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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

IDENTIFICAR O MODELO FORMATIVO DE UMA


INSTITUIÇÃO ESCOLAR: ENTRE O PPP E A PRÁTICA
DOCENTE

PAULO HENRIQUE PEREIRA MOTA


9394751
TEORIAS DO DESENVOLVIMENTO, PRÁTICAS ESCOLARES E PROCESSOS
DE SUBJETIVAÇÃO
NOTURNO
PROFª DRA ANA LAURA GODINHO

SÃO PAULO,

26 DE JUNHO DE 2019

1
Quando se pensa sentidos de formação dos alunos numa escola, rapidamente nos
deparamos com impasses gerais entre modelos de educação. Isso porque procuramos
selecionar os melhores modelos de educação para melhor formar as crianças segundo
critérios e finalidades pré-estabelecidos: educação para formar indivíduos críticos;
personalidades de liderança; disciplinados e morais; cidadãos trabalhadores e
cumpridores das leis; revolucionários e assim por diante. Dentre os diversos modelos de
educação escolar, dois opostos recebem mais atenção no momento de julgar a formação
defendida numa instituição escolar: a dita “escola tradicional” em contraposição a
chamada “escola moderna”.

De modo geral, o modelo de uma escola tradicional se caracterizaria como uma


educação que centraliza o conhecimento e o ensino no professor e torna o aluno passivo
no processo de ensino; ao passo que a escola moderna consideraria a posição ativa do
aluno no processo de ensino, tornando o professor mero facilitador do conhecimento.
Para Piaget, a primeira, identifica a estrutura mental do aluno com a estrutura mental da
criança, de modo que ela faz a criança trabalhar e impõe atividades em forma
essencialmente de linguagem, verbal, abstração do pensamento; ao passo que a escola
moderna: “apela para a atividade real, para o trabalho espontâneo baseado na
necessidade e no interesse pessoal”1. Para isso, o jogo é, segundo Piaget, fundamental
no processo de desenvolvimento da criança pois é por esse meio ela assimila o real: “da
mesma maneira que os jogos dos animais constituem o exercício de instintos precisos,
como os de combater ou caçar, também a criança que joga desenvolve suas percepções,
sua inteligência, suas tendências à experimentação, seus instintos sociais etc.” 2. Para
Piaget, a escola tradicional não associa o jogo, a atividade lúdica, como forma exemplar
de ensino.

Nesse sentido, o presente objetiva pensar as condições que possibilitam


determinar o modelo educacional que uma escola defende para formar seus alunos. Para
tanto, realizamos um estágio de observação numa escola de ensino fundamental I, a fim
de desenvolvemos uma análise comparativa entre o discurso prescrito no Projeto
Político-Pedagógico da escola e as práticas pedagógicas das professoras enquanto
expressões concretas de leitura e apropriação desse discurso. Dois pontos deverão ser

1
Piaget, J. Psicologia e pedagogia. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1970, p. 154-155.
2
Piaget, J. Psicologia e pedagogia. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1970, p. 156.

2
explicitados. Em primeiro momento, veremos as concepções de ensino e indivíduo no
PPP junto com seus pressupostos teóricos de psicologia, verificando, a partir disso, a
posição das professoras diante desses discursos. Em segundo momento,
compreenderemos a concepção de avaliação no discurso do PPP e relacionaremos com
as práticas de uma professora de uma turma do 4° ano, com interesse de demonstrar a
verdade diante de tal concepção - se está no documento do PPP, ou se está na prática da
professora.

Escola

A realização do estágio de observação em psicologia da educação se sucedeu


numa escola municipal de ensino fundamental localizada na região sul da cidade de São
Paulo, no bairro Chácara Inglesa: a EMEF Jean Mermoz. Com uma existência de mais
de 60 anos contribuindo com a formação escolar das famílias dessa região de classe
média, a escola possui uma estrutura evidentemente antiga: totalizando 4 andares,
existem somente 9 salas de aula para se lecionar. Assim, no período da manhã, 6 turmas
de ensino fundamental II (distribuídas nos anos do 6° ao 9° ano) e 3 turmas de ensino
fundamental I (uma turma de 1°ano, uma de 2° ano e uma de 3° ano, todos em período
integral) constitui o limite do número de alunos que podem se matricular (em média,
260 alunos frequentam cotidianamente a escola). Os alunos do ensino fundamental II
saem, mas permanecem os alunos do integral. No período da tarde, o ambiente da escola
se fixa em turmas do 1° ao 5° ano – as 3 turmas do período integral junto com mais 3
turmas (um 4° ano e dois 5°s anos). No período da noite, turmas do Ensino de Jovens e
Adultos (EJA) formam o ambiente da EMEF Jean Mermoz.

Ensino e indivíduo

Acompanhamos as professoras de todo o ensino fundamental I durante o período


da tarde. Cada qual com suas particularidades, tentamos observar o modo pelo qual cada
professora seguia e se apropriava do discurso constante no documento do Projeto
Político-Pedagógico da escola.

Porém, em primeiro lugar, devemos destacar a concepção estabelecida na


relação entre ensino e o indivíduo em desenvolvimento: amiúde, a letra do PPP procura
mostrar que todo o ensino procedido pelos professores deveria se adequar estritamente
às condições do aluno em seus diferentes aspectos – cognitivo, social e afetivo. Vemos

3
isso no seguinte trecho: “a organização do trabalho educativo desta Unidade
Educacional considerará a construção/apropriação do conhecimento em períodos em
que a singularidade dos estudantes seja respeitada em seus ritmos e considere sua
condição social, cognitiva e afetiva”. Isso pressupõe claramente uma visão segundo a
qual cada aluno possui uma individualidade estruturada pela determinação do seu
ambiente vivente, de modo que os professores, por isso, devem se restringir a ensinar o
que está no “alcance” dos alunos de suas turmas. Se a escola acolhe um aluno com uma
determinada singularidade, segundo as intenções do PPP, a professores deve, antes,
conhecer as condições desse aluno, a fim de respeitar “seus ritmos” e orientar seu
ensino em sala de aula.

Mas concebemos tal visão do processo de ensino como essencialmente


conservador – em contraposição a “emancipador”. Pois isso significa que a criança deve
aprender somente aquilo que, em nível de desenvolvimento real (aquele determinado
pelo desenvolvimento biológico), suas capacidades já estariam formadas enquanto
resultado de ciclos de desenvolvimento completados. Nesse sentido, como descobriu
Jean Piaget, muitas operações dedutivas e lógicas se tornam possíveis somente a partir
dos 7 anos de idade, como a dedução (A=B; B=C; então A=C); noção de conservação
da matérias, a partir dos 8 anos de idade (matéria da bolinha de modelar permanece,
embora se transforme em outras figuras); operação de proporção, a partir dos 11 anos e
a capacidade de um discurso lógico (de adulto), a partir de 12 ou 15 anos3. Os testes de
idade mental de Piaget procuravam determinar o nível de desenvolvimento real da
criança, ou seja, o grau de capacidade que conseguem resolver tarefas lógicas de forma
independente e autônoma

De fato, o modo pelo qual a criança desenvolve seu aprendizado está


estritamente associado a esse desenvolvimento real. Uma criança de 3 anos ainda não
consegue realizar nenhuma operação aritmética, por exemplo. Mas um professor não
poderia colocar como finalidade de seu ensino a adequação do aprendizado para um
estágio mental supostamente universal – como Piaget concebia a estrutura humana. Seu
objetivo teria de ser, antes, medir não os processos de maturação já completados da
criança, mas aqueles processos em que estão em formação, em potencial. A finalidade
do ensino do professor está em, a partir da identificação do que Vygotsky chamou de

3
Cf. Piaget, J. Problemas de psicologia genética.

4
zona de desenvolvimento proximal, desenvolver aquelas funções que ainda não
amadureceram na criança, mas que florescerão devido a sua ajuda – ou do auxílio de
companheiros.

Nesse sentido, em vez do professor terminar seu ensino para desenvolver


processos que, a rigor, já se encontrariam formados, ele deve antecipar tal
desenvolvimento através do aprendizado. Não se deve objetivar o que a criança já
conseguiria praticar de modo autônomo, mas pressupor esta para empurrá-la na direção
do que lhe falta. Se crianças retardadas, sozinhas, nunca atingirão formas de
pensamento abstrato, como dirá Vygotsky: “é a escola que deveria fazer todo esforço
para empurrá-las nessa direção, para desenvolver nelas o que está intrinsecamente
faltando no seu próprio desenvolvimento”4.

Mas não mencionamos e comparamos Piaget e Vygotsky gratuitamente.


Quisemos insistir na hipóstase problemática da concepção da relação entre ensino e
aluno segundo o discurso do PPP da EMEF Jean Mermoz. Quer dizer, para nós, o papel
dos professores está muito mais próximo de respeitar o vir a ser do aluno, a partir da
identificação da zona de desenvolvimento proximal, que propriamente a sua
singularidade pré-estabelecida. Sua função será bem desempenhada quando se floresce
o “musical” do aluno, e não quando se respeita os seus “ritmos”, como vimos no trecho
do PPP citado5.

Percebemos que a professora E, do 1°ano, respeitava alguns pontos do PPP,


como ensinar o conteúdo adequado à idade do aluno. Essa conclusão surgiu após
acompanharmos algumas aulas da professora E, em que os alunos realizavam uma
atividade cujo objetivo se reduzia, como ela explicou, ao desenvolvimento de operações
mentais – como dedução, proporção, classificação. Sentados em dupla, a atividade
consistia propor aos alunos que desenhassem dois aquários em seus respectivos
cadernos, enquanto a professora distribuía figuras de animais marinhos (5 diferentes
peixes e 5 de outras espécies) para que colassem no lado adequado do aquário a figura
correspondente ao lado. Do lado esquerdo, os alunos deveriam colar os peixes; do lado

4
Vygotsky, L. S. A formação social da mente. São Paulo: Editora Martins Fontes, 1991, p. 60.
5
Novamente: “a organização do trabalho educativo desta Unidade Educacional considerará a
construção/apropriação do conhecimento em períodos em que a singularidade dos estudantes seja
respeitada em seus ritmos...”.

5
direito, os outros animais marinhos (cavalo marinho, baleia, tartaruga, tubarão e polvo).
Desse modo, a professora nos confessou que procurava desenvolver o pensamento
lógico dos alunos: a classificação (pela distinção dos animais: entre peixes e animais
diversos) e a dedução (se, de um lado, existem 5 animais e os dois lados contêm o
mesmo número, então quantos animais existem ao todo?). A professora E buscava, pela
disciplina de ciências, de modo “concreto”, como ela se orgulhava de qualificar sua
metodologia de ensino, exercitar as operações lógicas fundamentais, pois sabia que os
alunos já possuíam as condições cognitivas suficientes para aprender.

Podemos dizer que essa atividade desempenhada pela professora E revela dois
pontos: (1) existe uma preocupação eminente de seguir o escrito do PPP, pois a
professora, para lecionar sobre as operações lógicas do pensamento, supunha certo
desenvolvimento da inteligência dos alunos. (2) Sobre isso, certamente a professora
demonstrava conhecimentos sobre a teoria de Piaget, uma vez que, como vimos, com 7
anos (em turma de 1° no ensino fundamental, a criança possui as condições psicológicas
para exercer determinadas operações lógicas (de dedução, por exemplo). Com a teoria
piagetiana, a professora E cumpria o imperativo do PPP de se respeitar a singularidade
dos alunos em seus ritmos! Por consequência, poder-se-ia afirmar que a teoria de
Vygotsky, sobretudo a utilização do conceito de zona de desenvolvimento proximal,
não se encontrava no horizonte dA sua metodologia de ensino.

Por fim, se tal comportamento profissional da professora E em relação aos


alunos pressupõe certa filosofia de progressão da inteligência geral dos indivíduos em
desenvolvimento, observamos que essa concepção de progressão no desenvolvimento
do ensino está incutida tanto no modo da educação escolar em geral quanto na didática
dos professores. Ao acompanharmos a professora D, do 2° ano, reparamos que outra
dinâmica de sala constituía suas aulas: diferentemente do 1° ano, já havia leitura
partilhada entre os alunos; estes esperavam a vez do outro para falar, em vez de um
monólogo difuso. Na turma do 3° ano, percebemos que a professora já escrevia em letra
de mão na lousa, a fim de que os alunos assim copiassem em seus cadernos. A
atividade, por sua vez, não se traduzia em termos de “concretude”: a professora passara
exercícios de antônimos das palavras. Na turma do 4° ano, a professora já pede para os
alunos pesquisarem nos livros; precisão nas respostas é exigida pela professora.
Dinâmica da aula se estabelece na modalidade do diálogo: entre professor e aluno,
trocavam-se conteúdos e experiências. O primeiro, por parte da professora; o segundo,

6
por parte dos alunos. A professora pede para os alunos lerem trechos do livro didático –
o que não ocorria nos primeiros anos do ensino fundamental, entre o 1° ao 3°. Na turma
do 5° ano, a professora perguntava aos alunos se eles se lembravam da aula anterior, de
modo a construir a aula conforme as respostas dos alunos. Percebemos que já existia um
determinado desenvolvimento pleno da inteligência nos alunos, pois a professora
trabalhava conteúdos de matemática (tipos de fração, como acompanhamos) de maneira
abstrata e lógica, sem recorrer a exemplos irrelevantes na compreensão do conteúdo.

Avaliação

Outro ponto importante deve ser salientado: a prova. Tivemos a oportunidade de


acompanhar uma aula cujo objetivo desta era a realização de uma prova de matemática
com a professora V, do 4° ano. A proposta de avaliação dos alunos através de uma
prova, ou seja, como nota parcial da nota do bimestre, adquire diversos problemas em
sua aplicação. Mas aqui deveremos apontar apenas seu lugar no PPP da EMEF Jean
Mermoz e sua apropriação pela professora do 4° ano.

O discurso do PPP da EMEF Jean Mermoz muito valoriza o processo de


avaliação como parte do processo ensino-aprendizagem. Parte-se da premissa de que a
prioridade na escolha da avaliação está nos aspectos qualitativos, em contraposição aos
aspectos quantitativos mobilizados pelas provas, de modo que as notas deverão se
constituir como instrumento no processo de avaliação para a consolidação da qualidade
das aprendizagens das crianças. Isso deve ser compreendido pelo seguinte trecho do
PPP: “entendemos que a avaliação faz parte do processo de ensino aprendizagem e
portanto irá contribuir para o constante replanejamento do ensino realizado pelo
professor. As avaliações na U.E não terão a finalidade fundamental de classificar o
aluno, mas buscar compreender o seu processo de aprendizagem”. A EMEF Jean
Mermoz preocupa-se mais com o ensino-aprendizagem que a classificação dos alunos.
Ocorre que a professora do 4° ano, a qual tivemos a oportunidade de
acompanhar algumas das suas aulas, parece não seguir esse caráter pedagógico da
avaliação. Pois, segundo nossas observações, durante a aula da prova, frequentemente a
professora comparava os alunos entre si e com o aluno consigo mesmo. Na prova de
matemática, a professora distribui uma folha de almaço para cada aluno, a fim de que
copiassem os enunciados por ela escrito na lousa e respondessem na folha de almaço. A
prova consistia em resolver 10 contas de aritmética (com centenas e milhares). Os

7
alunos deveriam montar as contas de forma organizada e cuidadosa, pois seriam
avaliados inclusive nisso. A professora exigia uma organização minuciosa: os alunos
deveriam montar duas linhas de contas – 5 na primeira, 5 na segunda. Todos deveriam
seguir tal forma de organização das contas de matemática na prova.
Durante a prova, a professora V afirmava que todos sabiam o conteúdo da
prova e por isso não deveriam temer a avaliação. Afirmava também que: “exceto um
único aluno [não sabia o conteúdo da prova], porque falta ou brinca nas aulas de
reforço”. Não temos condições de julgar a veracidade de tal afirmação. Em outro
momento, a professora, para chamar atenção de um aluno, dispara: “João6, você estava
tão bom no primeiro bimestre deste ano! O que está havendo contigo?”. Tal indagação
se fundamentava na incapacidade do aluno em seguir rigorosamente as regras da prova.
Para responder à pergunta sobre quanto valia (em termos de nota) a prova, a professora
V exclama: “avaliação é importante para vocês; façam como tarefa de ouro! [Pois] a
vida é uma nota!”. Isso para incentivar os alunos a realizarem a prova com
compromisso.
Essa breve descrição da aula destinada à realização de uma das provas
importantes para a nota bimestral dos alunos já evidencia o modo pelo qual a professora
V se apropriava da visão de avaliação descrita no PPP da escola: embora tivesse seu
apanágio na busca de compreender o processo de ensino-aprendizagem dos alunos, a
aplicação da avaliação se aproximava mais de uma técnica de disciplinar os corpos para
o bom adestramento. Pois, em virtude do saber pressuposto pelo exame, a professora,
como uma das figuras da vigilância hierárquica da instituição escolar, exerce o poder, a
fim de que o aluno se torne um registro, um relato: desse modo, avaliado, moldado,
julgado, comparado, mensurado, medido, classificado. A disciplina, como método que
permite o controle minucioso das operações dos corpos, que realiza a sujeição destes
numa relação de docilidade-utilidade, se manifesta no exame como forma mais eficaz
de adestramento porque se torna um poder invisível capaz de colocar à vista um
indivíduo. Nas palavras de Foucault, o exame:

É um controle normalizante, uma vigilância que permite qualificar, classificar e punir.


Estabelece sobre os indivíduos uma visibilidade através da qual eles são diferenciados e
sancionados. É por isso que, em todos os dispositivos de disciplina, o exame é altamente
ritualizado. Nele vêm-se reunir a cerimônia do poder e a forma da experiência, a
demonstração da força e o estabelecimento da verdade. No coração dos processos de

6
“João” é um nome fictício.

8
disciplina, ele manifesta a sujeição dos que são percebidos como objetos e a objetivação
dos que se sujeitam.7

Pelo exame, o poder capta o processo subjetivo do indivíduo a fim de torná-lo


objetivo. Sua objetivação se expressa como um caso, pois: “é o indivíduo tal como pode
ser descrito, mensurado, medido, comparado a outros e isso em sua própria
individualidade; e é também o indivíduo que tem que ser treinado ou retreinado, tem
que ser classificado, normalizado, excluído etc”8. Para o poder, a individualidade do
indivíduo se torna um status.

Ora, como vimos na prova de matemática, podemos dizer que a professora V


insiste em dissociar o exame do processo de ensino-aprendizado (como quer o PPP da
EMEF Jean Mermoz) enquanto o identifica com uma modalidade do poder disciplinar, a
fim de classificar seus alunos. Essa classificação ocorria por meio de comparações entre
os alunos (ao afirmar que “exceto um único aluno [não sabia o conteúdo da prova],
porque falta ou brinca nas aulas de reforço”) e na comparação entre o próprio aluno
(“João, você estava tão bom no primeiro bimestre deste ano! O que está havendo
contigo?”). Não se trata de julgar a posição e a metodologia de ensino da professora,
mas apenas de mostrar o modo pelo qual se sucedeu a sua apropriação do discurso
constante no PPP.

Análise da escola e conclusão

Pretendemos mostrar o modo pelo qual a EMEF Jean Mermoz se mobiliza para
adequar seus discursos e suas práticas ao desenvolvimento das crianças do ensino
fundamental I – entre 7 e 11 anos –, a fim de perceber como podemos identificar o fator
determinante na apreensão do modelo formativo de uma instituição escolar: se lendo
somente o PPP ou analisando as práticas concretas dos sujeitos constituidores da escola.
Por isso, resta ainda descrever alguns aspectos mais estruturais das relações entre os
professores e alunos com a escola.

A escola organiza o Ciclo de Alfabetização (do 1° ao 3° ano do ensino


fundamental) no tempo de período integral – os alunos entram às 7:45 da manhã e saem
às 16:45 da tarde, permanecendo, portanto, 9 horas na escola. Os alunos do 4° e 5° anos,

7
Foucault, M. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Petrópolis, RJ: Vozes, 2014, p. 181.
8
Foucault, M. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Petrópolis, RJ: Vozes, 2014, p. 187.

9
do Ciclo de Alfabetização, estudam em meio período – entram às 13:30 e saem às
18:20, permanecendo quase 5 horas na escola.

Com aulas que duram 45 minutos, existe uma política interna acordada entre os
professores e a coordenação da escola sobre a prática de passar lição de casa para as
turmas do Ciclo de Alfabetização: não passar lição de casa. A justificativa está no
tempo de permanência na escola: como ficam 9 horas na escola, não se deve ter lição de
casa, a fim de estimular o descanso. Com isso, todas as professoras do Ciclo de
Alfabetização (tanto da turma quanto as especialistas: inglês, leitura, informática e
artes) lecionam sem se preocupar em preparar lições de casa para serem corrigidas no
próximo dia. O Ciclo Interdisciplinar do período da tarde (que compreende o 4° e o 5°
anos), por sua vez, havia incentivo das professoras em passar lição de casa enquanto
forma de fixação dos conteúdos aprendidos em sala de aula. Vimos essa dinâmica se
realizar nas aulas da professora M, do 5° ano: em sala, os alunos aprendem os tipos de
fração; no final da aula, a professora M pediu para que os alunos realizassem exercícios
de fixação sobre resolução e classificação de frações. Após 3 aulas de 45 minutos, os
alunos se dirigem para o recreio de 20 minutos.

Como as turmas são compostas por número de 25 a 28 alunos, os professores


criam formas de manter a ordem em sala de aula, no sentido de adquirir o silêncio
necessário de se lecionar o conteúdo da disciplina. Tal como os conteúdos
progressivamente se tornam complexos entre os anos da vida escolar (como já
mostramos), as maneiras de disciplinar os alunos também se tornam progressivamente
mais rigorosas. A professora E, do 1° ano, constantemente chama atenção dos seus
alunos de forma branda: “eu não falo com aluno em pé!” – quando alguém queria
perguntar algo para ela em pé. Também ordenava que os alunos se sentassem em
duplas, conforme sua organização: os alunos com mais dificuldade de sentavam na
frente da sala; os alunos mais sagazes se sentavam em alunos mais lerdos. A professora
D, da turma do 2° ano, após o horário do almoço, às 12:30, tocava música de
relaxamento para seus alunos, a fim de retomar a presença dos alunos e iniciar as aulas
da tarde. Enquanto ouviam a música, os alunos deitavam a cabeça sobre a mesa e
tentavam relaxar ao som da música. O momento durava cerca de 20 minutos. De fato,
depois dessa dinâmica, raramente a professora chamava atenção dos alunos. A
professora G, do 3° ano, além de organizar os alunos escolhendo o lugar de cada um na
sala, anotava o nome dos alunos desobedientes e indisciplinados na lousa, a fim de

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puni-los com a exclusão desses do recreio. Os alunos que estivessem com o nome na
lousa, não poderiam brincar no horário do intervalo. A ameaça aos alunos perpetuava
depois do intervalo para excluírem das aulas de informática – a aula que eles mais
gostavam. A professora V, do 4° ano, além de se utilizar da prova no seu poder
disciplinar (como vimos), também organizava os alunos escolhendo a posição na qual
cada um deve ocupar no interior da sala: os amigos são afastados; os melhores alunos se
sentam pelo meio das carteiras; os alunos com dificuldade no aprendizado se sentam na
frente. Mas, distintamente do 1°, 2° e 3° anos, os alunos formam duplas involuntárias,
mas se sentam enfileirados individualmente. A professora M, do 5°, seguia tal
organização de sala e disciplina da professora V.

Nesse sentido, devemos concluir que, nessas práticas descritas, deveríamos


identificar a escola ao modelo de escola tradicional, haja vista a prerrogativa das
professoras em organizar e classificar os alunos de suas turmas (como o fato de todas do
ensino do ensino fundamental I escolherem o lugar no qual cada aluno deve
permanecer). De fato, porém, toda a organização do tempo e do espaço escolar está
prevista e descrita no Projeto Político-Pedagógico da EMEF, bem como a definição do
conceito de escola, de educação, sociedade; da prescrição dos objetivos do ensino da
escola; da formação necessária dos professores; do tratamento da educação geral dos
deficientes; os planos de trabalho de cada funcionário da escola e uma cartografia da
condição socioeconômica dos alunos matriculados na escola. Mas a maneira pela qual o
discurso constante no PPP se expressava nem sempre se associava às apropriações
realizadas na prática dos professores. Quer dizer, vimos como a professora E, do1° ano,
seguia até de forma rigorosa a posição que a escola adotava em relação ao ensino do
indivíduo; ao passo que a professora V, do 4° ano, aplicava o exame em direção oposta
às pretensões do discurso do PPP. De um lado, práticas de “escola moderna”, na medida
em que respeita a singularidade do aluno - condição necessária para torná-lo sujeito
ativo no processo de ensino; de outro, práticas de “escola tradicional”, pois centraliza a
totalidade do conhecimento no professor e consolida a relação de poder entre aluno e
professor por meio do exame.

Assim, se, por um lado, o PPP se identifica com o documento mais importante
de uma instituição escolar, por outro lado, não necessariamente o discurso aparecerá na
prática dos indivíduos que constituem a escola. Pois, embora um documento oficial
demonstre, de certa maneira, a precisão do modo como a escola se porta no interior de

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uma sociedade, ele não esgota o complexo de fatores que constitui a dinâmica
contraditória de uma realidade de uma escola. Somente a análise das práticas dos
sujeitos constituintes da escola pode nos mostrar a realidade dessa mesma escola. Ora,
se o PPP promove todo um discurso progressista em relação à educação, avaliação etc.,
não podemos concluir que a escola forma seus alunos numa direção mais progressista.
Na verdade, serão as práticas dos professores e dos funcionários da escola que
demonstrarão efetivamente se a escola se caracteriza como o que se chama comumente
de “escola tradicional” ou como uma “escola moderna”.

Diante do exposto, cabe a pergunta: comparando o discurso do PPP e as ações


dos professores, a EMEF Jean Mermoz seria uma escola tradicional ou uma escola
moderna?

Bibliografia

Foucault, M. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Petrópolis: Vozes, 2014.

Piaget, J. "Problemas de psicologia genética". In: Coleção Os Pensadores. São Paulo:


Abril Cultural, 1978.

_______. Psicologia e pedagogia. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1970.

Vygotsky, L. S. A formação social da mente. São Paulo: Editora Martins Fontes, 1991.

Documentos

Projeto Político-Pedagógico da EMEF Jean Mermoz.

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