Documente Academic
Documente Profesional
Documente Cultură
)
Moisés Olímpio-Ferreira & Rui Alexandre Grácio (Org.)
RETÓRICA E COMUNICAÇÃO
MULTIDIMEr~SIONAL
(Gr
Grácio
EDITOR
[Ficha Técnica)
Título
Retórica e Comunicação Multidimensional
Organização
Moisés Olímpio-Ferreira & Rui Alexandre Grácio
Conselho editorial
Christiani Margareth de Menezes e Silva (Universidade Estadual de londrina- Brasil)
Eduardo Lopes Piris (Universidade Estadual de Santa Cruz- Brasil)
Isabel Cristina Michelan de Azevedo (Universidade Federal de Sergipe- Brasil)
loic Nicolas (Université libre de Bruxelles- Belgique)
Maria Alejandra Vitale (Universidad de Buenos Air•es- Argentina)
Maria Helena Cruz Pistori (PUC São Paulo- Brasil)
Maria Manuel Baptista (Universidade de Aveiro- Portugal)
Paulo Roberto Gonçalves Segundo (Universidade dle São Paulo- Brasil)
Soraya Maria Romano Pacífico (Universidade de Sãio Paulo- Brasil)
Coordenação Editorial
Grácio Editor
Capa
Grácio Editor
ISBN: 978-989-99682-6-4
© Grácio Editor
Travessa da Vila União, n.2 16, 7.2 drt
3030-217 COIMBRA
Telef.: 239 084 370
e-mail: editor@ruigracio.com
sítio: www.ruigracio.com
ÍNDICE
APRESENTAÇÃO:
RETÓRICA E COMUNICAÇÃO MULTIDIMENSIONAL.. .............................................7
Moisés Olímpio-Ferreira & Rui AlexandrE! Grácio
PALAVRAs-CHAVE
Retórica. Persuasão. Nova Retórica. Nuper-retórica. Multimeios.
Introdução
Qualquer veículo pressupõe uma trajetória, um meio e um fim específico.
Não obstante, seu ponto de partida deve ser perfeitamente demarcável, para que
se possa aferir o deslocamento desde a migem até a chegada. Afinal, veicular im-
plica transportar algo de um l ugar a outno. Trata-se de um processo de condução,
passível de ocorrer nos domínios do púlolico ou do privado. Na esfera das cons-
truções discursivo-argumentativas, por exemplo, a retórica se apresenta como
uma espéde de veículo cuja trajetória p1E!rfaz o caminho existente entre os inter-
locutores, que utilizam diversos meios p<lra alcançar- exclusivamente- a persua-
são: o fim último de qualquer retórica.
Durante a antiguidade, o meio era o discurso, e o espaço de aplicação desse
discurso era a ekklesía1• O fim do discurso dentro daquele contexto já era a per-
suasão, com o objetivo de conquistar a ê1desão dos ouvintes à(s) teses do orador
ou do perfil ideológico que ele representa. Nesse sentido, a força do vocábulo re-
1
A ekklesío é, no campo de experiência do profano, a assembleia do demos, a assembleia popular,
Como em Atenas e também em todos os Estados gregos. A palavra refere-se normalmente, portanto,
à assembleia geral de todos os homens livres com direito a voto, os cidadãos plenos de uma pólis. Os
membros da ekklesío eram os cidadãos, porém os cidadãos nunca constitufam a população total de
uma pó/is grega; possivelmente, não existiu uma 1ínica ddade-estado em que meramente um quarto
dos habitantes gozassem do status de ddadãos (C f. STEGEMANN; STEGEMANN, 2004, p. 311).
~
INOICf
AS ATRIBUIÇÕES DA (NUPER·)RETÓRICA : ARGUMENTAÇÃO E PERSUASÃO EM CONTEXTO($) MULTIMIDIÁTICO(S)
tórica pode ser traduzida pelo próprio efeito persuasivo contido em sua enuncia-
ção. Trata-se de um daqueles conceitos que bem sabemos o que significa até que
sejamos compelidos a falar acerca dele, tal como sugere Agostinho de Hipona e
ratifica ludwig Wittgenstein, em lnvesti!7GÇÕes Filosóficas (1952, 1979). Quando
se fala de um efeito retórico, pode-se querer dizer muitas coisas. Pode-se, por
42 1 exemplo, estabelecer um vínculo entre o que se diz e algo enganador, superficial. É
possível, igualmente, que se queira mencionar algo de caráter eminentemente per-
suasivo, capaz de promover uma inquietude no interlocutor ou, quiçá, mover-lhe
no sentido de agir em conformidade conn aquilo que se propõe. Essas aplicações
do verbete estão associadas ao sentido ola retórica como uma ferramenta de per-
suasão, um poderoso instrumento de produção de convicções nos interlocutores.
Nesse sentido, o termo se mostra ambíguo e relacionado ao sentido negativo que
lhe fora concedido por Sócrates e Platã,o. Mas, há que se falar da existência de
uma retórica que está aquém dos sofistas e perpassa a existência desses, trans-
portando os seus ensinamentos eficazes para além do medievo. Podemos falar de
uma retórica clássica associada a Córax e Tísias, assim como se mostra possível
tratar de uma retórica que amparou a construção dos discursos de grandes ora-
dores da Grécia Antiga, sobretudo durante o século de Péricles. Há lugar, igual-
mente, para uma discussão específica act:?rca da retórica em Aristóteles, Cícero ou
Quintiliano. Transcendendo aos limites dia antiguidade, encontraremos a retórica
instrumental integrando o Trivium e o QU'adrivium, flertando com a formação mo-
nástica da Idade Média e culminando em um consorte da composição textual que
lhe fará restringir-se à estilística no período compreendido entre os séculos XVII e
XIX.
No universo da Nova retórica, o m•:?io é a argumentação- em substituição
ao simples discurso, amalgamado à repmsentatividade do orador. O meio se con-
solida através os argumentos- elaborados e estruturados para serem- proferidos
pela oralidade ou pela escrita, com o intuito de converter o auditório às teses que
se lhe apresentam ao assentimento. O fim permanece imutável: a persuasão. No
contexto de uma Nuper-retórica, os multimeios conectam os indivíduos aos es-
paços - físicos e virtuais - ampliando os limites e as modalidades de linguagem
que se formam e transmutam, fragilizando as fronteiras do(s) conhecimento(s) e
tornando os indivíduos crédulos acerca1da validade (imutável) e da solidez do
saber superficial que se oferta nos múltiplos espaços, formando generalistas per-
suadidos pela suposta apreensão de saberes que lhe são ofertados de modo ins-
tantâneo. A mediação do conhecimento (entre o sujeito cognitivo e o objeto
cognoscente) passa a ser regida pela instabilidade das certezas, fazendo com que
esse conhecimento revestido de um im,ediatismo indesejável_ se apresente tra-
vestido de verdade(s). Entre os atores do saber, apresentam-se os multimeios,
cuja velocidade de transmissão- e o menor rigor de aferição- amplia a carga de-
sejável de informações despejada sobre os indivíduos, fazendo-os crer que a ra-
RETÓRICA E COMUNICAÇÃO MULTI DIMENSIONAl
~
INOICE
AS ATRIBUIÇÕES DA (NUPER·)RETÓRICA : ARGUMENTAÇÃO E PERSUASÃO EM CONTEXTO($) MULTIMIDIÁTICO(S)
persuasão por meio da linguagem. Alérn de ser a ideia mais disseminada, essa
compreensão corresponde ao sentido preconizado por Aristóteles (2005, p.95-
96), segundo o qual "a retórica parece ter,, por assim dizer, a faculdade de descobrir
os meios de persuasão sobre qualquer questão dada. E por isso afirmamos que,
como arte, as suas regras não se aplicam a nenhum gênero específico de coisas" 2 •
44 1 Trata-se, portanto, de uma arte do desvelar. Uma competência que se desen-
volve com o intuito específico de identificar aquilo que se deve (des-)cobrir ou
velar, conforme o contexto, para atingir a finalidade precípua da persuasão. Seu
campo de abrangência transcende as especificidades dos campos do saber, motivo
pelo qual perpassa os múltiplos segmentos do conhecimento, fomentando o de-
senvolvimento da faculdade de aplicar o:s mecanismos mais adequados à persua-
são do interlocutor. Ao sugerir que compete à retórica identificar tais meios,
Aristóteles abre um horizonte de aborda1gem que permite a manutenção da atua-
lidade da retórica. Ainda que a retórica tE~nha ultrapassado os limites da acusação
e da defesa de opiniões, que se mostram mais ou menos favoráveis à sustentação
(oral) de um posicionamento- por meio de argumentos produzidos em linguagem
natural - manteve-se a si ngular caracte1rística de alinhar-se com o propósito de
vencer o interlocutor, persuadindo-o. Pe!rmanecendo como a nobre arte de pro-
duzir discursos de excelência, em quaisqUier segmentos do saber, atravessa os tem-
pos apropriando-se de novas linguagens e mecanismos persuasivos que sejam
capazes de converter o interlocutor ao assentimento das ideias do orador, ou das
ideologias que ele representa.
Desde as suas origens a retórica oferece um conjunto de elementos capazes
de cativar a atenção do ouvinte e modificar a sua tomada de decisão. Esse enten-
dimento ganha reforço quando se analisam as observações concernentes à retó-
rica clássica proferidas por Cha·im Pemlman, o idealizador da Nova Retórica,
segundo o qual
a Retórica clássica, a arte de bem falar, ou seja, a arte de falar (ou es-
crever) de modo persuasivo se propunha estudar os meios discursi-
vos de ação sobre um auditório, com o intuito de conquistar ou
aumentar sua adesão às teses qw~ se apresentavam ao seu assenti-
mento (PERELMAN, 1997, p. 177).
2 Embora costume-se atribuir ao pensamento aristotélico o sentido original do termo Retóriro, deve-
se salientar que há uma antiga lenda que sugere ter o nascimento da arte da persuasão sua origem
fundamentada na Sicília por volta do século V a.C., quando Hiéron (tirano de Siracusa) cerceou os
seus súditos do direito da fala, despertando, assim, a atenção de Tísias e Corax que, conscientes da
imensa importância da palavra, desenvolveram uma retórica sintagmática, uma arte discursiva que
se ocupava essencialmente das partes do discurso (Cf. OLIVEIRA, 2001, p. 39).
RETÓRICA E COMUNICAÇÃO MULTI DIMENSIONAl
cação da máxima emergente do senso comum, segundo a qual "à mulher de César
não basta ser honesta, há de parecer honesta". Esse brocardo se ajusta ao campo
das estratégias persuasivas tipicamente retóricas, uma vez que não basta ser ver-
dadeiro, convincente; há de ser capaz de· converter, persuadir. Para além de favo-
recer o entendimento, a retórica se ocupa com o entretenimento, com a ação. A
retórica seduz pelas afecções. Para persuadir, procura afetar o interlocutor. Isso 145
permanece com a retórica desde as basE!S de sua formação, entre os antigos.
No campo da retórica prevalece o entendimento segundo o qual a forma
ideal de discurso consiste naquela que objetiva a eficiência, a eficácia, a persuasão
do interlocutor. Observar o comportamento e o desempenho do(s) inter-
locutor(es) na enunciação dos discursos ou antever as possibilidades de objeção
a certas ideias, com base no reconhecimento de valores que são admitidos pelos
auditórios aos quais se destinam os argumentos, são procedi mentos de suma im-
portância no campo da retórica. Verificar o modo como repercute o discurso ou
evitar objeções previsíveis são estratégias que favorecem a força persuasiva dos
discursos/argumentos e reforçam a competência daquele a quem compete a atri-
buição de conduzir o discurso ou a elab,oração dos argumentos. Nesse contexto
em que se edificam os espaços de inserçi3o das figuras retóricas que emerge o as-
pecto artístico da argumentação.
As regras da argumentação, no campo retórico, objetivam especificamente
a persuasão. Ainda que haja uma arbitrariedade na escolha dos pontos de partida,
porque não há um princípio norteador, mas um fim a ser atingido, não se trata de
um barco sem rumo. Existe, igualmente, um percurso. Este, por sua vez, caracte-
riza-se pelas estratégias utilizadas para assegurar o assentimento do interlocutor
às teses que o orador pretende sustentar. Um elemento constitutivo dessa traje-
tória consiste na criatividade, a competüncia criativa, a habilidade criadora, que
concede o amálgama necessário para condensar discursos, valores, formas e con-
teúdos voltados à persuasão. Aliás, dentre os elementos constitutivos de qualquer
retórica, a criatividade merece destaque, pois dela depende boa parte da estrutura
de qualquer mecanismo persuasivo.
No caso da Retórica, em especial, E!Xiste um enlace indissolúvel com o pro-
blema da argumentação. Essa união se e:;tabelece desde as suas origens, entre os
gregos, permanecendo (ainda que veladamente) até o surgimento da vertente
belga da Teoria da Argumentação, também conhecida como a Nova Retórica. Por
esse motivo, uma breve análise do percurso que se origina na Grécia, por meio
da Retórica Antiga, estendendo-se até meados do século passado, com a Nova
Retórica de Cha'im Perel man, favorece a l[re-)descoberta contemporânea dos arti-
fícios linguísticos nos processos de comu1nicação.
Desde a sua origem, a retórica se mostra aderente à intenção de cativar os
espíritos. Por envolver os incautos inte·rlocutores, que se permitem sucumbir
diante de uma boa argumentaçi3o, a retórica concentra no ato - e nos modos -
de persuadir. Sua metodologia consiste em ressignificar as coisas, para que elas
~
INOict
AS ATRIBUIÇÕES DA (NUPER·)RETÓRICA : ARGUMENTAÇÃO E PERSUASÃO EM CONTEXTO($) MULTIMIDIÁTICO(S)
1 É razoável afinnar, na trilha de Sócrates, que os sofistas não buscavam o conhecimento como tal,
mas sua utilidade, pois pretendiam fazer dos cid;adãos atenienses pessoas capazes de atuar ativa e
decisivamente na vida pública. Neles a riqueza, k.f!rémata, a utilidade, prágmata e o ente, ánta, não
se dissociavam. (CURADO, 2010, p. 71)
• Em O Império Retórica, Perelman (1993, p. 26) destaca que o declínio da Retórica no século XVI
deve-se ao fato de haver nesse período a ascensãio do pensamento burguês que se firma no pressu-
posto cartesiano do critério da evidência. Dewrre daí o fato de encontrarmos em condição de
primazia as referências feitas à 'analítica aristotélica' em desapreço à 'dialética', pois os primeiros
tratam das coisas evidentes, enquanto esses últimos tratam das prováveis.
RETÓRICA E COMUNICAÇÃO MULTI DIMENSIONAl
linguagem e passando a ser vista como 1uma técnica de elaboração de belos dis-
cursos, limitando-se ao tratamento das fi'guras linguísticas e afastando-se propor-
cionalmente do universo filosófico à medida que se aproxima do gênero literário.
Consagrada à persuasão, na antiguidade, a Retórica representava uma forma
de expressão suasória, que se convertia e:m uma maneira especificamente política
de falar. Sua repercussão entre os atenie:nses, que se orgulhavam de conduzir os 147
seus assuntos políticos pelo método discursivo, transformou a retórica em uma
arte política por excelência, fundamenta da no princípio da persuasão. Essa incur-
são, aliás, revela a existência de um liamt:! necessário entre as questões acerca da
retórica antiga e os problemas da Retórica no mundo contemporâneo, motivo pelo
qual se faz imprescindível identificar os traços constitutivos da retórica antiga entre
os principais pensadores que se dedicaram ao tratamento das questões que lhe
estão associadas. É inegável a contribuição da Arte Retórica à(s) nova(s) Teoria(s)
da Argumentação, donde se mostram meramente depreciativos os comentários
que são esboçados ao seu respeito, em detrimento das suas inúmeras contribui-
ções. A Nova Retórica desenvolvida por IPerelman, por exemplo, possui um traço
distintivo em relação às demais modalidades retóricas, porque
~
INOict
AS ATRIBUIÇÕES DA (NUPER·)RETÓRICA : ARGUMENTAÇÃO E PERSUASÃO EM CONTEXTO($) MULTIMIDIÁTICO(S)
designá-la como uma Nova Dialética, tendo evitado esta nomenclatura em virtude
da aproximação entre o termo e a tradic;ão pós-hegeliana. Há outras razões que
lhe fizeram preferir uma aproximação com a Retórica:
~
INOICE
AS ATRIBUIÇÕES DA (NUPER·)RETÓRICA : ARGUMENTAÇÃO E PERSUASÃO EM CONTEXTO($) MULTIMIDIÁTICO(S)
linguagens, por sua vez, manifestam-se por multi meios e formam redes- e sub-
redes- de comunicação. Enquanto a Retórica se caracterizava pela atenção espe-
cial ao orador e a Nova Retórica nos argumentos, a Nuper-retórica procura se
consolidar com a ideia de Estrutura Dialôgica do Conhecimento, segundo a qual a
participação dos entes envolvidos propicia a formação de um saber sólido e cons-
truído coletivamente.
As fragilidades da Nova Retórica, n~io superadas pela Novíssima Retórica de
Santos, dão azo à possibilidade de um:a Nuper-retórica. A concepção de uma
Nuper-retórica incorpora elementos próprios da estruturação perelmaniana, mas
sugere uma inversão de algo proposto pela teoria hermenêutica de Schleierma-
cher, numa perspectiva que antepõe a Hermenêutica à Retórica, embora ampa-
rando esta naquela. Schleiermacher sug~~re que
~
INOict
AS ATRIBUIÇÕES DA (NUPER·)RETÓRICA : ARGUMENTAÇÃO E PERSUASÃO EM CONTEXTO($) MULTIMIDIÁTICO(S)
Considerações finais
Entre os gregos antigos, a retórica favorecia a inserção política do indivíduo.
Cumpria, nesse sentido, a função de promover a integração social (dos hómoi) e
amplificava a capacidade de ouvir e ser ouvido. Auxiliava, por assim dizer, na cria-
ção de uma identidade. Com isso, propiciava o reconhecimento do indivíduo em
virtude do seu caráter único e distintivo. Pela retórica procurava-se exacerbar a
autenticidade de um orador. Em outras palavras, a retórica estava essencialmente
ligada ao falar persuasivo, motivo pelo qual se confunde, ainda nos dias de hoje,
retórica e oratória. No entanto, mesmo existindo uma conexão entre os termos,
uma vez que a oratória assume uma das ·feições mais tradicionais da retórica, não
se pode restringir o seu campo de atuaç:ío aos domínios da oralidade. A essência
da tradição retórica reserva consigo aqUiilo que se configura como a sua própria
natureza: a persuasão. Ser persuasivo é o objetivo último do orador. Por conta
disso, permanece atual o entendimento que encontra na retórica um sentido ins-
trumental, pragmático e dedicado à persuasão.
Aristóteles já assinalava a imprescindibilidade do estudo da retórica para
identificar os meios de persuasão. Tais meios, no entanto, sofrem mudanças con-
forme o contexto e as transformações sociais. No decorrer dos tempos, novas lin-
guagens, tecnologias e mecanismos de persuasão se desenvolveram com o
objetivo de adequar-se aos tipos de auditórios e interlocutores que foram sur-
gindo. Conforme o nível de esclarecimento e informação de um interlocutor, os
argumentos e estratagemas de persuasã'o precisam de maior precisão. Para aten-
der às exigências de um público mais ri,goroso, se faz mister a utilização de um
maior arcabouço de elementos conceitua1is, mais abrangente e especializado. Uma
vez que a retórica ganha novas feições, conforme avançam os meios que se mos-
tram adequados para cativar os interlociUtores, precisamos desvelar esses meios
e identificar quais elementos se mantêm imutáveis no decorrer da sua trajetória.
Um traço constitutivo da retórica, que se incorpora à Nuper-retórica, consiste
no pressuposto persuasivo que lhe orienta e condiciona a sua aplicação. Quem
argumenta, busca conquistar a atenção do i nterlocutor para modificar- ou moti-
var- a sua decisão. É preciso, portanto, afetar o público. Isso significa que a retó-
rica atinge o campo das inclinações pessoais, porque move o interlocutor a tomar
um posicionamento que corresponde aos interesses do orador. Assim, seu com-
promisso com a eficácia se reitera e corrobora o entendimento de que se trata de
uma arte, a arte de argumentar, de persuadir.
A Nuper-retórica preenche um nicho que se formou com o esvaziamento de
valores da sociedade. Esse esvaziamento se traduz pela multiplicidade de meios
e pela fragilidade dos princípios. Os fins da Nuper-retórica são os mesmos que ca-
racterizaram todas as feições assumida!; pela retórica no decurso da história: a
persuasão e o assentimento às teses formuladas para conquistar a adesão de mais
interlocutores. Por esse motivo, pode-se dizer que os fins permaneceram intactos,
RETÓRICA E COMUNICAÇÃO MULTI DIMENSIONAl
imutáveis e invariáveis; suasórios como o canto das ninfas e das sereias. O fulcro
da Nu per-retórica se mostra análogo ao pressuposto orientador das múltiplas ma-
nifestações da retórica: a persecução suasória.
De contornos nitidamente pragmátiícos, os argumentos se revestem de uma
simplicidade indelével. Aquilo que originalmente integrava o campo da retórica,
pela expressão de uma linguagem acessível e pela expressão enfática da segurança 153
do orador, foi incorporado pela Nuper-netórica através de codinomes e caracte-
rísticas como intuitivo, produtivo e dotado de mobilidade. Não se trata desses
conceitos, mas dos seus respectivos significados, enquanto elementos constituti-
vos de um objeto que cativa, seduz e conduz pela sua própria forma. Aquilo que
vale para os objetos, também ocupa lugar de destaque no campo dos aplicativos
e softwares para dispositivos eletrônicos, incluindo os seus respetivos sistemas
operacionais. A marca, enquanto expressão gráfica de um fabricante, passa a in-
tegrar um arcabouço de símbolos linguísticos que, amalgamados, indicam status,
poder, posição social e competência pro·fissional.
Esse é o motivo pelo qual apresentamos esse conjunto amorfo de aponta-
mentos, que sinalizam a possibilidade de criação de um sistema complexo de con-
ceitos, técnicas e procedimentos, que nesgatam os elementos que servem para
consubstanciar uma Nuper-retórica, calcada nos pressupostos da ação voluntária,
no interesse da persuasão e ajustada a Llm modelo de pensamento que se pauta
na ideia de Fast Thinking (Cf. BOURDIEU,. 1997, p. 38-42). Orientada pelo resgate
de traços essenciais da retórica, em seus diversos matizes, sua configuração trans-
cende o campo do verbal indicado por IEemeren e Grootendorst (2004) em sua
Pragma-dialética, mas permanece ligada ao ambiente persuasivo das peças argu-
mentativas, implicando uma forma de argumentação não-verbal, cujos modelos
de retórica -da antiguidade às pretensêies da Novíssima retórica -não contem-
plaram. Aquilo que se designa como arglllmentação não-verbal, nos estreitos limi-
tes deste esboço, corresponde à organização sistemática de elementos e
componentes não-verbais de grande valor persuasivo. Trata-se de uma argumen-
tação, porque não deixa de ser uma forma de apresentar justificativas para uma
ideia que se pretender incutir em outrern, mas foge do escopo verbal, porque não
comporta a oralidade, sem, entretanto, desprezá-la.
REFERÊNCIAS
ALVES, Marco Antônio Sousa; FERES, Marcos Vinício Chein. Para uma ciência e um direito
pós-modernos. Revista da Faculdade de Direito Milton Campos, v. 10, p. 17-55,
2003. Disponível em:
https ://www.academia.edu/863297/Para_uma_ciência_e_um_direito_pós-
modernos. Acesso em: 22/09/2012.
ARISTÓTELES. Arte retórica. Tradução e notas de Manuel Alexandre Júnior; Paulo Farm-
house Alberto; Abel do Nasàmen1to Pena. Usboa: Imprensa Nacional- Casa da
Moeda, 2005. (Coleção Biblioteca de Autores Clássicos).
~
INOICE
AS ATRIBUIÇÕES DA (NUPER·)RETÓRICA: ARGUMENTAÇÃO E PERSUASÃO EM CONTEXTO($) MULTIMIDIÁTICO(S)