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AGUSTINA BESSA-LUÍS
biografia de Vieira da Silva, 1982
OS MENINOS DE OURO, rornance, 1983
ADIVINHAS DE PEDRO E IN:ÊS, história, 1983
UM BICHO DA TERRA, romance, 1984
(tradução para espanhol)
A MONJA DE LISBOA, romance, 1 985
A BELA PORTUGUESA, rearro, 1986
(posto em cena)
O APOCALIPSE DE ALBRECHT DÜRER,
cornerredrio, 1986
CONTEMPLAÇÃO
CONTOS AMARANTINOS, consos, 1987
CARINHOSA
DENTES DE RATO, "1e"1óriasdein.ftincia, 1987;
A CORTE DO NORTE, rornarzce, 1987
(traduzido em francês)
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DA ANGUSTIA
PRAZER E GLÓRIA, rornarzce, 1988
AFORISMOS, 1988
EUGÉNIA E SILVINA, romance, 1989 SELECÇÃO E INTRODUÇÃO
VENTO, AREIA E AMORAS BRAVAS, DE
rnernõ rias de in.ftincia, 1990
VALE ABRÁAO, rornarzce, 1991 PEDRO MEXIA
(tradução para francês, grego e dinamarquês;
adapatado para cinema)
2.ª edição
BREVIÁRIO DO BRASIL, viagens, 1991
ESTADOS ERÓTICOS IMEDIATOS
DE SÔREN KIERKEGAARD,
teatro, 1992 (tradução para dinamarquês)
ORDENS MENORES, romance, 1 992
O CONCERTO DOS FLAMENGOS, rornarzce, 1994
AS TERRAS DO RISCO, ro rna nce, 1994
(tradução para francês)
ALEGRIA DO MUNDO I, 1996
Escritos dos Anos 1965 a 1969,
MEMÓRIAS LAURENTINAS, rornance, 1 996
PARTY, diálogos, 1996
(tradução_para francês; adaptado para cinema)
UM CAO QUE SONHA, romance, 1997
(tradução para alemão, dinamarquês e francês)
GARRETT- O EREMITA DO CHIADO, rearro, 1998
O COMUM DOS MORTAIS, rornarzce, 1998
A QUINTA ESS:ÊNCIA, rornarzce, 1999
LISBOA
GUIMARÃES EDITORES
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AGUSTINA BESSA-LUÍS
l1 CONTEMPLAÇÃO CARINHOSA DA ANGÚSTIA
que para edi ficar um a cult:ura uni versal é necessário dia- primordial. Uma vez distinguida, na sua complexidade,
loga r com todos os povos; conhecer os seus objectivos a origem da culpa, o problema da cult:ura social dum
económ icos e políticos, e assegu rar o rendim ento dos povo fica, em grande parte, resolvido. Est:amos em pre-
seus valores -próprios. Para isso é essencial encarar a cul- sença dum ser estranho ao nosso ser, e nunca o homem
tura como emanação dum centro comum que nos ori- teve ao seu dispor meios tão excelentes para o descobrir.
enta desde o princípio do mundo. Todos nascemos E, no ent:anto, nunca esteve t:ão longe de chegar lá.
duma convulsão nuclear, e por isso é que sentimos a Porque, quanto mais a presença do outro ser é desta-
vocação desse retorno ao caos que, simbolizado pela lin- cada, mais muda a sua aparência e a sua revelação.
guagem, é um rerorrro a Babel. Por isso é que a polít:ica Ent:ão verificamos que a culpa -- - o permanecer-mos em
linguíst:ica rern tanta import:ância como meio de salva- nós mesmos - é menos arriscada do que perseguir
guardar as identidades culturais. A linguagem é um meio aquele outro ser, sempre diferente· do que imaginamos.
de complement:aridade, e não de isolamento. É evidente Caímos na mais fácil das soluções, que é a de vermos
que não é possível aproximar os dialectos e as línguas nos outros a nossa própria imagem. Isto desencadeia em
todas de vocação regional. Mas é possível a integração das nós a culpabilidade, porque a figura próxima não é
línguas nacionais numa polít:ica que subentenda a von- alcançável, e a voz da minha consciência não sou eu, mas
tade de inst:aurar uma cultura mundial. ele que me chama. A solidão fecha-se sobre nós e, com
A psicologia dos povos tem enorme importância ela, a culpa.
para a preservação da sua cultura. As rivalidades, que em Mas outra coisa acontece se dissermos: «A minha
Portugal se definem por um anti-iberismo, como na linguagem nada é. O outro é a linguagem.» Já foi expe-
França se definem por um antianglicanismo, servem riment:ado pôr duas crianças completament:e ineduca-
para encontrar o lado unitário dessas dolorosas impres- das, sem quaisquer rudimentos de idioma, uma em
sões que a História ampliou de maneira art:ificiosa algu- frente da outra. Elas acabaram por criar uma lingua-
rrras vezes. gem. Porém, se ficarem isoladas, não são capazes de o
A tendência para revermos a Hist:ória como um fazer. Limitam-se a proferir sons que não se destinam a
romance policial que é preciso explorar no sentido da jus- identificá-las. Apenas t:raduzem as suas necessidades,
tiça, libertando-a das suas representações demasiado dra- não as suas angústias.
máticas, é também uma mecânica cultural moderna. O homem é um ser velado e obscuro. Só o outro o
Procura-se hoje desembaraçar a História da sua carga de pode interessar na linguagem e, assim, levá-lo a revelar-
ideologia pessoal e aré de caricatura cultural. Só fazendo -se. Mas a linguagem é apenas fonética? São apenas
tábua rasa das tradições que pesam sobre a consciência do sinais e sons? Não. A linguagem é um meio de fixação
homem, é que podemos chegar a ter noções sustentáveis do homem à sua realidade. Ela é t:anto mais um pro-
sobre o mesmo. Uma das tradições é ser o homem um blema da decisão humana, quanto est:á na raiz do des-
ente fechado em si mesmo. Daí que a maior culpa da tino social.
nossa época seja a de ficar cada um em si próprio, fur- A linguagem torna-se numa forma de força resolu-
tando-se a influências e a responsabilidades com respeito tiva; quando tem que impor a sua influência face a um
a tudo que não somos nós. quadro histórico em que a quant:idade de forças destrui-
Disse Heidegger que, para compreender qualquer doras parece obter os direitos duma norma. Em todas as
relação de culpa, é preciso chegar a uma culpabilidade épocas em que uma elite negativa de homens se oorrr-
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., CONTEMPLAÇÃO CARINHOSA DA ANGÚSTIA
porta avidamente, julgando usar de decisão real quando grandes coisas no sentido colectivo e real. A grande rela-
está apenas a afirmar um poder, a linguagem aparece em ção dá-se entre pessoas reais, e não entre seres fanáticos
toda a sua experiência. A linguagem é uma experiência; da curiosidade e da palração. A linguagem resgata o
representa uma quantidade da própria acção. As grandes homem da dissipação em que a palavra o arrasta muitas
revoluções da História forarn precedidas pela linguagem vezes por culpa dos meios de informação. Os meios de
que se organizou e tomou todas as formas do vivido, para informação acruarn geralmente mais como excitante da
agir sobre a decisão humana. Hoje, a sociedade luta por sociedade, do que agem no coração da ordem social. E a
um conceito de vida que a defenda do pânico antropoló- linguagem é usada como ferr~enta duma comunicação
gico em que se debate. A própria licença dos costumes, os de massa que não se pretende associada com o termo cul-
confusos meios de informar que atingem desordenada- t:ura.
mente a vida pessoal do homem, engendram fraqueza e É verdade que foi graças aos meios de informação
não força. A resolução falta; a afirmação tenta subsricuí- que a cultura tomou um carácter mais universal. Mas há
-la, A linguagem, base da convivência clirecra, tem vindo um potencial nefasto nos meios de informação que se
a empobrecer e esclerosar-se. Em vão se tenta animar de servem da linguagem para obter uma desintegração da
certas formas desabridas, concorrendo com o mais gros- sociedade contemporânea.
seiro desafio do gosto. Mas o acordo livre entre as pessoas Ficou clássica a definição do papel dos meios de
não melhorou. Pelo contrário: tornou-se vazio e desco- informação, quanto à sua importância na cultura, com
nexo. Numa coisa avançámos um pouco: há hoje muito as quatro perguntas: Quem diz? O que se diz? A quem
mais gente que admite que o fenómeno maior da huma- se diz? Qual o efeito produzido?
nidade é o que se funda na sua própria compreensão. A linguagem é uma arma que cria e destrói valores.
A linguagem é capaz de fazer a união da pessoa com O mundo está dividido em países em vias de desenvol-
a sociedade, e este vínculo é essencial para conhecer a vimento todos eles; mas alguns ainda sofrem o desequi-
índole humana. Sem isso, a civilização é apenas um líbrio, tanto duma informação como dum espectáculo e
suporte de relações de culpa em que a inautenticidade da sua linguagem de sentido único. Ninguém quer ser
do homem reverte para as coisas. O indivíduo tende a actualizado à força; nem quer ser convertido a necessi-
com portar-se com desconfiança em relação ao outro e a dades ilusórias no domínio da cultura e no domínio da
dar o seu apreço a tudo que não seja ele mesmo: jogos, comunicação em geral. Constatou-se, com estatística
objecros, e até a solicitude que engana a co n scí êrrcia bem elaborada, que há uma t:endência, nos países menos
humana porque se parece ao amor e é só uma atitude e desenvolvidos, para manter uma certa distância dos paí-
não uma decisão profunda.
ses de vanguarda económica e cultural. A solidariedade
Toda a linguagem implica uma decisão profunda. internacional é preservada por esse factor do direito à
Mas, em geral, não se faz singular, não ultrapassa os limi- própria cultura. As pessoas merecem ser educadas no
tes duma renúncia.
sentido de amarem a sua cult:ura; mas são sujeitas a pres-
Uma política de cultura tem que contemplar a sões de que a linguagem é responsável, oferencendo-se
multidão no meio da qual está o homem sem rosto, o para as ludibriar e dar-lhes uma noção errada de desen-
homem médio que é impessoal e que não quer aprofun- volvimento. A cultura pressupõe duas qualidades que
dar-se. Quando esse homem se converte em criatura sin- Mathew Arnold chamou muito apropriadamente stoees-
gular, adquire uma responsabilidade própria e é capaz de ness e lighr. Luz. é o que se comunica como factor do
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