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“O efeito da liberdade é de permitir aos indivíduos fazerem aquilo que lhes agrada:
vejamos, pois, o que lhes será agradável fazer antes de nos arriscarmos a cumprimentos
que muito cedo, talvez, devam ser convertidos em pêsames. A prudência nos ditaria tal
conduta no caso de indivíduos separados e isolados; mas quando os homens agem em
corpo, a liberdade é poder.” (BURKE, 2016, p.30).
“Os homens não têm nenhuma direito ao que não é razoável e ao que não é para o seu
benefício.” (BURKE, 2016, p.82). Assim, não cabe ao indivíduo estipular seu próprio
conceito de felicidade, estando dependente daquele proposto pelo Estado como sendo
mais benéfico e razoável.
Ao esperar que uma concepção moral ou religiosa obste o homem de agir viciosamente
está-se propondo amplo otimismo. As melhores políticas se encontram na doutrina do
pessimismo, afinal, reconhece-se a complexidade e amplitude da temática, o que
estagna qualquer possibilidade de algo ser deturpado por forças que ainda não são
reconhecidas como presentes. Ao propor um modelo de Estado, diversos fatores como a
natureza humana, a motivação pra a ação, os efeitos das relações entre os cidadãos e o
poder das circunstâncias são variáveis densas e de difícil elucidação. Desta maneira,
através de uma doutrina conservadora e pessimista, podemos pressupor pelo pior, o que
fomentará melhores resultados, afinal, o ponto de partida é o de desconfiar do indivíduo
isolado e de sua habilidade de agir sozinho.
“Para que amemos nosso país, o mesmo deve ser digno de nosso amor.” (BURKE,
2016, p.97). TEXTO 2.
“Os reis serão tiranos pela política quando os súditos forem rebeldes por princípio.”
(BURKE, 2016, p.97). Assim, cidadãos que não seguem as expectativas que o Estado
elenca como válidas tendem a forçar a mão dos grupos detentores do poder político, ou
seja, homens inferiores clamam, mesmo que indiretamente, por Estados abrangentes e
invasivos.
“Tememos colocar os homens para viver e negociar cada qual com o seu estoque
particular de razão, pois suspeitamos que o fundo de cada homem é pequeno, e que os
indivíduos fariam melhor aproveitando-se do capital do banco geral das nações e dos
séculos.” (BURKE, 2016, p.106).
Assim, não se mostra viável demandar erudição de homens irracionais, mas pelo
contrário, se faz imperioso que o homem não questione, e se abrace de olhos vendados a
tudo aquilo que já foi consolidado e aprovado pelo tempo. É o pessimismo quanto à
natureza do homem que move esse ponto de vista, afinal, não apraz o todo arriscar e
conceder liberdade, o que, possivelmente trará alguma desventura em relação aos
resultados.
Uma democracia pressupõe otimismo, o que a torna inviável. Propor que as maiorias
podem governar é vergonhoso. O poder de escolher o representante é desprendido de
qualquer castigo, ou seja, em uma democracia é concedido ao homem a faculdade de
buscar informação, refletir e canalizar suas ideias através de um voto, mas o que
também é facultado ao homem é estagnar e nada realizar. Esse é o grande perigo da
democracia: otimismo quanto ao que o homem fará com a sua liberdade política.
Conceder ao homem o poder de eleger o poder político dominante é reconhecê-lo apto
de fazer juízo de valor político. Uma concepção pessimista vedaria qualquer hipótese de
democracia em razão de reconhecer que um homem que não sabe ser livre não deve ser
posto em liberdade.
“[...] numa democracia a maioria dos cidadãos é capaz de exercer sobre a minoria a
mais cruel das opressões sempre que prevaleçam, o que é frequente nesse tipo de
organização política, grandes divisões. [...] essa opressão exercida sobre a minoria se
estenderá sobre um número maior de indivíduos e será exercida com uma fúria muito
maior do que [...] se pode esperar da dominação de um único cetro. Os indivíduos que
sofrem desse tipo de perseguição popular encontram-se em uma situação muito mais
deplorável do que em nenhuma outra. Pois aqueles que sofrem sob um príncipe cruel
têm o bálsamo da compaixão humana para aplacar o ardor de suas feridas e o aplauso do
público para animar a generosa constância com que suportam os sofrimentos, enquanto
aqueles que são submetidos à injustiça das multidões estão privados de toda consolação
externa. Parecem desertados pela humanidade, esmagados por uma conspiração de toda
a sua espécie.” (BURKE, 2016, p.143).
“Devo tolerar as imperfeições enquanto elas não degeneram em crimes. É certo que a
progressão natural das paixões, da fragilidade ao vício, deve ser prevenida com olhos
vigilantes e mãos firmes.” (BURKES, 2016, p.160). Assim, toda ação que, segundo a
concepção do Estado for perpetrada pelo indivíduo e em detrimento do próprio
indivíduo deverá ser punida. Não cabe ao indivíduo lesar a si mesmo, afinal, o homem
não pertence a si mesmo, mas ao todo. Uma mão não é dona de si mesma, mas pertence
ao organismo da qual faz parte. Este é o homem: o membro de um Estado, afinal, nós
somos o Estado.
“A superstição é a religião das mentes fracas, razão pela qual deve ser tolerada em uma
certa proporção [...] sob pena de privar os espíritos débeis de um recurso que se
reconhece como necessário aos mais vigorosos.” (BURKE, 2016, p.173).
“O que todos esperamos de uma eleição? Para que ela responda a seus verdadeiros fins,
é preciso que os eleitores possuam os meios necessários para conhecer as aptidões do
seu escolhido e disponham de algum controle sobre ele por obrigação ou dependência
pessoal. Para que fim são esses eleitores primários homenageados ou satirizados, com
uma eleição? Eles jamais poderão conhecer as qualidades de quem irá servi-los e esses
nunca terão obrigações para com eles. [...] Em caso de abuso, esse corpo de eleitores
primários jamais poderá exigir que o seu representante preste contas de sua conduta de
representação.” (BURKE, 2016, p.200).
A revolução francesa é representada pela vitória dos doentes sobre a casta dominante, a
vitória dos lunáticos sobre aqueles que detinham as chaves do hospício.
BURKE, Edmund. Reflexões sobre a revolução na França. São Paulo: Edipro, 2016.