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SER, CONSCIÊNCIA E LINGUAGEM: HORIZONTES DA FILOSOFIA

BEING, CONSCIENCE ANO LANGUAGE: PHILOSOPHICAL HORIZONS)

Onü.io AL VES AGUIAR I

RESUMO zes, pressuposto nos discursos filosóficos. Refiro-me


a termos como paradigma clássico, Filosofia da cons-
Articular os horizontes do ser (Filosofia Antiga), ciência, modelo lingüístico, padrão contemporâneo do
da consciência (Filosofia Moderna) e da linguagem (Fi- filosofar, pensamento metafísico etc. Através deste
losofia Contemporânea) presentes na história da Filoso- trabalho, esperamos alcançar não apenas um esclare-
fia, ressaltando a dimensão cosmológica no primeiro cimento semântico, mas também trazer à tona os gran-
momento, gnosiolàgica no segundo e lingüística no últi- des horizontes a partir dos quais o filosofar foi
mo, como uma forma de explicitar termos muitas vezes praticado, as grandes estruturas nas quais é possível
pressupostos nos discursos filosóficos da atualidade. compreender as diversas escritas filosóficas'. Na ver-
dade, já existe uma reflexão a esse respeito, pautada
Palavras-chave: Filosofia, horizontes, ser, cons- na idéia de paradigma. O problema é que é estruturada
ciência, linguagem na linguagem da história da ciência, que não achamos
adequada para a História da Filosofia'. A noção de ho-
rizonte mostra-se mais adequada, porque deixa intacta
ABSTRACT
a capacidade de um texto filosófico mostrar-se atual,
sdscitar reflexão apesar de distante no tempo. Uma
To articulate the horizons ofthe Being (Ancient
teoria filosófica jamais é deixada de lado, ao contrário
Philosophy), conscience (Modern Philosophy) and
de uma teoria científica, que se toma obsoleta quando
language (Contemporary Philosophy) as they present
sua representação do mundo ou da natureza é ultra-
themselves in the history of Philosophy, emphasizing
passada. Mesmo quando os filósofos ambicionaram
the cosmologic, gnosiologic and linguistic dimensions
oferecer uma representação verdadeira do mundo, da
as aform 10 clarify terms ofien not clearly defined in
natureza e do homem nos moldes da ciência, não foi
philosophical discourse today.
isso que ficou como o mais importante, mas as indaga-
Keywords: Philosophy, horizon, being, conscience, ções levantadas, os insights elaborados e os horizon-
language tes por eles desbravados".
Seguindo a cronologia praticada pelos histori-
o objetivodeste texto é explicitar o significa- adores e filósofos, que dividem a História da Filoso-
do de alguns termos cujo conhecimento é, muitas ve- fia em Clássica, Moderna e Contemporânea, podemos

I Doutor em Filosofia e Professor da UFC


2 Existe uma abordagem vulgar a respeito das estruturas de pensamento presentes na filosofia ocidental que hoje é considerada
ultrapassada. Essa abordagem encontra nos pares antitéticos idealismo-realismo. materialismo-espiritualismo. objetivismo-subjetivismo.
imanentismo-transcendentalismo as estruturas básicas nas quais podemos enquadrar o modo de pensar dos diversos filósofos. Não
seguimos essa tipologia, em razão de sua manifesta posição maniqueísta. Essa sobredeterminação moralista dificulta a compreensão
dos filósofos a partir do que eles próprios pensaram
3 Refiro-me basicamente a Habermas, que, principalmente em Pensamento Pós-Metafisico (1990), utiliza-se do termo paradigma, usado
primeiramente por T. Kuhn em As Estruturas das Revoluções Científicas (1962), para estudar as modificações, as revoluções científicas.
Em filosofia achamos inadequado esse termo, porque os "modelos de ser" não são tão fechados, são horizontes, e, mesmo aceitando que
haja "revoluções" estruturais no filosofar, é possível a retomada de um padrão em outro. O horizonte ontológico, para dar um exemplo
típico da filosofia clássica, é muitas vezes retomado na filosofia contemporânea, onde predomína o horizonte lingüístico do filosofar
• Utilizo o termo horizonte no sentido hermenêutico, explicitado por E. Coreth em Questões Fundamentais de Hermenêutica (1979: 79):
=Horizonte significa uma totalidade atematicamente co-apreendida ou pré-cornpreendida que entra, condicionando e determinando. no
conhecimento - percepção ou compreensão - de um conteúdo singular, que se abre de maneira distinta dentro dessa totalidade"

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afirmar que três grandes horizontes sobressaem nesses guem essa estrutura de pensamento. A ontologia cai
períodos", embora perspectivas menores se façam pre- no objetivismo, ao empreender a busca, no estilo dos
sentes e convivam dentro do horizonte principal. As- cavalheiros do Santo Graal, de um princípio primeiro
sim, podemos dizer que o horizonte do ser (ontológico) capaz de viabilizar a predicação universal e, assim,
é hegemônico na Filosofia Clássica, o horizonte da reduzir a multiplicidade dos fenômenos a um princí-
consciência (gnosiológico) é hegemônico na Filosofia pio unificador. Verificamos aí uma pretensão tipica-
Moderna e o horizonte da linguagem é hegemônico na mente arquimediana, pela qual se acredita na existência
Filosofia Contemporânea. de um fio condutor universal, capaz de dar a chave
A Filosofia, no sentido atribuído pelo Ociden- para a legitimação absoluta dos modos de vida. Paira
te, surgiu justamente como uma forma de saber, pre- nessa visão uma concepção do pensar como instância
tendendo apreender o todo em sua verdade última. de controle e dominação do real e não como recolha e
Segundo essa perspectiva, todas as coisas são referi- revelação do sentido.
das a um princípio único. Todas as entidades singula- Essa busca do todo de sentido está presente ra-
res são vistas como parte de um todo. Por isso, o dicalmente na primeira etapa da Filosofia ocidental.
pensamento antigo é tido como pensamento da iden- Nos pré-socráticos, encontramos a tentativa de apre-
tidade, pois defende a existência de uma ordem fun- ender o elemento universal que, segundo eles deter-
dadora da unidade de tudo. É um pensamento unicista minaria toda e qualquer realidade. Para Tales, esse
e substancialista. As singularidades recebem sua de- elemento é a água; para Anaximandro, é o ápeiron
terminação, sua essência, de uma instância externa a (matéria indetenninada); em Anaxímines é o ar; em
ela. A parte só adquire significação no todo. O todo, a Heráclito é o fogo; para Demócrito é o átomo e, em
ordem que unifica tudo, é o Ser, fundamento último Pannênides, numa elaboração mais refinada e abstra-
da realidade. Essa é a razão pela qual se diz que a ta, é o Ser.
Filosofia Clássica é cosmo lógica. Havia, nos filóso- Esse horizonte ontológico e cosmológico en-
fos da antiguidade, a pressuposição de que há uma contra-se fortemente presente, tam bém, na tentativa
ordem imutável (um "kosmos"), a partir de onde tudo de resguardar a normatividade do agir e conhecer hu-
podia ser compreendido. Vale dizer, o real é perpassa- manos, explicitada na Metafísica platônica e aristo-
do por uma racional idade que cabe à razão explicitar. télica. A Metafísica repõe na Filosofia o "horizonte
Cabe à Filosofia alcançar essa ordem, princípio, cau- do ser", ao erguer como questão central a pergunta
sa (arché) subjacente a todas as coisas. pela essência. A essência é, para estes filósofos, a
Diferentemente do Mito, que, nas narrativas, configuração permanente de uma coisa e é pensada
trabalha com a indeterminação, o "chaos", a possibi- em termos de perfeição e imutabilidade. É a essência
lidade de múltiplas forças geradoras, os filósofos acre- que possibilita que toda e qualquer categoria se ex-
ditaram haver nas coisas um relacionamento unitário presse como tal. Ela é o substractum, aquilo que faz
e afirmaram ser tarefa da Filosofia a ternatização des- com que alguma coisa seja como é, desde as categori-
sa ordem racional, segundo eles, fundamento da ação as mais simples, por exemplo, o homem como zoon
e do conhecimento dos homens. Esse é o motivo pelo politikon, às mais complexas, como comunidade, Polis
qual é dito que todo empreendimento filósofico é (cidade, fundada na lei) e comportamento ético. A
cosmológico. Na medida em que concebe a existên- Metafísica tornou possível a ternatização racional do
cia de uma ordem imutável, objetiva, e que é isso que todo. Este é inapreensível empiricamente, embora toda
lhe interessa, a Filosofia resvala para a Cosmologia e, ação e conhecimento humanos o pressuponham. So-
por conta disso, para um naturalismo intransponível, mente o trabalho especulativo da Filosofia pode ter
pois os seres singulares, como tais, não contam, a não acesso a ele. Apesar dessa inapreensibilidade, para
ser quando derivados ou referidos ao Ser", Os os metafísicos, a vida só adquiria a dignidade humana
determinismos de todas as espécies, seja o deter- na medida em que se adequava ao universal, ao Eidos,
minismo social, biológico, religioso, racial etc., se- essência suprema, padrão perfeito e eterno de todas

5 É preciso atentar, porém, para os equívocos que isso pode gerar, principalmente o perigo teleologizante, que consiste em ler a história
da filosofia como um encadeamento dirigido por uma consciência absoluta, da qual o último filosofar é a realização mais adequada
6 Esse objetivismo, essa busca dos princípios causais que possibilitariam uma representação verdadeira dos seres por parte da Filosofia
ocidental, levou Ernst Tugendhat, em Lições introdutórias àfilosofia analítica (1992), a afirmar que o conceito tradicional de Filosofia
é determinado por uma perspectiva que ele chama de "teoria do objeto". Mesmo no paradigma moderno, quando a filosofia vai se voltar
para a consciência, assim como nos primeiros filósofos da linguagem, há uma preservação da ontologia, na qual a razão é pensada
exclusivamente em função de uma representação verdadeira, objetiva dos objetos

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- coisas ou, como diria Aristóteles, substância, "gêne- mo estão na base de nossa cultura e o medievo foi um
supremo", nexo que articula todas as coisas ao todo dos importantes períodos de sua cristalização: nele
utável. A essência é, na metafísica, a possibilidade foram articulados, teoricamente, pela primeira vez. es-
objetividade racional. Sem um fundamento primei- ses diversos elementos culturais.
último, as coisas perderiam o sentido e a razão. É a A combinação entre Teologia e Filosofia se faz
ssibilidade mesma de um critério universal que se presente de modo contundente nos filósofos da patrís-
constitui com o surgimento da idéia de essência. Sem tica e da escolástica, notadamente em Santo Agosti-
ela cai-se, segundo os metafísicos, no arbítrio e na vio- nho e São Tomás. Esta conjunção tornou-se possível
ência. Com a Metafísica, nasce a necessidade de fun- justamente porque a Filosofia, no paradigma antigo,
damentação da ação e do conhecimento em bases principalmente na Metafísica, já era praticada como
uni ersalmente válidas, completamente objetiva, isen- uma espécie de teologia, já trabalhava com categorias
ta das tendências das paixões e ilusões dos sentidos que apontavam ou pressupunham um Ser que a Teo-
humanos. A falta, a inconclusão, a culpa, o desejo e a logia mais tarde chamará Deus. É o famoso deus dos
paixão, categorias determinantes dos homens como filósofos. A Metafísica, ao se interessar por princípi-
eres sensíveis, são substituídos pelas idéias de perfei- os últimos, causas primeiras, etc., viabilizou comple-
ção, razão, dever. Ou seja, o homem, como ser per- tamente a aproximação da Teologia à Filosofia. A idéia
tencente ao mundo supra-sensível, torna-se padrão para de "dois mundos", fundamental para a metafísica, tam-
o homem que, embora pertencente ao mundo sensí- bém facilitou a aproximação.
el, precisa conhecer e agir racionalmente. O paradigma metafísico, a fundamentação
Um aspecto muito ressaltado na Filosofia Clás- ontológico-conternplativa vai sofrer uma grande revi-
sica é o que ficou conhecido como intuição racional. ravolta na Filosofia moderna. Os filósofos modernos,
O homem, apesar de ser um ser sensível, possui uma em contraposição ao obscurantismo medieval, vão
faculdade que possibilita o acesso e a contemplação construir o movimento que ficou conhecido como
das coisas eternas. Através dessa faculdade, chamada Aufklârung (esclarecimento, I1uminismo). A funda-
pelos gregos de Nous, o homem poderia atingir o fun- mentação metafísico-conternplativa da vida vai pas-
damento da realidade, mesmo quando, como na pers- sar por uma profunda crítica. O saber especulativo é
pectiva clássica, esse fundamento estiver além do questionado em função do surgimento das chamadas
tempo, do espaço e até mesmo do discurso. A idéia de ciências experimentais. A adequação das instituições
"dois mundos", muito comum à Metafísica, precisou humanas ao Ser (modelo naturalista e religioso) pas-
articular essa faculdade humana, desenvolvida por sa a ser questionada. A razão não está mais nas coisas.
poucos, como elemento central de seu argumento. A O homem não é mais mero ente na grande ordem do
exterioridade dos padrões e critérios em relação à sin- cosmos. Processou-se o que Kant chamou de "revira-
gularidade humana, condição para a objetividade no volta categorial". Não o ser, mas a consciência passa
paradigma metafísico, precisou, sempre, da ênfase na a ser a referência a todas as categorias. É por isso que
conceituação do homem como "animal metafísico" ou a modernidade é profundamente prometéica, antropo-
animal racional. Através da faculdade referida, o ho- cêntrica. O homem agora é o construtor do seu mun-
mem pode atingir a objetividade, o em-si do real, as do. É um artifex que, como um demiurgo constrói a
coisas na sua constituição essencial, nas suas perten- realidade à sua imagem e semelhança. A racionalidade.
ças últimas. o fundamento do real não é mais con ebida orno algo
O horizonte ontológico fez-se presente, forte- pertencente às coisas, mas inerente à ons iên ia do
mente, na Filosofia medieval. A dominação da vida, homem concebido como sujeito teóri o e práti o. A
nesse momento, pelos princípios abstratos, religiosos, verdade uni ersal e atemporal, não é "dada". antes
coincidiu com o período de discriminação mortal a precisa da mediação da ons iên ia humana para ex-
qualquer experiência de vida diferente. O obscuran- primir-se como tal.
tismo reinou, a inquisição se instalou. O poder da abs- O homem. visto orno sujeito do conhecimento
tração coincidiu com o surgimento do chamado e não mais orno mero re eptáculo, implicou numa
"período das trevas". Mesmo nos fi lósofos mais es- torsão completa na Filosofia Perscrutar como a cons-
clarecidos, a supremacia dos "Universais" se realizou. ciência humana pode ser a entificação da razão levou
Para além dessas experiências, a formulação filosófi- a Filosofia a ultrapassar a problemática da metafísica
ca do período tenta a conciliação entre fé e razão, en- naturalista, em direção ao que foi chamado metafisica
tre Filosofia e Cristianismo. Aliás, poderíamos dizer subjetivista. A preocupação central passou a ser em
que o cristianismo, o legado greco-rornano e o judaís- que condições pode o homem conhecer e agir racio-

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nalmente. o
homem é o novo substractum, sujeito a h do as instituições ocidentais, abre
partir do qual tudo mais poderia ser predicado. A er- uma um amplo questionamento. A
dade não é mais algo contemplado, a essência de algo trans en e - ização do homem, isto é, a redução do
em-si mesmo, mas a possibilidade do sucesso adqui- homem a onsciê ia e razão, sujeito do saber, e sua
rido através de um método. O método adquiriu proe- atom iza ão odem estar na raiz do processo
minência e a Filosofia se tornou Gnosiologia, ocupada manipulatório que se instalou, de um modo geral, nas
exclusivamente com o tema do conhecimento. A cons- sociedades ocidentalizadas. É como se o homem, para
trução de um Método a partir do qual a verdade pu- ser sujeito ti esse que deixar de ser homem, de ser
desse obter uma legitimidade absoluta tornou-se a sensível, limitado. finito, necessitado dos outros,
grande preocupação de todos os filósofos, de todas os lingüisticamente situado etc".
matizes. Através do método o homem institui-se como Essa crítica à Metafisica, que abarca toda a Fi-
um sujeito soberano do conhecimento e da ação sobre losofia moderna de Bacon a Descartes, dos contra-
a natureza. tualistas aos racionalistas, torna-se contundentemente
O mundo não é mais pensado como constituído legítima, se considerarmos a filosofia de Kant, filóso-
naturalmente, mas como realização do homem-sujei- fo no qual o giro categorial moderno explicita-se ra-
to. A consciência teórica, transcendental, é a referên- dicalmente. Em sua obra, afirma que a tematização
cia básica na autocompreensão que os filósofos da subjetividade é a tarefa básica da Filosofia, uma
modernos têm do homem. O sujeito, é antes de mais vez que ela é a condição para todo agir e conhecer.
nada, um ser racional, capaz de representar e manipu- Na Crítica da razão pura, Kant (1781) critica a an-
lar objetos e agir conforme os postulados morais raci- tiga maneira de fazer ciência e filosofia por não fazer
onais. Vale dizer, a auto-referência do sujeito é isolada, uma pergunta fundamental: o que pode o homem co-
é a autoconsciência adquirida no exame das condi- nhecer? A tematização da Filosofia passa das coisas
ções aprióricas para o homem conhecer e agir. (dos entes) para a subjetividade (para as condições
Esse horizonte tem uma clara manifestação em aprióricas de o homem conhecer e agir). Na Crítica
Descartes. Este questiona todo o procedimento clás- da razão prática, Kant (1788) determina o caráter
sico que parte de fora (de algo exterior à consciência, apriórico da lei moral. A moral não depende da expe-
ao ser) para chegar à verdade. Há em Descartes o de- riência, pois se isso acontecesse, seria variável, con-
lineamento de toda a problemática moderna. Ele cha- tingente, particular. Para Kant a moral deve ser
ma a atenção para a necessidade de um "método para autônoma, pois só assim terá um valor absoluto. A
bem conduzir a razão" (a dúvida metódica) e postula moral efetiva-se não por uma exigência exterior à ra-
a consciência como o "porto seguro" a partir do qual zão, mas unicamente em função do imperativo cate-
tudo é mediado (Cogito ergo sum). O Cogito é a me- górico, liberada de qualquer concurso dos impulsos
diação fundamental para todas as outras categorias. sensíveis, determinada unicamente pela lei, de tal modo
Através do Cogito o universal pode se manifestar de que os seus postulados têm validade para qualquer ser
forma fundamentada, legítima. racional, em qualquer tempo e lugar.
A virada dos modernos em direção à consciên- A idéia de um sujeito transcendental, teórico,
cia, ao homem como sujeito, embora tenha trazido um que modela o mundo a partir da ciência, não deixa de
grande avanço para a Filosofia estabelece, porém, uni- lado nem mesmo as tentativas de universalização e
lateralmente, uma abstração, como se o homem fosse coletivização do sujeito, na transformação da huma-
um "puro eu" ou um "puro sujeito", concebido sem nidade em indivíduo, como aconteceu no século XIX,
mundo, sem linguagem e sem história. Pensado como quando se passou a pensar numa substancialização,
"razão autônoma", completamente independente da na encarnação da razão em instituições como o Esta-
realidade, o sujeito tende a ver e apoderar-se da natu- do, em Hegel, ou a classe universal, mais precisamen-
reza e da sociedade através do conhecimento científi- te o proletariado, em Marx. Esses filósofos, apesar de
co e na formação e no domínio técnicos do mundo, terem tentado um acordo entre o mundo contingente
como se o mundo fosse algo completamente alheio e (a História) e o mundo necessário (a Filosofia), aca-
ao seu inteiro dispor. Vale dizer, a passagem do baram por substancializar a História, encontrando nas
paradigma cosmológico para o paradigma do sujeito, melancólicas e conturbadas ações humanas um fio
embora tenha repercutido profundamente na cultura condutor desconhecido pelos próprios agentes. É a

7A isso está ligada a idéia de uma consciência universal, capaz de dar conta do destino de toda a humanidade e à qual todos os homens
devem seguir

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· éia de um sujeito universal agindo pelas costas dos reino do mundo inteligível, acontece na tematização
agentes contingentes, que vai propiciar a possibilida- do homem como ser-no-mundo (Dasein), histórico.
ce e uma Filosofia da História, uma teorização filo- finito, em contato com os outros, levada a cabo pela
-' fica dos acontecimentos temporais. O padrão teórico hermêneutica existencial que passou a ser sistemati-
ia, assim, ser aplicado não só ao conhecimento, zada a partir de Ser e Tempo, de Heidegger (1926).
as também à história. O homem podia agora ser o mas cujas bases já vinham sendo lançadas por outros
: bricante de sua história. pensadores, notadamente Kierkegaard e o próprio
Contra essa perspectiva, um dos argumentos Nietzsche. Outro conceito fundamental nessa virada
ais fortes foi levantado por Fichte, ao dizer que, na da Filosofia é o de Lebenswelt (Mundo da Vida), que
edida em que a referência para a compreensão do marca, juntamente com a noção de Experiência, am-
ornem como sujeito é retirada do campo do conheci- bos tematizados pelos fenomenólogos, a reconcilia-
ento, isto é, na medida em que o mundo é a ção da Filosofia com uma perspectiva mais mundana,
bjetivação de uma consciência transcendental, inte- menos metafísica.
igí el, referida a uma autoconsciência, então, torna- A partir daí, tornou-se possível a compreensão
se possível a eliminação da espontaneidade da vida, do mundo não como urna objetivação de um sujeito
pois, no processo de autoconscientização, a consciên- teórico, isolado, mas como pertencente ao plano da
ia, em sua espontaneidade, é tornada objeto. A cons- intersubjetividade. Nessa concepção, não existe o su-
iência teórica como condição do agir humano, ponto jeito, mas os sujeitos num mundo aberto, estruturado
orte da modernidade, está na raiz da reificação hu- lingüisticamente. O sujeito passa a ser concebido des-
mana, da manipulação mediada pela tecnologia, bem sa forma na medida em que é capaz não de elaborar
orno nas tentativas de submissão do mundo da polí- modelos e teorias a serem aplicadas, mas, sim, de agir
tica a determinadas teorias, tão comuns ainda nos dias como ser falante, capaz de articular suas pretensões num
atuais. A consciência teórica age no mundo como se ambiente onde nenhuma posição tem, de antemão, o
este fosse um deserto. O que importa são os postula- estatuto de absoluta. Ou seja, o sujeito teórico passa a
dos, a verdade científica, mesmo que para isso muitas ser questionado em sua pretensão de ter preponderân-
idas sejam sacrificadas. É próprio da perspectiva cia em relação ao mundo sensível, em razão de sua ha-
cognoscitiva a relação sujeito-objeto, mesmo quando bitação estar situada no mundo transcendental.
o objeto em questão é o próprio ser humano. A ten- ~ A dominação legitimada pelo saber pôde, as-
dência objetivadora da ciência não é deixada de lado sim, ser amplamente questionada. A pretensão de um
quando a matéria sobre a qual ela deverá agir é o pró- poder corno substancialização da razão passou a ser
priohomem. inaceitável e a ambição dominadora embutida na pre-
É dentro da exaustão não só da filosofia da cons- tensão arquimediana veio à tona. A ternatização e es-
ciência, mas, de certa forma, do racionalismo ociden- tabelecimento de critérios universais de validade foram
tal de um modo geral, que aos poucos a Filosofia vai desmascarados como uma maneira de retirar o poder
se encaminhando para um novo rumo, para uma nova dos homens enquanto seres individuais. A postura
mudança de horizonte. O preço do universalismo, da universalista, que questiona as ideologias por estarem
legitimação absoluta é o sacrifício da subjetividade, situadas no âmbito do interesse, mostrou-se, enquan-
do homem como ser singular. É o modo metafísico de to defensora dos valores universais, incapaz de cons-
proceder, como tal, que passará a ser questionado. Boa truir barreiras para o uso mortífero das suas
contribuição para a dissolução desse modelo de pen- potencial idades, legitimando, assim, o mal.
sar foi lançada pelos filósofos neo-hegelianos ou pós- Todos esses aspectos estão na base da passa-
hegelianos. Feuerbach, Marx, Kierkegaard e Nietzsche gem da filosofia da reflexão. ocupada om as condi-
foram fundamentais para o surgimento do novo hori- ções aprióricas de o homem conhecer e agir, e da
zonte, pois, apesar de situados na filosofia da consci- Ontologia, enquanto pergunta e demonstração do Ser
ência, com suas insatisfações e novos campos de dos princípios primeiros. que, ao mesmo tempo, cons-
tematizações abriram as perspectivas para o surgi- tituem a realidade e servem como critérios para a sua
mento de uma nova estrutura de pensamento no sécu- alidação, para uma filosofia cujo horizonte de refe-
lo XX. Nietzsche, em particular, influenciou de forma rência passa a ser a linguagem. Apontar a linguagem
direta a formulação da crítica ao sujeito transcendental como articuladora das categorias para se pensar o real,
por parte da fenomenologia, principalmente em sua significa pensar uma maneira de filosofar sem ponto
vertente heideggeriana. A passagem de uma subjetivi- fixo, sem critérios absolutos, sem ponto arquimediano.
dade concebida transcendentalmente, pertencente ao Vale dizer, as categorias poderão, agora, ser pensadas

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dessubstancializadas, sem a ancoragem num fundamen- A consideração das condições da consciência, no pro-
to a ela externo que a determinava, e, assim, abrem a cesso do conhecimento, como uma instância totalmen-
perspectiva para se pensar filosoficamente os seres sin- te isolada, como mera instância de representação
gulares, como o homem enquanto individualidade, em interna, é completamente ultrapassada a partir do mo-
seu valor próprio. mento em que se passa a considerar a mediação lin-
Há, nessa passagem, um questionamento pro- güística.
fundo da Metafísica embutida nos dois horizontes Todo um conjunto de elementos facilitou o giro
anteriores. Verificamos isso na primeira geração da lingüístico: o incremento no estudo da lógica, as des-
Filosofia Analítica. Para esses filósofos, principalmen- cobertas no campo da Hermenêutica Teológica, o avan-
te os do Círculo de Viena, inclusive na obra do pri- ço da Filologia, o surgimento da Lingüística e a
meiro Wittgenstein, o grande problema da Filosofia descoberta e estudo, por Freud, do inconsciente como
era a utilização de termos sem uma referência objeti- a parte mais importante do aparelho psíquico. Grosso
va. A solução para os enganos da Metafisica passaria modo, poderíamos dizer que três pensadores foram
então por uma crítica da linguagem. Se a Filosofia fundamentais na constituição do pensamento contem-
corrigisse sua linguagem, poderia atingir alguma porâneo: Heidegger, Wittgenstein e Freud. Em todos
racional idade. Afirmavam, positivistamente, que o eles a linguagem assume papel fundamental como
sentido de uma proposição residia em sua vinculação campo a partir do qual o pensamento tem o seu limite.
com fatos. Freud com a idéia de inconsciente, não só questiona o
A essa perspectiva, somou-se aquela mais sen- logocentrismo ocidental, a posição central da consci-
sível à desumanidade inerente ao sujeito transcen- ência no aparelho psíquico, mas também questiona os
dental, à concepção do homem como sujeito, submetida paradigmas provenientes dessa central idade: comple-
à sua transformação em ser inteligível. Esses filóso- tude, perfeição, universalidade etc., que eram, todos,
fos vão resgatar, além do valor proposicional da lin- critérios teóricos e práticos seguidos pela tradição
guagem, também e justamente a possibilidade de vida ocidental. A central idade do inconsciente na econo-
ser pensada em sua condição humana, vivida com os mia da vida psíquica abre lugar para o homem como
outros, na qual o sentido não é algo substancial, funda- ser desejante, incompleto, marcado pela falta. O mais
da em algo que escapa aos seres humanos comuns, importante para nosso estudo foi a descoberta de que
mas no que emerge em suas articulações lingüísticas, c1 inconsciente é estruturado como uma linguagem e
em suas falas, produções e ações. Vale dizer, a lingua- que o acesso a ele também só pode se dar através da
gem estabeleceu-se como um campo no qual a Filoso- verbalização livremente associada.
fia trabalha e cujos limites não pode transpor. O sentido Wittgenstein foi grande matemático, lógico e
não é mais algo alcançável pela intuição de um filóso- filósofo de nosso século. Suas primeiras obras faziam
fo solitário, nem representado por um sujeito a redução da Filosofia a uma análise do discurso.
transcendental, isto é, não se precisa mais acionar um Como vimos anteriormente, essa concepção estava
outro mundo, um padrão metafísico, para poder alcan- eivada de um preconceito semântico positivista. A lin-
çar algum significado da existência humana. Basta guagem era entendida basicamente em sua função
recorrer ao repertório da linguagem, que iremos per- proposicional, na qual era verdadeira a proposição que
ceber nas experiências humanas mesmas significações correspondesse a um estado de coisas. Posteriormen-
relevantes. Desse modo, passa-se de uma concepção te, o autor encaminha-se para uma dimensão mais
representacional, naturalista da linguagem para uma pragmática da linguagem, na qual o sentido está rela-
concepção da linguagem que não é apenas um meio, cionado não a um estado de coisas, mas a um "jogo de
mas o medium apropriado no qual está cristalizada a linguagem". Um discurso passa, assim, a ser signifi-
vida em sua densidade. A palavra, enquanto cativo, na medida em que está inserido num determi-
condensação da vida, deixa de ser mera palavra e se nado jogo de linguagem. É a esse jogo de linguagem
transforma em Dichtung, com a qualidade e função que as palavras devem ser reenviadas para se chegar
bastante comum aos poetas, isto é, em revelação e ao sentido. Há uma dessubstancialização da palavra.
manifestação da significação. Conforme o contexto de aparição, uma palavra pode-
O fundamental, na passagem do paradigma rá apontar para significações as mais diversas. Atrás
transcendental para o lingüístico, foi a superação da dessa idéia reside a concepção de que as palavras se
concepção de que a consciência não se relaciona com estruturam com sentidos diferentes de acordo com a
os objetos diretamente, mas que nos referimos comunidade dos falantes. A ciência tem um discurso
lingüisticamente aos objetos por meio de expressões. próprio, a Filosofia também, a forma de argumentação

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zzs _ en ias humanas é diferente das ciências naturais, devem se comportar. A pergunta que se faz é: serr:
- 5IIla forma que diferem os discursos das diver- esse fundamento único e universal, não está fadado c
ões, grupos políticos, nações, e em cada uma mundo a se acabar? Não se inviabiliza, assim, a idéia
- -:"'5 é fundamental o jogo de linguagem, a forma mesma de mundo? Os otimistas dizem que não e que.
_ ~ a linguagem é posta em prática e acontece nas ao contrário, a linguagem oferece um campo de orga-
t:::;:~~ç<i-~scotidianas. Vale dizer, o peso passou da ca- nização do mundo sem a necessidade de imposição a
~ ••...••.
ue de representar da linguagem para sua dirnen- todos de um mesmo modo de vida, de uma mesma
- - municativa e reveladora. concepção de mundo. A linguagem, e não um funda-
Em todos esses filósofos a idéia de razão, con- mento, um princípio etc. poderá dar as bases para a
e a como uma faculdade, é deixada de lado. existência e co-existência pacífica de diversos modos
~e' egger prefere O termo pensamento a razão. Este devida.
_ ssui uma carga semântica pesada, relacionada a sua Concluímos que, se no período clássico a Filo-
. ologia mesmo, Ratio, que aponta para os critéri- sofia foi praticada como uma teoria do ser e na Filoso-
- e medidas universais. Para Heidegger, pensamento fia Moderna o ser foi concebido gnosiologicamente,
ais apropriado para significar esse trabalho do es- como atributo da reflexão, na contemporaneidade, ao
_.. o humano, visando a recolher a significação ine- se ancorar na linguagem, a Filosofia abandona a idéia
ren e às experiências. Nesse autor, que foi o grande mesma de um fundamento único para o real, isto é, dei-
sistematizador da Filosofia da Existência, o giro xa de lado a sua autocompreensão como Ontologia e
, güístico combina-se com uma abertura ao fenôme- passa a exercitar-se como compreensão, como um tipo
o, ao campo do vivido, e são recusados os padrões de pensamento e reflexão ocupada com a esfera da sig-
enquadradores da existência humana. Para ele a sig- nificação, cuja estrutura não é proveniente de um pon-
ificação da existência humana não é mensurável em to arquimediano ou de um porto seguro, mas de um
ritérios morais ou teóricos, mas captável nas palavras ponto de mastro que teima em pensar, mesmo estando
e discursos significativos. As palavras, ao contrário em tempos sombrios, numa época de mares revoltos.
das teorias, apreendem a dimensão de singularidade
de uma experiência, "a linguagem é a morada do ser"
(Heidegger, 1926). REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Ao limitar-se a Filosofia ao campo da lingua- ,>

gem, passou-se de uma concepção do pensamento CORETH, Emerich. Questões fundamentais de


como autoconsciência para sua visão como interação hermenêutica. São Paulo: EDUSP, 1979.
lingüisticamente mediada. O pensamento não é mais HABERMAS, Jürgen. O discurso filosófico da
relacionado a reclusão, mas a diálogo. Com isso a es- modernidade. Lisboa: Publicações Dom Quixote,
fera do significante deixa de ser um fundamento ab- 1990.
soluto, tão caro à Filosofia metafísica tradicional, e ___ Pensamento pós-meta físico. Rio de Janeiro:
o

passa para as falas, produções, trocas, relações etc. Tempo Brasileiro, 1990.
Desse modo, através do giro lingüístico, verificamos OLIVEIRA, Manfredo. Reviravolta linguistico-prag-
uma mudança na concepção da própria Filosofia. An- mática na filosofia contemporânea. São Paulo:
tes ela era concebida como a esfera através da qual a Edições Loyola, 1996.
legitimação da vida era posta. Isso porque pautava-se ___ Sobre a fundamentação.
o Porto Alegre:
na idéia de que existe um fundamento único para o EDIPUCRS, 1993.
real e que a ele tudo e todos deviam se adequar. Res- TUGENDHA T, Ernst. Lições introdutorias à filoso-
salte-se que a Filosofia ambiciona não apenas uma fi- fia analítica da linguagem, Tradução de Mário
guração do mundo, mas, também, indicar como todos Fleig et alii. Ijuí: nijuí, 1992.

EDUCAÇÃO EM DEBATE' FORTALEZI\ • ANO 21 • V 2 • NQ 38 • p. 29-35 • 1999' 35

BH/UFC

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