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Octavio Rodríguez

Tradução: José Geraldo Portugal Jr.

pensamento da CEPAL é cons- junto de seus múltiplos componentes.


tituído pelas contribuições à Seguindo uma breve referência intro-
teoria e à política econômica dutória à unidade do pensamento men-
contidas nos documentos ofi- cionado (item 1), apresenta-se uma sín-
ciais daquela instituição. No quadro da tese dos diversos aportes à teoria eco-
página 10, tem-se uma visão de con- nômica (itens 2 a 5). Com base nesta

NOVOS ESTUDOS N.º 16


síntese, intenta-se mostrar que a concep- ricos que lhes servem de base conceituai. Copydesk de
Azevedo Noronha
ção do sistema centro-periferia — ori- As afirmações precedentes não implicam
gem e base do pensamento cepalino — negar que subsistem inconsistências
possui um caráter estruturalista, transmi- menores; sejam imprecisões no estabeleci-
tindo-o a todas as teorias que o compõem mento dos supostos, sejam imperfeições
(item 6). na lógica da argumentação. Tampouco
Sustenta-se, em seguida, que no caráter pretende se sugerir que as distintas con-
estruturalista radicam tanto os alcances tribuições se encontrem interconectadas
quanto as limitações do pensamento em e compatibilizadas a ponto de constituí-
estudo (item 7). Seu mérito principal rem aspectos parciais de uma só teoria
consiste em proporcionar uma descrição perfeitamente coerente. Contudo, as con-
de como se transforma a estrutura produ- tribuições, no que pese seu grande número
tiva, durante o processo de industriali- e a amplitude dos campos que abrangem,
zação das economias periféricas, no mar- possuem considerável unidade.
co de suas relações comerciais com os II. Esta unidade não é perceptível à
centros; e em conectar esta transforma- primeira vista, devido a que os compo-
ção estrutural aos desajustes e problemas nentes do pensamento da CEPAL estão
que acompanham a expansão da indús- disseminados em múltiplos documentos,
tria (as tendências ao desequilíbrio ex- publicados ao longo de muitos anos. A
terno, ao desemprego da força de traba- dificuldade de captá-la depende, ademais,
lho etc.)- A principal limitação se vin- do modo pragmático por meio do qual o
cula ao fato de que, ao concentrar a aná- pensamento se foi estruturando.
lise na transformação da estrutura pro- Diversos aportes têm origem no exame
dutiva, o pensamento cepalino deixa de de problemas concretos, sejam de toda
lado (ou só examina lateral e superficial- a área latino-americana, sejam de algu-
mente) as relações entre as diferentes mas economias que a conformam. Em
classes e grupos sociais, que são as que, torno a tais problemas, vai-se articulando
em última instância, impulsionam tal uma série de argumentos teóricos, reuni-
transformação. dos ad hoc para explicar a causa dos
Sugere-se, ademais (item 8), que des- mesmos e, especialmente, para justificar
considerar as relações sociais de produ- as medidas de política econômica que jul-
ção reflete o caráter ideológico do pen- ga-se adequadas para resolvê-los. Existem
samento da CEPAL: as diversas contri- casos em que as políticas são propostas
buições não as examinam porque esta- em abstrato, isto é, sem relação direta
belecem tacitamente suposições de cunho e visível com qualquer economia especí-
ideológico sobre as mesmas, o que, na fica. Mas, mesmo nesses casos, os argu-
verdade, significa adotar os pontos de mentos teóricos se desenvolvem em co-
vista e privilegiar os interesses de deter- nexão com as recomendações de política
minadas classes e grupos. econômica, vinculados à discussão e à
análise das mesmas. Assim, os trabalhos
da CEPAL tendem a perfilar ad hoc os
1. A unidade do pensamento da CEPAL argumentos teóricos mais pertinentes
para fundamentar determinadas ações
I. A revisão minuciosa das contribui- no campo da política econômica, em de-
ções cepalinas revela que, certamente, trimento do rigor e da precisão com que
não constituem uma mera justaposição ambos se apresentam.
de idéias genéricas sobre a evolução e o III. As notórias deficiências deste
funcionamento das economias subdesen- método pragmático não impediram que o
volvidas; ao contrário, possuem um con- pensamento cepalino alcançasse um grau
siderável desenvolvimento analítico e de unidade muito maior do que habi-
cumprem amplamente com os requisitos tualmente se reconhece. A chave desta
formais da teoria econômica. Em outras unidade se encontra no estabelecimento
palavras, ainda que o rigor das diversas inicial de uma concepção básica e no fato
contribuições varie segundo o documen- de que seus distintos aspectos foram sem-
to, o grau de coerência que cada uma de- do pouco a pouco incorporados e desen-
las alcança com o tempo resulta, sem dú- volvidos nas posteriores contribuições
vida, satisfatório. Além do mais, pode-se teóricas e medidas de política econômica.
comprovar que as análises e recomenda- A concepção originária está constituí-
ções de política econômica são, em geral, da por uma série de idéias e hipóteses
consistentes entre si e com os aportes teó- básicas sobre o desenvolvimento periféri-

DEZEMBRO DE 1986
Componentes do pensamento da CEPAL

1- Âmbito da Teoria 2-Âmbito da Política Econômica


Econômica

Política no Contexto
Política de Política Social, Traba- Política de
das Relações Econômi- Política Agrária
Desenvolvimento lhista e de Rendas Curto Prazo
cas Internacionais
Contribuições Teóricas Fundamentais

a) A concepção do sis- a) Condução deliberada


a) Proteção ao mercado
tema centro-periferia do processo de indus- a) Pesquisa e extensão
interno
(1949-1950) trialização

b) A teoria da deterio-
ração dos termos de b) Critérios de aloca- b) Integração latino- b) Tributação e reforma
trocas — "versão con- ção de recursos americana agrária
tábil" (1949-1950)

c) A teoria da deterioração
dos termos de trocas — c) Planificação do de-
c) Financiamento externo
"versão ciclos" (1949- senvolvimento
1950)

d) A interpretação do
processo de industriali- d) Papel do Estado d) Assistência técnica
zação (1949-1955)

e] A teoria da deterioração e) Política anticíclica


dos termos de trocas — (compensatória das flu-
O PENSAMENTO DA CEPAL: SÍNTESE E CRÍTICA

"versão industrialização" tuações da relação de


(1959) trocas)

f) A teoria da inflação e) Reformas e incenti- a) Redistribuição da a) Política


e) Reforma Agrária
(1958-1964) vos renda antiinflacionária
Outras Contribuições

f) Política anticíclica e
f) Reformulação dos
Teóricas

compensatória da dete-
princípios e métodos b) Política social
rioração da relação de
de planejamento
intercâmbio

g) A análise dos obs-


g) Intensificação do in-
táculos estruturais ao g) Exportação de ma- c) Política ativa de em-
tervencionismo; refor-
desenvolvimento (1960- nufaturas prego
ma fiscal
1963)
co que, apesar de formuladas ao nível las da estrutura produtiva dos centros,
pré-analítico, estão articuladas umas às que se considera, comparativamente, ho-
outras e são compatíveis entre si. Devido mogênea e diversificada. As diferenças
a isso, à medida em que os distintos de estrutura servem de base às distintas
aspectos desta concepção vão sendo for- funções que cada pólo cumpre no esque-
malizados e desenvolvidos com mais am- ma tradicional da divisão internacional do
plitude e rigor, tais formalizações não trabalho. Tais funções se refletem em um
resultam contraditórias nem excludentes, tipo de comércio internacional caracteri-
mas harmônicas e complementares. Assim zado pelo intercâmbio de alimentos e ma-
entendida, a unidade do pensamento da térias-primas por bens industrializados.
CEPAL significa que seus múltiplos com- A concepção básica reconhece a exis-
ponentes estão ligados por um conteúdo tência de uma diferenciação originária:
comum e conformam o esboço de uma em certo ponto do tempo, o centro já
teoria da economia periférica ou, em havia logrado implantar técnicas moder-
outros termos, o esboço de uma teoria nas e elevar a produtividade do trabalho
do subdesenvolvimento. em muito maior medida que a periferia.
Acaba-se de indicar que a unidade do Mas esta só adquire realmente suas ca-
pensamento da CEPAL depende de que racterísticas diferenciais através do de-
um mesmo conteúdo foi sendo desenvol- senvolvimento para fora. A heterogenei-
vido em distintas formalizações ao longo dade e a especialização se conformam e
do tempo. Este nexo entre o conteúdo se consolidam nessa etapa, onde a peri-
e a forma será retomado adiante a partir feria cresce primordialmente com base
de uma outra ótica. O item seguinte trata na expansão de atividades exportadoras
de mostrar que a concepção originária de bens primários.
possui um caráter estruturalista e, nos Ao aumentar o nível da renda da eco-
três seguintes, que o transmite aos apor- nomia mundial e da própria periferia, o
tes teóricos através dos quais se desen- padrão de desenvolvimento desta se alte-
volve. Com base nessas considerações, ra de forma espontânea. Na nova fase
sustentar-se-á posteriormente que a na- denominada desenvolvimento para den-
tureza estruturalista do pensamento em tro, a principal fonte de dinamismo pro-
estudo condiciona seu alcance e suas limi- vém da instalação e ampliação de um se-
tações de maneira decisiva. tor industrial, cuja produção se destina
ao mercado interno.
A diferenciação estrutural entre cen-
2. A concepção originária tro e periferia não implica que esta per-
maneça separada e em estado de atraso.
Ao contrário, supõe-se que em ambos
I. Esta concepção postula que a eco- os modelos e fases os dois pólos se inter-
nomia mundial está composta por dois
conectam e se condicionam reciproca-
pólos, o centro e a periferia, e que as
mente e que em cada um deles ocorrem
estruturas produtivas dos mesmos dife-
mudanças estruturais. Por exemplo: du-
rem de modo substancial. A estrutura rante o desenvolvimento para fora, a ex-
produtiva da periferia se diz heterogênea, pansão acelerada do setor exportador
para indicar que nela coexistem ativida- pode induzir o surgimento de diversos
des onde a produtividade do trabalho é ramos industriais e provocar a reabsor-
elevada, como no setor exportador, com ção de grandes contingentes de força de
outras de produtividade reduzida, como a trabalho em condições de alta produtivi-
agricultura de subsistência. Ademais, in-
dade, sem que a especialização chegue a
dica-se que dita estrutura é especializada,
se reduzir drasticamente, ou a heteroge-
em um duplo sentido: as exportações se neidade a desaparecer por completo. Tais
concentram em um ou em poucos bens características tampouco são erradicadas
primários; a diversificação horizontal, a mediante o desenvolvimento para dentro.
complementariedade intersetorial e a in-
Apesar das importantes mudanças que
tegração vertical da produção possuem
este novo modelo traz consigo, a espe-
escasso desenvolvimento, de tal modo
cialização e a heterogeneidade tendem a
que uma gama muito ampla de bens — se perpetuar, ou, mais propriamente, a se
sobretudo manufaturas — deve obter-se reproduzir e a reaparecer sob novas
mediante a importação. formas.
Estas duas características fundamen- Assim, pois, os conceitos de centro
tais (a heterogeneidade e a especializa- e periferia não se definem com base em
ção) se definem por contraste com aque-

DEZEMBRO DE 1986
O PENSAMENTO DA CEPAL: SÍNTESE E CRÍTICA

uma diferenciação estática de suas estru- tores produtivos e o grau de comptemen-


turas produtivas, mas envolvem as idéias tariedade existente entre eles; tais pe-
já assinaladas de interconexão e mudan- culiaridades se estabelecem, em ambos os
ça estrutural. Dito de outro modo: cen- casos, por contraposição com as que pos-
tro e periferia conformam um sistema suem a estrutura produtiva dos centros,
único, que é dinâmico por sua própria na- o que implica se estar, simultaneamente,
tureza. definindo um sistema: o sistema centro-
Os principais traços da evolução eco- periferia; a desigualdade é considerada
nômica a longo prazo do sistema centro- inerente à sua dinâmica: as estruturas
periferia podem resumir-se da seguinte produtivas dos pólos se fazem maiores e
maneira: mais complexas, mas as diferenças entre
• A estrutura produtiva da periferia per- elas (e entre os respectivos níveis de ren-
1
Estas considerações sobre a manece atrasada. A persistência deste da real média) tendem a perdurar 1 .
concepção do sistema centro-
periferia mostram que seu en- atraso a impede de gerar progresso técni- III. O exame detalhado das contribui-
foque é compatível com a de- co e incorporá-lo à produção em medida ções cepalinas permite afirmar que sua
finição de estrutura como "as
proporções e relações que ca- similar ao centro. Esta disparidade serve ampla e complexa argumentação se orde-
racterizam um conjunto eco- na e se articula, essencialmente, em tor-
nômico localizado no tempo de fundamento ao postulado segundo,
e no espaço (F. Perroux); e que diz que a produtividade do trabalho no à explicação de três tendências que
de sistema como um " com-
plexo coerente de estruturas" se incrementa menos no setor primário- se consideram inerentes ao desenvolvi-
{J. Lhome), sempre que se
entenda que tal conceito pos-
exportador da periferia do que na indús- mento da periferia, na fase de industria-
sui uma conotação dinâmica, tria cêntrica, e que seu aumento médio lização: o desequilíbrio externo, o de-
isto é, que as estruturas vão
se transformando e, com isso, tende também a ser menor na primeira. semprego da força de trabalho e a dete-
transforma-se o próprio siste- • O atraso estrutural tem um papel-cha- rioração dos termos de intercâmbio.
ma (A. Marchal). Sobre estas
definições veja-se A. Marchal, ve na interpretação da tendência à dete Ainda assim, as interpretações de tais
Estructuras y Sistemas Econó- tendências podem expressar-se mediante
micos, Editora Ariel, Barce- rioração dos termos de trocas. Em última
lona, 1961, pp. 50-60. Con- instância, esta se considera provocada três modelos básicos que, por sua vez,
tudo, é necessário ter presente
que a mencionada concepção pela geração contínua de um excedente sintetizam e mostram os traços mais ge-
diz respeito, fundamentalmen-
te, ao âmbito dos fenômenos
de mão-de-obra nos setores de baixa pro- rais daquelas contribuições.
econômicos e que se antecipa dutividade, que pressiona persistente- A seguir, resume-se os aportes teóri-
em vários anos ao surgimento
das preocupações metodológi- mente os salários da periferia e, através cos da CEPAL, com o intuito de mostrar
cas que se farão freqüentes deles, os preços de suas exportações pri- que o caráter estruturalista da concepção
na chamada corrente estrutu-
ralista latino-americana, ten- márias. inicial a eles se transmite, e de precisar
dentes a integrar outros as- em que consiste tal caráter. Como se
pectos do acontecer social à • Ambos os fenômenos (a diferenciação
interpretação do subdesenvol- da produtividade do trabalho e a dete- verá, este se associa a uma razão sim-
vimento.
rioração da relação de troca) explicam ples: a explicação das três tendências
por que os níveis de renda real média peculiares à industrialização periférica
tendem a se diferenciar entre os dois pó- está estreitamente relacionada com a ma-
los do sistema. Por sua vez, esta diferen- neira pela qual vai-se transformando a
ciação contribui para explicar por que as estrutura produtiva, durante o desenvol-
condições de atraso da estrutura produ- vimento para dentro.
tiva periférica não são superadas, mas se
perpetuam.
• No sistema centro-periferia existe, 3. Especialização produtiva e
pois, uma tendência ao desenvolvimento desequilíbrio externo
desigual dos dois pólos que o constituem.
Desigualdade crescente entre os níveis de I. Tentaremos descrever os argumen-
renda real média, por um lado; por tos cepalinos sobre o desequilíbrio exter-
outro, desigualdade quanto ao grau de no de maneira breve e simples, para que
penetração e difusão do progresso técni- o caráter estruturalista dos mesmos apa-
co (homogeneidade) e quanto ao grau de reça em primeiro plano.
complementariedade intersetorial e inte- II. Por hipótese, em um sistema eco-
gração vertical de suas estruturas produ- nômico bipolar, composto pelo centro e
tivas (diversificação). pela periferia, os preços dos bens elabo-
II. A natureza estruturalista da con- rados em ambos os pólos permanecem
cepção originária pode ser apreciada cla- constantes, assim como os preços dos
ramente na síntese anterior. Com efeito, bens que são objeto de seu comércio re-
essa concepção privilegia as peculiarida- cíproco. Se admite, além disso, que não
des da estrutura produtiva da periferia, se produzem movimentos de capital entre
entre as quais destaca-se o nível de pro- tais economias.
dutividade do trabalho dos distintos se- A periferia é especializada no duplo

NOVOS ESTUDOS N.º 16


sentido assinalado anteriormente: só ex- propriamente, a transformação da estru-
porta para o centro produtos primários; tura produtiva que a industrialização traz
o grau de diversificação horizontal, com- consigo, a fim de evitar a tendência ao
plementariedade intersetorial e integra- desequilíbrio externo imposta pela dispa-
ção vertical de sua estrutura produtiva é ridade de elasticidades. Admite-se como
incipiente. Em conexão com esta segunda simplificação adicional que as exporta-
característica, a demanda de importações ções primárias da periferia aumentem a
de manufaturas produzidas pelo centro uma taxa definida e constante. Para pre-
apresenta um grande dinamismo; sua servar o equilíbrio da balança comercial,
elasticidade-renda é superior à unidade, será necessário que as diferentes ativida-
de tal modo que na periferia as importa- des, cuja produção se destina ao merca-
ções tendem a crescer com mais inten- do interno, se expandam a ritmos tais
sidade que a renda. que a complementariedade entre os pro-
Com o centro sucede o contrário. Co- dutos dessas atividades, unida à mudança 2
A mudança na composição
das importações da periferia
mo só adquire alimentos e matérias-pri- na composição das importações 2 (a opor- reflete uma das características
tuna redução de algumas delas, para fazer da transformação da estrutura
mas no exterior, a elasticidade-renda da produtiva do centro, ao indi-
demanda de importações resulta menor frente às necessidades de importações car como se altera a compo-
sição de tal economia. Em
que a unidade e, portanto, as importa- dos setores que se expandem), limite o linhas gerais: concebe-se que
ções crescem num ritmo inferior à renda. crescimento das importações globais ao d urante as p rim eiras etap as
da industrialização periférica
III. A disparidade de elasticidades e ritmo em que crescem as exportações. requerer-se-á um intenso cresci-
mento das exportações de bens
a taxa de crescimento da renda dos cen- Implicitamente, se requer, ademais, que intermediários e bens de ca-
tros impõem um limite ao aumento da a oferta de bens — em parte originada pital produzidos pelo centro,
e um crescimento lento —
renda periférica; esta deverá ser inferior nas atividades internas e em parte com- inclusive nulo ou mesmo ne-
posta por importações — se ajuste às gativo — das de bens de con-
à do centro, e tanto menor quanto maior sumo.
seja tal disparidade. Se se excede desse mudanças na estrutura da demanda que
limite, geram-se sucessivos déficits co- acompanha a industrialização e o desen-
merciais na periferia, a menos que se con- volvimento da economia periférica.
siga evitá-los mediante certo tipo de in- O parágrafo acima mostra que as con-
dustrialização, caracterizado pela substi- dições dinâmicas requeridas para preser-
tuição de importações e pela mudança na var o equilíbrio externo consistem num
composição das importações. conjunto de taxas de expansão da pro-
dução (e conseqüentemente da acumula-
ção de capital) nas distintas atividades
s argumentos básicos da CE- da economia periférica, as quais, por sua
PAL sobre estes dois traços vez, supõem certos ritmos de aumento
da industrialização periférica ou redução dos diversos componentes das
são claros. Para crescer a uma importações. Em tais taxas setoriais e
taxa superior àquela imposta pelos fato- parciais, estão implícitas as taxas globais
res anteriormente mencionados, evitando de acumulação de capital, de crescimento
o desequilíbrio, requer-se, por um lado, do produto e de incremento das impor-
empreender a elaboração interna de al- tações, que não são nada mais do que
guns bens industriais e, por outro, impe- médias das primeiras. De uma outra pers-
dir as importações dos mesmos, assim pectiva, o mesmo modelo de equilíbrio
como de outros bens prescindíveis, de pode representar-se mediante as propor-
modo a satisfazer a demanda de importa- ções em que se devem distribuir os re-
ções induzida pela produção substitutiva cursos produtivos e a produção total
e, em geral, pelo crescimento da renda. entre os distintos setores e ramos de ati-
A substituição de importações deve ser vidade, bem como das divisas entre os
acompanhada por uma mudança na sua diversos tipos de importações, durante
composição, dado que se faz necessário um número arbitrário de período.
reduzir a importação de algumas catego- Nas considerações anteriores, aprecia-
rias de bens (por exemplo, os bens de se claramente o caráter estruturalista do
consumo de fácil elaboração, durante as modelo: trata-se de um padrão ideal de
primeiras etapas da expansão industrial) transformação da estrutura produtiva da
e aumentar a de outros tipos distintos periferia, que estabelece as proporções 3
Logicamente, requerer-se-ia ter
(como os insumos intermediários e má- que devem ser cumpridas entre seus di- em conta, ademais, o padrão
de transformação da estrutura
quinas). versos setores e ramos de atividades, a produtiva do centro. Da evo-
Estes argumentos contêm um padrão fim de evitar o desequilíbrio externo3 . lução desta economia, só se
considerou a mudança na com-
teórico de referência que estabelece as Na verdade, tal modelo constitui um dos posição de suas exportações,
condições que a industrialização ou, mais aspectos-chave da concepção inicial (a es- que equivale à das impor-
tações periféricas.

DEZEMBRO DE 1986
O PENSAMENTO DA CEPAL: SÍNTESE E CRÍTICA

pecialização da economia periférica), pois, de um padrão de desenvolvimento


pois se consegue superar a tendência ao no qual a periferia cresce de forma auto-
desequilíbrio mediante uma maior com- centrada, num fechamento gradual.
plementariedade intersetorial da produ- Neste tipo de modelo, a quantia anual
ção desta economia, isto é, reduzindo o de empréstimos e investimentos estran-
grau de sua especialização4.
4
Em contraste com o modelo geiros não pode aumentar de maneira
que se acaba de esboçar, é
possível supor a existência de IV. A tendência ao desequilíbrio ex contínua e indefinida 6 . Isto se deve ao
qualquer padrão de transfor-
mação da estrutura produtiva, terno se explica por contraste com um fato de que, com o tempo, as amortiza-
compatível com o equilíbrio
externo, que inclua as expor-
padrão de referência do tipo do que se ções e o serviço ultrapassam os novos
tações de bens primários. Po- acaba de resumir. Na periferia, a indus- ingressos de capital, ocasionando, a lon-
de-se, em troca, conceber ou-
tro modelo que, de forma si- trialização se inicia em condições de es- go prazo, um resultado crescentemente
milar, implique aumentar o
grau de diversificação e com-
pecialização primário-exportadora e de negativo7 nas transações financeiras cor-
plementariedade da estrutura baixos níveis de produtividade das ativi- rentes, fazendo com que este saldo tenda
produtiva interna, com base dades denominadas heterogêneas, o que a representar uma porcentagem cada vez
na diversificação das expor-
tações, inclusive de bens ma- impede empreender a substituição de im- maior das exportações.
nufaturados, de demanda mais
dinâmica que os produtos pri- portações, de forma mais ou menos si- Os documentos da CEPAL postulam
mários tradicionalmente ex-
portados. O item seguinte faz
multânea, nos distintos segmentos da ca- que durante certo tempo as entradas bru-
referência a esse tipo de mo- deia produtiva (por exemplo, em bens tas de K (capital) poderão ou deverão ir
delo.
de consumo, bens intermediários e bens aumentando, com dois propósitos fun-
6
Esta impossibilidade também
se verifica em outros tipos de
de capital). Ao contrário, as condições damentais: incrementar a poupança sem
modelo, nos quais as expor- aludidas induzem a realizar a substitui- maior sacrifício do exíguo nível de con-
tações (e seu poder de com- ção a partir dos bens cuja elaboração é sumo, nas primeiras etapas da industria-
pra) se expandem com relativa
lentidão, ainda que não ne- mais simples, como os bens de consumo lização periférica; e remediar a escassez
cessária nem permanentemente
inferiores às taxas de cresci- final da indústria leve. Isto, por sua vez, de divisas induzida pela própria substi-
mento do produto social. dá lugar a que a própria substituição tuição de importações, até que esta pro-
7
Salvo quando se adotem hi- gere crescentes requerimentos de impor- duza o efeito de reduzir a demanda ex-
póteses extremas, que carecem
de todo interesse prático, no tações, que tendem logo a exceder os terna dos bens substituídos.
que diz respeito aos ingressos
anuais de capital.
limites impostos pelo lento crescimento Esta dupla função, atribuída ao finan-
das exportações e pelo esgotamento das ciamento externo, se concebe como ne-
possibilidades de comprimir importações cessariamente transitória. A longo prazo,
prescindíveis. os novos aportes terão que cessar ou di-
Em outras palavras — e da perspecti- minuir; caso contrário, seus serviços com-
va do mencionado padrão de referência prometerão, crescentemente, a disponi-
—, acrescenta-se que as transformações bilidade de divisas geradas pelas exporta-
na estrutura produtiva e as mudanças na ções, impedindo que se satisfaça os cres-
composição das importações que a acom- centes requerimentos de importação que
panha não se dão na prática de acordo acompanham o desenvolvimento da peri-
com as condições ideais de proporciona- feria. A respeito deste processo, derivam-
lidade requeridas para preservar o equi- se das considerações precedentes as se-
líbrio externo. O desequilíbrio também guintes conseqüências: a longo prazo, o
se explica, em última instância, por des- coeficiente de poupança externa e de par-
proporções na composição setorial da ticipação da propriedade estrangeira so-
produção ou, se se quiser, pelos ritmos bre o total dos ativos da periferia deve-
5
de crescimento dos diversos setores pro- rão reduzir-se; inversamente, os percen-
Entre si e com o ritmo de
crescimento do centro e dos dutivos da periferia5. Percebe-se, desse tuais de poupança própria e da proprie-
distintos setores componentes modo, que estas desproporções expres- dade nacional deverão aumentar.
de tal economia. Veja-se, a
esse respeito, nota 2. sam a dificuldade de superar a especiali- Assim, pois, por razões econômicas (li-
zação peculiar da periferia. gadas às dificuldades enfrentadas por seu
V. O modelo apresentado tem impli- setor externo e à especialização da estru-
cações quanto à propriedade dos ativos tura produtiva subjacente), o desenvol-
da economia periférica, que se relacionam vimento da economia periférica deverá
com o capital estrangeiro e com os limi- ter por força um caráter nacional.
tes à sua participação no desenvolvimen-
to dessa economia.
De acordo com os supostos anterior- 4. Heterogeneidade estrutural e
mente considerados, as exportações se desemprego
expandem a um ritmo inferior ao da ren-
da global, o que por sua vez supõe a I. Os argumentos da CEPAL sobre a
paulatina diminuição dos coeficientes de tendência ao desemprego também podem
exportações e importações. Trata-se, ser apresentados, simplificadamente, de

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modo a se apreciar claramente seu cará- CEPAL sobre o desemprego se baseiam
ter estruturalista. num padrão de referência que estabelece
Nas economias periféricas, o problema as condições que devem ser cumpridas
do emprego apresenta dois aspectos prin- para que este fenômeno não se produza.
cipais: a absorção dos incrementos de Os pressupostos anteriores emolduram
população ativa em condições normais de uma apresentação muito breve e simples,
produtividade e a reabsorção da mão-de- que busca revelar os traços essenciais da
obra ocupada em setores atrasados, do- perspectiva cepalina.
tando-a de capital, de forma que sua De acordo com tais pressupostos, a de-
produtividade também alcance níveis si- manda de força de trabalho é proporcio-
milares aos prevalecentes nos centros. nal ao investimento e seu ritmo de cres-
Assim sendo, a solução de tal problema cimento está diretamente associado à taxa
não consiste somente em ocupar toda a de acumulação de capital. Por definição,
força de trabalho, mas em aproveitar, esta só se realiza no setor moderno, en-
além disso, a fronteira tecnológica dispo- quanto que no atrasado a quantidade de
nível, superando a heterogeneidade es- capital vai diminuindo.
trutural. Para se obter o pleno emprego, a ní-
II. Na periferia, a agricultura é o se- veis de produtividade normal, é necessá-
tor heterogêneo por excelência, já que rio que as taxas de acumulação na indús-
aí se origina e concentra grande massa de tria e na agricultura moderna sejam tais
trabalhadores de produtividade muito bai- que permitam a essas atividades absorve-
xa. O primeiro pressuposto adotado toma rem totalmente o crescimento da popula-
em conta essa circunstância. Admite-se a ção ativa, tanto o que nelas se produz,
existência de apenas três atividades pro- quanto o que provém do setor atrasado e,
dutivas: a indústria e a agricultura mo- ademais, que a ocupação deste último se
derna, que compõem o setor moderno, e reduza, até ser totalmente reabsorvida no
a agricultura atrasada, que constitui o setor moderno, ao cabo de um tempo de-
setor atrasado, arcaico ou heterogêneo. terminado. Além disso, faz-se necessário
As seguintes hipóteses definem as con- que os aumentos da produção manufatu-
dições técnicas da produção, nos três ti- reira e agropecuária se realizem de maneira
pos de atividade: os recursos produtivos compatível com as mudanças na estrutura
— trabalho, terra e capital — são perfei- de demanda de bens que acompanham a
tamente homogêneos e divisíveis; nas expansão do produto global e médio.
duas atividades do setor moderno, o ca- Como pode ser visto, as condições di-
pital (K) e o trabalho (T) se combinam nâmicas requeridas para o pleno emprego
em uma única proporção que define a e para a plena utilização da capacidade
densidade de capital existente em am- produtiva da força de trabalho são esta- 8
Em uma função de produção
bas8 ; na agricultura moderna, a propor- belecidas de forma muito simples: defi- linear, como a que aqui é
postulada, a densidade de ca-
ção em que esses dois recursos se combi- nem-se com base nas taxas de acumula- pital equivale à relação entre
ção de capital e de crescimento da pro- a produtividade do trabalho
nam com a terra é também fixa; na (t) e a produtividade do capital
agricultura atrasada, se dispõe igualmente dução (ou de desacumulação e de de- (K): K/T = t/k.
de uma única técnica, cuja densidade de crescimento) das distintas atividades;
capital é mais baixa que a do setor obviamente, tais taxas determinam, por
moderno; nesta atividade, todos os re- sua vez, o valor das taxas globais, que
cursos têm um nível de produtividade são nada mais que valores médios. Impli-
menor que o das demais, ou seja, a técni- citamente, este modelo de equilíbrio esta- 9
Na agricultura atrasada, a
ca prevalecente é ineficaz e obsoleta 9 . belece as proporções nas quais se deve produtividade do trabalho ( t ' ) ,
a produtividade do capital
Além desses, adotam-se os pressupostos distribuir a mão-de-obra, o investimento, (k') e a densidade de capital
a terra e a própria produção global entre (t'/K') são inferiores às do
que se seguem: a escassez de terra impe- setor moderno. Ou seja, cum-
de ao setor atrasado absorver os incre- as várias atividades e setores, ao longo prem-se as seguintes relações:
t' < t; k' < k; t' / k < t' / k.
mentos de sua própria população ativa, do tempo.
que são totalmente expulsos; a agricultu- 10
Por cada unidade de capital
investida no setor moderno,
ra moderna compete com a atrasada, de emprega-se mão-de-obra em
tal modo que qualquer inversão que gera as considerações acima, surge quantidade equivalente a k/t
(igual a T/K, ou relação
emprego na primeira origina, por sua vez, com nitidez o caráter estrutu- trabalho/capital). Mas, se o
investimento é realizado na
desemprego na segunda; o resultado lí- ralista do modelo apresentado, agricultura moderna, cuja pro-
quido é negativo, devido à menor quan- que consiste num padrão ideal dução compete com a do setor
atrasado, cada unidade de in-
tidade de trabalho por unidade de capital de transformação da estrutura produtiva. vestimento gera, adicionalmen-
que a técnica avançada utiliza 10 . Modelo, este, que estabelece certas leis te, desemprego tecnológico de
uma magnitude equivalente a
III. Implicitamente, as análises da de proporcionalidade que devem ser cum- k'/t. Como k'/t > k > t, o
resultado líquido é negativo.

DEZEMBRO DE 1986
O PENSAMENTO DA CEPAL: SÍNTESE E CRÍTICA

pridas intra e entre os distintos setores e população ativa, três elementos entram
atividades que realizam a produção ma- em jogo nessa tendência: a dimensão do
terial, para que se absorva totalmente os setor heterogêneo, a inadequação da tec-
aumentos de população ativa e se elimi- nologia e a acumulação de capital.
ne por completo as ocupações de baixa A influência do primeiro elemento é
produtividade. Note que tal paradigma clara: se o setor atrasado abriga uma ele-
está também estreitamente ligado ao con- vada proporção do total da população
ceito de heterogeneidade. Constitui, em ativa, a taxa a que esta última cresce,
última instância, uma expressão e um de- calculada em relação com o emprego no
senvolvimento deste conceito, pois indi- setor moderno, resultará sumamente ele-
vada11.
11
Se em um ano qualquer a
população ativa cresce 3% em
ca as mudanças que deverão ser introdu-
ambos os setores, distribuin- zidas na estrutura produtiva para que se Com relação à tecnologia, deve-se con-
do-se igualmente entre os
mesmos, sua taxa de aumento possa superar sua heterogeneidade. siderar em separado a inadequação da
com relação ao emprego no
setor m oderno será de 6%.
IV. O modelo que acaba de ser des- densidade de capital e a inadequação da
Se o setor atrasado ocupa qua- crito foi apresentado com base em pres- escala. A primeira, que atua sobre a oferta
tro trabalhadores por cada de emprego, origina-se da disparidade
um que o setor moderno em- supostos que lhe impõem uma simplici
prega, neste primeiro ano, tal dade extrema, a fim de tornar visível e entre a densidade de capital das técnicas
tax a se eleva a 1 5 % . Dad o
o valor da relação produto/ de definir com precisão seu caráter es- avançadas e a que prevalece no setor
capital, o esforço de poupança
requerido para ocupar o in- truturalista. Pode o mesmo ser reformu- atrasado. Quanto maior esta disparidade
cremento de população ativa lado em distintos níveis de complexida- — ou, se se quiser, quanto maior o grau
será duas vezes e meia maior
no segundo caso; assim, por de, sem que se perca seu mencionado de heterogeneidade estrutural —, maior
exemplo, sendo esta relação caráter. Assim, por exemplo, é factível será o desemprego tecnológico (bruto e
de 0,4, a taxa de poupança
requerida aumenta de 15 a reconhecer a existência de distintos tipos líquido) provocado pelas atividades mo-
37,5%. dernas que concorrem com a produção
de atividades atrasadas (como as do "se-
tor informal urbano"), ou mesmo consi- preexistente. A inadequação da escala
derar um número muito maior de ativi- mínima de produção ao tamanho dos
dades modernas. Para uma aproximação mercados periféricos obriga a que se dei-
às análises contidas nos documentos da xe capital ocioso e, conseqüentemente,
CEPAL, podem ser consideradas diversas impactua negativamente a demanda de
emprego12.
12
Para simplificar a apresen- opções tecnológicas, eliminando-se o
tação, supôs-se implicitamente
que a tecnologia está dada. pressuposto segundo, que dispõe de so- A acumulação de capital num setor
Quando se tem em conta os
postulados da CEPAL sobre mente uma técnica eficiente, definida por moderno relativamente exíguo traduz-se
o progresso técnico, tal fato
em nada altera o caráter estru-
uma densidade de capital uniforme em na adoção de técnicas de escala excessiva,
turalista da análise cepalina todo o setor moderno. Ao introduzir causando desperdício parcial desse recur-
da tendência ao desemprego. so. Mesmo quando a propensão a poupar
outras possibilidades técnicas, é necessá-
rio somente estabelecer leis de propor- seja elevada, a acumulação gera um ritmo
cionalidade algo mais complexas, que in- insuficiente de aumento da demanda de
diquem como distribuir os recursos entre emprego, se comparada com o ritmo da
as distintas atividades produtivas, ao lon- expansão da oferta. Isto não se deve
go do tempo, e, além disso, quais técnicas somente a fatores demográficos, depende
utilizar em cada uma dessas atividades. fundamentalmente da dimensão do setor
Em outras palavras, o padrão de trans- heterogêneo, que expulsa os incrementos
formação da estrutura produtiva que as- de sua própria população ativa e, além
segura condições de pleno emprego e disso, do uso de técnicas de elevada den-
produtividade normal deverá conter a so- sidade, que produzem desemprego tecno-
lução do problema da seleção de tecnolo- lógico nesse setor.
gia, conjuntamente com os da alocação Confirma-se, então, que, nas análises
intersetorial e intertemporal de recursos. da CEPAL, a tendência ao desemprego é
V. A tendência ao desemprego se ex- atribuída às desproporções na transfor-
plica por contraste com um padrão de re- mação da estrutura produtiva: basicamen-
ferência como o que acaba de ser esbo- te, entre o crescimento do setor moderno
çado. A explicação consiste em mostrar — tendo em conta as atividades que o
que as regras ou leis de proporcionalida- compõem e as técnicas utilizadas —, o
de estabelecidas por esse modelo não se crescimento demográfico e o ritmo de
cumprem e, conseqüentemente, que o de- expulsão de mão-de-obra do vasto setor
semprego crescente está relacionado com atrasado. Vê-se, ainda, que tais despro-
desproporções que surgem durante a porções não são mais que uma manifes-
transformação da estrutura produtiva pe- tação da heterogeneidade peculiar das
riférica. economias periféricas e da dificuldade de
Dado o crescimento da população e da superá-la.

NOVOS ESTUDOS N.° 16


VI. Existe uma argumentação comple- Num sistema econômico bipolar, com-
mentar à anterior, relativa à incidência posto pelo centro e pela periferia, preva-
da estrutura de propriedade e posse da lecem condições de livre comércio e livre
terra nos problemas do emprego. Tal es- mobilidade do capital, bem como de livre
trutura se caracteriza pela coexistência concorrência no interior de cada pólo.
do latifúndio com o minifúndio e pela Na periferia existem dois setores pro-
proliferação de formas precárias de posse dutivos, o primário exportador e o indus-
do solo agrícola. trial. A mão-de-obra de qualidade homo-
Em função do atraso tecnológico, da gênea foi totalmente absorvida por tais
escassez de terras e dos baixíssimos ní- setores, ao fim de um ano-base arbitrário.
veis de produtividade, o minifúndio é in- Na indústria, a renda real por pessoa
capaz de capitalizar-se e de reter os in- ocupada (medida em bens industriais)
crementos de sua população ativa. equivale, por definição, à produtividade
No latifúndio e nas explorações reali- física média do trabalho e se subdivide
zadas sob arrendamento ou outras formas em salário real e lucro unitário, este últi-
precárias de posse, tende-se a optar por mo, a remuneração do capital. A renda
técnicas mecanizadas, que utilizam pouca média do setor primário-exportador equi-
mão-de-obra por unidade de produto e para-se à da indústria, pois as forças do
de superfície, cuja densidade de capital é mercado igualam a remuneração dos re-
elevada. Mesmo que do ponto de vista cursos — trabalho e capital — em
privado se obtenha com essas técnicas ambas as atividades. No gráfico que se
maior rentabilidade, sua aplicação redunda segue, os níveis iniciais de renda mé-
em menos emprego face a outras dia, salários e lucro unitário da econo-
opções disponíveis e mais desemprego mia periférica estão representados por
tecnológico, quando concorrem com a PC = OA, PD = OB e DC = BA, respec-
produção preexistente. tivamente.
O latifúndio desfavorece a acumulação A produtividade do trabalho, o salário
de capital, seja pela subutilização de e o lucro da indústria periférica equiva-
grandes extensões de terra, que permane- lem aos do centro, de modo que os bens
cem ociosas ou mal utilizadas, seja pela que elabora são competitivos com simila-
alta propensão a consumir, que se vin- res importados, sem qualquer proteção.
cula à grande concentração da proprie- A balança comercial e o balanço de paga-
dade e à condição social do latifundiário. mentos acham-se em equilíbrio na situa-
ção inicial.
No que diz respeito à evolução da eco-
5. Especialização, heterogeneidade e nomia periférica, postula-se que durante
deterioração um número arbitrário (n) de períodos, a
produtividade do trabalho permanece
I. Este item se relaciona com a ter- constante13 e a mão-de-obra, plenamente 13
Este pressuposto deriva di-
ceira tendência que as contribuições da ocupada. O aumento total da população retamente de outro, acerca da
CEPAL buscam explicar: a deterioração ativa, correspondente aos n períodos, está inexistência de progresso téc-
nico e, portanto, estende-se
da relação de troca. Também aqui se tra- representado pelo segmento OP, no qual também às atividades produ-
tivas da economia central.
ta de revelar que a explicação se encon- se mede o emprego no setor primário-
tra baseada em um padrão de referência exportador (desde O até P) e o da in-
implícito, que impõe as condições reque- dústria (desde P até O). As forças do
ridas para que a deterioração não se pro- mercado impulsionam essa economia até
duza. Esse paradigma é o de maior com- uma situação final, ao cabo do período
plexidade e amplitude dos três conside- n, no qual o setor primário-exportador
rados, dado que, em linhas gerais, englo- absorve a quantidade OR de mão-de-obra
ba os anteriores. Com efeito, como se adicional e a indústria, a quantidade PR.
poderá ver, entre as mencionadas condi- Esta última é distribuída entre a pro-
ções se incluem o equilíbrio da balança dução para mercado interno e a produ-
comercial e o pleno emprego da força ção de manufaturas para a exportação,
de trabalho a níveis normais de produti- nas quantidades PS e SR, respectiva-
vidade, que são justamente os objetos de mente.
análise dos modelos anteriores. O aumento do emprego industrial (de
II. Para simplificar a apresentação, P até R) supõe a instalação sucessiva de
convém apoiar-se num conjunto de pres- novas atividades manufatureiras. Em al-
supostos que exclui a consideração do gumas delas, toda a produção se destina
progresso técnico. ao mercado interno, o que é suficiente

DEZEMBRO DE 1986
O PENSAMENTO DA CEPAL: SÍNTESE E CRÍTICA

para utilizar plenamente a capacidade que a evolução da economia periférica é


instalada. Em outras, a exportação com- compatível com a da economia central e
plementa a demanda interna e corrige a que se produzem nas mesmas transfor-
virtual inadequação da escala mínima dis- mações complementares. Assim, por
ponível14. Em cada período de renda, a exemplo, às mudanças na composição das
concorrência assegura o equilíbrio dos importações (e das exportações) da pri-
mercados dos distintos bens industriais, meira devem corresponder outras que
o que, por hipótese, é conseguido sem ocorram na composição das exportações
variação dos preços relativos dos mesmos (e das importações) da segunda.
(tanto das manufaturas produzidas inter- III. Os pressupostos que acabam de
namente como das importadas). A renda ser descritos têm também um padrão de
média (PC=ST=RQ), os salários (PD = referência. De acordo com os mesmos,
SV = RW) e o lucro unitário do setor in- cumpre-se um conjunto de condições
dustrial mantêm seus níveis iniciais. que impedem qualquer variação da rela-
A oferta da atividade primário-expor- ção de preços entre exportações primárias
tadora da periferia aumenta no mesmo e importações industriais, capaz de pro-
ritmo que a demanda que, por sua vez, vocar a diferenciação das rendas médias
expande-se à taxa determinada pelo cres- em ambas as economias.
cimento da renda do centro e pela elas-
ticidade-renda de sua demanda de impor-
tações primárias. O mercado desse tipo nfocando este paradigma da
de produto mantém-se, pois, em equilí- perspectiva da periferia e des-
brio, sem que varie o preço relativo vi- tacando seus aspectos dinâmi-
gente na situação inicial. Também nesse cos, sintetiza-se suas principais
setor, a renda média {OA = RQ) e os sa- características a seguir.
lários (OB = RW) e, portanto, o lucro Os setores produtivos — o primário-
unitário, conservam as magnitudes do pe- exportador, a indústria de exportação e
ríodo-base. a indústria voltada ao mercado interno
Como foi dito, a indústria periférica — acumulam e crescem a taxas compa-
tíveis entre si.
Em primeiro lugar, essa compatibilida-
de expressa-se no pleno emprego da for-
ça de trabalho, a níveis constantes de
produtividade. Nas atividades industriais
a produtividade é equivalente àquela al-
cançada nos centros, de tal modo que os
respectivos níveis de renda também se
equiparam.
Em segundo lugar, as taxas são com-

patíveis porque asseguram o equilíbrio
externo: o crescimento das exportações
primárias e industriais e a expansão das
atividades substitutivas implicam que as
exportações e importações globais cres-
cem num mesmo ritmo. No setor primá-
rio-exportador, a produtividade e os pre-
ços relativos não variam e a renda média
respectiva permanece constante e igual
àquela prevalecente na indústria periféri-
ca e na cêntrica.
não se expande somente por meio da
Em terceiro lugar, dadas as condições
substituição de importações, mas também
de emprego, produtividade e preços nas
através da exportação de manufaturas.
quais se expandem as diversas atividades
Junto com o aumento das exportações
periféricas, as remunerações dos recursos
primárias, a expansão industrial permite
também se igualam entre essas ativida-
manter o equilíbrio da balança comercial
des, assim como as do centro. Esta igual-
e do balanço de pagamentos, à taxa de
dade dos salários reais e dos lucros in-
câmbio vigente no ano-base.
dica, de outro ângulo, que não se produz
Tratando-se de um sistema bipolar,
diferenciação de rendas entre os dois pó-
está implícito nos pressupostos acima
los do sistema econômico.

NOVOS ESTUDOS N.º 16


Como os modelos anteriores, também drão cambial. Estas trazem consigo uma
este pode ser descrito mediante propor- série de elevações nos preços internos
ções em que a produção e os recursos das exportações primárias e das importa-
produtivos devem ser distribuídos em ções, impulsionando a expansão da pro-
cada um dos períodos de renda. No mes- dução primário-exportadora e da produ-
mo, se aprecia com clareza seu caráter ção industrial substitutiva. Este mecanis-
estruturalista, dado que nada mais é que mo de estímulo leva a economia perifé-
um padrão de transformação, sumamen- rica da situação inicial até a situação de-
te simples, da estrutura produtiva perifé- finida pelo ponto J, na qual se destina à
rica 15. Este padrão estabelece as condi-
15
indústria a quantidade PJ do incremento Como já se indicou, e mes-
m o q ue o m o d elo só se re-
ções requeridas para evitar tanto o de- da força de trabalho e ao setor exporta- fira ao pólo periférico, seus
pressupostos implicam que a
sequilíbrio externo quanto o desemprego, dor a parcela OJ. transformação estrutural e a
além de assegurar níveis de produtivida- Interessa, particularmente, examinar evolução econômica do pólo
central do sistema se produza
de do trabalho (na indústria) e dos pre- as características com que se vai produ- de forma compatível e com-
ços relativos (no setor primário-exporta- zindo a expansão de ambas as atividades. p lem entar co m as d o p ri-
meiro.
dor) que assegurem a nivelação das ren- A indústria não se expande em condições
das médias entre periferia e centro. de produtividade constante, como descri-
Também se pode observar que esse to anteriormente. Por hipótese, isso de-
modelo incorpora os conceitos de espe- pende de que os novos ramos instalados
cialização e heterogeneidade. A diversi- destinem sua produção exclusivamente
ficação da estrutura produtiva e das ex- ao mercado interno, cujas dimensões
portações alcançada com o desenvolvi- impõem margens crescentes de ociosida-
mento industrial (que permitem manter de. O aumento dos custos de deprecia-
o equilíbrio externo) indica que a espe- ção por unidade de mão-de-obra reflete-
cialização estrutural foi superada. O ple- se na diminuição da produtividade líquida
no emprego em condições de produtivi- do trabalho e da renda industrial média.
dade normal reflete que a heterogeneida- No gráfico anterior, esta cai paulatina-
de estrutural não mais subsiste. Assim, mente de acordo com CM (desde PC até
consegue-se evitar a deterioração dos pre- JM). Como o lucro unitário é suposto
ços das exportações primárias, evitando, constante, para que a produção manufa-
desta forma, a diferenciação de rendas. tureira mantenha sua competitividade,
No sistema centro-periferia não existe, faz-se necessário que os salários se redu-
pois, tendência ao desenvolvimento desi- zam paralelamente: estes diminuem ao
gual, seja no que concerne às caracterís- longo de DN (desde PD até JN).
ticas das estruturas produtivas, seja quan- As exportações tampouco se compor-
to aos níveis de renda real média dos dois tam como no paradigma anteriormente
pólos que o constituem. esboçado: as de manufaturas não chegam
IV. Implicitamente, a deterioração se a se realizar e as primárias aumentam a
explica por contraste com um modelo um ritmo maior que sua demanda res-
como o que se acaba de descrever, pos- pectiva. Conseqüentemente, os preços
tulando que a acumulação e o crescimento das exportações primárias se reduzem de
não se realizam na periferia de acordo maneira contínua e, embora a produti-
com as condições de proporcionalidade vidade do setor que as gera permaneça
requeridas para evitá-lo. Isso pode ser constante, a renda média diminui ao
visualizado claramente, recolocando a ex- longo de AM, e os salários, de acordo
plicação deste fenômeno, com base no com BN, paralelamente aos do setor in-
gráfico anterior, contrapondo-a, passo a dustrial, até alcançar as magnitudes JM
passo, com o aludido modelo. e JN, respectivamente.
Admite-se, em primeiro lugar, que as Em síntese: na indústria, a redução da
exportações da periferia não se diversi- renda média se associa à diminuição da
ficam. Ao manterem seu caráter primá- produtividade; no setor primário-expor-
rio, o funcionamento do sistema em seu tador, à deterioração dos preços relati-
conjunto se vê afetado pelo diferente di- vos. Dada a constância da remuneração
namismo que possui a demanda de impor- do capital, a queda da renda se reflete
tações em seus dois pólos. Segundo se exclusivamente nos salários, cuja dimi-
concebe, a disparidade de elasticidade dá nuição se faz possível em virtude da mão-
origem a sucessivos déficits comerciais de-obra disponível na economia periférica.
no pólo periférico que, por sua vez, im- As considerações precedentes permi-
plicam sucessivas desvalorizações no pa- tem destacar os elementos que atuam na

DEZEMBRO DE 1986
O PENSAMENTO DA CEPAL: SÍNTESE E CRÍTICA

explicação da deterioração. Por um lado, impeça qualquer variação dos preços re-
opera a disparidade de elasticidades e o lativos das exportações periféricas, capaz
desequilíbrio externo que tende a gerar. de proporcionar transferências de renda
Mas, se estes fatores são enfocados sob ao exterior. Este modelo possui implica-
o ângulo da estrutura produtiva, observa- ções no que diz respeito à estrutura do
se que neles se reflete sua especialização, comércio exterior que convém destacar
entendida nos dois sentidos já assinalados: em separado.
o caráter primário do setor exportador, Considere-se tal modelo, em primeiro
com uma lenta expansão de sua lugar, sob a perspectiva da preservação
demanda externa e a baixa diversificação do equilíbrio externo. Para obtê-lo, será
do aparato produtivo destinado a necessário certos ritmos adequados e
satisfazer o mercado interno e o modo compatíveis de expansão das exportações
pelo qual o mesmo vai-se ampliando primárias, de manufaturas e da produção
(mediante uma substituição que se rea- industrial substitutiva, destinada ao mer-
liza do simples ao complexo), gerando cado interno. Este modelo parcial exige
uma crescente demanda de bens impor- certas mudanças na estrutura do comér-
tados. Por outro lado, influem a queda cio: que as exportações se diversifiquem,
do nível de produtividade industrial e a incluindo certas porcentagens de manu-
disponibilidade de mão-de-obra, permi- faturados; as importações, mesmo que
tindo que tal diminuição seja compen- totalmente constituídas de bens indus-
sada com menores salários. Em outras triais, devem mudar de composição, no
palavras, atuam fatores que representam, sentido de incorporar proporcionalmente
de maneira simplificada, as condições de mais bens intermediários e de capital e,
heterogeneidade peculiares da estrutura em conseqüência, proporcionalmente me-
produtiva periférica: a existência de ati- nos bens de consumo. Obviamente, tais
vidades de tecnologia atrasada (expres- mudanças supõem que se produzam trans-
sada pela redução da produtividade in- formações complementares na estrutura
dustrial) e o excesso real ou virtual de do comércio do centro e que, subjacente
população ativa (expressado pela flexibi- às mesmas, se verifiquem as mudanças
lidade de oferta de trabalho subjacente correspondentes em sua estrutura pro-
na contração dos salários). dutiva.
Como se pode notar, a explicação do Além das já assinaladas, existem mu-
fenômeno da deterioração e da diferen- danças adicionais que devem ser efetiva-
ciação de rendas constitui, em última ins- das na estrutura do comércio, de forma
tância, um desenvolvimento analítico dos a se evitar a deterioração na relação de
conceitos de especialização e heteroge- preços e, conseqüentemente, conter a
neidade. As desproporções na estrutura tendência à diferenciação de rendas.
produtiva que servem de base a essa ex- Quanto às exportações primárias, é
plicação implicam que ambas subsistem, necessário que elas cresçam em adequa-
ou melhor, implicam que, mesmo em se ção ao aumento da demanda, de modo
produzindo transformações na economia que a relação de seu preço com o das
periférica, permanece a desigualdade no importações não varie, mantendo cons-
que diz respeito ao grau de diversifica- tante o nível da renda real média (me-
ção e de homogeneidade face à estrutura dido em termos de bens industriais) do
produtiva do centro. Em suma, a men- setor que as produz.
cionada interpretação incorpora e desen- As exportações de manufaturas devem
volve as idéias da concepção originária ser elaboradas por uma indústria eficien-
da CEPAL acerca do caráter desigual do te, capaz de produzir em condições de
desenvolvimento do sistema centro-peri- produtividade e salários constantes; este
feria, no seu duplo sentido: desigual- é um requerimento para que o nível de
dade de estruturas e desigualdade de renda média tampouco varie, seja nos
rendas. ramos que destinam sua produção ao
16
Como os preços relativos e
a produtividade do trabalho
V. Como se observou, o modelo des- mercado interno, seja naqueles que ex-
dos dois subsetores que expor- crito neste item consiste num padrão portam. Implicitamente, os aumentos das
tam se supõem constantes, taci-
tamente se admite que as rela- ideal de transformação da estrutura pro- exportações industriais são compatíveis
ções de troca de fator único dutiva, combinando taxas de crescimento com a constância da relação de seu preço
não se alteram. Como a pro-
dutividade da indústria cên- dos distintos setores e ramos da produ- com o das importações 16.
trica também é dada, as rela- ção, de modo que se atinja o pleno em- As considerações anteriores reafirmam
ções de troca de fator duplo
tampouco variam. Trata-se de prego a níveis normais de produtividade, que, para evitar variações dos preços re-
outras formas de expressar
q ue não se p ro d uz p erd as se mantenha o equilíbrio externo e se lativos das exportações e, conseqüente-
nem diferenciação de rendas.

NOVOS ESTUDOS N.º 16


mente, diferenciação de rendas se fazem tro, na periferia, consiste em uma gra-
necessárias, em última instância, transfor- dual ampliação e diversificação da ativi-
mações na estrutura produtiva que cor- dade manufatureira, que, eventualmente,
rijam a heterogeneidade e a especializa- torna possível absorver mão-de-obra de
ção da periferia. Também necessita-se setores atrasados, elevando a produtivi-
introduzir certas transformações na es- dade média do trabalho. Contudo, apesar
trutura do comércio, implícitas nas pri- da industrialização, a heterogeneidade e
meiras. Em síntese, trata-se de expandir a especialização se reproduzem em ou-
as exportações primárias a um ritmo ade- tros níveis, subsistindo o atraso estru-
quado, de diversificar as exportações, tural em relação ao centro. A disparidade
incluindo entre estas bens industriais dinâmica entre o grau de avanço das
produzidos com eficiência e de modificar, estruturas produtivas dos dois pólos do
concomitantemente, a composição das sistema garante a diferenciação de suas
importações. É claro que a tais transfor- rendas médias; esta, por sua vez, contri-
mações correspondem outras complemen- bui para dificultar que tal disparidade
tares na estrutura do comércio dos cen- diminua ou desapareça.
tros. Vejamos, em seguida, por que e de que
Como dos dois paradigmas anteriores, forma este nítido caráter estruturalista
deriva-se também do presente uma reco- da concepção originária reaparece nas vá-
mendação de política econômica caracte- rias contribuições teóricas da CEPAL.
rística da ótica cepalina: impulsionar a III. O primeiro modelo considerado
industrialização da periferia, a fim de dar constitui um desenvolvimento analítico
emprego e elevar a produtividade do tra- do conceito de especialização estrutural
balho, além de superar o obstáculo exter- e se refere à tendência ao desequilíbrio
no. Para além desta proposição industria- externo. Estabelece as leis de proporcio-
lista, este modelo reconhece a necessidade nalidade que deveriam ser cumpridas
de alterar o esquema tradicional da para que tal tendência não se verifique:
divisão internacional do trabalho e de indica como transformar a estrutura pro-
modificar a estrutura do comércio mun- dutiva interna, a fim de que a comple-
dial. Tais transformações são concebidas mentariedade entre seus diferentes ra-
com o intuito de redinamizar o comércio mos, aliada a uma mudança na composi-
em benefício do sistema em seu conjunto, ção das importações (que corresponde a
eliminando as desvantagens que o padrão uma mudança na composição das expor-
de intercâmbio atual apresenta para o tações do centro), limite o aumento das
pólo periférico. mesmas ao ritmo de crescimento das ex-
portações primárias. O desequilíbrio se
explica por desproporções que surgem
6. A natureza estruturalista do ao longo da transformação da estrutura
pensamento da CEPAL produtiva, as quais, na verdade, expres-
sam a dificuldade de superar a especiali-
I. Os itens anteriores trataram de zação. Devido às condições de atraso es-
revelar o caráter estruturalista da com- trutural, a industrialização da periferia
cepção do sistema centro-periferia e de começa pelos ramos tecnologicamente
mostrar como este caráter se transmite mais simples e mais próximos aos mer-
aos diversos componentes do pensamen- cados de bens de consumo final para,
to cepalino. Em seguida, destacam-se os gradativamente, atingir atividades tecno-
aspectos da argumentação anterior que logicamente mais complexas. Este padrão
permitem, breve e conjuntamente, carac- de transformação, do simples ao comple-
terizar a natureza estruturalista desse xo, não é o idealmente requerido, geran-
pensamento. do demandas crescentes por importações,
II. Fundamentalmente, as definições e que excedem, a cada etapa, a disponibi-
hipóteses básicas da concepção originária lidade de divisas originada pela lenta
dizem respeito às peculiaridades da es- expansão das exportações primárias.
trutura produtiva periférica e de sua IV. O segundo modelo desenvolve o
transformação. Essa estrutura é conside- conceito de especialização e trata dos pro-
rada heterogênea e especializada, em con- blemas do emprego. Estabelece, também,
traste com a do centro, homogênea e leis de proporcionalidade necessária para
diversificada. Tais estruturas produtivas que a estrutura produtiva periférica atinja
não permanecem imutáveis. Assim, por o pleno emprego da força de trabalho,
exemplo, o desenvolvimento para den- em condições normais de produtividade.

DEZEMBRO DE 1986
O PENSAMENTO DA CEPAL: SÍNTESE E CRÍTICA

O desemprego é explicado por contra- VI. As considerações anteriores per-


posição a tal paradigma, com base em mitem alcançar uma generalização que
desproporções intra e entre o crescimento mostra em que consiste e de que depen-
dos distintos setores produtivos. Em últi- de o caráter estruturalista da CEPAL.
ma instância, esse fenômeno se atribui Em todos os casos, os modelos conside-
ao tipo inadequado e ao ritmo insuficiente rados são desenvolvimentos analíticos de
de expansão das atividades modernas, aspectos da concepção originária, relacio-
vis-à-vis as necessidades de absorção e nados com a estrutura produtiva (e com
reabsorção da oferta de trabalho do vasto as diferenças da mesma em comparação
setor atrasado. com o centro). Com efeito, o primeiro
V. O terceiro modelo, referente à de- modelo desenvolve o conceito de hetero-
terioração da relação de troca e ao seu geneidade e o segundo, o de especializa-
significado em termos de renda, incor- ção; ambos são incorporados no terceiro
pora simultaneamente os conceitos de modelo que, ao conectá-los e utilizá-los
heterogeneidade e de especialização. Este conjuntamente, dá conta, ademais, da
modelo estabelece as leis de proporcio- desigualdade inerente à dinâmica do sis-
nalidade que devem ser cumpridas para tema. Em todos os casos, os modelos
que se atinja o pleno emprego da força estabelecem as leis de proporcionalidade
de trabalho a níveis normais de produ- que devem ser cumpridas durante a trans-
tividade, superando a heterogeneidade, e, formação da estrutura produtiva perifé-
para evitar o desequilíbrio externo, supe- rica, a fim de evitar as tendências que
rando a especialização; e, ainda, com base constituem os respectivos objetos de aná-
nestes resultados, para impedir que ocor- lise: o desemprego, o desequilíbrio exter-
ram quedas nos preços relativos das ex- no e a deterioração dos termos de troca
portações periféricas, que resultem na (e a diferenciação de renda implícitas
diferenciação de rendas. O fenômeno da neste fenômeno). Finalmente, em todos
deterioração é explicado por contraste a os casos, as tendências mencionadas se
esse padrão de referência. O crescimento explicam por desproporções que se pro-
das atividades destinadas ao mercado in- duzem entre as magnitudes e taxas de
terno é tal, que as diferenças de produti- crescimento da produção e da utilização
vidade e de salários em comparação com dos recursos produtivos, nos diversos se-
o centro perduram ou se ampliam — a tores internos e externos (periféricos e
heterogeneidade subsiste. A especializa- cêntricos).
ção também subsiste, em seu duplo sen-
tido: a falta de complementariedade in-
tersetorial das atividades que produzem 7. Alcance e limitações
para o mercado interno e o caráter pri-
mário do setor exportador. A especializa- I. Os alcances do pensamento da
ção gera desequilíbrio externo, que, por CEPAL não dependem, somente, da am-
sua vez, estimula uma expansão excessi- plitude e unidade destacadas no primeiro
va das exportações primárias, reduzindo item deste trabalho. Dependem, também,
os preços relativos das mesmas. Esta que- de sua natureza estruturalista, dado que
da compensa a menor diferenciação da este tipo de enfoque permite revelar uma
produtividade que se verifica no setor série de problemas e fenômenos especí-
primário-exportador, igualando a remu- ficos do subdesenvolvimento, alcançando,
neração dos recursos nos dois setores assim, uma interpretação sui generis,
componentes da economia periférica. A
diversa e mais complexa que as direta-
diferenciação dos níveis de produtividade
do trabalho (na indústria) e a deteriora- mente derivadas da economia conven-
ção da relação de troca (no setor primário- cional. O caráter estruturalista constitui,
exportador) implicam que as rendas, em pois, o traço de originalidade e o méri-
ambos os setores, se diferenciam em to principal das contribuições cepalinas.
relação ao centro. Dessa forma, na expli- Contudo, como se verá adiante, dele tam-
cação da deterioração se incorporam as bém depende uma das limitações funda-
idéias da concepção básica com relação mentais que as mesmas apresentam.
ao caráter desigual do desenvolvimento II. Convém reiterar que tais contri-
do sistema centro-periferia: a desigualda- buições podem ser resumidas através da
de no grau de avanço das estruturas pro- interpretação das três tendências consi-
dutivas de seus pólos e nos seus respec- deradas inerentes à industrialização das
tivos níveis de renda real média. economias periféricas: o desemprego, o

NOVOS ESTUDOS N.º 16


desequilíbrio externo e a deterioração. O subdesenvolvimento é julgado por
Em cada caso, a interpretação se apóia contraposição a esse simples padrão de
em algumas das hipóteses da concepção referência, perguntando-se que fatores
inicial e em certos pressupostos adicio- impedem de alcançar e manter uma ele-
nais que, em conjunto, delimitam o ra- vada taxa de crescimento da renda social.
ciocínio. Sobre estas bases, são elabora- Assim, por exemplo, refere-se com fre-
dos, implícita ou explicitamente, padrões qüência à existência de um duplo círculo
ideais de referência que indicam as con- vicioso: o atraso e a pobreza diminuem,
dições de proporcionalidade que devem de um lado, as possibilidades de poupan-
ser cumpridas entre os setores produtivos ça e acumulações; e limitam, por outro,
periféricos, para evitar que aquelas ten- o tamanho do mercado e as oportunida-
dências se manifestem, durante a expan- des de inversão, requisitos para se che-
são industrial. Tais tendências se expli- gar à superação da pobreza e do atraso.

A
cam por contraposição a tais paradigmas,
indagando-se quais desproporções as pro-
vocam. s contribuições cepalinas não
Mas, se ao invés de centrar a atenção negam a existência de distintos
nas tendências, que são objeto direto da tipos de situações de atraso, nas
análise, nos preocuparmos em como ex- sociedades de menor desenvol-
plicá-las — com base nas desproporções vimento, nem mesmo os entraves que os
que acompanham a transformação da es- mesmos representam às mudanças nestas
trutura produtiva —, o alcance das con- mesmas sociedades. Contudo, tais contri-
tribuições teóricas da CEPAL aparece em buições não encaram o subdesenvolvi-
primeiro plano. Com efeito, como pode mento como um mero estado de atraso,
ser observado nos itens anteriores, inde- senão como um processo de transforma-
pendentemente da relevância das tendên- ção a longo prazo da estrutura produtiva
cias mencionadas ou mesmo de sua pró- da periferia (condicionado pelo marco
pria existência 17, as características da es- das relações comerciais com o centro). 17
Uma análise mais detalha
da das contribuições cepalinas
trutura produtiva periférica são ordena- Com efeito, as contribuições que inte- permite demonstrar que, estri-
damente apresentadas em torno de tais gram a interpretação da industrialização tamente, suas hipóteses sobre
o caráter desigual do desen-
tendências, oferecendo uma imagem de periférica (sintetizadas nos itens 3 e 4 volvimento não requerem que
sua transformação e das dificuldades que deste trabalho) mostram que a mesma, se postule a deterioração da
relação de troca de mercado-
a acompanham, bem como do condicio- além de apresentar certas tendências e rias mas, tão-somente, a das
relações de troca de fator
namento exercido pelas relações comer- contradições (como o desemprego e o duplo.
ciais mantidas com os centros 18 . desequilíbrio externo), caracteriza-se por 18
De outro ângulo, as contri-
III. A amplitude desta temática e, determinados padrões de transformação buições da CEPAL se referem
a certos aspectos do desenvol-
sobretudo, o modo de analisá-la fazem estrutural: a conformação do setor ma- vimento das forças produtivas
com que o enfoque cepalino do subde- nufatureiro a partir dos ramos tecnologi- nas economias ditas subdesen-
volvidas, onde o capitalismo
senvolvimento difira significativamente camente mais simples e mais próximos e as técnicas que traz consigo
penetraram com atraso ou de
dos que são desenvolvidos por contraste ao mercado de bens de consumo final; a forma desigual e unilateral-
com modelos de crescimento de inspira- falta de complementariedade intersetorial mente. Entre tais aspectos se
destacam: a dotação de meios
ção neoclássica ou pós-keynesiana, ou da produção que acompanha este tipo de de produção por pessoa ocupa-
da, que condiciona a produ-
com variantes muito simples desses. expansão industrial; a baixa taxa de au- tividade do trabalho; a baixís-
Como se sabe, tais modelos estabele- mento das exportações primárias; o lento sima produtividade nos seto-
res atrasados; a diferenciação
cem a taxa de acumulação de capital e crescimento dos setores modernos frente dos níveis de produtividade
de crescimento da renda necessária para às necessidades de absorção de mão-de- frente às economias capitalis-
tas do centro, mesmo nas ati-
preservar o pleno emprego da força de obra impostas pela imensidão dos setores vidades modernas; os desajus-
tes e incongruências que sur-
trabalho e para manter a utilização plena atrasados; o agravamento deste desajuste, gem intra e entre os distintos
da capacidade instalada, virtuais expres- devido à inadequação de tecnologia ori- setores da produção material,
condicionados pelo tipo de
sões do equilíbrio dinâmico do sistema ginada nos centros ou devido à relativa comércio exterior, e a própria
reiteração do atraso frente ao
econômico. Freqüentemente se deixa de rigidez da estrutura agrária periférica centro, dependente em parte
lado os objetivos específicos e os pressu- etc. Ademais, as várias versões da teoria de tais desajustes.
postos de comportamento próprios deste da deterioração dos termos de trocas
tipo de modelo, deles se deduzindo uma (resumidas no item 5), além de exami-
concepção "estilizada" do crescimento, nar o significado e as causas deste fenô-
extremamente simples, que destaca algu- meno, mostram que, com a expansão in-
ma das condições necessárias para expan- dustrial, a heterogeneidade e a especiali-
dir a renda, em particular o aumento da zação da estrutura produtiva periférica
quantidade de fatores produtivos e de se atenuam, sem que se elimine o atraso
sua produtividade. estrutural com relação ao centro e às dife-

DEZEMBRO DE 1986
O PENSAMENTO DA CEPAL: SÍNTESE E CRÍTICA

renças entre os níveis de renda média dências peculiares da industrialização pe-


de ambas as economias. riférica não se produzam; e, além disso,
Assim, pois, a análise cepalina do sub- que estivesse apto para identificar, por
desenvolvimento é, por sua vez, mais contraposição, as desproporções que sur-
abstrata e mais ampla que aquelas que gem ao longo das transformações da es-
se estabelecem por contraposição direta, trutura produtiva e sua vinculação com
ou quase direta, com a teoria convencio- tais tendências. Conseqüentemente, com-
nal. Mais abstrata, porque considera sepa- preende-se que, devido à sua grande am-
radamente a transformação da estrutura plitude e à sua maior complexidade, para
produtiva periférica, deixando de lado a estabelecer coerentemente tal paradigma,
influência que fatores do tipo social ou será preciso estabelecer condições globais
cultural eventualmente exerçam sobre tal e setoriais de acumulação de capital que
transformação. Mais ampla, não só por- assegurem um crescimento proporcional
que leva em conta uma grande variedade das várias atividades produtivas, evitan-
de aspectos da estrutura produtiva peri- do-se, assim, o surgimento daqueles de-
férica e de sua transformação, mas por- sequilíbrios e tendências. No tipo de mo-
que, ademais, considera a inserção desta delo em questão, resultará eficiente ter
economia no sistema econômico mundial em conta certas condições de acumula-
e o condicionamento imposto por suas ção "necessárias" para que as diferentes
19
As contribuições da CEPAL relações comerciais 19. regras de proporcionalidade do cresci-
não só são alternativa às in-
terpretações correntes do sub-
IV. Como foi assinalado no item 1, mento setorial se cumpram simultanea-
desenvolvimento, mas também além de subsistirem inconsistências meno- mente. Tais condições são, pois, da mes-
à teoria tradicional da divi-
são internacional do trabalho. res, as diversas contribuições cepalinas ma natureza e em nada diferem das que
Esta — que pressupõe graus não chegaram a ser claramente conecta- estão implicitamente presentes nos mo-
semelhantes de desenvolvi-
mento nas economias que co- das e compatibilizadas. Existe entre elas delos mais simples, anteriormente consi-
merciam — adota um conjunto
de pressupostos adicionais uma unidade: se apóiam em um conjunto derados.
para demonstrar as vantagens comum de hipóteses básicas, de modo O estabelecimento explícito de condi-
da especialização e do inter-
câmbio sobre o isolamento que suas análises e suas conclusões não ções de acumulação "necessárias" ou
comercial. As várias versões
da teoria da deterioração dos
são contraditórias e excludentes, mas har- "requeridas" permite virtualmente esta-
termos de trocas partem da mônicas e complementares. Mas, tais con- belecer, com maior grau de coerência,
aceitação de que no centro e
na periferia existem caracte- tribuições não chegam a conformar um as regras de proporcionalidade que devem
rísticas estruturais e níveis de todo coerente, não se podendo afirmar ser cumpridas pelos distintos setores da
produtividade e renda média
substancialmente diferentes; que constituam aspectos parciais de uma produção material; também permite, em
estabelecem, além disso, uma
série de pressupostos adicio- mesma teoria global. princípio, examinar com mais precisão os
nais para demonstrar que, na Contudo, a limitação do pensamento desajustes que caracterizam a transfor-
dinâmica do sistema, os frutos
do progresso técnico tendem a cepalino não depende destes requisitos mação da estrutura produtiva periférica e
se concentrar nas economias
centrais e a desigualdade es-
de forma, mas do próprio enfoque que sua ligação com os desequilíbrios peculia-
trutural tende a perpetuar-se. utiliza, isto é, de sua natureza estrutura- res desta economia (o déficit externo, o
Em linhas gerais, pode-se di- desemprego etc.). Entretanto, mesmo al-
zer que a inadequação das crí- lista. Em suma, a limitação que se deseja
ticas feitas às teorias da CE- destacar deriva de que os aportes teóri- cançando os limites de suas possibilida-
PAL sob a perspectiva ortodo-
xa se baseiam no desconheci- cos da CEPAL (referentes essencialmen- des de coerência interna, o enfoque estru-
mento da substancial modi-
ficação que as teorias cepa- te ao modo como se transforma a estru- turalista é inadequado para analisar a
linas realizam nos pressupos- tura da produção de bens e serviços du- evolução a longo prazo do sistema eco-
tos das teorias convencionais,
adquirindo, com isso, carac- rante a industrialização periférica) não nômico em seu conjunto, que envolve
terísticas e alcance distintos. consideram nem analisam as relações so- mais do que a transformação da estru-
ciais que estão na base do processo de tura produtiva.
industrialização e das transformações de Uma análise como esta requer centrar
20
De um outro ângulo, pode- estrutura que este traz consigo20. a atenção no processo de acumulação de
se dizer que as contribuições V. Com o objetivo de esclarecer esta capital. Diferentemente do conceito de
teóricas da CEPAL examinam
diversos aspectos do limitação, convém tomar como ponto de acumulação necessária implícito nas teo-
desenvolvimento das forças rias da CEPAL, neste tipo de análise
produtivas das economias di- partida a falta de compatibilidade plena
tas subdesenvolvidas, sem entre os distintos componentes do pensa- faz-se necessário que se considere e se
considerar as relações sociais
de produção. Mais exatamen- mento cepalino. Pode-se pensar que para integrem as relações econômicas estabele-
te, só fazem referências late-
rais — não integradas no seio
se chegar a uma maior articulação lógica cidas entre as distintas entidades compo-
das análises — a algum as entre os três modelos que o sintetizam nentes do sistema. Trata-se de descrever
das relações econômicas que
fazem parte das relações de — e, através deles, entre as múltiplas como a acumulação se processa, a partir
produção (especialmente aque- contribuições que o constituem —, seria das motivações e do comportamento dos
las mencionadas nos itens 3,
po nto V e p o nto VI, e 5 , imperioso elaborar um padrão ideal de agentes econômicos, grupos de interesses
ponto V. crescimento setorial (e, conseqüentemen- e grupos sociais, cujas ações (por exem-
te, de crescimento global), onde as ten- plo, decisões de poupança e investimen-

NOVOS ESTUDOS N.° 16


to, adoção de novas técnicas, reivindica- derivam da diferenciação de produtivi-
ções salariais etc.) a dinamizam ou a dade e renda e, por outro, impulsionam
freiam, ou ainda, lhe imprimem determi- desigualmente as transformações das es-
nada orientação. Ainda assim, é factível truturas produtivas. A análise da desi-
fazer referência ao modo pelo qual tais gualdade não pode realizar-se somente
ações induzem a determinado padrão de com base nas pautas de acumulação "ne-
transformação da estrutura produtiva, cessária" ou "requerida" para evitar o
sofrendo, por sua vez, influência dessa surgimento de certas desproporções entre
transformação. os setores da produção material, posto
A mesma limitação pode ser estabele- que não está unicamente relacionada com
cida de uma outra perspectiva. As teorias tais desproporções; depende, também,
cepalinas descrevem e examinam certos das condições gerais em que se produz a
aspectos do desenvolvimento das forças acumulação em escala mundial e da me-
produtivas sem se referir, a não ser late- dida em que tais condições favoreçam,
ralmente, às relações de produção, e, entorpeçam ou bloqueiem o crescimento
tampouco, à forma em que ambas intera- da produção de um e de outro pólo.
tuam. Para abordar esta interação, exis- Encarando esta limitação sob outro ân-
tem dificuldades consideráveis, sendo que gulo, pode-se dizer que, para analisar a
as análises do subdesenvolvimento que bipolaridade do sistema centro-periferia,
o fizeram são, sem dúvida, incompletas. não basta postular a desigualdade do de-
Contudo, em linhas gerais, pode-se afir- senvolvimento das forças produtivas (ex-
mar que para incorporar e integrar as re- pressada nas teorias cepalinas pelas dife-
lações de produção nesta análise, superan- renças entre os dois pólos, no que diz
do o caráter unilateral do enfoque estru- respeito ao nível da produtividade do
turalista, além de se articular a argumen- trabalho e ao grau de diversificação e
tação em torno da acumulação de capital, homogeneidade de suas estruturas pro-
faz-se necessário encará-lo como um pro- dutivas). É necessário ter em conta que
cesso de geração, apropriação e utiliza- as mesmas se desenvolvem nos marcos de
ção do excedente econômico. A adoção um processo de geração, apropriação e
de tal perspectiva exige reconhecer a exis- utilização do excedente econômico, e que
tência de uma relação econômica básica tal processo — bem como as relações de
de exploração entre capital e trabalho, exploração em que está baseado — não
que imprime um caráter antagônico às se produz só no interior de cada pólo,
relações das classes sociais, o qual, por mas também entre eles, ou seja, entre as
sua vez, condiciona a evolução e o fun- economias avançadas e atrasadas do sis-
cionamento do sistema econômico-social tema capitalista mundial.
em seu conjunto.
VI. Existe, adicionalmente, uma outra
limitação do pensamento cepalino que 8. O caráter ideológico
também é atribuída ao caráter estrutura-
lista de seu enfoque. A teoria da deterio- I. As contribuições teóricas anterior-
ração dos termos de trocas, sintetizada mente resumidas sustentam uma moda-
no terceiro dos modelos anteriormente lidade política de desenvolvimento enfa-
considerados, incorpora o núcleo funda- ticamente industrialista, complementada,
mental das hipóteses constituintes da con- por sua vez, por uma série de análises
cepção originária. De acordo com estas e recomendações de política econômica.
hipóteses, o sistema centro-periferia evo- Quando a atenção se volta para essas con-
lui de forma desigual: as diferenças entre tribuições de política — nas quais é ine-
os níveis de produtividade e renda média vitável a referência ao comportamento
e entre as estruturas produtivas de seus dos agentes econômicos e dos grupos so-
dois pólos influenciam-se reciprocamente ciais e a adoção de uma postura pros-
e tendem a se reproduzir através do pectiva —, nota-se que o pensamento
tempo. cepalino contém pressupostos sobre as
O enfoque estruturalista impede às relações entre grupos e classes sociais e
teorias cepalinas aprofundar este as- sobre as mudanças que nelas se produzem
pecto crucial de suas próprias hipóteses ao longo do processo de industrialização
originárias. Com efeito, a desigualdade da periferia.
do desenvolvimento possui um claro vín- Tais pressupostos constituem, em seu
culo com as distintas possibilidades de conjunto, um projeto sócio-político. Tra-
poupança e acumulação que, por um lado, taremos, em seguida, de evidenciá-lo, não

DEZEMBRO DE 1986
O PENSAMENTO DA CEPAL: SÍNTESE E CRÍTICA

para demonstrar cabalmente, mas ao me- enquanto que as contribuições à política


nos para se chegar, com algum funda- econômica se destinam a estabelecer as
mento, à conclusão de que o pensamento políticas mediante as quais é possível e
da CEPAL possui um caráter ideoló- desejável conduzir esse processo delibe-
gico. radamente. Para além desta aparente neu-
Segundo se admite, com a industriali- tralidade, o projeto que subjaz neste pen-
zação, as relações sociais vão se alteran- samento revela seu caráter ideológico, ao
do de tal forma que esta mudança favo- tornar visíveis seus vínculos com os pon-
rece sua continuidade e sua aceleração. tos de vista e interesses de determinados
Nesta transformação, a burguesia indus- grupos e classes sociais.
trial nacional exerce uma liderança que O mencionado projeto — assim como
a habilita a redefinir sua participação nas o pensamento em epígrafe, que o contém
relações sociais de acordo com seus pró- — atribui alta prioridade aos interesses
prios interesses. As relações que se esta- da burguesia industrial nacional e, por-
belecem entre os distintos grupos da clas- tanto, resulta compatível e convergente
se capitalista transformam-se, em parte, com os mesmos. Possui, ademais, um
sob a pressão e em benefício da burgue- cunho "policlassista", pois pretende res-
sia industrial nacional; mas, num prazo guardar os interesses das camadas médias,
maior, na medida em que são difundidas dos setores trabalhadores e, em geral,
suas atitudes sócio-psicológicas, tenden- dos vastos grupos despossuídos, com base
tes a dar mais eficácia à produção e mais na absorção econômica e integração so-
racionalidade à gestão empresarial, os cial que supostamente vão ocorrendo com
interesses dos grupos capitalistas, grosso a industrialização deliberada. Enfoca as
modo, se tornam convergentes, o que relações sociais, segundo as evidências,
atenua seus conflitos. sob uma perspectiva específica e coinci-
Também sob esta mesma liderança, dente, em geral, com a dos estamentos
mudam as relações entre os grupos capi- ligados ao aparato estatal; propõe a am-
talistas e os não-proprietários. Como se pliação de suas funções e do grau de sua
supõe que estes últimos são amplamente intervenção, postulando ser, o mesmo,
absorvidos por um sistema econômico em capaz de conciliar interesses dos distin-
que os níveis de produtividade e de vida tos grupos e classes, além de privilegiar
aumentam de maneira contínua, se con- os da nação em seu conjunto.
cebe que os conflitos existentes entre tais II. Foi dito anteriormente que o pen-
grupos vão, pouco a pouco, encontrando samento cepalino não leva em conta as
mais fácil solução, nos marcos de padrões relações sociais, ou só as examina lateral
de conduta e formas de relacionamento e superficialmente. É possível afirmar,
social que se modernizam e se renovam. com maior precisão, que esta limitação
Estes pressupostos se complementam está vinculada ao caráter ideológico des-
com os que se referem ao Estado, ao se pensamento, pois ao se desprezar as
qual se atribui um importante papel. relações sociais estar-se-á, implicitamen-
Para cumpri-lo, é necessário ampliar con- te, estabelecendo para com as mesmas
sideravelmente o âmbito de seus próprios pressupostos de cunho ideológico.
interesses, o que deverá ocorrer, contu- Estes pressupostos podem, sintética e
do, dentro dos limites compatíveis com abstratamente, assim ser descritos. O Es-
o das distintas classes e grupos; é missão tado é concebido como uma entidade ex-
do Estado promover e tutelar as trans- terna ao sistema sócio-econômico, capaz
formações sociais a que se acaba de fazer de apreendê-lo de forma consciente, im-
referência e arbitrar os conflitos emer- primindo-lhe uma racionalidade que, por
gentes; finalmente, cabe ao Estado repre- si só, não possui. Uma segunda idéia ge-
sentar e defender os interesses da nação ral complementa esta forma de ver o Es-
em suas relações externas (impulsionando tado; sob sua tutela, é factível conseguir
sua transformação) e frente ao capital a consolidação e a livre expansão das re-
estrangeiro, assegurando o caráter nacio- lações sociais capitalistas nas áreas ditas
nal do desenvolvimento. periféricas ou subdesenvolvidas.
À primeira vista, as contribuições à Assim recolocados, tais pressupostos
teoria econômica da CEPAL parecem permitem considerar o caráter ideológico
destinadas a delinear as peculiaridades do pensamento cepalino de uma nova
do processo espontâneo de industrializa- perspectiva e num plano mais geral. Com
ção da periferia e das transformações na efeito, os mesmos revelam que este pen-
estrutura produtiva que o acompanha, samento postula, ideologicamente, a re-

NOVOS ESTUDOS N.º 16


produção de relações capitalistas de pro- que os pontos de vista do projeto cepa-
dução nas formações sociais conhecidas lino são similares aos dessas ideologias,
como periféricas; e assim o faz, sem re- se bem que estas os apresentem de modo
conhecer a existência de uma relação mais explícito e extremo. Por exemplo,
básica de exploração entre capital e tra- ao realçar a contraposição dos interesses
balho, nem o caráter antagônico que a nacionais com os do capital estrangeiro
mesma imprime ao conjunto das relações e com os dos países desenvolvidos com
sociais. Deste modo, é prescindível exa- os quais tradicionalmente se mantiveram
minar as características específicas que laços econômicos estreitos; além disso,
assumem tais relações no interior das for- reconhecem e enfatizam a existência de
mações sociais periféricas, bem como en- confrontação e conflito entre os grupos
tre estas e as formações avançadas do sociais que compõem as alianças popu-
sistema capitalista mundial. listas — e os grupos opostos às mesmas,
Em outras palavras, as contribuições vinculados ao latifúndio e aos interesses
estudadas realizam uma incisiva análise comerciais e financeiros do velho siste-
dos sintomas do subdesenvolvimento que ma primário-exportador.
são perceptíveis na esfera da produção Não somente o projeto implícito, mas
material, ou seja, ao nível das forças também o próprio pensamento da CEPAL
produtivas e de sua transformação. Mas, da década de 50, resultam compatíveis e
devido ao seu caráter ideológico, não convergentes com as ideologias mencio-
conseguem captar estes sintomas como
nadas. Em outras palavras, tanto estas
expressão do processo sócio-econômico
como aquele parecem fazer parte de um
global no qual se inscrevem, nem vinculá-
los ao conteúdo de classe da exploração mesmo movimento geral de idéias, mar-
econômica existente na periferia e entre cado por uma clara tendência progressis-
esta e os grandes centros capitalistas. ta. Ambos propunham realizar transfor-
Conclui-se pois que, apesar do pensa- mações econômicas e sociais que, além
mento da CEPAL alterar significativa- de supor a consolidação dos grupos mais
mente os pressupostos da economia con- dinâmicos da classe capitalista, também
vencional, brindando-nos com uma inter- pretendiam a gradual absorção econômica
pretação sui generis do subdesenvolvi- e integração social dos vastos grupos per-
mento, não supera os limites dessa eco- tencentes às classes despossuídas. Obser-
nomia, dentro dos quais, definitivamen- va-se, contudo, que, naqueles anos, as
te, se inscreve. mudanças propostas apresentavam indí- 21
De acordo com a pers-
III. O intento de detectar o caráter cios de viabilidade, pois, com distintas p ectiva d e Francisco C.
ideológico do pensamento cepalino me- variações e graus de êxito, segundo cada Weffort, os populismos são
sistemas políticos em que so-
diante somente sua análise e a de seus caso, inúmeras alianças de poder de corte bressaem as seguintes carac-
terísticas: "estrutura institu-
pressupostos implícitos resulta, sem dú- populista intentaram efetivá-las na prá- cional de tipo autoritário e
vida, unilateral e insuficiente. Para de- tica. semicorporativo; orientação
política de tendência nacio-
monstrar cabalmente a existência deste IV. No começo dos anos 60, os do- nalista antiliberal e antio-
ligárquica; orientação econô-
caráter, é necessário ter-se em conta as cumentos da CEPAL destacam uma série mica de tendência naciona-
circunstâncias históricas em que o mesmo de fatos e problemas que então se faziam lista, estatística e industria-
lista; composição policlas-
se originou e se desenvolveu, examinan- mais visíveis. Entre estes, cabe mencio- sista, mas com apoio majori-
tário nas classes populares"
do-as com um grau de detalhamento que nar a lenta transformação da agricultura, (F. Weffort, "Clases Popula-
excede as possibilidades de um trabalho o aumento contínuo do desemprego e do res y Desarrollo Social", in
A. Quijano e F. Weffort,
de cunho analítico, como este. Contudo, subemprego, a proliferação das condições Populismo, Marginalización y
a fim de complementar minimamente as de marginalidade, a concentração da ren- Dependencia, Editora Univer-
sitária Centroamericana, Costa
considerações que acabamos de fazer, é da e da riqueza, a pertinaz tendência ao Rica, 1973, p. 23). Tais
características são deduzidas
conveniente revelar o significado ideoló- déficit comercial e o conseqüente aumen- a partir dos casos de Argen-
gico das modificações que sofreram as to da dívida externa, a presença do capi- tina e Brasil, onde as mesmas
se perfilam de maneira mais
contribuições cepalinas nos anos 50 e 60. tal estrangeiro na produção manufatu- nítida e completa. Em outros
países, como Chile, México e
reira e, em diversos casos, a manifesta Uruguai, estas se apresentam
intensificação das tensões sociais e polí- atenuadas, de modo que o
termo populismo só pode ser
projeto sócio-político implícito ticas. Segundo se alega, tais fenômenos aplicado por extensão e apro-
ximadamente. Mediante a ex-
nas contribuições cepalinas dos revelam a crise do chamado "processo de pressão "ideologias populis-
industrialização por substituição de im- tas", este trabalho faz refe-
anos 50 pode ser comparado rência aos traços comuns da-
com as ideologias populistas portação". Os esforços de reintegração quelas ideologias que corres-
pondem aos sistemas políti-
que tiveram vigência nos diversos países teórica empreendidos nos anos 70 se des- cos populistas e seus simila-
latino-americanos, naquele decênio e nos tinam a explicar essa crise. As análises res e às alianças e movimen-
tos políticos que os susten-
dois anteriores21. Tal comparação mostra de política econômica de então buscam taram.

DEZEMBRO DE 1986
O PENSAMENTO DA CEPAL: SÍNTESE E CRÍTICA

delinear uma política global de desen- cente do investimento privado estrangeiro


volvimento sobre bases mais amplas, e e das empresas transnacionais nos
encarar os distintos problemas parciais setores mais modernos e dinâmicos das
com instrumentos mais adequados. economias latino-americanas, fenômeno
Com freqüência se afirma que as ideo- que, ainda que não seja ignorado nos
logias populistas possuem um caráter na- documentos da CEPAL, não se acha inte-
cional e popular, além de uma marcada grado na interpretação teórica, nem tam-
tonalidade estatizante. Como já se obser- pouco é objeto de propostas de política
vou, mesmo que de maneira sensivelmente definidas claramente.
mais cautelosa, os dois primeiros traços Em suma, durante os anos 60, se acen-
estão presentes nas contribuições tua o reformismo e o intervencionismo
cepalinas dos anos 50. Também o esta- do pensamento cepalino. Estes são dois
tismo ganha no seu corpo forma atenuada dos traços que lhe imprimiram, na déca-
de uma posição, em geral, interven- da anterior, um caráter nitidamente pro-
cionista. Brevemente, as novas colorações gressista. Observa-se, contudo, que os
adquiridas por tais contribuições na dé- pressupostos acerca das transformações
cada posterior podem ser descritas em nas relações sociais e sobre o plausível
torno dos três traços acima referidos. papel do Estado, sintetizados por tais
Sem chegar ao estatismo, o caráter in- traços, não tinham, nos 60, os mesmos
tervencionista do pensamento cepalino se indícios de viabilidade que antes. Dito de
intensifica de maneira considerável. Esta outra maneira, o pensamento da CEPAL
variação está vinculada a um elemento- do segundo decênio não registra nenhum
chave, ainda que não exclusivamente: o avanço significativo na interpretação do
papel protagonista que é atribuído ao processo global de desenvolvimento e,
Estado como impulsor e gestor da refor- simultaneamente, torna mais explícitas e
ma agrária que, por sua vez, passa a ser incisivas suas propostas de transforma-
considerada, juntamente com a industria- ção econômica e social, em circunstâncias
lização, um pilar básico da política de em que, em vários casos, se rompem as
desenvolvimento. alianças de poder de corte populista que
O reformismo das posições cepalinas pareciam conceder-lhes sentido histórico.
se acentua notoriamente, aproximando-as V. A crítica precedente pode ser es-
das ideologias populistas. Neste sentido, truturada num plano mais geral, que nos
as propostas destinadas a modificar a es- possibilita estendê-las às contribuições
trutura da propriedade agrária e a garantir dos 70 ou, com mais propriedade, ao
uma distribuição mais equitativa da pensamento cepalino considerado como
renda se fazem muito mais diretas e in- estrutura conceitual já constituída, com
cisivas; aumentam, além disso, as preo- o grau de desenvolvimento que chegou
cupações sociais do desenvolvimento, dan- a alcançar em anos recentes. Devido ao
do lugar a novas recomendações no âmbi- caráter ideológico que traz desde suas
to das políticas trabalhista e social. origens, este pensamento não examina as
As contribuições cepalinas dos anos 50 relações sociais de forma satisfatória e,
sustentam que a fração ideal da proprie- implicitamente, postula o sentido geral de
dade estrangeira sobre o total de ativos suas transformações. Por esta razão, ten-
da periferia, assim como a participação de a visualizar as mudanças que de fato
dos recursos externos na poupança glo- vão ocorrendo, sob o impulso das rela-
bal, devem ser decrescentes e sujeitas à ções entre classes sociais e de seu caráter
previsão e ao controle. Em outras pala- antagônico, não como uma manifestação
vras, sem negar a importância da colabo- da realidade em si mesma, mas como uma
ração transitória do capital estrangeiro, anomalia, propondo reiteradamente ade-
estas contribuições propunham um tipo quar a realidade aos padrões ideais de
de industrialização e de desenvolvimento normalidade estabelecidos, implícita ou
eminentemente nacional. Ainda que esta explicitamente, em suas contribuições à
posição não tivesse sido negada ou revi- teoria econômica.
sada, ainda que se tivesse aumentado, nos
anos 60, a importância atribuída à neces- Octavio Rodríguez é economista e pesquisador do
CINVE.
sidade de transformar a estrutura do co-
mércio internacional, o caráter nacional Novos Estudos CEBRAP, São Paulo
do pensamento cepalino tende a diluir-se. n.° 16, pp. 8-28, dez. 86
Isto se deu em função da presença cres-

NOVOS ESTUDOS N.º 16

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