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2016
RESUMO
Aprender profundamente, aprender a aprender (metalearning) e aprender por toda a vida (lifelong learning) são
alguns dos novos desafios que a sociedade do conhecimento apresenta ao ensino superior. O aumento do
interesse por métodos e estratégias inovadoras, que alterem a dinâmica da sala de aula, tem produzido boas
respostas. Esse artigo apresenta a técnica de mapeamento conceitual para favorecer a aprendizagem profunda,
que aproxima o aluno do conhecimento especializado do professor. A possibilidade de oferecer feedbacks preci-
sos e constantes ao longo do processo de ensino-aprendizagem justifica o uso dos mapas conceituais no ensino
superior. O domínio da técnica de mapeamento conceitual e o planejamento cuidadoso da demanda a ser apre-
sentada em sala de aula são aspectos fundamentais para assegurar os resultados esperados.
Palavras-chave: Mapas Conceituais; Ensino Superior; Aprendizagem Profunda; Avaliação da Aprendizagem;
Aprendizagem por Toda a Vida; Meta-aprendizagem.
ABSTRACT
Deep learning, metalearning and lifelong learning are some of the new challenges presented by the knowledge
society to higher education. The interest in innovative methods and strategies that change the dynamics of the
classroom has increased and produced good responses. This paper presents concept mapping as a way to en-
courage deep learning, which approximates students and the teacher’s expert knowledge. The ability to provide
accurate and constant feedback throughout the teaching-learning process justifies the use of concept maps in
higher education. The mastery of the concept mapping technique and the careful planning of the demand to be
presented in the classroom are critical to ensure the expected results.
Keywords: Concept Maps; Higher Education; Deep Learning; Learning Evaluation; Lifelong Learning; Metalearning.
(1a)
(1b)
Figura 1 – Estruturas conceituais que respondem “Como os mapas conceituais ajudam na comunicação?”: (a) não
apresenta termos de ligação, limita o entendimento do conteúdo e revela somente a associação entre conceitos; (b)
apresenta termos de ligação, que ampliam o conteúdo semântico e revelam com precisão as relações conceituais.
Somente (b) pode ser classificada como mapa conceitual.
Há quatro parâmetros de referência que precisam ciam o mapa e são progressivamente detalhados;
ser observados por todo mapeador (AGUIAR & • As revisões contínuas do mapa conceitual
CORREIA, 2013): devem ser utilizadas para modificar o conhecimento
• As proposições devem ter alta clareza semânti- representado, de acordo com as mudanças de enten-
ca e comunicar com precisão as relações conceitu- dimento conceitual do mapeador.
ais representadas; O nosso grupo de pesquisa desenvolveu uma
• A pergunta focal delimita o conteúdo a ser sequência de atividades visando ao aumento de
mapeado e é a forma mais eficiente para controlar proficiência na técnica de mapeamento conceitual.
o tamanho do mapa conceitual; Os participantes dos workshops sobre mapas con-
• A organização dos conceitos deve ser hierárquica, ceituais, promovidos pela USP e por outras ins-
sendo que os conceitos mais gerais (abrangentes) ini- tituições de ensino superior, utilizam essas ativi-
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Por que vale a pena usar mapas conceituais no ensino superior?
Tabela 1 – Comparação do conteúdo semântico de várias proposições envolvendo os conceitos USP (inicial)
e cursos de graduação (final).
dades e o programa CmapTools1 para construir pergunta focal e que se configuram como uma re-
mapas conceituais (NOVAK & CAÑAS, 2007). presentação do conhecimento em alta fidelidade
Os resultados obtidos até o momento são enco- (CAÑAS, NOVAK & REISKA, 2015). A Figura
rajadores e atestam que já existem bons mape- 2 expressa as diferenças entre os mapas conceituais
adores inovando suas práticas de sala de aula bons e excelentes, sugerindo que o entendimento
com os mapas conceituais. profundo da técnica de mapeamento conceitual de-
A utilização contínua do mapeamento conceitu- pende da persistência. Em outras palavras, a utiliza-
al aumenta a nossa capacidade de organizar estru- ção esporádica dos mapas conceituais dificilmente
turas de conhecimento e expressá-las com clareza, produzirá os resultados esperados na sala de aula.
a partir de proposições cuidadosamente seleciona-
das. Mapeadores excelentes combinam proficiência Mapeando o Processo de Ensino-Aprendizagem
na técnica e alto domínio do conteúdo para criar O processo de ensino-aprendizagem pode ser
mapas conceituais concisos, delimitados por uma compreendido como a negociação de significados
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Figura 2 – Estrutura e conteúdo são critérios que definem a qualidade dos mapas conceituais. Boa estrutura e
bom conteúdo resultam em mapas feitos por bons mapeadores com proficiência na técnica. Excelentes estrutura
e conteúdo resultam em mapas feitos por excelentes mapeadores, proficientes na técnica e especialistas no
assunto mapeado. Traduzido e adaptado de CAÑAS, NOVAK & REISKA (2015), com permissão.
A
(a) B
(b)
C
(c)
Figura 3 – Comparação de mapas conceituais sobre a USP contendo os mesmos conceitos (n=6): (a) estrutura
radial, que apresenta proposições a partir de um único conceito e sugere pouco domínio sobre o tema; (b)
estrutura linear, que apresenta encadeamento sequencial dos conceitos e sugere que algum domínio sobre o tema;
(c) estrutura em rede, que apresenta conceitos inter-relacionados e sugere alto domínio sobre o tema. Adaptado
de KINCHIN & HAY (2000), com permissão.
sem abusar do uso exclusivo da “USP” como maior eficiência, pois o professor tem condições
conceito inicial. Conceitos não relacionados na de individualizar seus comentários acerca do en-
estrutura radial aparecem conectados na estru- tendimento conceitual dos seus alunos.
tura linear. Por exemplo, as relações da “pesqui- A Figura 3c mostra uma estrutura em rede, na
sa” com “professores” (Figura 3b, proposição 3) qual os conceitos rompem o encadeamento linear
e dos “alunos” com os “cursos de graduação” e passam a participar de múltiplas proposições.
(Figura 3b, proposição 5) são indicadores de um Note, por exemplo, que a “pesquisa” é o conceito
aumento do domínio sobre o tema. Obviamente, mais acionado na rede proposicional (ele participa
faz-se necessário avaliar se as proposições desse de cinco proposições diferentes). O conceito “alu-
mapa conceitual são aceitáveis, considerando a nos”, antes relacionado somente com “cursos de
natureza conceitual do conteúdo representado. graduação” (Figura 3b, proposição 5), aparece em
Vale a pena destacar que o professor consegue proposições com “pesquisa” (Figura 3c, proposi-
visualizar com maior clareza a forma pela qual ção 5), “professores” (Figura 3c, proposição 7) e
os alunos organizam suas estruturas de conheci- “cursos de graduação” (Figura 3c, proposição 8).
mento, facilitando a identificação de conteúdos A grande inter-relação dos conceitos sugere alto
específicos que precisam ser retrabalhados. A domínio sobre o tema, ainda que inadequações
regulação da aprendizagem pode ser feita com conceituais possam ser identificadas e corrigidas.
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As estruturas em rede apresentam maior quanti- • Os professores já possuem uma rede de con-
dade de proposições do que as demais e caracte- ceitos altamente interligada, caracterizando-os
rizam o conhecimento especializado. Em outras como especialistas.
palavras, o mapa conceitual do professor sobre
sua própria disciplina tem a forma de uma rede. Aprendizagem Profunda e Superficial
A aprendizagem sobre um dado tema provoca Uma das formas de explicar o processo de en-
alterações nas nossas estruturas de conhecimen- sino-aprendizagem é a utilização de um modelo
to, aumentando o nível de articulação entre os baseado nas mudanças de estrutura de conheci-
conceitos. O processo de ensino-aprendizagem mento em dois ciclos possíveis, que remetem à
deve promover alterações nas estruturas de co- aprendizagem superficial e profunda (Figura 4).
nhecimento dos alunos, fazendo com que a or- A primeira transformação do conhecimento
ganização radial (Figura 3a) evolua na direção acontece quando o professor, utilizando sua rede
de uma organização em rede (Figura 3c), a qual de conhecimento, prepara sua aula a partir da se-
deve ser similar à estrutura de conhecimento do leção dos conceitos a serem abordados (Figura 4,
especialista. Alunos e professores podem ser colo- processo 1). O encadeamento conceitual obtido
cados nas extremidades de um continuum em que: reflete uma estratégia orientada à consecução de
• Os alunos estão prontos a aprender a partir um objetivo, qual seja, o de facilitar o aprendiza-
do detalhamento do conceito inicial, caracterizan- do dos alunos. Iniciantes no tema de estudo, os
do-os como iniciantes no tema de estudo; alunos apresentam uma estrutura conceitual ti-
Figura 4 – Ciclos de aprendizagem profunda e superficial descritos a partir das transformações da estrutura do
conhecimento. As setas 1-3 indicam transformações no conhecimento. As setas 4-5 se relacionam com a avaliação
da aprendizagem que tem como referência a rede do especialista e a sequência didática, respectivamente.
Destaca-se a aprendizagem superficial como um atalho do ciclo de aprendizagem profunda.
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picamente radial. A realização das aulas permite ou institucionais (regime de avaliação, reconheci-
a interação entre os conhecimentos dos alunos mento profissional), o professor muitas vezes opera
com a sequência didática elaborada pelo professor na “zona de conforto”, organizando o processo de
(Figura 4, processo 2). A partir do entendimento avaliação da aprendizagem de acordo com partes
da aula, os alunos podem reconstruir suas estru- específicas da sequência didática. Já a aprendiza-
turas conceituais (Figura 4, processo 3) para que, gem profunda é predominante nas atividades de
progressivamente, comecem a emergir especialistas pesquisa, sejam elas de iniciação científica ou de
em ascensão. Dois tipos de aprendizagem podem pós-graduação. Nesses casos, o professor, atuan-
ocorrer durante esse processo, de acordo com o do como mediador do processo de aprendizagem,
feedback oferecido pelo professor. Se, durante o busca do seu orientando as tomadas de decisões
processo de avaliação da aprendizagem, o profes- típicas do especialista. Ainda que professores e
sor adotar como referência a sequência didática alunos sejam os mesmos, a opção por um deter-
(estrutura linear), a aprendizagem superficial será minado tipo de aprendizagem dá-se pela natureza
favorecida (Figura 4, processo 5) porque os alunos do processo que será desenvolvido: a disseminação
não têm acesso à estrutura de conhecimento do es- do conhecimento tende a favorecer a aprendizagem
pecialista: a interação professor-aluno se mantém superficial; a produção de conhecimento estimula
a partir da sequência didática, que é uma versão a aprendizagem profunda.
parcial e simplificada do conhecimento especiali- A possibilidade de visualizar a construção do
zado. Se, por outro lado, o professor utilizar como conhecimento, potencializar a aprendizagem pro-
referência a sua rede de conhecimentos, a apren- funda e planejar feedbacks precisos e frequentes são
dizagem profunda será favorecida. Nesse caso, a os argumentos que justificam o uso dos mapas
regulação do processo de ensino-aprendizagem conceituais no ensino superior.
extrapola a organização conceitual das aulas e
explora o entendimento do especialista (Figura 4, Aplicações dos Mapas Conceituais no
processo 4). A interação professor-aluno se man- Ensino Superior
tém a partir da complexidade do conhecimento Há várias formas de explorar os mapas concei-
do especialista, criando oportunidades para que tuais no ensino superior. Estas podem ser organi-
os iniciantes alcancem tal patamar mais avançado zadas em dois grupos distintos, de acordo com o
durante o decorrer da disciplina. autor do mapa conceitual (alunos e professores
Os mapas conceituais tornam visíveis essas podem atuar como mapeadores). Em qualquer
estruturas de conhecimento, bem como a sua caso, é fundamental que o mapeador compreen-
transformação ao longo do tempo. Com isso, o da os princípios dessa técnica de representação do
professor é capaz de interagir com seus alunos, conhecimento. Uma etapa de treinamento deve
considerando o atual nível de entendimento que ser prevista para apresentar os quatro parâmetros
eles têm sobre os temas de estudo. Essa regulação de referência para se elaborar bons mapas concei-
da aprendizagem, por meio de feedbacks precisos tuais (AGUIAR & CORREIA, 2013).
e constantes, mostra-se importante para sustentar Ambas as aplicações podem cumprir diferentes
a opção dos alunos pela aprendizagem profunda. objetivos educacionais, como por exemplo, para
Ambos os ciclos de aprendizagem ocorrem estudo, revisão, avaliação ou colaboração. A Ta-
nas atividades acadêmicas do ensino superior. A bela 2 apresenta as aplicações mais recorrentes na
aprendizagem superficial é predominante no ensi- literatura para ilustrar várias possíveis formas de
no de graduação e, muitas vezes, de pós-gradua- se utilizar os mapas conceituais em sala de aula.
ção. Seja por fatores pessoais (visão fragmentada Nas situações em que o aluno deve elaborar
do conteúdo, a iniciativa de ministrar a disciplina o mapa conceitual, convém ao professor prestar
pela primeira vez ou fora da área de especialidade) especial atenção na demanda de realização da
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Aplicações
Objetivos educacionais
O aluno como mapeador O professor como mapeador
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atividade, ou seja, na forma por meio da qual o plementar ou ilustrativo no processo. Na verdade,
mapa conceitual será solicitado. A demanda con- espera-se que sua execução permita o desenvolvi-
tém as condições em que ele deve ser elaborado mento cognitivo do aluno. Quando se constrói o
para que se atinja um objetivo educacional espe- planejamento dessa maneira, torna-se necessário
cífico. Nesse caso, pode-se trabalhar com uma série o uso recorrente dos mapas conceituais para que
de fatores como limitação do número de conceitos, se altere a dinâmica de ensino-aprendizagem e se
presença de conceitos obrigatórios, perguntas focais amplifiquem as possibilidades para que ocorra
estabelecidas pelo professor e até aspectos de ordem uma maior ressonância pedagógica entre aluno
mais prática como o tempo de execução da tarefa e a e professor.
possibilidade de consulta dos materiais instrucionais. As novas demandas formativas da sociedade
Existem várias formas de usar os mapas conceituais e do conhecimento exigem a busca por respostas
é possível encontrar uma que melhor atende cada ob- inovadoras para transformar o ensino de graduação.
jetivo de ensino. Cabe ao professor, como especialista Essa busca precisa valorizar a interação entre alunos
do assunto, definir tais objetivos e determinar as me- e professor, visando à construção de estruturas de
lhores condições de utilização dos mapas conceituais conhecimento em rede por meio da aprendizagem
para que seus alunos se tornem futuros especialistas. profunda. Os mapas conceituais tornam visíveis
tais estruturas de conhecimento e, por isso, eles
Conclusão se mostram úteis no planejamento, na execução e
Na literatura especializada já existem diversos na avaliação do processo de ensino-aprendizagem.
trabalhos que demonstram o uso de mapas con- Apesar disso, é evidente a insuficiência dos mapas
ceituais aos mais diversos conteúdos e níveis de conceituais para resolver todos os problemas exis-
ensino2. Entretanto, o uso inadequado dessa técni- tentes nas salas de aula. Nosso grupo de pesquisa
ca de representação do conhecimento em sala de trabalha para compreender como essa técnica de
aula pode apresentar alguns entraves, como alu- representação do conhecimento pode se combinar
nos que “empacam” diante de uma folha em bran- com outras estratégias de ensino, de forma a gerar
co, ou que elaboram mapas conceituais simplórios modelos práticos que podem ser úteis a professores e
para o nível de conhecimento que possuem. alunos. É possível utilizar os mapas conceituais para
Diante desses problemas, recomendamos que aprender profundamente, aprender a aprender e a
os interessados no uso dos mapas conceituais em aprender por toda a vida.
sala de aula considerem os seguintes aspectos:
1. É necessário o domínio da técnica de ma- Agradecimentos
peamento conceitual pelos professores, a partir Nosso grupo de pesquisa agradece ao CNPq
da compreensão dos quatro componentes chaves (486194/2011-6; 440686/2014-8), à CAPES (PAEP
do mapeamento. Sugerimos que antes de reali- 2598/2014) e à FAPESP (2012/22693-5; 2014/09337-
zar essa atividade em sala de aula, o professor 0) pelo apoio financeiro. Joana Aguiar agradece à CA-
elabore um mapa conceitual sobre um conteúdo PES pela bolsa de doutorado. Anderson Viana agrade-
ce à FAPESP (2014/03367-5) pela bolsa de mestrado.
que conheça para compreender como essa é uma
atividade que requer esforço dos alunos e, assim,
Notas
tenha dimensão de eventuais dificuldades que
1. Gratuito, o programa CmapTools é dedicado à ela-
possam surgir no processo. Com essa atividade,
boração de mapas conceituais. Visite o site <http://
torna-se claro como é necessário o treinamento cmap.ihmc.us/> para maiores informações a respeito.
prévio dos alunos na técnica. 2. Os proceedings das conferências internacionais sobre
2. É necessário planejamento de ensino quando mapas conceituais contêm um rico repertório de pes-
quisas e experiências educacionais. O conteúdo está
se tem como objetivo utilizar mapas conceituais. disponível gratuitamente em <http://cmc.ihmc.us/
Estes não podem surgir como um aspecto com- cmc/CMCProceedings.html>.
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Publicado em 05/07/2016.
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