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OS DIREITOS FUNDAMENTAIS, A

TRIBUTAÇÃO E A HUMANIZAÇÃO
DAS PUNIÇÕES

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RESUMO: Existe um mito na esfera do Direito Penal com
relação ao período conhecido como de humanização das pu-
nições. A maior parte da doutrina atribui exclusivamente aos
ideais iluministas – principalmente ao que foi condensado na
obra de Cesare Bonesana, Marquês de Beccaria – que acaba-
ram por influenciar na positivação dos direitos fundamentais
da pessoa humana, a responsabilidade pela transição do Di-
reito Penal do terror para o Direito Penal humanitário. A his-
tória não foi exatamente assim, sendo o objetivo do presente
texto resgatar os outros motivos que levaram ao abrandamen-
to das punições como forma de melhor punir e de aumentar
o campo de atuação e a eficácia do Direito Penal.
PALAVRAS-CHAVE: Direito Penal. Punição. Direitos
Fundamentais.
ABSTRACT: There is a myth in the sphere of Criminal Law
regarding the period known as the humanization of punish-
ments. Most of the doctrine assigns exclusively to the Enli-
ghtenment ideals – especially to what was condensed in the
work of Cesare Bonesana, Marquês de Beccaria – that ended
up influencing the positivation of the fundamental rights of
the human person, the responsibility for the transition from
Criminal Law of terror to Humanitarian Criminal Law. The
purpose of this text was to rescue the other reasons that led to
the slowing down of punishments to better punish, to incre-
ase the field of action and the effectiveness of Criminal Law.
KEYWORDS: Criminal Law. Punishment. Fundamental Ri-
ghts.
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Punições: aproximação histó-
rico-doutrinal. 2.1 Gênese do direito penal. 2.2 Período da
vingança privada. 2.3 Período da vingança divina. 2.4 Perío-
do da vingança pública. 3. Do Estado Absoluto ao Estado Li-
beral: 3.1 A transição da forma estatal medieval para o Estado
moderno; 3.2 O Estado Absolutista. 3.3 O Estado Liberal. 4.

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A formação histórica dos direitos fundamentais: 4.1 Direito
natural: antecedente histórico dos direitos fundamentais. 4.2
A positivação dos direitos fundamentais. 5. Direito Penal: do
terror à humanização: 5.1 Os ideais iluministas e a humani-
zação das penas. 5.2 As ilegalidades de direitos e de bens e
a humanização das penas. 5.3 Os direitos fundamentais e a
humanização das penas. 6. Considerações finais.

1. INTRODUÇÃO
O período que corresponde à transição do Estado em sua
forma medieval até a consolidação do Estado liberal traz con-
sigo, concomitantemente, dois marcos de suma importância:
a transição do Direito Penal do terror para o Direito Penal
humanitário – com a importante e nem sempre abordada
problemática das ilegalidades dos direitos (sonegação de im-
postos) em confronto com as ilegalidades dos bens (crimes
patrimoniais), como fator preponderante para humanização
das penas – e a constitucionalização dos direitos fundamen-
tais da pessoa humana.
A análise da origem, da natureza e da evolução tanto das
penas quanto dos direitos fundamentais e a interação entre
ambos certamente é um tema dos mais fascinantes, entretan-
to de larga extensão e profundidade, o que refoge totalmente
aos objetivos deste pequeno trabalho que se cingirá apenas
a fazer uma aproximação histórica entre os direitos funda-
mentais, as ilegalidades praticadas na passagem do Estado
absolutista para o Estado Liberal e a influência de ambos na
humanização das penas.
A aproximação que acima se alude e se pretende fazer
nasce das semelhanças políticas, ideológicas, assim como jurí-
dicas de outrora, mas também hodiernas, entre a estrita lega-
lidade penal e a estrita legalidade tributária que, ao longo dos

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séculos, com maior ou menor rigor, garantiram a liberdade e
a propriedade, respectivamente, ambos direitos fundamentais
do homem.
Quanto ao enfoque histórico que norteia todo o presen-
te trabalho, tem este a sua razão de ser. A extrema carência
de produção científica na área penal que percorra a histó-
ria do direito, o que, sem sombra de dúvidas, servirá como
contraponto à produção estéril que se limita à compilação
da doutrina dogmática e à análise de julgados baseados em
tal doutrina, o que acaba por formar juristas com um conhe-
cimento empobrecido, acríticos e alienados, completamente
desorientados no que diz respeito aos fundamentos do Direi-
to. O conhecimento da história do Direito, suas origens, suas
transições, enfim, seu desenvolvimento ao longo dos séculos
é, estreme de qualquer argumentação, a chave para sua me-
lhor compreensão105.
Por outro lado, temos que o grande objetivo de qual-
quer trabalho científico é o estímulo à curiosidade, ou seja,
o estímulo à leitura de outras obras que melhor retratem e
aprofundem os vários temas expostos, fazendo com que, em
última instância, tenha-se a ampliação do conhecimento, já
que o poder é o produto do saber, o qual, da mesma forma,
engendra o poder. E é esse o ponto em que a presente obra
apresenta algum valor, somente enquanto estimula a curiosi-
dade para uma pesquisa mais aprofundada do que exposto,
já que não há a menor pretensão de esgotar qualquer das
temáticas abordadas.
105
Interessante notar que, nesse ponto, as abalizadas doutrinas de Mezger
(1946, p. 41) e de Asúa, (1950, p. 201) se chocam. Para o primeiro,
não é possível compreender nenhum ramo do Direito em seu estado
atual sem que se tenha conhecimento de seu desenvolvimento evoluti-
vo ao largo dos tempos. Já para o penalista argentino, fundado na dou-
trina de Augusto Conraz, o Direito Penal é eminentemente moderno,
filosófico independente do passado.

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No que pertine ao itinerário a ser percorrido, em um pri-
meiro momento uma abordagem histórica das punições se
torna imprescindível, sendo necessário traçar, ainda que resu-
midamente, o longo período por que passou o Direito Penal
em sua era de terror, em que as penas aplicadas eram de uma
crueldade inigualável, período este jamais superado em qual-
quer fase da história humana. Cuida-se, nesta etapa, de des-
tacar toda a evolução do Direito Penal em seu viés arbitrário
e ameaçador, em um período determinado, para uma melhor
compreensão da evolução correlata do Estado, período este
que vai da Antiguidade até meados da Idade Moderna, mo-
mento em que se finda a era do terror punitivo.
Em um segundo momento, ainda sob um prisma históri-
co, impende analisar ainda a transição das formas de poder do
Estado, mais precisamente do medievo até o liberalismo, por
estarem essas formas de poder intrinsecamente ligadas tanto à
transição penal – sendo nesse período que a problemática dos
ilícitos tributários em confronto com os ilícitos patrimoniais
tem papel preponderante para o deslinde da humanização das
penas – quanto à formação dos conceitos positivados dos di-
reitos fundamentais da pessoa humana.
De outra parte, sempre aproximando o tema abordado da
evolução do Estado e do Direito Penal, é a vez de se elabo-
rar uma síntese histórica dos direitos fundamentais, dos an-
tecedentes históricos à positivação dos mesmos, com especial
realce para os direitos de primeira geração, em razão de coin-
cidirem historicamente – influenciando de forma definitiva
– com a transição do Direito Penal do terror para o Direito
Penal humanitário.
Por fim, no quarto e último capítulo, a análise da impor-
tância que cada um dos temas abordados teve quando da
humanização das penas: qual o peso da noção recém-incor-
porada de direitos fundamentais da pessoa humana no que

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pertine ao ato de punir; qual o entrelaçamento da sonegação
dos impostos e dos crimes patrimoniais na suavização das pu-
nições; qual a influência da transição das formas de poder em
relação ao direito punitivo.
De ver-se, pois, que o presente trabalho objetiva, acima
de tudo, situar historicamente o Direito Penal quando de sua
transição mais importante – do terror para o humanitarismo
das penas –, quando então alcança o status de Direito Pe-
nal liberal, na certeza de que a compreensão histórica desse
período do direito punitivo proporciona, hodiernamente, o
necessário entendimento para os que querem se aprofundar
– tendo como referencial uma visão crítica – nesse ramo das
Ciências Jurídicas.

2. PUNIÇÕES: APROXIMAÇÃO
HISTÓRICO-DOUTRINAL

2.1 Gênese do Direito Penal

As primeiras manifestações do Direito Penal surgiram con-


comitantemente ao surgimento dos primeiros agrupamentos
de seres humanos, acredita-se. Por força do impulso de as-
sociação, o que se encontra na história e pré-história da hu-
manidade são grupos humanos e não indivíduos isolados106
e, por força da necessidade de sobrevivência, dentro desses
grupos, normas de comportamento social. No dizer de Ma-
galhães Noronha (1987, p. 20): “A história do Direito Pe-
nal é a história da humanidade. Ele surge com o homem e
o acompanha através dos tempos, isso porque o crime, qual
sombra sinistra, nunca dele se afastou”.

106
Cf. Asúa, (1950, p. 205-209).

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A origem das penas, segundo parte majoritária da dou-
trina, fundada em relatos antropológicos oriundos das mais
variadas fontes, está intimamente ligada à religião ou, melhor
ainda, à superstição religiosa que caracterizava os antigos po-
vos, podendo-se afirmar, portanto, que a pena teria origem
sagrada.
O homem primitivo cria que tudo o que escapava ao seu
conhecimento – reduzidíssimo, diga-se de passagem – seria
fruto de influências malignas, sobrenaturais, fantásticas, que
só poderiam ser compreendidas através da magia. Fenômenos
como a chuva, o raio, o trovão, entre outros fatos naturais
incompreendidos pelo homem primitivo influenciavam dire-
tamente a vida de cada um e de todo o grupo, premiando-os
ou castigando-os conforme o comportamento exteriorizado.
Neste ponto, surge a importante compreensão do totem,
fundamental para entendimento das punições aplicadas pelo
homem primitivo. O totem seria a representação de uma for-
ça sobrenatural por meio de uma planta ou, preferencialmen-
te, de um animal que vinculava os integrantes de uma família,
tribo ou comunidade. Logo, entende-se que as primeiras
proibições e punições sejam encontradas nas relações totêmi-
cas, mais precisamente em relação ao agradar ou desagradar
o totem, tendo por referencial o tabu, que significa o sagrado
e o proibido, ou seja, violar uma coisa ou uma pessoa-tabu
importa em sanções de ordem sobrenatural (totêmicas). A
violação do tabu – que poderiam ser os feiticeiros, os sacer-
dotes, os lugares interditos, as pedras sagradas, etc. – atrai
para o violador castigos duros como a doença, a loucura e a
morte107.
Dessarte, infere-se que o tabu é lei religiosa e, como tal,
uma expressão do controle social dos povos, garantido pelas

107
Pierangelli, (1992, p. 3-5).

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sanções sobrenaturais que acabavam por recair, não sobre o
indivíduo violador, isoladamente, mas sobre todo o grupo,
clã ou comunidade que, para se livrar da ira do ser sobrena-
tural, teria que castigar o infrator coletivamente. Daí que as
violações das proibições emanadas das exigências totêmicas e
caracterizadas como tabus obrigavam à imposição de penas
severíssimas, sendo a mais aplicada, a de morte108.
Esse primeiro período das punições caracteriza-se pela
função claramente reparatória da pena; tinham por fim as pu-
nições apenas aplacar a ira das entidades sobrenaturais des-
respeitadas pelos atos de agressão ao tabu, não se antevendo
qualquer reparação social, até porque o delito, nessa distante
época, representava apenas um pecado.

2.2 O período da vingança privada

Com a evolução dos grupos sociais, quando as diversas


tribos passam a conviver unidas por vínculos de sangue, so-
bre um mesmo território, surge uma maior complexidade das
relações entre seus membros, surgindo, por via de consequ-
ência, outras modalidades de penas, ainda bastante primitivas.
Duas são, basicamente, as reações punitivas: o castigo de
um membro da tribo que no interior da mesma tenha co-
metido uma infração contra esta ou contra algum de seus
membros; o castigo de um membro não pertencente à tribo
que tenha perturbado a atividade ou vontade daquela, ou de
um de seus vários membros, atentando-se sempre para o en-

108
Asúa (1950, p. 205) ensina que a primitiva reação é eminentemente
coletiva, até mesmo porque a consciência do individual não existe ainda
contra quem tenha transgredido a convivência social. Esse caráter co-
letivo é percebido até na forma de execução, já que a lapidação é uma
das maneiras mais antigas e características de manifestação da reação
punitiva na antiguidade, coletivamente exercida.

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sinamento de Asúa (1950, p. 207), para quem as reações pu-
nitivas desse período jamais se caracterizaram como vingança
individual, baseadas no instinto de conservação do indivíduo,
e sim como reação contra os interesses comuns da tribo,
como uma perturbação da paz, uma violação de direitos.
É nesse período que o ofendido tem a oportunidade de
vingar-se do ofensor através de atos que constituíam nova
ofensa, porém aceitos pelo grupo e, por isso, deixavam de ser
punidos, como também por falta de uma autoridade compe-
tente para tal. A isso se denomina vingança individual, carac-
terizada principalmente pela falta de proporcionalidade entre
o mal causado e a reação imposta (vingança), que poderia
inclusive recair sobre familiares do ofensor.109
Em sentido contrário, Bruno (1967, p. 67-74) entende
que nessas comunidades arcaicas, quando a ofensa era irro-
gada dentro do próprio grupo onde vigiam normas simples
e fáceis de entender e observar, onde as exigências da vida se
limitavam quase que exclusivamente ao elementarmente bio-
lógico, salvo as exigências míticas e, principalmente em virtu-
de do sentimento de união que era reforçado pela constante
luta entre grupos, as penas aplicadas eram de menor rigor,
limitando-se à humilhação ou ao desprezo que recaía sobre o
agente ou, como medida extrema, a expulsão ou banimento
da comunidade. Era o que mais tarde denominou-se de perda
da paz, ou seja, estava o homem sozinho, tinha rompido os

109
Segundo Mezger (1946, p. 43), há um Direito Penal interno, dentro
da tribo, comum a vários povos, em que o chefe de família, assim
como a tribo, poderiam expulsar membros indignos. Havia também
o Direito Penal externo, que ia da tribo até fora dela, onde regia o
princípio básico de que aquele que rompe a paz sobre um membro
da comunidade jurídica é convertido em inimigo deste e de sua tribo.
A vingança de sangue é direito e dever da tribo: produzindo como
consequência a morte imediata do sujeito colhido em flagrante delito
ou a guerra entre as estirpes.

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vínculos mágicos ou de sangue com o clã, ficava a mercê da
violência dos outros grupos, além do que, isolado, dificilmen-
te sobreviveria contra as forças hostis da natureza, cósmicas
ou animais.
A vingança privada, para o supramencionado autor, teria
surgido como ato de guerra entre grupos distintos, quando
uma tribo exercia atos vingativos contra outra em retaliação à
ação agressiva praticada em desfavor de qualquer um de seus
membros110.
No momento em que os grupos ou clãs começam a sub-
dividir-se é que a vingança aparece como reação dentro do
próprio grupo, onde os valores míticos são substituídos por
laços de sangue ou familiares e aumentam progressivamente
a complexidade da vida e, por via de consequência, os desa-
justamentos e as violações que as normas condenam. Nesse
período, a vingança assume sua forma mais cruel, desencade-
ando verdadeiros morticínios dentro das comunidades, nota-
damente entre famílias.
É a partir da constatação que o morticínio enfraquecia a
tribo, continuamente exposta às agressões dos seus inimigos
externos, que foi dando-se, lenta e gradualmente, a eficaz
transformação no sentido de transferir-se das mãos do ofen-
dido, ou da sua família, para as mãos do chefe do grupo, o

110
Vem a propósito referir que: “Fala-se comumente em vingança privada
como de uma forma de reação que se tenha manifestado desde as ori-
gens, nos grupos mais primitivos. A vingança foi um fato geral entre as
tribos, uma exercendo sobre outro ato vingativo contra ação agressiva
a qualquer dos seus membros, ação agressiva real, de um membro de
outra tribo, ou assim suposta de acordo com as ideias mágicas domi-
nantes nos grupos arcaicos. Foi consequência da solidariedade entre os
membros do mesmo clã, que é uma das forças de coesão e, portanto, de
continuidade do grupo. Não a encontramos, em geral, como forma de
reação punitiva dentro de uma comunidade primária”. Neste sentido,
cf. Dotti (1998, p. 31).

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poder de castigar o ofensor. São as primeiras manifestações da
vingança pública (ARAGÃO, 1977, p. 25-26).
Surge a Lei de Talião, que procurava trazer proporcionali-
dade à pena: “Oculum pro oculo – dentem pro dente”. É nesta
lei que o arbítrio da vingança cega e ilimitada é substituído
pelo princípio moderador da igualdade perfeita e absoluta en-
tre a severidade do castigo e a gravidade da ofensa. Aqui, des-
liga-se a vítima do manejo da pena, transferindo-se tal mister
para um juiz neutro e imparcial, o que já denota indícios de
publicitação da pena.
No Talião, usavam com frequência a castração para os cri-
mes contra os costumes, a ablação para os crimes de difama-
ção, a morte para os casos de homicídio. O olho por olho
significava dois homens cegos no grupo; braço por braço,
a invalidez de dois homens, o que aumentava o número de
mutilados, enfraquecendo-se, portanto, o grupo frente aos
inimigos externos.
Como alternativa a esse problema, surge a ideia de com-
posição, indeniza-se o mal causado por meio de uma transa-
ção pecuniária. Achou-se no chamado preço do sangue, pago
pelo ofensor, a forma de compor o dissídio; ao invés do cas-
tigo idêntico, como na Lei de Talião, impunha-se um castigo
equivalente, que não importava mais na reprodução do mal
que se queria evitar e punir, não só em benefício dos indiví-
duos, como da própria coletividade111.
A composição poderia ser voluntária, resultante de um
acordo de vontades entre as partes envolvidas ou de seus fa-
111
Neste sentido, Oliveira (1996, p. 24) afirma que com o passar dos tem-
pos e a evolução dos povos apareceu uma forma moderada de pena, a
composição. O delinquente poderia comprar a impunidade do ofendi-
do, ou de seus parentes, com dinheiro, armas, ou utensílios e gado, não
havendo, então, sofrimento físico, pessoal, mas uma reparação material
proporcionalmente correspondente.

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miliares, podendo-se retroagir para as formas primitivas de
sanção em caso de um não acordo, como também poderia ha-
ver a composição forçada em que os prejudicados tinham que
ceder aos costumes, às regras cívicas ou religiosas, ou ainda à
legislação, sendo obrigados a receber a indenização prescrita.
Como última forma de composição, existiam aquelas em que
havia uma autorização, como forma de satisfação, de substi-
tuição do autor por outra pessoa, geralmente um escravo ou
um membro mais jovem da família112.

2.3 O período da vingança divina

Chegamos então ao período em que o Direito foi domina-


do pela religião, era o Direito Teocrático no qual as leis eram
aplicadas pelos clérigos, impregnadas de um fervor religioso.
O fanatismo era a base de elaboração das leis, os mesmos
homens eram pontífices e jurisconsultos, já que o Direito e a
religião se confundiram formando um todo. O delito era uma
grave ofensa aos deuses. A pena era ainda dominada por um
total sentimento de vingança, mas agora se tratava de uma
vingança divina.
Neste sentido, vale transcrever a seguinte lição:
Ah, quantas penas cruéis e infamantes, em nome dos
deuses, foram infligidas nesta época: açoites, castração,
mutilação, flagelação, escravidão, enterramento em vida,
fogueira, esquartejamento, empalação, enforcamento,
crucificação, estrangulamento, decapitação, apedrejamen-
to (lapidação), esmagadura sob as patas de elefante ou en-
tre duas pedras. E a todas essas atrocidades se acrescentava
o “Juízo de Deus”, as ordálias e seu ritual absurdo e ma-
cabro (LEAL, 1998, p. 172-173).

112
Neste sentido, Pierangelli (1992, p. 8).

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Em razão do acima exposto, podemos afirmar que o pe-
ríodo da vingança divina, paradoxalmente, foi um dos mais
terríveis da história das punições, sendo usada a religião para
legitimar práticas cruéis e arbitrárias como forma de controle
social, como forma de manutenção do poder, o que nos leva
a acreditar que o desdobramento que nos mostra o panorama
histórico da lei penal é um dos aspectos mais sangrentos de
toda a história da civilização humana. Ele muito provavelmente
tem custado à humanidade mais vidas que todas as guerras e é
suscetível de ferir nossa sensibilidade atual mais profundamente
do que o próprio fenômeno da guerra, se por tal entendemos
a guerra tradicional, posto que esta, em geral, não supera a tre-
menda frieza, premeditação e racionalização que caracterizam
as crueldades e aberrações registradas na história da legislação
penal (ZAFFARONI; PIERANGELLI, 1999, p. 180).

2.4 O período da vingança pública

Com o evoluir da civilização, novos conceitos de valores


foram surgindo, ensejando a delimitação definitiva entre o
Direito e a religião. O Estado chamou para si, em virtude do
fortalecimento da autoridade pública, a tarefa de aplicação
das penas, perderam estas seu substrato religioso, tirou-se da
mão do ofendido, ou de sua família, a titularidade para apli-
cação do direito punitivo113.
Contudo, a publicitação da pena não significou o seu abran-
damento, as penas continuaram cruéis como antes; à pena de

113
A este respeito, Asúa (1950, p. 210) afirma que a luta entre o poder
público e a atuação familiar – quando do exercício do direito da vin-
gança de sangue ou mesmo da composição – é direcionada por um
esforço paulatino do Estado para transformar o castigo em uma verda-
deira pena pública, pronunciada por um juiz imparcial, afastando-a do
arbítrio passional da família atingida pelo dano.

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morte foi acrescida a pena das galeras, tão cruel que os infelizes
condenados, para se esquivarem de tal suplício, cortavam os
braços e as mãos. A tortura era bastante empregada, não só
para obtenção de confissões, era também uma forma de puni-
ção; arrancava-se ou furava-se a língua, amputavam-se as ore-
lhas, o nariz e os órgãos genitais, marcava-se com ferro quente,
usava-se a chibata. Ademais, a pena capital era executada em
diversas modalidades: morte no azeite quente, forca, espada,
dilacerações dos membros até a morte, etc.
A execução da pena era precedida de cerimônia destinada
a impressionar o povo. O condenado permanecia em exposi-
ção pública, no patíbulo, pelourinho ou nos locais ligados à
prática do crime. Era a oportunidade para que os espectado-
res do terrível suplício cuspissem, jogassem pedras e lama ou
esbofeteassem o condenado antes da hora final.
Para bem ilustrar o assunto, transcrevemos parte de uma
sentença descrita no estudo realizado por Foucault (1993,
p. 11-12) sobre a pena, que pode ser sintetizada nas seguin-
tes palavras:
Damiens foi condenado a pedir perdão publicamente
diante da porta principal da igreja de Paris, levado e acom-
panhado numa carroça, nu, de camisola, carregando uma
tocha de cera acessa de duas libras; na dita carroça, na
Praça de Grève, e sobre um patíbulo que aí será erguido,
atazanado nos mamilos, braços, coxas e barrigas das per-
nas, sua mão direita segurando a faca com que cometeu o
dito parricídio, queimada com fogo de enxofre, e às par-
tes em que será atazanado se aplicarão chumbo derretido,
óleo fervente, piche em fogo, cera e enxofre derretidos
conjuntamente, e a seguir seu corpo será puxado e des-
membrado por quatro cavalos e seus membros e corpo
consumidos ao fogo, reduzidos a cinzas, e suas cinzas lan-
çadas ao vento.

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Melhor sorte não teve Juan Calas, em Toulouse na Fran-
ça de 1762, que teve sua execução assim descrita por Dotti
(1998, p. 163): “A execução da pena capital foi marcada
com lances de extraordinária violência. O carrasco quebrou
os membros e o peito do condenado com golpes de uma
barra de ferro para, em seguida, amarrá-lo na roda. A mor-
te veio após lenta agonia. Completando o sinistro ritual, o
corpo foi queimado”.
Portanto, no período em estudo, o condenado era subme-
tido a um prolongado ritual: era exibido pelas ruas a caminho
do local de execução, muitas vezes carregando cartazes com
dizeres alusivos ao crime cometido pendurados nas costas,
no peito ou na cabeça; na mão uma tocha a queimar-lhe, nos
cruzamentos parava e lia a sentença de condenação, enfim,
uma verdadeira reprodução teatral de terror, triunfo e ritual
organizado, que devia exibir seu espetáculo ao público, com
a lentidão de requintados e sofisticados suplícios, peripécias
dos carrascos e os gritos alucinantes de tortura e sofrimento
(OLIVEIRA, 1996, p. 36-37).
Foi uma longa transição que custou rios de sangue, en-
tretanto, foi com o surgimento da pena pública – cujo indí-
cio mais remoto pode ser encontrado na composição – que
o Estado conseguiu acabar com a guerra entre famílias e, o
que é mais importante, a responsabilidade pessoal substitui
a noção de responsabilidade coletiva e ao Estado é reconhe-
cido o direito subjetivo de castigar. E, como tal, durante
muito tempo, depois de proclamado o Direito Penal pú-
blico, a pena segue sendo duríssima expiação do delito, em
uma época em que os propósitos expiatórios se confundem
com os intimidativos, estado de coisas que só vai mudar
quando do advento do Direito Penal liberal, a ser estudado
em capítulo próprio.

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3 DO ESTADO ABSOLUTO AO ESTADO
LIBERAL

3.1 A transição da forma Estatal medieval para o


Estado moderno

A sociedade medieval se caracterizava por ser uma socieda-


de que convivia com uma realidade de instabilidade política,
econômica e social por estar em permanente embate entre
o poder temporal e o poder espiritual – já que o Imperador
se recusava a submeter-se à autoridade da Igreja –, além de
se apresentar com um poder extremamente fragmentado em
razão da infinita multiplicação de centros internos de poder,
distribuídos a nobres, bispos, corporações, universidades, rei-
nos, etc., o que gerou um sistema jurídico consuetudinário
embasado em privilégios nobiliárquicos, assim como as rela-
ções sociais ali presentes se davam por dependência pessoal,
ou seja, mais uma vez fundada em privilégios e regalias (MO-
RAES, 1993, p. 144).
O feudalismo se desenvolveu sob um sistema administrati-
vo e uma organização militar intimamente ligados à situação
patrimonial, que se fundava em três institutos jurídicos: a vas-
salagem, que era composta por proprietários menos podero-
sos a serviço do senhor feudal, já que precisavam da proteção
deste; o benefício, no qual as pessoas que não possuíssem
patrimônio firmavam um contrato de servidão com o senhor
feudal (campesinato), recebendo uma porção de terras para
cultivo e tornando-se então parte inseparável da gleba; imu-
nidade, que era a total isenção de tributos às terras sujeitas ao
benefício. Em suma, uma aristocracia originalmente militar
se autodesignava um território e sua população, obrigando a

174 |
mesma a cultivar a terra necessária tanto para si como para o
senhor feudal114.
Quanto às relações entre os membros da aristocracia agrá-
ria, assim como entre esta e os monarcas, interessante notar a
existência de um sistema escalonado em que o senhor feudal
era vassalo de um nobre mais importante, denominado suse-
rano, do qual recebia o feudo em troca de assistência militar.
Todo esse engendramento, denominado subenfeudamen-
to115, acaba por conduzir os senhores feudais à condição de
vassalos, não só do suserano, como do próprio monarca, con-
siderando-se que os suseranos recebiam os feudos não como
propriedade, e sim a título precário, podendo a concessão ser
revogada ad nutum.
Em relação ao campo jurídico, temos que levar primei-
ramente em conta que o reino era concebido como parte
de uma unidade mais ampla e universal, que era o reino da
cristandade, fazendo com que a obediência ao direito não
se justificasse apenas pelo fato de ele ter sido emanado do
monarca ou senhor feudal – haja vista que aos mesmos era
concedida a prerrogativa de distribuir justiça em seus res-
pectivos feudos –, mas, sobretudo, por estar acorde com os
preceitos morais e religiosos emanados da Igreja, direitos
consuetudinários, portanto.
Logo, as relações jurídicas que envolviam os senhores feu-
dais e o monarca, ou os senhores feudais e os camponeses,
eram pautadas no direito costumeiro, baseadas no costume
secular, havendo uma pluralidade de ordenamentos jurídicos
no território de um único país, o que não levava a uma apli-
cação diferenciada do direito, em razão de sua célula principal

114
Para um maior aprofundamento no tema, Streck; Morais (2003, p.
21-24).
115
Cf. Scaff, (2001, p. 36).

| 175
estar assentada em bases teocráticas. Destarte, imperioso re-
gistrar que nenhuma das ordens jurídicas instituídas nesse pe-
ríodo foi criada a partir do Estado, até mesmo porque sendo
descentralizado o poder político sob o feudalismo, também
o foi o poder judicial. Em suma, apesar de conviverem no
território onde reinava o monarca, eram os feudos política e
judicialmente independentes.
Do exposto, é de se dessumir que o Direito Penal não fugiu
à regra geral, visto que era aplicado nos delitos comuns pelo
próprio senhor feudal através de critérios largamente arbitrá-
rios que, com frequência, refletiam-se na imposição de penas
cruéis e infamantes. Todavia, há que se fazer a ressalva de que
em caso de crimes de lesa-majestade, ainda que cometidos no
território de um feudo, a competência judicial saia das mãos
do senhor feudal passando diretamente para o monarca. O que
importa é que, em ambos os casos, o Direito Penal se caracte-
rizava pelo extremo rigor de suas penas e pelo modo arbitrário
de sua imposição, sem que fossem levados em consideração
princípios que hoje são comuns às legislações penais, como
proporcionalidade e pessoalidade da pena116.
O declínio do feudalismo e, por via de consequência, da
ordem jurídica que do mesmo emanava, deu-se em razão da
ascensão da burguesia, formada em sua origem por banquei-
ros e comerciantes – que se diferenciavam dos nobres tanto
em razão de sua origem quanto de suas ocupações –, que
quebraram os laços feudais com o soberano, formando cor-
porações denominadas comunas. No ensinamento de Scaff
(2001, p. 42-43), era o termo utilizado para designar tanto o
juramento como os conjurados ou o local onde se reclamava
o direito de trabalhar e negociar livremente, sendo também
utilizada a expressão burguês para designar os habitantes dos
burgos, ou seja, das cidades onde a comuna ou burguesia exi-
116
Cf. Freitas, (2001, p. 6-16).

176 |
gia direitos dentro do território do feudo, inclusive o de fazer
leis e administrá-las.
Ademais, utilizou-se inicialmente a burguesia dos institu-
tos do direito romano, o que possibilitou a criação do capital
livre na cidade e no campo, fortalecendo economicamente
tal classe, haja vista que a grande marca característica do di-
reito civil romano fora sua concepção de propriedade priva-
da absoluta e incondicional117, além do que imprimia maior
segurança às relações comerciais. Entretanto, rapidamente o
Direito Romano, por demais formalista, tornou-se obsoleto
aos interesses dos burgueses (SCAFF, 2001 p. 49-50), uma
vez que tinha como objeto a proteção da propriedade, sua
conservação, traduzida em segurança e estabilidade, e não o
desenvolvimento do patrimônio, com a consequente acumu-
lação de riqueza, sendo então substituído pelo direito mer-
cantil, mais adequado aos interesses dos burgueses, mais ágil
para a aquisição de novas riquezas e, o que é mais importante,
criado pela classe mercantil (SCAFF, 2001, p. 62).
É com Maquiavel, em seu mais conhecido escrito, deno-
minado O Príncipe, que pela primeira vez se cunha o ter-
mo Estado, havendo autores que entendem que tal termo só
pode ser usado para designar as formas de poder centraliza-
doras e institucionalizadas que surgem na segunda metade do
século XV, na França, Inglaterra e Espanha118.
Portanto, com a derrocada das formas medievais de poder
surge o Estado Moderno, que daquelas se diferencia por pos-
suir plena autonomia – sua autoridade não depende de nenhu-
ma outra –, assim como, por haver uma completa distinção
entre o Estado e sociedade civil, sendo o Estado representado
pelo monarca, no qual se identificava a soberania estatal.

117
Cf. Anderson (1998, p. 24).
118
Neste sentido, ver por todos, Scaff (2001, p. 23-26).

| 177
3.2 O Estado Absolutista

Impossível precisar-se historicamente o momento em que


houve a ruptura entre o Estado medieval feudal e o Estado
monárquico absoluto, inaugurando as formas modernas de
exercício do poder, já que as elações feudais ainda se mantive-
ram durante longo tempo, mesmo tendo perdido influência
no campo econômico com o advento da burguesia. Portanto,
pode-se afirmar estreme de dúvidas, que não há um momen-
to exato que marque o início e o fim do absolutismo monár-
quico.
Não obstante, o que caracteriza o surgimento do Esta-
do Moderno é a institucionalização do poder, aliado a algu-
mas condições de existência como território, nação, potência
(possibilidade de ser obedecido) e autoridade (qualificação
para dar a ordem), ou seja, o Estado moderno deixa de ser
patrimonial – no medievo, condes, barões e marqueses eram
os donos território e de tudo o que neles se encontrava –,
havendo, isto sim, uma identificação absoluta entre o monar-
ca e o Estado como expressão máxima da soberania estatal.
As relações de poder passam das mãos privadas dos senhores
feudais para a esfera pública, centralizadas nas mãos do mo-
narca119.
A burguesia, enquanto classe social, passou a ser conside-
rada como politicamente importante a partir do momento
em que começou a financiar as grandes campanhas militares
da época, aproximando-se, por essa via, do poder, haja vista
que tal situação gerava a dependência do monarca em relação
aos seus recursos econômicos. Consequentemente, com o
domínio da esfera econômica, através do modo de produção
capitalista que se sobrepôs às relações econômicas até então
existentes no regime feudal, aliado ao interesse do monarca
119
Cf. Streck; Morais (2001b, p. 26-29).

178 |
em expandir e fortalecer o Estado através dos recursos oriun-
dos dessa classe em ascensão, a burguesia se viu em excelente
posição para enfraquecer o feudalismo, pugnando pelo com-
bate à nobreza já em franco declínio.
Logo, com o enfraquecimento da nobreza e a ascensão da
burguesia, nasceu o Estado-nação absoluto, fruto do forta-
lecimento do poder real, considerando que somente em um
Estado no qual a vontade do poder monárquico pudesse se
impor em todo seu território, estaria assegurada a expansão
capitalista.
É importante ressaltar que a ascensão da burguesia se deu
por razões ligadas intrinsecamente ao plano econômico, o
que levou a mesma a combater rigorosamente os crimes con-
tra o patrimônio, pelo que estes tipos de delito representavam
contra a segurança das relações mercantis e, por via de conse-
quência, a sua estabilidade política.
A característica marcante do Estado absolutista foi, sem
dúvida, a irrestrita superioridade do Estado sobre tudo e so-
bre todos em seu território, superioridade esta refletida no
domínio do poder militar, no exclusivo poder de tributar e
no poder de julgar120, aplicando o direito. Tal soberania im-
plicava uma total libertação dos limites impostos ao monarca
durante a Idade Média pelos senhores feudais, pela Igreja,
como também pelo direito costumeiro121.
No campo jurídico, o Estado absolutista caracterizou-se
pela progressiva monopolização do poder de criar o direito,
pois para bem servir à nação, os poderes reais deveriam ser ili-
mitados, até mesmo para alavancar os recursos indispensáveis
ao fortalecimento do Estado. Nesta órbita, entra em cena a
teoria do direito divino, para o qual o monarca seria manda-
120
V. Scaff (2001, p.58).
121
Cf. Freitas (2001, p. 26).

| 179
tário de Deus para representar os interesses da nação, o que
lhe auferia supremacia sobre as leis humanas, não podendo,
portanto, ser submetido ao controle proveniente do direito
positivo anterior ao mesmo. Ao juiz, deixou de ser permitido
julgar com base em direito não emanado ou não autorizado
pelo Estado. Tal situação inaugurou uma tendência que iria
perdurar nos séculos seguintes, qual seja, a de identificar o
direito com o Estado.
O Direito Penal, como não poderia deixar de ser, ade-
quou-se ao espírito do direito absolutista em geral, isto é, a
conservação integral do poder monárquico, sendo utilizado
como um dos mais importantes instrumentos de imposição
de sua autoridade, máquina protetora da ordem social esta-
belecida122.
Por outro lado, o Direito Penal se colocou a serviço do
erário público, tendo em conta que necessário se fazia com-
bater os delitos que pudessem ameaçar o financiamento da
nova ordem, ou seja, os delitos contra o patrimônio do Es-
tado que repercutiam diretamente na esfera mercantil, mor-
mente os crimes contra a alfândega, os que acarretavam um
deslocamento da noção de crime enquanto pecado, haja vista
que as funções do Direito Penal se direcionaram muito mais
em benefício do Estado que da Igreja.
É nesse período que a pena assume definitivamente seu ca-
ráter público, ou seja, a sanção penal emana do Estado e não
da vontade de particulares ou do arbítrio do mais forte. En-
tretanto, as penas podiam ser aplicadas arbitrariamente pelos
juízes, sem necessidade de fundamentação das decisões. Mas
tal arbítrio não incluía a criação de penas ou a não aplicação
das regras que informavam o sistema de provas legais. Mister
ressaltar que as penas eram extremamente rigorosas e despro-

122
A respeito do tema, Tomás e Valiente (1992 p. 23).

180 |
porcionais ao delito praticado, principalmente quando estes
versavam sobre crimes de lesa majestade.
Em suma, o Direito Penal no Estado absoluto se caracte-
rizava por interpretar os delitos casuisticamente, sem a menor
noção de tipo penal, o que gerava incerteza do que poderia
ou não ser feito pelos súditos e arbítrio na interpretação judi-
cial, não havendo, por outro lado, determinação da medida
da pena, sendo seu fim vindicativo e intimidativo, o que expli-
ca o rigor quando da aplicação das mesmas, visto que visava
dar o exemplo aos demais, despertando-lhes temor de sofrer
igual castigo.
Portanto, pode-se afirmar que o Direito Penal servia per-
feitamente aos fins perseguidos pela monarquia. No âmbito
do processo, houve a liberação da instrução criminal como
instrumento para fins políticos, haja vista que por representar
os interesses da nação e concomitantemente a sua segurança,
seria um total despropósito interpor entre o Rei e o delin-
quente ameaçador da ordem, garantias processuais.

3.3 O Estado Liberal

Segundo Bonavides (2001, p. 41), foi da oposição histó-


rica e secular, na Idade Moderna, entre a liberdade do indiví-
duo e o absolutismo do monarca que nasceu a primeira noção
de Estado de Direito. Mas até aí, é uma longa história.
Convencionalmente, afirma-se que o absolutismo se fin-
da com o advento da Revolução Francesa de 1789, conside-
rando-se que a burguesia no nascedouro do capitalismo, por
razões econômicas, delegou o poder político ao soberano,
inaugurando o absolutismo monárquico. Entretanto, na vi-
rada do século XVIII, somente o poder econômico já não
bastava a seus propósitos, queria também o poder político,

| 181
privilégio, até então, da aristocracia, já que durante a monar-
quia absolutista a burguesia jamais exercera tal poder.
Os estopins da Revolução Francesa123 foram os privilégios,
pois na França pré-revolucionária o clero e a nobreza não pa-
gavam impostos, o que gerou um grande descontentamento
nas outras classes sociais, haja vista que tais privilégios repre-
sentavam uma ordem social arcaica que deveria ser definiti-
vamente sepultada. Ademais, para a burguesia havia Estado
demais e liberdade individual de menos, pugnando a mesma
pela limitação dos poderes do Estado e de suas funções em
prol de um Estado de direito, preferencialmente mínimo.
Com a queda da Bastilha – prisão política –, poucos dias
depois de ter sido declarada a Assembleia Constituinte, em
razão da insurreição popular originada nas tensões políticas
entre os notáveis (clero e nobreza) e o Terceiro Estado (bur-
guesia e operários), a burguesia inaugura seu poder político
como classe, mas como bem assevera Bonavides (2001, p. 42;
44), os direitos reivindicados pelos burgueses foram genera-
lizados doutrinariamente como ideais comuns a todo corpo
social; entretanto, quando de sua aplicação prática, a bur-
guesia não os implementa, só de maneira formal os sustenta,
preocupada, outrossim, em conservar intactos os privilégios
econômicos adquiridos.
Neste ponto, podemos afirmar então que o liberalismo
começa a assentar suas bases como ideário que exigia o reco-
nhecimento dos direitos naturais do indivíduo e da igualdade
fundamental entre todos os homens perante a lei, havendo,
pois, a substituição do súdito pelo cidadão, titular de direitos
diante do Estado e, até mesmo, contra ele. Bobbio (2006,
p.17) define o liberalismo como sendo uma determinada
concepção de Estado na qual o Estado tem poderes e funções

123
Sobre o tema, v. Roberts (2001, p. 517-524).

182 |
limitadas e, como tal, contrapõe-se tanto ao Estado absoluto
quanto ao Estado que hoje chamamos de social.
Na verdade, é incontestável que o liberalismo significou
uma limitação da autoridade, bem como sua divisão, haven-
do, pois, sob sua égide, a consolidação das liberdades, direitos
humanos, ordem legal, governo representativo, legitimação
da mobilidade social, etc., em que ao Estado caberia um pa-
pel intervencionista negativo, ou seja, suas tarefas se circuns-
crevem a ordem e a segurança, devendo abster-se de intervir
em tudo o que diga respeito à livre iniciativa individual, mais
precisamente no plano econômico, no qual a burguesia de-
veria atuar livremente (SCAFF, 2001, p. 68). Em uma feliz
síntese, Scaff (2001, p. 71) assim expõe a questão:
Dentro desta ideologia, ao Estado era lícito atuar sob três
aspectos: para manutenção da ordem, da segurança e da
paz, ou seja, da paz, em nível de política externa, para que
internamente fosse possível ocupar todo o tempo e todo
o pessoal disponível com atividades propriamente econô-
micas; da ordem em nível de política interna, evitando a
transgressão às leis estabelecidas pela burguesia através
do parlamento; e da segurança nas relações econômicas,
fazendo com que a propriedade privada e os contratos
fossem respeitados tal qual prescritos, e, em caso de seu
descumprimento, responsabilizado o infrator.

No campo jurídico, houve uma grande revolução. Como


já dito, surgiu o Estado de direito, no qual os indivíduos e
não as classes sociais se faziam representar no parlamento.
As leis apresentavam-se como tendo sido promulgadas visan-
do ao bem comum, baseadas nas teses jus naturalistas dos
filósofos iluministas124. Não obstante os avanços alcançados,
forçoso reconhecer que tudo isso acabava por escamotear a
verdadeira natureza do Estado Liberal, em que o respeito à

124
Sobre o Iluminismo, v. Roberts (2001, p. 492-493).

| 183
lei, nas bases concebidas pelo Iluminismo, disfarçava a do-
minação política e econômica da burguesia, já que sustenta-
va a existência de liberdades comuns a todos os indivíduos e
a igualdade entre eles perante o Estado, neutro e imparcial
diante dos conflitos de classe, jamais sendo concebido o Es-
tado Liberal como instrumento de dominação de uma deter-
minada classe social.
Touraine (2000, p. 74) chama a atenção para o fato de que
a ideia de democracia, no Estado Liberal se desenvolveu so-
mente depois que houve uma ruptura social e política dentro
da ordem assente, até então protegida pelo voto censitário,
com a instituição do voto universal, que de imediato acabou
com a diferenciação entre cidadãos ativos e passivos, assim
como quando o funcionamento das instituições políticas se
vinculou à satisfação das demandas populares que apelavam
contra os interesses dominantes e a racionalidade técnica e
econômica durante tanto tempo utilizada contra o povo.
Todavia, conforme o entendimento de Freitas (2001, p.
61), quando os iluministas anunciavam ser a lei fruto da razão,
criada em benefício do bem comum, queriam resguardar-se
de uma possível volta ao despotismo e garantir o exercício das
liberdades individuais pela limitação do exercício do poder
pelo direito; não objetivavam, pela via legal, atenuar as desi-
gualdades sociais, somente eliminar as arbitrariedades entre
governantes e governados.
Independentemente dos objetivos iluministas, o certo é
que a vontade expressa pelos parlamentos por intermédio das
leis fundava-se não na vontade de cada indivíduo, indepen-
dentemente de sua condição social, mas na vontade dos con-
tribuintes, dos proprietários, enfim, da burguesia, que era a
única classe que se fazia representar no parlamento, através
do voto censitário, defendido intransigentemente por todo
o século XIX, o que denota uma plena aversão à democracia.

184 |
Apesar do direcionamento legislativo em favor dos inte-
resses burgueses, é durante o Estado liberal que há a ruptura
entre o Direito Penal do terror e o Direito Penal Humanitá-
rio, até por força da própria doutrina que o legitimava, posto
que se passou a considerar que ao desempenhar suas funções,
o Estado, como fruto do contrato social, deveria garantir a
liberdade e a igualdade civis, assim como a propriedade pri-
vada. Logo, uma das funções precípuas é a de garantir os
direitos humanos do cidadão, admitindo-se a punição através
do Direito Penal dentro dos limites necessários à preservação
desses mesmos direitos, quais sejam, a vida e a propriedade.
Deveria, pois, o Direito Penal liberal proporcionar segurança
ao indivíduo, centro de suas atenções e sua própria razão de
existência.
Aliado aos postulados garantistas ilustrados, principalmen-
te no que pertine à igualdade formal de todos os cidadãos
perante a lei, as classes poderosas não poderiam ficar à mercê
de penas severas, já que a partir de então poderiam, teorica-
mente, ser atingidas por tais dispositivos. Melhor então foi
amenizar as aflições punitivas.

4. A FORMAÇÃO HISTÓRICA DOS


DIREITOS FUNDAMENTAIS

4.1 Direito Natural: antecedente histórico dos


direitos fundamentais

Os direitos fundamentais nos dias atuais são subdivididos


em gerações ou, como prefere grande parte da doutrina125,
em dimensões. Dentro do contexto abordado no presente

125
Sarlet (2001, p. 49).

| 185
trabalho, somente serão utilizados os direitos fundamentais
de primeira geração ou dimensão, haja vista serem os que se
inserem na trama histórica enfocada, ou seja, os direitos clás-
sicos à vida, à liberdade, à igualdade e à propriedade.
O caminhar histórico dos direitos fundamentais até sua
positivação nas primeiras Constituições escritas passou por
três etapas distintas, a saber: um primeiro momento que se
estende até o século XVI, quando as primeiras noções de di-
reitos inerentes ao ser humano começaram a ser elaboradas,
etapa essa conhecida como pré-história; um segundo momen-
to que corresponde à elaboração da doutrina jus naturalista126
e, consequentemente, da afirmação dos direitos naturais do
homem; e, como terceiro momento, a fase de constitucionali-
zação ou positivação dos direitos naturais, passando-se então
a denominá-los de direitos fundamentais, que se iniciou em
1776, com as sucessivas declarações de direitos dos novos es-
tados americanos (SARLET, 2001, p. 39).
Portanto, fica de logo explicitada que a primeira dimensão
de direitos fundamentais – produto do progressivo desenvol-
vimento das técnicas de positivação jurídica em interpenetra-
ção com as ideias desenvolvidas no terreno ideológico, de
liberdade e dignidade humana – é aquela que efetivamente
marcou o reconhecimento de seu status constitucional, com
a efetiva constitucionalização dos direitos naturais do homem
em fins do século XVIII.
A pré-história dos direitos fundamentais pode ser caracte-
rizada como a fase em que a religião e a filosofia do mundo
antigo, legaram algumas ideias-chave, que influenciaram di-
retamente o pensamento jus naturalista que seria desenvolvi-

126
Segundo Bonavides (2001, p. 29-30): “enquanto não positivam seus
valores, as ideologias guardam na essência uma dimensão encoberta
de jus naturalismo. Em verdade, o direito natural atuou sempre como
poderosa energia revolucionária e máquina de transformações sociais”.

186 |
do séculos mais tarde. De grande influência foram a filosofia
greco-romana e o pensamento cristão, que sem sombra de
dúvidas preconizaram os valores da dignidade da pessoa hu-
mana, da liberdade e da igualdade entre os homens.
A segunda fase de formação da doutrina jus naturalista
tem especial relevo a partir do século XVI quando, já na Ida-
de Média, desenvolveu-se a ideia de existência de postulados
suprapositivos como forma de limitação do poder. Tais postu-
lados, que eram a expressão da natureza racional do homem,
eram os direitos naturais, cuja desobediência por parte dos
governantes poderia gerar, até mesmo, por parte da popula-
ção, o exercício do direito de resistência. Tal desenvolvimen-
to de ideias é devido, principalmente, a São Tomás de Aquino
que defendia que “a personalidade humana se caracteriza por
ter um valor próprio, inato, expresso justamente na ideia de
sua dignidade de ser humano, que nasce na qualidade de va-
lor natural, inalienável e incondicionado, como cerne da per-
sonalidade do homem” (SARLET, 2001, p. 41).
Entretanto, o ápice do desenvolvimento das teorias jus na-
turalistas se deu nos séculos XVII e XVIII com o advento das
teorias contratualistas e da laicização127 do direito natural. Foi
nesse período que as ideias de direitos naturais inalienáveis do
homem e da submissão da autoridade aos ditames do direito
natural, assim como de tolerância religiosa e de liberdade de
manifestação oral e de imprensa adquiriram particular rele-
vância.
Dessarte, pode-se claramente inferir que foi do entrela-
çamento entre a secularização do direito natural e da indivi-
dualização dos privilégios estamentais que começaram a ser
forjadas as ideias de direitos fundamentais, ressaltando-se,
entretanto, que apesar da decisiva contribuição de tais pensa-

127
Lafer (2001, p. 120-121).

| 187
mentos, não se pode atribuir aos documentos elaborados sob
tal doutrina – como, por exemplo, as Declarações de Direitos
inglesas do século XVII – a condição de direitos fundamen-
tais, haja vista que, como aponta Ingo Sarlet (2001, p. 46),
em que pese à sua importância, inclusive como inspiração para
outras declarações, apesar de limitar o poder real em favor das
liberdades individuais, não há como se considerar como mar-
co inicial, isto é, como nascimento dos direitos fundamentais
no sentido que hoje se atribui ao termo, em razão de não
possuírem a necessária supremacia e estabilidade, podendo
ser modificados a qualquer tempo.
Para bem ilustrar o assunto, necessário se faz transcrever
as palavras de Rousseau (2001, p. 47), no clássico Do Con-
trato Social, que de forma concisa exprime o entendimento
da época:
Se indagais em que consiste justamente o maior bem de
todos, que tal deve ser o fim de todo o sistema de legisla-
ção, achá-lo-eis resumido nestes dois objetos principais,
a liberdade e a igualdade; a liberdade, porque toda a de-
pendência particular é outra tanta força tirada ao corpo
do Estado; a igualdade, porque sem ela não pode subsis-
tir a liberdade.

A fase conclusiva dessa segunda etapa da história dos di-


reitos fundamentais se dá, segundo a abalizada doutrina de
Bobbio (1992, p. 86), com o pensamento de Immanuel Kant
quando este, referindo-se à Revolução Francesa, dizia que o
povo tem o direito de não ser impedido por outras forças
de dar a si mesmo uma Constituição civil que ele crê boa,
exaltando o direito do povo de decidir seu próprio destino,
direito este que na realidade era o direito de liberdade, direi-
to natural por excelência, efluindo como autodeterminação,
como autonomia, como capacidade de legislar para si mes-
mo, contrapondo-se aos governos despóticos tradicionais.

188 |
Em suma, Kant, inspirado em Rousseau, definiu a liberdade
jurídica do povo como sendo a faculdade de só obedecer às
leis externas às quais tenha dado o seu livre assentimento.
A terceira etapa histórica dos direitos fundamentais diz
com sua positivação, havendo dissídio doutrinário sobre a
paternidade de tais direitos entre a Declaração de Direitos
do povo da Virgínia, de 1776, e a Declaração Francesa, de
1789. Inobstante tal desentendimento doutrinário, o certo
é que ambas as Declarações tinham como característica co-
mum uma profunda inspiração jus naturalista, trazendo em
seu bojo o reconhecimento dos direitos fundamentais do ser
humano, direitos estes naturais, invioláveis e imprescritíveis e,
o que é de suma importância, direitos de todos os homens,
não apenas de uma casta ou estamento.
O que é importante que realcemos, para completo enten-
dimento do desenvolvimento histórico da ideia de direitos
fundamentais, mais uma vez buscamos nos ensinamentos de
Bobbio (1992, p. 5-6), que ensina que os direitos do ho-
mem, por mais fundamentais que sejam, são direitos que
nasceram de forma lenta e gradual, sob certas circunstâncias,
caracterizadas por lutas em defesa de novas liberdades contra
velhos poderes, ou seja, são direitos históricos que nasceram
quando deviam ou podiam ter nascido, não todos de uma vez
e nem de uma vez por todas, o que denota o caráter eminen-
temente circunstancial dos mesmos sem, contudo, trazer em
seu bojo também a efemeridade, o que, por fim, acaba por
afastar peremptoriamente qualquer tentativa de absolutização
na definição do que sejam direitos fundamentais.
Portanto, podemos afirmar que os direitos fundamentais
são direitos universais, embora nem sempre reconhecidos de
maneira uniforme em todas as legislações, que mantêm um
caráter de temporalidade, no sentido de seu constante alarga-
mento objetivo e subjetivo, que exigem a todo instante o re-

| 189
conhecimento de situações novas e, por via de consequência,
a moldagem de novos instrumentos de proteção e efetivação
em um contexto moldado por relações dialéticas que acabam
por transformar e renovar os conteúdos albergados sob o
manto de direitos fundamentais de dimensões anteriores nas
atuais dimensões128.

4.2 A positivação dos direitos fundamentais

Característica intrínseca aos direitos fundamentais, como


acima afirmado, é sua constante transformação no que per-
tine ao seu conteúdo, titularidade, eficácia e efetividade, em
razão da inexorável mutação histórica a que os mesmos sem-
pre estão suscetíveis, o que acabou por dividi-los em diversas
gerações ou dimensões de direitos.
Entretanto, cabe a imprescindível advertência de que não
há a substituição gradativa de uma dimensão/geração de
direitos por outra, ao longo do desenvolvimento histórico a
que os direitos fundamentais, ratificamos, estão submetidos,
e sim sua paulatina expansão, cumulação e fortalecimento
destes, o que favorece o termo dimensão, haja vista que a
palavra geração dá a falsa ideia de substituição gradativa,
com a consequente eliminação dos direitos fundamentais
predecessores.
O que importa é que o desenvolvimento doutrinário acer-
ca dos direitos fundamentais ensejou sua divisão em três (ou
quatro?) dimensões, havendo uma crescente convergência
de opiniões no que faz referência ao caráter cumulativo do
processo evolutivo e da natureza complementar destes, como
também de sua unidade e indivisibilidade tanto no âmbito
do Direito Constitucional interno quanto no âmbito do mo-

128
Sobre o assunto, consultar Streck; Morais (2003, p. 135-140).

190 |
derno “Direito Internacional dos Direitos Humanos” (SAR-
LET, 2003, p. 49-50).
Os direitos fundamentais de primeira dimensão, direitos
conhecidos como clássicos, com seu reconhecimento estatu-
ído pelas primeiras Constituições escritas, foram produto do
pensamento liberal-burguês do século XVIII, que pode ser
resumido como aquele que atribuiu ao Estado a finalidade
precípua de realização da liberdade do indivíduo. Logo, tais
direitos se caracterizam como sendo direitos de defesa do in-
divíduo frente ao Estado, assumindo particular relevo pela es-
pecial inspiração jus naturalista, os direitos à vida, à liberdade,
à propriedade e à igualdade perante a lei.
Note-se que tais direitos marcam uma zona de não inter-
venção estatal, uma proibição ao Estado de intervir nas esfe-
ras de autonomia individual dos cidadãos, até mesmo porque
o direito fundamental à liberdade, na concepção liberal, é li-
berdade para contratar. Portanto, os direitos fundamentais
de primeira dimensão são direitos de resistência ou oposição
ao Estado, apresentados como direitos de cunho negativo,
ou seja, o Estado ao invés de efetuar uma prestação positiva
é obrigado a se abster de interferir na ampla liberdade do
cidadão129. Nasce assim, da oposição histórica e secular, – na
Idade Moderna – entre a liberdade do indivíduo e o absolu-
tismo do monarca, a primeira noção de Estado de Direito.
Os direitos fundamentais de primeira dimensão, com a
evolução da história, foram complementados por uma gama
de liberdades, tais como as liberdades de expressão, de im-
prensa, de manifestação, de reunião, de associação, etc., as-

129
Bonavides (2001, p. 40) chama a atenção para o fato de que na dou-
trina do liberalismo, o Estado sempre foi o fantasma que atemorizou
o indivíduo, caracterizando-se o poder – de que não pode prescindir
o ordenamento estatal –, na moderna teoria constitucional, como o
maior inimigo da liberdade.

| 191
sim como pelos direitos à participação política. É de se notar,
portanto, que os direitos civis e políticos, ainda hoje em voga,
já que integram grande parte das Constituições mundo afora,
têm sua origem correspondente – em sua maioria – à fase
inicial do Constitucionalismo ocidental.
A formação dos direitos de segunda dimensão se dá em
razão da passagem do Estado Liberal, de cunho individualista
e absenteísta, para o Estado Social, de feição intervencionista,
pois, nas palavras de Bonavides (2001, p. 188), o velho libe-
ralismo, na estreiteza de sua formulação habitual, não pôde
resolver o problema essencial de ordem econômica das vastas
camadas proletárias da sociedade e, por isso, entrou irreme-
diavelmente em crise.
Com o impacto da industrialização, que trouxe a reboque
graves problemas sociais e econômicos, já que foi a respon-
sável pelo agigantamento dos centros urbanos e pela forma-
ção do proletariado, assim como pelo desenvolvimento das
doutrinas socialistas, constatou-se que a positivação dos di-
reitos de liberdade e igualdade – direitos que fundamentaram
a doutrina do Estado Liberal – não gerou a garantia de seu
efetivo gozo, o que deu origem a amplos movimentos rei-
vindicatórios que pugnavam pelo reconhecimento de direitos
sociais e exigiam que o Estado os implementasse, ou seja,
que de prestações negativas, como no liberalismo, o Estado
passasse a ter comportamento ativo na realização da justiça
social.
Fundamental para uma abordagem dialética dos direi-
tos de primeira dimensão, transcrevermos o pensamento de
Marx (2000, p. 37):
Nenhum dos chamados direitos humanos ultrapassa, por-
tanto, o egoísmo do homem, do homem como membro
da sociedade burguesa, isto é, do indivíduo voltado para si
mesmo, para seu interesse particular, em sua arbitrarieda-

192 |
de privada e dissociado da comunidade. Longe de conce-
ber o homem como um ser genérico, estes direitos, pelo
contrário, fazem da própria vida genérica, da sociedade,
um marco exterior aos indivíduos, uma limitação de sua
independência primitiva. O único nexo que os mantém
em coesão é a necessidade natural, a necessidade e o inte-
resse particular, a conservação de suas propriedades e de
suas individualidades egoístas.

Portanto, ante o clamor público, restou ao Estado uma


mudança de atitude expressada em ações interventivas no
campo econômico, em práticas tidas até então como pró-
prias da iniciativa privada, cuidando-se não mais, a partir
de então, de liberdade perante o Estado e, sim, de liberda-
de através do Estado, o que em última instância significa,
também, não mais apenas uma igualdade formal – perante a
lei –, mas uma igualdade material a ser proporcionada pelo
Estado interventor.
Tal mudança de atitude, segundo Scaff (2001, p. 95-96),
deu-se em razão de a burguesia se sentir ameaçada pelas
tensões sociais existentes, o que acarretou uma maior flexi-
bilização do regime liberal, além do que a intervenção es-
tatal, através de verbas públicas, proporcionou a formação
da infraestrutura básica necessária para o desenvolvimento
das atividades de acumulação e expansão do capital, verbas
estas constituídas pela poupança e taxação generalizadas, ou
seja, dividiu-se o custo por todos, inclusive o povo, já que o
Estado bancou integralmente as reformas estruturais neces-
sárias o que, sem sombra de dúvidas, beneficiou a própria
burguesia.
A segunda dimensão de direitos fundamentais é compos-
ta, destarte, pelos direitos à assistência social, saúde, educa-
ção, trabalho, etc., que revelam, como já dito, a transição
das liberdades formais abstratas para as liberdades materiais

| 193
concretas. Tais direitos acabaram por evoluir também para a
liberdade de sindicalização, do direito de greve e outros di-
reitos fundamentais dos trabalhadores como férias, limitação
da jornada de trabalho, repouso semanal remunerado, etc.,
sempre se reportando à pessoa individual, como nos direitos
fundamentais de primeira dimensão130.
A terceira dimensão de direitos fundamentais, também de-
nominados de direitos de fraternidade ou de solidariedade,
tem como característica essencial a destinação para proteção
de grupos humanos, ou seja, são direitos de titularidade difu-
sa ou coletiva, ao contrário dos direitos fundamentais de pri-
meira e segunda dimensão que tinham por norte a proteção
de direitos do indivíduo. Logo, os direitos fundamentais de
terceira dimensão buscam proteger uma titularidade coletiva,
muitas vezes indefinida e indeterminável.
Considerados como uma resposta ao fenômeno denomi-
nado de “poluição das liberdades”, caracterizado pela de-
gradação sofrida pelos direitos fundamentais das dimensões
anteriores, constituem-se em direitos fundamentais de ter-
ceira dimensão mais aceitos pela doutrina o direito à paz, à
autodeterminação dos povos, ao desenvolvimento, ao meio
ambiente e à qualidade de vida, assim como o direito à comu-
nicação, à mudança de sexo, etc.131
Note-se que tais direitos, além de objetivarem uma pro-
teção coletiva, tem outro traço básico fundamental, que é
sua implicação universal, o que acaba por exigir esforços e
responsabilidades em escala até mesmo mundial para sua
efetivação.

130
Cf. Sarlet (2001, p. 51-52).
131
Cf. Sarlet (2001, p. 52-53).

194 |
5. DIREITO PENAL: DO TERROR À
HUMANIZAÇÃO

5.1 Os ideais iluministas e a humanização das penas

Mesmo antes da Revolução Francesa, algumas monar-


quias, influenciadas pelas tendências reformistas que visavam
atenuar o caráter absoluto do Estado, procuraram adotar,
com base em teses iluministas, algumas mudanças referentes
ao Direito Penal. Os monarcas responsáveis por tais reformas
foram denominados de déspotas esclarecidos, haja vista que
pugnavam pelo abandono de leis e modo de administrar a
justiça característicos dos regimes tirânicos.
Os ideais iluministas fundavam-se no direito natural de
base racional – bandeira de luta contra o absolutismo mo-
nárquico –, produto da razão humana evidenciada no con-
trato social que originou o estado civil. Para os iluministas, as
leis positivas deveriam ser racionais por estarem subordinadas
às leis naturais, próprias dos seres humanos; eternas, já que
inerentes à natureza humana não sofreriam variações com o
transcorrer do tempo; universais, porque a natureza humana
é a mesma em todo lugar. Portanto, os direitos do cidadão
emanados da lei deveriam ser os mesmos em todo lugar, in-
dependentemente da sua nacionalidade, direitos humanos
universais, absolutos, inalienáveis e imprescritíveis, oponíveis
ao Estado, mas garantidos por este por meio de leis positivas,
com o objetivo maior de evitar abusos cometidos pelo Esta-
do, assim como pelos próprios homens132.
Um pleno entendimento das teses iluministas aplicadas ao
Direito Penal pode ser colhido das ideias de Cesare Bonesa-

132
Cf. Freitas (2001, p. 64).

| 195
na, Marquês de Beccaria que, como já dito, fundam-se no
contrato social, pois para o pensador italiano a sociedade e
a ordem jurídica resultaram da livre renúncia de uma parte
mínima da liberdade de cada socius, não só para assegurar o
bem comum, mas para permitir a cada um deles gozar em
segurança aquela parte maior da própria liberdade que reser-
vara para si mesmo. O Direito Penal, portanto, é constituído
por aquele conjunto de pequenas porções da liberdade assim
livremente renunciadas e postas em depósito público, somen-
te a menor parte possível, a estritamente necessária, isto é,
precisamente o que seja necessário para empenhar os outros
e mantê-lo na posse do resto, sendo o conjunto de todas es-
sas pequenas porções de liberdade o fundamento do direito
de punir. Todo exercício do poder que se afastar dessa base
é abuso e não justiça, é um poder de fato e não de direito, é
uma usurpação e não mais um poder legítimo (BECCARIA,
1993, p. 17).
Infere-se claramente da leitura da obra Dos delitos e das
penas, a preocupação do autor em traçar grandes diretrizes de
uma legislação penal inspirada no respeito à liberdade, mais
precisamente no respeito à liberdade individual, à pessoa hu-
mana.
Portanto, nunca é demais afirmar que Beccaria foi um au-
têntico reformador das leis e das práticas penais, lançando
os fundamentos essenciais das modernas legislações, sendo
importante ressaltar que, apesar de ser um nobre e marquês,
ao invés de escutar as conveniências do egoísmo, de sufocar
a consciência nos gozos tranquilos de uma existência fidalga,
em lugar de manter-se no fácil silêncio de um estéril e cômo-
do mutismo, na atmosfera de ociosa indiferença, ergueu a
sua voz, fortalecida por um grande espírito saturado de ideias
generosas em defesa dos mais legítimos direitos dos cidadãos,
proclamando bem alto verdades filosóficas e princípios jurídi-

196 |
cos até então desconhecidos ou, pelo menos, desrespeitados
e repelidos (ARAGÃO, 1977, p. 28-31).
Insurgindo-se contra a crueldade das penas, pregava Bec-
caria (1993, p. 47; 61) que a mesma deveria ter um caráter
utilitário, procurando um exemplo para o futuro e não uma
vingança pelo passado; interligava a ideia do justo ao útil:
deveria a pena, em última análise, atuar na prevenção geral,
intimidando a consecução de novos delitos, sendo imprescin-
dível que se utilizassem os meios exclusivamente necessários
para o alcance desse fim, sem os excessos outrora praticados.
Antecipou o pensador italiano (1993, p. 18) princípios
hoje consagrados em Constituições das mais diversas nações,
como o princípio da legalidade no qual defendia que só as
leis podem fixar as penas de cada delito e que o direito de
fazer leis penais não pode residir senão na pessoa do legisla-
dor, que representa toda a sociedade unida por um contra-
to social; princípio da humanidade (p.19), em que advertia
que a atrocidade das penas não se coaduna com a filosofia,
mãe das virtudes benéficas, e que os castigos cruéis se opõem
diretamente ao bem público e ao fim que se lhes atribui, o
de impedir os crimes, estando provado que essa crueldade é
inútil, devendo ser considerada como odiosa, revoltante, con-
trária à toda justiça e à própria natureza do contrato social;
e princípio da proporcionalidade das penas, em que dizia ser
do interesse de todos não somente o cometimento de poucos
crimes, mas ainda que os delitos mais funestos à sociedade
sejam os mais raros, devendo a legislação, por sua vez, quan-
to aos meios que emprega para impedir os crimes, ser mais
contundente à medida que o delito é mais contrário ao bem
público e pode tornar-se mais comum, ou seja, há que se ter
uma proporção entre os delitos e as penas.
Afirmava Beccaria (1993, p. 35) que um homem não pode
ser considerado culpado antes da sentença do juiz e a socieda-

| 197
de só lhe pode retirar a proteção pública depois que seja de-
cidido ter ele violado as condições com as quais tal proteção
lhe foi concedida. Só o direito da força pode, pois, autorizar
um juiz a infligir uma pena a um cidadão quando ainda se
duvida se ele é inocente ou culpado, consagrando, assim, o
princípio de presunção da inocência. Reportou-se também a
importância da clareza e fixação das leis, opondo-se contra
a proposital obscuridade da legislação como meio de domi-
nação, já que o povo, por não entender as prescrições legais,
ficava à mercê de um pequeno número de intérpretes (BEC-
CARIA, 1993, p. 22), advertindo que enquanto o texto das
leis não for um livro familiar, uma espécie de catecismo, en-
quanto forem escritas numa língua morta e ignorada do povo
e enquanto forem solenemente conservadas como misterio-
sos oráculos, o cidadão que não puder julgar por si mesmo
as consequências que devem ter os seus próprios atos sobre
a sua liberdade e sobre os seus bens ficará na dependência de
um pequeno número de homens depositários e intérpretes
das leis, submetidos, portanto, ao jugo de uma multidão de
pequenos tiranos, tanto mais insuportáveis quanto menor é
a distância entre o opressor e o oprimido, tanto mais cruéis
quanto maior resistência encontram, porque a crueldade dos
tiranos é proporcional, não às suas forças, mas aos obstáculos
que se lhe impõem.
Beccaria (1993, p. 36) abominava a tortura, reputava-lhe
absoluta impropriedade como meio de obtenção de confis-
sões, não entendia como povos civilizados ainda podiam uti-
lizar-se dela como meio legal de prova, reputava-a como um
meio infame de descobrir a verdade, um monumento da bár-
bara legislação dos nossos antepassados, que honravam com
o nome de julgamento de Deus as provas de fogo, as de água
fervendo e a sorte incerta dos combates.

198 |
Assim como a tortura, a pena de morte também foi veemen-
temente combatida por Beccaria (1993, p. 50). Entendia o pen-
sador que o rigor desse tipo de castigo causava menos efeito
sobre o espírito humano do que uma pena de longa duração já
que o espetáculo atroz, mas momentâneo, da morte de um cri-
minoso, é para o crime um freio menos poderoso do que longo
e contínuo exemplo de um homem privado de sua liberdade.
Como todo o seu pensamento fundava-se no contrato so-
cial, não encontrava legitimação para a pena de morte, haja
vista que a soberania e as leis não são mais do que a soma das
pequenas porções de liberdade que cada um cedeu à socie-
dade. Representam a vontade geral, resultado da união das
vontades particulares. Destarte, nenhum homem em sã cons-
ciência poderia pensar em dar a outros homens o direito de
tirar-lhe a vida, não acreditando ser o caso de se supor que,
no sacrifício que faz de uma pequena parte de sua liberdade,
tenha cada indivíduo querido arriscar a própria existência, o
mais precioso de todos os bens133.
Com impressionante clarividência, Beccaria (1993, p. 59)
anteviu a questão da legalidade da prisão e da celeridade pro-
cessual, afirmando que a prisão é apenas um meio de deter
um cidadão até que ele seja julgado culpado, e como esse
meio é aflitivo e cruel, deve-se, tanto quanto possível, suavi-
zar-lhe o rigor e a duração, devendo um cidadão detido ficar
na prisão somente o tempo necessário para a instrução do
processo, já que quanto mais rápida for a aplicação da pena e
mais de perto seguir o delito, tanto mais justa e útil ela será.
Podemos afirmar que as ideias do Beccaria foram de clara
inspiração iluminista, portanto, em seu acendrado otimismo,
alimentava a crença de constante evolução que conduziria ao
aperfeiçoamento do homem e da sociedade graças ao poder

133
Cf. Beccaria (1993, p. 49).

| 199
da razão, à autonomia do indivíduo perante o Estado e à eli-
minação do arbítrio pelo império da lei, garantidor da liber-
dade e mantenedor da certeza do Direito.
Destarte, o Poder Estatal é um objeto de consentimento,
é fruto de um pacto por meio do qual os homens renunciam
à parcela de sua liberdade natural, em função da comunidade;
o vedado sob a acusação de sanção penal deve ser claramente
fixado em leis, a serem fidedignamente aplicadas pelo juiz.
As ideias acima expostas foram as responsáveis pelo gradu-
al desaparecimento das penas de suplício corporal, com exe-
cuções públicas134; chegamos a uma época em que imperava a
sobriedade punitiva marcada pelo aparecimento de uma nova
forma de punir, qual seja, a pena de prisão, que foi paulatina-
mente adotada como principal instrumento do Direito Penal,
status que mantém, sem sombra de dúvidas, até hoje.

5.2 Os tributos e a humanização das penas

Como visto no tópico anterior, as ideias voltaram-se para


outro desiderato, é preciso punir de outro modo, eliminar a
confrontação física entre soberano e condenado, o conflito
frontal entre a vingança do príncipe e a cólera contida do
povo, por intermédio do supliciado e do carrasco. Tais ideias
fizeram com que os suplícios se tornassem intoleráveis, revol-
tantes, o povo passou a perceber que as penas cruéis somente
revelavam a tirania, o excesso, a sede de vingança, o cruel
prazer de punir135.

134
Daí Bitencourt (1993, p. 43) ter feito a seguinte observação: “Beccaria
viu na pena privativa de liberdade um bom substitutivo para as penas
capitais e corporais. Suas ideias foram quase literalmente implantadas
pelo primeiro Código Penal da França, adotado pela Assembleia Cons-
tituinte de 1791”.
135
Para um maior aprofundamento no tema, Foucault (1993, p. 69-93).

200 |
Logo, imperioso que se encontrasse outras formas de pu-
nição, inclusive para os delitos que, sem sombra de dúvidas,
foram corresponsáveis pelo declínio da monarquia absolu-
tista, com a consequente ascensão da burguesia. Dentre tais
delitos, os que mais pesaram foram as ilegalidades fiscais, ile-
galidades aduaneiras, contrabando, saque e luta armada con-
tra os agentes do fisco, os crimes contra a alfândega como
definidos à época. A burguesia, como classe recém-alçada ao
poder, bem sabia que entre suas estratégias para enfraquecer
o monarca estava a da crescente utilização dessas práticas ile-
gais, haja vista que sem recursos econômicos, a monarquia
não poderia manter sua custosa máquina burocrática, a corte
e o exército, que lhe davam sustentação.
Essas ilegalidades, um consentimento mudo do poder mo-
nárquico, originavam-se da impossibilidade de efetivamente
impor a lei e reprimir os infratores, até mesmo porque para
a aristocracia havia o privilégio da isenção total de impostos,
logo, por questões políticas, para o terceiro Estado (burgue-
sia e classes menos favorecidas), era concedido certa margem
de tolerância, sob pena de, em havendo repressão, eclodirem
agitações populares. Interessante notar que com o alargamen-
to crescente das ilegalidades ocorreram certas transformações
(desuso de regulamentos, inobservâncias de barreiras alfan-
degárias, etc.) necessárias à ascensão da burguesia, que sobre
elas fundamentara parte de seu crescimento econômico.
É nesse ponto, mais precisamente na segunda metade do
século XVIII, que o processo começa a se inverter. É o fei-
tiço virando contra o feiticeiro, posto que com o aumento
geral da riqueza, aliado ao grande crescimento demográfi-
co, as ilegalidades populares, que até então estavam voltadas
para os direitos, mudam de objeto, voltam-se contra os bens.
Portanto, a pilhagem e o roubo substituem o contrabando
e a luta armada contra os agentes do fisco. Para a burguesia,

| 201
tal situação era inconcebível, pois se aceitou, estimulou e se
aproveitou das ilegalidades de direitos, outra era a concepção
quando se tratava dos bens que considerava como direito de
propriedade.
É Foucault (1993) quem melhor dimensiona o proble-
ma ao afirmar que, se essa ilegalidade é mal suportada pela
burguesia na propriedade imobiliária, é intolerável na pro-
priedade comercial e industrial. Na realidade, a acumulação
de capital através das relações de produção e do estatuto
jurídico da propriedade fez com que as ilegalidades fossem
violentamente deslocadas da seara dos direitos para a seara
patrimonial. O fenômeno é bem observado quando do de-
senvolvimento dos portos, do aparecimento dos grandes ar-
mazéns onde se acumulam mercadorias, da organização das
oficinas de grandes dimensões com um estoque considerável
de matéria-prima, de ferramentas, de objetos fabricados que
pertencem ao empresário e são difíceis de vigiar, passando,
pois, a exigir uma rigorosa, efetiva e eficaz repressão das ile-
galidades contra si perpetradas136.
É, portanto, necessário controlar e codificar todas essas
práticas ilegais incipientes, iniciando-se pela correta definição
das mesmas com a consequente e certa punição, de modo
exemplar, sem possibilidade de escapatória. Logo, houve uma
ruptura total entre as ilegalidades de direitos (sonegação) e
as ilegalidades de bens (crimes contra o patrimônio) e a con-
sequente diferenciação no tratamento dado a ambas. Para as
ilegalidades dos direitos – fraudes, evasões fiscais, operações
comerciais, etc. – campo fecundo reservado à burguesia – que
agora detinha o poder –, jurisdições especiais com transações,
acomodações, multas atenuadas, etc., para as ilegalidades pa-
trimoniais – delitos do povo, como sói acontecer até hoje –,
os tribunais ordinários e os castigos exemplares.
136
Foucault (1993, p. 78-79).

202 |
Do exposto, pode-se afirmar que a conjuntura que viu
nascer a reforma não é a de uma nova sensibilidade, mas a de
outra política em relação às ilegalidades. Houve, pois, uma
junção entre a luta contra o superpoder do soberano, fundada
nos ideais iluministas que se insurgiam contra os privilégios da
justiça, sua arbitrariedade, seus direitos sem controle e a luta
contra o infrapoder das ilegalidades populares conquistadas e,
até então, toleradas. Deve-se fazer da punição e da repressão
das ilegalidades uma função regular, coextensiva à sociedade,
sem que se puna menos, mas punindo melhor, atenuando-se
a severidade, entretanto, punindo com mais universalidade e
necessidade, em suma, inserir mais profundamente no corpo
social o poder de punir, repartido em circuitos homogêneos
que possam ser exercidos em toda parte, continuadamente,
até que seja atingido o granu salis do tecido social.
Com Foucault (1993, p. 82) encerramos a questão:
Deslocar o objetivo e mudar sua escala. Definir novas tá-
ticas para atingir um alvo que agora é mais tênue, mas
também mais largamente difuso no corpo social. Encon-
trar novas técnicas às quais se ajustar as punições e cujos
efeitos adaptar. Colocar novos princípios para regularizar,
afinar, universalizar a arte de castigar. Homogeneizar seu
exercício. Diminuir seu custo econômico e político au-
mentando sua eficácia e multiplicando seus circuitos. Em
resumo, constituir uma nova economia e uma nova tecno-
logia do poder de punir: tais são sem dúvidas as razões de
ser essenciais da reforma penal no século XVIII.

5.3 Os direitos fundamentais e a humanização das


penas

A concepção do Estado Liberal, além do ideário iluminista


voltado para as áreas afetas aos aspectos políticos e sociais,

| 203
pautou-se nas ideias fisiocratas que defendiam ser a política
econômica do absolutismo – o mercantilismo – um obstáculo
para o progresso, impedindo o desenvolvimento da economia
e da sociedade, haja vista que tal política era excessivamen-
te intervencionista e protetora do comércio devendo, pois, a
contrario sensu, manter a economia leis próprias e naturais de
funcionamento, sem regulamentações que não as do próprio
mercado (MORAES, 1993, p. 205).
Em consequência, o legislador deveria abster-se de interfe-
rir no livre curso da atividade econômica, restando ao direito
apenas a tarefa de proteção aos direitos individuais. Portanto, o
ideário liberal exigia o reconhecimento da existência dos direitos
naturais do indivíduo e da igualdade fundamental de todos os
homens – alçados então, de súditos a cidadãos – perante a lei.
A doutrina do direito natural, segundo Lafer (2001, p.
36), pautou-se nas ideias da imutabilidade, presumindo que
determinados princípios, pelas mais variadas razões, escapam
à história, podendo ser vistos como intemporais; da universa-
lidade, pois derivam da razão humana, sendo inatos a todos
os seres humanos, iguais em todos os lugares; da vinculação
à moral, posto que a função primordial do Direito não é co-
mandar e sim qualificar condutas de boas ou más, enfim, o
Direito Natural, ao contrário do Direito positivo, seria co-
mum a todos e, ligado à própria origem da humanidade,
representaria um padrão geral, a servir como ponto de Arqui-
medes na avaliação de qualquer ordem jurídica.
Aliado ao pensamento jus naturalista – que passa por um
processo de laicização – surgem as teses contratualistas, nas
quais a relação autoridade-liberdade fundamenta-se na auto-
-obrigação dos governados, diferentemente do absolutismo
em que havia uma relação despótica de imposições sem liber-
dade, somente autoridade fundada na força. O contratualismo
oferece então uma justificação do Estado e do Direito fora do

204 |
fundamento do poder irresistível do soberano, ou ainda, fora
do poder mais incontrastável de Deus, encontrando-a na base
da sociedade, através da vontade dos indivíduos137.
Portanto, de ver-se que a noção de direitos inatos – afetos
ao homem no estado de natureza – e contrato social, que ele-
vou tais direitos para a categoria de estado civil, com sua final
positivação nas Constituições, permitiram a elaboração de uma
doutrina do Direito e do Estado a partir da concepção indivi-
dualista da sociedade e da história, que marca o aparecimento
do mundo moderno e caracterizam o jus naturalismo dos sé-
culos XVII e XVIII, cujo apogeu deu-se com o Iluminismo138.
Todo esse aparato ideológico acima citado teve como
principal resultado o reconhecimento da pessoa humana
como valor-fonte de todos os valores sociais, assim como
fundamento último da ordem jurídica, consubstanciando-se
em uma conquista histórico-axiológica cuja expressão jurídica
são os direitos fundamentais do homem. Tais direitos realça-
ram outra dimensão importante que foi a do individualismo,
tendência irreversível do Estado Moderno que vê no indiví-
duo, na sua subjetividade, o dado fundamental da realidade,
caracterizando-se a liberdade individual como faculdade de
autodeterminação de todo ser humano.
Do exposto, fica extremamente claro que no jus naturalis-
mo, fonte de inspiração do constitucionalismo incipiente, os di-
reitos do homem eram vistos como direitos inatos e tidos como
verdade evidente, incompatibilizando-se total e definitivamente
com a violência que até então campeava no Direito Penal.
A proclamação dos direitos do homem traz em seu bojo
a noção de que a fonte da lei passa a ser o homem e não
mais o comando divino ou os costumes, que durante sécu-

137
Cf. Rousseau (2001, passim).
138
Para maior aprofundamento no tema, Lafer (2001, p. 35-41; 117-127).

| 205
los martirizaram o ser humano, mormente na seara penal,
conforme exposto no primeiro capítulo. De observar-se que
para o homem emancipado e isolado em sociedades crescen-
temente secularizadas, as Declarações de Direitos represen-
tavam um anseio muito compreensivo de proteção, pois os
indivíduos não se sentiam mais seguros ante as ordens divina
e estamental e, o que é mais importante, tais declarações vêm
inviabilizar de uma vez por todas a elaboração de legislações
penais que venham de encontro, que se antagonizem, a todo
o arcabouço de proteção da pessoa humana nelas elencado,
o que realmente se confirma com a inauguração do Direito
Penal liberal nos Códigos Franceses de 1790 e 1810139.
Portanto, como consectário lógico do reconhecimento
dos direitos à vida, à liberdade e à igualdade perante a lei,
produziu-se uma mudança radical na forma de punir, haja
vista que, se tais direitos estavam garantidos constitucional-
mente pela nova ordem de poder, como continuar aplicando
punições que, além de caracterizarem a ordem anterior, de
estarem intrinsecamente ligadas a ela, ainda lhe deram susten-
tação por um largo período de tempo e, o que é pior, como
aplicar penas que se antagonizavam peremptoriamente com
os ideais que deram base de sustentação às reformas? Pela
impossibilidade de tal conjugação, saíram vitoriosos os direi-
tos fundamentais da pessoa humana, em última instância os
indivíduos por eles protegidos.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Após o choque inicial, proposital, em razão da exposição
do que ao longo da história o homem pode ser capaz de fa-
zer ao seu semelhante sob as vestes do direito de punir, por

139
Cf. Luisi (1983).

206 |
motivos, no mais das vezes, completamente desvinculados da
responsabilidade pessoal – responsabilidade esta também ig-
norada quando da aplicação das punições –, imperioso que se
reflita para além do Direito Penal antigo como uma das mais
tristes demonstrações da crueldade humana, até alcançarmos
o seu viés mais perigoso, qual seja, o que desde as suas ori-
gens sempre esteve ligado ao poder, mais precisamente à sua
manutenção e reprodução e, como tal, sempre manipulado
pelas classes dominantes, ao sabor de seus interesses. É assim
até hoje! A história prova o que foi exposto acima, já que
o fenômeno da publicização das penas nada mais foi que a
apropriação por parte do Estado de um instrumento até en-
tão a serviço das relações privadas, pela percepção de que ali
estava o mais eficaz meio de controle social.
De concluir-se também que o ápice da utilização do Direi-
to Penal, enquanto controle social por meio do terror, deu-se
com o regime absolutista ou, como preferem os historiadores,
com o ancién regime, o que é comprovado pelo tratamento
dado aos crimes de lesa majestade. Entretanto, também foi
sob tal forma de poder despótica que se deu seu declínio. Foi
com o absolutismo monárquico que o terror punitivo encon-
trou seu ocaso.
Muito se credita aos ideais iluministas que acabaram por
ver suas ideias positivadas nas Constituições pós-revolucioná-
rias, após serem declarados nas Cartas da Virgínia e da Fran-
ça, os méritos pela superação de tão negro capítulo da história
humana. Impossível negar a importância de tais postulados,
entretanto, outros fatores influenciaram, e bastante, as ações
perpetradas pela classe que então objetivava a tomada do po-
der, a saber, a classe burguesa.
É evidente que princípios como o da legalidade dos cri-
mes e das penas, postulado até hoje em voga em todas as
legislações civilizadas do mundo, proporcionalidade, devido

| 207
processo legal, igualdade, clareza e taxatividade da legislação
penal, dentre tantos outros abordados no texto, tiveram e
têm sua devida importância na elaboração da moderna legis-
lação penal, além do que foram formulações básicas para a
reforma do direito punitivo.
Importante notar também que foi através dos ideais ilu-
ministas que as noções de direitos fundamentais da pessoa
humana, tão caros quando da transição do Direito Penal do
terror – que não respeitava tais direitos – para o Direito Penal
humanitário – que os colocou no mais alto patamar –, come-
çaram a ser forjados, enquanto direitos naturais do homem,
oriundos de sua razão.
Porém, é inegável que os ideais iluministas se voltavam
apenas contra um dos polos do problema, que era o do poder
arbitrário e desumano das monarquias absolutistas. Tanto os
direitos fundamentais da pessoa humana como os postulados
mais específicos do novo direito de punir se voltavam contra
as agruras do terror monárquico, e esse era apenas um dos
pontos da questão.
Mas, quando o tema envolve o poder, as coisas nunca se
passam de forma clara, sempre existem interesses sub-reptí-
cios, velados, disfarçados, ao sabor das conveniências dos que
o almejam. Logo, em tão importante época da história hu-
mana não poderia ser diferente. Tratava-se, no momento da
transição penal, também da transição das formas de controle
do poder, caía a monarquia absolutista, subia ao poder a bur-
guesia, na forma de monarquia constitucional. O problema,
pois, não se resumia somente à questão de como o Direito
Penal era aplicado no regime que se findava e que levara à su-
cumbência tanto o próprio direito punitivo como também o
poder que dele fizera uso, e sim em como deveria ser aplicado
de forma direcionada para a manutenção do poder sob a nova
ordem que se formava.

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De ver-se, então, que o fator preponderante para as mu-
danças efetivadas no âmbito do Direito Penal foi a busca de
defesa por parte da classe que então ascendia ao poder contra
as condutas que levaram o antigo regime ao ocaso. Bem sabia
a burguesia, já que de tal fez uso, que uma das principais cau-
sas que levaram a ruína à monarquia absolutista foi a constan-
te sonegação de impostos, mais precisamente as ilegalidades
dos direitos, visto que inviabilizaram a administração do rei-
no em razão da escassez de recursos. Perceberam os burgue-
ses, de forma precisa, que tais ilegalidades se transmudavam
em razão da acumulação de riqueza por eles alcançada. Já não
se voltavam os infratores contra os tributos e sim contra o pa-
trimônio da burguesia, fator preponderante e imprescindível
para manutenção da posição recém-alcançada, já não era a
ilegalidade dos direitos que ameaçava o poder vigente e sim a
ilegalidade dos bens.
Logo, temos que na realidade, a amenização nas formas
de punir – apesar da inegável influência da positivação dos di-
reitos fundamentais da pessoa humana, inspirados nas ideias
ilustradas, como também das bases democráticas infundidas
no Direito Penal, mormente com o reconhecimento da igual-
dade formal de todos perante a lei, também por obra dos
postulados iluministas – teve seu fundamento preponderante
no interesse da burguesia em combater os delitos que se tor-
navam comuns contra seu patrimônio e, por via de consequ-
ência, defender sua nova posição de detentora do poder.
Em verdade, os novos detentores do poder almejavam, em
defesa de seu patrimônio e de sua permanência no poder –
reiteramos –, já que ambos estavam intrinsecamente ligados,
assegurar uma melhor distribuição do poder de castigar, já
que punindo com menos rigor poderia, inclusive, punir mais,
dando maior efetividade ao Direito Penal, defendendo-se
desse modo, de modo muito mais eficaz o patrimônio.

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De concluir-se, portanto, que o Direito Penal, desde a sua
gênese nos tempos modernos, quando denominado de Di-
reito Penal liberal, esteve a serviço de interesses outros que
não os do verdadeiro Estado Democrático de Direito. To-
das as mudanças perpetradas no âmbito das punições – que
se restringem a endurecê-las e amenizá-las – não buscam o
bem-estar da sociedade, a melhoria das relações sociais e sim
satisfazer interesses próprios da política em voga. Esta é a
contribuição mais importante do presente trabalho: fomentar
a consciência crítica daqueles que lidam com o Direito Penal,
mostrar que desde sempre nunca esteve a serviço dos cida-
dãos, que nunca foi isonômico, muito pelo contrário, sempre
foi utilizado como forma eficaz de controle social, que por
objetivo último busca a manutenção e reprodução das formas
de poder vigentes. Sempre foi e continua sendo assim, restan-
do àqueles que têm a possibilidade do discurso e da prática
– todos os que atuam na seara punitiva – indisporem-se com
tal sorte de coisas, já que com o discurso podemos difundir
as verdades nas quais acreditamos e com a prática provar que
realmente acreditamos em tais verdades.

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