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Coluna ANPOF
13 Jul (O ESTADO DA ARTE DA TEORIA CRÍTICA DA ESCOLA
2017 DE FRANKFURT) A CRÍTICA DAS FORMAS DE VIDA,
DE RAHEL JAEGGI
Andreas Niederberger e Tobias Weihrauch
Universidade de Duisburg-Essen
Jürgen Habermas introduziu o conceito de ação comunicativa em sua teoria como uma tentativa
de superar as aporias da primeira geração da Teoria Crítica. Os escritos de Adorno e Horkheimer
mostram – segundo Habermas – que qualquer ponto de referência utilizado para criticar a
situação atual da sociedade se torna parte do problema. O proletariado votou pelos nazistas, a
cultura moderna, mesmo nas suas formas de vanguarda, serviu para reconciliar as pessoas com
sua condição de vida no capitalismo, e se poderiam ler as teorias losó cas, mesmo as
aparentemente mais abstratas e menos práticas, como preparando e mantendo uma forma de
subjetividade que domina a natureza, a si e aos outros. Assim, na visão de Habermas, a tarefa
das próximas gerações da teoria crítica é detectar padrões que possibilitem identi car
as contradições e crises das sociedades atuais, enquanto, ao mesmo tempo,
ofereçam orientações para possíveis transformações.
O novo livro de Rahel Jaeggi Kritik von Lebensformen (Crítica das Formas de Vida) deve ser lido à
luz dessa tarefa. Insatisfeita com o projeto em última análise kantiano e transcendental de
Habermas de identi car condições de possibilidade formais para discursos racionais, mas
também insatisfeita com o retorno de Axel Honneth à teoria hegeliana, substancial, da vida ética
(Sittlichkeit), Jaeggi sugere uma terceira via, manobrando entre essas duas outras abordagens.
Ela concorda com Honneth que a crítica deve ser imanente, assumindo que a crítica deve se
direcionar, em última análise, àqueles que são também os seus sujeitos. Mas, seguindo
Habermas, ela hesita em endossar crenças, decisões e formas de vida existentes,
possivelmente problemáticas. Jaeggi, portanto, identi ca um elemento formal no interior das
formas de vida, a saber, sua habilidade (ou inabilidade) de aprender com di culdades e
crises, como sendo sua dimensão crucial para os paradoxos que elas engendram e seus
meios de superá-los – e isso signi ca para seu maior ou menor potencial de racionalidade
e racionalização.
O livro contém quatro partes e uma longa introdução. Na introdução, Jaeggi lembra o leitor que
as loso as contemporâneas se opõem fortemente a questões sobre a boa vida e, em vez disso,
têm tipicamente focado em questões de legitimidade ou justiça. A sociedade moderna gerou
individualismo, pluralismo e re exividade, além de noções normativas de autonomia, auto-
determinação e auto-realização. Nós devemos colocar entre parênteses nossas próprias
tradições e forma de vida para promover ou, pelo menos, para nos acomodarmos à
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heterogeneidade
01/03/2019 de
ANPOF - (O formas
ESTADO de vida
DA ARTE concorrentes.
DA TEORIA Essa DE
CRÍTICA DA ESCOLA “auto-limitação liberal”
FRANKFURT) A CRÍTICA (30) tem
DAS FORMAS como
DE VIDA, DE …
Na primeira parte do livro Jaeggi examina a noção de formas de vida na nossa vida cotidiana e
desenvolve um conceito modular destas. Ela distingue a concepção de uma forma de vida de
estilo de vida, de hábito, de moral individual e costumes. Formas de vida são agregados de
práticas e orientações sociais que incluem atitudes e disposições habitualizadas para certos
comportamentos. Elas envolvem requisitos normativos relacionados ao grupo social, ainda que
não sejam nem codi cados estritamente, nem institucionalmente obrigatórios (77). E embora as
formas de vida sejam produtos do pensamento e da ação humanas, e por isso possam mudar,
elas são resilientes no sentido de que proporcionam aos agentes opções default de como agir
e reagir em situações dadas. Considerando que elas são, assim, muito mais profundamente
constitutivas das práticas sociais do que são os estilos de vida, que podem facilmente ser
abandonados, nós temos que - e podemos - considera-las à luz de sua efetividade e
racionalidade para lidar com novas situações. E, diferente dos estilos de vida etc., que são em
última instância uma questão de escolha, as formas de vida levantam internamente pretensões
de sucesso e de racionalidade.
A segunda parte do livro examina mais de perto essas pretensões normativas internas de
formas de vida: formas de vida alegam prover os agentes com estratégias para lidar com
problemas. Dada essa a rmação, formas de vida oferecem igualmente aos participantes e aos
observadores um critério de sua validade, ou seja, a capacidade de resolver os problemas que
pretendem resolver. Considerando que formas de vida são maneiras particulares de de nir e
enquadrar os problemas, os problemas não são “objetivos” no sentido de que se podem
comparar diferentes soluções que as várias formas de vida oferecem para o mesmo problema.
Não obstante, pode-se identi car um nível funcional, em que diferentes formas de vida devem
reagir a desa os funcionais similares (214-216). Formas de vida podem de nir problemas –
especialmente os normativos – de maneiras muito diferentes, e essas de nições não podem
ser simplesmente traduzidas uma na outra. Mas tampouco podem ser de nições que as livrem
de requisitos funcionais. Jaeggi sugere que podemos detectar diferentes racionalidades de
formas de vida nos mecanismos que elas oferecem para revisar sua de nição e enquadramento
de problemas e a descoberta das respectivas soluções, quando fracassam os modos existentes
de entender o mundo funcionalmente. E essas diferenças entre formas de vida são normativas,
porque dizem respeito aos requisitos normativos e as expectativas internos de formas de vida
para adaptarem-se aos desa os funcionais (227).
Dada a dependência das de nições de problemas e de suas soluções com relação a formas de
vida já sempre existentes, pode-se perguntar como os agentes seriam jamais capazes de mudar 2/18
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ou abrir
01/03/2019 mão
ANPOFde
- (Osua forma
ESTADO de DA
DA ARTE vida e de
TEORIA “escolher”
CRÍTICA uma
DA ESCOLA forma mais
DE FRANKFURT) racional
A CRÍTICA de lidar
DAS FORMAS com
DE VIDA, DE …
problemas. Na terceira parte do livro Jaeggi explora, portanto, como a crítica de formas de vida
pode ser formulada e a partir de qual ponto de vista. Ela desenvolve um modelo de crítica
imanente e rejeita abordagens internas e externas de crítica. O modelo de crítica que Jaeggi
recomenda não pode ser um modelo de crítica externa, visto que uma crítica externa não levaria
em conta a dependência das condições de racionalidade com relação a formas de vida e seu
caráter resiliente. Mas, por outro lado, a crítica também não pode ser uma crítica interna, pois
por aí ela não proveria as ferramentas necessárias para analisar e superar as contradições
internas de uma forma de vida, que são frquentemente a razão e a origem de crises.
O modelo de crítica imanente oferecido por Jaeggi é inspirado em Hegel, mas – diferente de
Hegel e, mais recentemente, de Honneth – ela não reconstrói a normatividade primária inerente
às formas de vida para reatualizar o núcleo normativo esquecido ou encoberto das práticas
sociais existentes. Aproveitando das críticas da ideologia, a versão de Jaeggi de crítica imanente
está relacionada ao potencial inerente às formas de vida de revisarem-se a si próprias em
situações de crise pela reconsideração de seus próprios recursos e por abrirem-se a novas
formas de vida. A crítica destaca contradições paralelas entre realidade e normas (293). Dadas
suas próprias reivindicações de validade, as formas de vida devem reagir tanto às tensões entre
a realidade e suas normas (o fato da realidade não estar constituída pelas normas) e também
àquelas entre suas normas e a realidade (o fato de que agentes não poderem implementar as
normas). O poder transformador da crítica imanente reside, assim, na mobilização do potencial
inerente às formas de vida de re etirem e reagirem a essa dupla tensão – e isso signi ca analisar
as di culdades na aplicação das normas e reconsiderá-las. Diferente de Honneth, por exemplo,
Jaeggi não foca em valores particulares incorporados nas formas de vida, mas na maneira como
as formas de vida se relacionam com seus valores diferentes e heterogêneos em situações de
crise. A crítica transformadora pode assim modi car a norma e a prática relativa a ela, invés
de restaurar a ordem corrente ou adequar a prática ao sentido inicial da norma.
Jaeggi oferece uma tentativa interessante e nova de preencher a tarefa que Habermas põe para
a teoria crítica. Ela recomenda aceitar o pluralismo das formas de vida e o fato de serem
inevitáveis em suas características particulares para o desenvolvimento de padrões normativos e
para o exercício da racionalidade. Porém podemos sustentar ainda um ideal geral de
emancipação e julgar as diferentes contribuições das diferentes formas de vida para um mundo
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mais
01/03/2019 racional,
ANPOFse
- (O considerarmos
ESTADO DA ARTE DA suas
TEORIAcapacidades deDEaprenderem
CRÍTICA DA ESCOLA com as
FRANKFURT) A CRÍTICA DAS crises
FORMAS e
DE de
VIDA,se
DE …
Quão convincente é essa nova resposta ao desa o de Habermas? Existem pelo menos três
problemas para a perspectiva de Jaeggi. Primeiro, o conceito de formas de vida permanece vago
demais. Jaeggi está claramente consciente das di culdades postas pelas referências fáceis à
noção “caixa preta” de práticas sociais. A noção é interessante, pois possibilita a inclusão de
algum tipo realidade social, que não pode ser reduzida a interações ad hoc e a intenções
individuais de cooperação. Em diferentes pontos do livro Jaeggi destaca a interrelação entre
atitudes e crenças dos participantes, por um lado, e ações e interações em contextos relevantes,
por outro (por exemplo, 104-6). Mas essa interrelação levanta questões importantes: as atitudes
e crenças, que são constitutivas de formas de vida, são resilientes? ou as ações e interações? ou
a própria interrelação? Nesses três casos não está claro por que e quando são resilientes e por
que essa resiliência deve ser um fator para os agentes. Seria desejável ter uma explanação mais
clara do conceito de práticas sociais, que é tão importante para a ideia de formas de vida
apresentada por Jaeggi - e também para as possibilidades de transformar, criar de novo ou
mesmo superar formas de vida.
Essa questão já aponta para uma segunda crítica: quão racional é a racionalidade descoberta
por Jaeggi nas capacidades de aprendizagem das diferentes formas de vida? Podemos
realmente esperar que a emancipação resulte dessa racionalidade? Se não há critérios
adicionais para a aceitabilidade ou inaceitabilidade de formas de vida além de suas capacidades
de aprenderem, então poderíamos ter que aceitar formas de vida opressivas, caso preencham
certos critérios de auto-re exividade e resolvam crises de maneiras adequadas. Isso certamente
não pode ser aceitável para uma teoria crítica. E mesmo se a referência a racionalidade fosse
su cientemente convincente, uma terceira crítica surgiria: Jaeggi detecta potenciais de
desenvolvimento racional em formas de vida, mas se a racionalidade das formas de vida
depende da maneira de elas lidarem com problemas, é importante compreender quem articula
os problemas e quem aprende e de que forma aprende com as soluções deles. Não ca claro na
análise de Jaeggi se formas de vida, como agentes coletivos, aprendem como indivíduos. Ela
a rma que é “insatisfatório” (328) que assumamos que os processos de aprendizagem das
formas de vida podem tanto ser representados como agregações e com isso serem reduzidos
a indivíduos, como pode ser que devamos conceber o “aprendedor” como um tipo de sujeito
coletivo. Como Jaeggi rejeita essa última ideia como “inapropriada”, sobra a primeira opção, de
reduzir as condições de agregação aos indivíduos. O processo de superação de crises, contudo,
é comparado a um processo evolucionário, em que a melhor opção para resolver um problema
e superar a crise sobrevive. Como deveríamos pensar em um processo desse tipo se não o
concebermos nos termos de uma ação coletiva ou de um esforço intelectual comum? Em suma,
é possível dizer, então, que Jaeggi oferece uma nova perspectiva interessante na busca da teoria
crítica por um padrão de avaliação do desenvolvimento e dos os potenciais da sociedade -
porém ela permanece muito uma ideia de como fazer teoria crítica de modo diferente que
ainda precisa ser ancorada numa teoria da sociedade.
variadas e em geral muito boas, podem ser recebidas gratuitamente, por email, por quem quer
as assine no respectivo site na internet.
ANPOF 2017-2018
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01/03/2019 10ANPOF
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- (O sobre
ESTADO a DA
DA ARTE loso a brasileira
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01/03/2019 ANPOF - (O ESTADO DA ARTE DA TEORIA CRÍTICA DA ESCOLA DE FRANKFURT) A CRÍTICA DAS FORMAS DE VIDA, DE …
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