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Resumo: É próprio da discussão acerca da ética certa diluição entre entradas teóricas e
metodológicas permanentes relativas ao conhecimento histórico, tais como noções de verdade
e prova e seus mais diversos usos, a autoridade do historiador e seu papel social, entre outros.
Atentando a tais aspectos, este trabalho pretende corroborar a ideia de que um esforço no
sentido de mapear elementos éticos presentes na historiografia brasileira em diferentes
períodos pode contribuir no sentido de apontar características, por vezes ignoradas, da figura
do historiador e de sua produção. Desse modo, parte da obra de Francisco Adolfo de
Varnhagen (1816-1878) é tomada como objeto da análise. Acredita-se que alguns dos escritos
do historiador e diplomata oitocentista constituem pertinente conjunto de exemplos a serem
explorados no que tange ao problema ético, a ser incorporado às análises historiográficas
desenvolvidas nas últimas décadas.
Abstract: It is in the discussion of ethics among some dilution entries theoretical and
methodological knowledge concerning the permanent history, such as notions of truth and
evidence and its various uses, the authority of the historian and social role, among
others. According to these aspects, this paper aims to reinforce the idea an effort to map out
ethical elements present in Brazilian history at different times may contribute to sense of point
features, often ignored, the figure of historian and his own production. Therefore, part of the
work of Francisco Adolfo de Varnhagen (1816-1878) is taken as an object of analysis. It is
believed that some of the writings of nineteenth-century historian and diplomat are relevant
set of examples to be explored in relation to the ethical problem, to be incorporated into the
historiographical analysis developed in recent decades.
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Doutorando em história na UFRGS e bolsista CAPES.
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Quando fazemos juízos morais, não estamos apenas dizendo que isso é melhor do
que aquilo. De um modo até mais fundamental, estamos dizendo que isso é mais
importante do que aquilo. É ordenar a avassaladora dispersão e simultaneidade de
tudo, ao preço de ignorar ou dar as costas para a maior parte daquilo que acontece
no mundo (SONTAG, 2008:235).
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Não é demais recordar que Max Weber é autor da clássica obra A ética protestante e o espírito do capitalismo,
publicada, em livro, no ano de 1920.
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ética historiográfica, ora percebida para o momento em que a história, como saber, encontra –
no trabalho dos mencionados letrados – seu feitio disciplinar.
A história, apesar de ainda não estar estabelecida como uma ciência (tal qual este
termo era apreendido ao longo de boa parte do século XIX), passou a ser, pouco a pouco,
entendida como uma disciplina, galgando o status que, já à época, justificaria recorrentes
tentativas de caracterização e diferenciação do ofício histórico. Hannah Arendt, em suas
considerações sobre os conceitos antigo e moderno de história, lembra que a ascensão do
conhecimento produzido pelos historiadores ao patamar que atingiu desde as décadas finais
do século XVIII, isto é, com o predomínio da noção de processo histórico a ocupar o lugar das
diretrizes políticas, não deve ser considerada uma obviedade. “E de fato, no início da época
moderna, tudo apontava para a elevação da ação e da vida política, e os séculos XVI e XVII,
tão ricos de novas filosofias políticas, eram ainda inteiramente inconscientes de qualquer
ênfase especial na História como tal” (ARENDT, 2003:110).
A continuidade das ciências provém dos gregos, quase todos que ainda hoje ocupam
sua inteligência têm na Grécia antiga o seu começo; sobretudo a região que bem se
denomina como ciências morais foi privilegiadamente organizada pelos gregos.
Mas, ao lado da Ética, da Política, da Economia etc., eles não têm uma teoria da
história [Historik] (DROYSEN, 2010:38).
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Por tratar-se de uma passagem extraída de um capítulo da obra de François Hartog dedicada a Fustel de
Coulanges (capítulo este destinado às “notas e fragmentos” de textos escritos pelo historioador oitocentista) e
não contar com título atribuído por seu autor, conforme explica François Hartog, não faço remissão direta ao
trabalho, tal como fiz com relação ao texto de Droysen.
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(...) apreciando altamente os trabalhos acerca da historia patria, pelos auxilios que
podem prestar (independentemente dos que proporcionam á erudição e á
litteratura) ao estadista, ao jurisconsulto, ao publicista, ao diplomata, ao
estrategico, ao naturalista, ao financeiro e aos varios artistas; e talvez tambem
prevendo que com serviço nenhum melhor, do que os que tivessem relação com a
historia e a geographia (e aqui cabem todos os productos naturaes), poderiam os
seus subditos ser uteis ao saber humano em geral, entrando na grande communhão
scientifico-litteraria europea, de que por outro lado tantos auxilios recebemos, por
meio da offerta de novos dados, que inclusivamente venham a ser ahi debatidos, em
proveito da illustração do paiz (VARNHAGEN, 1857:VI).3
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Nas citações presentes no texto é mantida a grafia original.
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formuladas décadas antes de serem, por fim, expostas. Um bom exemplo disso são seus
estudos sobre as viagens de Américo Vespúcio. Um assunto que extrapola o interesse
meramente nacional é submetido ao exame varnhagueniano desde os primórdios de suas
pesquisas até poucos anos antes da morte do pesquisador. Em suas viagens pelo mundo, não
perdia a oportunidade de localizar documentos para acrescentar ou corrigir suas deduções:
No opusculo que, sempre perseverante por esclarecer toda a verdade a respeito das
navegações do celebre florentino de quem o Continente de todo um hemispherio
leva o nome, publicámos em 1869, explicando definitivamente, pelo texto da propria
carta de Pedro Soderini em 1504, a sua primeira viagem como effectuada em 1497-
98, desde Honduras, pelas costas do Yucatan, Mexico e Florida, até as ilhas depois
denominadas Bermudas, fizemos menção de dois argumentos, que, com a mesma
boa fé que acompanha essa nossa constante perseverança na investigação da
verdade vamos hoje ser os primeiros a retirar, bem que substituindo-os por outro,
ao parecer de mair força, mas que serão tomados pelos críticos na consideração
que lhes mereçam (VARNHAGEN, 1874:1).
Cabe mencionar que uma definição de verdade histórica passível de ser mapeada está
registrada no prefácio anteriormente citado. A verdade, segundo o autor da Historia geral,
passa efetivamente pela correção, um método constante no ofício do historiador, tal como
concebido na obra aqui analisada: “quando em historia o criterio da verdade só se define e se
entende bem pela inversa, pelo erro” (VARNHAGEN, 1857:XII). Neste sentido, a história,
saber que interessa a diversos membros das sociedades letradas no século XIX, também só
poderia ampliar-se enquanto áreas de pesquisa não somente de interesse nacional mais direto,
mas a tudo que lhe havia de correlato por meio do acesso direto e constante a novos
documentos. Mesmo os textos considerados mais políticos de Varnhagen, como o Memorial
orgânico (1849-1850) e A questão da capital (1877), onde ele direciona o seu olhar
diplomático aos interesses do Estado por meio de seu conhecimento histórico e geográfico, a
recorrente confrontação com os documentos pode ser observada. No caso do primeiro, em sua
apresentação dos argumentos para a sugestão da transferência da capital do império para o
interior – que, aliás, será o assunto central do segundo trabalho supracitado – explica o autor:
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Desse modo, dois pontos merecem ser evidenciados a partir do que se buscou
sucintamente apresentar. Em primeiro lugar, seguindo a hipótese lançada por Olivier
Dumoulin, em sua investigação do papel do historiador na sociedade francesa dos últimos
dois séculos, pode ser dito que a história passa a assumir todas as funções e se desdobra da
forma como foi visto somente a partir do gradual estabelecimento de procedimentos que
diferenciam os argumentos históricos dos demais. Ainda, a forma como o historiador ocupa
seu espaço e pensa a sua produção em cada época define variações epistemológicas que
devem ser observadas (DUMOULIN, 2003:20). As dimensões éticas da disciplina somente
passam a ser consideradas quando há este acordo social entre pesquisadores. Em segundo
lugar, há certa dificuldade em se trabalhar com noções estritas de ética subdividas, de modo
geral, entre antiga e moderna (RICOEUR, 2003:592). De qualquer maneira, é fundamental
recordar que nenhuma das éticas antigas previram uma reflexão sobre normas individuais que
relacionasse indivíduos que ultrapassassem limites espaço-temporais restritos
(TUGENDHAT, 1996:13). As éticas eram desenvolvidas como uma ferramenta política
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direta, que ignorava o alheio. Esta é uma particularidade que a história, como saber de
pretensões científicas, terá de dar conta a partir do seu “século de ouro”.
Referências