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Para a melancolia de esquerda,


superar é tudo
Manuel Cruz
6-9 minutos

Se concordarmos em entender a melancolia, conforme se aceita


habitualmente, como a saudade daquilo que poderia ter sido e não
foi, alguém poderia imaginar que já a partir do título se anuncia ao
leitor desse livro o conteúdo que ele encontrará em suas páginas.

Mas só em parte é assim. De fato, este Melancolia de Esquerda


vem tutelado pela constatação de um fracasso, que deixou
indelevelmente marcado o século XX, século definido, a aceitar a
contabilidade de Hobsbawm, pela ascensão e queda do mais
poderoso projeto emancipador que a história da humanidade já
conheceu. Obviamente, o desenlace deste estende sua sombra
com efeitos retroativos sobre o projeto inteiro. Não há nada de
estranho nisso. O “onde fomos parar” não é algo suscetível de ser
evitado, nem, menos ainda, negado (principalmente quando se faz
com argumentos tão peregrinos como o de que esse fracasso não
existiu, porque na verdade o projeto em questão não chegou a se
materializar em parte alguma, traído por todos os que falavam em
seu nome).

Pois bem, não é recomendado se limitar a constatar o desenlace,


sem dele extrair as lições pertinentes ou, se preferir, sem se dar ao

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trabalho de interpretá-lo. É certo que não são poucos os que, por


oportunismo intelectual ou por simples preguiça, evitam a
inescapável reflexão crítica não só sobre os rumos de tal projeto
emancipador em geral, mas também sobre as causas profundas de
seu fracasso, substituindo ambas as tarefas pela mera certificação,
mais ou menos dolorida, do que terminou por ocorrer.

Felizmente para os leitores, Enzo Traverso — um dos pensadores


atuais que com maior lucidez e solvência analisaram a história
recente da Europa — não se inclui nesse grupo. Já de saída ele
deixa claro que seu livro fala da melancolia, mas não é de modo
algum uma obra nostálgica. Não se trata de ter saudades do
passado, prática em que alguns se demoram não tanto porque
aqueles tempos fossem efetivamente dignos de saudosismo, mas
porque eles então eram mais jovens, e lhes agrada pensar que
tinham tudo por fazer, e que nem de errar tiveram tempo. Trata-se,
a bem da verdade, de ter saudade daquele outro passado que não
aconteceu, a oportunidade que se deixou passar, a possibilidade
que não se materializou ou talvez, simplesmente, o sonho que
seus protagonistas não se atreveram a encarar.

Seria um grave erro pensar que a diferença entre ambos os


olhares é unicamente de matiz. Na verdade, a diferença é radical e
afeta a importância e localização que cada um deles confere ao
passado e, consequentemente, à memória. Porque, enquanto para
os nostálgicos o passado é um lugar onde morar, para os
melancólicos constitui o lugar de onde escapar, a alavanca para se
projetar, pela experiência, para o futuro. Esta colocação permite
também afugentar o temor de quem, como Wendy Brown,
considera que a melancolia da esquerda pode terminar
representando uma tendência conservadora que impeça os

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sujeitos de encontrarem um novo “espírito crítico e visionário”.

Convém destacar que a esquerda de cuja melancolia se ocupa


este livro fica definida em termos ontológicos e abrange os
movimentos que lutaram por mudar o mundo com o princípio de
igualdade no centro de seu programa, embora o marxismo, claro,
ocupe em suas páginas um lugar destacado, na medida em que foi
a expressão dominante da maioria dos movimentos revolucionários
do século XX. Em todo caso, foi o conjunto dessa esquerda que se
viu derrotado em 1989, quando o Muro de Berlim veio abaixo e,
com ele, a promessa de uma sociedade sem classes (embora uma
parte dessa mesma esquerda, incapaz de perceber o alcance do
que estava se dando, não fosse consciente num primeiro momento
de que o desmoronamento também lhe afetava).

E podemos afirmar isso tão rotundamente porque o efeito


fundamental provocado por essa derrota já sinalizava os
acontecimentos que viriam a partir daí. Esse efeito bem poderia ser
formulado assim: o capitalismo ficou sozinho. O que implicava por
sua vez que tinha sido transformado definitivamente em um modo
de produção de vida. E, embora seja verdade que a tendência de
mercantilização de todos os aspectos da realidade já tinha sido
apontada em seu momento por, entre outros, Karl R. Polanyi, essa
tendência se tornou praticamente incontrolável e hegemônica a
partir do momento em que sua alternativa, o socialismo real, foi
derrotada.

O capitalismo colonizou o presente, e impõe-se procurar chaves


em um passado que estávamos a ponto de esquecer

Que longe ficam, apesar de não estarem tão distantes (são só do


começo dos anos oitenta do século passado, tampouco é tanto),

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aquelas palavras de Habermas, de difusas ressonâncias


husserlianas, nas quais ainda parecia subjazer o convencimento
otimista de que, embora o capitalismo fosse ganhando a batalha,
ainda restavam territórios a salvo, âmbitos de experiência nos
quais se refugiar. Refiro à sua afirmação de que as utopias tinham
emigrado “do mundo do trabalho para o mundo da vida”.

Definitivamente, já não estamos mais lá, nada mais está fora da


lógica e do raio de ação do nosso modo de produção, incluídas as
supostas dimensões mais íntimas do ser humano. Mas justamente
porque o capitalismo desertificou o presente (ou o colonizou por
completo, se preferem seguir formulando-o à maneira de Husserl)
e desapareceram as utopias de nosso horizonte, impõe-se
procurar em um passado que estávamos a ponto de esquecer as
chaves que nos deem condições de enfrentar esta situação. Ou, o
que deve ser quase o mesmo, que nos proporcionem o impulso de
que precisamos para começar a sair dela.

A proposta de Traverso afunda suas raízes na melhor herança


frankfurtiana (Benjamin e Adorno fundamentalmente) e é clara a
este respeito: a melancolia não se opõe à memória, apenas à má
memória; isto é, àquela que, para citar um exemplo esclarecedor,
sob o pretexto de rememorar incessantemente as vítimas, esquece
de forma sistemática os ideais pelos quais elas se sacrificaram.
Está bem recordarmos a dor e o sofrimento que padeceram, mas
talvez seja ainda melhor recordarmos suas esperanças, suas lutas,
suas vitórias e suas derrotas. Agora que penso nisso, talvez seja a
mais bela maneira de honrá-las.

Melancolia de esquerda – Marxismo, História e Memória.


Tradução de André Bezamat. Editora Âyiné, 2018. 495 páginas. R$
64,72.

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