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Ponto 01

Direito Ambiental: conceito e objeto.

Definição de meio ambiente


Para o Dicionário Aurélio da língua portuguesa, ambiente é o “que cerca ou envolve os seres
vivos ou as coisas, por todos os lados”. Por isso, alguns entendem que a expressão meio
ambiente é redundante, podendo se referir à ambiente.

A definição legal do meio ambiente se encontra insculpida no artigo 3.º, I, da Lei 6.938/1981,
que pontifica que o meio ambiente é “o conjunto de condições, leis, influências e interações de
ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”.

Alguns estados da federação brasileira optaram por inserir em suas leis um conceito próprio, a
exemplo da Bahia, para quem meio ambiente é “a totalidade dos elementos e condições que,
em sua complexidade de ordem física, química, biológica, socioeconômica e cultural, e em
suas inter-relações, dão suporte a todas as formas de vida e determinam sua existência,
manutenção e propagação, abrangendo o ambiente natural e o artificial”.

Apesar de a definição de meio ambiente perpetrada pela Lei da Boa Terra ser até de melhor
técnica que a federal, vez que há referência expressa aos elementos socioeconômicos e
culturais, não se acha recomendável que cada entidade política regional ou local trace
conceitos próprios, porquanto se cuida de norma geral de Direito Ambiental, cuja competência
legiferante é da União.

Afinal, os elementos bióticos (com vida) e abióticos (sem vida) que integram o meio ambiente
são os mesmos dentro do Brasil, não cabendo nenhum tipo de diferenciação. Aliás, o próprio
Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA nos trouxe um conceito de meio ambiente
mais completo do que o posto na Lei 6.938/1981, englobando o patrimônio cultural e artificial, o
definindo como o “conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física,
química, biológica, social, cultural e urbanística, que permite, abriga e rege a vida em todas as
suas formas”.

Espécies de meio ambiente


Não há uniformidade doutrinária para a definição de meio ambiente, havendo inúmeras críticas
ao conceito legal acima transcrito (artigo 3.º, I, da Lei 6.938/1981), pois apenas foi dada ênfase
ao elemento biológico, não ao social. Entrementes, é certo que o meio ambiente em sentido
amplo é gênero que abarca o meio ambiente natural, cultural e artificial.

Já há quem entenda existirem, ainda, o meio ambiente do trabalho e o genético, mas crê-se
que o primeiro integra o artificial e o segundo o natural, ressalvando-se que não há
uniformidade doutrinária sobre a questão.

Contudo, ressalte-se que o STF já reconheceu a existência do meio ambiente do trabalho, ao


lado do natural, do cultural e do artificial.

É possível afirmar que o meio ambiente do trabalho, extensão do meio ambiente artificial, é
respeitado quando as empresas cumprem as normas de segurança e medicina do trabalho,
proporcionando ao obreiro condições dignas e seguras para o desenvolvimento de sua
atividade laborativa remunerada, a exemplo da disponibilização dos equipamentos de proteção
individual, a fim de preservar a sua incolumidade física e psicológica.

Para quem admite a sua existência autônoma, o meio ambiente genético é composto pelos
organismos vivos do planeta Terra, que formam a sua diversidade biológica.

É prevalente que a expressão “Direito Ecológico” não deve ser tomada como sinônimo de
“Direito Ambiental”, pois aquela apenas abarca o meio ambiente natural, excluindo o cultural e
o artificial.
Precedente em que o STF adota o conceito amplo de meio ambiente:

E M E N T A: MEIO AMBIENTE - DIREITO À PRESERVAÇÃO DE SUA


INTEGRIDADE (CF, ART. 225) - PRERROGATIVA QUALIFICADA POR
SEU CARÁTER DE METAINDIVIDUALIDADE - DIREITO DE TERCEIRA
GERAÇÃO (OU DE NOVÍSSIMA DIMENSÃO) QUE CONSAGRA O
POSTULADO DA SOLIDARIEDADE - NECESSIDADE DE IMPEDIR QUE A
TRANSGRESSÃO A ESSE DIREITO FAÇA IRROMPER, NO SEIO DA
COLETIVIDADE, CONFLITOS INTERGENERACIONAIS - ESPAÇOS
TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS (CF, ART. 225, § 1º, III)
- ALTERAÇÃO E SUPRESSÃO DO REGIME JURÍDICO A ELES
PERTINENTE - MEDIDAS SUJEITAS AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL
DA RESERVA DE LEI - SUPRESSÃO DE VEGETAÇÃO EM ÁREA DE
PRESERVAÇÃO PERMANENTE - POSSIBILIDADE DE A
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, CUMPRIDAS AS EXIGÊNCIAS LEGAIS,
AUTORIZAR, LICENCIAR OU PERMITIR OBRAS E/OU ATIVIDADES NOS
ESPAÇOS TERRITORIAIS PROTEGIDOS, DESDE QUE RESPEITADA,
QUANTO A ESTES, A INTEGRIDADE DOS ATRIBUTOS
JUSTIFICADORES DO REGIME DE PROTEÇÃO ESPECIAL - RELAÇÕES
ENTRE ECONOMIA (CF, ART. 3º, II, C/C O ART. 170, VI) E ECOLOGIA
(CF, ART. 225) - COLISÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS - CRITÉRIOS
DE SUPERAÇÃO DESSE ESTADO DE TENSÃO ENTRE VALORES
CONSTITUCIONAIS RELEVANTES - OS DIREITOS BÁSICOS DA
PESSOA HUMANA E AS SUCESSIVAS GERAÇÕES (FASES OU
DIMENSÕES) DE DIREITOS (RTJ 164/158, 160-161) - A QUESTÃO DA
PRECEDÊNCIA DO DIREITO À PRESERVAÇÃO DO MEIO AMBIENTE:
UMA LIMITAÇÃO CONSTITUCIONAL EXPLÍCITA À ATIVIDADE
ECONÔMICA (CF, ART. 170, VI) - DECISÃO NÃO REFERENDADA -
CONSEQÜENTE INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE MEDIDA
CAUTELAR. A PRESERVAÇÃO DA INTEGRIDADE DO MEIO AMBIENTE:
EXPRESSÃO CONSTITUCIONAL DE UM DIREITO FUNDAMENTAL QUE
ASSISTE À GENERALIDADE DAS PESSOAS. - Todos têm direito ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado. Trata-se de um típico direito de
terceira geração (ou de novíssima dimensão), que assiste a todo o gênero
humano (RTJ 158/205-206). Incumbe, ao Estado e à própria coletividade, a
especial obrigação de defender e preservar, em benefício das presentes e
futuras gerações, esse direito de titularidade coletiva e de caráter
transindividual (RTJ 164/158-161). O adimplemento desse encargo, que é
irrenunciável, representa a garantia de que não se instaurarão, no seio da
coletividade, os graves conflitos intergeneracionais marcados pelo
desrespeito ao dever de solidariedade, que a todos se impõe, na proteção
desse bem essencial de uso comum das pessoas em geral. Doutrina. A
ATIVIDADE ECONÔMICA NÃO PODE SER EXERCIDA EM DESARMONIA
COM OS PRINCÍPIOS DESTINADOS A TORNAR EFETIVA A PROTEÇÃO
AO MEIO AMBIENTE. - A incolumidade do meio ambiente não pode ser
comprometida por interesses empresariais nem ficar dependente de
motivações de índole meramente econômica, ainda mais se se tiver
presente que a atividade econômica, considerada a disciplina constitucional
que a rege, está subordinada, dentre outros princípios gerais, àquele que
privilegia a "defesa do meio ambiente" (CF, art. 170, VI), que traduz
conceito amplo e abrangente das noções de meio ambiente natural, de
meio ambiente cultural, de meio ambiente artificial (espaço urbano) e de
meio ambiente laboral. Doutrina. Os instrumentos jurídicos de caráter legal
e de natureza constitucional objetivam viabilizar a tutela efetiva do meio
ambiente, para que não se alterem as propriedades e os atributos que lhe
são inerentes, o que provocaria inaceitável comprometimento da saúde,
segurança, cultura, trabalho e bem-estar da população, além de causar
graves danos ecológicos ao patrimônio ambiental, considerado este em seu
aspecto físico ou natural. A QUESTÃO DO DESENVOLVIMENTO
NACIONAL (CF, ART. 3º, II) E A NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO DA
INTEGRIDADE DO MEIO AMBIENTE (CF, ART. 225): O PRINCÍPIO DO
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL COMO FATOR DE OBTENÇÃO
DO JUSTO EQUILÍBRIO ENTRE AS EXIGÊNCIAS DA ECONOMIA E AS
DA ECOLOGIA. - O princípio do desenvolvimento sustentável, além de
impregnado de caráter eminentemente constitucional, encontra suporte
legitimador em compromissos internacionais assumidos pelo Estado
brasileiro e representa fator de obtenção do justo equilíbrio entre as
exigências da economia e as da ecologia, subordinada, no entanto, a
invocação desse postulado, quando ocorrente situação de conflito entre
valores constitucionais relevantes, a uma condição inafastável, cuja
observância não comprometa nem esvazie o conteúdo essencial de um dos
mais significativos direitos fundamentais: o direito à preservação do meio
ambiente, que traduz bem de uso comum da generalidade das pessoas, a
ser resguardado em favor das presentes e futuras gerações. O ART. 4º DO
CÓDIGO FLORESTAL E A MEDIDA PROVISÓRIA Nº 2.166-67/2001: UM
AVANÇO EXPRESSIVO NA TUTELA DAS ÁREAS DE PRESERVAÇÃO
PERMANENTE. - A Medida Provisória nº 2.166-67, de 24/08/2001, na parte
em que introduziu significativas alterações no art. 4o do Código Florestal,
longe de comprometer os valores constitucionais consagrados no art. 225
da Lei Fundamental, estabeleceu, ao contrário, mecanismos que permitem
um real controle, pelo Estado, das atividades desenvolvidas no âmbito das
áreas de preservação permanente, em ordem a impedir ações predatórias e
lesivas ao patrimônio ambiental, cuja situação de maior vulnerabilidade
reclama proteção mais intensa, agora propiciada, de modo adequado e
compatível com o texto constitucional, pelo diploma normativo em questão.
- Somente a alteração e a supressão do regime jurídico pertinente aos
espaços territoriais especialmente protegidos qualificam-se, por efeito da
cláusula inscrita no art. 225, § 1º, III, da Constituição, como matérias
sujeitas ao princípio da reserva legal. - É lícito ao Poder Público - qualquer
que seja a dimensão institucional em que se posicione na estrutura
federativa (União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios) -
autorizar, licenciar ou permitir a execução de obras e/ou a realização de
serviços no âmbito dos espaços territoriais especialmente protegidos, desde
que, além de observadas as restrições, limitações e exigências
abstratamente estabelecidas em lei, não resulte comprometida a
integridade dos atributos que justificaram, quanto a tais territórios, a
instituição de regime jurídico de proteção especial (CF, art. 225, § 1º, III).

(ADI 3540 MC, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado
em 01/09/2005, DJ 03-02-2006 PP-00014 EMENT VOL-02219-03 PP-
00528)

Definição, autonomia e objetivo do Direito Ambiental


Outrossim, a definição de Direito Ambiental também não é simples, gozando da mesma
dificuldade da conceituação do meio ambiente. É possível defini-lo como ramo do direito
público composto por princípios e regras que regulam as condutas humanas que afetem,
potencial ou efetivamente, direta ou indiretamente, o meio ambiente, quer o natural, o cultural
ou o artificial.

Objetiva o Direito Ambiental no Brasil especialmente o controle da poluição, a fim de mantê-la


dentro dos padrões toleráveis, para instituir um desenvolvimento econômico sustentável,
atendendo as necessidades das presentes gerações sem privar as futuras da sua dignidade
ambiental, pois um dos princípios que lastreiam a Ordem Econômica é a Defesa do Meio
Ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos
produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação.

É certa a autonomia didática deste novo ramo jurídico, uma vez que goza de princípios
peculiares não aplicáveis aos demais, que serão estudados em capítulo próprio.

Conquanto já existissem leis ambientais anteriores, a exemplo do Código de Águas, do


Florestal antigo,8 de Pesca9 e da Lei de Proteção à Fauna,10 entende-se que a “certidão de
nascimento” do Direito Ambiental no Brasil foi a edição da Lei 6.938/1981, pois se trata do
primeiro diploma normativo nacional que regula o meio ambiente como um todo, e não em
partes, ao aprovar a Política Nacional do Meio Ambiente, seus objetivos e instrumentos, assim
como o Sistema Nacional do Meio Ambiente – SINAMA, que tem a missão de implementá-la.

Antes, apenas existiam normas jurídicas ambientais setoriais, mas não um Direito Ambiental
propriamente dito, formado por um sistema harmônico de regras e princípios.

Trata-se de disciplina transversal que se alastra aos demais ramos jurídicos, pois informa e
troca informações com todos eles, a exemplo do Direito Civil, como o disposto no artigo 1.228,
§ 1.º, do Código Civil, que consigna que o proprietário deve respeitar a fauna, a flora, as
belezas naturais, o equilíbrio ecológico, o patrimônio histórico e artístico, bem como evitar a
poluição do ar e das águas.

Com o Direito Administrativo a proximidade é ainda maior, pois as disposições gerais dessa
disciplina fundamentam o Direito Ambiental no que for compatível, a exemplo da teoria geral do
poder de polícia.

Aliás, com o advento da Lei 12.349/2010, algumas disposições em defesa do meio ambiente e
do desenvolvimento sustentável foram inseridas na Lei 8.666/1993 (Lei de Licitações e
Contratos Administrativos), não sendo exagero denominá-las agora de licitações sustentáveis.

Nesse sentido, a promoção do desenvolvimento nacional sustentável foi colocada como um


dos objetivos do processo administrativo de licitação, irradiando efeitos em toda contratação
administrativa.

Com esse espírito, conforme publicado no Diário Oficial da União em 20 de abril de 2012, “o
TCU deu ciência à Superintendência Regional do Departamento de Polícia Federal no Piauí no
sentido de que, no âmbito da administração pública federal, direta, autárquica e fundacional,
tanto em face do disposto no art. 3º da Lei nº 8.666/1993, quanto na IN/MP nº 1, de
19.01.2010, as especificações para a aquisição de bens, contratação de serviços e obras,
deverão conter critérios de sustentabilidade ambiental, atentando-se para os processos de
extração ou fabricação, utilização e descarte dos produtos e matérias-primas que deram
origem aos bens ou serviços a serem contratados” (item 1.5.1.1, TC-028.613/2011-2, Acórdão
nº 2.380/2012, 2ª Câmara).

De seu turno, o Direito Constitucional fornece todos os fundamentos primários da legislação


ambiental, notadamente nos artigos 215 e 216 (meio ambiente cultural) e no 225 (natural).

Operou-se neste país o fenômeno político da constitucionalização do Direito Ambiental, em que


as principais normas jurídicas sobre o meio ambiente foram elevadas a o status de norma
constitucional, tal qual ocorrera em inúmeras outras nações, a exemplo de Portugal (1976) e da
Espanha (1978).

Por sua vez, é o Direito Penal o responsável pela tutela mais densa do meio ambiente, ao
tipificar as condutas mais agressivas contra o patrimônio ambiental, por meio do
sancionamento das posturas humanas que tragam efetivo dano ou perigo concreto.

Prosseguem as relações com os demais ramos sem exceção, como ocorre com o Direito
Tributário, que prevê instrumentos de fomento à preservação ambiental (tributação ecológica),
como a não incidência do Imposto Territorial Rural em determinados espaços territoriais
especialmente protegidos sob o enfoque ambiental.
Também com o Direito Econômico são íntimas as relações, pois a Defesa do Meio Ambiente é
um princípio constitucional desse ramo, devendo-se tratar diferentemente os agentes que
causem menor impacto ambiental na sua produção.

Aliás, é nítida a natureza econômica das normas ambientais, que acaba importando em
intervenção estatal na economia, existindo, inclusive, instrumentos econômicos de efetivação
da Política Nacional do Meio Ambiente, a exemplo do seguro, da servidão e da concessão
ambiental, pois muitos recursos ambientais também são recursos econômicos.

Ademais, o próprio licenciamento ambiental se revela como um condicionante da livre iniciativa


para o trabalho, pois as atividades impactantes ao meio ambiente devem se sujeitar
previamente ao referido processo administrativo.

É no Direito Processual Civil que o Direito Ambiental vai buscar importantes armas processuais
para a sua proteção, a exemplo da tutela de inibição do dano ambiental, não podendo deixar
de citar as mais importantes ações coletivas: ação civil pública e ação popular.

Com o Direito do Consumidor há uma interação bem comum. É que muitas vezes os danos
causados ao consumidor pelo fornecedor de produtos ou serviços também se revelam como
prejuízos ambientais, sendo regulado simultaneamente pelo Código de Defesa do Consumidor
e pela legislação ambiental.

Até ramos jurídicos que aparentemente não são conexos ao Direito Ambiental este informa. É o
que ocorre com o Direito Previdenciário, em que os conceitos de extrativismo e pesca são
buscados na legislação ambiental, para fins de enquadramento do segurado especial da
Previdência Social.
PONTO 01 – DIREITO CONSTITUCIONAL

EMENTA: CONSTITUIÇÃO: CONCEITO, OBJETO, ESTRUTURA,


CLASSIFICAÇÃO E FONTES. SUPREMACIA DA CONSTITUIÇÃO.
CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE. AÇÃO DECLARATÓRIA DE
CONSTITUCIONALIDADE. EMENDAS À CONSTITUIÇÃO. PRINCÍPIOS
CONSTITUCIONAIS DO ESTADO BRASILEIRO E DA REPÚBLICA
FEDERATIVA DO BRASIL. PODER E DIVISÃO DOS PODERES. O ESTADO
DEMOCRÁTICO DE DIREITO. APLICABILIDADE E INTERPRETAÇÃO DAS
NORMAS CONSTITUCIONAIS. AÇÃO POPULAR. REFORMA DO PODER
JUDICIÁRIO: A EMENDA CONSTITUCIONAL 45/2004.

Item: Constituição: Conceito, objeto, estrutura, classificação e fontes:

1 - Conceito:

José Afonso da Silva: "A Constituição de um Estado, considerada sua lei fundamental, seria a
organização dos seus elementos essenciais: um sistema de normas jurídicas, escritas ou
costumeiras, que regula a forma do Estado, a forma de seu governo, o modo de aquisição e o
exercício do poder, o estabelecimento de seus órgãos, os limites de sua ação, os direitos
fundamentais do homem e as respectivas garantias. Em síntese, a Constituição é o conjunto de
normas que organiza os elementos constitutivos do Estado."

Diz Canotilho que na formulação do que deva consistir uma constituição, deve-se decidir
entre um conceito que coloque a constituição como uma lei do Estado, e só dele, ou seja, uma
lei que se limite a enumerar uma ordem de competências, bem como a disciplinar a forma
como o Estado se organiza, ou, por outro lado, deve a constituição ser o estatuto jurídico
do fenômeno político em sua totalidade, que não cuide apenas do Estado, mas também
de toda a sociedade.

Existem várias acepções a serem tomadas para definir o termo Constituição:

Sentido sociológico - Ferdinand Lassale defendeu que uma Constituição só seria legítima se
representasse o efetivo poder social, refletindo as forças sociais que constituem o poder. Caso
isso não ocorresse, ela seria ilegítima, uma mera "folha de papel". Só será boa, duradoura e
prevalecerá quando corresponder à constituição real e tiver raízes nos fatores do poder que
regem o pais. A Constituição seria, então, a somatória dos fatores reais do poder dentro de
uma sociedade.

Sentido político - Elaborado por Carl Schmitt, tal conceito distingue constituição de lei
constitucional. Constituição só se refere à decisão política fundamental (estrutura e órgãos do
Estado, direitos individuais, vida democrática, etc.); as leis constitucionais seriam os demais
dispositivos inseridos no texto do documento constitucional, mas não contêm matéria de
decisão política fundamental. A Constituição é a decisão política do titular do poder
constituinte.

Sentido material e formal - Do ponto de vista material, o que vai importar para definirmos se
uma norma tem caráter constitucional ou não será o seu conteúdo, pouco importando a forma
pela qual ela foi introduzida no ordenamento jurídico. Assim, constitucional será aquela norma
que defina e trate das regras estruturais da sociedade, de seus alicerces fundamentais. É o
que Schmitt chamou de Constituição. Quando nos valemos do critério formal, não interessa o
conteúdo da norma, mas sim a forma como ela foi introduzida no ordenamento jurídico. São as
introduzidas pelo poder soberano, por meio de um processo legislativo mais dificultoso,
diferenciado e mais solene que o das demais normas do ordenamento.

Sentido jurídico - Hans Kelsen aloca a Constituição no mundo do dever ser, e não no mundo
do ser, caracterizando-se como fruto da vontade racional do homem, e não das leis naturais. A
Constituição é considerada norma pura, puro dever ser, sem qualquer pretensão a
fundamentação sociológica, política ou filosófica. A concepção de Kelsen toma a palavra
Constituição em dois sentidos: no lógico-jurídico e no jurídico-positivo. De acordo com o
primeiro, Constituição significa norma fundamental hipotética, cuja função é servir de
fundamento lógico transcendental da validade da Constituição jurídico-positiva, que equivale à
norma positiva suprema, conjunto de normas que regula a criação de outras normas, lei
nacional no seu mais alto grau. Michel Temer (comentando Kelsen): "O jurídico-positivo é
corporificado pelas normas postas, positivadas. O lógico jurídico situa-se em nível do suposto,
do hipotético. Umas são normas postas; outra é suposta." A Constituição, por seu turno, tem o
seu fundamento de validade na norma hipotética fundamental, situada no plano lógico, e não
no jurídico, caracterizando-se como fundamento de validade de todo o sistema, determinando-
se a obediência a tudo o que for posto pelo Poder Constituinte Originário.
Obs: Konrad Hesse – concepção normativa (A força normativa da Constituição), defendendo a
concepção de Kelsen, rebate a concepção de Lassale, tentando demonstrar que nem sempre
os fatores reais de poder prevalecem sobre a constituição normativa. Hesse argumenta que se
as normas constitucionais nada mais expressam do que relações fáticas altamente mutáveis,
não há como deixar de reconhecer que a ciência da constituição tem apenas a função de
comentar e constatar os fatos criados pela REALPOLITIK. Neste caso, o direito constitucional
não estaria a serviço de uma ordem estatal justa. Aduz que a constituição real e a jurídica
estão em relação de coordenação, condicionando-se mutuamente, embora não dependam,
pura e simplesmente, uma da outra.

Sentido culturalista (JH Meirelles Teixeira) - Pode-se dizer, neste sentido, que a Constituição
é produto de um fato cultural, produzido pela sociedade e que sobre ela pode influir. A
concepção culturalista do direito conduz ao conceito de uma Constituição Total em uma visão
suprema e sintética que apresenta na sua complexidade instrínseca, aspectos econômicos,
sociológicos, jurídicos e filosóficos, a fim de abranger o seu conceito em uma perspectiva
unitária. Sob o conceito culturalista de Constituição as Constituições positivas são um
conjunto de normas fundamentais, condicionadas pela Cultura total, e ao mesmo tempo
condicionantes desta, emanadas da vontade existencial da unidade política, e reguladoras da
existência, estrutura e fins do Estado e do modo de exercício e limites do poder público.

Constituição aberta - Canotilho observa que, dentro da perspectiva de uma constituição


aberta, "relativiza-se a função material da tarefa da constituição e justifica-se a
desconstitucionalização de elementos substantivadores da ordem constitucional (constituição
econômica, constituição do trabalho, constituição social, constituição cultural). A historicidade
do direito constitucional e a indesejabilidade do perfeccionismo constitucional (a constituição
como estatuto detalhado e sem aberturas) não são, porém, incompatíveis com o caráter de
tarefa e projeto da lei constitucional. Esta terá de ordenar o processo da vida política fixando
limites às tarefas do Estado e recortando dimensões prospectivas traduzidas na formulação
dos fins sociais mais significativos e na identificação de alguns programas da conformação
constitucional." Em outras palavras, o objeto constitucional é aberto, dinâmico, não
enclausurado em si mesmo. Deve ser aberta para se adaptar às mudanças sociais, pois
se assim não o fizer, perderá sua razão de ser (Peter Haberle).

Outras concepções de constituição constantes do resumo elaborado para o TRF2 por


Leonardo Resende Martins:
a) jusnaturalistas: a constituição concebida consoante princípios de direito natural,
principalmente no que diz respeito aos direitos fundamentais do ser humano (Víctor Cathrein);
b) positivistas: a constituição como complexo normativo emanado do poder estatal, sem
considerar qualquer elemento axiológico em sua formação (Laband, Jellinek, Carré de Malberg
e Kelsen);
c) historicistas: a constituição como derivação do processo histórico, que ao reger a vida
de um povo considera a tradição, os costumes, os folkways e mores, a religião, a geografia, as
relações políticas e econômicas (Burke, De Maistre, Gierke);
d) marxistas: a constituição como produto da supra-estrutura ideológica, condicionada
pela infra-estrutura econômica. É o caso da “constituição-balanço”, que descreve e registra a
organização política estabelecida, é dizer, os estágios das relações de poder;
e) culturalistas: a constituição como fato cultural, desembocando na filosofia dos valores
(Meirelles Teixeira, Maunz, Otto Bachof);
f) estruturalistas: a constituição como resultado das estruturas sociais, equilibradora das
relações políticas e da sua transformação (José Afonso da Silva, Spagna Musso).

2 - Objeto:
As constituições têm por objeto estabelecer a estrutura do Estado, a organização de seus
órgãos, o modo de aquisição do poder e a forma de seu exercício, limites de sua atuação,
assegurar os direitos e garantias dos indivíduos, fixar o regime político e disciplinar os fins
sócio-econômicos do Estado, bem como os fundamentos dos direitos econômicos, sociais e
culturais.

3 - Estrutura:
Entende José Afonso da Silva que a constituição tem cinco categorias de elementos:
1) Elementos Orgânicos - se contêm nas normas que regulam a estrutura do Estado e do
poder, e, na atual Constituição, concentra-se predominantemente nos Títulos III (Da
Organização do Estado), IV (Da Organização dos Poderes e do Sistema de Governo),
Capítulos II e III do Título V (Das Forças Armadas e da Segurança Pública) e VI (Da Tributação
e do Orçamento, que constituem aspectos da organização e funcionamento do Estado);

2) Elementos Limitativos, que se manifestam nas normas que consubstanciam o elenco dos
direitos e garantias fundamentais - direitos individuais e suas garantias, direitos de
nacionalidade e direitos políticos e democráticos; são denominados limitativos porque limitam a
ação dos poderes estatais e dão a tônica do Estado de Direito; acham-se inscritos no Título II
da Constituição, sob a rubrica Dos direitos e garantias fundamentais, excetuando-se os Direitos
Sociais (capítulo II);

3) Elementos Sócio-Ideológicos, consubstanciados nas normas sócio-ideológicas, que


revelam o caráter de compromisso das constituições modernas entre o Estado individualista e
o Estado Social, intervencionista, como as do Capítulo II do Título II, sobre os Direitos Sociais,
e a dos títulos VII (Da Ordem Econômico e Financeira) e VIII (Da Ordem Social);

4) Elementos de Estabilização Constitucional, consagrados nas normas destinadas a


assegurar a solução de conflitos constitucionais, a defesa da Constituição, do Estado e das
instituições democráticas, premunindo os meios e técnicas contra sua alteração e infringência,
e são encontrados no art. 102, I, a (ação de inconstitucionalidade), nos arts. 34 a 36 (da
Intervenção nos Estados e Municípios), 59, I e 60 (Processo de emendas à Constituição), 102
e 103 (Jurisdição Constitucional) e o Título V (Da Defesa do Estado e das Instituições
Democráticas, especialmente o Capítulo I, porque os Capítulos II e II integram os elementos
orgânicos);

5) Elementos Formais de Aplicabilidade, são os que se acham consubstanciados nas


normas que estatuem regras de aplicação das constituições, assim, o prêambulo, o dispositivo
que contêm as cláusulas de promulgação e as disposições constitucionais transitórias, assim
também a do §1º do art. 5º, segundo o qual as normas definidoras dos direitos e garantias
fundamentais têm aplicação imediata.

4 - Classificação das Constituições:

- Quanto ao conteúdo: materiais e formais. A constituição material é concebida em sentido


amplo e sentido estrito. No primeiro, identifica-se com a organização total do Estado, com
regime político. No segundo, designa as normas constitucionais escritas ou costumeiras,
inseridas ou não num documento escrito, que regulam a estrutura do Estado, a organização de
seus órgãos e os direitos fundamentais. A Constituição formal é o peculiar modo de existir do
Estado, reduzido, sob forma escrita, a um documento solenemente estabelecido pelo poder
constituinte e somente modificável por processos e formalidades especiais nela própria
estabelecidos.

- Quanto à forma: escritas e não escritas. Escrita é a Constituição codificada e organizada


num texto único, elaborado por um órgão constituinte, encerrando as normas fundamentais à
Estrutura do Estado, organização dos Poderes constituídos, seu modo de exercício, limites de
atuação e direitos fundamentais. Não escrita é a constituição cujas normas não constam de
um documento único e solene, mas se baseie principalmente nos costumes, jurisprudência e
em convenções e em textos escritos esparsos, como é a Constituição Inglesa.

- Quanto ao modo de elaboração: dogmáticas e históricas. Constituição dogmática, sempre


escrita, é a elaborada por um órgão constituinte, e sistematiza os dogmas ou idéias
fundamentais da teoria política e do Direito dominantes no momento. Constituição histórica
ou costumeira, não escrita, é, ao contrário, a resultante de lenta formação histórica, do lento
evoluir das tradições, dos fatos sócio-políticos, que se cristalizam como normas fundamentais
de organização de determinado Estado. Devemos salientar aqui que também não há uma
antítese violenta entre constituição costumeira e constituição escrita. Por mais escrita
que seja a constituição (e há gradações na forma escrita constitucional), ela não
prescinde do costume. As constituições escritas costumam ser rígidas, quer dizer, há
dificuldade pré-concebida, sempre deliberada, de serem elas emendadas, ou reformadas, e
diante dessa dificuldade de reforma solene (o que não ocorre com as leis ordinárias), é preciso
fazer um trabalho cotidiano de adaptação do texto constitucional à vida, que não pára. A vida
não se pode fossilizar. Então, ou as constituições permitem este trabalho, ou através de um
processo evolutivo, de mudança constitucional, ou através de um processo formal de emenda,
ou elas têm que ser violentamente substituídas. Phillipe Hardin disse que as constituições
francesas sempre foram tão perfeitas que era impossível modificá-las. Então, sempre foi
preciso fazer uma revolução para mudá-las, diante da sua perfeição. Uma constituição, então,
não deve ser tão perfeita que ela tenha que ser violentamente substituída por uma revolução.
Ela deve permitir uma evolução progressiva, e não ensejar uma revolução para ser substituída
por outra. Então, a constituição escrita não pode prescindir do costume, porque sendo difícil
reformar a constituição, e como a vida política, a vida do organismo social ou político não pode,
muitas vezes, esperar uma reforma solene, sem se fazer violência ao texto constitucional
(porque senão o procedimento seria inconstitucional), ela precisa ir sendo vivificada
constantemente, como faz o Judiciário americano com a Constituição de 1.787.

- Quanto à origem: populares, democráticas ou promulgadas, outorgadas e cesaristas.


Constituições populares são as que se originam de um órgão constituinte composto de
representantes do povo, eleitos para o fim de as elaborar e estabelecer. Outorgadas são as
elaboradas e estabelecidas sem a participação do povo, aquelas que o governante por si ou
por interposta pessoa ou instituição, outorga, impõe, concede ao povo. Cesaristas são as
constituições formadas por um plebiscito popular sobre um projeto elaborado por um Imperador
ou um Ditador. A participação popular, nesses casos, não é democrática, pois visa apenas
ratificar a vontade do detentor do poder.

- Quanto à estabilidade: rígidas, flexíveis e semi-rígidas. Rígida é a constituição somente


alterável mediante processos, solenidades e exigências formais especiais, diferentes e mais
dificultosos que os de formação das leis ordinárias e complementares. Flexível é a
Constituição que pode ser livremente modificada pelo legislador segundo o mesmo processo
de elaboração das leis ordinárias. Semi-rígida é a constituição que contém uma parte rígida e
outra flexível, como fora a Constituição do Império do Brasil (art. 178). Fala-se ainda em
constituição fixa, que só pode ser alterada por outro poder constituinte originário, imutável,
que seriam inalteráveis, denominadas também de permanentes, graníticas ou intocáveis, e
transitoriamente flexível, que são suscetíveis de reforma pelo mesmo rito das leis comuns,
mas apenas por determinado período, passando a ser rígida posteriormente. Alguns autores
(ex: Alexandre de Morais) falam que nossa CF/88 é super-rígida, vez que possui cláusulas
pétreas, imutáveis, mesmo que por processos solenes.

- Quanto à extensão: sintéticas e analíticas. Sintéticas são aquelas enxutas, veiculadoras


apenas dos princípios fundamentais e estruturais do Estado, não descendo às minúcias.
Analíticas são aquelas que abordem todos os assuntos que os representantes do povo
entenderem fundamentais, descendo às minúcias, estabelecendo regras que deveriam estar
em leis infraconstitucionais.

- Quanto à sistemática: reduzidas e variadas (nomenclatura de Pinto Ferreira). Reduzidas


seriam aquelas que se materializam em um só código básico e sistemático. Variadas são as
que se distribuiriam em vários textos e documentos esparsos. Paulo Bonavides fala em
Constituições codificadas e constituições legais.
- Quanto à dogmática: ortodoxas e ecléticas. Ortodoxas são as que são formadas por uma
única ideologia (ex.: Constituição soviética de 1977), enquanto ecléticas são as formadas por
ideologias conciliatórias. Ensina o Professor Paulino Jacques que constituição ortodoxa,
maciça na sua ideologia, sem desvios na sua linha ideológica, teria que ser, normalmente, uma
constituição outorgada, porque, sendo a constituição produzida pelo chefe de estado, é natural
que ela reflita os anseios, ou os interesses, que o chefe de estado considera legítimos para a
comunidade. Isto seria uma univocidade, uma voz só, na ideologia constitucional. Mas não
seria normal que uma constituição promulgada, quer dizer, obra de uma assembléia
constituinte, ou de uma convenção constitucional, fosse unívoca, só tivesse uma voz
ideológica. O normal é que ela seja multívoca, quer dizer, que muitas vozes se tenham feito
ouvir ideologicamente, na elaboração constitucional, porque o normal é que a constituição
promulgada resulte de um compromisso, quer dizer, ela resulta de renúncias, das várias
facções partidárias, de reivindicações, para que se possa conseguir um todo harmônico. Então,
as constituições ecléticas, que se opõem às ortodoxas, não quer dizer que sejam
constituições desarmônicas, justaposição de ideologias representadas pelos vários grupos
partidários, na assembléia constituinte. Ela é uma síntese harmônica, ela resulta de um
compromisso, quer dizer, as facções partidárias renunciaram a parte de suas reivindicações,
para que a constituição resultasse eclética, para que ela exprimisse as colorações ideológicas
todas, naturalmente, com intensidade divergente, dependendo da maior ou menor força de
representação de cada grupo ideológico dentro da constituinte. Não há uma justaposição
ideológica, há uma síntese harmônica, para se chegar àquele compromisso, e um
trabalho eclético, como é a constituição que se opõe à constituição ortodoxa. É claro que
as constituições promulgadas normalmente têm que ser ecléticas. Ecléticas não quer dizer que
elas tenham contradições ideológicas, isso seria um absurdo. Não pode o artigo 1 o da
constituição estar em conflito com o 30o, etc. A Constituição tem que ser interpretada como um
todo sistemático. Houve cessões, houve compromissos, houve renúncias, em favor da
coerência constitucional, para se conseguir aquela síntese harmônica, e não uma colcha de
retalhos. A eclética é essencialmente pluralista.

- Quanto à correspondência com a realidade: De acordo com Karl Loewenstein


(Classificação Ontológica – cotejo constituição com o processo político) são normativas,
nominalistas (nominativas ou nominais) e semânticas. Normativas são as Constituições em
que o processo de poder está de tal forma disciplinado que as relações políticas e os agentes
do poder subordinam-se às determinações do seu conteúdo e do seu controle procedimental.
As nominalistas contêm disposições de limitação e controle de dominação política, sem
ressonância na sistemática do processo real de poder, e com insuficiente concretização
constitucional. As semânticas são simples reflexos da realidade política, servindo como mero
instrumento dos donos do poder e das elites políticas, sem limitação do seu conteúdo.
Obs: Constituição Plástica (Duas Correntes) – Seria aquela ligada à idéia de constituição
flexível (Pinto Ferreira) / Seria próximo à idéia de constituição aberta (Haberle)
Obs: Há constituição sem estado (realidade União Européia), que tem constituição (em fase de
aprovação) mas não tem estado.
- Quanto ao sistema: Segundo Diogo de Figueiredo Moreira Neto, pode ser principiológica ou
preceitual. Na principiológica predominam os princípios, identificados como normas
constitucionais providas de algo grau de abstração, consagradores de valores, pelo que é
necessária a mediação concretizadora. Na preceitual prevalecem as regras, individualizadas
como normas constitucionais revestidas de pouco grau de abstração, concretizadoras de
princípios, pelo que é possível a aplicação coercitiva.

Quanto à finalidade, podem se classificar as constituições em:

a) negativas ou garantia: equivalem às concisas.


b) dirigentes ou programáticas: estabelecem programas e definem os limites e a extensão de
seus direitos, equivalem às constituições longas. Principal teórico é o CANOTILHO, no livro
“Constituição dirigente e vinculação do legislador”, mas o próprio Canotilho fez um novo
prefácio, afirmando que a constituição dirigente morreu. Porque na realidade contemporânea,
há outros mecanismos que são responsáveis pela programação da sociedade, a CF não é
mais o único instrumento. Existe o direito internacional e a constituição da comunidade
européia.
c) constituições-balanço: preocupam-se em somente refletir a situação presente, sem
preocupação com o fruto. Ex: constituições soviéticas antes da queda do muro de Berlim.

- Quanto ao conteúdo ideológico das constituições (André Ramos Tavares): liberais (ou
negativas), aonde se destacam os direitos humanos de 1ª dimensão, não-intervenção do
estado e proteção das liberdades públicas, e sociais (ou dirigentes), que refletem um
momento posterior, de necessidade de atuação estatal, consagrando a igualdade substancial,
bem como os direitos sociais (de 2ª dimensão).

- Constituição expansiva (Raul Machado Horta) - a expansividade da Constituição de 1988, em


função dos temas novos e da ampliação conferida a temas permanentes, como no caso dos
Direitos e Garantias Fundamentais, pode ser aferida em três planos distintos: conteúdo
anatômico e estrutural da constituição (destaca a estruturação do texto e sua divisão em títulos,
capítulos, seções, subseções, artigos da parte permanente e ADCT), comparação
constitucional interna (comparando com as constituições precedentes, registra-se a dilatação
da matéria e evolução das Constituições) e comparação constitucional externa (relaciona a
Constituição brasileira com as constituições estrangeiras mais extensas).

- Constituição Suave (Gustavo Zagrebelsky). A CF/88 constitui uma ordem jurídica fundamental
de processo publico livre, caracterizando-se, nos termos de Haberle, como uma constituição
aberta, que torna possível a Sociedade Aberta de Popper, ou uma constituição suave, no
conceito de Zagrebelsky, que permite, dentro dos limites constitucionais, tanto a
espontaneidade da vida social quanto a competição para assumir a direção política, além de
condições para a sobrevivência de uma sociedade pluralista democrática. Zagrebelsky é autor
da obra “El direito dúctil – Ley, derechos y justicia”. Traça a idéia de ductibilidade constitucional
(distensão ou flexibilização de suas regras) – coexistência de valores e princípios. Idéia da
solidariedade dos princípios constitucionais (Canotilho). Busca da máxima efetividade das
normas constitucionais.
Obs: Zagrebelsky diz que a constituição federal substitui o papel do Estado na expressão da
soberania. Não é mais o Estado que controla as fontes de direito (p. ex. na edição de leis e
códigos), mas a CF que orienta o ordenamento jurídico.
Obs: Para Zagrebelsky há convergência para o centro, em conformidade do ordenamento
jurídico com os direitos fundamentais expressos na CF, e não mais uma pura e simples
irradiação da força normativa como vértice. Canotilho ensina que a CF representa o ápice do
ordenamento e o ponto de controle de sua coerência interna. São as leis que devem se
movimentar no âmbito dos direitos fundamentais e não o contrário.
Obs: Canotilho ensina que a CF é um sistema normativo aberto de princípios e regras. É aberto
porque tem uma estrutura dialógica (Caliess), traduzida na disponibilidade e capacidade de
aprendizagem das normas constitucionais para captarem a mudança da realidade. É normativo
porque a estruturação das expectativas referentes a valores, programas, funções e pessoas é
feita por normas. É de regras e princípios pois normas do sistema podem revelar-se por uma
ou por outra.

5 - Fontes:

Nos países que adotam o sistema da civil law, a fonte originária e suprema do direito
constitucional é a Constituição escrita. As fontes derivadas podem ser subdividas em fontes
delegadas e fontes reconhecidas.

As fontes delegadas são resultantes de competências atribuídas pelo legislador constituinte a


outros poderes e órgãos inferiores para a produção de normas jurídicas regulamentadoras de
dispositivos constitucionais, como no caso das leis ordinárias e complementares, decretos e
regulamentos que servem de apoio à Constituição. A jurisprudência sobre matérias
constitucionais pode ser incluída nesta espécie, ainda que o Poder Judiciário atue, seja na
interpretação, seja na integração, a partir do direito posto pelo legislador. As fontes
reconhecidas são normas jurídicas produzidas anteriormente ou durante à vigência da
Constituição e acolhidas por ela, como os costumes constitucionais. O costume constitucional
se diferencia dos demais, não pela forma de surgimento, mas por seu conteúdo referente aos
direitos fundamentais, à estrutura do Estado ou à organização dos poderes.

Item: Supremacia da Constituição:

A rigidez constitucional decorre da maior dificuldade para sua modificação do que para a
alteração das demais normas jurídicas da ordenação estatal. Da rigidez emana, como
primordial conseqüência, o princípio da supremacia da Constituição que, no dizer de Pinto
Ferreira, "é reputado como uma pedra angular, em que assenta o edifício do moderno direito
político". Significa que a constituição se coloca no vértice do sistema jurídico do país, a que
confere validade, e que todos os poderes estatais são legitimados na medida em que ela os
reconheça e na proporção por ela distribuídos. A Supremacia material pode ser reconhecida
até nas constituições costumeiras e flexíveis. Isto é certo do ponto de vista sociológico, tal
como também se lhes admite rigidez sócio-política. Mas do ponto de vista jurídico, só é
concebível a supremacia formal, que se apoia na regra de rigidez, de que é o primeiro e
principal corolário. Nas Constituições rígidas há hierarquia formal entre norma constitucional
e norma ordinária, o que não existe nas Constituições flexíveis, logo, em relação a estas
últimas, não há que se falar em supremacia da Constituição!

Conclui-se que, nos países onde prevalecem as Constituições rígidas, a lei ordinária
incompatível com a Lei Maior não se aplica por ser inválida, enquanto que, em relação
aos países onde adotam as Constituições flexíveis, em face da inexistência de hierarquia
ou supremacia entre essas normas, o problema não se resolve pela via da invalidade da
norma por vícios de inconstitucionalidade e, sim, pelo instituto da revogação da norma
anterior pela norma posterior (lex posterior derogat priori).

A compatibilização constitucional das normas no nosso país se dá, em face do princípio da


supremacia da Lei Fundamental, quando necessário, pela via do controle de
constitucionalidade, pois nossa Constituição é escrita e rígida.

Item: Controle de Constitucionalidade:

A idéia de controle, então, emanada da rigidez, pressupõe a noção de um escalonamento


normativo, ocupando a Constituição o grau máximo na aludida relação hierárquica,
caracterizando-se como norma de validade para os demais atos normativos do sistema.

A doutrina brasileira acatou, inclusive por influência do direito norte-americano, a


caracterização da teoria da nulidade ao se declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato
normativo (afetando o plano da validade).Trata-se, nesse sentido, de ato declaratório que
reconhece uma situação pretérita, qual seja, o vício congênito, de nascimento do ato
normativo.

Contra esse entendimento, destaca-se a teoria da anulabilidade da norma


inconstitucional defendida por Kelsen e que influenciou a Corte Constitucional austríaca,
caracterizando-se como constitutiva a natureza jurídica da decisão que a reconhece.

Sistema Austríaco (Kelsen) - decisão tem eficácia constitutiva (caráter constitutivo-negativo);


por regra, o vício de inconstitucionalidade é aferido no plano da existência; por regra, decisão
que reconhece a inconstitucionalidade produz efeitos ex nunc (prospectivos); a lei
inconstitucional é ato anulável (a anulabilidade pode aparecer em vários graus); lei
provisoriamente válida, produzindo efeitos até a sua anulação; o reconhecimento da ineficácia
da lei produz efeitos a partir da decisão ou para o futuro (ex nunc ou pro futuro), sendo erga
omnes, preservando-se, assim, os efeitos produzidos pela lei, podendo, contudo, ter efeitos
retroativos.

Sistema norte-americano (Marshall) - decisão tem eficácia declaratória de situação


preexistente; por regra, o vício de inconstitucionalidade é aferido no plano da validade; por
regra, decisão que declara a inconstitucionalidade produz efeitos ex tunc (retroativos); a lei
inconstitucional é ato nulo, ineficaz, írrito e, portanto, desprovido de força vinculativa;
invalidação ab initio dos atos praticados com base na lei inconstitucional, atingindo-a no berço;
a lei, por ter nascido morta, nunca chega a produzir efeitos, ou seja, apesar de existir, não
entrou no plano da eficácia.

O direito brasileiro flexibilizou o sistema da nulidade da lei declarada inconstitucional no


controle concentrado através do art. 27 da Lei 9.868/99 ("ao declarar a
inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança
jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por
maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou
decidir que ela só tenha eficácia a partir do seu trânsito em julgado ou de outro
momento que venha a ser fixado."). TRATA-SE DA DENOMINADA, PELA DOUTRINA,
TÉCNICA DE MODULAÇÃO DOS EFEITOS DA DECISÃO e que, nesse contexto, permite
uma melhor adequação da declaração de inconstitucionalidade, assegurando, por
conseqüência, outros valores também constitucionalizados, como os da segurança jurídica, do
interesse social e da boa fé. O STF, da mesma forma, em alguns julgados, vem modulando
os efeitos da declaração de inconstitucionalidade também no controle difuso.

Formas de Inconstitucionalidade:

Inconstitucionalidade por ação- ocorre com a produção de atos legislativos ou


administrativos que contrariem normas ou princípios da constituição. O fundamento dessa
inconstitucionalidade está no fato de que o princípio da supremacia da constituição resultada o
da compatibilidade vertical das normas da ordenação jurídica de um país, no sentido de que as
normas de grau inferior somente valerão se forem compatíveis com as normas de grau
superior, que é a Constituição. Essa incompatibilidade vertical de normas inferiores com a
constituição é o que, tecnicamente, se chama inconstitucionalidade das leis ou atos do Poder
Público, e que se manifesta por dois aspectos: formalmente ou materialmente.

O vício formal (inconstitucionalidade orgânica, inconstitucionalidade formal propriamente dita


e inconstitucionalidade formal por violação a pressupostos subjetivos do ato) verifica-se quando
a lei ou ato normativo infraconstitucional contiver algum vício em sua 'forma', ou seja, em seu
processo de formação, no processo legislativo de sua elaboração, ou, ainda, em razão de sua
elaboração por autoridade incompetente.

Inconstitucionalidade formal orgânica - decorre da inobservância da competência legislativa


do ente federado para a elaboração do ato. (ex.: Lei editada pelo Estado invadindo
competência da União)

Inconstitucionalidade formal propriamente dita - decorre da inobservância do devido


processo legislativo. É vício no procedimento de elaboração da norma, podendo ser verificado
em dois momentos distintos: na fase de iniciativa ou nas fases posteriores. Vício formal
subjetivo é o que verifica-se na fase de iniciativa (ex.: deputado deflagrando processo
legislativo de matéria de iniciativa exclusiva do Presidente da República), enquanto o vício
formal objetivo será verificado nas demais fases do processo legislativo, posteriores à fase de
iniciativa (ex.: lei complementar sendo votada por maioria relativa, em violação ao art. 69, CF).

Inconstitucionalidade formal por violação a pressupostos objetivos do ato normativo -


nos dizeres de Canotilho: "pressupostos constitucionalmente considerados como elementos
determinantes de competência dos órgãos legislativos em relação a certas matérias
(pressupostos objetivos). Exemplos no direito brasileiro: a edição de medida provisória sem a
observância dos requisitos da relevância e urgência (art. 62, caput) ou a criação de Municípios
por lei estadual sem a observância dos requisitos do art. 18, § 4º, CF.

O vício material (de conteúdo, substancial ou doutrinário) diz respeito à matéria, ao


conteúdo do ato normativo. Assim, aquele ato normativo que afrontar qualquer preceito ou
princípio da Lei Maior deverá ser declarado inconstitucional, por possuir um vício material. A
inconstitucionalidade material também é conhecida como nomoestática.

Pedro Lenza defende a existência de um chamado vício de decoro parlamentar,


considerando que um sistema de "compra de votos" de parlamentares para votação de
determinados projetos viciaria o processo legislativo a ponto de ensejar a inconstitucionalidade
das normas assim votadas.

Inconstitucionalidade por omissão: Verifica-se nos casos em que não sejam praticados atos
legislativos ou administrativos requeridos para tornar plenamente aplicáveis normas
constitucionais. O pressuposto para propositura da ação de inconstitucionalidade por omissão
é a omissão do legislador em legislar sobre matéria que a Constituição demanda a existência
de lei para aplicá-la (norma de eficácia limitada), visando obter deste a elaboração da lei em
causa. É inspirada na Constituição Portuguesa, art. 283, visando combater a chamada
"síndrome de inefetividade das normas constitucionais". Na ADI por omissão, temos
controle concentrado, enquanto no mandado de injunção, o controle difuso de tal
omissão. A omissão pode ser total ou parcial. Total, quando não houver o cumprimento
constitucional do dever de legislar; parcial, quando houver lei integrativa infraconstitucional,
porém de forma insuficiente. Por omissão parcial propriamente dita, temos o caso em que a lei
existe, mas regula de forma deficiente o texto. Na omissão parcial relativa, a lei existe e
outorga determinado benefício a certa categoria, mas deixa de concedê-la a outra, que deveria
ter sido contemplada.

O STF já entendeu que, pendente julgamento de ADI por omissão, se a norma que não
tinha sido regulamentada é revogada, a ADI por omissão deverá ser extinta por perda de
objeto. Contudo, quanto aos casos de encaminhamento de projeto de lei sobre a matéria
ao Congresso Nacional ou do processo legislativo já ter sido desencadeado, o STF não
mais entende ser caso de perda do objeto, devendo continuar a ação. Por fim, o STF não
admite a fungibilidade entre ADI por omissão e mandado de injunção.

A competência para julgar a ADI por omissão é do STF, e seus legitimados são os
mesmos da ADI genérica (art. 103, CF). Admite-se a concessão de cautelar na ADI por
omissão, após a oitiva dos órgãos ou autoridades responsáveis pela omissão
inconstitucional, consistente na suspensão da aplicação da lei ou do ato normativo
questionado, no caso de omissão parcial, bem como na suspensão de processos
judiciais ou de procedimentos administrativos, ou ainda em outra providência ser fixada
pelo tribunal (Lei 9868/99, art. 12-F).

Controle Prévio ou preventivo:

Pelo poder Legislativo - realizado pelo próprio parlamentar e pela Comissão de Constituição
e Justiça.
Pelo Poder Executivo - realizado pelo Chefe do poder Executivo através do chamado veto
jurídico.
Pelo Poder Judiciário - Mandado de Segurança impetrado por parlamentar em defesa do seu
direito de participar de um processo legislativo juridicamente hígido, quando a tramitação do
projeto agrida a própria Constituição.
Obs: Doutrina não trata do assunto, mas o STF admite o MS impetrado pelo chefe do
executivo com o fito de resguardar sua legitimidade para a iniciativa legislativa (p. ex.
criação de cargos públicos).

Controle Posterior ou Repressivo:

Controle político - verifica-se em Estados onde o controle é exercido por um órgão distinto
dos três Poderes, órgão este garantidor da supremacia da Constituição.

Controle jurisdicional - é realizado pelo Poder Judiciário, tanto através de um único órgão
(controle concentrado) como por qualquer juiz ou tribunal (controle difuso). O Brasil adotou o
sistema jurisdicional misto, porque realizado pelo Poder Judiciário - daí ser jurisdicional - tanto
de forma concentrada (controle concentrado) como por qualquer juiz ou tribunal (controle
difuso)

Controle Híbrido - algumas normas são levadas a controle perante um órgão distinto dos três
poderes (controle político), enquanto outras são apreciadas pelo Poder Judiciário (controle
jurisdicional)
* Controle Posterior Repressivo pelo Legislativo - art. 49, V, CF - compete ao Congresso
Nacional sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar
ou dos limites de delegação legislativa.; art. 62, CF - Entendendo o Congresso Nacional
inconstitucional a medida provisória, estará realizando controle de constitucionalidade.

Controle Difuso de Constitucionalidade:

O controle difuso, repressivo ou posterior, é também chamado de controle pela via de


exceção ou defesa, ou controle aberto, sendo realizado por qualquer juízo ou tribunal do Poder
Judiciário. O controle difuso verifica-se num caso concreto e a declaração de
inconstitucionalidade dá-se de forma incidental (incidenter tantum), prejudicialmente ao exame
do mérito.

O art. 97 da CF estabelece que, nos tribunais, somente pelo voto da maioria absoluta de
seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a
inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público. É a chamada cláusula da
reserva de plenário. Por meio do recurso extraordinário (nas hipóteses do art. 102, III, "a", "b",
"c" e "d"), a questão poderá chegar até o STF, que também, assim como o Tribunal de segunda
instância, realizará o controle difuso, de forma incidental (e não principal), observadas as
regras do art. 97, CF.
A cláusula de reserva de plenário (full bench) é aplicável somente aos textos normativos
erigidos sob a égide da atual Constituição. 3. As normas editadas quando da vigência das
Constituições anteriores se submetem somente ao juízo de recepção ou não pela atual ordem
constitucional, o que pode ser realizado por órgão fracionário dos Tribunais sem que se tenha
por violado o art. 97 da CF. Precedentes: AI-AgR 582.280, Segunda Turma, Rel. Min. Celso de
Mello, DJ 6.11.2006 e AI 831.166-AgR, Segunda Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, Dje de
29.4.2011. 3. Agravo regimental desprovido.

(ARE 705316 AgR, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 12/03/2013,
PROCESSO ELETRÔNICO DJe-070 DIVULG 16-04-2013 PUBLIC 17-04-2013)

A cláusula de reserva de plenário aplica -se às Turmas Recursais do


Juizado Especial?(oprocesso)
NÃO, pois não se trata – na essência – de Tribunal, já tendo o STF decidido que “A regra da
chamada reserva do plenário para declaração de inconstitucionalidade (art. 97 da CF) não se
aplica, deveras, às turmas recursais de juizado especial. Mas tal circunstância em nada
atenua nem desnatura a rigorosa exigência de juntada de cópia integral do precedente que
tenha, ali, pronunciado inconstitucionalidade de norma objeto de recurso extraordinário fundado
no art. 102, III, b, da Constituição da República, pela mesmíssima razão por que, a igual título
de admissibilidade do recurso, não se dispensa juntada de cópia de acórdão oriundo de
plenário” (1ª Turma, RE 453744-AgR, j. 13/06/2006).

Importante destacar que a doutrina majoritária compreendia que a cláusula de reserva de


plenário também se aplicava ao Supremo Tribunal Federal. Porém, no último ano tivemos
precedente que afastou sua aplicação embora não tenha indicado expressamente. Segue texto
do site dizer o direito:
A cláusula de reserva de plenário é aplicada ao próprio STF?
O art. 97 da CF destina-se também ao STF?
Se você consultar a quase totalidade dos livros de Direito Constitucional, eles irão afirmar que
sim. Pensamos, inclusive, que este posicionamento é correto, considerando que a função
precípua do STF é a de garantir a supremacia da Constituição e a segurança jurídica, evitando
decisões conflitantes de suas Turmas sobre a validade de dispositivos constitucionais (como no
caso concreto), o que ocasiona enorme instabilidade, além de tratamento desigual para
pessoas em situações iguais.

No entanto, deve-se alertar que existe um precedente da 2ª Turma do STF no qual a Min.
Ellen Gracie afirma expressamente que a cláusula da reserva de plenário não se aplica
ao STF:
(...) 4. O STF exerce, por excelência, o controle difuso de constitucionalidade quando do
julgamento do recurso extraordinário, tendo os seus colegiados fracionários
competência regimental para fazê-lo sem ofensa ao art. 97 da Constituição Federal. (...)
(RE 361829 ED, Relatora Min. Ellen Gracie, Segunda Turma, julgado em 02/03/2010)

A 2ª Turma invocou este precedente nas decisões em que afastou o regime inicial fechado ao
tráfico de drogas?
Ainda não foi disponibilizado o inteiro teor dos votos dos Ministros nos processos HC
111844/SP e HC 112195/SP (noticiados no Informativo 663 do STF). Contudo, se analisarmos
o voto do Min. Gilmar Mendes no leading caseHC 105779/SP, julgado em 8.2.2011, percebe-se
que o eminente Ministro não menciona esta questão da cláusula de reserva de plenário.

Diante desse quadro, das duas uma: ou realmente o art. 97 não se aplica ao STF, ou então
acreditamos que houve violação à cláusula de reserva de plenário.

Súmula Vinculante 10/STF: "Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, art. 97) a
decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a
inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, afasta sua incidência, no
todo ou em parte."

No controle difuso, para as partes os efeitos serão inter partes e ex tunc. Contudo, o
STF já entendeu que, mesmo no controle difuso, é possível dar efeito ex nunc (RE
197.917) – modulação dos efeitos.

Declarada inconstitucional a lei pelo STF, no controle difuso, desde que tal decisão seja
definitiva e deliberada pela maioria absoluta do pleno do Tribunal, o art. 178 do Regimento
Interno do STF estabelece que será feita a comunicação, logo após a decisão, à autoridade ou
órgão interessado, bem como, depois do trânsito em julgado, ao Senado Federal, para os
efeitos do art. 52, X, CF, que estabelece ser competência privativa do Senado Federal,
mediante o instrumento da resolução, suspender a execução, no todo ou em parte, de lei
declarada inconstitucional por decisão definitiva do STF. A suspensão pelo Senado Federal
poderá dar-se em relação a leis federais, estaduais, distritais ou mesmo municipais que forem
declaradas inconstitucionais pelo STF, de modo incidental, no controle difuso de
constitucionalidade.

A expressão "no todo ou em parte" significa que é impossível ao Senado Federal ampliar,
interpretar ou restringir a extensão da decisão do STF.

Os efeitos da decisão do Senado, na forma do art. 52, X, CF serão erga omnes e ex nunc,
não retroagindo.
Respeitável parte da doutrina e alguns julgados do STJ e do STF rumam para uma nova
interpretação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade no controle difuso pelo
STF. Gilmar Mendes afirma ser "possível, sem qualquer exagero, falar-se aqui de uma
autêntica mutação constitucional em razão da completa reformulação do sistema
jurídico e, por conseguinte, da nova compreensão que se conferiu à regra do art. 52, X,
da Constituição de 1988. Valendo-nos dos subsídios da doutrina constitucional a
propósito da mutação constitucional, poder-se-ia cogitar aqui de uma autêntica 'reforma
da Constituição sem expressa modificação de texto'". Na mesma linha, Teori Albino
Zavascki sustenta a transcendência, com caráter vinculante, de decisão sobre a
constitucionalidade da lei, mesmo em sede de controle difuso. Os principais argumentos
a embasar esse novo posicionamento são, em síntese apertada: força normativa da
Constituição; princípio da supremacia da Constituição e sua aplicação uniforme a todos
os destinatários; o STF enquanto guardião da Constituição e seu intérprete máximo;
dimensão política das decisões do STF. No julgamento do RE 197.917, nos termos do
voto do Ministro Celso de Mello, o Ministro Gilmar Mendes ressaltou a aplicabilidade, ao
E. TSE, do efeito vinculante emergente da própria ratio decidendi que motivou o
julgamento do precedente mencionado. Em outro julgado, o Min. Gilmar Mendes
"sepultou" de vez a regra do art. 52, X, aproximando o controle difuso do controle
concentrado, dizendo se tratar de reminiscência histórica. O tema ainda depende de
manifestação dos outros ministros do STF.

Controle Concentrado de Constitucionalidade:

Pode ser exercitado através de cinco ações constitucionais: ADI (ação direta de
inconstitucionalidade) genérica - art. 102, I, "a"; ADPF (ação de descumprimento de preceito
fundamental) - art. 102, § 1º; ADO (ação direta de inconstitucionalidade por omissão) - art. 103,
§ 2º; ADI interventiva - art. 36, III; ADC (ação direta de constitucionalidade) - art. 102, I, "a".

O controle concentrado é feito em tese, abstratamente, marcado pelos caracteres da


generalidade, impessoalidade e abstração.

Na ADI genérica, o objeto é a declaração de inconstitucionalidade da lei ou ato


normativo impugnado, diferentemente do controle difuso, onde o controle é incidental ao
objeto principal da lide. Podem ser impugnados por ADI as emendas à Constituição, leis
complementares, leis ordinárias, leis delegadas, medidas provisórias, decretos
legislativos e resoluções, resoluções administrativas dos tribunais e atos estatais de
caráter meramente derrogatório, como as resoluções administrativas, desde que incidam
sobre atos de caráter normativo. Súmulas de tribunais não são atos com grau de
normatividade adequada pra serem impugnadas via ADIN. As súmulas vinculantes, de acordo
com a Min. Ellen Gracie, podem ser revistas por meio de ADI, apesar de a Lei 11.417/2006
prever procedimento específico para sua revisão. É posicionamento isolado. Por possuíram
procedimento próprio para cancelamento, a regra é: não cabe ADI contra súmula vinculante.

O STF tem entendido serem passíveis de controle jurisdicional por ADI os requisitos
constitucionais de relevância e urgência para edição de Medida Provisória, em caráter
excepcional.

Regulamentos subordinados e decretos, via de regra, não podem ser atacados por ADI,
já que a discussão em torno deles é de legalidade e não de constitucionalidade. A
exceção é no caso do chamado decreto autônomo, aonde será analisada sua
compatibilidade com a Constituição para verificar-se a observância do princípio da reserva
legal.

Tratados internacionais podem ser objeto de controle de constitucionalidade, tenham


este status de emenda constitucional, caráter supralegal ou de lei ordinária.

O STF não admite a tese das normas constitucionais inconstitucionais, do jurista


tedesco (alemão) Otto Bachof, de maneira que as normas constitucionais originárias jamais
poderão ser objeto de controle de constitucionalidade, diferentemente das normas oriundas de
emendas constitucionais.
Teoria da transcendência dos motivos determinantes - O STF vem atribuindo efeito
vinculante em algumas decisões não apenas ao dispositivo da sentença, mas também
aos fundamentos determinantes da decisão, de maneira que as razões daquela decisão,
seus fundamentos, passam a vincular futuras decisões.
O STF não admite a teoria da transcendência dos motivos determinantes:
Este Supremo Tribunal, por ocasião do julgamento da Rcl 3.014/SP, Rel. Min. Ayres Britto,
rejeitou a aplicação da chamada “teoria da transcendência dos motivos determinantes”. III –
Agravo a que se nega provimento.
(Rcl 9778 AgR, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em
26/10/2011, DJe-215 DIVULG 10-11-2011 PUBLIC 11-11-2011 EMENT VOL-02624-01 PP-
00019)

Teoria da inconstitucionalidade por arrastamento - de acordo com Pedro Lenza "se em


determinado processo de controle concentrado de constitucionalidade for julgada
inconstitucional a norma principal, em futuro processo, outra norma dependente daquela que
foi declarada inconstitucional em processo anterior - tendo em vista a relação de
instrumentalidade que entre elas existe - também estará eivada pelo vício de
inconstitucionalidade 'conseqüente', ou por 'arrastamento' ou 'atração'".

Inconstitucionalidade Progressiva (ou lei ainda constitucional, ou declaração de


constitucionalidade de norma em trânsito para a inconstitucionalidade) - ex.: ação civil ex
delicto ajuizada pelo MP - art. 68, CPP. A norma encontra-se ainda constitucional enquanto a
defensoria pública não estiver efetiva e eficazmente instalada.

Não é possível o controle de constitucionalidade por ADI de lei municipal em face da


Constituição Federal, sendo que a lei ou ato normativo distrital poderá ser impugnado se
for proveniente de sua competência "estadual", mas não da "municipal".

A legitimidade para propositura de ADI é dos legitimados do art. 103, CF, sendo que os
dos incisos I, II, III, VI, VII, VIII (Presidente da República, Mesa do Senado Federal, Mesa da
Câmara dos Deputados, PGR, Conselho Federal da OAB e partido político com representação
no Congresso Nacional) tem legitimidade universal, enquanto os dos incisos IV, V e IX (Mesa
da Assembléia Legislativa e da Câmara Legislativa do DF, Governador do Estado ou do DF e
confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional) estão sujeitos ao requisito da
pertinência temática.

A ADI tem caráter dúplice ou ambivalente, pois, conforme estabelece o art. 24 da Lei
9.868/99, proclamada a constitucionalidade, julgar-se-á improcedente a ação direta ou
procedente eventual ação declaratória e, no mesmo passo, proclamada a inconstitucionalidade,
julgar-se-á procedente a ação direta ou improcedente eventual ação declaratória. A decisão
produzirá efeitos erga omnes e terá efeito ex tunc, retirando do ordenamento jurídico o ato
normativo ou lei incompatível com a constituição, tratando-se de ato nulo (teoria da nulidade –
plano de validade – influência do direito norte-americano). No entanto, a Lei 9.868/99, em seu
art. 27, introduziu a técnica da declaração de inconstitucionalidade sem a pronúncia de
nulidade (modulação dos efeitos). Neste sentido, ao declarar a inconstitucionalidade de lei
ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse
social, poderá o STF, por maioria qualificada de 2/3 de seus membros, restringir os efeitos
daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir do seu trânsito em julgado ou
de outro momento que venha a ser fixado. Ou seja, o STF poderá dar a decisão efeitos ex
nunc, ou até mesmo atribuir efeitos a ela após determinado momento que venha a ser fixado.
O efeito é, também, vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário e da Administração
Pública federal, estadual, municipal e distrital.

Declaração de inconstitucionalidade sem redução de texto - o STF pode decidir que a


inconstitucionalidade reside em uma aplicação ou interpretação da lei, indicando, então, qual
seria a interpretação conforme, através da qual não se configura a inconstitucionalidade.

É possível a concessão de medida cautelar na ADI, sendo ela concedida por decisão da
maioria absoluta dos membros do tribunal (art. 10 e 22, L. 9.868/99), após a audiência dos
órgãos ou autoridades dos quais emanou a lei ou ato normativo impugnado, que deverão
pronunciar-se em cinco dias, dispensada essa audiência em caso de excepcional urgência. A
concessão da medida cautelar terá eficácia contra todos e efeito ex nunc, salvo se o
Tribunal entender que deva conceder-lhe eficácia retroativa. A concessão da medida
cautelar torna aplicável a legislação anterior acaso existente (efeito repristinatório da
ADI – diferente da regra da LINDB, onde a repristinação por conta de revogação é a
exceção), salvo expressa manifestação em sentido contrário.

A reclamação visa garantir a autoridade de decisão proferida pelo STF em sede de controle
concentrado de constitucionalidade, nos termos do art. 102, I, “l”, CF, desde que o ato judicial
que se alega ter desrespeitado a decisão do STF não tenha transitado em julgado (Súmula
734, STF: “Não cabe reclamação quando já houver transitado em julgado o ato judicial que se
alega tenha desrespeitado decisão do Supremo Tribunal Federal”), pois não se pode usar a
reclamação como sucedâneo de ação rescisória. A inocorrência do trânsito em julgado,
segundo o STF, é pressuposto negativo de admissibilidade da reclamação. Óbvio que se a
decisão que transitou em julgado for a paradigma, não há problema (o que não pode transitar é
a decisão que desrespeitou a paradigma). São partes legítimas para ajuizar a reclamação
todos aqueles que forem atingidos por decisões contrárias ao entendimento formado pela
Suprema Corte no julgamento de mérito proferido em ação direta de inconstitucionalidade. A
reclamação tem natureza jurídica, de acordo com o STF (ADI 2.480 -2007), de simples
exercício constitucional do direito de petição (art. 5º, XXXIV, “a”, CF), por isso é cabível que os
regimentos internos dos tribunais prevejam reclamações (já que não é matéria de direito
processual).

A argüição de descumprimento de preceito fundamental tem previsão no art. 102, § 1º,


CF, com redação dada pela EC 3/93 e foi regulamentada pela Lei 9.882/99. Pode ser
autônoma, na forma do art. 1º, caput, da lei, quando terá nítido caráter preventivo na primeira
situação do caput (evitar) e repressivo (reparar), na segunda, devendo haver nexo de
causalidade entre a lesão ao preceito fundamental e o ato do Poder Público, podendo a lesão
resultar de qualquer ato administrativo, inclusive decretos regulamentares. A hipótese do § 1º
(argüição por equiparação) prevê a possibilidade de argüição quando for relevante o
fundamento da controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual,
municipal (e distrital), incluídos os anteriores à Constituição. Nessa hipótese, deve ser
demonstrada a divergência jurisprudencial relevante na aplicação do ato normativo, violador do
preceito fundamental. A competência para apreciar a ação é exclusiva do STF. Os legitimados
são os mesmos da ADI genérica. A decisão em ADPF é imediatamente auto-aplicável, tendo
efeitos erga omnes, vinculantes e ex tunc, com as observações expostas acerca da ADI
genérica, podendo o STF dar-lhe, por maioria de 2/3 dos votos, efeitos ex nunc ou a partir de
outro momento a ser fixado. O STF poderá, por maioria absoluta (voto de 6 Ministros) deferir
pedido de medida liminar na ADPF.
1) Direito positivo: CF, art 102, § 1º (norma constitucional de eficácia limitada, STF já
decidiu que a ADPF imprescindia de lei formal); e lei 9.882/99.
2) Competência – sempre no STF
3) Avocatória - tem-se discutido, com a edição da lei regulamentadora da ADPF, a
possível inconstitucionalidade de sua utilização como avocatória, pois a sua liminar
poderá consistir em que juízes e tribunais suspendam o andamento de processo, os
efeitos de decisões judiciais, ou qualquer outra medida que apresente relação com a
matéria em discussão, salvo se decorrentes de coisa julgada.
4) Cabimento da ADPF – Compõe o controle concentrado de constitucionalidade, tendo
por objeto preceito fundamental, e não qualquer dispositivo da CF. Mas o que é
preceito fundamental? É diferente de princípio, sendo o preceito mais amplo que o
princípio, já que envolve, além deste, direitos e garantias fundamentais, em especial a
dignidade da pessoa humana.
a. Princípio da SUBSIDIARIEDADE – quando for cabível outra ação eficaz para
sanar a lesividade, incabível será a ADPF (art 4º, L9882; e juris STF). Ou seja,
é preciso, em primeiro lugar, esgotar todas as vias possíveis.
i. Caso concreto interessante – ADPF 4 – O pedido era a edição de lei
sobre o salário mínimo. A liminar não foi deferida, com fundamento no
art 4º, §1º, da L9882, porque havia outro meio (Mandado de Injunção
ou ADI por omissão). Agravo. Pleno julgou contrariamente à liminar,
com fundamento no mesmo dispositivo, já que lá está escrito “outro
meio eficaz”, e sabe-se que MI e ADI por omissão não eram eficazes
(agora, tendo em vista a recente mudança jurisprudencial, o MI
possivelmente passará a ser eficaz): adoção da teoria concretista.
b. Aplica-se só para atos do Poder Público já concretizados, não para o controle
preventivo dos atos em si (STF). Mas cabe a ADPF preventiva (ver abaixo), o
que é diferente.
c. Não se aplica para súmulas do STF, que não podem ser concebidas como atos
do Poder Público lesivos a PF (STF).
d. São 3 hipóteses de cabimento
i. AUTÔNOMA PREVENTIVA - Para evitar lesão a PF, resultante de ato
do poder público;
ii. AUTÔNOMA REPRESSIVA - Para reparar lesão a PF, resultante de
ato do poder público;
iii. INCIDENTAL - Quando for relevante o fundamento da controvérsia
constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal,
incluídos os anteriores à CF (diferente da ADI e ADC, incabíveis para
atos anteriores à CF) – INCONSTITUCIONAL PARA ALEXANDRE DE
MORAES POR EXTRAPOLAR A COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL
DO 102, §1º, DA CF, PELA VIA DE LEI ORDINÁRIA
1. Entretanto, o STF já admitiu o ajuizamento de ADPF em
virtude de controvérsia constitucional relevante sobre lei ou ato
normativo federal, ou estadual, ou municipal, incluídos os
anteriores à CF, ainda que, excepcionalmente, revogados.
2. Há que se ressaltar que, em ambas as hipóteses (autônoma e
incidental), tratam-se de processos objetivos de controle de
constitucionalidade, uma vez que, até na ação incidental, o
STF não julgará a lide deduzida nas instâncias inferiores,
como em uma avocatória, mas decidirá apenas a
controvérsia constitucional, em similitude com o recurso
constitucional alemão e o recurso de amparo espanhol.
3. SÍNTESE: em função justamente do princípio da
subsidiariedade, a ADPF tem certas diferenças em relação
à ADI e à ADC:
a. Cabível para atos de municípios (ADC não cabe
nem para atos estaduais);
b. Cabível para atos concretos – com isso é possível
que uma mera decisão liminar de um juiz de 1º
grau vá para o STF via ADPF;
c. Cabível para atos anteriores à CF;
d. Cabível para atos revogados.
5) Legitimação Ativa – os mesmos legitimados para ADC e ADI. Há que se ressaltar o
veto presidencial à possibilidade da ADPF ser interposta por qualquer cidadão, o que é
tido por boa parte da doutrina como um retrocesso, chegando alguns (Lênio Luiz
Streck) a afirmar a inconstitucionalidade do veto. As objeções levantadas ao veto têm
inúmeros fundamentos, notadamente, o de que ele transformou o que deveria ser um
instrumento de defesa dos direitos constitucionais dos cidadãos em um meio de
proteger a governabilidade, ampliando, ainda mais, os poderes do STF.
6) Procedimento
a. A petição inicial será indeferida liminarmente pelo relator, quando não for caso
de ADPF, faltar algum requisito ou for inepta, cabendo agravo dessa decisão
ao Plenário.
b. Veja-se que o STF pode exercer um juízo de admissibilidade discricionário
para a utilização desse instrumento de efetividade dos preceitos fundamentais,
levando em conta o interesse público (o STF é um órgão político que deve
servir para a solução de questões de interesse público substancial, e não os
interesses exclusivos de algumas pessoas privadas) e a ausência de outros
mecanismos jurisdicionais efetivos.
c. Relator pode solicitar informações, no prazo de 10 dias, se houver pedido de
liminar. Pode também ouvir as partes nos processos que ensejaram a ADPF,
bem como consultar peritos. Cabe até audiência pública com os entendidos
especificamente da matéria.
d. LIMINAR – depende da maioria absoluta de seus membros. Em caso de
extrema urgência ou perigo de lesão grave, ou período de recesso, a liminar
será concedida pelo relator, ad referendum do Plenário.
e. MP – Terá vista do processo, nas ADPFs que não houver formulado, após o
decurso do prazo para informações (MP tem direito a vista de todos os
processos de competência do STF).
f. Quorum de instalação – 2/3 dos ministros.
g. Quorum de aprovação – maioria absoluta.
h. Efeitos da decisão – erga omnes, com efeitos vinculantes (excluído o próprio
STF e o Poder Legislativo), inclusive na cautelar. Cabe reclamação. Cabe a
modulação dos efeitos do artigo 11 (que significa que a declaração pode ter
seus efeitos restritos, ou decidir sua eficácia a partir do trânsito em julgado ou
de outro momento que venha a ser fixado), por decisão de 2/3 de seus
membros, tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional
interesse social, também chamada de “Declaração de Inconstitucionalidade
sem pronúncia de nulidade”. Essa modulação é análoga à do artigo 27 da L
9868/99, que trata da ADC e da ADI. Esses dispositivos são objeto de uma
ADI, já que objetivam podar efeitos constitucionais de defeito tão grave como o
da inconstitucionalidade de uma norma ou ato. Todavia, parte da doutrina
entende que há vários princípios que legitimam esses dispositivos, como a
própria segurança jurídica (aqui ela pode ser alegada pelos dois lados) e a
boa-fé em obedecer à lei.
i. A decisão é irrecorrível, não cabendo rescisória.

A ação direta interventiva é pressuposto para decretação de intervenção federal ou


estadual, pelos Chefes do Executivo, nas hipóteses previstas na CF/1988. O Judiciário exerce
controle da ordem constitucional tendo em vista o caso concreto que lhe é submetido à análise.
O Judiciário não nulifica o ato, mas apenas verifica se estão presentes os pressupostos para a
futura decretação da intervenção pelo Chefe do Poder Executivo. Hipóteses: art. 36, III c/c art.
34, VII, CF e art. 35, IV, CF. A ação direta de inconstitucionalidade interventiva possui dupla
finalidade, pois pretende, juridicamente, a declaração de inconstitucionalidade formal e material
de lei ou ato normativo estadual, e politicamente, a decretação de intervenção federal no
Estado-membro ou Distrito Federal exercendo um controle direto, para fins concretos. A
Constituição Federal prevê também a instituição pelos estados-membros da denominada
representação interventiva, destinada a legitimar eventual intervenção dos estados nos seus
municípios.
Note-se que a ação direta de inconstitucionalidade interventiva direciona seu fundamento para
o art. 36, III da CRFB/88, que por sua vez leva ao art. 34, VII da CRFB/88, que prescreve lista
taxativa de princípios constitucionais, denominados pela doutrina como sensíveis.
A ação em comento pode ser definida como uma demanda judicial decorrente da infração aos
princípios sensíveis, que, mediante representação do Procurador-Geral da República, o STF,
via provimento, requisitará ao Presidente da República a intervenção federal no Estado-
membro descumpridor dos referidos princípios, que, de forma temporária, sanará a
irregularidade, colimando, ao final, para a manutenção do regime federativo. No caso da ADI
interventiva estadual, a legitimidade para postular junto ao TJ é do PGJ, chefe do MP estadual
(art. 129, IV, CF). Nos termos da doutrina de renome, o Presidente da República está vinculado
à decisão do STF: é obrigado a decretar a intervenção.
Sendo proposta a demanda, o presidente do STF fará o juízo de admissibilidade, podendo, de
imediato, arquivar, decisão que cabe agravo regimental, ou diligenciar no sentido de
administrativamente remover as causas do pedido.
Paralelo a tentativa de resolução administrativa, o presidente do STF, solicitará informações
para a autoridade estadual e ouvirá o Procurador-Geral da República, sendo o julgamento
plenário realizado em sessão pública, caso haja matéria que exija segredo judicial, o qual
apenas o resultado será em sessão pública.
Julgada procedente será a decisão comunicada ao ente estadual e ao Presidente da
República, transitando em julgado, o presidente do STF requisitará a execução da decisão, que
será imposta pelo Presidente da República, mediante Decreto presidencial, sem a necessidade
de apreciação do Congresso Nacional.
Note-se que a ação direta interventiva, repita-se, é um mecanismo de controle de
constitucionalidade concentrado, num controle direto, para fins concretos, impossibilitando a
concessão de medidas liminares.Há quem defenda (Nagib Slaib Filho), entretanto, a
possibilidade de concessão de medidas cautelares em sede de ação direta interventiva, pois o
poder cautelar é inerente ao julgar, podendo, ainda, haver antecipação da tutela.

Item: Ação Declaratória de Constitucionalidade:

Foi introduzida no ordenamento jurídico brasileiro pela EC 3/93, alterando a redação do art.
102, I, “a”, e foi regulamentada pela Lei 9.868/99. O objetivo da ADC é transformar uma
presunção relativa de constitucionalidade em absoluta, não mais se admitindo prova em
contrário. Julgada procedente a ADC, tal decisão vinculará os órgãos do Poder Judiciário e a
administração pública, que não mais poderão declarar a inconstitucionalidade da aludida lei, ou
agir em desconformidade com a decisão do STF. O objeto da ação é lei ou ato normativo
federal. O órgão competente para seu processamento e julgamento é o STF. Os legitimados
ativos são os mesmos da ADI genérica - art. 103, CF. As regras sobre quórum e votação são
as mesmas da ADI genérica (instalação - 8 Ministros; voto de 6 Ministros para a procedência
da ação). Efeitos da decisão: erga omnes, ex tunc, vinculante em relação aos órgãos do Poder
Judiciário e à administração pública federal, estadual, municipal e distrital. O STF, por maioria
absoluta de seus membros, pode deferir pedido de medida cautelar em ADC, consistente na
determinação de que os juízes e tribunais suspendam o julgamento dos processos que
envolvam a aplicação da lei ou do ato normativo objeto da ação até seu julgamento definitivo.
Essa suspensão perdurará por apenas 180 dias, contados da publicação da parte dispositiva
da decisão no DOU.

Item: Emendas à Constituição:

As Emendas Constitucionais são fruto do trabalho do poder constituinte derivado reformador,


através do qual se altera o trabalho do poder constituinte originário, por acréscimo, modificação
ou supressão de normas. O poder constituinte derivado reformador é condicionado,
submetendo-se a algumas limitações, expressamente previstas ou decorrentes do sistema.
Trata-se das limitações expressas ou explícitas (formais ou procedimentais, circunstanciais e
materiais) e das implícitas.

Limitações formais ou procedimentais:

- art. 60, I, II e III - trata-se de iniciativa privativa e concorrente para alteração da Constituição.
Havendo PEC por pessoa diversa das taxativamente enumeradas, haverá vício formal
subjetivo, caracterizados de inconstitucionalidade. A Constituição, dessa forma, só pode ser
emendada mediante proposta: de 1/3, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou
do Senado Federal; do Presidente da República; de mais da metade das Assembléias
Legislativas das unidades da federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria
relativa de seus membros.

- art. 60, § 2º (quórum de aprovação) - a PEC será discutida e votada em cada Casa do
Congresso Nacional em 2 turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, 3/5 dos
votos dos respectivos membros.

- art. 60, § 3º - a promulgação da emenda deve ser realizada pelas Mesas da Câmara dos
Deputados e do Senado Federal, com o seu respectivo número de ordem. No processo
legislativo da Emenda Constitucional não existe sanção ou veto presidencial.

Limitações Circunstanciais:
A CF não poderá ser emendada na vigência de: intervenção federal; estado de defesa;
estado de sítio.

Limitações Materiais:

O Poder Constituinte Originário estabeleceu vedações materiais, definindo um núcleo


inatingível, chamado pela doutrina de cláusulas pétreas. Nesse sentido, não será objeto de
deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

- a forma federativa de estado;


- o voto direito, secreto, universal e periódico;
- a separação dos Poderes;
- os direitos e garantias individuais.

Obs.: Não há limitação temporal expressa prevista na CF/1988, sendo o exemplo clássico do
nosso constitucionalismo sobre o tema o art. 174 da Constituição Imperial de 1824, que não
permitia a reforma da Constituição antes de 4 anos do início de sua vigência

Limitações Implícitas:

Na esteia do ensinamento de Michel Temer, limitações implícitas são as que dizem respeito
à: 1 – As normas concernentes ao titular do Poder Constituinte; 2 – As normas concernentes
ao titular do Poder de Reforma; 3 – As normas referentes ao processo de emenda.
Parte expressiva da doutrina também afirma que, após o plebiscito de 1993, a forma
republicana passou a ser limitação implícita ao poder de reforma (virou cláusula pétrea).

Item: Princípios Constitucionais do Estado brasileiro e da República Federativa do


Brasil:

País é a palavra que se refere aos aspectos físicos, à paisagem territorial, habitat. Estado é,
na definição de Balladore Pallieri, uma ordenação que tem por fim específico e essencial a
regulamentação global das relações sociais entre os membros de uma dada população sobre
um dado território, na qual a palavra ordenação expressa a idéia de poder soberano,
institucionalizado. Elementos essenciais do Estado: poder soberano, povo, território e
finalidades. A constituição é o conjunto de normas que organizam esses elementos. República
Federativa do Brasil condensa o nome do Estado brasileiro, o nome do país (Brasil), a forma de
Estado (Federativa), e a forma de governo (República).

Território é o limite espacial dentro do qual o Estado exerce de modo efetivo e exclusivo o
poder de império sobre pessoas e bens. O modo de exercício do poder político em função do
território dá origem ao conceito de forma de estado. Pode ser unitário ou federal. O Brasil
assumiu a forma de Estado federal em 1889, sendo tal mantida pelas Constituições
posteriores. A Constituição de 1988 manteve com a declaração no art. 1º que configura o Brasil
como República Federativa. A federação consiste na união de coletividades regionais
autônomas que a doutrina chama de Estados federados, Estados-membros ou, simplesmente,
Estados. No federalismo brasileiro, há de se destacar que os Municípios, bem como o Distrito
Federal, também são entes federados.

Estado federal é o todo, dotado de personalidade jurídica de direito público internacional. A


União é entidade federal formada pela reunião das partes componentes, sendo pessoa jurídica
de direito público interno, autônoma em relação aos Estados e a que cabe exercer as
prerrogativas da soberania do Estado Brasileiro. Os estados-membros são entidades
federativas componentes, dotadas de autonomia e de personalidade jurídica de direito público
interno. O estado federal é dotado de soberania, os entes federados, de autonomia, ou seja,
capacidade de autogoverno e auto-administração.

Elementos da autonomia federativa: existência de órgãos governamentais próprios; posse de


competências exclusivas.
Forma de Estado: o Estado federal é um Estado que, embora parecendo único nas relações
internacionais, é constituído por Estados-membros dotados de autonomia, notadamente quanto
ao exercício de capacidade normativa sobre matérias reservadas à sua competência. O estado
federal brasileiro está constitucionalmente concebido como a união indissolúvel dos Estados,
Municípios e Distrito Federal (art. 1º). José Afonso da Silva entende que os Municípios não são
componentes da federação, mas não entidades federativas, diversamente da maioria da
doutrina.

- Federalismo por Agregação: Os Estados resolvem abrir mão de parcela de sua soberania
para agregarem-se e formarem novo Estado Federativo, passando a ser autônomos entre si.
Exemplos: EUA, Suiça, Alemanha.
- Federalismo por Desagregação (segregação): Surge a partir de um Estado unitário que
resolve descentralizar-se, em obediência a imperativos políticos e de eficiência. Ex: Brasil.
- Federalismo Dual: A separação de atribuições entre os entes federativos é absolutamente
rígida. Não se fala em cooperação ou interpenetração entre os entes. Ex: EUA
- Federalismo Cooperativo: As atribuições são exercidas de modo comum ou concorrente,
estabelecendo-se uma aproximação entre os entes federativos, que atuarão conjuntamente.
Ex: Brasil
- Federalismo Simétrico: Verifica-se a homogeneidade de cultura, desenvolvimento e língua.
Exemplo: EUA.
- Federalismo Assimétrico: Decorre da diversidade de cultura, desenvolvimento, língua. Ex: O
Canadá é um país bilíngüe e multicultural; A Suiça possui quatro diferentes grupos étnicos; O
Brasil possui diversidades de desenvolvimento.
- Federalismo Orgânico: O Estado deve ser considerado como um “organismo”, sustentando-se
a manutenção do todo sobre a parte. Os Estados membros seriam apenas um pequeno reflexo
do poder central. Acabaram por atender aos objetivos ditatoriais de governos federais
socialistas e da América Latina.
- Federalismo de integração: Há a preponderância do Governo Central sobre os demais entes
em nome da integração nacional. Trata-se de um federalismo meramente formal, aproximando-
se de um Estado Unitário descentralizado.
- Federalismo equilíbrio: Os entes federativos devem se manter em harmonia, reforçando-se as
instituições. Exemplos: Arts. 25, §3º; 43; 151, I; 157 a 159, todos da Constituição Federal.
- Federalismo de segundo grau: A Constituição de 1988 enaltece um federalismo de segundo
grau. No Brasil é reconhecida a existência de três ordens (União, Estados e Municípios, sem
nos esquecer da peculiar situação do Distrito Federal). O poder de auto-organização dos
Municípios deverá observar dois graus (Constituição Federal e Constituição do Estado).

Forma de Governo: é conceito que se refere à maneira como se dá a instituição do poder na


sociedade e como se dá a relação entre governantes e governados. O Brasil adota a forma
republicana. O art. 1º da Constituição mantém o princípio republicano, advindo da evolução
constitucional desde 1889. Não constitui cláusula pétrea a forma republicana de governo, como
nas constituições anteriores. A forma republicana implica a necessidade de legitimidade
popular do Presidente da República, Governadores de Estado e Prefeitos Municipais (arts. 28,
29, I e II, e 77), a existência de assembléias e câmaras populares nas três órbitas de governos
da República Federativa (arts. 27, 29, I, 44, 45 e 46), eleições periódicas por tempo limitado,
que se traduz na temporariedade dos mandatos eletivos, não vitaliciedade dos cargos políticos
e prestação da contas da administração pública.

O Estado brasileiro, segundo o art. 1º, tem como fundamentos a soberania, a cidadania, a
dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo
político. A cidadania tem sentido mais amplo que a titularidade de direitos políticos,
reconhecendo o indivíduo como pessoa integrada na sociedade estatal e a submissão do
funcionamento do Estado à vontade popular. Dignidade da pessoa humana é valor supremo
que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida.
Quando se fala na dignidade da pessoa humana, fala-se em sobreprincípio constitucional,
ou seja, valor pré-constituinte de hierarquia supraconstitucional (portanto, a idéia de não
hierarquia entre os princípios não se aplicaria quando em confronto com a dignidade da pessoa
humana).

A Constituição consigna como objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil


construir uma sociedade livre, justa e solidária; garantir o desenvolvimento nacional; erradicar a
pobreza e a marginalização; reduzir as desigualdades sociais e regionais; promover o bem de
todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e de outras formas de discriminação
(art. 3º).

Item: Poder e Divisão dos Poderes:

Art. 2º - São poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o


Executivo e o Judiciário.

Características fundamentais do Poder político: unidade, indivisibilidade e indelegabilidade.

Os órgãos do Estado são supremos (constitucionais) ou dependentes (administrativos).


Aqueles são os a quem incumbe o exercício do poder político, cujo conjunto denomina-se
governo ou órgãos governamentais. Os outros estão em plano hierárquico inferior, cujo
conjunto forma a administração pública, considerados de natureza administrativa. Os primeiros
são objeto do direito constitucional, os segundos do direito administrativo.

O poder político, uno, indivisível e indelegável, se desdobra e se compõe de várias funções,


fato que permite falar em distinção das funções, que fundamentalmente são três: a legislativa,
a executiva e a jurisdicional. A função legislativa consiste na edição de regras gerais, abstratas,
impessoais e inovadoras da ordem jurídica, denominadas leis. A função executiva resolve os
problemas concretos e individualizados, de acordo com as leis. Se distingue em: função de
governo, com atribuições políticas, co-legislativas e de decisão, e função administrativa, com
suas três missões básicas – intervenção, fomento e serviço público. A função jurisdicional tem
por objeto aplicar o direito aos casos concretos a fim de dirimir conflitos de interesse.

A divisão de poderes consiste em confiar cada uma das funções governamentais (legislativa,
executiva e jurisdicional) a órgãos diferentes, que tomam os nomes das respectivas funções,
menos o Judiciário (órgão ou poder legislativo, órgão ou poder executivo, órgão ou poder
judiciário). Elementos em que se fundamenta a divisão de poderes: a) especialização
funcional; b) independência orgânica. O princípio da separação de poderes, cogitado por
vários pensadores e materializado como conhecemos por Montesquieu, foi adortado pela
Constituição dos Estados Unidos e erigido a dogma pelo art. 16 da Declaração dos Direitos do
Homem e do Cidadão (1789 – França), que declarou que não teria Constituição a sociedade
que não tivesse separação de poderes.

Independência dos poderes – significa que: (a) a investidura e permanência das pessoas
num dos órgãos de governo não dependem da confiança nem da vontade dos outros; (b) no
exercício das atribuições que lhe sejam próprias, não precisam os titulares consultar os outros
nem necessitam de sua autorização; (c) na organização dos respectivos serviços cada um é
livre, observadas apenas as disposições constitucionais e legais.

A harmonia entre os poderes verifica-se primeiramente pelas normas de cortesia no trato


recíproco e no respeito às prerrogativas e faculdades a que mutuamente todos têm direito.
Há que se ressaltar que nem a divisão dos poderes nem a independência são absolutas.
Há interferências que visam o estabelecimento de um sistema de freios e contrapesos, à
busca de um equilíbrio necessário à realização do bem da coletividade e indispensável para
evitar o arbítrio e o desmando de um deles. Existem exceções ao princípio da separação de
poderes dando, como exemplos clássicos, os casos do art. 62 e do 68, ambos da CF.

TEORIA DOS PODERES IMPLÍCITOS

A TEORIA DOS PODERES IMPLÍCITOS, desenvolvida pelo constitucionalismo norte-


americano, fundamenta-se na idéia de que, para cada poder outorgado pela constituição a
certo órgão, são implicitamente conferidos amplos poderes para a execução desse poder.
Enfim, para a teoria dos poderes implícitos, a atribuição de direitos constitucionais
envolve a correspondente atribuição de capacidade para o seu exercício.
Importa-nos essa teoria porque, segundo seus cânones, na interpretação de um poder
constitucional, todos os meios ordinários e apropriados a executá-los devem ser vistos como
parte desse próprio poder.
Enfim, para os ideólogos da tese dos poderes implícitos, onde se pretende o fim se
autorizam os meios. Toda vez que a Constituição outorga um poder, aí se incluem,
implicitamente, todos os meios necessários à sua efetivação, desde que guardada uma
adequação entre os meios e o fim (princípio da proporcionalidade).
Nessa perspectiva, a outorga constitucional de um poder deve ser interpretada presumindo-se
que às autoridades públicas foram, simultânea e implicitamente, conferidos amplos poderes
para a concretização desse poder.
Ver trecho de artigo de Alexandre de Moraes sobre os poderes implícitos de
investigação do Ministério Público:
Incorporou-se em nosso ordenamento jurídico, portanto, a pacífica doutrina constitucional
norte-americana sobre a teoria dos poderes implícitos – inherent powers –, pela qual no
exercício de sua missão constitucional enumerada, o órgão executivo deveria dispor de todas
as funções necessárias, ainda que implícitas, desde que não expressamente limitadas (Myers
v. Estados Unidos – US 272 – 52, 118), consagrando-se, dessa forma, e entre nós aplicável ao
Ministério Público, o reconhecimento de competências genéricas implícitas que possibilitem o
exercício de sua missão constitucional, apenas sujeitas às proibições e limites estruturais da
Constituição Federal.

Item: O Estado Democrático de Direito:

Estado de Direito: características básicas – submissão ao imperito da lei; divisão de poderes;


enunciado e garantia dos direitos fundamentais.

Estado Social de Direito – o estado de direito deixou de ser formal, neutro e


individualista, para transformar-se em Estado material de Direito, enquanto adota uma
dogmática e pretende realizar a justiça social, onde o qualificativo social refere-se à correção
do individualismo clássico liberal pela afirmação dos chamados direitos sociais e realização de
objetivos de justiça social.

Art. 1º, CF – A República Federativa do Brasil se constitui em Estado Democrático de Direito


(EDD). Conceito de Estado Democrático de Direito (art. 2º da Constituição Portuguesa):
“é baseado na soberania popular, no pluralismo de expressão e organização política
democráticas, no respeito e na garantia de efetivação dos direitos e liberdades fundamentais,
que tem por objectivo a realização da democracia económica, social e cultural e o
aprofundamento da democracia participativa.”
Pelo art. 1º, parágrafo único, da CF/88, percebemos que em nosso Estado vigora a
denominada democracia semi-direta ou participativa, na qual são conjugados o princípio
representativo com institutos de democracia direta (plebiscito, referendo, iniciativa popular).

Princípios do EDD: da constitucionalidade; democrático (art. 1º); sistema de direitos


fundamentais (títulos II, VII e VIII); da justiça social (art. 170, caput e 193); da igualdade (art. 5º,
caput, e I); da divisão de poderes (art. 2º) e da independência do juiz (art. 95); da legalidade
(art. 5º, II); da segurança jurídica (art. 5º, XXXVI a LXXIII). A tarefa fundamental do EDD
consiste em superar as desigualdades sociais e regionais e instaurar um regime democrático
que realize a justiça social.

Item: Aplicabilidade e Interpretação das Normas Constitucionais:

Eficácia social se verifica na hipótese de a norma vigente, isto é, com potencialidade para
regular determinadas relações, ser efetivamente aplicada a casos concretos. Eficácia jurídica
significa que a norma está apta a produzir efeitos na ocorrência de relações concretas; mas já
produz efeitos jurídicos na medida em que a sua simples edição resulta na revogação de todas
as normas anteriores que com ela conflitam.

Classificação de José Afonso da Silva - normas constitucionais de eficácia: plena,


contida e limitada:

Normas Constitucionais de eficácia plena e aplicabilidade direta, imediata e integral são


aquelas normas da Constituição que, no momento em que esta entre em vigor, estão aptas a
produzir todos os seus efeitos, independentemente de norma integrativa infraconstitucional.

Normas Constitucionais de eficácia contida ou prospectiva têm aplicabilidade direta e


imediata, mas possivelmente não integral. Embora tenham condições de, quando da
promulgação da nova Constituição, produzir todos os seus efeitos, poderá a norma
infraconstitucional reduzir a sua abrangência. Michel Temer as chama de normas
constitucionais de eficácia redutível ou restringível.

Normas Constitucionais de Eficácia Limitada são aquelas normas que, de imediato, não têm
o condão de produzir todos os seus efeitos, precisando de lei integrativa infraconstitucional.
São, portanto, de aplicabilidade mediata e reduzida, ou, segundo alguns autores, aplicabilidade
diferida. José Afonso observa que tais normas têm, ao menos, eficácia jurídica imediata,
direta e vinculante, já que: a) estabelecem um dever para o legislador ordinário; b)
condicionam a legislação futura, com a conseqüência de serem inconstitucionais as leis
ou atos que a ferirem; c) informam a concepção do Estado e da sociedade e inspiram sua
ordenação jurídica; d) constituem sentido teleológico para a interpretação, integração e
aplicação das normas jurídicas; e) condicionam a atividade discricionária da Administração
e do Judiciário; f) criam situações jurídicas subjetivas, de vantagem ou desvantagem; g)
possuem eficácia ab-rogativa da legislação precedente incompatível.
Dividem-se em dois grupos: normas de princípio institutivo (ou organizativo) e normas de
princípio programático. As primeiras contêm esquemas gerais (iniciais) de estruturação de
instituições, órgãos ou entidades, enquanto as segundas veiculam programas a serem
implementados pelo Estado, visando a realização de fins sociais.

Classificação de Maria Helena Diniz – normas supereficazes ou com eficácia absoluta;


normas de eficácia plena; normas com eficácia relativa restringível; normas com eficácia
relativa complementável ou dependente de complementação legislativa:

Normas supereficazes com eficácia absoluta – são intangíveis, não podendo ser
emendadas. Contêm força paralisante total de qualquer legislação que, explícita ou
implicitamente, vier a contrariá-las (ex.: cláusulas pétreas: federação, voto direto, secreto,
universal e periódico, direitos e garantias individuais, Separação de Poderes).

Normas com eficácia Plena (self-executing provisions ou bastantes em si – Pontes de


Miranda) – contêm todos os elementos imprescindíveis para que haja possibilidade de
produção imediata dos efeitos previstos, já que, apesar de suscetíveis de emenda, não
requerem normação subconstitucional subseqüente. Podem ser imediatamente aplicadas.

Normas com eficácia relativa restringível – correspondem às normas de eficácia contida na


classificação de José Afonso da Silva.
Normas com eficácia relativa complementável ou dependente de complementação
legislativa - dependem de lei complementar ou ordinária para o exercício do direito ou
benefício consagrado. Podem ser de princípio institutivo ou programáticas.

Classificação de Celso Ribeiro Bastos e Carlos Ayres Britto – normas de aplicação


(irregulamentáveis ou regulamentáveis) e normas de integração (completáveis ou
restringíveis):

Normas de aplicação – aptas a produzir seus efeitos, dispensando regulamentação ou


permitindo-a, desde que sem qualquer restrição do conteúdo constitucional.

Normas de integração – são integradas pela legislação infraconstitucional. São completáveis


(exigindo legislação integrativa para completa produção de seus efeitos) ou restringíveis
(estabelecem a possibilidade do legislador infraconstitucional reduzir o comando
constitucional).

Uadi Lammêgo Bulos - normas constitucionais de eficácia exaurida e aplicabilidade


esgotada: são aquelas que já extinguiram a produção de seus efeitos. Próprias do ADCT,
notadamente as que já cumpriram o papel, encaro ou tarefa para o qual foram propostas.

Obs: CF só aceita a repristinação expressa. LINDB dispõe que, salvo disposição em contrário,
a lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigência.
Obs: Efeito repristinatório tácito – Hipóteses:
a) Art. 11, parágrafo segundo, L. 9868/99 – medida cautelar concedida pelo STF em sede
de controle concentrado. Lei revogada volta a ter aplicação;
b) Declaração de inconstitucionalidade com efeitos ex tunc em controle concentrado;
c) Exercício da competência legislativa pelos estados (Art. 24, parágrafo terceiro, CF);
d) Revogação ou rejeição da MP por outra.
Obs: Desconstitucionalização – normas constitucionais antigas compatíveis com a nova CF são
recepcionadas por ela, ainda que rebaixadas a categoria de lei ordinária (aceita por Pontes de
Miranda e Manoel Gonçalves filho). Deve-se atentar que inexistindo previsão expressa nesse
sentido não deve ser aceita.
Obs: Mutação Constitucional – conceito introduzido no direito constitucional por Laband e,
posteriormente tratado de forma mais ampla e técnica por Jellinek, que a situou em
contraposição a reforma constitucional. Mutação ocorre por meio de processos informais de
modificação do significado originário da CF sem alteração de seu texto. É tanto problema de
interpretação quanto de tensão entre o direito constitucional e a realidade constitucional.
Canotilho ensina que uma rigorosa compreensão da estrutura normativo-constitucional conduz
à exclusão de mutações constitucionais operadas por meio de interpretação, o que não
significa que a constituição deva ser compreendida como um texto estático e rígido, indiferente
à realidade constitucional. Aduz que as mutações constitucionais silenciosas poderiam ser
consideradas um ato legítimo quando decorrentes da permanente adequação dialética entre o
programa normativo (texto) e o domicílio normativo (realidade social) e desde que, embora
traduzindo a mudança de sentido de algumas normas provocado pelo impacto da evolução da
realidade constitucional, não sejam incompatíveis com os princípios estruturais da CF.
Repudia, no entanto, a interpretação criadora com base na força normativa dos fatos.

Interpretação Constitucional:

Métodos: JURÍDICO (HERMENEUTICO CLÁSSICO); TÓPICO-PROBLEMÁTICO;


HERMENEUTICO-CONCRETIZADOR; CIENTÍFICO-ESPIRITUAL; NORMATIVO-
ESTRUTURANTE; DA COMPARAÇÃO CONSTITUCIONAL.

Método Jurídico ou Hermenêutico-clássico (Forsthoff): utiliza-se dos métodos tradicionais


da hermenêutica, valendo-se dos seguintes elementos: genético, gramatical, lógico,
sistemático, histórico, teleológico (ou sociológico). O papel do intérprete resume-se a descobrir
o verdadeiro significado da norma. Tese da identidade entre lei e CF. Principio da
normatividade da CF estaria assegurado pela dupla relevância atribuída ao texto (ponto de
partida e limite para interpretação)
Método Tópico-Problemático (Theodor Viehweg – 1953): parte-se de um problema concreto
para alcançar o significado da norma. A Constituição é, assim, um sistema aberto de regras e
princípios. Open texture do texto constitucional não permite qualquer dedução substantiva.
Críticas: Pode conduzir a um casuísmo ilimitado; interpretação não deve partir do problema
para a norma e sim dessa para o problema.

Método Hermenêutico-Concretizador (Theodor Viehweg e Lumann): parte da Constituição


para o problema, usando os seguintes pressupostos interpretativos – subjetivos (intérprete vale
de suas pré-compreensões sobre o tema pra obter o sentido da norma); objetivos (intérprete
atua como mediador entre a norma e a situação concreta, tendo a realidade social como “pano
de fundo”); hermenêutico (é a mediação entre o subjetivo e objetivo até o intérprete chegar a
uma compreensão da norma). Interpretação é concretização. Primado do texto sobre o
problema. Este método concretista parte da ideia de que interpretação e aplicação consistem
em um processo unitário.

Método Normativo-Estruturante (Friedrich Muller - Concretista): não há identidade entre a


norma jurídica e o texto normativo. A norma deve ser concretizada em sua realidade social,
não só pelo legislador, mas pelo Judiciário, administração, governo, etc. Deve-se falar em
concretização e não em interpretação, que é etapa daquela. Texto só tem sentido quando
colocado numa operação ativa de concretização.

Método Científico-Espiritual (Rudolf Smend – valorativo ou sociológico): a análise da


norma constitucional parte da realidade social e dos valores subjacentes à Constituição. A
Constituição deve ser interpretada como algo dinâmico, que se renova constantemente, no
compasso das modificações da vida em sociedade. Estado e constituição são fenômenos
culturais (processo de integração comunitária).

Método da Comparação Constitucional: interpretam-se os institutos pela comparação nos


vários ordenamentos constitucionais.

Postulados normativos Aplicativos (Princípios hermenêuticos).


Metanormas que estabelecem critérios de interpretação ou a estrutura de aplicação das
normas.
a) Princípio da Supremacia – toda interpretação normativa se assenta no pressuposto
da superioridade jurídica da constituição. Impede a violação positiva (por ação) da CF,
bem como a negativa (por omissão constitucional do dever de legislar). Está presente
em todos os casos de controle de constitucionalidade. Papel de destaque no sistema
geral de freios e contrapesos;
b) Princípio da presunção da constitucionalidade das leis – poderes públicos retiram
suas competências da CF, suscitando uma presunção, ainda que relativa, de
conformidade de seus atos com a CF. No caso de dúvida acerca da
constitucionalidade, deve a norma ser declarada constitucional. Barroso ensina que a
presunção de constitucionalidade decorre do principio geral da separação dos poderes
e funciona como fator de autolimitaçao da atividade do judiciário, que, em referencia à
atuação dos demais poderes, só deve invalidá-los em caso de inconstitucionalidade
flagrante;
c) Principio da interpretação conforme a CF – decorrência da supremacia das normas
constitucionais e da unidade do ordenamento jurídico, evitando a anulação de normas
dúbias. Interpretação de normas constitucionais polissêmicas deve dar prevalência à
que lhes confira sentido compatível com a CF. Judiciário atua como legislador negativo,
eliminando, por serem incompatíveis com a CF, algumas possibilidades de
interpretação.
d) Princípio da simetria constitucional – impõe a adoção, pelas constituições estaduais
e lei orgânicas, dos paradigmas traçados pela CF, salvo quando esta dispõe em
contrário (princípio implícito – deduzido do art. 25 da CF).
e) Princípio da força normativa da CF - Força normativa da constituição ou
normatividade da constituição são expressões que significam que a constituição é uma
lei vinculativa dotada de efetividade e aplicabilidade. A força normativa da constituição
visa exprimir, muito simplesmente, que a constituição, sendo uma lei, como lei deve ser
aplicada.
Limites à utilização da decisão conforme à CF:
a) Intérprete não pode contrariar frontalmente o texto literal e o sentido da norma
interpretada, mesmo que assim conciliasse a lei com a CF (principio da autolimitação
jud);
b) Só é admitida quando existe de fato espaço de decisão;
c) Se o resultado interpretativo de uma lei resultar inequivocamente em contradição com
a Carta Magna, não se pode utilizar a interpretação conforme;
d) Intérprete deve zelar pela mens legis.

Postulados normativos (princípios) de interpretação constitucional:


a) DA UNIDADE DA CONSTITUIÇÃO – especificação da interpretação sistemática,
impondo o dever de harmonização das tensões e contradições existentes entre as
normas constitucionais, que não são hierarquizadas. Afasta a tese de Otto Bachof, em
seu Livro normas constitucionais inconstitucionais, na qual defende a possibilidade de
se declarar inconstitucional norma originária da CF. ;
b) DO EFEITO INTEGRADOR – CF é elemento do processo de integração comunitária.
Resolução dos problemas jurídico-constitucionais deve favorecer critérios que integrem
política e socialmente e reforcem a unidade política;
c) DA MÁXIMA EFETIVIDADE (da eficiência ou interpretação efetiva) – interpretação
das normas deve buscar o sentido que dê a essas a maior efetividade. Intimamente
ligado ao principio da força normativa da CF (soluções que densificam normas);
d) DA CONCORDÂNCIA PRÁTICA OU HARMONIZAÇÃO – bens protegidos pela CF,
em caso de colisão, devem ser tratados de maneira que a afirmação de um não
implique sacrifício total do outro. Concebido por Konrad Hesse, impõe-se que na
interpretação da Constituição "os bens constitucionalmente protegidos, em caso
de conflito ou concorrência, devem ser tratados de maneira que a afirmação de
um não implique o sacrifício do outro, o que só se alcança na aplicação ou na
prática do texto." É comumente utilizado para resolver problemas referentes à
colisão de direitos fundamentais
e) A JUSTEZA OU CONFORMIDADE FUNCIONAL – órgãos que interpretam CF não
podem chegar a resultado que subverta ou perturbe o esquema organizatório-funcional
estabelecido por ela. O princípio da conformidade funcional tem em vista impedir, em
sede de concretização da Constituição, a alteração da repartição das funções
constitucionalmente estabelecida.;
f) Proporcionalidade – ligado em sua origem à garantia do devido-processo legal.
Consagração implícita. Exigível diante do caráter substantivo do due processo of Law
(STF). Divide-se em necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito.
Há adequação quando as medidas adotadas são aptas a alcançar o fim almejado. Há
necessidade (menor ingerência possível) quando o meio utilizado para se atingir
determinado fim for o menos oneroso possível (proibição do excesso). Há
proporcionalidade em sentido estrito quando a ponderação da relação custo-benefício
da medida assinala a adequação da mesma.

Princípios da Interpretação Constitucional: DA UNIDADE DA CONSTITUIÇÃO (deve ser


interpretada em sua globalidade, afastando-se as aparentes antinomias); DO EFEITO
INTEGRADOR (deve-se dar primazia a critérios interpretativos que favoreçam integração
política e social); DA MÁXIMA EFETIVIDADE (a mais ampla efetividade social possível);
DA JUSTEZA OU CONFORMIDADE FUNCIONAL (o resultado deve reforçar o esquema
organizatório-funcional constitucionalmente estabelecido); DA CONCORDÂNCIA
PRÁTICA OU HARMONIZAÇÃO (coexistência harmônica dos bens jurídicos
constitucionalizados); DA FORÇA NORMATIVA (interpretação que dê a melhor eficácia à
lei fundamental); DA INTERPRETAÇÃO CONFORME À CONSTITUIÇÃO (pressupostos:
prevalência da Constituição; observação de normas; exclusão de interpretação contra
legem; espaço de interpretação; rejeição ou não aplicação de normas inconstitucionais;
intérprete não pode atuar como legislador positivo); DA PROPORCIONALIDADE OU
RAZOABILIDADE (necessidade + adequação + proporcionalidade em sentido estrito)

Item: Ação Popular:


Foi elevada ao nível constitucional na Constituição de 1934 e é assim disposta no art. 5º,
LXXIII, CF: “qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato
lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade
administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo
comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência.”

Requisitos: deve haver lesividade: ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado


participe; à moralidade administrativa; ao meio ambiente; ou ao patrimônio histórico e cultural.
Pela lesividade deve entender-se, também, ilegalidade.

Legitimidade ativa: do cidadão (brasileiro nato ou naturalizado, no pleno gozo de seus direitos
políticos, provada tal situação através do título de eleitor ou documento que a ele corresponda
– art. 1º, § 3º, Lei 4.717/65).

Legitimidade passiva: art. 6º, Lei 4.717/65 – agente que praticou o ato, entidade lesada e
beneficiários do ato ou contrato lesivo ao patrimônio público.

O Ministério Público é parte pública autônoma, funcionando como fiscal da lei ou prosseguindo
com a ação, se o autor popular desistir (art. 9º da Lei).

Competência – juízo de primeiro grau (federal ou estadual, dependendo do patrimônio


lesado). Exceções: art. 102, I, “f” e “n”, CF/88.

É possível a concessão de liminar, desde que presentes o fumus boni iuris e o periculum in
mora, podendo a ação popular ser tanto preventiva (evitar atos lesivos) ou repressiva
(buscando ressarcimento do dano, anulação do ato, recomposição do patrimônio público
lesado, etc.). A coisa julgada se opera secundum eventum litis, ou seja, se julgada procedente
ou improcedente por ser infundada, produzirá efeito de coisa julgada oponível erga omnes. Se
a improcedência se der por deficiência de provas, opera apenas coisa julgada formal, podendo
qualquer cidadão intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova.
Julgada improcedente a ação, só produzirá efeitos depois de passar pelo duplo grau obrigatório
de jurisdição. Julgada procedente, eventual apelação será recebida no seu duplo efeito:
suspensivo e devolutivo (art. 19 da Lei). O autor popular é isento de custas judiciais e ônus de
sucumbência, salvo comprovada má-fé.

Item: Reforma do Poder Judiciário: a Emenda Constitucional nº 45/2004:

Alterações trazidas pela Reforma do Judiciário:


1) a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do
processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação (art. 5º, LXXVIII, e
art. 7º da EC 45/2004);
2) a previsão de real cumprimento do princípio do acesso à ordem jurídica justa,
estabelecendo-se a Justiça itinerante e sua descentralização, assim como a autonomia
funcional, administrativa e financeira da Defensoria Pública Estadual (arts. 107, §§ 2º e
3º; 115, §§ 1º e 2º;125, §§ 6º e 7º; 134, § 2º; 168; e art. 7º, EC 45/2004);
3) possibilidade de criar varas especializadas para a solução de questões agrárias (art.
126);
4) a “constitucionalização” dos tratados e convenções internacionais sobre direitos
humanos, desde que aprovados pelo quorum qualificado das emendas constitucionais
(art. 5º, § 3º);
5) a submissão do Brasil à jurisdição do TPI a cuja criação tenha manifestado adesão (art.
5, § 4º);
6) a federalização de crimes contra os direitos humanos, mediante incidente suscitado
pelo PGR junto ao STJ, objetivando o deslocamento da competência para a Justiça
Federal (art. 109, V-A e § 5º);
7) criação do Conselho Nacional de Justiça, que passa a ser Órgão do Poder Judiciário,
com sede na Capital Federal. Ampliação de hipótese de impeachment abarcando todos
os membros do CNJ (e do CNMP). Criação de ouvidorias para o recebimento de
reclamações (arts. 52, II; 92, I-A, e § 1º; 102, I, ‘r’; 103-B e art. 5º, EC 45/2004);
8) previsão de controle do MP por intermédio do Conselho Nacional do Ministério Público,
assim como a criação de ouvidorias para o recebimento de reclamações (arts. 52, II;
102, I, ‘r’; 130-A; art. 5º, EC 45/2004);
9) ampliação de regras mínimas a serem observadas na elaboração do Estatuto da
Magistratura, destacando-se: previsão de exigência de três anos de atividade jurídica
para o bacharel em Direito como requisito para o ingresso na carreira da Magistratura
(quarentena de entrada); aferição do merecimento para a promoção conforme o
desempenho, levando-se em conta critérios objetivos de produtividade; maior garantia
ao magistrado, já que a recusa da promoção por antigüidade somente poderá se
implementar pelo voto fundamentado de 2/3 dos membros do Tribunal a que estiver
vinculado, conforme procedimento próprio e assegurada ampla defesa; impossibilidade
de promoção do magistrado que, injustificadamente, retiver autos em seu poder além
do prazo legal, não podendo devolvê-los ao cartório sem o devido despacho ou
decisão; previsão de cursos oficiais de preparação, aperfeiçoamento e promoção de
magistrados, constituindo etapa obrigatória do processo de vitaliciamento; o ato de
remoção, disponibilidade e aposentadoria do magistrado, por interesse público, fundar-
se-á em decisão por voto da maioria absoluta (e não mais 2/3) do respectivo tribunal ou
do CNJ, assegurada ampla defesa; previsão de serem as decisões administrativas dos
tribunais tomadas em sessão pública; modificação da sistemática de preenchimento
das vagas dos integrantes do Órgão Especial dos Tribunais, sendo metade por
antigüidade e a outra metade por eleição do Tribunal Pleno; o fim das férias coletivas
nos juízos e tribunais de segundo grau; previsão de número de juízes compatível com
a população; possibilidade de os servidores receberem delegação para a prática de
atos de administração e atos de mero expediente sem caráter decisório; distribuição
imediata dos processos em todos os graus de jurisdição (art. 93);
10) vedação dos juízes de receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou contribuições
de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas, ressalvadas as exceções previstas
em lei; instituição da denominada quarentena de saída, proibindo membros da
magistratura de exercer a advocacia no juízo ou tribunal do qual se afastarem por
aposentadoria ou exoneração pelo prazo de 3 anos – tal regra também se aplica aos
membros do MP (art. 95, par. Único, IV e V; art. 128, § 6º);
11) previsão de que custas e emolumentos sejam destinados exclusivamente ao custeio
dos serviços afetos às atividades específicas da Justiça, fortalecendo-a, portanto (art.
98, § 2º);
12) regulação do procedimento de encaminhamento da proposta orçamentária do
Judiciário e solução em caso de inércia; proibição de realização de despesas ou
assunção de obrigações que extrapolem limites estabelecidos na LDO, exceto se
previamente autorizadas, mediante a abertura de créditos suplementares ou especiais
(art. 99, §§ 3º, 4º e 5º);
13) a extinção dos tribunais de alçada, passando os seus membros a integrar os TJs de
seus estados (art. 4º, EC 45/2004);
14) transferência de competência do STF para o STJ no tocante à homologação de
sentenças estrangeiras e a concessão de exequatur às cartas rogatórias;
15) ampliação da competência do STF para o julgamento de recurso extraordinário quando
se julgar válida lei local contestada em face de lei federal (hipótese de conflito
federativo);
16) criação do requisito da repercussão geral das questões constitucionais discutidas no
caso para o conhecimento do recurso extraordinário (art. 102, § 3º);
17) a adequação da Constituição, no tocante ao controle de constitucionalidade, ao
entendimento jurisprudencial já pacificado no STF, constitucionalizando o efeito dúplice
ou ambivalente da ADI e da ADC, assim como o seu efeito vinculante. Ampliação da
legitimação para agir, igualando a legitimidade para ADC a da ADI e incluindo
expressamente a legitimação da Câmara Legislativa do DF e do Governador do DF
para propositura de ambas (art. 102, § 2º; 103, IV e V; revogação do art. 103, § 4º; art.
9º, EC 45/2004);
18) ampliação da hipótese de intervenção federal, dependente de provimento de
representação do PGR, objetivando prover a execução de lei federal (pressupondo ter
havido recusa). A Competência, que era do STJ, passa ao STF (art. 34, VI, c/c art. 36,
III; revogação do art. 36, IV; art. 9º, EC 45/2004);
19) criação da súmula vinculante do STF (art. 103-A e art. 8º, EC 45/2004);
20) aprovação da nomeação de Ministro do STJ pelo quorum de maioria absoluta dos
membros do Senado Federal, não mais simples ou relativa (art. 104, parágrafo único);
21) previsão de funcionamento, junto ao STF: (a) da Escola Nacional de Formação e
Aperfeiçoamento de Magistrados, cabendo-lhe, dentre outras funções, regulamentar os
cursos oficiais para o ingresso e promoção na carreira; (b) do Conselho de Justiça
Federal como órgão central do sistema e com poderes correcionais, cujas decisões
terão caráter vinculante (art. 105, par. único, I e II);
22) âmbito trabalhista: (a) TST passa de 17 pra 27 Ministros; (b) somente 1/5 dos Ministros
do TST vem da advocacia ou MPT, os demais (4/5) de membros dos TRTs, oriundos
da magistratura de carreira; (c) mínimo de 7 juízes por TRT; (d) modificação de
competência da justiça do trabalho; (e) criação da Escola Nacional de Formação e
Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho e do Conselho Superior da Justiça do
Trabalho; (f) lei criará varas do trabalho, podendo, em comarcas não abrangidas por
sua jurisdição, atribuí-las a juízes de direito, com recurso pro TRT respectivo; (g)
previsão de criação, por lei, do Fundo de Garantia das Execuções Trabalhistas
integrados por multas decorrentes de condenações trabalhistas e administrativas
oriundas da fiscalização do trabalho, além de outras receitas (art. 111, §§ 1º, 2º, 3º
(revogados); 111-A; 112;114;115; arts. 3º, 6º, 9º, EC 45/2004);
23) fixação de novas regras pra Justiça Militar (art. 125, §§ 3º, 4º, 5º);
24) regulação de procedimento de encaminhamento da proposta orçamentária do MP e
solução em caso de inércia. Proibição de realização de despesas ou assunção de
obrigações que extrapolem os limites estabelecidos na LDO, exceto se previamente
autorizadas, mediante a abertura de créditos suplementares ou especiais (art. 127, §§
4º, 5º, 6º);
25) diminuição do quórum de votação para a perda da inamovibilidade do membro do MP
de 2/3 para maioria absoluta;
26) vedação do exercício de atividade político-partidária, sem qualquer exceção ao
membro do MP; vedação de recebimento, a qualquer título ou pretexto, de auxílios ou
contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas, ressalvadas as
exceções previstas em lei; instituição, da quarentena de saída, nos mesmos termos
que para a magistratura (art. 128, § 5º, II, “e”, “f” e § 6º);
27) ainda referente ao MP: obrigatoriedade de as funções só poderem ser exercidas por
integrantes da carreira, que deverão residir na comarca da respectiva lotação, salvo
autorização do chefe da instituição; previsão da exigência de 3 anos de atividade
jurídica para o bacharel em direito como requisito para o ingresso na carreira do MP;
distribuição imediata dos processos; no que couber, as regras do art. 93 para a
Magistratura (art. 129, §§ 2º, 3º, 4º e 5º).

SÚMULA VINCULANTE

"Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante
decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria
constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito
vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta
e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou
cancelamento, na forma estabelecida em lei.
§ 1º A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas
determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses
e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de
processos sobre questão idêntica.
§ 2º Sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovação, revisão ou cancelamento
de súmula poderá ser provocada por aqueles que podem propor a ação direta de
inconstitucionalidade.
§ 3º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que
indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-
a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e
determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o
caso."
- Quais os requisitos para edição da súmula vinculante?
Matéria controversa entre órgãos do Judiciário ou entre estes e a Administração
Grave insegurança jurídica
Relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica.
- Quem são os legitimados a requerer a aprovação, revisão ou cancelamento de
súmula vinculante?
- Segundo a Lei 11.417/2006, Art. 3o São legitimados a propor a edição, a
revisão ou o cancelamento de enunciado de súmula vinculante:
- I - o Presidente da República;
- II - a Mesa do Senado Federal;
- III – a Mesa da Câmara dos Deputados;
- IV – o Procurador-Geral da República;
- V - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;
- VI - o Defensor Público-Geral da União;
- VII – partido político com representação no Congresso Nacional;
- VIII – confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional;
- IX – a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito
Federal;
- X - o Governador de Estado ou do Distrito Federal;
- XI - os Tribunais Superiores, os Tribunais de Justiça de Estados ou do Distrito
Federal e Territórios, os Tribunais Regionais Federais, os Tribunais Regionais
do Trabalho, os Tribunais Regionais Eleitorais e os Tribunais Militares.
- § 1o O Município poderá propor, incidentalmente ao curso de processo em que
seja parte, a edição, a revisão ou o cancelamento de enunciado de súmula
vinculante, o que não autoriza a suspensão do processo.
- § 2o No procedimento de edição, revisão ou cancelamento de enunciado da
súmula vinculante, o relator poderá admitir, por decisão irrecorrível, a
manifestação de terceiros na questão, nos termos do Regimento Interno do
Supremo Tribunal Federal.
- O Prefeito de Porto Alegre desrespeita disposição de súmula vinculante. Qual
a medida cabível? Quais os efeitos desta medida?
Reclamação, a qual anulará o ato.
- As súmulas já editadas adquirem efeito vinculante?
Não. Art. 8° da EC 45.
Art. 8º As atuais súmulas do Supremo Tribunal Federal somente produzirão efeito
vinculante após sua confirmação por dois terços de seus integrantes e publicação na
imprensa oficial.
NOÇÕES GERAIS DE DIREITO E FORMAÇÃO HUMANÍSTICA - ASPECTOS
GERENCIAIS DA ATIVIDADE JUDICIÁRIA (ADMINISTRAÇÃO E ECONOMIA).
GESTÃO. GESTÃO DE PESSOAS. TEORIA DO CONFLITO E OS MECANISMOS
AUTOCOMPOSITIVOS. TÉCNICAS DE NEGOCIAÇÃO E MEDIAÇÃO. CÓDIGO DE
ÉTICA DA MAGISTRATURA NACIONAL. DIREITOS E DEVERES FUNCIONAIS DA
MAGISTRATURA. ÉTICA NA FUNÇÃO JUDICIAL E NA VIDA PESSOAL DO JUIZ.

Aspectos gerenciais da atividade judiciária (administração e economia). Gestão. Gestão


de pessoas.

O marco da necessidade de modernização do Poder Judiciário foi a própria


Reforma do Poder Judiciário, com a Emenda Constitucional n.º 45, de 08 de dezembro de
2004, que, entre várias novidades, declarou o direito fundamental à razoável duração dos
processos e criou o CNJ.

A sociedade requer do setor público, cada vez mais, celeridade, economia de


recursos e aumento da qualidade dos serviços. Essa demanda exige das instituições
brasileiras mudanças estruturais, em conformidade com o novo paradigma da Administração
Pública Gerencial, menos burocrática e mais eficiente.

O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios busca, dessa forma,


renovar seu modelo de gestão e modernizar os serviços públicos prestados à sociedade do
Distrito Federal.

A exemplo de organizações no mundo todo, é necessário focar o trabalho da


instituição na Estratégia. Isso significa adotar instrumentos modernos de planejamento que
garantam a melhoria de desempenho e o alcance de metas préestabelecidas.

Desde 2007, o TJDFT utiliza o Planejamento Estratégico para promover sua


modernização e alavancar o processo de melhoria organizacional. Ele é uma ferramenta de
alinhamento e orientação das ações institucionais que viabiliza o alcance do objetivo maior:
atender à demanda da sociedade com celeridade, qualidade e redução de custo operacional.

O Plano Estratégico do TJDFT para o período de 2010 a 2016, aprovado pela


Resolução N. 001 de 12 de janeiro de 2010. O novo Plano tem validade de seis anos e está
alinhado ao Plano Estratégico do Poder Judiciário, em consonância com a Resolução n. 70, de
18 de março de 2009, do Conselho Nacional de Justiça – CNJ. A partir de uma avaliação dos
Planos anteriores e considerando seus resultados positivos, o Tribunal se preparou para
atender às novas exigências da sociedade.

O Plano Estratégico para o período 2010-2016 é o resultado do processo de


Planejamento Estratégico do TJDFT e caracteriza um expressivo avanço de gestão
institucional. A continuidade dos objetivos e das ações estratégicas, a partir de modelos de
atuação contínuos em diferentes gestões, auxiliará e facilitará o alcance das metas,
contribuindo para o cumprimento da Missão e a realização da Visão de futuro.

Contudo, o planejamento faz parte de um conceito maior: a Gestão Estratégica.


A formulação de um Plano é o começo de um processo de mudança em busca da capacitação
estratégica, representando o desenvolvimento de um novo comportamento e de uma cultura
estratégica em busca da excelência da gestão.

Ressalta-se que o Plano Estratégico, mais que um documento estático, deve ser
visto como um instrumento dinâmico de gestão, que contém decisões antecipadas sobre a
linha de atuação a ser seguida pelo TJDFT. A cada mudança no ambiente, novo diagnóstico
pode ser necessário e, em conseqüência, novas decisões devem ser tomadas. Daí, a
necessidade de constante revisão e atualização.

Candidato, o que é o Plabi?

É o planejamento estratégico do TJDFT, que é revisto a atualizado


bienalmente. Por isso, se chama Planejamento Bienal – PLABI.

Além disso, nesse contexto, deve ser destacada a Gestão por Competência, em
implementação no TJDFT desde 2009. Foi iniciada em abril de 2009 a implantação da Gestão
por Competências, que pretende definir e mapear as competências gerenciais adequadas aos
objetivos da Instituição e apontar as necessidades de capacitação. Profissionalizar as práticas
de gestão é requisito fundamental para aumentar a efetividade do TJDFT e o seu
reconhecimento pela sociedade. Gestão por competência é um modelo de gestão de
pessoas.

Com o programa, o TJDFT se antecipa ao atendimento do Decreto 5.707/06, que


instituiu a Política Nacional de Desenvolvimento de Pessoal na Administração Pública Federal
e que, em breve, deverá ser estendida ao Judiciário.

O modelo de gestão de pessoas é elaborado com base no Planejamento


Estratégico do Biênio, na Missão e Visão do TJDFT.

A definição de competência envolve os conhecimentos, habilidades e atitudes do


gestor que, ao aplicá-los no exercício de suas funções, obtém resultados positivos nos
processos de gestão da sua equipe e unidade e na prestação jurisdicional.

A implantação do projeto será iniciada com a definição e o mapeamento das


competências gerenciais. O diagnóstico é uma ferramenta de desenvolvimento e qualificação
para os gestores. A partir da identificação das lacunas entre as competências existentes e às
necessárias ao desempenho da função gerencial do Tribunal serão realizadas ações
direcionadas de capacitação.

Fonte: Planejamento Estratégico 2010/2016 do TJDFT


(Disponível em http://www2.tjdft.jus.br/plabi/docPlabi/pe_2010_2016.pdf)

Teoria do conflito e os mecanismos autocompositivos. Técnicas de negociação e


mediação.

Originalmente, o conflito é abordado como um fenômeno essencialmente negativo,


que deve ser evitado ou eliminado por meio de sacrifícios pessoais. Isso gera a insatisfação do
jurisdicionado com o resultado do processo, a sua forma de condução e a litigiosidade
remanescente, causando a percepção de que mesmo ao término do processo o conflito ainda
não foi resolvido. Conflito não resolvido pode configurar a litigiosidade remanescente, que deve
ser evitada ao máximo.

Em função disso, o escopo mais importante do sistema processual, que é a


pacificação social, vem sendo obtido apenas sob a ótica dos operadores do Direito, como uma
ficção jurídica. Há, pois, necessidade de compreensão de algumas abordagens mais eficientes
para resolução de conflitos, de forma a fazer com que o jurisdicionado se sinta efetivamente
pacificado.

O conflito deve ser considerado um fenômeno natural, que possui potencial


destrutivo ou construtivo, dependendo da forma como é abordado e das técnicas utilizadas
para sua resolução. Se abordado de forma apropriada (com as técnicas adequadas), o conflito
pode ser um importante meio de conhecimento, amadurecimento e aproximação dos seres
humanos. Este o marco teórico da Teoria do Conflito a partir dos ensinamentos de Morton
Deutsch.

Um processo destrutivo se caracteriza pelo enfraquecimento ou rompimento da


relação social preexistente à disputa em razão da forma pela qual esta é conduzida. Há a
tendência de o conflito se expandir ou se tornar mais acentuado. Destrutivo rompe ou
enfraquece a relação preexistente.

Já nos processos construtivos, as partes concluem a relação processual com


um fortalecimento da relação social preexistente à disputa. Construtivo fortalece a relação.

Assim, há evidente necessidade de que os novos mecanismos de resolução de


disputas, como a mediação, permitam que as partes possam, por intermédio de um
procedimento participativo, resolver suas disputas construtivamente ao fortalecer relações
sociais, identificar interesses subjacentes ao conflito, promover relacionamentos cooperativos e
explorar estratégias que venham a prevenir ou resolver futuras controvérsias. Perceber o
conflito, portanto, como um fenômeno natural e potencialmente positivo.

De acordo com a teoria da negociação, utilizada na mediação e em outros


processos de resolução de disputas, deve-se abandonar formas mais rudimentares de
negociação, como a chamada “negociação posicional”, a fim de se buscar resultados mais
satisfatórios.
Na negociação posicional, as partes se tratam como oponentes e pensam na
negociação em termos de ganhar ou perder. Por isso, frequentemente, questões pessoais,
como honra e respeito, passam a ser identificadas como parte da negociação, criando
obstáculos ao entendimento e ao acordo.

Ao contrário da negociação posicional há a “negociação baseada em princípios”


ou “negociação baseada em méritos”, a qual sugere que, para a obtenção de resultados
sensatos e justos, evitando-se a deterioração do relacionamento entre as pessoas, faz-se
necessário que se abordem os interesses reais dos envolvidos (e não suas posições).

São cinco os pontos fundamentais da negociação baseada em princípios:

a) Separar as pessoas do problema: antes de presumir que as pessoas


interessadas façam parte do problema a ser abordado, recomenda-se que os envolvidos
assumam uma postura de debater os méritos da negociação, lado a lado.
b) Foco nos interesses e não em posições;
c) Geração de opções de ganhos mútuos: geração de uma variedade de
possibilidades antes de se decidir qual solução será adotada.
d) Utilização de critérios objetivos: tal ponto favorece a despersonificação do
conflito. Ex.: adotar tabela de preços de veículos.
e) Melhor alternativa - a negociação de um acordo: os autores propõem uma
medida para o valor da negociação. Compensa negociar enquanto não houver uma alternativa
melhor.

A inserção da mediação no desenvolvimento sistêmico do nosso ordenamento


jurídico-processual está apenas em seu estágio inicial. A mudança de paradigma traz a
necessidade de um magistrado menos belicoso e adversarial e mais propenso à utilização
criativa dos instrumentos existentes no ordenamento jurídico (ex.: ajustamento de conduta e
transação), para solução das controvérsias de maneira mais eficiente. Desse modo, o
magistrado deve passar a se preocupar também com a litigiosidade remanescente, com a
capacitação das partes a melhor compor seus conflitos e com a maior humanização do conflito.

As diferenças entre práticas conexas: mediação e negociação


A diferença entre mediação e negociação é simples: o negociador é uma parte
envolvida. Representa os interesses de uma das partes. Isto implica que o negociador vai
procurar alcançar uma solução que satisfaça a parte que representa. O mediador não se
encontra envolvido. Acompanha a reflexão das duas partes permitindo-lhes encontrar um
acordo. Tal acordo é definido de várias formas, ou seja, baseando-se das abordagens da
negociação ou como acima indicado de forma que seja o mais satisfatório possível ou também
o menos insatisfatório possível entre as duas partes.

Lei 13.140/2015: Art. 1º - Esta Lei dispõe sobre a mediação como meio de
solução de controvérsias entre particulares e sobre a autocomposição de
conflitos no âmbito da administração pública.

Parágrafo único. Considera-se mediação a atividade técnica exercida por


terceiro imparcial sem poder decisório, que, escolhido ou aceito pelas
partes, as auxilia e estimula a identificar ou desenvolver soluções
consensuais para a controvérsia.

Art. 2º - A mediação será orientada pelos seguintes princípios:

I - imparcialidade do mediador;

II - isonomia entre as partes;

III - oralidade;

IV - informalidade;

V - autonomia da vontade das partes;

VI - busca do consenso;

VII - confidencialidade;

VIII - boa-fé.

§ 1º - Na hipótese de existir previsão contratual de cláusula de mediação, as


partes deverão comparecer à primeira reunião de mediação.

§ 2º- Ninguém será obrigado a permanecer em procedimento de mediação.

Art. 3 º- Pode ser objeto de mediação o conflito que verse sobre direitos
disponíveis ou sobre direitos indisponíveis que admitam transação.

§ 1º - A mediação pode versar sobre todo o conflito ou parte dele.

§ 2º - O consenso das partes envolvendo direitos indisponíveis, mas


transigíveis, deve ser homologado em juízo, exigida a oitiva do Ministério
Público.
Qual a diferença Mediação e conciliação?

A diferença entre mediação e conciliação reside no papel do terceiro interveniente.


Basicamente a terceira parte mediadora apoia as partes na sua reflexão e na sua decisão: faz
emergir a decisão das mesmas. Já, na conciliação, a terceira parte conciliadora propõe uma
solução às partes no processo.

Qual a diferença Mediação e arbitragem?

A diferença entre mediação e arbitragem reside no fato de o árbitro tomar uma


decisão que impõe às partes que optaram pela arbitragem. Uma prática ainda marginal
desenvolveu-se nomeadamente nos Estados Unidos, (no âmbito das Alternatives Disputes
Resolution), associando a intervenção de um mediador que, quando não consegue fazer
emergir uma solução, pode tornar-se árbitro através de convenção prévia com as partes ou
com o acordo das partes às quais o propõe ou que lho pedem. Este método é então nomeado
med-arb.

Resumo da Teoria dos conflitos

o Criador: Morton Deutsch


 Teoria da Negociação
o Técnica Rudimentar
 Negociação posicional
o Técnica adequada
 Baseada em princípios/méritos mediante:
 Separar pessoas dos problemas
 Ganhos múltiplos
 Critérios objetivos (tabela Fipe)
 Melhor alternativa
 Foco nos interesses
 Tipos de Conflitos
o Construtivos
 MEIO
 CONHECIMENTO
 AMADURECIMENTO
 APROXIMAÇÃO
o Destrutivos
 Relação social
 Rompimento
 Enfraquecimento
Código de Ética da Magistratura Nacional.

Conceito de ética

A ética é um conceito filosófico, que não deve ser confundido com a moral.

Moral Ética

Sistema normativo interno da pessoa, que vem estabelecer regras de conduta segundo análise
íntima, inserido em um ambiente histórico social.

Logo, ao se prever um Código de Ética para a magistratura, objetiva-se mais do que uma
análise setorial, ou de um determinado momento histórico, já que a avaliação feita seria do
comportamento do magistrado de forma global.

Os motivos de um Código de Ética da Magistratura (segundo o Min. TST João Oreste Dalzan):

- porque um sistema judicial altivo e respeitado é essencial em uma sociedade democrática


moderna e, para tanto, a confiança pública no sistema judicial e na autoridade moral dos
membros do Poder Judiciário é de extrema importância;

- porque o Código, como elemento essencial para os juízes incrementarem a confiança da


sociedade em sua autoridade moral, concorre para fortalecer a legitimidade do Poder
Judiciário;

- porque o Código, definitivamente, pode auxiliar o magistrado, em especial na solução de


dilemas e questões cruciais da vida humana, suscitadas no exercício profissional.

O surgimento de um estatuto deontológico é sinal de que o Estado se preocupa com a


excelência da prestação jurisdicional oferecida aos cidadãos.

O Código de Ética foi aprovado em 2008. Todavia, não há consenso em relação à necessidade
da elaboração de um Código de Ética para juízes. No entanto, o Código se preordena a focar
balizas, fornece parâmetros para os seus destinatários e para os órgãos correcionais, além se
ser um elenco de normas de bem proceder, e não de tipificação de condutas proibitivas. O seu
teor é diretivo, sinalizador de como deva ser o procedimento de um juiz no Brasil de tantas
carências na esfera do justo.

O profissional do Direito que se humanizar e der à técnica o seu valor, que não pode se
sobrepor ao substancial, que é reduzir a injustiça do mundo, saberá encontrar na prolífica
(produtiva) produção normativa as estratégicas hábeis a resolver os conflitos humanos.
Não padece de deficiência técnica a Magistratura brasileira. Ao contrário, alicerçada em boa
doutrina e em normatividade fundante reconhecidamente avançada, produz jurisprudência
paradigmática. Investir na formação de uma reta consciência dos agentes encarregados de
fazer valer o direito é solidificar uma atuação consequente, responsável, afinada com as reais
necessidades da sociedade. O Poder Judiciário não está liberado de buscar os objetivos
fundamentais desta República.

Os “Considerandos” (do Código de Ética):

“Considerando que a adoção de Código de Ética da Magistratura é instrumento essencial para


os juízes incrementarem a confiança da sociedade em sua autoridade moral;”:

O julgador ainda é a imagem da justiça e a qualidade desta depende da higidez moral de seu
artífice. Quando se detecta descompromisso moral no julgador, não se pode estranhar a queda
do grau de credibilidade na Justiça.

A exigência de diretrizes éticas para o juiz se justifica ante a diversidade de ritmo entre a
proliferação de demandas e a invencível lentidão das respostas. Somente uma nova postura do
juiz fará a reconfiguração do padrão simbólico da função judicial hoje residente na consciência
coletiva: o de um ser distante, afeiçoado a tecnicalismos e excessivamente burocratizado,
insensível perante a dor do jurisdicionado.

A autoridade moral do juiz é garantia de que, a despeito da falibilidade da prestação


jurisdicional, a dicção do direito não atendeu a outros imperativos que não a incidência do
ordenamento à luz da capacidade interpretativa de uma consciência reta.

“Considerando que o Código de Ética da Magistratura traduz a) compromisso institucional com


a excelência na prestação do serviço público de distribuir Justiça e, assim, b) mecanismo para
fortalecer a legitimidade do Poder Judiciário;”: a) Subordinação do juiz a prestar um serviço
estatal efetivo, oportuno e caracterizado pela excelência: O resultado da prestação jurisdicional
deve ser o fruto de um compromisso institucional e provindo de apurado preparo intensificado
por aprimoramento constante. Principalmente, o trabalho final do juiz deve ser subtraído a
qualquer propensão de preponderância de um voluntarismo desvinculado de uma verdadeira
vocação judicial.

b) Legitimidade do Poder Judiciário:

Em outras nações, questiona-se comumente a legitimidade de um poder que não se submete


ao sufrágio. Entretanto, no Brasil, o tema da legitimidade nunca adquiriu esses contornos de
veemência inquietante. Sempre se admitiu que legitimidade é consentimento. Assim, a
legitimação da magistratura é diuturna e se faz, de início, mediante recrutamento por certame
público.

Em seguida, a legitimação se obtém pela transparência do funcionamento da Justiça e,


principalmente, na fundamentação dos atos decisórios. Em oportuno momento, o CNJ
reconhece que a postura ética do juiz fortalecerá a legitimidade do Poder Judiciário. A
motivação permite que todos acompanhem o raciocínio do juiz ao decidir.

“Considerando que é fundamental para a magistratura brasileira cultivar princípios éticos, pois
lhe cabe também função educativa e exemplar de cidadania em face dos demais grupos
sociais;”

Toda decisão judicial é uma lição, no sentido de transmissão de um critério do que deva ser o
justo. Por isso, o aprendizado jurídico não pode descuidar da jurisprudência, da qual até o
parlamento se abebere para tentar reduzir a distância entre os reclamos da população e o
déficit normativo, decorrente da lentidão com que a produção legislativa acompanha as
mudanças sociais. Para poder julgar, o juiz se vê obrigado a completar a tarefa legislativa,
razão pela qual é considerado legislador negativo, pois afasta do quadro de normas cogentes
aquelas consideradas incompatíveis com a regra fundante.

Tudo que o magistrado faz é uma vitrine de condutas, Pode ser bom ou péssimo exemplo. Mas
o juiz não tem direito de ser mau exemplo. O CNJ impõe que seja paradigma perante os
demais grupos sociais. É natural se reclame um complexo de atributos mais completo a quem
pretenda ser julgador de seu semelhante. Por administrar as misérias humanas, o juiz
aperfeiçoa a sua capacidade de distinguir o certo do errado. Seria melancólico se soubesse
aplicar o critério distintivo em relação às partes e não o assimilasse para a sua própria conduta.
Situação de conflito do que vale para os jurisdicionados e o válido para ele próprio geraria uma
dicção falaciosa do justo.

“Considerando que a Lei veda ao magistrado "procedimento incompatível com a dignidade, a


honra e o decoro de suas funções" e comete-lhe o dever de "manter conduta irrepreensível na
vida pública e particular" (LC nº 35/79, arts. 35, inciso VIII, e 56, inciso II);”

A coerência é um signo obrigatório à identificação da persona juiz. Daí a relevância dos


aspectos exteriores da função. O acerto da sapiência vulgar quando propala que o juiz, tal
como a mulher de César, além de ser honesto, precisa parecer honesto. Conduta
irrepreensível é aquela insuscetível de repreensão. Quem pode repreender os juízes são não
só os órgãos correcionais – dentre eles o CNJ –, mas qualquer indivíduo, uma vez que
remunerado pelo Erário.

Com efeito, da leitura atenta do ordenamento, depreende-se que o legislador não delimitou o
alcance da repreensibilidade. A LOMAN (LC 35/79) submete o juiz à condição ser virtuoso: ter
o hábito de fazer o bem e evitar o mal.

A virtude predispõe à contínua autocrítica, mas “a luta fundamental da autocrítica dá-se contra
a autojustificação. A máquina cerebral funciona por todo lado a se inocentar, se legitimar e se
autoestatificar” (Edgar Morin, Meus demônios, p. 82). O risco da leniência é próprio do ser
humano e pode suplicar o juiz que negligencie a vida virtuosa. Dentre as virtudes, sobressai a
urgência da humildade, a requisitar incessante autoexame de consciência. Todos terão uma
justiça mais adequada se o juiz vier a enfrentar – corajosamente – a autocrítica.
Ao recordar o juiz brasileiro de que está submetido ao dever legal de virtude, o CNJ sublinha a
exigência de uma ética prudencial. Prudência é a virtude que impõe sensatez, pausa para
avaliar consequências, análise e avaliação dos passos a serem dados.

“Considerando a necessidade de minudenciar os princípios erigidos nas aludidas normas


jurídicas;”

O Código de Ética pormenoriza os deveres extraíveis da CF, LOMAN, dos Códigos e não se
pode ignorar a produção jurisprudencial disciplinar das corregedorias. Tais comandos exparsos
estão agora ordenados em 12 capítulos, abordados a seguir.

Relevância do Código de Ética da Magistratura Nacional

O Código de Ética é uma síntese de tudo aquilo que se espera do juiz no exercício funcional e
na vida particular. Explicita-se a função judicial como responsável, juntamente com as demais
tarefas estatais, pela edificação da pátria fraterna, justa e solidária, com eliminação da miséria
e redução de desigualdades e vedação ao preconceito. Promessa do constituinte de 1.988, da
qual o Judiciário é fiador e conclamado a concretizar.

Art. 1º O exercício da magistratura exige conduta compatível com os preceitos deste Código e
do Estatuto da Magistratura, norteando-se pelos princípios da independência, da
imparcialidade, do conhecimento e capacitação, da cortesia, da transparência, do segredo
profissional, da prudência, da diligência, da integridade profissional e pessoal, da dignidade, da
honra e do decoro.

A abrangência do preceito inicial o torna verdadeira carta de princípios da codificação ética. O


que reconduz à conveniência de se reiterar a discussão sobre a necessidade desta
preceituação, quando o ordenamento já traria dispositivos suficientes para exigir do magistrado
uma atitude intrínseca e extrinsecamente ética.

Necessidade de um Código de Ética diante do conteúdo ético da Constituição da


República, LOMAN e Código de Processo Civil

Ao adotar a dignidade da pessoa humana como verdadeiro supraprincípio, também sinalizara o


constituinte a ênfase que pretendeu conferir à questão moral. Pois a dignidade é um atributo
das criaturas cujo conteúdo só a consciência moral pode prover.

Todavia, o constituinte foi mais explícito em relação ao juiz, prevendo:

O acesso ordinário à magistratura por concurso público, privilegiando a seleção fundada no


preparo, além da aptidão vocacional:
Vedou assim qualquer favoritismo e conferiu um selo de moralização ao recrutamento judicial.
Ressalta-se que o terço constitucional do STJ, os juízes dos Tribunais Superiores indicados
livremente pelo Presidente da República ao Senado e o quinto constitucional dos demais
Tribunais também deveriam ser escolhidos mediante apuro idêntico. Os requisitos
constitucionais de notável saber jurídico e reputação ilibada não significam desapreço pelos
demais atributos exigíveis ao julgador. Preocupação que os órgãos de classe deveriam
evidenciar, até mesmo para precaver situações como as freqüentes devolução de listas
sêxtuplas em vários tribunais.

A subordinação da ascensão funcional na carreira a critérios de antiguidade e merecimento,


para conciliar experiência e devoção à causa da justiça:

Merecimento é mérito. A CF disciplinou o exercício da judicatura de maneira a reclamar


disponibilidade plena do juiz para a sua missão precípua. Por isso é que, em regra, o
magistrado não pode cumular funções.

A exigência de residir na Comarca:

Apesar de tratar-se de questão que não constitui matéria constitucional, mas preceito apenas
formalmente fundante, atendeu-se a uma exigência de ordem prática, ante a reiteração de
reclamos e denúncias. A primeira obrigação do juiz é estar a disposição de quem dele precise.
E isso pode acontecer a qualquer hora, não apenas durante o expediente.

A comunicação de prisão, por exemplo, não se fará em dia útil e no horário forense, mas deve
ser feita imediatamente. Desde a vigência da CF/88, não se justifica os Fóruns, Tribunais e
demais dependências judiciais não estarem permanentemente à disposição de quem necessite
ver respeitados os seus direitos fundamentais. Daí a estranheza que ainda se resista a plantão
judiciário, o que parece inconcebível na Democracia.

A necessidade de uma justiça rápida:

Em 88, ao elencar os requisitos para promoção por merecimento, não se deixou de mencionar
a presteza: qualidade de quem é presto, rápido célere. Dez anos depois, inclui-se a eficiência
dentre os princípios fundamentais da Administração Pública. Há que sustente que essa
inserção decorreu da incapacidade do Judiciário.

Não satisfeito com os resultados, o constituinte derivado produziu a EC 45/2004, a chamada


Reforma do Judiciário, a qual:

- incluiu, dentre os direitos fundamentais, o direito à prestação jurisdicional oportuna e o da


garantia de meios necessários a que ela se efetive com a presteza exigida;

- obrigou o funcionamento pleno dos serviços judiciais sem interrupção ou férias coletivas;
- determinou a distribuição imediata de todos os processos;

- vedou a promoção do juiz que mantivesse autos com atraso em seu poder;

- cometeu importância à produtividade, sem dispensar a presteza;

- ordenou descentralização (CF: Art. 125. § 6º O Tribunal de Justiça poderá funcionar


descentralizadamente, constituindo Câmaras regionais, a fim de assegurar o pleno acesso do
jurisdicionado à justiça em todas as fases do processo. (Incluído pela Emenda Constitucional nº
45, de 2004));

-a itinerância (CF: Art. 125. § 7º O Tribunal de Justiça instalará a justiça itinerante, com a
realização de audiências e demais funções da atividade jurisdicional, nos limites territoriais da
respectiva jurisdição, servindo-se de equipamentos públicos e comunitários.

(Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004));

-e outros meios de tornar a justiça mais eficaz e efetiva (Ex: Art. 126. Para dirimir conflitos
fundiários, o Tribunal de Justiça proporá a criação de varas especializadas, com competência
exclusiva para questões agrárias. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
Parágrafo único. Sempre que necessário à eficiente prestação jurisdicional, o juiz far-se-á
presente no local do litígio).

O compromisso com a rapidez não se esgota nestes preceitos. Ainda há: (i) a Súmula
vinculante; (ii) o efeito vinculante das decisões definitivas de mérito proferidas em ADIN e
ADECON; e (iii) o mecanismo da repercussão geral.

Tamanha é a preocupação com a celeridade porque este é o ritmo da sociedade


contemporânea. Falaciosa a postura de algumas mentalidades retrógradas, que oferecem
como resposta à pressa o dilema entre presteza e segurança. É possível decidir razoavelmente
bem e depressa. Aguardar-se a certeza absoluta, a prestação que adviesse de longa reflexão,
depois de medição para maturá-la e consistisse na decisão justificada por inúmeros
precedentes jurisprudenciais, calcada na melhor doutrina, seria condenar a parte a se nutrir do
desespero que o conflito impõe. Num país de quatro instâncias, as decisões são sempre
provisórias e o jovem juiz não deve se atormentar com a possibilidade de não oferecer o
melhor de si na elaboração da sentença. Haverá sempre um tribunal local e ao menos dois
outros superiores para aperfeiçoar a sua proposta de solução.

Seja como for, esta é a vontade do constituinte.

O mal menor é a decisão corrigível, mas oportuna. O mal maior é a decisão insuscetível de erro
– na visão do seu prolator – mas que sobrevém quando a permanência da controvérsia já
causou males financeiros e, sobretudo, morais aos que nela estão envolvidos.
Na verdade, conferir eficiência e efetividade à justiça é questão moral.

A LOMAN – texto legal recepcionado pela CF/88, segundo o STF –, por sua vez, foi própria em
disciplinar a vida e conduta do magistrado.

Os Códigos de Processo Civil e Penal também abrigam normas éticas:

A conotação moral da função do juiz está presente quando o legislador dele reclama sempre e
inevitavelmente uma decisão que resolva a controvérsia. Não pode o juiz alegar lacuna ou
obscuridade da lei para se eximir de sentenciar ou despachar. Exige-se-lhe ainda estudo
incessante, para aplicar as normas legais e conhecimento pleno do que significa analogia,
costumes e princípios gerais de direito. Se o CPC veda ao juiz decidir por equidade, ressalvada
a expressa previsão legal, isso não o impede de buscar o justo, valendo-se do contido na
LINDB: Art. 5o Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às
exigências do bem comum. Não pode uma reta consciência moral sentir-se em paz e satisfeita
com sua missão, ao retribuir quem procurou pela justiça no processo com uma resposta
meramente processual.

Mais do que manter a sua própria irrepreensibilidade ética, o magistrado é o zelador da ética
das partes.

Preservar a própria imparcialidade é imperativo ético para o julgador. As hipóteses legais de


impedimento e suspeição exemplificam a ocorrência de fatos que inibem o juiz de atuar com
isenção no processo.

O juiz é obrigado a manter a ordem e o decoro na audiência.

Tais preceitos são, ainda, complementados pelas recomendações, ordens de serviço,


resoluções e demais atos normativos editados pelas Corregedorias de Justiça. Enfim, não é
por falta de normas que se constata menoscabo pela conduta ética na Magistratura.

A doutrina também já forneceu substancioso material de ilustração ética. Por isso é que não
poucos se posicionaram no sentido de desnecessidade do Código de Ética, sob o
convencimento de que a capacidade de previsão do codificador é sempre inferior à
multiplicidade de ocorrências registradas na prática.

Exortação dos juízes brasileiros à sua fiel observância, inexistente dispositivo sancionador.

Característica singular do Código de Ética é a ausência de sanções. Ele apenas remete aos
deveres contidos na LOMAN e exorta os juízes brasileiros à sua fiel observância.

Mas é compreensível a falta de previsão, ante a inequívoca realidade de inexistir infração


penal, civil ou disciplinar que não seja, simultaneamente, uma infração ética. Esta a posição
que o José Renato Nalini adota, em consonância com os ensinamentos de Ronald Dworkin e
em oposição a H.L.A. Hart. Para este, embora possa haver muitas e diversas conexões
contingentes entre Direito e Moral, não há conexões necessárias conceituais necessárias entre
o conteúdo do Direito e a Moral. Por conseqüência, “as disposições moralmente aníquas pode
ser válidas como regras ou princípios jurídicos”.

Dworkin rechaça tal idéia, “em favor da tese – derivada, em última instância, de sua própria
teoria interpretativa do direito – de que deve haver ao menos fundamentos morais prima facie
para as afirmações acerca da existência dos direitos e deveres jurídicos. Por esta razão,
considera a idéia de que os direitos jurídicos devem ser entendidos como espécie dos direitos
morais, como um elemento crucial de sua teria do Direito (...)”:

Se não existe infração de outra natureza que não seja antes disso uma vulneração ética,
mostra-se suficiente a previsão de sanções no Estatuto da Magistratura, no capítulo da
responsabilidade civil previsto o Código de regência processual e no âmbito criminal.

A codificação ética passa a ser um reforço na conscientização do juiz brasileiro de que dele se
espera uma conduta compatível com a relevância das funções cometidas ao julgador.

Há quem defenda a inviabilidade de se incutir reflexão moral a quem já não possua um


sentimento ético profundamente entranhado na mente. Outra corrente entende que é urgente a
luta pela conversão ética do maior número de pessoas, notadamente aquelas detêm
autoridade e importância para se tornarem paradigmas.

Com a edição do Código de Ética, o CNJ acredita na suficiência deste convite para convencer
o juiz a ser ético. A função docente e exemplar da Magistratura diante dos demais grupos
sociais

É da tradição do direito consagrar ao seu profissional uma intimidade com a ética nem sempre
detectável em outras atividades. Por isso é que se tributa à Magistratura o epíteto de reserva
moral da Nação. A responsabilidade do juiz brasileiro é expressivamente acrescida no presente
estágio histórico, em que a sensação corrente é a de que a moralidade foi sepultada, tantas e
tamanhas são as mazelas comportamentais em todos os níveis.

A educação, que poderia treinar os espíritos para vôos mais elevados e prolongados, padece,
ela própria, de evidente deformidade. A maior parcela da população satisfaz-se com
sobreviver. A qualquer custo, a qualquer preço. Os valores estão em declínio.

Flexibilizam-se os preceitos, procedem-se a interpretações convenientes, relativiza-se o que já


foi absoluto. Conceitos como honra, probidade, compromisso, retidão, caráter, sofreram
mutação semântica. Interessa chegar lá, vencer na vida. Os meios não entram em conta.

Na falência da moral, a missão do juiz – fazer justiça – torna-se epopéia heróica. Não há direito
sem ética. A judicialização dos conflitos é uma seara em que se pode e se deve reorientar as
práticas sociais. Ao decidir, o juiz sinaliza à sociedade o parâmetro da conduta desejável. Há
uma Constituição principiológica e dirigente, que permite a hermenêutica seminal, criativa, de
uma ética para a nacionalidade.

Toda decisão veste caráter eminentemente docente. A magistratura pode ser fator de redenção
dos princípios sepultados na mercancia de interesses subalternos. A nacionalidade tem direito
de esperar que seus juízes liderem o processo de recuperação da moralidade pública. Em todo
e qualquer processo há um conteúdo ético a ser revigorado. Não há causas menores, nem
irrelevantes, para o significado incomensurável do apostolado de fazer justiça.

Princípios

De acordo com o art. 1◦ do CE, o exercício da magistratura deve ser norteado pelos seguintes
princípios:

Independência: a independência do juiz é dos traços característicos do Estado de Direito.


Nesse sentido, a CR consagra a independência e harmonia entre os Poderes da União. E o
julgador precisa estar inteiramente livre para o exercício da sua missa, ou seja, estar ao abrigo
de influencias que possam afetar o correto desempenho do seu dever. Para tanto, a CR trouxe
algumas garantias mínimas ao juiz, tais como a vitaliciedade, a inamovibilidade, a
irredutibilidade.

E a preocupação com essa imprescindível qualidade exigida ao Julgador, fez com que o CNJ
colocasse a independência como condição pioneira, por constituir a própria essência da função
judicial (pergunta da prova oral do TJDFT no concurso anterior);

O princípio da independência não tem como objetivo conferir privilégios aos julgadores.

Na verdade, visa garantir a defesa dos direitos interesses legítimos dos cidadãos.

Independência externa: é a independência perante os demais poderes ou diante de todas as


exteriorizações da onipresença estatal.

Independência interna: é aquela que examina a autonomia do juiz perante o próprio poder
judiciário, notadamente diante da estrutura orgânica hierarquizada em ele funciona.

Mas, o juiz para manter-se liberado de influências externas, é necessário assegurar a


imparcialidade. Mas, o que significa isso? A imparcialidade do juiz significa que ele não pode
tomar partido sobre os interesses que lhe são submetidos. Deve apreciar e decidir as questões
em exclusiva obediência à lei. Há uma dupla dimensão da imparcialidade: a subjetiva, que se
refere ao foro íntimo do juiz; a objetiva, que é a exteriorização da equidistância neutral do
julgador, diante do caso concreto.
A comunidade deve estar convencida de que o juiz é imparcial. Além de praticar o justo, o juiz
deve transparecer a imagem perfeita de um homem justo.

O magistrado não deve participar de atividade político-partidária, com vistas a assegurar o


princípio da independência.

Imparcialidade: a imparcialidade está ligada à independência. Não existe previsão


constitucional expressa a respeito da imparcialidade como qualidade do julgador. A
equidistância do juiz em relação às partes é a forma de demonstrar a imparcialidade, o que,
todavia, não implica distanciamento das partes. E para assegurar a imparcialidade, deve-se
garantir o contraditório e o devido processo legal.

Ainda, é papel do juiz assegurara a igualdade material (igualdade de oportunidades) entre


litigantes com profundas desigualdade fáticas – sociais, econômicas, culturais – com a
finalidade de se garantir a igualdade jurídica.

Conhecimento e capacitação;

Cortesia;

Transparência: é necessário dar publicidade aos atos praticados pelo Poder Judiciário, até
mesmo para o fim de compensar a sua legitimidade (já que não se sujeito a sufrágio). A
publicidade é um elemento de participação democrática. A publicidade precisa atender aos
interesses de quem litiga, mas também àquele que apenas pretenda exercer sua parcela
cidadã no controle de atuação do Estado.

Todavia, é necessário que a informação seja transmitida de forma útil, compreensível e clara;

Segredo Profissional;

Prudência: o Código de Ética contempla não só a prudência, mas impõe ao juiz atuar de forma
cautelosa, atento às consequências que sua decisão pode provocar. O juiz não pode se afastar
das consequências da sua atuação - consequencialismo;

Diligência e dedicação: diligencia é a capacidade de enfrentamento eficiente das questões


submetidas à sua apreciação. É a busca da solução mais efetiva. O juiz é um solucionador de
conflitos;

Integridade profissional e pessoal:


O juiz precisa ser integro, pois o ser humano chamado a julgar não pode situar-se em um grau
de inferioridade moral em relação àqueles sobre os quais incidirá seu julgamento.

Dignidade, honra e decoro.

Direitos e deveres funcionais da Magistratura.

Primeiramente, devem ser vistas as garantias dos Magistrados, que são a vitaliciedade (após
dois anos de efetivo exercício ou, para aqueles que ingressam direto nos tribunais, desde a
posse), a inamovibilidade (atenção para decisão recente do STF dizendo que substituto
também possui essa garantia) e irredutibilidade de subsídios.

Nas proibições, destacam-se a quarentena de saída (proibição de advogar no juízo ou tribunal


do qual se afastou por três anos); a proibição de exercer outro cargo ou função pública, ainda
que em disponibilidade, salvo uma de magistério (para o STF, ler: salvo uma, a de magistério.
Ou seja: pode dar aula em mais de um estabelecimento, desde que não prejudique o trabalho).
Também não pode exercer a atividade político-partidária. Lembrar que essa proibição não vale
para quem já se aposentou (é o caso da Juíza aposentada Denise Frossard, que queria ser
governadora do RJ).

Também vale a proibição de exercer comércio ou participar de sociedade comercial, inclusive


economia mista, exceto como acionista ou quotista.

Os deveres dos Magistrados estão na LOMAN e no CPC:

- portar-se com independência, serenidade, exatidão;

- justificar eventuais atrasos ou saídas antecipadas;

- agir com urbanidade, diligência e pontualidade;

- manter uma conduta irrepreensível na vida pública e particular;

- dar igualdade de tratamento às partes;

- velar pela rápida solução do litígio;

- prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da justiça;

- tentar conciliar as partes.

Destacam-se entre os direitos dos magistrados o de portar arma, ser ouvido como testemunha
em data, hora e local previamente ajustados com a autoridade ou juiz e não ser preso, senão
por ordem escrita do Tribunal ou em caso de flagrante delito por crime inafiançável.

Questões (retiradas do material do TRF1)

1) Qual o órgão ficou incumbido da elaboração do código de ética da Magistratura?


Resposta:
A CF88 não estabeleceu de forma expressa a competência para elaborar o código de Ética da
Magistratura, sendo que o CNJ, no exercício da competência que lhe atribuíram a Constituição
Federal (art. 103-B, § 4º, I e II), a Lei Orgânica da Magistratura Nacional (art. 60 da LC nº
35/79) e seu Regimento Interno (art. 19, incisos I e II), editou em 2008 o referido Código de
Ética.

2) Como se resolve a colisão entre normas da Loman e do Código de ética da Magistratura?


Resposta:
Deve prevalecer a Loman, vez que é hierarquicamente superior ao Código de Ética editado por
ato do CNJ.

3) Se um juiz ofender outro juiz por e-mail, deveria ele ser repreendido pelo tribunal, qual base
legal?
Resposta:
Penso que sim, porque a lei orgânica da magistratura “veda ao magistrado "procedimento
incompatível com a dignidade, a honra e o decoro de suas funções" e comete-lhe o dever de
"manter conduta irrepreensível na vida pública e particular" (LC nº 35/79, arts. 35, inciso VIII, e
56, inciso II)” (expressão extraída do Código de Ética da Magistratura,
http://www.cnj.jus.br/codigo-de-etica-da-magistratura).

Disserte sobre o relacionamento do juiz com a mídia em geral e o público em geral.


Resposta:
O magistrado não vive à margem da sociedade, nela vive e com ela convive. O Judiciário
provavelmente atua direta e habitualmente com pessoas mais do que os demais Poderes. A
imprensa exerce grande influência nessa interligação entre o serviço prestado e o usuário. O
Código de Ética da Magistratura, ao tratar do princípio da transparência, prevê que o
magistrado deve "na sua relação com os meios de comunicação social, comportar-se de forma
prudente e equitativa, e cuidar especialmente:
I - para que não sejam prejudicados direitos e interesses legítimos de partes e seus
procuradores;
II - de abster-se de emitir opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem,
ou juízo depreciativo sobre despachos, votos, sentenças ou acórdãos, de órgãos judiciais,
ressalvada a crítica nos autos, doutrinária ou no exercício do magistério.
Art. 13.O magistrado deve evitar comportamentos que impliquem a busca injustificada e
desmesurada por reconhecimento social, mormente a autopromoção em publicação de
qualquer natureza.
Art. 14.Cumpre ao magistrado ostentar conduta positiva e de colaboração para com os órgãos
de controle e de aferição de seu desempenho profissional."
Nas relações com o público em geral, especialmente com as partes no processo, o juiz deverá,
respeitadas as situações de segredo de justiça, “informar ou mandar informar aos interessados
acerca dos processos sob sua responsabilidade, de forma útil, compreensível e clara.”

Auxílio-moradia - TRECHOS DA DECISÃO DO MIN. LUIZ FUX NA AO 1773 MC/DF

"Quanto ao tema de fundo, cumpre destacar que a compreensão predominante nesta Corte é
no sentido de que os direitos e deveres dos magistrados são, no mínimo, aqueles previstos na
sua lei complementar de regência, qual seja, a Lei Complementar nº 35/79. Sobre o tema
específico da concessão da ajuda de custo para fins de moradia, cumpre transcrever o que
disposto no art. 65, inciso II, da Lei Complementar nº 35/79, verbis :

Art. 65 - Além dos vencimentos, poderão ser outorgadas aos magistrados, nos termos da lei, as
seguintes vantagens: (...)
II - ajuda de custo, para moradia, nas localidades em que não houver residência oficial à
disposição do Magistrado.
Nesse cenário, a previsão na LOMAN do direito à ajuda de custo pretendida afasta qualquer
tese no sentido de que o Poder Judiciário estaria concedendo vantagens pecuniárias não
previstas ou com fundamento de validade em lei."

"O direito à parcela indenizatória pretendido já é garantido por lei, não ressoando justo que
apenas uma parcela de juízes o perceba, considerado o caráter nacional da magistratura, tal
como reconhecido por esta Corte "

"os servidores federais lotados no Poder Judiciário ocupantes dos cargos em comissão de nível
CJ-2 a CJ-4 possuem o direito que, a despeito de expressa previsão legal, tem sido negado
aos autores. Cria-se, com isso, uma situação inusitada. É que, em casos de remoção ou
promoção de um magistrado federal, usualmente ele se desloca para o interior do país e
alguns servidores que integram a sua equipe o acompanham. Normalmente, o Diretor de
Secretaria, ocupante de um cargo CJ-3, é um dos que aceita o convite. Em razão do
deslocamento para um local em que não existe residência oficial, o Diretor de Secretaria terá o
direito a receber o auxílio-moradia pago regularmente nos termos da Resolução nº 4 do CJF.
Por outro lado, o Juiz Federal, que é seu chefe na hierarquia administrativa e que, também, se
removeu para o mesmo local, tem o seu pedido de ajuda de custo para fins de moradia
negado. E a situação se agrava quando se tem conhecimento inequívoco de que esta Corte,
bem como o CNJ, STJ, o Ministério Público Federal e o CJF já pagam, regularmente, a ajuda
de custo aos magistrados e membros do Ministério Público Federal convocados. "

"Por sua vez, o próprio CNJ reconhece o direito ao auxílio-moradia. Ao editar a Resolução nº
13, o referido Conselho estabeleceu que fica de fora do cômputo do teto de remuneração a
parcela recebida a título de auxílio-moradia (art. 8º), verbis :
Art. 8º Ficam excluídas da incidência do teto remuneratório constitucional as seguintes verbas:
I - de caráter indenizatório, previstas em lei: (...) b) auxílio-moradia; "

"A tese da inexistência de uma deliberação legal ou administrativa específica voltada para a
concessão da parcela pretendida em favor dos magistrados federais não pode inviabilizar o
reconhecimento de um direito assegurado por lei e fundado na Carta de 1988, mormente se
considerado que a regulamentação, já existente em diversos tribunais, e nesta própria Corte
Suprema, tem criado uma diferenciação iníqua e odiosa entre os magistrados: de um lado os
que já têm reconhecido a direito à ajuda de custo para fins de moradia, e, de outro, aqueles
que se encontram em situações fáticas idênticas, mas que, ainda, não tiveram o
reconhecimento expresso da administração judicial do direito à referida parcela. "

"Também não encontra amparo no ordenamento jurídico a tese defendida pela União de que o
auxílio-moradia não deveria ser pago ao magistrado na cidade que habitualmente o faça. É que
a pretendida restrição não foi imposta pelo Estatuto da Magistratura, ressoando inviável que, a
pretexto da regulamentação do tema, seja aniquilado ou restringido o direito nos termos do que
legalmente previsto. Regulamento de execução de lei não está autorizado a contrariá-la, e nem
mesmo a criar restrições que a própria lei não estabeleceu "

"Na jurisprudência desta Corte, há precedentes acerca do reconhecimento do direito pretendido


na peça vestibular. No MS nº 27.994, por exemplo, o Min. Celso de Mello destaca que o auxílio-
moradia só não é devido ao magistrado que já se aposentou, bem como àquele que não
preenche os requisitos exigidos pelo ordenamento jurídico, o que revela o direito à sua
percepção em favor de quem está na atividade e satisfaz as exigências para a sua percepção "

"E nem se diga que o referido benefício revela um exagero ou algo imoral ou incompatível com
os padrões de remuneração adotados no Brasil. É que cada categoria de trabalhador brasileiro
possui direitos, deveres e verbas que lhe são próprias. Por exemplo, os juízes federais não
recebem adicional noturno, adicional de insalubridade, adicional de periculosidade, participação
nos lucros, FGTS, honorários advocatícios, bônus por produtividade, auxílio-educação,
indenização para aprimoramento profissional, ou mesmo qualquer tipo de gratificação por
desempenho. Os juízes brasileiros sequer recebem qualquer retribuição por hora-extra
trabalhada, o que é, destaque-se, um direito universalmente consagrado aos trabalhadores.
Nada estão recebendo, ainda, pelo desempenho de funções gerenciais de caráter
administrativo, ou mesmo pela acumulação de juízos e de juízos com funções administrativas.
É isso o que, aliás, tem provocado no Brasil uma recente evasão maciça da carreira da
magistratura federal, o que, aliás, é noticiado como motivo de grande preocupação pelo CNJ
(Notícia publicada no Jornal do Brasil de 18/06/2013, http://www.jb.com.
br/pais/noticias/2013/06/18/evasao-de-magistrados-preo cupa-cnj/). Mais de cem candidatos
aprovados no árduo concurso público para Juiz Federal preferiram não assumir o cargo e se
enfileiram ao lado de outras centenas de juízes que estão, ano a ano, se exonerando do cargo,
em razão de carreiras mais atrativas, porquanto menos estressantes e que muito melhor
remuneram. "

"DEFIRO a tutela antecipada requerida, a fim de que todos os juízes federais brasileiros
tenham o direito de receber a parcela de caráter indenizatório prevista no artigo 65, inciso II, da
LC nº 35/79, aplicandose como regra aplicável para a concessão da referida vantagem,: i) o
artigo 65 da LOMAN ora referido, que, apenas, veda o pagamento da parcela se, na localidade
em que atua o magistrado, houver residência oficial à sua disposição; ii) os valores pagos pelo
STF a título de auxíliomoradia a seus magistrados " (a decisão foi posteriormente estendida
para todos os magistrados brasileiros)
PONTO 1 –
PROCESSO CIVIL

PONTO 01: JURISDIÇÃO E AÇÃO. ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA DO


DISTRITO FEDERAL. INTERVENÇÃO DE TERCEIROS. AÇÕES
POSSESSÓRIAS. AÇÃO DE DIVÓRCIO. AÇÃO DE ALIMENTOS.
EXECUÇÃO PROVISÓRIA.

Item: Jurisdição e Ação:

JURISDIÇÃO:
1 -Natureza da Jurisdição:
“A função jurisdicional é aquela função do Estado que se aplica concretamente, ou seja, no
caso concreto que lhe é apresentado, a norma abstrata e genérica que a função legislativa
criou. É a atuação da vontade concreta da lei. É a função do Estado de aplicar a lei ao caso
concreto que lhe é levado para processamento e julgamento.
“A jurisdição pode ser vista como poder, função e atividade. É manifestação do poder estatal,
conceituado como capacidade de decidir imperativamente e impor decisões. Expressa, ainda, a
função que têm os órgãos estatais de promover a pacificação de conflitos interindividuais,
mediante a realização do direito justo e através do processo. Marcelo Lima Guerra afirma que a
jurisdição civil tem a função específica de proteger direitos subjetivos (art. 5º, XXXV, CF/88) –
esse conceito exclui a jurisdição constitucional em controle abstrato da constitucionalidade das
normas. Por fim, a jurisdição é um complexo de atos do juiz no processo, exercendo o poder e
cumprindo a função que a lei lhe comete.” – Fredie Didier Júnior.

2 – Trilogia Estrutural do Processo Civil:


“A trilogia estrutural do direito processual civil nada mais é do que a interligação desses três
institutos, sendo certo de que um não existe sem o outro. A jurisdição, para ser exercida,
precisa de um processo. E não há jurisdição, em regra, sem que para tanto ocorra o exercício
do direito de ação.” – Edward Carlyle Silva.
“Essa nova teoria difundida por Cândido Rangel Dinamarco e Luiz Guilherme Marinoni
defende a existência de um quarto pilar: a Defesa. Os defensores dessa teoria acreditam que
da mesma maneira que o autor exerceria o seu direito de ação, o réu também teria o direito de
influenciar no convencimento do juiz através do exercício do direito de defesa. Este nada mais
seria do que o direito que o réu tem de exercer condutas positivas no processo, de modo a
influir no convencimento do juiz acerca dos fatos relevantes para o julgamento da causa.” –
Edward Carlyle Silva.

3 Conceito de Jurisdição:
Resumindo, para Carnelutti a jurisdição é a busca da justa composição da lide” – Edward
Carlyle Silva.
“Teoria contemporânea – Luiz Guilherme Marinoni defende posição de que o conceito de
jurisdição pode variar de acordo com a época e o tipo de Estado que irá exercer a atividade
jurisdicional. Significa dizer que, dependendo do tipo de Estado em que a Jurisdição deve ser
exercida, o conceito de jurisdição pode variar. (...) Da mesma maneira, a época em que o
Estado irá exercer a jurisdição também influencia diretamente em seu conceito.” – Edward
Carlyle Silva.

4 -Características da Jurisdição:
“O art. 2º, CPC traz o princípio da inércia, ou princípio da demanda, segundo o qual a
jurisdição, em regra, é inerte. Ela não se movimenta de ofício, precisando ser provocada. As
exceções a esse princípio podem ser observadas nos casos em que o juiz pode agir de ofício,
tais como: abertura de inventário (art. 989, CPC); exibição de testamento (art. 1.129, CPC);
arrecadação de bens de herança jacente (art. 1.142, CPC); arrecadação de bens de ausente
(art. 1.160, CPC); e execução de sentença trabalhista (art. 878, CLT). A atividade jurisdicional,
por sua vez, é delimitada pelo pedido formulado pelo autor (princípio da correlação entre
sentença e pedido). É o pedido formulado pela parte que limita a atuação do juiz. É por essa
razão que se considera eivada de vício, por exemplo, a sentença ultra petita, na qual o juiz
concede mais do que foi pedido. A sentença extra petita ocorre quando o juiz na sentença
decide fora do que foi pedido, julgando algo que não foi objeto do pedido, constituindo assim
uma espécie de vício. Entretanto o juiz pode conceder menos do que foi pedido, sem que, a
princípio, a sentença possa ser considerada viciada. É o caso da sentença de procedência
parcial ou sentença parcialmente procedente.” – Edward Carlyle Silva.
“Sentença de procedência parcial: o juiz julga procedente parcialmente porque acolhe um dos
pedidos e rejeita o outro. Ele examina todos os pedidos formulados, mas concede apenas parte
deles. Caberá apelação com base em error in judicando, não cabendo embargos de declaração
a princípio. Sentença citra petita: é aquela em que apenas uma parte dos pedidos formulados
recebe manifestação por parte do juiz, verificando-se assim que nem todos os pedidos
formulados pela parte foram objeto de exame pelo juiz, sendo omissa nesse particular.” –
Edward Carlyle Silva.
“No caso da sentença citra petita, cabem embargos de declaração para suprir a omissão.
Tema interessante, entretanto, diz respeito aos efeitos infringentes de tais embargos de
declaração. Haverá efeito infringente nos casos em que o exame dos argumentos
apresentados acarretarem uma nova decisão, modificando aquela anterior que foi objeto de
recurso. No caso de o juiz somente examinar a parte omissa que foi objeto de recurso e ela
não ocasionar qualquer alteração do julgado, não há que se falar em efeitos infringentes dos
embargos de declaração. Entretanto, se os embargos de declaração não forem recebidos ou
for negado provimento aos mesmos, caberá apelação por error in procedendo, já que o juiz foi
omisso no exame de um dos pedidos. O procedimento adequado a ser adotado pelo Tribunal é
o de anular a sentença, devolvendo o processo ao 1º Grau, para que seja proferida nova
sentença que abranja todos os pedidos.” – Edward Carlyle Silva.
“Princípio da Inércia - o processo se origina por iniciativa da parte (Nemo iudex sine actore;ne
procedar iudex ex officio), mas se desenvolve por impulso oficial (art. 262, CPC). Podem
provocar a atividade jurisdicional a parte ou o interessado (jurisdição voluntária), bem como o
Ministério Público nos casos em que estiver legitimado a ajuizar ação civil pública.” - Nelson
Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery.
“Assim, a inércia da jurisdição, embora permaneça como característica geral, fica reduzida,
basicamente, à instauração do processo e à determinação do objeto litigioso (o mérito da
causa), que, a princípio, exigem provocação da parte.” – Fredie Didier Júnior.
“Há matérias que, por serem de ordem pública, devem ser apreciadas ex officio pelo juiz, não
estando sujeitas à preclusão. São, por exemplo, as relativas às condições da ação (art. 267, VI
e 295, caput, II e III, e parágrafo único, III, ambos do CPC) e pressupostos processuais (art. 13,
113, 134, 136, 267, § 3º e 301, § 4º, todos do CPC), prescrição e decadência (art. 219, § 5º e
220, CPC), bem como nos procedimentos de jurisdição voluntária, fundados no interesse
público, onde vige o princípio inquisitório. Todas as questões relativas às relações de consumo
são de ordem pública e interesse social, devendo sobre elas se pronunciar o juiz de ofício,
independentemente de requerimento da parte ou do interessado (art. 1º, CDC). Pode o juiz
decretar de ofício a falência no curso do pedido de concordata ou do processo de recuperação
judicial (art. 73, LF).” - Nelson Ney Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery.
“Unidade – A jurisdição é poder estatal; portanto, é uma. Para cada Estado soberano, uma
jurisdição. Só há uma função jurisdicional, pois se falássemos de várias jurisdições,
afirmaríamos a existência de várias soberanias e, pois, de vários Estados. No entanto, nada
impede que esse poder, que é uno, seja repartido, fracionado em diversos órgãos, que
recebem cada qual as suas competências. O poder é uno, mas divisível.” – Fredie Didier
Júnior.
“O princípio da congruência, decorrência própria do princípio dispositivo, não incide
relativamente às questões de ordem pública, que o juiz deve examinar de ofício, em razão de
aqui incidir o princípio inquisitório.” - Nelson Ney Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery.
“Substitutividade – O Estado substitui a vontade dos particulares ou de órgãos públicos na
solução de eventuais conflitos que os envolvam. No momento em que o Estado é provocado
para exercer a atividade jurisdicional, ele substitui a vontade das partes, assumindo a
responsabilidade de solucionar o caso.Arbitragem – A corrente majoritária entende que ela é
atividade jurisdicional. Questão importante na arbitragem é que na própria lei existe previsão de
que se pode pleitear junto ao Poder Judiciário a nulidade da sentença nos casos de nulidade
(vício formal), obrigando o Judiciário a examinar tudo aquilo novamente. É necessário recordar
que os atos de execução da sentença arbitral são realizados pelo Estado (art. 584, CPC, com a
redação da Lei nº 11.232/05).” – Edward Carlyle Silva.
“Para a maioria da doutrina, de acordo com a qual a teoria de Chiovenda é a mais correta, a
natureza declaratória é uma característica da jurisdição. Sendo a atividade de declarar a
vontade concreta da lei preexistente, quando esta for objeto de violação.” – Edward Carlyle
Silva.
“Coisa Julgada – 1ª Corrente: defende como sendo uma das características da jurisdição a
definitividade. Segundo ela, a jurisdição teria como uma de suas características primordiais o
fato de que o exercício da atividade jurisdicional com a aplicação da vontade concreta da lei
àquele caso que lhe teria sido levado para conhecimento e julgamento poderia resultar na
imutabilidade e indiscutibilidade do teor daquela decisão, possibilitando, portanto, a formação
da coisa julgada ou na definitividade. 2ª Corrente: para parte majoritária da doutrina, as
decisões finais proferidas no processo cautelar (art. 810 a contrario sensu do CPC) e na
jurisdição voluntária (art. 1.111 do CPC) são consideradas atividades jurisdicionais, embora,
em regra, não façam coisa julgada. Como não é possível negar o caráter jurisdicional a estas
decisões, é forçoso concluir que a definitividade não pode ser considerada característica da
jurisdição.” – Edward Carlyle Silva.
“A coisa julgada é situação jurídica que diz respeito exclusivamente às decisões
jurisdicionais, mas isso não quer dizer que só haverá jurisdição se houver coisa julgada
material. A coisa julgada material é uma opção política do Estado; nada impede que o
legislador, em certas hipóteses, retire de certas decisões a aptidão de ficar submetida à coisa
julgada; ao fazer isso, não lhes tiraria a “jurisdicionalidade”. A coisa julgada é situação posterior
à decisão, não podendo dela ser sua característica ou elemento de existência; não se
condiciona o “ser” por algo que, no tempo, lhe é posterior. Na verdade, a marca da jurisdição
(...) é ser ela a última decisão, a decisão definitiva. Quando o Poder Judiciário resolve a
questão que lhe é submetida, cria uma norma jurídica concreta que não pode ser controlada
por nenhum outro poder, nem mesmo o legislativo; o Poder Judiciário dá a última palavra sobre
o conflito. Só os atos jurisdicionais podem adquirir essa definitividade, que recebe o nome de
coisa julgada, essa situação jurídica que estabiliza as relações jurídicas de modo definitivo.
Essa aptidão é, pensamos, a característica mais marcante da atividade jurisdicional.” – Fredie
Didier Júnior.
“Lide – 1ª Corrente: defende que a necessidade da existência de “lide” é considerada por
alguns autores como sendo característica do exercício da atividade jurisdicional. (...) Com base
nessa premissa, estes autores acabam por defender a idéia de que a jurisdição voluntária não
é hipótese de jurisdição, na medida em que não existiria lide nestes casos, mas sim meros
requerimentos. 2ª Corrente: para a doutrina mais atual, o exercício da jurisdição não exige a
existência de uma lide. A lide seria elemento acidental e não principal do processo. Seria
possível, portanto, a existência de processo sem lide. (...) Os adeptos desta teoria defendem a
natureza jurisdicional da jurisdição voluntária, exatamente pelo fato de ser desnecessária a
existência de lide para que a jurisdição possa ser considerada existente.” – Edward Carlyle
Silva.

5 – Poderes da Jurisdição:
São: poder de decisão, poder de coerção e poder de documentação.
6 – Princípios da Jurisdição:
“Princípio da Investidura: o juiz precisa estar investido de função jurisdicional para exercer a
jurisdição. Isso significa dizer que, a princípio, é exigência para o exercício da jurisdição a
aprovação em concurso de provas e títulos, tal como estabelece o art. 37, II da Constituição da
República. A doutrina afirma, no entanto, que de acordo com o art. 132 do CPC, no caso de o
juiz estar licenciado, afastado por qualquer motivo, aposentado ou convocado, ele não estará
mais investido de jurisdição, não podendo mais prestá-la. Nestes casos é incabível a aplicação
da teoria da aparência, uma vez que não existe investidura na jurisdição, o que impede que o
ato praticado por aquele sujeito possa implicar a produção de efeitos de qualquer ordem.” –
Edward Carlyle Silva.
“Princípio da aderência ao território: o juiz somente pode exercer a jurisdição dentro de um
determinado limite territorial previsto na lei. (..) A doutrina, entretanto, menciona como
exceções a esse limite: 1) o art. 107 do CPC – segundo o qual a competência do juiz prevento
prorroga-se para a parte do imóvel que esteja localizado em Estado ou comarca diversa. 2) o
art. 230 do CPC – o qual determina que os atos de citação podem ser realizados pelos oficiais
de justiça em comarcas contíguas, que não aquela da competência do juízo.” – Edward Carlyle
Silva.
“Princípio da Indelegabilidade: a atividade jurisdicional que é entregue aos juízes ou Tribunal
não pode ser delegada a outrem. A Jurisdição é indelegável. A doutrina, no entanto, usa como
exceção a possibilidade de o Tribunal expedir cartas de ordem para que juiz de 1º Grau cumpra
determinado ato. (...) Outra exceção por vezes mencionada é a possibilidade de o Colendo
Supremo Tribunal Federal delegar a prática de atos executivos de seus julgados, nos termos
do art. 102, inciso I, alínea “m” da Constituição da República. (...) Não pode ser entendida como
exceção ao princípio da indelegabilidade a expedição de carta precatória. Esta não implica
qualquer delegação ao juízo deprecado, na medida em que caracteriza a observância do
princípio da colaboração entre os órgãos jurisdicionais.” – Edward Carlyle Silva.
“O inciso XI do art. 93 da CF/88 autoriza a delegação da competência do Tribunal Pleno para
o órgão especial deste mesmo Tribunal. (...) O Tribunal Pleno compõe-se da totalidade dos
membros do tribunal, independentemente da antiguidade. Trata-se de delegação permitida pela
Constituição Federal, que “depende de ato dos delegantes, consubstanciado nas normas de
criação do órgão da sua competência. Matérias excluídas dessas normas só poderão ser
entregues ao órgão especial por delegação específica. (...) É preciso lembrar, ainda, a regra do
inciso XIV do art. 93 da CF/88, que expressamente permite a delegação, a serventuário de
justiça, do poder de praticar atos de administração e atos de mero expediente sem caráter
decisório. (...) Tanto atos jurisdicionais não decisórios quanto atos administrativos podem ser
delegados.” – Fredie Didier Júnior.
“Princípio da Indeclinabilidade: o juiz não pode se furtar a julgar a causa que lhe é
apresentada pelas partes. Trata-se da chamada proibição de o juiz proferir o non liquet, ou
seja, afirmar a impossibilidade de julgar a causa por inexistir dispositivo legal que regule a
matéria. Este princípio está previsto no ordenamento jurídico no art. 126, CPC. (...) A condição
de ação da possibilidade jurídica do pedido significa que o pedido não pode estar proibido pela
lei. Se não previsto na lei, ele, a princípio, é possível juridicamente, ou seja, tem que ser
julgado.” – Edward Carlyle Silva.
“Princípio do juiz natural: este princípio encontra sua base de fundamentação no art. 5º,
incisos XXXVII e LIII, ambos da Constituição da República. (...) Trata-se de verdadeira garantia
constitucional, na medida em que só podem exercer a jurisdição aqueles órgãos a quem a
Constituição atribui a função jurisdicional. (...) É interessante salientar que o princípio do juiz
natural deve ser compreendido sob dois aspectos: um formal ou objetivo; e outro denominado
material ou substancial. Quando ao aspecto formal ou objetivo, o princípio do juiz natural
identifica o juiz competente para o julgamento da causa com base em regras anteriores à sua
ocorrência. Tais regras devem ser abstratas, gerais e objetivas, de modo a impedir a possível
indicação de determinado juiz para o julgamento da causa. Note-se que sendo a definição do
juiz por critérios gerais, abstratos e genéricos, não há qualquer empecilho à criação de varas
especializadas, na medida em que não existe indicação de “determinado” juiz para o
julgamento da causa, mas sim de definição da competência de determinados juízos para o
julgamento de causas que envolvam matérias específicas. (...) Quanto ao aspecto material ou
substancial, o princípio do juiz natural diz respeito à imparcialidade da própria pessoa do juiz.
Não basta a preocupação com a existência de um órgão jurisdicional que esteja anteriormente
previsto como competente para o julgamento de determinada causa (aspecto formal); é
necessário, ainda, que o juiz que irá julgar a causa seja imparcial, independente, de modo a
evitar que por via oblíqua o princípio possa ser violado. (...)” Obs.: “O legislador implementou
alterações no CPC (Lei 11.280/06), em especial no art. 253 daquele estatuto, ampliando a
abrangência do dispositivo de modo a estabelecer como juiz natural aquele que tenha
extinguido, sem resolução do mérito e por qualquer motivo previsto no art. 267, o processo
anteriormente ajuizado pelo mesmo autor, que agora ingressa novamente em juízo, formulando
o mesmo pedido, sozinho, com outros litisconsortes e até alterando alguns dos réus da
demanda.” – Edward Carlyle Silva.
“Pelo princípio do juiz natural, proíbem-se, portanto, o poder de comissão (criação de juízos
extraordinários) e o poder de avocação (alteração das regras predeterminadas de
competência). (...) Não viola o princípio do juiz natural a criação de varas especializadas, as
regras de competência determinada pro prerrogativa de função, a instituição de Câmaras de
Férias em tribunais, porque em todas essas situações as regras são gerais, abstratas e
impessoais.” – Fredie Didier Júnior.
“Inevitabilidade – as partes hão de submeter-se ao quanto decidido pelo órgão jurisdicional.
Tratando-se da emanação do próprio poder estatal, impõe-se a jurisdição por si mesma. A
situação de ambas as partes perante o Estado-juiz (e particularmente a do réu) é de sujeição,
que independe de sua vontade e consiste na impossibilidade de evitar que sobre elas ou sobre
sua esfera de direitos se exerça a autoridade estatal.” – Fredie Didier Júnior.
“Prescreve o art. 5º, XXXV da Constituição Federal do Brasil: ‘a lei não excluirá da apreciação
do Poder Judiciário lesão ou ameaça de lesão a direito’. (...) Quando a Constituição fala de
exclusão de lesão ou ameaça de lesão do Poder Judiciário quer referir-se, na verdade, à
impossibilidade de exclusão de alegação de lesão ou ameaça, tendo em vista que o direito de
ação (provocar a atividade jurisdicional) não se vincula à efetiva procedência do quanto
alegado; ele existe independentemente da circunstância de ter o autor razão naquilo que
pleiteia; é direito abstrato. O direito de ação é o direito à decisão judicial tout court. Este
princípio não se dirige apenas ao Legislativo – impedido de suprimir ou restringir o direito à
apreciação jurisdicional -, mas também a todos quantos desejem assim proceder, pois, ‘se a lei
não pode, nenhum ato ou autoridade de menor hierarquia poderá’ excluir algo da apreciação
do Poder Judiciário. Ressalve-se a situação da arbitragem, na qual os próprios contendores
optam por retirar do Poder Judiciário o poder de solucionar os conflitos que advenham de
determinado negócio jurídico. (...) A única imposição de esgotamento de vias extrajudiciais é
em relação às questões desportivas. E só. Não se admite mais a chamada jurisdição
condicionada ou instância administrativa de curso forçado. (...) Com inclusão da tutela
jurisdicional da ameaça – inexistente na ordem jurídica anterior, constitucionalizou-se a tutela
preventiva, a tutela de urgência, a tutela contra o perigo, legitimando ainda mais a concessão
de provimentos antecipatórios e cautelares. A Constituição é clara ao prescrever a tutela
reparatória e a tutela preventiva. Interessante questão, que deriva desta inovação
constitucional, diz respeito às leis que proíbem ou limitam a concessão de medidas de urgência
- notadamente em face do Poder Público (Leis 4.348/64, 5.021/66, 8.437/92 e 9.494/97). No
julgamento da medida cautelar na ADIN 223-DF, o Supremo Tribunal Federal considerou
constitucionais tais restrições, o que não impede, contudo, que o magistrado, no caso concreto
que lhe for submetido, aprecie a constitucionalidade / razoabilidade da restrição. A lei que
restringe não é inconstitucional em tese, mas pode revelar-se com o vício supremo quando
concretizada.” – Fredie Didier Júnior.
“Surge, assim, a noção de tutela jurisdicional qualificada. Não basta a simples garantia formal
do dever do Estado de prestar a Justiça; é necessário adjetivar esta prestação estatal, que há
de ser rápida, efetiva e adequada. Esta última característica é a que aqui nos interessa:
atualmente, fala-se em tutela jurisdicional adequada. O princípio da inafastabilidade garante
uma tutela jurisdicional adequada à realidade da situação jurídico substancial que lhe é trazida
para solução. Ou seja, garante o procedimento, a espécie de cognição, a natureza do
provimento e os meios executórios adequados às peculiaridades da situação de direito
material. É de onde se extrai, também, a garantia do devido processo legal. E daí se retira o
princípio da adequação ao procedimento, que nada mais é do que um subproduto do princípio
da adequação da tutela jurisdicional.” – Fredie Didier Júnior.
“Escopos da jurisdição: Para Cândido Rangel Dinamarco, a jurisdição possui outros escopos
que não somente aquele já conhecido e que seria apenas o de natureza jurídica. Segundo ele
a jurisdição possui escopos de caráter social, político e jurídico. Escopos sociais: pacificar a
sociedade; realizar o bem comum; educar com justiça. Escopos políticos: garantia das
liberdades públicas (ou tutela das liberdades públicas) que dizem respeito aos direitos
fundamentais; afirmação do poder estatal; garantia do ideal de participação democrática.
Escopo jurídico: atuar a vontade concreta da lei.” – Edward Carlyle Silva.

“Espécies ou Classificação de Jurisdição: A – quanto ao tipo de pretensão: penal, trabalhista


e civil. B – quando ao grau: inferior (juízos de primeiro grau e competência originária dos
tribunais) e superior (de grau recursal). C – quanto ao órgão: especial – trabalhista, eleitoral e
militar – e comum – estadual e federal. D – quanto à submissão ao direito positivo: de equidade
e de direito. E – quanto à forma: contenciosa e voluntária.” – Edward Carlyle Silva.
“São julgadas de acordo com o CPC as lides civis, vale dizer, as não penais, não trabalhistas,
não eleitorais e não militares. No Brasil não existe jurisdição constitucional nem administrativa,
como em alguns países europeus. Na locução civil compreendem-se as questões relativas a
direito civil, comercial, da infância e juventude, previdenciário, consumidor, bem como a direito
constitucional, tributário e administrativo, todas elas julgadas pelo Poder Judiciário.” – Nelson
Ney Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery.

7 – Jurisdição Contenciosa e Jurisdição Voluntária:


“Jurisdição contenciosa é espécie de jurisdição através da qual o Estado procura dirimir um
conflito, um litígio que lhe é apresentado pelas partes. Há uma atividade substitutiva do Estado
com relação às partes. Na Jurisdição voluntária, ocorre a criação, a modificação ou a extinção
de uma relação jurídica que não é realizada através do juiz, mas sim com sua participação.
Isso porque o legislador estabeleceu e enumerou determinadas situações em que seria
indispensável para a produção dos efeitos desejados pelas partes que elas fossem realizadas
perante o Poder Judiciário. Assim sendo, algumas condutas que a princípio interessariam
somente às próprias partes passaram a ser consideradas tão importantes, bem como seus
efeitos externos passaram a importar em tamanha repercussão, que o legislador determinou
que elas somente poderiam acarretar a produção dos respectivos efeitos quando o ato fosse
realizado perante o Poder Judiciário, sob o crivo judicial. É por tal razão que a jurisdição
voluntária é chamada por muitos de “Administração Pública de Interesses Privados”. (...) Como
o juiz da causa não irá proferir julgamento, já que não há conflito, é comum a afirmação de que
tal espécie de jurisdição é inter volentes, ou seja, entre os que querem a produção de
determinados efeitos jurídicos, só obtidos com a participação do juiz. Diferente é a hipótese de
jurisdição contenciosa, que recebe o nome da doutrina de inter nolentes, ou seja, entre aqueles
que resistem.” – Edward Carlyle Silva.
“As características da jurisdição contenciosa são as seguintes: 1) há atividade jurisdicional, e
sendo assim, ela é substitutiva; 2) seu escopo é atuar a vontade concreta da lei; 3) tem partes
na relação (autor é réu), já que ela é inter nolentes; 4) a decisão final faz coisa julgada.” –
Edward Carlyle Silva.
“Características da Jurisdição Voluntária: 1ª Corrente:teoria administrativa ou tradicional. As
características da jurisdição voluntária para essa teoria, que é a majoritária, são: 1) é uma
atividade administrativa, porque o juiz não está proferindo julgamento de mérito algum, daí ela
não ser substitutiva; 2) sua finalidade é a criação, modificação ou extinção de uma relação
jurídica, ou seja, uma finalidade de caráter constitutiva e não-declaratória, uma vez que não
atua a vontade concreta da lei naquele caso; 3) por tratar-se de atividade onde, a princípio, não
haveria resistência, também não se poderia falar em existência de partes, mas sim de
requerentes ou interessados; 4) como não há julgamento de mérito ao final da causa, não se
pode falar em atuação da lei ao caso concreto, e, conseqüentemente, como não há sentença
de mérito, também não haveria a possibilidade de formação da coisa julgada. 2ª Corrente:
teoria revisionista, jurisdicional ou jurisdicionalista. É mais recente, defende a natureza
jurisdicional da atividade realizada na jurisdição voluntária. De acordo com essa corrente, a
jurisdição voluntária é espécie de jurisdição, contra-atacando a primeira teoria com os
seguintes argumentos: 1) o art. 1º do CPC diz que a jurisdição voluntária é espécie de
jurisdição civil, juntamente com a jurisdição contenciosa, não podendo a doutrina afirmar
exatamente o contrário quando a lei é expressa a esse respeito; 2) a jurisdição voluntária é o
exercício do direito de ação, tal como na jurisdição contenciosa. Significa que, em ambos os
casos, é o exercício da ação que inicia a atividade jurisdicional; 3) a primeira teoria diz que não
se pode falar em partes, mas esse conceito de partes é muito restrito. Na jurisdição voluntária
há autor, o que não pode existir é réu. Há parte, o que não pode existir é contra-parte. É
necessária a existência do autor, para que se possa provocar o exercício da jurisdição; 4) para
a primeira teoria, a decisão não faz coisa julgada, com base no art. 1.111 do CPC, ou seja, se a
sentença pode ser modificada, não fez coisa julgada. A segunda teoria afirma que devemos
nos ater ao final do artigo. As circunstâncias supervenientes devem dizer respeito à nova causa
de pedir. Significa dizer que, proposta uma demanda com base em circunstâncias
supervenientes, ou seja, posteriores àquela causa de pedir que fora utilizada na primeira
demanda, a sentença poderá ser modificada com base nesta nova “causa de pedir”, não
havendo coisa julgada. É uma nova demanda. A contrario sensu, se essa nova demanda
possuir como base as mesmas circunstâncias (mesma causa de pedir), a sentença não poderá
ser modificada, ou, melhor dizendo, terá ocorrido coisa julgada material, sendo inviável a
modificação da sentença. Então, para a segunda teoria, a sentença na jurisdição voluntária faz
coisa julgada porque só vai poder ser alterada com nova demanda (respaldada em nova causa
de pedir).” – Edward Carlyle Silva.
“A jurisdição voluntária não é jurisdição pura porque o juiz não diz o direito substituindo a
vontade das partes, mas pratica atividade integrativa do negócio jurídico privado administrado
pelo Poder Judiciário. Esse negócio jurídico privado não terá validade se não for integrado pelo
juiz, donde é lícito concluir não ser voluntária essa ‘jurisdição’, mas sim forçada. Nela não há
processo, mas procedimento; não há lide, mas controvérsia; não há partes, mais interessados;
não incide o princípio dispositivo, mas o inquisitório; não há legalidade estrita, pois pode o juiz
decidir por equidade (art. 1.109, CPC).” - Nelson Ney Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery.
“À jurisdição voluntária aplicam-se as garantias fundamentais do processo, necessárias à
sobrevivência do Estado de Direito, bem como todas as garantias da magistratura,
asseguradas constitucionalmente. Em relação aos poderes processuais do magistrado, a
doutrina aponta duas características da jurisdição voluntária: inquisitoriedade – doutrinadores
defendem que vige, nos procedimentos de jurisdição voluntária o princípio inquisitivo, podendo
o juiz tomar decisões contra a vontade dos interessados. O magistrado, em inúmeras
situações, tem a iniciativa do procedimento: arts. 1.129, 1.142, 1.171 e 1.190, CPC. Nelson
Nery Júnior critica a nossa legislação, no particular, pois, segundo ele, é o único sistema do
mundo em que os procedimentos de jurisdição voluntária começam, em regra, por iniciativa dos
interessados; possibilidade de decisão fundada em equidade – ainda de acordo com a idéia
de inquisitoriedade, permite-se (art. 1.109, CPC) ao juiz não observar a legalidade estrita na
apreciação do pedido, facultando-lhe o juízo por equidade, que se funda em critérios de
conveniência e oportunidade. O juízo de equidade é excepcional, somente se poderá dele valer
o juiz quando expressamente por lei autorizado (art. 127, CPC). Não se trata, porém, de juízo
de equidade acima da lei. Permite-se, em vários casos, que o magistrado profira juízo
discricionário, que deve, porém, respeitar o princípio da proporcionalidade.” – Fredie Didier
Júnior.
“Em todo procedimento de jurisdição voluntária, por força do art. 1.105, CPC, o Ministério
Público deveria ser intimado. O legislador se utiliza da expressão ‘citação’, unanimemente
considerada pela doutrina como imprópria, pois seria o caso de intimação. Há certa
controvérsia na doutrina quanto à aplicabilidade genérica deste instituto: entende-se que o
Ministério Público somente deve intervir, em procedimento de jurisdição voluntária, se nele
houver discussão sobre direito indisponível. Segundo levantamento feito por Antônio Cláudio
da Costa Machado, apenas nos procedimentos de alienação, locação e administração de coisa
comum e alienação de quinhão em coisa comum não se encontra o caráter da indisponibilidade
dos direitos. Nestes casos, sustenta que o MP não deve intervir, pois não é de seu mister a
fiscalização de direitos disponíveis. Nelson Nery Jr. defende, no entando, a aplicação irrestrita
do dispositivo. O STJ tem entendido com Antônio Cláudio. Há quem entenda que a intervenção
do Ministério Público, em tais casos, só ocorreria quando houvesse uma conjugação entre o
art. 1.105 e o art. 82 do CPC. Essa última posição é a que prevalece.” – Fredie Didier Júnior.
“Classificação dos procedimentos de jurisdição voluntária de Leonardo Greco: A) Receptícios:
a atividade judicial limita-se a registrar, documentar ou comunicar manifestações de vontade.
Ex.: notificações, interpelações e protestos. B) Probatórios: a atividade judicial limita-se à
produção da prova. Ex.: justificação. Há controvérsia sobre a produção antecipada de prova, se
voluntária ou contenciosa. Greco entende que dependerá do processo principal a que sirva. C)
Declaratórios: o magistrado limita-se a declarar a existência ou inexistência de uma situação
jurídica, como nos casos de extinção de usufruto (art. 1.112, VI, CPC), da posse em nome do
nascituro (arts. 877-878, CPC), na confirmação do testamento particular (arts. 1.130-1.133,
CPC). D) Constitutivos: são aqueles em que a criação, modificação ou extinção de uma
situação jurídica dependem da concorrência da vontade do juiz, por meio de autorizações,
homologações, aprovações, etc. E) Executórios: o juiz é demandado a exercer uma atividade
prática que modifica o mundo exterior. Exs.: alienação de coisas (arts. 1.112, I, IV e V, 1.113-
1.119, CPC; administração de coisa comum (art. 1.112, IV, CPC); arrecadação da herança
jacente (arts. 1.142 - 1.158, CPC); arrecadação dos bens dos ausentes (arts. 1.159 – 1.169,
CPC); coisas vagas (arts. 1.170 – 1.176, CPC). F) Tutelares: são aqueles em que a proteção
de interesses de determinadas pessoas que se encontram em situação de desamparo, como
os incapazes, é confiada diretamente ao Poder Judiciário, que pode instaurar os procedimentos
ex officio. Exs.: nomeação ou remoção de tutores / curadores (arts. 1.187 – 1.198 do CPC);
exibição de testamento (art. 1.129, CPC); procedimentos do ECA.” – Fredie Didier Júnior.

8 – Equivalentes Jurisdicionais:
“A solução dos conflitos intersubjetivos pode ser classificada de acordo com a titularidade
para decidi-los. Caso essa titularidade seja atribuída às próprias partes, estaremos diante da
autonomia. Já se a titularidade for atribuída a terceiro, estaremos diante da heteronomia.
Diante disso, os equivalentes jurisdicionais ou substitutivos da jurisdição são formas de solução
de conflitos sociais sem que haja a participação do Estado-Juiz. Assim como é verdade que o
Estado é soberano e que o exercício da jurisdição é uma das manifestações desse poder,
também é verdade que as próprias partes podem solucionar suas desavenças sem a
indispensável participação estatal. Nesses casos, estamos diante do que a doutrina denomina
de equivalentes jurisdicionais. São formas de solução de conflitos que acarretam o mesmo
resultado prático que o exercício da jurisdição, muito embora não sejam realizadas pelo
Estado.” – Edward Carlyle Silva.
“A autotutela é a solução do conflito através do emprego de meios próprios. (...) Ela é
normalmente caracterizada pelo exercício de ação direta de uma das partes sobre a outra, o
que acaba por torná-la inaceitável para grande parte dos ordenamentos jurídicos. (...) A
autotutela é prevista como crime no Código Penal sob o nomen iuris de exercício arbitrário das
próprias razões caso o autor seja um particular, e abuso de poder (Lei 4.898/65), no caso de o
autor ser autoridade pública. Apesar disso, em algumas hipóteses expressamente previstas na
lei, o legislador entendeu por bem permitir a utilização de autotutela. São situações específicas
em que o ordenamento permite a utilização da própria força para a defesa do direito lesado ou
ameaçado de lesão. São os casos de legítima defesa, desforço imediato, direito de retenção,
direito de greve, etc. A autocomposição é uma forma de solução do conflito por meio da qual
uma das partes aceita abrir mão de parcela ou de todo o seu interesse em favor da parte
contrária. É por tal razão que a autocomposição é considerada uma forma de solução de
conflitos que é o gênero, e da qual podem ser identificadas como espécies a transação, a
submissão e a renúncia. A transação pressupõe uma concessão recíproca entre as partes. A
submissão é a aquiescência de um ao direito postulado pelo outro. Equipara-se, por assim
dizer, ao reconhecimento do pedido no âmbito judicial. A renúncia ocorre quando o autor
reconhece que não possui alegado direito, razão pela qual abre mão daquele interesse,
renunciando ao mesmo. Mediação – nesta espécie de método para a solução de conflitos, um
terceiro que não está incluído dentre as autoridades investidas do poder estatal para exercer a
jurisdição é colocado entre as partes, para tentar levá-las a uma solução de consenso. Esse
terceiro seria um profissional preparado para realizar a aproximação das partes adversárias, de
modo a possibilitar uma solução de comum acordo. O mediador não traz as hipóteses de
solução do conflito, mas cria um ambiente favorável às partes. A arbitragem é uma técnica
utilizada para solução de conflitos que utiliza o auxílio de um terceiro, escolhido de comum
acordo entre as partes, para que este decida de modo “imparcial” o eventual conflito existente.
Não é forma obrigatória, mas sim facultativa de composição de litígios. (...) A arbitragem é
regulamentada pela Lei 9.307/96. As principais características da arbitragem são expostas com
clareza por Fredie Didier Jr., o qual faz inclusive menção ao fato de que ela não é propriamente
um equivalente jurisdicional, mas verdadeiro caso de jurisdição, uma vez que a decisão nela
proferida não pode ser revogada ou modificada pelo Poder Judiciário, mas apenas anulada
com base em vícios formais. Segundo ele, são características da arbitragem: 1) há a
possibilidade de escolha da norma de direito material a ser aplicada (art. 2º, §§2º e 3º, L. arb.);
2) árbitro (art. 13, L. arb.); 3) desnecessidade de homologação judicial da sentença arbitral (art.
31, L. arb.), que produz efeitos imediatos; 4) a sentença arbitral é titulo executivo judicial (art.
13, L. arb.; art. 584, VI, CPC) – o árbitro pode decidir, mas não tem poder para tomar nenhuma
providência executiva; também não é possível a concessão de provimentos de urgência, que
exigem atividade executiva para serem implementados (art. 22, § 4º, L. arb.); e possibilidade de
reconhecimento e execução das sentenças arbitrais produzidas no exterior (art. 34 e segs. L.
arb.).” – Edward Carlyle Silva.
“A arbitragem, no Brasil, é regulamentada pela Lei Federal 9.037/96. Pode ser constituída por
meio de um negócio jurídico denominado convenção de arbitragem que, na forma do art. 3º da
Lei 9.307/96, compreende tanto a cláusula compromissória como o compromisso arbitral.
Cláusula compromissória é a convenção em que as partes resolvem que as divergências
oriundas de certo negócio jurídico serão resolvidas pela arbitragem, prévia e abstratamente; as
partes, antes do litígio ocorrer, determinam que, ocorrendo, a sua solução, qualquer que seja
ele, desde que decorra de certo negócio jurídico, dar-se-á pela arbitragem. Compromisso
arbitral é o acordo de vontades para submeter uma controvérsia concreta, já existente, ao juízo
arbitral, prescindindo do Poder Judiciário. Trata-se, pois, de um contrato, por meio do qual se
renuncia à atividade jurisdicional, relativamente a uma controvérsia específica e não
simplesmente especificável. Para efetivar a cláusula compromissória, é necessário que se faça
um compromisso arbitral, que regulará o processo arbitral para a solução do conflito que surgiu.
(...) Há possibilidade de controle judicial da sentença arbitral, mas apenas em relação à sua
validade (art. 32 e 33, caput, L.Arb.). Não se trata de revogar ou modificar sentença arbitral
quanto ao seu mérito, por entendê-la injusta ou por errônea apreciação da prova pelos árbitros,
senão de pedir sua anulação por vícios formais. É por conta desta circunstância que se diz que
a arbitragem, no Brasil, não é equivalente jurisdicional: é propriamente jurisdição, sem qualquer
diferença, a não ser que é privada e o juiz é escolhido pelos litigantes.” – Fredie Didier Júnior.

9 – Limite da Jurisdição:
“Os juízes e tribunais exercem a atividade jurisdicional apenas no território nacional (princípio
da aderência). Dentro do Brasil essa atividade é repartida entre os juízes, de acordo com as
regras de determinação de competência. A denominada competência internacional (art. 88 e
89, CPC) é, na verdade, jurisdição, pois se o juiz brasileiro não tem jurisdição não pode ter
competência, que é daquela derivada.” - Nelson Ney Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery.
“Quem dita os limites internacionais da jurisdição de cada Estado são as normas internas
desse mesmo Estado. Contudo, o legislador não leva muito longe a jurisdição de seu país,
tendo em conta principalmente duas ponderações ditadas pela experiência e pela necessidade
de coexistência com outros Estados soberanos: A) a conveniência (excluem-se os conflitos
irrelevantes para o Estado, porque o que lhe interessa, afinal, é a pacificação no seio da sua
própria convivência social); B) a viabilidade (excluem-se os casos em que não será possível a
imposição autoritativa do cumprimento da sentença). A doutrina, sintetizando os motivos que
levam à observância dessas regras, alinha-os assim: a existência de outros Estados
soberanos; respeito a convenções internacionais; razões de interesse do próprio Estado. Fala-
se também nos princípios da submissão e da efetividade, que condicionam a competência
internacional de cada Estado. Assim, em princípio cada Estado tem poder jurisdicional nos
limites de seu território: pertencem à sua autoridade judiciária as causas que ali tenham sede.
No direito brasileiro, os conflitos civis consideram-se ligados ao território nacional quando: A) o
réu tiver domicílio no Brasil; B) versar a pretensão do autor sobre obrigação a ser cumprida no
Brasil; C) originar-se de fato aqui ocorrido; D) for objeto da pretensão um imóvel situado no
Brasil; E) situarem-se no Brasil os bens que constituam objeto de inventário (arts. 88 e 89,
CPC).” – Ada Pellegrini Grinôver, Cândido Rangel Dinamarco e Antonio Carlos de Araújo
Cintra.
“Por respeito à soberania de outros Estados, tem sido geralmente estabelecido, em direito
das gentes, que são imunes à jurisdição de um país: a) os Estados estrangeiros (par in parem
non habet judicium); b) os chefes de Estados estrangeiros; c) os agentes diplomáticos. (...)
Cessa a imunidade, nos termos das regras de direito das gentes: a) quando há renúncia válida
a ela; b) quando o seu beneficiário é autor; c) quando se trata de demanda fundada em direito
real sobre imóvel situado no país; d) quando se trata de ação referente à profissão liberal ou
atividade comercial do agente diplomático; e) quando o agente é nacional do país em que é
acreditado.” – Ada Pellegrini Grinôver, Cândido Rangel Dinamarco e Antonio Carlos de Araújo
Cintra.

AÇÃO:
1. – Conceito:
“Ação como Direito Cívico – É aquela ação prevista no art. 5º, inciso XXXV da CR. É a
palavra ‘ação’ sendo utilizada como direito inerente à pessoa humana, o qual está vinculado ao
direito de personalidade. Qualquer um pode exercer o direito de ação, esteja certo ou errado,
porque a Constituição da República, no dispositivo mencionado, assegura esse direito. A
palavra ‘ação’ nesse sentido tem concepção mais constitucional do que processual.” – Edward
Carlyle Silva.
“Ação como Direito a um Processo Justo e Équo - É uma interpretação do direito de ação
muito atual, baseada na concepção de um processo em que devem ser observadas as
garantias do contraditório, da ampla defesa, da possibilidade de produção de provas, etc.
Trata-se, a bem dizer, da garantia de um processo no qual todos os requisitos de existência e
desenvolvimento do processo sejam devidamente observados, para que tanto autor como o réu
tenham oportunidade de se manifestar no curso do processo, com o objetivo de apresentar
todas as alegações e provas que possam auxiliar o juiz na formação do seu convencimento
com vistas a um julgamento favorável do pedido. (...) É preciso afastar a idéia tradicional de
processo civil com base apenas no ponto de vista do autor da demanda e permitir que
autor e réu sejam tratados de forma equânime, em relação de paridade, concedendo-lhes os
mesmos direitos, deveres, ônus, sujeições e faculdades. O processo civil não é visto mais sob
o ponto de vista do autor. Autor e réu têm os mesmos direitos de proteção do Estado.” –
Edward Carlyle Silva.
“Ação como Direito à Jurisdição – Ocorre que, para prestar a jurisdição (que em regra é
inerte), o Estado precisa ser provocado. Esta provocação é feita pelo exercício do direito de
ação. Instado a prestar a atividade jurisdicional, o Estado precisa de um instrumento para
deixar assentada sua decisão em relação àquele caso concreto, tornando-a pública: o
instrumento através do qual o Estado torna pública sua decisão para aquele conflito é o
processo. A palavra ‘ação’ é utilizada, portanto, no sentido de meio de provocar o Estado para
exercer a atividade jurisdicional. Neste sentido, a palavra em questão possui natureza mais
processual do que constitucional, o que implica a impossibilidade de confundir ação como
direito cívico com ação como direito à jurisdição. Enquanto naquela hipótese qualquer pessoa,
possuindo ou não direito, pode se dirigir ao Poder Judiciário, nesta última a prestação da
atividade jurisdicional está diretamente vinculada à presença ou não dos requisitos necessários
(pressupostos processuais e condições da ação) ao exame do mérito da causa. Isto significa
que existe uma diferença entre prestação jurisdicional ou atividade jurisdicional e o termo ‘tutela
jurisdicional’. Na prestação ou atividade jurisdicional, qualquer pessoa pode pleitear, esteja ela
certa ou não, ou seja, independe de ter ou não razão. Já o termo ‘tutela jurisdicional’ é oriundo
do latim tutere, que significa tutela, proteção. Diante disso, somente tem direito à tutela
jurisdicional quem efetivamente possui razão.” – Edward Carlyle Silva.
“Ação como Demanda – A demanda é a materialização do direito de ação. O correto não é
propor, suspender ou cumular ações, mas sim propor, suspender ou cumular demandas.
Sempre que a palavra ação for utilizada no sentido de ‘exercício concreto do direito de ação’,
ou seja, materializado, na verdade estamos falando de demanda. A ação é abstrata, a
demanda é concreta.” – Edward Carlyle Silva.
“Ação de Direito Material – É a ação que o próprio credor irá realizar para obter o
cumprimento da obrigação. São atos materiais realizados pelo próprio credor, pela própria
pessoa, para obter aquilo que o devedor voluntariamente não cumpriu. O credor pessoalmente,
com suas próprias forças, ingressa no patrimônio do devedor, retira o bem necessário à
satisfação de seu direito, e com isso obtém o pagamento da dívida. Assim, ele irá praticar atos
de direito material, concretos para satisfação do seu direito. (...) O Estado proíbe a autotutela
(mas há exceções legalmente previstas como o desforço pessoal e o direito de retenção). Tal
fato levou alguns doutrinadores à conclusão de que a ação de direito material teria sido banida
do ordenamento jurídico. Para os defensores desta teoria, no momento em que o Estado
proíbe a autotutela, o titular do direito violado pode se dirigir a ele (Estado) através do exercício
do direito de ação (processual) e pleitear a prestação jurisdicional. Diante disso, não se pode
afirmar que a ação de direito material desapareceu, uma vez que determinadas situações
permitem a atuação do próprio titular do direito na defesa de seus interesses, mas ela teria
ficado esvaziada pela possibilidade de ajuizamento da ação processual. Há outra corrente,
entretanto, que sustenta a permanência da ação de direito material no ordenamento jurídico,
mas no sentido de que ela teria sido atribuída ao próprio Estado quando da realização de atos
de execução em face do patrimônio do devedor.” – Edward Carlyle Silva.
“A ação processual possui um conteúdo, que se constitui naquela obrigação no plano do
direito material e que agora faz parte do próprio processo. Essa pretensão recebe a
denominação de pretensão processual, uma vez que formalizada dentro do processo.
Normalmente, o que não quer dizer sempre, a pretensão de direito material e a pretensão
processual tratam da mesma pretensão, embora em momentos distintos. (...) Resumindo: como
não posso exercer a autotutela, não posso exercer na prática minha ação de direito material.
Isto significaria uma divergência doutrinária: 1ª Corrente – a ação de direito material estaria
extinta, salvo nas hipóteses em que o próprio ordenamento permite sua realização, como nos
casos de desforço imediato, direito de retenção, etc. Defendida por Guilherme Rizzo Amaral,
Gabriel Pintaúde e Carlos Alberto Álvaro de Oliveira; 2ª Corrente – a ação de direito material
existiria ‘através’ da ação processual, na medida em que seria caracterizada pela atuação do
Estado na realização de atos executórios. Parece ser a posição de Ovídio Baptista da Silva e
Daniel Francisco Mitidiero. A pretensão processual é o conteúdo da ação processual. Em regra,
ela equivale à pretensão de direito material. Existem casos, entretanto, em que elas não
representam a mesma coisa, isso porque uma diz respeito ao plano do direito material e outra
ao plano processual. Além disso, outra diferença pode ser verificada quando, por exemplo,
você tem o direito de cobrar R$ 100,00 (pretensão de direito material), mas pode cobrar R$
100,00 ou menos (pretensão processual). A pretensão processual pode ser inferior ao direito
material que a pessoa possui. Fato é que o autor não tem direito a receber mais do que a
pretensão de direito material lhe possibilita pedir em juízo (a pretensão de direito processual é
limitada pela de direito material).” – Edward Carlyle Silva.

2. – Teorias acerca do Direito de Ação:


“Teoria Civilista ou Imanentista – O direito de ação estava intimamente vinculado ao direito
material, era o próprio direito material reagindo a uma violação e não era independente do
direito material. (...) Esta teoria vigorou por algum tempo, até uma disputa doutrinária entre dois
alemães (Windscheid e Müther), professores de direito civil, que começaram uma desavença
em torno do conceito de ‘actio’ no direito romano e de suas implicações no conceito de ação no
direito alemão. Dessa desavença surgiu um importante aspecto para o direito processual: o
direito de ação ficou desvinculado do direito material, sendo aquele independente deste.” –
Edward Carlyle Silva.
“Teoria Concreta do Direito de Ação – Defendida por Adolf Wach, este teoria parte da
premissa de que o direito de ação é independente do direito material, mas só possui o direito
de ação quem possui o direito material. Daí sua natureza ‘concreta’. Se somente quem tem
direito de ação é aquele sujeito que também possui o direito material, isso acaba por vincular o
direito de ação à existência do direito material. Com isso, para os adeptos desta teoria, a
sentença sempre deveria ser de procedência do pedido. Se não fosse de procedência,
significaria que o autor não tinha direito de ação desde o início.” – Edward Carlyle Silva.
“Teoria Abstrata do Direito de Ação – Para os adeptos dessa teoria, o direito de ação
existe mesmo havendo sentença de improcedência. Numa ação declaratória negativa, por
exemplo, a teoria concreta não funcionaria, já que nesta ação pede-se exatamente que seja
declarada a não-existência do direito material (que não há relação jurídica. Devido a isso, a
teoria concretista começou a enfraquecer, mas contra-argumentando que os defensores da
teoria abstrata não se importavam com o fato de o autor estar de boa ou má-fé quando
ajuizava a demanda, mesmo sabendo que perderia desde o início. Para a teoria concreta os
abstrativistas pecavam por tratar todos os autores de forma idêntica. Já para a teoria abstrata,
o exercício do direito de ação é inerente a todos os indivíduos; é um direito próprio da
personalidade da pessoa, esteja ela certa ou errada. Pode ser que não exista direito à tutela, à
proteção estatal, ou seja, que não haja sentença de procedência, mas o direito de ação foi
exercido. Aquela sentença proferida pelo Estado seria direta conseqüência do exercício do
direito de ação. Então, o exercício do direito de ação propiciava uma sentença de qualquer
natureza, com ou sem resolução do mérito.” – Edward Carlyle Silva.
“Essa teoria possui natureza de teoria concreta e seu principal defensor é Chiovenda. Para
ele, o direito de ação é potestativo na medida em que o réu estava subordinado à vontade do
autor em exercer o direito de ação. Como o réu não poderia apresentar qualquer obstáculo ao
exercício do direito de ação por parte do autor, este direito seria potestativo. Mas tal como na
teoria concreta, só teria direito de ação quem possuísse o direito material, ou seja, quem
tivesse direito a uma sentença de procedência do pedido.” – Edward Carlyle Silva.
“Teoria Eclética – Originariamente, o exame do processo pelo juiz se dividia
basicamente em dois momentos: um primeiro momento em que ele examinaria os
pressupostos processuais; e um segundo momento, após a instrução da causa, em que
da prolação da sentença, onde seriam verificados os pressupostos da ação (estas
abrangiam a legitimidade, o interesse de agir e o mérito. Liebman manteve os
pressupostos processuais e trouxe o exame da legitimidade e do interesse para um
momento anterior ao da sentença, atribuindo-lhes o nome de condições da ação e ainda
acrescentou a estas duas condições uma terceira, que denominou de possibilidade
jurídica do pedido, deixando para a sentença a ser prolatada ao final da instrução o
exame simplesmente do mérito (stricto senso) da causa. Diante disso, é possível afirmar
que ele não criou as condições da ação, mas sim antecipou seu exame no curso do
processo. De acordo com sua teoria, para se chegar ao exame do mérito da causa, é
necessário examinar primeiramente os pressupostos processuais, e depois as
condições da ação. Para Liebman, portanto, somente possui direito de ação quem
cumpre as condições da ação e, conseqüentemente, tem direito a uma sentença de
mérito, ou seja, um sentença que examina a relação jurídica de direito material. A
sentença pode ser de procedência ou de improcedência, mas é de mérito, uma vez que
ultrapassada a fase de exame dos pressupostos processuais e das condições da ação,
resta apenas o mérito para julgamento. E no caso de sentença terminativa, por carência
de ação (falta de condições da ação), em que não houve processo, o que existiu até esse
momento? Para Liebman, não houve direito de ação, houve atividade administrativa.
Para os defensores dessa teoria o que existiu até aqui foi o direito de petição. A teoria
eclética, embora sujeita a críticas, é adotada pelo Código, como dispõe o art. 267, inciso
VI do CPC. Indispensável lembrar, contudo, que ela possui natureza abstrata.” – Edward
Carlyle Silva.

3. – Condições da Ação:
“Alexandre Câmara prefere o termo ‘requisitos do provimento final’, José Carlos Barbosa
Moreira denomina de condições para o regular exercício do direito de ação, porque para ele, se
uma das condições não estiver presente, não é hipótese de ausência de direito de ação (plano
da existência), mas sim de abuso do direito de ação (plano da validade).” – Edward Carlyle
Silva

“Legitimidade: Há quem adote em termos de legitimidade o ensinamento de Chiovenda,


segundo o qual a legitimidade existiria quando a demanda fosse proposta pelo titular da
relação jurídica de direito material (autor) em face do titular da obrigação (réu). Chiovenda,
entretanto, era adepto da teoria potestativa do direito de ação, de natureza concreta. Diante
disso, a sentença seria sempre de procedência, desde que presente o direito material da parte
autora. (...) Para Liebman, legitimidade é a pertinência subjetiva da lide, o que significa que
devem estar presentes na relação jurídica processual aquelas partes necessárias para o
julgamento do mérito da causa.
A questão da titularidade do direito material fica em segundo plano, pois partes necessárias
são apenas aquelas que possibilitam o julgamento do mérito da causa.
Daí surgir a diferença entre legitimidade ad causam e legitimidade ad processum.
Legitimidade ad causam – é a legitimidade para aquela causa específica que será examinada
pelo juiz. Para saber se a parte realmente pode pleitear a tutela jurisdicional em relação a
determinado direito, será necessário verificar o conteúdo da própria relação de direito material.
É na relação jurídica de direito material que será possível constatar o vínculo do autor e do réu
com o alegado direito, a fim de se definir pela procedência ou improcedência do pedido. Como
esse vínculo é aferido pela relação jurídica de direito material, é nela que a questão da
legitimidade para a causa deverá ser constatada. Diante disso, a legitimidade ad causam é
verdadeira condição da ação.
Legitimidade ad processum – é a legitimidade para figurar em qualquer processo, ou seja, para
estar em juízo. Em regra, todas as pessoas físicas, jurídicas e formais possuem capacidade
para estar em juízo, desde que não precisem de assistência ou representação, como é o caso
dos menores, dos portadores de deficiência mental, daqueles que por causa transitória não
puderem exprimir sua vontade, etc. (arts. 3º e 4º, do NCC). (...)

Outra classificação importante é a que distingue a legitimidade ordinária da legitimidade


extraordinária:

Legitimidade Ordinária – ocorre quando alguém, em nome próprio, defende interesse próprio.
Pode ser considerada a regra no ordenamento jurídico;
Legitimidade Extraordinária – (art. 6º, CPC) ocorre quando alguém, em nome próprio, defende
interesse alheio. Não é representação, uma vez que ele defende em nome próprio, e não em
nome de outrem, aquele direito. Um exemplo é o caso em que o Ministério Público propõe uma
ação de investigação de paternidade. O MP não é titular do direito, nem pode ser considerado
como representante do menor, mas a lei atribui a ele a legitimação extraordinária para
ingressar com a demanda. (...) Legitimação extraordinária é sempre prevista em lei. (...)
Tema controvertido é o que trata da legitimidade extraordinária e da substituição processual
ensejando o aparecimento de entendimentos como:
1ª corrente: para os adeptos dessa corrente, a legitimidade extraordinária e a substituição
processual são tratadas como sinônimas;
2ª corrente: defendida por José Carlos Barbosa Moreira. Para ele a legitimidade extraordinária
pode ser de dois tipos: subordinada e autônoma. A subordinada é aquela que ‘... não habilita
o respectivo titular nem a demandar nem a ser demandado quanto à situação litigiosa, mas
unicamente a deduzi-la, ativa ou passivamente, junto com o legitimado ordinário, em processo
já instaurado por este ou em face deste, e no qual aquele se limita a intervir.’ Já a legitimidade
extraordinária autônoma é aquele em que se ‘... confere ao respectivo titular a possibilidade
de atuar em juízo com total independência em relação à pessoa que ordinariamente seria
legitimada’. Ele ainda divide a legitimação autônoma em exclusiva e concorrente. Legitimidade
extraordinária autônoma exclusiva: ocorre quando é atribuída a uma pessoa, em virtude de
lei e com exclusividade, ‘a posição processual que ordinariamente pertenceria ao titular da
situação litigiosa’. Legitimidade extraordinária autônoma concorrente: ocorre quando ‘a
legitimação extraordinária não cancela a legitimação ordinária do titular da situação jurídica
litigiosa, nem lhe produz o rebaixamento de nível (...). Tão somente concorre com ela, tornando
indiferente para a verificação da regularidade do contraditório que no processo figure apenas o
legitimado extraordinário, apenas o ordinário, ou ambos’. Para o professor José Carlos Barbosa
Moreira, a substituição ocorre na legitimação extraordinária autônoma exclusiva. O exemplo
dado por ele é o caso do marido na defesa dos bens dotais da mulher, o que aliás, não existe
mais no novo CC.” – Edward Carlyle Silva.

“Possibilidade Jurídica do Pedido: para autores como Liebman e José Eduardo Carreira
Alvim, possibilidade jurídica do pedido significa a admissibilidade em tese do pedido formulado.
É importante salientar que é possível a existência de pedido que não encontra previsão legal: a
impossibilidade jurídica significa que o pedido é proibido pela lei. Em contrapartida, não
havendo qualquer previsão, o pedido, em tese, é juridicamente possível, até mesmo por força
do princípio da indeclinabilidade ou inafastabilidade da jurisdição. Liebman criou a possibilidade
jurídica do pedido, mas a partir da 3ª edição de seu manual, ele a abandonou, salientando que
tal problema poderia ser solucionado através do interesse de agir. Mas no Brasil estas duas
condições não se confundem.” – Edward Carlyle Silva.

“Interesse de Agir: a questão atinente ao interesse de agir, apesar de possuir cunho


nitidamente teórico, é motivo de imensa divergência na doutrina e na jurisprudência. Isso
porque é possível identificar a existência de três correntes sobre o assunto, que procuram
esclarecer quais os elementos que caracterizam a existência do interesse de agir pela parte.
1ª Corrente: para os adeptos desta corrente, o interesse deve ser analisado sob o prisma da
necessidade e da utilidade do provimento jurisdicional. Defendem essa posição Nelson Nery
Júnior, José Carlos Barbosa Moreira, Luiz Fux e Luiz Rodrigues Wambier.
2ª Corrente: para os adeptos da segunda corrente, o interesse deve ser verificado sob o
prisma da necessidade e da adequação. São adeptos desta corrente Alexandre Câmara,
Cândido Rangel Dinamarco e Luiz Guilherme Marinoni.
3ª Corrente: existe ainda uma 3ª corrente, que defende o entendimento segundo o qual o
interesse de agir deve ser analisado pelas três perspectivas anteriormente mencionadas, ou
seja, para essa corrente o interesse deveria ser analisado com base na necessidade, na
utilidade e na adequação. Defendem esse pensamento Leonardo José Carneiro da Cunha e
Humberto Theodoro Júnior. Interesse-necessidade: é aquela parcela do interesse
caracterizado exatamente pela necessidade do provimento jurisdicional, ou seja, quando não
há outro meio para obter a proteção do suposto direito senão através da atividade jurisdicional.
Interesse-adequação: é aquele aspecto do interesse caracterizado pela necessidade de
pleitear a atividade jurisdicional utilizando a forma adequada. Do contrário, ocorreria falta de
interesse de agir. Interesse-utilidade: outros autores preferem a utilização do termo interesse-
utilidade, uma vez que, segundo eles, o interesse pode ser aferido pela possibilidade de se
obter através da prestação jurisdicional, um resultado mais favorável, mais vantajoso, mais útil,
do que aquele originariamente obtido. A utilidade da medida será aferida pela possibilidade de
se conceder ao interessado um resultado mais vantajoso do que aquele que o mesmo já
possui. – Edward Carlyle Silva.

4. – A Verificação das Condições da Ação – Teoria da Asserção:


“Questão muito polêmica no ordenamento processual pátrio diz respeito ao momento de
verificação das condições da ação. A teoria mencionada pela doutrina majoritária é a
denominada ‘teoria da asserção’, também conhecida como ‘teoria da prospettazione’ no direito
italiano. A referência mais comum à sua adoção no ordenamento pátrio ocorre quando se
afirma que as condições da ação são examinadas in status assertiones, ou seja, no estado em
que são apresentadas. Com a propositura da demanda (petição inicial), o juiz verifica a
presença das condições da ação na forma como elas foram apresentadas pelo autor, ou seja, o
juiz examina as condições da ação no estado em que o autor as apresenta. Originariamente, a
teoria da asserção deveria ser aplicada no início do procedimento, com o exame da petição
inicial, porque só naquele momento ela é examinada no estado em que é apresentada pelo
autor.
Na prática, porém, o juiz examina a presença das condições da ação após a contestação, já
que, tratando-se de matéria de ordem pública, ela não preclui. Entendendo que as condições
da ação estão presentes, o juiz determina o prosseguimento da causa com o início da fase
instrutória.
Vale ressaltar, entretanto, que, segundo o código, o juiz poderá examinar a presença ou não
das condições da ação a qualquer momento e em qualquer grau de jurisdição (art. 267, §3º e
art. 301, inciso II e § 4º, todos do CPC).
Surgem dessa desavença duas correntes de pensamento no direito pátrio.
1ª Corrente: para os adeptos desta corrente de pensamento, o Código de Processo Civil é
taxativo ao afirmar a possibilidade de as condições da ação serem objeto de análise até o
momento da sentença, em sede recursal e a qualquer momento (art. 267, §3º e art. 301, inciso
II e §4º, ambos do CPC). Diante disso, independentemente do momento em que for verificada
a ausência de alguma das condições da ação, o juiz deverá extinguir o processo sem
resolução do mérito, uma vez que ausente um requisito indispensável para o julgamento da
relação jurídica de direito material. É a posição tradicional defendida por Cândido Rangel
Dinamarco.
2ª Corrente: no entanto, existe uma outra corrente de pensamento que adota a chamada
‘Teoria da Asserção’ ou della prospettazione. Segundo esta teoria, as condições da ação
devem ser examinadas in status assertionis, ou seja, da forma pela qual elas são
apresentadas. Com isso, o juiz poderia examinar as condições da ação até o momento anterior
ao início da fase instrutória, uma vez que até aquele momento as alegações ainda não foram
objeto de provas, salvo aquelas já apresentadas na inicial ou na contestação. Significa dizer
que até esse momento (antes da fase de instrução probatória), constatada a ausência de
alguma das condições da ação, a demanda deve ser extinta sem resolução do mérito (art. 267,
inciso VI do CPC). Mas a partir do momento em que se ingressa na fase de instrução
probatória, já se está falando em mérito, tendo decorrido o momento limite em que o processo
poderia ser extinto por falta de alguma das condições da ação. Nesse momento, as condições
da ação já não estão mais sendo examinadas in status assertionis, o que implica em considerar
que ingressando na fase instrutória a decisão deverá ser de mérito (procedência ou
improcedência do pedido). É a posição defendida por Marinoni, Alexandre Câmara, Fredie
Didier Jr., Leonardo Greco, etc.
Por outro lado, definidas as correntes quanto ao momento de verificação das condições da
ação, surge um outro problema, diretamente oriundo daquele, que diz respeito à necessidade
ou não de provar as condições da ação quando do ajuizamento da inicial.
1ª Corrente: para esta corrente de pensamento, as condições da ação devem ser provadas
desde o momento do ajuizamento da inicial. É defendida por Dinamarco e Ada Pelegrini
Grinover.
2ª Corrente: defende a desnecessidade de prova das condições da ação quando do
ajuizamento da inicial. Caso estas sejam necessárias para demonstrar as condições da ação,
já estaríamos tratando de mérito, pois a produção dessas provas ocorreria na fase de instrução
probatória. É a posição dominante na doutrina. (...) Quando são realizadas provas acerca das
condições da ação, elas não estão mais sendo analisadas in status assertionis. Quando se
realizam provas acerca da presença ou não das condições da ação, já está se falando de
mérito. Resumindo: para essa corrente doutrinária e jurisprudencial, o exame in status
assertionis é realizado até o momento em que se inicia a produção de provas. Iniciado esse
momento, fala-se em mérito da causa e o julgamento não pode mais ser de carência de ação,
mas sim de procedência ou improcedência do pedido. Assim sendo, se as provas demonstram
que o autor não era parte legítima, a sentença será de improcedência do pedido.” – Edward
Carlyle Silva.

5. – Elementos da Ação ou da Demanda:


“A ação, como já foi dito, existe no plano abstrato. A partir do momento em que ela é
materializada, passa a existir a demanda. São elementos da demanda: partes; pedido; causa
de pedir.” – Edward Carlyle Silva.
“Partes: há partes em sentido formal e partes em sentido material. Parte em sentido formal
são as que figuram no pólo ativo e no pólo passivo da demanda, pouco importa se as partes
são legítimas ou não. Parte formal são o autor e o réu. Parte em sentido material é o titular da
relação jurídica de direito material deduzida em juízo. Então o conceito de ‘partes’ é
nitidamente de caráter processual, ou seja, parte processual não é o mesmo que parte legítima.
Parte processual é a que consta no processo (autor e réu). A questão de a parte ser legítima ou
não é questão de condição da ação, cuja verificação ocorrerá posteriormente. Dinamarco
classifica ainda em: partes na demanda – aqueles que, desde o momento de propositura da
demanda, constam na inicial, autor(es) e réu(s). Partes no processo – são todos aqueles que
participam do procedimento em contraditório. O autor é desde o início, mas o réu só se torna
parte no processo quando é citado, porque antes o réu só é parte na demanda. É conceito
mais amplo que abrange o assistente, o opoente, o denunciado, o chamado, etc.” – Edward
Carlyle Silva.
“O pedido pode ser: imediato, quando o autor deseja ser atendido imediatamente. É o que a
demanda vai propiciar ao autor, a sentença de procedência; mediato – é o bem da vida (o bem
econômico) que se deseja obter indiretamente através do provimento jurisdicional favorável.” –
Edward Carlyle Silva.

“Causa de Pedir – há duas teorias que procuram esclarecer o conteúdo da causa de pedir:
Teoria da individuação (ou individualização): De acordo com essa teoria, a causa de pedir é
composta apenas da menção à relação jurídica que envolve as partes, sendo desnecessária a
apresentação de fatos, bastando apenas demonstrar a relação jurídica existente entre o autor
da demanda e o bem da vida pretendido. Dependendo do tipo de demanda proposta, a relação
é entre autor e réu.
Teoria da substanciação: amplamente dominante na doutrina e jurisprudência, ela afirma que
o conteúdo da causa de pedir é formado pelos fatos e fundamentos jurídicos apresentados pelo
autor. Com base nesses fatos, o juiz poderá qualificá-los juridicamente e eventualmente
atribuir-lhes as conseqüências jurídicas pleiteadas pelo autor. O Código faz menção a adotar
esta teoria quando afirma que o autor deverá apresentar na petição inicial os fatos e
fundamentos jurídicos de seu pedido. (art. 282, III do CPC).
A causa de pedir pode ser (em relação à proximidade do pedido):
Remota – são os fatos relatados pelo autor na inicial.
Próxima – são os fundamentos jurídicos. Na verdade, a causa de pedir remota são os fatos
constitutivos do direito do autor que processualizam o direito material que o autor julga possuir.
E a fundamentação jurídica é a adequação do fato a uma norma legal que permite a este autor
a propositura da demanda pleiteando a prestação jurisdicional, em razão da suposta violação
àquela norma. Por isso que alguns autores falam em causa de pedir ativa que são os fatos
constitutivos, ou seja, os fatos geradores do direito do autor.
Por outro lado, existiria a chamada causa de pedir passiva caracterizada pela violação da
norma legal realizada pelo réu e que ocasionaria o direito à prestação jurisdicional. Seria
possível falar, ainda, em causa de pedir simples, composta e complexa.
Simples – aquela composta apenas por uma só causa de pedir que dará ensejo a um pedido.
Composta – duas ou mais causas de pedir fundamentam um pedido.
Complexa - há duas ou mais causas de pedir ensejando a formação de dois ou mais pedidos.”
– Edward Carlyle Silva.
6. – Cumulação de Demandas:
“Exemplo: Maria propõe demanda em face de João, com pedido de separação judicial. Ela
alega abandono do lar e violência doméstica por parte do marido. Nesse caso, quantas
demandas existem? Existem duas demandas em um único processo. (...) O fato é que a
alteração de qualquer dos elementos da demanda (partes, pedido ou causa de pedir) enseja o
surgimento de uma nova demanda, distinta daquela que foi proposta. Resumindo: no caso
acima tenho duas demandas cumuladas em um só processo. É a cumulação de demandas que
alguns autores chamam de cumulação causal, porque é caso de cumulação de causas de
pedir. A cumulação de pedidos do art. 292, CPC ocorreria no caso de Maria alegar violência
por parte de João e formular dois pedidos, separação e indenização, por exemplo. Também
são duas demandas, há cumulação de demandas, mas em razão dos pedidos feitos. É a
denominada cumulação de pedidos prevista no art. 292 do CPC. No caso de três autores
formulando um pedido em face do réu, com base em uma causa de pedir, dependendo do tipo
de natureza da relação jurídica de direito material, também seria caso de cumulação de
demandas, conhecida normalmente com o nome de litisconsórcio ou cumulação subjetiva. O
litisconsórcio é uma das espécies de cumulação subjetiva, mas não é a única, porque esta
também abrange a intervenção de terceiros.” – Edward Carlyle Silva.
“Apesar de a doutrina nacional defender a pretensão processual como sendo o objeto do
processo, e, portanto, o elemento passível de pluralidade, a causa de pedir das próprias partes
também podem dar ensejo ao surgimento da cumulação de causas. Diante disso, não obstante
existir quem sustente a teoria ser a demanda o próprio objeto do processo, enquanto outros
afirmam ser a pretensão, a cumulação de causas surge com base na pluralidade de elementos
identificadores da demanda, ou seja, partes, pedido ou causa de pedir. Assim sendo, embora
Dinamarco afirme que ‘... através da demanda, formula a parte um pedido, cujo teor determina
o objeto do litígio e, conseqüentemente, o âmbito dentro do qual toca ao órgão judicial decidir a
lide (art. 128)’, o fato de qualquer demanda ser identificada por três elementos distintos (partes,
pedido e causa de pedir) implica em admitir que qualquer modificação ou pluralidade de tais
elementos acarretará o surgimento de uma nova demanda (modificada) ou varias delas
(pluralidade de partes, pedido ou causa de pedir).
O art. 292 do CPC afirma, portanto, que a hipótese versada em seu texto cuida de cumulação
de pedidos, ou seja, apenas um dos elementos passíveis de cumulação, entendido aqui no
sentido de ‘pretensão’. Contudo, é inegável que, ao estabelecer para a cumulação de tais
pedidos que eles não precisam ser conexos, o próprio legislador demonstra que existe
diferença entre as espécies de cumulação e os casos de conexão. Diante disso, muito embora
o Código de Procesos Civil afirme que o art. 292 cuida de cumulação de pedidos, a doutrina se
divide entre aqueles que entendem ser caso de cumulação de ações, de pedidos, de
demandas ou de pretensões.” – Edward Carlyle Silva.

“Diferentes classificações da cumulação de demandas:


1) Primeira espécie de classificação da cumulação de demandas: Normalmente, a
existência de um processo indica a presença de apenas um litígio a ser resolvido. São os
chamados processos simples ou singulares. Quando, porém, em um único processo existem
dois ou mais litígios a serem resolvidos, diz-se que a hipótese é de processo cumulativo ou
plural. A característica principal deste último é que os vários litígios que compõem seu
conteúdo são processados e decididos de forma simultânea. No Brasil, é tradicional a
classificação das hipóteses de cumulação partindo-se do ponto de vista do pedido formulado.
Não se pode negar, entretanto, a existência de outros tipos de classificação que esclarecem as
diferentes nuances da cumulação.
Em primeiro lugar, a cumulação pode ser classificada quanto à oportunidade em que ela pode
ocorrer. Por este critério, a cumulação pode ser subdividida em cumulação inicial ou
originária e cumulação sucessiva ou ulterior. Na primeira hipótese – cumulação inicial ou
originária – o autor formula mais de um pedido através da mesma demanda, ou seja, no
ajuizamento da petição inicial ele apresente dois ou mais pedidos em face do réu. É o caso da
cumulação de pedidos prevista no art. 292 do CPC, já mencionada. Pode ocorrer, entretanto,
que a cumulação aconteça quando já exista processo pendente. Nestes casos, a doutrina
denomina esta espécie de cumulação de sucessiva ou posterior. É possível distinguir, ainda,
duas subespécies de cumulação sucessiva. A primeira delas seria a cumulação sucessiva por
reunião de processos, que se constitui no objeto do presente estudo. A segunda subespécie é
chamada de cumulação sucessiva por inserção ou adesão e refere-se àqueles casos em que a
cumulação ocorre no bojo de um processo já pendente, através da inserção de novas
pretensões pelas partes ou por terceiros, as quais, por sua vez, poderiam ser objeto de
processos autônomos.
Uma segunda classificação da cumulação adota como critério os elementos que podem ser
cumulados. Diante disso, a doutrina distingue os casos de cumulação objetiva, cumulação
causal e cumulação subjetiva. A primeira hipótese – cumulação objetiva – ocorre naqueles
casos em que são formulados vários pedidos ou efeitos jurídicos. Ocorre nos casos de conexão
meramente subjetiva, como na cumulação de pedidos prevista no art. 292 do CPC. O segundo
caso – cumulação causal – é aquela em que, apesar da identidade de partes e de pedido, este
último encontra-se amparado por mais de uma causa de pedir. Importante ressaltar que, neste
caso, embora o pedido seja um só, a multiplicidade de causae petendi indica o número
correspondente de demandas. A cumulação é subjetiva quando se vislumbra a presença de
mais de dois sujeitos no litígio. É a hipótese de litisconsórcio, que pode ser ativo, passivo ou
misto, caso a pluralidade de partes se encontre no pólo ativo, passivo ou em ambos os pólos
da relação processual.
Por fim, a terceira espécie de cumulação utiliza como critério a iniciativa de sua formação,
razão pela qual é possível distinguir os casos de cumulação judicial e cumulação voluntária.
Pela primeira, é o próprio juiz, ex officio, quem determina a cumulação de causas. Por outro
lado, na cumulação voluntária, são as partes e os terceiros que possuem o poder de provocar a
cumulação com o ajuizamento de outras demandas no curso do processo. Como exemplo,
podemos citar a conduta do réu ao ajuizar a reconvenção, ou o próprio autor ao aditar a inicial,
ou dos terceiros ao ingressarem naquele mesmo processo com pedidos próprios, tal como no
caso da denunciação da lide, oposição e em outros casos.
2) Segunda espécie de cumulação de demandas: No que concerne às espécies de
cumulação existente no direito pátrio, a doutrina normalmente a subdivide em cumulação em
sentido estrito e cumulação em sentido amplo (lato). Partindo da premissa de que tais espécies
de cumulação possuem como objeto os pedidos formulados pelo autor, o que caracteriza
primordialmente a cumulação em sentido estrito é a possibilidade de que as pretensões
sejam conhecidas e julgadas independentemente uma da outra. Isso implica em dizer que o
juiz pode considerar todas as pretensões procedentes, ou todas improcedentes, ou mesmo
procedentes algumas e improcedentes outras.
Ela se subdivide em outras duas espécies de cumulação, que recebem o nome de cumulação
simples e de sucessiva. Na verdade, o que as identifica como espécies de um mesmo gênero é
o fato de que, a princípio, o autor deseja e pode obter a procedência, em conjunto, de todos os
pedidos (pretensões) formulados. A primeira delas – cumulação simples – pode ser definida
como aquela em que ‘... o acolhimento de um pedido não depende do acolhimento ou da
rejeição de outro’. Como exemplo, podemos citar o caso de cobrança de dívidas oriundas de
contrato de mútuo e de contrato de compra e venda; ações de cobrança de dívida de mútuos
diferentes, etc.
A cumulação sucessiva de pedidos se diferencia da cumulação simples, na medida em que se
concede ao ‘... autor a possibilidade de formular um segundo pedido que, em relação ao
primeiro, dependa de sua procedência’. Ela ocorre, basicamente, quando ‘... o acolhimento de
um pedido depende do acolhimento de outro’. Como exemplo, podemos citar as ações de
investigação de paternidade e de alimentos; investigação de paternidade e herança; ações de
resolução de contrato e perdas e danos, etc.
Quanto à cumulação de pedidos em sentido amplo, ela é caracterizada pela possibilidade
de o autor formular dois ou mais pedidos, bem como um pedido com dois ou mais objetos
mediatos, sendo que, ao final, caso saia vitorioso, receba apenas um dentre eles. A bem dizer,
o autor pretende a procedência de um daqueles pedidos que foram apresentados.
Advém desta distinção a caracterização da cumulação como sendo PRÓPRIA (quando os
pedidos formulados podem ser acolhidos conjuntamente) e IMPRÓPRIA (quando por força do
direito material controvertido a procedência de uma pretensão exclui a das demais). Nesta
hipóteses de cumulação de pedidos em sentido amplo, podemos também identificar a presença
de subespécies, tais como a cumulação alternativa e a cumulação eventual. A cumulação
eventual está prevista no art. 289 do CPC e, na verdade, também é conhecida como
cumulação subsidiária, subordinada ou condicional. Na verdade, o autor pode formular um
pedido (denominado subsidiário) para ser conhecido somente na eventualidade da rejeição de
outro (que é o principal). Há quem o denomine de ‘cumulação alternativa por subsidiariedade,
uma vez que os pedidos não estariam situados no mesmo plano, mas um deles, sendo
formulado como principal, só no caso da eventualidade de sua rejeição é que o outro seria
subsidiariamente examinado.
Tal hipótese só impropriamente pode ser entendida como espécie de cumulação de pedidos,
uma vez que a pluralidade se refere aos objetos (mediatos) de um único pedido. (...) Há
também a possibilidade de cumulação alternativa de pedidos, prevista no art. 288 do CPC, e
que ocorre quando a pluralidade não é de pedidos propriamente ditos, mas sim de objetos
(mediatos) do pedido. Por esta razão é considerada como sendo espécie de cumulação
imprópria. Ocorre a cumulação alternativa quando ‘... se formulam pedidos relativos a
obrigações que, embora não alternativas em sua origem, por força do inadimplemento do
obrigado, ensejam a opção do credor por formas alternativas de satisfação.’ No que tange aos
requisitos de admissibilidade da cumulação, eles se encontram expressamente descritos nos
§§1º e 2º do art. 292 do Código de Processo Civil. (...)
É imperioso ressaltar que tais requisitos constituem a regra geral no que diz respeito à
cumulação de causas, sendo sua aplicabilidade irrestrita em relação a todas as suas hipóteses.
Independentemente da hipótese de cumulação, o aspecto procedimental deve ser adequado
para todas as demandas, de forma a permitir o processamento de julgamento simultâneo de
todas elas. O primeiro desses requisitos é de que os pedidos sejam compatíveis entre si, sob
pena de inépcia da inicial. De um ponto de vista lógico, a compatibilidade exigida pelo
dispositivo só seria cabível nos casos de cumulação em sentido estrito, ou seja, nas hipóteses
de cumulação simples ou sucessiva, quando todos os pedidos formulados podem ser obtidos
pelo demandante. No caso de cumulação alternativa, a rigor, o pedido seria único. Por outro
lado, no caso de pedido subsidiário, a incompatibilidade entre os pedidos seria originariamente
manifesta, na medida em que não poderiam existir conjuntamente, uma vez que somente no
caso de improcedência do primeiro pedido é que o segundo será examinado.
Por outro lado, a incompatibilidade de pedidos é causa de inépcia da inicial (art. 295, parágrafo
único, inciso IV do CPC). Mesmo com o fato de a jurisprudência dos tribunais minorar tal
determinação, permitindo ao autor a escolha do pedido que preferir, a falta desta escolha irá
acarretar a inépcia da inicial, em razão da impossibilidade de o juiz imiscuir-se no pedido ou no
objeto do processo. O segundo requisito da cumulação de pedidos diz respeito à competência.
Significa dizer que, no caso do órgão judicial ser incompetente (de natureza absoluta) para a
apreciação de algum dos pedidos, este ficará sem possibilidade de apreciação, sendo cabível
seu ajuizamento no juízo competente.
(...) Quanto ao último dos três requisitos – compatibilidade do procedimento – existe uma
mitigação a esta exigência no §2º do citado art. 292, quando este sustenta a possibilidade de
cumulação de causas cujos procedimentos são originariamente distintos, mas que o autor, ao
ajuizá-las, opte pelo procedimento comum de rito ordinário para o processamento de todas
elas. Desta forma, a doutrina estabelece três hipóteses no tocante à compatibilidade
procedimental. A primeira delas é a de que o autor indique adequadamente ritos distintos para
os pedidos cumulados. Neste caso, um dos pedidos pode prosseguir, cabendo ao autor ajuizar
outro pedido, com o procedimento e perante juízo competente, uma vez que o mesmo possui
rito procedimental distinto. A segunda hipótese refere-se à cumulação de pedidos em que o
autor indica para todos um procedimento de rito não-ordinário. Caberá ao juiz, então indeferir a
inicial em relação aos pedidos a que corresponde rito diverso daquele indicado pelo autor,
salvo se ele vier a pleitear o prosseguimento do processo pelo rito ordinário. A terceira hipótese
diz respeito àquele caso em que o autor cumula pedidos com ritos procedimentais diversos,
indicando, porém, em relação a todos, o rito ordinário (art. 292, §2º do CPC). Caso não haja
pedidos incompatíveis com ele, a cumulação será deferida. Em caso negativo, a petição inicial
será indeferida.” – Edward Carlyle Silva.

7. – Ações Necessárias ou Ações Constitutivas Necessárias:


“Em casos específicos, certas relações jurídicas somente podem ser criadas, modificadas ou
extintas através do ajuizamento de uma demanda. Isto porque, nestes casos, existe a
‘indispensabilidade’ de que tais efeitos sejam obtidos através do Poder Judiciário. É o caso, por
exemplo, da interdição de uma pessoa. Apesar dela manifestar visivelmente sinais de
insanidade, sua interdição somente pode ser obtida através do Poder Judiciário, quando do
julgamento da ação de interdição, cuja sentença passa a produzir efeitos imediatamente,
embora possua natureza constitutiva e não tenha ainda transitado em julgado (art. 1.184 CPC).
Trata-se, em outras palavras, de ação necessária.
Em sua grande maioria, retratam hipóteses de jurisdição voluntária, mas podem também
abranger típicos casos de jurisdição contenciosa, como a ação rescisória de sentença, a
separação litigiosa, etc. Nessas hipóteses, seria dispensável o exame do interesse na
propositura da demanda, pois esta já estaria ínsita, na medida em que não existiria outra forma
de se obter os efeitos jurídicos almejados que não seja pelo Poder Judiciário. Para uma parcela
da doutrina, o termo correto seria ‘jurisdição necessária’, uma vez que indispensável a
obtenção do resultado através da participação do Poder Judiciário, mas os exemplos citados
são os mesmos. É a posição de Luiz Fux.” – Edward Carlyle Silva.

Item: Intervenção de Terceiros:


Antes de ingressarmos no resumo propriamente dito, é de se frisar que os institutos do
Litisconsórcio e da Assistência não se constituem, nos termos da lei, intervenções de terceiros.
A assistência, porém, é tida pela doutrina como autêntica intervenção de terceiro, não obstante
a lei assim não tratar. O litisconsórcio, de fato, não se trata de intervenção, porém, devido à
completa correlação com a matéria objeto do resumo, entendemos pertinente tratar do mesmo
no presente.
Conforme prescreve o art. 472 do CPC, “a sentença faz coisa julgada às partes entre as quais
é dada, não beneficiando, nem prejudicando terceiros”. Todavia, pode acontecer que um
terceiro não pertencente à relação jurídica seja titular de um interesse ou bem ligado a essa
relação. Neste caso, torna-se necessário que o terceiro intervenha no processo para melhor
resguardar o seu direito, que poderá ser afetado de modo indireto pela sentença. Tomemos,
portanto, aqui, a intervenção de terceiros, como instituto que permite o ingresso de alguém, que
originariamente não é parte, no processo.
Terceiro é, pois, aquele que não é parte no processo, que, por ter interesse jurídico na causa,
pode intervir na mesma, deixando de ter a condição de terceiro para assumir a função de parte
processual.
A intervenção de terceiros é admissível no processo de conhecimento, na execução e nos
processos cautelares – a depender da espécie de intervenção.
Em algumas hipóteses, é vedada a intervenção de terceiros. Nos Juizados Especiais, há total
vedação à intervenção de terceiros, a teor do disposto no art. 10, da Lei 9099/95. Assim, nos
JE, não incidem as sanções e consequências que o CPC prevê para os casos em que a parte
se omita no dever ou na faculdade de provocar a intervenção de terceiro no processo
pendente. Logo, a não-denunciação da lide deixa de acarretar a perda da pretensão regressiva
contra o terceiro.
O CDC também contém previsão expressa sobre o CHAMAMENTO AO PROCESSO. De
acordo com o art. 101, II, do CDC, é autorizado o chamamento ao processo ao
fornecedor de produtos ou serviços que, sendo réu em ação com base no CDC, haja
contratado seguro de responsabilidade. Nesse caso, a seguradora será chamada ao
processo, sendo-lhe defeso pretender a integração do contraditório pelo IRB. Desse
modo, a teor do art. 88, do CPC, a sentença poderá condenar tanto o réu original como o
segurador (este nos limites do contrato de seguro, é claro) e valerá como título executivo
em favor do que satisfizer a dívida, normalmente em favor do segurado contra o
segurador. Segundo Arruda Alvim, o CDC, ao colocar o segurador como devedor
solidário, em relação ao consumidor acaba ampliando a garantia deste último, tornando
mais abrangente a legitimação passiva em favor do consumidor. Não se deve perder de
vista também que esse dispositivo também favorece o próprio fornecedor que pode
convocar desde logo, sem necessidade de ação regressiva autônoma, o segurador para
responder pela cobertura securitária prometida.
Continuando o rol de vedações, temos que, nas ADINs e ADCs, é vetada a intervenção de
terceiros, tendo em vista a natureza especialíssima do processo. Nelson Nery assevera que
nestas ações qualquer legitimado poderá agir como assistente litisconsorcial.
No rito sumário, com vista à celeridade processual, não se admite a intervenção de terceiro,
salvo a assistência, o recurso de terceiro prejudicado e a intervenção fundada em contrato de
seguro, valendo observar que esta última hipótese foi acrescida pela Lei 10.444, de maio de
2002.
Antes dessa inovação legal, a doutrina já criticava a proibição da denunciação da lide ao
segurador no caso de procedimento sumário, tendo em vista as peculiares circunstâncias que
envolvem tanto no plano jurídico quanto no plano dos fatos as demandas regressivas fundadas
em contrato de seguro (Athos Gusmão). Observa Edson Ribas Malachini que não importa a
inexistência de relação jurídica direta entre a vítima e a empresa seguradora do autor do dano,
vez que a solidariedade em favor da vítima resulta da própria relação jurídica entre denunciante
e denunciado. Ressalte-se que É DE INTERESSE DO DENUNCIANTE SEGURADO (OU
SEGURADOR) TANTO QUANTO DO AUTOR DA AÇÃO a condenação do denunciado a pagar
diretamente ao autor da ação o valor do seguro (ou do resseguro). Afinal, ao contratar com a
seguradora, pretendeu o segurado justamente livrar-se do risco de ter que pagar pessoalmente
a quantia indenizadora. Nunca esteve nos planos do segurado pagar primeiro (indo atrás de
recursos para tanto) para só depois ser reembolsado.
Com a mudança legislativa, sendo procedentes a ação e a denunciação da lide, o autor poderá
executar a condenação tanto contra o autor do dano como, nos limites da apólice, contra
empresa seguradora.
Observe-se também que o dispositivo fala em INTERVENÇÃO FUNDADA EM CONTRATO DE
SEGURO, SEM DISTINGUIR ENTRE DENUNCIAÇÃO DA LIDE E CHAMAMENTO AO
PROCESSO, possibilitando desse modo que o magistrado ACEITE A TESE DA
SOLIDARIEDADE PASSIVA ENTRE SEGURADO E SEGURADORA perante a pretensão
indenizatória apresentada pelo prejudicado: chamamento ao processo.

Modalidades de intervenção:
1) por provocação - intervenção provocada ou coacta;
2) por deliberação espontânea do terceiro - intervenção voluntária ou espontânea.
A intervenção provocada assume 3 institutos distintos:nomeação à autoria, denunciação da
lide, chamamento ao processo.
A intervenção voluntária ou espontânea se apresenta pelos seguintes institutos: assistência,
oposição. A intervenção voluntária é aquela em que o ingresso do terceiro no processo é
deixado ao seu arbítrio. Os efeitos da sentença não serão refletidos diretamente no terceiro,
todavia, poderão, de modo reflexo, trazer-lhe algum prejuízo. Assim, se desejar, poderá o
terceiro interferir no feito para tentar, por vias diretas ou indiretas, batalhar para o resguardo de
seus direitos ou interesses.
A intervenção voluntária pode ser: a) ad coadjuvandum – aquela em que o terceiro intervém na
relação processual para auxiliar uma das partes, praticando atos processuais com o objetivo de
que a sentença seja favorável àquela parte que ele ajuda; b) ad excludendum – dá-se quando
o terceiro intervém no processo exercendo uma pretensão sobre a coisa ou o direito que é o
objeto da controvérsia entre autor e réu.
Para Fredie Didier, toda intervenção de terceiro propriamente dita é incidente do processo; se o
terceiro gera processo novo ele não estará intervindo. Por isso é que os embargos de terceiro
não são intervenção de terceiro.
Uma intervenção de terceiros pode acarretar:
a) uma ampliação subjetiva do processo (ex. denunciação da lide);
b) uma modificação subjetiva do processo (ex. nomeação à autoria);
c) uma ampliação objetiva do processo (ex. oposição)

LITISCONSÓRCIO
O litisconsórcio pressupõe pluralidade de partes no processo, de autor (ativo), ou do réu
(passivo), ou de ambos (misto).
Alguns autores entendem que o litisconsórcio implica, necessariamente, na cumulação de
pretensões. Outros autores, ao contrário, entendem que a pretensão é única, mas dirigida a
mais de uma pessoa. Na realidade, há casos em que a pretensão é única, e tal ocorre, quando
o litisconsórcio é necessário. Tratando-se de litisconsórcio facultativo, há cumulação de
pretensões.
O litisconsórcio pode ser :
Facultativo- quando se forma pela vontade originária das partes. O litisconsórcio facultativo
ativo forma-se no momento do ajuizamento da ação, não se admitindo o litisconsórcio
facultativo ativo ulterior, sob pena de afronta ao princípio do juiz natural. A limitação do
litisconsórcio facultativo não impede que o excluído ajuíze sozinho ação autônoma ou que haja
reunião dos processos por conexão (Nery, 2003).
Necessário- quando é de formação obrigatória, seja por determinação de lei, seja em razão da
natureza da relação jurídica deduzida no processo. Exemplo de litisconsórcio necessário pela
lei: citação obrigatória de ambos os cônjuges nas ações reais imobiliárias (art. 10, § Único,
CPC). Exemplo de litisconsórcio necessário pela natureza da relação jurídica: dissolução de
sociedade, em que, pela própria lógica, devem ser citados todos os sócios. O litisconsórcio
necessário subdivide-se também em unitário e simples. Os dois exemplos citados
anteriormente são casos de litisconsórcio necessário unitário. Um exemplo de litisconsórcio
necessário simples seria o usucapião, em que obrigatoriamente são citados todos os
confinantes, além da pessoa em cujo nome o imóvel está registrado, podendo a decisão ser
diferente para cada confinante. O litisconsórcio necessário deve estar fundamentado em uma
das hipóteses do art. 46, I, do CPC. Tal dispositivo também poderá embasar o litisconsórcio
facultativo, será, contudo, necessário, em razão da lei ou da natureza da relação jurídica.
A redação do art. 47, do CPC, não é perfeita pois acaba definindo o litisconsórcio necessário
como sendo aquele em que o juiz tem que decidir a lide de forma uniforme para todos os
litisconsortes. Tal definição, conforme abaixo, é a do litisconsórcio unitário. Como é cediço, o
litisconsórcio necessário pode ser simples ou unitário. Será sempre unitário o litisconsórcio
necessário fundado na natureza da relação jurídica. Por outro lado, o litisconsórcio necessário
por preceito legal poderá ser simples ou unitário. Por fim, não se pode olvidar a possibilidade
de haver litisconsórcio facultativo e unitário.
Unitário é aquele em que o juiz tem de decidir a questão de modo igual para todos os autores e
todos os réus, não podendo a sentença ser procedente para uns e improcedente para outros.
Isto porque a relação jurídica é a mesma.
Simples– é aquele em que a decisão pode ser diferente para cada litisconsorte. Quatro
empregados de uma empresa, por exemplo, propõem juntos uma reclamação trabalhista para
obter determinada verba. A decisão pode ser diferente para cada um, dependendo das
respectivas provas e situações.
As classificações acima se cruzam, ou seja, o litisconsórcio pode ser necessário unitário,
necessário simples, facultativo unitário e facultativo simples.
O litisconsórcio se forma quando os direitos e obrigações derivarem do mesmo fundamento de
fato ou de direito; quando ocorrer conexão pelo objeto ou causa de pedir. O objeto mediato é o
bem, objeto de direito material sobre o qual incide a ação.
No litisconsórcio simples,os litisconsortes são independentes e autônomos entre si. Os atos de
um não prejudicam nem favorecem os outros (art. 48, CPC). Cada um tem de fazer a sua
defesa e apresentar as suas provas.
No litisconsórcio unitário, tanto facultativo como necessário, a sentença será igual para todos.
Por isso, os atos úteis, praticados por um, beneficiam os demais. A todos os litisconsortes
aproveita a defesa de um só, a exceção oposta por um só, a prova oferecida por um só. O
recurso de um só também a todos aproveita (art. 509, CPC). Por outro lado, em regra, os atos
prejudiciais de um não atingem a comunidade dos co-litigantes. A confissão de um só, por
exemplo, é inoperante, vez que apenas será válida a confissão coletiva (art. 302, I, CPC). No
unitário, atos que beneficiem um, aproveitam aos demais. Atos que prejudiquem, não
aproveitam.
No litisconsórcio passivo necessário, a ação não se instaura validamente sem a participação de
todos (art. 267, VI, CPC). Se faltar um litisconsorte necessário passivo, ordenará o juiz que o
autor promova a citação do mesmo. Não poderá o juiz determinar a citação ex officio do
litisconsorte necessário. A ausência de litisconsorte necessário acarreta a ineficácia da
sentença prolatada. A sanção para a parte que não providencia a citação do litisconsorte
necessário ou unitário é a extinção do processo sem julgamento do mérito.
Toda vez que se vislumbrar a possibilidade de a sentença atingir diretamente a esfera jurídica
de outrem, a menos que a lei estabeleça a faculdade litisconsorcial, deve ser citado como
litisconsorte necessário.
Na ação coletiva para a defesa de direito individual homogêneo, as pessoas não são parte na
ação. Apenas os legitimados do art. 82, CDC é que estão autorizadas a ingressar com a ação,
não havendo litisconsórcio multitudinário.
Nos termos do art. 47, § Único, do CPC, o juiz ordenará ao autor que promova a citação
de todos os litisconsortes necessários, dentro do prazo que assinar, sob pena de
declarar extinto o processo.
O dispositivo acima mencionado só se aplica no caso de citação de litisconsorte necessário
passivo. No pólo ativo, se faltar litisconsorte, a ação poderia ser proposta, pois ninguém pode
ser obrigado a ser autor de uma ação ou a aderir a pedido alheio (Celso Agrícola Barbi).
Ademais, entende-se que não pode o autor ser privado do seu direito de ação (art. 5º, XXXV,
CF); ou seja, não se pode condicionar a ida de alguém a juízo à aceitação de outrem. Em
suma, não existe litisconsórcio necessário no pólo ativo, mesmo sendo unitário, pois quem
quiser ajuizar uma ação não pode ser condicionado à formação de litisconsórcio no pólo ativo.
ASSISTÊNCIA
É uma das formas de intervenção de terceiros (CPC art. 50/55). Embora o CPC tenha tratado
da assistência junto ao litisconsórcio, ou seja, fora do capítulo “Intervenção de Terceiro”, é de
entendimento geral que, na realidade, o ingresso do assistente no processo seja caso típico de
intervenção voluntária de terceiro, mesmo quando é considerado litisconsorte da parte
principal.
Nos termos do art. 50 do CPC, dá-se a assistência quando o terceiro, na pendência de uma
causa entre outras pessoas, tendo interessejurídico em que a sentença seja favorável a uma
das partes, intervém no processo para prestar-lhe colaboração.
A assistência permite que o terceiro intervenha no processo para combater a simulação e a
fraude, auxiliando a parte a que assiste, exercendo os mesmos poderes, sujeitando-se aos
mesmos ônus. O assistente pode ser considerado gestor de negócios ou substituto processual
do assistido caso este seja revel.
Enquanto durar o processo, cabe a intervenção do assistente; não existindo limite de
tempo/grau de jurisdição para a manifestação do assistente.
Espécies: assistência (simples ou adesiva), (litisconsorcial ou autônoma).
O interesse do assistente, seja simples ou litisconsorcial, é sempre jurídico.
O que difere a assistência simples da litisconsorcial é o fato de, na simples, não haver relação
jurídica entre assistente e adversário do assistido; ao passo que, na litisconsorcial, o assistente
tem relação direta com o adversário do assistido.
Assistência simples (art. 50, CPC): é a intervenção de terceiros no processo entre as partes
visando a sustentar as razões de uma delas contra a outra. O assistente intervém no auxílio de
uma das partes contra a outra, em razão do interesse jurídico que tem na vitória do assistido
e/ou na derrota do adversário do assistido. O papel do assistente é o de auxiliar a parte
assistida em defesa do direito da mesma. Ex: sublocatário que assiste o locatário em demanda
deste contra o locador. A assistência simples é forma exata de intervenção de terceiros, ao
contrário da assistência litisconsorcial, em que o assistente é parte.
A assistência litisconsorcial, por sua vez, pressupõe haver uma relação jurídica entre o
interveniente e o adversário do assistido; essa relação há de ser normada pela sentença. A
assistência será litisconsorcial, pois, se a sentença tiver de ser uniforme, envolvendo
diretamente também o direito do assistente, como no caso de um condômino em coisa indivisa
que intervenha em auxílio de outro condômino (art. 54, CPC). Trata-se de verdadeiro
litisconsórcio unitário.
O interesse do assistente terá de ser jurídico, não podendo ser apenas econômico (RT
469/170), seja a assistência simples ou litisconsorcial. O assistente pode contestar no lugar do
assistido revel (RT 550/127); recorrer da sentença, mesmo que não o faça o assistido (RT
402/199), bem como purgar a mora do locatário assistido (RT 542/166). Não é permitido,
contudo, postular contra o assistido (RT 383/181).
Admite-se a assistência em qualquer ação e em qualquer procedimento ou grau de jurisdição.
Não cabe, porém, assistência na jurisdição voluntária, porque não há litígio, apenas atividade
administrativa do juiz. A relação jurídica processual quando decidida definitivamente dá origem
à sentença. Esta sentença diz respeito às partes da relação processual, não a terceiros
estranhos a esta.
Para ingressar como assistente, o terceiro o fará por meio de petição fundamentada onde
comprovará suas alegações indicando a parte que pretende assistir e juntando documentos.
Os poderes processuais do assistente litisconsorcial são os mesmos do assistido. O assistente
litisconsorcial pode praticar qualquer ato processual com ou sem oposição do assistido, e,
como tal, pode alegar prescrição.
A sentença faz coisa julgada entre as partes. Oassistente litisconsorcional, uma vez que é parte
no processo, se submete à coisa julgada. Ora, uma vez que o assistente litisconsorcial é titular
do direito discutido em juízo, será atingido pela coisa julgada. Ex.: o adquirente do bem
litigioso, que não seja admitido a suceder o alienante, pode ingressar na lide como assistente
litisconsorcial (ele tem relação jurídica com o adversário do assistido). Para Marinoni, a
assistência litisconsorcial corresponde à formação de um litisconsórcio ulterior (o assistente
litisconsorcial, apesar de não formular pedido próprio, ele adere ao pedido formulado pelo
assistido).
Diz o art. 55 do CPC que ao terceiro, havendo ingressado como assistente, depois não será
lícito discutir a justiça da decisão. Tal artigo tem aplicação, exclusivamente, à assistência
simples.
Tal artigo não significa, em rigor técnico, que ele (o assistente simples) fique sujeito às
vinculações inerentes à coisa julgada. Esta se refere exclusivamente ao conteúdo da sentença
em relação aos eventuais direitos e obrigações entre autor e réu. Somente foi julgada a
pretensão daquele em face deste e por isso somente os efeitos sentenciais referentes a essa
pretensão é que ficam cobertos pelo julgado. E o assistente simples, que não é sujeito desses
direitos e obrigações e não foi o autor da pretensão ou destinatário dos efeitos da sentença,
não fica dentro dos limites subjetivos da coisa julgada.
A vinculação do assistente simples, neste caso, constitui o que a doutrina chama de eficácia da
intervenção. Trata-se de autêntica eficácia preclusiva da coisa julgadae não da res judicata em
si mesma. Em virtude dela, ficará o assistente preso ao julgamento pronunciado inter alios, na
medida em que venha a ser relevante em eventual causa ulterior na qual ele figure como parte
principal. Em suma, até o que consta da fundamentação – e não-só do dispositivo – resta
imodificável através de nova demanda, por conta do instituto da eficácia preclusiva da coisa
julgada ou justiça da decisão. O efeito da intervenção somente poderá ser afastado, se o
assistente simples alegar e provar que pelo estado em que recebera o processo, ou pelas
declarações do assistido, fora impedido de produzir provas suscetíveis de influir na sentença,
ou que desconhecia a existência de alegações ou de provas, de que o assistido, por dolo ou
culpa, não se valeu.
O artigo 55 do CPC, que trata da eficácia preclusiva da coisa julgada, não se destina ao
assistente litisconsorcial, pois este, a rigor, já fica submetido à coisa julgada, por se tratar de
caso de verdadeiro litisconsórcio unitário.
Lei 9469/97, art. 5º. É possível (não obrigatório) que a União intervenha nas causas em que
sejam partes os estes da administração indireta -federais, não tendo a UF que demonstrar
interesse estritamente jurídico em que a sentença venha a ser favorável à entidade assistida.

A maior novidade, porém, está no fato de poder a administração direta ou indireta intervir em
QUALQUER DEMANDA cuja sentença possa influir, ainda que de forma indireta, no patrimônio
da aludida pessoa jurídica. Nesses casos, por se tratar de intervenção atípica, a competência
não se desloca para a JF, salvo se a entidade de direito público interpuser recurso. Nesse
caso, será considerada assistente e haverá deslocamento de competência.

Observações:
- o simples interesse econômico não embasa a assistência. Assim, o credor do demandado
numa ação reivindicatória não está legitimado a intervir para auxiliar seu devedor, uma vez que
o seu interesse não é jurídico, pois a sentença contrária ao seu devedor, ainda que possa
reduzi-lo à insolvência, não vai interferir na existência da relação obrigacional que liga o
demandado ao seu credor;
- o assistente não pode ser considerado parte da demanda, pois não faz pedidos e não formula
nenhum pedido em face de si; no entanto, Liebman e Fredie Didier Jr. afirmam a qualidade de
parte do assistente;
- Fredie Didier Jr. sustenta que o assistente simples atua no processo como legitimado
extraordinário, pois, em nome próprio, auxilia a defesa de direito alheio. Tal entendimento
parece merecer uma reflexão mais aprofundada. O legitimado extraordinário recebe
legitimidade legal para em nome próprio figurar como parte na defesa de direito alheio, e não
simplesmente para auxiliar a parte na defesa de direito desta;
- as pessoas jurídicas de direito público poderão, mediante simples demonstração de interesse
econômico, ingressar como assistente (art. 5º, parágrafo único, da Lei n.º 9.469, de 10-07-97);
- a União poderá intervir como assistente, independentemente da demonstração de qualquer
tipo de interesse (quase sempre, interesse econômico), nas causas em que figurarem como
partes as suas autarquias, fundações públicas, empresas públicas e sociedades de economia
mista (art. 5º, caput, da Lei 9.469/97). Marinoni e Sérgio Cruz denominam tal figura de
intervenção anômala;
- o mero interesse moral não autoriza a assistência.
- se a parte assistida for vencida, o assistente será condenado nas custas em proporção à
atividade que houver exercido no processo (art. 32 do CPC);
- é descabida a condenação do assistente simples em honorários advocatícios (Celso Agrícola
Barbi, RT 623/50);
- se o assistido for revel, o assistente assumirá a posição de gestor de negócios daquele
(parágrafo único do art. 52 do CPC); devendo ser ressaltado que a figura da gestão se limita ao
campo processual;
- o assistente simples não pode praticar atos contrários à vontade do assistido;
- discute-se se o assistente simples pode, contra a vontade do assistido, recorrer da sentença.
Contra a possibilidade de recurso, Nélson Nery. A favor, RJTJSP 111/43 e RT 514/194;
- o assistente não pode suscitar exceção de incompetência de foro, oferecer reconvenção ou
propor ação declaratória incidental;
- assistente está sujeito ao denominado efeito de intervenção, segundo o qual, uma vez
transitada em julgado a sentença, na causa em que interveio o assistente, este não poderá, em
processo posterior, discutir a justiça da decisão (art. 55 do CPC), salvo se alegar e provar a
exceção de processo mal conduzido ou de má gestão processual (exceptio malegesti
processus), nos termos do art. 55, I e II, do CPC. Por justiça da decisão se entende a definição
quanto aos fatos e fundamentos jurídicos. Assim, pelo efeito da intervenção, o assistente fica
adstrito ao fundamento da sentença, e não à parte dispositiva. Seria, por exemplo, o caso da
intervenção do fiador no processo em que se discute a obrigação principal, ficando aquele
impedido de, em processo futuro, rediscutir o reconhecimento da obrigação principal.
- não se admite a assistência no processo de execução, uma vez que este visa realizar o direito
do credor, e não a formar um título favorável àquele que haveria de ser assistido (Ovídio
Baptista, Alexandre Freitas Câmara, Athos Gusmão Carneiro, Sergio Ferraz, Arruda Alvim,
Humberto Theodoro, STJ- 6ª Turma- REsp 329059/SP e TFR - 5ª Turma, DJU, 1, 22.8.88).
Existe posição em contrário (Celso Agrícola Barbi, Cândido Dinamarco, Ernane Fidélis dos
Santos e Nélson Nery);
- é possível o ingresso do assistente por ocasião da liquidação da sentença;
- se a União ingressa como assistente, em ação indenizatória em curso na Justiça Estadual,
em fase de liquidação, a competência se desloca para o foro federal, não se aplicando o
princípio da perpetuatio jurisdictionis (STJ, 4ª Turma, DJU, 1, de 18.2.91);
- estando o processo em grau de recurso, o pedido de assistência deve ser formulado perante
o juízo ad quem;
- não se admite no Juizado Especial Cível a assistência simples (art. 10 da lei 9.099/95);
- discute-se quanto ao cabimento da assistência litisconsorcial no Juizado Especial Cível, tendo
em vista o disposto no art. 10 da LJE. Nélson Nery entende que não, enquanto Theotônio
Negrão, que sim;
- não cabe assistência simples em ação direta de inconstitucionalidade ( art. 7º , caput, da Lei
9.868/99 e julgado do STF na ADIN 1191-0). Por outro lado, o STF, com base no art. 7º, § 2º,
da lei antes referida, admite o ingresso de terceiro na ADIN na condição de amicus curiae,
tendo em vista a necessidade de legitimar socialmente as decisões em controle concentrado de
constitucionalidade. A admissão de alguém na condição de amicus curiae exige que o alguém
tenha representatividade, ou seja, o ente deve representar os interesses gerais da coletividade
ou expressar valores essenciais e relevantes de grupos, classes ou estratos sociais;
- ao amicus curiae, inicialmente, o STF não reconheceu legitimidade para fazer sustentação
oral em ADin (ADin MC 2.223-DF), passando a admitir a partir do julgamento da ADI 2777
QO/SP;
- entende-se que não cabe assistência nos procedimentos de jurisdição voluntária, pois nesta
não há litígio;
- a doutrina e a jurisprudência dominantes, inclusive a do STJ e a do STF (RE 111.778-8),
fixaram-se no sentido do não cabimento da assistência simples em mandado de segurança.
Ovídio Baptista mantém tese oposta;
- Ovídio Baptista e Marcelo Abelha defendem o cabimento da assistência no processo cautelar.
Já Marcus Vinícius Rios só admite em cautelar de produção antecipada de provas;
- Antônio Gidi (Coisa julgada e litispendência em ações coletivas. Saraiva, 1995, p. 54-55) não
admite que o particular possa ingressar como assistente em ação coletiva para defesa de
interesses difusos ou coletivos. Por outro lado, Fredie Didier Jr., embasado no § 2° do artigo 5°
da Lei da Ação Civil Pública, defende o cabimento da assistência em ação coletiva por parte de
um co-legitimado;
- O Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 94, prevê a possibilidade de o particular
intervir nas causas relativas a direitos individuais homogêneos

OPOSIÇÃO
Nos termos do art. 56 do CPC: “Quem pretender, no todo ou em parte, a coisa ou o direito
sobre que controvertem autor e réu, poderá, até ser proferida a sentença, oferecer oposição
contra ambos”.
É intervenção ad excludendum, visa a procurar comprovar que nenhumas das partes
originárias têm razão.
Essa intervenção desnatura a idéia e a condição de terceiro, porque o opoente, quando
participa do processo, formula ação própria, tendente a excluir a pretensão dos sujeitos iniciais
sobre o objeto litigioso do processo. Como se sabe, quem formula ação própria é parte e não
terceiro.
Traz um pedido novo, ampliando objetivamente a lide.
Gera um litisconsórcio ulterior necessário, porém não necessariamente unitário (entre os
opostos – autor e réu originários).
A oposição pode ser total ou parcial, ou seja, pode referir-se a toda a coisa ou direito litigioso,
ou apenas parte dele.
Na oposição, o opoente formula sua pretensão independente, mas conexa com a causa. É
espécie de intervenção de terceiro no processo. A oposição se caracteriza pela pretensão que
o terceiro tem sobre a coisa ou direito em controvérsia. Pode ser oferecida até a sentença e
deve ser proposta contra ambos os opostos (Autor e Réu da demanda principal), desde que
haja conexão entre o objeto mediato do pedido, que é a coisa ou direito disputados. Forma-se,
assim, com a oposição, um litisconsórcio necessário posterior simples entre os opostos.
A oposição será deduzida no mesmo processo em que as partes originariamente contendem,
sempre que vier antes da audiência (art. 59) – é a oposição interventiva.Com ela, aquele que
não é parte, mas pretenda o mesmo bem ou direito em torno do qual litigam as partes, tornar-
se-á parte também e estará inserido na relação processual já existente.
Se este terceiro formular oposição depois de iniciada a audiência, com isso dará formação a
processo novo e a sua oposição dir-se-á autônoma(art. 60, CPC), onde o opoente não se
insere entre os sujeitos do primeiro processo.
Em outras palavras, pode constatar-se, então, que a atitude do terceiro em relação ao bem ou
direito em disputa pelas partes de um processo pendente pode dar-se: a) mediante a oposição
interventiva, até que se inicie a audiência de instrução e julgamento da causa pendente; b)
mediante oposição autônoma, que dá origem a novo processo e não é propriamente uma
intervenção de terceiro, sempre que trazida a juízo quando já iniciada a audiência e sempre
antes da prolação de sentença de mérito ou terminativa; c) mediante a propositura de demanda
verdadeiramente autônoma, que também dá origem a novo processo, a partir de quando
proferida a sentença e mesmo que o processo ainda penda de recurso.
Na modalidade interventiva, a oposição será necessariamente julgada com a causa principal,
dado que se integram num processo só (art. 59). A oposição interventiva caracteriza-se como
um incidente do processo, recaindo sobre ele e nele sendo resolvida juntamente com a causa
originária.
Já a oposição autônoma se dá através de um processo incidente.
A oposição autônoma poderá, conforme o caso, ser julgada em conjunto com a causa principal,
sobrestando-se no andamento desta à espera da instrução daquela (art. 60). Mas, ao deduzi-
la, o terceiro dá vida a um novo processo: trata-se de um processo incidente, dado que
produzirá efeitos destinados a se projetarem sobre aquele. Assim, se apresentada a oposição
depois de iniciada a audiência, corre em autos separados, mas nada impedirá que o juiz, antes
de proferir a sentença, determine a reunião dos autos da ação e da oposição.
A oposição autônoma, por ser um novo processo, se extingue por uma sentença. Ademais, a
lei diz que a oposição autônoma ‘seguirá o procedimento ordinário’ (art. 60), mas, segundo
Cândido Rangel Dinamarco, inexiste razão para que esse processo de oposição, que é
processo em si mesmo e não mero incidente, seja invariavelmente encaminhado ao
procedimento ordinário, quando haja fundamento para fazê-lo trilhar as vias do sumário (seja
pela natureza da causa, seja pelo valor: CPC, art. 275, I e II).
Na oposição interventiva, o opoente deixa de ser terceiro em relação ao processo instaurado
entre os opostos, ingressando nele e fazendo-se parte.
Já na oposição autônoma, o terceiro não se torna parte no processo inicial e quanto a ele
mantém a qualidade de terceiro, (art. 60). É curioso observar que, mesmo nesta, a partir de
quando eventualmente reunidos os feitos para sentença única todos os três sujeitos passam a
ser partes de um processo só e como tais são tratados (para fins recursais, etc.).
A demanda proposta depois da prolação de sentença não suspende o primeiro processo, os
autos não se apensam aos deste e os julgamentos serão sempre separados (pela própria
razão de o primeiro deles já ter recebido sentença em primeiro grau, pelo menos).
O que difere a oposição autônoma do art. 60 do processo autônomo (que se dá com o
oferecimento da oposição após a sentença) é o fato de a primeira poder gerar
julgamento simultâneo das lides (principal e oposição autônoma), tendo o juiz da
demanda inicial competência funcional para julgar a oposição.

A oposição é fenômeno restrito ao processo de conhecimento. Pode, contudo, ser


admitida em procedimento sumaríssimo desde que a ele se adapte. A oposição é incabível no
processo executivo porque pressupõe indefinição em torno do direito das partes do processo
originário. Também é incabível nos embargos à execução de título judicial, porque a titularidade
do bem já foi definida no processo que embasou a execução. Tal argumento, contudo, não se
estende aos embargos à execução de título extrajudicial, nos quais é cabível a oposição (sem
prejuízo da utilização de embargos de terceiro), dado que pode um terceiro apresentar-se como
pretendente àquele mesmo crédito ou àquele mesmo direito real posto em litígio entre as
partes do processo dos embargos.
A oposição diferencia dos embargos de terceiros porque a lide nos embargos de terceiro se
refere apenas à exclusão ou inclusão da coisa na execução e não aos direitos que caibam ao
terceiro sobre a coisa, mesmo quando deles se tenha discutido. Em outras palavras, a
oposição decide de quem é o direito real ou pessoal afirmado pelo autor inicial e pelo opoente,
fazendo, pois, coisa julgada material quanto a isso; os embargos de terceiro apenas se referem
à exclusão ou inclusão da coisa na execução e não fazem coisa julgada em relação ao direito
real ou pessoal alegado. Não pretendendo o terceiro livrar o imóvel da constrição judicial, mas
sim obter o reconhecimento de seu suposto direito sobre o bem, a respeito do qual autor e réu
disputam a posse em outro processo, o remédio cabível é a oposição e não os embargos de
terceiro.
A instrumentalidade dos provimentos cautelares ao processo principal (cognitivo, executivo)
conduz à conclusão de que inexiste campo para a incompatibilidade de pretensões, que é
inerente à oposição.
Como ato de propositura de demanda que é, a petição do opoente (inicial na intervenção
autônoma ou interventiva se também interventiva a oposição) deve trazer todos os requisitos
do art. 282 do CPC, inclusive a indicação do valor da causa (inciso V) – porque ele propõe
efetivamente uma causa, seja pelo modo interventivo ou autônomo.
A oposição contém pedido autônomo e independente da ação principal. É julgada primeiro que
a ação principal (a oposição é uma prejudicial em relação à causa original-principal). Se o Autor
desiste da ação principal, a oposição prossegue até o final, da mesma forma.
“Não sendo condenatória a sentença – extintiva do processo ou da oposição, constitutiva ou
meramente declaratória, inclusive em casos de improcedência – deve prevalecer o disposto no
§ 4º do art. 20 e o juiz fará o arbitramento dos honorários segundo os critérios bastante
elásticos ali reportados. Arbitrá-los-á com moderação, ou seja, equilibradamente e com atenção
ao caso concreto (equidade), procurando adequá-los ao valor econômico em disputa. É errada
e injusta a praxe de calcular a percentual honorária sobre o valor da causa, porque tal não é
um critério estabelecido em lei (v. art. 20, § 3º) e porque a falta de correspondência com o valor
econômico da pretensão distorce a realidade (nem sempre o valor da causa é fixado
corretamente). Além disso, viola-se o princípio isonômico porque se concedem honorários ao
demandado vencedor em níveis muito inferiores aos que seriam concedidos ao demandante se
vencesse”.(Cf. Cândido Dinamarco, Intervenção de Terceiros, p. 130).
Se a oposição tiver sido julgada inadmissível (carência de ação, falta de pressupostos
processuais, etc.), não será admissível a ação rescisória proposta pelo opoente, dado
que este remédio só tem valia contra sentença de mérito (art. 485, caput, CPC).

# Observações:
- Marcus Vinícius Rios e Fredie Dider Jr. entendem que a oposição interventiva corre nos
mesmos autos da ação primitiva;
- no julgamento conjunto da ação e da oposição, deve o juiz conhecer desta em primeiro
lugar (art. 61 do CPC), pois o julgamento da oposição interfere na apreciação da ação
primitiva. Com efeito, se acolhida a oposição, fica prejudicado o julgamento da ação. É
nula a sentença que inverte a ordem (JTA 96/70);
- a extinção da ação principal não obsta o prosseguimento da oposição (Nélson Nery, Aldo
Sabino e RT 599/63);
- há divergências quanto ao recurso cabível contra o ato que rejeita liminarmente a oposição:
há um entendimento de que seria apelação (Ovídio Baptista e Vicente Greco Filho e JTA
91/380); o segundo entendimento é no sentido de que caberia agravo de instrumento (Arruda
Alvim, RP. 2/237). Nélson Nery e Bedaque entendem que a rejeição liminar da oposição antes
da audiência se configura decisão interlocutória e, depois da audiência, sentença;
- a hipótese de oposição não se confunde com a de embargos de terceiro. Nestes, busca-se
desembaraçar bem atingido por constrição judicial; já naquela, insurge-se contra pretensões de
autor e réu deduzidas num processo em curso;
- embora não sendo unânime, prevalece o entendimento segundo o qual não cabe oposição
em processo de execução, uma vez que neste não haveria controvérsia material entre autor e
réu, pressuposto básico para a intervenção do terceiro na qualidade de opoente (JTA 99/128,
Arruda Alvim, Nélson Nery, Dinamarco, Marcus Vinícius Rios). Celso Agrícola Barbi entende
que não é possível oposição apenas em execução baseada em sentença. Já Humberto
Theodoro admite a oposição sem restrição no processo de execução;
- Ernane Fidélis não admite oposição no processo cautelar. Já Aldo Sabino admite “nas
hipóteses em que seria cabível na cognição”;
- o art. 280 do CPC excluiu a oposição do procedimento sumário;
- os opostos são citados na pessoa de seus advogados (art. 57 do CPC), independentemente
de estes terem recebido poderes especiais, uma vez que o poder para receber a citação
decorre da lei; no entanto, não pode ser feita mediante publicação na imprensa, devendo ser
observadas as modalidades citatórias previstas no CPC;
- é incabível oposição oferecida em ação possessória pelo titular do domínio (JTA 107/214).
Divergente é a posição de Ovídio Baptista;
- é controvertida a questão relativa ao fato de ser aplicável a regra do art. 191 do CPC em se
tratando de prazo para contestar a oposição. Eduardo Arruda Alvim, Moniz de Aragão, Luiz
Fux, Ovídio Baptista, João Penido Burnier Jr. e Nélson Nery entendem que não. Celso Agrícola
defende a aplicação;
- não se admite oposição nos juizados especiais (art.10 da LJE);
- não cabe oposição em desapropriação (Nélson Nery e RT 505/153);
- o instituto da oposição, por restringir-se ao âmbito dos processos subjetivos, não se estende
nem se aplica ao processo de fiscalização abstrata de constitucionalidade, que se qualifica
como processo típico de caráter objetivo, sine contradictores, destinado a viabilizar o
julgamento, não de uma relação jurídica concreta, mas da validade da lei em tese (STF em RTJ
95/999);
- Celso Agrícola, Ovídio Baptista Fredie Didier Jr. e Frederico Marques admitem oposição de
oposição (oposição sucessiva);
- Candido Rangel Dinamarco fala ainda da possibilidade de oposições convergentes. Seriam
aquelas deduzidas no processo para impugnação da pretensão inicial sem levar em
consideração as demais oposições já deduzidas, ou seja, ter-se-iam duas ou mais
oposições à ação primitiva, e não oposição a uma anterior oposição já deduzida
- a oposição resulta da conexão entre a sua ação e a já existente;
- a oposição não pode ter objeto mais amplo que a coisa ou o direito controvertido entre autor e
réu (TFR, 2ª Turma, AC83.433-MS), sendo também esta a posição de Aldo Sabino;
- há divergência na doutrina quanto à classificação do litisconsórcio formado pelos
opostos. Athos Gusmão Carneiro e Alexandre Freitas Câmara ressaltam que por não ter
o juiz que decidir de maneira idêntica em relação aos opostos, se trata de litisconsórcio
simples e não unitário. Já Cândido Rangel Dinamarco e Luiz Fux sustentam o caráter
unitário do litisconsórcio.

NOMEAÇÃO À AUTORIA
Consiste no incidente pelo qual o mero detentor, quando demandado, indica aquele que é o
proprietário ou o possuidor da coisa litigiosa, visando a transferir-lhe a posição de réu (art. 62,
CPC). Na nomeação à autoria, na verdade, a demanda não é do nomeante, mas do nomeado.
O objetivo é corrigir o polo passivo da demanda. Tem como finalidade apenas a de fazer o
acertamento da legitimidade passiva ad causam do processo. Alexandre Freitas Câmara
entende que não é esse o real objetivo da nomeação à autoria, em razão da adoção da Teoria
da Asserção, no que se refere às condições da ação. Com efeito, de acordo com tal teoria, se o
autor indica o réu como sendo possuidor (ainda que ele seja mero detentor), ele é parte
legítima para a causa, uma vez que as condições da ação são aferidas em face das alegações
da parte autora. Na instrução do feito, caso se verifique que o réu é mero detentor, o caso será
o de improcedência da demanda, e não de ilegitimidade passiva. Dessa forma, para tal autor, a
nomeação à autoria existe para assegurar-lhe um resultado favorável e não para corrigir o polo
passivo da demanda.
Pode ser nomeado à autoria aquele com o qual o detentor está em relação direta de
dependência em relação ao objeto.
Aquele que deveria ser nomeado à autoria e não o foi não sofre os prejuízos da coisa julgada
diretamente no processo em que não foi parte.
Essa medida é cabível, também, nas ações de indenização, quando o réu causador do dano
“alegar que praticou o ato por ordem, ou em cumprimento de instruções de terceiro” (art. 63,
CPC).
O art. 63 do CPC trata da nomeação à autoria aplicável aos prepostos. Pela redação do §
único do art. 942 c/c art. 932 do novo CC, são responsáveis pelos atos do preposto tanto ele (o
preposto) como o empregador.
Pelo estudo dos artigos acima, Fredie Didier entende que, se o preposto é responsável
solidário com o empregador, não seria ele parte ilegítima; então o art. 63 do CPC não seria
nomeação à autoria, mas sim um chamamento ao processo, interpretando o tal artigo em
consonância com o novo Código Civil.
A nomeação à autoria, no sistema do Código, não é uma faculdade, mas sim um dever do réu,
de cuja inobservância resulta a responsabilidade por perdas e danos (art. 69, I, CPC). A
mesma sanção é aplicável no caso em que o réu nomeia pessoa diversa daquela em cujo
nome detém a coisa demandada (art. 69, II, CPC). Para ser admitida a nomeação à autoria,
faz-se necessário que se opere a dupla concordância, ou seja, primeiro o autor tem que
concordar com a nomeação. Depois, o nomeado tem que concordar com a nomeação.
Somente a partir de então, ocorreu a saída do réu-nomeante.
Chama-se extromissão a saída do réu-nomeante.
Sendo aceita a nomeação e assim sucedido um sujeito por outro na condição de réu, alterado
está o polo passivo da relação processual. A sentença que vier a ser dada incluirá o autor e o
réu nomeado, não mais o primitivo réu (o nomeante), que já estará excluído do processo.
Obviamente, com isso a coisa julgada será vinculativa do nomeado e não do nomeante – como
seria se não tivesse sido feita a nominatio, ou se não tivesse sido aceita. A nomeação à autoria
é uma iniciativa, portanto, que influirá na configuração subjetiva da coisa julgada a se formar ao
cabo do processo.
É cabível a nomeação à autoria em qualquer procedimento do processo de
conhecimento.
O prazo é o mesmo da contestação.
Quando o réu nomeia à autoria, não deve contestar o mérito da causa, pois, agindo desta
forma, aceita sua legitimidade para a causa. A nomeação à autoria está prevista no Código de
Processo Civil, artigos 64 a 68.
Com o advento do art. 1228 do novo CC (“art. 1228. O proprietário tem o direito de reavê-la do
poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha”), surgiram vozes afirmando que o
mero detentor seria parte-ré legítima em ação reivindicatória. Para Fredie Didier Jr., isto é um
absurdo, ele diz que a inovação é inaplicável, continuando a regra da nomeação à autoria
prevista no art. 62 do CPC.
# Observações:
a) não cabe nomeação à autoria quando o preposto agiu com excesso de gestão e praticou ato
culposo;
b) embora o CPC (art. 66) faça presumir que ao terceiro nomeado será sempre livre a recusa,
ficando o autor e o nomeante constrangidos a persistirem numa causa para a qual ambos
resultem convencidos da completa ilegitimidade passiva do demandado originário, a disposição
do art. 66 deve ser entendida em termos, uma vez que não parece lógico, que alguém possa
se livrar da condição de réu alegando simplesmente ilegitimidade passiva. De forma que se
deve atribuir ao juiz o poder de decidir quanto à legitimidade do nomeado (posição de Ovídio A.
Baptista);
c) na verdade, a tese defendida por Ovídio Baptista na alínea anterior não prevalece em termos
doutrinários. Celso Barbi e Barbosa Moreira defendem que o processo prossiga sem a
participação do nomeado que recusou a nomeação, mas este ficará sujeito aos efeitos da coisa
julgada se a recusa não tinha justa causa;
d) o CPC, ao estabelecer a responsabilidade por perdas e danos daquele que deixou de
nomear à autoria, quando lhe competia tal mister (art. 69, I), estabeleceu a
obrigatoriedade da nomeação à autoria;
e) o juiz pode indeferir de plano a nomeação à autoria, quando verificar desde logo o não
cabimento, sendo que neste caso há dois entendimentos quanto à restituição do prazo
para a resposta. A 3ª Turma do STJ entende que não se deve restituir o prazo para
resposta, sob pena de se incentivar a prática imoral de dilação do prazo para
contestação através de inadmissíveis nomeações (REsp 19452/RJ). Já a 4ª Turma do
mesmo STJ entende que, no caso de nomeação requerida de modo temerário, devem ser
aplicadas as sanções por litigância de má-fé, mas há que ser restituído o prazo para
resposta (REsp 32605/RS);
f) o nomeado à autoria não pode oferecer oposição;
g) se o autor nada requereu no prazo em que lhe competia se pronunciar sobre a nomeação,
ou se o nomeado não compareceu ou nada alegou, presume-se aceita a nomeação (art. 68 do
CPC);
h) não se admite nomeação a autoria no procedimento sumário (art. 280 do CPC);
i) Lívia Dal Pont Nicola leciona o cabimento da nomeação à autoria no processo cautelar por
ser a nomeação modo de fazer cessar a ilegitimidade passiva, o que beneficia o autor (que tem
inclusive o poder de recusá-la).

DENUNCIAÇÃO DA LIDE
A doutrina clássica, citada por Ovídio Baptista da Silva, conceitua denunciação da lide
como o ato pelo qual o Autor ou o Réu chamam a juízo um terceiro a que se ligam por
alguma relação jurídica de que decorra, para este, a obrigação de ressarcir prejuízos
porventura ocasionados ao denunciante, em virtude de sentença que reconheça a algum
terceiro direito sobre a coisa por aquele adquirida, ou para que este reembolse dos
prejuízos decorrentes da demanda. O instituto, segundo Sydney Sanches, melhor se
denominaria chamamento à garantia.
Trata-se de medida que leva, a uma sentença, a análise da responsabilidade do terceiro em
face do denunciante, de par com a solução normal do litígio de início deduzido em juízo, entre
autor e réu. A sentença poderá decidir sobre a relação e a responsabilidade de denunciado
para com o denunciante. Daí ter a denunciação da lide um caráter de “ação de regresso
incidental” – embora no bojo dos autos principais – entre denunciante e denunciado. Deve-se
sublinhar que o denunciado só pode ser condenado em relação ao denunciante e não em
relação à outra parte, perante a qual é terceiro alheio à lide, segundo a doutrina tradicional.
A denunciação à lide consiste em chamar o terceiro (denunciado) mantenedor de um vínculo
de direito com a parte (denunciante), para vir a responder pela garantia do negócio jurídico,
caso o denunciante saia vencido no processo.
O entendimento atual da jurisprudência admite a condenação direta da seguradora integrada à
lide por meio da denunciação. Invoca-se a função social do contrato de seguro, celeridade,
efetividade:
1. Para fins do art. 543-C do CPC: Em ação de reparação de danos movida em face do
segurado, a Seguradora denunciada pode ser condenada direta e solidariamente junto com
este a pagar a indenização devida à vítima, nos limites contratados na apólice.

2. Recurso especial não provido.

(REsp 925130/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em
08/02/2012, DJe 20/04/2012)

O art. 70 do CPC elenca os casos em que é obrigatória a denunciação da lide: a) na garantia


advinda da evicção; b) na garantia devida pelo possuidor indireto para com o possuidor direto;
e c) na garantia daquele que, por via de regresso, deva indenizar o prejuízo de quem perder a
demanda.
Assim, sempre que possa agir em demanda regressiva para reaver os prejuízos decorrentes da
eventual sucumbência na causa, o réu está autorizado a chamar para a ação esse terceiro que
à mesma se liga, ocorre o instituto da denunciação da lide.
O objetivo do incidente é enxertar no processo uma nova lide, que vai envolver o denunciante e
o denunciado em torno do direito de garantia ou de regresso que um pretende exercer contra o
outro. A sentença, de tal sorte, decidirá não apenas a lide entre autor e réu, mas também a que
se criou entre a parte denunciante e o terceiro denunciado. Porém, só haverá decisão quanto à
denunciação da lide caso o pedido do processo principal seja julgado procedente, pois, caso
não seja, carecerá o denunciante de interesse processual em relação ao denunciado.
A interpretação meramente literal do art. 70, do CPC, levaria à conclusão de que a
denunciação da lide, nas hipóteses elencadas seria obrigatória, sob pena de perda do direito
de regresso.
A maioria da doutrina entende que essa perda só ocorre no caso da evicção (art. 70, I -
evicção), em face do respaldo dado pelo art. 456 do novo CC. Nas demais hipóteses, previstas
no art. 70, II e III, do CPC, não ocorre a perda do direito de regresso, mesmo que não haja
denunciação da lide. O que ocorre na não denunciação, nestes casos, é apenas a perda de
uma oportunidade, qual seja, a de ver desde logo regulada, na mesma sentença, a situação
entre denunciante e denunciado (Arruda Alvim, Humberto Theodoro e Vicente Greco Filho).
Segundo Cândido Rangel Dinamarco, apesar de o art. 70 afirmar ser obrigatória a
litisdenunciação nas hipóteses que os três incisos tipificam, na verdade essa obrigação não
existe. É que nem sempre é absoluto o ônus de fazê-lo, no tocante à sorte do sujeito no
processo mesmo ou em relação ao direito material que tenha perante o terceiro. A
desvantagem que a parte suportará por não haver feito a litisdenunciação, podendo fazê-la,
ordinariamente não irá além da privação das vantagens que se habilitaria a receber se a
houvesse feito. A perda do eventual direito subjetivo material perante o terceiro, como sanção à
omissão de denunciar, existe exclusivamente no que diz respeito à evicção. Tal é a regra
contida no próprio CC (art. 456) e expressamente reafirmada no art. 70 do CPC, inciso I.
Há, ainda, uma corrente minoritária que entende que nem no caso do art. 70, I, haveria a perda
do direito de regresso por ação autônoma. Dizem que, se assim não se admitir, estar-se-á
prestigiando o enriquecimento ilícito.
Fredie Didier diz que, mesmo no caso do art. 70, I, nos casos em que a evicção decorre de ato
administrativo, há uma tranquilidade em aceitar o direito à ação autônoma de regresso, isto
porque sequer houve possibilidade de denunciar à lide, já que a evicção não adveio de
processo judicial.
Também é pacífica a admissão de ação autônoma nos casos do art. 70, I, quando o
procedimento da ação judicial da qual decorreu a evicção não admitir intervenções de
terceiro.
O problema é admitir a ação autônoma de regresso, nos casos do art. 70, I, mesmo quando a
evicção decorre de processo judicial em que não se exerceu o ônus de denunciar à lide.
No RESP 255639, o STJ manifestou-se pela desnecessidade da denunciação para o exercício
da ação autônoma de regresso:
Evicção. Denunciação da lide. Precedentes da Corte.

1. Já assentou a Corte, em diversos precedentes, que o "direito que o evicto tem de recobrar o
preço, que pagou pela coisa evicta, independe, para ser exercitado, de ter ele denunciado a
lide ao alienante, na ação em que terceiro reivindicara a coisa". 2. Recurso especial não
conhecido.

Outra questão que também causa dúvidas é o exato alcance do art. 70, III, do CPC (direito
regressivo de indenização).
Se no regime do Código de Processo revogado a única obrigação de indenizar que justificava a
denunciação da lide era aquela decorrente da evicção, muito raros não eram os julgados que
ampliavam o instituto, admitindo o chamamento à garantia em casos diferentes da evicção –
especialmente quando era chamada alguma companhia seguradora em caso de demanda de
ressarcimento movida por pessoa que mantinha contrato de seguro de responsabilidade civil
(especialmente demandas relativas a acidentes automobilísticos). Foi assim que, consciente da
linha da evolução dos ordenamentos processuais mais avançados, no inciso III de seu art. 70,
o CPC passou a destinar o instituto da denunciação da lide à conservação de qualquer direito
de garantia – e não mais, exclusivamente como antes, da garantia pela evicção. A partir de
então, qualquer que seja a natureza da garantia ou a natureza da obrigação sobre que ela
incide, poderá a parte denunciar a lide ao garante. E, despregada a litisdenunciação do instituto
da evicção, não há mais razão para limitá-la às ações reais; ao contrário, é justamente nas
ações pessoais para ressarcimento de dano que reside a sua grande e mais freqüente
utilidade, no dia-a-dia da experiência forense.
De acordo com o entendimento atual do STJ o exercício dos direitos de que resulta a evicção
não dependem do manejo da denunciação da lide, podendo ser realizado em processo
autônomo. Também não precisa aguardar o trânsito em julgado:
2. A evicção consiste na perda parcial ou integral do bem, via de regra, em virtude de decisão
judicial que atribui o uso, a posse ou a propriedade a outrem, em decorrência de motivo jurídico
anterior ao contrato de aquisição, podendo ocorrer, ainda, em virtude de ato administrativo do
qual também decorra a privação da coisa. Precedentes.

3. A perda do bem por vício anterior ao negócio jurídico oneroso é fator determinante da
evicção, tanto que há situações em que, a despeito da existência de decisão judicial ou de seu
trânsito em julgado, os efeitos advindos da privação do bem se consumam, desde que, por
óbvio, haja a efetiva ou iminente perda da posse ou da propriedade, e não uma mera cogitação
da perda ou limitação desse direito.

4. O trânsito em julgado da decisão que atribui a outrem a posse ou a propriedade da coisa


confere o respaldo ideal para o exercício do direito oriundo da evicção. Todavia, o aplicador do
direito não pode ignorar a realidade hodierna do trâmite processual nos tribunais que, muitas
vezes, faz com que o processo permaneça ativo por longos anos, ocasionando prejuízos
consideráveis advindos da constrição imediata dos bens do evicto, que aguarda, impotente, o
trânsito em julgado da decisão que já há muito assegurava-lhe o direito.

5. No caso dos autos, notadamente, houve decisão declaratória da ineficácia das alienações
dos imóveis litigiosos - assim como seu arresto - em virtude do reconhecimento de fraude nos
autos da execução fiscal movida pelo Estado de Goiás contra a empresa Onogás S/A, que
transferiu os referidos bens à recorrente, sendo certo que, em consulta ao sítio do Tribunal a
quo, verificou-se a improcedência dos embargos à execução fiscal em 14/12/2012, em
processo que tramita desde 1998.

6. Dessarte, a despeito de não ter ainda ocorrido o trânsito em julgado da decisão prolatada na
execução fiscal, que tornou ineficaz a alienação dos bens imóveis objeto do presente recurso,
as circunstâncias fáticas e jurídicas acenam para o robusto direito do adquirente, mormente
ante a determinação de arresto, medida que pode implicar no desapossamento dos bens e que
promove sua imediata afetação ao procedimento executivo futuro.

7. O exercício do direito oriundo da evicção independe da denunciação da lide ao


alienante na ação em que terceiro reivindica a coisa, sendo certo que tal omissão apenas
acarretará para o réu a perda da pretensão regressiva, privando-lhe da imediata obtenção do
título executivo contra o obrigado regressivamente, restando-lhe, ainda, o ajuizamento de
demanda autônoma. Ademais, no caso, o adquirente não integrou a relação jurídico-processual
que culminou na decisão de ineficácia da alienação, haja vista se tratar de executivo fiscal,
razão pela qual não houve o descumprimento da cláusula contratual que previu o chamamento
da recorrente ao processo.

8. Recurso especial não provido. (REsp 1332112/GO, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO,
QUARTA TURMA, julgado em 21/03/2013, DJe 17/04/2013)

Em relação ao denunciante, o denunciado é réu.


Já a relação do denunciado em face do adversário do denunciante é tratada de três formas, de
acordo com a respectiva corrente doutrinária:
a) Nelson Nery – O denunciado seria um assistente simples do denunciante, pois a vitória
deste lhe interessa;
b) Dinamarco. O denunciado seria assistente litisconsorcial do denunciante, pois é parte e não
simples coadjuvante (pode recorrer, etc.);
c) Corrente do CPC. O denunciado é litisconsorte unitário. Diz Fredie Didier que esta é a
orientação do STJ. A repercussão prática configura-se na possibilidade de o denunciado
ser condenado diretamente, ou seja, não seria preciso condenar o denunciante para, em
seguida, dizer que quem responderia seria o denunciado. Exemplo: se um segurado
denuncia a seguradora à lide, o juiz poderia condenar diretamente esta última.
A despeito de ser esta a orientação do STJ, Fredie Didier discorda da mesma, sob o
argumento de que não há relação direta entre denunciado e adversário do denunciante,
nem pedido nesse sentido, a fim de justificar a condenação do litisdenunciado.
A denunciação da lide coloca o terceiro (garantidor) na condição de assistente do denunciante.
Inadequadamente, insinua o CPC uma falsa condição de litisconsorte, o que faz ao proclamar
que, “feita a denunciação pelo autor, o denunciado, comparecendo, assumirá a posição de
litisconsorte do denunciante” (art. 74) e que, quando feita pelo réu, “se o denunciado a aceitar e
contestar o pedido, o processo prosseguirá entre o autor de um lado, e de outro, como
litisconsortes, o denunciante e o denunciado” (art. 75, I, CPC).
Isso significa que, na mesma medida da assistência litisconsorcial descrita pelo art. 54 do CPC
como figura geral, também aqui a assistência a ser prestada pelo denunciado ao denunciante
abre-se num conjunto muito rico de possibilidades de participação. Mesmo assim, o assistente
litisconsorcial é sempre um assistente e nunca um litisconsorte. Ele continua a sê-lo ainda
quando equiparado a este em seus poderes, faculdades, ônus, deveres, etc., ou mesmo
quando diga a lei que ele se considera um litisconsorte. O fato de ser essa uma assistência
provocada não desnatura a assistência como tal.
Como assistente – e ainda quando omisso no processo, sem participar – o denunciado ficará
afinal vinculado ao que se decidir quanto à causa pendente entre o denunciante e seu
adversário. Dados os limites do objeto do processo colocado pela demanda inicial deste, o
julgamento dessa causa não lhe dirá respeito, diretamente. Mas ele ficará impedido de repor
em discussão a justiça dessa decisão (art. 55, CPC), ou seja, ficará adstrito pela eficácia
preclusiva da coisa julgada. Isso significa que, passada em julgado a sentença, não poderá
alegar, em seu proveito, que houvesse sido mal julgada a causa entre o denunciante e seu
adversário. Em palavras liebmanianas: a eficácia da sentença não atinge o terceiro, mas a sua
autoridade impede que ele possa sustentar validamente algum fundamento contrário ao
decidido.
Ao fazer a denunciação da lide, a parte amplia o objeto do processo em relação à demanda
dita principal. O processo passa a conter, para fins de julgamento de meritis, também a
pretensão do denunciante em face do denunciado. Ter-se-á, portanto, um objeto composto, ou
complexo, e não mais somente a pretensão deduzida pelo autor inicial em face do réu. Tal é o
significado do art. 76 do CPC ao dispor: “a sentença que julgar procedente a ação declarará,
conforme o caso, o direito do evicto, ou a responsabilidade por perdas e danos, valendo como
título executivo”.
Ampliando assim o objeto do processo e devendo a sentença conter tanto o julgamento
principaliter da demanda inicial quanto da ação de garantia, segue-se que o seu decisório
estruturar-se-á necessariamente em capítulos, isto, porém somente se dará quando julgado
procedente o pedido principal. Haverá, assim, pelo menos um capítulo de sentença destinado
ao julgamento da pretensão do autor em face do réu e outro em que se julgará a pretensão do
denunciante em face do denunciado.
É de prejudicialidade a relação existente entre as duas causas pendentes no processo em que
se fez a denunciação da lide. Tomando como causa prejudicial aquela cujo julgamento interfere
no teor do julgamento de outra, a demanda inicial do processo é prejudicial à ação de garantia
proposta pelo denunciante em face do denunciado – no sentido de que, conforme os termos
em que for feito, o seu julgamento determinará o teor do julgamento desta.
Em outras palavras: a sentença a ser pronunciada na denunciação da lide compor-se-á pelo
menos de dois capítulos. A matéria a ser julgada no primeiro desses capítulos (a causa entre
as partes originárias do processo) é prejudicial à que no segundo capítulo se julgará – dado
que a pretensão do litisdenunciante perante o litisdenunciado é trazida em via eventual, para
que este seja condenado a ressarcir somente no caso de aquele sair vencido perante o
adversário inicial. Em caso de vitória do denunciante sobre este, a denunciação ficará
prejudicada e não se julgará pelo mérito.
A denunciação da lide é fenômeno típico do processo de conhecimento. Na execução
forçada, no processo monitório e no cautelar, em que julgamento algum de meritis se
pede nem se proferirá, isso é simplesmente inconcebível. Mesmo no âmbito do processo
de conhecimento, em alguns casos a lei afasta a admissibilidade da denunciação da lide,
como naqueles que se celebram pelo procedimento sumário (CPC, art. 280, I), ou perante
os juizados especiais (art. 10, Lei 9099), bem como em alguns processos preordenados a
uma tutela jurisdicional diferenciada – como o mandado de segurança, a ação popular,
etc.
Não pode o denunciado ser condenado no processo no que diz respeito à demanda principal
(posição do Didier e contrária do STJ no caso de seguradora). Mas a sentença poderá decidir
sobre a responsabilidade do denunciado para com o denunciante (art. 76 do CPC) (RT
550/193).
A denunciação da lide deve ser oposta no prazo da contestação.
Com fundamento no inciso III do art. 70 do CPC, discute-se a possibilidade do o Estado
denunciar à lide o servidor, no bojo de um processo em que se busca a
responsabilização civil do Estado.
A minoria (Nelson Nery, Vicente Greco, Marcelo Abelha) que nega a possibilidade da
denunciação, nestes casos, embasa a impossibilidade no fato de a responsabilidade subjetiva
do servidor ser um fato novo que inovaria a discussão do processo (responsabilidade objetiva).
A corrente majoritária (Dinamarco, Barbosa Moreira) diz que o art. 70, III deve ser
interpretado de forma ampla.
Neste conflito, ambas as teorias são usadas pelo STJ.
Para Fredie Didier Jr., é à luz do caso concreto que se admitirá ou não a denunciação da lide
ao servidor, somente devendo ser admitida quando beneficiar a solução da controvérsia
(princípio da economia processual).
Outra novidade é o § único do art. 456 do CC. Pela redação de tal artigo, o denunciante pode
deixar de contestar e/ou recorrer caso o denunciado não atender (revel) a denunciação da lide.
Para Fredie Didier, com este novo dispositivo, o art. 75, II, do CPC encontra-se obsoleto. Hoje
o que se aplica é o tal parágrafo único. O que explica a consequência prevista em tal
dispositivo é o fato de o denunciado ser um réu e, como tal, deve comparecer ao processo sob
pena de arcar com as consequências de sua revelia.
Por fim, há discussão a respeito do contido no caput do art. 456 do Código Civil “Art. 456. Para
poder exercitar o direito que da evicção lhe resulta, o adquirente (leia-se denunciante) notificará
do litígio o alienante imediato (denunciado), ou qualquer dos anteriores (outros denunciados),
quando e como lhe determinarem as leis do processo”. Denunciação per saltum.
Sobre tal tema, existem 4 correntes:
1) Alexandre Câmara – até que sobrevenha lei processual, é inaplicável a denunciação de
quem não for o último alienante;
2) Diz-se que surgiu novo instituto, a denunciação “per saltum” ou por salto; podendo-se
denunciar saltando de último para o penúltimo, ou antepenúltimo alienante e assim
sucessivamente; ou seja, não se denunciaria o último, mas o penúltimo ou antepenúltimo
alienante ou outros que houvesse na cadeia;
3) Sugere-se que o art. 456 do CC estabeleceu solidariedade passiva de todos os que
participaram da cadeia (solidariedade passiva);
4) Haveria denunciações sucessivas. O último alienante denunciaria o penúltimo, que, por sua
vez, denunciaria o antepenúltimo, e assim sucessivamente. Fredie Didier concorda com esta
corrente.
O Código de Defesa do Consumidor (art. 13, parágrafo único, c/c art. 88) estabelece que
aquele que efetivar o pagamento poderá, nos mesmos autos, dirigir o seu direito de regresso
contra os demais responsáveis, sendo vedada a denunciação. Tal dispositivo tem por objeto
resguardar o direito do consumidor que não pode ser obrigado a uma extensão, demora no
julgamento do processo. O que acontece, nesse caso, é que se julga primeiramente a relação
entre autor e réu, o qual condenado, e depois de paga a indenização poderá se valer dos
mesmos autos para se valer do direito de regresso contra o garante.
1. A jurisprudência desta Corte firmou posicionamento no sentido de que é possível o prestador
de serviço denunciar à lide, mesmo nas relações de consumo, somente incidindo a vedação do
art. 88 do estatuto consumerista quando se tratar de comerciante.

(AgRg no REsp 702.689/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA
TURMA, julgado em 23/10/2012, DJe 29/10/2012)

1. A vedação à denunciação da lide prevista no art. 88 do CDC não se restringe à


responsabilidade de comerciante por fato do produto (art. 13 do CDC), sendo aplicável também
nas demais hipóteses de responsabilidade civil por acidentes de consumo (arts. 12 e 14 do
CDC).

2. Revisão da jurisprudência desta Corte.

3. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO.

(REsp 1165279/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA,


julgado em 22/05/2012, DJe 28/05/2012)

# Observações:
a) há uma posição que não admite a possibilidade de denunciação da lide no processo
cautelar, uma vez que não há neste condenação indenizatória (Nélson Nery, Cândido
Dinamarco, Bedaque, JTA CIV 89/301); e há outra em sentido contrário (RT 592/208, RJTJSP
84/186);
b) predomina o entendimento da impossibilidade de denunciação da lide no processo de
execução (Nélson Nery, Cândido R. Dinamarco, Bedaque, RT 600/209,590/231, 562/112);
c) não se admite a denunciação da lide no procedimento sumário (CPC, art. 280) e no juizado
especial cível (LJE, art. 10). No primeiro caso, excetua-se a regra quando a denunciação
decorre de contrato de seguro;
d) admite-se denunciação da lide em ação declaratória (RTJ 125/655); há posição em contrário,
como a de Nélson Nery. Este sustenta que só seria cabível a denunciação em ação
condenatória, pois o objetivo do litisdenunciante é obter indenização regressiva a partir de uma
decisão que imponha pagamento ou a perda de um bem;
e) por se considerar que a obrigatoriedade constante do art. 70 decorre do direito material,
entende-se predominantemente que a denunciação da lide é obrigatória apenas nos casos em
que o direito material a estabelece como condição para o exercício do direito decorrente da
garantia. Assim, a denunciação da lide só seria obrigatória na hipótese do inciso I do art. 70 do
CPC; esta inclusive era a posição do STF (RTJ 106/1054). Por outro lado, ainda que se
reconheça que o adquirente, que não denunciou a lide ao alienante, perca o direito que da
evicção lhe resulta, por haver renunciado tacitamente a ele, aquele pode autonomamente
ajuizar ação para reaver o preço pago, a respeito do qual a renúncia tácita não se opera, sob
pena de se permitir o enriquecimento sem causa do alienante (Pontes de Miranda, JSTJ 40/75,
RJTJSP 131/123). A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, no REsp 132.258-RJ, julgado
em 06.12.99, no entanto, decidiu de forma diversa, entendendo que a não denunciação da lide
não acarreta a perda da pretensão regressiva, mas apenas a privação da imediata obtenção de
título executivo contra o obrigado regressivamente;
f) o art. 73 do CPC admite a cumulação sucessiva de várias denunciações da lide num só
processo;
g) o Código Civil, em seu art. 456, parece admitir a denunciação per saltum, conforme
entendimento esposado por Cássio Scarpinella Bueno (Partes e terceiros no processo civil.
Saraiva, 2003, p.249-256) e por Nélson Nery. Não obstante há que se salientar que tal
entendimento não é pacífico.
Rodrigo Salazar, Daniel Carvalho e Fredie Didier Jr. sustentam que o artigo legal em
destaque autoriza a denunciação da lide coletiva, ou seja, a disposição legal permite a
denunciação de todos os anteriores proprietários, e não apenas a denunciação a um elo
intermediário da cadeia dominial.
E ainda há tese no sentido de que, como a lei civil determina que a cientificação se
faça em conformidade com a lei processual, e esta exige que a denunciação seja feita a quem
fez imediatamente a transferência do bem ao denunciante, a disposição do art. 456 do CC se
apresenta inócua (Alexandre Freitas Câmara);
h) Marinoni e Sérgio Cruz entendem que, como o art. 73 do CPC fala em intimação do outro
terceiro (a ser denunciado por aquele que já o foi anteriormente), o ideal é que a partir da
primeira denunciação não se admita outra figura, mas que seja apenas intimado o terceiro
alienante;
i) a denunciação sucessiva pode ser feita coletivamente, ou seja, requerida em conjunto pelo
denunciante (Moniz de Aragão, STJ- RT 679/195);
j) não se admite a denunciação da lide pelo comerciante titular do direito de regresso
decorrente da responsabilidade pelo fato de o produto comercializado ser defeituoso (art. 88
c/c art. 13, parágrafo único, ambos do CDC);
k) discute-se quanto à possibilidade de condenação no pagamento de honorários
advocatícios do réu denunciante quando o pedido da ação principal foi julgado
improcedente e prejudicada, em conseqüência, a denunciação. Há entendimento
segundo o qual só há condenação se a denunciação era facultativa; bem como se
defende que, neste caso, o adversário do denunciante deve ser condenado, pelo
princípio da causalidade, pois deu causa à propositura da ação secundária. Já José
Roberto dos Santos Bedaque entende que, quando a denunciação não era obrigatória e
a mesma fica prejudicada, quem arca com os honorários advocatícios é o denunciante;
Não tendo havido resistência à denunciação da lide não cabe a condenação da denunciada em
honorários de advogado em face da sucumbência do réu denunciante. Incidência da Súmula
83.

2. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg no Ag 1226809/MG, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA,


julgado em 02/12/2010, DJe 01/02/2011)

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO - DENUNCIAÇÃO DA LIDE -


NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL - INEXISTÊNCIA – IMPROCEDÊNCIA DA
AÇÃO PRINCIPAL - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DEVIDOS PELA DENUNCIANTE À
DENUNCIADA - RECURSO IMPROVIDO.

(AgRg no Ag 1220661/RJ, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em


15/12/2009, DJe 03/02/2010)

PROCESSUAL CIVIL - DENUNCIAÇÃO À LIDE - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS -


AUSÊNCIA DE RESISTÊNCIA DO DENUNCIADO - IMPOSSIBILIDADE.

1. Na denunciação à lide, se o denunciado comparece aos autos e atua como litisconsorte ativo
do réu, obtendo ambos o êxito na demanda, é descabida a condenação em honorários
advocatícios entre eles.

Precedentes.

2. Recurso especial provido.


(REsp 1065437/MG, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em
05/03/2009, DJe 02/04/2009)

l) o CPC de 1939 tratava a denunciação da lide como chamamento à autoria; se bem que esta
naquele diploma legal tinha acepção mais restrita;
m) não existe a possibilidade de a parte denunciada simplesmente não aceitar a denunciação.
Aquela poderá impugnar o cabimento, e não apenas recusar a denunciação;
n) há entendimento segundo o qual, se o réu alega ilegitimidade passiva, não pode promover a
denunciação da lide, pois, se se coloca como parte ilegítima, não terá automaticamente
legitimidade ativa na denunciação (Arruda Alvim, Eduardo Arruda Alvim, RT581/213, JTA
149/92). Há outro entendimento no sentido do cabimento, diante do princípio da eventualidade
(Theotônio Negrão, LEX 149/92);
o) o art. 76 do CPC deve ser entendido como se dissesse que a sentença, quando o
denunciante for vencido na ação principal, declarará o direito do evicto ou a responsabilidade
por perdas e danos decorrentes da derrota;
p) em ação civil pública fundada em responsabilidade objetiva do réu, não cabe
denunciação da lide que importaria em introduzir fundamento novo em detrimento do
direito do autor (Mazzilli, STJ-1ª Turma, REsp 232.187/SP). Em sentido oposto se
posiciona Mancuso;
q) é da competência da Justiça Federal decidir sobre a denunciação da lide a ente federal;
r) contestando a ação, o litisdenunciado assume a posição de litisconsorte do
denunciado e pode ser diretamente condenado, tanto que reconhecida a sua exclusiva
responsabilidade (STJ, 3ª Turma, REsp 23.102-8-RS);
s) não cabe denunciação da lide em ação de despejo (RT 596/157, 661/135);
t) Nélson Nery e Armelim entendem que não cabe denunciação da lide em embargos de
terceiro, uma vez que nestes não se exerce pretensão à propriedade, posse ou uso da coisa;
u) o VI ENTA concluiu pelo não cabimento da denunciação da lide em embargos à execução;
v) Cândido R. Dinamarco afirma que o entendimento dominante é no sentido de não se admitir
denunciação na monitória. Em sentido contrário, é a posição de Verônica Santos de Novaes;
w) pelo que consta do art. 75, inciso II, do CPC, se o denunciado for revel, cumprirá ao
denunciante, na relação primitiva, prosseguir na defesa do interesse até o final. Por outro lado,
o Código Civil de 2002 fixa, para o caso de denunciação da lide feita em razão de evicção, a
possibilidade, em caso de revelia do denunciado, de o denunciante deixe de contestar ou de
usar recursos na relação primitiva. Assim, fica evidente que não se aplica o inciso II do art. 75
do CPC em caso de denunciação da lide feita com fundamento em evicção.
Importante registrar que Fredie Didier Jr. sustenta que o dispositivo mencionado no parágrafo
anterior foi revogado totalmente e já era incompatível com a figura da denunciação da lide
como introdução de uma nova relação processual. Destaca o doutrinador em evidência que o
art. 75, II, do CPC só teria razão de ser na vigência da figura extinta denominada de
chamamento à autoria.

CHAMAMENTO AO PROCESSO
É o incidente pelo qual, nos termos do art. 77 do CPC, o devedor demandado chama para
integrar o mesmo processo os coobrigados pela dívida, de modo a fazê-los também
responsáveis pelo resultado do feito.
É uma intervenção provocada pelo réu facultativa, só cabível em processo de conhecimento.
Do ponto de vista do direito material, o que caracteriza o chamamento é a existência de uma
solidariedade passiva.
Na situação em que se admite o chamamento ao processo (art. 77), abre-se ao réu (e só ao
réu) a possibilidade de provocar um litisconsórcio passivo, trazendo à relação processual o
legitimado que o autor excluíra; é o fiador chamando o devedor principal, ou um co-fiador
chamando outro, ou um devedor solidário chamando o co-devedor. O chamamento à demanda
se dirige invariavelmente ao coobrigado que o autor não fez citar. No chamamento ao processo
o terceiro deixa de ser terceiro, tornando-se litisconsorte passivo (ulterior) ainda que venha a
impugnar a existência da solidariedade.
O efeito útil da integração de terceiro ao processo é, para o réu que o chama, a obtenção de
título para promover execução forçada contra ele (chamado) em caso de sucumbir perante o
autor e vir a satisfazer a obrigação (art. 80). Assim, por exemplo, o fiador que é condenado e
paga ou suporta a execução sub-roga-se no direito do credor e, se tiver chamado o afiançado
ao processo, valer-se-á da mesma sentença que impusera condenação solidária a ambos
como título para promover a execução contra ele. Conseqüentemente, a sentença que julgar a
causa compor-se-á de capítulos– um para decidir a pretensão do demandante, outro dispondo
sobre a deduzida pelo chamador. E, com isso, tal sentença terá eficácia mais ampla do que a
que teria se não tivesse sido feito o chamamento.
A incorporação do instituto do chamamento ao processo à ordem processual brasileira veio a
simplificar as coisas, em benefício do fiador, ou do devedor solidário: se tomar a iniciativa de
chamar ao processo aquele ou aqueles perante os quais terá direito em caso de sucumbir,
todos serão condenados juntamente com ele, tornando-se desnecessária nova iniciativa, no
processo de conhecimento; bastar-lhe-á, se vier a fazer o pagamento ou a suportar a execução
promovida pelo credor comum, promover a sua própria execução em face dos chamados.
O chamamento ao processo é uma faculdade e não uma obrigação do devedor demandado.
Só o réu pode fazer o chamamento ao processo.
O chamamento ao processo é instituto peculiar ao processo de conhecimento, sendo
inadmissível chamar terceiro ao de execução, ao cautelar ou ao monitório. Essa modalidade de
intervenção coata gravita em torno de uma sentença de mérito, que seria dada entre autor e
réu e passará a ser dada entre aquele e todos os litisconsortes passivos integrantes da relação
processual a partir de quando feito o chamamento. A utilidade do chamamento, para o
chamador, reside precisamente nesta sentença assim mais ampla e de eficácia subjetivamente
mais ampla. Ora, inexiste sentença de mérito naqueles processos, como é notório. Não há
como produzir, no processo monitório, por exemplo, uma sentença como aquela indicada no
art. 80 do CPC, quando nele o juiz não profere sentença alguma sobre a existência ou
inexistência do direito do autor. O STF afirmou uma vez a admissibilidade do chamamento ao
processo executivo, mas o fez por notória razão pragmática e depois, acertadamente,
retrocedeu.
Tampouco cabe o chamamento ao processo em caso de procedimento sumário (art. 280, I,
CPC), bem como nos processos perante os juizados especiais (art. 10, Lei 9099) e em certos
processos destinados à tutela diferenciada, como o mandado de segurança, etc.
O art. 77 do CPC elenca os casos de admissibilidade do incidente: “I – do devedor, na ação em
que o fiador for o réu; II – dos outros fiadores, quando para a ação foi citado apenas um deles:
III – de todos os devedores solidários, quando o credor exigir de um ou de alguns deles, parcial
ou totalmente, a dívida comum".
Vê-se, assim, que ocorre o chamamento ao processo quando, sendo citado apenas um ou
alguns dos devedores solidários, peçam eles a citação do outro, ou outros, de modo a decidir
num mesmo processo sobre a responsabilidade de todos. A finalidade do chamamento ao
processo é ampliar o objeto do processo, trazendo para a causa os demais obrigados
solidariamente responsáveis com o Réu. Trata-se de formação litisconsorcial facultativa,
faculdade legal outorgada ao Réu.
Para parte da doutrina, da análise do art. 77 do CPC, os casos ali especificados são de
obrigações que comportam direito de regresso, fato que poderia muito bem ser enquadrado na
previsão do art. 70, III (denunciação da lide). No entanto, não poderá o réu escolher se
denuncia a lide ao terceiro ou se o chama ao processo, eis que o artigo 77 trata decasos
específicos de direitos regressivos, aos quais a lei deu tratamento à parte.
Fredie Didier Jr. discorda do entendimento acima. A disciplina da situação do chamado no
processo é diferente da disciplina da situação do litisdenunciado, justamente por causa da
direta vinculação jurídico-material ao autor, que o primeiro tem e o segundo, não.
Ademais, distingue-se o chamamento ao processo da denunciação à lide por vários motivos:
1º) no chamamento ao processo os réus são obrigados perante o credor comum; na
denunciação da lide há vínculo obrigacional apenas entre o denunciante e o denunciado, não
havendo nenhuma relação jurídica entre este e o adversário do denunciante;
2º) a denunciação da lide constitui ação condenatória incidente que permite ao juiz
cumulativamente, ao julgar procedente ou improcedente o pedido, estabelecer a
responsabilidade do terceiro para com o denunciante; no chamamento ao processo, além
dessa responsabilidade que pode ser fixada, o terceiro chamado fica também sujeito aos
efeitos da sentença que julgar o pedido procedente;
3º) cabe denunciação da lide em casos em que o prejuízo obtido advém de ato ou por
responsabilidade de outrem e que o denunciante deve suportar;
4º) na denunciação à lide não há previsão de solidariedade passiva, enquanto no chamamento
ao processo todas as hipóteses são formas de solidariedade; e
5º) na denunciação à lide está previsto o direito de regresso. A denunciação à lide pode ser
feita pelo Autor e pelo Réu, ao passo que o chamamento ao processo é faculdade atribuída tão
somente ao Réu.
Segundo Fredie Didier, não obstante a literalidade do art. 80 do CPC, deve-se permitir que
qualquer um (chamante ou chamado) pode sofrer, primeiramente, a execução. Não há ordem
de preferência na execução. Aquele que pagar a dívida poderá se voltar contra o outro.
O chamamento ao processo deve ocorrer no prazo da contestação.
# Observações:
a) não se admite o chamamento ao processo no procedimento sumário (art. 280 do CPC);
b) predomina o entendimento de que não cabe chamamento ao processo na execução
(Dinamarco e Walter Vecchiato Júnior, por exemplo), uma vez que, tendo esta a finalidade de
realização do crédito do exeqüente, não haveria lugar para a prolatação da sentença referida
no art. 78, e que serviria de título executivo ao vencido contra os co-obrigados; no processo de
execução, se o co-obrigado paga a dívida por inteiro, poderá nos mesmos autos executar os
demais co-obrigados (CPC, art. 595, parágrafo único), desde que o título executivo já
estabeleça a responsabilidade dos co-devedores;
c) entende-se predominantemente que não cabe chamamento ao processo nos embargos à
execução, uma vez que os réus destes são os credores e, ainda, pelo fato de os embargos
terem objetivo exclusivo de elidir a execução;
d) predomina o entendimento de que não cabe chamamento ao processo no processo cautelar,
uma vez que não haveria espaço para condenação de co-obrigado (Dinamarco e RT 591/180);
e) não se admite chamamento no Juizado Especial Cível (LJE, art. 10);
f) não cabe o chamamento ao processo em ação civil pública, quando fundada na
responsabilidade objetiva do réu (RT 655/83);
g) é cabível o chamamento ao processo em ação de indenização por acidente de veículo
quando o réu imputar a terceiros participação na causação do dano, tendo em vista que o
terceiro tem responsabilidade solidária (RT 526/86, 494/89 e RF 255/195);
h) Dinamarco admite o chamamento ao processo na monitória.
OBSERVAÇÕES GERAIS A RESPEITO DA INTERVENÇÃO DE TERCEIROS:
1ª) Na ação desenvolvida no Juizado Especial, é possível a formação de litisconsórcio tanto
ativo quanto passivo. Já quanto às formas de intervenção de terceiro, todas são
expressamente vedadas, inclusive a assistência (art. 10, lei 9099/95). Afinal, busca-se
simplicidade e celeridade no procedimento, que, com a adoção das aludidas formas ficariam
prejudicadas.
2ª) No procedimento sumário não será admissível ação declaratória incidental, nem a
intervenção de terceiros, salvo a assistência, o recurso de terceiro prejudicado e a intervenção
fundada em contrato de seguro (art. 280, I, CPC).
3ª) Não cabe, no processo de embargos, a denunciação da lide, o chamamento ao processo e
a nomeação à autoria. Os dois primeiros são formas de intervenção que ocorrem em processo
tendente à obtenção de sentença condenatória. A última (nomeação à autoria) funciona como
mecanismo de correção de ilegitimidade passiva, cabível em hipóteses restritíssimas, que não
se realizam na execução.
4ª) A assistência é a modalidade de intervenção de terceiro que mais se adapta ao processo
cautelar, em maior amplitude de hipóteses. A perspectiva de futura intervenção no processo
principal – pela forma de oposição, denunciação da lide ou de chamamento ao processo –
legitima o terceiro a intervir como assistente no cautelar; ele tomará a iniciativa de intervir para
preparar sua própria oposição, ou será provocado a isso pela parte que pretende fazer depois
a denunciação ou chamamento (assistência voluntária ou coata, portanto, conforme o caso).
Apenas a nomeação à autoria é que, por suas características e objetivos, aparece também no
processo cautelar em sua plena configuração.
5ª) O chamamento ao processo e a denunciação da lide, que entre si guardam significativos
pontos de semelhanças, não são admissíveis, como tais, em espécie alguma de processo
cautelar. É pensar, por exemplo, num processo de arresto, seqüestro, busca-e-apreensão, ou
mesmo atentado: a pedra de toque para eliminar qualquer cogitação a respeito é sempre a
observação de que condenação alguma cabe nesses feitos, os quais não conduzem a medidas
satisfativas, mas de apoio.

Item: Ações Possessórias:


A tutela possessória prevista nos arts. 920 e seguintes do CPC é destinada às ações de força
nova fundadas na posse. Se a questão versar sobre domínio (propriedade), a ação adequada é
a petitória, cujo rito é o ordinário. O rito ordinário será destinado, ainda, às ações possessórias
de força velha, isto é, àquelas em que a violação do direito se deu há mais de ano e dia.
Caberá ação de reintegração de posse sempre que ocorrer o esbulho, ou seja, se o possuidor
for injustamente desapossado da posse por terceiro. Falar-se-á em manutenção de posse nas
hipóteses em que o possuidor for turbado, isto é, quando o terceiro atrapalhar o livre exercício
do direito de posse. Por fim, o interdito proibitório terá lugar nas ocasiões em que o possuidor
queira se assegurar de violência iminente ou tenha justo receio de ser molestado no seu
exercício de posse (art. 1.210, CC).
Pede-se, por via das ações possessórias, a posse com fundamento no fato jurídico posse. O
pedido e a causa de pedir têm que ser fundados na posse. O art. 923 do CPC prevê que, na
pendência de ação possessória, não se poderá intentar outra cujo objeto seja o
reconhecimento do domínio.
Em regra, descabe discutir o domínio em ação possessória, exceto se ambos os litigantes
disputam a posse sob a alegação de propriedade ou quando duvidosas ambas as posses
suscitadas
Exerce-se a proteção possessória por três modos: (a) pela autotutela, através de desforço
físico e imediato e nos limites indispensáveis à manutenção ou restituição (art. 1.210, CC); (b)
pelas ações possessórias típicas; (c) por outros tipos de ações de conteúdo possessório, como
ocorre, por exemplo, com os embargos de terceiros.
A ação de imissão na posse não tem natureza possessória, mas sim petitória, pois se discute
através dela o domínio.
O art. 920, CPC prevê a fungibilidade das ações possessórias, de modo que o juiz poderá
conhecer e julgar a ação mesmo que a parte formule pedido diverso daquele originalmente
nominado. O art. 921 permite a cumulação do pedido possessório com: condenação em perdas
e danos; cominação de pena para caso de nova turbação ou esbulho; desfazimento de
construção ou plantação feita em detrimento de sua posse.
As ações possessórias possuem natureza dúplice, ou seja, se o réu pretende deduzir defesa
contra o autor, poderá fazê-lo por intermédio de pedido contraposto na mesma peça de
contestação, não sendo necessário que interponha reconvenção. Há quem entenda, porém,
que restará configurada a natureza dúplice quando pela natureza do direito material debatida, a
improcedência do pedido do autor levará o réu a obtenção do bem da vida discutido, ou seja,
não há nem mesmo necessidade do réu fazer pedido. O art. 922 preceitua que poderá o réu
formular pedido contraposto quando se tratar de pretensões relacionadas à proteção
possessória e à indenização pelos prejuízos resultantes do esbulho ou da turbação cometidos
pelo autor. A jurisprudência tem admitido a reconvenção em casos excepcionais, havendo
conexão.
A competência para conhecer e decidir questões possessórias é o foro da situação da
coisa (art. 95, CPC), sendo tal regra de competência absoluta.
A legitimidade ativa para propor a ação possessória é daquele que tem a posse da coisa ou
está no direito de pedir sua restituição. Legitimado ativo é aquele que tem tanto a posse direta,
como a indireta. É permitido aos copossuidores defender sua posse dos outros copossuidores
desde que exista a divisão. Legitimado passivo será aquele que turba, esbulha ou ameaça. Se,
porventura, o autor da ação desconhecer a qualificação do réu, a inicial não poderá ser
indeferida, pois as pessoas podem ser determináveis e assim será proferida a sentença (REsp
326165/RJ). Igualmente não será indeferida se, em se tratando de espólio, não houver a
instauração prévia de inventário (REsp 474982/PR). Sendo o autor ou réu casado, necessitará
de outorga uxória ou marital tão-somente em casos de composse ou de atos praticados por
ambos.
Prevê o art. 924, CPC que, tratando-se de posse nova, o procedimento a ser seguido é o
especial. Se, no entanto, a posse for de força velha, a ação seguirá o rito ordinário ou sumário,
dependendo do valor da causa. Nas ações de posse nova e, portanto, que seguem o rito
especial, admite o legislador que a parte formule pedido liminar, o qual poderá ser negado ou
não. O fato de o juiz não conceder a liminar não impede que a ação prossiga pelo rito ordinário,
o qual, aliás, será adotado após a análise da pretensão liminar. A decisão liminar na ação de
força nova possui natureza de interlocutória, sendo atacável por agravo de instrumento.
Poderá, ainda, o juiz determinar que o autor preste caução, se verificar, através de prova
produzida pelo réu, que o autor carece de idoneidade financeira para reparar eventuais danos
em havendo sentença que favoreça o réu (art. 925, CPC).
A ação de manutenção de posse é o meio de que se pode servir o possuidor em caso de
turbação. Seu objetivo específico é o de obter mandado judicial que faça cessá-la; visa,
também, ao recebimento de indenização dos danos causados pela turbação e à cominação da
pena para o caso de reincidência. Turbação é todo ato que embaraça o livre exercício da
posse, haja, ou não, dano, tenha o turbador, ou não, melhor direito sobre a coisa. Há de ser
real, isto é, concreta, efetiva, consistente em fatos.
Quanto à reintegração de posse, é ação que tem por fim específico a recuperação da coisa da
qual o possuidor foi desapossado. “Tem todo possuidor direito a consegui-la se da posse for
privado por violência, clandestinidade ou precariedade. Também chamada de ação de força
nova espoliativa, pressupõe ato praticado por terceiro que importe para o possuidor perda da
posse, contra sua vontade.” (Orlando Gomes)
A petição inicial deve obedecer aos requisitos dos arts. 282 e 927 do CPC. Se a posse foi
transmitida por ato inter vivos ou causa mortis, poderá servir de fundamento para a ação, sob
alegação da soma daquela que cabia ao sucessor para com a do antecessor. A inicial deve vir
instruída com os documentos que forem necessários para a prova da turbação ou do esbulho,
com a indicação precisa da data, requisito este essencial para o cabimento do procedimento
especial. É característica do procedimento especial das possessórias o poder que tem o
juiz em conceder a liminar sem que haja pedido expresso da parte, bastando que se
configurem os requisitos do art. 927, CPC. Poderá o juiz não se convencer, inicialmente, do
preenchimento dos requisitos para a concessão da liminar, determinando, então, que o autor
justifique previamente o alegado. Neste caso, o réu será citado para a audiência de justificação
para acompanhá-la. Se o réu for pessoa jurídica de direito público, a audiência de justificação é
obrigatória, o que se justifica em razão da presunção de que o poder público age sempre
dentro dos parâmetros de legalidade. Demonstrados os requisitos para a concessão da liminar,
o juiz determinará a expedição do mandado de manutenção ou reintegração de posse. Em
seguida, dentro do prazo de cinco dias, o autor deverá promover a citação do réu, agora para
responder aos termos da demanda. Se já houver sido citado para a justificação prévia,
desnecessária a repetição do ato processual, prevendo o legislador que o prazo para a defesa
será contado da intimação da decisão que houver negado ou concedido a liminar. O réu poderá
apresentar todas as defesas previstas em lei (contestação, exceção e reconvenção, se for o
caso), e, mantendo-se silente, será revel. O prazo é de quinze dias, tomando o feito o rito
ordinário (art. 931, CPC). Da sentença final caberá apelação no efeito devolutivo e suspensivo,
ressalvada a hipótese do art. 520, VII, CPC, que, apesar de referir-se à tutela antecipada,
pode ser aplicado também às liminares da possessória.
Prevista nos arts. 932 e 933, CPC, tem cabimento a ação de interdito para impedir que se
efetive a turbação ou o esbulho possessório. Necessário para ajuizamento da ação a prova do
receio de turbação ou esbulho. O justo receio é subjetivo, devendo a parte demonstrar sua
existência. O autor formulará pedido de pena pecuniária caso o preceito da decisão favorável
seja descumprido. A decisão do juiz que acatar o pedido resultará na expedição de mandado
proibitório com cominação de pena pecuniária. É ação de caráter preventivo, sendo de preceito
cominatório, devendo ser observados os arts. 287, 644 e 645, CPC. O rito especial somente se
aplica a ações de força nova, cabendo pedido liminar que poderá ser deferido inaudita altera
pars ou após justificação prévia. Deferida ou não a liminar, o réu, após citado, terá o prazo de
15 dias para apresentar defesa, cabendo todas previstas na lei processual civil. Após a
apreciação da liminar, seguir-se-á o rito ordinário.
Peculiaridades
Há algum caso em que o domínio é relevante em possessória?
Em regra é irrelevante, mas a jurisprudência identificou dois casos em que o domínio é
relevante na ação possessória:
(i) Se ambas as partes alegarem domínio, é preciso dar a posse a quem tiver o domínio.
Súmula 487 STF: Será deferida a posse a quem, evidentemente tiver o domínio, se com base
neste for ela disputada.
(ii) Se ninguém conseguir comprovar a posse, é preciso dar a posse a quem tiver o
domínio.

Art. 923 CPC. Na pendência do processo possessório, é defeso, assim ao autor como ao réu,
intentar a ação de reconhecimento do domínio.
Interpretação literal deste dispositivo é que se há uma ação possessória pendente, autor e réu
não podem propor ação petitória sobre o bem, entretanto, a interpretação dominante que se dá
a este artigo é se a ação possessória pendente for uma ação em que a alegação de
domínio é irrelevante esta proibição não se aplica. Este dispositivo só se aplica na
pendência de ações possessórias nas quais o domínio for relevante.
SÚMULA 228 STJ: É inadmissível o interdito proibitório para a proteção do direito autoral.
A idéia é que os direitos autorais não se protegem por ações possessórias, pois só pode existir
posse de bens materiais. Para proteger os direitos autorais é necessário utilizar a proteção do
art. 461 CPC.
A posse pode ser divida entre duas pessoas, possuidor direto e indireto. Neste caso, ambos
podem obter proteção possessória.
Na ação possessória é necessário provar a posse e a violência (ameaça, esbulho,
turbação). Entretanto, atualmente muitos discutem a necessidade de provar um terceiro
elemento que decorreria diretamente da CF, qual seja, a FUNÇÃO SOCIAL DA POSSE,
pois só uma posse exercida em conformidade com a sua função social pode ser
considerada digna de proteção. Diz-se que a função social da propriedade exige a
função social da posse.
O procedimento especial das ações possessórias tem como grande marca a possibilidade de
tutela antecipada possessória, a qual dispensa a demonstração de perigo/ urgência,
basta que prove a posse e a violência. Uma tutela antecipada que dispensa perigo é uma tutela
antecipada apenas da evidência.
 Esta tutela antecipada diferenciada pode ser concedida com ou sem audiência de
justificação de posse. Nesta audiência de justificação de posse para concessão de liminar, o
réu deve participar? Participa, pode inclusive inquirir as testemunhas porventura levadas pelo
autor (existe contraditório).
 Não cabe tutela antecipada possessória contra o Poder Público sem a sua oitiva prévia
(art. 928, § único CPC).
O CC/1916 previa que o possuidor só teria direito a este procedimento especial da possessória
se entrasse com ação possessória no prazo de ano e dia contados do esbulho ou da turbação,
caso contrário a ação estará sujeita ao procedimento comum. Esta disposição foi repetida pelo
CPC/1973. O CC/2002 não fala mais no prazo de um ano e dia, entretanto, este prazo
ainda é admitido com base no CPC.
 Cabe tutela antecipada na ação possessória comum (com mais de um ano e dia)?
Cabe a tutela antecipada comum com necessidade de comprovar a urgência.
Cabe reconvenção em possessória?
É cabível, desde que se peça algo distinto da proteção possessória e da indenização. Ex.:
resolução do contrato.
É na defesa da ação possessória que o réu alega o direito de retenção.
Na defesa da ação possessória o réu pode alegar usucapião? É possível, mas pode ser isso
irrelevante, pois usucapião refere-se ao domínio.
Item: Ação de Divórcio:
Com a recente alteração da CF acerca do divórcio, surgiram algumas questões interessantes:
Questão controvertida acerca do desaparecimento ou não da separação judicial:
1° posição: foi extinta com a emenda do divórcio.
2° posição: não foi a finalidade da emenda acabar com a separação. Ela apenas acabou com a
sua obrigatoriedade como fase para se chegar ao divórcio. Ainda é faculdade dos cônjuges.
O divórcio pode ser feito extrajudicialmente ou judicialmente. Esse tem vez com a ação de
divórcio. Sempre que houver filhos menores ou incapazes, ou então, não houver consenso
entre os cônjuges.
Pode se ajuizada um dia após o casamento, não havendo mais a obrigatoriedade de cumprir
qualquer prazo.
Não precisa imputar ao outro qualquer quebra do dever conjugal, apenas comprovar a
insuportabilidade da vida em comum.
A EC 66/2010 suprimiu o requisito da prévia separação judicial para a dissolução do casamento
civil pelo divórcio.
A Lei 6.515/1977 (Lei do Divórcio) deve ser lida hoje à luz da EC 66/2010.

Item: Ação de Alimentos:


O rito especial da lei de alimentos (Lei 5.478/1968) é aplicável no caso de cobrança de
alimentos com prova pré-constituída da obrigação alimentar.
Havendo necessidade de discussão do dever alimentar, a ação será de procedimento
ordinário. Pode, ainda, valer-se deste rito a companheira comprovada de homem solteiro,
separado judicialmente, divorciado ou viúvo, que com ele viva há mais de cinco anos, ou dele
tenha prole, enquanto não constituir nova união e desde que prove a necessidade, e, nas
mesmas condições, o companheiro.
O autor dirigir-se-á ao juiz competente expondo suas necessidades e provando apenas seu
parentesco ou a obrigação alimentar do devedor, indicando sua qualificação e recursos de que
dispõe. Se o credor não estiver assistido por advogado, o juiz nomeará profissional para que o
faça.
O juiz poderá, ao despachar o pedido, fixar alimentos provisórios a serem pagos pelo devedor,
salvo se o credor expressamente declarar que deles não necessita.
No caso de companheiros, deverá haver comprovação documental da união para a concessão
de alimentos provisórios.
O escrivão, em 48 horas remeterá ao devedor a segunda via da petição com despacho do juiz
e designação de dia e hora para a realização de audiência, fixada com prazo razoável para a
preparação da contestação.
A comunicação é feita pelo correio com registro postal e com aviso de recebimento, mesmo se
o devedor é domiciliado fora da comarca. Não logrando êxito, se fará por oficial de justiça e,
ainda assim não sendo possível, por edital.
Na audiência de conciliação e julgamento deverão estar presentes autor e réu e advogados.
Não comparecimento do autor implica arquivamento do processo, e o do réu, em revelia.
Aberta a audiência e lidas inicial e contestação, juiz ouvirá as partes litigantes e MP, propondo
a conciliação. Havendo acordo, lavrar-se-á o respectivo termo. Não havendo, o juiz tomará o
depoimento pessoal das partes e das testemunhas, ouvidos os peritos, se houver, podendo
julgar o feito sem produção de provas, se as partes concordarem. Terminada a instrução,
poderão as partes e o MP aduzir alegações finais no prazo de dez minutos para cada um. O
juiz, em seguida, renovará a proposta de conciliação sendo que, não sendo aceita, proferirá a
sentença com um sucinto relatório do ocorrido.
Da sentença cabe apelação sem efeito suspensivo.
Os alimentos definitivos são devidos desde a citação. Os provisórios poderão ser modificados
havendo alteração da situação financeira das partes.
Atenção ao art. 13 da lei de alimentos: § 1º. Os alimentos provisórios fixados na inicial poderão
ser revistos a qualquer tempo, se houver modificação na situação financeira das partes, mas o
pedido será sempre processado em apartado.
Os definitivos só poderão ser alterados pela competente ação revisional. A execução da
obrigação alimentar far-se-á nos termos dos arts. 732 a 735 do CPC. O STJ entende por
aplicável o regime do cumprimento de sentença (CPC, art. 475 – J).
Item: Execução Provisória:
Art. 475-I, §1º, CPC: “É definitiva a execução de sentença transitada em julgado e provisória
quando se tratar de sentença impugnada mediante recurso ao qual não foi atribuído efeito
suspensivo.”; Art. 587, CPC: “É definitiva a execução fundada em título extrajudicial; é
provisória enquanto pendente apelação da sentença de improcedência dos embargos do
executado, quando recebidos com efeito suspensivo (art. 739)”.
A execução provisória tem características próprias que procuram garantir que não sofra o
devedor prejuízos irreparáveis.
O art. 475-O determina que: corre por iniciativa, conta e responsabilidade do exequente, que
deverá reparar os prejuízos do executado caso a sentença seja reformada; fica sem efeito a
execução provisória caso acórdão anule ou reforme a sentença objeto da execução, restituindo
as partes ao estado anterior; necessidade de caução quando o exequente levantar depósito em
dinheiro ou praticar atos que importem alienação de propriedade ou causa grave dano ao
executado. Esta caução será dispensada nos casos de crédito de natureza alimentar ou
decorrente de ato ilícito até sessenta salários mínimos, quando o exequente estiver em
situação de necessidade, ou quando pendente agravo de instrumento junto ao STF ou STJ,
salvo quando da dispensa resultar risco de grave dano ou de difícil ou incerta reparação.
Para requerer a execução provisória é necessário instruir a petição com cópias autenticadas
das seguintes peças: sentença ou acórdão exeqüendo; certidão de interposição de recurso não
dotado de efeito suspensivo; procurações outorgadas pelas partes; decisão de habilitação,
sendo o caso; outras peças que o exeqüente julgar necessárias.
A execução provisória será processada em autos suplementares, formados pelo próprio
exeqüente, na forma do art. 475-O, § 3º, CPC.
No processo de título executivo extrajudicial, a execução sempre é definitiva, perdendo essa
natureza enquanto pender julgamento de apelação contra sentença de improcedência dos
embargos de execução, quando recebidos com efeito suspensivo.
2.2. A obrigação de indenizar o dano causado ao adversário, pela execução de tutela
antecipada posteriormente revogada, é consequência natural da improcedência do pedido,
decorrência ex lege da sentença e da inexistência do direito anteriormente acautelado,
responsabilidade que independe de reconhecimento judicial prévio, ou de pedido do lesado na
própria ação ou em ação autônoma ou, ainda, de reconvenção, bastando a liquidação dos
danos nos próprios autos, conforme comando legal previsto nos arts. 475-O, inciso II, c/c art.
273, § 3º, do CPC. Precedentes.

2.3. A complexidade da causa, que certamente exigia ampla dilação probatória, não exime a
responsabilidade do autor pelo dano processual. Ao contrário, neste caso a antecipação de
tutela se evidenciava como providência ainda mais arriscada, circunstância que aconselhava
conduta de redobrada cautela por parte do autor, com a exata ponderação entre os riscos e a
comodidade da obtenção antecipada do pedido deduzido.

3. Recurso especial do Condomínio do Shopping Conjunto Nacional não provido e recurso de


Mozariém Gomes do Nascimento provido.

(REsp 1191262/DF, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em
25/09/2012, DJe 16/10/2012)

1. Não se olvida que "a multa prevista no art. 475-J do CPC não se aplica à execução
provisória" (REsp 1.059.478/RJ, Corte Especial, Relator o Ministro Luis Felipe Salomão,
Relator p/acórdão o Ministro Aldir Passarinho Junior, DJ de 11/4/2011).
DIREITO TRIBUTÁRIO - IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS. IMUNIDADES EM
ESPÉCIE, DISTINÇÃO ENTRE IMUNIDADE E ISENÇÃO.

Imunidades Tributárias

A imunidade tributária liga-se ao contexto de proteção de algo ou alguém, com relação ao


tributo.

A norma imunizante ou imunitória prevê uma desoneração de tributo.

Imunidade tributária não se confunde com isenção uma vez que essa deve estar prevista em
lei.

Importante: dois artigos na CF/88 que trazem a expressão equivocada “são isentas de” quando
na verdade trata-se de imunidade: art. 195, parágrafo 7º e art. 184, parágrafo 5º.

Art. 184. Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de
reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social,
mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com
cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte
anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida
em lei.

(...) § 5º São isentas de impostos federais, estaduais e municipais as


operações de transferência de imóveis desapropriados para fins de reforma
agrária.

Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma
direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos
orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e
das seguintes contribuições sociais:

(...) § 7º - São isentas de contribuição para a seguridade social as entidades


beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas
em lei.

A imunidade estará ligada aos mais diferentes tributos, a depender do dispositivo


constitucional. Ex: art. 149, parágrafo 2º, I, CF/88.

Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de


intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias
profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas
respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem
prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que
alude o dispositivo.

§ 2º As contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico de que


trata o caput deste artigo:

I - não incidirão sobre as receitas decorrentes de exportação;

Conceito de Imunidade
Norma constitucional de desoneração tributária, que, justificada no conjunto de caros valores
proclamados no texto constitucional, delimita uma não incidência do tributo e credita ao
beneficiário um direito público subjetivo de não incomodação.

Exemplos de valores: liberdade religiosa (igreja não paga impostos); liberdade sindical
(sindicato trabalhador não paga imposto); liberdade de expressão (não incidem impostos sobre
livros, jornais).

A norma de imunidade é uma norma de não incidência tributária. Daí se falar que ela se opõe
negativamente ao plano de competência tributária (poder político de instituição do tributo). Para
parte da doutrina, a norma de imunidade é uma norma de “incompetência tributária”.

O campo de intributabilidade demarcado pela imunidade não pode ser desafiado por nada e
ninguém: nem por emenda constitucional, muito menos por lei ordinária.

Principal Artigo de Imunidade (art. 150, VI, CF/88)

É uma imunidade para União, Estados, Municípios e DF; é uma imunidade que afasta apenas o
imposto (então a igreja paga taxa; o sindicato de empregado paga contribuição de melhoria,
etc.).

Alínea “a”: imunidade recíproca ou intergovernamental recíproca (Sasha Calmon). O elemento


axiológico que justifica essa norma é o pacto federativo (federalismo de equilíbrio, cooperação)
entre o ente que cobra os tributos e o ente do qual se cobra e a ausência de capacidade
contributiva das pessoas políticas. Exs.: não incide IPTU em prédio da União; não incide IPVA
em carro da Prefeitura.

Segundo o STF, deve-se dar interpretação extensiva a essa norma (inclusão de IOF, IPI, II, IE
e outros).

E quanto às outras pessoas jurídicas de direito público (autarquias e fundações públicas)? Art.
150, § 2º - a vedação do inciso VI, "a", é extensiva às autarquias e às fundações instituídas e
mantidas pelo Poder Público, no que se refere ao patrimônio, à renda e aos serviços,
vinculados a suas finalidades essenciais ou às delas decorrentes. Em regra, sociedade de
economia mista, empresa pública e prestacionista de direito público tem tributação normal.

O STF analisou o caso de duas empresas públicas (Correios e INFRAERO – art. 21, X e XII,
“c”, CF/88) e uma sociedade de economia mista (CAERD) e entendeu que todas
desempenhavam funções típicas de Estado, portanto, dotadas de estatalidade. Por esse
motivo, estendeu-lhes a imunidade tributária.

Importante: em 28/02/13 o Pleno do STF finalizou o julgamento do RE 601.392, analisado com


repercussão geral, em que se estendeu a imunidade própria dos Correios para até mesmo os
serviços não tipicamente postais, prestados em regime de concorrência por aquela entidade.

Alínea “b”: o templo já foi conceituado a partir de várias teorias. No passado, o templo era
apenas o local do culto, tributando-se tudo o mais. Com a evolução da doutrina e da casuística,
houve a necessidade de reformular o conceito de templo. Aos poucos, “templo” passou a
abranger aquilo que correspondia a ele próprio e, até mesmo, situações ligadas indiretamente
ao propósito religioso.

Segundo o STF, o templo é “entidade”, ou seja, uma organização religiosa a qual merece
proteção sem mesquinharia e sem sectarismo (liberdade de culto – art. 5º, VI ao VIII, CF/88). O
Brasil é um Estado laico, ou seja, não há religião pré-definida e todas as religiões merecem
proteção.

A imunidade religiosa afasta: IR sobre as receitas; IPTU sobre o imóvel dedicado ao evento
religioso; IPVA sobre o veículo de propriedade da igreja; ITBI sobre a aquisição do imóvel que
será destinado ao evento religioso, dentre outros.
Caso: Igreja X é proprietária de um apartamento e o aluga a terceiros, recebendo alugueis.
Incide IPTU no apartamento? Provado o reinvestimento dos alugueis no propósito eclesiástico,
teremos a conexão ou correspondência fática entre o valor protegido e a atividade correlata
(art. 150, § 4º, CF/88).

Dicas Finais:

1- A imunidade tributária só se cogita na situação de propriedade daquele bem imóvel.


Vale dizer que as igrejas (e as entidades políticas), colocando-se como inquilinas não
merecerão a proteção da imunidade.

2- O STF analisou a hipótese de estender a imunidade religiosa aos templos maçônicos /


lojas maçônicas (RE 562.351-RS) e entendeu que não é o caso de aplicação da
imunidade tributária, sob o argumento de que a maçonaria não é uma sociedade de
cunho religioso, não se confundindo com religião, mas apenas uma entidade que cultua
uma filosofia de vida.

Alínea “c”: partidos políticos (inclusive suas fundações), sindicais dos trabalhadores,
instituições de educação (inclusive bibliotecas públicas, museus, centro de pesquisa –
educação extracurricular) e de assistência social (entidades filantrópicas).

Essa imunidade não é autoaplicável porque depende de um incremento normativo (“atendidos


os requisitos da lei”). Esse incremento normativo é uma Lei Complementar que é o CTN,
embora não seja formalmente uma LC, mas tem status de tanto.

O artigo 14, CTN é que regula a fruição da imunidade descrita na alínea “c”: I – se a entidade
tiver lucro, esse não poderá ser distribuído com os seus mantenedores, ou seja, o lucro não é
proibido, mas sim a sua distribuição (não confundir distribuição de lucro com pagamento de
salários razoáveis); II – não pode ter remessa dolosa do lucro (superávit) para o exterior; III –
manutenção da contabilidade (escrituração contábil) em dia, capaz de atestar o cumprimento
dos dois primeiros requisitos (obrigação tributária acessória).

SÚMULA 724 - AINDA QUANDO ALUGADO A TERCEIROS, PERMANECE


IMUNE AO IPTU O IMÓVEL PERTENCENTE A QUALQUER DAS ENTIDADES
REFERIDAS PELO ART. 150, VI, "C", DA CONSTITUIÇÃO, DESDE QUE O
VALOR DOS ALUGUÉIS SEJA APLICADO NAS ATIVIDADES ESSENCIAIS DE
TAIS ENTIDADES.

SÚMULA 730 - A IMUNIDADE TRIBUTÁRIA CONFERIDA A INSTITUIÇÕES DE


ASSISTÊNCIA SOCIAL SEM FINS LUCRATIVOS PELO ART. 150, VI, "C", DA
CONSTITUIÇÃO, SOMENTE ALCANÇA AS ENTIDADES FECHADAS DE
PREVIDÊNCIA SOCIAL PRIVADA SE NÃO HOUVER CONTRIBUIÇÃO DOS
BENEFICIÁRIOS.

SÚMULA VINCULANTE 52 - AINDA QUANDO ALUGADO A TERCEIROS,


PERMANECE IMUNE AO IPTU O IMÓVEL PERTENCENTE A QUALQUER DAS
ENTIDADES REFERIDAS PELO ART. 150, VI, “C”, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL, DESDE QUE O VALOR DOS ALUGUÉIS SEJA APLICADO NAS
ATIVIDADES PARA AS QUAIS TAIS ENTIDADES FORAM CONSTITUÍDAS.

Imunidade Tributária e as Entidades do Sistema “S” (serviços sociais autônomos): como essas
entidades promovem a integração no mercado de trabalho (uma das características da
assistência social – art. 203, III, CF/88 – entendimento também do STF) são consideradas
entidades de assistência social e, consequentemente, possuem imunidade tributária.

Alínea “d”: pode ser classificada como uma imunidade objetiva já que protege bens e não
pessoas. Exclusão de ICMS, IPI, ISSQN, II, IE e etc.
Os valores prestigiados aqui são: difusão do conhecimento, acesso à cultura, acesso à
informação, liberdade de expressão e outros. OBS: o STF considerou que a lista telefônica (na
condição de periódico) também é imune levando em consideração a utilidade social do bem.

Temos nessa alínea 03 veículos de pensamento (livro, jornal e período) e 01 insumo (papel
destinado à impressão).

O conteúdo é relevante ou não? Segundo o STF, não é relevante, pois o que importa é o valor
homenageado pelo constituinte que é a liberdade de expressão.

E quanto aos suportes físicos? Essa questão ainda está aberta e demanda esforços
interpretativos, sobretudo do STF, no qual a questão atualmente se encontra pendente de
julgamento em nível de repercussão geral. A doutrina e a jurisprudência se dividem diante da
problemática de estender ou não a imunidade aos livros digitais e outros suportes. Para
Ricardo Lobo Torres, a interpretação deve ser restritiva, entendendo o doutrinador que “não se
pode saltar da cultura tipográfica para a cultura eletrônica.” Por outro lado, Roque Antônio
Carrazza, acredita que a melhor interpretação deverá ser a ampliativa, buscando a finalidade
espiritual do bem, em detrimento do suporte físico. Segundo o professor Sabbag, a
interpretação que melhor se adapta à realidade parece ser aquela que busca realizar a
finalidade da norma. No plano jurisprudencial, os Tribunais sempre oscilaram e, atualmente, a
questão se encontra pendente de julgamento no STF, como dito acima (o caso no STF diz
respeito a enciclopédia jurídica em formato eletrônico: RE 330.817-RJ).

Atenção! Para o STF, há dois periódicos importantes que receberam a imunidade: 1) listas e
catálogos telefônicos; 2) álbum de figurinhas. O valor prestigiado é o caráter lúdico (recreativo)
de transmissão da cultura, do conhecimento.

Outros insumos, além do papel, podem ser imunes? A doutrina e a jurisprudência oscilam no
tema. Para uns, deve prevalecer a interpretação literal da alínea; para outros, a interpretação
ampliativa. No caso dessa interpretação mais ampla, o signo “papel” abrangeria outros insumos
(tinta, por exemplo). O STF editou a Súmula 657, na qual prioriza uma exegese (interpretação)
literal.

Questão mais recente no STF: importação de chapas de impressão offset para jornais. A
referência no preceito a “papel” é exemplificativa e não exaustiva (RE 202.149, STF). Atenção:
em julgamento de Embargos de Divergência no presente RE, houve decisão monocrática do
Min. Celso de Mello, dando provimento ao RE da União, no sentido de não reconhecer
imunidade tributária no presente caso (07/04/15). Foi interposto Agravo Regimental contra tal
decisão e está pendente de julgamento!

Alínea “e”: inserida pela Emenda Constitucional 75/2013. Chamada de “imunidade


musical”. Fonogramas (CD) e videofonogramas (DVD) musicais produzidos no Brasil contendo
obra artística de ou interpretada por autor brasileiro, bem como os suportes materiais ou
arquivos digitais que os contenham, salvo na etapa de replicação industrial de mídias ópticas
de leitura a laser.

A ressalva diz respeito ao suporte físico vazio, ou seja, o CD e o DVD vazios. Haverá a
incidência de impostos na escala de produção desses suportes.

Haverá a exclusão de ICMS, ISS e IOF (nas operações virtuais). Na prática, espera-se o
barateamento dos produtos e o combate à pirataria.

Contra a EC 75/2013 foi ajuizada a ADI 5058 no STF pelo governador do Estado do Amazonas
que está temeroso quanto aos reflexos negativos que essa medida poderá influenciar na Zona
Franca de Manaus (acompanhar julgamento).

Distinção entre Imunidade e Isenção e Não Incidência


Os institutos tributários da imunidade, da isenção e da não incidência, apesar de serem
tecnicamente semelhantes, não se confundem. Suas principais características são abaixo
delineadas.

Não incidência

A não incidência é a não subsunção de certa situação a uma norma tributária,


independentemente de lei que a preveja. É definida por exclusão: toda situação tática que não
se enquadra na descrição do fato gerador é uma hipótese de não incidência.

A previsão da não incidência nos próprios textos legais é uma exceção - por muitos vista como
desnecessária-, porém útil para definir e esclarecer situações duvidosas, aumentando a
segurança jurídica nas relações tributárias e prevenindo conflitos. Quando ocorre, é chamada
de não incidência legalmente qualificada.

Exemplo: pode ser que determinada norma preveja que um tributo incida sobre as situações
jurídicas "A", "B" e "C". Do que se depreende, logicamente, que as situações "D", "E", "F" etc.
não estarão submetidas à tributação, pois elas não se encontram previstas na regra de
incidência. Entretanto, como uma dada situação "X" é bastante semelhante à situação tributada
"A", o legislador opta, por questão de segurança jurídica, que a norma preveja expressamente
que "o tributo não incidirá na situação X", aclarando seu alcance e proscrevendo qualquer
tentativa de interpretação extensiva que vise abarcar aquela situação pela tributação.

Não incidência constitucionalmente qualificada

Parte da doutrina advoga que as imunidades nada mais são do que hipóteses de não
incidência da norma tributária constitucionalmente classificadas, isto é, normas de não
incidência previstas no próprio texto constitucional.

Isenção

A isenção distingue-se da imunidade pela sede jurídica. Toda previsão de imunidade radica na
Constituição e, às vezes, é chamada de isenção constitucional O nomen juris não importa: se a
previsão está no texto constitucional, é imunidade; a seu turno, toda previsão de
intributabilidade abaixo da Constituição é isenção (Coêlho, 2007).

"Isenção constitucional"

Em algumas passagens de seu texto, a Constituição impõe isenções a certas situações que
discrimina, como aquela inserta no § 5° do art. 184: "são isentas de impostos federais,
estaduais e municipais as operações de transferência de imóveis desapropriados para fins de
reforma agrária".

Essas previsões nada mais são do que imunidades, pois quando definidas no corpo da Carta
Magna, impedem que as normas tributárias incidam sobre as situações descritas. Os termos
utilizados na CF é que não observaram a boa técnica jurídica; correto seria dizer "são
imunes...".
1.3.1. DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE.
PONTO 1 - História da proteção jurídica e social da infância brasileira. Evolução
histórico-sociológica da infância e da juventude. Aspectos Gerais do Direito da Criança e
do Adolescente. A proteção da infância no Brasil.

História da proteção jurídica e social da infância brasileira.


Fonte: Curso de Direito da Criança e do Adolescente. Aspectos teóricos e práticos. RT.
No Brasil colônia tinha-se a aplicação das Ordenações do Reino, sendo assegurado ao pai o
direito de castigar o filho como forma de educá-lo, excluindo-se a ilicitude da conduta paterna
se no exercício desse mister o filho viesse a falecer ou sofre lesão.
Na fase imperial tem início a preocupação com os infratores, menores ou maiores, sendo a
política repressiva fundada no temor ante a crueldade das penas. Vigente as Ordenações
Filipinas a imputabilidade penal era alcançada aos 07 anos. Entre os 07 e 17 anos o tratamento
era similar ao do adulto com certa atenuação na aplicação da pena. Entre 17 e 21 eram
considerados jovens adultos, sujeitando-se inclusive a pena de morte, salvo nos casos de
falsificação de moeda em que a pena de morte era admitida desde os 14 anos.
O Código Penal do Império sofreu alteração em 1830 para considerar os menores de 14 anos
inimputáveis. Contudo, eram submetidos a exame de capacidade de discernimento para
aqueles compreendidos entre 07 e 14 anos, os quais poderiam ser encaminhados para casas
de correção.
No primeiro Código Penal dos Estados Unidos do Brasil os menores de 9 anos eram
inimputáveis, mantendo-se o exame de discernimento entre aqueles com 9 e 14 anos. Aqueles
que tinham a idade de até 17 anos eram apenados com 2/3 da pena do adulto.
No campo não infracional até então consolidava-se a política de recolhimento, sendo fundadas
entidades assistenciais com práticas assistenciais ou higienistas.
Posteriormente, após influência externa, desenvolve-se a Doutrina do Direito do Menor,
fundada no binômio: carência-delinquência. Criminalizava-se a infância pobre
desenvolvendo-se a Doutrina da Situação Irregular.
Em 1926 publica-se o primeiro código de menores determinando a obrigação da família em
suprir as necessidades básicas das crianças e jovens de acordo com o modelo idealizado pelo
Estado. Procura-se minimizar a infância de rua.
No campo infracional crianças e adolescentes de até 14 anos eram objeto de medidas
punitivas com caráter educacional, já os jovens entre 14 e 18 eram passíveis de punição com
responsabilidade atenuada. Construiu-se a categoria do “Menor”.
Com a Constituição de 1937 ampliou-se o horizonte social da infância e da juventude. Em 1941
criou-se o Serviço de Assistência do Menor (SAM) que atendia delinquentes e desvalidos. A
preocupação era correcional com a institucionalização e afastamento do menor do convívio
familiar.
Após o golpe militar houve a extinção do SAM e criação da Fundação Nacional de Bem-Estar
do Menor (FUNABEM). Legalmente apresentava uma proposta pedagógico-assistencial
progressista, mas na prática era utilizada como instrumento de controle do regime político
autoritário. Ainda no período militar, em 1967 reduziu-se a responsabilidade penal para 16 anos
de idade sendo que entre 16 e 18 seria utilizado o critério subjetivo da capacidade de
discernimento. Em 1968 retorna-se ao regime anterior com imputabilidade aos 18 anos.
Em 1967 publica-se no novo Código de Menores Consolidando a doutrina da Situação
Irregular, sendo a segregação a tônica para carentes e delinquentes.
Com a Constituição de 1988 o novo modelo prima pelo resguardo da dignidade da pessoa
humana, deixando as crianças e adolescentes de serem objetos de direito à luz da doutrina
da situação irregular (caráter filantrópico, assistencial, centralizador no juiz de menores,
binômio abandono-delinquência) para serem titulares de direitos de acordo com a doutrina
da proteção integral (titulares de direitos, municipalização, modelo democrático com
participação da família, sociedade e Estado).

Evolução histórico-sociológica da infância e da juventude


Na idade antiga os laços familiares eram estabelecidos pelo culto à religião e não pelas
relações afetivas. A família romana fundava-se no poder paterno (pater familiae), o qual
detinha poder e autoridade absolutos sobre os filhos enquanto vivessem na casa do pai. Não
havia distinção entre filhos maiores e menores, sendo os filhos objeto de relações jurídicas
sobre os quais o pai exercia o papel de proprietário. O pai poderia decidir sobre a vida e a
morte de seus descendentes.
Os gregos mantinham vivas crianças saudáveis e fortes.
Em geral o tratamento entre os filhos não era isonômico. Os direitos sucessórios limitavam-se
ao primogênito do sexo masculino. Em um segundo momento o direito romano passou a
estabelecer a diferença entre menores púberes e impúberes, o que resultava no abrandamento
de punições.
Na idade média o cristianismo reconhecia o direito à dignidade para todos, inclusive para os
menores.
Atenuou a severidade de tratamento na relação entre pai e filho pregando, contudo, o dever de
respeito “honrar pai e mãe˜. Contudo, estabeleceu tratamento discriminatório em relação aos
filhos nascidos fora do casamento (sétimo sacramento).
1 – Documentos Internacionais (os principais)
a) Convenção OIT (1919) = ela limitava a idade para o início da vida economicamente ativa
dos jovens.
b) “Declaração de Genebra” (1924) = teve o objetivo de declarar alguns direitos da criança,
porém havia um problema: a criança ainda era vista como objeto de proteção. Esta
“declaração” não possuía força coercitiva sobre os Estados.
c) “Declaração dos Direitos da Criança” (1959) = apenas enunciava alguns direitos, sem
impor força coercitiva sobre os Estados.
d) Em 1979 foram iniciados os trabalhos para uma Convenção. E somente em 1989 realizou-se
a “Convenção sobre os Direitos da Criança e do Adolescente”, com a inclusão do princípio
da proteção integral, passando a criança e o adolescente ser sujeitos de direitos (deixando de
ser objeto de proteção).
e) em 2000 foram realizados dois protocolos quais sejam:
● Protocolo facultativo contra exploração, venda de Crianças e Adolescentes;
● Protocolo facultativo que trata de crianças junto às Forças Armadas.
f) Documentos Internacionais direcionados ao infrator:
● Diretrizes RIAD (visa a prevenção de delinqüência juvenil);
● Regras de Beijing (regras mínimas das Nações Unidas para a administração da justiça da
infância e juventude);
● Regras de Tóquio (regras mínimas das Nações Unidas para os jovens privados de
liberdade).
** ATENÇÃO: Estes três documentos internacionais direcionados ao infrator + a Convenção
sobre os Direitos da Criança e Adolescente formam a chamada “Doutrina das Nações Unidas
de Proteção Integral à Criança”.
Obs.: A CRFB/88 é anterior à Convenção e mesmo assim, ela segue o mesmo teor desta, pois
o legislador constituinte acompanhava de perto a evolução desta doutrina de proteção integral.
A inclusão só foi completa com o advento do ECA.
Quanto a evolução no direito brasileiro olhar tópico anterior.
Aspectos Gerais do Direito da Criança e do Adolescente. A proteção da infância no
Brasil.
Temos a vigência do Princípio da proteção integral da criança e do adolescente em
substituição à doutrina da situação irregular (ponto 2).
Os menores passam a ser sujeitos de direitos e são tutelados como sujeitos em situação
peculiar e como pessoas em desenvolvimento. Dever de todos prevenir a ocorrência de
ameaça ou violação dos direitos da criança e do adolescente. Primazia da reintegração familiar
ao acolhimento institucional. Responsabilidade primária e solidária de União, Estados e
Municípios.
Principais princípios: prioridade absoluta, melhor interesse (abordados no tópico 2),
municipalização.
Municipalização – reflete a descentralização da política de atendimento e assistencial
privilegiando-se um contato mais próximo com a comunidade integrando-a à rede de
atendimento de crianças e menores. Conselhos Tutelares

Código de Menores Estatuto da Criança e do Adolesc.


Tutela apenas o menor em situação irregular Dá ampla proteção à criança e ao
adolescente
O menor era visto como objeto de tutela Criança e adolescente são sujeitos de direitos
DIREITO ELEITORAL - Princípios do direito eleitoral. Princípio
democrático. Princípio republicano. Princípio federativo. Princípio da
igualdade. Princípio do voto direto e secreto. Democracia partidária.
Participação popular ou acesso democrático. Princípio da anualidade ou
da anterioridade.

1. PRINCÍPIOS DO DIREITO ELEITORAL


1.1. Conceito de princípio
No campo jurídico, princípio pode ser empregado no sentido de regra fundamental, regra padrão
ou regra paradigma à ciência do direito.

1.2. Princípios de Direito Eleitoral em espécie


1.2.1. Princípio da Anualidade ou da Anterioridade da lei eleitoral
É o princípio que está inserido no art. 16 da CF/88, com a redação dada pela EC nº 04/93, assim
redigido: “a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se
aplicando à eleição que ocorra até 1 (um) ano da data de sua vigência”.
Destarte, para que uma lei modificadora ou alteradora do processo eleitoral produza eficácia, ela
terá que ser publicada no Diário Oficial da União, no mínimo, um ano e um dia antes de determinada
eleição.
Estabeleceu, assim, o legislador constitucional originário, o princípio da anualidade eleitoral, de
fundamental importância para a preservação da segurança jurídica.
Evita-se, a partir da aplicação do referido princípio, que as normas eleitorais sejam modificadas
faltando menos e um ano e um dia para as eleições, prejudicando o equilíbrio da disputa, com a
mudança das regras do jogo.

1.2.2. Princípio da Celeridade


Em razão da temporariedade do exercício dos mandatos eletivos, o Poder Judiciário tem de dar
a maior prioridade possível na apreciação dos feitos eleitorais.
Estando para ser apreciado um processo oriundo da Justiça Eleitoral e outro advindo da Justiça
Comum, o magistrado dará prioridade àquele, ressalvados apenas os casos de habeas corpus e de
mandado de segurança.
A rapidez na tramitação processual, portanto, deve ser a marca registrada do processo eleitoral.
Como reflexo do princípio da celeridade no processo eleitoral, é possível elencar:
a) Recursos: devem os recursos eleitorais, na sua maioria, ser interpostos no prazo de 3 dias
(art. 258, CE), salvo exceções expressamente previstas em lei e, via de regra, não terão
efeito suspensivo (art. 257 do CE).
b) Irrecorribilidade das decisões do TSE: o TSE é a última instância possível para recursos
em matéria estritamente eleitoral.
c) Preclusão instantânea: como o processo eleitoral é composto de uma sucessão de fases
bem definidas e sucessivas (alistamento, convenção partidária, registro de candidaturas,
propaganda eleitoral, etc.), concluída uma, não podem mais ser impugnadas eventuais
nulidades ocorridas em fases anteriores, salvo matérias de ordem constitucional ou legal de
ordem pública, isto é, as impugnações decorrentes de irregularidades ou nulidades relativas
devem ser alegadas de imediato, sob pena de preclusão. São exemplos:
a. Art. 147, §1º do CE: “A impugnação à identidade do eleito, formulada pelos
membros da mesa, fiscais, delegados, candidatos ou qualquer eleitor, será
apresentada verbalmente ou por escrito, antes de ser o mesmo admitido a votar”.
b. Art. 149 do CE: “Não será admitido recurso contra a votação, se não tiver havido
impugnação perante a Mesa Receptora, no ato da votação, contra as nulidades
arguidas”.
d) Prazo de um ano como duração razoável do processo eleitoral que possa resultar em
perda do mandato: a tramitação do processo eleitoral que possa redundar em perda do
mandato eletivo (em todas as suas fases e graus de jurisdição) não poderá ultrapassar o
prazo de um ano). Nesse sentido, ver art. 97-A da CF/88.

1.2.3. Princípio da Periodicidade da investidura das funções eleitorais


Os magistrados e os membros do Ministério Público Eleitoral são investidos na função eleitoral
por um prazo de 2 anos e nunca por mais de dois biênios consecutivos.
Nesse sentido, dispõe o §2º do art. 121 da CF/88: “Os juízes dos tribunais eleitorais, salvo
motivo justificado, servirão por dois anos, no mínimo, e nunca por mais de dois biênios consecutivos,
sendo os substitutos escolhidos na mesma ocasião e pelo mesmo processo, em número igual para cada
categoria”.

1.2.4. Princípio da Lisura das Eleições ou da Isonomia de Oportunidades


As eleições em um regime verdadeiramente democrático devem ser pautadas pela igualdade de
oportunidades entre todos os candidatos em disputa.
A garantia de lisura das eleições no Brasil está calcada na ideia de cidadania, de origem popular
do poder e no combate à influência do poder econômico ou político nas eleições.
- Plano Constitucional: art. 1º, inciso II (cidadania); art. 1º, § único (todo o poder emana do povo);
art. 14, §9º.
- Plano Infraconstitucional: art. 23 da LC 64/90;

1.2.5. Princípio da Responsabilidade Solidária entre candidatos e partidos políticos


Tal princípio está previsto expressamente no art. 241 do Código Eleitoral: “Toda propaganda
eleitoral será realizada sob a responsabilidade dos partidos e por eles paga, imputando-lhes
solidariedade nos excessos praticados pelos seus candidatos e adeptos”.
Todavia, com o advento da Lei 12.891/13, houve restrição à responsabilidade solidária entre
candidatos e partidos, ao acrescentar o parágrafo único ao art. 241 do Código Eleitoral: “a solidariedade
prevista neste artigo é restrita aos candidatos e aos respectivos partidos, não alcançando outros
partidos, mesmo quando integrantes de uma mesma coligação”.
Por seu turno, a Lei 9504/97 também torna explícito o aludido princípio quando assevera:
I) As despesas da campanha eleitoral serão realizadas sob a responsabilidade dos partidos,
ou de seus candidatos, e financiadas na forma desta Lei (art. 17).
II) O candidato é solidariamente responsável com a pessoa indicada na forma do art. 20 desta
Lei pela veracidade das informações financeiras e contábeis de sua companha, devendo
ambos assinar a respectiva prestação de contas (art. 21, com redação dada pela Lei
11.300/06); e
III) Independe de obtenção de licença municipal e de autorização da Justiça Eleitoral a
veiculação de propaganda eleitoral pela distribuição de folhetos, adesivos, volantes e outros
impressos, os quais devem ser editados sob a responsabilidade do partido, coligação ou
candidato (art. 38, “caput”, com redação dada pela Lei 12.891/13).

O TSE, tradicionalmente tem se posicionado pela responsabilidade solidária entre partidos


políticos e seus candidatos por excessos na propaganda eleitoral.
Por seu turno, é digno informar, ainda sobre o tema da responsabilidade, que o art. 15-A da Lei
9096/95, cujo “caput” foi modificado pela Lei 12.034/09, o parágrafo único acrescentado pela Lei
12.891/12, passou a ter a seguinte redação:

Art. 15-A. A responsabilidade, inclusive civil e trabalhista, cabe


exclusivamente ao órgão partidário municipal, estadual ou nacional que
tiver dado causa ao não cumprimento da obrigação, à violação de direito,
a dano a outrem ou a qualquer ato ilícito, excluída a solidariedade de
outros órgãos de direção partidária. (Redação dada pela Lei nº 12.034,
de 2009)

Parágrafo único. O órgão nacional do partido político, quando


responsável, somente poderá ser demandado judicialmente na
circunscrição especial judiciária da sua sede, inclusive nas ações de
natureza cível ou trabalhista. (Incluído pela Lei nº 12.891, de 2013)

Incumbe acrescentar, por último, que eventual responsabilidade penal por crime eleitoral será
individual do infrator (sempre pessoa física), pois não há previsão legal de punição por prática de aludido
delito por pessoa jurídica.

1.2.6. O Princípio da Democracia


O princípio da Democracia, como aponta o renomado José J. Gomes (2012) é atualmente
considerado como ‘um dos mais preciosos valores da humanidade’. O fundamento normativo para a
afirmação “é que o artigo XXI da Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, e o artigo 25 do
Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, de 1966, elevaram-na ao status de direitos humanos”
(GOMES, 2012, p. 35).
Embora seja um princípio de vasta aplicação e importância, percebe-se que há Estados que a
forjam. Escamoteiam regimes totalitários com a máscara de vertente democrática. Gomes (2012)
assevera que a imprecisão do conceito de democracia dá margem à formação “de diferentes
concepções de democracia, exemplo da liberal, cristã, marxista, social, neoliberal, representativa.”
(GOMES, 2012, p. 36).
Antes de tudo, para a efetivação da democracia é preciso uma sociedade esclarecida e ativa. Do
contrário,

“segundo ensina Ferreira Filho (2005: 102-103), longe de prosperar em


qualquer solo, a experiência de um autêntico regime democrático exige a
presença de alguns pressupostos. Há mister haver um certo grau de
desenvolvimento social, de sorte que o povo tenha atingido nível
razoável de independência e amadurecimento, para que as principais
decisões possam ser tomadas com liberdade de consciência”.
(FERREIRA FILHO apud GOMES, 2008, p. 36).

Segundo Gomes (2012) a Democracia só é possível com a participação popular. Estudioso do


assunto, indica uma subdivisão da mesma em 3 (três) grupos: democracia direta, indireta e semidireta. A
direta configura-se como o modelo clássico, na qual o povo participa diretamente das decisões
governamentais. “As decisões são tomadas em assembleia pública, da qual devem participar todos os
cidadãos” (2012, p. 38).
A indireta ou representativa consolida a transferência do exercício do poder a outro cidadão.
“Indireta é a democracia representativa. Nela os cidadãos escolhem aqueles que os representarão no
governo. Os eleitos recebem um mandato. A participação das pessoas no processo político se dá, pois,
na escolha dos representantes ou mandatários. A estes toca o mister de conduzir o governo, tomando as
decisões político-administrativas que julgarem convenientes, de acordo com as necessidades que se
apresentem.” (GOMES, 2012, p. 39).
Por último, a semidireta ou mista, que fora adotada pela Federação Republicana do Brasil.
Semelhantemente o modelo de democracia representativa, escolhe-se um representante para a tomada
das decisões político-administrativas e a gestão da coisa pública. “Todavia, são previstos mecanismos
de intervenção direta dos cidadãos” (GOMES, 2012, p. 40).
Desse modo, fica evidente que a Democracia é um princípio indelével no seio social. Finalmente,
não se cogita falar em Estado Democrático de Direito sem os mecanismos garantidores do exercício da
Democracia, independentemente se direta, indireta ou semidireta.

1.2.7. Princípio da Democracia Partidária


Preceitua a carta Magna: “todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes
eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição” (Art. 1º, Parágrafo Único, BRASIL, 2013). Ora, tal
preceito constitucional informa que se está diante de uma Democracia Representativa. Como tal,
necessária é a atuação do povo na condução do Estado.
“A Democracia autêntica requer o estabelecimento de debate público permanente acerca dos
problemas relevantes para a vida social.” (GOMES, 2012, 39). Porém, hodiernamente é impossível que
os cidadãos exerçam diretamente a democracia. Imagine-se num Estado em que bilhões de pessoas
tenham que se reunir para produção legislativa, por exemplo. Por isso, a representação ocorre por meio
dos partidos políticos.
Dessa forma, “O esquema partidário é assegurado pelo artigo 14, § 3º, V da Lei Maior, que erigiu
a filiação partidária como condição de elegibilidade. Assim, os partidos políticos detêm o monopólio das
candidaturas, de sorte que, para ser votado, o cidadão deve filiar-se. Inexistem no Brasil as candidaturas
avulsas.” (GOMES, 2012, p. 39).
Nesse sentido, convém explanar acerca conceito de partido político. Para defini-lo, Daniela
Wochnicki faz uso da Lei dos Partidos Políticos (Lei 9.096/95, art. 1º): “Partido Político é pessoa jurídica
de direito privado. Destina-se a assegurar, no interesse do regime democrático, a autenticidade do
sistema representativo e a defender os direitos fundamentais definidos na Constituição Federal” (Lei
9.096/95, art. 1º). (WOCHNICKI, 2013, p. 16)
Conforme Paulo Bonavides apud Luciana Xavier, “Partido Político é uma organização de
pessoas que, inspirados por ideias ou movidas por interesses, buscam tomar o poder, normalmente pelo
emprego de meio legais, e nele consertar-se para a realização dos fins propugnados.” (BONAVIDES
apud XAVIER, 2013, p. 1). Ainda,

“constituem uma organização (instituição dotada de regras próprias),


criada com personalidade própria com intuito de permanência
(continuidade ao tempo), formada por pessoas (eleitores) que,
comungando de uma mesma ideologia, pretendem tomar legalmente o
poder político governamental. Note-se que o inciso V do art. 1º de nossa
Lei Fundamental adota o sistema eleitoral denominado pluripartidarismo,
isto é, a existência de vários partidos políticos, inclusive daqueles que
fazem oposição: o Estado Democrático de Direito admite o dissenso, a
existência de várias correntes ideológicas e a alternância.” (XAVIER,
2013, p. 1).

Tamanha é a importância das agremiações políticas que o TSE e o STF afirmam que o mandato
eletivo a elas pertence. Por corolário, “se o mandatário se desliga da agremiação pela qual foi eleito,
perde igualmente o mandato, salvo se houver justa causa.” (GOMES, 2012, p. 39).
Diante do exposto, fica claro que os partidos políticos têm suma importância para efetivação da
democracia.

1.2.8. Princípio do Voto Direto e Secreto


A Constituição Federal de 1988 dispõe em seu art. 1º, I como um dos fundamentos da República
Federativa do Brasil: a soberania. Para que a soberania esteja em conformidade com a democracia deve
ser exercida de forma popular, ou seja, poderes são atribuídos ao povo a fim de que este se manifeste,
prevalecendo, contudo, a vontade da maioria.
Os direitos políticos são meios de tutela da soberania popular, os quais garantirão o exercício do
sufrágio universal, pelo voto direto e secreto, mediante o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular.
O sufrágio universal e o voto direto e secreto, além de direito e garantia fundamental instituídos
pela Lei Maior, são princípios fundamentais do Direito Eleitoral e mola propulsora para o estabelecimento
da Democracia. Porém, apesar de sinônimos, os mesmos são institutos diferentes com classificações
distintas, mas que não deixam de complementar um ao outro.

SUFRÁGIO
Na doutrina, o melhor e mais didático meio de entender o que é o sufrágio está descrito como “o
direito de votar e ser votado”. Contudo, e mais além que isso o sufrágio para a democracia deve revelar-
se como a vontade do povo, a verdadeira participação da sociedade na vida política e nas decisões
tomadas pelo governo, não existindo limitações fundadas em descriminações sociais, raciais,
intelectuais, de sexo, cor e/ou idade.
Porém, esta participação política apesar da ideia de amplitude contida na nomenclatura da
palavra “povo”, é restrita aos denominados cidadãos. E quem são os cidadãos? Seriam aqueles
detentores de direitos políticos.
Enfim, o sufrágio universal é o direito de votar e ser votado inerente a todos os indivíduos da
sociedade, desde que respeitadas às restrições trazidas pela Constituição Federal com o intuito apenas
de garantir a mínima capacidade possível para aqueles que participarão do processo eleitoral, os
chamados cidadãos.

VOTO
O ato de votar é o exercício do sufrágio pelo cidadão, consequentemente o ponto máximo do
exercício da soberania popular. Os indivíduos revestidos de plena capacidade eleitoral ativa e exercendo
seus direitos políticos, por meio do voto escolhem aqueles que irão representá-los no governo. É a
manifestação da vontade popular de forma a viabilizar a concretização de uma das formas da
democracia, no Brasil, a chamada democracia representativa ou indireta.

Características do voto:
a) Direto: é o voto pelo qual os cidadãos escolhem de forma direta seus representantes, sem
terceiros na intermediação do voto. A própria Constituição Federal traz exceções ao voto direto, no caso
de vacância do Presidente e Vice Presidente da República nos últimos dois anos do período presidencial
as eleições serão feitas de forma indireta através do Congresso Nacional. (art. 8, §1º CF).
b) Secreto: o voto é secreto, não podendo ser revelado, apenas por vontade do próprio eleitor. É
a garantia de um processo eleitoral imparcial, probo e forma de evitar corrupção, suborno, além de
dificultar a prática do voto de cabestro.
c) Igual: o voto de qualquer cidadão terá o mesmo peso e valor.
d) Personalíssimo: o ato de votar é restrito a pessoa do eleitor, o qual deve se apresentar sem
intermédio de terceiros na votação.
e) Obrigatório: é obrigatório o voto a todo cidadão maior de 18 anos e menor de 70 anos. A
obrigatoriedade de comparecimento às urnas nos dias de eleição. No entanto, o voto poderá ser
facultado para os analfabetos, os maiores de 70 anos e maiores de 16 anos e menores de 18 anos.
f) Livre: é o direito do eleitor em votar em quem quiser ou mesmo anular o voto.
g) Periódico: o voto será realizado em determinados períodos. No Brasil, por exemplo, ocorrem
eleições de dois em dois anos com o intuito de renovação e rotatividade dos mandatos políticos.

1.2.9. Princípio da Igualdade


O princípio da igualdade (ou da isonomia) da disputa eleitoral está consagrado no art. 5°, caput,
da Constituição, que determina que "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza".
Assinala José Jairo Gomes que o princípio em tela adquire especial relevo no Direito Eleitoral, já
que rege diversas situações. Basta lembrar que os concorrentes a cargos político-eletivos devem contar
com as mesmas oportunidades, ressalvadas as situações previstas em lei - que têm em conta o
resguardo de outros valores - e as naturais desigualdades que entre eles se verificam.
Disto decorre a necessidade da regulação das campanhas eleitorais, do controle da propaganda
eleitoral, da neutralidade dos Poderes Públicos, da vedação ao abuso do poder político ou econômico, e
da imparcialidade dos meios de comunicação social.

PRINCÍPIO REPUBLICANO X PRINCÍPIO FEDERATIVO


O que se entende por princípio O que se entende pelo princípio
republicano? federativo?

O PRINCÍPIO REPUBLICANO representa a Falar em PRINCÍPIO FEDERATIVO é dizer


forma de governo adotada. É o modo de que os membros da federação (União,
atribuição do poder político-estatal pelo Estados, Municípios e DF) devem possuir
qual as autoridades públicas relacionam-se tratamento isonômico.
com os seus cidadãos, tendo as seguintes Um instrumento utilizado para assegurar essa
características: isonomia é a existência do Senado Federal,
* Eletividade, pois através dele assegura-se a isonomia
* Temporariedade e a entre os membros da federação, já que essa
* Necessidade de prestação de contas pela Casa é composta por três representantes de
administração pública. cada Estado. Por consequência, possível
OBS.: O princípio republicano impede que extinção do Senado Federal seria uma
prevaleça a prerrogativa de foro, perante o fragilização da federação, ferindo cláusula
Supremo Tribunal Federal, nas infrações pétrea.
penais comuns, mesmo que a prática
delituosa tenha ocorrido durante o período de
atividade funcional, se sobrevier a cessação
da investidura do indiciado, denunciado ou
réu, no cargo, função ou mandato, cuja
titularidade se qualifica como o único fator de
legitimidade constitucional apto a fazer
instaurar a competência penal originária do
STF.
Não protegido por emenda a CF Protegido por emenda a CF
Art. 1º A República Federativa do Brasil, Art. 60, §4º, I, da CF:
formada pela união indissolúvel dos Estados e § 4º - Não será objeto de deliberação a
Municípios e do Distrito Federal, constitui-se proposta de emenda tendente a abolir:
em Estado Democrático de Direito e tem como I - a forma federativa de Estado;
fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania;
III - a dignidade da pessoa humana; IV - os
valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V - o pluralismo político. Paragrafo único: Todo
o poder emana do povo, que o exerce por
maio de representantes eleitos ou
diretamente, nos termos dessa CF.
DIREITO DO CONSUMIDOR - Do direito do Consumidor: conceito, objeto,
histórico e abrangência em face do Direito Civil. A Constituição Federal e
o microssistema do Código de Defesa do Consumidor (CDC). (FALTA
ESSA PARTE EM AMARELO) Da boa-fé. Da convenção coletiva de
consumo.

1. Histórico

Iniciou-se com a 1ª Revolução Industrial — “Revolução do aço e do carvão” — um


grande contingente de pessoas saiu do campo e foram para os centros urbanos, o que
acarretou no maior número de demandas. Ou seja, surgiu daí um novo modelo de produção —
Produção em Série, Produção em Escala ou Homogeneização da Produção.
Este modelo ganhou força com a 2ª Revolução Industrial (período pós – 2ª Guerra
Mundial), a denominada “Revolução Tecnológica”, com a consolidação do novo modelo:
tecnologia de ponta.
Por fim, a última e atual revolução industrial — A “Revolução da Informatização e da
Globalização”.

2. Característica do Modelo de Produção em Série

A principal característica é a unilateralidade da produção. Ou seja, é o fornecedor


que determina (o que, como e quando produzir). Ele é que detém o monopólio dos meios de
produção. Isto significa que o fornecedor fica numa posição de superioridade em relação ao
consumidor. Este não discute as cláusulas de relação de consumo — relação desigual.
Por isso, houve a necessidade de uma lei especifica para reequilibrar esta relação
desigual de consumidor. Além disso, precisava também romper os ideais privativista clássico
(Código Civil) – Pact Sunt Servanda.

3. Referência expressa do Direito do Consumidor

● Em 1962, John Kennedy enumerou os direitos dos consumidores e levantou a seguinte


questão: “os direitos dos consumidores serão o novo desafio para o mercado”.

● Em 1985, a ONU traçou as diretrizes de uma relação consumirista — o direito do consumidor


é um direito humano de nova geração, direito social e econômico e direito de igualdade do
mais fraco.

4. Três maneiras para introduzir o Direito do Consumidor

4.1) Introdução Sistemática = a defesa do consumidor tem amparo na CRFB/88.

A CRFB/88 traz um triplo mandamento: o direito do consumidor é um direito


fundamental (art. 5º XXXII); define direito do consumidor como Princípio da Ordem Econômica
(art. 170,V) e também exige a elaboração de uma lei de defesa do consumidor (art. 48 ADCT).
I) O direito do consumidor como direito fundamental (art. 5º, XXXII CRFB/88):

Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito
à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XXXII - o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor.

Quatro observações a se fazer:

1ª) Quando se fala em direito fundamental, remete-se à uma eficácia vertical entre Estado e
Administrado. Com este dispositivo, surge a eficácia horizontal dos direitos fundamentais nas
relações privadas de consumo.

Estado Consumidor  Fornecedor



Administrado

2ª) Força normativa da CRFB/88, na qual não se tem mais norma programática e sim norma
exigível.

3ª) Elevando o direito do consumidor a status de direito constitucional fundamental, tem-


se um direito privado mais social, que a doutrina alemã chamou de Direito Privado Solidário.
Para Raizer — Plubicização do Direito Privado e no Brasil, Orlando Gomes o denominou como
Constitucionalização do Direito Privado.
Traz como conseqüência a simbiose de entre direito privado e o público. Em virtude
disso, há divergência:

1ª corrente) esta diz que esta simbiose traz repercussões negativas, em razão da autonomia
valorativa típica do direito privado.

2ª corrente) esta diz que esta simbiose traz repercussões positivas, em razão da garantia
reforçada de certos institutos do direito privado, como é o caso da defesa dos consumidores —
os vulneráveis da relação jurídica.

4ª) Elevar o direito do consumidor à status de direito constitucional fundamental, acarretou na


criação de um novo direito privado (mais social, comprometido com a igualdade material).

II) Direito do consumidor como Princípio da Ordem Econômica (art. 170,V)

Art. 170- A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre


iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça
social, observados os seguintes princípios:
IV - livre concorrência;
V - defesa do consumidor.

 Qual a relação existente entre a livre concorrência a defesa do consumidor?


Resposta: A livre concorrência tem uma contrapartida — preservar os direitos dos
consumidores, pois vivemos numa sociedade que não só prevê a livre concorrência, bem
como a estimula. Ou seja, não se permite que diminua a qualidade de um produto, com o
intuito de barateá-lo, sob pena de violar os direitos dos consumidores.
III) Exigência de elaboração de uma lei de defesa do consumidor (art. 48 ADCT)

Art.48 ADCT - O Congresso Nacional, dentro de cento e vinte dias da promulgação da


Constituição, elaborará código de defesa do consumidor.

4.2) Introdução Dogmático-Filosófico = trabalha-se com o Princípio Favor Debilis (“Princípio


em Favor do Mais Fraco”), onde chegou-se a conclusão de que seria necessária além da
igualdade formal, também a igualdade material. Ou seja, o Estado deveria intervir na relação
de consumo, conferindo direitos dos mais fracos (consumidores) e impondo deveres aos mais
fortes (fornecedores).

4.3) Introdução Econômica e Social = tem como objetivo trazer acontecimentos, às vezes
sociais, que fizeram surgir a necessidade de defesa especifica para o consumidor.

● Ordem econômica = Para Adam Smith, o consumidor é que dita a regra do mercado (é o rei
do mercado). O consumidor deixou de ser rei, quando sua vontade passou a ser manipulada
por técnica agressiva de marketing e de publicidade.

● Âmbito social

- surgimento da sociedade de massa (produção em série, em escala) — o fornecedor passou a


ter a seguinte visão: “se muita gente quer meu produto, devo preocupar-me com a quantidade
e não com a qualidade”.
Conseqüência prática: produtos e serviços com vícios e defeituosos no mercado.
Desta formal houve a necessidade de lei específica para defender os consumidores.

- Revoluções Industriais (Do aço e do carvão, A tecnológica e a da informatização e


globalização).

5. Natureza Jurídica do Direito do Consumidor = Há três correntes:

1ª corrente (Gustavo Tepedino) = é direito civil-constitucional.

2ª corrente (Rizzardo Nunes) = é ramo autônomo do direito, porém misto (público +privado) —
é o chamado DIREITO DIFUSO.
3ª corrente (Cláudia Lima Marques) = é ramo do direito privado, ou seja, ao lado do direito civil
e do direito empresarial há o direito do consumidor – DIREITO TRIPARTITE. Ela entende que é
direito privado, não porque possui regras de direito privado, mas sim porque os sujeitos do
direito do consumidor são sujeito privados.

6. Código de Defesa do Consumidor – L. 8.078/90

6.1 – Características mais importantes (são três):

a) é um diploma multidisciplinar = porque possui regras: constitucionais (dignidade humana),


direito civil (reparação do dano pelo fornecedor), processo civil (ônus da prova), direito
administrativo (infrações administrativas) e direito penal (há tipos penais previsto no CDC).

b) é lei principiológica – porque confere séries de princípios, cujo objetivo é reequilibrar uma
relação jurídica que é bastante desigual — conferindo direito ao consumidor (mais fraco) e
impondo deveres ao fornecedor (mais forte).

c) alberga ordem pública e de interesse social = os direitos dos consumidores não podem
ser renunciados, são indisponíveis. Desta forma, existindo cláusula abusiva num contrato,
pode o juiz reconhecer, de ofício, os direitos do consumidor.

** ATENÇÃO: A situação é diferente no que tange aos contratos bancários, onde o juiz não
poderá reconhecer de ofício uma cláusula abusiva, conforme preconiza a súmula 381 STJ.

Súmula 381: “Nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da


abusividade das cláusulas”.

6.2 – Formas implícitas de proteção ao consumidor na CRFB/88

● dignidade da pessoa humana (art. 1º,III);

Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e
Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como
fundamentos:
III - a dignidade da pessoa humana.

● direito à vida (art. 5º, caput);

Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade,
à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
● direito à intimidade, vida privada, honra e imagem (art. 5º,X);
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o
direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

● direito à informação (art. 5º, XXXIII);

XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse
particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de
responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da
sociedade e do Estado.

● Princípio da Eficiência (art. 37, caput);

Art.37 - A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

● Regulamentação da publicidade de certos produtos (art. 220,§4º c/c L.9.294/96).

§4º - A propaganda comercial de tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos e


terapias estará sujeita a restrições legais, nos termos do inciso II do parágrafo anterior, e
conterá, sempre que necessário, advertência sobre os malefícios decorrentes de seu uso.

6.3 – Relação jurídica de Consumo = Segundo, Nelson Nery Jr., é a relação jurídica existente
entre fornecedor e consumidor tendo por objeto a aquisição de produtos ou utilização de
serviços pelo consumidor.

O CDC traz quatro definições:

Consumidor Fornecedor

Aquisição de Contratação de serviço


produto

● Elementos Subjetivos = Consumidor e Fornecedor


● Elementos Objetivos = Produto e Serviço.

6.3.1 – Elementos Subjetivos


a) Consumidor (art. 2º, caput CDC) = traz o conceito em seu sentido estrito.

Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou
serviço como destinatário final.

 O Consumidor é sempre o destinatário final?


Resposta: Há divergências:

1ª corrente (Finalistas) = consumidor é aquele que adquire o produto ou serviço para o


consumo próprio ou de sua família. Ou seja, só inclui pessoa física e não pessoa jurídica ou
profissional liberal/autônomo — aquele que compra para compor a cadeia produtiva.

2ª corrente (Maximalista) = é aquele que retira produto ou serviço do mercado de consumo,


qualquer que seja a sua finalidade (menos em caso de revenda). Ele é um destinatário fático,
independente de integrar a cadeia produtiva. Assim, por exemplo, empresa que compra
algodão para produção de toalha também é consumidor.

** Posição do STJ = adora a corrente FINALISTA ATENUADA. Isto é, a pessoa jurídica


(micro-empresas, empresas de pequeno porte) ou o profissional liberal poderão ser
considerados consumidores, desde que comprovada a vulnerabilidade.

REsp 476428/SC (19/04/2005)


Ementa: Direito do Consumidor. Recurso especial. Conceito de consumidor. Critério subjetivo
ou finalista. Mitigação. Pessoa Jurídica. Excepcionalidade. Vulnerabilidade. Mesmo nas
relações entre pessoas jurídicas, se da análise da hipótese concreta decorrer inegável
vulnerabilidade entre a pessoa-jurídica consumidora e a fornecedora, deve-se aplicar o CDC na
busca do equilíbrio entre as partes. Ao consagrar o critério finalista para interpretação do
conceito de consumidor, a jurisprudência deste STJ também reconhece a necessidade de, em
situações específicas, abrandar o rigor do critério subjetivo do conceito de consumidor, para
admitir a aplicabilidade do CDC nas relações entre fornecedores e consumidores-empresários
em que fique evidenciada a relação de consumo (Neste sentido REsp nº 716.877-SP de
22/3/2007).

● Agravo 686.793 STJ (em sentido oposto) = caso em que o consumidor não fora considerado
destinatário final — empresa que busca empréstimo bancário para dinamizar seu negócio,
pois neste caso, há o chamado consumidor intermediário.

Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO ESPECIAL. HIPÓTESE DE CONSUMO


INTERMEDIÁRIO. INAPLICABILIDADE DO CDC. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
No que tange à definição de consumidor, a Segunda Seção desta Corte, ao julgar, aos
10.11.2004, o REsp nº 541.867/BA, perfilhou-se à orientação doutrinária finalista ou subjetiva,
de sorte que, de regra, o consumidor intermediário, por adquirir produto ou usufruir de serviço
com o fim de, direta ou indiretamente, dinamizar ou instrumentalizar seu próprio negócio
lucrativo, não se enquadra na definição constante no art. 2º do CDC. Sujeitos da Relação –
Consumidor - CDC traz quatro definições:
II – Consumidor por Equiparação -artigo 2º, parágrafo único, CDC:“equipara-se a consumidor a
coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de
consumo”.
Sujeitos da Relação –Consumidor - CDC traz quatro definições:
III - Consumidor por Equiparação -artigo 17, CDC: “equiparam-se aos consumidores todas as
vítimas do evento danoso”. Protege-se a figura do by-stander.
Sujeitos da Relação –Consumidor - CDC traz quatro definições:
IV - Consumidor por Equiparação -artigo 29, CDC: “Para os fins deste Capítulo e do seguinte,
equiparam-se aos consumidores todas as pessoas determináveis ou não,expostas às práticas
nele previstas”. Todas as pessoas determináveis ou não, expostas às práticas comerciais e
contratuais.
Sujeitos da Relação –Fornecedor - Artigo 3º do CDC: “é toda pessoa física ou jurídica, pública
ou privada, nacional ou estrangeira,bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem
atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação,
exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços”.

** Consumidor por equiparação = previsão:

I) art. 2º,§Ú CDC = fundamentação na tutela coletiva do consumidor, além de ser mero
espectador, estando protegido pela tutela coletiva.

Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que


indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.

II) art. 17 CDC = trata das vítimas do evento danoso (ex.: é aquela pessoa que não comprou a
TV e sim ganhou e quando a liga na tomada, esta explode na sua cara). As vítimas de evento
danoso são conhecidas pela doutrina americana de By-stander. Por exemplo, aquele que
passava pelo shopping para cortar caminho em direção a sua casa, mesmo não comprando
qualquer coisa no shopping. Mesmo aquele que não foi comprar um produto, mas sofreu o
evento danoso, também será considerado consumidor. Outro exemplo, avião que cai em uma
casa na favela, o morador também será considerado consumidor por equiparação por ser
vítima do evento danoso.

Art. 17. Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas
do evento.

III) art. 29 CDC = incluem todas as pessoas determináveis ou não expostas às práticas
comerciais e contratuais.

Art. 29. Para os fins deste Capítulo e do seguinte, equiparam-se aos consumidores
todas as pessoas determináveis ou não, expostas às práticas nele previstas.

b) Fornecedor (art. 3º, caput CDC) = é toda PF ou PJ, público ou privado, nacional ou
estrangeira, bem como os entes despersonalizados que colocam um produto ou serviço no
mercado de consumo com habitualidade na atividade fim (não há necessidade de uma
constituição formal para a sua caracterização, bastando a habitualidade).
 As associações desportivas (clubes) e condomínio estão abrangidos como fornecedores,
pelo CDC?
Resposta: Nenhum dos dois, em razão da natureza comunitária entre os filiados e os
condôminos (sem fins lucrativos) e pelo fato dos interessados deliberarem o objeto social.

● Resp 310.953/SP (10/04/2007)


Ementa: CIVIL E PROCESSUAL. ACÓRDÃO ESTADUAL. NULIDADE NÃO
CONFIGURADA. FURTO DE MOTOCICLETA NAS DEPENDÊNCIAS DE CLUBE
SÓCIO-RECREATIVO. ESTACIONAMENTO. INDENIZAÇÃO INDEVIDA.(...) II.
Inexistindo expressa previsão estatutária, não é a entidade sócio-recreativa, assim
como por igual acontece nos condomínios, responsável pelo furto de veículos
ocorrido em suas dependências, dada a natureza comunitária entre os filiados,
sem caráter lucrativo.

 Condomínio pode ser enquadrado como consumidor?


Resposta: Sim, só não pode como fornecedor.

● Resp 650.791/RJ
Ementa: TRIBUTÁRIO. TAXA DE ESGOTO. COBRANÇA INDEVIDA. RELAÇÃO DE
CONSUMO. CONDOMÍNIO.
1. É inaplicável o Código de Defesa de Consumidor às relações entre os condôminos e
o condomínio quanto às despesas de manutenção deste.
2. Existe relação de consumo entre o condomínio de quem é cobrado indevidamente
taxa de esgoto e a concessionária de serviço público.
3. Aplicação do artigo 42 do Código de Defesa de Consumidor que determina o
reembolso em dobro.

6.3.2 – Elementos Objetivos

a) Produto (art. 3º,§1º CDC) = exemplo de bem imaterial (mútuo bancário). A doutrina também
considera como produto, os bens novos ou usados, fungíveis ou infungíveis, principais ou
acessórios.

§ 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.

 Produto de amostra-grátis está protegido pelo CDC?


Resposta: Sim.

b) Serviços (art. 3º,§2º CDC) = só estão incluídos os serviços remunerados (“mediante


remuneração”), seja ela direta ou indireta. Não abrange os não-remunerados.

- Remuneração indireta = estacionamento gratuito no shopping.


- Serviço gratuito = médico que atende pessoa passando mal no meio da rua.
 Aplica-se o CDC às instituições financeiras?
Resposta: Além de ter previsão legal, o STJ também editou súmula neste sentido.

Súmula 297 STJ: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições


financeiras”.

A doutrina também entende que se aplica às instituições, sob os seguintes


fundamentos:
I) serviço bancário é serviço remunerado;
II) serviço prestado de forma ampla e geral;
III) habitualidade e profissionalismo da prestação destes serviços;
IV) os tomadores deste serviço (consumidor) são vulneráveis na relação (parte mais fraca).

Obs.: Foi proposta a ADIN 2591/DF, na qual argumentava que o CDC é lei ordinária, não
podendo assim regulamentar a instituição financeira, em razão de ser inconstitucional, pois o
art. 192 CRFB/88, diz que as mesmas serão regidas por lei complementar. A decisão do STF
foi de julgá-la improcedente, podendo o CDC ser aplicado às instituições financeiras.

ADI 2591/DF (07/06/2006)


Ementa: INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. SUJEIÇÃO DELAS AO CÓDIGO DE DEFESA DO
CONSUMIDOR, EXCLUÍDAS DE SUA ABRANGÊNCIA A DEFINIÇÃO DO CUSTO DAS
OPERAÇÕES ATIVAS E A REMUNERAÇÃO DAS OPERAÇÕES PASSIVAS PRATICADAS
NA EXPLORAÇÃO DA INTERMEDIAÇÃO DE DINHEIRO NA ECONOMIA [ART. 3º, § 2º, DO
CDC]. MOEDA E TAXA DE JUROS. DEVER-PODER DO BANCO CENTRAL DO BRASIL.
IMPROCEDÊNCIA.

 Aplica-se o CDC aos juros bancários remuneratórios?


Resposta: Sim (Resp 715.894/PR).

 E quanto à limitação da fixação dos juros remuneratórios?


Resposta: A fixação de juros não está limitada a 12% ao ano, e sim à média do mercado
(súmula 382 STJ c/c Resp 715.894/PR).

Súmula 382 STJ: “A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por
si só, não indica abusividade”.

● Resp 715.894/PR (26.04.2006)

Ementa: Direito bancário. Contrato de abertura de crédito em conta corrente. Juros


remuneratórios. Previsão em contrato sem a fixação do respectivo montante.
Abusividade, uma vez que o preenchimento do conteúdo da cláusula é deixado ao
arbítrio da instituição financeira (cláusula potestativa pura). Limitação dos juros à média
de mercado (arts. 112 e 113 do CC/02). - - As instituições financeiras não se
sujeitam ao limite de 12% para a cobrança de juros remuneratórios, na esteira da
jurisprudência consolidada do STJ.
-Na hipótese de o contrato prever a incidência de juros remuneratórios, porém sem lhe
precisar o montante, está correta a decisão que considera nula tal cláusula porque fica
ao exclusivo arbítrio da instituição financeira o preenchimento de seu conteúdo. A
fixação dos juros, porém, não deve ficar adstrita ao limite de 12% ao ano, mas deve ser
feita segundo a média de mercado nas operações da espécie (...)

AgRg no AgRg no AREsp 613.726/RS (05/05/2015)

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE

CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO CO PACTO DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA.

JUROS REMUNERATÓRIOS PACTUADOS. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. COMISSÃO DE

PERMANÊNCIA. TARIFAS BANCÁRIAS. MORA CONFIGURADA. AGRAVO REGIMENTAL

NÃO PROVIDO.

1. O Tribunal de origem consignou que a taxa de juros praticada pela Instituição bancária
deveria observar a taxa média de mercado apurada pelo Banco central para o período de
contratação, não sendo abusiva a taxa de juros pactuada. Rever este entendimento implicaria
no reexame do acervo fático-probatório da demanda, o que é vedado pelo teor da Súmula 7 do
STJ.

2. "É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos


celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em
vigor como MP 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada." (REsp 973.827/RS,
Rel. p/ Acórdão Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em
08/08/2012, DJe 24/09/2012)

3. Admite-se a comissão de permanência durante o período de inadimplemento contratual, à


taxa média dos juros de mercado, limitada ao percentual fixado no contrato (Súmula nº
294/STJ), desde que não cumulada com a correção monetária (Súmula nº 30/STJ), com os
juros remuneratórios (Súmula nº 296/STJ) e moratórios, nem com a multa contratual.

4. Agravo regimental não provido.

Pela súmula 380 STJ (relativa aos bancos), a pessoa que não concorda com o valor ou
existência de uma dívida com o banco e por conta disso ajuíza ação revisional, não inibirá a
mora do consumidor, podendo assim ver o seu nome incluído no cadastro de inadimplente.
Desta forma, para impedir o cadastramento, a ação revisional além de ter que conter
jurisprudência pacífica dos Tribunais (STJ e STF), terá o interessado que depositar o valor
incontroverso.

Súmula 380 STJ: “A simples propositura da ação de revisão do contrato não inibe a
caracterização da mora do autor”.
Pela Súmula 379 STJ (juros moratórios), há o estabelecimento de um limite destes —
12% ao ano. Diferentemente dos juros remuneratórios que podem ser superiores a 12% ao
ano, desde que dentro da média do mercado.

Súmula 379 STJ: “Nos contratos bancários não regidos por legislação específica, os
juros moratórios poderão ser fixados em até 1% ao mês”.

 E os serviços públicos? Eles se enquadram no CDC?


Resposta: O CDC somente abrange os serviços públicos, cuja remuneração seja por tarifa
(ex.: energia elétrica, transporte coletivo e telefonia. O STJ e STF também consideram
natureza de tarifa o serviço de água e esgoto). Assim, taxa e preço público o CDC não
abrange, pois possui relação jurídica tributária (ex.: serviço de saúde pública, segurança
pública).

REsp 647710/RJ (20/06/2006)


Ementa: RECURSO ESPECIAL. ACIDENTE EM ESTRADA. ANIMAL NA PISTA.
RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. CÓDIGO
DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PRECEDENTES.

Súmula 321 CTJ: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável à relação jurídica


entre a entidade de previdência privada e seus participantes”.

 E quanto ao serviço notarial (serventuário de registro, envolvendo Tabelionato de Notas),


pode-se ingressar com ação, com fulcro no CDC?
Resposta: Prevalece na jurisprudência que não (Resp 625.144/SP c/c ADIN 3694/AP).

● Resp 625.144/SP (14.03.2006)


Ementa: PROCESSUAL. ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL.
RESPONSABILIDADE CIVIL. TABELIONATO DE NOTAS. FORO COMPETENTE.
SERVIÇOS NOTARIAIS.
- A atividade notarial não é regida pelo CDC. (Vencidos a Ministra Nancy Andrighi e
o Ministro Castro Filho) (...)

● ADIN 3694/AP (não se aplica o CPC e sim a lei tributária, por justamente os emolumentos e
custas terem caráter de taxa).
Ementa: Ação direta de inconstitucionalidade: L. 959, do Estado do Amapá, publicada no DOE
de 30.12. 2006, que dispõe sobre custas judiciais e emolumentos de serviços notariais e de
registros públicos, cujo art. 47 - impugnado - determina que a "lei entrará em vigor no dia 1º de
janeiro de 2006”: II. Custas e emolumentos: serventias judiciais e extrajudiciais: natureza
jurídica. É da jurisprudência do Tribunal que as custas e os emolumentos judiciais ou
extrajudiciais tem caráter tributário de taxa. III. Lei tributária: prazo nonagesimal.

 Aplica-se o CDC, nos caso de crédito educativo (formalizado em banco)?


Resposta: Prevalece que não se aplica o CDC, pois o crédito educativo é um programa de
governo, em benefício do estudante, sem conotação de serviço bancário (art. 3º,§2º CDC).

● Resp 479.863/RS (03.08.2004)


Ementa: ADMINISTRATIVO – CRÉDITO EDUCATIVO – NATUREZA JURÍDICA –
CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – JUROS CAPITALIZÁVEIS – LEI DA
USURA – DECRETO 22.626/33.
1. Na relação travada com o estudante que adere ao programa do crédito educativo,
não se identifica relação de consumo, porque o objeto do contrato é um programa de
governo, em benefício do estudante, sem conotação de serviço bancário, nos
termos do art. 3º, § 2º, do CDC (...)

**ATENÇÃO: Em 27.07.2009, o CDC sofreu alteração em seu art. 31, sendo acrescido o §Ú,
pela L. 11.989/09.

Art. 31. A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações


corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características,
qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros
dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores.
Parágrafo único. As informações de que trata este artigo, nos produtos refrigerados
oferecidos ao consumidor, serão gravadas de forma indelével. (Incluído pela Lei nº 11.989, de
2009).
6 – Diálogos das Fontes

6.1 – Origem = Havia uma concepção de que caso existisse duas ou mais normas
regulamentando uma matéria deveria haver cisão delas, prevalecendo apenas uma norma. E,
1995, no Curso Geral de Haia, Erik Jayme propôs o diálogo das fontes, ou seja, a unificação
destas normas, invés da cisão (exclusão).

6.2 – Aprofundamento = Para Cláudia Lima Marques (no Brasil) três são os tipos de “diálogo”
possíveis:

a) Diálogo sistemático de coerência = aplicação simultânea de duas leis, sendo que uma
serve de base conceitual para outra (o CCB é a base do CDC). Para ela, o CDC não impede a
aplicação do CCB, quando este trouxer regra mais favorável ao consumir, como é o caso dos
prazos prescricionais.

b) Diálogo sistemático de complementariedade e subsidiariedade = consiste na aplicação


coordenada de duas leis, uma complementando a aplicação da outra ou sendo aplicada de
forma subsidiária. Ex.: Temas que constam no CCB e não no CDC e vice-versa.

c) Diálogo das influências recíprocas sistemáticas = influência do sistema geral no especial


e vice-versa.

Por fim, vale dizer que o diálogo das fontes deverá ocorrer também entre o CDC e “leis
especiais” como a lei de planos de saúde, lei sobre incorporação imobiliária, Código Brasileiro
de Aeronáutica, lei sobre as mensalidades escolares, lei de concessões e permissões de
serviços públicos, lei complementar que regulamenta o sistema financeiro...
** ATENÇÃO: O STJ não admite a Teoria Dos Diálogos Das Fontes, prevalecendo ainda em
suas decisões à cisão entre o CDC e o CCB e quando aplicado este último prejudica o
consumidor.
O STJ admite a aplicação do diálogo das fontes. A doutrina, todavia, critica a aplicação que
vem sendo feita quando sustentam que seria tão somente para beneficiar o consumidor, sendo
que a jurisprudência vem aplicando tanto em desfavor quanto em benefício do consumidor:

PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TÍTULOS DE CAPITALIZAÇÃO.


CLÁUSULA INSTITUIDORA DE PRAZO DE CARÊNCIA PARA DEVOLUÇÃO DE VALORES
APLICADOS. ABUSIVIDADE. NÃO OCORRÊNCIA.
1. A manifestação do Ministério Público após a sustentação oral realizada pela parte não
importa em violação do art. 554 do CPC se sua presença no processo se dá na condição de
fiscal da lei.
2. Não pode ser considerada abusiva cláusula contratual que apenas repercute norma legal em
vigor, sem fugir aos parâmetros estabelecidos para sua incidência.
3. Nos contratos de capitalização, é válida a convenção que prevê, para o caso de resgate
antecipado, o prazo de carência de até 24 (vinte e quatro) meses para a devolução do
montante da provisão matemática.
4. Não pode o juiz, com base no CDC, determinar a anulação de cláusula contratual
expressamente admitida pelo ordenamento jurídico pátrio se não houver evidência de que o
consumidor tenha sido levado a erro quanto ao seu conteúdo. No caso concreto, não há
nenhuma alegação de que a recorrente tenha omitido informações aos aplicadores ou agido de
maneira a neles incutir falsas expectativas.
5. Deve ser utilizada a técnica do "diálogo das fontes" para harmonizar a aplicação
concomitante de dois diplomas legais ao mesmo negócio jurídico; no caso, as normas
específicas que regulam os títulos de capitalização e o CDC, que assegura aos investidores a
transparência e as informações necessárias ao perfeito conhecimento do produto.
6. Recurso especial conhecido e provido.
(REsp 1216673/SP, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, julgado
em 02/06/2011, DJe 09/06/2011).

DA BOA-FÉ

A boa-fé objetiva estabelece um dever de conduta entre fornecedores e consumidores


no sentido de agirem com lealdade (treu) e confiança (glauben) na busca do fim comum, que é
o adimplemento do contrato, protegendo, assim, as expectativas de ambas as partes. Em
outras palavras, a boa-fé objetiva constitui um conjunto de padrões éticos de comportamento,
aferíveis objetivamente, que devem ser seguidos pelas partes contratantes em todas as fases
da existência da relação contratual, desde a sua criação, durante o período de cumprimento e,
até mesmo, após a sua extinção.
A boa-fé objetiva apresenta as seguintes funções: a) teleológica ou interpretativa
(art. 113 CC)- é a mais utilizada pela jurisprudência, e serve de orientação para o juiz, devendo
este sempre prestigiar, diante de convenções e contratos, a teoria da confiança, segundo a
qual as partes agem com lealdade na busca do adimplemento contratual; b) controle ou
limitadoras de direitos (art. 187 CC)- visa evitar o abuso do direito subjetivo, limitando
condutas e práticas comerciais abusivas, reduzindo, de certa forma, a autonomia dos
contratantes; c) integrativa ou criadora de deveres laterais (anexos) (art. 422 CC) - insere
novos deveres para as partes diante das relações de consumo, pois além da verificação da
obrigação principal, surgem novas condutas a serem também observadas. São os assim
denominados “deveres anexos” ou “deveres laterais” pela doutrina e jurisprudência. A violação
a qualquer dos deveres anexos implica inadimplemento contratual. Exemplo de deveres
anexos: proteção, informação, cooperação, cuidado etc. A violação desses deveres anexos ou
laterais é chamado pela doutrina de “violação positiva do contrato” ou também de
“adimplemento ruim.”

CONVENÇÃO COLETIVA DE CONSUMO

Art. 107. As entidades civis de consumidores e as associações de fornecedores ou sindicatos


de categoria econômica podem regular, por convenção escrita, relações de consumo que
tenham por objeto estabelecer condições relativas ao preço, à qualidade, à quantidade, à
garantia e características de produtos e serviços, bem como à reclamação e composição do
conflito de consumo.

§1º. A convenção tornar-se-á obrigatória a partir do registro do instrumento no cartório de


títulos e documentos.

§2º. A convenção somente obrigará os filiados às entidades signatárias.

§3º. Não se exime de cumprir a convenção o fornecedor que se desligar da entidade em data
posterior ao registro do instrumento.

- Principais pontos:

i) Possibilidade das entidades civis de consumidores e as associações de fornecedores


ou sindicatos de categoria econômica regularem, através de convenção coletiva, certas
condições para as relações de consumo;

ii) A convenção tornar-se-á obrigatória a partir do registro do instrumento no cartório


de títulos e documentos;

iii) A convenção somente obrigará os filiados às entidades signatárias;

iv) Não se exime de cumprir a convenção o fornecedor que se desligar da entidade em


data posterior ao registro do instrumento;

v) É vedada qualquer estipulação que limite a abrangência do Código de Defesa do


Consumidor, por se tratar de norma de ordem pública e de interesse social.
Ponto 01
Direito Empresarial - Empresário. Conceito e caracterização. Capacidade. Deveres.
Empresário individual e sociedade empresária. Sociedade não empresária. Alienação
Fiduciária em Garantia. Teoria geral dos títulos de crédito. Títulos de crédito no Código
Civil. Constituição do crédito. Exigibilidade. Títulos de crédito em espécie. Letra de
Câmbio. Nota promissória. Cheque. Duplicata. Títulos de créditos vinculados ao crédito
rural. Títulos de créditos vinculados ao financiamento imobiliário. Conhecimento de
depósito. Warrant. Conhecimento de transporte. Títulos do agronegócio. Ações
cambiárias. Teoria geral da falência. Evolução do Direito Falimentar. Princípio da
preservação da empresa. Crise da empresa. Lei nº 11.101/2005.

Conceito de Empresário.

Definição legal: empresário é o profissional exercente de “atividade econômica


organizada para a produção e circulação de bens e serviços.”

Destacam-se as noções de: (a) profissionalismo; (b) atividade econômica organizada;


(c) produção ou circulação de bens ou serviços.

O profissionalismo pressupõe:

1. Habitualidade: pois não será empresário o exercente de atividade esporádica


ou episódica;
2. Pessoalidade: pois o empresário está à frente do negócio e contrata
empregados que agem em seu nome,
3. Monopólio da Informação: pois o empresário domina informações sobre o
produto ou serviço de sua empresa.

A atividade econômica organizada.

Atividade. A empresa é atividade de produção ou circulação de bens ou serviços.


Muitas vezes há equívocos ou atecnias no emprego da expressão “empresa”. Às vezes
empresa é confundida com empresário quando se diz que “a empresa faliu”. A empresa é
confundida com estabelecimento comercial quando se diz que “foi feita uma reforma na
empresa”. A empresa é confundida com sociedade quando se diz que “separam-se os bens da
empresa e dos sócios” ou “A e B abriram uma empresa”, quando certo seria afirmar separam-
se os bens sociais dos bens dos sócios ou A e B.

Econômica. Busca-se o lucro, sendo este o fim e não o meio da união de bens e
esforços.

Organizada. Empresa é a atividade que articula os 4 fatores de produção: (a) mão-de-


obra; (b) capital; (c) tecnologia; (d) insumos. Se faltar algum destes fatores não se trata de
empresa.
Produção ou Circulação de Bens ou Serviços.

Produção é fabricação. A atividade industrial é essencialmente empresária. Ex.


montadora de veículos; fabricante de roupas. Produzir serviços é prestá-los. Ex. Serviços de
bancos, seguradoras, escolas, hospitais.

Circulação. É atividade de comércio. Busca-se o produto do produtor e leva-se ao


consumidor. Circular serviços é intermediar sua prestação. Ex. a agência de turismo não presta
serviços de transporte e de hospedagem, mas os intermedeia.

Agentes econômicos excluídos do conceito de empresário:

São basicamente 4 hipóteses de atividades civis.

1. Não enquadramento no conceito de empresário (exemplo, realizou uma venda


eventual, não tem habitualidade);
2. Empresário rural não registrado na Junta Comercial;
3. Cooperativa;
4. Profissionais intelectuais.

Profissionais intelectuais:

Art. 966, CC, § único: Não se considera empresário quem exerce profissão
intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de
auxiliares e colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de
empresa.

Advogados, médicos, dentistas, arquitetos, atores, artistas, escritores.

Exemplo: O médico que começa com seu consultório, amplia os negócios e abre uma
clínica e depois amplia e abre um hospital. Nesta última etapa, sua clientela não mais busca os
serviços prestados pessoalmente, mas os serviços oferecidos pelo hospital, sendo a atividade
médica elemento de empresa.

Enunciado 194 aprovado na III Jornada de Direito Civil: os profissionais liberais não são
considerados empresários, salvo se a organização dos fatores de produção for mais importante
que a atividade pessoal desenvolvida.

Enunciado 195 aprovado na III Jornada de Direito Civil: a expressão elemento da


empresa demanda interpretação econômica, devendo ser analisada sob a égide da absorção
da atividade intelectual, de natureza científica, literária ou artística como um dos fatores da
organização empresarial.
Empresário rural.

Art. 971, CC: O empresário, cuja atividade rural constitua sua principal profissão, pode,
observadas as formalidades do art. 968 e seus parágrafos (que cuidam da inscrição do
empresário), requerer inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis da respectiva
sede, caso em que, depois de inscrito, ficará equiparado, para todos os efeitos, ao empresário
sujeito a registro.

Cooperativas.

São sempre sociedade simples (sociedades civis – é o que não for empresária),
independentemente do que venham a explorar, por força de lei.

As sociedades anônimas são sempre empresárias independentemente da atividade


explorada. Lei das SAs (6404/76, art. 2º, p. 2º).

Empresário Individual.

Empresário pode ser pessoa física ou jurídica. Se física, será empresário individual; se
jurídica, será sociedade empresária. Atualmente, existe uma outra forma de exercício da
empresa: EIRELI. Trata-se de uma nova espécie de pessoa jurídica.

Os sócios de uma sociedade empresárias NÃO são empresários; são empreendedores


(capital + trabalho) ou investidores (capital). A pessoa jurídica é que será a empresária. O
regime jurídico é absolutamente diverso.

O exercício de atividade empresarial por pessoa física é vedado em 2 hipótese


relativas a: capacidade e a proibições ao exercício da empresa. Ressalva, vedações impostas
a pessoas física para ser empresário individual, não para ser sócio de sociedade empresária.

Para ser empresário individual a pessoa física deve estar no pleno gozo de sua
capacidade civil. Há duas hipóteses especialíssimas que permitem ao incapaz, mediante
autorização judicial (alvará), através dos institutos da assistência ou representação, exercer a
empresa: (a) continuar atividade que já exercia antes da superveniência da incapacidade; (b)
suceder os pais ou pessoa de quem é sucessor que exerciam a atividade.

Os bens do incapaz não respondem pelas obrigações decorrentes da atividade durante


o prazo da autorização, salvo se antes ou depois do ato foi empregado.

O incapaz não pode dar início à atividade como empresário individual. No entanto, se o
incapaz estiver enquadrado nas hipóteses de emancipação, poderá ser empresário individual.
 O incapaz pode continuar uma empresa?
Sim, ele pode continuar. Art. 974 CC (Decorar).

Art. 974. Poderá o incapaz, por meio de representante ou


devidamente assistido, continuar a empresa antes exercida por ele
enquanto capaz, por seus pais ou pelo autor de herança.
§ 1o Nos casos deste artigo, precederá autorização judicial, após
exame das circunstâncias e dos riscos da empresa, bem como da
conveniência em continuá-la, podendo a autorização ser revogada
pelo juiz, ouvidos os pais, tutores ou representantes legais do menor
ou do interdito, sem prejuízo dos direitos adquiridos por terceiros.
§ 2o Não ficam sujeitos ao resultado da empresa os bens que o
incapaz já possuía, ao tempo da sucessão ou da interdição, desde
que estranhos ao acervo daquela, devendo tais fatos constar do
alvará que conceder a autorização.
§ 3o O Registro Público de Empresas Mercantis a cargo das Juntas
Comerciais deverá registrar contratos ou alterações contratuais de
sociedade que envolva sócio incapaz, desde que atendidos, de
forma conjunta, os seguintes pressupostos: (Incluído pela Lei nº
12.399, de 2011)
I – o sócio incapaz não pode exercer a administração da
sociedade; (Incluído pela Lei nº 12.399, de 2011)
II – o capital social deve ser totalmente integralizado; (Incluído pela
Lei nº 12.399, de 2011)
III – o sócio relativamente incapaz deve ser assistido e o
absolutamente incapaz deve ser representado por seus
representantes legais.
Essa regra é aplicada ao menor, como também àquele que sofreu incapacidade
superveniente. Ex.: quando capaz, o sujeito desenvolvia atividade empresarial. Posteriormente,
veio a sofrer incapacidade: ele poderá continuar a atividade.

Ex. 2: menor pode continuar tocando hotel, após o falecimento de seu pai.

Mas é preciso a observância de alguns requisitos, para que o incapaz possa continuar
a atividade empresarial:

a) Devidamente assistido ou representado


b) Autorização judicial – art. 974, parágrafo 1º. É revogável a qualquer tempo
O empresário individual possui responsabilidade ilimitada: responderá com seus
bens pessoais pelas dívidas comerciais (dívidas contraídas pela empresa).

Em verdade, o art. 974 caput é regra de preservação da empresa: já estava em


atividade, e atualmente será preservada. Se o incapaz reúne condições para tocar o negócio,
deve-se preservar a empresa. Mas o incapaz pode ter prejuízo por conta disso? Ex.: o menor
recebeu, de seu avô, uma fazenda. Seu outro avô deixou-lhe um carro. E o menor continuou
tocando o hotel. Caso o hotel contraia dívidas, a regra é de que essas dívidas deveriam recair
sobre o patrimônio do menor. Entretanto, o legislador criou uma regra de proteção ao
patrimônio do incapaz (regra de blindagem do patrimônio do incapaz): parágrafo 2º.

O juiz dá alvará autorizando o incapaz a continuar a atividade empresarial (que pode


ser revogado a qualquer tempo). É imprescindível que no alvará conste qual é o patrimônio
que o menor/interdito já possui: tais bens não responderão por dívidas da atividade
empresarial.

974 caput: regra de preservação da empresa


974, parágrafo 2º: regra de proteção ao patrimônio do incapaz

Obs.: juiz, promotor, delegado, defensor público, procurador, funcionário público e


militares na ativa não podem ser empresários individuais, mas podem ser sócios, quotistas
ou acionistas de uma sociedade, desde que não exerçam a administração.

Um Promotor pode ter uma franquia do Habib´s? Um funcionário público pode ter uma
floricultura? Um Militar na ativa pode ter uma empresa de segurança?

Cuidado: é preciso analisar sob duas óticas. Uma coisa é ser empresário individual:
pessoa natural que sozinha, individualmente está organizando uma atividade empresarial.
Outra coisa é ser sócio de uma sociedade empresária.

Em todos esses casos eles não podem ser empresário individual. Mas eles podem ser
sócios de sociedade empresária.

Logo, o MP pode ter franquia do Habib´s, o juiz pode adquirir ações da Petrobrás,
desde que não exerçam a administração.

Prepostos.

Para o exercício da empresa é necessário a contratação de mão-de-obra. Poderá ela


sujeitar-se ao regime trabalhista ou civil, mas o empregado ou prestador de serviços, para
todos os efeitos obrigacionais são denominados prepostos. Atuam em nome do empresário,
vinculando-o. Se atuam com culpa, respondem perante o empresário via ação de regresso, se
agem com dolo, podem ser diretamente responsabilizados pelo prejudicado, em solidariedade
com o empresário.

O preposto não pode concorrer com o proponente (empresário), sob pena de perdas e
danos e retenção dos créditos equivalentes ao lucro da operação.
O C. Civil refere-se especificamente a 2 espécies de prepostos: o gerente e o
contabilista. A existência do primeiro é facultativa. A do segundo é obrigatória.

Proibidos de Exercerem a Empresa.

O principal alvo no que concerne à proibição do exercício da empresa é o falido não


reabilitado. Aquele que tiver sua falência decretada, só pode voltar a exercer empresa após a
declaração judicial de reabilitação.

Se a falência foi fraudulenta, ou seja, incorrendo o falido em crime falimentar, deverá


aguardar também a reabilitação penal.

O leiloeiro e funcionário público não podem ser empresário.

Transporte aéreo doméstico só pode ser feito por empresas brasileiras.

Os devedores do INSS não podem ser empresários.

O impedido poderá sofrer sanções administrativas e penais.

Informação importante: na omissão do contrato, o alienante de estabelecimento


comercial não pode restabelecer-se na mesma praça, concorrendo com o adquirente pelo
prazo de 5 anos, sob pena de cessar a atividade e indenizar este último.

_____________________________

CAPACIDADE PARA SER EMPRESÁRIO INDIVIDUAL


Somente a pessoa capaz pode ser empresário individual, logo é preciso ter 18 (dezoito) anos
ou então ser emancipado por qualquer das formas previstas no Código Civil. Com efeito,
dispõe o art.972 do CC: “Podem exercer a atividade de empresário os que estiverem em
pleno gozo da capacidade civil e não forem legalmente impedidos”.

Em hipótese alguma o incapaz poderá iniciar uma atividade empresarial. Todavia, poderá
continuá-la em duas hipóteses:

a) incapacidade superveniente: Tal ocorre quando, após o início da empresa, lhe sobrevém
incapacidade mental.

b) aquisição da empresa por herança.

Com efeito, dispõe o art.974 do CC: “Poderá o incapaz, por meio de representante ou
devidamente assistido, continuar a empresa antes exercida por ele enquanto capaz, por
seus pais ou pelo autor da herança”.

Vê-se que o exercício da atividade empresarial pelo menor ou incapaz será feito mediante
representação ou assistência do representante legal, conforme se trate de absolutamente ou
relativamente incapaz.

É preciso ainda alvará judicial para que o menor ou incapaz continue a empresa, revogável a
qualquer tempo pelo juiz, sem prejuízo dos direitos adquiridos por terceiros.

O juiz só expedirá o alvará após o exame das circunstâncias e dos riscos da empresa, bem
como da conveniência em continuá-la. De fato, reza o §1º do art.974 do CC: “Nos casos deste
artigo, precederá autorização judicial, após exame das circunstâncias e dos riscos da
empresa, bem como da conveniência em continuá-la, podendo a autorização ser
revogada pelo juiz, ouvidos os pais, tutores ou representantes legais do menor ou do
interdito, sem prejuízo dos direitos adquiridos por terceiros”.

O art.975 dispõe que: “Se o representante ou assistente do incapaz for pessoa que, por
disposição de lei, não puder exercer atividade de empresário, nomeará, com aprovação
do juiz, um ou mais gerentes”.

Vê-se assim que quem nomeia o gerente é o próprio representante, o juiz apenas aprova a
nomeação. Fora dessa hipótese, será ainda nomeado gerente em todos os casos em que o juiz
entender ser conveniente (§1º do art.975). A aprovação do gerente não exime o representante
ou assistente do menor ou do interdito da responsabilidade pelos atos dos gerentes nomeados
(§2º do art.975).

Não ficam sujeitos ao resultado da empresa os bens que o incapaz já possuía, ao tempo da
sucessão ou da interdição, desde que estranhos ao acervo daquele, devendo tais fatos constar
do alvará que conceder a autorização (§ 2º do art.974). Preserva-se assim o patrimônio anterior
do incapaz dos riscos do negócio. O juiz, ao expedir o alvará, deverá separar os bens que o
incapaz já tinha, enumerando-se no alvará que será registrado na Junta Comercial,
protegendo, destarte, o seu patrimônio anterior.

IMPEDIDOS DE EXERCER A EMPRESA


Os impedidos são pessoas capazes as quais a lei veda o exercício da atividade empresarial,
com o escopo de proteger o interesse público ou o mercado de consumo.

Com efeito, não podem ser empresários:

a) Falido: com a sentença de falência, suspende-se para o falido o direito de exercer atividade
empresarial (art.102 da Lei nº 11.101/2005). Se o falido não sofreu condenação criminal, ele
pode exercer atividade empresarial a partir da sentença que julgar extinta as suas obrigações.
Se ele foi condenado por crime falimentar e a sentença lhe impõe expressamente como efeito
da condenação a inabilitação para o exercício de atividade empresarial, ele só poderá tornar-se
novamente empresário após a reabilitação penal (art. 181, §1º, da Lei nº 11.101/2005). Se foi
condenado por crime falimentar, mas a sentença não lhe impôs expressamente o efeito da
condenação mencionado acima, ele readquire o direito de exercer atividade empresarial com a
simples sentença que declara extinta as suas obrigações.

b) Os magistrados, membros do Ministério Público, Militares e funcionários públicos;

c) Leiloeiros: não podem exercer atividades estranhas às suas funções.

d) Devedores do INSS (art.95, §2º, d, da Lei nº 8.212/1991);

e) Estrangeiros: Não podem exercer atividades relacionadas com jazidas, demais recursos
minerais e com energia hidráulica (art.176, §1º, da CF). Não podem ser proprietários de
empresa jornalística e de radiofusão sonora e de sons e imagens (art.222 da CF), mas podem
ser sócios de sociedade que explore essa atividade, desde que não seja gestor e que 70%
(setenta por cento) do capital social e do capital votante pertença a brasileiro nato ou
naturalizado há mais de 10 anos (§1º do art. 222 da CF). O serviço de transporte aéreo
doméstico só pode ser exercido por pessoa jurídica brasileira (art.216 CBA).

f) Deputado e Senador: Não podem ser proprietários, controladores ou diretores de empresa


que goze de favor decorrente de contrato com pessoa jurídica de direito público, ou nela
exercer função remunerada (art.54, II, a, da CF).
Saliente-se, contudo, que a pessoa legalmente impedida de exercer atividade própria de
empresário, se a exercer, responderá pelas obrigações contratuais (art.973 do CC). Trata-se
do princípio de que ninguém pode alegar a própria torpeza. Portanto, o patrimônio pessoal do
impedido responde pelas dívidas contraídas no exercício da atividade empresarial, sem
prejuízo da caracterização da contravenção de exercício ilegal da profissão (art.47 da LCP).
DO EMPRESÁRIO

Art. 966, CC. Conceito. Empresário: aquele que exerce profissionalmente atividade
econômica organizada para produção e circulação de bens e serviços. Não é empresário quem
exerce atividade intelectual, científica, artística ou literária, salvo se elemento da empresa.

Conceito Doutrinário. Pessoa física ou jurídica que de forma profissional (contínuo),


através de seu fundo empresarial (1.152, CC, conjunto de bens corpóreos ou incorpóreos),
exerce uma atividade econômica organizada com o fim de lucro, bem como aquela pessoa em
que a lei reputa empresária (Sociedades por ações - anônima ou em comandita por ações,
construtores de imóveis).

Empresário individual – é pessoa física. A responsabilidade é ilimitada, ou seja, os


credores atingem o patrimônio individual, ressalvado os bens impenhoráveis. É muito
arriscado.

Sociedade Empresária – é a pessoa jurídica. Os sócios não são empresários (na


linguagem técnica), são sócios – não vão a falência os sócios, mas a sociedade. Porém, os
sócios podem sofrer os efeitos da falência. Mínimo de 2 sócios em regra.

Natureza Jurídica de sócio. Tem natureza de participante.

Atividade rural: Atividade agrícola, pastoril ou pecuária. Em princípio não é empresário, mas
seu explorador poderá escolher se será empresário (artigo 971, CC, registro constitutivo da
situação de empresário). Enunciado do CJF – o registro tem natureza excepcionalmente
constitutiva (ruralista). ENUNCIADO 202 CJF: o registro do empresário ou sociedade rural na
Junta Comercial é facultativo e de natureza constitutiva, sujeitando-o ao regime jurídico
empresarial. É inaplicável esse regime ao empresário ou sociedade rural que não exercer tal
opção.

A sociedade limitada pode ser ou não empresária (é total flex).

Antes de iniciar a atividade deve o empresário registrar-se na Junta Comercial.

Criação de filial em outro lugar. Deve-se inscrever no Registro Público de Empresas


Mercantis do lugar e averbar na sede.

Sociedade entre Cônjuges. Se os cônjuges forem casados sob o regime da comunhão


universal de bens ou separação obrigatória (legal) de bens, não poderão constituir sociedade
entre si. Nada impede que cada um seja titular de empresa individual ou sócio de uma
sociedade empresaria.
1. O legislador criou uma presunção absoluta de fraude, principalmente no caso de
separação obrigatória de bens para que não houvesse confusão patrimonial.

2. CONTRA: Enunciado 204 do CJF – Art. 977: A proibição de sociedade entre


pessoas casadas sob o regime da comunhão universal ou da separação obrigatória só atinge
as sociedades constituídas após a vigência do Código Civil de 2002. [Aplicação do ato jurídico
perfeito]

3. Enunciado 396 do CJF – A capacidade para contratar a constituição da sociedade


submete-se a lei vigente no momento do registro

4. Enunciado 205 do CJF – Art. 977: Adotar as seguintes interpretações ao art. 977: (1)
a vedação a participação de cônjuges casados nas condições previstas no artigo refere-se
unicamente a uma mesma sociedade; (2) o artigo abrange tanto a participacao originaria (na
constituição da sociedade) quanto a derivada, isto e, fica vedado o ingresso de sócio casado
em sociedade de que já participa o outro cônjuge.

Quem casou sob a égide do código de 16 poderá mudar o regime? 1ª Corrente


(Minoritária): Não pode mudar o regime, por causa do art. 2.039, CC c/ 230 que fala da
imutabilidade de regime. Segundo argumento, 2035, 1ª parte. Solução separa-se e casa-se
novamente. 2ª Corrente (doutrina – Tepedino, Pablo e jurisprudência majoritárias – Maria
Berenice Dias). Admite-se a modificação de regime. Art. 977, atrapalha-se a ordem econômica.
Art. 2035, 2ª parte, CC, art. 2039, CC, não visa impedir a modificação de regimes, apenas
preceitua que quem casou na vigência do CC/16 deve ter a parte patrimonial regida pelo
CC/16, mas nada impede que em petição fundamentada os cônjuges requeiram a modificação
de regimes. Neste caso passaria a ser aplicado o novo código civil. Portanto, deve ser lido o
art. 2.039 do CC da seguinte forma: “o regime de bens dos casamentos celebrados na vigência
do CC/16 é o por ele estabelecido até que venha a ser alterado. Se não se admitir a
modificação de regime dos casamentos anteriores ao CC de 2002 também não pode se admitir
o divórcio para quem casou antes da lei do divórcio.

EMPRESÁRIO INDIVIDUAL

O empresário individual é a pessoa natural que exerce atividade empresarial.

O direito brasileiro segue o princípio da unidade (unicidade) patrimonial: tanto a pessoa


física quanto a pessoa jurídica possuem um único patrimônio. Os bens empresariais e pessoais
são uma coisa só. O empresário tem um único patrimônio. Se o empresário possuir dívidas
empresariais, essas dívidas podem recair não somente sobre os bens empresariais, mas
também sobre os bens pessoais dele.
Idem quanto às dívidas pessoais: as dívidas pessoais podem recair sobre os bens
pessoais e sobre os bens destinados à representação comercial, pois o empresário tem um
patrimônio só.

A responsabilidade é ilimitada: o empresário individual responde com seu patrimônio


pessoal pelas dívidas empresariais.

 O débito civil do comerciante individual (despesa com tratamento dentário)


pode ser garantido por expropriação do estabelecimento mercantil?
Sim, porque a empresa mercantil integra o patrimônio único do empresário.

Jurisprudência: Em se tratando de empresa individual, prevalece o princípio da


unicidade patrimonial, não havendo distinção entre o patrimônio da pessoa jurídica e o da
pessoa física (na verdade, pessoa jurídica está empregada no sentido de CNPJ). Os bens
pessoais do titular da firma individual devem arcar com as dívidas contraídas.

Empresário casado: art. 978. O empresário casado pode, sem necessidade de outorga
conjugal, qualquer que seja o regime de bens, alienar os imóveis que integrem o patrimônio da
empresa ou gravá-los de ônus real.

Enunciado 6, da I Jornada de Direito Comercial do CJF: O empresário individual


regularmente inscrito é o destinatário da norma do art. 978 do Código Civil, que permite alienar
ou gravar de ônus real o imóvel incorporado à empresa, desde que exista, se for o caso, prévio
registro de autorização conjugal no Cartório de Imóveis, devendo tais requisitos constar do
instrumento de alienação ou de instituição do ônus real, com a consequente averbação do ato
à margem de sua inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis

EIRELI

Empresa individual de responsabilidade limitada.

Não significa que a EIRELI é o empresário individual, mas sim uma nova espécie de
pessoa jurídica, na qual existe um único titular de todas as quotas. Capital será de, no mínimo,
100 salários mínimos.

O nome empresarial deverá ser formado pela inclusão da expressão "EIRELI" após a
firma ou a denominação social da empresa individual de responsabilidade limitada. A pessoa
natural que constituir empresa individual de responsabilidade limitada somente poderá figurar
em uma única empresa dessa modalidade
A empresa individual de responsabilidade limitada também poderá resultar da
concentração das quotas de outra modalidade societária num único sócio, independentemente
das razões que motivaram tal concentração. Poderá ser atribuída à empresa individual de
responsabilidade limitada constituída para a prestação de serviços de qualquer natureza a
remuneração decorrente da cessão de direitos patrimoniais de autor ou de imagem, nome,
marca ou voz de que seja detentor o titular da pessoa jurídica, vinculados à atividade
profissional.
Aplicam-se à empresa individual de responsabilidade limitada, no que couber, as regras
previstas para as sociedades limitadas.
Duas correntes a respeito da EIRELI:

I. EIRELI é uma sociedade unipessoal. É uma pessoa jurídica com um único sócio.
Exceções, em que há um único sócio: subsidiária integral (art. 251, L.S.A.), empresa pública
(pode ser unipessoal, tendo a União como única acionista), EIRELI.

O direito brasileiro permite a sociedade unipessoal, para ser pessoa jurídica não há
necessidade de coletividade de pessoas. A fundação, por exemplo, decorre de coletividade de
patrimônio, e não de pessoas. Não há impedimento para classificação da EIRELI como
sociedade de um único sócio.

O legislador não usou a expressão “sociedade”, mas o art. 980-A diz: “capital social”:
quem tem capital social é a sociedade. Ainda, utiliza-se a expressão “cotas”: quem tem cotas é
sociedade.

II. EIRELI é uma pessoa jurídica sui generis. Não se trataria de sociedade. Tratar-se-
ia de nova categoria de pessoa jurídica, formada por apenas um titular.

Em momento algum o legislador chamou a EIRELI de sociedade. O art. 980-A,


topograficamente, não trata de sociedade. Se quisesse classifica-la como sociedade, a EIRELI
estaria no capítulo da sociedade.

O Código Civil adotou a segunda teoria, pois no artigo 44, inciso VI, indica como
espécie de pessoa jurídica de direito privado a EIRELI.

Discute-se quem pode ser o titular da EIRELI. De acordo com sua estrutura, a doutrina
majoritária afirma que somente a pessoa física pode constituir a EIRELI. Enunciado 468 da V
Jornada de Direito Civil: a empresa individual de responsabilidade limitada só pode ser
constituída por pessoa natural.

ADI 4637 busca a inconstitucionalidade da regra que exige capital mínimo de 50


salários mínimos, por entender que seria inconstitucional a exigência de um capital mínimo, e
que não deveria haver indexação do capital com parâmetros do salário mínimo.

Se a EIRELI tem dívida trabalhista, e o patrimônio da EIRELI não for suficiente, não é
possível a execução do patrimônio do titular (a princípio). Mas na EIRELI cabe a
desconsideração da personalidade jurídica (é diferente do empresário individual, que não
há desconsideração).

SOCIEDADE
A pessoa jurídica (sociedade) é constituída por, no mínimo, 2 sócios. Os bens pessoais dos
sócios não respondem pelos débitos da pessoa jurídica. Por ter personalidade jurídica, a
sociedade tem patrimônio próprio. Há separação de patrimônio.

Só haveria responsabilidade dos sócios com a desconsideração da personalidade jurídica.

O brasileiro, buscando a proteção de seu patrimônio, passou a constituir sociedade. “Ele quer
ter sociedade, mas não quer ter sócio.” Passou a fazer uma sociedade forjada, fraudulenta: fica
com 99% das cotas, e passa 1% para a esposa / laranja. É uma forma de forjar o empresário
individual.

A fim de evitar esse comportamento, para criar uma estrutura melhor, para promover a
regularização de muitos empresários individuais que sequer tinham registro, criou-se a EIRELI.

Sociedades simples e sociedades empresárias.

Sociedades empresárias são as que desenvolvem atividade empresarial, isto e,


exploram seu objeto social mediante a organização dos fatores de produção (capital, insumos,
mão-de-obra e tecnologia). Por força de lei, as sociedades anônimas são sempre
empresárias (art. 982, p.u., do NCC). Seus atos constitutivos e as posteriores alterações
devem ser inscritas no Registro Público de Empresas Mercantis, vinculado a Junta Comercial.
Esse registro só e facultativo e constitutivo da empresariedade para quem desenvolve
organizada e preponderantemente a atividade rural (art. 971 do NCC). A Lei 11.101/02 adota o
sistema latino de falência (ou sistema francês ou restritivo), segundo o qual empresário pode
falir, mas sociedade simples não.

As sociedades simples são aquelas que, independentemente do tipo societário,


exploram seu objeto social sem aquela organização dos fatores de produção. As cooperativas
são simples por forca do art. 982, p.u., do NCC. Não se considera de caráter empresarial o
exercício de profissão intelectual, de natureza cientifica, literária ou artística, ainda com o
concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se preponderar o elemento de organização
empresarial (art. 966, p.u., do NCC). Em regra, o registro da sociedade simples e feito no RCPJ
– Registro Civil das Pessoas Juridicas. A sociedade de advogados adquire personalidade
apenas com o registro no Conselho Seccional da OAB.

Alienação Fiduciária em Garantia.

- Alienação Fiduciária em Garantia. Classificação.

VISÃO GERAL

Pode recair sobre imóveis, valores mobiliários (títulos emitidos por S/A) e veículos.
Para imóvel: lei 9.514/97, a partir do art. 33.
Para valores mobiliários: art. 66-B, da lei 4.728/65.
Para veículos: DEL 911/69, alterado pela lei 13.043/14.
Fiduciário (credor) ---------mútuo------------------------> Fiduciante (devedor)
<----------alienação fiduciária----

O devedor-fiduciante faz a alienação fiduciária, que é um contrato acessório, para


garantir um contrato de mútuo (em que o fiduciante é o mutuário). A propriedade é do fiduciário
(é propriedade resolúvel). O devedor-fiduciante tem posse direta.
Se o devedor-fiduciante não pagar, o fiduciário faz pedido de busca e apreensão,
se for de veículo, já ocorrendo a restrição judicial sobre o veículo com o mero ajuizamento. O
contraditório é só para dizer que já pagou ou para pagar. Não há contraditório extenso. É
restrito aqui. Em seguida, o bem é vendido. E essa venda não depende de leilão, avaliação
prévia, hasta pública etc.. O fiduciário vende o bem como quiser. Se a venda não conseguir
liquidar a dívida, o credor ainda pode ingressar com ação de execução, segundo o DEL 911/69.
Mas a súmula 384, do STJ, diz que a ação usada para a cobrança do saldo devedor é uma
monitória: “Cabe ação monitória para haver saldo remanescente oriundo de venda
extrajudicial de bem alienado fiduciariamente em garantia.”

Caso o bem desapareça, mesmo com a restrição judicial, é possível executar o


saldo devedor (não houve abatimento da dívida pela venda do bem, pois ele desapareceu).

Se o devedor-fiduciante falir, cabe pedido de restituição, pois o bem é de


propriedade do credor-fiduciário.

Se não for veículo, o credor antes consolida a propriedade para si e depois


promove reintegração de posse.

CONCEITO

É o negócio jurídico pelo qual o devedor, para garantir o pagamento da dívida,


transmite ao credor a propriedade de um bem, retendo-lhe a posse direta, sob a condição
resolutiva de saldá-la.

Diz-se que é instrumental porque, em regra, é formalizado como meio para a


concretização de outro negócio, principal. Assim, geralmente está associado ao mútuo,
servindo-lhe de garantia.

Transmitida condicionalmente a propriedade da coisa para fim de garantia, se o


devedor paga a dívida, o credor tem que lhe restituir a propriedade, por isso, o pagamento
importa implemento da condição resolutiva, isto é, da condição que extingue a propriedade
resolúvel do credor-fiduciário.

CREDOR FIDUCIÁRIO: aquele que concede o crédito e recebe a PROPRIEDADE


RESOLÚVEL DO BEM. Não se trata da propriedade plena, mas sim de propriedade mediante
condição resolutiva, pois na medida em que o devedor quita o débito, a propriedade deixa de
ser do credor e passa a ser do devedor. Além disso, o CREDOR terá a POSSE INDIRETA DO
BEM, pois a posse é desdobrada.

DEVEDOR FIDUCIANTE: aquele que recebe o crédito e que receberá a


propriedade do bem após a quitação do débito. Em que pese a propriedade resolúvel ser do
credor, o DEVEDOR FIDUCIANTE tem a POSSE DIRETA do bem.
A jurisprudência assentou que (i) é inadmissível alienação fiduciária de bens
fungíveis e consumíveis; (ii) a alienação fiduciária pode recair sobre bens que já pertencem ao
devedor, não havendo obrigatoriedade de a garantia recair apenas sobre objetos a adquirir
com o próprio financiamento (Súmula 28, STJ – “O contrato de alienação fiduciária em garantia
pode ter por objeto bem que já integrava o patrimônio do devedor.”).

Deve-se ressaltar que um dos efeitos da alienação fiduciária em garantia é o


surgimento da propriedade fiduciária, direito real de garantia, que produz efeitos erga omnes.
Entretanto, é importante salientar que a propriedade fiduciária não surge apenas com a
alienação fiduciária em garantia. Um exemplo de propriedade fiduciária que não envolve a
alienação fiduciária é o FIDEICOMISSO, instituto de direito das sucessões em que a
propriedade é fiduciária e resolúvel, pois se extingue com o advento de condição resolutiva ou
termo final.

CLASSIFICAÇÃO:

(i) Contrato bilateral;


(ii) Real: somente se perfaz com a transferência da propriedade resolúvel e da
posse indireta do bem alienado;
(iii) Oneroso;
(iv) Comutativo.

É um contrato bilateral (prevê prestações recíprocas), real (somente se perfaz com


a transferência do domínio resolúvel e a posse indireta do bem alienado, independentemente
de sua tradição), oneroso (vantagens para ambas as partes) e comutativo (de antemão ambos
os contratantes têm ciência do sacrifício patrimonial que irão sofrer).

- Alienação Fiduciária de bem móvel

Legislação Aplicável: Bens móveis – Art. 66-B, da Lei 4.728/651 e Decreto- lei 911/69 (no
âmbito do mercado financeiro e de capitais ou em garantia de créditos fiscais ou

Art. 66-B. O contrato de alienação fiduciária celebrado no âmbito do mercado financeiro e de capitais,
bem como em garantia de créditos fiscais e previdenciários, deverá conter, além dos requisitos
definidos na Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil, a taxa de juros, a cláusula penal, o
índice de atualização monetária, se houver, e as demais comissões e encargos.(Incluído pela Lei 10.931,
de 2004)
§ 1o Se a coisa objeto de propriedade fiduciária não se identifica por números, marcas e sinais no
contrato de alienação fiduciária, cabe ao proprietário fiduciário o ônus da prova, contra terceiros, da
identificação dos bens do seu domínio que se encontram em poder do devedor.(Incluído pela Lei
10.931, de 2004)
§ 2o O devedor que alienar, ou der em garantia a terceiros, coisa que já alienara fiduciariamente em
garantia, ficará sujeito à pena prevista no art. 171, § 2o, I, do Código Penal.(Incluído pela Lei 10.931, de
2004)
§ 3o É admitida a alienação fiduciária de coisa fungível e a cessão fiduciária de direitos sobre coisas
móveis, bem como de títulos de crédito, hipóteses em que, salvo disposição em contrário, a posse direta
e indireta do bem objeto da propriedade fiduciária ou do título representativo do direito ou do crédito é
atribuída ao credor, que, em caso de inadimplemento ou mora da obrigação garantida, poderá vender a
terceiros o bem objeto da propriedade fiduciária independente de leilão, hasta pública ou qualquer
outra medida judicial ou extrajudicial, devendo aplicar o preço da venda no pagamento do seu crédito e
das despesas decorrentes da realização da garantia, entregando ao devedor o saldo, se houver,
acompanhado do demonstrativo da operação realizada.(Incluído pela Lei 10.931, de 2004)
§ 4o No tocante à cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis ou sobre títulos de crédito aplica-se,
também, o disposto nos arts. 18 a 20 da Lei no 9.514, de 20 de novembro de 1997.(Incluído pela Lei
10.931, de 2004)
previdenciários) e CC subsidiariamente (art. 1368-A, CC). ATENÇÃO para as alterações
promovidas pela Lei 13.043/14.

Obs.: Apesar de o art. 1365 do CC vedar o pacto comissório, as leis específicas que
regulamentam a alienação fiduciária admitem tal pacto (arts. 26 e 27 da Lei 9514/97 e art. 3° do
Decreto- lei 911/69).

Registro do Contrato

O contrato de alienação fiduciária somente produzirá efeitos perante terceiros se


registrado. O registro deverá ser feito REGISTRO DE TÍTULOS E DOCUMENTOS. No caso
de veículo automotor, o registro deverá ser feito no órgão responsável pelo licenciamento
(DETRAN).

A doutrina discute se com o advento do CC, art. 1361, § 1º, no caso de alienação
fiduciária de automóveis, é necessário registrar no REGISTRO DE TÍTULOS E DOCUMENTOS
ou se é suficiente apenas o registro no DETRAN. O STJ já decidiu que a exigência do duplo
registro afronta o princípio da razoabilidade. Assim, basta o registro no DETRAN para que o
contrato produza efeitos contra terceiros.

Art. 1361, § 1º CC. Constitui-se a propriedade fiduciária com o


registro do contrato, celebrado por instrumento público ou particular, que lhe serve
de título, no Registro de Títulos e Documentos do domicílio do devedor, ou, em se
tratando de veículos, na repartição competente para o licenciamento, fazendo-se a
anotação no certificado de registro.

Nesse sentido, o RESP 686.932, j. 01/04/2008, Rel. Min. Luiz Fux:

“ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. VEÍCULO AUTOMOTOR. ANOTAÇÃO NO


CERTIFICADO DE REGISTRO DO VEÍCULO - CRV. DETRAN. PUBLICIDADE. REGISTRO
CARTORIAL PARA EXPEDIÇÃO DO DOCUMENTO DO VEÍCULO. INEXIGIBILIDADE. (...) 1.
Assentando o aresto recorrido que:" O registro do contrato de alienação fiduciária no
Cartório de Títulos e Documentos, previsto no inciso 5º do art. 129 da Lei de Registros
Públicos (Lei nº 6.015/73), não revela condição para a transferência da propriedade do
bem, senão, procedimento tendente a emprestar publicidade e, a fortiori, efeito erga
omnes ao ato translatício, evitando prejuízos jurídicos ao terceiro de boa-fé. Precedente
da Corte: REsp 770315/AL , 2ª Turma, DJ 15.05.2006. 2. Deveras, consoante a ratio da
Súmula nº 92 do Egrégio STJ, o registro no órgão de licenciamento faz as vezes do
arquivo no Cartório de Títulos e Documentos (RTD), por isso que, mercê de a exigência
de duplo registro revelar odiosa imposição, afronta o princípio da razoabilidade, posto
impor desnecessário bis in idem, máxime à luz da interpretação autêntica levada a efeito
pelo novel artigo 1.361 do Código Civil. (...)”

Súmula 92 STJ: A terceiro de boa-fé não é oponível a alienação fiduciária não


anotada no certificado de registro do veículo automotor.

O STF, por sua vez, reconheceu a repercussão geral da matéria no RE N.


611.639-RJ, ainda aguardando julgamento:

§ 5o Aplicam-se à alienação fiduciária e à cessão fiduciária de que trata esta Lei os arts. 1.421, 1.425,
1.426, 1.435 e 1.436 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002.(Incluído pela Lei 10.931, de 2004)
§ 6o Não se aplica à alienação fiduciária e à cessão fiduciária de que trata esta Lei o disposto no art. 644
da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002.(Incluído pela Lei 10.931, de 2004)
REPERCUSSÃO GERAL EM RE n. 611.639-RJ, Relator Min. Marco Aurélio
VEÍCULOS AUTOMOTORES - GRAVAME - OBRIGATORIEDADE DO REGISTRO EM
CARTÓRIO DE TÍTULOS E DOCUMENTOS - INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO
1.361, § 1º, DO CÓDIGO CIVIL DECLARADA NA ORIGEM. Possui repercussão geral a
controvérsia sobre a constitucionalidade do artigo 1.361, § 1º, do Código Civil no tocante à
obrigatoriedade do registro, no cartório de títulos e documentos, do contrato de alienação
fiduciária de veículos automotores, mesmo com a anotação no órgão de licenciamento. (Info
621, STF)

Características Fundamentais da Alienação Fiduciária. São as seguintes:

 Implica no desdobramento de posse. O devedor fica com a posse


direta e o credor com a posse indireta. Junto com a propriedade será transferida ao
credor a posse indireta.
 Constituto possessório: aquisição de posse por contrato. O credor
nunca manteve contato físico com a coisa, a posse foi recebida por contrato.
 Propriedade fiduciária, resolúvel. A propriedade é ad tempus. Admite-
se o pacto comissório.
 Patrimônio de afetação: patrimônio separado; o bem apesar de
pertencer ao titular não é suscetível de penhora por dívidas suas. No direito brasileiro
existem dois exemplos: alienação fiduciária e bens objetos de incorporação imobiliária.
Neste sentido: art. 119, IX, LF, art. 53 da Lei 10.931/2004.

Inadimplemento do Devedor

Quando o devedor deixa de pagar as prestações, o credor tem as seguintes


opções:
 AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO – ação autônoma prevista no DL
911/69 (não é a ação de busca e apreensão do CPC). 2
 EXECUÇÃO DO CONTRATO (título executivo extrajudicial).

O STJ não admite o ajuizamento concomitante da ação de busca e apreensão e


da ação de execução, mas somente a conversão da busca e apreensão em ação executiva.
Esta, inclusive, é uma das mudanças promovidas pela lei 13.043/14. O art. 4º, do DEL 911/69
passou a ter a seguinte redação: “Se o bem alienado fiduciariamente não for encontrado ou
não se achar na posse do devedor, fica facultado ao credor requerer, nos mesmos autos, a
conversão do pedido de busca e apreensão em ação executiva, na forma prevista no Capítulo
II do Livro II da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil.” Já o art. 5º
passou a dispor que “Se o credor preferir recorrer à ação executiva, direta ou a convertida na
forma do art. 4o, ou, se for o caso ao executivo fiscal, serão penhorados, a critério do autor da
ação, bens do devedor quantos bastem para assegurar a execução.”

Restrições sobre veículos:


Se o bem objeto da alienação fiduciária for um veículo, caso seja concedida a
liminar na busca e apreensão, uma medida de grande eficácia para conseguir localizar e
recuperar o bem é inserir uma restrição judicial no “registro” do veículo.

2
Lembrar que a Ação de Busca e Apreensão do DL 911/69 tem aplicação somente nas
hipóteses previstas no art. 8-A do Decreto (no âmbito do mercado financeiro e de capitais ou
em garantia de créditos fiscais ou previdenciários). Fora desses casos, a alienação fiduciária
de bens móveis é regida pelo CC.
Pensando nisso, a Lei n.° 13.043/2014 acrescentou o § 9º ao art. 3º do DL 911/69
estipulando que o juiz, ao decretar a busca e apreensão de veículo, deverá inserir uma
restrição judicial na base de dados do Renavam.
Renavam significa Registro Nacional de Veículos Automotores e consiste em um
banco de dados que funciona como um registro de todos os veículos existentes no Brasil. Cada
veículo recebe um número identificador que é chamado de “código renavam” e lá são
registradas todas as informações sobre a “vida” do automóvel, desde o momento da sua
fabricação ou importação, passando pelo emplacamento, mudanças de proprietário, alterações
em sua cor e características, até o instante em que o veículo sai de circulação.
O Poder Judiciário mantém convênio com o DENATRAN por meio do qual os
magistrados possuem acesso ao sistema informatizado do Renavam. Assim, o juiz pode digitar
seu login e sua senha, entrar na página interna do Renavam e inserir restrições judiciais
incidentes sobre os veículos objeto do processo. Assim, quando o carro for parado em uma
blitz ou for realizar uma inspeção de rotina no DETRAN, aparecerá aquela informação no
sistema e o veículo será apreendido e entregue à Justiça.
Dessa forma, quando o juiz decreta a busca e apreensão, ele próprio, com sua
senha, deverá inserir diretamente a restrição judicial no RENAVAM. Caso ele não tenha acesso
à base de dados, deverá expedir um ofício ao DETRAN para que:
I - registre o gravame referente à decretação da busca e apreensão do veículo; e II
- retire o gravame após a apreensão do veículo. (§§ 9º e 10 do art. 3º do DL 911/69,
acrescentados pela Lei n.° 13.043/2014).

No mais:
Caso o bem seja localizado em comarca diferente da qual onde está tramitando a
ação (ex: o processo tramita em Belo Horizonte e o carro foi encontrado em Lavras), a parte
interessada poderá requerer diretamente ao juízo dessa comarca pedindo a apreensão do
veículo, bastando que em tal requerimento conste a cópia da petição inicial da ação e, quando
for o caso, a cópia do despacho que concedeu a busca e apreensão do veículo (§ 12 do art. 3º
do DL 911/69, acrescentado pela Lei n.° 13.043/2014).
A apreensão do veículo será imediatamente comunicada ao juízo, que intimará a
instituição financeira para retirá-lo do local depositado no prazo máximo de 48 horas (§ 13 do
art. 3º do DL 911/69, acrescentado pela Lei n.°13.043/2014).
O devedor, por ocasião do cumprimento do mandado de busca e apreensão,
deverá entregar o bem e seus respectivos documentos (§ 14 do art. 3º do DL 911/69,
acrescentado pela Lei n.° 13.043/2014).
AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO

Quando o credor faz a busca e apreensão do bem, poderá fazer a venda do bem.
Para a venda judicial, não é preciso leilão ou avaliação prévia, nos termos do art. 2º do DL
911/69. Nada impede que a venda seja feita de outras formas, como, por exemplo, venda em
consignação.

O dinheiro da venda será aplicado para satisfação do crédito e, se houver saldo


remanescente, será entregue ao devedor, “com a devida prestação de contas”. A lei
13/043/14 inseriu a necessidade de prestação de contas pelo credor fiduciário ao devedor
fiduciante após a alienação do bem.

Art. 2º No caso de inadimplemento ou mora nas obrigações


contratuais garantidas mediante alienação fiduciária, o proprietário fiduciário ou
credor poderá vender a coisa a terceiros, independentemente de leilão, hasta
pública, avaliação prévia ou qualquer outra medida judicial ou extrajudicial, salvo
disposição expressa em contrário prevista no contrato, devendo aplicar o preço da
venda no pagamento de seu crédito e das despesas decorrentes e entregar ao
devedor o saldo apurado, se houver, com a devida prestação de contas.

Após as providências tomadas pelo credor, se houver saldo remanescente oriundo


de venda extrajudicial de bem alienado fiduciariamente em garantia, este poderá se valer da
ação monitória.

Súmula 384 do STJ - Cabe ação monitória para haver saldo remanescente
oriundo de venda extrajudicial de bem alienado fiduciariamente em garantia.

Na ação de busca e apreensão, se o credor comprovar que o devedor está


constituído em mora, o juiz concederá liminar de busca e apreensão (art. 3º, caput, DL 911/69),
o que poderá ser feito no plantão judiciário (inclusão da lei 13/043/14, sendo que a leitura é que
o juiz não pode, mas deve concedê-la no plantão, se for o caso).

No contrato de alienação fiduciária, a mora decorre do simples vencimento do


prazo para pagamento, mas a lei exige que o credor (mutuante) demonstre a ocorrência desse
atraso notificando o devedor.
Assim, o credor deverá fazer a notificação extrajudicial do devedor de que este se
encontra em débito, comprovando, assim, a mora. Essa notificação é indispensável para que o
credor possa ajuizar ação de busca e apreensão 3. Antes, a comprovação da constituição em
mora se dava por meio de protesto ou notificação por meio do Registro de Títulos e
Documentos (art. 2º, § 2º, DL 911/69). E como é feita a notificação do devedor atualmente?
Essa notificação precisa ser realizada por intermédio do Cartório de Títulos e
Documentos? NÃO. Essa notificação é feita por meio de carta registrada com aviso de
recebimento. Logo, não precisa ser realizada por intermédio do Cartório de RTD. Essa foi mais
uma das mudanças operadas pela Lei n.° 13.043/2014 no § 2º do art. 2º do DL 911/69.

Saliente-se que a mora é ex re, independentemente de notificação, valendo a


máxima “o dia do vencimento interpela a pessoa”, com fulcro no art. 2, § 3°, do CPC. No
entanto, segundo a jurisprudência, faz-se necessário comprovar a mora para fins de fins de
concessão da liminar de busca e apreensão (Súmula 72 STJ).

Ou seja, o credor pode demonstrar a mora do devedor por meio de carta


registrada com aviso de recebimento. Não mais se exige que a carta registrada seja expedida
pelo Cartório de Títulos e Documentos. É dispensável que haja o protesto do título.

A Lei n.° 13.043/2014 alterou o § 2º do art. 2º do DL 911/69, deixando expresso


que não se exige que a assinatura constante do aviso de recebimento seja a do próprio
destinatário. Todavia, isso já era entendimento adotado pelo STJ:
“Esta Corte consolidou entendimento no sentido de que, para a constituição em
mora por meio de notificação extrajudicial, é suficiente que seja entregue no endereço do
devedor, ainda que não pessoalmente.” (STJ. 4ª Turma. AgRg no AREsp 419.667/MS, Rel.
Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 06/05/2014.)

Nos termos da Súmula 245 STJ: A notificação destinada a comprovar a mora nas
dívidas garantidas por alienação fiduciária dispensa a indicação do valor do débito.

3
Súmula 72 do STJ: A comprovação da mora é imprescindível à busca e apreensão do bem
alienado fiduciariamente.
A indicação do valor do débito é necessária na petição inicial.

Art. 3º O proprietário fiduciário ou credor poderá, desde que


comprovada a mora, na forma estabelecida pelo § 2o do art. 2o, ou o
inadimplemento, requerer contra o devedor ou terceiro a busca e apreensão do
bem alienado fiduciariamente, a qual será concedida liminarmente, podendo ser
apreciada em plantão judiciário.

A Lei 10.931/2004 traz situação favorável ao credor, nos termos do art. 3º, § 1º, do
DL 911/69: 05 dias após a execução da liminar, o credor passa a ter a propriedade e a posse
plena do bem. O bem passa a integrar a propriedade do credor.

§ 1o Cinco dias após executada a liminar mencionada no caput,


consolidar-se-ão a propriedade e a posse plena e exclusiva do bem no patrimônio
do credor fiduciário, cabendo às repartições competentes, quando for o caso,
expedir novo certificado de registro de propriedade em nome do credor, ou de
terceiro por ele indicado, livre do ônus da propriedade fiduciária.

O prazo de defesa (contestação) é de 15 dias contados da execução da liminar.


Antes da Lei 10.931/2004, havia limitação para a contestação. Por exemplo, não era possível
discutir cláusulas contratuais. A Lei 10.931/2004 revogou as limitações das matérias para
contestar. Assim, agora é possível discutir a validade ou a revisão de cláusulas contratuais,
mesmo se o devedor fiduciante pagar nos 5 dias após o cumprimento da liminar. Nesse
sentido, é o entendimento do STJ sobre a matéria:

É possível a discussão sobre a legalidade de cláusulas contratuais como matéria


de defesa na ação de busca e apreensão decorrente de alienação fiduciária.
Consolidou-se o entendimento no STJ de que é admitida ampla defesa do
devedor no âmbito da ação de busca e apreensão decorrente de alienação
fiduciária, sendo possível discutir em contestação eventual abusividade
contratual, uma vez que essa matéria tem relação direta com a mora, pois
justificaria ou não a busca e apreensão do bem. (REsp 1.296.788, J. 13.11.2012, 4
Turma, Info 509, STJ)

Reitere-se: o devedor fiduciante poderá apresentar contestação ainda que tenha


pagado a dívida apresentada pelo credor na petição inicial, desde que entenda ter havido
pagamento a maior e deseje a devida restituição, aplica-se a regra solve et repete.

Art. 3º, § 3o O devedor fiduciante apresentará resposta no prazo de


quinze dias da execução da liminar. (Redação dada pela Lei 10.931, de 2004)

Purgação da mora: pela sistemática inicialmente aplicável à ação de busca e


apreensão (art. 3º do Decreto-lei n. 911/1969), a concessão de medida liminar ao credor
fiduciário era seguida da citação do devedor fiduciante para contestar, facultando-se a este
último promover a purgação da mora, pagando as parcelas em atraso com a pertinente
atualização monetária e outros acréscimos legais (juros, cláusula penal moratória etc). Tal
faculdade, entretanto, não era assegurada em caráter irrestrito, somente sendo “permitida
quando já pagos pelo menos 40% (quarenta e por cento) do valor financiado” (Súmula 284 do
STJ, de 2004). Sobrevindo a sentença, e inexistindo reversão na via recursal, a propriedade e
a posse plena se consolidavam na esfera patrimonial do requerente da ação de busca e
apreensão.
Ocorre que, após o advento da Lei n. 10.931, em agosto de 2004, a mora debendi
passou a ter consequência mais rigorosa. À luz do panorama instituído pelo aludido diploma
normativo, não basta ao devedor fiduciante somente pagar as parcelas vencidas com os
respectivos acréscimos decorrentes da impontualidade para assegurar a continuidade do
contrato objeto da garantia de alienação fiduciária. Para além disso, se ele quiser mesmo evitar
a consolidação da propriedade e da posse plena do bem na esfera patrimonial de quem
requereu a liminar de busca e apreensão, terá de efetuar o pagamento integral, nos cinco dias
subsequentes à execução dessa mesma liminar, da “integralidade da dívida pendente,
segundo os valores apresentados pelo credor fiduciário na inicial, hipótese na qual o bem lhe
será restituído livre do ônus” (redação atual dada ao §2º do art. 3º do Decreto-lei n. 911/1969
pela Lei n. 10.931/2004). Não o fazendo, ainda assim poderá contestar, mas sujeito ao risco de
não reaver o bem se este já tiver sido alienado quando da prolação de sentença que
eventualmente concluir pela improcedência do pedido de busca e apreensão. Isso ocorrendo,
restará ao credor sucumbente suportar multa “equivalente a cinquenta por cento do valor
originalmente financiado, devidamente atualizado” e responder “por perdas e danos” (§§ 6º e 7º
do Decreto-lei n. 911/1969).
Desta forma, não se aplica mais a Súmula 284 do STJ (aos contratos celebrados
após a edição da lei 10.931/04): “A purga da mora, nos contratos de alienação fiduciária, só é
permitida quando já pagos pelo menos 40% (quarenta por cento) do valor financiado.” Com
isso, desde 2004 é necessário o pagamento dos débitos vencidos e vincendos.

Exemplo (tirado do site Dizer o Direito): Antônio financiou o veículo em 60


parcelas. A partir da 20ª prestação ele começou a não mais pagar. Estão vencidas 5
parcelas.
Para ter de volta o bem ele terá que pagar somente as 5 parcelas vencidas
(purgação mora) ou todo o financiamento restante (40 parcelas)?
Todo o débito.
Segundo decidiu o STJ, a Lei n.° 10.931/2004, que alterou o DL 911/69, não mais
faculta ao devedor a possibilidade de purgação de mora, ou seja, não mais permite que ele
pague somente as prestações vencidas.
Para que o devedor fiduciante consiga ter o bem de volta, ele terá que pagar a
integralidade da dívida, ou seja, tanto as parcelas vencidas quanto as vincendas (mais os
encargos), no prazo de 5 dias após a execução da liminar.
Em nosso exemplo, Antônio terá que pagar, em 5 dias, as 40 parcelas restantes.

O devedor purga a mora quando ele oferece ao devedor as prestações que estão
vencidas e mais o valor dos prejuízos que este sofreu (art. 401, I, do CC). Nesse caso,
purgando a mora, o devedor consegue evitar as consequências do inadimplemento. Ocorre
que na alienação fiduciária em garantia, a Lei n.° 10.931/2004 passou a não mais permitir a
purgação da mora.

Vale ressaltar que o tema acima foi decidido em sede de recurso repetitivo,
tendo o STJ firmado a seguinte conclusão, que será aplicada em todos os processos
semelhantes:
“Nos contratos firmados na vigência da Lei n.° 10.931/2004, que alterou
o art. 3º, §§ 1º e 2º, do Decreto-lei 911/1969, compete ao devedor, no
prazo de cinco dias após a execução da liminar na ação de busca e
apreensão, pagar a integralidade da dívida – entendida esta como os
valores apresentados e comprovados pelo credor na inicial –, sob pena
de consolidação da propriedade do bem móvel objeto de alienação
fiduciária.” STJ. 2ª Seção. REsp 1.418.593-MS, Rel. Min. Luis Felipe
Salomão, julgado em 14/5/2014 (recurso repetitivo).
Ao mesmo tempo em que a lei favorece ao credor, permitindo que faça uma venda
mais célere (05 dias após a execução da liminar), se a ação for julgada improcedente ao final,
o credor deverá devolver o dinheiro ao devedor e mais uma multa equivalente a 50% do valor
originalmente financiado.

Art. 3º, § 6o Na sentença que decretar a improcedência da ação de


busca e apreensão, o juiz condenará o credor fiduciário ao pagamento de multa,
em favor do devedor fiduciante, equivalente a cinqüenta por cento do valor
originalmente financiado, devidamente atualizado, caso o bem já tenha sido
alienado. (Redação dada pela Lei 10.931, de 2004)

Quando se tratar de BEM ESSENCIAL PARA ATIVIDADE EMPRESARIAL, o STJ


(RESP 318.182) entende que o bem pode permanecer na posse do devedor, enquanto tramita
a ação de busca e apreensão. Aplica-se o princípio da preservação da empresa.

Prisão civil do depositário. Com fulcro no art. 4° do DL, se o bem não for
encontrado ou não se achar na posse do devedor, o credor poderá requerer a conversão do
pedido de busca e apreensão em ação de depósito, na forma do CPC.

A conversão da ação de busca e apreensão em depósito, prevista no DL 911/69,


tem como finalidade aumentar a garantia do credor. Entretanto, no RE 466.343, o STF decidiu
pela inconstitucionalidade da prisão civil do devedor na alienação fiduciária em razão do art. 7º
do Pacto de São José da Costa Rica, que ingressou no ordenamento jurídico brasileiro com
status supra legal. Assim, remanesce no direito brasileiro apenas uma hipótese de prisão civil
no caso de alimentos.

A partir desta orientação, o STF entende que o Pacto de São José da Costa Rica,
recepcionado com status supralegal, cessa a possibilidade da conversão da ação de busca e
apreensão em ação de depósito. Eis o entendimento sumulado do Supremo:

Súmula Vinculante n. 25, STF: É Ilícita a prisão civil de depositário infiel,


qualquer que seja a modalidade do depósito.

No mesmo sentido, é o entendimento sumulado do STJ:

Súmula 419, STJ: Descabe a prisão civil do depositário judicial infiel.

Alienação fiduciária de bem imóvel

Legislação Aplicável: Bens imóveis – Lei 9.514/97 e CC subsidiariamente (art. 1368-A, CC).

É o negócio jurídico pelo qual o devedor, com o escopo de garantia, contrata a


transferência ao credor, da propriedade resolúvel da coisa imóvel.

A norma é clara ao prever que a propriedade do credor fiduciário é resolúvel, pois


pago o preço, geralmente um financiamento, o devedor fiduciante consolida a propriedade em
seu nome.

Nos termos da lei, pode ser realizada por pessoa física ou jurídica, não sendo
privativa das entidades que operam no Sistema Financeiro Imobiliário.
Além da propriedade plena, podem ser objeto de alienação fiduciária em garantia:

 Bens enfitêuticos, hipótese em que será exigível o pagamento do


laudêmio, se houver a consolidação do domínio útil no fiduciário;
 Direito de uso especial para fins de moradia;
 Direito real de uso, desde que suscetível de alienação;
 Propriedade superficiária.

Nos casos de direito real de uso e propriedade superficiária, o direito de garantia


fica limitado à duração da concessão ou do direito de superfície, caso tenham sido transferidos
por prazo determinado.

A propriedade fiduciária de coisa imóvel se constitui mediante registro no


competente registro de imóveis (art. 23 da Lei). Há desmembramento da posse, o devedor
fiduciante é possuidor direto e o credor fiduciário é possuidor indireto.

O contrato deverá conter os seguintes requisitos (art. 24 da Lei):


 Valor principal da dívida
 Prazo e as condições de reposição do empréstimo ou do crédito
fiduciário
 Taxa de juros e encargos incidentes
 Cláusula de constituição da propriedade fiduciária com a descrição do
imóvel objeto da alienação fiduciária.
 Cláusula assegurando ao fiduciante, enquanto adimplente, a livre
utilização por sua conta e risco, do imóvel objeto da alienação fiduciária.
 Indicação para efeito de venda em leilão público, do valor do imóvel e
dos critérios para a respectiva revisão.
 Cláusula dispondo sobre os procedimentos do leilão judicial previsto no
art. 27.

Ocorrendo o pagamento da dívida pelo devedor fiduciante, no prazo de 30 dias, o


fiduciário fornecerá o respectivo termo de quitação, sob pena de multa. Referido termo de
quitação deverá ser apresentado ao oficial de registro de imóveis que efetuará o cancelamento
do registro da propriedade fiduciária.

Vencida, não paga a dívida e constituído em mora o devedor, consolida-se a


propriedade nas mãos do credor fiduciário. O procedimento é o seguinte:

 Intimação pessoal do devedor a pedido do credor pelo oficial do


Registro de Imóveis para satisfação no prazo de 15 dias da prestação vencida, das que
se vencerem até o pagamento e demais encargos.
 Se o devedor encontrar-se em local incerto e não sabido, será
promovida nova intimação por edital, publicado por 03 dias, pelo menos, em um dos
jornais de maior circulação na comarca. A lei 13.043/14 promoveu singela alteração
aqui, apenas para enfatizar que o prazo de purgação da mora se conta da publicação
do último edital.
 Sendo purgada a mora, o oficial de registro entregará os valores ao
credor fiduciário.
 Não purgada a mora, o oficial de registro averbará da consolidação da
propriedade em nome do credor fiduciário, à vista da comprovação do pagamento do
imposto de transmissão inter vivos.
Pode o devedor entregar o imóvel em pagamento da dívida com dispensa do
procedimento mencionado.

Consolidada a propriedade em nome do credor fiduciário, no prazo de 30 dias da


averbação, deverá ser promovido leilão público para alienação do imóvel. Se no primeiro leilão
o maior lance for inferior ao valor do imóvel, nos 15 dias subseqüentes será promovido 2º
leilão, sendo aceito o maior lance oferecido, desde que igual ou superior o valor da dívida (=
saldo devedor da operação).

Após o leilão, no prazo de 05 dias, o credor deverá devolver eventual saldo ao


devedor. Se no 2º leilão o maior lance oferecido não for igual ou superior que o valor da dívida
e dos encargos contratuais, considera-se extinta a dívida, estando o credor fiduciário
dispensado do encargo de devolver as quantias, por razões óbvias.

Se o imóvel estiver locado, a locação será denunciada com prazo de 30 dias para
desocupação.

O devedor responde pelos impostos, taxas e contribuições condominiais até a


data em que o credor vier a ser imitido na posse.

Constitucionalidade do leilão extrajudicial


Aqueles que defendem a inconstitucionalidade do leilão extrajudicial sustentam o
ferimento da ampla defesa e do contraditório, pois independe de ação judicial. Ademais, a
venda em 2º leilão pelo valor da dívida possibilita que o devedor perca a moradia e tudo o que
já foi pago e ainda propicia que o terceiro adquirente enriqueça-se indevidamente ao pagar
valor inferior ao de mercado.

Em sentido contrário, posição majoritária da doutrina e jurisprudência


entendem que o leilão extrajudicial está de acordo com a função social da propriedade,
porque a facilidade do credor em receber seu crédito implica no incremento da construção civil
e do acesso à moradia.

Além disso, nada impede que o devedor que se sinta prejudicado busque o
Judiciário para revisão de eventuais cláusulas abusivas ou para impedir a venda do imóvel em
valor muito inferior ao de mercado.

CESSÃO DE CRÉDITO: a cessão implica na transferência ao cessionário de todos


os direitos e obrigações inerentes à propriedade fiduciária em garantia. Além disso, o devedor
fiduciante também poderá, com anuência expressa do credor fiduciário, transmitir os direitos de
que seja titular sobre o imóvel objeto da alienação fiduciária em garantia, assumindo o
adquirente as respectivas obrigações. Há, portanto, nos dois casos, a cessão da posição
contratual ou cessão de contrato.

O fiador ou terceiro interessado que pagar a dívida ficará SUB-ROGADO de pleno


direito no crédito e na propriedade fiduciária.

Alienação Fiduciária no âmbito do Mercado de Valores Mobiliários

Legislação Aplicável: Bens móveis – Art. 66-B, da Lei 4.728/65 e Decreto- lei 911/69 (no
âmbito do mercado financeiro e de capitais ou em garantia de créditos fiscais ou
previdenciários), CC subsidiariamente (art. 1368-A, CC).
A alienação fiduciária de bens móveis está regulada pelo art. 66-B da Lei
4.728/65, quando celebrado no âmbito do mercado financeiro e de capitais ou feito em garantia
de créditos fiscais e previdenciários. Nesses casos, ademais, aplicam-se as regras processuais
do DL n. 911/69, por força do que dispõe o art. 8 –B, desse diploma legal: “o procedimento
judicial disposto neste decreto-lei aplica-se exclusivamente às hipóteses da seção XIV da lei
4.728/65, ou quando o ônus da propriedade fiduciária tiver sido construído para fins de garantia
do débito fiscal ou previdenciário”. Destarte, remete-se o leitor para os comentários ao
procedimento da Ação de Busca e Apreensão do DL 911/69 supra, do item alienação fiduciária
de bem móvel.

Aqui se admite, portanto, a alienação fiduciária de bens móveis fungíveis (títulos


de crédito, valores mobiliários, etc.), ao contrário do código civil, que admite apenas de bens
móveis infungíveis.

Neste caso, a posse direta e indireta do bem objeto do título pode ser atribuída ao
credor, que, em caso de inadimplemento ou mora, deverá vender a terceiro o bem objeto da
propriedade fiduciária independentemente de leilão, hasta pública ou qualquer outra medida
judicial ou extrajudicial, devendo aplicar o preço da venda no pagamento do seu crédito e das
despesas decorrentes da realização da garantia, cabendo ao devedor eventual saldo.
Art. 66-B. O contrato de alienação fiduciária celebrado no âmbito do mercado
financeiro e de capitais, bem como em garantia de créditos fiscais e previdenciários, deverá
conter, além dos requisitos definidos na Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil,
a taxa de juros, a cláusula penal, o índice de atualização monetária, se houver, e as demais
comissões e encargos. (Incluído pela Lei 10.931, de 2004)
§ 1o Se a coisa objeto de propriedade fiduciária não se identifica por números,
marcas e sinais no contrato de alienação fiduciária, cabe ao proprietário fiduciário o ônus da
prova, contra terceiros, da identificação dos bens do seu domínio que se encontram em poder
do devedor. (Incluído pela Lei 10.931, de 2004)
§ 2o O devedor que alienar, ou der em garantia a terceiros, coisa que já alienara
fiduciariamente em garantia, ficará sujeito à pena prevista no art. 171, § 2o, I, do Código Penal.
(Incluído pela Lei 10.931, de 2004)
§ 3o É admitida a alienação fiduciária de coisa fungível e a cessão fiduciária de
direitos sobre coisas móveis, bem como de títulos de crédito, hipóteses em que, salvo
disposição em contrário, a posse direta e indireta do bem objeto da propriedade fiduciária ou do
título representativo do direito ou do crédito é atribuída ao credor, que, em caso de
inadimplemento ou mora da obrigação garantida, poderá vender a terceiros o bem objeto da
propriedade fiduciária independente de leilão, hasta pública ou qualquer outra medida judicial
ou extrajudicial, devendo aplicar o preço da venda no pagamento do seu crédito e das
despesas decorrentes da realização da garantia, entregando ao devedor o saldo, se houver,
acompanhado do demonstrativo da operação realizada. (Incluído pela Lei 10.931, de 2004)
§ 4o No tocante à cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis ou sobre
títulos de crédito aplica-se, também, o disposto nos arts. 18 a 20 da Lei no 9.514, de 20 de
novembro de 1997.(Incluído pela Lei 10.931, de 2004)
§ 5o Aplicam-se à alienação fiduciária e à cessão fiduciária de que trata esta Lei
os arts. 1.421, 1.425, 1.426, 1.435 e 1.436 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002.(Incluído
pela Lei 10.931, de 2004)
§ 6o Não se aplica à alienação fiduciária e à cessão fiduciária de que trata esta Lei
o disposto no art. 644 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002. (Incluído pela Lei 10.931, de
2004)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
APLICAÇÃO DAS REGRAS DO DL 911/69 AO LEASING: o arrendamento
mercantil (também chamado de leasing) é uma espécie de contrato de locação, no qual o
locatário tem a possibilidade de, ao final do prazo do ajuste, comprar o bem pagando uma
quantia chamada de valor residual garantido (VRG).
A Lei n.° 6.099/74 dispõe sobre o tratamento tributário das operações de
arrendamento mercantil, mas não trata, de forma detalhada, a respeito das regras e
procedimentos aplicáveis nos casos de leasing.
Pensando nisso, a Lei n.° 13.043/2014 determinou que o procedimento adotado
pelo DL 911/69 para o caso de inadimplemento do devedor na alienação fiduciária,
inclusive o regramento sobre a ação de busca e apreensão deveria ser também aplicado para
o arrendamento mercantil.
Importante: Assim, a partir de agora, os procedimentos previstos no art.
2º, caput e § 2º e no art. 3º do DL 911/69 (regras relacionadas com a alienação fiduciária)
deverão ser aplicadas às operações de arrendamento mercantil (leasing).
Se o devedor do contrato de alienação fiduciária estiver em processo de recuperação
judicial ou extrajudicial, mesmo assim será possível a busca e apreensão do bem?
SIM. Mesmo já existindo pedido de recuperação judicial ou extrajudicial envolvendo o devedor
do contrato de alienação fiduciária, tal fato não impedirá a distribuição e a busca e apreensão
do bem (art. 6º-A do DL 911/69, inserido pela Lei n. 13.043/2014).

Se, além da instituição financeira mutuante, o devedor do contrato de alienação


fiduciária possuir débitos com outros credores, estes poderão pedir o bloqueio judicial
do bem objeto da alienação fiduciária?
NÃO. Não será aceito bloqueio judicial de bens constituídos por alienação fiduciária de que
trata o DL 911/69. Se os outros credores quiserem alegar que possuem créditos preferenciais
em relação à instituição financeira mutuante, tal discussão sobre concursos de preferências
deverá ser resolvida pelo valor da venda do bem após ele ser apreendido (art. 7º-A do DL
911/69, inserido pela Lei n. 13.043/2014).

O Código Civil traz regras sobre a alienação fiduciária de bens MÓVEIS infungíveis quando o
credor fiduciário for pessoa natural ou jurídica (sem ser banco).

A Lei n.° 13.043/2014 promoveu duas mudanças nessas regras do CC-2002. Vejamos:

ANTES DEPOIS

Art. 1.367. Aplica-se à propriedade fiduciária, Art. 1.367. A propriedade fiduciária em


no que couber, o disposto nos arts. 1.421, garantia de bens móveis ou imóveis sujeita-se
1.425, 1.426, 1.427 e 1.436. às disposições do Capítulo I do Título X do
Livro III da Parte Especial deste Código e, no
que for específico, à legislação especial
pertinente, não se equiparando, para
quaisquer efeitos, à propriedade plena de que
trata o art. 1.231.

O legislador teve três objetivos ao modificar a redação desse dispositivo:


a) Deixar claro que existem várias espécies de alienação fiduciária e que cada uma delas
possui um regramento próprio, aplicando-se as normas do Código Civil apenas para os casos
em que a alienação fiduciária não for tratada em lei específica;
b) Ressaltar que as regras da propriedade fiduciária são diferentes e especiais em relação à
propriedade plena (art. 1.231 do CC);
c) Determinar que sejam aplicadas à espécie de propriedade fiduciária regida pelo Código Civil
as normas dos arts. 1.419 a 1.430 do CC.
Alienação fiduciária confere direito real de aquisição
A alienação fiduciária em garantia de bem móvel ou imóvel confere direito real de aquisição ao
fiduciante, seu cessionário ou sucessor (art. 1.368-B do CC, inserido pela Lei
n. 13.043/2014).

Responsabilidades do credor fiduciário pelo bem em caso de consolidação da


propriedade
O credor fiduciário que se tornar proprietário pleno do bem, por efeito de realização da
garantia, mediante consolidação da propriedade, adjudicação, dação ou outra forma pela qual
lhe tenha sido transmitida a propriedade plena, passa a responder pelo pagamento dos tributos
sobre a propriedade e a posse, taxas, despesas condominiais e quaisquer outros encargos,
tributários ou não, incidentes sobre o bem objeto da garantia, a partir da data em que vier a ser
imitido na posse direta do bem (parágrafo único do art. 1.368-B do CC, inserido pela Lei
n. 13.043/2014).

Teoria geral dos títulos de crédito. Títulos de crédito no Código Civil. Constituição do crédito.
Exigibilidade. Títulos de crédito em espécie. Letra de Câmbio. Nota promissória. Cheque.
Duplicata. Títulos de créditos vinculados ao crédito rural. Títulos de créditos vinculados ao
financiamento imobiliário. Conhecimento de depósito. Warrant. Conhecimento de transporte.
Títulos do agronegócio. Ações cambiárias.

CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO CAMBIÁRIO

A disciplina da constituição do crédito tributário é objeto da Convenção de Genebra, que prevê


sua uniformização nos direitos dos países signatários, entre os quais o Brasil.

A constituição do crédito cambiário dá-se com o saque do título, o qual dá ensejo a diferentes
situações jurídicas para os envolvidos, ou seja, o sacador, que emite o título, constituindo o
crédito cambiário; o beneficiário do crédito cambiário – credor; e o aceitante, se houver.

O saque é, portanto, o ato da criação do título de crédito e de constituição do crédito cambiário.

ESPÉCIES DE TÍTULOS DE CRÉDITO

São espécies de títulos de crédito:

a) Letra de câmbio – analisada anteriormente.

b) Nota promissória – analisada anteriormente.

c) Cheque – analisado anteriormente.


d) Duplicata mercantil – É um título de crédito que emerge de uma compra e venda mercantil
(ou prestação de serviço) a prazo, a qual originou uma fatura. Foi criado no direito brasileiro
(Lei 5474/68). É um titulo vinculado ou causal, porque é vinculado a um contrato de compra e
venda ou de prestação de serviços, realizados por empresários. Esse contrato é provado por
meio da fatura; essa fatura, em regra, é de emissão facultativa. Se for uma compra e venda
com prazo de pagamento superior a 30 dias, a emissão da fatura é obrigatória. A legislação
tributária admite que a nota fiscal substitua a fatura. Provado o contrato de compra e venda
pela fatura, o empresário, com base nela, pode emitir uma duplicata. É uma ordem de
pagamento que representa o crédito do empresário. A emissão da duplicata é facultativa. Na
duplicata figuram o sacador (vendedor), o sacado (comprador) e o beneficiário, sendo que o
sacador e o beneficiário são normalmente a mesma pessoa.

e) Conhecimento de depósito e warrant - São regidos pelo Decreto 1102/1903. Os armazéns


gerais são entidades destinadas à guarda e conservação de mercadorias. Quando se deposita,
pode-se pedir ao armazém que emita dois títulos: conhecimento de depósito e o warrant. Eles
nascem juntos. O conhecimento de depósito representa a propriedade das mercadorias
depositadas. O warrant constitui um penhor sobre as mercadorias depositadas. Podem circular
juntos ou separados. Se endossar separadamente os títulos, primeiro endossa o warrant (é
uma ordem obrigatória). O primeiro endosso do warrant é uma promessa de pagamento,
garantida pelo penhor das mercadorias. Deve-se anotar no conhecimento de depósito o valor e
o vencimento da dívida porque quando for vender as mercadorias, o terceiro que compra tem
como saber que as mercadorias estão empenhadas para o pagamento da dívida. Quem tem os
dois títulos juntos, tem propriedade plena da mercadoria. Quem tem o conhecimento de
depósito, tem propriedade das mercadorias, mas uma propriedade gravada com o ônus do
penhor; por causa disso ele só pode levantar as mercadorias mediante o depósito do valor do
warrant. Quem tem o warrant, tem um direito de crédito garantido pelo penhor das
mercadorias. Se ele não recebe o valor do warrant, ele pode protestar o título em um dia útil e
com esse protesto ele tem dez dias para vender as mercadorias extrajudicialmente. Se não
protestou ou se protestou e não conseguiu vender no prazo, o art. 23, § 7°, do Decreto,
estabelece que o portador do warrant só vai poder cobrar o primeiro endossante do warrant ou
pode promover a excussão do penhor (vender as mercadorias judicialmente). Se conseguir
vender as mercadorias e mesmo assim não for suficiente para se pagar a divida, ele ainda
pode cobrar dos endossantes do warrant (art. 25). Esses títulos não valem para produtos
agropecuários desde janeiro/2006, porque se criaram novos títulos para esses produtos pela
Lei 11076/2004 – Certificado de Depósito Agropecuário e o Warrant Agropecuário. Esses
títulos são passíveis de negociação no mercado, por meio eletrônico.

f) Cédulas de crédito – São promessas de pagamento com ou sem garantia cedularmente


constituída, vinculada a um financiamento. O emitente é necessariamente um produtor (rural,
industrial, comercial ou exportador), alguém que exerce uma atividade econômica, e o
beneficiário é uma instituição financeira. Nos financiamentos com garantia real (pignoratícia ou
hipotecária), a cédula é instrumento suficiente para registro da oneração do bem; nos
financiamentos sem garantia, o título bancário denomina-se nota de crédito; as cédulas e notas
de crédito devem ser levadas a registro no Cartório de Imóveis, para produzir efeitos contra
terceiros; são títulos executivos extrajudiciais. É possível a cobrança de correção monetária,
juros moratórios no montante de 1% ao ano e juros remuneratórios. “A legislação sobre
cédulas de crédito rural, comercial e industrial admite a capitalização de juros” Inclusive a
capitalização por período de tempo inferior a 1 ano (Súmula 93 do STJ). A multa também pode
ser cobrada. O STJ diz que vale o limite do CDC de 2%. Súmula 297/STJ. Ver AgResp 527230.
A comissão de permanência não é cobrada nas cédulas (Resp 500000). São cédulas de
crédito tradicionais:
- Cédula de crédito rural – Decreto-lei 167/67
- Cédula de crédito industrial – Decreto- lei 413/69
- Cédula de crédito comercial – Lei 6840/80
- Cédula de crédito à exportação – Lei 6313/75

g) Cédula de crédito bancário (Lei 10.931/04) – São promessas de pagamento em dinheiro,


emitidas em favor de instituição financeira, representativa de operação bancária ativa. São
títulos executivos extrajudiciais. Os juros remuneratórios podem ser livremente pactuados e
capitalizados, não incidindo limite legal. O próprio instrumento cedular basta para a constituição
e registro de garantias reais, inclusive sobre bens imóveis. O protesto independe do
encaminhamento do original da cédula ao cartório, desde que o banco declare que a única via
negociável encontra-se em seu poder.

CLASSIFICAÇÃO DOS TÍTULOS DE CRÉDITO

CLASSIFICAÇÃO DE REQUIÃO
a) títulos cambiários: são os títulos perfeitos, abstratos. Nota Promissória e Letra de Câmbio.
b) títulos cambiariformes: são títulos que não apresentam todas as características dos títulos
de crédito. São títulos imperfeitos. Exemplo: cheque - não possui o elemento crédito, porque é
ordem de pagamento à vista; duplicata – é um título causal.

CLASSIFICAÇÃO DE FRAN MARTINS


a) títulos próprios: incorporam operação de crédito e têm como elementos o tempo e a
confiança. Exemplo: nota promissória, letra de câmbio, duplicata.
b) títulos impróprios: não incorporam operação de crédito. Exemplo: cheque.
c) títulos de legitimação: entrada de cinema, bilhete de passagem área. Esta classificação é
criticada pelos outros doutrinadores, uma vez que referidos títulos não são títulos de crédito
porque não dão direito ao crédito, mas sim a prestação de serviço.
d) títulos de participação: as ações de uma sociedade anônina. Esta classificação também é
criticada, pois, para a doutrina majoritária, as ações não são títulos de crédito, já que
carecem de cartularidade.

A doutrina apresenta ainda quatro critérios para classificação dos títulos. São eles:

1. Quanto ao Modelo – diz respeito aos aspectos formais do título de crédito.


1.1. Títulos de crédito de modelo livre - aqueles que não exigem a observância de padrão
previamente estabelecido pela norma. São títulos de modelo livre a nota promissória e a letra
de câmbio.
1.2. Títulos de crédito de modelo vinculado - na norma há definição de um padrão a ser
seguido para que tenham validade. É exemplo de título de modelo vinculado o cheque.

2. Quanto à estrutura
2.1. Ordem de pagamento - alguém dá ordem para que interposta pessoa efetue o pagamento
a um terceiro beneficiário. São exemplos o cheque, a duplicata mercantil, a letra de câmbio.
2.2. Promessa de pagamento - alguém, diretamente, se compromete a pagar determinado
valor ao beneficiário. É exemplo de promessa de pagamento a nota promissória.

3. Quanto às Hipóteses de Emissão


3.1. Títulos causais - são os títulos cuja emissão depende de prévia ocorrência de fato que a lei
determina ser causa possível para sua origem. É exemplo a duplicata mercantil (só pode
circular se houver compra e venda mercantil).
3.2. Títulos não-causais (abstratos) - podem ser criados em decorrência de qualquer causa,
não importando a obrigação que venham a representar. Exemplos: o cheque e a nota
promissória.

4. Quanto à Circulação – leva em consideração o ato jurídico empregado para transferir a


titularidade do instrumento.
4.1. Título ao portador - são títulos que não identificam seu credor podendo, por esse motivo,
ser transferidos mediante tradição. São títulos ao portador os cheques com valores abaixo de
R$100,00 (cem reais).
4.2. Título nominativo - indicam o nome de seu credor. Assim, para que se transfiram,
necessitam, além da tradição, endosso (títulos à ordem) ou cessão civil de crédito (títulos não à
ordem).

O Código Civil de 2002 apresentou uma classificação tripartite dos títulos de crédito com
relação à sua circulação. A diferença é que os títulos à ordem deixaram de ser considerados
“subdivisão” dos títulos nominativos, passando a ser uma categoria diferente. Assim, segundo
o diploma civil, a classificação quanto à circulação se faz da seguinte forma:
a) Título ao portador - classificado da mesma forma que faz a doutrina majoritária, ou seja, são
os títulos transferíveis mediante a simples tradição (artigos 904 e seguintes do Código Civil).
b) Título à ordem - transmissíveis por endosso, em branco ou em preto (artigos 910 e seguintes
do diploma civil).
c) Título nominativo - circulam mediante termo no registro próprio do emitente, assinado pelo
proprietário e pelo adquirente (artigos 921 e seguintes do Código Civil).

REGIME JURÍDICO DOS TÍTULOS DE CRÉDITO

Para Fábio Ulhôa, os títulos de crédito são documentos representativos de obrigações


pecuniárias, que não se confundem com a própria obrigação.

Para Cesare Vivante, títulos de crédito constituem “documentos necessários para o exercício
do direito literal e autônomo nele mencionado”. Este conceito foi acolhido pelo Código Civil de
2002, segundo o qual “título de crédito é o documento necessário ao exercício do direito
literal nele contido” (art. 887).

São características dos títulos de crédito:


- é bem móvel;
- faz parte do direito comercial;
- é título de apresentação – o título precisa ser apresentado para se exercer o direito;
- é título de resgate – não é um título eterno, devendo ser resgatado pelo devedor quando há o
pagamento;
- é título destinado à circulação – a circulação é facilitada e incentivada;
- tem presunção de liquidez e certeza – presume-se que a obrigação existe e que o valor está
correto;
- eficácia processual abstrata – os títulos de crédito são títulos executivos;
- formalismo – todos os títulos têm requisitos estabelecidos em lei. Se faltar algum desses
requisitos, o documento não vale como título de crédito;
- obrigação quesível – quem tem que tomar a iniciativa para o cumprimento da obrigação é o
credor;
- natureza pro-solvendo – a emissão do título não extingue a obrigação que lhe deu origem;
- solidariedade cambial – todos que assinam o título é devedor do mesmo; havendo mais de
um devedor, eles são solidários e essa solidariedade decorre da lei (art. 47 da Lei Uniforme de
Genebra). Essa solidariedade, entretanto, possui duas distinções em relação à solidariedade
do direito civil: o direito de regresso do devedor solidário que paga é pela dívida inteira e
somente pode ser exercido contra os devedores que vieram antes no título.

Natureza jurídica: O título de crédito é declaração unilateral de vontade.

Em que momento nasce a obrigação? Na assinatura ou na entrega voluntária do título ao


credor? Duas teorias respondem a indagação: a teoria da criação, segundo a qual a
obrigação nasce com a assinatura do título; e a teoria da emissão, segundo a qual a
obrigação nasce com a entrega. No Brasil, há remições no CC sobre essas teorias – arts. 905,
parágrafo único, 909 e 903. Contudo, prevalece a teoria da criação, nos termos dos arts. 16 e
17 da Lei de Genebra.

Os atributos do título de crédito são a negociabilidade e a executividade. No que diz


respeito à negociabilidade, o credor do título de crédito pode receber o valor nele mencionado
antes da data do vencimento, uma vez que o título pode ser transferido por endosso e, se for
ao portador (cheque com valor inferior a R$ 100,00), pela simples tradição. Quanto à
executividade, os títulos de crédito, em geral, são títulos executivos extrajudiciais (art. 585 do
CPC).

Princípios dos títulos de crédito (alguns autores chamam de características):

a) princípio da cartularidade ou incorporação – a apresentação do título é essencial para o


exercício do direito.

b) princípio da literalidade - vale o que está escrito no título, ou seja, é o título que define os
contornos da obrigação. A literalidade indireta é aquela em que também vale o que decorre da
lei ou de um outro documento a que o título faz remição. Quem fala disso é Túlio Ascarelli.

c) princípio da autonomia – cada obrigação do título é independente das outras obrigações. O


vício na obrigação de um devedor não contamina a obrigação de outro devedor; fatos que
digam respeito a um credor não afetam outro credor. Pelo princípio da autonomia entende-se
que as obrigações representadas por um mesmo título de crédito são independentes entre si.
Se uma dessas obrigações for nula ou anulável, eivada de vício jurídico, tal fato não
comprometerá a validade e eficácia das demais obrigações constantes do mesmo título de
crédito. Este princípio se desdobra em dois: da abstração e da inoponibilidade das exceções
pessoais aos terceiros de boa-fé.

d) princípio da abstração – Fábio Ulhoa não trata como princípio. Em regra, o título se
desvincula do negócio jurídico que lhe deu origem, ou seja, o credor não pode discutir o
negócio jurídico para cobrar a dívida. Esse princípio não se aplica a todos os títulos de crédito,
como no caso da duplicata, que é um título causal, e das cédulas de crédito. Para os outros
títulos a abstração não é aplicada em três hipóteses:
- se o credor participou do negócio jurídico;
- se o credor tem ciência de problemas no negócio jurídico – RESp 612423;
- quando o título está expressamente vinculado ao negócio jurídico – RESp 111961

e) princípio da independência – Significa que o título vale por si só, não precisando ser
completado por nenhum outro documento. Não é aplicado a todos os títulos, como no caso da
cédula de crédito bancário, que não vale sozinha, precisando ser completada pelos extratos e
pelo contrato. A duplicata sem aceite também não vale sozinha, precisando do comprovante de
recebimento de mercadoria e do protesto para ser executada.
f) Princípio da tipicidade – Todos os títulos de crédito são disciplinados por lei, criados por ela e
com requisitos formais a serem observados, sob pena de serem inexistentes. Discute-se, no
entanto, se este princípio ainda é aplicado, diante da possibilidade de criação de títulos atípicos
por particulares. Para a doutrina majoritária, este princípio não vale mais porque os particulares
podem criam títulos de crédito atípicos, que seriam regidos pelo CC. Fábio Ulhôa, por exemplo,
diz que é possível a criação desses títulos atípicos, porém eles não seriam regidos pelo CC. A
doutrina minoritária defende a impossibilidade de criação de títulos atípicos.

O prazo prescricional dos títulos de crédito no Código Civil é de três anos, nos termos do artigo
206, § 3°, VIII, ressalvadas as disposições de lei especial.

Os institutos típicos do regime jurídico cambiário, como o saque, o aceite, endosso, o aval e o
protesto foram analisados quando do estudo da letra de câmbio, no item 1 do resumo deste
ponto.

LETRA DE CÂMBIO

É um título de crédito clássico e comporta todas as características dos títulos de crédito. É mais
utilizada em negócios internacionais (comércio exterior). Na prática, foi substituída pela
duplicata. Está prevista no Decreto 57663/66 (Lei Uniforme de Genebra). Ler o anexo I do
Decreto, que ainda está em vigor. O anexo II estabelece as reservas do que não vige no Brasil,
devendo ser aplicado o Decreto 2044/1908.

ORIGEM
Na idade média. Alcançou sua perfeição (abstração) no direito germânico em 1849 (Requião).

LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
Decreto n. 57.663/66 – Lei Uniforme de Genebra - e, excepcionalmente, o Decreto
2044/1908, quanto às reservas e omissões da Lei Uniforme.

CONCEITO
Ordem dada por escrito a uma pessoa para que pague a um beneficiário ou a sua ordem uma
determinada importância em dinheiro.

ELEMENTOS PESSOAIS
a) SACADOR - eminente da letra de câmbio / quem dá a ordem de pagamento;
b) SACADO - quem recebe a ordem de pagamento;
c) TOMADOR - o beneficiário da ordem de pagamento.

REQUISITOS DA LETRA DE CÂMBIO


É título de modelo livre que deve conter:
1. a expressão “letra de câmbio” inserta no próprio texto do título;
2. o mandato puro e simples de pagar quantia determinada;
3. o nome do sacado e sua identificação;
4. o lugar do pagamento ou a indicação de um lugar ao lado do nome do sacado, o qual
será tomado como lugar do pagamento e domicílio do sacado;
5. o nome do tomador;
6. local e data do saque;
7. assinatura do sacador.

Observação: A letra em que se não indique a época do pagamento entende-se pagável à


vista.

Quanto à assinatura do sacador, seja ele próprio, seja um representante com poderes para
tanto; quem se apresenta como representante do sacador, mas age sem poderes ou com
excesso de poder (ultra vires), responde pessoalmente pela obrigação. O sacador é garante
tanto da aceitação como do pagamento de letra. É permitido que o sacador se desonere da
garantia da aceitação, mas não que se desonere do pagamento, razão pela qual toda e
qualquer cláusula pela qual ele pretenda exonerar-se da garantia do pagamento considera-se
como não escrita.
A validade da assinatura do mandatário, ainda que com poderes especiais, não é
ampla, havendo que se destacar a Súmula 60 do STJ: “É nula a obrigação cambial assumida
por procurador do mutuário vinculado ao mutuante, no exclusivo interesse deste”. Tal
enunciado veio para proibir uma prática que se tornava comum: quando emprestavam dinheiro
(contrato de mútuo), algumas instituições financeiras (mutuantes) colhiam a assinatura do
cliente (mutuário: aquele que tomou o empréstimo) numa procuração. Assim, diante do
inadimplemento, a instituição financeira ou empresa a ela vinculada sacava uma letra de
câmbio como representante do mutuário, o que foi considerado ilícito. Note-se, porém, que não
se impede a própria instituição financeira emita, como sacadora, a letra de câmbio,
apresentando-se como tomadora e indicando o cliente como sacado; se ele recusa a letra,
haverá protesto por falta de aceite; obviamente, se houve abuso no saque, o cliente sacado
terá ação contra a instituição sacadora, pedindo a indenização pelos danos morais sofridos.

Alguns doutrinadores defendem que o lugar do pagamento, o lugar da emissão e a data do


vencimento são requisitos não-essenciais, uma vez que podem ser suprimidos ou substituídos,
nos termos do artigo 2° , da LUG.

Outros, ainda, entendem que o vencimento não é requisito, pois se não tiver vencimento
escrito, o título é à vista.

Hoje predomina o entendimento de que a lei não veda a emissão de cambial indexada ou com
cláusula de correção monetária, desde que o índice usado seja oficial ou de amplo
conhecimento no comércio.

Título em branco: A presença dos requisitos impostos por lei é necessária em razão do
formalismo que rege os títulos de crédito. Um documento só será considerado um título de
crédito se atender a todos os requisitos impostos em lei. Todavia, a verificação da obediência a
esses requisitos não é necessária desde a emissão do título. Os requisitos devem estar
presentes no momento da apresentação do título para pagamento. Portanto, é perfeitamente
possível a emissão de um título em branco.
Esse preenchimento de lacunas da letra emitida em branco pode ser feito pelo próprio credor
do título, que possui uma espécie de mandato (art. 891, CC) para preencher o documento.

A Súmula 387 do STF dispõe que os requisitos dos títulos de crédito não precisam constar do
instrumento no momento do saque. Os requisitos devem estar totalmente cumpridos antes da
cobrança ou do protesto do título, entendendo-se o portador de boa-fé como procurador do
sacador para completar o título emitido com emissões.
STF Súmula nº 387 -
A cambial emitida ou aceita com omissões, ou em branco, pode ser completada pelo credor
de boa-fé antes da cobrança ou do protesto.

SAQUE
É o ato de emissão da letra de câmbio. O saque é declaração originária e necessária porque o
título surge graças a ele.

Este ato vincula o sacador ao pagamento da LC. O sacador é codevedor do título junto com o
sacado. A lei faculta que uma mesma pessoa ocupe mais de uma dessas situações. A letra
pode ser sacada em benefício do próprio sacador (mesma pessoa sacador e tomador) ou pode
ser sacada sobre o próprio sacador (mesma pessoa como sacador e sacado).
Na hipótese de serem a mesma pessoa sacador e sacado, temos, na verdade, uma promessa
de pagamento, e não uma ordem de pagamento.

Ressaque:
É o saque à vista contra qualquer dos coobrigados do título vencido, não pago,
protestado e não prescrito, evitando-se o ajuizamento da ação cambial, sendo a letra de
câmbio colocada novamente em circulação. Na realidade, é um novo saque que substitui
a ação regressiva.

ACEITE
Não é essencial do título. Só existe aceite na LC e na duplicata.
O sacado de uma LC não tem nenhuma obrigação cambial pelo só fato de o sacador ter-lhe
endereçado a ordem de pagamento. Estará vinculado ao pagamento do título apenas se
concordar em atender à ordem que lhe é dirigida.

O ato cambial pelo qual o sacado concorda em acolher a ordem incorporada pela letra se
chama “aceite”. É ato de sua livre vontade. O aceite resulta da simples assinatura do sacado
lançada no anverso do título, mas poderá ser firmado também no verso, desde que identificado
o ato praticado pela expressão “aceito” ou outra equivalente.

O aceite pode ser dado fora do titulo? Não, em virtude do princípio da literalidade. Também em
virtude do princípio da cartularidade.

Contudo, para Bulgarelli e Mamede, o aceite dado fora do título de crédito produz
efeitos normalmente, tornado o sacador devedor da obrigação. De outro lado, Luiz Emygidio da
Rosa Júnior afirma que o aceite dado em separado produz efeitos não cambiários, como um
reconhecimento de dívida, mas reconhece a possibilidade do aceite dado em documento
separado, no caso de aceite riscado do sacado, nos termos do art. 29 da LUG.

Art. 29 da LUG é o caso do aceite riscado; manda uma carta ao credor dizendo que aceitou e
quando o titulo volta, risca o aceite; nesse caso, a carta enviada mais o titulo com o aceite
riscado vale como aceite. Bulgarelli diz que é um caso de aceite dado fora do titulo.

Com efeito, firmado o aceite no próprio título, garante-se ao sacado o direito de


arrependimento, isto é, uma vez que ele não é o criador daquele documento, ele pode se
arrepender da obrigação assumida. Para tanto, ele deve riscar o aceite antes de devolver o
título para quem o apresentou (LUG – art. 29). Nesse caso, o aceite riscado não produz efeitos,
ou seja, o sacado continua sem ter responsabilidade pelo pagamento do título.
Todavia, se ele comunicou por escrito a qualquer signatário da letra que deu o aceite, ele fica
vinculado em relação a essas pessoas que receberam a comunicação. Nesse caso, protege-se
a confiança do terceiro que recebeu essa comunicação, e com base nela se organizou em seus
afazeres. Não se trata exatamente de um aceite dado fora do título, mas da não produção de
efeitos do cancelamento do aceite em relação àqueles que foram comunicados.

Para que haja aceite é necessário que o beneficiário apresente o titulo para o sacado. Essa
apresentação pode ser obrigatória, facultativa ou dispensada ou inexistente, dependendo do
vencimento do titulo.
A apresentação para aceite pode ser: a) facultativa: se a letra for a dia certo ou em certo prazo
da data; b) obrigatória: quando o vencimento for em certo termo da vista.

Quando a letra for pagável a vista ou a um certo termo da vista, o sacador poderá estipular a
incidência de juros sobre a quantia ser paga. Trata-se de uma exceção válida à regra do art.
890 do CC. A taxa de juros deverá ser indicada na letra; sua ausência invalida a incidência; os
juros contam-se da data da letra, se outra data não for indicada. Trata-se de um estímulo para
apresentação tardia da letra para pagamento. Nos demais casos, a estipulação de juros será
considerada como não escrita.

O prazo para apresentação é de até um ano após o saque, no vencimento à vista ou a certo
tempo da vista (artigos 34 e 23 da LU); e até no vencimento, nas demais hipóteses (artigo 23,
da LUG). Se perder o prazo, não pode cobrar dos coobrigados (art. 53 da LU).

Art. 23 - As letras a certo termo de vista devem ser apresentadas ao aceite dentro do
prazo de um ano das suas datas.
O sacador pode reduzir este prazo ou estipular um prazo maior.
Esses prazos podem ser reduzidos pelos endossantes.
Apresentado o título ao sacado, este tem o direito de pedir que ele lhe seja reapresentado no
dia seguinte, nos termos do art. 24 da LU. É o chamado PRAZO DE RESPIRO ou
reapresentação.
Nesse caso, o prestador não está obrigado a deixar nas mãos do aceitante a letra apresentada
ao aceite. Irá recolhê-la e trará novamente no dia seguinte. Se o sacado retiver a letra, além do
protesto por falta de devolução, é possível requerer judicialmente a busca e apreensão do
título.
A legislação não estabelece o prazo no qual deverá haver a devolução do título, sendo
razoável entender-se que o prazo é de 24 horas, caso não haja nenhum prazo combinado
entre as partes.

Não é requisito do aceite a expressão da data em que foi passado; basta a assinatura do
sacado, salvo nas hipóteses da letra pagável a certo termo de vista e a letra que deva ser
apresentada ao aceite dentro de um prazo determinado por estipulação especial. A data,
nesses casos, é essencial. Diante da recusa do sacado em dispor a data correta, o portador
deverá providenciar imediato protesto do título pela falta de data, preservando seus direitos
contra o endossante e contra o sacador. Na falta de protesto, o aceite não datado entende-se,
apenas no que respeita ao aceitante, como tendo sido dado no último dia do prazo para a
apresentação ao aceite; mas essa regra não alcança a responsabilidade solidária de
endossantes e sacador, bem como seus avalistas.

O aceitante é o devedor principal da letra de câmbio. No vencimento, o credor do título deve


procurar, inicialmente, o aceitante para cobrar o seu pagamento. Somente na hipótese de
recusa de pagamento pelo devedor principal, é que o credor poderá cobrar o título, em
determinadas condições, dos coobrigados.

Se o sacado não aceitar a ordem de pagamento que lhe foi dirigida, o tomador – ou credor –
poderá cobrar o título de imediato do sacador, posto que o vencimento originariamente fixado
para a cambial é antecipado com a recusa do aceite, o que também ocorre no caso de aceite
parcial - limitativo ou modificativo.

Se o sacado aceita, mas modifica alguma coisa do titulo, é o aceite qualificado. Há o aceite
qualificado limitativo quando o sacado reduz o valor. Há também o aceite modificativo, onde o
sacado modifica outra coisa que não seja o valor, como, por exemplo, o vencimento. O sacado
que dá o aceite qualificado se torna responsável nos termos do aceite qualificado e não na
forma do titulo. O tomador não é obrigado a concordar com o aceite qualificado, para ele esse
aceite equivale à recusa, podendo protestar o titulo, provando que o aceite não foi dado como
deveria e cobrar o titulo antecipadamente. Quanto pode cobrar antecipadamente no caso do
aceite limitativo? São 2 opiniões:
1)Bulgarelli e Fabio Ulhoa entendem que pode cobrar tudo.
2)Requião, Luis Emydio, Fran Martins, Gladston Mamede entendem que pode cobrar a parte
não aceita.

Para evitar que a recusa do aceite produza o vencimento antecipado da LC, o sacador pode
valer-se de expediente previsto no art. 22 da LU – cláusula “não-aceitável”. Uma LC com
esta cláusula não poderá ser apresentada ao sacado para aceite. O credor somente poderá
apresentar o título ao sacado no seu vencimento, e, para pagamento, portanto.

O sacado que retém indevidamente a LC que lhe foi apresentada para aceite – ou o devedor,
em caso de entrega para pagamento – está sujeito a prisão administrativa, que deverá ser
requerida ao juiz, nos termos do art. 885 do CPC. Obs.: a prisão aqui foi considerada
inconstitucional, eis que a Carta Magna só prevê prisão civil para devedor de alimentos e
depositário infiel.)

A recusa do aceite deve ser comprovada pelo protesto do título (art.14).


Portanto, com a recusa do aceite, o beneficiário poderá cobrar o título imediatamente em face
dos signatários. Para exercer esse direito, exige-se prova por parte do beneficiário. Tal prova,
contudo, deve ser solene, isto é, a lei exige como prova da recusa do aceite o protesto lavrado
pelo competente cartório.
Aceite por procuração – cláusula-mandato – Código de Defesa do Consumidor, art. 51, VIII.
“São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de
produtos e serviços que: VIII - imponham representante para concluir ou realizar outro negócio
jurídico pelo consumidor.”

Limitação do aceite - o aceite, em princípio, é puro e simples, mas admite que o sacado o limite
a uma parte da importância sacada. Assim, se o sacado aceita uma letra pela metade de seu
valor, a limitação resulta em recusa do aceite, mas o aceitante se vincula cambiariamente ao
pagamento da importância reduzida. É o aceite parcial, e o sacador é o responsável pelo saldo
não aceito.

Cancelamento – a Lei Uniforme admite o cancelamento do aceite, antes da restituição da letra,


o que é considerado, então, aceite recusado.

Aceite por intervenção – a Lei Uniforme admite que, em certas condições, um estranho à
relação cambiária nela intervenha, para firmar o aceite pelo sacado. Esclareçamos a utilidade
da intervenção: é que a recusa do aceite pelo sacado pode criar embaraçosas situações para o
sacador e os endossantes, pois o portador, em consequência da recusa do aceite pelo sacado,
tem o direito de usar do regresso contra o sacador ou endossantes, exigindo deles o
pagamento da letra, antes mesmo do vencimento.

Prorrogação do prazo de apresentação para aceite – a decadência ou perda de certos direitos


cambiários decorrem da não apresentação ou da tardia apresentação da letra. A Lei Uniforme
admite, assim, que, havendo caso fortuito ou força maior, possa ser prorrogado o prazo de
apresentação para aceite. Cessado o caso fortuito ou força maior, o portador deve apresentar
sem demora a letra para aceite, ou para pagamento.

ENDOSSO
Ato cambiário que opera a transferência e vinculação dos direitos inerentes ao título de crédito.
Ato cambiário que opera a transferência do crédito representado por título “à ordem”.

Em síntese, o endosso é um meio especial de transferência de determinados bens móveis –


títulos de crédito – isto é, ele representa o meio próprio de transferência da propriedade dos
títulos de crédito e de todos os direitos inerentes a esse título.

O endosso deve sempre constar do título (cartularidade - art.13, Lei Uniforme). O local próprio
é o verso do título, não precisando de indicação do ato. Se for feito na frente tem que constar
como endosso. Caso o espaço no documento não seja suficiente para realizar o endosso,
deve-se colar uma folha de papel (anexo, alongue ou alongamento) ao título e realizar o
endosso nessa folha, que, para todos os efeitos, é o próprio título de crédito.
Para que se efetive o endosso, pressupõe-se que o título possua a cláusula à ordem. Ela é
presumida na letra de câmbio e na nota promissória (LUG- art. 11), bem como no cheque.
Caso queira impedir o endosso, deve-se escrever expressamente a cláusula não à ordem ou
outra equivalente. O simples fato de riscar a cláusula à ordem impressa no título não é
suficiente para tornar o título não passível de endosso.
Inserida expressamente a cláusula não à ordem, o título só poderá ser transferido com
forma e os efeitos de uma cessão ordinária de créditos.
Caso seja realizado um endosso nessa hipótese, a melhor doutrina afirma que será
válido, mas não produzirá os seus próprios efeitos, mas apenas de cessão de crédito. Aplica-se
a teoria da conversão substancial do negócio jurídico.

Endossante – aquele que transfere por endosso.


Endossatário – aquele que recebe o título por endosso.

É nulo o endosso parcial (art 12 da LUG). O endosso condicional, em que a transferência do


crédito fica subordinada a alguma condição, resolutiva ou suspensiva, não é nulo, mas referida
condição será ineficaz, porque a lei a considera não-escrita.

O endosso pode ser em preto (indicando a pessoa a quem é transferido o título) ou em branco
(não indicando a pessoa a quem é transferido o título).
O endosso em branco só pode ser lançado no verso do título ( art. 13- LUG).

Não há limite para o número de endossos de um título de crédito.

O endosso vincula o endossante ao pagamento do título, na qualidade de coobrigado (regra),


salvo se registrar que endosso é sem garantia – art. 15, da Lei Uniforme.
Nesse caso, não se responsabiliza pelo aceite e pelo pagamento do titulo, cujos efeitos
se limitam à pessoa que inseriu a cláusula. Tem como efeito único a transferência da
propriedade.
Vale ressaltar que no CC (art. 914), a regra se inverte, isto é, para os títulos de crédito
atípicos, o endossante não responde pelo pagamento, salvo cláusula expressa em
sentido contrário.

Proibição de novo endosso


Além de excluir sua responsabilidade, o endossante pode limitá-la ao seu endossatário
imediato. O endossante, por meio de uma cláusula expressa, pode restringir as pessoas que
poderão cobrá-lo. Não retira a responsabilidade do endossante, nem impede propriamente a
realização de um novo endosso, mas afasta a responsabilidade do endossante em face das
pessoas a quem o título for posteriormente endossado.

Endossos impróprios: torna-se legítima a posse de uma pessoa sobre o documento, sem
a transferência da titularidade do título.

a) Endosso caução, em garantia ou pignoratício – o título de crédito, considerado bem móvel, é


onerado por penhor, em favor do credor do endossante. Não há a transferência do crédito,
salvo na eventualidade de não-cumprimento da obrigação garantida, hipótese em que o
endossatário apropria-se do crédito representado pelo título.
A legislação lhe assegura todos os direitos decorrentes do título, exceto a transferência
da propriedade do documento, uma vez que tem apenas a posse do documento. Ele
poderá apresentar o título para aceitação ou para pagamento, levar o título a protesto e
ajuizar ações, isto é, a lei lhe assegura a prática de todos os atos necessários à defesa e
conservação do título.
Qualquer endosso que realizar deverá ser entendido como endosso-mandato, na medida
em que as demais modalidades de endosso não podem ser realizadas por ele, que é um
mero possuidor. Nem outro endosso-caução ele poderá realizar, pois não se pode dar
em garantia apenas a posse do título.
Por agir em nome e em proveito próprio, o endossatário-pignoratício assumirá todos os
riscos das suas ações. Se ele der causar um dano a alguém no exercício dos direitos
inerentes ao título, é ele que irá responder pela indenização, ao contrário do que ocorria
no endosso-mandato (STJ- REsp 397.771/MG).

b) Endosso mandato (endosso-procuração) – o beneficiário outorga poderes ao mandatário


para, em nome daquele, cobrar, executar, protestar. Também aqui não há do crédito. A morte
do endossante-mandante não extingue o endosso-mandato – altera a regra geral do mandato
(art. 917, § 2º, CC/02).
Segundo Pontes de Miranda, “é aquele em que o endossante da letra de câmbio
transfere a outra pessoa o exercício e a conservação dos seus direitos cambiários, sem
dispor deles”.
Em todo caso, o endosso-mandato deverá ser em preto.
*** O endossatário-mandatário não pode, por não ter a propriedade, fazer um endosso
translativo. Nada impede, contudo, que ele faça um novo endosso-mandato.
Como o proveito é do endossante-mandante, o risco também será dele. Se o
endossatário-mandatário causar algum dano ao exercício da sua função, ele estará
agindo em nome e em proveito do endossante. Assim sendo, a responsabilidade pelos
danos causados será, a princípio, do endossante-mandante. O endossatário poderá ser
demandado, nesses casos, apenas se houver a prova de que ele agiu com culpa na sua
função (STJ- REsp 541.477/RS).

O protesto é ato necessário para garantir o direito de regresso contra os endossantes e seus
avalistas (coobrigados).
Não se confunde com a cessão de crédito, tendo em vista apresentarem as seguintes
distinções:
a) o endosso é ato unilateral de declaração de vontade, enquanto a cessão é um contrato
bilateral;
b) a nulidade de um endosso não afeta os endossos posteriores; na cessão, a nulidade de uma
acarreta a das posteriores;
c) o devedor não pode opor exceções pessoais ao endossatário; na cessão, o devedor pode
opor ao cessionário a mesma defesa que teria contra o cedente (princípio da autonomia das
obrigações cambiais e subprincípio da inoponibilidade das exceções pessoais aos terceiros de
boa-fé).
d) o endosso é forma própria de transferência dos títulos de crédito. A cessão de
créditos objetiva a transferência de qualquer tipo de crédito, inclusive títulos;
e) o endosso independe de qualquer comunicação ao devedor, enquanto a cessão de
créditos só produz efeitos quando notificada ao devedor (art. 290, CC);
f) no endosso, em regra, o endossante responde pelo pela aceitação e pelo pagamento;
já na cessão de crédito, em regra, o cedente responde apenas pela existência do crédito

Endosso tardio, posterior ou póstumo:


O endosso normalmente deve ser feito até o vencimento do título. Todavia, nada impede
que o endosso seja feito mesmo depois do vencimento do título. O endosso posterior ao
vencimento da obrigação é válido e produz os mesmos efeitos do endosso anterior.
Todavia, caso o endosso seja efetuado após o protesto por falta de pagamento ou após
o prazo para efetivação do protesto por falta de pagamento, ele não produz os efeitos de
endosso, mas apenas efeitos de cessão ordinária de créditos (art. 20, LUG). O protesto
por falta de pagamento nas letras de câmbio e notas promissórias é de um dia útil após
o vencimento (art. 28, Decreto 2044/1908).

Há alguns endossos que produzem efeitos de cessão civil de crédito, ou seja, endossos em
que o endossante não responde, em regra, pela solvência do devedor e em que o endossatário
não adquire obrigação autônoma. São duas as hipóteses de endosso com efeito de cessão civil
de crédito: a) endosso praticado após o protesto por falta de pagamento ou do transcurso do
prazo legal para a extração desse protesto (endosso tardio, posterior ou póstumo – art. 20,
LUG); b) endosso de letra de câmbio com a cláusula “não à ordem”.

A Lei 8021/90 sobre títulos nominativos e endossáveis (Plano Collor) vale para títulos da SA e
não para títulos de crédito (Resp 120173). Tal lei proibia a emissão de quotas ao portador ou
nominativo-endossáveis, pelos fundos em condomínio, bem como a emissão de títulos e a
captação de depósitos ou aplicações ao portador nominativo-endossáveis.
A Lei 8088/90, no art,19 diz que todos os títulos devem ser endossáveis em preto, mas isso
não acabou com o endosso em branco, porém o endossatário tem que se identificar na hora de
receber (Resp 204595).

Factoring e endosso

Factoring é uma atividade empresarial que envolve a prestação de serviços e a compra de


ativos financeiros (créditos).
A modalidade mais usual é o denominado “conventional factoring”, que envolve a compra de
direitos creditórios, com o pagamento imediato dos valores a quem transferiu os créditos
(faturizado).
A transferência aqui mencionada pode ser feita tanto por meio de endosso, como por uma
cessão de crédito. Em ambas as formas, quem transfere o crédito pode assumir ou não a
responsabilidade pelo não pagamento do título.
Parte da doutrina reconhece a possibilidade de que exista uma convenção expressa no sentido
da responsabilidade pela solvência do devedor na cessão de crédito. Tendo em vista que se
trata de contrato atípico, as partes poderiam, pela autonomia que lhes é assegurada,
convencionar que o faturizado será responsável pelo pagamento do título. Não haveria no
nosso Direito qualquer impedimento para que as partes pactuassem essa responsabilidade
expressamente. No endosso, tal responsabilidade já seria a regra (LUG- art. 15; Lei 7357/85-
art.21) e, por isso, a própria pactuação da responsabilidade seria desnecessária, conforme
orientação mais recente do STJ (REsp 820672/DF)

O TJDFT já afirmou que “por ser o contrato de factoring uma operação de risco, especulativo,
portanto, e não uma operação de crédito, como são as operações bancárias, o faturizador, ao
adquirir créditos, mediante uma contraprestação, isenta o faturizado da responsabilidade pelo
pagamento do título” (20040020091815AGI, Rel. Ana Maria Duarte Amarante, j. em
14/03/2005). O STJ também já havia afirmado que a faturizadora não teria direito de regresso
contra o faturizado.

Nessa linha de entendimento, contudo, reconhece-se a responsabilidade do faturizado pela


existência do crédito, isto é, caso transfira um crédito inexistente (ex: duplicata fria), ele
responderá perante o faturizador. Além disso, reconhece-se também a responsabilidade do
faturizado se foi ele quem deu causa ao não-pagamento do crédito, como quando ele não
cumpre o contrato..

Pode-se concluir, portanto, que a tendência mais recente é no sentido de admitir o pacto
expresso de responsabilidade do faturizado pelos créditos transferidos, ou sua
responsabilidade, mesmo sem pacto, no caso do endosso de títulos próprios.

AVAL
Conceito: Segundo Fábio Ulhoa, é o ato cambiário pelo qual uma pessoa (avalista) se
compromete a pagar um título de crédito, nas mesmas condições do avalizado.

Obrigação cambiária assumida por alguém no intuito de garantir o pagamento de título de


crédito nas mesmas condições de um outro obrigado. Ato cambial de garantia. Somente há em
título de crédito; em contratos, a garantia é a fiança.

Avalista – aquele que oferece a garantia.


Avalizado – aquele que recebe a garantia. É o devedor original do título de crédito.

Aval pode ser total ou parcial (art.30). O artigo 897, parágrafo único, do Código Civil,
entretanto, veda o aval parcial para os títulos atípicos.

Pode-se indicar a quem é dada a garantia – aval em preto (identifica o avalizado) – ou não –
aval em branco (não identifica o avalizado). O aval em branco deve ser lançado na frente do
título e é oferecido em favor do sacador (art.31).

O local apropriado é na frente da LC, se for no verso deve identificar o ato. Sendo feito em
branco na frente do título, o sacador é o avalizado. Para avalizar o sacado, deve ser em preto.

Embora a lei não considere suficiente a simples assinatura no verso do título, o STJ vem
reconhecendo que a assinatura no verso por si só pode caracterizar o aval, desde que não
concorram elementos em sentido contrário. (REsp 493.861/MG):

PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FUNDADA EM TÍTULO DE


CRÉDITO. CHEQUE. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM.
CARACTERIZAÇÃO. ASSINATURA NO VERSO DA CÁRTULA.
AVAL.
1 - Consignado pelas instâncias ordinárias haver o recorrente
assinado no verso do cheque, sem indicação alguma, não se trata de
reexame de provas, mas de, partindo dessa premissa fática, dar à
espécie a qualificação jurídica que o caso requer.
2 - Denotado que o cheque, na hipótese vertente não é ao portador,
mas nominal, e a assinatura constante do seu verso é de outra
pessoa, que não o seu beneficiário, a conclusão é de que somente
pode ter sido efetivada como aval, ainda que não especificada a sua
finalidade (por aval), pois, do contrário, estar-se-ia admitindo quebra
na cadeia creditícia.
3 - Somente poderia ser endosso se a assinatura constante no verso
da cártula coincidisse com quem dela seja o beneficiário, o que não
ocorre na espécie, pois o beneficiário é pessoa diversa daquela que
apôs a assinatura no dorso do cheque em apreço.
4 - A assinatura, que não se pode ter por inútil no título, faz atribuir à
pessoa que a apôs coobrigação e responsabilidade pelo crédito por
ele representado.
5 - Legitimidade passiva ad causam que se impõe àquele tido por
avalista.
6 - Recurso especial não conhecido

Características: a) equivalência – o avalista é obrigado nos mesmos termos que o avalizado


(exceto se o aval for parcial). Não há benefício de ordem e pode ser acionado isoladamente. b)
autonomia – a obrigação do avalista independe da obrigação do avalizado. Mesmo que a
relação do avalizado seja nula, a do avalista permanece.

AVAL FIANÇA

É contratual.
É unilateral.
É acessória, nulidade da obrigação do afiançado
É autônomo. A obrigação do avalista persiste
abrange a obrigação do fiador. (princípio da
mesmo com a nulidade do avalizado.
gravitação jurídica)

Há benefício de ordem (fiador indica bens livres


Não há benefício de ordem.
e desembaraçados do afiançado) – via de regra

Com o CC/02 passou-se a exigir outorga


uxória, exceto se houver o regime de
A necessidade de outorga uxória permanece
separação de bens.
com o CC/02.

A obrigação do avalista é personalíssima? Não. Transfere-se para os herdeiros até o limite de


seu quinhão, mesmo que o óbito ocorra antes do vencimento.

Súmula nº 26 do Superior Tribunal de Justiça – “O avalista do título de crédito vinculado a


contrato de mútuo também responde pelas obrigações pactuadas, quando no contrato figurar
como devedor solidário”.

O avalista, se executado, não pode se opor ao pagamento, alegando matéria atinente à origem
do título. Recorde-se que nenhum obrigado pode opor ao exequente as exceções pessoais de
outro devedor. O Supremo Tribunal Federal já afirmou que “não cabe ao avalista defender-se
com exceções próprias do avalizado, esclarecendo que sua defesa, quando não se funda em
defeito formal do título, ou em falta de requisito para o exercício da ação, somente pode
assentar em direito pessoal seu” (RE nº 67.378, in RTJ 57/474).
No entanto, vale ressaltar que o STJ, no REsp 678.881/PR, já entendeu que o avalista poderá
opor exceções causais ao credor de má-fé, sob pena de enriquecimento ilícito deste. Não se
aplicaria o princípio da abstração in casu.

Por outro lado, vale ressaltar que há o Enunciado 114 do CJF: “Art. 1647- O aval não pode ser
anulado por falta de vênia conjugal, de modo que o inciso III do art. 1647 apenas caracteriza a
inoponibilidade do título ao cônjuge que não consentiu”.

Aval antecipado – o aval pode anteceder o aceite ou o endosso, ainda não lançados no título. A
respeito do aval aposto antes do aceite, cumpre salientar que a recusa total ou parcial do
aceite nenhuma influência exercerá sobre a responsabilidade do avalista, que
independentemente do aceite assumiu a obrigação de garantir o pagamento do título.

No entanto, há autores que sustentam que o aval antecipado pode ser dado, mas somente
produzirá efeitos com o aceite do sacado (Pontes de Miranda). Deve existir ao menos a
aparência da existência da obrigação e do aceite.

Diferentemente ocorre com o avalista antecipado de endosso: se o endosso não se realizar,


nenhuma obrigação se originou para o avalista do endossante.

Avais conjuntos - Súmula 189 do STF: “Avais em branco e superpostos consideram-se


simultâneos e não sucessivos.”
Aval simultâneo: Não cabe ação cambiária entre avalista e avalista coobrigado simultâneo.
Dois avalistas avalizam, ao mesmo tempo, um só avalizado.
Aval sucessivo: O avalista do avalizado é também avalizado por outro avalista. Este último tem
ação cambiária contra o primeiro avalista e contra quem este tenha ação.

VENCIMENTO
Há duas espécies de vencimento: o ordinário, que se opera pelo fato jurídico decurso do tempo
ou pela apresentação ao sacado da letra à vista; e o extraordinário, que se opera por recusa do
aceite ou pela falência o aceitante.

Somente a falência do ACEITANTE (sacado) de uma letra de câmbio produz o seu


vencimento antecipado. Alguns autores entendem que a falência de qualquer coobrigado
deveria ser levada em conta como vencimento extraordinário do título de crédito.

a) à vista: vence contra a apresentação. Apresenta para pagamento e não para aceite.
b) a dia certo: no dia que consta no título, que já está ali fixado;
c) a tempo certo da data (DO SAQUE): a data do vencimento será contada a partir do saque
(emissão);
d) a tempo certo da vista (DO ACEITE): o marco inicial é o aceite. Se o sacado recusa-se a
aceitar o título, o prazo para vencimento será contado a partir do protesto por falta de
aceite.

Ocorrendo o vencimento, em princípio, deveria ocorrer o pagamento do titulo. Quanto se paga?


É o valor do titulo, mas esse valor pode ser acrescido de juros remuneratórios? Sim, desde que
previstos no titulo e só podem ser previstos se o titulo for à vista ou a certo termo da vista.

Se o titulo vencer, podem incidir juros de mora e esses juros são legais e por isso não precisam
estar previstos no titulo. Qual é o termo inicial e a taxa desses juros de mora? O termo inicial é
o vencimento. A taxa é prevista no art. 48 e 49 da LUG, mas foi objeto de reserva e por isso
não vale; também o Dec. 2044 não vale; o que vale é o art. 406, CC (não fixou a taxa; diz que é
a taxa para a Fazenda Pública, que é a selic, mas nela tem juros e correção). Há divergências
e há quem defenda a aplicação do art. 161, CTN (1%). A 2ª Seção do STJ aplica a SELIC
(Resp 823818); a 1ª Seção aplica 1% (Resp 784235). A divergência entre as seções do STJ
acabou sendo resolvida por meio dos Embargos de Divergência 727.842, no qual a Corte
Especial entendeu que os juros de mora decorrentes de descumprimento da obrigação civil são
calculados conforme a taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia (SELIC);
o TJDF recomenda o uso da taxa de 1%.

Prorrogação do vencimento:

O direito brasileiro não admite dias de perdão, ou dias de graça em relação à letra de
câmbio (LUG – art. 74), ou seja, não se admite que o credor conceda dias de tolerância
para o cumprimento da obrigação. Caso o faça, ele poderá perder os direitos contra os
devedores indiretos, uma vez que se exige para a cobrança deles um protesto
tempestivo (LUG – art. 53).
Caso as partes convencionem uma prorrogação de tal vencimento, tal convenção só vale
em relação às partes que o ajustaram.
EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO CAMBIÁRIO
Os devedores de um título de crédito são: devedor principal, que na LC é o aceitante, e os
coobrigados, que nesta espécie de título são o sacador e os endossantes. Os avalistas se
enquadram em um outro grupo em função do enquadramento do respectivo avalizado.

Para tornar-se exigível o crédito cambiário contra o devedor principal basta o vencimento do
título; já em relação aos coobrigados, é necessária, ainda, a negativa de pagamento do título
vencido por parte do devedor principal. A comprovação deste fato deve ser feita por protesto do
título, em face do princípio da literalidade. O protesto do título também é condição de
exigibilidade deste crédito na hipótese de recusa do aceite. Para produzir este efeito, contudo,
o protesto deve ser providenciado pelo credor dentro de um prazo estabelecido por lei.

Um coobrigado, portanto, ao contrário do que ocorre em relação ao devedor principal, não está
vinculado ao pagamento do título não-protestado ou protestado fora do prazo legal.

O coobrigado que paga o título de crédito tem o direito de regresso contra o devedor principal e
contra os coobrigados anteriores. As obrigações representadas por um título de crédito só se
extinguem, todas, com o pagamento, pelo aceitante, do valor do crédito. Para se localizarem os
coobrigados na cadeia de anterioridade das obrigações cambiais, adotam-se os seguintes
critérios: a) o sacador da LC é anterior aos endossantes; b) os endossantes são dispostos, na
cadeia, segundo o critério cronológico; c) o avalista se insere na cadeia em posição
imediatamente posterior ao respectivo avalizado.

PAGAMENTO
A letra de câmbio é uma obrigação quesível (quérable) por natureza, pois o devedor, no dia do
vencimento, não sabe nas mãos de quem e onde se encontra o título. O portador deve ir ao
devedor apresentar o título para pagamento.

Tipos de pagamento:
A doutrina distingue dois tipos de pagamento, de acordo com a posição do sujeito que o
efetua.
O primeiro tipo é o pagamento extintivo, na qual a letra deixa de existir cambialmente.
Tal tipo de pagamento extingue a vida útil do TC. Na letra de câmbio é o pagamento feito
pelo aceitante, ou pelo sacador de letra não aceita.
O segundo é o chamado pagamento recuperatório que não extingue a vida útil do TC, na
medida em que faz nascer o direito de regresso. Tal pagamento é feito pelo devedor
indireto.

O pagamento de uma LC deve ser feito no prazo da lei, que difere segundo o lugar de sua
realização. Para uma LC pagável no exterior, o credor deve apresentar o título ao aceitante no
dia do vencimento ou num dos dois dias úteis seguintes (LU art. 38). Já se a LC é pagável no
Brasil, o credor deve apresentá-la ao aceitante para pagamento no dia do vencimento ou,
recaindo este num dia não-útil, no primeiro dia útil seguinte. Tal regra, evidentemente, não se
aplica às letras à vista, as quais podem ser apresentadas em qualquer momento, no prazo de
um ano.

Se não for observado o prazo de apresentação para pagamento, o credor não perderá o direito
ao crédito cambiário. Mas nesta hipótese, qualquer devedor poderá depositar, em juízo, por
conta do credor, o valor do título. Responderá, portanto, o credor de LC não-apresentada
tempestivamente para pagamento, pelo ressarcimento das despesas de eventual depósito
judicial feito pelo devedor principal ou por um coobrigado.

Somente na hipótese de LC com a cláusula “sem despesas”, que dispensa o protesto para fins
de conservação do direito de crédito contra os coobrigados, ou parte deles, é que a
inobservância do prazo de apresentação para pagamento importa conseqüência distinta, a
saber: perda do direito de crédito contra todos os coobrigados, nos termos do art. 53 da LU.

Para fins cambiais, considera-se útil o dia em que há expediente bancário, independentemente
de ser, ou não, feriado local ou nacional.
Em conseqüência de o título ser documento essencial para o exercício do direito, a sua posse
em mãos do devedor presume o pagamento. Tal presunção, contudo, admite prova em
contrário (pode ser que haja o título sido roubado ou extraviado).

O portador não pode recusar o pagamento que se lhe queira efetuar, seja total ou parcial, se
for oferecido no dia do vencimento (no direito civil, o credor pode recusar o pagamento parcial).
Art. 902, § 1°, CC: no vencimento, não pode o credor recusar pagamento, ainda que parcial. No
mesmo sentido, art. 39, 2 – LUG).

O pagamento antecipado, seja total ou parcial, pode ser recusado. Art. 902 CC: não é o credor
obrigado a receber o pagamento antes do vencimento do título, e aquele que o paga, antes do
vencimento, fica responsável pela validade do pagamento.

Verificação dos endossos – Aquele que paga a letra é obrigado a verificar a regularidade da
sucessão dos endossos, mas não a assinatura dos endossantes. A cadeia de endossos em
preto deve estar perfeita, com as assinaturas dos endossantes se encadeando, um a um.

Supremo Tribunal Federal – Somente se caracteriza a recusa do pagamento de título cambial


pela sua apresentação ao devedor, demonstrada pelo protesto. Até este momento, o devedor
não é culpado pelo atraso na liquidação da dívida (até porque pode nem saber quem é o
portador do título). Não se olvide que a cambial é um título de apresentação.

Lugar do pagamento – Na falta de menção no título, prevalece o lugar que constar ao lado do
nome do sacado.

O credor pode fazer uma oposição ao pagamento, nos casos em que o título estiver na posse
ilegítima de outra pessoa. Esta oposição deve ser dirigida ao devedor por carta registrada.

Efeitos do pagamento – Há que se distinguir duas situações:


a) o pagamento efetuado pelo aceitante (obrigado principal) ou pelos respectivos avalistas
desonera da responsabilidade cambial todos os coobrigados;
b) o pagamento feito pelo sacador, endossantes ou respectivos avalistas desonera da
responsabilidade apenas os coobrigados posteriores.

Pagamento por intervenção: o que paga por intervenção (a intervenção é sempre voluntária)
fica sub-rogado nos direitos emergentes da letra.

Se a apresentação da letra ou o seu protesto não puder ser feito dentro dos prazos indicados
por motivo insuperável (caso fortuito ou força maior), esses prazos serão prorrogados. É a
mesma regra da apresentação para aceite.

PROTESTO
Não é meio de cobrança. É meio de prova, regulado pela Lei 9492/97.

Fábio Ulhôa conceitua como o ato formal e solene feito perante o competente cartório,
para fins de incorporar ao título a prova de fato relevante para as relações cambiais.

Espécies:

- protesto por falta de aceite: só pode ser feito até o vencimento do título;
- protesto por falta de pagamento: prova a falta de pagamento e só pode ser feito após o
vencimento do título;
- protesto por falta de devolução: prova que o título foi remetido ao sacado e não foi devolvido e
pode ser feito tanto antes como depois do vencimento;
- protesto por falta de data do aceite: é extraído contra o aceitante e é específico para as letras
de câmbio a certo termo da vista. O aceitante é intimado para vir datar a letra em cartório,
considerando-se, em caso de não comparecimento, como data do aceite a do protesto.

Pedido do protesto:
Deve-se atentar para o disposto no art. 9º, da Lei 9492/97, pois o tabelião, ao lavrar o
protesto, se aterá apenas aos aspectos formais do título ou documento de dívida. Assim,
não cabe a ele analisar a prescrição.

Intimação do protesto:
A princípio tal intimação não precisa ser pessoal, sendo suficiente a entrega do aviso no
endereço indicado (Lei 9492/97 – art. 14). Todavia, para fins de pedido de falência, o STJ
já se manifestou no sentido de que é essencial a identificação da pessoa que recebeu a
intimação, afirmando que a gravidade de tal protesto exige uma certeza maior de que a
intimação foi efetivamente realizada (Súmula 361).

Súmula 361 do STJ

A notificação do protesto, para requerimento de falência da empresa devedora, exige a


identificação da pessoa que a recebeu.

O protesto pode ter várias finalidades, funções que vão depender do tipo de protesto. Assim
são efeitos do protesto:
a) permitir a cobrança dos devedores indiretos (sacador, endossante e respectivos avalistas); o
protesto tem que ser feito até o primeiro dia útil após o vencimento do título (art. 53, LUG c/c
art. 28, Dec. 2044); isso vale para LC e NP; para cheque e duplicata o prazo é diferente. Fábio
Ulhôa e Fran Martins dizem que vale a LUG (prazo de dois dias úteis após o vencimento), mas
é uma opinião isolada. A maioria da doutrina e jurisprudência dizem que vale é o decreto
(prazo de um dia útil após o vencimento).
b) interrupção da prescrição: art. 202, III, CC. A Súmula 153/STF (“Simples protesto cambiário
não interrompe a prescrição”) não vale mais por causa do advento do CC.
c) permitir o pedido de falência: art. 94, I da Lei 11101/05 - só vale para o protesto por falta de
pagamento.
d) o devedor que for intimado no protesto tem o nome automaticamente inserido no SPC e no
SERASA. O cartório dá o prazo de 3 dias úteis para a pessoa se manifestar. Para o protesto
não ser concluído e não haver o pagamento há uma ação de sustação de protesto; essa ação
pode ser uma cautelar com pedido de liminar ou ação de conhecimento com pedido de
antecipação de tutela em virtude da fungibilidade. O sucesso dessa ação pode depender de
uma caução, que não é obrigatória, mas ajuda bastante. Se não conseguir sustar o protesto, é
possível ainda se pedir um cancelamento do protesto (art. 26 da Lei 9492/97) judicial ou
extrajudicialmente (tem que provar que pagou o título).

O protesto constitui elemento fundamental para o exercício do direito de regresso.

Pode-se, destarte, fazer-se a seguinte distinção:

a) protesto obrigatório (ou necessário, ou conservatório) – deve ser feito pelo portador do título
para não perder o direito de regresso, ou seja, o direito de ação contra os coobrigados não
principais (sacador, endossantes e respectivos avalistas);

b) protesto facultativo (ou probatório) – interessa apenas para provar a mora do


sacado/aceitante (o protesto não é obrigatório em relação a este, porquanto ele pode ser
acionado ainda que o título não tenha sido protestado).

Da jurisprudência do STF – Para o credor exigir judicialmente do aceitante ou do seu avalista a


dívida cambiária, não é necessário o prévio protesto do título. O protesto é exigido “só para os
casos de ação regressiva do portador contra o sacador, endossador e avalista” (in RTJ
57/469).

Protesto extemporâneo – Para execução dos coobrigados é necessário o protesto do título, no


prazo máximo de um dia útil após o vencimento. Se o protesto não for feito nesse prazo, o
credor perde o direito de cobrança em relação aos coobrigados.
Cláusula “sem protesto” (ou “sem despesa”) – É possível inseri-la no título. Caso o seja, o
portador pode exercer o seu direito de ação contra os coobrigados independentemente de
protesto do título. A inserção de tais cláusulas produz o efeito de tornar facultativo o protesto
necessário. Se escrita pelo sacador, vincula a todos. Se inserida por um endossante ou por
avalista, só produz efeito em relação a esses (artigo 46, da LU). O portador de LC com cláusula
dessa espécie somente perde o direito de crédito contra os coobrigados a que ela se refere se
deixar de apresentar o título ao aceitante, para pagamento, no prazo da lei (Fábio Ulhôa).

Cancelamento do protesto: Lei 9.492/97 – Art. 26. Só é feito pela prova do pagamento ou por
determinação judicial.

Deve-se apresentar ao cartório a prova desse pagamento, o que, em regra, se dá pela


apresentação do próprio título. Excepcionalmente, contudo, apenas para fins de cancelamento
do protesto, admite-se como prova de pagamento uma declaração de pessoa que figurou no
protesto como credor, com a sua identificação e firma reconhecida.

Sustação do protesto – Cuida-se de construção jurisprudencial, para evitar o abuso do direito


de certos credores, que usam o protesto para oprimir e coagir o devedor. Confere-se ao
protestando a chance de demonstrar judicialmente a inexistência ou invalidade da pretendida
obrigação. A sustação vale, então, como medida processual cautelar. Impõe-se o depósito da
quantia reclamada, não em consignação em pagamento, mas como preliminar e preparatória
de ação judicial de anulação do título. Poderá o juiz, entretanto, admitir apenas a prestação de
caução.

A medida de sustação do protesto só poderá ocorrer enquanto não consumado o


protesto. Após a lavratura do protesto, o máximo que se poderá conseguir é a sustação
dos efeitos do protesto. Não se deve buscar esses efeitos muito depois do protesto, pois
nesse caso os efeitos já terão ocorrido, dificultando a demonstração da utilidade da
própria medida. (TJDF – 20000710038799APC).
Quando se tratar de protesto necessário, a jurisprudência vem reconhecendo que o
protesto não poderá ser sustado. (STJ- REsp 245460/MG e TJDF 19980110566679APC).

Protesto indevido:

Por protesto indevido deve-se entender aquele protesto irregular sob o ponto de vista
formal, ou mesmo aquele protesto por falta de pagamento se a dívida inexiste. A
responsabilidade pela indenização será, a princípio, da pessoa que levou o título a
protesto, uma vez que é a sua conduta que foi apta a causar o dano. Mesmo no caso de
endosso translativo, a responsabilidade será do endossatário que levou o título a
protesto.
No endosso-mandato, a responsabilidade será do endossante mandante, uma vez que o
endossatário mandatário age em nome e em proveito do endossante. No caso de culpa
comprovada do endossatário mandatário, ele é quem responderá pela indenização. Já no
endosso caução a responsabilidade será do endossatário pignoratício, uma vez que ele
age em nome e em proveito próprio.

AÇÃO CAMBIAL
Os títulos de crédito constituem títulos executivos extrajudiciais e a ação cambial é a execução
por quantia certa contra devedor solvente. A doutrina divide essa ação em 2 tipos:
- ação direta: devedor principal; não precisa de protesto.
- ação de regresso: devedores indiretos; é essencial o protesto no prazo estipulado.

Essa ação cambial tem como sujeitos legítimos o credor (autor) e todos os devedores, a critério
do credor, que pode ajuizar ação contra um, contra alguns ou contra todos os devedores (art.
47, LUG). O foro competente é o local de pagamento. O valor da causa é o valor principal do
título acrescido de juros de mora, correção monetária e outros encargos previstos no título e
também as despesas do protesto.

O prazo prescricional dessa ação é de:


a) 3 anos contados do vencimento contra o devedor principal (aceitante e respectivos
avalistas) e
b) 1 ano contra os devedores indiretos (endossante/sacador) contados do protesto ou do
vencimento se houver a cláusula sem despesas (art. 70, LUG).

Há ainda o prazo do devedor que pagou para exercer o direito de regresso, que é de 6
meses.
Esses prazos estão sujeitos à interrupção da prescrição do art. 202, CC. Porém a
interrupção só vale para o devedor em relação a que foi feita a ação (art. 71, LUG).

É possível denunciação à lide e chamamento ao processo na ação cambial? Não cabe


denunciação em processo de execução. O chamamento (art. 77, III, CPC) também não cabe
porque o dispositivo fala em dívida comum e nos títulos de crédito a dívida é autônoma.

Se passar o prazo da ação cambial, tem-se ainda a ação de enriquecimento sem causa ou de
locupletamento ilícito. Essa ação não está na LUG e por isso vale o Dec. 2044, art. 48. Tem 4
pressupostos:
- não caber mais ação cambial, porque é uma ação subsidiária. O STJ tem relativizado esse
pressuposto (Resp 504503).
- enriquecimento sem causa do réu
- empobrecimento do autor
- nexo de causalidade entre eles.

Essa ação tem sua legitimidade: autor é o credor; réu pode ser o sacador ou o aceitante (o
endossante e o avalista não podem – Resp 200492). O foro competente é o domicilio do réu. O
autor prova os pressupostos acima apenas com a apresentação do título não pago (Resp
575027). O rito para essa ação pode ser ordinário e, dependendo do valor, pode ser sumário
ou sumaríssimo, mas o normal é o rito da ação monitória.

Essa ação prescreve (LC, NP e duplicata) em 3 anos contados da perda do direito de ajuizar a
ação cambial. O fundamento desse prazo é art. 70, LUG para Luis Emydio. Outros autores
como Fran Martins usam o fundamento do art. 206, §3°, IV, CC. É divergente esse fundamento
por causa da natureza jurídica dessa ação; quem entende que é ação cambiária segue a linha
de Luis Emydio e quem entende que é ação civil segue a linha do Fran Martins.

Para Fábio Ulhôa, um coobrigado cuja obrigação tenha se originado exclusivamente no título
de crédito, como é, em geral, o caso do avalista, após a prescrição da execução, não poderá,
em nenhuma hipótese, ser responsabilizado perante o credor da letra.

Se a obrigação que se encontrava representada pelo título de crédito tinha origem


extracambial, o seu devedor poderá ser demandado por ação de conhecimento própria, na qual
a letra servirá, apenas, como elemento probatório. Esta ação de conhecimento prescreverá de
acordo com a disposição de lei aplicável à espécie, e, inexistindo regra específica, de acordo
com o art. 205 do CC (prescreve em 10 anos).

Ação causal

É aquela que tem por base o negócio jurídico que deu origem ao próprio título ou que
permitiu a sua circulação, vale dizer, a causa de pedir dessa ação será o
descumprimento desse negócio jurídico. Embora ela tenha o mesmo objetivo da ação
cambial (receber o crédito), é certo que ela é uma ação autônoma.

Pressupostos:
a) subsistência da relação jurídica que deu origem ao título;
b) não pagamento;
c) devolução do título ao devedor.

Legitimidade:
Será definida pelo negócio subjacente, isto é, as partes do NJ é que terão legitimidade
para a ação.
Prescrição:
Irá depender do tipo de NJ que deu origem ao título.
Em todo caso, a prescrição irá se iniciar a partir do momento em que é possível exigir o
cumprimento da obrigação subjacente.

Procedimento:
Pode haver a cumulação da ação cambial e da ação causal. Nesse caso, o rito pode ser
executivo.
Caso não haja cumulação, resta para a ação causal o procedimento ordinário comum.
Além desses procedimentos, o autor pode optar pelo procedimento monitório.

NOTA PROMISSÓRIA
Está prevista na mesma legislação da letra de câmbio, por isso o regramento é praticamente o
mesmo. Serão abordadas a seguir apenas as diferenças do regime jurídico, como a
inexistência de aceite e de vencimento antecipado por recusa de aceite.

LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
Decreto n. 57.663/66 – Lei Uniforme de Genebra - e, excepcionalmente, o Decreto 2044/1908,
quanto às reservas e omissões da Lei Uniforme.

CONCEITO
É uma promessa de pagamento de certa quantia em dinheiro feita por escrito por uma pessoa
em favor de outra ou a sua ordem.

ELEMENTOS PESSOAIS
a) SACADOR, EMITENTE OU SUBSCRITOR – é aquele que promete pagar quantia
determinada. Quando emite a nota, já está se obrigando. É o devedor.
b) BENEFICIÁRIO OU SACADO- é aquele que se beneficia com a promessa. É o credor.

REQUISITOS DA NOTA PROMISSÓRIA


É título de modelo livre que deve conter: a denominação “nota promissória” inserta no próprio
texto do título; a promessa incondicional de pagar quantia determinada; o nome do beneficiário
da promessa; a data do saque; o local do saque ou a menção de um lugar ao lado do nome do
subscritor, que se considera também o domicílio deste; a assinatura do sacador, bem como a
sua identificação.

APLICAÇÃO DAS REGRAS DA LETRA DE CÂMBIO, SALVO:


O artigo 77, da LU estabelece que são aplicáveis às notas promissórias as mesmas
disposições relativas à letra de câmbio, com apenas quatro diferenças:
a) não há aceite na NP;
b) o emitente é o devedor principal, razão pela qual o protesto é facultativo para o
exercício de crédito contra ele;
c) como não há sacador, o aval em branco tem como avalizado o emitente; o avalista em
branco então é devedor principal;
d) não pode ter segunda via.

NP pode ter vencimento a certo termo da vista? Sim, mas é estranho porque não tem aceite.
Nesta hipótese, o credor deverá apresentar o título ao visto do emitente no prazo de 1 ano do
saque, sendo a data desse visto o termo a quo do lapso temporal do vencimento. A nota
promissória desta espécie pode ser protestada por falta de data.

NP vinculada a contrato:
Embora esteja vinculada a um contrato, a NP não perde a sua identidade, isto é, ela
continua a ser um TC, admitindo seus institutos típicos, como o endosso e o aval, e
especificamente mantém a condição de título executivo.
a) perde a abstração do título; b) endossatário, ainda que de boa-fé, fica sujeito a exceções
pessoais de que disponha o emitente com base no ajuste subjacente (REsp 238558/CE); c) se
o valor do título não corresponde ao contrato (mútuo) em que se vinculou, tem-se como
imprestável ao processo executório (validade: art. 889, CC); d) Para o STJ e TJDF, a nota
promissória vinculada a contrato de crédito carece de autonomia em razão da iliquidez do
título que a originou. (STJ- Súmula 258).

CHEQUE
O cheque é uma ordem de pagamento à vista, atualmente disciplinada pela Lei 7357/85. Quem
ordena o pagamento é o emitente ou devedor. A ordem é dirigida ao banco (instituição
financeira) que é o sacado e cumpre a ordem de pagamento. Aquele que recebe o cheque é o
beneficiário, o credor da importância. O banco não tem qualquer responsabilidade pelo
pagamento imediato de cheques pós-datados.

Foi elaborada, também na Convenção de Genebra, uma Lei Uniforme apenas para a disciplina
dos cheques, a qual foi inserida no ordenamento jurídico brasileiro através do Decreto nº
57.595, de 7 de janeiro de 1966.

O Brasil, todavia, posteriormente, editou sua própria lei sobre cheques – a Lei nº 7.357, de 2 de
setembro de 1985. Referida lei, no entanto, respeitou as normas da Lei Uniforme; seu escopo
foi apenas de assegurar uma redação mais condizente com as peculiaridades da legislação
interna e de melhor harmonizar certos dispositivos a outros existentes na praxe doméstica.

Tem por pressupostos: ser o sacado uma instituição financeira; haver um prévio contrato de
conta corrente entre o emitente e o sacado; e existir fundos disponíveis do emitente.

Alguns levantam dúvidas quanto à sua caracterização como título de crédito. O cheque – é
bem verdade – é um instrumento de pagamento, na sua forma mais simples. Todavia, ele
também toma a feição de título de crédito, quando se apresenta com endosso e aval, pondo-se
em circulação. Aplicam-se ao cheque, portanto, os institutos próprios aos títulos de crédito.
Para Fran Martins e Requião é um título impróprio.

Quanto aos cheques “pós-datados” (os chamados pré-datados), deve ser feita a seguinte
observação: o artigo 28 da Lei Uniforme determina que “o cheque apresentado a pagamento
antes do dia indicado como data de emissão é pagável no dia da apresentação”. A data futura,
ou a pré-data, é pela Lei Uniforme considerada como inexistente, e o beneficiário pode
apresentá-la imediatamente ao sacado. Assim, não havendo provisão, caracteriza-se o cheque
sem fundos. Ademais, a cláusula de pós-datação não é cláusula cambial e expressa apenas
uma obrigação civil de não-fazer.

Súmula 370 STJ –

“CARACTERIZA DANO MORAL A APRESENTAÇÃO ANTECIPADA DE


CHEQUE PRÉ-DATADO."

Desapossamento – o artigo 24 da Lei Uniforme esclarece que desapossado alguém de um


cheque, o novo portador legitimado não está obrigado a restituí-lo, se não o adquiriu de má-fé.
LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
Lei n°. 7.357/85 – Lei do Cheque.

CONCEITO
Ordem de pagamento, à vista, dada a um banco ou instituição assemelhada, por alguém que
tem fundos disponíveis no mesmo, em favor próprio ou de terceiro.

ELEMENTOS PESSOAIS
a) EMITENTE ou SACADOR – dá a ordem de pagamento. É o devedor principal.
b) SACADO – aquele que recebe a ordem de pagamento – o banco.
c) BENEFICIÁRIO ou TOMADOR– o favorecido da ordem de pagamento.

REQUISITOS
O cheque é título de modelo vinculado, cuja emissão só pode ser feita em documento
padronizado pelo banco sacado, e deve conter: a expressão “cheque” inserta no próprio texto
do título; a ordem incondicional de pagar quantia determinada; a identificação do banco
sacado; o local de pagamento ou a indicação de um ou mais lugares ao lado do nome do
sacado ou, ainda, a menção de um local ao lado do nome do emitente; a data da emissão; a
assinatura do sacador ou seu mandatário com poderes especiais, admitido o uso de chancela
mecânica ou processo equivalente. O local da emissão deve constar do título mas, na sua
ausência, entende-se como tendo sido o cheque emitido no local designado ao lado do nome
do sacador.

ACEITE, ENDOSSO E AVAL


O sacado de um cheque não tem, em nenhuma hipótese, qualquer obrigação cambial. O
sacado não garante o pagamento do cheque, nem pode garanti-lo, posto que a lei proíbe o
aceite do título (art. 6º da Lei 7357/85 – Lei do Cheque) bem como o endosso (art. 18,
parágrafo 1º) e o aval de sua parte (art. 29). A instituição financeira só responde pelo
descumprimento de algum dever legal, como o pagamento indevido de cheque, a falta de
reserva de numerário para liquidação no prazo de apresentação de cheque visado, o
pagamento de cheque cruzado diretamente ao portador não cliente, o pagamento em dinheiro
de cheque para se levar em conta etc. Ou seja, o banco responde por ato ilícito que venha a
praticar, mas não pode assumir qualquer obrigação cambial referente a cheques sacados por
seus correntistas.

O ordenamento jurídico brasileiro não admite o cheque marcado, uma vez que é vedado o
aceite pelo banco sacado.

O cheque de valor superior a R$ 100,00 (cem reais) deve adotar, necessariamente, a forma
nominativa e pode conter a cláusula “à ordem” ou a cláusula “não à ordem”. A sua circulação,
portanto, segue o regramento da circulação da LC. Salientem-se, no entanto, três diferenças
em relação a tal disciplina: a) não se admite o endosso-caução, em razão da natureza do
cheque de ordem de pagamento à vista; b) o endosso feito pelo sacado é nulo como endosso,
valendo apenas como quitação, salvo se o sacado tiver mais de um estabelecimento e o
endosso feito por um deles em cheque a ser pago por outro estabelecimento; c) o endosso
feito após o prazo para apresentação é tardio, e por isso, gera os efeitos de cessão civil de
crédito.
Nos termos da Lei 9311/96, o cheque só pode ter um endosso (a razão era a cobrança do
CPMF, que não existe mais desde 31 de dezembro de 2007 – ADCT – art. 90 e, por isso, não
há mais esse limite do número de endossos no cheque.
No tocante ao aval, a lei estabelece que o aval em branco favorece o sacador; além disso,
proíbe-se o aval por parte do sacado. No mais, aplica-se o mesmo regime reservado ao aval
da LC.

TIPOS DE CHEQUE
a) Cheque Cruzado – Recebe na frente (anverso) dois traços paralelos e transversais. O
cruzamento do cheque faz com que ele só possa ser pago a um banco, para tanto deverá ser
depositado em uma conta. Há cruzamento em branco (quando não se indica em que banco
deve ser depositado) e em preto (quando, entre os traços, é feita indicação do banco em que
deve ser depositado). Destina-se a possibilitar, a qualquer tempo, a identificação da pessoa em
favor de quem foi liquidado.

b) Cheque Para Ser Levado Em Conta – Quando o emitente proíbe o pagamento do título em
dinheiro, exigindo que seja depositado em conta. Tem o mesmo objetivo do cheque cruzado.

c) Cheque Administrativo – É sacado pelo banco contra um de seus estabelecimentos. Há


identificação do sacado e do sacador. Será necessariamente nominal. Tem como exemplo o
cheque de viajante (traveller’s check).

d) Cheque de viagem: representa um instrumento de troca de moeda, isto é, são cheques que
podem ser sacados em estabelecimentos no exterior, quando o emitente estiver em viagem.

d) Cheque Visado – Aquele em que o banco sacado lança declaração de suficiência de fundos
a pedido do emitente ou do portador legitimado. O visto não equivale a aceite e o banco
sacado deve reservar quantia equivalente ao valor do cheque, em beneficio do credor, durante
o prazo de apresentação.

e) CHEQUE PÓS –DATADO: Cheque pós-datado é aquele em que se combina a


apresentação futura do cheque. O art. 32 diz que o cheque é um pagamento à vista e não se
considera nada que estiver escrito em contrário. É lícito porque esse artigo é dirigido ao banco
e não às partes. A natureza jurídica desse cheque é de contrato, onde as partes fazem um
acordo com uma obrigação de não fazer, de não apresentar o cheque antes da data
combinada. Qualquer meio de prova é admissível. Se o beneficiário apresentar o cheque antes
da data combinada, ele descumpre o contrato e responde por perdas e danos, mas estas
devem ser demonstradas. Se o cheque for devolvido, a simples devolução do cheque já
representa o dano moral (Resp 707272). Se o cheque é apresentado antecipadamente por um
endossatário, que não foi parte do contrato, o endossante responde sempre pela apresentação
antecipada, porque foi ele quem fez o contrato. O terceiro que recebe o cheque e sabia dessa
pós-datação, responde por culpa extracontratual se apresentar o cheque antecipadamente.

O STJ entende que a pós-datação, de qualquer forma, amplia o prazo de apresentação e


consequentemente o prazo de prescrição (Resp 620218). A conseqüência penal (art. 171,
parg.2, VI, CP) da emissão de cheque sem fundos exige um dolo especifico de emitir um
cheque à vista e não um pós-datado sem provisão de fundos; se emite o pós-datado, não pode
configurar esse tipo penal porque seria uma garantia de dívida e não um forma de pagamento
(RHC 13793/STJ – Min. Laurita Vaz). Nada impede que se configure o tipo do estelionato do
caput, mas o tipo qualificado do § 2° não pode configurar.

f) Outros: Cheque Fiscal - relativo a devolução de tributos do Governo para o contribuinte;


Cheque Postal - exceção à regra de que somente bancos podem emitir cheques. É possível,
pela ECT, art. 66.
PRAZO PARA APRESENTAÇÃO DO CHEQUE
Não é o prazo prescricional do cheque, é prazo para apresentação e visa garantir o direito de
regresso em relação ao coobrigados: 30 dias da emissão, se da mesma praça; 60 dias da
emissão, se de praças diversas.

A não apresentação do cheque no prazo de apresentação acarreta a perda do direito de


regresso contra os endossantes e seus avalistas (continua podendo cobrar do emitente);
e a perda do direito de cobrar do emitente, se havia fundos durante o prazo de
apresentação e eles deixaram de existir após o término deste prazo, por culpa não
imputável ao correntista (como, por exemplo, a falência do banco ou o confisco
governamental).

Mesmo que passe o prazo de apresentação, o banco deve pagar o cheque. Porém, não
pode ter passado o prazo para execução (art. 59 – 6 meses contados da expiração do prazo
para apresentação - 30 ou 60 dias – e conta-se sem ou com apresentação) – posição
majoritária.

Se o cheque for devolvido sem provisão de fundos, reapresentado e devolvido pela segunda
vez, o banco pode encerrar a conta e mandar o nome do cliente para um cadastro do Banco
Central (CCF). No cheque não se admite os juros remuneratórios. Os juros moratórios são
admitidos sem problema.

O protesto é facultativo, uma vez que a apresentação pode ser provada por declaração do
banco sacado, escrita e datada, com indicação do dia de apresentação (carimbo de devolução
do cheque). No cheque só há o protesto por falta de pagamento.

Pedido de falência: é obrigatório o protesto especial para fins de falência, mesmo com a
declaração de devolução do sacado (Não se confundem os protestos) (art 11).

SUSTAÇÃO DO CHEQUE
Objetiva impedir a liquidação do cheque pelo banco sacado.

Revogação ou Contra-ordem – Ato exclusivo do emitente e que deve ser motivado. Esta
modalidade de sustação do pagamento gera efeitos apenas após o término do prazo de
apresentação e, evidentemente, caso o cheque não tenha sido, ainda, liquidado. Equivale a
ato cambial que limita ao prazo de apresentação previsto em lei a eficácia do cheque como
ordem de pagamento à vista;

Oposição – Pode ser praticado pelo emitente ou portador legitimado do cheque, mediante
aviso escrito, fundado em relevante razão de direito (extravio ou roubo do título, falência do
credor etc). Produz efeitos a partir da cientificação do banco sacado desde que anterior à
liquidação do título. Não cabe ao banco julgar a relevância da razão invocada para a oposição.

A sustação, seja por revogação, seja por oposição, pode configurar crime de fraude no
pagamento por cheque, nos termos do art. 171, parágrafo 2º do CP, se o emitente ou o
portador presumivelmente legitimado agirem dolosa e fraudulentamente, provocando dano ao
portador do cheque.

PAGAMENTO, PRESCRIÇÃO E AÇÕES CABÍVEIS


O pagamento feito por cheque tem efeito pro solvendo, ou seja, até a sua liquidação, não
se extingue a obrigação a que se refere.
As partes, no entanto, podem pactuar que o pgto de determinada obrigação por cheque tenha
efeito pro soluto, hipótese em que restará ao credor da obrigação apenas um direito cambial no
caso de o cheque não ser liquidado por insuficiência de fundos.

A execução do cheque sem fundos prescreve, contra qualquer devedor, no prazo de 6 meses,
contados do término do prazo de apresentação a pagamento.O direito de regresso de um
coobrigado contra outro, contra o devedor principal ou seu avalista prescreve em 6 meses
contados do pagamento ou da distribuição da execução judicial contra ele.

Se se tratar de cheque pós-datado, apresentado antes da data lançada como emissão, para
fins de cálculo do prazo prescricional, considera-se como data de emissão do título não a que
nele consta, mas a da sua apresentação a pagamento. Computam-se então 30 ou 60 dias,
conforme seja cheque da mesma ou de praças diferentes e, em seguida, os 6 meses.

Após o decurso do prazo prescricional do cheque, será admissível ação com base no
locupletamento sem causa, no prazo de 2 anos. Embora se cuide de ação de conhecimento, é
ainda de fundamento cambial. Qualquer coobrigado cambial que se locupletou indevidamente
em função da prescrição do cheque pode ser responsabilizado.

Normalmente usa o rito da ação monitória – Súmula 299/STJ. Não precisa narrar a causa-
debendi (origem) do cheque, basta apenas apresentar o cheque – Resp 575027. O prazo
prescricional dessa ação é de 2 anos (regra especial). Como a redação do art. 61 é genérica,
em tese essa ação pode ser contra o emitente e o endossante. A princípio, contra o avalista
não pode porque não gerou enriquecimento ilícito, já que ser avalista é ato gratuito.

Prescrita a ação de enriquecimento ilícito, nenhuma outra ação será possível com base no
título de crédito. Poderá, no entanto, o credor por obrigação que, embora representada por um
cheque, seja de origem extracambiária promover a ação correspondente a seu título, que
prescreverá no prazo que a lei específica estabelecer ou nos termos do art. 205 do CC (10
anos). É a chamada ação causal. A própria Lei do Cheque possibilita esse entendimento ao
dispor, no seu art. 62, que, salvo prova de novação, a emissão ou transferência do cheque não
exclui a ação fundada na relação causal, feita a prova do não-pagamento.
Na ação causal é essencial a narrativa da causa debendi. Tal afirmação é indiscutível
quando forem usados os ritos ordinário, sumário ou do juizado especial. Todavia,
usando-se o procedimento monitório, o STJ firmou a orientação no sentido de que
também não seria necessária a narrativa da causa debendi na ação causal.
Para o STJ, no rito da monitória, há uma técnica de inversão do contraditório, o que
dispensaria o autor de narrar a causa debendi do cheque. Se o réu quiser ele é quem
deveria trazer a causa para discussão. Não se afastaria a discussão, mas dependeria da
intervenção do réu na ação. Tal orientação é seguida em alguns julgados do TJDF.
Na execução do cheque sem fundos o credor terá direito à importância do título acrescida de
juros legais a partir da apresentação a pagamento, despesas com protesto, avisos e outras e
correção monetária prevista no art. 52, IV, da Lei do Cheque.

ASPECTOS CRIMINAIS
Fraude no pagamento por meio de cheque (art. 171, §2°, VI, CP):
- o cheque é do emitente
- a consumação ocorre com a recusa do pagamento
- o foro competente é o do local onde se deu a recusa do pagamento pelo sacado (Súmula 521
STF)
- se o pagamento ocorre antes do recebimento da denúncia, a pena será reduzida de um a dois
terços, em face do arrependimento posterior (art. 16 do CP, após reforma de 1984)
- antes da reforma não existia tal instituto e nos termos da Súmula 554 do STF, o pagamento
efetuado antes do recebimento da denúncia retirava a justa causa para a ação penal (554 - O
pagamento de cheque emitido sem provisão de fundos, após o recebimento da denúncia, não
obsta ao prosseguimento da ação penal. (D. Pen .)
Prevalece o entendimento que a Súmuls 554 do STF permanece vigente, em razão do seu
caráter especial. Assim o pagamento antes do recebimento da denúncia retira a justa causa
para a ação penal.

Estelionato comum mediante falsificação de cheque (art. 171, “caput”):


- o cheque não é do emitente
- a consumação ocorre no momento em que o agente obtém a vantagem ilícita
- compete ao juízo do local da obtenção da vantagem ilícita processar e julgar (Súmula 48 STJ)

Teoria geral da falência. Evolução do Direito Falimentar. Princípio da preservação da empresa.


Crise da empresa. Lei nº 11.101/2005.
PROCESSO PENAL - Inquérito Policial – Polícia Judiciária – Investigações Criminais
Presididas pelo Ministério Público – Modelos de investigação criminal, poderes e
deveres investigatórios (FALTA A PARTE EM AMARELO) – Prisão em Flagrante – Analogia
– Processo Penal Militar.

PONTO 1 – ITEM “INQUÉRITO POLICIAL”:


1 NOÇÕES GERAIS
É melhor tratar como INVESTIGAÇÃO PRELIMINAR, porque não se trata mais de somente
inquérito.
1. Persecução penal: é a atividade que consiste em investigar, processar, comprovar e julgar
uma infração penal.
2. Fases: (a) investigação preliminar (artigo 144, CF/88 = atribui à autoridade policial a
presidência da investigação preliminar); (b) ação penal (processo).

Fase pré-processual
(INQUÉRITO)
PERSECUÇÃO CRIMINAL
Fase processual (EM JUÍZO)

Nova Lei sobre Inquérito Policial:


LEI Nº 12.830, DE 20 DE JUNHO DE 2013.
Dispõe sobre a investigação criminal conduzida
Mensagem de veto
pelo delegado de polícia.
A PRESIDENTA DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu
sanciono a seguinte Lei:
Art. 1o Esta Lei dispõe sobre a investigação criminal conduzida pelo delegado de
polícia.
Art. 2o As funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais exercidas pelo
delegado de polícia são de natureza jurídica, essenciais e exclusivas de Estado.
§ 1o Ao delegado de polícia, na qualidade de autoridade policial, cabe a condução da
investigação criminal por meio de inquérito policial ou outro procedimento previsto em lei, que
tem como objetivo a apuração das circunstâncias, da materialidade e da autoria das infrações
penais.
§ 2o Durante a investigação criminal, cabe ao delegado de polícia a requisição de
perícia, informações, documentos e dados que interessem à apuração dos fatos.
§ 3o (VETADO).
§ 4o O inquérito policial ou outro procedimento previsto em lei em curso somente
poderá ser avocado ou redistribuído por superior hierárquico, mediante despacho
fundamentado, por motivo de interesse público ou nas hipóteses de inobservância dos
procedimentos previstos em regulamento da corporação que prejudique a eficácia da
investigação.
§ 5o A remoção do delegado de polícia dar-se-á somente por ato fundamentado.
§ 6o O indiciamento, privativo do delegado de polícia, dar-se-á por ato fundamentado,
mediante análise técnico-jurídica do fato, que deverá indicar a autoria, materialidade e suas
circunstâncias.
Art. 3o O cargo de delegado de polícia é privativo de bacharel em Direito, devendo-lhe
ser dispensado o mesmo tratamento protocolar que recebem os magistrados, os membros da
Defensoria Pública e do Ministério Público e os advogados.
Art. 4o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 20 de junho de 2013; 192o da Independência e 125o da República

2 INVESTIGAÇÃO PRELIMINAR
2.1 QUEM PROMOVE
2.1.1 POLÍCIA JUDICIÁRIA
Em regra é a polícia judiciária (CPP, art. 4º). A investigação, portanto, no Brasil, em princípio, é
policial. Mas outras autoridades podem também investigar delitos (CPP, art. 4º, parágrafo
único). Por exemplo: CPIs, Inquérito Policial Militar (nos crimes militares), autoridades
administrativas (procedimentos administrativos), Coaf (lavagem de capitais), Banco Central
(nos crimes financeiros), MP, etc.
2.1.2 OUTRAS AUTORIDADES
Há outros inquéritos presididos por outras autoridades? Sim:
(a) inquérito contra membros do ministério público (quem preside é o PGJ - LONMP: Lei
8.625/93, art. 41, parágrafo único);
(b) contra juiz de direito (quem preside é o Desembargador sorteado – LOMN: Lei
Complementar 35/79, art. 33, parágrafo único);
(c) contra autoridade que goza de prerrogativa de função (parlamentares, Ministros etc.) um
Magistrado da Corte competente etc.. Exemplo: Investigação contra Deputado Federal:
quem preside é Ministro do STF; investigação contra Desembargador: quem preside é
Ministro do STJ e assim por diante;
(d) autoridades administrativas.
No que concerne à alínea c, tem-se que observar o seguinte. Na verdade, o Ministro/Relator
não preside o IP. Pelo contrário, o IP é presidido pelo próprio delegado. O que ocorre é que o
STF, ou STJ, ou TJ, a depender do caso, passa a ser o Órgão Jurisdicional perante o qual tem
tramitação o procedimento investigativo. Nesse sentido, os seguintes julgados:

2.1.3 INVESTIGAÇÀO PRELIMINAR FEITA PELO MP


Investigação preliminar feita pelo Ministério Público vale?
(a) as leis vigentes não prevêem expressamente essa possibilidade (de presidir investigação
criminal). Pode o MP presidir investigação ou inquérito civil, isto não apresenta dúvida. A
questão é no âmbito criminal.
(b) Posição do STJ: Sim, pode (vide HC’s 55.500 – 5ª Turma e 43.030/DF – 6ª Turma).
Nessas ementas, o STJ é expresso no sentido de que o MP pode investigar criminalmente,
inclusive colhendo depoimentos. O que lhe é vedado é a atribuição para presidir inquéritos
policiais, posto serem privativos das autoridades policiais.
(c) Posição do TRF5: Encontrei apenas um julgado da 5ª Turma (HC 2004.05.00.039262-1),
de relatoria do Des. Fed. Marcelo Navarro, do ano 2005, acompanhando o STJ, no sentido da
possibilidade da investigação criminal. Não achei outros julgados.
(d) Posição do STF: Já julgou. O MP pode investigar: Existe previsão constitucional para que o
Ministério Público (MP) possa presidir investigação criminal: essa foi a decisão unânime da
Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), em julgamento realizado no dia 10.03.09,
na análise do Habeas Corpus (HC) 91.661 , referente a uma ação penal instaurada a pedido do
MP, na qual os réus são policiais acusados de imputar a outra pessoa uma contravenção ou
crime mesmo sabendo que a acusação era falsa.
De acordo com a ministra Ellen Gracie, relatora do Habeas Corpus, é perfeitamente possível
que o Ministério Público promova a coleta de determinados elementos de prova que
demonstrem a existência da autoria e materialidade de determinado delito. "Essa conclusão
não significa retirar da polícia judiciária as atribuições previstas constitucionalmente", afirmou
Ellen Gracie ao site do STF.

O MP pode investigar os crimes cometidos no caso do ECA.


Art. 201. Compete ao Ministério Público:
VII - instaurar sindicâncias, requisitar diligências investigatórias e determinar a
instauração de inquérito policial, para apuração de ilícitos ou infrações às normas de
proteção à infância e à juventude;
§ 4º O representante do Ministério Público será responsável pelo uso indevido das
informações e documentos que requisitar, nas hipóteses legais de sigilo.

O MP pode investigar os crimes cometidos no caso do Estatuto do Idoso.


Art. 74. Compete ao Ministério Público:
VI – instaurar sindicâncias, requisitar diligências investigatórias e a instauração de
inquérito policial, para a apuração de ilícitos ou infrações às normas de proteção ao
idoso

MP que investiga ou que acompanha a fase preliminar está impedido de oferecer


denúncia? Não (Súmula 234 STJ). Pode oferecer denúncia e aparecer no pólo ativo da
ação penal? Sim.
STJ Súmula nº 234. A participação de membro do Ministério Público na fase
investigatória criminal não acarreta o seu impedimento ou suspeição para o
oferecimento da denúncia.

2.1.4 INVESTIGAÇÃO PARTICULAR


Investigação particular é válida? Sim. Uma vez concluída, tudo deve ser enviado à polícia ou
ao MP.

2.1.5 JUIZ E A INVESTIGAÇÃO


Juiz pode presidir investigação preliminar? O juiz de direito, em regra, não investiga, mas,
em 02 hipóteses o juiz brasileiro continua investigando:
a) investigação de crime praticado por juiz;
b) investigação de crime praticado por quem tenha prerrogativa de função (este é o
posicionamento expressado originalmente no resumo, entretanto, como já explicado
acima, nesses casos de prerrogativa de função – afora membros do MP e magistrados,
o IP apenas tramita no Tribunal competente – ao invés de tramitar perante uma vara
criminal de primeira instância, tramita no Tribunal, para fins de medidas cautelares,
controle de prazos etc -, mas a investigação em si permanece com o delegado.
Essas outras autoridades produzem peças de investigação ou peças de informação, que
não é um inquérito policial.
Antes da nova lei de Falência, o juiz poderia investigar no caso de crime falimentar (o inquérito,
nesse caso, é judicial). Isso é anômalo e constitucionalmente discutível. De qualquer modo, o
juiz que preside o inquérito judicial jamais poderia atuar na fase judicial. Entretanto, isso mudou
com a nova lei falimentar (Lei n. 11101/05). Agora o inquérito para apuração de crimes
falimentares é policial (art. 187). É de se observar, porém, que a nova lei não se aplica aos
processos de falência ou concordata ajuizados anteriormente ao início de sua vigência, que
serão concluídos nos termos da legislação anterior, artigo 192. O juiz não mais preside o IP.
No que concerne ao crime organizado temos o seguinte: o art. 3º, da Lei 9.034/95, permitia ao
juiz de direito ampla investigação, nos casos do art. 2º, III, da mesma lei. Esse dispositivo dizia
que é permitido “o acesso a dados, documentos e informações fiscais, bancárias, financeiras e
eleitorais”.
Como se vê, regulava quatro situações: (a) dados documentos e informações fiscais, (b)
bancárias, (c) financeiras e (d) eleitorais.
Duas delas foram objeto da Lei Complementar 105/01 (Dispõe sobre o sigilo das operações de
instituições financeiras e dá outras providências): dados bancários e financeiros. Logo,
nessa parte, hoje rege a citada Lei Complementar, que redisciplinou a matéria totalmente
(revogando o art. 2º, III, por incompatibilidade).
Do art. 2º, inc. III, restavam apenas duas outras hipóteses: dados fiscais e eleitorais. Esse
específico ponto é que foi objeto da decisão do STF, de 12.02.04, na ADI 1570. Posição do
STF: julgou inconstitucional o art. 3º da Lei 9.034/90, no que se refere aos sigilos fiscais
e eleitorais.
Conclusão: o art. 3º da Lei 9.034/90 perdeu sentido e eficácia jurídica. Não tem validade.
Nenhum juiz pode mais investigar o crime organizado no Brasil. Não tem amparo legal e
constitucional essa atividade. Numa parte o art. 3º foi afetado pela Lei Complementar 105/01
(dados bancários e financeiros). Noutra (dados fiscais e eleitorais) perdeu eficácia em razão da
decisão do STF (inconstitucionalidade).
Interessa sublinhar que quando do julgamento liminar na ADI 1517 (interposta pela Adepol –
Associação dos Delegados de Polícia), Maurício Corrêa, como relator, indeferiu o pedido,
entendendo não haver ofensa à Constituição. Cinco anos depois seu pensamento modificou-se
radicalmente:
“O art. 3º criou um procedimento excepcional, não contemplado na sistemática
processual penal contemporânea, dado que permite ao juiz colher pessoalmente provas
que poderão servir, mais tarde, como fundamento fático-jurídico de sua própria decisão”
... “Ninguém pode negar que o magistrado, pelo simples fato de ser humano, após
realizar pessoalmente as diligências, fique envolvido psicologicamente com a causa,
contaminando sua imparcialidade” ... “A neutralidade do juiz é essencial, pois sem ela
nenhum cidadão procuraria o Poder Judiciário para fazer valer seu direito” ... “Passados
mais de cinco anos do julgamento cautelar, e após refletir mais detidamente sobre o
tema, agora tratando-se de julgamento definitivo, penso que, efetivamente, o dispositivo
atacado não pode prevalecer diante das normas constitucionais vigentes”.
A decisão de parcial inconstitucionalidade do art. 3º da Lei 9.034/90 foi tomada na ADI 1570
por maioria de votos (o voto vencido isolado foi do Min. Carlos Velloso). Essa ADI foi ajuizada
pela Procuradoria Geral da República, que alegou que o referido dispositivo tinha transformado
o juiz brasileiro em juiz investigador, concedendo-lhe poderes inquisitoriais, o que não condiz
com o princípio do devido processo legal, além de comprometer sua imparcialidade. O sistema
inquisitorial, enfatizou-se, é abominado pela CF. Enfim, o simulacro de Juizado de Instrução
(que prevê a possibilidade de um juiz investigar os crime) contemplado no art. 3º da Lei
do Crime Organizado (Lei 9.034/90) está definitivamente sepultado.

2.2 JUIZADO DE INSTRUÇÃO


Existe juizado de instrução no Brasil? Não. Juizado de instrução significa que um juiz de
direito pode presidir a investigação, de modo sistêmico. Isso não existe no Brasil.
CONCURSO: no Brasil, não existe processo judicialiforme, mas já existiu até 1988, que
consistia no processo INICIADO por juiz (lesão culposa e homicídio culposo). Agora, não é
mais possível porque o titular da ação é o MP e por força do princípio acusatório.
2.3 DISTINÇÃO ENTRE POLÍCIA JUDICIÁRIA E POLÍCIA DE SEGURANÇA
Diferença entre polícia judiciária e polícia de segurança(ou ostensiva ou preventiva): a
primeira atua (em regra) depois de cometido o delito; a segunda atua preventivamente (em
regra).
Qual é a natureza jurídica da polícia judiciária? É auxiliar da Justiça (CPP, art. 13).
Qual é a natureza da polícia rodoviária federal (CF, art. 144, § 2º), da polícia ferroviária federal
(CF, art. 144, § 3º) e da guarda civil metropolitana (CF, art. 144, § 8º)? São polícias de
segurança.
Quem exerce a função de polícia judiciária no Brasil? Polícia civil, polícia federal e polícia
militar (apuração só de crimes militares).
Como regra o poder de investigação é da autoridade policial, polícia judiciária, que pode ser
dividida em:
a) polícia civil
b) polícia federal (Lei 10.446/02 que ampliou a competência)
c) polícia militar nos crimes militares

2.3.1 ATRIBUIÇÕES DA POLÍCIA JUDICIÁRIA


Divisão das atribuições da polícia judiciária (critérios):
(a) territorial: cada Distrito Policial tem seu âmbito de atuação (tem sua circunscrição)
(CPP, art. 4º);
(b) em razão da matéria: há delegacia de crimes contra o patrimônio, de seqüestro, de
homicídio etc.;
(c) em razão da pessoa: delegacia da mulher etc..
E se inobservados esses critérios? Nenhuma nulidade existe. É mera irregularidade (cf. art.
22 do CPP; RTJ 82, p. 118; RT 531, p. 364).
2.3.2 CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE POLÍCIAL
Controle externo da atividade policial: é possível? Sim. Quem faz esse controle externo?
Ministério Público (CF, art. 129, VII). Depende de regulamentação complementar? Sim. Em
alguns Estados essa regulamentação já existe: São Paulo, por exemplo (e o STF já decidiu que
isso é constitucional). Mas de qualquer modo o controle externo tem sido pouco atuante.

2.3.3 INVESTIGAÇÃO PRELIMINAR


Como é feita a investigação preliminar pela polícia judiciária? Por meio de inquérito
policial ou por meio de termo circunstanciado (nos casos de infração de menor potencial
ofensivo).
O IP é dispensável, já que o MP e o querelante podem, por meio de peças de informação,
ajuizar a ação penal competente.

3 INQUÉRITO POLICIAL
3.1 CONCEITO E FINALIDADE
É o conjunto de diligências que visa à apuração do fato punível e de sua autoria, ou seja, é o
procedimento administrativo, meramente informativo destinado a apurar a autoria e a
materialidade de uma infração penal.
Finalidade do inquérito policial: apuração do fato punível e sua autoria, ou seja, preparar a
ação penal para o oferecimento da inicial, fornecendo ao titular do direito de ação de elementos
para a instrução da inicial e para formar o convencimento do titular da ação penal (opinio
delicti). Nos termos do art. 12, do CPP (“O inquérito policial acompanhará a denúncia ou
queixa, sempre que servir de base a uma ou outra”) destina-se o IP a servir de base para a
futura ação penal (pública ou privada).
EXCEÇÃO: INQUÉRITO POLICIAL PARA EXPULSÃO DO ESTRANGEIRO não tem por
finalidade apurar uma infração penal (artigo 70, Lei 6815/80 – Estatuto do Estrangeiro), sua
finalidade é permitir a expulsão do estrangeiro, para tanto tem que ser garantido o
CONTRADITÓRIO.

3.2 QUEM PRESIDE


Quem preside o inquérito policial? É a autoridade policial. Que se entende por autoridade
policial? É a de carreira, mas também há autoridades nomeadas (sem concurso público - em
alguns Estados a polícia judiciária ainda não está totalmente estruturada por concurso público).
No artigo 4º, CPP, fala-se em (competência) jurisdição, mas o correto é (atribuição)
circunscrição. As regras de competência não são relevantes no IP. A circunscrição da
autoridade policial é a do local do crime, mas se for desrespeitada, é uma mera irregularidade
que não traz conseqüências à ação penal, por tratar-se de mero procedimento administrativo
informativo.

3.3 CARACTERÍSTICAS DO IP
Pré-processual, preparatório, informativo e meio de realização do conjunto de
diligências investigatórias, tem como destinatários imediatos o MP e o ofendido, e como
destinatário mediato o juiz.
3.3.1 PEÇA INFORMATIVA / ADMINISTRATIVA
É peça meramente informativa, isto é, administrativa: seus vícios, portanto, não afetam a
ação penal futura. Inquérito presidido por autoridade policial, com vícios: não anula a ação
penal superveniente. Isso não se confunde com a situação anômala de a investigação ser
totalmente inválida, como reconheceu o STF (Segunda Turma), em caso em que o MP presidiu
a investigação. Mas se a investigação for inteiramente inválida, não vale nada, daí se não
sobra nada da investigação, também não tem ação. O STF entendeu assim, no julgamento do
poder de investigação do MP que tinha como investigado um delegado de polícia. OBS.: Li o
inteiro teor do RHC 81326 - relator o Min. Jobim, e ali não se falou de ação penal a ser
anulada; apenas se anulou o procedimento investigativo em curso no MPDFT, porque o MP
não teria “legitimidade” (palavra do Ministro) para investigar delegado de polícia civil.

3.3.3 DISPENSABILIDADE
É dispensável: sim (arts. 12, 27, 39, § 5º e § 1º do art. 46 do CPP). (cf. RTJ 76, p. 741). O MP,
se conta com documentos suficientes, pode ingressar com ação penal diretamente.
Facultativo e disponível para o MP – somente as peças de informação são capazes de
instruir a ação penal, não sendo necessário o IP. EXEMPLO: nos crimes financeiros objeto de
apuração no BACEN, já vem tudo pronto, não precisa de inquérito. Se o inquérito é
dispensado, não há indiciamento. O que sempre será necessário é a JUSTA CAUSA
(suporte probatório mínimo da autoria e da materialidade) (condição da ação). As peças de
informação também estão submetidas ao procedimento do artigo 28, CPP. EXCEÇÃO:
inquérito indispensável (não policiais): expulsão de estrangeiro.
3.3.4 ESCRITO
É peça escrita(Art. 9º do CPP): Não existe IP oral nem mesmo o termo circunstanciado.
3.3.5 SIGILOSO
É sigiloso(Art. 20 do CPP): sim. O sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo
interesse da sociedade (o sigilo é no interesse da sociedade e da investigação). Em regra, o IP
é sigiloso, diferentemente de uma audiência, por exemplo. O delegado de polícia pode
assegurar o sigilo de parte da investigação, deixando a outra parte pública, bem como poderá
verificar o momento; mas, sempre, nas investigações de natureza propriamente sigilosa, não
haverá publicidade.

Mas o sigilo não vale:


(a) para o juiz do caso (a quem foi distribuído o IP);
(b) para o ministério público do caso; essa regra é intuitiva, decorre diretamente da
natureza do próprio inquérito, entretanto, mesmo assim, no artigo 26, IV, da Lei
8625/93, diz expressamente que o sigilo da investigação criminal não pode ser
oposto ao MP.
(c) para o advogado (Estatuto da Advocacia, Lei 8.906/94, art. 7º, XIII a XV e §
1º)? O texto a 14ª Súmula Vinculante diz o seguinte: "É direito do defensor,
no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova
que, já documentados em procedimento investigatório realizado por
órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício
do direito de defesa".

EXCEÇÃO: o sigilo da lei de tóxicos (artigo 26) é concebido no interesse do investigado (a


lei 6368 continua em vigor nesse aspecto, porque daí resulta a prática de crime; há corrente
que entende que a lei foi revogada). OBS.: Não achei dispositivo semelhante na Nova Lei
11.343/06; também procurei na Lei 10.409/02 e nada achei.

3.3.5.1 Incomunicabilidade do preso


Outra questão tormentosa é a incomunicabilidade do preso prevista no artigo 21, CPP, que
permite a decretação pelo juiz. Ela é uma medida de natureza cautelar e permite que o Juiz a
decrete pelo prazo de 03 dias. Entretanto, a polêmica gira em torno de se saber se a CF
recepcionou ou não o citado artigo (há corrente nos dois sentidos: recepção ou não
recepção).
NÃO RECEPÇÃO DO ARTIGO:
I – em decorrência do Artigo 5o. CF/88, que garante a presença de advogado em caso de
prisão em flagrante (Mirabete argumenta que na CF/88 está garantido o acesso do preso à
sua família e ao seu advogado);
II – em decorrência do artigo 136, § 3o., IV, CF/88, que veda a incomunicabilidade no Estado
de anormalidade (Estado de Defesa e Estado de Sítio), assim, muito menos, o será possível
em situação de normalidade. A posição dominante é a que entende que o artigo 21 não foi
recepcionado. DEMERCIAN acredita que não há posição dominante. LFG afirma que é essa a
posição dominante.
RECEPÇÃO DO ARTIGO: fundamentam-se no próprio artigo 136, dizendo que veda a
incomunicabilidade somente no estado de defesa, por se tratar de um período de exceção, a
incomunicabilidade poderia impedir que a autoridade competente tomasse conhecimento dos
abusos possivelmente cometidos, ou seja, alegam que o dispositivo constitucional trata das
situações de presos políticos em caso de estado de anormalidade (DAMÁSIO). LFG afirma
que essa posição é ultrapassada.
Independentemente da posição adotada, a incomunicabilidade não se estende ao
advogado, de acordo com a própria sistemática do Código de Processo Penal (art. 21, par.
Único, parte final) e art. 7º, III, do EOAB.

3.3.5.2 Regime Disciplina Diferenciado – RDD


O RDD (Regime Disciplinar Diferenciado) torna o réu incomunicável? O RDD permite a
visita de 02 pessoas por 02 horas durante o período de 01 semana, assim, o réu não está
incomunicável, somente existe uma restrição de horário. Note-se que não há imposição dessa
restrição ao advogado, bastando que ele marque um horário. (SOBRE RDD VER RESUMO DE
EXECUÇÕES PENAIS).
Art. 52 - A prática de fato previsto como crime doloso constitui falta grave e, quando
ocasione subversão da ordem ou disciplina internas, sujeita o preso provisório, ou
condenado, sem prejuízo da sanção penal, ao regime disciplinar diferenciado, com as
seguintes características:
I - duração máxima de trezentos e sessenta dias, sem prejuízo de repetição da sanção
por nova falta grave de mesma espécie, até o limite de um sexto da pena aplicada;
II - recolhimento em cela individual;
III - visitas semanais de duas pessoas, sem contar as crianças, com duração de duas
horas;
IV - o preso terá direito à saída da cela por 2 horas diárias para banho de sol.
§ 1º O regime disciplinar diferenciado também poderá abrigar presos provisórios ou
condenados, nacionais ou estrangeiros, que apresentem alto risco para a ordem e a
segurança do estabelecimento penal ou da sociedade.
§ 2º Estará igualmente sujeito ao regime disciplinar diferenciado o preso provisório ou o
condenado sob o qual recaiam fundadas suspeitas de envolvimento ou participação, a
qualquer título, em organizações criminosas, quadrilha ou bando.
3.3.6 INQUISITIVO
É inquisitivo: não há contraditório no IP. Não há contraditório, porque não há litigantes e nem
acusados, trata-se de mero procedimento administrativo de investigação. No inquérito, não há
acusação formal, não decorre dele nenhuma espécie de sanção, esse é um ponto distintivo
entre o IP e outros procedimentos administrativos.
Normalmente, a doutrina e o STF alegam que não há contraditório no IP por se tratar de um
procedimento inquisitivo (opinião simplista e reducionista), entretanto, há impropriedades
técnicas (erros de concepção) nessa afirmativa: contraditório e inquisitivo não são expressões
antagônicas, é possível um procedimento inquisitivo que determine a contraditoriedade,
inquisitivo é contrário de acusatório.
SISTEMA INQUISITIVO SISTEMA ACUSATÓRIO
Funções de acusar e julgar
mesmo órgão para acusar e julgar, pode órgãos distintos para o exercício das funções de
resultar uma sanção: daí garantir o acusar, de defender e julgar: o juiz deve manter a
contraditório pars conditio (igualdade de armas)
RAZÕES PARA INEXISTÊNCIA DE CONTRADITÓRIO NO IP4:
I – O investigado não é sujeito de direito, mas objeto de investigação;
II – Do IP não pode resultar sanção;
III – A lei e a CF não impõem contraditório ao IP.

É possível argüição de suspeição das autoridades policiais? Não (CPP, art. 107).
Vítima ou indiciado podem requerer provas? Sim. (CPP, art. 14). Serão deferidas ou
indeferidas, conforme o caso.
Exceções: há inquéritos que admitem (ou exigem) defesa do investigado: inquérito para
decretar expulsão de estrangeiro (defesa obrigatória), inquérito para apurar falta administrativa
(defesa obrigatória) etc.
3.3.7 LEGALIDADE
Legalidade:todo ato praticado no curso do IP deve encontrar amparo legal. IP ilegal perde a
credibilidade. E pode ser tido como inválido (foi o que ocorreu com a investigação do caso de
Santo André).
3.3.8 OFICIALIDADE
Oficialidade: No IP atua um órgão oficial (que é a polícia judiciária).
3.3.9 OFICIOSIDADE
Oficiosidade ou obrigatoriedade na atuação: no caso de ação penal pública incondicionada
a autoridade policial, desde que existam indícios de uma infração penal, é obrigada a agir (a
investigar). Não conta a autoridade policial com poder discricionário de agir ou não agir. A
autoridade policial, tendo o conhecimento da prática de infração penal, tem o dever de instaurar
o inquérito, não há espaço para discricionariedade do delegado, nos crimes de ação penal
pública incondicionada.
A lei 9099/95 substitui o IP pelo termo circunstanciado. Há uma divergência sobre quem tem
autoridade para elaborar o termo, entre saber se somente o delegado pode (ato exclusivo) ou
se outros policiais podem elaborar o termo. A posição dominante é a de que qualquer policial
pode, é o que predomina, em que pese a existência de doutrina de peso em sentido contrário,
defendendo que se trata de atribuição exclusiva de autoridade policial. Ninguém pode arquivar,

4
Poderia haver o contraditório no IP, seria uma regra possível, entretanto, resta
saber se ela realmente seria viável ou factível. Para DEMERCIAN, essa regra não traria benefícios para
a sociedade e nem para o investigado. Seria assegurado ao investigado o direito de se defender de uma
acusação que ainda não foi feita; ou seja, seria colocado na posição de réu, sem dominar qual a acusação
que lhe é imputada. Por outro lado, a sociedade sofreria danos maiores que os sofridos pelo investigado;
pois esse, faria de tudo para prejudicar a investigação, na prática, não existe investigado que coopere com
a investigação; cada diligência que a autoridade policial fosse realizar teria que notificar o investigado e
seu advogado, o que significa que os IP não terminariam.
a não ser, mediante requerimento do MP apreciado pelo juiz (princípios da obrigatoriedade e
da titularidade da ação penal). Não obstante a discussão supra, cabe salientar que o art. 69, da
Lei 9.099/95, é expressa no seguinte sentido: “A autoridade policial que tomar conhecimento
da ocorrência lavrará termo circunstanciado e o encaminhará imediatamente ao Juizado...”
(destaquei).
3.3.10 INDISPONIBILIDADE
Indisponibilidade:a autoridade policial não pode arquivar o IP (CPP, art. 17). O artigo 17,
CPP, estabelece claramente que a autoridade policial não poderá arquivar o IP (somente pode
ser arquivado pelo juiz, mediante requerimento do MP). Delegado não arquiva inquérito,
somente o MP pode arquivar
3.3.11 UNIDIRECIONAL
Unidirecional: o delegado não pode fazer juízo valorativo sobre a conduta do investigado, dar
parecer está errado. Deve se limitar a investigar, mas não valorar, tanto que a ausência de
classificação é mera irregularidade. Somente na Lei de Tóxicos é que se exige que o delegado
tem que fundamentar por que está enquadrando o sujeito em determinado crime. (Lei 6368 e
10409). OBS.: essa última observação vale para a nova Lei 11.343/06, que, no seu art. 52, I,
também determina que a autoridade policial justifique as razões da sua classificação.
3.3.12 ATIVIDADE ADMINISTRATIVA
Atividade investigatória ADMINISTRATIVA e atos praticados: é muito comum dizer-se que
o IP é um procedimento administrativo (PAULO RANGEL: a natureza jurídica do IP é de um
PROCEDIMENTO DE ÍNDOLE MERAMENTE ADMINISTRATIVA, de caráter informativo,
neste caso, de intervenção do Estado-juiz).
Mas isso somente é válido mediante a abordagem de um sentido amplo do termo procedimento
administrativo (em sentido estrito, é a concatenação de atos em uma determinada ordem), pois
no IP não há uma concatenação de atos num movimento para frente. Não há, portanto,
nulidades procedimentais (no processo penal, a inversão da ordem pode causar nulidade). Não
há rito ou ordem predeterminada para a prática dos atos 5. Eventuais invalidades não
contaminam a ação penal. Por isso, EXPEDIENTE ADMINISTRATIVO.
Não há especificação de fases, os artigos 6º e 7º, do CPP:
3.3.12.1 Produção das provas
Os artigos somente elencam os atos que a autoridade policial pode adotar.
Discricionariamente, a autoridade policial poderá adotar as práticas que entender convenientes
de acordo com o caso concreto. O IP não tem um roteiro específico, caberá ao delegado
definir as diligências que prefere adotar na ordem que melhor for conveniente para a
investigação criminal.
3.3.12.2 Requerimento de provas
A autoridade não está obrigada a atender aos requerimentos de prova elaborados pelo
investigado (esse é o conteúdo da discricionariedade da autoridade policial), mas se a
diligência for importante (irrepetível) e o delegado por capricho não autorizar a realização, esse
argumento pode ser usado pela defesa durante a ação penal.
3.3.12.3 Requisição de provas
Se o MP requisitar a produção, a diligências, a autoridade policial está obrigada a realizar,
uma vez que não se trata de requerimento, mas sim de REQUISIÇÃO (ordem com base na lei).
OBS. Se a portaria instauradora do IP for irregular, os atos seguintes não estão eivados de
nulidade, essa é mais uma diferença entre o IP e a ação penal, e demonstra que não se trata
de procedimento. Note-se que a produção de provas ilícitas invalida as demais.
3.3.12.4 INDICIAMENTO
3.3.12.4.1 Conceito
O famigerado indiciamento pouca gente sabe o que é, na verdade, ele consiste na
formalização da suspeita, o delegado evidencia pelos elementos colhidos que há indícios de
autoria e prova da autoria. Há quem diga que o indiciamento pode ser solicitado pelo MP
ou pelo Juiz, mas o indiciamento é ato discricionário da autoridade policial. O
indiciamento somente pode ser feito se houver base ou prova. O Delegado se convence de que

5
A autoridade policial pode proceder a outras diligências que não estejam previstas no artigo 6 o.,
CPP; há no CPP, um rol de provas nominadas expressamente previstas, mas há também os meios de
prova que não têm previsão expressa, em que pesem não previstas, podem ser realizadas se não forem
imorais, ilegais ou ilícitos. Esse mesmo critério vale para o delegado de polícia, ou seja, pode colher as
provas inominadas
tem provas, se o delegado está certo ou não é outro problema, bastam provas mínimas da
prática da conduta.

3.3.12.4.2 Providências e consequências


Conseqüências do indiciamento: INTERROGATÓRIO, AVERIGUAÇÃO DA VIDA PREGRESSA
e IDENTIFICAÇÃO CRIMINAL (pode ser fotográfica ou datiloscópica).
Súmula 568. A identificação criminal não constitui constrangimento ilegal ainda que o
indiciado tenha sido identificado civilmente.
Essa súmula é antiga. A CF/88 modificou isso: o civilmente identificado não será
identificado criminalmente, salvo nas hipóteses previstas em lei:
3.3.12.4.3 Hipóteses legais de identificação criminal
1) crime organizado, Lei 9034; (STJ afirma que foi revogado o artigo 5o., pela Lei
10.054; o fundamento é que esta lei regulou inteiramente o assunto, nos termos do
art. Art. 2º, § 1º, parte final)
2) A identificação criminal atualmente vem prevista na Lei 12.037/2009. Vale a pena
transcrever a redação do artigo 3º:

Art. 3º Embora apresentado documento de identificação, poderá ocorrer identificação


criminal quando:

I – o documento apresentar rasura ou tiver indício de falsificação;

II – o documento apresentado for insuficiente para identificar cabalmente o indiciado;

III – o indiciado portar documentos de identidade distintos, com informações conflitantes


entre si;

IV – a identificação criminal for essencial às investigações policiais, segundo despacho


da autoridade judiciária competente, que decidirá de ofício ou mediante representação da
autoridade policial, do Ministério Público ou da defesa;

V – constar de registros policiais o uso de outros nomes ou diferentes qualificações;

VI – o estado de conservação ou a distância temporal ou da localidade da expedição do


documento apresentado impossibilite a completa identificação dos caracteres essenciais.

Parágrafo único. As cópias dos documentos apresentados deverão ser juntadas aos
autos do inquérito, ou outra forma de investigação, ainda que consideradas insuficientes para
identificar o indiciado.

3) Promotores e juízes não serão identificadas criminalmente, porque não podem


ser indiciados; LOMP (artigo 41, II) e LC 33/79;
4) protegidos por Tratados e Convenções pelas mesmas razões constantes no
item anterior.

LISTA DE CRIMES: A teoria de LOMBROSO ainda não morreu totalmente, o legislador quando
escolheu os tipos de delinqüência está aplicando a teoria de Lombroso, essa escolha não é
fundada, LFG afirma que deveria ter começado pelos CRIMES HEDIONDOS e CRIMES
FINANCEIROS. Por isso tudo, há uma discussão sobre a constitucionalidade da exigência.
CONCURSO: não questione a constitucionalidade.
HIPÓTESES DE DÚVIDAS: a identificação criminal é obrigatória. EXEMPLOS: apresentação
de identidade rasgada ou sem fotografia ou foto colada; apresenta uma cópia e é deferido
prazo para apresentação do original, que não é cumprida pelo agente.
3.3.12.4.4 DESINDICIAMENTO
Caiu em uma prova de delegado se caberia o DESINDICIAMENTO, em concurso para
delegado deve-se responder que, como se trata de ato discricionário, pode fazê-lo, mas na
prática, isso é meio difícil, porque não tem como desidentificar o indivíduo. DEMERCIAN
acredita que poderia estar querendo se referir ao não envio do nome ao prontuário do instituto
de identificação.
OBS.: O nosso resumo é expresso na seguinte afirmação: “Caso se queira impugnar o
indiciamento o instrumento cabível é o MS e não o HC, mas os juízes têm aplicado o princípio
da fungibilidade e aceitado o HC”. Não obstante isso, andei buscado jurisprudência e verifiquei
que o STJ admite o HC sem problemas.
Enfim, vale salientar que fiz pesquisa no STF e encontrei vários HC’s tratando de indiciamento.
Todos foram conhecidos, portanto, não há falar em impropriedade da via eleita.
3.3.12.4.5 Identificação criminal nos juizados
INDENTIFICAÇÃO CRIMINAL NOS JUIZADOS: se se elabora TC não existe indiciamento.
Mas se a situação for complexa e o MP requer o IP, nele haverá o indiciamento.
Sobre a identificação em si, aplica-se a Lei 10.054, no que for cabível. É óbvio que não se
aplicará para os delitos previstos no art. 3º, inc. I. Entretanto, ocorrendo qualquer das demais
hipóteses, possível será a identificação. Aliás o próprio caput do art. 1º, da referida Lei,
expressa sua aplicabilidade às infrações penais de menor gravidade.
3.3.12.5 Reconstituição do crime ou reprodução simulada do crime
O delegado pode fazer isso, desde que não afete os bons costumes e a ordem pública
(CPP, art. 7º). Exemplo: não se faz a reconstituição de um estupro.
O suspeito ou indiciado é obrigado a participar da reconstituição do crime? Não(nemo
tenetur se detegere (RT, HC 64354, RT 624/372 e RTJ 127/461, TJSP, RJTJSP 431343 e RT
697/385). De outro lado, se não é obrigado a participar do ato, tampouco é obrigado a ir ao
local dos fatos. Constitui rematado constrangimento fazê-lo estar presente no local dos fatos na
medida em que ele tem o direito de não participar de absolutamente nada – ninguém é
obrigado a se autoincriminar. De outro lado, se o ato final (participação da reconstituição) está
vedado, não tem sentido o meio (condução do suspeito ao local dos fatos). Essa condução tem
puro caráter incriminatório. É coercitiva e abusiva. Esse é o posicionamento do LFG. O
Fernando Capez, de seu turno, defende que “O indiciado poderá ser forçado a comparecer
(CPP, 260), mas não a participar da reconstituição, prerrogativa que lhe é garantida pelo direito
ao silêncio e seu corolário, o princípio de que ninguém está obrigado a fornecer provas contra
si (CF, art. 5º, LXIII)”.
3.3.12.6 Reconhecimento
O réu é obrigado a estar presente no ato do reconhecimento, podendo inclusive o delegado
mandar buscar, não há violação constitucional, porque, no reconhecimento não se exige do réu
nenhum comportamento ativo, logo, é legítimo. Art. 260, CPP.
3.3.12.7 Busca domiciliar e busca pessoal
BUSCA DOMICILIAR: Só juiz pode determinar. Há uma RESERVA DE JURISDIÇÃO
E a busca pessoal? Pode ser determinada por juiz ou por autoridade policial. Em regra,
entretanto, a busca pessoal é feita sem ordem escrita. Há muitas situações em que isso é
possível. Por exemplo: suspeita de posse de arma de fogo.
judicial.
3.3.12.8 Incidente de insanidade mental
Só juiz pode determinar. Esse poder (de iniciar o incidente) não foi conferido à Autoridade
Policial, o qual pode representar pela realização do exame de sanidade.
3.3.12.9 Folha de antecedentes e instrumentos do crime
Devem acompanhar o IP.
Outras diligências ou atos que podem ser, também, empreendidos pela autoridade policial:
representação para a prisão preventiva, para a prisão temporária, cumprimento de mandado de
prisão, representação para decretação da interceptação telefônica, cumprimento da ordem de
interceptação etc.
3.3.12.10 Infiltração de policiais
A Lei de Tóxicos n. 10.409 admitia a INFILTRAÇÃO DE POLICIAIS em quadrilhas, grupos,
organizações ou bandos, cabível somente para os fins de COLHER INFORMAÇÕES. PAULO
RANGEL: entende que essa medida somente é cabível na fase de persecução penal, já que se
trata de atividade policial para busca de formação da justa causa. A nova Lei 11.343/06
mantém essa possibilidade e mais, a saber:
Art. 53. Em qualquer fase da persecução criminal relativa aos crimes previstos nesta Lei, são
permitidos, além dos previstos em lei, mediante autorização judicial e ouvido o Ministério
Público, os seguintes procedimentos investigatórios:
I - a infiltração por agentes de polícia, em tarefas de investigação, constituída pelos órgãos
especializados pertinentes;
II - a não-atuação policial sobre os portadores de drogas, seus precursores químicos ou outros
produtos utilizados em sua produção, que se encontrem no território brasileiro, com a finalidade
de identificar e responsabilizar maior número de integrantes de operações de tráfico e
distribuição, sem prejuízo da ação penal cabível.
Parágrafo único. Na hipótese do inciso II deste artigo, a autorização será concedida desde que
sejam conhecidos o itinerário provável e a identificação dos agentes do delito ou de
colaboradores.
Há infiltração de policiais prevista da Lei 9034 (crime organizado). Não se admite a figura da
infiltração para a investigação de quaisquer outros crimes, sob pena de ilicitude da prova
colhida. Mas se no decurso da infiltração, descobrir-se a prática de outro crime (caso fortuito):
se conexo, não há problema algum; se independente, dará ensejo à abertura de outro
processo. É o chamado encontro fortuito de prova. A nova Lei do Crime Organizado, Lei
12.850/2013, prevê a infiltração de agentes como meio de obtenção de prova. A matéria é
tratada entre os artigos 10 e 14 da citada lei:

Seção III

Da Infiltração de Agentes

Art. 10. A infiltração de agentes de polícia em tarefas de investigação, representada pelo


delegado de polícia ou requerida pelo Ministério Público, após manifestação técnica do
delegado de polícia quando solicitada no curso de inquérito policial, será precedida de
circunstanciada, motivada e sigilosa autorização judicial, que estabelecerá seus limites.

§ 1o Na hipótese de representação do delegado de polícia, o juiz competente, antes de


decidir, ouvirá o Ministério Público.

§ 2o Será admitida a infiltração se houver indícios de infração penal de que trata o art.
1o e se a prova não puder ser produzida por outros meios disponíveis.

§ 3o A infiltração será autorizada pelo prazo de até 6 (seis) meses, sem prejuízo de
eventuais renovações, desde que comprovada sua necessidade.

§ 4o Findo o prazo previsto no § 3o, o relatório circunstanciado será apresentado ao juiz


competente, que imediatamente cientificará o Ministério Público.

§ 5o No curso do inquérito policial, o delegado de polícia poderá determinar aos seus


agentes, e o Ministério Público poderá requisitar, a qualquer tempo, relatório da atividade de
infiltração.

Art. 11. O requerimento do Ministério Público ou a representação do delegado de polícia


para a infiltração de agentes conterão a demonstração da necessidade da medida, o alcance
das tarefas dos agentes e, quando possível, os nomes ou apelidos das pessoas investigadas e
o local da infiltração.

Art. 12. O pedido de infiltração será sigilosamente distribuído, de forma a não conter
informações que possam indicar a operação a ser efetivada ou identificar o agente que será
infiltrado.

§ 1o As informações quanto à necessidade da operação de infiltração serão dirigidas


diretamente ao juiz competente, que decidirá no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, após
manifestação do Ministério Público na hipótese de representação do delegado de polícia,
devendo-se adotar as medidas necessárias para o êxito das investigações e a segurança do
agente infiltrado.

§ 2o Os autos contendo as informações da operação de infiltração acompanharão a


denúncia do Ministério Público, quando serão disponibilizados à defesa, assegurando-se a
preservação da identidade do agente.

§ 3o Havendo indícios seguros de que o agente infiltrado sofre risco iminente, a operação
será sustada mediante requisição do Ministério Público ou pelo delegado de polícia, dando-se
imediata ciência ao Ministério Público e à autoridade judicial.

Art. 13. O agente que não guardar, em sua atuação, a devida proporcionalidade com a
finalidade da investigação, responderá pelos excessos praticados.

Parágrafo único. Não é punível, no âmbito da infiltração, a prática de crime pelo agente
infiltrado no curso da investigação, quando inexigível conduta diversa.

Art. 14. São direitos do agente:

I - recusar ou fazer cessar a atuação infiltrada;

II - ter sua identidade alterada, aplicando-se, no que couber, o disposto no art. 9o da Lei
no 9.807, de 13 de julho de 1999, bem como usufruir das medidas de proteção a testemunhas;

III - ter seu nome, sua qualificação, sua imagem, sua voz e demais informações pessoais
preservadas durante a investigação e o processo criminal, salvo se houver decisão judicial em
contrário;

IV - não ter sua identidade revelada, nem ser fotografado ou filmado pelos meios de
comunicação, sem sua prévia autorização por escrito.

AGENTE INFILTRADO está amparado pela excludente de ilicitude do ESTRITO


CUMPRIMENTO DO DEVER LEGAL. O agente infiltrado não se confunde com o agente
provocador, porque o infiltrado ganha a confiança do investigado e retira dele as
informações necessárias da atuação ilícita do grupo, tendo uma atuação INFORMATIVA
DO CRIME e NÃO FORMATIVA.
A INFILTRAÇÃO é um meio de obtenção de prova na fase de investigação criminal, ou seja, de
uma MEDIDA CAUTELAR PREPARATÓRIA SATISFATIVA DA AÇÃO PENAL que, como
tal, deve estar revestida dos requisitos de toda e qualquer medida cautelar, quais sejam:
fumus comissi delicti e periculum libertatis. O fato de ser uma medida cautelar satisfativa
não significa dizer que não irá estar submetida ao crivo do contraditório, pois ela é preparatória
da ação penal e, como tal, adotada na fase de investigação criminal, na fase inquisitiva. Deve
durar somente pelo prazo de 30 dias, por aplicação da regra geral do artigo 806, CPC. O juiz
que determine a infiltração tem a sua competência afastada para o processo principal, como
proteção de sua imparcialidade, a decisão de deferimento da infiltração NÃO torna o juízo
prevento. O agente policial pode se recusar a participar da infiltração, porque que se trata de
um perigo superior ao da atividade policial e até por segurança da operação. OBS.: Essas
informações constam do resumo, mas não consegui verificar na doutrina a atualidade e acerto
delas.
AGENTE ENCOBERTO é aquele policial que estava no lugar certo (ou errado) na hora certa
(ou errada), sem que soubessem de sua qualidade funcional, quando presenciou a prática de
um crime, dando voz de prisão em flagrante delito ao autor do mesmo. A característica
principal é a sua passividade em relação à decisão criminosa, ou seja, não incita o autor do
crime (agente provocador) nem ganha a confiança do suspeito (agente infiltrado).
3.3.12.11 Condução coercitiva para o interrogatório
É possível? (TACrimSP): “No poder legal dos delegados de polícia, iniludivelmente se
encontra o de interrogar a pessoa indiciada...pode mandá-la conduzir a sua presença” (RT,
482/357). LFG: Esse mesmo poder também é válido para vítima e testemunhas (podem ser
conduzidas coercitivamente). No que pertine ao suspeito, se de um lado é certo que pode ser
conduzido coercitivamente, de outro também é correto dizer que ele não tem a obrigação de
responder a qualquer pergunta da autoridade policial (o direito ao silêncio está
constitucionalmente garantido).
Com a alteração da natureza jurídica do interrogatório, passando a ser meio de defesa,
EUGÊNIO PACELLI entende que não cabe a condução coercitiva.
3.4 VALOR PROBATÓRIO DO IP
Em regra só serve para instruir a ação penal futura (para dar-lhe justa causa ou para a
comprovação do fumus boni iuris, isto é, fumus delicti). Não tem valor judicial, sobretudo
para o efeito de condenação do réu. Existem determinadas perícias que não são renováveis
pela ausência de vestígios, não podendo ser renovadas na instrução, podem fundamentar a
condenação.
Exceções:provas cautelares (perícias, por exemplo) e documentais. Nesses casos, as provas
possuem valor judicial. E o contraditório? É diferido (leia-se: postergado para a fase judicial –
em juízo o interessado faz o contraditório). Condenação fundada exclusivamente em provas
policiais sem valor judicial é válida? Não (RTJ 59, p. 786).
Essa verificação depende da análise dos efeitos que as informações /provas PODEM ou NÃO
produzir:
a) NÃO pode haver condenação com base em prova EXCLUSIVAMENTE produzida no
IP, sob pena de nulidade.
b) Somente pode ser usada como fundamento para a sentença, a prova produzida no IP,
quando confirmada na fase processual. Essa afirmativa é inócua, já que abrangida pelo
item anterior.
c) As PROVAS DEFINITIVAS produzidas no IP poderão fundamentar a sentença, sem a
necessidade de nova produção em fase processual, na medida em que não podem ser
renovadas, em razão do desaparecimento dos vestígios materiais (CORPO DE
DELITO). Essas provas, que têm caráter eminentemente técnico, são exceção à regra,
por ser aplicado-lhes o contraditório diferido. Há uma tendência em algumas
legislações de fazer um contraditório na própria instrução.

3.5 INÍCIO DO IP
O seu início depende do tipo de ação penal que é cabível:
3.5.1 AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA
(a) por portariada autoridade policial (notitia criminis de cognição imediata ou informal do
delito);
(b) por auto de prisão em flagrante(notitia criminis de cognição coercitiva);
(c) por requisiçãode juiz; (notitia criminis de cognição mediata ou formal do delito);
(d) por requisiçãodo ministério público ou (notitia criminis de cognição mediata ou formal
do delito);
(e) por requerimentoda vítima ou de quem tiver qualidade para representá-la (notitia criminis
de cognição imediata).

Portaria: é a peça que dá início ao IP; decorre do conhecimento pela autoridade policial em
razão de suas atividades de rotina, p. ex. boletim de ocorrência (documento de natureza
estatística), relatório de investigação, etc
REQUERIMENTO na ação penal pública (artigo 5o., II última parte): Esse requerimento não é
obrigatório, nos crimes de ação penal pública, se a vítima não o requerer o Delegado de Polícia
pode e deve instaurar de ofício. Se for indeferida a instauração, cabe recurso ao Chefe de
Polícia (artigo 5o. § 2o., CPP). Como se trata de crime de ação penal pública, na verdade, esse
recurso é totalmente desnecessário, porque o ofendido pode escolher outra via: dirigir-se ao
MP ou ao juiz solicitando-lhes, que requisitem a instauração do IP.
REQUERIMENTO/DELATIO CRIMINIS (artigo 5o. § 3o. CPP):Qualquer pessoa do povo que
tomar conhecimento de prática de crime que deve ser apurada mediante ação penal pública
incondicionada poderá verbalmente ou por escrito comunica-la à autoridade, e essa verificando
a procedência mandará instaurar o IP. O CPP fala somente em crimes de ação penal pública,
mas deve-se entender como APP INCONDICIONADA, porque se for condicionada exigível a
representação.
Exercício: se o fato, mesmo em tese, não constitui fato punível, admite-se a abertura de
inquérito policial? Não (JSTJ 33, p. 341). E se se trata de fato absolutamente insignificante?
Incide o princípio da insignificância (fato atípico). Logo, não há que se falar em IP. E se
instaurado, não há que se falar em indiciamento. Toda a ocorrência tem que ficar registrada
para que o MP possa requerer o arquivamento, em juízo. O correto, portanto, é a autoridade
policial não instaurar inquérito policial no caso, nem lavrar auto de prisão em flagrante.
Registra-se o fato e manda tudo para juízo, que cuidará do arquivamento.
Diferença entre requerimento e requisição: o primeiro pode ser indeferido. No caso de
requisição (do juiz ou do MP), a autoridade deve agir. E se se trata de fato flagrantemente
atípico? Deve fundamentar sua convicção e não instaurar o IP (sob pena de estar cometendo
atividade arbitrária). Caso o MP discorde, deve requerer a abertura de IP ao Chefe da
Autoridade policial que se recusou a agir. A autoridade que se recuou a agir pode praticar o
crime de prevaricação (satisfação de interesse próprio ou de terceiro) ou falta funcional. Note-
se que não se trata de crime de desobediência, para parte da doutrina e da
jurisprudência, porque para sua configuração exige-se que o particular (e não o
funcionário público) o pratique contra a autoridade pública.
Há, na doutrina, quem diga inadequadamente, que o Delegado pode deixar de cumprir a
requisição se a ordem for manifestamente ilegal (Tourinho e Vicente Grecco); está errada essa
posição, porque exigir é determinar legalmente, e assim, não tem como ser manifestamente
ilegal. O instituto é determinado não pelo nome que recebe, mas pela sua natureza. Assim, o
delegado pode não atender a uma ordem manifestamente ilegal (claro), mas a requisição tem
em sua natureza a característica de ordem legal. Não confundir: REQUISIÇÃO (ordem legal
do MP) com a REQUISIÇÃO DO MINISTRO DA JUSTIÇA, que é, na verdade, uma condição
específica da ação penal pública condicionada à requisição do Ministro da Justiça (artigo 141, I,
CP).
REQUISIÇÃO = obrigação, quando o MP requisita o delegado é obrigado a instaurar o IP.
REQUERIMENTO = pode ser deferido ou indeferido
A requisição do juiz é muito questionada, o juiz deve copiar e mandar ao MP (artigo 40, CPP).
E se indeferido o requerimento da vítima (de abertura de inquérito policial)? Cabe recurso para
o Chefe de Polícia (em São Paulo, Delegado Geral de Polícia).
AÇÃO PENAL PÚBLICA CONDICIONADA
Depende de representação da vítima ou seu representante legal. A representação, nesse
caso, constitui uma delatio criminis postulatória (porque revela o crime e ainda postula a
abertura do IP).
Requisição do ministro da justiça – não está sujeita a prazo. É um ato de natureza
POLÍTICA e ADMINISTRATIVA. Quanto à REVOGABILIDADE, há divergência quanto à sua
possibilidade ou não. Impossibilidade por ser ato político, não vincula o MP, que não é obrigado
a oferecer denúncia mantém a sua autonomia funcional.
Está prevista no artigo 5o. IV, CPP (é a forma de iniciar a ação penal pública condicionada). Os
conceitos registrados na ação penal são utilizados aqui também. A investigação criminal nos
crimes em que a ação penal for pública condicionada não se inicia sem a representação do
ofendido ou de seu representante (autorização).
AÇÃO PENAL PRIVADA
Depende de requerimento da vítima ou de seu representante legal (princípio da
oportunidade).A vítima é obrigada a “denunciar” o fato? Não. Sem requerimento da vítima, a
autoridade policial não pode jamais investigar o crime de ação penal privada. Mulher casada
pode requerer abertura de IP? Sim (CPP, art. 35: revogado – Lei 9.520/97).
IP só pode ser instaurado a requerimento do ofendido ou de seu representante legal, não
podendo ser instaurado de ofício; quem tem legitimidade para exercer o direito de queixa, são
as mesmas pessoas que podem exercer o direito de representação.
INDEFERIMENTO DE INSTAURAÇÃO DO IP
Se for indeferida a instauração do IP, cabe recurso ao Chefe de Polícia, nos termos do artigo
5o. § 2o., CPP, é um recurso de natureza administrativa, assim, conclui-se que a autoridade
policial pode indeferir a abertura de IP, mas o CPP não estabelece as hipóteses em que o
indeferimento pode ocorrer. Mas se pode inferir algumas hipóteses (em qualquer tipo de ação):
a. Fato não ser típico;
b. Manifesta extinção de punibilidade;
c. Ausência de mínimo de informações para início das investigações.
Há quem entenda que o Chefe de Polícia é o Secretário de Segurança Pública e há quem
entenda que é o Delegado Geral da Polícia (artigo 5o. § 2o., CPP)..
TÉRMINO DO IP
O encerramento do IP ocorre em prazos distintos de acordo com a previsão legal específica:
CÓDIGO PENAL
10 dias – preso, improrrogável (a partir do 1º dia – artigo 10, CP) e 30 dias – solto (artigo 798,
CPP), poderá o juiz prorrogar o prazo PEDIDO DE DILAÇÃO DE PRAZO, quando houver
necessidade (artigo 10, § 3o.), controle da Polícia pelo Judiciário, correndo o risco de prejudicar
o sistema acusatório, a rigor o juiz não deveria controlar isso, já que a CF fala que é papel do
MP, o controle externo da atividade policial
JUSTIÇA FEDERAL E CPM
Justiça Federal(artigo 66 daLei 5010/66): se preso, 15 dias prorrogável por mais 15’. Se solto
segue a regra do CPP normalmente (trinta dias).
Código Penal Militar: 20 dias se preso (contado do dia em que se executar a prisão) e 40 dias
se solto (contado a partir da data em que se instaurar o IP).
ECONOMIA POPULAR
Lei de Economia Popular (Lei 1521/51): 10 dias, preso ou solto; 02 dias denúncia
TÓXICOS
Lei 10.409 Tóxicos (Art. 29): 15 dias, preso (prorrogável por mais 15), 30 dias, solto
(prorrogável por mais 30 dias); 10 dias, denúncia.
Lei 6368 Tóxicos (Art. 21): 05 ou 10 dias, preso e 30 ou 60 dias, solto
A nova Lei 11.343/06 aumentou os prazos: 30 dias, se preso, podendo ser duplicado; 90 dias,
se solto, também admitindo duplicação. É a regra do art. 51.
Nos processos de competência da JUSTIÇA FEDERAL, a dúvida surge em relação ao crime de
TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES, cuja competência é da Justiça Federal:
SÚMULA 522, STF. Salvo ocorrência de tráfico para o exterior, quando então a
competência será da Justiça Federal, competem à Justiça dos Estados o processo e
julgamento dos crimes relativos a entorpecentes.
Note-se que os crimes de tráfico podem ser de MULHERES, CRIANÇAS OU
ENTORPECENTES. O entendimento mais aceito consiste na aplicação do prazo previsto
na Lei de tóxicos, por ser específica e mais recente.
PRISÃO TEMPORÁRIA
A prisão temporária pode ser pelo prazo de 5 dias, mais 5 dias, totalizando 10 dias. Na Lei de
Crimes Hediondos o seu prazo é de 30 dias mais 30 dias, totalizando 60 dias. Note-se que
essa prisão é estabelecida para facilitar a investigação criminal, sendo assim, o IP pode
perdurar pelo prazo de duração da prisão, alterando o limite máximo para a conclusão do
inquérito. A prisão temporária pode ser convertida em prisão preventiva, o delegado terá ainda
mais 10 dias para finalizar o IP.
ARTIGO 10, CAPUT: TOURINHO diz que, em caso de prisão preventiva, já houve indício de
autoria e prova da materialidade, logo, não há porque continuar com o IP, pois o seu objetivo já
está atendido. DEMERCIAN diz que esse entendimento está errado, porque o caput é
expresso ao estabelecer o prazo de encerramento do IP, quando o indiciado estiver preso
preventivamente.
EXCESSO DE PRAZO
Excesso de prazo para a conclusão: o indiciado está preso, pode ser impetrado o HC.
PROCEDIMENTO DE FINALIZAÇÃO
Finalizando o IP: a autoridade policial poderá elaborar um relatório (artigo 10, §§ 1 o. e 2o.)
(que não é imprescindível) e o MP poderá adotar as providências:
DELEGADO → JUIZ → PROMOTOR (adotará as seguintes providências:)
1. Requisitar diligência (retorno dos autos à polícia – artigo 16)
2. Propugnar pelo arquivamento, que pode ser deferido ou indeferido
3. Apresentar denúncia e o conseqüente início da ação penal
No relatório, a autoridade policial poderá fazer constar o nome e o endereço das testemunhas
que não tenha ouvido. Mas não cabe, em princípio, o juízo de valor da autoridade policial, por
se tratar de um relatório e o seu juízo ser inócuo para a formação da opinião do MP.
Entretanto, há atos no IP que demandam uma apreciação, p. ex., na decisão de indiciamento,
para tanto terá que analisar os indícios de autoria. Note-se que no tráfico de entorpecentes, há
previsão de que a autoridade policial deverá justificar as razões que a levaram à classificação
do delito (essa previsão ainda permanece na nova Lei 11.343/06).
O MP somente poderá solicitar as diligências imprescindíveis para o oferecimento da
denúncia, de acordo como juízo valorativo do próprio MP (detentor da opinio delicti).
CARLOS FREDERICO COELHO NOGUEIRA o artigo 16 contém um duplo comando: 1)
requerimento do promotor ao juiz para o retorno físico dos autos à delegacia de polícia e 2) a
requisição de diligência feita pelo MP à autoridade policial. GUSTAVO SENNA: Somente pode
ser utilizado com o indiciado em liberdade, pois as idas e vindas do IP, com indiciado preso,
podem ocasionar excesso de prazo e constrangimento ilegal sobre a liberdade do preso.
O juiz não pode indeferir, mas se o juiz indeferir, não cabe recurso, podendo o MP adotar:
a. Correição parcial
b. Requisitar diretamente à autoridade policial, que não pode se recusar.
Se o pedido de diligência do promotor for monstruoso, afastando-se da legalidade, o juiz
poderá exercer um controle, indeferindo o pedido e depois por analogia aplicar o artigo 28,
CPP, remeter os autos ao Procurador Geral de Justiça que poderá designar outro órgão do
MP.
ENCERRAMENTO ANORMAL DO IP
Encerramento anormal do IP: trancamento por falta de justa causa. Só pode ser trancado, por
falta de justa causa, quando os fatos investigados são atípicos, quando não constituem nem
mesmo em tese, crime ou contravenção. Não se pode trancar o IP, por falta de justa causa,
sob a alegação de insuficiência de provas contra o indiciado.
O IP pode ter sucessivas prorrogações de prazo, caso o indiciado esteja solto, nos termo do
art. 10, § 3º, do CPP. A exceção fica por conta da Lei 10.409 e agora 11.343 que apenas
admitem a duplicação, ou seja, uma única prorrogação.
O MP pode devolver o IP para a polícia, desde que seja para diligências imprescindíveis (artigo
16, CPP).
ARQUIVAMENTO DO IP
Promover ou requerer o arquivamento são expressões sinônimas. O arquivamento ocorre
quando o IP está concluído, mas não traz prova suficiente e não há novas diligências a serem
realizadas. O juiz pode deferir ou indeferir a promoção de arquivamento, requerida nos termos
do artigo 18, CPP. O juiz defere o arquivamento, que somente pode ser requerido pelo MP, não
pode a autoridade policial requerer.
DESARQUIVAMENTO
A decisão interlocutória mista de arquivamento não (LFG afirma que faz coisa julgada, nos
termos abaixo) faz coisa julgada e pode ocorrer o desarquivamento. Mudando a situação de
fato (rebus sic stantibus), a decisão de arquivamento pode ser modificada se existir notícia de
prova nova. Súmula 18 – ela é para denunciar e exige depois do arquivamento do IP se tiver
prova nova, nem precisa desarquivar o IP.
 COISA JULGADA MATERIAL: se o juiz analisa a tipicidade ou se extingue a
punibilidade.
 COISA JULGADA FORMAL: se o juiz arquiva por falta de provas.
Pelo artigo 18, reabre o IP quando há NOTÍCIA DE PROVAS NOVAS, ou seja, basta a simples
notícia para a reabertura do IP. Mas a futura ação penal somente poderá ser promovida se
EFETIVAMENTE foram encontradas provas novas.
Súmula 524, STF. Arquivado o IP por despacho do juiz, a requerimento do MP, não pode
a ação penal ser iniciada sem novas provas.

Para desarquivar o IP, basta a notícia. Novas provas no sentido substancial até poderiam
existir, mas não haviam chegado ao conhecimento das autoridades, p. ex., testemunho de
nova testemunha.
FUNDAMENTO DO ARQUIVAMENTO
O pedido do MP deve ser fundamentado, pois o artigo 28, CPP, fala em razões invocadas. O
CPP não elenca as hipóteses de arquivamento, usando a contrario sensu as hipóteses de
rejeição da denúncia (artigo 43):
 Falta de condição da ação para o exercício da ação, incluindo a justa causa
(presença de prova da materialidade e indícios de autoria).
 O fato não se constituir em fato criminoso.
 Aplicando-se o conceito analítico do crime.
 A excludente de culpabilidade (vide observação abaixo com relação à
inimputabilidade).
 Comprovada a inimputabilidade a denúncia é imprópria OBS.: Ao contrário do que
aqui sustentado, Rogério Greco entende que, nesse caso, deve-se oferecer
denúncia, já que o processo penal é único meio para se impor medida segurança
(vide Curso de Direito Penal Parte Geral, Impetus, 5ª ed., p. 451).
 Causas extintivas da punibilidade, nos termos do artigo 107, CP, e outras por que o
rol não é taxativo. A única dúvida que pode surgir é em relação à prescrição virtual
ou da pena ideal. IMPORTANTE OPINIÃO ABAIXO. 6

A) atipicidade coisa julgada formal e material.

B) excludente da ilicitude coisa julgada formal e material. *** julgado que ainda não foi
concluído (HC 87.395 – está com vista para o Min. Carlos Brito). O último julgado ainda
admite o desarquivamento.

1. A decisão que determina o arquivamento de inquérito policial, a pedido do Ministério Público


e determinada por juiz competente, que reconhece que o fato apurado está coberto por
excludente de ilicitude, não afasta a ocorrência de crime quando surgirem novas provas,
suficientes para justificar o desarquivamento do inquérito, como autoriza a Súmula 524 deste
Supremo Tribunal Federal. 2. Habeas corpus conhecido e denegado. (HC 95211, Relator(a):
Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, julgado em 10/03/2009, DJe-160 DIVULG 19-08-2011
PUBLIC 22-08-2011 EMENT VOL-02570-01 PP-00169)

C) causas excludentes da culpabilidade, salvo no caso do inimputável coisa julgada formal


e material.

D) causas extintivas de punibilidade coisa julgada formal e material. *** OBS.: a questão da
certidão de óbito falsa o STF entende que é possível reabrir o processo contra o acusado,
ou seja, o STF entende que não é revisão criminal.

E) ausênciade elementos probatórios/informativos quanto à autoria e materialidade


coisa julgada formal. A doutrina diz que esta decisão se baseia em uma clausula rebus sic
stantibus (mantidos os pressupostos fáticos que serviram de fundamento para a decisão, esta
deve ser mantida; alterados os pressupostos fáticos a decisão pode ser modificada).

03 ANOS

FATO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA SENTENÇA


Interrompe o prazo
Condenando a 08 meses

No exemplo acima, houve a prescrição retroativa já que o prazo prescricional é de 2 anos,


trata-se de efeito autofágico da sentença. Essa situação pode ser prevista pelo MP antes de
oferecer a denúncia, então ele deixa de denunciar promovendo o arquivamento do IP, mas
essa posição não é pacífica.
OBS.: Como é notório, o STJ e o STF são contrários à chamada prescrição pela pena em
perspectiva ou virtual, não obstante o posicionamento majoritário na doutrina. O STJ JÁ
PUBLICOU SÚMULA REPUDIANDO A APLICAÇÃO DA PRESCRIÇÃO EM PERSPECTIVA.

RECURSO
Não cabe recurso da decisão do juiz que determina o arquivamento do IP (ARQUIVAMENTO
DIRETO). O TJ/SP, entretanto, já admitiu recurso da vítima em hipótese específica na qual se
reconhece, para efeito de arquivamento, a atipicidade do fato, essa posição também já foi

6 EUGÊNIO PACELLI: quando a hipótese for de PRESCRIÇÃO PELA PENA EM ABSTRATO ou de


QUAISQUER OUTRAS CAUSAS EXTINTIVAS DA PUNIBILIDADE, o MP não deve requerer o
arquivamento do IP ou das peças de informação, mas sim, o RECONHECIMENTO JUDICIAL EXPRESSO
da EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE, para o que deve, também especificar detidamente em relação a quais
fatos ela se estenderá, diante dos efeitos da coisa julgada material que deverá acobertar tais provimentos
judiciais.
verificada no STF, considerando que essa decisão pode adquirir a força de coisa julgada,
sendo assim, portanto, cabível o recurso, porque o juiz considerou a inexistência de fato típico;
logo, é decisão com força de definitiva. EXEMPLOS de decisões que fazem coisa julgada
(STF):
1) que reconhece a atipicidade do fato (cabível apelação, artigo 593, II) e
2) que reconhece a extinção da punibilidade do fato (cabível o recurso em sentido estrito,
artigo 583, IX).
LFG: reconhece 02 exceções, (a 3a. é de DEMERCIAN) nas quais é permitida a interposição de
recurso contra a decisão que determina o arquivamento:
a) RESE – nos crimes contra a economia popular e saúde
pública: Duplo grau (remessa de ofício) nos crimes contra a
economia popular e saúde pública (art. 7º, Lei 1521/51) – se
for dado provimento ao recurso, o promotor não pode ser
obrigado a denunciar, o TJ tem que aplicar o artigo 28.
(condição de eficácia é a remessa necessária). Não se aplica
aos tóxicos
b) RESE – Jogo do bicho e aposta sobre corrida de cavalos.
Qualquer do povo pode interpor o recurso. ATENÇÃO: nesses
casos se trata atualmente de contravenção, assim, contra o TC
entra com o recurso para as turmas recursais. Lei 1508/51
(Regula o processo das contravenções penais de JOGO DO
BICHO e CORRIDAS DE CAVALOS)

Se o juiz arquivar o IP sem o prévio pedido do MP, cabe a correição parcial (recurso
cabível em hipóteses de error in procedendo). Por outro lado, equivaleria à concessão de
ofício de HC, assim, poderia haver a impugnação por meio de RECURSO EM SENTIDO
ESTRITO voluntário do MP e de ofício, já que o juiz é obrigado a recorrer de sua decisão
concessiva de HC.

Feito o pedido de arquivamento, o juiz NÃO pode, em princípio restituir os autos ao MP para
que o reavalie, nos termos do artigo 28, CPP. Mas, em recente decisão, o STJ entendeu ser
possível essa medida, em casos excepcionais, o juiz poderia devolver os autos ao MP, em
virtude do princípio da verdade real e não do formalismo. O STJ cuidou de caso (OBS.: não
encontrei) no qual tomou ciência de situação após o pedido de arquivamento e o deferimento
do arquivamento, situação que demonstrava a existência de elementos que viciavam a prova
produzida, ou seja, trata-se de possibilidade somente cabível em caso
EXCEPCIONALÍSSIMOS. Mas NUNCA os autos poderão ser devolvidos para outro membro do
MP, ele deve valer-se da medida do artigo 28, CPP.
O artigo 28 disciplina o procedimento de arquivamento, sendo que o juiz exerce uma função
atípica de controle do princípio da obrigatoriedade da ação penal (controle judicial, feito
pelo magistrado, e administrativo, feito pelo chefe o MP). O MP tem independência (funcional
do órgão do MP, o juiz não pode obrigar o promotor a promover a ação penal, porque isso
equivaleria ao juiz ajuizar a ação) e autonomia (do MP em face de outros órgãos estatais), daí
as origens do artigo 28. Também fundamenta a existência do artigo 28, o fato de que o MP
representa a sociedade, o interesse público, assim, deve ser verificada a sua atuação pelo
chefe do MP.
APLICAÇÃO DO ARTIGO 28
Se o juiz discorda da promoção de arquivamento, ele deve enviar o IP para o Procurador
Geral de Justiça, que poderá:
 Concordar com MP (arquivamento obrigatório, que vincula o juiz)
 Denunciar pessoalmente (é uma hipótese incomum)
 Determinar que outro promotor o faça por delegação, ele não pode recusar (atua
como longa manusdo chefe do MP), não haverá lesão a sua independência
funcional, porque ele ainda não manifestou a sua opinião (independência
funcional somente é garantida quando o MP manifeste a sua posição).
 Requisitar diligências complementares (decorrente dos poderes do órgão
máximo do MP)
Em hipótese alguma, o promotor que promoveu o arquivamento pode ser obrigado a
denunciar, sob pena de violação à sua independência funcional (já antecipou a sua opinião
sobre a impossibilidade de ajuizamento da ação). A decisão de arquivamento não faz coisa
julgada material (senão nos casos de atipicidade e extinção de punibilidade), tanto que pode
haver o desarquivamento do IP (ver anotações acima). A decisão do juiz deve ser
fundamentada.
Se o juiz desobedecer ao arquivamento obrigatório, há duas medidas previstas na doutrina:
a) correição parcial, remédio jurídico contra erro em procedendo do juiz que causa
uma confusão processual (ainda que no momento não há processo);
b) HC, pelo constrangimento ilegal que passa a sofrer o investigado.
MP FEDERAL
No MP FEDERAL, não é o Procurador Geral da República que atua no lugar do PGJ, os autos
deverão ser enviados para uma Câmara de Coordenação e Revisão Criminal do MPF (artigo
167 e seguintes da LC 75/93 – LOMPF); que é formada por 03 Procuradores da Republica com
mandato de 02 anos, tendo 02 suplentes.
O artigo 28 é aplicado analogicamente em algumas hipóteses, sendo que, algumas são
equivocadas, para permitir uma aplicação analógica, devem ser obedecidas algumas
premissas:
b. Tratar-se de ato privativo do MP;
c. Ato do qual dependa o andamento do processo
EXEMPLO: Na audiência de instrução e julgamento, o MP requer ao juiz a juntada de
documento, que é indeferida pelo juiz, o MP avisa que se não deferir ele não fala;
normalmente, o juiz aplica o artigo 28, mas não deveria, pois, não há dúvida que o debate oral
é privativo do MP, entretanto, a segunda premissa não foi atendida, ou seja, da sua prática não
depende o andamento do processo, assim, basta o juiz sentenciar, mesmo que o MP não fale
nos debates orais.
ARQUIVAMENTO IMPLÍCITO OU TÁCITO e INDIRETO
Arquivamento implícito ou tácito – Nessas hipóteses, o juiz deve adotar o artigo 28, por
aplicação analógica, pedido indireto de arquivamento.
Arquivamento Objetivo – deixar um delito de fora, sem falar nada.
implícito Subjetivo – deixar sujeito de fora, sem falar nada.
(STJ)
Com o arquivamento implícito, a denúncia somente pode ser aditada, mediante a existência de
novas provas. Mas se o entendimento é pela inadmissão do arquivamento implícito, admite-se
o aditamento da denúncia. DEMERCIAN não concorda, porque não pode existir decisão tácita;
o MP tem o dever constitucional de fundamentação de suas manifestações; da mesma forma,
se o Juiz não diz nada, estaria ele também decidindo tacitamente, ou seja, também
desobedecendo ao dever constitucional de fundamentação.
LFG afirma que o arquivamento indireto ocorre quando o MP identifica que o juiz não é
competente, mas o juiz se entende competente. Se o MP diz que não tem atribuição, o juiz
pode: 1) concordar, remetendo para o juízo competente; 2) discordar, e, assim, enviar os autos
ao PGJ, nos termos do art. 28, do CPP; aqui caso o PGJ concorde com o promotor,
discordando, portanto, do juiz, este nada poderá fazer (não pode obrigar o MP ao oferecimento
da denúncia perante aquele Juízo).Melhor dizendo, o MP, ao invés de requerer o arquivamento
ou o retorno dos autos à polícia para novas diligências, ou, ainda, de não oferecer denúncia,
manifestar-se no sentido da INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO perante o qual oficia, recusando, por
isso, atribuição para a apreciação do fato investigado. O juiz não concordando com a alegação
de incompetência, aplicará o artigo 28, CPP, e se submeterá à decisão da última instância do
MP, tal como ocorre em relação ao ARQUIVAMENTO propriamente dito, ou o arquivamento
direto. Esse tipo de arquivamento já passou pelo crivo do STF, que acolheu tal tese.
CONFLITO DE ATRIBUIÇÕES DOS MP
Trata-se de tema ainda aberto nas nossas Cortes Superiores. Entre membros do MP do
mesmo Estado ou do entre membros de MP do mesmo ramo do MPU, não há dúvidas: a) MP
estadual: PGJ; b) MPU: respectiva Câmara de Coordenação e Revisão; c) entre ramos
diferentes do MPU (exemplo: MPT e MPF): PGR, nos termos do art. 26, inc. VII, da LC 75/93.
O problema ocorre quando se tratar de membros do MPE, de um lado, e membros do MPF, de
outro.
Conforme Pacelli, três correntes surgiram: a) o PGR, como órgão máximo do MP brasileiro,
deveria decidir; b) trata-se de dissenso entre órgão federal e estadual, portanto, a competência
seria do STF, a teor do art. 102, I, CF; c) ter-se-ia, no caso, verdadeiro conflito virtual de
competência, porque tudo desaguará no Judiciário, assim, invocável o art. 105, I, d, CF, e,
portanto, a competência seria do STJ.
Na verdade, o tema ainda está aberto. O primeiro posicionamento nunca foi bem aceito, porque
o PGR é o chefe do MPU e do MPF, portanto, não tem qualquer ingerência sobre os MPE’s. Na
PET 1503/MG, o Plenário do STF acolheu posição do Ministro Maurício Corrêa, no sentido de
que se verifica “...Presença de virtual conflito de jurisdição entre os juízes federal e estadual
perante os quais funcionam os órgãos do parquet em dissensão. Interpretação analógica do
artigo 105, I, d, da Carta da República, para fixar a competência do Superior Tribunal de
Justiça, a fim de que julgue a controvérsia”. Tal entendimento foi seguinte posteriormente em
outros casos como na ACO 756/SP.

PONTO 1 – ITEM “PRISÃO EM FLAGRANTE”: JÁ COM A ALTERAÇÃO DA NOVA LEI.


1. PRISÃO EM FLAGRANTE
A lei 12.403/11 trouxe importante alteração na prisão em flagrante.
a) Conceito de flagrante: A expressão deriva do latim “flagrare”, que significa “queimar”.
Flagrante é algo que está “queimando”, o delito que está sendo cometido ou que acabou de
ser.
Não se pode confundir o flagrante com a prisão em flagrante.
Prisão em flagrante: A prisão em flagrante é uma medida de autodefesa da sociedade,
caracterizada pela privação da liberdade de locomoção daquele que é surpreendido em
situação de flagrância, a ser executada independentemente de prévia autorização judicial.
Em regra, a ninguém é dado fazer justiça com as próprias mãos. Mas, em situações
excepcionais, o próprio ordenamento autoriza a autotutela, uma vez que o Estado não está
presente em todos os locais. A própria CF/88 autoriza que até mesmo um particular prenda
alguém em flagrante.
b) Funções processuais da prisão em flagrante:
1. Evitar a fuga do infrator;
2. Auxiliar na colheita de elementos informativos (produzidos na fase investigatória) – a
probabilidade de êxito de persecuções penais que se iniciam com a prisão em flagrante é muito
maior do que nos demais casos;
3. Impedir a consumação ou o exaurimento do delito, a depender do caso concreto.
A prisão em flagrante serve para que a pessoa permaneça presa ao longo do processo?
Antes da Lei 12.403/11: a prisão em flagrante, por si só, autorizava a permanência do
acusado na prisão durante o curso da persecução penal, o que era criticado pela doutrina. Não
havia nenhum dispositivo que obrigasse o juiz a transformar a prisão em flagrante em
preventiva. Muitas vezes, a pessoa continuava presa até o dia em que começava o processo,
ficando “esquecida” na delegacia.
Após a Lei 12.403/11: se o juiz entender que a prisão deve ser mantida, deve converter a
prisão em flagrante em prisão preventiva. Art. 310, II, CPP.
CPP. Art. 310. Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentadamente:
I - relaxar a prisão ilegal; ou
II - converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes
do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares
diversas da prisão; ou

Desnecessária a existência de representação do agente policial ou da oitiva do Parquet, pois,


existindo a necessidade da custódia preventiva respeitado os requisitos do art. 312 do Código
de Processo Penal, deve o magistrado, mesmo sem provocação, decreta-la. Não há que falar
em nulidade no decisum de primeiro grau pela ausência de representação policial ou
ministerial, na medida em que se cuida de mera conversão da prisão em flagrante em
preventiva, em exato cumprimento do dispositivo legal.
(HC 263.320/MS, Rel. Ministra MARILZA MAYNARD (DESEMBARGADORA CONVOCADA DO
TJ/SE), QUINTA TURMA, julgado em 28/05/2013, DJe 03/06/2013)

III - conceder liberdade provisória, com ou sem fiança.


Parágrafo único. Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o
fato nas condições constantes dos incisos I a III do caput do art. 23 do Decreto-Lei nº 2.848, de
7 de dezembro de 1940 - Código Penal, poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado
liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos processuais, sob
pena de revogação.

c) Sujeitos da prisão em flagrante:


Sujeito ativo: é aquele que efetua a prisão em flagrante. Não deve ser confundido com a figura
do condutor que, às vezes, pode ser a mesma pessoa.
O sujeito ativo da prisão em flagrante pode ser qualquer pessoa: autoridade policial ou
particular.
Flagrante obrigatório ou compulsório ou coercitivo: Quando é efetuada pela autoridade
policial, trata-se do flagrante obrigatório ou compulsório ou coercitivo. O policial tem obrigação
de agir. Não há qualquer critério de discricionariedade (decisão de prender ou não). O policial
age acobertado pelo estrito cumprimento do dever legal.
A lei fala apenas em autoridade policial; não abrange o juiz ou o membro do MP.
A omissão do policial pode até mesmo ensejar responsabilização penal (prevaricação). O
policial é garantidor, tem obrigação de cuidado, proteção e vigilância. A omissão será
penalmente relevante se era possível agir.
Há uma hipótese em que a obrigação de agir do policial é mitigada?
Sim, o flagrante obrigatório acaba sendo mitigado pela ação controlada. São as situações em
que se pode postergar o flagrante.
Flagrante facultativo: Quanto ao particular, há a faculdade de se efetuar a prisão em
flagrante. A doutrina chama a prisão feita pelo particular de flagrante facultativo. O particular
estará agindo em exercício regular de direito.
Sujeito passivo: pelo menos em regra, qualquer pessoa pode ser presa em flagrante.
Contudo, há exceções, já abordadas no ponto das imunidades prisionais (Presidente,
senadores, deputados, agentes diplomáticos, membros do MP, advogados).
d) Espécies de flagrante
Art. 302, CPP. Nesse dispositivo, consta a maioria das espécies.
CPP. Art. 302 - Considera-se em flagrante delito quem:
I - está cometendo a infração penal; (FLAGRANTE PRÓPRIO)
II - acaba de cometê-la; (FLAGRANTE PRÓPRIO)
III - é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em
situação que faça presumir ser autor da infração; (QUASE-FLAGRANTE)
IV - é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam
presumir ser ele autor da infração. (FLAGRANTE PRESUMIDO)

1. Flagrante próprio, perfeito, real ou verdadeiro.


Art. 302, I e II.
Ex: pessoa furta objeto no supermercado e, ainda no interior do supermercado, é preso em
flagrante. Essa prisão é legal? Não! Os tribunais entendem que o início da execução só
ocorreria no momento em que se passasse pelo caixa do supermercado e não efetuasse o
pagamento.
2. Flagrante impróprio, imperfeito, irreal ou quase-flagrante.
Previsto no art. 302, III.
O dispositivo mostra que deve ter havido perseguição e ela deve começar “logo após” a prática
delituosa.
O que se entende por “logo após”?
É o tempo que decorre entre o acionamento da polícia, seu comparecimento ao local, colheita
de informações quanto ao autor e início da perseguição.
A perseguição pode durar mais de 24 horas?
Sim. O que interessa é que a perseguição tenha início logo após a conduta, mas ela deve ser
ininterrupta e pode durar tantas horas quanto necessário.
Art. 290, § 1º, CPP.
CPP. Art. 290 - Se o réu, sendo perseguido, passar ao território de outro município ou
comarca, o executor poderá efetuar-lhe a prisão no lugar onde o alcançar, apresentando-o
imediatamente à autoridade local, que, depois de lavrado, se for o caso, o auto de flagrante,
providenciará para a remoção do preso.
§ 1º - Entender-se-á que o executor vai em perseguição do réu, quando:
a) tendo-o avistado, for perseguindo-o sem interrupção, embora depois o tenha perdido de
vista;
b) sabendo, por indícios ou informações fidedignas, que o réu tenha passado, há pouco tempo,
em tal ou qual direção, pelo lugar em que o procure, for no seu encalço.
§ 2º - Quando as autoridades locais tiverem fundadas razões para duvidar da legitimidade da
pessoa do executor ou da legalidade do mandado que apresentar, poderão pôr em custódia o
réu, até que fique esclarecida a dúvida.

Crimes praticados contra pessoas vulneráveis:


Ex: crime sexual praticado contra criança de 3 anos às 3 horas da tarde e o agente é
preso às 7 da noite, em outro lugar. Pode haver essa prisão em flagrante?
O “logo após” deve valer não para o momento da prática do delito, mas sim para o momento
em que o representante legal do menor toma conhecimento do crime e aciona as autoridades.
Isso porque a criança não teria condição de acionar a polícia. Por isso, o flagrante é válido.
III - é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em
situação que faça presumir ser autor da infração; (QUASE-FLAGRANTE)

STJ, HC 3.496:
STJ, HC 3496: ESTADO DE QUASE-FLAGRÂNCIA. PRISÃO. ATENTADO VIOLENTO AO
PUDOR. 1- Em se tratando de quase-flagrante ou flagrante impróprio relativo a fato contra
menor, o tempo a ser considerado medeia entre a ciência do fato pelo seu representante e as
providências legais que este venha a adotar para a perseguição do paciente. 2- Havendo
perseguição ao ofensor, por policiais, logo após terem sido informados do fato pela mãe da
vítima, caracterizado está o estado de quase-flagrância, pouco importando se a prisão ocorreu
somente quatro horas após. 3- Fato comprovado que dá subsistência ao auto de prisão em
flagrante. 4- Ordem denegada.
3. Flagrante presumido, ficto ou assimilado
Art. 302, IV, CPP. Nesse flagrante presumido, não há necessidade de perseguição. Basta
que a pessoa seja encontrada com objetos que tragam a presunção de autoria.
No flagrante presumido, o encontro casual deve ser “logo depois” da prática delituosa. No
flagrante impróprio, a lei fala em “logo após”. Há diferença?
A doutrina mais antiga diz que, se a lei usou palavras distintas, é porque o significado é
distinto. Dizem que o “logo depois” é um pouco a mais que o “logo após”.
Isso não mais prevalece! A doutrina moderna diz que é a mesma coisa.
Flagrante provocado ou preparado ou crime de ensaio ou delito putativo por obra
do agente provocador.
Requisitos cumulativos:
a) Indução à prática do delito pelo agente provocador, que pode ser tanto um policial quanto
um particular);
b) Adoção de precauções para que o delito não se consume.
O crime só existiu “na cabeça do criminoso”.
O flagrante preparado é uma hipótese de crime impossível. Isso por causa da ineficácia
absoluta do meio, pelas precauções que impedem a consumação do delito.
Súmula 145, STF:Não há crime, quando a preparação do flagrante pela polícia torna
impossível a sua consumação.
Prisão em flagrante por crime impossível: essa prisão é ilegal. Deve haver o seu imediato
relaxamento.
5. Flagrante esperado
A autoridade policial se limita a aguardar o momento da prática delituosa. Não há ação de
agente provocador; a autoridade não induz nada. O que acontece é que, devido a uma prévia
investigação, toma-se o conhecimento de que um delito será praticado e se espera a prática
para que ocorra a prisão.
Prisão em flagrante esperado: é uma prisão legal. Não houve qualquer induzimento.
Ex: venda simulada de drogas (o policial pede para um traficante a droga, simulando querer
comprá-la). O crime de tráfico de drogas é crime de ação múltipla ou de conteúdo variado.
Quanto à venda da droga, o flagrante é preparado e não seria legal. Contudo, o agente já
portava a droga e poderá ser responsabilizado, sendo plenamente possível a prisão em
flagrante do agente com base nos verbos ‘trazer consigo’, ‘guardar’, etc., desde que a posse da
droga seja preexistente.
Nesse caso de prisão em flagrante por drogas, lembrar que é indispensável o laudo preliminar
de constatação da natureza.
6. Flagrante postergado ou prorrogado ou diferido ou de ação controlada
Essa prisão consiste no retardamento da intervenção policial, que continua sendo obrigatória,
para que ocorra no melhor momento sob o ponto de vista probatório.
Ex: apreensão de droga em mala em aeroporto. É interessante deixar a prisão para momento
posterior, para que se identifique o maior número de pessoas envolvidas no crime.
Esse flagrante está previsto na lei de drogas (11.343/06), lei das organizações criminosas
(12.850/2013) e lei de lavagem de capitais (9.613/98).
Lei das organizações criminosas: não há necessidade de autorização judicial, porém, com a
Nova Lei das Organizações Criminosas, deve haver prévia comunicação ao juiz competente
(artigo 8º, § 1º).
Lei de drogas e Lei de lavagem de dinheiro: há previsão expressa da necessidade de
autorização judicial.
7. Flagrante forjado ou fabricado, maquinado ou urdido
Um policial ou um particular cria provas de um crime inexistente. Trata-se de prisão ilegal e, em
se tratando de autoridade, é crime de abuso de autoridade.
Ex: colocar drogas no carro de alguém.
e) Prisão em flagrante nas várias espécies de crimes
Crimes permanentes: a consumação se prolonga no tempo.
Ex: quadrilha, extorsão mediante sequestro, algumas modalidades de tráfico e de lavagem de
capitais, associação para o tráfico. A prisão em flagrante pode ser efetuada a qualquer
momento. Art. 303, CPP.
Art. 303. Nas infrações permanentes, entende-se o agente em flagrante delito enquanto não
cessar a permanência.
Inclusive a violação ao domicílio poderá ser realizada para o flagrante, mesmo sem autorização
judicial.
Crimes habituais: são aqueles crimes que demandam a prática reiterada de determinada
conduta.
Ex: exercício ilegal da medicina (art. 282, c; a prática isolada de determinada conduta não
caracteriza o crime).
Há grande polêmica doutrinária:
1ª Corrente: Não é possível a prisão em flagrante em crimes habituais, por não ser possível a
verificação, no momento da prisão, se o crime foi ou não cometido de maneira reiterada (Paulo
Rangel, Capez, Tourinho Filho).
2ª Corrente: É possível a prisão em flagrante, a depender das circunstâncias do caso
concreto. Ex: falso médico em um consultório, com estrutura montada, agenda cheia de
consultas e vários pacientes na sala de espera. Não há dúvida acerca da prática reiterada do
crime.
Crimes de ação penal privada e ação penal pública condicionada à representação: A
prisão em flagrante é possível, mas é condicionada à manifestação do ofendido. Ex: estupro.
Não há necessidade de formalismo quanto a essa manifestação da vítima, mas o ideal é que
ela se dê em 24 horas, que é o prazo que o delegado tem para lavrar o APF.
Crimes culposos: Prisão em flagrante em crimes culposos é plenamente possível, mas muito
provavelmente a pessoa não permanecerá presa. É cabível a concessão de fiança pela
autoridade policial.
Art. 301, CTB: hipóteses em que o condutor presta socorro à vítima; não haverá flagrante nem
se exigirá fiança.
CTB.Art. 301. Ao condutor de veículo, nos casos de acidentes de trânsito de que resulte
vítima, não se imporá a prisão em flagrante, nem se exigirá fiança, se prestar pronto e integral
socorro àquela.

Crimes formais: É possível a prisão em flagrante? Ex: um funcionário público exige dinheiro
de alguém para não praticar um ato e pede que o dinheiro seja levado em outro local em outro
dia. A prisão em flagrante ocorre no momento da entrega do dinheiro, que é o exaurimento da
conduta delituosa. Isso pode ocorrer?
O flagrante é possível, mas deve ocorrer no momento da execução do delito e não no
exaurimento.
Crime continuado: (flagrante fracionado).
O crime continuado é uma ficção jurídica: crimes da mesma espécie, praticados com
homogeneidade de circunstâncias de tempo, lugar e modo de execução.
A prisão em flagrante é possível e pode ser efetuada em qualquer um dos crimes da
continuidade.
f) Prisão em flagrante e apresentação espontânea do agente
Cuidado com a Lei 12.403/11 e a nova redação dos artigos 317 e 318 do CPP.
Ainda que se apresentasse espontaneamente, a prisão preventiva poderia ser realizada (antiga
redação do art. 317). A doutrina, interpretando esse artigo, dizia que a prisão em flagrante não
poderia ser feita.
Hoje, esses artigos falam de outro assunto e não há mais o capítulo da apresentação
espontânea no CPP. Então, pode ou não haver a prisão???
1ª Corrente: diante da mudança do art. 317 e da inexistência do assunto no CPP, seria
possível a prisão em flagrante nas hipóteses de apresentação espontânea (LFG).
2ª Corrente: continua não sendo possível a prisão em flagrante (Renato Brasileiro), o que, no
entanto, não impede a decretação da prisão preventiva. Quando a pessoa se apresenta
espontaneamente, ela não está em situação de flagrância.
Ainda não há posição jurisprudencial sobre a mudança legislativa nesse ponto.
g) Fases da prisão em flagrante
1. Primeiro momento: captura do agente. É um momento muito delicado, pois não se sabe
qual será a reação do indivíduo.
Considerações sobre a captura: pode se valer do emprego de força? Sim. Art. 292, CPP.
Havendo resistência, os meios necessários podem ser utilizados.
Uso de algemas: com moderação. Somente quando houver resistência ou pretensão de fuga
por parte do preso ou quando se verificar que a utilização das algemas é necessária para evitar
agressão do preso contra policiais, contra terceiros ou contra si mesmo.
Há a súmula vinculante 11:
Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo
à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a
excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente
ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da
responsabilidade civil do Estado.
A doutrina critica a súmula, dizendo que isso não é matéria para uma súmula vinculante, pois
não se trata de grande controvérsia sobre matéria de direito.
Exibição de presos pela imprensa: apenas se a exibição atender a alguma finalidade de
interesse público. Ex: a exibição de um estuprador preso em região em que várias mulheres
foram estupradas e se busca a autoria.
2. Segundo momento: condução coercitiva à delegacia.
3. Lavratura do auto de prisão em flagrante.
O APF é lavrado no local onde o crime foi praticado ou no local onde se deu a prisão?
A lavratura se dá no local da captura. Art. 290, CPP.
Lei 11.343/06, art. 48, § 2º e Lei 9.099/95, art. 69, § único: para o usuário de drogas e autor de
infração de menor potencial ofensivo, não se imporá prisão em flagrante. Mas isso não significa
que nada possa ser feito contra essa pessoa.
A captura é possível e a condução coercitiva também. O que se deve entender é que não será
lavrado o APF. No caso dos juizados, não se lavrará o APF desde que o agente compareça ao
juizado ou assuma o compromisso de lá comparecer.
4. Recolhimento à prisão.
Às vezes, será possível a concessão de fiança pela autoridade policial. Art. 322, CPP. Se não
for possível, é que ocorrerá o recolhimento à prisão.
CPP.Art. 322. A autoridade policial somente poderá conceder fiança nos casos de infração
cuja pena privativa de liberdade máxima não seja superior a 4 (quatro) anos.
Parágrafo único. Nos demais casos, a fiança será requerida ao juiz, que decidirá em 48
(quarenta e oito) horas.

Se o agente não paga a fiança, ele ficará aguardando a manifestação judicial.


Até esse momento (4), trata-se de ato administrativo. Para fins de HC, a autoridade coatora até
esse momento é o delegado de polícia e o HC será julgado pelo juiz de 1ª instância.
5. Comunicação à família e entrega da nota de culpa.
A nota de culpa é um instrumento entregue ao preso que dá ciência a ele dos motivos e dos
responsáveis pela sua prisão. Art. 5º, LXIV, CF/88.
6. Comunicação imediata e remessa do APF, em até 24 horas, ao juiz e ao MP. Se o
autuado não informar o nome de seu advogado, também à Defensoria Pública.
CPP. Art. 306. A prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados
imediatamente ao juiz competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à pessoa por
ele indicada. (Alterado pela L-012.403-2011)
§ 1º Em até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, será encaminhado ao juiz
competente o auto de prisão em flagrante e, caso o autuado não informe o nome de seu
advogado, cópia integral para a Defensoria Pública. (Alterado pela L-012.403-2011)
§ 2º No mesmo prazo, será entregue ao preso, mediante recibo, a nota de culpa, assinada pela
autoridade, com o motivo da prisão, o nome do condutor e os das testemunhas. (Alterado pela
L-012.403-2011)

Qual é a consequência do descumprimento desse ponto 6? Trata-se de mera


irregularidade ou ilegalidade? Dizer que é mera irregularidade é negar importância ao
preceito constitucional. A inobservância dessas formalidades acarreta a ilegalidade da prisão
em flagrante, devendo haver o seu relaxamento. Contudo, isso não impede a decretação da
prisão preventiva: é uma ilegalidade, mas, desde que presentes os seus pressupostos legais,
poderá ser decretada a prisão preventiva.
As formalidades não devem ser banalizadas, mas isso não significa que o agente sempre será
imediatamente solto, caso presentes os pressupostos da preventiva. Poderão também ser
impostas as medidas cautelares.

h) Convalidação judicial da prisão em flagrante


Essa é a grande mudança trazida pela nova lei. Nova redação do art. 310 do CPP.
CPP.Art. 310. Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentadamente:
(Alterado pela L-012.403-2011)
I - relaxar a prisão ilegal; ou (Acrescentado pela L-012.403-2011)
II - converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes
do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares
diversas da prisão; ou
III - conceder liberdade provisória, com ou sem fiança.
Parágrafo único. Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o
fato nas condições constantes dos incisos I a III do caput do art. 23 do Decreto-Lei nº 2.848, de
7 de dezembro de 1940 - Código Penal, poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado
liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos processuais, sob
pena de revogação.

Ao receber cópia do APF, o juiz deverá, fundamentadamente:


I. Relaxar a prisão ilegal. O preso estava mesmo em situação de flagrância? As formalidades
constitucionais e legais foram observadas? Se não, haverá o relaxamento da prisão, o que não
impede que se decrete a preventiva ou cautelares diversas da prisão.
II. Converter a prisão em flagrante em preventiva. Quando presentes os requisitos do art.
312, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão.
A nova lei diz que, se o juiz entender que a prisão precisa ser mantida, deve haver a
conversão. Essa conversão deve ser feita de maneira fundamentada.
A doutrina diz que a conversão pode ser também em prisão temporária e não apenas em
preventiva. Às vezes, é mais fácil uma temporária do que uma preventiva.
A lei diz que deverão estar presentes os requisitos do art. 312. A lei não menciona o art. 313,
que passou a prever quais são os crimes que admitem a preventiva. Então, deve ser
observado apenas o 312 ou ambos? Interpretar que seria apenas o art. 312 não faz sentido,
pois necessariamente deve ser observado o art. 313 quando uma pessoa está solta; então
também deverá ser observado quando for preso em flagrante.
As medidas cautelares devem funcionar como prima ratio à decretação da preventiva.
III. Conceder a liberdade provisória, com ou sem fiança cumulada ou não com as
medidas cautelares diversas da prisão.
O flagrante, por si só, não é mais fundamento para que alguém permaneça preso.
A liberdade provisória pode ser concedida em conjunto com as cautelares, caso necessário.
Ex: funcionário público corrupto preso em flagrante. Não precisa ser mantido preso; concede a
liberdade provisória com fiança e também a cautelar de suspensão do exercício da função para
impedir a reiteração delituosa.
Agora, a pessoa não mais permanece presa em flagrante durante todo o processo.
Se a prisão em flagrante for legal, dela poderá resultar duas possíveis medidas
cautelares:
a) Haverá a conversão em prisão preventiva ou;
b) Será concedida a liberdade provisória.
Qual é a natureza jurídica da prisão em flagrante?
A maioria da doutrina ainda insiste em dizer que é uma espécie de prisão cautelar. Contudo,
pelo que foi dito, agora a prisão em flagrante sozinha não justifica mais que a pessoa
permaneça presa. Ou se converte em preventiva (exemplo de medida cautelar) ou se concede
liberdade provisória (também medida de natureza cautelar). Assim, hoje, a prisão cautelar dá
origem a duas possíveis medidas cautelares. Ela passa a ter natureza jurídica de uma medida
de natureza pré-cautelar!
Prisão em Flagrante: espécie de prisão cautelar que dá origem a duas medidas cautelares.
Tem natureza jurídica medida pré-cautelar.
Assim, hoje, se alguém estiver preso em flagrante após a edição da lei, trata-se de uma prisão
ilegal, pois deve ser convertida ou preventiva ou ser concedida a liberdade provisória.

PONTO 1 – ITEM “ANALOGIA”:

“A analogia é a atividade pela qual se aplica hipótese prevista em lei a uma hipótese
semelhante sem previsão legal. Quanto à natureza jurídica, a analogia é forma de auto-
integração da lei, e não de interpretação. (...) A analogia é expressamente prevista no
CPP (art. 3º) e no CPPM (art. 3º,
Quanto às espécies de analogia, temos as seguintes:
a) quanto à fonte: a.1) analogia legis: método de integração da norma com outra; a.2) analogia
iuris: método de integração da norma ou do ordenamento jurídico com os princípios gerais de
direito;
b) quanto ao resultado: b.1) analogia in bonam partem: em benefício do acusado (permitida);
b.2) analogia in malam partem: em prejuízo do acusado (proibida no direito penal, mas
permitida no direito processual penal, se não houver constrição da liberdade individual).
A lei processual admite interpretação extensiva e analogia. Veja arts. 4º e 5º da LINDB e art. 3º
do CPP (previsão expressa). Exemplo de analogia no processo penal: aplica-se a suspeição
por motivo íntimo, prevista no CPC, art. 135, parágrafo único, também ao juiz criminal, mesmo
não tendo previsão no CPP.
Podemos fazer as seguintes distinções entre:
a) analogia: não existe norma reguladora do caso concreto, devendo ser aplicada norma que
trata de hipótese semelhante. Dizemos, então, que há uma aplicação analógica. Por exemplo,
na hipótese de ‘arquivamento indireto’, um promotor de justiça se manifesta no sentido de não
querer oferecer a denúncia, em razão de considerar o juiz incompetente, o qual afirmou sua
competência. Como não há norma específica regulando como resolver o problema, o juiz aplica
analogicamente o art. 28 do CPP, que trata de hipótese semelhante, na qual ocorre
discordância judicial do pedido (expresso) de arquivamento;
b) interpretação extensiva: existe a norma para o caso concreto, mas ela não mencionou
expressamente o seu alcance, que foi atingido pela interpretação. Por exemplo, o art. 33 do
CPP trata da queixa, mas está claro que a lei também quis dizer interpretação; c) interpretação
analógica: a norma regula o caso concreto de modo expresso, embora genericamente. Após
enumeração casuística, a norma traz formulação genérica, que deve ser interpretada de acordo
com os casos anteriormente elencados; por exemplo, arts. 121, §2º, III e IV, do CP, art. 171 do
CP e art. 403 do CPP.” – Denilson Feitoza Pacheco.

PONTO 1 – ITEM “PROCESSO PENAL MILITAR”:

Aplicação da lei processual penal militar - o CPPM admite a aplicação subsidiária da lei
processual comum nos casos omissos, fazendo ressalva expressa (art. 3º, CPPM), desde que
não haja prejuízo da índole do processo penal militar (ou seja, desde que não fira os princípios
do processo penal castrense). Pela ordem, em caso de omissão aplica-se: a) legislação
processual penal comum; b) jurisprudência; c) usos e costumes militares; d) princípios gerais
de direito; e) analogia.
Aplica-se ao CPPM o princípio do tempus regit actum (art. 5º), ou seja, a nova lei processual
aplica-se de imediato.
Inquérito policial militar (IPM):
A atribuição de polícia judiciária militar é exercida pela Polícia Militar, se o agente for policial
militar, ou pelo respectivo Corpo de Bombeiros Militar, se o agente for bombeiro militar. A
presidência do inquérito fica a cargo do comandante da unidade (ou batalhão), ou de um
encarregado, que recebe a atribuição de presidir o IPM por delegação do comandante (v. art.
7º, §1º, CPPM). Tal encarregado, necessariamente, deve ser Oficial (Bombeiro ou PM, sempre
da mesma corporação que o suspeito).
Caso o agente seja Oficial (PM ou BM), o encarregado deve ser de posto superior ao dele.
Sendo o suspeito/indiciado praça, basta que seja Oficial da mesma corporação, de qualquer
patente, mas, atendendo ao disposto no art. 15, CPPM, deve ser, preferencialmente, oficial de
posto não inferior ao de capitão. Ressalte-se que não é norma imperativa, sendo corriqueiro,
na prática, a atribuição de tal encargo a Oficial de posto inferior (Primeiro ou Segundo
Tenente).
O art. 8º, CPPM enumera as atribuições da polícia judiciária militar (o dispositivo,
incorretamente, utiliza o nomen iuris “competência”): apurar os crimes militares, prestar aos
órgãos e juízes da justiça militar e aos membros do MP informações necessárias à instrução e
julgamento dos processos, bem como realizar as diligências que por eles lhe forem
requisitadas; cumprir os mandados de prisão expedidos pela Justiça Militar; representar a
autoridades judiciárias militares acerca da prisão preventiva e da insanidade mental do
indiciado; cumprir determinações da Justiça Militar relativas aos presos sob sua guarda e
responsabilidade, bem como demais prescrições do CPPM nesse sentido, solicitar das
autoridades civis as informações e medidas que julgar úteis à elucidação das infrações penais,
que esteja a seu cargo; requisitar da polícia civil e repartições técnicas civis as pesquisas e
exames necessários ao complemento e subsídio de IPM; atender, com observância dos
regulamentos militares, a pedido de apresentação de militar ou funcionário de repartição militar
à autoridade civil competente, desde que legal e fundamentado o pedido.
Vale ressaltar que o encarregado exerce funções equivalentes no IPM, grosso modo, ao do
delegado no IP.
O IPM é iniciado mediante portaria (art. 10): de ofício, pela autoridade militar em cujo âmbito
ocorreu a infração penal militar, observando a hierarquia do infrator; por determinação de
autoridade militar superior; em virtude de requisição do MP; a requerimento do ofendido ou de
quem tenha tomado conhecimento da infração penal cuja repressão caiba à Justiça Militar;
quando, de sindicância feita em âmbito militar, resulte indício da existência de infração penal
militar. Ressalte-se que um oficial de patente inferior não pode instaurar IPM contra seu
superior, devendo comunicar a infração à autoridade superior competente (comandante do
autor da infração, em regra), para que esta decida sobre a instauração do inquérito (art. 10,
§1º). Da mesma forma, se no curso do IPM se verifica que existem indícios de autoria contra
militar superior ao encarregado, este comunicará o comandante para proceder sua
substituição.
O escrivão do inquérito será sargento, subtenente ou suboficial (praças graduados), se o
indiciado for praça, e primeiro ou segundo-tenente, se aquele for oficial. O escrivão será
nomeado pelo encarregado.
Os arts. 12 e 13 do CPPM descrevem as atribuições do encarregado do IPM, com razoável
semelhança com as disposições do art. 6º, CPP. Cabem alguns comentários:
- O CPPM é anterior à Constituição, sendo lei de 1967, período da ditadura militar. Desta
forma, além de não haver referência ao direito ao silêncio na parte que trata do interrogatório
no inquérito, o art. 308, CPPM afirma que “o silêncio do acusado não importará confissão, mas
poderá constituir elemento para a formação do convencimento do juiz.” É cristalino que tal
dispositivo não foi recepcionado pela ordem constitucional vigente.
- Neste momento, a autoridade a que se refere o art. 12, CPPM, será o comandante ou oficial
mais graduado presente na ocasião (exemplo, um oficial de dia, como costuma ocorrer fora do
horário de expediente). Já no art. 13, CPPM, as medidas serão tomadas pelo encarregado do
inquérito (presidente do IPM). O art. 6º, CPP aglutina as medidas determinadas nos dois
artigos do CPPM em um só. Isso se dá porque no CPP a autoridade policial é presidente do
inquérito em decorrência do próprio cargo exercido (delegado de polícia). No processo penal
militar, o encarregado é designado para aquele inquérito específico e APÓS A OCORRÊNCIA
DO DELITO, cessando suas funções quando do encerramento do procedimento. Só poderá
presidir outro inquérito se houver nova delegação para apuração de outro fato criminoso. As
medidas mais imediatas, desta forma, são tomadas pela autoridade militar presente ao local, e
não pelo presidente do inquérito, que ainda não foi designado.
A previsão de incomunicabilidade do preso constante no art. 17, CPPM é inconstitucional, em
face do art. 136, § 3º, IV, CF.
O encarregado elaborará relatório (art. 22, CPPM), devendo remetê-lo a autoridade de quem
recebeu a delegação (comandante) para homologar ou não a solução, aplicar penalidade ou
determinar novas diligências. Discordando da solução, o comandante poderá avocá-lo e dar
solução diferente (art. 22, §2º).
O IPM deve ser concluído em 20 dias, se o indiciado encontrar-se preso, e em 40 dias, se este
estiver em liberdade, podendo, neste caso, haver prorrogação por mais 20 dias.
Quanto ao procedimento de arquivamento, transcrevo a lição do Prof. Denílson Feitoza
Pacheco (Direito Processual Penal, Ed. Impetus, 2009): “No direito processual penal militar, a
decisão de indeferimento do pedido de arquivamento é sujeita a recurso em sentido estrito (art.
516, ‘b”, CPPM). Vamos supor que o Promotor da Justiça Militar requeira o arquivamento ao
juiz-auditor. Este discorde do arquivamento e aplique o art. 397, caput, do CPPM (equivalente
ao art. 28 do CPP). O Promotor da Justiça Militar poderá insistir no arquivamento, interpondo
recurso em sentido estrito para o tribunal ad quem, objetivando o deferimento, em grau
recursal, do seu pedido de arquivamento. Se o tribunal ad quem der provimento ao recurso, o
inquérito policial militar será arquivado; se não der provimento, remeterá o inquérito ao
Procurador Geral de Justiça (militar), para que este decida, nos termos em que o faria se
tivesse recebido os autos diretamente do juiz-auditor. Note que o tribunal ad quem, na Justiça
Militar Federal é o STM e, se admitirmos o sistema recursal do CPPM nas Justiças Militares
Estaduais, será o tribunal de Justiça Militar, ou, se não houver, o Tribunal de Justiça.”
O trecho acima foi reproduzido apenas a título de curiosidade, já que, em virtude do art. 6º,
CPPM, não se aplica à Justiça Militar Estadual as regras do CPPM referentes a organização da
Justiça, recursos e execução de sentença. Quanto aos recursos, aplica-se o CPP comum e a
LEP vigerá as execuções de sentenças condenatórias contra os BMs e PMs. Ou seja, na
Justiça Militar Estadual (Distrital) teremos a aplicação tão-somente do art. 397, CPPM, mas não
do recurso em sentido estrito do art. 516, "b", CPPM. Em suma, o procedimento a ser adotado
no DF é idêntico ao do art. 28, CPPM.
Ainda como curiosidade, ressalte-se outra peculiaridade, também aplicável somente à Justiça
Militar Federal: o corregedor-geral de Justiça Militar da União pode interpor correição parcial
por representação perante o STM para corrigir arquivamento irregular de IPM (art. 598, ‘b’,
CPPM), no prazo de cinco dias da decisão de arquivamento. Se o STM prover a
representação, aplicará o art. 397, caput, CPPM (equivalente ao art. 28, CPP), cabendo a
palavra final ao Procurador-Geral da Justiça Militar.
O arquivamento do inquérito não obsta a instauração de outro, se novas provas aparecerem
em relação ao fato, ao indiciado ou a terceira pessoa, ressalvados o caso julgado e os casos
de extinção de punibilidade. No caso, porém, a teor do art. 25 e seu § 1º (CPPM), não haverá
desarquivamento do inquérito, como no processo penal comum, mas sim A INSTAURAÇÃO
DE NOVO IPM, POR REQUISIÇÃO DO MP.
Nos crimes sujeitos a processos especiais (deserção - arts. 187 a 192, CPM - e insubmissão -
art. 183 e seu § 1º, CPM) não existe inquérito, mas sim INSTRUÇÃO PROVISÓRIA, a teor do
art. 452 e 463, § 1º, ambos do CPPM. Voltemos ao tema quando falarmos dos processos
especiais (LIVRO II, TÍTULO II, CPPM).
Ação Penal Militar:
A ação penal no processo penal militar é sempre pública, na forma do art. 29, CPPM. Existe
previsão de ação pública condicionada à requisição no art. 31, CPPM, porém os crimes a que
se refere são de competência da Justiça Militar da União, já que são os Crimes contra a
Segurança Externa do País, de forma que, em tese, não será possível ocorrer na Justiça Militar
estadual. Aplica-se, por força do art. 5º, LIX, CF, a possibilidade de ação penal privada
subsidiária da pública, em caso de inércia do órgão ministerial. Não existe ação penal privada
ou ação pública condicionada à representação do ofendido no processo penal militar.
O CPPM refere-se a um "direito de representação" no seu art. 33, que nada mais é do que a
notitia criminis do art. 27 do CPP comum.
Ressalte-se também que não existe mitigação do princípio da obrigatoriedade da ação penal
pública, já que não se aplica a lei 9.099/1995 na órbita da Justiça Militar, por expressa vedação
de seu art. 90-A, acrescido pela Lei 9.839/1999.
Princípios da ação penal pública: oficialidade, obrigatoriedade e indisponibilidade.
Da denúncia:
Requisitos (art. 77, CPPM): designação do juiz a que se dirigir; nome, idade, profissão e
residência do acusado ou esclarecimentos pelos quais possa ser identificado; tempo e lugar do
crime; qualificação do ofendido e designação da pessoa jurídica ou instituição prejudicada ou
atingida, sempre que possível; exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias;
as razões de convicção ou presunção da delinqüência; a classificação do crime; rol de
testemunhas, em número não superior a seis, com indicação da sua profissão e residência; e o
das informantes com a mesma indicação. O rol de testemunhas poderá ser dispensado, se o
MP dispuser de prova documental suficiente para oferecer a denúncia.
O juiz rejeitará a denúncia (art. 78, CPPM): se não contiver os requisitos expressos do artigo
anterior; se o fato narrado evidentemente não constituir crime da competência da Justiça
Militar; se já estiver extinta a punibilidade em qualquer das hipóteses do art. 123 do CPM; se
for manifesta a incompetência do juiz ou a ilegitimidade do acusador.
Ausentes os requisitos formais, o juiz, antes de rejeitar a denúncia, mandará, em despacho
fundamentado, remeter o processo ao órgão do MP para que, dentro do prazo de três dias,
contados da data do recebimento dos autos, sejam preenchidos tais requisitos.
Prazos para oferecimento da denúncia: cinco dias, se o acusado estiver preso; quinze dias, se
solto. Pode ser prorrogado, por despacho do juiz, ao dobro ou ao triplo, em caso excepcional e
se o acusado não estiver preso (art. 79 e seu § 1º, CPPM). O juiz deverá manifestar-se sobre a
denúncia em quinze dias.
Sujeitos no Processo:
Do Juiz -
art. 38 - casos de suspeição: se for amigo íntimo ou inimigo de qualquer das partes; se ele,
seu cônjuge, ascendente ou descendente, de um ou de outro, estiver respondendo a processo
por fato análogo, sobre cujo caráter criminoso haja controvérsia; se ele, seu cônjuge, ou
parente, consangüíneo ou afim até o segundo grau inclusive, sustentar demanda ou responder
a processo que tenha de ser julgado por qualquer das partes; se ele, seu cônjuge, ou parente,
a que alude a alínea anterior, sustentar demanda contra qualquer das partes ou tiver sido
procurador de qualquer delas; se tiver dado parte oficial do crime; se tiver aconselhado
qualquer das partes; se ele ou seu cônjuge for herdeiro presuntivo, donatário ou usufrutuário de
bens ou empregador de qualquer das partes; se for presidente, diretor ou administrador de
sociedade interessada no processo; se for credor ou devedor, tutor ou curador, de qualquer
das partes. O art. 39 refere-se a suspeição entre adotante e adotado e o art. 40 à suspeição ou
impedimento decorrente de parentesco por afinidade.
Impedimento - art. 37, CPPM - o juiz não poderá exercer jurisdição no processo que: como
advogado ou defensor, órgão do MP, autoridade policial, auxiliar de justiça ou perito, tiver
funcionado seu cônjuge, ou parente consangüíneo ou afim até o terceiro grau inclusive; ele
próprio houver desempenhado qualquer dessas funções ou servido como testemunha; tiver
funcionado como juiz de outra instância, pronunciando-se, de fato ou de direito, sobre a
questão; ele próprio ou seu cônjuge, ou parente consangüíneo ou afim, até o terceiro grau
inclusive, for parte ou diretamente interessado. São considerados inexistentes os atos
praticados por juiz impedido.
Vale lembrar que os casos de impedimento e suspeição aplicam-se ao juiz de direito e aos
juízes militares, juízes de fato que são (membros do Conselho Permanente de Justiça e
Conselho Especial de Justiça, que serão estudados adiante).
Do MP -
Suspeição - art. 58, CPPM: se for amigo íntimo ou inimigo do acusado ou ofendido; se ele
próprio, seu cônjuge ou parente consangüíneo ou afim, até o terceiro grau inclusive, sustentar
demanda ou responder a processo que tenha de ser julgado pelo acusado ou pelo ofendido; se
houver aconselhado o acusado; se for tutor ou curador, credor ou devedor do acusado; se for
herdeiro presuntivo, ou donatário ou usufrutuário de bens, do acusado ou seu empregador; se
for presidente, diretor ou administrador de sociedade ligada de qualquer modo ao acusado.
Impedimento - art. 57, CPPM - não poderá funcionar no processo o membro do MP: se nele
houver intervindo seu cônjuge ou parente consangüíneo ou afim, até o terceiro grau inclusive,
como juiz, defensor do acusado, autoridade policial ou auxiliar da justiça; se ele próprio houver
desempenhado qualquer dessas funções; se ele próprio ou seu cônjuge ou parente
consangüíneo ou afim, até o terceiro grau inclusive, for parte ou diretamente interessado no
feito.
Do assistente de acusação -
O ofendido, seu representante legal e seu sucessor podem habilitar-se a intervir no processo
como assistentes do MP (art. 60 e parágrafo único do CPPM). Cabe ao juiz do processo,
ouvido o MP, conceder ou negar a admissão de assistente de acusação (art. 61), enquanto não
passar em julgado a sentença e recebendo a causa no estado em que se achar (art. 62). A
atuação do assistente é restrita e complementar, sendo permitido, com aquiescência do juiz e
ouvido o MP, apenas atuar nos seguintes casos: a) propor meios de prova; b) requerer
perguntas às testemunhas, fazendo-o depois do promotor; c) apresentar quesitos em perícia
determinada pelo juiz ou requerida pelo MP; d) juntar documentos; e) arrazoar os recursos
interpostos pelo MP; f) participar do debate oral. Não poderá arrolar testemunhas, exceto
requerer o depoimento das que forem referidas, nem requerer a expedição de precatória ou
rogatória, ou diligência que retarde o curso do processo, salvo a critério do juiz e com audiência
do MP, em se tratando de apuração de fato do qual dependa o esclarecimento do crime (art.
65, § 1º). Não poderá impetrar recursos, salvo de despacho que indeferir o pedido de
assistência (art. 65,§ 2º), que não terá efeito suspensivo, processando-se em autos apartados.
Do Perito -
Os peritos e intérpretes serão nomeados de preferência dentre oficiais da ativa, atendida a
especialidade (art. 48). O encargo não poderá ser recusado, salvo motivo relevante que o
nomeado justificará, para apreciação do juiz (art. 49). As perícias serão, sempre que possível,
feitas por dois peritos, especializados no assunto ou com habilitação técnica, observado o art.
48 (art. 318, CPPM).

Jurisdição e Competência:

Princípios: juiz natural; investidura; devido processo legal; inércia; indeclinibilidade da


jurisdição; indelegabilidade da jurisdição; improrrogabilidade ou aderência.
Compete à Justiça Militar Estadual processar e julgar os militares dos Estados (PMs e BMs),
nos crimes militares definidos em lei (art. 9º, CPM) e as ações judiciais contra atos disciplinares
militares (competência de natureza cível), ressalvada a competência do júri quando a vítima for
civil (nos crimes dolosos contra a vida), cabendo ao tribunal competente (no caso de SP, MG e
RS, o Tribunal de Justiça Militar - TJM; no caso do DF e demais estados, o próprio TJ) decidir
sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças (art. 125, § 5º,
CF).
À Justiça Militar da União compete processar e julgar os crimes militares definidos em lei (art.
124, CF). Ressalte-se que na esfera federal, civis poderão ser processados por crime militar
junto à Justiça Castrense, fato que não é possível na Justiça Militar Estadual.
Conceito de crime militar (art. 9º, CPM) -
Rápidos conceitos: crime militar próprio - 1ª acepção - aqueles previstos somente no Código
Penal Militar, enquanto o impróprio é o que encontra idêntica definição na lei penal comum; 2ª
acepção - referente ao agente - aquele crime, previsto somente no CPM ou também na
legislação penal comum, que é praticado por militar (ex.: deserção - art. 187, CPM - só tem
previsão no CPM e só pode ser praticado por militar da ativa; art. 240, CPM - furto simples,
praticado por militar); o impróprio é aquele praticado por civil, previsto o delito somente no CPM
ou não (ex.: insubmissão - art. 183, CPM).
São crimes militares:
I - aqueles previstos somente no CPM ou previstos de maneira diversa na lei penal comum
(crime militar próprio na primeira acepção acima colocada);
II - crimes previstos no CPM com igual definição na lei comum, quando praticados:
a) por militar em situação de atividade contra militar na mesma situação (não se aplica o
conceito de assemelhado na justiça militar estadual, e há controvérsia se é constitucional
também na esfera federal);
b) por militar em situação de atividade em lugar sujeito à administração militar, contra militar da
reserva ou civil (excetuando-se a competência do tribunal do júri no crime doloso contra a
vida);
c) por militar em serviço ou atuando em razão da função contra militar da reserva ou civil
(mesma ressalva da alínea anterior);
d) por militar em período de manobras ou exercício contra militar da reserva ou civil;
e) por militar em atividade contra o patrimônio sob a administração ou a ordem administrativa
militar.
Obs.: neste inciso, utiliza-se a segunda acepção acima referida de crime militar próprio, ou
seja, aonde o agente é militar.
III - este inciso somente se aplica na esfera federal, pois a justiça estadual não tem
competência para julgar civis (o militar da reserva é civil para tais fins).
Resumindo, será da competência da justiça militar estadual julgar os crimes militares quando o
agente for militar e estiver em serviço ou agindo em razão da função, excluída a competência
do tribunal do júri em delitos dolosos contra a vida de civil.
A competência do foro será determinada pelo lugar da infração ou, no caso da tentativa, pelo
lugar em que for praticado o último ato de execução (art. 88, CPPM). Os arts. 89 e 90 tratam do
crime cometido a bordo de navio e aeronave militar. Tal assunto tem pouca relevância na
justiça militar estadual, valendo apenas rápida leitura. O art. 91 trata de crimes cometidos fora
do território nacional. Na justiça militar estadual, a regra seria o processamento na auditoria da
capital do estado de origem do PM ou BM, caso haja auditoria descentralizada (Obs. 1:
recentemente a LOJ do TJM de MG previu auditorias militares estaduais a serem instaladas no
interior do estado, o que traria alguma relevância ao assunto; Obs. 2: é difícil imaginar caso em
que um PM ou BM possa estar em serviço fora do território nacional).
Não sendo conhecido o lugar da infração, a competência regular-se-á pelo lugar de serviço do
acusado (art. 96, CPPM). A regra do art. 93 é subsidiária, tendo difícil aplicação na justiça
militar estadual, já que somente militares da ativa da PM e BM são processados perante ela.
O art. 98, CPPM trata da competência por distribuição. A distribuição realizada em virtude de
ato anterior à fase judicial do processo prevenirá o juízo.

Haverá conexão (art. 99, CPPM): a) se, ocorridas duas ou mais infrações, tiverem sido
praticadas, ao mesmo tempo, por várias pessoas reunidas (intersubjetiva por simultaneidade)
ou por várias pessoas em concurso (intersubjetiva por concurso), embora diverso o tempo e o
lugar, ou por várias pessoas, umas contra as outras(intersubjetiva por reciprocidade); b) se, no
mesmo caso, umas infrações tiverem sido praticadas para facilitar as outras (objetiva
teleológica), ou para ocultar, conseguir impunidade ou vantagem em relação a qualquer delas
(objetiva conseqüencial); c) quando a prova de uma infração ou de qualquer de suas
circunstâncias elementares influir na prova de outra infração (instrumental ou probatória). Não
há, aqui, maiores diferenças pro processo penal comum.
Haverá continência (art. 100, CPPM): a) quando duas ou mais pessoas forem acusadas da
mesma infração (cumulação subjetiva); b) na hipótese de uma única pessoa praticar várias
infrações em concurso (casos de concurso formal, aberratio ictus e aberratio criminis).
Regras para determinação (art. 101, CPPM): no concurso entre a jurisdição especializada e a
cumulativa, preponderará aquela; no concurso de jurisdições cumulativas, prevalecerá a do
lugar da infração para a qual é cominada pena mais grave, a do lugar onde houver ocorrido o
maior número de infrações, se as penas forem de igual gravidade, ou firmar-se-á pela
prevenção nos demais casos; no concurso de jurisdição de diversas categorias, predominará a
de maior graduação (ex.: TJ sobre a auditoria militar estadual).
No caso de civil praticar crime conexo com PM, por vedação expressa, o PM será julgado na
justiça militar estadual e o civil na justiça comum (art. 102, ‘a’, CPPM e súmula 90 do STJ). Na
justiça militar federal, o militar e o civil serão julgados pela justiça castrense. Caso interessante:
PM pratica crime da Lei 4.898/1965 (abuso de autoridade) e de lesão corporal (art. 209, CPM).
Pelo primeiro será julgado no juizado especial criminal (Súmula 172/STJ) e pelo segundo, na
auditoria militar. A transação penal aceita e homologada no juizado criminal não extingue a
punibilidade pelo crime conexo (lesão corporal), que será processado e julgado na auditoria
militar estadual.
Separação facultativa de processos (art. 106, CPPM): quando as infrações houverem sido
praticadas em situações de tempo e lugar diferentes; quando for excessivo o número de
acusados, para não lhes prolongar a prisão; quando ocorrer qualquer outro motivo que ele
próprio repute relevante. Os parágrafos 1º e 2º (referentes ao recurso de ofício) não se aplicam
à Justiça Militar Estadual, por força do art. 6º, CPPM.
Separar-se-ão somente os julgamentos: se, de vários acusados, algum estiver foragido e não
puder ser julgado à revelia; se os defensores de dois ou mais acusados não acordarem na
suspeição de juiz do Conselho de Justiça, superveniente para compô-lo, por ocasião do
julgamento.
O desaforamento do processo poderá ocorrer (arts. 109 e 110, CPPM): no interesse da ordem
pública, da Justiça ou da disciplina militar; em benefício da segurança pessoal do acusado;
pela impossibilidade de se constituir o Conselho de Justiça ou quando a dificuldade de
constituí-lo ou mantê-lo retarde demasiadamente o curso do processo.
Conflito de competência (arts. 111 a 121, CPPM): poderá ser suscitado pelo acusado, pelo
órgão do MP ou pela autoridade judiciária. Quando negativo o conflito, pode ser suscitado nos
próprios autos do processo. Se positivo, o relator do feito poderá ordenar, desde logo, que se
suspenda o andamento do processo até decisão final. Como curiosidade, vale lembrar que o
conflito de competência entre auditoria militar estadual e auditoria militar federal é solucionado
pelo STJ, por força do art. 105, I, ‘d’, CF (conflito de competência entre juízes vinculados a
tribunais diversos). No caso de conflito de competência entre auditoria militar estadual e vara
criminal federal, será julgada pelo TJ, quando não houver TJM, como no DF, ou pelo STJ,
quando houver naquele estado TJM, com fulcro no mesmo dispositivo constitucional acima
transcrito (caso de SP, MG e RS).
A exceção de incompetência (arts. 143 a 147, CPPM) poderá ser oposta verbalmente ou por
escrito, logo após a qualificação do acusado. No primeiro caso, será tomada por termo nos
autos. Se aceita a alegação, os autos serão remetidos ao juízo competente. Se rejeitada, o juiz
continuará no feito. Neste caso, o art. 145, CPPM prevê recurso ao STM em autos apartados.
Ressalve-se que as disposições do CPPM referentes a recursos não se aplicam a Justiça
Militar Estadual.
Competência Interna:
Aplica-se, aqui, a regra do art. 125, § 5º, CF, com a redação da EC 45/2005, na Justiça Militar
Estadual. Ao juiz de direito da auditoria militar (juízo militar, na letra da CF) compete processar
e julgar, singularmente, os crimes militares cometidos contra civis. Independentemente da
patente ou graduação do oficial ou praça, se a vítima do delito militar for civil, será julgado pelo
juiz de direito singular, aplicando-se as regras do CPPM, desprezando-se somente aquelas que
se referem aos conselhos de justiça.
Quando a vítima não for civil, a competência para processar e julgar o crime militar será do
Conselho de Justiça. Se o agente for praça ou graduado, será julgado pelo Conselho
Permanente de Justiça da mesma corporação que o réu (PM ou BM). Sendo Oficial, será
julgado por Conselho Especial de Justiça, constituído exclusivamente para aquele processo e
composto por oficiais da mesma corporação e de patente superior a sua (ou da mesma
patente, desde que os conselheiros sejam mais antigos na corporação que o réu).
As regras de formação e composição dos Conselhos, na esfera federal, são regulados pela Lei
de organização da JMU (Lei. 8.457/92) e, na esfera do DF, pela Lei 11.697/2008, lei de
organização judiciária do DF.
O art. 39, LODJDF prevê que o Conselho Especial de Justiça será composto por 4 juízes
militares, de patente igual ou superior ao acusado e do Juiz-Auditor (Juiz de Direito do DF).
Não havendo Oficiais da ativa nessa condição, recorrer-se-á a Oficiais em inatividade. O Juiz
Auditor é presidente e relator do CEJ (art. 37, § único, LODJDF). O Conselho Permanente de
Justiça compor-se-á de 4 (quatro) Juízes Militares, escolhidos dentre os oficiais da ativa, e do
Juiz-Auditor (art. 39, § 2º, LODJDF). Os Juízes Militares do Conselho Permanente de Justiça
servirão pelo período de 4 (quatro) meses consecutivos e só poderão ser de novo sorteados
após transcorrido o prazo de 6 (seis) meses, contados da dissolução do Conselho que tenham
integrado (art. 39, § 3º, LODJDF). O Juiz Auditor presidirá e relatará os processos do CPJ (art.
37, § único, LODJDF). Cada Juiz Militar do Conselho Especial ou Permanente de Justiça terá
um suplente, ambos escolhidos em sorteio presidido pelo Juiz-Auditor em sessão pública (art.
40, LODJDF). Os Juízes Militares dos Conselhos Especial e Permanente de Justiça serão
sorteados dentre os oficiais constantes da relação que deverá ser remetida ao Juiz-Auditor pelo
Comando-Geral da Polícia Militar do Distrito Federal e pelo do Corpo de Bombeiros Militar do
Distrito Federal.
Ressalta-se que, se o militar cometer crime militar em outra unidade federativa, responderá na
auditoria da sua unidade.
Caso interessante ocorre quando o mesmo militar cometer um crime, por ex., numa mesma
ocasião, de lesão corporal (art. 290, CPM) contra um civil e de violência contra um superior seu
agravada pela lesão corporal (art. 157, § 3º, CPM). Neste caso, Ricardo Henrique Alves
Giuliani (Direito Processual Penal Militar, Ed. Verbo Jurídico, 2ª ed., pg. 131) sugere,
acompanhado por Célio Lobão (“Reforma do Judiciário. Competência da Justiça Militar” -
Revista Direito Militar nº 50), que o primeiro crime seja julgado pelo juiz de direito monocrático
e o segundo pelo Conselho competente, separando-se o processo.
Outra questão interessante refere-se a aplicação da Lei 11.719/2008 ao processo de crime
cometido por militar contra civil. Ricardo Henrique Alves Giuliani defende ser possível tal
aplicação da lei nova do processo comum ao processo de militar perante o juízo monocrático
(crime praticado contra civil). Vale lembrar que o STF entende que somente em caso de
omissão da legislação processual penal militar pode-se aplicar o CPP comum (HC 90977/MG).
Da mesma forma, o caso não é referente a recursos ou execução de pena, a teor do art. 6º,
CPPM. Tratando-se de fato que, ainda que sujeito ao juízo monocrático como os crimes
comuns, é crime militar e processado perante o juízo especializado, penso que deve seguir o
rito processual do CPPM, não sendo possível a aplicação da Lei 11.719/2008. Melhor faria o
legislador se, ao alterar o CPP, dispusesse acerca do CPPM também, já que este sempre é
esquecido nas ocasiões de reforma. Por fim, pesquisando a jurisprudência, parece-me que o
assunto ainda não pôde ser analisado pelos tribunais pátrios, em especial pelo E. STJ e E.
TJDFT.
Da citação, da intimação e da notificação:
A citação real no processo penal militar far-se-á: mediante mandado, quando o acusado estiver
servindo ou residindo na sede do juízo em que se promove a ação penal; mediante precatória,
quando estiver servindo ou residindo fora desta sede, mas no país; mediante requisição,
quando militar em atividade (art. 280, CPPM) ou preso (art. 282, CPPM). É intuitivo que, na
justiça militar estadual, esta última será a forma de citação do réu, em regra.
A citação ficta far-se-á somente por edital. Considerando não aplicar-se as recentes alterações
processuais penais ao processo castrense, não se admitirá a citação por hora certa do art. 362,
CPP. Os arts. 286 e 287 do CPPM tratam dos requisitos e prazos para a citação por edital.
As intimações e notificações são feitas em regra pelo diretor de secretaria às partes,
testemunhas e peritos, para prática de atos (notificação) ou seu conhecimento (intimação) no
curso do processo, por meio de carta, telegrama ou comunicação telefônica, bem como
pessoalmente, se estiverem presentes em juízo, o que será especificado nos autos (art. 288,
CPPM). O MP e a defensoria pública tem a prerrogativa de intimação pessoal. Tratando-se de
militar em situação de atividade a intimação ou notificação será feita por intermédio da
autoridade a que estiver subordinado. As notificações, intimações e citações serão sempre
feitas de dia e com antecedência de 24 horas, pelo menos, do ato a que se referirem. A
citação feita no início do processo é pessoal, bastando, para os demais termos, a intimação ou
notificação do seu defensor, salvo se o acusado estiver preso, caso em que será, da mesma
forma, intimado ou notificado. O processo seguirá a revelia do acusado que, citado, intimado ou
notificado, para qualquer ato do processo, deixar de comparecer sem motivo justificado.
Em relação à aplicação do art. 366 do CPP comum, em recente decisão, o STF negou
provimento a recurso ordinário em HC em que a DPU pleiteava a aplicação subsidiária, ao
processo penal militar, da regra do art. 366 do CPP (“Se o acusado, citado por edital, não
constituir advogado, ficarão suspenso o processo e o curso do prazo prescricional...)
Considerou-se ausente, no caso, fundamento legal para justificar a aplicação da suspensão
prevista no CPP comum ao processo penal militar. Não existiria, tendo em conta o caráter
excepcional e os pressupostos de aplicação analógica do CPPM, omissão a ensejar a
incidência da legislação comum. Ademais, salientou-se que a pretensão implicaria situação
desfavorável ao paciente, quanto à interrupção do prazo prescricional, uma vez que esta
hipótese não estaria prevista na legislação castrense (HC 90997/MG - Rel, Min, Carmen Lúcia -
08/06-2007).
Das Provas:
As alterações trazidas pela Lei 11.690/08, a priori, não se aplicam ao Processo Penal Militar,
devido ao princípio da especialidade deste.
O CPPM, no art. 297 acolheu o sistema da livre convicção ou livre convencimento, segundo o
qual o juiz formará sua convicção pela livre apreciação do conjunto das provas colhidas em
juízo. O Conselho Permanente ou Especial tem liberdade de apreciação, limitado apenas aos
fatos e circunstâncias constantes nos autos.
A prova no juízo penal militar, salvo quanto ao estado das pessoas, não está sujeita às
restrições estabelecidas na lei civil, sendo admissível qualquer espécie de prova, desde que
não atente contra a moral, a saúde ou segurança individual ou coletiva, ou contra a hierarquia
ou disciplina militar. Não são admitidas as provas produzidas por meios ilícitos (art. 5º, LVI,
CF).
O interrogatório é ato privativo do juiz. Somente este pode inquirir o acusado. No processo
penal militar, todos os membros do Conselho de Justiça podem fazer perguntas ao acusado,
sendo o primeiro o juiz, e, posteriormente, os juízes militares por ordem de hierarquia, sendo as
perguntas formuladas por intermédio do juiz auditor, que poderá entender pela impertinência da
pergunta e não repassá-la ao acusado. Findo o interrogatório, poderão as partes levantar
questões de ordem, que o juiz resolverá de plano, fazendo-as consignar em ata com a
respectiva solução, se assim for requerido. Não tem aplicação na Justiça militar a Lei
10.793/2003 que alterou o interrogatório no CPP comum. Havendo mais de um, cada acusado
será interrogado separadamente. Apesar da previsão do art. 305, CPPM, tal artigo não foi
recepcionado pela CF, não podendo seu silêncio ser interpretado contra si, constituindo direito
do acusado.
A confissão é meio de prova , não tendo nenhuma hierarquia entre ela e as demais existentes.
Deve ser: feita perante autoridade competente; ser livre, espontânea e expressa; versar sobre
o fato principal; ser verossímil; ter compatibilidade e concordância com as demais provas do
processo (art. 307, CPPM). A confissão é retratável e divisível.
As declarações do ofendido serão feitas na presença do acusado, que poderá contraditá-las no
todo ou em parte, após a sua conclusão, bem como requerer ao juiz que o ofendido esclareça
ou torne mais precisa qualquer das suas declarações, não podendo, entretanto, reperguntá-lo.
O ofendido não está obrigado a responder pergunta que possa incriminá-lo.
As perícias estão disciplinas nos arts. 314 a 346, CPPM. Elas serão, sempre que possível,
feitas por dois peritos, especializados no assunto ou com habilitação técnica, nomeados de
preferência dentre os oficiais da ativa, atendida a especialidade, que deverá prestar
compromisso para cada nomeação.
As testemunhas serão notificadas em decorrência de despacho do juiz-auditor ou deliberação
do Conselho de Justiça, em que será declarado o fim da notificação e o lugar, dia e hora em
que devem comparecer. O comparecimento é obrigatório, não podendo dele eximir-se a
testemunha, salvo motivo de força maior, devidamente justificado. A testemunha que,
notificada regularmente, deixar de comparecer sem justo motivo, será conduzida por oficial de
justiça e receberá uma multa na quantia de um vigésimo a um décimo do salário mínimo
vigente. Havendo recusa ou desobediência à condução, o juiz poderá impor-lhe prisão de até
quinze dias, sem prejuízo do processo penal por crime de desobediência. O art. 352, § 2º
elenca os casos em que não se tomará compromisso da testemunha, e o art. 355, os casos de
proibição de depor. O militar ou funcionário público será requisitado ao respectivo chefe, pela
autoridade que ordenar a notificação. As testemunhas serão arroladas pelo MP na denúncia e
pela defesa, regra geral, até após a oitiva das testemunhas da acusação, que mudará o prazo
para o seu oferecimento, caso de procedimento ordinário, até cinco dias após (art. 417, par. 2º,
CPPM), e em procedimentos especiais (deserção e insubmissão), até três dias após a oitiva
das testemunhas do MP, que serão ouvidas no ato do interrogatório do réu (art. 457, § 4º,
CPPM). O número de testemunhas são 6, por fato, ao MP e 6, por acusado, para a defesa (por
isonomia, apesar do artigo falar em somente 3). Esta é a regra contida na leitura dos arts. 77,
‘h’ e 417, § 2º, CPPM. O juiz pode ouvir testemunhas suplementares e referidas quando julgar
necessário. O juiz poderá, de ofício ou a requerimento de qualquer das partes, tomar-lhe
antecipadamente o depoimento, se qualquer testemunha tiver de ausentar-se ou, por
enfermidade ou idade avançada, inspirar receio de que, ao tempo da instrução criminal, esteja
impossibilitado de depor.
Os arts 365 a 367 dispõe sobre a acareação, quando houver divergência em declarações sobre
fatos ou circunstâncias relevantes.
Reconhecimento de pessoas e coisas (art. 368 a 370, CPPM): a pessoa que tiver de fazer o
reconhecimento será convidada a descrever a pessoa que deva ser reconhecida; a pessoa
cujo reconhecimento se pretender será colocada, se possível, ao lado de outras que com ela
tiverem qualquer semelhança, convidando-se a apontá-la quem houver de fazer o
reconhecimento; se houver razão para recear que a pessoa chamada para o reconhecimento,
por efeito de intimidação ou outra influência, não diga a verdade em face da pessoa que deva
ser reconhecida, a autoridade providenciará para que esta não seja vista por aquela.
Documentos - no processo penal militar, a simples fotocópia, sem autenticação,
desacompanhada de fé pública, não tem valor probante de documento. Poderão os
documentos ser juntados em qualquer fase do processo, até o momento dos autos conclusos
para julgamento, respeitando sempre o contraditório.
Prisão:
Com exceção da prisão disciplinar (art. 5º, LXI, CF), da prisão do art. 18, CPPM, nos crimes
propriamente militares, a do estado de defesa, a do estado de sítio (art. 139, II, CF) e a
recaptura de réu evadido (art. 230, parágrafo único, CPPM), toda prisão só poderá ser efetuada
em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente.
O emprego de algemas deve ser evitado, desde que não haja perigo de fuga ou de agressão
da parte do preso, e de modo algum será permitido nos presos recolhidos ao quartel ou à
prisão especial a que se refere o art. 242, CPPM.
As pessoas sujeitas à prisão provisória deverão ficar separadas das que estiverem
definitivamente condenadas (art. 239, CPPM).
Da prisão em flagrante - 1) flagrante próprio ou real: art. 244, ‘a’ e ‘b’, CPPM; 2) flagrante
impróprio ou quase-flagrante: art. 244, ‘c’, CPPM; 3) flagrante presumido ou ficto: art. 244, ‘d’,
CPPM. Qualquer pessoa poderá (flagrante facultativo) e os militares deverão (flagrante
necessário) prender quem for insubmisso ou desertor, ou seja, encontrado em flagrante delito.
A autoridade militar deverá, ao elaborar o APF, observar, além dos dispositivos constitucionais
do art. 5º, especialmente seus incisos LXII, LXIII e LXIV. Em relação à presença de advogado
no flagrante, esta é dispensável; o que é indispensável é a possibilidade de contratar um
defensor, ou na impossibilidade, os autos devem ser remetidos à Defensoria Pública no prazo
de 24 horas, conforme a Lei 11.449/2007. Deve-se observar, ainda, o disposto nos arts. 245 a
247, CPPM, devendo ser remetido o APF imediatamente ao juiz competente, ou, no máximo,
em cinco dias quando depender de diligências previstas no art. 246, CPPM, entre elas o exame
de corpo de delito e a busca e apreensão dos instrumentos do crime. Quando a prisão em
flagrante for efetuada em lugar não sujeito à Administração Militar, o auto poderá ser lavrado
por autoridade civil, ou pela autoridade militar do lugar mais próximo daquele em que ocorrer a
prisão.
Para a manutenção da prisão em flagrante há necessidade de estarem presentes os
pressupostos e fundamentos da prisão preventiva.
Pressupostos da prisão preventiva (art. 254, CPPM): prova do fato delituoso; indícios
suficientes de autoria. Fundamentos da prisão preventiva (art. 255, CPPM): garantia da ordem
pública; conveniência da instrução criminal; periculosidade do indiciado ou acusado; segurança
da aplicação da lei penal militar; exigência da manutenção das normas ou princípios de
hierarquia e disciplina militares, quando ficarem ameaçados com a liberdade do indiciado ou
acusado. Na prática, devem ocorrer os dois pressupostos do art. 254 e ao menos um
fundamento do art. 255 para fundamentar a prisão preventiva do indiciado. O art. 257
estabelece motivos que demonstram a desnecessidade da prisão preventiva. A prisão
preventiva não será decretada se for verificado, pelas provas constantes dos autos, ter o
agente praticado o fato amparado pelo erro de direito (art. 35, CPM), em coação irresistível ou
em obediência hierárquica (art. 38, CPM), em coação física irresistível (art. 40, CPM), em
estado de necessidade como excludente da culpabilidade (art. 39, CPM) e nos casos das
excludentes da ilicitude (art. 42, CPM).
Da Menagem:
“Instituto tipicamente militar, é o benefício outorgado por lei a certos acusados, os que
respondem por crimes cujo máximo da pena não exceda a quatro anos, para ficarem presos
sob palavra, fora do cárcere, uma vez preenchidos os requisitos legais. Trata-se de medida que
evita o recolhimento provisório do acusado à prisão, substituindo o instituto da prisão provisória
para a maioria da doutrina.” - Ricardo Henrique Alves Giuliani (obra citada).
A menagem pode ser concedida a militar e cumprida em sua residência, ou, atendido o seu
posto e graduação, em quartel, navio, acampamento, ou em estabelecimento ou sede de órgão
militar. O insubmisso tem uma menagem com regramento próprio, não sendo preso, mas tendo
o quartel por menagem. Não irei, contudo, aprofundar o assunto, já que a insubmissão é crime
de competência exclusivamente militar federal.
Antes de conceder a menagem, a autoridade judicial pedirá informações à autoridade militar e
ouvirá previamente o MP que emitirá parecer em três dias. Quando concedida a menagem, são
fixadas algumas condições, dentre elas, ser cumprida em determinado local, comparecer a
todos os atos judiciais a que tenha sido intimado ou a que deva comparecer
independentemente de intimação especial. Descumprindo alguma dessas condições, será
cassada a menagem. A cessação da menagem ocorre com a sentença condenatória, ainda
que não transitada em lugado. Ao reincidente é vedada expressamente a menagem (art. 269,
CPPM)
Menagem-liberdade - concedida tendo a cidade ou residência como local de cumprimento;
menagem-prisão - é concedida para ser cumprida em quartel, navio ou estabelecimento
delimitado. Esta última será contada para fins de detração penal, na execução de pena.
Liberdade Provisória:
A legislação processual penal militar prevê apenas a liberdade provisória sem fiança, com
vinculação (art. 253, CPPM) e sem vinculação (art. 270, CPPM). Esta última se dará nos
crimes: não punidos com pena privativa de liberdade; culposos, salvo se cometido contra a
segurança externa do País (caso de competência da JMU); punidos com deteção não superior
a dois anos, salvo os crimes dos arts. 157, 160, 161, 162, 163, 164, 155, 173, 177, 178, 187,
192, 235, 299 e 302, CPM. ]
Processo Ordinário:
Recebimento da denúncia ----> sorteio do Conselho Especial, se o acusado for Oficial, ou
convocação do Conselho Permanente, se praça (o juiz, exceto nos casos de vítima civil,
quando terá competência singular até o fim, só tem competência monocrática até o
recebimento da denúncia; após, a competência será do Conselho) ----> citação do acusado até
24 horas antes do interrogatório ----> qualificação e interrogatório em ato único ----> oitiva de
até 6 testemunhas da acusação por fato imputado ao réu (bem como testemunhas referidas e
substituídas pelo MP)----> prazo de cinco dias da oitiva da última testemunha de acusação para
a defesa arrolar testemunhas (máximo de 6 por acusado) ----> autos conclusos ao juiz ---->
vista em cartório para as partes requererem diligências ou juntada de documentos no prazo de
cinco dias após a oitiva da última testemunha de defesa ----> prazo para alegações escritas,
sucessivo, de oito dias para o MP e, após, para a Defesa (havendo assistente de acusação,
este terá prazo de cinco dias que será aberto após o prazo do MP; havendo mais de cinco
acusados e sendo diferentes os advogados, o prazo para as partes será de 12 dias, correndo
em cartório a vista) ----> autos conclusos para o juiz, que poderá ordenar diligências, ou,
achando-se o processo devidamente instruído, designará dia e hora para o julgamento,
cientificando os demais juízes, partes e acusado.
Obs.1: não há no processo penal militar a chamada defesa prévia.
Obs.2: as testemunhas serão inquiridas, pela ordem, pelo juiz, e, após, por intermédio deste,
pelos juízes militares, por quem arrolou (acusação ou defesa) e, por fim, pela outra parte
(defesa ou acusação). Só serão recusadas as perguntas ofensivas ou impertinentes com o fato
descrito na denúncia.
Obs.3: as partes e o acusado devem ser notificados com 3 dias de antecedência da audiência
de oitiva de testemunha
O julgamento pode ser adiado uma vez, faltando o réu solto. Não comparecendo na nova data,
será declarado revel. A ausência do advogado, na segunda ocasião, resultará na sua
substituição por outro. A ausência do assistente de acusação não obstará a realização da
audiência de julgamento.
Procedimento da audiência de julgamento - iniciada a sessão, o presidente ordenará ao
escrivão a leitura das seguintes peças: a) denúncia e seu aditamento; b) exame de corpo de
delito e conclusão de outros exames ou perícias fundamentais à configuração do crime; c)
interrogatório do acusado; d) qualquer outra pela dos autos cuja leitura tenha sido proposta
pelos juízes militares ou requeridas pelas partes. ----> 3 horas para alegações orais da
acusação ----> 1:30 hora para alegações orais do assistente de acusação ----> 3 horas para
alegações orais da defesa (se forem mais de 10 acusados, cada advogado terá direito a, no
máximo, 1 hora para cada réu e 6 horas de tempo total) ----> se houver, 1 hora para réplica
pelo MP ----> havendo, 1 hora para tréplica para a defesa ----> Em seguida, Conselho
deliberará em sessão pública (a sessão secreta do art. 434, CPPM não foi recepcionada pelo
art. 93, X, CF), votando primeiro o juiz de direito e depois os juízes militares, em ordem inversa
de hierarquia sobre as questões preliminares e o mérito da causa.
Obs.1: Poderão ser dados apartes durante os debates, desde que permitidos por quem esteja
na tribuna e não tumultuem a sessão.
Quando, pela diversidade de votos, não se puder constituir maioria para a aplicação da pena,
entender-se-á que o juiz que tenha votado por pena maior, ou mais grave, terá votado por pena
imediatamente menor ou menos grave. O Conselho de Justiça poderá: a) dar ao fato definição
jurídica diversa da que constar da denúncia, ainda que, em conseqüência, tenha de aplicar
pena mais grave, desde que aquela definição haja sido formulada pelo MP em alegações
escritas, e a outra parte tenha tido a oportunidade de respondê-la; b) proferir sentença
condenatória por fato articulado na denúncia, não obstante haver o MP opinado pela
absolvição, bem como reconhecer agravante objetiva, ainda que nenhuma tenha sido argüida
(art. 437, CPPM).
O juiz “civil”, ainda que vencido e discordando dos fundamentos ou da conclusão, redigirá a
sentença, podendo, entretanto, justificar o seu voto, no todo ou em parte, após a assinatura. Os
juízes militares vencidos também tem a faculdade de justificar seu voto. Se a sentença não for
lida na sessão de julgamento, deverá ser lida em oito dias, em audiência pública, ficando dela
intimados desde logo o MP, o réu e o defensor, se presentes.
A intimação da sentença condenatória será feita ao defensor, ao réu, pessoalmente, se estiver
preso; se o réu estiver solto ou revel, far-se-á após a prisão.
Dos Processos Especiais (Deserção e Insubmissão)
Não vou ater-me a insubmissão, por não estar na competência da justiça militar estadual, mas
sim da federal, por ser crime cometido pelo conscrito contra o serviço militar obrigatório às
forças armadas.
O crime de deserção (art. 187, CPM) é crime de mera conduta, consumando-se após expirado
o prazo de graça de 08 dias ou, no caso da deserção especial (art. 190, CPM), no momento em
que parte o navio ou aeronave a qual deixou de apresentar-se (de configuração mais
improvável na justiça militar estadual).
Consumado o crime de deserção, o comandante da unidade, ou autoridade correspondente, ou
ainda autoridade superior, fará lavrar o respectivo termo, imediatamente. O termo de deserção
tem o caráter de instrução provisória e destina-se a fornecer os elementos necessários à
propositura da ação penal, sujeitando, desde logo, o desertor a prisão. O desertor que se
apresentar ou for capturado deve ser submetido a inspeção de saúde e, se julgado incapaz
definitivamente, fica isento do processo e da reinclusão, sendo os autos arquivados, após o
pronunciamento do MP. A incapacidade temporária não afasta a condição de procedibilidade
(ser militar) para o processo. Sendo capaz, os autos serão encaminhados ao MP para
oferecimento da denúncia.
O processo, com desertor preso, deve terminar em 60 dias do momento da captura ou
apresentação voluntária do desertor, sob pena de ser o acusado colocado em liberdade, se
estourar este prazo. Contudo, é possível a concessão de liberdade provisória antes deste
prazo, conforme entendimento do STF.
As testemunhas do MP serão ouvidas na mesma ocasião da qualificação e interrogatório do
desertor. Cada parte tem direito a três testemunhas somente, devendo as testemunhas de
defesa ser arroladas três dias após a oitiva da última testemunha da acusação, devendo ser
ouvidas em cinco dias, prorrogáveis até o dobro pelo Conselho, ouvido o MP.
Não haverá apresentação de alegações escritas. No julgamento, o prazo para debates e
sustentação oral será de 30 minutos para cada parte, podendo haver réplica e tréplica pelo
prazo de 15 minutos.

Caso o acusado seja condenado, o juiz de direito expedirá, imediatamente, a devida


comunicação para a autoridade competente para os devidos fins e efeitos legais. Absolvido o
acusado, o juiz providenciará para que seja posto em liberdade, se por outro motivo não estiver
preso.
Súmulas:
STF:
155 - É competente o Tribunal de Justiça para julgar conflito de jurisdição entre juiz de direito
do estado e a justiça militar local.
Obs.: O STJ tem competência para julgar o conflito quando houver Tribunal de Justiça Militar
no Estado, como já salientado. Precedentes recentes: CC 96330 / SP, CC 99210 / MG, CC
99137 / MG.
STJ:
6 - Compete à Justiça comum estadual processar e julgar delito decorrente de acidente de
trânsito envolvendo viatura da Polícia Militar, salvo se autor e vítima forem policiais militares em
situação de atividade.
47 - Compete à Justiça Militar processar e julgar crime cometido por militar contra civil, com
emprego de arma pertencente à corporação, mesmo não estando em serviço.
Obs.: Tal Súmula encontra-se superada por outros julgados do mesmo E. STJ: CC19639/SP
(3ª Seção); HC 119813/PR (6ª Turma - acórdão de 2008); HC 59489/MG (5ª Turma), etc.
53 - Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar civil acusado de prática de crime
contra instituições militares estaduais.
Obs.: A própria EC 45/2005 sepultou qualquer possibilidade de discussão em sentido diverso.
75 - Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar policial de corporação estadual,
ainda que o delito tenha sido praticado em outra unidade federativa.
78 - Compete à Justiça Militar Estadual processar e julgar o policial militar por prática do crime
militar e à Comum pela prática do crime comum simultâneo aquele.
172 - Compete à Justiça Comum processar e julgar militar por crime de abuso de autoridade,
ainda que praticado em serviço.
192 - Compete ao Juízo das execuções penais do estado a execução das penas impostas a
sentenciados pela Justiça Federal, Militar ou Eleitoral, quando recolhidos a estabelecimentos
sujeitos à administração estadual.
Ponto I

Direito Civil

Diretrizes teóricas do Código Civil. Princípios do Direito Civil. Direito Civil Constitucional.
Das pessoas naturais. Dos atos ilícitos. Da responsabilidade civil. Dos Contratos em geral.

DIRETRIZES TEÓRICAS DO CÓDIGO CIVIL. PRINCÍPIOS DO DIREITO CIVIL. DIREITO


CIVIL CONSTITUCIONAL

O próprio Miguel Reale apontava os regramentos básicos que sustentam a atual codificação
privada: eticidade, socialidade e operabilidade. Repise-se que o estudo de tais princípios é
fundamental para que se possa entender os novos institutos que surgiram com a nova lei
privada.

De início, a respeito do princípio da eticidade, o Código Civil de 2002 se distancia do


tecnicismo institucional advindo da experiência do Direito Romano, procurando, em vez de
valorizar formalidades, reconhecer a participação dos valores éticos em todo “o Direito Privado.
Cumpre transcrever as palavras do Ministro José Delgado, do Superior Tribunal de Justiça, no
sentido de que “o tipo de Ética buscado pelo novo Código Civil é o defendido pela corrente
kantiana: é o comportamento que confia no homem como um ser composto por valores que o
elevam ao patamar de respeito pelo semelhante e de reflexo de um estado de confiança nas
relações desenvolvidas, quer negociais, quer não negociais. É, na expressão kantiana, a
certeza do dever cumprido, a tranquilidade da boa consciência.

O princípio da eticidade pode ser percebido pela leitura de vários dispositivos da atual
codificação privada. Inicialmente, nota-se a valorização de condutas éticas, de boa-fé objetiva –
aquela relacionada com a conduta de lealdade das partes negociais –, pelo conteúdo da norma
do art. 113, segundo o qual “os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e
os usos do lugar de sua celebração” (função interpretativa da boa-fé objetiva). Ademais, o art.
187 determina qual a sanção para a pessoa que contraria a boa-fé no exercício de um direito:
cometerá abuso de direito, assemelhado a ilícito (função de controle da boa-fé objetiva). Ato
contínuo,o art. 422 valoriza a eticidade, prevendo que a boa-fé deve integrar a conclusão e a
execução do contrato (função de integração da boa-fé objetiva).

No que concerne ao princípio da socialidade, o Código Civil de 2002 procura superar o caráter
individualista e egoísta que imperava na codificação anterior, valorizando a palavra nós, em
detrimento da palavra eu. Os grandes ícones do Direito Privado recebem uma denotação
social: a família, o contrato, a propriedade, a posse, a responsabilidade civil, a empresa, o
testamento.

Destaque-se que a função social da propriedade já estava prevista na Constituição Federal de


1988, em seu art. 5.º, XXII e XXIII, e no seu art. 170, III, tendo sido reforçada pelo art. 1.228, §
1.º, do CC/2002. Como novidade de grande impacto, a função social dos contratos passou a
ser tipificada em lei, prevendo o art. 421 do Código Civil que "A liberdade de contratar será
exercida em razão e nos limites da função social do contrato”. Trata-se de um princípio
contratual de ordem pública, pelo qual o contrato deve ser, necessariamente, visualizado e
interpretado de acordo com o contexto da sociedade

Por fim, há o princípio da operabilidade, que tem dois significados. De início, há o sentido de
simplicidade, uma vez que o Código Civil de 2002 segue tendência de facilitar a interpretação e
a aplicação dos institutos nele previstos. Como exemplo, pode ser citada a distinção que agora
consta em relação aos institutos da prescrição e da decadência, matéria que antes trazia
grandes dúvidas pela lei anterior, que era demasiadamente confusa. Por outra via, há o sentido
de efetividade, ou concretude do Direito Civil, o que foi seguido pela adoção do sistema de
cláusulas gerais.

São exemplos de cláusulas gerais constantes do Código Civil de 2002:

– Função social do contrato – art. 421 do CC.

– Função social da propriedade – art. 1.228, § 1.º, do CC.

– Boa-fé – arts. 113, 187 e 422 do CC.

– Bons Costumes – arts. 13 e 187 do CC.

– Atividade de risco – art. 927, parágrafo único, do CC.

As cláusulas gerais têm um sentido dinâmico, o que as diferencia dos conceitos jurídicos
indeterminados, construções estáticas que constam da lei sem definição. Assim, pode-se
afirmar que quando o aplicador do direito cumpre a tarefa de dar sentido a um conceito legal
indeterminado, passará ele a constituir uma cláusula geral.

DIREITO CIVIL CONSTITUCIONAL

Primeiramente, é importante fazer uma distinção entre publicização do direito civil e


constitucionalização do direito civil.

Publicização do direito civil: são inseridos princípios limitadores do individualismo e da


voluntariedade (autonomia da vontade), surgindo as chamadas normas de ordem pública - em
espaços antes privados por excelência, como a família, a propriedade, o contrato e o trabalho.
A consagração de normas desse jaez, pregoeiras de direitos tidos por indisponíveis, marcou a
fase denominada publicização do direito privado, segundo a qual alguns efeitos de atos
jurídicos privados eram predeterminados pelo ordenamento, de forma absoluta, surgindo o
germe de temas contemporâneos, como a função social do contrato e da propriedade.

Constitucionalização do direito civil: Na esteira das transformações experimentadas pelo direito


privado, depois da publicização veio a chamada constitucionalização do direito privado,
momento em que o foco transmudou-se definitivamente do Código Civil para a própria
Constituição Federal, a qual, no caso brasileiro, contém normas relativas à família, criança,
idoso, adolescente, proteção do consumidor e função social da propriedade. Assim, os
princípios constitucionais alusivos a institutos típicos de direito privado passaram a condicionar
a própria interpretação da legislação infraconstitucional. Na expressão de Luís Roberto
Barroso, a dignidade da pessoa humana assume dimensão transcendental e normativa, e a
Constituição passa a ser não somente "o documento maior do direito público, mas o centro de
todo o sistema jurídico, irradiando seus valores e conferindo-lhe unidade" (BARROSO, Luís
Roberto. Curso de direito constitucional contemporâneo. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p.
60).

Pois bem, três são os princípios básicos do Direito Civil Constitucional, conforme as lições de
Gustavo Tepedino, o que é fundamental para a compreensão da essência desse marco teórico
importante para a civilística contemporânea.

O primeiro deles, aquele que pretende a proteção da dignidade da pessoa humana, está
estampado no art. 1.º, III, do Texto Maior, sendo a valorização da pessoa um dos objetivos da
República Federativa do Brasil. Trata-se do superprincípio ou princípio dos princípios como se
afirma em sentido geral. A proteção da dignidade humana, a partir do modelo de Kant, constitui
o principal fundamento da personalização do Direito Civil, da valorização da pessoa humana
em detrimento do patrimônio.

O segundo princípio visa à solidariedade social, outro objetivo fundamental da República,


conforme o art. 3.º, I, da CF/1988. Outros preceitos da própria Constituição trazem esse
alcance, como no caso do seu art. 170, pelo qual: “a ordem econômica, fundada na valorização
do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna,
conforme os ditames da justiça social”. Aqui também reside o objetivo social de erradicação da
pobreza, do mesmo modo prevista na Constituição Federal de 1988 (art. 3.º, III).

Por fim, o princípio da isonomia ou igualdade lato sensu, traduzido no art. 5.º, caput, da Lei
Maior, eis que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-
se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”. Quanto a essa igualdade, princípio
maior, pode ser a mesma concebida pela seguinte expressão, atribuída a Aristóteles e Ruy
Barbosa: A lei deve tratar de maneira igual os iguais, e de maneira desigual os desiguais. Do
texto, nota-se na sua primeira parte a consolidação do princípio da igualdade stricto sensu (a
lei deve tratar de maneira igual os iguais), enquanto a segunda traz o princípio da
especialidade (... e de maneira desigual os desiguais). Essa é a essência da igualdade
substancial.

Outra questão relevante é a chamada eficácia horizontal dos direitos fundamentais, que pode
ser dividida ainda em direta e indireta.

A eficácia horizontal dos direitos fundamentais, também chamada de eficácia dos direitos
fundamentais entre terceiros ou de eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas,
decorre do reconhecimento de que as desigualdades não se situam apenas na relação
Estado/particular, como também entre os próprios particulares, nas relações privadas.
Para a teoria da eficácia indireta ou mediata, os direitos fundamentais são analisados do ponto
de vista de duas dimensões: a) dimensão negativa ou proibitiva, que veda ao legislador editar
lei que viole direitos fundamentais; b) dimensão positiva, impondo um dever para o legislador
implementar direitos fundamentais, ponderando, porém, quais deles devam se aplicar às
relações privadas. Essa a teoria prevalente na Alemanha.

Para essa teoria, não há que se falar em imposição de direitos fundamentais numa relação
entre particulares que estão em nível de igualdade. Não negam - os seguidores de referida
teoria - que os direitos fundamentais possam ser aplicados a essas relações, mas dizem que
para isso acontecer, é necessário uma intermediação através da lei. A lei, o direito privado,
teria que regulamentar, que incorporar aqueles direitos fundamentais ao direito privado, para
que a aplicação fosse relativizada, ou, tecnicamente falando, os direitos fundamentais irradiam
os seus efeitos nas relações entre particulares por meio de mediação legislativa. Então,
segundo a doutrina alemã, essa porta de entrada dos direitos fundamentais nas relações entre
particulares seriam as cláusulas gerais do direito privado, os pontos de infiltração.

Portanto, para a teoria da eficácia indireta dos direitos fundamentais, ao se interpretar uma
cláusula geral, deve-se fazê-lo com base nos direitos fundamentais que a Constituição
consagra.

Nos termos da proposta da teoria da eficácia direta ou imediata, como o próprio nome sugere,
alguns direitos fundamentais podem ser aplicados diretamente às relações privadas, ou seja,
sem a necessidade da intervenção legislativa.

PEDRO LENZA traz o seguinte sustentáculo à aplicação da teoria:

“(...) sem dúvida, cresce a teoria da aplicação direta dos direitos fundamentais às relações
privadas (‘eficácia horizontal’), especialmente diante de atividades privadas que tenham um
certo ‘caráter público’, por exemplo, em escolas (matrículas), clubes associativos, relações de
trabalho etc.”

Porém, Ingo Wolfgand Sarlet lembra que há duas considerações a respeito da aplicação da
teoria da eficácia dos direitos fundamentais às relações privadas:

Primeiro, quando há relativa igualdade das partes figurantes da relação jurídica, caso em que
deve prevalecer o princípio da liberdade para ambas, somente se admitindo eficácia direta dos
direitos fundamentais na hipótese de lesão ou ameaça ao princípio da dignidade da pessoa
humana ou aos direito aos direitos da personalidade.

Segundo: quando a relação privada ocorre entre um indivíduo (ou grupo de indivíduos) e os
detentores de poder econômico ou social, caso em que, de acordo com o referido autor, há
consenso para se admitir a aplicação da eficácia horizontal, pois tal relação privada assemelha-
se àquela que se estabelece entre os particulares e o poder público (eficácia vertical).
E ainda Armando Cruz Vasconcellos nos adverte que as:

“(...) violações aos direitos fundamentais podem partir tanto do Estado soberano como,
também, dos agentes privados. Essa tendência atual de aplicação horizontal dos direitos
fundamentais não visa se sobrepor à relação anterior, uma vez que o primordial nessa questão
é nos atentarmos para que a aplicação dos direitos fundamentais, no caso concreto, esteja
sempre ponderada com os demais princípios. Diversas questões precisam ser melhores
desenvolvidas, como qual a forma dessa vinculação e seu alcance”.

Alguns autores como Alexy, por exemplo, defendem ser uma teoria integradora, onde, em face
de uma demanda entre particulares, que tenha por objeto direito fundamentais, que se faça
uma ponderação entre os valores discutidos.
DAS PESSOAS NATURAIS

Pessoa natural é o ser humano considerado como sujeito de direitos e deveres (art. 1º, CC).
Toda pessoa é dotada de personalidade, isto é, tem capacidade para figurar em uma relação
jurídica. Capacidade é a medida da personalidade. A que todos possuem (art. 1º) é a
capacidade de direito (de aquisição ou de gozo de direitos). Mas nem todos possuem a
capacidade de fato (de exercício do direito), que é a aptidão para exercer, por si só, os
atos da vida civil. Capacidade não se confunde com legitimação – esta é a aptidão para a
prática de determinados atos jurídicos. Quem tem as duas capacidades, tem capacidade plena.
Quem só tem a de direito, tem capacidade limitada e necessita de outra pessoa que substitua
ou complete a sua vontade. São, por isso, chamados de incapazes.

Incapacidade é a restrição legal ao exercício dos atos da vida civil, ou seja, é a restrição da
capacidade de fato. A absoluta (art. 3º) acarreta a proibição total do exercício, por si só, do
direito. O ato somente poderá ser praticado pelo representante legal do absolutamente
incapaz, sob pena de nulidade (art. 166, I, CC). A relativa (art. 4º) permite que o incapaz
pratique atos da vida civil, desde que assistido, sob pena de anulabilidade (art. 171, I, CC).
ALGUNS ATOS O RELATIVAMENTE INCAPAZ PODE PRATICAR SEM A ASSISTÊNCIA
DO REPRESENTANTE LEGAL (SER ELEITOR, ACEITAR MANDATO, FAZER
TESTAMENTO, SER TESTEMUNHA ETC.).

Absolutamente Incapazes (art. 3º, CC) – (a) os que, por enfermidade ou deficiência
mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática dos atos da vida civil; (b)
os que, por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade; (c) os menores de
dezesseis anos (menores impúberes).

NOSSA LEI NÃO ADMITE OS CHAMADOS INTERVALOS LÚCIDOS. Se declarado incapaz,


os atos praticados pelo privado de discernimento serão nulos, NÃO SE ACEITANDO A
TENTATIVA DE DEMONSTRAR QUE, NAQUELE MOMENTO, ENCONTRAVA-SE LÚCIDO.

Relativamente Incapazes (art. 4º, CC) – (a) os maiores de dezesseis e menores de dezoito
anos (menores púberes); (b) ébrios habituais, viciados em tóxicos e os que, por deficiência
mental, tenham o discernimento reduzido; (c) os excepcionais, sem desenvolvimento mental
completo; (d) os pródigos.

SE O MENOR RELATIVAMENTE INCAPAZ OCULTAR SUA IDADE OU


ESPONTANEAMENTE DECLARAR-SE MAIOR, no ato de se obrigar, perderá a proteção que a
lei confere aos incapazes e não poderá, assim, anular a obrigação ou eximir-se de cumpri-la
(art. 180, CC).

RESPONSABILIDADE CIVIL:O incapaz, menor de 18 anos ou deficiente mental, responde


pelos prejuízos que causar, se as pessoas por ele responsáveis não tiverem obrigação
de fazê-lo ou não dispuserem de meios suficientes (art. 928, CC). Pronunciada a interdição
dos deficientes mentais, dos ébrios habituais e dos viciados em tóxicos, o juiz assinará,
segundo o estado ou o desenvolvimento mental do interdito, os limites da curatela, que
poderão circunscrever-se à privação do direito de, sem curador, praticar atos que possam
onerar ou desfalcar seu patrimônio.
Pródigo é o indivíduo que dissipa o seu patrimônio desvairadamente. Pode ser submetido à
curatela (art. 1.767, V), promovida pelos pais ou tutores, pelo cônjuge ou companheiro, ou por
qualquer parente (arts. 1.768 e 1.769, CC). O pródigo só ficará privado, no entanto, de
praticar, sem curador, atos que extravasam a mera administração e implicam
comprometimento do patrimônio, como emprestar, transigir, dar quitação, alienar,
hipotecar, demandar e ser demandado (art. 1.782, CC).

Quanto aos indígenas, sua capacidade é regulada pelo Estatuto do Índio – Lei 6.001/73. A
referida lei considera nulos os negócios celebrados entre um índio e pessoa estranha à
comunidade indígena, se a participação da FUNAI, enquadrando-o, pois, como absolutamente
incapaz. Entretanto, declara que se considerará válido tal ato se o índio revelar consciência e
conhecimento do ato praticadoe, ao mesmo tempo, tal ato não o prejudicar. A tutela do
indígena é independente de qualquer medida judicial (ou seja, não se exige processo de
interdição), sendo ele incapaz desde o nascimento, até que preencha os requisitos exigidos
pelo art. 9º da Lei 6.001/73 - quais sejam: idade mínima de 21 anos, conhecimento da língua
portuguesa, habilitação para o exercício de atividade útil à comunidade nacional, razoável
compreensão dos usos e costumes da comunhão nacional – e seja liberado por ato judicial,
diretamente, ou por ato da FUNAI homologado pelo órgão judicial.

Cessa a incapacidade, primeiramente, quando cessar a sua causa e, em segundo lugar, pela
emancipação. A menoridade cessa aos dezoito anos completos (art. 5º, CC). A emancipação
(aquisição da capacidade plena antes da idade legal) pode ser de três espécies:
voluntária, judicial ou legal. A voluntária é a concedida pelos pais, se o menor tiver dezesseis
anos completos. A judicial é concedida por sentença, ouvido o tutor, em favor do tutelado que
já completou dezesseis anos. A legal é a que decorre de determinados fatos previstos em lei
(casamento, exercício de emprego público efetivo, colação de grau em curso de ensino
superior e estabelecimento com economia própria, civil ou comercial, ou a existência de
relação de emprego, tendo o menor dezesseis anos completos).

A emancipação voluntária deve ser concedida por ambos os pais, ou um deles, na falta do
outro. Havendo divergência entre eles, esta será dirimida pelo juiz. Forma – instrumento
público. Segundo o STF, tal forma de emancipação só não produz o efeito de isentar os
pais da obrigação de indenizar as vítimas dos atos ilícitos praticados pelo menor
antecipado, para evitar emancipações maliciosas. Se o menor estiver sob tutela, deve
requerer sua emancipação por sentença – o tutor não pode emancipá-lo. As emancipações
voluntária e judicial devem ser registradas em livro próprio do 1º Ofício do Registro Civil da
comarca do domicílio do menor, anotando-se também, com remissões recíprocas, no assento
de nascimento. A emancipação legal independe de registro e produzirá efeitos desde logo, a
partir do ato ou do fato que a provocou. A emancipação é irrevogável, mas é possível
reconhecimento de invalidade do ato (nulidade ou anulabilidade). A dissolução da sociedade
conjugal não faz o menor retornar à condição de incapaz. No caso de casamento nulo, estando
ele de boa-fé, será putativo com relação a ele e produzirá efeitos de um casamento válido,
inclusive a emancipação (art. 1.561, CC). É dominante a corrente que exige tratar-se de
emprego público EFETIVO para ocorrer a emancipação.

A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida (art. 2º, CC), o que se
constata pela respiração. Antigamente utilizava-se de método chamado de “docimasia
hidrostática de Galeno”, atualmente a medicina tem outros modos de aferir se houve a
respiração. Os direitos assegurados ao nascituro encontram-se em estado potencial, sob
condição suspensiva – não há personalidade antes do nascimento, apenas garantia de
alguns direitos.
Somente com a morte termina a existência da pessoa natural. Doutrinariamente fala-se em:
(a) morte real (art. 6º, CC) – prova-se pelo atestado de óbito ou pela justificação, em caso
de catástrofe e não encontro do corpo (art. 88, L. 6.015/73) – acarretaa extinção do poder
familiar, a dissolução do vínculo matrimonial, a extinção dos contratos personalíssimos, a
extinção da obrigação de pagar alimentos, etc.; (b) morte simultânea ou comoriência (art. 8º,
CC) – se dois indivíduos falecerem na mesma ocasião, não se podendo averiguar qual morreu
primeiro, presumir-se-ão simultaneamente mortos. Não há transferência de bens entre os
comorientes; (c) morte presumidasem declaração de ausência – presume-se a morte,
quanto aos ausentes, nos casos em que a lei autoriza a abertura de sucessão definitiva (art.
6º, 2ª parte, CC). A declaração de ausência produz efeitos patrimoniais, permitindo a abertura
da sucessão provisória e, depois, a definitiva. Na última hipótese, constitui causa de dissolução
da sociedade conjugal. Declaração de morte presumida – art. 7º, CC –sem decretação de
ausência: se for extremamente provável a morte de quem estava em perigo de vida; se
alguém, desaparecido em campanha ou feito prisioneiro, não for encontrado até dois anos
após o término da guerra.

Nome é a designação pela qual a pessoa identifica-se no seio da família e da sociedade. O


pseudônimo adotado para atividades lícitas goza da proteção que se dá ao nome (art. 19, CC).
O nome tem a natureza jurídica de direito da personalidade. O nome tem dois aspectos: um
público (interesse do Estado na perfeita identificação das pessoas) e um individual. É direito
inalienável e imprescritível, essencial para o exercício regular dos direitos e cumprimento de
obrigações. Prenome – livremente escolhido pelos pais, desde que não exponha o filho ao
ridículo (art. 55, parágrafo único, LRP). Sobrenome – identifica a procedência da pessoa – é
imutável. O sobrenome faz parte, por lei, do nome completo, podendo ser lançado pelo
escrivão de ofício adiante do prenome escolhido pelo pai (art. 55, LRP). O registro com
indicação do sobrenome tem mero caráter declaratório. Pode ser o do pai, o da mãe, ou de
ambos.

Exceções à imutabilidade do nome – art. 58, parágrafo único, LRP (antiga redação) –
retificação de evidente erro gráfico; art. 55, parágrafo único – mudança em face de nomes que
expõem ao ridículo seus portadores – a lei 9.708/98 alterou o art. 58, parágrafo único para
dizer que: “O prenome será definitivo, admitindo-se, todavia, a sua substituição por
apelidos públicos notórios”; a lei 9.807/99 mudou novamente a redação do par. único do
art. 58, prescrevendo também “que a substituição do prenome será ainda admitida em
razão de fundada coação ou ameaça decorrente de colaboração com a apuração de
crime, por determinação, em sentença, de juiz competente, ouvido o Ministério Público.”
A sentença concessiva de adoção pode determinar a modificação do prenome do adotado, se
menor, a pedido do adotante ou do próprio adotado (art. 1.627, CC). É possível alteração do
nome (sem modificar prenome ou sobrenome) no primeiro ano após atingir a maioridade
civil pela via administrativa ou decisão judicial (art. 110, LRP). Decorrido este prazo
decadencial, tais alterações só poderão ser feitas, motivadamente e por exceção, em
ação judicial de retificação de nome, conforme o art. 57, LRP. O nome completo pode
também sofrer alterações no casamento, reconhecimento de filhos, adoção, união estável,
separação judicial e divórcio. Exemplos de casos não previstos em lei: viuvez; abandono
afetivo (o filho poderá retirar o sobrenome do pai – STJ); divórcio dos pais com mudança do
nome (o filho poderá retificar seu registro – STJ).

Estado: soma das qualificações da pessoa na sociedade, hábeis a produzir efeitos jurídicos –
é seu modo particular de existir. Estado individual é o modo de ser da pessoa quanto à idade,
sexo, cor, altura, saúde, etc. Estado familiar é o que indica a sua situação na família em
relação ao matrimônio (solteiro, casado, viúvo, divorciado) e ao parentesco (pai, filho, irmão,
etc.). Estado político é a qualidade jurídica que advém da posição do indivíduo na sociedade
política, podendo ser nacional (nato ou naturalizado) e estrangeiro. Características (ou
atributos) do estado: indivisibilidade; indisponibilidade (o que não implica sua mutação em
decorrência dos fatos, mas sua inalienabilidade e irrenunciabilidade); imprescritibilidade.

Direitos da Personalidade:

São inerentes à pessoa humana, estando a ela ligados de forma perpétua. Maria Helena Diniz:
“direitos da personalidade são direitos subjetivos da pessoa de defender o que lhe é próprio, ou
seja, a sua integridade física (vida, alimentos, próprio corpo vivo ou morto, corpo alheio vivo ou
morto, partes separadas do corpo vivo ou morto); a sua integridade intelectual (liberdade de
pensamento, autoria científica, artística e literária); e a sua integridade moral (honra, recato,
segredo profissional e doméstico, identidade pessoal, familiar e social).” O Novo Código Civil
os disciplina entre os arts. 11 e 21.

Art. 11, CC – “Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são
intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária.” São,
ainda, inalienáveis e imprescritíveis.

Enunciado 04 da I JDC/CJF: O exercício dos direitos da personalidade pode sofrer limitação


voluntária, desde que não seja permanente nem geral.

Direitos da personalidade no CC: disciplina os atos de disposição do próprio corpo (arts. 13 e


14), direito à não-submissão a tratamento médico de risco (art. 15), direito ao nome e
pseudônimo (art. 16 a 19), proteção à palavra e à imagem (art. 20) e a proteção da intimidade
(art. 21). O art. 52 dispõe que “aplica-se à pessoa jurídica, no que couber, a proteção dos
direitos da personalidade.

Art. 13, CC – Salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo,
quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes.

Gustavo Tepedino: Apesar da falta de previsão expressa no CC, considera-se hoje lícita a
cirurgia de mudança de sexo, quando em conformidade com o procedimento médico
estabelecido pelo CFM. Permanecem, contudo, polêmicos os efeitos civis da mudança.
Enunciado 276 da IV Jornada de Direito Civil do CEJ do CJF: “o art. 13 do Código Civil, ao
permitir a disposição do próprio corpo por exigência médica, autoriza as cirurgias de
transgenitalização, em conformidade com os procedimentos estabelecidos pelo Conselho
Federal de Medicina, e a conseqüente alteração do prenome e do sexo no Registro Civil.”

Art. 14, CC – É válida, com objetivo científico, ou altruístico, a disposição gratuita do próprio
corpo, no todo ou em parte, para depois da morte. Parágrafo Único – O ato de disposição pode
ser livremente revogado a qualquer tempo.
Enunciado 277 da IV Jornada de Direito Civil do CEJ do CJF: “o art. 14 do Código Civil, ao
afirmar a validade da disposição gratuita do próprio corpo, com objetivo científico ou altruístico,
para depois da morte, determinou que a manifestação expressa do doador de órgãos em
vidaprevalece sobre a vontade dos familiares, portanto, a aplicação do art. 4º da Lei
9.434/97 ficou restrita à hipótese de silêncio do potencial doador.”

Art. 15, CC – “Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento
médico ou a intervenção cirúrgica.”

Gustavo Tepedino leciona: “há de ser interpretado o art. 15 – não só o constrangimento que
induz alguém a se submeter a tratamento com risco deve ser vedado, como também a
intervenção médica imposta a paciente que, suficientemente informado, prefere a ela não se
submeter, por motivos que não sejam fúteis e que se fundem na afirmação de sua própria
dignidade.” Nesse sentido, o art. 46 do Código de Ética Médica (Resolução CFM n. 1.246/88):
“é vedado ao médico efetuar qualquer procedimento médico sem o esclarecimento e
consentimento prévios do paciente ou de seu responsável legal, salvo iminente perigo de vida.”

O art. 20, CC prescreve que poderão ser proibidas a transmissão da palavra e divulgação de
imagens, a requerimento do autor e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem
a honra, a boa fama ou respeitabilidade, ou se destinarem a fins comerciais, salvo se
autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública.
O mesmo tratamento é dado à exposição ou à utilização da imagem, que o art. 5º, X da CF
considera um direito inviolável

Enunciado 279, da IV Jornada de Direito Civil do CEJ do CJF: “a proteção à imagem deve
ser ponderada com outros interesses constitucionalmente tutelados, especialmente em face do
direito de amplo acesso à informação e da liberdade de imprensa. Em caso de colisão, levar-
se-á em conta a notoriedade do retratado e dos fatos abordados, bem como a veracidade
destes e, ainda, as características de sua utilização (comercial, informativa, biográfica),
privilegiando-se medidas que não restrinjam a divulgação de informações.”

Art. 21, CC: “A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do
interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a
esta norma.”

Da ausência:

Ausente é a pessoa que desaparece de seu domicílio sem dar notícia de seu paradeiro e sem
deixar um representante ou procurador para administrar-lhe os bens (art. 22, CC). Neste caso,
o juiz, a requerimento de qualquer interessado, ou do MP, declarará a ausência, e nomear-
lhe-á curador. Também será nomeado quando o ausente deixar mandatário que não queira ou
não possa exercer ou continuar o mandato, ou se os seus poderes forem insuficientes.

Fases da Ausência:
- fase da curadoria: art. 22 a 25, CC – é restrita aos bens, não produzindo efeitos de
ordem pessoal. Comunicada a ausência ao juiz, este determinará a arrecadação dos bens do
ausente e os entregará à administração do curador nomeado. Prolonga-se pelo período de um
ano, durante o qual serão publicados editais, de dois em dois meses, convocando o ausente a
reaparecer (art. 1.161, CPC). Decorrido o prazo sem que o ausente apareça, ou se tenha
notícia de sua morte, ou se ele deixou representante ou procurador, e, passando três anos,
poderão os interessados requerer a abertura da sucessão provisória (art. 26, CC).

Cessa a curadoria: (a) pelo comparecimento do ausente, do seu procurador ou de quem o


represente; (b) pela certeza da morte do ausente; (c) pela sucessão provisória.

- fase da sucessão provisória: art. 26 a 36 – estão legitimados para requerer sua abertura:
(a) cônjuge não separado judicialmente; (b) herdeiros presumidos, legítimos ou testamentários;
(c) os que tiverem sobre os bens do ausente direito dependente de sua morte; (d) credores de
obrigações vencidas e não pagas. A sentença que determinar sua abertura só produzirá
efeitos 180 dias depois de publicada pela imprensa, mas logo que passe em julgado,
proceder-se-á à abertura do testamento e ao inventário e partilha de bens, como se o ausente
houvesse falecido. Os bens serão entregues aos herdeiros, em caráter provisório e
condicional, desde que prestem garantia da restituição deles. Se não o fizerem, ficarão os
respectivos quinhões sob a administração de curador ou de outro herdeiro designado pelo juiz
que preste a garantia. Tal regra não inclui ascendentes, descendentes e cônjuge (art. 30 e
parágrafos). Os descendentes, ascendentes ou cônjuge que for sucessor provisório fará seus
todos os frutos e rendimentos dos bens que a ele couberem; os outros sucessores deverão
capitalizar metade desses frutos e rendimentos. Se o ausente aparecer e ficar provado que sua
ausência foi voluntária e injustificada, perderá em favor do sucessor sua parte nos frutos e
rendimentos.

Cessará a sucessão provisória pelo comparecimento do ausente e converter-se-á em


definitiva: (a) quando houver certeza da morte do ausente; (b) dez anos depois de passada
em julgado a sentença de abertura da sucessão provisória; (c) quando o ausente contar
oitenta anos de idade e houverem decorridos cinco anos das últimas notícias suas (art. 1.167,
III, CPC e art. 37 e 38, CC).

- fase da sucessão definitiva: art. 37 a 39 – poderão os interessados, dez anos depois de


passada em julgado a sentença que concedeu a abertura de sucessão provisória, requerer a
definitiva e o levantamento das cauções prestadas. Poderá também ser requerida se provado
que o ausente conta oitenta anos de idade e decorreram cinco anos das últimas notícias suas.
Se o ausente não regressar nesses dez anos, e nenhum interessado promover a
sucessão definitiva, os bens arrecadados passarão ao domínio do Município ou do DF,
se localizados nas respectivas circunscrições, incorporando-se ao domínio da União,
quando situados em território federal (art. 39, caput e parágrafo único, CC).
DOS ATOS ILÍCITOS

É o ato praticado em desacordo com a ordem jurídica que viola direitos e causa
prejuízos a outrem. Diante da sua ocorrência a norma jurídica cria o dever de reparar o dano, o
que justifica ser o ato ilícito fonte do direito obrigacional7. O ato jurídico é considerado fato
jurídico em sentido amplo, uma vez que produz efeitos jurídicos que não são desejados pelo
agente, mas somente aqueles impostos pela lei, sendo, por isso, chamados de
involuntários. Entende-se que o ato ilícito constitui um fato jurídico, mas não é um ato jurídico,
pois para a configuração deste é necessária a licitude da conduta.

FATOS JURÍDICOS (fatos que interessam ao direito e acarretam consequências


jurídicas)

I) ATO JURÍDICO EM SENTIDO AMPLO (possui atividade humana, sendo essa


vontade, portanto, a fonte dos efeitos jurídicos)
a. ATO JURÍDICO LÍCITO
i. NEGÓCIO JURÍDICO (admite-se que as partes regulamentem
livremente as consequências do ato)
ii. ATO JURÍDICO EM SENTIDO ESTRITO (as partes devem se
submeter integralmente às consequências que a legislação civil
estabelece para a atividade humana – resta às partes acatar as
consequências que a lei previamente estabeleceu para aquele ato
jurídico)
b. ATO JURÍDICO ILÍCITO
c. ATO FATO JURÍDICO (diferencia-se pelo fato de que, para sua formação,
o elemento vontade é irrelevante)

II) FATO JURÍDICO EM SENTIDO ESTRITO (fenômeno natural)

7São consideradas fontes das obrigações: a) a lei, que é a fonte primária ou imediata
(embora alguns autores, como Fernando Noronha, entendam que a lei sozinha não é
fonte obrigacional, sendo necessária a presença da autonomia privada, que é o direito
que a pessoa tem de regulamentar os próprios interesses); b) os contratos, tidos como
fonte principal do direito obrigacional; c) os atos ilícitos e o abuso de direito, pois
geram o dever de indenizar; d) os atos unilaterais, declarações unilaterais de vontade
que geram obrigações; e) os títulos de crédito, documentos que trazem em seu bojo,
com caráter autônomo, a existência de uma relação obrigacional de natureza privada.
a. FATO JURÍDICO EM SENTIDO ESTRITO ORDINÁRIO (fenômeno natural
comum)
b. FATO JURÍDICO EM SENTIDO ESTRITO EXTRAORDINÁRIO
(excepcional, como caso fortuito e força maior)

Quando alguém comete um ato ilícito, há infração de um dever e a imputação de um


resultado. Assim, consequência do ato ilícito é a sanção, que, no direito civil, é imposta sobre o
patrimônio, dada a impossibilidade de atingir a esfera física da pessoa. Trata-se de hipótese de
responsabilidade civil extracontratual ou aquiliana, oriunda do desrespeito ao direito alheio e às
normas que regram a conduta.

O ato ilícito pode ser civil, penal ou administrativo. Por vezes, a conduta ofenderá às 03
esferas.

CÓDIGO CIVIL 2002 CÓDIGO CIVIL DE 1916

Art. 186. Aquele que, por ação ou Art. 159. Aquele que, por ação ou
omissão voluntária, negligência ou omissão voluntária, negligência, ou
imprudência, violar direito e causar dano imprudência, violar direito, ou causar
a outrem, ainda que exclusivamente prejuízo a outrem, fica obrigado a
moral, comete ato ilícito. reparar o dano.

A verificação da culpa e a avaliação


da responsabilidade regulam-se pelo
disposto neste Código, arts. 1.518 a
1.532 e 1.537 a 1.553. (Redação dada
pelo Decreto do Poder Legislativo nº
3.725, de 15.1.1919)

Da análise do art. 186 CC verifica-se que O art. 159 CC/16 utilizava a expressão
o ato ilícito é a soma entre lesão de “ou”, admitindo o ato ilícito por mera
direitos e dano causado. lesão de direitos.

A CC/2002 admite a reparação do dano


moral puro, sem repercussão patrimonial,
o que não tem grande repercussão
prática, pois a CF já admitia no art. 5º V e
X.

A consequência do ato ilícito é a obrigação de indenizar, de reparar o dano, nos termos


do art. 927 CC.
Art. 188. Não constituem atos ilícitos:

I - os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito


reconhecido;

II - a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim


de remover perigo iminente.

Parágrafo único. No caso do inciso II, o ato será legítimo somente quando
as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os
limites do indispensável para a remoção do perigo.

ABUSO DE DIREITO COMO ATO ILÍCITO.

O art. 187 CC traz uma nova dimensão de ilícito, consagrando a teoria do abuso de
direito como ato ilícito, também conhecida como teoria dos atos emulativos. Amplia-se a
noção de ato ilícito para considerar como precursor da responsabilidade civil também aquele
ato praticado em exercício irregular de direitos, ou seja, o ato é originariamente lícito, mas foi
exercido fora dos limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé objetiva ou
pelos bons costumes.

O atual CC alicerça a responsabilidade extracontratual no ato ilícito e no abuso de


direito, ao contrário da codificação anterior, que a amparava apenas no ato ilícito. Frise-se que
a modificação também atinge a responsabilidade contratual, pois o art. 187 do CC (abuso de
direito) também pode e deve ser aplicado em sede de autonomia privada. Este seria, assim,
um dispositivo unificador do sistema de responsabilidade civil, que supera a dicotomia
responsabilidade contratual X extracontratual.

Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo,
excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou
social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

Da análise do art. 187 CC verifica-se que o abuso de direito está baseado em 04


conceitos legais indeterminados, cláusulas gerais que devem ser preenchidas pelo juiz caso a
caso: fim social, fim econômico, boa-fé e bons costumes.

O abuso de direito mantém relação com o princípio da socialidade e da eticidade, vez


que o CC trata como ilícita a conduta de desrespeito à boa-fé objetiva.

Parte–se da premissa de que todas as situações jurídicas, que se conceituam como


direito subjetivo, atualmente, são reconhecidas e protegidas pela norma tendo em vista uma
finalidade, que se poderá chamar de finalidade econômica e social do direito. Todas as vezes
que o direito é exercício de acordo com essas finalidades, está dentro de seus quadros
teleológicos. Acontece, porém, que o titular de um direito, pode, em vez de exercê-lo no sentido
destas finalidades, o faz no sentido de finalidade contraria, contrastando, expressamente, com
a finalidade para a qual o direito foi instituído.

Segundo RUBENS LIMONGI FRANÇA, abuso de direito é um “ato lícito pelo conteúdo,
ilícito pelas conseqüências, tendo natureza jurídica mista – entre o ato jurídico e o ato ilícito –
situando-se no mundo dos fatos em sentido amplo”. Em outras palavras, a ilicitude do abuso
de direito está presente em sua execução (e não na sua origem, que é lícita). Assim, a
diferença para o ato ilícito é que este é ilícito no todo quanto ao conteúdo e quanto às
consequências.

Prevalece na doutrina que no caso de abuso de direito a responsabilidade é objetiva,


independentemente de comprovação da culpa (Enunciado 37 CJF: art. 187. A responsabilidade
civil decorrente do abuso de direito independe de culpa, e fundamenta-se somente no critério
objetivo finalístico). Para identificar essas situações de abuso, portanto, nosso direito usa
critérios objetivos e finalísticos, e não a intenção do sujeito. Deve-se comparar a conduta que
se adotou e a que deveria ter sido adotada. Em sentido contrário, alguns autores sustentam
que é necessário o reconhecimento judicial da intenção de prejudicar do ato emulativo.

ESPÉCIES DE ATO ILÍCITO

O Código trabalhou com dois ilícitos: Ato ilícito subjetivo (art. 186) e o ato ilícito objetivo
(art. 187). Há, portanto, uma bifurcação no conceito de ilicitude. Ilicitude, para o Código é um
conceito rico porque existem diferentes espécies, categorias de ilicitude.

Ato ilícito subjetivo

O primeiro conceito de ilicitude é um conceito de ilicitude subjetiva: art. 186. Esse


conceito do art. 186 é um conceito culposo, lembrando que a culpa do direito civil é a culpa lato
sensu que abrange a um só tempo o dolo e a culpa stricto sensu. Já o lícito objetivo é um ilícito
comportamental, funcional, e não culposo. Duas diferentes espécies, duas diferentes
categorias de ato ilícito.

O art. 186 traz o conceito: aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou
imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete
ato ilícito.

Você acaba de ver o que é o ato ilícito subjetivo. Um ato ilícito subjetivo é a violação de
um direito alheio culposamente causando dano a outrem.
Observe que o art. 186 revela que todo ato ilícito tem 4 pressupostos. E os quatro
pressupostos da ilicitude são:

1º Pressuposto: Conduta comissiva ou omissiva

2º Pressuposto: Culpa

3º Pressuposto: Dano

4º Pressuposto: Nexo de causalidade

São os quatro pressupostos de um ato ilícito subjetivo. Isso porque o ato ilícito
subjetivo se dá quando se causa dano a terceiro violando culposamente o direito dele.

O dano é pressuposto da ilicitude: está no Código. Dano causando a outrem pela


violação de um direito seu. Nem toda ilicitude gera responsabilidade civil, portanto, apesar do
dano ser pressuposto da ilicitude, nem todo dano é indenizável.

Esse conceito é aberto ou fechado? O conceito de ilicitude subjetiva, culposa, comporta


variações? Ou o ato ilícito é somente isso? Em outras palavras, você está diante de norma-
regra ou de norma-princípio. Esse artigo 186 revela norma-regra. É conceito fechado. Pode
conferir! Ele não deixa nenhum campo aberto. Ato ilícito é violar o direito de alguém
culposamente, causando-lhe dano. Se ocorre um dano decorrente da violação de direito do
titular culposa, tem ato ilícito. Portanto, o conceito de ilicitude subjetiva não é um conceito
aberto, na medida em que já se tem o conceito de ilicitude subjetiva previamente definido. É
um conceito previamente conhecido. Eu já sei, de antemão, o que é um ilícito subjetivo. Esse
conceito não precisa ser construído porque ele já é um conceito previsto em lei. Ilícito subjetivo
é: a violação culposa do direto de outrem causando um dano. Isso é ato ilícito não há
variações. E nenhum desses conceitos é aberto, não permitindo construção no caso concreto.
Em outras palavras, no campo da ilicitude subjetiva, aplica-se uma regra ontológica: ser ou não
ser. Ou é ou não é. Há uma delimitação rigorosa. É ou não é ilícito.

Se eu celebrar um contrato de servidão predial (tirada de água) na fazenda. Ele pode ir


na minha fazenda retirar água. No nosso contrato de servidão predial de tirada de água, João
pode retirar 10 mil litro mensais por um contrato de servidão. Num determinado mês, ele vai à
minha fazenda e tira 14 mil. Se fez isso, me causou um dano e violou direito meu. Cometeu ato
ilícito. É ato ilícito subjetivo. Ou ele sabia ou deveria saber que só podia tirar no limite de 10.
Tirou 14, praticou ato ilícito subjetivo. Consequência disso: reparação do dano causado, sem
prejuízo da invalidade do contrato eu ainda posso pedir a anulação do contrato. Nesse caso,
poderá haver vários efeitos decorrentes do ato ilícito.
Ato ilícito objetivo

Ao lado do ato ilícito culposo, subjetivo, o Código de 2002 estabeleceu um novo


modelo de ilicitude. Agora, vamos ter o ato ilícito comportamental. Se ele é comportamental, é
porque está desatrelado da culpa. O ato ilícito objetivo, por isso, é comportamental. A culpa é
elemento estranho porque o ato ilícito objetivo, comportamental, não está fundado no elemento
anímico, subjetivo. Ele decorre apenas e tão-somente do comportamento do titular de um
direito. Portanto, o ato ilícito objetivo ganha cor, se aperfeiçoa quando alguém exerce um
direito excedendo os seus limites. Olha só!

• Ato ilícito subjetivo se caracteriza quando alguém viola o direito de outrem e causa um
dano.

• Ato ilícito objetivo se caracteriza quando alguém exerce um direito excedendo os seus
limites.

O art. 187 está dizendo: o ilícito objetivo é caracterizado pelo exercício abusivo de um
direito. Observe que o ato ilícito objetivo não nasceu ilícito. Ele nasceu lícito e se tornou ilícito
pelo seu exercício anormal, irregular.

Para você não confundir, a doutrina brasileira apelidou o ato ilícito objetivo de
abuso do direito. É aquela ilicitude caracterizada pelo exercício da norma, irregular do direito.
É lógico que você só vai pensar no ato ilícito objetivo quando você estiver dentro do campo da
licitude. Isso porque o abuso do direito nasceu quando alguém, ao exercer o direito, excede o
seu limite. Esse excesso tem que ser controlado (como eu vou saber se um exercício de direito
é ou não abusivo) pela boa-fé objetiva, bons costumes, finalidade social e econômica. Esses
são os mecanismos de controle do excesso do exercício de um direito.

O que é o ato ilícito subjetivo? Violar direito e causar dano a outrem culposamente.
Nasce e morre ilícito. O ato ilícito objetivo nasceu lícito e se tornou ilícito pelo seu exercício
anormal. Por isso, que a ilicitude objetiva está no plano do exercício do direito. E não no plano
da violação do direito.

Você acabou de aprender que é possível praticar ilícito simplesmente exercendo um


ato rigorosamente lícito. Eu vou te dar dois exemplos:

1º Exemplo: Leading Case – O primeiro caso sobre abuso julgado na história do


direito. Orlando Gomes faz referencia a ele. O primeiro caso é o de um proprietário de terras na
França, chamado Bayard. A terra dele ficava vizinha ao campo de pouso dos dirigíveis. Um dia
ele resolveu fincar uma lança de 35 metros de altura na sua propriedade. E isso causava danos
aos dirigíveis que tinham de manobrar em outro lugar. A empresa de dirigíveis ajuizou uma
ação contra Bayard que se defendeu alegando ausência de ato ilícito, mas que estava apenas
exercendo seu direito de propriedade. E o juiz lhe perguntou sobre a finalidade da lança. Como
ele disse que não era nenhuma, o juiz concluiu pela ilicitude do ato porque decorreu do
exercício do direito de propriedade violando a finalidade social, a função social da propriedade.
Veja, portanto, que esse é o primeiro caso de todos.

2º Exemplo: Primeiro caso Brasileiro – No Brasil, quando primeiro se adotou a teoria


do abuso do direito com essa percepção de um novo modelo de ilícito, foi no célebre
julgamento pelo STF da Farra do Boi em SC. O Supremo foi provocado em 1990 pra julgar. A
farra do boi era um festejo promovido por alguns municípios. Não há nenhum relato de vitória
do boi. A multidão sempre ganhava. Grupos ambientais pediram a suspensão daquela
brincadeira e o caso chegou ao Supremo. Os municípios se defenderam dizendo que na
Constituição, no art. 215, está garantido o direito às manifestações culturais. Aquela festividade
histórica em SC fazia parte da cultura daquele lugar e, evidentemente, toda manifestação
cultural deve ser protegida, preservada. Era direito realizar aquela festividade? Era. Mas o
Supremo disse: havia um excesso no que se refere aos bons costumes porque não é um bom
costume maltratar os animais. E se é assim, aquele ato é abusivo. Abuso no direito de
manifestação cultural. O Supremo reconheceu, assim, a tese do abuso do direito, voltado
exatamente para essa nova modalidade de ilicitude.

O conceito de ato ilícito objetivo, que é um conceito funcional (não é subjetivo), é


aberto ou fechado? É norma-regra ou norma-princípio? Agora não dá para ter dúvida: é norma-
princípio. Eu somente tenho como saber se o exercício é ou não excessivo, no caso concreto
(JUIZ QUE VAI DIZER SE HÁ O ABUSO), até porque a minha conduta para com Juliana pode
ser lícita e para com João, pode ser ilícita, a depender da boa-fé, dos bons costumes, da
função social e econômica. Portanto, o abuso do direito é uma cláusula aberta a ser construída
no caso concreto com princípios. Por isso, quando eu disse que o ato ilícito objetivo é
funcional, eu vou corrigir. Me arrepender. O ato ilícito objetivo é multifuncional. A ilicitude aqui
não tem uma só função, tem múltiplas funções: boa-fé, bons costumes, função econômica e
social. Portanto, a ilicitude objetiva não é nem funcional, é multifuncional porque traz a reboque
diferentes funções. E essas diferentes e múltiplas funções só podemos descobrir em cada caso
concreto.

Se o ilícito objetivo é uma categoria aberta e em construção, ele admite subcategorias.


Se está em aberto e em construção, nós vamos descobrir dentro do conceito de ilicitude
objetiva uma série de subcategorias. Uma série impressionante (passar para a parte das
categorias de abuso de direito).

EFEITOS DECORRENTES DE UM ATO ILÍCITO


O Código de 1916 partia da premissa de que todo efeito de uma ilicitude era um efeito
indenizante. Para o Código de 1916 todo ato ilícito gerava indenização porque produzia
responsabilidade civil. O Código de 1916 confundia ilicitude com responsabilidade. Nessa
tocada, o Código de 2002 diz que a responsabilidade civil é um dos efeitos da ilicitude.

Além do efeito indenizante, o novo código também reconhece efeitos caducificantes, ou


seja, perda ou restrição de direitos. Ou seja, de um ato ilícito nós podemos ter responsabilidade
civil (ilícito indenizante), a perda ou restrição de direitos (ilícito caducificante) e a nulidade ou
anulabilidade de um negócio (efeitos invalidades). De um ato ilícito podem decorrer diferentes
efeitos que serão indicados pela própria norma:

• Obrigação de reparar o dano, efeito indenizante

• Perda ou restrição de direitos, efeito caducificante.

• Nulidade ou anulabilidade de um negócio jurídico, efeito invalidante.

• Permitir exercício de direitos pela contraparte, efeito autorizante.

Além desses efeitos, o ato ilícito pode produzir infinitos efeitos previstos na norma.
Basta que a norma indique, que esses efeitos serão possíveis. Toda ilicitude é normativa e
seus efeitos também. Exemplos:

Efeito indenizante – Acidente de veículo que vinha na contramão. É típico exemplo de


ilícito indenizante. Impõe a obrigação de reparar o dano. A grande maioria dos ilícitos, a
maioria esmagadora dos atos ilícitos produz efeitos indenizantes.

Efeito caducificante – O CC permite aos pais, no exercício do poder familiar, aplicar a


seus filhos castigos moderados. Imagine o pai que aplica um castigo ao filho. Eu estou falando
do pai que tira o filho da escola para castigá-lo. Ele praticou um castigo e, ao que se consta,
um castigo imoderado. Castigo imoderado é ato ilícito. E se é assim, esse pai não vai ser
obrigado a reparar dano, mas poderá sofrer destituição ou restrição do poder familiar. Pode
sofrer perda ou restrição de direitos. É a prática de um ilícito caducificante e não indenizante.
Outro exemplo: transporte de substancia entorpecente. Um dos dois ajustou o transporte de
substância entorpecente e o transportador entregou a substância e a outra parte não quer
pagar. Cabe execução desse contrato? Não porque o objeto do negócio é ilícito e o Código, no
seu art. 166, diz que negócios cujo objeto sejam ilícitos são nulos. Nesse caso, a ilicitude não
gera indenização, mas gera invalidade do negócio. E nós estamos diante de um ilícito
invalidante. É um exemplo típico de ato ilícito que não gera responsabilidade civil. E mais um
exemplo: prática de ato de ingratidão contra o doador (art. 557, do CC, contrato de doação). Se
o donatário faz isso, o doador pode ajuizar ação de revogação da doação. Perceba que, nesse
ato, é um ilícito autorizante porque a prática do ato ilícito permitirá ao doador exercer um direito
seu, que é promover a ação de revogação da doação. Nesse caso, ilícito autorizante. A prática
de um ato de ingratidão pelo donatário contra o doador permite ao doador o ajuizamento de
uma ação de revogação da doação. Ilícito não indenizante, mas autorizante. E são inúmeros os
efeitos da ilicitude. Esses efeitos se flexibilizam de acordo com a norma.

Vamos abrir um parêntesis para uma informação importante sobre o art. 557.
Revogação da doação é matéria muito importante que vai caindo bastante em concurso.
Revogar é retratar, voltar atrás, se arrepender. Revogação da doação é expressão lamentável
porque o doador não está voltando atrás, mesmo porque a doação é irrevogável. A revogação
da doação nada mais é do que a perda de eficácia do contrato de doação por um ato
superveniente praticado pelo donatário. Ou seja, as hipóteses de revogação da doação
tecnicamente não constituem revogação. O doador não está se retratando, mas ajuizando uma
ação para que o juiz suspenda a eficácia do ato. Pois bem, no Código Civil, duas são as
causas de revogação da doação. Cabe revogação da doação por ingratidão do donatário (em
toda e qualquer doação) e por descumprimento de encargo (somente nas doações onerosas,
com encargo, óbvio).

O Código Civil diz que o prazo para a propositura da ação de revogação da doação por
ingratidão do donatário é de 1 ano. Prazo decadencial. E qual é o prazo decadencial para a
propositura da revogação da doação por descumprimento de encargo? O código esqueceu.
Esqueceu! Não tem previsão no código. Ele simplesmente esqueceu de estabelecer um prazo
de revogação da doação por descumprimento de encargo. Se restringiu a estabelecer um
prazo para a revogação da doação por ingratidão, ação personalíssima, que só pode ser
proposta pelo doador, salvo na hipótese de homicídio que, evidentemente, serão os seus
herdeiros. Mas, descumprimento de encargo, qual é o prazo? Não tem. E como a doutrina
resolve? Vem estabelecendo dois critérios para tentar indicar um prazo para essa ação:

Flávio Tartuce – Esse prazo seria de 10 anos, com base na cláusula geral de
prescrição do art. 205, do Código Civil: toda ação condenatória sem prazo prescrito em lei vai
seguir o prazo de 10 anos. Eu tenho uma objeção: esse prazo é uma cláusula geral de
prescrição. E aqui é caso de decadência porque não se trata de ação condenatória, mas
constitutiva. E em se tratando de ação constitutiva, não é possível utilizar uma cláusula geral
de prescrição até porque os fundamentos da prescrição e da decadência são distintos.
Afastado o cabimento do prazo de dez anos, qual seria o prazo? Fico com a opinião do
professor sinopse, Carlos Roberto Gonçalves:

Carlos Roberto Gonçalves – Este prazo para a ação de revogação da doação por
descumprimento de encargo também será de 1 ano. Por analogia da revogação da revogação
por ingratidão. Eu voto com ele. Me parece que esse prazo é de 1 ano e não de 10. Essa é
uma posição mais razoável.
Se você estiver em prova objetiva, a resposta é: não tem prazo porque o Código não
estabeleceu prazo para a ação de revogação de doação por descumprimento de encargo.

Mas eu abri esse parêntesis para falar do art. 557, para saber o que significa ingratidão
do donatário. Quais são os atos que geram ingratidão do donatário? Quando é que o donatário
é ingrato?

Art. 557. Podem ser revogadas por ingratidão as doações:

I - se o donatário atentou contra a vida do doador ou cometeu crime de homicídio


doloso contra ele;

II - se cometeu contra ele ofensa física;

III - se o injuriou gravemente ou o caluniou;

IV - se, podendo ministrá-los, recusou ao doador os alimentos de que este necessitava.

O Código indica quatro hipóteses de ingratidão:Homicídio doloso, tentado ou


consumado; ofensa física, injúria grave e abandono material. São as quatro hipóteses previstas
no Código de ingratidão o donatário e sofrer ação revocatória. Esses quatro tipos formam um
rol taxativo ou exemplificativo? Toda norma que estabelece sanção deve ser interpretada
restritivamente. Então, você está louco para dizer que esse rol é taxativo. Mas o Enunciado 33
da Jornada de Direito Civil estabelece, seguindo as pegadas da doutrina brasileira, que este rol
não é taxativo.

33 - Art. 557: o novo Código Civil estabeleceu um novo sistema para a revogação da
doação por ingratidão, pois o rol legal previsto no art. 557 deixou de ser taxativo, admitindo,
excepcionalmente, outras hipóteses.

Ora, na medida em que se diz isso, são admitidos outros tipos. Então, vale tudo?
Qualquer outro tipo pode ser considerado pelo juiz? Calma, não é assim. A interpretação do
art. 557 estará submetida ao Princípio da Tipicidade Finalística. Significa: o juiz pode
considerar outros tipos, outras circunstancias, outras condutas, que se adequem à finalidade
daqueles tipos que estão previstos em lei. O juiz pode considerar outros fatos que estejam
adequados ao tipo, que se harmonizem com aquele tipo, que tenham a mesma finalidade. Daí
o nome: tipicidade finalística.

Olhando para o art. 557, no conceito de ingratidão, traz quatro hipóteses. Eu pergunto:
homicídio culposo pode ser considerado como ingratidão? Ele está adequado à mesma
finalidade do homicídio doloso? Não. Portanto, o juiz não pode. Mas ao invés de matar, faz
auxílio, induzimento ou instigação ao suicídio. Agora, o juiz pode considerá-lo ingrato? Sim
porque esse ato se adequa à finalidade do tipo. O X da questão, portanto, é saber se a conduta
a ser considera da pelo juiz se adequa à finalidade do tipo. Se há adequação, há tipicidade
finalística e é possível admitir outras situações previstas em lei. Essa é uma importantíssima
novidade. Caiu recentemente no MP/RJ. Por isso, eu abri esses parêntesis para lembrar que o
conceito de ingratidão do art. 557 é não taxativo, se adequando à tipicidade finalística.

Isso vale também para a indignidade (art. 1.814) e deserdação (arts. 1.962 e 1.963), no
campo do direito das sucessões.

Eu estou falando dos efeitos do ato ilícito que podem decorrer diferentes efeitos. Vou
lembrar de mais um exemplo de ilicitude, só para lhe provar que esse rol é exemplificativo e
que do ato ilícito pode gerar uma presunção contrária a quem o praticou. Ou seja, sempre que
se fala em ilicitude vamos ter efeitos jurídicos que estão previstos na norma. Isso que eu vou tô
falando é tão importante que caiu no MP/SP (2005). Olha o que perguntou: “O ato ilícito produz
efeitos”? Sim. “Por quê?” norma jurídica. Se a ilicitude veio prevista na norma, é a própria
norma que estabelece os seus efeitos. Só que nem todo efeito é responsabilidade civil. TJ/SC
(2003). “O ilícito é fato jurídico?” Sim. “O ilícito é ato jurídico volitivo?” não necessariamente. “O
ilícito é ato jurídico inconsciente?” Não necessariamente. O certo é que podemos perceber que
há em nosso sistema inúmeros efeitos para o ato ilícito que pode produzir uma infinidade de
efeitos e todos esses efeitos que podem decorrer de um ato ilícito estarão decorrendo da
norma.

EXEMPLOS DE ABUSO DE DIREITO COMO ATO ILÍCITO

A publicidade abusiva e o ato emulativo civil

Segundo o § 2º, art. 37 do CDC “É abusiva, dentre outras a publicidade discriminatória


de qualquer natureza, a que incite à violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite
da deficiência de julgamento e experiência da criança, desrespeita valores ambientais, ou que
seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua
saúde ou segurança.”

Do conceito de publicidade abusiva transborda a concepção de interferência objetiva


da ordem pública na ordem privando, interessando à matéria que envolve o abuso de direito,
ou ato emulativo, ao interesse social e da coletividade.

Cite-se como exemplo, o caso em que foi considerada abusiva uma publicidade que
incitava as crianças à destruição de tênis velhos, que deveriam ser substituídos por outros
novos, situação tida como incentivadora da violência, abusando da inocência das crianças.
Abuso de direito art. 187 do CC: exerce o direito subjetivo ou o potestativo de modo
desproporcional, fere a boa-fé objetiva, o direito é exercido de forma distorcida a ponto de
violar a finalidade para a qual este direito fora concedido pelo ordenamento. Não olha o
elemento psicológico, não é conduta ilegal. A ilicitude ocorrerá devido à falta de legitimidade, o
ofensor viola materialmente os limites éticos do ordenamento jurídico (é ilícito na finalidade,
mas lícito na origem).

Ato ilícito com culpa X sem culpa

- O ato ilícito culposo é subjetivo. Já o abuso do direito é ato ilícito objetivo;

- O ato ilícito culposo é ilegal. Já o abuso do direito é ilícito por ilegitimidade (é


antijuridicidade de resultado, na origem é lícito);

- O ato ilícito culposo é dito pela lei. Já no abuso do direito o juiz é quem diz o que é
ilícito, pois o abuso do direito é uma cláusula geral.

As práticas previstas no CDC e o conceito do art. 187 CC

Segundo a doutrina, constituem abuso de direito as seguintes condutas previstas no


CDC:

 Venda casada, ou seja, condicionamento da venda de um produto/serviço à aquisição


de outro.
 Negação de venda ou recusa ao atendimento às demandas dos consumidores.
 Envio de produto ao consumidor sem solicitação.
 Ausência de orçamento prévio.
 Repasse de informação depreciativa referente a ato praticado pelo consumidor no
exercício de seus direitos
 Colocação de produto no mercado fora das especificações da ABNT ou CONMETRO.
 Ausência de fixação de prazo pelos fornecedores para cumprimento da obrigação
assumida.

A lide temerária como exemplo de abuso de direito

SILVIO DE SALVO VENOSA defende que no direito processual o abuso de direito


caracteriza-se pela lide temerária, trazendo o CPC, nos arts. 14 a 16, descrição pormenorizada
da falta processual. São exemplos citados pela doutrina: o requerimento de arresto formulado
pelo credor de bens que sabe não pertencer ao devedor; o requerimento de busca e apreensão
sem necessidade.
Abuso do direito de propriedade. A função socioambiental da propriedade

O direito de propriedade é aquele que atribui ao seu titular as prerrogativas de usar,


gozar, buscar ou reaver a coisa, sendo oponível contra todos. O conceito de propriedade
evoluiu muito ao longo do tempo, pois segundo o STF: “não se reveste de caráter absoluto, eis
que, sobre ele, pesa grave hipoteca social que lhe é inerente (CF, art. 5º, XXIII), observados,
contudo, para esse efeito, os limites, as formas e os procedimentos fixados na própria CF. O
acesso à terra, a solução dos conflitos sociais, o aproveitamento racional e adequado do
imóvel rural, a utilização apropriada dos recursos naturais disponíveis e a preservação do meio
ambiente constituem elementos de realização da função social da propriedade.” (ADI 2213)

Assim, existem diversas limitações da propriedade em prol do interesse da


coletividade. Existem, pois, restrições ligadas à segurança e defesa nacional, economia,
higiene e saúde pública, interesse urbanístico, cultura nacional, patrimônio cultural e
urbanístico, meio ambiente etc.

Por tudo isso, e pela concepção relativizada do direito de propriedade, constitui abuso de
direito a situação em que o proprietário se excede no exercício de qualquer um dos direitos
decorrentes do domínio, de forma a causar prejuízo a outrem como ocorre, por exemplo, no
caso de danos ambientais.

Neste sentido, dispõe o art. 1228, § 2º CC: São defesos os atos que não trazem ao
proprietário qualquer comodidade, ou utilidade, e sejam animados pela intenção de prejudicar
outrem. Deve-se ressaltar que também poderá ser configurado ato emulativo se o proprietário
tiver vantagens com o prejuízo alheio.

Desde os primórdios do Direito Romano e passando pelo Direito Medieval, o exemplo


típico de ato emulativo está relacionado com os abusos decorrentes do exercício do direito de
propriedade, principalmente aqueles que envolvem os direitos de vizinhança. O direito de
propriedade é aquele que atribui ao seu titular as prerrogativas de usar, gozar, buscar ou
reaver a coisa, sendo oponível contra todos (erga omnes). A reunião dessas quatro
prerrogativas ou atributos caracteriza a propriedade plena, sendo necessário observar que
esses elementos encontram limitações na própria norma civil codificada, eis que deve a
propriedade ser limitada pelos direitos sociais e coletivos.

Assim, constitui abuso de direito a situação em que o proprietário se excede no


exercício de qualquer um desses atributos decorrentes do domínio, de forma a causar prejuízo
a outrem, como ocorre, por exemplo, no caso de danos ambientais e ecológicos. Como
caracterização do abuso de direito no exercício da propriedade também pode ser citado o
contemporâneo exemplo do excesso de animais em casa ou apartamento.
Existe uma contradição entre o art. 1.228, § 2º, do CC (“São defesos os atos que não
trazem ao proprietário qualquer comodidade, ou utilidade, e sejam animados pela intenção de
prejudicar outrem”) e o art. 187 do CC, vez que o primeiro faz referência ao dolo ao mencionar
a intenção de prejudicar outrem. Para a doutrina, a melhor solução seria a reforma legislativa,
com a retirada do § 2º do art. 1.228 do Código Civil, pois o art. 187 é suficiente para regular o
abuso de direito em qualquer relação ou figura privada. Enquanto isso não ocorrer, vale a
recomendação contida no Enunciado 49 CJF/STJ: “Interpreta-se restritivamente a regra do art.
1.228, § 2º, do novo Código Civil, em harmonia com o princípio da função social da propriedade
e com o disposto no art. 187”.

Em outras palavras, o §2º do art. 1.228 proíbe o exercício abusivo da propriedade


(ATO EMULATIVO), mas, em sua parte final, não deveria ter feito referência ao elemento
“intencional”. Quando estudamos abuso de direito, no art. 187, vimos que o codificador ao
conceituá-lo não utilizou o elemento intencional.

O §2º segundo, na parte final, faz com que a pessoa prejudicada tenha de provar que
estava com intenção de prejudicar. Deveria o codificador ter seguido a linha do art. 187. Como
se prova que o vizinho tem a intenção de prejudicar? Pablo entende que a parte final do
parágrafo é inútil pelo simples fato da dificuldade de se provar a intenção do vizinho.

Spam e o abuso de direito

O spamming consiste no envio de mensagens eletrônicas, não solicitadas,


normalmente de natureza comercial, em grande quantidade e de maneira repetida, a pessoas
com as quais o remetente não teve contato anterior.

FLÁVIO TARTUCE entende tratar-se de abuso de direito, pois contraria o fim social e
econômico da internet, além de ser atentatória à boa fé objetiva, pois uma pessoa que nunca
solicitou a mensagem a recebe, o que contraria a probidade e lealdade.

Além disso, pode-se dizer que o spammer viola garantias fundamentais, eis que utiliza-
se de informação privativa e até certo ponto íntima de uso exclusivo do internauta: o seu
endereço eletrônico.

CATEGORIAS ESPECÍFICAS DE ABUSO DE DIREITO

Venire contra factum proprium


“O venire contra factum proprium é uma modalidade de abuso de direito caracterizada
pela prática de um comportamento, ou seja, pelo exercício de um direito afrontando uma
expectativa criada de que aquele direito não seria exercido. Em outras palavras, ocorre o
venire contra factum proprium sempre que alguém exerce o direito depois de ter criado a
expectativa de que não iria fazê-lo.”

É claro que se nós estivéssemos diante do conceito clássico de ato ilícito, que era um
conceito puramente subjetivo, jamais se poderia falar em ilicitude por venire porque no venire o
titular está exercendo um direito seu, mas está exercendo um direito seu depois de criar a
expectativa de que aquele direito não seria exercido.

Se você esquecer do venire, lembra de um trecho da música de Vanessa da Mata,


porque o venire nada mais é do que a criação de expectativas desleais. São expectativas
desleais de que um direito não seria exercido. Vejam que coisa inovadora! Dizer que alguém,
ao exercer um direito seu, acabou de cometer ilícito porque criou a expectativa de que aquele
direito não seria exercido.

O venire é admitido tanto no campo das relações privadas, quanto no campo das
relações de direito público.

Proibição de alegação da própria torpeza – E é importantíssimo que você não confunda


venire contra factum proprium com proibição de alegação da própria torpeza. Venire é
proibição de comportamento contraditório e isso não é proibição de alegação da própria
torpeza. Onde está a diferença? Ela vem na seguinte medida: o venire decorre da boa-fé
objetiva. A proibição de alegação da própria torpeza está fundada na boa-fé subjetiva. Perceba
a diferença, que é valorativa: proibição de comportamento contraditório é boa-fé objetiva,
proibição de alegação da própria torpeza é boa-fé subjetiva.

Reserva mental – Também não se confunde o venire contra factum proprium com a
reserva mental porque a reserva mental está no campo do descumprimento contratual, do
inadimplemento contratual. O venire, em verdade, não se confunde com a reserva mental
porque a reserva mental é uma das espécies de descumprimento contratual.

E assim, você vai percebendo que o venire está atrelado na boa-fé objetiva, no
comportamento de alguém que criou uma expectativa de que não iria exercer determinado
direito e o faz, surpreendentemente.

Vou dar exemplos do venire na jurisprudência:

A primeira de todas as hipóteses do venire julgada no direito brasileiro (RE 86787/RS):


na década de 70, uma mulher próspera, empresária famosa, se apaixona por um homem
muito, muito mais novo do que ela. Dez, vinte anos mais novo. Aquele casal conta com toda a
resistência da família dela. Eles vão até o Uruguai e se casam no Uruguai porque lá, o regime
de bens oficial é o de separação de bens. O que é dela não comunica com ele. Voltam para o
Brasil e comunicam que se casaram. Só que eles não dizem a ninguém, mas tempos depois,
eles requerem a homologação daquele casamento no Brasil e, em sendo assim, o regime sai
do uruguaio e vem para o regime brasileiro que, na década de 70 era o regime universal. Só
que isto eles não revelam a ninguém e todos sabem que estão casados pelo regime da
separação. Ela faz uma doação a ele e ele monta uma empresa para dar apoio logístico às
empresas dela, do gênero alimentício. Em pouco tempo ele faliu e vieram todos os credores
para executá-lo. Acabou o patrimônio dele. Os credores tentaram, então, executá-la. E ele
defende dizendo que o patrimônio dela não poderia ser executado porque nós somos casados
no regime de separação e comprovam o casamento no Uruguai. Com isso, a justiça termina
blindando o patrimônio dela por conta das alegações dele de que, de fato, eram casados sob o
regime de separação. Sem ocupação, ele resolve procurar um outro trabalho e aí resolve ser
ator de filme pornográfico. Um trabalho duro! Ela já não gosta mais da ocupação que ele
arrumou e pede a separação. Ele contesta a ação dizendo assim: “quer separar, a gente
separa, só que tem que dividir todo o patrimônio, porque somos casados no regime de
comunhão universal” E aparece com a homologação do casamento no Brasil. O Supremo,
nesse caso, aplicou o venire contra factum proprium, dizendo assim: de fato, você teria direito à
meação, mas você criou em todos e nela a expectativa de que na sua cabeça vocês eram
casados pelo regime da separação. Ato ilícito objetivo caducificante. Ele perdeu o direito de
exercer o seu direito à meação.

Exemplificando no STF (REsp 95539/SP) – O STJ dirimiu uma situação igualmente


interessante. Um casal em SP resolve vender um terreno que possuía numa cidade do interior.
O marido vai até a cidade e acertou toda a compra e venda com aquela pessoa. Celebrou a
promessa e assinou o contrato sozinho. O comprador depositou o dinheiro na conta-conjunta
do casal e a mulher concordou em entregar a posse para o comprador. O dinheiro foi
depositado, sob o compromisso de escrever a escritura futuramente. Nesse ínterim, o
comprador começa a construir no imóvel e a prefeitura embarga a obra: ação de nunciação de
obra nova por violação das leis municipais. Ao embargar, sem saber quem era o dono da obra,
a prefeitura então, ajuíza ação contra aqueles em cujo nome o imóvel está registrado: o casal
vendedor. O casal, então, citado na referida ação, contesta dizendo que já venderam e
mostraram o contrato, provando até que receberam o dinheiro. Ressaltaram que, pelo sim, pelo
não, se fossem condenados a ressarcir o município, queriam o direito de regresso e, com isso,
eles denunciaram à lide e depois disso, o que ela faz? Alega, com base nos arts. 1647 e 1649,
do CC, que a compra e venda de pessoa casada sem o consentimento do cônjuge é anulável.
Ela ajuíza uma ação de anulação de compra e venda. É direito dela fazê-lo? Sim, só que ela
está exercendo esse direito depois de ter criado a expectativa de que tinha anuído com aquele
contrato. O STJ disse que ela praticou venire contra factum proprium, que ela está exercendo
direito depois de ter criado a expectativa de que não iria fazê-lo.

Fique atento ao seguinte:


“Vem se debatendo na doutrina e na jurisprudência a ocorrência ou não do venire em
uma determinada hipótese que é a oferta voluntária, pelo devedor executado, de bem de
família à penhora com alegação posterior de impenhorabilidade.”

Durante o processo de execução, o executado oferece voluntariamente à penhora o


seu bem de família. E, no curso do processo de execução, ele alega que aquele bem é
impenhorável. Primeiro oferece, depois diz que é bem de família. Ficou claro?

Fredie Didier entende que é caso típico de venire e que ele está renunciando à
impenhorabilidade, portanto, que há supressão de direito, que há renúncia à
impenhorabilidade. Essa não é a posição do STJ.

“O STJ vem entendendo que é possível ao executado invocar a impenhorabilidade


mesmo depois de ter ofertado voluntariamente o bem, entendendo que moradia é direito
fundamental, motivo pelo qual afastar-se-ia a alegação de ilicitude.”

Requesitos: conduta inicial (que se abstém a exigir determinado direito)  Legítima


confiança na manutenção da conduta (reiteração ou expressa menção de continuar) 
Comportamento contraditório. Exemplo: esposa que não se opõe à execução de promessa de
venda e compra de imóvel por 17 anos, constatando a posse dos compromissários, não pode
pretende opor-se a concessão da escritura sob a alegação de que não concedeu outorga
uxória.

OBS: o venire contra factum proprium tem aplicação também nas condutas no
processo, inclusive quanto às condutas do juízo.

Supressio

Inadmissibilidade do exercício de determinada prerrogativa jurídica em virtude do


retardamento, omissão, fazendo surgir para a outra pessoa uma justa expectativa. Ex: aceitar o
pagamento reiteradamente em local diverso ao contrato. (é semelhante à prescrição)

Art. 330. O pagamento reiteradamente feito em outro local faz presumir


renúncia do credor relativamente ao previsto no contrato.--> Se o credor
admite reiteradamente que o devedor pague em local diverso do previsto
em contrato, presume-se que ele renunciou a essa cláusula.

OBS: O art. 330 do CC fundamenta-se na regra proibitiva do venire contra factum


proprium, podendo também, a luz da mesma regra, ser compreendido na perspectiva das
noções de supressio e surrectio. Essa regra proíbe o comportamento contraditório. Não pode,
na linha do tempo, uma mesma pessoa adotar comportamentos incompatíveis. No caso, se o
credor sempre aceita o pagamento em lugar, não pode, sem mais nem menos, se insurgir
contra ele com base no contrato.

Na supressio, a parte perde um direito ou uma faculdade não exercida ao longo do


tempo, que se consolida, via surrectio, em favor da outra parte. O credor perdeu o direito ao
pagamento no lugar pactuado por não exercê-lo e, em contrapartida, o devedor consolidou o
direito de pagar em local diversa pela ausência de impugnação ao longo do tempo.

A palavra mais importante do artigo 330 CC é “reiteradamente” por um motivo simples:


porque não é qualquer renúncia, não é qualquer concessão, não é qualquer tolerância que
gera a supressio. A tolerância que gera a supressio é uma tolerância reiterada. É aquilo que
desperta confiança. Por isso que nem toda tolerância pode implicar em venire e em supressio.
É somente aquela conduta reiterada e só.

É um sub-tipo do venire contra factum proprium. É uma modalidade do venire. No


venire você observou: o titular cria a expectativa de que determinado direito seu não será
exercido e, supreendentemente, aquele direito é exercido.

“Na supressio ocorrerá a supressão da possibilidade de exercício de um direito pelo


titular por ter ele criado em alguém a legítima expectativa de poder exercer aquele direito em
lugar do titular.”

Você acabou de descobrir que supressio e surrectio formam o verso e o reverso da


mesma moeda. Na supressio suprime-se a possibilidade de o titular exercer aquele direito
porque ele criou em alguém a expectativa de que esse alguém o exerceria em seu lugar
(surrectio). Na mesma medida em que ocorre surrectio para o titular, ocorre surrectio para o
terceiro. Na mesma tocada em que ocorre supressio para o titular, ocorre surrectio para o
terceiro. Daí a conclusão:

No venire o titular cria uma expectativa de que não vai exercer determinado direito
(nem ele nem ninguém), ele cria a expectativa de que aquele direito não será exercido.

Na supressio ele cria a expectativa de que alguém exercerá aquele direito em seu lugar
(aquele direito não será exercido por ele, mas será por outrem). Supressio para o titular e
surrectio para o terceiro.

O STJ vai admitindo a supressio e a surrectio com facilidade: REsp 356821/RJ e REsp
214680/SP. Nestes julgados, o STJ vai, tranquilamente, admitindo, acolhendo a alegação de
supressio e surrectio.

Fredie Didier sustenta a aplicação de supressio e surrectio no campo processual. E dá


como exemplo a preclusão lógica. Mas atenção. Nestes julgados que estão acima, aplica-se a
supressio no campo do condomínio edilício. A Lei 4591/64 proíbe usucapião de área comum
em condomínio edilício. Pois bem, apesar de a lei proibir, não é raro encontrar condomínios
que permitem o uso de área comum a um ou outro condômino (que acaba exercendo seu
direito em área comum). Pois bem, se o condomínio permite que o condômino use por dez,
vinte, trinta anos uma área comum, esse condômino pode alegar usucapião? Não, porque a
usucapião de área comum é proibida por lei. Mas ele pode alegar supressio porque o
condomínio criou nele a expectativa de que ele exerceria aquele direito em lugar do titular.

Surrectio

Situação inversa: surgimento de uma vantagem/favorecimento em virtude do não


exercício por outrem de um determinado direito.

Tu quoque

Até tu, Brutus, meu filho.

Alguém viola determinada norma jurídica e, posteriormente, tenta tirar proveito da


situação, com o fito de beneficiar-se. Semelhante à exceptio non adimpleti contractus. O tu
quoque é abreviação da expressão latina, “tu quoque, Brutus?” Até tu, Brutus? Surpresa,
quando Julio César descobriu que seu filho Brutus participava da conspiração contra ele. Dá
ideia de surpresa.

“Tu quoque ou Estoppel nada mais é do que o venire contra factum proprium aplicado
no âmbito das obrigações contratuais.”

Tu quoque ou Estoppel, portanto, é a proibição de comportamento contraditório entre


os contratantes. É uma limitação de comportamento entre contratantes. É a limitação do
exercício de direitos contratuais. Se o contratante exerce o direito seu, violando a expectativa
que ele criou, está praticando tu quoque e, portanto, ato ilícito.

Exemplo: é o contratante que, embora não tenha cumprido suas obrigações, exige que
o outro o faça. Você está louco para dizer que isso é o exemplo típico de exceptio non
adimpleti contractus. Exceção do contrato não cumprido. Pensou nisso e acertou. Só que você
deve lembrar que a exceção do contrato não cumprido é exclusiva dos contratos onerosos e
bilaterais. Se o contrato não é bilateral, não é oneroso, não se admite a exceptio non adimpleti
contractus. A exceptio non adimpleti contractus pode ser afastada pela cláusula solve et repete.
A cláusula solve et repete é uma cláusula expressa que serve para afastar a exceptio non
adimpleti contractus. Se a exceptio non adimpleti contractus é tácita, significa que a solve et
repete só pode ser expressa. E a solve et repete é a cláusula que permite ao contratante exigir
o cumprimento das obrigações do outro sem ter cumprido as suas.
Agora você acompanha comigo. Atenção! O tu quoque é mais largo, é mais amplo, do
que a exceptio non adimpleti contractus porque o tu quoque chega onde a exceptio não
conseguiu chegar. O tu quoque vai estar presente sempre, porque diz respeito a abuso do
direito, mesmo que o contrato não admita a exceptio non adimpleti contractus. E quais são os
contratos que não admitem a exceptio non adimpleti contractus? Os contratos unilaterais
gratuitos ou os contratos que têm cláusula solve et repete. Esses não admitem a exceptio, mas
o tu quoque está ali porque o tu quoque é o abuso do direito no que tange às obrigações
contratuais.

O STJ ainda não julgou nada sobre isso, mas vai julgar agora e é um caso muitíssimo
interessante aqui da Bahia. É um contrato celebrado entre duas grandes empresas. Através
desse contrato, elas estipularam convenção de arbitragem caso ocorresse algum conflito.
Estipularam a decisão de um árbitro e não do juiz. A empresa interessada, alegando que a
outra descumpriu suas obrigações foi lá e o árbitro dirimiu o conflito. Dirimindo o conflito por
sentença arbitral a empresa vencida no laudo arbitral vai a juízo. Se você fosse o advogado da
empresa vencedora iria alegar o quê? Extinção do processo sem resolução do mérito por
inadequação da vida processual, uma vez que aquilo era caso de arbitragem. Sabe o que foi
que a empresa vencedora do laudo arbitral e ré na ação disse? Contestou dizendo: não
procedem as alegações do autor e não alegou a existência de arbitragem. Contestou dizendo
que não era verdade nada daquilo e foi mais longe: ofereceu reconvenção. E disse: “não fui eu
quem descumpriu as obrigações. Foi ela e estou reconvindo. Agora estou formulando um
pedido contra ela, apesar de ter sido vencedora no laudo arbitral.” O processo andou e nas
alegações finais sabe o que o réu alegou? Arbitragem! Tu quoque nele! E por quê? Porque ele
está se comportando de forma arbitrária. Era direito dele ter alegado arbitragem, mas na
medida em que ele contesta e oferece reconvenção sem alegar arbitragem e permite a
instalação da instrução do processo, agora é abuso lembrar da cláusula de arbitragem. O STJ
não julgou esse caso ainda, mas vai julgar e, seguramente, vai aplicar o tu quoque. Abuso do
direito no que tange ao campo das relações obrigacionais.

Duty to mitigate the loss (dever de mitigar as próprias perdas)

Credor deve evitar o surendividamento. Exemplo – Súmula 309 do STJ: O credor de


alimentos somente pode obter a prisão civil do devedor de alimentos pela dívida dos últimos
três meses vencidos. É o dever de mitigar as próprias perdas. Agora, atenção: o duty to
mitigate the loss é abuso do direito do credor.

“Ocorre o dever de mitigar as próprias perdas quando o credor exerce um direito seu,
gerando prejuízo para si mesmo ou se omite de uma conduta que lhe geraria uma vantagem ou
eliminaria uma desvantagem.”
É abuso do direito do credor quando ele pratica um ato que lhe prejudica ou se omite
de uma conduta que lhe geraria uma vantagem ou que eliminaria uma desvantagem.

O conceito moderno de obrigação é um conceito de dever de cooperação. O conceito


moderno de relação jurídica obrigacional é um conceito de dever de cooperação, isto é, não é
apenas o devedor quem aspira o cumprimento da obrigação. O credor deve adotar
providencias para facilitar o cumprimento da obrigação e toda vez que o credor atrapalha, de
algum modo complica o cumprimento da obrigação, ele está prejudicando diretamente a si e,
indiretamente ao devedor, porque está agravando a situação do devedor. Abuso do direito.
Portanto, o duty to mitigate the loss, o dever de mitigar as perdas, é o abuso praticado pelo
credor agravando a sua situação e, indiretamente, a situação do devedor.

Expressamente acolhendo o duty to mitigate the loss como manifestação do abuso do


direito e violação da boa-fé objetiva, o Enunciado 169, da Jornada de Direito Civil: Art. 422: O
princípio da boa-fé objetiva deve levar o credor a evitar o agravamento do próprio prejuízo.

Vamos agora para os exemplos de aplicação do duty to mitigate the loss.

Recálculo das Astreintes (multa diária) – Meu nome foi inserido indevidamente no SPC.
Aí eu vou à Justiça e o juiz manda tirar, sob pena de multa diária de 1000 reais. Mas o réu não
cumpre a obrigação. Passa uma semana, dois meses. Ele não cumpriu e eu comuniquei o juiz
que ele não tinha cumprido. Eu fico esperando e já se passaram dois anos e dois anos depois
a dívida já está na casa de 1 milhão de reais e eu nunca comuniquei ao juiz. Sabe o que eu
vou fazer agora? Vou executar a multa e ao fazer isso, estou abusando do meu dinheiro que
não tinha natureza indenizatória, mas tinha natureza inibitória. Se tinha natureza inibitória era
para evitar o descumprimento e se o réu descumpriu, qual era o meu dever ético? Comunicar
ao juiz quanto tinha 15 dias, um mês, uma semana, sei lá! Se eu esperei dois anos e agora
executei estou fazendo de forma abusiva. O juiz deve, nessa hipótese, recalcular as Astreintes.
Ele faz o quê? Diminui o valor da multa e, com isso refaz o título executivo. Ele vai diminui o
valor da multa para que a execução não seja abusiva. Para que essa execução não viole a
natureza inibitória do título. Ele vai, portanto, diminuir o valor da multa, promovendo um
recálculo do título para impedir uma execução abusiva. Com esse exemplo, o STJ julgou o
AgRg 1075142/RJ (Luiz Felipe Salomão – Junho/2009) – para você ver a importância do duty
to mitigate the loss,

Súmula 309, do STJ – Na mesma linha de compreensão, no mesmo passo, a Súmula


309, do STJ é outro exemplo. Ela diz que o credor de alimentos tem direito de executar a dívida
sob pena de prisão. É o único caso de prisão civil do sistema. A dívida de alimentos prescreve
em dois anos. Se o devedor deixa de pagar dois anos e o credor, em nenhum momento o
executa, considerando que a natureza dos alimentos é a subsistência, o que ele está querendo
fazer é chantagem. Ele está querendo juntar um ano, dois anos, para executar tudo de uma
vez só. E aí ou ele não paga ou ele é preso. A Súmula 309 estabelece que o direito do credor
alimentício de pedir a execução sob pena de prisão civil, é somente em relação às parcelas
relativas aos últimos 3 meses, bem como as vincendas dentro do processo. O direito do credor
alimentício de promover a execução sob pena de prisão é somente em relação às parcelas dos
últimos 3 meses e das vincendas dentro do processo porque o STJ entende que executar sob
pena de prisão mais do que os últimos 3 meses é abuso porque o credor tinha o dever de
minorar o seu próprio prejuízo.

Direito à purgação da mora na locação dos imóveis urbanos – A Lei de Locações (Lei
8.245/91) diz expressamente que nas ações de despejo por falta de pagamento, o locatário
tem direito à purgação da mora. Tem direito de afastar o despejo pagando a dívida no curso do
procedimento. Ele só não pode exercer o direito à purgação da mora duas vezes no prazo de
12 meses. Sabe o que o locador faz, para impedir que o locatário tenha o direito de purgar a
mora? Ao invés de promover a ação de despejo com dois, três meses de inadimplemento, ele
deixa juntar um ano, um ano e meio, dois. Se o cara não pagou, agora é que não paga de jeito
nenhum. O juiz deve limitar o número de meses para a purgação da mora. Ou seja, o réu está
devendo 14, 16 meses, o juiz diz: “se ele pagar 4, a mora está purgada e afasta-se o despejo.”
E o resto? Cobrança autônoma. O credor tem o dever de minorar suas próprias perdas, tem o
dever de minorar o prejuízo violado.

Código de Defesa do Consumidor – Mais um exemplo do duty to mitigate the loss é o


superendividamento. É o comportamento do credor nas operações financeiras. Sabe o que
acontece? Você está devendo no cheque especial e vai até o gerente negociar. Ele dobra o
limite do seu cheque especial, te dá um empréstimo e um cartão de crédito sem limite. Em
outras palavras: agora você vai se enrolar todo. Superendividamento. É o credor, nas
operações financeiras, colaborando para o inadimplemento do devedor, sabendo que sua
capacidade contributiva não vai a tanto. Nesses casos, deve o juiz limitar o cálculo dos juros.
Nas hipóteses de superendividamento é dever do juiz limitar o cálculo dos juros.

Substancial performance (inadimplemento mínimo ou adimplemento substancial).

O credor não poderá exercer o direito potestativo de resolução do contrato em


situações que caracterizam o cumprimento substancial do contrato pelo devedor. Ex. Pedir
busca e apreensão de veículo, quando o devedor já quitou 58 das 60 prestações. O credor
deverá buscar o seu crédito através de ação de cobrança. Anote os sinônimos: adimplemento
substancial, inadimplemento mínimo ou inadimplemento irrisório.

Todos vão lembrar que nos termos dos arts. 389 e 395, do Código Civil, é direito da
parte requerer a rescisão contratual com todos os seus efeitos quando ocorrer o
descumprimento das obrigações pela outra parte. Toda vez que o contratante descumpre as
suas obrigações, toda vez que ocorre o inadimplemento contratual, surge para a outra parte o
direito à rescisão com todos os seus efeitos. Para quem não lembra quais são os efeitos da
rescisão de um contrato:

• Perdas e danos (multa) – normalmente já são previamente limitadas por cláusula penal.

• Juros e correção monetária

• Honorários e custas

Estes são os efeitos da rescisão contratual. Extingue-se o contrato com todos esses
efeitos. Imagine o contrato de financiamento de automóvel em 24 parcelas. Dessas parcelas, o
devedor pagou 21 ou 22. Deixou de pagar as restantes. Ficou desempregado, por exemplo.
Não pagou 3 de 24 parcelas. Se não pagou, descumpriu. Se é assim, rescisão contratual nos
seus efeitos. O banco tem direito de ajuizar rescisão de contrato pedindo a devolução do carro.
“Com prazer. Devolvo o carro e você me devolve o meu dinheiro.” E o banco, muito honesto,
vai dizer: “devolvo, sim, mas antes vou fazer alguns abatimentos na forma da lei.” Art. 389. Eu
vou reter a multa, cláusula pena, vou reter juros e correção, honorários e custas e taxa de
ocupação (que é uma espécie de aluguel, afinal de contas, o devedor estava utilizando o
carro). Na hora que você somar isso tudo, significa que o cara devolve o carro e continua
devendo. Tudo isso porque ele deixou de pagar duas ou três parcelas. É direito do contratante
requerer a rescisão do contrato nesse caso? Sim, mas esse direito está sendo exercido
abusivamente.

“Substantial performance é o abuso do direito de o credor ao requerer a rescisão do


contrato quando o descumprimento de obrigações pelo devedor foi mínimo, irrisório.”

E qual é a solução para esse caso? Reconhecer a ilicitude desse requerimento de


rescisão. Eu disse que o banco vai ficar sem receber? Não. Ele só não vai poder requerer a
rescisão. Ele vai ter que promover uma ação de cobrança comum. Mas rescisão não dá para
requerer porque, nesse caso, consubstanciou-se o substantial performance, o abuso do direito
do credor de requerer a rescisão.

Dois julgados exatamente desse caso: REsp 272739/MG e 293722/SP. Nesses dois
julgados, o STJ reconheceu o abuso do direito do credor no requerimento da rescisão. Ele não
perde o direito ao crédito. Ele perde o direito de rescindir o contrato. São coisas bem
diferentes.

Quem quiser pesquisar mais sobre o performance, vá ao site do STJ e ao TJ/RS. Você
verá uma grande quantidade de acórdãos tratando do substantial performance. Todavia, muito
embora os acórdãos que você encontrará sejam todos tratando do substantial performance
numa ótica quantitativa, eu queria que você deixasse claro no seu caderno. Anote agora: é
possível falar de substantial performance também pela ótica qualitativa. Em outras palavras: no
exemplo que eu dei (de 24 foram cumpridas 22), estou falando da ótica quantitativa.
Mas é possível falar no subtantial performance qualitativo. Eu me lembro dos
financiamentos de imóveis que têm um plano diferente. O devedor começa pagando uma
parcela muito alta e, na metade do contrato, a parcela já é quase irrisória porque ele começa
quitando a dívida para, lá no final, pagar os juros. Imagine que esse contrato é de dez anos.
Imagine que no 5º ano ele já pagou a dívida inteira e que dali pra frente ele só vai pagar juros.
Nesse momento houve o inadimplemento. Eu posso dizer que o inadimplemento foi mínimo?
Se eu olhar para o critério quantitativo, não. Mas se eu olhar para o critério qualitativo, sim,
porque a dívida já foi paga e agora ele só está pagando juros. Eu quero dizer, portanto, que o
substantial performance não atende somente a um critério quantitativo, mas também a um
critério qualitativo.

Violação positiva do contrato – descumprimento dos direitos anexos (informação, riscos,


prestar garantia)

E o que é isso? A violação positiva de contrato é um novo modelo de inadimplemento


contratual. Historicamente, se falou que o inadimplemento contratual era apenas e tão-somente
o descumprimento de obrigações contratuais. Portanto, todo inadimplemento sempre foi
negativo: descumprimento das obrigações de um contrato. Com o novo Código Civil, além de
cumprir as obrigações contratuais, os contratantes devem também cumprir a boa-fé objetiva e
os seus deveres anexos. Com isso, pode ser que o contratante cumpra todas as obrigações
contratuais, sem exceção, mas descumpra os deveres anexos oriundos boa-fé objetiva. Que
deveres são esses? Dever de informação, de segurança, de lealdade. São deveres éticos.
Nesse caso, não houve um descumprimento negativo. Houve um descumprimento positivo.
Houve uma violação positiva de um contrato. E por que houve uma violação positiva de
contrato? Porque cumpriu todos os deveres contratuais, mas descumpriu os deveres anexos.
Haverá, portanto, aqui, um novo modelo de inadimplemento, o inadimplemento positivo. Alguns
exemplos são maravilhosos:

TV de Plasma – Em 2006 todo mundo comprou para ver a Copa. Quem vendeu,
vendeu a TV em perfeito estado e não contou que no sinal de TV analógico a imagem do
plasma deformava. O vendedor entregou a TV em perfeito estado, no prazo, mas descumpriu o
dever de informação.

Lada – Foi outro exemplo, julgado pelo STJ. Lada era um carro russo horroroso. E a
Lada vendia aquele carro e de repente parou de vender e parou de vender peças de reposição.
Aí você tinha um carro do ano. Se quebrou uma lanterna, tinha que mandar buscar na Rússia.
Violação positiva de contrato. O STJ obrigou a Lada a manter por cinco anos peças de
reposição no mercado.
Outdoors – TJ/SP julgou: Uma empresa queria fazer uma propaganda em placas de
outdoor de um produto muito caro, voltado para o público A. 20 placas foram espalhadas pela
cidade. E a empresa, mesmo sabendo que o produto era dirigido à classe A, espalhou as
placas pelos subúrbios e favelas. Cumpriu o contrato porque colocou as 20 placas, mas violou
positivamente o contrato.

O STJ vem admitindo a violação positiva de contrato: REsp 330261/SC. Nesse julgado,
o STJ admitiu violação positiva de contrato.
DA RESPONSABILIDADE CIVIL

A responsabilidade civil é uma espécie do gênero responsabilidade jurídica, do qual


também são espécies a responsabilidade tributária e a responsabilidade administrativa, entre
outras.
Nesse passo, são esclarecedoras as diferenças apontadas por Maria Helena Diniz,
entre a responsabilidade civil e a penal. A responsabilidade civil tem por causa geradora o
interesse em restabelecer o equilíbrio jurídico alterado ou desfeito pela lesão, de modo que a
vítima poderá pedir reparação do prejuízo causado, traduzida na recomposição do statu quo
ante ou numa importância em dinheiro. Por fim, temos a responsabilidade penal que implica na
existência de lesão aos deveres de cidadãos para com a sociedade.
A responsabilidade civil, no século XXI, vem gradativamente afastando a noção de
culpa. Para Calmom de Passos, por exemplo, esse século será marcado pela responsabilidade
civil baseada no risco.
Nesse sentido, pode-se constatar que existem dois tipos de responsabilidade civil: a)
Clássica, subjetiva, baseada na culpa; e b) Objetiva, que dispensa o elemento culpa.

Ilícito civil X ilícito penal:


Segundo Miguel Fenech, um mesmo comportamento humano pode configurar um ilícito
civil, um ilícito penal e outro administrativo (ex: avanço de sinal vermelho; atropelamento).
O que diferencia esses tipos de ilícito é, primeiramente, o mecanismo sancionatório. A
resposta penal tende a ser mais severa que a resposta civil, razão pela qual vige naquele
sistema o princípio da intervenção mínima do direito penal. Além disso, a tipicidade somente é
exigida para o Direito Penal, cujas sanções são, como dito, mais gravosas. No âmbito do direito
civil, não há tipicidade, havendo apenas um princípio genérico no sentido de que ninguém pode
causar prejuízo ou dano a outrem.

Conceito de responsabilidade civil:


A palavra responsabilidade é polissêmica, isto é, possui vários sentidos. No sentido
jurídico, o termo responsabilidade normalmente está ligado ao fato de respondermos pelos atos
que praticamos.
Conforme ensinamento de Romualdo Baptista dos Santos, “A responsabilidade civil
está relacionada à noção de que somos responsáveis pelos fatos decorrentes da nossa
conduta, isto é, que devemos nos conduzir na vida sem causar prejuízos às outras pessoas,
pois se isso acontecer, ficamos sujeitos a reparar os danos. E, de outra parte, significa que as
pessoas têm o direito de não serem injustamente invadidas em suas esferas de interesses, por
força de nossa conduta, pois caso isso aconteça têm elas o direito de serem indenizadas na
proporção do dano sofrido. Vemos então que a responsabilidade civil está ligada à conduta que
provoca dano à outra pessoa.” Carlos Roberto Gonçalves, por seu turno, entende que a
“responsabilidade civil decorre de uma conduta voluntária violadora de um dever jurídico, isto é,
da prática de um ato jurídico, que pode ser lícito ou ilícito.” Por seu turno, Maria Helena Diniz
define a responsabilidade civil “como a aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar
dano moral ou patrimonial causado a terceiros em razão de ato do próprio imputado, de pessoa
por quem ele responde, ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda ou, ainda, de simples
imposição legal.”A responsabilidade civil deriva da transgressão de uma norma jurídica pré-
existente (contratual ou legal), impondo ao infrator a obrigação de indenizar a vítima pelo dano
material ou moral sofrido, a fim de restituir seu status quo ante.
A depender da natureza jurídica da norma violada, a responsabilidade civil pode ser:
Contratual: a norma pré-existente violada é negocial. Baseia-se nos art. 389 e
seguintes, e art. 395 e seguintes do CC/02;
Extracontratual ou aquiliana: a norma jurídica pré-existente violada é a própria norma
legal. Fundamenta-se nos art. 186, 187 e 927 do CC/02.
A responsabilidade contratual implica numa imposição de indenizar muito mais
facilitada, porque existe contrato prévio, bastando a prova do não-cumprimento daquilo que foi
pactuado.
No caso da responsabilidade extracontratual, não há contrato prévio entre vítima e
autor do dano. A norma jurídica violada é legal, pré-existente, que determina que, ocorrido
determinado fato danoso, ocorrerá a responsabilidade como consequência.
Mas essa responsabilidade contratual não deriva apenas de quando a obrigação
principal (dar, fazer e não fazer) é descumprida. Existe responsabilidade contratual também
com base na violação do princípio da boa-fé objetiva, quando as obrigações anexas são
descumpridas (assistência, sigilo, informação).
O art. 186 consagra a regra geral da responsabilidade civil. Define ato ilícito. Traduz o
princípio do “neminem laedere” (a ninguém é permitido causar prejuízo a outrem):
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária (dolo), negligência ou
imprudência (culpa), violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente
moral, comete ato ilícito.
Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede
manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou
pelos bons costumes.
O art. 187 consagra o abuso de direito, conectando-o ao ato ilícito. A respeito do abuso
de direito, Flávio Tartuce explica que é um ato lícito pelo conteúdo, mas ilícito pelas
conseqüências.
Vejamos Enunciados da V Jornada de Direito Civil:
412) Art. 187. As diversas hipóteses de exercício inadmissível de uma situação jurídica
subjetiva, tais como supressio, tu quoque, surrectio e venire contra factum proprium, são
concreções da boa-fé objetiva.
413) Art. 187. Os bons costumes previstos no art. 187 do CC possuem natureza subjetiva,
destinada ao controle da moralidade social de determinada época, e objetiva, para permitir a
sindicância da violação dos negócios jurídicos em questões não abrangidas pela função social
e pela boa-fé objetiva.
414) Art. 187. A cláusula geral do art. 187 do Código Civil tem fundamento constitucional nos
princípios da solidariedade, devido processo legal e proteção da confiança e aplica-se a todos
os ramos do direito.

Para Daniel Boulos, a ilicitude prevista no art. 186 é subjetiva, diferente da ilicitude
prevista no art. 187, que é objetiva, uma vez que, na definição do abuso de direito, o legislador
utilizou um critério apenas finalístico, qual seja, o desvio na finalidade que o ato deveria buscar.
O art. 927 representa uma síntese desse sistema dual consagrado pelo direito
brasileiro, pois reconhece a ilicitude subjetiva (com culpa) e a ilicitude objetiva (sem culpa).
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica
obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa,
nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo
autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Convém, nesta oportunidade, trazer à baila os conceitos e as nuances que envolvem
os institutos baseados na boa-fé objetiva, um dos pilares da novel Codificação Civil.
Para minimizar ou evitar o abuso do direito, há mecanismos que procuram evitar que a
aplicação da lei se torne tirânica.
Este é, precisamente, o sentido da verwirkung, Instituto que impede que o titular
exercite seu direito, sempre que tenha criado, na contraparte, a partir de inércia prolongada ao
longo do tempo, a expectativa fundada de que não o faria valer, malgrado não fosse ainda o
caso de prescrição.
No Brasil, o Ilustre Ministro Ruy Rosado já explicara a importância que as referidas
teorias possuem no âmbito das relações contratuais:
"A teoria dos atos próprios, ou a proibição de venire contra factum proprium protege
uma parte contra aquela que pretenda exercer uma posição jurídica em contradição com o
comportamento assumido anteriormente. Depois de criar uma certa expectativa, em razão de
conduta seguramente indicativa de determinado comportamento futuro, há quebra dos
princípios de lealdade e de confiança se vier a ser praticado ato contrário ao previsto, com
surpresa e prejuízo à contraparte.
Aquele que vende um estabelecimento comercial e auxilia, por alguns dias, o novo
comerciante, inclusive preenchendo pedidos e novas encomendas, fornecendo o seu próprio
número de inscrição fiscal, não pode depois cancelar tais pedidos, sob alegação de uso
indevido de sua inscrição. O credor que concordou, durante a execução do contrato de
prestações periódicas, com o pagamento em lugar ou tempo diverso do convencionado, não
pode surpreender o devedor com a exigência literal do contrato. Para o reconhecimento da
proibição é preciso que haja univocidade de comportamento do credor e real consciência do
devedor quanto à conduta esperada”.
Na supressio, um direito não exercido durante um determinado lapso de tempo não
poderá mais sê-lo, por contrariar a boa-fé.
O contrato de prestação duradoura, que tenha passado sem cumprimento durante
longo tempo, por falta de iniciativa do credor, não pode ser exigido, se o devedor teve motivo
para pensar extinta a obrigação e programou sua vida nessa perspectiva. O comprador que
não retira as mercadorias não pode obrigar ao vendedor a guarda dos bens por tempo
indeterminado.
Enquanto a prescrição encobre a pretensão pela só fluência do tempo, a supressio
exige, para ser reconhecida, a demonstração de que o comportamento da parte era
inadmissível, segundo o princípio da boa fé.
A surrectio é a outra face da supressio, pois consiste no nascimento de um direito,
sendo nova fonte de direito subjetivo, conseqüente à continuada prática de certos atos. A
duradoura distribuição de lucros de sociedade comercial, em desacordo com os estatutos,
pode gerar o direito de recebê-los do mesmo modo, para o futuro."
Figuras típicas delineadas pela casuística dos tribunais alemães vão determinar o
alcance do exercício inadmissível de posições jurídicas, sob as seguintes formas:
a) exceptio doli: Fundamentado em bases romanas, este instituto é definido por
Menezes Cordeiro, como “o poder que uma pessoa tem de repelir a pretensão do autor, por
este ter incorrido em dolo”;
b) inalegabilidade de nulidades formais: Ocorre quando “o exercício de um direito
que implique a alegação de nulidade formal pode ser abusivo por contrariar a boa-fé”;
c) supressio: É “a situação do direito que, não tendo sido em certas circunstâncias,
exercido durante um determinado lapso de tempo, não possa mais sê-lo por, de outra forma, se
contrariar a boa-fé”,
d) surrectio: De semelhante modo, erige-se ao lado da supressio, a denominada
surrectio, apontada por Menezes Cordeiro, como instituto que faz surgir um direito que não
existe juridicamente, mas que existe na efetividade social;
e) tu quoque: Define-se como a “regra pela qual a pessoa que viole uma norma
jurídica não poderia, sem abuso, exercer a situação jurídica que essa mesma norma lhe tivesse
atribuído”;
f) o desequilíbrio no exercício de direitos: Hipótese ainda apontada por Menezes
Cordeiro, encontra-se no despropósito entre o exercício do direito e os efeitos que dele
derivam, gerando um desequilíbrio.
g) duty to mitigate the loss: Tal teoria tem por base o princípio da boa-fé objetiva,
inspirado no art. 77 da Convenção de Viena:
“A parte que invoca a quebra do contrato deve tomar as medidas razoáveis, levando em
consideração as circunstâncias, para limitar a perda, nela compreendido o prejuízo resultante
da quebra. Se ela negligencia em tomar tais medidas, a parte faltosa pode pedir a redução das
perdas e danos, em proporção igual ao montante da perda que poderia ter sido diminuída”.
Atualmente pode-se dizer que tal teoria tem guarida no art. 422, do CC, segundo o qual “Os
contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua
execução, os princípios da probidade e boa-fé”.

Em que pese a diversidade de tais condutas, em todos está presente a idéia de


comportamentos contraditórios, expressa na figura do venire contra factum proprium.
Trata-se este do “exercício de uma posição jurídica em contradição com o
comportamento assumido anteriormente”. Pressupõe a existência de dois comportamentos
lícitos desempenhados pelo titular de um direito, que se estendem no tempo, mas em que o
segundo comportamento apresenta-se em contradição ao primeiro.

Elementos da responsabilidade civil:


Conduta humana;
Nexo de causalidade;
Dano ou prejuízo.
1 - Conduta humana:
Conceito: A conduta humana é o comportamento voluntário, positivo ou negativo do
agente, que desemboca em um dano ou prejuízo. No caso da omissão, é preciso que exista o
dever jurídico de praticar o ato.
No passado, eram cabíveis ações de responsabilidade contra animais. Entretanto, a
voluntariedade deveria estar presente. Giuseppe Bettiol exemplifica: cidadão está no museu
observando uma obra de arte, guardada a distância regulamentar, quando uma veia do seu
nariz rompe. Ele espirra e estraga a obra. O sonâmbulo também não pode ser civilmente
responsabilizado.
Atenção! Muitos autores colocam, como primeiro elemento, a conduta humana ilícita.
Mas a ilicitude não é uma característica sempre presente na responsabilidade civil porque,
ainda que em caráter excepcional, pode haver responsabilidade civil sem ilicitude, ou seja,
decorrente de comportamentos lícitos. São exemplos de responsabilidade por atos lícitos:
desapropriação, passagem forçada (art. 1285, CC/02).
OBS: Passagem forçada não é igual a servidão: a passagem forçada é direito de vizinhança e decorre da
lei; a servidão do CC/02 não decorre diretamente da lei.
Art. 1.285. O dono do prédio que não tiver acesso a via pública, nascente ou porto, pode, mediante
pagamento de indenização cabal, constranger o vizinho a lhe dar passagem, cujo rumo será judicialmente
fixado, se necessário.
§ 1º Sofrerá o constrangimento o vizinho cujo imóvel mais natural e facilmente se prestar à passagem.
§ 2º Se ocorrer alienação parcial do prédio, de modo que uma das partes perca o acesso a via pública,
nascente ou porto, o proprietário da outra deve tolerar a passagem.
§ 3º Aplica-se o disposto no parágrafo antecedente ainda quando, antes da alienação, existia passagem
através de imóvel vizinho, não estando o proprietário deste constrangido, depois, a dar uma outra.

2 - Nexo de causalidade:
Conceito: O nexo causal traduz o liame jurídico que vincula o agente ao prejuízo
causado.
Teorias: Há 3 teorias explicativas fundamentais sobre o nexo de causalidade:
Teoria da equivalência de condições, ou da conditio sine qua non:
Sustenta que todo antecedente que concorra para o resultado é causa. Para a doutrina
clássica, é adotada pelo CP, no seu art. 13, com os temperamentos trazidos pela teoria da
imputação objetiva. Contudo, é preciso estar atento às críticas encetadas a essa teoria no
sentido de, se se levar essa teoria aos extremos, a responsabilidade alcançaria infinitos
comportamentos, podendo vir a implicar mesmo o marceneiro que fez a cama onde se
cometeu o adultério. Isto é, a referida teoria não estabelece um limite para a fixação da causa.
No Direito Civil essa teoria não é aceita.
Teoria da causalidade adequada:
Desenvolvida por Von Kries, sustenta que nem todo antecedente é causa. Somente é
causa o antecedente abstratamente idôneo ou adequado a produzir o resultado danoso. Ou
seja, o antecedente que, segundo um juízo de razoabilidade e probabilidade, e, segundo a
experiência comum da vida, determina o resultado danoso.
Por exemplo, se X prende Y no banheiro de um avião, e, em decorrência disso, Y é
obrigado a pegar um vôo diferente do inicialmente planejado, vindo a sofrer acidente aéreo do
qual resulta a sua morte, não se pode responsabilizar X pela eventual morte de Y, pois a
conduta de X, abstratamente analisada, não é causa adequada ao evento morte.
Adotada no direito argentino e por grande parte da doutrina brasileira (ex: Jean
Carbonnier, irmãos Mazzaud, Andre Tunc, Cavalieri Filho, Washington de Barros Monteiro,
parte da doutrina argentina), encontrando também eco na jurisprudência.
Teoria da causalidade direta e imediata, ou da necessariedade do dano, ou da
interrupção do nexo causal:
Defendida por Tepedino, Carlos Roberto Gonçalves, Agostinho Alvim, e pelo próprio
professor Pablo Stolze, consoante essa doutrina, causa é apenas o antecedente que determina
um resultado como sua conseqüência direta e imediata.
Embora as duas últimas teorias sejam semelhantes, a teoria da causalidade direta é
mais objetiva, e explica melhor as concausas relativamente independentes (ex: X dá um soco
em Y; Y é socorrido por ambulância, que se envolve em acidente e ocasiona, por si, a morte de
Y o soco de X não enseja como conseqüência direta e imediata a morte de Y).
Além disso, o CC/02 adotou essa teoria, em seu art. 403:
Art. 403. Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só
incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e imediato,
sem prejuízo do disposto na lei processual.
3 – Dano ou prejuízo:
Sem dano ou prejuízo não há responsabilidade civil. O mero aborrecimento, percalço
da vida comum, não gera responsabilidade civil.
Conceito: O dano ou prejuízo traduz lesão ao interesse jurídico tutelado material ou
moral
O dano material (lucros cessantes e danos emergentes) constituem prejuízos ou
perdas ao patrimônio corpóreo de alguém.
Requisitos do dano indenizável:
Lesão a interesse jurídico: nem todo dano interessa à responsabilidade civil. Na
Apelação Cível 7000.822.0634, por exemplo, o TJRS entendeu que o término de
namoro não traduz interesse jurídico tutelado, para efeito de responsabilidade civil,
mesmo se tratando de relacionamento prolongado;
Certeza do dano: o dano não pode ser hipotético.
Relativizando esse requisito, a doutrina francesa desenvolveu a doutrina da indenização
pela perda de uma chance (perte d’une chance). Segundo Fernando Gaburri, a perda de uma
chance pode ser indenizável, por afastar uma expectativa favorável ao lesado. Isso ocorre nos
casos em que o ato ilícito praticado por outrem retira da vítima a oportunidade de, futuramente,
melhorar sua situação atual.
Na Apel. Cível 7000.0958868, o TJRS reconhece essa teoria, em face de um advogado
que perdeu prazo para interposição de um recurso, ainda que não se possa saber qual seria o
resultado de um eventual recurso.
Quanto ao tema – perda de uma chance – tem-se o Enunciado 444 da V Jornada de Direito
Civil: Art. 927. A responsabilidade civil pela perda de chance não se limita categoria de danos
extrapatrimoniais, pois, conforme as circunstâncias do caso concreto, a chance perdida pode
apresentar também a natureza jurídica de dano patrimonial. A chance deve ser séria e real,
não ficando adstrita a percentuais apriorísticos.

Informativo nº 0466 – 2a Turma.

TEORIA. PERDA. CHANCE. CONCURSO. EXCLUSÃO.

A Turma decidiu não ser aplicável a teoria da perda de uma chance ao candidato que pleiteia
indenização por ter sido excluído do concurso público após reprovação no exame psicotécnico.
De acordo com o Min. Relator, tal teoria exige que o ato ilícito implique perda da oportunidade
de o lesado obter situação futura melhor, desde que a chance seja real, séria e lhe proporcione
efetiva condição pessoal de concorrer a essa situação. No entanto, salientou que, in casu, o
candidato recorrente foi aprovado apenas na primeira fase da primeira etapa do certame, não
sendo possível estimar sua probabilidade em ser, além de aprovado ao final do processo,
também classificado dentro da quantidade de vagas estabelecidas no edital. AgRg no REsp
1.220.911-RS, Rel. Min. Castro Meira, julgado em 17/3/2011.

Inf. 513 – 3a Turma

DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. APLICABILIDADE DA TEORIA DA PERDA DE


UMA CHANCE PARA A APURAÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL OCASIONADA POR
ERRO MÉDICO

A teoria da perda de uma chance pode ser utilizada como critério para a apuração de
responsabilidade civil ocasionada por erro médico na hipótese em que o erro tenha reduzido
possibilidades concretas e reais de cura de paciente que venha a falecer em razão da doença
tratada de maneira inadequada pelo médico. De início, pode-se argumentar ser impossível a
aplicação da teoria da perda de uma chance na seara médica, tendo em vista a suposta
ausência de nexo causal entre a conduta (o erro do médico) e o dano (lesão gerada pela perda
da vida), uma vez que o prejuízo causado pelo óbito da paciente teve como causa direta e
imediata a própria doença, e não o erro médico. Assim, alega-se que a referida teoria estaria
em confronto claro com a regra insculpida no art. 403 do CC, que veda a indenização de danos
indiretamente gerados pela conduta do réu. Deve-se notar, contudo, que a responsabilidade
civil pela perda da chance não atua, nem mesmo na seara médica, no campo da mitigação do
nexo causal. A perda da chance, em verdade, consubstancia uma modalidade autônoma de
indenização, passível de ser invocada nas hipóteses em que não se puder apurar a
responsabilidade direta do agente pelo dano final. Nessas situações, o agente não responde
pelo resultado para o qual sua conduta pode ter contribuído, mas apenas pela chance de que
ele privou a paciente. A chance em si – desde que seja concreta, real, com alto grau de
probabilidade de obter um benefício ou de evitar um prejuízo – é considerada um bem
autônomo e perfeitamente reparável. De tal modo, é direto o nexo causal entre a conduta (o
erro médico) e o dano (lesão gerada pela perda de bem jurídico autônomo: a chance).
Inexistindo, portanto, afronta à regra inserida no art. 403 do CC, mostra-se aplicável a teoria da
perda de uma chance aos casos em que o erro médico tenha reduzido chances concretas e
reais que poderiam ter sido postas à disposição da paciente. REsp 1.254.141-PR, Rel. Min.
Nancy Andrighi, julgado em 4/12/2012.

Inf. 513 – 3a Turma

DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. FIXAÇÃO DO VALOR DA INDENIZAÇÃO PELA


PERDA DE UMA CHANCE.

Não é possível a fixação da indenização pela perda de uma chance no valor integral
correspondente ao dano final experimentado pela vítima, mesmo na hipótese em que a teoria
da perda de uma chance tenha sido utilizada como critério para a apuração de
responsabilidade civil ocasionada por erro médico. Isso porque o valor da indenização pela
perda de uma chance somente poderá representar uma proporção do dano final experimentado
pela vítima. REsp 1.254.141-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 4/12/2012.

Inf. 549 – 3ª Turma:

Tem direito a ser indenizada, com base na teoria da perda de uma chance, a criança que, em
razão da ausência do preposto da empresa contratada por seus pais para coletar o material no
momento do parto, não teve recolhidas as células-tronco embrionárias. STJ. 3ª Turma. REsp
1.291.247-RJ, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 19/8/2014 (Info 549).

Para o STJ, não se está diante de situação de dano hipotético (o que não renderia ensejo a
indenização), mas sim de caso claro de aplicação da teoria da perda de uma chance. A
responsabilidade é por perda de uma chance por serem as células-tronco, cuja retirada do
cordão umbilical deve ocorrer no momento do parto, o grande trunfo da medicina moderna para
o tratamento de inúmeras patologias consideradas incuráveis. É possível que o dano final
nunca venha a se implementar, bastando que a pessoa recém-nascida seja plenamente
saudável, nunca desenvolvendo qualquer doença tratável com a utilização das células-tronco
retiradas do seu cordão umbilical. O certo, porém, é que perdeu, definitivamente, a chance de
prevenir o tratamento dessas patologias. Essa chance perdida é, portanto, o objeto da
indenização.

Subsistência do dano: o dano, para ser indenizável, não pode ter sido objeto de uma
reparação (in natura, extrajudicial, etc.) Deve ser mantido o estado de prejuízo (v. MHD).
Questões especiais de concurso envolvendo dano:
Dano moral in re ipsa: trata-se do dano que, dada a sua natureza, dispensa a prova
em juízo (v. REsp 296634 – RN; 357404 – RJ; 718618 – RS). Ex: negativação indevida do
nome no SPC ou SERASA.
Dano reflexo ou em ricochete: ocorre quando o prejuízo atinge terceira pessoa,
ligada à vítima direta do ilícito (v. REsp 254418 – RJ; Apelação Cível 598.060.713 – TJRS) (ex:
pai é baleado e vem a óbito. Seus filhos serão as vítimas indiretas).
O dano reflexo não deve ser confundido com o simples dano indireto, em que uma
mesma vítima sofre prejuízos em cadeia (ex: X compra uma vaca, que veio com uma doença
(1º dano). X coloca essa vaca em contato com seu rebanho, e essa vaca contamina outras
(danos em cadeia).
Partindo-se da premissa de que o dano mensura a indenização a ser paga, o
ordenamento jurídico permite que o juiz reduza o quantum indenizatório, com base no
grau de culpa?
Normalmente, a indenização é fixada com base na extensão do dano, como preceitua o
art. 944 do CC/02. Entretanto, o CC/02 trouxe dispositivo, bastante criticado pela doutrina (v.
Rui Stoco), que permite a redução do valor da indenização devida se o juiz verificar ausência
de gravidade na culpa (art. 944, parágrafo único):
Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do dano.
Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o
dano, poderá o juiz reduzir, eqüitativamente, a indenização.

Dano social: Muito além da simples reparação dos danos materiais e morais, aqui já
consolidada, Antonio Junqueira de Azevedo propõe uma nova modalidade: o dano social. Para
ele, “os danos sociais, por sua vez, são lesões à sociedade, no seu nível de vida, tanto por
rebaixamento de seu patrimônio moral – principalmente a respeito da segurança – quanto por
diminuição na qualidade de vida”. O conceito mantém relação direta com a principiologia
adotada pelo Código Civil de 2002, que escolheu entre um de seus regramentos básicos a
socialidade: a valorização do nós em detrimento do eu, a superação do caráter individualista e
egoísta da codificação anterior. Justamente por isso, os grandes ícones privados têm
importante função social: a propriedade, o contrato, a posse, a família, a empresa e também a
responsabilidade civil.
A função social da responsabilidade civil deve ser encarada como uma análise do
instituto de acordo com o meio que o cerca, com os objetivos que as indenizações assumem
perante o meio social. Mais do que isso, a responsabilidade civil não pode ser desassociada da
proteção da pessoa humana, e da sua dignidade como valor fundamental.
O dano social está caracterizado, por exemplo, na responsabilidade civil do Estado por
omissão, particularmente pelas balas perdidas.
Nesse sentido, cumpre anotar Enunciado 456 da V Jornada de Direito Civil: Art. 944. A
expressão “dano” no art. 944 abrange não só os danos individuais, materiais ou imateriais, mas
também os danos sociais, difusos, coletivos e individuais homogêneos a serem reclamados
pelos legitimados para propor ações coletivas.

STJ. Info 522/2014:


O dano social é uma nova espécie de dano reparável, que não se confunde com os
danos materiais, morais e estéticos, e que decorre de comportamentos socialmente
reprováveis, que diminuem o nível social de tranquilidade. Em uma ação individual, o juiz
condenou o réu ao pagamento de danos morais e, de ofício, determinou que pagasse também
danos sociais em favor de uma instituição de caridade. O STJ entendeu que essa decisão é
nula, por ser “extra petita”. Para que haja condenação por dano social, é indispensável que
haja pedido expresso. Vale ressaltar, no entanto, que, no caso concreto, mesmo que houvesse
pedido de condenação em danos sociais na demanda em exame, o pleito não poderia ter sido
julgado procedente, pois esbarraria na ausência de legitimidade para postulá-lo. Isso porque,
na visão do STJ, a condenação por danos sociais somente pode ocorrer em demandas
coletivas e, portanto, apenas os legitimados para a propositura de ações coletivas poderiam
pleitear danos sociais. Em suma, não é possível discutir danos sociais em ação individual. STJ.
2ª Seção. Rcl 12.062-GO, Rel. Ministro Raul Araújo, julgado em 12/11/2014 (recurso repetitivo)
(Info 552).

Responsabilidade objetiva e atividade de risco:


Em um primeiro momento (final do século XIX e início do século XX), a
responsabilidade era baseada na culpa, sob influência da doutrina francesa.
Com a crescente complexidade das relações sociais somada aos avanços
tecnológicos, surgiram situações em que a prova da culpa seria muito difícil de ser produzida.
Não obstante, as situações de risco se tornaram cada vez mais diversas.
Com isso, desenvolveu-se uma teoria baseada na premissa de que quem cria a
situação de risco com a sua atividade deve não somente experimentar a vantagem econômica
que ela proporciona mas também as conseqüências trazidas pelos riscos que cria. A teoria do
risco propõe que aquele que realiza atividade perigosa deve responder por ela.
No início, essa teoria se baseava na presunção de culpa, trazendo uma
responsabilidade civil objetiva no caso de atividade de risco desempenhada pelo ofensor.
Falava-se em responsabilidade objetiva impura mitigada, pois partia de uma presunção de
culpa ou inversão do ônus da prova.
Com o passar das décadas, no século XX, a responsabilidade objetiva pura,
independente da análise da culpa, passou a ganhar espaço.
A primeira lei no Brasil a cuidar da responsabilidade objetiva foi o DL 2681/1912. Ele
reconhecia a responsabilidade objetiva das ferrovias em caso de acidente ferroviário. Após
esse decreto, vieram:
Legislação sobre acidente do trabalho (lei 5316/67 e lei 8213/91);
Legislação do seguro obrigatório de veículo (DPVAT) (lei 6194/74 e lei 8441/92): o
beneficiário pode requerer o pagamento da indenização junto a uma das seguradoras
que formam o convênio;
CDC;
Responsabilidade objetiva do Estado, por força do art. 37, §6º da CF.
E, por último, o CC/02, no seu art. 927, parágrafo único.
Para o STJ, a responsabilidade objetiva do Estado é somente a comissiva, sendo subjetiva
a omissiva.
O CC 02 tratou, no art. 927, da responsabilidade subjetiva e objetiva:
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica
obrigado a repará-lo. (responsabilidade subjetiva).
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa,
nos casos especificados em lei (vide exemplos de leis especiais, acima), ou quando a
atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza,
risco para os direitos de outrem (norma aberta). (o parágrafo único é considerado a
base da responsabilidade objetiva).
As hipóteses de responsabilidade objetiva do parágrafo único do art. 927 devem ser
dimensionadas pelo juiz mediante critérios de hermenêutica. Conforme esse dispositivo, são 2
as hipóteses de responsabilidade objetiva no CC/02:
Previstas nas leis especiais;
Se a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua
natureza, risco para os direitos de outrem.
Deve-se compreender o que seja atividade de risco para não se alargar demais o
conceito.
O princípio da operabilidade (princípio da concretude – direito italiano) aponta no
sentido de que o juiz deve preencher os preceitos abertos, as cláusulas gerais, no caso
concreto, (sistema aberto do CC) com valores sociais objetivados. Por isso, deve saber
preencher o que seja atividade de risco.
Chaves hermenêuticas para se aferir o que seja atividade de risco:
Somente as atividades que habitualmente (ou normalmente, na dicção do CC/02)
expuserem alguém a uma probabilidade maior de dano se enquadram no conceito
de atividade de risco. Atividades episódicas não estão abrangidas (Enunciado 38
da 1ª Jornada de Direito Civil).
Tipo de risco: Segundo Alvino Lima, o risco que justifica a responsabilidade objetiva
é o denominado RISCO PROVEITO, ou seja, o risco criado para dele se extrair um
proveito econômico.

Causas excludentes da responsabilidade civil:


Art. 188. Não constituem atos ilícitos:

I - os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido;

II - a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover


perigo iminente.

Parágrafo único. No caso do inciso II, o ato será legítimo somente quando as
circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os limites do
indispensável para a remoção do perigo.
Estado de necessidade;
Legítima defesa;
Exercício regular do direito;
Estrito cumprimento do dever legal;
Caso fortuito ou força maior;
Culpa exclusiva da vítima;
Fato de terceiro.

Estado de necessidade e legítima defesa:


No estado de necessidade, o agente atua agredindo interesse jurídico alheio, em
virtude de perigo iminente, visando a salvaguardar interesse jurídico próprio ou de outrem, à luz
do princípio da proporcionalidade (art. 188, II, CC/02).
Na legítima defesa, diferentemente, o agente atua defensivamente, repelindo agressão
injusta, atual ou iminente (art. 188, I, 1ª parte, CC/02).
Essas excludentes atacam a ilicitude do ato. Quem atua em Legítima Defesa ou Estado
de Necessidade, age de forma lícita, desde que guardada a proporcionalidade dos atos.
Caso seja atingido terceiro inocente, o agente deve indenizá-lo, cabendo ação
regressiva contra o verdadeiro culpado (Arts. 929 e 930; REsp 124.527).
Art. 929. Se a pessoa lesada, ou o dono da coisa, no caso do inciso II do art. 188, não
forem culpados do perigo, assistir-lhes-á direito à indenização do prejuízo que
sofreram.

Art. 930. No caso do inciso II do art. 188 (estado de necessidade), se o perigo ocorrer
por culpa de terceiro, contra este terá o autor do dano ação regressiva para haver a
importância que tiver ressarcido ao lesado.

Parágrafo único. A mesma ação competirá contra aquele em defesa de quem se


causou o dano (art. 188, inciso I).
Estrito cumprimento do dever legal e exercício regular de direito:
Segundo José Frederico Marques, o estrito cumprimento do dever legal não tem
regulamentação específica no CC/02 porque é uma modalidade de exercício regular de direito,
sendo este previsto no art. 188, I (2ª parte).
O acolhimento da tese do Exercício Regular de Direito está vinculado à razoabilidade
do ato. Se o agente atuar com excesso, haverá responsabilidade.
Exemplos: Policial invade casa cumprindo mandado de busca e apreensão; funcionário
da INFRAERO, trabalhando no setor de “Raio X”, verifica as bolsas dos passageiros;
travamento repetido da porta giratória em bancos (a responsabilidade somente pode decorrer
do tipo de abordagem dos seguranças, mas não do repetido travamento, que configura mero
aborrecimento - v. REsp 689213 – RJ; Ag 524457 – RJ).
Há situações em que o próprio STJ nega a teoria do Exercício Regular de Direito, como
se deu no REsp 164391 – RJ. Nesse caso, uma empregada doméstica foi trancada no quarto
do apartamento, por ser suspeita de furto. Em conseqüência, a empregada caiu da janela e
morreu. Na decisão, afastou-se, pelo excesso, a tese do ERD, pois, segundo o relator, o
excesso pode se transformar em verdadeiro abuso de direito (v. decisão na íntegra).
Caso fortuito ou força maior:
O direito positivo brasileiro, no plano da eficácia, não distingue caso fortuito e força maior,
tratando-os no art. 393, parágrafo único, como acontecimento que não se pode impedir.
Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força
maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.

Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos
efeitos não era possível evitar ou impedir.
Fortuito interno e externo:
Interno: o fortuito ocorre durante o próprio processo de elaboração do produto ou
execução do serviço, não excluindo a responsabilidade civil.
Externo: o acontecimento se dá após a colocação do produto no mercado ou após a
prestação do serviço. Esse fortuito exclui a responsabilidade civil, pois é alheio à
atividade do fornecedor, rompendo o nexo causal.
Na V Jornada de Direito Civil aprovou-se o enunciado: 443 com o seguinte teor: Arts.
393 e 927. O caso fortuito e a força maior somente serão considerados como excludentes da
responsabilidade civil quando o fato gerador do dano não for conexo à atividade desenvolvida
O STJ tem entendido o assalto à mão armada em ônibus como fortuito externo. Ele
exime a responsabilidade civil da empresa de transportes, pois os ministros entendem que a
empresa também é vítima da falta de segurança pública. Todavia, existe ainda o entendimento
respeitável, posto não predominante, no sentido de que se o assalto é freqüente, haverá
previsibilidade e a empresa transportadora será responsável por ele (há julgados nesse sentido
no TJRO e no TJRJ). Portanto, há de se analisar o caso concreto à luz da previsibilidade.
Obs.: Há hipóteses legais em que o caso fortuito e força maior não excluem a
responsabilidade civil:
(ii) perpetuatio obligationis –
Art. 399. O devedor em mora responde pela impossibilidade da prestação, embora
essa impossibilidade resulte de caso fortuito ou de força maior, se estes ocorrerem
durante o atraso; salvo se provar isenção de culpa, ou que o dano sobreviria ainda
quando a obrigação fosse oportunamente desempenhada.
(iii) do mandatário (procurador) que agiu contra a proibição do mandante. Vide:
CC/02 - Art. 667, § 1º.
Art. 667 - O mandatário é obrigado a aplicar toda sua diligência habitual na execução
do mandato, e a indenizar qualquer prejuízo causado por culpa sua ou daquele a quem
substabelecer, sem autorização, poderes que devia exercer pessoalmente.
§ 1º Se, não obstante proibição do mandante, o mandatário se fizer substituir na
execução do mandato, responderá ao seu constituinte pelos prejuízos ocorridos sob a
gerência do substituto, embora provenientes de caso fortuito, salvo provando que o
caso teria sobrevindo, ainda que não tivesse havido substabelecimento.
§ 2º Havendo poderes de substabelecer, só serão imputáveis ao mandatário os danos
causados pelo substabelecido, se tiver agido com culpa na escolha deste ou nas
instruções dadas a ele.
§ 3º Se a proibição de substabelecer constar da procuração, os atos praticados pelo
substabelecido não obrigam o mandante, salvo ratificação expressa, que retroagirá à
data do ato.
§ 4º Sendo omissa a procuração quanto ao substabelecimento, o procurador será
responsável se o substabelecido proceder culposamente.
(iv) comodatário que salva primeiro os seus bens – Art. 583 do CC/02.
Art. 583. Se, correndo risco o objeto do comodato juntamente com outros do
comodatário, antepuser este a salvação dos seus abandonando o do comodante,
responderá pelo dano ocorrido, ainda que se possa atribuir a caso fortuito, ou força
maior.
Culpa exclusiva da vítima:
É a defesa mais comum dos demandados na responsabilidade civil. Ela rompe o nexo
de causalidade, excluindo a responsabilidade. Aplicável também no Direito Administrativo (v.
CABM) e no Direito do Consumidor, em favor do fornecedor (ex: mesmo diante do aviso de não
plugar o aparelho em tomada 220V, o consumidor pluga o aparelho e o danifica).
No campo dos acidentes automobilísticos, o evento perto de passarela exclui a
responsabilidade do motorista. O STJ tem entendido (RESP 439408/SP) que não se presume a
culpa exclusiva da vítima, tendo de ser provada.
A culpa concorrente da vítima não exclui a responsabilidade, apenas atenua a
indenização. A doutrina consumerista tem certa resistência à tese da culpa concorrente: há
quem entenda que a redução da indenização somente seria aplicável nas relações regidas pelo
CC/02, por falta de previsão na legislação do consumidor.
Fato de Terceiro:
O fato de terceiro também é causa excludente da responsabilidade civil por ruptura do
nexo jurídico de causalidade. É pacificamente aceito pela doutrina e jurisprudência, apesar de
não estar previsto expressamente no CC/02. Ex: Um ator dispara contra outro, acreditando que
seu revólver está carregado com balas de festim, mas o revólver estava, em verdade,
carregado com balas de verdade. O ator alvejado morre.
Obs.: O enunciado da Súmula 187 do STF proíbe o transportador de alegar, em
defesa, fato de terceiro, em virtude do princípio da segurança. A empresa de transporte aéreo
GOL, por exemplo, não pode alegar fato de terceiro no caso do acidente com o jato Legacy,
ainda que os pilotos desta aeronave sejam considerados culpados pelo referido acidente.
Súmula 187 do STF: A responsabilidade contratual do transportador, pelo
acidente com o passageiro, não é elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem
ação regressiva.
Teoria do corpo neutro: Segundo o professor Pablo Stolze, a teoria do corpo neutro é
uma especial aplicação do fato de terceiro nos acidentes de trânsito. É a situação na qual o
agente físico do dano, sem atuação voluntária, atinge veículo de terceiro inocente. Ex:
engavetamento.
Existe entendimento no sentido de que a vítima poderia demandar o mero agente físico
da ação e este interporia ação regressiva contra o verdadeiro culpado. No entanto, por não
haver previsão específica, o melhor entendimento, amparado no Superior Tribunal de Justiça
(REsp n.º 54.444/SP), é o de que a vítima deve demandar diretamente o causador jurídico do
dano, com base na teoria do corpo neutro.
Exemplo de situação em que se aplica a referida teoria: condutor de caminhão fecha
um Ford Ka (que trafegava regularmente), arremessando-o no passeio, causando ferimentos a
um transeunte.
Na situação acima, há corrente jurisprudencial (v. RT 646/89 e RT 437/127) no sentido
de que, envolvido terceiro inocente, o condutor do Ford Ka deverá indenizá-lo, cabendo ação
regressiva em face do condutor do caminhão, verdadeiro culpado. Trata-se de uma aplicação
analógica dos art. 929 e 930, de forma equivocada, pois o causador do dano também foi vítima.
A segunda corrente, sustentada pelo STJ (v. REsp 54444/SP), é no sentido de que, quando um
veículo for arremessado, como um corpo neutro (“bola branca de bilhar”), a vítima deve
demandar diretamente contra o condutor do caminhão, o terceiro causador do dano.

Responsabilidade pelo fato da coisa e do animal:


Trata-se de modalidade de responsabilidade indireta, porquanto o dano provém de uma
coisa ou um animal vinculado a uma pessoa.
Teoria do guardião ou da guarda:
Segundo essa teoria, o responsável pelo fato da coisa e do animal é a pessoa que
detém poder de comando ou de direção (guardião). Em geral, o proprietário é o guardião
presuntivo. Mas há situações em que a responsabilidade não recai sobre o dono.
Responsabilidade pelo fato do animal:
Na vigência do CC/16 (v. art. 1527), o dono ou detentor do animal poderia se eximir de
responsabilidade alegando não ter culpa, o que dificultava a reparação da vítima. No CC/02, a
responsabilidade pelo fato do animal é objetiva, sem análise de culpa (v. art. 936).
Art. 936. O dono, ou detentor (ex: X, dono de pitbull, entrega o animal a adestrador,
firmando contrato. Durante os treinamentos, o animal se solta, mordendo pessoa.
Responsabilidade do detentor), do animal ressarcirá o dano por este causado, se não
provar culpa (exclusiva) da vítima ou força maior (causas que romperão o nexo causal).
Outro exemplo bastante recorrente são os animais que circulam soltos por estradas. O
STJ (v. REsp 438831 – RS) firmou entendimento no sentido de que o Estado tem
responsabilidade subjetiva por omissão, quando há falta de fiscalização ou sinalização da via.
O Estado indenizará pela falta de sinal indicativo de animal na pista, demandando
posteriormente o dono do animal. Entretanto, no caso de concessionária, a responsabilidade é
objetiva, com base no CDC (v. REsp 647710 – RJ).

Responsabilidade pelo fato da coisa:


Somente 2 situações foram reguladas no CC/02: a responsabilidade pela ruína de
edifício ou construção e a responsabilidade por objetos lançados ou caídos.
Responsabilidade pela ruína de edifício ou construção:
A ruína pode ser total (ex: desabamento de prédio) ou parcial (ex: desabamento de
placa).
O CC/02 consagrou, no caso, a responsabilidade objetiva do dono da construção ou do
edifício (v. art. 937, CC). Note-se que a responsabilidade, na forma do CC, é do dono, não se
incluindo aí o inquilino, por exemplo.
Art. 937. O dono de edifício ou construção responde pelos danos que resultarem de
sua ruína, se esta provier de falta de reparos, cuja necessidade fosse manifesta.
Responsabilidade por objetos lançados ou caídos:
A ação para indenização, no caso, denomina-se actio de effusis et dejectis, devendo
ser proposta contra quem habita o local de onde foi lançado o projétil (proprietário, locatário,
comodatário, etc.), ainda que o causador seja uma visita, por exemplo.
Se a vítima não souber de qual unidade autônoma saiu o projétil, a jurisprudência (v.
RT 530/213) responsabiliza todo o condomínio, com base na teoria da causalidade alternativa.
Se algum dos blocos do condomínio estiver em localização que torne impossível o lançamento,
esse bloco não será incluído.
Art. 938. Aquele que habitar prédio, ou parte dele, responde pelo dano proveniente das
coisas que dele caírem ou forem lançadas em lugar indevido.
RESPONSABILIDADE CIVIL. OBJETOS LANÇADOS DA JANELA DE
EDIFÍCIOS. A REPARAÇÃO DOS DANOS É RESPONSABILIDADE DO
CONDOMÍNIO. A impossibilidade de identificação do exato ponto de onde parte
a conduta lesiva, impõe ao condomínio arcar com a responsabilidade
reparatória por danos causados à terceiros. Inteligência do art. 1.529, do
Código Civil Brasileiro. Recurso não conhecido. (STJ, RESP 64.682/RJ, rel.
Min. Bueno de Souza, 4ª Turma, j. 10/11/98.)
Questões especiais envolvendo responsabilidade indireta:
A) O STF, com base na teoria do risco, sumulou o entendimento no sentido de que a
empresa locadora de veículos é solidariamente responsável pelo acidente com o veículo
locado. Veja o teor da Súmula 492 STF: A empresa locadora de veículos responde, civil e
solidariamente com o locatário, pelos danos por este causados a terceiros, no uso do carro
locado.
A razão da edição da súmula é que a empresa locadora explora economicamente a
atividade de locação. O art. 942 do CC/02 reforça esse entendimento:
Art. 942. Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam
sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos
responderão solidariamente pela reparação.

Parágrafo único. São solidariamente responsáveis com os autores os co-autores e as


pessoas designadas no art. 932.
Nesse sentido, confiram-se os seguintes precedentes:
ACIDENTE DE TRÂNSITO. RESPONSABILIDADE DA EMPRESA
LOCADORA. BOLETIM DE OCORRÊNCIA FEITO POR POLICIAL
RODOVIÁRIO, O QUAL CHEGOU POUCOS MINUTOS APÓS O EVENTO.
PRECEDENTES. SÚMULA N° 492 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
1. O boletim de ocorrência feito por policial rodoviário federal, o qual chegou ao
local minutos após o acidente, serve como elemento de convicção para o
julgamento da causa, não se equiparando com aquele boletim decorrente de
relato unilateral da parte.
2. "A empresa locadora de veículos responde, civil e solidariamente com o
locatário, pelos danos por este causados a terceiro, no uso do carro locado"
(Súmula n° 492, do Colendo Supremo Tribunal Federal).
3. Recurso especial não conhecido. (REsp 302.462/ES, Rel. Min. CARLOS
ALBERTO MENEZES DIREITO, DJ 04.02.2002)

RESPONSABILIDADE CIVIL. LOCADORA DE VEÍCULO. ACIDENTE DE


TRÂNSITO. VERBETE N.492 DA SÚMULA/STF. PRECEDENTES.
"A empresa locadora de veículos responde civil e solidariamente com o
locatário, pelos danos por este causados a terceiro, no uso do carro locado."
Recurso especial conhecido e provido. (REsp 284.536/PR, Rel. Min. CESAR
ASFOR ROCHA, DJ 22.10.2001)

B) Veículo alienado sem a necessária realização do registro da transferência no


DETRAN, em caso de acidente, não acarreta a responsabilidade do antigo proprietário, pois a
transferência do veículo se opera com a tradição, não com a transferência administrativa
efetuada pelo DETRAN. Nesse sentido, vide Súmula 132 STJ: A ausência de registro da
transferência não implica a responsabilidade do antigo proprietário por dano resultante de
acidente que envolva o veiculo alienado.

Veículo conduzido por terceiro:


Sérgio Cavalieri Filho e Pablo Stolze entendem que, transferida a guarda do veículo,
transfere-se também a responsabilidade. O CC/02 não traz uma norma específica sobre o
tema. Mas o STJ tem entendimento diverso: o proprietário do veículo emprestado responde
solidariamente com o condutor. Baseia-se tal orientação no art. 942 do CC/02:
Art. 942. Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam
sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos
responderão solidariamente pela reparação.

Parágrafo único. São solidariamente responsáveis com os autores os co-autores e as


pessoas designadas no art. 932.
Corroborando o exposto:

ACIDENTE DE TRÂNSITO. TRANSPORTE BENÉVOLO. VEÍCULO


CONDUZIDO POR UM DOS COMPANHEIROS DE VIAGEM DA VÍTIMA,
DEVIDAMENTE HABILITADO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO
PROPRIETÁRIO DO AUTOMÓVEL. RESPONSABILIDADE PELO FATO DA
COISA.
- Em matéria de acidente automobilístico, o proprietário do veículo responde
objetiva e solidariamente pelos atos culposos de terceiro que o conduz e que
provoca o acidente, pouco importando que o motorista não seja seu
empregado ou preposto, ou que o transporte seja gratuito ou oneroso, uma vez
que sendo o automóvel um veículo perigoso, o seu mau uso cria a
responsabilidade pelos danos causados a terceiros.
- Provada a responsabilidade do condutor, o proprietário do veículo fica
solidariamente responsável pela reparação do dano, como criador do risco para
os seus semelhantes. Recurso especial provido. (STJ, RESP 577902/DF, rel.
Min. Antônio de Pádua, rel. para acórdão Min. Nancy Andrighi, 3 T., DJ
28/08/2006, p. 279.)

PROCESSO CIVIL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. RESPONSABILIDADE


SOLIDÁRIA DO PROPRIETÁRIO DO VEÍCULO CONDUZIDO POR
TERCEIRO. O proprietário é solidariamente responsável pelos danos causados
pelo uso do seu veículo, ainda que conduzido por terceiro. Agravo regimental
desprovido. (AgRg no AREsp 234.868/SE, Rel. Ministro ARI PARGENDLER,
PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/05/2013, DJe 08/05/2013)

Responsabilidade civil por ato de terceiro:


Há de se dividir o estudo da responsabilidade por atos de terceiros em duas partes.
Primeiramente, considerar-se-á como terceiro qualquer pessoa alheia a uma relação jurídica
que, com sua conduta espontânea, provoque dano. Em regra, somente o terceiro responderá
pela sua conduta danosa, afastando a responsabilidade de qualquer outra pessoa. Vejamos um
exemplo da jurisprudência do STF:
AÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL. PASSAGEIRO DE ONIBUS
ATINGIDO POR ESTILHACO DE VIDRO PRODUZIDO POR UMA PEDRA
ATIRADA POR TERCEIRO. ATO DE TERCEIRO EQUIPARADO A CASO
FORTUITO. INEVITABILIDADE DO FATO E AUSÊNCIA DE CULPA DO
TRANSPORTADOR. INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO CAUSAL ENTRE O
FATO E O CONTRATO DE TRANSPORTE. NÃO HÁ FALAR EM
DIVERGENCIA COM A SÚMULA 187. RECURSO EXTRAORDINÁRIO NÃO
CONHECIDO. (RE 113195, Relator(a): Min. DJACI FALCAO, SEGUNDA
TURMA, julgado em 13/09/1988, DJ 07-10-1988 PP-25712 EMENT VOL-
01518-01 PP-00175)

Todavia, há situações em que o ato praticado por terceiro poderá responsabilizar outra
pessoa. A nova codificação trouxe um rol, nos Arts. 932 e 933, em que determinadas pessoas
responderão por atos praticados por terceiros sujeitos ao seu cuidado ou vigilância.
O art. 933 do CC/02 traz a responsabilidade civil por ato de terceiro, consagrando a
responsabilidade objetiva:
Art. 933. As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que não
haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos.
Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:

I - os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua
companhia;
II - o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se acharem nas mesmas
condições;

No CC/16, a responsabilidade do terceiro era baseada em presunções de culpa (v. arts.


1521 a 1523), e não na responsabilidade objetiva. Tais presunções desapareceram com o
advento do CC/02, sendo a responsabilidade do terceiro agora totalmente objetiva, sem
averiguação da culpa. Ex: o empregador responde objetivamente pelo ato do seu empregado;
o pai, pelo ato de seu filho; o dono de escola, pelo ato de seus educandos.
(obs.: a lei aplicável, naquelas demandas em trâmite quando da entrada em vigor da
novel legislação, será a lei do tempo do cometimento do ato ilícito).

Explicações sobre os Incisos I e II do atual Art. 932:

Os pais (bem como tutores e curadores) respondem pelos atos de seus filhos menores.
No CC/16, o art. 156 dizia que os menores relativamente capazes (16 a 21 anos) equiparavam-
se aos maiores pelos ilícitos que praticassem. Havia responsabilidade passiva entre esse
menor e o seu representante. Porém, caso o menor fosse absolutamente incapaz, os pais
responderiam sozinhos, sem equiparação, pois o menor absolutamente incapaz era
considerado inimputável e, portanto, irresponsável por seus atos, e, conseqüentemente, não
responderia, mesmo que seus responsáveis não pudessem pagar, e que o menor tivesse
grande patrimônio.

O CC/02, no entanto, mudando completamente o tratamento da matéria, passou a


admitir a responsabilidade civil do incapaz (absoluta ou relativamente), aplicando-se a regra da
subsidiariedade, nos moldes do art. 928:
Art. 928. O incapaz responde pelos prejuízos que causar, se as pessoas por ele
responsáveis não tiverem obrigação de fazê-lo ou não dispuserem de meios
suficientes.

Parágrafo único. A indenização prevista neste artigo, que deverá ser eqüitativa, não
terá lugar se privar do necessário o incapaz ou as pessoas que dele dependem.
O incapaz só responderá perante a vítima se os seus responsáveis não dispuserem de
condições econômicas, ou não tiverem a obrigação de indenizar. Na verdade, a
responsabilidade subsidiária não passa de uma responsabilidade solidária com preferência.
Hipóteses em que o representante legal não tem obrigação de indenizar a vítima pelo
dano causado pelo menor, recaindo o dever sobre o incapaz:
Medida sócio-educativa de reparação pecuniária do ECA: em caráter pedagógico, o
juiz pode impor ao menor a obrigação de reparar o dano, imputando-lhe, por exemplo, as
despesas de limpeza de um muro pichado com sua mesada. Corrobora essa conclusão o
Enunciado 40 da I Jornada de Direito Civil.
Art. 928, parágrafo único: Cumpre salientar que, para indenizar, o patrimônio do menor
não pode ser totalmente esgotado. A idéia constante do parágrafo único do art. 928 guarda
conexão com a Teoria do Estatuto Jurídico do Patrimônio Mínimo (Luiz Edson Fachin),
segundo a qual, numa perspectiva civil-constitucional, as normas das legislações ordinárias
devem resguardar a cada pessoa um mínimo para assegurar a vida digna. Essa é a idéia
refletida nos Enunciados 39 e 449 das Jornadas de Direito Civil.
Casal separado: No caso de casal separado, terá responsabilidade quem estiver com a
guarda do menor (salvo se, no momento do ato ilícito, o menor estava visitando o outro pai). O
STJ, no REsp 540459/RS, interpretou literalmente a responsabilidade dos pais, de maneira que
o dever de indenizar recairá apenas àquele que detinha a autoridade e esteve com o incapaz
em sua companhia quando do ilícito. O professor critica esse posicionamento, pois, em geral,
ele acaba por excluir a responsabilidade do pai que não tem a guarda, sendo que, muitas
vezes, esse pai participa ativamente da educação do menor.
Essa crítica doutrinária é bem explicitada no Enunciado 450 da V Jornada: Art. 932, I.
Considerando que a responsabilidade dos pais pelos atos danosos praticados pelos filhos
menores é objetiva, e não por culpa presumida, ambos os genitores, no exercício do poder
familiar, são, em regra, solidariamente responsáveis por tais atos, ainda que estejam
separados, ressalvado o direito de regresso em caso de culpa exclusiva de um dos genitores
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE DOS PAIS E DA AVÓ EM FACE DE ATO
ILÍCITO PRATICADO POR MENOR. SEPARAÇÃO DOS PAIS. PODER FAMILIAR EXERCIDO
POR AMBOS OS PAIS. DEVER DE VIGILÂNCIA DA AVÓ. REEXAME DE FATOS. INCIDÊNCIA
DA SÚMULA 7/STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL COMPROVADO.
1. O Tribunal a quo manifestou-se acerca de todas as questões relevantes para a solução da
controvérsia, tal como lhe fora posta e submetida. Não cabe alegação de violação do artigo 535
do CPC, quando a Corte de origem aprecia a questão de maneira fundamentada, apenas não
adotando a tese da recorrente. Precedentes.
2. Ação de reparação civil movida em face dos pais e da avó de menor que dirigiu veículo
automotor, participando de "racha", ocasionando a morte de terceiro. A preliminar de
ilegitimidade passiva dos réus, sob a alegação de que o condutor do veículo atingiu a
maioridade quando da propositura da ação, encontra-se preclusa, pois os réus não
interpuseram recurso em face da decisão que a afastou.
3. Quanto à alegada ilegitimidade passiva da mãe e da avó, verifica-se, de plano, que não
existe qualquer norma que exclua expressamente a responsabilização das mesmas, motivo
pelo qual, por si só, não há falar em violação aos arts. 932, I, e 933 do CC.
4. A mera separação dos pais não isenta o cônjuge, com o qual os filhos não residem, da
responsabilidade em relação ao atos praticados pelos menores, pois permanece o dever de
criação e orientação, especialmente se o poder familiar é exercido conjuntamente. Ademais,
não pode ser acolhida a tese dos recorrentes quanto a exclusão da responsabilidade da mãe,
ao argumento de que houve separação e, portanto, exercício unilateral do poder familiar pelo
pai, pois tal implica o revolvimento do conjunto fático probatório, o que é defeso em sede de
recurso especial. Incidência da súmula 7/STJ.
5. Em relação à avó, com quem o menor residia na época dos fatos, subsiste a obrigação de
vigilância, caracterizada a delegação de guarda, ainda que de forma temporária. A insurgência
quanto a exclusão da responsabilidade da avó, a quem, segundo os recorrentes, não poderia
se imputar um dever de vigilância sobre o adolescente, também exigiria reapreciação do
material fático-probatório dos autos. Incidência da súmula 7/STJ.
(omissis) 7. Recurso especial parcialmente conhecido e, na extensão, provido. (REsp
1074937/MA, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em
01/10/2009, DJe 19/10/2009)

III - o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no


exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele;

Empregado e comitente:

Súmula 341 STF: É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do
empregado ou preposto.
Esta súmula foi derrubada, pois, como visto, com a vigência do CC/02, não mais vigora
a presunção de culpa, sendo a responsabilidade, nesses casos, objetiva.
A teoria que explica a responsabilidade do empregador pelo ato do empregado é
denominada teoria da substituição. Entende-se que o empregador substitui o empregado no
pagamento à vítima.

IV - os donos de hotéis, hospedarias, casas ou estabelecimentos onde se albergue por


dinheiro, mesmo para fins de educação, pelos seus hóspedes, moradores e
educandos;

Hotéis: A responsabilidade solidária dos donos de hotéis por atos de seus hóspedes se
baseia no dever de segurança, segundo José de Aguiar Dias. Complementa Sérgio Cavalieri
Filho que a responsabilidade é objetiva, por se tratar de relação de consumo.
Escolas: Os donos de escola respondem pelos atos de seus educandos menores, pois,
no momento em que os responsáveis deixam seus filhos na escola, há a transferência da
guarda provisória da criança (v. Cáio Mário). A escola passa a ser responsável pela segurança
da criança e dos atos que ela praticar.
Atenção! Se o educando for maior, em tese, não há responsabilidade da escola.
Entretanto, se houver omissão da escola, pode-se verificar nexo causal, acarretando a sua
responsabilidade.
V - os que gratuitamente houverem participado nos produtos do crime, até a
concorrente quantia.
Ex. o receptador que acondiciona o produto do crime participa gratuitamente e terá
responsabilidade solidária. Aplicação do princípio que veda o enriquecimento sem causa.
O fato de não ser possível a discussão de culpa na relação entre o responsável e a
vítima não impede que se discuta a culpa do terceiro que praticou o ato (ex: num acidente de
trânsito, o empregador responderá objetivamente pelo dano provocado pelo seu empregado,
mas poderá alegar, em juízo, que seu empregado não teve culpa no acidente).
Direito de regresso (ação regressiva):
Art. 934. Aquele que ressarcir o dano causado por outrem pode reaver o que houver
pago daquele por quem pagou, salvo se o causador do dano for descendente seu,
absoluta ou relativamente incapaz.
Em geral, é cabível a ação regressiva, salvo se quem causou o dano for descendente
incapaz.
No caso de donos de escola, entretanto, se o dono da escola indeniza a vítima pelo ato
do menor, NÃO caberá ação regressiva em face dos pais da criança, justamente por ter havido,
durante o período de aulas, a transferência de guarda (v. Cáio Mário).
Jurisprudência:
Responsabilidade civil do advogado:
Parte da doutrina entende que a responsabilidade do advogado é subjetiva, baseada
na culpa profissional, nos termos do art. 14, §4º, CDC:
Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa,
pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à
prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre
sua fruição e riscos.
(...)
§ 4° A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a
verificação de culpa.
O advogado assume obrigação de meio, não de resultado.
No entanto, o STJ vem negando aplicação do CDC, ao fundamento de que o Estatuto
dos Advogados esgota a matéria referente à responsabilidade.
“CONTRATO DE SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS. CDC. INAPLICABILIDADE.
3. O CDC não se aplica à regulação de contratos de honorários advocatícios. (REsp
1123422/PR, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, julgado em
04/08/2011, DJe 15/08/2011)”
Responsabilidade civil médica:
Cirurgia de miopia a laser:
Prevalece o entendimento de que, por ser obrigação de meio, o médico não pode
garantir o resultado. Somente se a visão se deteriorar haverá a sua responsabilidade.
Regra geral:
A responsabilidade civil do médico é, nos termos dos artigos 951, CC/02 e 14, §4º do
CDC, subjetiva (baseada na culpa profissional), traduzindo-se numa obrigação de meio.
Médico é profissional liberal, pessoa física que presta serviço técnico. Culpa em geral traduzida
pela imperícia. Em regra, o médico assume uma obrigação de meio, porque não pode assumir
a responsabilidade da cura, mas tem o dever de empregar seus conhecimentos em prol da
cura do mal.
Cirurgião plástico estético:
Excepciona a regra geral da responsabilidade subjetiva do médico a hipótese do
cirurgião plástico estético, porque ele assume uma obrigação de resultado, havendo
entendimento do STJ no sentido de que, em razão disso, sua responsabilidade seria objetiva
(v. REsp 81101 – PR).
Assim, mister analisar se a cirurgia é de natureza reparadora ou estética. A cirurgia
reparadora tem a função de reparar um mal ocorrido sem culpa do médico e, por isso, ele não
tem a obrigação de resultado. O cirurgião plástico de reparação assume obrigação de meio. Já
na cirurgia estética, o médico tem o dever de empregar a melhor técnica para melhorar o
aspecto físico do paciente, tendo, portanto, obrigação de resultado.
Anestesiologistas:
O anestesiologista, que tem responsabilidade autônoma em face do chefe da equipe
cirúrgica, responde com base na culpa profissional, e, segundo Jurandir Sebastião, assume
obrigação de meio.
Testemunhas de Jeová: Há 2 correntes sobre o tema:
Com base no direito constitucional à liberdade de consciência e crença, e à luz da
dignidade da pessoa humana, o paciente teria o direito de se recusar a uma
intervenção médica indesejada, mesmo que isso lhe custe a própria vida. O
paciente, mesmo que fosse curado, poderia, por exemplo, ser alijado de sua
comunidade (nesse sentido: Gustavo Tepedino, Anderson Schreiber).
No caso de criança, o professor aconselha não defender essa corrente, pois
significaria colocar nas mãos dos pais a possibilidade de ceifar a vida de uma
criança que ainda não escolheu sua própria religião. Importante lembrar que a
criança está amparada pelo princípio da proteção do menor, calcado no ECA,
cabendo ao Estado a defesa do menor.
À luz do princípio da proporcionalidade, com base nos art. 46 a 56 do Código de
Ética Médica, na Resolução 1.021 do CFM e em vários julgados (ex: Apel. Cível
123430-4 TJSP), não se deve impedir a atuação do médico, se essa for a única
alternativa capaz de salvar a vida do paciente.
Responsabilidade dos hospitais e clínicas:
O hospital presta serviço de consumo e, não sendo pessoa física, não estaria
excepcionado pelo art. 14, §4º do CDC. Assim sendo, o paciente poderia demandar o hospital
diretamente, que responderia objetivamente, em vez de demandar o médico membro do seu
quadro clínico, caso em que deveria demonstrar culpa profissional.
RESPONSABILIDADE CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO
ESPECIAL.TEMPESTIVIDADE. DEMONSTRAÇÃO NOS AUTOS. FIBROPLASIA
RETROENTICULAR, QUE OCASIONOU PERDA DA VISÃO AO PACIENTE.
RESPONSABILIDADE CIVIL DO HOSPITAL E DO MÉDICO POR ALEGADO ERRO
CULPÁVEL. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CULPA DO PROFISSIONAL DA
MEDICINA E DO NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE O DANO E O ATO COMISSIVO OU
OMISSIVO. REEXAME DE PROVAS, EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL. INVIABILIDADE.
(omissis)
2. A obrigação do médico, em regra, é de meio, isto é, o profissional da saúde assume
a obrigação de prestar os seus serviços atuando em conformidade com o estágio de
desenvolvimento de sua ciência, com diligência, prudência e técnicas necessárias, utilizando
os recursos de que dispõe - elementos que devem ser analisados, para aferição da culpa, à luz
do momento da ação ou omissão tida por danosa, e não do presente-, de modo a proporcionar
ao paciente todos os cuidados e aconselhamentos essenciais à obtenção do resultado
almejado.
3. Portanto, como se trata de obrigação de meio, o resultado final insatisfatório
alcançado não configura, por si só, o inadimplemento contratual, pois a finalidade do contrato é
a atividade profissional médica, prestada com prudência, técnica e diligência necessárias,
devendo, para que exsurja obrigação de indenizar, ser demonstrada a ocorrência de ato,
comissivo ou omissivo, caracterizado por erro culpável do médico, assim como do nexo de
causalidade entre o dano experimentado pelo paciente e o ato tido por causador do dano.
4. "O reconhecimento da responsabilidade solidária do hospital não transforma a
obrigação de meio do médico, em obrigação de resultado, pois a responsabilidade do hospital
somente se configura quando comprovada a culpa do médico, conforme a teoria de
responsabilidade subjetiva dos profissionais liberais abrigada pelo Código de Defesa do
Consumidor". (REsp 1.216.424/MT, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em
09/08/2011, DJe 19/08/2011)
5. No caso, a Corte local apurou que a oxigenoterapia era tratamento premente e
essencial à preservação da vida do autor e que "não há como estabelecer como único vínculo
para a retinopatia de prematuridade a utilização da oxigenoterapia, pois além deste fator, no
presente caso, a apelante também nasceu com insuficiência respiratória grave, sendo
imprescindível naquele momento afastar o risco de morte" e o acórdão impugnado, com base
em laudo pericial, consignou que "o oxigênio somente não é suficiente nem necessário para
desencadear retinopatia da prematuridade, e o nível seguro de oxigênio ainda não foi
determinado" pela Ciência, de modo que só se concebe a revisão da decisão por meio do
reexame provas, obstado pela Súmula 7/STJ. 6. Recurso especial não provido. (REsp
992.821/SC, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 14/08/2012,
DJe 27/08/2012)

Companhias de seguro de saúde:


Também podem ser responsabilizadas subjetivamente pelo erro do médico credenciado
(v. REsp 328309 – RJ).
RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CONSUMIDOR. CIVIL. RESPONSABILIDADE
SOLIDÁRIA DAS OPERADORAS DE PLANO DE SAÚDE. ERRO MÉDICO. DEFEITO NA
PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. DANO MORAL RECONHECIDO. VALOR DA INDENIZAÇÃO.
MAJORAÇÃO. RECURSO PROVIDO.
1. Se o contrato for fundado na livre escolha pelo beneficiário/segurado de médicos e hospitais
com reembolso das despesas no limite da apólice, conforme ocorre, em regra, nos chamados
seguros-saúde, não se poderá falar em responsabilidade da seguradora pela má prestação do
serviço, na medida em que a eleição dos médicos ou hospitais aqui é feita pelo próprio
paciente ou por pessoa de sua confiança, sem indicação de profissionais credenciados ou
diretamente vinculados à referida seguradora. A responsabilidade será direta do médico e/ou
hospital, se for o caso.
2. Se o contrato é fundado na prestação de serviços médicos e hospitalares próprios e/ou
credenciados, no qual a operadora de plano de saúde mantém hospitais e emprega médicos
ou indica um rol de conveniados, não há como afastar sua responsabilidade solidária pela má
prestação do serviço.
3. A operadora do plano de saúde, na condição de fornecedora de serviço, responde perante o
consumidor pelos defeitos em sua prestação, seja quando os fornece por meio de hospital
próprio e médicos contratados ou por meio de médicos e hospitais credenciados, nos termos
dos arts. 2º, 3º, 14 e 34 do Código de Defesa do Consumidor, art. 1.521, III, do Código Civil de
1916 e art. 932, III, do Código Civil de 2002. Essa responsabilidade é objetiva e solidária em
relação ao consumidor, mas, na relação interna, respondem o hospital, o médico e a operadora
do plano de saúde nos limites da sua culpa.
4. Tendo em vista as peculiaridades do caso, entende-se devida a alteração do montante
indenizatório, com a devida incidência de correção monetária e juros moratórios. 5. Recurso
especial provido. (REsp 866.371/RS, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado
em 27/03/2012, DJe 20/08/2012)

Termo de Consentimento Informado:


É a declaração firmada pelo paciente, por meio da qual o médico esclarece os efeitos e
conseqüências da sua intervenção, à luz do princípio da boa-fé objetiva e do dever de
informação Baseia-se no art. 15 do CC/02.
Art. 15. Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento
médico ou a intervenção cirúrgica.
Essa declaração não é um salvo-conduto dado ao médico, isto é, o médico não fica
desobrigado a agir com perícia e diligência para curar o paciente; a assinatura do referido
termo pelo paciente não o isenta de eventual responsabilização. Todavia, serve para esclarecer
dúvidas acerca da relação médico-paciente.
Responsabilidade civil do transportador:
Enuncia o art. 750 do CC de 2002 a responsabilidade objetiva do transportador. O
transportador assume uma obrigação de fim, qual seja, a de levar a coisa até o destino
com segurança e integridade, o que gera a cláusula de incolumidade.
Transporte gratuito, desinteressado ou de mera cortesia (carona):
Súmula 145 do STJ: No transporte desinteressado, de simples cortesia, o transportador
só será civilmente responsável por danos causados ao transportado quando incorrer
em dolo ou culpa grave.
Se o transportador receber qualquer vantagem indireta pelo transporte a sua
responsabilidade volta a ser contratual objetiva (art. 736, parágrafo único), como seria o
caso do conduzido arcar com as despesas de combustível..
Responsabilidade civil dos bancos:
A decisão do STF foi no sentido da aplicação do CDC, mas com ressalvas. No tocante
aos serviços bancários e aspectos secundários do contrato, aplica-se o CDC. Entretanto, no
que tange a questões sobre financiamento e mútuo a juros, só se pode invocar as
regulamentações do BACEN.
Por assalto em terminal eletrônico: É pacífico o entendimento de que o banco tem o
dever de oferecer segurança aos seus usuários. Logo, não se aplica a tese defensiva do
fortuito externo (o acontecimento se dá após a prestação do serviço, excluindo a
responsabilidade civil, pois é alheio à atividade do fornecedor, rompendo o nexo causal). Nesse
julgado asseverou-se que, apesar de os bancos não prestarem serviços propriamente de
segurança, esta não deixa de ser um elemento que agrega valor ao serviço bancário, cabendo
ao banco responder como se o serviço fosse deficiente.
O STJ firmou entendimento no sentido de que, se o assalto ocorre no interior da
agência, ainda que fora do horário de expediente, a responsabilidade civil é do banco (v. REsp
488310 – RJ). Para o professor, essa responsabilidade é objetiva, com base no CDC.
Se, todavia, o assalto ocorre fora do banco, o STJ entende que a responsabilidade é do
Estado.
Se o assalto ocorre dentro de quiosques ou ATMs em locais como postos de gasolina,
o professor entende que há responsabilidade do banco, pois tais terminais são uma extensão
do banco, à luz da teoria do risco e do CDC.
DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. ESTACIONAMENTO DE VEÍCULOS. ROUBO ARMADO DE
CLIENTE QUE ACABARA DE EFETUAR SAQUE EM AGÊNCIA BANCÁRIA.
RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTACIONAMENTO. ALCANCE. LIMITES.
1. Em se tratando de estacionamento de veículos oferecido por instituição financeira, o roubo
sofrido pelo cliente, com subtração do valor que acabara de ser sacado e de outros pertences
não caracteriza caso fortuito apto a afastar o dever de indenizar, tendo em vista a
previsibilidade de ocorrência desse tipo de evento no âmbito da atividade bancária, cuidando-
se, pois, de risco inerente ao seu negócio. Precedentes.
2. Diferente, porém, é o caso do estacionamento de veículo particular e autônomo -
absolutamente independente e desvinculado do banco - a quem não se pode imputar a
responsabilidade pela segurança individual do cliente, tampouco pela proteção de numerário
anteriormente sacado na agência e dos pertences que carregava consigo, elementos não
compreendidos no contrato firmado entre as partes, que abrange exclusivamente o depósito do
automóvel. Não se trata, aqui, de resguardar os interesses da parte hipossuficiente da relação
de consumo, mas de assegurar ao consumidor apenas aquilo que ele legitimamente poderia
esperar do serviço contratado, no caso a guarda do veículo.
3. O roubo à mão armada exclui a responsabilidade de quem explora o serviço de
estacionamento de veículos. Precedentes.
4. Recurso especial a que se nega provimento.(REsp 1232795/SP, Rel. Ministra NANCY
ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 02/04/2013, DJe 10/04/2013)

Cláusula de não indenizar e causas de excludentes da responsabilidade civil


A cláusula de não indenizar traduz a estipulação negocial que afasta a
responsabilidade civil do infrator. Exemplo corriqueiro refere-se aos objetos deixados no interior
de um carro em estacionamento pago.
No sistema como o nosso, que contempla o princípio da função social do contrato, e
em que, na esmagadora maioria das negociações negociais, utiliza-se como técnica de
contratação a proposta por adesão, por conta da manifesta vulnerabilidade de uma das partes,
esta cláusula pode ser considerada abusiva (art. 25 do CDC).
A vulnerabilidade não é só econômica, mas também cultural, técnica ou jurídica.
Art. 25. É vedada a estipulação contratual de cláusula que impossibilite, exonere ou
atenue a obrigação de indenizar prevista nesta e nas Seções anteriores.
§ 1º Havendo mais de um responsável pela causação do dano, todos responderão
solidariamente pela reparação prevista nesta e nas Seções anteriores.
§ 2º Sendo o dano causado por componente ou peça incorporada ao produto ou
serviço, são responsáveis solidários seu fabricante, construtor ou importador e o que
realizou a incorporação.
RESPONSABILIDADE CIVIL E RELAÇÃO EMPRESARIAL: comentários ao artigo 931
Art. 931. Ressalvados outros casos previstos em lei especial, os empresários
individuais e as empresas respondem independentemente de culpa pelos danos
causados pelos produtos postos em circulação. (E SERVIÇOS TAMBÉM)
Até a entrada em vigor do CC/02, a responsabilidade entre as empresas era subjetiva.
Após, a relação interempresarial se tornou objetiva. Vide ainda o enunciado 378 da IV Jornada.
Mesmo que a relação entre os empresários não seja de consumo, a responsabilidade será do
tipo objetiva.
Responsabilidade do construtor e do empreiteiro:
Era regulada no CC/16 pelo art. 1.245. Hoje, é regulada, no CC/02, pelo art. 618 in
verbis:
Art. 618. Nos contratos de empreitada de edifícios ou outras construções
consideráveis, o empreiteiro de materiais e execução responderá, durante o prazo
irredutível de cinco anos, pela solidez e segurança do trabalho, assim em razão dos
materiais, como do solo.
Ocorrendo fato que derive de falta de solidez ou segurança, dentro do prazo irredutível
de 5 anos, o construtor responde perante o dono da obra.
OBS: Esse prazo não é prescricional, é decadencial legal de garantia da obra (tal como a
garantia que é dada a uma TV, por exemplo).
Com o passar do tempo, a construtora passa a ter mais argumentos para se esquivar
da responsabilidade, alegando que a administração do condomínio, por exemplo, não agiu com
os devidos cuidados de manutenção. Entretanto, se for possível provar que a causa do
acidente é anterior à entrega do prédio, ainda será possível responsabilizar o construtor.
Prazo prescricional para se formular pretensão indenizatória de responsabilidade civil
contra a construtora: Era de 20 anos (v. 194 STJ), mas essa súmula não pode mais ser
aplicada, salvo para fatos ocorridos antes da entrada em vigor do CDC e do CC/02, e, ainda
assim, dependendo da contagem do prazo prescricional.
Súmula 194 do STJ: “Prescreve em 20 (vinte) anos a ação para obter do construtor
indenização por defeitos da obra”.
Hoje, há 2 prazos prescricionais, pelo fato do produto (acidente, dano, NÃO vício):
Se a vítima do fato for consumidora (ex: dono da obra): 5 anos (art. 27, CDC):
Art. 27. Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados
por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se
a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria.
Se não for consumidora (ex: empresa de incorporação imobiliária): 3 anos (CC/02).
Se o fato ou vício ocorreu somente depois dos 5 anos, o STF entende que pode haver
responsabilidade da construtora, em uma verdadeira prorrogação.
Parágrafo único. Decairá do direito assegurado neste artigo o dono da obra que não
propuser a ação contra o empreiteiro, nos cento e oitenta dias seguintes ao
aparecimento do vício ou defeito.
Esse prazo de 180 dias, contido no parágrafo único, não é prescricional (para se
formular pretensão indenizatória de responsabilidade civil contra o construtor). É prazo
decadencial, para se exercer direito potestativo de reclamar vício de qualidade da obra. Tal
vício redibitório pode ensejar variadas conseqüências (rejeição, abatimento do preço, etc.).
Vício de qualidade: ex: X compra um telefone celular que não fala, ou que faz alguma das
funções que deveria (prazo: 90 dias);
Fato do consumo: ex: o celular de X explode em sua mão (prazo: 5 anos).

DANO MORAL
Num primeiro momento da história do Direito, não se admitia reparação civil.
Argumentava-se que não se poderia colocar um preço na dor da vítima. Ademais, o dano moral
não seria mensurável (não se poderia quantificar a dor sentida pela vítima) sua reparação
significaria dar um poder excessivo ao juiz.
Até o primeiro quarto do século XX, o STF não reconhecia a indenização por dano
moral (mas houve somente uma ou duas decisões nesse sentido).
A reparação por dano moral no Brasil começou a ser acatada, desde que vinculada ao
reconhecimento de um dano material, sendo conseqüência deste.
O dano moral somente ganhou autonomia no Brasil com o advento da CF 88 (art. 5º, V
e X), que deu maior atenção aos direitos da personalidade:
V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização
por dano material, moral ou à imagem;
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas,
assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua
violação;
Conceito de dano moral: O dano moral é a lesão a direito da personalidade (ex: direito à
imagem, à honra, à vida privada).
A reparação do dano moral é autônoma. O entendimento no STJ é consolidado nesse
sentido, de forma que o dano moral pode, inclusive, ser cumulado com o dano estético (v. REsp
519258 – RJ, julgado em 06/05/2008), pois a imagem tem uma dimensão física e outra
psicológica.
Súmula 37 do STJ: São cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral
oriundos do mesmo fato.
A tendência atual é de se reconhecer os novos danos, conforme Súmula STJ 387, que
admite a cumulação dos danos estéticos com os danos morais e, obviamente, também com os
danos materiais.

O dano moral deve ser a lesão ao direito da personalidade, e, portanto, não se


confunde com o mero aborrecimento ou percalço, que não geram direito a indenização. Para a
doutrinadora Maria Celina Bodin o dano moral é dividido em objetivo, aquele referente a
violação a direitos da personalidade, e subjetivo, o relacionado a dor psicológica da vitima,
aborrecimento que transborde o limite tolerável de convívio na sociedade.
Prazo para se formular a pretensão indenizatória por dano moral: O prazo geral,
no CC/02, é de 3 anos. Já nas relações de consumo, o CDC estabelece o prazo é de 5 anos.
Dano moral e PJ:
A maioria da doutrina e da jurisprudência sustenta que a PJ pode sofrer dano moral,
pois pode sofrer abalo em sua honra objetiva, em sua imagem (v. 227 STJ e art. 52 do CC 02).
Dano institucional.
Art. 52: Aplica-se às pessoas jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos da
personalidade.
Súmula 227 do STJ: A pessoa jurídica pode sofrer dano moral.

Quantificação do dano moral:


O sistema brasileiro adota uma regra geral, aberta, de responsabilidade civil por dano
moral. Não há tipificação (v. art. 186):
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência,
violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato
ilícito.
Há 2 sistemas de quantificação por dano moral:
1. Livre, ou do arbitramento: atualmente, é o sistema mais utilizado pela
jurisprudência brasileira. Para o professor, é o sistema que encontra amparo na CF/88, pois a
CF não tarifou previamente a reparação por dano moral.
O arbitramento é feito com base na equidade, na justiça do caso concreto (art. 4º da
LICC e art. 126 do CPC):
Art. 4º da LICC: Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a
analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.
Art. 126. O juiz não se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou
obscuridade da lei. No julgamento da lide caber-lhe-á aplicar as normas legais; não as
havendo, recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito.
O sistema do arbitramento não significa que o juiz tem poderes ilimitados: significa que
cabe à jurisprudência a fixação de parâmetros razoáveis, e não à lei. Isso porque a lei não é
suficientemente flexível para alcançar as especificidades de cada caso concreto.
Critérios objetivos elencados pela jurisprudência: proporcionalidade, razoabilidade,
capacidade financeira do autor do dano, condição da vítima, fim preventivo da compensação e
não enriquecimento indevido.
2. Legal de tarifamento ou tabelamento: Não é aceito no STJ (v. 281 STJ).
Natureza jurídica da reparação por dano moral: É forte a corrente doutrinária no
sentido de que a reparação por dano moral teria natureza compensatória da vítima. Entretanto,
tem ganhado espaço, na doutrina e jurisprudência brasileira, a corrente que sustenta a
natureza pedagógica ou punitiva da reparação por dano moral.
Teoria do punitive damage:
A reparação de dano moral não teria apenas a função compensatória, mas também a
função punitiva.
Com a mudança dos valores na CF, não se pode mais conceber a reparação com a
função meramente compensatória. Hoje, os institutos de direito privado foram funcionalizados
(ex: função social da empresa, da posse, da propriedade), ou seja, eles têm um papel social.
Nesse contexto, para que seja implementada a função social da responsabilidade civil, o juiz
deve, na fixação da reparação por dano moral, buscar a função compensatória para a vítima, e
a função punitiva para o ofensor, ou seja, deve também, pedagogicamente, desestimular a
violação.
Essa teoria tem se aproximado do sistema brasileiro (v. REsp 860705 – DF; enunciado
379 da 4ª JDC). O art. 944 do CC não afasta a possibilidade do caráter punitivo da
indenização. A teoria do punitive damage pode gerar situações de desproporção entre o dano
sofrido e a indenização fixada, já que, em casos de grandes empresas, somente indenizações
de grande monta podem ser capazes de realizar a função de desestímulo à violação. Em tais
casos, a solução norte-americana tem sido no sentido de atribuir à vítima a parte
compensatória da indenização, e a instituições de caridade o montante fixado a título de
punição.

No REsp 1002985, a 2ª seção do STJ, por unanimidade, decidiu que o devedor que já
tiver outros registros em cadastros de proteção não tem direito a indenização por dano moral.
Incidência de IR sobre a indenização por dano moral: há uma discussão sobre se essa
indenização tem natureza de reparação por um direito ofendido, ou se tem natureza de nova
riqueza, fruto do trabalho, ganho de capital. O STJ tem entendido o seguinte:

RECURSO ESPECIAL. PETROBRAS. VERBA INDENIZATÓRIA PAGA POR ACIDENTE DE


TRABALHO. ACORDO HOMOLOGADO POR SENTENÇA COM TRÂNSITO EM JULGADO.
EMBARGOS À EXECUÇÃO DA PARCELA RETIDA PELA EMPRESA PAGADORA A TÍTULO
DE IMPOSTO DE RENDA. ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO-
IMPUGNAÇÃO OPORTUNA. PRECLUSÃO LÓGICA. NÃO-INCIDÊNCIA DO IMPOSTO DE
RENDA SOBRE PARCELA INDENIZATÓRIA. INTELIGÊNCIA DOS ARTIGOS 6º, IV E XIV DA
LEI 7.713/88, E 39, XVII DO DECRETO 3000/99. AFASTAMENTO DA MULTA DO ARTIGO 538,
PARÁGRAFO ÚNICO DO CPC. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO PELA ALÍNEA "A" E
PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Não deve ser acolhida a alegação de cerceamento de defesa, por não apreciação de matéria
preliminar e, também, pela ausência de juntada da declaração anual de imposto de renda do
recorrido, se a embargante não impugnou, oportunamente, a sentença homologatória que
resguardou "o direito ao autor de executar a quantia referente ao Imposto de Renda, recolhido
indevidamente" (fl. 72). No caso, operou-se a preclusão lógica.
2. Os valores recebidos a título de "indenização" não podem sofrer a incidência do imposto de
renda (artigo 43, I e II do CTN), pois não representam a "aquisição de disponibilidade", mas sim
a compensação pela perda da capacidade de adquirir a disponibilidade que detinha o credor
anteriormente ao fato que gerou a indenização.
3. Nos precisos termos dos artigos 6º, IV e XIV da Lei 7.713/88 e 39, XVII, do Decreto 3000/99,
a verba paga a título de indenização por acidente do trabalho não está sujeita à tributação pelo
imposto sobre a renda.
4. No julgamento do REsp nº 963.387/RS (Min. Herman Benjamin, julgado em 08/10/2008), a
Primeira Seção desta Corte firmou o entendimento de que não estão sujeitos à tributação pelo
imposto de renda as indenizações decorrentes de dano moral.
5. Deve ser afastada a multa aplicada com base no artigo 38, parágrafo único do CPC, pois
nos termos da Súmula 98/STJ "embargos de declaração manifestados com notório propósito
de prequestionamento não tem caráter protelatório." 6. Recurso especial conhecido e
parcialmente provido. (REsp 885.826/SE, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA
TURMA, julgado em 17/03/2011, DJe 22/03/2011)

TRIBUTÁRIO – IMPOSTO DE RENDA – INCIDÊNCIA – DANOS MORAIS –


AUSÊNCIA DE IDENTIDADE DE BASE FÁTICA – PREMISSAS DE COMPLEXIDADE
DIFERENTE – TIPOLOGIAS DIVERSAS DE DANOS MORAIS – IMPOSSIBILIDADE
DE CONFRONTO.
1. Os embargos de divergência destinam-se a superar dissídio e uniformizar o
entendimento do STJ sobre matéria posta em processo específico, quando existir
divergência entre os órgãos fracionários da Corte.
2. (...).
3. No acórdão embargado (Primeira Turma), concluiu-se que há incidência de imposto
de renda quando os danos morais são puros. Na espécie, julgou-se indenização por
atropelamento da genitora do autor da ação. Os acórdãos trazidos para o confronto
(Segunda Turma) não se prestam à divergência, porque: a) o primeiro deles refere-se a
dano moral por acidente de trabalho, o que foi ressalvado expressamente como
espécie não-tributável no acórdão embargado; b) o segundo não expressa de modo
claro qual o objeto indenizável, impedindo distinguir entre as espécies de danos morais.
4. A complexidade das premissas exige perfeita identidade dos fatos, sob pena de se
realizar simplificação ou generalização indevidas, capazes de comprometer o caráter
pedagógico e pacificador do julgamento desta espécie recursal. Embargos de
divergência não-conhecidos. (STJ, EREsp 748868 / RS, Rel. Min. Humberto Martins, 1ª
Seção, Dje. 06/04/2009.)

Inf. 544 – Corte Especial:

Na fixação do valor da reparação pelos danos morais sofridos por parentes de vítimas
mortas em um mesmo evento, não deve ser estipulada de forma global a mesma
quantia reparatória para cada grupo familiar se, diante do fato de uma vítima ter mais
parentes que outra, for conferido tratamento desigual a lesados que se encontrem em
idêntica situação de abalo psíquico, devendo, nessa situação, ser adotada metodologia
de arbitramento que leve em consideração a situação individual de cada parente de
cada vítima do dano morte. A fixação de valor reparatório global por núcleo familiar,
justificar-se-ia apenas se a todos os lesados que se encontrem em idêntica situação
fosse conferido igual tratamento. STJ. Corte Especial. EREsp 1.127.913-RS, Rel. Min.
Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 4/6/2014 (Info 544).
Prejuízo de afeição: No voto, o Min. Psulo de Terso Sanseverino fez menção a um
interessante termo: o prejuízo de afeição. Conforme explica o Min. Sanseverino, o
“prejuízo de afeição” (préjudice d'affection) é o dano extrapatrimonial sofrido pelos
familiares da pessoa morta.
Trata-se do dano moral povocado em decorrência da morte do ente querido, cujo
sofrimento é incomensurável, bastando pensar na dor dos filhos menores com a perda
do pai em acidente de trabalho, no sofrimento psíquico da esposa com a morte do
marido em um desastre aéreo, no vazio existencial dos pais com o óbito de um filho em
um acidente de trânsito.
Busca-se com a indenização um paliativo para o sofrimento psíquico ensejado pelo
evento danoso, sendo esse o ponto nuclear do conceito de dano moral stricto sensu
(voto do Ministro no EREsp 1.127.913-RS).
O prejuízo de afeição é um da moral que atinge as vítimas por ricochete considerando
que a vítima direta é o falecido e seus familiares são afetados reflexamente pelo
evento.

Inf. 539. 4ª Turma.


O advogado que ajuizou ação de execução de honorários de sucumbência não só
contra a sociedade limitada que exclusivamente constava como sucumbente no título
judicial, mas também, sem qualquer justificativa, contra seus sócios dirigentes, os quais
tiveram valores de sua conta bancária bloqueados sem aplicação da teoria da
desconsideração da personalidade jurídica, deve aos sócios indenização pelos danos
materiais e morais que sofreram. STJ. 3ª Turma. REsp 1.245.712-MT, Rel. Min. João
Otávio de Noronha, julgado em 11/3/2014.

Inf. 549 – 4ª Turma


É cabível indenização por danos morais ao aluno universitário que fora compelido a
migrar para outra instituição educacional pelo fato de a instituição contratada ter
extinguido de forma abrupta o curso, ainda que esta tenha realizado convênio, com as
mesmas condições e valores, com outra instituição para continuidade do curso
encerrado. Obs: ressalte-se que o tema não é tranquilo e que existe julgado da 4ª
Turma entendendo, com base nas peculiaridades do caso concreto, que não seria
devida a indenização: STJ. 4ª Turma. REsp 1094769/SP, Rel. Min. Marco Buzzi,
julgado em 18/03/2014. STJ. 3ª Turma. REsp 1.341.135-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso
Sanseverino, julgado em 14/10/2014 (Info 549). STJ. 4ª Turma. REsp 1094769/SP, Rel.
Min. Marco Buzzi, julgado em 18/03/2014.
STJ. Info 553/2015.
Atualização de posicionamento. A simples aquisição de refrigerante contendo inseto
no interior da embalagem, sem que haja a ingestão do produto, não é circunstância
apta, por si só, a provocar dano moral indenizável. Obs: existe precedente em sentido
contrário (info 537), mas o que prevalece é que não há dano moral.

STJ. Info 553/2015.


Configura dano moral coletivo in re ipsa a realização de venda casada por operadora
de telefonia. A prática de venda casada por parte de operadora de telefonia é capaz de
romper com os limites da tolerância. No momento em que oferece ao consumidor
produto com significativas vantagens - no caso, o comércio de linha telefônica com
valores mais interessantes do que a de seus concorrentes - e de outro, impõe-lhe a
obrigação de aquisição de um aparelho telefônico por ela comercializado, realiza
prática comercial apta a causar sensação de repulsa coletiva a ato intolerável, tanto
que encontra proibição expressa em lei. Lembrar que dano moral coletivo é a lesão na
esfera moral de uma comunidade (Min. Mauro Campbell Marques).

STJ. Info 554/2015


REGRA: para que o órgão de proteção de crédito inclua o nome de um consumidor no
cadastro de inadimplentes, é necessário que, antes, ele seja notificado (Súmula 359-
STJ). A ausência de prévia comunicação enseja indenização por danos morais.
EXCEÇÕES: 1) Se o devedor já possuía inscrição negativa no banco de dados e foi
realizada uma nova inscrição sem a sua notificação. Súmula 385-STJ: Da anotação
irregular em cadastro de proteção ao crédito, não cabe indenização por dano moral
quando preexistente legítima inscrição, ressalvado o direito ao cancelamento. 2) Se o
órgão de restrição ao crédito estiver apenas reproduzindo informação negativa que
conste de registro público (exs.: anotações de protestos que constem do Tabelionato de
Protesto, anotações de execução fiscal que sejam divulgadas no Diário Oficial). Diante
da presunção legal de veracidade e publicidade inerente aos registros do CARTÓRIO
DE PROTESTO ou do CARTÓRIO DE DISTRIBUIÇÃO JUDICIAL, a reprodução
objetiva, fiel, atualizada e clara desses dados na base de órgão de proteção ao crédito
- ainda que sem a ciência do consumidor - não tem o condão de ensejar obrigação de
reparação de danos. O simples erro no valor inscrito da dívida (ex: a dívida era de R$
10 mil e foi inscrita como sendo de R$ 15 mil) não gera dano moral!

STJ. Info 556. 2015


Determinada pessoa foi presa e torturada por policiais. Foi instaurado inquérito policial
para apurar o ocorrido. Qual será o termo de início da prescrição da ação de
indenização por danos morais? • Se tiver sido ajuizada ação penal contra os autores do
crime: o termo inicial da prescrição será o trânsito em julgado da sentença penal. • Se o
inquérito policial tiver sido arquivado (não foi ajuizada ação penal): o termo inicial da
prescrição da ação de indenização é a data do arquivamento do IP. Voto antigo do Min.
Luiz Fux, ainda no STJ: “A coisa julgada na instância penal constitui o termo inicial da
contagem do prazo de prescrição da ação de indenização em face do Estado. (...) 3. A
regra nesses casos é a de que o termo a quo seja o trânsito em julgado da sentença
condenatória penal, porquanto a reparação do dano ex delicto é consequente.
Enquanto pende a incerteza quanto à condenação, não se pode aduzir a prescrição,
posto instituto vinculado à inação, inocorrente quando em curso inquérito policial militar
para apurar responsabilidade de militar pela morte de outro colega de corporação”.
STJ. Info 556/2015.
Se a ECT não comprovar a efetiva entrega de carta registrada postada por consumidor
nem demonstrar causa excludente de responsabilidade, há de se reconhecer o direito a
reparação por danos morais in re ipsa, desde que o consumidor comprove
minimamente a celebração do contrato de entrega da carta registrada. O extravio de
correspondência registrada acarreta dano moral in re ipsa (sem necessidade de
comprovação do prejuízo), devendo os Correios indenizar o consumidor. A
responsabilidade civil dos Correios é objetiva (art. 37, § 6º da CF/88 e arts. 14 e 22 do
CDC).

STJ. Info 557/2015.


O aparecimento de grave vício em revestimento (pisos e azulejos), quando já se
encontrava devidamente instalado na residência do consumidor, configura FATO DO
PRODUTO, sendo, portanto, de 5 anos o prazo prescricional da pretensão reparatória
(art. 27 do CDC). O art. 12, § 1º do CDC afirma que defeito diz respeito a
circunstâncias que gerem a insegurança do produto ou serviço. Está relacionado,
portanto, com o acidente de consumo. No entanto, a doutrina e o STJ entendem que o
conceito de “fato do produto” deve ser lido de forma mais ampla, abrangendo todo e
qualquer vício que seja grave a ponto de ocasionar dano indenizável ao patrimônio
material ou moral do consumidor. Desse modo, mesmo o produto/serviço não sendo
“inseguro”, isso poderá configurar “fato do produto/serviço” se o vício for muito grave a
ponto de ocasionar dano material ou moral ao consumidor. Foi nesse sentido que o
STJ enquadrou o caso acima (do piso de cerâmica).

STJ. Info 558/2015.


A sociedade empresária gestora de portal de notícias que disponibilize campo
destinado a comentários de internautas terá responsabilidade solidária por comentários
postados nesse campo que, mesmo relacionados à matéria jornalística veiculada,
sejam ofensivos a terceiro e que tenham ocorrido antes da entrada em vigor do Marco
Civil da Internet (Lei 12.965/2014). Ressalte-se que o ponto nodal não é apenas a
efetiva existência de controle editorial, mas a viabilidade de ele ser exercido.
Consequentemente, a sociedade empresária deve responder solidariamente pelos
danos causados à vítima das ofensas morais, que, em última análise, é um bystander,
por força do disposto no art. 17 do CDC.
Dos contratos em geral

CONTRATOS EM GERAL

1 NOÇÕES GERAIS

O Estado Social, marcado pelo avanço tecnológico, e pela sociedade de massa subverteu a
concepção clássica de contrato que pressupunha a igualdade dos contratantes. O contrato de
adesão, criado em 1901, demonstrou a necessidade de o Estado limitar a autonomia privada
em prol do interesse público e social. O contrato de adesão é um contrato bastante suscetível
de abuso do poder econômico (RIPERT): onde está a autonomia da vontade no contrato de
adesão? É mais um ato de império. Em que pesem as críticas, o contrato de adesão é um mal
necessário à sociedade moderna. EXEMPLO: contratos de prestação de fornecimento de água,
luz, telefone. Cabe ao Estado coibir os abusos decorrentes do contrato de adesão, por meio de
leis de intervenção para imprimir a igualdade onde há desigualdade econômica. EXEMPLO:
CDC.

A autonomia da vontade está limitada pelos princípios da BOA-FÉ OBJETIVA e FUNÇÃO


SOCIAL DO CONTRATO, que, ao lado da EQUIVALÊNCIA MATERIAL DAS PRESTAÇÕES,
constituem os PRINCÍPIOS SOCIAIS DO CONTRATO.

CONTRATO BASE e CONTRATO DERIVADO (TRF1): contrato derivado tem o condão de


extinguir o contrato base? Pela resposta da questão NÃO. Já que afirma: o mecanismo técnico
do contrato derivado propicia, por parte de terceiro, o gozo das utilidades do contrato base,
SEM, CONTUDO, LEVÁ-LO À EXTINÇÃO.

EXEMPLO 01: a sublocação, como ocorre com qualquer contrato derivado, haverá de seguir o
contrato-base (LOCAÇÃO), não podendo, desta forma, permitir o que este proíbe. Assim,
extinto o contrato-base, seja qual for a sua causa, serão também extintas as eventuais
sublocações, ressalvados direitos indenizatórios em favor do sublocatário contra o
sublocador.

EXEMPLO 02: CONTRATO DE SUBEMPREITADA NA CONSTRUÇÃO CIVIL é o contrato


celebrado entre empreiteira e outras empresas para a execução de obra ou de serviços na
construção civil, no todo ou em parte, com ou sem fornecimento de material. A subempreitada
é um contrato derivado (expressão que serve para explicar que ele depende de um contrato
principal, o de empreitada. Pode ser total ou parcial (conforme abranja todo o conjunto da obra
ou parte dela).

2 CONCEITO

CONTRATO é um negócio jurídico em que as partes convergem vontades contrapostas, com o


escopo de atingir determinados interesses, segundo as limitações impostas pelos princípios da
FUNÇÃO SOCIAL e da BOA-FÉ OBJETIVA.
O contrato é um negócio jurídico, que tem forma livre, exceto no que for determinado pela lei.

CONTRATO INSTRUMENTO CONTRATUAL


Relação jurídica, ou seja, é o negócio jurídico, É o documento do contrato, é a forma física
o acordo de vontades. do contrato.
Requisitos
Ë a introdução do contrato, é a
Preâmbulo cabeça, é a parte na qual os
contratantes são qualificados
É o corpo do contrato no qual
Contexto
estão previstas as cláusulas

4.1 CLASSIFICAÇÃO DOS CONTRATOS

Os contratos podem ser classificados de acordo com os critérios abaixo identificados:

RECIPROCAMENTE
CONSIDERADOS EM SI MESMOS
CONSIDERADOS
Unilaterais ou bilaterais
Onerosos ou gratuitos
Quanto à natureza da obrigação
Comutativos ou aleatórios
Formais ou reais
Consensuais, formais ou CONTRATOS PRINCIPAIS ou
Quanto à forma CONTRATOS-BASE
reais
Quanto à designação Nominados e inominados
Quanto à presença de Formais, informais,
formalidades solenes ou não solenes
Alienação de bens
Transmissão de uso e
Quanto ao objeto (conteúdo do gozo
direito conferido)
Prestação se serviço
Conteúdo especial
CONTRATOS ACESSÓRIOS
Execução imediata
ou CONTRATOS-DERIVADOS
Quanto ao tempo de execução Execução continuada
Execução diferida
Quanto à pessoa do Intuito personae ou
contratante impessoal

4.1.1 CONSIDERADOS EM SI MESMOS (principais classificações)


4.1.1.1 BILATERAIS ou UNILATERAIS ou PLURILATERAIS

Unilaterais: se um só dos contratantes assumir obrigações em face do outro, de tal sorte que
os efeitos são ativos de um lado e passivos do outro, pois uma das partes não se obrigará, não
havendo, portanto, qualquer contraprestação.

EXEMPLO: doação pura e simples, em que do concurso de vontades nascem obrigações


somente para o doador. EXEMPLOS: depósito, comodato, mútuo, mandato.

Os contratos unilaterais requerem duas manifestações de vontade, mas colocam um só dos


contratantes na posição de devedor, ficando o outro como credor.

EXEMPLO de contrato unilateral imperfeito = doação modal ou com encargo, por trazer um
ônus ao donatário.

Bilaterais: são os contratos em que cada um dos contratantes é simultânea e reciprocamente


credor e devedor do outro, pois produz direitos e obrigações para ambos, tendo por
característica principal o SINALAGMA, ou seja, a dependência recíproca de obrigações
(CONTRATOS SINALAGMÁTICOS).

EXEMPLOS: compra e venda, permuta, locação, prestação de serviços, transporte, seguro,


etc.

Vantagens dos contratos bilaterais:

SOMENTE SE APLICAM AOS CONTRATOS BILATERAIS


EXCEPTIO INANDIMPLETI Exceção do contrato não cumprido. NÃO se aplica a
CONTRACTUS contratos unilaterais.
Admite o inadimplemento como condição resolutiva. Os
CLÁUSULA RESOLUTIVA
contratos bilaterais contêm implícita ou explicitamente essa
TÁCITA
cláusula.
CONTRATOS UNILATERAIS: o contraente a quem o
contrato aproveite responde por culpa, e por dolo responde
aquele a quem não favoreça.
TEORIAS DOS RISCOS Princípio da res perit creditori.
CONTRATOS BILATERAIS: cada contratante responde por
dolo.
Princípio da res perit debitori.
Fica a obrigação em suspenso até que seja prestada
ARTIGO 477 garantia real ou fidejussória suficiente, já que as
circunstâncias supervenientes de modificação no patrimônio
do devedor alteram os termos contratuais, permitindo ao
contratante que se comprometeu a realizar a sua prestação
em primeiro lugar recusar-se a cumpri-la, até que o outro
satisfaça sua obrigação ou dê garantia bastante de que
cumprirá o prometido.

Art. 477. Se, depois de concluído o contrato, sobrevier a uma das


partes contratantes diminuição em seu patrimônio capaz de
comprometer ou tornar duvidosa a prestação pela qual se obrigou,
pode a outra recusar-se à prestação que lhe incumbe, até que
aquela satisfaça a que lhe compete ou dê garantia bastante de
satisfazê-la.

Contrato bilateral imperfeito – é o contrato unilateral que, por circunstâncias acidental, ocorrida
no curso da execução, gera alguma obrigação para o contratante que não se comprometera.
Pode ocorrer com o depósito e o comodato quando, por exemplo, surgir para o depositante e o
comodante, no decorrer da execução, a obrigação de indenizar certas despesas realizadas
pelo comodatário e pelo depositário. O contrato bilateral imperfeito subordina-se ao regime dos
contratos unilaterais, porque as contraprestações não nascem com a avença (Carlos Roberto
Gonçalves).

4.1.1.2 ONEROSOS ou GRATUITOS

Gratuitos ou benéficos são os contratos em que apenas uma das partes aufere benefício ou
vantagem. Nos onerosos, ambos os contraentes obtêm proveito, ao qual corresponde um
sacrifício.

Art. 114. Os negócios jurídicos benéficos e a renúncia interpretam-


se estritamente.

A doutrina distingue os contratos gratuitos propriamente ditos dos contratos desinteressados.


Aqueles acarretam uma diminuição patrimonial a uma das partes, como se dá nas doações
puras. Estes, subespécies dos primeiros, não produzem esse efeito, malgrado beneficiem a
outra parte (comodato e mútuo, p.ex.).

4.1.1.3 COMUTATIVOS ou ALEATÓRIOS

Os contratos onerosos subdividem-se em comutativos e aleatórios. Comutativos são os de


prestações certas e determinadas. Os contratos aleatórios caracterizam-se pela incerteza, para
as duas partes, acerca das vantagens e sacrifícios que deles pode advir.

Alguns negócios são aleatórios devido à sua própria natureza, caso dos contratos de seguro e
de jogo e aposta. Em outros casos, contudo, o contrato é aleatório em virtude da existência de
um elemento acidental, que torna a coisa ou o objeto incerto quanto à sua existência ou
quantidade, como ocorre na compra e venda de uma colheita futura. O CC/2002 consagra duas
formas básicas de contratos aleatórios:
 Contrato aleatório emptio spei – um dos contratantes toma para si o risco relativo à
própria existência da coisa, sendo ajustado um determinado preço, que será devido
integralmente, mesmo que a coisa não exista no futuro, desde que não haja dolo ou
culpa da outra parte (art. 458 do CC). O risco é maior. No caso de compra e venda,
essa forma negocial pode ser denominada venda da esperança.

 Contrato aleatório emptio rei speratae – se o risco versar somente em relação à


quantidade da coisa comprada, pois foi fixado pelas partes um mínimo como objeto
do negócio (art. 459 do CC). Nesse contrato o risco, apesar de existente, é menor. Em
casos tais, a parte terá direito a todo o preço, desde que de sua parte não tenha
concorrido com culpa, ainda que a coisa venha a existir em quantidade inferior à
esperada. Mas, se a coisa não vier a existir, alienação não haverá, e o alienante
deverá devolver o preço recebido (art. 459, parágrafo único, do Código Civil). Na
compra e venda trata-se da venda da esperança com coisa esperada.

4.1.1.4 CONSENSUAIS ou REAIS

Contratos consensuais ou formais, são aqueles que se perfectibilizam com a simples


manifestação do consentimento.

Contratos reais são os que exigem, para se aperfeiçoar, além do consentimento, a entrega da
coisa que lhe serve de objeto, como os de depósito, comodato ou mútuo, por exemplo.

OBS: segundo Tartuce, não se pode confundir o aperfeiçoamento do contrato (plano da


validade) com o seu cumprimento (plano da eficácia). A compra e venda gera efeitos a partir do
momento em que as partes convencionam sobre a coisa e o seu preço (art. 482 do CC). No
caso da compra e venda de imóveis, o registro mantém relação com a aquisição da
propriedade do negócio decorrente, o mesmo valendo para a tradição nos casos envolvendo
bens móveis. Utilizando a Escada Ponteana, o registro e a tradição estão no plano da eficácia
desse contrato. No que concerne à tradição, é melhor dizer que está, em regra, no plano da
eficácia. Isso porque, no caso dos contratos reais, a entrega da coisa está no plano da
validade.

4.1.1.6 NOMINADOS ou INOMINADOS

Contratos nominados são os que têm designação própria. Inominados são as que não a têm.

Contratos típicos são os regulados pela lei, os que têm o seu perfil nela traçado. Contratos
atípicos são os que resultam de um acordo de vontades, não tendo, porém, as suas
características e requisitos definidos e regulados na lei.

4.1.1.7 FORMAIS ou INFORMAIS ou SOLENES ou NÃO SOLENES

Forçoso repisar a diferenciação entre forma e solenidade. Forma é gênero, ou seja, qualquer
formalidade, caso da forma escrita. Solenidade é espécie, querendo significar o ato público,
caso da escritura pública, lavrada no Tabelionato de Notas. Feito esse esclarecimento,
vejamos as quatro possibilidades de categorias:

 Contrato formal – aquele que exige qualquer formalidade, caso da forma escrita.
Exemplo: o contrato de fiança deve ser celebrado por escrito (art. 819 do CC).
 Contrato informal – não exige qualquer formalidade, constituindo regra geral pelo
sistema civil brasileiro, pelo que consta do art. 107 do CC, que consagra o princípio da
liberdade das formas. Exemplo: prestação de serviço.
 Contrato solene – aquele que exige solenidade pública. O art. 108 do CC enuncia que
a escritura pública somente é necessária para os negócios de alienação de imóvel com
valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País. Ilustrando, em
havendo compra e venda de imóvel com valor superior a tal parâmetro, necessária a
escritura pública (contrato solene e formal). Se o imóvel tiver valor inferior, dispensa-se
a escritura, mas é fundamental a forma escrita, para o registro (contrato não solene,
mas formal).
 Contrato não solene – Não há necessidade de se lavrar a escritura pública em
Tabelionato de Notas, como no último exemplo citado.

4.1.1.8 EXECUÇÃO IMEDIATA ou DIFERIDA ou CONTINUADA

 Contrato instantâneo ou de execução imediata – aquele que tem aperfeiçoamento e


cumprimento de imediato, caso de uma compra e venda à vista.
 Contrato de execução diferida – tem o cumprimento previsto de uma vez só no futuro.
Exemplo: compra e venda pactuada com pagamento por cheque pré ou pós-datado.
 Contrato de execução continuada ou de trato sucessivo – tem o cumprimento previsto
de forma sucessiva ou periódica no tempo. É o caso de uma compra e venda cujo
pagamento deva ser feito por meio de boleto bancário, com periodicidade mensal,
quinzenal, bimestral, trimestral ou qualquer outra forma sucessiva. Exemplos: locação
e financiamentos em geral.

4.1.1.8 PESSOAL ou IMPESSOAL

 Contratos pessoal, personalíssimos ou intuitu personae – aqueles em que a pessoa do


contratante é elemento determinante de sua conclusão. Tal contrato não pode ser
transmitido por ato inter vivos ou mortis causa, ou seja, pelo falecimento da parte.
Exemplo: contrato de fiança, uma vez que a condição de fiador não se transmite aos
herdeiros, mas somente as obrigações vencidas e não pagas enquanto era vivo o
fiador e até os limites da herança (art. 836 do CC).
 Contrato impessoal – aquele em que a pessoa do contratante não é juridicamente
relevante para a conclusão do negócio. Exemplo: compra e venda, hipótese em que a
causa do contrato está relacionada com a transmissão do domínio.

4.1.2 RECIPROCAMENTE CONSIDERADOS

Contratos principais: são os que existem por si, exercendo sua função e finalidade
independentemente de outro.

Contratos acessórios: são aqueles cuja existência jurídica supõe dos principais, pois visam a
assegurar a sua execução. EXEMPLO: a fiança é contrato acessório, estabelecido para
garantir a locação, que é contrato principal; logo, a fiança não poderá existir sem a locação.
Diante do princípio da gravitação jurídica, pelo qual o acessório segue o principal, tudo o que
ocorre no contrato principal repercute no acessório. Desse modo, sendo nulo o contrato
principal, nulo será o acessório; sendo anulável o principal o mesmo ocorrerá com o acessório;
ocorrendo prescrição da dívida do contrato principal, o contrato acessório estará extinto; e
assim sucessivamente. Todavia, deve ficar claro que o que ocorre no contrato acessório não
repercute no principal. Assim sendo, a nulidade do contrato acessório não gera a nulidade do
contrato principal; a anulabilidade do contrato acessório não gera a nulidade relativa do
principal e assim de forma sucessiva. A conclusão é retirada do art. 184 do CC, segundo o qual
“Respeitada a intenção das partes, a invalidade parcial de um negócio jurídico não o
prejudicará na parte válida, se esta for separável; a invalidade da obrigação principal implica a
das obrigações acessórias, mas a destas não induz a da obrigação principal”.

3 CONTRATOS NO CC/02

O Código Civil de 2002 os disciplinou da seguinte forma:

a) Título V – Dos contratos em Geral, subdividido em dois Capítulos (Capítulo I - “Das


Disposições Gerais” - e Capítulo 2 - “Da Extinção do Contrato”). Tais capítulos são ainda
estruturados em Seções, que versam sobre aspectos gerais da matéria contratual;

b) Título VI – Das Várias Espécies de Contratos, subdividido em 20 capítulos,


compartimentados em várias outras Seções, cuidando dos Contratos em Espécie. Nota-se, no
estudo dessa disciplina, que o codificador inovou, ao tratar de temas não regulados pelo
Código anterior, a exemplo do contrato preliminar, do contrato com pessoa a declarar, da
resolução por onerosidade excessiva (aplicação da teoria da imprevisão), da venda com
reserva de domínio, da venda sobre documentos e do contrato estimatório.

Além disso, disciplinou contratos novos, como a comissão, a agência/distribuição, a corretagem


e o contrato de transporte, deixando de fazer referência a alguns outros institutos, como, por
exemplo, a cláusula comissória na compra e venda (art. 1163 do CC-16).

4 PRINCÍPIOS DO DIREITO CONTRATUAL

Os princípios assumiram grande importância no CC/2002.

PRINCÍPIO: regramento básico aplicável a um determinado instituto jurídico, no caso em


questão aos contratos. Os princípios são abstraídos das normas, costumes, doutrina,
jurisprudência e dos aspectos políticos, econômicos e sociais.

Temos, portanto, como princípios mais relevantes e difundidos em doutrina:

a) o princípio da autonomia privada;

b) o princípio da força obrigatória do contrato (pacta sunt servanda);


c) o princípio da relatividade dos efeitos do contrato;

d) o princípio da função social do contrato;

e) o princípio da boa fé objetiva;

4.1 PRINCÍPIO DA AUTONOMIA PRIVADA


O negócio jurídico constitui verdadeiro instrumento da liberdade humana, tendo sua raiz na
vontade. A declaração de vontade constitui o elemento central e mais característico do negócio
jurídico.

O domínio da vontade foi uma conquista advinda de lento processo histórico, culminando com
o “respeito à palavra dada, principal herança dos contratos romanos e expressão propulsora da
ideia central de contrato como fonte de obrigação.

A doutrina diferencia liberdade de contratar e liberdade contratual:

 LIBERDADE DE CONTRATAR: está relacionada com a escolha da pessoa ou das


pessoas com quem o negócio será celebrado, sendo uma liberdade plena, em regra.
Entretanto em algumas hipóteses há limitação da vontade, por exemplo, a limitação da
contratação com o Poder Público.

 LIBERDADE CONTRATUAL: relaciona-se com o conteúdo do negócio jurídico, ponto


em que residem limitações ainda maiores à liberdade humana.

Dessa dupla liberdade (de contratar e contratual) é que decorre o PRINCÍPIO DA


AUTONOMIA PRIVADA, que seria a liberdade que a pessoa tem para regular os próprios
interesses. Essa autonomia não é absoluta, encontrando limitações nas normas de ordem
pública.

Segundo FRANCISCO AMARAL, a autonomia privada é o poder que os particulares têm de


regular, pelo exercício de sua própria vontade, as relações que participam, estabelecendo-lhe o
conteúdo e a respectiva disciplina jurídica.

Autonomia da Vontade x Autonomia Privada

Para alguns doutrinadores, são expressões sinônimas. A diferenciação feita por parte da
doutrina é no sentido de que a autonomia da vontade tem conotação subjetiva, psicológica;
enquanto a autonomia privada marca o poder da vontade no direito de um modo objetivo,
concreto e real.
É importante salientar que a função social não elimina totalmente a autonomia privada ou a
liberdade contratual, mas apenas reduz o alcance desse princípio.

Assim, entende-se que o contrato é formado por uma soma de fatores, e não mais pela
vontade pura dos contratantes, delineando-se o significado do princípio da autonomia
privada, pois outros elementos de cunho particular irão influenciar o conteúdo do negócio
jurídico patrimonial. Na formação do contrato, muitas vezes, percebe-se a imposição de
cláusulas pela lei ou pelo Estado, o que nos leva à intervenção do Estado nos contratos ou
dirigismo contratual.

Pode-se concluir que o princípio da autonomia privada é um regramento básico, de ordem


particular, mas influenciado por normas de ordem pública, pelo qual na formação do contrato,
além da vontade das partes, entram em cena outros fatores: psicológicos, políticos,
econômicos e sociais. Trata-se de direito indeclinável da parte de autorregulamentar os seus
interesses, decorrente da dignidade humana, mas que encontra limitações em normas de
ordem pública, particularmente nos princípios sociais contratuais.

4.2 PRINCÍPIO DA RELATIVIDADE DOS EFEITOS DO CONTRATO ou PRINCÍPIO DO RES


INTER ALIOS ACTA

Segundo este princípio, o contrato, em regra, somente atinge as partes contratantes, não
prejudicando ou beneficiando terceiros estranhos a ele.

Contudo, deve-se entender que o principio da relatividade dos contratos também encontra
limitações na própria codificação privada ou mesmo na legislação extravagante aplicável aos
contratos. Em outras palavras é possível afirmar que o contrato também gera efeitos perante
terceiros. Ex.: estipulação em favor de terceiros (436 e 438 CC).

Além disso, é exceção ao princípio da relatividade, a promessa de fato de terceiro (art. 439 e
440 CC), contrato com pessoa a declarar e o consumidor por equiparação.

Para NELSON NERY JR., a função social do contrato é um abrandamento do princípio da


relatividade dos efeitos contratuais. Isso porque a função social do contrato constitui cláusula
geral, a impor a revisão do principio da relatividade em relação a terceiros, implicando a tutela
externa do crédito.

Essa tutela externa do crédito pode ser verificada no art. 608 CC: “Aquele que aliciar pessoas
obrigadas em contrato escrito a prestar serviço a outrem pagará a este a importância que ao
prestador de serviço, pelo ajuste desfeito, houvesse de caber durante dois anos.”

Outro exemplo de tutela externa do crédito é o entendimento do STJ segundo o qual a vítima
de evento danoso poderá propor ação direta contra a seguradora (e o segurado), mesmo não
havendo relação contratual direta entre as partes.
RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO
MATERIAL. ACIDENTE AUTOMOBILÍSTICO. AÇÃO INDENIZATÓRIA AJUIZADA POR
TERCEIRO CONTRA O SEGURADO E A SEGURADORA. LITISCONSÓRCIO PASSIVO.
POSSIBILIDADE. OBSERVÂNCIA DOS LIMITES CONTRATADOS NA APÓLICE. RECURSO
PROVIDO. 1. A controvérsia dos autos cinge-se à possibilidade de o terceiro prejudicado no
acidente automobilístico promover a ação convocando à lide, em litisconsórcio passivo, o
segurado e a seguradora, no seguro de responsabilidade civil facultativo. 2. Desde que os
promovidos não tragam aos autos fatos que demonstrem a inexistência ou invalidade do
cogitado contrato de seguro de responsabilidade civil por acidentes de veículos, limitando-se a
contestar sobretudo o mérito da pretensão autoral, mostra-se viável a preservação do
litisconsórcio passivo, entre segurado e seguradora. Isso, porque esse litisconsórcio terá,
então, prevalentes aqueles mesmos contornos que teria caso formado, em ação movida só
contra o segurado apontado causador do acidente, por denunciação feita pelo réu, em
decorrência da aplicação das regras dos arts. 70, 71, 72, 75 e 76 do Código de Processo Civil -
CPC. 3. Se o réu segurado convocado para a ação iria mesmo denunciar a lide à seguradora,
nenhum prejuízo haverá para esta pelo fato de ter sido convocada a juízo, como promovida, a
requerimento do terceiro autor da ação. Em ambos os casos haverá de defender-se em
litisconsórcio passivo com o réu, respondendo solidariamente com este pela reparação do dano
decorrente do acidente, até os limites dos valores segurados contratados. 4. Recurso especial
provido. (REsp 710.463/RJ, Rel. Min. RAUL ARAÚJO – 4ª TURMA, DJe 17/04/2013).

4.3 PRINCÍPIO DA FORÇA OBRIGATÓRIA DOS CONTRATOS (PACTA SUNT SERVANDA)

Decorrente do princípio da autonomia privada, a FORÇA OBRIGATÓRIA DOS CONTRATOS


prevê que tem força de lei o estipulado pelas partes na avença, constrangendo os contratantes
ao cumprimento do conteúdo completo do negócio jurídico. Esse princípio importa em autêntica
restrição da liberdade, que se tornou limitada aqueles que contrataram a partir do momento em
que vieram a formar o contrato consensualmente e dotados de vontade autônoma.

O princípio da força obrigatória como regra máxima tinha previsão já no direito romano,
segundo o qual deveria prevalecer o pacta sunt servanda. Não poderia, sem qualquer razão
plausível, ser o contrato revisto ou extinto, sob pena de acarretar insegurança jurídica ao
sistema romano.

Entretanto, a realidade jurídica e fática do mundo capitalista e pós-moderno não possibilita


mais a concepção estanque do contrato, pois conforme as circunstâncias, pode este,
fundando-se em superiores princípios de direito, boa-fé, comum intenção das partes, amparo
do mais fraco contra o forte, interesse coletivo, afastar a regra da força obrigatória.

4.3.1 Conceito da teoria da imprevisão

A teoria consiste no reconhecimento de que a ocorrência de acontecimento novo e


imprevisível, com impacto na base econômica do contrato, justificaria a sua revisão ou
resolução.

A presente teoria somente interessa aos contratos de execução continuada ou de trato


sucessivo, ou seja, de médio ou longo prazo, uma vez que se mostraria inútil nos de
consumação instantânea.
4.3.2 Requisitos da teoria da imprevisão

Podemos, nessa linha de intelecção, decompor essa importante construção dogmática, nos
seguintes elementos:

4.3.2.1 superveniência de circunstância imprevisível – claro está, assim, que se a


onerosidade excessiva imposta a uma das partes inserir-se na álea de previsão contratual, não
se poderá, em tal caso, pretender-se mudar os termos da avença, eis que, na vida negocial,
nada impede que uma das partes tenha feito um “mau negócio”;

4.3.2.2 alteração da base econômica objetiva do contrato – a ocorrência da circunstância


superveniente altera a balança econômica do contrato, impondo a uma ou ambas as partes
onerosidade excessiva.

4.3.2.3 onerosidade excessiva – consequencialmente, uma ou até mesmo ambas as partes


experimentam um aumento na gravidade econômica da prestação a que se obrigou. Com isso,
podemos concluir, consoante anotamos linhas acima, que a teoria da imprevisão não
pressupõe, necessariamente, enriquecimento de uma parte em detrimento do empobrecimento
da outra. Isso porque, a superveniência da circunstância não esperada poderá haver
determinado onerosidade para ambas as partes, sem que, com isso, se afaste a aplicação da
teoria.

4.3.2.4 enriquecimento ilícito – Não teria que haver um quarto requisito: ENRIQUECIMENTO
ILÍCITO DA PARTE? Parte da doutrina defende a necessidade desse requisito. Entretanto, a
menção a somente 03 requisitos acima é defendida por outra parte da doutrina (RUY ROSADO
DE AGUIAR), porque NEM sempre o enriquecimento ilícito é INDISPENSÁVEL, para a
doutrina. Mas o CC/02 exige o enriquecimento ilícito, nos termos do artigo 478, que afirma a
necessidade de a onerosidade excessiva gere uma vantagem exagerada para a outra parte.

DA RESOLUÇÃO POR ONEROSIDADE EXCESSIVA

Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a


prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa,
com extrema vantagem para a outra, em virtude de
acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor
pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a
decretar retroagirão à data da citação.

Art. 479. A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a


modificar equitativamente as condições do contrato. (SEGUNDO
NELSON NERY, ESSE ARTIGO É UM ABSURDO PORQUE
PERMITE AO RÉU A FACULDADE DE, QUERENDO, ADMITIR A
REVISÃO DO CONTRATO; ENTRETANTO, O CORRETO É QUE O
JUIZ POSSA DETERMINAR A REVISÃO DO CONTRATO,
MEDIANTE SENTENÇA DETERMINATIVA)
Art. 480. Se no contrato as obrigações couberem a apenas uma
das partes, poderá ela pleitear que a sua prestação seja reduzida,
ou alterado o modo de executá-la, a fim de evitar a onerosidade
excessiva.

O artigo 317 do CC é uma aplicação específica da teoria da imprevisão para fins de revisão de
uma prestação do contrato. O artigo 478 é o artigo que serve para revisar o CONTRATO e não
somente uma prestação específica do contrato.

Art. 317. Quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier


desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o do
momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da
parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da
prestação.

Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a


prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa,
com extrema vantagem para a outra, em virtude de
acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor
pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a
decretar retroagirão à data da citação.

OBS: O Código de Defesa do Consumidor, em seu art.6, V, consagra a teoria da imprevisão


em favor do consumidor dispensando o elemento da imprevisibilidade. O consumidor pode
pleitear a revisão do contrato quando a circunstância superveniente desequilibrar a base
objetiva do contrato, impondo-lhe prestação excessivamente onerosa. Como o CDC não exige
a imprevisibilidade para rediscutir os termos do contrato, a doutrina e a jurisprudência
denominam a teoria de “teoria da onerosidade excessiva”.

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

(...)

V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam


prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos
supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;

4.4 PRINCÍPIO DA FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO

Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos


limites da função social do contrato.

Os contratos devem ser interpretados de acordo com a concepção do meio social onde estão
inseridos, não trazendo onerosidades excessivas às partes contratantes, garantindo que a
igualdade entre elas seja respeitada, mantendo a justiça contratual e equilibrando a relação
onde houver preponderância da situação de um dos contratantes sobre a do outro.

À luz da personalização e constitucionalização do direito civil, pode-se afirmar que a real


função social do contrato não é a segurança jurídica, mas sim atender os interesses da pessoa
humana. Desta forma, pode-se conceituar o PRINCÍPIO DA FUNÇÃO SOCIAL DO
CONTRATO como regramento contratual, de ordem pública, pelo qual o contrato deve ser,
necessariamente analisado e interpretado de acordo com o contexto da sociedade.

Art. 2035, § único. Nenhuma convenção prevalecerá se contrariar


preceitos de ordem pública, tais como os estabelecidos por este
Código para assegurar a função social da propriedade e dos
contratos.

Trata-se de norma de direito intertemporal que revelou a manifestação inequívoca do legislador


em privilegiar os preceitos de ordem pública relacionados com a proteção da função social da
propriedade em sentido amplo e estrito e a função social da propriedade.

Quando se lê “convenção” pode-se enquadrar qualquer ato jurídico celebrado, inclusive os


negócios jurídicos celebrados antes da entrada em vigor do novo CC.

O § único do art. 2035 CC, é um dispositivo de suma importância para a função social do
contrato pois:

a) Compara a função social dos contratos à função social da propriedade stricto sensu,
dotando a primeira de fundamento constitucional.
b) Prevê expressamente que a função social dos contratos é preceito de ordem pública,
o que faz com que caiba sempre declarar a sua proteção ex officio, pelo magistrado e
eventual intervenção do MP.
c) Traz em seu bojo o principio da retroatividade motivada ou justificada, princípio anexo à
função social dos contratos.

Dupla eficácia do princípio da função social dos contratos:

 Eficácia Interna
o Proteção dos vulneráveis contratuais
o Vedação da onerosidade excessiva ou desiquilíbrio contratual (efeito gangorra)
o Proteção da dignidade humana e dos direitos da personalidade
o Nulidade de cláusulas antissociais, tidas como abusivas
o Tendência de conservação contratual, sendo a extinção a última medida

 Eficácia Externa
o Proteção dos direitos difusos e coletivos
o Tutela externa do crédito

Dispositivos do CC/2002 consagradores da função social dos contratos:


O dispositivo visa amparar ao
Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura comprador economicamente
pública é essencial à validade dos negócios jurídicos destituído que muitas vezes não
que visem à constituição, transferência, modificação ou possui recursos para dispor quanto
renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor às despesas da escritura.
superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente
no País.

Trata da anulabilidade do contrato


Art. 157. Ocorre a lesão quando uma pessoa, sob por lesão subjetiva, novo vício do
premente necessidade, ou por inexperiência, se obriga negócio jurídico, mas que tem
a prestação manifestamente desproporcional ao valor repercussões sociais, diante da
da prestação oposta. relativização da força obrigatória. A
lesão subjetiva está presente
§ 1o Aprecia-se a desproporção das prestações sempre que o contrato trouxer
segundo os valores vigentes ao tempo em que foi onerosidade excessiva + premente
celebrado o negócio jurídico. necessidade ou inexperiência de
quem celebrou o pacto.
§ 2o Não se decretará a anulação do negócio, se for
oferecido suplemento suficiente, ou se a parte Segundo a doutrina, é facultado à
favorecida concordar com a redução do proveito. parte requerer a revisão do contrato
(princípio da conservação
contratual).

Traz em seu conteúdo a


Art. 170. Se, porém, o negócio jurídico nulo contiver os conservação e a função social que
requisitos de outro, subsistirá este quando o fim a que possibilita a conversão do negócio
visavam as partes permitir supor que o teriam querido, nulo, desde que preenchidos os
se houvessem previsto a nulidade. requisitos legais.

A função social do contrato também


Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um é reconhecida no art. 187 CC, que
direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os imputa responsabilidade civil àquele
limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela que age com abuso de direito. Este
boa-fé ou pelos bons costumes. dispositivo também se relaciona com
a boa-fé objetiva.

Trata-se de inovação de ordem


Art. 423. Quando houver no contrato de adesão pública e com interesse social
cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar relevante, assim como o seu
a interpretação mais favorável ao aderente. correspondente no CDC. A referida
proteção poderá ser declarada de
oficio sem a necessidade argüição
Art. 424. Nos contratos de adesão, são nulas as pela parte.
cláusulas que estipulem a renúncia antecipada do
aderente a direito resultante da natureza do negócio.

4.5 PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA

BOA-FÉ SUBJETIVA BOA-FÉ OBJETIVA

Trata-se de um estado psicológico de É uma cláusula geral implícita em todos os


inocência. É a boa-fé do “eu não sabia”, ou contratos, ela tem status principiológico, e que
seja, o indivíduo ignora o possível vício. se traduz em uma regra de conteúdo ético e
EXEMPLO: posse de boa-fé. exigibilidade jurídica.

Relaciona-se exclusivamente com a intenção CONCEITO: É a exigência de conduta leal dos


do sujeito. contratantes.

A boa-fé objetiva está relacionada com os deveres anexos ou laterais de conduta que são
ínsitos a qualquer negócio jurídico, não havendo sequer a necessidade de previsão no
instrumento negocial. Assim, pode-se dizer que o contrato será sempre complexo, pois
composto de uma obrigação principal + deveres anexos referentes à boa-fé objetiva.

Os deveres anexos podem ser observados durante todo o curso ou desenvolvimento da


relação jurídica e em certos casos posteriormente ao adimplemento da obrigação principal.

Assim, acrescenta-se mais uma forma de inadimplemento contratual à mora e ao


inadimplemento absoluto, a quebra dos deveres anexos gera violação positiva do contrato,
com responsabilização civil daquele que desrespeita a boa-fé objetiva, independentemente da
comprovação de culpa.

A constatação de que existem no vínculo obrigacional, o que a doutrina tem chamado dos
DEVERES INSTRUMENTAIS, DEVERES SECUNDÁRIOS, DEVERES ANEXOS ou
DEVERES COLATERAIS8. Queiram as partes ou não, esses deveres, que enriquecem o
vínculo obrigacional além da obrigação principal prevista, são deveres de conduta de lealdade,
por exemplo, são deveres de informação, de sigilo, de cuidado, de colaboração; são deveres
de comportamento que visam a garantir que o vínculo patrimonial irá se desenvolver de forma
mais honesta e solidária; esses deveres decorrem do PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA
(standard de comportamento honesto e leal).

São exemplos de deveres anexos:

a) Dever de cuidado em relação à outra parte negocial;


b) Dever de respeito;
c) Dever de informar a outra parte sobre o conteúdo do negócio;
d) Dever de agir conforme a confiança depositada;
e) Dever de lealdade e probidade;
f) Dever de colaboração ou cooperação;
g) Dever de agir com honestidade;
h) Dever de agir conforme a razoabilidade, a equidade e a boa razão.

O dever anexo de cuidado/proteção impõe às partes a adoção de medidas necessárias a fim


de evitar que a outra parte perceba danos ao seu patrimônio ou pessoa.

8 Wanderlei de Paula Barreto: Professor da Universidade Estadual de Maringá. O ordenamento civil obrigacional brasileiro não
contém normas específicas e tampouco outras adequadas para regular hipóteses do chamado adimplemento ruim ou
insatisfatório e das denominadas violações positivas do contrato. As recentes normas sobre a boa-fé objetiva (artigos. 113 e 422
do Código Civil de 2002) e sobre o abuso de direito (art. 187 do mesmo Código, que se vale, entre outros, da boa-fé como valor
paradigma para aferir o abuso de direito) introduziram fundamento legal para a admissibilidade de deveres secundários nos
negócios jurídicos e nos contratos. Enquanto as obrigações principais ou primárias pressupõem violação culposa para ensejar
responsabilidade pela indenização, os denominados deveres anexos ou secundários consideram-se violados objetivamente.
Já os deveres acessórios de informação tornam obrigatórios às partes, a prestação de
informações relevantes ao contrato, sendo essa obrigação considerada reciprocamente entre
elas.

Finalmente, o dever anexo de lealdade obriga as partes a evitar a adoção de condutas que
possam tornar inútil à contraparte, a prestação a ser cumprida. Contudo, deve-se ressaltar que
esses deveres anexos de lealdade, informação e proteção, encontram-se implícitos nos
contratos

FUNÇÕES DA BOA-FÉ OBJETIVA:

 Função de Interpretação (art. 113, CC): os contratos devem ser interpretados da


maneira mais favorável a quem esteja de boa-fé.
 Função de Controle (art. 187, CC): aquele que viola a boa-fé objetiva no exercício de
um direito comete abuso de direito (que equivale a um ilícito).
 Função de Integração (art. 422, CC): a boa-fé objetiva deve integrar todas as fases
contratuais, desde a fase pré-contratual (apesar de o artigo não mencionar), passando
pela fase contratual e chegando à fase pós-contratual.

Exemplos:

Fase Pré-contratual: “Caso dos Tomates” envolvendo a empresa CICA (TJRS, década de 90).
Sem nada escrito, a empresa CICA distribuía sementes de tomates aos produtores gaúchos
para plantação. Eles plantavam as sementes e após vendiam os tomates para a empresa. Isso
se repetia ano a ano, até que certo ano a CICA distribuiu as sementes, os produtores
plantaram e a empresa não comprou os tomates. Os produtores foram indenizados por quebra
da confiança.

Fase Contratual: Súmula 308, STJ = a boa-fé objetiva “vence” a hipoteca.

Súmula 308 – “A HIPOTECA FIRMADA ENTRE A CONSTRUTORA E O AGENTE


FINANCEIRO, ANTERIOR OU POSTERIOR À CELEBRAÇÃO DA PROMESSA DE COMPRA
E VENDA, NÃO TEM EFICÁCIA PERANTE OS ADQUIRENTES DO IMÓVEL.”

Fase Pós-contratual: o credor tem o dever de retirar o nome do devedor de cadastro negativo
no prazo de 05 dias úteis após acordo ou pagamento da dívida (art. 43, CDC).

CONSUMIDOR. INSCRIÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. QUITAÇÃO DA DÍVIDA.


CANCELAMENTO DO REGISTRO. OBRIGAÇÃO DO CREDOR. PRAZO. NEGLIGÊNCIA.
DANO MORAL. PRESUNÇÃO. 1. Cabe às entidades credoras que fazem uso dos serviços de
cadastro de proteção ao crédito mantê-los atualizados, de sorte que uma vez recebido o
pagamento da dívida, devem providenciar o cancelamento do registro negativo do devedor.
Precedentes. 2. Quitada a dívida pelo devedor, a exclusão do seu nome deverá ser requerida
pelo credor no prazo de 05 dias, contados da data em que houver o pagamento efetivo, sendo
certo que as quitações realizadas mediante cheque, boleto bancário, transferência
interbancária ou outro meio sujeito a confirmação, dependerão do efetivo ingresso do
numerário na esfera de disponibilidade do credor. 3. Nada impede que as partes, atentas às
peculiaridades de cada caso, estipulem prazo diverso do ora estabelecido, desde que não se
configure uma prorrogação abusiva desse termo pelo fornecedor em detrimento do
consumidor, sobretudo em se tratando de contratos de adesão. 4. A inércia do credor em
promover a atualização dos dados cadastrais, apontando o pagamento, e consequentemente,
o cancelamento do registro indevido, gera o dever de indenizar, independentemente da prova
do abalo sofrido pelo autor, sob forma de dano presumido. Precedentes. 5. Recurso especial
provido. (REsp 1.149.998 – RS, RELATORA MINISTRA NANCY ANDRIGHI, 3ª Turma, DJe
14/08/2012).

4.5.1 TEORIAS RELEVANTES PARA OS CONTRATOS: SUPRESSIO, SURRECTIO, TU


QUOQUE e VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM NO POTEST

À ideia de “supressio”, “surrectio”, “tu quoque”, “venire contra factum proprium no potest”
necessita, preliminarmente, de uma exata compreensão sobre o princípio da confiança e sobre
abuso de direito.

A confiança instalada nas tratativas e execuções de um negócio jurídico, expõem o sujeito a


uma correspondência de considerações éticas e morais. Por outro lado, defraudada a pessoa
da confiança depositada, desenvolve-se uma instabilidade social, que deve ser, desde logo,
refutada do convívio social.

A proteção conferida a confiança se revela, assim, num princípio fundamental de concretização


da boa-fé, onde o Direito deve proteger o investimento confiado pelos indivíduos. Logo, a
confiança guardada pelas partes, merece uma tutela jurídica específica, já que não pode ficar
descampada de uma eventual frustração. Essa proteção, de um modo geral, em nosso
ordenamento jurídico deriva de um preceito constitucional fundamental, inerente a todos os
indivíduos, que assegura um acesso irrestrito ao Poder Judiciário, pela lesão sofrida, sendo
outrossim, exercitável através do direito de petição (art. 5º, XXXIV e XXXV, CF).

Portanto, sendo legítima a expectativa criada, e por ser a boa-fé uma cláusula geral inserida no
ordenamento jurídico brasileiro, a tutela jurídica ampara o sujeito que teve a sua confiança
violada, conforme, por exemplo, é a vedação do “venire contra factum proprium”. Igualmente, o
abuso do direito decorre da violação de um direito subjetivo, cuja conceituação varia conforme
a maioria da doutrina. Logo, em rápida síntese, direito subjetivo é aquele conferido ao indivíduo
que visa à satisfação dos próprios interesses. Desse modo, visando o direito subjetivo à
satisfação de determinados interesses, da sua violação verifica-se o seu abuso, ou seja, dá-se
o abuso de direito toda vez que um interesse se sobrepujar ao interesse reciprocamente
contraposto na relação jurídica. A conjectura gerada pela violação do princípio da confiança,
respaldada na cláusula geral da boa-fé (art. 422, CC), como o abuso de direito, tutelado pela
responsabilidade civil dos atos ilícitos, transpõem-se de uma responsabilidade meramente
subjetiva, para uma responsabilidade que independe de culpa. Ou seja, a ilicitude do ato
praticado com abuso de direito possui natureza objetiva, auferível independentemente de culpa
ou dolo.

O “VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM” é uma vedação decorrente do princípio da


confiança. Trata-se de um tipo de ato abusivo de direito. Referida vedação assegura a
manutenção da situação de confiança legitimamente criada nas relações jurídicas contratuais,
onde não se admite a adoção de condutas contraditórias. Trata-se de “uma regra de coerência,
por meio do qual se veda que se aja em determinado momento de uma certa maneira e,
ulteriormente, adote-se um comportamento que frustra, vai contra aquela conduta tomada em
primeiro lugar”. Portanto, o “venire contra factum proprium no potest” significa a proibição de ir
contra fatos próprios já praticados.
A título de exemplo, é a situação em que o credor, durante anos, aceita o pagamento da
obrigação em data posterior ao do vencimento estipulado no contrato – configurando-se uma
violação deste – e, depois, vem pleitear a rescisão contratual com base na conduta
anteriormente, por ele, tolerada. O Superior Tribunal de Justiça abriu precedente de aplicação
do venire contra factum proprium¸ antes mesmo do advento do Novo Código Civil, em julgado
que afastou a possibilidade de anulação de compra e venda de um imóvel, celebrado somente
pelo marido sem a outorga uxória, uma vez que a própria esposa declarou, como testemunha,
em outro processo, a anuência tácita à venda.

Já as expressões “surrectio” e “supressio” são classificações dadas em Portugal às expressões


“verwirkung” e “erwirkung”, originárias da Alemanha. A “SUPRESSIO” refere-se ao fenômeno
da supressão de determinadas relações jurídicas pelo decurso do tempo. A “SURRECTIO”,
por sua vez, consagra o fenômeno inverso, ou seja, o surgimento de uma prática de usos e
costumes locais. Assim, tanto a “supressio” como a “surrectio” consagram formas de perda e
aquisição de direito pelo decurso do tempo. Por outro lado, essas aquisições e restrições, em
nosso ordenamento jurídico, somente são admitidos mediante expressa disposição de lei,
como se vê no art. 1.238 que trata da aquisição de propriedade pela usucapião extraordinária,
bem como pelos arts. 205 e 206, do Código Civil, que tratam de prescrição extintiva, uma vez
que a prescrição consiste na aquisição ou extinção de direitos, pelo decurso do tempo. É
admitido, outrossim, a aquisição ou perda de direitos – “surrectio” ou “supressio”,
respectivamente – pelo transcurso do tempo, em nosso ordenamento jurídico, desde de que a
ele se relacionam uma situação de confiança, investida numa relação jurídica. Portanto, o
transcurso de tempo, como forma de aquisição ou perda de um direito, afora das previsões
legais, somente é possível mediante à conjugação do “venire contra factum proprium no
potest”.

Encontra-se exemplo de “supressio” e “surrectio”, assim, como bem acertadamente expõe


Maria Helena Diniz, no art. 330 do Código Civil, ao dispor que se o devedor efetuar,
reiteradamente o pagamento da prestação em lugar diverso do estipulado no negócio jurídico,
há presunção “juris tantum” de que o credor a ele renunciou, baseado no princípio da boa-fé
objetiva e nessas formas de aquisição e perda de direito pelo decurso do tempo.

Consequentemente, se o devedor efetuar o pagamento em local diverso do previsto no


contrato, de forma reiterada, surge o direito subjetivo de assim continuar fazendo-o – “surrectio”
– e o credor não poderá contrariá-lo, pois houve a perda do direito – “supressio” -, desde que,
contudo, com observância do “venire contra factum proprium no potest”. Desse modo, a
“surrectio”, nas palavras de Menezes de Cordeiro “é o instituto que faz surgir um direito que
não existe juridicamente, mas que tem existência na efetividade social”

Com relação ao “TU QUOQUE”, é esta expressão que, de fato, revela os deveres anexos de
uma relação contratual, decorrentes da boa-fé. Essa locução é designativa de uma situação
gerada de um abuso de direito, que se verifica quando uma das partes viola a norma jurídica e,
após, tenta aproveitar-se dessa conduta em benefício próprio, que conforme o brocardo
“turpitudinem suam allegans non auditur” – o sujeito não pode valer-se da própria torpeza -,
que é vedada pelo direito. Assim, quem viola as suas obrigações contratuais não pode se valer
da sua própria falta para se favorecer diante da contra parte. Assim, conforme o Enunciado nº
24 do Conselho Superior da Justiça Federal, a violação dos deveres anexos decorrentes da
cláusula geral da boa-fé objetiva, constitui-se espécie de inadimplemento, independentemente
de culpa.

Afirma, neste contexto, Menezes de Cordeiro que “a pessoa que, mesmo fora do caso
nuclearmente exemplar do sinalagma, desequilibre, num momento prévio, a regulação material
instituída, expressa, mas só em parte, no seu direito subjetivo, não pode pois pretender, como
se nada houvesse ocorrido, exercer a posição que a ordem jurídica lhe conferiu. Distorcido o
equilíbrio da base, sofre-lhe a consequência”. Consequentemente, chega-se à conclusão de
que tanto o “tu quoque” como o “venire contra factum proprium no potest” são autênticos
representantes dos deveres anexos implícitos nos contratos, que devem ser observados à
integralização pela boa-fé objetiva. Logo, da sua não observância que configura uma
usurpação dissimulada de uma conduta juridicamente válida, como visto, acarreta numa
responsabilização objetiva desse inadimplemento contratual. Por outro lado, o “venire contra
factum no potest representa”, também, diametralmente, um nexo de ligação da “supressio” e da
“surrectio”, para que essas formas de aquisição e extinção de direitos possam ser validamente
considerados, uma vez que, repita-se, essas formas de criação e perda de direitos, pelo
decurso do tempo, somente são abarcadas como legítimas, em nosso ordenamento jurídico,
mediante expressa disposição legal.

4.6 EQUIVALÊNCIA MATERIAL

O princípio da equivalência material busca realizar e preservar o equilíbrio real de direitos e


deveres no contrato, antes, durante e após sua execução, para harmonização dos interesses.
Assim, o princípio pacta sunt servanda passa a ser entendido no sentido de que o contrato
obriga as partes contratantes nos limites do equilíbrio dos direitos e deveres entre elas.

Para alguns autores (ex.: PAULO LUIZ NETTO LOBO) é princípio; para outros (ex.: PABLO
STOLZE E RODOLFO PAMPLONA) é “subproduto normativo do princípio maior, senão axial,
da função social do contrato.”

5 FORMAÇÃO DOS CONTRATOS

Os contratos são a convergência de duas vontades contrapostas:

A parte que faz a proposta (POLICITAMENTO) é a parte PROPONENTE, POLICITANTE ou


SOLICITANTE. A parte que aceita é chamada de POLICITADO, ACEITANTE, OBLATO OU
SOLICITADO.

Declaração receptícia de vontade: só surte efeitos quando do conhecimento da parte


contrária.

Proposta trata-se de uma declaração receptícia de vontade, séria e concreta, dirigida ao


aceitante. A proposta obriga o proponente, salvo nas hipóteses em que a própria lei afirma que
a proposta não é obrigatória.

Art. 427. A proposta de contrato obriga o proponente, se o


contrário não resultar dos termos dela, da natureza do negócio, ou
das circunstâncias do caso.

RESULTAR DOS TERMOS DELA = previsão de desistência.


NATUREZA DO NEGÓCIO = limitação de estoque.

CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO = conceito aberto que será avaliado


pelo juiz. EXEMPLO: proposta jocosa, feita de brincadeira.

Art. 428. Deixa de ser obrigatória a proposta:

I - se, feita sem prazo a pessoa presente, não foi imediatamente


aceita. Considera-se também presente a pessoa que contrata por
telefone ou por meio de comunicação semelhante;

II - se, feita sem prazo a pessoa ausente, tiver decorrido tempo


suficiente para chegar a resposta ao conhecimento do
proponente;

III - se, feita a pessoa ausente, não tiver sido expedida a resposta
dentro do prazo dado;

IV - se, antes dela, ou simultaneamente, chegar ao conhecimento


da outra parte a retratação do proponente.

Art. 429. A oferta ao público equivale a proposta quando encerra


os requisitos essenciais ao contrato, salvo se o contrário resultar
das circunstâncias ou dos usos.

Parágrafo único. Pode revogar-se a oferta pela mesma via de sua


divulgação, desde que ressalvada esta faculdade na oferta
realizada.

A proposta entre presentes é aquela feita entre pessoas que mantém contato direto e
simultâneo uma com a outra. Entre ausentes, todavia, a proposta pressupõe não haver contato
direto e imediato entre as partes. EXEMPLOS ENTRE PRESENTES: telefone e internet.
EXEMPLO ENTRE AUSENTES: por carta ou por e-mail.

A aceitação é a manifestação concordante do oblato. O consentimento somente existe com a


aceitação da proposta.

Se o aceitante modificar a proposta ele estará fazendo uma contraproposta.

4.1 TEORIAS DA FORMAÇÃO

O maior problema que temos na matéria de contratos é formação de contratos entre ausentes,
digladiando-se a doutrina ao sabor de 02 teorias: TEORIA DA COGNIÇÃO e TEORIA DA
AGNIÇÃO.

Fundamentalmente, a doutrina criou duas teorias explicativas a respeito da formação do


contrato entre ausentes:
4.1.1 teoria da cognição: para os adeptos dessa linha de pensamento, o contrato entre
ausentes somente se consideraria formado, quando a resposta do aceitante chegasse ao
conhecimento do proponente. CRÍTICA: não se sabe qual o exato momento em que o
proponente tomou conhecimento da aceitação.

4.1.2 teoria da agnição: dispensa-se que a resposta chegue ao conhecimento do proponente.


Subdivide-se em:

4.1.2.1 sub-teoria da declaração propriamente dita: o contrato se formaria no momento em


que o aceitante ou oblato redige a sua resposta. Peca por ser extremamente insegura, dada
a dificuldade em se precisar o instante da resposta.

4.1.2.2 sub-teoria da expedição: considera formado o contrato, no momento em que a


resposta é expedida.

4.1.2.3 sub-teoria da recepção: reputa celebrado o negócio no instante em que o


proponente recebe a resposta. Dispensa, como vimos, que leia a mesma. Trata-se de uma
subteoria mais segura do que as demais, pois a sua comprovação é menos dificultosa,
podendo ser provada, por exemplo, por meio do A.R. (aviso de recebimento), nas
correspondências.

Mas, afinal, qual seria a teoria adotada pelo nosso direito positivo?

No Direito brasileiro, parte da doutrina entende que se deve aplicar a subteoria da EXPEDIÇÃO
e outra parte sustenta que se deve aplicar a subteoria da RECEPÇÃO.

CLÓVIS BEVILÁQUA, autor do anteprojeto do Código Civil de 1916 era, nitidamente, adepto da
subteoria da expedição, por reputá-la “a mais razoável e a mais jurídica”. Por isso, boa parte
da doutrina brasileira, debruçando-se sobre o art. 1086 do Código revogado, concluía tratar-se
de dispositivo afinado com o pensamento de CLÓVIS;

Art. 1086 (caput). Os contratos por correspondência epistolar, ou


telegráfica, tornam-se perfeitos desde que a aceitação é expedida.

Na mesma linha, se cotejarmos esse dispositivo com o correspondente do Código em vigor,


teremos a nítida impressão de que foi adotada a vertente teórica da expedição:

Art. 434. Os contratos entre ausentes tornam-se perfeitos desde


que a aceitação é expedida, exceto:

I - no caso do artigo antecedente;


II - se o proponente se houver comprometido a esperar resposta;

III - se ela não chegar no prazo convencionado.

Note-se, entretanto, que o referido dispositivo enumera situações em que o contrato não se
reputará celebrado a partir da expedição da aceitação: no caso do art. 433; se o proponente se
houver comprometido a esperar a resposta (nesta hipótese, o próprio policitante comprometeu-
se a aguardar a manifestação do oblato); ou, finalmente, se a resposta não chegar no prazo
assinado pelo policitante.

Art. 433. Considera-se inexistente a aceitação, se antes dela ou


com ela chegar ao proponente a retratação do aceitante.

Ocorre que se nós observarmos a ressalva constante no inciso I desse artigo, que faz remissão
ao art. 433, chegaremos à inarredável conclusão de que a aceitação não se reputará existente,
se antes dela ou com ela chegar ao proponente a retratação do aceitante. Atente para essa
expressão: “se antes dela ou com ela CHEGAR ao proponente a retratação do aceitante”.

OBS: Por tais comandos legais, é correto afirmar que o Código Civil de 2002 adotou tanto a
teoria da expedição quanto a da recepção, sendo a primeira regra e a segunda exceção, de
acordo com a própria organização da matéria no Código em vigor. A grande dúvida reside
sobre a formação do contrato eletrônico celebrado entre ausentes, como é o caso da
contratação por e-mail, segundo o entendimento majoritário. O que prevalece na doutrina
nacional é a aplicação da teoria da recepção, o que pode ser retirado do Enunciado n. 173 do
CJF/STJ, aprovado na III Jornada de Direito Civil: “A formação dos contratos realizados entre
pessoas ausentes, por meio eletrônico, completa-se com a recepção da aceitação pelo
proponente”. De toda sorte, alerte-se que o Projeto de Lei 281/2012, que pretende tratar dos
contratos eletrônicos dentro do Código de Defesa do Consumidor, propõe a inserção, em
nosso sistema, da teoria da confirmação, chamada na Europa de teoria do duplo clique.
Por essa teoria, o contrato eletrônico é formado com a confirmação do recebimento da
aceitação pelo proponente originário.

6 VÍCIOS REDIBITÓRIOS

6.1 CONCEITO

Os vícios redibitórios, por definição, são defeitos ocultos que diminuem o valor ou
prejudicam a utilização da coisa recebida por força de um contrato comutativo (é o
contrato que tem regras certas, sendo o oposto ao contrato aleatório). EXEMPLO: aparelho de
celular que não aceita determinadas ligações (matéria que tem regramento próprio pelo CDC).

DOS VÍCIOS REDIBITÓRIOS

Art. 441. A coisa recebida em virtude de contrato comutativo pode


ser enjeitada por vícios ou defeitos ocultos, que a tornem
imprópria ao uso a que é destinada, ou lhe diminuam o valor.

Parágrafo único. É aplicável a disposição deste artigo às doações


onerosas.
6.2 REQUISITOS

Poderíamos, assim, elencar os seguintes elementos caracterizadores ou requisitos do vício


redibitório:

a) a existência de um contrato bilateral, comutativo e oneroso;

b) um defeito oculto existente no momento da tradição;

c) a diminuição do valor econômico ou o prejuízo à adequada utilização da coisa.

6.3 FUNDAMENTO

A regulação dos vícios redibitórios é uma garantia para o adquirente.

6.4 AÇÕES EDILÍCIAS

Diante da ocorrência dos vícios redibitórios, o adquirente pode propor dois tipos de ação (não
cumuláveis: TRF1), há um concurso de ações:

6.4.1 ação redibitória: rejeição da coisa. As perdas e danos estão referidas no artigo 443:

Art. 443. Se o alienante conhecia o vício ou defeito da coisa,


restituirá o que recebeu com perdas e danos; se o não conhecia,
tão-somente restituirá o valor recebido, mais as despesas do
contrato.

6.4.2 ação estimatória ou ação quanti minoris: abatimento (artigo 442)

Art. 442. Em vez de rejeitar a coisa, redibindo o contrato (art. 441),


pode o adquirente reclamar abatimento no preço.

Prazos para a propositura das ações edilícia foram dos poucos prazos que foram aumentados
(artigo 445):

Art. 445. O adquirente decai do direito de obter a redibição ou


abatimento no preço no prazo de trinta dias se a coisa for móvel, e
de um ano se for imóvel, contado da entrega efetiva; se já estava
na posse, o prazo conta-se da alienação, reduzido à metade.
§ 1o Quando o vício, por sua natureza, só puder ser conhecido
mais tarde, o prazo contar-se-á do momento em que dele tiver
ciência, até o prazo máximo de cento e oitenta dias, em se
tratando de bens móveis; e de um ano, para os imóveis. (PARA O
CASO DE VÍCIO REDIBITÓRIO SÓ SE MANIFESTAR DEPOIS)

§ 2o Tratando-se de venda de animais, os prazos de garantia por


vícios ocultos serão os estabelecidos em lei especial, ou, na falta
desta, pelos usos locais, aplicando-se o disposto no parágrafo
antecedente se não houver regras disciplinando a matéria.

São prazos decadenciais:

BEM 15 DIAS
30 DIAS
MÓVEL Contado da SE JÁ
Contado da
entrega ESTAVA NA
BEM alienação
01 ANO efetiva POSSE
IMÓVEL 6 MESES

O legislador entende que se o adquirente já estava na posse, já conhecia a coisa, então deve
ter um prazo menor para ingressar com ação contra o alienante. EXEMPLO: pessoa que mora
em imóvel por comodato, sendo que o comodatário decide adquirir o imóvel, será aplicado o
prazo menor.

CRÍTICA: a lei não estabeleceu um prazo mínimo da posse, assim pela letra fria da lei até o
prazo de posse de 01 dia seria suficiente para a perda da metade do prazo decadencial. Assim
seria justo que o legislador estabelecesse um período de tempo suficiente para o efeito de
perda da metade do prazo, na hipótese prevista na segunda parte do artigo 445.

Há GARANTIA LEGAL (essa estabelecida nos artigos acima), mas há também a GARANTIA
CONTRATUAL. Enquanto o prazo de GARANTIA CONTRATUAL está em curso, o prazo de
garantia legal está suspenso, nos termos do artigo 446, CC, que deve ser aplicado também às
relações de consumo, já que não há regulação no CDC.

Art. 446. Não correrão os prazos do artigo antecedente na


constância de cláusula de garantia; mas o adquirente deve
denunciar o defeito ao alienante nos trinta dias seguintes ao seu
descobrimento, sob pena de decadência.

Art. 444. A responsabilidade do alienante subsiste ainda que a


coisa pereça em poder do alienatário, se perecer por vício oculto,
já existente ao tempo da tradição.
7 EVICÇÃO

7.1 CONCEITO

A evicção, prevista como garantia legal do adquirente, ocorre quando o adquirente vem a
perder a posse e a propriedade da coisa, em virtude do reconhecimento judicial ou
administrativo do direito anterior de terceiro. Consiste a evicção na perda, pelo adquirente
(evicto), da posse ou propriedade da coisa transferida, por força de uma sentença judicial ou
ato administrativo que reconheceu o direito anterior de terceiro, denominado evictor.

Em nosso Código Civil, a evicção é disciplinada a partir do seu art. 447 (art. 1107, CC-16):

Art. 447. Nos contratos onerosos, o alienante responde pela


evicção. Subsiste esta garantia ainda que a aquisição se tenha
realizado em hasta pública.

(QUEM SERÁ O RESPONSÁVEL? É O DEVEDOR PORQUE O BEM


FOI ARREMATADO PARA PAGAR UMA DÍVIDA SUA; MAS HÁ
AUTORES QUE DEFENDEM QUE A RESPONSABILIDADE É DO
CREDOR, QUE FOI ELE QUEM RECEBEU O VALOR; MAS HÁ
QUEM DIGA QUE A RESPONSABILIDADE PODE SER DO ESTADO,
QUE NÃO PESQUISOU PARA SABER SE O BEM PODERIA SER
LEVADO À HASTA PÚBLICA).

Personagens fundamentais:

a) ALIENANTE: que responde pelo risco da evicção.

b) ADQUIRENTE ou EVICTO: que é a pessoa que perde a coisa.

c) TERCEIRO ou EVICTOR: que é a pessoa que reivindica a coisa provando direito


anterior.

A mesma sentença que condena o adquirente a devolver, determina que o alienante responda
junto ao adquirente.

(CPC) Art. 70. A denunciação da lide é obrigatória:

I - ao alienante, na ação em que terceiro reivindica a coisa, cujo


domínio foi transferido à parte, a fim de que esta possa exercer o
direito que da evicção Ihe resulta;

II - ao proprietário ou ao possuidor indireto quando, por força de


obrigação ou direito, em casos como o do usufrutuário, do credor
pignoratício, do locatário, o réu, citado em nome próprio, exerça a
posse direta da coisa demandada;
III - àquele que estiver obrigado, pela lei ou pelo contrato, a
indenizar, em ação regressiva, o prejuízo do que perder a
demanda.

No aspecto processual, em que pese a letra da lei, o STJ entende que ainda assim NÃO é um
caso de denunciação obrigatória.

PROCESSO CIVIL. DIREITO CIVIL. EXERCÍCIO DOS DIREITOS ADVINDOS DA EVICÇÃO.


DENUNCIAÇÃO DA LIDE. DESNECESSIDADE. TRÂNSITO EM JULGADO DA DECISÃO.
VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. (...) 7. O exercício do direito
oriundo da evicção independe da denunciação da lide ao alienante na ação em que
terceiro reivindica a coisa, sendo certo que tal omissão apenas acarretará para o réu a
perda da pretensão regressiva, privando-lhe da imediata obtenção do título executivo
contra o obrigado regressivamente, restando-lhe, ainda, o ajuizamento de demanda
autônoma. Ademais, no caso, o adquirente não integrou a relação jurídico-processual que
culminou na decisão de ineficácia da alienação, haja vista se tratar de executivo fiscal, razão
pela qual não houve o descumprimento da cláusula contratual que previu o chamamento da
recorrente ao processo. 8. Recurso especial não provido. (REsp 1.332.112/GO, Ministro LUIS
FELIPE SALOMÃO, 4ª Turma, DJe 17/04/2013).

OBS: na redação do novo CPC (2015/16) a expressão “obrigatória” foi trocada por
“admissível”, o que corrobora o entendimento do STJ.

(NCPC) Art. 125. É admissível a denunciação da lide, promovida


por qualquer das partes:

I - ao alienante imediato, no processo relativo à coisa cujo domínio


foi transferido ao denunciante, a fim de que possa exercer os
direitos que da evicção lhe resultam;

7.2 RESPONSABILIDADE CIVIL DO ALIENANTE

A primeira parte do artigo 447 deixa bem claro quem responde pelos riscos: o alienante.

Art. 447. Nos contratos onerosos, o alienante responde pela


evicção. Subsiste esta garantia ainda que a aquisição se tenha
realizado em hasta pública.

E para que a sua responsabilidade se manifeste, três requisitos devem se conjugar:

a) aquisição de um bem;

b) perda da posse ou da propriedade;

c) prolação de sentença judicial ou execução de ato administrativo.


Art. 450. Salvo estipulação em contrário, tem direito o evicto, além
da restituição integral do preço ou das quantias que pagou:

I - à indenização dos frutos que tiver sido obrigado a restituir;

II - à indenização pelas despesas dos contratos e pelos prejuízos


que diretamente resultarem da evicção;

III - às custas judiciais e aos honorários do advogado por ele


constituído.

Parágrafo único. O preço, seja a evicção total ou parcial, será o do


valor da coisa, na época em que se evenceu, e proporcional ao
desfalque sofrido, no caso de evicção parcial.

7.3 EXCLUSÃO DA GARANTIA

O contrato pode aumentar a garantia da evicção além do estabelecido no artigo 450, da


mesma forma pode ser diminuída.

Art. 448. Podem as partes, por cláusula expressa, reforçar,


diminuir ou excluir a responsabilidade pela evicção.

A evicção pode ser até mesmo EXCLUÍDA, por admissão do CC. A exclusão pode ser: LEGAL
(artigo 457) ou CONVENCIONAL (artigo 449)

Art. 457. Não pode o adquirente demandar pela evicção, se sabia


que a coisa era alheia ou litigiosa.

Ora, se o adquirente sabia que a coisa era de terceiro, não pode demandar contra a evicção.

Art. 449. Não obstante a cláusula que exclui a garantia contra a


evicção, se esta se der, tem direito o evicto a receber o preço que
pagou pela coisa evicta, se não soube do risco da evicção, ou,
dele informado, não o assumiu.

O contrato pode dizer que o alienante não responde pela evicção (até poderia ser revisada sob
a luz do princípio da função social do contrato, mas a lei permite). Mas se isso ocorrer (cláusula
que exclui a garantia), o evicto terá pelo menos o direito a receber o PREÇO QUE PAGOU, o
que pode significar a não exclusão total da garantia. Entretanto, o contrato pode prever que o
adquirente ciente do ato está assumindo-o, o que implicará a total exclusão da garantia.

Para que haja a exclusão total da garantia (artigo 449), é preciso que o adquirente
expressamente tome ciência e assuma os riscos da evicção.
Resumindo:

 Cláusula expressa de exclusão da garantia + conhecimento do risco da evicção pelo


evicto = isenção de toda e qualquer responsabilidade por parte do alienante.
 Cláusula expressa de exclusão da garantia – ciência específica desse risco por parte
do adquirente = responsabilidade do alienante apenas pelo preço pago pelo adquirente
pela coisa evicta.
 Cláusula expressa de exclusão da garantia, sem que o adquirente haja assumido o
risco da evicção de que foi informado = direito deste de reaver o preço que
desembolsou.

DA EVICÇÃO

Art. 451. Subsiste para o alienante esta obrigação, ainda que a


coisa alienada esteja deteriorada, exceto havendo dolo do
adquirente.

Art. 452. Se o adquirente tiver auferido vantagens das


deteriorações, e não tiver sido condenado a indenizá-las, o valor
das vantagens será deduzido da quantia que lhe houver de dar o
alienante.

Art. 453. As benfeitorias necessárias ou úteis, não abonadas ao


que sofreu a evicção, serão pagas pelo alienante.

Art. 454. Se as benfeitorias abonadas ao que sofreu a evicção


tiverem sido feitas pelo alienante, o valor delas será levado em
conta na restituição devida.

Art. 455. Se parcial, mas considerável, for a evicção, poderá o


evicto optar entre a rescisão do contrato e a restituição da parte
do preço correspondente ao desfalque sofrido. Se não for
considerável, caberá somente direito a indenização.

Art. 456. Para poder exercitar o direito que da evicção lhe resulta,
o adquirente notificará do litígio o alienante imediato, ou qualquer
dos anteriores, quando e como lhe determinarem as leis do
processo.

Parágrafo único. Não atendendo o alienante à denunciação da lide,


e sendo manifesta a procedência da evicção, pode o adquirente
deixar de oferecer contestação, ou usar de recursos.

7.3. REFORÇO DA GARANTIA


Quanto ao reforço em relação à evicção, diante da vedação do enriquecimento sem causa,
bem como dos princípios da boa-fé e da função social dos contratos, tem-se entendido que o
limite é o dobro do valor da coisa.

8 CONTRATOS E O DIREITO INTEREMPORAL

O NOVO CÓDIGO CIVIL E OS CONTRATOS CELEBRADOS ANTES DA SUA VIGÊNCIA

Com a entrada em vigor do novo Código Civil, importantes problemas referentes ao Direito
Intertemporal poderão ser suscitados, exigindo do magistrado redobrada cautela. Um desses
problemas diz respeito à possibilidade de incidência da lei nova em contratos celebrados antes
de 11 de janeiro de 2003. Tentando dirimir eventual conflito de normas, o Código Civil, em seu
art. 2035, dispõe que:

Artigo 2035. A validade dos negócios e demais atos jurídicos,


constituídos antes da entrada em vigor deste Código, obedece ao
disposto nas leis anteriores, referidas no art. 2.045, mas os seus
efeitos, produzidos após a vigência deste Código, aos preceitos
dele se subordinam, salvo se houver sido prevista pelas partes
determinada forma de execução.

Parágrafo único. Nenhuma convenção prevalecerá se contrariar


preceitos de ordem pública, tais como os estabelecidos por este
Código para assegurar a função social da propriedade e dos
contratos.

Segundo esta regra, os negócios jurídicos celebrados antes da entrada em vigor do novo
Código continuarão regidos pelas leis anteriores (Código Civil de 1916, Código Comercial), no
que tange aos seus pressupostos de validade (nulidade e anulabilidade).

Destarte, tomando como exemplo um contrato de mútuo (empréstimo de coisa não fungível)
celebrado em 2000, não poderá o intérprete invocar os pressupostos de validade do art. 104 do
CC-02, eis que continuará a ser aplicada a regra anterior do código revogado (art. 82 – agente
capaz, objeto lícito, forma prescrita ou não defesa em lei).

Da mesma forma, não se deve pretender aplicar as regras da lesão e do estado de perigo
(defeitos do negócio jurídico), inauguradas pelo Código de 2002 (art. 156 e 157), restando ao
hermeneuta recorrer a outros meios de colmatação, eventualmente aplicáveis, e à luz da
disciplina normativa anterior.

Por tais razões, um contrato celebrado por um menor de 18 anos, antes de 11 de janeiro
(data da entrada em vigor do novo Código), continua sendo anulável (art. 147, I, CC-16), a
despeito da redução da maioridade civil (18 anos), eis que, à época da celebração do negócio,
segundo a lei então vigente, o ato seria considerado inválido.
Aliás, esta impossibilidade de retroação dos efeitos da lei nova para atingir a validez dos
negócios já celebrados apenas consubstancia a observância da regra constitucional que impõe
o respeito ao ato jurídico perfeito (art. 5°, XXXVI, CF).

No entanto, se, por um lado, não pode a lei nova atingir a validade dos negócios jurídicos já
constituídos, por outro, se os efeitos do ato penetrarem o âmbito de vigência do novo
Código, deverão se subordinar aos seus preceitos, salvo se houver sido prevista pelas
partes determinada forma de execução. Esta parte final do caput causa polêmica e abre
margem à insegurança jurídica. (MÁRIO DELGADO = direito intertemporal). (ANTONIO
JEOVÁ DOS SANTOS = a segunda parte é inconstitucional).

Para melhor entendê-lo, cumpre-nos marcar, neste ponto, um divisor de águas: quanto ao
aspecto de sua validade, não poderá o Código de 2002 atingir negócios celebrados antes da
sua vigência; no entanto, quanto ao seu aspecto eficacial, ou seja, de executoriedade ou
produção de seus efeitos, caso estes invadam o âmbito temporal de vigência da nova lei,
estarão a esta subordinados.

Um exemplo. Imaginemos um contrato de financiamento celebrado em 1999, de execução


repetida no tempo (trato sucessivo), em que o financiado se obrigou a pagar, mensalmente,
prestações pecuniárias à instituição financeira pelo prazo de 5 anos. Pois bem, entra em vigor
o novo Código Civil. Este, por expressa dicção legal, não poderá interferir na validade do
negócio celebrado, embora os efeitos do contrato – de execução protraída no tempo – se
sujeitem às suas normas (art. 2035). Com isso, regras como as relativas à “resolução por
onerosidade excessiva” (arts. 478 a 480), à “correção econômica das prestações pactuadas”
(art. 317), ao “aumento progressivo de prestações sucessivas” (art. 316), ou às “perdas e
danos” (arts. 402 a 405), para citar apenas alguns exemplos, poderão ser imediatamente
aplicadas aos negócios jurídicos já constituídos, por interferirem, apenas, em seu campo
eficacial ou de executoriedade. EXEMPLO: desconsideração da personalidade jurídica,
porque atinge o plano da eficácia.

Entretanto, nos termos da parte final do art. 2035, se as partes houverem previsto outra
forma de execução, a exemplo da execução instantânea (que se consuma imediatamente, em
um só ato), ou se afastaram a incidência de determinadas regras consagradas na lei nova –
que não tenham substrato de ordem pública – a exemplo do aumento progressivo das
prestações sucessivas, poderá ser evitada a incidência da nova lei.

Mas observe: determinadas normas, como a que prevê a resolução por onerosidade excessiva
ou a correção econômica das prestações pactuadas, por seu indiscutível caráter publicístico e
social, não podem, a prioristicamente, ser afastadas pela vontade das partes.

Finalmente, o parágrafo único do artigo sob comento, utilizando linguagem contundente,


determina que “nenhuma convenção prevalecerá se contrariar preceitos de ordem pública, tais
como os estabelecidos por este Código para assegurar a função social dos contratos e da
propriedade”.
Utilizando a expressão “nenhuma convenção”, o legislador impõe a todos os negócios
jurídicos, não importando se celebrados antes ou após a entrada em vigor do novo
Código, a fiel observância dos seus preceitos de ordem pública, especialmente a função
social da propriedade e dos contratos. Assim, contratos que violem regras ambientais ou a
utilização econômica racional do solo, assim como as convenções que infrinjam deveres
anexos decorrentes da cláusula de boa fé objetiva (lealdade, respeito, assistência,
confidencialidade, informação), expressamente prevista no art. 422 do novo Código, não
poderão prevalecer, ante a nova ordem civil.

Muitos autores têm defendido que por meio desse dispositivo, há a extinção de toda e qualquer
cláusula leonina.

9 EXTINÇÃO DOS CONTRATOS

9.1 FORMA NATURAL


É a execução do contrato, o próprio cumprimento do contrato.

9.2 CAUSAS ESPECIAIS DE DISSOLUÇÃO DO CONTRATO

Extinção por fatos ANTERIORES à celebração:

CLÁUSULA DE CLÁUSULA RESOLUTIVA


INVALIDADE CONTRATUAL
ARREPENDIMENTO EXPRESSA

Pode existir previsão no


negócio de uma cláusula
resolutiva expressa, podendo
Hipótese em que se estipula um evento futuro e incerto
Casos envolvendo contrato
que o negócio será extinto, (condição) acarretar a
nulo (nulidade absoluta) ou
mediante declaração unilateral extinção do contrato.
anulável (nulidade relativa ou
de vontade, se qualquer um Justamente porque essa
anulabilidade).
deles se arrepender. previsão consta da origem do
pacto é que há a extinção por
fato anterior ou
contemporâneo à celebração.

Extinção por fatos POSTERIORES à celebração:

RESILIÇÃO RESOLUÇÃO RESCISÃO

Tem dois sentidos:

Opera-se quando há o TEORIA CLÁSSICA


Opera-se quando houver (FRANCESCO MESSINEO):
desfazimento de um contrato
INADIMPLEMENTO, ou seja, opera-se quando houver
por simples manifestação de
quando uma das partes LESÃO ou ESTADO DE
vontade de uma ou de ambas
descumpre o contrato. PERIGO.
as partes.
TEORIA PRAGMÁTICA
(jurisprudência brasileira):
mesmo sentido de resolução.
Inexecução voluntária:
impossibilidade da prestação
“NÃO DÁ MAIS” por culpa ou dolo do devedor,
não interessa mais o vínculo podendo ocorrer tanto na
contratual obrigação de dar como nas
obrigações de fazer e de não
fazer.
Inexecução involuntária: fato
alheio à vontade dos
contratantes, ou seja, as
Aplica-se, especialmente, a hipóteses em que ocorrer a
contratos de atividades ou impossibilidade de
serviços por tempo cumprimento da obrigação em
indeterminado decorrência de caso fortuito
(evento totalmente imprevisível)
ou de força maior (evento
previsível, mas inevitável).
Por Onerosidade Excessiva:
EXEMPLOS: resilição de em decorrência de um evento
contrato de linha de celular ou extraordinário e imprevisível
de canal por assinatura ou que dificulte extremamente o
renúncia de mandato ou adimplemento do contrato,
manifestação do locatário de gerando a extinção do negócio
não continuar na locação. de execução diferida ou
continuada (trato sucessivo).

Cláusula resolutiva tácita:


decorre da lei e que gera a
Que nome se dá ao ato resolução do contrato em
jurídico que concretiza uma decorrência de um evento
resilição? Depende do tipo de futuro e incerto, geralmente
resilição: relacionado ao inadimplemento
BILATERAL: é o DISTRATO (condição). Como essa
UNILATERAL: é a cláusula decorre de lei,
DENÚNCIA necessita de interpelação
judicial para gerar efeitos
jurídicos (art. 474 do CC).
O que é EXCEPTIO NOM
ADIMPLENTI CONTRACTUS?

REQUISITO: notificação Trata-se de uma defesa


prévia para a denúncia, conferida à parte demandada,
(artigo 473, parágrafo único) no sentido de apontar o
descumprimento prévio da
prestação cabível à parte
adversa.

Extinção por morte de um dos contratantes:

Para algumas categorias negociais a morte de um dos contratantes pode gerar o fim do pacto.
Isso somente ocorre nos casos em que a parte contratual assume uma obrigação
personalíssima ou intuitu personae, sendo denominada cessação contratual, conforme
expressão de Orlando Gomes.

Em casos tais, o contrato se extingue de pleno direito, situação que ocorre, por exemplo, na
fiança. Para este contrato, os herdeiros não recebem como herança o encargo de ser fiador, só
respondendo até os limites da herança por dívidas eventualmente vencidas durante a vida do
seu antecessor (art. 836 do CC). Em reforço, a condição de fiador não se transmite, pois ele
tem apenas uma responsabilidade, sem que a dívida seja sua (“obligatio sem debitum” ou
“Haftung sem Schuld”).

10 CONTRATO DE ADESÃO

É uma técnica de contratação típica das sociedades de massa, na qual um dos pactuantes pré-
determina as cláusulas do negócio.

Ele possui as seguintes características:

 Uniformidade: as cláusulas são gerais e homogêneas para todas as pessoas.

 Pré-determinação unilateral: o conteúdo do contrato é pré-determinado.

 Rigidez: não há discussão sobre as cláusulas.

 Superioridade material de uma das partes: essa característica está presente em


quase todos os contratos de adesão.

Não se pode confundir o contrato de adesão com o contrato obrigatório. O último é não tanto
um contrato, mas uma determinação da lei. EXEMPLO: contrato de seguro obrigatório (só é
contrato no nome, mas não tem qualquer expressão de vontade); trata-se na verdade de uma
imposição da lei.

O NCC é muito tímido ao regular o contrato de adesão somente trata do assunto em dois
artigos 423 e 424:

Art. 423. Quando houver no contrato de adesão cláusulas


ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação
mais favorável ao aderente.

Art. 424. Nos contratos de adesão, são nulas as cláusulas que


estipulem a renúncia antecipada do aderente a direito resultante
da natureza do negócio.

OBS: nem sempre que houver contrato de adesão haverá uma relação de consumo.
11 CONTRATO COM PESSOA A DECLARAR

Surgiu na Idade Média. Era muito vergonhoso para os nobres comparecerem na praça para
fazer o contrato e também era vergonhoso fazer um contrato de mandato.

Atualmente esse contrato é mais uma cláusula do que um contrato em si. EXEMPLO 01: no
contrato de compra e venda, uma das partes pode indicar quem é a pessoa que vai assumir o
contrato. EXEMPLO 02: no contrato de locação que conste a pessoa que irá assumir (o locador
somente celebraria o contrato com pessoa jurídica e o locatário ainda não tinha constituído a
pessoa jurídica).

Não se trata de uma cessão contratual.

Segundo ORLANDO GOMES, trata-se de um contrato em que se introduz a cláusula PRO


AMICO ELIGENDO ou PRO AMICO ELECTO, por meio da qual uma das partes se reserva a
faculdade de indicar quem irá assumir a posição de contratante.

Art. 467. No momento da conclusão do contrato, pode uma das


partes reservar-se a faculdade de indicar a pessoa que deve
adquirir os direitos e assumir as obrigações dele decorrentes.

O contrato deve estabelecer qual é o prazo para a indicação. Não havendo prazo aplica-se o
artigo 468.

Art. 468. Essa indicação deve ser comunicada à outra parte no


prazo de cinco dias da conclusão do contrato, se outro não tiver
sido estipulado.

Parágrafo único. A aceitação da pessoa nomeada não será eficaz


se não se revestir da mesma forma que as partes usaram para o
contrato.

Há casos em que a cláusula perde a eficácia

Art. 470. O contrato será eficaz somente entre os contratantes


originários:

I - se não houver indicação de pessoa, ou se o nomeado se


recusar a aceitá-la;

II - se a pessoa nomeada era insolvente, e a outra pessoa o


desconhecia no momento da indicação.
DO CONTRATO COM PESSOA A DECLARAR

Art. 469. A pessoa, nomeada de conformidade com os artigos


antecedentes, adquire os direitos e assume as obrigações
decorrentes do contrato, a partir do momento em que este foi
celebrado.

Art. 471. Se a pessoa a nomear era incapaz ou insolvente no


momento da nomeação, o contrato produzirá seus efeitos entre os
contratantes originários.
Ponto 1 – Direito Penal

PONTO 01: A NORMA PENAL: ESPÉCIES, FONTES E INTERPRETAÇÃO.


TEORIA FINALISTA DA AÇÃO. RELAÇÃO DE CAUSALIDADE. HOMICÍDIO.
CRIMES CONTRA A VIDA. CRIMES DE PERIGO COMUM. CRIMES
CONTRA A PAZ PÚBLICA. (FALTA A PARTE EM AMARELO)

Item: A Norma Penal: Espécies, Fontes e Interpretação:

Luís Régis Prado: “A norma jurídico-penal tem a natureza imperativa e endereça-se a todos os
cidadãos genericamente considerados, através de mandados (imperativo positivo) ou
proibições (imperativo negativo) implícita e previamente formulados, visto que a lei penal
modernamente não contém ordem direta, mas sim vedação indireta, na qual se descreve o
comportamento humano pressuposto da conseqüência jurídica.” Segundo Binding, a lei penal
teria caráter descritivo da conduta proibida ou imposta, tendo a norma, por sua vez, caráter
proibitivo ou mandamental. Em outras palavras, a lei contém uma norma, que deve ser
desvendada pelo intérprete ao ler a descrição.

Normas Penais incriminadoras – a elas é reservada a função de definir as infrações penais,


proibindo ou impondo condutas, sob a ameaça de pena. É a norma penal por excelência. São,
por isso, consideradas normas penais em sentido estrito, proibitivas ou mandamentais.

Preceito primário – encarregado de fazer a descrição detalhada e perfeita da conduta que se


procura proibir ou impor.

Preceito secundário – a este cabe a tarefa de individualizar a pena, cominando-a em abstrato.

Normas Penais não-incriminadoras – subdivide-se em: (a) permissivas – tornam lícitas


determinadas condutas (justificantes) ou afastam a culpabilidade do agente, erigindo causas de
isenção de pena (exculpantes); (b) explicativas – esclarecem determinados conceitos; (c)
complementares – fornecem princípios gerais para a aplicação da lei penal.

Normas Penais em branco (primariamente remetidas – ou seja, o preceito primário que é


remetido) – normas penais em branco ou primariamente remetidas são aquelas em que há
uma necessidade de complementação para que se possa compreender o âmbito de aplicação
de seu preceito primário. Normas penais em branco homogêneas (ou em sentido amplo)
são aquelas em que o seu complemento é oriundo da mesma fonte legislativa que editou a
norma que necessita desse complemento (lei produzida pelo Congresso Nacional). Normas
penais em branco heterogêneas (ou em sentido estrito) são aquelas em que seu
complemento é oriundo de fonte diversa daquela que a editou (ex.: art. 28 da Lei 11.343/2006,
complementada pelo Decreto 5.912/2006, editado pela ANVISA).
Entendem alguns autores que as normas penais em branco heterogêneas ofendem o princípio
da legalidade penal (Zafaronni, Nilo Batista, Rogério Greco). A maioria da doutrina não vê
ofensa quando a norma penal em branco prevê o que se denomina núcleo essencial da
conduta(O STF já se posicionou em vários julgados pela constitucionalidade).

Normas Penais incompletas ou imperfeitas (secundariamente remetidas – o preceito


secundário que é remetido) – são aquelas que, para saber a sanção imposta pela
transgressão de seu preceito primário, o legislador nos remete a outro texto de lei (ex.: art. 1º,
Lei 2.889/56 – genocídio).

Concurso aparente de normas penais – será resolvido com a análise dos seguintes princípios:
especialidade (normas especial afasta norma geral); subsidiariedade (norma subsidiária –
soldado de reserva, na lição de Hungria); consunção (crime-meio, crime-fim; antefato ou pós-
factum impuníveis); alternatividade (caso de crimes de ação múltipla ou de plurinucleares –
punição por somente um dos fatos listados no delito).
Fontes:

Segundo Luiz Flávio Gomes: “A doutrina clássica distingue a fonte de produção ou


substancial ou material (quem pode criar o conjunto de normas que integra o Direito;
quem é o sujeito competente para isso) das fontes formais (fontes de cognição ou de
conhecimento ou de exteriorização desse Direito), que se dividem em fontes formais
imediatas (lei etc.) e mediatas (costumes, jurisprudência, princípios gerais do Direito
etc.). Essa classificação deve ser revisada. De qualquer modo, parece certo que os
tratados e convenções internacionais configuram fontes imediatas, na medida em que
exprimem normas de criação do Direito. No âmbito específico do Direito penal, o
assunto fontes deve partir de uma premissa muito relevante que é a seguinte: é
fundamental distinguir o Direito penal incriminador (que cria ou amplia o ius puniendi,
ou seja, que cuida da definição do crime, da pena, das medidas de segurança ou das
causas de agravamento da pena) do Direito penal não incriminador (conjunto de
normas penais que cuidam de algum aspecto do ius puniendi, sem se relacionar com o
crime, a pena, as medidas de segurança ou com o agravamento das penas). O primeiro
(Direito penal incriminador), no que se refere à sua origem (isto é, à sua fonte), é muito
mais exigente (e restrito) que o segundo. No que diz respeito ao Direito penal
incriminador (conjunto de normas que cuidam do delito, da pena, da medida de
segurança ou do agravamento das penas) somente o Estado está autorizado a legislar
sobre Direito penal. Em outras palavras: ele é o único titular da criação ou ampliação do
ius puniendi, logo, cabe a ele a produção material do Direito penal objetivo (ou seja:
cabe ao Estado a criação das normas que compõem o Direito penal incriminador).
Capacidade legislativa dos Estados membros: por meio de lei complementar federal os
Estadosmembros (quando concretamente autorizados) podem legislar sobre Direito
penal, porém, somente em questões específicas de interesse local (CF, art. 22,
parágrafo único). No que diz respeito às fontes formais (como se exterioriza
formalmente o Direito penal) faz-se mister distinguir as fontes formais do Direito penal
em geral da fonte formal e única do Direito penal incriminador (que é a lei). As fontes
formais (ou imediatas) do Direito penal em geral são: a Constituição e seus princípios, o
Direito Internacional dos Direitos Humanos e seus princípios, a legislação escrita e seus
princípios e o Direito Internacional não relacionado com os direitos humanos e seus
princípios. A fonte formal (ou imediata) do Direito penal incriminador (que cria ou amplia
o ius puniendi) é exclusivamente a lei. Os costumes, nesse contexto, são fontes
informais do Direito penal. A doutrina e a jurisprudência, por último, configuram fontes
formais mediatas.

A lei como fonte formal única, exclusiva e imediata do Direito penal incriminador:no que diz
respeito às normas que criam ou ampliam o ius puniendi a única e exclusiva fonte de
exteriorização é a lei formal (lei ordinária ou complementar), escrita, cujo conteúdo é discutido,
votado e aprovado pelo Parlamento. Por força do nullum crimen, nulla poena sine lege
nenhuma outra fonte pode criar crimes ou penas ou medidas de segurança ou agravar as
penas (ou seja: nenhuma outra fonte pode criar ou ampliar o ius puniendi).

O que acaba de ser dito expressa o conteúdo do chamado princípio da reserva legal ou
princípio da reserva de lei formal. Reserva legal é um conceito muito mais restrito que
legalidade (que é um conceito amplo). A única manifestação legislativa que atende ao princípio
da reserva legal é a lei formal redigida, discutida, votada e aprovada pelos Parlamentares.
Essa lei formal é denominada pela Constituição brasileira de lei ordinária, mas não há
impedimento que seja uma lei complementar que exige maioria absoluta (CF, art. 69).

Constituição Federal: a Constituição Federal constitui fonte imediata ou direta do Direito penal
(em geral), mas ela não pode definir crimes ou penas ou agravar as existentes. Essa função,
por força do nullum crimen, nulla poena sine lege é exclusiva da lei ordinária ou complementar.

Os Tratados e Convenções internacionais tampouco podem cumprir esse papel. Recorde-se


(como vimos acima) que os Tratados internacionais são firmados pelo Chefe do Executivo
(Presidente da República). O Parlamento apenas referenda o Tratado, mas não pode alterar o
seu conteúdo. Ou seja: não se trata de conteúdo que seja redigido, discutido e votado pelo
Parlamento. Admitir que Tratados internacionais possam definir crimes ou penas significa, em
última instância, conceber que o Presidente da República possa desempenhar esse papel.
Com isso ficaria esvaziada a garantia política e democrática do princípio da legalidade (da
reserva legal).

Medidas provisórias: no que concerne às normas penais incriminadoras (as que definem
crimes, penas, medidas de segurança ou que agravam as penas), exclusivamente a lei penal
formalmente redigida, discutida e aprovada pelo Parlamento (garantia da lex populi) é que
serve de instrumento para essa finalidade. Em relação às normas penais não incriminadoras,
conseqüentemente, admite-se a medida provisória como fonte formal do Direito penal. Em
conclusão: a lei, por emanar do poder que encarna a soberania popular, conta com um plus de
legitimidade política, diante de outras fontes. Sendo norma escrita, retrata uma segurança
jurídica frente à arbitrariedade e ao ius incertum.

Como dizia o Marquês de Beccaria, Cesare Bonessana, "só uma norma procedente do poder
legislativo, que representa toda uma sociedade unida pelo contrato social, pode limitar a
sagrada liberdade do indivíduo, definindo os delitos e estabelecendo as penas". Sendo a lei
formal a única e exclusiva fonte imediata do Direito penal incriminador (o que cria ou amplia o
ius puniendi), não podem cumprir esse papel a lei delegada nem os princípios jurídico-penais
nem os costumes.

Leis delegadas: considerando-se que as leis delegadas são elaboradas pelo Presidente da
República (CF, art. 68), parece muito evidente que elas não servem de fonte para o Direito
penal incriminador. Aliás, referidas leis não podem versar sobre direitos individuais (CF, art. 68,
§ 1º, II). Daí se infere que não podem cuidar da definição do delito nem das suas
conseqüências jurídicas.

Princípios jurídico-penais: os princípios jurídico-penais, que são extraídos dos textos


constitucionais, internacionais ou legais, constituem fontes formais imediatas do Direito penal
(em geral), mas tampouco podem definir crimes ou penas ou medidas de segurança ou agravar
penas. Os princípios ganham força a cada dia na nossa jurisprudência, mas não podem
substituir a lei formal como fonte única do Direito penal incriminador.

Os costumes são "normas" de comportamento que as pessoas obedecem de maneira uniforme


e constante (requisito objetivo), com a convicção de sua obrigatoriedade jurídica (requisito
subjetivo). No âmbito penal, os costumes, como fontes informais, jamais podem criar crime ou
pena ou medida de segurança ou agravar a pena. Podem, entretanto, beneficiar o agente (em
casos específicos – cf. RT 594/365). Exemplo: imagine um costume indígena de praticar
relação sexual com a adolescente logo após sua primeira menstruação. Mesmo que ela conte
com treze anos de idade, não há que se falar em delito (nem em presunção de violência). Esse
costume seria invocado pelo juiz para a absolvição do agente (por se tratar de fato atípico).

De qualquer maneira, quanto aos índios, não é correto concluir que a vida deles está regida
exclusivamente pelos seus costumes. O homicídio praticado por índio, ainda que tenha como
vítima outro índio, configura, em regra, um fato punível de acordo com o Direito penal nacional
e, por isso mesmo, deve o autor responder por ele normalmente. Aliás, em regra a
competência, nesse caso, é da Justiça estadual (Súmula 140 do STJ).

Fontes formais mediatas: duas são as fontes formais mediatas (que explicam ou interpretam ou
aplicam as fontes imediatas ou informais): doutrina e jurisprudência.

1º) Doutrina: a função da doutrina (opnio doctorum) consiste em interpretar as fontes formais
imediatas do Direito penal. Não conta com caráter vinculante, mas muitas vezes acaba bem
cumprindo seu papel de evitar a improvisação e o arbítrio, oferecendo conceitos coerentes que
muito contribuem para a sistematização do Direito.

2º) Jurisprudência: a decisão reiterada dos juízes e tribunais num determinado sentido forma a
jurisprudência, que muitas vezes não só é fonte formal do Direito como inclusive "criadora" dele
(por exemplo: quem afirma no Brasil que só existe crime continuado quando as infrações não
se distanciam mais de um mês umas das outras? A jurisprudência. Logo, essa regra foi criada
pela jurisprudência. É lógico que não é uma posição ortodoxa afirmar que o juiz "cria" o Direito,
porém, na prática, é isso o que ocorre (muitas vezes) e inclusive é legítima essa função do juiz,
desde que ele atue no âmbito do vazio legislativo (para suprir suas lacunas).

3º) Súmulas vinculantes: sendo as súmulas vinculantes uma parte da jurisprudência


consolidada do STF, também elas constituem fonte mediata do Direito penal. Embora
vinculantes, não possuem força de lei nem emanam do Poder Legislativo. É por isso que não
podem ser classificadas como fonte imediata do Direito penal”.

Interpretação:

Interpretação objetiva (voluntas legis): busca encontrar a vontade da lei – mens legis.
Interpretação subjetiva (voluntas legislatoris): procura-se alcançar a vontade do legislador –
mens legislatoris.

A interpretação pode ser distinguida, ainda, quanto ao órgão (sujeito) de que emana, quanto
aos meios que são utilizados para alcançá-la, e, ainda, quanto aos resultados obtidos.

Quanto ao sujeito: (a) Autêntica (realizada pelo próprio texto legal, podendo ser contextual –
realizada no mesmo momento em que é editado o diploma legal, como o art. 327 do CP, que
definiu o conceito de funcionário público pra fins penais – ou posterior – realizada pela lei
depois da edição do diploma legal anterior) ; (b) doutrinária (realizada pelos estudiosos do
Direito, comentando sobre a lei que se pretende interpretar); (c) judicial (realizada pelos
aplicadores do Direito, ou seja, os magistrados de 1º grau e que compõem os tribunais,
podendo nela incluir-se as súmulas).

Quanto aos meios empregados: (a) literal (ou gramatical) – o exegeta se preocupa com o real
significado das palavras; (b) teleológica – busca-se alcançar a finalidade da lei, sua real
intenção; (c) sistêmica (ou sistemática) – o exegeta analisa o dispositivo em consonância com
o sistema jurídico em que está contido, para extrair sua interpretação; (d) histórica – o
intérprete busca no momento histórico da criação do dispositivo os seus fundamentos, o
momento da sociedade, para alcançar sua melhor interpretação.

Quanto aos resultados: (a) declaratória – o intérprete apenas declara a vontade da lei; (b)
restritiva – o intérprete restringe o alcance inicial da lei – esta disse mais que pretendia dizer
(Lex plus dixit quam voluit); (c) extensiva – o intérprete alarga o alcance da lei, haja vista ter
aquela dito menso do que efetivamente pretendia (Lex minus dixit quam voluit).

Interpretação analógica – a uma forma casuística, que servirá de norte ao exegeta, segue-se
uma fórmula genérica – ex.: art. 121, § 2º, III, CP.

Na dúvida acerca de matéria de interpretação, defende Hungria que deve-se aplicar o in dubio
pro reo, resolvendo-se a dúvida a favor do agente.

Analogia – a analogia in malam partem não é permitida em matéria penal. A analogia in bonam
partem pode ser utilizada em matéria de interpretação. (ex.: art. 128, II, CP – aplicação por
analogia no caso de atentado violento ao pudor). No processo penal, a analogia é possível.

Item: Teoria Finalista da Ação:

TEORIAS DO DELITO E TEORIA CONSTITUCIONALISTA DO DELITO (Adaptação extraída


de texto especialização em ciências penais de LFG)

1. Evolução do conceito de delito

Durante o século XX foram desenvolvidos muitos conceitos de delito. Os principais são:


a) o causal-naturalista (ou causalista): culpa e dolo são a culpabilidade;
b) o neokantista: culpa e dolo integram a culpabilidade;
c) o finalista: culpa e dolo vão para o fato típico;
d) o funcionalista teleológico ou teleológico-racional (Roxin);
e) o funcionalista sistêmico (Jakobs).
No Brasil, até 1970, predominou a teoria causalista do delito (Bento de Faria, Nélson
Hungria, Basileu Garcia, Magalhães Noronha, Aníbal Bruno, Paulo José da Costa Júnior
etc.). Dessa época até hoje, passou a preponderar a teoria finalista (Mestieri, Dotti,
Toledo, Damásio, Mirabete, Fragoso, Tavares, Cirino dos Santos, Bitencourt, Prado,
Capez, Greco, Queiroz, Nucci).
A integração sistemática entre Constituição, Política criminal e Direito penal deve nos conduzir
a reestruturar a própria teoria do delito, que já não pode ser compreendida e ensinada desde a
perspectiva puramente legalista (ou formalista). O Direito penal, sendo o instrumento mais
poderoso de exercício do poder, não pode ser estruturado exclusivamente no texto legal, senão
também com os limites e restrições impostos pela ou derivados da Constituição.

1.1. Teoria causalista ou causal-naturalista


Essa primeira teoria do delito se deve a von Liszt e Beling e enfocava a conduta como
simples movimento corpóreo de fazer ou não fazer. O crime, naquele tempo (final do
século XIX e princípio do século XX), era dividido em duas partes: objetiva e subjetiva.
• Parte objetiva: era constituída da tipicidade e da antijuridicidade. A tipicidade, como se sabe,
foi desenvolvida por Beling, em 1906;
• Parte subjetiva: era a culpabilidade (teoria psicológica da culpabilidade), que consistia no
vínculo do agente com seu fato que se dá pelo dolo ou pela culpa. Como se vê, nesse período,
dolo e culpa eram a culpabilidade.

1.2. Teoria neokantista


Dentre as inúmeras diretrizes que tentaram superar o formalismo legalista do positivismo
jurídico deve ser destacado o neokantismo por sua significação metodológica e particular
incidência na Ciência penal. O finalismo, em seguida, foi não só reação ao formalismo
positivista como ao próprio neokantismo. A Escola de Kiel (que foi sustentada pelo nazismo),
não quis superar o positivismo, senão o próprio Direito penal, instrumentalizando-o para atingir
suas finalidades autoritárias.
Essas três correntes penais foram marcadas pelo:
• método teleológico neokantista em que o Direito penal existe para a proteção de
valores;
• ontologicismo, no qual o Direito penal deve ter como premissas básicas algumas
estruturas lógicas que vinculam o legislador e
• método intuitivo (irracionalismo da Escola nazista).
O formalismo a que se reduziu o positivismo jurídico (de Binding e de Rocco) é o seu ponto
mais crítico. O positivismo jurídico − que considerava a “lei” como puro “factum” − reafirmou a
substantividade jurídica da função penal, rendendo homenagem à segurança jurídica e levando
a extremos de precisão a análise sistemática do delito. Mas padeceu de um excessivo
formalismo, de sutilezas, de abstração, que separaram o Direito da realidade. Talvez isso tenha
ocorrido pelo evidente mimetismo das técnicas do Direito privado, isto é, por ter se valido
dessas técnicas sem sentido crítico. A maior preocupação dos positivistas era construir um
sistema lógico, um verdadeiro palácio do Direito. Não procuravam (prioritariamente) alcançar a
justiça em cada caso concreto, senão a construção de um sistema lógico.
O positivismo jurídico enfocou o delito de forma equivocada e insatisfatória. As três categorias
fundamentais do delito até então admitidas (ação, antijuridicidade e culpabilidade), com efeito,
eram descritas - segundo a perspectiva da teoria causalista da ação - de forma não
consistente.
A ação, no esquema positivista causalista (ou causal-naturalista), era concebida como
movimento corporal que produzia uma determinada modificação no mundo exterior. Essa
concepção naturalista da ação não podia explicar, por exemplo, a omissão, pois a essência
desta não é naturalista, senão normativa. Omitir não significa “não fazer”, senão “não fazer o
que o ordenamento jurídico espera” que seja feito; a omissão implica uma referência à “ação
esperada”, uma valoração que emana da lei. No crime omissivo o sujeito responde não porque
simplesmente omitiu, mas sim, porque não praticou a conduta esperada e determinada pelo
ordenamento jurídico.
O mesmo acontecia com a antijuridicidade, que era isenta de todo significado valorativo (aliás,
desvalorativo) no esquema positivista. A antijuridicidade expressaria só uma relação lógica de
contradição entre o fato acontecido e a norma concreta considerada, mas sem carga de
desvalor algum, neutra (concepção formal da antijuridicidade). Mesmo quando, posteriormente,
admitiu-se a concepção material da antijuridicidade, com a inclusão do bem jurídico na teoria
do delito, pouco mudou, porque o bem jurídico foi compreendido em termos naturalísticos e a
antijuridicidade passa a ser o perigo ou lesão do bem jurídico, no sentido de causa de um
perigo ou de uma lesão, isto é, no sentido naturalístico. Dessa forma, não poderiam ser
compreendidos, por exemplo, os denominados requisitos subjetivos do injusto, pois se o
decisivo era a lesão ao bem jurídico, esta era independente de tais requisitos; e, em
conseqüência, teria que considerar antijurídica toda ação contrária ao bem jurídico, embora
não concorresse o especial ânimo requerido pela lei.
Finalmente, o esquema positivista admitiu (no momento da configuração da culpabilidade) a
supremacia psicológica. Com efeito, aparecia a culpabilidade como nexo psicológico (anímico)
entre o autor e o fato antijurídico (teoria psicológica da culpabilidade); o dolo e a culpa eram
suas espécies, isto é, a forma pela qual o agente se vinculava com seu fato. Imputabilidade e
dolo e culpa eram os requisitos da culpabilidade.
De acordo com essa concepção subjetivo-descritiva da culpabilidade o crime conta com duas
partes: uma objetiva e outra subjetiva: à primeira pertencem a tipicidade e a antijuridicidade e à
segunda a culpabilidade, que abarca tudo que se refere ao plano subjetivo e que permite
descrever a relação psicológica entre o sujeito e sua ação antijurídica. Tal concepção, porém,
não explicava a imputabilidade nem as causas de exclusão da culpabilidade que não afetam a
relação psicológica mencionada; nem explica a culpa ou a culpa inconsciente, onde falta
necessariamente toda relação espiritual entre autor e fato. Interesse da vida que devia se
constatar empiricamente (Liszt, 1884).
Na visão neokantista, a ação deixa de ser entendida como mero movimento corporal em
sentido naturalístico para se destacar seu significado social: prefere-se falar em
comportamento humano ou de conduta e não mais só de ação. Radbruch (1904, Ûber den
Schuldbegriff) destacaria a impossibilidade de utilizar um superconceito (Oberbegriff) de ação
que abarcasse a ação e a omissão. A concepção meramente descritiva, neutra e objetiva
da tipicidade, de outro lado, não se coaduna com a descoberta dos requisitos
normativos e subjetivos do tipo. A crítica dos neokantistas ao conceito naturalístico de
ação tem procedência. Tal como concebida, não explicava no Direito penal a omissão.
A antijuridicidade deixa de ser concebida como expressão lógica de uma contradição entre a
conduta e a lei, quer dizer, em seu sentido formal. Passa a ser admitida como danosidade
social, com ajuda do conceito do bem jurídico.
Com isso, as relações entre tipicidade e antijuridicidade são entendidas de outra maneira:
aquela não é a descrição neutra de um processo externo, senão a concreção das
características essenciais do injusto: os tipos penais são tipos do injusto. A antijuridicidade,
junto com a culpabilidade, serão as duas características materiais do delito, enquanto a
tipicidade − antes, de igual categoria que a antijuridicidade − conservará exclusivamente uma
função formal de garantia.
A concepção neoclássica, própria do método teleológico dos neokantianos, conduziu a
uma configuração não só psicológica da culpabilidade, senão também normativa. Em
outras palavras, a culpabilidade é vista também como reprovação. Isso permitia explicar
a culpabilidade nos casos onde falta o nexo psicológico entre o autor e o resultado, e
vice-versa: fundamentar a ausência de culpabilidade, apesar da existência de referido
nexo psicológico. Assim, por exemplo, Quem falsifica uma assinatura ameaçado por
uma arma na cabeça atua dolosamente em relação ao falso, mas não podia agir de modo
diferente.
Há vínculo psicológico entre o agente e a conduta (há dolo), mas não há exigibilidade de
conduta diversa, ou seja, não há culpabilidade, não há reprovabilidade, em razão da coação
moral irresistível.
Fundamentalmente, a transformação da culpabilidade de “psicológica” para
“psicológiconormativa” deve-se a Frank que, em 1907, descobriu o requisito da exigibilidade
de conduta diversa. Esse mesmo requisito foi posteriormente aprofundado por Goldschimit e
Freudental.

1.3. Teoria finalista


O neokantismo foi uma resposta à estreita interpretação da realidade penal levada a cabo pelo
positivismo naturalista. O neokantismo reagiu contra o causalismo e o finalismo lançou suas
críticas contra o neokantismo. A fenomenologia, para a qual o Direito penal deve partir de
algumas premissas pré-estabelecidas (a ação é finalista, a culpabilidade é normativa etc.),
constitui a essência do finalismo. E é, por sua vez, uma resposta ao unilateral ponto de vista
teórico-cognoscitivo do neokantismo.
A doutrina finalista aparece nos anos trinta do século XX, quando se achava em pleno auge o
neokantismo. O pensamento finalista foi uma resposta à obra de Schwinge:
TeleologischeBegriffsbildung im Strafrecht, publicada em 1930, que é produto e culminação do
pensamento neokantiano.
A obra que iniciou a corrente finalista foi Kausalität und Handlung (Causalidade e Ação), de
Hans Welzel, cujas idéias se concretizam posteriormente em outros artigos e monografias.9 A
incidência delas na sistemática penal viria a ocorrer em 1939, ano em que Welzel publica seus
Studien zum System des Strafrechts (Estudos sobre o sistema do Direito penal).
A ação, para Welzel (1939), é, ao mesmo tempo, causal e final. Às ciências naturais interessa
a ação como fenômeno do mundo natural, como fato causal. Mas ao Direito, que pertence à
ordem do pensar, só interessa a dimensão ou aspecto final enquanto essência da ação,
imanente à mesma.
É interessante destacar − mais do que o conceito de ação ou de culpabilidade em Welzel − a
repercussão metodológica que têm as estruturas lógico-objetivas welzelianas. Estamos nos
referindo ao caráter vinculante delas, que operam (ou deveriam em sua concepção operar)
como limite ao próprio legislador, e não simplesmente para integrar as lacunas (interpretação)
do Direito positivo. No tempo de Welzel notava-se muito abuso do Direito penal, e ninguém
falava em limites ao legislador. Todo o sistema finalista de Welzel foi construído sobre essa
base: o Direito penal possui certas premissas que devem ser reconhecidas pelo legislador.
Em suma, segundo o finalismo, as estruturas lógico-objetivas (da ação e da culpabilidade),
portanto, limitariam a vontade do legislador, que deixaria de ser absolutamente livre.
O finalismo de Welzel, entretanto, apesar do seu evidente direcionamento para o objetivismo
ontologicista, não conseguiu uma efetiva superação do positivismo legalista. Isso, talvez, fosse
sua meta inicial, mas não foi alcançada. Nem Welzel nem seus seguidores conseguiram
transformar o Direito penal formalista do século XX em instrumento que pudesse fazer justiça
em cada caso concreto.
Apesar de o finalismo partir da existência de certos conceitos ou realidades pré-jurídicas, como
a ação final e a capacidade de autodeterminação do ser humano conforme seus fins, não
conseguiu a desejada aproximação com a realidade concreta, ficando ancorado nas referidas
estruturas lógico-objetivas, sem transcendê-las. Se de um lado seu método dedutivo
axiomático faz derivar as soluções jurídicas dos dados ontológicos mencionados, de outro,
acentua a importância do pensamento abstrato-sistemático. Com razão os penalistas da Escola
de Kiel (Segunda Guerra Mundial) afirmavam que “Welzel proporcionou à dedução lógico-
dogmática uma força desconhecida desde os tempos de Binding”.
Com base na doutrina finalista também foi possível construir um Direito penal positivista
legalista, pouco preocupado com a solução justa do caso concreto. Aliás, de todo
enfrentamento entre os neokantistas e positivistas ou mesmo entre finalistas e positivistas, dois
aspectos ganham relevância: o isolamento do Direito penal diante da realidade e o
desenvolvimento teórico do Direito penal, que foi muito superior aos outros ramos do Direito.
A causa principal de uma relativa aceitação do finalismo pela jurisprudência e doutrina
clássicas no Brasil foi, então, a seguinte: perceberam depois de um certo tempo que
mesmo adotando o finalismo ainda era possível conviver com o positivismo legalista,
com os ditames da lei.
Na teoria do delito, várias foram as repercussões do finalismo de Welzel: o dolo e a culpa,
como dados integrantes da ação, passaram a fazer parte do tipo (leia-se: do fato típico).
Deixaram de integrar a culpabilidade, que se transformou em puro juízo de censura, de
reprovação.
Eliminados os requisitos subjetivos da culpabilidade, nela somente restaram requisitos
normativos:
a) imputabilidade;
b) potencial consciência da ilicitude e
c) exigibilidade de conduta diversa.

9Überdie Wertungen im Strafrecht: sobre as valorações no Direito penal (1932) e Naturalismus und
Wertphilosophie im Strafrecht: sobre Naturalismo e Filosofia dos valores no Direito penal (1935)
Todos esses requisitos são normativos porque devem ser aferidos pelo juiz. Nem a
imputabilidade nem a consciência da ilicitude, que se acham na cabeça do agente, devem ser
enfocados desde essa perspectiva. Cabe ao juiz examinar em cada caso concreto se o
agente tinha capacidade de entender ou de querer e, ademais, se tinha possibilidade de
ter consciência da ilicitude, ainda que seja nos limites de sua capacidade de
compreensão do injusto - numa “valoração paralela na esfera do profano” (Mezger,
Tratado de Derecho penal, trad. de 1955), isto é, valoração do injusto levada a cabo pelo
leigo, de acordo com sua capacidade de compreensão.

1.4. Atuais tendências do Direito penal no plano dogmático (orientações teleológicas e


funcionalistas − Roxin e Jakobs)
O Direito positivo, o mundo dos valores (reconhecidos desde a perspectiva de quem conhece a
realidade) e a esfera ontológica constituíram o centro de gravidade da evolução do sistema
penal, até a década de sessenta.
Os três momentos mais significativos da dogmática penal, conseqüentemente, até então,
foram: o positivista naturalista (teoria causal da ação); o neokantiano (teoria dos valores) e o
finalista (teoria finalista da ação); respectivamente. Em outras palavras, as três etapas mais
significativas da teoria do delito até a década de sessenta foram: o causalismo, o neokantismo
e o finalismo.
Todos os penalistas do século XX (causalistas, neokantistas ou finalistas) que construíram
suas doutrinas sobre bases eminentemente positivistas (mera interpretação da lei penal e sua
sistematização) entendem (tal como Binding, que é o pai do positivismo jurídico) que a Ciência
do Direito penal esgota-se na Dogmática penal.
Fizeram, assim, só Dogmática. E foram acríticos, assépticos, neutros, não se preocuparam
com a construção de uma ciência evolutiva. Afastaram-se da realidade e elaboraram um Direito
penal extremamente formalista e conservador (proteção do status quo). Não estudaram
Criminologia, não se aprofundaram na Política criminal. Não admitiram os postulados político-
criminais dentro da teoria do delito. Aceitaram o método meramente subsuntivo em relação à
tipicidade (fato típico é o descrito na lei). Glorificaram o legislador, poucas vezes foram críticos
em relação à caótica legislação.
No panorama dogmático-penal seguinte (aos anos sessenta) ganharam protagonismo
considerações axiológicas (valorativas ou normativas), de raízes neokantianas; uma busca de
soluções ad hoc (o justo em cada caso concreto), cuja origem reside nas orientações críticas
da dogmática dedutivo-abstrata dos anos anteriores.
A característica predominante da moderna dogmática jurídico-penal é a teleológico-
valorativa, com a conseguinte tendência à normativização das categorias do sistema
penal (da tipicidade, antijuridicidade etc.). O delito, desse modo, já não conta só com
uma dimensão natural ou ontológica (fática), mas também com uma dimensão axiológica
(valorativa), retratada na exigência da imputação objetiva bem como do resultado
jurídico relevante.
Está se produzindo uma revisão geral do pensamento dogmático acrítico. A ciência penal, na
atualidade, está aberta aos princípios político-criminais e preocupa-se com a solução
justa de cada caso concreto.
Destacam-se na atualidade as propostas dogmáticas funcionalistas ou teleológicas. O
ponto comum entre elas consiste na pretensão de construir sistemas abertos aptos para
uma permanente orientação às exigências político-criminais assim como à própria
evolução dos conhecimentos.
Considera-se como ponto de partida do moderno pensamento teleológico-valorativo o
livro Kriminalpolitik und Strafrechtssystem e, mais recentemente, a obra Grundfragen
des modernen Strafrechtssystems.10

10Política Criminal e Sistema do Direito Penal, de Roxin, obra programática cuja primeira edição alemã veio a público em 1970.
Fundamentos dos modernos sistemas penais, obra coletiva compilada por Schünemann e publicada em 1984. Saiba mais sobre a
orientação sustentada por Claus Roxin nas seguintes obras: ROXIN; Claus. Política Criminal e Sistema Jurídico-Penal, trad. de Luís
Greco, Rio de Janeiro: Renovar, 2000; ROXIN; Claus. A apreciação jurídico-penal da eutanásia. Revista Brasileira de Ciências
Criminais, vol. 8, fascículo 32, São Paulo, 2000; ROXIN; Claus. A culpabilidade como critério limitativo da pena. Revista de Direito
Penal, nº 11/12, 1973, Rio de Janeiro: Borsoi, p.7 e ss.; ROXIN; Claus. A teoria da imputação objetiva. Revista Brasileira de Ciências
Criminais, vol. 10, fascículo 38, São Paulo, 2002; ROXIN; Claus. Culpa e responsabilidade. Revista Portuguesa de Ciência Criminal,
ano I, nº 4, Lisboa: Aequitas, 1991, p.503 e ss; ROXIN; Claus. Funcionalismo e imputação objetiva no Direito Penal, 3ª ed., Rio de
Janeiro: Renovar, 2002; ROXIN; Claus. Problemas atuais da política criminal. Revista Ibero-Americana de Ciências Penais, vol. 2,
No âmbito da atual tendência à normativização do sistema penal (e particularmente do delito: o
delito e o Direito penal não podem abrir mão de um momento axiológico fundamental) e suas
categorias, convém distinguir duas sub-orientações teleológico-funcionalistas:
• a moderada: que é sustentada por Roxin (1997) e seus seguidores.
• a radical: representada pelo funcionalismo-sociológico ou sistêmico (teoria dos
sistemas) de Jakobs.
A pretensão de Roxin consiste em superar as barreiras existentes entre o Direito penal e a
Política criminal, fazendo do sistema penal um instrumento válido para a solução satisfatória
(político-criminalmente) dos problemas reais levados para o sistema penal. Sua preocupação é,
portanto, prática.
Sugere Roxin a decidida orientação do sistema do Direito penal às valorações da Política
criminal, isto é, todas as categorias do sistema penal (tipicidade, antijuridicidade, culpabilidade
e punibilidade) seriam redefinidas em função das exigências político-criminais. Um bom
exemplo dessa interferência da Política criminal no Direito penal pode ser dado com o princípio
da insignificância, que contava com pouco (ou nenhum) espaço dentro do Direito penal
formalista e lógico-dedutivista. Na medida em que orientações político-criminais de cunho
minimalista (Direito penal mínimo) ganham terreno no âmbito penal, já não podemos enfocar a
tipicidade de maneira puramente formalista (ou naturalista ou finalista); só pode ser típico o fato
ofensivo relevante. Em se tratando de uma ofensa insignificante, ínfima, embora o fato seja
formalmente típico, materialmente não o é (porque o Direito penal só deve intervir quando
necessário, posto que é a ultima ratio). Por considerações de ordem político-criminal o fato
insignificante deixa de ser típico, isto é, está fora do Direito penal.
Com a reorientação de todas as categorias e subcategorias do sistema penal procura Roxin
evitar o lamentável contra-senso que propiciava o positivismo jurídico, com seus excessos
abstrato-dedutivos, que muitas vezes apresentava uma interpretação dogmaticamente correta
e impecável mas que, do ponto de vista político-criminal, não resolvia o problema concreto de
forma adequada e satisfatória.
Jakobs, por seu turno, pretendendo uma nova fundamentação da dogmática jurídico-
penal e do sistema, correlaciona a missão do Direito penal (de prevenção geral) com a
perspectiva sociológico-funcionalista.
A teoria luhmaniana dos sistemas permitiria, no seu entender, a renormativização das velhas
categorias da dogmática, inservíveis por sua vinculação às inexpressivas estruturas lógico-
objetivas e conceitos pré-jurídicos.
Jakobs, desde logo, diferentemente de Roxin, torna absoluto o critério funcional,
rejeitando toda limitação que proceda do âmbito ontológico (teoria finalista de Welzel) ou
mesmo do sentido ordinário da linguagem ou dos postulados político-criminais (Roxin).
As orientações moderadas (Roxin, 1970), por seu turno, não conferem tanta magnitude ao
sistema, nem às exigências derivadas dele, conservando certa operatividade aos limites
externos ao Direito penal ancorados na esfera do ser (natureza das coisas) ou no âmbito da
própria linguagem. Ademais, o funcionalismo moderado de Roxin orienta as categorias do
sistema do Direito penal às finalidades da política criminal (intervenção mínima, exclusiva
proteção de bens jurídicos, resultado jurídico relevante etc.) que são várias e diversas entre si
e que se limitam reciprocamente.
Em suma, enquanto para Jakobs, 1984, somente são decisivas as necessidades
“sistêmicas”, orientadas ao princípio supremo da “função do Direito penal” (a
prevenção-integração), Roxin dá acolhimento a valores e princípios garantistas no
momento de configurar o sistema do Direito penal (direito positivado) e da dogmática
jurídico-penal (que deve estudar, sistematizar e criticar o direito positivado). Enquanto
na teoria teleológico-funcional (Roxin) o sistema penal deve ser orientado para as
finalidades político-criminais, na construção sistêmica (Jakobs) o sistema penal deve ser
orientado para as necessidades sistêmicas.11

fascículo 4, Porto Alegre, 2001; ROXIN; Claus. Sobre a fundamentação político-criminal do sistema jurídico-penal. Revista Brasileira
de Ciências Criminais, vol. 9, fascículo 35, São Paulo, 2001.

11Saiba mais sobre a orientação sustentada por Jakobs nas seguintes obras: JAKOBS, Günther. A Imputação Objetiva no Direito
Penal, trad. de André Luís Callegari, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000; JAKOBS, Günther. Fundamentos do direito penal, trad.
de André Luís Callegari, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003; JAKOBS, Günther. Sociedad, norma, persona. Trad. Manuel Cancio
Meliá e Bernardo Feijoó, Bogotá, UEC, s/d; JAKOBS, Günther. Derecho penal-PG. Trad. Cuello Contreras e Serrano Gonzalez de
Murillo, Madri, Marcial Pons, 1995
As teorias funcionalistas radicais (Jakobs e seus seguidores) têm como ponto comum a
mudança do centro de atenção do sistema social, subordinando, a seu bom funcionamento − à
produção de um eficaz consenso −, qualquer valoração ética, política, individual ou coletiva.
Desde essa ótica sistêmica do funcionalismo radical, o indivíduo não é mais que um
“subsistema físico-psíquico”, mero centro de imputação de responsabilidades e o próprio
Direito um “instrumento de estabilização social, de orientação das ações e de
institucionalização das expectativas”. Ao “subsistema penal” corresponde assegurar a
“confiança institucional” dos cidadãos, entendida a referida função como forma de integração
no sistema social.
A violação de uma norma (o delito) é considerada socialmente disfuncional, porém, não porque
lese ou coloque em perigo determinados bens jurídicos, senão porque questiona a “confiança
institucional” no sistema. O delito é, antes de tudo, para o funcionalismo radical, “expressão
simbólica de uma falta de fidelidade ao Direito”: uma ameaça para a integridade e estabilidade
sociais, particularmente nocivo quando a infração aparece de modo manifesto, visível. A teoria
sistêmica, por isso, adota um enfoque “sintomatológico”, preocupando-se mais com a
manifestação do fato disfuncional do que com as causas do conflito que possam gerar o delito.
A pena, por isso mesmo, tem finalidade de reforçar o conteúdo da norma (isto é, o Direito
penal).
Para a teoria sistêmica, sustentada pelo funcionalismo radical, o Direito penal não se
limita a proteger bens jurídicos, senão funções, isto é, a confiança institucional no
sistema assim como a segurança dos co-associados em seu bom funcionamento.
Para comprovar, fundamentar e graduar a culpabilidade não interessa se o sujeito podia e/ ou
devia comportar-se de outra forma: a exigência funcionalista de restabelecer a confiança no
Direito mediante a contraposição simbólica de uma pena será o critério decisivo, exacerbando-
se assim a concepção “normativista”, que prescinde de todo conteúdo psicológico-cognoscitivo
no juízo de reprovação.
A pena não é examinada desde um enfoque valorativo (fins ideais da mesma), senão funcional,
dinâmico, como qualquer outra instituição social (funções reais que a pena desempenha em
função do bom funcionamento do sistema).
A pena, segundo a teoria sistêmica, cumpre uma função de prevenção integradora, que é
distinta dos objetivos retributivos, de prevenção geral e especial, que lhe atribuía a
dogmática tradicional. Se o delito lesa os sentimentos coletivos da comunidade, isto é, o
considerado por “bom e correto”, a pena simboliza a necessária reação social: esclarece
e atualiza exemplarmente a vigência efetiva dos valores violados pelo criminoso,
impedindo que se diluam e percam eficácia; reforça a convicção coletiva em torno da
transcendência desses valores; fomenta e canaliza os mecanismos de integração e de
solidariedade social frente ao infrator e devolve ao cidadão honesto sua confiança no
sistema.
A primeira crítica que se pode formular contra o funcionalismo sistêmico consiste na sua falta
de cientificidade (alto déficit empírico).
A crítica básica centra-se na tendência à neutralidade valorativa, típica da análise sociológica
(positivista ou sistêmica).
No que concerne à teoria do delito, as diferenças marcantes entre o funcionalismo
moderado (Roxin) e o radical (Jakobs) são as seguintes:
• para Roxin o fato punível é composto de tipicidade, antijuridicidade e responsabilidade.
Esta última (a responsabilidade) cuida de saber se o agente imputável é ou não
merecedor da pena. Seu pressuposto é a culpabilidade bem como a necessidade
preventiva da pena. A pena tem finalidade preventiva (geral e especial), não retributiva. A
culpabilidade não funciona como fundamento da pena, mas sim, apenas como limite
dela;
• para Jakobs todas as categorias do delito (tipicidade, antijuridicidade, etc.) devem ser
interpretadas de acordo com o fim da pena, que é o preventivo geral positivo (leia-se: a
pena existe para reafirmar o valor da norma violada; a pena é um reforço da vigência da
norma; a pena reafirma a ordem jurídica e isso incrementa a atitude de confiança e
fidelidade ao Direito; a pena exercita a fidelidade ao Direito). O Direito penal não existe
para proteger bens jurídicos, mas sim, para reafirmar o conteúdo comunicativo da
norma. O Direito penal existe para cumprir uma função de tutela das normas,
independentemente do seu conteúdo. Parece não haver dúvida que a doutrina brasileira já
alcançou, com certa pacificidade, o terceiro estágio, ou seja, a teoria finalista. Pelo menos essa
é a posição majoritária. De qualquer modo, na atualidade, como você leu, a concepção de
delito que encontra maior ressonância constitucional e maior afinidade com o tipo de Estado
democraticamente consagrado que adotamos é a que considera o delito como uma ofensa
intolerável ao bem jurídico, protegido pela norma penal e, ao mesmo tempo, objetivamente
imputável ao risco proibido criado. Isso é o que estamos denominando de teoria
constitucionalista do delito (ou do fato punível), cujas bases teóricas encontram forte
ressonância na teoria funcionalista de Roxin.

Obs: Tipo no finalismo – adoção da Teoria da ratio cognoscendi da antijuridicidade: a teoria


da tipicidade passou a admitir que não era neutra, e o tipo passou a ter caráter indiciário da
ilicitude. Quer dizer que quando o agente pratica um fato típico, provavelmente, este fato
também será antijurídico (função indiciária do tipo). Afirma Zaffaroni que “a tipicidade opera
como um desvalor provisório, que deve ser configurado ou desvirtuado mediante a
comprovação de causas de justificação. Devido a isto é que Max Ernest Mayer fazia um gráfico
da relação entre a tipicidade e a antijuridicidade dizendo que ambas se comportavam como a
fumaça e o fogo, respectivamente.” Mitigação do tipo total do injusto: tipicidade +
antijuridicidade.

Obs: Conceito de ação de acordo com a evolução das teorias penais:


Teoria Clássica – Sistema Causal-Naturalista (Lizst e Beling): ação é o movimento humano
voluntário produtor de uma modificação no mundo exterior; é o fato que repousa sobre a
vontade humana, a mudança no mundo exterior referível à vontade do homem. Sem ato de
vontade não há ação, não há injusto, não há crime: cogitationis poenam nemo patitur. Mas
também não há ação, não há injusto, não há crime sem uma mudança operada no mundo
exterior, sem um resultado. Para esta teoria, dolo e culpa faziam parte da culpabilidade, não da
conduta. Importava o querer, não o conteúdo desse querer. Recebeu muitas críticas em face
de um conceito de ação puramente natural, eis que não explicava o problema da omissão.
Teoria Neoclássica (Paz Aguado): dentro de uma concepção causalista, mas em um
momento posterior, segundo a teoria neoclássica a ação deixa de ser absolutamente natural
para estar inspirada de um certo sentido normativo que permita a compreensão tanto da ação
(em sentido estrito) quanto da omissão. Agora a ação se define como um comportamento
humano voluntário manifestado no mundo exterior.
Teoria Finalista da Ação (Welzel):a ação passou a ser concebida como o exercício de uma
atividade final. É a ação, portanto, um comportamento humano voluntário, dirigido a uma
finalidade qualquer. O homem, quando atua, seja fazendo ou deixando de fazer alguma coisa a
que estava obrigado, dirige a sua conduta sempre a determinada finalidade, que pode ser ilícita
(quando atua com dolo) ou lícita (quando não quer cometer delito, mas que, por negligência,
imprudência ou imperícia, causa um resultado lesivo, previsto na lei penal). A finalidade
corresponde ao dolo, que está na conduta, mas o dolo é naturalístico. Não é dolo de cometer
conduta proibida, já que a consciência da ilicitude está na culpabilidade e não no fato típico. A
culpabilidade é enfocada como mero juízo de reprovação, só contendo elementos normativos.
O dolo é natural (sem consciência da ilicitude).
Teoria Social da Ação (Johannes Wessels):ação é toda atividade humana social e
juridicamente relevante, segundo os padrões axiológicos de uma determinada época,
dominada ou dominável pela vontade.

Obs: Posição do dolo e da culpa: na teoria finalista da ação, dolo e culpa deixam de ser
elementos ou requisitos da culpabilidade para integrarem o fato típico; fazem parte, assim, do
tipo, não da culpabilidade. E, “dogmaticamente a colocação do dolo no tipo, que hoje é aceita
até mesmo por não-finalistas, trouxe enormes facilidades na construção do delito.
Primeiramente, equacionou o problema da separação assistemática dos elementos subjetivos,
que informam o ilícito, do dolo, para juntá-los num mesmo bloco. Tudo o que é, assim,
naturalisticamente subjetivo, deve ser encarado de uma mesma forma. Depois, pôde-se obter
um melhor enquadramento técnico da tentativa e do crime consumado, da autoria e da
participação, do erro de tipo e do erro de proibição, como também, dosar-se adequadamente o
caráter indiciário do tipo com relação à antijuridicidade”.12

Obs: Síntese da culpabilidade de acordo com a teoria adotada pelo CP (LFG): De acordo com
a teoria normativa pura a culpabilidade é tão-somente normativa (não possui nenhum requisito

12
TAVARES, Juarez. Teorias do delito (variações e tendências), cit., p. 86; sobre a tentativa, v. REALE
JÚNIOR, Miguel. Dos estados de necessidade. São Paulo: José Bushatsky, 1971, p. 6-7.
psicológico); a culpabilidade é, assim, vista como puro juízo de reprovação, de censura; está só
na cabeça do juiz; ela pressupõe a imputabilidade e tem como requisitos a potencial
consciência da ilicitude e a exigibilidade de conduta diversa; dolo e culpa deixam de pertencer
à culpabilidade e passam a fazer parte do tipo; acolhe-se o dolo natural (dolo de tipo ou de
fato) e assim distingue-se claramente o dolo da consciência da ilicitude; esta, para adequar-se
às exigências normativas puras do finalismo, passa a ser vista também como requisito
normativo, e assim basta a possibilidade ou a potencial consciência da ilicitude; em relação ao
erro surgem as teorias da culpabilidade, a extrema ou estrita e a limitada; o ponto de
divergência entre ambas reside no tratamento do erro sobre os pressupostos fáticos de uma
causa de exclusão da ilicitude: a primeira considera-o também erro de proibição, com a
conseqüência de excluir ou atenuar a culpabilidade dolosa, enquanto a segunda admite-o
como erro equiparável ao erro de tipo, com a conseqüência de excluir sempre o dolo, podendo
o agente ser punido por crime culposo, se previsto em lei; objeto do juízo de culpabilidade é o
poder agir de outro modo (o agente, mesmo podendo agir de modo diverso, formou sua
vontade em desacordo com o ordenamento jurídico); a culpabilidade recai sobre o fato, mas,
pela sua fundamentação, não se pode excluir a culpabilidade de autor; a culpabilidade tem por
fundamento a liberdade relativa do homem de dirigir seus atos finalisticamente; integra a
culpabilidade o conceito analítico de crime, que consiste na ação típica, ilícita e culpável.

Item: Relação de Causalidade:

Relação de causalidade – Causalidade é o elo necessário entre a conduta praticada pelo


agente ao resultado por ela produzido. O resultado referido no art. 13 do CP não é somente o
resultado naturalístico, mas também o resultado jurídico (que não deixa vestígios no mundo
exterior, mas decorre da simples lesão de bem juridicamente protegido pela lei penal).
Os autores divergem sobre uma causalidade específica do domínio jurídico. Aníbal Bruno
(acompanhando Mezger e Asúa, entre outros) afasta essa especificidade, entendendo a
causalidade como dado inicial que precede os juízos de valor próprios da apreciação jurídica e
que indica se o fato a se considerar é ou não resultado causal da vontade manifesta do
homem. Já Assis Toledo, citando Maurach e Wessels, proclama uma teoria jurídico-penal da
causalidade, a qual interroga por um vínculo de conhecimento entre a ação do agente e o
resultado por ela produzido.
No conceito analítico, o fato, para alçar-se a crime, deve ser, primeiramente, típico. Diz-se
típico o comportamento humano que ocasiona o resultado e é previsto como infração penal.
Elementos do fato típico são, portanto, a conduta (na forma comissiva ou omissiva), o
resultado, o nexo causal e a tipicidade.
Verificado o resultado de dano ou de perigo, deve-se indagar, preliminarmente, se pode ser
referido, em conexão causal, à ação ou omissão do acusado. O nexo causal serve de liame
entre a conduta humana (comissiva ou omissiva) e o resultado, numa relação etiológica (de
causa e efeito). Também a omissão é elevada à categoria de causa (que não é conceito
puramente naturalístico, mas lógico), vislumbrando-se uma relação causal entre o omitir e a
produção do resultado, tanto doutrinariamente como perante nosso direito positivo.
Como integrante do fato típico, desnecessário discutir-se, para determinação do nexo causal, a
antijuridicidade do fato ou a culpabilidade do agente – etapas posteriores na escala de
valoração penal. De toda sorte, está a relação causal intimamente relacionada ao elemento
psicológico do comportamento, dada a impossibilidade de separação absoluta entre os
aspectos objetivo (imputatio facti) e subjetivo (imputatio delicti) da ação.

CRIMES EM QUE NÃO OCORRE O NEXO CAUSAL:


a) formais: delitos em que o legislador resolveu antecipar a sua consumação antes
mesmo da ocorrência do resultado naturalístico, considerando-se este último como
mero exaurimento. Ex: art.159.
b) de mera conduta: delitos de simples atividade em que o legislador não fez qualquer
previsão de resultado naturalístico a fim de caracterizá-lo. Ex: art.150.
c) omissivos próprios ou puros: aqueles em que, para a sua caracterização, basta a
inação do agente, mesmo que em virtude disso não advenha qualquer resultado
naturalístico. Ex: art.135.
Obs. os crimes omissivos próprios não comportam, em regra, nexo causal, pois a estrutura da
conduta omissiva é essencialmente normativa, não naturalística.
Comissivos por omissão (omissivos impróprios)
Existe nexo de causalidade normativo entre a omissão, quando o agente tinha o dever
jurídico de agir, e o resultado (art. 13, § 2.º).
Obs: Crimes omissivos próprios, puros ou simples, segundo Mirabete: “são os que
objetivamente são descritos com uma conduta negativa, de não fazer o que a lei determina,
consistindo a omissão na transgressão da norma jurídica e não sendo necessário qualquer
resultado naturalístico. Para a existência do crime, basta que o autor se omita quando deve
agir. Crimes omissivos impróprios, comissivos por omissão ou omissivos qualificados são
aqueles em que, para sua configuração, é preciso que o agente possua um dever de agir para
evitar o resultado. Nos termos o § 2º do art. 13 do CP, a omissão é penalmente relevante
quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. A lei penal exige, então, a
conjugação de duas situações: o dever de agir com o poder agir. O garante, nas situações
elencadas pelo código penal, tem o dever de agir para tentar impedir o resultado. Estas são as
situações que impõem ao agente a posição de garantidor: tenha por lei obrigação de cuidado,
proteção ou vigilância; de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado; com
seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado.
Teorias sobre a relação de causalidade penal
- Teoria da Causalidade Adequada – (Von Kries): causa é a condição necessária e adequada
para a produção do evento. Considera-se a conduta adequada quando é idônea a gerar o
efeito. A idoneidade se baseia na regularidade estatística. Daí se conclui que a conduta
adequada exclui acontecimentos extraordinários, fortuitos, excepcionais, anormais. Não são
levados em conta todas as circunstâncias necessárias, mas somente aqueles que, além de
indispensáveis, sejam idôneas à causação do evento. No exemplo de Beling, não existiria
relação causal entre acender uma lareira no inverno e um incêndio produzido pelas fagulhas
carregadas pelo vento.
- Teoria da Relevância Jurídica – entende como causa a condição relevante para o resultado.
O juízo de relevância engloba dentro de si o juízo de adequação. Será irrelevante tudo aquilo
que for imprevisível para o homem prudente, situado no momento da prática da ação. Só o
objetivamente previsível é causa relevante. Assim, no caso daquela que joga um balde d’água
em uma represa completamente cheia, fazendo com que rompa o dique, não pode ser
responsabilizado pela inundação, pois que sua conduta não pode ser considerada relevante a
ponto de ser-lhe imputada a infração penal tipificada no art. 254 do CP.
- Teoria da Equivalência dos Antecedentes Causais (conditio sine qua non) – (Von Buri):
adotada em nosso CP, considera causa a ação ou a omissão sem a qual o resultado não teria
ocorrido. Isto significa que todos os fatos que antecedem o resultado se equivalem, desde que
indispensáveis à sua ocorrência. Verifica-se se o fato antecedente é causa do resultado a partir
de uma eliminação hipotética. Daí pode-se observar que, partindo do resultado naturalístico,
devemos fazer uma regressão almejando descobrir tudo aquilo que tenha exercido influência
na sua produção. A crítica que se faz à teoria da equivalência dos antecedentes causais é no
sentido de que, havendo necessidade desta regressão em busca de apontar todas as causas
que contribuíram para o resultado, chegaríamos a uma regressão ad infinitum. Contudo, para
que seja evitada tal regressão, devemos interromper a cadeia causal no instante em que não
houver dolo ou culpa por parte daquelas pessoas que tiveram alguma importância na produção
do resultado. Frank, procurando estabelecer limitações a tal teoria, formulou a chamada
proibição de regresso, segundo a qual não é possível retroceder além da vontade livre e
consciente, dirigida à produção do resultado.
TEORIA DA EQUIVALÊNCIA DOS ANTECEDENTES CAUSAIS (Conditio sine qua non). (=
equivalência das condições).
ART. 13, caput, 2.ª parte – "é considerada causa toda ação ou omissão sem a qual o resultado
não teria ocorrido."
"Não distingue entre causa e condição: tudo quanto contribui, in concreto, para o resultado é
causa" Francisco de Assis Toledo, princípios básicos de direito penal.
Para reconhecer se uma condição é causa do resultado, utiliza-se o processo de eliminação
hipotética, atribuído ao penalista e professor sueco Von Thyrén, segundo o qual “a mente
humana julga que um fenômeno é condição de outro toda vez que, suprimindo-o mentalmente,
resulta impossível conceber o segundo fenômeno”. O sistema penal, assim, foge da amplitude
do problema da causalidade em seu aspecto filosófico-gnoseológico.
Procedimento hipotético de eliminação de Thyrén: "Para se saber se uma ação é causa do
resultado basta, mentalmente, excluí-la da série causal. Se com sua exclusão o resultado teria
deixado de ocorrer, é causa" (Damásio de Jesus).
Os excessos dessa teoria da equivalência dos antecedentes (que equipara, por exemplo, o
vendedor da arma a agente do homicídio) foram minimizados pela utilização do nexo
normativo. Desse modo, é insuficiente para aferir a causalidade o nexo físico, sendo
imprescindível a presença do dolo ou da culpa (nexo normativo).

Causas:
DEPEDENTES da conduta – encontram-se na mesma linha de desdobramento causal da
conduta. Não quebram o nexo causal13. (Ex.: A, sabendo que B é diabético, ministra-lhe
grande dose de açúcar e leva-o a morte).
INDEPENDENTES -
Causas absolutamente independentes – sempre excluem o nexo causal
PRÉ-EXISTENTE
Ex. A atira em B, que vem a falecer pouco depois, mas porque ingeriu veneno antes de tomar o
tiro. A não responderá pela morte, pois a causa dela foi outra independente de sua conduta e
pré-existente a esta. Responderá pelos atos anteriores e, assim, será punido por tentativa de
homicídio.
1. CONCOMITANTE
Ex. A atira em B, no mesmo momento em que este vem a falecer exclusivamente por um
colapso cardíaco. A não responderá pela morte, pois a causa dela foi outra independente de
sua conduta, embora concomitante a esta. Responderá pelos atos anteriores e, assim, será
punido por tentativa de homicídio.
2. SUPERVENIENTE.
Ex. A ministra veneno na alimentação de B que, quando está tomando a refeição, vem a
falecer em conseqüência de um desabamento. A não responderá pela morte, pois a causa dela
foi outra ABSOLUTAMENTE independente de sua conduta, embora a ela superveniente.
Responderá pelos atos anteriores e, assim, será punido por tentativa de homicídio.
As causas absolutamente independentes rompem o nexo causal decorrente da conduta. O
agente não responde pelo resultado, mas sim pelos atos praticados antes de sua produção.
Causas Relativamente independentes –
a) PRÉ-EXISTENTE
Ex. A, querendo a morte de B, golpeia-o e este, hemofílico, vem a falecer em decorrência dos
ferimentos.
b) CONCOMITANTE
Ex. A desfecha tiros em B, no exato instante em que está sofrendo um colapso cardíaco,
provando-se que a lesão contribuiu para eclosão do êxito letal.
O resultado é imputável nestes dois casos, pois o resultado se coloca na linha de
desdobramento causal gerado pela ação. O fato de ser a vítima hemofílica ou portadora de
doença cardíaca não afasta o nexo entre a conduta (tiros disparados para matar) e o resultado
(morte em decorrência dos tiros).
No entanto, deve-se ter em mente o dolo do agente: se ele queria ferir, mas a causa
relativamente independente, seja ela concomitante ou pré-existente, não era de seu
conhecimento, ele poderá responder por crime preterdoloso, se provada a sua culpa em
relação ao resultado mais grave.
c) SUPERVENIENTE (exceção ao princípio consagrado no caput do art. 13)
O código adota a teoria da condicionalidadeadequada – "para ser considerada como causa do
evento, seja concretamente reconhecida como idônea à consecução, através de uma
'valoração póstuma'." (Miguel Reale Júnior, Teoria do Delito)
"Por sua preponderância sobre as condições anteriores, às quais está ligada de modo relativo,
a nova condição absolve o processo de causalidade no qual interfere. Se a ação subseqüente,
mesmo que relativamente relacionada com as condições anteriores, por si só apresenta-se
como causadora do evento, esse apenas é a ela atribuído com a ressalva de que os fatos
anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou" Miguel Reale Júnior. Ex. Vítima de um
atentado é levada ao hospital e sofre acidente no trajeto, vindo, por esse motivo, a falecer.
A causa superveniente relativamente independente exclui a imputação do resultado,
respondendo o agente apenas pelos atos praticados.

13
O problema da condenação do agente dependerá da prova do seu dolo.
OBS.: Segundo Capez, “se a causa superveniente está na linha do desdobramento físico
ou anátomo-patológico da ação, o resultado é atribuído ao agente. Trata-se de causa
dependente. Exemplos colhidos na jurisprudência: choque anestésico por excesso de éter ou
imprudência dos médicos operadores (...). Em tais hipóteses, ao autor é atribuído o resultado
final (morte), já que a segunda causa guarda relação com a primeira, num desdobramento
causal obrigatório. Inserem-se, assim, dentro da linha de desdobramento causal da
conduta, classificando-se como causas dependentes desta. (..)”.
RESULTADO = MESMA LINHA DE DESDOBRAMENTO FÍSICO DA AÇÃO INICIAL +
SIGNIFICÂNCIA DA LESÃO.
Para Alberto Silva Franco, a tese de que o evento se encontra na linha de desdobramento
físico da ação anterior não basta, contudo, para concluir-se sempre pelo nexo de causalidade,
como enfatizou, com razão Silva Pinto. Se tal fosse exato, um ferimento levíssimo, através do
qual houve no organismo a penetração de bacilos tetânicos, poderia engendrar o resultado
morte e não se poderia negar que tal resultado estivesse na linha de desdobramento físico da
lesão provocada. Para evitar tal rigor, ao critério do desdobramento da ação física deve ser
adicionado outro ingrediente, qual seja, o conceito de significância, para evitar que, na vida
real, surjam situações embaraçosas ou excessivamente rigorosas que poderiam atentar contra
o sentimento de justiça de um homem de bem14.
Aberratio causae (dolo geral ou erro sucessivo) – ERRO SOBRE O NEXO CAUSAL
Quando o agente, na convicção de já ter praticado o crime, pratica outra conduta, que achava
ser mero exaurimento da primeira, e, neste momento sim, chega à consumação desta, terá
praticado o primeiro crime na modalidade de dolo geral, posto que, desde o começo, sua
intenção era atingir o resultado a que somente chegou através de duas condutas. Ex.: o
agente, após estrangular a vítima, crendo que esta já está morta, atira-a num rio e esta vem a
falecer por afogamento, fato este provado pelo exame de corpo de delito. O agente responderá
por homicídio doloso com dolo geral e não por tentativa de homicídio doloso e homicídio
culposo em concurso material.
OMISSÃO COMO CAUSA DO RESULTADO: a omissão também poderá ser considerada
causa do resultado, bastando que para isso o omitente tenha o dever jurídico de impedir, ou
pelo menos tentar impedir, o resultado lesivo.
CRIMES OMISSIVOS PRÓPRIOS E IMPRÓPRIOS:
crimes omissivos próprios, puros ou simples: são os que objetivamente são descritos com uma
conduta negativa, de não fazer o que a lei determina, consistindo a omissão na transgressão
da norma jurídica e não sendo necessário qualquer resultado naturalístico. Para a existência do
crime basta que o autor se omita quando deve agir. Aqui o legislador faz expressa previsão
típica da conduta que deve ser imposta ao agente.
crimes omissivos impróprios, comissivos por omissão ou omissivos qualificados: são aqueles
que, para sua configuração, é preciso que o agente possua um dever de agir para evitar o
resultado. Esse dever de agir não é atribuído a qualquer pessoa, mas tão somente àquelas que
gozem do status de garantidoras da não-ocorrência do resultado (art.13, §2º do CP). Chamam-
se também de crimes de omissão qualificada, porque os sujeitos devem possuir uma qualidade
específica. Estes são considerados tipos abertos, não existindo prévia definição típica. É
preciso que o julgador elabore um trabalho de adequação, situando a posição de garantidor do
agente aos fatos ocorridos, considerando, ainda a sua rela possibilidade de agir. Enquanto nos
crimes omissivos próprios a conduta é negativa, aqui a conduta é positiva, só que praticada via
omissão do agente que, no caso concreto, tinha o dever de agir para evitar o resultado. Por
isso é que se diz que o crime é comissivo por omissão. Os resultados podem ser imputados ao
agente em razão das condutas dolosa ou culposa do agente.
O CP adotou o critério das fontes formais do dever de garantidor, deixando de lado a teoria das
funções, preconizada por Armin Kaufmann, que defendia a tese de que seria garantidor o
agente que tivesse uma relação estreita com a vítima, mesmo que não existisse qualquer
obrigação legal entre eles.

14
Veja-se o caso da doença raríssima polineurite viral: o sujeito, numa briga, recebe um soco
que lhe corta a testa. Teríamos aí uma lesão corporal leve. Porém, por “azar” da vítima – “azar”
porque só há registro, no mundo, de 12 casos da doença – ela a contrai e vem a ficar
tretaplégica. Deve o autor do soco responder por lesão corporal gravíssima? Penso que não, seja
dado à insignificância da ação em relação ao resultado, seja pela correção da teoria da
causalidade adequada pela imputação objetiva: quem desfere soco em outro alguém cria risco
proibido penalmente relevante de lesionar levemente e não de lesionar gravemente.
TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA:
Surgiu na Alemanha, tendo seus primeiros conceitos partido de Hegel e Richard Honig.
Recebeu maior impulso depois da Segunda Guerra Mundial por Claus Roxin, que é o
responsável pela corrente doutrinária denominada funcionalismo teleológico funcional (o Direito
Penal existe para cumprir determinados fins, que são retratados nos princípios da intervenção
mínima, da exclusiva proteção dos bens jurídicos, etc).
EVOLUÇÃO: Enquanto prevaleceu a Teoria Causalista, bastavam ao tipo seus elementos
objetivos (descrição do sujeito, do objeto e da ação executiva, formas especiais de
comissão...), eis que dolo e culpa não integravam o fato típico, mas sim a culpabilidade. Com a
posterior adoção da Teoria Finalista, o dolo e culpa foram retirados da culpabilidade e inseridos
no tipo, que passou desta maneira a possuir também um elemento subjetivo (“tipo complexo”).
A partir daí o tipo deixou de ser considerado realizado tão-somente em decorrência do
fenômeno natural da causação, passando a ser exigido também um direcionamento.
O tipo objetivo, entretanto, continuou a ser considerado como realizado por meio da mera
relação de causalidade. Em outras palavras, manteve a Teoria Finalista o conceito de Tipo
Objetivo já adotado na Teoria Causalista.
Daí surgiu a TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA, com o fito de resolver os problemas não
solucionados pelo causalismo e o finalismo, por intermédio de uma nova metodologia de
análise e delimitação do tipo objetivo. A partir dela, deixa-se de analisar uma relação de
causalidade puramente material. Esta somente é condição mínima, a ela devendo se agregar
também a causalidade normativa (imputação objetiva).
Chama-se imputação objetiva porque procura descobrir se o fato pode ser imputado ao agente,
independentemente de seu dolo. Em outras palavras, a imputação objetiva é distinta da
imputação subjetiva. Por sinal, distinta e precedente.
A imputação objetiva é a sintonia fina da teoria da equivalência dos antecedentes causais
(art.13 do CP). Se pudéssemos nos valer de uma imagem, diríamos que o nexo de causalidade
é uma peneira de espaços grandes enquanto a imputação objetiva conta com orifícios
menores. Muitos fatos passam pelo filtro maior do nexo de causalidade, não porém pelo menor
da imputação objetiva.
CONCLUSÕES INICIAIS:
- Para as teorias causalista e finalista:
TIPO OBJETIVO = (Presença dos) ELEMENTOS DO TIPO OBJETIVO.
- Para a teoria da imputação objetiva:
TIPO OBJETIVO = (Presença dos) ELEMENTOS DO TIPO OBJETIVO + IMPUTAÇÃO
OBJETIVA.
TIPO COMPLEXO = TIPO OBJETIVO (ELEMENTOS DO TIPO OBJETIVO + IMPUTAÇÃO
OBJETIVA) + TIPO SUBJETIVO.
A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA SEGUNDO CLAUS ROXIN: deve o tipo compreender
tanto a causalidade material quanto a causalidade normativa (imputação objetiva). Para que
possa haver imputação objetiva, seria necessária a concorrência de três condições:
a) criação ou incremento de um risco proibido relevante;
b) conexão direta entre esse risco e o resultado jurídico;
c) resultado no âmbito de proteção da norma.
A contrario sensu, podemos afirmar não poder o resultado ser imputado ao agente sempre que
ocorrer uma das seguintes situações:
a) o resultado decorra do exercício de um risco permitido ou de uma ação do agente que
tenha visado apenas diminuir um risco não permitido;
b) o risco não permitido não chegue a se realizar no resultado concreto;
c) o resultado se encontre fora do alcance do tipo ou da esfera de proteção da norma.

a) CRIAÇÃO OU INCREMENTO DE UM RISCO PROIBIDO RELEVANTE (mnemônica de Luiz


Flávio Gomes ->CIRPR)
O risco será considerado permitido:
- nas ações perigosas que sejam autorizadas pelo
legislador, em virtude de sua preponderante
utilidade social, quando se tratar de um risco
inevitável ou realmente necessário para o avanço
das empresas que integram nossa sociedade
industrializada;
- quando decorrer do princípio da confiança (não
realiza conduta típica aquele que, confiando em
terceiro e agindo conforme o Direito, envolve-se em
situação na qual terceiro produza o resultado
danoso. Ex: padeiro que tenha vendido um bolo
para o homicida que, posteriormente, nele inseriu
veneno);
- nos casos de ausência de domínio do resultado (o
resultado querido pelo agente não depende
exclusivamente da sua vontade. Ex: A, sabedor da
violência das ondas daquela praia, proporciona a
seu amigo surfista B viagens ao local, na
expectativa de que ele se afogue.)
- diminuição de risco de dano maior ao bem jurídico.
- (Luiz Flávio Gomes) intervenções médicas
terapêuticas ou curativas; lesões esportivas;
colocação de ofendículos; situações inseridas por
Zaffaroni na sua teoria da tipicidade conglobante.
Tratar-se-á de criação de risco proibido, a autorizar a imputação objetiva, a conduta do agente
que aumentar um risco preexistente, mesmo que permitido, ou ultrapassar os limites para os
quais tal risco seria juridicamente tolerado.
b) CONEXÃO DIRETA ENTRE ESSE RISCO E O RESULTADO JURÍDICO
O risco não permitido, criado pelo autor, deve se realizar. No clássico exemplo do indivíduo que
é baleado, mas vem a falecer em razão de acidente envolvendo a ambulância que o
transportava para o hospital, pode-se afirmar que o autor do disparo criou risco não-permitido
que, entretanto, não se realizou, eis que a vítima não faleceu em decorrência do tiro, mas sim
do acidente. Desta forma o autor do disparo apenas poderia ser punido pela tentativa.
a) RESULTADO NO ÂMBITO DE PROTEÇÃO DA NORMA
Deve, ainda, a conduta afrontar a finalidade protetiva da norma para que possa haver
imputação. Imaginemos dois carros que trafegam à noite, um atrás do outro, ambos com os
faróis apagados. O motorista que dirigia à frente colide com um automóvel que vinha em
direção contrária. O motorista que seguia à frente deve ser punido por lesões corporais
culposas. O que dirigia atrás, embora também tenha criado o perigo, não poderá ser
responsabilizado pelo crime, eis que não realizou o risco não-permitido que a lei pretendia
evitar com seu comando.
Também delimita o alcance do tipo o critério da auto-responsabilidade da vítima. Ex: traficante
que entrega heroína ao viciado, vindo este último a falecer de overdose ao consumi-la. Deve o
traficante responder apenas pelo tráfico.
TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA SEGUNDO GUNTHER JAKOBS: para ele, deverá o tipo
objetivo ser acrescido de um novo elemento essencial, qual seja, a violação de um papel.
Assim, as instituições delimitadoras da imputação objetiva seriam as seguintes:
a) risco permitido;
b) princípio da confiança;
c) proibição de regresso (um comportamento que de modo invariavelmente insiderado é
inofensivo, não constitui participação em uma atividade não permitida. Vide exemplo do
padeiro e o bolo envenenado);
d) competência ou capacidade da vítima: incluídas as situações da posição da vítima (ex:
eutanásia), as ações a próprio risco (ex: prática de esportes radicais), e o
consentimento da vítima, quando presentes os requisitos de validade.

Item: Homicídio:

Homicídio Simples (art. 121, CP):


Conceito: eliminação da vida humana extra-uterina praticada por outra pessoa.
Objeto Jurídico: Vida humana extra-uterina.
Sujeito passivo: qualquer ser humano vivo.
Sujeito ativo: qualquer pessoa. Admite co-autoria e participação. Autoria colateral – duas
pessoas querem praticar crime e agem ao mesmo tempo, sem que uma saiba da intenção da
outra, e o resultado morte decorre da ação de apenas uma delas. Este responde pelo
homicídio consumado, o outro pelo tentado. Autoria incerta – mesmo caso, mas não se
identifica qual deles causou a morte. A doutrina entende que ambos devem responder por
tentativa.
Qualificação doutrinária – é crime: comum (praticado por qualquer pessoa); simples (atinge um
único bem jurídico); de dano; de ação livre; instantâneo (de efeitos permanentes); material.
Consumação – com a morte (encefálica) da vítima (crime material) provada com exame de
corpo de delito (se impossível é aceitável o indireto – por testemunhas). Não é necessária a
viabilidade do neonato para se caracterizar o homicídio.
Tipo objetivo – tirar a vida de alguém. Vida extra-uterina, que se dá com o rompimento do saco
amniótico.
Tipo subjetivo – dolo, consciente vontade de matar alguém (animus necandi ou occidendi).
Pode ser direto (agente quer o resultado) ou eventual (assume o risco de produzi-lo).
Delito plurissubsistente (fracionável) – Admite tentativa inclusive no crime cometido com dolo
eventual, já que equiparado por lei a dolo direto.
É admissível a tentativa. Tentativa branca ou incruenta – não houve lesão à vítima. Tentativa
cruenta – houve lesão corporal à vítima.
Elemento subjetivo – dolo (direto ou eventual).
Aumenta a pena em 1/3 se crime contra menor de 14 ou maior de 60.
Vítima Presidente da República, Presidente do Senado Federal, da Câmara ou do STF e
agente com motivação política. Crime é o do artigo 29 da Lei de segurança nacional (L.
7170/83).
Homicídio simples, quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio (chacina,
matança generalizada), mesmo que por um único executor, é etiquetado como crime hediondo
(doutrina o chama de homicídio condicionado – depende de condição para ser hediondo).
Quanto ao número mínimo para integrar esse grupo, no silêncio da lei, Luiz Vicente Cernichiaro
sugere 3 pessoas. Rogério Sanches pelo número mínimo de 4 pessoas (legislador teve em
mente o art. 288 quando incluiu esse crime no rol dos hediondos).
Homicídio Privilegiado (art. 121, § 1º, CP):
Motivo de relevante valor social – diz respeito a interesses da coletividade.
Motivo de relevante valor moral – aqueles aprovados pela moralidade média, considerados
nobres ou altruístas (ex.: eutanásia).
Obs: Eutanásia – homicídio piedoso, ato deliberado para tirar a vida de outrem que padece de
doença incurável (é abrangida pelo homicídio privilegiado). Ortotanásia – eutanásia passiva,
não se utiliza dos equipamentos médicos para prolongar a vida, pois este tratamento, por si só,
já representaria grande sofrimento (Resolução do CFM que a admitia foi suspensa por decisão
judicial). Distanásia – morte lenta e sofrida que é postergada pelos recursos médicos
disponíveis.
Sob domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação – são, na verdade, três
requisitos: (a) existência de emoção intensa, a ponto de descontrolar o agente; (b) injusta
provocação da vítima (não agressão, pois aí poderá haver legítima defesa); (c) reação imediata
– não deve haver uma interrupção entre o momento da provocação e do homicídio – leva-se
em conta o momento em que o agente fica sabendo da provocação, e não o da sua ocorrência.
Obs: Mora na reação exclui a minorante, transmudando-se em vingança. Injusta provocação
como qualquer conduta incitante, desafiadora, injuriosa.
Todas as formas de privilégio são de caráter subjetivo, porque ligadas à motivação do crime ou
ao estado emocional do agente e, assim, nos termos do art. 30 do CP, não se comunicam aos
co-autores e partícipes que tenham agido por outro motivo.
Art. 121, §1 º, CP. Comunicabilidade. Doutrina é no sentido de que o parágrafo primeiro traz
circunstâncias (dados eventuais), interferindo apenas na quantidade de pena e não na
qualidade do crime, que permanece o mesmo. Assim, na hipótese de concurso de pessoas,
tais circunstâncias minorantes (subjetivas) são incomunicáveis entre os concorrentes (CP, art.
30)

Homicídio Qualificado (art. 121, § 2º, CP):


As qualificadoras dos incisos I, II e V são consideradas de caráter subjetivo, porque se referem
à motivação do agente. As dos incisos III e IV são de caráter objetivo, porque ligadas aos
meios de execução. Todas as suas formas etiquetadas como hediondas.
Inciso I, primeira parte – “mediante paga ou promessa de recompensa” – também chamada de
homicídio mercenário. Delito de concurso necessário. De acordo com o STF, responde pelo
crime não só quem recebe, mas também aquele que paga ou promete recompensa. Há
decisões do STJ em sentido contrário, entendendo que as qualificadoras não são elementares
do tipo e, portanto, ainda que subjetivas, não se comunicam entre os co-autores Pode ser
pagamento em dinheiro ou outra vantagem econômica. Alguns autores entendem que a
vantagem não precisa ser econômica. A paga é prévia em relação ao homicídio, a promessa é
para pagamento posterior à execução do ato homicida. É hipótese de concurso necessário
(mandante e executor). A qualificadora, para a maioria da doutrina e jurisprudência, aplica-se a
mandante e executor, por ser a paga ou promessa elementar do crime, na forma do art. 30,
CP.
Inciso I, segunda parte – “motivo torpe” – motivo vil, repugnante, abjeto, desprezível, que
demonstra depravação moral do agente. Ciúme não é motivo torpe. A vingança, por si só, pode
ser motivo torpe, se o antecedente for torpe, caso contrário, não. Depende da causa que a
originou. Se alguém mata o assassino de seu filho não é.
Inciso II – “motivo fútil” – matar por motivo de pequena importância, insignificante, havendo
absoluta desproporção entre a causa e o crime. A ausência de motivos se equipararia ao
motivo fútil. Bitencourt concorda com a razoabilidade da equiparação, mas, em respeito ao
princípio da reserva, defende a inclusão de inciso no art. 121, § 2º, CP tratando do caso . O
ciúme não é motivo fútil, se não há outras circunstâncias a ele acrescentadas. Há julgados que
apontam que quando o ciúme junta-se com a estima possessiva, pode haver configuração do
motivo torpe.No STJ ausência de motivos não é considerada motivo fútil: . Na hipótese em
apreço, a incidência da qualificadora prevista no art. 121, § 2º, inciso II, do Código Penal, é
manifestamente descabida, porquanto motivo fútil não se confunde com ausência de motivos,
de tal sorte que se o crime for praticado sem nenhuma razão, o agente somente poderá ser
denunciado por homicídio simples (Precedentes STJ).
3. Ordem concedida para excluir da sentença de pronúncia a qualificadora prevista no inciso II
do § 2º do art. 121 do Código Penal.
(HC 152548/MG, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 22/02/2011, DJe
25/04/2011)

Inciso III – quanto aos meios empregados:


a) veneno- substância química ou biológica que, introduzida no organismo, pode causar
morte. Para configurar a qualificadora, o veneno tem que ser inoculado sem que a
vítima perceba, de forma sub-reptícia. Se for inoculado com violência, aplica-se a
qualificadora de meio cruel. Exige-se prova pericial toxicológica para comprovar o
emprego de veneno.
b) Fogo
c) Explosivo
d) Asfixia – é o impedimento da função respiratória. Pode ser mecânica ou tóxica. A
asfixia mecânica por dar-se por: (1) esganadura – constrição do pescoço da vítima
efetuada pelo próprio corpo do agente; (2) estrangulamento – constrição do pescoço da
vítima com fios, arames ou cordas que são apertados pelo agente; (3) enforcamento –
causado pelo próprio peso da vítima, que tem seu pescoço envolto em corda ou
similar; (4) sufocação – uso de objeto para obstruir a passagem do ar e impedir sua
chegada aos pulmões da vítima; (5) afogamento – submersão em meio líquido; (6)
soterramento – submersão em meio sólido; (7) imprensamento ou sufocação indireta –
impedir o funcionamento da musculatura abdominal responsável pelo movimento
respiratório. A asfixia tóxica pode ocorrer por: uso de gás asfixiante; ou confinamento –
colocação da vítima em recinto fechado sem renovação do oxigênio (ex.: trancar a
vítima num caixão).
e) Meio insidioso – uso de armadilha ou fraude para atingir a vítima sem que ela perceba
que está ocorrendo um crime (ex. sabotagem de freio de veículo).
f) Qualquer meio que possa provocar perigo comum – além de causar a morte da vítima,
o meio utilizado pelo agente tem o potencial de causar situação de risco á vida ou
integridade corporal de número elevado e indeterminado de pessoas.
Obs: STJ, por maioria de votos, considerou admissível a qualificadora do perigo comum
nos casos de homicídio doloso (eventual) na condução de veículo automotor com
excesso de velocidade (no caso 165 km em via pública)
g) Tortura ou qualquer outro meio cruel – quando o agente sujeita a vítima a graves e
inúteis sofrimentos físicos ou morais. A crueldade, para configurar a qualificadora, deve
ser empregada como meio para causar a morte. Se houver dolo apenas com relação a
tortura, derivando a morte de culpa, responderá pelo crime de tortura qualificado pelo
resultado. O crime de tortura qualificado pela morte da Lei 9.455/97, art. 1º, § 3º é
preterdoloso, diferenciando-se aí do homicídio qualificado pelo uso de tortura.
Inciso IV – quanto ao modo de execução:
a) Traição – o agente se aproveita de uma prévia confiança que a vítima nele deposita
para alvejá-la em um momento em que esteja desprevenida.
b) Emboscada – tocaia. O agente aguarda escondido a passagem da vítima por um
determinado local para, em seguida, alvejá-la.
c) Dissimulação – utilização de um recurso qualquer para enganar a vítima, visando a
possibilitar uma aproximação para que o agente possa executar o ato homicida. Pode
ser material (disfarce) ou moral (ex.: dar falsas provas de amizade).
d) Qualquer outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa da vítima – fórmula
genérica que só pode ser aplicada quando o fato não se enquadrar em qualquer das
qualificadoras do inciso IV.
Obs: Idade da vítima (tenra ou avançada), por si só, não possibilita a aplicação dessa
qualificadora, porquanto constitui característica da vítima, e não recurso procurado pelo agente.
Inciso V – Por conexão:
a) Teleológica – para assegurar a execução de outro crime. Nessa hipótese, o agente
primeiro mata a vítima para depois cometer outro crime. Caso o agente cometa o
homicídio com a intenção de assegurar a execução de outro crime e depois desista de
praticá-lo, ainda assim incidirá a qualificadora.
b) Conseqüencial – quando o homicídio visa assegurar a ocultação, impunidade ou
vantagem de outro crime. Nesses casos, o agente primeiro comete o outro crime e
depois o homicídio. Ocultação – o sujeito quer evitar que se descubra que crime
anterior foi praticado; Impunidade – a preocupação do agente é evitar a punição do
autor do delito anterior; Vantagem de outro crime – matar co-autor de roubo para ficar
com todo o dinheiro, por exemplo. Se a intenção do agente é assegurar a execução,
ocultação ou vantagem de contravenção (como no jogo do bicho, por exemplo), não
restará caracterizada tal qualificadora, mas a do motivo torpe (inciso I).
A conexão ocasional, que ocorre quando o agente aproveita-se de um crime para cometer
outro, sem que essa fosse sua original intenção, não está prevista nesta qualificadora,
configurando concurso material (p. ex. hom + furto/ há decisão do STJ no sentido de latrocínio)
Homicídio qualificado privilegiado – Doutrina majoritária admite, desde que as qualificadoras
sejam de natureza objetiva (STF e STJ neste sentido). Prevalece que o crime não será
hediondo (analogia com o artigo 67 do CP, preponderando o privilégio). Há doutrina em
contrário, aduzindo que o art. 67 do CP aplica-se apenas para agravante e atenuante e a lei
8930/94 (confirmar numero da lei) não fez ressalva neste sentido.
Pluralidade de circunstâncias qualificadoras – 2 Correntes:
a) Uma é considerada qualificadora e as demais como circunstâncias agravantes;
b) Uma é considerada como qualificadora e, com base nela, fixa-se a pena de 12 a 30
anos, e, as demais, são consideradas como circunstâncias judiciais do artigo 59 do CP,
pois o art. 61 do CP é expresso ao afirmar que as circunstâncias não podem funcionar
como agravantes quando forem, ao mesmo tempo, rãslificadoras.
Obs: AIDS – transmissão intencional para matar. É homicídio se sobrevier a morte da vítima.
No entanto, enquanto não sobrevier o óbito, há entendimento no sentido de se reconhecer
lesão corporal gravíssima (art. 129, § 2º, II, CP), como regra, pois é difícil reconhecer tentativa
de homicídio nesse caso. STJ já decidiu pela tentativa. Se o aidético não conseguir contaminar
a vítima, poderá ser caracterizado o crime do artigo 131 do CP (perigo de contágeo de moléstia
grave)
Obs: Genocídio – competência Juiz Singular da Justiça Federal. STF entendeu que a
responsabilidade pelo genocídio não afasta a imputação pelos homicídios cometidos.
Concurso formal entre os crimes de homicídio (na forma continuada) e genocídio (crimes com
desígnios autônomos). Julga o Tribunal do Júri Federal pela conexão.
As qualificadoras somente se comunicam aos partícipes que, no caso concreto, tenham
tomado conhecimento a seu respeito.
Se os jurados reconhecerem mais de uma qualificadora, o juiz, na fixação da pena, usará uma
delas para qualificar o delito e as demais como agravantes genéricas.
Art. 121, § 4º, CP – causas de aumento de pena.
Homicídio Culposo (art. 121, § 3º, CP):
Ocorre homicídio culposo quando o agente não queria causar a morte nem assumiu o risco de
produzi-la, mas dá causa a ela por imprudência, negligência ou imperícia.
Não existe compensação de culpas no direito penal, sendo que, havendo culpa da vítima, o
agente ainda assim responderá por sua conduta culposa.
Causas de aumento de pena – art. 121, § 4º, CP (mais 1/3) –
a) Inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício (chamada culpa profissional,
aplicável apenas no caso de profissional tecnicamente capacitado);
b) Se o agente deixa de prestar socorro imediato à vítima – só é aplicável se o agente
causador do fato deixou de prestar assistência à vítima. Não será aplicada se se
comprovar que havia riscos à integridade física do agente. STF decidiu que, ainda
que se constate morte instantânea, haverá o aumento de pena se o agente não
puder efetivamente certificar-se de tal situação. Se o socorro foi prestado, não cabe
a atenuante genérica do art. 65, III, “b”, do CP, pois é dever legal do causador do delito
prestá-lo;
c) Agente não procura diminuir as conseqüências do seu ato (espécie do anterior);
d) Agente foge para evitar sua prisão em flagrante (há entendimento pela sua
inconstitucionalidade, além de ser pacífica sua não incidência quando o agente foge
para evitar linchamento).
Perdão Judicial – art. 121, § 5º, CP – somente pode ser aplicado na sentença e não precisa ser
aceito para produzir efeitos. Natureza Jurídica do Perdão Judicial – Súmula 18 – “A sentença
concessiva do perdão judicial tem natureza declaratória da extinção da punibilidade, não
subsistindo qualquer efeito condenatório.”

Homicídio Culposo na direção de veículo automotor (art. 302, Lei 9.503/97): apesar do veto no
dispositivo do CTB, é aplicável o perdão judicial ao homicídio culposo na direção de veículo
automotor. Causas de aumento de pena: agente não possuir permissão para dirigir ou carteira
de habilitação; crime é cometido na faixa de pedestres ou na calçada; deixar de prestar
socorro, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à vítima do acidente; agente, no exercício
da profissão ou atividade estiver conduzindo veículo de transporte de passageiros.

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