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Psicologia.

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ISSN 1646-6977
Documento publicado em 04.02.2018

UM ESTUDO EPISTEMOLÓGICO
SOBRE A PSICOLOGIA SÓCIO-HISTÓRICA

Pesquisa desenvolvida no âmbito acadêmico como prerrogativa para uma discussão ou abertura
para o estudo da Epistemologia na Psicologia

2017

Alan Ferreira dos Santos


Graduando de Psicologia na Universidade Paulista (UNIP) e discente na Universidade Estadual de
Campinas (UNICAMP) - Faculdade de Ciências Médicas (FCM) (Brasil)

Contacto:
alanfs1995@gmail.com

RESUMO

Se pretendeu com este ensaio teórico demonstrar as características epistemológicas que


subjazem o cânone do pensamento da Psicologia Sócio-Histórica, principalmente aquela referente
à sua principal expoente no Brasil: Ana Mêrces Bahia Bock. Ficou evidente o problema não apenas
ontológico mas também epistêmico. Identificou-se as esferas de poder como a política e a ciência
se intercruzando, produzindo discursos que não correspondem diretamente aos critérios da
composição estrutural do organismo humano e das suas tendências inerente ao seu
sociodinamismo. Constatou-se um teor restritivo dessa linha de reflexão em relação aos achados
empíricos das ciências naturais e da Psicologia Social Tradicional, havendo assim um
encerramento da teoria sobre si mesma. Deve-se ressaltar que, por meio dos estudos teóricos de
Sueli Damergian e Edgar Morin, pôde-se fundamentar, de modo lógico e sustentável, as teses –
aqui – apresentadas.

Palavras-chave: Ana Mercês Bahia Bock, psicologia sócio-histórica, psicologia crítica.

Copyright © 2018.
This work is licensed under the Creative Commons Attribution International License 4.0.
https://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/

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CAPÍTULO I - A PRODUÇÃO E A DINÂMICA DO CONHECIMENTO

A INSTITUIÇÃO E A ESPECIALIZAÇÃO

A especialização nas universidades brasileiras, se torna cada vez mais comum, seguindo
assim o ritmo global da escalonada, rumo ao afunilamento do conhecer. A especialidade acaba por
produzir campos teóricos que se legitimam, como sendo hegemônicos, não havendo possibilidade
de comunicação, a não ser dentro daquilo que é considerado como válido. O processo se perpetua
ramificando-se para as diversas esferas, a 1° seria a institucionalização desse saber na universidade,
na graduação e pós graduação. Nesse último caso, ocorre o advento das linhas de pesquisa, que
impele os indivíduos externos à aderirem caso queiram fazer um mestrado, em contrapartida não é
possível fazer pesquisas que estejam em dissonância com as linhas propostas. Com este fato o
sujeito tem algumas possibilidades (1) se enquadrar naquilo que é proposto, isto é, se submeter a
linha que não corresponde a sua predisposição inicial, e nesse sentido executar um mestrado,
doutorado e pós doutorado, prestar concurso docente e constituir uma linha de pesquisa própria,
tal percurso perfaz no mínimo 5 anos, pois o mestrado para a sua conclusão, o mínimo é de 1 ano,
doutorado 3 e pós, é 1.
Não obstante, quem fará mestrado de 1 ano? Doutorado de 3 e pós de 1? E o produto disso o
que será? Lembrando que a pesquisa em ciências humanas, é totalmente diferente das naturais. Por
outro lado se fizermos o percurso correto, que seria um Mestrado de 3 anos, Doutorado de 5 e Pós
Doutorado 1 à 5, concluiríamos o período em 8 à 13 anos, e o prestar concurso docente 1 ou 2 anos
a mais, ressaltando que estaríamos estudando algo que não corresponde ao nosso animo; (2)
pesquisar de modo independente (o que é impossível em ciências humanas, à respeito de algumas
disciplinas, como sociologia, antropologia e ciência política, por um aspecto puramente
econômico, pois não são todos que predispõem de um capital financeiro, que o permita ser
independente e pensar questões metafísicas sem financiamento) (Disponível em:
<www.unicamp.br> Acesso em: 12, de dezembro, de 2016).
Isto seria o panorama sobre o percurso da especialização, e que ocorre na maioria das
universidades, pois todo o processo é estabelecido por meio do órgãos estaduais e federais que
regulamentam o processo de pesquisa no país. Sabido que existem linhas de pesquisa e docentes
responsáveis o conhecimento é produzido, e reconhecido socialmente, sendo reproduzido na
graduação onde irá estimular os alunos a serem futuros investigadores. No geral, o que ocorre é

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aceitação por parte de todos, desde da graduação existe o Programa de Iniciação Científica, o
sujeito é incumbido na especialidade desde do início, e quando for prestar mestrado, doutorado e
assim por diante, será no mesmo tema que pesquisou outrora, e irá concorrer à vaga com outros
concorrentes, caso queira trocar de tema, logo após ter concluído sua graduação e ter exercido
diversas atividades em solo único, é possível que as suas chances diminuíam com relação, à uma
vaga divergente do seu currículo, até pelo fato de que, existiram outras pessoas mais avançadas e
que passaram maior parte do seu tempo na vida universitária perscrutando tal assunto, que apenas
neste instante você vislumbrou como sendo de seu interesse, nada mais justo, do que ofertar à
aqueles a chance.
O conhecimento, portanto, é produzido na pós-graduação e reproduzido na graduação onde
irá estimular os alunos à fazer futuras pesquisas dentro do próprio campo, e caso o indivíduo não
se sinta estimulado, por aquilo que é oferecido, pode se utilizar das alternativas citadas no início
(1) e (2). Se o indivíduo seguir a primeira opção, existe a possibilidade de constituir o seu próprio
campo de pesquisa (o que ocorre muito). Geralmente, isto é muito comum nas ciências naturais,
nas humanas por conta da delimitação do objeto torna-se mais difícil, não obstante a tendência
contemporânea é a especialização, o que faz das ciências humanas de fácil enquadre nos modelos
teóricas.

CIÊNCIAS NATURAIS

Nas ciências naturais quando o indivíduo investiga um parasitoide, há uma especificação do


que exatamente será pesquisado, isto é, se irá examinar os elementos bioquímicos, sua morfologia
ou outros. Existe níveis de análise que quando feitas, não implicam em uma compreensão equívoca
ou errônea de seu objeto, portanto se compreendo determinadas propriedades químicas do meu
organismo, isto não afeta a compreensão geral que tenho do mesmo, e além disso a especialização
em ciências naturais é um acontecimento irreversível e necessário, nos dois sentidos, uma por que
precisamos desse aprimoramento para novas descobertas e soluções para as mais variadas
patologias e segundo por que é inerente a constituição do próprio ser humano a busca por
conhecimento, seja lógico matemático ou esotérico místico, sempre houve a busca por conhecer.

Em vista disso, percebemos que a especialização nas ciências naturais, não é um problema
do ponto de vista epistemológico, ou seja, do conhecimento do objeto. Conhecer os seus mínimos
detalhes é a única coisa a ser fazer, tanto para o avanço do conhecimento, e este é uma prerrogativa
da especialização, quanto para a satisfação humana de ter conhecido algo e ir em direção à um
novo objeto. Nessa via não é possível reproduzir pesquisas que já foram feitas, simplesmente por
não haver sentido em redescobrir o descoberto, tanto que aquilo que foi amplamente pesquisado,

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é repassado para as séries anteriores, graduação, ensino médio, ensino fundamental e assim
sucessivamente, permitindo abertura para investigação de fenômenos desconhecidos.

Uma outra característica, é que quando me debruço sobre uma parte do objeto, e tenho
conhecimento sobre esse aspecto de sua constituição, a impressão que tenho deste, não se sobrepõe
a sua composição geral, em outras palavras "a parte não se sobrepõe ao todo", "o específico não
torna-se o geral", "o caso particular, não torna-se universal". Em vista disso, um elemento
bioquímico é um componente do organismo, e não organismo em si, havendo uma relação
indissociável e distinguível, o organismo é algo e o elemento é outro. O microbiologista
compreende, o que é, e o que não é. Sendo inconcebível denominar um parasita, por meio, de uma
de suas moléculas unitariamente, pois o parasita só é, por conta determinadas estruturas que o
constituí, mas caso este fosse apenas uma molécula, já não seria um parasita, por que este é
constituído por uma complexidade de estruturas relacionais.

Nas ciências humanas por sua vez, é um pouco mais complicado, por conta de uma questão
ontológica e epistemológica. A concepção de ser (ontologia) frente à seu objeto, irá moldar o modo
pelo qual o conhece (epistemologia). Uma comparação pertinente é em relação a ciências naturais,
caso um biólogo tenha uma concepção da célula, que diverge do meio acadêmico, e que esteja
imbuída de misticismo ou de uma moralidade, não irá afetar a sua pesquisa laboratorial, pois o
modo de pensar não altera os elementos do objeto. E caso ainda esteja convicto de suas afirmações,
os componentes bioquímicos e as reações físico-químicas compareceram inalteradas, portanto as
ideias, não serão passíveis de modificação de um fenômeno. Isto seria a ontologia (concepção de
ser do objeto) que não afeta a sua epistemologia (modo de conhecer o objeto), dado que, a
investigação irá ocorrer no laboratório com determinados procedimentos e metodologia específica.
A origem sociocultural do investigador, seja ele do Brasil ou do Japão, sua condição
socioeconômica e até mesmo, caso tenha uma deficiência física, não irá influenciar os resultados
do experimento, caso se utilize dessa metodologia o resultado é invariavelmente idêntico, dentro
das condições controladas e dos instrumentos adequados, o experimento é replicável. Portanto, se
o biólogo não "crê" na profilaxia por meio da vacina, isto é irrelevante, persuadido, sim ou não, de
sua crença (mística ou moral), as consequências são invariáveis e caso ocorra a variação (pois
existe uma margem de erro) não será por conta do seu "ponto de vista", mas sim por outras
motivações.
O avanço exponencial da ciência natural, ocorre por conta do seu aspecto quantitativo de se
fazer ciência, o conhecimento torna-se cumulativo. Nesse sentido, o sistema nervoso é composto
por células nervosas (neurônios) e células de sustentação (células da glia). O primeiro é composto
por um corpo celular (pericário) e por duas formas de prolongamento: os dendritos e os axônios.
A neuróglia por sua vez, tem como função fornecer suporte, por meio de nutrição, defesa e
reparação aos neurônios (ANDRADE, 2004). Tal composição do cérebro, não é descrito de outro

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modo, a não ser este, tanto que não existe afirmações do tipo "a composição do sistema nervosa
na perspectiva..." ou "a composição do sistema nervoso sobre o olhar..." e até "a composição do
sistema nervoso do ponto de vista...".
Nos dendritos por seu turno, é onde ocorre a transferência das informações provenientes de
outras células nervosas por meio de suas ramificações. As informações transmitidas de uma célula
para outra, ocorre por meio de impulsos nervosos, que são de natureza eletroquímica (ANDRADE,
2004). E mais uma vez, não se ouvirá "o funcionamento do cérebro na perspectiva..." e "a
representação do funcionamento do cérebro sobre o olhar". Portanto, não há modos de se pensar a
estrutura do cérebro, muito menos o seu funcionamento, "sobre um olhar", "ponto de vista" e "de
uma perspectiva", por isto, o avanço crescente da ciências naturais, dado que, quando surge um
problema os pesquisadores concentram-se em solucionar à adversidade, permitindo assim o
progresso do conhecimento. O que possibilita isto, é simplesmente não ter um "olhar",
"perspectiva" e muito menos, "pontos de vista", nessa via, o cientista se atém aos fatos, se
utilizando dos seus métodos de pesquisa e analisando os seus dados colhidos. Uma das implicações
da pesquisa em ciências naturais é a produção de tecnologia que beneficia a sociedade como um
todo, a objetividade é imprescindível, caso um estudante de medicina absorva a informação
incorreta advinda do docente, e produza uma solução equivocada, pode haver consequências para
o seu paciente, o equivalente serve a um estudante de engenharia que desenvolve um cálculo
inexato.

CIÊNCIAS HUMANAS

A ciências humanas é um caso sério na contemporaneidade, principalmente por conta da


especialização já citada no início do texto. Para a ciências naturais a especialidade é um benefício,
enquanto que para nós, das humanidades é um benefício e desafio. Em primeiro ponto, o que deve
ser considerado é o objeto de nossa ciência, que já o título da disciplina informa que é o ser humano.
Este por sua vez ainda não foi descoberto, pois com o avanço da ciência em geral, é que se permite
avançar degraus na escalonada do conhecimento sobre a sua própria constituição, por meio da
"Hard Sciences", desde da menor partícula subatômica, passando por células, moléculas orgânicas
e inorgânicas, a constituição dos tecidos, dos órgãos e dos sistemas, indo além com o estudo dos
aglomerados de minérios (rochas), a relação do homem com as planícies, temos também a questão
da ecologia que estuda a relação entre os organismos num determinado ambiente, se estendo para
as questões físicas, do próprio espaço e do tempo, as diversas dimensões que a consciência não
pode alcançar por conta das suas limitações, mas que por meio do raciocínio lógico matemático e
uma tecnologia que foi possibilitada exatamente por conta dessa capacidade da inteligência

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humana, podemos entender o universo, desde do sistema solar, as galáxias e até mesmo a matéria
escura, além disso é possível estudar a própria consciência, sobre a sua origem que é um fato não
desvendado.
Quanto maior a compreensão dos variados objetos, maior conhecimento o homem adquiri
sobre si próprio, da sua condição enquanto homem, dos seus objetivos ou finalidades. No entanto,
entender o universo por meio de sua extensão física ou através de um micro-organismo, não faz
que tenhamos a compreensão total do que é o próprio homem, mas fornece indicativos. Podemos
entender por exemplo, que existem espaços maiores do que, o da geofísica na qual estamos.
Entendemos também, que existem organismos menores, e que por uma faculdade cognitiva de
raciocínio comparativo, é possível supor outros maiores.

Dado essas características, vemos com isso que existe um universo de conhecimento, mas
quando nos deslocamos de uma sociedade de alta complexidade de técnica, e adentramos em uma
tribo indígena, percebemos que o conhecimento sobre o universo é diferente do referencial que
utilizávamos até então. É necessário se adequar a tais condições para que se possa explorar o novo
arsenal de informações, e veremos a manifestação de fenômenos não experienciados em ambientes
urbanos, exatamente por conta do adentrar em uma realidade por meio de uma percepção de
mundo, que é proveniente de uma maneira de pensar e que reflete nos costumes e no
comportamento. Egresso de tal sociedade adentramos em uma segunda e o mesmo ocorrerá, uma
cultura, comportamentos, linguagem, a maneira e os relacionamentos são divergentes.

A biologia se insere nessas comunidades com a Etnobotânica ou Etnofarmacologia, fazendo


um cruzamento entre as ciências naturais e humanas, objetivando compreender não apenas em
nível molecular ou químico, mas a interação entre as plantas, o seu significado aferido pela
comunidade e consequentemente a sua relação com o homem. Tal intercambio permite um novo
olhar sobre a natureza e o modo pelo qual nós lidamos com a mesma. Nessa via, o conhecimento
se específica compreendendo essa relação entre biologia e antropologia, o que possibilita um maior
conhecimento sobre a própria biologia tradicional por via direta das comunidades.
Mas para entender o ser humano, não é possível apenas por meio da relação entre algumas
ciências. O modo de produção de uma célula nervosa e a maneira pela qual ocorre o seu
desenvolvimento em uma criança aqui no Brasil, é idêntico de uma segunda criança na Índia. A
sinapse ocorre do mesmo jeito, os neuroquímicos se direcionam na mesma rota passando pela
membrana pré sináptica, fenda sináptica e pós sináptica (ANDRADE, 2004). No entanto, como
podemos saber o que é o ser humano, se não trabalharmos com a diversidade? No caso de um
etnólogo, o que o mesmo faz? Coleta dados sobre uma determinada etnia ou grupo social e
compartilha tais dados. O antropólogo por sua vez, fará o processo de estudo comparativo, que tem
como função encontrar semelhanças entre a Etnia (x) e (y), com isto formula-se conceitos gerais
sobre o que é o ser humano (ULLMANN, 1991). Mas o homem, enquanto homem, não se restringe

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meramente aos seus costumes, existindo uma esfera psicológica que irá estudar as manifestações
do psiquismo. Além do que existe o campo da biologia, pois o homem detém um sistema nervoso,
que permite os processos psicológicos básicos, do pensamento, da linguagem e da emoção
(MYERS, 2006).

Neste ponto inicia-se o problema das Ciências Humanas. Nas ciências naturais, não é
necessário compreender Filosofia ou Sociologia, para entender um patógeno, e é tal fato que
propicia a especialização de modo bem sucedido. Para ser mais específico, não entender Filosofia
ou Sociologia, não impede que o patologista investigue o seu objeto de modo preciso, caso o
investigador tenha conhecimentos filosóficos, o máximo que poderá fazer, é se enveredar para o
campo da Filosofia da Biologia, ter esse conhecimento amplia sua percepção sobre a vida, mas não
implica diretamente na precisão da pesquisa. O contrário ocorre nas humanidades, e principalmente
na Psicologia Social. Se o homem é constituído de uma fisiologia, em uma cultura e com
determinadas formas de pensamento, como posso compreende-lo em sua totalidade à não ser, por
meio dessas instancias em comunicação? Aqui diferente do patologista é necessário conhecer
Filosofia e Sociologia, a primeira ao que concerne a consistência lógica das teorias e a segunda,
sobre as dinâmicas que ocorrem no tecido social, e também a própria biologia. Por mais incrível
do que pareça, este é apenas, um dos nossos problemas quando se fala em ciências humanas. Nesse
estudo que pretendo desenvolver, demonstrarei de modo empírico o que ocorre na prática, quando
se expurga uma das dimensões de compreensão do ser.

Um segundo problema que deve ser exposto, é a questão de que nas ciências humanas ao
decorrer de um século para cá, por conta da especialização houve uma separação entre as ciências
humanas, exatas e naturais, para essas duas últimas não há problema ao que concerne a sua validade
científica, quanto mais específico, maior conhecimento, maior produção de técnica. Nas ciências
humanas por sua vez, é imprescindível o conhecimento de outras ciências, exatamente por estudar
um fenômeno, que resvala em todas as esferas. O que é o comportamento? O comportamento pode
ser visto, sem o biológico? Sem o aspecto cultural? Sem o aspecto psicológico? Evidentemente
que não. E o que seria a consciência? É possível estudar sem um sistema nervoso? Sem as
interações do ambiente? Sem as suas representações mentais? Evidentemente que não. A
Psicologia estuda um fenômeno complexo, que não se reduz ao social, ao biológico ou ao
psicológico, todas concepções que não englobem tais esferas, não é possível ser validada como
científica.

É de conhecimento de todos, que Freud foi, não só o maior Psicanalista, como também um
grande neurologista, que estudava Mitologia, Arqueologia, Antropologia, Filosofia e Sociologia, e
que tinha um conhecimento incomensurável sobre essas disciplinas (FREUD, 1910). É possível
afirmar que a Psicanálise hoje, não só se ramificou, adentrando as mais variadas disciplinas desde
da Pintura, passando por Cinema até a Política, como isto, só foi possível exatamente por conta

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dessa multidisciplinaridade que Freud desde do início acatou, um avanço científico nesse sentido,
como jamais houve. Além disso, estou convencido e logicamente por conta do material recolhido
e analisado, que o conhecimento em Ciências Humanas desenvolve-se apenas por conta da
multiplicidade, que só é possível por meio da especificidade.

A descoberta do Inconsciente Coletivo e os Arquétipos, não seria possível, se não fosse por
meio do conhecimento múltiplo, é sabido também, que Jung discípulo de Freud, dispunha de um
enorme conhecimento sobre as mais variadas religiões, não só do ocidente, como também do
oriente. Jung do mesmo modo, fazia estudos experimentais sobre o sistema nervoso, mas num
intercambio voraz, entre Filosofia, Antropologia, Mitologia, Teologia e assim por diante, até
mesmo o conceito de Sincronicidade veio ter validação científica, por meio da Física (JUNG,
2011). Nesse sentido, se o conhecimento deu um salto inimaginável com Freud, com o Jung
alavancamos em direção ao norte.

E o que dizer de Marx? Um homem que descobriu os mais variados fenômenos, por meio do
conhecimento não só Filosófico, mas da Economia Política de sua época, dos achados da
Antropologia, constituindo aquilo que se denominou Antropologia Marxiana que concebe uma
nova ontologia, uma nova concepção de ser (MORIN, 1973). Poderia citar Lévi-Strauss com sua
antropologia imbuída de Psicanálise, Linguística e Matemática (LÉVI-STRAUSS, 1989). Como
também Gyorgy Lukács, que foi (sem a menor dúvida) o maior comentador de Marx, que
contribuiu para a Literatura, e para a tradição Marxista (LUKÁCS, 2015).

Todos esses cientistas sociais e psicanalistas, se utilizaram de um arsenal de conhecimento


que transgredia a sua própria disciplina, o que evidentemente possibilitou o avanço da ciência. A
fragmentação do conhecimento nas ciências humanas atinge em maior medida esse espaço, tendo
consequências severas não só para o desenvolvimento da ciência, como também do retorno de
práticas à benefício da população.
O terceiro ponto é a questão das motivações. Quando refiro-me a motivação, estou utilizando
o termo em sentido genérico, remetendo as projeções, identificações e resistências de quem
pesquisa, isto afeta a conclusão e a objetividade do fenômeno investigado. O estudo presente se
propõe demonstrar como isto se manifesta, e como a "posição" de quem discursa influencia o relato
científico, não apenas por conta da visão de mundo ou percepção, mas por ideais ou uma
determinada moralidade.

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CAPÍTULO II - PSICOLOGIA SÓCIO-HISTÓRICA E PSICOLOGIA SOCIAL


CLÁSSICA: DIFERENÇAS.

A PSICOLOGIA SÓCIO-HISTÓRICA: ANA MERCÊS BAHIA BOCK.

No artigo intitulado A Perspectiva histórica da subjetividade: uma exigência para la


Psicologia atual (2004) de autoria de Ana. M. Bahia Bock, docente da PUC de São Paulo e que
foi Presidente do Conselho Federal de Psicologia, a autora apresenta a concepção da Psicologia
Sócio-Histórica, de início, nos revela algumas informações de sua tese de doutorado intitulada As
Aventuras do Barão de Munchhausen na Psicologia: Um Estudo Sobre o Significado do Fenômeno
Psicológico na Categoria dos Psicólogos (1997), neste estudo objetivou identificar as definições
do fenômeno psicológico, por meio de questionários aplicados a psicólogos, segundo a
pesquisadora, foram encontrados (em suas palavras) "chavões" que os profissionais relataram,
como "O fenômeno bio-psico-social; o fenômeno que envolve ou implica a interação entre pessoas;
o fenômeno que se refere a um indivíduo que é agente e sujeito" (BOCK, 2004, p. 5). E logo após
demonstrar algumas conceituações, segue dizendo:

Mas que coisa é esta, o fenômeno psicológico? Ora é processo, ora é estrutura, ora
manifestação, ora relação, ora é conteúdo, ora é distúrbio, ora experiência. É interno, mas
com relação com o externo. É biológico, é psíquico e é social; é agente e é resultado; é
fenômeno humano, relacionado ao que denominamos “eu”. O fenômeno psicológico seja
lá qual for sua conceituação aparece descolado da realidade na qual o indivíduo se insere
e mais ainda, descolado do próprio indivíduo que o abriga (BOCK, 2004, p. 5).

Nesse sentido seria interessante trazer mais algumas definições que foram encontradas na
pesquisa e que são "descoladas da realidade, "seja lá qual for a conceituação":

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[...] acontecimento organísmicos, manifestações do aparelho psíquico, individualidade,


algo que ocorre na relação e é o que somos, conflitos pulsionais, confusão mental,
manifestação do homem, pensar e sentir o mundo, o homem e relação com o meio,
consciência, saber-se indivíduo, o que se mostra, subjetividade, funções egóicas, existência
intersubjetiva, experiências, vivências, loucura, distúrbio, o próprio homem, evento
estruturantes do homem, comportamento, engrenagem de emoção, motivação, habilidades
e potencialidades, experiências emocionais, psique, pensamento, sensação, emoção e
expressão, entendimento de si e do mundo, manifestação da vida mental, tudo que é
percebido pelos sentidos, é consciente e é inconsciente (Bock, 1999 pag. 173 apud BOCK,
2004, p.5).

Em seguida dirá, que alguns psicólogos afirmam a relação com o meio social e cultural,
necessária e importante, mas diz que há uma "naturalização" do fenômeno psicológico por parte
deles. Adiante se propõe defender a visão histórica do fenômeno psicológico, pois "se apresenta
desde seus primórdios como uma possibilidade de superação destas visões dicotômicas" (BOCK,
2004, p. 5). Nos fala, sobre a psicologia sócio-histórica e a sua possibilidade de "crítica", "não
apenas por uma intencionalidade de quem a produz, mas por seus fundamentos epistemológicos e
teóricos" (BOCK, 2004, p. 5). Além disso irá lançar alguns pressupostos, como:

- o fenômeno psicológico não pertence à Natureza Humana

- o fenômeno psicológico não pré existe ao homem

- o fenômeno psicológico reflete a condição social, econômica e cultural em que vivem os


homens (BOCK, 2004, p. 5).

Aponta ainda, para as diversas perspectivas, que dizem haver um "verdadeiro eu":

Porque tais perspectivas fazem uma psicologia descolada da realidade social e cultural
que é constitutiva do fenômeno psicológico. E isto é uma questão importante, porque é
desta “descolagem” que se constitui o processo ideológico da psicologia. Passamos a
contribuir significativamente para ocultar os aspectos sociais do processo de construção
do fenômeno psicológico em cada um de nós.Fazemos ideologia (BOCK, 2004, p. 6).

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E segue dizendo que a Psicologia Sócio-Histórica tem como principal tarefa, fazer a crítica
às concepções naturalizantes, que o ser humano precisa ser pensando, a partir de uma perspectiva,
"que tenha a historicidade como uma de suas principais características" (BOCK, 2008, p. 4).
Como vimos no início deste tópico, a descrição do fenômeno psicológico, descrita a partir
dos profissionais, é identificada pela autora como "chavões". Seja fenômeno biopsicossocial ou
que se refere a relação de agente e sujeito. Outros termos como: Manifestação do aparelho psíquico,
o homem e a relação com o meio, individualidade, consciência, subjetividade, existência
intersubjetiva, eventos estruturantes, comportamento, motivação, habilidades e potencialidades,
são referidos, não como sendo "chavões", mas "seja lá como for" aparecem descoladas da realidade
na qual o indivíduo se insere e do próprio indivíduo, e que por parte dessas noções, existe uma
"naturalização" do fenômeno psicológico. Nesse sentido a Psicologia Sócio-Histórica, é uma
abordagem que se apresenta com a possibilidade de superação das visões dicotômicas, além de ser
"crítica" com relação a intencionalidade de quem produz e aos fundamentos epistemológicos e
teóricos. Segue adiante, lançando os pressupostos da "Perspectiva Crítica", sendo: O fenômeno
psicológico não é pertencente à natureza, não pré existe e reflete a condição social, econômica e
cultural do homem.

A PSICOLOGIA SOCIAL CLÁSSICA (GESTALT) E A PSICANÁLISE

No artigo da Profª Drª Sueli Damergian, do Instituto de Psicologia da Universidade de São


Paulo (USP), foi produzido um contraponto com relação a Sócio-Histórica, a vertente vem se
popularizando havendo uma hegemonia por toda academia, seu crescimento é exponencial e se
deve a diversos fatores, que não poderão ser explorados no momento, não antes de passarmos por
algumas etapas. A princípio autora nos diz sobre a instituição que constantemente reprime e
aprisiona o homem, com sua lei, burocracia e diríamos o processo civilizador em geral, e destaca:

É neste cenário, nada animador, que se desenrolam as interações humanas, objeto da


Psicologia Social. Quando se fala em interações humanas pensa-se nas relações que o
indivíduo estabelece com os outros indivíduos, na constituição dos agrupamentos e
vínculos humanos, inevitavelmente, na personalidade de cada um que está envolvido na
situação. Não há como desconsiderar a emergência de desejos, fantasias inconscientes,
pulsões de vida e morte quando nos debruçamos sobre a vida social e tentamos
compreender como os homens convivem entre si. Para tanto, temos que estar atentos. É
preciso cuidar para que nosso desejo onipotente de tudo saber e controlar não nos cegue
para os fatos que apontam em direção aos aspectos obscuros do ser e que aparecem
revestidos de uma simplicidade enganadora (DAMERGIAN, 1991, p. 66).

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De início podemos perceber, uma concepção totalizante da realidade, vemos que existe uma
interação sujeito e ambiente que constituí a personalidade, mas como destacado pela autora, não
podemos negar alguns fatores. Se nos indagarmos sobre a constituição do sujeito,
compreenderemos que o mesmo, se produz nas relações com seu meio, numa determinada
sociedade e cultura, num processo histórico. O que não é novidade, como sabemos, Freud
desenvolvia pesquisas arqueológicas e histórico-sociais, desde dos assírios-babilônios aos egípcios
(FREUD, 1910). Isto é apenas para evidenciar o argumento implícito da Bock (2008) da
necessidade de uma abordagem que contenha em si, a característica da historicidade, além disso,
existe uma passagem que evidencia com clareza a questão, de modo pungente e que se coaduna
com a proposta da Profª Damergian:

Algo mais está invariavelmente envolvido na vida mental do indivíduo, como um modelo,
um objeto, um auxiliar,um oponente, de maneira que, desde o começo, a psicologia
individual, nesse sentido ampliado, mas inteiramente justificável das palavras, é, ao mesmo
tempo, também psicologia social (FREUD, 1996/1921, p.81).

Mas ainda falta responder uma questão: o que vem a ser um sujeito? Além de ser constituído
por meio de suas interações sociais, poderíamos supor, que as suas emoções, afetos (sentimentos)
fantasias/devaneios e expectativas (formas de pensamento), coexistem invariavelmente? É o que
sugere a Profª Damergian, e mais adiante, dirá da necessidade desses fatores e que estejam
imbuídos na análise do social. Não obstante, não seria um tanto equivocado analisar sonhos, afetos,
expectativas, com relação ao social? Para responder esta questão é importante ressaltar dois fatores
(1) caso haja análise ou não, isto é um fato empírico (2) e por sua vez, é inerente a realidade e um
componente da mesma, se houver a subtração (negação) de tais fenômenos, a possibilidade desvio
da apreensão da sociabilidade é afirmada. Nesse sentido a interação humana não tem sido
considerada na sua complexidade, do mesmo modo que Freud considerou, porém um segundo
psicólogo social, tinha a mesma perspectiva deste último:

[...] a escola da Gestalt e Kurt Lewin nos leva de encontro ao indivíduo considerado em
sua totalidade. Neles, encontramos uma concepção de campo onde todos os elementos se
fazem presentes, os internos e os externos. Os conscientes e os inconscientes. Cada qual
com sua parcela de influência no comportamento psico-social (DAMERGIAN, 1991, p.
66).

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Nessa via, a Psicologia Socio-Histórica deixa de considerar tais instancias:

[...] Também não encontramos essa busca da compreensão da totalidade e da


complexidade do comportamento social numa visão que se pode considerar
sociologizante, baseada no materialismo dialético, fio condutor e interpretativo
das relações sociais (DAMERGIAN, 1991, p. 66).

Temos também um terceiro psicólogo social de renome para nos amparar:

[...] KOFFKA (1975) diz que a Psicologia Social pode ser perfeitamente
quantitativa sem perder seu caráter de ciência qualitativa, ou seja, de explicação
do fenómeno. Ao destacar a questão da qualidade, a Gestalt leva-nos a refletir
sobre a qualidade da interação psicológica, aspecto fundamental para a Psicologia
Social. Afinal, sobre qual qualidade se exerce a interação humana? Ela é saudável
ou não? A mera descrição de dados conscientes não pode dar conta desta questão
(DAMERGIAN, 1991, p. 67).

Nesse sentido, os autores Sigmund Freud (1856-1939), Kurt Koffka (1886-1941) e Kurt
Lewin (1890-1947), expõe uma concepção que corresponde aos avanços da ciência, no entanto é
importante explorar um pouco mais, vejamos:

KOFFKA diz também que a Psicologia da Gestalt é integradora e não pode ignorar
os problemas da interação mente-corpo e vida-natureza. Também não pode,
segundo ele, aceitar que tais domínios do ser estejam separados entre si por
abismos intransponíveis. A proposta integradora da Gestalt permite-nos
desenvolver a idéia de integração interno-externo e incluir o inconsciente em nossa
investigação acerca da interação humana (DAMERGIAN, 1991, p. 67).

A representante da Sócio-Histórica, disse alguma, e não apenas uma vez, sobre essas esferas
e sobre abandonar "definitivamente as visões naturalizantes de homem e de mundo, adotando
perspectivas históricas" (BOCK, 2004, p. 9) e que "O ser humano precisa ser pensado a partir de
outra perspectiva que tenha a historicidade como uma de suas principais características" (BOCK,
2008, p. 4), e adiante de forma irônica, e diria até caricatural diz:

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Um fenômeno concebido de forma abstrata, enclausurado no homem, descolado da


realidade social (a não ser como oportunidades para o desabrochar do potencial);
algo em nosso corpo, do qual não temos muito controle; visto como algo que em
determinados momentos de crise nos domina sem que tenhamos qualquer
possibilidade de controlá-lo; algo que inclui “segredos” que nem eu mesmo sei;
algo enclausurado em nós que é ou contém um “verdadeiro eu” (BOCK, 2004, p.
8).

Se autora no caso se refere a questão da historicidade, demonstramos que em Freud de algum


modo existe uma concepção, e até mesmo, da noção do autor sobre a incoerência epistemológica
e ontológica de uma psicologia social, sem uma individual, e assim vice-versa. Enquanto que
Lewin e Koffka, nos dizem sobre a esfera da subjetividade contendo um relacionamento
indissociável entre processos inconscientes e conscientes, interno e externos ao sujeito, e por fim
o aspecto qualitativo e quantitativo, que devem confluir numa Psicologia Social Científica.
Portanto, é nítido que a Sócio-Histórica representada por Ana Bock, não inclui a dimensão
inconsciente nas relações sociais, ao menos à nível individual do sujeito, de acordo com as nossas
evidencias até o momento.
KOFFKA (1975) dirá que a visão de campo, são todos fenômenos presentes no aqui-e-agora
e no ego enquanto subsistema desse campo. Incluído à isto, observa que as forças que determinam
o comportamento, nem sempre é, aquelas que "acreditamos" serem determinantes:

[...] A respeito dessas forças subterrâneas [...] é verdade que esse tipo de ação
existe [...] Além disso, ela não pode ser explicada em termos de meio
comportamental e é tão semelhante ao resto do comportamento que necessita de
um conceito explicativo comum. Ou seja, uma coisa é o meio em que o organismo
se comporta, ou melhor, com o qual interage e outra coisa é o campo psicológico
que define esse organismo. Koffka assinala mesmo que a totalidade de nosso
comportamento não é explicável em termos do meio comportamental, quer dizer,
do externo ao organismo. Uma tal consideração torna possível incluir os aspectos
inconscientes como elementos a serem considerados por uma teoria que se ocupe
do campo psicológico (DAMERGIAN, 1991, p. 67).

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Gostaria de explorar este ponto e produzir um link com a questão do inconsciente na Sócio-
Histórica. Se considerarmos que Koffka se refere, à forças que determinam o comportamento, mas
que nem sempre percebemos, e por conseguinte, diz não ser possível explicar a totalidade do
comportamento pelo campo/meio comportamental, e logo em seguida a Profª Damergian, sugere
a possibilidade de uma teoria que se ocupe do campo psicológico com aspectos inconscientes, é
possível deduzirmos disso (1) o campo comportamental determina o comportamento (2) mas nem
sempre, pois existem forças, que por sua vez, determina este também, mas que percebemos
sensorialmente sendo efeito do campo comportamental por atrelarmos a relação de causa e efeito,
e não considerarmos a reação do sujeito como possivelmente sendo de outra origem que não à
externa (pensamentos/sentimentos - expectativas, sonhos, projeções, fantasias, identificações e
temporalidade/passado) e portanto do campo psicológico (3) que por seu turno, é constituído pelo
Id e o Ego (aqui-e-agora) assinalado por Koffka.

ANÁLISE DO FENÔMENO PSICOLÓGICO DA SÓCIO-HISTÓRICA

[...] falar do fenômeno psicológico é obrigatoriamente falar da sociedade. Falar da


subjetividade humana é falar da objetividade onde vivem os homens. A compreensão do
“mundo interno” exige a compreensão do “mundo externo”, pois são dois aspectos de um
mesmo movimento, de um processo no qual o homem atua e constrói/ modifica o mundo e
este, por sua vez, propicia os elementos para a constituição psicológica do homem. As
capacidades humanas devem ser vistas como algo que surge após uma série de
transformações qualitativas. Cada transformação cria condições para novas
transformações, em um processo histórico, e não natural. O fenômeno psicológico deve ser
entendido como construção no nível individual do mundo simbólico que é social. O
fenômeno deve ser visto como subjetividade, concebida como algo que se constituiu na
relação com o mundo material e social, mundo este que só existe pela atividade humana.
Subjetividade e objetividade se constituem uma à outra sem se confundirem. A linguagem
é mediação para a internalização da objetividade, permitindo a construção de sentidos
pessoais que constituem a subjetividade. O mundo psicológico é um mundo em relação
dialética com o mundo social. Conhecer o fenômeno psicológico significa conhecer a
expressão subjetiva de um mundo objetivo/coletivo; um fenômeno que se constitui em um
processo de conversão do social em individual; de construção interna dos elementos e
atividades do mundo externo. Conhecê-lo desta forma significa retirá-lo de um campo
abstrato e idealista e dar a ele uma base material vigorosa. Permite ainda que se supere
definitivamente visões metafísicas do fenômeno psicológico que o conceberam como algo
súbito, algo que surge no homem, ou melhor, algo que já estava lá, em estado embrionário,
e que se atualiza com o amadurecimento humano (BOCK, 2004, p. 6).

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Se analisarmos tal trecho em comparação com a proposta da escola tradicional, perceberemos


divergências. A frase em negrito "Subjetividade e objetividade se constituem uma à outra sem se
confundirem" é contrário, ao que foi exposto algum tempo atrás que "o campo ambiental determina
o comportamento, mas nem sempre, pois este pode ser determinado por fatores internos, por
atrelarmos uma relação de causa e efeito, portanto de estímulo e resposta", nesse sentido,
poderíamos afirmar que há uma relação de causa e efeito, estímulo e resposta na abordagem Sócio-
Histórica, já que "se constituem, sem se confundirem"? Diríamos, talvez, que há um certo
mecanicismo? É significativo enfatizar, que em Lewin e Koffka, como apresentado, o que seria na
Sócio-Histórico, subjetivo e objetivo, nem sempre, o objetivo determina o subjetivo, e as vezes o
subjetivo determina o objetivo, portanto, teríamos a questão do sujeito, determinando o objeto, o
que não ocorre nesta perspectiva, já que:

A sociedade age inevitavelmente sobre os indivíduos em sua interioridade, até nas formas
mais íntimas de pensamento, de sentimento, de ações e reações e nesse permanente
processo de interação entre indivíduo e sociedade se constitui a substância da individuali-
dade humana, a personalidade como manifestação da interioridade do sujeito humano.
Nem sempre o problema da essência do indivíduo foi visto desta maneira. Neste aspecto
predominaram, frequentemente, “falsas antinomias” entre indivíduo e sociedade. Pois,
para Lukács "se é falso pensar que haja uma substância da individualidade humana fora
do espaço e do tempo, que as circunstâncias da vida podem modificar apenas
superficialmente, igualmente errado é conceber o indivíduo como um simples produto do
seu ambiente" (p.261 apud DA COSTA, 2007, p. 48).

Tocamos na problemática, a Bock se refere a "naturalização", e diz, ser o homem desprovido


de qualquer "substancia ou potencialidade inata", e dirá "fala-se de habilidades e aptidões de um
sujeito sem se falar das suas reais possibilidades de acesso à cultura" (BOCK, 2004, p. 8). Isto, não
seria o sujeito, como apenas um produto do meio? E aqui mais uma vez ligando àquela frase
"subjetivo e objetivo, não se confundem", logo o indivíduo é determinado apenas por fatores
externos, e não tem possibilidade determinar. Nessa via, é incoerente com abordagem da Psicologia
Social Clássica, e por mais incrível do que pareça, é oposta a própria concepção, do maior
comentador de Karl Marx (1818-1888), que é Gyorgy Lukács (1885-1971). E agora podemos
entender, o do por que a Profª Damergian dizer, que a vertente é "sociologizante", ao mesmo tempo
que diz, que a sociedade é constituída pelo sujeito, alega que a sociedade o constrói, e que ele é
"fruto de suas determinações materiais", nisto se justifica a ideia, que "objetividade e subjetividade
não se confundem", com isso o objetivo não se confunde com o subjetivo, e apesar de dizer que o

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sujeito é ativo, o trecho nos revela um indivíduo que constrói, mas de modo passivo. A antípoda é
justamente esta, se afirmar que o sujeito é ativo, esbarra na concepção liberal, e o que menos deseja
é isto "A Psicologia Sócio-Histórica não trabalha com a concepção liberal de homem e de
fenômeno psicológico. Acredita que o fenômeno psicológico se desenvolve ao longo do tempo
(BOCK, 2004, p. 6). Pois afirmar que o homem é ativo, é pressupor uma consciência da suas ações,
logo afirmando que ele é ativo e histórico, o homem perde sua autonomia (presente) e torna-se
construtor da realidade ao decorrer do tempo (ativo nesse sentido) mas sem ter consciência da suas
determinações materiais, pois desconhece sua realidade histórico material. A sócio-histórica "adota
o materialismo histórico e dialético como filosofia, teoria e método. Nesse sentido, concebe o
homem como ativo, social e histórico (BOCK, 2004, p. 5).

Façamos uma análise pormenorizada, a Profª Damergian alegou, a vertente de ser


"sociologizante", o que é contunde com as evidencias, pois se a "subjetividade e objetividade não
se confundem", o sujeito constrói e por sua vez é construído, nesse sentido passa a desconhecer
sua realidade material e histórica, por não saber aquilo que o determinou, mas o indivíduo também
não tem nenhuma "substancia, potencialidade ou habilidades" (ativo, social e histórico) por sua
vez Lewin e Koffka dirá que existe uma totalidade e que deve ser considerada, inclusive "os fatores
que determinam, mas não percebemos como determinante", e a Sócio-Histórica, como
demonstrado retira qualquer noção "naturalizante" como "verdadeiro eu - e - segredos
desconhecidos" que pressupõe algo "inato", o que possivelmente deve ser uma alusão a
substancia/potencialidade e ao inconsciente. Nessa via, é contrário ao Gyorgy Lukács que diz, que
a antinomia entre "sujeito e sociedade" é falsa, e que supõem o indivíduo sendo apenas um produto
de seu meio. Vejamos o paradoxo. Se diz que o indivíduo é ativo, mas não no presente, pois é supor
uma concepção liberal de autonomia, assim relega o termo ativo ao passado, se associando à
história, portanto o sujeito é ativo no sentido de que constrói a si mesmo ao longo das épocas, mas
se relegarmos o termo ativo ao passado, o indivíduo torna-se apenas fruto do seu meio, pois não
tem consciência do que o determina no presente, portanto nas palavras de Lukács "é um produto
do seu ambiente", não havendo "alternativa". Nessa via, o indivíduo é um construtor da sua
realidade histórico material, mas é um construtor não ativo e sim passivo, mas como isto pode ser
possível? Ser um construtor passivo é construir a si mesmo e a sua história, mas a desconhecendo
ao longo do tempo, isto não seria um movimento inconsciente? Isto é, de não ter consciência do
que se faz? O indivíduo, só pode ter consciência, daquilo que é inconsciente, ou nas palavras da
Bock "dos seus segredos", e mais, como o indivíduo pode ser ativo no presente e no passado? Se
for ativo no presente, desemboca na concepção liberal de autonomia, pois é consciente e não o
contrário "desconhece os seus determinantes", mas se for ativo no sentido de construção de si
mesmo e dos seus determinantes materiais, tem de ser alegar no presente de que "desconhece" e se
"desconhece", é inconsciente, o que nos remete as afirmações de Kurt Lewin e Koffka, de que o
sujeito não é apenas determinado pelo seu meio, mas por variáveis, de outra origem.

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Irei prosseguir com a possibilidade de uma resposta hipotética "mas o desconhecimento que
falamos não é análogo ao do inconsciente, é heterogêneo à isto, senhor". Vejamos a definição de
ideologia:

Ideologia como definida por Charlot é “um sistema teórico, cujas idéias têm sua
origem na realidade, como é sempre o caso das idéias; mas que coloca, ao
contrário, que as idéias são autônomas, isto é, que transforma em entidades e em
essências as realidades que ele apreende, e que, assim, desenvolve uma
representação ilusória ao mesmo tempo daquilo sobre o que trata e dele próprio;
e que, graças a essa representação ilusória, desempenha um papel mistificador,
quase sempre inconsciente (o próprio ideológico é mistificado, acredita na
autonomia de suas idéias): as idéias assim destacadas de sua relação com a
realidade servem, com efeito, para construir um sistema teórico que camufla e
justifica a dominação de classe. Ideológico não significa, portanto, errôneo (....).
Aliás, é porque uma ideologia é um sistema ilusório e não um sistema de idéias
falsas que é social e potencialmente eficaz (Charlot, 1979, p.32 apud BOCK, 2004,
p. 6-7).

É evidente que existe um inconsciente, conceitos de ideologia e fetiche, são processos


mentais que ocorrem inconscientemente. Mas como é possível inferir existir um inconsciente a
nível social, mas não individual? Como já demonstrado, mas é importante está repetindo,
"segredos" e "verdadeiro eu", são concebidos como noções "naturalizantes".
Como visto até aqui, percebemos uma inconsistência não só ontológica, pois não é lógica a
concepção de ser, como também epistemológica, pois impede o pesquisador de conhecer tal
realidade e desenvolver qualquer teoria de conhecimento, haja vista, saibamos que uma
epistemologia é consequência de uma ontologia e corresponde de modo lógico formal àquela.

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CAPÍTULO III - A INVERSÃO: "AO INVÉS DE UMA HISTÓRIA DA


PSICOLOGIA, UMA PSICOLOGIA DA HISTÓRIA"

PSICOLOGIA DA HISTÓRIA: COLETA DE DADOS

Uma observação importante a se fazer (é não estar satisfeito), com tal parênteses me indago,
mas por que tamanha inconsistência teórica? Neste ponto a análise se torna mais profunda, e
devemos nos perguntar "da onde fala o sujeito que constitui uma teoria" e "quais são suas
motivações", eu sugiro nesse sentido, não uma "História da Psicologia" mas sim, uma "Psicologia
da História", o que isto quer dizer?

Quero dizer com o termo Psicologia da História, compreender os fatores históricos com viés
psicológico, entendendo de que maneira aspectos históricos-sociais influenciaram a constituição
psicológica/comportamental/motivacional da organização social do presente. Nesse sentido
pretendo fazer uma coleta de dados, com o intuito de obter informações para uma futura análise,
da estrutura constituinte da Sócio-Histórica por meio da Psicologia da História.

COLETA DE DADOS: CARACTERÍSTICA COMPORTAMENTAL

Comecemos com a primeira pergunta "Da onde fala o sujeito que constitui uma teoria", Ana
Mercês Bahia Bock, não foi só Presidente do Conselho Federal de Psicologia do Brasil, como
também é uma das maiores expoentes da Psicologia Social no país, Professora de PUC de São
Paulo que é um grande polo de pesquisas, e atualmente Presidente do Instituto Silvia Lane, esta
última, foi uma das pioneiras em Psicologia Social no Brasil. O currículo que não é pequeno, mas
que denota a grande influencia dentro dos centros acadêmicos e com a própria psicologia, torna-se
impossível estudar Psicologia Social na universidade, sem conhecer Silvia Lane e Bock. Com isto,
podemos perceber o do por que, não houve uma crítica desta abordagem até o momento (crítica
esta, que ainda não terminou), um sociólogo chamado Pierre Bourdieu (1930-2002) tem um
conceito denominado de "legitimidade" (MONTAGNER, 2011), que é descrito exatamente pelo
processo de que "não importa o que indivíduo fale, mas sim da onde" isto é "seja falso ou
verdadeiro, quem tá falando é a Presidente" ou "Não, mais foi ele que disse, é formado em
Harvard", nessa via, é indiferente se o sujeito proclama o correto ou errado, todos devem segui-lo
por que é uma "autoridade", e caso um indivíduo o "desautorize" é abandonado, mesmo que haja
uma certa veracidade do que diz, o conhecimento só é validado, se for legitimado, isto
principalmente em ciências humanas, pelo fato de que, não existem critérios de cientificidade

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solidificados (discorrerei, mais a frente sobre isto). Portanto a legitimidade do porta voz é um
imperativo segundo Bourdieu. Nessa via compreendemos de modo descritivo o comportamento
manifesto da organização "a academia não é contrária ou crítica por conta da legitimidade do porta
voz".

COLETA DE DADOS: CARACTERÍSTICA MOTIVACIONAL

Antes de fazer a identificação motivacional é necessário (1) elucidar alguns conceitos da


Análise Institucional, logo em seguida será (2) demonstrado os trechos que serão utilizados, e por
conseguinte será feito (3) um processo de identificação de palavras, que comparecem nas narrativas
em maior quantidade, se intui com isto (4) produzir agrupamentos linguísticos, por meio de
"Temas", que serviram de categorias analíticas para compreender as características motivacionais.

ANÁLISE INSTITUCIONAL: IMPLICAÇÃO E SOBREIMPLICAÇÃO

Na Análise Institucional René Lourau (1933-2000) cunhou o termo "implicação", que se


refere as qualidades emocionais que interferem no ato de pesquisa, no ato de constituição de uma
teoria, aí se inclui "projeções, identificações e resistências" em suma os seus investimentos
libidinais:

Segundo Merleau-Ponty, o sociólogo chega ao conhecimento não só pela


observação de um objeto exterior, mas canalizando também sua própria implicação
no momento da observação (...) Merleau-Ponty vai mais longe do que aqueles que
se detêm na compreensão das instituições por meio de uma análise do vivido. Para
ele, estudar o social é saber ( ...) como pode ser em si e para nós (Lourau, 1975, p.
38).

Nesse sentido o "especialista", nunca está isento de "intencionalidades", de algum modo sua
"afetividade" será demonstrada, ora aqui, ora ali. Pois o momento de conhecimento do objeto
exterior é o momento de conhecimento de si próprio, mas que é bloqueado no momento descrição
em prol da objetividade, nesse sentido o teórico faz o movimento de deslocação da sua afetividade
de uma representação para outra (mais tarde veremos, aplicação dessas noções). O que se coloca é
uma questão ética:

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Nesse sentido, Lourau (1990) destaca como podemos nos voltar a isso que os
sentimentos, percepções, ações, acontecimentos, trazem para o campo: “O útil ou
necessário para a ética, a pesquisa e a ética da pesquisa não é a implicação –
sempre presente em nossas adesões ou rechaços, referências e não referências,
participações e não participações, sobremotivações e desmotivações, investimentos
e desinvestimentos libidinais... mas a análise dessa implicação.” (LORAU, 1990: 4
apud LACAZ, 2013, p. 214).

Lourau utiliza, ainda, outro conceito-ferramenta que denominou “sobreimplicação” e que é


fundamental para compreendermos o processo de rompimento que fica claro nesse contexto, em
especial durante a realização de uma pesquisa. Buscando, portanto, fazer essa diferenciação nos
utilizamos do autor, que explicita:

A implicação é um nó de relações; não é ‘boa’ (uso voluntarista) nem ’má’ (uso


jurídico-policialesco). A sobreimplicação, por sua vez, é a ideologia normativa do
sobretrabalho, gestora da necessidade do implicar-se (LORAU, 2004:189 apud
LACAZ, 2013, p. 214).

Uma outra citação se faz necessária sobre a implicação, para denotar suas características:

Estar implicado (realizar ou aceitar a análise de minhas próprias


implicações) é, ao fim de tudo, admitir que eu sou objetivado por aquilo que
pretendo objetivar: fenômenos, acontecimentos, grupos, idéias, etc. Com o saber
científico anulo o saber das mulheres, das crianças e dos loucos - o saber social,
cada vez mais reprimido como culpado e inferior. O intelectual (...) com sua
linguagem de sábio, com a manipulação ou o consumo ostensivo do discurso
instituído e o jogo das interpretações múltiplas, dos “pontos de vista” e “níveis de
análise”, esconde-se atrás da cortina das mediações que se interpõem entre a
realidade política e ele. O intelectual programa a separação entre teoria e política:
é para comer-te melhor, minha filha (...) mas, esquece que é o único que postula tal
separação, tal desgarramento.” (René Lourau, 1975, pp. 88-89, grifos do autor).

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Vemos, então, que as motivações são de diversas origens, que é possível um conhecimento
objetivo, mas que este não passa, se não houver uma "análise das implicações", o pesquisador deve
saber quais são suas implicações, políticas, econômicas, sociais e até mesmo "o do por que faz, o
que faz", todas suas intencionalidades se incluem nesta parte.

TRECHOS QUE FORMARAM OS AGRUPAMENTOS LINGUÍSTICOS.

As idéias liberais serão responsáveis pelo desenvolvimento da concepção de


fenômeno psicológico dominante na Psicologia. Um fenômeno concebido de forma
abstrata, enclausurado no homem, descolado da realidade social (a não ser como
oportunidades para o desabrochar do potencial); algo em nosso corpo, do qual não
temos muito controle; visto como algo que em determinados momentos de crise nos
domina sem que tenhamos qualquer possibilidade de controlá-lo; algo que inclui
“segredos” que nem eu mesmo sei; algo enclausurado em nós que é ou contém um
“verdadeiro eu” (BOCK, 2004, p. 8).

Assim, os psicólogos se puseram de costas para a realidade social, acreditando


poder entender o fenômeno psicológico a partir dele mesmo. As crianças não
aprendem na escola porque não se esforçam ou porque têm pais que bebem e mães
ausentes; as mães pobres não tratam adequadamente seus filhos porque não
conhecem os saberes da Psicologia; as pessoas não melhoram de vida porque não
querem; os trabalhadores perdem suas mãos nas máquinas devido a pulsões de
morte ou coisa que o valha. Os jovens matam crianças com tiros porque têm
natureza violenta ou porque seus pais. E assim vamos explicando todas as questões
sociais a partir de mecanismos naturais do mundo psicológico (BOCK, 2008, p.
3).

Porque tais perspectivas fazem uma psicologia descolada da realidade social e


cultural que é constitutiva do fenômeno psicológico. E isto é uma questão
importante, porque é desta “descolagem” que se constitui o processo ideológico
da psicologia. Passamos a contribuir significativamente para ocultar os aspectos
sociais do processo de construção do fenômeno psicológico em cada um de nós.
Fazemos ideologia (BOCK, 2004, p. 6).

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A psicologia não tem sido capaz de, ao falar do fenômeno psicológico, falar de
vida, das condições econômicas, sociais e culturais nas quais se inserem os
homens. A psicologia tem, ao contrário, contribuído significativamente para
ocultar estas condições. Fala-se da mãe e do pai sem falar da família como
instituição social marcada historicamente pela apropriação dos sujeitos; fala-se
da sexualidade sem falar da tradição judaico-cristã de repressão à sexualidade;
fala-se da identidade das mulheres sem se falar das características machistas de
nossa cultura; fala-se do corpo sem inseri-lo na cultura; fala-se de habilidade e
aptidões de um sujeito sem se falar das suas reais possibilidades de acesso à
cultura; fala-se do homem sem falar do trabalho; fala-se do psicólogo sem falar do
cultural e do social. Na verdade, não se fala de nada. Faz-se ideologia! (BOCK,
2004, p. 7).

É hora de rompermos. É hora de fazermos a crítica contundente a esta


perspectiva liberal de homem. É hora de abandonarmos definitivamente as visões
naturalizantes de homem e de mundo, adotando perspectivas históricas (BOCK,
2004, p. 9).

Pensar esse processo de construção da subjetividade como um movimento e uma


relação do homem com o mundo, no qual nem homem nem mundo existem a priori
(em um certo sentido), é superar visões naturalizantes e ideológicas na Psicologia.
O mundo psicológico que estudamos não é natural; não está lá pronto; não possui
conteúdos universais, nem processos e estruturas prontas para serem
movimentadas ou preenchidas (BOCK, 2004, p. 9).

Ao mesmo tempo que esta tarefa, de definirmos o projeto de nossa intervenção, se


coloca como obrigatória, outro ganho acontece. Passamos a nos ver, como
profissionais, que através de nossas intervenções atuamos no mundo; mudamos
o mundo; nos objetivamos no mundo. Nos vemos, então, como sujeitos que
transformam o mundo a partir de sua prática profissional. Isto passa a exigir que
façamos de nosso projeto profissional, um projeto político, de construção do
âmbito coletivo (BOCK, 2004, p. 10).

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Portanto, gostaríamos de colocar aqui uma conclusão parcial de nossa reflexão:


compromisso com a sociedade a Psicologia sempre manteve, mas seu compromisso
foi, na maior parte do tempo, um compromisso com as elites e seus interesses. O
novo projeto de profissão significa um rompimento com esta tradição e a
construção de um novo lugar para a Psicologia; a construção de uma nova relação
da Psicologia com a sociedade. Queremos uma Psicologia a serviço dos interesses
da maioria da sociedade; uma psicologia acessível a todos. Este novo
compromisso que queremos manter com a sociedade exige que enfrentemos alguns
desafios teóricos e práticos, de velhas concepções que ainda não foram superadas
(BOCK, 2008, p. 3).

Em meu estudo de doutorado, sobre a concepção de fenômeno psicológico entre os


psicólogos, encontrei entre a maioria dos psicólogos uma noção que equipara o
fenômeno psicológico com um “verdadeiro eu”, ou seja, é mais verdadeiro que o
eu que aparece nas relações sociais, sendo este, em geral, resultado da negociação
feita pelo sujeito com o mundo social, para dar conta dos interesses e desejos do
“eu verdadeiro” (BOCK, 2008, p. 3).

Como o mundo psicológico tem destino traçado, porque está visto sob uma
perspectiva naturalizante, a prática profissional dos psicólogos surge como algo
que dá suporte a este desenvolvimento, reencaminhando para o “seu trilho”
quando algo provoca um desvio. Nossa missão é sublime! Temos uma missão que
conserta o que a natureza planejou e o que a sociedade desviou (BOCK, 2008, p.
3).

E aí chegamos à Psicologia Sócio-Histórica: uma perspectiva em Psicologia que


faz da crítica às concepções naturalizantes sua principal tarefa. O ser humano
precisa ser pensado a partir de outra perspectiva que tenha a historicidade como
uma de suas principais características (BOCK, 2008, p. 4).

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A Psicologia que ensinamos ainda é aquela que se fundamenta em perspectivas


universalizantes e naturalizantes da subjetividade. Idéias que pensavam o homem
como um ser natural, dotado de capacidades e características da espécie e que,
inserido em um meio adequado, poderia ter seu desenvolvimento (BOCK, 2008, p.
4).

CATEGORIAS ANALÍTICAS.

Todos os trechos são provenientes de artigos, segue a lista: A perspectiva sócio-histórica de


Leontiev e a crítica à naturalização da formação do ser humano: a adolescência em questão
(2004), A perspectiva histórica da subjetividade: uma exigência para la psicologia atual (2004),
O compromisso social da psicologia: contribuições da perspectiva sócio-histórica (2008) e A
Psicologia a caminho do novo século: identidade profissional e compromisso social (1999). Os
temas identificados foram produzidos a partir das palavras em negrito dos trechos acima,
expressões como:

Aspecto Inato do Ser Humano: Verdadeiro Eu, Segredos, Mecanismos Naturais,


Visões Naturalizantes, Concepções Naturalizantes e Universalizantes.

A Psicologia Descomprometida com a Sociedade: Os psicólogos se puderam de


costa para a realidade social, A psicologia contribui significativamente para
ocultar as condições de desigualdade, Psicologia descolada da realidade social,
Descolagem que se constitui o processo ideológico da psicologia, Uma psicologia
acessível a todos, Nova relação da psicologia com a sociedade.

Esperança: O projeto da profissão, Passamos a nos ver como profissionais que


através de nossas intervenções atuamos no mundo, O projeto de nossa intervenção,
Nós mudamos o mundo, Nos vemos como sujeitos que transformam o mundo, O
projeto profissional, A construção de um âmbito coletivo, Queremos uma
psicologia a serviço dos interesses da maioria da sociedade e O ser humano
precisa.

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Tarefa da Sócio-Histórica: É hora de fazermos a crítica contundente, É hora


rompermos, Rompimento com esta tradição, E aí chegamos à Psicologia Sócio-
Histórica: Uma perspectiva que faz da crítica às concepções naturalizantes sua
principal tarefa.

Tradição Psicológica: Os trabalhadores perdem suas mãos nas máquinas devido a


pulsões de morte ou coisa que o valha, Tais perspectivas, Fazemos ideologia, Não
se fala de nada. Faz-se ideologia!, De velhas concepções que ainda não foram
superadas.

Compromisso: Compromisso com a Sociedade e Novo lugar para a Psicologia.

As próximas categorias, foram identificadas diretamente por meio do texto da autora, quando
à mesma relata sobre a sua tese de doutorado:

Chavões: Biopsicossocial - Relação entre Agente e Sujeito - Fenômeno que Envolve


a Interação entre Pessoas.

Visões Dicotômicas: Manifestação do aparelho psíquico, o homem e a relação com


o meio, individualidade, consciência, subjetividade, existência intersubjetiva,
eventos estruturantes, comportamento, motivação, habilidades e potencialidades.

Visões Dicotômicas, Outras: Acontecimento Organísmico, Manifestação do


Homem, Pensar e Sentir o Mundo, Saber-se Indivíduo, O Que Se Mostra, Funções
Egóicas, Experiências, Vivencias, O Próprio Homem, Psique, Pensamento,
Sensação, Emoção e Expressão, Entendimento de Si e do Mundo, Manifestação da
Vida Mental, Consciência e Inconsciência, Tudo que é Percebido pelos Sentidos,
Experiências (BOCK, 1999, p. 173).

Poderíamos desse modo dividir as 9 categorias em dois grupos. A Psicologia Sócio-


Histórica em: Esperança - Compromisso - Tarefa da Sócio-Histórica e Outras abordagens em:

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Aspecto Inato do Ser Humano - A Psicologia Descomprometida com a Sociedade e Tradição


Psicológica.

As categorias Chavões, Visões Dicotômicas e Visões Dicotômicas, Outras. Podem produzir


um segundo agrupamento linguístico que se referem, à abordagens psicológicas, e nesse sentido
podemos compreender, ao que, exatamente a autora se refere, vejamos:

Psicanálise: Manifestação do Aparelho Psíquico, Funções Egóicas,


Acontecimentos Organísmico, Psique, Consciência e Inconsciência, Habilidades e
Potencialidades.

Construtivismo: Entendimento de Si e do Mundo, Fenômeno que Envolve a


Interação Entre Pessoas, Relação entre Agente e Sujeito, Existência Intersubjetiva,
O Homem e a Relação com o Meio, Biopsicossocial.

Psicologia Comportamental: Comportamento.

Fenomenologia: Consciência, O que Se Mostra, Manifestação do Homem,


Manifestação da Vida Mental

Existencialismo: Experiências, Vivencias, Pensar e Sentir o Mundo, Saber-se


Indivíduo.

Psicologia Cognitiva: Sensação, Percepção, Pensamento, Sentidos, Expressão,


Eventos Estruturantes, Motivação.

COLETA DE DADOS: CARACTERÍSTICA PSICOLÓGICA.

Nesta parte será feita o empreendimento de compreender a lógica do pensamento que foi
utilizada no processo de produção do conhecimento, se intui nesse sentido entender a dinâmica
subjacente aos elementos constituintes da teoria da abordagem Sócio-Histórica, por meio da
representante estudada.

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ANÁLISE DA TESE DE DOUTORADO E APLICAÇÃO DAS CATEGORIAS


ANALÍTICAS

A concepção dos psicólogos em relação ao fenômeno psicológico é descrita da seguinte


maneira "No entanto, é vista como uma relação na qual o "externo" (mundo social) impede e
dificulta o pleno e livre desenvolvimento de nosso mundo "interno" (psicológico) (BOCK, 2004,
p. 5). Seria importante ter a tese de doutorado da autora para colher maiores informações sobre o
que realmente pensam os psicólogos, no entanto não é possível, pois não foi encontrado no banco
de dados, além disso se questiona como a mesma pode inferir tal afirmativa pelas evidencias
colhidas, sugere-se que a pesquisa foi mais quantitativa, do que qualitativa "Na publicação de tese
de doutorado, Bock relata que encontrou em questionário aplicados a psicólogos, muitas definições
para o fenômeno psicológico (BOCK, 2004, p. 4). Nesse sentido pode-se dizer que a mesma inferiu
tal concepção a partir dos questionários (respostas assertivas), o que é complicado em termos
metodológicos de análise, pois como pode-se dar uma resposta qualitativa por meio de dados
quantitativos, além disso vimos o enquadramento de todas essas abordagens, até mesmo daquelas
"Construtivistas", como sendo vertentes "dicotômicas" e "chavões", além do mais, alguns
psicólogos responderam "Entendimento de Si e do Mundo", "Fenômeno que Envolve a Interação
entre Pessoas", " Relação entre Agente e Sujeito", "existência intersubjetiva" e "o homem e a
relação com o meio". Ainda sim todas essas respostas foram enquadradas como sendo
"dicotômicas" o que é contraditório num certo sentido, pois em matriz todas essas respostas,
contém uma base de pensamento "construtivista", não havendo assim por dizer uma divisão. Com
relação a resposta "Comportamento", pode se supor que este psicólogo seja comportamental, ainda
sim tal abordagem não é dicotômica, pois as características colocadas por Skinner em sua
concepção de ser humano, isto é, em sua ontologia é coerente, tendo um aspecto Filogenético
(biológico-espécie), ontogenético (desenvolvimento do próprio indivíduo/sua história) e
Sociogenético (Culturais) (MOREIRA, 2009).
Alguns psicólogos, disseram "Manifestação do aparelho psíquico", "Acontecimento
Organísmico", "Funções Egóicas", "Psique", " Consciência e Inconsciência", nesta parte é provável
que sejam psicanalistas, Junguianos, Freudianos e Reichianos. Como demonstrei no início a
psicanálise tem uma concepção de história, e envolve na sua concepção de ser humano, a interação
com o meio. Outros disseram "consciência", "Manifestação do Homem", "Pensar e Sentir o
Mundo", "Saber-se Indivíduo", "O Que Se Mostra", "Experiências", "Vivencias" e "Entendimento
de Si e do Mundo", o que me parece ser característico de abordagens que trabalham o "aqui-e-
agora" e o "futuro", isto é, perspectivas existencialistas e fenomenológicas, dependendo da linha
de pensamento, como SARTRE (1963), se vislumbra um aspecto histórico, é nítido que existem

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algumas relações entre materialismo dialético e o existencialismo Sartriano. Outros psicólogos


afirmaram "Sensação, Percepção, Pensamento, Sentidos", o que é característico de abordagens da
Psicologia Cognitiva, no entanto com relação à esta não tenho nada afirmar, o mesmo serve para a
Fenomenologia. Com este exame podemos concluir que em relação abordagem Psicanalítica,
Comportamental, Construtivista, o que concerne mais ou menos 60% da pesquisa da autora, foi
considerado como dicotômico, mesmo não o sendo, com relação a abordagem Fenomenológica e
Cognitiva, isto perfaz os outros 40% e suponhamos que sejam hipoteticamente dicotômicas, não
seria ao mínimo um equívoco generalizar como uma totalidade 40%? Além disso suponhamos que
seja 80%, e reste apenas abordagem "construtivista" que se assemelha a Sócio-Histórica, ainda sim,
para um estudo que se diz quantitativo e qualitativo, não seria impreciso?

Além do mais, é importante se perguntar, o do por que a autora considera todas as abordagens
"dicotômicas", tendo em mente que demonstrei o contrário. E me pergunto novamente, por que
será que considerou dicotômico? A questão é a seguinte: Quando diz que essas abordagens são
dicotômicas não está se referindo, àquilo que expus como sendo "concepção de ser", muito pelo
contrário, quando diz dicotômico não é a teoria, e a pergunta deve ser reformulada do seguinte
modo: As abordagens são dicotômicas em relação, à que e a quem? E a resposta é: São dicotômicas
em relação ao Social. Mas como isto é possível? A resposta do enigma se encontra na resposta dos
profissionais, como identifiquei, existe ali psicólogos Cognitivos, Comportamentais, Reichianos,
Junguianos, Existencialistas, Fenomenológicos, Freudianos. Ora essa, esses psicólogos, não são
psicólogos sociais, são clínicos! Na perspectiva da autora eles são dicotômicos, por que são clínicos
"dividem o indivíduo e o social", não me parece que tenha feito uma análise da perspectiva teórica,
mas da profissão. São dicotômicos por que trabalham em clínicas, e por isto, do enquadramento de
todos "seja lá qual for a conceituação" como percebendo a "dificuldade no desenvolvimento
psicológico em relação ao meio". Esta pesquisa não foi feita com psicólogos comunitários, sociais,
hospitalares, que trabalham com saúde coletiva. Nessa via, generalizou o pensamento do psicólogo
no Brasil, por meio de uma pesquisa clínica, quantitativa, inferindo colocações qualitativas e ainda
se referindo à uma naturalização do psiquismo, por meio das respostas "vida mental, distúrbio,
loucura, conflitos pulsonais (BOCK, 2004, p. 4). É mais do que evidente que iriam responder isto,
trabalham com tratamento individual. Se objetivo fosse, compreender a noção dos psicólogos com
relação ao desenvolvimento social e cultural, deveria ter feito a pesquisa com psicólogos sociais
(pois como sabemos, existem modos de atuação e de se pensar determinado fenômeno, não se
pensa um paciente clínico, do mesmo modo que se pensa um adolescente em condição de
vulnerabilidade socioeconômica em alguma fundação de reabilitação ou reinserção psicossocial),
e evidentemente encontraria a maioria deles na perspectiva Sócio-Histórica ou com raciocínio
diferente do clínico, pois o Brasil é de tradição Social, e se não Sócio Histórico, de Psicologia
Tradicional Gestalt (O que não é, negativo). A validade científica da pesquisa é posta em questão
(e ainda não falamos das implicações sociais, no meio acadêmico de tais colocações), como

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exposto a contradição é demonstrada por meio dessa análise textual. Nesse sentido, me pergunto,
será que tais psicólogos são sociais? Comportamentais, Cognitivistas, Existencialistas,
Psicanalistas? Talvez pesquisou alguns da categoria "construtivistas", mas ainda sim
"naturalizantes", como todos o são. Nessa via quando autora fez a pesquisa, será que não tinha
conhecimento, que caso pesquisa-se psicólogos sociais, iria se confrontar com a maioria
esmagadora de vertente Sócio-Histórica? E não iria fazer suposições como "As idéias
naturalizadoras do liberalismo serão responsáveis pela concepção de fenômeno psicológico que se
tornará dominante na Psicologia" (BOCK, 2004, p. 5). Me indago, se não havia ao menos um pouco
de conhecimento, haja vista a investigação foi feita em meados de 90, quando a Psicologia Social
está no auge, o pior disso é ao contrário (o que é pior). E se tivesse conhecimento, e ainda sim
prosseguiu com a pesquisa com psicólogos clínicos? Eu diria, que é melhor acreditarmos, que não
tinha.

É importante fazer uma observação não em relação a esta última hipótese de caráter, mas ao
menos, as pressuposições levantadas ao início sobre a consistência e coerência teórica do trabalho.
Pois, de acordo com o desvendado nessa análise textual, é perceptível incongruências não só
teóricas, mas até mesmo, de metodologia de pesquisa.

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CAPÍTULO IV - A DESCONSTRUÇÃO DE UMA PSICOLOGIA "CRÍTICA" E A


IMERSÃO DE UMA PSICOLOGIA SOCIAL CIENTÍFICA.

TRECHO À SER ANALISADO.

E aqui cabe falarmos da relação deste fenômeno psicológico com o meio social e
cultural. Esta relação é afirmada como necessária e importante por muitos
psicólogos; no entanto, é vista como uma relação na qual o “externo”(mundo
social) impede e dificulta o pleno e livre desenvolvimento de nosso mundo
“interno”(psicológico). O mundo social é um mundo estranho ao nosso eu. Um
lugar, no qual temos que estar e por isto nos resta a tarefa de nos adaptarmos. E a
história deste aparato psicológico passa a ser a história da sua adaptação ao
mundo social, cultural e econômico. Trabalhar, relacionar-se, aprender, fazer são
atividades desta adaptação. Amar, emocionar-se, perceber, motivar-se são vistas
também como possibilidades humanas que se desenvolvem, ou melhor, se
atualizam(pois já eram potencializadas) neste mundo externo. Um fenômeno
abstrato, visto como característica humana. Um fenômeno que existe em nós, como
estrutura, processo, expressão, ou qualquer de suas conceituações, porque somos
humanos e ele pertence a nossa natureza. Fica então naturalizado o fenômeno
psicológico. Algo que lá está como possibilidade, quando nascemos; algo que
deverá ser fertilizado por afeto, estimulações adequadas e boas condições de vida,
mas que lá está, pronto para desabrochar (BOCK, 2004, p. 5).

"O MUNDO SOCIAL É UM MUNDO ESTRANHO AO NOSSO EU. UM LUGAR,


NO QUAL TEMOS QUE ESTAR E POR ISTO NOS RESTA A TAREFA DE NOS
ADAPTARMOS".

O sentido colocado da palavra "adaptação", é provável que seja referente "ao sujeito se
adequar ao meio", dadas as configurações sociais, nas quais vivemos, nada mais, do que necessário.
Mas é importante lembrar que adaptação não se refere apenas ao sujeito em relação ao meio, mas
também nessa dinâmica relacional, entre sujeito e meio, pois qualquer forma de deficiência, não é
individual, mas sim relacional (ROCHA, 1999). Nesse sentido, tal argumentação não foge a sua
coerência, mas ainda, é possível supor que "adaptação" à qual os psicólogos se referem, são de

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demandas clínicas específicas, e não de saúde pública, e pergunta-se a um clínico "Qual sua
concepção de ambiente" e a resposta "propor condições, nas quais o sujeito possa se adaptar ao seu
meio", por sua vez quem pergunta é de abordagem Sócio-Histórica, nesse sentido, a resposta de
adaptação do clínico, não corresponde a concepção de quem pergunta (até por que, os propósitos
de um psicólogo clínico e social são diferentes), mas não por ser equívoca, mas sim pela inclinação
com relação a sua própria perspectiva, tendo como referencial apenas a si próprio, o outro se torna
incorreto, o que poderia assinalar o "encaixotamento" de todas abordagens como sendo
"naturalizantes".

"AMAR, EMOCIONAR-SE, PERCEBER, MOTIVAR-SE SÃO VISTAS TAMBÉM


COMO POSSIBILIDADES HUMANAS QUE SE DESENVOLVEM".

De início, eu diria o seguinte, que "perceber/percepção, motivar-se/motivação e emoção" são


processos psicológicos básicos (MYERS, 2006). Enquanto que "amar" é um sentimento, sendo
portanto um processo elementar do ser humano, não apenas deste. Em segundo plano diria, que
tais processos psicológicos são universais em sua estrutura, o que se altera são os significados de
cultura para cultura. O amor por exemplo se transformou ao decorrer da história, desde do "O
Banquete" de Platão (1971), onde encontra-se por exemplo 7 definições de amor, não obstante, tais
amores não se remetem ao mesmo "afeto". O amor Ágape, Eros, Philia se remetem a diferentes
formas de emoção, um corresponde ao amor incondicional, o outro a paixão e o terceiro amizade.
No senso comum, as pessoas chamam de amor, o "amor de mãe" que seria o incondicional, o
segundo de "amor fatal" e o terceiro, do modo paradoxal se confundido com o segundo de "eterna
paixão". Mas, tudo se refere à "amor", ninguém irá dizer, "o meu amor por você é Ágape minha
mãe", diz-se na verdade "eu te amo", do mesmo modo que se diz, para o amor fatal e a eterna
paixão, sendo assim modos descritivos, de se dizer da qualidade do amor. Nesse sentido o processo
psicológico básico do afeto é existente em si, o que se alteram são as significações que se dá para
cada afeto, do mesmo modo, que "amor de mãe" no Brasil, pode ser diferente do afeto de "amor
de mãe" no Japão. Além disso a percepção não é uma potencialidade por que é inexorável, quando
organismo se estabelece, como sendo, mesmo que haja alguma deficiência, existe uma percepção
pelo fato da consciência de si, e mesmo no caso de doenças mentais, existe uma percepção de
mundo. A motivação e a emoção por sua vez, é fidedigno dizer, que são processos universais dos
seres humanos (e até dos animais, discutirei com referencias bibliográficos, em capítulos
posteriores). O que se altera nesse sentido, são as representações que são acopladas à esses
processos, variando de cultura para cultura (ULLMANN, 1991). Isto por que não entrarei na
questão da biologia das emoções, como o amor sendo uma derivação da secreção de ocitocina,
denominado de "hormonio do amor" (ALVES, 2013) adaptação de um processo evolutivo, onde

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houvera transformações orgânicas na espécie, como mecanismo de sobrevivência da prole, talvez


pelo fato das mães se desgarrarem dos filhos, e os deixarem à mercê da morte na pré-história.

"OU MELHOR, SE ATUALIZAM (POIS JÁ ERAM POTENCIALIZADAS) NESTE


MUNDO EXTERNO".

A frase corrobora a hipótese inicial que apontamos, do sujeito como produto do meio, não
contendo em si próprio nada que o possibilite ter "alternativas". A questão da "potencialidade" é
óbvio que não podemos considerar, que o sujeito se desenvolverá, apenas por que existe um
ambiente propício, deve-se considerar outros fatores na constituição do sujeito. Nessa via, se não
devemos considerar que o ambiente "propício" é garantia de um pleno desenvolvimento, também
não podemos considerar o polo negativo, que o ambiente como um todo, isto é, nas condições
materiais impróprias, iram determinar o insucesso, por que como dito, existem outros fatores, que
não são apenas restrito ao ambiente ou a "condição histórico-material". Nesse sentido é
conveniente uma citação sobre a substancia de Lukács:

À medida que a sociedade se desenvolve, o indivíduo ganha uma substância pessoal


que pode ser abstratamente expressa mediante a autoconsciência da própria indi-
vidualidade humana. Essa expressão é parte do movimento do seu fazer-se homem
e na realidade resulta do movimento real de sociabilidade e de individuação pelo
qual evolui de mera singularidade até transformar-se em individualidade e
personalidade (DA COSTA, 2007, p. 47).

[...] agora já podemos registrar algo que, na verdade, não poderíamos deixar de
ter Indivíduo e Sociedade presente: o inevitável e ativo – justamente nas coisas
mais concretas – influxo do ser social sobre as mais íntimas, mais pessoais, formas
de pensamento, de sensibilidade, de ações e de reações de todo indivíduo humano
(LUKÁCS, p.260 apud DA COSTA, 2007, p. 47)

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Na medida em que o conceito de substância não se contrapõe ao de continuidade,


constitui indício de que ontologicamente o ser tende à historicidade como parte do
seu próprio movimento interno. Isto torna mais claras as reflexões citadas
anteriormente pelo autor, quanto ao conceito de substância ontologicamente
definido como “universal e, ao mesmo tempo, histórico”, que nem se caracteriza
como dado a priori nem se dilui na esfera dos fenômenos Lukács conecta a
constituição da substância da individualidade à alternativa expressa nas escolhas-
decisões do indivíduo concreto ante uma situação efetivamente concreta. Processo
no qual se configura sua própria história pessoal (DA COSTA, 2007, p. 49). Neste
ponto, acrescenta:

Do mesmo modo pelo qual o ser social se constrói com essas cadeias de decisões
alternativas, entrecruzadas de várias maneiras, assim também a vida singular do
indivíduo é composta pela sua sucessão e derivação uma da outra (LUKÁCS, 1981,
p.261 apud DA COSTA, 2007, 49-50).

A questão da alternativa também comparece, como sendo necessário ser expresso:

Como mediação necessária à criação do novo, a alternativa age desde as formas


mais simples do trabalho. Constitui os atos de escolha dos homens na realização
das suas atividades diante das possíveis alternativas para cada situação concreta
ante o desafio da matéria natural. A decisão entre alternativas existentes permite à
consciência transformar em ato aquilo que potencialmente está contido na prévia
ideação do sujeito. Neste sentido, a alternativa está ligada à possibilidade de trans-
formação de algo ainda não existente em existente (DA COSTA, 2007, p. 50). Ou
seja:

Um projeto, por mais complexo e delineado com base em reflexos corretos, mas
que seja rejeitado, permanece um não existente (Nitchtsiendes), obstante esconde
em si a possibilidade de se tornar um existente (Seiendes). Em substância, portanto,
apenas a alternativa daquela pessoa (ou daquele coletivo de pessoas) que é
requerida para colocar em movimento o processo de realização material mediante
o trabalho, pode atualizar esta transformação da potencialidade em existente
(LUKÁCS, p. 47 apud DA COSTA, 2007, p. 50-51).

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O projeto idealizado pelo sujeito é posto em movimento por decisões alternativas


de pessoas ou grupos, cuja dinâmica é bastante complexa. Consiste em “uma
ininterrupta cadeia temporal de alternativas sempre novas, na qual opera um
sistema de reflexos, dinamicamente elaborado e contraditório” (p.45). Todo
processo de escolha no trabalho constitui uma sequência bastante numerosa de
decisões alternativas. Requer sempre novas decisões que se apoiam sobre as
anteriores, ampliando mais e mais as mediações no sistema de decisão (DA
COSTA, 2007, p. 51).

Dessa declaração deriva que a personalidade só pode ser concreta e, como tal,
socialmente posta, do ponto de vista que ela se revela nas decisões tomadas pelos
indivíduos. O indivíduo guarda em si um grande número de possibilidades que
podem ou não se tornar realizações, “mas o seu verdadeiro caráter se realiza, no
seu ser- precisamente-assim, justamente quando e porque traduz em ato uma certa
possibilidade, e não outra” (LUKÁCS, p.262 apud DA COSTA, 2007, p. 52).

De modo que nas escolhas entre alternativas existentes se revela a personalidade


de alguém; sua realização se traduz precisamente em momento da exteriorização
do sujeito como pessoa e aí adquire realmente o caráter de ser social. A
complexidade do indivíduo comporta em si a possibilidade, no sentido aristotélico
do termo, de transformar essa mesma potencialidade em ato, visto que superá-la
depende de uma decisão alternativa. Mas a interrogação que permanece consiste
em saber se será aceita ou negada, se irá transformar-se em ação ou se
permanecerá uma mera possibilidade. Somente quando a escolha realiza a pos-
sibilidade ela se traduz em continuidade do próprio processo interior da
individualidade. Assim, o autor afirma: “A substância de um indivíduo é, portanto,
aquilo que no curso da sua vida se compõe como continuidade, direção, qualidade
da ininterrupta cadeia destas decisões” (p.262 apud DA COSTA, 2007, p. 53). Ou
seja, a permanência na mudança que caracteriza a dinâmica de sua personalidade
consiste na síntese constituída pela contínua cadeia das decisões tomadas ao longo
da vida, traduzida em continuidade, direção e qualidade destas mesmas decisões.
Temos aí resolutivamente estabelecida a relação entre personalidade, substância e
alternativa, formando um quadro da concepção de Lukács sobre a personalidade
humana (DA COSTA, 2007, p. 52-53).

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O autor adverte também que se quisermos “compreender corretamente em termos


ontológicos o indivíduo, é necessário nunca esquecer que estas decisões
determinam ininterruptamente a sua essência, a dirigirem para uma elevação ou
para um rebaixamento” (p.262 apud DA COSTA, 2007, p. 53). Ou seja, pode
significar um avanço ou um retrocesso da sua individualidade em relação ao para-
si do gênero humano. Deste modo, a cadeia de decisões que formam o quadro das
escolhas dos indivíduos impulsiona e determina a sua essência, mas a direção e a
qualidade desse continuum tanto pode rebaixar conduzindo para uma ruína do
indivíduo como pessoa, como pode elevar a personalidade a patamares superiores
de consciência em direção a uma autêntica generidade (DA COSTA, 2007, p. 53).
Ainda sobre a concreção da cadeia de decisões alternativas e seu caráter de
finalidade particular, quando se trata de uma atividade artística como a pintura,
por exemplo, Lukács comenta que a alternativa não reside na escolha do pintor se
deve pintar um ou outro quadro; ela está presente em cada pincelada “e quando
ele a tem como aquisição crítica, utilizando-a para a pincelada sucessiva, revela
com a máxima evidência o que representa a sua pessoa do ponto de vista artístico”
(p.262 apud DA COSTA, 2007, p. 53). O autor então diz que “isto vale, em sentido
ontológico geral, para cada atividade humana e para toda relação entre
indivíduos” (p.262 apud DA COSTA, 2007, p. 53). Deste modo, a personalidade do
homem exprime-se em cada um dos seus atos pela capacidade que este apresenta
de avaliar criticamente cada passo dado; essa avaliação é de terminante para as
escolhas que ele faz ao longo de sua vida. Isso se realiza nas suas múltiplas
atividades e nas suas relações (DA COSTA, 2007, p. 53-54).

As escolhas dos indivíduos são sempre respostas práticas aos desafios que a vida
social lhes impõe. Os próprios sentimentos e pensamentos que preparam as
decisões são também socialmente determinados pelas circunstâncias de classe,
estamento, família, das quais fazem parte. Tem-se, portanto, que a reprodução do
indivíduo é determinada pelas condições de sua existência desde o momento de seu
nascimento e ao longo de sua vida. As respostas elaboradas por ele se encontram
em íntima relação com as demandas que lhe são formuladas pelas circunstâncias
nas quais vive e age. Em consequência, o seu desenvolvimento individual e interior
é o resultado da trama de demandas e respostas que implica decisões ante as
alternativas socialmente determinadas (DA COSTA, 2007, p. 55)

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Convém realçar novamente aqui que o retorno da exteriorização sobre os


indivíduos, ou melhor, “sobre os sujeitos do trabalho é por princípio diversificado”
(p.565 apud DA COSTA, 2007, p. 55) e impulsiona para a variedade de
comportamentos individuais. Além do que a individuação, como todo processo
social, é determinada socialmente, mas na sua dinâmica imediata permite ao
indivíduo “manter-se no controle de uma ampla vida própria” (Lukács, 1990, p.64
apud DA COSTA, 2007, p. 55), o que assegura a ele certa autonomia na direção de
seu destino pessoal. Deste modo, como veremos logo mais, a determinação social
das circunstâncias não pode ser absoluta no desenvolvimento interno dos sujeitos
individuais. Na trama de demandas e respostas às alternativas socialmente criadas,
o comportamento dos indivíduos implica atos de consciência a partir de um variado
campo de possibilidades que pode ir além das suas escolhas impostas simplesmente
pelas condições de classe etc. Portanto, a decisão entre alternativas não significa
nem expressão de liberdade puramente individual, nem meramente uma
determinação fixa socialmente de uma vez por todas. Ao indivíduo resta sempre a
possibilidade de uma escolha avaliada segundo a sua consciência ante as
condições de uma situação concreta (DA COSTA, 2007, p. 55-56).

"UM FENÔMENO ABSTRATO, VISTO COMO CARACTERÍSTICA HUMANA"

Via de regra é incoerente dizer, que os processos psicológicos básicos são meramente "Um
fenômeno abstrato, visto como característica humana". Não apenas é uma característica humana,
como também é dos animais, haja vista que à destes, são tão complexas quanto, às dos seres
humanos. Tentei articular a questão com três ponto de vista, o leitor deverá concordar que as
articulações produzidas se complementam. Sendo uma visão da ciência psicológica, da
antropologia e biologia. Não são apenas "abstrações" ou "criações humanas", são processos que se
constituem, numa relação complexa entre aspectos socioculturais, psicológicos e biológicos. Cada
uma dessas instancias tendo uma função, pois se uma criança é abandonada à selva, como visto ao
longo da história alguns casos, por exemplo de Amala e Kamala (SQUIRES, 1927) na índia, onde
essas duas crianças, que deixada aos cuidados de lobos, passaram a ter comportamentos
semelhantes, como ausência de linguagem verbal e forte tendência a irrupção de emoções
agressivas, isto sem dúvida ocorreu por conta de um fator ambiental, tornaram-se lobos. Mas é
importante pensar pela negativa, geralmente o lobo em si, tem algumas características, como
"audição apurada" e "visão aguçada" (HECKLER, 2011). Suponhamos que fosse uma criança com

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síndrome me down que até tempos atrás em 1950, a expectativa de vida era de 10 a 15 anos, hoje
a media chegando aos 50, por conta de diversos problemas fisiológicos como cardiovasculares,
indo até auditivos e de visão, como miopia (BUCKLEY, 2000). Esta criança se tornaria um "lobo"?
O caso é hipotético, mas é para ilustrar, que até mesmo para se tornar-se um "lobo" é necessário
um "aparato biológico", não torna-se lobo em "alguns anos em interação com o meio", é um
processo evolutivo de adaptação de milênios, não é apenas por fatores ambientais, são fatores
orgânicos em interação com o meio, que determinam o gene, e os genéticos determinam por sua
vez o meio novamente (caso das abelhas, que nascem sabendo fazer comeia), se reproduzindo na
espécie (filogeneticamente). Existe nesse sentido uma interação, entre os aspectos biológicos e
sociais, havendo uma inseparabilidade. Do mesmo modo, apenas torna-se "homem", se tiver um
aparato biológico de "homem", em outras palavras, um genoma humano, se não tiver, não é. Por
sua vez, torna-se golfinho se tiver aparato biológico de golfinho, este morre numa selva com leões,
e o leão da selva, morre no atlântico, pois sua fisiologia não corresponde ao biótopo marinho. É
necessário um ambiente que corresponda ao organismo, e que o organismo corresponda ao
ambiente, sem um, ou outro, é impossível o processo de constituição do ser, o aparato deve ser
correspondente ao ambiente, e o ambiente correspondente ao aparato. Os cães vivem conosco, a
milênios, desde da pré-história em constante interação não só com os instrumentos (arrastando
trenó), mas se relacionando-se afetivo-emocional (o cão melhor amigo do homem), nem por isto,
tornou-se homem, ainda que estivesse no mesmo ambiente. Tem de haver nesse sentido, "algo" no
homem, para tornar-se homem, o análogo ocorre com abelhas, tubarões, águias. O exemplo é muito
claro, o do cão (trenó), além disso é sabido na primatologia, que os símios constantemente se
utilizam de instrumentos, como varas e alguns afiam pontas, mas nem por isso, desenvolveram
consciência e tecnologia complexa (desenvolverei tal questão posteriormente com fundamentos
científicos), o que prova que o relacionamento com "instrumentos", não é unitariamente a causa da
cultura, muito menos ainda da consciência, como dito, existem outros fatores que serão discutidos.

"FICA ENTÃO NATURALIZADO O FENÔMENO PSICOLÓGICO. ALGO QUE


LÁ ESTÁ COMO POSSIBILIDADE, QUANDO NASCEMOS".

Ana Mercês Bahia Bock irá produzir um artigo em 2004 chamado "A Perspectiva Sócio-
Histórica de Leontiev e a Crítica à Naturalização da Formação do Ser Humano: A Adolescência
em Questão". Irei me deter apenas à questão da formação do ser humano, que é no caso o mais
importante e pertinente aos meus objetivos. Retirei de modo semelhante, partes do texto, com as
quais irei discutir. Vejamos:

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É Vigotski em seu texto “Internalização das funções psicológicas superiores”


(1994) que vai apresentar o desenvolvimento destas capacidades, a partir da
combinação entre o uso do instrumento (de trabalho) e do signo (atividade
psicológica). Essa combinação vai permitir que o homem vá além do imediato, por
meio de uma reconstrução interna de uma operação externa. Vigotski chamou a
esse processo de internalização. Segundo o autor: “A internalização das atividades
socialmente enraizadas e historicamente desenvolvidas constitui o aspecto
característico da psicologia humana; é a base do salto quantitativo da psicologia
animal para a psicologia humana” (Vigotski, 1994, p. 76 apud BOCK, 2004, p. 28).

E:

É Leontiev que traz então a explicação que se esperava: se o homem se libertou de


suas limitações biológicas e criou o humano, como essas características passam de
geração a geração se elas não podem fixar-se na herança genética? “Foi sob uma
forma absolutamente particular, forma que só aparece com a sociedade humana:
a dos fenômenos externos da cultura material e intelectual” (Leontiev, 1978, p. 265
apud BOCK, 2004, p. 28).

Nesse sentido, a genética é apenas uma característica do organismo humano, que se


desenvolveu ao decorrer da história, e que por sua vez, não exerce nenhuma função no processo
de desenvolvimento da espécie como ela é. Deve-se alegar o genoma humano como preponderante
no desenvolvimento do homem, caso um organismo não tenha o genoma humano, torna-se
homem? E nesse sentido se não é necessário um genoma específico, para um ambiente específico,
poderíamos dizer, que se deixarmos qualquer espécie animal, em determinados ambientes, os
mesmos, se desenvolvem e se adaptam ao ambiente, e desenvolvem as características e habilidades
correspondentes, puramente por conta dos fatores externos? Como eu havia dito, se colocarmos
um símio em sociedade, nem por isto desenvolve consciência complexa semelhante à do homem
puramente por conta dos instrumentos. Nós temos a percepção, de achar que a consciência é
originada puramente/unitariamente por conta da "cultura material e intelectual" como dito pelo
Leontiev. No entanto é sabido, que os primatas:

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Mas, mais ainda do que o fato de ser capaz de utilizar de forma elementar uma
linguagem não fonética e, evidentemente, não alfabética, verificou-se, pelo próprio
emprego dessa linguagem, que o chimpanzé jovem manifesta duas qualidades que
se julgavam firmemente dependentes da cultura e da inteligência humanas: a
consciência da sua própria identidade e o exercício da computação. Há um filme
rodado pelos Gardner que revela o primeiro aspecto, Washoe divertia-se muito
com um espelho; um dia, a assistente dos Gardner perguntou-lhe por gestos,
designando-lhe a imagem do espelho: “Quem é este?”, e Washoe respondeu: “Eu
(indicador apontado para o peito) Washoe (carícia numa das orelhas, significando
convencionalmente Washoe) (MORIN, 1973, p. 25).

E:

A consequência é importante e Moscovici aponta-a com clareza: «Estávamos


habituados à ideia de que a nossa fisiologia, a nossa anatomia, “descendem” das
dos primatas, mas devemo-nos habituar à ideia de que sucede o mesmo com o nosso
corpo social.» (Moscovici, 1972, p. 221 apud MORIN, 1973, p. 26).

A noção de que a "sociedade", o "homem", a "consciência", é um "constructo social", uma


"criação humana", e nós humanos, "inventamos", tudo o que nos rodeia, caí por terra. A
consciência no seu sentido basilar, não é um privilégio humano os símios às possuem, é lógico que
de modo elementar. Mas tal consciência, não foi obtida por meio da cultura, ouvindo Bach ou lendo
Goethe e Homero, por outro lado, é conhecido da ciência principalmente no campo da primatologia
a utilização de instrumentos por esses animais:

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Pratica ocasionalmente a caça e consegue ver-se que manifesta simultaneamente


cooperação e estratégia de cerco e de diversão na caça aos pequenos porcos
selvagens7. Serve-se ocasionalmente de paus, que brande contra adversários de
outra espécie e, ocasionalmente, dá forma a um utensílio, quer dizer, modifica um
objeto natural, como a espécie de armadilha de palha que introduz na termiteira
para aspirar térmites. Ocasionalmente, marcha ou corre sobre os membros
posteriores. Deste modo, como bem comentou Moscovici, o chimpanzé manifesta,
ocasionalmente, esporadicamente, alguns dos traços que até então se julgavam
específicos da espécie humana, porque nesta se tornaram centrais e permanentes:
a caça, a técnica, o bipedismo (MORIN, 1973, p. 24).

Nesse sentido, os primatas se utilizam de instrumento semelhantemente igual aos dos


homens, no entanto não existe uma consciência a nível semelhante dos homens, nessa via o
"instrumento" não é fator exclusivo de determinar ou não a consciência. Pois o homem é homem,
por conta de um genoma específico, portanto o ambiente não é fator exclusivo no desenvolvimento
da integralidade do ser. Por outro lado, os primatas não desenvolveram literatura, nem música, mas
tem a capacidade de apreender linguagem de libras e se comunicar, como foi demonstrado na
situação anterior, no entanto só é possível desenvolver tal habilidade, tendo um aparato biológico
semelhante ao do homem. Portanto a questão colocada da "cultura material e intelectual externa",
não corresponde aos achados contemporâneos da ciência. O homem de início tem de ter algo que
o possibilite a se desenvolver:

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Conceber a interação humana como troca leva também a conceber a subjetividade


como resultante de um processo de construção, de troca entre o organismo e o
meio, basicamente, entre o bebê e a mãe. Assim, pensar o que é do indivíduo (o
bebê, no caso) enquanto organismo leva a pensar nas condições mínimas
necessárias para que possa se estabelecer a interação. Como ponto de partida, a
concepção de Waddington: o genoma como um sistema ativo de "respostas" e
reorganizações, um sistema capaz de enfrentar o meio, utilizar seus recursos para
processar as informações que recebe. Isto é muito diferente de uma "tabula rasa".
Ao contrário, temos um organismo vivo, ativo, dinâmico, que "responde" interna e
externamente às informações recebidas do meio. É preciso, então, que o organismo
disponha das condições mínimas necessárias para que se possa estabelecer a
relação com o meio, inicialmente representado pela mãe. Entre essas condições
necessárias está a ausência de deficiências neurológicas que comprometam a
assimilação do dado externo, que o impeçam de estabelecer a relação com o meio-
objeto-mãe. Assim, dispondo de condições internas, digamos "normais", com
possibilidades de se desenvolver e encontrando um meio favorável o indivíduo
poderá, presumivelmente, construir sua identidade de forma bem estruturada e
saudável.
Entretanto, interno e externo tem que estar presentes. As condições do meio
também precisam ser adequadas a fim de propiciarem: a construção da
subjetividade. Quando o organismo-sujeito é dotado de condições para o
crescimento e tem que enfrentar um meio adverso, as vicissitudes pelas quais terá
que passar poderão deixar marcas profundas, verdadeiras fraturas em sua
personalidade. Neste caso, o crescimento pode ser tolhido em suas possibilidades
e o sujeito pode não alcançar o estado de integração que suas condições lhe
permitiriam. Ele pode até superar um meio adverso. O difícil e supor que isso não
deixará lacunas em sua personalidade. Por outro lado, o meio, por favorável e
adequado que seja, pode compensar, até certo ponto, uma estrutura de
personalidade mais frágil, estimulando o crescimento. O que ele não pode, de
qualquer forma, é proporcionar um desenvolvimento que vá além daquilo que o
organismo é capaz de receber. Isto significa que quando existem limitações
internas, constitucionais mesmo, elas podem ser atenuadas mas não ultrapassadas
por um meio extremamente favorável.

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A importância de pensar a interação enquanto troca é, do ponto de vista da


Psicologia Social, a possibilidade de contribuir para uma vida mais saudável.
Podemos levar em conta um organismo capaz, ou não de processar a informação
que recebe do meio. Capaz também de modificar o meio à medida em que processa
essa informação e que modifica a si próprio. Não é possível, neste processo de
interação, excluir ou desvalorizar nenhum dos elementos em questão: indivíduo e
meio têm assegurados seu lugar, sua especificidade e sua importância sem que um
se reduza ao outro. Isto equivale a admitir que o psicológico está presente no social,
que o biológico está presente no psicológico e que o social está presente no
psicológico. Entretanto, trata-se de ordens diferentes e uma não pode explicar a
outra, como aponta MERLEAU-PONTY (1975), ao tratar da ordem vital, da ordem
humana e da ordem social (DAMERGIAN, 1991, p. 69-70).

O homem nessa via, é concebido em sua totalidade e complexidade, afirmações do tipo que
a "sociedade é inventada" ou "criação humana", ou que a "genética é uma criação social", que a
"Psicologia Tradicional é Naturalizante", além de serem anticientíficas, é um desserviço para a
psicologia:
Tudo isto significa que a sociedade, concebida como organização complexa de
indivíduos diversos, baseada ao mesmo tempo na competição e na solidariedade,
comportando um sistema de comunicações rico, é um fenômeno extremamente
espalhado na natureza. Hoje já é possível conceber que a sociedade é uma das
formas fundamentais mais largamente espalhadas, desenvolvida de uma maneira
muito desigual mas muito variada, da auto-organização dos sistemas vivos. E,
assim, a sociedade humana surge como uma variante e um desenvolvimento
prodigioso do fenômeno o social natural e, assim, a sociologia - ciência humana -
perde a sua insularidade e passa a ser coroamento da sociologia geral - ciência
natural - (Moscovici, 1972 apud MORIN, 1973, p. 14)
Deste modo, as consequências da etologia e da sociologia animal são igualmente
mortais para o paradigma fechado do antropologismo. Chega-se à conclusão de
que nem a comunicação, nem o símbolo, nem o rito, são exclusividades humanas,
e de que têm raízes muito remotas na evolução das espécies.

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Da mesma maneira que é bem evidente que a espécie humana não inventou os
comportamentos de namoro e de submissão, a estruturação hierárquica do grupo,
ou a noção de território (Cosnier, 1969), também não deixa agora de ser menos
evidente que a sociedade não é uma invenção humana. Digamos mesmo que certas
características próprias das sociedades humanas (ligação ambígua e complexa
entre conflitos e solidariedades, entre oposições e complementaridades,
combinação de indivíduos diferentes num sistema de comunicação-organização) já
emergem em muitas sociedades animais. Já não se pode opor a ordem social
humana à desordem dos comportamentos animais; já não se podem opor as
incertezas complexas que reinam no seio das sociedades humanas (a parte de
variabilidades, de conflitos e de tensões que elas pressupõem) ao constrangimento
mecânico que reinaria nos grupos animais. Já existe, nas sociedades animais, e
designadamente nos mamíferos, uma ordem complexa que pressupõe uma certa
desordem ou “ruído” como ingrediente indispensável à sua própria complexidade.
Tudo isto, que apenas se esboça na etologia animal, surge subitamente nos
magníficos trabalhos de primatologia dos últimos dez anos. Desta vez, não muda
só a ideia de sociedade, mas muda igualmente a ideia de símio e a ideia de homem
(MORIN, 1973, p. 14).

O homem não é uma construção social, muito menos a sociedade, é interessante como pode
ser localizada a abordagem sócio-histórica, em diversos discursos, que dizem "O homem é
machista", como se a mulher também não fosse. A mulher é tão machista quanto o homem, pois
se coloca na posição de aceitação por meio de pequenos atos, a mulher se submete ao "machismo",
o feminismo foi um movimento importante iniciado de reivindicação de direitos, mas que
conforme as décadas, criou-se segregações no grupo, tendo aquilo que se denomina feminismo
radical, que tem a noção de que, não diferente da abordagem sócio-histórica, que as coisas
aconteceram numa mesa de bar, os homens numa certa feita, resolveram criar como as coisas
deveriam ser, aí disseram "Vamos criar a mulher desse jeito, faremos com que elas se comportem
de tal modo, os homens por sua vez deverá se comportar de tal maneira, e não aceitaremos quem
não é da nossa etnia, e iremos assim dominar o mundo, por que somos maus". A explicação da
abordagem sócio-histórica reduz a realidade social, a um aspecto moral e alega que somos
destituídos de uma biologia, e que existe um culpado por todas as mazelas humanas, que é o
"Capital" e a "Sociedade Burguesa", além de ser um reducionismo grotesco da teoria de Marx, não
apenas nessa concepção de Capital e Sociedade Burguesa, como também da Antropologia
Marxiana. As doenças mentais, nesse sentido tornam-se "criações sociais", as relações entre
homem e mulher, tornam-se "invenções" e as dificuldades de aprendizagem ou distúrbios

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neurológicos são considerados, noções "naturalizantes", isto ocorreu por um longo tempo na
história brasileira:

Em resumo, por muitos anos, a falta de testes psicométricos adaptados à população


dificultou o desenvolvimento de pesquisas e distanciou os psicólogos brasileiros da
psicometria. Por outro lado, as questões sociopolíticas relacionadas à existência
ou não de diferenças individuais dificultavam aceitação de fatores biológicos
determinantes da inteligência. Hoje, diversos trabalhos sugerem o papel da
genética para o desenvolvimento da inteligência. Estudos recentes com
equipamentos de ressonância magnética funcional já mostram que pessoas
inteligentes possivelmente utilizam menos energia e seus cérebros respondem mais
rápido que pessoas menos inteligentes (Gottfredson, 1999 apud ANDRADE, 2004,
p. 74).

As ideias que demonstrei ao longo desse estudo, sobre a forte conotação moral das
colocações de Bock, sendo mais de opinião do que ciência, é um prejuízo:

A psicologia não tem sido capaz de, ao falar do fenômeno psicológico, falar de
vida, das condições econômicas, sociais e culturais nas quais se inserem os homens.
A psicologia tem, ao contrário, contribuído significativamente para ocultar estas
condições (BOCK, 2004, p. 7).

Depois de tudo que foi exposto, com relação as concepções da Bock, é importante revisarmos
algumas colocações. "A psicologia tem ocultado estas condições"? Qual psicologia? Sócio-
Histórica? "Na verdade, não se fala de nada. Faz-se ideologia! (BOCK, 2004, p. 7). Realmente não
se fala de nada, faz-se propaganda "Queremos, com a perspectiva histórica na Psicologia, reverter
esse processo e nos comprometermos com outros setores da população (BOCK, 2004, p. 10).
Compromisso? Com quem? Nem com a própria psicologia no sentido literal de ciência, imagina-
se com a população. A única maneira de ajudar a população de modo eficiente é compreendendo
a realidade, e não imiscuindo-a em narrativas verborrágicas:

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Pensar desta forma a subjetividade nos coloca em uma outra relação com o mundo
social. Passamos a perceber a necessidade de nos posicionarmos sobre qual
homem e qual sociedade queremos estimular. Isto porque, passamos a pensar que
o mundo psicológico não está pronto e nem mesmo tem direção para seu
desenvolvimento dada naturalmente. Nossas intervenções profissionais são
portanto direcionamentos. Qual mundo queremos estimular? Qual sociedade?
Qual subjetividade? Qual homem? (BOCK, 2004, p. 10).

Considera-se as pessoas maleáveis a tal ponto? O que se oculta por de trás de tais "segredos"
ou "intenções" Bock? Voltarei agora, as questões mais científicas:

O trabalho e a vida em sociedade são duas características da vida humana que vão
permitir um salto de qualidade no desenvolvimento humano. O homem liberta-se
de suas limitações biológicas para “inventar” a condição humana. Queremos com
isso frisar a idéia de que as habilidades e os comportamentos humanos, a partir
daquele momento, não estavam mais previstos pelo código genético. Por isso
dizemos que o homem não estava mais submetido às leis biológicas e sim a leis
sócio-históricas (BOCK, 2004, p. 28).

A divisão entre "natureza" e "homem" não existe. O homem é um processo em


desenvolvimento de aspectos que são genéticos ou biológicos, sociais ou culturais e psicológicos
por sua vez. "As limitações biológicas"? O homem não é mais biológico então? Considerando que
existia um biológico, e que a cultura só foi possível a partir de tal aparato e que agora
"transcendeu", o homem abandonou a sua "carcaça natural" e tornou-se puro e racional? É isto?:

A antropologia da primeira metade do nosso século lançou-se exactamente no


sentido contrário, repudiando firmemente qualquer ligação com o “naturalismo”.
O espírito humano e a sociedade humana, únicos na natureza, devem encontrar a
sua inteligibilidade não só em si próprios, mas também como antítese de um
universo biológico sem espírito e sem sociedade.

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Ainda que objeto de ciência e dependente dos métodos próprios às outras ciências,
o homem permanece insular e a filiação que o liga a uma classe e a uma ordem
naturais – mamíferos, primatas - nunca é concebida como afiliação. Pelo contrário,
o antropologismo define o homem como oposto de animal; a cultura como oposto
de natureza; o reino humano, síntese de ordem e de liberdade, opõe-se tanto às
desordens naturais (“lei da selva”, pulsões não controladas) como aos mecanismos
cegos do instinto; a sociedade humana, maravilha de organização, define-se por
oposição aos ajuntamentos gregários, às hordas e aos bandos.

Deste modo, o mito humanista do homem sobrenatural reconstituiu-se no próprio


seio da antropologia e a oposição natureza/ cultura assumiu a forma de paradigma,
quer dizer, de modelo conceptual que dirige todos os seus discursos.
No entanto, esta dualidade antitética homem/animal, cultura/natureza, esbarra
contra toda a evidência: é evidente que O homem não é constituído por duas
camadas sobrepostas, uma bionatural e outra psicossocial, é evidente que não
transpôs nenhuma muralha da China que separasse a sua parte humana da sua
parte animal; é evidente que cada homem é uma totalidade biopsicossociológica.
E, desde que se encaram tais evidências, a antropologia insular suscita paradoxos
que não consegue superar: se o Homo sapiens surgiu bruscamente todo armado,
isto é, dotado de todas as suas potencialidades, como Atena nasceu do cérebro de
Zeus, mas de um Zeus inexistente, como Adão nasceu de Eloim, mas de um Eloim
recusado, nesse caso donde veio o homem? Se se concebe o ser biológico do
homem, não como produtor, mas como matéria-prima da qual se modela a cultura,
nesse caso, donde veio a cultura? Se o homem vive na cultura, mas trazendo em si
a natureza, como pode ser simultaneamente antinatural e natural? Como se pode
explicar isso a partir duma teoria que apenas se refere ao seu aspecto antinatural?
(MORIN, 1973, p. 4-5).

Aponta-se para o caráter pernicioso da abordagem Sócio-Histórica, principalmente a


representada neste estudo. Tudo que vá nesta direção reduzindo a psicologia ao social, ou o social
à psicologia, e destituindo o ser de qualquer biologia é prejudicial, e não pode ser validado como
científico. A questão da desigualdade social, pode ser vista na natureza também, e antes de qualquer
comentário tendencioso por parte de um leitor "crítico", isto não é uma maneira de legitimar a
desigualdade até por que é possível alteração, por conta da consciência e escolha, não obstante,
não podemos ser ingênuos e não olhar para a natureza e ver semelhanças. Não é julgar, muito
menos acolher, mas sim compreender e extrairmos lições que sirvam a condição humana:

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Como é sabido, a sociologia humana julgava-se sem precedente no mundo vivo, e


as únicas sociedades reconhecidas, as das formigas, das térmites e das abelhas,
pareciam não só exceções extraordinárias, mas também exemplos monstruosos de
anti-sociedade, por se basearem unicamente na obediência a um “instinto cego”
[...] É pela relacionação dos diversos dados evidenciados pela etologia que se pode
hoje constituir uma noção de sociedade. Esta sociedade arranja e defende,
evidentemente, a sua base territorial, estrutura-se hierarquicamente, mas essa
hierarquia resulta de competições e conflitos que se resolvem provisoriamente por
meio de relações interindividuais de submissão/dominação; estas últimas,
encadeadas umas nas outras, constituem precisamente a hierarquia. Ao mesmo
tempo, a sociedade implica solidariedades em relação a inimigos e a perigos
exteriores e suscita atividades de cooperação que são muitas vezes organizadas e
diferenciadas de forma subtil (MORIN, 1973, p. 13).

As relações de dominação/submissão regulam as relações hierárquicas entre as


“classes” e também entre os indivíduos. O princípio da dominação é complexo;
não é a potência sexual, como se julgou durante muito tempo, nem a pura força
física, nem a inteligência, que, por si sós, incitam ao poder e o obtêm. Uma vez que
o domínio social oferece plenos poderes, sexuais e “políticos”, e permite a livre
expansão pessoal, pode supor-se que o que incita ao poder é uma mescla obscura
e variável, muito difícil de analisar, como sucede com os humanos. Já se chegou a
dizer que o exercício do poder oscila entre dois pólos, o da agressividade e o do
exibicionismo. N o primeiro sentido, o chefe mantém a autoridade pela intimidação,
pela mímica da ameaça (threat behavior); no segundo sentido, pela repetição
histriônica da sua presença e da sua importância (MORIN, 1973, p. 15).

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A subordinação ainda é mais complexa do que a dominação, visto que, para o


subordinado, se trata de aceitar a sua sorte com o mínimo de danos possível.
Manifesta-se pelo comportamento de evitação, em que se procura não pisar o
caminho do chefe, pelos comportamentos de submissão, de complacência, de
servilismo (assim, o inferior que apresenta o traseiro ao macho dominante, à
maneira duma fêmea, imita a feminidade e a homossexualidade para exprimir os
seus sentimentos da maior devoção e respeito). Ainda há uma atitude mais
extraordinária, embora pareça bastante rara (Itani, Rowell, Hinde, Spencer, Both),
em que uma fêmea de estatuto médio sem filho, ou um macho também de “classe
média”, se oferecem para proteger e acariciar os filhos duma fêmea de estatuto
superior. O servilismo destas “tias” e “tios” temporários parece dissimular quer
o servilismo, quer a pequena ambição de subir um degrau, quer o prazer de servir
uma alta personalidade, ou, ainda, as três coisas ao mesmo tempo. Por outro lado,
verificasse que se dispõem à periferia ora indivíduos temporariamente solitários,
ora pequenos grupos de “semi-fora-da-lei” rejeitados, desviantes, marginais. Por
vezes, chega a acontecer que um rejeitado no exílio se associa a um companheiro,
com quem vai lutar, com vista à ascensão social (MORIN, 1973, p. 16).

Como acabamos de ver, não existe apenas a hierarquia coletiva de “classe”, mas
existe também a hierarquia individual de escalão, que se estabelece em função da
relação ameaça/evitação ou de servilismo, e, entre as fêmeas, em função do escalão
do respectivo macho. A cada escalão corresponde um estatuto, quer dizer, um
conjunto de direitos e de deveres: a cada escalão e estatuto corresponde um papel,
isto é, um estilo de conduta que não está imutavelmente ligado a um indivíduo, mas
que depende da posição ocupada no escalão e na “classe” social. Como diz Crook,
“pode-se descrever um comportamento social de primata em termos de estatuto de
idade e de sexo, de papel e de afiliação num grupo-tipo” (Crook, 1971, p. 39 apud
MORIN, 1973, p. 16).

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De tudo isto deduzem-se duas consequências, que são simultaneamente


antagonistas e complementares. A primeira é a desigualdade social, a segunda a
mobilidade social. Em primeiro lugar, sobretudo quando a hierarquia é rígida, a
desigualdade social é uma verdadeira desigualdade de vida; na casta elevada, os
indivíduos têm uma grande liberdade de movimentos, a faculdade de realizar os
seus desejos e os seus prazeres com muito poucas inibições. O poder já confere
todas as vantagens, todas as liberdades e sobretudo a livre expansão pessoal. Nos
escalões muito baixos, a subordinação acompanha-se de restrições, de frustrações,
de proibições, de inibições, talvez mesmo de “neuroses”. Deste modo, a
desigualdade social também é, de certa maneira, a desigualdade da felicidade.
Essa desigualdade é muito menos marcada nas sociedades descentralizadas da
floresta e muito mais opressiva, pesada, dura, nos bandos militarizados das
savanas (MORIN, 1973, p. 16).

Desta forma, distinguem-se claramente linhas de força, umas simpáticas e outras


antipáticas, que vão colorir de maneiras muito diversas as relações entre os
indivíduos. A origem das primeiras reside, sem dúvida, na conservação da seiva
afetiva dá infância na vida adolescente, e por vezes adulta, assim como a sua
transferência para novos companheiros, por meio de afinidades eletivas. A origem
das segundas encontra-se provavelmente nas competições repulsivas entre machos,
muito frequentes e fortes entre os mamíferos, nos “ciúmes” entre as fêmeas, que a
relação hierárquica estabiliza mais ou menos, sem chegar a reabsorver. Portanto,
há dois tipos de comportamento, ambos originariamente ligados ao domínio da
reprodução biológica (atração mãe-filho, repulsão de macho a macho) que se
expandem e transformam, um, sobretudo, na vida adolescente e o outro,
principalmente, na vida adulta, e que vão ambos constituir elementos da
individualidade complexa e da sociedade complexa, em que as relações se
diferenciam e se constroem a partir e para além da esfera da reprodução biológica
(MORIN, 1973, p. 18).

Portanto, a sociedade dos antropóides avançados controla os indivíduos por meio


das suas restrições e hierarquias, mas não uniformiza as individualidades,
permitindo-lhes o desdobramento relativo das respectivas diferenças. Quando a
hierarquia é rígida e autoritária, só os privilegiados do vértice, ou até mesmo só o
chefe, é que podem dar largas à sua própria individualidade.

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A sociedade e a individualidade surgem-nos, assim, como duas realidades


simultaneamente complementares e antagonistas. A sociedade, ao mesmo tempo
em que maltrata a individualidade, impondo-lhe os seus limites e as suas coações,
oferece-lhe estruturas que lhe permitem exprimir-se. Utiliza, para a sua variedade,
a diversidade individual, que, caso contrário, se dispersaria na natureza; a
variedade individual utiliza a variedade social para tentar expandir-se. Portanto,
já ao nível da sociedade primática, não pode conceber-se a sociedade como um
simples enquadramento nem um indivíduo como uma unidade correspondente a um
compartimento, visto que o enquadramento é constituído pelas relações
interindividuais e que não existe compartimento vazio enquanto não houver um
indivíduo para ocupá-lo. Por outras palavras, trata-se da noção fundamental de
que sociedade e individualidade não são duas realidades separadas que se ajustam
uma à outra, mas existe um ambissistema em que, complementar e
contraditoriamente, indivíduo e sociedade são constituintes um do outro, ao mesmo
tempo em que se parasitam entre si (MORIN, 1973, p. 19).

Existe, pois, ambissistema biossocial, e, se nele inserirmos o ambissistema


socioindividual, temos um trissistema ambíguo. Já no indivíduo não existe
conjugação rigorosa entre procriação e prazer sexual, o qual até se pode
emancipar na masturbação. Por outro lado, repitamos que o calor mamário da
pequena infância vai constituir a placenta das simpatias, das ternuras e das
amizades da vida adolescente e até mesmo de parte da adulta (será esta a origem
da sentimentalidade humana). Portanto, não existe uma categorização rígida nem
uma fronteira nítida entre o biológico, o social e o individual, mas, ao mesmo
tempo, existe unidade e pluralidade, confusão original e distinção dos
desenvolvimentos. Não existe integração perfeita, funcionalidade sem equívoco,
mas existe, ao mesmo tempo, complementaridade, concorrência e, em última
análise, antagonismo entre estes três termos. A sociedade e o indivíduo estão ao
serviço da espécie, a espécie está ao serviço da sociedade e do indivíduo, mas de
forma complexa, com uma zona de ambiguidade, de contradições, de
indecidibilidade. E são bem essas ambiguidades, essas contradições, essa
indecidibilidade que a humanidade levará a um nível nunca dantes atingido
(MORIN, 1973, p. 21).

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No entanto, a integração social dos primatas avançados já é complexa, na medida


em que comporta antagonismos e desordem, os quais não são apenas os resíduos
despejados pela organização, mas sim elementos parcialmente constitutivos da
própria organização. A cooperação, a complementaridade, não são noções que se
oponham duma maneira absoluta (ontologicamente) às competições, aos conflitos,
aos antagonismos, mas constituem, juntamente Com estes, como que dois pólos
oscilatórios através dos quais se constitui a organização social. Esta ambiguidade
de princípios volta a surgir a todos os níveis; como vimos, as relações
interindividuais oscilam entre o matching (competição) e o fitting (ajustamento), e
ambos se conjugam para manter a rigidez da hierarquia e a mobilidade social dos
indivíduos; como dissemos, existe simultaneamente antagonismo potencial e
complementaridade potencial entre o indivíduo que desenvolve os seus interesses
pessoais e o interesse da organização coletiva. Mas também dissemos que este
sistema não é tão harmonioso como Hegel teria sonhado, visto que impõe não só
grandes desperdícios, mas também grandes sacrifícios e grandes frustrações
naqueles que se encontram na base da escala social. Quer dizer que o princípio da
hierarquia tem duas facetas: uma integrativa e urna de exploração do símio pelo
símio. Como se vê, herdamos raízes de desigualdade social, o que torna este
problema não insolúvel, mas radical (MORIN, 1973, p. 22).

Um cientista social que seja digno e no mínimo condizente, jamais dirá que não há
desigualdade social, e a questão a princípio não é esta, mas sim os pressupostos fundamentais de
como se pensar o fenômeno psicológico, que não esteja desenraizado da biologia, tanto quanto da
sociologia, e das noções fundamentais da psicologia. Sem isto, é impossível compreender não só
o social, como também a própria psicologia individual:

O fenômeno psicológico não pertence mais à natureza humana. O homem, ao


construir a cultura e a sociedade, se libertou de sua “natureza”, ultrapassando
seus limites e características. O fenômeno psicológico como registro, no homem,
de sua relação com o mundo, na medida em que este mundo é social e cultural,
passa a se caracterizar por esta condição. Assim, o fenômeno psicológico não
preexiste no homem. Se desenvolve conforme o homem se insere na sociedade, nas
relações e na cultura. Ali estão as possibilidade do homem se tornar humano. A
humanidade do homem está na cultura, nas relações sociais e nas formas de
produção da vida. É lá que o homem vai buscar os elementos para sua constituição
(BOCK, 2004, p. 9).

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Afirmarei que a sociedade, não é um processo consciente, muito menos uma criação humana,
as relações sociais por sua vez também, apesar de haver os "oportunistas" que se valem do sistema
por ter uma consciência maior do que de outras pessoas, e ao invés de utilizar isto, a proveito do
bem comum, utilizam em proveito próprio, como Platão, que dizia ser necessário queimar os livros
de Demócrito (Atomista). O que se sabe, é que os discípulos de Platão disse à ele para não queimar,
não obstante, temos hoje todos os diálogos do filósofo e de Demócrito, nenhuma página se quer
dos seus, mais de 70 livros (VAN DOREN, 2013).

É importante ressaltar sempre, Platão dizia em nome da verdade, "queime os livros de


Demócrito, mas em nome da verdade, que fique dito". Suas acusações não eram puramente por
"repressão ou por egoísmo vulgar", mas sim por uma moralidade digna, não é mesmo? Mas sim
em nome da liberdade, por que o conhecimento, deve ser de todos e para todos (desde de que, se
queime alguns). As acusações de Bock, nos parece ser em nome da verdade, não é mesmo? Aos
leitores que me acompanham até aqui, lembrem-se da categoria analítica:

A Psicologia Descomprometida com a Sociedade: Os psicólogos se puseram de


costa para a realidade social, A psicologia contribui significativamente para
ocultar as condições de desigualdade, Psicologia descolada da realidade social,
Descolagem que se constitui o processo ideológico da psicologia.

Realmente, mais de 2000 anos se passaram e ainda sim existem "Platões", grandes
autoridades da sociedade que acusam, mas é importante lembrar sempre, em nome da
"VERDADE". A maioria dos seguidores, tanto de Freud como de Marx expurgaram a dimensão
da biologia, de suas concepções:

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Houve, no entanto, tentativas teóricas para firmar a ciência do homem sobre uma
base natural. Nas páginas fulgurantes do manuscrito de 1844, Marx colocava no
centro da antropologia não o homem social e cultural, mas o “homem genérico”;
longe de opor natureza e homem, Marx afirmava que “a natureza é o objeto
imediato da ciência que trata do homem”, visto que “o primeiro objeto do homem
- o homem- é natureza”, e enunciava o princípio básico: “As ciências naturais
englobarão em seguida a ciência do homem, assim como a ciência do homem
englobará as ciências naturais: apenas haverá uma única ciência.” (Segundo a
tradução Molitor.) Engels esforçou-se por integrar o homem na “dialética da
natureza” [...] O primeiro movimento de Marx e de Freud refluiu, não teve
continuação, por lhe ter faltado terreno propício, e foi classificado como um
engano do jovem Marx; depois, os epígonos da era estru-turalista fizeram tudo
para purificar as duas doutrinas de quaisquer resíduos “naturalistas”, ao mesmo
tempo que arrumavam no museu a embaraçosa “dialética da natureza”(MORIN,
1973, p. 4).

Então quer dizer que Marx, compreendia o ser humano, como ser biológico, social e
psicológico? Não havendo distinção entre ciências naturais e humanas? Nessa via, a abordagem
Sócio-Histórica que "Fundamenta-se no marxismo e adota o materialismo histórico e dialético
como filosofia, teoria e método (BOCK, 2004, p. 5). Rechaça a biologia, sendo que o próprio Marx,
considerava tais aspectos. Podemos considerar a Sócio-Histórica uma herdeira de Marx? E
Leontiev com o seu "construcionismo genético" onde o colocamos? A abordagem Sócio-Histórica
se diz de vertente Marxista, mas não é fundamentada no próprio Marx, e ainda se diz herdeira de
Marx? O que Marx diria disso? É bom salientar nas suas próprias palavras "Tout ce que je sais,
c'est que je ne suis pas Marxiste", isto é "Tudo o que eu sei é que não sou marxista!" (BARATA-
MOURA, 1982, p. 542). Que afirmação em! E com ponto de exclamação ainda "Tudo o que eu sei
é, que eu não sou marxista!". E realmente Marx é Marx, e não Sócio-Histórica. Devemos fazer
justiça a Marx, e no caso, o que eu me propus a fazer neste pequeno ensaio, é exatamente isto.
Separar Marx, disto que se diz Marxismo. A Psicologia Sócio Histórica, permanecerá muito tempo
na academia, mas isto não é Marx, muito menos ciência. Este último previa em sua época, como
os ditos "intelectuais" deturpava sua concepção de modo aberrante, que teve de anunciar que ele
próprio não era marxista. Que a Psicologia Sócio-Histórica continue com as suas concepções, mas
é imperativo dizer, não deturpe o nome Marx! Duas coisas que são totalmente diferentes, que não
se correlacionam, e que muito menos se dialogam é, o nosso barbudo alemão e a teoria Sócio-
Histórica. Repetindo mais uma vez, não se mistura água com óleo!

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As afirmações proferidas por Bock, de que o homem "se libertou de sua natureza" (BOCK,
2004). Se refere a uma concepção, não só anticientífica, como também política no sentido mais
vulgar da palavra, de ludibriar de modo intencional:

Paradigma inexistente de Pascal, paraíso perdido de Rousseau, a ideia da natureza


humana ainda havia de perder o núcleo, tornar-se protoplasma informe quando se
adquiriu consciência da evolução histórica e da diversidade das civilizações: se os
homens são tão diferentes no espaço e no tempo, se se transformam de acordo com
as sociedades, nesse caso a natureza humana não passa de uma matéria-prima
maleável que só adquire forma por influência da cultura ou da história. Além disso,
na medida em que a ideia de natureza humana foi imobilizada pelo conservantismo,
a fim de ser mobilizada contra a transformação social, a ideologia do progresso
chegou à conclusão de que, para haver transformação no homem, este não podia
ter natureza humana. Deste modo, esvaziada por todos os lados de virtudes, de
riqueza, de dinamismo, a natureza humana surge como um resíduo amorfo, inerte,
monótono: aquilo de que o homem se desfez, e não aquilo que o constitui. Mas não
é certo que a natureza comporta um princípio de variedade que é testemunhado
pelos milhões de espécies vivas? Não comporta um princípio de transformação?
Não comporta em si própria a evolução, que conduziu ao homem? Será a natureza
humana desprovida de qualidades biológicas? (MORIN, 1973, p. 3).

Por fim, com tudo o que foi exposto vimos por meio de uma análise pormenorizada as
falácias da ciência psicológica contemporânea, e o modo pelo qual a mesma vem se desenvolvendo,
cito Morin:

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É nessa lacuna que agora se pode ver um animal humano, uma sociedade natural,
uma elaboração cultural ligada a uma evolução biológica. É nessa lacuna que os
conceitos de vida, de animal, de homem, de cultura, perdem a sua suficiência e a
sua rigidez [...] A hominidade não é reintegrada no quadro do biologismo; não se
troca um conceito fechado por outro conceito fechado [...] Esta dupla ruptura (do
biologismo e do antropologismo) e dupla abertura (do conceito de vida e do
conceito de homem) tem para nós uma importância capital. A abertura da noção
de homem sobre a vida não é unicamente necessária à ciência do homem, também
é necessária ao desenvolvimento da ciência da vida; a abertura da noção de vida
é, por si mesma, uma condição para a abertura e para o desenvolvimento da ciência
do homem. A insuficiência de uma e de outra tem inevitavelmente de apelar para
um ponto de vista teórico que possa, ao mesmo tempo, uni-Ias e distingui-Ias, quer
dizer, permitir e estimular o desenvolvimento de uma teoria da auto-organização e
de uma lógica da complexidade. Assim, a questão da origem do homem e da cultura
não diz unicamente respeito a uma ignorância que é preciso reduzir, a uma
curiosidade a satisfazer. É uma questão com um alcance teórico imenso, múltiplo
e geral. É o nó górdio que sustém a soldadura epistemológica entre
natureza/cultura, animal/homem. É o local exato onde devemos procurar o
fundamento da antropologia (MORIN, 1973, p. 27-28).

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CAPÍTULO V - PSICOLOGIA DA HISTÓRIA EM APLICAÇÃO

PSICOLOGIA DA HISTÓRIA: ANÁLISE GERAL DOS DADOS:


COMPORTAMENTO, MOTIVAÇÃO E PSICOLÓGICO

Sendo mais política do que científica, nos resta perguntar: o que é ser mais político do que
científico? Que nem dito por Maquiavel em O Príncipe a política é a disputa de forças pelo
exercício do poder (MAQUIAVEL, 2010), não obstante, lutamos pelo o que? Pela soberania de
um partido político ou pela libertação da sociedade como um todo? Se for a segunda opção, as
ações da psicologia não corresponde ao seu desejo, pois se utilizando de um critério analítico
tendencioso "de como as coisas devem ser" e não "como são", deixa de perceber a objetividade,
reduzindo o sujeito concreto ao sujeito ideal inexistente ou a sociedade real à sociedade ideal, que
por sua vez, nunca existiu nos pressupostos epistemológicos de Marx, se a psicologia social diz
"se emparelhar nas bases marxistas", é bom salientar nas palavras de Marx "Tout ce que je sais,
c'est que je ne suis pas Marxiste", isto é "Tudo o que eu sei é que não sou marxista" (BARATA-
MOURA, 1982, p. 542). Pois bem, se uns dos maiores intelectuais da humanidade diz que não é
marxista, e se a psicologia diz se fundamentar nos pressupostos "marxistas", poderíamos concluir
então que Marx não tem, "nada vê" com o marxismo e por conseguinte que a psicologia social nada
com Marx? É plausível, não? As palavras do autor se dá, pelo fato que o mesmo já previa no que
daria os seus estudos, indivíduos se apropriando de suas concepções de modo indiscriminado e
sem atender as exigências necessárias, que dão suporte ao intelectual que pretenda se utilizar de tal
conhecimento, estas palavras se dirigiam aos marxistas franceses de 1870 (BARATA-MOURA,
1982).
Além disso, a psicologia atual não atende a uma exigência imprescindível que é, sem teoria
revolucionária, não há prática revolucionária:

A teoria não nasce da teoria, nasce das distintas práticas, individuais e sociais,
mas ela representa um momento específico de reflexão, de deciframento dos
mecanismos do concreto, de apreensão dos seus sentidos, das suas articulações
internas, da própria relação entre teoria e prática (SADER, Sem teoria
revolucionária, não há prática revolucionária, 2008).

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E quando é científica, não é prática, pelo fato dos intelectuais não saírem da academia,
estando comprometidos apenas com o núcleo de aulas e palestras para outros intelectuais, salvo
uma minoria que tende a fazer o esforço de organização política em comunidades. No outro oposto,
há os que não são científicos, mas tendem a prática sem fundamentação teórica, o grande
historiador Hobsbawm (1917 - 2012) denomina essa influência "o grosso do que consideramos
como a influência marxista sobre a historiografia certamente foi marxista vulgar” (HOBSBAWN,
1998, p. 161). O marxismo denominado vulgar, é o marxismo tendencioso, que mais almeja poder
político do que a libertação da sociedade como um todo, mas o praticantes não percebem, pois
fazer das ideias de Marx que são conceituações extremamente complexas e dinâmicas algo
mecânico e desprovido de revisionismo teórico, é reprodução ideológica. Agora pensemos e
façamos um resumo até aqui. A psicologia Sócio- Histórica como demonstrado, é mais política do
que científica, por ser política, preza pelo exercício do poder, como foi definido por Maquiavel.
Quando científicas (teórico e não prático) não são práticas e quando práticas (desprovidas de teoria
fundamentada) não são científicas, portanto a única função que exercem socialmente é a
manutenção do status quo. Essa manifestação de retorno do reprimido (LAPLANCHE, 1967), por
conta da ditadura, fez com que os indivíduos que foram represados, emerge-se perante a sociedade
com traumas, tornando-se radicais idealistas e proferindo "a liberdade mais do que tudo", criou-se
representações sociais, onde a liberdade impera como imperativo categórico, com isto, elevou-se
os ideais de sujeito e de sociedade, perdendo-se a objetividade, onde o que se pensa é o ideal e não
o real. Tanto que as produções são puramente acadêmicas e se restringem apenas a este campo, do
mesmo modo que o sujeito traumatizado não se expõe ao estímulo traumático, o mesmo ocorreu
em nível social, pois o que vemos são os psicólogos, assistentes sociais, sociólogos, filósofos,
economistas que se dizem "marxistas", mas que não fazem a operação da segunda parte do
processo, que é a prática. Isto nada mais é do que o sintoma social, do medo e a da repressão, e
análogo ao sujeito traumatizado que por meio de tentativas sucessivas tenta superar seu trauma,
fazendo pequenas investidas, o mesmo também ocorre, só que dentro das universidades, a
universidade seria o consultório do psicanalista para o intelectual "marxista" onde ele pode proferir,
produzir e dizer tudo, esse é o seu porto seguro, mas nunca avançando para fora, pois o que é
externo à este, é o aspecto social dos traumas e das repressões. Se não houver a prática, isto é,
organização do proletariado, as greves necessárias, movimentos de reivindicações massivos,
concílio entre academia e o sindicato, não haverá revolução, pois:

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A teoria desenvolvida por Marx é, em muitos momentos, entendida ou definida


como um determinismo rígido, estrito, isto é, como uma filosofia do sentido ou do
arremate da história. Acreditamos que a filosofia de Marx não se configura em um
determinismo rígido ou uma filosofia da história porque está fundamentada no
processo de autocriação por parte dos homens, processo este que tem como base a
materialidade das relações humanas. Sustentamos esta visão porque como ele
afirma a história não passa de simples “sucessão de gerações”. Portanto, ela não
tem um sentido em si mesma, a história não tem nenhum significado além daquele
que os homens lhe conferem nos seus vários estágios de desenvolvimento. Segundo
Marx, a história não se constitui com “variações únicas”, ela se dá a partir de
variações fundamentadas nas várias possibilidades que são intrínsecas aos
processos que constituem a atividade humana. É por esse motivo que o fundamento
da história deve ser a base material das relações e dos modos de produção
humanos. Essas relações e esses modos de produção não se constituem em um
processo fechado, acabado em si mesmo, mas seguem a dinâmica natural da
atividade humana, este processo é progressivo, mas nem por isso se constitui em
um determinismo histórico rígido, onde cada novo resultado da história já se
achava prescrito no livro sagrado da história. Assim, acreditamos a teoria da
história apresentada por nosso autor como passagem a uma visão de história que
não promete nenhuma salvação e que se apresenta como um devir incerto, ou seja,
não há uma razão na história ou regendo a mesma. Parece-nos que o pensamento
de Marx se aproxima mais de uma teoria crítica da luta social e da mudança do
mundo, do que propriamente de um sistema doutrinário (SILVA, 2009, p.7).

Talvez pelo fato, dos "marxistas" que não conhecem Marx, já que Marx não era "marxista"
(segundos suas próprias palavras), tenham a concepção de que a história evolui, que estamos indo
em direção "alguma coisa", muito pelo contrário, a compreensão total da obra do autor, nos faz
perceber que a sua concepção de mundo, é que o homem faz a si próprio, e que a sociedade pode
transformar-se para melhor ou simplesmente se autodestruir. Nesse sentido percebemos como a
psicologia Sócio-Histórica, acomoda-se nas academias com tom messiânico do que devemos fazer,
quando nem ela própria produziu sua crítica e revisionou suas ações. A psicologia social exerce
função ideológica, por exercer mais ação política do que científica, preza mais pela manutenção da
sua classe social, de professores universitários que transmitem constantemente uma "imagem de
preocupação pela população", o problema de tudo isto, é que se enganam, mais do que tentam
enganar. Mas proferem em nome da população para produzir os seus discursos, ao invés disto, por
que não à ação conciliada a teoria fundamentada? Simplesmente por que não estamos preparados

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e ainda não superamos nossos traumas da ditadura e não sabemos se realmente queremos uma
sociedade igualitária, pois o que produz o conforto é exatamente a condição de "não alteração"
como também o salário do Professor Universitário, o financiamento de pesquisa e reprodução
bibliográfica com dinheiro público (Conhecimento novo? Onde?). É exatamente "criticar o
Capital" que gera a sua renda, se não fosse isto, o que fariam de suas vidas? Enquanto isto, o
chamado do nosso grande Marx, confluí nas ondas do tempo e nas vozes mortas do passado
"Proletários de todos os países, uni-vos! (MARX, 2001, p. 84).

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CAPÍTULO VI - O FINAL DO INÍCIO

CONCLUSÕES PRELIMINARES

A Psicologia Sócio-Histórica irá persistir na universidade por muito tempo, não pelo fato de
ser científica, pois não é, ou até mesmo por se dizer originária de Marx ou do Marxismo, afirmo
que não há nenhuma correlação, não por mim, mas pelo próprio Marx em suas palavras, como
colocadas anteriormente e pela análise empreendida por mim. Mas permanecerá por longa data,
uma por conta da condição histórica em que vivemos no contemporâneo, por conta da
especialização do conhecimento que tende a se intensificar, mas não apenas por isto, mas também
por que nossa cultura gerou ao decorrer do último século XX, mais entretenimento do que houvera
até então, o conhecimento e estudo passaram a ser opções menores no arsenal de possibilidade de
divertimento, o entretenimento como foi em épocas passadas, onde lia-se um livro como novelas
das 6, já não existe, tem-se a TV! Não obstante, não são todos que tem um interesse profundo pelo
conhecimento e se dedica ao mesmo, pensando-o como uma coisa séria que acarreta em
consequências severas. Principalmente em alguns países que não se conserva uma cultura, diria
"intelectual" como no Brasil, ao contrário da França que há estímulo e investimento maciço por
parte do estado em fomento de cultura. Nessa via, os alunos de psicologia tendem aderir essa
abordagem por conta da questão da especialização, por que "deve-se ter" uma especialidade em
alguma coisa, segundo, a vertente é um reducionismo burlesco, decorrente disso não há a
necessidade de pré-requisito cognitivo para compreende-la, o que se coaduna com os fenômenos
contemporâneos do desinteresse pelo conhecimento e até mesmo diria em sentido psicológico, isto
permite, aquilo que se denomina a "lei do mínimo esforço possível", a teoria está posta, e é
legitimada como verdadeira. E o fator principal que seria, assim por dizer, o elemento que produz
a reação dos fatores anteriores, reagindo quimicamente como um cimento, é que a teoria é um polo
de concentração ou afluência, de toda identificação, projeção e resistência que o indivíduo tem em
relação à própria existência. Em síntese, poderia ser dito, que a conjugação da especialização, a lei
do menor esforço possível, o desinteresse pelo conhecimento, o processo de centralização e
concentração das projeções, resistências e identificações, por parte dos aderentes dessa concepção,
permitirá a sua permanência na academia até o início da aurora dos tempos, mesmo não sendo uma
ciência. A teoria sem dúvida consegue ser (não sem um certo magnetismo) a objetivação ou
realização concreta de todo anseio e esperança dos homens.

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CONCLUSÃO FINAL

Sobre o ombro de Marx e Freud, é possível vislumbrar algo maior e dar continuidade àquilo
que Edgar Morin (1973) disse não ter havido âmbito propício que é exatamente a geração de
conhecimento, que vá além, e não se restrinja apenas aos ideias políticos, de uns, e de outros, ou
de uma minoria que se diz a favor da população ou da minimização da desigualdade, que proferem
um compromisso social, se nem ter, com os próprios de sua categoria. Fazem colocações em nome
da "verdade" ou do "bem da sociedade", esquecendo-se, que tal ato, é uma própria mentira. Se
valendo de tudo que é cabível, fazem do discurso uma retórica. Assim reduzem o conhecimento, à
uma porção de conceitos, que se ramificam no tecido social, ganhando legitimidade e
plausibilidade. A ciência pode avançar, ir além, e explorar horizontes inimagináveis até mesmo
por Freud ou Marx.
É importante ressaltar que isto é possível, e que a justiça ou igualdade social, será apenas
possível quando estivermos ciente, da nossa condição enquanto homens, que sendo defeituosos por
natureza ou "homens doentes" (NIETZSCHE, 2004) temos a condição e possibilidade de
transformação, é óbvio, que dentro de suas limitações. Se poderemos ou não, ir em direção a uma
sociedade igualitária, é uma questão que não foi respondida ainda, e que merece estudos, sobre, o
do por que, tendo conhecimento, tecnologia, ainda existe pobreza, e vivemos numa circularidade
banal de desprazer e prazer.
Material e vontade não me carece para seguir adiante nesta aventura intelectual, se terei
tempo para responder as minhas indagações, só os batimentos cardíacos de meu coração podem
me resguardar, pois a vida é determinada por condições fisiológicas e psicológicas, que
ultrapassam a minha própria vontade de continuar sendo. Uma coisa que me deixa contente, é a
possibilidade de poder pensar, e ter essa capacidade fenomenal de analisar, e observar a realidade
e logo em seguida descrever, conectar, produzir relações, é incrível esse processo de "pensamento",
que nos foi legado. É um consolo saber que é possível ser objetivo, sem ser neutro, e ao mesmo
tempo, ajudar algumas pessoas dentro do possível e cabível, sem retirar a liberdade e muito menos,
diluir em minhas expectativas ou projeções. No fim das contas, nós, temos o necessário para
produzir o conhecimento. O resto... nada mais é, do que mera covardia. E Nietzsche falou:

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Nós, aeronautas do espírito! — Todos esses ousados pássaros que voam para
longe, para bem longe — é claro! em algum lugar não poderão mais prosseguir e
pousarão num mastro ou num recife — e ainda estarão agradecidos por essa mísera
acomodação! Mas quem poderia concluir que à sua frente não há mais uma imensa
via livre, que voaram tão longe quanto é possível voar? Todos os nossos grandes
mestres e precursores pararam, afinal, e não é com o gesto mais nobre e elegante
que a fadiga se detém: assim também será comigo e com você! Mas que importa a
mim e a você! Outros pássaros voarão adiante! Esta nossa idéia e crença porfia
em voar com eles para o alto e para longe, sobe diretamente acima de nossa cabeça
e de sua impotência, às alturas de onde olha na distância e vê bandos de pássaros
bem mais poderosos do que somos, que ambicionarão as lonjuras que
ambicionávamos, onde tudo é ainda mar, mar e mar! — E para onde queremos ir,
então? Queremos transpor o mar? Para onde nos arrasta essa poderosa avidez,
que para nós vale mais que qualquer outro desejo? Por que justamente nessa
direção, para ali onde até hoje todos os sóis da humanidade se puseram,
desapareceram? Dirão as pessoas, algum dia, que também nós, rumando para o
Ocidente, esperávamos alcançar as Índias — mas que nosso destino era naufragar
no infinito? Ou então, meus irmãos? Ou? (Nietzsche, 2004, p. 214).

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