Sunteți pe pagina 1din 8

http://www.deriva.com.br/?

p=39

A Aventura – Georg Simmel


Cada parte de nossa atividade e de nossa experiência tem um duplo significado: ela gira em
torno do próprio ponto central; ela terá tanto em amplitude e profundidade, em prazer e dor,
quanto lhe for concedido pela experiência imediata; e ela é simultaneamente uma parte do
decorrer da vida, não apenas uma totalidade circunscrita, mas também um componente de um
organismo completo. Estes dois sentidos configuram diversamente cada conteúdo de vida;
acontecimentos cujas significações próprias poderiam ser muito semelhantes entre si – quando
essas se referem a si mesmas – são extremamente divergentes em função de suas relações
com a totalidade da vida; ou, sendo talvez incomparáveis com respeito à primeira perspectiva,
seus papéis como elementos de nossa existência inteira podem ser quase idênticos. Se de
duas experiências, cujos conteúdos perceptíveis são semelhantes, uma é percebida como
“aventura” e a outra não, isto constitui aquela diversividade da relação com a totalidade da
nossa vida, pela qual cabe a esta tal significado, que à outra não se coloca.Cada parte de
nossa atividade e de nossa experiência tem um duplo significado: ela gira em torno do próprio
ponto central; ela terá tanto em amplitude e profundidade, em prazer e dor, quanto lhe for
concedido pela experiência imediata; e ela é simultaneamente uma parte do decorrer da vida,
não apenas uma totalidade circunscrita, mas também um componente de um organismo
completo. Estes dois sentidos configuram diversamente cada conteúdo de vida;
acontecimentos cujas significações próprias poderiam ser muito semelhantes entre si – quando
essas se referem a si mesmas – são extremamente divergentes em função de suas relações
com a totalidade da vida; ou, sendo talvez incomparáveis com respeito à primeira perspectiva,
seus papéis como elementos de nossa existência inteira podem ser quase idênticos. Se de
duas experiências, cujos conteúdos perceptíveis são semelhantes, uma é percebida como
“aventura” e a outra não, isto constitui aquela diversividade da relação com a totalidade da
nossa vida, pela qual cabe a esta tal significado, que à outra não se coloca.

A forma da aventura, em sua acepção mais genérica, pode ser assim expressa: ela extrapola o
contexto da vida. Por aquela totalidade de uma vida entendemos que em seus conteúdos
específicos – por mais que eles se distingam de uma maneira flagrante e irreconciliável –
circula um processo de vida unitário. Contraposto à imbricação dos anéis da vida, ao
sentimento de que, apesar de todas essas contracorrentes, essas viradas, esses embaraços,
se tece, finalmente, uma linha contínua, está aquilo que chamamos aventura: uma parte da
nossa existência à qual – pela frente e por trás se ligam imediatamente outras, mas que, ao
mesmo tempo, em seu sentido profundo, corre por fora de qualquer continuidade desta vida.
Não obstante, ela é distinta do simples acaso, do estranho, do que apenas roça a epiderme da
vida. Ao situar-se fora do contexto da vida, a aventura como que penetra, justamente com esse
mesmo movimento, novamente nele – isso será paulatinamente esclarecido. Ela é um corpo
estranho em nossa existência, que, no entanto, é de alguma forma ligado ao centro. O externo
é, mesmo via um longo e não habitual desvio, uma forma do interno. Por essa situação
anímica, a aventura recebe facilmente a coloração do sonho na memória. Todos sabem como
os sonhos são rapidamente esquecidos, em função de eles se situarem também fora do
contexto de sentido da totalidade da vida. O que denominamos “onírico” não é outra coisa
senão uma recordação, que se associa com menos fios que as demais experiências ao
processo dinâmico e unitário da vida. Localizamos nossa incapacidade em ordenar uma
experiência a esse processo na representação do sonho, no qual esta experiência teria se
realizado. Quanto mais “aventureira” for uma aventura, tanto mais seu conceito será
preenchido em sua acepção mais pura, tanto mais ela será “onírica” para nossa memória. E ela
freqüentemente se afasta tanto do ponto central do Eu e do decurso da totalidade da vida, por
ele firmemente assegurado, que pensamos facilmente na aventura, como se um outro a tivesse
vivenciado; quão distante ela paira no lado oposto desta totalidade e quão estranha a aventura
se lhe tomou, exprime-se justamente pelo fato de, por assim dizer, ser compatível com nosso
sentimento, dar a ela um outro sujeito que não aquele. Em um sentido muito mais preciso do
que quando tratamos das outras formas dos nossos conteúdos de vida, a aventura tem começo
e fim. Isto constitui seu desligamento dos entrelaçamentos e encadeamentos daqueles
conteúdos, seu centramento em um sentido próprio. Com respeito aos acontecimentos
cotidianos e aos anuais, percebemos que um termina na medida em que – ou por que – o outro
se coloca. Eles determinam suas fronteiras entre si, e, com isso, a unidade do contexto da vida
é configurada ou expressa. A aventura, porém, segundo seu sentido como aventura, é
independente do anterior e do posterior; ela determina seus limites sem considerá-los,
http://www.deriva.com.br/?p=39

precisamente lá onde a continuidade com a vida é recusada por princípio – ou que em verdade
sequer precisa ser recusada, porque um estranhamento, uma intocabilidade e uma existência à
parte são dados de antemão – falamos de aventura. A ela falta aquela penetração mútua com
as partes vizinhas da vida, pela qual esta forma uma totalidade. O seu começo e o seu fim são
determinados como uma ilha na vida, de acordo com suas próprias forças formadoras, e não
como um pedaço de um continente, determinado simultaneamente pelo lado de cá e pelo lado
de lá. Esta delimitação decisiva, com qual a aventura se subtrai da marcha conjunta de um
destino, não é algo mecânico, mas orgânico. Assim como o organismo não determina sua
forma espacial simplesmente por meio de obstruções vindas da direita e da esquerda, mas
mediante a força motriz de uma vida que se forma internamente, também a aventura não
termina porque alguma outra coisa se inicia. Antes, sua forma temporal, seu fim radical,
constitui a figura precisa de seu sentido interior.Aqui temos, em primeiro lugar, a relação
profunda do aventureiro com o artista, e talvez também o fundamento da inclinação do artista
pela aventura, pois a essência da obra de arte é que ela recorta um pedaço da linha
infinitamente contínua da plasticidade e da experiência, o solta da conexão com este e com
aquele lado e lhe dá uma forma auto-suficiente, determinada a partir de um centro interno, e
por de mantida unida. O fato de uma parte da existência – entrelaçada na ininterrupção desta –
ser, todavia, sentida como uma totalidade, como uma unidade acabada, constitui a forma
comum à obra de arte e à aventura. E em função dela ambas são sentidas – em toda
parcialidade e casualidade dos seus conteúdos – como se em cada uma delas de alguma
maneira se resumisse e se esgotasse a vida toda. E isto parece acontecer não de um modo
pior, mas sim de um modo mais perfeito, porque a obra de arte se coloca do lado oposto da
vida, uma realidade, e a aventura se coloca do lado oposto da vida, como um processo
ininterrupto, que entrelaça compreensivelmente todo elemento com seu vizinho. Justamente
porque a obra de arte e a aventura se opõem à vida (mesmo que nos mais distintos
significados do oposto),1 uma e outra são análogas à totalidade de uma vida, como é
representado em um pequeno corte e na densidade da experiência do sonho.

Por isso o aventureiro é também o exemplo mais forte do homem a histórico, do ser do
presente. De um lado, ele não é definido por nenhum passado, o que determina sua oposição à
velhice, de outro, não há para ele o futuro. Uma prova extrema, e bem característica disto,
temos no fato de Casanova, como é de se ler em suas memórias, tão amiúde, no decorrer da
sua vida erótico-aventureira, pretender seriamente se casar com a mulher que ele amava
naquele momento. Na natureza e na condução da vida de Casanova havia algo completamente
contraditório; interna e externamente algo mais impossível seria impensável. Casanova não foi
somente um conhecedor primoroso dos homens, mas especialmente um raro conhecedor de si
mesmo; tendo de dizer a si próprio que não manteria um casamento por mais de catorze dias e
que as conseqüências lastimáveis deste passo seriam totalmente inevitáveis, o êxtase do
momento (quero aqui colocar o acento mais sobre o momento do que sobre o êxtase) engolia a
perspectiva de futuro. Porque o sentimento do presente o dominava incondicionalmente, ele
buscava uma relação para o futuro, o que era impossível justamente por sua natureza do
presente.O fato de algo isolado e casual conter uma necessidade e um sentido diferencia o
conceito de aventura de todas as partes da vida que encaixam os meros desígnios do destino
em sua periferia. Uma tal parte da vida só se torna uma aventura por meio daquela dupla
doação de sentido: ela constitui em si uma configuração de um sentido que é de alguma
maneira deveras significativo – configuração que é fixada por meio de um começo e um fim -;
ela está, não obstante toda sua casualidade e toda sua exterioridade perante o fluxo contínuo
da vida, em conexão com a essência e com a determinação do sujeito em um sentido amplo –
que se alastra aos segmentos racionais da vida – e em uma necessidade secreta.

Isso faz lembrar a relação do aventureiro com o jogador. O jogador, na verdade, está
abandonado à falta de sentido do acaso; apenas na medida em que ele conta com o favor
deste acaso, na medida em que ele considera possível uma vida condicionada por este acaso,
e a realiza, o acaso coloca-se para ele em uma concatenação do sentido. A superstição típica
do jogador não é outra coisa senão a forma palpável e singular, e por isso infantil, deste
esquema profundo e abrangente de sua vida: que no caso reside um sentido, um significado,
necessário qualquer – mesmo que este não seja necessário segundo a lógica racional. Pela
superstição, com a qual o jogador quer atrair o acaso, via augúrios e lances mágicos, para
dentro do seu sistema de finalidade, ele o libera de seu impenetrável isolamento, ele procura
http://www.deriva.com.br/?p=39

nesse acaso uma ordem vigente segundo certas leis, mesmo que segundo leis fantásticas. E
assim o aventureiro permite que o acaso, que se situa fora da linha da vida, que é dirigida por
um sentido, seja todavia abrangido por este sentido. Ele introduz um sentimento central da
vida, que é conduzido por meio da excentricidade da aventura e produz uma necessidade nova
e significativa de sua vida, justamente na amplitude da distância entre seu conteúdo casual
dado pelo exterior e o centro da existência – unificador e doador de sentido. Entre acaso e
necessidade, entre os fragmentados da realidade exterior e o significado unitário da vida
desenvolvida a partir de dentro, está em jogo, em nós, um processo eterno, e as grandes
formas, nas quais configuramos os conteúdos da vida, são as sínteses, os antagonismo e os
compromissos destes aspectos fundamentais. A aventura é um deles. Se o aventureiro
profissional faz da ausência de sistema da sua vida um sistema de vida, se ele busca os meros
acasos exteriores a partir de sua necessidade interior, incorporando aqueles nesta, com isto ele
toma apenas macroscopicamente visível o que constitui a forma essencial de toda “aventura”,
mesmo a do homem não aventureiro, pois sempre entendemos por aventura um terceiro termo
– além tanto do mero acontecimento abrupto, cujo sentido permanece pura e simplesmente
exterior para nós (do mesmo modo como veio do exterior), como também da linha unitária da
vida, na qual cada parte complementa a outra, formando um sentido total. A aventura não é
uma mistura de ambos, mas a experiência incomparavelmente colorida, que se deixa
interpretar apenas como abrangência especial daquele pólo casual-exterior pelo pólo interior-
necessidade. Ocasionalmente toda esta relação é ainda abarcada por uma profunda
configuração interior. Da mesma maneira como a aventura parece basear-se numa
diferenciação dentro da vida, a vida como um todo pode ser sentida como uma aventura. Para
tanto, não é preciso nem ser um aventureiro, nem vivenciar várias aventuras específicas. Quem
tem esta atitude singular perante a vida deve sentir, sobre a totalidade daquela vida, uma
unidade superior, como que uma vida superior que se comporta perante aquela como a própria
totalidade da vida imediata diante das experiências específicas – que são para nós as
aventuras empíricas. Talvez pertençamos a uma ordem metafísica, talvez nossa alma viva uma
existência transcendente, de tal forma que, contraposta a uma inominável existência que se
completa acima dela, nossa vida terrena consciente seja somente uma parte isolada. O mito da
transmigração de almas pode ser uma tentativa hesitante de exprimir este caráter segmentário
de toda vida dada. Quem sente por meio de toda a vida real uma existência atemporal e
secreta da alma – que é ligada a estas realidades apenas como que de longe – perceberá a
vida em sua totalidade dada e limitada como uma aventura, comparada àquele destino
transcendente e em si unitário. Certas motivações religiosas parecem provocar isto. Onde
nosso trilho terreno é considerado um mero estágio anterior do cumprimento do destino eterno,
onde temos sobre a terra apenas uma ligeira estadia de hóspede, mas não um lar, há
manifestamente apenas uma coloração especial do sentimento geral de que a vida como uma
totalidade é uma aventura; com o que é expresso somente que os sintomas da aventura afluem
para ela: que ela se situa fora do sentido próprio e do decurso contínuo da existência, mas
está,contudo, ligada a eles por meio de um destino e de uma simbólica misteriosa; que ela é
um acaso fragmentário, mas é, todavia, coesa como uma obra de arte, com começo e fim; que
ela, como um sonho, junta em si todas as paixões e, como este, está fadada ao esquecimento;
que ela, como o jogo, se distingue do sério, mas caminha, como o Va banque do jogador, em
direção à alternativa de um ganho máximo ou da destruição.

A síntese das grandes categorias da vida – sendo a aventura uma formação peculiar delas –
perfaz-se entre a atividade e a passividade, entre aquilo que conquistamos, e aquilo que nos é
dado. Sem dúvida, a síntese da aventura torna a oposição destes elementos extremamente
perceptível. Por um lado, com ela, abarcamos violentamente o mundo em nosso interior. A
diferença em relação à maneira como aproveitamos as dádivas dele no trabalho deixa isto
claro. O trabalho possui, por assim dizer, uma relação orgânica com o mundo, ele desenvolve
continuamente as matérias e forças do mundo até seu ápice, visando a finalidades humanas,
enquanto, na aventura, temos uma relação inorgânica com o mundo; ela traz consigo os gestos
do conquistador, o rápido aproveitamento das chances, não importando se com isto separamos
uma parte harmônica ou desarmônica para nós, para com o mundo ou para com a relação de
ambos. De outro lado, porém, na aventura, estamos expostos ao mundo, mais desprotegidos e
sem reservas do que naquelas relações todas, que estão ligadas por mais pontes com a
totalidade de nossa vida no mundo e que, portanto, nos protegem melhor contra os choques e
perigos, por meio de desvios e adaptações.
http://www.deriva.com.br/?p=39

Aqui entrelaçamento de ação e sofrimento, no qual decorre nossa vida, estende seus
elementos a uma simultaneidade da conquista, que deve tudo somente à própria força e ao
espírito do presente, e do completo abandonar-se às forças e às chances do mundo, que tanto
podem nos favorecer como nos destruir. O fato de a unidade na qual reunimos em cada
momento nossa atividade e nossa passividade perante o mundo – unidade que num certo
sentido constitui a vida – conduzir seus elementos a um aguçamento tão extremo e,
precisamente com isto, tomar-se mais profundamente perceptível – como se eles fossem
somente aspectos de uma e da mesma vida misteriosamente inseparável – constitui um dos
mais admiráveis encantos com o qual a aventura nos seduz. O fato de a aventura continuar nos
parecendo um cruzamento do momento de segurança da vida com o de insegurança constitui
algo mais que o posicionamento da mesma relação fundamental, sob um outro ponto de vista.
A segurança que – acertada ou equivocadamente – temos com respeito ao êxito confere à
atividade uma coloração qualitativamente especial. Se, ao contrário, não estamos seguros de
que alcançaremos o objetivo estabelecido na partida, se temos consciência da incerteza com
respeito ao êxito, isto constitui não apenas uma segurança quantitativamente menor, mas
significa, antes, uma condução interna e externamente singular da nossa praxis. O aventureiro,
para dizê-lo numa só palavra, trata o que na vida é incalculável, como em geral tratamos o que
pode ser calculado com segurança. (Por isso o filósofo é o aventureiro do espírito. Ele faz a
tentativa sem perspectiva, porém não sem sentido, de formular em termos de um conhecimento
conceitual um procedimento de vida da alma, sua disposição diante de si, do mundo e de Deus.
Ele trata o insolúvel como se fosse solúvel.)

Onde o entrelaçamento com os elementos desconhecidos do destino torna duvidoso o êxito de


nossa atividade, cuidamos de limitar o emprego de nossas forças, de manter abertas as linhas
de retirada e damos cada passo apenas experimentando. Na aventura, procedemos de um
modo diametralmente oposto: apostamos tudo justamente na chance flutuante, no destino e no
que é impreciso, derrubamos a ponte atrás de nós, adentramos o nevoeiro, como se o caminho
devesse nos conduzir sob quaisquer circunstâncias. Este é o típico “fatalismo” do aventureiro.
Certamente as escuridões do destino não são mais transparentes a ele que aos outros, mas
ele se comporta como se fossem. A ousadia peculiar com a qual ele sempre se retira da
estabilidade da vida constrói de certa maneira, para sua própria legitimação, um sentimento de
segurança e de necessidade do êxito, que em geral só encontramos na transparência de
acontecimentos calculáveis. O fato de o aventureiro, não obstante, crer que este desconhecido
é seguro para ele constitui apenas um afastamento subjetivo da convicção fatalista, de que
nosso destino – o qual não conhecemos – é com certeza inevitável; por isso a atividade do
aventureiro freqüentemente parece loucura aos olhos do homem sóbrio, porque, para que
tenha sentido, ela parece ter como pré-requisito que o insondável seja sabido. O príncipe de
Ligne dizia de Casanova: “Ele não acredita em nada, exceto no que é menos plausível”.
Evidentemente, aquela relação perversa ou no mínimo “aventureira” entre o sabido e o
ignorado constitui o fundamento desta afirmação. O ceticismo do aventureiro – o fato de ele
“não acreditar em nada” – é manifestamente um correlato disto: para quem o improvável é
provável, o provável toma-se facilmente improvável. O aventureiro confia, de algum modo, em
sua própria força; antes de tudo, porém, confia em sua própria sorte; no fundo, ele se fia em
uma singular união não diferenciada de ambas. A força, da qual ele está seguro, e a sorte, da
qual ele não está seguro, convergem nele – subjetivamente – em direção a um sentimento de
segurança. Se a essência do gênio é caracterizada por uma relação imediata com as unidades
misteriosas, que na experiência e na decomposição operada pela razão se separam em
fenômenos completamente isolados, então o aventureiro genial vive, como que com um instinto
místico, no ponto onde a marcha do mundo e o destino individual por assim dizer ainda não se
diferenciaram um do outro. Por isso o aventureiro tem geralmente feições “geniais”. A partir
desta constelação especial, na qual ele faz do mais inseguro e do incalculável os pressupostos
de sua ação – o que um outro faria apenas do calculável -, tomase compreensível a “segurança
sonâmbula” com a qual o aventureiro conduz sua vida e, mediante a postura inabalável que
este mantém quando vem a ser desmentido pelos fatos, se comprova quão profundamente
aquela constelação está enraizada nos pressupostos de vida de pessoas desta natureza.

Mesmo sendo a aventura uma forma de vida que pode se concretizar em uma multiplicidade de
conteúdos de vida não decididos de antemão, o conteúdo erótico tende, antes de todos os
demais, a assumir esta forma, de tal modo que nossa linguagem praticamente impede a
http://www.deriva.com.br/?p=39

aventura de ser entendida como algo diferente de uma experiência erótica. Na verdade, uma
experiência amorosa de curta duração não constitui necessariamente uma aventura. Antes,
para que ela exista, é mister que as qualidades anímicas especiais – em cujo ponto de
encontro reside a aventura – se unifiquem com esse momento quantitativo. Sua tendência para
esta aproximação manifesta-se passo a passo. A relação amorosa contém em si a junção clara
– que também unifica a forma do aventureiro – desses elementos: a força conquistadora e a
concessão não-constrangi da, o ganho advindo da própria capacidade e a dependência da
sorte, que nos é concedida por uma instância incalculável alheia à nossa força e capacidade.
Talvez uma certa equivalência destas direções na experiência, obtidas na base de sua
diferenciação profunda, seja encontrável somente da parte do homem; talvez se deva a isto a
significação exemplar, constatável no fato de a relação amorosa normalmente ser considerada
apenas para o homem “aventura”, sendo que para a mulher algo idêntico é enquadrado em
outras categorias. A atividade da mulher em um romance amoroso é tipicamente entremeada
de passividade, que foi pela natureza ou pela história atribuída à sua essência; por outro lado,
o ato de receber e o seu contentamento constituem imediatamente uma concessão e um
presentear. Os dois pólos da conquista e da graça – que podem ser expressos em vários
matizes – estão muito próximos na mulher e se distanciam decisivamente no homem, e por
isso sua junção na experiência erótica confere ao homem o cunho – pouco dúbio – de
“aventura”.

O fato de o homem ser a parte pretendente, ativa e amiúde impetuosamente abarcadora


permite facilmente que, em cada experiência erótica percebida com displicência, o momento do
destino, ou seja, a dependência a algo não previamente determinável, a algo que se subtrai a
qualquer coação, passa desapercebido. Com isto entendemos não apenas a dependência à
concessão por parte do outro, mas algo mais profundo.Certamente todo amor correspondido é
um presente que não pode ser “merecido”, independente da proporção do amor, porque o amor
se esquiva de qualquer exigência e pagamento e, por princípio, pertence a uma categoria
totalmente distinta do acerto mútuo de contas; um ponto que mostra uma de suas analogias
com a relação religiosa profunda. Além daquilo que recebemos do outro como doação livre,
existe ainda em cada felicidade amorosa um favor do destino – como portador mais profundo e
impessoal daquela doação pessoal. Nós o recebemos não apenas do outro, antes, o fato de
recebermos dele constitui uma graça dos poderes incalculáveis. No acontecimento mais
orgulhoso e autoconfiante deste campo reside algo que devemos tomar com humildade. E na
medida em que a força, que deve seu sucesso a si mesma e que dá a toda conquista amorosa
algum tom de vitória e triunfo, se casa com aquela outra da graça do destino, temos de certa
maneira a constelação da aventura. Em solos profundos enraíza-se a relação do conteúdo
erótico com as formas gerais de vida da aventura. A aventura é o enclave do contexto da vida,
o recorte abrupto, cujo início e fim não têm ligação com a corrente de algum modo unitária da
existência – e não obstante, ela, como que por sobre esta corrente e prescindindo de sua
mediação, se conecta com os instintos mais misteriosos e com uma intenção última da vida e
se diferencia, em função disto, do mero episódio casual, do que nos “acontece” apenas
exteriormente. Onde a experiência amorosa tem uma duração curta, ela vive justamente neste
entrelaçamento de um caráter meramente tangencial com um caráter central. Ela pode dar à
nossa vida um brilho simplesmente momentâneo, como um raio que lança, em um ambiente
interior, uma luz externa, deslizante, efêmera; todavia, com isto é satisfeita uma necessidade,
ou, em outros termos, a aventura só é possível em função de uma necessidade – chamem-na
física, psíquica ou metafísica – que existe como que atemporalmente no fundamento ou no
centro de nossa essência e que é tão ligada à experiência fugaz, quanto aquela claridade
casual prontamente extinguível o é com a nossa nostalgia da luz.

A possibilidade de existência desta dupla relação no âmbito do erótico espelha-se em seu


duplo aspecto temporal: o êxtase momentaneamente culminante e abruptamente cadente e a
eternidade, em cuja idéia se cria uma expressão temporal para o fato de duas almas serem de
uma forma mística determinadas uma para a outra e ainda para uma unidade superior. E isto
poderia ser comparado com a dupla existência de conteúdos espirituais, que emergem de fato
apenas na fugacidade do processo anímico, no ponto sempre instantâneo de incandescência
da consciência, mas cujo sentido lógico possui, porém, uma validade atemporal, uma
significação ideal, totalmente independente daquele instante da consciência, na qual estes
conteúdos espirituais se tornam reais para nós. O fenômeno da aventura – com sua marca
http://www.deriva.com.br/?p=39

abruptamente pontiaguda, que empurra o final para o campo de visão do início e com sua
relação simultânea com um centro da vida, que a distingue do mero acontecimento casual
(relação cuja ausência implicaria a impossibilidade de existência do “risco de vida” no estilo da
aventura) – é deste modo um forma que, pelo seu simbolismo temporal, aparece como
predeterminada para a recepção do conteúdo erótico. Estas analogias e formulações comuns
ao amor e à aventura já prenunciam o fato de a aventura não pertencer ao estilo de vida da
velhice. O que é decisivo para este fato é que a aventura, segundo sua essência e encanto
específicos, é uma forma da experiência. O conteúdo do acontecer não constitui ainda a
aventura: o fato de existir um risco de vida ou de uma mulher ser conquistada para uma breve
felicidade; o fato de elementos desconhecidos, com os quais se ponderou o jogo, terem trazido
ganho ou perda surpreendente; o fato de a pessoa com um disfarce físico ou psíquico se
encontrar em esferas da vida, das quais se regressa ao mundo familiar como que vindo de um
mundo estranho – tudo isto não constitui ainda necessariamente uma aventura. Esta se
caracterizará somente por meio de uma certa tensão do sentimento de vida, com a qual
aqueles conteúdos se realizam; somente quando uma corrente, indo e vindo entre a parte mais
exterior da vida e a sua fonte central de energia, abarca aquela em si, e quando aquela
coloração, temperatura e ritmo especiais do processo de vida constituem o que é
verdadeiramente decisivo, o que de certa maneira acentua o conteúdo de um tal processo de
vida, o acontecimento deixará de ser uma simples experiência e se tornará uma aventura.

Este princípio de acentuação, porém, se distancia da velhice. De forma geral, somente a


juventude conhece tal preponderância do processo sobre os conteúdos da vida, enquanto para
a velhice, quando o processo da vida começa a desacelerar e a enrijecer, importam os
conteúdos, que são de certo modo atemporais e indiferentes ao ritmo e à paixão de sua
experiência. Na velhice, ou se vive totalmente centralizado, e neste caso os interesses
periféricos decaem e perdem a ligação com a vida essencial e com sua necessidade interna,
ou o centro se atrofia, em decorrência do que a existência passa a se limitar tão-somente aos
detalhes isolados e passa a haver a acentuação da importância do que é meramente exterior e
casual. Em nenhum dos dois casos é possível a relação entre o acontecimento exterior e as
fontes de vida interna, na qual se fundamenta a aventura, em nenhum deles se pode chegar à
sensação de contraste da aventura: onde uma atividade é retirada totalmente do contexto geral
da vida, mas deixa, não obstante, fluir em si a força e a intensidade totais da vida. Esta
oposição entre juventude e velhice – por meio da qual a aventura se torna prerrogativa da
primeira, o que acentua lá o processo da vida, seu ritmo e suas antinomias e aqui os
conteúdos, para os quais a experiência aparece cada vez mais como uma forma
comparativamente casual – pode ser expressa como aquela entre o espírito romântico e o
espírito histórico da vida. Para a atitude romântica importa a vida em sua imediaticidade, na
individualidade de sua forma momentânea, em seu aqui e agora; ela sente a força total da
corrente da vida com mais intensidade precisamente na pontualidade de uma experiência
arrancada do curso normal das coisas, mas à qual se estende, contudo, um nervo proveniente
do coração da vida. Toda esta ação da vida lançando-se fora de si, esta amplitude da oposição
dos elementos penetrados por esta ação, pode alimentar-se somente do excesso e da alegria
incontida da vida, como ocorre na aventura, no romantismo e na juventude.

A disposição histórica é mais própria da velhice, se esta como tal tem uma atitude importante e
característica de recolhimento. O fato de esta disposição histórica ampliar-se para uma visão
do mundo ou restringir seu interesse ao próprio passado é irrelevante; em todo caso ela
corresponde, em sua objetividade e meditação retrospectiva, à imagem dos conteúdos da vida,
da qual a imediaticidade da vida em si desapareceu. Toda história como imagem, em um
sentido científico restrito, é gerada por meio desta sobrevivência dos conteúdos além do
processo de seu presente, que é vivenciado, porém indizível. A ligação que este processo
construiu entre eles desintegrou-se e precisa ser agora reconstruída na forma de uma imagem
ideal, por meio de linhas totalmente diferentes. Com este deslocamento do acento, deixam de
existir todos os pressupostos dinâmicos da aventura. Sua atmosfera é, como já foi indicado, a
contemporaneidade incondicional, a aceleração do processo da vida até um ponto que não
possui nem passado nem futuro – e que por isso reúne a vida em si com intensidade – e que
se torna com freqüência relativamente indiferente à matéria do processo.
http://www.deriva.com.br/?p=39

Assim como para a verdadeira natureza do jogador o motivo decisivo não é ganhar esta ou
aquela quantia em dinheiro, mas sim o jogo como tal, a violência do sentimento rasgado pela
oscilação entre a felicidade e o desespero, a proximidade, como que palpável, das forças
sobrenaturais, que decidem entre ambos, também a sedução da aventura inúmeras vezes não
se encontra no conteúdo que ela nos oferece – e que, oferecido de outra forma, seria talvez
menos reparado – mas sim na forma aventureira de sua experiência, na intensidade e no
suspense, com os quais ela, exatamente nestes casos, nos permite sentir a vida. Justamente
isso liga a juventude à aventura. O que se chama de subjetividade da juventude é somente isto:
a matéria da vida em seu significado objetivo não é para ela tão importante quanto o processo
que a conduz, quanto a própria vida. O fato de a velhice ser “objetiva”, o fato de ela formar, a
partir dos conteúdos que a vida passada deixou restar de um modo especialmente atemporal,
uma composição nova: da contemplatividade, da ponderação objetiva, do que está livre da
inquietação com a qual a vida se torna presente – precisamente isto é o que aliena a aventura
da velhice, o que faz do velho aventureiro um fenômeno repulsivo e sem estilo; não seria difícil
desenvolver toda a essência da aventura pelo fato de ela simplesmente não ser uma forma de
vida em conformidade com a velhice. Todas aquelas determinações e situações da vida que
são não só estranhas mas mesmo hostis à sua forma de aventura não impedem que a
aventura, em um aspecto mais geral, apareça misturada a toda existência humana prática
como elemento encontrado por todo lado, que apenas comparece reiteradamente nas
distribuições mais sutis como que macroscopicamente invisível e encoberta por outros
elementos no fenômeno. Independente daquela representação que se aproxima da metafísica
da vida, segundo a qual nossa existência sobre a terra como totalidade e unidade constitui uma
aventura, e visto antes pelo lado puramente concreto e psicológico, cada experiência singular
contém alguma quantidade de determinações que em certa medida lhe faculta alcançar o
“limiar” da aventura. Dentre estas determinações, a mais essencial e mais profunda neste caso
é o apartamento do acontecimento do contexto geral da vida. O fato de pertencer a este
contexto não esgota a significação de nenhuma de suas partes. Antes, mesmo onde uma tal
parte está mais estreitamente entrelaçada com o todo, onde ela parece estar realmente toda
dissolvida no contínuo fluir da vida, como uma palavra não-acentuada no decorrer de uma frase
mesmo aí uma percepção refinada permite reconhecer uma valor próprio desta parcela da
existência; com uma significação autocentrada, esta parcela contrapõe-se àquele
desenvolvimento total, ao qual, visto pelo outro lado, ela pertence inseparavelmente. Tanto a
riqueza como a perplexidade da vida procedem inúmeras vezes desta dualidade de valores de
seus conteúdos. Vista a partir do centro da personalidade, uma tal experiência constitui tanto
algo necessário, desenvolvido a partir da unidade da história individual, como algo casual,
estranho a esta unidade, insuperavelmente delimitado e colorido por uma profunda
incompreensibilidade, como se esta experiência estivesse em algum lugar no vazio e
gravitasse no nada.

Destarte, sobre toda e qualquer experiência há uma sombra daquilo que a aventura realiza em
sua concisão e clareza. Uma tal experiência permite que um certo sentimento de inclusividade
em um começo e um fim, um sentimento da pontualidade da experiência singular que como tal
desconsidera o resto, se afaste de sua incorporação à seqüência da vida. Este sentimento
pode tornar-se imperceptível, mas ele está latente em cada experiência e emerge dela,
freqüentemente, para nosso próprio espanto. Não se poderia indicar uma experiência, cuja
distância da continuidade da vida seja ínfima, na qual não pudesse emergir o sentimento da
aventura, nem tampouco uma experiência tão distante dela, na qual este sentimento emergiria
necessariamente; não se poderia tornar tudo aventura caso seus elementos não repousassem
em alguma medida em tudo, caso eles não pertencessem aos fatores vitais, devido aos quais
um acontecimento pode ser designado como experiência humana. O mesmo ocorre com a
relação do que é casual com o que é vinculado ao sentido. Em cada sucesso que se nos
depara, há tanto de algo simplesmente dado, exterior e eventual, que se reduz somente a uma
questão de quantidade saber se a totalidade pode ser considerada algo razoável, algo que
possa ser compreendido conforme um sentido, ou se sua indissolubilidade com respeito ao
passado e sua incalculabilidade com respeito ao futuro devem determinar a coloração do todo.
Entre o empreendimento burguês mais seguro e a aventura mais irracional há uma série
contínua de manifestações da vida, nas quais o compreensível e o incompreensível, o
provocado e a graça concedida, o calculável e o casual se misturam em uma infinitude de
graus. Na medida em que a aventura indica um extremo nesta série, o outro tem também,
justamente por isso, uma parcela em seu caráter. A inserção de nossa existência em uma
http://www.deriva.com.br/?p=39

escala, na qual cada marca é simultaneamente determinada por uma atuação de nossa força e
por um abandono às coisas e poderes impenetráveis – esta problemática de nossa colocação
no mundo que assume uma conotação religiosa na questão insolúvel sobre a liberdade do
homem com respeito às determinações divinas – permite que nos tornemos todos aventureiros.
No âmbito de nossa circunscrição de vida e de nossas tarefas nela, que definem nossos
objetivos e nossos meios, não poderíamos viver sequer um dia, se não tratássemos o
incalculável como se fora calculável; se não confiássemos à nossa força o que ela não pode
produzir sozinha, mas apenas em sua enigmática atuação conjunta como as forças do destino.
Os conteúdos de nossa vida são continuamente compreendidas por formas que se misturam e
que deste modo realizam sua totalidade unitária: há por toda parte formação artística,
concepção religiosa, coloração de valores morais e reciprocidade de sujeito e objeto. Talvez
não haja nenhuma dimensão da corrente deste rio, na qual cada um destes tipos de
configuração, e muitos outros ainda, não formariam pelo menos uma gota de suas ondas.
Porém, somente quanto elas, a partir da escala e da situação fragmentária e misturada nas
quais a vida mediana as deixa submergir e emergir, alcançam um domínio sobre a matéria da
vida, elas se tomam formações puras, correspondendo então às denominações da linguagem.
Assim que a atmosfera religiosa cria puramente de si sua formação, o Deus, ela vem a ser
“religião”; assim que a forma estética faz de seu conteúdo algo de importância secundária, com
o que ela vive sua vida baseada somente em si, ela se toma “arte”; somente quando o dever
moral é cumprido apenas porque ele é um dever – não importando quão cambiante sejam os
conteúdos com os quais ele se preenche e que antes, por seu lado, determinaram a vontade –
ele se toma “moralidade”. Com a aventura não é diferente. Somos os aventureiros da Terra,
nossa vida é perpassada a cada passo pelas tensões que constituem a aventura. Apenas
quando estas tensões ficam de tal modo violentas, que elas passam a dominar a matéria na
qual se perfazem, surge a “aventura”, pois ela não se baseia nos conteúdos, que com ela são
ganhos ou perdidos, desfrutados ou sofridos: tudo isto nos é acessível também em outras
formas de vida. Antes, o fato de o radicalismo estar ali, radicalismo pelo qual ela é sentida
como tensão da vida, mudança de ritmo do processo de vida, independente de sua matéria e
de suas diferenças; o fato de a quantidade destas tensões ser grande o suficiente para a vida
arrancar-se daquela matéria – isto faz da mera experiência uma aventura. Ela é decerto
apenas uma parte da existência, paralela a tantas outras, pertencente porém àquelas formas
que – além de sua mera participação na vida e além de toda casualidade de seus conteúdos
específicos – possuem a força misteriosa de deixar a totalidade da vida ser sentida em um
instante. Instante no qual a vida se perfaz e que constitui um suporte que estaria ali apenas
para sua realização.

1 No original, Gegenüber, que também pode significar “perante”, “estar diante de”. (N. do T.

S-ar putea să vă placă și