Sunteți pe pagina 1din 70

Universidade do Sul de Santa Catarina - UNISUL

Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes – REDE LFG

Curso de Especialização Telepresencial e Virtual em Direito


Tributário

Disciplina

Sistema Constitucional Tributário: Princípios e


Imunidades
Aula 4
Índice
Leitura Facultativa 1 .....p. 01
Leitura Facultativa 2 .... p. 23
Leitura Facultativa 3 .... p. 32
Leitura Facultativa 4 .... p. 42
Leitura Facultativa 5 .... p. 46
Leitura Facultativa 6 .... p. 50
Leitura Facultativa 7 .... p. 59

LEITURA FACULTATIVA 1

HERMENEGILDO HENRIQUE LEITE VELTEN


Advogado em Vitória (ES).

O PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA - UMA ABORDAGEM


QUANTO À SUA SIGNIFICAÇÃO

Como citar este artigo:

VELTEN, Hermenegildo Henrique Leite. O princípio da capacidade


contributiva - Uma abordagem quanto à sua significação. Disponível em:
http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6609. Material da 4ª aula
da Disciplina Sistema Constitucional Tributário: Princípios e Imunidades,
ministrada no Curso de Especialização Telepresencial e Virtual de
Direito Tributário - UNISUL - REDE LFG.
O Princípio da Capacidade Contributiva tem sido objeto de acirrados debates entre os vários
estudiosos do Direito Tributário, no que se refere ao seu real significado e quanto à sua
abrangência. O que se percebe, todavia, é que nenhum deles consegue aclarar
adequadamente o sentido do referido princípio. Há quem pense que o fato de alguém possuir
uma mansão, mas que aufira uma renda insignificante, não poderia ter esse patrimônio
tributado em face do princípio em estudo. Mas, não é bem esse o correto entendimento, pois,
o que a lei diz é que o cidadão será tributado quando houver um signo de riqueza e a mansão
é essa demonstração da condição para que a exigência seja oponível. Ao destacar essa
questão controversa, busca-se, preliminarmente, o estudo etimológico da palavra princípio no
que se refere ao significado lingüístico e o que define no âmbito do Direito. Adiante, segue-se
com uma análise dos princípios constitucionais gerais e os princípios constitucionais
tributários para, posteriormente, aprofundar-se no significado do princípio da capacidade
contributiva e, ao final, a apresentação das conclusões.

1.INTRODUÇÃO
1.1. Apresentação
É o objeto da presente monografia o estudo do significado do princípio constitucional da
capacidade contributiva. Parece até estranho que alguém cuide de um estudo que persiga tal
objetivo, mas o que me motiva a desenvolver o tema visando esclarecer o que realmente se
entende pelo referido princípio é o fato da dúvida se realmente os impostos que amiúde
reinam pelo território brasileiro são exigidos dos contribuintes levando-se em conta as suas
capacidades de os recolherem.
Para levar este trabalho a contento, primeiramente, iniciamos uma abordagem preliminar
enfocando alguns pontos que dão margem a dúvidas sobre a aplicação do princípio da
capacidade contributiva, como, por exemplo, o que seja realmente a capacidade econômica
do indivíduo, se em função da renda que dispõe para a sobrevivência ou se em face do seu
patrimônio ou algum signo de riqueza. A seguir, aprofundamos um estudo para entender o
significado da palavra princípio, tanto na sua origem etimológica como no seu significado
estrito dentro do Direito.
Mais adiante, serão feitos breves comentários aos princípios constitucionais gerais e aos
princípios estritamente tributários, entrando, finalmente na abordagem direta do princípio da
capacidade contributiva. Na conclusão, busca-se formar uma posição quanto ao real
significado do princípio tema e sua abrangência no nosso sistema tributário.

1.2. Metodologia
Consolidada a opção pelo tema objeto desta monografia, iniciamos, de imediato, a uma
intensa leitura de todos os artigos que enfocassem qualquer coisa sobre o princípio da
capacidade contributiva, sejam provenientes de autores renomados ou de juristas menos
conhecidos. A maioria deles foi localizada em sites jurídicos na internet. A partir dessas
leituras, foi desenvolvido um projeto enfocando o que seria abordado e como isso seria levado
a efeito e quais as obras norteariam a pesquisa.
Deu-se preferência aos autores especialistas do direito tributário utilizados no curso de pós-
graduação, indicados pelo IBET, dos quais se destacam Paulo de Barros Carvalho, Roque
Antônio Carrazza, Luiz César de Souza Queiroz, Roberto Quiroga Mosquera, Vittório Cassone
etc.
À medida que se percebia a necessidade de desenvolver algum assunto não abordado
especificamente pelos autores que serviram de base ao trabalho, partia-se na busca de mais
informações em outros autores, sem dispensar, por óbvio, a colaboração da doutrina
disponibilizada na internet. Afinal, na atualidade, não podemos dispensar tão importante
ferramenta de pesquisa.

2
1.3. Objetivo
É objetivo desta monografia contribuir para o estudo do Direito Tributário, dando-se ênfase
ao entendimento do princípio da capacidade contributiva no que se refere ao seu real
sentido.
O que se deseja realmente saber é como realmente se exige o imposto do cidadão, levando-se
em conta a sua capacidade ou possibilidade de arcar com o ônus de pagar o tributo, se em
face dos recursos que dispõe no bolso ou no banco ou se em virtude do patrimônio que
ostenta. Afinal, o que se pretende desvendar é o que se denomina signo de riqueza.

2. A CAPACIDADE ECONÔMICA DO CONTRIBUINTE


O que nos motivou enfrentar o tema, antes de tudo, foi a consciência de que o estudo do
Direito nunca se esgota em si mesmo, pois sempre haverá quem consiga enxergar algo nos
meandros da lei não visto antes. Por mais que uma lei, cujo sentido se ache claramente
revelado em seu texto, a sua interpretação será sempre imprescindível.
Ensina Marcus Cláudio Acquaviva que aqueles acostumados ao manuseio da legislação sabem
muito bem que, por vezes, uma lei aparentemente clara contém sentido que, à primeira
vista, não se mostra. Diz o referido autor, que o texto pode parecer límpido e, contudo,
possuir um sentido que não se patenteia de imediato.
O jurista supracitado ainda ressalta:
“A descoberta das razões histórico-sociológicas da lei, a revelação dos objetivos do legislador
esclarecem, por vezes, um pensamento que não está expresso em palavras. Tal orientação,
porém, nem sempre foi obedecida ao longo da história. Houve época em que o brocardo in
claris cessar interpretatio, isto é, a clareza da lei dispensaria a interpretação, prevalecia da
maneira absoluta. Assim é que o imperador Justiniano (482-565 da era cristã), autor da
imorredoura compilação de leis denominada Corpus Juris Civilis, determinou a seguinte
cláusula no Terceiro Prefácio do Digesto:
“Quem ousar tecer comentários à nossa compilação de leis cometerá crime de falso, e as
obras que compuser serão apreendidas e destruídas.”
Esta norma encontrou, porém, oposição na doutrina, especialmente em Ulpiano e Celso. No
Digesto, Livro 25, Título 4º, fragmento 1º, § 11, Ulpiano adverte:
“Embora claríssimo o edito do pretor, não cabe descuidar de sua interpretação”.
Celso, por sua vez, afirmava:
“Saber as leis não consiste em conhecer-lhes as palavras, mas sua força e poder” (Digesto,
Livro 1º, Título 3º, Fragmento 17).” (1)
Dessa forma, consciente das dificuldades que certamente existem no estudo de um tema,
principalmente de natureza tributária, pois são ínfimas as correntes diametralmente
opostas que se debatem na busca de um entendimento sobre determinada questão, ouso
aprofundar-me no estudo do princípio da capacidade contributiva na tentativa de entender-
lhe o signiicado e quais são realmente os seus efeitos em face do contribuinte.
Muitos autores têm se debruçado no estudo desse Princípio expresso no § 1º, do art. 145, da
Constituição Federal, com o intuito de dissecar o seu signiicado, a sua abrangência e a sua
relação com os demais princípios constitucionais. Assim dispõe o referido dispositivo:
“Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a
capacidade econômica do Contribuinte.”
O pressuposto do princípio da capacidade contributiva consiste na não exigência de impostos
além da capacidade econômica do contribuinte, ou seja, ninguém será obrigado a pagar
impostos além dos indícios de riqueza que ostente.

3
Muitas discussões acerca do significado do princípio da capacidade contributiva têm acirrado
debates entre vários estudiosos do direito tributário. Afinal, o que realmente significa tal
princípio, quando se diz que ninguém poderá pagar mais impostos do que realmente possa
pagar? Tal princípio, por acaso, se refere ao dinheiro ou fortuna que o contribuinte dispõe e,
nesse caso, haveria uma limitação que impediria tirar desses recursos apenas uma parcela
para pagamento do imposto?
Há quem pense, verba gratia, que se um cidadão possui uma mansão numa região nobre, mas
que aufira uma renda insignificante, não poderia pagar um IPTU, cuja base de cálculo levasse
em conta o valor daquele imóvel, na qual uma tabela progressiva exigisse um valor em
patamar insuportável para aquele proprietário. Ou, em outro caso, alguém de parcos recursos
que ganhasse um automóvel importado naqueles sorteios que amiúde ocorrem nos Shopping
Center, não deveria pagar o IPVA.
Afinal, não seria esse o sentido correto da capacidade contributiva? Como se poderia pagar
um imposto incidente sobre um patrimônio tão valioso, se não houvesse uma renda capaz de
suportá-lo?
Seria razoável alguém afirmar que a imposição tributária sobre a mansão, colocada como
exemplo, tendo o sujeito passivo uma renda tão miserável, que obviamente não tivesse como
pagar o tributo, acabaria por perdê-la para o Estado, o que resultaria em confisco, o que é
vedado por lei?
É óbvio que, se esse sujeito, não recolhendo o imposto, provavelmente, veria o seu bem ser
objeto de penhora numa execução fiscal, que seria alienado para fins de pagamento do
imposto que incidiu sobre ele. Como salienta Carrazza (2), não haveria como evitar que o
proprietário da mansão ou o sorteado do veículo não pagassem os respectivos impostos
incidentes sobre esses bens. É que, o que vale para efeito da capacidade contributiva, é o
signo de riqueza e não as condições econômicas do contribuinte.
Uma maneira mais compreensível que Carrazza exemplifica como um patrimônio, seja um
carro ou uma mansão, que representa um signo de riqueza, é que se um deles for vendido, o
cidadão o substituirá por dinheiro. Daí não se poderá se afirmar que o seu possuidor não
tenha recursos para pagar tributo. Esse seria o significado básico da Capacidade Contributiva.
Outra especulação, qual relação poderá existir entre o princípio da capacidade contributiva e
o princípio da proibição da exigência de tributo com efeito de confisco? Ora, ao
mencionarmos a pouco um sujeito que seja proprietário de uma mansão, mas que não tenha
renda suficiente para pagar o tributo incidente sobre abastada propriedade não estaria isento
de tributo. Não teríamos nesse caso um confisco? A dúvida parece ser pertinente, pois se ele
não pode pagar, e perder tal bem em benefício do Estado, não haveria aí um confisco?
Tais dúvidas certamente não são somente nossas. Ao iniciar os estudos sobre o Princípio da
Capacidade Contributiva, fui, antes de me debruçar nos compêndios dos mais avalizados
cientistas do Direito Tributário, na busca de artigos dos mais eminentes profissionais da área
jurídica, para verificar se alguém já escrevera sobre o tema. Na internet, há uma abundância
de trabalhos sobre o assunto, alguns tangenciando superficialmente a questão, outros indo
diretamente ao ponto do significado ou restringindo-se quanto ao alcance do Princípio.
Dentre várias monografias, deveras interessante é a do advogado tributarista mineiro
Alberto Monteiro Alves. Indaga o ilustre jurista: “Qual o alcance do princípio da capacidade
contributiva, abrigado no artigo 145, § 1º da Constituição Federal?”
Ele mesmo responde:
“O tema da capacidade contributiva vem sendo discutido há muito pela doutrina.
No Brasil, o assunto foi objeto de acirrados debates por parte dos especialistas a partir da
Constituição Federal de 1946, onde coloca, através do art. 202, o princípio segundo o qual os
tributos deveriam ser graduados conforme a capacidade econômica dos contribuintes.

4
A Emenda Constitucional nº 18, de 1º de dezembro de 1965, retira o dispositivo do texto
constitucional; o mesmo aconteceu com a Carta de 1967 e a Emenda nº 1, de 1969.
A Constituição de 1988, traz, dentre suas inúmeras virtudes, a de devolver ao princípio da
capacidade contributiva a atenção constitucional que este tema requer.
Este princípio encontra importantes aplicações nas relações entre o isco e o contribuinte,
constituindo-se no centro do Estado de Direito no campo tributário.
Apesar de norma fundamental, a linha de contorno não está suficientemente bem definida,
gerando dúvidas no seu campo de aplicação quanto aos seus efeitos.
A capacidade contributiva envereda por caminhos diversos de outros princípios e institutos
jurídicos (3)”
Em que pese a importante contribuição do citado jurista, ele não avança no esclarecimento
do significado do princípio, mas apenas corrobora o nosso entendimento quanto às dúvidas já
mencionadas. Quando percebemos a avidez do Estado na criação de novos impostos, tais
como o CPMF e a carga pesada nos nossos ombros gerada pelo imposto de renda, sentimos
que, ou o princípio da capacidade contributiva não é respeitado, ou realmente os
fundamentos que o norteiam não são bem compreendidos pela maioria, nem pelo isco e nem
pelo contribuinte.
Não é fácil aceitar que a exigência do Imposto de Renda e outros Proventos respeite o
princípio da capacidade contributiva. Optando o Estado por não corrigir anualmente a tabela
desse imposto, a cada ano, ele abocanha importante parcela das nossos rendas, as quais não
se sabe realmente se são rendas, pois parte substancial delas imprescindível ao sustento da
família serve para amansar o famoso “leão”.
O princípio da capacidade contributiva parece também ser ignorado na exigência do CPMF,
um imposto que incide sobre movimentação de contas correntes bancárias, cujos valores
taxados já foram alvos de outros impostos, tais como o imposto de renda e a IOF.
Portanto, este estudo rastreará o entendimento dentre vários doutrinadores de escol
do Direito Tributário e levar-se-á em conta o que contém a jurisprudência, para, ao final,
concluirmos quanto ao significado do princípio e quais impostos que realmente acolhem a sua
abrangência.
Para levarmos adiante este modesto trabalho de forma satisfatória, vale a pena
considerarmos o que Roberto Quiroga Mosquera orienta na sua obra “Renda e Proventos de
Qualquer Natureza – O Imposto e o Conceito Constitucional”. Aduz esse autor:
“Geraldo Ataliba dizia que é totalmente impossível cogitar-se de estudar qualquer conceito
que tenha sido tratado pelo Texto Maior sem almejar compreendê-lo no contexto da
Constituição globalmente considerada, isto é, somente uma interpretação sistemática da
Carta Constitucional é que nos dará os contornos precisos de um conceito nela injetado.
Maximiliano, ao discorrer sobre o processo sistemático de interpretação, qualifica-o como
método comparativo de determinados dispositivos com outros do mesmo repositório ou de leis
diversas, mas que se refiram ao mesmo objeto. Ensina o ilustre hermeneuta que o Direito não
constitui um conglomerado de preceitos caóticos, sem sentido e desprovidos de uma conexão
íntima. O Direito, diz ele, constitui vasta unidade, organismo regular, sistema, conjunto
harmônico de normas coordenadas, em interdependência metódica, embora fixada cada uma
no seu lugar próprio. Cada um desses preceitos é membro de um grande todo, por isso do
exame em conjunto resulta bastante luz para o processo interpretativo.” (4)
Quiroga, ao valer-se dessas valiosas lições, teve em mente extrair um conceito constitucional
da palavra “renda” e da expressão “proventos de qualquer natureza”, meta que coincide de
certa forma com a que perseguimos neste trabalho, pois é isto que pretendemos, captar um
conceito ou uma significação do princípio da capacidade contributiva. Para atingirmos tal
objetivo teremos mesmo que atuar, como muito bem salienta esse autor, num contexto maior
onde o referido princípio se situa, que também é a Constituição Federal.

5
Tentar estudar determinado fenômeno, seja jurídico ou não, fora do seu contexto, pode-se
chegar à conclusões equivocadas. No caso do princípio da capacidade contributiva será
necessário transitar por toda a Carta Magna e absorver desde os princípios fundamentais e
garantias individuais do cidadão até àqueles restritos ao sistema do Direito Tributário. É o que
pretendemos fazer para elaboração da presente monografia.

3.O SIGNIFICADO ETIMOLÓGICO DE PRINCÍPIO


Para conseguirmos, ao final, construir com êxito, não só um conceito, mas o significado
preciso da expressão “capacidade contributiva”, como também o seu alcance, será necessário
a obtenção de uma visão global dos princípios que norteiam a Carta Magna, sejam aqueles
considerados fundamentais, sejam aqueles que inspirem os direitos e garantias fundamentais
ou aqueles concernentes aos princípios gerais do Sistema tributário Nacional.
Todavia, antes de também discorrermos acerca de tais princípios, ainda será necessário
assimilarmos adequadamente o significado da palavra princípio, não tão somente no seu
significado idiomático, mas, especificamente no seu sentido jurídico.
Carrazza (5) aduz que, “Etimologicamente, o termo “princípio” (do latim principium, principii
) encerra a idéia de começo, origem, base. Em linguagem leiga é, de fato, o ponto de partida
e o fundamento (causa) de um processo qualquer.”
Sem dúvida, na sua origem etimológica, princípio sempre dá a idéia de começo ou o início de
qualquer situação. A Bíblia, em Gênesis, no relato da criação do mundo, o narrador inicia essa
expressão para situar como o mundo era ante da decisão do Criador: “No princípio, Deus criou
os céus e a terra.”
Carrazza, entretanto, pesquisa e localiza um significado no período clássico:
“Introduzida, na Filosofia, por Anaximandro, a palavra foi utilizada por Platão, no sentido de
fundamento do raciocínio (Teeteto, 155 d), e por Aristóteles, como a premissa maior de uma
demonstração (Metafísica, V. 1,1.012 b 32 – 1.013 a 19). Nesta mesma linha, Kant deixou
consignado que “princípio é toda proposição geral que pode servir como premissa maior num
silogismo”(Crítica da Razão Pura, Dialética, II.A).
Por igual modo, em qualquer Ciência, princípio é começo, alicerce, ponto de partida.
Pressupõe, sempre, a figura de um patamar privilegiado, que torna mais fácil a compreensão
ou a demonstração de algo. Nesta medida, é ainda, a pedra angular de qualquer sistema.” (6)
Geraldo Ataliba, citado por Carrazza, contribui com o seu entendimento:
“O caráter orgânico das realidades componentes do mundo que nos cerca e o caráter lógico
do pensamento humano conduzem o homem a abordar as realidades que pretende estudar,
sob critérios unitários, de alta utilidade científica e conveniência pedagógica, em tentativa
de reconhecimento coerente e harmônico da composição de diversos elementos em um todo
unitário, integrado em uma realidade maior.
A esta composição de elementos, sob perspectiva unitária, se denomina sistema.” (7)
E Carrazza, complementando Ataliba, inspirando-se nos ensinamentos de Étienne Bonnot de
Condillac, define o signo sistema:
“Sistema, pois, é a reunião ordenada das várias partes que formam um todo, de tal sorte que
elas se sustentam mutuamente e as últimas explicam-se pelas primeiras. As que dão razão às
outras chamam-se princípios, e o sistema é tanto mais perfeito, quanto em menor número
existam (8).”
Destarte, no sistema há um conjunto de elementos que se integram porque estão harmônicos
entre si. Mas para que haja essa integração há uma razão que sustenta a união, como uma
premissa maior que dá sentido à premissa menor. Essa premissa maior se denomina princípio.
Valemo-nos, a seguir, da contribuição de Paulo de Barros Carvalho:

6
“Em Direito, utiliza-se o termo “princípio” para denotar as regras de que falamos, mas
também se emprega a palavra para apontar normas que fixam importantes critérios objetivos,
além de ser usada, igualmente, para significar o próprio valor, independentemente da
estrutura a que está agregado e, do mesmo modo, o limite objetivo sem a consideração da
norma”. (9)
Fazendo tal reflexão semântica, Carvalho divisa quatro usos distintos para a palavra princípio:
a) como norma jurídica de posição privilegiada e portadora de valor expressivo; b) como
norma jurídica de posição privilegiada que estipula limites objetivos; c) como os valores
insertos em regras jurídicas de posição privilegiada, mas considerados independentemente
das estruturas normativas; e d) como o limite objetivo estipulado em regra de forte
hierarquia, tomado, porém, sem levar em conta a estrutura da norma. Diz o mesmo cientista:
“Nos dois primeiros, temos “princípio’ como “norma”; enquanto nos dois últimos, “princípio”
como “valor” ou como “critério objetivo”.
Muitas outras considerações Paulo de Barros Carvalho teceu para explicar o significado
semântico da palavra princípio, mas que não nos alongaremos a apreciá-las. Todavia, ao final,
o referido autor ensina:
“Seja como for, os princípios aparecem como linhas diretivas que iluminam a compreensão de
setores normativos, imprimindo-lhes caráter de unidade relativa e servindo de fator de
agregação num dado feixe de normas. Exercem eles uma reação centrípeta, atraindo em
torno de si regras jurídicas que caem sob seu raio de influência e manifestam a força de sua
presença. Algumas vezes constam de preceito expresso, logrando o legislador constitucional
enunciá-los com clareza e determinação. Noutras, porém, ficam subjacentes à dicção do
produto legislado, suscitando um esforço de feitio indutivo para percebê-los e isolá-los. São
os princípios implícitos. Entre eles e os expressos não se pode falar em supremacia, a não ser
pelo conteúdo intrínseco que representam para a ideologia do intérprete, momento em que
surge a oportunidade de cogitar-se de princípios e de sobre princípios.”
Ao abordar um estudo sobre os Princípios Fundamentais do Imposto de Renda, o advogado
Ricardo Mariz de Oliveira, afirmou que os princípios são os alicerces de um sistema jurídico,
ou de um subsistema, inclusive de um determinado objeto de regulação jurídica. Segundo
Mariz, Celso Antonio Bandeira de Mello, citado por Geraldo Ataliba na Revista de Direito
Mercantil n.º 56, p. 6, asseverou:
Princípio – já averbamos alhures – é, por definição, mandamento nuclear de um sistema,
verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas
compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência,
exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a
tônica e lhe dá sentido harmônico. É o conhecimento dos princípios que preside a intelecção
das diferentes partes componentes do todo unitário que há por nome sistema jurídico
positivo. Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma. A desatenção ao
princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório mas a todo
sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme
o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema,
subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e
corrosão de sua estrutura mestra. Isto porque, com ofendê-lo, abatem-se as vigas que o
sustêm e alui-se toda a estrutura neles esforçada (10).”
Acrescenta Ricardo Mariz mais uma contribuição ao significado dos princípios:
“Exercendo esse papel primordial, os princípios atuam com a mesma função das fundações de
um edifício. Tanto quanto estas sustentam a solidez de toda a estrutura sobre elas
construídas, os princípios jurídicos atuam de maneira a sustentar a validade eficaz, bem como
a consistência, ¸daquilo a que se referem, ¸seja todo um sistema jurídico (por exemplo, o
sistema constitucional democrático, para o qual é essencial o princípio da representatividade,
dentre outros), seja um subsistema (por exemplo, o chamado “sistema Tributário Nacional”,
baseado no princípio da estrita legalidade, dentre outros), seja um objeto menor regido pela

7
Constituição, ou até por legislação infraconstitucional (por exemplo, o imposto de renda,
cujos princípios veremos neste breve estudo).”
Ainda para Mariz, a expressão “princípios fundamentais” chega a ser redundante, pois que
princípios são os próprios fundamentos de um dado sistema, subsistema ou objeto menor.No
âmago do estudo do DIREITO CIVIL - INTRODUÇÃO, Francisco Amaral (11)leciona que os
princípios jurídicos são pensamentos diretores de uma regulamentação jurídica. Diz ele que,
como diretrizes gerais e básicas, os princípios fundamentam e dão unidade a um sistema ou a
uma instituição. Dessa forma, acrescenta o mesmo autor, o direito, como sistema, seria assim
um conjunto ordenado segundo princípios.
Temos ainda que considerar a expressão “Princípios Gerais de Direito”, que no “Dicionário
Jurídico Brasileiro Acquaviva” tem o seguinte significado: “Princípios gerais de direito são os
princípios que decorrem do próprio fundamento da legislação positiva, que, embora não se
mostrando expressos, constituem os pressupostos lógicos necessários das normas legislativas
(12).”
O art. 108, do CTN também faz referência, além dos princípios gerais de direito tributário,
aos princípios gerais do direito público, porém, fazendo um alerta no seu art. 109, que os
princípios gerais de direito privado utilizam-se para a pesquisa da definição, do conteúdo e do
alcance de seus institutos, conceitos e forma, mas não para definição dos respectivos efeitos
tributários.
Logo, quando nos referimos aos princípios constitucionais gerais ou aos princípios
constitucionais tributários, podemos afirmar que tais princípios se inserem num rol de
princípios gerais de direito, mas que no âmago do direito tributário somente se é permitido
aplicar estritamente aqueles princípios, sendo vedado o uso dos provenientes do direito
privado, a não ser para a pesquisa de definição, do conteúdo e do alcance dos seus institutos,
conceitos e formas.

4.OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS GERAIS E OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS


TRIBUTÁRIOS
A Constituição Federal é regida por muitos princípios. Ensina Ataliba (13) que três princípios
devem ser considerados como fulcro em torno do qual se ergue o edifício das instituições
republicanas, no direito positivo brasileiro, operando como premissas básicas. Em grau de
igualdade de importância estão os princípios da legalidade, da isonomia e da intangibilidade
das liberdades públicas, expandidos em clima, consoante assevera ainda Ataliba, no qual se
asseguram a certeza e segurança do direito.
Paulo de Barros Carvalho (14) relaciona os princípios gerais que influem mais diretamente nos
fenômenos jurídicos tributários. São eles: o princípio da justiça, o princípio da certeza do
direito, o princípio da segurança jurídica, o princípio da igualdade, princípio da legalidade,
princípio da irretroatividade das leis, princípio da universalidade da jurisdição, princípio que
consagra o direito de ampla defesa e o devido processo legal, princípio de isonomia das
pessoas constitucionais, princípio que afirma o direito de propriedade, princípio da liberdade
do trabalho, princípio que prestigia o direito de petição, princípio da supremacia do interesse
público ao do particular e o princípio da indisponibilidade dos interesses públicos
No âmago dos princípios constitucionais estritamente tributários, encontraremos o princípio
da estrita legalidade, princípio da anterioridade, princípio da irretroatividade da lei
tributária, princípio da tipologia tributária, princípio da proibição de tributo com efeito de
confisco, princípio da vinculabilidade da tributação, princípio da uniformidade geográfica,
princípio da não-discriminação tributária, em razão da procedência ou do destino dos bens,
princípio da territorialidade da tributação e o princípio da indelegabilidade da competência
tributária.
Curiosamente, no seu rol dos princípios constitucionais tributários, Paulo de Barros Carvalho
não faz referência ao princípio da capacidade contributiva. Porém, quando ele trata do

8
princípio da proibição de tributo com efeito de confisco, faz considerações como se estivesse
cogitando do princípio tema do nosso trabalho. Destarte, quando o citado tributarista diz “De
evidência que qualquer excesso impositivo acarretará em cada um de nós a sensação de
confisco.”, leva-nos a pensar que dentro desse pensamento também esteja implícito o
princípio da capacidade contributiva.
Não é absurdo chegar-se à essa dedução, pois há entre os dois princípios uma íntima relação.
Ora, cobra-se tributo além da capacidade contributiva, teremos como efeito um verdadeiro
confisco.
A nossa dedução tem lógica se observarmos o que Carrazza pensa dessa ínfima relação entre
os dois princípios. Em seu trabalho, quando aborda a capacidade contributiva e a não
confiscatoriedade, o referido tributarista assim se refere:
“Estamos convencidos de que o princípio da não confiscatoriedade, contido no art. 150, IV, da
CF ( pelo qual é vedado “utilizar tributo com efeito de confisco”), deriva do princípio da
capacidade contributiva. Realmente, as leis que criam impostos, ao levarem em conta a
capacidade econômica dos contribuintes, não podem compeli-los a colaborar com os gastos
públicos além de suas possibilidades. Estamos vendo que é confiscatório o imposto que, por
assim dizer, “esgota” a riqueza tributável das pessoas, isto é, não leva em conta suas
capacidades contributivas (15).”
Não vamos esmiuçar neste trabalho o significado de cada princípio, pois acabaríamos indo
além dos limites traçados para esta monografia. Limitar-nos-emos ao estudo do princípio da
capacidade contributiva e a sua estreita ligação com vários dos princípios, sejam gerais ou
constitucionais.

5.ESTREITA LIGAÇÃO ENTRE O PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA E DEMAIS


PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS GERAIS E TRIBUTÁRIOS
Temos observado em vasta discussão doutrinária que o princípio da capacidade contributiva é
a aplicação do princípio constitucional da igualdade, previsto no art. 5º, caput da
Constituição Federal, no âmbito do Direito Tributário.
Dispõe o art. 5º da Carta Magna:
“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.”
Para Angela Maria da Motta Pacheco (16), o princípio da igualdade, da isonomia, da justiça é
aquele que informa todo o sistema jurídico. Ainda ela complementa: “Por este todos aqueles
que se encontrem numa mesma situação fática devem ser tratados com igualdade (17).”
Diz mais, a mesma autora, “Mais ainda quando o tema é o tributo. A igualdade, no campo do
direito tributário revela-se pelo princípio da capacidade contributiva, tal como explícito no
texto do art. 145.§ 1º (18).”
José Maurício Conti (19), ao abordar sobre esse tema, aduz que o princípio da capacidade
contributiva ultrapassa as fronteiras de um simples princípio constitucional. A idéia de
igualdade está vinculada à justiça. A igualdade é o sistema nuclear de todo o nosso sistema
constitucional. É princípio básico do regime democrático e do Estado de Direito.
Vale a pena transcrever as relevantes considerações do constitucionalista Alexandre de
Moraes, citado num trabalho da jurista de Belo Horizonte, Patrícia Brandão Paoliello:“A
Constituição Federal de 1988 adotou o Princípio da Igualdade de direitos, prevendo a
igualdade de aptidão, uma igualdade de possibilidades virtuais, ou seja, todos os cidadãos
têm o direito de tratamento idêntico pela lei, em consonância com os critérios albergados
pelo ordenamento jurídico. Dessa forma, o que se veda são as diferenciações arbitrárias, as
discriminações absurdas, pois, o tratamento desigual dos casos desiguais, na medida em que

9
se desigualam, é exigência tradicional do próprio conceito de justiça, pois o que realmente
protege são certas finalidades, somente se tendo por lesado o princípio constitucional quando
o elemento discriminador não se encontra a serviço de uma finalidade acolhida pelo
direito...” (20)
É óbvio que o sistema constitucional vigente em nosso país jamais conseguirá fazer com que
todos os indivíduos sejam iguais, pois as pessoas são na essência desiguais. É a razão porque
se ouve de todos os tratadistas que o Direito deve considerar estas desigualdades e atribuir
um tratamento desigual entre os cidadãos, de modo a fazer com que os efeitos das
desigualdades naturais entre estes sejam minimizados.
Muito bem, com tais considerações. Mas é de se indagar se, ao fazermos tais conjecturas com
relação ao princípio da igualdade, poderemos chegar a um real significado do princípio da
capacidade contributiva. Em como haveremos de concluir que o princípio tema do nosso
trabalho prestigia a questão do tratamento dos desiguais de forma desigual.
Se ouvirmos somente Bandeira de Mello (21), que afirma ser a capacidade contributiva o
critério de discriminação adotado para estabelecer as diferenças entre as pessoas, não
conseguiremos aclarar nitidamente o significado do princípio tema. Entretanto, Bernardo
Ribeiro de Moraes nos traz excelente contribuição, conforme a seguir.
“Diante do direito tributário, o princípio da igualdade jurídica passa a denominar-se princípio
da igualdade jurídica tributária, princípio da igualdade na tributação. Em matéria fiscal, a
igualdade de todos perante a lei é entendida como igualdade perante a lei tributária.
Gravames jurídicos iguais devem ser estabelecidos para uma mesma categoria de
contribuintes, que se acham em condições ou situações iguais (22).”
Esclarece mais o referido doutrinador:
“Em decorrência, diante do princípio da igualdade jurídica tributária, podemos estabelecer as
seguintes regras:
c) a existência de desigualdades naturais justifica a criação de categorias ou classes de
contribuintes, desde que as distinções sejam razoáveis e não arbitrárias. A lei, sem perder o
seu caráter de universalidade, pode estabelecer distinções dirigir-se a grupo de pessoas,
contemplar situações excepcionais em que se pode colocar um número indeterminado de
indivíduos.”
Outro princípio que firma o da capacidade contributiva é o da progressividade. Isso se
consegue com a aplicação das alíquotas graduadas, na proporção da percepção de riqueza do
indivíduo.
O mecanismo do sistema alíquotas funciona de tal forma que as alíquotas fiquem cada vez
mais elevadas na medida da dimensão da riqueza. A inteligência da graduação das alíquotas é
alcançar equidade na tributação, o que é o objetivo primordial do princípio da capacidade
contributiva.
Ensina Roque Antonio Carrazza (23), que o princípio da capacidade contributiva informa a
tributação por meio de impostos. Segundo o eminente tributarista, esse princípio está
intimamente ligado ao princípio da igualdade, razão porque é um dos mecanismos mais
eficazes para que se almeje a tão almejada justiça fiscal. Diz mais, o referido tributarista:
“ É por isso que, em nosso sistema jurídico, todos os impostos, em princípio, devem ser
progressivos. Por que? Porque é graças ä progressividade que eles conseguem atender ao
princípio da capacidade contributiva (24).”
Para Carrazza (25) não remanescem dúvidas, como os demais impostos, o Imposto Sobre a
Renda e Proventos de Qualquer Natureza exige obediência ao princípio da capacidade
contributiva, e para isso, deverá ser progressivo. A posição do ilustre estudioso está em
sintonia com o art. 153, § 2º, I, da Constituição Federal, ou seja, “o imposto previsto no
inciso III será informado pelos critérios da generalidade, da universalidade, e da
progressividade, na forma da lei.”

10
Vittório Cassone (26) aduz que a “ Renda é expressão jurídico-tributária, consistente em
acréscimo patrimonial, de caráter pessoal e cuja tributação deve ser graduada segundo a
capacidade econômica do contribuinte.”
Transmite-nos também o referido mestre: “A capacidade econômica não diz respeito a cada
contribuinte, individualmente considerado, mas em função da base de cálculo ou do
acréscimo patrimonial tido no regime jurídico que orienta a tributação, verificado durante
certo período de tempo estabelecido pela lei (27).”
É ainda em Vittorio Cassone, que buscamos alguns ensinamentos acerca do critério da
progressividade. Para ele, “Progressividade significa que à medida que o acréscimo
patrimonial aumenta, também aumenta o IR, mas desproporcionalmente a maior.
Progressividade é o sistema de tributação em que a alíquota vai aumentando à medida que
aumenta a base de cálculo (28).”
José Antonio Francisco e Marcelli Jorge Pellegrina (29), no Curso de Direito
Tributário, coordenado por Ives Gandra da Silva Martins, ao analisarem a progressividade das
alíquotas em função da área do imóvel para fins do ITR (Imposto Territorial Rural), dizem
que, segundo a doutrina, existem dois tipos de progressividade: a fiscal e a extrafiscal, sendo
que a primeira seria determinada apenas em função da capacidade econômica do
contribuinte, enquanto a segunda, em função de um parâmetro externo ao direito tributário,
ligado a um objetivo específico.
Para eles, a progressividade fiscal deve ser função de um parâmetro de medida da capacidade
econômica do contribuinte, como o valor venal do imóvel. Mas a Lei n.º 9.393/1996 determina
a progressividade das alíquotas do ITR em função da área total do imóvel, que não tem
relação alguma com a capacidade econômica do proprietário, uma vez que imóveis de
diferentes áreas têm diferentes valores venais (dependendo da localização e qualidade da
terra, por exemplo).
Certamente, a adoção de tal critério viola o princípio da igualdade, ao tratar de uma mesma
forma contribuintes em situações diferentes (mesma alíquota para proprietários de imóveis
de diferentes valores) e, assim, tal progressividade nem sequer pode ser caracterizada como
“fiscal”.
Os referidos autores ainda salientam:
“Não bastasse isso, o STF, por várias vezes, julgou inconstitucionais leis municipais que
instituíam a progressividade do IPTU em função dos valores venais dos imóveis, considerando
que impostos reais não podem ser graduados de acordo com a capacidade econômica do
contribuinte. Dessa forma, a mesma posição deve ser mantida pelo Supremo Tribunal na
eventual apreciação da constitucionalidade da Lei n. 9.393/1996, no que diz respeito à
progressividade das alíquotas do ITR em função da área total do imóvel rural (30).”
Outro princípio objeto de breves considerações com vistas a aclarar a nossa compreensão com
relação ao princípio da capacidade contributiva é o princípio da pessoalidade.
Luciano Amaro trata do aludido princípio da seguinte forma:
“A personalização do imposto pode ser vista como uma das faces da capacidade contributiva,
à qual, sem dúvida, o imposto pessoal deve ser adequado (31).”
Os financistas, como Hugo de Brito Machado (32), classificam os impostos em reais e pessoais.
Os impostos pessoais levam em conta as quantificações consideradas as condições pessoais de
cada contribuinte, seja na definição da base de cálculo ou da fixação da alíquota. Quanto aos
impostos reais, referem-se àqueles, cujas quantificações consideram apenas a matéria
tributável.
Para muitos, esta classificação advinda do Direito Romano é considerada obsoleta, uma vez
que, ao final, a tributação recairá sempre sobre um contribuinte, ou seja, sobre uma pessoa,
não existindo, portanto, a referida distinção.

11
Todavia, ensina o Mestre Sacha que:
“... Ao falar em pessoalidade, o contribuinte rendeu-se às classificações pouco científicas da
Ciência das Finanças. Nem por isso o seu falar é destituído de significado. Dentre as inúmeras
classificações dos impostos, avultam-se duas, de resto muito em voga: a que divide os
impostos em pessoais e reais e a que os divide em diretos e indiretos (33).”
Com relação ao princípio da proibição da tributação confiscatória, do qual já fizemos
perfunctórios comentários, ele está previsto no art. 150, inciso II da Constituição Federal, e
sua pretensão finalística é impedir que tanto a União, como aos Estados, ao Distrito Federal e
aos Municípios se utilize do tributo com efeito de confisco. A sua disposição se compatibiliza
tranqüilamente com o direito de propriedade, previsto no art. 5º, inciso XXII, da Constituição
Federal e com o art. 145, § 1º que trata da capacidade contributiva.
Menciona Luiz Carlos Trouche Ramina:
“É elementar que só cabe imposição tributária quando se está diante de fatos que denotem
fundamento econômico e, considerando que a tributação interfere no patrimônio das pessoas
de forma a subtrair parcelas expressivas de bens, não resta dúvida de que será
inconstitucional a imposição de cargos superiores à força desse patrimônio (34).”
Acrescenta ainda o mesmo autor:
Tributos confiscatórios são os que absorvem todo o valor da propriedade, aniquilam a
empresa, ou impedem o exercício da atividade lícita ou moral. Todavia, é tormentosa a
tarefa de fixar limite para o que seja confisco, cuja configuração e aferição envolvem grande
margem de subjetivismo. Assim, uma alíquota de 25% para o imposto sobre a renda e
proventos de qualquer natureza pode não configurá-la, mas a mesma alíquota sobre o imposto
de transmissão de bens móveis indubitavelmente caracterizará confisco de propriedade. O
Poder Público, portanto, deverá se comportar pelo critério de razoabilidade, evitando
insolvências e falências, bem como permitir a subsistência e a dignidade das pessoas (35).

6.O PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA


6.1. Doutrina
Consoante já mencionado no início deste trabalho, dispõe o § 1º, do art. 145 da Constituição
Federal de 1988 que, sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão
graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte. Imediatamente, já poderemos
extrair um entendimento de que o princípio da capacidade contributiva não se refere a todos
os tributos, mas tão somente a imposto. Não haverá a sua aplicação à taxa nem não pouco à
contribuição de melhoria.
A outra menção, digna de nota, que se extrai do aludido dispositivo, é o caráter de
pessoalidade do princípio, o que se pode compreender como a condição estrita do
contribuinte alvo da incidência, ou seja, somente haverá interesse da condição econômica
daquele indivíduo e não de um terceiro.
A condição econômica do contribuinte é outro requisito para que se aplique o princípio em
comento. É nele que supomos haver controvérsias, no que se refere ao sentido do que seja
realmente a condição econômica. O que se pretende averiguar é se condição econômica é a
renda do sujeito passivo, proveniente de salário, quando se refere a empregado, ou
honorários no caso do profissional liberal, ou pró-labore de empresário, bem como dividendos
pagos aos sócios de uma empresa, ou estamos falando do seu patrimônio físico, tal como
imóvel, veículo, etc.
Os mestres Cortés Domingues e Martín Delgado, citados por Alberto Monteiro Alves (36),
ensinam que a capacidade econômica absoluta se refere à aptidão abstrata para concorrer
aos gastos públicos, tendo a ver com a definição legal de quem são os sujeitos e quais os fatos
que têm ou indicam a existência daquela idoneidade. Por outro lado, acrescentam os

12
referidos autores, capacidade econômica relativa, que supõe a absoluta, se dirige a delimitar
o grau de capacidade, o “quantum”. Opera, pois, no momento de determinações da quota.
Nesta segunda vertente, a capacidade contributiva tem a ver com a aptidão específica e
concreta de cada contribuinte de per si em face dos fatos geradores previstos na lei.
O que se extrai também do referido dispositivo constitucional é uma condicionante
representada em “sempre que possível”, a qual poderá se entendida por um mais afoito, de
que a capacidade contributiva será aplicada ao alvedrio do isco, o que não é verdade. Quando
a lei diz “sempre que possível”, na verdade está impondo a necessária observância da
capacidade sempre que houver a condição, desobrigando o sujeito ativo quando realmente
não haja alguma forma de mensurar a condição econômica do contribuinte para fins da
tributação nos limites da sua capacidade.
Sobre o assunto o mestre Aliomar Baleeiro leciona:
“O art. 145, §1º, fala em pessoalidade sempre que possível. A cláusula sempre que possível
não é permissiva, nem confere poder discricionário ao legislador. Ao contrário, o advérbio
sempre acentua o grau da imperatividade e abrangência do dispositivo, deixando claro que,
apenas sendo impossível, deixará o legislador de considerar a pessoalidade para graduar os
impostos de acordo com a capacidade econômica subjetiva do contribuinte. E quando será
impossível? A doutrina costuma apontar a hipótese dos impostos que são suportados pelo
consumidor final, como exemplo de tributação não-pessoal. É que nos impostos incidentes
sobre a importação, a produção ou a circulação, o sujeito passivo, que recolhe o tributo aos
cofres públicos (o industrial ou o comerciante), transfere a um terceiro, o consumidor final,
os encargos tributários incidentes. Tornar-se-ia muito difícil, senão impossível, graduar o
imposto sobre produtos industrializados ou sobre operação de circulação de mercadoria de
acordo com a capacidade econômica da pessoa que adquire o produto ou a mercadoria para o
consumo (37).”
Os impostos indiretos, conforme são denominados pela doutrina a uma categoria de impostos
dentro daqueles previstos na Constituição Federal, realmente, configuram a hipótese da
impossibilidade da aplicação do princípio da capacidade contributiva, pois comportam, por
sua natureza de transferência do respectivo encargo financeiro, conforme a definição
disposta no artigo 166, do CTN.
Compreende-se como tais impostos o Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI, de
competência privativa da União Federal, nos termos do art. 153, inciso IV da Constituição
Federal, e o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS, de competência
privativa dos Estados, nos termos do art. 155, inciso II, do mesmo diploma legal.
A impossibilidade, aventada por Baleeiro, se justifica pelo fato desses impostos serem
gerados dentro de um ciclo de industrialização e de circulação dos produtos, surgindo, em
conseqüência, vários fatos geradores, bem como várias obrigações tributárias com os
respectivos Entes Federados constitucionalmente competentes para exigir o tributo.Sobre a
questão, Baleeiro ainda nos salienta:
“O fenômeno, que estamos referindo, da translação ou da repercussão ocorrente nos impostos
ditos ‘indiretos’, exigirá um tratamento especial frente aos dois princípios que estamos pondo
em contato e resolver-se-á, exclusivamente, na seletividade de alíquotas ou na isenção dos
gêneros de primeira necessidade. É que a capacidade econômica demonstrada por quem tem
aptidão para o consumo, somente está disponível para o pagamento de tributos, em se
tratamento de consumo de gêneros e produtos de necessidade média, de luxo ou supérfluos
(38).”
Eis também oportuna lição do Professor Paulo Roberto Coimbra:
“Quanto à capacidade contributiva, abra-se neste ponto necessário parêntesis para frisar,
desde logo, que nos impostos plurifásicos incidentes sobre o consumo, busca-se tributar a
renda gasta no consumo. Nestes casos, a capacidade contributiva a ser atingida é a do
consumidor final, não se podendo onerar o agente intermediário obrigado a recolher o

13
tributo, seja ele contribuinte de jure ou responsável. O industrial, o comerciante e o
prestador de serviços, juridicamente obrigados a recolhê-los, não suportam o seu ônus
econômico, mas se esquivam de seu encargo financeiro, repassando-o ao consumidor –
contribuinte de facto (39).”
Vittorio Cassone faz as seguintes considerações sobre o princípio em comento:
“Com essa disposição, a CF está determinando, como princípio, que a lei deve estabelecer de
modo que quem pode mais paga mais, e quem pode menos paga menos, quanto aos impostos.
Mas, diz o texto, “sempre que possível”, pelo que caberá ao legislador veriicar sobre a
possibilidade, estabelecendo graduação segundo a capacidade contributiva ou econômica,
mas não em relação a cada contribuinte, mas em tese, genericamente.
O XIV Simpósio Nacional de Direito Tributário, realizado em São Paulo em 21-10-89,
coordenado por Ives Gandra da Silva Martins, conferência inaugural do Min. Moreira Alves, e a
relatoria de Vittorio Cassone, resolveu que: “A expressão ‘sempre que possível’ contida no
art. 145, § 4º da CF, significa que os impostos deverão ter, obrigatoriamente, caráter pessoal
e ser graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, salvo se, por sua natureza,
isso for impossível (40).”
Vale também transcrever mais uma contribuição de Luiz Carlos Trouche Ramina:“Note-se que
este princípio refere-se aos impostos, espécie tributária não vinculada a qualquer
atuação estatal, ou seja, independente de qualquer atividade específica do governo
tributante em relação ao contribuinte. No que se refere às taxas, o legislador competente
deve observar a regra da retributividade ou remuneração. Na contribuição de melhoria
respeitar-se-á a regra do benefício advindo da realização de obra pública.
O princípio da capacidade contributiva, em matéria de imposto, fica, portanto, limitada: do
mesmo modo que não se pode, igualmente, aniquilar a riqueza por meio da tributação. É a
possibilidade de instituir tratamento discriminatório, devendo, entretanto, estar devidamente
controlada a relação de pertinência entre a distinção de tratamento tributário e a efetividade
da alegada existência de discrepância no grau de riqueza manifestada pelos sujeitos
alcançados pela norma de tributação (41).”
Em sua obra “Sujeição Passiva Tributária”, Luís Cesar Souza de Queiroz define o conceito do
princípio constitucional da capacidade contributiva, da seguinte forma:
“Princípio Constitucional da Capacidade Contributiva é o complemento, necessário e
condicionante, do aspecto declaração prescritiva do antecedente da norma constitucional de
produção normativa (que dispõe sobre criação de normas impositivas de imposto), portador
de elevada carga axiológica, o qual exige que o antecedente da norma impositiva de imposto
descreva um fato que ostente sinal de riqueza pessoal, e que o seu conseqüente prescreva a
conduta (obrigatória) do titular dessa riqueza de entregar parte dela ao Estado.” (42)
Roque Antonio Carrazza fez profundas reflexões sobre o Princípio da Capacidade Contributiva
e concluiu o seguinte:
“O princípio da capacidade contributiva hospeda-se nas dobras do princípio da igualdade e
ajuda a realizar, no campo tributário, os ideais republicanos. Realmente, é justo que quem,
em termos econômicos, tem muito pague, proporcionalmente, mais imposto do que quem
tem pouco. Quem tem mais riqueza, deve, em termos proporcionais, pagar mais imposto do
que quem tem menor riqueza. Noutras palavras, deve contribuir mais para a manutenção da
coisa pública. As pessoas, pois, devem pagar impostos na proporção dos seus haveres, ou seja,
de seus índices de riqueza (43).”
Roque ainda acrescenta o seguinte entendimento:
“O princípio da capacidade contributiva informa a tributação por meio de impostos.
Intimamente ligado ao princípio da igualdade, é um dos mecanismos mais eficazes para que
se alcance a tão almejada Justiça Fiscal (44).”

14
Roberto Quiroga Mosquera, concordando com Carrazza quanto a ser a capacidade
contributiva objetiva, já que não se refere às condições econômicas reais dos indivíduos mas
às suas manifestações objetivas de riquezas, salienta que o professor espanhol Lapatza é
incisivo quando analisa a questão da capacidade contributiva em sua pátria. Repassa-nos,
Quiroga, a lição do referido professor:
“a capacidade contributiva como capacidade econômica significa possuir riqueza, ou,
utilizando outros termos, possuir um conjunto de bens econômicos materiais ou imateriais.
Em vista disso, o legislador tem como finalidade precípua tributar a riqueza do indivíduo.
Muitas vezes, afirma o ilustre ibérico, o legislador delimita quais elementos da riqueza do
contribuinte quer gravar: a renda, o patrimônio etc; em outras ocasiões, o legislador quer
tributar a riqueza do contribuinte, sem maiores especificações. Portanto, gravar a riqueza é
um fim primário, fundamental; é um ponto de referência material das intenções do
legislador” (45)
Para Lapatza, segundo Quiroga:
“o objeto material de cada tributo é um bem econômico. Mas nem todos os bens econômicos,
é óbvio, são gravados pelos tributos. Cada um grava um ou alguns de terminados bens. A
renda, o patrimônio, os bens imóveis, o tabaco, a gasolina, os direitos de hipoteca, os títulos
mobiliários, os serviços profissionais, a atividade comercial etc.”
Oportunas também são as considerações do advogado supracitado, Alberto Monteiro Alves,
quanto a significação do termo capacidade jurídica:
“Pode ser dada, sem distinção, no Plano Jurídico-Positivo; Ético-Econômico e Técnico-
Econômico.
No Plano Jurídico-Positico, a capacidade contributiva significa que um sujeito é titular de
direitos e obrigações com fundamento na legislação tributária vigente, que é quem vai definir
aquela capacidade e seu âmbito.
No Plano Ético-Econômico relaciona-se com a justiça econômica material. Aqui a capacidade
contributiva é a aptidão econômica do sujeito para suportar ou ser destinatário de impostos,
que depende de dois elementos:
Volume de Recursos que o sujeito possui para satisfazer o gravame; e A Necessidade que tem
de tais recursos.
No Plano Técnico-Econômico, são considerados todos os princípios, regras, procedimentos e
categorias relativas a operacionalidade e eficácia arrecadatória dos tributos. Segunda esta
concepção tem capacidade tributária aqueles que:
Constituam unidades econômicas de possessão e de emprego de recursos produtivos ou de
riqueza;sejam facilmente identificáveis e avaliados pela Fazenda Pública como
suscetíveis de imposição; e estejam em situação de solvência presumidamente suficiente
para suportar o tributo.” (46)
Alberto Xavier, citado pelo mesmo advogado, traz-nos a seguinte lição:
“Nem todas as situações da vida abstratamente suscetíveis de desencadear efeitos tributários
podem, pois, ser designadas pelo legislador como fatos tributáveis. Este encontra-se limitado
na sua faculdade de seleção pela exigência de que a situação da vida a integrar na previsão
da norma seja reveladora de capacidade contributiva, isto é, de capacidade econômica, de
riqueza, cuja expressão sob qualquer forma se pretende submeter a tributo.
Pode o Legislador escolher livremente as manifestações de riqueza que repute relevantes
para efeitos tributários, bem como delimitá-las por uma ou outra forma mas sempre deverá
proceder a essa escolha de entre as situações da vida reveladoras de capacidade contributiva
e sempre a estas se há de referir na definição dos critérios de medida do tributo.” (Manual de
Direito Fiscal, Vol. I, pág. 108.). (47)

15
Francisco José de Castro Rezek (48) leciona que o princípio da capacidade contributiva é
corolário do princípio da igualdade ( art. 5o. da C.F.), sendo que, deste modo, todos os
contribuintes devem concorrer “com o mesmo sacrifício para suportar as despesas e os
investimentos necessários à manutenção da atividade estatal”.
Salienta Rezek, ainda, considerando que a igualdade real é uma idéia utópica, de escabroso
alcance pelo operador do Direito, deve-se tentar buscar as desigualdades do homem, com
relação aos bens da vida e em consonância com o ordenamento jurídico, vinculando-se a
máxima de que “igualdade é tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na
medida de suas desigualdades”. Deste modo, todos que se encontram em posições diferentes
devem ser tratados de forma diferente, procurando assim, harmonia e igualdade na
contribuição para o financiamento do Estado.
Roque Antonio Carrazza ressalta que o princípio da igualdade guarda intima relação com o
princípio progressividade, e em decorrência disso eles conseguem atender o princípio da
capacidade contributiva.
Salienta ainda o referido cientista que a progressividade não deve ser confundida com a
proporcionalidade, pois, esta atrita com o princípio da capacidade contributiva, “fazendo
com que pessoas economicamente fortes paguem impostos com as mesmas alíquotas”.
Deste modo, tanto as pessoas economicamente fortes, como as mais fracas estariam
pagando tributos na mesma proporção, deixando-se de levar em consideração a capacidade
econômica de cada qual.Pelo princípio da proporcionalidade, considerável contingente da
população, que não tem a mínima condição de contribuir com o Estado, estaria em débito.
Enquanto, o princípio da progressividade, de forma mais justa e humana, fica longe de atritar
com o princípio da capacidade tributária, atingindo de forma igualitária tanto os
economicamente fortes, quanto os economicamente fracos.
Dessa forma, a tributação por alíquotas fixas, tendem a contribuir com a desigualdade
econômica, obrigando que pessoas, que não tem condições de contribuir, suportem um
sacrifício injustificável.
Conseqüentemente, sem a progressividade não há como atingir a igualdade tributária.Para
Angela Maria da Motta Pacheco (49) o art. 154, inciso I, da CF, também é expressão do
princípio da capacidade contributiva. Preceitua o referido dispositivo:
“Art. 154 – A União poderá instituir:
I – mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior, desde que não
sejam não-cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos
discriminados nesta Constituição.”
Ela justifica o seu entendimento com os seguintes argumentos:
“Assim o inciso I. está proibindo a criação e a existência de impostos com a mesma base de
cálculo ou o mesmo fato gerador e, ainda, proibindo, neste caso, o tributo cumulativo. O
princípio da não cumulatividade, para os impostos sobre operação de circulação de
mercadoria é expressão do princípio da capacidade contributiva. Por este evita-se a
superposição da tributação sobre a mesma base de cálculo (50).”
As razões da ilustre tratadista, a meu ver, são consistentes, pois, na medida que se possa
admitir que um imposto seja exigido do contribuinte, incidente sobre determinado produto
que já vem, desde o início, onerado pelo mesmo imposto, sem o mecanismo da não-
cumulatividade, acabará por extrapolar os limites do suportável e tornando inviável a
comercialização do referido produto, violando frontalmente o princípio da capacidade
contributiva.
Em suma, a partir de tantas e abalizadas opiniões de conceituados cientistas do Direito
Tributário, concluímos, em sintonia com Ruy Barbosa Nogueira (51), que o princípio da
capacidade contributiva realmente é um conceito econômico e de justiça social e, em
consequência, verdadeiro pressuposto da lei tributária.

16
6.2. A Jurisprudência
Não são raras vezes que contribuintes buscam a Justiça sob o fundamento em que impostos
que lhes estão sendo exigidos infringe os princípios da Capacidade Tributária, da isonomia,
não confisco e igualdade tributária. Percebe-se, na maioria dos julgados, que os tribunais
estão em sintonia com o pensamento da doutrina no que se refere ao conceito ou significado
do Princípio da Capacidade Tributária.
No acórdão de n.º 1999.04.01.027743-9, publicado no DJU de 04.04.2001, o então TFR 4ª R.,
ao apreciar questão sobre a contribuição instituída pela Lei Complementar n.º 84/96,
incidente sobre as remunerações dos corretores de seguro, que pretendiam a exclusão de
aplicabilidade do adicional de 2,5 % sobre a base de cálculo da contribuição, respaldando-se
no princípio da capacidade contributiva, não deu provimento ao recurso por entender que o
art. 2º da Lei Complementar n.º 84/96, ao instituir adicional sobre a base de cálculo da
contribuição previdenciária, não feriu os preceitos constitucionais. O argumento daquele
Tribunal é que “O princípio da capacidade contributiva significa que os impostos devem ser
graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte”.
O que se pretendia, daquele recurso, que o referido adicional, instituído pela Lei
Complementar 84/96 não incidisse nas remunerações pagas pelos serviços prestados pelos
corretores de seguros, o que foi rechaçado pela decisão, pois a incidência estava nos limites
das possibilidades econômicas das seguradora.
Em outro julgado (TAPR – RN-AC 137261-2 – (10786) – 5ª C.Cív. – Rel. Juiz Tui Maron Filho –
DJPR 02.06.2000), fundamentado na ofensa ao princípio da isonomia e da capacidade
tributária, houve a seguinte decisão: “A legislação infra-constitucional, Federal e Municipal,
que estabelece tratamento privilegiado para as sociedades de profissionais, permitindo a
cobrança anual do ISS pelo regime de alíquotas fixas ou variáveis, conforme o número de
profissionais que as integrem, é incompatível com o princípio da igualdade tributária prevista
no inc. II, do art. 150, da nova CF, que expressamente vedou à União, Estados e Municípios:
“instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente,
proibida qualquer distinção em razão da ocupação profissional ou função por eles exercida,
independente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos.”
Deduz-se do referido julgado que a legislação estabeleceu uma cobrança anual do ISS, cujas
alíquotas fixas ou variáveis variavam de acordo com o número de profissionais que
integrassem suas respectivas sociedades, criando uma situação de desigualdade entre elas, ou
seja, uma sociedade com uma equipe menor pagaria menos imposto e outra maior pagaria
maior imposto, situação que afetava o princípio da igualdade tributária.
Não foi caso de infringência ao Princípio da Capacidade Contributiva, o fato de um
contribuinte, que tendo declarado o seu débito pela guia de informação e apuração de ICMS,
tendo o imposto incidido sobre o referido débito, alegar dificuldades financeiras em face da
conjuntura econômica do país, o que afetou a sua possibilidade de recolher o imposto,
conforme decidido no Acórdão de n.º 0060450-8, pelo TJPR (DJPR de 22.02.1999)O STF
consolidou o seguinte entendimento:
“O IPTU, como imposto de natureza real que é, incidindo sobre a propriedade, o domínio útil
ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil,
localizado na zona urbana do município (CTN art. 32), não pode variar segundo a presumível
capacidade contributiva do sujeito passivo. 2. A única progressividade admitida pela
Constituição Federal de 1988 é a extraiscal (art. 182, § 4º, II), que, todavia, depende de lei
federal. 3. Daí a declaração de inconstitucionalidade de normas de leis municipais de Belo
Horizonte (RE 153.771) e São Paulo (RE 204.827), que instituíram a progressividade do IPTU,
segundo a localização e o valor do imóvel. 4. Examinou-se, nesse último precedente, a Lei nº
10.921/90, do Município de São Paulo, a mesma que é objeto de questionamento nestes
autos. 5. Agravo improvido.” (STF – AgRg-AI 194.852-3 – SP – 1ª T. – Rel. Min. Sydney Sanches –
DJU 11.12.1998 – p. 03)

17
Temos, portanto, que a progressividade, que é um instrumento que dinamiza o Princípio da
Capacidade Contributiva, rechaçada pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando aplicada
ao IPTU, cujas alíquotas são ixadas segundo a localização e do valor do imóvel. Decidiu,
portanto, o STF que a progressividade somente é admitida pela Constituição Federal quando
for extraiscal.
O STJ decidiu que a base de cálculo do IPVA é o valor venal do veículo, onerando o
contribuinte segundo a grandeza do seu patrimônio, observado, assim, o princípio da
capacidade contributiva (STJ – ROMS – 8309 – RJ – 2ª T. – Relª Minª Laurita Vaz – DJU
08.10.2001 – p. 00189), o que nos remete às primeiras considerações, logo no início deste
trabalho, com base no entendimento de Carrazza, ou seja, o que vale para efeito da
capacidade contributiva é o signo de riqueza e não as condições econômicas do contribuinte.
Enim, o então TRF 5ª R., ao julgar o Agravo de Instrumento de n.º 10.275-CE, publicado no
DJU, de 28/11/1997, assim comentou com relação ao princípio em comento: “O princípio da
capacidade contributiva não impõe uma dicotomia plena entre os contribuintes, mas uma
estratiicação desses, a qual levará em conta não só seus rendimentos brutos, mas também os
gastos necessários para sua manutenção e de seus dependentes”

CONCLUSÃO
O Princípio da Capacidade Contributiva, previsto no art. 145, § 1o. da Constituição Federal,
deve ser compreendido como uma diretriz obrigatória a guiar todo o ordenamento tributário,
e não apenas aos impostos, conforme entendimento já manifestado pelo Supremo Tribunal
Federal (AGRRE-216259/CE. J. 09/05/2000. DJ 19.05.2000.P 00018./ RTJ 174-3.P.911).O
Princípio da Capacidade Contributiva tem como pressuposto efetivo, não só limitar o poder do
Estado na exigência tributária, mas estabelecer critérios de forma que cada contribuinte
possa recolher tributos em consonância com a riqueza que efetivamente disponha, sem que
ela seja diminuída.
O Estado ao mensurar tal riqueza, não se restringe a meras condições econômicas do cidadão,
mas a um signo de riqueza que ele ostente, seja patrimônio mobiliário ou imobiliário ou renda
de origem das mais diversas.
Por outro lado, é poder discricionário do Estado escolher qual signo de riqueza ele pretende
tributar. Num momento, poderá ser a renda, em outro um bem móvel ou imóvel, como
também o combustível.
Ainda dentro desse poder discricionário do Estado, em que pese o princípio da capacidade
contributiva somente referir-se a impostos, é possível estender-se o princípios à taxas e
contribuição de melhorias através de leis ordinárias.
A efetividade do princípio da capacidade contributiva depende da sua conjunção com outros
princípios, tais como o da legalidade, da igualdade, da segurança jurídica, da não
confiscatoriedade, da pessoalidade e da progressividade.
De fato, não poderá o indivíduo ter a certeza da inviolabilidade do seu patrimônio ou receio
da perda dos seus bens, se não houver a garantia do princípio da legalidade, ou seja, que um
tributo não venha a lhe ser exigido sem que uma lei anterior o defina.
Não haverá uma adequada aplicação do princípio da capacidade contributiva, se a exigência
tributária não tiver critérios que equilibrem as condições desiguais dos indivíduos, de forma
que o que tiver mais recursos realmente pague mais que o menos aquinhoado.
Esse princípio da igualdade dependerá muito de outro, que é o princípio da progressividade,
pelo qual se cria mecanismos onde alíquotas diferentes solucionam as questões de
desigualdades.

18
O princípio da não confisco talvez seja o que esteja mais íntimo ao princípio da capacidade
contributiva, pois a mera ocorrência de alguma exigência tributária que exceda os limites da
capacidade econômica do indivíduo, fatalmente teremos o fenômeno do confisco.
Enfim, o princípio da capacidade contributiva visa promover justiça social, onde todos pagam
o imposto como pode e recebem os serviços do Estado de forma igualitária. Explicando em
outra vertente, paga menos imposto quem pode pagar menos e paga mais quem pode pagar
mais, mas não de forma simples como quem tem dois paga um quem tem quatro paga dois,
mas sim, por intermédio de critérios técnicos aplicados em uma tabela progressiva que
contemplem as condições dos desiguais, pelo menos em tese.
Diz-se, pelo menos em tese, porque vemos fatos que ocorrem, com as decisões de governo
que parecem opor-se aos princípios até agora cogitados, mormente, o princípio da capacidade
contributiva.
O fato da não correção da tabela do Imposto de Renda e Outros Proventos por tão longo
tempo é, sem sombra de dúvidas, uma afronta ao princípio em estudo, como também é o
CPMF, em que pese esse tributo ter sido acolhido pelo STF,o que é um absurdo.

REFERÊNCIAS
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Editora Saraiva, 13ª
Edição, 2000.
CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. São Paulo: Malheiros
Editores, 16a. Edição, 2001.
SOUZA DE QUEIROZ, Luís César. Sujeição Passiva Tributária. Rio de Janeiro: Forense, 1998.
MOSQUERA, Roberto Quiroga. Renda e Proventos de Qualquer Natureza – O Imposto e o
Conceito Constitucional. São Paulo: Dialética, 1996.
CASSONE, Vittorio. Direito Tributário. São Paulo: Editora Atlas, 8ª Edição, 1995.
ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Teoria e Prática do Direito – Volume 1. São Paulo: Brasiliense
Coleções,
______.Dicionário Jurídico Brasileiro Acquaviva. São Paulo: Editora Jurídica Brasileira Ltda.,
7ª Edição, 1995.
ALVES, Alberto Monteiro. Alcance do Princípio da Capacidade Contributiva (art. 145, § 1º, cf
). Belo Horizonte: Texto extraído do Jus Navigandi.
MARIZ DE OLIVEIRA, Ricardo. Princípios Fundamentais do Imposto de Renda. In: Direito
Tributário, estudos em homenagem a Brandão Machado. São Paulo: Dialética, 1998.
AMARAL, Francisco. Direito Civil – Introdução. Rio de Janeiro: Editora Renovar, 2ª Edição,
1998.
ATALIBA, Geraldo. Sistema Tributário Constitucional Brasileiro. São Paulo, Editora RT, 1966.
PACHECO, Ângela Maria da Motta. Sanções Tributárias e Sanções Penais Tributárias editora
Max Limonad.
CONTI, José Maurício. Princípio Tributários da Capacidade Contributiva e da Progressividade.
São Paulo: Dialética, 1997.
PAOLIELLO, Patrícia Brandão. O Princípio da Capacidade Contributiva. Jus Navigandi,
Terezina, a. 7, n.66, jun. 2003. Disponível em:
www.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=4138>.Acesso em: 22. Jun. 2004.
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antonio. O Conteúdo jurídico do Princípio da Igualdade. São
Paulo: Editora Malheiros, 1993.

19
MORAES, Bernardo Ribeiro de. Compêndio de Direito Tributário. Rio de Janeiro: Forense,
1997.
GANDRA DA SILVA MARTINS,Ives. (Coord.). Curso de direito tributário
AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 7ª ed. São Paulo: Saraiva, 2001.
MACHADO, Hugo de Brito. Os Princípios Jurídicos da Tributação na Constituição de 1988. São
Paulo: Editora Dialética, 2001.
COELHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à Constituição de 1988 - Sistema Tributário. Rio
de Janeiro: Editora Forense, 1999.
RAMINA, Luiz Carlos Trouche, Iniciação ao Direito Financeiro e Tributário. São Paulo: Editora
Resenha Tributária, 2ª edição, 1996.
BALEEIRO, Aliomar. Limitações Constitucionais ao Poder Tributar. Atual. Mizabel Abreu
Machado Derzi. 7ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997.
COIMBRA, Paulo Roberto. A Substituição Tributária Progressiva nos Impostos Plurifásicos e
Não-cumulativos. Belo Horizonte: Del Rey, 2001.
REZEK, Francisco José de Castro. A Defesa do Contribuinte no Direito Brasileiro. São Paulo:
IOB ( A Thomson Company), 2002.
NOGUEIRA, Ruy Barbosa. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Editora Saraiva, 1999.

NOTAS
1 ACQUAVIVA, M. C. Teoria Prática do Direito. São Paulo: Brasiliense Coleções, p. 129.
2 CARRAZZA, R. A. Curso de Direito Constitucional Tributário. São Paulo: Malheiros Editores,
16. Ed., 2001, p. 67.
3 ALVES, ª M. Alcance do princípio da capacidade contributiva (art. 145, § 1º, CF). Jus
Navigandi, Teresina, a. 1, n. 5, jan. 1997. Disponível em: . Acesso em: 23 jun. 2004.
4 MOSQUERA, R. Q.. Rendas e proventos de qualquer natureza – O Imposto e o conceito
constitucional. São Paulo: Dialética, 1996, p. 72
5 CARRAZZA, op. cit. (nota 2). p. 30
6 Ibid., p. 30
7 Ibid., p. 30
8 Ibid., p. 30
9CARVALHO, P. B.. Curso de direito tributário.São Paulo: Editora Saraiva, 13. Ed., 2000, p.
142
10 MARIZ DE OLIVEIRA, R.Princípios fundamentais do imposto de renda.São Paulo, Dialética,
1998, p. 197
11 AMARAL, F. Direito civil – Introdução. Rio de Janeiro: Editora Renovar, 2. Ed., 1998, p. 89.
12 ACQUAVIVA, M. C. Dicionário jurídico brasileiro acquaviva. São Paulo: Editora Jurídica
Brasileira Ltda., 7ª. Ed., 1995, p. 1143.
13 ATALIBA, G. Sistema tributário constitucional brasileiro. São Paulo, Editora RT, 1966
14 CARVALHO, op. cit. Nota 9.
15 CARRAZZA, op. Cit. (nota 2). P. 73
16 PACHECO, A. M. M. Sanções tributárias e sanções penais tributárias. editora Max Limonad,

20
p. 193.
17 Ibid., p. 193.
18 Ibid., p. 193.
19 Conti, J. M. Princípio tributários da capacidade contributiva e da Progressividade. São
Paulo: Dialética, 1997. p. 25
20 PAOLIELLO, P. B.. O Princípio da capacidade contributiva. Jus Navigandi, Terezina, a. 7,
n.66, jun. 2003. Disponível em: www.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=4138>.Acesso em: 22.
Jun. 2004.
21 BANDEIRA DE MELLO, C. A. O Conteúdo jurídico do princípio da igualdade. São Paulo:
Editora Malheiros, 1993.
22 MORAES, B. R.. Compêndio de direito tributário. Rio de Janeiro: Forense, 1997, pp.
116/117.
23 CARRAZZA, op. Cit., p.65, nota 2.
24 CARRAZZA, op. Cit., p.65, nota 2
25 Ibid., p. 83.
26 CASSONE, V. Direito Tributário. São Paulo: Atlas, 1995. p. 209.
27 Ibid, p. 209.
28 Ibid., p. 214
29 FRANCISCO, J. A. ; PELLEGRINA, M. J. Curso de direito tributário. São Paulo: Saraiva. p.
477.
30 Ibid., p. 477.
31 AMARO, L. 2001 apud PAOLIELLO, 2003, op. cit. Nota 20.
32 MACHADO, h., 2001 apud PAOLIELLO, 2003, op. cit. Nota 20.
33 SACHA apud ALVES, Alberto Monteiro, op. cit. Nota 3.
34 RAMINA, L. C. T. Iniciação ao direito financeiro e tributário. São Paulo: Editora Resenha
Tributária, 2. Ed., 1996, p. 75.
35 RAMINA, op. cit. p. 75.
36 ALVES, op. cit. Nota 3..
37 BALEEIRO, A., 1997 apud PAOLIELLO, op. cit. nota 20.
38 BALEEIRO, A., 1997 apud PAOLIELLO, op. cit. Nota 20.
39 COIMBRA, P. R. A Substituição tributária progressiva nos impostos plurifásicos e não
cumulativos. Belo Horizonte: Del Rey, 2001.
40 CASSONE, V., op. cit. nota 26.
41 RAMINA, op. cit. p. 75.
42 QUEIRÓZ, L.C.S., Sujeição passiva Rio de Janeiro: Forense, 1998.p. 168.
43 CARRAZZA, op. cit. p. 65.
44 Ibid, p. 65.
45 MOSQUERA, op. cit. Nota 4.
46 ALVES, op. cit. Nota 3.
47 ALVES, op. cit. Nota 3.

21
48 REZEK, F. J. de C. A Defesa do contribuinte no direito brasileiro. São Paulo: IOB ( A
Thomso Company), 2002.
49 PACHECO, op. cit. Nota 16.
50 PACHECO, op. cit. Nota 16.
51 NOGUEIRA, R. B. Curso de direito tributário. São Paulo: Editora Saraiva, 1999.

22
Universidade do Sul de Santa Catarina - UNISUL
Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes – REDE LFG

Curso de Especialização Telepresencial e Virtual em Direito


Tributário

Disciplina

Sistema Constitucional Tributário: Princípios e


Imunidades

Aula 4

LEITURA FACULTATIVA 2

TÁCITO RIBEIRO DE MATOS


Advogado.
Gerente de planejamento tributário.

CONSTITUCIONALIDADE DO FUST FACE AO PRINCÍPIO DA ISONOMIA

Como citar este artigo:

MATOS, Tácito Ribeiro de. Constitucionalidade do FUST face ao


Princípio da Isonomia. Disponível em:
http://jus2.uol.com.br/pecas/texto.asp?id=460. Material da 4ª aula da
Disciplina Sistema Constitucional Tributário: Princípios e Imunidades,
ministrada no Curso de Especialização Telepresencial e Virtual de
Direito Tributário - UNISUL - REDE LFG.

23
Ementa: Esta breve análise tem por objeto avaliar a constitucionalidade do Fundo de
Universalização dos Serviços de Telecomunicações – FUST(entendido como uma contribuição
de intervenção no domínio econômico, doravante denominada CIDE), no que tange a definição
do sujeito passivo da exação e a aplicação do princípio da isonomia a tais contribuintes. A
dúvida suscitada refere-se a possibilidade de tratamento desigual a entes participantes do
grupo econômico afetado pela intervenção.

1. CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES - O DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL


A CIDE está regulamentada no art. 149 da Constituição Federal que dispõe, in verbis:
“Art. 149 – Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no
domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como
instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos art. 146, III e 150
I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195 § 6º, relativamente às contribuições a que alude
o dispositivo.”
A análise do dispositivo reproduzido revela três elementos básicos da CIDE, quais sejam (a) a
utilização desse instrumento como meio de intervenção e regulação da livre iniciativa; (b) a
limitação do grupo atingido pela exação e (c) os princípios constitucionais a que está
submetida. Em nossa análise, limitamo-nos ao exame do grupo atingido pela exação e da
aplicação do princípio da isonomia tributária.

2. O PÓLO PASSIVO NAS HIPÓTESES DE INSTITUIÇÃO DA CIDE


Os limites constitucionais, implícita ou explicitamente apresentados no texto ora
reproduzido, vêm sendo interpretados por diversos autores, sendo assertiva geral, senão
unânime, o fato de que a CIDE deve onerar apenas e tão somente aqueles que pertencem a
determinado grupo econômico, sob pena de inconstitucionalidade. É o que se depreende dos
comentários apresentados pelo ilustre Ricardo Mariz de Oliveira que assevera:
“No caso das contribuições de intervenção, mais se impõe a necessidade de relação ou
vínculo com os respectivos fatos geradores, a partir de que a premissa constitucional para a
instituição dessa espécie tributária é ela ser instrumento da atuação da intervenção da União
numa determinada área” (1).
No mesmo sentido são as palavras do Prof. Marco Aurélio Greco, in verbis:
“Outro parâmetro para exame destas contribuições resulta da circunstância de a intervenção
voltar-se a uma determinada área ou setor da economia. Ou seja, a contribuição supõe a
existência de um grupo atrelado à finalidade que se quer alcançar. Tratando-se de figura
voltada a um grupo, disto decorre que os contribuintes devem fazer parte do conjunto
alcançado pela intervenção.Se os contribuintes, indicados na lei que instituir a contribuição,
não fazem parte do grupo ao qual a finalidade diretamente se atrela, das duas uma: ou falta
racionalidade à exigência, o que fere o princípio da razoabilidade e a garantia do devido
processo legal material; ou o grupo é mais amplo do que aparenta ser, dele fazendo parte
também os contribuintes indicados na lei. Na segunda hipótese, se o grupo é mais amplo do
que pareceria à primeira vista, então é necessário proceder a um novo exame para verificar
se há cabimento da intervenção nesse grupo mais amplo etc., lembrando-se que, a meu ver,
existe um limite para a ampliação do grupo, pois pode-se chegar ao ponto de não mais ser
uma ‘parte’ da coletividade, mas ela toda, o que faz desaparecer a intervenção enquanto
tal.”(2)
Em resumo, podemos inferir que a normatização precisa e objetiva dos sujeitos posicionados
no pólo passivo da relação tributária é elemento indispensável à caracterização da CIDE, sob
pena inconstitucionalidade da mesma.

24
Partindo dessa premissa, caberia avaliar o conceito de “grupo econômico”. A análise do
vocábulo em abstrato poderia levar à “elasticidade” vislumbrada nas palavras do Prof. Marco
Aurélio Greco, qual seja, a possibilidade de entender que o grupo econômico afetado pela
CIDE – caracterizado como contribuinte – poderia abranger qualquer conjunto de pessoas,
físicas ou jurídicas, que tenham algum elemento em comum. Ressalve-se, porém, que o
próprio autor alerta que o excesso na definição do pólo passivo da relação tributária - quer
dizer, a inclusão de pessoas que não tem relação direta com a atividade objeto da
intervenção - poderá resultar na afronta ao princípio da razoabilidade, quiçá na
descaracterização da finalidade interventora da contribuição, e por conseguinte, em sua
inconstitucionalidade. Diante da dificuldade de conceituar “grupo econômico” em abstrato,
socorremo-nos da análise das CIDEs recentemente instituídas.
No setor de Telecomunicações, foram instituídas duas contribuições, quais sejam o FUST e o
FUNTTEL. Em ambos os casos, definiu a legislação instituidora que são contribuintes as
empresas prestadoras de serviços de telecomunicações. Nesse caso, é obvia a oneração de um
grupo específico que exerce a mesma atividade econômica, tanto mais pelo fato de ser dita
atividade pública explorada em regime privado por meio de concessão, permissão ou
autorização. Parece-nos também sustentável a função interventora das contribuições citadas.
No caso do FUST, a regulação mercadológica se dá pelo subsídio na prestação de serviços de
telecomunicação que, sem tal apoio, são economicamente inviáveis. No caso do FUNTTEL, a
atividade estatal se consubstancia no fomento de processos de inovação tecnológica, na
capacitação de recursos humanos, na geração de empregos e promoção de acesso de
pequenas e médias empresas a recursos de capital, de modo a ampliar a competitividade da
indústria brasileira de telecomunicações.
A precisão na definição do grupo econômico onerado, a nosso ver, não se manteve na
instituição da CIDE sobre os contratos de transferência de tecnologia. A Lei nº 10.168, de 29
de dezembro de 2001, dispõe que são contribuintes as pessoas jurídicas detentoras de licença
de uso ou adquirente de conhecimentos tecnológicos, bem como aquela signatária de
contratos que impliquem transferência de tecnologia, firmados com residentes ou
domiciliados no exterior. Não há de se dizer que os contribuintes exercem atividades
similares ou têm características comuns, restando como único elemento de ligação a posse ou
propriedade de conhecimentos tecnológicos. Tampouco conseguimos identificar com precisão
a função regulatória visto que a incidência não regula, nem equaliza, nem incentiva o grupo
econômico onerado, representando, a nosso ver, mero instrumento de captação de recursos
para subsídio da indústria nacional, em clara afronta aos princípios constitucionais da
razoabilidade, da isonomia e da capacidade contributiva.

2. A APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA ISONOMIA


Assentado o conceito de grupo econômico, caberia discutir a aplicação do princípio
constitucional da isonomia, garantidos no art. 5º (conceito genérico) e, em especial, no art.
150, II da Constituição Federal vigente (princípio da isonomia tributária). Vale a reprodução
do inciso citado do art. 150:
“Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos
Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I – [...]
II – instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação
equivalente, proibida qualquer distinção em razão da ocupação profissional ou função por
eles exercida, independente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;”
Da inteligência do texto reproduzido, importante destacar a proibição do tratamento desigual
a contribuintes que se encontrem em situação equivalente. Não se dispõe sobre proibição
genérica, a todos os contribuintes, sob pena de inviabilização da CIDE, que pressupõe
a oneração de determinado grupo ou setor econômico. Isonomia absoluta eliminaria

25
igualmente a aplicação do princípio da capacidade contributiva como elemento diferenciador
dos contribuintes. Portanto, só nos cabe a interpretação teleológica da Carta Magna,
conjugando a isonomia com a capacidade contributiva.
Uma vez que, conforme já discorrido, um dos elementos identificadores e validadores da CIDE
é a oneração de contribuintes que são semelhantes, i.e. aqueles que por conjugarem
características e operações similares podem ser enquadrados em um mesmo grupo
econômico, concluímos ser aplicável o princípio da isonomia tributária. Em outras palavras,
embora a CIDE onere apenas uma parte das pessoas físicas ou jurídicas, e nesse momento é
discriminatória, não pode tratar de maneira desigual aqueles que fazem parte do “grupo
econômico” onerado, estando vedada inclusive a concessão de benefício de isenção ou similar
a parte dos membros do grupo, sob pena de inconstitucionalidade.
Cremos que essa é a mesma conclusão apresentada em parecer de autoria do Dr. Luis
Eduardo Schoueri, in verbis:
“Cogita-se, aqui, de uma atividade estatal a ser financiada por um grupo de pessoas.
Conquanto inaplicável a igualdade tributária (já que se discrimina um grupo, que passa a ser
tributado, enquanto outros não o serão), o princípio geral da igualdade exige um fator de
discrimen, implicando, em síntese, a igualdade dentro do próprio grupo.”(3).
No mesmo sentido leciona Paulo Roberto Lyrio Pimenta ao entender que
“O princípio da isonomia necessariamente deverá ser aplicado às contribuições sob exame.
Entretanto, como estas atingem determinado grupo econômico, o exame da observância da
regra isonômica deve ser interno, ou seja, deve considerar os indivíduos do grupo, não
podendo ser confrontados com outros setores, ou grupos.” (4).
Refutamos entendimento no sentido de que um eventual tratamento desigual teria a função
regulatória. O exercício da intervenção, do equilíbrio ou incentivo do setor dar-se-á pela
aplicação dos recursos arrecadados e não pela discriminação na arrecadação. Além de
afrontar a isonomia, a discriminação na arrecadação inviabilizaria a manipulação dos
montantes dos subsídios a serem disponibilizados a cada ente, inviabilizando, por
conseguinte, a calibragem do mercado. Tampouco concordamos com interpretação que
sustenta que o benefício desonerador genérico visa atender a capacidade contributiva de
cada membro do grupo. O atendimento da capacidade de contribuição se dá pela aplicação
de alíquotas e base de cálculo progressivas ou pela concessão de isenções específicas
pautadas em critérios objetivos e aplicáveis a todos os contribuintes que satisfaçam a ditos
critérios. Aliás, cremos ser esse o ensinamento de Mizabel Derzi, in verbis:
“É altamente controvertido separar o que seja igual do desigual, pois sujeitos os conceitos a
variações histórico-culturais. Não obstante, o preceito da igualdade, disposto na Constituição,
já é dotado de substância e conteúdo jurídico: é vedado distinguir os homens segundo o sexo,
a raça, etc... que sob tal aspecto são juridicamente iguais. E os iguais devem ser igualmente
tratados, pois diz a norma que os homens, diferindo em sexo, ou credo religioso, são iguais.
Esse é o enfoque do princípio da igualdade mais corrente: uma proibição de distinguir. As
características de generalidade e abstração da norma estão a seu serviço.(...) Interessa, pois,
muitas vezes, saber em que casos o princípio da igualdade prescreve uma atuação positiva do
legislador, sendo-lhe vedado deixar de considerar as disparidades advindas dos fatos (a que se
ligam necessariamente as pessoas) para conferir-lhes diferenciação de tratamento. É
necessário saber quais as desigualdades existenciais que são também desigualdades jurídicas,
na medida em que não se sujeitam a uma ignorância legislativa.(...) Alguns autores analisam-
na exclusivamente sob o aspecto negativo. É aliás, o enfoque corrente. Celso Bandeira de
Mello, não obstante o brilhantismo do tratamento que dispensou à matéria, também deu-lhe
a seguinte abordagem: ‘é vedado ao legislador distinguir’. Mas a isonomia, com relação ao
Direito Tributário, deve ser formulada também, necessariamente, de maneira positiva. (...) A
questão torna-se tanto mais importante quanto se sabe que, na ordem dos fatos, a
desigualdade econômica é dado inegável, com ela convive e dela se alimenta o sistema
capitalista, suporte e estrutura do atual regime jurídico. ‘Pode’ ou deve o legislador

26
considerar tais diferenças advindas dos fatos? Se a resposta for apenas ‘pode’, então o
princípio da igualdade (no sentido material) não tem significado especial para o Direito
Tributário. Em matéria fiscal, interessa menos saber o que o legislador está proibido de
distinguir e mais o que ele deve incriminar. (...) (...) só há tratamento igual aos desiguais,
como dizia o grande mestre e príncipe do Direito brasileiro, que é Rui Barbosa, em matéria
tributária, ‘se cada qual tiver de contribuir com imposto, de acordo com sua capacidade
contributiva.’ (Geraldo Ataliba, “Do Sistema Constitucional Tributário”, in Curso sobre Teoria
do Direito Tributário, São Paulo, Tribunal de Impostos e Taxas, 1975, p. 251). Por que deve o
legislador considerar disparidades? Para nós, a juridicidade da capacidade contributiva
resulta, como vimos, do lado positivo do princípio da igualdade: o dever imposto ao legislador
de distinguir disparidades. Vimos, com Uckmar, que, universalmente, a isonomia é aceita
como a igualdade de direitos e deveres dos cidadãos. Ora, o tributo é um dever. Um dever de
que natureza? Um dever obrigacional, cuja característica é ser econômico, patrimonial. O
levar dinheiro aos cofres públicos. O que se postula é puramente que esse dever seja idêntico
para todos, importe em sacrifício igual a todos os cidadãos. Profundamente infratora do
princípio em estudo seria a norma tributária que criasse um imposto fixo, incidente sobre os
rendimentos auferidos no ano anterior, cuja prestação fosse quantitativamente idêntica para
todos os contribuintes, independentemente do valor desses rendimentos. E tanto mais odiosa
seria a norma quanto mais gravoso fosse o tributo, representativo de leve encargo para os
ricos e de insuportável dever para os pobres, pois ela excluiria do peso fiscal apenas as
pessoas que não obtivessem qualquer rendimento. (...) Temos, por conseguinte, dois
marcos limitadores obrigatórios, que constrangem o legislador a considerar as disparidades
advindas dos fatos. O primeiro deles delimita o ponto a partir do qual se inicia o poder
tributário e que deve estar sempre acima da renda mínima, indispensável à subsistência.
Delimita, pois, onde se inicia a capacidade contributiva. O segundo circunscreve a esfera da
capacidade contributiva do sujeito passivo. Extrema o texto máximo o ponto além do qual,
por excesso, o tributo torna-se confiscatório. O direito de propriedade encontra-se no limite
da área da capacidade contributiva. A norma tributária que exceder os marcos referidos é
inconstitucional, exatamente por ignorar desigualdades. Desigualdades que não são colocadas
artificialmente nas normas, mas são disparidades econômicas advindas dos fatos que devem
ser pesados pelo legislador ordinário. (...) Sendo assim, o lado positivo da igualdade (dever de
distinguir desigualdade) impõe-se seja o tributo, quantificado segundo a capacidade
contributiva de cada um, que é diversificada, e o lado negativo do princípio (dever de não
discriminar) constrange o legislador a tributar, de forma idêntica, cidadãos de idêntica
capacidade contributiva. Os aspectos negativo e positivo do princípio da igualdade
miscigenam-se continuamente, constrangendo o legislador ordinário a criar os mesmos
deveres tributários para aqueles que manifestarem idêntica capacidade contributiva.
Configuram, pois, os requisitos de generalidade e proporcionalidade da norma tributária.”(5)
(grifos nossos).
Com base nos argumentos até agora apresentados, temos, em resumo, que:
- A constitucionalidade da CIDE está submetida, dentre outras, a duas premissas, quais sejam,
a apresentação da finalidade (intervenção estatal) e a precisa definição do grupo econômico
onerado, haja vista que atividades estatais difusas ou genéricas devem ser subsidiadas pelos
impostos e não por CIDE;
- Definido o grupo econômico onerado, restaria aplicável o princípio da isonomia, não se
admitindo, sob pena de inconstitucionalidade, o tratamento desigual de membros desse grupo
econômico, tampouco se admitindo, obviamente, a desoneração seletiva de membros desse
grupo.

3. A APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA ISONOMIA NA INTERPRETAÇÃO DA LEGISLAÇÃO DO FUST


Como anteriormente exposto, os dispositivos regulamentadores do FUST (Lei nº 9.998, de 17
de agosto de 2000), a nosso ver, definem com precisão o grupo econômico onerado (as
empresas prestadoras de serviços de telecomunicações) e a atividade estatal interventora,

27
não havendo de se suscitar inconstitucionalidade material das referidas CIDEs em relação a
tais elementos fundamentais. A dúvida que surgiu no mercado refere-se a norma específica
que, no entender de alguns, criaria hipótese de isenção, e sua validade jurídica face ao
princípio da isonomia tributária.
Para possibilitar o entendimento do tema, partiremos da reprodução de artigos que definem
os contribuintes. A Lei do FUST dispõe, in verbis:
“Art 6º Constituem receitas do Fundo:
I -[...];
IV - contribuição de um por cento sobre a receita operacional bruta, decorrente de prestação
de serviços de telecomunicações nos regimes público e privado, excluindo-se o Imposto sobre
Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transportes
Interestadual e Intermunicipal e de Comunicações - ICMS, o Programa de Integração Social -
PIS e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - Cofins;
[...]”
O Decreto Nº 3.624, de 5 de outubro de 2000, que regulamentou o FUST dispõs que:
“Art 7º Constituem receitas do Fust:
I -[...];
IV - contribuição de um por cento sobre a receita operacional bruta, decorrente de prestação
de serviços de telecomunicações nos regimes público e privado, excluindo-se o Imposto sobre
Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte
Interestadual e Intermunicipal e de Comunicações - ICMS, o Programa de Integração Social -
PIS e a Contribuição para o Financiamento da Seguridadde Social - COFINS;
[...]
Art 8º A contribuição ao Fust de que trata o inciso IV do art. 7º deste Decreto é devida por
todas as prestadoras de serviços de telecomunicações, à alíquota de um por cento sobre o
valor da receita operacional bruta de cada mês civil, decorrente da prestação dos serviços de
telecomunicações de que trata o art. 60 da Lei nº 9.472, de 1997, nos regimes público e
privado, e deverá ser paga até o décimo dia do mês seguinte ao de apuração” (grifo nosso).
Observa-se que o texto legal reproduzido deixa claro que todas as prestadoras de serviços de
telecomunicações são contribuintes da CIDE. Caberia questionar:
- Qual teria sido o intuito do legislador ao usar o termo “todas” se não explicitar o princípio
da isonomia tributária?
- Por que não reproduzir, no decreto, o texto da lei, sem a necessidade da ressalva (que
colocamos em negrito)?
Parece-nos razoável afirmar que a inclusão da frase “é devida por todas as prestadoras de
serviços de telecomunicações” tem por objetivo explicitar a sujeição desta CIDE ao princípio
da isonomia, embora tal cuidado legislativo fosse dispensável uma vez que a aplicação do
princípio decorre de previsão constitucional.
Superada e confirmada a aplicação do princípio constitucional da isonomia, resta saber se a
legislação vigente criou hipótese de isenção e se tal hipótese está em consonância com os
mandamentos da Lei Maior.
O § único do art. 6º da Lei nº 9.998/2000 dispõe, in verbis:
Art 6º [...]
Parágrafo único. Não haverá a incidência do Fust sobre as transferências feitas de uma
prestadora de serviços de telecomunicações para outra e sobre as quais já tenha havido o

28
recolhimento por parte da prestadora que emitiu a conta ao usuário, na forma do disposto no
art. 10 desta Lei.”
O decreto regulamentador anteriormente citado traz os seguintes mandamentos:
Art 7º Constituem receitas do Fust:
§ 1º [...]
§ 2º Não haverá a incidência da contribuição de que trata este artigo sobre as transferências
feitas de uma prestadora de serviços de telecomunicações para outra e sobre as quais já
tenha havido o recolhimento por parte da prestadora que emitiu a conta ao usuário, nos
termos da regulamentação emitida pela Agência Nacional de Telecomunicações.”
Preliminarmente vale destacar que, a nosso ver, o legislador não foi feliz nos termos
utilizados. Ainda que se considere que as normas ora reproduzidas criam benefício
desonerador, deve-se concluir que tal benefício seria uma isenção e não uma não incidência.
Se o benefício está sujeito à existência de recolhimento pretérito, inaplicável o instituto da
não incidência.
Considerada essa ponderação, é de se reconhecer, que o texto legal em comento poderia
levar o intérprete a concluir que o legislador pretendeu conceder o benefício da isenção, mas
como compatibilizar tal conclusão com o princípio da isonomia? Vejamos como é o
funcionamento do setor de telecomunicações.
Segundo a regulamentação em vigor, o mercado está dividido em nichos territoriais
explorados em regime de duopólio (serviços de telefonia fixa comutada e telefonia celular) ou
de livre concorrência (serviços de dados). Qualquer que seja o modelo, é característica da
atividade a prestação de serviços por diversas empresas em regime de consórcio necessário
(não no sentido jurídico do termo, mas no sentido econômico-operacional). O modelo de
privatização adotado no Brasil fez com que os meios de produção (nesse caso, as redes de
telecomunicações) fossem entregues a pessoas jurídicas distintas. Dessa forma, uma empresa
não têm como oferecer serviços de telecomunicação a um consumidor sem contar com os
recursos (redes) dos demais “players” do mercado. Uma empresa consegue coletar uma
chamada na origem (onde dispõe de rede própria) mas terá que se utilizar da rede de
terceiros para entregar o tráfego no destino se não dispuser de rede local. No caso da Intelig
e da Embratel tal situação é típica, uma vez que nenhuma das duas dispõe do acesso local
(acesso ao domicílio do consumidor – conhecido como “last mile”). Atendendo a essa
característica, os órgãos reguladores do setor estabeleceram as regras de interconexão
técnica das redes das operadoras e os parâmetros de remuneração pela utilização de rede de
terceiro para prestação de serviços ao consumidor final.
Em termos gráficos teríamos:
Cliente -> Operado (A)-> Operadora B -> Destinatário da ligação
(1) - cliente toma serviços da operadora (A) não se estabelecendo nesse momento qualquer
relação jurídica com a operadora (B)
(2) - operadora (A) repassa a ligação para a operadora (B) que é que têm os meios de rede no
destino da ligação
(3) - operadora (B) completa a ligação
(4) - operadora (A) cobra do cliente o valor total da ligação
(5) - operadora (A) repassa parte do valor cobrado do consumidor final à operadora (B) a
título de remuneração pelo completamento da chamada
É importante destacar que, embora apenas uma operadora preste serviços ao consumidor
final, as duas prestam serviços de telecomunicação.
Voltemos pois às normas reguladoras do FUST. O dispositivo que define os contribuintes
determina que todas as prestadoras dos serviços de telecomunicações são oneradas. No

29
exemplo acima, tanto (A) quanto (B) são contribuintes. Interpretando a regra do art. 7º do
Decreto nº 3.624/2000 – “Não haverá a incidência da contribuição de que trata este artigo
sobre as transferências feitas de uma prestadora de serviços de telecomunicações para outra
e sobre as quais já tenha havido o recolhimento por parte da prestadora que emitiu a conta
ao usuário” - poder-se-ia suscitar que (B) não seria onerado pela contribuição. Se todos são
contribuintes, mas alguns estariam beneficiados pela isenção, então nem todos são
efetivamente contribuintes. Essa conclusão afronta o princípio da isonomia? A nosso ver sim.
Se tal tivesse sido o intuito do legislador, estaria criada uma casta de operadoras de
telecomunicação não oneradas pela contribuição, uma parte do grupo econômico tratada com
privilégios sem qualquer relação com sua capacidade contributiva. Se essa é a única
interpretação cabível ao artigo, restaria o mesmo inaplicável por afronta a Constituição
Federal. Finalmente, se tal regra fosse uma isenção, não caberia condicioná-la ao
cumprimento de obrigação de outro contribuinte, sob pena de confusão de fatos geradores
distintos e violação do autonomia dos contribuintes.
Conquanto nos pareça correto concluir pela inconstitucionalidade art. 6º da Lei nº 9.998/2000
e do § 2º do Decreto nº 3.624/2000, por dever de ofício, cabe-nos avaliar a possibilidade de
interpretação sistêmica das regras em questão com sujeição ao princípio da isonomia e da
capacidade contributiva.
Do ponto de vista prático, a operação exemplificada no gráfico desenrola-se em duas fases,
dois negócios jurídicos distintos, quais sejam (a) relação consumidor – Empresa (A) e; (b)
relação Empresa (A) – Empresa (B). Se, por exemplo, o valor cobrado ao consumidor final pela
empresa (A) é R$ 100,00, admita-se que R$ 20,00 devem ser repassados à empresa (B) a título
de remuneração pelo completamento da chamada. Se todas as empresas são contribuintes e
atendendo à capacidade contributiva de cada uma, pode-se concluir que a empresa (A)
deveria contribuir considerando como base de cálculo R$ 80,00 e a empresa (B) deveria
contribuir considerando como base de cálculo R$ 20,00. Estariam indubitavelmente cumpridos
os princípios da isonomia (ambas estariam contribuindo) e da capacidade contributiva
(cada qual estaria contribuindo com base na remuneração que lhe cabe). Nessa hipótese, só
restaria concluir que o art. 6º da Lei nº 9.998/2000 e o § 2º do Decreto nº 3.624/2000 criaram,
em verdade, hipótese de retenção da CIDE na fonte. Assim, quando a empresa (A) recebe R$
100,00 deverá, antes do repasse dos R$ 20,00 para a empresa (B) fazer a retenção da
contribuição devida pela empresa que completou a ligação. Essa alternativa nos parece ainda
mais plausível face à condição prevista nos dispositivos em tela “Não haverá a incidência da
contribuição..... . sobre as quais já tenha havido o recolhimento por parte da prestadora que
emitiu a conta ao usuário”. Parece-nos óbvio que não há descaracterização do contribuinte.
O contribuinte é aquele que presta os serviços de telecomunicação. No nosso exemplo, tanto
a empresa (A) quanto (B) são contribuintes, porém, se (A) fizer a retenção e recolhimento da
CIDE incidente sobre os valores a serem repassados a empresa (B), essa estaria desobrigada ao
recolhimento. É de se reconhecer que a texto legal sob análise é de difícil interpretação e
que a caracterização do instituto da retenção da CIDE na fonte é um exercício de criatividade
que visa sujeitar o texto legal aos princípios constitucionais.

4.CONCLUSÃO
Com base em todo o exposto, cremos ser possível concluir que:
- O FUST, por ser uma CIDE, deve submeter-se ao princípio da isonomia tributária e o fez ao
considerar que a contribuição é devida por todas as prestadoras de serviços de
telecomunicações;
- Se o § único do art. 6º da Lei nº 9.998/2000 e art. 7º do Decreto nº 3.624/2000 criaram
hipótese de isenção, então tais dispositivos tratam de maneira desigual membros do mesmo
grupo econômico em afronta ao princípio da isonomia tributária. Por conseguinte, tais regras
são inconstitucionais;

30
- Se os dispositivos citados não tratam da criação de benefício aplicável a um grupo de
operadoras conciliando a tributação com o princípio da isonomia, então há de se concluir que
criaram uma hipótese de retenção da contribuição na fonte.

NOTAS
1.Parecer apresentado na obra “Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico e Figura
Afins – Coordenador Marco Aurelio Greco” – São Paulo – Ed. Dialética – 2001
2Parecer apresentado na obra “Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico e Figura
Afins – Coordenador Marco Aurelio Greco” – ob cit.
3.Parecer apresentado na obra “Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico e Figura
Afins – Coordenador Marco Aurelio Greco” – ob cit.
4.Parecer apresentado na obra citada no item 3 acima.
5.Do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana em co-autoria com Sacha
Calmon – São Paulo – Ed. Saraiva – 1982

31
Universidade do Sul de Santa Catarina - UNISUL
Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes – REDE LFG

Curso de Especialização Telepresencial e Virtual em Direito


Tributário

Disciplina

Sistema Constitucional Tributário: Princípios e


Imunidades

Aula 4

LEITURA FACULTATIVA 3
ALBERTO MONTEIRO ALVES
Advogado em Minas Gerais

ALCANCE DO PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA (ART. 145, §


1º,CF)

Como citar este artigo:

ALVES, Alberto Monteiro. Alcance do princípio da capacidade


contributiva art. 145, § 1º, CF). Disponível em:
http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1294. Material da 4ª
aula da Disciplina Sistema Constitucional Tributário: Princípios e
Imunidades, ministrada no Curso de Especialização Telepresencial e
Virtual de Direito Tributário - UNISUL - REDE LFG.

32
Qual o alcance do princípio da capacidade contributiva, abrigado no artigo 145, § 1º da
Constituição Federal?
O tema da capacidade contributiva vem sendo discutido há muito pela doutrina.
No Brasil, o assunto foi objeto de acirrados debates por parte dos especialistas a partir da
Constituição Federal de 1946, onde coloca, através do art. 202, o princípio segundo o qual os
tributos deveriam ser graduados conforme a capacidade econômica dos contribuintes.
A Emenda Constitucional nº 18, de 1º de dezembro de 1965, retira o dispositivo do texto
constitucional; o mesmo aconteceu com a Carta de 1967 e a Emenda nº 1, de 1969.
A Constituição de 1988, traz, dentre suas inúmeras virtudes, a de devolver ao princípio da
capacidade contributiva a atenção constitucional que este tema requer.
Este princípio encontra importantes aplicações nas relações entre o isco e o contribuinte,
constituindo-se no centro do Estado de Direito no campo tributário.
Apesar de norma fundamental, a linha de contorno não está suficientemente bem definida,
gerando dúvidas no seu campo de aplicação quanto aos seus efeitos.
A capacidade contributiva envereda por caminhos diversos de outros princípios e institutos
jurídicos.
O ART. 145, § 1º , DA CF:
“Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os
seguintes impostos:
§ 1º. Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a
capacidade econômica do contribuinte, facultado a administração tributária, especialmente
para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e
nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.”

O PRINCÍPIO DA PESSOALIDADE
Os impostos sempre que possível, terão caráter pessoal e graduados segundo a capacidade
econômica (contributiva) dos contribuintes.
Diz o Mestre Sacha que: “... Ao falar em pessoalidade, o contribuinte rendeu-se às
classificações pouco científicas da Ciência das Finanças. Nem por isso o seu falar é destituído
de significado.
Dentre as inúmeras classificações dos impostos, avultam-se duas, de resto muito em voga:a
que divide os impostos em pessoais e reais e a que os divide em diretos e indiretos.”(Do livro
Comentários à Constituição de 1988 - Sistema Tributário; Sacha Calmon Navarro Coêlho; pág.
88.).
O caráter pessoal, da Constituição, significa que a pessoa tributada tenha o imposto incidente
nas suas características pessoais, que não possa ele, pessoa, transferir, repassar a terceiros.
Quando o legislador se achar em face de opções, escolher obrigatoriamente aquela que feche
o imposto num contribuinte, a um só tempo de jure (apontado pela lei) e de fato (o que sofre
o peso do encargo tributário). O princípio há de ter, também, um mínimo de eficácia (Idem,
pág. 90).

O PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA


Significação do termo CAPACIDADE JURÍDICA.
Pode ser dada, sem distinção, no Plano Jurídico-Positivo; Ético-Econômico e Técnico-
Econômico.

33
No Plano Jurídico-Positico, a capacidade contributiva significa que um sujeito é titular de
direitos e obrigações com fundamento na legislação tributária vigente, que é quem vai definir
aquela capacidade e seu âmbito.
No Plano Ético-Econômico relaciona-se com a justiça econômica material. Aqui a capacidade
contributiva é a aptidão econômica do sujeito para suportar ou ser destinatário de impostos,
que depende de dois elementos:
• Volume de Recursos que o sujeito possui para satisfazer o gravame; e
• A Necessidade que tem de tais recursos.
No Plano Técnico-Ecônomico, são considerados todos os princípios, regras, procedimentos e
categorias relativas a operacionalidade e eficácia arrecadatória dos tributos. Segunda esta
concepção tem capacidade tributária aqueles que:
• Constituam unidades econômicas de possessão e de emprego de recursos produtivos ou de
riqueza;
• sejam facilmente identificáveis e avaliados pela Fazenda Pública como suscetíveis de
imposição; e
• estejam em situação de solvência presumidamente suficiente para suportar o tributo.

O Conceito de Capacidade Contributiva.


A Capacidade Contributiva é a possibilidade econômica de pagar tributos, (ability in pay).
Podemos dividi-la em subjetiva e objetiva.
• Subjetiva ou relativa diz-se quando estão consideradas as pessoas, é a chamada
capacidade econômica real, desta forma o sujeito é individualizado na medida das
possibilidades econômicas. Neste plano esta a concretude da capacidade contributiva, o
sujeito está apto para absorver a carga tributária.
• Objetiva ou absoluta diz-se quando leva em consideração “manifestações objetivas da
pessoa”, numa manifestação de riqueza, nessa forma, o legislador aponta os eventos que
demonstrem aptidão para concorrer às despesas públicas..
Citação de Alberto Xavier:
“Nem todas as situações da vida abstratamente suscetíveis de desencadear efeitos tributários
podem, pois, ser designadas pelo legislador como fatos tributáveis. Este encontra-se limitado
na sua faculdade de seleção pela exigência de que a situação da vida a integrar na previsão
da norma seja reveladora de capacidade contributiva, isto é, de capacidade econômica, de
riqueza, cuja expressão sob qualquer forma se pretende submeter a tributo.
Pode o Legislador escolher livremente as manifestações de riqueza que repute relevantes
para efeitos tributários, bem como delimitá-las por uma ou outra forma mas sempre deverá
proceder a essa escolha de entre as situações da vida reveladoras de capacidade contributiva
e sempre a estas se há de referir na definição dos critérios de medida do tributo.” (Manual de
Direito Fiscal, Vol. I, pág. 108.)
Se os fatos a serem escolhidos pelo legislador como hipóteses da incidência tributária devem
espelhar situações reveladoras de tal capacidade, forçoso é que se refiram, portanto, a
índices ou indicadores de capacidade contributiva, que nada mais são do que signos
indicadores que representam manifestações de riqueza.
Atualmente, os índices de capacidade contributiva indicam sempre à renda, ao patrimônio ou
ao consumo.
Os índices são sempre pares porque diversos são os fatos reveladores da situação econômica
dos sujeitos, argumento que afasta a possibilidade de um imposto único.

34
A capacidade contributiva relativa ou subjetiva atua, inicialmente, como critério de
graduação dos impostos e como limite da tributação permitindo a manutenção do “mínimo
vital”, obstando-se, desta forma, que a progressividade tributária atinja níveis de confisco ou
de cerceamento de outros direitos constitucionais.

O PRINCÍPIO JURÍDICO.
Quanto à capacidade contributiva, o princípio deve ser atuante, permeando os impostos do
sistema. Aliás, a capacidade contributiva, assim como o princípio da isonomia, do direito
adquirido, da irretroatividade das leis, são princípios gerais do direito.
Princípio Jurídico é o expressar lógico que poderá ser explícito ou implícito, de grande
generalidade, é o primordial do Direito a cujo entendimento se faz vincular a conexão das
Normas Jurídicas que se aplicam.Poderemos afirmar, então, que os princípios jurídicos
são normas de maior hierarquia, autênticas sobre normas que orientam a aplicação das
demais.
Citando Agustín Gordillo: “os princípios do direito público contidos na Constituição diferem
das simples normas porque, enquanto a norma é um indicar dentro do qual existe uma certa
liberdade, o princípio tem substância integral. A norma é limite, o princípio é limite e
conteúdo, estabelecendo uma direção estimativa, uma indicação de valor e de
espírito.Naquilo que diz respeito à capacidade contributiva, não se pode negar o fundamento
econômico do conceito, algumas vezes confundidas com “capacidade econômica”, mas não se
pode tirar seu conteúdo jurídico à medida que se encontra unido à idéia de justiça tributária.
“Da lição de Cortés Domingues e Martín Delgado, capacidade econômica absoluta se refere à
aptidão abstrata para concorrer aos gastos públicos, tendo a ver com a definição legal de
quem são os sujeitos e quais os fatos que têm ou indicam a existência daquela idoneidade.
Por outro
lado, capacidade econômica relativa, que supõe a absoluta, se dirige a delimitar o grau de
capacidade, o “quantum”. Opera, pois, no momento de determinações da quota. Nesta
segunda vertente, a capacidade contributiva tem a ver com a aptidão específica e concreta
de cada contribuinte de per si em face dos fatos geradores previstos na lei.”.
O direito como instrumento de poder, tem sido ao longo dos tempos, o instrumento de
opressão, mas devido às altas pressões do mundo moderno estamos chegando aos pontos de
mutação. O Constituinte elegeu como princípio a “capacidade econômica real” do
contribuinte. Essa Capacidade Contributiva tem sede no mundo dos valores.
Na C.F.B. o princípio expressamente consagrado no seu corpo é o da capacidade contributiva,
assim além de constitucional ele é, também, jurídico.
A Capacidade Contributiva apresenta duas estradas éticas que estão no centro do Estado de
Direito:
• A supremacia do ser humano e de suas organizações em face do poder de tributar do
Estado;
• A realização do valor justiça através do valor igualdade, que no campo tributário, só pode
efetivar-se pela prática da Capacidade Contributiva e suas técnicas.

IGUALDADE E CAPACIDADE CONTRIBUTIVA.


O princípio da Isonomia Tributária não tem condição de ser operacionalizado sem a ajuda do
Princípio da Capacidade Contributiva, quando observa-se a capacidade de contribuir das
pessoas físicas e até jurídicas, esta capacidade subordina o legislador e atribui ao Judiciário o
dever de controlar a sua efetivação, enquanto poder de controle da constitucionalidade das
leis e da legalidade dos atos administrativos.

35
De Aristóteles: “em tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida em
que eles se desigualam”, opera como princípio constitucional, onde sofre diversas
interpretações, pela manipulação política diversa.
O princípio da igualdade, mostrado por Ruy Barbosa, em sua Oração aos Moços, 1949, “A regra
da igualdade não consiste senão em quinhoar desigualmente aos desiguais na medida em que
se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se
acha a verdadeira lei da igualdade. O mais são desvarios da inveja, do orgulho ou da loucura.
Tratar com desigualdade a iguais ou a desiguais com igualdade seria desigualdade lagrante e
não igualdade real.”. Incerto nos princípios relativos à capacidade tributária.
Por ser do homem a capacidade de contribuir, a sua medição é pessoal, sendo absolutamente
desimportante intrometer no assunto a natureza jurídica das espécies tributárias. A idéia de
capacidade contributiva, o seu conteúdo, serve de parâmetro para analisarmos o maior ou
menor teor de injustiça fiscal existente nos sistemas tributários.
O princípio da Capacidade Contributiva aliado aos Princípios da Igualdade e da Generalidade
podem atuar para controlar o Legislativo e o Judiciário com referência a tributação
pervertida ou das perversões da extrafiscalidade.
“... As isenções extrafiscais (tanto quanto as isenções iscais “que preservam o necessário
mínimo”), quando não iluminadas por critérios como esses, transformam-se em privilégios
inconstitucionais e são espúrias; desvirtuadas, informam a possível colisão dos regimes de
incentivos com o princípio da igualdade concebido como princípio de capacidade contributiva,
conforme advertência das VI Jornadas Latino-Americanas de Direito Tributário, intitulada Los
Incentivos Tributários Al Desarrollo Econômico. ...”.(Prof. José Marcos Domingues ).
Na opinião de Tércio Sampaio Ferraz Júnior, “o princípio da igualdade imprime um caráter de
racionalidade que preside permanentemente e constantemente o sentido do jogo sem fim do
direito...”( Curso de Direito Constitucional, Celso Bastos, pág. 325).
Celso Antônio Bandeira de Melo, diz que as discriminações são admissíveis quando se verifique
uma correlação lógica entre o fator de discriminação e a desequiparação procedida e que esta
seja conforme os interesses prestigiados pela Constituição. Entende, ele, que para não se
agredir o princípio da isonomia concorrerão quatro requisitos.
• que a discriminação não atinja de modo atual e absoluto um só indivíduo;
• que o fator de desigualação consista num traço diferencial residente nas pessoas ou
situações, vale dizer, que não lhes seja alheio;
• que exista um nexo lógico entre o fator de discriminação e a discriminação legal
estabelecida em razão dele; e
• que, no caso concreto, tal vínculo de correlação seja pertinente em função dos interesses
constitucionalmente protegidos, visando o bem público, à luz do texto constitucional.
É no ideal de justiça que se inspira o princípio da igualdade, cujo conteúdo, por sua vez, é
integrado no Direito Tributário pelo princípio da capacidade contributiva, determinando-se
desta forma o profundo sentido ético-jurídico do tributo, que não poderá fugir ao que
Heinrich Kruse denomina princípio da justiça da imposição, cuja interpretação, cabe ao Poder
Judiciário.
Ora, se um tributo violar a capacidade contributiva estará desrespeitando a própria isonomia
constitucional e a diretriz de Justiça, fiscal, de que se reveste o princípio.Justiça e Igualdade,
além de princípios jurídicos, são sentimentos próprios da condição humana, vivificados
concretamente, e que permeiam imperceptivelmente as constituições democráticas, na
esteira de formulações vagas e aparentemente vazias como a cláusula due process of law
(devido processo legal).
Relacionamento com outros Princípios Constitucionais.

36
O maior relacionamento, deste princípio, com os princípios da legalidade, tipicidade,
segurança pública não poderiam deixar de ser relacionados.
A capacidade contributiva liga-se de maneira coesa e permanente ao princípio da
legalidade.
É a lei que estabelecerá as hipóteses de incidência dos impostos, tomando como base o
delineamento genérico da Norma Constitucional e observando que a idéia de tributar esta em
razão direta com a riqueza dos indivíduos.
O princípio da tipicidade é uma forma de império constitucional, delimitando pelos modelos
ou tipos a forma pelas quais deverão ser ajustadas as situações, nas quais incidirão os efeitos
tributários, da lei.
O conceito de fato tributário caracteriza-se por um requisito formal, “a tipicidade”, e por um
requisito material, a capacidade contributiva.
O Princípio da Segurança Pública está ancorado nos postulados de certeza e da igualdade,
exige que as discriminações efetuadas pela lei tributária apresentem relação de causalidade
entre a discriminação eleita e a distinção procedida em razão dela, o que ocorre na aplicação
da capacidade contributiva, “maior riqueza, maior carga tributária”.
A Natureza da Norma Acolhedora do Princípio.
Com sede constitucional, a atuação do legislador infraconstitucional e do magistrado estão
vinculados. Para o primeiro, ela é obrigatória na medida em que ele só poderá eleger fatos
que demonstrem capacidade econômica para a composição das hipóteses de incidência
tributária, se observar as regras matrizes de incidência desenhadas na Constituição, para o
segundo, a norma é compulsória no sentido de cumprir à magistratura declarar a aludida
inconstitucionalidade, bem como à inexistência ou insuficiência da efetiva capacidade
contributiva, no caso concreto.
Concretizando melhor, a positividade jurídico-constitucional das normas programáticas
significa fundamentalmente:
• Vinculação do legislador, de forma permanente, à sua realização, imposição constitucional.
• Como diretivas materiais permanentes, elas vinculam positivamente todos os órgãos
concretizadores, devendo este tomá-las em consideração em qualquer dos momentos da
atividade concretizadora, (legislação, execução, jurisdição).
• Como limites negativos, justificam a eventual censura, sob a forma de
inconstitucionalidade, em relação aos atos que as contrariam.
O caráter programático de certas normas constitucionais não retira o caráter destas outras
normas, já que todas elas possuem eficácia. No capo tributário, de princípio de maior
amplitude, que é o da igualdade, o postulado da capacidade contributiva carrega consigo a
plenitude de eficácia atribuída àquele. Na verdade, se não há discordância quanto à eficácia
plena e a aplicabilidade direta, imediata e integral do princípio da igualdade, parece
desarrazoado entender-se diversamente no que concerne à diretriz da capacidade
contributiva.
O estudo dos tributos exige, em todas as suas manifestações fundamentais, a observância ao
princípio da legalidade, art.. 150, I, CF. Logo, a intermediação legislativa é essencial à
dinâmica da tributação, uma vez que, somente assim, é viável a instituição de tributos.
A Eficácia do Princípio.
Os principais efeitos da aplicação da capacidade contributiva é o poder de limitar a
tributação e assegurar os direitos subjetivos do contribuinte.
Esta regra se faz relacionar com institutos básicos do direito tributário, tais como a
capacidade tributária e o critério quantitativo da hipótese de incidência.

37
Sendo o imposto a espécie tributária cuja hipótese de incidência consiste “num fato qualquer
que não se constitua numa atuação estatal”, já se compreende que essa modalidade de
cobrança rigorosa de impostos só pode fundar-se na capacidade contributiva do sujeito
passivo, (contribuinte). O contribuinte, indicador de riqueza que não foi, de nenhuma
maneira, provocada ou proporcionada pelo Poder Público é a única diretriz que pode ser
seguida pela tributação não vinculada a uma atuação estatal.
Geraldo Ataliba grifa que a capacidade contributiva é o único critério para a modulação dos
impostos; “todos os outros eventuais critérios que possam ser adotados pelo legislador e que
não levem em conta a capacidade contributiva, são arbitrários e, por via de conseqüência,
inconstitucionais”.
Como princípio informador dos impostos, a capacidade contributiva dá a tendência de
personalização dos mesmos. Desse modo, deverão ser observados e considerados, o mais
possível, as condições pessoais dos contribuintes.
A personalização do imposto há de ser observada sempre que a estrutura do aspecto material
da hipótese de incidência o comporte, mesmo que se esteja diante dos chamados impostos
reais.
A capacidade tributária passiva é a habilitação que a pessoa titular de direitos fundamentais
tem para ocupar o papel de sujeito passivo de relações jurídicas de natureza fiscal. Gozar de
capacidade tributária passiva não é suficiente para qualificar um sujeito passivo para
responder pelo gravame tributário. Não é porque alguém está indicado como sujeito passivo
da relação tributária que poderá ser alcançado. Temos de verificar se estão presentes todas
as condições que o farão de um sujeito passivo potencial em um contribuinte efetivo.
O legislador deve colocar como sujeito passivo, nos impostos, a pessoa cuja capacidade
contributiva é manifestada pelo fato tributário: “o sujeito passivo é alguém de alguma forma
relacionado com o fato posto como aspecto material da hipótese de incidência, de modo que
se finira ser o titular da capacidade contributiva onerada”.(Geraldo Ataliba & Cléber
Giardino, RDT 38/143)
Becker adverte que “o dever jurídico que a regra constitucional impõe ao legislador ordinário
não é apenas o de escolher fatos-sígnos presuntivos de renda ou capital para a composição da
hipótese de incidência do tributo, mas também e principalmente o dever de criar isenções
tributárias que resguardem a imunidade tributária do mínimo indispensável de capital
e renda,..., assim procedendo, o legislador ordinário cria o conceito jurídico de mínimo
indispensável.” (Teoria Geral do Direito Tributário - Alfredo Augusto Becker, pág. 455 e 456).
São diversas as razões propostas para as isenções:
• Conveniência Prática, imposto improdutivo;
• Justiça Fiscal, não reduzir a capacidade financeira da camada social de baixa renda;
• Compensação Econômico-Financeira, porque o contribuinte de baixa renda é o que suporta
mais duramente o ônus dos impostos indiretos.
A quantia a ser desembolsada pelo sujeito passivo é o resultado de duas grandezas: “a base
de cálculo e a alíquota”.
A base de cálculo deverá dirigir-se para o fato econômico inscrito no círculo da hipótese de
incidência tributária; deverá guardar relação íntima com a capacidade absoluta ou objetiva
determinada pelo legislador.A alíquota é uma fração da base de cálculo que leva ao valor que
o contribuinte deverá desembolsar.
A progressividade está limitada pelo princípio da capacidade contributiva, visando à não
confiscatoriedade e ao não cerceamento de outros direitos.
Os Poderes de Investigação do Fisco no parágrafo e art., tratado neste trabalho, permite ao
Estado-Administração aferir a capacidade contributiva dos grupos de contribuintes e não para
fiscalizá-los em época posterior. Este poder de polícia o Fisco sempre teve, obedecidos os

38
devidos processos e procedimentos legais e respeitados os direitos fundamentais. A
Constituição deseja obrigar a administração cumprir, realizar o princípio da capacidade
contributiva investigando a realidade, sem intuito fiscalizatório dos contribuintes para que
possa preparar os projetos de leis tributárias dentro de um sistema efetivo e justo. Por isto a
CF rejeita as técnicas presuntivas de aferição da capacidade contributiva.O mencionado art.
e seu parágrafo tem por fundamento a justiça distributiva.A capacidade econômica é a
concretização da potencialidade econômica da pessoa, seu relacionamento ou vínculo com o
poder, já a capacidade contributiva leva em conta a capacidade econômica em face da
imposição global ou específica, como um aspecto próprio de um vínculo com o poder
tributante, no interesse coletivo, no dever da solidariedade e na aptidão para realizar o
interesse público.
A graduação segundo a capacidade econômica é sempre possível e a interferência dos Entes
Públicos na contribuição pessoal serve como forma de benefício ou prejuízo daquele que se
quer gravar, sendo exemplo desta figura.A designação do destinatário legal do imposto deve
considerar a efetiva aptidão para contribuir e não a mera idoneidade para ser sujeito passivo
da obrigação tributária.
O conceito de capacidade contributiva é aplicável às pessoas jurídicas, as quais, também, se
inserem no conceito de destinatário legal tributário.
A preservação do mínimo vital é efeito do princípio examinado, correspondendo a uma
isenção
técnica, fundada na ausência de capacidade contributiva, não podendo ser revogada.
As isenções e as imunidades de natureza política constituem verdadeiras exceções ao
princípio, posto que visam beneficiar pessoas que possuem capacidade para contribuir.
A apuração da inconstitucionalidade da imposição tributária no caso concreto, face à
inobservância do princípio da capacidade contributiva, é viável, cabendo ao juiz, negar
efeitos à lei impugnado in casu, quando constatar a ausência de capacidade contributiva
relativa ou subjetiva ou o excesso de carga fiscal sobre determinado sujeito.
A cláusula “sempre que possível”, do art.. 145, § 1º, da Constituição Federal, não quer dizer
que o caráter pessoal dos impostos e sua graduação segundo a capacidade econômica do
contribuinte sejam de adoção facultativa pelo legislador. A pessoalidade dos impostos está
condicionada à viabilidade jurídica de ser considerada a situação individual do sujeito passivo
numa dada hipótese de incidência tributária. Já a graduação dos mesmos consoante a
capacidade econômica somente pode ser completamente afastada ante a tributação exercida
com finalidade extrafiscal.
A alusão constitucional à capacidade contributiva não se resume ao preceito contido em seu
artigo 145, § 1º. Diversos dispositivos do texto fundamental prestigiam tal idéia mediante
outros instituto, como a vedação à utilização de tributo com efeito de confisco, art.. 150, IV,
a progressividade expressa do IR, art. 153, § 2º, I, e II e 155, § 2º, I e III, e a fixação de um
salário mínimo, art.. 7º, IV.
A noção de capacidade contributiva afina-se com outros direitos constitucionais além do
direito de propriedade, com o qual guarda relação necessária.

CONCLUSÃO
Os Princípios Constitucionais do Poder de Tributar
Todos os princípios abaixo relacionado envolvem-se diretamente com o Sistema Tributário
Nacional e são ditos gerais.
Expressos:
1. da reserva legal de lei ou da legalidade estrita;

39
2. da igualdade tributária;
3. da personalização dos impostos;
4. da capacidade contributiva;
5. da prévia definição legal do fato gerador;
6. da anualidade do lançamento do tributo;
7. da proporcionalidade razoável;
8. da ilimitabilidade do tráfego de pessoal ou bens.
Decorrentes:
1. universalidade;
2. destinação da verba pública dos tributos.Especiais:
1. uniformidade tributária;
2. limitabilidade da tributação da renda das obrigações da dívida pública estadual e municipal
e os proventos de agentes dos Estados e Municípios;
3. o poder de tributar é ínsito ao de isentar;
4. não-diferenciação tributária.
Específicos:
1. progressividade;
2. não-cumulatividade do imposto;
3. seletividade do imposto;
4. imunidades iscais.
Questão de ordem do Professor José Afonso da Silva.
Depois de visto todos os princípios que a Ordem Econômica utiliza em sua base Constitucional,
não poderíamos deixar de transcrever o que diz o Professor José Afonso, em seu livro do
Curso de Direito Constitucional Positivo, 9ª Edição, 4ª Tiragem, 1994:
“A Constituição diz mal quando intitula de princípios gerais a seção 1 do capítulo I do título
VII, referindo-se ao sistema tributário nacional. Não há nela, senão os princípios da
personalização e o da capacidade contributiva, constante do art. 145, § 1º. Os princípios
constitucionais, gerais, especiais e específicos da tributação aparecem mesmo é na seção II,
como expressão das limitações do poder de tributar.
Na primeira seção, o que temos são disposições gerais sobre a tributação, que sintetizam as
bases constitucionais do sistema tributário nacional.”(p. 597).
Síntese.
Os impostos, de acordo com o art.. 145, § 1º, serão, sempre que possíveis, personalizados e
serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte.
A administração poderá, através do seu poder fiscalizatório, conferir se a graduação está
atingindo os fins que a idéia, a necessidade, a renda planejou para o indivíduo apanhado nas
redes delimitatórias da incidência do tributo.
Não há de se supor, ao menos de longe, a quebra dos direitos individuais, do patrimônio, das
atividades econômicas.
O princípio da capacidade contributiva, onde o tributo deve ser distribuído, implica:
• numa base impositiva que seja capaz de medir a capacidade para suportar o
encargo;

40
• alíquotas que igualem esse ônus, a dificuldade residirá na graduação pessoal para que
tenha ele, a justiça do encargo. Citando Dalton: “A doutrina fixou alguns critérios para isso,
como o de sacrifício igual, o de sacrifício proporcional, o de menor sacrifício e o de “não
altere a desigualdade das rendas pela tributação”.
A Constituição nos deu direitos e deveres, garantias e sacrifícios para que haja uma
coletividade feliz, pautada numa base de justiça, honradez e a certeza de um retorno
eficiente na redistribuição da renda, proporcionando saúde, educação e justiça para todos.

41
Universidade do Sul de Santa Catarina - UNISUL
Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes – REDE LFG

Curso de Especialização Telepresencial e Virtual em Direito


Tributário

Disciplina

Sistema Constitucional Tributário: Princípios e


Imunidades

Aula 4
LEITURA FACULTATIVA 4

GESIEL DE SOUZA RODRIGUES


Advogado.
Professor Direito Tributário e Direito Financeiro.
Especialista em Direito Tributário IBET – IBDT, Pós-graduado em Direito Civil e Processo Civil.

IPTU PROGRESSIVO - SÚMULAS 656 E 668 DO STF: REAFIRMAÇÃO DA


CLÁSSICA DIVISÃO ENTRE IMPOSTOS REAIS E PESSOAIS - VEDAÇÃO À
PROGRESSIVIDADE FISCAL

Como citar este artigo:

RODRIGUES, Gesiel de Souza. IPTU progressivo - Súmulas 656 e 668 do


STF: Reafirmação da Clássica divisão entre impostos reais e pessoais -
vedação à progressividade fiscal. Disponível em:
//www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?id=435. Material da
4ª aula da Disciplina Sistema Constitucional Tributário: Princípios e
Imunidades, ministrada no Curso de Especialização Telepresencial e
Virtual de Direito Tributário - UNISUL - REDE LFG.

42
O Supremo Tribunal Federal publicou em data de 09/10/03 as súmulas 656 e 668 que tratam
respectivamente da inconstitucionalidade das alíquotas progressivas para o ITBI e sobre a
inconstitucionalidade do estabelecimento da progressividade para o IPTU antes da edição da
emenda constitucional 29/2000, com a seguinte redação, in verbis:
Enunciado da Súmula 656:
É inconstitucional a lei que estabelece alíquotas progressivas para o imposto de transmissão
inter vivos de bens imóveis - ITBI com base no valor venal do imóvel.
Enunciado da Súmula 668:
É inconstitucional a lei municipal que tenha estabelecido, antes da Emenda Constitucional
29/2000, alíquotas progressivas para o IPTU, salvo se destinada a assegurar o cumprimento da
função social da propriedade urbana.
Alguns autores, sem a devida acuidade e meditação sobre a complexidade do tema, passaram
a afirmar que a progressividade do IPTU estaria autorizada e reconhecida pelo próprio
Supremo Tribunal Federal a teor do enunciado nº 668, na medida que ao fazer a ressalva
(antes da EC 29/2000), expressa e inequivocamente teriam criado um marco inicial para que
os Municípios passassem a promover tal exação pela modalidade progressiva, ou seja, a partir
daí estaria consagrada à permissão legal.
Contudo, a solução não se a figura tão simplista como apressadamente pode se fazer crer,
porquanto, o Supremo Tribunal Federal, de forma sábia, logrou deixar claro que todas as
matérias que chegaram para julgamento diziam respeito à progressividade anteriores a
inserção da emenda constitucional 29/2000 no sistema constitucional tributário. Assim, essa
postura traz em seu bojo acentuada lógica jurídica, pois não seria crível admitir que a
Suprema Corte, que ainda não foi instada a manifestar-se sobre a progressividade após a EC
29/2000, já restringisse sua aplicabilidade ou ainda que a reputasse conforme a Carta Maior,
uma vez que todos os precedentes eram anteriores à edição da EC 29/00.
Dessa forma, por absoluta pertinência temática relacionada à edição da súmula 668,
os ministros promoveram a ressalva de forma exemplar. Também ressaltaram que a
progressividade seria admissível desde que destinada a assegurar o cumprimento da função
social da propriedade. Como cediço essa ordenação deve estar disposta em Plano Diretor
elaborado em estrita sintonia com as regras constantes do Estatuto das Cidades (artigos 39 e
40).
A respeito da necessidade prévia de elaboração do plano diretor, vez que antecedente lógico
inafastável para criação da modalidade progressiva, já se teve oportunidade de afirmar:“A
clara intenção do legislador constitucional foi conferir à norma estrutural do art. 182 da
CF/88, o elemento objetivo para aferição do atendimento da função social da propriedade,
qual seja, a elaboração do plano diretor, a fim de evitar a substituição da legalidade pelo
arbítrio e ilicitude, que, a toda evidência, não se harmoniza com as disposições contidas no
art. 37, caput, da CF/88, as quais exigem da administração pública respeito aos primados da
legalidade, pessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
Destarte, após o advento da CF/88, toda a forma de propriedade, rural ou urbana, está
impregnada do princípio da função social da propriedade. Assim, tal função integra o próprio
desenho da propriedade privada, condicionando este ao cumprimento daquele (função social).
Entretanto, a função social não é mero rebusque legislativo, mas efetivamente
componente essencial e primacial da tributação do IPTU, sob pena de, não existindo, ser
totalmente inválida a exação fiscal pretendida.
A função social, nos termos do art. 182, CF/88 c.c com arts. 39 e 40 do Estatuto da Cidade,
SOMENTE é obtida após regular elaboração do plano diretor. Trata-se, pois, de requisito
essencial, inafastável e que compõe a estrutura básica para imposição da tributação.”

43
(RODRIGUES, Gesiel de Souza, IPTU PROGRESSIVO E A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE -
REQUISITO CONSTITUCIONAL PARA FIXAÇÃO DA EXAÇÃO FISCAL PROGRESSIVA. Tributário.net,
São Paulo, a.5 8/11/20004 - Disponível em http//www.tributario.ler/artigo_ler)
Nesse diapasão, a alegação de que o advento da súmula 668 do STF teria chancelado pelo
órgão de cúpula a controvérsia de modo a permitir que os Municípios adotassem a sistemática
progressiva fiscal disposta na EC 29/00 não pode ser admitida ante a ausência de rigor
científico, mormente, porque o enunciado ressalta a necessidade do atendimento da função
social da propriedade, que por óbvio deve estar objetivamente fixada no plano diretor o que
reafirma a natureza extrafiscal do IPTU.
Assim, sob esse aspecto o Município que não tenha criado seu plano diretor dentro das regras
do Estatuto das Cidades estará impedido de criar e cobrar o IPTU Progressivo.Outro aspecto
relevante diz respeito ao cotejo que deve ser efetuado em relação a súmula 656, que ao
tratar do ITBI, também reconheceu a inconstitucionalidade da progressividade, uma vez que
se trata de modalidade de imposto classificada como Real. Um dos precedentes justificadores
da edição da súmula 656 refere-se ao Recurso Extraordinário 153.771/MG
(Relator Ministro Moreira Alves) que ao apreciar a legislação do Município de Belo
Horizonte/MG, sobre o IPTU Progressivo tornou a reafirmar que os chamados impostos reais
não se harmonizam com a sistemática da progressividade.
Observe-se, portanto, nos moldes da ementa abaixo transcrita, que o Supremo Tribunal
Federal reafirmou a sua histórica classificação entre impostos reais e pessoais. Ao fazê-lo
adotou como um dos precedentes jurisprudenciais justamente o julgamento sobre o IPTU. O
que também fica claro é que a única forma admitida de progressividade é a extrafiscal que
tenha por objetivo atender a função social da propriedade e que deve estar disposta em plano
diretor criado nos estritos lindes do Estatuto das Cidades.
Por oportuno, transcreve-se a ementa do RE 153.771/MG, que serviu de precedente para
edição da súmula 656- STF:
RE 153771 / MG - MINAS GERAIS
RECURSO EXTRAORDINÁRIO
Relator(a): Min. MOREIRA ALVES
Julgamento: 05/09/1997
Órgão Julgador: Tribunal Pleno
Publicação: DJ DATA-05-09-1997 PP-41892 EMENT VOL-01881-03 PP-00496 RTJ VOL-00162-02
PP-00726
Ementa
EMENTA: - IPTU. Progressividade. - No sistema tributário nacional é o IPTU inequivocamente
um imposto real. - Sob o império da atual Constituição, não é admitida a progressividade
fiscal do IPTU, quer com base exclusivamente no seu artigo 145, § 1º, porque esse imposto
tem caráter real que é incompatível com a progressividade decorrente da capacidade
econômica do contribuinte, quer com arrimo na conjugação desse dispositivo constitucional
(genérico) com o artigo 156, § 1º (específico). - A interpretação sistemática da Constituição
conduz inequivocamente à conclusão de que o IPTU com finalidade extrafiscal a que alude o
inciso II do § 4º do artigo 182 é a explicitação especificada, inclusive com limitação temporal,
do IPTU com finalidade extrafiscal aludido no artigo 156, I, § 1º. - Portanto, é inconstitucional
qualquer progressividade, em se tratando de IPTU, que não atenda exclusivamente ao
disposto no artigo 156, § 1º, aplicado com as limitações expressamente constantes dos §§ 2º e
4º do artigo 182, ambos da Constituição Federal. Recurso extraordinário conhecido e provido,
declarando-se inconstitucional o sub-item 2.2.3 do setor II da Tabela III da Lei 5.641, de
22.12.89, no município de Belo Horizonte.

44
No momento em que o Supremo Tribunal Federal faz editar na mesma data (09/11/03)
súmula em que reafirma a clássica divisão entre impostos reais e pessoais (súmula 656, STF),
pelo que torna defeso a criação dessa sistemática para impostos reais, estando o IPTU
nitidamente inserido neste contexto, tem-se como corolário lógico irrefutável que a súmula
668 apenas e tão somente reafirmou que a única progressividade admissível para o IPTU é a
extrafiscal plasmada no art. 182, CF/88.
O motivo para a ressalva é fruto de forte linha de coerência do STF, vez que ainda não
provocado a se manifestar sobre os lindes da EC 29/00, atestou a natureza real do imposto,
mas deixou claro, como não poderia ser diferente, que ainda não analisou os aspectos
constitucionais da EC 29/00 na parte que pertine ao IPTU.
Em resumo, a súmula 656 ao se referir ao ITBI valeu-se de precedente relativo ao IPTU (RE
153771/MG) e afirmou ser inconstitucional a fixação de alíquotas progressivas, logo, por ser o
IPTU imposto real, tem-se como resultado a inaplicabilidade da progressividade fiscal da EC
29/00. A única exceção admitida plasmada no plano constitucional é a extrafiscal constante
do art. 182, CF/88.
Juristas de renome, mormente o ilustre Prof. Sacha Calmon Navarro Coelho, apresentam forte
rejeição acerca da distinção entre impostos reais e pessoais pelo que é enfático ao afirmar
que tal distinção não existe. Com o devido acatamento acredita-se que essa posição é de alta
indagação e não se presta ao deslinde da problemática. O grande jurista alemão Klaus Tipke
aduz que o imposto sobre a propriedade não denota capacidade efetiva de seus proprietários
(TIPKE, Klaus, Sobre a unidade da Ordem Jurídica, in Estudos em homenagem a Brandão
Machado, Coord. Schouri, Luiz Eduardo e Zilverti, Fernando, São Paulo, 1998, p. 67). Essa
ponderação induz ao raciocínio lógico acolhido pelo STF de que a capacidade contributiva
está afeta aos impostos pessoais (§ 1º, art. 145, CF/88), pois apenas e tão somente para esses
impostos é que a capacidade contributiva se aplica adequadamente.
A discussão sobre a questão atinente a inaplicabilidade do princípio da capacidade
contributiva ao impostos reais não comporta espaço dentro do presente estudo, pelo que
deverá ser objeto de outro trabalho a ser apresentado, contudo, é importante salientar que a
capacidade contributiva não é o único vetor admissível, pelo que a proporcionalidade, a
razoabilidade ajoujados a vedação ao confisco, direito de propriedade e a proibição de
excesso oferecem garantias ao poder de exação do Estado e não esbarram nos equívocos da
aplicação da capacidade contributiva para todos os impostos.
Destarte, a edição das súmulas 656 e 668, do Supremo Tribunal Federal reafirmam a divisão
historicamente admitida pelo Pretório Excelso entre impostos reais e pessoais e que veda
para aqueles a adoção de progressividade meramente fiscal, como a plasmada na EC
29/00. A publicação das súmulas reforça todos os demais argumentos jurídicos contrários a
implantação da progressividade fiscal.

45
Universidade do Sul de Santa Catarina - UNISUL
Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes – REDE LFG

Curso de Especialização Telepresencial e Virtual em Direito


Tributário

Disciplina

Sistema Constitucional Tributário: Princípios e


Imunidades

Aula 4

LEITURA FACULTATIVA 5

JOÃO PEDRO AYRIMORAES SOARES JÚNIOR


Procurador do Estado do Piauí.
Advogado.

A TRIBUTAÇÃO DOS ATOS NULOS, ANULÁVEIS, ILÍCITOS, CRIMINOSOS E


IMORAIS

Como citar este artigo:

SOARES JÚNIOR, João Pedro Ayrimoraes. A tributação dos atos nulos,


anuláveis, ilícitos, criminosos e imorais. Disponível em:
http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6105. Material da 4ª
aula da Disciplina Sistema Constitucional Tributário: Princípios e
Imunidades, ministrada no Curso de Especialização Telepresencial e
Virtual de Direito Tributário UNISUL - REDE LFG.

46
Conta a História que, na Roma Antiga, tendo o Imperador Vespasiano instituído um tributo
sobre os mictórios públicos (cloacas), logo foi sugerida, por seu ilho Tito, a extinção da nova
exação, em decorrência de sua origem espúria. Convicto, indagou Vespasiano, empunhando
uma moeda: Olet? (Tem cheiro?). Ao que lhe respondeu o ilho: Non olet! (Não tem cheiro!),
ficando assim demonstrado que a receita advinda da tributação não é acompanhada das
características do fato tributado.
Da Antiguidade Romana até o presente, muita coisa se passou na seara tributária, contudo o
princípio do non olet, em que pese hesitações e negativas diversas, continua válido.
E isso acontece, porque não se pode confundir a concreção da hipótese de incidência
tributária, ou seja, a materialização do fato gerador tributário, abstratamente em lei
previsto, com a nulidade, anulabilidade, ilicitude, crime ou imoralidade circunstancial,
ocorrente no surgimento desse fato gerador concreto.
Nesse sentido, dispondo o art. 43, do Código Tributário Nacional, que o imposto de renda tem
como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica de renda ou de
proventos de qualquer natureza, para que nasça a obrigação tributária respectiva, basta que
se adquira a disponibilidade de uma renda ou de um provento qualquer e nada mais. Pouco
importa se essa renda ou se esse provento tem origem na prostituição, no jogo de azar, no
tráfico de entorpecentes ou, ao contrário, numa atividade comercial, industrial ou
profissional regular, posto que tal circunstância, para esse fim, não é legalmente referida.
Do mesmo modo, nos termos dos arts. 1º e 2º, da Lei Complementar Nacional nº 87/96, é
bastante, para o surgimento da obrigação de pagar ICMS, a venda da mercadoria, o transporte
da carga ou o uso do serviço de telefonia, por exemplo; nada importando se essa mercadoria
foi adquirida por pessoa absolutamente incapaz ou sob coação, se a carga é roubada ou se o
telefonema serve a organizações criminosas. O relevante, para efeitos tributários, é que a
hipótese de incidência, legalmente preconizada, materializou-se em fato gerador da
obrigação de recolher ICMS.
E tanto isso é verdadeiro que, num espectro mais amplo, aplicável a todos os tributos,
preceitua o Código Tributário Nacional, em seu art. 118: “A definição legal do fato gerador é
interpretada abstraindo-se: I – da validade jurídica dos atos efetivamente praticados pelos
contribuintes, responsáveis, ou terceiros, bem como da natureza do seu objeto ou dos seus
efeitos; II – dos efeitos dos fatos efetivamente ocorridos.”
Comentando esse dispositivo legal, Aliomar Baleeiro, Direito Tributário Brasileiro, 11ª ed.,
Forense, 2004, pág. 714, averba:
“A validade, invalidade, nulidade, anulabilidade ou mesmo a anulação já decretada do ato
jurídico são irrelevantes para o Direito Tributário.
Praticado o ato jurídico ou celebrado o negócio que a lei tributária erigiu em fato gerador,
está nascida a obrigação para com o Fisco. E essa obrigação subsiste independentemente da
validade ou invalidade do ato.Se nulo ou anulável, não desaparece a obrigação fiscal que dele
decorre, nem surge para o contribuinte o direito de pedir repetição do tributo acaso pago sob
invocação de que o ato era nulo ou foi anulado. O fato gerador ocorreu e não desaparece, do
ponto de vista fiscal, pela nulidade ou anulação.”
Todavia, não se quer dizer que o tributo deva incidir diretamente sobre atos proibidos ou
imorais, como que abrangidos na correspondente hipótese de incidência, mas apenas que a
receita eventualmente oriunda desses atos há de ser tributada. Recorde-se, a propósito, que
tributo, na escorreita definição do art. 3º, do CTN, configura: “prestação pecuniária
compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato
ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.”
Assim, não deve o tributo sancionar atividade ilícita, seja no sentido de punir, seja no sentido
de legitimar tal atividade. Nessa linha de pensamento, expõe Hugo de Brito Machado, Curso
de Direito Tributário, 24ª ed., Malheiros, 2004, págs. 129-130:

47
“Não se pode, entretanto, admitir um tributo em cuja hipótese de incidência se inclua a
ilicitude. A compreensão do que se está afirmando é facilitada pela distinção, inegável, entre
hipótese de incidência e fato gerador do tributo. Cuida-se, com efeito, de dois momentos. O
primeiro é aquele em que o legislador descreve a situação considerada necessária e suficiente
ao surgimento da obrigação tributária. Nessa descrição a ilicitude não entra. O outro
momento é o da concretização daquela situação legalmente descrita. Nessa concretização
pode a ilicitude eventualmente fazer-se presente. Aí estará, assim, circunstancialmente. Sua
presença não é necessária para a concretização da hipótese de incidência do tributo.
Mas não impede tal concretização, até porque, para o surgimento da obrigação tributária,
como já visto, a concretização do previsto é bastante. Por isto, a circunstância ilícita, que
sobra, que não cabe na hipótese de incidência tributária, é, para fins tributários,
inteiramente irrelevante.”
Também Luiz Emygdio Franco da Rosa Júnior, Manual de Direito Financeiro & Direito
Tributário, 16ª ed., Renovar, 2002, pág. 490, anota:
“Ademais, o fato de o Estado cobrar imposto de renda da pessoa que aufira rendimentos da
exploração do jogo do bicho, ou de uma casa de prostituição, não tem o condão de legitimar
tais atividades. Isso porque o CTN, em seu art 3º, prescreve que a prestação tributária não
constitui sanção (legalização, validação) de ato ilícito.”
Por outro lado, sendo o fato gerador da obrigação tributária um fato econômico a que o
direito imprime relevo jurídico ou, dito de outra forma, um fato jurídico de apreciável
consistência econômica, apto, portanto, a servir de medida de capacidade econômica do
contribuinte, não poderia sua ocorrência, ainda que circunstancialmente ilícita, criminosa ou
imoral, passar despercebida. É o que ensina Amílcar de Araújo Falcão, na sua clássica
monografia Fato Gerador da Obrigação Tributária, citado por Luiz Emygdio Rosa Júnior, Ob.
Cit., pág. 203, verbis:
“Não pode ser de outro modo, se se tomar em consideração que a natureza do fato gerador
da obrigação tributária, como um fato jurídico de acentuada consistência econômica, ou um
fato econômico de relevância jurídica, cuja eleição pelo legislador se destina a servir de
índice de capacidade contributiva. A validade da ação, da atividade ou do ato em Direito
Privado, a sua juridicidade ou antijuridicidade em Direito Penal, disciplinar ou em geral
punitivo, enfim, a sua compatibilidade ou não com os princípios da ética ou com os bons
costumes não importam para o problema da incidência tributária, por isso que a ela é
indiferente a validade ou nulidade do ato privado através do qual se manifesta o fato gerador:
desde que a capacidade econômica legalmente prevista esteja configurada, a incidência há
de inevitavelmente ocorrer.”
Ademais, considerando que “o tributo é uma entidade amoral”, como ensina Zelmo Denari
(Curso de Direito Tributário, 6ª ed., Forense, pág. 176), a exoneração tributária das
atividades proibidas ou não recomendadas, em contraposição à taxação das atividades
lícitas ou socialmente úteis, antes de configurar consectário da moralidade, ensejaria isto
sim séria violação ao principio da isonomia, vez que trataria desigualmente fatos de idêntica
conotação contributiva, diversos, apenas, em sua emanação originária.
Atento a essa inaceitável possibilidade, objetou, não faz muito tempo, o Excelso Supremo
Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, à unanimidade, no julgamento do Habeas Corpus nº
77.530-4/RS, Relator Ministro Sepúlveda Pertence, manifestando-se, peremptoriamente, nos
seguintes termos:
“Sonegação fiscal de lucro advindo de atividade criminosa: “non olet”. Drogas: tráfico de
drogas, envolvendo sociedades comerciais organizadas, com lucros vultosos subtraídos à
contabilização regular das empresas e subtraídos à declaração de rendimentos:
caracterização, em tese, de crime de sonegação fiscal, a acarretar a competência da Justiça
Federal e atrair pela conexão, o tráfico de entorpecentes: irrelevância da origem ilícita,
mesmo quando criminal, da renda subtraída à tributação. A exoneração tributária dos

48
resultados econômicos de fato criminoso - antes de ser corolário do princípio da moralidade -
constitui violação do princípio de isonomia fiscal, de manifesta inspiração ética.”
Contudo, dada a dialeticidade do Direito, abalizadas opiniões existem em contrário, valendo
transcrever a de Misabel Abreu Machado Derzi, que, em nota de atualização à já citada obra
de Aliomar Baleeiro, afirma:
“Em verdade, antes e depois da Lei nº 9.613/98, o correto é concluir que, estando
comprovado o crime do qual se originaram os recursos ou o acréscimo patrimonial, seguir-se-á
a apreensão ou o seqüestro dos bens, fruto da infração. E é absolutamente incabível a
exigência de tributos sobre bens, valores ou direitos que se confiscaram, retornando às
vítimas ou à administração pública lesada. Pois o tributo, que não é sanção de ato ilícito,
repousa exatamente na presunção de riqueza, em fato signo presuntivo de renda, capital ou
patrimônio. Coerentemente, a Lei nº 9.613/98, que disciplinou os crimes de “lavagem de
dinheiro”, por exemplo, renovou, em alguns aspectos, as normas processuais pertinentes e
determinou, como efeitos da condenação, a perda dos bens, direitos e valores, objeto do
crime, assim como a interdição do exercício de cargo ou função pública de qualquer natureza
(art. 7º, I e II).
Imposto poderá incidir sobre a ostentação de riqueza ou o crescimento patrimonial
incompatíveis com a renda declarada, no pressuposto de ter havido anterior omissão de
receita. Receita, em tese, de origem lícita, porém nunca comprovadamente criminosa. Não
seria ético, conhecendo o Estado, a origem criminosa dos bens e direitos, que legitimasse a
ilicitude, associando-se ao delinqüente e dele cobrando uma quota, a título de tributo.
Portanto, põem-se alternativas excludentes, ou a origem dos recursos é lícita, cobrando-se
em conseqüência o tributo devido e sonegado, por meio da execução fiscal, ou é ilícita, sendo
cabível o perdimento dos bens e recursos, fruto da infração.”
Ainda assim, especialmente à luz dos dias que correm, em que a criminalidade, a ilegalidade
e a imoralidade assumem proporções cada vez maiores e mais organizadas, a tributabilidade
dos atos nulos, anuláveis, ilícitos, criminosos e imorais constitui imperativo da mínima
partição dos ônus e encargos públicos sobre todos, de modo a suprir o Estado dos recursos
necessários à consecução dos seus fins sociais.
Se efetivada a persecução criminal, e punidos os infratores, plenamente restará assegurada a
preservação da ordem jurídica e comunitária. Enquanto isso não acontece, porém, que, pelo
menos, a capacidade econômica externada nesses proscritos atos contribua, como qualquer
outra, para a manutenção do bem comum. Ou, caso tal contribuição não aconteça, que
sinalize essa falta a própria prática do crime, como ocorreu ao Agente Eliot Ness, que
somente conseguiu desmontar a máfia de Al Capone, a partir da comprovação da sonegação
do imposto de renda.

49
Universidade do Sul de Santa Catarina - UNISUL
Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes – REDE LFG

Curso de Especialização Telepresencial e Virtual em Direito


Tributário

Disciplina

Sistema Constitucional Tributário: Princípios e


Imunidades

Aula 4
LEITURA FACULTATIVA 6
REGINA HELENA COSTA
Desembargadora Federal do Tribunal Regional Federal da 3ª Região.
Professora da Faculdade de Direito da PUC/SP.

IMPOSTO DE RENDA E CAPACIDADE CONTRIBUTIVA

Como citar este artigo:

COSTA, Regina Helena. Imposto de Renda e Capacidade Contributiva.


Disponível em:
http://www.cjf.gov.br/revista/numero22/artigo04.pdf. Material da 4ª
aula da Disciplina Sistema Constitucional Tributário: Princípios e
Imunidades, ministrada no Curso de Especialização Telepresencial e
Virtual de Direito Tributário - UNISUL - REDE LFG.

50
RESUMO
Traça um panorama histórico acerca da instituição do Imposto de Renda no Brasil, ao abordar
sua origem, implementação e evolução frente ao ordenamento jurídico brasileiro.
Promove, constitucionalmente, a distinção entre os termos “renda” e “proventos”, bem como
aborda os critérios orientadores da imposição fiscal, ao considerá-los como desdobramentos
da idéia de isonomia.
Discorre a respeito do princípio inserto no § 1º do art. 145 da Constituição Federal, cujo
conteúdo se divide em: capacidade contributiva “absoluta”ou “objetiva” e capacidade
contributiva “relativa” ou “subjetiva”.
Ao final, sinaliza para necessidade de observância ao princípio da capacidade contributiva,
mormente quanto ao dever de se imprimir aos impostos a personalização e a progressividade
de alíquotas, a fim de se cumprir a vontade constitucional, a qual defende a idéia de
proporcionalidade entre a capacidade contributiva e o gravame tributário a ser suportado
pelo contribuinte.

PALAVRAS-CHAVE
Imposto de Renda; sistema tributário brasileiro; renda; provento; tributação; Constituição
Federal.

* Conferência proferida no "Seminário sobre a Reforma Tributária", realizado pelo Centro de Estudos
Judiciários, nos dias 20 e 21 de março de2003, no auditório da Seção Judiciária do Ceará, Fortaleza-CE.

1 ORIGEM DO IMPOSTO SOBRE A RENDA


O Imposto de Renda, da forma como o conhecemos hoje, incidente sobre a renda total do
contribuinte, foi, após diversas tentativas, instituído no Brasil em 1922, mediante a Lei de
Orçamento n. 4.625, de 31 de dezembro.
O apontado diploma legal, em seu art. 31, dispunha :
Art. 31. Fica instituído o imposto geral sobre a renda, que será devido anualmente, por toda
pessoa física ou jurídica, residente no território do país, e incidirá, em cada caso, sobre o
conjunto líquido dos rendimentos de qualquer origem 1.
Tendo em vista a constatação de algumas dificuldades para arrecadá-lo, tal como previsto
nesse dispositivo, foram procedidas alterações por meio da Lei Orçamentária n. 4.728, o de
31 de dezembro de 1923 (art. 3), a fim de facilitar a sua implantação, o que ocorreu em
1924. Optou-se, então, pela progressividade de suas alíquotas, estabelecidas entre 0,5% e 8%
.2
Desde então, o Imposto sobre a Renda, o mais pessoal de todos os impostos, tem-se revelado
importante imposto da União, ao lado do Imposto sobre Produtos Industrializados. No
entanto, estudos econômicos demonstram que a participação da
tributação da renda na carga tributária brasileira é baixa, atingindo apenas 23%, enquanto,
em países desenvolvidos, essa participação representa 70% .3
Em contrapartida, a carga tributária brasileira é muito dependente de impostos sobre
produção e circulação de bens e serviços, que significam 60% do total .4
Tais dados fazem concluir que o sistema tributário brasileiro apresenta pequeno grau de
progressividade, chegando, mesmo, a ser regressivo, dado o elevado número de tributos
incidentes sobre o consumo de bens e serviços. A conseqüência é a imposição de maior ônus
àqueles que ostentam menor aptidão de contribuir às despesas do Estado, posto que, em
regra, quem possui renda e patrimônio revela maior capacidade contributiva.

51
Diante desse quadro e, passados 80 anos da instituição do Imposto sobre a Renda, oportuno
fazer-se algumas reflexões, pelo quê recomendável sejam lembrados alguns conceitos básicos
pertinentes a essa imposição fiscal.

2. DISCIPLINA CONSTITUCIONAL
A Constituição da República contempla o Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer
Natureza dentre aqueles de competência da União (art. 153, inc. III), acrescentando que este
será informado pelos critérios da generalidade, da universalidade e da progressividade, na
forma o da lei (art. 153, § 2, II).
Primeiramente, cabe lembrar que o conceito de renda encontra-se delimitado
constitucionalmente. Traduz acréscimo patrimonial, riqueza nova, que vem se incorporar a
patrimônio preexistente, considerado determinado período de tempo. Constitui sempre um
plus, jamais algo que venha apenas substituir uma perda no patrimônio do contribuinte.
Proventos, por seu turno, é a denominação dada aos rendimentos recebidos em função de
aposentadoria. Em ambos os casos, temos acréscimos de capacidade contributiva.
Anote-se que a existência de um conceito constitucional de renda e proventos de qualquer
natureza implica a pouca liberdade do legislador infraconstitucional para estabelecer as
hipóteses de incidência .5
Os critérios orientadores da imposição fiscal em foco também merecem ser abordados,
devendo salientar-se que todos eles constituem desdobramentos da idéia de isonomia:
generalidade, universalidade e progressividade.
A generalidade, por primeiro, significa que todas as pessoas que aufiram renda e proventos de
qualquer natureza devem submeter-se à imposição tributária, sem privilégios e
discriminações .6
Já a universalidade, por sua vez, impõe que nenhuma forma de renda, advinda do trabalho,
do capital, ou da combinação de ambos, pode estar fora do campo de incidência do tributo .7
A progressividade, dada sua íntima conexão com o princípio da capacidade contributiva,
merecerá análise mais detida adiante.

3. O PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA


Relembradas tais noções básicas, mister abordar o conteúdo essencial do princípio da
capacidade contributiva. Informador de todos os impostos, somente com a democrática
Constituição de 1946 vem a ganhar o merecido realce, em face da dicção de seu art. 202,
assim vazado:
Art. 202 – Os tributos terão caráter pessoal sempre que isso for possível, e serão graduados
conforme a capacidade econômica do contribuinte.
Todavia, a Emenda Constitucional n. 18, de 1º de dezembro de 1965, ao imprimir a reforma
constitucional tributária, veio a retirar aquele preceito do Texto Fundamental, não
reproduzido pela Constituição de 1967 nem pela Emenda Constitucional n. 1, de 1969.
Presentemente, encontra-se o expressamente insculpido no § 1 do art. 145 da Constituição,
nos seguintes termos:
Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados consoante a
capacidade econômica do contribuinte (...).
Doutrinariamente, podemos conceber dúplice acepção ao conceito de capacidade
contributiva. Fala-se em capacidade contributiva absoluta ou objetiva quando se está diante
de um fato que se constitua numa manifestação de riqueza; refere-se o termo, nessa
acepção, à atividade de eleição, pelo legislador, de eventos que demonstrem aptidão para

52
concorrer às despesas públicas. Tais eventos, assim escolhidos, apontam para a existência de
um sujeito passivo em potencial. Nesse sentido, a capacidade contributiva atua como
pressuposto ou fundamento jurídico do imposto, constituindo diretriz para a eleição das
hipóteses de incidência de impostos.
Diversamente, a capacidade contributiva relativa ou subjetiva – como a própria designação
indica – reporta-se a um sujeito individualmente considerado. Expressa aquela aptidão de
contribuir na medida das possibilidades econômicas de determinada pessoa. Nesse plano,
presente a capacidade contributiva in concreto, aquele potencial sujeito passivo torna-se
efetivo, apto, pois, a absorver o impacto tributário. Nessa outra acepção, a capacidade
contributiva opera, desse modo, como critério de graduação do imposto e limite à tributação.

4. EFICÁCIA DO PRINCÍPIO
Posto isto, impende examinar a eficácia do princípio, naquilo em que mais de perto se
relaciona com o Imposto sobre a Renda. Logo, mister abordar-se a personalização dos
impostos, a preservação do mínimo vital e a orientação para o legislador no estabelecimento
de critério na definição da base de cálculo e da alíquota e na indicação da natureza
confiscatória do imposto.
Sendo o imposto a espécie tributária cuja hipótese de incidência consiste num fato qualquer
que não se constitua numa atuação estatal ,8 já se depreende que essa modalidade de exação
só pode fundar-se na capacidade contributiva do sujeito passivo. E assim é porque, nos
impostos, o sujeito passivo realiza comportamento indicador de riqueza, que não foi, de
nenhuma maneira, provocada ou proporcionada pelo Poder Público. Tal riqueza, portanto, é a
única diretriz que pode ser seguida pela tributação não vinculada a uma atuação estatal.

4.1. PERSONALIZAÇÃO DOS IMPOSTOS


Como diretriz orientadora da exigência de impostos, a capacidade contributiva imprime a
tendência da personalização destes. Desse modo, na instituição dos impostos deverão ser
consideradas, o mais possível, as condições pessoais dos contribuintes.
Cumpre, nesse passo, tecer uma breve explanação do que se impõe entender por impostos
pessoais e impostos reais, ainda que essa classificação seja tida, por muitos, mais como de
natureza econômico-financeira do que jurídica. No entanto, seu caráter jurídico é inegável, à
vista do tema ora abordado.
Ensina o mestre Ataliba que a apontada classificação apóia-se na existência de uma conexão
maior ou menor entre a estrutura do aspecto material com o aspecto pessoal da hipótese de
incidência. Logo, são impostos reais aqueles cujo aspecto material da hipótese de incidência
limita-se a descrever um fato, acontecimento ou coisa independentemente do elemento
pessoal, ou seja, indiferente ao eventual sujeito passivo e suas qualidades ,9 vale dizer, o
aspecto pessoal desses impostos não tem relação com a estrutura do aspecto material dos
mesmos.
Diversamente, impostos pessoais são aqueles cujo aspecto material da hipótese de incidência
leva em consideração certas qualidades juridicamente qualificadas do sujeito passivo .10
Nesse caso, as qualidades jurídicas dos sujeitos passivos refletem-se no aspecto material da
hipótese de incidência para estabelecer diferenciação no tratamento destes. Várias técnicas
podem ser empregadas para o atingimento dessa finalidade, sendo de citar-se, como a mais
usual, as distinções na alíquota ou na base imponível .11 São os impostos pessoais, portanto, os
mais idôneos à realização da justiça fiscal .12
Em conclusão, para atender-se o ao comando inserto no § 1 do art. 145 do Texto
Fundamental, parece-nos que a personalização do imposto há de ser observada sempre que a
estrutura do aspecto material da hipótese de incidência o comporte, mesmo que se esteja
diante dos chamados impostos reais .13

53
4.2. PRESERVAÇÃO DO MÍNIMO VITAL
Outro efeito da diretriz em exame vem a ser a preservação do chamado “Mínimo Vital”, assim
entendida a quantidade de riqueza mínima, suficiente para a manutenção do indivíduo e de
sua família, intangível pela tributação por via de impostos.
Para Sainz de Bujanda, a isenção do mínimo vital é inseparável do princípio da capacidade
contributiva .14 Isto porque a capacidade contributiva só pode se reputar existente quando
aferir-se alguma riqueza acima do mínimo vital. Este deve ser, pois, intocável.
A fixação do mínimo vital, destarte, variará de acordo com o conceito que se tiver de
necessidades básicas. O problema é tormentoso, pois concerne a decisão política do
legislador. Em se tratando de pessoas físicas, este deverá basear-se, à falta de normas
constitucionais específicas, no que, numa sociedade dada, razoavelmente se reputarem
necessidades fundamentais do indivíduo e de sua família .15
O conceito de mínimo vital, em conseqüência, varia no tempo e no espaço .16

4.3. PROGRESSIVIDADE DE ALÍQUOTAS


O princípio em foco traça, ainda, orientação para o legislador no estabelecimento de critério
para a graduação dos impostos.
Como anotado precedentemente, a noção de capacidade contributiva absoluta ou objetiva
relaciona-se àqueles fatos legislativamente escolhidos por representarem manifestações de
riqueza. Já a capacidade contributiva relativa ou subjetiva corresponde à aptidão de um
determinado sujeito para suportar o impacto tributário, avaliável consoante suas
possibilidades econômicas. A expressão econômica do fato protagonizado pelo sujeito em
questão é mensurada, justamente, pela base de cálculo, para a qual se deve aliar a alíquota.
A base de cálculo, em conseqüência, deverá reportar-se àquele fato de conteúdo econômico
inserto na hipótese de incidência tributária, ou seja, deverá guardar pertinência com a
capacidade absoluta ou objetiva apreendida pelo legislador. Ausente essa correlação
necessária entre a base de cálculo e a hipótese de incidência tributária, a imposição será
inconstitucional, por desrespeito, também, ao princípio estudado.
A alíquota, por sua vez, é uma fração da base de cálculo que, conjugada a esta, conduz à
determinação do quantum objeto da prestação tributária. Nas palavras de Geral-do Ataliba, é
a quota (fração), ou parte da grandeza contida no fato imponível que o Estado se atribui
(editando a lei tributária) .17
Com relação a esta, é que se coloca o tema da progressividade dos impostos, critério
expressamente apontado como orientador da exigência do Imposto sobre a Renda (art. 153, §
2º, II, CF).
O princípio da capacidade contributiva, como vimos, exige que a tributação seja feita em
proporção à riqueza de cada um, assim entendida aquela manifestada pelo fato imponível.
Mediante a técnica chamada “proporcionalidade tributária”, a alíquota ou percentagem é
sempre uniforme e invariável, qualquer que seja o valor da matéria tributada. Muito
utilizados na Idade Moderna e ocupando, ainda hoje, posição de destaque nos sistemas fiscais
contemporâneos, os impostos proporcionais já não são considerados os mais idôneos a atender
o princípio da capacidade contributiva, persistindo sua aplicação em casos pouco ajustáveis à
progressividade .18
A progressividade tributária, por seu turno, implica seja a tributação mais do que
proporcional à riqueza de cada um. Um imposto é progressivo quando a alíquota se eleva à
medida que aumenta a quantidade gravada .19
Com efeito, se a igualdade na sua acepção material, concreta, é o ideal para o qual se volta
todo o ordenamento jurídico-positivo, a progressividade dos impostos é a técnica mais

54
adequada ao seu alcance. Isto porque a graduação dos impostos meramente proporcional à
capacidade contributiva dos sujeitos não colabora para aquele fim. Diversamente, na
tributação progressiva, aqueles que detêm maior riqueza arcarão, efetivamente mais, pelos
serviços públicos em geral, em favor daqueles que pouco ou nada possuem e, portanto, não
podem pagar.
Enfaticamente, Misabel Derzi assevera que a progressividade é a única técnica que permite a
personalização dos impostos, como determina, expressamente, o art. 145, § 1, da
Constituição de 1988, acrescentando que, na medida em que o legislador considera as
necessidades pessoais dos contribuintes, passa, também, a conceder reduções e isenções. E
arremata: Tais renúncias de receitas, ocorrentes em favor do princípio da igualdade, têm de
ser compensadas por meio da progressividade, a fim de que o montante da arrecadação se
mantenha o mesmo no total .20
Acresça-se ser conclusão pacífica da doutrina especializada a afirmação de que a
progressividade tributária deve reportar-se ao sistema tributário como um todo e não a um
tributo em particular. Logo, pode-se ter tributos em estrutura progressiva convivendo com
tributos com natureza apenas proporcional. Mas a aplicação conjunta dos mesmos resultará
numa tributação progressiva.21

4.4. NÃO-CONFISCATORIEDADE E NÃO-CERCEAMENTO DE DIREITOS CONSTITUCIONAIS


Finalmente, não se pode olvidar do trato dos limites da progressão fiscal. São eles os postos
pelo princípio da capacidade contributiva, a saber: a não-confiscatoriedade e o não-
cerceamento de direitos constitucionalmente contemplados.
O confisco, em definição singela, é a absorção total ou substancial da propriedade privada,
pelo Poder Público, sem a correspondente indenização.
Como se depreende de tal definição, em nosso sistema jurídico, o confisco é medida de
caráter sancionatório, sendo admitida apenas excepcionalmente. Se o tributo, na própria
dicção legal, é prestação pecuniária compulsória que não constitua sanção de ato ilícito (art.
3º do CTN), lógica a conclusão segundo a qual não pode ele ser utilizado com efeito
confiscatório.
Desse modo, o tributo será confiscatório quando exceder a capacidade contributiva relativa
ou subjetiva visada.
Nem sempre é fácil, contudo, aquilatar até que ponto um tributo não é confiscatório e a
partir de quando passa a sê-lo. Certo é que a resposta variará conforme o caso concreto e
deverá apoiar-se na eqüidade e na razoabilidade .22
Ainda, uma palavra sobre o não-cerceamento de direitos fundamentais.
Assim como o direito de propriedade não pode ser indevidamente restringido ou aniquilado
pela tributação, outros direitos constitucionais, igualmente, não podem ser cerceados, tais
como o direito à educação, o direito à saúde, a liberdade de iniciativa e a liberdade de
profissão, pois, se de um lado o ordenamento constitucional os incentiva e ampara, não pode,
ao mesmo tempo, compactuar com a obstância ao seu exercício por uma atividade tributante
desvirtuada .23

5. PROPOSTAS
De tudo quanto foi exposto, cremos ter demonstrado a importância da observância do
princípio da capacidade contributiva, notadamente quanto ao dever de imprimir-se, aos
impostos, a personalização e a progressividade de alíquotas.
No que tange especialmente ao Imposto sobre a Renda, impende que a lei, o quanto possível,
leve em conta as condições pessoais dos contribuintes, sejam pessoas físicas ou jurídicas. Isso

55
implica seja efetuada a fixação de um “mínimo vital” compatível com a realidade, bem como
seja aplicado um adequado grau de progressividade de alíquotas, em função da quantidade de
renda auferida, como também de um amplo número de deduções permitidas, visando a
modular a exigência fiscal ao perfil do contribuinte.
Há que se imprimir maior progressividade às alíquotas, de modo a cumprir, efetivamente, a
vontade constitucional segundo a qual aqueles que possuem maior capacidade contributiva,
devem suportar maior gravame tributário. Num país com tanta diversidade do ponto de vista
econômico, afigura-se-nos inconcebível a previsão de apenas duas alíquotas, sendo razoável
pensar-se num leque de quatro ou cinco.24
Quanto às deduções, especialmente em relação ao Imposto sobre a Renda de Pessoa Física,
devem ser consideradas dedutíveis todas as despesas necessárias à manutenção do indivíduo e
de sua família, sem limitações, as quais, evidentemente, não podem integrar o conceito de
“renda”.
Despesas médicas e as referentes à educação e aos dependentes, por exemplo, devem ser
consideradas de maneira abrangente, incluindo a aquisição de medicamentos e de material
escolar, diversamente da previsão restritiva contida na atual legislação do Imposto sobre a
Renda. Outrossim, novas deduções devem ser admitidas, como o valor do aluguel de imóvel
destinado à residência, com vistas a personalizar, devidamente, a imposição fiscal em tela.
Por derradeiro, não se pode esquecer que o art. 6º da Constituição da República, com a
redação dada pela Emenda Constitucional n. 26, de 2000, arrola, como direitos sociais, a
educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a
proteção à maternidade e à infância, a e a assistência aos desamparados. Portanto, impende
que tais valores sejam protegidos e prestigiados pelo Estado, inclusive mediante a legislação
do Imposto sobre a Renda.

NOTAS BIBLIOGRÁFICAS
1 Registre-se, todavia, que, desde 1843, o Fisco imperial exigia tributos sobre determinadas
categorias de rendas, denominando-se genericamente esse conglomerado de impostos, pagos
separadamente pelo contribuinte, de “impostos sobre rendimentos” (AMED, Fernando José,
NEGREIROS, Plínio José Labriola de Campos. História dos Tributos no Brasil. São Paulo:
SINAFRESP, 2000. p. 250).
2 Idem, p. 255.
3 VERSANO, Ricardo et al. Uma Análise da Carga Tributária no Brasil, Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada – IPEA, 1998, texto para discussão n. 583, p. 18. Disponível em:
http://www.ipea.gov.br. O mesmo estudo aponta também a pouca expressividade da
participação da tributação sobre o patrimônio na carga tributária brasileira, que fica em
torno de 4,6%.1996. p. 18.
4 Idem, p. 17.
5 O art. 43 do CTN traça normas gerais acerca dessa imposição fiscal e, como não poderia
deixar de ser, ao definir os conceitos de renda e proventos, não destoa do conceito
constitucional: Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de
qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição de disponibilidade econômica ou
jurídica: I – de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho, ou da combinação
de ambos; II – de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos
patrimoniais não compreendidos no inciso anterior. § 1° A incidência do imposto independe
da denominação da receita ou do rendimento, da localização, condição jurídica ou
nacionalidade da fonte, da origem e da forma de percepção.
6 Misabel Derzi, nota ao Direito Tributário Brasileiro, de Aliomar Baleeiro, 7. ed., Rio de
Janeiro: Forense, 1997. p. 293.

56
7 Idem, p. 292.
8 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 1993. p.
121.
9 Idem.
10 Idem.
11 Debates do VII Curso de Especialização em Direito Tributário. PUC/SP-IDEPE, 4/142.
12 BALEEIRO, Aliomar. Uma Introdução à Ciência das Finanças. 14. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 1987. p. 268. O mesmo jurista chama-nos a atenção para o fato de que a legislação
contemporânea tende para a personalização dos impostos reais, conseqüência da elevação do
nível de civilização e cultura de um país, por meio de isenções e de presunção de capacidade
econômica em razão das coisas ou serviços tributados (idem, p. 265). O preclaro Sainz de
Bujanda ressalta as virtudes da imposição pessoal: Lo que acontece es que la imposición
personal, por la estructura de sus presupuestos de hecho, ofrece posibilidades más amplias de
que actúe el principio de justicia distributiva través de una discriminación cuantitativa de la
renta y de uma estimación de las circunstancias individuales y familiares del sujeto pasivo. En
tal sentido, la tensión entre el critério real y el personal en el reparto impositivo imperó
como uno de los factores mas importantes a tener en cuenta dentro del campo de la justicia
tributaria e influye em la estimación crítica que desde el aludido punto de vista se haga de
cada sistema, en su conjunto. Pero ello no es óbice, claro está, para que ese problema de
justicia se plantee asimismo dentro de cada uno de esos dos sectores impositivos
fundamentales. (SAINZ DE BUJANDA, Fernando. Hacienda y Derecho. Madri: Instituto de
Estudios Políticos, 1963, v. 3, p. 127-218.
13 BALEEIRO, Aliomar. Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar. 7. ed. Atualizado por
Misabel de Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 1997.
14 BUJANDA, op. cit., v. 34. p. 197. Encontramos como expressões equivalentes a“mínimo
vital” as seguintes: “mínimo necessário”, “mínimo de existência”, “mínimo indispensável” e
“mínimo imponível”. Entendemos tratar-se de verdadeira isenção e não de imunidade, mesmo
decorrendo da aplicação de princípio de magnitude constitucional. Isso porque a Constituição
não traz o desenho típico da situação imune, deixando que o legislador infraconstitucional o
faça. Portanto, se a tipificação não advém da Lei Maior, seu status não pode ser de
imunidade, e sim, de isenção.
15 O art. 7º, inc. IV, da Constituição, ao disciplinar os itens que compõem o salário-mínimo,
fornece, a nosso ver, parâmetros para a fixação do mínimo vital.
16 No mesmo sentido BORGES, Souto Maior. Isenções Tributárias. 2. ed. São Paulo: Sugestões
Literárias, 1980. p. 62.
17 ATALIBA, op. cit., 101. Anote-se a crítica de Aires Barreto, para quem essa definição
merece reformulação, posto que a parte que se toma do todo é o quantum debeatur e
porque a mesma não se adequa às hipóteses em que a alíquota é fixada em percentual não
inferior a 100% (BARRETO, Alves. Base de Cálculo, Alíquota e Princípios Constitucionais. São
Paulo: RT, 1987. p. 41-42).
18 BALEEIRO, Aliomar. Uma Introdução à Ciência das Finanças. 14. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 1987. p. 202–203.
19 Paulo de Barros Carvalho assim disserta sobre as feições que a alíquota pode assumir:
“Infere-se do exposto que as alíquotas podem assumir duas feições: a) um valor monetário
fixo, ou variável em função de escalas progressivas de base de cálculo (...), ou b) uma fração,
percentual ou não, da base de cálculo (que neste caso será representada por quantia
monetária). Aparecendo sob a forma de fração (b), a alíquota pode ser proporcional
invariável (por ex., 1/25 da base de cálculo, seja qual for seu valor monetário); proporcional
progressiva (aumentando a base de cálculo, aumenta a proporção) ou proporcional regressiva
(aumentando a base de cálculo, diminui a proporção). Além disso, as alíquotas proporcionais

57
progressivas podem aumentar por degraus ou escalões (caso do nosso IR – pessoa física) ou de
maneira contínua e ininterrupta, até o limite máximo que a lei indicar. Curso de Direito
Tributário. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 227-228).
20 Nota ao Direito Tributário Brasileiro, de Aliomar Baleeiro, op. cit., p. 293.
21 NEUMARK, Fritz. Princípios de la Imposición. Madri: Instituto de Estúdios Fiscales, 1974, p.
219 e BUJANDA, Sainz de, op. cit., v. 3, p. 223.
22 No entanto, é bom frisar, o princípio do não-confisco tem sido utilizado também para fixar
padrões ou patamares de tributação tidos por suportáveis, de acordo com a cultura e as
condições de cada povo em particular, ao sabor das conjunturas mais ou menos adversas que
estejam se passando. Neste sentido, o princípio do não-confisco se nos parece mais como um
princípio de razoabilidade na tributação... COELHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à
Constituição de 1988 –Sistema Tributário. 2. ed. Rio de Janeiro:Forense, 1990. p. 336.
23 Nesse sentido, dissertamos em COSTA, Regina Helena. Princípio da Capacidade
Contributiva. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 103-110.
24 A legislação regente do Imposto sobre a Renda de Pessoa Física, consigna, presentemente,
tão-somente, duas alíquotas (15% e 25%, sendo atualmente exigível a alíquota provisória de
27,5%. Para obter-se a legislação atualizada, veja se o site <http://www.receita.fazenda.
gov.br>. Até 1995, havia também a previsão de uma terceira alíquota, de 35%.

BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR
CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 17. ed. revista,
ampliada e atualizada. São Paulo: Malheiros, 2002.

The authoress outlines a historical view about the establishment of the Income Tax in Brazil,
by approaching its origin, implementation, and evolution before the Brazilian legal system.
She promotes, constitutionally, the difference between the terms “income” and “revenues”,
as well as she approaches the criteria that guide the fiscal imposition, by considering them as
developments of the isonomy idea.
She discourses on the principle that is inserted in the first paragraph of the article 145 of the
Brazilian Constitution, whose content is divided into: “absolute” or “objective” tax-paying
ability and “relative” or “subjective” one.
Finally, she displays the necessity of observance of the principle of the tax-paying ability,
mainly in relation to the duty of giving the taxes the personalization and the escalation of
rates, in order to execute the constitutional will that defends the idea of proportionality
between the tax-paying ability and the tax onus that will be paid by the taxpayer.

KEYWORDS - Tax Income; Brazilian taxation system; income; revenue; taxation; Brazilian
Constitution.

58
Universidade do Sul de Santa Catarina - UNISUL
Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes – REDE LFG

Curso de Especialização Telepresencial e Virtual em Direito


Tributário

Disciplina

Sistema Constitucional Tributário: Princípios e


Imunidades

Aula 4

LEITURA FACULTATIVA 7

MARCELO DIAS FERREIRA


Procurador do Município de Porto Alegre.

A PROGRESSIVIDADE FISCAL NO IPTU E O PRINCÍPIO DA CAPACIDADE


CONTRIBUTIVA

Como citar este artigo:

BIANCHINI, Alice. A Progressividade Fiscal no IPTU e o Princípio da


Capacidade Contributiva. Disponível em:
http://lproweb.procempa.com.br/pmpa/prefpoa/pgm/usu_doc/A000
1_04.pdf. Material da 4ª aula da Disciplina Sistema Constitucional
Tributário: Princípios e Imunidades, ministrada no Curso de
Especialização Telepresencial e Virtual de Direito Tributário - UNISUL
- REDE LFG.

59
“A questão de saber qual é, de entre as possibilidades que se apresentam nos quadros
do Direito a aplicar, a <correcta>, não é sequer – segundo o próprio pressuposto de que
se parte – uma questão de conhecimento dirigido ao Direito positivo, não é um problema de
teoria do Direito, mas um problema de política do Direito. A tarefa que consiste em obter, a
partir da lei, a única sentença justa (certa) ou o único acto administrativo correcto é, no
essencial, idêntica à tarefa de quem se proponha, nos quadros da Constituição, criar as únicas
leis justas (certas).Assim como da Constituição, através de interpretação, não podemos
extrair as únicas leis correctas, tão-pouco podemos, a partir da lei, por interpretação,
obter as únicas sentenças correctas.”
(KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito, 5ª ed., 1979, Colecção Studium, Armênio Amado ed. –
Coimbra, p. 469)
“A justiça e a eqüidade são a mesma coisa, embora a eqüidade seja melhor. O que cria o
problema é o fato de o eqüitativo ser justo, mas não o justo segundo a lei, e sim um corretivo
da justiça legal.”
(ARISTÓTELES. Ética a Nicômacos. UnB, 3ª ed., 1992, p. 109)

O propósito deste trabalho é, à luz das inovações trazidas pela Emenda Constitucional nº
29/2000 e do Estatuto das Cidades (Lei Federal nº 10.257/01), discutir o fenômeno da
progressividade fiscal do Imposto Predial e Territorial Urbano - IPTU e sua relação jurídico-
axiológica com o Princípio da Capacidade Contributiva, trazendo à baila algumas
considerações sobre a herança romanista que classifica o tributo em tela como um imposto
real e que, infelizmente, ainda resiste teimosamente em nossos pretórios unicamente para
afastar, até mesmo com a mancha da inconstitucionalidade, a possibilidade da instituição do
IPTU progressivo em razão do valor do imóvel. Recentemente, participando do Curso de
Desarrollo Profesional sobre Impuestos a la Propiedad Inmobiliaria en América Latina,
desenvolvido pelo Lincoln Institute of Land Policy, na cidade de Cambridge – Massachusetts -
EUA, tivemos a chance de constatar, juntamente com representantes do México, Argentina,
Chile, Colômbia, Uruguai, Venezuela, EUA e Nicarágua, dentre outros, a imensa dificuldade
de aceitação da chamada progressividade fiscal do Imposto Predial e Territorial Urbano,
inserido em uma política tributária que seja lastreada, em nível local, na eficiência
econômica, na eqüidade, na redistribuição da riqueza, na governabilidade e no
exercício da cidadania. Basicamente, parte-se do imperativo categórico de que o IPTU não é o
melhor instrumento de redistribuição de riqueza, uma vez que é um imposto real, e não
pessoal, inaplicável, portanto, a regra contida no § 1º do art. 145 da Constituição Federal;
ademais, as alíquotas progressivas correriam o risco de afetar de forma mais acentuada as
decisões econômicas dos contribuintes, sendo preferíveis outros modelos pela sua suposta
“neutralidade”, como as alíquotas proporcionais, posto que – dados os deficientes modelos de
aferição da base de cálculo do IPTU e das inconsistências dos cadastros imobiliários – o valor
do imóvel não reflete necessariamente a capacidade contributiva do sujeito passivo.
Ora, são proposições fundamentadas em dados consistentes, como se teve a
oportunidade de verificar ao debater sobre as bases conceituais adequadas sobre o Imposto
Predial, técnicas de avaliação, confecção de cadastros e atualização de mapas de valores,
fórmulas alternativas à proporcionalidade de alíquotas, extrafiscalidade e evasão impositiva,
além da elaboração e interpretação de indicadores que reflitam o desempenho de políticas
públicas e sistemas de arrecadação a elas associados. Nesse sentido, cumpre inicialmente
asseverar que o processo de redistribuição de riqueza é, também, parte da efetivação da
função social da cidade, e o IPTU serve, sim, como um dos instrumentos desta política, pelo
fato de lhe caberem algumas atribuições constitucionais atinentes à garantia e concretude de
direitos fundamentais e sociais, como a igualdade, aos quais a propriedade e a cidade se
vinculam em razão de suas funções. Logo, as grandes desigualdades sociais e econômicas que
atingem os povos da América Latina (AL) se refletem no mapa da exclusão no espaço urbano,
e a tributação imobiliária é o mecanismo que pode e deve ser utilizado enquanto
instrumento efetivo de mudança sócio-econômica, influenciando de modo incisivo na

60
estrutura das sociedades latino-americanas, dispondo o ente estatal de poder suficiente para
redistribuir a riqueza de uma forma mais igualitária.
Entretanto, para atingir este ideal de igualdade material, conferindo à tributação esta função
distributiva, tem-se que necessariamente analisar, mesmo que de passagem, como a carga
tributária – soma de todo o dinheiro que o governo recebe cobrando tributo dividido pelo
valor da riqueza do país – no Brasil e em outros países latino-americanos, é significativamente
mal distribuída. Ora, são as classes sociais e os setores menos favorecidos que têm a maior
parte de seus rendimentos e recursos destinados ao financiamento do Estado, enquanto que
as classes de renda mais elevada têm diversos benefícios e reduções tributárias. Isso significa
que a elevação da carga tributária é feita com tributos indiretos e cumulativos, que geram
distorções históricas nas economias destes países1 . Isto, em parte, explica porque o Brasil é
um dos países com uma das maiores concentrações de renda do planeta, só comparada a de
alguns paÍses da África Subsaariana2. No equilíbrio de forças políticas, a tributação no Brasil –
e não é muito diferente dos outros países da AL - tem sido usada como instrumento de
concentração de renda, agravando o ônus fiscal dos mais pobres e aliviando o dos mais ricos.
Para mitigar os reflexos perversos desta política tributária em relação aos menos favorecidos,
deve a Administração Pública, em todas as esferas de atuação, reagir proativamente,
conferindo plena efetividade ao princípio da capacidade contributiva e da função social da
propriedade e da cidade, como corolários ao basilar princípio da igualdade tributária.
Nesse diapasão, convém, de plano, questionar se, dentro do sistema jurídico-tributário
nacional, a tese de que o IPTU é um tributo de natureza real e, portanto, incidente sobre a
categoria da coisa que dá origem à obrigação tributária, não poderá levar em consideração a
condição pessoal do sujeito passivo, e não poderá a expressão “sempre que possível” ,
contida no comando constitucional do § 1º do art. 145, ser interpretada de modo a abarcar
todos os impostos, mas apenas aqueles que permitam a aplicação do princípio da capacidade
contributiva (impostos ditos pessoais), afastando-se, consequentemente, a
progressividade fiscal, restando somente às Municipalidades o trato da
progressividade com finalidades extrafiscais, respeitadas as diretrizes do art. 182, § 4º, II,
da CF/88 e art. 7º da Lei Federal nº 10.257/01.
Tal discussão está atrelada, mesmo com o advento da Emenda Constitucional nº 29, de 14 de
setembro de 2000 - que alterou substancialmente a redação do § 1º do art. 156 da CF3 e
adicionou-lhe dois incisos, inaugurando expressamente a progressividade fiscal e balizando os
critérios de seletividade de alíquotas enquanto instrumento regulador da ocupação urbana
(localização e uso do imóvel) – ao julgamento do Recurso Extraordinário nº 153.771-0-MG
(apreciado pelo Plenário do STF em 20.11.1996, nove votos a um, acórdão publicado no

1
A taxinomia utilizada para distinguir os impostos em diretos e indiretos é, no entender de um amplo
leque de teóricos do Direito Tributário, desprovida de qualquer conteúdo jurídico. Convém esclarecer
que estamos utilizando-a neste caso, tão-somente, para evidenciar que, nos chamados ‘impostos sobre
o consumo’, o repasse da carga impositiva tributária é um fato econômico real.
2
Informe do FORUM BRASIL CIDADÃO, “Justiça Fiscal e Social para Reconstruir o Brasil”, 2002, p.08.
3
“Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:
(...)
I – propriedade predial e territorial urbana;
(...)
§ 1º - Sem prejuízo da progressividade no tempo a que se refere o art. 182, § 4º, II, o imposto previsto
no inciso I poderá:
I – ser progressivo em razão do valor do imóvel; e
II – ter alíquotas diferentes de acordo com a localização e o uso do imóvel. (Parágrafo dado pela EC
29, de 13.09.2000)”

61
D.J.U., Seção I, em 05.09.1997, e na LEX-STF, vol. 229, pp. 177-219), que concluiu não
ser admissível a progressividade arrecadatória (ou fiscal), devido ao caráter real do IPTU,
restando a respecti ementa assim consignada, verbis:

“EMENTA: IPTU. Progressividade. No sistema tributário nacional é o IPTU


inequivocamente um imposto real. Sob o império da atual Constituição, não á
admitida a progressividade fiscal do IPTU, quer com base exclusivamente no seu art. 145, §
1º, porque esse imposto tem caráter real que é incompatível com a progressividade
decorrente da capacidade econômica do contribuinte, quer com arrimo na conjugação
desse dispositivo constitucional (genérico) com o artigo 156, § 1º (específico). A
interpretação sistemática da Constituição conduz inequivocamente à conclusão de que o
IPTU com finalidade extrafiscal a que alude o inciso II do § 4º do artigo 182 é a
explicitação especificada, inclusive com limitação temporal, do IPTU com
finalidade extrafiscal aludido no artigo 156, I, § 1º. Portanto, é inconstitucional qualquer
progressividade, em se tratando de IPTU, que não atenda exclusivamente ao disposto no
artigo 156, § 1º, aplicado com as limitações expressamente constantes dos §§ 2º e 4º
do artigo 182, ambos da Constituição Federal. Recurso Extraordinário provido,
declarando-se inconstitucional o sub-item 2.2.3 do setor II da Tabela III da Lei 5.641, de
22.12.89, no Município de Belo Horizonte.”

No voto vencedor do RE 153.771-0, que conduziu toda jurisprudência do STF à negativa


de constitucionalidade das alíquota progressivas em função do valor venal dos imóveis,
buscou-se a força no Dire Financeiro, o qual sempre advogou pela distinção entre impostos
reais e pessoa manifestando-se o eminente Ministro Moreira Alves nos seguintes termos:
“(...)Ora, no sistema tributário nacional, é o IPTU inequivocamente um imposto real,
porquanto tem ele como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de imóvel
localizado na zona urbana do Município, sem levar em consideração a pessoa do
proprietário, do titular do domínio útil ou do possuidor, tanto assim que o Código
Tributário Nacional ao definir seu fato gerador e sua base de cálculo não leva em conta as
condições da pessoa do sujeito passivo. E mais: no artigo 130 estabelece que ‘os
créditos tributários relativos a impostos cujo fato gerador seja a propriedade, o domínio útil
ou a posse de bens imóveis,(...),subrogam-se na pessoa dos respectivos adquirentes, salvo
quando conste do título a prova de sua quitação’, o que implica dizer que, se não
constar do título de transmissão a prova de quitação desses impostos (inclusive,
portanto, o IPTU), o sujeito passivo do imposto devido anteriormente à
transmissão do imóvel passa a ser o adquirente, o que importa concluir que essa
obrigação tributária, nesse caso, de certa forma, se aproxima da obrigação ob ou
propter rem, também denominada obrigação ambulatória, porque o devedor não é
necessariamente o proprietário, titular do domínio útil ou possuidor ao tempo em que
ocorreu o fato gerador e nasceu a obrigação tributária, mas pode ser o que
estiver numa dessas posições quando da exigibilidade do crédito tributário,
circunstância esta que mostra, claramente, que nesses impostos não se leva em consideração
a capacidade contributiva do sujeito passivo (...)”
Em suma, objetivou o Pretório Excelso fixar o seguinte balizamento: os impostos reais, tal
como o IPTU, são incompatíveis com o sistema de progressividade (fiscal), por não levarem
em consideração a pessoa do sujeito passivo, de modo que a esta espécie de imposto não
pode ser aplicado o princípio da capacidade contributiva, expresso genericamente no art.
145, § 1º, da Magna Carta.

62
Na verdade, como dito pelo eminente Professor Hugo de Brito Machado4, não existe na
Constituição Federal de 1988 qualquer vedação ao emprego do princípio da capacidade
contributiva em relação aos impostos reais, mas, muito pelo contrário, nela existe norma
expressa que o preconiza, como demonstra:
“Primeiro, note-se que o § 1º do art. 145 não veda de modo nenhum a realização do princípio
da capacidade contributiva relativamente aos impostos reais. É certo que preconiza, tenham
os impostos, sempre que possível, caráter pessoal e sejam graduados em função
da capacidade econômica do contribuinte. Isto, porém, não quer dizer que só os
impostos de caráter pessoal sejam instrumentos de realização do princípio da
capacidade econômica, ou contributiva.
“À primeira vista, pode parecer que os impostos reais não se prestam para a
realização do princípio da capacidade contributiva. Na verdade, porém, assim não é.
No dilema entre a justiça e a produtividade, o legislador contemporâneo inclina-se
para soluções transacionais, introduzindo certa dose de personalização em impostos
outrora havidos como de natureza real.(....)
“Entendemos que não apenas a natureza de certos produtos, mercadorias e serviços,
presta-se para demonstrar capacidade contributiva, como também, muitas vezes, o local, o
ambiente, as circunstâncias em que ocorre o consumo, ou o uso, do produto, mercadoria ou
serviço. Daí sustentarmos a conveniência da instituição de um imposto que tenha como
elemento essencial de sua hipótese de incidência o caráter suntuário de consumo,ou uso, do
bem ou serviço. Quem se hospeda, ou almoça, ou simplesmente consome uma cerveja, ou
mesmo um refrigerante, em um hotel cinco estrelas, seguramente está demonstrando que
tem uma capacidade econômica bastante acima da capacidade econômica média dos
brasileiros. É justo que as pessoas tenham a liberdade de desfrutar dos bens materiais
de que podem dispor, porque são ricas. Essa liberdade o Estado deve assegurar. É
justo, entretanto, que paguem por isso, contribuindo para a manutenção dos serviços
públicos que o Estado deve prestar, especialmente em favor dos mais carentes.
“Não se deve, portanto, afastar dos impostos ditos reais o princípio da capacidade
contributiva. Pelo contrário, tal princípio deve ser aplicado intensamente em relação a
eles. As alíquotas do IPI, por exemplo, estão a merecer uma profunda reformulação, de sorte
a que se cumpra mais rigorosamente o preceito constitucional que ordena seja ele seletivo
em função da essencialidade do produto. Também as alíquotas do ICMS devem ser mais
acentuadamente seletivas em função da essencialidade das mercadorias e serviços
tributados.
“Por fim, é importante que se esclareça, porém, que o fato de ser utilizado um imposto,
como o IPI, para a realização do princípio da capacidade contributiva, como se
colocou acima, não confere a esse imposto um caráter pessoal. Por maior que seja o seu grau
de seletividade em função da essencialidade do produto, segue sendo ele tipicamente um
imposto real. Pela mesma razão, o fato de ter um imposto caráter pessoal não significa que
esse imposto realiza o princípio da capacidade contributiva. Imposto de caráter pessoal,
repita-se, é aquele cujo valor é determinado tendo-se em consideração as condições
pessoais do contribuinte, não necessariamente para o fim de verificar a sua capacidade
contributiva.”
Vê-se, pois, nitidamente, que não é porque o IPTU seja um imposto classificado como real
que não possa se permitir à Administração Tributária Municipal aplicar o princípio da
capacidade contributiva. Tal equívoco a respeito da temática foi, recentemente, explicitado
em decisão de primeira instância no Judiciário Paulista, onde, em sentença proferida pela
MMª Juíza de Direito da 14ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo, Dra. Christine Santini, nos

4
MACHADO, Hugo de Brito. Progessividade e Seletividade no IPTU. In “IPTU, Aspectos Jurídicos
Relevantes”, Coord. Marcelo Magalhães Peixoto – São Paulo: Quartier Latin, 2002. P. 259-62.

63
autos do Mandado de Segurança nº 053.02.005274-2, impetrado pela empresa ALLPAC
EMBALAGENS LTDA., a ilustre magistrada declarou incidentalmente a inconstitucionalidade da
EC nº 29/2000, fundamentando seu entendimento na classificação dos impostos em reais
e pessoais, e que a aplicação da progressividade de alíquotas em razão do valor do
imóvel feriria o princípio da isonomia entre os contribuintes, razão pela qual afastou do
ordenamento jurídico a Lei Municipal nº 13.250/2001, que havia instituído a progressividade
no Município de São Paulo. Obviamente, por se tratar de matéria sujeita a duplo grau de
jurisdição, poderá ser reformada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, mas, em função da
orientação traçada pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 153.771-0-
MG, são grandes as chances de sua manutenção in totum pelos tribunais superiores.
De qualquer modo, tem-se que a relação jurídico-tributária a envolver o fisco e o
contribuinte, ou responsável tributário, é de ordem pessoal, obrigacional, e não real. A
expressão “sempre que possível”, ao nosso sentir, não foi colocada no § 1º do art. 145 da CF,
no intuito de excluir do albergue do princípio da capacidade contributiva os impostos reais,
porque, se a vontade do legislador originário fosse a de realizar esta exclusão, o teria feito
expressamente, e não o fez.5
Ressalte-se que a progressividade fiscal no IPTU não somente como finalidade a realização do
princípio da capacidade contributiva, mas é, em última instância, a concretização de um
ideal de igualdade material e de justiça fiscal. Para o doutor Everardo Maciel, citado pelo
Prof. Hugo Machado em seu artigo, a igualdade que realiza a justiça é a igualdade horizontal.
A nosso ver, entretanto, a máxima aristotélica que citamos no prefácio deste trabalho e que
foi eternizada pelo insigne Rui Barbosa diz diferente: a verdadeira igualdade consiste em
aquinhoar desigualmente aos desiguais na medida em que se desigualam:6 “Portanto, na
tributação, alguém que possua um imóvel de valor elevado, ou de pequeno valor, ou
localizado em bairro pobre, com utilização ou destinação comercial, ou prestação de
serviços, para residência ou atividade essencial ou supérflua, todas estas situações são
diferenciações relevantes que justificam o tratamento diferenciado na tributação do IPTU.7
Como salientado no início, uma das razões que sustentam a manutenção, em
nosso sistema tributário, da chamada proporcionalidade de alíquotas, é a de que ela

5
A respeito do assunto, são louváveis as palavras de Sacha Calmon Navarro Coelho, em seuManual de
Direito Tributário, 2ª ed., RJ: Forense, 2002, p.206: “É notável, no particular, comotratadistas de
renome, tirantes os leguleios, continuam a proclamar que o IPTU é um imposto real,denunciando com
isso: a) a má assimilação de lição da Ciência das Finanças; e b\ insuficienteacuidade de análise
jurídica, decorrente de repetição, sem espírito crítico, de avelhantadas afirmações. Sem embargo,
estamos convencidos de que tal vezo enraíza-se, a par dos vícios acima expostos, em uma lembrança
mal compreendida de certo tipo obrigacional que existia entre os romanos. Referimo-nos à obrigação
ambulatória, em que a prestação era certus na e certus quando, mas o sujeito passivo tanto podia
ser conhecido como não, por isso que a coisa ambulava com o dono, e este nem sempre era o mesmo
(ambulant cum dominus). Este tipo de obrigação era comum em tributos que recaíam sobre bens
imóveis, terras e edificações. Os romanos não se preocupavam com a coisa, por isso que a sua
propriedade ‘ambulava’, em sentido legal, com seu dono, e este era exatamente quem devia pagar o
tributo, fosse lá quem fosse. A muitos pareceu que a pessoa não tinha importância, mas a coisa,
irrelevante o seu dominus, daí a idéia de um tributo real. Ora, dava-se extamente o contrário. A
pessoa do proprietário era o que importava, por isso que o tributo incidia sobre a condição
jurídica ‘ ser proprietário’: o imposto era pessoal. Real era o direito.”
6
Com o surgimento e a evolução do Estado Democrático de Direito, passou-se a buscar as efetivas
dimensões do princípio da igualdade e, num primeiro momento, partiu-se do pressuposto da existência
de uma igualdade material de todos os cidadãos, sintetizada no pensamento de Rui Barbosa. Ocorre,
porém, conforme assevera Elizabeth Carraza, em obra adiante citada, “que no mundo fático não
existe a igualdade absoluta. As desigualdades existem e decorrem da própria natureza. Devem,
porém, ser minimizadas pelo Estado, no desempenho de suas funções, sempre que, ao lume da Carta
Fundamental, sejam ilegítimas.”

7
ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária. 6ª ed., Malheiros ed., 2000, p. 141.

64
seria, em tese, um sistema supostamente “neutro”, posto que lastreado em pressupostos
legais tendentes à realização da garantia constitucional da vedação ao confisco, enunciadas
no artigo 150, inciso IV, da CF/88. Ora, proporcionais seriam os impostos cujo valor a pagar é
definido, em cada caso, pela conjugação de dois elementos estabelecidos
abstratamente na lei instituidora: base de cálculo e alíquota. A base de cálculo, nos impostos
proporcionais, é grandeza ou medida de valor, estabelecida abstratamente na lei (no caso do
IPTU, o valor venal do imóvel). A alíquota, por seu turno, é o percentual, a parte da grandeza
que representará, após singela operação aritmética, o exato valor do imposto devido. É a
alíquota, pois, o elemento definidor da parte do signo presuntivo de riqueza que deverá ser
recolhido aos cofres estatais. Nos impostos proporcionais, o montante a pagar a título de
imposto será, sempre, proporcionalmente igual, independentemente das características de
cada contribuinte, uma vez que nesses impostos a alíquota é única, invariável. Obviamente
que o montante a pagar, de acordo com o valor ‘inconcreto’ da base de cálculo, será maior
ou menor conforme o seja a riqueza tributada. Em tese, alguns tratadistas renomados
sustentam que a proporcionalidade – obtida pela aplicação de uma alíquota única sobre
base tributável variável – é um instrumento de justiça fiscal ‘neutro’, onde se realiza de
forma ideal o princípio da capacidade contributiva, que, em síntese, postula que o
desembolso de cada qual seja proporcional à grandeza da expressão econômica do fato
tributado.
Sem querer entrar a fundo nas divergências doutrinárias a respeito da questão de saber
se a proporcionalidade realiza ou não uma justiça fiscal ‘neutra’, a realidade é que, na
insofismável lição de Geraldo Ataliba8, “os impostos que não sejam progressivos – mas que
tenham a pretensão de neutralidade – na verdade, são regressivos, resultando em injustiça
e inconstitucionalidade. A progressividade é constitucionalmente postulada, tanto a de
caráter fiscal (inerente ao próprio tributo) como a extrafiscal (promoção de uma
igualação social – eliminação da desigualdade), o favorecimento dos desvalidos, a
criação de empregos, o desenvolvimento econômico, a melhoria das condições de vida, a
proteção do meio ambiente, etc., são valores que mereceram do constituinte especial
encômio.” Cumpre verificar que a eficácia do sistema tributário brasileiro, calcado nos
princípios e valores definidos na Magna Carta, deixa claro que a exacerbação do
individualismo econômico produz uma crescente desigualdade de renda, intensada pelas
vicissitudes imanentes ao nosso capitalismo tardio. No crescente apelo por políticas
eqüitativas reside o dilema: toda a ação afirmativa do Estado, destinada a distribuir a riqueza
social, tende a expandir o conceito de incidência tributária para além das fronteiras tênues
da autolimitação da liberdade, pois afeta as esferas do mínimo existencial e do não-confisco.
Diante do paradoxo, o sistema tributário acaba por operar de maneira regressiva sobre a
população, incidindo gravemente, em termos relativos à renda, nas famílias com menor poder
aquisitivo, constituindo-se num dos fatores que contribui decisivamente para a manutenção
dos níveis de concentração de renda e de desigualdade sociais observados no país, muito
embora, como é sabido, as origens destes problemas sejam bem mais complexos e estejam
além da inequívoca tributação regressiva praticada pelo Estado em relação ao imposto
imobiliário9.
A tese da regressividade dos impostos proporcionais recebeu guarida em estudo que honrou a
Dra. Claudia De Cesare - assessora em assuntos relacionados à tributação imobiliária e

8
ATALIBA, Geraldo. Progressividade e Capacidade Contributiva, Separata da Revista de Direito
Tributário, 1991, p. 49.
9
Estereotipada por longos anos de vida rural, um dos efeitos da improvisação quase forçada de uma
espécie de burguesia urbana no Brasil, está o que Sérgio Buarque de Holanda (in “Raízes do Brasil” –
21ª ed., Rio de Janeiro: José Olympio, 1989, p. 55) chama de “mentalidade de casa-grande”, que
invadiu as cidades e conquistou todas as pessoas, sem exclusão das mais humildes. Ou seja, num país
que, durante a maior parte de sua existência, foi terra de senhores e escravos, os centros urbanos
brasileiros, desde os seus primórdios, nunca deixaram de se ressentir fortemente da ditadura dos
domínios rurais. (n. do autor)

65
avaliação de imóveis da Secretaria da Fazenda do Município de Porto Alegre - com o Ph.D
pela Universidade de Saltford – Inglaterra 10. Fundamentalmente, defende a Profª. De Cesare
que a instituição do tributo imobiliário com alíquotas progressivas contribui para tornar o
Sistema Tributário Nacional menos regressivo e, portanto, mais justo. E assim justifica:
“Diversos estudos prévios identificam que, à medida em que a renda aumenta, os gastos com
habitação ocupam uma percentagem menor da renda das famílias. A adoção de uma alíquota
única (para imóveis de uso residencial, p.ex.) para o imposto imobiliário resultaria em uma
tendência a regressividade, isto é, na incidência de uma carga tributária maior
proporcionalmente sobre as famílias mais pobres. (...) Aplicar alíquotas progressivas
para o cálculo do imposto sobre a propriedade imobiliária tendo por objetivo a
progressividade fiscal do tributo, isto é, gerar uma carga tributária maior
proporcionalmente para as famílias de maior capacidade econômica, é uma decisão de
cunho fortemente ideológico. A análise apresentada no presente estudo demonstrou que
a adoção de uma alíquota única (invariável) para os imóveis residenciais resulta em um
imposto sobre a propriedade imobiliária regressivo. Ou seja, a carga tributária do IPTU
é maior proporcionalmente para as famílias de menor capacidade econômica, porque o
imposto absorve uma parcela maior da renda das famílias de baixa renda. Esta conclusão está
diretamente relacionada à inerente regressividade do imposto sobre a propriedade,
causada pelo fato de que as famílias mais ricas precisam de menos meses de salário para
adquirir um imóvel. A associação da regressividade inerente do imposto com a extrema
concentração de riquezas existente sugere que alíquotas progressivas poderiam ser
aplicadas para tornar o IPTU mais justo. O uso de alíquotas progressivas para o IPTU seria
recomendável se a progressividade introduzida servisse para eliminar a característica
regressiva do imposto proporcional, contribuindo para um sistema ‘neutro’. Neste
sentido, a diferenciação de alíquotas seria estabelecida dentro dos limites da razoabilidade,
visando apenas à correção do viés identificado na relação entre o ‘Preço do Imóvel’ e a
‘Renda Familiar’.” (o grifo é meu)
Esta razoabilidade se estabelece, como decorrência lógica do princípio da capacidade
contributiva, com a limitação imposta pelo art. 150, inciso IV, da CF, que veda à União, aos
Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a utilização do tributo com efeito de confisco,
donde decorre que o confisco em si mesmo será vedado – salvo aquele do art. 243 e § único,
referente às glebas utilizadas para o cultivo ilegal de plantas psicotrópicas – ainda que não
seja consequência de tributo. Também a razoabilidade na instituição de alíquotas
progressivas se estabelece num outro patamar, que o filósofo do direito Siches chama de
lógica do razoável e que contemplaria, ao lado da justiça, o conjunto de valores11 que
formam o direito enquanto ciência de objeto cultural, que nos valiosos ensinamentos de
Dilthey, somente pela ‘compreensão’ podemos conhecê-lo, e não pela ‘explicação’,
constituindo aquilo que já se denominou método empírico-dialético12. Nesse sentido, é
preciso ter em linha de conta, como já citado pela Dra. De Cesare, as decisões de forte cunho
ideológico que envolvem a instituição, pelos Municípios brasileiros e da AL, da progressividade
fiscal do IPTU. Obviamente, interesses poderosos tentarão obstaculizar, de qualquer forma, a
implantação nos Municípios do comando constitucional insculpido no inciso I do § 1º do art.

10
DE CESARE, Claudia Monteiro. An Empirical Analysis of a Property Tax System: a Case Study from
Brazil.
11
Conforme ensina A L. Machado Neto, in Compêndio de Introdução à Ciência do Direito, Ed. Saraiva,
São Paulo, 1969, p. 75, ao lado do justo, costuma-se afirmar que formam o plexo axiológico-jurídico
um total de sete valores: ordem, segurança, poder, paz, cooperação, solidariedade e
justiça e, ao se privilegiar, demasiadamente, um dos valores, por maior importância que possa ter, no
caso, a busca do justo, fatalmente se desatenderá aos demais.

12
Conforme Machado Neto, op. Cit., onde resume a teoria de Wilhelm Dilthey e aprecia a formulação,
com base nela, de Cóssio, sobre o método empírico-dialético, p. 268.

66
156 da CF, com a redação dada pela EC nº 29/2000. E, para evitar um raciocínio jurídico
empreendido a partir de uma lógica formal (obtida através da exegese de um dispositivo
legal, por exemplo) que conduza a uma conclusão dúbia, irritante, agressiva aos valores
prestigiados pelo direito, causando uma insegurança jurídica que inevitavelmente abarrotará
as mesas dos juízes, promotores e procuradores de municípios, é preciso, sempre , ter em
mente, que por objeto visamos problemas humanos, de natureza jurídica e política e que
devem, por isso, ser compreendidos em seus sentidos e conexões de significados, operando
sempre com valores e estabelecendo finalidades e propósitos.
Conseqüentemente, dois aspectos – citados pelo Prof.Gilberto Marques Bruno, em magistral
arrazoado13 -, devem ser observados, ao lado da já citada obediência ao princípio
constitucional da vedação da utilização do tributo com efeito de confisco: (i) tanto o Poder
Executivo, quanto o Poder Legislativo Municipal, têm o dever legal de respeitar os
preceitos consubstanciados na Carta de Regência Brasileira, destacando-se entre eles, os
direitos e garantias individuais, o processo legislativo, a hierarquia das leis e, dentro do
Sistema Tributário Nacional, o Capítulo que cuida das limitações constitucionais ao poder de
tributar (em geral). A fiel observância de tais preceitos, adicionando-se o cumprimento
ao disposto nas Constituições Estaduais e também nas Leis Orgânicas Municipais, enseja a
edição de atos normativos essencialmente legalizados, evitando-se, assim, as
incansáveis discussões no âmbito do Poder Judiciário em todos os seus níveis; e (ii) a
progressividade fiscal no IPTU deve se adequar à realidade de cada uma das administrações
nas mais diferentes localidades do Brasil, onde os representantes do executivo municipal, na
medida em que estejam exercendo seus papéis de administradores da coisa pública, o façam
com lisura e respeito aos contribuintes, instituindo alíquotas progressivas em razão do valor
do imóvel dentro de critérios de bom senso e razoabilidade, de sorte que as exações
tributárias não viessem, ao longo do tempo, representar perda patrimonial, reduzindo o valor
econômico dos imóveis.
Também em termos de bom senso e razoabilidade, dentro dos parâmetros de uma proposta
de redução da iniqüidade na tributação imobiliária, uma crítica relevante tem sido feita aos
deficientes modelos de aferição da base de cálculo do IPTU e das inconsistências dos
cadastros imobiliários – com isto, sustentam alguns, o valor do imóvel não reflete
necessariamente a capacidade contributiva do sujeito passivo e, portanto, se hoje podemos
eliminar a regressividade do sistema proporcional por meio de alíquotas progressivas,
podemos ter na chamada base imponível (base de cálculo em concreto) uma série de
distorções e erros que fatalmente levarão a um outro tipo de regressividade, ensejadora de
séria iniqüidade na distribuição da carga tributária. Sobre este assunto, com propriedade,
disserta a Profª. DE CESARE:
“A Regressividade no imposto sobre a propriedade imobiliária pode resultar
basicamente de duas fontes: imperfeita administração e intrínseca natureza do imposto
(Paglin e Fogarty, 1972; Edelstein, 1979); o grau de eqüidade das avaliações empregadas no
estabelecimento da base de cálculo do imposto, isto é, do valor de mercado dos
imóveis, depende diretamente dos seguintes fatores:
- habilidade de avaliar os imóveis com acurácia;
- habilidade de controlar a qualidade das avaliações;
- realização de reavaliação dos imóveis em intervalos curtos de tempo para garantir
que alterações no mercado imobiliário sejam refletidas nas avaliações; e
- existência de cadastro de imóveis adequado, contendo os principais elementos
responsáveis pela formação dos preços dos imóveis.

13
BRUNO, Gilberto Marques. A Progressividade do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial
Urbana. In IPTU, Aspectos Jurídicos Relevantes. Coord. Marcelo Magalhães Peixoto – São Paulo:
Quartier Latin, 2002, p. 215.

67
“Naturalmente que distorções e erros na avaliação da base de cálculo do imposto
afetam diretamente a distribuição da carga tributária. Ou seja, devido unicamente à baixa
qualidade das avaliações, isto é, imperfeições na administração do imposto, a carga
tributária pode ser equivocamente transferida entre diferentes grupos de renda e
mesmo internamente entre os elementos que compõem cada grupo (Sabella, 1975).
Portanto, a precisa avaliação da base de cálculo do imposto é imprescindível para a justiça
fiscal.” (o grifo é meu)
Deve-se, portanto, identificar quais são os limites constitucionais e legais colocados à
disposição dos legisladores municipais no que se refere a determinação da base de cálculo do
IPTU, uma vez que tal determinação guarda intrínseca relação com a possibilidade de
cobrança deste imposto de maneira progressiva. No que concerne exclusivamente à
determinação da base de cálculo do IPTU, necessário se faz compreender o que deve ser
entendido, então, por ”valor venal do imóvel”, expressamente referido no art. 33 do Código
Tributário Nacional (CTN), bem como esclarecer a quem compete definir este seu valor e qual
o veículo adequado para sua entrada no mundo jurídico. Considerando que a lei determina
que a base de cálculo seja o valor de mercado do imóvel, como salienta Nygaard14, “é vedado
que a administração utilize métodos ou critérios de avaliação inconsistentes e
dissociados da realidade; a abstrata definição, em lei, do critério de aferição do valor
tributável, determina que, concretamente, em cada fato imponível, seja o valor concreto
correspondente à descrição legal; quer dizer, se a lei diz que a base de cálculo é o valor de
mercado, necessariamente o valor concretamente atribuído a cada imóvel deverá
corresponder ao seu valor de mercado no momento da ocorrência do fato gerador.”
Analisando a definição de valor venal, o Prof. Aires Fernandino Barreto afirma que “é possível
conceituar valor venal como o valor normal que qualquer bem comercial obtém no mercado.
A seu turno, valor venal do imóvel nada mais é do que espécie desse gênero e como tal não
foge às regras que ditam a apuração dos demais valores venais. Os valores venais, quaisquer
que sejam, são sempre decorrentes das forças econômicas que caracterizam a lei da oferta e
da procura; todavia, ademais disso, são valores altamente influenciados por fatores
psicológicos ou subjetivos. Por isso, é temerário afirmar que na sua busca se venha a
encontrar alguma coisa mais precisa do que um ‘ valor provável de venda’.”15
Como pode-se facilmente depreender, a determinação da base de cálculo do IPTU não possui
uma precisão matemática, sendo, desta forma, presumido em relação aos valores que podem
ser obtidos no mercado por aquele imóvel. Entretanto, como pressuposto inerente ao
princípio da isonomia, a presunção daquele valor torna-se necessária, devendo ficar adstrita
aos limites legalmente aceitos, que permitam ao contribuinte demonstrar, cabalmente,
qualquer discrepância existente entre a valoração inicialmente determinada e a realmente
obtida nas negociações ocorridas em situações reais, possibilitando a adequação do valor
presumidamente fixado, se for o caso16.

14
NYGAARD, Gustavo. Presupuestos Legales y Constitucionales para la Creación de Impuestos sobre la
Propiedad Urbana. Texto interno ao Curso de Desarrollo Profesional sobre Impuestos e Ça Propiedad
Inmobiliaria, Lincoln Institute of Land Policy, Cambridge – USA, 2003.

15
BARRETO, Aires Fernandino. Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU, in Curso de Direito
Tributário, vol. 2, 2ª Edição, Ed. CEJUP, Belém, 1993, p. 318.

16
Cfe. CICONELO, Ricardo Malachias. O Imposto sobre Propriedade Predial e Territorial Urbano –IPTU e
sua Base de Cálculo, in IPTU, Aspectos Jurídicos Relevantes. Coord. Marcelo Magalhães Peixoto – São
Paulo: Quartier Latin, 2002, p. 553.

68
No caso do IPTU, a definição do valor venal dos imóveis se dá através da edição, veiculada por
intermédio de lei strictu sensu,17 da chamada Planta Genérica de Valores, utilizada como
padrão para determinar a valorização dos imóveis nas transações realizadas naquele local. Ou
seja, como garantia ao princípio do tratamento isonômico entre contribuintes que se
encontrem na mesma situação, os municípios, baseados nos negócios realizados e na
experiência adquirida em relação ao seu território, “presumem que determinado imóvel possa
atingir um certo valor em caso de negociação e, assim sendo, admitem este valor como
verdadeiro num primeiro momento, para fins de lançamento do imposto”.18
As eventuais inconsistências nas avaliações utilizadas para a determinação da base de cálculo
do tributo imobiliário não são óbices tendentes a impedir a prevalência do princípio da
capacidade contributiva, uma vez que, mesmo admitindo-se devidamente veiculadas as
referidas Plantas Genéricas de Valores e considerando-se ainda os limites aplicáveis à
utilização de presunções no campo do Direito Tributário, tem o contribuinte o justo e fundado
direito de divergir do valor exigido pela Administração Fazendária a título de IPTU, todas as
vezes que os valores lançados não correspondam àqueles que são realmente praticados no
mercado em relação ao imóvel tributado. Não se pode perder de vista o fato de que a única
presunção admitida em Direito Tributário é a presunção relativa (iuris tantum), que , por
definição, admite a prova em contrário.19 Ademais, não convém esquecer, nas palavras da
Dra. De Cesare, que as avaliações realizadas para fins tributários dependem da aprovação de
um corpo político – o Poder Legislativo local – cuja resistência em aceitar avaliações mais
precisas é histórica, muitas vezes impondo restrições sérias aos efeitos das avaliações no
imposto, em função, por exemplo, da inflação, ao teor do que dispõe a Súmula 160 do STJ,
que impede a atualização de valores do IPTU mediante ato exclusivo do Poder Executivo.
Parte da problemática que envolve as inconsistências nas avaliações deve-se também, a uma
responsabilidade do corpo legislativo municipal, que por injunções diversas acaba por gerar,
por ação ou omissão, uma violação clara ao princípio da isonomia e, conseqüentemente,
malferindo o da capacidade contributiva na apuração e determinação de critérios de aferição
do valor tributável lastreados em uma base de cálculo dissociada da realidade.
Por fim, cabe enfatizar que a progressividade fiscal instituída a partir da EC nº 29/2000 é o
corolário – ou, como alguns doutrinadores de escol afirmam, um refinamento – do princípio da
capacidade contributiva e, num grau axiologicamente superior, do princípio da isonomia, de
modo que a carga tributária seja mais significativa para os contribuintes que revelam superior
riqueza20 e menos onerosa para os cidadãos de mais baixa renda. Durante muito tempo a

17
“Art. 97 (CTN): Somente a lei pode estabelecer: (....) II – a majoração de tributos, ou sua redução,
ressalvado o disposto nos arts. 21.26,39,57 e 65; (....) IV – a fixação da alíquota do tributo e da sua
base de cálculo, ressalvado o disposto nos arts. 21,26,39,57 e 65; (...)
18
Cfe. CICONELO, Ricardo Malachias. Op. Cit., p. 554.
19
“Antes de mais importa recordar que as “Plantas Genéricas de Valores” consistem na fixação de
critérios genéricos de apuração dos valores do metro quadrado de terreno e de construção, dos
fatores de correção e dos métodos de avaliação. Revestem assim a natureza jurídica de presunções
legais, o que redunda no caso concreto em atribuir ao imposto sobre a propriedade predial e
territorial urbana uma base de cálculo presumida. (...) Ora, a planta genérica de valores não pode
revestir a natureza de uma presunção legal absoluta ou uma ficção legal. Se assim fosse, ela não faria
prova do valor venal do terreno ou de construção, mas substituir-se-ia à prova, dando como provado
precisamente aquilo que se pretende provar”. (“Presunções no Direito Tributário”, in Caderno de
Pesquisas Tributárias – Vol. 9 , Ed. Resenha Tributária, São Paulo, 1984, p. 93)

20
Elizabeth Nazar Carrazza (IPTU e Progressividade. Curitiba: Juruá Editora, 1ª ed. – 3ª tiragem, 2002,
p. 91) afirma, com inteira razão, que “O IPTU – como todo e qualquer imposto – deve obedecer ao
princípio da capacidade contributiva, que vem expresso no artigo 145, § 1º, da Constituição Federal.
Por incidir sobre o direito de propriedade, a capacidade contributiva a que alude a Constituição
Federal – e que o legislador ordinário deverá levar em conta ao criar o imposto – é de natureza

69
capacidade contributiva foi vista como um princípio de natureza econômica, muito mais do
que jurídica. Hoje, com a juridicização do princípio da capacidade contributiva, ele se tornou
efetivo para, nas palavras de Misabel Derzi 21, consagrar o princípio da isonomia, ou seja, “o
dever imposto ao legislador de distinguir disparidades”. A Constituição Federal de 1988, já no
seu preâmbulo, prestigiou expressamente o princípio da isonomia como um ‘superprincípio’,
no qual se consigna a instituição de um Estado Democrático de Direito, destinado a assegurar
o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o
desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna,
pluralista e sem preconceitos. Albergar o princípio da capacidade contributiva com a
instituição da progressividade fiscal no IPTU é garantir a todos o exercício da cidadania,
devendo o ente estatal exercer um papel decisivo e insubstituível na aplicação normativa do
tributo e na execução das políticas públicas condizentes com o que preceitua o preâmbulo de
nossa Magna Carta. Assim, justiça (legal) e eqüidade andarão juntas, sem que esta tenha que
ser, sempre, o corretivo daquela, na visão de Aristóteles.

objetiva. Refere-se a uma manifestação objetiva de riqueza do contribuinte (ter um imóvel). Este o
fato-signo presuntivo de riqueza, a que se refere ALFREDO AUGUSTO BECKER.” (o grifo é nosso)

21
DERZI, Misabel. Do imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana, SP, Saraiva Ed.,1982,
p.63.

70

S-ar putea să vă placă și