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Instituto de Relações Internacionais

RAÇA, PODER, COLONIALIDADE DO SER: REPENSANDO A IDEIA


DE RAÇA NA POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA

Aluno: Daisy Bispo Teles


Orientadora: Marta Regina Fernandez y Garcia Moreno

Introdução: Elementos de colonialidade na estrutura de poder


Na tentativa de se problematizar as facetas racistas da política externa desenvolvida
pelo Estado brasileiro, em relação ao continente africano, se buscou, através desta pesquisa,
rever a construção do racismo dentro das próprias Relações Internacionais. Dessa forma,
informando-se por uma perspectiva decolonial, notou-se a centralidade do termo raça, no que
tange a formação das estruturas de poder. Neste aspecto, foi possível perceber a intersecção
da relação entre raça e a ordem internacional liberal capitalista contemporânea. Tal ordem,
informada pela ideia do sistema mundo moderno, só foi possível graças ao início da
empreitada colonial nas Américas, pois é partir do marco de Colombo, que se constitui o
capitalismo moderno eurocentrado como o novo padrão de poder mundial. Neste sentido, o
engajamento com a noção racial se explicita, neste contexto, pois o eixo fundamental da
hierarquia de poder colonial se deu a partir da classificação social da população do mundo de
acordo com a ideia de raça, fato que implica em um elemento de colonialidade.
A ideia de raça, neste aspecto foi engajada de modo a outorgar legitimidade à
imposição da conquista colonial, a partir da formação de um discurso, na qual o binarismo
inferior/superior, pela perspectiva racial, se relacionava, respectivamente, à dicotomia
colonizado/colonizador. Neste sentido, a noção de raça e sua diferenciação serviram para
naturalizar as inúmeras violências colônias (QUIJANO, 2005 e GROSFOGUEL, 2016).
Dado então o marco decolonial de identificar a ideia de raça como fundamental para o
entendimento de estruturas de poder contemporâneas, identifica-se que a postura brasileira
frente ao continente africano não foge deste ambiente de colonailidade.
Neste sentido, trabalhando a partir do que fora produzido por André Cicalo (2012),
percebe-se como a política externa brasileira mobiliza o discurso sobre raça e passado
colonial frente ao continente africano, sendo possível identificar que apesar do fim do
colonialismo, a ideia de raças ainda é uma estrutura discursiva sobre as quais os atores de
relações internacionais traçam suas ações e perpetuam as hierarquias de poder.

Raça, Poder e colonialidade do ser


A América constitui-se como o principal espaço/tempo de um padrão de poder de
vocação mundial e, desse modo e por isso, como a primeira id-entidade da
modernidade. Dois processos históricos convergiram e se associaram na produção
do referido espaço/tempo e estabeleceram-se como os dois eixos fundamentais do
novo padrão de poder. Por um lado, a codificação das diferenças entre conquistador
e conquistados na ideia de raça, ou seja, uma supostamente distinta estrutura
biológica que situava a uns em situação natural de inferioridade em relação a outros.
Essa ideia foi assumida pelos conquistadores como o principal elemento
constitutivo, fundacional das relações de dominação que a conquista exigia. Nessas
bases, consequentemente, foi classificada a população da América, e mais tarde, do
mundo, nesse novo padrão de poder. Por outro lado, a articulação de todas as formas
históricas de controle do trabalho, de seus recursos e de seus produtos, em tono
capital e do mercado mundial. (QUIJANO, 2005).
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Ao se ter contato com o trabalho do autor decolonial Aníbal Quijano (2005), percebe-
se a centralidade da ideia de raça, principalmente no que tange à formação das estruturas de
poder, pois fica possível identificar, que ao longo do tempo, o conceito de raça foi engajado,
justamente, para dar forma a tais estruturas. Neste aspecto, o que é destacado por Quijano é de
extrema importância para elucidar a relação entre raça e o sistema liberal capitalista
contemporâneo. Tal sistema, só foi possível graças ao início da empreitada colonial nas
Américas, pois é partir do marco de Colombo, que foi possível constituir o capitalismo
moderno eurocentrado como o novo padrão de poder mundial. O engajamento do conceito de
raça se explicita, neste contexto, pois o eixo fundamental de tal padrão de poder é a
classificação social da população do mundo de acordo com a ideia de raça, fato que implica
em um elemento de colonialidade neste padrão de domínio hegemônico (QUIJANO, 2005).
Seguindo este pensamento, vê-se que outro elemento constitutivo das relações frente a
este padrão colonial, além da separação da população mundial frente ao parâmetro de raça,
segundo Quijano (2005), foi a articulação e controle do trabalho em torno do capital e do
mercado mundial. Deste modo, mesmo que a classificação racial e o estabelecimento do modo
de produção (com suas devidas relações de produção) sejam fatores sistemáticos, porém
distintos, é graças à instauração do padrão de poder colonial que tais elementos se relacionam,
havendo assim uma divisão racial do trabalho. Conforme novas identidades foram sendo
produzidas, a partir da conotação racial (negros, índios, europeus), estas foram sendo
associadas a um tipo de relação de produção. Desta forma, mais do que apenas expressar
raça, a identidade indígena, por exemplo, implicava em uma “mão de obra descartável”
(QUIJANO, 2005), não assalariada, abaixo na pirâmide da burocracia colonial.
A ideia de raça, neste aspecto, em seu conceito específico, foi engajada de modo a
“outorgar legitimidade” à imposição da conquista colonial, a partir da formação de um
discurso, na qual o binarismo inferior/superior, se relacionava, respectivamente, à dicotomia
colonizado/colonizador. A ideia de raça e sua diferenciação serviram para naturalizar o que
era propagado por este discurso colonial. Além disso, conforme a expansão colonial foi
ocorrendo, a perspectiva eurocêntrica do conhecimento foi se moldando, assim, mais do que
referente à produção do discurso de poder, a ideia de raça foi teorizada pelos europeus frente
aos povos conquistados.
Neste ponto, recorre-se à Sankaran Krishna (2003), quando o autor afirma que as
abstrações, referente aos termos utilizados pelas Relações Internacionais, não são inocentes
das concepções de poder. A tradição teórica dos estudos internacionalistas apenas demonstra a
fugacidade perante a necessidade de historização, de termos, como Estado, propriedade,
soberania e também raça. Tais conceitos não estão dispostos aleatoriamente no conjunto
metodológico e epistêmico das Relações Internacionais, mas foram construídos perante a
certo contextos que expressam a dimensão do poder e o caráter eurocêntrico da racionalidade
que envolve a disciplina.
Deste modo, ampliando a perspectiva eurocêntrica sobre a ideia de raça e se
elaborando com isto a dicotomia entre inferioridade e superioridade, a diferenciação racial se
mostrou o mais eficaz meio universal de dominação social (QUIJANO, 2005), e isto em todos
os campos: desde o controle do trabalho, até o controle das formas culturais de
intersubjetividade e noções de conhecimento. Houve uma colonização, segundo Quijano
(2005) das percepções subjetivas até mesmo de sentir as experiências materiais e a cultura.
Desta forma, ao olhar-se de forma cruzada para o que expressa Aníbal Quijano (2005), sobre
o controle exercido por este novo padrão de poder e o que aponta Sankaran Krishna (2003)
para a elaboração pontual de certos termos e o racismo nas Relações Internacionais,
recordamos do termo epistemicídio[1], trabalhado pelo autor Boaventura de Souza Santos e
relembrado por Ramon Grosfoguel (2016) in “A Estrutura do Conhecimento nas
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Universidades Ocidentalizadas: Racismo/sexismo epistêmico e os quatro


genocídios/epistemicídios do longo século XVI”.
Sendo a raça, o critério de distribuição da população mundial na estrutura de poder da
nova sociedade capitalista, foi possível perceber, com isso, a associação da branquitude às
relações de trabalho assalariada, ao usufruto de privilégios e até mesmo a posse de
capacidades cognitivas, tal como racionalidade e linguagem formal. Neste aspecto, vislumbra-
se Robbie Schilliam (2013), quando este aborda, de forma a relacionar a visão colonial, à
dicotomia cartesiana entre mente e corpo. No movimento colonial, de relacionar o
colonizador à figura de racionalidade, isso fez legitimar a ação da empreitada colonial e a
introdução do racismo para sua neutralização. Neste sentido, nos informa Grosfoguel, 2016:

O que conecta o “conquisto, logo existo” (Ego conquiro) com o idolátrico


“penso, logo existo” (Ego cogito) é o racismo/sexismo epistêmico produzido pelo
“extermino, logo existo” (Ego extermino). É a lógica conjunta do
genocídio/epistemicídio que serve de mediação entre o “conquisto” e o
racismo/sexismo epistêmico do “penso” como novo fundamento do conhecimento
do mundo moderno e colonial. O Ego extermino é a condição sócio-histórica
estrutural que faz possível a conexão entre o Ego coquiro e o Ego cogito.
(GROSFOGUEL, 2016)

Pela abordagem iluminista, estaria o homem moderno relacionado ao âmbito da


mente, a racionalidade. Contudo a modernidade, dentro do discurso do poder colonial, se
refere à Europa colonizadora, frente às regiões colonizadas, que fazem alusão ao passado,
atraso. Assim, o branco europeu se coloca no lugar de regência frente os conceitos que são
postos, ocupando um lugar de privilégio epistêmico (SHILLIAM, 2013).
Criando-se novas identidades frente ao novo padrão de poder colonial, há o exercício
da homogeneização das categorias identirárias frente a três elementos: a colonialidade do
poder, o capitalismo e o eurocentrismo. Isso implica em um conjunto de práticas sociais da
esfera intersubjetiva comum a todas as áreas do globo, com até mesmo esferas valorativas, da
onde surgem instituições comuns tal como o Estado Nação, a família e a burguesia.
(QUIJANO, 2005). Mudando-se, então, toda a esfera das relações sociais, este padrão de
poder altera, também, a relação espaço tempo, principalmente a espera de mudanças
históricas. Contudo se pela racialização das relações sociais e de trabalho se expõe a
legitimação da dicotomia inferior e superior, a história, assim, também será pautada, sendo
que seu ponto máximo, afetado pela perspectiva eurocêntrica, será a transformação das áreas
colonizadas em “Europa” (evidenciando assim, caminhos da Teoria da Modernização).
Desta forma, paradoxalmente caminham junto, segundo Quijano (2005), a noção do
evolucionismo e do dualismo: Como pode algo que é considerado o estágio passado da
Europa, ser também o antônimo, o outro, da mesma? Dentro deste paradoxo, os povos da
América, Ásia e África foram reduzidos a uma identidade colonial inferiorizada. Esta
percepção não apenas fez elucidar a outra face deste espelho (a Europa moderna e civilizada),
mas também a concepção de que o poder colonial afastou os povos colonizados de suas
singularidades e de sua participação na produção cultural histórica.
Robbie Shilliam (2013) irá afirmar que os conceitos de liberdade, igualdade e justiça,
por exemplo, não englobam a percepção dos escravos sobre os mesmos. Estes conceitos
foram pensados por intelectuais que ajudaram a construir as bases dos Estados escravizadores.
Quando se pensa na participação dos escravos na construção destes conceitos em seus
próprios termos, se fala em conceitos forjados, que são encontrados na conexão com o
passado negro, via música, oralidade, história, arte, entre outros meios (vide Nascimento
1980). O mesmo autor irá afirmar que a narrativa da abolição enxerga estes caminhos como
formas inviáveis, pois do mesmo modo que os senhores de escravos vêm à libertação dos
negros por meio da condolência branca, os abolicionistas também assim a fazem. Shilliam
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(2013) irá, então, defender, uma nova hermenêutica da visão abolicionista, que coloca o negro
como protagonista da sua própria libertação, via redenção.
Quando Sankaran Krishna (2003), por elucidação dos estudos de Edward Said, oferece
o instrumento da contrapontualidade, faz-se perceber que o autor também se coloca em um
esforço hermenêutico que repense os termos das Relações Internacionais. A universalidade
dos termos, algo que segundo Abdias do Nascimento (1980) fere a emancipação negra, frente
às categorias epistêmicas de RI, tal como o Estado Nação, faz com que não se veja a
construção dialética destes conceitos e das identidades que se formam ao redor deles. Aníbal
Quijano (2005) ao formular seu pensamento sobre a criação do Estado Nação da América
Latina, tenta elucidar estas questões ao perceber o paradoxo de Estados independentes, mas
enraizados politicamente nas estruturas coloniais.
O desafio hermenêutico posto por Shilliam (2013) de ver o esforço negro frente a sua
libertação choca com as concepções coloniais postas pelo novo padrão de poder citado por
Quijano (2005). Desta forma, assim como as questões levantadas por Krishna (2003), para se
repensar a epistemologia das Relações Internacionais, isto reflete o verdadeiro esforço de
colonial de resgate as raízes esquecidas e rompidas pelo conhecimento colonial e a
descolonização das mentes para o entendimento das estruturas de poder. O exemplo mais
prático desta ação pode ser revelado na práxis do Quilombismo, explorada por Abdias do
Nascimento (1980). No âmbito da luta social, anti-imperialista o quilombismo coloca-se
como uma ação libertadora através da reorganização da sociedade pelo regate da memória e
empoderamento dos atores, antes oprimidos.
Vê-se que a raça, estando na centralidade da estrutura de poder que compõe a ordem
capitalista mundial moderna, possibilita a formação do discurso colonial em binarismos, na
qual restringe a história e sua construção à uma Europa moderna, civilizada “universal”. Com
isso, se é colonizado não só as estruturas materiais da sociedade, mas também a concepção
dos saberes. Desta forma, por mais que seja possível pontuar o fim formal do colonialismo, os
elementos de colonialidade ainda se fazem enraizados na estrutura de poder, sobre as quais os
atores das Ralações Internacionais pautam suas ações e, não obstante, a raça continua ser um
elemento categorizador da sociedade. Isto pode ser vislumbrado na ação do Estado Brasileiro,
para com o continente africano, que mobiliza tal artefato discursivo a fim de traçar pontes
estratégicas.

Racismo e Política Externa Brasileira


André Cicalo (2012), com altos estudos em antropologia social e com trabalhos
referentes à identidade nacional negra brasileira e as relações entre Brasil e África, no mesmo
viés, produziu o texto “Brazil and its african mirror: discussing ‘black’ aproximation in the
South Atlantic”. A obra em questão tem como principal objetivo correlacionar às relações
raciais brasileiras com o diálogo transatlântico entre Brasil e África, tendo como pano de
fundo a intenção de mostrar que mesmo havendo uma mistura racial, com a presença de um
“senso pardo”, que influencia a formação da identidade nacional no Brasil, o país tem
dificuldade de definir sua “identidade negra” tanto no cenário doméstico quanto no
internacional, evidenciando a presença do racimo nas estruturas de poder do país. Vemos, ao
mesmo tempo, o estabelecimento de programas e políticas públicas para retomar esta
identidade negra como afirmativa, além do Brasil projetar seus interesses geopolíticos na
África por meio das cooperações Sul-Sul.
A África, de acordo com Cicalo (2012) representa um terreno importante para os
interesses nacionais, como forma de estabelecimento da liderança do Brasil no cenário
internacional. Contudo, as relações com o Atlântico Sul, também representam uma nova
fronteira para as relações raciais da antiga colônia portuguesa nas Américas.
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Desde o fim do século dezenove, o Brasil goza do renome internacional de uma


“democracia” racial. A pluralidade étnica do país é marcante ao ponto de transcrever novas
categorias dentro dos programas de análise demográfica (separação pela escolha racial entre:
branco, pardo, negro, amarelo, que sofreu ao longo do tempo críticas por parte do movimento
negro nacional) (CICALO, 2012).
Devido a um mesmo passado colonial, o Brasil define uma relação simbólica com o
continente africano. Neste ponto, percebe-se que as relações estratégicas brasileiras travadas
dentro do contexto africano são respaldadas por um discurso, de duas regiões distintas, mas de
berço comum. A ideia da “Mãe África” (vide Patrícia Pinho, 2010 apud Cicalo 2012)
desempenha um papel fundamental e ajuda a compreender como a história diplomática do
Brasil, neste continente, faz-se presente na formulação de diferentes ralações raciais no
contexto nacional e cultural – “... the developments of Brazilian race relations over the last
two decades, and past discourses of a shared cultural ‘Africaness’ have been now superposed
by racial images of a shared, transatlantic ‘blackness’.”[2].
Ao analisar-se a atuação diplomática brasileira durante diferentes governos no
continente africano, destaca-se que, principalmente, nos anos sessenta, os discursos da
“mestiçagem”, “democracia racial”, “nação arco-íris” (vide Hellwing, 1992), presentes em
várias das interpretações do Brasil, foram ponto de partida para promover os interesses
estratégicos e econômicos nacionais em determinadas áreas do “continente mãe”. Assim,
houve vários significados nas ações desempenhadas pelo país, que não apenas traçava
expansões para seu mercado, mas também representava a uma “ponte natural” entre a África e
o Ocidente, pois devido ao compartilhamento de um passado e uma cultura comum, passando
da língua até a fé, o Brasil tornar-se-ia o país que poderia “civilizar” a África sem
“desculturaliza-la” (CICALO, 2012).
Contudo, apesar do discurso de paraíso racial brasileiro ter se apresentado como uma
ferramenta discursiva para a promoção de poder brasileiro na África, durante os anos sessenta
e setenta, foi possível perceber que tal ideia enfrentava, em uma primeira análise, certas
contradições que, de certa forma, questionavam as intenções nacionais para com o continente
africano: (1) a imediata contradição da maioria de diplomatas brancos, (2) a negação do
discurso diplomático brasileiro em mencionar a ligação do Brasil com aspectos da escravidão,
(3) o consistente apoio do Brasil a Portugal que até meados dos anos sessenta mantinha
colônias na África e (4) o início da crítica social ao paraíso racial, na qual o argumento da
classe começava a se relacionar com o fator da raça, e a democracia racial começava a ser
questionada por intelectuais negro, como Abdias do Nascimento.
Neste sentido, era apontado que o discurso de democracia racial apresentava uma
grave distancia, para com a realidade nacional de racismo e discriminação para a população
negra. A cerca da democracia racial, Nascimento apontou:

ou ela é democrática para todas as raças e lhes confere igualdade


econômica, social e cultural, ou não existe uma sociedade plurirracial democrática.
À hegemonia da ‘raça’ branca se contrapõe uma associação livre e igualitária de
todos os estoques raciais (NASCIMENTO, 1978).

A configuração da mestiçagem como uma experiência vivida na América Latina, que


fez ser possível o surgimento da ideia de democracia racial contradizia a uma espécie de
quebra cabeça, na qual os fatores étnicos e raciais ainda pontuam certas hierarquias no Brasil.
Não obstante a elite branca, no topo desta pirâmide social continuou a desfrutar do aparato
colonial para sustentação de seus privilégios. Neste ponto, recorda-se de Aníbal Quijano
(2005) e destaca-se como a delimitação das burocracias coloniais pela ideia de raça, fez ser
possível perpetuar estas demarcações até os dias de hoje, colaborando com a continuidade dos
elementos de padrões coloniais em nações não mais colonizadas, tal com o Brasil, que mesmo
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com o racismo vigente em sua sociedade, mobilizou a ideia de democracia racial perante as
ações de política externa no continuem africano.
Em um movimento de se desvencilhar das críticas levantadas sobre as relações
transatlânticas e após os anos 80, devido às crises econômicas e o fechamento do Brasil para o
embalsamo neoliberal, as relações Brasil-África passaram por uma grande mudança. Sobre
grande influência do governo Lula, o Brasil trocou o discurso da mestiçagem, para a aceitação
de certos quadros de desigualdade, o que fez ser possível emergir ações afirmativas, tais como
as cotas universitárias e traçar novas relações com a África através de um ideal de ação
horizontalizada sobre orientação da cooperação Sul-sul. (CICALO, 2012).
Neste contexto, o país, como grande potência emergente, precisou do continente
africano para reproduzir seu prestígio internacional e sua liderança, ao passo que os alguns
países da África começaram a atender o Brasil como extensão de sua representatividade em
órgãos como a OIT e FMI.
Contudo, esta mudança de discurso e redefinição de postura a cerca da negritude não
conseguiu apagar por completo o arcabouço colonial, ainda existente no país. A ponte com o
continente africano ainda recai sobre a observância de um Brasil com espaços de poder
altamente racializados, vinculados à branquitude. No entanto, o discurso de que o Brasil é
“the main African nation ourside África”[3] acolhia a necessidade dos diplomatas, além dos
próprios políticos que favoreciam a criação de um cenário nacional, no qual o Brasil reforçava
sua “negritude”, através de políticas públicas, que por exemplo, conclamavam o estado da
Bahia como representante do berço africano no país.
Neste sentido, se nos anos sessenta a presença inexorável da mistura racial era
necessária a prevalência de um diálogo com a África, recentemente, os atores de política
externa brasileiros tentam maquiar a ambiguidade grave, entre o discurso de harmonia racial e
a presença obscura do Brasil no passado escravocrata. Com isso, a palavra da mistura racial é
transformada em pedido de desculpas, como evidenciado nos dizeres do presidente Lula: “o
Brasil tem um débito com África” [4].
Mobilizando seu passado colonial frente às relações raciais no cenário nacional, foi
possível perceber a criação de um discurso sobre o qual o Brasil, por ventura deste “débito
com a África”, teria a necessária função de intervir com a cooperação no continente. Dessa
forma, o país se apresentaria como aquele capaz de levar ajuda estrutural, para a promoção da
modernidade africana, além de sua própria cultura, pois Cicalo (2012) afirma que se antes a
herança africana era uma ferramenta para atuação no continente, atualmente segue-se a ideia
de que o Brasil, ao intervir, poderia ensinar para África algo sobre seu próprio passado.
Evidenciar este aspecto é fundamental para se perceber os elementos de colonialidade ainda
dispersos nas relações internacionais. Ao demarcar por esses termos suas atividades no
continente africano, o Brasil atua de forma igualmente imperialista com os pressupostos ação
da teoria da modernização.
Dessa forma, por mais que as relações raciais sejam uma pauta do dialogo
transatlântico brasileiro, vê-se que a postura brasileira da política externa não atua para o
questionamento de realidade nacional, mesmo pairando sobre da democracia racial e de Brasil
de regate a negritude.
A viagem transatlântica das relações Brasil e África, feita por André Cicalo (2012),
permite-nos extrair que a construção da identidade nacional por uma realidade racial
brasileira, tanto no cenário externo, quanto interno, emerge e modifica-se perante os
incentivos estratégicos advindos do continente próximo, além de encontrar obstáculos devido
a um racismo camuflado por uma história que passa da colonização até a escravatura, fazendo
a ideia de cooperação, que atravessa o Atlântico, necessitar de uma avaliação crítica uma vez
revela relações raciais desiguais e embriagadas por um discurso civilizatório. Logo a
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“negritude” brasileira não se torna uma realidade vigente e sim apenas discursos proferidos
em prol dos benefícios estratégicos do Brasil para com a “Mãe África”.

Conclusão
A conclusão que se chegou ao se desenhar esta pesquisa foi que o aspecto racial, tido
como padrão organizador da ordem internacional vigente, ainda influencia muito das ações
dos atores neste ambiente. O Brasil ao redefinir suas ações com o continente africano a partir
da elucidação deste conceito, no seu discurso de política externa, acaba por se colocar como
agente perpetuador das instâncias coloniais de poder, nas quais se baseiam os padrões
políticos e sociais contemporâneos. A análise das relações Brasil/África, oferece uma boa
perspectiva sobre as quais se pode identificar como as ações de política moderna ainda
carregam em seu âmago, elementos de colonialidade, sendo possível dar continuidade a
hierarquias, tal como a divisão Norte e Sul global.

Referências
CICALO, André. Brazil and its African mirror: discussing ‘Black’ Approximations in the
South Atlantic. Working Paper Series, Berlim, 2012. Disponível em:
<http://www.desigualdades.net/Resources/Working_Paper/WP_24_Cicalo_ONLINE.pdf>.
Acesso em: 23 jun. 2017.

GROSFOGUEL, Ramón. A estrutura do conhecimento nas universidades ocidentalizadas:


racismo/sexismo epistêmico e os quatro genocídios/epistemicídios do longo século XVI. Soc.
estado, Brasília, 2016. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1590/S0102-
69922016000100003>. Acesso em 23 jun. 2017.

HELLWING, Davis. African-American Reflections on Brazil’s Racial Paradise.


Philadelphia: Temple University Press, 1992.

KRISHNA, Sankaran. Race, Amnesia and the Education of International Relations.


Alternatives: Global, Local, Political, v. 26, n. 4, 2001, p. 401-424.

NASCIMENTO, Abdias. Quilombolismo: Na Afro-Brazilian Political Alternative. Journal of


Black Studies, Afro-Brazilian Experience and Proposals for Social Change, Vol. 11, N. 2,
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1978.

QUIJANO, Aníbal. Colonialidade do Poder, Eurocentrismo e América


Latina. In: Colonialidade do Saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-
americanas. Edgardo Lander (org). ColecíonSurSur, CLACSO, Ciudad autônoma de Buenos
Aires, Argentina. 2005.
Instituto de Relações Internacionais

[1] “(...)“epistemicídio”, ou seja, a destruição de conhecimentos ligada à destruição de seres


humanos. In GROSFOGUEL, Ramon: A Estrutura do Conhecimento nas Universidades
Ocidentalizadas: Racismo/sexismo epistêmico e os quatro genocídios/epistemicídios do longo
século XVI”, 2016. p. 2.

[2] CICALO, André. Brazil and its African mirror: discussing ‘Black’ Approximations in the
South Atlantic. Working Paper Series, Berlim, 2012. Disponível em:
<http://www.desigualdades.net/Resources/Working_Paper/WP_24_Cicalo_ONLINE.pdf>.
Acesso em: 23 jun. 2017. p.2.

[3] CICALO, André. Brazil and its African mirror: discussing ‘Black’ Approximations in the
South Atlantic. Working Paper Series, Berlim, 2012. Disponível em:
<http://www.desigualdades.net/Resources/Working_Paper/WP_24_Cicalo_ONLINE.pdf>.
Acesso em: 23 jun. 2017. p.14.

[4] LULA apud CICALO, André. Brazil and its African mirror: discussing ‘Black’
Approximations in the South Atlantic. Working Paper Series, Berlim, 2012. Disponível em:
<http://www.desigualdades.net/Resources/Working_Paper/WP_24_Cicalo_ONLINE.pdf>.
Acesso em: 23 jun. 2017. p.20.

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