp.41-42).

Para grande parte dos intelectuais, o Brasil não preparado para se incorporar
à nova ordem econômica mundial passa a ser identificado como o país do atraso, o
Brasil arcaico. Esse questionamento da ordem traduz-se em um movimento de perfil
difuso, o Modernismo, com instâncias ora nacionalistas, ora cosmopolitas. Por um
lado promovia uma ruptura com a rotina acadêmica que isolara o país das
discussões mundiais acerca da arte, e abria o país ao mundo contemporâneo,
reiterando sua condição de país periférico, semicolonial, que buscava na Europa as
chaves para a interpretação de sua própria realidade, do mesmo modo que fizera
antes o Romantismo (BOSI, 1970, pp.232-233). Por outro lado expressava seu amor
pelas “soluções folclóricas, neo-indianistas, neo-românticas” e buscava uma nova
linguagem, pesquisando o folclore e a linguagem do interior.

[...] a mesma corrente que fôra aprender junto à arte ocidental modos
novos de expressão refluiu para um conhecimento mais livre e direto
do Brasil: o nacionalismo seria o outro lado da práxis modernista.[...]
Na sua vontade de acertar o passo com a Europa, sem deixar de ser
brasileiro, o intelectual modernista criou como pôde uma nova
poesia, um nôvo romance, uma nova arte plástica, uma nova música,
uma nova crítica; e a seu tempo se verá o quanto ainda lhe devemos
(Ibid., p.233).

Alfredo Bosi, procurando distinguir o perfil do movimento modernista, aponta


para o quadro de ideologias em conflito no país no primeiro quarto doe século XX,
com o tradicionalismo agrário ajustando-se mal “à mente inquieta dos centros
urbanos, permeável aos influxos europeus e norte-americanos na sua faixa
burguesa, e rica de fermentos radicais nas suas camadas média e operária”.
Lembra, porém que isso ocorria em um Brasil plural, “onde os níveis de consciência
se manifestavam em ritmos diversos”.

47
Assim os conflitos deram-se em tempos e lugares diferentes, não
raro parecendo exprimir tensões meramente locais. Sé para
exemplificar, o núcleo jagunço de Canudos, matéria de Os Sertões
de Euclides da Cunha [refletiu] a situação crítica de um Nordeste
marginalizado e. portanto, aderente a soluções arcaicas. Os
movimentos operários em São Paulo, durante a guerra de 1914-18 e
logo depois, eram sintoma de uma classe nova que já se debatia em
angustiantes problemas de sobrevivência numa cidade em fase de
industrialização. [...] Estudados em si, êsses movimentos têm uma
história de todo independente; mas, no conjunto, testemunham o
estado geral de uma nação que se desenvolvia à custa de graves
problemas (ibid., pp.340-341).

Diante desse quadro, o movimento modernista no Brasil será colorido


ideologicamente pelas opções dos intelectuais que “viveram com maior ou menor
dramaticidade uma consciência dividida entre a sedução da ‘cultura ocidental’ e as
exigências de seu povo, múltiplo nas raízes históricas e na dispersão geográfica”
(Ibid., pp.341-343).

[...] a coexistência deu-se de forma dinâmica e progressiva: e se na


pressa dos manifestos houve apenas colagem de matéria-prima
nacional e módulos europeus, nos frutos maduros do movimento se
reconhece a exploração feliz das potencialidades formais da cultura
brasileira (Ibid., p.343).

A semana “pretendia captar a vida em movimento, a eletricidade, o cabo


submarino, o automóvel, o aeroplano, o cinema. Na revista Klaxon9 está presente o
debate entre ser ou não futurista” (OLIVEIRA, p.190) o que envolvia a questão da
ruptura ou não com a tradição nacional. No discurso de Menotti Del Picchia na
segunda noite da Semana de 22, há uma negação ao futurismo ortodoxo, para cuja
existência no Brasil o orador não vê razão lógica, pois acreditava que o prestígio do
passado brasileiro não tolheria “a liberdade de sua maneira de ser futura”. E
prossegue:

9
O arquiteto Nestor Goulart Reis Filho (1998, pp. 154-155) lembra que o termo tem origem no
francês e significa buzina, e o automóvel, nessa fase era realmente apresentado como um símbolo de
modernidade, enfatizando “certas formas de modernização, características da sociedade industrial e
do desenvolvimento tecnológico, enfatizados pelo cinema, pela arquitetura e pelas diferentes
atividades artísticas”.

48
Queremos luz, ar, ventiladores, aeroplanos, reivindicações obreiras,
idealismos, motores, chaminés de fábricas, sangue, velocidade,
sonho, na nossa Arte. E que o rufo de um automóvel, nos trilhos de
dois versos, espante da poesia o último deus homérico, que ficou
anacronicamente, a dormir e a sonhar, na era do jazz-band e do
cinema, com a frauta dos pastores da Arcádia e os seios divinos de
Helena! (PICCHIA, 1922 apud BOSI, pp.380-381).

“Mas a dado trecho, salienta que o grupo quer fazer nascer ‘uma arte
genuinamente brasileira, filha do céu e da terra, do Homem e do Mistério’” (BOSI,
p.381). Embora o movimento modernista tenha, então, na questão da brasilidade
seu eixo principal, difundindo “a necessidade de identificar a substância do SER
brasileiro”, as estratégias diferem entre os diversos artistas do movimento
(OLIVEIRA, p.191). O Movimento Verde-Amarelo, por exemplo, do qual faz parte
Menotti del Picchia,

tem como proposta abandonar as influências européias, fixar-se na


originalidade brasileira, voltar aos mitos fundadores, ao mito tupi, a
escolha da Anta como animal totêmico. [...] Aceitam a vida no
interior, regional, como a que teria se mantido mais autêntica em
oposição ao litoral, visto como a parte falsa e enganadora do Brasil
[...] Vários dos verde-amarelos vão participar [em 1932] do Estado
Novo no Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) (Ibid.,
p.191).

Outro grupo, representado pelo Movimento Antropofagia, propunha

a apropriação das influências européias pelo canibalismo cultural. A


Revista de Antropofagia (o antropófago come a carne de seus
inimigos para captar suas energias) exprime essa metáfora em suas
seções: Hors d’oeuvre, entrada, aperitivo, cafezinho, e em suas
fases: primeira dentição, segunda dentição (Ibid., p.191).

Milton Lahuerta (1998, p.97-105) considera que, tendo a intelectualidade “ido


ao povo”, esperando “encontrar nas manifestações populares uma matéria-prima
pura e dotada de autenticidade, à qual caberia dar forma final mediante um trabalho
de síntese eminentemente cultural”, ou tendo ficado impressionada com o
industrialismo europeu com a ascensão de Getúlio Vargas, em 1930, passa a haver
“uma politização das questões culturais e o tema da modernidade fica integralmente
subsumido ao da construção de um projeto nacional”. Além disso, considera que a

49
aceitação, entre os intelectuais, da institucionalização corporativa implantada com o
Estado Novo (1937-45), não é obra do acaso e tampouco fruto de cooptação.
Mesmo apresentando uma face repressiva10, oferecia aos intelectuais uma
perspectiva de realização de suas demandas, “inclusive as éticas, acolhendo-os e
procurando dar sentido à sua atividade, engajando-os na construção de um Estado
ético” e modernizador, dessa forma tirando-os do isolamento e integrando-os à vida
nacional. Além disso, estar sob a tutela do Estado permitiria ao artista, como fez
Lucio Costa, por exemplo, a experimentação, impensável nos limites da iniciativa
privada. É através da mediação do Estado que se consolida, então,

uma cultura política cujo eixo estruturador é um desenvolvimento


capitalista excessivamente jurisdicionado, recoberto pela norma do
direito e que busca sua legitimidade na realização de fins sociais. A
tal ponto isso se dá que “o privado carece de legitimação própria,
qualquer interesse dependendo que o Estado lhe confira o estatuto
de público” [WERNECK VIANNA, L.,. p.2]. De modo que o
capitalismo avança cumprindo o percurso de uma “revolução
passiva”, na qual a nação não tem identidade própria, é criatura do
Estado, sendo organizada “como um corpo de funcionários a serviço
do ideal de expansão da acumulação” [Ibid., p.43]. Portanto, se a
“revolução” aprofunda a exigência de renovação, o Estado
Corporativo, que se quer Novo, reconhece a necessidade de
mudança e de modernização, mas procura domesticar esse impulso
transformador, trazer para si essa exigência. É em nome da ordem e
até da tradição, e sempre pleiteando o primado do público sobre o
privado, que o Estado Novo, realizando expectativas difusas da
sociedade civil, se assume como arauto da modernidade [...]
(LAHUERTA, 1998, p.101).

Antônio Cândido (1984, p.27-36) também chama a atenção para o vínculo de


dependência do intelectual brasileiro ao Estado afirmando que a Revolução de 1930
trouxe uma atmosfera de fervor, um movimento de unificação no plano da cultura,
projetando na escala nacional fatos antes restritos às diversas regiões:

10
O DIP – Departamento de Imprensa e Propaganda –, por exemplo, não visava apenas
censurar, “mas também organizar a produção cultual, imprimindo um sentido moderno e nacionalista”.
(LAHUERTA, 1998, p.101)

50
A este aspecto integrado é preciso juntar outro, igualmente
importante: o surgimento de condições para realizar, difundir e
“normalizar” uma série de aspirações, inovações, pressentimentos
gerados no decênio de 1920, que tinha sido uma sementeira de
grandes e inúmeras mudanças. [...] Isto ocorreu em diversos setores:
instrução pública, vida artística e literária, estudos históricos e
sociais, meios de difusão cultural como o livro e o rádio (que teve
desenvolvimento espetacular). Tudo ligado a uma nova correlação
entre, de um lado o intelectual e o artista; do outro, a sociedade e o
Estado – devido às novas condições econômico-sociais (Ibid., p.27).

Enfim, a colaboração dos intelectuais parece ter sido fundamental no projeto


de Getúlio Vargas de organização de uma nação comprometida com a modernidade
e, ainda segundo Lahuerta (1998, p.102), embora haja controvérsias sobre o papel
da Revolução de 30 na constituição da ordem burguesa no Brasil, seria certo o seu
caráter de ruptura, de verdadeiro “marco histórico” no processo de constituição não
só do Estado nacional como da própria cultura, ao gerar um movimento de
“unificação cultural”, exacerbando-se, a partir dele, o esforço de construção de uma
identidade nacional.

51
3. SAMBA CAFÉ E ARQUITETURA

A história do gosto, individual ou coletivo, é suficiente


para desmentir a ilusão segundo a qual objetos tão
complexos como as obras de arte, produzidos conforme
leis de construção que foram elaboradas no curso de
uma história relativamente autônoma, sejam capazes de
suscitar preferências naturais apenas pela força de suas
propriedades formais.
Pierre Bourdieu

Com uma certa irritação, em 1959, Vilanova Artigas, um dos maiores


arquitetos brasileiros, reagia à maneira como um grande jornal brasileiro definia o
país na manchete com o título acima, durante aula inaugural ministrada na
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Rio Grande do
Sul, entendendo que nela havia um “intuito malicioso de fazer acreditar, ainda hoje
que o nosso país é uma terra estranha, curiosa e indefinível, desordenada e
injustificável”. Argumentava então que o sucesso da Arquitetura Brasileira seria, na
verdade, o resultado do esforço dos brasileiros de “afirmar a nossa capacidade de
criar uma pátria unida e independente, original em suas manifestações culturais e
artísticas” (ARTIGAS, 1981, p.25). Ele prossegue afirmando, nesse sentido, que:

Um frêmito de progresso que tem raízes profundas em nossa história


agita todos os brasileiros e se acrescenta com a força criadora que
os imprime o caminhar inexorável do mundo contemporâneo para
etapas cada vez mais elevadas do desenvolvimento humano. [...] A
luta contra o subdesenvolvimento brasileiro, que empolga a todos,
encontra os arquitetos com posições tomadas e com o coração cheio
de agradável certeza de terem sentido, com oportunidade, os apelos
da pátria (Ibid., pp. 25-26).

O tom absolutamente patriótico do discurso de Artigas expõe o caráter do


envolvimento da Arquitetura Moderna Brasileira (e em seus escritos a expressão
sempre aparece com as iniciais em maiúscula) com o Estado e o papel que
representou no processo civilizatório apresentado no capítulo precedente. Quando
diz que “a Arquitetura é antes de tudo a expressão cultural de um povo; que se serve
52
do avanço técnico e da produção industrial, sobre os quais exerce também sua
influência criadora” (Ibid., p.22), parece consentir que não é possível renunciar a tal
envolvimento. O fato de ter pertencido ao Partido Comunista Brasileiro e, ainda
assim, ter produzido para uma sociedade organizada de uma maneira da qual ele
ideologicamente discordava, permite supor seu engajamento, junto com outros
setores da intelectualidade, na estruturação da nação pretendida pelo Estado, ou
pelo menos uma concordância por parte daqueles de “ter no Estado seu agente
privilegiado, seu agente fundamental de institucionalização”, nas palavras de Carlos
Ferreira Martins (1994, p.95) que prossegue: “Não porque os homens de Estado nos
procuraram, mas porque nós estávamos convencidos de que o Estado era o único
canal viável para implantar a arquitetura moderna, a literatura moderna e assim por
diante”.

Porém, se a um determinado tempo, a arquitetura moderna brasileira cumpriu


o papel de integrar o Brasil na contemporaneidade, isso não aconteceu de forma
instantânea, transcorrendo um longo intervalo de tempo entre as primeiras
manifestações do movimento moderno no país e sua aceitação pelo poder como
veículo ideológico11. Como se verá adiante (item 4.3, Capítulo 4), por quase duas
décadas prevalecerá na arquitetura privada nacional o Art Déco, e por quase uma
década ela será apropriada como estilo oficial do Estado. Conforme refere Yves
Bruand (1981, p. 62-81), as primeiras tentativas de introdução da arquitetura
moderna no Brasil tiveram um caráter restrito, quer pelo número de oportunidades e
encomendas particular ou pública, quer pelo caráter temporário dos recursos

11
Antônio Cândido crê mesmo que houve “na arquitetura uma espécie de sanção oficial do
modernismo, que correspondia à aceitação progressiva pelo gosto médio [...]. O ‘estilo futurista’ não
apenas se difundiria, mas receberia a consagração do mau gosto nas inumeráveis casas quadradas,
brilhantes de mica, que se espalharam por todo o país” (1984, p.29, grifo nosso). Por sua descrição,
as tais construções mais se identificam com o estilo Art Déco que com uma arquitetura racionalista,
em que pese as “formas quadradas”.

53
concedidos12, que não possibilitaram ao movimento se afirmar definitivamente.
Mesmo a superestimada Semana de Arte Moderna de 1922, se trouxe algumas
contribuições positivas para a literatura e a pintura, foi inócua quanto à arquitetura:

Os organizadores contavam com um grande número de literatos,


quatro pintores (Anita Malfatti, Di Cavalcanti, Vicente do Rego
Monteiro e o suíço John Graz), um escultor (Brecheret), um
compositor (Villa-Lobos); era também necessário um arquiteto para
que a exposição fosse completa. Recorreram então a um espanhol
radicado em São Paulo, Antonio Garcia Moya, autor de casas
inspiradas na tradição mourisca espanhola, que, em suas horas
livres, colocava no papel desenhos de uma arquitetura visionária que
agradava aos futuristas por sua fisionomia extravagante (Ibid., p. 63).

Mesmo as obras pioneiras de Gregori Wachavichik, que causaram alvoroço e


críticas positivas inclusive dos líderes da Semana de 22, no começo, foram logo
preteridas em função da ausência de traços que referenciassem a tradição e o
nacionalismo, exigências difíceis de serem satisfeitas pelo arquiteto nascido russo e
formado na Itália.

O projeto modernista só foi integrado ao modelo cultural nacionalista depois


de passar por um processo de assimilação que lhe conferiria a condição de uma
arquitetura especificamente brasileira como arquétipo a ser pronta e facilmente
seguido e respeitado:

Originalmente esta arquitetura brasileira é o resultado da importação


obviamente de modelos da metrópole [...], mas mais que tudo, ela é
o resultado de um processo de lenta decantação desses modelos, de
lenta adaptação às condições climáticas, técnicas, sociais, culturais.
É essa lenta decantação que permite falar numa arquitetura
especificamente brasileira (MARTINS, 1994, pp.93-94).

Nesse lento processo de decantação, no entanto, há um momento de corte


abrupto e decisivo, quando Gustavo Capanema, Ministro da Educação em 1935,

12
Bruand refere-se à rápida passagem do arquiteto Luis Nunes pela chefia de um serviço de
arquitetura encarregado dos edifícios públicos do Estado de Pernambuco e dos privados
subvencionados, a “Diretoria de Arquitetura e Construção”, criada em Novembro 1934 com o apoio do
governador Carlos de Lima Cavalcanti e fechada em Novembro 1935, sob suspeita de atividades
subversivas. Reorganizado em 1936, foi novamente fechado em 1937. Enquanto funcionou, Luis
Nunes conseguiu montar “uma equipe de técnicos, artistas e artesãos, cuja colaboração iria
possibilitar importantes estudos, especialmente no campo da padronização da construção e uma
execução de alto nível dos projetos elaborados” (1981, 77).

54
escolhe um projeto modernista, num aparente paradoxo em que homens de um
Estado autoritário elegem a arquitetura moderna como sua face oficial. Na verdade,
como se verá (item 4.3, Capítulo 4), quando Capanema instituiu o concurso para o
anteprojeto do edifico do Ministério da Educação e Saúde Pública, as normas
pediam um edifício em estilo marajoara, nome pelo qual ficou conhecido o estilo Art
Déco no Brasil. Isso era uma maneira de afirmar uma nacionalidade ou tradição,
recorrendo a uma linguagem “nacional” em oposição ao “universal”, segundo afirma
Carlos Coutinho (1979, p.22-23), ou o “autêntico” contrastando com o “alienígena”, já
que, conforme mostrado a seguir, não existia uma significativa cultura autóctone
anterior à colonização. Mesmo tentando adotar então uma linguagem indígena que
pudesse conferir uma fisionomia especificamente brasileira ela era pouco mais do
que um amálgama com as matrizes européias.

Esse momento de afirmação cultural, no entanto, pode ser precisamente


definido: a tentativa de construir uma identidade nacional liberta da subordinação
formal européia data dos tempos da Primeira República. Até então, o país não
oferecia quaisquer obstáculos à importação de padrões exógenos. Ninguém que se
proponha a um estudo sério da arte pode dissociar a sua produção do seu contexto
contemporâneo e das relações entre cultura local e cultura universal. Ainda hoje,
apesar do acúmulo de estudos acerca da estética e da produção artística, parece
existir, mesmo entre autores consagrados, uma “noção romântica da arte como uma
criação de ‘gênio’, que transcende a existência, a sociedade e a época”, sem
perceber que ela é antes “a construção completa de vários fatores reais, históricos”.
O artista não é um ser a-social, esperando a divina inspiração e alheio às regras
normais do intercâmbio social.

Por isso, muito mais que determinar fontes e influências é preciso apontar a
maneira como se “articulou a evolução das formações econômico-sociais brasileiras,
de cuja reprodução e transformação a nossa cultura é momento determinado e
determinante, com o desenvolvimento do capitalismo em nível mundial”
(COUTINHO, 1979, p. 19-21).

55
[as velhas indústrias nacionais] são suplantadas por novas indústrias,
cuja introdução se torna uma questão vital para todas as nações
civilizadas, indústrias que não empregam mais matérias-primas
autóctones, mas sim matérias primas vindas das regiões mais
distantes, e cujos produtos se consomem não somente no próprio
país, mas em todas as partes do globo. Em lugar das antigas
necessidades, satisfeitas pelos produtos nacionais, nascem novas
necessidades que reclamam para sua satisfação os produtos das
regiões mais longínquas e dos climas mais diversos. Em lugar do
antigo isolamento de regiões e nações que se bastavam a si
próprias, desenvolvem-se um intercâmbio universal, uma universal
interdependência das nações. E isso se refere tanto à produção
material como a produção intelectual. As criações intelectuais de
uma nação tornam-se propriedade comum de todas (MARX;
ENGELS, [1985?], pp. 24-25, grifo nosso).

Como exposto anteriormente, o objetivo central do colonialismo foi a extorsão


de valores-de-uso da colônia e sua transformação em valor-de-troca no mercado
mundial, pela metrópole, havendo a necessidade, no caso do Brasil, de “criar um
aparelho produtivo que se articulasse diretamente com o mercado mundial”, em
função da falta em nosso território de “uma formação econômico-social que, mesmo
primitiva, fosse capaz de fornecer excedentes de vulto no processo de circulação do
capital mercantil colonialista” (COUTINHO, 1979, pp. 21-22). Isso teve uma
importante conseqüência para a questão cultural brasileira que não colocou
obstáculos à penetração da cultura européia, pelo menos até que o sentimento
nacionalista se exacerbasse.

O momento de consolidação do International Style, especialmente na


arquitetura, coincide com o auge da afirmação da identidade nacional no Brasil.
Somado a isso, uma total e deliberada ausência de representação do real por parte
do modernismo acabou por dificultar, momentaneamente a expansão do movimento
no país:

A tendência modernista de reduzir toda forma à abstração fez disso


uma maneira insatisfatória de representar o poder e a ideologia do
Estado. Em grande parte, essa inadequação iconográfica explica a
sobrevivência de uma abordagem historicista da construção [...]
(FRAMPTON, 2000, p. 255).

Como com a Revolução de 1930, ganhou força o propósito de formatar uma


unidade ideológica, uma nova “cara do poder”, que cuidasse de legitimar o poder do
Estado diante das massas, e a arquitetura moderna, pelos motivos explicados
acima, não se prestava a esse papel, pelo menos não até que se integrasse ao

56
modelo cultural nacionalista, os ideólogos de Getúlio Vargas lançaram mão do estilo
exposto no capítulo seguinte. Mas antes, essa peculiaridade da arquitetura moderna
ainda obrigaria a adoção de outros modelos, tanto no Brasil como na Europa.

Diante do que Kenneth Frampton (2000, pp. 255-257) chama de incapacidade


de comunicação da forma abstrata, a modalidade pública que na Europa oscilava
entre o neogótico e o neobarroco encontrou seu equivalente no Brasil no
neocolonial, defendido pelo próprio Lúcio Costa sem, porém, resultar numa
expressão arquitetônica convincente e apropriada para “representar a ideologia
progressista de uma sociedade industrialmente avançada, [...] as aspirações
ideológicas de uma sociedade liberal e progressista”.

Em 1908 Ricardo Severo já havia elaborado seus primeiros projetos


dentro do que se considerou na época estilo Neocolonial. Essa
preocupação de revalorização de uma tradição tinha certamente
vinculação direta com o movimento nacionalista [...] (REIS FILHO,
1998, p.156).

Fernando de Azevedo (1964, pp.476-479) chama a atenção para o fato de


que a arquitetura não fez nenhum progresso importante entre o período colonial e a
República, “nem na linha de evolução do espírito colonial, cuja tradição se perdeu,
nem segundo os rumos novos que Grandjean de Montigny pretendeu imprimir-lhe
com suas sóbrias arquiteturas clássicas”. Para ele, o “predomínio da economia
agrícola e as lentas transformações das paisagens urbanas” derrubavam por terra
qualquer intenção de produção de grandes obras – civis, religiosas ou militares –
ainda mais se se considerar que a arquitetura é a arte que mais depende das
condições materiais. Por isso, prossegue, não seria possível se esperar um surto
significativo de obras expressivas onde os operários não atendiam às exigências
técnicas dos grandes artistas estrangeiros como Montigny. Nas primeiras décadas
do século passado o surto de crescimento de cidades como o Rio de Janeiro – que
começava “a se despojar de seu velho aspecto colonial para adquirir a fisionomia
esplêndida de uma grande cidade moderna” – e São Paulo ocorreu em ritmo de
acelerado e fez ver que o problema continuava:

57
No ímpeto das construções que se multiplicavam, reclamando por
toda parte operários e arquitetos, a falta de mão de obra e de
profissionais especializados abre um domínio cada vez mais vasto à
improvisação e a toda espécie de aventuras. “Empreiteiros
promovidos a arquitetos, na justa expressão de Nereu Sampaio,
simples construtores quase analfabetos que se fizeram arquitetos e
estrangeiros sem escrúpulos” encontraram o campo livre para uma
intensa atividade, sem os freios da opinião pública, num meio
social a que faltava educação artística e sem elites profissionais com
idéias bastante claras e definidas para orientarem o movimento
extraordinário de construções urbanas (AZEVEDO, 1964, p. 479,
grifo nosso).

Azevedo se queixava da falta de uma educação estética do povo brasileiro,


algo que dizia não se fazer através de escolas, mas sim “nas ruas, nos jardins e nas
praças públicas, nos museus e pinacotecas”, etc. É interessante chamar a atenção
para a consciência de que a “aplicação, em larga escala, da arte às indústrias” ou,
pelo menos, “uma colaboração mais íntima da arte e das indústrias”, era necessária
para a educação artística da população. Confrontando com a iniciativa anterior de
Bethencourt da Silva, é possível perceber que a educação não tinha por objetivo
apenas adestrar o operário para as tarefas das novas indústrias interessadas na
“produção em série de artefatos marcados pelo selo das artes e acessíveis a um
público cada vez mais vasto” (Ibid. p.491), mas formar o consumidor desses
artefatos.

Em 1914, ao iniciar a Primeira Grande Guerra, Ricardo Severo, engenheiro


português radicado no Brasil poucos anos antes e associado ao maior escritório de
engenharia e arquitetura de São Paulo, o Escritório Técnico Ramos de Azevedo,
realizou em São Paulo suas famosas conferências visando a valorização do
Neocolonial. A primeira, “A Arte Tradicional no Brasil” (SEGAWA, 1998, p.35), foi
proferida na Sociedade de Cultura Artística e pregava a valorização da arte
tradicional, no caso a arte colonial de origem portuguesa, como manifestação de
nacionalidade e como elemento de constituição de uma verdadeira arte brasileira e
seu estudo conduziria à “perfeita cristalização da nacionalidade”. Ao contrário da
mera veneração tradicionalista “diluída em nostálgica poesia do passado” ou puro
saudosismo, o discurso de Severo era uma especulação sobre o presente:

58
Com efeito, para criar uma arte que seja nossa e do nosso tempo,
cumprirá, qualquer que seja a orientação, que não se pesquisem
motivos, origens, fontes de inspiração, para muito longe de nós
próprios, do meio em que decorreu nosso passado e no qual terá que
prosseguir nosso futuro. Ficará bem explícito que não se intima ao
artista de hoje a postura inerte da esfinge, voltada em adoração
estática para os mitos do passado, mas sim a atitude viva do
caminhante que, olhando o futuro, tem de seguir um caminho
demarcado pela experiência e pelo estudo do passado, e cuja única
diretriz é o progresso e a glória das artes nacionais (SEVERO, apud
SEGAWA, 1998, p.35)

A propagação dessas idéias estava lastreada pelo sentimento de


nacionalismo que se intensificou desde as comemorações do quarto centenário do
descobrimento do Brasil e a conseqüente institucionalização de movimentos
nacionalistas como, por exemplo,

a Liga de Defesa Nacional, criada em 1916 pelo poeta Olavo Bilac


(1865-1918 [...] ou recrudescimento de movimentos capitaneados por
instituições como a Sociedade Eugênica de S. Paulo ou a Liga Pró-
Saneamento do Brasil – críticos do falso ufanismo e a situação
médico sanitária no Brasil [...] (SEGAWA, 1998, p.36).

Reis Filho (1998, p. 155-157), aponta para a existência de uma


“modernização conservadora”, expressa numa “relação direta entre dois movimentos
aparentemente contraditórios” que se “evidencia com a realização da Semana de
Arte Moderna de 1922 a poucos dias da comemoração do Centenário da
Independência”. A Exposição Internacional do Centenário da Independência,
realizada no Rio de Janeiro tinha diversos pavilhões em estilo neocolonial, os
principais e mais admirados, encantando principalmente os estrangeiros que viam
neles uma nota de exotismo. A repercussão e os elogios

reforçaram o entusiasmo brasileiro pelo movimento, que a partir de


então passou a contar com o apoio oficial declarado. Em 1926,
quando o Ministério da Agricultura instituiu um concurso para a
escolha do enteprojeto do pavilhão do Brasil na Exposição da
Filadélfia, a primeira condição do programa era a adoção do estilo
colonial (BRUAND, 1981, p.56)

Isso, juntamente com a orientação francamente internacionalista que as


formas puras, neutras e não referenciadas, do modernismo, em especial na
arquitetura, seguramente ajuda a explicar a posição aparentemente contraditória não
apenas do Brasil, mas de outros Estados totalitários, quase sempre com orientação
nacionalista de direita, de rejeição à arte moderna, ao mesmo tempo em que o

59
discurso oficial era o de desvinculação com o passado e o arremessar-se rumo ao
futuro, identificado com o arrojo da máquina, da automação, como nos manifestos
futuristas.

Raffaele Raja (1993, pp.47-50) oferece uma tentativa de demarcação dos


limites do termo “moderno”, contrapondo-o ao termo “contemporâneo” e sugerindo
que, numa interpretação mais abrangente, o primeiro pode implicar tanto uma atitude
positiva, favorável, quanto hostil, no que se refere “às mais recentes aquisições do
progresso, às vezes efêmeras ou provisórias”, mas mais freqüentemente apontaria
para uma

adesão ao espírito do progresso e, por assim dizer, existe


dinamicamente, prefigurando a categoria dialética do devir,
[enquanto o termo “contemporâneo”denota uma existência estática,
isto é, não perturbada pela contínua negação de si ou pela dialética
(ou então pelo espírito do progresso). Em outras palavras, se
moderno só pode ser algo de ideologicamente vizinho do espírito dos
tempos e em linha com o progresso industrial, científico e tecnológico
(e social), contemporâneo é também aquilo que está ideologicamente
longe deste mito, embora vivo e presente em nossos dias (RAJA,
1993, pp.47-48).

Esclarece em seguida, e essa interpretação será decisiva para este trabalho,


que pode ser contemporâneo, mas não-moderno, aquele que “rejeita a tecnologia, a
ordem social, política e econômica hoje existente” opondo-se “aos esquemas da
civilização industrial ou pós-industrial do mundo ocidental (mas também dos Estados
socialistas), ao consumismo, ao terciário”. Assim aceito, a definição de “Moderno”
implicaria quase que numa instância moral, (Ibid., p.48), não importando se se esteja
falando de arquitetura ou da sociedade em geral e presumiria

Uma dupla referência à contemporaneidade, que deve aparecer


dividida de maneira inconciliável entre um ser negativo e um dever
ser positivo. O conceito de moderno se esclarece desse modo [...]
como programática vontade de atuação do único empenho imperioso
na situação histórica determinada. [...] O fato de o termo “moderno”
adquirir no século XIX seu valor polêmico definitivo deve-se às
enorme mudanças sociais que então se processavam; o progresso
incubado pela Revolução Industrial gera os binômios antinômicos
cidade-campo [...], indústria-agricultura, progresso-conservação,
esquerda-direita, traduzindo-se – em termos ideológicos – em luta de
classes e teorização da evolução dialética (Ibid., p.50).

Embora uma particularidade do modernismo nas artes seja o aparecimento de


“grupos de vanguarda dispostos a promover a ruptura cultural, tendo como

60
fundamento a idéia do moderno contra o tradicional e o antigo”, surgiu entre 1900 e
1914 na Europa um estilo historicista que se aspirava “modernizado” fazendo com
que os antigos Neobarroco e Neogótico começassem a perder sua definição e
surgisse o que se convencionou chamar de Nova Tradição, cuja luta com o
Movimento Moderno foi travada até na União Soviética, por ocasião do concurso
para o Palácio dos Sovietes (FRAMPTON, 2000, pp.255-256).

Na verdade, o termo “luta” talvez seja um pouco forte para qualificar a


relação, nas palavras de Nestor Goulart (1998, p.156), entre a revalorização do
passado e o projeto de modernização que andaram lado a lado e não apenas no
Brasil, como se costuma interpretar, atribuindo à nossa formação cultural uma
especificidade que na verdade pode ser apenas uma ideologia que pretende
mascarar a realidade da nossa formação fundada na expansão do capital
internacional. As explicações baseadas puramente em uma marca especial do
caráter do homem brasileiro de uma pretensa criatividade inspirada, seja pela graça
divina, seja pela natureza exuberante, seja pela “mistura positiva das raças,
escondem questões mais profundas das relações de produção”.

Essa forma particular de articulação entre tradição e modernidade,


que em todos os textos aparece como sendo uma espécie de raiz da
originalidade – e o tema da originalidade é um tema recorrente –
[não] me parece tão evidente assim. Na verdade, uma arquitetura
moderna que não seja de fato tão a-histórica [...], uma arquitetura
moderna que esteja preocupada com o resgate, o reengate com a
sua tradição, não é uma especificidade, uma originalidade do Brasil.
Basta pensar [...] no desenvolvimento da arquitetura moderna na
Itália para saber que, se as soluções podem ter sido originais, o
problema não era. Pensar a relação tradição-modernidade não era
um problema nem exclusivo nem original do Brasil (MARTINS, 1994,
p.95).

Por volta de 1920, “época de indecisões de tentativas, mais ou menos


aventureiras”, conforme refere Fernando Azevedo (1964, p.479), é que se inicia o
movimento de renascimento da arquitetura colonial, para ele “a única que fala de
nossas origens históricas e que, trazendo caráter racial bem definido, corresponde,
do ponto de vista das habitações privadas, à natureza do clima”.

61
O que com êle se pretendia era que estudássemos a fundo os
modelos antigos, não para reproduzi-los, mas “para retomar o fio da
tradição e confrontarmos com o novo quadro social o que nossos
antepassados, por intuição, acomodaram maravilhosamente à
diversa natureza de clima e de materiais”13. Êsse movimento tornou-
se tanto mais útil quanto mais, na volta ao tipo brasileiro de
habitação, os arquitetos haviam perdido a noção da arquitetura
funcional, racional, ou a consciência do valor utilitário dos elementos
principais que entravam na sua composição arquitetônica, e que
eram empregados, na observação de José Mariano Filho, a título de
“meros ornamentos”, quando tinham uma “função” – a de defesa
contra o clima – na casa colonial [...] (Ibid., pp.479-480).

José Mariano Filho, a quem Azevedo se referia, foi o historiador da arte que
cunhou o termo neocolonial e com cuja adesão o movimento de valorização da arte
tradicional brasileira ganhou força e cujo ativismo abriu espaço para que uma série
de obras públicas de porte fosse executada seguindo essa concepção. Chegou a
interferir junto ao governo para que, nos editais de concurso para os pavilhões do
Brasil nas Exposições de Filadélfia (1926) e Sevilha (1928) e do projeto para o novo
edifício da Escola Normal (1928), que se tornou a mais importante obra pública no
estilo, constasse a obrigatoriedade do neocolonial como estilo, considerado pelos
seus defensores como portador de um caráter de “progresso” (SEGAWA, 1998,
p.36-37).

O reconhecimento oficial do neocolonial e a construção de


importantes edifícios públicos nessa linha vulgarizaram os elementos
ornamentais de gosto tradicional a ponto de serem apropriados, em
todo o Brasil, em edificações tão distintas quanto habitações
populares ou postos de gasolina. A aplicação indiscriminada do
neocolonial gerou uma acalorada discussão entre arquitetos e
artistas [...] (Ibid., p.37).

13
Trecho da conclusão do inquérito de Azevedo publicado em O Estado de São Paulo, em 29
de abril de 1926, intitulado Arquitetura Colonial VIII.

62
Figura 1 Ângelo Bruhns e José Cortez: Escola Normal. Rio de Janeiro, 1926.
(Fonte: BRUAND, 1981)

O debate culminou em uma série de reportagens de Azevedo para o jornal O


Estado de São Paulo que, em 13 de abril de 1926 publicaria seu artigo “Architectura
Colonial I”, no seguinte tom:

A arquitetura no Brasil está positivamente deslocada das duas


correntes adversárias em que se divide, do ponto de vista artístico, a
concepção da arquitetura moderna. Não está, de fato, nem com os
reformadores revolucionários que procuram na arquitetura um jogo
de formas geométricas primárias ordenadas no espaço virtual e de
um caráter social marcado; nem com os tradicionalistas que a
querem encarada sob uma óptica local, em todos os aspectos que
toma ao seu ambiente. Nem se orienta no sentido de uma “arte
mundial” em que se apaguem as diferenças regionais e cuja estética
resulte da nova técnica de construção e da solução de problemas
puramente utilitários; nem tenta vincular a arte às tradições locais e
ao espírito da raça. Em uma palavra nem é tradicionalista, nem
antitradicionalista. Nem nacional, nem “supranacional”. Definiu-o
Monteiro Lobato com essa expressão motejadora: “um jogo
internacional de disparates...” (FERNANDO DE AZEVEDO, 1926
apud SEGAWA, 1998, p.41).

O concurso para o Pavilhão do Brasil na Exposição da Filadélfia foi vencido


por um jovem arquiteto que marcou profundamente tanto o movimento neocolonial
quanto, depois, o movimento racionalista que originou a Arquitetura Moderna
Brasileira: Lúcio Costa. Somente seu projeto “resolvia perfeitamente os problemas
de distribuição interna e de circulação, conservando ao mesmo tempo ao mesmo
tempo um grande parentesco formal com a arquitetura da época colonial” (BRUAND,
1981, p.56), enquanto os outros ou se pareciam com residências ou sacrificavam a
funcionalidade em função da necessária monumentalidade. Costa, porém, logo

63
percebeu que a adoção de um “estilo” não bastaria para resolver os problemas da
arquitetura e, portanto, não se devia limitar a uma interpretação literal, mas procurar
encontrar o espírito que presidira o nascimento dessa arquitetura colonial.

Ora, seu principal valor era o de ter trazido, principalmente para a


construção civil, uma resposta satisfatória aos problemas
decorrentes das necessidades da época; portanto não bastava tomar
de empréstimo seu vocabulário arquitetônico, era preciso também
transpor sua perfeita lógica interna para termos contemporâneos
(Ibid., p.58).

Essa compreensão de Lucio Costa terminaria por afastá-lo do movimento


neocolonial, por não ver nele espaço para algo mais que pesquisas puramente
plásticas. A nova sociedade industrial, com seus novos materiais, novos métodos
construtivos e, principalmente, suas novas necessidades, exigia uma nova
abordagem dos problemas da arquitetura, tanto em seus aspectos estéticos quanto
funcionais. Mas, acima de tudo, a nova arquitetura pretendida precisava se
identificar com uma sociedade preocupada em descobrir sua própria identidade.

64
4. ART DÉCO: O QUASIMODERNO ECLETISMO

[...] toda a gente pode desligar o rádio e abandonar os


concertos, não gostar do cinema e do teatro e não ler um
livro, mas ninguém pode fechar os olhos perante as
construções que constituem o palco da vida citadina e
trazem a marca do homem na paisagem.
Bruno Zevi

4.1 – EXPOSIÇÕES UNIVERSAIS: AS VITRINES DO CAPITAL

Quando dizemos que um determinado indivíduo


considera sua actividade como um escalão necessário
na cadeia dos acontecimentos necessários, afirmamos,
entre outras coisas, que a falta de livre-arbítrio equivale
para ele à total incapacidade de permanecer inactivo e
que essa falta de livre-arbítrio se reflecte na sua
consciência como forma da impossibilidade de actuar de
um modo diferente daquele como actua.
Pleckanov

A metade do século XIX encontrou a Inglaterra mergulhada na mais profunda


onda de otimismo expansivo de toda sua história. A Revolução Industrial, em seu
auge, deixava o país mais rico do que jamais estivera e a próspera burguesia se
encontrava representada pela própria rainha Vitória. A confiança no progresso
industrial, sempre ascendente durante todo o século, e o acentuado
desenvolvimento técnico produziram as condições materiais e o entusiasmo
necessário para o início do que seria o ciclo das Grandes Exposições Universais
(BRUNA, 1983 e PEVSNER, 2002), responsáveis, entre outras coisas, pela
propagação mundial de uma nova forma de pensar a arquitetura.

65
Nenhuma outra geração antes desta teria sido capaz de conceber a
idéia de organizar uma exposição de matérias primas e produtos
técnicos de nações de todo o mundo. O plano, que foi tão
gloriosamente realizado em 1851, devia-se em larga medida à
energia do príncipe Alberto, que, ao delineá-lo e executá-lo, foi
arrastado pela mesma onda de otimismo expansivo que os seus
contemporâneos (PEVSNER, 2003, p.27).

Na verdade, as exposições de produtos industriais aconteciam desde o fim do


século XVIII, motivadas pelo fim das corporações – não por coincidência, com o fim
das corporações na França, além da realização da primeira exposição industrial em
1798, são fundados a École Polytechnique em 1795 e o Conservatoire des Arts et
Métiers em 1798 (PEVSNER, 2002, p.32) – e a decorrente nova relação direta que
se estabelece entre produtores, comerciantes e consumidores. Eram, contudo,
realizadas sempre em âmbito nacional nos diversos países, em virtude das rigorosas
leis de restritivas ao livre comércio externo que visavam proteger as nascentes
indústrias locais. A situação muda a partir 1850, a partir de quando as nações
começam a atenuar as barreiras alfandegárias possibilitando o comércio
internacional, e isso se refletiu nas Exposições que se tornam internacionais com
mostras de produtos do mundo todo (BENÉVOLO, 1976, p.129).

Para a Exposição Universal de Londres de 1851, a comissão organizadora


realizou um concurso para a escolha do edifício que a abrigaria. Todos os 245
projetos inscritos foram recusados – embora o prêmio para o primeiro colocado
tenha sido pago – porque a estrutura deveria ser desmontada e reaproveitada após
o evento. Foi então encomendado um projeto às pressas, para o arquiteto-paisagista
(ou engenheiro perito em jardinagem, segundo algumas fontes) Joseph Paxton que,
em apenas oito dias, entregou o desenho de uma espécie de “kit de montagem
altamente versátil”, todo em peças padronizadas de ferro e vidro – por isso chamado
de Palácio de Cristal – de montagem rápida (em apenas quatro meses estava
pronta): um revolucionário “processo de construção tornado manifesto como sistema
total, desde a concepção, a fabricação e o transporte iniciais até a construção e o
desmonte finais” e que ainda pôde ser revisto durante o desenvolvimento para

66
acomodar um grupo de árvores adultas14 no local da exposição15 (FRAMPTON,
2000, pp.31-32). O sucesso foi tão grande que um edifício semelhante – também
projeto de Paxton – foi construído para a Exposição de Nova York, em 1853.

O Palácio de Cristal propõe e extingue em si mesmo a problemática


da arquitetura entendida como Industrial Design e forneceu a mais
completa e indiscutível contribuição de seu tempo, marcando a
primeira fuga dos estilos históricos na arquitetura e simultaneamente
uma concepção estritamente ligada aos conceitos de produção em
massa (BRUNA, 1983, p.40).

As Exposições Universais eram sofisticados catálogos dos processos e


resultados dos procedimentos industriais e manifestavam uma fé inabalável no
progresso ao oferecer grandes panoramas do poder do homem sobre a natureza.
Havia “uma tentativa quase didática de abranger todo o conhecimento humano,
organizá-lo e catalogá-lo”, promovendo uma “comparação entre cultura e
desenvolvimento técnico das nações, reforçando a idéia da evolução embasada nas
novas teorias biológicas e geológicas do século XIX” (BITTAR, 2004). O próprio
recinto da exposição, o Palácio de Cristal foi uma das grandes realizações da
engenharia da época que se fazia notar com suas experiências com coberturas de
grandes vãos e avanços na tecnologia do ferro e do vidro e da profunda e crescente

14
Havia uma persistente oposição da opinião pública à realização da Grande Exposição de
1851 e o motivo principal parece ter sido o problema da preservação desse grupo de árvores no Hyde
Park, o local escolhido. Essa grande resistência da população parece justificar a maneira elogiosa
com que os manuais de história da arquitetura se referem ao Príncipe Alberto, como o grande
responsável pela organização daquele primeiro grande espetáculo tecnológico e, como
conseqüência, pela criação das condições favoráveis para o surgimento de uma nova arquitetura. No
mínimo, dele foi o papel de um dos mediadores dos “acontecimento necessários” – nas palavras de
Pleckanov – para a plena expansão da burguesia.
15
.Paxton resolveu o problema introduzindo um transepto central com um altíssimo teto curvo
com estrutura em madeira laminada para que as árvores pudessem ser acomodadas, surgindo assim
a dupla simetria que caracterizou a forma final. Segundo Bruna (1983, p.42), na verdade, o visitante,
quando da inauguração, apreciou muito mais o espaço formado pelo transepto em forma arco do que
a longa nave central porque o primeiro apresentava ao grande público uma linguagem familiar.

67
relação entre a arquitetura e a indústria16 (BRUNA, 1983). Uma nova era precisava
de uma nova arquitetura. O grande sucesso de público motivou os realizadores e
nações convidadas das exposições posteriores a investir ainda mais na construção
dos pavilhões nacionais, sempre entregues a profissionais de renome nos seus
respectivos países, o que aumentou a importância que tiveram em relação à nova
arquitetura, cuja máxima expressão no uso da tecnologia específica do uso de ferro,
vidro e luz foi a Galeria das Máquinas. Sobre este projeto (Figura 2) do arquiteto
Ferdinand Dutert para a exposição mundial de Paris em 1889, considerada o ápice
da onda de construções de grandes pavilhões e da arquitetura em ferro e vidro
ocorrido na Europa naquela época, a mesma que apresentaria ao mundo a Torre
Eiffel (

Figura 3), projeto e construção de Gustave Eiffel, também responsável pela


estrutura interna de sustentação da Estátua da Liberdade de Bartholdi, Benévolo
(1976, p. 134; 138) apresenta os detalhes:

A Galerie dês Machines, com um vão de 35 metros é sustentada por


arcos metálicos; as pressões são eliminadas prolongando-se as
pilastras até o exterior, e ligando-as com vigas por cima da abóbada
envidraçada. J. B. Krantz, projetista do edifício, encomenda as
armações metálicas à oficina que um jovem engenheiro, Gustave
Eiffel (1832-1923) acabou de abrir em Lavellois-Perret; Eiffel
encarrega-se também dos cálculos e das verificações experimentais.

16
A seguir, exemplos de obras que fizeram uso dessas novas tecnologias: entre 1800 e 1840:
criação, em quase todas as grandes cidades européias, de centenas de passagens cobertas ou
galerias, construídas com estruturas metálicas e fechamentos de vidro, alcançando no interior desses
ambientes um micro-clima controlado (Galeria Panoramas, Galeria D’Olrleans, Galeria Lafayette);
1811: estrutura de ferro para o Mercado de Trigo de Paris (arquiteto Bellange e engenheiro Brunet);
1818-1821: Pavilhão Real de Brighton (Jonh Nash), cuja coluna de ferro fica à vista pela primeira vez;
1824: a nave do mercado de la Madeleine em Paris, toda construída em ferro; 1833: hibernáculo do
Museu de História Natural de Paris (Charles Rahault de Fleury) (DELGADO, 2003).

68
Figura 2 - Galeria das Máquinas. Exposição de Paris, 1889.
(Fonte: BENÉVOLO, 1976)
Primeira estrutura arquitetônica a utilizar o arco triarticulado para vencer grandes vãos (107 metros). Segundo Frampton (2000,
p. 32), ela não se limitava a expor as máquinas, mas era ela mesma uma “máquina de exposição” em que plataformas móveis,
correndo por trilhos elevados, passavam sobre o espaço da exposição em ambos os lados do eixo central, transportando os
visitantes, permitindo assim que eles tivessem um panorama rápido e abrangente de toda a mostra.

Esse impulso na tecnologia das construções se devia a uma adequação às


novas necessidades programáticas criadas pelo extraordinário incremento na
produção e aumento populacional provocado pela exigência de cada vez mais
braços aliada à diminuição da taxa de mortalidade. Além disso, o desenvolvimento
no comércio, se acontecia em nível mundial, também acontecia na escala das
cidades, que cresciam numa velocidade espantosa. Com o aumento no volume e
variedade das mercadorias tornava-se necessária a construção de depósitos,
armazéns e – um novo fenômeno gerado pela criação de novas necessidades de
consumo e pelo aumento no número de consumidores e na variedade de
mercadorias em circulação – as lojas de departamentos ou magazines (DELGADO,
2003). Essas novas construções, juntamente com as das fábricas, traziam novos
problemas como necessidade de mais espaço livre, riscos de incêndio, comuns nas
tecelagens com cobertura em estrutura de madeira, e excesso de peso nos
pavimentos, como quando da introdução, em meados do século XVIII do tear
mecânico, maior e mais pesado que o convencional.

69
Foram as novas exigências por melhores transportes, pontes e
canais, por edifícios industriais maiores e mais resistentes, por
edifícios não combustíveis, por edifícios públicos, como as estações
da estradas de ferro, portos e armazéns e os edifícios para as
exposições universais, que caracterizaram o fim do século XIX, a
solicitar os novos materiais como o ferro fundido e o vidro [...]
(BRUNA, 1983, p.32).

Figura 3 - Vista parcial da Exposição Universal de Paris,1889.


(Fonte: Ciência Hoje Especial República)
É interessante observar, neste postal da época da realização da Exposição, o tratamento dedicado pelo artista à iluminação,
conferindo à Torre Eiffel um aspecto de grandiosidade ainda maior que a própria estrutura apresentava. A iluminação feérica
somada às nuvens que, na pintura, se sobrepõem a ela abaixo da metade de sua altura, dá ao monumento o aspecto de um
farol quase místico e comunicando o caráter contundente de sua presença na paisagem parisiense. O espectador estaria diante
de um memorial da capacidade do homem moderno.

A procura de respostas às necessidades de acomodação dessas novas


atividades humanas levou ao desenvolvimento das novas tecnologias construtivas e
industriais específicas. Embora o ferro e o vidro já se constituíssem como materiais
de construção havia muitos séculos, o ferro, por exemplo, era utilizado apenas como
“elemento complementar, como reforço, sob a forma de correntes, tirantes ou anéis
de ligação entre as pedras nas construções”, tornando os custos dessas obras muito
elevados em função da baixa capacidade de produção das indústrias siderúrgicas

70
(Ibid, p.32). Foram necessárias diversas inovações na metalurgia para que
finalmente o uso do ferro se tornasse habitual:

Em 1713 Abraham Darby fez ferro fundido com carvão (em vez de
lenha); cerca de 1740 Benjamin Huntsman inventou o mprocesso de
fundir o aço em cadinho; em 1783 Cort introduziu a pudlagem17;
fizeram-se em 1810 os aperfeiçoamentos decisivos no alto-forno
(Albertot); em 1839 Nasmyth inventou o martelo pilão; e em 1856
Bessemer inventou um método para produzir aço isento de carbono
(PEVSNER, 2002, p.32).

Com o aumento da produção e a conseqüente redução dos preços, o ferro


fundido difundiu-se rapidamente e em 1869 é utilizado para a construção do primeiro
grande magazine. O texto abaixo evidencia as vantagens do uso do ferro e vidro
para esse tipo de edifício:

A construção do Bon Marché por Boileau e Eiffel, constituiu a


primeira grande loja moderna em ferro e vidro, assegurando livre
afluxo de luz natural aos interiores. Esse prédio contrastou com o tipo
de prédios comercias da época constituídos por pavimentos
superpostos e iluminados artificialmente na maior parte dos seus
espaços. Boileau constatou que as paredes maciças não se
adaptavam bem ao tipo de espaço conveniente às grandes lojas e a
estrutura deveriam ter colunas de pequenos diâmetros. Destaca-se,
portanto, no Bon Marché, a ampla superfície envidraçada, os vidros
dispostos em série, sem nenhuma interrupção. A marquise, também
em vidro, se estende ao longo de toda a fachada da loja, por cima
das vitrines, acentuando ainda mais o efeito dos seus grandes vidros
(DELGADO, 2003).

Para além de divulgar os novos avanços tecnológicos e seus produtos, no


entanto, as Exposições Universais, depois Feiras Mundiais, objetivavam exaltar a
nova organização do trabalho18 decorrente da Revolução Industrial, conforme se
pode concluir pelas palavras do príncipe consorte Alberto em um dos discursos

17
Processo para a diminuição do teor de carbono do ferro, mediante a ação de escória ou
óxidos, transformando a gusa em ferro doce, menos quebradiço.
18
Não por coincidência, com raras exceções, as Exposições Universais eram inauguradas no
dia 1º de Maio, dia do trabalho. E, segundo Benévolo (1976, p. 134), a segunda Exposição Universal
de Paris, em 1867, organizada no Campo de Marte, foi abrigada em um edifício oval composto por
sete galerias concêntricas: a mais externa e maior, para as máquinas, as demais, destinadas às
matérias primas, ao vestuário, à mobília, às artes liberais, às belas-artes, a história do trabalho; no
centro encontra-se um jardim descoberto, contendo um pavilhão para as moedas, os pesos e as
medidas”.

71
preparatórios à Exposição de 1851, quando após chamar a atenção para as
características especiais de sua época, um “período de maravilhosa transição, que
tende para a rápida realização da grande finalidade que a história certamente indica,
e que é a unidade do gênero humano”, prossegue celebrando “o grande princípio da
divisão do trabalho, que pode ser considerado a força que faz progredir a civilização”
(PEVSNER, 2002, pp.27-28). Ainda o volume de introdução da The Great Exhibition
of the Works of Industry of All Nations, logo em sua primeira página trazia,
vaidosamente, a afirmação de que “um acontecimento como esta exposição não
poderia ter-se dado em nenhuma outra época, e talvez mesmo em nenhuma outra
nação a não ser a nossa”:

Claro que não; os que escreveram estas linhas conheciam as razões


disso e falaram delas com inteira franqueza: “a segurança total da
propriedade” e “a liberdade comercial”. Os milhares de visitantes que
se apinhavam na exposição sentiram provavelmente o mesmo. A
afluência era enorme, assim como o tamanho dos pavilhões e a
quantidade dos produtos expostos (PEVSNER, 2002, p.28).

Apesar da aclamação ao trabalho, o trabalhador continuava em segundo


plano com jornadas de até quatorze horas por dia – incluindo crianças de até cinco
anos, cujo horário de trabalho foi reduzido em 1802 para doze horas por dia – em
fábricas cujas portas e janelas eram sempre mantidas fechadas. Após digressar
sobre essas questões vergonhosas, Pevsner parece mais preocupado com a
educação do consumidor:

Os economistas e filósofos foram suficientemente cegos para


fornecer aos patrões um fundamento ideológico para sua criminosa
atitude. A filosofia ensinava que dar livre curso à energia de cada um
era a única maneira natural e sã de conseguir o progresso. O
liberalismo dominava tanto na filosofia quanto na indústria, e
implicava a completa liberdade do fabricante para produzir todo o
gênero de objetos de mau gosto e de má qualidade desde que
conseguisse vendê-los. E isto era fácil, pois o consumidor não
tinha tradição, nem educação, nem tempo livre, e era, tal como o
produtor, uma vítima desse círculo vicioso (PEVSNER, 2002, p.33,
grifo nosso).

72
O sucesso das Exposições Universais que se multiplicam por todo o mundo
após 187819, porém, associado a diversas outras iniciativas (ver item 2.1 do Capítulo
2) de mediadores das necessidades da burguesia industrial cuidou de educar, por
um lado, o operário, dando-lhe as habilidades necessárias para a nova organização
da produção e, por outro lado, o consumidor, que aos poucos ia se familiarizando,
com a nova “estética da máquina” (Walter Benjamin definiu as ExposiÇões
Universais como locais de peregrinação para o culto da mercadoria). Em ambos os
casos a participação dos arquitetos que pretendiam a renovação da arquitetura foi
fundamental. Depois de exploradas as possibilidades da construção em ferro, nas
duas últimas décadas do século XIX, ganha força rapidamente um novo sistema de
edificação, o concreto armado, que invade o campo da edificação comum, tanto por
sua conveniência econômica, quanto por ter normas oficiais que regulamentavam
seu uso, facilitando a acesso a mais profissionais.

O crescimento extremamente rápido das cidades, especialmente nos


países que somente agora se industrializam, como a Alemanha,
demanda da indústria de construção um esforço extraordinário que
exige uma revisão completa dos métodos de construção antigos
(BENÉVOLO,1976, pp.146-148).

Contudo, se as técnicas construtivas tinham evoluído com rapidez, o que fica


patente nos edifícios construídos para as Exposições Universais e nas novas obras
em concreto, o mesmo não se dava com a cultura artística tradicional que entra,
então, em sua crise definitiva, que transparece com o problema do cada vez mais
difícil e preocupante controle arquitetônico:

19
O Brasil também teve o papel de nação anfitriã, conforme visto no Capítulo 3. De acordo
com Martins (1997, p.4): “A Exposição Internacional de 1922 foi um marco em sua época. Seu
objetivo foi o de comemorar os cem anos de independência do Brasil, mostrar ao mundo e ao próprio
país toda a nossa potencialidade, promover o intercâmbio cultural e comercial, valorizar os produtos
da terra e trazer as novidades do ramo industrial de outros países para o conhecimento de nossos
cidadãos.” Quanto à participação em Exposições em outros países, o Brasil se inseria entre as
nações exóticas: as Exposições apareciam também como mostruários antropológicos, cujas atrações
eram “povos desconhecidos, matas virgens a serem descobertas” tidos como a visão do paraíso.
Ainda segundo Martins, eram eventos que refletiam a lógica da divisão internacional do trabalho com
os “colonizadores” demonstrando sua supremacia sobre os “colonizados”. “Estes, como no caso do
Brasil, se esforçavam ao máximo para impressionar com suas características exóticas e seus
esforços no campo industrial, promovendo seu próprio desenvolvimento”.

73
Nos pavilhões franceses [...] a cultura eclética esforça-se de várias
maneiras em conferir dignidade e respeitabilidade às estruturas dos
engenheiros, sem uma forte convicção e com um crescente senso de
estranheza. Não é de maravilhar que a Exposição de 1889 e as
discussões levantadas tenham produzido, como reação uma onda
extrema de intransigente classicismo [...]. Retorna às revistas a
antiga polêmica sobre o uso dos materiais novos e sobre as relações
entre arte e ciência (Ibid., p.148).

Os arquitetos conservadores não pareciam prontos para a Era da Máquina.


Coube a um grupo de arquitetos racionalistas franceses a tarefa de obter um decreto
de Napoleão III, em 1863, com o objetivo de reformar a École de Beaux-Arts, tirando
parcialmente o controle de ensino das mãos da academia e conferindo um sentido
mais liberal aos estudos. Embora a discussão fosse no sentido de atenuar a
orientação clássica e outras questões estilísticas, a verdadeira controvérsia era com
relação ao ensino técnico e suas relações com a formação artística: os progressistas
se queixavam que o estudante não tinha o menor contato com os novos materiais e
técnicas construtivas, durante os seis ou oito anos do curso. Como a polêmica foi
grande e a maior parte das reformas caiu por força de outro decreto, Émile Trélat
funda a École Centrale d’Arquiteture, instituição privada destinada a um ensino
rigorosamente técnico para “jovens engenheiros, empresários e a poucos arquitetos”
(Ibid., pp.148-152). No mundo todo, inclusive Brasil (ver item 2.1 do capítulo 2)
diversos grupos de intelectuais de vanguarda prosseguiram fazendo a necessária
mediação para cumprimento das demandas da burguesia industrial.

As Exposições Universais prosseguiram sempre com um grande número de


nações participantes, até o apogeu em 1904, com a Exposição de Saint Louis,
depois da qual veio o desinteresse, em razão dos conflitos e das constantes crises
por que o mundo passava. De qualquer maneira, após a Exposição Universal de
Paris de 1889, por algum tempo a arquitetura não mais conseguiu simbolizar as
conquistas e a capacidade do mundo industrializado, adquirindo apenas um caráter
lúdico ao adotar o neoclassicismo e o ecletismo como ornamentos destinados a
ocultar melancolicamente aquilo de que a burguesia tanto se orgulhava.

74
4.2 – A EXPOSITION DES ARTS DÉCORATIFS ET INDUSTRIELS
MODERNES DE PARIS: O DÉBUT DO ART DÉCO

__Vejo por aí que vosmecê condena toda e qualquer


aplicação de processos modernos.
__ Entendamo-nos. Condeno a aplicação, louvo a
denominação. O mesmo direi de toda a recente
terminologia científica; deves decorá-la. Conquanto o
rasgo peculiar do medalhão seja uma certa atitude de
deus Término, e as ciências sejam obra do movimento
humano, como tens de ser medalhão mais tarde, convém
tomar as armas do teu tempo.
O Medalhão. Machado de Assis

A realização da Exposição Universal de Paris de 1900 – o ponto culminante


do Art Nouveau – trouxe para a França um grande prejuízo financeiro e, decidida a
não mais sediar as onerosas feiras internacionais – uma exposição nos moldes das
anteriores seria muito fatigante e, principalmente dispendiosa para um país recém
saído de um conflito mundial particularmente arrasador em seu território – opta por
criar uma exposição temática, de caráter nacionalista, mostrando os novos produtos
de suas indústrias. O próprio Governo francês admitia que o país havia perdido sua
superioridade e influência nos valores estéticos mundiais, ao menos nos territórios
da arquitetura e do design, em parte pelo malogro nas reformas na École de Beaux-
Arts que persistiu na contínua cópia de estilos históricos (embora artistas de
vanguarda prosseguissem suas pesquisas sem apoio oficial), em parte graças aos
avanços conquistados pelos países vizinhos que se aclamavam modernos e, por
conseguinte, perfeitamente capazes de responder às exigências do comércio
internacional. Com o objetivo de mudar a própria imagem, tentando mostrar ao
mundo que também era capaz de ser moderna, organiza a Exposition Internationale
des Arts Décoratifs et Industriels Modernes, cujas discussões começaram de fato no
início dos anos 10 do século XX, mas por falta de fundos a princípio e em seguida a
primeira Grande Guerra tem sua inauguração seguidamente adiada até 1925. A
Exposição pretendia ser a “grande celebração à modernidade” – de qualquer
modernidade – (SEGAWA, 1998, p.54).

75
É a partir desse evento que medra uma derivação do Modernismo –
conhecido pelo nome de Art Déco20, derivado da Exposição que o divulgou
mundialmente, mas cunhado apenas na década de 60 do século passado –
desenvolvendo-se paralela à obra dos “verdadeiros” representantes do movimento.
Segundo Dennis Sharp (1972) essa produção, embora refletisse certas
características próprias do International Style, mantinha pouca relação com o
trabalho de seus arquitetos mais radicais.

Este estilo paralelo recibe actualmente los nombres de “Art Déco”,


“Moderno” o “Jazz Age Modern”; sus similitudes superficiales con la
arquitectura funcional internacional son desconcertantes y
ilustrativas a la vez. Aunque los historiadores de la arquitectura
prácticamente lo han ignorado por carecer de un programa y un estilo
de diseño coherentes, tuvo una vigencia mundial y bastante éxito
popular. Utilizaba muchos elementos decorativos que hubieron sido
antema para los funcionalistas, incluidos motivos superficiales en
zigzag, arcos redondeados y detalles de aristas matadas,
complicados adornos “proa de barco” y el empleo de materiales con
superficies reflectantes, muchas veces de color negro (SHARP,
1972, p.116, grifo nosso).

Aqui será útil abrir parêntese para uma definição de estilo. É preciso
considerar que os produtos da arte sejam edifícios, objetos industrializados, ou obras
de arte, considerados como artefatos, ou seja, obras humanas, são condicionados
pelos conhecimentos e inspiração de seu autor, orientado pelas forças estéticas
dominantes e respaldado no conhecimento das técnicas de sua época, técnicas
construtivas no caso específico da arquitetura – daí não se produzir, por exemplo, o
gótico no século XIX, mas neogótico. Mesmo que o artista prefira se esquivar do
problema da estética dificilmente conseguirá fugir às exigências técnicas da
construção ou, em nossos dias e no caso de objetos utilitários, da industrialização.

20
Na época, numa demonstração da confusão que o público fazia com outros estilos e
movimentos ou, simplesmente, de personalidades e fenômenos coexistentes, ficou também
conhecido “como Stile Poiret (do modista Paul Poiret), Style Chanel (de Coco Chanel), Bauhaus (de
Gropius), Esprit Nouveau (de Ozenfant e Le Corbusier), Arte Holandesa (de Theo Van Doesburg,
J.J.P.Oud e Mondrian), Style Puiforcat (de Jean Puiforcat, prateiro e designer), Jazz Modern Style,
Paris 25, Style 1925, La mode 1925 e Arte Funcional, Futurista, Cubista ou Cúbica (no Brasil)”. A
exemplo do termo Art Déco, outras denominações só foram criadas recentemente, para identificar o
estilo regionalmente, como o Tropical Déco (Miami), Pueblo Déco, (sudoeste dos EUA) e Marajoara
Déco (Brasil) (CONDE; ALMADA, 2000, p.11).

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Por tanto, el historiador de la arquitectura, al valorar un edificio por
sus méritos, lo relacionará en el tiempo con los edificios precedentes
y posteriores, y en el espacio con el contexto cultural del lugar en que
ha sido construido. Entonces es posible un análisis amplio que,
atravesando las fronteras nacionales, tenga en cuenta el intercambio
y la propagación de las ideas. Normalmente recibe el nombre de
“estilo” el conjunto de aquellas cualidades más obviamente
reconocibles de las obras de arte, de la obra de arquitectos o de un
grupo de edificios (SHARP, 1972, p.14).

É, portanto, comum que se encontrem, dentro do movimento moderno,


subdivisões em diversas categorias como International Style, Expressionismo,
Futurismo, Construtivismo, etc., como classificações convenientes para analisar
características e famílias formais. Muitos autores relutam em usar o termo estilo para
identificar o Art Déco, devido à sua característica de promiscuidade plástica,
adotando indistintamente particularidades típicas de diferentes estilos e que, embora
buscasse a linearidade de modo se distinguir do excessivamente sinuoso e
artesanal Art Nouveau21, impróprio para a nova condição do artista preocupado com
a industrialização, não conseguia se libertar totalmente do ecletismo. Neste trabalho,
no entanto, com o propósito de estabelecer as necessárias correspondências
existentes entre os diversos edifícios e circunscrevendo as posturas comuns,
descritas mais adiante, dos diferentes profissionais envolvidos nas manifestações,
foi adotado o conceito mais amplo, sugerido por Meyer Shapiro, para quem estilo
seria

la forma constante – y a veces los elementos, las cualidades y la


expresión constantes – que hay en el arte de un grupo o de un
individuo (…) y sobre todo, un sistema formal con una calidad y una
expresión significativa gracias al cual son visibles la personalidad del
artista y las características generales de un grupo (ibid., p.14).

21
Na realidade um e outro tinham em comum a intenção de renegar a herança do repertório
decorativo do passado, e procuravam “resolver valores plásticos através de elementos lineares e
cromáticos, acentuando a estruturação da forma e fundindo ornamento e objeto”. O Art Nouveau, por
seu empenho em criar um vocabulário totalmente novo e defendendo o uso do vidro e do ferro, foi
considerado um estilo de transição para o modernismo. E, por significar inovação em todos os lugares
onde se manifestou, recebeu nomes que sugerem mesmo essa associação: Modern Style na França,
Jugendstil na Alemanha, Stile Liberty, na Itália e Estilo Joven na Espanha. (CASTELNOU, 2002,
pp.27-28).

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O estilo presente nos pavilhões, portanto, refletia as influências relacionadas
acima tanto na arquitetura –desta vez com construções muito menores, mas nem
por isso menos monumentais que nas Exposições Universais, pois seu objetivo
ainda era chamar a atenção – quanto nos objetos expostos pelas grandes lojas de
departamentos parisienses presentes na mostra, como a Bon Marché.
Diferentemente das feiras anteriores, estava também representado o trabalho do
artesão, não como curiosidade, mas como produto. A exposição, mais comercial que
industrial, mostrou uma maneira diferente de pensar a arte, não propondo uma volta
ao academicismo, o qual se propunha a superar, mas, o que foi considerado bizarro
pelos modernistas, “vestir” as estruturas da arte moderna com uma ornamentação
de padrões geométricos simples, não comprometida com os estilos históricos.

Numa posição extrema e isolada do conjunto22 da Exposição, segundo Conde


e Almada (2000, p.9), é preciso destacar a presença do grande ícone da arquitetura
moderna, Le Corbusier, expondo, com o apoio do Ministério das Artes, um protótipo
de suas Immeubles-Villas, apartamentos-tipos empilhados formando arranha-céus
que, enfileirados formavam um quarteirão, proposta de uma nova fórmula de
moradia urbana. A unidade foi chamada de Pavillon de l’Espirit Nouveau e pretendia
de fato representar o espírito novo. Exaltando a padronização, mobiliou a unidade
inteiramente com o que chamava de objetos-tipo, numa manifesta apologia à
capacidade da indústria de produzir peças em série que fossem úteis e, ao mesmo
tempo, preenchessem “funções estéticas que se supunha, mesmo em círculos
progressistas, exigissem os serviços de marceneiros”. De fato,

Somente a estrutura foi obra de criação da mente que criou o


ambiente; o resto pretendia ser um trabalho de seleção, quase à
maneira de Duchamp, dos produtos padronizados, objets-types, já
existentes no mercado; a homogeneidade provinha em grande parte
da adaptação da estrutura a uma estética derivada de certas classes
de objets-types, e à rejeição de quaisquer produtos padronizados
que não obedecessem a essa estética (BANHAM, 1979, p.381).

22
Na verdade, nem tão isolada assim, já que, segundo Aracy Amaral (1975, p.303), para essa
mesma exposição, Konstantin Melnikov projetara o avançadíssimo pavilhão da União Soviética, o
maior edifício construído do movimento construtivista russo.

78
Permitir que Le Corbusier mobiliasse o pavilhão segundo o cânone purista
23
dos objets-types – poltronas inglesas do tipo “club”, móveis Thonet (de Michel
Thonet, que se tornaria famoso como representante da cadeira Chaise Longue,
desenho de Le Corbusier) de madeira curvada, estantes de aço em substituição aos
armários com portas, deixando à mostra ainda outros objetos industriais, etc. –
parece ter sido um gesto deliberadamente polêmico por parte do Ministro das Artes
Charles de Monzie de combate ao movimento Art Déco:

[...]sobre todo era un puntapié en el rostro de las llamadas arts


décoratifis, por lo que no es extraño que un comité de la exposición
impidiera que fuese expuesto al público , aunque recibió después el
primer premio del certamen (SHARP, 1972, p.85).

O estilo dos outros pavilhões apresentava uma ornamentação geométrica,


abstrata, de inspiração diferente das curvas de inspiração vegetal do Art Nouveau,
estilo contra o qual buscava reagir, embora tenha sua origem fortemente ligada a
algumas de suas vertentes: alguns de seus maiores representantes como Charles
Rennie Mackintosh, Otto Wagner e Joseph Maria Olbrich, serviram notavelmente de
fonte de inspiração para os artistas Déco. Apesar de ter uma genealogia artística
difusa e pouco clara, além do Art Nouveau, percebem-se influências no plano mais
imediato “do Cubismo, da Bauhaus, do Fauvismo, do Expressionismo e do
Neoplasticismo e, no plano mais remoto, de aspectos da arte egípcia24, maia, asteca
e ameríndia em geral” (CONDE; ALMADA, 2000, p.11). Pode-se perceber também
traços que remetem à arte da África negra que, por ter deixado os museus
empoeirados e aparecer com vitalidade nas Exposições Universais, através de
mostras daquelas culturas, contendo máscaras – muito admiradas pelos cubistas – e
outros artefatos intensamente decorados, despertaram no público o interesse pelas

23
Le Corbusier se considerava ele próprio um homem em consonância com o seu tempo.
Sua aparência pessoal era motivo de comentários freqüentes, “pois ele se esforçava por apresentar-
se como um homme-type de sua época, com as roupas escuras, chapéu coco, cachimbo e gravata
borboleta de um engenheiro” (BANHAM, 1979, pp.381-382)
24
Tambini (apud Castelnou, 2002, p.37) lembra que em 1922 fora descoberto o túmulo e o
tesouro de Tutankhamon por Howard Carter e pouco depois já se notavam os padrões egípcios na
joalheria e no mobiliário. “Surgiram reproduções de cadeiras, semelhantes a tronos, encontrados no
túmulo, e máscaras passaram a ser usadas para dar um toque exótico à decoração de interiores”.
Logo a moda repercutiria na Europa especialmente em jóias e edifícios para cinemas e em detalhes
como portas de elevadores, além de roupas, mobiliário e design gráfico.

79
culturas exóticas25. Outra fonte perceptível de influência – embora sem seu cuidado
projetual – é a obra do arquiteto norte americano Frank Lloyd Wright, com sua
volumetria limpa e cujo repertório ornamental já apresentava motivos da cultura
maia. O vocabulário estilístico desse amálgama de culturas tão diversas foi
reinterpretado a partir dos conceitos do modernismo e incorporado pelos artistas
Déco a toda sorte de produtos e edificações, com sucesso imediato de público,
talvez porque, conquanto adotasse linhas simples não abandonava inteiramente a
ornamentação, amenizando o choque causado pelos dogmas puristas das obras
modernistas.

Figura 4 - Frank Lloyd Wright: Residência Charles Ennis. Los Angeles –CA,1924.
(Fonte: PFEIFFER, 2004)

Afirma Castelnou (2002, pp.36-39) que “nisso residia, sem dúvida o sucesso
do Art Déco: renovava sem provoca desordem”, pois apesar de simplificar as linhas

25
Aracy Amaral (1975, p.88) relata a conferência proferida por Oswald de Andrade na
Sorbonne em 1923, em que o escritor faz o reconhecimento da atualidade do exótico na França e
declara: “Jamais foi possível sentir-se tão bem, no ambiente de Paris, a presença do tambor negro e
do canto do índio. Estas forças étnicas estão em plena modernidade”.

80
e planos dos objetos e de suprimir a decoração considerada inútil, mantendo-se
assim atualizado com as discussões modernas (como as de Adolf Loos no livro
Ornamento e Crime), permitia, geralmente “um ornato floral de escasso relevo e de
estilização geométrica”26. Além disso, “a elaboração complexa com técnicas
refinadas e ricos materiais” cuidava de evitar “a sensação de pobreza trazida pela
simplificação das formas”. Apesar disso, não permaneceu um estilo voltado à alta
sociedade, pois a indústria exigia a produção de objetos também acessíveis às
camadas populares e passou a utilizar materiais alternativos como o plástico, o
crômio e a baquelite, por exemplo, uma resina sintética muito utilizada em
brinquedos, ou substituindo a madeira, cara por conta da mão-de-obra especializada
e de modelagem limitada, em gabinetes dos rádios e outros aparelhos e objetos
utilitários domésticos.

Após a realização da Exposição e graças ao seu êxito surpreendente, houve


a evolução do estilo em vários campos da arte. O âmbito preferencial de suas
manifestações, no entanto, foi sempre o dos gêneros artísticos mais associados à
vida cotidiana, daí seu sucesso na arquitetura e nas artes aplicadas:

Embora se possa identificar uma Pintura e Escultura Art Déco é na


Arquitetura, Urbanismo, Paisagismo, Arquitetura de Interiores,
Design (de mobiliário, serralheria artística, luminárias, objetos
decorativos e/ou utilitários, louças, cristais, jóias e produtos
industriais como rádios e relógios), Cenografia (de cinema),
Publicidade, Artes Gráficas, Caricatura, Moda e Vestuário que se
encontram suas expressões mais significativas. [...] Ainda, de
especial relevância são os trabalhos de Arquitetura, Decoração e
Design naval que atingem o ápice nos interiores dos transatlânticos
franceses Atlantique (1931) e Normandie (1935) (CONDE; ALMADA,
2000, pp.10-11).

Um dos ícones Art Déco, aliás, é o clássico cartaz desenhado em 1935 por
Adolphe Mouron Cassandre, premiado artista gráfico conhecido por seus enfoques

26
Os motivos florais, tão caros ao Art Nouveau não desaparecem, como se viu, apenas são
simplificados e transformados freqüentemente em cactos e palmeiras ou em “buquês compactos de
rosas”. “Outros temas recorrentes na iconografia Art Déco são os cachorros, lebres e cervos, sempre
em movimento veloz, os repuxos d’água, trampolins e banhistas, [...] as linhas onduladas e
aerodinâmicas, os cabelos ao vento, o sol nascente e os motivos geométricos (círculos, retas,
quadrados), todos banhados em luz branca, filtrada por vidros foscos” (CONDE; ALMADA, 2000,
p.11).

81
em maquinário e velocidade sempre enfatizados pela perspectiva e pela composição
inusitada, para o a luxuosa linha de transatlântico Normandie. Outro nome
conhecido nas artes gráficas n é o de Robert Bonfils que, além de ser um dos
organizadores, desenhou o cartaz para a Exposição de 1925, com formas simples e
cores poucas e chapadas contrapunham-se ao academicismo das Beaux Arts.

Figura 5 - A. M. Cassandre: Poster para o Normandie 1934.


(Fonte: GRAFICA. Revista de Artes Gráficas. Curitiba: Casa de Idéias, n.30, 1991)

82
Figura 6 - Robert Bonfils: Exposition Internationale des Arts Décoratifs et Industriels Modernes
. 1925.
(Fonte: http://www.rom.on.ca/exhibits/artdeco/image_ROM2003_794_13.html)

Na arquitetura, em pouco tempo se tornou o estilo favorito das construtoras


em edifícios que, objetos dos novos tempos, não possuíam qualquer tradição
anterior, portanto isentos de qualquer necessidade de reverência para com ao
passado, “tais como garagens, cinemas, terminais de aeroportos, estações de força
e clubes de piscina”. Esses edifícios possuíam programas novos que não cabiam
nas limitações academicistas. Necessariamente aspiravam à
modernidade.Efetivamente, o Art Déco

foi o suporte formal para inúmeras tipologias arquitetônicas que se


afirmavam a partir dos anos de 1930. O cinema (e por associação,
alguns teatros), a grande novidade entre os espetáculos de massa
que mimetizava as fantasias da cultura moderna, desfilava sua
tecnologia em deslumbrantes salas [...], verdadeiros monumentos
Déco (SEGAWA, 1998, p.61).

Para se avaliar a penetração do estilo e uma certa indistinção com o


movimento moderno, é interessante citar o famoso costureiro parisiense, hoje
identificado como Déco, Paul Poiret. Com seus vestidos compridos e tecidos
“persas”, foi o “pioneiro dos novos estilos livres para mulheres, alterando sua

83
silhueta e revolucionando a moda ao libertar o corpo feminino dos espartilhos e
armações que os estrangulavam há quatro séculos”. O estilista era, a exemplo de
seus colegas da Alta Costura, não apenas criador de um estilo, mas um verdadeiro
modelo de um estilo de vida, morando e trabalhando em casas que eram
verdadeiros cenários de um orientalismo indeterminado – depois copiados em filmes
populares – e dando festas deslumbrantes em barcaças (CASTELNOU, 2002, pp.46-
47). A pintora modernista brasileira Tarsila do Amaral se vestia com ele, em uma
atitude de “vanguardismo”, a ponto de Oswald de Andrade, amigo pessoal de Poiret,
defini-la, como a “caipirinha vestida por Poiret”, ressaltando “sua dualidade de moça
de interior altamente civilizada e sofisticada numa personalidade única em sua
suavidade” (AMARAL, 1978, p.29).

Essa imbricação do Art Déco com a arte moderna acompanhou sua trajetória
por muito tempo, sem que isso signifique que era aceita por todos, em especial pelos
modernistas, principalmente por se tratar de um estilo que se limitava,
essencialmente, à superfície dos objetos, sem se preocupar com a estrutura. Em sua
obra Perspectiva da Arquitectura Européia de 1943 Nicolaus Pevsner lastima a
torção que as linhas da arquitetura moderna sofreriam, já por volta de 1925, “para
um expressionismo em alguns aspectos semelhantes à Arte Nova (‘Art Nouveau’)”
(PEVSNER, 1947, pp.351-353) ou, ainda, um “expressionismo cubista”, como
denominou, à falta de melhor classificação na época. Cita, para exemplificar, entre
outros, a Chile Haus, projeto de Fritz Höger para a sede de uma companhia de
navegação em Hamburgo, na Alemanha, cuja esquina apresentava a forma de proa
de barco referida na citação acima, aqui usada como simbolismo evidente (e todas
as características do desenho estão em função desse símbolo). Sua queixa se
assentava na convicção de que o International Style abrigava todos os argumentos
lógicos para se apresentar como legítimo espelho do século XX, “o século das
massas e da Ciência”, porque “em perfeito acordo com a nova situação social e
industrial da arquitectura” e preparado para a árdua tarefa de reconstrução da
Europa do primeiro pós-guerra. Dessa maneira, apenas a Arquitetura Moderna,
através de seus criadores, “homens de grande coragem e determinação e de
admirável imaginação e espírito inventivo”, estava preparada para responder às
novas e urgentes necessidades da produção:

84
O novo estilo, com sua recusa em aceitar o trabalho do artífice e as
extravagâncias do desenho, é de grande conveniência para uma
clientela anônima; e as superfícies lisas e com um mínimo de
molduragens tornam-no indicado para a produção industrial de
peças. O aço, o vidro e o betão armado não ditaram o novo estilo,
mas pertencem-lhe (PEVSNER, 1947, pp. 351-352).

Figura 7 - Fritz Hoeger: Chile Haus, 1923.


(Fonte: SHARP, 1972)
Apesar da exaltação à capacidade daqueles homens determinados e
inventivos, não lhes poupou críticas quando de suas incursões a outros estilos,
citando a “passageira homenagem” de Walter Gropius, verdadeiro baluarte do
Movimento Moderno, ao expressionismo em seu projeto de 1921 para o monumento
em concreto armado aos mortos na Primeira Guerra Mundial em Weimar. Outro alvo
de sua reprovação foi o que chamou de “surpreendente capricho” de Mies van der
Rohe: o seu desenho para o monumento a Rosa Luxemburgo e Karl Liëbknecht em
Berlim, construído em 1926 e destruído posteriormente pelos nazistas. Todo
construído em tijolos, Pevsner o considerava deslocado quando comparado com “o
perfeito racionalismo” de suas outras obras coevas. Lado a lado com essas
iniciativas pouco ortodoxas, graças à propagação dos postulados da nova
arquitetura também surgiam por toda a Europa obras que ostentavam inequívocas
marcas da arquitetura modernista, porém justapostas a estruturas convencionais.

85
Figura 8 - Mies van der Rohe: Monumento a Karl Liëbknecht e Rosa Luxemburgo. Berlin, 1926.
(Fonte: SHARP, 1972)
Pevsner ainda chama a atenção para a obra de Erich Mendelsohn, um
arquiteto com enorme influência em sua época, bastante conhecido inicialmente por
seus esboços de arquitetura fantástica, “de intensa agressividade e um vago caráter
simbolista que se enquadra perfeitamente no movimento expressionista
contemporâneo”, segundo Benévolo (1976, p. 438), que prossegue afirmando que
ao contrário de muitos outros que projetavam uma “arquitetura imaginária, às vezes
em manifesto contraste com as possibilidades de realização”, este tem como
objetivo “preparar uma nova linguagem arquitetônica que tenha validade geral”.
Quando consegue transferir para a realidade as “visões súbitas” que dizia ter nas
trincheiras da frente russa, o resultado é extremamente vigoroso. Pevsner, no
entanto, é implacável:

86
Mais importante para o futuro [do que o capricho de Mies] foi o
expressionismo de Mendelsohn, na sua Torre de Einstein, construída
em 1920, em Potsdam, porque, lado a lado com seus muitos
projectos de 1914-1924 (que parecem ter sido influenciados por
Sant’Elia), deu o tom à corrente que se tornou tão funestamente
omnipotente no desenho industrial americano. Também na
arquitetura, as horizontais de Mendelsohn, passando
impetuosamente por esquinas arredondadas, foram imitadas
inúmeras vezes. [...] O estilo de 1914 [o modernismo],
temporariamente obliterado pelos fumos do expressionismo ganhou
novo impulso e passou em alguns países, a constituir o estilo aceite
[...]. Noutros países evoluiu para uma monumentalidade
semiclássica, mais aceitável para aqueles que eram demasiados
fracos para absorver os aspectos inconformistas ou que se sentiam
demasiado desejosos de agradar às massas ainda não afeiçoadas à
novidade (PEVSNER, 1943, p.353-355).

Referia-se, em sua crítica “à corrente funestamente onipotente”, à


aerodinâmica “que varreu o design americano de produtos adequados e
inadequados a ela a partir do início da década de 30” (HOBSBAWM, 1998, p.185),
que tinha, na verdade, muito mais afinidade com o futurismo italiano que também
ecoava no design gráfico. Posteriormente tanto este estilo de design gráfico quanto
o que se pode chamar de objetos estáticos com aparência de velocidade seriam
identificados com o Art Déco.

Mais transigente que Pevsner, seu colega historiador da arquitetura Dennis


Sharp (1972) reconhece o espaço conquistado pelo estilo embora também lhe
negue crédito maior que o de uma espécie de “maneirismo sincrônico”:

Esta ambigua variante del modernismo – muy frecuente en los


balnearios costeros, en los garajes y los edificios destinados a
diversiones populares – forma parte claramente de la arquitectura del
siglo XX, tanto como los edificios del movimiento moderno, pero sus
repercusiones fueron insignificantes (Ibid., p.116, grifo nosso).

87
Figura 9 -Esquerda - Harry W. Weedon e Andrew Mather: Cine Odeon, Londres, 1937. Direita –
Andrew Mather: Cine Odeon, Chingford, Essex, 1935.
(Fonte: SHARP, 1972)

Figura 10 - Iles, Leathart e Granger: Cine Dreamland. Margate, Kent, 1937


(Fonte: SHARP, 1972)

88
Já no início dos anos 1920, Le Corbusier, em um panfleto de sua revista
l’Esprit Nouveau, assim se referia ao estilo:

As “artes decorativas”grassam! Após trinta anos de surdo trabalho,


ei-las aqui em apogeu. Comentadores entusiasmados falam de
regeneração da arte francesa! Retenhamos desta aventura (que vai
acabar mal) que outra coisa nasceu mais que uma regeneração da
decoração: uma nova época substitui uma época que morre (LE
CORBUSIER, 1994, p.59).

Figura 11 - Pierre Patout. Portão Monumental, Praça da Concórdia, Exposição de Paris de 1925
(Fonte: Guia da Arquitetura Art Déco no Rio de Janeiro)

Figura 12 - Vista Geral da Explanada dos Inválidos. Exposição de 1925, Paris.


(Fonte: http://www.retropolis.net/exposition/viewsouth.jpg)

89
Figura 13 - Pavilhão da Primavera e o Bon Marché. Exposição de 1925, Paris.
(Fonte: http://www.retropolis.net/exposition/marche.jpg)

Figura 14 - Vista das Galerias Lafayette. Exposição de 1925, Paris.


(Fonte: http://www.retropolis.net/exposition/lafayette2.jpg)
Mesmo tendo sua gênese ligada ao enfraquecimento do predomínio estético
francês e sendo considerado pelos críticos de arte como “fútil”, enfrentando a
resistência dos que se reclamavam “verdadeiros modernos” e tendo uma trajetória
extremamente curta27, o Art Déco rapidamente se espalhou pelo mundo atingindo
culturas tão diferentes como a brasileira, a cubana, a japonesa, a mexicana e a
norte-americana graças, em parte, à facilidade de deslocamento entre os

27
Conde e Almada (2000, p.9) estabelecem quatro períodos para as manifestações do Art
Déco: até 1925 deu-se sua formação e manifestções embrionárias. Depois, a partir do lançamento ao
público na Exposition des Arts Decoratifs até 1930, a divulgação e expansão mundial. De 1930 a
1940, a consolidação e o apogeu e de 1940 até 1950, as manifestações tardias.

90
continentes propiciada pelo avião, à expansão da imprensa, tanto jornalística como
de entretenimento, e ao cinema. Este pode ser duplamente considerado como um
importante divulgador do estilo seja com suporte físico para suas manifestações,
seja por exibir nas telas a cenografia luxuosa de palácios, transatlânticos, etc. Além
disso, o sucesso do Art Déco nos Estados Unidos, com marcante presença em
Chicago, Miami e Nova Iorque, onde estão seus mais célebres edifícios, pode ser
também atribuído à excursão que parte da mostra da Exposition Internationale des
Arts Décoratifs et Industriels Modernes de Paris fez pelo país durante todo o ano de
1926. A produção arquitetônica nos diferentes países, no entanto, sofreu várias
adaptações ou aclimatações a partir de influências locais, das quais

resultaram três linhas de Art Déco: a primeira, mais seca e


geometrizada, muito próxima do racionalismo modernista e também
conhecida como escalonada ou ziguezague; a segunda,
afrancesada, com resquícios acadêmicos e ênfase decorativa,
lembrando o Art Nouveau inglês e o austríaco e, a terceira, sinuosa
e aerodinâmica, inspirada no Expressionismo e também
denominada streamline. À primeira e terceira tendências pertencem
a maior parte da produção latino-americana e brasileira, em especial
edifícios de apartamentos e cinemas. A segunda, inspira o pioneiro
Art Déco francês, a produção italiana e inúmeras obras nos EUA,
entre as quais o Rockfeller Center (1931-39), o Chrysler Buiding
(1930), o Radio City Music Hall (1931-32), todos em Nova Iorque, e o
Palmolive Building (1929-30) em Chicago. No Brasil, pertencem a
essa linhas alguns prédios comerciais e igrejas, assim como certas
obras na variante Marajoara do Art Déco (CONDE; ALMADA, 2000,
p.12, grifo do autor).

O edifício sede para a Chrysler em Nova Iorque, projeto de Willian van Allen,
de 1930, é considerado um dos maiores monumentos Art Déco no mundo,
expressando seu glamour na decoração interna e em suas formas. “Os pináculos
semi-circulares foram revestidos com metal Nircosta para criar superfícies brancas
brilhantes, que lembrassem platina, o metal preferido da joalheria contemporânea”
(STRINER apud CASTELNOU, 2002, p.40). Esse arranha-céu, juntamente com o
Empire State Building de 1931, o Rockfeller Center de 1935 e os interiores criados
para o Radio City Music Hall, de 1931, fez de Nova Iorque um dos maiores redutos
Art Déco fora da França (CASTELNOU, 2002, pp.39-40) e ajudou a construir sua
imagem de grande metrópole.

91
Figura 15 - Willian van Allen: Crhysler Building, Nova Iorque, 1930.
(Fonte: MATTHEWS. 1999)

Em Miami há a maior concentração de construções Déco no mundo, na


variante denominada Tropical Déco, caracterizada por construções em:

Concreto revestido com uma linguagem aerodinâmica associada a


detalhes em ziguezague, policromia e ornamentos estilizados
orgânicos e abstratos. O branco funcionalista do Art Déco era
freqüentemente coberto por um tratamento em cores pastéis, tais
como o rosa-flamingo, o verde-mar e o amarelo-canário. Assim, as
fachadas dos hotéis de Miami Beach caracterizam-se por planos
curvilíneos e ornatos aplicados, cujas estruturas horizontais são
coroadas por símbolos futuristas da era da máquina e sinais em
néon. [...] Sem usar materiais caros, os arquitetos [...] conseguiram
dar uma impressão de elegância par o que na verdade eram
modestos hotéis. [...] as janelas geralmente são enfeitadas com
flamingos, garças, conchas do mar, palmeiras e principalmente
nascer-de-sóis (sic) (Ibid., p.54).

Curioso é que uma liga preservacionista conseguiu o tombamento nos anos


80 do século passado de uma área de 2,5 quilômetros, a primeira do século tendo
os edifícios, entretanto, recebido novas pinturas, desta vez com cores fortes. O fato

92
de a população considerar que a intervenção “deixou os edifícios melhores que
nunca” (Ibid., p.55) talvez seja mais uma demonstração da flexibilidade do estilo.

Vale destacar, também o estabelecimento do estilo em Cuba, que ocorre em


condições muito semelhantes às do Brasil, coincidindo com mudanças na sociedade
cubana.

A República de Cuba, em plena etapa neocolonial – devido a suas


limitações constitucionais e de todo tipo, impostas pela histórica
Emenda Platt –, estava em busca de uma "nova imagem". Por um
lado, como símbolo deveria diferenciar-se claramente do que havia
significado, até 1º de janeiro de 1899, a capital da colônia espanhola
Ilha de Cuba. Por outro lado, era evidente a aspiração da cultura
cubana dominante – persistente em sua tradição colonial: elitista, de
conhecidos refinamentos europeus, mas em dia com os avanços
tecnológicos norte-americanos, e economicamente muito poderosa –,
de integrar a seu cabedal novas edificações que se originaram na
corrente renovadora "moderna", cujos focos brilhavam
deslumbrantemente, tanto vindo de Paris, como desde Nova York
(ARUCA, 2001).

Assim, logo após a Exposição de Paris, Cuba importava o estilo rapidamente


aplicado em construções de aspecto monumental, tanto públicas – Hospital
Municipal América Arias e a Biblioteca da Universidade de Havana, como privadas –
Edifício Bacardí, Edifício América, e os cinemas Arenal e Fausto. Em pouco tempo, o
estilo era absorvido pelas camadas populares (Ibid.).

Não obstante o sucesso que o estilo alcançou mundialmente parece não


haver entre os historiadores estudados, oposição ao conceito de que o Art Déco,
com seu otimismo e frivolidade, representava uma diluição libertina dos conceitos da
modernidade de vanguarda da qual se nutria. Antagonizava-se escandalosamente
com o engajamento político ideológico das vanguardas como o futurismo e com as
propostas de eliminação do supérfluo, como os ornamentos das fachadas dos
edifícios, presentes nos programas do neoplasticismo, do construtivismo e da
Bauhaus. Originários de diferentes países, todos estes movimentos de formulação
da modernidade, “nascidos em contextos históricos convulsivos, com assumido
engajamento ideológico e social”, tinham como palavras de ordem o funcionalismo,
utilitarismo e estandardização (SEGAWA, 1998, p.54). O Art Déco dava ares de uma
modernidade de difícil caracterização e a Exposição de 1925 e a posterior
propagação do estilo internacionalmente, evidenciavam “a busca de qualquer
modernidade, a necessidade de exprimir idéias novas, de tentar ser moderno

93
mesmo sem que se pudesse esclarecer o que isso significava ou como se chegava à
condição de moderno”.

4.3 – A REPÚBLICA ANTROPOFÁGICA DOS ESTADOS UNIDOS DO


BRASIL

Conforme referido na introdução deste trabalho, poucas historiografias da


arquitetura, em especial brasileiras, identificam o estilo Art Déco, o que dificulta
determinar sua origem no Brasil. Mesmo assim, pode-se considerá-lo como uma
tentativa de manifestar o Movimento Moderno entre nós, rescaldo da onda
modernizadora européia dos anos de 1910 a 1930 que se apresentou por aqui com
as mesmas contradições de lá, com um desvirtuamento quando de sua assimilação
no campo arquitetônico. Segundo Hugo Segawa (1998) formas alternativas de
modernidade, diferentes das radicais e “legítimas”, se manifestaram entre nós muito
antes da Casa Modernista de Warchavchik, em São Paulo, no ano de 1928. E tais
demonstrações de renovação arquitetônica, “qualquer que seja ela – à maneira folle,
mimeticamente, pragmaticamente ou como transformação modernizadora em sua
dimensão perversa” – que hoje recebem o nome de Déco ou, com intenção
depreciadora, de “estilo fascista”, receberam apelidos diversos, alguns igualmente
pejorativos. “São arquiteturas que também foram chamadas de ‘modernas’,
‘cúbicas’, ‘futuristas’, ‘comunistas’, ‘judias’, ‘estilo 1925’, ‘estilo caixa d’água’ e assim
por diante” (SEGAWA, 1998, p.54).

A arquitetura modernista de Warchavchik encontrava dificuldades em libertar-


se do perfil internacionalista que o próprio nome, cunhado posteriormente, mas já

94
manifesto, International Style28, lhe impunha. Assim, quando “o estilo Art Déco [...]
domesticou a angularidade e abstração modernistas” (HOBSBAWM, 1998, p.185) e
serviu, num primeiro momento, de ponte entre o modernismo desejado e o
necessário nacionalismo, já que os enfeites de estilo egípcio e grego e as imensas
estátuas de homens musculosos montando guarda às portas dos edifícios-
monumentos, que caracterizavam o estilo na Europa e Estados Unidos, eram
facilmente cambiáveis em ziguezagues Marajoaras e estátuas de índios à entrada
dos prédios. Conde e Almada (2000, pp.10-14) interpretam esse intercâmbio com os
motivos marajoara, no Brasil, como o uma espécie de “aclimatação” do estilo ao
debate cultural em que estava mergulhado o país: ao encontrar a forte corrente
nacionalista dos grupos Nativistas, que se manifestavam em todos os campos da
arte, o Art Déco logo é adaptado a uma linha, com a qual facilmente se identifica, de
inspiração indigenista inventada por Edgar Vianna29, baseada nos motivos
decorativos geométricos e labirínticos da cerâmica dos índios da Ilha de Marajó, no
Pará, cuja cultura era anterior à chegada dos portugueses. Também incorpora
motivos em alto e baixo relevo e, embora mais raramente, estátuas representando o
índio, a flora e a fauna amazônica. Importante também foi o costume de hábito de
batizar os edifícios Déco com nomes indígenas.

Mas o Art Déco pretendia-se também um “estilo industrial, isto é, associado à


sociedade industrial nascente, implícitas aí todas as suas conseqüências, sobretudo
tecnológicas” ou seja, da mesma maneira que o Movimento Moderno, também tinha
sua imagem com tudo que se definia como moderno: arranha-céus, automóveis,
aviões, cinema, rádio, música popular, moda/vestuário e emancipação da mulher.
Era, portanto, um estilo cosmopolita, mas a possibilidade do diálogo com a cultura

28
Segundo Sharp (1972) o termo, bastante significativo, amplo e específico ao mesmo tempo,
ganhou repercussão ao ser escolhido como título do livro publicado em 1932 por Henry-Russel
Hitchcock e Philip Johnson. Por sua vez, fora tomado da exposição do ano anterior realizada no
então recentemente inaugurado Museu de Arte Moderna de New York e denominada “International
Style: Architecture from 1922.
29
Segawa (1998, p.61) atribui essa “invenção” ao pintor Theodoro Braga, estudioso dos
motivos da cerâmica da Ilha de Marajó, onde nasceu e que, no início da década de 30 do século XX
considerava que a saída para a arte brasileira seria mirar-se na experiência de nossos vizinhos latino-
americanos que adotavam desenhos pré-hispânicos como ornamentação.

95
nacional, expressa na adoção do Marajoara, por exemplo, permitindo que a
modernidade fosse construída pela continuidade e não pela ruptura, pode explicar
seu sucesso num país onde Estado e intelectuais estavam engajados na construção
da identidade nacional.

O caminho que une o Art Déco europeu com as primeiras obras do estilo no
Brasil, no entanto, é de difícil reconstituição. Conde e Almada (2000, p.15-17)
consideram a possibilidade de uma amálgama de influências entre os muitos
arquitetos estrangeiros que imigraram para cá imigraram, principalmente após a
Primeira Guerra Mundial, os profissionais que voltaram ao país após estudar na
Europa e, ainda, as influências indiretas proporcionadas pelo intercâmbio cultural
precário através de revistas de arte e arquitetura que divulgavam as novas idéias
artísticas. Outro componente importante foram as visitas para palestras e
conferências ou a trabalho, de importantes profissionais como os modernistas Le
Corbusier em 1929 e 1936, Frank Lloyd Wright, em 1931, e o urbanista pré-moderno
Alfredo Agache, que esteve no Brasil em 1928 a convite do governo do Distrito
Federal para elaborar um plano para a então capital do país. Embora o plano não
tenha sido executado de imediato, em função da eclosão da Revolução de 1930,
Agache foi o primeiro a introduzir no Brasil as discussões a respeito da cidade
industrial. Esse quadro ocorre justamente no período mais ativo de construções Art
Déco, começando no início dos anos 30, o que pode fazer pensar nas influências
mútuas entre os estilos.

Embora faltem dados em quantidade e qualidade suficiente para


conclusões mais sólidas, pode-se perceber que o grosso da
produção Art Déco acontece no período 1930-40. Entre os arquitetos
autores dos projetos, desde já destacam-se seis com significativo
número de obras construídas: Robert Prentice, Henri Sajous, Arnaldo
Gladosch, Elisário da Cunha Bahiana, Ricardo Wriedt e Adalberto
Szilard, cujas obras completas ainda estão por ser levantadas
(CONDE; ALMADA, 2000,p.15).

A difícil genealogia da arquitetura Art Déco no Brasil deve começar, sugerem


Conde e Almada (2000, pp.13-14), no exato ponto entre o que se convencionou
chamar de Ecletismo e o Modernismo. O Ecletismo pode ser compreendido de duas
maneiras diferentes, de um lado designando o período em que convivem ou se
sucedem rapidamente vários estilos concorrentes entre si e de outro lado a mescla
de influências de vários estilos em uma mesma obra, sendo considerada eclética no

96
Brasil toda produção que ocorre entre o fim do período barroco até a consolidação
do Modernismo. Segundo o raciocínio destes autores, o Art Déco estaria
classificado, juntamente com o Art Nouveau, tanto entre os estilos ecléticos como
entre o movimento moderno que visava superas as limitações do historicismo. Em
vez de um divisor de águas, o Art Déco se classificaria entre as últimas
manifestações do Ecletismo ao mesmo tempo que se enquadraria entre as primeiras
expressões do Movimento Moderno, o que explicaria seu caráter ambíguo. Seriam
ecléticas:

 Obras estritamente ou livremente referenciadas a um estilo


histórico (revivals ou interpretações):-neoclássicas
(neogregas, neo-romanas, neo-renascentistas, neobarrocas,
etc.); e neogóticas e neo-românicas;

 Obras referenciadas a estilos românticos, nacionais,


regionais, vernáculos, pitorescos ou exóticos: chalés e
bangalôs “suíços”, “germânicos”, “normandos” e “flamengos”;
“mediterrâneas” e em estilo “Missões” californiano;
“neocoloniais (luso-brasileiras, hispano-americanas e anglo-
americanas); “astecas”e “maias”; e “mouriscas”, “bizantinas”,
pagodes “chineses” e “japoneses”;

 Obras referenciadas simultaneamente a diversos estilos (isto


é, ecléticas stricto sensu);

 Obras em estilo original: Art Nouveau; e Art Déco e sua


vertente Marajoara;

 Obras ditas “utilitárias”, sem filiação estilística acadêmica, em


especial: obras em ferro; obras industriais; depósitos e
armazéns comerciais ou portuários; e silos e galpões rurais.
(Ibid., p.13, grifo do autor).

Inversamente à divergência que caracterizou o Ecletismo até sua


fragmentação final, ainda segundo os mesmos autores, o Modernismo se
caracterizaria pela convergência em seu período de consolidação, por isso
considerado não apenas como um estilo, mas um movimento que “embora
abrigando manifestações distintas, soube articular suas diferenças em prol de um
objetivo comum: a liquidação do Academicismo”. Pertenceriam então ao Movimento
Moderno no Brasil os seguintes tipos de obras, também chamadas de
“protomodernas”:

 Obras ditas “utilitárias”, sem filiação estilística acadêmica, já


relacionadas acima;

97
 Obras Art Déco e sua variante Marajoara;

 Obras pioneiras isoladas, referenciadas principalmetne à


tradição racionalista alemã, entre as quais as casas
modernistas de Warchavchik (a partir de 1927), o Albergue da
Boa Vontade, de Reidy (1931), o Edifício Morro de Santo
Antônio, de Marcelo Roberto (1929), a residência do arquiteto
F. Kirchgässner (1930), em Curitiba, e a obra pouco
conhecida de Julio de Abreu Junior (após 1927); e

 Obras derivadas das visitas de Le Corbusier ao Brasil,


corrente essa que se tornaria hegemônica após 1936,
obscurecendo as demais contribuições (Ibid., pp.13-14).

Não se deve imaginar, como ensinam as historiografias, que a transição


aconteceu de forma instantânea: não teria havido, novamente segundo Conde e
Almada (2000, p.14), uma ruptura, mas em vez disso houve uma “mutação lenta e
imperceptível, produzida por protagonistas até hoje quase anônimos”. Assim,
durante muito tempo, houve um conjunto de manifestações arquitetônicas que exibiu
traços em proporções diferentes, tanto da vanguarda européia quanto do ecletismo
nacional, numa pluralidade que caracterizou a produção arquitetônica do período
estudado.

Naquele momento a manifestação de diversas tendências estilísticas


permitiu a reinterpretação, por vezes programada, outras diluída, das
correntes artísticas racionalistas e modernas do início do século XX,
que ambicionavam reafirmar e atender ao esforço progressista da
civilização industrial. [...] Estas arquiteturas identificadas com a
modernidade podem ser identificadas inclusive em regiões onde
arquitetos e engenheiros (nacionais e estrangeiros) incorporaram à
sua maneira os debates teóricos e os avanços tecnológicos da
época, com certa dose de autodidatismo, adotando uma atitude
pragmática. Pragmatismo que reforçaria a tese de que a produção
arquitetônica moderna no Brasil de meados do século XX não se
resumiu àquela que seria denominada Arquitetura Moderna Brasileira
e suas escolas regionais, mas também incluiu manifestações
arquitetônicas que, imbuídas de um espírito modernizador, se
inseriram na transformação de nossas cidades (BLANCO; CAMPOS
NETO, 2003).

98
Figura 16 - Roberto Lacombe e Flávio Barbosa. Projeto de Residência Marajoara, 1939.
(Fonte: Guia da Arquitetura Art Déco no Rio de Janeiro)

A falta de documentação anterior permite o ato arbitrário de identificar a


primeira edificação que tipificava as expressões apresentadas acima. Segundo
Segawa (1998, pp.55-57), no mesmo ano da Semana de Arte Moderna era
inaugurado, na cidade de Santos, então o porto estratégico para o escoamento do
principal produto de exportação brasileiro, o café, um edifício que ganhou
imediatamente repercussão regional, “nem tanto por sua arquitetura, mas por se
tratar da mais luxuosa casa de diversão da cidade. Era o Cassino e Teatro Parque
Balneário”30, que apresentava uma arquitetura formalmente filiada à arquitetura da
Deutscher Werkbund, portanto absolutamente destoante da produzida no país até
então e, embora a organização não apresentasse uma linguagem artística particular,
“por analogia, filiava-se à produção anterior a 1920 de arquitetos ligados [àquele]
movimento como Peter Behrens (1868-1940), Walter Gropius (1883-1969) e Adolf
Meyer (1887-1929)”.

30
Ainda anterior seria a construção, em 1921 do Moinho Chaves, em Porto Alegre, projeto do
alemão Theo Wiedersphan. Era, porém um edifício industrial em que a sobriedade do programa
refletia-se no tratamento externo, com sua fachada marcada por pilastras que acentuavam sua
verticalidade, uma seqüência de janelas repetidas e apenas uma discreta linha de cimalha e desenho
de platibanda (SEGAWA, 1998, p.57).

99
Lembrando-se que naquele mesmo ano repercutia o sucesso de nosso
neocolonial na exposição internacional do centenário da independência, o fato
ganha mais importância e pode ser atribuído à iniciativa de um homem, bastante
polêmico à época (Ver Capítulo 2). Trata-se do engenheiro civil Roberto Simonsen, à
frente da Companhia Construtora de Santos, a maior empresa de construção civil do
país e cujas obras, a exemplo do cassino, apresentavam formas mais limpas, era um
dos onze brasileiros assinantes da revista L’Esprit Nouveau, publicada por Le
Corbusier entre os anos de 1920 e 1925. Mas se o fazia, parece claro que não era
por diletantismo. Defensor de primeira hora da industrialização e da entrada do
Brasil na Era da Máquina, via na racionalização a forma de conseguir o aumento da
produtividade e essa, por sua vez, a única maneira, de aumentar a renda do
operário brasileiro evitando assim os perigos da rebelião das massas.

Alguns criticos chegam a censurar a racionalisação, como uma das


causadoras da crise. Um exame meticuloso do assunto mostrará que
o que houve foi exactamente, insufficiencia de racionalisação,
porquanto ella não terá alcançado todas as phases do cyclo de
producção. A racionalisação deve comprehender o estudo das
capacidades dos mercados, para que a producção não as exceda,
abrangendo outrosim a criação de novas actividades que absorvam,
continuamente, as sobras de mão de obra, decorrentes das
industrias que forem sendo racionalisadas. (SIMONSEN, 1933, p.32)

A idéia da racionalização deveria ser aplicada em todas as esferas, desde a


agricultura até a construção civil. E de fato Simonsen aplicou os princípios que
pregava, em sua própria construtora, introduzindo a reorganização científica do
trabalho de base taylorista. Conseguiu, pelo aumento da eficiência do trabalhador e
conseqüente aumento de produtividade, baratear os custos da construção sem que
para isso fosse necessário reduzir salários, resultado que destacava nos discursos
que freqüentemente pronunciava aos operários da construtora.

100
Figura 17- Companhia Construtora de Santos: Cassino e Teatro Parque Balneário de Santos, S
P, 1922.
(Fonte: SEGAWA, 1998)
A Companhia Construtora de Santos foi a responsável pela imigração para o
Brasil, em 1923, do arquiteto Gregori Warchavchik, um dos outros onze brasileiros a
assinar a revista L’Esprit Nouveau, também ele um defensor da racionalização e da
tecnologia moderna na construção, no mesmo ano da construção do Cassino. O
russo nascido em Odessa, em 1896, e formado em arquitetura pelo Instituto Superior
de Belas Artes de Roma deixou a Itália já contratado pela empresa, onde viria a
trabalhar por cerca de dois anos31 (BRUAND, 1981, p.64).

Uma leitura do manifesto Acerca da Arquitectura Moderna permite perceber a


proximidade do pensamento de Warchavchik e de Roberto Simonsen. Este artigo foi
publicado primeiramente em 14 de junho de 1925, em italiano, língua que o arquiteto
dominava melhor que o português, em um jornal de circulação restrita entre a
comunidade italiana de São Paulo. Percebendo o alcance limitado dessa sua

31
Simonsen também empregou em sua construtora, na mesma época, outros dois pioneiros
da arquitetura moderna brasileira: Rino Levi e Jayme da Silva Telles. Para Segawa (1998, p.56), se
essa evidências pontuais não são suficientes para comprovar uma coerência de perspectiva
arquitetônica, a perspectiva industrialista do empresário dá indícios de “uma possível aliança entre a
apologia da indústria na arquitetura racionalista européia e a introdução de elementos inovadores na
arquitetura mediante a modernização da construção civil no Brasil das primeiras décadas do século
20”.

101
iniciativa, encaminha o artigo para tradução para o português e o envia para o jornal
carioca Correio da Manhã que o publica em 01 de novembro de 1925 “entre uma
coluna sobre moda feminina de Paris e propaganda de automóveis, sapatos e
produtos farmacêuticos” (BRUAND, 1981, p.64), tendo pouca repercussão a mais
que a tentativa anterior. Quando da primeira publicação, os editores do jornal Il
Piccolo, os editores precederam o manifesto Intorno All’Architettura Moderna com
uma pequena introdução intitulada Futurismo?, talvez tendo em vista a maior
familiaridade da população de imigrantes italianos com as idéia do movimento
lançado em 1909, por Marinetti, e também pela proximidade de seus conceitos com
os emitidos pelo jovem arquiteto russo. Após saudar a inteligência do autor e chamar
a atenção para a universalidade das questões colocadas tanto por envolverem a
habitação quanto a cidade, destacando a necessidade de maior racionalismo
construtivo e da limpeza formal das construções, a nota justifica:

Il futurismo é nato del nostro tempo, e ha detto le sciochezze che ha


dette, solo perchè il nostro tempo è marcio di cultura e di spirito
d'imitazione. E invero, quando si vedono le belle estrade dei quartieri
dei ricchi infestate dea una mascherata di casette moderne, vestite in
costume, e il barroco di Luigi XV accanto al moresco di Maometto, e il
classico de Leone X accanto al gotico di Lutero, come in una
incomposta mascherata storica, viene veramente fatto di pensare
com raccapriccio, a che cosa diranno di noi e del nostro secolo i
nostro posteri (BRUAND, 1981, apêndice, p.379)

O artigo-manifesto chamava a atenção para questões que vinham sendo


discutidas na Europa, havia muito tempo, no campo da arquitetura e artes plásticas
em geral. Mesmo no Brasil os temas abordados por Warchavchik já chamavam a
atenção da elite, intelectuais e empresários, preocupados com a inserção do país na
modernidade sem que, no entanto, a arquitetura fosse mencionada. Basta lembrar
que, quando da organização da Semana de Arte Moderna, na sessão reservada ela,
não havia um nome que representasse a visão da vanguarda brasileira, mas sim
dois profissionais convidados apenas que a exposição ficasse completa: um
arquiteto polonês, Georg Przyrembel, que expôs o projeto de sua própria casa de
praia no padrão da arquitetura tradicional brasileira (SEGAWA, 1998, p.36), e
Antonio Garcia Moya de origem espanhola e que estudou no Liceu de Artes e
Ofícios de São Paulo, projetista de casas em estilo mourisco espanhol, (ver Capítulo
3) e que se manteve produzindo obras de natureza eclética por toda sua vida. Seus
trabalhos expostos, alguns de clara inspiração maia, porém, “captavam a vertente

102
‘exótica’ que pairava no ambiente cultural de então” e parecem ser “a mais antiga
proposição conhecida dessa tendência de tomar emprestado motivos pré-
colombianos no Brasil”. Antecederam mesmo o projeto de Flávio de Carvalho para o
concurso do Farol de Colombo em 1928 e parecem ter sido precursores de “um
formalismo que se seguiu ao esgotamento da voga neocolonial” (Ibid., pp. 60-61).

Foi um dos dois participantes da modesta seção de Arquitetura [...],


na qual apresentou desenhos que insinuam um desejo de
rompimento formal com os estilos acadêmicos e uma aproximação
às Avant-Garde, porém sem um projeto estético definido. Moya utiliza
nesse momento volumetrias pouco ortodoxas, “cúbicas“ por assim
dizer, aliadas a um decorativismo de motivação pré-colombiana.
Posteriormente chamado “Estilo Marajoara“ em referência à rica arte
geométrica indígena da foz do Rio Amazonas, este estilo é pela
primeira vez detectado nesses desenhos de 1922 [...](NEDELYKOV;
MOREIRA, 2001).

É de se supor também que Moya tivesse conhecimento da obra do americano


Frank Lloyd Wright, admirador dos motivos maias (ver Capítulo 4.2), posterior a
1916, ainda que fosse apenas no nível formal, sem uma verdadeira digestão de seus
princípios. Essa falta de uma fundamentação teórica restringia sua atuação a
experiências de caráter meramente especulativo – na verdade, para Yves Bruand
(1981, p.63), Moya se restringia a colocar no papel “desenhos de uma arquitetura
visionária que agradava aos futuristas por sua fisionomia extravagante” – tanto na
Semana de 22 quanto posteriormente.

Figura 18 - Antonio Garcia Moya, Projeto para uma residência, 1928.


(Fonte: NEDELYKOV; MOREIRA, 2001). Disponível em
<http://www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq018/arq018_03.asp>

103
Figura 19 - Frank Lloyd Wright: Residência Alice Millard. Los Angeles –CA,1924.
(Fonte: PFEIFFER, 2004)

Em razão desta ausência de propostas ou de um projeto estético mais


definido (como se viu, o que Moya expôs no salão consagrado à arquitetura não
eram mais do que esboços) ganha peso o manifesto de Warchavchik. Embora
tivesse uma formação estritamente acadêmica, possuía uma nítida vantagem sobre
seus colegas paulistas, pois além do prestígio da formação de sua formação técnica
no Velho Mundo, o ensino de arquitetura na Europa era mais aberto que na América
Latina. Além disso, os alunos viviam mergulhados na agitação dos debates artísticos
por todo o continente e, mesmo que o ensino nas escolas européias ainda
permanecesse acadêmico,

O espírito clássico não estava voltado para a cópia do passado, nem


impedia a pesquisa de uma arquitetura prática e econômica, de
volumes e linhas puras, onde os elementos decorativos fossem
reduzidos ao mínimo e correspondessem a uma função, sem jamais
esconder a estrutura do edifício. A preocupação com a verdade e
com a simplicidade e a rejeição do ornamento supérfluo eram uma
tendência profunda, de modo algum exclusiva dos mestres da
vanguarda francesa, austríacos ou alemães; o neoclassicismo de
Piacentini baseava-se nos mesmos princípios (BRUAND, 1981,
p.64).

104
Aparentemente, Warchavchik tinha então as condições pessoais necessárias
para iniciar o que seria a nova arquitetura brasileira e, eventualmente, o fez. Nesse
primeiro momento, porém diversos problemas surgidos quando da construção de
sua primeira casa moderna, em 1927, um ano após deixar a Companhia Construtora
de Santos, não permitiram que ele expressasse na obra seu próprio discurso
modernizador, impedido pela falta de materiais industrializados e de mão-de-obra
especializada.

Na construção de sua casa da Rua Santa Cruz, Warchavchik teve de


contornar as dificuldades: Não tive coragem de construir a casa com
cobertura de terraço-jardim32, como o teria desejado. Ainda não
existiam na praça os materiais isolantes adequados. Cobri o telhado,
embutido entre as paredes, com telhas coloniais. Não pude
conseguir nem portas nem janelas lisas. Ninguém as sabia fazer.
Ainda não existia madeira compensada. Para suas construções
precisou montar oficina própria: “agora já posso empregar portas de
madeira compensada fabricadas em minha oficina própria: devo
desenhar cada detalhe e mandar fazer tudo: janelas de ferro, grades,
maçanetas, caixas luminosas, lustres, móveis e até barras para
cortinas. A casa da Rua Santa Cruz está revestida exteriormente
com reboco rústico de cimento branco, caolin e mica” (AMARAL,
1975, p.246).

Aqui, um paradoxo: se por um lado a dificuldade de “obtenção de materiais


importados e da mão-de-obra altamente especializada exigida pela arquitetura
eclética”, impunha-lhe “a simplificação estética e a racionalização construtiva:
‘conceitos como funcionalidade, eficiência e economia na arquitetura – termos
próprios da equação racionalista’” (BLANCO; CAMPOS NETO, 2003 ), por outro lado
limitava essa mesma evolução pretendida. Longe do que pregava em seu Manifesto,
Warchavchiki fôra obrigado a concessões que inviabilizava a pretendida busca da
“verdade total”e o abandono de todos os artifícios. Além de ter que, como referido

32
Certamente, Warchavchik pretendia se utilizar dos “cinco pontos da arquitetura
moderna”enunciados por Le Corbusier e publicados em 1926. Todos seriam possibilitados pela
técnica do concreto armado: os pilotis, que liberariam o terreno sob a construção; os tetos-jardim,
cuidariam de manter a temperatura e umidade constante sobre as lajes impedindo trincas e, ao
mesmo tempo, tornariam a cobertura mais um local agradável de permanência; a planta livre, que
libertaria um andar em relação ao outro com o fim das paredes de sustentação; a “fenetre en
longeueur”, com as janelas correndo de um lado a outro da fachada; a fachada livre, que seria
apenas uma membrana de paredes isoladas ou janelas, com o afastamento dos pilares na direção da
parte interna da casa (BENÉVOLO, 1976, pp. 431-434).

105
acima, renunciar ao teto-jardim, escondendo o telhado com uma platibanda, outras
soluções foram adotadas de forma contraditória com seus princípios:

Parecia tratar de uma construção em concreto armado – que era a


idéia original – , mas o edifício foi construído quase que inteiramente
de tijolos, ocultados sob um revestimento de cimento branco.

As janelas horizontais de canto davam à obra um toque característico


inegável, mas, sob o ponto de vista técnico, não se justificavam
numa construção executada com materiais tradicionais, tendo elas
acarretado complicados problemas de construção.

A solução, que consistia em dar à ala direita da fachada [...] o mesmo


aspecto externo da ala esquerda, quando essa correspondia a uma
varanda [...] e não a um interior como a ala oposta, contraria a
firmação feita em termos por demais absolutos no manifesto de
1925: “a beleza de uma fachada deve resultar da racionalidade da
planta da disposição interna, assim como a forma de uma máquina é
determinada pelo mecanismo, que é sua alma” (BRUAND, 1981,
p.66).

Pode-se atribuir a essas dificuldades construtivas o fato da arquitetura


moderna no Brasil ter se mostrado “corrompida” a princípio, com o uso de detalhes
decorativos Art Déco sobre plantas funcionalistas. Em geral, havia a utilização de
técnicas construtivas avançadas no arcabouço dos edifícios, como as estruturas em
concreto armado e instalações elétricas e hidráulicas, mas a ornamentação e o
revestimento se mantinham em bases artesanais, com a diferença, em relação à
rebuscada ornamentação acadêmica, que se sobrepunha às fachadas, de que o
novo estilo utilizava os próprios elementos arquitetônicos e construtivos, atribuindo-
lhes valores decorativos, como as “faixas de entrepiso frisadas horizontalmente e
coroamentos diferenciados por acabamentos serrilhados ou escalonados”, sempre
se adequando à escala do volume externo e marcando as linhas principais do
edifício (CONDE; ALMADA, 2000, p.105-106). Mesmo esses detalhes foram sendo
simplificados em prol de uma maior preocupação com a composição volumétrica
posterior.

O forte antagonismo estilístico entre Art Déco e racionalismo – que


marcou a produção e o debate arquitetônicos na Europa dos anos
20, sobretudo após o lançamento do livros L’art décoratif
d’aujourd’hui, de Le Corbusier, em 1925 – não teve a mesma
incidência no Brasil e nos outros países da América Latina, onde
predominam contaminações mútuas e contínuas entre as duas
correntes: coexistia uma concepção volumétrica estritamente
funcionalista com detalhes decorativos de ascendência Déco
(SEGRE, 2000, p.14).

106
Em pouco tempo era possível perceber na paisagem urbana brasileira um
sem número de edifícios que pareciam empenhados em refletir uma imagem otimista
dos novos tempos e traziam características em comum que os identificavam com a
estética Déco, muitos deles exclusivos de sua manifestação no Brasil. Abaixo,
alguns detalhes que permitem essa identificação:

 Composição de matriz clássica:

-simétrica/axial, com acesso centralizado ou valorizando a esquina


(no plano horizontal); e

-tripartida em base, corpo e coroamento escalonado (no plano


vertical);

 Tratamento volumétrico das partes constituintes e superfícies,


à maneira moderna com:

-predominância de cheios sobre vazios;

-articulação de volumes geometrizados e simplificados (varandas


semi-embutidas) ou sucessão de superfícies curvas
(aerodinamismo);

-linguagem formal tendente à abstração (contenção expressiva dos


ornamentos decorativos, quase sempre em alto e baixo relevo); e

-composição com linhas e planos, verticais e horizontais, fortemente


definidos e contrastados;

 Articulação/integração entre Arquitetura, Interiores e Design


(mobiliário, luminárias e serralheria artística). Valorização dos
acessos e portarias;

 Estruturas em concreto armado, embasamentos revestidos


em granito, mármores e materiais nobres, revestimentos altos
em pó-de-pedra (mica) e janelas tipo “Copacabana”
(persianas de enrolar/basculantes) em madeira ou ferro:
mescla de técnicas construtivas industriais/modernas e
decorativas artesanais/tradicionais;

 Plantas flexíveis, com acesso por hall, circulação ou galeria


(espaço interconector) e compartimentos de uso
intercambiável (quartos/salas); e

 Iluminação feérica e cenográfica, intenção esta manifesta


desde as perspectivas que acompanham os projetos (talvez
uma influência cinematográfica) (CONDE; ALMADA, 2000,
p.14).

107
Entre as obras precursoras, destaca-se o edifício projetado em 1928, na
Avenida Angélica em São Paulo, por Júlio de Abreu Júnior. O prédio residencial de
seis pavimentos caracterizava-se por não apresentar nenhuma decoração tradicional
– exceto por um ramo floral estilizado encimando o destacado volume vertical que
marcava duas fileiras de janelas – e pela composição assimétrica, com a fachada
“composta apenas pelos vazios dos terraços da sala e pelas paredes lisas de
fechamento dos banheiros, mais alguns vãos de ventilação e iluminação” (SEGAWA,
1998, p.57).

Talvez o mais conhecido arquiteto Déco, até pelo número de obras


significativas nas duas maiores cidades brasileiras, embora nem todas com o
mesmo tratamento formal, seja Elisiário da Cunha Bahiana, formado segundo os
valores das Beaux Arts os quais acabou renegando ao adotar uma linguagem
oposta às normas acadêmicas, em busca de uma arquitetura moderna. Foi
responsável por inúmeras obras de prédios públicos, comerciais e residenciais e até
pelo viaduto do Chá, em São Paulo, entre 1927 e 1943. Em seu currículo
profissional,

uma observação anotando o insucesso numa participação em


concurso no Rio de Janeiro é bastante reveladora. Consta o
seguinte: “Projeto do Estádio do Clube de Regatas do Flamengo, na
Gávea, e tira o 2º lugar com projeto moderno, gênero Perret (o
primeiro lugar foi adjudicado a um projeto clássico)”. Esse concurso
foi promovido em 1925: por “clássico”, pode-se entender a adoção de
linguagens ornamentais Beaux Arts; por “moderno”, a identificação é
eloqüente.

Em 1928, Bahiana novamente obteve um segundo lugar, agora no


concurso para a embaixada da Argentina; o vencedor era seu colega
de turma, que apresentara um projeto de gosto neocolonial: Lucio
Costa (Ibid., p.58).

Outro famoso projeto de Elisiário Bahiana, e considerado um monumento Art


Déco, foi o edifício A Noite, sede do jornal de mesmo nome, com vinte e dois
pavimentos e de cujo terraço de cobertura se via a Baía da Guanabara. Segundo
Conde e Almada (2000, p.29) foi o primeiro arranha-céu do Rio de Janeiro,
construído em 1929 com a então recentemente introduzida tecnologia do concreto
armado. “É um grande corpo sólido, marcado basicamente pelas aberturas das
janelas que lhe conferem uma feição bastante regular e padronizada”. Uma discreta
ornamentação enfatiza o eixo central do volume e frisos horizontais marcam a

108
fachada entre o décimo-quarto e o décimo-sétimo pavimentos. O Déco se prestava
perfeitamente a uma arquitetura integrada à estrutura e, durante as décadas de
1930 e 40, ele predominaria na verticalização das cidades. De fato,

Na década de 1930, a linguagem Art Déco estava associada ao


envoltório por excelência das grandes estruturas que romperiam os
horizontes urbanos desenhados pelos homens, marcados sobretudo
(ou apenas) pela verticalidade das torres sineiras de igrejas ou
referências semelhantes. Assim, em São Paulo, o edifício Saldanha
Marinho competiria com o seiscentista convento e igreja dos
franciscanos; o edifício Oceania em Salvador – a maior construção
em todo o Norte e Nordeste na época [...] – faria o contraponto
robusto ao esbelto farol da Barra, do século 18 (SEGAWA, 1998,
p.64).

Talvez a mais espetacular inserção de uma obra de arquitetura Art Déco em


uma paisagem tradicional seja a do famoso Elevador Lacerda, de 1929, com 73,50
metros de altura, em concreto armado, que faz a ligação entre a parte alta e a baixa
da cidade de Salvador na Bahia (Ibid., p.64). Rivaliza, no caráter monumental, com a
estátua do Cristo Redentor, construída no Morro do Corcovado pela prefeitura do
então Distrito Federal entre os anos de 1926 e 1931. Conde e Almada (2000, p.27)
registram que o gigantesco monumento teria sido concebido como uma “estátua
arquitetural”, cujas dimensões teriam exigido a combinação, quando da construção,
de técnicas avançadas de engenharia “com princípios consagrados de composição
arquitetônico/escultórica”. Projetado para ser apreciado de diferentes distâncias,
adequava-se perfeitamente à estética Déco pela simplificação e redução dos
detalhes à sua expressão mais simples, concentrando-se mais na definição dos
grandes volumes e planos. Em geral, a linguagem do Art Déco quando aplicada à
estatuária de monumentos – muito freqüente durante toda década de 1930 como
parte de um projeto de revalorização dos heróis da pátria – é mais evidente e
expressiva nos pedestais do que nas figuras representadas propriamente ditas,
como no caso do monumento ao Almirante Tamandaré, na praia de Botafogo, de
1937, em que a ênfase é colocada na base de proporções exageradas e não no topo
onde está a estátua de bronze do homenageado. Os altos e baixos relevos, os
dísticos, os ornamentos de volumetria discreta e a estatuária secundária
desenvolvem-se no nível do olho do observador. Uma das raras exceções é a
estátua “Mulher com Ânfora”, de 1934, na Praça Pio X, também no Rio de Janeiro,
em que a forma lânguida da mulher representada, inscrita em um triângulo

109
imaginário, revela a estilização no tratamento dos cabelos e do planejamento que a
recobre parcialmente (Ibid., 27-78).

A partir da Revolução de 1930, como reflexo das transformações provocadas


pelas propostas de reformulação na área educacional contidas nos discursos da
Aliança Liberal e levadas avante no governo de Vargas, a elaboração de novos
modelos de edifícios escolares experimenta um notável incremento.

As linhas geometrizantes foram caracterizadoras da arquitetura


escolar dessa época. Todavia, não se tratava somente de uma
preocupação estética. Isso se depreende do trabalho que a
Secretaria da Educação de São Paulo desenvolveu com a Diretoria
de Obras públicas do Estado de São Paulo: uma série de tópicos
funcionais, programáticos e pedagógicos – orientação do edifício e
desenho de janelas, organização do programa mínimo de
dependências, acabamentos – foram destacados como elementos
determinantes para um novo modelo de prédio escolar (SEGAWA,
1998. pp. 66-67).

O engenheiro-arquiteto José Maria da Silva Neves foi o responsável por


inúmeros desses projetos e para conceituá-los citava arquitetos como Le Corbusier,
Mallet-Stevens e Piacentini:

Fazer arquitetura não é somente construir fachadas. A arquitetura é


função dos processos de construção da época. O grande arquiteto
de uma época é o seu estado social. Acima das obras, acima dos
programas especiais, há o programa dos programas: a civilização de
cada século, – a fé ou a incredulidade, a democracia ou a
aristocracia, a severidade ou a democratização dos costumes. [...]

Sejamos artistas do nosso tempo e teremos realizado uma nobre


missão. Não podemos admitir hoje uma arquitetura que não seja
racional, pois, a escola deve aproveitar de todo o conforto das
construções modernas, de todas as conquistas da ciência no sentido
de realizar a perfeição sob o ponto de vista da higiene pedagógica.
[...]

Fazer arquitetura moderna não significa copiar o último figurino de


Moscou ou de Paris. A arquitetura racional exige o emprego de
materiais da região, atendendo às condições do clima, usos,
costumes etc. Obedecendo a esses princípios básicos, criaremos um
estilo original para cada povo (NEVES apud SEGAWA, 1998, p.67).

Ainda anterior a essa iniciativa de São Paulo é a reformulação do programa


educacional da cidade do Rio de Janeiro, implementada por Anísio Teixeira, quando
à frente do Departamento de Educação do Distrito Federal, e cujo plano pedagógico
estabelecia uma família de cinco tipos de escolas.

110
Impulsionado pela meta de levar a escola elementar gratuita para
todos, Anísio Teixeira criou 5 programas básicos de escola de baixo
custo que deveriam servir de base às novas construções. Os
programas iam da "escola mínima" (com apenas duas salas, para
atender a pequenas comunidades) até o "programa completo" (com
espaços para serem utilizados por toda a comunidade) e sua
principal preocupação era, além do custo, o conforto térmico.

O projeto [da Escola Argentina, de Enéas Silva], de 1935, é um dos


pioneiros na tentativa da construção de uma escola para a sociedade
"urbano-industrial", proposta pela filosofia de Anísio Teixeira.
Considerada proto-moderna, apresenta elementos déco, com
destaque para o volume de circulação vertical que, com sua janela
escotilha e o guarda-corpo de tombadilho, lembram uma ponte de
comando naval. A fachada lisa com básculas e quebra-sóis, no
entanto, já representa a imagem da arquitetura moderna que irá
prevalecer por muitos anos nas escolas públicas. A compactação do
volume, com a substituição do pátio interno pela circulação de
corredores e a diminuição da dimensão das salas de aula denunciam
a preocupação com a economia e a nova modulação imposta pelo
concreto armado. A localização da caixa da escada, ocupando lugar
central na composição, não só otimiza a circulação como preconizam
a tendência moderna de destacar plasticamente os volumes de
circulação vertical, "para o alto e avante", o espaço "otimizado",
mínimo, racional, para o qual o próprio navio é paradigma, segundo
Le Corbusier.O programa inclui ateliê e um pequeno laboratório,
espaço novo nas escolas. A modernidade aqui está presente no
ambiente industrial. A dimensão do auditório indica a utilização para
grandes eventos abertos à comunidade (DRAGO; PARAIZO, 1999).

Figura 20 - Escola Argentina. Rio de Janeiro, 1935.


(Fonte: DRAGO; PARAIZO, 1999).

Os projetos de Enéas Silva para essas escolas previam construções de Baixo


custo e funcionais, sempre em estrutura em concreto armado com fechamentos em
alvenaria, isentos de qualquer estilo acadêmico ou regional, o que provocou a ira de
José Mariano Filho, o grande defensor do neocolonial na arquitetura escolar, que
acorreu à imprensa em artigos contra as novas propostas:

111
Para desgraça do Brasil, as grandes oportunidades arquitetônicas
surgiram como que por epidemia, depois da revolução. O momento
teria sido propício para se erguerem monumentos de arte,
condicionados às nossas peculiares exigências mesológico-sociais.
Estabeleceu-se um padrão ínfimo, miserável, a caixa d’água
envidraçada que se implantou em cada bairro a guisa de escola
municipal. O mesmo padrão pesteou a cidade, infiltrando-se nos
ministérios. Sob o argumento muito sedutor de que esse gênero de
arquitetura de baixa classe é baratíssimo, os homens do governo não
hesitaram em adotá-la. Quando tiver passada essa onda de
estupidez, olhando para os mastodontes de cimento onde se alojam
a preços de quitanda os nobres edifícios públicos, as gerações
futuras poderão em justiça julgar a vulgaridade da época em que
estamos vivendo (JOSÉ MARIANO FILHO apud SEGAWA, 1998,
p.66).

Figura 21 - Rafaello Alberti, Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, 1935.


(Fonte: ALBERTI, 2000)

112
As profundas mudanças provocadas pela Revolução de 30 no país também
se fizeram sentir na esfera da administração pública como parte do esforço de
“reconstrução do país”, com o “reajustamento social e econômico de todos os rumos
até então seguidos”, conforme se podia perceber já no discurso de posse de Vargas,
no qual figurava,

entre outras propostas de reforma, a de fusão dos quadros do


funcionalismo. Começou-se por desenhar um novo perfil para o
Ministério da Viação e Obras Públicas que levaria à reorganização
dos serviços postais e telegráficos [...]. Afinal, pelo Decreto nº 20.859
de 26 de dezembro de 1931, os serviços postais e telegráficos foram
reunidos em uma única repartição, o Departamento dos Correios e
Telégrafos (DCT) (PEREIRA, 1999, p.99).

Iniciava-se um processo em que o governo federal procurava centralizar as


ações dispersas dos governos estaduais e municipais, que mantinham serviços
telegráficos ou cabos submarinos para uso próprio, mas que acabavam atendendo a
interesses privados, além de operarem sem qualquer controle e registro exato de
seu número e de suas instalações. Com decretos que tornavam exclusividade da
União o serviço interior, foram fechadas todas as estações particulares de telegrafia
e estabelecido o prazo limite de concessão para as que exploravam os serviços de
cabo submarino, além de considerar sem efeito estações telegráficas e postais
regionais e reduzir as tarifas postais e telegráficas. Afirmava também o papel do
governo federal na expansão dos serviços interestaduais e internacionais de
telefonia. As reformas administrativas no campo do serviço postal suprimiram
repartições e cargos, ao mesmo tempo em que criava outros, terminando por fundir,
com o decreto referido na citação acima, os serviços dos Correios e Telégrafos
(Ibid., pp.100-101).

A essa normalização do serviço, que em pouco tempo tornou o espaço físico


das antigas agências pouco funcional ou mesmo insuficiente, correspondeu também
uma normalização arquitetônica sem precedentes, em função da introdução de
inovações essenciais.

113
Talvez primeira e mais importante tenha sido a adoção de uma lógica
de funcionamento claramente “industrial”, pautada na rigorosa
hierarquização das regiões e municípios, que definia o perfil, as
dimensões e a categoria de cada agência num sistema operacional
mais amplo. [...] A tradução dessa diretriz política de prestação de
um serviço e, ao mesmo tempo, de equipamento de cidades e
regiões de maneira sistêmica e hierarquizada, gerou, em termos
espaciais, arquitetônicos e urbanos, a consolidação de uma
verdadeira “arquitetura postal” (Ibid., p.101).

A idéia era introduzir uma arquitetura padronizada, que se tornaria a marca


dos Correios e Telégrafos, estrategicamente localizada no centro de cada capital do
país e seus pólos regionais, de forma a criar, além das questões puramente
funcionais, uma imagem do serviço público colocado a serviço do maior número de
cidadãos. Para isso, a Seção de Edifícios, criada junto com a DCT, elaborou 92
projetos ou estudos de remodelação de agências já existentes, além da
mecanização nas sedes de diretorias regionais. Os prédios eram divididos em tipos,
começando com um básico que sofria ampliações, reduções ou pequenas
simplificações conforme a importância da agência, sendo que em dez anos foram
projetados e construídos mais de 140 edifícios espalhados pelo Brasil, começando
pelo Nordeste, pela urgência da situação da região até então sem atendimento
(Ibid., pp.100-108).

De acordo com Margareth da Silva Pereira (1999, p.106-107), em seu livro Os


Correios e Telégrafos no Brasil, o Art Déco estava presente nesses prédios já no
tratamento que recebiam as muretas que marcavam os terrenos em várias agências.
Outra característica do estilo presente em quase todos essas construções era a
adoção da marquise que conferia imponência e sentido público aos edifícios,
“estruturando a composição axial em torno da qual a planta se organizava
simetricamente, dividindo-se em duas partes: uma para atendimento postal, outra
para atendimento telegráfico”. Em alguns desses edifícios, com o acréscimo de mais
um pavimento, a marquise se transformava em balcão e o corpo central era
destacado em função da sua verticalização acentuada e do uso de réguas verticais,
comuns na composição Déco que também se expressa no aumento no número de
aberturas, principalmente de janelas.

114
Figura 22 - Agência Postal dos Correios e Telégrafos. Quixeramobim, CE, 1932.
(Fonte: PEREIRA, 1999)

As agências sedes das Diretorias Regionais mostravam maior requinte que


nas do interior e introduziam diferenças de concepção e execução, explicitando
ainda mais a referência à geometrização Déco .

Esses tipos de agências iam ganhando, conforme a classe, maior


destaque nos pontos focais do edifício: a marcação vertical e o
alteamento da platibanda no acesso principal; a introdução, em
contraponto, de réguas horizontais, que enfatizam a marquise
seguiam marcando na fachada zonas de abertura das esquadrias; os
recuos mais pronunciados dos corpos laterais com o fim de também
acentuar o acesso; as reminiscências de rusticação nos ângulos da
edificação sublinhando os seus limites e, por fim, a introdução, no
corpo principal da fachada, de imponentes caracteres em argamassa
desenhando o nome: “Correios e Telégrafos” (Ibid., p.110).

115
Figura 23 - Diretoria Regional dos Correios e Telégrafos. Curitiba, 1934.
(Fonte: PEREIRA, 1999)
Essa incorporação de caracteres tipográficos à arquitetura era pouco usual
antes da introdução do Art Déco. Conde e Almada (2000, p.106) referem que os
nomes e números de identificação dos prédios passaram a ser aplicados em posição
de destaque nas fachadas, geralmente sobre as portarias dos edifícios. Usualmente
utilizavam-se tipos sem serifa e podiam ser mesclados a motivos da flora e fauna a
que os nomes aludiam. Configuravam-se como um importante elemento de
caracterização, a exemplo da serralheria artística presente em portas e gradis, de
grande parte das edificações no estilo.

Os projetos assinados por novos arquitetos, como Rafael Galvão, para as


agências de algumas capitais introduziam algumas inovações importantes na
concepção arquitetônica que já denotavam o interesse pelas discussões européias
sobre a arquitetura moderna, como a eliminação da simetria a partir de um eixo
central e do tratamento tripartido da fachada no sentido vertical, que subdividia o
edifício em base, corpo e coroamento. Nos programas de “grandes composições”,
isto é, aqueles em que o sentido e a função pública são acentuados, os projetos, já
anteriormente, propunham o “deslocamento do eixo da composição do centro para
os ângulos do edifício, tornando a ‘esquina’ um dos pontos focais do tratamento
decorativo” (PEREIRA, 1999, pp.129-135). Assim, o ponto de interesse deslocava-se

116
do centro para o ângulo do edifício, que passava a ser valorizado, recebendo
“torreões, cúpulas, pequenas marquises envidraçadas e escadas cuidadosamente
ornamentadas”.

A tendência à “decomposição” da volumetria do edifício, ao


tensionamento da axialidade, acentuando ora ângulos, ora duplas
entradas, contrapondo marcações horizontais e volumes verticais,
além da proposição de várias possibilidades de leitura do edifício,
que os arquitetos começavam a experimentar, mostrava que a
arquitetura, nesse agenciamento de volumes regulares e irregulares,
voltava a ser entendida como jogo espacial em detrimento da retórica
do estilo (Ibid., p.132).

Figura 24 - Rafael Galvão, Diretoria Regional da ECT (antigo DCT), São Luis - MA, 1932.
(Fonte: PEREIRA, 1999)

117
A autora salienta que essa arquitetura padronizada com características das
“tendências em voga no campo arquitetônico” tinha a intenção de criar um
paralelismo com a nova estrutura da DCT: “a modernização do país tornava-se
concreta e se confundia com a presença do poder público e com o perfil de cada
agência dos Correios e Telégrafos que ia sendo construída”.

As obras do governo federal, em todos os seus serviços, prosseguem,


sempre que possível com um marcado sentido de monumentalidade evidenciado de
várias maneiras. Por vezes pelo próprio porte do edifício como no projeto do Palácio
Duque de Caxias, sede do Ministério do Exército, de 1935:

Composto pela interseção de dois grandes volumes contrastantes,


um horizontal e outro vertical, o edifício marca enfaticamente uma
centralidade e domina o espaço ao seu redor. A fachada principal,
simétrica, tem no volume vertical o elemento dominante que organiza
volumétrica e funcionalmente a composição. Sua subdivisão, de
inspiração clássica, é bem definida: embasamento revestido em
mármore com acesso em pórtico, corpo em argamassa e torreão de
comando com coroamento escalonado (CONDE; ALMADA, 2000,
p.28).

Figura 25 - Christiano Stockler das Neves: Ministério da Guerra, Rio de Janeiro, 1935.
(Fonte: SEGAWA, 1998)

Outras vezes a monumentalidade era garantida pelo uso de materiais nobres


como no Tribunal Regional do Trabalho, no Rio de Janeiro, com seus acessos
enfatizados pelo revestimento em granito negro emoldurando os portões de
118
serralheria artística rendilhados ou, ainda, pelo superdimensionamento estrutural
para além das necessidades físicas, como no edifício do Instituto Nacional de
Previdência Social, também no Rio, com suas janelas mínimas e colunas de seção
exagerada e de pé-direito duplo, que conferem à construção “um peso e
monumentalidade que ultrapassa suas reais dimensões, à maneira das usinas
futuristas de Antonio Sant’Elia”. A metáfora da solidez é evidente e justifica-se por se
tratar da sede de um instituto de aposentadoria (Ibid., p.37).

Menos evidente como simbologia, mas não menos freqüente, é a utilização


dos torreões com relógio, como que a marcar o ritmo dos trabalhadores urbanos, um
recurso compositivo introduzido em diversos prédios, públicos e privados, de
arquitetura Art Déco, como o da sede da Diretoria Regional dos Correios e
Telégrafos de Belém, no Pará ou edifício da Polícia Federal, no Rio de Janeiro e o
mais espetacular: a Estação Dom Pedro II – a Central do Brasil – em que a torre do
relógio com seu coroamento escalonado, na esquina, é abraçada pelas alas baixas
e tem sua verticalidade acentuada por descer até o solo (Ibid., p.27).

Mas sua capacidade característica de expressar a monumentalidade não


assegura ao estilo sua sobrevivência. Em 1935 ocorre o que pode ter sido o maior
embate entre a arquitetura Art Déco e modernista “verdadeira”, do qual a primeira sai
derrotada, como antecipado no item 4.2 do Capítulo 4.

[...].o concurso de anteprojetos para o edifício do Ministério da


Educação e Saúde, realizado em 1935, foi ganho por Archimedes
Memória [...], com um projeto acadêmico em estilo marajoara, ou
seja, inspirado na civilização pré-colombiana que se desenvolveu na
Ilha de Marajó, conhecida unicamente através de peças de cerâmica.
O caráter aberrante dessa idéia evidencia o alcance da vaga
nacionalista, que, insatisfeita com o neocolonial, passou a pesquisar
fontes puramente decorativas, numa das raras manifestações de arte
local, anteriores ao estabelecimento dos portugueses (BRUAND,
1981, p.81).

Coube a uma iniciativa pessoal do Ministro da Educação Gustavo Capanema,


não executar o projeto vencedor, justamente por discordar do “estilo marajoara”
pagando os projetos classificados e, em um ato arbitrário, encoberto por minúcias de
ordem jurídica, convidar o modernista Lúcio Costa, um dos participantes
desclassificados (Ibid., p.82). Essa aparente insurreição de Gustavo Capanema, e é
bom lembrar que ele era assessorado por uma equipe de intelectuais
comprometidos com um projeto modernista, como Manuel Bandeira e Carlos
119
Drummond de Andrade, pode ser explicável: “A política supõe a existência de
doutrinas, mas também envolve cálculos imediatos, pragmáticos, que ocasionam
alterações nos próprios princípios doutrinários. Doutrina e regime não têm o mesmo
significado. A doutrina nos diz de como as coisas devem ser e não de como elas
são” (OLIVEIRA, 1982). Além disso, Lúcio Costa já deixava transparecer em sua
arquitetura uma preocupação nacionalista, mesmo tendo abandonado o estilo
neocolonial.

A escolha de Lúcio Costa era lógica e fundamentada: sem dúvida


alguma, era ele a figura de maior destaque dentre os adeptos da
arquitetura “moderna”, pelo papel que havia desempenhado na
reforma da Escola de Belas-Artes33 em 1930-1931 e, a seguir, pelas
posições teóricas e práticas assumidas (BRUAND, 1981, p.82).

De qualquer forma, a questão da identidade nacional vem à tona


definitivamente quando o ministro decide erigir no pátio do prédio uma estátua de 12
metros de altura, representando a figura do “Homem Brasileiro”, o que não ocorre
por não se chegar à conclusão de qual seria a imagem adequada ao autêntico “tipo
nacional”.

Procurando definir a imagem de um autêntico tipo nacional,


sociólogos, antropólogos, biólogos, são ouvidos. O debate vai do
tema da "sub-raça mestiça e crioula" a do "tipo eclético modelado
pela nossa ambiência cósmica". Mário de Andrade é convocado a
mediar a questão e tenta convencer os melhores escultores, entre
eles Victor Brecheret, a colaborarem. Os mais importantes escultores
de nosso modernismo contribuem realmente para o acervo de
esculturas que prédio ainda abriga, mas a imagem que deveria
representar a síntese do "Homem brasileiro" nunca foi realizada
(RESENDE, 2000).

Ainda assim, Portinari recebeu a incumbência de “realizar o melhor de sua


arte”, expondo então por inteiro sua inclinação à monumentalidade, influência dos
muralistas mexicanos:

33
Lucio Costa foi convidado a dirigir a reforma em 1930 por Francisco Campos, à frente do
então recém criado Ministério da Educação e Saúde, por indicação de Rodrigo Mello Franco de
Andrade, também responsável pela criação em 1937 do S.P.H.A.N (Serviço do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional) (BRUAND, 1981, p.72).

120
Todo governo forte demanda pintura histórica: Tiradentes, 1ª. Missa,
Chegada de D. João VI. Portinari assumia o posto de pintor oficial.
Indiscutivelmente, no Ministério da Educação e na Pampulha, em sua
melhor fase, bastou ao artista a primeira colaboração com os jovens
arquitetos modernos para ser situado como o artista que melhor
expressava o seu tempo – no caso, monumentalmente (AMARAL,
1975, pp.315-317).

Hugo Segawa (1998, pp.90-92) explica que a prioridade do Ministério da


Educação e Saúde Pública não era, a princípio, sua sede própria e sim a
implantação de um campus para a Universidade do Brasil. Para isso, Capanema
convidara Marcello Piacentini, arquiteto fascista que projetara a Universidade de
Roma.

Em meados dos anos 1930, o alinhamento político do Brasil era


ambíguo em relação ao nazismo e ao fascismo, embora o getulismo
correspondesse em linhas gerais às formas de autoritarismo em voga
na Alemanha e na Itália. O arquiteto italiano chegou ao Brasil em
agosto de 1935, mas o Conselho Regional de Engenharia e
Arquitetura advertia o ministro da proibição e contratar profissionais
estrangeiros para essa finalidade (Ibid., p.90).

Costa, ao ser consultado pelo ministro, manifestou-se contra o convite a


Piacentini e, como contrapartida, indicou, já com vistas ao projeto do edifício do
ministério, o nome de Le Corbusier, que vem então ao país a pretexto de realizar
conferências que, estas sim, podiam ser remuneradas, burlando a legislação quanto
ao trabalho de arquitetos estrangeiros. O anteprojeto do arquiteto suíço é rejeitado
pela comissão de professores criada para a definição do organograma e
necessidades físicas do campus e o projeto definitivamente entregue a Piacentini. A
estada de Le Corbusier no Brasil, no entanto, serviu para que este desenvolvesse os
primeiros esboços para a sede do ministério, assessorando rejeitando todos os
estudos elaborados pela equipe montada por Lucio Costa (Ibid., p.90).

A contribuição de Le Corbusier para o projeto do edifício do


Ministério é inegável. Tem sido afirmada e reafirmada tantas vezes
que não vale a pena pormenorizá-la. Cabe-nos, entretanto, constatar
que o terreno cultural achava-se como que preparado, dominado por
figuras que puderam valorizar e assimilar com lucidez a experiência
artística do mestre francês (sic) conformando-a aos ideais
nacionalistas e reformadores da revolução de 30. E de tal forma que,
na ausência de Le Corbusier, mudadas certas premissas que
conduziram os primeiros estudos, o edifício foi sendo construído com
a apropriação formal em termos de proporções, colorido, decoração,
paisagismo, que fez dele o ponto de partida para uma aproximação
cada vez maior de facetas características da memória artística
brasileira (ARTIGAS, 1981, p.124).
121
Yves Bruand (1981, p.91), por outro lado, prefere diminuir a importância
atribuída por Vilanova Artigas à atuação dos arquitetos brasileiros na valorização dos
elementos nacionais. Para ele foi Le Corbusier o responsável por conciliar as
posições consideradas como antagônicas entre o estilo internacional adequado à
sociedade moderna e as variáveis regionais, abrindo novos horizontes aos
arquitetos brasileiros. Teria sido iniciativa de Le Corbusier, “seduzido pela natureza
tropical”, o aproveitamento da flora nacional como elemento complementar da
arquitetura34, no teto jardim, por exemplo, e, principalmente, o uso da palmeira
imperial no pátio de entrada, pela monumentalidade dos visuais que definia, tendo
incluído-a em todos os seus esboços.

Figura 26 - Le Corbusier: Esboço para o Ministério da Educação e Saúde. Rio de Janeiro, 1936.
(Fonte: MINDLIN, 1999)

Também teria sido de Le Corbusier a sugestão do uso do granito cinza e rosa,


das montanhas do Rio de Janeiro contrariando a prática usual de importação de
pedras e mármores de mesma qualidade, impulsionando a exploração das jazidas
locais. Evidenciava, assim, “que o emprego exclusivo de materiais artificiais,
enquanto elementos estruturais da nova arquitetura, não excluía um apelo
complementar aos recursos naturais do país” (Ibid., p.91). Talvez sua mais
importante recomendação, no entanto, vital para a evolução da arquitetura

34
O próprio Bruand admite, no entanto, que Mina (Klabin) Warchavichik havia associado o
jardim tropical à arquitetura moderna já em 1928 na casa construída pelo marido.

122
contemporânea no Brasil, tenha sido a idéia de incorporar o emprego dos azulejos,
típicos da arquitetura colonial. Retomado com o movimento neocolonial, seu uso
havia sido recusado pelos arquitetos modernistas brasileiros que o encaravam como
um mero recurso decorativo comprometido com o passado, esquecendo seu caráter
funcional como proteção às paredes contra a excessiva umidade tropical. A
“genialidade” de Le Corbusier teria mostrado aos arquitetos nacionais essas
vantagens, além das possibilidades de expressão plástica, fazendo-os compreender
que a nova arquitetura não precisava necessariamente ser voltada para a
austeridade e que, quando os recursos do passado conservavam sua razão de ser
adaptavam-se perfeitamente ao espírito das construções modernas.

A pregação de Le Corbusier foi ainda mais significativa, porquanto se


identificava com as tendências mais representativas do pensamento
brasileiro do século XX. A preocupação co a plasticidade, ou seja,
com a riqueza formal e decorativa, correspondia aos desejos de uma
sociedade em plena evolução, sensível aos aspectos exteriores e
expressivos [...]. Além disso, a valorização dos elementos locais
naturais ou históricos, integrava-se perfeitamente no contexto
nacionalista [...] (Ibid., p. 91).

Na verdade, importa pouco saber os verdadeiros autores da apropriação


pioneira do repertório tradicional da arquitetura brasileira, se a equipe liderada por
Lucio Costa ou o arquiteto suíço: quem quer que tenha sido, estava inteirado do
debate em torno de qual estilo artístico melhor representaria a nação. Seguramente,
o projeto para uma construção com o porte e o significado da sede do Ministério da
Educação e Saúde Pública, talvez a pedra angular, junto com o Ministério do
Trabalho, do governo Vargas, não seria entregue a uma equipe de aventureiros
descomprometidos com os ideais nacionalistas. Ao mesmo tempo, ainda que
Capanema tenha recusado o projeto “marajoara” vencedor, severas recomendações
quanto ao conteúdo nacionalista da obra devem ter sido encaminhadas à nova
equipe que, não por coincidência era liderado por um arquiteto famoso como um dos
antigos incentivadores do movimento neocolonial, reconhecidamente nacionalista,
mas sem o perfil adequado à sociedade industrial. É lícito, portanto, supor que a Le
Corbusier tivesse também sido expressamente recomendado que explorasse as
potencialidades da terra, aproximando-se o máximo possível das “expressões”
verdadeiramente brasileiras, certamente uma imposição de programa da edificação.

123
Graças ao resultado plástico e funcional do novo edifício, criava-se um novo
repertório formal na arquitetura brasileira. Com os mesmos recursos sendo adotados
posteriormente por outros arquitetos brasileiros, a valorização dos elementos
nacionais na arquitetura tornou-se uma prática usual, sendo inclusive reconhecida
internacionalmente. Segawa (1998, p.92) considera que aquela obra é o ponto inicial
de “uma arquitetura moderna de feitio brasileiro”, baseado nos desdobramentos
posteriores que confirmariam a afirmação, sobretudo no plano internacional, com
publicação em revistas da área e a organização de uma exposição fotográfica pelo
Museum of Modern Art (MoMA)de Nova Iorque em 194335 denominada Brazil Builds,
mostrando a nova e a tradicional arquiteturas brasileiras. O edifício sede do M.E.S.
foi fotografado com sua construção completada apenas externamente, mas o vice-
presidente do MoMA, Philip Goodwin já o usava como exemplo ao citar o país como
dono “dos mais belos edifícios do continente americano”(GOODWIN, 1943 apud
SEGAWA, 1998, p.101).

Segawa prossegue informando que a mostra parece ter sido motivada, além
dos motivos de interesse geopolíticos, pelo sucesso do pavilhão brasileiro na Feira
Mundial (título que sucedeu às Exposições Universais) de Nova Iorque de 1939,
projeto de Lucio Costa escolhido em concurso no ano anterior, e executado em
parceria com o concorrente que ficou em segundo lugar, Oscar Niemeyer. A obra de
uso efêmero (seria desmontada logo após a exposição) e que foi considerada um
dos pontos altos da feira, apresentava “alguns dos arquétipos que iriam doravante
povoar a arquitetura brasileira”, com destaque para a curva de inspiração barroca,
presente ostensivamente nas plantas do térreo e do andar superior. (SEGAWA,
1998, pp.95-96).

Diferentemente do concurso para o pavilhão da exposição da Filadélfia de


1926 em que o programa admitia somente o estilo neocolonial, este procurava

35
Ainda segundo Segawa (1998, pp.100-101), a mostra fazia parte da “política de boa
vizinhança” do presidente americano Franklin Roosevelt, a mesma que trouxe recursos para o Brasil
construir a Siderúrgica de Volta Redonda, que fez Walt Disney criar o Zé Carioca e que “exportou”
Carmem Miranda para os EUA, com o objetivo de angariar alianças para a Segunda Guerra Mundial.
Até então, o presidente Getúlio Vargas flertava alternadamente com os nazistas e os norte-
americanos. O prefácio do catálogo referia-se ao Brasil como “nosso futuro aliado”.

124
corresponder ao próprio tema da Exposição de Nova Iorque, que pretendia oferecer
“uma visão do mundo de amanhã”. Assim, ainda que tanto a forma como a técnica
necessariamente devessem se adequar aos princípios modernos, continuava a
permanecer como prioridade a conformidade com o caráter nacional sem que isso
significasse, dessa vez, uma imitação do passado. Bruand (1981, p.105) esclarece
que o próprio programa do concurso recomendava que essa conformidade fosse
obtida através da “pesquisa de ‘uma forma arquitetônica que pudesse traduzir a
expressão do meio brasileiro’”, mas que, preferencialmente, estivesse baseada nas
preocupações atuais para adequar-se ao tema da exposição.

A nova arquitetura brasileira apenas começava a se definir e a


libertar-se do estilo internacional, sua fonte de origem; ora, a
conciliação dos dois requisitos pelo concurso não podia resultar de
geração espontânea, mas de um amadurecimento mais ou menos
prolongado. Nestas condições, não surpreende nenhum dos
anteprojetos ter sido considerado plenamente satisfatório pela
comissão julgadora. A escolha recaiu sobre o de Lucio Costa por ser
ele o que apresentava mais forte dose de brasilidade [...] (Ibid.,
1981, p.105).

Mesmo com esse programa ambicioso o resultado plástico, embora simples


formalmente, e funcional foi surpreendente, tendo se tornado o marco inicial,
juntamente com o edifício do Ministério da Educação, de uma arquitetura
autenticamente brasileira. Os dois edifícios podem ser lidos como uma metáfora
conciliatória dos acirrados debates culturais iniciados ainda na primeira república
buscando determinar a verdadeira identidade do Brasil como nação. O
reconhecimento internacional da arquitetura brasileira como uma verdadeira corrente
dentro do movimento moderno motivou uma inédita auto-valorização do povo
brasileiro.

Em pleno conflito mundial, firmava-se a arquitetura brasileira como uma


expressão mundial e o Brasil se descobria como nação. Por todo o país, iniciava-se
um período de construções oficiais, municipais, estaduais e federais, explorando a
nova arquitetura que então se tornava oficial, substituindo definitivamente o Art
Déco. O Conjunto da Pampulha, em Belo Horizonte, por exemplo, em que Niemeyer
novamente utiliza-se da curva barroca e ganha, mais uma vez, reconhecimento
mundial, mostrava que o país não mais necessitava de seu decorativismo de
inspiração européia ou mesmo americana que os ornatos marajoaras conseguiram
abrandar apenas pelo tempo necessário para a incubação do movimento que se
125
pretendia redentora da arte brasileira, finalmente senhora de uma atitude
arquitetônica própria, genuinamente nacional, mas referendada pelo prestígio
internacional. Importava pouco que fosse uma arquitetura com bases no
International Style, desde que fosse reconhecida como brasileira. Estava
equacionada a questão de se reconhecer como nação e, ao mesmo tempo se fazer
conhecer moderno. O Brasil era agora a terra do samba, café e arquitetura.

126
5. CONCLUSÃO

Considerando as circunstâncias históricas em que o Art Déco surgiu, pode-se


dizer que esse estilo é reflexo e mesmo protagonista das transformações
deflagradas pelo processo de industrialização, apresentando-se como uma
possibilidade de expressão artística adequada aos novos métodos de produção de
mercadorias, bem como da difusão de seu consumo. Ao renegar os métodos
artesanais de produção dos estilos precedentes, não apropriados aos processos
industriais, sem, no entanto, exibir as características de abstração radicais que os
artistas de vanguarda propunham, oferecia-se como uma das possibilidades e
necessidades da industrialização. É possível concluir, a partir deste quadro, que a
arte não deve ser considerada apenas como uma manifestação pouco importante,
praticamente restrita à esfera ociosa do lazer, e, sim, como uma atividade humana
constituída a partir de fatores históricos aos quais o artista não pode e não consegue
ficar alheio, mesmo que se proclame mero produtor da arte pela arte. A arte
reproduz a vida.

Seu papel como agente transformador pôde ser avaliado, neste trabalho, pela
exposição das ações desenvolvidas por homens como Francisco Joaquim
Bethencourt da Silva, ao estabelecer no Rio de Janeiro a Sociedade Propagadora
das Bellas Artes, não só com o objetivo de preparar mão-de-obra capaz de atender
as necessidades da produção, mas também de formar o consumidor de suas
mercadorias. O texto deixa claro, porém, que as ações desses homens não devem
ser vistas como obras de “gênios iluminados”, mas, antes, como atos de indivíduos
que agiram como mediadores das necessidades da classe burguesa.

Este trabalho possibilitou apreciar a importância que o debate sobre a


identidade nacional assume nesse contexto de expansão industrial e inserção no
mercado mundial. A questão era equacionar as necessidades de modernização do
país com a visão de nação presente desde o início da Primeira República e que
objetivava extinguir os regionalismos, reunindo toda a população em torno de um só
interesse nacional de classe. A busca de uma arte que representasse essa nação
ganha as discussões nos meios intelectuais, e aos arquitetos cabia a difícil tarefa de

127
expressar espacialmente essa discussão que passou pela eleição, num primeiro
momento, do estilo neocolonial como o mais apropriado para realizar as expectativas
da sociedade. Ora, ainda que a arquitetura neocolonial conseguisse refletir uma
idéia de Brasil, o fazia ecoando o domínio lusitano, além de não ser adequada aos
novos materiais e processos construtivos. A modernização do país exigia uma
arquitetura moderna, de sua época, mas a que assim se denominava era por demais
abstrata para expressar uma identidade nacional. Nesse caso não pode ser
descartada a importância da arquitetura Art Déco, que toma para si o papel de
modernizadora sem descartar as preocupações nacionalistas, respondendo,
portanto, a uma necessidade específica. Mesmo que o Art Déco não tenha se
firmado como uma solução definitiva para os novos programas, materiais e métodos
construtivos ou mesmo que se opte por aceitá-lo como uma “moda passageira” ou
leitura equivocada das discussões presentes no movimento moderno, não se pode
negar o espaço que ocupou na história da arquitetura e mesmo da sociedade
brasileira. Isso foi demonstrado durante todo este trabalho, numa interpretação
diferente da encontrada na maior parte da bibliografia consultada, que considera o
estilo estudado apenas como um “estilo de fachada”, vazio de conteúdo ideológico e
de propósitos.

Considerando-se que o arquiteto é um homem do seu tempo e que paga seu


tributo às necessidades culturais, sociais, políticas e econômicas, bem como
encontra limites de criação na correlação das forças sociais que atuam nesse
mesmo tempo, talvez seja lícito supor, num paralelo entre o quadro apresentado
neste trabalho e acontecimentos mais recentes, que a ascensão da chamada
arquitetura pós-moderna, com seu resgate do historicismo, principalmente durante
os anos 80 do século passado, também tenha se dado como conseqüência do
desenvolvimento das forças produtivas naquela época, da nova divisão internacional
do trabalho, da estrutura de poder do estado existente naquela época. Neste caso, o
renascimento da Arquitetura Moderna Brasileira, em oposição ao pós-modernismo, a
partir dos anos 90 poderia ser visto como uma simples repetição do mesmo
processo dos anos 30?

A discussão presente nesta dissertação pode também ser ampliada, em um


futuro estudo que se pretende que seja desenvolvido como seqüência ao mestrado,
fazendo uma análise da apropriação da arquitetura Art Déco, nos anos 1930 e 40,
128
pela pequena burguesia e mesmo pelas camadas populares, que exibem em suas
moradias e pequenos comércios nas vilas operárias de todo o Brasil, traços
inconfundíveis do estilo. Talvez essa interpretação popular de uma arquitetura que
pretendeu dar ares de modernidade ao país seja um testemunho de seu êxito.

Quando o artista plástico suíço Max Bill esteve no Brasil em 1953 fez
violentas críticas ao edifício do Ministério da Educação e Saúde, em especial ao uso
do azulejo como elemento decorativo, declarando que “a pintura mural jamais tivera
outro sentido que o de educar as massas, tarefa que, em nossa época, havia se
transformando em apanágio dos jornais, das revistas e do cinema” (BRUAND, 1981,
p.93). A falta de conhecimento acerca das discussões internas relativas à construção
da identidade nacional, pode atenuar a impressão causada por uma tal declaração,
mas é incontestável que faltou ao crítico, em primeiro lugar, uma melhor formulação
quanto ao conceito de educação e, em segundo lugar, a consciência do papel que a
arquitetura e a arte em geral desempenham nesse processo. A força da arquitetura
como veículo de transformação social é inegável, até por sua inevitabilidade.
Parafraseando Bruno Zevi, você pode desligar o rádio e abandonar os concertos,
não gostar do cinema e do teatro, não ler um livro e se recusar a freqüentar os
bancos escolares, mas não pode ficar indiferente ao edifício que se ergue à sua
frente, pleno dos valores da sociedade em que se manifesta.

129
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