Sunteți pe pagina 1din 4

O segredo de traduzir

Entrevista com Maria Luiza Borges

Os contos de fadas encantam há séculos gerações de crianças. Sua linguagem simbólica


é atemporal, prescinde de épocas, culturas ou religiões. No entanto, modismos
pedagógicos vêm fazendo com que adaptações resumidas e distorcidas afastem cada vez
mais as histórias infantis de suas versões tradicionais - os clássicos. Nesta entrevista, a
tradutora Maria Luiza X. de A. Borges – que teve duas de suas obras premiadas
relançadas em 2010 (quadro abaixo) – explica o que é uma boa tradução e critica a
tendência a simplificar, a facilitar, quando se traduz para crianças.

Carta Fundamental: O que é uma boa tradução?


Maria Luiza: É a que proporciona ao leitor uma experiência tão próxima quanto
possível à que ele teria lendo o original. Quanto mais a tradução “transmite” (estilo,
atmosfera, registro, ritmo, humor), melhor. Alguma coisa se perde necessariamente no
processo. Robert Frost (poeta norte-americano, 1874-1963) chegou a dizer que “poesia
é o que se perde na tradução”. Manter o humor pode ser um desafio também. Passei os
olhos pouco tempo atrás numa tradução de Razão e Sensibilidade, de Jane Austen, em
que a ironia, que banha tudo no original, havia desaparecido. Ou seja, era outra obra.

CF: Os critérios são diferentes quando se trata da tradução de um livro infantil?


ML: A meu ver, não. Percebo com frequência a tendência a facilitar, simplificar, trocar
em miúdos quando se trata de traduzir para crianças. Não vejo por que tratar o leitor,
adulto ou criança, com mais condescendência do que o autor da obra o tratou.

CF: Como avaliar se um conto de fadas teve ou não uma boa tradução?
ML: Com os mesmos critérios que se aplicam a qualquer obra. O bom tradutor é o que
serve de ponte entre autor e leitor e passa despercebido. Essa é uma das razões porque,
exceto em livros de caráter mais técnico, não gosto de notas do tradutor, estorvando a
história. O ideal é que o texto não pareça ter sido traduzido.

CF: O que um tradutor deve levar em consideração ao traduzir contos de fadas?


ML: O texto que tem em mãos e os recursos de sua própria língua que podem lhe
permitir recriar a experiência de leitura.

CF: As versões clássicas são as mais recomendadas por estudiosos da literatura


infantil. Por quê?
ML: Não é à toa que elas atravessaram os séculos. Elas calam fundo no coração
humano. Há décadas a psicanálise vem se debruçando sobre os contos de fadas
clássicos. Há mais mistérios em Chapeuzinho Vermelho do que sonha nossa vã
filosofia.

CF: Quais os problemas das adaptações? São muito reduzidas? Empobrecem a


história?
ML: Elas tendem, no mínimo, a ser mais rasas que a história original. O que sempre
pergunto a mim mesma é: por que o adaptador não inventa uma história em vez de bulir
na obra-prima alheia? Qual é a razão de ser de uma adaptação? Encurtar a história?
Simplificá-la? A troco de quê? Uma versão condensada de Guerra e paz será ainda
Guerra e paz? Há exceções, é claro. Monteiro Lobato, por exemplo, recontou para as
crianças histórias de livros não destinados a elas, como Dom Quixote. Com oito anos,
eu certamente não tinha condições de ler Cervantes, e adorei acompanhar aquelas
aventuras.
CF: Em alguns casos, as obras infantis passam por uma adequação ao que hoje é
chamado de “politicamente correto”. Isso não acaba sendo um tipo de censura?
Por exemplo, na versão de Perrault, Chapeuzinho Vermelho 9 (séc. XVII) é
devorada pelo lobo. Na versão dos irmãos Grimm (séc. XIX), apenas a avozinha
era devorada e depois tirada da barriga do lobo. Hoje, para não haver “crueldade”
com o lobo ao abrir a barriga dele, nem a avó é devorada. Você pode comentar
isto?
ML: Ah, a praga do “politicamente correto”! Fabricar um lobo bonzinho, poupar o
bicho e a avozinha, tudo isso é de uma burrice, de uma ignorância sem limites, e
prejudicial também. Seria preciso entrar pelas teorias de Melanie Klein, pelos estudos
de Bruno Bettel¬heim adentro para expor a gravidade, até, dessa edulcoração dos
contos de fadas, que os impede de exercer seu papel junto à criança às voltas com seus
sentimentos, conflitos e desejos nada suaves. É censura deslavada, claro; é deturpação e
empobrecimento.

CF: Recentemente falou-se em tirar Monteiro Lobato das leituras recomendadas


nas escolas, por seu “racismo” ao chamar tia Nastácia de “negra”. O que a senhora
pensa disto?
ML: Pelo que lembro, Tia Nastácia é querida e valorizada no sítio. É importante,
acompanha a família para todo lado e as crianças parecem gostar tanto dela quanto da
avó. Há um volume inteiro dedicado às deliciosas histórias que ela contava. Ou seja, seu
saber, e não só seus bolinhos, são apreciados. Racismo? Sem uma infância mergulhada
em Monteiro Lobato, eu não seria a pessoa que sou. Não me parece que ela tenha
alimentado em mim qualquer tipo de prevenção contra algum ser humano.

CF: E agora, as questões do idioma. Uma tradução deve ser a mais fiel possível ao
texto original?
ML: A questão da fidelidade é complexa. Se o texto soa natural e fluente no original,
deve soar assim também na tradução, o que será impossível se o tradutor ficar colado à
letra do original. O que interessa é obter o mesmo efeito, ainda que por vezes seja
preciso usar recursos um pouco diferentes. Mas creio que se deve ter a fidelidade
possível, respeitados os limites da língua-alvo. Quanto à criatividade, seria conveniente
não tentar ser mais criativo que Perrault, os irmãos Grimm ou Andersen.

CF: Como tornar a leitura compreensível ao leitor infantil sem mudar as


características do original?
ML: Não tenho esse tipo de preocupação, isto é, a de trocar em miúdos. Procuro tornar
o texto da tradução tão compreensível quanto o texto original, nem mais, nem menos.
CF: Substituir referências estrangeiras por equivalentes da nossa cultura pode ser
uma solução, em alguns casos?
MF: Solução para quê? Qual é o problema de uma história ambientada na Lapônia? Ou
de referências a coisas que não fazem parte do dia a dia da criança? Por que diabos a
criança não deve nem ouvir falar de outras culturas? Não seria o caso, ao contrário, de
pô-la em contato com tantos usos e costumes quanto possível?

CF: Uma dificuldade da tradução é a linguagem de época? A saída seria a


equivalência em linguagem moderna para facilitar a compreensão?
MF: Por que “facilitar a compreensão”? A adolescente inglesa de hoje que lê um
romance inglês do século XVIII não enfrenta o mesmo problema? O ideal é tentar usar
uma linguagem de época equivalente, o que nem sempre é fácil nem possível, ou, pelo
menos, evitar, num texto mais antigo, uma linguagem flagrantemente modernosa. O
dicionário Houaiss dá a data em que as palavras entraram em uso corrente, o que muitas
vezes me é muito útil. Na tradução das histórias de Sherlock Holmes, por exemplo,
tentei, sem excessivo rigor, preservar um gostinho de século XIX, evitando palavras
muito novas e fraseados informais.

CF: Quando se trata de gíria é ainda mais difícil?


MF: Gíria é de fato um desafio. Quando posso, uso gírias antigas para traduzir gírias
antigas. E, no caso das gírias mais atuais, às vezes tenho de fazer certo esforço para me
atualizar com o que a garotada anda dizendo. É bom não ousar demais, ou o texto
parecerá datado já no próximo verão. O bom é que hoje, para o linguajar e 1001 outras
coisas, temos esse recurso maravilhoso que é a internet.

CF: No caso de Aventuras de Alice no País das Maravilhas e Através do Espelho,


traduzidos pela senhora, há jogos de palavras e de ideias, poemas com rimas.
Como contornou essa dificuldade?
MF: Não houve como contorná-las. Tive de me engalfinhar com todas elas da melhor
maneira possível, uma por uma. Foi extremamente trabalhoso, mais ainda porque, na
edição anotada, eu tinha de traduzir as versões originais dos poemas e as paródias
escritas por Carroll. E tudo, tanto quanto possível, com rimas e métrica. Quanto aos
jogos de palavras e ideias, quando não eram passíveis de tradução, tentei recriá-los.

CF: No processo de tradução é importante pesquisar sobre o autor, estudar o


contexto histórico e a obra?
MF: Para mim, seja como leitora, seja como tradutora, o fundamental é o que está na
página, o texto a ler ou traduzir e as informações que ele me dá, os sentimentos que me
transmite. O resto (biografia do autor, contexto histórico-social, conjunto da obra etc.)
pode ser ilustrativo e enriquecedor, mas é acessório.

CF: O que é importante o professor saber sobre o trabalho do tradutor?


MF: Deve saber que uma tradução é uma aproximação, algo que fica sempre aquém da
obra original. As crianças devem ser informadas de que estão lendo uma tradução. Usar
um texto integral e uma tradução que busca ser fiel é melhor que lançar mão de uma
adaptação ligeira, um arremedo da história. O fato de haver dificuldades numa obra não
deve ser visto como um empecilho – a criança deve aprender a encarar o texto escrito
como uma fonte de prazer, mas também como um desafio. Algo que pode exigir
esforço, trabalho, para revelar seus segredos. É melhor ler com as crianças um capítulo
de um livro na versão integral, ajudando-as a decifrá-lo, caso encerre dificuldades, que
lançar mão de uma adaptação em tamanho reduzido, que pouco lhes acrescentará e as
deixará com a falsa impressão de conhecer a obra.

CF: Como o professor pode selecionar boas traduções para sua escola e seus
alunos?
MF: Boas traduções muitas vezes não são aquelas assinadas por nomes famosos, ou
mesmo por grandes escritores. Num livro muito interessante chamado À margem das
traduções, publicado nos anos 40, Agenor Soares de Moura analisa as tolices
perpetradas por grande número de escritores brasileiros da melhor estirpe em traduções
descuidadas... De fato, se nomeada não é documento, não conheço maneira de descobrir
boas traduções senão correndo os olhos por elas, examinando-as. A prova do pudim está
em comê-lo. Há também tradutores, sejam eles também escritores ou não, cujo nome é
uma marca de qualidade. O professor deve aprender a reconhecê-los.

Maria Luiza Borges recebeu menção honrosa do Prêmio Jabuti, em tradução, pelo
livro Alice: edição comentada, de Lewis Carroll (Zahar), em 2002, e o Prêmio
FNLIJ Monteiro Lobato de melhor tradução jovem pelos livros Contos de fadas
(Zahar), em 2005, e Nenhum peixe aonde ir, de Marie-Francine Hébert (Edições
SM), em 2007. Os livros publicados pela Zahar foram relançados em 2010, em uma
caprichada versão de bolso.

Disponível em http://www.cartacapital.com.br/educacao/carta-fundamental-arquivo/o-
segredo-de-traduzir-2. Acesso em 06/1/17.

S-ar putea să vă placă și