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Revista Trimestral de
Jurisprudência
PRIMEIRA TURMA
Pág.
ACÓRDÃOS.............................................................................................1
ÍNDICE ALFABÉTICO............................................................................I
ÍNDICE NUMÉRICO...........................................................................XXIII
ACÓRDÃOS
AGRAVO REGIMENTAL NA AÇÃO RESCISÓRIA 1.754 — BA
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal
Federal, por seu Tribunal Pleno, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigrá-
ficas, por unanimidade de votos, desprover o agravo regimental, nos termos do voto do
Relator.
Brasília, 6 de abril de 2005 — Nelson Jobim, Presidente — Carlos Ayres Britto,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Carlos Ayres Britto: Trata-se de agravo regimental contra decisão
singular que, apoiada no art. 21, § 1º, do RISTF, negou seguimento a ação rescisória que
põe em debate índices de correção monetária atinentes ao Fundo de Garantia por Tempo
de Serviço – FGTS.
4 R.T.J. — 195
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Ayres Britto (Relator): Conforme expus na decisão impugnada,
a inicial da ação rescisória é feita numa moldura única, aplicada a várias ações da mesma
natureza, pelo mesmo causídico. Nesse modelo, a parte autora não se dá ao trabalho de
especificar os índices que pleiteia, nem identifica o recurso extraordinário em que foi
proferido o acórdão rescindendo. Transfere esse encargo para o Relator e a parte contrá-
ria, juntando apenas as cópias pertinentes ao caso.
7. De qualquer forma, o pedido teve curso nesta Suprema Corte, com defesa da
requerida e parecer da Procuradoria-Geral da República, redundando na decisão ora
agravada. Decisão que se louvou no precedente alusivo ao Agravo Regimental na
Ação Rescisória n. 1.756, Relator Ministro Marco Aurélio, julgado na Sessão Plenária
de 19-8-2004.
8. Conforme já adiantei no relatório, a Corte examinou, no mencionado julga-
mento, caso semelhante ao presente, patrocinado pelo mesmo advogado, dele resul-
tando a seguinte ementa:
“Ação rescisória — Violência à literalidade de norma — Decisão rescin-
denda em harmonia com precedente do Plenário. Estando a decisão rescindenda
em harmonia com precedente do Plenário, mostra-se manifestamente infundada a
argüição de ofensa a texto constitucional.
Ação rescisória — Negativa de seguimento — Atuação do Relator. Conso-
ante dispõe o artigo 21, § 1º, do Regimento Interno, é atribuição do Relator negar
seguimento a pedido ‘improcedente e, ainda, quando contrariar a jurisprudência
predominante do Tribunal’.”
9. Por via de consequência, non nova sed nove. O presente agravo chove no
molhado, permito-me dizer. Embora não se possa desestimular a busca e o exercício da
jurisdição, em todos os níveis, fica a impressão, nesses casos, de que o demandante usa
e abusa do jus postulandi, certo de que o manto da Justiça Gratuita o isentará, em todos
esses lances, do pagamento de custas e honorários, bem como do depósito a que se refere
o art. 488, inciso II, do CPC.
10. Ante o exposto, nego provimento ao agravo.
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EXTRATO DA ATA
AR 1.754-AgR/BA — Relator: Ministro Carlos Britto. Agravantes: Mário Vidal de
Santana e outro. (Advogado: Jairo Andrade de Miranda). Agravada: Caixa Econômica
Federal — CEF (Advogados: Augusto Bonfim Nery e outros).
Decisão: O Tribunal, por unanimidade, desproveu o agravo regimental, nos termos
do voto do Relator. Ausente, justificadamente, a Ministra Ellen Gracie. Presidiu o julga-
mento o Ministro Nelson Jobim.
Presidência do Ministro Nelson Jobim. Presentes à sessão os Ministros Sepúlveda
Pertence, Celso de Mello, Carlos Velloso, Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Cezar Peluso,
Carlos Britto, Joaquim Barbosa e Eros Grau. Procurador-Geral da República, Dr. Cláudio
Lemos Fonteles.
Brasília, 6 de abril de 2005 — Luiz Tomimatsu, Secretário.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal
Federal, em Sessão Plenária, sob a presidência da Ministra Ellen Gracie (RISTF, art. 37, I), na
conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos,
6 R.T.J. — 195
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Gilmar Mendes: A Procuradoria-Geral da República assim relata o
presente Inquérito:
“O Ministério Público Federal, em 02.08.2002, perante o MM. Juízo da 2ª
Vara Federal da Seção Judiciária do Estado do Tocantins, ofereceu denúncia em
desfavor de Jader Fontenelle Barbalho, Roseana Sarney Murad, Jorge Francisco
Murad Júnior, Teodoro Hubner Filho, José Artur Guedes Tourinho, Maurício
Benedito Barreira Vasconcelos, Maria Auxiliadora Barra Martins, Antonio José
Costa de Freitas Guimarães, Valmor Felipetto, Amauri Cruz Santos, Magaly
Hubner, Ulbi Arlant, Roderjan Busato, Arnaldo Lopes da Silveira, Alexandre
Rizzotto Falcão, Adaljor Dlugonski Lemos, Paulo Ivan Alberti, Márcia Pastor da
Silva Pinheiro, Antônio dos Santos Ferreira Neto, Raimundo Rogério Dias Magalhães,
Madson Antônio Brandão da Costa, Antônio Alves de Oliveira Filho, Mário Jorge de
Macedo Bringel, Honorato Luis Lima Cosenza Nogueira, Admilson Fernando de
Oliveira Monteiro e Maria José Correa Alves por vários ilícitos penais perpetra-
dos em desfavor da extinta Sudam. (fls. 03/78). Posteriormente, o parquet federal
aditou a peça acusatória (fls. 752/772).
2. Em decisão fundamentada de 09.08.2002, proferida a fls. 774/792 (vol. 4),
o ilustre magistrado processante rejeitou a denúncia em relação aos denunciados
Roseana Sarney Murad e Arnaldo Lopes da Silveira, por não vislumbrar a presen-
ça de justa causa, e recebeu a peça acusatória em relação aos demais denunciados.
3. O Ministério Público Federal interpôs recurso em sentido estrito em face
da decisão que não recebeu a denúncia oferecida contra Roseana Sarney Murad e
Arnaldo Lopes da Silveira (fls. 813/842).
4. Foram citados e interrogados todos os réus: Jader Fontenelle Barbalho
(fls. 1280/1285), Jorge Francisco Murad Júnior (fls. 1041/1044), Teodoro
Hubner Filho (fls. 1787/1788), José Artur Guedes Tourinho (fls. 1287/1291),
Maurício Benedito Barreira Vasconcelos (fls. 1063/1068), Maria Auxiliadora
Barra Martins (fls. 1239/1241), Antônio José Costa de Freitas Guimarães (fls.
1242/1244), Valmor Felipetto (fls. 1789/1790), Amauri Cruz Santos (fls. 1791/
1792), Magaly Hubner (fls. 1793/1794), Ulbi Arlant (fls. 1796/1797), Roderjan
Busato (fls. 1798/1799), Alexandre Rizzotto Falcão (fls. 1036/1040), Adaljor
Dlugonski Lemos (fls. 1800/1801), Paulo Ivan Alberti (fls. 1802/1803), Márcia
Pastor da Silva Pinheiro (fls. 1245/1247), Antônio dos Santos Ferreira Neto (fls.
1248/1250), Raimundo Rogério Dias Magalhães (fls. 1306/1310), Madson Antonio
Brandão da Costa (fls. 1303/1305), Antônio Alves de Oliveira Filho (fls. 1297/
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1301), Mário Jorge de Macedo Bringel (fls. 1294/1296), Honorato Luis Lima
Cosenza Nogueira (fls. 1267/1270), Admilson Fernando de Oliveira Monteiro (fls.
1274/1277) e Maria José Correa Alves (fls. 1271/1273).
5. Apresentaram defesa prévia os réus: Jader Fontenelle Barbalho (fls. 1412/
1515), Jorge Francisco Murad Júnior (fls. 1045/1047), Teodoro Hubner Filho e
Magaly Hubner (fls. 1929/1937), José Artur Guedes Tourinho (fls. 1535/1546),
Mauricio Benedito Barreira Vasconcelos (fls. 1069/1081), Antonio José Costa de
Freitas Guimarães (fls. 1313/1360), Valmor Felipetto (fls. 1918/1919), Amauri
Cruz Santos (fls. 1976/1985), Ulbi Arlant (fls. 1986/1996), Roderjan Busato (fls.
1972/1975), Alexandre Rizzotto Falcão (fls. 1048/1049), Adaljor Dlugonski Lemos
(fls. 1920/1921), Paulo Ivan Alberti (fls. 1938/1951), Márcia Pastor da Silva
Pinheiro e Antonio dos Santos Ferreira Neto (fls. 1401/1403), Raimundo Rogério
Dias Magalhães (fls. 1606/1608), Madson Antonio Brandão da Costa (fls. 1572/
1604), Antonio Alves de Oliveira Filho (fls. 1567/1570), Mario Jorge de Macedo
Bringel (fls. 1549/1557), Honorato Luis Lima Cosenza Nogueira, Admilson
Fernando de Oliveira Monteiro e Maria José Correa Alves (fls. 1407/1410). A ré
Maria Auxiliadora Barra Martins não apresentou defesa prévia (fls. 1312).
6. O réu Jader Barbalho requereu a declinação do feito a esse Excelso Supremo
Tribunal Federal em razão de sua diplomação como Deputado Federal (fls. 1998/
1999).
7. O MM. Juízo da 2ª Vara Federal da Seção Judiciária do Estado do
Tocantins determinou a remessa dos autos a essa Suprema Corte (fls. 2009).”
Remetidos os autos à Procuradoria-Geral da República requereu-se “a reautuação
do feito como ação penal e o regular prosseguimento desta, com a inquirição das teste-
munhas arroladas a fls. 77/78, excetuados os réus já ouvidos em juízo: Teodoro Hubner
Filho, Magaly Hubner, Amauri Cruz Santos, Roderjan Busato e Ulbi Arlant.” (Fl.
2022)
Jorge Franciso Murad Júnior apresentou petição, sustentando que:
“(...) a própria denúncia oferecida em Palmas afirma que todos os fatos se
deram em Belém e em São Luís do Maranhão. Nada aconteceu em Tocantins. A
escandalosa cautelar antecedente de busca e apreensão foi deferida em outro
inquérito em que apurava operações da empresa Nova Holanda, com sede em
Balsas, no Maranhão, mas foi utilizada para considerar-se ‘prevento o Juízo de
Palmas, em Tocantins, porque nela foi incluída a devassa na empresa Lunus, de
propriedade da então Governadora Roseana Sarney e do Requerente, seu marido e
Secretário de Estado.
E os fatos desta ação penal, segundo o libelo acusatório, dizem respeito ao
projeto Usimar, que nada tem que ver com a empresa Nova Holanda. De qualquer
forma, todos os fatos, de um e de outro inquérito, deram-se no Maranhão e em
Belém do Pará. Tanto que o Inquérito Civil sobre os mesmos fatos foi instaurado
pelo Ministério Público Federal no Maranhão e, em São Luís, foi proposta a decor-
rente ação civil pública (Doc. 2). O inquérito policial, sobre os mesmos fatos, não
podia tramitar em Palmas, onde nada aconteceu, e não podia tramitar sob jurisdi-
ção do Juízo daquele Estado porque dentre os indiciados ou investigados estava a
Governadora do Maranhão, tanto que foi denunciada.
8 R.T.J. — 195
Ainda que se diga que no momento da denúncia ela renunciara ao cargo, não
valida a ilegalidade do inquérito sem a supervisão do Superior Tribunal de Justiça
(art. 105, inciso I, alínea a, da Constituição). E mais, no momento da denúncia, o
Requerente era Secretário de Estado do Governo do Maranhão e a competência era
do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, mesmo se os fatos tivessem ocorrido
em Tocantins (o que também não se deu), por força da Constituição do Estado que,
sob autorização constitucional federal (art. 125, § 1º), estabelece o Tribunal de
justiça como juiz natural do Secretário de Estado (art. 81, II), competência que se
desloca para o Tribunal Regional Federal quando se trata de delito contra a União
(Constituição Federal, art. 109, inciso IV).” (Fl. 2029)
Acrescenta:
“Quer sob a disposição legal que declara o local do delito como o foro com-
petente, quer sob o enfoque de que no inquérito já havia pessoas com prerrogativa
de foro em razão da função, ou pela conjugação dos dois comandos de força
cogente, o Juízo de Palmas era absolutamente incompetente para supervisionar o
inquérito e processar a superveniente ação penal.”
E ainda:
“Não há em toda a denúncia, de minuciosa narrativa, um único fato que se
tenha passado no Estado de Tocantins, ou um único réu que tenha domicílio
naquele Estado.
A palavra ‘Tocantins’ somente aparece no cabeçalho da petição inicial do
Ministério Público porque endereçada ao juiz federal daquele Estado.
Não aparece sequer no final da petição, posto que a peça acusatória não
registra o local e data em que foi firmada por vários procuradores, cada qual lotado
em Estado diferente.” (fls. 2037-2038)
Asseverou também que “a medida de busca e apreensão, que teria fixado a ‘preven-
ção’ do foro de Palmas, foi declarada nula pelo Tribunal Regional da 1ª Região” (fl.
2041), e que “nada restou, portanto, para a fixação da competência da Justiça Federal de
Tocantins, a não ser o lamentável opróbio que manchará a história judiciária de nosso
país por muito tempo.” (fl. 2040)
Remetidos os autos à Procuradoria-Geral da República, sustentou:
“várias pessoas, dentre elas o peticionário, foram denunciadas perante o
MM. Juízo da 2ª Vara Federal em Palmas – TO, ocasião em que nenhuma delas
detinha prerrogativa de função ao chamamento originário desta Corte ao proces-
samento da opinio delicti.
(...)
Dessa exposição resta induvidoso que:
a) ao receber a denúncia contra grande parte dos acusados e rejeitá-la em
relação a dois o magistrado federal de 1º grau tinha plena competência jurisdicio-
nal visto que, na ocasião não havia condição funcional de quem quer que seja a
convocar o exame originário do feito por esta Suprema Corte.
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VOTO
A presente questão de ordem cinge-se a examinar se a denúncia contra os acusados
recebida pelo Juiz da 2ª Vara Federal de Tocantins está ou não eivada de nulidade, a se
determinar a tramitação do presente Inquérito no Supremo Tribunal Federal.
Esse conhecimento, diferentemente do pretendido pela Procuradoria-Geral da
República, não implica supressão de instância.
A matéria agora está afeta a este Supremo Tribunal Federal em face da prerrogativa
de foro de um dos acusados, razão pela qual não conheço dessa preliminar.
Eugênio Pacelli, em capítulo sobre Jurisdição e Competência, após dissertar sobre
a especialização do Poder Judiciário a ditar a repartição constitucional de competências,
assevera relativamente à competência em razão da pessoa do acusado:
“Em outra via, atendendo a outro critério que não o da especialização e, por
isso, não mais em relação à matéria, mas já ao próprio agente do crime, é prevista
a jurisdição colegiada, ou competência originária dos Tribunais, estabelecidas em
razão das relevantes funções públicas exercidas pelo autor – ou acusado – da
infração penal, ou seja, foros privativos ratione personae.
Em todas estas situações impõe-se o relevante princípio do juiz natural, a ser
entendido como o órgão da jurisdição cuja competência, estabelecida anterior-
mente ao cometimento do fato, derive de fontes constitucionais, legitimando a
partir da vedação, imposta ao legislador infraconstitucional, da instituição do
juízo ou tribunal de exceção (art. 5º, XXXVII, CF). Legitimado ainda pela exigência de
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julgamento da causa pelo juiz ou tribunal ali indicados (órgão ou juiz especializado
em razão da matéria e órgão ou tribunal colegiado em razão da função do imputado).
Em uma e outra hipótese, estaremos diante de competências absolutas, cuja
determinação independe da vontade das partes processuais, acusação e defesa,
diante da rigidez e da estatura da fonte normativa de uma e outra espécie, qual seja,
a Constituição da República.” (OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo
Penal. Belo Horizonte: Del Rey, 2004, p. 196)
Sendo absoluta a incompetência do juízo, tem-se como conseqüência a nulidade
absoluta do processo, caracterizada que está a violação ao princípio do juiz natural
consagrado constitucionalmente (CF, art. 5º, LIII).
Cabe aqui trazer a lição de Tourinho Filho acerca da nulidade em face da incompe-
tência do juízo:
“A lei exige, para a validade do processo, a competência do Juiz. Em se
cuidando de incompetência relativa, cumpre à parte, na oportunidade da defesa
prévia, atacá-la por meio da exceção própria, sob pena de ter lugar a prorrogatio
jurisdiccionis. (...) Sendo absoluta, a qualquer tempo pode ser alegada. Havendo
incompetência do órgão jurisdicional, os atos por ele praticados são atípicos e, por
isso, mesmo sujeitam-se à sanção de ineficácia. É preciso, contudo, trate-se de
incompetência absoluta, que ocorre quando a Justiça Comum julga causa afeta à
Justiça Especial e vice-versa (...), quando órgãos da jurisdição inferior julgam
causas afetas aos órgãos superiores, quando o Juiz do cível decide causa criminal
(...). Enfim: se o Juiz não tiver competência ratione personae ou ratione materiae,
a incompetência é absoluta. Na incompetência absoluta tudo perderá o seu valor:
atos postulatórios, instrutórios e decisórios; a ineficácia atingirá toda a relação
processual”. (Tourinho Filho, Fernando da Costa. Código de Processo Penal
Comentado. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 237-238).
Verifico dos documentos acostados aos autos que Jorge Franciso Murad Júnior
foi nomeado como Secretário de Estado Extraordinário para assuntos da área de Ciência
e Tecnologia, em 5 de abril de 2002.
A denúncia foi oferecida em 19 de julho de 2002. O seu recebimento data de 9 de
agosto de 2002 (fls. 774-792).
Ressalte-se o que afirmou Jorge Francisco Murad Júnior, relativamente à decisão
do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, verbis:
“2. Julgado em 18 de junho de 2002, a Turma denegou writ ao argumento de
que os Secretários de Estado, no Maranhão, apesar de deterem as mesmas prerroga-
tivas dos Gerentes de Estado, não têm os mesmos direitos no que pertine à fixação
da competência para o processo. Entendeu a Corte que não se pode aplicar o
princípio da simetria ao Secretário, uma vez que o cargo da esfera estadual que
corresponde ao de Ministro, na esfera federal, é apenas o de Gerente (cargo criado
na reforma administrativa promovida no Maranhão e que corresponde ao conceito
clássico de Secretário de Estado).
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3. O requerente continua firme no entendimento que o cargo que ocupa, por deter
prerrogativas idênticas ao cargo de Gerente, também tem direito a foro especial. No
entanto, após o referido julgamento, a Assembléia Legislativa maranhense, visando
resguardar juridicamente o cargo de Secretário, revelado desguarnecido em compara-
ção aos Gerentes após o pronunciamento do TRF, aprovou a Lei n. 7.760, de 17 de
julho de 2002.
4. Esta lei veio dispor sobre a ‘alteração, criação e extinção de cargos em
comissão na Gerência de Estado de Justiça, Segurança Pública e Cidadania’ e
estabelece, em seu art. 8º, que:
‘Art. 8º. Os arts. 24 e 77 da Lei n. 7.356 de 29 de dezembro de 1998,
passam a vigorar com a seguinte redação:
‘Art. 24. O Poder Executivo é exercido pelo Governador Estado, auxi-
liado pelos Secretários de Estado, pelo Chefe do Gabinete do Governador,
Chefe do Gabinete Articulação Política do Governador, Procurador Geral do
Estado, Procurador-Geral da Defensona Pública do Estado, Auditor-Geral do
Estado, Presidente da Comissão Permanente de Licitação e Gerentes de Estado.’
‘Art. 77. Ficam criados seis cargos de Secretário de Estado, que inte-
gram a estrutura básica da Administração Estadual e terão as atribuições que
lhes forem conferidas pelo Governador do Estado.’
5. Com a mudança legislativa, dissipam-se as dúvidas sobre a total equipara-
ção do cargo de ‘Secretário ao cargo de Gerente - que era a intenção do legislador
atual desde o princípio, diga-se de passagem. A diferença que resta é uma questão
de simples nomenclatura. Daí que o raciocínio desenvolvido pelo TRF no julga-
mento do citado habeas corpus esvazia-se, pois mesmo o precedente do Supremo
Tribunal Federal invocado pelo ilustre Relator é aplicável à situação em apreço.
6. Afinal, se a diferença entre ambos os cargos é exclusivamente de nomen-
clatura e se, inquestionavelmente, como reconheceu o TRF, o cargo de Gerente
equivale, na esfera federal, ao de Ministro de Estado, resta patente que o cargo de
Secretário também corresponde ao de Ministro, sendo incorreto, portanto, falar de
extensão para além dos limites definidos na Constituição Federal.
7. Portanto, assim como acontece com os Gerentes, deve ser aplicado aos
Secretários o princípio da simetria que equipara cargos estaduais aos federais,
estabelecendo o foro competente para processo e julgamento de seus ocupantes
também no Tribunal Regional Federal.” (Fls.719/720)
Manifesta, portanto, a incompetência do Juízo de Primeiro Grau para o recebimento
da denúncia. Eventual dúvida acerca da prerrogativa de foro de Jorge Francisco Murad
Júnior restou sanada com a referida alteração legislativa.
Ressalte-se que essa incompetência alcança, inclusive, os signatários da denúncia,
porque não autorizados a instaurar a persecução criminal contra acusado detentor de
prerrogativa de foro.
Essa é a linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, da qual destaco as
seguintes decisões:
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VOTO
O Sr. Ministro Eros Grau: Senhora Presidente, o denunciado ocupa cargo de Secre-
tário de Estado Extraordinário. Há direito à prerrogativa de foro. A denúncia não poderia
ter sido oferecida à Justiça Federal de primeiro grau; é nula, tanto ela quanto o seu
recebimento.
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O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhora Presidente, vou insistir no ponto que enfo-
quei anteriormente. Esse tema foi submetido ao Tribunal Regional Federal, que afastou,
por isso ou por aquilo — e já temos como premissa a insubsistência da fundamentação —, a
prerrogativa de foro. A decisão precluiu na via recursal. Foi formalizada em habeas
corpus e, por isso, não gera, em primeiro lugar, preclusão material. Em segundo lugar,
sabemos que o habeas corpus não está sujeito às peias sequer da coisa julgada. Todavia,
podemos simplesmente reexaminar a matéria, constante de acórdão, por força de uma
petição da parte interessada? A meu ver, não. Podemos sim, constatando ato de constran-
gimento no processo, acionar o artigo 654, § 2º, do Código de Processo Penal e conce-
der, de ofício, a ordem, para fulminar o recebimento da denúncia; para fulminar, até
mesmo como ressaltado pelo Relator, a própria denúncia, porque subscrita por quem não
era o promotor natural da causa.
Preso a esse aspecto, para não transigir a respeito, adiro ao voto do Relator, mas
resolvendo a questão de ordem para conceder o habeas corpus de ofício e fulminar a
denúncia e, conseqüentemente, o recebimento da denúncia.
EXTRATO DA ATA
Inq 2.051-QO/TO — Relator: Ministro Gilmar Mendes. Autor: Ministério Pú-
blico Federal. Indiciados: Jader Fontenelle Barbalho (Advogados: Edison Messias
de Almeida e outro e José Eduardo Rangel de Alckmin), Jorge Francisco Murad
Júnior (Advogados: Antônio Carlos de Almeida Castro e outro), Teodoro Hübner
Filho (Advogados: Eduardo Casillo Jardim e outro), José Artur Guedes Tourinho (Advo-
gados: Alessandra de Cássia Fonseca Tourinho e outro), Maurício Benedito Barreira Vas-
concelos (Advogados: Alberto da Silva Campos e outro), Maria Auxiliadora Barra Martins
(Advogada: Maria do Socorro Miralha de Paiva Neves), Antônio José Costa de Freitas
Guimarães (Advogado: Edison Messias de Almeida), Valmor Felipetto (Advogados: Anto-
nio Acir Breda e outro), Amauri Cruz Santos (Advogados: Domingos Caporrino Neto e
outro), Magaly Hubner (Advogados: Emerson Luiz Laurenti e outro), Ulbi Arlant (Ad-
vogado: Fausto Pereira de Lacerda Filho e outro), Roderjan Busato (Advogado: Paulo
César Hertt Grande), Alexandre Rizzotto Falcão (Advogado: Eduardo José Leal Moreira),
Adaljor Dlugonski Lemos (Advogado: Marcos Gomes Salvador), Paulo Ivan Alberti
(Advogado: Gerson Massignan Mansani), Márcia Pastor da Silva Pinheiro (Advogado:
Angelo Demetrius de Albuquerque Carrascosa), Antonio dos Santos Ferreira Neto (Advo-
gado: Angelo Demetrius de Albuquerque Carrascosa), Raimundo Rogério Dias Maga-
lhães (Advogados: Angelo Demetrius de Albuquerque Carrascosa e outro), Madson
Antônio Brandão da Costa (Advogados: Sábato Giovani Megale Rossetti e outro),
Antônio Alves de Oliveira Filho (Advogada: Rita Conceição Lopes de Matos), Mário
Jorge de Macêdo Bríngel (Advogado: Sílvio da Costa Batista), Honorato Luís Lima
16 R.T.J. — 195
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribu-
nal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade, julgar procedente a ação e declarar a inconstitucionali-
dade do artigo 26 da Lei Complementar n. 851, de 9 de dezembro de 1998, do Estado de
São Paulo, nos termos do voto do Relator.
Brasília, 6 de abril de 2005 — Nelson Jobim, Presidente — Eros Grau, Relator.
R.T.J. — 195 17
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Eros Grau: O Governador do Estado de São Paulo ajuizou ação
direta, com pedido de medida cautelar, na qual pleiteia a declaração de inconstituciona-
lidade do artigo 26 da Lei Complementar n. 851/98, daquele Estado-Membro, que tem
o seguinte teor:
“Art. 26. Observar-se-á o procedimento previsto no art 28 do Código de
Processo Penal, nos seguintes casos:
I - se o Juiz deixar de acolher a proposta do Ministério Público prevista no art.
76, da Lei Federal n. 9.099, de 26 de setembro de 1995;
II - se o Juiz entender cabível a proposta mencionada no inciso anterior, não
oferecida pelo Ministério Público;
III - se o Juiz deixar de acolher a suspensão do processo proposta pelo Minis-
tério Público, nos termos do art. 89, da Lei federal n. 9.099, de 26 de setembro de
1995.”
2. O requerente, entendendo haver afronta ao artigo 2º da Constituição de 1988,
alega que “em qualquer dos casos previstos no dispositivo impugnado há ato judicial
que, se aplicável o procedimento previsto no art. 28, do Código de Processo Penal,
implicaria sua submissão ao Procurador-Geral de Justiça”.
3. A Assembléia Legislativa prestou informações nas quais sustenta haver compa-
tibilidade formal entre o ato atacado e o texto constitucional, pois aquele trata de proce-
dimento e não de processo. Acrescentou que o preceito impugnado está em “perfeita
sintonia com as funções do Ministério Público” [fls. 35/46 e 87/97].
4. A medida cautelar foi deferida, em 14 de fevereiro de 2001, sob o argumento de
que a matéria disciplinada pelo texto normativo em análise é processo — não procedi-
mento — nos termos do disposto no artigo 22, inciso I, da CB/88, compete privativa-
mente à União legislar sobre processo [fls. 68/81].
5. O Advogado-Geral da União manifestou-se pela procedência do pedido formu-
lado por entender que os preceitos atacados afrontam o artigo 22, inciso I, da Constitui-
ção do Brasil [fls. 99/101].
6. O Procurador-Geral da República opinou pela procedência do pedido de declaração
de inconstitucionalidade, confirmando-se a decisão cautelar, já que o Estado-Membro não
pode legislar sobre matéria pertinente a direito processual [fls. 102/105].
É o relatório, do qual deverão ser extraídas cópias para envio aos Senhores Ministros
[RISTF, art. 172].
VOTO
O Sr. Ministro Eros Grau (Relator): Como ressaltado por esta Corte quando do
deferimento da medida cautelar, a matéria tratada pelo preceito impugnado é de conteúdo
processual e não meramente procedimental.
18 R.T.J. — 195
2. O texto normativo atacado dispõe sobre atos do Juiz nos processos sujeitos ao
rito da Lei n. 9.099/95, direcionando sua atuação quando deixar de acolher ou entender
cabível a proposta de transação penal, ou quando discordar da proposta de suspensão do
processo formulada pelo membro do Ministério Público, além de criar hipóteses de
intervenção do Procurador-Geral de Justiça nos processos criminais subordinados aos
ditames daquela Lei. Trata-se de matéria eminentemente processual, a propósito da qual
legislação estadual não pode dispor, visto que aos Estados-Membros é facultado legis-
lar, concorrentemente, apenas sobre procedimentos. Nos dizeres de Carnelutti1, procedi-
mento “é uma sucessão de atos não só finalmente mas também causalmente vinculados,
porquanto cada um deles supõe o precedente e assim o último supõe o grupo todo”,
distinguindo-se de processo, que é “o conjunto de todos os atos necessários em cada
caso para a composição da lide”.
3. Assim, a competência legislativa concorrente dos Estados-Membros deve se
restringir à edição de leis que disponham sobre matéria procedimental, isto é, sobre a
sucessão coordenada dos atos processuais, no que se refere à forma, ao tempo e ao lugar
de sua realização, e com o cuidado de não usurpar a competência da União para legislar
sobre normas de caráter geral.
4. Destarte, patenteada a ofensa ao artigo 22, inciso I, da Constituição, é de ser
declarada a inconstitucionalidade do texto normativo [nesse sentido: ADI n. 1.916/MC,
Relator o Ministro Nelson Jobim, DJ de 26-10-2001 e ADI 371, Relator o Ministro
Maurício Corrêa, DJ de 23-4-2004].
Ante o exposto, julgo procedente o pedido formulado nesta ação direta e declaro a
inconstitucionalidade do artigo 26 da Lei Complementar n. 851/98 do Estado de São
Paulo.
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Sr. Presidente, deixo consignado que, no caso,
há procedência da ação por vício de incompetência. Mas não há, a meu ver, nenhuma
lesão à interpretação que aqui se deu, conforme nossa jurisprudência, com relação à
proposta da suspensão condicional, ou à não-proposta da suspensão condicional do
processo pelo Promotor (HC 73.343, Red. Pertence).
EXTRATO DA ATA
ADI 2.257/SP — Relator: Ministro Eros Grau. Requerente: Governador do Estado
de São Paulo (Advogado: PGE/SP – Márcio Sotelo Felippe). Requerida: Assembléia
Legislativa do Estado de São Paulo.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal
Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas,
por unanimidade, julgar procedente a ação e declarar a inconstitucionalidade da Lei Com-
plementar n. 239, de 6 de maio de 2002, do Estado do Espírito Santo, nos termos do voto
do Relator.
Brasília, 6 de abril de 2005 — Nelson Jobim, Presidente — Eros Grau, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Eros Grau: O Governador do Estado do Espírito Santo, com funda-
mento no art. 103, inciso V, da Constituição do Brasil, propõe ação direta objetivando a
20 R.T.J. — 195
a) Departamento de Classificação;
b) Departamento Administrativo e Financeiro;
c) Departamento de Planejamento e Infra-estrutura.’
Art. 3º Fica suspensa a liquidação das Centrais de Abastecimento do Espírito
Santo S/A – CEASA/ES, que passa a incorporar o Sistema Estadual de Política
Agrícola, Agrária e Pesqueira do Espírito Santo – SEPAAP.
Art. 4º As Centrais de Abastecimento do Espírito Santo S/A – CEASA/ES,
reger-se-á, pela Legislação vigente e pelas disposições do seu Estatuto Social,
visando a execução das Políticas de Abastecimento e Comercialização, bem como,
apoiar programas especiais de programas popular, administrar espaços próprios de
comercialização, em articulação com Prefeituras e Organizações de Produtores,
tais como Centrais de Abastecimento no Norte e Sul do Estado.
Art. 5º Fica o Poder Executivo autorizado a abrir os créditos adicionais
necessários ao cumprimento desta Lei.
Art. 6º O Poder Executivo regulamentará a presente Lei, no prazo de 180
(cento e oitenta) dias, ressalvado a folha de pagamento dos trabalhadores que
deverá ser paga a contar da data de sua publicação.
Art. 7º Revogam-se os arts. 6º, 7º, 18, 19, 23, 27 e 31 da Lei Complementar n.
81, de 29.02.1996.
Art. 8º Esta Lei Complementar entra em vigor na data de sua publicação”.
3. Afirma o requerente que o preceito impugnado viola os artigos 2º; 61, § 1º,
inciso II, alínea e; 84, inciso II e VI, alínea a; 63, inciso I; 166, §§ 3º e 4º; 167, inciso V;
e 173, § 1º e incisos, da Constituição do Brasil.
4. Primeiramente, sustenta que a Lei Complementar n. 239 desrespeitou o artigo
61, 1º, inciso II, alínea e, da Constituição, uma vez que seria de iniciativa privativa do
Chefe do Poder Executivo a deflagração do processo legislativo visando à extinção e
criação de entidades públicas. O requerente afirma que “a Assembléia Legislativa do
Estado do Espírito Santo, em desrespeito à determinação constitucional, iniciou o pro-
cesso legislativo de lei regulamentadora de órgãos do executivo” (fl. 09).
5. Alega ainda afronta ao artigo 84, incisos II e VI, alínea a, da Constituição, visto
que constitui função típica do Poder Executivo praticar atos de funcionamento da má-
quina estatal. Sendo assim, o Poder Legislativo somente poderia legislar sobre os servi-
ços administrativos em sua esfera de competência, sendo-lhe defeso “regulamentar, criar,
liquidar ou suspender a liquidação de órgãos públicos, além de modificar a estrutura
operacional da política agrícola, pecuária e pesqueira estadual, como se a ele fosse
possível definir quais são as metas e prioridades administrativas do Poder Executivo
para essas áreas” (fl. 13).
6. Ademais, segundo o requerente, o preceito atacado viola o artigo 173, § 1º, da
Constituição, já que não atende aos imperativos de segurança ou interesse público,
mencionados na parte final do artigo 173 da CB/88. Assevera que cabe ao Poder Executivo,
gerenciador do erário e administrador das políticas públicas, aferir se as circunstâncias
econômicas e sociais do momento permitiriam a criação ou extinção de uma sociedade
de economia mista.
22 R.T.J. — 195
7. No que se refere à alegada ofensa aos artigos 63, inciso I; 166, §§ 3º e 4º; e 167,
inciso V, da Constituição, o requerente sustenta que a criação de órgão público gera
despesa, não cabendo ao Poder Legislativo determinar a abertura de créditos orçamentá-
rios adicionais sem invadir, mais uma vez, a competência exclusiva do Governador de
Estado. Ressalta ainda que a abertura de créditos suplementares, consoante dispõe o
artigo 167, inciso V, da CB/88, deve vir necessariamente acompanhada da indicação
dos recursos correspondentes.
8. Por fim, o requerente aduz que a lei impugnada afronta os princípios da harmo-
nia e da independência dos Poderes, previstos no artigo 2º da CB/88, ao disciplinar
assunto concernente a “órgãos públicos e à esfera administrativa funcional do Poder
Executivo” (fl. 22).
9. Em face da relevância da matéria, o Ministro Nelson Jobim, Relator à época,
determinou, na forma do artigo 12 da Lei n. 9.868/99, a oitiva do Advogado-Geral da
União e do Procurador-Geral da República (fl. 70).
10. A Advocacia-Geral da União manifestou-se às fls. 72/77 e, no que se refere à
alegada afronta aos artigos 61, § 1º, inciso II, alínea e; 84, inciso II e VI, alínea a; e 173,
§ 1º, e incisos, destacou precedentes desta Corte que sugerem a inconstitucionalidade da
lei estadual. Quanto à suposta violação aos artigos 63, inciso I; 166, §§ 3º e 4º; e 167,
inciso V, discorda da tese apresentada pelo requerente, afirmando que apenas uma leitu-
ra transversa desses artigos levaria à conclusão de que o texto normativo impugnado os
teria ofendido.
11. O Procurador-Geral da República, em seu parecer de fls. 79/86, opinou pela
procedência do pedido. Afirma que o preceito em análise padece de inconstitucionali-
dade formal ao tratar da criação, estruturação e atribuições do Sistema Estadual de Polí-
tica Agrícola, Agrária e Pesqueira do Espírito Santo — matéria reservada ao Chefe do
Poder Executivo Estadual pela Constituição de 1988.
12. A Assembléia Legislativa do Estado do Espírito Santo apresentou informa-
ções às fls. 88/93, sustentando que o Poder Legislativo estadual, ao editar a lei ataca-
da, agiu respeitando a esfera de competência dos demais poderes e que a criação das
entidades contidas no preceito normativo visava a atender necessidade urgente do
Estado-Membro. Apresenta documentos referentes ao processo de elaboração da Lei
Complementar n. 239.
É o relatório, do qual se extrairão cópias para remessa aos Senhores Ministros
(RISTF, art. 172).
VOTO
O Sr. Ministro Eros Grau (Relator): O ato legislativo atacado determina ao Poder
Executivo a criação de uma sociedade de economia mista em substituição a duas outras
sociedades, cuja liquidação é imposta pelo mesmo texto normativo, além de disciplinar a
estrutura administrativa do novo ente e prever a abertura dos créditos adicionais necessários.
R.T.J. — 195 23
1 Art. 61. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da
Câmara dos Deputados do Senado Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao
Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da República e aos cida-
dãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição.
§ 1º São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que:
[...]
II - disponham sobre:
[...]
e) criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração pública, observado o disposto no art. 84,
VI.
24 R.T.J. — 195
EXTRATO DA ATA
ADI 2.750/ES — Relator: Ministro Eros Grau. Requerente: Governador do Estado
do Espírito Santo (Advogados: PGE/ES – Flávio Augusto Cruz Nogueira e outro).
Requerida: Assembléia Legislativa do Estado do Espírito Santo.
Decisão: O Tribunal, por unanimidade, julgou procedente a ação e declarou a
inconstitucionalidade da Lei Complementar n. 239, de 6 de maio de 2002, do Estado do
Espírito Santo, nos termos do voto do Relator. Votou o Presidente, Ministro Nelson
Jobim. Falou pelo requerente o Dr. André Luis Garini de Oliveira. Ausente, justificada-
mente, a Ministra Ellen Gracie.
Presidência do Ministro Nelson Jobim. Presentes à sessão os Ministros Sepúlveda
Pertence, Celso de Mello, Carlos Velloso, Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Cezar Peluso,
Carlos Britto, Joaquim Barbosa e Eros Grau. Procurador-Geral da República, Dr. Cláudio
Lemos Fonteles.
Brasília, 6 de abril de 2005 — Luiz Tomimatsu, Secretário.
RECLAMAÇÃO 2.833 — RR
ACÓRDÃO
RELATÓRIO
“(...)
a discussão central que se tem na presente lide diz com a preservação, por
parte dos autores da ação popular, da área física do Estado de Roraima que,
segundo eles, queda reduzida em 50% a vingar os limites traçados na Portaria
demarcatória (...), ao passo que a Funai e a União Federal sustentam que os limites,
como traçados na questionada Portaria, espelham terras indígenas, sobre as quais
o Estado-membro da Federação não tem qualquer ingerência, mas sim a União
Federal.
Assim posta a questão, não resta a menor dúvida que há conflito federativo,
como delineado na alínea f, do inciso I, do artigo 102, da Constituição Federal
(...)”
3. Prossigo na tarefa de delimitar o quadro fático da presente causa, para anotar
que, às fls. 38/40, deferi o provimento acautelador requestado na inicial. E o fiz para
determinar a suspensão, até o julgamento de mérito deste feito: a) da referida ação
popular, em trâmite perante a 1a Vara da Seção Judiciária de Roraima; e b) do Agravo de
Instrumento n. 2004.01.00.011002-0, em curso no Tribunal Regional Federal da 1a
Região; como também suspendi os efeitos das medidas liminares concedidas no bojo
desses feitos.
4. Nesse diapasão, importa ainda averbar que, tendo em vista as razões insertas nos
petitórios de fls. 63, 202 usque 205 e 518 usque 542, estendi os efeitos da cautelar concedida
às fls. 38/40, de sorte a também impedir o andamento dos seguintes processos:
5. Pois bem, contra o decisório que deferiu a cautela (fls. 38/40), interpôs o Estado
de Roraima agravo regimental (fls. 181/193). Mas não só ele. Também o fizeram Ivo
Barili (fls. 407/416), Ivalcir Centenaro (fls. 419/426) e Jaqueline Magalhães Lima (fls.
430/439). De outra parte, os Senadores Francisco Mozarildo de Melo Cavancanti e
Augusto Affonso de Botelho Neto, bem como a Deputada Federal Maria Suely Silva
Campos, foram por mim admitidos no presente feito, na qualidade de interessados.
6. A seu turno, os reclamados prestaram as respectivas informações.
R.T.J. — 195 27
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Ayres Britto (Relator): Antes de tudo, Senhor Presidente,
penso que o debate jurídico a ser travado neste caso deve limitar-se ao exame do acerto,
ou não, da tese de que a competência desta Suprema Corte vem sendo indevidamente
assenhoreada pelos reclamados. Para tanto, importa saber se há, na espécie, um conflito
capaz de fragilizar os laços que prendem entre si as pessoas políticas que se integram na
Federação brasileira.
10. Ora bem, relanceando os olhos para o caso em vitrine, cumpre observar que os
requerentes da Ação Popular n. 9994200000014-7 buscam proteger o patrimônio público
roraimense, atacando a validade jurídica da Portaria n. 820/98 do Ministério da Justiça.
E o fato é que esse instrumento normativo, que demarcou a reserva indígena “Raposa
Serra do Sol”, foi editado pela União no exercício da competência que lhe foi outorgada
pela Carta-cidadã. Confira-se:
“Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes,
línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicional-
mente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos
o seus bens.” (Original sem destaques)
11. Calha, nesta quadra, abrir um parêntese para dizer que não se deve entender
descaracterizado o conflito federativo, ante a circunstância de que a mencionada ação
foi proposta não pelo Estado de Roraima, mas por particulares. É que, segundo já deci-
dido por esta Casa Maior da Justiça brasileira, o litígio federativo entre um Estado-
Membro e a União resta configurado no caso de ação popular “em que os autores,
pretendendo agir no interesse de um Estado-Membro, postulam a anulação de decreto
do Presidente da República e, pois, de ato imputável à União” (Rcl 424, Rel. Min.
Sepúlveda Pertence).
12. No fluxo dessa compreensão das coisas, é de se reconhecer que a impugnação
da validade jurídica da citada Portaria n. 820/98 do Ministério da Justiça acarreta:
a) uma peculiar situação de desconsideração da competência constitucional que
detém a União para efetuar os procedimentos de demarcação de áreas indígenas (CF, art.
231), e
28 R.T.J. — 195
1 Na tarefa de explicar os traços identificadores da nossa Federação, ensina o Professor Raul Machado
Horta que a sua diversidade organizatória recebe o contraste do princípio da homogeneidade, que
dissolve as antinomias dentro da federação. Para preservar a diversidade dentro da homogeneidade, a
autonomia do Estado-Membro passa a receber normas centrais crescentes no texto da Constituição
Federal. As normas dos direitos e garantias fundamentais, as normas de repartição de competências, as
normas dos direitos políticos, as normas de pré-ordenação dos poderes do Estado-Membro, entre
outras, constituem os centros de irradiação das normas centrais da Constituição, que, no federalismo
brasileiro de 1988, se projetaram na modelagem e conformação da autonomia do Estado-Membro,
com incidência na atividade constituinte, na atividade legislativa, na atividade administrativa e na
atividade jurisdicional do Estado Federado (in Normas Centrais da Constituição Federal, Revista do
Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, edição n. 01, 1997, ano XV).
2 in Litígio Constitucional entre Estados-Membros e a Competência do STF. Revista de Direito
Administrativo. Rio de Janeiro, 194: 6-11, outubro/dezembro 1993.
R.T.J. — 195 29
17. Com efeito, da novel Portaria 534/05 se extrai que, da área anteriormente
demarcada, foram excluídos os seguintes espaços físicos e bens materiais (art. 4º):
a) a área do 6º Pelotão Especial de Fronteira (6º PEF), no Município de Uiramutã,
Estado de Roraima;
b) os equipamentos e instalações públicos federais e estaduais atualmente existentes;
c) o núcleo urbano atualmente existente da sede do Município de Uiramutã, no
Estado de Roraima;
d) as linhas de transmissão de energia elétrica; e
e) os leitos das rodovias públicas federais e estaduais atualmente existentes.
18. Vê-se, portanto, que a precitada Portaria n. 534/05 alterou, de modo corpulento
ou substancial, a de número 820/98. Pelo que impende reconhecer a perda supervenien-
te do objeto das ações judiciais apontadas pelo reclamante, devido a que elas impugnam
um ato normativo cujo conteúdo restou substancialmente modificado.
19. Com esses fundamentos, Senhores Ministros, voto pela procedência desta re-
clamação para o fim de reconhecer a competência desta Corte Suprema quanto ao pro-
cesso e julgamento dos seguintes feitos:
Processo (Classe/Número) Juízo ou Tribunal
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Presidenta, creio que precisamos, para ter como
aplicável a letra j do inciso I do artigo 102 da Constituição Federal, perquirir as balizas
das ações propostas e que correm na primeira instância. Não creio que estejam, na rela-
ção processual, quer da ação popular, quer das três ações possessórias, o Estado e a
União. A ação popular, em si, é da competência — sempre e sempre, pouco importando
a origem do ato impugnado, até mesmo ato do dirigente maior do País — da primeira
instância, que, portanto, surge como juiz natural.
30 R.T.J. — 195
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Eminente Ministro, V. Exa. está entendendo que a
competência é do Supremo Tribunal Federal?
O Sr. Ministro Carlos Britto (Relator): Conflito federativo.
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Que conflito federativo há?
O Sr. Ministro Carlos Britto (Relator): A União, no exercício de uma competência
constitucional expressa, demarcou uma área no Estado de Roraima. Autores populares
entraram com uma ação dizendo que o Estado de Roraima ficaria prejudicado com
sensível redução do seu território. Segundo eles, ocorreria cinqüenta por cento de redu-
ção do Estado.
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Os autores populares afirmam isso?
O Sr. Ministro Carlos Britto (Relator): Sim.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Litigam, alegadamente, em defesa de interes-
ses ou direitos do Estado?
O Sr. Ministro Carlos Britto (Relator): Tal como está na Reclamação n. 424.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Substitutos processuais do Estado-Membro: é
a hipótese da ACO 473 (RTJ 168/17).
O Sr. Ministro Carlos Britto (Relator): Reclamação n. 424, da Relatoria de V. Exa.,
cuja ementa é a seguinte:
“Ação Popular: natureza da legitimação do cidadão em nome próprio, mas na
defesa do patrimônio público: caso singular de substituição processual.
R.T.J. — 195 31
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Sra. Presidente, quanto ao objeto da reclama-
ção, peço vênia aos dissidentes para acompanhar o voto do eminente Relator.
Já o sustentei na Reclamação 424, citada por S. Exa., e também na Ação Cível
Originária 473, (RTJ 168/17). Ali não se tratava de ação popular, mas de ação civil
pública na qual o Ministério Público propunha contra o Estado, pretendendo agir na
defesa do patrimônio da União. Entendemos aí existente um conflito substancial entre a
União e o Estado.
Peço vênia apenas ao eminente Relator para dispensar a douta dissertação feita por
S. Exa. quanto à existência do chamado “conflito federativo”. Essa construção redutora
que o Supremo Tribunal fez, a meu ver, só se aplica quando é parte entidade da Adminis-
tração Indireta do Estado ou da União; situando-se o conflito entre a União e o Estado,
a competência é sempre do Supremo Tribunal, independentemente do objeto ou da
natureza da causa.
Assim se decidiu, entre outros casos, na Ação Cível Originária 447, Relator o
eminente Ministro Octavio Gallotti.
Por outro lado, entendo que, se no julgamento da reclamação, de logo se verifica
haver causa extintiva do processo, a economia processual aconselha que, de imediato, se
dê solução à causa.
Ainda muito recentemente, julgamos questão similar (Rcl 1.017, 7-4-05, Pertence,
Inf. STF 382). Tratava-se de uma ação popular — se não estou enganado — que entende-
mos ter objeto próprio e exclusivo de uma ação de inconstitucionalidade por omissão.
Ocorre que o autor popular não era dos legitimados para propor a ADI por omissão, e, por
32 R.T.J. — 195
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Presidenta, creio que a competência da Corte é razão
para se chegar à improcedência, porque somos competentes para julgar a reclamação.
Então, não teríamos ficado vencidos quanto à competência. Ficamos vencidos na maté-
ria de fundo propriamente dita da reclamação, que é o pedido formulado para declarar-se
a competência do Supremo.
EXTRATO DA ATA
Rcl 2.833/RR — Relator: Ministro Carlos Britto. Reclamante: Ministério Público
Federal. Liticonsorte ativo: União (Advogado: Advogado-Geral da União). Reclamados:
Juiz Federal da 1ª Vara Federal da Seção Judiciária de Roraima e Tribunal Regional
Federal da 1ª Região. Interessados: Silvino Lopes da Silva e outro (Advogados: Luiz
Rittler Britto de Lucena e outro), Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti (Advogado:
Alexander Ladislau Menezes), Maria Suely Silva Campos (Advogados: Alexander
Ladislau Menezes) e Augusto Affonso Botelho Neto (Advogado: Cláudio Vinícius
Nunes Quadros). Assistente: Estado de Roraima (Advogado: PGE/RR – Regis Gurgel
do Amaral Jereissati).
Decisão: O Tribunal, por maioria, julgou procedente a reclamação para o efeito de
reconhecer a competência do Supremo Tribunal Federal para julgamento dos seguintes
feitos: Ação Popular n. 9994200000014-7 (1ª Vara Federal de Roraima); Agravo de
Instrumento n. 2004.01.00.10111-0 (TRF da 1ª Região); Agravo de Instrumento n.
2004.01.00.11116-9 (TRF da 1ª Região); Agravo Regimental na Suspensão de Liminar
n. 94 (Superior Tribunal de Justiça); Ação Possessória n. 2004.42.00.001122-1 (1ª Vara
Federal de Roraima); Ação Possessória n. 2004.42.00.001123-5 (1ª Vara Federal de
Roraima); Ação Possessória n. 2004.42.00.001374-6 (1ª Vara Federal de Roraima);
Ação Possessória n. 2004.42.00.001760-6 (1ª Vara Federal de Roraima); Agravo de
Instrumento n. 2004.01.00.46273-8 (TRF da 1ª Região); Agravo de Instrumento n.
2004.01.00.01123-5 (TRF da 1ª Região); Agravo de Instrumento n. 2004.01.00.47500-
4 (TRF da 1ª Região), vencidos os Ministros Marco Aurélio, Carlos Velloso e Celso de
Mello, que a julgavam improcedente. Subseqüentemente, o Tribunal reconheceu a per-
da superveniente de objeto dos feitos relacionados, ante a edição da Portaria n. 534/05
do Ministério da Justiça, como também declarou a prejudicialidade dos agravos regi-
mentais interpostos no bojo desta reclamatória, tudo nos termos do voto do Relator.
Votou a Presidente. Declarou impedimento o Ministro Nelson Jobim (Presidente). Presi-
diu o julgamento a Ministra Ellen Gracie (Vice-Presidente).
Presidência do Ministro Nelson Jobim. Presentes à sessão os Ministros Sepúlveda
Pertence, Celso de Mello, Carlos Velloso, Marco Aurélio, Ellen Gracie, Gilmar Mendes,
Cezar Peluso, Carlos Britto, Joaquim Barbosa e Eros Grau. Vice-Procurador-Geral da
República, Dr. Antônio Fernando Barros e Silva de Souza.
Brasília, 14 de abril de 2005 — Luiz Tomimatsu, Secretário.
R.T.J. — 195 33
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribu-
nal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por maioria de votos, julgar procedente a ação para declarar a inconstitu-
cionalidade da Lei n. 10.331, de 18 de junho de 1999, do Estado de São Paulo.
Brasília, 9 de março de 2005 — Nelson Jobim, Presidente — Eros Grau, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Eros Grau: O Procurador-Geral da República, com fundamento no
inciso VI do artigo 103 da Constituição do Brasil, propõe ação direta em que pleiteia a
declaração de inconstitucionalidade da Lei n. 10.331, de 18 de junho de 1999, do
Estado de São Paulo:
“Artigo 1º Os veículos particulares ou de aluguel poderão estacionar com
pisca-alerta ligado, por 15 (quinze) minutos, em frente às farmácias, mesmo que
proibido pela sinalização (placa — Proibido Estacionar), desde que seja para aqui-
sição urgente de medicamentos ou atendimento grave.
Artigo 2º Os órgãos responsáveis por este setor empreenderão todas as medi-
das cabíveis, no sentido de que a presente lei seja rigorosamente obedecida em
todas as comunidades do Estado.
Artigo 3º Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogando-se as
disposições em contrário.”
2. O requerente sustenta que o preceito hostilizado, ao tratar de estacionamento de
veículos defronte de farmácias, entraria em confronto direto com o inciso XI do artigo 22
da Constituição do Brasil, que dispõe sobre competência privativa federal (fls. 2/4).
3. Afirma que “é manifesta a inconstitucionalidade que está a assolar a lei estadual
impugnada”, tendo em vista que “a competência legislativa para dispor sobre trânsito e
34 R.T.J. — 195
transporte é privativa da União” e que “o referido assunto não foi objeto de delegação,
por meio de lei complementar federal, como permite o parágrafo único do art. 22 da
Constituição da República”.
4. A Assembléia Legislativa defende a constitucionalidade do texto normativo
atacado, sob o argumento de que “o assunto versado na lei em epígrafe é ínsito ao campo
da defesa da saúde e não se refere a trânsito ou transporte”. Daí porque aos Estados-
Membros caberia estabelecer normas a propósito do assunto, visto que elaborar leis
sobre defesa da saúde é matéria da competência concorrente da União e dos entes fede-
rativos (fls. 47/55).
5. A Advocacia-Geral da União é pela improcedência do pedido, por entender que
o órgão requerido “não legislou sobre trânsito, mas sobre defesa da saúde.” Portanto,
prossegue, dever-se-ia “invocar o princípio da proporcionalidade para resolver a contro-
vérsia desta demanda. No caso de conflitos entre dois bens jurídicos protegidos pela
Carta Constitucional, o que possui maior densidade social deve preponderar sobre o
valor de menor eficácia social. In casu, a proteção à saúde pública ganha destaque se
comparada com a aplicação irrestrita do Código de Trânsito” (fls. 66/69).
6. O Procurador-Geral da República sustenta que, “ao prever a possibilidade de
estacionamento de veículos em locais proibidos, a norma estadual vergastada legislou
sobre trânsito e avançou a competência estatuída pela Constituição Federal privativa-
mente à União [...} uma vez que não há Lei Complementar autorizando o Estado a
legislar sobre tais matérias, como exige o artigo 22, parágrafo único, da Lei Funda-
mental” (fls. 71/73).
É o relatório, do qual deverão ser extraídas cópias para envio aos Senhores Ministros
(RISTF, artigo 172).
VOTO
O Sr. Ministro Eros Grau (Relator): O Procurador-Geral da República sustenta que
a Lei n. 10.331, que dispõe sobre o estacionamento de veículos defronte de farmácias,
padece de inconstitucionalidade formal, vez que teria usurpado competência exclusiva
da União para legislar sobre a matéria.
2. Pretendendo sustentar a legitimidade do preceito atacado, a Assembléia Legis-
lativa do Estado de São Paulo esgrima o argumento de que o texto normativo dispõe
sobre “defesa da saúde”; por isso não consubstanciaria matéria concernente a trânsito. É
que, no caso de ser essa a hipótese, seria possível que os entes da federação legislassem
a propósito do tema, dado que a defesa da saúde compõe o rol de competências concor-
rentes da União e dos Estados-Membros.
3. A tese da requerida, contudo, não subsiste. Em que pese a finalidade à qual se
volta a lei hostilizada — permitir a aquisição urgente de medicamentos ou atendimento
grave —, a norma veiculada pelo preceito impugnado autoriza particulares e veículos de
aluguel a estacionarem em locais indevidos, “mesmo que proibido pela sinalização
(placa — Proibido Estacionar)”. Ainda que a lei estadual de fato dispusesse sobre defesa
da saúde, dela derivaria norma atinente à legislação de trânsito.
4. Esta Corte, em pronunciamentos reiterados, assentou que a Constituição de
1988 conferiu exclusivamente à União a competência para legislar sobre trânsito.
R.T.J. — 195 35
1 Constituição do Brasil
"Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:
[...]
Parágrafo único. Lei complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas das
matérias relacionadas neste artigo".
36 R.T.J. — 195
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Presidente, ambíguo é até o diploma. Concluo pela
constitucionalidade.
Peço vênia para divergir.
EXTRATO DA ATA
ADI 2.928/SP — Relator: Ministro Eros Grau. Requerente: Procurador-Geral da
República. Requerida: Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo (Advogado:
Jorge L. Galli).
Decisão: O Tribunal, por maioria, julgou procedente a ação para declarar a inconsti-
tucionalidade da Lei n. 10.331, de 18 de junho de 1999, do Estado de São Paulo, vencido
o Ministro Marco Aurélio. Votou o Presidente, Ministro Nelson Jobim. Ausente, justifica-
damente, neste julgamento, a Ministra Ellen Gracie.
Presidência do Ministro Nelson Jobim. Presentes à sessão os Ministros Sepúlveda
Pertence, Celso de Mello, Carlos Velloso, Marco Aurélio, Ellen Gracie, Gilmar Mendes,
Cezar Peluso, Carlos Britto, Joaquim Barbosa e Eros Grau. Procurador-Geral da República,
Dr. Cláudio Lemos Fonteles.
Brasília, 9 de março de 2005 — Luiz Tomimatsu, Secretário.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribu-
nal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos, indeferir a segurança, nos termos do voto da
Relatora.
Brasília, 30 de junho de 2005 — Nelson Jobim, Presidente — Ellen Gracie, Relatora.
RELATÓRIO
A Sra. Ministra Ellen Gracie: Trata-se de mandado de segurança impetrado por
Paulo César Lima contra Decreto do Presidente da República, de 27 de junho de 1994,
que o demitiu do cargo de patrulheiro rodoviário federal em razão de ter-se valido do
cargo para lograr proveito pessoal e por corrupção (artigos 117, IX; e 132, XI, da Lei
8.112/90).
O impetrante sustenta que o processo disciplinar de demissão contém vícios insa-
náveis, afronta a Constituição Federal, a Lei 8.112/90 e a Instrução Normativa 3/92.
Alega: a) a incompetência da autoridade que instaurou o processo administrativo disci-
plinar, já que a autoridade competente, no caso, é o Ministro de Estado; b) a falta de
publicação no Diário Oficial da portaria que instaurou o procedimento de apuração,
com descrição insuficiente dos fatos; c) a designação de pessoa em posição hierarquica-
mente inferior à do acusado para constituir a comissão; d) o excesso de prazo para
conclusão do processo e a conseqüente decadência do direito de punição.
Foi requerida a concessão de liminar para suspender os efeitos do ato impugnado
e, quando do julgamento final, a anulação do ato de demissão, da correspondente porta-
ria, bem como o reconhecimento de seu direito de não ser punido.
A liminar foi indeferida (fl. 134) e foram prestadas informações (fls. 141/265).
A Procuradoria-Geral da República opinou pela denegação da segurança (fls.
271/274).
É o relatório.
VOTO
A Sra. Ministra Ellen Gracie (Relatora): Na forma da cópia da Portaria 46/93, que se
encontra nos autos à fl. 161, a autoridade que instaurou o processo administrativo disci-
plinar foi o Superintendente Substituto da 9a SPRF/MJ/RS, órgão da estrutura regimen-
tal do Ministério da Justiça. Sua competência decorre do que dispõe a Lei 8.112, de 11
de dezembro de 1990, verbis:
“Art. 143. A autoridade que tiver ciência de irregularidade no serviço público
é obrigada a promover a sua apuração imediata, mediante sindicância ou processo
administrativo disciplinar, assegurada ao acusado a ampla defesa.”
38 R.T.J. — 195
Não tem, pois, suporte legal a alegação do impetrante de que a autoridade compe-
tente, no caso, é o Ministro de Estado.
A publicação da portaria no boletim informativo interno, com afixação no quadro-
mural para ampla divulgação (fl. 161), foi considerada válida quando dos julgamentos,
pelo Plenário desta Corte, dos MS 22.888 e 22.055, Relatores, respectivamente, os Mi-
nistros Nelson Jobim e Carlos Velloso.
Com relação ao vício apontado no que diz respeito à designação de servidor de
nível hierarquicamente inferior ao do acusado para constituir a comissão, verifico que
foram indicados três servidores estáveis (fl. 162). O presidente, Jurandir Oliveira Abreu
da Silva, era inspetor, como o impetrante, e ocupante de cargo efetivo. Nos termos do art.
149 da Lei 8.112, de 11 de dezembro de 1990, o presidente ‘deverá ser ocupante de cargo
efetivo superior ou do mesmo nível, ou ter nível de escolaridade igual ou superior ao do
indiciado’. Não houve, assim, ofensa a referido dispositivo legal.
Por último, não ocorreu a alegada decadência por excesso de prazo para a conclu-
são do processo. O Plenário desta Corte, também quando do julgamento dos mandados
de segurança acima citados, decidiu que, na forma do art. 169, § 1º, da Lei 8.112/90, o
julgamento fora do prazo legal não implica nulidade do processo.
Indefiro a segurança.
EXTRATO DA ATA
MS 22.127/RS — Relatora: Ministra Ellen Gracie. Impetrante: Paulo Cesar Lima
(Advogado: Silverio Azeredo Mello). Impetrado: Presidente da República.
Decisão: O Tribunal, por unanimidade, indeferiu a segurança, nos termos do voto
da Relatora. Ausentes, justificadamente, o Ministro Carlos Velloso e, neste julgamento,
o Ministro Sepúlveda Pertence. Presidiu o julgamento o Ministro Nelson Jobim.
Presidência do Ministro Nelson Jobim. Presentes à sessão os Ministros Sepúlveda
Pertence, Celso de Mello, Marco Aurélio, Ellen Gracie, Gilmar Mendes, Cezar Peluso,
Carlos Britto, Joaquim Barbosa e Eros Grau. Subprocurador-Geral da República, Dr.
Haroldo Ferraz da Nóbrega.
Brasília, 30 de junho de 2005 — Luiz Tomimatsu, Secretário.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribu-
nal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos, negar provimento ao agravo regimental.
Brasília, 30 de junho de 2005 — Nelson Jobim, Presidente — Eros Grau, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Eros Grau: Trata-se de agravo regimental em mandado de segurança
interposto por Sônia Castro D’Oliveira, em face de decisão monocrática que negou
seguimento ao writ.
2. A agravante alega que a decisão recorrida cerceou seu direito de defesa ao
manter o ato administrativo que determinou a cassação de sua aposentadoria, sem levar
à Turma o julgamento da matéria.
3. Acrescenta que houve desproporção entre as faltas cometidas pela impetrante,
quando ainda era servidora do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, e a penalidade
40 R.T.J. — 195
aplicada, eis que não teriam passado de atos culposos, que não causariam prejuízo para
a Administração. Alega a ocorrência de prescrição, pois, na data do ato que determinou
a aplicação da penalidade, já teriam passados mais de cinco anos desde a concessão de
sua aposentadoria.
4. Por fim, alega que, após a EC n. 3/93, a aposentadoria deixou de ser um prêmio,
consubstanciando um seguro para o qual a impetrante contribuiu a fim de que pudesse
gozar daquele benefício. Conforme dispõe o Enunciado n. 6 da Súmula desta Corte,
argumenta que a cassação de aposentadoria somente é possível após a revisão do ato
pelo Tribunal de Contas da União.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Eros Grau (Relator): Preliminarmente, não procede a alegação de
que teria ocorrido a prescrição da ação disciplinar, eis que, conforme prevê o art. 142, I
e § 2º, da Lei n. 8.112/90, o direito da Administração Pública Federal de punir seus
servidores prescreve em cinco anos quanto às infrações passíveis da pena de demissão,
cassação de aposentadoria ou disponibilidade e destituição de cargo em comissão, co-
meçando a correr o prazo a partir da data em que o fato se tornou conhecido.
2. Os dois fatos cuja prática é atribuída à impetrante — a concessão irregular de
uma aposentadoria por idade e de uma pensão por morte — remontam, respectivamente,
a 19-12-91 e 28-12-91, quando foram publicados no Diário Oficial da União. O proces-
so administrativo para apurar a ocorrência das citadas infrações foi instaurado por meio
de despacho exarado em 3-5-95 [fl. 111], o que ocasionou a interrupção do prazo prescri-
cional, conforme disposto no artigo 142, § 3º, da Lei n. 8.112/90. Em 14-5-98 foi publi-
cado no Diário Oficial da União o ato que determinou a cassação da sua aposentadoria.
Não há, pois, que se cogitar de prescrição.
3. No que se refere ao fato de a impetrante já se encontrar aposentada ao tempo em
que lhe foi aplicada a sanção administrativa, este Tribunal já decidiu que o fato do
servidor público ter atendido aos requisitos para a aposentadoria não obsta a instauração
de processo administrativo para apurar a existência de falta eventualmente praticada no
exercício do cargo. Ainda que aposentado o servidor, se houver notícia de infração, cuja
prática é a ele atribuída e que possa ensejar a sua demissão, deve ser instaurado o
processo administrativo, eis que a confirmação dos indícios levará à cassação da
aposentadoria anteriormente concedida [MS n. 21.948, Relator o Ministro Néri da
Silveira, DJ de 7-12-95].
4. Quanto à alegação de que a Súmula n. 6 subordina a eficácia do ato de cassação
de aposentadoria a aprovação por parte do Tribunal de Contas, a jurisprudência desta
Corte orienta-se no sentido de que o Presidente da República não necessita do prévio
assentimento do Tribunal de Contas da União para exercer a sua competência discipli-
nar, conforme destacou o Ministério Público em seu parecer de fls. 286/290:
“A conotação jurídico-disciplinar de que se acha impregnada a cassação de
aposentadoria — que constitui pena administrativa — torna inaplicável, quando
de sua imposição, a Súmula n. 6 do STF, que só tem pertinência nas hipóteses de
revogação ou anulação do ato concessivo da aposentadoria. O Presidente da
Republica, para exercer competência disciplinar que privativamente lhe compete,
R.T.J. — 195 41
EXTRATO DA ATA
MS 23.219-AgR/RS — Relator: Ministro Eros Grau. Agravante: Sônia Castro
D’Oliveira (Advogados: Aloisio Jorge Holzmeier e outros). Agravado: Presidente da
República (Advogado: Advogado-Geral da União).
Decisão: O Tribunal, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental,
nos termos do voto do Relator. Ausentes, justificadamente, o Ministro Carlos Velloso e,
neste julgamento, o Ministro Sepúlveda Pertence. Presidiu o julgamento o Ministro
Nelson Jobim.
Presidência do Ministro Nelson Jobim. Presentes à sessão os Ministros Sepúlveda
Pertence, Celso de Mello, Marco Aurélio, Ellen Gracie, Gilmar Mendes, Cezar Peluso,
Carlos Britto, Joaquim Barbosa e Eros Grau. Subprocurador-Geral da República, Dr.
Haroldo Ferraz da Nóbrega.
Brasília, 30 de junho de 2005 — Luiz Tomimatsu, Secretário.
42 R.T.J. — 195
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribu-
nal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por maioria de votos, negar provimento ao recurso.
Brasília, 7 de abril de 2005 — Sepúlveda Pertence, Presidente e Relator.
EXTRATO DA ATA
RMS 24.128/DF — Relator: Ministro Sepúlveda Pertence. Recorrente: Ozéas das
Neves do Nascimento (Advogados: Ignacio de Aragão e outros). Recorrida: União (Ad-
vogado: Advogado-Geral da União).
Decisão: A Turma decidiu remeter o presente recurso ordinário em mandado de
segurança a julgamento do Tribunal Pleno. Unânime.
Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Ministros Marco
Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Vice-Procurador-Geral da República, Dra.
Delza Curvello Rocha.
Brasília, 15 de março de 2005 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.
R.T.J. — 195 43
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Trata-se, na origem, de mandado de segurança
contra ato do Ministro de Estado da Justiça, consubstanciado na Portaria 1.039/2000,
que demitiu o impetrante do cargo de Policial Rodoviário Federal, sob o fundamento de
utilização de pessoal e recursos materiais da repartição em serviços e atividades
particulares, improbidade administrativa e lesão aos cofres públicos.
É esta a ementa do acórdão recorrido:
“Mandado de Segurança. Policial rodoviário federal. Processo administra-
tivo disciplinar. Demissão.
1. É legal a delegação de competência do Presidente da República para Ministro
de Estado, se a hipótese estiver em conformidade com o disposto na CF, art. 84.
2. Não há vício no processo administrativo quando não apontados os dispo-
sitivos legais tidos por violados, eis que o indiciado se defende não da capitulação
legal, mas dos fatos que lhe são imputados.
3. Não peca pela ausência de fundamentação o ato administrativo que deter-
mina a demissão do servidor investigado, delimitando, ainda que sucintamente, os
motivos objetivos da punição e sua fundamentação legal.
4. Mandado de Segurança denegado.”
Foram interpostos embargos de declaração, que foram rejeitados.
Daí o recurso ordinário, que alega:
“(...)
O impetrante sustenta que, como a primeira parte do inciso XXV do art. 84,
na primeira parte, refere-se a prover os cargos públicos, não se aplica a delegação
para desprover, isto é, para demitir.
(...)
Outra lei, também anterior a esse Decreto n. 3.035, a Lei n. 8.112, de
11.12.90, que dispõe sobre o Regime Jurídico dos Servidores Civis da União, em
seu art. 141, I, estipula que quando a penalidade prevista for a demissão, o julga-
mento caberá ao Presidente da República.
(...)
Se o entendimento do Relator do MS-7351, de que o ato de demissão
correspondia a “dispor sobre a organização e o funcionamento da administração
federal”, cumpre dizer que deverá ser feito na “forma da lei”, e a lei, na espécie, são
as de n. 8.112/90 e 9.784/99.”
Alega, ainda, falta de fundamentação do ato de demissão (violação do art. 93, IX,
CF) e cerceamento de defesa.
Foram apresentadas contra-razões pela Advocacia-Geral da União.
O parecer do Ministério Público da lavra do em. Subprocurador-Geral Paulo de
Tarso Braz Lucas é pelo improvimento.
É o relatório.
44 R.T.J. — 195
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Sobre a alegação de cerceamento de
defesa, colho do parecer do Ministério Público:
“(...) Em segundo lugar, quanto ao alegado cerceamento de defesa, por
inobservância do disposto na Lei n. 9.784, de 29.01.99, cuida-se de causa de pedir
que não foi deduzida na petição inicial, o que, ao caracterizar inovação da lide,
impede o seu exame em sede recursal, nos exatos termos do art. 264 e parágrafo
único do CPC. De mais a mais, semelhante lei sequer se mostra aplicável na espé-
cie, onde se cuida de processo administrativo disciplinar contra servidor público,
e não de processo em que sejam interessadas algumas das pessoas físicas ou jurídi-
cas arroladas como legitimadas no art. 9º do mesmo diploma legal.
Ainda que assim não fosse, não houve cerceamento de defesa, uma vez que o
processo administrativo disciplinar respeitou o devido processo legal, o contraditório
e a ampla defesa, com 65 testemunhas ouvidas, apresentação de laudos periciais e
acareações.
A alegada ausência de fundamentação do ato decisório também não se verifica,
uma vez que a portaria reportou-se ao processo administrativo no qual estavam, minucio-
samente motivados, o relatório da Comissão e o parecer de Consultoria Jurídica do
Ministério de Justiça.
II
Resta analisar o ponto central do recurso, que é a inconstitucionalidade do Decreto
3.035/99, que dispôs:
Art. 1º Fica delegada competência aos Ministros de Estado e ao Advogado-
Geral da União, vedada a subdelegação, para, no âmbito dos órgãos da Administra-
ção Pública Federal direta, autárquica e fundacional que lhes são subordinados ou
vinculados, observadas as disposições legais e regulamentares, especialmente a
manifestação prévia e indispensável do órgão de assessoramento jurídico, praticar
os seguintes atos:
I - julgar processos administrativos disciplinares e aplicar penalidades, nas
hipóteses de demissão e cassação de aposentadoria ou disponibilidade de servi-
dores;
II - exonerar de ofício os servidores ocupantes de cargos de provimento efe-
tivo ou converter a exoneração em demissão;
(...)”
O parágrafo único do art. 84 da Constituição dispõe que o Presidente da República
poderá delegar as atribuições mencionadas nos incisos VI, XII e XXV — primeira parte —
aos Ministros de Estado.
Alega-se que a competência de prover cargos públicos federais (primeira parte do
inciso XXV do art. 84 da CF) não abrangeria a de desprovê-los.
A argüição não procede.
R.T.J. — 195 45
É a leitura que faço da Constituição Federal, Presidente, e, por isso, peço vênia a
Vossa Excelência para entender que, na alusão a provimento, não está contemplada a
demissão a bem do serviço público.
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Presidente e Relator): Ministro Marco Aurélio,
então não compete ao Presidente da República?
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Não sei, Excelência. O que não admito é a delegação
de início.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Presidente e Relator): Mas, se se diz que ele
não pode delegar, quem pode delegar a atribuição do inciso XXV está expresso no
parágrafo.
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Imagino que a atribuição de início seja do Presidente
da República. Tanto que ele delegou.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Presidente e Relator): Por isso é que digo que
na atribuição de prover e extinguir o cargo se compreende o de desprovê-lo.
O Sr. Ministro Marco Aurélio: A lei é específica, não é nem a de n. 8.112/90 que
rege a matéria. Há norma especial.
O Sr. Ministro Carlos Britto: Sr. Presidente, entendo que mais importante do que
saber que autoridade poderá demitir é assegurar ao servidor estável, sob processo admi-
nistrativo, a ampla defesa. O contraditório e a ampla defesa foram observados. É o que
está no art. 41, II, da Constituição. Por isso acompanhei o Relator.
Quanto ao fundamento do voto, retirar da competência para prover a competência
para desprover, acho lógico também.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Presidente e Relator): Caso contrário, não há
como resolver o problema de atribuição. Se não é do Presidente da República, de quem
seria?
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Presidente, não estou assentando que não caberia ao
Presidente da República. Ao contrário. Se gloso a atuação do Ministro de Estado é porque
uma autoridade superior deveria praticar esse ato. E aí é o Presidente da República, por
coerência.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Presidente e Relator): Com base em que inciso
do art. 84 da Constituição? No XXV?
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Não, Ministro Sepúlveda Pertence.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Presidente e Relator): A autoridade competente
para prover é naturalmente — salvo outra disposição da Constituição — por exemplo, a
de Ministro do Supremo Tribunal Federal, que é do Senado — a autoridade competente
para desprover, sob pena de admitir-se que o provimento do Presidente da República
fosse desfeito pelo desprovimento imediato por uma autoridade inferior.
R.T.J. — 195 47
EXTRATO DA ATA
RMS 24.128/DF — Relator: Ministro Sepúlveda Pertence. Recorrente: Ozéas
das Neves do Nascimento (Advogados: Ignacio de Aragão e outros). Recorrida: União
(Advogado: Advogado-Geral da União).
Decisão: O Tribunal, por maioria, negou provimento ao recurso, vencido o Ministro
Marco Aurélio. Ausentes, justificadamente, os Ministros Nelson Jobim (Presidente), Ellen
Gracie (Vice-Presidente) e Gilmar Mendes. Presidiu o julgamento o Ministro Sepúlveda
Pertence.
Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Ministros Celso
de Mello, Carlos Velloso, Marco Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto, Joaquim Barbosa
e Eros Grau. Vice-Procurador-Geral da República, Dr. Antônio Fernando Barros e Silva
de Souza.
Brasília, 7 de abril de 2005 — Luiz Tomimatsu, Secretário.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal
Federal, em Sessão Plenária, sob a presidência da Ministra Ellen Gracie (RISTF, art. 37, I), na
48 R.T.J. — 195
RELATÓRI O
O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Cuida-se de Mandado de Segurança, com pedido
de liminar, impetrado por Octávio Junqueira Leite de Moraes contra ato do Exmo. Sr.
Presidente da República que, por meio do Decreto de 21-11-02 (DOU de 22-11-02),
declarou de interesse social, para fins de reforma agrária, por ter sido classificado como
grande propriedade improdutiva, o imóvel rural denominado “Fazenda Ipê”, com área
de 978,7534 ha., registrado sob o n. R-1-11.292, fl. 01, do Livro 2, do Cartório de
Registro de Imóveis da Comarca de Andradina, Estado de São Paulo.
O impetrante alega a ocorrência de motivo fortuito ou de força maior, nos termos
do § 7º do art. 46 da Lei n. 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, em conseqüência do
falecimento de sua esposa, em acidente automobilístico, no dia 22-3-01 e, também, em
face das dificuldades na elaboração e formalização da partilha entre os filhos Odete
Leite de Moraes, Octávio Leite de Moraes, Rodrigo Leite de Moraes e Elza Leite de
Moraes Andrade.
E que a vistoria administrativa feita pela Fundação Instituto de Terras do Estado de
São Paulo “José Gomes da Silva” – ITESP, nos termos do convênio firmado entre essa
instituição e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA (fls. 29-
52) deu-se em 12-11-01 e “apurou o Grau de Eficiência e Produtividade GEE referente
ao período dos 12 (doze) meses que antecederam”, período em que o impetrante esteve
extremamente abalado emocional e financeiramente, devido ao óbito de sua esposa.
Ao final, pede que se declare a nulidade do decreto expropriatório.
Indeferi o pedido liminar e solicitei informações, as quais vieram assim sumariadas
(fl. 72):
“Mandado de Segurança perante o STF, em face do Exmo. Sr. Presidente da
República, por haver declarado imóvel rural como de interesse social para fins de
reforma agrária. Assertiva de que houve desrespeito às regras do art. 6º, § 7º da Lei
n. 8.629/93, ao argumento de existência de caso fortuito ou força maior, devido o
falecimento da esposa do impetrante em março de 2001, que impediu, devido a
instabilidade emocional e financeira ocasionada ao impetrante, a manutenção do
índice do grau de eficiência e produtividade do imóvel. Inaplicabilidade do § 7º,
art. 6º da Lei n. 8.629/93. Inexistência dos requisitos caracterizadores do caso
fortuito e da força maior. Evento ordinário natural. Liminar cujo indeferimento se
impõe, merecendo também a segurança ser denegada.”
A Procuradoria-Geral da República, em parecer de fls. 78-81, opinou pelo conheci-
mento e denegação da ordem.
É o relatório.
R.T.J. — 195 49
VOTO
O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Relator): Do parecer da Subprocuradora-Geral da
República, Dra Sandra Cureau, destaco (fls. 79-81):
“O writ não merece ser concedido. É que as hipóteses levantadas, de faleci-
mento da esposa e de dificuldades oriundas da partilha, que causaram instabilidade
emocional e financeira ao impetrante, não configuram caso fortuito ou força maior.
Isso porque os acontecimentos descritos são naturais ordinários e não extraordiná-
rios, reconhecendo-se, assim, a inaplicabilidade do art. 6º, § 7º, da Lei 8.629/93.
Ora, se uma pessoa não tem condições de dar a devida atenção à sua proprie-
dade, existem diversas alternativas para se evitar conseqüências não desejadas,
como a do presente caso. Exemplificando, o impetrante poderia ter nomeado admi-
nistradores para cuidarem da propriedade.”
Ainda, o Ministério Público Federal fundamentou suas razões nas informações
prestadas pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário, de onde extraiu os seguintes
trechos:
“(...) as hipóteses de caso fortuito e força maior operam como garantias
realizadoras da integridade do direito de propriedade, constituindo-se em um
dos casos em que excepcionalmente, o interesse social pode ceder constitucional-
mente em relação ao interesse individual, haja vista que seu acontecimento aca-
ba por tornar impossível, apesar do esforço do proprietário, a consecução dos
índices legais da produtividade.
Como visto, para sua configuração deve existir uma relação direta entre o
acontecimento extraordinário cujos os efeitos sobre o imóvel não era possível
evitar ou impedir, e a conduta adotada pelo proprietário, de forma a não permitir
a desclassificação do imóvel rural de propriedade produtiva.
Ora, apesar de compreender todo o abalo de natureza emocional do proprie-
tário com a perda de sua esposa e as dificuldades porventura enfrentadas durante a
elaboração e formalização da partilha, querer imputar a este acontecimento a
natureza de caso fortuito ou força maior suficiente a justificar a improdutividade
aferida no seu imóvel rural, verificada por intermédio da vistoria realizada em
novembro de 2001, convenhamos, não encontra guarida em nenhum fundamento,
seja ele de natureza fática ou jurídica.
Não resta dúvida que os acontecimentos previstos na norma legal acima
transcrita dizem respeito a fatos extraordinários que atinjam o imóvel rural de tal
maneira que tornem impossível ao seu proprietário a aferição dos índices de
produtividade (GUT e GEE), de modo a tornar o imóvel insuscetível de desapro-
priação compulsória, no ano respectivo ao seu evento, v.g. períodos de secas,
enchentes ou ocupação no imóvel rural.
Longe, portanto, querer atribuir a morte de qualquer ente da família com
agente capaz de estabelecer um liame lógico e objetivo com o descumprimento da
função social por parte do proprietário (...)
(...)
50 R.T.J. — 195
II - MS indeferido.”
No mesmo sentido: MS 24.503/DF, Marco Aurélio, DJ de 5-9-03, dentre outros.
Assim, em face desses amplos precedentes, indefiro a ordem.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Britto: Sr. Presidente, também acompanho o voto do Relator.
Entendo que não se trata de caso fortuito, força maior. Além do mais, para se comprovar
isso, a via estreita do mandado de segurança seria inadequada.
EXTRATO DA ATA
MS 24.442/DF — Relator: Ministro Gilmar Mendes. Impetrante: Octávio Junqueira
Leite de Moraes (Advogado: Ynácio Akira Hirata). Impetrado: Presidente da República.
Decisão: O Tribunal, à unanimidade, indeferiu a segurança, nos termos do voto do
Relator. Votou a Presidente. Ausentes, justificadamente, os Ministros Nelson Jobim
(Presidente) e Carlos Velloso. Presidiu o julgamento a Ministra Ellen Gracie.
Presidência da Ministra Ellen Gracie, Vice-Presidente. Presentes à sessão os Minis-
tros Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Cezar Peluso,
Carlos Britto, Joaquim Barbosa e Eros Grau. Vice-Procurador-Geral da República, Dr.
Antônio Fernando Barros e Silva de Souza.
Brasília, 25 de maio de 2005 — Luiz Tomimatsu, Secretário.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribu-
nal Federal, em Sessão Plenária, sob a Presidência da Ministra Ellen Gracie, na conformi-
dade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos, denegar a
segurança.
Brasília, 25 de maio de 2005 — Ellen Gracie, Presidente (art. 37, I, RISTF) —
Gilmar Mendes, Relator para o acórdão.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Colho da inicial articulação em torno do direito do
impetrante à pensão a ser satisfeita, tendo em conta haver contribuído para tanto, consi-
derado o extinto Instituto de Previdência dos Congressistas – IPC. Na qualidade de ex-
Deputado, havendo cumprido quatro mandatos e ante o disposto nas Leis n. 7.087/82 e
9.506/97, vem percebendo o benefício à base de 65,60% dos subsídios dos Deputados
Federais. Conforme declaração transcrita na inicial, percebe o impetrante mensalmente
o valor bruto de R$ 8.344,32, representando um líquido de R$ 5.469,47. Ressalta-se a
inobservância ao Decreto Legislativo n. 444/2002, mediante o qual se dispôs que “a
remuneração dos membros do Congresso Nacional corresponderá à maior remuneração
percebida, a qualquer título, por Ministro do Supremo Tribunal Federal, incluídas as
relativas ao exercício de outras atribuições constitucionais” (sic). Ter-se-ia na espécie
que, em vez de considerar-se o valor total de R$ 17.172,00, acrescido pelo que satisfeito
pelo Tribunal Superior Eleitoral — R$ 3.052,80 — alcançada a quantia de R$
20.224,80, as Mesas do Senado e da Câmara dos Deputados baixaram ato conjunto
versando sobre a quantia de R$ 12.720,00, à margem, assim, do que previsto no Decreto
Legislativo. Nesse ato teria havido alusão, no artigo 6º, à maior remuneração recebida, a
qualquer título, por Ministro do Supremo Tribunal Federal, remetendo-se ao Decreto
Legislativo n. 444/2002, mas se fixando valor inferior. Pleiteou-se a concessão de limi-
nar para observar-se o total de R$ 20.244,80, satisfazendo-se diferença a partir de 1º de
fevereiro de 2003, vindo-se, alfim, a conceder em definitivo a segurança (folhas 3 a 18).
À inicial juntaram-se os documentos de folhas 19 a 42.
A impetração ocorreu na primeira instância da Justiça Federal e, ante o envolvi-
mento das Mesas da Câmara e do Senado, deu-se a declinação da competência (folha
35). Distribuído o processo ao Ministro Maurício Corrêa, a quem sucedi na relatoria,
determinou fossem solicitadas informações, diante das quais decidiria sobre o pedido de
concessão de liminar (folha 45).
Às folhas 51 a 57, consta a manifestação do Presidente da Câmara dos Deputados,
João Paulo Cunha. Em síntese, aponta-se o envolvimento de ato interno da Câmara dos
Deputados, não sujeito à correção judicial, mencionando-se a melhor doutrina — Helly
Lopes Meirelles. O ato baixado teria tratado do tema de forma abstrata, não se constitu-
indo, assim, em ato administrativo. No mérito, alude-se à competência do Congresso
Nacional para fixar o subsídio dos Deputados Federais e dos Senadores — inciso VII do
artigo 49 da Constituição Federal — e à circunstância de o Decreto Legislativo n. 444,
R.T.J. — 195 53
VOTO
O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Realmente, o pleito formulado dirige-se à
satisfação pela Câmara dos Deputados. Somente é dado atribuir a inserção na inicial da
Mesa do Senado Federal como órgão coator ante o fato de o ato que estaria a respaldar o
procedimento adotado quanto à satisfação da pensão ser conjunto. Está-se diante de
processo subjetivo e não objetivo, razão pela qual tenho a Mesa do Senado Federal
como estranha às balizas deste mandado de segurança.
Da preliminar de não-cabimento do mandado de segurança
A inicial parte de relação jurídica mantida pelo impetrante com a Câmara dos
Deputados, no que, frente à extinção do Instituto de Previdência dos Congressistas –
IPC, assumiu o passivo existente. Considerado o Decreto Legislativo e o Ato Conjunto
das duas Casas, ou seja, da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, sustenta-se o
direito à observância de certo valor. Atente-se para o fato de a garantia constitucional de
acesso ao Judiciário — artigo 5º, inciso XXXV — não sofrer limitação, tendo em conta
54 R.T.J. — 195
EXTRATO DA ATA
MS 24.527/SP — Relator: Ministro Marco Aurélio. Impetrante: João Orlando Duarte
da Cunha (Advogado: João Orlando Duarte da Cunha). Impetradas: Mesa da Câmara dos
Deputados e Mesa do Senado Federal.
Decisão: Após o voto do Ministro Marco Aurélio, Relator, que concedia a segurança,
pediu vista dos autos o Ministro Gilmar Mendes. Ausente, justificadamente, neste julga-
mento, o Ministro Maurício Corrêa, Presidente. Presidência do Ministro Nelson Jobim,
Vice-Presidente.
Presidência da Ministro Maurício Corrêa. Presentes à sessão os Ministros Sepúlveda
Pertence, Celso de Mello, Carlos Velloso, Marco Aurélio, Nelson Jobim, Ellen Gracie,
Gilmar Mendes, Cezar Peluso, Carlos Britto, Joaquim Barbosa e Eros Grau. Procurador-
Geral da República, Dr. Cláudio Lemos Fonteles.
Brasília, 1º de abril de 2004 — Luiz Tomimatsu, Coordenador.
VOTO (Vista)
O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Cuida-se de mandado de segurança impetrado por
João Orlando Duarte da Cunha, contra a Mesa da Câmara dos Deputados e a Mesa do
Senado Federal, que regulamentaram, em Ato Conjunto de 2003, a aplicação dos dispo-
sitivos sobre a remuneração dos membros do Congresso Nacional, tendo em vista o
disposto no § 2º do art. 1º do Decreto Legislativo n. 444, de 2002.
O Impetrante diz que serviu à Nação por quatro mandatos como deputado federal
e, conforme o disposto no art. 31, I, b, e art. 35 da Lei n. 7.087, de dezembro de 1982, e
pela Lei n. 9.506, de 30-10-97, “contribuiu como ‘segurado obrigatório’, assim defini-
do pelo art. 21 da Lei n. 7.087/82 para o extinto Instituto de Previdência dos Congres-
sistas IPC (...)” e que recebe, a título de pensão por tempo de contribuição, o valor
mensal correspondente a 65,60% dos subsídios percebidos pelos deputados.
No entanto, agora vê o seu direito lesado pela não-observância do Decreto Legis-
lativo n. 444, de 2002, no ponto em que dispõe: “a remuneração dos membros do
Congresso nacional corresponderá à maior remuneração percebida, a qualquer título,
por Ministro do Supremo Tribunal Federal, incluídas as relativas ao exercício de ou-
tras atribuições constitucionais”. Isso porque o Ato Conjunto de 2003 fixou valor
inferior àquele percebido pelos Ministros do Supremo Tribunal Federal.
O Relator, Marco Aurélio, em seu voto, concede a ordem:
“Realmente, o pleito formulado dirige-se à satisfação pela Câmara dos Depu-
tados. Somente é dado atribuir a inserção na inicial da Mesa do Senado Federal
como órgão coator ante o fato de o ato que estaria a respaldar o procedimento
adotado quanto à satisfação da pensão ser conjunto. Está-se diante de processo
subjetivo e não objetivo, razão pela qual tenho a Mesa do Senado Federal como
estranha às balizas deste mandado de segurança.
56 R.T.J. — 195
das Mesas do Senado Federal e da Câmara dos Deputados — de 2003. Neste, não se
considerou o que imposto pelo Decreto Legislativo, muito embora o artigo 6º nele
inserido, ou seja, do próprio ato conjunto, aluda à maior remuneração percebida, a
qualquer título, por Ministro do Supremo Tribunal Federal, remetendo ao artigo 1º
do Decreto no que fixou, como incumbia fazer, o subsídio de Deputados e Senado-
res para a legislatura em curso. Concedo a ordem para que se observe, na satisfação
da pensão do impetrante, o valor de R$ 20.224,80, em vez da quantia de R$
12.720,00. É como voto na espécie.”
Pedi vista dos autos, para melhor examinar a espécie.
Da legitimidade passiva
Embora a impetração tenha sido dirigida também contra a Mesa do Senado Federal,
somente a Mesa da Câmara dos Deputados é parte legítima para integrar o pólo passivo
da relação jurídica processual, porque a demanda do impetrante, ex-deputado federal, na
condição de pensionista do extinto Instituto de Previdência dos Congressistas – IPC,
visa o pagamento de sua pensão por tempo de contribuição, com base de cálculo distinta
daquela adotada pelo Ato Conjunto das Mesas do Senado Federal e da Câmara dos
Deputados, de 2003, que regula o § 2º do art. 1º do Decreto Legislativo n. 444, de 2002.
Da admissibilidade do Mandado de Segurança
Não subsiste a preliminar de que “o mandado de segurança volta-se contra ‘ato das
Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal’, mas ato genérico de fixação de
subsídios dos parlamentares”.
Trata-se, no caso, de ato concreto, qual seja, o Ato Conjunto das Mesas do Senado
Federal e da Câmara dos Deputados, de 2003, que dispõe sobre a “remuneração” mensal
dos membros do Congresso Nacional, nos termos do § 2º do art. 1º do Decreto Legislativo
n. 444, de 2002.
Esta “remuneração”, portanto, é a base para o cálculo da pensão que lhe é devida
no índice de 65,60% sobre os subsídios (partes fixa e variável) dos Congressistas.
Sistemática de remuneração dos parlamentares
O Decreto Legislativo n. 444, de 19 de dezembro de 2002, ao dispor sobre a
remuneração dos membros do Congresso Nacional para a 52ª Legislatura, estabeleceu
que os efeitos financeiros se dariam a partir de 1º de fevereiro de 2003, nos seguintes
termos:
“Art. 1º Até que seja aprovada a lei de iniciativa conjunta de que trata o art.
48, XV, da Constituição Federal, a remuneração dos Membros do Congresso nacio-
nal corresponderá à maior remuneração percebida, a qualquer título, por Ministro
do Supremo Tribunal Federal, incluídas as relativas ao exercício de outras atribui-
ções constitucionais, e se constituirá de subsídio fixo, variável e adicional.”
Pois bem. O art. 1º do Ato Conjunto das Mesas do Senado Federal e da Câmara dos
Deputados, de 2003, estabeleceu:
“Art. 1º A remuneração mensal dos membros do Congresso Nacional, deter-
minada pelo Decreto Legislativo n. 444 de 2002 constitui-se de subsídios fixo,
variável e adicional.
58 R.T.J. — 195
“Art. 1º (...)
§ 1º Para os fins de quaisquer limites remuneratórios, não se incluem no
cômputo da remuneração as parcelas percebidas, em bases anuais, por Ministro do
Supremo Tribunal Federal em razão de tempo de serviço ou de exercício temporá-
rio de cargo no Tribunal Superior Eleitoral.”
Assim, meu voto é pela denegação da segurança.
VOTO
O Sr. Ministro Eros Grau: Sra. Presidente, peço vênia ao Relator para acompanhar
a divergência do Ministro Gilmar Mendes.
VOTO
O Sr. Ministro Joaquim Barbosa: Senhora Presidente, também peço vênia para
acompanhar a divergência.
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Ministro Marco Aurélio, esse decreto legislativo
de 2002 ainda é o vigente?
O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Esse decreto se refere ao artigo 48, inciso
XV, da Constituição Federal, na redação da Emenda n. 19, quando havia iniciativa
conjunta, que jamais se realizou.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: O que se discute aí, depois, é a fixação de
subsídios parlamentares a partir de 2003.
O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Daí, talvez, a ilação de que tenhamos um
espaço de tempo limitado coberto por ele. A partir da impetração até a Emenda n. 41.
Apenas considerei, mesmo assim, talvez seja o caso de o Plenário repetir aquela
óptica quanto à redação primitiva do teto, o emprego da expressão “a qualquer título”.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Quanto ao adicional por tempo de serviço, não
tenho dúvida de que, de acordo com a nossa jurisprudência, seria ele indevido aos
congressistas. A minha dúvida é essa alusão ao Decreto Legislativo n. 444/2002:
“Art. 1º Até que seja aprovada a lei de iniciativa conjunta de que trata o art.
48, XV, da Constituição Federal, a remuneração dos Membros do Congresso Nacio-
nal corresponderá à maior remuneração percebida pelo Ministro do STF, incluídas
as relativas ao exercício de outras atribuições constitucionais (...)”.
O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Aí seria para incluir-se o jeton, mas não a
gratificação?
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Não. Essa, a gratificação por tempo de serviço,
nós nunca consideramos extensível aos parlamentares. Ao contrário, o que se decidiu é
que, por se tratar de vantagem pessoal, não se considerava o adicional por tempo de
serviço dos magistrados no teto do primitivo art. 37, XI, da Constituição.
O Sr. Ministro Marco Aurélio (Relator): Se viesse a prevalecer essa óptica, ter-se-ia
concessão parcial do mandado de segurança.
60 R.T.J. — 195
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Sra. Presidente, concedo, em parte, nestes termos:
para incluir a remuneração do Ministro do Supremo, percebida em razão do exercício no
Tribunal Superior Eleitoral.
VOTO
A Sra. Ministra Ellen Gracie (Presidente): Também peço vênia ao Ministro Marco
Aurélio para alinhar com a divergência.
EXTRATO DA ATA
MS 24.527/SP — Relator: Ministro Marco Aurélio. Relator para o acórdão:
Ministro Gilmar Mendes. Impetrante: João Orlando Duarte da Cunha (Advogado: João
Orlando Duarte da Cunha). Impetradas: Mesa da Câmara dos Deputados e Mesa do
Senado Federal.
Decisão: Renovado o pedido de vista do Ministro Gilmar Mendes, justificadamente,
nos termos do § 1º do artigo 1º da Resolução n. 278, de 15 de dezembro de 2003.
Presidência, em exercício, do Ministro Nelson Jobim, Vice-Presidente. Plenário, 2-6-
2004.
Decisão: O Tribunal, por maioria, denegou a segurança, vencidos o Ministro Marco
Aurélio, que concedia integralmente a segurança, e o Ministro Sepúlveda Pertence, que
deferia, em parte, a segurança apenas para incluir os valores referentes ao pagamento da
gratificação eleitoral, excluído do cálculo o adicional de tempo de serviço. Votou a
Presidente. Redigirá o acórdão o Ministro Gilmar Mendes. Ausentes, justificadamente, os
Ministros Nelson Jobim (Presidente) e Carlos Velloso. Presidiu o julgamento a Ministra
Ellen Gracie.
Presidência da Ministra Ellen Gracie, Vice-Presidente. Presentes à sessão os Ministros
Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Cezar Peluso,
Carlos Britto, Joaquim Barbosa e Eros Grau. Vice-Procurador-Geral da República, Dr.
Antônio Fernando Barros e Silva de Souza.
Brasília, 25 de maio de 2005 — Luiz Tomimatsu, Secretário
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma
do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na
conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos,
negar provimento ao agravo regimental no recurso em mandado de segurança, nos ter-
mos do voto do Relator.
Brasília, 22 de junho de 2005 — Sepúlveda Pertence, Presidente — Eros Grau,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Eros Grau: Trata-se de agravo regimental interposto contra decisão
monocrática que negou seguimento a recurso ordinário em mandando de segurança.
2. O imóvel dos agravantes foi desapropriado por interesse social, sendo por eles
recebidos, como indenização, Títulos da Dívida Agrária emitidos em 3-2-1987, com
prazo de cinco anos para resgate e amortização na proporção de 25% [vinte e cinco por
cento] anuais a partir do segundo ano. Em 30-10-1995, impetraram mandado de segu-
rança perante o STJ, requerendo o cálculo da correção monetária dos TDAs, incluindo as
variações verificadas pelas diferenças do IPC relativamente aos expurgos dos Planos
Bresser e Collor II, mais juros legais de 6% [seis por cento] ao ano, devidos a partir do
vencimento dos títulos.
3. Em 11-9-1996, o STJ concedeu a ordem [fls. 37/43], sendo o acórdão assim
ementado:
“Desapropriação por interesse social. Títulos da Dívida Agrária. Atualiza-
ção. Plano Bresser e Plano Collor II. I - Aplica-se a títulos da dívida agrária
(TDA’s), emitidos em 3-2-87 e com vencimento posteriores aos denominados ‘Pla-
no Bresser’ e ‘Plano Collor II’, as perdas a eles relativas. II - Mandado de segurança
concedido”.
62 R.T.J. — 195
VOTO
O Sr. Ministro Eros Grau (Relator): Os agravantes argúem, simultaneamente, o
impedimento e a suspeição da Ministra Eliana Calmon, Relatora do mandado de segu-
rança impetrado junto ao Superior Tribunal de Justiça.
2. Afasto, de início, a alegação de impedimento, cujas hipóteses encontram-se
taxativamente enumeradas nos incisos I a VI do artigo 134 do Código de Processo Civil.
O julgador, enquadrando-se em qualquer dessas hipóteses, há presunção absoluta de
parcialidade, que pode ser argüida em qualquer grau de jurisdição. Os agravantes, entre-
tanto, não comprovaram nenhuma daquelas situações, devendo ser afastada a objeção.
3. No que se refere à suspeição, cumpre observar, independentemente dos motivos
trazidos pelos agravantes, que, sendo relativa a presunção de parcialidade, é sempre
possível a preclusão. Neste sentido a doutrina de Celso Agrícola Barbi1: “se o juiz não
se considerar suspeito, e a parte não alegar, no prazo e forma legais, a suspeição, o defeito
deixa de produzir qualquer conseqüência jurídica no processo; os atos e a sentença que
ele proferir serão válidos. É como se o defeito não tivesse existido ou ficasse sanado”.
Assim, se o interessado, por inércia, deixa de argüi-la “na primeira oportunidade em que
lhe couber falar nos autos” [art. 138, § 1º, do CPC], convalida-se o vício, considerando-
se imparcial o magistrado.
1 Comentários ao Código de Processo Civil. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 413.
64 R.T.J. — 195
EXTRATO DA ATA
RMS 24.613-AgR/DF — Relator: Ministro Eros Grau. Agravantes: Ruben Klee-
bank e outro (Advogados: Ana Paula Silva Miranda e outro). Agravada: União (Advoga-
do: Advogado-Geral da União).
Decisão: A Turma negou provimento ao agravo regimental no recurso em mandado
de segurança, nos termos do voto do Relator. Unânime.
Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Ministros Marco
Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Subprocuradora-Geral da República, Dra.
Maria Caetana Cintra Santos.
Brasília, 22 de junho de 2005 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma
do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Marco Aurélio, na confor-
midade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, dar
provimento ao recurso ordinário em mandado de segurança para, reformando o acórdão
proferido pelo Superior Tribunal de Justiça, cassar o ato mediante o qual foi imposta a
penalidade de demissão a Bernardo Rosenberg, determinando, em conseqüência, sua
imediata reintegração ao cargo que anteriormente ocupava, nos termos do voto do
Relator.
Brasília, 30 de novembro de 2004 — Marco Aurélio, Presidente — Eros Grau,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Eros Grau: Trata-se de recurso ordinário em mandado de segurança,
interposto por Bernardo Rosenberg, contra acórdão proferido pela Terceira Seção do
Superior Tribunal de Justiça, assim ementado:
“Servidor Público.
- Nulidade do processo administrativo não caracterizada.
- Ordem denegada.” (Fl. 105).
2. O mandado de segurança foi impetrado contra o Advogado-Geral da União e o
Ministro de Estado dos Transportes, apontando como ato coator a Portaria n. 01, de 26
de fevereiro de 2002, via da qual o recorrente foi demitido do cargo de Engenheiro do
Quadro de Pessoal do Departamento Nacional de Estradas e Rodagem – DNER, por
improbidade administrativa e valimento do cargo para lograr proveito pessoal de ou-
trem, em detrimento da dignidade da função pública, com fulcro no art. 117, IX, da Lei
8.112/90 e no art. 11, caput e inciso I, da Lei 8.429/92.
66 R.T.J. — 195
VOTO
O Sr. Ministro Eros Grau (Relator): Conforme anotado no relatório, instaurou-se
procedimento disciplinar contra o recorrente porquanto ele, na qualidade de engenheiro
do DNER, elaborou os cálculos de atualização de dívida objeto de acordo que seria
celebrado entre o DNER e a Viriato Cardoso Construções e Projetos Ltda. utilizando-se
de índices e métodos supostamente incorretos.
68 R.T.J. — 195
6 Meu O direito posto e o direito pressuposto, 5. ed. São Paulo: Malheiros Editores, pp. 191 e ss.
R.T.J. — 195 69
8. Daí porque esta Corte tem assiduamente recolocado nos trilhos a Administração,
para que exerça o poder disciplinar de modo adequado aos preceitos constitucionais. Os
poderes de Comissão Disciplinar cessam quando o ato administrativo hostilizado se
distancia do quanto dispõe o art. 37 da Constituição do Brasil. Nesse sentido, excerto da
ementa constante do MS 20.999/DF, Celso de Mello, DJ de 25-5-90:
“O mandado de segurança desempenha, nesse contexto, uma função instru-
mental do maior relevo. A impugnação judicial de ato disciplinar legitima-se em
face de três situações possíveis, decorrentes (1) da incompetência da autoridade,
(2) da inobservância das formalidades essenciais e (3) da ilegalidade da sanção
disciplinar. A pertinência jurídica do mandado de segurança, em tais hipóteses,
justifica a admissibilidade do controle jurisdicional sobre a legalidade dos atos
punitivos emanados da Administração Pública no concreto exercício do seu poder
disciplinar.”
9. É, sim, devida, além de possível, a revisão dos motivos do ato administrativo
pelo Poder Judiciário, especialmente nos casos concernentes a demissão de servidor
público.
10. Os atos administrativos que envolvem a aplicação de “conceitos indeterminados”
estão sujeitos ao exame e controle do Poder Judiciário. “Indeterminado” o termo do con-
ceito — e mesmo e especialmente porque ele é contingente, variando no tempo e no
espaço, eis que em verdade não é conceito, mas noção —, a sua interpretação [interpre-
tação = aplicação] reclama a escolha de uma entre várias interpretações possíveis, em
cada caso, de modo que essa escolha seja apresentada como adequada.
11. Como a atividade da Administração é infralegal — administrar é aplicar a lei
de ofício, dizia Seabra Fagundes —, a autoridade administrativa está vinculada pelo
dever de motivar os seus atos. Assim, a análise e ponderação da motivação do ato admi-
nistrativo informam o controle, pelo Poder Judiciário, da sua correção.
12. O Poder Judiciário verifica, então, se o ato é correto. Não, note-se bem — e
desejo deixar isso bem vincado —, qual o ato correto.
13. E isso porque, repito-o, sempre, em cada caso, na interpretação, sobretudo de
textos normativos que veiculem “conceitos indeterminados” [vale dizer, noções], ine-
xiste uma interpretação verdadeira [única correta]; a única interpretação correta —
que haveria, então, de ser exata — é objetivamente incognoscível (é, in concreto, incog-
noscível). Ademais, é óbvio, o Poder Judiciário não pode substituir-se à Administração,
enquanto personificada no Poder Executivo. Logo, o Poder Judiciário verifica se o ato é
correto; apenas isso.
14. Nesse sentido, o Poder Judiciário vai à análise do mérito do ato administrativo,
inclusive fazendo atuar as pautas da proporcionalidade e da razoabilidade, que não são
princípios, mas sim critérios de aplicação do direito, ponderados no momento das nor-
mas de decisão. Não voltarei ao tema, até para não maçar demasiadamente esta Corte. O
fato porém é que, nesse exame do mérito do ato, entre outros parâmetros de análise de
que para tanto se vale, o Judiciário não apenas examina a proporção que marca a relação
entre meios e fins do ato, mas também aquela que se manifesta na relação entre o ato e
seus motivos, tal e qual declarados na motivação.
70 R.T.J. — 195
no Estatuto dos Servidores. Não lhe cabe punir com base na Lei de Improbidade Admi-
nistrativa, visto que o procedimento correcional administrativo não é a via apropriada
para se averiguar a sua ocorrência.
39. É que as hipóteses de improbidade administrativa diferem das faltas discipli-
nares, na medida em que a aplicação das penalidades previstas na Lei n. 8.429/92
não incumbe à Administração, eis que privativa do Poder Judiciário. Ainda que
assemelhados às infrações penais, que só podem ser julgadas pelo Poder Judiciário, os
ilícitos administrativos são julgados e punidos pela própria Administração.
40. Ora, a perda da função pública quando aplicada como sanção por improbidade
administrativa só se torna efetiva com o trânsito em julgado da sentença condenatória
(Lei n. 8.429, de 1992, art. 20). Enquanto pender qualquer recurso, essa pena, em home-
nagem ao princípio da presunção de inocência contemplado na Constituição do Brasil,
não terá eficácia.
41. Em caso semelhante, esta Corte fixou entendimento que se aplica ao caso sob
exame, verbis:
“Servidor — Responsabilidade administrativa cível e penal — Demissão.
Estando o decreto de demissão alicerçado em tipo penal, imprescindível é
que haja provimento condenatório trânsito em julgado. Se de um lado é certo que
a jurisprudência sedimentada do Supremo Tribunal Federal indica o caráter autô-
nomo da responsabilidade administrativa, a não depender dos procedimentos
cível e penal pertinentes, de outro não menos correto é que, alicerçada a demissão
na prática de crime contra a administração pública, este há que estar revelado
em pronunciamento judiciário coberto pelo manto da coisa julgada” (grifei)
(Pleno, MS 21.310/DF, Marco Aurélio, DJ de 11-3-94)
37. Concluo, portanto, no sentido de que, verificada a prática de atos de improbi-
dade no âmbito administrativo, caberia representação ao Ministério Público para ajuiza-
mento da competente ação e não a aplicação de demissão.
Ante essas circunstâncias, provejo o recurso para, reformando o acórdão proferido
pelo Superior Tribunal de Justiça, cassar o ato mediante o qual foi imposta a penalidade
de demissão a Bernardo Rosenberg, determinando, em conseqüência, sua imediata rein-
tegração ao cargo que anteriormente ocupava.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Ayres Britto: Senhor Presidente, acompanho o voto do Relator,
entendendo, inclusive, que foi ilegal a sanção disciplinar aplicada porque não vejo
sequer conduta reprovável por parte do servidor demitido. Segundo entendi, ele foi
designado para fazer cálculos de atualização monetária de um débito do Estado, do
Poder Público, constante de um acordo administrativo, e foi indiciado por haver incor-
rido em duas supostas faltas: adotado índice de correção monetária inadequado para as
dívidas da União, porque se louvou em índice prevalecente para a Justiça do Trabalho,
e aplicado à divida juros de mora de 6% ao ano.
Não sei em que isso constitui ilícito administrativo, até porque esse acordo foi
celebrado pela Administração Pública seguramente em cima de parecer jurídico, de
análise jurídica. Esses cálculos poderiam passar pelo crivo, pela análise do Departamento
Jurídico. Foi o DER?
74 R.T.J. — 195
O Sr. Ministro Eros Grau (Relator): O DNER. Na verdade, há também uma aplica-
ção, que não está nos autos, mas é relatada, da pena de demissão ao procurador que teria
dado o parecer e assinado o acordo; acordo que não foi cumprido porque foi tornado
nulo posteriormente.
O Sr. Ministro Carlos Ayres Britto: Isso é importante, o acordo não foi levado
adiante e impediu a consumação de prejuízo ao erário. Acompanho o voto de V. Exa.,
entendendo que o estudo está muito bem feito.
Só queria fazer uma observação lateral. Esse lapidar conceito de Miguel de Seabra
Fagundes, segundo o qual administrar é aplicar a lei de ofício, talvez esteja a exigir uma
atualização.
O artigo 37 da Constituição, tão apropriadamente citado por V. Exa., Sr. Ministro
Eros Grau, na cabeça desse artigo, há uma novidade que não tem sido posta em ênfase
pelos estudiosos. Esse artigo tornou o Direito maior do que a lei ao fazer da legalidade
apenas um elo, o primeiro elo de uma corrente de juridicidade que ainda incorpora a
publicidade, a impessoalidade, a moralidade, a eficiência. Ou seja, já não basta ao admi-
nistrador aplicar a lei, é preciso que o faça publicamente, impessoalmente, eficientemente,
moralmente. Vale dizer: a lei é um dos conteúdos desse continente de que trata o artigo 37.
Então, se tivéssemos que atualizar o conceito de Seabra Fagundes, adaptando-o à nova
sistemática constitucional, diríamos o seguinte: administrar é aplicar o Direito de ofício,
não só a lei.
O Sr. Ministro Eros Grau (Relator): Não é bem assim, se me permite, porque, na
verdade, o Estado faz as leis, mas quem faz o Estado que faz as leis, antes, é o Direito. Isso
é uma bela discussão.
O Sr. Ministro Carlos Ayres Britto: Mas para o Direito ser respeitado, não basta
aplicar a lei, é preciso que ela seja aplicada eficientemente. Ou seja, o Direito também se
manifesta na eficiência; publicamente, o Direito também se manifesta na publicidade;
moralmente, o Direito também está presente na moralidade. Então, o administrador deve
aplicar a lei e, ainda, observar todos esses princípios de que o Direito se constitui. Assim,
teríamos de dizer que administrar é aplicar o Direito de ofício, um direito que incorpore
lei, publicidade, moralidade, impessoalidade e eficiência.
VOTO
O Sr. Ministro Cezar Peluso: Sr. Presidente, além de todos os muitos e doutos
argumentos do eminente Relator, ousaria acrescentar que talvez até bastasse reconhecer
que, com base em fato tido por incontroverso, a imputação de uma ação culposa, sem
dano, a funcionário com mais de vinte anos de serviço público, sem nenhuma punição,
é absolutamente ilegal, porque contraria a Lei n. 8.112, em sendo desproporcional à
gravidade e à natureza da falta a aplicação da pena de demissão. A Comissão teve por
culposo um comportamento meramente desidioso, que ela própria reconheceu não ha-
ver causado dano, até porque, depois, os fatos teriam confirmado que, pela desconstitui-
ção do acordo, não houve pagamento nenhum. Não era, pois, caso de aplicar ao
funcionário, sem nenhum antecedente disciplinar, a pena mais grave da Administra-
ção Pública.
Acompanho, inteira e tranqüilamente, o voto do Ministro Relator.
R.T.J. — 195 75
EXTRATO DA ATA
RMS 24.699/DF — Relator: Ministro Eros Grau. Recorrente: Bernardo Rosenberg
(Advogados: Rodrigo Alves Chaves e outro). Recorrida: União (Advogado: Advogado-
Geral da União).
Decisão: A Turma deu provimento ao recurso ordinário em mandado de segurança
para, reformando o acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça, cassar o ato
mediante o qual foi imposta a penalidade de demissão a Bernardo Rosenberg, deter-
minando, em conseqüência, sua imediata reintegração ao cargo que anteriormente
ocupava, nos termos do voto do Relator. Unânime. Presidiu o julgamento o Ministro
Marco Aurélio. Ausente, justificadamente, o Ministro Sepúlveda Pertence. Falou pelo
recorrente o Dr. Rodrigo Alves Chaves.
Presidência do Ministro Marco Aurélio. Presentes à sessão os Ministros Cezar
Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Ausente, justificadamente, o Ministro Sepúlveda
Pertence. Subprocurador-Geral da República, Dr. Wagner de Castro Mathias Netto.
Brasília, 30 de novembro de 2004 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo
Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade, rejeitar os embargos interpostos pela União e não co-
nhecer dos embargos interpostos pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma
Agrária – INCRA, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, o Ministro
Cezar Peluso.
Brasília, 9 de junho de 2005 — Nelson Jobim, Presidente — Carlos Velloso, Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Trata-se de embargos de declaração opostos, simulta-
neamente, pela União e pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária –
INCRA, ao acórdão que porta a seguinte ementa:
“Ementa: Constitucional. Agrário. Desapropriação: reforma agrária.
Vistoria prévia: notificação do proprietário rural. Lei 8.629/93, art. 2º, § 2º.
Devido processo legal: CF, art. 5º, LV. Imóvel rural: divisão: sucessão mortis
causa: princípio da saisina: Código Civil, 1916, art. 1.572; Código Civil, 2002,
art. 1.784. Estatuto da Terra, Lei 4.504/64, art. 46, § 6º.
I - Vistoria prévia: notificação: a notificação para a vistoria prévia constitui
exigência do devido processo legal (CF, art. 5º, LV). Precedente do STF.
II - Princípio da saisina: aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo,
aos herdeiros legítimos e testamentários: Código Civil, 1916, art. 1.572; Código
Civil, 2002, art. 1.784.
III - No caso de imóvel rural em comum por força de herança, as partes ideais
para os fins da desapropriação serão consideradas como se divisão houvesse, de-
vendo ser cadastrada a área que, na partilha, tocaria a cada herdeiro e admitidos os
demais dados médios verificados na área total do imóvel. Lei 4.504/1964 (Estatuto
da Terra), art. 46, § 6º.
IV - No caso, não foram notificados os herdeiros para a vistoria prévia,
tampouco comprovou a entidade expropriante a prova do domínio para os fins do
art. 185, I, CF. O ônus dessa prova negativa é da entidade expropriante. Precedente
do STF: MS 23.006/PB, Ministro Celso de Mello, DJ de 29-8-03.
V - Aplicabilidade, à desapropriação para reforma agrária, do princípio da
saisina e da regra do § 6º do art. 46 do Estatuto da Terra. Precedentes do STF: MS
23.306, Ministro Octavio Gallotti, DJ de 10-8-2000; MS 22.045/ES, Ministro
Marco Aurélio, DJ de 30-6-95.
VI - Mandado de Segurança deferido.” (Fl. 643)
Nos embargos de declaração opostos pela União (fls. 650-659), sustenta-se, em
síntese, que foram “maliciosamente omitidos pela embargada” (fl. 651) fatos capazes
de modificar o julgado, fatos esses extraídos do Inventário 2001.01.1.100037-5, em
curso perante a Vara de Órfãos e Sucessões de Brasília, que tem por objeto a partilha do
espólio de Afrânio Frossard, quais sejam:
R.T.J. — 195 77
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Velloso (Relator): Examino os embargos da União.
Os embargos de declaração apresentam caráter de infringentes, desejando a embar-
gante, simplesmente, um novo julgamento, o que não é possível nos embargos de decla-
ração.
Com efeito.
Decidiu o Supremo Tribunal, quanto à vistoria prévia, que a sua notificação cons-
titui exigência do devido processo legal (CF, art. 5º, LV) e que, no caso, não foram
notificados os herdeiros para essa vistoria, tampouco a entidade expropriante trouxe
para os autos a prova do domínio para os fins do art. 185, I, CF, certo que o ônus dessa
prova é da entidade expropriante, conforme decidiu o Supremo Tribunal no MS 23.006/PB,
Ministro Celso de Mello.
Destarte, as questões trazidas, agora, pela embargante, União, são despiciendas, cum-
prindo salientar que, quanto às questões suscitadas — ciência da instauração de processo
expropriatório da Fazenda Boa Esperança e bem assim requerimento formulado pela inven-
tariante, em 27-8-2003, de juntada, aos autos do inventário, do relatório técnico —, ficaram
R.T.J. — 195 79
EXTRATO DA ATA
MS 24.999-ED/DF — Relator: Ministro Carlos Velloso. Embargantes: União (Ad-
vogado: Advogado-Geral da União) e Instituto Nacional de Colonização e Reforma
Agrária – INCRA (Advogados: Gleci Borges Flores e outros). Embargada: Celina Valente
Frossard (Advogados: Miguel Arcanjo César Guerrieri e outro).
Decisão: O Tribunal, por unanimidade, rejeitou os embargos interpostos pela
União e não conheceu dos embargos interpostos pelo Instituto Nacional de Colonização
e Reforma Agrária – INCRA, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente,
o Ministro Cezar Peluso. Presidiu o julgamento o Ministro Nelson Jobim.
Presidência do Ministro Nelson Jobim. Presentes à sessão os Ministros Sepúlveda
Pertence, Celso de Mello, Carlos Velloso, Marco Aurélio, Ellen Gracie, Gilmar Mendes,
Carlos Britto, Joaquim Barbosa e Eros Grau. Vice-Procurador-Geral da República, Dr.
Antônio Fernando Barros e Silva de Souza.
Brasília, 9 de junho de 2005 — Luiz Tomimatsu, Secretário.
80 R.T.J. — 195
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma
do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na
conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos,
dar provimento ao recurso ordinário em habeas corpus, nos termos do voto do Relator.
Brasília, 29 de março de 2005 — Sepúlveda Pertence, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: O paciente e outros co-réus foram condenados,
em primeiro grau, à pena de 5 anos e 4 meses de reclusão, por infração do art. 12, § 1º, II;
e 18, III, da Lei 6.368/76.
Estes os fatos firmados na sentença (fls. 57/70):
“(...)
Quanto a participação dos demais acusados – Márcio, Reinaldo (Tato),
Samar e Delmar (Bugio), tenho, de igual forma que verte do acervo probatório.
Nesse sentido, a chamada do co-réu de Reli Schmidt (fl. 35), quando sinalou
quem plantou os pés de maconha foi o co-acusado Márcio, sendo que seguidamente
compareciam no local Bugio, Tato e Samar, asseverando inclusive: ‘(...) Que, avis-
tou certa feita os acima nominados retirando pequenos galhos dos pés mais desen-
volvidos, os quais carregavam consigo até Porto Xavier’. E tal chamada foi devida-
mente judicializada à fl. 325, quando o referido acusado asseverou: ‘...Informa que
provavelmente foi o acusado Márcio que efetuou a plantação de ditos pés de
maconha, tendo certeza que foi tal acusado quem plantou tais pés. Quem mais
cuidava era o Márcio, sendo que por vezes lá aparecia a pessoa conhecida por Tato,
R.T.J. — 195 81
ou ‘Tato’, um Fiat vermelho, conduzido por ‘Bugio’, bem como uma moto de
propriedade de Márcio. Que avistou certa feita os acima nominados retirando
pequenos galhos de pés mais desenvolvidos os quais carregavam consigo até
Porto Xavier”.
Em juízo alterou suas afirmações buscando retirar a responsabilidade sua e
de sua esposa Semilda. Esclareceu que somente com a intervenção da polícia
federal é que tomou conhecimento dos pés de maconha. Imaginava serem pés de
picão do reino. Acrescentou ser o acusado Márcio o responsável pela plantação,
bem como seus companheiros Tato; Samar e Bugio que também ‘olhavam’ a plan-
tação, fazendo-o semanalmente. Márcio não havia lhe pedido autorização para
plantar. Finalizou informando que os pés de maconha foram plantados no início
do ano de 1996’.
(...)
Vanderlei Schmidt, filho do casal [co-réus Reli e Semilda], em seu depoi-
mento, em juízo, informou ser Márcio o responsável pela plantação dos pés de
maconha, sendo que Tato, Bugio e Samar auxiliavam-no. Esclareceu que presen-
ciou Márcio e Tato tirarem folhas e galhos da plantação e levaram embora da
propriedade bem como Reinaldo plantando as sementes de maconha, concluindo
que os dois iam na plantação às vezes de manha, às vezes de tarde (fl. 380v/381).
Andrei Schimdt, irmã de Vanderlei confirmou o depoimento acusando
Márcio e Tato (fl. 381/v).
Avelino Pascoal Rigo, convocado a presenciar a prisão dos acusados e o
flagrante na propriedade rural, confirmou as informações apresentadas pelas tes-
temunhas de acusação e finalizou acrescentando que não presenciara qualquer
pressão ou ameaça por parte dos policiais (fl. 382/383).
(...)
A materialidade restou comprovada pela apreensão de mais de 1600 pés de
maconha, conforme auto de apreensão de fl. 11; lado provisório de fl. 13 e auto
definitivo de fls. 139/142 e levantamento fotográfico de fls. 142/145.”
Opostos embargos de declaração, assim decidiu o TJRS (fls. 153/157):
“(...)
Sob a tese de flagrante erro material, a defesa visa reinterpretar as pro-
vas dos autos, transcrevendo depoimentos visando apontar equívocos e in-
terpretações tendenciosas por parte deste Relator.
Relativo a tais argumentos entendo que razão assiste a defesa em alegar
que o filho de um dos acusados, Vanderlei, negou ter imputado qualquer
conduta delituosa ao réu em juízo. Realmente a testemunha alterou sua versão
aos fatos informados quando de seu depoimento na polícia, na presença de
duas testemunhas, onde confirmava o envolvimento de Delmar. Todavia, per-
manece válido, aos olhos deste Relator, o depoimento acusatório frente aos
demais elementos de prova (fls. 37/38).
R.T.J. — 195 83
(...).
Contra esta decisão o paciente impetrou habeas corpus ao Superior Tribunal de
Justiça, que denegou a ordem nos termos da ementa transcrita (fl. 243):
“HC. Tráfico. Concenação em 1º e 2º graus. Erro material. Alegação de
ausência de provas a sustentar a condenação. Exame aprofundado de provas.
Inviável na via estreita do writ. Ordem denegada.
Alegação do paciente de que houve erro material na leitura de depoimentos
de testemunhas, não havendo suporte probatório a justificar a condenação. Tese
enfrentada pelo Tribunal a quo e que não foi capaz de elidir a condenação.
Inviável, na via do habeas corpus, exame aprofundado de provas de forma a
estabelecer a inocência do réu, que não se afigura flagrante nos autos. Ordem
denegada.”
Donde o presente recurso ordinário, no qual se repisam as alegações de que as
instâncias de mérito fizeram uma leitura equivocada dos depoimentos e que não há
suporte probatório válido para justificar a condenação.
O Ministério Público Federal, em parecer da lavra do então Subprocurador
Cláudio Fonteles, opinou pelo indeferimento da ordem, na linha do decidido pelo
STJ (fls. 265/268).
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator):
I
Temos entendido que não cabe o habeas corpus para solver controvérsia de fato
dependente da ponderação de provas desencontradas; cabe, entretanto, para aferir a
idoneidade jurídica ou não das provas nas quais se fundou a decisão condenatória.
Este o caso dos autos, ao menos quanto à alegada ausência de elementos suficientes
para embasar a condenação.
Conheço do habeas corpus.
II
Ocorre que, como visto, os elementos de prova restantes acertados nas instâncias
de mérito se restringem às chamadas dos co-réus, que não se prestam para lastrear a
condenação (v.g., HHCC 74.368, Pleno, 1º-7-97, Pertence, DJ de 28-11-97; 81.172, 1ª
T., Pertence, DJ de 7-3-03).
Conforme acentuei no primeiro dos precedentes mencionados, “mesmo em juízo, a
chamada de co-réu não pode ser prova suficiente para condenação nenhuma, pois
evidentemente lhe falta o requisito básico da aquisição sob a garantia do contraditó-
rio: é o que resulta da impossibilidade, em nosso direito, de o réu ser questionado pelas
partes, incluídos os co-réus que delatou”.
Na mesma linha o voto que proferi no HC 81.172, oportunidade em que recordei as
seguintes páginas de Manzini1:
“(...) não se trata somente de uma fonte de prova particularmente suspeitosa
(o que, dado o princípio da livre convicção do juiz seria insuficiente para justificar
a regra cogitada), mas de um ato que, provindo do acusado, não se pode, nem
mesmo para certos efeitos, fingir que provenha de uma testemunha. O acusado, não
apenas não jura, mas pode até mentir impunemente em sua defesa (...) e, portanto,
suas declarações, quaisquer que sejam, não se podem assimilar ao testemunho,
privadas como estão das garantias mais elementares desse meio de prova.”
E, adiante:
‘O conteúdo do interrogatório, que não é testemunho com respeito ao inter-
rogado, tampouco pode vir a sê-lo a respeito dos demais, porque seus caracteres
seguem sempre sendo os mesmos. O que se designa como chamada de co-réu não
é mais que uma confissão, que, além de o ser do fato próprio, o é do fato alheio, e
conserva os caracteres e a força probatória dos indícios e não do testemunho.’
Tudo, para concluir:
‘Dos co-denunciados do mesmo delito, por conseguinte, um não pode teste-
munhar nem a favor nem contra o outro, já que suas declarações mantém sempre o
caráter de “interrogatório”, de tal modo que seria nula a sentença que tomasse
tais declarações como testemunhos.’”
Este o quadro, provejo o recurso e defiro a ordem para cassar a condenação do
paciente: é o meu voto.
1 MANZINI, Vincenzo. Tratado de Derecho Procesal Penal, trad, EJEA, Bs As, 1952, III/275 ss.
R.T.J. — 195 85
EXTRATO DA ATA
RHC 81.740/RS — Relator: Ministro Sepúlveda Pertence. Recorrente: Delmar dos
Santos (Advogado: André Luis Rigo). Recorrido: Ministério Público Federal.
Decisão: A Turma deu provimento ao recurso ordinário em habeas corpus, nos
termos do voto do Relator. Unânime.
Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Ministros Marco
Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Subprocuradora-Geral da República, Dra.
Maria Caetana Cintra Santos.
Brasília, 29 de março de 2005 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma
do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na
86 R.T.J. — 195
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Trata-se de habeas corpus substitutivo de
recurso ordinário, contra acórdão do STJ (HC 27.820, Gilson Dipp), do qual se extrai (fls.
147/163):
“Trata-se de habeas corpus, substitutivo de recurso ordinário, contra acórdão
do e. Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que denegou ordem anteriormente
impetrada em favor de Antônio Izzo Filho, visando ao trancamento da ação penal n.
98.03.088873-41 e, em conseqüência, a revogação da prisão preventiva contra ele
decretada.
O r. julgado possui a seguinte ementa:
“Processual Penal. Habeas corpus. Coisa julgada material. Inexistência.
Bis in idem. Inocorrência. (...)
(...) IV – A Justiça Estadual, no âmbito de sua competência, investigou
a má administração e o desvio de recursos oriundos do Ministério da Ação
Social, em benefício de particulares e concluiu pela desnecessidade de pros-
seguimento das diligências. Na Justiça Federal, a controvérsia cifra-se à com-
provação de que estes recursos não foram desviados em detrimento da União,
fato que deveria ter sido comprovado em favor do paciente.
V – O arquivamento na Justiça Estadual do inquérito policial instaurado
para apuração de determinada conduta não tem o condão de fazer coisa
julgada, que se oporia contra todos os elementos supervenientes que indicas-
sem para uma nova persecução penal.
(...)
VII – Ordem denegada’.
(...)
Sustenta-se, em síntese, que o paciente estaria sendo processado e julgado
pela prática de atos que já teriam sido objeto de anterior inquérito policial, que
restou arquivado por determinação de Desembargador do Tribunal de Justiça do
Estado de São Paulo, em decisão que não foi objeto de recurso.
Desta forma, alega-se que a ação penal que se pretende trancar está afrontan-
do a autoridade da coisa julgada e consubstanciando inadmissível bis in idem.
Não merece prosperar a irresignação.
O e. Tribunal a quo ressaltou, com propriedade, que a ausência de elementos
a motivar a ação penal perante a Justiça Estadual, o que determinou o arquivamen-
to do respectivo inquérito policial, foi suprida por fatos novos que justificaram o
recebimento da denúncia na Justiça Federal, pela possível prática do delito pre-
visto no art. 315 do Código Penal, em detrimento de bens da União Federal, bem
como do seu aditamento.
R.T.J. — 195 87
Restou ressalvado, ainda, que a hipótese não constitui bis in idem, a ensejar
o trancamento da ação penal em curso perante a Justiça Federal.
Na Justiça Estadual, teria sido investigada a má administração e o desvio de
recursos oriundos do Ministério da Ação Social, em benefício de particulares,
concluindo-se pela desnecessidade de prosseguimento das diligências.
Já na Justiça Federal, interessaria a comprovação de que os r. recursos não
foram desviados em detrimento da União Federal.
Acrescentou-se, de outro lado, que na Justiça Estadual ocorreu apenas o
arquivamento de inquérito policial, instaurado para a apuração de determinada
conduta, que não tem o condão de fazer coisa julgada.
Assim, não vislumbro qualquer ilegalidade nas conclusões do acórdão ora
impugnado.
A d. Subprocuradoria-Geral da República, por sua vez, ainda ressalta que o
bis in idem só ocorreria se a Justiça do Estado de São Paulo tivesse apreciado, no
mérito, alguma imputação contra o paciente e esta mesma apreciação, sendo
absolutória, tivesse transitado em julgado.
Disto, entretanto, não se trata in casu.
Ainda esclarece, o Ministério Público Federal:
‘Ademais, quando se fala em arquivamento de inquérito, não há trân-
sito em julgado. Isto porque, salvo em casos legais, art. 107 do CP, o inqué-
rito pode ser desarquivado, antes de prescritos os fatos, quando novo ele-
mento surgir para possibilitar a persecução penal, o que ocorreu na espé-
cie’ (fl. 358).
Desta forma, sobressaindo fato novo a justificar o desarquivamento de inquérito
policial, não há porque se trancar a ação penal por ocorrência de bis in idem.”
Repisa-se, nesta impetração, a alegação de que “os mesmos fatos imputados ao
paciente foram apurados em outra instância penal e, em razão da atipicidade da conduta,
este feito foi arquivado pelo E. Tribunal de Justiça de São Paulo”, verbis:
“Naquela oportunidade, a manifestação do ilustre Procurador de Justiça
lançada no Inquérito que apurava os mesmos fatos objeto da ação penal em discus-
são, o mesmo convênio firmado entre a Prefeitura de Bauru e o Ministério do Bem
Estar Social e o mesmo suposto desvio de verbas articulado sob idêntica angulação
jurídica, ou seja, o crime de responsabilidade de Prefeito descrito no Decreto-Lei n.
2.01/67, destacou:
“(...) Analisando-se o contingente probatório carreado aos autos (...) con-
clui-se pela desnecessidade de prosseguir-se produzindo provas, já que as exis-
tentes bastam para evidenciar que as irregularidades elencadas pela Comissão
Especial de Inquérito não constituem prática de crimes de responsabilidade
previstos no artigo 1º, incisos III, IV e XIV, do Decreto-lei n. 201/67.”
Ressalta o impetrante que o arquivamento, no caso, faz coisa julgada material,
posto que por “atipicidade de conduta, quando o mérito da acusação foi profundamente
analisado e conclui-se pela inexistência de crime”.
88 R.T.J. — 195
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator):
I
Afasto de logo o obstáculo ao cabimento do habeas corpus, vislumbrado no voto
condutor do acórdão do TRF/3 na superveniência de sentença condenatória, pendente
de apelação.
É da jurisprudência do Tribunal que não impedem a impetração de habeas corpus
a admissibilidade de recurso ordinário ou extraordinário da decisão impugnada1, nem a
efetiva interposição deles2.
II
Este, o teor da denúncia oferecida contra o paciente — então Prefeito de Bauru —
ao TRF da 3ª Região — fl. 89:
“1. Conforme consta das inclusas peças de informação oriundas do inquérito
policial e anexo, bem como das conclusões da Comissão Especial de Inquérito
instaurada pela Câmara Municipal de Bauru, foi celebrado, em data de 27.06.92, o
Convênio de n. 857/SNH/92 entre o Ministério da Ação Social e a Prefeitura de
Bauru, representada pelo ora denunciado, na condição de Prefeito.
1 V.g., HC 30.622, Laudo, 1948, RF 249/ (...); HC 31.086, Orozimbo, 1949; RHC 38.061, 1960, l.
Gallotti; HC 40.182, 1963, Victor Nunes; RHC 60.357, 15-10-82, Passarinho, RTJ 104/153; HC
83.983, 7-12-04 (não concluído).
2 V.g. HC 80.487, 6-3-01, Galvão, DJ de 14-5-2001; HC 82.561, 1ª T., 8-4-03, Galvão; HC 83.510,
1ª T., 7-10-03, Britto.
90 R.T.J. — 195
(...)
11. Justamente no mês em que vieram os recursos federais, a medição foi feita
em data diversa da usual, além de terem sido feitas duas medições em menos de 10
dias. Outro ponto é o de que o pagamento da medição de 01/09/92, protocolada na
prefeitura em 04/09/92, foi feito no mesmo dia, em 04/09/92. Como o Município
não aguardou o prazo máximo para pagamento, estima-se que houve prejuízo de
cerca de um bilhão de cruzeiros, em valores da época. Por derradeiro, houve uma
“incrível coincidência” entre os valores da medição com correções e dos recursos,
pois ambos eram exatamente iguais, ou seja, totalizavam sete bilhões de cruzeiros.
12. Incontroverso o fato de que houve desvio de finalidade dos recursos
recebidos do convênio 857/SNH/92, restando evidente também que este desvio
foi realizado em proveito (benefício) da Construtora Coesa, o que implica em
elementar de outro tipo penal diferente daquele indicado na denúncia de fls.
201/203.”
Excluí, apenas da transcrição, trechos de relatórios elaborados no Ministério referido
(fl. 81) e da comissão de inquérito da Câmara Municipal (fl. 82) e de decisão do Tribunal
de Contas (fl. 84) — invocados para respaldar a imputação, mas que a ela não acrescen-
tam fatos novos.
A sentença afirmou a competência da Justiça Federal (fl. 28) e rejeitou a alegação
de bis in idem, aduzindo a este propósito — fl. 30:
“Suscita, ainda, o réu Antônio Izzo Filho, a ocorrência de bis in idem, pois os
fatos objeto da presente ação penal já foram apreciados pela autoridade judiciária
estadual, que concluiu pela improcedência das acusações.
Ora, em que pese o ilustre Procurador-Geral de Justiça do Estado de São
Paulo ter pedido o arquivamento do processo movido contra o réu na Justiça
Estadual, não há impedimento da análise dos fatos na Justiça Federal, haja vista
que, como já observado, esta é a competente para julgá-lo. Além do que, não houve
a apreciação do mérito naquele processo pelo Tribunal de Justiça do Estado de São
Paulo.”(...)”
No mérito — ao cabo de minuciosa análise da prova —, conclui por acolher a
denúncia, nos termos do aditamento — fl. 47:
“As provas carreadas para os autos, documental testemunhal, demonstram
claramente que os fatos ocorreram da forma como descrito na denúncia.
Assim, incontroverso o fato que houve desvio da finalidade dos recursos
recebidos do convênio 857/SNH/92, resta evidente também que este desvio foi
realizado em proveito (benefício) da Construtora Coesa.”
Por isso, condenou o paciente a cinco anos (fl. 52) e o co-réu a três anos de reclusão
(fl. 53), impondo-lhes “a inabilitação, pelo prazo de 5 (cinco) anos, para o exercício
de cargo ou função pública, eletivo ou de nomeação, sem prjuízo da reparação de
dano causado ao patrimônio público, nos termos do inciso 2º, do art. 1º, do Decreto-
Lei 201/67)”.
Não há dúvida de que são seríssimas as acusações formuladas pelo Ministério
Público Federal e acolhidas pela sentença.
R.T.J. — 195 93
III
Tem-se no caso que, na Justiça estadual, o pedido de arquivamento de inquérito
não se fundou na inexistência ou insuficiência de elementos informativos sobre o fato
criminoso investigado ou a sua autoria.
Ao contrário — por entender suficientemente apurado o fato — o Procurador-Geral
rejeitou o alvitre de baixa do inquérito para prosseguimento das investigações, formulado
pela autoridade policial (fl. 67 e fl. 78).
E a partir dessa premissa — a de estarem os fatos esclarecidos — é que concluiu por
requerer o seu arquivamento, dado que neles não havia crime a perseguir.
A hipótese — no comum dos casos — tem solução sedimentada na jurisprudência
do Tribunal, conforme ementa que lavrei para o acórdão unânime desta Turma — HC
80.560, 20-2-01, de que fui Relator — RTJ 179/755:
“Inquérito policial: decisão que defere o arquivamento: quando faz coisa
julgada.
A eficácia preclusiva da decisão que defere o arquivamento do inquérito
policial, a pedido do Ministério Público, é similar à daquela que rejeita a denúncia
e, como a última, se determina em função dos seus motivos determinantes, impe-
dindo — se fundada na atipicidade do fato — a propositura ulterior da ação penal,
ainda quando a denúncia se pretenda alicerçada em novos elementos de prova.
Recebido o inquérito — ou, na espécie, o Termo Circunstanciado de Ocor-
rência — tem sempre o Promotor a alternativa de requisitar o prosseguimento das
investigações, se entende que delas possa resultar a apuração de elementos que
dêem configuração típica ao fato (Código de Processo Penal, art. 16; Lei 9.099/95,
art. 77, § 2º).
Mas, ainda que os entenda insuficientes para a denúncia e opte pelo pedido
de arquivamento, acolhido pelo Juiz, o desarquivamento será possível nos termos
do art. 18 da lei processual.
O contrário sucede se o Promotor e o Juiz acordam em que o fato está suficien-
temente apurado, mas não constitui crime.
Aí — a exemplo do que sucede com a rejeição da denúncia, na hipótese do
art. 43, I, Código de Processo Penal — a decisão de arquivamento do inquérito é
definitiva e inibe que sobre o mesmo episódio se venha a instaurar ação penal, não
importa que outros elementos de prova venham a surgir posteriormente ou que
erros de fato ou de direito hajam induzido ao juízo de atipicidade.”
No voto então proferido, minudenciei as razões do meu convencimento, nestes
termos:
96 R.T.J. — 195
IV
Vale assinalar, de seu turno — como referido na menção aos precedentes —, que
em nada se altera a equação jurídica do problema que, na denúncia, se haja capitulado os
fatos em hipótese diferente (inciso II) daqueles cogitados (incisos III e XIV) do mesmo
tipo misto alternativo do art. 1º do Decreto-Lei 201/67, se — repita-se — os dados
relevantes do mesmo episódio foram objeto de ambas as contrapostas apreciações do
Ministério Público.
R.T.J. — 195 99
V
Resta enfrentar a questão talvez mais intrigante que o caso concreto suscita, a
partir da circunstância de o arquivamento do inquérito policial ter sido decidido na
Justiça Comum do Estado, ao passo que a denúncia provém do Ministério Público Federal
por crime que se afirma ofensivo de interesses da União e, por isso, do seu recebimento
decorreu a instauração do processo em curso na Justiça Federal ordinária.
Daí, como visto, partiu o il. Juiz Federal, na sentença, para rejeitar a preliminar
então suscitada pela defesa do paciente e que ora lastreia este habeas corpus — fl. 30:
“Suscita, ainda, o réu Antônio Izzo Filho, a ocorrência de bis in idem, pois os
fatos objeto da presente ação penal já foram apreciados pela autoridade judiciária
estadual, que concluiu pela improcedência das acusações.
Ora, em que pese o ilustre Procurador-Geral de Justiça do Estado de São
Paulo ter pedido o arquivamento do processo movido contra o réu na Justiça
Estadual, não há impedimento da análise dos fatos na Justiça Federal, haja vista
que, como já observado, esta é a competente para julgá-lo. Além do que, não houve
a apreciação do mérito naquele processo pelo Tribunal de Justiça do Estado de São
Paulo.”
Enfrentei questão similar ao relatar habeas corpus no qual — a luz da vedação da
chamada reformatio in pejus indireta — se sustentava a prescrição da pretensão punitiva
à base da pena aplicada na sentença pela Justiça Comum, não obstante anulada, mediante
recurso da defesa, por ser o caso da competência da Justiça Militar.
A Turma acompanhou o meu voto e deferiu a ordem, por maioria, vencido o em.
Ministro Moreira Alves.
Na ementa, consignei — HC 75.907, 11-11-97, DJ de 9-4-99:
“Reformatio in pejus indireta: aplicação à hipótese de consumação da
prescrição segundo a pena concretizada na sentença anulada, em recurso
100 R.T.J. — 195
3 Súmula 160: É nula a decisão do tribunal que acolhe, contra o réu, nulidade não argüida no recurso
da acusação, ressalvados os casos de recurso de ofício.
102 R.T.J. — 195
VI
De tudo — com a renovação de minhas escusas pela desmesurada extensão do
voto, só atenuada pela contingência em que me vejo de propor o sepultamento de
acusações de inegável gravidade —, defiro o habeas corpus para trancar o processo
condenatório objeto da impetração: é o meu voto.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Britto: Sr. Presidente, acompanho Vossa Excelência, não sem
antes registrar a fecundidade do seu pensar, a excepcional qualidade do voto.
Então, adiro ao seu pensamento com inteiro agrado.
(...)
O Sr. Ministro Cezar Peluso: Sr. Presidente, acompanho-o também. Vossa Excelência
deixou muito pouco para ser dito, a rigor, quase nada.
Gostaria apenas de acentuar alguns aspectos deste caso, de tamanha importância.
O primeiro, que Vossa Excelência demonstrou, e já me tinha, de certo modo, convencido
à bela sustentação oral, que o fato é o mesmo. Tratava-se da aplicação de verba proveniente
de convênio, com destinação a obras de infra-estrutura de programa de lotes urbanizados,
cujo numerário foi aplicado em outra obra já realizada de infra-estrutura, também de
acesso viário.
O Sr. Ministro Marco Aurélio: E destinação não prevista sequer em lei. Estava em
convênio.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Presidente e Relator): Fala-se que ele não tinha
autorização legislativa para convênio.
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Mas não havia destinação específica prevista em lei.
O Sr. Ministro Cezar Peluso: Por mais que forcejassem o Procurador Regional da
R.T.J. — 195 103
República e o Ministério Público da Justiça Federal local por tentar mudá-lo, o fato era
o mesmo, e, daí, a dispensa de prova por parte do Procurador-Geral.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Presidente e Relator): O único ponto em que a
denúncia federal é de certo nova é na atribuição de tudo aquilo ao propósito de benefi-
ciar a empresa. Agora, esse não seria o crime federal.
O Sr. Ministro Cezar Peluso: Como beneficiar a empresa? Segundo consta, a obra
já tinha sido realizada! Era, portanto, débito legítimo, segundo se presume.
O Procurador-Geral do Estado dispensou novas diligências e novas provas, porque
lhe pareceu manifestamente atípico o fato. E sobre isso adveio acórdão do Tribunal de
Justiça de São Paulo, que considerou o fato atípico.
Nada tenho por acrescentar ao exame profundo, feito por Vossa Excelência, da
jurisprudência da Casa, quanto à circunstância de que tal decisão, isto é, o arquivamento
de inquérito baseado na afirmação e reconhecimento da atipicidade do comportamento,
faz coisa julgada material. E, aqui, é que gostaria de fazer duas observações, que, embora
nada acrescentem ao brilhantismo do voto de Vossa Excelência, servem para reafirmá-lo.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Presidente e Relator): Os votos de Vossa Exce-
lência me deixam orgulhoso, porque, antes deles, não sabia que tinha tanta razão. Claro,
quando concordam comigo.
O Sr. Ministro Cezar Peluso: A primeira delas é que a circunstância, que poderia
parecer extremamente ponderável, de uma nova decisão originar-se de outra “Justiça”,
de outro ramo do Poder Judiciário, significa apenas que se trataria de decisão viciada por
eventual incompetência de caráter absoluto. Todos os vícios, exceto o de falta ou nuli-
dade de citação inicial, todos os vícios processuais são sanados pela coisa julgada. A
propósito, a doutrina vale-se de expressão extremamente imprópria para definir esse
fenômeno muito claro: “sanatória geral do processo”. A coisa julgada produziria sanató-
ria geral dos processos. Isso significa apenas que todos os vícios processuais, inclusive
o de incompetência absoluta, que fere de nulidade o processo, se tornam irrelevantes
depois do trânsito em julgado da sentença, exceto o de falta de citação inicial, porque
este é vício perpétuo.
Ora, a respeito da coisa julgada material, é preciso recuperar-lhe de certo modo o
significado próprio, e nisso me valho de expressão mais usada em Portugal, a qual me
parece traduzir com mais propriedade o fenômeno. Em Portugal, em vez de coisa julgada,
diz-se caso julgado. E a coisa julgada é exatamente isto: é um caso ou um fato que foi
julgado, mas definitivamente julgado. Por isso, como já recebeu do Estado a norma
singular e concreta que deu certeza sobre a relação jurídica, seja de caráter civil, seja de
caráter penal, envolvida no caso, este não pode, por força de garantia constitucional, ser
rejulgado, até porque é invulnerável a qualquer força normativa, como seria, por
exemplo, o de uma lei.
De modo que acompanho integralmente o voto de Vossa Excelência e subscrevo
todos os brilhantes fundamentos que Vossa Excelência deduziu, para também trancar o
processo.
104 R.T.J. — 195
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor Presidente, no caso, estão envolvidos, a meu
ver, dois valores: o valor justiça e o valor segurança jurídica, no que, com esta última,
busca-se o restabelecimento da paz social.
Vossa Excelência ressaltou que os fatos se mostraram idênticos. Tanto o Minis-
tério Público quanto o magistrado entenderam que não seriam típicos, passíveis de
levar à glosa penal.
Não se pode confundir também jurisdição com competência. A jurisdição, mono-
pólio do Estado, é una. E, aí, não cabe distinguir se o pronunciamento emanou da Justiça
Comum ou da Justiça Federal. A preclusão incide da mesma forma. A oferta subseqüente
de denúncia revelou como que uma quase revisão criminal. E sabemos que a revisão
criminal só pode ser intentada pela defesa, em benefício, portanto, do acusado.
A solução preconizada por Vossa Excelência é a mais consentânea com a ordem
jurídica, no que se evita que permaneça sobre a cabeça do cidadão uma verdadeira
espada de Dâmocles, passível de cair a qualquer momento.
Acompanho-o e defiro a ordem.
EXTRATO DA ATA
HC 83.346/SP — Relator: Ministro Sepúlveda Pertence. Paciente: Antônio Izzo
Filho. Impetrantes: Alberto Zacharias Toron e outro. Coator: Superior Tribunal de Justiça.
Decisão: A Turma deferiu o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do
Relator. Unânime. Falou pelo paciente o Dr. Alberto Zacharias Toron.
Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Ministros Marco
Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Subprocuradora-Geral da República, Dra.
Maria Caetana Cintra Santos.
Brasília, 17 de maio de 2005 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma
do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na
conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos,
deferir o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator.
Brasília, 19 de abril de 2005 — Sepúlveda Pertence, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: O paciente foi condenado, em primeiro grau, à
pena de 22 anos de reclusão e multa, em regime fechado, por infração, em concurso
material, dos arts. 157, caput; 213; e 214, todos do Código Penal.
O Tribunal de Justiça de São Paulo, por maioria, deu provimento em parte à apelação
do paciente e reconheceu a continuidade delitiva entre os crimes de estupro e de atentado
violento ao pudor e, à unanimidade, reduzir a pena quanto ao crime de roubo, bem como
determinar seu cumprimento no regime inicial fechado (fl. 19).
Em conseqüência, foi a pena reduzida para 14 anos e 8 meses de reclusão e multa
(fl. 27).
Não há nos autos do processo principal — em apenso —, nem nos do presente
habeas corpus, comprovação da data em que foi dada entrada dos autos na Secretaria do
Ministério Público estadual para a ciência do acórdão: consta apenas a data — 27-4-00 —
da remessa deles ao MP (fls. 28; e 211, Apenso II) e a aposição do “ciente” pelo Procurador
de Justiça, no dia 19-5-00 (fls. 211-v, Apenso II).
No dia 24-5-00, o Ministério Público estadual interpôs recurso especial (CF, art.
105, III, c), sustentando que o caso era de concurso material de estupro e atentado
violento ao pudor (fl. 55).
O STJ não conheceu do recurso especial, dado que ausente a correta “apresentação
dos arestos divergentes” (RISTJ, art. 255, §§ 1º e 2º) — fl. 55.
No dia 13-8-01, a Coordenadoria da 6ª Turma do STJ certificou que o “Ministério
Público Federal foi devidamente intimado, na pessoa de seu representante legal, conforme
determina o artigo 236, § 2º, do Código de Processo Civil e o artigo 390, do Código de
Processo Penal” (fl. 376 — Apenso I).
106 R.T.J. — 195
Em 16-8-01, os autos foram retirados pelo MPF que, na mesma data, registrou a
entrada deles na Procuradoria, tendo o Il. Subprocurador-Geral responsável lançado seu
“ciente” em 17-8-01 (fls. 376-v, Apenso I).
Opostos embargos de declaração pelo MPF no dia 20-8-01, foram eles “acolhidos
para, conferindo-lhes excepcionais efeitos infringentes, atestar o juízo positivo de ad-
missibilidade do recurso especial e lhe dar provimento para condenar o réu, como
incurso nas penas dos artigos 157, caput, 213 e 214, todos do Código Penal, reconhe-
cido o concurso material, a 21 anos e 4 meses de reclusão e 13 dias-multa, preservado
o regime de cumprimento da pena tal qual fixado pela Corte estadual” (fl. 81).
A essa decisão a Procuradoria-Geral do Estado opôs novos embargos de declaração,
rejeitados nos termos da ementa transcrita (fl. 100):
“Embargos de declaração. Recurso especial. Penal. Tempestividade. Inti-
mação pessoal do Ministério Público. Data da ciência. Omissão. Inocorrência.
A Egrégia 3ª Seção desta Corte Superior de Justiça pacificou entendimento
no sentido de que a intimação do Ministério Público deve ser pessoal e o prazo
para a interposição do recurso ministerial tem início na data da aposição do ciente
pelo representante do Parquet.
Adotando-se tal posicionamento, é de se ter por tempestivos os embargos de
declaração anteriormente opostos pelo Ministério Público Federal, bem como o
recurso especial interposto pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, não
havendo falar, assim, em omissão no decisum.”
Donde a presente impetração, na qual se alega que o recurso especial e os embargos
de declaração são intempestivos e, em conseqüência, deles não poderia conhecer o STJ.
O MPF, em parecer da lavra do Il. Subprocurador Geral Haroldo da Nóbrega,
assim opinou pelo indeferimento da ordem (fls. 137/145):
“(...)
O documento de fls. 28 prova que o Poder Judiciário fez remessa dos autos ao
Ministério Público do Estado de São Paulo. Mas não prova sequer a entrada dos
autos em dependências da Procuradoria-Geral da Justiça do Estado de São Paulo,
nem muito menos a intimação pessoal do Representante do Ministério Público
Estadual.
Também não cabe raciocinar em termos de prazo para o Ministério Público
Federal (para os embargos declaratórios) a partir da certidão de fls. 56, que é uma
certidão acoplada à publicação no Diário da Justiça.
Os autos do Resp 300.137 só ingressaram em dependências do Ministério
Público Federal, após a publicação do acórdão, em 16/08/2001, sendo cientificado
pessoalmente o Dr. Wagner Gonçalves, Subprocurador-Geral da República, em
17/08/2001 (ver fls. 56v).
R.T.J. — 195 107
Anote-se que o dia 16/08/2001 foi uma quinta-feira (...) sendo, conseqüente-
mente, tempestivos os embargos opostos na segunda-feira, 20/08/2003. Reitere-se
que o Dr. Wagner Gonçalves, Subprocurador-Geral da República, só tomou ciên-
cia do acórdão, pessoalmente, a 17-08-2001, uma sexta-feira, pelo que o prazo para
os embargos iniciar-se-ia a 20/08/2001 (ver final de fls. 56v, anotação, por cópia,
um pouco borrada, mas com a data de 17/08/2004 perfeitamente legível). Mesmo
computando-se o prazo dos embargos de declaração, a partir de 16/08/2001 (uma
quinta-feira) — hipótese que se admite só para argumentar — os embargos de
declaração protocolados a 20/08/2001 (fls. 58) são perfeitamente tempestivos.
(...)”
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator):
I
EXTRATO DA ATA
HC 83.915/SP — Relator: Ministro Sepúlveda Pertence. Paciente: Joaquim Cícero
Gomes. Impetrante: PGE/SP – Waldir Francisco Honorato Junior (Assistência Judiciária).
Coator: Superior Tribunal de Justiça.
Decisão: A Turma deferiu o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do
Relator. Unânime. Não participou deste julgamento o Ministro Marco Aurélio. Ausente,
justificadamente, o Ministro Eros Grau.
Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Ministros Marco
Aurélio, Cezar Peluso e Carlos Britto. Ausente, justificadamente, o Ministro Eros Grau.
Subprocurador-Geral da República, Dr. Eitel Santiago de Brito Pereira.
Brasília, 19 de abril de 2005 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma
do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na
conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos,
indeferir o pedido de habeas corpus. Vencido o Ministro Marco Aurélio.
Brasília, 7 de dezembro de 2004 — Sepúlveda Pertence, Presidente — Carlos
Ayres Britto, Relator.
110 R.T.J. — 195
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Carlos Ayres Britto: Trata-se de habeas corpus, impetrado contra
acórdão do Superior Tribunal de Justiça, que manteve a prisão preventiva do paciente,
por entender que este pretendia, com seu comportamento, se furtar à aplicação da lei
penal. Eis a ementa do decisum impugnado (fl. 06):
“Processual Penal. Habeas corpus. Prisão preventiva. Réu foragido. Cita-
ção. Não-realização. Endereço fornecido. Terreno baldio. Intenção. Fuga. Ca-
racterização. Custódia cautelar. Manutenção.
I – A circunstância de ter o defensor fornecido endereço para realização da
citação por meio de carta precatória, no qual chegou o oficial de justiça e consta-
tou que havia apenas um terreno baldio, acaba por reforçar a possível idéia do
acusado de se subtrair à aplicação da lei penal.
II – A fuga do réu, por si só, constituiu motivo suficiente a embasar a custódia
cautelar. (Precedentes).
Ordem denegada.”
2. Com o objetivo de reformar a decisão acima transcrita, o impetrante sustenta que
não há que se falar em fuga do acusado, dado que este não revelara o “animus de não
retornar”. Ademais, afirma que mudança de residência ou de domicílio não significa,
necessariamente, hipótese de fuga.
3. O pedido de medida liminar foi por mim indeferido, ante a ausência de seus
requisitos autorizadores.
4. Com o objetivo de confrontar as alegações do impetrante (no sentido de que as
intimações a ele encaminhadas foram dirigidas a endereços equivocados) com aquelas
afirmações constantes do acórdão impugnado (que dão conta de que no endereço forne-
cido pelo próprio advogado do paciente existia um terreno baldio), solicitei fossem
remetidos, a esta Suprema Corte, os autos originais do habeas corpus que tramitou no
egrégio Superior Tribunal de Justiça.
5. A douta Procuradoria-Geral da República, em parecer do Subprocurador-Geral
Haroldo Ferraz da Nóbrega, primeiramente opinou pela denegação da ordem, manifes-
tando-se, após análise dos documentos que integravam o processo em trâmite no STJ,
pela concessão do writ. Para isso, afirmou que “não se pode dizer que seja patente esteja
o paciente a se subtrair à aplicação da lei penal”.
É o breve relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Ayres Britto: Feito o relatório, passo ao voto.
8. Consoante relatado, discute-se no presente habeas corpus a validade jurídica do
decreto de prisão cautelar expedido contra o paciente, que foi denunciado pela suposta
prática, em continuidade delitiva, dos crimes de estelionato e formação de quadrilha
(art. 171, caput, c/c o art. 71 e art. 288, caput, todos do CP). Tais crimes teriam ocorrido
entre agosto e setembro de 1999, quando a empresa da qual o acusado é sócio (“Meltur
R.T.J. — 195 111
Operadora de Viagens Ltda.”) vendeu passagens aéreas inexistentes. Este fato só era
descoberto pelas numerosas vítimas quando, ao tentarem “resgatar” os vouchers que
recebiam, constatavam que a estes não correspondia nenhuma operação realizada entre
a empresa de turismo e a companhia aérea.
9. Pois bem, recebida a denúncia e verificada a impossibilidade de citação do paciente,
foi requerida sua prisão preventiva, não acolhida nos termos seguintes (fl. 30 — apenso 1):
“(...)
Com efeito, assiste razão ao dr. Promotor de Justiça quando baseado nesses
fundamentos pede o decreto da prisão preventiva. No caso, avultam os requisitos
que estão relacionados com a garantia da ordem pública e aquele outro que diz
com o propósito de assegurar a aplicação da lei penal. Importante salientar que o
vultuoso prejuízo causado, bem como o expressivo número de vítimas que teriam
suportado, sem dúvida ofende frontalmente a ordem pública, que deve ser garanti-
da. Somados esses fatos à notícia certificada nos autos de que os acusados estão
em lugar incerto, o que impede a sua citação pessoal, além de dificultar a correta
instrução processual e a indispensável aplicação da lei penal, tem-se que a prisão
preventiva encontra amparo naqueles mencionados requisitos legais, todos pre-
sentes, para que o pedido seja acolhido. De outro lado, os indícios da materialida-
de do delito e da sua autoria, conforme decorre das declarações prestadas pelas
vítimas e da prova documental juntada aos autos, estão suficientemente compro-
vados para justificar a pretensão que busca a prisão processual”. (sem destaques no
original)
10. Daí as sucessivas impetrações de habeas corpus que, buscando cassar o decreto
de prisão do paciente, repisam a alegação de que este não fugira, mas apenas mudara de
endereço, sem nenhuma intenção de se furtar à aplicação da lei penal. Também se afirma
que houvera equívoco no endereço constante do mandado de citação do acusado, tendo
sido este dirigido para a cidade de São Paulo (mais especificamente à filial que a empresa
mantinha nesta cidade), enquanto que o réu teria localização bem definida na cidade de
Recife.
11. Em que pesem os fundamentos lançados pelo impetrante, não é de ser acolhida
a impetração, visto que os fundamentos dela constantes não encontram respaldo nos
documentos carreados aos autos. Na verdade, quanto mais pedidos de informações
complementares eu solicitava, mais me convencia da absoluta inviabilidade do pre-
sente writ.
12. Com efeito, não é de se sustentar a afirmação de que houvera erro na citação do
acusado, que, residente em Recife, fora procurado na filial de sua empresa de turismo, em
São Paulo.
13. Bem vistas as coisas, o primeiro mandado de citação ao paciente foi encami-
nhado para a sede da Meltur Operadora em São Paulo (fl. 131 — apenso 1). Ao contrário
do que faz crer o impetrante, este não foi, no entanto, o único endereço utilizado pela
Justiça. Na tentativa de encontrar o acusado, foi expedida carta precatória para a comar-
ca de Recife/PE, da qual constou o endereço da sede da empresa do acusado, que ficava
112 R.T.J. — 195
em Boa Viagem (fls. 140/141 — apenso 1). Também este novo esforço não foi bem
sucedido, uma vez que, neste peregrinar procedimental, a sede da empresa já estava
fechada, existindo nos dois endereços fornecidos um escritório de advocacia e um terre-
no baldio (fls. 150 v. — apenso 1).
14. E não é só. Posteriormente a todas essas diligências (que restaram infrutíferas),
o defensor do acusado ingressou nos autos do processo-crime, solicitando a revogação
da custódia deste último, indicando seu novo endereço e dando início às sucessivas
alegações de que estariam ocorrendo equívocos na busca da localização do réu (fls.
176/184 — apenso 1). Ledo engano. Expedida nova carta precatória, desta vez com
mandado de citação para o endereço fornecido pelo próprio advogado do paciente,
também este não pôde ser cumprido. No local indicado, apenas foi encontrada a mulher
do paciente, que informou que seu marido residia em São Paulo (fls. 225 v.).
15. Ora, o paciente parece querer envolver a Justiça num círculo vicioso de infor-
mações cruzadas, tudo isso com o propósito de se furtar à aplicação da lei penal. Senão
veja-se: de início, alega que foi erroneamente procurado em São Paulo, quando sua
firma teria sede em conhecido endereço na cidade de Recife. Procurado em Recife, são
encontrados nos lugares indicados um escritório de advocacia e um terreno baldio.
Posteriormente, afirma-se que o acusado apenas mudou de residência e estaria morando
em Jaboatão dos Guararapes. Efetuada nova diligência, apenas é encontrada a esposa
do acusado, que afirma que este reside em São Paulo, deixando de indicar, todavia,
endereço específico.
16. Cumpre enfatizar que, ao contrário do que vislumbrou a douta Procuradoria-
Geral da República, o decreto de prisão preventiva do paciente é posterior a sua fuga.
Tanto é assim que o principal fundamento da segregação cautelar do acusado é justa-
mente o fato de este encontrar-se em “lugar incerto e não sabido”, pretendendo, com tal
conduta, se furtar à aplicação da lei penal. Para ser mais preciso, consigno que a prisão do
réu foi decretada em 13-9-2002 (fls. 29 — apenso 1), enquanto que os mandados de
citação dirigidos a Recife e a São Paulo são ambos de 23-7-2002 (fls. 131 e 141).
17. Presente esta ampla moldura fática, parece-me que as alegações de “mudança
de domicílio” apenas pretendem camuflar o fato de que o réu se encontra efetivamente
foragido, com o claro propósito de se furtar à aplicabilidade da lei penal. Correto, pois,
o decreto de prisão preventiva, que, por encontrar respaldo em elementos concretos,
deve ser mantido. Nesse sentido, cito a ementa do julgamento, por esta Suprema corte,
do RHC 67.338:
“Prisão preventiva. Se o paciente se esquiva da Justiça, causando dificulda-
des à aplicação da lei penal, justifica-se a sua prisão preventiva.
Recurso improvido.”
18. Isso posto, meu voto indefere a ordem de habeas corpus.
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor Presidente, realmente é possível procurar um
acusado para citação e não o encontrar.
R.T.J. — 195 113
A indagação que surge é se, nesse caso, tem-se como obrigatória, como conseqüên-
cia natural, a prisão preventiva. Responde a essa pergunta a legislação em vigor, o artigo
366 do Código de Processo Penal. Se o acusado, citado por edital, está em lugar incerto
e não sabido, não comparece nem constitui advogado, ficarão suspensos o processo e o
curso do prazo prescricional, ou seja, ele não logra vantagem com o fato de se evadir,
podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes —
provas que o tempo possa solapar — e, se for o caso — há a previsão a revelar, portanto,
que a prisão preventiva não é uma conseqüência de o acusado não ser encontrado —,
decretar prisão preventiva, nos termos do disposto no artigo 312 do Código de Processo
Penal.
Estabeleço a premissa de que é possível uma preventiva, mas não pelo fato de o
acusado, simplesmente, não ter sido encontrado.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Presidente): Parece que, no caso, houve suces-
sivas manobras de elisão da peregrinação procedimental referida pelo eminente Relator.
O peregrino parecer ter, propositadamente, induzido à tontura procedimental.
A simples revelia, já assentamos repetidas vezes, é uma opção do réu e não leva,
necessariamente, à prisão preventiva.
Mas não parece ser este o caso.
Ele indicou três ou quatro endereços diversos.
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Ele, no caso, não chegou a ser citado por edital?
O Sr. Ministro Carlos Britto (Relator): Foram sucessivas cartas precatórias.
O Sr. Ministro Cezar Peluso: E com advogado representado nos autos, que forne-
ceu um endereço falso.
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor Presidente, continuo a vislumbrar a prisão
preventiva como ato de excepcionalidade maior, a partir até mesmo do princípio escul-
pido na Carta de 1988, que é o princípio da não-culpabilidade, e extraio do citado artigo
366 a maior eficácia possível, quer relativamente à suspensão do processo, quer no
tocante ao curso do prazo prescricional e à própria prisão preventiva.
Não vejo, no caso de não ser encontrado o acusado, base, apenas por isso — sem
mesmo ter-se a citação por edital —, para chegar-se à preventiva, que há de estar reservada
a situações excepcionalíssimas. Já tenho sustentado até mesmo, interpretando o artigo 312
do Código de Processo Penal à luz da Carta de 1988, que, a rigor, o texto, que vem do
Estado Novo, está direcionado àqueles casos em que o acusado apresenta periculosida-
de maior para a sociedade, ou interfere, pressionando testemunhas, peritos e outros, na
própria instrução penal.
Peço vênia ao ilustre Relator para fazer essa leitura do artigo 366 do Código de
Processo Penal e tomar a cláusula final desse artigo — “se for o caso, decretar prisão
preventiva” —, não considerada a ausência do distrito da culpa, mas frente ao artigo
312, como algo de excepcionalidade maior.
Concedo a ordem.
114 R.T.J. — 195
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Presidente): Data venia do voto do eminente
Ministro Marco Aurélio, o artigo 366 nada tem a fazer neste caso, no qual o acusado
constituiu advogado.
Por outro lado, é certo, temos julgado mais de uma vez (por exemplo, no HC
81.151, relatado pelo eminente Ministro Ilmar Galvão), que a revelia, por si só, não
autoriza prisão preventiva. Até, aí, é óbvio.
O que há no caso, no entanto, é uma repetida e propositada atividade maliciosa do
acusado, pessoalmente ou por intermédio do seu advogado constituído na instância
ordinária — não o ilustre Advogado que hoje impetra o habeas corpus — para eludir e
enganar a Justiça, sendo ingênuo pensar que, se isso se fez no curso do processo, não se
fará na hipótese de condenação.
Acho plenamente justificada a terceira hipótese da prisão preventiva, que é garan-
tir a aplicação da lei penal, quando haja indícios mais que eloqüentes de uma propositada
intenção de fuga.
Acompanho o voto do eminente Ministro Relator.
EXTRATO DA ATA
HC 84.202/SP — Relator: Ministro Carlos Britto. Paciente: Nivaldo Tavares de
Mello. Impetrantes: Luiz Vicente Cernicchiaro e outro. Coator: Superior Tribunal de
Justiça.
Decisão: Por maioria de votos, a Turma indeferiu o pedido de habeas corpus;
vencido o Ministro Marco Aurélio. Falou pelo paciente o Dr. Luiz Vicente Cernicchiaro.
Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Ministros Marco
Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Subprocurador-Geral da República, Dr.
Edson Oliveira de Almeida.
Brasília, 7 de dezembro de 2004 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tri-
bunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos, deferir o pedido de habeas corpus, para deter-
minar a imediata extinção do Processo-Crime n. 2002.19335-4 (12ª Vara Federal da
Seção Judiciária do Distrito Federal), com a conseqüente invalidação desse procedi-
mento penal, desde o oferecimento da denúncia, inclusive, observados os demais termos
do voto do Relator. Falou, pelo paciente, o Dr. José Saraiva e, pelo Ministério Público
Federal o Dr. Geraldo Brindeiro.
Brasília, 14 de setembro de 2004 — Celso de Mello, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Celso de Mello: Trata-se de habeas corpus impetrado contra
decisão emanada do E. Superior Tribunal de Justiça, que, em sede de idêntico processo,
denegou o writ constitucional ao ora paciente, em acórdão assim ementado (fl. 260):
“Penal e Processual Penal. Habeas corpus substitutivo de recurso ordinário.
Crime contra a ordem tributária. Inépcia da denúncia. Condição de procedibili-
dade. Condição objetiva de punibilidade.
I - Não é, em princípio, indispensável a descrição pormenorizada de cada
conduta delitiva no caso de imputação de crime societário. A exigência legal é, aí,
mitigada.
II - O art. 83 da Lei n. 9.430/96 não criou, como regra geral, qualquer óbice
para a atuação do Ministério Público (art. 129, I e VIII da Carta Magna).
III - A existência de procedimento administrativo não tem o condão de, em
princípio, e por si só, obstar formalmente uma apuração criminal.
116 R.T.J. — 195
VOTO
O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): O Plenário do Supremo Tribunal Federal,
ao julgar o HC 81.611/DF, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, apreciou controvérsia em
tudo idêntica à que se registra na presente impetração, assentando o entendimento
segundo o qual, “(...) nos crimes do art. 1º da Lei 8.137/90, que são materiais ou de
resultado, a decisão definitiva do processo administrativo consubstancia uma condi-
ção objetiva de punibilidade, configurando-se como elemento essencial à exigibilida-
de da obrigação tributária, cuja existência ou montante não se pode afirmar até que
haja o efeito preclusivo da decisão final em sede administrativa” (Informativo/STF
333, de 2003 — grifei).
Essa mesma orientação vem de ser reiterada em julgamento efetuado pela Colenda
Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, que, ao apreciar o HC 83.414/RS, Rel.
Min. Joaquim Barbosa, proferiu decisão consubstanciada em acórdão assim ementado:
R.T.J. — 195 119
Vale ressaltar, ainda, por necessário, que essa mesma orientação vem de ser perfi-
lhada em recentíssimas decisões proferidas por ambas as Turmas desta Suprema Corte:
“Habeas corpus — Delito contra a ordem tributária — Sonegação fiscal —
Procedimento administrativo-tributário ainda em curso — Ajuizamento pre-
maturo, pelo Ministério Público, da ação penal — Impossibilidade — Ausência
de justa causa para a válida instauração da persecutio criminis — Invalidação
do processo penal de conhecimento desde o oferecimento da denúncia, inclusive —
Pedido deferido.
— Tratando-se dos delitos contra a ordem tributária, tipificados no art. 1º da
Lei n. 8.137/90, a instauração da concernente persecução penal depende da exis-
tência de decisão definitiva, proferida em sede de procedimento administrativo,
na qual se haja reconhecido a exigibilidade do crédito tributário (an debeatur),
além de definido o respectivo valor (quantum debeatur, sob pena de, em
inocorrendo essa condição objetiva de punibilidade, não se legitimar, por ausên-
cia de tipicidade penal, a válida formulação de denúncia pelo Ministério Público.
Precedentes.
— Enquanto não se constituir, definitivamente, em sede administrativa, o
crédito tributário, não se terá por caracterizado, no plano da tipicidade penal, o
crime contra a ordem tributária, tal como previsto no art. 1º da Lei n. 8.137/90. Em
conseqüência, e por ainda não se achar configurada a própria criminalidade da
conduta do agente, sequer é lícito cogitar-se da fluência da prescrição penal, que
somente se iniciará com a consumação do delito (CP, art. 111, I). Precedentes.”
(HC 84.092/CE, Rel. Min. Celso de Mello, 2ª Turma)
“Habeas corpus. Paciente denunciado por infração ao art. 1º, inciso II, da
Lei n. 8.137/90 e art. 288 do CP. Alegada necessidade de exaurimento da via
administrativa para instauração da ação penal, sem o que não estaria compro-
vada a redução ou supressão do tributo e, por conseguinte, também revelaria a
insubsistência do delito de quadrilha. Pedido de trancamento do processo.
A necessidade do exaurimento da via administrativa para a validade da ação
penal por infração ao art. 1º da Lei n. 8.137/90 já foi assentada pelo Supremo
Tribunal Federal (HC 81.611). Embora a Administração já tenha proclamado a
existência de créditos, em face da pendência do trânsito em julgado das decisões,
não é possível falar-se tecnicamente de lançamento definitivo. Assim, é de se
aplicar o entendimento do Plenário, trancando-se a ação penal no tocante ao delito
do art. 1º da Lei n. 8.137/90, por falta de justa causa, sem prejuízo do oferecimento
de nova denúncia (ou aditamento da já existente) após o exaurimento da via
administrativa. Ficando, naturalmente, suspenso o curso da prescrição. (...)”
(HC 84.423/RJ, Rel. Min. Carlos Britto, 1ª Turma — grifei)
Cabe assinalar, neste ponto, tendo em vista a plena liquidez dos fatos — formula-
ção prematura de acusação penal, por suposta prática de delitos contra a ordem tributária,
tipificados no art. 1º, n. I e IV, da Lei n. 8.137/90, deduzida antes de concluído o procedi-
mento administrativo-fiscal de lançamento tributário (consoante evidenciado pela certi-
122 R.T.J. — 195
dão de fl. 278) —, que se revela processualmente viável, ainda que em sede de habeas
corpus, reconhecer-se, para efeito de extinção anômala do processo penal condenatório,
a inocorrência de causa legitimadora da instauração da persecutio criminis, conforme
tem admitido o magistério jurisprudencial firmado por esta Suprema Corte.
Com efeito, impende reconhecer, nos termos em que formulado este voto e na
linha de reiterados pronunciamentos desta Suprema Corte (RT 594/458 — RT 747/597 —
RT 49/565 — RT 753/507), que, “Em sede de habeas corpus, só é possível trancar ação
penal em situações especiais, como nos casos em que é evidente e inafastável a negati-
va de autoria, quando o fato narrado não constitui crime, sequer em tese, e em situa-
ções similares, onde pode ser dispensada a instrução criminal para a constatação de
tais fatos (...)” (RT 742/533, Rel. Min. Maurício Corrêa — grifei).
E é, precisamente, o que se registra na espécie ora em exame.
Cumpre registrar, finalmente, que essa orientação tem o prestigioso beneplácito
de Julio Fabbrini Mirabete (Código de Processo Penal Interpretado, pp. 1426/1427,
7. ed., 2000, Atlas), cuja autorizada lição, no tema, adverte:
“Também somente se justifica a concessão de habeas corpus, por falta de
justa causa para a ação penal, quando é ela evidente, ou seja, quando a ilegalidade
é evidenciada pela simples exposição dos fatos, com o reconhecimento de que há
imputação de fato atípico ou da ausência de qualquer elemento indiciário que
fundamente a acusação (...).” (Grifei)
Sendo assim, pelas razões expostas, tendo em consideração os precedentes acima
referidos e acolhendo, ainda, o parecer da douta Procuradoria-Geral da República, defiro
o presente pedido de habeas corpus, para determinar, por ausência de tipicidade
penal, a imediata extinção do Processo-Crime n. 2002.19335-4, ora em tramitação
perante a 12ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal (fl. 280), com a
conseqüente invalidação desse procedimento penal, desde o oferecimento da denúncia,
inclusive, sem prejuízo, no entanto, de nova instauração da persecutio criminis, se e
quando satisfeita a condição objetiva de punibilidade a que se refere a jurisprudência
do Supremo Tribunal Federal, permanecendo suspensos os efeitos da prescrição penal
até o definitivo julgamento do processo administrativo-fiscal instaurado perante órgão
competente do Ministério da Fazenda (fls. 202/215 e 219/236).
É o meu voto.
VOTO
A Sra. Ministra Ellen Gracie: Sr. Presidente, depois irá ao Ministro.
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Não. Ao Ministro irá, se a decisão for desfavorável
ao Fisco. Se a decisão for desfavorável ao contribuinte, o Ministro nada tem que acres-
centar.
A Sra. Ministra Ellen Gracie: O contribuinte não tem direito de recurso ao Ministro?
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Não. Decidindo o Conselho de Contribuintes con-
trariamente ao contribuinte, segue-se a cobrança, na forma do decreto que consubstancia
o processo administrativo fiscal, Decreto 70.235/72, art, 43.
R.T.J. — 195 123
VOTO
A Sra. Ministra Ellen Gracie: Sr. Presidente, assinalo apenas a minha divergência
em tese, porém, democraticamente, rendo-me à orientação firmada pelo Plenário do
Supremo Tribunal Federal e acompanho Vossa Excelência quanto à conclusão.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Sr. Presidente, duas palavras apenas para marcar a
minha posição.
No Plenário, concorri com meu voto, para que se tomasse a decisão no sentido de
que a ação penal somente poderia ser proposta depois de findo o devido processo legal
administrativo fiscal.
O processo administrativo fiscal é regulado pelo Decreto n. 70.235, de 1972, com
várias alterações advindas posteriormente, mediante decretos-leis e, mesmo, leis ordiná-
rias. No que interessa, a situação é esta: o auto de infração e a notificação de lançamento
constituem o lançamento. É dizer: no momento em que é lavrado o auto de infração, é
expedida a notificação de lançamento, lançamento já existe. Esses atos administrativos
estão previstos no Decreto n. 70.235/72, artigos 9º, 10 e 11.
Seguem-se, a partir daí, os recursos administrativos, que o Decreto n. 70.235 chama
de impugnação e de recurso. A impugnação é feita para a autoridade de primeiro grau, e o
recurso, da decisão da autoridade de primeira instância para o Conselho de Contribuintes.
A impugnação é feita no prazo de 30 dias — artigo 15, do Decreto n. 70.235. E essa
124 R.T.J. — 195
Dessa forma, penso que a decisão tomada pelo Plenário parece-me acertada e presta
obséquio ao disposto no artigo 5º, LV, da Constituição: nos processos administrativos
observar-se-á o devido processo legal; no caso, o devido processo legal administrativo
fiscal previsto em legislação própria, Decreto n. 70.235/72, alterado por diversas dispo-
sições legais posteriores.
Peço licença para divergir do douto entendimento da Ministra Ellen Gracie.
Acompanho o voto do eminente Ministro Relator.
O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Sr. Presidente, gostaria, apenas, de ressaltar que, na
discussão Plenária — a Ministra Ellen tinha enfatizado isto. Levava-se em conta, tam-
bém, a possibilidade de que, dada a demora eventual do procedimento administrativo,
se verificasse a prescrição. A solução, então, alvitrada pelo Ministro Sepúlveda Pertence
solveu essa dúvida.
A Sra. Ministra Ellen Gracie: Protraindo a prescrição para o momento final desse
processo administrativo.
O Sr. Ministro Celso de Mello (Presidente e Relator): Foi o que fiz constar, expres-
samente, de meu voto proferido nesta sessão, na linha do precedente que o Plenário do
Supremo Tribunal Federal firmou no julgamento do leading case.
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Invoquei, aliás, no meu voto, o princípio da actio
nata: a prescrição só começa a correr com o nascimento da ação. Se a ação não pode ser
proposta, não há falar em prescrição.
O Sr. Ministro Joaquim Barbosa: Sr. Presidente, também no precedente da minha
Relatoria, fiz consignar isso.
EXTRATO DA ATA
HC 84.262/DF — Relator: Ministro Celso de Mello. Paciente: José Sanchez. Impe-
trantes: José Saraiva e outro. Coator: Superior Tribunal de Justiça.
Decisão: A Turma, por votação unânime, deferiu o pedido de habeas corpus, para
determinar a imediata extinção do Processo-Crime n. 2002.19335-4 (12ª Vara Federal da
Seção Judiciária do Distrito Federal), com a conseqüente invalidação desse procedi-
mento penal, desde o oferecimento da denúncia, inclusive, observados os demais termos
do voto do Relator. Falou pelo paciente o Dr. José Saraiva e, pelo Ministério Publico
Federal, o Dr. Geraldo Brindeiro.
Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Carlos
Velloso, Ellen Gracie, Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa. Subprocurador-Geral da
República, Dr. Geraldo Brindeiro.
Brasília, 14 de setembro de 2004 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.
126 R.T.J. — 195
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo
Tribunal Federal, em Segunda Turma, sob a presidência do Ministro Celso de Mello, na
conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por votação majoritária,
deferir o pedido de habeas corpus, por reconhecer a inépcia da denúncia oferecida
contra o ora paciente, determinado, em conseqüência, quanto a ele, a extinção do pro-
cesso penal em que oferecida, nos termos do voto do Ministro Gilmar Mendes.
Brasília, 14 de dezembro de 2004 — Celso de Mello, Presidente — Gilmar Mendes,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Joaquim Barbosa: Trata-se de habeas corpus impetrado em favor de
Ali Mazloum em face do acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça no julga-
mento do HC 33.610, cuja ementa tem o seguinte teor:
“Habeas corpus. Ação penal. Denúncia que descreve crime em tese com indí-
cios de autoria. Alegação de conduta atípica e ausência de justa causa. Tranca-
mento. Invialidade por exigir exame do conjunto fático probatório.
Denegação da ordem.” (Fl. 518)
R.T.J. — 195 127
VOTO
O Sr. Ministro Joaquim Barbosa (Relator): Insurge-se o impetrante contra a denún-
cia recebida pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Assinala que a inicial acusa-
tória está fundada em elementos precários, porquanto o Ministério Público não realizou
a oitiva do paciente, tendo oferecido a denúncia com base exclusivamente no resultado
das degravações telefônicas.
Afirma que a denúncia é inepta, na medida em que o seu conteúdo impossibilita o
direito de defesa do paciente. Alega ainda que inexiste justa causa para a propositura da
ação penal, inclusive por não ter a denúncia descrito a circunstância elementar da esta-
bilidade, contida no tipo de quadrilha ou bando. Por fim, discorre sobre o mérito da
imputação atribuída ao paciente.
O trancamento da ação penal, requerido pelo impetrante, só é admitido por esta
Corte em circunstâncias excepcionalíssimas, quando evidente a ausência de justa causa
para a propositura da ação penal.
Sendo assim, a questão central a ser resolvida no presente habeas corpus diz res-
peito a se saber se a denúncia está em consonância com o que dispõe o art. 41 do Código
de Processo Penal.
Antes de analisar a questão da alegada inépcia da denúncia, farei algumas conside-
rações acerca da afirmação de que o Ministério Público Federal não procedeu à oitiva do
paciente conforme determina o teor do art. 6º, V, do Código de Processo Penal, o que
implicaria, segundo o impetrante, violação das normas de processo.
128 R.T.J. — 195
Ressalto que a denúncia em análise não foi proposta com base em inquérito policial,
e sim em peças de informação constituídas pelo resultado do monitoramento telefônico
legalmente autorizado pelo Poder Judiciário, de modo que inaplicáveis à espécie os cita-
dos dispositivos legais.
A denúncia originou-se das investigações realizadas pelo Departamento de Polícia
Federal, em que se apurou inicialmente a ação delituosa levada a efeito por Jorge Luiz
Bezerra da Silva, relativamente a pessoas investigadas em inquéritos policiais instaurados
na Superintendência Regional do Departamento de Polícia Federal no Estado de Alagoas.
Posteriormente, quando surgiram indícios do envolvimento de magistrados federais
na suposta quadrilha, o feito passou a tramitar no TRF da 3ª Região.
A interceptação telefônica e o monitoramento das linhas fixas e dos celulares dos
envolvidos foram requeridos pela autoridade policial e deferidos pela autoridade judiciá-
ria competente. Tais interceptações foram acompanhadas pelo Ministério Público e pror-
rogadas pelo Juízo, obedecendo-se aos requisitos da Lei 9.296/1996.
Não há que se falar, portanto, em violação de normas de processo. Há diversos
precedentes desta Corte no sentido da prescindibilidade da instauração de inquérito
policial antes do oferecimento da denúncia, quando existirem outras peças de informa-
ção que forneçam indícios suficientes da autoria e materialidade do fato imputado (AI
266.214-AgR, Rel. Min. Sepúlveda Pertence; HC 63.213, Rel. Min. Néri da Silveira; HC
77.770, Rel Min. Néri da Silveira, e HC 80.405, Rel. Min. Celso de Mello).
Examino, agora, a alegação de ausência de justa causa por inépcia da denúncia.
Os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal estão, a meu ver, completa-
mente preenchidos.
Sobre esse aspecto, elucidativo é o teor do parecer exarado pelo membro do Ministério
Público Federal oficiante no Superior Tribunal de Justiça, do qual transcrevo o seguinte
trecho:
“26. A denúncia, que contém os requisitos exigidos pelo art. 41 do Código
de Processo Penal, acentua que toda a ação delituosa descrita ‘só se tornou possí-
vel graças à adesão, voluntária e consciente de agentes do Estado a um projeto
criminoso, apto a lesar, a partir do ajuste consensual quanto à prática de diversos
ilícitos penais, a própria paz pública, que constitui o bem jurídico protegido pelo
art. 288 do Código Penal’.
27. Narra que o paciente e os co-réus João Carlos da Rocha Mattos e Casem
Mazloum, todos juízes titulares de varas criminais da capital paulista, integravam
associação criminosa, estável e organizada, instituída ‘ com o fito de proteger os
intermediadores e/ou servidores que intervêm nos procedimentos administrativos,
além de fornecer cobertura aos negócios ilícitos geridos por pessoas que pagam
pelas atividades da quadrilha, consistentes na interrupção de investigações em
andamento, quando não pela conclusão das mesmas pela autoridade policial, ex-
cluindo a responsabilidade penal dos ´clientes´ da quadrilha, além da liberação de
mercadorias apreendidas’.
R.T.J. — 195 129
28. Nos termos da peça vestibular, ‘a estrutura montada conta com a destaca-
da atuação dos magistrados, para o caso das investigações saírem do controle e
ensejarem as ações penais que não possam, sem excessivo risco, ser rejeitadas de
plano, tendo, assim, garantida a interrupção daquelas e/ou a absolvição dos auto-
res de delitos penais, a despeito de toda a prova e evidência existentes nos
autos’(fls. 47).
29. Ao contrário do que quer fazer crer o impetrante, além de observadas as
exigências contidas no art. 41 do Código de Processo Penal, não se verifica nenhu-
ma das hipóteses previstas no art. 43 do mesmo diploma legal, tendo sido feita a
exposição do fato criminoso de forma a permitir o pleno exercício da defesa. A
conduta delitiva levada a efeito está descrita com os elementos necessários à com-
preensão do ilícito imputado ao paciente.”
Além dos trechos constantes dessas transcrições, o Ministério Público Federal é
claro na inicial ao individualizar o suposto papel do paciente na quadrilha. Assinala o
Parquet que o paciente teria praticado os delitos de ameaça e abuso de poder, apurados
em procedimento criminal específico1, contra policiais rodoviários federais, com o fim
de descobrir se números de telefone seus e de César Herman estavam sendo intercepta-
dos. É o que se infere da leitura do seguinte trecho da denúncia:
“O Ministério Público Federal denunciou Alexandre Crenitte, Wellengton
Carlos de Campos, Ari Natalino da Silva e Débora Aparecida Gonçalves da Silva
pela prática dos crimes descritos nos autos n. 2003.61.81.007078-8 (doc. n. ).
Referida denúncia decorre de fatos apurados com base em interceptações telefôni-
cas autorizadas judicialmente em inquérito policial em trâmite perante a 10ª Vara
Federal de Brasília e tramita perante a 7ª Vara Criminal Federal, titularizada pelo
Juiz Federal Ali Mazloum.
Embora a denúncia data de 16.09.03, até o presente momento não foi recebida
pelo magistrado. De fato o Juiz Federal Ali Mazloum condicionou o recebimento da
denúncia ao conhecimento, por ele, da integralidade das gravações realizadas nas
interceptações telefônicas pelo Juiz Federal da 10ª Vara de Brasília.
Demonstrando intenso interesse em conhecer totalmente as gravações acima
mencionadas, o magistrado Ali Mazloum telefonou para o Policial Rodoviário
Federal Wendel Benevides Matos em 22.09.03. Em 23.09.03, o Prf Wendel e seu
colega Marcos Prado (que tem atuação junto às investigações de Brasília) compa-
receram ao gabinete do Juiz Federal Ali Mazloum. O Juiz exigiu, então, ter acesso
a todo o material de Brasília, inclusive daquelas feitas sem a concorrência das
operadores de telefonia. Como justificativa, apontava eventuais falhas na investi-
gação, afirmando que não aceitaria intermediários no acesso às degravações das
investigações de Brasília.
1 A denúncia relativa a tais crimes foi oferecida concomitantemente à que é impugnada no presente
pedido, sob o registro 2003.03.00.065347-0 (v. fl. 138).
130 R.T.J. — 195
Ressalto que o trancamento da ação penal via habeas corpus por ausência de justa
causa, apesar de perfeitamente possível, é tido como medida de caráter excepcional,
conforme entendimento pacífico desta Corte (cf. HC 82.393, Rel. Min. Celso de Mello,
Segunda Turma, DJ de 22-8-2003).
No que concerne à alegação de ausência da elementar estabilidade, também não
vislumbro a ocorrência da tal vício na inicial acusatória. Ao contrário, os indícios de que
o paciente ameaçou policiais rodoviários federais para saber se o seu telefone e o de
César Herman estavam sendo monitorados demonstram ser provável a existência de
vinculação estável entre o paciente e o co-réu César Herman, um dos principais integrantes
da suposta quadrilha. Assinalo ainda que, na decisão relativa ao recebimento da
denúncia, o nome do paciente é mencionado a fls. 139/143/144/149/155/166, além de
nos demais trechos acima transcritos, o que indica sua participação estável na suposta
associação criminosa.
Ademais, há outros indícios que apontam a necessidade de realização de instrução
criminal para a elucidação dos fatos apresentados na denúncia.
Valho-me novamente do escorreito voto condutor da decisão de recebimento da
denúncia, na parte em que a desembargadora Therezinha Cazerta demonstra que os
documentos apreendidos nas diligências de busca e apreensão judicialmente autori-
zadas indicam a existência da associação criminosa, verbis:
“[...] Além disso, foram apreendidos documentos, na residência de Rocha
Mattos, localizada na Rua Maranhão, que representam indícios de participação na
quadrilha. Para exemplificar:
[...]
- papéis contendo anotações lançadas com letra muito semelhante a de João
Carlos, relativas a números de telefones de pessoas ligadas, de algum modo, ao
grupo: Ali, Law, Wagner Rocha, Enrico;
- anotações constantes de agenda apreendida: Dr. JOÃO pegar U$ 10.000,00;
José Guilherme-Eliana quer falar a respeito do Ali; Wagner – U$ 20.000,00; AAC
(Antônio Augusto César) - U$30.000,00; Palgrp – R$ 85.000,00; BMW – R$
40.000,00; Lio – R$ 19.000,00; Liberdade – R$ 35.000,00; Morumbi – R$
100.000,00. Sub-total: U$ 50.000,00. Apto Adri - U$ 110.000,00.” (Fls. 153/155/166)
Ressalto que, consoante sinalizado no voto da desembargadora, na fase de recebi-
mento da denúncia “vige o princípio in dubio pro societatis” (fl. 139).
Quanto à alegação de constrangimento supostamente causado ao paciente pela
fundamentação sucinta do acórdão que recebeu a denúncia, considero-a improcedente,
pois os trechos da referida decisão acima transcritos evidenciam que foi ela suficiente-
mente fundamentada, inclusive no que concerne ao paciente.
Ademais, conforme já decidido, por unanimidade, pela Segunda Turma, por oca-
sião do julgamento do HC 72.286 (Rel. Min. Maurício Corrêa):
“3. O despacho que recebe a denúncia ou a queixa, embora tenha também
conteúdo decisório, não se encarta no conceito de ‘decisão’, como previsto no art.
93, IX, da Constituição, não sendo exigida a sua fundamentação (art. 394 do CPP);
R.T.J. — 195 133
VOTO
O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Como já foi referido pelo eminente Ministro Relator,
o art. 41 do Código de Processo Penal estabelece:
“Art. 41. A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com
todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pe-
los quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o
rol das testemunhas.”
Essa fórmula encontrou em texto clássico de João Mendes de Almeida Júnior uma
bela e pedagógica sistematização. Diz João Mendes de Almeida Júnior sobre a denúncia:
“É uma exposição narrativa e demonstrativa. Narrativa, porque deve revelar
o fato com tôdas as suas circunstâncias, isto é, não só a ação transitiva, como a
pessoa que a praticou (quis), os meios que empregou (quibus auxiliis), o malefício
que produziu (quid), os motivos que o determinaram a isso (cur), a maneira porque
a praticou (quomodo), o lugar onde a praticou (ubi), o tempo (quando). (Segundo
enumeração de Aristóteles, na Ética a Nincomac, 1. III, as circunstâncias são resu-
midas pelas palavras quis, quid, ubi, quibus auxiliis, cur, quomodo, quando, assim
referidas por Cícero (De Invent. I)). Demonstrativa, porque deve descrever o corpo
de delito, dar as razões de convicção ou presunção e nomear as testemunhas e
informantes.” (Almeida Júnior, João Mendes de. O processo criminal brasileiro, v.
II. Rio de Janeiro/São Paulo: Freitas Bastos, 1959, p. 183)
Essa questão — a técnica da denúncia —, como sabemos, tem merecido do Supremo
Tribunal Federal reflexão no plano da dogmática constitucional, associada especialmente
ao direito de defesa.
Destaco as reflexões desenvolvidas pelo Ministro Celso de Mello, no HC 73.271,
cuja ementa diz o seguinte:
“(...)
Persecução penal — Ministério Público — Aptidão da denúncia. O Minis-
tério Público, para validamente formular a denúncia penal, deve ter por suporte
uma necessária base empírica, a fim de que o exercício desse grave dever-poder
não se transforme em instrumento de injusta persecução estatal. O ajuizamento da
ação penal condenatória supõe a existência de justa causa, que se tem por inocor-
rente quando o comportamento atribuído ao réu ‘nem mesmo em tese constitui
crime, ou quando, configurando uma infração penal, resulta de pura criação mental
134 R.T.J. — 195
da acusação’ (RF 150/393, Rel. Min. Orozimbo Nonato). A peça acusatória deve
conter a exposição do fato delituoso em toda a sua essência e com todas as suas
circunstâncias. Essa narração, ainda que sucinta, impõe-se ao acusador como exi-
gência derivada do postulado constitucional que assegura ao réu o pleno exercício
do direito de defesa. Denúncia que não descreve adequadamente o fato criminoso
é denúncia inepta.”
Em outro habeas corpus, também da Relatoria do Ministro Celso de Mello, extrai-se
o seguinte excerto:
“O processo penal de tipo acusatório repele, por ofensivas à garantia da
plenitude de defesa, quaisquer imputações que se mostrem indeterminadas, vagas,
contraditórias, omissas ou ambíguas. Existe, na perspectiva dos princípios consti-
tucionais que regem o processo penal, um nexo de indiscutível vinculação entre a
obrigação estatal de oferecer acusação formalmente precisa e juridicamente apta e
o direito individual de que dispõe o acusado a ampla defesa. A imputação penal
omissa ou deficiente, além de constituir transgressão do dever jurídico que se impõe
ao Estado, qualifica-se como causa de nulidade processual absoluta. A denúncia —
enquanto instrumento formalmente consubstanciador da acusação penal — consti-
tui peça processual de indiscutível relevo jurídico. Ela, ao delimitar o âmbito
temático da imputação penal, define a própria res in judicio deducta. A peça
acusatória deve conter a exposição do fato delituoso, em toda a sua essência e com
todas as suas circunstâncias. Essa narração, ainda que sucinta, impõe-se ao acusa-
dor como exigência derivada do postulado constitucional que assegura ao réu o
exercício, em plenitude, do direito de defesa. Denúncia que não descreve adequa-
damente o fato criminoso é denúncia inepta.” (HC 70.763, DJ de 23-9-94)
O tema tem, portanto, sérias implicações no campo dos direitos fundamentais.
Denúncias genéricas, que não descrevem os fatos na sua devida conformação, não
se coadunam com os postulados básicos do Estado de Direito.
Mas há outras implicações!
Quando se fazem imputações vagas, dando ensejo à persecução criminal injusta,
está-se a violar, também, o princípio da dignidade da pessoa humana, que, entre nós, tem
base positiva no artigo 1º, III, da Constituição.
Como se sabe, na sua acepção originária, este princípio proíbe a utilização ou trans-
formação do homem em objeto dos processos e ações estatais. O Estado está vinculado ao
dever de respeito e proteção do indivíduo contra exposição a ofensas ou humilhações. A
propósito, em comentários ao art. 1º da Constituição alemã, afirma Günther Dürig que a
submissão do homem a um processo judicial indefinido e sua degradação como objeto
do processo estatal atenta contra o princípio da proteção judicial efetiva (rechtliches
Gehör) e fere o princípio da dignidade humana [“Eine Auslieferung des Menschen an
ein staatliches Verfahren und eine Degradierung zum Objekt dieses Verfahrens wäre
die Verweigerung des rechtlichen Gehörs.”] (Maunz-Dürig, Grundgesetz Kommentar,
Band I, München, Verlag C. H. Beck , 1990, 1I 18).
R.T.J. — 195 135
Não é difícil perceber os danos que a mera existência de uma ação penal impõe ao
indivíduo. Daí a necessidade de rigor e prudência por parte daqueles que têm o poder de
iniciativa nas ações penais e daqueles que podem decidir sobre o seu curso.
Leio do destacado ponto da denúncia, também referido pelo Ministro Joaquim
Barbosa, que o Sr. Ali Mazloum teria uma “participação peculiar na quadrilha”. E tal
participação peculiar decorreu do fato de ter jurisdição sobre processo de interesse dos
mentores daquela e estaria a utilizar de serviços prestados pela quadrilha para obter
vantagens ou favores.
Nada se esclarece sobre tais serviços, nem sobre o que seria a peculiar participação!
Parece que estamos no campo da vagueza absoluta, da indeterminação ilimitada,
da acusação pela acusação.
Não fosse a discussão que tramita em outro processo sobre eventual abuso de poder
ou ameaça, não haveria nenhuma linha em torno da participação do Sr. Ali Mazloum no
presente processo.
Nesses termos, pedindo vênia ao Ministro Relator, defiro a ordem para trancar a ação.
VOTO
A Sra. Ministra Ellen Gracie: Sr. Presidente, acompanho o Ministro Relator quando
ele considera suficientemente explícita a denúncia, ao descrever fatos que vinculam o
paciente às atividades da quadrilha.
Peço vênia ao Ministro Gilmar Mendes para, pelo que ouvi do pronunciamento do
eminente Relator, entender detalhada a descrição das ocasiões em que esse paciente
teria convocado policiais, obtido detalhes relativos a fitas gravadas e, ainda, inquirido
esses policiais a respeito de um eventual grampeamento de telefone seu e também de
outro telefone pertencente a outro integrante do bando.
Entendo que está suficientemente descrita a atividade, possivelmente delituosa, e,
portanto, acompanho o Relator.
VOTO (Vista)
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Eminente Ministro Relator, a denúncia é simples-
mente formação de quadrilha?
O Sr. Ministro Joaquim Barbosa (Relator): Há duas denúncias.
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Neste caso, que denúncia estamos a examinar?
O Sr. Ministro Joaquim Barbosa (Relator): Neste caso, formação de quadrilha.
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Somente isso? Quer dizer, o habeas corpus diz
respeito à denúncia de formação de quadrilha, apenas?
O Sr. Ministro Joaquim Barbosa (Relator): Sim, formação de quadrilha. Mas, na
denúncia, o Ministério Público tenta estabelecer um vínculo entre o suposto crime de
ameaça e o fato de ele pertencer à quadrilha. Ou seja, o crime de ameaça estaria em um
outro processo.
136 R.T.J. — 195
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Por gentileza, eminente Ministro, em que consistiu
esse crime de ameaça? O eminente Advogado, em sua sustentação, esclareceu que o Juiz
Ali Mazloum teria exigido dos policiais que apresentassem as gravações das intercepta-
ções telefônicas porque o processo estava sob sua jurisdição. Essa é a questão? O juiz,
realmente, fez essa exigência?
O Sr. Ministro Joaquim Barbosa (Relator): O Ministério Público alega isso.
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Aqui, ele fez essa exigência?
O Sr. Ministro Joaquim Barbosa (Relator): Quanto a isso não há dúvida.
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Sim. E agora eu pergunto: gravações que estavam
em um processo sujeito à jurisdição do juiz?
O Sr. Ministro Joaquim Barbosa (Relator): Mas realizadas aqui em Brasília. A
alegação é esta: em um processo em que estavam envolvidos policiais e outros contra-
bandistas, outros indiciados lá em São Paulo, teriam sido autorizadas gravações por um
juiz de Brasília, e o paciente, antes de receber a denúncia, chamou os policiais ao seu
gabinete e pediu informações detalhadas. Ele queria a totalidade, a integralidade dessas
gravações, ameaçando os policiais.
O Sr. Antônio Cláudio M. de Oliveira (Advogado): Posso esclarecer sobre matéria
de fato, Sr. Presidente?
O Sr. Ministro Joaquim Barbosa (Relator): Pois não.
O Sr. Antônio Cláudio M. de Oliveira (Advogado): Muito obrigado. Na verdade,
vieram gravações da Décima Vara, a competência era de São Paulo, foram essas grava-
ções para a Sétima Vara. O Ministério Público ofereceu denúncia com base nessas grava-
ções da Décima Vara, e o juiz entendeu que não poderia receber a denúncia ou rejeitá-la
enquanto não tivesse a complementação.
A Sra. Ministra Ellen Gracie: Indago ao eminente Advogado, também, se, na
mesma ocasião em que teria sido apresentada essa relação de telefones, dentre os quais
uma do próprio magistrado, outra de outro integrante da quadrilha?
O Sr. Antônio cláudio M. de Oliveira (Advogado): Não posso afirmar isso a Vossa
Excelência porque meu cliente nega. Se é verdade ou não, isso não posso afirmar.
O Sr. Ministro Joaquim Barbosa (Relator): Mas consta essa informação?
O Sr. Antônio Cláudio M. de Oliveira (Advogado): Consta, sim.
O Sr. Ministro Joaquim Barbosa (Relator): Ele deu o telefone próprio e de duas
outras pessoas e perguntou ao policial se aqueles telefones estavam sendo monitorados.
O Sr. Antônio Cláudio M. de oliveira (Advogado): Isso quem afirma é o policial,
porque o cliente nega.
O Sr. Ministro Joaquim Barbosa (Relator): Pois é. Essa informação consta dos
autos.
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Quer dizer, o policial afirma que o telefone do juiz
estava grampeado?
O Sr. Ministro Joaquim Barbosa (Relator): O juiz pergunta ao policial, dá o número...
R.T.J. — 195 137
EXTRATO DA ATA
HC 84.409/SP — Relator: Ministro Joaquim Barbosa. Paciente: Ali Mazloum.
Impetrante: Antônio Cláudio Mariz de Oliveira. Coator: Superior Tribunal de Justiça.
Decisão: Depois dos votos do Ministro Relator e da Ministra Ellen Gracie, inde-
ferindo o pedido de habeas corpus, e do Ministro Gilmar Mendes deferindo-o, o
julgamento foi suspenso em virtude de pedido de vista do Ministro Carlos Velloso.
Falou, pelo paciente, o Dr. Antonio Cláudio Mariz de Oliveira.
Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Carlos
Velloso, Ellen Gracie, Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa. Subprocurador-Geral da
República, Dr. Francisco. Alberto Nóbrega.
Brasília, 7 de dezembro de 2004 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.
VOTO (Vista)
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Trata-se de habeas corpus impetrado em favor de
Ali Mazloum, com a alegação de que o paciente está sofrendo constrangimento ilegal
por parte do Eg. Superior Tribunal de Justiça, que manteve acórdão proferido pelo Órgão
Especial do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que recebeu denúncia oferecida
pelo Ministério Público Federal imputando ao paciente e a outros co-réus a prática do
crime de quadrilha ou bando (Código Penal, art. 288).
Sustenta o impetrante: a) ocorrência de violação das normas do processo; b) falta
de justa causa para a propositura da ação penal, em razão da inépcia da denúncia e da
inexistência de participação em quadrilha e da descrição da elementar estabilidade; c)
existência de omissão na denúncia; d) constrangimento ilegal ocasionado pelo acórdão
que recebeu a denúncia.
Requer a concessão da ordem, a fim de que seja trancada a ação penal.
Na sessão em que teve início o julgamento, o Sr. Ministro Joaquim Barbosa, Relator,
votou no sentido da denegação da ordem, no que foi acompanhado pela Sra. Ministra
Ellen Gracie. O Sr. Ministro Gilmar Mendes, por sua vez, votou no sentido da concessão da
ordem de habeas corpus.
138 R.T.J. — 195
Ali teria se utilizado de “serviços” prestados pela quadrilha, está na denúncia. Que
“serviços” são esses? A denúncia também não esclarece.
Os “serviços” prestados pela quadrilha seriam “para obter vantagens e/ou favores
ilícitos”. Que vantagens e/ou favores ilícitos foram obtidos? A denúncia também silencia
no ponto.
Ali aproveita-se “da função jurisdicional ‘para proteger os interesses ilícitos da
quadrilha”, está na denúncia. Que interesses ilícitos foram protegidos por Ali? De que
forma Ali aproveita-se ou aproveitou-se da função jurisdicional? A denúncia também
não esclarece. É certo que afirma que “planeja e realiza para a sua proteção e de outro
membro da quadrilha o crime de ameaça e abuso de poder.” Isso, entretanto, foi anali-
sado linhas atrás e vimos a inconsistência dessa afirmativa constante da denúncia.
Voltemos ao caso da ameaça e do abuso do poder.
O paciente, ficou esclarecido, exigiu que viessem para os autos da ação penal, que
corria sob sua direção, todos os fatos apurados em interceptações telefônicas, fatos em
que se embasava a denúncia, que deveria receber ou rejeitar.
Vale salientar, a propósito, o que, no memorial que nos foi apresentado pelo ilustre
advogado Mariz de Oliveira, está escrito:
“(...)
A acusação ensaiou uma explicação flagrantemente inconsistente, visivel-
mente fantasiosa, no sentido de que o objeto de Ali Mazloum seria o de saber se
César Herman, suposto membro da quadrilha, teria sido alvo de monitoramento
telefônico. Queria, assim, ‘proteger’ membros da quadrilha.
Já foi afirmado e reafirmado, está cabalmente provado que, antes de conver-
sar diretamente com os policiais rodoviários, o paciente já havia oficiado ao Juiz
de Brasília cobrando a totalidade das interceptações. Afinal, era um processo de
sua competência, em relação ao qual lhe fora solicitado o recebimento de uma
denúncia é até prisão cautelar. O raciocínio que a lógica impõe é o seguinte: se
quisesse proteger membros da quadrilha de possíveis gravações comprometedo-
ras, teria requisitado oficialmente as interceptações? Ele gostaria que esta prova,
até então distante e desconhecida, integrasse oficialmente o processo, para ciência
das partes e do Ministério Público?
Cabe reconhecer, além do mais, que a própria decisão de postergamento de
recebimento da denúncia até a vinda das gravações, postura esta, aliás, também
adotada por seu sucessor Caio Moyses de Lima — e em relação a ele ninguém
suspeitou de seu desiderato —, é mais uma demonstração clara de que Ali não
tinha qualquer temor quanto o teor das gravações.
(...).” (Fl. 02 do memorial)
Importante trazer ao debate, também, os fatos indicados na inicial, devidamente
documentados, e que vêm em socorro da defesa do paciente:
142 R.T.J. — 195
“(...)
Cumpre, nesta oportunidade, mostrar que dentro do ilegal critério seletivo de
provas, foram omitidos pela denúncia inúmeros fatos que contrariam e
desqualificam a imputação. Pedimos vênia para mencionar alguns desses aspectos
que militam a favor de Ali Mazloum:
- Em 19.02.03 ele decretou a prisão preventiva de Ari Natalino da Silva
nos autos do processo n. 2003.61.81.001098-9 (Doc. 12). Ari Natalino seria
um dos protegidos da quadrilha.
- Neste mesmo feito, Ari foi condenado em 29.08.03, em sentença da
lavra do requerente, à pena privativa de liberdade de 04 (quatro) anos e 06
(seis) meses de reclusão, uma sanção próxima à pena máxima cominada para
o delito (Doc. 13).
- Nos autos do processo n. 2003.61.81.001439-9, onde figura como
acusada a esposa de Ari Natalino, Sra. Aparecida Maria Pessuto, Ali Mazloum
decretou sua prisão preventiva, estando a ação penal ainda em trâmite com a
ré presa (Doc. 14).
- No inquérito policial n. 2002.61.81.003540-4, investigação na qual
se apuram diversos delitos em tese cometidos por Ari Natalino da Silva e
pessoas a ele ligadas, o ora requerente decretou quebras de sigilo bancário e
fiscal de dezenas de pessoas físicas e jurídicas ligadas ao grupo de Ari. Além
disso, determinou a expedição de inúmeros mandados de busca e apreensão,
em diversos endereços de pessoas físicas e jurídicas, inclusive em outros
Estados. E, ainda autorizou a interceptação telefônica de várias pessoas,
procedimento este que inclusive possibilitou a localização e prisão da
ex-mulher de Ari Natalino, foragida até então (Doc. 15).
- No procedimento 2003.61.81.007078-0 o paciente decretou a prisão
temporária do Delegado Alexandre Morato Crenite em 08.09.03 (Doc. 6), a
renovou em 12.09.03 (Doc. 7), e, depois, quando vencido o prazo da tempo-
rária, determinou a sua soltura já que não lhe foram encaminhadas todas as
interceptações telefônicas (Doc. 8). Alexandre Crenite também teria ligações
com alguns dos co-denunciados.
- Outro suposto contato do bando seria Law Kin Chong (Doc. 1 - fls.
33). Consta ainda da inicial que tal pessoa teve suas atividades investigadas
por meio de Inquérito Policial que tramita pela 7ª Vara Federal, cujo titular é
o Juiz aqui acusado. Omitiu a inicial que Ali Mazloum determinou, por três
vezes, busca e apreensão em estabelecimentos ligados ao Sr. Law, deferindo
pleito ministerial que visava angariar provas que o incriminassem (Doc. 16).
(...).” (Fls. 25-26)
O art. 41 do Código de Processo Penal estabelece que “a denúncia ou queixa
conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualifica-
ção do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação
do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas”.
R.T.J. — 195 143
A denúncia conterá, pois, “a exposição do fato criminoso com todas as suas cir-
cunstâncias”, lecionando Mirabete que “é indispensável que na denúncia se descreva,
ainda que sucintamente, o fato atribuído ao acusado, não podendo ser recebida a
inicial que contenha descrição vaga, imprecisa, de tal forma lacônica que torne impos-
sível ou extremamente difícil ao denunciado entender de qual fato preciso está sendo
acusado” (MIRABETE. Julio Fabbrini. Código de Processo Penal Interpretado. Ed.
Atlas, 8. ed., 2001, p. 171). Registra Mirabete que as circunstâncias do fato criminoso
se resumem nas “seguintes indagações: quis (o sujeito ativo do crime); quibus auxiliis
(os autores e meios empregados); quid (o mal produzido); ubi (o lugar do crime); cur (os
motivos do crime); quomodo (a maneira pela qual foi praticado) e quando (o tempo do
fato). Assim havendo concurso de pessoas, é necessário que a denúncia especifique
qual o comportamento de cada um dos co-autores ou partícipes e como ele concorreu
para o resultado” (ob. cit., pp. 172-173).
No HC 73.271/SP, Relator o eminente Ministro Celso de Mello, mencionado pelo
Sr. Ministro Gilmar Mendes, decidiu o Supremo Tribunal Federal:
“(...)
Persecução penal — Ministério Público — Aptidão da denúncia.
O Ministério Público, para validamente formular a denúncia penal, deve ter
por suporte uma necessária base empírica, a fim de que o exercício desse grave
dever-poder não se transforme em instrumento de injusta persecução estatal. O
ajuizamento da ação penal condenatória supõe a existência de justa causa, que se
tem por inocorrente quando o comportamento atribuído ao réu ‘nem mesmo em
tese constitui crime, ou quando, configurando uma infração penal, resulta de pura
criação mental da acusação’ (RF 150/393, Rel. Min. Orozimbo Nonato).
A peça acusatória deve conter a exposição do fato delituoso em toda a sua
essência e com todas as suas circunstâncias. Essa narração, ainda que sucinta,
impõe-se ao acusador como exigência derivada do postulado constitucional que
assegura ao réu o pleno exercício do direito de defesa. Denúncia que não descreve
adequadamente o fato criminoso é denúncia inepta. Precedente.
(...).” (DJ de 4-10-96)
A denúncia, no caso sob exame, bem anotou o Ministro Gilmar Mendes, é inepta.
A ameaça e o abuso de poder estão sendo investigados em sede própria, por isso que
ficou esclarecido que contra o paciente foi instaurada ação penal. O que não é possível
é a inclusão do paciente numa denúncia por formação de quadrilha sem que sejam
apontados os fatos, como linhas atrás tentamos demonstrar, que indicariam a participa-
ção do paciente nessa quadrilha, ou, como bem sustenta o ilustre impetrante, o Dr. Mariz
de Oliveira, sem que se demonstre “em que medida esta eventual ameaça é indicativo de
participação em quadrilha”, ou “qual o liame, o nexo lógico, o elo causal entre o
possível abuso de autoridade e a participação em quadrilha”.
Do exposto, com a vênia do Sr. Ministro Joaquim Barbosa e da Sra. Ministra Ellen
Gracie, adiro ao voto do Sr. Ministro Gilmar Mendes e concedo a ordem de habeas
corpus.
144 R.T.J. — 195
VOTO (Aditamento)
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Sr. Presidente, quero dizer que a denúncia não é
somente inepta, ela é cruel. Ela foi formulada contra um magistrado que não tinha
contra ele qualquer acusação. E, formulada com essa vagueza que se viu, submeteu o
magistrado — como dito hoje nos jornais pelo seu ilustre advogado — a um calvário.
Essa denúncia não é só inepta; é, também, cruel.
Concedo a ordem.
VOTO (Retificação)
A Sra. Ministra Ellen Gracie: Sr. Presidente, ouvi o voto do Ministro Carlos Velloso
e convenci-me das razões por ele alinhadas, bem como pelo Ministro Gilmar Mendes.
Portanto, com vênia do eminente Relator, também concedo a ordem.
VOTO
O Sr. Ministro Celso de Mello (Presidente): Consta que o ora paciente, Ali Mazloum,
teria tido “uma participação peculiar na quadrilha”, consistente em possuir “jurisdi-
ção em processo de interesse dos mentores” da organização criminosa, além de utilizar-se
“de serviços prestados pela quadrilha para obter vantagens ou favores”.
Esse caráter extremamente genérico da imputação penal deduzida pelo Ministério
Público levou o eminente Ministro Gilmar Mendes — depois de acentuar que, na peça
acusatória, “não se diz mais nada” — a observar:
“(...) parece que estamos no campo da vagueza absoluta, da indeterminação,
e, não fosse a discussão que tramita em outro processo sobre eventual abuso ou
ameaça, não haveria aqui nenhuma discussão em torno da participação do Sr. Ali
Mazloum neste processo.”
Trata-se de indagar, no caso presente, da correção formal da peça acusatória,
que, segundo alega o impetrante, revelar-se-ia inidônea e imprestável à válida instau-
ração da persecução penal.
Entendo que as alegações feitas pelo ilustre impetrante impõem algumas refle-
xões em torno da indeclinável obrigação jurídica que condiciona o exercício, pelo
Ministério Público, de seu gravíssimo poder de denunciar.
Não se pode perder de perspectiva, neste ponto, que a análise de qualquer peça
acusatória apresentada pelo Ministério Público impõe que nela se identifique, desde
logo, a narração objetiva, individuada e precisa do fato delituoso, que deve ser especifi-
cado e descrito, em todos os seus elementos estruturais e circunstanciais, pelo órgão
estatal da acusação penal.
É preciso proclamar que a imputação penal não pode ser o resultado da vontade
pessoal e arbitrária do acusador (RTJ 168/896-897, Rel. Min. Celso de Mello). Este, para
que possa validamente formular a denúncia penal, deve ter por suporte uma necessária
base empírica, a fim de que a acusação não se transforme, como advertia o saudoso
Ministro Orosimbo Nonato, em pura criação mental do acusador (RF 150/393).
R.T.J. — 195 145
A peça acusatória, por isso mesmo, deve conter a exposição do fato delituoso, em
toda a sua essência e com todas as suas circunstâncias. Essa narração, ainda que sucinta,
impõe-se ao acusador como exigência derivada do postulado constitucional que asse-
gura ao réu o exercício, em plenitude, do direito de defesa. Denúncia que não descreve
adequadamente o fato criminoso — já advertiu esta Corte — é denúncia inepta (RTJ
57/389 — RTJ 168/896-897).
Lapidar, sob esse aspecto, a advertência do eminente Desembargador paulista
Alberto Silva Franco, cujo magistério vale relembrar (RT 525/372-375):
“Num processo de tipo acusatório, não se compreende que o objeto da acusa-
ção fique ambíguo, indefinido, incerto ou logicamente contraditório, pois é ele
que estabelece os limites das atividades, cognitiva e decisória, do Juiz. A este
efeito do objeto da acusação é que Eberhard Schmidt denominou de vinculação
temática do Juiz. Este só pode ter ‘como objeto de suas comprovações objetivas e
de sua valoração jurídica aquele sucesso histórico cuja identidade, com respeito
ao fato e com respeito ao autor, resulta da ação (...)”. (Grifei)
Não se pode deixar de ter presente, neste ponto, que foi em proveito da liberdade
individual que se impôs, ao órgão da acusação, o dever de incluir, na denúncia, todos os
elementos essenciais à exata compreensão da imputação penal por ele deduzida contra
o suposto autor do comportamento delituoso.
Essa obrigação processual do Ministério Público guarda íntima conexão com
uma garantia fundamental outorgada pela Constituição da República em favor daqueles
que sofrem, em juízo, a persecução penal movida pelo Estado: a garantia da plenitude
de defesa (RTJ 33/430).
É por essa razão que Vicente Greco Filho (Manual de Processo Penal, p. 64,
1991, Saraiva), ao versar o tema referente aos princípios constitucionais que regem o
processo penal, estabelece o nexo de indiscutível vinculação que existe entre a obriga-
ção estatal de oferecer acusação formalmente precisa e juridicamente apta e o direito
individual de que dispõe o acusado à ampla defesa:
“Outro requisito essencial à ampla defesa é a apresentação clara e completa
da acusação, que deve ser formulada de modo que possa o réu contrapor-se a seus
termos. É essencial, portanto, a descrição do fato delituoso em todas as suas cir-
cunstâncias. Uma descrição incompleta, dúbia ou que não seja de um fato típico
penal gera a inépcia da denúncia e nulidade do processo, com a possibilidade de
trancamento através de habeas corpus, se o juiz não rejeitar desde logo a inicial.
Para que alguém possa preparar e realizar sua defesa é preciso que esteja claramen-
te descrito o fato de que deve defender-se.” (Grifei)
É que, se assim não for, inverter-se-á, de modo ilegítimo, no processo penal de
condenação, o ônus da prova, com evidente ofensa ao postulado constitucional da não-
culpabilidade.
Não custa enfatizar, por isso mesmo, na linha do magistério jurisprudencial con-
sagrado no âmbito do Supremo Tribunal Federal, que “nenhuma acusação penal se
presume provada. Não compete ao réu demonstrar a sua inocência. Cabe ao Ministério
Público comprovar, de forma inequívoca, a culpabilidade do acusado. Já não mais
R.T.J. — 195 147
prevalece, em nosso sistema de direito positivo, a regra, que, em dado momento histórico
do processo político brasileiro (Estado Novo), criou, para o réu, com a falta de pudor
que caracteriza os regimes autoritários, a obrigação de o acusado provar a sua pró-
pria inocência (Decreto-Lei n. 88, de 20/12/37, art. 20, n. 5)” (RTJ 161/264-266, 265,
Rel. Min. Celso de Mello).
Tendo em vista, portanto, a natureza dialógica do processo penal acusatório,
hoje impregnado, em sua estrutura formal, de caráter essencialmente democrático
(José Frederico Marques. “O Processo Penal na Atualidade”, in: Processo Penal e
Constituição Federal, Apamagis/Ed. Acadêmica), 1993. pp. 13/20, não se pode descon-
siderar, na análise do conteúdo da peça acusatória — conteúdo esse que delimita e que
condiciona o próprio âmbito temático da decisão judicial —, que o sistema jurídico
vigente no Brasil impõe ao Ministério Público, quando este deduzir determinada impu-
tação penal contra alguém, a obrigação de expor, de maneira individualizada e precisa,
a participação das pessoas acusadas da suposta prática da infração penal, a fim de que
o Poder Judiciário, ao resolver a controvérsia penal, possa, em obséquio aos postulados
essenciais do direito penal da culpa e do princípio constitucional do due process of law,
e sem transgredir esses vetores condicionantes da atividade de persecução estatal,
apreciar a conduta individual do réu, a ser analisada, em sua expressão concreta, em
face dos elementos abstratos contidos no preceito primário de incriminação.
Cumpre ter presente, desse modo, que se impõe ao Estado, no plano da persecução
penal, o dever de definir, com precisão, na peça acusatória, a participação individual dos
autores de quaisquer delitos, sob pena de inépcia da denúncia (RTJ 168/896-897, Rel.
Min. Celso de Mello).
Bem por isso é que o Poder Público, tendo presente a norma inscrita no art. 41 do
Código de Processo Penal, não pode deixar de observar as exigências que emanam
desse preceito legal, sob pena de incidir em grave desvio jurídico-constitucional no
momento em que exerce o seu dever-poder de fazer instaurar a persecutio criminis
contra aqueles que, alegadamente, transgrediram o ordenamento penal do Estado.
Impõe-se relembrar, neste ponto, a advertência de Heleno Cláudio Fragoso,
que, ao versar o tema da “Ilegalidade e Abuso de Poder na Denúncia e na Prisão Preven-
tiva”, observou (Revista Brasileira de Criminologia e Direito Penal, n. 13/63):
“(...) elemento essencial de garantia para o acusado, a narração minuciosa do
fato fundamenta o pedido, demonstra a convicção da acusação pública, justifica a
ação penal, afasta o arbítrio e o abuso de poder.”
Não custa enfatizar, ainda, por necessário, que, no sistema jurídico brasileiro, não
existe qualquer possibilidade de o Poder Judiciário, por simples presunção ou com
fundamento em meras suspeitas, reconhecer, em sede penal, a culpa de alguém.
Na realidade, os princípios democráticos que informam o modelo constitucional
consagrado na Carta Política de 1988 repelem qualquer ato estatal que transgrida o
dogma de que não haverá culpa penal por presunção, nem responsabilidade criminal
por mera suspeita.
148 R.T.J. — 195
Tenho por consistente, portanto, a alegação feita pelo ilustre impetrante de que a
denúncia oferecida pelo Ministério Público, na espécie ora em análise, está viciada pelo
gravíssimo defeito da inépcia, como bem o reconheceu, em seu douto voto, o eminente
Ministro Gilmar Mendes.
Sendo assim, tendo em consideração as razões expostas, peço vênia para deferir
o pedido de habeas corpus, nos precisos termos constantes do douto voto que proferiu
o eminente Ministro Gilmar Mendes, por reconhecer que “a denúncia não preenche
os requisitos para o desenrolar de uma ação penal garantidora do legítimo direito de
defesa” (grifei).
É o meu voto.
EXTRATO DA ATA
HC 84.409/SP — Relator: Ministro Joaquim Barbosa. Relator para o acórdão:
Ministro Gilmar Mendes. Paciente: Ali Mazloum. Impetrante: Antônio Cláudio Mariz de
Oliveira. Coator: Superior Tribunal de Justiça.
Decisão: A Turma, por votação majoritária, deferiu o pedido de habeas corpus, por
reconhecer a inépcia da denúncia oferecida contra o ora paciente, determinando, em
conseqüência, quanto a ele, a extinção do processo penal em que oferecida, nos termos
do voto do Ministro Gilmar Mendes, vencido o Ministro Relator que o indeferia. Retifi-
cou seu voto a Ministra Ellen Gracie. Redigirá o acórdão o Ministro Gilmar Mendes.
Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Carlos
Velloso, Ellen Gracie, Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa. Subprocurador-Geral da Re-
pública, Dr. Haroldo Ferraz da Nóbrega.
Brasília, 14 de dezembro de 2004 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo
Tribunal Federal, em Segunda Turma, sob a Presidência do Ministro Carlos Velloso
(RISTF, art. 37, II), na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas,
por unanimidade de votos, negar provimento.
Brasília, 21 de junho de 2005 — Carlos Velloso, Presidente — Gilmar Mendes,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Trata-se de agravo regimental contra decisão de
indeferimento de extensão de concessão de habeas corpus por mim proferida. Deneguei
o pedido do recorrente, afirmando, no ponto, o seguinte:
“Todavia, a extensão da decisão em habeas corpus para co-réu somente pode
abranger aquele que esteja em situação objetivamente idêntica à do beneficiado.
Esta é a posição da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal relativamente
à exegese do art. 580 do Código de Processo Penal:
[...]
Na espécie, observo que não é comum a descrição da conduta atribuída a Ali
Mazloum (beneficiado pelo habeas corpus) e dos ora requerentes. Outras passa-
gens da denúncia descrevem condutas atribuídas a Casem. Quanto a Carlos
Alberto, embora a denúncia seja sucinta, não se trata da mesma situação descrita
em relação a Ali.
Para a extensão do habeas corpus, as situações haveriam de ser idênticas, o
que não me parece estar demonstrado pelos requerentes.” (fls. 832-833)
Alega-se que:
“no que concerne à qualidade, essência ou substância, a descrição da forma
de participação de Casem no suposto crime de quadrilha é idêntica à imputada a
Ali, na medida em que,
“(...) Casem Mazloum e Ali Mazloum ocupam funções peculiares na
quadrilha, pois têm jurisdição em processos de interesse dos mentores daque-
la, bem com utilizam-se de ‘serviços’ prestados pela quadrilha para obter
vantagens e/ou favores ilícitos. Aproveitam-se da função jurisdicional para
proteger os interesses ilícitos da quadrilha (...).” (Fl. 842)
Afirma-se que “tal como no caso de Ali, a denúncia não mencionou, em uma única
linha sequer, qual processo de interesse da quadrilha tem sob sua jurisdição e que ato
Casem praticou para proteger os interesses ilícitos da quadrilha” (fl. 843). E ainda
“retirados os fatos banais e que em nada se relacionam com o crime de quadrilha, os
fundamentos de fato e de direito que determinaram a concessão do habeas corpus a Ali
se ajustam perfeitamente à conduta de Casem descrita na denúncia, ou seja, falta de
menção aos processos sob sua jurisdição de interesse da quadrilha e ao ato de proteção,
o que viola o art. 41 do CPP e os princípios do contraditório e da dignidade da pessoa
humana.” (Fl. 848)
R.T.J. — 195 151
VOTO
O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Relator): Indeferi o pedido de extensão, afirmando,
no ponto, o seguinte:
“Na espécie, observo que não é comum a descrição da conduta atribuída a Ali
Mazloum (beneficiado pelo habeas corpus) e dos ora requerentes. Outras passa-
gens da denúncia descrevem condutas atribuídas a Casem. Quanto a Carlos
Alberto, embora a denúncia seja sucinta, não se trata da mesma situação descrita
em relação a Ali.
Para a extensão do habeas corpus, as situações haveriam de ser idênticas, o que
não me parece estar demonstrado pelos requerentes.”
A Segunda Turma entendeu estar caracterizada a inépcia da denúncia em relação a
Ali Mazloum, por não preencher os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal.
Em meu voto, que iniciou a divergência e restou vencedor, defendi que os requisitos
da denúncia referidos no art. 41 do Código de Processo Penal revelam concretização do
direito de defesa. Apontei dois acórdãos da relatoria do Ministro Celso de Mello que
corroboram esse entendimento (HC 73.271, DJ de 4-10-94 e HC 70.763, DJ de 23-9-94) e
teci algumas considerações sobre as implicações de denúncias vagas no campo do Direito
Constitucional.
Ao final, afirmei:
“Leio do destacado ponto da denúncia, também referido pelo Ministro Joaquim
Barbosa, que o Sr. Ali Mazloum teria uma ‘participação peculiar na quadrilha’. E tal
participação peculiar decorreu do fato de ter jurisdição sobre processo de interesse dos
mentores daquela e estaria a utilizar de serviços prestados pela quadrilha para
obter vantagens ou favores.
Nada se esclarece sobre tais serviços, nem sobre o que seria a peculiar parti-
cipação!
Parece que estamos no campo da vagueza absoluta, da indeterminação ilimi-
tada, da acusação pela acusação.
Não fosse a discussão que tramita em outro processo sobre eventual abuso de
poder ou ameaça, não haveria nenhuma linha em torno da participação do Sr. Ali
Mazloum no presente processo.”
Acrescentou o Ministro Velloso em seu voto, verbis:
152 R.T.J. — 195
EXTRATO DA ATA
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma
do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na
156 R.T.J. — 195
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Carlos Ayres Britto: Trata-se de habeas corpus impetrado em favor
de Alexandre Manoel Trevisan, no qual se argúi a nulidade do decreto de prisão preven-
tiva do paciente, por ausência de fundamentação idônea.
2. A custódia ora impugnada foi decretada ainda na fase inquisitiva, mantida após
a instauração da ação penal em que o paciente, conjuntamente com outros réus, foi
denunciado pelo homicídio qualificado do líder ruralista Bartolomeu Morais da Silva,
vulgo “Brasília”, ocorrido no distrito de Castelo dos Sonhos, comarca de Altamira/PA.
Para a denúncia, “Maneco”, fazendeiro da região, teria contratado os pistoleiros “Márcio
Cascavel” e “Parazinho” para assassinarem o sindicalista.
3. O fatídico episódio teve repercussão nacional, haja vista a condição da vítima
de representante dos trabalhadores rurais da região, conhecida pelos graves conflitos
fundiários. Daí que, em 11-11-2003, por efeito do agravamento dos conflitos, foi realizada
audiência pública na cidade, com a participação do Exmo. Ministro da Justiça, Márcio
Thomas Bastos, e do Procurador-Geral da República, Cláudio Lemos Fonteles. E foi
nesse contexto que se deu a propositura da ação penal, atentando-se, ainda, para a
ocorrência de vários contratempos curiosos, como, por exemplo, os sucessivos pedidos
de afastamento, subscritos por dois promotores, ambos indicados pelo Procurador-Geral
de Justiça do Estado para acompanharem o caso.
4. Pois bem, prossigo no relato do caso para dizer que a presente impetração renova
o pedido já formulado nas instâncias ordinárias, no sentido da falta de motivação do
decreto prisional. Daí consignar o impetrante que a custódia cautelar teria sido decretada
exclusivamente com base na gravidade do delito. Da mesma forma, conteria afirmações
hipotéticas de que o paciente, em liberdade, poderia praticar novos crimes, bem assim
que a ordem pública e a aplicação da lei penal estariam ameaçadas, o que, segundo a
inicial, não se traduz em fundamento válido, porquanto divorciado dos dados objetiva-
mente verificados. Donde pedir a revogação da prisão preventiva.
5. A douta Procuradoria-Geral da República, em parecer da ilustrada Subprocura-
dora-Geral, Dra. Delza Curvello Rocha, reportou-se ao acórdão impugnado e às informa-
ções prestadas pelo Juízo perante o qual tramita o feito, para concluir pelo indeferimento
da ordem.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Ayres Britto (Relator): Feito o relatório, passo ao voto.
8. Consoante registrei em linhas passadas, a custódia do ora paciente foi decretada
R.T.J. — 195 157
de chão em precário estado de conservação, sendo que naquele local quase não há
a presença do Estado no pertinente à segurança pública, contando tão somente
com uma guarnição da Polícia Militar.
Além disso, o Ministério Público não fundamentou o seu pedido de prisão
preventiva no pertinente à conveniência da instrução processual, alegando gene-
ricamente que o réu iria “tentar eliminar testemunhas, apagar provas e prejudicar a
aplicação da justiça”, não havendo nenhum fato concreto nos autos que retrate
alguma ação do acusado Alexandre em tal sentido.
Ressalto que o referido réu compareceu espontaneamente perante este Juízo
a fim de ser interrogado, no dia 31.10.2003, quando ainda encontrava-se amparado
pelo salvo conduto acima mencionado.
Por fim, em que pese o réu ter se evadido do distrito da culpa logo após a
decretação de sua prisão preventiva na fase inquisitiva, a meu ver, tal fato não pode
ser acolhido como argumento válido, visando a garantia da lei penal, para o aten-
dimento ao pedido formulado pelo representante do Parquet, haja vista que à
época do requerimento o réu encontrava-se amparado pela liminar concedida pelo
STJ.
Ante o exposto, denego o pedido de prisão preventiva do acusado Alexandre
formulado pelo representante ministerial ás fls. 251/253, por não vislumbrar nenhum
fato novo que a ampare, mantendo a prisão cautelar do réu decretada ainda na fase
inquisitiva.
Reafirmo que o delito imputado aos réus nomeados acima causou grande
comoção social e grave repercussão de âmbito nacional, posto que envolveria
questões fundiárias no distrito da culpa, sendo a vítima um representante sindical
dos trabalhadores rurais da região de Castelo dos sonhos.
Assim, apesar da lenta tramitação da ação penal, devida a vários obstáculos
já reiteradamente retratados nos autos, a prisão cautelar dos acusados, decretada
ainda na fase inquisitiva, apresenta-se a este magistrado como extremamente ne-
cessária para garantir a ordem pública no local da prática delitiva, haja vista
que há nos autos notícias de ameaças às testemunhas de acusação, sem vincula-
ção a nenhum réu especificamente, todas residentes no distrito de Castelo dos
Sonhos-PA, onde ficam à mercê da própria sorte, ante o isolamento daquela
localidade e a pequena presença do Estado, que como dito acima é representado
tão somente por poucos Policiais Militares.
(...)”
10. Essa decisão, embora posterior à presente impetração, não a prejudica. É que,
bem vistas as coisas, o novo decreto nada mais fez do que afastar a prisão preventiva
pelos novos motivos declinados pelo Parquet, reiterando, contudo, as razões do primeiro
decisum, cujos fundamentos já foram apreciados pelas demais instâncias.
11. Prossigo neste voto, analisando o constrangimento ilegal tal como veiculado
quando da impetração.
R.T.J. — 195 159
(...)”
Cleonice Moraes (fl. 248):
“(...)
encontrava-se em seu ambiente de trabalho (rádio Curuá FM), quando recebeu
um telefonema anônimo, onde a pessoa que falava disse – (...) “não adianta revelar as
fotos, nem mandar para o jornal, senão você vai se machucar, você pense duas vezes
antes de revelar”, que a declarante ainda perguntou quem era a pessoa que falava,
porém não se identificou, apenas disse que estava avisada; que no dia 28.08.2002,
por volta das 20:32 horas, quando estava no estúdio da rádio, recebeu novamente
um telefonema anônimo, o qual passou a dizer – textuais “não adianta você e o
Fernando dormirem na casa do Douglas, porque no dia que eu entrar lá pra matar
ele e a mulher dele, se vocês estiverem lá dentro eu vou matar vocês também”,
repetindo por duas vezes a ameaça, tendo desligado em seguida: que na mesma
noite, logo após o telefonema, um homem desconhecido passou em frente ao pré-
dio da rádio, tirou uma arma de fogo da cintura, da parte da frente da calça, e
colocou na parte de traz, colocando a camisa por cima, não sendo possível identi-
ficar o tal elemento; que logo após o tal elemento passar em frente a rádio, chegou
a viatura da Polícia Militar, que tinha sido acionada. Que a declarante acrescenta
que uns vinte dias atrás, a declarante quando saia do seu ambiente de trabalho por
volta das 00:15, quando foi abordada por um homem desconhecido, de cor morena,
(... ) 1,75 m, o qual passou a seguir a declarante e em dado momento tentou agredi-la
fisicamente, porém a declarante conseguiu escapar do elemento, correndo; que
depois de uma semana deste fato, foi novamente seguida por um homem desconhe-
cido, porém desta feita não foi agredida; que a declarante acredita que tais ameaças
ocorreram, pois fez parte da equipe da rádio que fez a cobertura da morte de
Bartolomeu Moraes da Silva.
(...)”
Moisés Silva Gomes (testemunha do Juízo):
“(...) que resolveu contar o que sabe porque foi informado por terceiros que
alguns fazendeiros envolvidos em conflitos agrários na localidade de Castelo dos
Sonhos haviam dito que iriam matá-lo.”
22. Na realidade, o quadro em bosquejo muito se assemelha àquele apreciado por
esta Primeira Turma no HC 81.613. Na ocasião, manteve-se, por unanimidade, o decreto
fundado na garantia da ordem pública em acórdão bem resumido na ementa seguinte:
“(...)
No tocante à ordem pública e à coação das testemunhas, a decretação da
prisão preventiva é possível quando se verifique, por meio de fatos concretos que
respaldem a conclusão do magistrado, que a liberdade do acusado implica a fundada
suspeita de que poderá tornar a delinqüir, comprometendo a ordem social, bem
como que as testemunhas teriam justo receio de depor contra o acusado. No caso,
o decreto impugnado não se afastou desses parâmetros, afirmando a necessidade
da segregação pelo último fundamento, estando a assertiva corroborada por ele-
mentos dos autos que informam o temor das testemunhas em relação ao acusado,
R.T.J. — 195 163
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor Presidente, tenho votado, aqui, na Turma,
pelo indeferimento da ordem quando se determina prisão de acusado, simples acusado,
a partir de tentativa de interferência na formação da culpa. Mas a premissa de meus votos
tem sido única, ou seja, um dado concreto que revele o procedimento.
Imaginei, quando da metade da leitura do voto do Relator, que Sua Excelência
estaria caminhando para a concessão da ordem, mas eis que, ao término do voto, acaba
por realçar que se teria a necessidade de preservação da ordem pública e da instrução do
processo. E leu parte de um depoimento colhido, em que se alude à ameaça de fazendei-
ros, à ameaça que seria de terceiros. Na área penal, cada qual responde pelos respectivos
atos. A circunstância de se manter o paciente sob a custódia do Estado certamente não
afasta a possibilidade de testemunha ser pressionada para depor desta ou daquela forma,
segundo o depoimento colhido.
Não ouvi notícia concreta quanto a prática que pudesse ser atribuída ao paciente,
já que o próprio juiz mencionou a ameaça. Não entendi bem a posição que ele assumiu,
mantendo e, ao mesmo tempo, refutando o que seria requerimento de prisão preventiva,
consideradas as premissas diversas, que não seriam tão diversas assim, porque voltou
Sua Excelência à ameaça às testemunhas.
Penso que o ato — para mim, de excepcionalidade maior, que é a prisão antes da
culpa formada — não encontra fundamento, presente o disposto no artigo 312 do Código
de Processo Penal.
164 R.T.J. — 195
Votaria pelo indeferimento da ordem, caso houvesse uma notícia concreta quanto
a ato do próprio paciente visando a intimidar testemunhas. Mas a única referência está
direcionada no sentido de que as ameaças partiriam — como disse — de terceiros, dos
fazendeiros.
Peço vênia ao Relator para conceder a ordem.
VOTO (Confirmação)
O Sr. Ministro Carlos Britto (Relator): Sr. Presidente, vou ler rapidamente trechos
do voto. Disse uma das testemunhas:
“Arlindo de Sousa (fls. 251/252)
‘(...)
Que na data de hoje, ao chegar em Castelo de Sonhos, foi informado que a
irmã de “Brasilia”, a Sra. Maria de Fátima Romualdo da Silva Nunes, conhecida
por Dona Santa, estava querendo conversar com o declarante e, este ao conversar
com a mesma, foi lhe assegurado que várias autoridades estariam aqui presentes e
lhe dariam a devida segurança, garantindo a integridade do mesmo, o que levou o
declarante a superar o medo e contar tudo que sabia e anteriormente não havia
falado para a equipe de Policiais que lhe foi apresentada, haja visto que ninguém
sabia da história; (...) Respondeu que não confia na polícia local e tem bastante
medo de que possa acontecer-lhe alguma coisa:
(...)’
Edizom de Souza Lima (fls. 249)
‘(...)
Que o declarante, na época, não testemunhou o crime por medo,”(...)
A testemunha foi ouvida nas duas fases, mas, segundo me consta, está convocada
para ser ouvida novamente.
Há testemunha, recente, que pediu para ser incluída no Provita, ou seja, uma das
quatro que ainda não foram ouvidas. Insisto que faltam quatro testemunhas para serem
ouvidas, e os depoimentos que estão aqui me convencem de que realmente elas estão
ameaçadas.
Há uma testemunha que diz:
“Edizom de Souza Lima (fls. 249)
(...) é conhecido como “Pistoleiro” e traficante de drogas nesta localidade de
Castelo de Sonhos.
(...)’
Maurício Rodrigues dos Santos (fls.246/247):
‘(...)
Que no mesmo dia a polícia civil de Belém esteve na localidade apurando o
crime e, após a equipe de policiais civis se retirarem da cidade, o declarante passou
R.T.J. — 195 165
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Presidente): Peço vênia ao eminente Ministro
Marco Aurélio para acompanhar o voto do Ministro Relator.
Tenho constantemente recusado, nesta Casa, em matéria de prisão preventiva, os
apelos retóricos à ordem pública, que estaria comprometida pela repercussão social do
fato, sobretudo, pelo noticiário acerca do fato. Mas é claro que não podemos aplicar
esses mesmos critérios a uma região notória e internacionalmente conhecida como de
difundida violência, onde os indícios de intranqüilidade do meio social, com o crime
atribuído a pistoleiros, é, sim, uma hipótese verdadeira em que se pode invocar a ordem
pública para fundar prisão preventiva.
Indefiro a ordem.
EXTRATO DA ATA
HC 84.680/PA — Relator: Ministro Carlos Britto. Paciente: Alexandre Manoel
Trevisan. Impetrante: Jorge Luiz Anjos Tangerino. Coator: Superior Tribunal de Justiça.
Decisão: Por maioria de votos, a Turma indeferiu o pedido de habeas corpus,
vencido o Ministro Marco Aurélio, que o deferia. Falou pelo paciente o Dr. Jorge Luiz
Anjos Tangerino.
Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Ministros Marco
Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Subprocurador-Geral da República, Dr.
Paulo de Tarso Braz Lucas.
Brasília, 14 de dezembro de 2004 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.
166 R.T.J. — 195
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma
do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na
conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos,
julgar prejudicado o pedido de habeas corpus quanto ao paciente Milton Luiz Neto e,
por maioria de votos, indeferir quanto aos demais, nos termos do voto do Relator.
Brasília, 9 de novembro de 2004 — Sepúlveda Pertence, Presidnete — Eros Grau,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Eros Grau: A Defensora Pública do Estado do Rio de Janeiro Dilara
Estephá Henriques Pereira impetra habeas corpus contra ato da Primeira Turma Recursal
Criminal dos Juizados Especiais daquele Estado, que implicou constrangimento ilegal
aos pacientes, ao confirmar a decisão do 6º Juizado Especial Criminal.
R.T.J. — 195 167
VOTO
O Sr. Ministro Eros Grau (Relator): Como observa o Subprocurador-Geral da Repú-
blica Edson Oliveira de Almeida, o writ está prejudicado em relação ao paciente Milton
Luiz Neto. A Turma Recursal fez cessar o constrangimento ilegal a que estava submetido,
ao conceder-lhe habeas corpus de ofício no ato ora impugnado. Assim, a reparação por
eventual dano pela condenação indevida deve ser perseguida na esfera cível.
2. A pena de multa substitutiva está prevista no artigo 60, § 2º, do Código Penal e
tem aplicação nos casos em que a reprimenda corporal seja fixada em patamar igual ou
inferior a 6 (seis) meses, em concurso com os requisitos arrolados nos incisos II e III do
artigo 44 do mesmo Estatuto. Logo, não sendo mera faculdade do juiz, deve ele, ao
conceder ou negar a substituição, fazê-lo de forma fundamentada, o que não ocorreu na
espécie.
3. Todavia, a jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido da impossibilidade
de aplicar-se a pena de multa substitutiva do § 2º do artigo 60 do Código Penal aos
crimes tipificados em lei especial, quando há cumulação de pena privativa de liberdade
com pena pecuniária (HC 70.445, 1ª Turma, Moreira Alves, DJ de 25-2-94, e RHC
84.040, 2ª Turma, Ellen Gracie, DJ de 30-4-04). O voto proferido no segundo precedente
revela a síntese precisa dos fundamentos que orientaram o entendimento deste Tribunal
a respeito do tema, verbis:
168 R.T.J. — 195
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Britto: Senhor Presidente, vou reconsiderar. Peço vênia ao
Ministro Relator para acompanhar a dissidência do Ministro Marco Aurélio.
EXTRATO DA ATA
HC 84.721/RJ — Relator: Ministro Eros Grau. Pacientes: Anderson da Silva Fonseca,
Leandro Sebastião dos Santos e Milton Luiz Neto. Impetrante: Defensoria Pública da
União – DPU. Coatora: Primeira Turma Recursal Criminal do Conselho Recursal dos
Juizados Especiais Cíveis e Criminais da Comarca do Rio de Janeiro.
Decisão: Após os votos dos Ministros Eros Grau, Relator, e Cezar Peluso julgando
prejudicado o pedido de habeas corpus quanto ao paciente Milton Luiz Neto e o inde-
ferindo quanto aos demais, e dos Ministros Marco Aurélio e Carlos Britto deferindo-o,
em parte, pediu vista dos autos o Ministro Sepúlveda Pertence.
Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Ministros Marco
Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Subprocuradora-Geral da República,
Dra. Delza Curvelho Rocha.
Brasília, 26 de outubro de 2004 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.
VOTO (Vista)
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Os pacientes foram condenados por infração
do art. 16 da Lei de Tóxicos a seis meses de detenção — substituídos por limitação de
fim de semana — e multa.
O Relator, em. Ministro Eros Grau, denega a ordem: alinha-se a precedentes do
Tribunal (HC 70.445, 1ª Turma, Moreira Alves; RHC 84.040, 2ª Turma, Ellen Gracie),
“no sentido da impossibilidade de aplicar-se a pena de multa substitutiva do § 2º do
art. 60 do Código Penal aos crimes tipificados em lei especial, quando há cumulação
de pena privativa de liberdade com pena pecuniária”.
Por isso, indefere a ordem.
170 R.T.J. — 195
EXTRATO DA ATA
HC 84.721/RJ — Relator: Ministro Eros Grau. Pacientes: Anderson da Silva
Fonseca, Leandro Sebastião dos Santos e Milton Luiz Neto. Impetrante: Defensoria
Pública da União – DPU. Coatora: Primeira Turma Recursal Criminal do Conselho Recur-
sal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais da Comarca do Rio de Janeiro.
Decisão: Prosseguindo o julgamento, a Turma julgou prejudicado o pedido de
habeas corpus quanto ao paciente Milton Luiz Neto e o indeferiu quanto aos demais,
vencidos os Ministros Marco Aurélio e Carlos Britto, que o deferiam em parte.
Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Ministros Marco
Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Subprocurador-Geral da República, Dr.
Paulo de Tarso Braz Lucas.
Brasília, 9 de novembro de 2004 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.
prevista no art. 5º, § 5º, da Lei n. 1.060/1950 é típica dos defensores públicos.
5. Precedentes: HC n. 70.521/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 1º-10-1993
(2ª Turma, unânime); HC n. 76.934/MG, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 13-
11-1998 (2ª Turma, unânime); HC n. 74.260/RS, Rel. Min. Marco Aurélio,
DJ de 14-11-1996 (2ª Turma, unânime). 6. Ordem deferida.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo
Tribunal Federal, em Segunda Turma, sob a Presidência do Ministro Celso de Mello, na
conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos,
deferir o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator.
Brasília, 28 de junho de 2005 — Celso de Mello, Presidente — Gilmar Mendes,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Eis o teor da decisão que proferi ao indeferir o
pedido de medida liminar (fl. 110):
“Decisão: Trata-se de habeas corpus impetrado em favor de Marcos Wellington
Krisostomo contra decisão do Superior Tribunal de Justiça assim ementada:
‘Execução penal. Recurso especial. Falta grave. Remição. Art. 127 da LEP.
A perda dos dias remidos tem como pressuposto a declaração da
remição. E esta não é absoluta, sendo incabível cogitar-se de ofensa a direito
adquirido ou a coisa julgada na eventual decretação da perda dos dias remi-
dos em decorrência de falta grave. A quaestio se soluciona com a aplicação
direta do disposto no art. 127 da LEP (Precedentes do STJ e do STF).
Recurso provido.’ (Fl. 100)
Alega-se cerceamento de defesa por ausência de intimação pessoal do Defen-
sor Público, o que inviabilizou a interposição de Agravo Regimental.” (Fl. 110)
Neste ponto, anota o parecer da lavra da Subprocuradora-Geral da República, Dra.
Delza Curvello Rocha, assim resume a controvérsia (Fls. 112-115):
“4. Expressando o impetrante que o constrangimento ilegal decorre do fato
de que o agravo de instrumento interposto pelo Ministério Público não estava em
condições de ser conhecido, e que a intimação pessoal em se tratando de ‘Defensor
Público’, é obrigatória, alega que ‘...a intimação da decisão que deu provimento
ao agravo de instrumento foi feita por publicação no Diário da Justiça do dia
08.08.2003, não havendo notícia sobre a indispensável intimação pessoal da
Procuradoria de Assistência Judiciária do Estado de São Paulo.’ (fls. 04)
5. Requer, assim, liminarmente, a sustação da execução do acórdão proferido
pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso
Especial n. 621.945/SP, e, a final, a concessão da ordem para determinar a
intimação pessoal da Procuradoria de Assistência Judiciária do Estado de São
174 R.T.J. — 195
Paulo, reabrindo-se o prazo para recurso contra a decisão que deu provimento ao
agravo de instrumento e, por conseqüência, seja decretada a nulidade do julga-
mento do recurso especial suso referido.” (Fl. 113)
O parecer da Procuradoria-Geral da República é pela denegação da ordem.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Relator): O parecer da Procuradoria-Geral da Repú-
blica sustenta:
“8. Sem razão o impetrante, pois, no que concerne à Lei 7.871/89, que acres-
centou o parágrafo quinto ao artigo quinto da Lei n. 1.060/1950, essa Colenda
Corte de Justiça já se pronunciou que não se estendem aos defensores dativos as
prerrogativas processuais da intimação pessoal e do prazo em dobro asseguradas
aos defensores públicos em geral, conforme entendimento publicado no Informa-
tivo 219, do resultado do julgamento proferido na CR-7870-EUA, consoante arti-
go assim fundamentado:
‘Não se estendem aos defensores dativos as prerrogativas da intimação
pessoal e do prazo em dobro asseguradas aos defensores públicos em geral e
aos profissionais que atuam nas causas patrocinadas pelos serviços estaduais
de assistência judiciária (Lei 7.871/89 e LC 80/94). Com base nesse entendi-
mento, o Tribunal, por maioria, negou provimento a recurso interposto con-
tra decisão que não conhecera de agravo regimental – interposto contra deci-
são que concedera exequatur a carta rogatória -, porque intempestivo
(RISTF, art. 227, parágrafo único). Vencidos os Ministros Marco Aurélio,
Sepúlveda Pertence e Néri da Silveira, que davam provimento ao agravo
regimental. Precedentes citados: Pet 932-SP (DJU de 14.9.94) e AG
166.716-RS (DJU de 25.5.95). CR (AgRg-AgRg) 7.879-Estados Unidos da
América, rel. Min. Carlos Velloso, 7.3.2001.(CR-7870)’” (fl. 114)
Apesar de reconhecer que a jurisprudência desta Corte se firmou no sentido de que
a prerrogativa da intimação pessoal, nos termos do art. 5º, § 5º, da Lei n.1.060/1950, não
se estende aos defensores dativos, no presente caso, o constrangimento alegado decorre
da não-observância de intimação de Procurador do Estado de São Paulo.
Nesse particular, assevero que esta Corte já se pronunciou sobre o tema ao afirmar
que “é incontroverso que, no Estado de São Paulo, a Defensoria Pública tem atuação
mediante Órgão da Procuradoria Geral do Estado” (HC n. 70.521/SP, Rel. Min. Marco
Aurélio, DJ de 1º-10-1993). Por essa razão, uma vez que é patente o prejuízo para o ora
paciente, torna-se imperiosa a referida intimação, sob pena de nulidade.
Também com base nesse mesmo entendimento, arrolo os seguintes casos: HC n.
76.934/MG, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 13-11-1998 (2ª Turma, unânime); HC n.
74.260/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 14-11-1996 (2ª Turma, unânime).
Nestes termos, voto pelo deferimento da ordem, para os efeitos de que: i) seja
sustada a execução do acórdão proferido pela 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça
R.T.J. — 195 175
EXTRATO DA ATA
HC 84.747/SP — Relator: Ministro Gilmar Mendes. Paciente: Marcos Wellington
Krisostomo ou Marcos Wellington Khrisostomo. Impetrante: PGE/SP – Waldir Francisco
Honorato Junior (Assistência Judiciária). Coator: Superior Tribunal de Justiça.
Decisão: A Turma, por votação unânime, deferiu o pedido de habeas corpus, nos
termos do voto do Relator.
Presidência do Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Carlos Velloso,
Ellen Gracie, Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa. Subprocuradora-Geral da República,
Dra. Sandra Verônica Cureau.
Brasília, 28 de junho de 2005 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma
do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na
176 R.T.J. — 195
conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos, não
conhecer do pedido de habeas corpus.
Brasília, 22 de fevereiro de 2005 — Sepúlveda Pertence, Presidente — Eros Grau,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Eros Grau: Trata-se de habeas corpus substitutivo de recurso ordi-
nário, com pedido de liminar, contra ato do Superior Tribunal de Justiça consubstanci-
ado na denegação de outro writ, cuja ementa está assim redigida:
“Processual Penal. Habeas corpus. Arts. 214, c/c 224, alínea a, ambos do
Código Penal. Prisão preventiva. Garantia da ordem pública.
A decisão que motiva a medida constritiva para garantia da ordem pública e
conveniência da instrução criminal, considerando a real possibilidade da prática
de novos delitos, mostra-se devidamente fundamentada. (Precedentes).
Writ denegado.”
2. O paciente foi indiciado em inquérito policial instaurado com o objetivo de
apurar a prática do delito de atentado violento ao pudor. Segundo o impetrante, apesar
de o paciente colaborar nas investigações, a autoridade policial representou pela prisão
preventiva e o Juiz da Vara Criminal da Comarca de Balneário de Camboriú/SC a decre-
tou com fundamento na garantia da ordem pública, justificada pela necessidade de
acautelar o meio social de novos delitos.
3. O impetrante alega que a simples presunção de que o paciente continuaria
delinqüindo não constitui base idônea à decretação da medida extrema de cerceamento
da liberdade, sendo imprescindível a demonstração de elementos concretos que levem a
uma conclusão segura da assertiva.
4. Argumenta, ademais, que o TJ/SC e o STJ acrescentaram outro fundamento, que
é o da necessidade de assegurar a aplicação da lei.
5. A liminar foi indeferida.
6. O Ministério Público Federal opina pelo não-conhecimento; se conhecido, pelo
indeferimento.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Eros Grau (Relator): Colho o seguinte trecho do parecer do Subpro-
curador-Geral da República Haroldo Ferraz da Nóbrega:
“(...)
Preliminarmente – O presente habeas corpus parece-me prejudicado, e por
dois motivos, cada um de per si, suficiente.
R.T.J. — 195 177
e autoria do crime, com base no relato da vítima de que “(...) Beto [o paciente] pediu para
o depoente deitar de bruços e praticou sexo anal com o mesmo (...)” (fls. 139/140). No
segundo depoimento a vítima confirmou os fatos constantes do primeiro e revelou que
o paciente o abordou mais uma vez oferecendo trinta reais para fazer um programa. Ora,
sem embargo do acréscimo do fundamento concernente à aplicação da lei penal, o qual
afasto desde já, a prisão cautelar tem plena justificativa para evitar a reiteração de crimes,
pois, como visto, a vítima foi abordada para fazer outro programa quando o paciente
ainda estava sendo investigado. Portanto, o fundamento de sua prisão cautelar tem
respaldo legal.
3. No entanto, é de ser acolhida a segunda preliminar levantada pelo Ministério
Público para declarar prejudicado o presente writ. É que, não provida a apelação da
defesa, a manutenção da custódia passou a ter outro fundamento: o efeito da condena-
ção, cujo título está apto à execução, pelo menos até que esta Corte se pronuncie defini-
tivamente sobre o tema, que, de qualquer sorte, por não ter sido examinado pelo STJ, não
pode agora ser apreciado.
Ante o exposto, não conheço do writ.
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Presidente, peço vênia ao Relator para adentrar o
tema de fundo do habeas corpus.
A verdade formal revela parâmetros da impetração ligados à preventiva e submete
à apreciação deste Colegiado o que decidido pelo Superior Tribunal de Justiça. Não há
como potencializar o que consignado no parecer sobre pesquisa que teria sido feita pela
assessoria do procurador, no sítio eletrônico do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, e
o dado relativo ao desprovimento da apelação.
Não sei mesmo — isso não é dito no parecer — se, quando desse desprovimento,
implementou-se, por fundamentos diversos daqueles atacados no habeas corpus, a pró-
pria custódia preventiva do paciente.
Admito a impetração.
EXTRATO DA ATA
HC 84.761/SC — Relator: Ministro Eros Grau. Paciente: Celso Roberto Berri.
Impetrante: Luiz Carlos Cercato Padilha (Advogados: Alexandre Magno da Cruz e
outro). Coator: Superior Tribunal de Justiça.
Decisão: Por maioria de votos, a Turma não conheceu do pedido de habeas
corpus; vencido o Ministro Marco Aurélio.
Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Ministros
Marco Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Subprocuradora-Geral da
República, Dra. Maria Caetana Cintra Santos.
Brasília, 22 de fevereiro de 2005 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.
R.T.J. — 195 179
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma
do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na
conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos,
julgar prejudicado o recurso ordinário e conceder, porém, de ofício, habeas corpus, nos
termos do voto do Relator.
Brasília, 12 de abril de 2005 — Sepúlveda Pertence, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: O paciente foi condenado, em primeiro grau,
à pena de 12 anos de reclusão e multa, por infração do art. 12; e 18, III, ambos da Lei
6.368/76, com a agravante do art. 61, I, do Código Penal.
Esta a versão de fato acertada na sentença (fls. 97/101):
“(...)
“A materialidade delitiva está perfeitamente caracterizada a partir do auto de
apresentação e apreensão da substância entorpecente, bem como pelos laudos
periciais de exame daquele material (entorpecente), prévio e definitivo, ambos
positivos, às fls. 04 e 184, respectivamente, roborados pela prova testemunhal
produzida em ambas as fases procedimentais.
A autoria, embora negada em sonora comunhão em sede judicial por ambos
os réus, foi confessada pelo réu Paulo Rogério Gomes de Castro em sede
inquisitorial e sua retratação em Juízo é despida de qualquer seriedade e de um
mínimo de lastro comprobatório e indica Marcelo Araújo de Souza, o “Cobra”
como o proprietário da substância entorpecente encontrada em seu poder, já que o
material apreendido no interior da “pochete” presa à sua cintura era o que restou da
noite de “trabalho” por ele empreendida, enquanto vendedor da malsinada subs-
tância, para o 2º réu.
180 R.T.J. — 195
O Relator indeferiu liminarmente a revisão (Código de Processo Penal, art. 625, § 3º),
decisão confirmada quando do julgamento do agravo regimental interposto, sob o fun-
damento de que ela não teria sido “instruída de qualquer prova nova, e as que foram
apresentadas já foram devidamente apreciadas quando da sentença e apelação inter-
posta” (fl. 159).
Donde o presente recurso ordinário, no qual se requer a renovação do julgamento
da revisão criminal e, de ofício, das demais instâncias, a fim de que sejam analisadas
todas as teses da defesa.
O Ministério Público Federal, em parecer da lavra da Il. Subprocuradora-Geral
Delza Rocha, opinou pelo indeferimento da ordem, na linha do decidido pelo acórdão
impugnado, ressaltando que “a questão relativa ao não-enfrentamento das teses da defe-
sa deveria ser objeto de embargos declaratórios, não cabendo invocá-las em habeas
corpus, ou no presente recurso”, conforme precedente desta Corte que entende aplicável
ao caso (HC 83.160, 2ª T., j. 9-9-03, Jobim, DJ de 13-2-04).
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator):
I
EXTRATO DA ATA
RHC 84.845/RJ — Relator: Ministro Sepúlveda Pertence. Recorrente: Marcelo
Araújo de Souza (Advogados: Karine Faria Braga de Carvalho). Recorrido: Ministério
Público Federal.
Decisão: A Turma julgou prejudicado o recurso ordinário. Concedeu, porém, de
ofício, habeas corpus, nos termos do voto do Relator. Unânime.
Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Ministros Marco
Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Subprocuradora-Geral da República, Dra.
Delza Curvello Rocha.
Brasília, 22 de fevereiro de 2005 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma
do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na
conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos,
indeferir o pedido de habeas corpus.
Brasília, 21 de junho de 2005 — Sepúlveda Pertence, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: A representação do Delegado de Polícia Federal,
Chefe do Setor de Operações da Delegacia de Repressão ao Crime Organizado e Inquéritos
Especiais em São Paulo, pela quebra de sigilos bancário e fiscal da paciente e de outros
seis indiciados, tem o teor seguinte (fls. 215/218):
“Os presentes autos foram instaurados objetivando apurar os crimes de Lava-
gem de dinheiro previsto na norma do artigo 1º, inciso II, da Lei 9.613/98, e
Sonegação fiscal capitulado no art. 2º, inciso I, da Lei 8.137/90, decorrentes da
“operação diamante” desencadeada pelo Setor de Repressão a Entorpecente da
Polícia Federal e que culminou na prisão em flagrante delito por tráfico de entorpe-
cente de Orlando Marques dos Santos, Valdemar Ferreira de Santana, Deise
Rodrigues dos Santos, Wanderlei Aparecido Vidal, Ricardo Mendes dos Santos e
Antonia Gonzaga.
No procedimento criminal que apurou o tráfico de entorpecente, descorti-
nou-se um outro fato importantíssimo, qual seja, uma considerável movimentação
financeira e patrimonial pertencentes aos integrantes da quadrilha, não deixando
dúvidas que os bens e valores auferidos pelos membros da organização tiveram
origem no lucro das operações referente a venda de substância entorpecente.
O crime de Lavagem de dinheiro como crime subseqüente, prende-se ao fato
que os valores e patrimônio movimentado pelos autuados, e constatado na inves-
tigação criminal, distoa das atividades desempenhadas pelos seus membros, le-
vando a crer que o dinheiro e bens amealhados são provenientes de suas atividades
criminosas.
Como exemplo, citamos o caso de Orlando Marques dos Santos, pessoa a
quem se reputa ser o líder da quadrilha, e que teria adquirido uma fazenda recente-
mente no município de Palmeirópolis no valor de R$ 500.000,00 (quinhentos mil)
reais.
R.T.J. — 195 185
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Consolidou-se a jurisprudência do
Tribunal no sentido do cabimento do habeas corpus para impugnar autorização judicial
de quebra de sigilos, destinada a fazer prova em procedimento penal1.
1 V.g., HC 79.191, 1ª T., 4-5-99, Pertence, RTJ 171/258; HC 80.100, Pl., 24-5-00, Gallotti, Inf.STF
190; HC 81.294, 1ª T., 20-11-01, Ellen, RTJ 180/656.
190 R.T.J. — 195
02. De sua vez, recentemente decidiu a Turma caber o habeas corpus — quando
em jogo eventual constrangimento à liberdade física — contra decisão denegatória de
mandado de segurança2.
03. Nessa linha, conheço do pedido.
II
04. No mérito, estou em que, no caso, a quebra dos sigilos bancário e fiscal da
paciente — assim como a requisição de seus registros telefônicos — estão suficiente-
mente fundamentados pela decisão de primeiro grau, a cuja motivação se integraram
per relationem a representação da autoridade policial e a manifestação do Ministério
Público3.
05. Como anotou com precisão a decisão do Superior Tribunal de Justiça, a parti-
cipação no crime antecedente — no caso, o tráfico de entorpecentes, pelo qual foi
condenado, entre outros, o seu ex-marido, mas não a paciente — não é pressuposto de
validade da investigação da sua possível cooperação na lavagem de dinheiro dele resul-
tante, suspeita lastreada em elementos de informação relativas às suas atividades e ao
seu padrão de vida.
06. De outro lado, não procede a alegação do suposto excesso das diligências
deferidas, no que, além do atinente à movimentação bancária, à documentação fiscal e
aos dados telefônicos da paciente —, se determinou a requisição de informações ao
Detran, aos cartórios de imóveis e à Junta Comercial: é que se trata de registros públicos,
em relação aos quais não cabe invocar proteção constitucional da privacidade.
07. Indefiro a ordem: é o meu voto.
EXTRATO DA ATA
HC 84.869/SP — Relator: Ministro Sepúlveda Pertence. Paciente: Antonia
Gonzaga. Impetrante: Celso Sanchez Vilardi. Coator: Superior Tribunal de Justiça.
Decisão: A Turma indeferiu o pedido de habeas corpus. Unânime. Não participou
deste julgamento o Ministro Marco Aurélio.
Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Ministros Marco
Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Subprocurador-Geral da República, Dr.
Wagner de Castro Mathias Netto.
Brasília, 21 de junho de 2005 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma
do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na
conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos,
deferir o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator.
Brasília, 14 de dezembro de 2004 — Sepúlveda Pertence, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: O paciente e outro foram denunciados por
homicídio doloso no Município de Tapaciguara/MG.
Provendo recurso especial do paciente, o STJ desaforou o Júri para Uberlândia.
Posteriormente, o Juízo da 3ª Vara Criminal de Uberlândia/MG, ao qual fora distri-
buído o processo, ofereceu representação ao Tribunal local no sentido de que fosse o
julgamento transferido para Belo Horizonte.
Embora notificado pessoalmente (fl. 63), o paciente não respondeu à representa-
ção, sobrevindo o acórdão do Tribunal local que deferiu o pedido de desaforamento, nos
termos da ementa transcrita (fls. 80/83):
“Desaforamento – Dúvida sobre a imparcialidade do júri – Existência de
fatos objetivos – Pedido formulado pelo próprio juiz – Deferimento.
Havendo fatos objetivos que autorizam fundada dúvida sobre a imparciali-
dade dos jurados, é de se deferir o pedido de desaforamento, mormente se formula-
do pelo próprio juiz.”
Contra essa decisão impetrou-se habeas corpus ao STJ, no qual se alegou que,
embora o paciente tenha sido notificado para responder à representação, seu defensor
não foi comunicado de nenhum ato, pois não informado do envio da representação ao
Tribunal local, da abertura de prazo para a resposta ou mesmo da data do julgamento.
O Superior Tribunal de Justiça denegou ordem nos termos do acórdão do qual se
extrai:
“Consoante asseverou a d. Subprocuradoria-Geral da República, o pedido de
desaforamento partiu do Juiz, que desfruta da presunção de imparcialidade. Tinha,
portanto, de ser acolhido. E não era obrigatória a intimação do acusado e do seu
defensor, pois a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal vem proclamando
192 R.T.J. — 195
que a inobservância daquela formalidade não ofende as garantias (art. 5º, LVI e LV,
da CF) nem invalida a decisão do Tribunal de Justiça.
A propósito, confiram-se os seguintes precedentes.
[HC 71.345, Francisco Rezek, DJ de 10/05/96]
“Habeas corpus. Júri. Desaforamento pedido pelo juiz. Contraditório.
Comarca distante. Fundamentação idônea. Ausência de ilegalidade.
I. O desaforamento, por constituir derrogação da regra do julgamento
no distrito da culpa, é de aplicação restrita. Partindo do magistrado o pedido,
ele deve ser acolhido. A regra de que no desaforamento deve-se ouvir a parte
contrária à vista do contraditório não prevalece quando o alvitre é do magis-
trado. A presunção é de imparcialidade.
II. A indicação da comarca mais distante do distrito da culpa teve fun-
damentação idônea. Ausência de ilegalidade.
Habeas corpus indeferido.’
[HC 67.749, Celso de Mello, DJ 20.3.90]
‘Habeas corpus – Processo penal – Desaforamento – Garantia consti-
tucional do contraditório — Alegação de nulidade do julgamento por au-
sência de publicação da pauta respectiva – Inocorrência – Irrelevância das
informações do juiz – Repercussão do fato criminoso na Imprensa – Causa
insuficiente para justificar o desaforamento.
Donde a presente impetração — substitutiva de recurso ordinário —, na qual o
impetrante repisa os mesmos fundamentos, asseverando ainda que:
“(...) O fundamento e a finalidade da impetração é de que o processamento da
representação da Meritíssima Juízo ocorreu sem a participação da defesa. O acusa-
do foi intimado, mas se manteve inerte. Cabia intimar seu defensor. Se também
permanecesse sem ação, era o caso de nomear defensor dativo, para o incidente de
desaforamento. Mas nem o defensor de livre escolha foi intimado nem se nomeou,
mesmo que pro forma, um defensor dativo.
É nulo, sem dúvida, o desaforamento processado e julgado (...) à revelia da
defesa do acusado, o paciente. Outro acusado, José dos Santos Coutinho, sequer
foi lembrado, não foi intimado e não teve seus interesses defendidos e observados.
(...)
O douto entendimento que dispensa a participação da defesa afronta o
auditur et altera pars, a essência do processo penal democrático, do contraditório
e da ampla defesa. Não por acaso, Súmula 742, do Pretório Excelso, dita:
‘É nula a decisão que determina o desaforamento de processo da com-
petência do júri sem audiência da defesa’.
a) Ubi eadem ratio, ibi eadem dispositio: as razões da jurisprudência domi-
nante que levaram à Súmula 742 – que não faz exceção, para excluir a participação
da defesa no exame dos desaforamentos provocados pelos senhores Juízes – não
podem ser ignoradas nem afastadas nesses casos;
R.T.J. — 195 193
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Certo, conforme ressaltou o Ministério
Público Federal, o Regimento Interno do TJMG adota para o julgamento da representação
de desaforamento o rito do habeas corpus, que dispensa a sua inclusão em pauta.
194 R.T.J. — 195
Daí, contudo, não se extrai que, como ocorreu no caso, apenas o paciente — e não
seu defensor — devesse ter sido notificado para “contrariar a representação” (fl. 63), de
cujo envio ao Tribunal, ademais, sequer fora cientificado o advogado.
Esse o quadro, defiro a ordem, para cassar o acórdão do Tribunal de Justiça, a fim
de que, após a prévia notificação do advogado do paciente para responder à representa-
ção, outro seja proferido conforme entender de direito: é o meu voto.
EXTRATO DA ATA
HC 85.052/MG — Relator: Ministro Sepúlveda Pertence. Paciente: Ricardo
Abdulmassih. Impetrante: Wanderley de Medeiros. Coator: Superior Tribunal de Justiça.
Decisão: A Turma deferiu o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do
Relator. Unânime. Falou pelo paciente o Dr. Wanderley de Medeiros.
Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Ministros
Marco Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Subprocurador-Geral da
República, Dr. Paulo de Tarso Braz Lucas.
Brasília, 14 de dezembro de 2004 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma
do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na
conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos,
indeferir o pedido de habeas corpus.
Brasília, 22 de fevereiro de 2005 — Sepúlveda Pertence, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Trata-se de habeas corpus — substitutivo de
recurso ordinário —, no qual se imputa coação ao STJ, que firmou a competência do
Juízo Federal de Dourados/MS para julgar os pacientes por tráfico internacional de
entorpecentes.
O entorpecente fora apreendido no interior de aeronave em pouso no Município de
Naviraí/MS, que não é sede de Vara da Justiça Federal.
A aeronave partiu da Bolívia e somente teria pousado naquele Município por
causa de “uma pane mecânica”.
Colhe-se no voto-condutor do acórdão impugnado, da lavra do il. Ministro Gilson
Dipp (STJ, HC 85.039):
“Extrai-se dos autos que os pacientes foram denunciados como incursos nos
termos dos arts. 12, caput c/c o art. 18, incisos I e III, da Lei n. 6.368/76, perante a
Justiça Federal.
Segundo narra a peça exordial (fls. 86 a 89, apenso 1):
“Consta do procedimento administrativo criminal em epígrafe, origi-
nado a partir de diversas diligências determinadas de ofício por esse Juízo
Federal, nos autos da Ação Penal n. 2000.60.02.2154-8 (fl. 01 do procedi-
mento administrativo), que os denunciados associaram-se para o tráfico in-
ternacional de entorpecentes e, em conluio com os já condenados Waltécio
de Matos Barbosa e Adão Félix Vissuela, após terem adquirido, promoveram
o transporte de 337,8Kg (trezentos e trinta e sete quilos e oitocentos
gramas) de cocaína (...) proveniente da Bolívia, utilizando-se do avião
Cesna, prefixo PT-OLO.
196 R.T.J. — 195
E ressaltam:
“(...) o delito cometido a bordo de aeronave não pode transmudar-se em
delito de tráfico internacional, até porque esta última espécie de delito consuma-
se antes do entorpecente ser colocado na aeronave, em razão da sua natureza
permanente.
A Lei Processual Penal define delito cometido a bordo de aeronave, quando
a aeronave se encontra ‘dentro do espaço aéreo correspondente ao território brasi-
leiro, ou ao alto-mar, ou a bordo de aeronave estrangeira, dentro do espaço aéreo
correspondente ao território nacional’ (art. 90, CPP).
Há de se considerar, ainda, que se o delito é tipificado e qualificado como
sendo delito cometido a bordo de aeronave, ele não pode ser tráfico internacional,
porque este envolve a consumação em países diferentes, sendo que aeronave não é
país. Isto é elementar.
(...)
Demais a mais, seria possível aplicar-se o aumento de pena previsto no art.
18, I, da Lei Antitóxicos, ao delito cometido a bordo de aeronave?
(...)
A espécie ‘tráfico internacional’ é característica essencial do delito que en-
volve mais de um país. Por isso, não se pode admitir a prevalência da espécie de
‘delito cometido a bordo de aeronave’, pois isto gera uma incoerência lógico-
jurídica ou contradição insuperável.
Se esta hipótese absurda de delito cometido a bordo de aeronave justificas-
se o delito de tráfico internacional, todo delito cometido a bordo seria também
delito de tráfico internacional, pelo que inúmeros processos inerentes ao tráfico
interno (transporte de entorpecentes) – praticado o emprego de aeronave, e que
foram processados perante a Justiça Estadual – seriam processos nulos, ensejan-
do a propositura de revisões criminais.”
Após afirmarem que os precedentes mencionados pelo STJ “estão eivados de equí-
vocos” e que alguns deles sequer são aplicáveis à espécie, tece considerações no sentido
de que houve, no caso, “malabarismo inédito para deslocar a competência da Justiça
Estadual”.
Registra-se, por fim, que os pacientes são primários e não possuem antecedentes
criminais, sendo que a ação penal já se encontra “em grau de apelação”.
Pugna-se pelo reconhecimento da incompetência do Juízo Federal de Dourados/MS,
para declarar a nulidade do processo desde o início e remeter os autos ao Juízo Estadual de
Naviraí/MS.
O Ministério Público Federal, em parecer da lavra do Il. Subprocurador Edson de
Almeida, após transcrever a íntegra do acórdão impugnado, opinou pelo indeferimento
da ordem, verbis (fls. 35/42):
202 R.T.J. — 195
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Entendo desnecessário, no caso, sub-
meter a questão ao Pleno, sobretudo porque a solução da controvérsia repousa em enten-
dimento que se firmou em ambas as Turmas desta Corte: ser o caso de competência
relativa.
Com efeito, nos termos do parecer do Ministério Público Federal, restou preclusa,
no caso, a questão da competência, posto que, apesar de relativa, fora suscitada pela
primeira vez apenas nas alegações finais (fl. 17, apenso II).
Conforme o decidido no HC 70.627, 1ª T., Sydney Sanches, DJ de 18-11-94, é
federal a jurisdição exercida por Juiz estadual na hipótese do art. 27 da Lei 6.368/76.
204 R.T.J. — 195
Corrobora a tese o disposto no art. 108, II, da Constituição, segundo o qual cabe
aos Tribunais Regionais Federais “julgar, em grau de recurso, as causas decididas
pelos juízes federais e pelos juízes estaduais no exercício da competência federal da
área de sua jurisdição”.
É territorial, portanto, o critério para saber se ao Juiz federal ou estadual cabe o
“exercício da competência federal”; e, por isso, se nulidade houvesse seria ela relativa.
Colhe-se, no ponto, a seguinte passagem do voto-condutor do em. Ministro Sydney
Sanches no referido HC 70.627:
“(...)
Na verdade, a jurisdição prestada pelos Juízes estaduais, em comarca onde
não haja Vara da Justiça Federal, é, também, jurisdição federal, embora excepcio-
nal. De sorte que a competência do Juiz estadual do local em que se deu a prisão em
flagrante (no município de Monte Alegre-Pará...) é competência relativa. E não
absoluta. Assim, tendo sido o feito processado e julgado por Juiz Federal de Belém
do Pará, não se caracterizou hipótese de nulidade absoluta, por incompetência
absoluta, mas de nulidade relativa, por incompetência relativa.
Nulidade relativa, que ficou sanada, à falta de oportuna argüição, mediante
exceção de incompetência, como previsto no art. 95, inciso II, do Código de Pro-
cesso Penal (exceção da incompetência de juízo).”
Assim, faz-se de todo ociosa a questão de saber se a competência seria do Juízo
Federal de Dourados/MS ou do Juízo estadual do Município onde apreendida a droga,
dado que, conforme ressaltou o Ministério Público Federal, não foi a incompetência
suscitada oportunamente.
De qualquer sorte, na questão de fundo, não teria dúvidas em subscrever o acórdão
recorrido e o precedente do STF (HC 80.730, Jobim), nele invocado.
Não procede o argumento de que, na hipótese, prevaleceria, para o fim da determi-
nação da competência, sobre a circunstância de o delito se ter consumado a bordo de
aeronave, o fato de cuidar-se de tráfico internacional de drogas: ao contrário, a incidên-
cia do art. 109, IX, da Constituição2 — este não alcançado pela regra do art. 27 da Lei
6.368/76 — independe da espécie do crime cometido “a bordo de navios ou aerona-
ves”, cuja persecução, só por isso, incumbe por força de norma constitucional à Justiça
Federal.
De toda maneira, a preclusão — que se me afigura inquestionável — basta a tornar
ociosa a discussão.
Indefiro a ordem: é o meu voto.
VOTO
O Sr. Ministro Cezar Peluso: Sr. Presidente, o caso é de competência de juízo, não
de competência de “Justiças”.
Acompanho Vossa Excelência.
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor Presidente, peço vênia a Vossa Excelência
para assentar que, no caso, está em discussão competência não territorial, mas em razão da
matéria. Invoco, em amparo a essa óptica, o próprio Verbete n. 522 da Súmula da Casa:
“Salvo ocorrência de tráfico com o exterior,” — matéria pano de fundo da
persecução criminal — “quando, então, a competência será da Justiça Federal,
compete à Justiça dos Estados o processo e o julgamento dos crimes relativos a
entorpecentes.”
Até aqui prevaleceu o entendimento de que, no caso, incidiria o artigo 109, inciso
IX, da Constituição Federal, cuja regência diz respeito, em si, ao crime, à prática delituosa,
portanto, a algo ligado à matéria a ser objeto de exame. De acordo com tal inciso,
compete aos juízes federais, portanto, a apreciação dessa matéria:
IX - os crimes cometidos a bordo de navios ou aeronaves, ressalvada a com-
petência da Justiça Militar.
Afasto o trecho do parecer da Procuradoria Geral da República, calcado na regra do
artigo 27 da Lei n. 6.368/76, segundo a qual:
“O processo e o julgamento do crime de tráfico” — volta-se à matéria —
“com exterior caberão à justiça estadual com interveniência do Ministério Público
respectivo, se o lugar em que tiver sido praticado for município que não seja sede
de vara da Justiça Federal, com recurso para o Tribunal Federal de Recursos.”
Em última análise, até aqui o que prevalece é o enquadramento do crime como
praticado a bordo de aeronave; é o enquadramento do tema concernente à competência
a partir da matéria, das balizas da acusação, da imputação constante da denúncia.
No mais, reporto-me ao voto que proferi, escudado em lição de Ada Pellegrini
Grinover, no Habeas Corpus n. 80.730-5/MS de Mato Grosso do Sul, e, agora, na mani-
festação de Vicente Greco Filho, reconhecendo que há uma dualidade a ser considerada.
Não posso confundir a situação concreta, tendo em conta o núcleo do tráfico ligado ao
processo, que é a importação, com o fato de a droga haver sido encontrada em veículo de
transporte — um avião —, no solo brasileiro, e entender que, aí, trata-se de caso incluído
na competência da Justiça Federal a partir da regra linear, concernente ao crime praticado
a bordo de aeronave e a bordo, em si, de navio.
No artigo 12 da Lei n. 6.368/76, tem-se a abertura do texto com referência a “im-
portar ou exportar”, fatos ligados ao tráfico internacional, vindo, após, alusão ao trans-
porte que se faz de forma secundária, sem que haja o esvaziamento do núcleo “importar”,
do núcleo “exportar”, mesmo porque, consideradas essas duas figuras, abre-se margem à
incidência da causa de aumento — como ressaltado da tribuna pelo ilustre defensor do
206 R.T.J. — 195
primordial para se definir a questão. Quanto ao fundo, concluo que, não havendo no
local vara federal, muito embora considerado — e aí o ângulo material salta aos olhos —
o tráfico internacional de drogas, o processo respectivo deve ser apreciado pela Justiça
comum, com recurso, como me referi, em face da regra do artigo 27 da Lei n. 6.368/76,
para o Tribunal Regional Federal com jurisdição na região.
EXPLICAÇÃO
O Sr. Ministro Cezar Peluso: Sr. Presidente, Vossa Excelência me permite nova
intervenção, até para remediar um lapso?
Na anterior, aludi a caso de competência de juízo, quando não o é; na verdade, o
caso é de competência de foro.
Quero recordar que o problema da perquirição da competência interna obedece a
um processo metodológico bem definido, que começa pela indagação acerca do “ramo
de Justiça”, entendida como a grande divisão da estrutura do Poder Judiciário nacional,
à qual é atribuída a competência. Tal competência, sem dúvida nenhuma, é de caráter
absoluto. Ninguém tem dúvida, pois, de que o caso é de competência absoluta da Justiça
Federal. Encontrada a competência de Justiça, o passo seguinte, no processo metodoló-
gico, está em indagar qual a competência de foro, ou seja, qual é a circunscrição territo-
rial a que a lei restringe a competência. E, só num terceiro passo — e aqui foi meu
equívoco —, busca-se, dentro daquele território, qual o juízo ou o órgão competente.
Portanto, a competência de juízo é o produto do terceiro passo.
Daí ver-se que a hipótese é tipicamente de competência de foro e, pois, relativa,
porque o critério da matéria já predeterminou a competência absoluta da Justiça Federal.
O passo seguinte é o recurso ao critério territorial para definir a competência de foro, na
alternativa: ou o local do crime é sede da Justiça Federal, ou, não o sendo, a competência
é delegada e limita-se ao Município que corresponda a comarca de juízo estadual. É o
que, com o devido respeito, reforça meu convencimento de que se trata aqui de compe-
tência tipicamente relativa, por ser territorial ou de foro, e, portanto, prorrogável à falta
de alegação oportuna da incompetência.
O Sr. Ministro Carlos Ayres Britto: Sr. Presidente, acho a matéria, data venia do
ponto de vista do Ministro Marco Aurélio, clara no sentido de que o art. 109, inciso IX,
superou a questão da competência judicante, em razão do local, ao dizer simplesmente:
“os crimes” — seja qual for o crime — “cometidos a bordo de navios ou aeronaves”. Essa
circunstância de o crime ter sido praticado a bordo de aeronave ou de navio já é defini-
dora da competência judicante para processo e julgamento.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Presidente e Relator): Se assim não o fora, o
crime doloso contra a vida praticado a bordo de aeronave seria da competência do Júri
estadual, porque assim dispõe a Constituição.
O Sr. Ministro Carlos Ayres Britto: Agora, a própria Constituição abriu uma exce-
ção quando se trata de competência da Justiça Militar. Se quisermos ir atrás da razão de
ser lógica desse dispositivo constitucional, inciso IX do art. 109, talvez esteja no art. 22,
inciso X, da Constituição, que reserva para a União, privativamente, a competência para
208 R.T.J. — 195
legislar sobre regime dos portos, navegação lacustre, fluvial, marítima, aérea e aeroespa-
cial. Não estou fazendo uma afirmativa categórica, mas, talvez, uma matéria esteja imbri-
cada com a outra.
Acompanho o voto do eminente Relator, com a vênia do Ministro Marco Aurélio.
EXTRATO DA ATA
HC 85.059/MS — Relator: Ministro Sepúlveda Pertence. Pacientes: José Elias
Fernandes do Amaral ou José Elias Fernandes Amaral e Eliandro Fernandes do Amaral.
Impetrantes: Vicente Greco Filho e outro. Coator: Superior Tribunal de Justiça.
Decisão: Por maioria de votos, a Turma indeferiu o pedido de habeas corpus;
vencido o Ministro Marco Aurélio, que o deferia. Falou pelos pacientes o Dr. Manoel
Cunha Lacerda.
Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Ministros Marco
Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Subprocuradora-Geral da República, Dra.
Maria Caetana Cintra Santos.
Brasília, 22 de fevereiro de 2005 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo
Tribunal Federal, em Segunda Turma, sob a Presidência do Ministro Celso de Mello,
R.T.J. — 195 209
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Trata-se de habeas corpus impetrado em favor de
Maria Regina Mascarenhas Barbosa Florido, do acórdão da 5ª Turma do Eg. Superior
Tribunal de Justiça, que deu provimento ao recurso especial interposto pelo Ministério
Público do Estado do Rio de Janeiro (REsp 543.037/RJ), em acórdão assim ementado:
“Criminal. Resp. Crime contra a propriedade intelectual. Busca e apreen-
são. Regra geral. Aplicabilidade. Crimes puníveis mediante ação penal pública.
Afastamento da regra específica. Recurso provido.
I - Nos crimes contra a propriedade intelectual, de ação penal pública, a
autoridade policial pode instaurar o inquérito e proceder à busca e apreensão de
acordo com a regra geral descrita no art. 240, § 1º, do CPP, afastando-se a aplicação
do artigo 527 do Código de Processo Penal.
II - Recurso especial provido, nos termos do voto do Relator.” (Fl. 71)
Dizem os impetrantes que, em favor da paciente, foi impetrado habeas corpus
perante o TJ/RJ, sustentando a nulidade da ação penal a que responde como incursa no
art. 184, § 2º (por duas vezes), c/c o art. 69, ambos do Código Penal. O Tribunal deferiu o
writ para declarar a nulidade do feito desde a realização da perícia, ante a inobservância do
disposto no art. 527 do Código de Processo Penal, que dispõe sobre a diligência de
busca e apreensão a ser realizada nos crimes contra a propriedade imaterial.
Contra essa decisão, o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro interpôs
recurso especial, sustentando a aplicabilidade da regra geral do art. 240 aos crimes
punidos mediante ação penal pública. O recurso especial foi provido para cassar o acór-
dão do TJ/RJ.
Daí o presente writ, em que se sustenta a ilegalidade do procedimento de busca e
apreensão, ao argumento de que, nos crimes contra a propriedade industrial, a busca e
apreensão regula-se pelo disposto no art. 527 do Código de Processo Penal e não pelo
procedimento genérico previsto no art. 240 do mesmo Código.
Sustentam, mais, em síntese, o seguinte:
a) ausência de previsão legal, na época dos fatos, que possibilitasse a criação de
exceção no procedimento de busca e apreensão nos crimes contra a propriedade imate-
rial de ação penal pública;
b) falta de correspondência entre as circunstâncias fáticas que originaram o prece-
dente do STJ e as características do caso concreto.
210 R.T.J. — 195
Requerem a concessão da ordem, para que sejam anulados todos os atos praticados
desde a busca e apreensão realizada.
Requisitadas informações (fl. 62), foram elas prestadas pelo eminente ministro
presidente do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, que encaminhou cópia do acórdão
proferido no Resp 543.037/RJ (fls. 71-77).
O Ministério Público Federal oficiou à fl. 87, parecer do ilustre Subprocurador-
Geral Edson Oliveira de Almeida, opinando pelo indeferimento do pedido.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Velloso (Relator): Assim o voto proferido pelo eminente
Min. Gilson Dipp, Relator do Resp 543.037/RJ, ora impugnado:
“(...)
A discussão gira em torno da diligência de busca e apreensão nos crimes
contra a propriedade imaterial e se a mesma deve respeitar a regra geral disposta no
art. 240 do Código de Processo Penal ou o disposto no art. 527 da mesma norma
penal.
O artigo 240 do Código de Processo Penal traz norma geral de realização de
busca e apreensão.
Já o art. 527 prevê a diligência de busca e apreensão a ser realizada nos crimes
contra a propriedade imaterial.
Nos delitos contra a propriedade imaterial, de ação penal privada, a realiza-
ção da busca e apreensão obedece o disposto nos artigos 524 e segs. do CPP.
O presente caso, no entanto, trata de infração ao art. 184, § 2º, do Código
Penal, para o qual aplica-se a regra geral prevista no art. 240 do CPP, por se tratar de
delito persequível mediante ação penal pública, conforme o disposto no art. 186
do Código Penal, deste teor:
‘Art. 186. Nos crimes previstos neste Capítulo somente se procede me-
diante queixa, salvo quando praticados em prejuízo da entidade de direito
público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou funda-
ção instituída pelo poder público, e nos casos previstos nos §§ 1º e 2º do art.
184, desta Lei.’
Esta Corte já se posicionou a respeito, no julgamento do REsp. 13.531/SP,
DJ de 13/09/1993, de relatoria do Min. José Cândido de Carvalho Filho, cujo
Relator para Acórdão foi o Min. Pedro Acioli. O v. acórdão, a propósito, restou
assim ementado:
‘Penal e Processual Penal. Crime contra a propriedade intelectual.
Inquerito policial. Trancamento. Inadmissibilidade. Apreensão de fitas de
video cassete pela autoridade policial. Apontada negativa de vigencia ao
art. 527, do CPP. Procedencia.
R.T.J. — 195 211
EXTRATO DA ATA
HC 85.177/RJ — Relator: Ministro Carlos Velloso. Paciente: Maria Regina Mas-
carenhas Barbosa Florido. Impetrantes: Márcia Dinis e outro (Advogados: João Eduardo
de Drumond Verano e outro). Coator: Superior Tribunal de Justiça.
Decisão: A Turma, por votação unânime, indeferiu o pedido de habeas corpus, nos
termos do voto do Relator. Falou, pela paciente, a Dra. Márcia Dinis. Ausente, justifica-
damente, neste julgamento, o Ministro Gilmar Mendes.
212 R.T.J. — 195
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tri-
bunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos, conhecer, em parte, do habeas corpus e, na
parte conhecida, deferi-lo, nos termos do voto do Relator. Votou o Presidente, Ministro
Nelson Jobim. Ausentes, justificadamente, os Ministros Carlos Velloso e Carlos Britto.
Falou pelo paciente o Dr. Ataíde Jorge de Oliveira.
Brasília, 17 de março de 2005 — Nelson Jobim, Presidente — Celso de Mello,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Celso de Mello: Trata-se de habeas corpus originariamente impe-
trado, perante o Supremo Tribunal Federal, contra decisão denegatória de igual writ,
que, emanada do E. Superior Tribunal de Justiça, acha-se consubstanciada em acórdão
assim ementado (fl. 11):
“Processo penal — Homicídio qualificado — Formação de quadrilha — excesso
de prazo — Réu pronunciado.
– Pronunciado o réu, fica superada a alegação de constrangimento ilegal da pri-
são por excesso de prazo na instrução (Súmula 21, desta Corte).
– Ordem denegada.”
(HC 21.345/DF, Rel. Min. Jorge Scartezzini)
Sustenta-se, na presente impetração, que a manutenção da prisão cautelar do ora
paciente — que já ultrapassa o período de 4 (quatro) anos e 5 (cinco) meses de duração —
configuraria situação de ilegal constrangimento, seja em face do alegado excesso de
prazo que se revelaria configurado, seja em virtude da suposta ausência, no caso, dos
requisitos legais autorizadores da adoção dessa excepcional medida de privação da liber-
dade de locomoção física do réu (fls. 02/10).
214 R.T.J. — 195
Consta da impetração que o ora paciente, que ainda se acha preso, está submetido
à custódia cautelar do Estado desde 9-9-2000, data em que sofreu a imposição de prisão
temporária, quando se realizavam as investigações policiais (fl. 02).
O ora paciente, juntamente com outras 17 (dezessete) pessoas, veio a ser denunciado,
pelo Ministério Público, perante a Vara do Júri da Circunscrição Judiciária de Planalti-
na/DF, pela suposta prática dos crimes de homicídio duplamente qualificado (CP, art.
121, § 2º, incisos IV e V) e de quadrilha armada (CP, art. 288, parágrafo único), em
concurso material (CP, art. 69) (Processos n. 2000.05.1.002835-0 e 2001.05.1.000093-
7).
Em 6-11-2000, data em que recebida a denúncia penal em questão, a prisão tem-
porária do ora paciente convolou-se, mediante decisão judicial, em prisão preventiva (fl.
16).
Posteriormente, em 6-8-2001, sobreveio a sentença de pronúncia do ora paciente,
pelos mesmos delitos capitulados na denúncia, sendo certo que o magistrado pronunci-
ante, por entender subsistentes as razões justificadoras da prisão preventiva, manteve a
privação cautelar da liberdade individual de Ricardo Peixoto de Castro (fl. 77).
Os autos registram que o ora paciente vem sofrendo a privação cautelar de sua
liberdade de locomoção física, sem qualquer solução de continuidade, desde 9-9-2000,
muito embora não tenha sido levado, até a presente data, a julgamento perante o
Tribunal do Júri, o que significa que essa prisão processual perdura por quase 4 (quatro)
anos e 6 (seis) meses.
Daí as razões que dão suporte à presente impetração, na qual o ilustre autor deste
writ constitucional, além de censurar a duração excessiva da prisão cautelar do ora
paciente (decretação inicial de sua prisão temporária, posteriormente convolada em
prisão preventiva e agora transformada em prisão processual decorrente da sentença de
pronúncia), sustenta a ilegalidade das decisões judiciais que ordenaram tal extraordiná-
ria medida, considerado o fato de que se achariam desprovidas de fundamentação idô-
nea (fls. 04/09):
“(...)
Ricardo Peixoto de Castro está preso há quase 5º anos por causa de fato
praticado por outra pessoa. Tal conclusão é inevitável, eis que, a par do abuso em
atribuir fato de um co-réu a outro, o atual título da prisão cautelar está na ‘Sentença
de Pronúncia’ (DOC. 02), e a fundamentação deste título se resume em palavras
vazias da Lei: ‘a custódia objetiva assegurar a aplicação da lei penal e garantia
da ordem pública’
(...)
A custódia preventiva, ainda que temporária, por se tratar de restrição máxi-
ma da liberdade individual, valor maior que de per si define a dignidade da pessoa
humana, só pode ser decretada se presentes os requisitos da Lei (CPP, 311 e 312),
‘in genere’ o fumus boni iuris e o periculum in mora. (...).
(...)
A demora em julgar, devida exclusivamente aos promotores de justiça e aos
juízes de direito, é ato de indignidade contra a justiça (...). Afinal, são três tentati-
vas vãs, e nenhuma esperança de pôr fim ao processo. (...).
R.T.J. — 195 215
VOTO
O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): A presente impetração, como precedente-
mente referido, apóia-se nos seguintes fundamentos: (a) suposta ilegalidade da decisão
que decretou a prisão cautelar do ora paciente, eis que desprovida — segundo sustenta-
do neste writ — de fundamentação jurídica idônea; e (b) alegada ocorrência de excesso
de prazo na manutenção da custódia cautelar do paciente, que já se prolonga por quase
quatro (4) anos e meio, sem que, nesse ínterim, tenha ocorrido qualquer julgamento do
réu pelo Tribunal do Júri.
Cabe analisar, preliminarmente, a cognoscibilidade, ou não, da presente impetra-
ção, no ponto em que se pretende o reconhecimento da ilegalidade da decretação da
216 R.T.J. — 195
prisão cautelar, sob a alegação de que a sentença de pronúncia — que lhe dá suporte —
apresentar-se-ia destituída de fundamentação jurídica idônea.
Impende acentuar, desde logo, que o exame desse específico ponto da impetra-
ção não se revela possível, considerado o estrito âmbito temático delineado no acór-
dão em questão, emanado do Tribunal ora apontado como coator, eis que não cabe, a
esta Suprema Corte — em face de sua própria jurisprudência (RTJ 136/230 — RTJ
141/570 — RTJ 148/732 — RTJ 164/213 — RTJ 182/243-244 — HC 73.390/RS, Rel.
Min. Carlos Velloso — HC 81.115/SP, Rel. Min. Ilmar Galvão) —, apreciar, em
sede originária, fundamentos diversos daqueles que deram suporte à decisão denega-
tória de habeas corpus impugnada perante o Supremo Tribunal Federal.
Isso significa, portanto, que se impõe o não-conhecimento, em parte, deste pedido
de habeas corpus, no ponto em que a impetração se apóia em fundamento não aprecia-
do na decisão ora impugnada, vale dizer, na parte em que o impetrante sustenta a
ilegalidade do ato de privação cautelar da liberdade do paciente, sob a alegação (não
examinada pelo Superior Tribunal de Justiça) de que a decisão não se mostraria ade-
quadamente motivada.
É que, se assim não fosse, registrar-se-ia indevida supressão de instância, consoante
tem advertido a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (RTJ 182/243-244, Rel.
Min. Sepúlveda Pertence — HC 73.390/RS, Rel. Min. Carlos Velloso — HC 81.115/SP,
Rel. Min. Ilmar Galvão, v.g.):
“Impetração de habeas corpus com apoio em fundamento não examinado
pelo tribunal apontado como coator: hipótese de incognoscibilidade do writ
constitucional.
— Revela-se insuscetível de conhecimento, pelo Supremo Tribunal Federal,
o remédio constitucional do habeas corpus, quando impetrado com suporte em
fundamento que não foi apreciado pelo Tribunal apontado como coator.
Se se revelasse lícito ao impetrante agir per saltum, registrar-se-ia indevida
supressão de instância, com evidente subversão de princípios básicos de ordem
processual. Precedentes.”
(HC 83.842/SP, Rel. Min. Celso de Mello)
“Em habeas corpus substitutivo de recurso ordinário, a inconformidade
deve ser com o acórdão proferido pelo STJ e não contra o julgado do Tribunal
de Justiça.
O STF só é competente para julgar habeas corpus contra decisões pro-
venientes de Tribunais Superiores.
Os temas objeto do habeas corpus devem ter sido examinados pelo
STJ.
(...)
Caso contrário, caracterizaria supressão de instância.
Habeas Corpus não conhecido.”
(HC 79.551/SP, Rel. Min. Nelson Jobim — grifei)
R.T.J. — 195 217
(...)
Afigura-se, com efeito, de todo inaceitável a delonga na finalização do pro-
cesso de conhecimento (especialmente o de caráter condenatório), com a ultrapas-
sagem do tempo necessário à consecução de sua finalidade, qual seja a de defini-
ção da relação jurídica estabelecida entre o ser humano, membro da comunidade,
enredado na persecutio criminis, e o Estado: o imputado tem, realmente, direito ao
pronto solucionamento do conflito de interesses de alta relevância social que os
respectivos autos retratam, pelo órgão jurisdicional competente.
(...)
Realmente, tendo-se na devida conta as graves conseqüências psicológicas
(no plano subjetivo), sociais (no objetivo), processuais, e até mesmo pecuniárias,
resultantes da persecução penal para o indivíduo nela envolvido, imperiosa tor-
na-se a agilização do respectivo procedimento, a fim de que elas, tanto quanto
possível, se minimizem, pela sua conclusão num ‘prazo razoável’.” (Grifei)
Esse entendimento encontra pleno apoio na jurisprudência que o Supremo Tribu-
nal Federal firmou na matéria ora em exame, tanto que se registrou, nesta Corte, em
diversas decisões, a concessão de ordens de habeas corpus, em situações nas quais o
excesso de prazo — reconhecido em tais julgamentos — foi reputado abusivo por este
Tribunal (RTJ 181/1064, Rel. Min. Ilmar Galvão).
Refiro-me, particularmente, aos casos nos quais a duração da privação cautelar
da liberdade do acusado era claramente inferior ao período de encarceramento proces-
sual a que ainda está submetido, na espécie, o ora paciente: 3 (três) anos, 7 (sete) meses
e 5 (cinco) dias (HC 82.761/PI, Rel. Min. Nelson Jobim); 3 (três) anos, 1 (um) mês e 24
(vinte e quatro) dias (HC 78.978/PI, Rel. Min. Nelson Jobim, v.g.).
Tal entendimento também foi reiterado pelo Supremo Tribunal Federal — e a
ordem de habeas corpus igualmente deferida —, em hipóteses nas quais o excesso de
prazo pertinente à prisão cautelar revelava-se substancialmente inferior ao que se
registra na presente impetração: 2 (dois) anos, 4 (quatro) meses e 8 (oito) dias (HC
84.662/BA, Rel. Min. Eros Grau); 1 (um) ano, 5 (cinco) meses, e 15 (quinze) dias (HC
79.789/AM, Rel. Min. Ilmar Galvão); 1 (um) ano e 3 (três) meses (HC 84.907/SP, Rel.
Min. Sepúlveda Pertence); 1 (um) ano e 5 (cinco) dias (HC 84.181/RJ, Rel. Min. Marco
Aurélio); 10 (dez) meses e 21 (vinte e um) dias (HC 83.867/PB, Rel. Min. Marco
Aurélio); 4 (quatro) meses e 10 (dias) (RTJ 118/484, Rel. Min. Carlos Madeira).
Cabe também assinalar que o Supremo Tribunal Federal, revelando extrema
sensibilidade a propósito de situações anômalas derivadas da superação abusiva
e irrazoável do prazo de duração de prisões meramente cautelares, tem conhecido
do pedido de habeas corpus, até mesmo quando não examinada essa específica
questão pelo Tribunal de jurisdição inferior, como resulta claro das decisões a
seguir mencionadas:
“Recurso em habeas corpus. Liberdade provisória. Excesso de prazo.
Conhecimento de ofício da matéria. Constrangimento ilegal. Extensão de
liberdade provisória.
R.T.J. — 195 223
VOTO
O Sr. Ministro Eros Grau: Sr. Presidente, reportando-me aos Habeas Corpus n.
84.662, 84.921 e 85.400, pelas razões lá expostas vou acompanhar o eminente Relator
concedendo a ordem.
VOTO
O Sr. Ministro Cezar Peluso: Sr. Presidente, gostaria de fazer uma ressalva quanto
à preliminar de não-conhecimento, pois não quero comprometer-me com a tese do emi-
nente Min. Relator.
R.T.J. — 195 225
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor Presidente, apenas para firmar posição sobre
a matéria e revelar o meu convencimento quanto à sentença de pronúncia, quanto à
possibilidade de se implementar ordem de ofício. O fato de se estar diante de quadro
revelador de ilicitude no processo em que retratado o habeas corpus não é obstáculo
para acionar-se o Código de Processo Penal. Reservo, entretanto, essa concessão a situa-
ções em que realmente salte aos olhos a ilicitude.
A sentença de pronúncia para mim não é um fenômeno, um marco para a interrup-
ção de prazo alusivo à preventiva. Ela apenas resulta na submissão do acusado — até
então um simples acusado — ao juízo natural, retratado pelo Tribunal do Júri.
No caso do processo, como ressaltou o Ministro Relator, nota-se uma situação
extravagante em que se compele aquele preso, inicialmente, de modo temporário e,
depois, preventivamente a adiantamento do cumprimento de uma pena que ainda não
foi formalizada, que ainda não existe no mundo jurídico. O Estado precisa aparelhar-se
para encerrar os processos nos prazos previstos na legislação instrumental de regência,
sob pena de — considerado o aspecto para mim simplesmente objetivo, que é o relativo
ao excesso de prazo — ter-se a concessão da ordem.
Acompanho o Relator.
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Senhor Presidente, eu queria estar de acordo
com a ressalva do Ministro Cezar Peluso quanto ao não-conhecimento, mas, no caso, a
questão está prejudicada pela concessão da ordem.
Entendo que, afora hipóteses de evidente constrangimento ilegal a impor a con-
cessão de ofício, a sucessão de impetrações de habeas corpus não exige o prequestiona-
mento. Exige-se que a questão tenha sido posta perante o tribunal coator, porque, se
omitir sobre um fundamento posto é, em si mesmo, uma coação, e o tribunal superior,
considerando evidenciada a coação ilegal, pode fazer cessar de imediato a coação e não
devolver o tema ao tribunal omisso.
226 R.T.J. — 195
VOTO
O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Senhor Presidente, quero registrar primeiro a minha
adesão integral ao voto magnífico proferido pelo Ministro Celso de Mello.
Registro também a apreensão com esse quadro quase que patológico que se revela
e mostra a necessidade, realmente, de uma urgente reforma e quase uma revolução no
âmbito do Poder Judiciário como um todo. Ontem, apreciamos aquele mandado de
segurança (MS 22.151/PR, Rel. Min. Ellen Gracie); hoje, este habeas corpus, o que é
revelador indiciariamente de mazelas muito sérias no funcionamento do Judiciário.
Por último, saliento a belíssima sustentação feita da tribuna.
Acompanho o Relator.
VOTO
O Sr. Ministro Nelson Jobim (Presidente): Efetivamente, aqui, temos um caso em
que a delonga se deve à má gestão do sistema judiciário. É uma questão de gestão. Há
casos em que a demora se dá por habilidade da defesa, e temos negado habeas corpus
quando o tempo decorre exatamente de ações desenvolvidas pela defesa.
No caso específico, mostrou o Relator que o problema é de mera gestão, ou seja, a
administração do fluxo dos processos, da perspectiva da sua urgência. Temos muito
trabalho, e por isso, precisamos da capacidade de estabelecer uma ordenação de natureza
político-judiciária para efeito de darmos tramitação a esses feitos.
Na verdade, todos nós, ou grande parte do sistema judiciário nacional, têm sempre
uma visão da perspectiva do processo como um dado individual. Ou seja, satisfaz-se o
julgamento do processo individual, mas não se gere o conjunto de fatos que possam
conduzir a decisões que tenham eficácia social.
Acompanho o Relator.
EXTRATO DA ATA
HC 85.237/DF — Relator: Ministro Celso de Mello. Paciente: Ricardo Peixoto de
Castro. Impetrante: Ataíde Jorge de Oliveira. Coator: Presidente do Superior Tribunal de
Justiça.
Decisão: O Tribunal, por unanimidade, conheceu, em parte, do habeas corpus e, na
parte conhecida, deferiu-o, nos termos do voto do Relator. Votou o Presidente, Ministro
Nelson Jobim. Ausentes, justificadamente, os Ministros Carlos Velloso e Carlos Britto.
Falou pelo paciente o Dr. Ataíde Jorge de Oliveira.
Presidência do Ministro Nelson Jobim. Presentes à sessão os Ministros Sepúlveda
Pertence, Celso de Mello, Marco Aurélio, Ellen Gracie, Gilmar Mendes, Cezar Peluso,
Joaquim Barbosa e Eros Grau. Vice-Procurador-Geral da República, Dr. Antônio Fernando
Barros e Silva de Souza.
Brasília, 17 de março de 2005 — Luiz Tomimatsu, Secretário.
R.T.J. — 195 227
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribu-
nal Federal, em Segunda Turma, sob a presidência do Ministro Celso de Mello, na
conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos,
resolvendo questão de ordem, invalidar o julgamento da presente causa, a que procedeu
na sessão de 3 de maio de 2005, em ordem a determinar a submissão do pleito ao exame
do egrégio Plenário do Supremo Tribunal Federal, nos termos do voto do Relator.
Brasília, 17 de maio de 2005 — Celso de Mello, Presidente — Gilmar Mendes,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Trata-se de recurso ordinário em habeas corpus
impetrado em favor de Lúcio Carlos Finholdt Pereira contra a decisão proferida pelo
Min. Carlos Britto no HC 85.086.
Autuado como recurso ordinário em habeas corpus, a Segunda Turma, por unani-
midade, negou-lhe provimento, em sessão de 3 de maio próximo passado.
Em face dessa decisão, é que trago a presente questão de ordem.
VOTO
O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Relator): Em decisão de 2 de dezembro de 2004, o
Ministro Carlos Britto proferiu decisão negando seguimento ao HC 85.086, publicada
no Diário da Justiça do dia 10 de dezembro do mesmo ano.
Em 9 de dezembro de 2004, portanto, extemporaneamente, o paciente impetrou
recurso de habeas corpus, autuado como RHC 85.243, distribuído à minha relatoria.
Remetidos os autos à Procuradoria-Geral da República, afirmou-se, em parecer da
lavra do Subprocurador-Geral da República Edson de Oliveira Almeida:
“No caso, embora admissível o habeas corpus contra ato singular do Relator
(HC 69.138-MG, rel. Min. Moreira Alves, DJU 29.05.92; HC 80.170-RS, rel. Min.
Sepúlveda Pertence, DJU 24.08.01; HC 82.867, rel. Min. Maurício Corrêa, DJU
228 R.T.J. — 195
EXTRATO DA ATA
RHC 85.243-QO/MG — Relator: Ministro Gilmar Mendes. Recorrente: Lúcio
Carlos Finholdt Pereira (Advogado: Manoel de Jesus Filho). Recorrido: Relator do HC
n. 85.086 do Supremo Tribunal Federal.
Decisão: A Turma, por unanimidade, resolvendo questão de ordem, invalidou o
julgamento da presente causa, a que procedeu na sessão de 3 de maio de 2005, em ordem
a determinar a submissão do pleito ao exame do egrégio Plenário do Supremo Tribunal
Federal, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste julgamento, a
Ministra Ellen Gracie.
Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Carlos
Velloso, Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa. Ausente, justificadamente, a Ministra Ellen
Gracie. Subprocurador-Geral da República, Dr. Francisco Adalberto da Nóbrega.
Brasília, 17 de maio de 2005 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tri-
bunal Federal, em Segunda Turma, sob a Presidência do Ministro Celso de Mello, na
conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos,
conhecer, em parte, do pedido de habeas corpus e, na parte conhecida, o indeferir, nos
termos do voto do Relator.
Brasília, 31 de maio de 2005 — Celso de Mello, Presidente — Carlos Velloso,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Trata-se de habeas corpus impetrado em favor de
Marcus Vinícius dos Santos Gomes (ou Marcos Vinicius dos Santos), do acórdão da 5ª
Turma do Eg. Superior Tribunal de Justiça, que indeferiu pedido de habeas corpus (HC
38.134/RJ), em acórdão assim ementado:
“Habeas corpus. Roubo. Consumação. Posse tranqüila do bem. Desnecessi-
dade. Dosimetria da pena. Decisão devidamente fundamentada.
I - O roubo se consuma no instante em que a coisa é retirada da esfera de
disponibilidade da vítima, mediante violência ou grave ameaça, sendo irrelevante
a ocorrência de posse tranqüila sobre a res furtiva.
II - Afasta-se a redução de 2/3 da pena pela tentativa quando o delito restou
consumado, mantendo-se a redução de metade aplicada em primeiro grau apenas
em virtude da ausência de recurso do Ministério Público.
Ordem denegada.” (Fl. 54)
Diz a impetração que o paciente foi condenado em primeiro grau à pena de 2 (dois)
anos e 8 (oito) meses de reclusão, mais multa, como incurso no art. 157, § 2º, II, c/c o art.
14, II, do Código Penal, com redução da pena pela metade, por tratar-se de crime tentado.
Esclarece que contra essa decisão interpôs apelação para postular a redução de 2/3 da
pena, a que a Quarta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro negou
provimento, por entender que a redução da metade da pena pela sentença condenatória
foi extremamente benéfica ao paciente, já que fora condenado por tentativa de roubo,
quando se tratava de crime consumado. Entretanto, em face da ausência de recurso do
Ministério Público, o Tribunal não reconheceu o crime como consumado.
Inconformado, impetrou habeas corpus perante o Eg. Superior Tribunal de Justiça,
também indeferido pela 5a Turma do Tribunal.
230 R.T.J. — 195
Daí o presente writ, no qual se sustenta que a pena deve ser diminuída na propor-
ção inversa do iter criminis percorrido, ou seja, no máximo permitido. Insurge-se, ainda,
contra a expedição do mandado de prisão expedido contra o paciente, na medida em
que, além de cumprir suas obrigações eleitorais, possuir trabalho fixo e freqüentar curso
de ensino superior, fora condenado ao cumprimento da pena em regime aberto.
Por isso, pede a concessão do writ, “fixando-se para efeito de diminuição o grau
máximo permitido para o crime tentado, com aplicação da suspensão condicional da
penal” (fl. 09).
Requisitadas informações, foram elas prestadas pelo Sr. Presidente do Superior
Tribunal de Justiça, que encaminhou cópia do acórdão proferido pela 5ª Turma daquele
Tribunal (fls. 54-58).
O Ministério Público Federal, pelo parecer da ilustre Subprocuradora-Geral da
República, Dra. Delza Curvello Rocha, oficiando às fls. 68-72, opina pelo indeferimento
do writ.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Velloso (Relator): Insurge a impetração contra acórdão da 5a
Turma do Eg. Superior Tribunal de Justiça, que indeferiu pedido de habeas corpus em
que se postulava a redução de 2/3 da pena imposta ao paciente pela tentativa de roubo.
De início, não conheço do writ na parte em que se insurge contra a expedição de
mandado de prisão contra o paciente. É que tal questão não foi posta à apreciação do Eg.
Superior Tribunal de Justiça. De acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal, não
se conhece de questões não apreciadas pelo Tribunal de origem, sob pena de supressão
de instância.
Prossigo.
O acórdão do Eg. Superior Tribunal de Justiça, aqui impugnado, porta a seguinte
ementa:
“Habeas corpus. Roubo. Consumação. Posse tranqüila do bem. Desnecessi-
dade. Dosimetria da pena. Decisão devidamente fundamentada.
I - O roubo se consuma no instante em que a coisa é retirada da esfera de
disponibilidade da vítima, mediante violência ou grave ameaça, sendo irrelevante
a ocorrência de posse tranqüila sobre a res furtiva.
II - Afasta-se a redução de 2/3 da pena pela tentativa quando o delito restou
consumado, mantendo-se a redução de metade aplicada em primeiro grau apenas
em virtude da ausência de recurso do Ministério Público.
Ordem denegada.” (Fl. 54)
Assim o voto proferido pelo eminente Min. José Arnaldo da Fonseca, relator do
habeas corpus, aqui impugnado:
“(...)
R.T.J. — 195 231
Não obstante reconhecer que a questão acerca da tentativa tem pouca visibi-
lidade em sede de habeas corpus, pois demandaria o confronto probatório, no
caso, visualiza-se a ineficiência dos fundamentos da defesa, porquanto o iter
criminis, com o exaurimento de toda a execução, afigura-se incontestável. Aliás,
foi o que bem ponderou a opinião ministerial, às fls. 62/4:
‘6. Não merece prosperar a pretensão do impetrante. Não há que se
confundir a consumação do delito com o proveito auferido a partir da prática
delituosa. O roubo se consuma no instante em que a coisa é retirada da esfera
de disponibilidade da vítima, mediante violência ou grave ameaça, sendo
irrelevante a ocorrência de posse tranqüila sobre a res furtiva.
7. No caso sob apreciação, o fato do paciente permanecer no vagão do
metrô após a prática delitiva não descaracteriza, inclusive, a consumação do
delito, uma vez que, submetida a grave ameaça e com violência física e,
sobretudo, quando se tem presente que a res furtiva (camisa) passou para o
poder dos assaltantes, havendo a alteração na esfera de disponibilidade do
bem.
8. De outro lado, não há que se confundir a consumação do delito com
a obtenção de proveito da empreitada criminosa. Diz-se consumado o crime
quando nele estão reunidos todos os elementos de sua definição legal (art.
14, I, CPB). No caso do roubo, a subtração da coisa alheia móvel mediante
grave ameaça é suficiente para a consumação, independentemente da posse
mansa e pacífica da coisa ou de seu desfruto, sendo que este se situa na fase de
exaurimento.
9. Nesse sentido é o entendimento da nossa Corte Constitucional, que
reiteradas vezes assim já se pronunciou acerca do tema: ‘o roubo está consu-
mado se o ladrão é preso em decorrência de perseguição imediatamente após
a subtração da coisa, não importando assim que tenha, ou não, posse tranqüi-
la desta’ (RTJ 135/161). Em caso assemelhado ao dos autos, já decidiu o
Supremo Tribunal Federal:
‘Roubo consumado - Carro. Configura-o a abordagem do con-
dutor, mediante o uso de arma de fogo, procedendo-se à tomada do
veículo, embora a passagem por radiopatrulha, já informada da ocor-
rência, haja implicado a interceptação, com a conseqüente recupera-
ção do veículo e prisão dos agentes’.
10. Também o Superior Tribunal de Justiça segue a mesma linha de
raciocínio, já havendo deixado assentado: ‘O crime de roubo se consuma no
momento, ainda que breve, em que o agente se torna possuidor da res furtiva,
subtraída mediante grave violência ou ameaça, não se mostrando necessário
que haja posse tranqüila, fora da vigilância da vítima’.
11. Com efeito, mostra-se inviável a redução de pena pleiteada pelo
impetrante, eis que, em verdade, o crime restou consumado e, como consig-
nado na própria decisão atacada, se houvesse recurso do Ministério Público,
deveria ser reconhecida a consumação do delito.
232 R.T.J. — 195
EXTRATO DA ATA
HC 85.262/RJ — Relator: Ministro Carlos Velloso. Paciente: Marcus Vinícius dos
Santos Gomes ou Marcos Vinicius dos Santos. Impetrante: Edir Gonçalves Ramos. Coator:
Superior Tribunal de Justiça.
Decisão: A Turma, por votação unânime, conheceu, em parte, do pedido de habeas
corpus e, na parte de que conheceu, indeferiu-o, também por unanimidade, nos termos
do voto do Relator.
Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Carlos
Velloso, Ellen Gracie, Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa. Compareceu à Turma o
Ministro Nelson Jobim, Presidente do Tribunal, a fim de julgar processo a ele vinculado,
assumindo, nesta ocasião, a Presidência da Turma, de acordo com o art. 148, parágrafo
único, RISTF. Subprocurador-Geral da República, Dr. Francisco Adalberto da Nóbrega.
Brasília, 31 de maio de 2005 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.
234 R.T.J. — 195
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo
Tribunal Federal, em Segunda Turma, sob a Presidência do Ministro Celso de Mello,
na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de
votos, indeferir o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator. Ausente,
justificadamente, neste julgamento, a Ministra Ellen Gracie.
Brasília, 17 de maio de 2005 — Celso de Mello, Presidente — Carlos Velloso,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Trata-se de habeas corpus impetrado em favor de
André Luiz de Jesus Peres, da decisão da 5a Turma do Eg. Superior Tribunal de Justiça
que indeferiu pedido de habeas corpus (HC 14.876/RJ), em acórdão assim ementado:
“Ementa: Execução penal. Indulto. Tráfico ilícito de entorpecentes. Decreto
3.226/99. Impossibilidade.
I. - Não é possível conceder indulto apenas quanto à causa de aumento defi-
nida no inciso III do art. 18 da Lei n. 6.368/76.
II. - Conforme jurisprudência firmada pelo Plenário do colendo Supremo
Tribunal Federal, é constitucional o art. 2º, I da Lei 8.072/90, pelo qual se veda a
concessão de indulto aos condenados por crimes hediondos, tráfico ilícito de en-
torpecentes e drogas afins e terrorismo. (Precedentes).
Writ indeferido.” (Fl. 38)
O paciente, condenado à pena de 15 (quinze) anos de reclusão, em regime integral-
mente fechado, pela prática do crime previsto no art. 12 c/c 18, III, da Lei 6368/76,
postula o reconhecimento do direito ao indulto da pena, tão somente na parte relativa ao
aumento da pena. Sustenta a impetração que o DL 3.226/99, em seu art. 2º, permite a
comutação mesmo em se tratando de crimes hediondos.
R.T.J. — 195 235
Requisitadas informações (fl. 22), foram elas prestadas pelo eminente Ministro
Edson Vidigal, Presidente do Eg. Superior Tribunal de Justiça, que encaminhou cópia
do acórdão proferido no HC 14.876/RJ, aqui impugnado (fls. 38-46).
O Ministério Público Federal, pelo parecer do ilustre Subprocurador-Geral da Re-
pública, Dr. Edson Oliveira de Almeida, opina pelo indeferimento da ordem (fls. 63-64).
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Velloso (Relator): Assim o voto proferido pelo eminente
Ministro Felix Fischer, Relator do HC 14.876/RJ, aqui impugnado:
“(...)
O habeas corpus busca o reconhecimento do direito do paciente, condenado
pela prática do crime previsto no art. 12, c/c o art. 18, inciso III, ambos da Lei
6.368/76 – tráfico ilícito de entorpecentes e associação – ao indulto da pena com
relação ao art. 18, inciso III, com base no Decreto 3.226/99, que dispõe o seguinte:
‘Art. 2º O condenado que, até 25 de dezembro de 1999, tenha cumprido
um quarto da pena, se não reincidente, ou um terço, se reincidente, e não
preencha os requisitos deste Decreto para receber indulto, terá comutada sua
pena com redução de um quarto, se não reincidente, e de um quinto, se
reincidente.’
(...)
‘Art.7º O indulto previsto neste Decreto não alcança os:
I - condenados por crimes hediondos e pelos crimes de tortura,
terrorismo e tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins;
II - condenados pelos crimes definidos no Código Penal Militar
que correspondam às hipóteses previstas nos incisos I e III deste artigo;
III - condenados que, embora solventes, tenham deixado de repa-
rar o dano;
IV - condenados por roubo com emprego de arma de fogo;
V - condenados por roubo que tenham mantido a vítima em seu
poder ou de outra forma restringido sua liberdade.’
O condenado faz uma análise comparativa entre o art. 14 e o art. 18, inciso III,
ambos da Lei n. 6.368/76. Argumenta que o primeiro diz respeito à associação
permanente e não é considerado crime hediondo pelos Tribunais Superiores (STJ e
STF). Ao passo que o segundo refere-se à associação eventual, ou seja, de menor
potencial ofensivo à sociedade, e por isso não deveria também ser aplicada a Lei de
Crimes Hediondos. Conclui pela possibilidade de aplicação do indulto com rela-
ção à associação eventual uma vez que satisfaz as exigências contidas no art. 2º
acima transcrito - cumprimento de ao menos um quarto da pena, se não reincidente,
ou um terço, se reincidente.
236 R.T.J. — 195
EXTRATO DA ATA
HC 85.279/RJ — Relator: Ministro Carlos Velloso. Paciente: André Luiz de Jesus
Peres. Impetrante: Antonio de Padua Nunes Pereira. Coator: Superior Tribunal de Justiça.
Decisão: A Turma, por votação unânime, indeferiu o pedido de habeas corpus, nos
termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste julgamento, a Ministra
Ellen Gracie.
R.T.J. — 195 241
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma
do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na
conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos,
deferir o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator.
Brasília, 22 de fevereiro de 2005 — Sepúlveda Pertence, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Este o teor da decisão liminar que proferi à
fl. 33:
“Alega o paciente-impetrante que foi condenado, “por decisão do Colégio
Recursal da Comarca de Avaré”, à pena de 1 ano e 6 meses e 20 dias de detenção,
substituída por uma restritiva de direito, “na modalidade de prestação pecuniária
às vítimas, mediante depósito judicial no valor equivalente a 18 (dezoito) salários
mínimos”.
Aduz que foi inadmitido o recurso extraordinário interposto contra esta deci-
são, motivo pelo qual interpôs agravo de instrumento, ainda em processamento na
origem (fl. 12).
242 R.T.J. — 195
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Conforme mencionado no relatório,
a Primeira Turma desta Corte, ao apreciar casos assimiláveis (v.g., HC 84.677, Rel. Min.
Eros Grau, Redator para o acórdão Min. Cezar Peluso, Inf. 371; HC 84.741, Pertence,
j. 7-12-04), firmou entendimento no sentido de que há fundamento bastante para vedar,
no caso, a execução provisória, qual seja, o disposto no art. 147 da Lei de Execuções
Penais, segundo o qual o termo inicial da execução penal da pena restritiva de direitos é
o trânsito em julgado da sentença condenatória.
Este o quadro, defiro a ordem, para suspender a execução das penas restritivas de
direitos, até o eventual trânsito em julgado da sentença condenatória: é o meu voto.
EXTRATO DA ATA
HC 85.289/SP — Relator: Ministro Sepúlveda Pertence. Paciente e Impetrante: Dirceu
Silvestre Zaloti (Advogado: Nilson Ribeiro Negrão). Coatora: Juíza Presidenta do Colégio
Recursal da 24ª Circunscrição Judiciária da Comarca de Avaré.
Decisão: A Turma deferiu o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do
Relator. Unânime.
Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Ministros Marco
Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Subprocuradora-Geral da República, Dra.
Maria Caetana Cintra Santos.
Brasília, 22 de fevereiro de 2005 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma
do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na
conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos,
deferir em parte o pedido de habeas corpus, cassando a liminar, nos termos do voto do
Relator.
Brasília, 28 de junho de 2005 — Sepúlveda Pertence, Presidente — Eros Grau,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Eros Grau: Trata-se de habeas corpus em que se aponta como auto-
ridade coatora a Primeira Turma Recursal da Comarca de Lavras/MG, por ter afirmado a
competência do Juizado Especial para julgar a ação penal referente ao delito de condu-
ção de veículo automotor, em via pública, sob a influência de álcool ou substância de
efeitos análogos (CTB, artigo 306), cuja pena máxima em abstrato é de 3 (três) anos de
detenção, ultrapassando o teto de 2 (dois) anos, previsto na Lei n. 10.259/01.
2. Os impetrantes alegam, por outro lado, que o juiz não observou o princípio da
consumpção, ao aplicar o concurso material quanto aos crimes de ameaça, de resistência,
de desobediência e de desacato, tipificados respectivamente nos artigos 147, 329, 330 e
331 do Código Penal, de modo que o desacato absorve a ameaça, assim como a resistên-
cia absorve o desacato.
3. Requerem a concessão de liminar para suspender os efeitos da condenação,
liberando a carteira de habilitação apreendida. No mérito, postulam a declaração de
nulidade da ação penal, desde o recebimento da denúncia.
4. A Ministra Ellen Gracie deferiu a liminar para suspender os efeitos da condenação
(fl. 155).
5. O Ministério Público Federal manifesta-se pela concessão parcial da ordem.
É o relatório.
R.T.J. — 195 245
VOTO
O Sr. Ministro Eros Grau (Relator): Esta Primeira Turma, ao julgar o HC n. 81.510,
Relator o Ministro Sepúlveda Pertence, DJ de 12-4-2002, reconheceu ser o juizado
especial incompetente para o processo referente aos crimes descritos nos artigos 303,
306 e 308 do Código de Trânsito Brasileiro. Naquela oportunidade, porém, condicio-
nou a anulação do julgamento realizado pelo juizado especial à demonstração de
prejuízo. A Segunda Turma desta Corte decidiu do mesmo modo no julgamento do HC
n. 85.019, Relatora a Ministra Ellen Gracie. Peço vênia para transcrever a ementa do HC
n. 81.510, por refletir, com clareza, os fundamentos do acórdão:
“Ementa: I - Juizado Especial Criminal: incompetência para o processo
dos crimes descritos nos arts. 303, 306 e 308 do Código de Trânsito: inteligên-
cia do art. 291 e parágrafo, do CTB, c/c o art. 61 da Lei 9.099/95.
1. Embora o pudesse ter feito, o CTB não converteu em infrações penais de
“menor potencial ofensivo”, para o fim de tipificá-los na competência dos
Juizados Especiais, os crimes tipificados nos seus arts. 303 (lesão corporal no
trânsito), 306 (embriaguez ao volante) e 308 (participação em competição não
autorizada): no art. 291, caput, a aplicação da Lei dos Juizados Especiais foi limi-
tada pela cláusula “no que couber”, bastante a excluí-la em relação aos delitos de
trânsito cuja pena cominada seja superior a um ano (Lei 9.099/95, art. 61); no
parágrafo único do mesmo artigo, cingiu-se o CTB a prescrever aos três crimes
referidos — todos sujeitos a pena máxima superior a um ano — os arts. 74 (compo-
sição de danos civis no processo penal), 76 (transação penal) e 88 (exigência de
representação para a persecução de lesões corporais).
II - Nulidade por incompetência do Juizado Especial: declaração sujeita à
existência de prejuízo.
2. O âmbito normativo do dogma fundamental da disciplina das nulidades —
pas de nullité sans grief — compreende as nulidades absolutas — qual, no caso, a
incompetência do Juizado Especial — se a falta de inquérito policial — que não é
garantia de defesa —, e a seqüência do procedimento da Lei 9.099/95, perante
Juíza que, na comarca, era a titular exclusiva da jurisdição penal, nenhum prejuízo
concreto acarretou à defesa do paciente.
3. Declaração de nulidade restrita, em conseqüência, ao acórdão confirmató-
rio da sentença condenatória exarado por Turma Recursal dos Juizados Especiais.”
2. É certo que — diversamente do que ocorre no caso sob exame — Sua Excelên-
cia, o Ministro Sepúlveda Pertence, ressalvou a circunstância de ser a magistrada do
Juizado Especial titular exclusiva da jurisdição penal na comarca. Entendo, contudo,
que essa distinção não infirma a conclusão contrária à anulação ex radice da ação penal,
até porque no precedente citado entendeu-se que o apotegma pas de nullité sans grief
pode ser aplicado nos casos de nulidade absoluta.
3. No caso concreto, os impetrantes não lograram demonstrar prejuízo decorrente
do procedimento dos juizados especiais.
246 R.T.J. — 195
EXTRATO DA ATA
HC 85.350/MG — Relator: Ministro Eros Grau. Paciente: Cesar Adriane Oliveira
ou César Adriano Oliveira. Impetrantes: Négis M. Rodarte e outro. Coator: Primeira
Turma Recursal da Comarca de Lavras.
Decisão: Por maioria de votos, a Turma deferiu, em parte, o pedido de habeas
corpus, cassando a liminar, nos termos do voto do Relator; vencido, parcialmente, o
Ministro Marco Aurélio, que o deferia integralmente.
R.T.J. — 195 247
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribu-
nal Federal, em Segunda Turma, sob a Presidência do Ministro Celso de Mello, na
conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos,
indeferir o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator.
Brasília, 31 de maio de 2005 — Celso de Mello, Presidente — Gilmar Mendes,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Gilmar Mendes: A Min. Ellen Gracie, ao indeferir o pedido de
liminar, assim resumiu a controvérsia (fl. 50):
“Trata-se de habeas corpus substitutivo de recurso ordinário impetrado con-
tra ato da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, que indeferiu writ em favor
do ora paciente.
Afirma a impetrante que o ora paciente foi condenado à pena de 8 anos e 8
meses de reclusão, pela prática de homicídio. Informa que sua apelação foi negada
pelo Tribunal de Justiça e que, contra essa decisão, interpôs recurso extraordinário
e especial, além de ter impetrado habeas corpus junto ao STJ.
Alega que a decisão do Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia que
ordenou a expedição de mandado de prisão contra o paciente carece da necessária
fundamentação exigida pelo art. 93 da Constituição.”
248 R.T.J. — 195
VOTO
O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Relator): Foram estas as razões do Superior Tribu-
nal de Justiça para manutenção da prisão do paciente:
“A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, na voz da sua Terceira
Seção, firmou a compreensão de que, ressalvada a demonstrada necessidade de
decretação da prisão cautelar, deve ser preservada a liberdade do réu condenado,
até o exaurimento da instância recursal ordinária, se respondeu solto a todo o
processo da ação penal.
In casu, ao que se tem, o paciente permaneceu solto durante a instrução
criminal e foram opostos embargos de declaração da decisão impugnada.
Contudo, segundo informações complementares obtidas perante a Corte de
Justiça estadual, a instância ordinária já se encontra exaurida, por já julgado os
embargos de declaração opostos, cujo acórdão foi publicado no dia 5 de novembro
do corrente ano.
Nesse passo, firmou-se já o entendimento no sentido de que, não tendo o
recurso especial efeito suspensivo, a sua interposição não inibe a expedição de
mandado de prisão decorrente da preservação ou estabelecimento de condenação
em grau de apelação, não havendo falar, em casos tais, em violação qualquer do
princípio constitucional da presunção de inocência.” (Fl. 65)
Também a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que a
interposição do recurso especial e/ou recurso extraordinário, porque desprovidos de
efeito suspensivo, não impede a prisão do condenado. Nesse rumo são expressivos os
precedentes: HC 80.939, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ de 13-9-02; HC 81.685, Rel. Min.
Néri da Silveira, DJ de 17-5-02; HC 77.128, Rel. Min. Nelson Jobim, DJ de 18-5-01.
Note-se que a Corte está reexaminando a constitucionalidade de exigência de
prisão para que o condenado possa apelar na Reclamação n. 2.391, que se encontra com
vista à Ministra Ellen Gracie.
Em meu voto, sustentei que a exigência de recolhimento à prisão para recorrer
viola os princípios constitucionais da não-culpabilidade, da dignidade da pessoa huma-
na, da proporcionalidade. Defendi que a necessidade da prisão, antes do trânsito em
julgado de sentença condenatória, há que embasar-se em decisão judicial devidamente
fundamentada em quaisquer das hipóteses previstas no art. 312 do Código de Processo
Penal.
Desse modo, na linha ainda assente do Supremo Tribunal Federal, não merece
prosperar o presente pleito, razão pela qual o meu voto é pelo indeferimento do writ.
R.T.J. — 195 249
VOTO
O Sr. Ministro Joaquim Barbosa: Senhor Presidente, acompanho o voto do emi-
nente Ministro Relator, embora faça uma ressalva do meu ponto de vista pessoal com
relação a essa hipótese específica, aquela em que o réu acompanha toda a instrução em
liberdade e só na fase do recurso especial ou extraordinário, no qual não há efeito
suspensivo, é expedido o mandado de prisão.
Tenho sérias ressalvas quanto a esse entendimento. No entanto, mantenho-me fiel
à jurisprudência ainda prevalecente na Corte.
EXTRATO DA ATA
HC 85.351/RO — Relator: Ministro Gilmar Mendes. Paciente: Lourival Claudino
ou Lorival Claudino. Impetrante: Carla Falcão Rodrigues (Advogados: Eder de Barros
Tavares e outros). Coator: Superior Tribunal de Justiça.
Decisão: A Turma, por votação unânime, indeferiu o pedido de habeas corpus, nos
termos do voto do Relator.
Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Carlos
Velloso, Ellen Gracie, Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa. Compareceu à Turma o Mi-
nistro Nelson Jobim, Presidente do Tribunal, a fim de julgar processo a ele vinculado,
assumindo, nesta ocasião, a Presidência da Turma, de acordo com o art. 148, parágrafo
único, RISTF. Subprocurador-Geral da República, Dr. Francisco Adalberto da Nóbrega.
Brasília, 31 de maio de 2005 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma
do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na
conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos,
deferir o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator.
Brasília, 17 de maio de 2005 — Sepúlveda Pertence, Presidente — Eros Grau,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Eros Grau: O paciente e outros foram denunciados como incursos
nas sanções do artigo 95, d, da Lei n. 8.212/91, c/c os artigos 29 e 71 do Código Penal —
apropriação indébita de contribuições previdenciárias descontadas dos empregados da
empresa Ibéria Indústria de Embalagens Ltda., da qual é sócio-gerente.
2. A denúncia foi recebida em 15-12-99. No curso da instrução criminal, parcela-
ram e pagaram espontaneamente os débitos.
3. Foram absolvidos em primeira instância, não por terem pago o débito apurado,
mas com esteio na ausência de dolo.
4. O TRF da 3ª Região deu provimento ao apelo do Ministério Público Federal,
condenando o paciente e outro a 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, mais 11
dias-multa, substituindo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direito:
prestação de serviços à comunidade e pecuniária, equivalente a 1 (um) salário mínimo
mensal destinado a entidade pública, a ser definida pelo Juiz da Execução Penal.
5. Impetrou, sem sucesso, habeas corpus no STJ, argumentando que o pagamento
da totalidade das contribuições implica a extinção da punibilidade, com base no artigo
9º, § 2º, da Lei n. 10.684/031, de aplicação retroativa, por se tratar de norma penal
benéfica.
1 Art. 9º É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos nos arts. 1º e 2º da
Lei 8.137/90, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168A e 337A do Decreto-Lei 2.848, de 7 de
dezembro de 1990 — Código Penal, durante o período em que a pessoa jurídica relacionada com o
agente dos aludidos crimes estiver incluída no regime de parcelamento.
(...)
§ 2º Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos neste artigo quando a pessoa jurídica relacionada
com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e contribuições sociais,
inclusive acessórios.
R.T.J. — 195 251
VOTO
O Sr. Ministro Eros Grau (Relator): Discordo da proposta do Ministério Público
Federal no sentido de sobrestar o feito até o julgamento da ADI n. 3.002, cujo objeto é a
inconstitucionalidade do artigo 9º da Lei n. 10.684/03. A ADI foi distribuída em 24-4-03
e não há sequer previsão para o seu julgamento. As leis nascem com presunção de
constitucionalidade. Não é razoável nem compreensível sobrestar HHCC que busquem
sanar constrangimento ilegal consubstanciado no ajuizamento de processo penal ou em
eventual condenação, após ser deferido o parcelamento e até mesmo a quitação do
débito previdenciário.
2. Leio a ementa do HC 35.331, do STJ:
“Penal e Processual Penal. Recurso especial (sic). Apropriação indébita de
contribuições previdenciárias. Aplicação do art. 9º, da Lei 10.684/2003. Impossi-
bilidade.
Não há que se cogitar na aplicação do benefício da suspensão da pretensão
punitiva do Estado, prevista no art. 9º, da Lei n. 10.684/2003, porquanto não
existe previsão legal para o parcelamento das contribuições descontadas dos em-
pregados (contribuição previdenciária), pelo contrário, há expressa vedação,
contida no art. 7º, da Lei n. 10.666/03, intenção essa corroborada quando do veto ao
§ 2º, do art. 5º, da Lei n. 10.684/2003. (Precedentes).
Habeas corpus denegado.”
3. Cumpre observar, de início, que o precedente invocado como embasamento
deste writ (HC n. 81.929), cuidou de caso diferente: o paciente daquela impetração foi
condenado pela prática do crime descrito no artigo 1º, I, da Lei n. 8.137/90, ao passo que
o crime imputado ao ora paciente é o tipificado no artigo 168A do Código Penal. Mas
há, no campo monocrático, precedente desta Corte, firmado no HC 85.273, em que o
Ministro Cezar Peluso acolheu alegações idênticas às desenvolvidos pelo impetrante do
presente habeas corpus.
4. A Lei n. 10.684/03, ao contrário das anteriores, inovou ao permitir o parcela-
mento e a quitação do débito após o recebimento da denúncia. No primeiro caso, dá-se
a suspensão da ação penal; no segundo, a extinção da punibilidade.
252 R.T.J. — 195
VOTO
O Sr. Ministro Cezar Peluso: Sr. Presidente, acompanho Vossa Excelência, até
porque a minha liminar no Habeas Corpus n. 85.273 foi exatamente nesse sentido.
EXTRATO DA ATA
HC 85.452/SP — Relator: Ministro Eros Grau. Paciente: Gonzalo Gallardo Diaz.
Impetrante: Helios Nogués Moyano. Coator: Superior Tribunal de Justiça.
Decisão: A Turma deferiu o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do
Relator. Unânime.
Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Ministros Marco
Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Subprocuradora-Geral da República, Dra.
Maria Caetana Cintra Santos.
Brasília, 17 de maio de 2005 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma
do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na
conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos,
deferir o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator.
Brasília, 22 de março de 2005 — Sepúlveda Pertence, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: O paciente foi condenado, em primeiro grau, à
pena de 16 anos de reclusão, e multa, por infração, em concurso material, dos arts. 157,
§ 2º, I, e 288, ambos do Código Penal.
Estes os fatos acertados na sentença (fls. 13/20):
“(...)
Na fase extrajudicial, o réu confessou a prática de diversos delitos patrimoniais.
Confirmou todos os fatos descritos na denúncia, detalhando a formação de quadrilha
e o roubo, praticado com os outros três agentes. Em Juízo alegou ter sido torturado
na Delegacia para confessar o crime, e que Beline e Osmar o acusam por divergên-
cias pessoais. Divergências tais, corridas em 1990.
As vítimas ouvidas em Juízo, em relatos precisos e uníssonos, descreveram o
roubo, praticado por quatro agentes, que entraram armados na residência e subtra-
íram praticamente todos os objetos que lá se encontravam.
O réu não foi reconhecido com absoluta certeza por nenhuma das vítimas.
Há que se ponderar, entretanto, que essas permaneceram trancadas em um cômodo
da casa, deitadas no chão, o que certamente fez por dificultar a visualização dos
roubadores. Marcelo dos Santos Beline foi reconhecido por três vítimas. Na fase
R.T.J. — 195 255
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Esta a ementa do HC 84.517, 1ª T., de
que fui Relator, DJ de19-11-04, deferido em favor do paciente para anular a condenação
que lhe fora imposta em outro processo:
“Ementa: I - Habeas corpus: cabimento: direito probatório.
Não cabe o habeas corpus para solver controvérsia de fato dependente da
ponderação de provas desencontradas; cabe, entretanto, para aferir a idoneidade
jurídica ou não das provas onde se fundou a decisão condenatória.
II - Chamada dos co-réus na fase policial e o reconhecimento de um deles:
inidoneidade para restabelecer a validade da confissão extrajudicial, retratada
em Juízo.
Não se pode restabelecer a validade da confissão extrajudicial, negando-se
valor à retratação, sob o fundamento de que esta é incompatível e discordante das
“demais provas colhidas” (Código de Processo Penal, art. 197), especialmente as
chamadas dos co-réus na fase policial e o reconhecimento de um deles, que de nada
servem para embasar a condenação do Paciente.
A chamada de co-réu, ainda que formalizada em Juízo, é inadmissível para
lastrear a condenação (Precedentes: HHCC 74.368, Pleno, Pertence, DJ de 28-11-
97; 81.172, 1ª T, Pertence, DJ de 7-3-03).
Insuficiência dos elementos restantes para fundamentar a condenação.
III - Nemo tenetur se detegere: direito ao silêncio.
Além de não ser obrigado a prestar esclarecimentos, o paciente possui o
direito de não ver interpretado contra ele o seu silêncio.
IV - Ordem concedida, para cassar a condenação.”
As conclusões, mutatis mutandis, se aplicam ao caso quanto ao delito de roubo: a)
o paciente retratou-se em Juízo; b) não foi reconhecido por nenhuma das vítimas; c)
restabeleceu-se a validade da confissão extrajudicial com fundamento na delação dos
co-réus e porque o paciente deixou de “dar versão hábil para o seu envolvimento nos
fatos”.
Resta observar os fundamentos lançados para embasar a condenação pelo delito
previsto no art. 288 do Código Penal.
No ponto, colhe-se da sentença:
258 R.T.J. — 195
“(...)
O investigador de polícia Ricardo Marques dos Santos asseverou que o
réu e os outros dois agentes eram criminosos conhecidos na região, e que
todos os finais de semana assaltavam residências, sempre com ameaças às
vítimas. São muitos os inquéritos, pelo que não se recordou especificamente
do caso descrito na denúncia. Fatos confirmados pela folha de antecedentes
do réu, que aponta diversos roubos praticados em curto prazo.
(...)
Por derradeiro, igualmente consumado o delito do art. 288 do Código
Penal. Provada a associação em caráter permanente e estável, porquanto os
agentes há muito vinham praticando roubos no litoral paulista. Este o teor da
confissão, corroborado pelos antecedentes certificados nos autos. (...) A con-
sumação deste delito antecedeu a prática do roubo descrito na denúncia, e
independe dos delitos subseqüentes.”
No mesmo sentido o acórdão da apelação, verbis:
“(...)
Com relação à quadrilha, na demonstração da sua permanência e habituali-
dade, há a narrativa do policial civil Ricardo, que identificou, claramente, que o
Apelante e outros dois agentes, nos finais de semana, praticavam roubos na região
e, como conseqüência, respondiam a inúmeros inquéritos policiais sobre tais fatos.
Os demais elementos aderiam à quadrilha na medida dos seus desejos, sem
desnaturá-la.
(...)”.
A conclusão de que houve o delito de quadrilha revela-se, pois, a partir de dois
elementos considerados convergentes: (a) o depoimento do policial Ricardo Marques
dos Santos; (b) a confissão extrajudicial do paciente, malgrado retratada em Juízo; e (c)
seus antecedentes.
Ainda que se entendesse possível restabelecer a validade da confissão pelo depoi-
mento do policial, a versão de fato deste extraída é que a associação para a prática de
crimes seria entre o paciente e “outros dois agentes”, nada mais.
A dicção do art. 288 do Código Penal, todavia, é expressa em que, para a configu-
ração do delito de quadrilha, se exige a associação de “mais de três pessoas” (v.g., HC
81.260, Pleno, Pertence, DJ de 19-4-02).
Certo, em tese, para a formação de uma quadrilha, seria possível que houvesse
adesão do 4º participante do roubo à vontade do paciente e dos “outros dois agentes”.
Este parece ser o entendimento das instâncias de mérito, conforme se colhe do
acórdão da apelação ao afirmar que “os demais elementos aderiam à quadrilha na
medida dos seus desejos, sem desnaturá-la”, entendendo-se por “demais elementos”
os três participantes do roubo.
Ocorre que nenhum dado de fato ampara referida ilação.
R.T.J. — 195 259
EXTRATO DA ATA
HC 85.457/SP — Relator: Ministro Sepúlveda Pertence. Paciente: Marcelo de Sousa
da Silva ou Marcelo Souza e Silva ou Marcelo de Souza da Silva ou Marcelo Souza Silva.
Impetrante: Marcelo de Sousa da Silva. Coator: Superior Tribunal de Justiça.
Decisão: A Turma deferiu o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do
Relator. Unânime. Ausente, justificadamente, o Ministro Eros Grau.
Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Ministros Marco
Aurélio, Cezar Peluso e Carlos Britto. Ausente, justificadamente, o Ministro Eros Grau.
Subprocuradora-Geral da República, Dra. Delza Curvello Rocha.
Brasília, 22 de março de 2005 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tri-
bunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos, deferir a ordem. Ausentes, justificadamente,
neste julgamento, os Ministros Celso de Mello, Presidente, e Ellen Gracie.
Brasília, 21 de junho de 2005 — Carlos Velloso, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Trata-se de habeas corpus impetrado em favor de
Natanael Cavalcante de Souza, do acórdão da 6ª Turma do Eg. Superior Tribunal de
Justiça que indeferiu pedido de habeas corpus (HC 25.274/SP), em acórdão assim
ementado:
“Habeas corpus. ECA. Roubo. Liberdade assistida. Substituição por inter-
nação sem prazo determinado. Possibilidade.
1. A disposição inserta no artigo 122 do Estatuto da Criança e do Adolescente
não exclui, por óbvio, a substituição da medida de semiliberdade pela de
internação, quando esta for a medida compatível com a situação do adolescente e
aquela, demonstradamente, insuficiente, como é da letra do artigo 99, combinado
com o artigo 113, do mesmo diploma legal.
2. A única exigência legal em casos tais é a de que o ato infracional, em
natureza, admita a medida de internação ou haja reiteração no cometimento de
outras infrações graves (ECA, artigo 122, incisos I e II).
3. Em se aplicando medida sócio-educativa diversa da internação, em razão
da prática de ato infracional que a comporta, nada impede, antes se faz imperativo,
que o magistrado, exigindo a situação do menor, substitua a medida menos
gravosa por aqueloutra permitida na lei.
4. Ordem denegada.” (Fl. 72)
Diz a impetração que o paciente, adolescente, em razão da prática de roubo com
uso de arma imprópria, foi inserido em medida de liberdade assistida e que, posterior-
mente, por ter sido apreendido por furto, recebeu, no juízo de conhecimento, a medida
de internação-sanção, com fundamento no art. 122, III, do ECA.
O Juiz do Departamento de Execuções, ao tomar conhecimento do incidente, de-
terminou a substituição da internação-sanção por internação por prazo indeterminado.
Afirma a impetração que o paciente não praticou novo ato infracional mediante
violência ou grave ameaça, nem reiterou, por isso alega que o paciente está sofrendo
constrangimento ilegal, porquanto a referida decisão, confirmada pelo Eg. Superior
Tribunal de Justiça, “violou o princípio da legalidade, uma vez que desconsiderou o
parágrafo primeiro do art. 122 do ECA, que estabelece que ‘o prazo de internação na
hipótese do inciso III deste artigo não poderá ser superior a três meses’ (fl. 06).
R.T.J. — 195 261
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Velloso (Relator): Em razão da prática de ato infracional
equiparado a roubo qualificado (CP, art. 157, § 2º, I e II), o Juízo da 3a Vara Especial da
Infância e Juventude de São Paulo proferiu sentença impondo ao paciente a medida
socioeducativa de liberdade assistida. Constou da decisão que “o descumprimento da
medida ora imposta implicará em internação-sanção do representado, independente-
mente de sua intimação pessoal” (fls. 31-33).
Durante o cumprimento da medida imposta, o paciente se envolveu em novo ato
infracional — furto, — apurado em outro processo perante o Juízo da 4a VEIJ (Processo
3655-2), do qual resultou medida de internação, por prazo determinado, até o dia 15 de
junho de 2002, quando então deveria retornar à medida anteriormente imposta, ou seja,
liberdade assistida (fl. 35).
Considerando esses fatos, no processo relativo ao primeiro ato infracional, o Juiz
de Direito do Departamento de Execução da Infância e Juventude de São Paulo, em 13-
6-2002, após ouvir o paciente, bem como o Ministério Público (fls. 36-37), substituiu a
internação-sanção por medida de internação por prazo indeterminado, em decisão assim
fundamentada (fls. 38-39):
“O ECA contempla as seguintes espécies de internação:
I – Internação-provisória do Processo de Conhecimento (artigo 183) com
prazo máximo de duração de 45 dias;
II – Internação por prazo indeterminado como medida sócio-educativa, aplica-
da pelo Juiz do Processo de Conhecimento e acompanhada pelo Juiz do Processo de
Execução;
III – Internação por prazo determinado (conhecida como internação-sanção)
com tempo de duração máxima de 3 meses, aplicada como medida precipuamente
punitiva pelo Juiz de Execução nas hipóteses previstas no artigo 122, III e § 1º;
262 R.T.J. — 195
“(...)
E esta, por sua vez, a letra dos artigos 99, 113 e 122 do Estatuto da Criança e
do Adolescente:
‘Art. 99. As medidas previstas neste Capítulo poderão ser aplicadas
isolada ou cumulativamente, bem como substituídas a qualquer tempo.’
‘Art. 113. Aplica-se a este Capítulo o disposto nos arts. 99 e 100.’
‘Art. 122. A medida de internação só poderá ser aplicada quando:
I - tratar-se de ato infracional cometido mediante grave ameça ou vio-
lência a pessoa;
II - por reiteração no cometimento de outras infrações grave;
III - por descumprimento reiterado e injustificável da medida anterior-
mente imposta.’
Tem-se assim, que o Estatuto da Criança e do Adolescente, ao disciplinar as
medidas sócio-educativas aplicáveis em função da prática de ato infracional, pre-
viu a sua substituição, em se mostrando inadequada à situação do adolescente a
que lhe foi inicialmente infligida.
A única exigência legal em casos tais, como tenho seguidamente decidido, é
a de que o ato infracional, em natureza, admita a medida de internação ou haja
reiteração no cometimento de outras infrações graves (ECA, artigo 122, incisos I e
II).
Em se aplicando, pois, medida sócio-educativa diversa da internação, em
razão da prática de ato infracional que a comporte, nada impede, antes se faz
imperativo, que o magistrado, assim o exigindo a situação do adolescente, substi-
tua a medida menos gravosa, que se mostra inadequada, por aqueloutra permitida
na lei.
In casu, a internação substitutiva do adolescente deu-se em razão da insuficiência
da medida sócio-educativa anteriormente imposta e por ajustada à natureza do ato
infracional - roubo.
Não têm incidência, na espécie, pois, o inciso III e o parágrafo 1º, do ECA, de
modo que a medida de internação, por ajustada à hipótese descrita no inciso I do
seu artigo 122, deve ser preservada.
A propósito, colha-se precedente desta Sexta Turma:
‘Habeas corpus. Estatuto da Criança e do Adolescente. Ato infracional.
Medida sócio-educativa de semiliberdade. Insuficiência. Substituição.
Internação. Oitiva do menor. Ausência de violação do devido processo le-
gal e da ampla defesa. Ordem denegada.
1. A disposição inserta no artigo 122 do Estatuto da Criança e do Ado-
lescente não exclui, por óbvio, a substituição da medida de semiliberdade
pela de internação, quando esta for a medida compatível com a situação do
adolescente e aquela, demonstradamente, insuficiente, como é da letra do
artigo 99, combinado com o artigo 113, do mesmo diploma legal.
264 R.T.J. — 195
3. É certo que o art. 101 admite outras medidas além das oito específicas, mas
da mesma natureza e mesmos objetivos, isto é, pedagógicas e que ‘visem ao for-
talecimento dos vínculos familiares e comunitários’, o que torna incabível a
determinação de internação, por constituir medida socioeducativa privativa da
liberdade e não medida específica de proteção.
4. Considera-se decisão ultra petita o acórdão que diante do requerimento
do representante do Ministério Público, objetivando a internação-sanção pelo
prazo de três meses (§ 1º do art. 122), entendeu de afastar a aplicação do art. 122, III,
e determinar, como incidente da execução, a regressão do adolescente ao regime
de internação que pode durar até três anos (§ 3º do art. 121).
5. Habeas corpus deferido.” (DJ de 16-5-97)
No mesmo sentido decidiu a Primeira Turma no julgamento do HC 84.603/SP, Rel.
Min. Sepúlveda Pertence, portando o acórdão a seguinte ementa:
“Ementa: 1. Descumprimento da medida socioeducativa aplicada pela prática
de ato infracional, em tese, não sujeito à medida de internação e cometimento de
novo ato infracional mediante grave ameaça ou violência à pessoa, apurado em
processo diverso: substituição da medida aplicada por outra de internação, com
fundamento no art. 113 do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90):
impossibilidade.
A prática de ato infracional ‘mediante grave ameaça ou violência a pessoa’
ou a reiteração ‘no cometimento de outras infrações graves’ (art. 122, I e II, respec-
tivamente), embora justifiquem, per si — após o procedimento de apuração do ato
infracional, com as garantias previstas —, a aplicação da medida de internação de
que trata o art. 121, não servem para fundamentar a substituição da medida já
aplicada pela de internação.
De outro lado, descumprida a medida de semiliberdade por uma única vez,
sequer caberia invocar a regressão prevista no art. 122, III, aplicável apenas às
hipóteses de ‘descumprimento reiterado e injustificado’.
Também não há falar em ‘internação-substituição’ com fundamento no art.
113 da 8.069/90, tendo em vista que a substituição — na linha da tese adotada no
HC 74.715, 2ª T., Maurício Corrêa, DJ de16-5-97 — somente é aplicável quanto
às medidas específicas de proteção (arts. 101 e 112, VII).
2. Ordem deferida.” (DJ de 3-12-2004)
Conforme salientou o eminente Min. Cezar Peluzo, no julgamento do HC
84.682/SP, a internação é medida excepcional e, como tal, deve ser aplicada nos casos
específicos do art. 122 do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Do exposto, defiro a ordem, para restabelecer a medida de semiliberdade.
VOTO
O Sr. Ministro Joaquim Barbosa: Senhor Presidente, acompanho o voto de Vossa
Excelência. Acho, também, que o caso não se ajusta ao art. 122.
266 R.T.J. — 195
EXTRATO DA ATA
HC 85.503/SP — Relator: Ministro Carlos Velloso. Paciente: Natanael Cavalcante
de Souza. Impetrante: PGE/SP — Patrícia Helena Massa Arzabe (Assistência Judiciária).
Coator: Superior Tribunal de Justiça.
Decisão: Deferiu-se a ordem, decisão unânime. Falou, pelo paciente, a Dra. Patrícia
Helena Massa Arzabe. Ausentes, justificadamente, neste julgamento, os Ministros Celso
de Mello e Ellen Gracie. Presidiu, este julgamento, o Ministro Carlos Velloso.
Presidência do Ministro Carlos Velloso. Presentes à sessão os Ministros Gilmar
Mendes e Joaquim Barbosa. Ausentes, justificadamente, os Ministros Celso de Mello
e Ellen Gracie. Subprocuradora-Geral da República, Dra. Sandra Verônica Cureau.
Brasília, 21 de junho de 2005 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribu-
nal Federal, em Segunda Turma, sob a Presidência do Ministro Carlos Velloso, na con-
formidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos,
indeferir a ordem.
Brasília, 7 de junho de 2005 — Carlos Velloso, Presidente — Ellen Gracie, Relatora.
R.T.J. — 195 267
RELATÓRIO
A Sra. Ministra Ellen Gracie: Os pacientes, condenados por crimes de estupro e
atentado violento ao pudor, em concurso material, reiteram, neste habeas corpus substi-
tutivo de recurso ordinário não interposto, os mesmos temas veiculados no writ indefe-
rido no Superior Tribunal de Justiça (fls. 240/251): falta de motivação das decisões
condenatórias e atipicidade de conduta; ilegitimidade do Ministério Público para inten-
tar a ação penal, em face da ausência de representação da vítima e do atestado de pobreza;
impossibilidade da expedição de mandados de prisão, dado que a sentença condicionara
a ordem de prisão ao trânsito em julgado. A liminar foi indeferida (fls. 228/229), tendo o
ilustre Subprocurador-Geral da República, Edson Oliveira de Almeida, opinado pela
denegação da ordem (fls. 264/268).
É o relatório.
VOTO
A Sra. Ministra Ellen Gracie (Relatora): A primeira questão suscitada no habeas
corpus — falta de motivação das decisões condenatórias e atipicidade de conduta — foi
acertadamente repelida pelo Superior Tribunal de Justiça, porque, na verdade, identifica
pretensão de reexame inadmissível de prova no âmbito de habeas corpus. A conclusão
soberana das instâncias ordinárias na apreciação do conjunto probatório impossibilita
que esse juízo de valor seja revisto pelas instâncias especial ou extraordinária. Os fatos
criminosos, como costuma acontecer nos delitos sexuais, não tiveram testemunhas pre-
senciais. As instâncias ordinárias, portanto, apreciaram o conjunto probatório, avalian-
do e ponderando a versão dos réus — um deles não nega ter praticado com a ofendida
conjunção carnal e coito anal, como relatado na inicial deste habeas corpus (fl. 05) — e
a palavra da vítima, bem como as circunstâncias anteriores e posteriores à agressão. Não
se pode, portanto, cogitar de condenação desmotivada ou de conduta atípica. No tocante
à suposta ilegitimidade do Ministério Público, reporto-me à manifestação do Tribunal
de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul no julgamento da apelação: “A ofendida,
Verá Lúcia, de 21 anos de idade, vai até à autoridade policial no dia 30-1-92 (o crime
ocorreu no dia 29-1-92 — fl. 4l), quando narra o acontecido, fl. 10. Tal narrar e pedido
de providências valem por representação. De banda outra, a ofendida é auxiliar de
cozinha, presumindo-se sua pobreza, que não foi desmentida no decorrer do processo”
(fl. 82). Nesse particular, o parecer do Ministério Público Federal lembra precedente
desta Corte:
“I - Miserabilidade da vítima. A pobreza pode ser demonstrada pelos meios
de prova em geral. Miserabilidade aceita, no curso da ação penal, como fato notó-
rio diante das circunstâncias.
II - Caracterizada nos autos, a manifestação de vontade do ofendido, no
sentido de ser o ofensor processado, o que se deduz de suas declarações prestadas
na polícia e em juízo, está satisfeita a exigência da representação.” (HC 68.794,
Carlos Velloso — fl. 268)
268 R.T.J. — 195
EXTRATO DA ATA
HC 85.556/RS — Relatora: Ministra Ellen Gracie. Pacientes: Lucas Bellarmino da
Silva ou Lucas Belarmino da Silva e Vanderlei dos Santos. Impetrantes: Lucas Bellarmi-
no da Silva e outro (Advogado: Francisco de Assis Maia). Coator: Superior Tribunal de
Justiça.
Decisão: Indeferiu-se a ordem, decisão unânime. Ausentes, justificadamente, neste
julgamento, os Ministros Celso de Mello e Gilmar Mendes. Presidiu este julgamento o
Ministro Carlos Velloso.
Presidência do Ministro Carlos Velloso. Presentes à sessão os Ministros Ellen Gracie
e Joaquim Barbosa. Ausentes, justificadamente, os Ministros Celso de Mello e Gilmar
Mendes. Subprocurador-Geral da República, Dr.Haroldo Ferraz da Nóbrega.
Brasília, 7 de junho de 2005 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tri-
bunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos, indeferir a ordem, nos termos do voto do
Relator. Ausentes, justificadamente, neste julgamento, os Ministros Gilmar Mendes e
Celso de Mello, Presidente.
Brasília, 7 de junho de 2005 — Carlos Velloso, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Trata-se de habeas corpus, impetrado em favor de
Sérgio Thomas da Silva, da decisão da 5ª Turma do Eg. Superior Tribunal de Justiça
que indeferiu pedido de habeas corpus, em acórdão assim ementado (HC 35.202/RJ):
“Ementa: habeas corpus. Crime hediondo. Regime prisional. Progressão.
Descabimento. Lei 8.072/90, art. 2º, § 1º.
Nos chamados crimes hediondos, o regime previsto é o fechado, descabendo
progressão (art. 2º, § 1º, da Lei 8.072/90).
Fixando a sentença condenatória que o cumprimento da pena dar-se-á em
regime fechado, não é concebível que seja apenas inicialmente, mas, sim, atendo-
se ao preceito de lei, integralmente.
Quisesse o magistrado prolator da sentença condenatória admitir a progres-
são de regime, teria fixado o regime inicial fechado, o que não ocorreu.
Ordem denegada.” (Fl. 54)
Alega a impetração que o paciente, condenado à pena de 28 (vinte e oito) anos e 8
(oito) meses de reclusão, em regime fechado, como incurso no art. 157, § 2º, I e II, c/c o
art. 29 e o art. 157, § 3º, in fine, c/c os arts. 29 e 71, todos do Código Penal, está sofrendo
constrangimento ilegal, porque a omissão do advérbio “integralmente” na sentença
condenatória, transitada em julgado, possibilitaria a progressão do regime.
270 R.T.J. — 195
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Velloso (Relator): Postula o impetrante a concessão da or-
dem para que seja assegurado ao paciente, condenado por crime hediondo, o direito à
progressão de regime prisional. Alega que a omissão do advérbio “integralmente” na
sentença condenatória, transitada em julgado, possibilitaria a progressão do regime.
O writ é de ser indeferido. É que a jurisprudência do Supremo Tribunal firmou-se
no sentido de considerar irrelevante a omissão do advérbio “integralmente”, quando do
contexto da sentença se extrai que a progressão não foi deferida. Veja-se, a propósito, o
acórdão proferido pela Primeira Turma quando do julgamento do HC 78.976/RJ, Rel.
Min. Ilmar Galvão:
“Ementa: habeas corpus. Crime hediondo. Lei n. 8.072/90. Progressão de
regime da pena.
Em relação aos crimes hediondos, por força de disposição legal, a pena deve
ser cumprida necessariamente em regime fechado. O fato de a sentença não se
haver referido à expressão ‘integralmente’ não significa que tenha assegurado a
progressividade do regime da pena.
Habeas corpus indeferido.” (DJ de 18-6-99)
No caso, verifica-se da sentença de fls. 8-15, que o d. magistrado, embora não tenha
se referido à expressão “integralmente”, fez expressa menção à Lei 8.072/90. Assim, não
há dúvida de que a progressão do regime não foi assegurada ao paciente.
Acrescente-se, ademais, que, até que o Plenário do Supremo Tribunal Federal jul-
gue, definitivamente, o HC 82.959/SP, prevalece a jurisprudência da Casa no sentido de
que a pena por crime previsto no art. 2º, § 1º, da Lei n. 8.072/90, deverá ser cumprida em
regime fechado. No HC 76.991/MG, de que fui Relator, decidiu esta Turma:
“Ementa: Penal. Processual Penal. Habeas corpus. Estupro. Crime hediondo.
Regime fechado. Lei n. 8.072/90, art. 2º, § 1º.
I - A pena por crime previsto no art. 2º, § 1º, da Lei n. 8.072/90 (crime hedion-
do) deverá ser cumprida em regime fechado. Precedentes do STF.
II - HC indeferido.” (DJ de 14-8-98)
Não foi outro o decidido pelo Supremo Tribunal, pelo seu Plenário, no HC
69.657/SP, Rel. Min. Francisco Rezek, ficando assim ementado o acórdão:
R.T.J. — 195 271
EXTRATO DA ATA
HC 85.585/RJ — Relator: Ministro Carlos Velloso. Paciente: Sergio Thomas da
Silva. Impetrante: Defensoria Pública da União – DPU. Coator: Superior Tribunal de
Justiça.
Decisão: Indeferiu-se a ordem, decisão unânime. Ausentes, justificadamente, neste
julgamento, os Ministros Celso de Mello e Gilmar Mendes. Presidiu este julgamento o
Ministro Carlos Velloso.
Presidência do Ministro Carlos Velloso. Presentes à sessão os Ministros Ellen
Gracie e Joaquim Barbosa. Ausentes, justificadamente, os Ministros Celso de Mello e
Gilmar Mendes. Subprocurador-Geral da República, Dr. Haroldo Ferraz da Nóbrega.
Brasília, 7 de junho de 2005 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribu-
nal Federal, em Segunda Turma, sob a Presidência do Ministro Carlos Velloso (RISTF,
art. 37, II), na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimi-
dade de votos, indeferir a ordem.
Brasília, 21 de junho de 2005 — Carlos Velloso, Presidente — Gilmar Mendes,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Gilmar Mendes: O Parecer elaborado pela eminente Dra. Delza
Curvello Rocha, Subprocuradora-Geral da República, assim relata o caso (fls. 31-32):
Cuida-se de habeas corpus substitutivo, com pedido liminar, impetrado em
favor de Rogério Dias dos Santos, contra ato da Exma. Sra. Ministra Laurita Vaz,
do C. Superior Tribunal de Justiça, Relatora do Habeas Corpus n. 36.672/SP, por
não submeter o feito a julgamento.
Aduz o impetrante, que o aludido writ foi protocolado em 02.07.2004, inicial-
mente distribuído ao ilustre Ministro Edson Vidigal e, posteriormente, à Ministra
Laurita Vaz, teve seu pedido liminar indeferido em 05.07.2004, pelo Ministro
Edson Vidigal.
Esclarece, ainda, que:
“(...)
‘Transcorridos mais de 8 (oito) meses da negativa da liminar, sendo que
há quase 4 (quatro) meses, ainda, encontra-se aguardando despacho da Min.
Rel. Laurita Vaz, portanto, evidente o descaso com o cárcere alheio.
(...)
‘Para reforçar a tese da defesa e a imagem da Justiça, menciona-se a
Reforma do Judiciário, por meio da Emenda Constitucional n. 45/2004, inse-
rindo o Constituinte, nos Direitos e Garantias Fundamentais, o ignorado e
rechaçado Princípio da Celeridade Processual, no inciso LXXVIII artigo 5º
da Constituição Federal...
‘(...) o Paciente é primário, tem residência fixa, é trabalhador e de famí-
lia tradicional na cidade de Rincão, e está preso desde 05 de agosto de 2003,
após efetivamente colaborar, como testemunha, em todas as diligências poli-
ciais. E a fase de alegações finais no Juízo a quo, objeto de discussão no STJ,
R.T.J. — 195 273
VOTO
O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Relator): O Ministério Público Federal manifesta-se
nos seguintes termos (fls. 33/34):
“Sem razão o impetrante.
Consta dos autos, que a denúncia contra o ora paciente e 06 (seis) co-réus foi
recebida em 06.08.2003, narrando fato ocorrido em 18.07.2003, que configura, em
tese, infringência ao disposto nos termos dos arts. 288; 180, § 1º; 29 (quatro vezes)
c/c o art. 69, todos do Código Penal e art. 10, caput, da Lei n. 9.437/97. Em
13.08.03 foi dado integral cumprimento à mandado de prisão expedido em
desfavor do paciente, razão pela qual encontra-se preso preventivamente, estando
o processo em fase de alegações finais. (Fl. 13)
Considerando que as infrações imputadas ao paciente — possuir, deter, por-
tar, fabricar, adquirir, vender, alugar, expor à venda ou fornecer, receber, ter em
depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empre-
gar, manter sob guarda e ocultar arma de fogo, de uso permitido, sem a autorização
e em desacordo com determinação legal ou regulamentar; receptação qualificada;
quadrilha ou bando; em concurso material — ensejaram a expedição do competente
mandado de prisão, devidamente cumprido, sem que o impetrante se insurgisse
contra os fundamentos deste, não há que se falar em excesso de prazo, sendo que as
providências cabíveis estão sendo adotadas pelo Poder Judiciário, para que se
apure a veracidade das gravíssimas condutas acima tipificadas, e possa ser efetiva-
da a legítima prestação jurisdicional.
Demais disso, no caso sub examine, não se pode adiantar esta Suprema Corte
à apreciação de Habeas Corpus, cuja liminar restou indeferida pelo C. Superior
Tribunal de Justiça, a um por configurar supressão de instância, e a dois pelo óbice
contido na Súmula 691/STF, qual seja:
274 R.T.J. — 195
EXTRATO DA ATA
HC 85.670/SP — Relator: Ministro Gilmar Mendes. Paciente: Rogério Dias dos
Santos. Impetrantes: Régis Galino e outro. Coatora: Relatora do HC n. 36.672 do Superior
Tribunal de Justiça.
Decisão: Indeferiu-se a ordem, decisão unânime. Ausentes, justificadamente, neste
julgamento, os Ministros Celso de Mello e Ellen Gracie. Presidiu este julgamento o
Ministro Carlos Velloso.
Presidência do Ministro Carlos Velloso. Presentes à sessão os Ministros Gilmar
Mendes e Joaquim Barbosa. Ausentes, justificadamente, os Ministros Celso de Mello
e Ellen Gracie. Subprocuradora-Geral da República, Dra. Sandra Verônica Cureau.
Brasília, 21 de junho de 2005 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma
do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na
conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos,
indeferir o pedido de habeas corpus.
Brasília, 31 de maio de 2005 — Sepúlveda Pertence, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: O paciente foi condenado à pena de 6 anos e
oito meses de reclusão, pela prática do delito de associação para o tráfico internacional
de entorpecentes (Lei 6.368/76, art. 14, na forma do art. 18, I).
Para fixar a pena do paciente, aduziu o Juiz (fl. 31):
“Os réus Olimpio Ludovico Bastos Neto, Eduardo Solano Fernandez,
Benedicto Torres Hernandez agiram com considerável grau de culpabilidade e em
proporção. Eram os cabeças da operação aqui no Brasil, responsáveis por todo o
suporte indispensável por todo o transporte da carga ilícita; não foram juntados
aos autos antecedentes criminais em nome dos acusados; não se dispõe também de
elementos suficientes à aferição de suas condutas sociais e personalidades, salvo
no que diz respeito a Eduardo Solano, que se mostrou mais audacioso, tendo
276 R.T.J. — 195
inclusive feito ameaças de uma greve de fome para impressionar o Juízo acerca de
sua suposta inocência: os motivos estão relacionados à perspectiva de ganho fácil
e rápido, sabendo-se que o tráfico ilícito de entorpecentes é um negócio altamente
lucrativo, as circunstâncias não destoam da conduta normal ao tipo, uma vez que
os traficantes se valem de todos os expedientes possíveis par alcançarem o seu
intento; as consequências, visto que a operação foi abortada antes que a droga
fosse embargada, não foram graves.
Em face da edição da Lei que define os crimes hediondos (Lei n. 8.082/90) e
na esteira de jurisprudência do STF (HC 72.862-6 – Rel. Néri da Silveira, DOU
25.10.1996, HC 73.119-8 – Rel. Carlos Velloso, RT 733/498), tomo por base a
pena prevista no seu art. 8º, para considerar como suficiente e necessária à repres-
são e prevenção do delito a pena-base de 4 (quatro) anos de reclusão para Olimpio
Ludovico, Eduardo Solano e Benedicto Hernandez, que, à míngua de atenuantes e
majorantes, elevo de 2/3 (dois terços), em face da causa de aumento do art. 18, I, da
lei de entorpecentes, tornando definitiva a pena em 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de
reclusão.”
(...)
“Estabeleço o regime integralmente fechado para cumprimento das penas”.
(...)
“Conservem-se os réus recolhidos ao cárcere (art. 393, I, do CPP).”
O paciente interpôs apelação, ainda pendente de julgamento no Tribunal Regional
Federal da 1ª Região (Apelação Criminal 2003.39.00.007342-6), conforme se extrai do
sítio do TRF1 na Internet (www.trf1.gov.br).
Impetrou habeas corpus àquele mesmo Tribunal. Alegou falta de fundamentação
da sentença quanto ao paciente poder apelar em liberdade (CF, art. 93, IX); violação à
garantia da individualização da pena e ao princípio da reserva legal, por ter sido a pena
definitiva do paciente (6 anos e 8 meses) fixada acima das margens legais escolhidas
pelo legislador (3 a 6 anos — Lei 8.072/90, art. 8º); e, em conseqüência, incorreção do
regime de cumprimento fixado. A ordem foi denegada, verbis (fl. 45):
“1. Tendo o paciente sido mantido preso preventivamente durante toda a
instrução processual, a manutenção da prisão para apelar é efeito da sentença
condenatória. Precedentes do eg. Superior Tribunal de Justiça.
2. O habeas corpus não é substitutivo do recurso de apelação, uma vez que a
apelação é que devolve ao tribunal o conhecimento amplo de toda a matéria dos
autos, permitindo a reapreciação de fatos e provas, além da possibilidade de
eventualmente se divergir dos fundamentos da sentença condenatória. Precedentes
desta Corte Regional Federal.
3. Somente se apresenta possível a anulação de processo penal, em sede de
habeas corpus, no caso de manifesta ilegalidade, verificável de plano, de forma
clara e incontroversa, o que não é o caso dos presentes autos, uma vez que a
R.T.J. — 195 277
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator):
I
EXTRATO DA ATA
HC 85.673/PA — Relator: Ministro Sepúlveda Pertence. Paciente: Olimpio Ludovico
Bastos Neto. Impetrante: Ney Gonçalves de Mendonça Júnior. Coator: Superior Tribunal de
Justiça.
Decisão: A Turma indeferiu o pedido de habeas corpus. Unânime.
Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Ministros Marco
Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Subprocurador-Geral da República, Dr.
Eitel Santiago de Brito Pereira.
Brasília, 31 de maio de 2005 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.
1 V.g., SILVA FRANCO. C.Pen. e sua Interpr. Jurisprudencial, ed. RT, 7. ed, I/1246; DELMANTO,
C.Pen. Comentado, 6. ed, Renovar, p. 136; NUCCI, Guilherme. C.Pen. Comentado, 5. ed, RT, p. 362;
PRADO, Luiz Régis. Comentários ao C. Pen., RT, 2. ed, p. 332; fica a exceção por conta de
BITTENCOURT, César. Tratado de Dir. Penal, Saraiva, I/559.
STJ, RHC 2.816, Cernichiaro, DJ de 22-11-93;
R.T.J. — 195 281
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tri-
bunal Federal, em Primeira Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos, negar provimento ao agravo.
Brasília, 23 de abril de 1996 — Moreira Alves, Presidente — Celso de Mello,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Celso de Mello: Trata-se de recurso de agravo, tempestivamente
interposto, contra decisão que desacolheu agravo de instrumento deduzido pela parte
ora recorrente.
A decisão agravada, invocando o conteúdo da Súmula 288 desta Corte, reconhe-
ceu imprescindível a existência, no traslado, da certidão comprobatória da plena tem-
pestividade do recurso extraordinário que, interposto pela parte agravante, deixou de ser
admitido pela Presidência do Tribunal a quo.
Inconformada com esse ato decisório, interpõe a parte ora agravante a presente
manifestação recursal, sob a alegação de ofensa ao princípio constitucional da lega-
lidade.
Sustenta, ainda, quanto à aplicação da exigência, como peça de traslado obrigató-
rio, da certidão comprobatória da tempestividade do recurso extraordinário (Súmula
288/STF), que “com a edição de tal Resolução, ou mesmo Súmula contendo semelhante
exigência, parece ter-se degradado para instância juridicamente inadequada o poder
de regulação concernente a categoria temática — a criação de exigência tipicamente
processual quanto aos elementos essenciais à instrução do recurso — que se acha
submetida, em razão de sua própria matéria, ao postulado constitucional da reserva
absoluta de lei em sentido formal” (fl. 64).
Por não me convencer das razões expostas, submeto, à apreciação desta Colenda
Turma, o presente recurso de agravo.
É o relatório.
R.T.J. — 195 283
VOTO
O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): Não assiste razão à parte ora recorrente,
eis que esta, descumprindo obrigação processual que lhe incumbia, não providen-
ciou a inclusão, no traslado, da prova necessária concernente à demonstração da
tempestiva interposição do recurso extraordinário que por ela foi manifestado perante
o Tribunal a quo.
A jurisprudência de ambas as Turmas do Supremo Tribunal Federal, tal como
enfatizei na decisão ora agravada, tem acentuado que se revela incompleto o traslado
a que falte peça comprobatória da oportuna interposição do apelo extremo deduzido
pelos agravantes, eis que esse elemento documental — por referir-se à própria tempes-
tividade da impugnação recursal — reveste-se de essencialidade na definição desse
significativo pressuposto, de índole objetiva, inerente a qualquer recurso, especial-
mente ao recurso extraordinário (RTJ 131/1403, Rel. Min. Celso de Mello):
“A prova da oportuna interposição do recurso extraordinário, cujo proces-
samento deixou de ser admitido na instância a quo, deve ser necessariamente
produzida pelo agravante quando da formação do traslado. Trata-se de peça es-
sencial à definição de um dos pressupostos recursais objetivos de maior significa-
ção: a própria tempestividade do apelo extremo.”
(RTJ 132/1345, Rel. Min. Celso de Mello, Primeira Turma)
“Agravo regimental em agravo de instrumento. Extempestividade do
recurso extraordinário. Deficiência do traslado, Súmula 288.
(...)
O traslado da certidão de publicação do acórdão recorrido é peça impres-
cindível à compreensão da controvérsia acerca da tempestividade do recurso ex-
traordinário, Súmula 288.
Agravo regimental não provido.”
(AI 146.704-AgR/RS, Rel. Min. Paulo Brossard, Segunda Turma — grifei)
Impõe-se ressaltar que o agravo de instrumento interposto contra ato veiculador
do juízo negativo de admissibilidade do apelo extremo tem por finalidade, por única
finalidade, viabilizar a aferição, por esta Suprema Corte, das condições de admissibili-
dade do recurso extraordinário, exaurindo-se, em conseqüência, no exame exclusivo
desses requisitos mínimos, a específica função jurídico-processual para a qual foi aquele
recurso concebido. Daí a precisa observação feita pelo eminente Ministro Sepúlveda
Pertence que, na condição de Relator, fez consignar, em decisão monocrática, que “(...)
o agravo de instrumento contra a denegação de recurso extraordinário só devolve ao
STF a questão de admissibilidade deste” (Pet 944/SP).
Na realidade, o thema decidendum que se projeta na apreciação do agravo de
instrumento concerne, especificamente, à análise dos fundamentos — efetivamente
deduzidos ou potencialmente invocáveis — em que se apóia o juízo negativo de admis-
sibilidade que incidiu sobre o recurso extraordinário manifestado pela parte agravante,
284 R.T.J. — 195
tanto que a tal recorrente se impõe o dever de questionar, em sede de agravo, não o
conteúdo do acórdão impugnado pela via do apelo extremo, mas, exclusivamente, as
razões impeditivas do trânsito e do processamento dessa modalidade de impugnação
excepcional (RTJ 126/864, Rel. Min. Francisco Rezek — RTJ 133/485, Rel. Min. Célio
Borja).
Note-se, pois, que o agravo de instrumento, na hipótese de recusa de processamento
do recurso extraordinário, possui conteúdo temático próprio e específico, de tal modo
que nele se justifica o exercício, pelo Supremo Tribunal Federal, do seu incontrastável
poder de verificação dos pressupostos — de todos os pressupostos — inerentes ao apelo
extremo, dentre os quais avulta, por sua extrema relevância, aquele concernente ao
requisito da tempestividade, ainda que não invocado por qualquer dos sujeitos da
relação processual.
O controle da tempestividade do apelo extremo — precisamente por constituir
pressuposto recursal de ordem pública — revela-se matéria suscetível, até mesmo, de
conhecimento ex officio por este Tribunal, independendo, em conseqüência, de qual-
quer formal provocação dos sujeitos que intervêm no procedimento recursal (Nelson
Nery Júnior, “Princípios Fundamentais — Teoria Geral dos Recursos”, p. 52, 1990,
RT; José Carlos Barbosa Moreira, Comentários ao Código de Processo Civil, vol.
V/235, item n. 146, 6ª ed., 1993, Forense).
Essa é a razão pela qual o traslado deve também consubstanciar a demonstração
inequívoca da plena tempestividade do recurso extraordinário, eis que é ao processa-
mento do apelo extremo — devidamente satisfeitos todos os pressupostos inerentes à
sua admissibilidade — que se destina, em última análise, a utilização do agravo de
instrumento.
Não se pode desconsiderar, na perspectiva da finalidade para a qual se acha voca-
cionado o agravo de instrumento — interponível contra decisão que nega trânsito ao
recurso extraordinário —, que o juízo de admissibilidade manifestado pela Presidência
do Tribunal a quo, qualquer que seja o seu conteúdo, reveste-se de caráter preliminar,
qualificando-se, em conseqüência, como ato jurisdicional meramente provisório e ins-
tável, posto que sujeito, sempre, à confirmação ulterior do Supremo Tribunal Federal,
que poderá, por isso mesmo, reconhecer inexistentes determinados requisitos conside-
rados satisfeitos, ainda que implicitamente, pelo órgão judiciário que efetuou, num
primeiro momento, o controle de admissibilidade do apelo extremo.
Torna-se necessário proclamar, desse modo, que o juízo de admissibilidade —
seja ele positivo ou negativo — jamais importará em preclusão da faculdade processual,
que assiste ao Tribunal ad quem (ao Supremo Tribunal Federal, no caso), de reapreciar, em
toda a sua extensão, a ocorrência, ou não, dos pressupostos legitimadores da interpo-
sição do recurso extraordinário.
Daí a necessidade de a parte agravante instruir, sempre, o traslado com cópia da
certidão de publicação do acórdão recorrido, a fim de, com essa peça essencial à análise
de um dos requisitos de admissibilidade do recurso extraordinário, viabilizar o controle,
pelo Supremo Tribunal Federal, do pressuposto legal da tempestividade inerente ao
apelo extremo.
R.T.J. — 195 285
EXTRATO DA ATA
AI 179.560-AgR/RJ — Relator: Ministro Celso de Mello. Agravantes: Realco
Comércio de Alimentos S.A. e outros (Advogados: Pio Perez Pereira e outros). Agravado:
Estado do Rio de Janeiro (Advogado: Marcelo Mello Martins).
Decisão: A Turma negou provimento ao agravo. Unânime.
Presidência do Ministro Moreira Alves. Presentes à sessão os Ministros Sydney
Sanches, Octavio Gallotti, Celso de Mello e Ilmar Galvão. Subprocurador-Geral da
República, Dr. Flavio Giron.
Brasília, 23 de abril de 1996 — Ricardo Dias Duarte, Secretário.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma
do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na
conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos,
não conhecer do recurso extraordinário.
Brasília, 16 de agosto de 2005 — Sepúlveda Pertence, Presidente e Relator.
R.T.J. — 195 289
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: RE, a, que alega violação dos arts. 40,§§ 4º e
5º, XXXVI, da Constituição, contra acórdão que concluiu ser possível a extensão, a
servidores aposentados do Estado de São Paulo, do adicional de magistério previsto no
art. 54 da LC estadual 444/85, na redação dada pelo art. 3º da LC 645, de 27-12-89, bem
como do adicional de 5%, nos termos do art. 4º das Disposições Transitórias desta.
Sustenta o Estado recorrente, em suma, que, em se tratando de vantagem condi-
cionada ao exercício das atividades de magistério, não incidiria, na espécie, a regra do
art. 40, § 4º, da Constituição. Alega, por outro lado, que, ao aplicar a lei aos servidores
aposentados — os quais, anteriormente à edição de referidas leis, já haviam sido avalia-
dos pelos critérios legais então vigentes e beneficiados com as promoções daí decorren-
tes, inclusive para efeito de enquadramento na LC 645/89 —, deu-lhe o acórdão eficácia
retroativa, ofendendo o art. 5º, XXXVI, da Constituição.
A Procuradoria-Geral da República manifestou-se, com parecer do Subprocurador-
Geral Roberto Gurgel, pelo provimento do recurso (fls. 338/339), reportando-se às deci-
sões proferidas nos RREE 134.578, 174.529, 194.456 (Ilmar Galvão) e no Ag 180.722
(Maurício Corrêa).
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Embora venha sendo acolhida na
Corte a tese sustentada pelo Estado no tocante ao art. 40, § 4º, CF (v.g., RE 195.159,
Gallotti, DJ de 23-5-97; RE 191.562, Galvão, DJ de 2-5-97; RE 199.573, Velloso, DJ de
11-4-97; RE 194.181, M. Aurélio, DJ de 16-5-97), não se viabiliza, na espécie, o conhe-
cimento do RE sob esse fundamento. É que, para deferir a extensão da vantagem aos
aposentados, o acórdão recorrido não se fundou apenas no preceito constitucional:
baseou-se, principalmente, na LC paulista 645/89, cujo art. 3º alterou a redação do art.
54, da LC 444/85, bem como do art. 5º da mesma LC 645/89 e do art. 4º de suas Dispo-
sições Transitórias.
Assim, ainda que se reconhecesse a existência de contrariedade ao mencionado art.
40, § 4º, da Constituição, a decisão recorrida subsistiria — na parte em que estendeu o
benefício aos inativos — pelo fundamento de direito local, a cujo reexame o recurso
extraordinário não se presta (Súmula 280).
No ponto, portanto, o RE não comporta conhecimento.
Resta o exame da matéria concernente ao art. 5º, XXXVI, da Constituição, cuja
ofensa decorreria do fato de o acórdão ter permitido a retroação dos efeitos da Lei 645/89
em favor de servidores inativos.
Tenho que, nesta parte, assiste razão ao Estado.
Com efeito. Mesmo que o art. 5º da LC 645/89 houvesse determinado a aplicação
da lei aos inativos, como decidido pelo Tribunal de origem, essa aplicação só poderia
ocorrer nos termos da própria lei, isto é, tomando por base o tempo de exercício em
290 R.T.J. — 195
VOTO
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor Presidente, aposentados ingressaram em
juízo para terem tratamento análogo em relação a certa gratificação adicional de magis-
tério e o fizeram a partir do disposto na Lei Complementar n. 645, do Estado de São
Paulo, de 27 de dezembro de 1989.
Pleitearam, na inicial, as diferenças a partir da vigência dessa lei, 1º de janeiro
imediato. A Corte de origem, o Tribunal de Justiça, reconheceu o direito com base na
letra expressa da Lei Complementar n. 645/89, no que estendida a vantagem aos inati-
vos, evocando o § 4º do artigo 126 da Constituição estadual — o acórdão é do desembar-
R.T.J. — 195 291
EXTRATO DA ATA
RE 208.156/SP — Relator: Ministro Sepúlveda Pertence. Recorrente: Estado de
São Paulo (Advogada: PGE/SP – Renata Vasconcellos Simões). Recorrido: Deogenir de
Oliveira e outro (Advogado: Franz Artur Wifer dias e outro).
Decisão: Após os votos do Ministro Sepúlveda Pertence, Relator, conhecendo e
dando provimento ao recurso extraordinário, e do Ministro Marco Aurélio, dele não
conhecendo, o julgamento foi adiado por proposta do Relator.
Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Ministros Marco
Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Joaquim Barbosa Compareceu a Ministra Ellen
Gracie a fim de julgar processo a ela vinculado. Subprocuradora-Geral da República,
Dra. Maria Caetana Cintra Santos.
Brasília, 6 de abril de 2004 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.
VOTO (Retificação)
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence (Relator): Após o voto do em. Ministro Marco
Aurélio, que não conhece do recurso extraordinário por entender que no caso não haveria
questão de direito intertemporal, pedi o adiamento do julgamento para melhor refletir
sobre o caso.
O pedido inicial da ação ordinária se baseia em dispositivo expresso da Lei Com-
plementar 645/89 (art. 5º) que determina a sua incidência “nas mesmas bases e condi-
ções aos inativos”.
O direito pleiteado pelos autores tem fundamento no art. 54 da LC 444/85, com a
alteração conferida pela LC 645/89.
292 R.T.J. — 195
EXTRATO DA ATA
RE 208.156/SP — Relator: Ministro Sepúlveda Pertence. Recorrente: Estado de
São Paulo (Advogada: PGE/SP – Renata Vasconcellos Simões). Recorridos: Deogenir
de Oliveira e outro (Advogados: Selma Aparecida Ferreira de Souza e outro e Vera Lúcia
Pinheiro Cardoso Dias).
Decisão: Renovado o pedido de vista do Ministro Sepúlveda Pertence, de acordo
com o art. 1º, § 1º, da Resolução n. 278. Primeira Turma, 6-4-2004.
Decisão: Prosseguindo o julgamento, após a retificação de voto do Ministro
Sepúlveda Pertence, Relator, acompanhando o voto do Ministro Marco Aurélio, a
Turma não conheceu do recurso extraordinário. Unânime.
Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Ministros Marco
Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Subprocurador-Geral da República, Dr.
Paulo de Tarso Braz Lucas.
Brasília, 16 de agosto de 2005 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.
R.T.J. — 195 293
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tri-
bunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos, negar provimento ao recurso de agravo, nos
termos do voto do Relator.
Brasília, 22 de fevereiro de 2005 — Celso de Mello, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Celso de Mello: Trata-se de recurso de agravo, tempestivamente
interposto, contra decisão que não conheceu do recurso extraordinário deduzido pela
parte ora agravante (fls. 246/247).
Inconformada com esse ato decisório, a parte ora agravante interpõe o presente
recurso, postulando o conhecimento e o provimento do apelo extremo que deduziu (fls.
252/254).
Por não me convencer das razões expostas, submeto, à apreciação desta Colenda
Turma, o presente recurso de agravo.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): Não assiste razão à parte ora recorrente, eis
que em situações assemelhadas à destes autos, a jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal tem enfatizado não caber recurso extraordinário contra decisões que concedem
ou denegam medidas cautelares ou provimentos liminares, pelo fato de que tais atos
294 R.T.J. — 195
tem enfatizado a necessidade de tal ato decisório revelar-se definitivo (RTJ 17-18/114,
Rel. Min. Victor Nunes — RTJ 31/322, Rel. Min. Evandro Lins):
“(...) O recurso extraordinário é admissível de decisão de caráter interlocutório,
quando ela configura uma questão federal, encerrada definitivamente nas instâncias
locais.”
(RTJ 41/153, Rel. Min. Hermes Lima — grifei)
Sendo assim, tendo em consideração as razões expostas, nego provimento ao pre-
sente recurso de agravo, mantendo, em conseqüência, por seus próprios fundamentos, a
decisão ora agravada.
É o meu voto.
EXTRATO DA ATA
RE 289.764-AgR/DF — Relator: Ministro Celso de Mello. Agravante: Dorival
Rodrigues Alves (Advogados: Paula Evaristo Carlos Regal e outro). Agravada: União
(Advogada: PFN – Maria Vanda Diniz Barreira).
Decisão: A Turma, por votação unânime, negou provimento ao recurso de agravo,
nos termos do voto do Relator.
Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Carlos
Velloso, Ellen Gracie, Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa. Subprocurador-Geral da
República, Dr. Geraldo Brindeiro.
Brasília, 22 de fevereiro de 2005 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribu-
nal Federal, em Segunda Turma, sob a Presidência do Ministro Celso de Mello, na
conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos,
conhecer e dar provimento ao recurso extraordinário, nos termos do voto da Relatora.
Brasília, 31 de maio de 2005 — Celso de Mello, Presidente — Ellen Gracie, Relatora.
RELATÓRIO
A Sra. Ministra Ellen Gracie: Trata-se de recurso extraordinário interposto contra
acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte, que deferiu o presente
mandado de segurança, nos termos da seguinte ementa:
“Mandado de segurança – Concurso público para escrivão de polícia civil –
Preliminar de ausência de direito líquido e certo rejeitada – Distensão muscular
durante o exame de capacidade física – Realização da prova em outra data –
Concessão do writ.
I – O fato em comento não necessita de instrução probatória própria do pro-
cedimento comum ordinário, podendo ser analisado na via do Mandado de Segu-
rança;
II – Há de se fazer uma distinção entre o conceito da ‘igualdade integral’ e a
‘igual relativa’, devendo esta última prevalecer quando presente justificativa
plausível.
III – Considerar o princípio da vinculação ao edital como de caráter absoluto
seria negar o princípio da isonomia constitucionalmente consagrado, que determina
a desigualdade para os desiguais.”
Sustenta o Estado do Rio Grande do Norte que permitir que a recorrida realize uma
nova prova física, depois de sofrer uma distensão muscular durante a prova de corrida,
ofenderia o princípio da isonomia, com a criação de um benefício não estendido aos
demais candidatos.
O recurso foi admitido na origem mediante o despacho de fls. 76/77, tendo o
Ministério Público Federal opinado pelo seu não-conhecimento.
É o relatório.
VOTO
A Sra. Ministra Ellen Gracie (Relatora): Colho dos autos que a recorrida submeteu-se
ao exame de aptidão física para o cargo de Escrivão de Polícia Civil, composto de quatro
etapas: corrida, salto em distância, salto em altura e flexão abdominal. Durante a realiza-
ção do primeiro teste, sofreu uma distensão muscular que a impossibilitou de continuar
na prova. Impetrou, por isso, o presente mandado de segurança para que pudesse realizar
essa etapa do certame em outra data.
R.T.J. — 195 297
EXTRATO DA ATA
RE 351.142/RN — Relatora: Ministra Ellen Gracie. Recorrido: Estado do Rio
Grande do Norte (Advogado: PGE/RN – Ricardo George Furtado de M. e Menezes).
Recorrida: Adeilze Silva dos Santos (Advogados: Paulo Barra Neto e outros).
Decisão: Após o voto da Ministra Ellen Gracie, conhecendo do recurso e lhe dando
provimento, pediu vista o Ministro Gilmar Mendes. Ausente, justificadamente, neste
julgamento, o Ministro Celso de Mello. Presidiu este julgamento o Ministro Carlos
Velloso.
Brasília, 19 de abril de 2005 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.
VOTO (Vista)
O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Relator): Cuida-se de recurso para se cassar segu-
rança concedida a candidata a cargo de Escrivão de Polícia que, acometida de distensão
muscular durante o exame de aptidão física, obteve a permissão para realização de nova
prova.
298 R.T.J. — 195
EXTRATO DA ATA
RE 351.142/RN — Relatora: Ministra Ellen Gracie. Recorrido: Estado do Rio
Grande do Norte (Advogado: PGE/RN – Ricardo George Furtado de M. e Menezes).
Recorrida: Adeilze Silva dos Santos (Advogados: Paulo Barra Neto e outros).
Decisão: A Turma, por votação unânime, conheceu e deu provimento ao recurso
extraorinário, nos termos do voto da Relatora.
Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Carlos
Velloso, Ellen Gracie, Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa. Compareceu à Turma o
R.T.J. — 195 299
Ministro Nelson Jobim, Presidente do Tribunal, a fim de julgar processo a ele vinculado,
assumindo, nesta ocasião, a Presidência da Turma, de acordo com o art. 148, parágrafo
único, RISTF. Subprocurador-Geral da República, Dr. Francisco Adalberto da Nóbrega.
Brasília, 31 de maio de 2005 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tri-
bunal Federal, em Segunda Turma, sob a Presidência do Ministro Celso de Mello, na
conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de vo-
tos, negar provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator. Ausente,
justificadamente, neste julgamento, a Ministra Ellen Gracie.
Brasília, 17 de maio de 2005 — Celso de Mello, Presidente — Carlos Velloso,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Trata-se de agravo regimental interposto por Ação
S.A. Corretora de Valores e Câmbio e outros, da decisão (fls. 723-733) que negou
seguimento ao recurso extraordinário ao entendimento de que as isenções de tributos
municipais concedidas pela União na sistemática da CF/67, art. 19, § 2º, e do DL 406/68,
art. 11, redação da Lei Complementar 22/71, não mais prevalecem na sistemática da
CF/88, na forma do disposto no art. 151, III, CF/88, com observância das regras de
transição inscritas no art. 41, §§ 1º, 2º e 3º, do ADCT/1988.
300 R.T.J. — 195
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Velloso (Relator): Assim a decisão agravada, ora sob exame:
“(...)
Foi requerido o efeito suspensivo ao RE pelas ora recorrentes, o que ocorreu
na AC 130/RJ. Indeferi o requerido e submeti a minha decisão ao referendo da
Turma, em questão de ordem, que decidiu:
‘Ementa: Tributário. Processual Civil. Recurso extraordinário.
Medida cautelar. Pressupostos. ISS. Isenção prevista em lei complementar.
Restrição ao poder de tributar do Município.
R.T.J. — 195 301
EXTRATO DA ATA
RE 361.829-AgR/RJ — Relator: Ministro Carlos Velloso. Agravantes: Ação S.A.
Corretora de Valores e Câmbio e outro (Advogados: Eduardo Ferrão e outro). Agravado:
Município do Rio de Janeiro (Advogado: Jaqueline Ripper Nogueira do Vale Cuntin
Perez).
Decisão: A Turma, por votação unânime, negou provimento ao recurso de agravo,
nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, neste julgamento, a Ministra
Ellen Gracie.
Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Carlos
Velloso, Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa. Ausente, justificadamente, a Ministra Ellen
Gracie. Subprocurador-Geral da República, Dr. Francisco Adalberto da Nóbrega.
Brasília, 17 de maio de 2005 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.
306 R.T.J. — 195
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tri-
bunal Federal, em Segunda Turma, sob a Presidência do Ministro Celso de Mello, na
conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de vo-
tos, negar provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator. Ausente,
justificadamente, neste julgamento, a Ministra Ellen Gracie.
Brasília, 5 de abril de 2005 — Celso de Mello, Presidente — Carlos Velloso,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Trata-se de agravo regimental, interposto pelo
Município de Belo Horizonte, da decisão (fls. 93-98) que negou seguimento ao recur-
so extraordinário, ao fundamento de que se aplica a imunidade tributária às autar-
quias, pessoas jurídicas de direito público, excluindo-se a incidência do IPTU sobre o
imóvel de sua propriedade locado a terceiros, conforme o entendimento desta Corte
relativo aos imóveis das entidades de assistência social.
Sustenta o agravante, em síntese, o seguinte:
a) não-aplicação do entendimento desta Corte no julgamento do RE 237.718/SP,
uma vez que o INSS não comprovou qual a efetiva utilização dada ao imóvel, se própria
ou locação, bem como porque inexiste destinação dos recursos oriundos da locação (fl.
104);
b) para os fins da imunidade tributária prevista no art. 150, VI, a, da Constituição,
o patrimônio, a renda e os serviços das entidades devem estar diretamente relacionados
com suas finalidades essenciais, assim, a imunidade tributária somente afastará a tribu-
tação dos imóveis efetivamente utilizados pelas autarquias e fundações públicas na
consecução dos seus fins sociais;
R.T.J. — 195 307
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Velloso (Relator): Tem este teor a decisão agravada, ora sob
exame:
“(...)
Finalmente, porque, em caso semelhante, no julgamento do RE 302.585-
AgR/MG, DJ de 28-10-2004, decidi:
‘(...)
Ementa: Constitucional. Tributário. IPTU. Imunidade tributária:
autarquia estadual. CF, art. 150, VI, a.
I - Aplicabilidade da imunidade tributária recíproca — CF, art. 150, VI,
a — mesmo tratando-se de imóvel locado a terceiros, de modo a excluir a
incidência do IPTU sobre o imóvel de propriedade da entidade imune.
II - Precedentes do STF no que concerne a entidades de assistência
social.
III - RE conhecido e provido.
(...)
Decido.
No julgamento do AI 438.889-AgR/MG, de que fui Relator, decidiu o
Supremo Tribunal Federal (2ª Turma):
‘Ementa: Constitucional. Tributário. IPTU. Imunidade. Insti-
tuição de assistência social. CF, art. 150, VI, c. Imóvel locado.
I - Aplicabilidade da imunidade tributária — CF, art. 150, VI, c —,
mesmo tratando-se de imóvel locado a terceiros, de modo a excluir a
incidência do IPTU sobre o imóvel de propriedade da entidade imune.
II - Precedentes do STF.
III - Agravo não provido.’ (DJ de 27-2-2004)
No RE 362.856-AgR/MG, também por mim relatado, não foi outro o
entendimento da Corte (DJ de 12-9-2003).
308 R.T.J. — 195
EXTRATO DA ATA
RE 388.838-AgR/DF — Relator: Ministro Carlos Velloso. Agravante: Município
de Belo Horizonte (Advogados: Maria de Fátima Mesquita de Araújo e outro). Agravado:
Instituto Nacional do Seguro Social – INSS (Advogada: Regina Celia S. Alves).
310 R.T.J. — 195
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma
do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na
conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos,
rejeitar os embargos de declaração nos embargos de declaração no agravo regimental no
agravo de instrumento.
Brasília, 26 de abril de 2005 — Sepúlveda Pertence, Presidente — Carlos Ayres
Britto, Relator.
R.T.J. — 195 311
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Carlos Ayres Britto: Trata-se de novos embargos declaratórios con-
tra acórdão assim ementado:
“Penal. Embargos de declaração em agravo regimental. Alegada omis-
são do acórdão embargado. Preliminar de prescrição dos crimes conexos: ho-
micídio qualificado e lesão corporal.
Contando o réu, no dia da sentença condenatória, com sessenta e sete anos de
idade, não há falar na redução do prazo de prescrição do delito de homicídio,
previsto no art. 115 do CP.
Quanto ao crime de lesão corporal, tendo sido anulado, no ponto, o decreto
condenatório por falha na formulação de quesitos, uma eventual futura condena-
ção por esse delito dará ensejo à incidência do referido art. 115 do CP, com a
conseqüente redução do prazo prescricional, já que, atualmente, conta o embar-
gante com mais de setenta e quatro anos de idade. Nesse contexto, considerando a
data do último marco interruptivo da prescrição — condenação pelo crime conexo
de homicídio (art. 117, § 1º, 2ª parte, do CP) —, o referido prazo prescricional já
transcorreu antes mesmo da autuação do agravo de instrumento nesta Corte.
Embargos rejeitados, com a concessão de habeas corpus de ofício para
declarar-se a extinção da punibilidade tão-somente quanto ao crime de lesão
corporal, em decorrência da prescrição já consumada.”
2. A embargante sustenta que “o fato ocorreu no dia 26-9-1991. A denúncia foi
oferecida no dia 8-10-1991 e recebida no mesmo dia. O réu foi condenado a pena defini-
tiva de 12 anos de reclusão e contando-se o prazo de prescrição desde o cometimento do
crime este já prescreveu, trazendo-se a colação os artigos 110, 115 e 117 do Código
Penal” (sic, fl. 742). Aduz que o réu estaria preso desde 1º-10-1991, tendo, dessa forma,
cumprido integralmente a pena aplicada.
3. Em resposta aos ofícios de fls. 759 e 763, o Juiz de Direito da Vara de Execuções
Criminais da Comarca de Fortaleza/CE informa o andamento da execução provisória da
pena imposta ao recorrente.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Ayres Britto (Relator): Os embargos devem ser rejeitados,
tendo em vista que inexistem omissão, obscuridade ou contradição capazes de justificar
a reparação do aresto atacado. Na verdade, pretende o embargante rediscutir matéria já
debatida no aresto impugnado, qual seja, a possível ocorrência da prescrição da preten-
são punitiva.
6. Pois bem, conforme relatado pelo eminente Ministro Ilmar Galvão, o embargante
“foi condenado, em primeira instância, a uma pena de quatorze anos de reclusão, pelo
crime de homicídio qualificado (art. 121, § 2º, inciso IV), e de três anos de reclusão pelo
crime de lesão corporal, sendo, finalmente, unificadas em quinze anos de reclusão,
tendo em vista o reconhecimento da atenuante prevista no art. 65, inc. III, d, do Código
312 R.T.J. — 195
EXTRATO DA ATA
AI 394.065-AgR-ED-ED/CE — Relator: Ministro Carlos Britto. Embargante: Luiz
Rufino (Advogados: José Lineu de Freitas e outros). Embargado: Ministério Público do
Estado do Ceará. Assistentes: Laisete Gadelha Oliveira e outro (Advogados: Maria Odele
de Paula Pessoa e outros).
R.T.J. — 195 313
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma
do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence, na
conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos,
negar provimento ao agravo regimental no recurso extraordinário, nos termos do voto
do Relator.
Brasília, 22 de junho de 2005 — Sepúlveda Pertence, Presidente — Carlos Ayres
Britto, Relator.
314 R.T.J. — 195
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Carlos Ayres Britto: Cuida-se de agravo regimental, manejado pela
Souza Cruz S.A. contra decisão singular do teor seguinte:
“Recurso extraordinário em face de acórdão do Tribunal Superior do Traba-
lho, que negou provimento a agravo regimental interposto contra despacho
denegatório de recurso de embargos, tendo em vista o Enunciado n. 333 do mesmo
tribunal. É do seguinte teor a decisão recorrida (fls. 173):
“Agravo Regimental. Nega-se provimento a agravo regimental cujas ra-
zões não conseguem desconstituir os fundamentos do despacho agravado”.
O apelo extremo não merece acolhida. É que o acórdão recorrido se
limitou a discutir os pressupostos de admissibilidade do recurso, restringin-
do, assim, o debate ao plano infraconstitucional.
Cite-se, a propósito, trecho do voto: “o art. 896, § 5º, da CLT autoriza
o Relator a negar seguimento ao recurso de embargos quando a decisão
recorrida está em consonância com interativa notória e atual jurisprudência
do TST, o que ocorreu no presente caso, afastando-se a possibilidade de
dissenso pretoriano”.
Outro não é o entendimento deste colendo Supremo Tribunal Federal. A
propósito, o eminente Ministro Sepúlveda Pertence, ao julgar o AI 400.469, assim
consignou, na parte que interessa, in verbis:
(...)
“Verifica-se que a discussão restringe-se ao plano processual ordinário
infraconstitucional — referente ao cabimento da revista trabalhista — insus-
ceptível de reexame via recurso extraordinário. Com efeito, se houve ofensa
aos dispositivos constitucionais que se alega terem sido violados, deu-se de
forma reflexa e indireta, que não enseja RE, conforme copiosa jurisprudência
desta Corte”.
Por isso, frente ao art. 557, caput, do CPC e ao art. 21, § 1º , do RISTF, nego
seguimento ao recurso.”
2. Alega-se, no presente agravo, ofensa ao inciso I do art. 7º da Magna Carta e ao
art. 10 do ADCT/88. A agravante, ao reproduzir as razões recursais, busca demonstrar
que o direito constitucional à proteção do emprego contra despedida arbitrária ou sem
justa causa é matéria reservada à edição de lei complementar, sendo de rigor a declaração
de inconstitucionalidade do art. 118 da Lei n. 8.213/91.
3. Não obstante, mantenho a decisão agravada e submeto o feito à apreciação desta
Turma.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Ayres Britto (Relator): O agravo regimental não merece
acolhida.
R.T.J. — 195 315
EXTRATO DA ATA
RE 409.919-AgR/PE — Relator: Ministro Carlos Britto. Agravante: Souza Cruz
S.A. (Advogados: Hélio Carvalho Santana e outro). Agravado: Vanildo Barbosa Bayer
(Advogados: Geraldo Azoubel e outro).
Decisão: A Turma negou provimento ao agravo regimental no recurso extraordinário,
nos termos do voto do Relator. Unânime.
Presidência do Ministro Sepúlveda Pertence. Presentes à sessão os Ministros Marco
Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto e Eros Grau. Subprocuradora-Geral da República, Dra.
Maria Caetana Cintra Santos.
Brasília, 22 de junho de 2005 — Ricardo Dias Duarte, Coordenador.
316 R.T.J. — 195
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribu-
nal Federal, em Segunda Turma, sob a Presidência do Ministro Carlos Velloso (RISTF,
art. 37, II), na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimi-
dade de votos, acolher os embargos, com provimento do agravo, para o fim de o Superior
Tribunal de Justiça apreciar o agravo de instrumento.
Brasília, 21 de junho de 2005 — Carlos Velloso, Presidente — Gilmar Mendes,
Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Ao julgar o AI 418.402, o Rel. Nelson Jobim,
proferiu a seguinte decisão (fl. 934):
“Decisão:
Adoto o relatório da decisão agravada.
Com efeito, o recurso não merece trânsito.
É que a matéria constitucional suscitada, além de não prequestionada
(Súmula 282), depende da verificação de provas (Súmula 279), e, ainda, do pré-
vio exame de normas infraconstitucionais cujo exame é vedado em RE, confor-
me orientação do STF.
Nego seguimento ao agravo.”
Contra essa decisão, Algemir Tonello e outra interpuseram o agravo regimental de
fls. 937/957, ao qual foi negado provimento por esta Turma, em acórdão assim ementado
(fls. 960/967):
“Ementa: Processual. Agravo de instrumento. Pressupostos de seu cabimento.
Controvérsia infraconstitucional. Regimental não provido.”
Em face deste acórdão, foram opostos embargos de declaração de fls. 970/992, os
quais foram rejeitados por esta Turma, em acórdão assim ementado (fls. 995/1001):
R.T.J. — 195 317
VOTO
O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Relator): Os embargos declaratórios estão previstos
no Título X — Dos Recursos — do Código de Processo Civil (art. 496, IV). O art. 535 do
CPC relaciona as hipóteses de seu cabimento:
“Art. 535. Cabem embargos de declaração quando:
I - houver, na sentença ou no acórdão, obscuridade ou contradição;
II - for omitido ponto sobre o qual devia pronunciar-se o juiz ou o tribunal.”
Da mesma forma, o art. 337 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal
dispõe que são cabíveis os embargos de declaração “quando houver no acórdão
obscuridade, dúvida, contradição ou omissão que devam ser sanadas”. Hoje, já não é
passível de impugnação por meio de embargos a dúvida, nos termos do referido art. 535
do CPC, na redação da Lei n. 8.950, de 13 de dezembro de 1994.
O objetivo desse recurso é o aperfeiçoamento do pronunciamento judicial, seja
para esclarecê-lo ou para complementá-lo, com a eliminação de contradição, obscurida-
de ou omissão. No entanto, por vezes, visa reformar ou invalidar a decisão, pela ocorrên-
cia de manifesto equívoco. Nessa hipótese é que se tem admitido o efeito infringente ou
modificativo do julgado, por não haver, no sistema legal, previsão de outro recurso para
a correção de eventual erro cometido. A única ressalva que fazem a doutrina e a jurispru-
dência, em tais casos, é quanto à observância do contraditório.
Admito o caráter infringente dos presentes embargos e passo à análise de suas
razões.
Observe-se que não se trata de simples exame de admissibilidade de agravo de
instrumento contra decisão que negou processamento a recurso especial.
Verifica-se que ocorreu um erro no processamento do citado agravo, provocado
pelo Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso, que, embora tenha autuado o pro-
cesso com quatro volumes, encaminhou somente dois ao Superior Tribunal de Justiça.
Este equívoco foi constatado após o julgamento do agravo, que não foi conhecido
em face de ausência de peças obrigatórias.
O Tribunal de origem encaminhou ofício ao Superior Tribunal de Justiça, infor-
mando o ocorrido, o qual foi recebido em 28-2-01 (fl. 709) — antes, portanto, do julga-
mento do agravo regimental, que manteve a decisão monocrática.
Dessa decisão o agravante embargou de declaração.
Os embargos de declaração foram rejeitados, tendo o Rel. Carlos Alberto Menezes
Direito consignado em seu voto que:
“Por fim, com relação ao Ofício n. 22/2001 (fls. 585), assinado pela Diretora
do Terceiro Departamento Judiciário Cível do Tribunal de Justiça do Estado de
Mato Grosso, está datado de 13/02/2001, protocolado nesta Corte em 28/02/2001.
Vê-se que o referido ofício tem data bem posterior à da interposição do agravo de
320 R.T.J. — 195
EXTRATO DA ATA
AI 418.402-AgR-ED-ED-ED/MT — Relator: Ministro Gilmar Mendes. Embar-
gantes: Algemir Tonello e Rosângela Tonello (Advogados: Lycurgo Leite Neto e
outro). Embargados: Sebastião Pereira do Lago e outro (Advogado: Agildo Oliveira
Amorim).
Decisão: A Turma, por unanimidade, acolheu os embargos, com provimento do
agravo, para o fim de o Superior Tribunal de Justiça apreciar o agravo de instrumento.
Decisão unânime. Ausentes, justificadamente, neste julgamento, os Ministros Celso de
Mello e Ellen Gracie. Presidiu este julgamento o Ministro Carlos Velloso.
Presidência do Ministro Carlos Velloso. Presentes à sessão os Ministros Gilmar
Mendes e Joaquim Barbosa. Ausentes, justificadamente, os Ministros Celso de Mello
e Ellen Gracie. Subprocuradora-Geral da República, Dra. Sandra Verônica Cureau.
Brasília, 21 de junho de 2005 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.
R.T.J. — 195 321
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo
Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por maioria de votos, preliminarmente, nos termos do voto da Relatora,
conhecer do recurso para efeitos diversos, sem anular, porém, a decisão. No mérito, por
maioria, conhecer e dar provimento ao recurso extraordinário, nos termos do voto da
Relatora.
Brasília, 30 de março de 2005 — Ellen Gracie, Presidente (art. 37, I, do RISTF) e
Relatora.
RELATÓRIO
A Sra. Ministra Ellen Gracie: Trata-se de recurso extraordinário interposto contra
decisão de Juiz da 1ª Turma Recursal da Seção Judiciária do Rio de Janeiro que confirmou
o desprovimento do recurso inominado apresentado pela Caixa Econômica Federal, profe-
rido nos seguintes termos:
“Trata-se de Recurso de sentença proferida em Juizado Especial Federal do
Estado do Rio de Janeiro que condenou a parte recorrente a pagar à parte recorrida
os valores referentes às diferenças decorrentes da aplicação dos índices expurga-
dos das contas vinculadas de FGTS (42,72% em janeiro de 1989 e 44,80% em abril
de 1990), além dos acréscimos apurados até a data do efetivo pagamento.
322 R.T.J. — 195
A Recorrente sustenta que a parte Recorrida firmou acordo com a CEF, aper-
feiçoado através da assinatura do Termo de Adesão. Na medida em que a expressão
‘acordo’ reflete a idéia de concessões recíprocas, em que há vantagens para todas
as partes envolvidas, é de se concluir que o trabalhador acreditava que o ‘Termo de
Adesão’ descrito na Lei Complementar 110 lhe seria benéfico, sobretudo levando-
se em conta a propaganda veiculada nos meios de comunicação sobre o assunto.
Portanto, é fácil perceber que a intenção do trabalhador ao manifestar a von-
tade através da celebração da transação não correspondia às reais conseqüências
advindas do ato. Na verdade, provavelmente a renúncia a direitos ocorrida com a
assinatura do mencionado acordo tinha como único objetivo evitar a longa espera
pela solução do processo judicial, pela via ordinária.
Todavia, os resultados atingidos pelos Juizados Especiais Federais represen-
tam fato novo e imprevisível ao cidadão comum, o que influenciou no equilíbrio
do ajuste, tornando injustificada a onerosidade imposta a uma das partes.
Por outro lado, a natureza jurídica da conta de FGTS é de depósito bancário
de natureza especial. O trabalhador é correntista e a CEF, banco depositário do
referido fundo.
Tendo em vista que os estabelecimentos bancários, na qualidade de presta-
dores de serviços, vinculam-se à disciplina do Código de Defesa do Consumidor,
é de concluir-se que as cláusulas expressas no Termo de Adesão, em prejuízo do
trabalhador, são nulas, uma vez que traduzem renúncia a direitos sem que haja
compensação que valide a onerosidade suportada.
Some-se a isto o fato de as restrições decorrentes, tais como o deságio, a
renúncia e a supressão dos juros remuneratórios não estarem ressalvadas de forma
compreensível ao trabalhador comum, ensejando também a nulidade do instru-
mento.
Concluindo, entendo que a assinatura do Termo de Adesão não impede o
percebimento de valores não pagos na esfera administrativa. Portanto, a parte re-
corrida faz jus às diferenças requeridas, conforme conclusão na r. sentença, nos
moldes contidos na Súmula n. 252, do STJ, verbis: ‘os saldos das contas do FGTS,
pela legislação infraconstitucional, são corrigidos em 42,72% (IPC) quanto às
perdas de janeiro de 1989 e 44,80% (IPC) quanto às de abril de 1990, acolhidos
pelo STJ os índices de 18,02% (LBC) quanto às perdas de junho de 1987, de 5,38%
(BTN) para maio de 1990, e 7,00% (TR), para fevereiro de 1991, de acordo com o
entendimento do STF (RE 226.855-7-RS)’
Nesse sentido dispõe o Enunciado n. 21 das Turmas Recursais dos Juizados
Especiais Federais:
‘O trabalhador faz jus ao crédito integral, sem parcelamento, e ao le-
vantamento, nos casos previstos em lei, das verbas relativas aos expurgos de
índices inflacionários de janeiro de 1989 (42,72%) e abril de 1990 (44,80%)
sobre os saldos das contas de FGTS, ainda que tenha aderido ao acordo
previsto na Lei Complementar n. 110/2001, deduzidas as parcelas porventura
já recebidas.’
R.T.J. — 195 323
VOTO
A Sra. Ministra Ellen Gracie (Relatora): 1. Senhor Presidente, já na oportunidade
da apreciação do feito cautelar de que resultou o sobrestamento dos demais processos na
origem1, aludi à conveniência de superarmos a questão referente ao alegado vício de
procedimento (correspondente à aplicação do Enunciado n. 26 das Turmas Recursais
Federais2), tendo em vista não apenas a relevância jurídica da questão de fundo —
também controvertida — mas ainda a informação prestada pela Presidente das Turmas
Recusais dos Juizados Especiais da Seção Judiciária do Rio de Janeiro, a qual atestou
que, desde janeiro de 2004, os julgamentos dos Relatores em questões sumuladas vêm
sendo submetidos ao referendo do colegiado (fl. 200 do feito cautelar).
Com essa providência, estaria sanado, a partir de janeiro/2004, defeito processual
já reconhecido por este Supremo Tribunal, porque consistente na sucessão de decisões
monocráticas sem oportunidade de acesso à Turma Recursal (aponto precedentes mono-
cráticos específicos: RE 427.076, Min. Carlos Britto, DJ de 29-9-2004; RE 427.528,
Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 14-6-2004). Não, porém, no presente feito, que
encerra uma seqüência de julgamentos monocráticos efetivamente excluídos à aprecia-
ção da Turma Recursal (negativa de seguimento ao recurso inominado, fl. 100; agravo
regimental recebido como embargos declaratórios rejeitados, fl. 120).
Anoto, nesse ponto, que a persistência da Caixa Econômica Federal na insurgência
contra o procedimento adotado e contra a desconsideração do acordo foi repelida pelo
Julgador recorrido mediante a aplicação de multa por litigância procrastinatória (fl.
100), o que não se coaduna com a garantia do exercício regular do direito de defesa —
que neste caso nem sequer é próprio, já que a CEF é apenas gestora dos recursos do
Fundo de Garantia do Tempo de Serviço.
2. Além da problemática procedimental, persiste a invocação ao Enunciado n. 213,
que preconiza a desconsideração do acordo da Lei Complementar n. 110/2001, o que,
por si só, já dá ensejo à irresignação extraordinária.
Constato também que muitas são as demandas idênticas à presente a merecerem o
crivo desta Corte, tendo em vista a existência — devidamente comprovada pela recor-
rente — de uma deliberada instigação ao trabalhador que aderiu ao acordo, para que
ingresse em juízo e busque a sua desconstituição.
A empresa pública recorrente faz juntar formulário de petição inicial constante, até
o presente momento, da página na internet dos Juizados Especiais Federais da Seção
Judiciária do Rio de Janeiro4. Ali são elencadas as razões que levariam ao afastamento
do acordo firmado, com a conseqüente procedência da ação (fl. 202).
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Sra. Presidente, gostaria que se destacasse a
questão inicial, o primeiro fundamento do recurso, a preliminar de nulidade da decisão
que negou seguimento ao agravo contra a decisão singular. Parece-me que a preliminar
leva à impossibilidade de conhecer-se do recurso quanto ao mérito, com base na Súmula
n. 281. Assim decidimos, a respeito de decisões de Turmas Recursais dos Juizados, por
exemplo, no RE 311.382, de que fui Relator, na Primeira Turma, em 4-9-2001.
Lembra-me de que, quando Procurador-Geral, propus representação por inconsti-
tucionalidade de dispositivo do Regimento Interno do Tribunal de Justiça de Goiás que
tornava irrecorrível a decisão do Relator que indeferisse liminarmente o mandado de
segurança. E o Tribunal o julgou inconstitucional, entendendo que podem, sim, os
Tribunais outorgar competência decisória aos relatores; mas, sendo o Tribunal, sempre,
um órgão colegiado, é necessário que haja um meio recursal para levar ao colegiado a
questão, se a parte não se conforma com a decisão singular (Rp 1.299, Célio Borja,
21-8-86, RTJ 119/980).
O Sr. Ministro Marco Aurélio: O relator atua como verdadeiro porta-voz do Cole-
giado, em substituição, justamente tendo em conta a grande carga de processos suporta-
da pelo Colegiado.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Não se trata de um tribunal, mas, a Turma
Recursal, pelo artigo 98 da Constituição, é órgão colegiado, ainda mais quando, no
mérito, haja uma questão de constitucionalidade a decidir.
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Vossa Excelência apontou bem, porque temos uma
dificuldade para conhecer do recurso extraordinário quanto ao fundo. Não houve o
esgotamento da jurisdição na origem.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: É a Súmula n. 281.
A Sra. Ministra Ellen Gracie (Presidente e Relatora): O que me leva a superar a
preliminar para adentrar o mérito é exatamente a peculiaridade da questão.
R.T.J. — 195 329
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Há uma súmula das Turmas Recursais dos
Juizados Especiais da Seção Judiciária do Rio de Janeiro, segundo a qual decisão
monocrática proferida pelo Relator não desafia recurso à Turma Recursal. Então, teremos
de abrir essa exceção, sempre que, na questão de fundo, se aplicar súmula da Turma
Recursal.
O Sr. Ministro Gilmar Mendes: A vantagem é que estamos a falar de processos de
massa, que têm causado tanta preocupação, e já foram objeto de consideração de Vossa
Excelência, e, nesse caso, pelo menos o Tribunal se pronuncia de maneira seletiva, quer
dizer, decide um caso, é essa a proposta, e, em princípio, fixará uma orientação normativa
num ou noutro sentido. Podemos até, daqui a pouco, estar a extrair súmulas vinculantes
desse pronunciamento.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Sim, é o destino natural para os processos de
massa. Mas eu fico com a liturgia.
O Sr. Ministro Gilmar Mendes: E eu proponho a heterodoxia neste caso.
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Penso que esse é o caso realmente típico em que o
Tribunal deveria adotar uma posição menos ortodoxa, heterodoxa mesmo, porque, nos
juizados especiais, de regra, não há recurso. Tenho sustentado que o recurso extraordiná-
rio constitui um atentado contra a natureza do juizado especial.
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Seriam superórgãos, acima do Supremo Tribunal
Federal, como guardas da Carta.
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Não é bem isso. É que esses juizados especiais foram
concebidos para julgar causas de pequeno valor, comumente de carentes, de necessita-
dos, que devem ter uma resposta pronta da Justiça, e não ficarem por conta de recursos e
filigranas processuais, como sói acontecer com a Justiça brasileira. Então, eminentes
Colegas, penso que este é um caso em que o Supremo Tribunal Federal deve dar resposta
imediata. Ele tem caráter objetivo.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Mas, Ministro, o recurso cabível é o extraordinário.
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Em muitos casos, nesses processos, a Turma homo-
loga a decisão do juiz. De maneira que, não obstante reconhecer as preocupações do
eminente Ministro Sepúlveda Pertence, penso que a importância e as preocupações de
milhares sobrepõem a essas preocupações puramente processuais.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Os milhares não estão nada preocupados.
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Não sei porque essas questões estão paradas. Outro dia
um juiz me dizia, em Minas Gerais, da responsabilidade do Supremo Tribunal Federal com
milhares de processos paralisados. É hora, portanto, de resolvermos a situação.
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Não apenas nesse tema, e em decorrência de nos
defrontarmos, por ano, com cento e vinte mil processos. O que é uma anomalia.
O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Sim, mas é exatamente nesse caso que se tenta um
mínimo de racionalização, permitindo que a Corte se pronuncie sobre essa questão, in
concreto, mas também com essa perspectiva ampla, com essa perspectiva objetiva.
Acho que o Ministro Sepúlveda Pertence foi, talvez, um dos autores do voto que
flexibilizou a leitura do artigo 97, antes do advento da alteração introduzida pela Lei
n. 9.868, que, na verdade, destaca e valoriza a decisão tomada.
R.T.J. — 195 331
VOTO (Preliminar)
O Sr. Ministro Eros Grau: Sra. Presidente, acompanharei a heterodoxia.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Britto: Sra. Presidente, permanecerei fiel à Sumula n. 281.
Acredito que não há decisão final no caso a desafiar o manejo do RE.
Acompanho o pensamento do Ministro Sepúlveda Pertence, data venia de todos
os outros.
VOTO (Preliminar)
O Sr. Ministro Cezar Peluso: Sra. Presidente, também peço vênia, mas é um caso
singular, do qual não extrairei nenhum princípio para aplicar em outro. Aqui as Turmas
já prefixaram um entendimento com caráter normativo, como se editasse uma norma de
lei, de modo que a pressuposição é que todas as causas serão julgadas dessa forma.
Trata-se de precedente que é multiplicador de causas, e isso provoca inquietação.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Só para compreender a decisão que se insinua.
Vossa Excelência se refere à súmula da questão de fundo ou à súmula de que não cabe
agravo da decisão do Relator?
O Sr. Ministro Cezar Peluso: À súmula da questão de fundo.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Então, sempre que houver súmula no Tribunal
a quo ou na Turma Recursal, o recurso pode ser decidido até pelo chefe do protocolo?
O Sr. Ministro Cezar Peluso: Não, necessariamente.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Ministro, não podemos decidir um caso espe-
cial. Estamos estabelecendo uma orientação.
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Sim, para este caso.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Por exemplo, há uma Turma de um Tribunal muito
augusto que não concede habeas corpus. Então, por quê não vamos julgar origiariamente a
impetração?
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Eles devem ter suas razões.
O Sr. Ministro Cezar Peluso: Ainda não foi sumulada.
Com o devido respeito, neste caso ficarei com a heterodoxia.
332 R.T.J. — 195
Sucede que há também outro princípio legal — que está no artigo 249, § 2º, do
Código de Processo Civil — que reza, com reverência ao princípio da brevidade, da
economia e da efetividade, que, se puder, no juízo de mérito, quando a causa esteja
madura para tanto, prover em favor da parte a quem aproveitaria a declaração de nulidade,
o tribunal não deve declará-la, mas prover o mérito imediatamente.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: O caso é de admissibilidade do recurso extraor-
dinário.
O Sr. Ministro Cezar Peluso: Essa é a posição de Vossa Excelência, mas não é a do
Ministro Marco Aurélio nem a do Ministro Carlos Britto. Por isso é que estou fazendo a
observação, após a manifestação do Ministro Marco Aurélio.
O Sr. Ministro Marco Aurélio: A minha posição é a mesma do Ministro Sepúlveda
Pertence, porque só podemos ir ao mérito da causa — julgar o conflito de interesses — se,
em sede extraordinária, ultrapassarmos a barreira do conhecimento.
Ora, qual é a premissa do meu voto? Não foi esgotado o ofício jurisdicional na
origem. E, atrelado a esse aspecto, vem outro dado: o vício de procedimento, no que se
ataca a decisão do relator de não ter levado o agravo ao Colegiado.
O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Tenho a impressão de que muito mais ousada do
que esta construção que agora está se esboçando foi a construção feita em torno da não-
aplicação ou da redução teleológica do artigo 97, porque é uma cláusula tradicional —
vem da Constituição de 1934 e reproduzida praticamente em todos os textos constitucio-
nais —, e o Tribunal passou a entender que, naqueles casos em que ele já tivesse declarado
a inconstitucionalidade, por exemplo, não precisava de submeter a matéria a discussão
do Plenário. Nós poderíamos até discutir isso.
O Sr. Ministro Marco Aurélio: A premissa é o Órgão de Cúpula, o Guardião Maior
da Carta, já haver se pronunciado.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Essa construção foi aceita porque parte de uma
posição de todos os Tribunais de segundo grau do País, segundo a qual, quando haja
decisão do plenário deles sobre a inconstitucionalidade de lei, não é preciso, a cada
processo idêntico, levar a questão, de novo, ao plenário. Então, dissemos: com mais
razão, se já há decisão do Supremo Tribunal Federal. Em ADIn nem há falar, dada a
eficácia erga onmes e vinculante. Mas, mesmo, no controle difuso, em que a decisão é
susceptível de suspensão de vigência pelo Senado.
O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Não discordo de Vossa Excelência, mas diria que,
aqui, o Tribunal, na verdade, atravessou o Rubicão do efeito vinculante da decisão no
controle incidental, porque, ao fazê-lo, admitiu. Por isso diria que essa heterodoxia é
construção de Vossa Excelência, não minha nem da Ministra Ellen Gracie neste caso. De
fato, o grande passo se deu a partir do modelo do artigo 97.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Nós vamos chegar, daqui a pouco, ao que eu
disse: para que a Turma Recursal, se a Turma já tem súmula e é contra a nossa jurispru-
dência?! Que venha direto!
R.T.J. — 195 335
O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Nesse caso, poderá haver todos os recursos possí-
veis que, tanto quanto à admissibilidade quanto ao mérito, a decisão da Turma Recursal
já está tomada e celebrada em súmulas. Portanto, tenho a impressão de que aqui há uma
singularidade.
VOTO (Vista)
O Sr. Ministro Eros Grau: Todas as condições da avença de “adesão” ou transação
judicial estão definidas na lei complementar.
2. É inteiramente descabida, na hipótese, a qualificação do “termo de adesão”
como “contrato de adesão”.
Este, tal qual definido pelo artigo 54 do Código de Defesa do Consumidor, é
“aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabele-
cidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor
possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo”. A inserção de cláusula no
formulário — diz o seu § 1º — “não desfigura a natureza de adesão do contrato”.
3. No caso do “termo de adesão” a que refere o art. 4º da Lei Complementar não há
contrato, menos ainda “contrato de adesão”, tal como definido pelo Código de Defesa
do Consumidor. É a lei — LC 110/01 — que estipula as condições da adesão. Seu
conteúdo não se presta a ser discutido ou modificado substancialmente. Não há que
falar, no caso, em excessos cometidos por empresários em suas relações com os adquirentes
finais de seus produtos ou serviços. Nem se trata, no caso, de “estandartização” de
cláusulas contratuais, de ausência de diálogo negocial em favor da redução de custos e
riscos da empresa. Aqui, diretamente, comanda a lei, não o poder empresarial.
4. Nem há que falar, no caso, em “contrato coativo”, nos quais o particular é
alcançado pelo dever de contratar, isto é, de assumir obrigação perante terceiro. Aqui o
titular da conta vinculada do FGTS pode, ou não, fazer a adesão referida no art. 6º da Lei
Complementar. Se o fizer, estará sujeito ao quanto estipulado pela lei.
5. Aqui há situação de sujeição, que, como ensina Carnelutti1, é a expressão
subjetiva do comando jurídico, considerado no seu lado passivo, isto é, da parte de
quem é comandado; significa necessidade de obedecer. Distinguindo a sujeição do
dever, Carnelutti2 esclarece que este é um vínculo imposto à vontade, ao passo que
aquela significa impossibilidade de querer com eficácia.
6. Dizendo-o de modo mais completo: o titular da conta vinculada sujeita-se ao
creditamento, nela, de determinado complemento de atualização monetária definido
pela lei; a adesão do titular da conta ao disposto no seu artigo 4º — adesão a que
corresponde um benefício [= o creditamento] e sujeição à própria lei — não pode ser
anulada por ato de vontade seu, isto é, ato de vontade do titular da conta. Atuaria, aí,
ademais, a vedação do venire contra factum proprium.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Britto: Sra. Presidente, fiz umas anotações, que passo a ler:
“Parece-me que a solução da controvérsia passa pela análise de norma infraconsti-
tucional e de provas. Salvo engano, foi uma sugestão dos Ministros Marco Aurélio e
Carlos Velloso no julgamento da Ação Cautelar n. 272, medida cautelar.
Explico: os correntistas do FGTS aderiram ao acordo criado pela Lei Complementar
n. 110/2001, a qual disciplinou, de forma pormenorizada, os parâmetros a serem obser-
vados na adesão aos acordos.
Minha conclusão: para se chegar ao entendimento de que não houve qualquer
vício de vontade na assinatura do acordo ou mesmo se a Lei Complementar previa
taxativamente os parâmetros desse acordo, seria necessário examinar a matéria infra-
constitucional e reexaminar provas.
Por isso, voto, agora, pelo desprovimento do RE.
VOTO
O Sr. Ministro Cezar Peluso: Sra. Presidente, vou pedir vênia ao eminente Ministro
Carlos Britto, para acompanhar Vossa Excelência. Vou fazê-lo brevemente, porque pre-
ciso explicar umas afirmações que adiantei no julgamento da medida cautelar.
Na verdade, trata-se de decisão baseada em enunciado normativo, o qual dispõe na
cláusula final:
(...) “ainda que tenha – quem quer que seja – aderido ao acordo previsto na
Lei Complementar n. 110/01” (...)
Ou seja, esse enunciado normativo, fundamento central da decisão, deu por ine-
ficazes a Lei Complementar n. 110/01 e o acordo, independentemente das particularidades
deste e do caso concreto. Em outras palavras, editou norma de caráter geral e abstrato,
tornando ineficazes a Lei e todos os acordos celebrados com base nela.
Ora, não se declarou a inconstitucionalidade da Lei nem se examinou, em concreto,
nenhuma particularidade do acordo da qual pudesse resultar, como vício inerente ao
acordo, no caso concreto, uma causa de nulidade, uma causa de anulabilidade, ou uma
causa de ineficácia, enfim, uma causa qualquer que permitisse ao julgador retirar os
efeitos jurídicos de um ato jurídico perfeito.
O Sr. Ministro Carlos Britto: Vossa Excelência me permite um aparte?
Vou ler um trecho da sentença, assim expresso:
(...) “a parte Autora não tinha ciência de elemento essencial, qual seja, o valor
que teria a receber.
R.T.J. — 195 337
VOTO
O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Sra. Presidente, também eu gostaria de felicitar
Vossa Excelência pela coragem e iniciativa de ter trazido este tema ao Plenário, dada a
importância da questão.
É a primeira vez que estamos a aplicar os elementos da Lei n. 10.259 nesta exten-
são, já no julgamento da cautelar e, agora, no de mérito.
Sabemos todos que, aqui, não estamos a falar de um caso singular. Isso já foi objeto
de muitas considerações. Lembro-me, inclusive, de depoimento proferido no Congresso
Nacional — creio que na Câmara dos Deputados, pelo próprio Ministro Sepúlveda
Pertence — sobre as razões das chamadas “causas multitudinárias”.
Aqui, temos a possibilidade de, se seguirmos a toada do chamado “processo subje-
tivo individual, singular”, alcançarmos, em pouco tempo, 60 milhões de processos em
discussão no âmbito do Juizado, porque só o acordo — como foi dito da tribuna —
abrangeu algo em torno de 32 milhões de pessoas. Vejam, portanto, a dimensão.
Já foi demonstrado, e estamos aqui a discutir a tese — disse-o bem o Ministro Cezar
Peluso — de que, a rigor, nenhuma consideração faz o Juizado Especial no Rio de
Janeiro sobre um dado caso singular, mas presume que todos os acordos foram assinados
contra esse valor — fundamental, claro — da autonomia pessoal, da autonomia de
decidir.
R.T.J. — 195 339
Quem acompanha bem esse processo sabe que não houve sequer essa assinatura às
cegas. As pessoas sabiam, sim, com alguma aproximação, qual era o quantum devido,
porque elas tinham acesso as suas contas na própria Caixa Econômica. Tanto é que
faziam a opção. Tanto quanto já se demonstrou também, não é possível, de plano, dizer
que há um critério de não-razoabilidade. Para aqueles que ganhariam até cerca de dois
mil ou coisa do tipo, deu-se a indenização integral. Depois, então, trabalhou-se no
sentido de um deságio, porque havia a possibilidade de pagamento imediato, exclusão
de verbas honorárias e tudo mais. Portanto, era um tipo de aproximação que se podia
fazer.
Imagino que este é um caso de escola, um caso modelo para tantos outros que
virão, na senda — espero — da súmula vinculante. Certamente temos de construir não
um modelo judicial, mas um modelo administrativo, um processo administrativo —
admito — para solucionar casos como esses.
Imaginem os Senhores que amanhã tenhamos de fazer uma revisão de um critério
de pensão do INSS, e fixemos, lá, uma orientação qualquer. Isso pode atingir facilmente
30 ou 40 milhões de pessoas. Não é possível imaginar que a solução desse caso se dê
sequer na forma do Juizado Especial — como já foi demonstrado pelo Ministro Carlos
Velloso. Não podemos esperar isso. Teremos de encontrar uma solução administrativa.
Sra. Presidente, felicitando-a pelo brilhante voto e pela iniciativa, acompanho o
voto de Vossa Excelência.
Essa é uma parte, mas não estou aqui a rejulgar o que já foi objeto de exame pelo
Colegiado. Estou a me defrontar com um recurso extraordinário em processo subjetivo,
considerando uma decisão que, talvez, tenha implicado a potencialização, a mais não
poder, do ato de vontade, a interpretação, vislumbrando-se os trabalhadores como tute-
lados e passando o Judiciário — não se defrontando com o conflito de interesse a envol-
ver empregado e empregador — a atuar como órgão protetor dos trabalhadores, olvidan-
do o que já submetido ao crivo do Supremo Tribunal Federal.
Em vista da decisão proferida no campo monocrático, no campo individual, pelo
Relator, temos que, diante dos parâmetros da lei, não diante dos parâmetros fáticos —
isso foi muito bem salientado pelo Ministro Cezar Peluso –, concluiu-se pela inconstitu-
cionalidade — e posso dizer, mesmo não havendo sido utilizadas essas palavras — da
Lei Complementar n. 110/2001.
Lembro-me de que, quando da edição dessa Lei, o Dirigente Maior do País fez um
pronunciamento em horário nobre, visando a ressaltar os aspectos positivos da adesão, do
acordo que era proposto aos titulares das contas do Fundo de Garantia do Tempo de
Serviço e, em um ato falho, chegou mesmo — podemos pegar a fita do Jornal Nacional —
a dizer que quem não aceitasse a proposta fixada na Lei deveria recorrer ao Judiciário. Aí,
evidentemente, iria aguardar o desfecho da causa projetado para as calendas gregas,
passados muitos anos.
Então, o Relator partiu da presunção de vício de consentimento, quando o vício
de consentimento a contaminar o ato jurídico precisa estar aprovado. Não se presume
o erro, o dolo, a coação, a simulação, a fraude. Presume-se não o extravagante — o
extraordinário —, mas o que normalmente ocorre. Consignou o Relator que o trabalhador
não teria idéia do que viria a receber. O trabalhador que aderiu — talvez por não ter mais
gás para enfrentar a vida econômica, precisando do numerário — teve presente que
haveria um deságio, porque estampado na própria lei alusiva ao termo de adesão.
Não ficou aí o Relator, entretanto. Acabou por lançar o que aponto como verdadeira
pérola: os resultados atingidos pelos Juizados Especiais Federais representariam um fato
novo, em termos de celeridade e economia processuais, de rapidez no desfecho dos
processos. Soubessem os trabalhadores — é o que está inserido na decisão — dessa
rapidez, não teriam aderido. Presumiu-se, portanto, que aderiram por erro, por não confia-
rem na entrega da prestação jurisdicional dentro de um lapso razoável. E prossegue
assentando que representaria um fato novo e imprevisível para o cidadão comum a
rapidez dos Juizados, o que influenciou no equilíbrio do ajuste, tornando injustificada
a onerosidade imposta a uma das partes. Evocou-se o Código de Defesa do Consumidor,
mas, a meu ver, sob uma óptica que não a agasalhada por esse mesmo Código. Evocou-se,
partindo — repito — da presunção do vício de consentimento: soubessem os trabalha-
dores da agilidade dos juizados especiais, não teriam firmado os termos de adesão. A
premissa e o resultado mostraram-se um passo, para mim, demasiadamente largo.
Presidenta, não estou, aqui, modificando o entendimento inicial, referente à as-
sentada em que foi referendada a liminar concedida por Vossa Excelência. Na oportu-
nidade, atuei no campo precário e efêmero, ou seja, sem um mergulho mais profundo,
consideradas as balizas da decisão, e mesmo assim aludi à impossibilidade jurídica da
suspensão operada — dos processos em curso na origem.
R.T.J. — 195 341
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Sra. Presidente, a questão posta na decisão recorrida
tem caráter geral, porque incluída em súmulas dos Juizados Especiais.
Bem demonstrou o Sr. Ministro Cezar Peluso que, no caso, para se reconhecer a
existência do ato jurídico perfeito e acabado, não há necessidade do exame deste sob o
ponto de vista infraconstitucional e fático, já que a questão foi posta sob o ponto de vista
geral, em abstrato.
Faço essas considerações porque, quando a questão veio ao Tribunal, trazida por
Vossa Excelência, oportunidade em que se conferiu efeito suspensivo ao recurso, votei,
entendendo de outra forma: que, no caso, teríamos que enfrentar matéria infraconstitucio-
nal e de fato. Porém, as considerações feitas pelo Ministro Cezar Peluso, nesta assentada,
me convenceram.
Por isso, eminente Ministra, reconsidero-me das observações feitas por mim e, com
essas brevíssimas considerações, acompanho o douto voto de Vossa Excelência.
VOTO
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: Sra. Presidente, também já tenho afirmado que,
regra geral, não cabe, em recurso extraordinário por afronta à garantia do ato jurídico
perfeito, examinar in concreto a validade deste ato jurídico, conforme a legislação infra-
constitucional.
Mas vejo que, afora expressões retóricas, como evidenciado nos votos que me
precederam, em particular no voto do Ministro Cezar Peluso, afora considerações retóri-
cas, o fundamento da decisão recorrida — não falo acórdão, porque não há acórdão de
um só — é o Enunciado 21 das Súmulas das Turmas Recursais dos Juizados Especiais
Federais onde se lê (fls. 150/151):
‘O trabalhador faz jus ao crédito integral, sem parcelamento, e ao levanta-
mento, nos casos previstos em lei, das verbas relativas aos expurgos de índices
inflacionários de janeiro de 1989 (42,72%) e abril de 1990 (44,80%) sobre os
saldos das contas de FGTS, ainda que tenha aderido ao acordo previsto na Lei
Complementar n. 110/01, deduzidas as parcelas porventura já recebidas.’
342 R.T.J. — 195
Portanto, não se pressupõe que o acordo haja contrariado a lei, mas, ao contrário, se
afirma que, independentemente do acordo firmado nos termos da lei, ele não vale, não é
eficaz. Concede-se, por isso, o pagamento integral quando o acordo era de pagamento
parcelado.
Neste caso, porque não necessário examinar a eventual nulidade ou anulabilidade
do ato jurídico, dado que a sua validade faz parte da própria hipótese normativa da
súmula, creio que é correto o entendimento de Vossa Excelência de que a decisão recor-
rida efetivamente afrontou a garantia do ato jurídico perfeito.
Conheço do recurso e lhe dou provimento.
EXTRATO DA ATA
RE 418.918/RJ — Relatora: Ministra Ellen Gracie. Recorrente: Caixa Econômica
Federal – CEF (Advogados: Antônio Carlos Ferreira e outro). Recorrido: Jorge Peres Alves
da Silva (Advogada: Maria Tereza Costa Ferraz Borges). Assistente: União (Advogado:
Advogado-Geral da União).
Decisão: O Tribunal, preliminarmente, nos termos do voto da Relatora, conheceu
do recurso para efeitos diversos, sem anular, porém, a decisão, vencidos, no ponto, os
Ministros Sepúlveda Pertence, Carlos Britto e Marco Aurélio, que entendiam que o
agravo deveria ser processado e julgado na origem. No mérito, o Tribunal, por maioria,
conheceu e deu provimento ao recurso extraordinário, nos termos do voto da Relatora,
vencido o Ministro Carlos Britto. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Ministro
Nelson Jobim (Presidente). Falaram, pela recorrente, o Dr. Davi Duarte e, pela Advocacia-
Geral da União, o Dr. Álvaro Augusto Ribeiro Costa, Advogado-Geral da União. Presidiu
o julgamento a Ministra Ellen Gracie (Vice-Presidente).
Presidência do Ministro Nelson Jobim. Presentes à sessão os Ministros Sepúlveda
Pertence, Celso de Mello, Carlos Velloso, Marco Aurélio, Ellen Gracie, Gilmar Mendes,
Cezar Peluso, Carlos Britto, Joaquim Barbosa e Eros Grau. Procurador-Geral da República,
Dr. Cláudio Lemos Fonteles.
Brasília, 30 de março de 2005 — Luiz Tomimatsu, Secretário.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribu-
nal Federal, em Segunda Turma, sob a Presidência do Ministro Celso de Mello, na
conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos,
conhecer e dar provimento ao recurso extraordinário, nos termos do voto da Relatora.
Brasília, 28 de junho de 2005 — Celso de Mello, Presidente — Ellen Gracie,
Relatora.
RELATÓRIO (Antecipação)
A Sra. Ministra Ellen Gracie: Senhor Presidente, previamente ao relatório do feito,
eu desejo trazer ao conhecimento da Turma que, pouco antes da sessão, recebi petição
firmada pelo ilustre Advogado, Dr. José Eduardo Rangel de Alckmin, solicitando o
afetamento deste processo ao exame do Plenário. Sua Excelência traça, na sua petição,
uma série de considerações porque entende que o feito deva merecer a atenção do Plená-
rio, nas quais, todavia, não encontro a necessária consistência que nos fizesse sustar o
julgamento na Turma.
Embora, de fato, Sua Excelência tenha razão num ponto. É a primeira vez que o
Supremo enfrenta esta matéria especificamente, mas esse fato, por si só, não justifica que
a competência da Turma não seja exercida na sua plenitude.
Por outro lado, a repercussão que uma eventual decisão, num sentido ou no outro,
terá é a repercussão normal e natural decorrente de qualquer processo em que uma das
partes ganhe e a outra perca.
De modo que, com a devida vênia, não vejo elementos bastantes para deslocar a
nossa competência para exame do feito ao Plenário.
Por isso, submeto-me à decisão dos Colegas, mas, desde logo, aponto que entendo
perfeitamente viável o exame nesta sentada.
RELATÓRIO
A Sra. Ministra Ellen Gracie: Trata-se de recurso extraordinário interposto contra
acórdão do Tribunal Superior Eleitoral, que, em sede de agravo regimental, confirmou
decisão monocrática que deu provimento a recurso especial eleitoral, reconhecendo a
344 R.T.J. — 195
VOTO
A Sra. Ministra Ellen Gracie (Relatora): Registro, inicialmente, que, em consulta ao
site do TSE na internet, verifiquei que o ora recorrente foi eleito prefeito do Município de
Ipubi/PE nas eleições de 2004, com 7.486 votos (61,280% dos votos válidos).
346 R.T.J. — 195
Ora, vejamos, o parentesco, como se sabe, pode ser (1) natural ou consangüí-
neo, ou ainda, (2) civil. Este último resulta do vínculo matrimonial ou da adoção.
O vínculo decorrente do casamento encerra-se com a morte de um dos cônjuges
(Código Civil, art. 1.571, I). A relação de afinidade, dele decorrente, com os paren-
tes do morto permanece – por obséquio ao tabu de incesto e, conseqüentemente,
apenas, para efeito de casamento – quanto aos ascendentes e descendentes do
falecido, vale dizer sogros e enteados (Código Civil, art. 1.595, §2º), bem como aos
adotantes relativamente ao ex-cônjuge do adotado e ao adotado, relativamente ao
ex-cônjuge do adotante (Código Civil, art. 1.521, III), bem como ao adotado em
relação ao filho do adotante (Código Civil, art. 1.521, V).
Na hipótese de separação judicial ou divórcio, ocorre a dissolução ou a rup-
tura do vínculo conjugal. Porém, eventualmente, podem eles constituir fórmulas
fraudatórias da intenção do legislador, para efeito de perpetuação de uma mesma
família no poder.
É justamente para evitar que tal conduta ocorra que a jurisprudência desta
Corte tem adotado entendimento rigoroso nos casos de separação judicial. Cito
alguns precedentes:
‘Consulta. Deputada Federal. Candidatura ao cargo de vice-prefeito
em município no qual ex-cônjuge é prefeito, no exercício do segundo man-
dato consecutivo. Impossibilidade. Separação ou divórcio ocorrido duran-
te o exercício do mandato. Precedente.
- No caso, não se admite que deputada federal concorra ao cargo de
vice-prefeito em município no qual seu ex-cônjuge exerce, pela segunda vez
consecutiva, o cargo de prefeito, se a separação ou o divórcio tiver ocorrido
no curso do mandato. Precedente desta Corte.
Consulta a que se responde negativamente.’ (Res.-TSE n. 21.475, de
26-8-2003, Relator Ministro Barros Monteiro);
‘Consulta. Elegibilidade. Deputada Federal. Cargo prefeito. Município.
Ex-cônjuge. Atual prefeito reeleito.
1. Impossibilidade de candidatura no mesmo município, na eleição
imediatamente subseqüente, se a separação ou divórcio ocorreu durante o
exercício do mandato.
2. Respondida negativamente.’ (Res.-TSE n. 21.472, de 21-8-2003,
Relator Ministro Carlos Madeira);
‘Eleitoral. Consulta. Elegibilidade. Ex-cônjuge do titular do poder
executivo reeleito. Separação judicial ou divórcio durante o exercício do
mandato. Impossibilidade. CF, art. 14, § 7º.
1. É inelegível, no território de jurisdição do titular, o ex-cônjuge do
chefe do Executivo reeleito, visto que em algum momento do mandato exis-
tiu o parentesco, podendo comprometer a lisura do processo eleitoral.
2. Consulta respondida negativamente.’ (Res.-TSE n. 21.441, de
12-8-2003, Relator Ministro Carlos Velloso).
348 R.T.J. — 195
VOTO
O Sr. Ministro Joaquim Barbosa: Senhor Presidente, vou acompanhar a eminente
Relatora, não a seguindo, entretanto, integralmente nos seus fundamentos. Mas me pare-
ceu crucial a informação comprovada nos autos de que a batalha eleitoral se travou
exclusivamente entre os dois, o ex-sogro e o recorrente.
Esse dado me basta para dar provimento ao recurso.
EXTRATO DA ATA
RE 446.999/PE — Relatora: Ministra Ellen Gracie. Recorrente: Francisco Rubensmário
Chaves Siqueira (Advogados: Elvis Del Barco Camargo e outro e José Eduardo Rangel de
Alckmin e outro). Recorridos: José Tavares de Lira (Advogados: Graciano de Lira Rocha e
outro), Coligação Democrática Ipubiense (PP/PMDB/PFL/PSDB) (Advogados: Maurício de
Fontes Oliveira e outro) e Antônio Rogério Andrade de Carvalho (Advogados: Gabriel
Portella Fagundes Neto e outro).
Decisão: Depois dos votos da Ministra Relatora e do Ministro Joaquim Barbosa,
que conhecem e dão provimento ao recurso extraordinário, o julgamento foi suspenso
em virtude de pedido de vista formulado pelo Eminente Ministro Carlos Velloso. Falou,
pelo recorrente, o Dr. José Eduardo Rangel de Alckmin. Ausente, justificadamente, neste
julgamento, o Ministro Gilmar Mendes.
Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Carlos
Velloso, Ellen Gracie, Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa. Subprocuradora-Geral da
República, Dra. Sandra Verônica Cureau.
Brasília, 14 de junho de 2005 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.
VOTO (Vista)
Ementa: constitucional. Eleitoral. Inelegibilidade: CF, art. 14, § 7º. Paren-
tesco por afinidade: ex-genro.
I - A separação de fato não afasta a inelegibilidade prevista no § 7º do art. 14
da CF.
II - Se a sentença de dissolução do casamento transitar em julgado durante o
mandato, persiste, para fins de inelegibilidade, até o fim o mandato, o vínculo de
parentesco com o ex-cônjuge, pois em algum momento do mandato existiu o
vínculo conjugal.
III - Inaplicabilidade, para fins de inelegibilidade, da norma do § 2º do art.
1.595 do Código Civil, a estabelecer que “na linha reta, a afinidade não se extin-
gue com a dissolução do casamento ou da união estável”.
IV - RE conhecido, mas não provido.
O Sr. Ministro Carlos Velloso: O Eg. Tribunal Superior Eleitoral decidiu pela
inelegibilidade de ex-genro de atual prefeito, candidato à reeleição, na jurisdição do
titular do mandato executivo, em razão do parentesco por afinidade em linha reta (fls.
1047-1051).
350 R.T.J. — 195
Convém esclarecer que o § 2º do art. 1.595 do Código Civil estabelece que “na
linha reta, a afinidade não se extingue com a dissolução do casamento ou da união
estável”. Não obstante os termos rígidos dessa disposição da lei civil, o acórdão recorri-
do restringiu, bem registrou o Ministro Pertence no mencionado despacho que inadmi-
tiu o RE, “quanto possível, a inelegibilidade” do § 7º do art. 14 da CF, “ao excluir, para
efeitos eleitorais, a incidência do art. 1.595, § 2º, do Código Civil” (fl. 1079).
Realmente, está no voto em que se embasa o acórdão que, para fins de inelegibili-
dade, o vínculo de parentesco por afinidade na linha reta se extingue com a dissolução
do casamento, não se aplicando o disposto no § 2º do art. 1.595 do Código Civil/2002
à questão de inelegibilidade. Todavia, acrescentou o voto, indicando jurisprudência do
TSE, “há de observar-se que, se a sentença de dissolução do casamento transitar em
julgado durante o mandato, persiste até o fim do mandato o vínculo de parentesco por
afinidade”.
Interpretar de outra forma significa flexibilizar, com prejuízo para a lisura dos
pleitos, a norma inscrita no § 7º do art. 14 da Constituição Federal.
Assim posta a questão, peço vênia à eminente Ministra Ellen Gracie, Relatora, para
conhecer do recurso e negar-lhe provimento.
EXPLICAÇÃO (Apartes)
A Sra. Ministra Ellen Gracie (Relatora): Presidente, permita-me só uma palavra.
Apenas a título de esclarecimento, devo dizer que o fundamento do meu voto, em
hipótese alguma, rejeita esses precedentes do TSE, muito bem calcados nessa experiên-
cia que se teve, ao longo do tempo, relativa à possibilidade de que, efetivamente, algu-
mas separações se fizessem fraudulentamente para a finalidade de garantir a permanên-
cia de um mesmo grupo familiar no poder. Não é o caso dos autos. Estamos diante de um
caso individual e é exatamente por isso, em homenagem ao meu caríssimo Colega, e
modelo de juiz que faço este esclarecimento.
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Não estaria Vossa Excelência examinando a prova
para decidir o recurso extraordinário?
A Sra. Ministra Ellen Gracie (Relatora): Mas esses fatos que estão postos nos autos
nunca foram questionados. Não devo fechar os olhos para eles.
O Sr. Ministro Carlos Velloso: O que está posto nos autos é isto: há uma sentença
que diz que a separação de fato ocorreu em 1999. Exato?
A Sra. Ministra Ellen Gracie (Relatora): Então, Presidente, eu só digo que, até o
exemplo que trouxe o Ministro Velloso, dessa questão da convivência homossexual,
gerando perante o TSE a inelegibilidade, mais demonstra que esse vínculo é analisado
sob o ponto de vista fático, não formal; e é, inclusive, o exemplo do TSE.
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Ministra, o TSE retira — isso é que precisa ficar bem
claro — a possibilidade de a separação de fato implicar o afastamento da inelegibilidade
do § 7º do art. 14. E a tese básica de Vossa Excelência é esta: há uma separação de fato,
portanto, está afastada a inelegibilidade. Repito: a jurisprudência do TSE, em outras
palavras, é que somente a sentença de dissolução anterior ao mandato é que afasta o
parentesco que geraria inelegibilidade. Separação de fato o TSE não admite, reconheci-
da ou não por sentença. Essa é a tese.
352 R.T.J. — 195
VOTO
O Sr. Ministro Gilmar Mendes: Sr. Presidente, até já votei nessa questão lá no TSE,
acompanhando a jurisprudência com base em experiência anterior, já colhida; e, tam-
bém, destituindo o Relator desse outro caso referido pelo Ministro Carlos Velloso. To-
davia, nas minhas manifestações, creio que, salvo engano, o Ministro Caputo Bastos
suscitou tentando rever o entendimento; e eu dizia que gostaria até de seguir aquela
orientação se pudesse traçar linhas inteiras, linhas divisórias entre as hipóteses de mani-
festa fraude ou de suposta fraude naquelas situações em que a separação ocorreu.
Tenho a impressão de que, neste caso, temos essa possibilidade como bem de-
monstrada no voto da Ministra Ellen Gracie, porque a própria configuração do conflito
já nos enuncia essa impossibilidade de fraude, arreglo de acerto.
De modo que, pedindo vênia ao nosso mestre, em todos os assuntos e também em
Direito Eleitoral, Professor Ministro Carlos Velloso, e ao nosso eminente Presidente,
mas também fiel à essa manifestação que eu tinha já externado no Tribunal Superior
Eleitoral, acompanho o voto da Ministra Ellen Gracie.
VOTO
O Sr. Ministro Celso de Mello: Já tive o ensejo de enfatizar, nesta Suprema Corte,
em voto proferido no julgamento do RE 344.882/BA, que, desde a promulgação do
estatuto republicano de 1891, o sistema de direito constitucional positivo vigente em
nosso País tem-se revelado claramente hostil a práticas ilegítimas, que, estimuladas
pela existência do vínculo conjugal e/ou de parentesco, culminam por afetar a normali-
dade e a legitimidade das eleições, em inaceitável deformação do modelo institucio-
nal, subvertido em seus objetivos básicos que consistem em atribuir, à autenticidade, à
transparência e à impessoalidade do processo eleitoral, a condição de valores essenciais
à consolidação do regime democrático e à preservação da forma republicana de governo.
Com o objetivo de proteger tais valores fundamentais, definiram-se, em sede
constitucional, situações de inelegibilidade destinadas a obstar a formação de grupos
hegemônicos, cuja atuação — ao monopolizar o acesso aos mandatos eletivos — acaba,
virtualmente, por patrimonializar o poder governamental, convertendo-o, em função
de uma inadmissível inversão dos postulados republicanos, em verdadeira res domestica,
R.T.J. — 195 353
Foi por tal motivo que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, quando do
julgamento do RE 98.935/PI (RTJ 103/1321, Rel. Min. Cordeiro Guerra), tendo pre-
sente esse contexto normativo, fez consignar a seguinte advertência, que guarda irre-
cusável atualidade em face do texto constitucional em vigor:
“(...) quem analisa detidamente os princípios que norteiam a Constituição
na parte atinente às inelegibilidades, há de convir que sua intenção, no particular,
é evitar, entre outras coisas, a perpetuidade de grupos familiares, ou oligarquias,
à frente dos executivos.” (Grifei)
Vê-se, portanto, que a razão subjacente à cláusula de inelegibilidade tem por
objetivo evitar “o continuísmo no poder” (Pedro Henrique Távora Niess, Direitos
Políticos - Condições de Elegibilidade e Inelegibilidades, p. 57, item n. 4, 1994, Sarai-
va) e frustrar qualquer ensaio de nepotismo ou de “perpetuação no poder através de
interposta pessoa” (Manoel Gonçalves Ferreira Filho, Comentários à Constituição
Brasileira de 1988, vol. 1/130, 1990, Saraiva).
As razões que venho de expor, associadas aos fatos expostos nesta causa, conven-
cem-me de que a eminente Relatora, em seu douto voto, revelou absoluta fidelidade aos
parâmetros axiológicos que devem condicionar o intérprete no processo de indagação
da teleologia da cláusula constitucional que define a inelegibilidade fundada em vín-
culo de parentesco ou, considerado o contexto em análise, a inelegibilidade — de todo
inocorrente na espécie — derivada de vínculo de ordem conjugal.
Sendo assim, e tendo em consideração as razões expostas, peço vênia para conhecer
e dar provimento ao presente recurso extraordinário.
É o meu voto.
EXTRATO DA ATA
RE 446.999/PE — Relatora: Ministra Ellen Gracie. Recorrente: Francisco Rubensmário
Chaves Siqueira (Advogados: Elvis Del Barco Camargo e outro e José Eduardo Rangel de
Alckmin e outro). Recorridos: José Tavares de Lira (Advogados: Graciano de Lira Rocha e
outro), Coligação Democrática Ipubiense (PP/PMDB/PFL/PSDB) (Advogados: Maurício de
Fontes Oliveira e outro) e Antônio Rogério Andrade de Carvalho (Advogados: Gabriel
Portella Fagundes Neto e outro).
Decisão: A Turma, por votação majoritária, conheceu e deu provimento ao recurso
extraordinário, nos termos do voto da Ministra Relatora, vencido o eminente Ministro
Carlos Velloso, que lhe negava provimento.
Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Carlos
Velloso, Ellen Gracie, Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa. Subprocuradora-Geral da
República, Dra. Sandra Verônica Cureau.
Brasília, 28 de junho de 2005 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.
356 R.T.J. — 195
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tri-
bunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos, negar provimento ao agravo regimental.
Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Ministro Celso de Mello, Presidente.
Brasília, 15 de fevereiro de 2005 — Carlos Velloso, Presidente e Relator.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Trata-se de agravo regimental da decisão (fls.
88-90) que negou seguimento ao agravo de instrumento interposto da decisão denega-
tória do processamento do recurso extraordinário. O acórdão recorrido, em mandado de
segurança, deu provimento ao recurso para reformar a sentença que concedera o writ
impetrado pela agravante com o objetivo de não ser autuada por funcionar em dias de
repouso, domingos e feriados.
No recurso extraordinário, fundado no art. 102, III, a e c, da Constituição Federal,
sustenta-se ofensa aos arts. 5º, caput, e 170, caput, da mesma Carta.
A decisão agravada negou seguimento ao recurso com base em precedentes da
Corte.
Sustenta a agravante, em síntese, a insubsistência da decisão impugnada, mormente
porque seu funcionamento encontra legitimidade em diversos diplomas legais, mais
precisamente nas Leis 605/49, 6.011/91, 7.701/97, 8.105/98 e 10.101/2000, na CLT e
no Decreto 27.048/49.
R.T.J. — 195 357
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Velloso (Relator): Destaco da decisão agravada:
“(...)
A decisão é de ser mantida. É que a jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal é no sentido de que compete ao Município estabelecer o horário de funci-
onamento de estabelecimentos comerciais. No RE 182.976/SP, por mim relatado,
decidiu a 2ª Turma:
‘Ementa: Constitucional. Administrativo. Município: horário de
funcionamento de estabelecimentos comerciais: competência municipal.
CF, art. 30, I. CF, artigos 5º, caput, XIII e XXXII; art. 170, IV, V e VIII.
I - Competência do Município para estabelecer horário de funciona-
mento de estabelecimentos comerciais: CF, art. 30, I.
II - Inocorrência de ofensa aos artigos 5º, caput, XIII e XXXII, art. 170,
IV, V e VIII, da CF.
III - RE não conhecido.’
No voto que proferi por ocasião do citado julgamento, disse eu:
‘(...)
Ora, a fixação do horário de funcionamento de estabelecimentos co-
merciais situados no território do Município é da competência deste, dado
que se constitui em matéria ou assunto de interesse local (CF, art. 30, I).
Destarte, a legislação local que assim disponha, desde que o faça de forma
razoável, tem legitimidade constitucional. Assim procedendo, a legislação
municipal não causa ofensa aos dispositivos inscritos no art. 170, IV (livre
concorrência), V (defesa do consumidor) e VIII (busca do pleno emprego),
dado que esses princípios devem ser visualizados no sistema da Carta.
Haveria ofensa ao princípio da livre concorrência se a legislação proibisse
para uns o funcionamento num certo horário e facultasse para outros. Isso,
evidentemente, não ocorre no caso. É dizer, o horário de funcionamento é
para todos os estabelecimentos comerciais. Os princípios de defesa do consu-
midor e busca do pleno emprego (CF, art. 170, V, art. 5º, XXXII) (CF, art. 170,
VIII), por sua vez, devem conviver com o poder de polícia exercido pelo
Município, que tem por finalidade o interesse coletivo. No caso, interfere o
interesse de parcela da comunidade, que são os empregados dos estabeleci-
mentos, com direito ao descanso. De outro lado, a busca do pleno emprego
não se faz desordenadamente.
A alegação no sentido de que a legislação municipal, no ponto, é
atentatória ao princípio da isonomia — CF, art. 5º, caput — não é razoável,
dado que o horário estabelecido atinge a todos e não apenas a alguns
358 R.T.J. — 195
EXTRATO DA ATA
AI 481.886-AgR/SP — Relator: Ministro Carlos Velloso. Agravante: Companhia
Brasileira de Distribuição (Advogados: Cláudia de Almeida São Bernardo e outro).
Agravado: Município de Ribeirão Preto (Advogados: Regina Lucia Cocicov Lombardi).
R.T.J. — 195 359
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tri-
bunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos, negar provimento no agravo regimental.
Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Ministro Celso de Mello, Presidente.
Brasília, 15 de fevereiro de 2005 — Carlos Velloso, Presidente e Relator.
360 R.T.J. — 195
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Trata-se de agravo regimental da decisão (fls. 404-
405) que, reconhecendo a ausência de nexo de causalidade entre a omissão estatal e o
evento danoso, deu provimento ao agravo e, desde logo, conheceu do recurso extraordi-
nário e deu-lhe provimento.
Sustentam os agravantes, em síntese, que o recurso não poderia ter sido provido.
A uma, porque o agravo regimental interposto pelo Estado do Rio Grande do Sul
encontrava-se intempestivo. A duas, porque “o nexo causal entre o evento danoso e a
negligência do Poder Público foi declarada existente pelo acórdão da instância
ordinária” (fl. 412).
Ao final, requerem os agravantes a reconsideração da decisão agravada ou, caso
assim não se entenda, o provimento do presente agravo regimental.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Velloso (Relator): Inicialmente, ressalte-se que, ao contrário
do afirmado pelos agravantes, o agravo regimental interposto pelo Estado do Rio Gran-
de do Sul (fls. 371-385) mostra-se tempestivo, pois interposto dentro do decêndio legal.
No mais, o agravo não merece prosperar. No julgamento do RE 369.820/RS, por
mim relatado, decidiu o Supremo Tribunal Federal, por sua 2ª Turma:
“Ementa: Constitucional. Administrativo. Civil. Responsabilidade civil
das pessoas públicas. Ato omissivo do poder público: latrocínio praticado por
apenado fugitivo. Responsabilidade subjetiva: culpa publicizada: falta do ser-
viço. CF, art. 37, § 6º.
I - Tratando-se de ato omissivo do poder público, a responsabilidade civil
por tal ato é subjetiva, pelo que exige dolo ou culpa, esta numa de suas três verten-
tes, a negligência, a imperícia ou a imprudência, não sendo, entretanto, necessário
individualizá-la, dado que pode ser atribuída ao serviço público, de forma genérica,
a falta do serviço.
II – A falta do serviço — faute du service dos franceses — não dispensa o
requisito da causalidade, vale dizer, do nexo de causalidade entre a ação omissiva
atribuída ao poder público e o dano causado a terceiro.
III – Latrocínio praticado por quadrilha da qual participava um apenado que
fugira da prisão tempos antes: neste caso, não há falar em nexo de causalidade entre
a fuga do apenado e o latrocínio. Precedentes do STF: RE 172.025/RJ, Ministro
Ilmar Galvão, DJ de 19-12-96; RE 130.764/PR, Relator Ministro Moreira Alves,
RTJ 143/270.
IV – RE conhecido e provido.” (DJ de 27-2-2004)
No meu voto, disse eu:
“(...)
R.T.J. — 195 361
III
No caso, o acórdão decidiu pela ocorrência da falta do serviço.
A falta do serviço decorre do não-funcionamento ou do funcionamento insu-
ficiente, inadequado, tardio ou lento do serviço que o poder público deve prestar.
No RE 179.147/SP, por mim relatado, decidiu esta 2ª Turma que, ‘tratando-se
de ato omissivo do poder público, a responsabilidade civil por tal ato é subjetiva,
pelo que exige dolo ou culpa, numa de suas três vertentes, negligência, imperícia
ou imprudência, não sendo, entretanto, necessário individualizá-la, dado que
pode ser atribuída ao serviço público, de forma genérica, a faute du service dos
franceses.’ (RTJ 179/791).
IV
Todavia, a faute du service não dispensa o requisito da causalidade, vale
dizer, do nexo de causalidade entre a ação omissiva atribuída ao poder público e o
dano causado a terceiro. O Ministro Moreira Alves, no voto que proferiu no RE
130.764/PR, lecionou que ‘a teoria adotada quanto ao nexo de causalidade é a
teoria do dano direto e imediato, também denominada teoria da interrupção do
nexo causal’, que ‘sem quaisquer considerações de ordem subjetiva, afasta os in-
convenientes das outras duas teorias existentes: a da equivalência das condições e
a da causalidade adequada’ (cf. Wilson Mello da Silva, Responsabilidade sem
culpa, n. 78 e 79, pp. 128 e seguintes, Ed. Saraiva, São Paulo, 1974). Essa teoria,
como bem demonstra Agostinho Alvim (Da Inexecução das Obrigações, 5ª ed.,
n. 226, p. 370, Ed. Saraiva, São Paulo, 1980), só admite o nexo de causalidade
quando o dano é efeito necessário de uma causa, o que abarca o dano direto e
imediato sempre, e, por vezes, o dano indireto e remoto, quando, para a produção
deste, não haja concausa sucessiva. Daí dizer Agostinho Alvim (1. c): ‘os danos
indiretos ou remotos não se excluem, só por isso; em regra, não são indenizáveis,
porque deixam de ser efeito necessário, pelo aparecimento de concausas. Suposto
não existam estas, aqueles danos são indenizáveis.’ (RE 130.764/PR, RTJ 143/
270, 283).
V
A questão a ser posta, agora, é esta: a fuga de um apenado da prisão, vindo
este, tempos depois, integrando quadrilha de malfeitores, assassinar alguém, im-
plica obrigação de indenizar por parte do poder público, sob color de falta do
serviço?
No citado RE 130.764/PR, da Relatoria do Ministro Moreira Alves, cuidou-se
de tema semelhante ao aqui tratado. Ali, a espécie versada foi a seguinte: bando de
marginais, integrado por dois evadidos de prisões estaduais, invadiu residência e,
dominando a família, apossou-se de bens desta, levando o terror às pessoas, agre-
dindo o dono da casa e causando elevado prejuízo à família. Proposta a ação de
indenização, reconheceram as instâncias ordinárias a responsabilidade civil do
362 R.T.J. — 195
VI
Assim posta a questão, conheço do recurso e dou-lhe provimento.”
A decisão agravada, assentada na jurisprudência e na melhor doutrina, é de ser
mantida, por seus próprios fundamentos.
Do exposto, nego provimento ao agravo.
EXTRATO DA ATA
AI 489.254-AgR/RS — Relator: Ministro Carlos Velloso. Agravantes: Teresinha
Silva dos Santos Moura e outro (Advogado: João Carlos de Oliveira Antonelli). Agravado:
Estado do Rio Grande do Sul (Advogados: PGE/RS – Karina da Silva Brum e outro).
Decisão: Negou-se provimento, decisão unânime. Ausente, justificadamente,
neste julgamento, o Ministro Celso de Mello. Presidiu este julgamento o Ministro
Carlos Velloso.
Presidência do Ministro Carlos Velloso. Presentes à sessão os Ministros Ellen
Gracie, Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa. Ausente, justificadamente, o Ministro Celso
de Mello. Subprocurador-Geral da República, Dr. Geraldo Brindeiro.
Brasília, 15 de fevereiro de 2005 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tri-
bunal Federal, em Segunda Turma, sob a Presidência do Ministro Celso de Mello, na
conformidade da ata do julgamentos e das notas taquigráficas, por unanimidade de
votos, negar provimento ao recurso de agravo, nos termos do voto do Relator.
Brasília, 1º de fevereiro de 2005 — Celso de Mello, Presidente — Carlos Velloso,
Relator,
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Trata-se de agravo regimental interposto da deci-
são (fls. 2237-2242) que negou seguimento ao agravo de instrumento interposto da
decisão denegatória do processamento do recurso extraordinário. O acórdão recorrido
condenou o agravante à pena de 3 (três) anos de reclusão, a ser cumprida em regime
aberto e com recolhimento domiciliar mais multa, e declarou, como efeito da condena-
ção, a perda do cargo de magistrado.
No recurso extraordinário criminal, fundado no art. 102, III, a, da Constituição
Federal, sustenta-se ofensa ao art. 5º, X e XII, da mesma Carta.
A decisão agravada negou seguimento ao recurso com base na Súmula 279/STF.
Sustenta o agravante, em síntese, a insubsistência da decisão impugnada, pelos
seguintes argumentos:
a) desnecessidade da análise do conjunto fático-probatório;
b) ausência de indicação, no acórdão recorrido, de que esse estaria baseado em
outras provas suficiente para a condenação;
c) inexistência de “prova autônoma, não decorrente de prova ilícita, que dê
ensejo à manutenção da condenação do Agravante” (fl. 2267);
R.T.J. — 195 365
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Velloso (Relator): Assim a decisão agravada, ora sob apreciação:
“(...)
O acórdão recorrido, proferido pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça do
Estado do Paraná, condenou o agravante à pena de 3 (três) anos de reclusão, a ser
cumprida em regime aberto e com recolhimento domiciliar, mais multa, declaran-
do-se, ainda, como efeito da condenação, a perda do cargo de magistrado, em
acórdão assim ementado:
‘Crime funcional – Corrupção passiva atribuída a magistrado – Co-
autoria – prova satisfatória – Condenação – Continuidade delitiva –
Apenamento – Perda do cargo.
1.- A circunstância de co-réu não ser funcionário público não é
obstativa a que o mesmo figure como sujeito ativo do crime de corrupção
passiva.
2.- É de rigor a condenação dos acusados, quando a materialidade e a
autoria restarem induvidosamente demonstradas nos autos, extraídas da aná-
lise do conjunto probatório (declarações de sujeitos passivos secundários, de
testemunhas, da prova documental, da indiciária e das contradições e impos-
turas dos réus).
3.- Apenamento que tem como norte a natureza retributiva e preventiva
do crime, extremamente lesivo aos interesses da sociedade, sem deixar de
levar em conta o sistema trifásico (art. 68 do CP).
4.- Substituição da pena carcerária não autorizada, em face do exame
das circunstâncias judiciais totalmente desfavoráveis aos agentes.
5.- Perda do cargo de juiz de direito, como efeito extra penal específi-
co da condenação, com apoio no disposto pelo art. 95, inciso I, da Consti-
tuição Federal e 26, inciso I da Lei Orgânica da Magistratura Nacional.’
(Fls. 1760-1761)
Daí o recurso extraordinário interposto por Ronaldo Echstein de Andrade,
fundado no art. 102, III, a, da Constituição Federal, com alegação de ofensa ao art.
5º, X e XII, da mesma Carta.
Sustenta, em síntese, a nulidade do acórdão proferido pelo Órgão Especial do
Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por estar baseado em escutas telefônicas
realizadas antes da vigência da Lei 9.296/96 e em gravações de conversas não
autorizadas pelo agravante.
366 R.T.J. — 195
Alega, ainda, que tais provas não poderiam servir de base à condenação, pois
foram produzidas sem a intimação do acusado para que exercesse seu direito ao
contraditório e à ampla defesa.
O recurso foi inadmitido na origem.
Autos conclusos em 22-4-2004.
Decido.
O RE e inviável.
Destaco do acórdão recorrido:
‘(...)
A análise do painel probatório é de ser feita com minúcia. Mas, em tema
de prova e sua repercussão, a douta Procuradoria Geral de Justiça, através das
judiciosas alegações finais de fls. 1.541 usque 1.605, produziu peça impecá-
vel, que como tal merece transcrição:
‘(...)
Sem embargo, os fatos deixaram vestígios materiais – Corpus
delicti – cuja referência merece destaque. Quanto ao primeiro crime, a
solicitação de vantagem econômica efetuada junto a Roberto Wypych
Júnior, feita pessoalmente, não deixou vestígios. Porém, o desdobra-
mento da atuação de Koite Dodo, insistindo na vantagem ilícita atra-
vés de telefonemas, encontra-se materializado nos autos, a partir das
contas telefônicas de fls. 612/614, bem assim do levantamento nelas
baseado, fls. 647, no qual a d. Corregedoria Geral de Justiça constatou
sete telefonemas de Koite a Roberto Wypych Júnior, todos ocorridos
no mês de maio de 1995.
(...)
Portanto, os poucos vestígios deixados pelos fatos criminosos
foram colhidos, conforme dispõe a regra do art. 158 do C.P.P., sendo de
reiterar-se que os crimes tratados não exigem resultado naturalístico
para aperfeiçoarem-se.’
(...)
II. 3. a – Declarações de Ofendidos
Quanto às declarações dos ofendidos, in casu, os extranei, cons-
tituem fonte de extrema importância na fixação da autoria. De logo, é
importante salientar a condição de sujeitos passivos secundários de
indesejável conflito com o magistrado titular de uma das Varas Cíveis
da Comarca, avultando em relação a Roberto Wypych a partir das reta-
liações que relata ter sofrido em relação ao processo em que litigou
contra o ‘Lembrasul Supermercados’, que teria sido favorecido propo-
sitalmente pelo acusado Ronaldo, além do constrangimento próprio de
quem mantém a decência como norte do existir, evidenciam explícitos
prejuízos de cunho moral), não necessariamente patrimoniais (cf.
Damásio, op. cit., vol. I, 13º ed., São Paulo, Saraiva, 1988, p. 158).
R.T.J. — 195 367
(...)
Destacada a condição de ofendidos de Roberto Wypych Júnior e
Maurício Monteiro Barros Vieira, impende analisar seus depoimentos.
(...)
II. 3. b – Declarações de testemunhas
Das testemunhas ouvidas, Leonor da Silveira, secretária do advo-
gado Maurício, é de extrema importância para o Ministério Público, já
que: a) confirma in totum o relato de Maurício no sentido de ter recebi-
do Koite Dodo em seu escritório na manhã de sábado, 22 de julho de
1995; b) ratifica a ocorrência da gravação da conversa de Maurício
com seu interlocutor Koite; c) confirma os telefonemas que foram
efetuados no entorno do dia da visita.
(...)
II. 3. c – Provas documentais
Aqui entram em linha de consideração as evidências materiais
das condutas de Koite e Ronaldo, sendo: a) o rol de telefonemas man-
tido entre ambos; b) os telefonemas de Koite a Roberto Wypych Júnior
e Maurício Monteiro Barros Vieira; c) os recortes de jornais estampan-
do às largas os fatos escandalosos objetos da percutio criminis; d) a
degravação constante do volume IV, fls. 648 e ss., dando conta da
veracidade do relato de Maurício Monteiro Barros Vieira, confirmando
a conversa que manteve com Koite Dodo, em 22 de julho de 1995.
(...).’ (Fls. 1728-1736)
A apreciação do extraordinário, está-se a ver, não prescindiria do exame de
prova, o que não é possível. Súmula 279/STF.
Acrescente-se, ademais, que a matéria relativa à licitude das gravação de
conversas feita ou autorizada por um dos interlocutores já foi apreciada pela 2ª
Turma quando do julgamento do HC 75.338/RJ, Rel. Ministro Nelson Jobim, que
restou assim ementado:
‘Ementa: Habeas corpus. Prova. Licitude. Gravação de telefonema
por interlocutor. É lícita a gravação de conversa telefônica feita por um
dos interlocutores, ou com sua autorização, sem ciência do outro, quando
há investida criminosa deste último. É inconsistente e fere o senso comum
falar-se em violação do direito à privacidade quando interlocutor grava
diálogo com seqüestradores, estelionatários ou qualquer tipo de chanta-
gista.
Ordem indeferida.’ (DJ de 25-6-98)
Outro não foi o entendimento da 1ª Turma no julgamento do RE 212.081/RO,
Rel. Ministro Octavio Gallotti:
‘Ementa: Captação, por meio de fita magnética, de conversa entre pre-
sentes, ou seja, a chamada gravação ambiental, autorizada por um dos
interlocutores, vítima de concussão, sem o conhecimento dos demais.
368 R.T.J. — 195
EXTRATO DA ATA
AI 503.617-AgR/PR — Relator: Ministro Carlos Velloso. Agravante: Ronaldo
Echstein de Andrade (Advogados: João Roberto Santos Régnier e outro). Agravado:
Ministério Público do Estado do Paraná.
Decisão: A Turma, por votação unânime, negou provimento ao recurso de agravo,
nos termos do voto do Relator.
Presidência do Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão os Ministros Carlos
Velloso, Ellen Gracie, Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa. Subprocurador-Geral da
República, Dr. Haroldo Ferraz da Nóbrega.
Brasília, 1º de fevereiro de 2005 — Carlos Alberto Cantanhede, Coordenador.
ÍNDICE ALFABÉTICO
A
PrPn Ação penal. Crime material contra a ordem tributária. Processo administrativo
pendente. Condição objetiva de punibilidade: inocorrência. Justa causa:
ausência. Prescrição: suspensão. Lei n. 8.137/90, art. 1º. HC 84.262 RTJ
195/114
PrPn Ação penal privada. (...) Busca e apreensão. HC 85.177 RTJ 195/208
PrPn Ação penal pública condicionada. Legitimidade ativa. Ministério Público.
Estupro e atentado violento ao pudor. Miserabilidade: presunção. Represen-
tação: comparecimento à autoridade policial. HC 85.556 RTJ 195/266
PrPn Ação penal pública incondicionada. (...) Busca e apreensão. HC 85.177
RTJ 195/208
Ct Ação popular. (...) Competência originária. Rcl 2.833 RTJ 195/24
PrSTF Ação rescisória. Decisão rescindenda conforme jurisprudência do STF.
Decisão de Relator. Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal –
RISTF, art. 21, § 1º. AR 1.754-AgR RTJ 195/3
TrGr Acidente de trabalho. Estabilidade provisória. Lei n. 8.213/91, art. 118. RE
409.919-AgR RTJ 195/313
Trbt ADCT/88, art. 41, §§ 1º, 2º e 3º. (...) Imposto sobre Serviços – ISS. RE
361.829-AgR RTJ 195/299
Adm Adicional de magistério: incidência. (...) Servidor público estadual. RE
208.156 RTJ 195/288
Adm Adicional por tempo de serviço. (...) Remuneração. MS 24.527 RTJ 195/51
PrCv Agravo de instrumento. Traslado deficiente. Certidão de publicação do acórdão
recorrido: ausência. Princípio da legalidade: ofensa inocorrente. Súmula 288. AI
179.560-AgR RTJ 195/281
IV Ame-Bus — ÍNDICE ALFABÉTICO
C
PrPn Cabimento. (...) Habeas corpus. RHC 81.740 RTJ 195/80 – HC 83.346 RTJ
195/85 – HC 84.869 RTJ 195/183 – HC 85.457 RTJ 195/253 – HC 85.673
RTJ 195/274
El Candidato: ex-genro do prefeito. (...) Mandato eletivo. RE 446.999 RTJ
195/342
PrCv Caráter descritivo. (...) Súmula. AI 179.560-AgR RTJ 195/281
Adm Cargo público. Provimento e exoneração. Presidente da República: compe-
tência. Ministro de Estado: delegação. CF/88, art. 84, parágrafo único. De-
creto n. 3.035/99. RMS 24.128 RTJ 195/42
Adm Caso fortuito: não-configuração. (...) Desapropriação. MS 24.442 RTJ
195/47
Adm Cassação de aposentadoria. (...) Competência. MS 23.219-AgR RTJ 195/38
Adm Cassação de aposentadoria. (...) Processo administrativo. MS 23.219-AgR
RTJ 195/38
Pn Causa especial de aumento. (...) Pena. HC 85.673 RTJ 195/274
PrCv Certidão de publicação do acórdão recorrido: ausência. (...) Agravo de instru-
mento. AI 179.560-AgR RTJ 195/281
El CF/88, art. 14, § 7º: interpretação teleológica. (...) Mandato eletivo. RE
446.999 RTJ 195/342
Ct CF/88, art. 22, I. (...) Competência legislativa. ADI 2.257 RTJ 195/16
Ct CF/88, art. 61, § 1º, II, “e”. (...) Processo legislativo. ADI 2.750 RTJ 195/19
Adm CF/88, art. 84, parágrafo único. (...) Cargo público. RMS 24.128 RTJ 195/42
Ct CF/88, art. 102, I, “f”. (...) Competência originária. Rcl 2.833 RTJ 195/24
Trbt CF/88, art. 150, VI, “a”, e § 2º. (...) Imunidade tributária recíproca. RE
388.838-AgR RTJ 195/306
Trbt CF/88, art. 151, III. (...) Imposto sobre Serviços – ISS. RE 361.829-AgR RTJ
195/299
Pn Chamada de co-réu. (...) Roubo. HC 85.457 RTJ 195/253
PrPn Chamada de co-réu. (...) Sentença condenatória. RHC 81.740 RTJ 195/80
PrPn Chamada de co-réu: fundamento único. (...) Sentença criminal. RHC 84.845
RTJ 195/179
PrPn Código de Trânsito Brasileiro – CTB, arts. 303, 306 e 308. (...) Competência
criminal. HC 85.350 RTJ 195/243
PrPn Coisa julgada material. (...) Inquérito policial. HC 83.346 RTJ 195/85
VI Com-Con — ÍNDICE ALFABÉTICO
PrPn Condenação: nulidade. (...) Sentença criminal. RHC 84.845 RTJ 195/179
PrPn Condição objetiva de punibilidade: inocorrência. (...) Ação penal. HC
84.262 RTJ 195/114
Pn Confissão extrajudicial. (...) Roubo. HC 85.457 RTJ 195/253
Ct Conflito federativo. (...) Competência originária. Rcl 2.833 RTJ 195/24
Adm Cônjuge: falecimento. (...) Desapropriação. MS 24.442 RTJ 195/47
Pn Consumação: momento. (...) Roubo. HC 85.262 RTJ 195/228
Adm Controle jurisdicional. (...) Ato administrativo. RMS 24.699 RTJ 195/64
PrPn Conversa telefônica. (...) Prova criminal. AI 503.617-AgR RTJ 195/363
TrGr Correção monetária de conta vinculada. (...) Fundo de Garantia do Tempo
de Serviço – FGTS. RE 418.918 RTJ 195/321
Pn CP/40, art. 60, § 2º: inaplicabilidade. (...) Pena. HC 84.721 RTJ 195/166
Pn CP/40, arts. 115 e 117, IV. (...) Prescrição. AI 394.065-AgR-ED-ED RTJ
195/310
Pn CP/40, art. 157, § 2º, II. (...) Roubo. HC 85.262 RTJ 195/228
PrPn CP/40, art. 184, “caput”. (...) Busca e apreensão. HC 85.177 RTJ 195/208
PrPn CP/40, art. 184, §§ 1º e 2º. (...) Busca e apreensão. HC 85.177 RTJ 195/208
PrCv CPC/73, art. 134, I a VI. (...) Magistrado. RMS 24.613-AgR RTJ 195/60
PrCv CPC/73, art. 138, § 1º. (...) Magistrado. RMS 24.613-AgR RTJ 195/60
PrPn CPP/41, art. 240, § 1º. (...) Busca e apreensão. HC 85.177 RTJ 195/208
PrPn CPP/41, art. 312. (...) Prisão preventiva. HC 84.680 RTJ 195/155
PrPn CPP/41, art. 527. (...) Busca e apreensão. HC 85.177 RTJ 195/208
PrPn CPP/41, art. 580. (...) Habeas corpus. HC 84.409-AgR RTJ 195/149
PrPn Crime contra a propriedade intelectual. (...) Busca e apreensão. HC 85.177
RTJ 195/208
PrPn Crime de trânsito. (...) Competência criminal. HC 85.350 RTJ 195/243
PrPn Crime hediondo. (...) Execução penal. HC 85.279 RTJ 195/234
Pn Crime hediondo. (...) Pena. HC 85.585 RTJ 195/268
PrPn Crime hediondo. (...) Prisão preventiva. HC 85.237 RTJ 195/212
PrPn Crime material contra a ordem tributária. (...) Ação penal. HC 84.262 RTJ
195/114
PrPn Crime praticado a bordo de aeronave. (...) Competência criminal. HC 85.059
RTJ 195/194
Pn Crime previsto em lei especial. (...) Pena. HC 84.721 RTJ 195/166
VIII Deb-Des — ÍNDICE ALFABÉTICO
D
Pn Débito: pagamento após o recebimento da denúncia. (...) Extinção da
punibilidade. HC 85.452 RTJ 195/249
Adm Decadência: inocorrência. (...) Processo administrativo. MS 22.127 RTJ
195/36
PrSTF Decisão de Relator. (...) Ação rescisória. AR 1.754-AgR RTJ 195/3
PrPn Decisão denegatória de mandado de segurança. (...) Habeas corpus. HC
84.869 RTJ 195/183
PrSTF Decisão monocrática de ministro do STF em HC. (...) Competência recursal.
RHC 85.243-QO RTJ 195/227
PrSTF Decisão que concede ou denega medida liminar. (...) Recurso extraordinário.
RE 289.764-AgR RTJ 195/293
PrSTF Decisão rescindenda conforme jurisprudência do STF. (...) Ação rescisória.
AR 1.754-AgR RTJ 195/3
Adm Decreto Legislativo n. 444/02. (...) Remuneração. MS 24.527 RTJ 195/51
Adm Decreto n. 3.035/99. (...) Cargo público. RMS 24.128 RTJ 195/42
PrPn Decreto n. 3.226/99. (...) Execução penal. HC 85.279 RTJ 195/234
PrPn Defensor do acusado: não-notificação. (...) Júri. HC 85.052 RTJ 195/191
Adm Demissão. (...) Processo administrativo. RMS 24.128 RTJ 195/42
Adm Demissão de servidor público. (...) Ato administrativo. RMS 24.699 RTJ
195/64
Adm Demissão: ilegalidade. (...) Processo administrativo. RMS 24.699 RTJ
195/64
PrPn Denúncia. Inépcia. Narração genérica. Quadrilha ou bando. Princípio da
dignidade da pessoa humana: ofensa. HC 84.409 RTJ 195/126
PrPn Denúncia. Nulidade. Incompetência de juízo. Princípio do juiz natural:
ofensa. Inq 2.051-QO RTJ 195/5
PrCv Deputado federal pensionista. (...) Mandado de segurança. MS 24.527 RTJ
195/51
Adm Deputado federal pensionista. (...) Remuneração. MS 24.527 RTJ 195/51
PrPn Desaforamento. (...) Júri. HC 85.052 RTJ 195/191
PrCv Desapropriação. (...) Mandado de segurança. MS 24.999-ED RTJ 195/75
Adm Desapropriação. Reforma agrária. Produtividade do imóvel. Cônjuge: fa-
lecimento. Caso fortuito: não-configuração. MS 24.442 RTJ 195/47
ÍNDICE ALFABÉTICO — Des-Est IX
E
PrCv Efeito modificativo. (...) Embargos de declaração. AI 418.402-AgR-ED-ED-
ED RTJ 195/316
El Elegibilidade. (...) Mandato eletivo. RE 446.999 RTJ 195/342
PrCv Embargos de declaração. Efeito modificativo. Tribunal de origem: erro de
processamento. AI 418.402-AgR-ED-ED-ED RTJ 195/316
PrCv Embargos de declaração. Ministério Público: intimação pessoal. Entrada
dos autos em setor administrativo do MP: termo inicial. HC 83.915 RTJ
195/104
PrPn Endereço: alteração sucessiva. (...) Prisão preventiva. HC 84.202 RTJ 195/109
PrCv Entrada dos autos em setor administrativo do MP: não-comprovação. (...)
Recurso. HC 83.915 RTJ 195/104
PrCv Entrada dos autos em setor administrativo do MP: termo inicial. (...) Embargos
de declaração. HC 83.915 RTJ 195/104
TrGr Enunciado n. 21 das Turmas Recursais da Seção Judiciária do Rio de Janeiro:
inconstitucionalidade. (...) Fundo de Garantia do Tempo de Serviço –
FGTS. RE 418.918 RTJ 195/321
Ct Estabelecimento comercial: horário de funcionamento. (...) Competência
legislativa. AI 481.886-AgR RTJ 195/356
TrGr Estabilidade provisória. (...) Acidente de trabalho. RE 409.919-AgR RTJ
195/313
Ct Estacionamento em local proibido: aquisição de medicamento. (...) Compe-
tência legislativa. ADI 2.928 RTJ 195/33
PrPn Estupro e atentado violento ao pudor. (...) Ação penal pública condicionada.
HC 85.556 RTJ 195/266
X Exc-Fun — ÍNDICE ALFABÉTICO
F
Adm “Faute de service” (falta do serviço): não-configuração. (...) Responsabilidade
civil do Estado. AI 489.254-AgR RTJ 195/359
Pn Fixação acima do máximo legal. (...) Pena. HC 85.673 RTJ 195/274
PrPn Fundamentação insuficiente. (...) Sentença condenatória. RHC 81.740 RTJ
195/80
PrPn Fundamentação suficiente. (...) Prisão preventiva. HC 84.202 RTJ 195/109 –
HC 84.680 RTJ 195/155 – HC 84.761 RTJ 195/175
PrPn Fundamentação suficiente. (...) Prova criminal. HC 84.869 RTJ 195/183
Trbt Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS. Natureza jurídica. RE
418.918 RTJ 195/321
TrGr Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS. Termo de adesão:
desconsideração. Correção monetária de conta vinculada. Lei Comple-
mentar n. 110/01. Enunciado n. 21 das Turmas Recursais da Seção Judiciária
do Rio de Janeiro: inconstitucionalidade. RE 418.918 RTJ 195/321
PrSTF Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS: correção de saldo. (...)
Recurso extraordinário. AR 1.754-AgR RTJ 195/3
ÍNDICE ALFABÉTICO — Gar-Ile XI
G
PrPn Garantia da ordem pública. (...) Prisão preventiva. HC 84.680 RTJ 195/155 –
HC 84.761 RTJ 195/175
PrPn Gravação por interlocutor. (...) Prova criminal. AI 503.617-AgR RTJ 195/363
H
PrPn Habeas corpus. Cabimento. Decisão denegatória de mandado de segurança.
HC 84.869 RTJ 195/183
PrPn Habeas corpus. Cabimento. Idoneidade jurídica da prova: aferição. RHC
81.740 RTJ 195/80 – HC 85.457 RTJ 195/253
PrPn Habeas corpus. Cabimento. Prequestionamento: inexigibilidade. Recurso
ordinário ou extraordinário: independência. HC 85.673 RTJ 195/274
PrPn Habeas corpus. Cabimento. Recurso ordinário ou extraordinário: indepen-
dência. HC 83.346 RTJ 195/85
PrPn Habeas corpus. Cabimento. Sigilo bancário e fiscal: quebra. Prova em proce-
dimento penal. HC 84.869 RTJ 195/183
PrPn Habeas corpus. Descabimento. Matéria de prova. RHC 81.740 RTJ 195/80
PrPn Habeas corpus. Extensão a co-réu: descabimento. Situação objetivamente
idêntica: inocorrência. CPP/41, art. 580. HC 84.409-AgR RTJ 195/149
PrPn Habeas corpus. Extensão a co-réu: indeferimento. Matéria nova: inclusão.
Supressão de instância. HC 84.409-AgR RTJ 195/149
PrPn Habeas corpus. Julgamento pelo STJ: demora. Excesso de prazo: inocorrência.
Liberdade de locomoção: ofensa inocorrente. HC 85.670 RTJ 195/271
PrPn Habeas corpus. Prejudicialidade. Apelação: desprovimento. Prisão: manu-
tenção como efeito da condenação. HC 84.761 RTJ 195/175
PrPn Habeas corpus. Questão não apreciada pelo STJ. Supressão de instância.
HC 85.262 RTJ 195/228
I
Pn Idade inferior a setenta anos. (...) Prescrição. AI 394.065-AgR-ED-ED RTJ
195/310
PrPn Idoneidade jurídica da prova: aferição. (...) Habeas corpus. RHC 81.740
RTJ 195/80 – HC 85.457 RTJ 195/253
PrCv Ilegitimidade. (...) Mandado de segurança. MS 24.999-ED RTJ 195/75
PrCv Ilegitimidade da Mesa do Senado Federal. (...) Mandado de segurança. MS
24.527 RTJ 195/51
XII Imp-Ise — ÍNDICE ALFABÉTICO
J
PrPn Juiz da Vara da Infância e Juventude. (...) Competência jurisdicional. HC
85.503 RTJ 195/259
Adm Julgamento fora do prazo. (...) Processo administrativo. MS 22.127 RTJ
195/36
PrPn Julgamento pelo STJ: demora. (...) Habeas corpus. HC 85.670 RTJ 195/271
PrPn Júri. Desaforamento. Defensor do acusado: não-notificação. Princípio do
contraditório: ofensa. HC 85.052 RTJ 195/191
PrPn Justa causa: ausência. (...) Ação penal. HC 84.262 RTJ 195/114
PrPn Justiça comum. (...) Competência criminal. HC 85.350 RTJ 195/243
PrPn Justiça Federal. (...) Competência criminal. HC 85.059 RTJ 195/194
L
Adm Latrocínio praticado por presidiário foragido. (...) Responsabilidade civil do
Estado. AI 489.254-AgR RTJ 195/359
PrPn Lavagem de dinheiro: suspeita razoável. (...) Prova criminal. HC 84.869
RTJ 195/183
PrPn Legitimidade ativa. (...) Ação penal pública condicionada. HC 85.556 RTJ
195/266
PrCv Legitimidade passiva da Mesa da Câmara dos Deputados. (...) Mandado de
segurança. MS 24.527 RTJ 195/51
Ct Lei Complementar estadual n. 239/02/ES: inconstitucionalidade. (...) Pro-
cesso legislativo. ADI 2.750 RTJ 195/19
Adm Lei Complementar estadual n. 645/89/SP. (...) Servidor público estadual.
RE 208.156 RTJ 195/288
Ct Lei Complementar estadual n. 851/98/SP, art. 26: inconstitucionalidade. (...)
Competência legislativa. ADI 2.257 RTJ 195/16
TrGr Lei Complementar n. 110/01. (...) Fundo de Garantia do Tempo de Serviço –
FGTS. RE 418.918 RTJ 195/321
Pn Lei de Execução Penal – LEP, art. 147. (...) Pena. HC 85.289 RTJ 195/241
Ct Lei estadual n. 10.331/99/SP: inconstitucionalidade. (...) Competência
legislativa. ADI 2.928 RTJ 195/33
PrPn Lei n. 1.060/50, art. 5º, § 5º. (...) Intimação criminal. HC 84.747 RTJ 195/172
Pn Lei n. 6.368/76, arts. 14 e 18, I. (...) Pena. HC 85.673 RTJ 195/274
Pn Lei n. 8.069/90, arts. 112, IV, e 122, III. (...) Medida socioeducativa. HC
85.503 RTJ 195/259
XIV Lei-Man — ÍNDICE ALFABÉTICO
PrPn Lei n. 8.069/90, art. 122, I e II. (...) Competência jurisdicional. HC 85.503
RTJ 195/259
PrPn Lei n. 8.072/90, art. 2º, I. (...) Execução penal. HC 85.279 RTJ 195/234
Pn Lei n. 8.072/90, art. 2º, § 1º. (...) Pena. HC 85.585 RTJ 195/268
Pn Lei n. 8.072/90, art. 8º. (...) Pena. HC 85.673 RTJ 195/274
Adm Lei n. 8.112/90, art. 142, I e § 3º. (...) Prescrição. MS 23.219-AgR RTJ 195/38
Adm Lei n. 8.112/90, arts. 143 e 149. (...) Processo administrativo. MS 22.127
RTJ 195/36
PrPn Lei n. 8.137/90, art. 1º. (...) Ação penal. HC 84.262 RTJ 195/114
TrGr Lei n. 8.213/91, art. 118. (...) Acidente de trabalho. RE 409.919-AgR RTJ
195/313
Adm Lei n. 8.429/92. (...) Servidor público. RMS 24.699 RTJ 195/64
Adm Lei n. 8.429/92, art. 20. (...) Servidor público. RMS 24.699 RTJ 195/64
Pn Lei n. 10.684/03, art. 9º, § 2º. (...) Extinção da punibilidade. HC 85.452 RTJ
195/249
Adm Lesão temporária. (...) Concurso público. RE 351.142 RTJ 195/295
Pn Liberdade assistida. (...) Medida socioeducativa. HC 85.503 RTJ 195/259
PrPn Liberdade de locomoção: ofensa inocorrente. (...) Habeas corpus. HC
85.670 RTJ 195/271
PrPn Liberdade provisória. Descabimento. Prisão preventiva: legalidade. HC
85.673 RTJ 195/274
PrPn Licitude. (...) Prova criminal. AI 503.617-AgR RTJ 195/363
Trbt Locação de imóvel a terceiro. (...) Imunidade tributária recíproca. RE
388.838-AgR RTJ 195/306
PrPn Local do crime: insegurança, isolamento e falta de apoio estatal. (...) Prisão
preventiva. HC 84.680 RTJ 195/155
M
PrCv Magistrado. Impedimento: inocorrência. CPC/73, art. 134, I a VI. RMS
24.613-AgR RTJ 195/60
PrCv Magistrado. Suspeição. Presunção relativa. Preclusão. CPC/73, art. 138, § 1º.
RMS 24.613-AgR RTJ 195/60
PrCv Mandado de segurança. Assistência e intervenção de terceiro. Ilegitimidade.
Incra. Desapropriação. MS 24.999-ED RTJ 195/75
ÍNDICE ALFABÉTICO — Man-Nat XV
N
PrPn Narração genérica. (...) Denúncia. HC 84.409 RTJ 195/126
Trbt Natureza jurídica. (...) Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS. RE
418.918 RTJ 195/321
PrCv Natureza: proposição jurídica. (...) Súmula. AI 179.560-AgR RTJ 195/281
XVI Nex-Pre — ÍNDICE ALFABÉTICO
P
PrCv Parcela remanescente: resgate. (...) Mandado de segurança. RMS 24.613-
AgR RTJ 195/60
Pn Pena. Crime hediondo. Regime fechado: omissão do advérbio integralmente.
Progressão: impossibilidade. Lei n. 8.072/90, art. 2º, § 1º. HC 85.585 RTJ
195/268
Pn Pena. Fixação acima do máximo legal. Causa especial de aumento. Princí-
pio da individualização: ofensa inocorrente. Lei n. 6.368/76, arts. 14 e 18, I.
Lei n. 8.072/90, art. 8º. HC 85.673 RTJ 195/274
Pn Pena. Privativa de liberdade e pecuniária: cumulação. Substituída por
restritiva de direitos. Multa substitutiva: impossibilidade. Crime previsto em
lei especial. CP/40, art. 60, § 2º: inaplicabilidade. HC 84.721 RTJ 195/166
Pn Pena. Restritiva de direitos. Execução provisória: vedação. Trânsito em
julgado: termo inicial. Lei de Execução Penal – LEP, art. 147. HC 85.289
RTJ 195/241
Adm Penalidade: aplicação. (...) Servidor público. RMS 24.699 RTJ 195/64
Adm Perda de função. (...) Servidor público. RMS 24.699 RTJ 195/64
PrSTF Plenário do STF. (...) Competência recursal. RHC 85.243-QO RTJ 195/227
Adm Policial rodoviário federal. (...) Processo administrativo. RMS 24.128 RTJ
195/42
Pn Posse tranqüila sobre a “res”: irrelevância. (...) Roubo. HC 85.262 RTJ
195/228
Adm Prazo: termo inicial. (...) Prescrição. MS 23.219-AgR RTJ 195/38
PrCv Preclusão. (...) Magistrado. RMS 24.613-AgR RTJ 195/60
PrPn Prejudicialidade. (...) Habeas corpus. HC 84.761 RTJ 195/175
PrSTF Prequestionamento: ausência. (...) Recurso extraordinário. AI 503.617-
AgR RTJ 195/363
PrPn Prequestionamento: inexigibilidade. (...) Habeas corpus. HC 85.673 RTJ
195/274
Ct Prerrogativa de função. (...) Competência originária. Inq 2.051-QO RTJ
195/5
ÍNDICE ALFABÉTICO — Pre-Pri XVII
PrSTF Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal – RISTF, art. 21, § 1º. (...)
Ação rescisória. AR 1.754-AgR RTJ 195/3
PrPn Registro público: informação. (...) Prova criminal. HC 84.869 RTJ 195/183
Adm Regularidade. (...) Processo administrativo. MS 22.127 RTJ 195/36
PrPn Reiteração de prática criminosa. (...) Prisão preventiva. HC 84.761 RTJ
195/175
Adm Remuneração. Deputado federal pensionista. Teto constitucional. Vanta-
gem pessoal: exclusão. Adicional por tempo de serviço. Exercício temporá-
rio de cargo no TSE. Decreto Legislativo n. 444/02. MS 24.527 RTJ 195/51
PrPn Representação: comparecimento à autoridade policial. (...) Ação penal
pública condicionada. HC 85.556 RTJ 195/266
Adm Responsabilidade civil do Estado. Ato omissivo. Latrocínio praticado por
presidiário foragido. Nexo de causalidade: ausência. “Faute de service”
(falta do serviço): não-configuração. AI 489.254-AgR RTJ 195/359
Adm Responsabilidade civil do Estado. Ato omissivo. Responsabilidade sub-
jetiva. AI 489.254-AgR RTJ 195/359
PrPn Responsabilidade da defesa: ausência. (...) Prisão preventiva. HC 85.237
RTJ 195/212
Adm Responsabilidade subjetiva. (...) Responsabilidade civil do Estado. AI
489.254-AgR RTJ 195/359
Pn Restabelecimento da confissão: inidoneidade. (...) Roubo. HC 85.457 RTJ
195/253
Pn Restritiva de direitos. (...) Pena. HC 85.289 RTJ 195/241
Pn Retratação em juízo. (...) Roubo. HC 85.457 RTJ 195/253
Pn Retroatividade de lei benéfica. (...) Extinção da punibilidade. HC 85.452
RTJ 195/249
PrPn Rito processual específico. (...) Busca e apreensão. HC 85.177 RTJ 195/208
PrPn Rito processual específico: inaplicabilidade. (...) Busca e apreensão. HC
85.177 RTJ 195/208
Pn Roubo. Confissão extrajudicial. Retratação em juízo. Chamada de co-réu.
Restabelecimento da confissão: inidoneidade. HC 85.457 RTJ 195/253
Pn Roubo. Consumação: momento. Posse tranqüila sobre a “res”: irrelevância.
CP/40, art. 157, § 2º, II. HC 85.262 RTJ 195/228
S
Ct Secretário de Estado. (...) Competência originária. Inq 2.051-QO RTJ 195/5
PrPn Sentença condenatória. Fundamentação insuficiente. Chamada de co-réu.
RHC 81.740 RTJ 195/80
ÍNDICE ALFABÉTICO — Sen-Sup XXI
T
PrCv Tempestividade. (...) Recurso. HC 83.915 RTJ 195/104
PrSTF Teoria dos frutos da árvore envenenada. (...) Recurso extraordinário. AI
503.617-AgR RTJ 195/363
TrGr Termo de adesão: desconsideração. (...) Fundo de Garantia do Tempo de
Serviço – FGTS. RE 418.918 RTJ 195/321
Adm Teto constitucional. (...) Remuneração. MS 24.527 RTJ 195/51
PrCv Título da Dívida Agrária – TDA. (...) Mandado de segurança. RMS 24.613-
AgR RTJ 195/60
PrPn Tráfico de entorpecente. (...) Sentença criminal. RHC 84.845 RTJ 195/179
PrPn Tráfico internacional de entorpecente. (...) Competência criminal. HC
85.059 RTJ 195/194
Ct Trânsito. (...) Competência legislativa. ADI 2.928 RTJ 195/33
Adm Trânsito em julgado: necessidade. (...) Servidor público. RMS 24.699 RTJ
195/64
Pn Trânsito em julgado: termo inicial. (...) Pena. HC 85.289 RTJ 195/241
PrCv Traslado deficiente. (...) Agravo de instrumento. AI 179.560-AgR RTJ
195/281
PrPn Tribunal de Justiça. (...) Competência recursal. HC 85.350 RTJ 195/243
PrCv Tribunal de origem: erro de processamento. (...) Embargos de declaração.
AI 418.402-AgR-ED-ED-ED RTJ 195/316
U
Ct União Federal. (...) Competência legislativa. ADI 2.257 RTJ 195/16 – ADI
2.928 RTJ 195/33
V
Adm Vantagem pessoal: exclusão. (...) Remuneração. MS 24.527 RTJ 195/51
ÍNDICE NUMÉRICO
ACÓRDÃOS