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Perf il da

LITERATURA
AMERICANA
¦
EDIÇÃO REVISADA
SUMÁRIO
LITERATURA
AMERICANA
EDIÇÃO REVISADA
Período Inicial Publicado pelo Departamento de Estado
dos Estados Unidos da América
e Colonial Americano até 1776 5
CORPO EDITORIAL
Origens Democráticas
e Escritores Revolucionários, Escrito por: Kathryn VanSpanckeren
1776-1820 16 Editor Executivo: George Clack
Editor-Chefe: Paul Malamud
Editor Colaborador: Kathleen Hug
Período Romântico, 1820-1860: Diretor de Arte / Designer:
Ensaístas e Poetas 28 Thaddeus A. Miksinski, Jr.
Editor de Imagens: Joann Stern
Traduzido por: Márcia Biato
Período Romântico, Revisado por: Vera Galante
1820-1860: Ficção 38 Editor Gráfico da Tradução:
Elizabeth de Souza

Ascensão do Realismo:
Capa: © 1994 Christopher Little
1860-1914 49
SOBRE A AUTORA
O Modernismo e Kathryn VanSpanckeren
a Experimentação: 1914-1945 62 é professora de inglês na
Universidade de
Tampa, fez palestras sobre
Poesia Americana, literatura americana em vários
de 1945-1990: A Antitradição 81 países e foi diretora do programa
de Literatura Americana no
Instituto de Verão da Fulbright
A Prosa Americana, para estudantes internacionais.
de 1945-1990: Seus trabalhos publicados
Realismo e Experimentação 99 incluem poesia e conhecimento.
Ela graduou-se pela Universidade
da Califórnia, em Berkeley, e fez
Poesia Americana Contemporânea 123 doutorado na Harvard University.

Literatura Americana Contemporânea 138


Glossário 159
Índice 165
Os seguintes textos não podem ser reproduzidos sem a permissão do detentor dos direitos autorais:
“In a Station of the Metro” [Numa Estação do Metrô] (pág. 65), de Ezra Pound. De Personae, de Ezra Pound.
Copyright © 1926 de Ezra Pound. Traduzido e reproduzido com a permissão de New Directions Publishing
Corporation.
“Stopping by Woods on a Snowy Evening” [Parando no Bosque numa Noite de Neve] (pág. 67) de Robert
Frost. De The Poetry of Robert Frost [A Poesia de Robert Frost], editado por Edward Connery Lathem. Copyright
1923, © 1969 de Henry Holt and Co., Inc., © 1951 de Robert Frost. Reproduzido e traduzido com a permissão
de Henry Holt and Co., Inc.
“Disillusionment of Ten O’Clock” [Desilusão das Dez Horas] (pág. 68) de Wallace Stevens. De Selected Po-
ems [Poemas Selecionados] de Wallace Stevens. Copyright 1923 e prorrogado em 1951 por Wallace Stevens.
Reproduzido com a permissão de Alfred A. Knopf, Inc.
“The Red Wheelbarrow” [O Carrinho de Mão Vermelho] (pág. 68) e “The Young Housewife” [A Jovem Dona
de Casa] (pág 69) de William Carlos Williams. Collected Poems, 1909-1939. Vol. I. [Coletânea de Poemas,
1909- 1939. Vol.1] Copyright 1938 New Directions Publishing Corp. Reproduzido com a permissão de New
Directions.
“The Negro Speaks of Rivers” [O Negro Fala de Rios] (pág. 71) de Langston Hughes. De Selected Poems
[Coletânea de Poemas], de Langston Hughes. Copyright 1926 de Alfred A. Knopf, Inc.e renovado em 1954 por
Langston Hughes. Reproduzido com a permissão do editor.
“The Death of the Ball Turret Gunner” [Morte do Artilheiro da Torre de Tiro] (pág. 82) de Randall Jarrell em
Randall Jarrell: Selected Poems [Randall Jarrell: Poemas Selecionados]; © 1945 de Randall Jarrell, © 1990
de Mary Von Schrader Jarrell, publicado por Farrar Straus & Giroux. Permissão concedida por Rhoda Weyr
Agency, Nova York.
“The Wild Iris” [A Íris Selvagem] (pág. 127) de The Wild Iris por Louise Gluck. Copyright © 1993 por Louise
Gluck. Reproduzido com a permissão de HarperCollins Publishers Inc.
“Chickamauga” (pág. 128) de Chickamauga por Charles Wright. Copyright © 1995 por Charles Wright.
Reproduzido com a permissão de Farrar, Straus and Giroux, LLC.
“To The Engraver of my Skin” [Para o Gravador de minha Pele] (pág. 131) de Source por Mark Doty. Copyright
© 2001 por Mark Doty. Reproduzido com a permissão de HarperCollins Publishers Inc.
“Mule Heart” [Coração de Mula] (pág. 132) de The Lives of The Heart [As Vidas do Coração] por Jane Hir-
shfield. Copyright © 1997 por Jane Hirshfield. Reproduzido com a permissão de HarperCollins Publishers Inc.
“The Black Snake” [A Cobra Negra] (pág. 133) copyright © 1979 por Mary Oliver. Usado com permissão de
Molly Malone Cook Literary Agency.
“The Dead” [O Morto] (pág. 134) de Questions About Angels [Perguntas sobre Anjos] por Billy Collins, ©
1991. Reproduzido com a permissão de University of Pittsburgh Press.
“The Want Bone” [O Osso do Desejo] (pág. 135) de The Want Bone [O Osso do Desejo] por Robert Pinsky.
Copyright © 1991 por Robert Pinsky. Reproduzido com a permissão de HarperCollins Publishers Inc.
Yusef Komunyakaa, “Facing It” [Encarando-o] (pág. 136) de Dien Cai Dau in Pleasure Dome: New and
Collected Poems [Dien Cai Dau na Cúpula do Prazer: Coletânea e Novos Poemas], © 2001 por Yusef Ko-
munyakaa e Reproduzido com a permissão de Wesleyan University Press.

Algumas das ilustrações que aparecem neste volume também são protegidas por copyright, conforme indica-
do na própria ilustração. Estas não podem ser reproduzidas sem a permissão do detentor do direito autoral.

4
CAPÍTULO
Quetzalcoatl, deus dos toltecas e astecas e, nou­
tras regiões, contavam-se histórias de um deus
ou cultura superior. Não há, porém, lon­gos ci­clos

1
religiosos padronizados em tor­no de uma divin­
dade suprema. Os equi­va­lentes mais pró­xi­­mos
das narra­tivas espiri­tuais do Ve­lho Mun­do seriam
relatos das ini­cia­ções e viagens dos xamãs. Fora
isso, há histó­rias sobre he­róis cul­tu­rais, como o
PERÍODO INICIAL E Ma­na­bozho,da tribo Ojibwa,ou o Coyote,da tribo
COLONIAL ATÉ 1776 Navajo. A esses tra­paceiros são dados dife­rentes
graus de respeito. Numa lenda,po­dem agir como

A
literatura americana se inicia com a trans­ he­róis, enquan­to que nou­tra, poderão parecer
missão oral dos mitos, lendas, histórias ego­ís­tas ou tolos. Em­bo­ra autoridades do pas­
e letras (sem­pre canções) das cul­­tu­ras sado, como o suíço Carl Jung, tenham desapro­
indígenas.Não havia literatura escri­ta nas mais de vado histó­rias sobre trapa­ceiros, tachando-as de
500 diferentes línguas indí­ge­nas e culturas tribais expres­sões do lado inferior e amoral da psi­que,
da América do Norte antes da chegada dos pri­ ou­tros estudiosos con­tempo­râ­neos — al­guns,
mei­ros euro­peus.Como resultado,a lite­­ra­­­tura oral índios americanos — ressaltam que Ulisses e
dos ameri­canos nativos é bem diversificada. As Prometeu, heróis re­ve­ren­ciados pelos gre­gos,
nar­ra­ti­vas de culturas caça­doras quase nômades, eram, em essência, trapaceiros também.
co­­mo os Navajo, diferem das histórias con­ta­das Exemplos de quase todo gênero oral podem
por tribos agrícolas, como os Acoma, que viviam ser encontrados na literatura indígena ameri­
em pueblos (aldeias). Histórias dos ha­bi­tantes cana: letras de canções, cânticos, mitos, con­tos
dos lagos do Norte, como os Oji­bwa, muitas vezes de fada, anedotas, encan­tamentos, enigmas, pro­
diferem radi­calmente das con­ta­­das por tribos do vérbios, épicos e lendas. São muitos os regis­tros
deserto, como os Hopi. de migrações e de ancestrais, bem como cantos
As tribos mantinham sua própria reli­gião — de visões e de cura e lendas sobre trapaceiros.
ado­ravam deuses, animais, plan­tas ou pes­soas Algumas histórias da criação são particularmente
sagradas. Os sistemas de governo incluíam popu­lares. Numa das mais co­nhe­cidas, con­tada
democracias, conselhos de anciãos e até teocra­ em várias tribos com variações, uma tarta­ruga
cias.Essas varia­ções tribais aparecem tam­bém na sus­ten­ta o mundo. Numa versão Cheyenne da
litera­tura oral. lenda, o criador Maheo tem quatro chan­ces para
Mesmo assim, é possível fazer algumas ge­ne­ modelar o mun­do a partir de um universo aquoso.
ralizações. As histórias indígenas, por exem­­plo, Ele manda quatro aves aquáticas mergulharem
brilham com reverências à natu­reza como mãe para tentar trazer terra do fundo.O ganso da neve,
espiri­tual e física.A natureza está viva e dotada de o mergulhão-do-norte e o pato selva­gem voam
forças espiri­tuais; os princi­pais per­so­na­gens po­ até bem al­to e depois mergulham,sem conseguir
dem ser animais ou plan­tas ou fre­quen­temente alcançar o fundo; o pequeno galei­rão, contudo,
totens associados a tri­bos,a gru­pos ou indivíduos. que não pode voar, conse­gue trazer um pouco
Na literatura americana mais re­cente, o que de lama em seu bico. Ape­nas uma criatura, a
mais se apro­xima do sen­tido sagrado indígena humilde Vovó Tarta­ruga, possui as formas ne­
é a “Over-Soul” [Sobre-Alma] transcendental de cessárias para sus­tentar o mundo de lama que
Ralph Waldo Emer­son, que permeia toda vida. Maheo forma so­­bre seu casco — por isso o no­me
As tribos mexicanas reverenciavam o divino indígena pa­ra a América,‘Ilha da Tartaruga’.

5
As canções ou poesias, como as nar­rativas, vão falar espanhol e formar uma nação com o
do sagrado ao leve e humo­rístico: há cantigas de México ou fran­cês e unir-se aos fran­cófonos
ninar,cantos de guerra,canções de amor e canções cana­denses de Quebec e Mon­treal.
especiais para jogos infan­tis, jogos de azar, várias Porém, os primeiros explora­dores da Amé­ri­ca
tarefas,cerimônias de magia ou de dança.Em geral, não foram ingleses, espanhóis ou france­ses. O
são canções repe­titivas. Curtas can­ções-poema primeiro registro europeu de explo­­ração da Amé­
rece­bidas em sonhos podem às vezes trans­mitir as rica está numa língua es­can­­­di­nava. Vinland Saga
ima­gens claras e o clima sutil associados ao haicai [A Saga de Vinland] conta como Leif Eriksson e
japonês ou à poesia imagística influen­ciada pelo um bando de nórdicos errantes se fixaram breve­
Oriente. Uma canção Chippewa diz: men­te na costa nor­des­te da América — talvez na
No­va Escócia, no Canadá — na primeira déca­da
Pensei que fosse um mergulhão do século 11, quase 400 anos antes da próxima
Mas era o remo desco­berta europeia registrada do Novo Mundo.
do meu amor O primeiro contato conhecido continuado
batendo na água. en­tre a América e o resto do mundo começou,
porém, com a famosa viagem do explora­dor
Canções de visões, bem curtas, são outra italiano, Cristóvão Colombo, financiada pe­los reis
for­­ma caracte­rística. Apa­recendo em sonhos espanhóis, Fernão e Isabela. “Epístola”, o diá­rio
ou visões, às vezes sem aviso, podem ser can­ de Colombo, publicado em 1493, conta o drama
ções de cura, caça ou de amor. Muitas vezes da viagem — o terror dos homens, que temiam
são pessoais, como neste canto Modoc: mons­tros mari­nhos ou cair da borda do mundo; o
quase mo­tim; como Colombo alterou os diá­rios de
Eu bordo para que os homens não soubessem quão
o canto lon­ge tinham viajado além de qualquer outro; e
eu caminho aqui. a pri­mei­ra visão da terra, ao chegarem à América.
Bartolomé de las Casas é a mais rica fonte de
A tradição oral indígena e sua relação com informação sobre os primeiros contatos en­tre
a literatura americana como um todo é um dos índios americanos e euro­peus. Como jo­vem
temas mais ricos e menos explorados nos estudos padre, ele ajudou a conquis­tar Cuba, trans­creveu
ameri­canos. A contribuição dos índios à América o diário de Colombo e, já no fim de sua vida,
é maior do que se su­põe. As cen­te­nas de palavras produziu a extensa e vivaz History of the Indians
indígenas in­corpo­ra­das ao in­glês incluem ‘canoe’ [História dos Ín­dios], que critica a escravização
[ca­noa],‘to­bac­­co’ [taba­co],‘potato’ [batata],‘moc­ dos índios pelos espa­nhóis.
casin’ [mocassim], ‘moose’ [alce], ‘persimmon’ As tentativas inglesas iniciais de colo­nização
[caqui],‘racoon’ [guaxinim],‘tomahawk’ [macha­ foram desastrosas. A pri­meira colônia foi fun­da­da
dinha] e“totem”. A literatura americana indígena em 1585, em Roanoke, no litoral da Carolina do
con­tem­porânea,discutida no capí­tulo 8,também Norte; os colonos desapareceram e até hoje con­
contém obras de gran­de beleza. tam-se lendas sobre índios Croa­­tans de olhos azuis,
naquela região. Durou mais a se­gun­da colônia:
A LITERATURA DE EXPLORAÇÃO Jamestown, fundada em 1607. Re­­sis­­tiu à fome, à

S
e a história tivesse seguido outro rumo, bruta­lidade e ao mau gover­no.A litera­tura da épo­
os Estados Unidos poderiam facilmente ca, entretanto, pinta a Amé­rica com cores vibran­
ter sido parte dos gran­des im­­pé­rios da tes, como a terra das ri­quezas e opor­tunidades.
Espanha ou França. Seus ha­bi­tantes pode­riam Rela­tos das coloniza­ções tornaram-se mundial­

6
mente conhe­cidos.A explo­ração do Roanoke foi Em­bora a literatura americana passe agora a
cuidadosamente regis­trada por Thomas Hariot em concen­trar-se nos relatos ingleses, é impor­
A Brief and True Report of the New-Found Land of tante reco­nhecer seus primórdios ricamente
Virginia [Um Breve e Verdadeiro Relatório sobre cosmopolitas.
a Terra Re­cém-Descoberta da Virgínia] (1588).
O livro de Hariot logo foi tradu­zido para o latim, O PERÍODO COLONIAL
francês e alemão; o texto e as ilustra­ções, trans­for­ NA NOVA INGLATERRA

T
mados em gravuras,foram reproduzidos por mais alvez não tenha havido na história mun-
de 200 anos. dial outro grupo de colonos tão intelec-
O principal relato da colônia de James­town, tualizados quanto os Puritanos. Entre 1630
os escritos do Capitão John Smith, um de seus e 1690, havia tan­tos colonos diplomados em
líde­res,é o opos­to do trabalho preciso e cien­tí­fico universidades no nordes­te dos Estados Unidos,
de Hariot. Smith, romântico incor­rigível, pa­re­­ce na re­gião da Nova Inglaterra,quan­­to no país mãe
ter floreado suas aven­turas. A ele deve­mos a fa­ — fato notável, considerando-se que a maio­­ria
mosa es­tória da jovem índia Poca­hon­tas. Fato ou das pessoas educadas da épo­ca eram aristo­
ficção, ela está arrai­­gada no imagi­nário histórico cratas pouco dispos­tos a arris­car suas vidas em
americano. A len­da conta como Pocahontas,filha condições primitivas. Os Puri­tanos au­to­­di­datas,
predi­leta do Chefe Powhatan, salvou a vida do que venceram por seus próprios méritos, consti­
Capi­tão Smith enquanto prisio­neiro do chefe. tuíam notável exce­ção.Eles que­riam a edu­cação
Mais tarde, quando os ingleses persua­diram para com­preender e executar a von­tade de Deus
Powhatan a en­tre­gar Pocahontas como refém,sua no pro­cesso de colonização da Nova Inglaterra.
suavidade, inteligência e bele­za impres­­sio­naram A definição puritana de boa leitura era aquela
os ingleses. Em 1614, ca­sou-se com John Rolfe, que transmitia a plena consciência da im­por­tân­­
cavalheiro inglês, o que deu início a um perío­ cia de se adorar a Deus e os perigos espi­ri­­tu­ais
do de paz de oito a­nos en­tre colonos e índios, enfrentados pela alma na Terra. O esti­lo pu­ritano
assegurando a sobre­vi­vên­cia da nova colônia. variava muito — da poesia metafísica e comple­
No século 17, piratas, aventureiros e explo­­ xa até diários casei­ros e relatos his­tó­ricos religio­
radores abriram caminho para uma nova onda sos tremen­da­mente pedantes. Mas a despeito do
de colonos permanentes, que traziam suas es­ti­­lo ou gêne­ro, certos te­mas eram cons­tantes.
famílias, implementos agrí­colas e ferramentas A vida era vista como pro­­va; o fracasso levava
de artesãos. A litera­tura inicial da ex­plo­ração, à conde­nação eterna e ao fogo do inferno e o
formada por diários, cartas, relatos de viagens, sucesso, recom­pen­sado com o êx­tase celestial.
diários de bordo e relatórios aos financiadores O mundo era a arena de com­bate cons­tante
dos colonos — governantes euro­peus ou, no entre as forças de Deus e as hostes de Satanás,
ca­so da Inglaterra e da Holanda mercantilistas, inimigo terrível com vá­rios disfarces.Muitos Puri­
insti­tuições societárias — foi, aos poucos, subs­ ta­nos aguardavam ansio­sa­mente a chegada do
tituída por relatos dos próprios colonos. Como a “milênio”,quando Jesus voltaria à Terra,aca­ba­ria
Ingla­terra acabou por apoderar-se das colônias com a miséria humana e inauguraria 1000 anos
da América do Norte,a literatura mais conhecida de paz e prosperidade.
e documen­tada é a inglesa.Como a literatura das Os estudiosos vêm, há muito, mos­tran­­do a
minorias americanas ainda flo­res­ce no século 20 ligação entre o puri­tanismo e o ca­pi­­ta­­lis­mo: am­
e a sociedade americana tor­na-se cada vez mais bos funda­men­tam-se na am­bição, no tra­ba­lho
multicultural, os estu­dio­sos estão redescobrindo árduo e na busca inces­sante do sucesso. Embora,
a importância de sua herança cultural mista. individual­mente, os Puri­tanos não pu­dessem

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Pintura, cortesia da Smithsonian Institution

“The First Thanksgiving” [O Primeiro Dia de Ação de Graças], quadro de J.L.G. Ferris, retrata os primeiros
colonos americanos e os americanos nativos celebrando uma colheita abundante.

saber, em termos teológicos, se estavam ‘salvos’ e perseguições. Como a maioria dos Pu­ri­ta­nos,
por­tanto entre os eleitos ao pa­ra­­íso, eles ten­diam inter­pre­tavam a Bíblia literal­men­te. Liam e agiam
a sentir que o sucesso ter­reno era sinal de eleição. com base na Se­gun­da E­pís­tola aos Coríntios —
Riqueza e status não eram al­me­jados por si sós, “Saia do meio deles e fique se­­­pa­­­­rado, disse o
mas como reafir­mação de saúde espiritual e pro­ Senhor.” Desilu­didos quanto a purificar a Igreja
mes­sa de vida eterna. da Inglaterra de den­tro para fora, os ‘Separatistas’
Além disso, o conceito de consciência admi­ formaram igre­jas clan­des­­­tinas — ‘da aliança’
nis­trativa estimulava o sucesso. Os Puritanos (cove­nant­ed) — que ju­ra­vam lealdade ao gru­po
in­­ter­pretavam todas as coisas e eventos como e não ao Rei. Consi­de­­rados trai­dores do reino
símbolos de um significado espiri­tual mais pro­ e hereges con­de­nados ao inferno, eram muito
fundo e sentiam que, ao promover seu pró­prio persegui­dos. Sua separação os le­vou final­mente
lu­cro e o bem-estar de sua co­mu­nidade, esta­vam ao Novo Mundo.
também levando avante os planos de Deus. Não
distinguiam as esferas secular e reli­­giosa: toda a William Bradford (1590 - 1657)
vida era expres­são da vontade divi­na — cren­­ça Logo após a chegada dos Separatistas, William
que renasce no Trans­cen­den­ta­lismo. Bradford foi eleito governador de Plymouth, na
Ao registrar os eventos comuns para revelar Colônia de Massachusetts Bay. Era extremamente
seu significado espiritual, os Purita­nos muitas piedoso, autodi­data, tendo apren­dido muitas
vezes citavam a Bíblia, capí­tulo e versículo. A línguas, até o hebraico, para poder “ver com os
história era um panorama religioso simbólico pró­prios olhos os antigos orá­culos de Deus em
que levava ao triunfo Puritano no Novo Mun­do sua be­le­za original.”Seu papel na mi­gra­­ção para a
e ao Reino dos Céus na Terra. Holanda e na viagem do May­flower para Plymouth
Os primeiros Puritanos da Nova Inglaterra e seu trabalho como gover­nador o tor­na­vam
exem­plificavam a serie­dade do Cristianismo Re­ perfeito para ser o primeiro histo­riador de sua co­
for­mado.Conhe­cidos como ‘Peregrinos’,eram um lônia.Sua his­tó­ria,Of Plymouth Plantation [Sobre a
pe­que­no grupo de fiéis que mi­grou da Ingla­terra Colônia de Plymouth] (1651) descreve com clareza
para a Holanda — famosa desde aque­la é­­po­­ca e fas­cínio os primórdios da colônia. Sua des­cri­­ção
pela tole­rân­cia religiosa — em 1608, época de da primeira visão da América faz juz à fama:
8
Tendo atravessado o vasto oceano e um mar de gran­de cidade de Bos­ton.Ela pre­feria seus longos
dificuldades... agora não tinham amigos para poemas religio­sos, sobre temas con­ven­cio­nais,
aco­lhê-los nem hospedarias para dis­trair ou descan­ como as esta­ções, em­bora os leito­res de hoje
sar seus corpos castigados pelo tempo; nem casas apreciem mais seus poemas curtos e espi­ri­tuosos
e muito menos cidades para onde ir, para bus­car sobre a vida coti­di­ana e suas poe­sias caloro­sas e
auxílio... bárbaros selva­gens... esta­vam mais dis­pos­ amorosas dedicadas ao marido e aos fi­lhos. Ela
tos a cobri-los de flechadas. Co­mo era inver­no e se inspirava na poesia metafí­sica ingle­­­­sa e seu
aqueles que conhe­cem o inverno desse país sa­­bem livro The Tenth Muse Lately Sprung Up in America
que são rigo­ro­sos e violentos, sujei­tos a tem­­pes­­ta­ [A Décima Musa Recém-Surgida na América]
des cruéis e ferozes... to­dos os enfrenta­vam com (1650) revela a influência de Edmund Spenser,
a face crestada pelas intem­­péries e o país inteiro, Philip Sidney e outros poetas ingle­ses. Recorria
cheio de florestas e mata­gais, se mos­trava com um com fre­quên­­cia a conceitos elaborados ou a
ar selvagem e bravio. me­tá­foras dilatadas. “To My Dear and Loving
Husband”[Para Meu Querido e Amoroso Ma­ri­­do]

B
radford também registrou o primeiro (1678) usa imagens orientais, o tema do amor
documento de autogoverno colonial no e a técnica da comparação, muito popular na
Novo Mundo inglês,o Mayflower Compact Europa da época. No final, a autora reveste seu
[Acordo de Mayflower], elaborado enquan­to os poema de um sentido piedoso:
peregrinos ainda estavam à bordo do navio. O
acordo era precursor da Declaração de Inde­ Se algum dia dois foram um, então certa­mente nós.
pen­­dência que viria um século e meio depois. Se algum dia um homem foi amado pela esposa,
Os Puritanos reprovavam as diversões en­tão você;
secu­lares como dança e jogo de cartas, que Se alguma mulher já foi feliz com um homem,
associa­vam ao estilo de vida ímpio e imo­ral dos Comparem-se comigo, ó mulheres, se puderem.
aristo­cratas. Escrever ou ler livros “le­ves” caia na Prezo seu amor mais do que minas inteiras de ouro
mesma cate­goria. As mentes puri­tanas dedi­ca­ Ou todas as riquezas que o Oriente possui.
vam suas energias a gêneros pie­dosos e a­lheios Meu amor é tanto, que rios não podem saciá-lo,
à ficção: poesia, sermões, textos teo­ló­gicos e Nada além do seu amor pode dar recom­pensa.
relatos históricos. Seus diários e medita­ções ín­ Seu amor é tal, que nada posso para retribuí-lo,
timas regis­tram a riqueza da vida interior dessas Rogo aos céus que lhe paguem em dobro.
pessoas introspectivas e intensas. Então, enquanto vivermos, perseveremos no amor
Para, quando já não vivermos, vivermos sempre.
Anne Bradstreet (c. 1612 - 1672)
O primeiro livro de poesias publicado por um Edward Taylor (c. 1644 - 1729)
americano foi também o primeiro livro ame­ri­ Como Anne Bradstreet, e, de fato, como qua­se
cano publicado por uma mu­lher — Anne Brad­­­ todos os primeiros escritores da Nova Ingla­ter­ra,
street. Não é surpresa que tenha sido im­presso o intenso e brilhante poeta e ministro Edward
na Ingla­terra, dada a falta de prensas tipo­grá­­ficas Taylor nasceu na Ingla­terra. Filho de um pequeno
nos primórdios das colô­nias ameri­ca­nas. Nasci­ proprietário rural — agricul­tor independente,
da e educada na Ingla­terra, Anne Bradstreet era dono de suas terras — Taylor foi um professor que
filha do adminis­trador da propri­edade de um pre­feriu vir para a Nova In­gla­­terra em 1688 a fazer
conde. Emi­grou com sua família aos 18 anos. o juramento de leal­dade à Igreja da Ingla­terra. Ele
Seu marido tornou-se gover­­na­­dor da Colônia estudou no Har­vard College e,como a maioria dos
de Massachusetts Bay, que for­ma­ria mais tarde a clérigos trei­­na­dos em Harvard, conhecia grego,

9
latim e he­brai­co. Altruísta e piedoso, Taylor agiu Arthur Dimmes­dale, o pastor pu­ritano cul­pado,
como missionário juntos aos colonos quando de Nathaniel Hawthorne, em The Scarlet Letter
acei­tou a posição vitalícia de pastor em West­field, [A Carta Escarlate] (1850), ou o aleijado Captain
Mas­sachusetts,cidade de fronteira 160 quilô­metros Ahab, de Herman Melville, um Fausto da Nova
adentro de florestas fechadas. Taylor era o mais Ingla­terra cuja busca pelo conhe­ci­mento proi­
culto da região e usou sua educa­ção para servir bido afun­da o barco da huma­nidade ame­ri­cana
como pastor, médico e líder cívico da cidade. em Moby-Dick (1851). (Moby-Dick era o romance
Modesto, piedoso e trabalhador, Taylor nunca pre­dileto do romancista americano do século 20
pu­­blicou suas poesias, que foram descobertas por William Faulkner, cuja obra pro­funda e perturba­
volta de 1930. Ele certamente cre­ditaria a desco­ dora sugere que a vi­são obs­­cura e meta­física da
berta à pro­­vi­­dên­cia divina; os leitores de ho­je América pro­tes­­tan­te ain­da não foi exaurida.)

C
devem ser gratos pela exis­tên­cia de seus poe­­mas omo quase toda a literatura colonial,os pri-
— os melhores exempla­res da poesia do século 17 ­meiros poemas da Nova Inglaterra imitam
na América do Norte. a forma e técnica do país mãe, em­­bora a
Taylor escreveu várias obras poéticas: ele­gias paixão religiosa e citações frequentes de passa­
fune­rárias, poemas líricos, um “deba­te” medieval gens bíblicas, além do novo cenário, dêem a eles
e o Metrical History of Christianity [His­tó­ria Mé­ identidade especial.Os autores isolados do Novo
trica da Cristan­dade] de 500 páginas (uma histó­ Mundo viveram antes do ad­ven­to dos transportes
ria de mártires). Sua melhor obra,na opinião dos rápidos e da comunicação ele­trônica. Como
crí­ticos modernos,é a série de curtas meditações resultado,os escritores co­lo­ni­ais imitavam estilos
prepara­tórias. já fora de mo­da na Inglaterra. Portanto, Edward
Taylor, o me­lhor poeta de sua é­po­ca, escreveu
Michael Wogglesworth (1631 - 1705) poesia me­ta­física quando já havia caído em
Como Taylor, Michael Wogglesworth nasceu de­suso na Ingla­terra. Às vezes, como no ca­so
na Inglaterra, era ministro puri­tano edu­cado em de Taylor, riqueza e ori­gi­na­li­dade nasciam do
Harvard que praticava a medi­cina. Foi o terceiro iso­la­mento da colônia.
poeta de renome na Nova Ingla­ter­ra colonial. Dá Os escritores coloniais muitas vezes pare­ciam
continuidade aos te­mas pu­ri­tanos em sua obra ignorar gran­des au­tores ingleses como Ben Jonson.
mais conhecida,The Day of Doom [O Dia do Juízo Al­­guns rejeitavam poetas ingleses que pertenciam
Final] (1662). Uma longa narra­tiva que muitas a outras seitas,a­fas­­tando-se assim dos melhores mo­­
vezes decai para o burlesco, esta popularização de­los líricos e dramá­ticos pro­duzidos pela língua
ater­radora da dou­trina calvinista era o poema inglesa.A­lém disso, muitos colonos per­mane­ciam
mais popular do período colonial. O primeiro ignorantes devido à fal­ta de livros.
bestseller ameri­cano é um retrato apa­vorante da O grande modelo de escrita, fé e conduta era
conde­nação ao inferno, em métrica de balada. a Bíblia, numa tradu­ção inglesa autorizada já
É péssima poesia — mas todos adoravam. há muito desatualizada quan­do foi finalmen­te
Mes­­­clava o fascínio de uma história de terror divulgada. A idade da Bí­blia, mai­or que a da
com a au­to­ridade de Calvino. Por mais de Igreja Roma­na, dava a ela autoridade aos olhos
dois sé­­culos, as pessoas decoraram esse longo Puri­tanos.
e pa­vo­­roso monumento ao terror religioso; as Os Puritanos da Nova Inglaterra ape­­­ga­vam-se às
cri­an­ças o recitavam com orgu­lho e os mais histórias dos ju­deus no Velho Testamen­to, crendo
ve­lhos o cita­vam em conver­sas diárias. Não é que eles, como os judeus, eram per­­se­guidos por
gran­­de a dis­tância dos sofri­men­tos atrozes des­­ sua fé, eram os únicos a conhecerem o Deus
se po­e­ma à chocante ferida autoinfligida por verda­deiro e eram os eleitos para fundar a Nova

10
Jerusalém — o paraíso na Terra. Sewall nasceu tarde o bastante
Os Puritanos estavam cien­tes dos para ver a mudança do estilo de
paralelos entre os antigos judeus do vi­da reli­gio­so rígido seguido pe­los
Velho Testamento e eles pró­prios. Puritanos para o período yan­kee
Moisés li­de­rou os israelitas em fuga mais mundano de riqueza mer­
da es­­cra­vidão do Egito, abriu o Mar can­tilista na Nova Inglaterra; seu
Ver­melho com a ajuda miraculosa Diary, muitas vezes com­parado ao
de Deus para que pudessem fu­gir do contem­porâneo in­glês Samuel
e rece­beu a lei divina na for­ma dos Pepys, inadver­tidamente regis­tra
Dez Manda­mentos. Como Moi­sés, os essa transição.
lí­de­res Puritanos criam es­tar sal­van­ Como o diário de Pepys,o de Sewall
do seu povo da corrupção espiritual faz registro minucioso de sua vida
na Inglaterra,atra­ves­sando miraculo­ coti­diana e reflete sua preo­cu­pação
sa­mente um oce­ano bravio com a em viver bem e piedo­sa­mente. Ele
ajuda de Deus e crian­do no­vas leis menciona com­pras de doces para a
e formas de go­ver­no com base nos moça que ele cor­te­ja­va e suas discus­
desejos de Deus. sões sobre se de­ve­­ria ou não adotar
Os mundos coloniais tendem maneiras aris­tocratas e dispendiosas,
a ser arcaicos e a Nova Inglaterra como usar peruca e carruagem.
cer­tamente não foi exce­ção. Seus
Puri­tanos eram arcai­cos por opção, Mary Rowlandson
con­vicção e circunstância. (c. 1635 - 1678)
A primeira escritora de prosa dig­
Samuel Sewall (1652 - 1730) na de nota foi Mary Rowland­son, es­
De leitura mais fácil que a poe­ posa de um pastor que rela­ta clara e
sia profun­damente religiosa, rica comoventemente as onze sema­nas
em referências bíbli­c as, são os que passou em poder dos índios,
rela­tos históricos e seculares que num massacre, em 1676. O livro, sem
des­­cre­­vem fatos verdadeiros com dú­vi­da,ali­men­tou a chama do senti­
deta­lhes vibrantes. O Journal (1790) mento anti-indígena,como o fez The
do Go­ver­nador Winthrop é a me­lhor Cotton Mather Redeemed Captive [O Cativo Resga­
fon­te de infor­mação sobre o início ta­­do] (1707), de John Williams,
da colônia de Massa­chusetts Bay e que des­creve seus dois anos como
a teo­­­ria política dos Puritanos. pri­sio­neiro dos fran­ceses e índios
O Diary [Diário] de Samuel Se­wall, após um massacre. Os textos pro­
que registra os anos 1674 a 1729, du­­­z idos por mu­l he­r es são em
é vivaz e ca­ti­vante. Sewall se­­gue o geral relatos domésticos, que não
pa­drão dos primeiros es­cri­­­­tores da exigem educa­ção especial. Pode-se
No­va In­gla­terra, como Bradford e dizer que a literatura fe­minina se
Taylor. Nasceu na Ingla­ter­ra e veio bene­ficie do realismo familiar e da
para a colô­nia ainda jo­­vem. Viveu perspi­cácia do bom senso; é cer­to
em Boston, for­mou-se em Harvard e que obras co­mo Journal [Diá­rio],
seguiu a car­reira le­­gal,admi­nis­trativa Gravura © The Bettmann
de Sarah Kem­ble Knight (pu­bli­cado
e religiosa. Archive
Gravura © The Bettmann Archive postu­ma­mente em 1825) de gran­de

11
viva­ci­dade, descrevendo uma auda­cio­sa viagem os reis europeus não tinham direito de conceder
solo de ida e volta de Boston a No­va York em terras.Williams tam­bém acreditava na separa­ção
1704, são ex­ceção à comple­xi­dade barroca que entre es­ta­do e igreja — prin­cí­pio funda­men­­­tal que
marcou muitos escri­tos Puri­tanos. vigora até hoje na América.Afir­ma­va que tri­bu­nais
não deve­riam ter o po­der de punir pes­soas por
Cotton Mather (1663 - 1728) mo­tivos religiosos — po­sição que en­fra­­quecia as
Nenhum exame da literatura colonial da Nova rigorosas teo­cra­cias da Nova In­gla­­terra. Acreditava
Inglaterra estaria completo sem menção a Cotton em igual­da­de e demo­cracia e foi amigo dos índios
Mather,mestre dos intelectuais.Ter­cei­ro na dinas­ por toda a sua vi­da. Seus inúmeros livros in­­cluem:
tia Mather de quatro gerações em Massachusetts A Key Into the Languages of Amer­ica [Uma Cha­
Bay, escreveu mui­to sobre a Nova In­gla­­terra, ve pa­ra as Línguas da América] (1643), um dos
em mais de 500 livros e panfletos. Magnalia primei­ros livros com frases em línguas indí­genas.
Christi Americana (História Ecle­siás­tica da Nova O livro repre­senta um estudo etno­grá­­fico em­
Inglaterra), de 1702, sua obra mais am­bi­ciosa, brio­­nário, fazendo ousadas des­­crições da vida
descreve exaus­­tivamente a colonização da Nova indí­gena, a par­tir de sua expe­riência vivida entre
Inglaterra por meio de uma série de biografias. as tribos. Cada capítulo é dedicado a um tema
O enorme li­vro apre­senta a missão divina dos — por exemplo, comida e refeições. As palavras
Purita­nos, na terra des­co­nhe­cida de estabelecer e fra­ses in­dí­­­genas sobre esse te­ma são mes­cla­das
o Reino dos Céus; sua estrutura é uma série de a co­men­tários, ane­dotas e um poema final. O
narra­tivas sobre a vi­­da de “Santos” americanos primeiro capí­tu­lo ter­mina assim:
re­pre­­senta­tivos. Seu zelo o re­di­me em parte
Se os filhos da natureza, selva­gens ou não,
por sua pre­ten­são: “Des­­crevo as maravilhas da
São benevolentes e amáveis,
reli­gião cristã, fu­gin­do das pri­vações da Europa
Como fica mal para os filhos de Deus
para as praias da América.”
Carecerem de humanidade.

N
Roger Williams (c. 1603 - 1683) o capítulo das palavras sobre di­vertimen­­
Na passagem do século 17 para o século 18, tos, ele comenta que:“é u­­ma verdade es­
o dog­matismo religioso enfraqueceu-se gradual­ tranha que um ho­mem possa geral­mente
mente, apesar de esforços puri­ta­nos espo­rádicos encontrar mais distra­ção gratuita e agradável
e agres­sivos pa­ra conter a onda de tole­rância. O entre esses bár­baros do que entre os milhares
pas­tor Roger Williams sofreu por suas opiniões que se consi­de­ram cristãos.”
so­bre religião. Inglês, fi­lho de um alfaia­te, foi A vida de Williams é parti­cu­lar­­men­­te inspirado­
banido de Massachusetts, durante o ter­rí­vel ra.Em visita à In­glaterra,durante a Guer­ra Civil san­­
inverno de 1635 na Nova In­gla­­terra. Avisa­do grenta lá ocor­rida, usou sua ex­­pe­riên­cia de sobre­
secre­ta­mente pelo Governador de Massachusetts, vivência na ge­lada Nova Inglaterra para organizar
John Winthrop, só so­bre­vi­veu vivendo com os ín­ a dis­tribuição de lenha para os po­bres de Londres
dios; em 1636, criou em Rhode Island uma nova durante o inver­no, depois que os su­pri­­mentos de
colônia que acolhia pessoas de outras reli­giões. car­vão foram cortados. Ele es­cre­­­­veu ardo­ro­sas
Formado pela Cambridge University (In­glater­ defesas da tolerância religiosa, não apenas entre
ra), manteve a simpatia pelos trabalha­dores e por seitas cris­tãs, mas até em re­la­ção a não-cristãos.
pontos de vista di­ver­gentes. Suas i­deias eram mui­ “É a vontade e o man­da­men­to de Deus que... se­ja
to avançadas pa­ra a época. Foi um dos pri­­meiros permi­tido a todos os homens, em todas as nações,
críticos ao imperia­lismo, in­sis­tindo que as terras possuir uma consciência pagã, judaica, turca ou
ame­rica­nas pertenciam aos índios e que,por­tanto, anticristã...”, escreveu ele em The Bloody Tenent of
12
Persecu­tion for Cause of Conscience na cidade e passou uma temporada
[A Dou­­trina Sanguiná­ria da Perse­­ com os ín­dios porque pensava que
guição por Causa de Cons­ciência] poderia aprender com eles e com­
(1644).A experiên­cia intercultural de parti­lhar suas ideias. Ele apenas
viver entre ín­dios humanos e cor­­te­ses descreve seu de­se­jo de “sen­­tir e
cer­ta­­men­te ex­plica boa par­­te de sua com­­preen­der suas vidas e o Espí­rito
sabe­doria. em que vivem.” Seu espírito a­man­te
Na colônia, a influência foi nos da justiça na­­tu­­­ralmente se vol­ta para
dois sentidos.Por exemplo, John Eliot a crítica social: “Per­ce­­bi que mui­tos
traduziu a Bí­blia para Narra­gansett. brancos vendem rum aos ín­dios, o
Alguns índios se converte­ram ao cris­ que, creio, é um grande Mal.”

W
tianismo. Até ho­je,a i­gre­­ja nativa ame­ oolman foi um dos primei­
ricana é uma mis­tura de cristianismo ros es­cri­­tores an­ti­es­cra­
e crenças in­dí­genas tradicio­nais. vagistas e pu­bli­­cou dois
O espírito de tolerância e liberda­­ en­sai­os,“Some Considerations on the
de reli­giosa, que foi aos poucos se Keeping of Negroes” [Considerações
fortalecendo nas colônias america­ Sobre o Tra­ta­mento de Negros], em
nas, surgiu primei­ra­m ente em 1754 e 1762. Hu­­ma­nitário ar­do­ro­so,
Rhode Island e Pensilvânia, terra se­guiu o caminho da “o­be­­­­­diência
dos Quakers. Estes, benevolentes e pas­­si­va” às auto­rida­des e às leis que
tole­­rantes, ou “Amigos”, como e­ram considerava in­jus­tas,se ante­ci­­pando
conhe­c idos, acreditavam que a assim ao fa­mo­so ensaio de Henry
cons­ciência individual era sagra­da David Thoreau, “Ci­vil Dis­obedience”
e a origem da ordem social e da [Deso­bediência Civil] de 1849.
mo­ra­lidade. A crença fundamental
dos Quakers no amor universal e Jonathan Edwards
na frater­nidade, os fez firme­mente ( 1703 - 1758)
demo­cráticos e vigorosamente opos­ A antítese de John Woolman,
tos à autoridade reli­gio­sa dogmática. Jona­than Ed­wards, nasceu 17 anos
Expulsos da rígi­da Massachusetts, antes do Quaker no­t á­­vel. Wool­
que te­mia sua influência, eles cria­ man recebeu pouca ins­tru­ç ão
ram em 1681, sob a liderança de Jonathan Edwards formal; Edwards era muito ins­truí­do.
William Penn,a muito bem sucedida Wool­man seguiu sua luz interior;
colônia da Pensilvânia. Edwards dedicou-se à lei e à autori­­­­
da­de. Ambos escre­viam mui­to bem,
John Woolman (1720 - 1772) mas reve­laram polos opos­tos da
O trabalho Quaker mais conhe­ci­do experiên­cia reli­giosa colonial.
é o extenso Journal [Diário] (1774),de Edwards foi moldado por seu
John Woolman, que do­cu­menta sua exa­cerbado senso do dever e um
vida interior com ta­manha pureza ambiente puri­tano severo, que
e doçura de cora­ção, que recebe conspiraram para fazê-lo defender
até hoje elogios de muitos escritores o cal­vi­nis­mo rigoroso e sombrio das
americanos e in­gle­­­ses. Este homem Gravura ©
forças liberais que brota­vam à sua
notável dei­xou para trás seu conforto The Bettmann Archive volta. É co­nhe­cido por seu sermão

13
pode­roso e assus­ta­dor “Sinners in the Hands of William Byrd (1674 - 1744)
an Angry God” [Peca­­dores nas Mãos de Um Deus A cultura do Sul naturalmente girava em tor­
Irado] (1741): no do ideal do cavalheiro. Como um homem da
Renascença, igual­mente capaz de admi­nistrar
[I] Se Deus o soltasse, você imediatamente afun­­da­ria, uma fazenda e ler grego clássico, ele de­tinha o
desceria em pecado e mergulharia no abis­mo sem po­der de um senhor feudal.
fim... O Deus que o mantém acima do abismo do William Byrd, numa famosa carta de 1726 a
inferno,como alguém se­gu­raria uma ara­nha ou outro um amigo inglês, Charles Boyle, Conde de Orrery,
inseto repug­nante acima do fogo,o abomina e sente­ descreve a graciosa vida em sua fazenda cha­­
-se terri­velmente pro­vo­cado... ele o vê como algo mada Westover:
que merece ser lança­do no pre­ci­­pício sem fundo.
Além da vantagem do ar puro, temos abun­dância
Os sermões de Edwards tinham enorme im­ de todo tipo de provisão, sem qualquer despesa
pac­to, levando con­gregações inteiras ao pranto (quero dizer, nós que temos plantações). Tenho
histérico.A longo prazo,porém,seu rigor gro­tes­co uma grande família, mi­nhas portas estão aber­tas
afas­tou o povo do calvinismo por ele de­fen­dido a todos e, no en­tan­to, não tenho con­tas a pa­gar e
com valentia. Seus ser­mões dogmáticos e medie­ uma meia coroa poderá permanecer into­cada no
vais não se a­de­quavam à ex­pe­ri­ên­­cia prós­­pera meu bolso por muitas luas.
e re­la­­ti­vamente pa­cí­fica dos colonos do século Como um patriarca, tenho meus reba­nhos, meus
18. Após Edwards, as novas cor­ren­tes libe­rais de escravos e todo tipo de comércio entre meus servos,
tolerân­cia se fortale­ceram. de modo que vivo uma espécie de in­de­­pendência
em relação a todos, a não ser a Pro­vi­dência...
A LITERATURA NAS COLÔNIAS
DO SUL E DO CENTRO William Byrd representa o espírito da elite

A
literatura pré-revolucionária do Sul era colonial sulista. Herdeiro de 1.040 hectares, que
aristocrática e secular, refletindo os siste­ ex­pan­diu para 7.160, era mercador, comer­cian­te
mas sociais e econômicos predomi­nan­­tes e fazendeiro. Sua biblioteca de 3.600 li­­­vros era a
nas plan­ta­ções do Sul. Os primeiros imi­grantes maior do Sul. A in­te­li­gên­­­cia argu­ta foi aprimo­
ingle­ses foram atraídos para as colônias do Sul rada por seu pai, que o mandou pa­ra excelen­tes
pe­­la oportunidade econômica e não pela liber­ escolas na Inglaterra e na Ho­lan­­da. Visitou a
dade de culto. corte francesa, foi mem­­bro da So­cie­dade Real
Embora muitos sulistas fossem agricul­tores e amigo de al­guns dos prin­ci­pais es­cri­tores
pobres ou artesãos, vivendo pouco melhor que ingleses da épo­ca, como William Wycherley e
es­cra­vos, a elite instruída inspi­rava-se no ideal William Con­gre­ve. Seus diá­rios de Lon­dres são o
clássico do Velho Mundo, de aristo­cra­cia agrá­ria oposto dos relatos pu­ri­tanos da Nova Inglaterra:
cuja existência se devia à escra­vidão.Es­ta institui­ com janta­res sofisti­cados, fes­tas reluzentes e
ção liberava os brancos ricos do trabalho manual, promis­cuidade, sem muita introspecção.
dava-lhes lazer e permitia o so­­nho de uma vida Byrd é mais conhecido por sua obra vivaz
aris­to­crática em pleno interior ameri­cano. A His­tory of the Dividing Line [História da Linha
ên­fa­se puri­tana no tra­ba­­­lho duro, edu­ca­ção e de Fronteira], diário de uma viagem de algumas
dili­gên­cia era ra­­­ra — ao invés disso, ou­vi­­mos semanas em 1729, de 960 quilômetros no interior
falar de pra­ze­­res como cavalgar e caçar. A igreja do país para fazer um levantamento topo­grá­fico
era fo­­­co da vida social elegante e não foro para da linha que dividia as colônias da Virgí­nia e Ca­
exame da consciência. ro­lina do Norte. As rápidas impressões da­quela

14
vastidão, dos índios, dos brancos semisselvagens, com humor as maneiras rudes dos colo­nos e os
das feras e de toda espécie de dificul­dades enfren­ acusou de trapaceá-lo.O poema termi­na com uma
tadas por este cavalheiro civilizado fazem deste maldição exagerada: “Que a ira di­vi­na possa trans­
um livro singularmente americano e muito sulista. formar essa região em terras improdutivas/ Em que
Ele ridiculariza os primeiros co­lo­nos da Virgínia, não haja homem fiel nem mulher virtuosa.”
“cerca de cem homens, a maioria deles réprobos Em geral, o sul colonial pode ser associado à
de boas famílias,”e zomba que,em Jamestown,“co­ tradição literária realista,informativa,mun­da­na e
mo verdadeiros ingle­ses, construíram uma igreja leve. Imitadores das modas literá­rias in­glesas, os
que só custou cinquenta libras e uma taverna que sulistas alcan­çaram grandes altu­ras, em termos
custou quinhentas.”Os escritos de Byrd constituem de ima­gi­nação em observações precisas e espi­
exce­lentes exemplos do grande interesse que os rituosas das condições do Novo Mundo.
sulistas tinham pelo mundo material: a terra, os
índios, as plantas, os animais e os colonos. Olaudah Equiano (Gustavus Vassa)
(c. 1745 - c.1797)
Robert Beverly (1673 - 1722) Durante o período colonial, impor­tantes escri­

R
obert Beverly, outro rico dono de terras e tores negros emergiram, como Olaudah Equi­ano
autor de The History and Present State of e Jupiter Hammon. Equiano, um Ibo da Nigéria
Vir­gi­nia [A História e o Estado Atual da (África Ocidental),foi o primeiro ne­gro a escrever
Virgínia] (1705, 1722), registra a his­tó­ria da co­ uma autobiografia, The Interest­ing Nar­ra­tive of
lônia da Virgínia num estilo vigoroso e humano. the Life of Olaudah Equiano, or Gustavus Vassa
Como Byrd, admirava os índios e comentou as the African [A Interessante Narrativa da Vida de
estra­nhas superstições que os eu­ro­peus tinham Olaudah Equiano, ou Gus­ta­vus Vassa o Africano]
so­bre a Virgínia — por exemplo, a crença de (1789). Nesse livro — um dos primeiros exemplos
que “a terra transforma em negros todos os que do gênero de nar­rativa escravista — Equiano faz
lá vão”. Assinalou a grande hospi­ta­lidade dos um relato de sua terra natal e dos horrores e cruel­
sulistas, característica mantida até hoje. dade de sua captura e escravização nas Antilhas.
A sátira humorística — obra literária em que Equi­ano,que se converteu ao cristianismo,lamen­
vícios ou loucuras humanas são atacados com ta de modo comovente o tratamento“não-cris­tão”
ironia, escárnio ou chiste — apa­rece com fre­ que recebeu nas mãos dos cristãos — senti­men­to
quên­­cia no sul colonial. Um gru­po de colonos que muitos afro-americanos expres­sa­riam nos
irri­tados com o General James Oglethorpe, séculos seguintes.
fun­dador filantrópico da Colônia da Georgia,
satiri­zou-o num panfleto intitulado A True and Jupiter Hammon (c. 1720 - 1800)
Historical Narrative of the Colony of Georgia [A O poeta negro americano Jupiter Hammon,
Ver­dadeira e Histórica Narrativa da Colônia da escravo em Long Island, Nova York, é lembrado
Georgia] (1741).Eles fingiam louvá-lo por man­tê- pelos seus poemas religiosos e também por seu
los tão pobres e sobrecar­regados de tra­ba­lho,que Address to the Negroes of the State of New York
eles tiveram de desenvolver a“valiosa virtude da [Discurso aos Negros do Estado de Nova York]
humildade”e rejeitar“as ansiedades de qualquer (1787), em que defendia a libertação de fi­lhos
outra ambição.” de escravos, ao invés de condená-los à escravi­
O poema satírico e desordeiro intitulado The dão hereditária.Seu poema“An Even­ing Thought”
Sotweed Factor satiriza a colônia de Maryland, [Um Pensamento na Noite] foi o pri­meiro poema
onde o autor, o inglês Ebenezer Cook, tentou, sem publicado por um homem ne­gro na América. 
êxito, ser um negociante de tabaco. Cook expôs

15
CAPÍTULO
James Fenimore Cooper, Ralph Waldo Emerson,
Henry David Thoreau, Herman Melville, Natha­niel
Hawthorne,Edgar Allan Poe,Walt Whitman e Emily

2
Dickinson. A independência literária dos Esta­dos
Unidos foi um pouco retar­dada em função da
prolongada identificação com a Inglaterra, da imi­
tação excessiva dos mo­delos literários ingleses ou
clássicos e de di­fic­ ul­dades econô­micas e políticas
ORIGENS DEMOCRÁTICAS que prejudi­caram a publicação das obras.
E ESCRITORES Os escritores revolucionários, apesar de seu
REVOLUCIONÁRIOS, 1776-1820 patriotismo genuíno, eram, por necessidade, cons­
cientes e nunca pu­de­­ram encontrar raízes em suas

A
renhida Revolução Americana contra a sensi­bili­dades americanas. Os escrito­res coloniais
Grã-Bretanha (1775 - 1783) foi a primeira da ge­ra­ção revolucionária haviam nascido ingleses,
guerra moderna de libertação contra uma chegado à maturidade como cidadãos ingleses e
potência colonial. O triunfo da inde­pen­dên­cia cultivado há­bi­tos de pensa­mento e conduta ingle­
americana parecia, para muitos da épo­ca, um ses. Seus pais e avós e­ram ingleses (ou europeus),
sinal divino de que a Amé­rica e seu povo se des­ as­sim como seus amigos.  Além disso,a consciência
tinavam à gran­de­za. A vitória militar alimentou americana das modas lite­rárias era sempre defa­
esperanças nacionalistas de uma no­va grande sada em relação à inglesa, o que intensificava a
literatura. Com exceção dos notáveis textos imitação pelos americanos.Cinquenta anos depois
políticos, porém, poucas obras de valor aparece­ de te­rem alcançado a fama na Inglaterra,escrito­res
ram durante ou logo após a Revolução. neoclássicos co­mo Joseph Addison,  Richard Steele,
Os livros americanos eram alvo de críti­ca rigo­ Jonathan Swift, Alexander Pope, Oliver Goldsmith
rosa na Inglaterra. Os america­nos esta­vam doloro­ e Samuel Johnson ainda eram entusiastica­mente
samente cientes de sua ex­ces­si­va depen­dência em imitados na América.
relação aos modelos lite­rários ingle­ses.  A busca de Por outro lado, os empolgantes desafios
uma literatura pró­pria tornou-se obsessão nacional. re­sul­­­tantes da necessidade de construir uma
Segundo o editor de uma revista americana, por no­va nação levaram muitas pessoas talentosas e
volta de 1816, “A de­pen­dência é um estado de de­ ins­truí­das a se encaminharem para a política, o
gra­dação repleto de ignomínia e ser de­pendente di­reito e a diplomacia.Esse caminho tra­zia hon­ra,
de mentes es­tran­geiras para aquilo que pode­mos glória e segurança financeira. Já a litera­tu­ra não
produzir nós mesmos é o mesmo que acres­centar pagava bem. Os primeiros escri­tores ame­ri­canos,
o crime da indolência à fra­que­za da estupidez.” agora separados da Ingla­terra, não dispunham,
As revoluções culturais,diferentemente das revo­ efetivamente, de edito­res mo­der­­nos, público ou
luções militares,não podem ser impostas,  mas têm proteção legal adequada.A as­sis­tência editorial,
de brotar do solo da experiência com­par­ti­lhada. a distribuição e a divul­gação eram rudimentares.
Revo­lu­ções traduzem expressões do coração das Até 1825, a maioria dos autores americanos
pes­soas; desenvolvem-se gradual­men­te a partir de tinha de pagar aos edi­to­res para ter suas obras pu­
novas sensibilidades e da ri­­que­za de expe­riências. bli­ca­das. É claro que apenas os que dis­pu­­nham
Seria preciso esperar cinquenta anos de história de tempo e posses, como Wa­shing­ton Irving e o
acumulada para a Amé­rica ganhar sua indepen­ gru­­po Knicker­bocker de Nova York, ou os poetas
dência cultural e produzir a pri­meira geração de de Connec­ticut, co­nhe­cidos como Hartford Wits,
grandes escri­tores ameri­ca­nos: Washington Irving, podiam se dar ao luxo de es­crever. A exceção

16
foi Ben­jamin Fran­­­klin que, embora ti­pó­­grafos em toda a América. São
de família po­bre, era ti­pó­grafo de no­tó­rios casos de pirataria. Matthew
profissão,podendo por is­so publicar Carey, importante editor ame­ricano,
suas pró­prias obras. contratou um agente em Lon­dres —
Charles Brockden Brown foi mais espécie de espião li­te­­rá­rio — para
típico. Autor de vários roman­ces que lhe mandasse páginas ainda
‘góticos’ interessantes, Brown foi o por encadernar, ou até mesmo pro­
primeiro autor ameri­cano a tentar vas gráficas, em na­vi­os velozes que
ganhar a vida com a li­te­­ra­tura. Mas pudessem chegar à América dentro
morreu moço e pobre. de um mês. Já na América,os empre­
A falta de público era outro pro­ gados de Ca­rey saíam ao encontro
blema. O reduzido público culto da desses navios no porto, e imprimiam
América queria autores euro­peus rapi­da­men­te os livros pirateados, re­
bem conhecidos, em parte devido cor­rendo a tipógrafos que dividiam o
ao exagerado respeito que as anti­gas livro em seções e trabalhavam em tur­
co­lô­nias tinham por seus ex-gover­ nos 24 horas por dia. Um livro inglês
nantes. Essa preferência por obras assim pirateado podia ga­nhar nova
inglesas tinha sua razão de ser, dada tira­gem em um dia, e ser colocado à
a inferioridade da pro­dução ameri­ ven­da em livrarias americanas qua­se
cana. Mas só fez piorar a situação, ao mesmo tem­po que na Ingla­terra.
ao pri­var os autores ame­­ri­canos de Como edições importadas au­
pú­blico. Apenas o jornalismo ofere­ to­rizadas eram mais caras e não
cia remu­neração finan­cei­ra, mas o po­diam competir com as piratea­
público de massa que­ria obras leves, das, a falta de proteção ao direito
ensaios curtos so­bre temas atuais ou auto­ral prejudicava não só au­tores
versos fáceis — nada de trabalhos ame­ricanos, mas também autores
longos ou ex­pe­rimentais. es­tran­geiros, como Sir Wal­ter Scott e
A ausência de legislação adequa­ Charles Dickens. Só que os auto­res
da sobre direitos autorais talvez estrangeiros já ti­nham pelo me­
tenha sido o principal motivo da es­ nos sido pagos por seus edito­res
tagnação literária. Os edito­­res a­me­ originais e eram bem conhe­ci­dos.
ricanos que pirateavam obras de
Noah Webster Americanos, como James Fe­ni­­more
sucesso na Inglaterra na­turalmen­te Cooper, não só deixavam de receber
não estavam dis­postos a pagar a um pagamento con­dizente, co­mo ainda
autor ameri­cano por material desco­ passavam pelo despra­zer de ver suas
nhecido. A cópia não autori­za­da de obras pira­teadas nas suas bar­bas. O
livros estrangeiros foi ini­cial­mente pri­meiro suces­so de Cooper, The Spy
enca­rada como um be­ne­fício para [O Espião] (1821), foi pirateado por
as colônias e uma fonte de lucro quatro diferentes editoras no de­cor­rer
para tipó­grafos como Fran­­­klin, que do pri­meiro mês de seu lançamento.
reim­p rimia grandes clás­s icos e Ironicamente, a lei de direitos
obras europeias, no intuito de edu­ autorais de 1790, que permitia a pi­
car o público ame­ricano. rataria,tinha intenções nacionalistas.
Gravura ©
Seu exemplo foi seguido por The Bettmann Archive Escrita por Noah Webster, o gran­­­­­de

17
lexicógrafo que mais tarde compilou um di­cio­ em 1683.A vida de Franklin ilus­­tra de muitos modos
nário americano, a lei protegia apenas o tra­ba­lho o impacto que o Iluminismo pode exercer sobre
de autores americanos; sentia-se que os autores um indi­víduo talentoso. Autodidata, mas muito
ingleses deveriam cuidar de si pró­prios. versado nas obras de John Locke,Lord Shaftes­bury,
Apesar de ruim,ne­nhum dos editores da é­po­ca Joseph Addison e outros autores do Iluminismo,
estava dis­pos­to a al­te­rar a lei,  já que lhes propiciava Franklin aprendeu com eles a aplicar a razão à sua
lu­cros. A pirataria fez morrer de fo­me a pri­mei­­ra própria vida e romper com a tra­dição — so­­bre­tudo
gera­ção de escritores revolu­cio­nários a­mericanos; a antiquada tradição puritana — quan­­do ameaçou
não é de surpreender que a geração seguinte tenha sufocar seus ideais.
produzido ainda me­nos obras de valor.  O ápice da Enquanto jovem, Franklin aprendeu sozinho
pirataria, 1815, corres­ponde ao ponto mais baixo várias línguas, leu muito e praticou a arte de es­­
na li­te­ra­tura ame­ricana. Mas a oferta a­bun­­dante e cre­­ver para o público. Quando se transferiu de
barata de livros estrangeiros e clás­sicos pira­teados Boston para Filadélfia, na Pen­silvânia, já ti­nha o
durante os primeiros cin­quenta anos da nação, tipo de educação geralmente associado às elites.
te­ve o mérito de educar os ame­rica­nos, inclusi­ve Tinha também a capacidade dos pu­ritanos para o
os primeiros grandes es­cri­tores,que começa­ram a trabalho, cuida­do­so e com cons­tan­te autocrítica,
surgir por volta de 1825. além do desejo de aper­feiçoar-se cada vez mais.
Essas qualidades o impul­sionaram progressiva­
O ILUMINISMO AMERICANO mente na direção da riqueza, da respeitabilidade

O
Iluminismo americano do século 18 foi um e do prestígio. Não era egoísta e procurou ajudar
movimento marcado pela ênfase dada à outras pes­soas comuns a progredirem na vida,
razão,em lugar da tradição; à pes­­quisa cien­ compar­tilhando sua sabedoria e dando início a
tífica,em lugar do dogma religioso inquestionável;e um gênero caracteristicamente americano — o
ao governo representativo,em lugar da monarquia. livro de autoajuda.
Os pensadores e escritores ilu­mi­nistas dedicavam­ Poor Richard’s Almanack [O Almanaque do
-se aos ideais de justi­ça, liberdade e igualdade, Pobre Ricardo], iniciado em 1732 e publi­cado
prer­ro­­gativas ineren­tes ao homem. durante muitos anos, tornou Franklin próspero e
conhecido em todas as colô­nias.  Nes­se anuá­rio
Benjamin Franklin (1706 - 1790) de estímulos úteis,conse­lhos e informações factu­
Benjamin Franklin, a quem o filósofo escocês ais, personagens divertidos, como o Velho Abraão
David Hume chamou de“o primeiro grande ho­­­mem e o Pobre Ricardo, exortam o leitor com adágios
das letras”na América,encarnava o i­de­­al iluminista enérgicos e memoráveis. Em The Way to Wealth
da racionalidade humanista. Prático, mas idealista, [O Caminho para a Riqueza], que apa­receu
trabalhador e muito bem sucedido, Franklin regis­ pela primeira vez no almanaque, o Velho Abraão,
trou seus primeiros anos na famosa Autobiography “velho íntegro, sim­ples, com cachos bran­cos,”
[Autobio­grafia]. Escritor, tipógrafo, editor, cientista, cita inúmeras vezes Pobre Ricardo. “Para o sábio,
fi­lan­tropo e diplomata, foi a figura privada mais meia palavra bas­ta”, diz ele.“Deus ajuda os que
fa­mosa e respeitada de sua época. Foi o primei­ro se ajudam.”“Quem cedo dorme e cedo se levanta,
grande ho­mem a vencer sozinho na Amé­rica: um torna-se saudável, rico e sábio.”O Pobre Ricar­do é
de­mo­crata pobre nascido numa era aris­to­cra­ta,que psi­cólogo (“O trabalho paga as dívidas,en­quan­to
seu próprio exemplo ajudou a liberalizar. o desespero só as faz aumentar”) e sem­pre acon­
Franklin pertencia a uma segunda geração de selha o tra­balho esforçado (“A dili­gên­cia é a mãe
imigrantes.Seu pai,puritano,fabricante de velas,imi­ da boa sorte”).Não seja pregui­çoso,ele aconselha,
grou da Inglaterra para Boston, em Massachusetts, pois“Um hoje vale dois ama­nhã.” Às vezes,ele cria

18
Benjamin Franklin

Gravura, cortesia da Biblioteca do Congresso


19
ane­dotas para ilustrar suas verdades:“Um pouco simplicidade mate­mática.”
de negli­gên­cia pode criar um grande pro­blema... Mesmo próspero e famoso, Franklin nunca
Por falta de um cravo perdeu-se a ferradura; por perdeu sua sensibilidade democrática e foi figu­
falta de uma ferra­du­ra perdeu-se o cavalo; por ra de proa na convenção de 1787, que redigiu
falta do cavalo perdeu-se o cava­leiro, alcançado a Constituição dos Estados Uni­dos. Em seus
e abatido pelo inimigo, tudo por falta de cuidado últimos anos, presidiu uma as­so­­ciação aboli­
com um cravo de ferra­dura.”  Frank­lin era um gênio cionista. Um de seus últimos em­preendimentos
ao condensar um pensamento moral: “O gastos foi promover a educação pú­blica universal.
com um vício sus­tentariam duas cri­anças.”“Um
pequeno va­za­mento afun­da um navio.”“Os tolos Hector St. John de Crèvecoeur (1735 - 1813)
dão ban­quetes, os sá­bios os comem.” Outro Iluminista é Hector St. John de Crève­
Autobiography de Franklin é, em parte, outro coeur, cujas Letters from an American Farmer
livro de autoajuda. Escrita para orientar seu filho, [Cartas de Um Agricultor America­no] (1782)
cobre apenas seus primeiros anos. A par­te mais de­ram aos europeus uma ideia brilhan­te das
famosa descreve seu sistema cien­tífico de auto­ opor­tu­nidades de paz, riqueza e orgulho na
-aperfeiçoamento. Franklin rela­ciona 13 virtudes: Amé­rica. Nem ame­ri­cano nem agricultor, mas
sobriedade, silêncio, ordem, deter­mi­nação, fruga­ aris­tocrata francês que antes da Revo­lução foi
lidade, trabalho, sinceri­dade, justiça, moderação, dono de terras fora da cida­de de Nova York, Crè­
asseio, tranquilidade, cas­tidade e humildade. ve­­coeur exaltou entu­sias­­ti­ca­­mente o espírito
Ele fala de ca­da uma, através de aforismos. Por em­pre­endedor, a tole­rân­­cia e a crescente pros­
exemplo, a máxima re­­la­­tiva à sobriedade é: pe­ridade das colônias em 12 cartas que pintam
“Coma, sem ficar em­bo­tado. Beba, sem ficar alto.” a América como um paraí­so agrário. Sua visão
Cientista pragmá­tico, Franklin testou a ideia da inspiraria Thomas Jefferson, Ralph Waldo E­mer­
per­feição, usan­do a si mesmo como objeto de son e vários outros autores, até hoje.
expe­ri­mentação. Crèvecoeur foi o primeiro euro­peu a desen­
Para cultivar bons hábitos, Franklin criou volver uma visão pon­derada da América e do
uma agenda de registro em que trabalhava uma no­­vo cará­ter americano. O pri­mei­ro a explorar
virtude a cada semana, marcando cada lapso a ima­gem do “caldei­rão de raças” [melting pot]
com um ponto preto.  Sua te­o­ria pre­fi­­gura o beha­ para a América, o autor, num famoso trecho, faz
viorismo psicológico e seu método sis­­te­mático a seguinte per­gunta:
de anotação antecipa a alteração comportamen­
tal moderna. O projeto de autoa­per­feiçoa­mento Quem é afinal o americano, esse novo ho­mem? É
mistura a crença iluminista na perfeição ao europeu ou descendente de europeu. Daí, aque­la
hábito purita­no do autoexame. estranha mistura de sangue que não é en­con­trada

P
ercebeu desde cedo que a melhor manei­ em nenhum outro país. Eu poderia lhes apon­­tar
ra de promover suas ideias seria pô-las no uma família cujo avô era inglês,a esposa,holandesa,
papel.Então,deliberadamente,apri­morou o filho, casado com uma fran­cesa e cujos quatro
seu estilo de pro­sa, não como um fim em si, mas filhos hoje são casados com mu­lhe­res de quatro
co­­mo uma ferramenta.“Es­creva com os letra­dos. di­fe­rentes nacionalidades... Aqui, indiví­duos de
Pro­­­­nuncie com o povo”, sugeria ele. Cien­tis­ta, se­ todas as nações se fundem em u­ma nova raça de
guiu o conselho da So­cie­dade Real (de Ciên­cias) ho­mens, cujo tra­balho e descen­den­tes irão um dia
de 1667 para adotar um estilo natural, pre­ciso, mudar o mundo.
trans­pa­rente; expressões posi­tivas,sen­­ti­dos claros,
trazendo todas as coisas o mais perto pos­sível da

20
literário simples. A cla­reza era vital
PANFLETO POLÍTICO: para o re­cém-che­ga­do que poderia
Thomas Paine (1737 - 1809) ter no inglês sua se­gun­da língua. A
A paixão da literatura revolucio­ versão original da Decla­ração de
nária é encontrada em panfletos, Independência, es­cri­ta por Thomas
a forma mais popular de literatura Jefferson, era clara e lógica, mas as
po­lí­tica na época. Mais de 2.000 modificações feitas por sua comissão
pan­­fletos foram publicados duran­te a tor­na­ram mais simples ain­da. The
a Revo­lu­ção. Os panfletos faziam Federa­list Papers [Tex­tos Federalistas],
vibrar os patriotas e amea­çavam os escri­tos para apoi­ar a Cons­tituição,
legalistas (loyalists); preenchiam o tam­bém são ar­gu­mentos lú­cidos e
pa­pel do drama, pois eram quase lógicos, adequados ao debate numa
sempre lidos em voz alta para emo­ na­ção democrática.
cionar as plateias. Sol­­dados ame­­ri­
canos os liam em voz alta em seus NEOCLASSICISMO: ÉPICO,
acampamentos, legalistas ingleses PARÓDIA DE ÉPICO E SÁTIRA
os lançavam em grandes fogueiras. Infelizmente, a escrita “literá­ria”

O
panfleto Common Sense não era tão simples e direta quan­­­­to a
[Bom Senso], de Thomas política. Ao tentar escre­ver poesia,a
Paine,vendeu mais de 100.000 maioria dos au­to­res cultos tropeçava
exempla­res nos primeiros três meses. no abismo do neoclassicismo ele­
Ain­da hoje, inflama os espí­ritos. gante. O épi­co, em par­ti­cular, exercia
“A causa da A­mé­­rica é, em gran­de uma atra­ção fatal. Os patriotas literá­
parte, a cau­­sa da hu­­ma­nidade”,  rios ame­­rica­nos tinham certeza de
es­cre­veu ele, ex­­pres­­sando a ideia da que a gran­de Revolução Americana
excepcionalidade americana, ain­da na­tu­­ral­mente encontraria expres­são
for­­te nos Estados Unidos — o sentido no gê­nero épico — um longo poe­ma
fundamental de que,como a Amé­rica nar­­rativo e dramático, es­crito em
é um experi­mento demo­crático teo­ri­ lin­guagem elevada, que cele­bra­va
camente aberto a to­­dos os imi­­­­gran­tes, os feitos de um herói len­dário.
seu destino prefigura o destino de Muitos tentaram, mas nenhum
toda a humanidade. Thomas Paine conseguiu. Timothy Dwight (1752
Os textos políticos numa demo­ - 1817), integrante do grupo deno­
cracia precisavam ser claros, para minado Hartford Wits, é um bom
empolgarem os leito­res. E, para ter exemplo. Dwight, que aca­bou se
eleitores informados, muitos dos tor­­­nando Presidente da Uni­­ver­si­
fun­dadores da nação promoveram dade de Yale, baseou seu épico, The
a educação universal. Um indício Conquest of Canaan [A Con­quista
da vigorosa, ainda que simples, vi­da de Ca­naã] (1785), na his­tória bí­blica
literária foi a proliferação de jor­nais. da luta de Josué para chegar à ter­ra
Durante a Revolução,liam-se mais jor­ prometida.Dwight colocou o Ge­ne­ral
nais na América do que em qualquer Washington,co­man­­dan­te do exército
outra parte do mun­do. A imigração Retrato, cortesia da Biblioteca
americano e primeiro Pre­si­den­te dos
tam­b ém determi­n ava um estilo do Congresso Estados Unidos, como Josué em sua

21
alego­ria e to­mou em­prestada a forma do dístico Outra obra satírica, o romance Modern Chi­
usado por Alexander Pope para traduzir Home­ro. valry [Cavalheirismo Moderno], publicado em
O épico de Dwight era tão massante quanto am­bi­ capítulos por Hugh Henry Brackenridge, de 1792
cioso. Os críticos ingleses arrasaram o poe­ma. Até e 1815,zomba de forma memorável dos excessos
os amigos de Dwight, como John Trum­bull (1750- da época.Brackenridge (1748-1816),imigrante es­
1831),não se entusiasmaram.Tan­tos raios e trovões cocês criado na fronteira america­na, baseou seu
troavam nas cenas de batalha melodramáticas,que romance pica­resco em Dom Quixote; descreve
Trumbull propôs que o é­pi­co viesse acompanhado as desventuras do Capitão Farrago e seu servo
de pára-raios. Teague O’Re­gan, estúpido, brutal, ainda assim

N
ão é de surpreender que a poesia satírica agradavel­mente humano.
tenha se saído melhor que a poesia séria.
A pa­ró­dia de épico estimulou os poe­tas POETA DA REVOLUÇÃO AMERICANA:
americanos a usarem suas vozes naturais e não os Philip Freneau (1752 - 1832)
atraiu para o atoleiro de sentimentos patrióticos Poeta, Philip Freneau, absorveu os novos es­
pretensiosos e previ­síveis e de outros epítetos tí­mulos do Romantismo europeu e escapou da
poéticos convencionais copiados do poe­ta imi­­tação e universalidade vaga dos Hartford Wits.
grego Homero e do poeta romano Virgílio por A chave para seu sucesso, como tam­bém de seu
intermédio dos poetas ingleses. fracasso,estava no seu espírito apai­xo­na­damente
Em paródias de épicos,como a bem-humorada democrático combinado a seu tem­pera­men­to
M’Fingal (1776 - 1782) de John Trum­bull, emoções inflexível.
estilizadas e clichês conven­cio­nais são munição Os Hartford Wits, indubitavel­mente patrio­tas,
para a boa sátira e a própria oratória bombástica da refletiam o conservadorismo cultural das classes
Revolução era ridicu­larizada.Basenado-se no texto instruídas. Freneau colocou-se em opo­sição a
Hu­dibras, do po­e­ta inglês Samuel Butler, a paródia essa herança das velhas atitudes conser­vadoras,
zomba de M’Fingal,um Tory [político conser­vador]. criticando os“escritos de uma facção aristocrática,
É muitas vezes consiso, co­mo quando descreve os especulativa de Hartford a favor da monarquia e
condenados que enfrentam a forca: da concessão de títulos nobiliárquicos.” Embora
tenha recebido edu­cação primorosa e conhe­
Nenhum homem jamais sentiu o aperto do laço cesse os clássicos tão bem quanto qualquer dos
Com boa opinião sobre a lei. Hartford Wits, Fre­neau abraçou as causas liberais
e demo­cráticas.
M’Fingal teve mais de 30 edições, foi reim­
De família huguenote (protestantes fran­ce­ses
presso por mais de 50 anos e apreciado tan­to na
radicais), Freneau foi da milícia durante a Guerra
Inglaterra quanto na Amé­rica.A sátira agra­dava ao
Revolucio­nária.Em 1780,foi cap­tu­ra­do e preso em
público revolucioná­rio em parte porque continha
dois navios ingleses; qua­se mor­reu antes de sua
comentários e críticas sociais; temas po­líticos e
família conseguir libertá-lo.Seu poema“The British
problemas sociais eram o grande assunto da épo­
Prison Ship” [O Na­vio-Pri­são Britânico] é uma
ca.A primeira comédia america­na a ser encenada,
amarga condenação da crueldade dos ingleses,
The Contrast [O Contraste] (produzida em 1787),
que queriam“man­char o mundo com san­gue.”Essa
de Royall Tyler (1757-1826), contrasta de forma
e outras obras re­­vo­­lu­cionárias, incluindo “Eutaw
humorística o Coro­nel Manly, oficial americano,
Springs” [A Fonte de Eutaw], “Ame­rican Liberty”
e Dimple, imitador das modas in­glesas. É claro
[Liberdade Ame­ri­cana], “A Political Litany” [Li­ta­
que Dimple é ridi­cu­larizado. A peça introduz a
nia Política], “A Midnight Consultation” [Consulta
pri­mei­ra perso­nagem yankee, Jonathan.
à Meia-Noi­te], e “George the Third’s Soliloquy” [O

22
O
Solilóquio de George III],o tor­naram Os primeiros anos lan­ça­ram bases
famoso como o“Poeta da Re­­vo­lução para outros feitos literários subse­­­
Americana”. quen­tes. O nacio­na­lismo inspi­rou
Freneau editou uma série de a publicação de trabalhos em mui­
pe­ri­ódicos durante sua vida, sem­ tos campos, levando à valorização
pre cônscio da grande causa da das coisas americanas. Noah Webs­
demo­c racia. Quando, em 1791, Iluminismo ter (1758-1843) criou o Ame­rican
Thomas Jefferson o ajudou a fundar americano do Dictionary [Di­cio­nário Ame­ri­cano]
o National Gazette, jornal militante sé­cu­lo XVIII foi e também u­ma impor­tante cartilha
e antifederalista, Freneau tornou-se um movimento de leitura e ortografia para as esco­
o primeiro editor poderoso de jor­ las. Seu Spelling Book [Li­vro de Or­
marcado pela
na­l defensor de grandes causas na tografia] vendeu mais de 100 mi­­­lhões
América e o predecessor literá­rio de ênfase na de cópias. Versões atua­li­zadas do
William Cullen Bryant,William Lloyd razão em lugar dicionário Webster ainda estão em
Garrison e H.L. Mencken. da tradição, uso até hoje.  Ame­­rican Geography
Como poeta e editor, Freneau na pesquisa [Geografia Ameri­cana], de Jedidiah
ade­riu a seus ideais de­mo­cráticos. científica, Morse,ou­tra impor­tan­tíssima obra de
Seus poemas popu­lares, publica­dos em lugar do re­ferência,pro­movia o conheci­mento
em jornais, celebravam te­mas bem do grande território ameri­cano,ainda
dogma religioso
america­nos. “The Virtue of Tobacco” em franca expansão. Algu­mas das
[As Vir­tudes do Tabaco] fala dessa
incontestável, o­bras mais interes­santes do perío­do,
plan­ta nativa, esteio da eco­nomia su­ e no governo embora sem cunho li­te­rário, são os
lis­ta, ao passo que “The Jug of Rum” representativo, diários de desbra­vadores e explora­
[A Gar­rafa de Rum] elogia a bebida em lugar da dores,co­mo Meri­wether Lewis (1774-
das Antilhas,  item básico no comér­cio monarquia. Os 1809) e Zebulon Pike (1779-1813),
da Amé­rica e um dos prin­cipais pro­ pensadores que re­latam suas expedições no
dutos de ex­por­tação do Novo Mundo. e escritores Terri­tó­rio da Louisiana, vasta por­ção
Per­so­na­gens ame­ricanos comuns do con­tinente americano comprada
do Ilu­mi­nismo
viviam em obras como “The Pilot por Thomas Jefferson de Napoleão
of Hatte­ras” [O Pi­loto de Hatteras] e
eram dedicados em 1803.
poemas so­bre médicos charlatões e aos ideais de
evangelistas bombásti­cos. justiça, liberdade FICCIONISTAS

O
Freneau escrevia num estilo natural e igualdade, s primeiros escritores impor­
e coloquial, adequado a u­ma demo­ considerando-os tantes de fic­ção amplamente
cracia au­tên­tica, mas podia atingir o prerro­gativas reco­nhe­cidos hoje, Charles
ápice do liris­mo neo­clás­sico em obras inerentes ao Brockden Brown, Washington Irving
frequen­temente incluídas em antolo­ e James Fe­ni­more Cooper, usa­vam
homem.
gias como “The Wild Honey Suckle” persona­g ens ame­r icanas, pers­­
[A Madressilva Sil­vestre] (1786), que pectivas históri­cas,temas envolvendo
evoca um ar­busto nativo de perfu­me mu­dança e nostalgia.Escreveram em
adoci­cado. Só com a “Re­nas­­­­cença muitos gê­ne­ros de prosa, ini­ciaram
Americana” (1820), a po­e­sia ameri­ no­­vas for­­mas e encontraram meios
cana conseguiu superar o que Fre­neau de ga­nhar a vida com a literatura.
havia alcançado 40 anos antes. Com eles, a litera­tura ameri­cana

23
co­me­çou a ser lida e apre­ciada nos Estados Uni­ tornou-se um tipo de embaixador cul­tu­ral e di­
dos e o exterior. plo­mático na Europa, como Benjamin Fran­klin e
Nathaniel Hawthorne. Apesar de talento­so, talvez
Charles Brockden Brown (1771 - 1810) não se tivesse torna­do es­cri­tor em tempo integral,
Já citado como o primeiro escritor americano da­da a falta de re­tor­no finan­ceiro propor­cio­nado
profissional,Charles Brockden Brown inspirou-se pela litera­tu­ra, não fosse uma série de inciden­tes
nos escritores ingleses Radcliffe e English William for­tui­tos que o força­ram a escolher o cami­nho da
Godwin. (Radcliffe é conhecida por seus roman­ li­te­­­ra­­tu­ra. Graças à ajuda de ami­gos, ele pôde pu­
ces ‘góticos’ aterrorizantes; Godwin, ro­mancista e blicar seu Sketch Book [Cader­no de Ilustra­ções]
reformador social, foi pai de Mary Shelley, autora (1819-1820), simultanea­mente na Ingla­terra e na
de Frankenstein, casada com o poeta inglês Percy América, ter reconhe­cidos seus direi­tos autorais
Bysshe Shelley.) nos dois países e re­ceber o paga­men­to devido.
Movido pela miséria, Brown rapida­mente es­­cre­­ Sketch Book of Geoffrye Crayon [Caderno
veu quatro romances assustadores em dois anos: de Esboços de Geoffrye Crayon] (pseudônimo
Wieland (1798), Arthur Mervyn (1799), Ormond de Irving) contém suas duas histórias mais
(1799) e Edgar Huntley (1799). Nessas obras, de­ co­nhecidas, “Rip Van Winkle” e “The Legend of
senvolveu o gênero ‘gótico ame­ri­cano’. O romance Sleepy Hollow”[A Lenda do Va­le Sonolento]. O
gótico, mui­to popular na época, caracterizava-se termo “esboço” (sketch) a­pli­­ca-se perfei­ta­mente
por cená­rios exó­ticos e fan­tás­ti­cos, pro­fundidade ao estilo delicado, ele­gan­te, ainda que aparente­
psi­cológica pertur­ba­dora e muito suspense. Os mente espontâneo de Irving, enquanto “crayon”
acessórios inclu­íam castelos ou mos­teiros abando­ sugere seu talen­to para colorir ou criar matizes
nados,fantas­mas,segredos misteriosos,personagens ricos e efeitos emo­cionais.No Sketch Book,Irving
amea­ça­dores e donzelas solitárias que sobreviviam transforma as Montanhas Catskills, que acompa­
graças à inteli­gência e à força espiritual.Os me­­­­lhores nham o Rio Hudson ao norte da cidade de Nova
do gê­ne­ro oferecem muito suspense e toques de York, nu­­ma região fabulosa e mágica.
má­gi­­ca, além da exploração pro­­funda da alma Os leitores americanos aceitaram a“história”dos
humana submetida a con­di­ções extremas. Os crí­­ Catskills inventada por Irving, apesar das his­tórias
ticos sugerem que a sen­sibi­lidade gótica de Brown terem sido adaptações de lendas de origem alemã
expressa profunda an­siedade em relação às ins­ (fato por eles ignorado).Irving deu à América algo
tituições sociais ina­dequadas da nova nação. de que ela precisava mui­to naqueles primeiros
Brown recorria a cenários bem americanos. anos impetuosos e ma­terialistas:deu-lhe uma forma
Homem de ideias,dramatizou teo­rias cien­tí­fi­cas,de­ imaginativa de se relacionar com a nova terra.
senvolveu uma teoria pessoal de ficção e conquistou Nenhum autor conseguiu humanizar a terra
alto pa­drão literário, apesar das sé­­rias dificuldades como ele, dando-lhe nome, rosto e um conjunto
financeiras. Embora imper­fei­ta, sua obra é som­ de lendas. Virou folclore a história de “Rip Van
briamente pode­rosa. Cada vez mais, é visto como Winkle”, que dormiu por 20 anos e despertou
predecessor de escritores românticos como Edgar quando as co­lônias já estavam indepen­­dentes.
Allan Poe,Her­man Melville e Nathaniel Hawthorne. Foi adaptada ao teatro, in­cor­porada à tra­dição
Ex­pressa temo­res incons­cientes que o período ilu­ oral e passou a ser aceita, por várias ge­ra­ções,
minista, apa­ren­temente otimista, procurou reprimir. co­­mo uma lenda genui­na­mente ame­ri­cana.
Irving identificou e ajudou a pre­encher o sen­
Washington Irving (1789 - 1859) tido de história da nova nação. Suas inú­meras
Caçula de 11 filhos de uma próspera família obras po­dem ser vistas como bem inten­cionados
comerciante de Nova York, Washington Irving esforços para cons­truir u­ma alma para a nova

24
na­ção, recri­an­do a história com vita­ in­ten­samente as mudanças nas ter­ras
lidade e ima­­ginação. Escolheu co­mo intocadas e tratar de ou­tros te­mas,
temas os aspectos mais dramá­ticos da como o mar e o con­flito entre pessoas
his­tória americana: a des­coberta do de diferentes cultu­ras.Fi­lho de família
Novo Mundo, o primeiro presi­den­te quaker, foi cri­a­do na propriedade de
e herói nacional e a ex­plo­­ração da seu pai em Otsego La­ke (hoje Cooper­
fronteira oeste. Sua pri­meira obra foi s­town), no cen­tro do então remoto
a cintilante sátira History of New York Estado de Nova York. Em­bora a área
(1809),con­tan­do a his­­tória da cidade desfru­tas­se de rela­tiva tranquilidade
ain­da sob do­mínio dos holandeses e du­ran­­te sua infân­cia, já tinha sido
os­ten­­si­vamente escrita por Diedrich pal­­co de um massacre de índios.
Knicker­bocker (daí o nome dado ao O jovem Feni­­more Cooper cresceu
círculo de amigos de Irving e es­­cri­­ num am­bi­­ente qua­­se feudal. Seu pai,
tores de NovaYork na época,a“Escola Juiz Cooper,era dono de terras e líder
Knickerbocker”). co­mu­­nitário. Quando me­ni­no, em
Otsego La­­ke, co­nhe­ceu des­­­­bra­­va­do­
James Fenimore Cooper res das frontei­ras e índios. Mais tarde,
(1789 - 1851) viu suas terras invadidas por colonos
James Fenimore Cooper, como bran­­cos audaciosos.
Irving, evocava o passado dando-lhe Natty Bumppo, a conhecida per­
uma presença geográfica e um nome. sonagem de Cooper, encarna sua
Em Cooper, contudo, encon­tramos o vi­­são do explorador das fronteiras:
poderoso mito de uma era dourada e um cavalheiro, um “aristocrata na­tu­­
a pungência de sua per­da. En­quan­to ral” à moda de Jefferson. No iní­cio
Irving e outros escri­tores americanos, de 1823, em The Pioneers [Os Pio­­
antes e depois de­­­le, vas­cu­lharam a neiros], Cooper começava a des­
Europa em bus­ca de lendas, castelos cobrir Bumppo. Natty é o primeiro
e grandes te­mas, Cooper captou a desbravador fa­moso na literatura
essência do mito americano: uma americana, bem como o predeces­
terra a­tem­­poral, como o ermo. A his­ sor de inúme­ros ‘caubóis’ e heróis
tó­ria americana era como que uma James Fenimore do interior. É aquele individualista
invasão do eterno; a história euro­peia Cooper idealizado,de grande retidão,me­lhor
na América era uma reencenação da do que a so­­ciedade que ele pro­tege.
queda no Jardim do Éden. O ciclo Pobre e isolado,mas ainda assim puro,
da natu­reza só era vis­lum­brado no é a pedra de toque dos valores éti­cos,
mo­mento de sua des­truição: o ermo prefigurando Billy Budd de Her­man
desaparecia di­an­te dos olhos dos Melville, e Huck Finn de Mark Twain.
ame­ricanos, desv­a­ne­cendo como se Parcialmente baseado na vida
fosse mira­gem. Esta é a trágica visão real de Daniel Boone – quaker,
bá­si­ca da irô­ni­ca destruição das ter­ co­mo Cooper – Natty Bumppo, exí­
ras in­to­cadas,o novo Éden que havia mio le­nhador como Boone, foi um
atraído os primeiros colonos. ho­mem pacífico adotado por u­ma
As experiências pessoais per­ tri­­bo indígena.Tanto Boone quan­to o
Foto, cortesia da Biblioteca
mi­tiram a Cooper poder descre­ver do Congresso
fictício Bumppo amavam a na­tu­reza

25
e a liberdade. Estavam sem­pre avan­ Os romances de Cooper revelam
çando em direção ao oeste pa­ra fugir profunda tensão entre o indi­víduo
dos colonos que eles mes­­mos haviam solitário e a sociedade,a na­tu­reza e a
guiado no ermo e tor­na­ram-se lendas cultura, a espi­ri­tualidade e a re­­li­gião
vivas. Natty é tam­bém virtuoso, probo formal.Em suas obras,o mundo natu­
e profun­da­mente espiritual, tal qual ral e os índios são fun­damentalmente
um ca­va­­leiro cristão dos romances bons — co­mo tam­­bém o é a esfera
medi­e­vais transposto às flo­res­tas vir­ mais civi­li­zada associada a seus per­
gens e o solo rochoso da América. so­na­gens mais cultos.Os persona­gens
O elo de ligação entre os cinco intermedi­ários são muitas vezes sus­
ro­mances conhecidos coletiva­men­te peitos, espe­cialmente co­lonos bran­
como Leather-Stocking Tales [Contos cos po­bres e ga­nan­cio­sos incultos
das ‘Perneiras de Cou­ro’] é a vida de ou in­ca­pazes de apre­­­ciar a natureza
Natty Bumppo. São a obra-prima de ou a cultura. Assim como Rudyard
Cooper: um grande épico em prosa Ki­pling, E.M. Fors­ter, Herman Mel­ville
que tem o conti­nente norte-ameri­ e outros ob­ser­­vadores sen­sí­veis aos
cano por pal­co, as tribos indíge­nas matizes na inte­ração entre cultu­ras
por persona­gens e gran­des guerras e a variadas, Cooper era um rela­tivista
mi­gra­ção para o Oeste como pano de cultural. En­tendia que ne­nhu­ma
fun­do social.Os romances dão vida à cultura tem o mono­pólio da virtude
fronteira oeste entre 1740 e 1804. ou do refinamento.
Os romances de Cooper retra­tam Cooper aceitava a condição ame­
as sucessivas ondas de colo­nização ricana, enquanto Irving não. Este
de fronteira: as terras into­cadas tratava o cenário americano como
inicialmente habitadas por ín­dios; faria um europeu — impor­tando
a chegada dos primei­ros bran­cos e adap­tando da Europa as len­das,
como guias, soldados, co­mer­ciantes cultura e história. Cooper levou o
e desbrava­dores; a che­gada das pro­cesso um passo adiante.Criou ce­
famílias de colonos rudes e pobres; nários ameri­canos e novos e dis­tintos
e por fim a chegada da classe média, personagens e temas ameri­canos.Foi
trazen­do os pri­mei­ros profissio­nais – o pri­mei­­ro a soar a nota trágica que
o juiz, o mé­dico e o ban­queiro. Cada Phillis Wheatley permeia toda a fic­ção americana.
onda des­lo­ca­va o gru­po anterior:
os bran­cos des­­lo­caram os índios, MULHERES E MINORIAS

E
que recu­a­ram para o oeste; a classe mbora o período colonial
mé­dia “civi­li­zada”, que construía tenha testemunhado o despon­
es­co­las, igre­jas e prisões, deslocou tar de várias escrito­ras dignas
os des­bra­vadores individualistas de de nota, a era revolucio­nária não
clas­se mais baixa mais para oeste favoreceu o trabalho das mu­lhe­res e
e que, por sua vez, des­lo­ca­ram os das mi­­norias, apesar do sur­gimento
ín­dios que os haviam prece­dido. de muitas es­colas, re­vis­tas, jornais
Cooper evoca a onda intermi­nável e clubes literários. Mu­­­lhe­res da era
e ine­vitável de colonos e vê não só Gravura © The Bettmann colonial como Anne Brad­street,Anne
os bene­fícios mas também as perdas. Archive Hutchinson, Ann Cotton e Sarah

26
Kemble Knight,exerceram consi­derável influência
social e literária,apesar das condições primitivas e ‘A misericórdia me trouxe de minha terra pagã
dos perigos.Das dezoito mulheres que vieram para Ensinou minha alma inculta a compreender
a América em 1620, no navio Mayflower, apenas Que há um Deus, que há um Salvador também;
quatro sobre­viveram ao primeiro ano. Quan­do Antes eu não buscava nem conhecia a redenção.
cada pessoa ativa era importante e as con­dições Alguns olham nossa raça escura com desdém,
sociais eram ainda fluidas, o talento inato podia “Sua cor é uma tintura diabólica”.
encontrar expressão. Porém, à me­di­­da que as Lembrem-se, cristãos, negros escuros como Caim,
instituições culturais na nova repú­blica foram Podem purificar-se e ingressar no coro angelical.
sendo for­malizadas, as mulhe­res e as minorias
foram progres­sivamente excluídas. Outras Mulheres Escritoras
Várias escritoras da era revolucionária vêm
Phillis Wheatley (C. 1753 - 1784) sendo redescobertas por doutos feministas.
Dada a dureza dos primeiros anos na Amé­rica, Susa­nna Rowson (c. 1762-1824) foi das primei­
é irônico que algumas das melhores poe­sias do ras romancistas profissionais da Amé­rica. Seus
período tenham sido escritas por uma mulher sete romances incluem a popularís­sima história
fantástica e escrava. A primeira autora afro-ame­ de sedução, Charlotte Temple (1791). Ela abor­da
ricana de importância nos Estados Unidos,Phillis temas feministas e aboli­cionistas e retrata os
Wheatley nasceu na África e foi trazida pa­ra índios americanos com respeito.

O
Boston, Massachusetts, aos sete anos, on­de foi utra romancista há muito esquecida é
comprada por um alfaiate devoto e rico, John Hanna Foster (1758-1840),cujo ‘best-seller’
Wheatley, para servir de companhia para sua The Coquette [A Coquete] (1797) contava
esposa. Os Wheatleys reconheceram a no­tá­vel sobre uma jovem dilacerada entre a vir­tu­de e a
inteligência de Phillis e, com a ajuda de sua filha tentação. Rejeitada pelo namorado, ho­mem frio
Mary, ensinaram-na a ler e escrever. de igreja, ela é seduzida, aban­do­nada, tem um
Os temas poéticos de Phillis são religiosos e filho e morre sozinha.
seu estilo é neoclássico,como o de Philip Fre­neau. Judith Sargent Murray (1751-1820) publi­cou
Entre seus poemas mais famosos estão “To S.M., a suas obras com um pseudônimo masculino,
Young African Painter, on Seeing His Works” [Para para assegurar uma atenção mais séria a seus
S.M., Jovem Pintor Africano, ao Ver Suas Obras], trabalhos. Mercy Otis Warren (1728-1814) era
poema de louvor e encoraja­men­to a outro negro poeta, historiadora, dramaturga, satirista e pa­
de talento,e um cur­to po­e­ma mostrando sua forte triota. Fazia reuniões pré-revolucionárias em
sensibi­lidade reli­giosa filtrada por sua experiência sua casa, atacava os ingleses em suas vigorosas
de con­ver­são cristã. Esse poema perturba alguns peças teatrais e escreveu a única história radical
críticos con­tem­porâneos — os brancos, porque contemporânea da Revolução Americana.
o consi­deram convencional, e os negros, porque As cartas trocadas entre mulheres, como
não expressa um protesto contra a imoralidade Mercy Otis Warren e Abigail Adams, e cartas
da escravidão.No entanto,a obra é uma expressão de uma maneira geral, constituem importantes
sincera; confronta o racismo branco e afirma a documentos do período. Por exemplo, Abigail
igualdade espiritual. De fato, Wheatley foi a pri­ Adams escreveu para seu marido, John Adams
mei­ra a abordar tais questões de forma confian­te (mais tarde, segundo Presidente dos Estados
em seus versos, como em“On Being Brought from Unidos), em 1776, instando-o a garantir a inde­
Africa to America”[Como Fui Comprada e Trazida pendência das mulheres na futura cons­tituição
da África para a América]: americana. 

27
CAPÍTULO
um dos principais temas. A autoconscientização,
um método primário. Se, de acordo com a teoria

3
ro­mântica, ser e natureza são um, então o auto­
conhecimento não é um beco sem saída e­go­ís­ta,
mas uma forma de conhecimento que abre as
portas do universo. Se seu ser está em sinto­nia
com a humanidade,o indivíduo tem o dever moral
PERÍODO ROMÂNTICO de reformar as desigualdades so­ciais e aliviar o
1820-1860 sofrimento humano.O conceito“ser”(self) — que
ENSAÍSTAS E POETAS evocava egoísmo para ge­ra­ções ante­riores — foi
redefinido. Surgiram novas palavras compostas,

O
movimento Romântico — que surgiu na com significados positivos:“autorealização” (self­
Alemanha, mas rapidamente se espalhou -realization), “au­toexpressão” (self-expression),
para a Inglaterra,França e além — chegou à “auto­confian­ça” (self-reliance).
América em torno de 1820,cer­ca de 20 anos depois Como o ser subje­tivo e único se tornou im­por­­
de William Wordsworth e Samuel Taylor Coleridge tante, assim o fez a esfera da psicologia.Técni­cas e
terem revolucionado a poesia inglesa com a obra efeitos artísticos excepcionais foram de­sen­­volvidos
Lyrical Ballads [Ba­ladas Líricas]. Na América, co­ para evocar estados psico­lógicos ele­vados.O“subli­
mo na Europa, a nova visão eletrizou os círculos me”— efeito da be­le­za em es­cala grandiosa (a vista
artísticos e in­­te­lectuais. Mas havia uma diferença do alto de uma monta­nha,por exemplo) — gerava
impor­tan­te: o Romantismo na América coincidiu senti­mentos de admi­ração, reverência, vastidão e
com a expansão nacional e a descoberta de uma um poder além da compreensão humana.
voz distintamente americana. A consolidação da O Romantismo era afirmativo e apropriado para a
iden­­tidade nacional, o idealismo emer­gente e a maioria dos poetas e ensaístas criativos da América.
paixão vigorosa do Ro­man­tismo nutriram as obras­ As vastas montanhas da América,desertos e trópicos
-primas da “Renascença Americana”. encarnavam o sublime. O espírito Romântico pare­
As ideias românticas giravam em torno da ar­te cia adequar-se parti­cularmente bem à democracia
como inspiração, da dimensão estética e espi­­ americana:enfa­tizava o individualismo,valorizava a
ritual da natureza, das metáforas de cresci­men­to pes­­soa co­mum e buscava,na imaginação ins­pi­rada,
orgânico.A arte,mais que ciência,argu­men­tavam seus valores estéticos e éticos. Certamen­te, o movi­
os Românticos, poderia melhor expres­sar a men­to Romântico inspirou os trans­cen­­denta­listas
verdade universal. Os Român­ticos salien­tavam a da Nova Inglaterra — Ralph Wal­­do Emer­son,Henry
importância da arte expressiva para o indivíduo e David Thoreau e seus colegas — pa­ra uma nova afir­
a sociedade. Em seu ensaio,“The Poet” [O Poeta] mação otimis­ta. Na No­va Inglaterra, o Romantismo
(1844), Ralph Waldo Emer­son, talvez o escritor encon­trou solo fértil.
mais influente da era Român­tica, afirma:
TRANSCENDENTALISMO
Pois todos os homens vivem pela verdade e pre­cisam O Movimento Transcendentalista foi uma rea­ção
expressar-se.No amor,na arte,na avareza,na política, ao racionalismo do século 18 e uma ma­ni­fes­tação
no trabalho, nos jogos, estuda­mos co­mo exprimir da tendência humanista geral do século 19. O
nosso doloroso segredo. O homem é apenas sua movimento era baseado na crença fun­damental
metade, a outra é sua ex­pres­são. na unidade entre Deus e o mundo.A alma de cada
in­di­víduo era con­siderada idêntica ao mundo —
O desenvolvimento do próprio ser torna-se um micro­cosmo do próprio mundo. A doutrina da

28
au­to­confiança e do in­dividualismo o edu­ca­dor (e pai da romancista
de­sen­volveu-se atra­vés da crença na Louisa May Alcott) Bronson Alcott e
iden­tificação da alma individual com o poe­ta William Ellery Channing. O
Deus. Clu­be Transcendental foi informal­
O Transcendentalismo estava men­te organizado em 1836 inclu­indo,
inti­mamente ligado à cidadezinha em diferen­tes momentos, E­mer­­son,
de Concord, Nova Ingla­terra, 32 Thoreau, Fuller, Chan­ning, Bronson,
qui­­lô­metros a oeste de Boston. Con­ Alcott, Orestes Brown­son (pregador
cord foi o primeiro povoado de da de gran­de in­flu­ência),Theodore Par­
Colônia de Massachusetts Bay. Cerca­ ker (aboli­cio­nista e pastor) e ou­tros.
da de florestas, era e ainda é bem Os transcendentalistas publica­
cal­ma e suficientemente próxi­ma às ram por quatro anos a revista
pa­lestras,livrarias e univer­sidades de tri­mes­­tral The Dial editada inicial­
Boston, para ser inten­samente culta, men­­te por Margaret Fuller e depois
mas longe o bastan­te para manter por Emerson. Esforços refor­mis­tas
sua tranquilidade.  A pri­meira batalha os inspiravam, além da literatu­ra.
da Re­vo­lução Ame­ricana aconteceu Vários transcenden­ta­listas fo­ram
em Concord e o poe­ma em que abo­l i­c ionistas e al­g uns par­t i­c i­
Ralph Waldo Emer­son come­mora param de comunida­des utó­picas
a batalha,“Concord Hymn” [Hino de ex­p e­r imentais, como Fruit­l ands
Concord],tem u­ma das mais famosas e Brook Farm (descrita em The
estrofes da literatura ame­ricana: Blithe­dale Romance [O Ro­mance
de Blithedale] de Haw­thorne).
Junto à rude ponte que se arqueia Contrariamente a muitos gru­pos
sobre a corrente, europeus,os transcenden­talis­tas nun­
Sua bandeira desfraldada na brisa ca lançaram um manifesto. Insistiam
de abril, nas diferenças indivi­duais — nos pon­
Aqui, num dia, prontos para a luta, tos de vista únicos de cada indivíduo.
estiveram agricultores Os românticos trans­­­cendentalistas
Cujo tiro foi ouvido em todo o mundo. americanos le­varam o individualis­
Ralph mo radical ao extremo. Os autores
Concord foi a primeira colônia
Waldo Emerson americanos fre­q uen­temente se
rural de artistas, e o primeiro lugar a viam como ex­plo­radores solitários à
oferecer uma alternativa espiri­tual e mar­­gem da sociedade e das con­ven­­
cultural ao materia­lismo ame­ricano. ções. O he­rói americano — co­mo o
Era um lugar para con­versas eleva­ Capitão Ahab de Herman Melville,ou
das e vida simples (tan­to E­mer­son Huck Finn de Mark Twain, ou Arthur
como Henry David Thoreau tinham Gordon Pym de Edgar Allan Poe —
hortas). Emer­son, que se mudou tipicamente enfrentava riscos, ou até
para Concord em 1834, e Thoreau mes­mo a destruição certa, na busca
são os escritores mais associados à do autodes­co­bri­mento metafísico.
cidade; mas o lo­cal também atraiu Para o escritor român­tico ameri­ca­no,
o romancista Na­thaniel Hawthorne, Foto, cortesia nada era axiomático. As conven­ções
National Portrait Gallery,
a escritora fe­­mi­nista Margaret Fuller, Smthsonian Institution literá­rias e sociais,longe de ajudarem,

29
e­ram perigo­sas.Havia enorme pressão para atin­gir original com o uni­verso? Por que não podemos nós
auten­ti­cidade na forma literária,no conteú­do e na ter uma poe­sia de discernimento e não de tradição,
voz — tudo ao mesmo tempo. Fica cla­ro, através uma religião de re­ve­lação direta e não a história das
das muitas obras-primas produ­zidas nas três dé­ de outros. Abrigados por uma estação na natureza,
cadas que antecederam a Guer­ra Civil Americana cujas correntes de vida cor­rem à nossa volta e
(1861-65), que os escritores americanos venceram dentro de nós e nos convi­dam, pelos poderes que
o desafio. nos conferem, a agir em harmonia com a natureza,
por que deve­rí­amos tropeçar entre os ossos secos
Ralph Waldo Emerson (1803 - 1882) do pas­sado..? O sol também brilha hoje. Há mais
Ralph Waldo Emerson, figura mais impor­tante lã e li­nho nos campos. Há novas terras, novos ho­
de sua época, tinha um sentido reli­gioso de mis­ mens, novos pensamentos. Deixe-nos exijir nossas
são. Embora muitos o acusassem de subverter o pró­prias obras, nossas próprias leis e nossa pró­pria
cristianismo, explicava que, para ele,“pa­ra ser um forma de adoração.
bom pastor,era preciso deixar a igreja”.O discurso
proferido em 1838, em sua alma mater, a Harvard Emerson adorava o ensaísta francês Mon­taigne,
Divinity School [Fa­culdade de Teologia], fez dele gênio aforístico do século 16, e certa vez disse a
per­sona non grata naquela universidade por 30 Bronson Alcott que adoraria escrever um livro
anos. Nes­se pronunciamento, Emerson acusou a como o de Montaigne, “cheio de graça, poesia,
i­gre­ja de agir“como se Deus estivesse morto”e de negócios, divindade, filosofia, anedotas, histórias
en­­fa­tizar o dogma em detrimento do espí­rito. picantes”. Queixou-se que o estilo abs­trato de

A
filosofia de Emerson tem sido tachada Alcott omitia “a luz que brilha no cha­péu de um
de contraditória e é certo que ele cons­ homem, na colher de uma criança”.
cientemente evitou erigir uma estrutura A visão espiritual e a expressão aforística
in­te­lectual lógica, porque tal sistema racional prá­tica tornam Emerson fascinante; um dos
contrariaria sua crença romântica na intuição e trans­cen­dentalistas de Concord disse com muita
na flexibilidade. Em seu ensaio intitulado “Self- pro­­prie­dade que escutá-lo era como “subir aos
Reliance”[Autoconfiança], Emerson co­men­ta: céus num balanço”. Uma boa parcela de seu
“Uma consistência tola representa o bi­cho- discerni­mento espiritual advém de suas leituras
papão de mentes pequenas”. E, no entanto, ele é sobre religiões orientais, especialmente do
impressionantemente consistente em seu apelo hin­duísmo, confucionismo e sufismo islâmico.
ao surgimento do individualismo ame­ri­cano Seu poema “Brahma”, por exemplo, apoia-se em
inspirado na natureza. A maioria de suas ideias fontes hindus para afirmar uma ordem cósmica
principais — a necessidade de uma nova visão além da limitada per­cepção dos mortais:
nacional, o uso da experiência pessoal, a noção
de uma Sobre-Alma cósmica e a doutrina da Se o homicida vermelho pensa que matou
compensação — estão sugeridas em sua pri­ Ou se o assassinado pensa que está morto,
meira obra, Nature [Natureza] (1836). O ensaio Eles não conhecem bem os caminhos sutis
assim começa: Que sigo, percorro e retorno novamente.

Nossa era é retrospectiva. Constrói os sepulcros dos Longe ou esquecido para mim está próximo
pais. Escreve biografias, histórias, críticas. As gera­ Sombra e luz do sol são o mesmo;
ções que nos antecederam contemplaram Deus e Os deuses desaparecidos aparecem para mim;
a natureza face a face; nós, por seus olhos. Por que E um só para mim são a fama e a vergonha.
não podemos tam­bém usufruir de u­ma relação Caem em erro os que me deixam fora;

30
Quando me alçam ao vôo, sou as asas; ao nível mais simples e conseguiu
Sou o que duvida e a dúvida, viver com muito pouco dinheiro,man­
E eu, o hino que o Brâmane canta tendo portanto sua in­de­pendência.
Em essência, fez da vida sua carreira.
Os fortes deuses anseiam por minha Não-confor­mis­­ta,procurou viver sem­
permanência, pre de acor­do com seus princípios
E anseiam em vão os Sete Sagrados, rígidos. Es­­sa tentativa foi tema de
Mas Tu, modesto amante do bem! muitos de seus escritos.
Encontre-me e vire as costas para o A obra-prima de Thoreau,Walden,
céu. or,Life in the Woods [Wal­den,ou,Vida
no Bosque] (1854), foi o resultado
Esse poema, publicado no pri­ de dois anos, dois meses e dois dias
meiro número da revista Atlantic (de 1845 a 1847) passados numa
Monthly (1857), confundiu os lei­to­ cabana por ele mesmo construída,
res não familiarizados com Bra­ma, em Walden Pond, propriedade de
deus supremo dos hindus, al­ma Emerson. Em Walden, Thoreau
eter­na e infinita do universo. Emer­­ deliberada­mente condensa esse
son deu aos seus leitores o se­­guin­ tempo em um ano e o livro é cui­
te conselho: “Diga-lhes para dizer dadosamente montado de forma
Jeová em vez de Brama.” que as estações são sutilmente evo­
O crítico inglês Matthew Arnald cadas em or­dem. O livro também é
disse que as obras mais impor­tan­ organiza­do de modo que em primei­
tes do século 19, escritas em in­glês, ro lugar vêm as preocupações terre­
eram as poesias de Words­worth e os nas (na seção chamada“Economia”,
ensaios de Emerson. Gran­­de escritor, ele des­creve as despesas envolvidas
tanto em prosa co­mo em poesia, na construção de uma cabana). No
Emerson influen­ciou uma longa série final, o livro progrediu até medita­
de poetas ame­ricanos, inclusive Walt ções sobre as estrelas.
Whit­man, Emily Dickinson, Edwin Em Walden, Thoreau, amante de
Arlington Robinson,Wallace Stevens, livros de viagens e autor de vá­rios
Hart Crane e Robert Frost. Credi­ta-se Henry David Thoreau deles, dá-nos um livro antivia­gem,
também a ele influ­ência sobre os filó­ que paradoxalmente abre as frontei­
sofos John De­wey, Geor­ge San­tayana, ras interiores do autodes­co­brimento,
Frie­drich Nietzsche e William James. como nenhum livro ame­ricano fez
até o momento. Ilu­soriamente mo­
Henry David Thoreau desto, como a pró­­pria vida ascética
(1817 - 1862) de Thoreau, não é nada menos que
Henry David Thoreau, descenden­te um guia para se viver o ideal clássico
de franceses e escoceses, nasceu em de u­ma vida completa. Reunindo
Concord e lá sempre residiu.Nascido poe­sia e filo­so­fia, esse longo ensaio
numa família pobre, como Emerson, poé­tico de­safia o leitor a examinar
teve que trabalhar pa­­ra se sustentar, sua vida e a vivê-la com autentici­
esquanto estudava em Har­vard. Por da­de. A cons­trução da cabana, des­
toda a vida,redu­ziu suas necessidades Foto © The Bettmann Archive
crita em riqueza de detalhes, é uma

31
metá­fora concreta da cuidadosa informam quan­do seus animais selva­
edi­­­fi­cação da alma. Em seu diário, gens,mas não seus homens selvagens,
no dia 30 de janeiro de 1852, expli­ca foram extintos. Havia necessi­da­de de
sua prefe­rência por viver enrai­zado uma América.
num só lugar:“Receio viajar mui­­to ou
a lugares famosos senão iria dissipar Walden inspirou William Butler
completamente a mente.” Yeats, apaixonado nacionalista irlan­­­
O método de recolhimento e dês,a escrever The Lake Isle of Innisfree
con­centração de Thoreau lembra as [A Ilha Lacustre de Innis­free] en­
técnicas orientais de meditação. A quanto o ensaio de Thoreau Civil
semelhança não é acidental: co­mo Disobedience [De­­so­be­­diência Civil],
Emerson e Whitman, tam­bém foi com sua te­o­ria de resistência pacífica,
influenciado pela filosofia hindu e ba­seada na necessidade moral do
budista. Seu maior tesouro era sua ho­mem justo de desobe­decer leis
coleção de clássicos asiáticos, que injustas, serviu de inspi­ração para o
ele compartilhava com Emer­son. movi­mento de inde­pen­dência india­
Seu estilo eclético tem influ­ên­cia na liderado por Mahatma Gandhi e
dos clássicos gregos e roma­nos, é a luta de Martin Luther King pelos
cristalino, cheio de jogo de palavras direitos civis dos negros no sé­culo 20.
e tão ricamente meta­fórico quanto Thoreau é hoje o mais atraente
o dos autores metafí­sicos ingleses dos transcendentalistas, por sua
do final da Renascença. cons­ciência ecológica,  indepen­
Em Walden, Thoreau não ape­nas dên­cia e autosuficiência, seu com­
testa as teorias do Trans­cen­den­ta­ pro­misso ético com o aboli­cionis­mo
lismo, ele reence­na a experi­ên­cia e a teoria política da de­so­be­di­ência
coletiva ame­ri­cana no século 19: civil e da resistência pa­cífica. Suas
viver nas fronteiras. Tho­reau acha­va ideias parecem atu­ais e novas. Seu
que sua contribuição con­sis­tiria em estilo poético incisi­vo e o hábito de
recuperar,na lin­gua­gem,o sentido da fazer observa­ções cuida­dosas ainda
terra indo­ma­da. Seu diário contém a hoje são mui­to mo­dernos.
seguin­te entrada, sem data, em 1851:
Walt Whitman (1819 - 1892)
A literatura inglesa dos dias dos me­ Walt Whitman Nascido em Long Island,NovaYork,
nestréis até os Lake Poets, in­clu­­in­do Walt Whitman era carpinteiro em
Chaucer, Spenser, Shakes­p eare e regime de tempo parcial e homem do
Milton, não tem caráter refrescante e, povo cuja obra brilhan­te e inovadora
neste sentido, sel­va­gem. É essencial­ expressou o espírito de­mocrático do
men­te domestica­d a e civilizada, país. Whitman era praticamente um
refle­tindo a Grécia e Roma. Suas autodidata: aos 11 anos deixou a
vas­ti­­­dões são uma flo­res­ta, sua selva escola para traba­lhar,perdendo o tipo
é frondosa, seus selva­gens, Robin tradicional de educação que fazia da
Hood.Há em seus poetas muito amor maio­ria dos escritores americanos
prazeroso pela na­tu­reza, mas não há Foto, cortesia da imitadores respei­tosos dos ingleses.
muita natu­reza. Suas crônicas nos Biblioteca do Congresso
Seu Leaves of Grass [Folhas de Rel­

32
va] (1855), que ele reescreveu e revisou por toda seca,suas crianças  assitindo a tudo...  Sou o escravo
a sua vida, contém “Song of Myself” [Can­ção de caçado,estremeço a cada mordida dos cachorros...
Mim Mesmo],o poema mais incrivel­men­­te original Sou o bombeiro ferido, com o ester­no fraturado...”
escrito por um americano. Os elogios entusiasma­ Mais que qualquer outro escritor, Whit­man
dos que Emerson e alguns outros fizeram a esse inventou o mito da América democrática.“Os ame­
volume audacioso confir­maram a vocação poética ricanos,de todas as nações,em qualquer época na
de Whitman, embora o livro não tenha sido um terra, tem provavelmente a natureza poética mais
sucesso de público. aguçada.Os Estados Unidos são essencialmente o
Livro visionário que celebra toda a criação, maior poema”. Quando Whit­man escreveu essas
Leaves of Grass foi fortemente inspirado pelos palavras, audaciosa­men­te re­­ver­teu a opinião
escritos de Emerson, especialmente seu ensaio generalizada de que a Amé­rica era muito tosca e
“The Poet” [O Poeta] que antevia um poeta do nova para ser poética. Ele inventou uma América
tipo robusto,sincero e universal,  misteriosa­men­te atemporal de ima­ginação livre,habitada por espí­
parecido com o próprio Whitman.A for­ma inova­ ritos pioneiros de todas as nações. O romancista
dora, sem rima e com verso livre, sua celebração e poeta inglês D.H. Lawrence, chamou-o, muito
aberta da sexualidade,sua vi­bran­te sensibilidade apropriada­men­te, de poeta da “estrada aberta”.

A
democrática e a afirma­ção român­tica extrema grandeza de Whitman pode ser vista em mui­
de que o ser do poeta era um só com a poesia, o tos de seus poemas, inclusive em “Crossing
universo e o leitor alteraram para sempre o curso Brooklyn Ferry” [Atravessan­do na Barca do
da poesia ame­ricana. Brooklyn], “Out of the Cradle Endlessly Rocking”
Leaves of Grass é tão vasto, pleno de energia e [Fora do Berço que Balan­ça Continuamente]
natural quanto o próprio continente ameri­cano; e “When Lilacs Last in the Dooryard Bloom’d”
era o épico que gerações de críticos ameri­canos [Quando os Lilases Perdu­ram do Jardim Florido],
aguardavam, embora não o tivessem reconheci­ uma tocante elegia sobre a morte de Abraão
do.O movimento perpassa “Song of Myself” como Lincoln. Outra impor­tan­te obra é seu longo en­
música inquieta: saio “Democratic Vistas” [Vistas Democrá­ticas]
(1871), escrito durante os anos de mate­rialismo
Meus vínculos e lastros se vão... desenfreado da“Era de Ouro”da industrialização.
Contorno serras, as palmas de minhas mãos Nesse en­saio, Whitman critica merecidamente a
cobrem continentes Améri­ca,por sua indústria e riqueza multivariadas
Caminho com minha visão. e gigantescas, que encobrem uma alma “seca e
plana como o Saara”. Ele pede o surgimento de
O poema se arqueia com uma miríade de visões um novo tipo de literatura que sirva para reanimar
e sons concretos. Os pássaros de Whit­man não a população americana (“Não é tanto o livro que
são os “espíritos alados” da poesia convencional. precisa ser uma coisa acabada, e sim o leitor do
Sua “garça de crista amarela vem para a beira do livro”). Mas, em última instância, a imortalidade
pântano à noite e se alimenta de pequenos caran­ de Whitman se deve sobretudo a Song of Myself.
guejos”. Whitman parece projetar-se em tudo que Aqui ele coloca o ser Român­tico no centro da
vê ou imagina.É um homem das massas: “Viajando consciência do poema:
a cada porto atrás de pechinchas e aventuras, /
Apressando-se com a multidão moderna,ansioso e Celebro a mim mesmo e canto o meu ser,
incons­tante como qualquer outro”.Mas ele é tam­ E o que eu assumir você vai assumir,
bém o indivíduo sofredor,“A mãe de antigamente, Pois cada átomo que a mim pertence
condenada como bruxa, queimada com lenha também pertence a você.

33
A voz de Whitman eletriza até às eu­­ro­peias e procuraram criar u­ma
lei­tores modernos com sua procla­ continuidade de experiências do
mação da unidade e força vital de A­tlântico com­par­tilhadas. Esses po­e­­
toda a criação. Foi extremamente tas acadêmicos pro­curaram e­du­­car
ino­vador.Dele brotou o poema co­mo e elevar o nível da popu­la­ção pela
autobiografia, o americano comum introdução da di­men­­são euro­peia
como bardo, o lei­tor como criador e na literatura ame­­­­­­ricana. É irô­ni­co
a descoberta ainda con­tem­porânea que seu efeito global fosse con­ser­
da forma ‘experimental’ ou orgânica. vador. Insistindo em coisas e for­­mas
euro­peias, retardaram o cres­­ci­mento
OS POETAS BRÂMANES de uma consciência ame­­ricana

E
m sua época, os brâmanes distin­ta. Bem­-inten­cio­na­dos, sua for­
de Boston (como veio a ser ma­­ção conservadora os cegou para
conhecida a classe alta for­ as inovações au­da­ciosas de homens
ma­da em Harvard) eram a fonte dos como Thoreau, Whit­man (a quem
árbitros literários mais respei­tados e recusaram rece­ber so­cial­­men­te) e
verdadeiramente cultos nos Estados Edgar Allan Poe (considerado pelo
Unidos. Suas vidas se en­cai­xavam pró­prio Emerson um “rima­dor”).
num agradável padrão de riqueza e Eram os pilares da chamada“tradição
lazer ditado pela forte éti­ca de tra­ elegante”,contra a qual três gerações
balho e respeito pelo co­nhe­­cimento de realistas america­nos tiveram que
da Nova Inglaterra. lutar. Em parte de­vido à sua influên­
Na era puritana anterior, os brâ­ cia benig­na, mas insípida, passaram­
manes de Boston teriam sido pre­ -se qua­se 100 anos até que o gê­nio
gadores. No século 19, torna­ram-se ameri­c a­n o dis­t into de Whitman,
professores, geralmente em Har­vard. Melville,Poe e Thoreau fosse reconhe­
Mais velhos, por vezes ser­viam como cido nos Es­ta­dos Unidos.
embai­xadores ou recebiam títulos
ho­no­ríficos de ins­ti­tuições euro­peias. Henry Wadsworth Longfellow
A maioria deles viajou ou estudou na (1807 - 1882)
Euro­pa: esta­vam familiarizados com Henry Wadsworth Os principais poetas brâ­ma­nes
Longfellow
as ideias e livros da Grã-Breta­nha, de Boston foram Henry Wads­­­worth
Ale­manha e França, além da Itália e Longfellow, Oliver Wen­dell Holmes
Espanha. Eli­tistas por formação, mas e James Russell Lo­well. Long­fellow,
demo­cratas por simpatia, os poe­tas professor de lín­guas mo­dernas em
brâ­ma­nes leva­vam seu enfoque ele­ Har­vard, foi o mais famoso poeta
gan­­te,eu­ropei­zado a todos os Es­ta­dos a­me­ricano de sua épo­ca.Foi res­pon­­
Unidos, em palestras nos 3.000 liceus sá­vel pela vi­são nebulosa,len­dária e
(centros reservados para palestras pú­ não-histó­rica do passado,que fun­dia
blicas) e nas pá­ginas de duas revistas as tra­di­ções americana e euro­peia.
in­flu­entes de Boston, North Ame­ri­can Es­cre­­­­veu três longos po­e­mas nar­
Review e Atlantic Monthly. ra­tivos que populari­zavam lendas
Os textos dos poetas brâmanes Foto, cortesia de
nativas e usavam a métrica euro­peia
fun­diram as tradições americanas Brown Brothers — “Evan­geline” (1847),“The Song of

34
Hia­watha” [Canto de Hiawatha] (1855) e “The Oliver Wendell Holmes (1809 - 1894)
Court­ship of Miles Stan­dish” [O Noivado de Mi­les Oliver Wendell Holmes, famoso médico e
Stan­dish] (1858). professor de anatomia e fisiologia em Harvard, é
Longfellow também escreveu livros de lín­ o mais difícil dos três brâmanes mais famosos de
guas modernas e um livro de viagens, Outre-Mer categorizar, pois seu trabalho é mar­cado por uma
[Além-Mar], recontando lendas estran­gei­ras, no versatilidade refrescante. Inclui coletâ­neas de en­
formato do Sketch Book, de Wa­shington Irving. saios humorísticos (The Autocrat of the Break­fast-
Embora conven­cio­na­lis­mo, sen­­ti­­menta­lismo e Table [O Autocrata da Mesa de Ca­fé da Manhã]
superficialidade estra­guem os poemas longos, 1858), romances (Elsie Venner, 1861), biografias
os versos líricos, curtos e marcantes co­mo “The (Ralph Waldo Emerson,1885) e versos que podiam
Jewish Cemetery at New­port” [O Ce­mi­té­rio Judeu ser ligei­ros (“The Deacon’s Masterpiece” [A Obra-
em Newport] (1854), My Lost Youth [Minha Pri­ma do Diá­co­no] ou “The Wonderful One-Hoss
Juventude Perdi­da] (1855) e The Tide Rises, The Shay” [A Maravilhosa Caleche de um Cavalo]),
Tide Falls [A Ma­ré Sobe, A Maré Baixa] (1880) filo­sóficos (“The Chambered Nautilus” [O Náu­tilo
continuam agradando. Com­par­­ti­­men­talizado]) ou fervorosa­men­­te patrió­
ticos (“Old Ironsides” [O Velho Encouraçado]).
James Russell Lowell (1819 - 1891) Holmes, nascido em Cambridge, subúrbio de
James Russell Lowell, que lecionou línguas Boston onde fica a Universidade de Harvard, era
modernas em Harvard após a aposentadoria filho de um preeminente ministro local. Sua mãe
de Longfellow, é o Matthew Ar­nold da literatura era descendente da poeta Anne Bradstreet. Em
americana. Começou como poeta, mas aos sua época e mais ainda poste­riormente, simboli­
pou­cos foi per­dendo sua habi­lidade poética e zou perspicácia,in­te­ligência e charme,não como
termi­nou como respeitado crí­tico e educador. um descobridor ou desbra­vador, mas por ter
Como edi­tor do Atlan­tic e co-editor do North sido intérprete exemplar de tudo, da sociedade
American Review, Lowell foi muito influente. à linguagem, da medicina à natureza humana.
A Fable for Critics [Uma Fábula para Críticos]
(1848) de Lowell é uma avaliação engraçada e DOIS REFORMADORES

N
oportuna dos autores americanos, como neste os anos anteriores à Guerra Civil, a Nova
co­men­tá­rio: “Aí vem o Poe com seu corvo, como Inglaterra reluzia com energia intelectual.
um Bar­­na­by Rudge/Três quintos gênio e dois Algumas estrelas que hoje bri­lham mais
quin­tos de pura bobagem”. que a famosa constelação de Brâmanes fo­ram
Influenciado pela esposa,tor­nou-se refor­ma­­dor obscurecidas em vida pela pobreza ou por con­
liberal,  abolicionista e defensor do voto feminino e tingências de sexo ou raça. Leitores mo­dernos
de leis pro­i­bindo o tra­­ba­lho in­fantil. Biglow Papers, valorizam cada vez mais o trabalho do abolicio­
First Se­ries [Ensaios de Biglow, Primeira Série] nista John Greenleaf Whittier e da feminista e
(1847-48) cria Hosea Biglow,  po­eta de al­­deia sagaz reformadora social Margaret Fuller.
mas inculto que de­­fende a introdu­ção de refor­mas
em sua po­e­sia em di­a­leto.   Ben­jamin Fran­klin e John Greenleaf Whittier (1807 - 1892)
Fre­neau já haviam usa­do aldeões inteli­gen­tes co­ John Greenleaf Whittier, o poeta mais ativo da
mo porta-vozes de co­mentários so­ciais.  Lo­well es­ época, teve criação muito semelhante à de Walt
creveu no mesmo estilo,ligan­do a tradi­ção co­lonial Whitman. Nasceu e foi criado numa modesta
da ‘per­so­na­gem’ ao no­vo re­a­lismo e re­­gionalis­mo fazenda quacker em Massachusetts, teve pouca
ba­­se­ado no dia­leto,  no­va tra­di­ção que flores­ceu na educação formal e trabalhou como jornalista.
dé­cada de 1850 e amadu­receu com Mark Twain. Muitas décadas antes da causa ter-se tornado

35
popular,já era ardoroso abo­licio­nista. prisio­neiras e de loucos.Alguns des­­­ses
Whittier é respeitado por po­e­mas ensaios foram publicados no livro :
antiescravagistas como “Icha­­­bod” e Papers on Literature and Art [Textos
sua poesia é às vezes vis­ta como um sobre Literatura e Arte] (1846). Um
dos primeiros exem­plos do realismo ano antes, pu­blicou seu livro mais
regionalista. significativo,Woman in the Nineteenth
As imagens penetrantes de Whittier, Century [A Mu­lher no Século 19]. O
sua construção simples e seus dísticos texto ha­via aparecido original­mente
tetramétricos,pare­cidos com baladas, na re­vista transcen­den­ta­lista The Dial,
têm a textura simples e natural de que editou de 1840 a 1842.
Robert Burns. Sua melhor obra, o Woman in the Nineteenth Century,
longo poema “Snow Bound” [Presos escrito por Fuller, é a primeira e a
pe­la Neve], re­­cria vividamente seus mais americana análise do papel
fami­li­a­res e ami­gos já falecidos como das mulheres na sociedade. Apli­
os recor­da da infância,acon­che­ga­dos can­do com frequên­cia princípios
em volta da lareira acesa du­ran­te democráticos e transcendentalis­tas,
uma violenta tempes­tades de neve analisa aten­tamente as inú­me­ras
na Nova Inglaterra. Esse poe­ma sim­ causas sutis e as con­se­quências
ples,religioso e in­ten­samen­te pes­soal, nefastas da discrimi­nação se­xual
escrito depois do longo pesa­de­lo da e sugere medidas positivas a serem
Guerra Civil, é uma elegia aos mortos tomadas. Muitas de suas i­deias são
e um hi­no de consolo. Afirma a eter­ impressio­nante­mente mo­dernas.
ni­dade do es­pírito,o poder atem­poral Enfatiza a impor­tância da“autossufi­
do amor na lembrança e a beleza ciência”, que as mu­lheres care­cem
irredu­tível da natureza, a despeito porque “são ensi­na­­das a a­pren­der
das vio­lentas tempestades polí­ticas regras que vêm de fora e não deixá­
exter­nas. -las brotarem de dentro.”
Fuller não é simplesmente uma
Margaret Fuller (1810 - 1850) feminista, mas uma ativista e refor­
Margaret Fuller, ensaísta extraor­ ma­dora dedicada à causa da liber­
dinária, nasceu e cresceu em Cam­ dade criativa e da dignidade de
brid­ge, Massachusetts. De origem Emily Dickinson to­dos os seres humanos:
modesta, foi educada em casa pelo
pai (mulheres não podiam estudar ...Sejamos sábios e não impeçamos
em Harvard). Foi criança pro­dígio a alma... Tenhamos uma energia
nos clás­sicos e na litera­tura mo­ criativa... Deixemos que ela tome a
derna. Sua paixão mai­o r era a forma que quiser e não a prenda­mos
lite­ratura ro­mântica ale­mã, es­pe­­ pelo passado, a homens ou mulheres,
cial­mente Goethe, que ela traduziu. negros ou brancos.
Primeira jornalista profissional
de renome na América, es­cre­veu Emily Dickinson
críticas literárias influentes, além (1830 - 1886)
de reportagens sobre temas sociais Daguerreótipo, cortesia Emily Dickinson é, num certo
como o tra­tamento de mulheres Harper & Bros. sentido, um elo de ligação entre sua

36
era e a sensibilidade literária da vi­ra­da do século. uma impressionante diversidade de abordagens.
Individualista ra­dical,  nasceu e passou toda a sua Seus poemas geralmente são conhecidos pelos nú­
vida em Am­herst, pequena cidadezinha calvinis­ meros que lhes foram atribuídos na edição padrão
ta de Massachusetts.  Nunca se casou e le­­vou uma de Thomas H. Johnson, em 1955. Apresentam um
vi­da na­­da convencional,  externamente tran­quila, emprego extravagante de maiúsculas e travessões.
mas dotada de grande in­ten­sidade interior. Não-conformista, como Thoreau, ela por ve­zes
A­mava a natureza e inspi­rou-se pro­fun­da­mente invertia o sentido de palavras e frases e u­sa­va os
em pássaros, animais, plantas e a mudança das paradoxos com grande impacto. Da poesia 435:
estações, no campo, na Nova Inglaterra.

D
ickinson passou o final da vida como Muita Loucura é o sentido mais divino —
re­clusa, por sua psique extremamente sen­ Para um Olho capaz de discernir —
sível e possivelmente para arranjar tempo Muito Senso — a mais pura Loucura —
para escrever (durante alguns períodos, es­crevia É a Maioria
um poema por dia). Sua rotina também incluía Nisso, como em Tudo, prevalece —
cuidar da casa de seu pai advo­ga­do, figura de Concorde — e você é são —
destaque em Amherst que se tor­nou parlamentar. Vacile — logo será tachado de perigoso
Dickinson não tinha lido muito, mas conhe­cia E levado em cadeias —
profundamente a Bíblia, as obras de William
Shakespeare e as obras da mitologia clás­si­ca. Sua perspicácia brilha no poema 288, que
Esses foram seus verdadeiros professores: pois foi ridiculariza a ambição e a vida pública:
certamente a figura literária mais soli­tária de sua
época. Essa mulher tímida, retraí­da, de uma cida­ Não sou Ninguém! Quem é você?
dezinha,cujas obras qua­se não foram publicadas Será você — Ninguém — Também?
e lidas,criou parte do que há de melhor na poesia Então há dois de nós?
americana do século 19, além de ter fascinado Não diga! Eles vão anunciar — você
o público des­de a dé­ca­da de 1950, quando sua sabe!
poesia foi redescoberta. Como é enfadonho — ser — Alguém!
O estilo lapidar e frequentemente imagístico de Quão Público — como um Sapo —
Dickinson é ainda mais moderno e inovador que o Dizer o nome de alguém — durante todo
de Whitman.Ela nunca usa duas pala­vras,se uma é Junho —
suficiente e combina coisas con­cretas com ideias Para um brejo admirador!
abstratas num estilo con­densado,quase proverbial.
Suas melhores poe­sias não contêm excessos; Os 1.775 poemas de Dickinson continuam
muitas ridicu­la­ri­zam o sentimentalismo corrente e intri­gando os críticos, que muitas vezes discor­
algumas che­gam a ser heréticas.  Por vezes,  revela dam entre si a respeito. Alguns salien­tam seu
uma ater­radora consciência existencial.Assim co­ la­do místico, outros sua sensibilidade para com
mo Poe,ela explora as partes escuras e escondidas a natureza; alguns ressaltam seu apelo estra­nho,
da mente, dramatizando a morte e o túmulo. E, no exótico. Um crítico moderno, R.P. Blackmur, co­
entanto, também celebrava objetos sim­ples — menta que às vezes a poesia de Dickin­son nos
uma flor,  uma abelha.  Sua poesia revela grande passa a sensação de que “um gato se apro­xi­mou
inteligência e muitas vezes evoca o angustiante de nós falando inglês”. Seus versos, lim­pos, cla­
paradoxo dos limites da consci­ência humana presa ros, burilados, estão entre os mais fasci­nantes e
no tempo. Tinha um excelente senso de humor e desafiadores da literatura americana. 
tratava de uma enorme variedade de temas com

37
CAPÍTULO sociedade complexa,bem arti­cu­lada e tradicional
e compartilhavam com os lei­tores atitudes que
informavam sua ficção rea­lista. Os romancistas

4
ame­ricanos se defronta­vam com uma his­tória
de luta e revo­lução, geo­grafia de vas­tos ermos
e sociedade de­mo­­crática fluida e pouco estra­
ti­ficada. Os ro­man­­­ces ameri­canos muitas vezes
PERÍODO ROMÂNTICO revelam revo­lucionária falta de tradição. Muitos
ro­man­ces ingleses mostram um protagonista
1820-1860: FICÇÃO
pobre ascendendo econômica e socialmente
devido a um bom casamento ou des­co­berta de

W
alt Whitman, Nathaniel Hawthorne, um pas­­sa­do aris­tocrático es­con­dido. Mas essa
Herman Melville,Edgar Allan Poe, Emily tra­ma oculta não desafia a estru­tura social aris­to­
Dickinson e os transcen­d en­t a­l istas crá­tica da Inglaterra.Ao con­trário,vem con­fir­má-la.
representam a primeira grande geração literária A ascen­são da perso­na­­gem satisfaz o desejo dos
surgida nos Estados Unidos. No Ro­mantismo, a leitores, em sua maio­­ria, de classe média.
visão Romântica tendia a expres­sar-se na forma Já o romancista americano tinha que depen­
que Hawthorne denomi­nou“Romance”, um tipo der de seus próprios recursos. A América era em
elevado, emo­cional e sim­bólico de romance. Os parte uma fronteira indefinida e em cons­tante
“Roman­ces” não e­ram histórias de amor, mas movimento povoada por imigrantes falan­do lín­
obras sérias que usavam técnicas especiais para guas estrangeiras e seguindo costumes ru­­­des e es­
co­mu­­nicar sig­ni­ficados complexos e sutis. tranhos. Por isso, a per­so­nagem prin­cipal poderia
Em vez de definir cuidadosamente e em en­con­trar-se só entre uma tribo de canibais,como
detalhe perso­na­gens realistas, como fazia a mai­ em Typee de Melville, explo­rando vastidões into­
o­­ria dos romancistas ingleses ou con­­ti­nen­tais, cadas, como em Leather-Stocking Tales de Ja­mes
Hawthorne, Melville e Poe molda­ram figu­ras Fe­nimore Cooper, pre­senciando vi­sões solitá­rias
heróicas grandiosas, impreg­nadas de signi­ficado do túmulo, como os solitários de Poe, ou encon­
mítico. Os protagonistas típicos do “Ro­mance” trando o demônio caminhando na floresta,como
Americano eram atormen­tados e alie­na­dos. Young Goodman Brown de Haw­thorne. Quase
Arthur Dimmesdale, de Haw­thorne ou Hester todos os grandes pro­ta­go­nistas ame­ricanos foram
Prynne em The Scarlet Letter [A Carta Es­carlate] “solitários”. O indiví­duo de­mocrático americano
ou Ahab de Melvi­lle, em Moby-Dick e as inúmeras tinha, de certo mo­do, que inventar a si próprio.
per­so­na­gens iso­la­das e obce­ca­das dos contos de O romancista americano sério tinha que in­
Poe são prota­go­nistas soli­tá­rias que têm que en­ ven­tar novos modelos também — daí a forma
fren­tar des­ti­nos desco­nhe­cidos e obs­curos e que, es­par­ramada e idiossincrática de Moby-Dick
de modo miste­rioso,bro­tam de seus incons­cien­­­­tes de Melville e a Narrative of Arthur Gordon Pym
mais pro­fun­dos. As tramas simbólicas re­ve­lam as [Narrativa de Arthur Gordon Pym] de sonho e
ações escon­didas de um espírito angus­tiado. de­va­neio de Poe. Ainda hoje, pou­cos romances
Uma razão para a exploração fic­tí­­cia dos americanos alcançam a perfeição formal. Ao
re­côn­ditos da alma é a ausência de uma vida co­ invés de tomar empres­tado modelos literários
mu­nitária consolidada e tradicional na Amé­ri­ca. já experimentados, os americanos tendem a
Os romancistas ingleses — Jane Austen, Char­les inventar novas técnicas criativas.Na América,não
Dickens (o grande favorito), Anthony Trollope, basta ser uma unidade social tradicional e defi­
George Eliot, William Tha­ckeray — viviam numa nível, pois o velho e o tradicio­nal são deixa­dos

38
para trás; a força nova e inova­dora sível e religioso, o Reverendo Arthur
é o centro das atenções. Dimmesdale, e Hester Prynne, moça
da cidade sen­sual e bonita. Pas­sada
O ROMANCE em Boston por volta de 1650,no início

A
forma do “Roman­ce” é som­ da colonização Puritana, o roman­ce
bria e ameaçadora, indicando destaca a obsessão calvi­nista por
co­mo é difícil criar iden­ti­dade mora­li­dade, repressão se­xual, cul­pa
sem uma sociedade estável.A mai­o­ e con­fissão e salvação espiritual.
ria dos heróis românticos mor­­re no Para a época,The Scarlet Letter era
fim: todos os ma­ri­nhei­ros, com ex­ um livro audacioso e até subversivo.O
ceção de Ishmael,mor­rem afoga­dos estilo suave de Haw­thorne,o contexto
em Moby-Dick e o mi­­­nistro Ar­thur histórico remoto e a am­bi­guidade
Dimmes­­dale, sen­sível, mas pe­­­ca­­dor, ameni­zaram seus temas sombrios e
morre no fim de The Scar­let Letter. satisfizeram o pú­blico, mas escri­to­
A nota trá­­­gi­ca da própria di­visão res sofisti­cados como Ralph Waldo
na lite­ratura a­me­r icana tor­na-se Emerson e Herman Melville re­
domi­nan­te nos romances, mes­­mo conheceram o poder ‘infernal’ do
antes da Guerra Civil de 1860 ter livro. Abor­dava questões geral­mente
manifestado a tra­gédia social maior reprimidas na América do século
de uma socie­dade em guerra contra 19 como, por exemplo, o impacto
si mesma. da nova ex­pe­riência democrática e
liberta­dora no comportamento indi­
Nathaniel Hawthorne vidual, parti­cu­lar­mente na liber­dade
(1804 - 1864) se­xual e religiosa.
Nathaniel Hawthorne,quinta ge­­­ra­ O livro é maravilhosamente
ção americana descendente de ingle­ or­ganizado e muito bem escrito.
ses, nasceu em Salem, Mas­­­sa­­­chu­setts, Apropriadamente, usa a ale­go­ria,
próspero porto ao norte de Bos­ton técnica praticada pelos primeiros
especializado no comér­cio com as Pu­ritanos.
Índias Orientais.Um antepassado seu A reputação de Hawthorne deve­
havia si­do juiz no século anterior nos Nathaniel Hawthorne -se tam­­bém a outros romances e
julga­­men­tos de mu­lhe­­res acu­­­­­­sadas con­­tos. Em The House of the Seven
de bru­xaria em Salem. Haw­thorne Ga­bles (1851), ele vol­ta novamente
u­sou a ideia de uma maldição so­bre à história da Nova Inglaterra. O des­
a família de um juiz iníquo no ro­man­ moronamento da “casa” refe­re-se à
ce The House of the Seven Ga­bles [A uma família de Salem, além da casa
Casa das Se­te Cu­me­eiras]. propria­mente dita. O tema trata de
Muitas histórias de Haw­thorne se uma maldição her­dada e seu fim
passam na Nova Inglaterra Puri­tana pelo amor.Como observou um crítico,
e seu mais importante roman­ce, Holgrave, o pro­ta­go­nis­ta idealista,
The Scarlet Letter [A Letra Es­car­late] expressa a descrença democrática
(1850), transformou-se no retrato do próprio Haw­thorne em relação às
clássico da América Puri­tana.Fala da velhas famí­lias aris­to­crá­ticas:“A verda­
paixão proibida entre um jovem sen­ Foto, cortesia OWI de é que,uma vez em cin­quen­ta anos

39
pelo menos, a família deveria ser incorporada à suas obras. Embora Leather-Stocking Tales de
grande mas­sa obscura da hu­manidade e esquecer Cooper tenha conseguido introduzir famílias
seus an­cestrais.” nos ermos mais improváveis, as his­tórias e ro­

O
s dois últimos romances de Hawthorne man­ces de Haw­thorne volta e meia mostram
não foram bem sucedidos. Ambos usam fa­­mí­lias divididas, amaldiçoadas ou artificiais e
cen­ários modernos, comprometendo a os sofrimentos do indivíduo isolado.
magia do romance. The Bli­thedale Romance [O A ideologia da revolução também deve ter
Romance de Blithedale] (1852) é interes­san­te tido seu papel na glorificação da liber­dade
por retratar a comuni­da­de socia­lista e utó­pica orgu­lhosa, ainda que alienada. A Revo­lução
de Brook Farm [Fazen­da Brook]. No li­­vro, Haw­ Americana, do ponto de vista psico-histó­rico,
thorne critica os reforma­do­res sociais arro­gantes asseme­lha-se à rebelião do adolescente contra
e ávidos de po­der com ins­tin­tos pro­­fundos não a figura paterna da Inglaterra e a comu­nidade
genuinamente de­mo­crá­ticos.The Marble Faun [O mais am­pla do império britânico. Os ame­ricanos
Fau­no de Már­more] (1860), em­bora em Roma, ganha­ram sua independência e então se depara­
lida com temas pu­ri­tanos de pecado, isola­mento, ram com o dilema des­concertante de des­co­brir
expia­ção e salva­ção. sua identidade sem o referencial das ve­lhas
Esses temas e cenários da Nova Ingla­terra co­ autori­dades. Esse ce­ná­rio repetiu-se tantas vezes
lonial Puritana são marca registrada dos con­tos nas regiões de fronteira, que, na ficção, o isola­
mais conhecidos de Hawthorne: “The Mi­nis­­ter’s mento parece ser condição básica de vida dos
Black Veil” [O Véu Negro do Pregador], “Young ame­ri­canos. O puritanismo e suas ramificações
Goodman Brown” [O Jovem Good­man Brown] pro­tes­tantes pode ter enfraquecido ainda mais
e “My Kinsman, Major Molineux” [Meu Colega, a família, ao pregar que a primeira res­ponsabi­
Major Molineux].Neste,um jo­­vem ingê­nuo do in­ lidade do indivíduo é salvar sua própria alma.
terior vem à cidade — trajeto comum na América
do século 19 em crescente urbani­za­ção — para Herman Melville (1819 - 1891)
pedir ajuda a um parente po­de­ro­so a quem Herman Melville, como Haw­thorne, descen­
não conhecia. Robin tem mui­ta di­fi­culdade em dia de família antiga e rica que, com a mor­te
encontrar o major e acaba se unindo a uma es­ do pai, caiu repentinamente na pobreza. Apesar
tranha revolta notur­­na na qual um homem, que da criação sofisticada, das orgulhosas tradi­ções
parece um cri­­mi­noso em des­graça, é cô­mica e familiares e do trabalho ár­duo, Melville se viu
cruel­mente expulso da ci­­­da­de.Robin ri mais alto pobre e sem edu­ca­ção universitária. Aos 19
que os outros até des­­co­brir que esse “cri­mino­so” a­nos, foi para o mar. Seu interesse pela vida
nada mais é que o ho­­­mem por ele pro­curado dos marinheiros brotou naturalmente de suas
— um repre­sen­tante inglês recém-de­pos­to pela próprias ex­pe­ri­ências e muitos de seus primei­ros
turba de revo­lucio­ná­­rios americanos. A história roman­ces inspiraram-se nestas viagens. Ne­les,
con­firma o elo de pecado e sofrimento compar­ vemos a experiência am­pla e demo­crática de
ti­lha­do por toda a humanidade.Tam­bém res­sal­­ta Melville e seu horror à tirania e à in­jus­tiça. Seu
o tema do ho­mem que se faz sozinho: Robin pri­meiro livro, Typee, baseou-se no con­ví­vio com
tem que apren­der, como qual­quer ame­ricano os Taipis, das Ilhas Marquesas, no Pací­fico Sul, su­
democrático, a prosperar por seu traba­lho árduo postamente cani­bais, mas muito hospitaleiros. O
e não por favo­res especiais de paren­tes ricos. livro elogia a tribo,  sua vida na­­tu­ral e harmoniosa
My Kinsman, Major Molineux ilustra um dos e critica os mis­sio­nários cris­­tãos, que Melville
elementos mais notáveis na ficção de Haw­ con­siderou menos civiliza­dos que os povos que
thorne: a ausência de famílias operacionais em tinham vin­do converter.

40
Moby-Dick; or The Whale [Moby- rém, que os seres hu­ma­nos possam
Dick ou A Baleia], obra-prima de ‘ler’ a ver­da­de na na­tu­reza, co­mo se
Melville,é o relato épico do baleeiro ima­gina em Emerson. Por trás do
Pequod e seu Capitão Ahab, um acú­mulo de fatos de Mel­ville,há uma
“semideus per­­verso”, cuja caça ob­ visão mís­tica — mas não fica claro
ses­siva à baleia branca Moby-Dick se essa visão é má ou boa, humana
levou o navio e sua tripulação à ou desu­mana.
des­truição.  A obra, romance realista O romance é moderno em sua
de aventura, con­tém uma série de tendência reflexiva ou de autorrefe­
reflexões so­bre a condição huma­ rência. Em outras pa­la­vras, o ro­man­
na. A caça à ba­leia, em todo o livro, ce é muitas vezes sobre ele mesmo.
é a grande metáfora para a busca Melville frequen­temente comenta os
do conhe­cimento. Classificações e processos mentais co­mo a escrita, a
descrições realistas de ba­leias e da leitura e a com­pre­ensão.Um capítulo,
indústria baleeira povoam o livro, por exem­plo, é um estudo exaustivo
mas têm co­no­tações simbólicas. que o nar­ra­dor tenta classificar mas
No capítulo 15, “The Right Whale’s acaba por desis­tir, alegando que
Head”[A Cabeça da Baleia Direita], nada grande pode vir a ser con­
o nar­­rador diz que a Baleia Direita é cluído (“Não permita Deus que eu
es­tóica e que a Baleia Cachalote é um dia conclua alguma coisa. Todo
pla­tônica, refe­rin­do-se a duas esco­ este li­vro não passa de um rascu­
las clássicas de filosofia. nho — nem isso: o ras­cunho de um
Embora o ro­mance de Melville ras­cunho. Ó Tem­po, Força, Dinhei­ro
seja filosófico, também é trágico. e Paciência”). A noção de Mel­ville
A­pe­sar de seu heroísmo, Ahab é sobre o texto lite­rário como uma
condenado e talvez amaldiçoado no versão imper­feita ou um ras­cunho
final.A natureza, ain­­­­­da que bela, per­ abandonado é bem con­tem­po­rânea.
ma­nece estranha e potencial­men­te Ahab insiste em imaginar um
fatal. Em Moby-Dick, Mel­ville desafia mun­do heróico, atemporal, de ab­
a ideia oti­mista de E­mer­son de que so­lutos, em que pode ser superi­or a
os homens podem com­pre­ender herman Melville seus homens. Tolamente, exi­ge um
a natureza. Moby-Dick, a grande texto acabado, uma res­pos­ta. Mas o
ba­leia branca, é um ser cósmico, romance mos­tra que, assim como
i­nes­crutável, que do­mina todo o ro­ não existem textos acabados, não
mance à medida que ob­ceca Ahab. há também respostas finais, a não
Fa­tos so­bre ba­leias e so­­bre a caça às ser, talvez, a morte.
baleias não podem explicar Moby- Certas referências literárias res­
Dick; ao con­trá­rio, os próprios fatos so­am em todo o romance. Ahab,
tendem a se tor­nar símbolos e todo que é o nome de um rei do Velho
fa­to está obs­cu­ramente relacionado Testamento,deseja um conhe­ci­men­
a todos os demais,numa rede cósmi­ to total,faustiano,quase divi­no.Como
ca. Es­sa ideia de cor­res­pondência o Édipo na tragédia de Sófocles,
(como Melville a denomina no Retrato, cortesia Biblioteca que paga caro pelo conhe­cimento
do Harvard College
capítulo Sphinx) não sig­nifica, po­ indevido, Ahab fica cego antes de

41
ser ferido na perna e final­­mente mor­to.  Moby-Dick a importância da amizade e da comu­nidade
termi­na com a palavra“órfão”. Ishmael,o narrador, multicul­tural.Depois do naufrágio,Ish­mael é salvo
é um viajante meio órfão. O nome Ishmael emana pelo caixão entalhado por seu gran­de amigo,
do livro do Gênesis, no Velho Testamento — era Queequeg, príncipe da Polinésia e he­rói­co arpo­
filho de Abraão e Hagar (serva de Sara, esposa ador tatuado. As figuras primitivas e mitológicas
de Abra­ão). Ish­mael e Hagar foram lançados ao entalhadas no caixão incorporam a história dos
deserto por Abraão. cosmos. Ishmael é salvo da morte por um objeto
Existem outros exemplos.Raquel (uma das es­ de morte. Da morte, surge a vida, no final.
posas do patriarca Jacó) é o nome do barco que Moby-Dick tem sido chamado de‘épico natural’
resgata Ishmael, no fim do livro. Por fim, a baleia — magnífica dramatização do espírito hu­ma­no en­
metafísica lembra a judeus e cristãos a his­­­tória bí­ cenada na natureza primitiva — por causa do mito
blica de Jonas, lan­çado ao mar por seus colegas do caçador,do tema da iniciação,do simbolismo da
marinheiros, por ser considerado objeto de má- ilha paradisíaca,da abor­dagem positiva dos povos
sorte. O texto bíblico diz que foi engolido por pré-tec­nológicos e da busca do renascimento. Ao
um ‘grande peixe’ e viveu algum tempo dentro colocar a huma­nidade sozinha na na­tureza, é
do seu ventre, antes de ser devol­vido à terra essencial­men­te americana. O escritor e político
firme pela inter­venção de Deus. Ao tentar fugir francês Alexis de Tocqueville havia predito,em sua
do sofrimento, só fez provocar sofrimento ain­da obra Democracy in America [Democracia na Amé­
maior para si mesmo. rica] de 1835,que esse tema iria surgir na Amé­ri­ca,
O romance é também enriquecido por refe­ como resultado de sua democracia:
rências históricas. O barco Pequod tem o nome
de uma tribo indígena extinta da Nova In­gla­terra; Os destinos da humanidade, o próprio homem
o nome sugere, portanto, que o barco es­tá fadado alheio ao seu país e à sua era, na presença da
à destruição.A caça de baleias era de fato uma im­ Natureza e de Deus,com suas paixões,dúvi­das,raras
portante indústria, sobretudo na Nova Inglaterra: inclinações e miséria inconcebível, se­rão o princi­
fornecia óleo, uma impor­tante fonte de energia, pal, senão o único, tema da poesia (americana).
especialmente para lâm­padas. Assim, a baleia
literalmente ‘ilumina’ o universo.A caça às baleias Tocqueville pondera que,numa democracia,a
era também ine­ren­­temente expan­sionista e ligada literatura versaria sobre “as profundezas ocultas
à ideia de um destino manifesto, por exigir que da natureza imaterial do homem”, em vez de
os ameri­canos navegassem por todo o mundo à meras aparências e distinções superfi­­ciais,como
pro­cura das baleias (na realidade,o estado do Ha­ classe e status. É certo que tanto Moby-Dick quan­
vaí tornou-se possessão americana porque era a to Typee, assim como Adventures of Huckleberry
principal base de reabastecimento para os navios Finn e Walden, encai­xam-se nessa descrição.
baleeiros americanos). A tripulação do Pequod Representam celebra­ções da natureza e subver­
representa todas as raças e diversas religiões, o sões pastoris da civilização urbana estratificada
que sugere a ideia da América como um estado socialmente.
de espírito universal, além de um cal­­deirão de
culturas. Por fim, Ahab encarna a versão trágica Edgar Allan Poe (1809 - 1849)
do individualismo democrático americano. Ele O sulista Edgar Allan Poe com­partilha da
afirma sua digni­dade como indi­víduo e ousa visão metafísica e sombria de Melville,que re­ú­ne
opor-se às forças externas inexo­ráveis do universo. elementos de realismo, paró­dia e burlesco. Ele
O epílogo do romance abranda a trágica des­ aperfeiçoou o gê­nero do con­to e inventou a fic­
truição do barco.Por toda a obra,Melville enfatiza ção policial. Muitas de suas histó­rias prefi­guram
42
os gêneros de fic­ç ão científica, cená­rios góticos ber­rantes não são
horror e fantasia,hoje tão populares. meramente de­co­rativos. Refletem o
A curta e trágica vida de Poe foi interior ex­ces­sivamente civili­zado
atormentada pela insegurança. Co­ mas inerte da psique perturbada de
mo tantos outros grandes escri­to­res suas per­sonagens. São expres­sões
americanos do século 19, Poe ficou simbóli­c as do subconsciente e,
órfão muito cedo. Seu es­tra­n ho portanto, cerne de sua arte.
casamento, em 1835, com sua prima A poesia de Poe, como a de
Virginia Clemm, de 14 anos incom­ mui­tos sulistas, era muito musical e
pletos, foi inter­pretado como uma de métrica rígi­da. Seu poema mais
tentativa de encontrar a vida familiar conhecido, tanto em vida como ho­
estável que tanto lhe fazia falta. je, é “The Raven” [O Corvo] (1845).

P
oe acreditava que a estra­ Nes­se poema lúgubre, o narrador
nheza era um ingrediente assombrado e insone lê e lamenta
essencial da beleza e seus a morte de sua ‘falecida Lenore’
textos são muitas vezes exó­ti­cos. quan­do, à meia noite, recebe a visi­
Suas histórias e poemas es­tão ple­ ta de um corvo (pássaro que come
nos de aris­tocratas intros­pec­­­­tivos carne morta, portanto, um símbolo
e predestinados (Poe, co­mo vários da morte) que pousa em cima de
sulistas, nutria ideal a­ris­to­crata). As sua porta e repete agourentamen­te
persona­gens me­­lan­­cólicas pare­cem o famoso refrão do poema, ‘nun­ca
nunca tra­ba­lhar ou ter vida social; ao mais’(nevermore).O poema ter­mina
contrá­rio, en­ter­ram-se em cas­telos numa cena de morte-em-vida:
escu­ros e de­­ca­dentes, simboli­ca­
mente de­co­ra­dos com tapetes e E o Corvo, sem adejar, ainda
tapeçarias bi­zar­­ras que escondem o está pousado, ainda pousado
mundo re­al de sol, janelas, paredes No pálido busto de Palas,
e pisos. Cômodos secretos re­ve­lam em cima da porta de meu quarto;
antigas bi­bliotecas, estra­nhas obras E seus olhos têm toda a aparência
de arte e objetos orien­tais ecléticos. dos de um demônio que sonha,
A­r is­­tocratas tocam instrumentos Emily Dickinson E a luz da lâmpada sobre ele
mu­sicais ou lêem li­vros anti­gos, en­ no chão espraia sua sombra;
quan­to remoem suas tragédias,co­mo E minha alma, daquela sombra
a morte de entes queri­dos.Te­mas de que paira sobre o chão
mor­te-em-vida, es­pe­cial­men­te ser Será levantada — nunca mais!
en­ter­ra­do vivo ou voltar do túmulo
como vampiro, apare­cem em várias As histórias de Poe — como as
o­bras, como “The Pre­mature Burial” citadas cima — foram descritas
[O Enter­ro Pre­­ma­­­turo], “Ligeia”, como histórias de horror. Contos
“The Cask of A­mon­tilla­do” [Barril como “The Gold Bug” [O Escarave­lho
de Amon­tilla­do] e “The Fall of the Dourado] e “The Purloined Letter” [A
House of Usher” [A Que­da da Casa Carta Furtada] são mais nar­rativas
de Usher]. O rei­no crepuscular de de raciocínio ou argu­men­­tação. As
Poe entre a vi­­da e a morte e os Foto © The Bettmann Arquive his­tórias de horror pre­fig­ uram o­bras

43
de autores ame­ri­canos de fantasia de horror,como va­lorização dos símbolos ocorrida no século
H.P.Lovecraft e Ste­phen King,já os contos de raciocí­ 19 — a tendência de misturar promiscuamente
nio são precursores da ficção policial de Dashiell objetos de arte de várias eras e lugares, privan­
Hammett, Ray­mond Chandler, Ross Macdonald e do-os de sua identidade e reduzindo-os a itens
John D.MacDonald.Havia indícios também daquilo decorativos numa coleção. O caos de estilos
que viria a ser a ficção científica.Todas essas histó­ resultante era particularmente aparente nos
rias revelam o fascínio de Poe pela mente humana Estados Unidos, que muitas vezes carecia de
e o per­tur­bador conhecimento científico que estilos próprios tradicionais. Essa mescla re­flete
estava secu­larizando radical­men­te a cosmovisão a perda de sistemas coerentes de pensa­mento, já
do século 19. que a imigração, urbani­zação e indus­trialização
Em todos os gêneros, Poe explora a psique. cortaram as raízes familiares e os modos tradi­
Profundas introvisões psicológicas faíscam em cionais. Na arte, essa confusão de símbolos ali­
suas histórias. “Quem já não cometeu mais de mentou o gro­tesco, ideia que Poe explicitamente
cem vezes um ato vil ou estúpido, pela simples transformou em tema de sua clássica coleção
razão de saber que não deveria fazê-lo”, lemos de contos Tales of the Grotes­que and Arabesque
em “The Black Cat” [O Gato Preto]. Para explorar [Contos do Grotesco e do Arabesco] (1840).
os aspectos exóticos e estra­nhos dos processos
psicológicos, Poe mer­gu­lhou em relatos de lou­ ESCRITORAS E REFORMADORAS

A
cura e extrema emo­ção. O estilo penosa­mente s mulheres americanas suportaram mui-
inten­cional e as ex­pli­cações elaboradas nas tas desigualdades no século 19: não po-
histórias inten­sificam a sensação de hor­ror, por diam votar, eram barradas nas es­colas
tor­narem os eventos vívidos e plausíveis. profissionalizantes e universidades, não podiam
Sua combinação de decadência e primiti­ falar em público nem participar de con­venções
vismo romântico atraía fortemente os europeus, públicas e não podiam ter propriedades. Apesar
particularmente os poetas franceses Stéphane de todos esses obstáculos, uma forte re­de de
Mallarmé, Charles Baudelaire, Paul Valéry e Ar­thur mulheres surgiu. Através de cartas, ami­­zades
Rimbaud.  Mas Poe não é não-ameri­ca­no,  apesar de pessoais, reuniões formais, jornais fe­mi­ninos e
seu desprezo aristo­crático pela democracia,prefe­ livros,as mulheres promoveram mu­danças sociais.
rência pelo exótico e temas de desumanização.  Ao Mulheres intelectuais traçaram parale­los entre
con­trá­rio, é quase um exem­plo literal da previsão elas e os escravos. Cora­josamente, exi­­giram refor­
de Tocqueville que a democracia americana mas fundamen­tais,como a abo­lição da escravidão
produziria obras que desvendariam as partes mais e o voto femi­nino,a despeito do ostracismo social
profun­das e ocul­tas da psique. Ansiedade profun­ e às vezes a ruína finan­cei­ra. Suas obras eram
da e insegu­rança psíquica parecem ter ocorrido a vanguar­da da expres­são intelectual de uma
primeiro na América que na Europa,  já que os euro­ tradição literária femi­nina maior e que incluía
peus tinham ao menos uma estrutura social rígida e o romance sentimental. Romances sentimen­tais
complexa que lhes dava segurança psicológica.Na femininos, co­mo Uncle Tom’s Cabin [A Cabana
América, não havia segurança compensató­ria; era do Pai To­más], de Harriet Beecher Stowe, eram
cada homem por si. Poe des­creveu com precisão muito popu­lares. Despertavam as emoções e, não
o outro lado do sonho americano do ho­mem que raro, dra­ma­tizavam questões so­­ciais polêmicas,
se faz por si próprio e mostrou o preço cobrado so­bre­tudo aquelas atinentes à família e ao papel
pelo materialismo e pelo excesso de competição e responsabilidades das mulheres.
—solidão, alienação e imagens de morte-em-vida. A abolicionista Lydia Child (1802 - 1880), que
A ‘decadência’ de Poe também reflete a des­ muito influenciou Margaret Fuller, era uma das

44
líderes dessa rede. Seu popular romance de 1824, nário Revolution. Presidente da Woman Suffrage
Hobomok, mostra a necessidade de to­lerância Association por 21 anos, liderou a luta pelos
racial e religiosa.  Seu cenário — a ci­­dade Puritana direitos da mulher. Discursou publicamente em
de Salem, Massachusetts — antecipou Nathaniel vários estados,em parte para sustentar a educação
Hawthorne. Ativista, Child fundou uma escola de seus sete filhos.
particular para moças,fun­dou e editou o pri­mei­ro Depois da morte de seu marido, Stanton apro­
jornal para crianças nos Estados Unidos e publi­ fundou sua análise das desigualdades entre os
cou em 1833 o pri­meiro tratado anti­escravagista, sexos. Seu livro The Woman’s Bible [Bí­blia da
An Appeal in Favor of that Class of Americans Mulher] (1895) discerne uma profunda tendência
Called Africans [Apelo em Prol Daquela Classe de antifeminina na tradição judaico-cristã.Discursou
Ame­ri­canos Chamados Africanos]. Esse trabalho sobre temas como divórcio, direitos da mulher e
au­da­cioso tornou-a muito conhecida e arruinou­ religião até sua morte, aos 86 anos, pouco depois
-a fi­­nan­ceiramente. Sua History of the Condition de escrever uma car­ta ao Presidente Theodore
of Women in Various Ages and Nations [His­tó­ria Roosevelt, em favor do voto feminino. Suas nu­
da Condição das Mulheres em Várias Épocas e merosas obras — ini­cialmente sob pseudônimo e
Nações] (1855) defende a igualdade das mulheres mais tarde com seu próprio nome — incluem três
relatando seus feitos históricos. volumes da History of Woman Suffrage [História
Angelina Grimké (1805-1879) e Sarah Grim­ do Su­frágio da Mulher] (1881-1886), escritos em
ké (1792-1873) eram de grande fa­mília de ricos parceria, e uma autobiografia franca e jocosa.

S
senhores de escravos na ele­­gante Char­leston, ojourner Truth (c.1797-1883) é a epítome
na Caro­lina do Sul. Ambas se transferiram pa­ra da perseverança e do carisma desse grupo
o Norte, para defender os direitos de ne­gros e extraordinário de mulheres.Nascida escra­
mulheres. Co­mo porta-vozes da Socie­da­de An­ va em Nova York,cresceu falando ho­landês.Fugiu
tiescra­va­gista de Nova York, foram as primei­ras de seu cativeiro em 1827, instalando-se, com
a falar em público, inclusive para homens. Em um casal de filhos, junto à acolhedora família
cartas,en­saios e estudos,traça­ram para­le­los entre Van Wagener, de origem ho­lan­desa, para quem
racis­mo e dis­crimina­ção se­xual. traba­lhava como empre­gada. Eles a ajudaram
Elizabeth Cady Stanton (1815-1902), abo­ a ganhar a batalha legal pela liberdade de seu
licionista e ativista de direitos femininos, viveu filho e ela adotou o nome da família. Resolveu
certo tempo em Boston, onde foi amiga de Lydia tomar rumo próprio, tra­balhando com um pastor
Child.Com Lucretia Mott,orga­ni­zou a Conven­ção para converter prosti­tutas ao cristianismo e viveu
de Seneca Falls pelos Direitos da Mulher; redigiu num lar comu­nitário progressista. Foi batizada
também Declaration of Sentiments [Declaração ‘Sojourner Truth’ [Viajante Verdade] pelas vozes
de Sentimentos] da Convenção. Sua ‘Declaração e visões místicas que passou a ter.  Para difundir a
de Independência da Mulher’ começa com ver­dade desses ensinamentos visionários, viajou
“homens e mulheres são criados iguais” e inclui só,  por mais de três décadas,proferindo pales­tras,
uma reso­lução para dar às mu­lheres direito cantando músicas evangélicas e pre­gando o
ao voto. Com Susan B. Anthony, Elizabeth fez abolicionismo em muitos Estados. Encorajada
campanha em favor do sufrágio para mulheres por Elizabeth Cady Stanton, de­fen­deu o su­frá­gio
nas décadas de 1860 e 1870, formou a anties­ da mulher. Sua vida é con­ta­da por Narra­tive of
cravagista Women’s Loyal Na­tio­nal Lea­gue (Liga Sojourner Truth [Nar­rativa de ‘Viajante Verdade’]
Nacional das Mulheres Leais) e a National Woman (1850), relato auto­biográfico transcri­to e editado
Suffrage Association (Asso­cia­ção Nacional Para o por Olive Gilbert.  Analfabeta toda sua vida,falava
Sufrágio das Mulheres) e foi co-editora do sema­ inglês com sotaque holandês. Conta-se que certa

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vez, acusada de ser um homem, Estados Unidos inflamou o debate
desnudou o peito numa convenção que em uma década con­duziria à
sobre os direitos da mu­lher.Tornou- Guerra Civil Americana (1861-1865).
se lendária a resposta por ela dada São óbvias as razões do sucesso
a um homem que afirmou ser a de Uncle Tom’s Cabin. Ele re­fle­tia
mulher o sexo fraco: a ideia de que a escravidão nos
Es­tados Unidos, nação que apa­ren­
Já arei e plantei e ajuntei em feixes, e temente encarnava a demo­cra­cia
nenhum homem me vencia! E não e a igualdade de todos, era uma
sou mulher? Podia trabalhar como in­justiça de proporções colossais.

S
homem e comer como homem towe era uma representante
— quando podia — e aguentar as perfeita dos velhos Puritanos
chicotadas também! E não sou da Nova Inglaterra. Seu pai,
mulher? Tive treze filhos e vi quase irmão e marido eram todos instru­
todos serem vendidos como escra­vos ídos e conhecidos clérigos e refor­ma­
e quando clamei com minha dor de dores protestantes. Stowe con­ce­beu
mãe, ninguém a não ser Jesus me a ideia para o romance — numa
ouviu! E não sou mulher? visão de um velho escravo, todo es­
farrapado,sendo açoitado — quando
Essa oradora humorística e irre­ participava de um culto religioso.
verente já foi comparada aos gran­des Mais tarde, disse que o ro­mance foi
cantores de blues. Harriet Bee­cher inspirado e “escrito por Deus”. Sua
Stowe e muitos outros encon­tra­ram motivação foi pai­xão religiosa de re­
sabedoria nessa mulher negra visio­ formar a vida,tor­nando-a mais piedo­
nária capaz de exclamar, “Senhor, sa. O perío­do romântico introduzido
Senhor, posso amar até os brancos!” uma era de sentimentos: As virtudes
da fa­mília e do amor de­ve­riam reinar
Harriet Beecher Stowe su­premos. O romance de Stowe a­ta­
(1811 - 1896) cava a escravidão precisamente por
O romance de Harriet Beecher violar valores domésticos.
Stowe, Uncle Tom’s Cabin or Life Uncle Tom, escravo e perso­
Among the Lowly [Cabana do Pai Harriet nagem central, é um verdadeiro
To­más ou Vida Entre os Humildes] Beecher Stowe már­­tir cristão que se esforça por
foi o livro americano mais popular converter seu bondoso dono, St.
do século 19.Publicado inicial­mente Clare, reza por sua alma quando
em capítulos,  pela revista National Era este está morrendo e é morto ao
(1851-1852), tor­nou-se sucesso ime­ de­­fender mulheres escravas. A es­
diato. Só na In­glaterra, foi publicado cravidão é retratada como maléfica,
por 40 edi­tores e logo traduzido pa­ra não por razões políticas ou filo­só­
20 lín­guas, recebendo elogios de au­ ficas, mas sobretudo porque divide
tores como Georges Sand na França, famílias, destrói o amor familiar
Heinrich Heine na Ale­ma­nha, e I­van e é ineren­temente an­ticristã. As
Turgenev na Rús­sia. Seu apelo apai­ Foto, cortesia ce­nas mais como­ven­tes mostram
Culver Pictures, Inc.
xonado pelo fim da escravidão nos uma escrava an­gus­tiada, incapaz

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de ajudar seu filho que chora, e abriu no teto. Final­mente, escapou
um pai vendido e separado de sua para o Norte e se fixou em Rochester,
fa­mília. Esses eram crimes con­tra a Nova York, onde Frederick Douglass
santidade do amor domés­tico. publicava o jornal antiescravagista
Originalmente, o romance não North Star e perto de on­de (Seneca
tinha a intenção de atacar o Sul. Falls) acabava de ser rea­lizada uma
De fato, Stowe havia visitado o Sul, con­ven­ção dos direitos da mulher.
gostava dos sulistas e os retratou com Ja­cobs fez amizade com Amy Post,
benevolência. Sulistas se­nho­res de abo­li­cionista e feminista quacker,
escravos são bons e tra­tam Tom bem. que a encorajou a es­crever sua au­
St. Clare,  pesso­al­mente, abomina to­­bio­grafia. In­cidents in the Life of a
a escravidão e tem a in­ten­ção de Slave Girl [Incidentes naVida de uma
libertar todos os seus es­cravos. Já o Jovem Escrava], publi­cado em 1861
senhor cruel,Simon Le­gree,é do nor­ com o pseudônimo de“Lin­­da Brent”,
te e o vilão.Ironi­camente,o romance foi editado por Lydia Child.  Condena
tinha a inten­ção de reconciliar norte aber­tamente a exploração sexual de
e sul, que estavam à beira da Guerra es­cravas ne­gras. Tanto o livro de Ja­
Civil uma década depois. No fim, cobs,como o de Douglass,  são parte
porém,foi usado por abolicionistas e do gênero de narrativa de escravo,
ou­tros como polêmica contra o Sul. iniciado por Olaudah Equiano na
era colonial.
Harriet Jacobs (1818 - 1896)
Nascida escrava na Carolina do Harriet Wilson (c. 1807 - 1870)
Norte, Harriet Jacobs aprendeu a ler Harriet Wilson foi a primeira afro­
e escrever com sua senhora. Com a -americana a publicar um romance
morte desta, foi vendida pa­ra um nos Estados Unidos — Our Nig: or,
senhor branco, que tentou forçá-la Sketches from the Life of a Free Black,
a ter relações sexuais.Ela lhe resistiu, in a two-storey white house, North.
encontrando outro aman­te branco showing that Sla­very’s Shadows
com quem teve dois filhos, que Fall Even There [Nosso Nego: ou
foram viver com sua avó. “Parece Ilustrações da Vi­da de Uma Negra
Frederick Douglass
menos degradante entre­gar-se a Livre, Numa Ca­sa Branca de Dois
alguém do que sujeitar-se à coação”, Andares, no Nor­te. mostrando que
escreveu ela com im­pres­sionante as Sombras da Escravidão Chegam
franqueza. Ela esca­p ou de seu Até Mesmo Lá] (1859). O romance
senhor e espalhou o boato de que dramatiza rea­lis­ticamente o casa­
havia fugido para o Norte. mento de uma mu­lher branca
Apavorada em ser pega e voltar com um ho­mem ne­gro e também
pa­­ra a escravidão e o castigo,pas­sou descreve a vida difícil de uma serva
quase sete anos escondida na cidade negra nu­ma ca­­sa cristã próspera.
de seu senhor, no pequeno sótão Inicialmente considerada autobio­
es­cu­ro da casa de sua avó. Era sus­ grá­fica, hoje acredita-se que seja
Foto-ambrotipo, cortesia
tentada pelas olhadelas que dava em National Portrait Gallery, obra de ficção.
seus amados filhos por orifícios que Smithsonian Institution Como Jacobs, Wilson não pu­

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blicou seu livro com seu próprio nome (Our Nig em 1892),a melhor e mais po­pular das“narrativas
era uma ironia), e sua obra es­teve esquecida até de escravos”.Essas nar­rativas,ge­ralmente ditadas
recentemente. O mes­mo pode ser dito da obra por negros anal­fa­betos a abo­licionistas brancos
da maioria das escritoras da época. O famoso e usadas como propaganda, eram bem conhe­
estudioso afro-ame­ricano, Henry Louis Gates, cidas nos dias que ante­ce­deram a Guerra Civil.
Jr. — no seu papel de levar adiante o projeto de A narrativa de Dou­glass é intensa e bem escrita
ficção negra — reeditou Our Nig em 1983. e nos dá in­trovisões únicas da mentalidade da
escra­vi­dão e agonia que essa instituição cau­sava
Frederick Douglass (1817 - 1895) aos negros.
O mais famoso líder afro-americano anti­ A “narrativa de escravo” foi o primeiro gênero
escravagista e orador negro da época, Frederick literário de prosa negra nos Estados Unidos.
Douglass nasceu escravo numa propriedade em Ajudou os negros na difícil tarefa de estabelecer
Maryland. Sua sorte foi ser mandado,  quando jo­ uma identidade afro-americana em meio a uma
vem,  para Baltimore,  cidade relativamente liberal, América branca e continuou a exercer impor­
onde aprendeu a ler e escre­ver. Fugindo para tante influência nas técnicas de ficção e nos
Massachussetts em 1838, aos 21 anos, Douglass temas adotados pelos negros em todo o século
foi ajudado pelo editor abolicionista William 20. A busca de uma identidade, o ódio contra a
Lloyd Garrison e passou a palestrar em reuniões discriminação e a sensação de viver uma vida
de sociedades antiescravagistas. clandestina, invisível, ameaçada, não reconhe­
Em 1845, publicou Narrative of the Life of cida pela maioria branca, ainda aparece em
Frederick Douglass, An American Slave [Nar­ obras de escritores americanos negros do séc­ulo
rativa da Vida de Frederick Douglass, Um Es­cra­vo 20, tais como Richard Wright, James Baldwin,
Americano] (segunda versão em 1855 e re­vista Ralph Ellison e Toni Morrison. 

48
CAPÍTULO
neses e filipi­nos foram importados por grandes
agri­cultores no Havaí, ferro­vias e outras empresas

5
americanas na costa oeste.
Em 1860, a maioria dos americanos vivia em
fazendas ou em pequenas vilas, mas em 1919
metade da população se concen­trava em cerca
de 12 grandes cidades.Surgi­ram pro­ble­mas de ur­
ASCENÇÃO DO REALISMO: banização e indus­trializa­ção:  habi­tações pobres
1860-1914 e superlotadas,  con­di­ções  insalu­bres,  salários
baixos (chamados de “salário escra­vo”), condi­

A
Guerra Civil Americana (1861-1865) entre ções difíceis de traba­lho e limi­tes inadequados
o Norte industrializado e o Sul agrícola e aos empre­sários.  Os sindi­catos cres­ce­ram e as gre­
escravagista foi um divisor de águas na ves trouxe­ram as difi­cul­da­des dos trabalha­dores
história americana. O inocente otimismo da à cons­ciência na­cio­nal. Os agricultores também
jovem nação democrática cedeu lugar, depois se viram lu­tando contra “inte­resses financeiros”
da guerra,a um período de exaus­tão.O idea­lismo do Leste, os chama­dos ‘barões ladrões’, como
americano sobreviveu, mas foi redirecio­nado. J.P. Morgan e John D. Rockefeller. Seus bancos no
Antes da guerra, os idealistas defendiam os leste contro­la­vam com mão de ferro hipo­tecas e
direitos humanos, especialmente a abolição da cré­dito, tão vitais para a agricultura e o desenvol­
escravatura; depois da guerra, os americanos ide­ vimento do Oes­te,enquanto empre­sas ferro­viá­rias
alizavam mais e mais o progres­so e o homem que co­bra­vam carís­simo para trans­por­tar produtos
se faz por si próprio. Essa foi a era do in­dus­trial agrícolas até as cida­des. O agricul­tor aos poucos
milionário e do especu­lador, quando a evolução se tornou objeto de ridículo, sati­ri­zado como
darwiniana e a ‘sobre­vi­vência do mais adaptado’ caipira (hick) ou jeca (rube). O ame­ri­­cano ideal
pareciam san­cionar métodos pouco éticos do do período pós-Guerra Civil passou a ser o mi­lio­
magnata indus­trial bem-sucedido. nário. Em 1860, havia me­nos de 100 milio­nários;
Os negócios prosperaram depois da guerra. A em 1875, já eram mais de 1000.
produção bélica havia estimulado a indústria no De 1860 a 1914, os Estados Unidos se trans­
Norte, dando-lhe prestígio e influência polí­tica. formaram de uma pequena e jovem ex-colônia
Também deu aos líderes industriais expe­ri­ência agrí­cola para uma grande nação indus­trializa­da
valiosa na administração de homens e máqui­ e moderna. Nação endividada em 1860, em 1914,
nas. Os abundantes recursos naturais do solo era a mais rica do mun­do, cuja população havia
americano — ferro, carvão, petróleo, ouro e prata mais que dobrado, pas­sando de 31 mi­­lhões em
— beneficiaram os negócios. O novo sis­tema fer­ 1860,para 76 mi­lhões em 1900. Na Primeira Guerra
roviário intercontinental,inau­gura­do em 1869,e o Mun­dial, os Estados Unidos eram uma po­tên­cia
telégrafo transcontinental,que começou a operar mun­dial.
em 1861, deram à in­dús­tria acesso a materiais, Crescia a industrialização, assim como a alie­
mercados e comu­nicações. O constante influxo nação. Os romances ame­ricanos mais caracte­
de imigrantes fornecia uma fonte interminável rísticos do período — Mag­gie: A Girl of the
de mão-de-obra barata. Mais de 23 milhões de Streets [Maggie: Uma Mo­ça das Ruas] de Ste­phen
estrangeiros — alemães,escan­dinavos e irlandeses Crane, Martin Eden de Jack London e depois An
inicial­mente e, mais tarde, da Eu­ropa central e do American Tragedy [Uma Tragédia Ame­ri­cana] de
sul — acorreram aos Estados Unidos en­tre 1860 Theodore Dreiser — re­tra­tam danos das forças
e 1910.Traba­lhadores con­tra­tados chineses, japo­ eco­­nô­mi­cas e da alienação ao indi­víduo fraco

49
ou vulne­rá­vel. Sobre­vi­ven­tes, como ência e ajudar um es­cravo negro a
Huck Finn de Twain, Hum­­p hrey fugir,mesmo cren­do que essa infração
Vanderveyden de Sea-Wolf [Lo­bo da lei o conde­nará ao inferno.
do Mar] de London e a opor­tu­­nista A obra prima de Twain, surgida
Sister Carrie de Drei­ser, re­­sistem em 1884, se passa na vila ri­beiri­nha
graças à força interior que envolve do Mississipi de St. Petersburg. Filho
bondade, flexi­bili­dade e, acima de de um vaga­bundo bê­bado, Huck
tudo, indivi­duali­dade. acaba de ser ado­ta­d o por uma
SAMUEL CLEMENS família res­peitável, quan­­do seu pai,
(MARK TWAIN) (1835 - 1910) num estu­p or alcoó­­l ico, ameaça

S
amuel Clemens, mais conhe­ matá-lo. Temendo pela vi­da, Huck
cido pelo pseudônimo Mark fo­ge, simulando sua mor­te. Em sua
Twain, cresceu na cidade­zi­ fuga,junta-se a ou­tro fugitivo,o escra­
nha ribeirinha do Rio Mississipi de vo Jim, cuja dona, Miss Watson, está
Hannibal, no Missouri. A famo­sa pen­san­do em vendê-lo rio abaixo,
declaração de Ernest Heming­way no coração do Sul, onde a escra­
que toda a literatura america­na vidão era mais im­placável. Huck e
vem de um gran­de livro, Adventures Jim des­cem de bal­sa o majestoso
of Huckleberry Finn [Aven­tu­­ras de Mis­sis­sipi, mas são afundados por
Huckleberry Finn] de Twain indica um barco a vapor, separados e
a preemi­n ência desse autor na reunidos nova­men­te. Passam por
tradição. Escritores ame­rica­nos do mui­tas aventu­ras perigosas e en­
início do século 19 ten­diam a ser gra­­çadas, em ter­ra, que mostram a
muito floreados, sen­ti­men­­tais ou diver­sidade, a generosidade e, por
pomposos — em parte, porque vezes, a cruel irracionalidade da
ainda ten­tavam pro­var que podiam socie­dade. No fim, descobre-se que
escrever de for­m a tão ele­g an­te Miss Watson já havia libertado Jim e
quanto os ingleses.  O esti­lo de Twain, que uma família respeitável estava
basea­do na fala ame­rica­na vigo­rosa, cuidando do travesso Huck. Mas
realista e colo­quial, deu aos autores este impa­cienta-se com a soci­ed­ ade
americanos novo apre­­ço por sua voz civilizada e planeja fugir para “os
nacio­nal.  Twain foi o primeiro grande territórios” — as terras dos ín­dios.
autor do interior do país e captou sua Samuel Clemens O fim apre­senta ao leitor a versão
icono­clastia e gí­ria jocosa e peculiar. (Mark Twain) oposta do mito clás­si­co americano
Para Twain e outros escritores do suces­so: o cami­nho aberto, que
ame­ricanos do final do século 19,  re­ leva às terras into­cadas, longe da
alismo não era apenas uma técni­ca influ­ência moral­mente corruptora
literária: era um modo de di­zer a da “civilização”. Os romances de
verdade e derrubar con­ven­ções sur­ Ja­mes Fenimore Cooper, os hinos
radas. Era, portanto, pro­funda­mente de Walt Whitman em louvor do
libertador e poten­cial­mente em de­ cami­nho aberto, The Bear [O Urso]
savença com a sociedade.O exem­plo de William Faulkner e On the Road
Ilustração por
mais conhecido é Huck Finn,menino Thaddeus A. Mikinski, Jr.
[Na Estrada] de Jack Kerouac são
pobre que decide se­guir sua consci­ outros exemplos literários.
50
Huckleberry Finn inspirou nu­merosas inter­ mo’.Tais a­bor­dagens lite­rárias correlatas surgiram
pretações literárias.É claro que o romance é uma por volta de 1830 — e tinham raízes ante­rio­res
história de morte, renas­ci­mento e inicia­ção. O na tra­dição oral local. Nas cidades rudes de
escravo fugitivo Jim torna-se figura pater­­na para fron­teira, nas barcas, garimpos, rodas de cau­bóis
Huck que,ao decidir salvá-lo,cres­ce moralmente em torno da fogueira, longe dos diver­timentos
e ultrapassa as fron­teiras de sua so­ciedade es­ das cidades, floresceu a arte de contar histórias.
cravagista.  As aventuras de Jim iniciam Huck na Exageros, his­tórias exorbitantes, ga­bo­lices incrí­
comple­xidade da natureza humana e o imbuem veis e heróis cômicos trabalhadores davam vida à
de coragem moral. literatura de fronteira. Essas for­mas humorísticas
O romance também dramatiza o ideal de eram encontradas em muitas regiões de fronteira
Twain de uma comunidade equilibrada:“O que — no “velho Sudoeste” (hoje, o interior do Sul e
você mais quer,  numa balsa, é que todos estejam baixo Meio-Oeste), na fronteira das minas e na
satisfeitos e se sin­tam bem e gene­rosos para com costa do Pacífico. Cada região tinha suas perso­
os outros”. Co­mo o navio Pequod, de Mel­ville, a nagens pitorescas, sobre as quais se contavam
balsa afunda e, com ela, aquela comu­ni­dade as histórias: Mike Fink, ar­ruaceiro das barcas do
especial.O mun­do puro e simples da balsa acaba Mis­sissipi; Casey Jo­nes, corajoso engenheiro das
domi­nado pelo progres­so — o bar­co a vapor — ferrovias; John Henry,  afro-americano durão; Paul
mas a imagem mítica do rio per­ma­nece, vasta e Bunyan,  le­nhador gigante cuja fama foi promovi­
mutante como a própria vida. da pela pu­blicidade;  Kit Carson,que combatia os
A relação instável entre realidade e ilusão é o ín­dios, e Davy Crockett, batedor, ambos do oeste.
tema característico de Twain, a base para mui­to Seus feitos foram exagerados e acentuados em
do seu humor. O rio, magnífico mas engano­so, baladas,  jornais e revistas.  Às vezes,  como acon­
sempre em mutação, é também o principal ele­ te­ceu com Kit Carson e Davy Crockett,as his­tórias
mento de sua criativa paisagem. Em Life on the eram reunidas em forma de livro.
Mississippi [Vida no Missis­sipi], Twain relembra Twain,Faulkner e muitos outros escritores,parti­
seu treinamento como jovem piloto de barco a cularmente do Sul,devem muito aos hu­mo­ristas de
vapor e diz:“Passei a tra­balhar ago­ra em conhe­ fronteira pré-Guerra Civil, como Johnson Hooper,
cer a forma do rio; de todas as coi­­sas evasivas e George Washington Harris, Au­gustus Longstreet,
inalcançáveis que um dia tentei compreender Thomas Bangs Thorpe e Joseph Baldwin. Deles e
ou agarrar, essa foi a mais difícil.” do pessoal da fron­tei­ra ameri­cana veio a prolife­
O senso moral de Twain, como escritor, ecoa ração de no­vas pa­lavras cô­micas: “absquatulate”
sua responsabilidade, como piloto, de con­­duzir (sair), “flabbergasted” (impressionado), “rampa­
o barco para a segu­rança. O pseudônimo de gious” (in­dis­ciplinado, turbulento). Os fanfarrões
Samuel Clemens, “Mark Twain”,  é a expressão que locais,ou“ring-tailed roarers”que alegavam ser me­
os barqueiros do Mississipi usavam para indicar tade cavalo, metade jacaré, também res­sal­tavam a
2 braças (3,6 metros) de água, o nível mí­­nimo energia incontida da fronteira.Eles tiravam for­ça de
exigido para a passagem segura de um barco. O perigos naturais que aterrori­zariam ho­mens menos
propósito sério de Twain, aliado a um raro gênio valentes.“Sou um ver­da­deiro fura­cão,” gabava-se
para o humor e estilo, mantêm seu texto atraente um,“duro co­mo a nogueira e com fôlego do vento
e sempre atual. noroeste. Eu soco como a ár­vore que cai e cada
golpe abre um rom­bo na turba que deixa entrar
HUMOR E REALISMO DA FRONTEIRA
um acre de sol.”
Duas importantes correntes literárias na América
do século 19 se fundem em Mark Twain: o humor COLORISTAS LOCAIS
popular da fron­teira e a cor local ou ‘regionalis­ Como o humor de fronteira, a literatura colo­
51
rista local tem raízes antigas, mas vações precisas das perso­na­gens e
pro­­d u­z iu suas melhores obras cenário do Maine e seu estilo sen­
bem depois da Guerra Civil. É sível sobressaem de for­ma especial
claro que muitos escritores pós- no conto“The White Heron”[A Gar­ça
Guerra, de Henry David Thoreau Branca], de Country of the Poin­ted
e Natha­n iel Hawthorne a John Firs [Terra dos Pinhei­ros Pon­tia­
Greenleaf Whittier e James Russell gudos] (1896).As obras coloristas de
Lowell, pintam retratos notáveis Har­riet Beecher Stowe,especialmen­
de certas regiões americanas. O te The Pearl of Orr’s Island [A Pérola
que dis­tin­gue os coloristas é seu da Ilha de Orr] (1862) que retrata
inte­res­se consciente e exclu­sivo humil­des comunidades pesquei­ras
em re­pro­duzir um lugar e a téc­nica do Maine,exerceram grande influên­
es­cru­pulosamente factual e realista. cia sobre Jewett. As escrito­ras do
Bret Harte (1836-1902) é lem­ século 19 formavam suas próprias
bra­do como o autor de aventu­ras redes de apoio moral e influência,
como The Luck of Roaring Camp como re­ve­­lam suas cartas. As mu­
[A Sor­te do Campo do Agito] e The lheres eram os principais lei­tores
Outcasts of Poker Flat [Os Margi­nais de ficção e muitas escreveram
de Poker Flat], ambientados nas mi­ romances, poemas e peças humo­
nas do Oes­te.Como primei­ro grande rís­ticas po­pu­lares.
sucesso da escola de co­lo­­ristas Todas as regiões do país celebra­­
locais, Harte foi talvez, por algum ram a si mesmas em obras literá­rias
tempo,o es­cri­­­tor mais co­nhe­­cido na influenciadas pela cor local. Al­gumas
Amé­rica — tamanha a popula­ delas incluíam pro­testos so­ciais,
ridade de sua versão roman­tizada sobretudo ao fim do século, quan­do
do Oeste, onde todos anda­vam desi­gual­dade social e difi­cul­da­des
armados.Aparen­te­mente rea­lis­ta,foi eco­nô­micas se tornaram ques­tões
um dos pri­mei­ros a intro­duzir perso­ pre­men­tes. Injus­tiça racial e desi­
na­gens menos nobres — jogadores gual­dade entre sexos apa­recem nos
astu­tos, prostitutas espalhafatosas e Sarah Orne Jewett traba­lhos de escritores sulistas como
ladrões rudes — em obras lite­rárias George Washington Cable (1844-1925)
sérias.Conse­guiu sair-se bem (como e Kate Chopin (1851-1904), cujos
o ti­nha fei­to, na Inglaterra, Charles poderosos ro­man­­ces, passa­dos na
Dickens, que admirava muito o tra­ Luisiana fran­­­cesa, trans­cen­dem o
balho de Har­te) ao mos­trar, no final, rótulo de cor local. The Grandissimes
que es­ses su­postos párias tinham na (1880) de Ca­ble de­sen­volve o tema
rea­li­­da­de corações de ouro. da in­jus­tiça racial com grande virtuo­
Várias escritoras são lembradas si­dade; como The Awakening [O
por suas boas descrições da Nova Des­per­tar] (1899) de Kate Chopin,
Ingla­ter­ra: Mary Wilkins Freeman que trata da ten­­­ta­tiva malsucedida
(1852-1930), Harriet Beecher Stowe de uma mu­lher de buscar sua iden­ti­
(1811-1896) e especial­men­te Sarah dade nu­ma paixão, estava à frente de
Orne Jewett (1849-1909). A origi­ sua época. Em The Awakening, uma
Foto © The Bettmann Archive
nalidade de Jewett, suas ob­s er­ jovem casada, com lindas cri­an­ças
52
e um marido bem-sucedido e indul­ cien­te da corrupção moral dos
gente, abandona família, di­nhei­ro, mag­natas dos Anos Dourados da
respeitabilidade e even­tual­­mente a dé­cada de 1870.Em The Rise of Silas
vida na busca da autorrealização. Lapham,Howell usa um título irônico
Evoca­ç ões poéti­c as do oce­a no, para ressaltar seu pro­pósito. Silas
pás­saros (pre­sos e livres) e música Lapham torna­ra-se rico fraudando
dotam esse curto roman­ce de inten­ um velho só­cio nos negócios. Seu
sidade e com­plexidade inusitadas. ato imoral per­tur­bou muito sua
The Awakening é frequente­ famí­lia, embo­ra por anos o próprio
men­te comparado a “The Yellow Lapham tenha sido inca­p az de
Wallpaper” [Papel de Parede perceber que agira mal. No fim,
Ama­­­relo] (1892), ótimo conto de Lapham é moralmen­te redi­mi­do
Charlotte Perkins Gilman (1860- ao escolher a falência, ao in­vés do
1935). Ambas estavam es­­que­cidas, sucesso sem ética. Si­las Lapham é,
mas fo­ram redescobertas por críti­ como Huckleberry Finn,uma história
cos literá­rios feministas, já no final de insucesso: o fracasso empresa­
do século 20.  Na história de Gilman, rial de Lapham corres­ponde à sua
um médico condescendente leva ascensão moral. No fim da vida,
sua mulher à loucura, confinando-a Howells, do mesmo modo que Mark
num quarto para “curá-la” de um Twain, tornou-se cada vez mais ativo
esgotamento nervoso. A mulher em causas po­líticas, defendendo os
a­pri­­sionada projeta sua clausura no di­reitos dos organizadores de sindi­
papel de parede, em cujo de­se­nho catos e de­plo­rando o colonia­lismo
vê mulheres aprisio­na­das rastejan­ ameri­cano nas Filipinas.
do atrás das grades.
ROMANCISTAS COSMOPOLITAS
REALISMO DO MEIO-OESTE Henry James (1843 - 1916)
Por vários anos, o editor da impor­ Henry James uma vez escre­veu
tante revista Atlantic Monthly,William que arte, especialmente a arte li­­­te­­­­
Dean Howells (1837-1920), publicou rária,“é o que dá vida, gera inte­resse
o­bras realistas de cor local de Bret e tem importância.”A fic­ção e crítica
Harte, Mark Twain, George W. Cable Harriet de James são as mais cons­cientes,
Beecher Stowe
e outros. Defensor do realis­mo, seus sofisticadas e também as mais
romances, co­mo A Modern Instance difíceis de sua época. Junto com
[Ins­tân­cia Mo­der­na] (1882),The Rise Twain, James é consi­derado o maior
of Silas Lapham [As­cen­­são de Silas ro­mancista ameri­cano da segunda
La­pham] (1885) e A Hazard of New metade do século 19.
Fortunes [O Ris­co de Novas For­tunas] James é conhecido por seu“te­ma in­
(1890) en­tre­la­çam com cui­dado cir­ ternacional”— ou seja,as com­­plexas
cuns­tân­cias sociais e emo­ções do relações entre ame­rica­nos ingênuos
ame­­ricano co­mum de clas­se mé­dia. e europeus cos­­­mopo­litas.A fase que
Amor, ambição, idealismo e ten­ seu bió­grafo,  Leon Edel,  classifica co­
tação movem suas persona­gens. mo primeira ou fase “interna­cional”
Foto © The Bettmann Archive
Howells era profundamente cons­ engloba obras co­mo Transatlantic
53
Sketches [Im­pressões Tran­s­a­tlân­ticas] seu amadurecimento, os ro­mances
(1875),The American [O Americano] de James se tornaram mais psico­
(1877), Daisy Miller (1879) e uma lógicos e me­nos preocu­pa­dos com
obra-prima, The Portrait of a Lady eventos exter­nos.Em suas últimas
[O Re­trato de Uma Dama] (1881). obras, os even­tos mais importantes
Em The American, por exemplo, são todos psicológicos — geral­men­
Christopher New­man, ingê­nuo mas te momentos de inten­sa per­cep­ção,
inteli­gente e idealista industrial que revelam às per­so­na­gens sua
milionário que se fez sozinho, vai cegueira anterior. Por exem­plo, em
à Europa à procura de uma noi­va. The Ambassadors, Lam­bert Strether,
Quando a família desta o re­jeita, por idealista de certa idade, desvenda
sua falta de antecedentes aris­to­crá­ um caso amoroso secreto e, ao fazê­
ticos, ele tem a oportu­ni­dade de se -lo,descobre nova comple­xidade em
vingar; ao decidir não fazê-lo, revela sua vida interior.Sua moralidade rígi­
sua superio­ridade moral. da,hon­rada,se humaniza e amplia à

A
segunda fase de James foi medida que des­cobre a capacidade
experimental. Explorou no­ de acei­tar os que pecaram.
vos temas — feminismo e
re­­forma social em The Bostonians Edith Wharton (1862 - 1937)
[Os Bostonianos] (1886) e intrigas Como James,Edith cresceu em par­
políticas em The Princess Sasa­ te na Eu­ro­pa e aca­bou por lá re­si­dir
massima [A Princesa Sasamas­sima] perma­nente­mente. Descen­dia de fa­
(1885).Tentou também es­cre­­ver para mília rica, estabelecida na sociedade
o teatro,mas fracassou terrivelmente de Nova York, e assis­tiu, em pri­meira
quando sua peça Guy Domville mão, ao declí­nio des­se gru­po culto e,
(1895) foi vaiada na noite de estreia. no seu pon­­to de vista, à as­cen­são de
Em sua terceira ou ‘principal’ famí­lias de em­pre­sá­rios nou­veaux-
fa­se, James voltou aos temas inter­ riches incul­tos. Es­sa mudança social
na­cionais, mas tratou-os com cres­ é cenário de mui­tos de seus romances.
cen­­te sofisticação e penetração Como James, Wharton contrasta
psi­cológica. Datam dessa fase: The americanos e europeus. O cer­ne de
Wings of the Dove [As Asas do Henry James sua preocupação é o abismo entre
Pom­bo] (1902), obra complexa e realidade social e o ser inte­rior.
qua­se mítica; The Ambassadors [Os Não raro, uma persona­gem sen­sível
Embaixadores] (1903),consi­derado sen­te-se aprisionada por persona­
por James seu me­lhor romance, e gens ou forças sociais in­sen­síveis.
The Golden Bowl [O Vaso Dourado] Edith Wharton havia pas­­sado por
(1904). Se o tema central da obra tal experiência de apri­sionamento
de Twain é apa­rên­cia e realidade, a como jovem escritora, tendo um
preocu­pação cons­tan­te de James prolonga­do esgota­men­to nervoso,
é com a per­c ep­ç ão. Nele, só a em parte devido ao con­fli­to entre
autocons­ciên­cia e uma cla­ra per­ Fotogravura, cortesia seus papéis de escritora e esposa.
cep­ção dos outros pode gerar sabe­ National Portrait Gallery. Entre os melhores romances
Smithsonian Institution
doria e amor de abnega­ção. Com de Whar­­ton estão: The House of
54
Mirth [Casa da Alegria] (1905), The culo 19, Henry Adams, cons­truiu
Custom of the Country [O Costume uma sofisticada teoria da história,
da Terra] (1913), Summer [Ve­rão] que envolve a ideia de dína­mo,
(1917), The Age of Innocence [A ou força de máquina, e entro­pia,
Era da Inocência] (1920) e a linda ou desgaste de força. Ao invés de
novela Ethan Frome (1911). pro­g resso, Adams vê o de­clínio
inevi­tável da sociedade hu­ma­na.
NATURALISMO E Stephen Crane, filho de clé­rigo,
DENÚNCIA (MUCKRAKING) expôs de forma sucinta a per­da de

A
s dissecações das motivações Deus:
sexuais e financeiras ocultas
na sociedade de Whar­ton e Um homem disse para o universo:
James os ligam a escri­to­res que na “Senhor, eu existo!”
superfície parecem muito diferen­ “Entretanto”, respondeu o universo,
tes: Stephen Crane, Jack Lon­don, “Esse fato não criou em mim
Frank Norris, Theo­dore Dreiser e Um sentido de obrigação”.
Upton Sinclair. Como os romancis­
tas cosmopoli­tas, mas mais ex­plici­ Como o Romantismo, o Natu­
tamente, os natura­lis­tas usa­ram o ralismo apareceu inicialmente na
realismo pa­ra relacio­nar o indi­ Europa. Geralmente é remontado
víduo à so­cie­da­de. Fre­quen­te­men­te, às obras de Honoré de Balzac, na
denuncia­vam pro­ble­­mas sociais e década de 1840, e visto como movi­
eram in­flu­encia­dos pelo pensa­men­ mento literário francês associado
to dar­wi­niano e a dou­trina filo­sófica a Gustave Flaubert, Edmond e
afim do de­ter­­mi­nismo, que vê o Ju­les Goncourt, Émile Zola e Guy
indiví­duo como joguete impo­tente de Maupassant. Audaciosamente
de for­ças eco­nômicas e so­ciais além re­ve­­lou o lado sórdido da socie­
de seu con­trole. dade e temas como divórcio, sexo,
Naturalismo é, em essência, ex­ adul­tério, pobreza e crime.
pressão literária do deter­minis­mo. O Naturalismo floresceu quando
Associado a descrições áridas e os americanos se tornavam urba­nos
rea­listas da vida da classe baixa, o Stephen Crane
e conscientes da im­portância das
de­ter­minismo nega a reli­gião como grandes forças eco­nômicas e so­
for­ça motivadora no mun­do e, em ciais. Em 1890, as fronteiras fo­ram
vez disso, percebe o universo como oficialmente declaradas fecha­das.A
máquina. Os iluministas do século maioria dos ame­rica­nos mo­rava em
XVIII tam­bém imaginaram o mun­do cidades e os negó­cios do­mi­navam
como máquina,só que perfeita,inven­ até mesmo as fazendas remotas.
tada por Deus e caminhando para o
pro­gresso e o aprimora­men­to huma­ Stephen Crane (1871 - 1900)
no. Já os naturalistas ima­ginavam a Stephen Crane, nascido em New
sociedade como uma máqui­na cega, Jersey, tinha em sua linhagem sol­
sem Deus e fora de controle. Foto, cortesia da Biblioteca dados revolucionários, clérigos, xeri­
do Congresso
O historiador americano do sé­ fes, juizes e fazendeiros que viveram
55
um século antes. Basica­mente um jornalista que O romance autobiográfico Martin Eden (1909)
também escrevia fic­ção, ensaios, poesias e peças revela as tensões interiores do sonho americano,
dramáticas, Crane encarava a vida nua e crua, em como experimentado por London, quando
favelas e campos de batalha. Seus contos — em ascendeu vertiginosamente da pobreza e do
particular,“The Open Boat” [O Barco Aberto],“The desconhecimento para a riqueza e a fama. Eden,
Blue Hotel” [O Hotel Azul] e “The Bride Comes to marinheiro e operário inteligente e tra­ba­lhador,
Yellow Sky” [A Noiva Vem Para o Céu Amarelo] — embora pobre, resolve tornar-se es­cri­tor. Com
exemplificam sua forma literária. Seu pun­gente o tempo, sua literatura o torna rico e famoso,
romance da Guerra Civil,The Red Badge of Courage mas Eden vê que a mulher por ele amada só se
[A Insígnia Vermelha da Coragem], foi publicado interessa pelo dinheiro e a fama. Seu desespero
e muito aclamado em 1895, mas ele pouco gozou ante sua incapacidade de amá-lo termina por
da fama antes de morrer aos 29 anos, por ter desiludí-lo da na­tu­reza humana. Também sofre
negligenciado a saúde. Pratica­mente esquecido de alienação de classe, já que não pertence mais
durante as primeiras duas décadas do século 20,foi à classe trabalhadora en­quanto rejeita os valores
redescoberto através de uma biografia laudatória mate­rialistas da classe rica,que tanto se esforçara
por Thomas Beer,em 1923.Desde então,vem sendo por integrar. Ele parte para o Pacífico Sul e se
muito lido — como defensor do homem comum, suicida, jogando-se ao mar. Como muitos dos
realista e simbolista. melhores romances de sua época, Martin Eden

M
aggie: A Girl of the Streets [Maggie: é uma história de insucesso. Prefigura The Great
Uma Moça das Ruas] (1893) de Crane Gatsby [O Gran­de Gatsby], de F. Scott Fitzgerald,
é um dos me­lho­res senão o primeiro ao revelar o desespero em meio à grande riqueza.
romance americano naturalista. É a história
an­gustiante de uma jovem pobre e sensível cu­ Theodore Dreiser (1871 - 1945)
jos pais, ignorantes e alcoólatras, a deixam no A obra de 1925, An American Tragedy [Uma
desamparo. Apaixona­da e ansiosa por escapar Tragédia Ame­ricana] de Theodore Dreiser, co­mo
da vida familiar violenta, deixa-se seduzir e Martin Eden de London, explora os peri­gos do
vai viver com um jovem, que logo a abandona. sonho americano.O romance relata,com detalhes,
Quan­do sua mãe farisaica a rejeita, Maggie se a vida de Clyde Griffiths, ra­paz de von­tade fraca
torna prostituta para sobreviver, mas logo se sui­ e limitada consciência de si pró­prio. É criado na
cida em deses­pero. Seu tema mundano e es­tilo po­breza, nu­ma família de evan­ge­lizadores itine­
cien­tífico e objetivo, sem moralismo, definem rantes, mas sonha com a riqueza e o amor de
Maggie como uma obra naturalista. lin­das mulhe­res.Um tio ri­co o emprega em sua fá­
brica.Quando sua na­mora­da Roberta fica grávida,
Jack London (1876 - 1916) exige que ele se ca­se com ela.  Nesse interim,Clyde
Trabalhador pobre e autodidata da Califór­ se apai­xona por rica mo­ça de sociedade, que
nia, o naturalista Jack London se viu içado da repre­senta su­cesso, di­nheiro e aceitação social.
pobre­za à fama por sua primeira coletânea de Ele planeja cuida­dosamente afogar Roberta num
histó­rias, The Son of the Wolf [O Filho do Lobo] passeio de bar­co,mas,no último minuto,muda de
(1900), passadas sobretudo na região Klondike, ideia; ela, porém, cai do barco aci­den­talmen­te.
do Alasca, e no Yukon canadense. Outros suces­ Clyde, bom nadador, não a sal­va e ela se a­fo­­ga.
sos, como The Call of the Wild [Apelo do Ins­­tinto] Quando ele vai a julgamen­to,  Dreiser re­conta sua
(1903) e The Sea-Wolf [O Lobo do Mar] (1904) história no sentido in­ver­so,usando magistralmente
fizeram dele o mais bem pago escritor de sua as posições dos advogados de acusação e defesa
época, nos Estados Unidos. para analisar cada passo e motivo que levaram o

56
pacato Clyde, com forte bagagem re­ Empresa Standard Oil] (1904) de Ida
ligiosa e boas co­nec­ções familiares, M. Tarbell, The Shame of the Cities
a cometer ho­mi­cídio. [A Vergonha das Cidades] (1904) de

N
ão obstante seu estilo canhes­ Lincoln Steffens e outras denúncias
tro, Dreiser, em An American sérias. Romances de de­núncia usa­
Tragedy, revela autoridade vam técni­cas jornalís­ticas chamati­
esmagadora. Seus deta­lhes precisos vas para retratar du­ras condições
criam uma sensação avas­saladora de trabalho e opres­são. Frank Norris,
de trágica inevita­b i­lidade. O ro­ autor populista de The Octopus
mance é o retrato con­­­tundente do [O Polvo] (1901), expôs grandes
mito de sucesso ame­ricano que empresas ferroviá­rias enquanto The
azedou,mas tam­bém é uma história Jun­gle [A Selva] (1906) do socialista
universal das tensões decorrentes Upton Sinclair, pintava a sordidez
da urbani­za­ção, mo­der­­ni­zação e das casas de em­pacotamento de
alienação. Ne­le estão presentes as carne de Chicago.A distopia de Jack
fantasias ro­mân­ticas e perigosas London, The Iron Heel [O Cal­ca­nhar
dos espolia­dos. de Ferro] (1908), prefigura 1984 de
An American Tragedy reflete a George Orwell que prevê uma guerra
insatisfação, a inveja e o desespero de classe e a derru­ba­da do governo.
que afligiam muitos pobres e traba­ Outra resposta mais artística foi
lha­dores na sociedade americana o retrato realista, ou grupo de re­tra­
marcada pela competição e voltada tos, de per­sonagens comuns e suas
unicamente para o sucesso. Com vidas in­te­riores frustradas. A cole­
a expansão do poderio industrial tânea de histórias Main-Travelled
americano, a vida cintilante dos Roads [Estradas Mais Viaja­d as]
ri­cos, retratada em jornais e foto­gra­ (1891) de Hamlin Garland (1860-
fias, contrastava nitidamente com a 1940), protegido de William Dean
vida insípida dos agricultores e tra­ Howells, é uma galeria de re­tra­tos
balhadores urbanos comuns.A mídia de gente comum.Descreve de modo
alimentava expectativas gran­diosas e chocante a pobreza dos fa­z en­
desejos exorbitantes. Tais problemas, deiros do Meio-Oeste, que exi­­giam
comuns às nações em modernização, Theodore Dreiser reformas agrícolas. O títu­lo sugere
fez surgir o jor­nalismo de denúncia as muitas trilhas percor­ridas pelos
de corrupção (“muckraking”) — valentes pioneiros para Oeste e as
reportagens jornalísticas investigativas estradas em­poeiradas das aldeias
pene­tran­tes que documentavam os que funda­ram.
pro­blemas sociais e deram impor­ Perto de Main-Travelled Roads de
tante impulso à reforma social. Garland, está Wines­burg, Ohio, de
A grande tradição do jornalismo Sherwood Anderson (1876-1941),
investigativo americano teve iní­ iniciado em 1916. É uma co­le­tânea
cio nesse período, em que revis­ de his­tórias sobre os ha­bi­tantes da
tas na­c ionais, como McClures e cida­de fictícia de Wi­nes­­burg, vistas
Collier’s, publicaram a History of the pelos olhos de um jo­vem repórter
Standard Oil Company [His­­tória da Foto © The Bettmann Archive ingênuo, George Willard, que um

57
dia vai em­bora em busca de fortuna na cida­de que são surpreen­dentemente modernos.
grande.Como Main-Travelled Roads e ou­tras obras Carl Sandburg (1878 - 1967)
natura­listas, Winesburg, Ohio enfati­za a pobreza Um amigo disse certa vez: “Tentar escrever
re­sig­na­da, solidão e desespero nas ci­da­dezi­nhas sucintamente sobre Carl Sandburg é como ten­
da América. tar captar o Grand Canyon em uma única foto
em preto e branco”. Poeta, historiador, biógrafo,
A “ESCOLA DE CHICAGO” DE POESIA romancista, músico, ensaísta — Sandburg, fi­lho

T
rês poetas do Meio-Oeste,criados em Illinois de um ferreiro de estrada de ferro, era tudo isso
e que compartilhavam a preocupação do e mais. Jornalista por profissão, escreveu uma
meio-oeste com as pessoas co­muns são biografia monumental de Abraão Lincoln, que
Carl Sandburg,Vachel Lindsay e Edgar Lee Masters. é uma das obras clássicas do século 20.
Sua poesia cos­tu­ma tratar de indivíduos des­ Para muitos, Sandburg foi um Walt Whitman
conhecidos; desenvolveram téc­nicas — realismo, moderno, escrevendo poemas urbanos e patrió­
interpretações dra­má­ticas — que alcançaram ticos evocativos, expansivos, e rimas e baladas
um número maior de leito­res. Integram a Escola simples, infantis. Viajou muito, recitando e gra­
do Meio-Oeste, ou Chi­ca­go, que surgiu antes da van­do suas poesias numa voz cadenciada e tom
Primeira Guerra Mun­dial, para desafiar o domínio melífluo,que parecia um tipo de canto.No fun­do,
literário da costa leste.A“Renas­cença de Chicago” era totalmente despretensioso, ape­sar da fa­ma
foi um divisor de águas na cultura americana: de­ nacional. O que queria da vida, dis­se certa vez,
monstrou que o interior do país havia amadurecido. era “ficar fora da cadeia... comer regular­mente...
conseguir publicar o que escre­vi... um pouco de
Edgar Lee Masters (1868 - 1950) amor em casa e uma gostosa afeição aqui e ali
Na virada do século,Chicago já se trans­formara na paisagem americana, ...(e) can­tar todo dia.”
numa grande cidade, com inova­do­ra ar­qui­tetura Um bom exemplo de seus temas e estilo à
e coleções de arte cosmopo­litas. Chi­cago era moda de Whitman e o poema “Chicago” (1914):
também a cidade de Poetry, de Harriet Monroe, a
mais importante revista literária da época. Açougueiro de Porcos para o Mundo,
Entre os poetas con­temporâneos intrigantes Artífice de Ferramentas, Empilhador de Trigo,
que a revista publicava estava Edgar Lee Masters, Jogador com as Estradas de Ferro e os
autor do audacioso Spoon River Antho­l ogy Transportadores de Carga da Nação;
[Antologia de Spoon River] (1915),  com seu no­ Tempestuosa, robusta, barulhenta,
vo estilo coloquial“não-poético”, franca apresen­ Cidade dos Ombros Largos...
tação do sexo, visão crítica da vida pro­vinciana
e a vida interior intensamente imagi­nada das Vachel Lindsay (1879 - 1931)
pessoas comuns. Vachel Lindsay era um celebrante do popu­lis­
Spoon River Anthology é uma coleção de mo da cidadezinha do Meio-Oeste e criador de
retratos apresentados como epitáfios colo­quiais, poesia rítmica e forte, criada para ser decla­mada
resumindo a vida dos habitantes como que em em voz alta.Seu trabalho cria um elo cu­rio­so entre
suas próprias palavras.Apresenta o pano­rama de as formas populares, ou folclóri­cas, de poesia, co­
uma vila do interior a partir de seu cemitério: 250 mo as músicas gospel cristãs e os espatáculos de
pessoas lá enterradas falam,revelando seus segre­ variedades vaudeville (tea­tro popular) e, de outro
dos mais profundos.Mui­tas delas são aparentadas; lado, a poética mo­der­nista avançada. Tendo sido
membros de cerca de 20 famílias falam de seus um declamador extrema­men­te popular em sua
fracassos e sonhos em monólogos de verso livre, época, as lei­turas de Lindsay prefiguram leituras
58
de poe­sia “Beat”, surgidas após a sombrio de um homem rico que
Segunda Guerra Mundial, que eram se suicida:
acompanhadas por jazz. Sempre que Richard Cory ia à cidade,
Para popularizar a poesia,Lindsay Nós, pessoas na calçada, olhávamos
desenvolveu o que ele chamou de para ele:
espetáculo de variedades em al­to Era um cavalheiro, dos pés à cabeça,
ní­vel (“higher vaudeville”), u­san­­­ Bem apessoado e imperialmente
do música e ritmos fortes. Ra­cista, delgado,
pelos padrões atuais, seu fa­moso
poema “The Congo” [O Con­go] E sempre vestido discretamente,
(1914) celebra a história dos afri­ E sempre humano em suas conversas;
canos misturando jazz, poesia, Mas ainda fazia palpitar os corações
mú­s ica e cantilenas. Ao mesmo quando dizia,
tem­po, imortalizou figuras do ce­ “Bom dia”, e resplandecia quando
nário americano como Abraham passava.
Lincoln (“Abra­ham Lincoln Walks at
E era rico — sim, mais rico que um
Midnight” [Abraão Lincoln Caminha
rei —
à Meia-Noite]) e John Chapman
E admiravelmente instruído nas boas
(“Johnny Appleseed”) [Johnny Se­
maneiras:
mente de Maçã], fre­quen­­temente
Enfim, achávamos que ele era tudo
incorporando mitos aos fatos.
Para nos fazer desejar estar em seu lugar.

Edwin Arlington Robinson Então, continuávamos trabalhando e


(1869 - 1935) aguardando a luz,
Edwin Arlington Robinson é o me­ E passávamos sem carne e amaldiçoá­
lhor poeta americano do final do vamos o pão;
século 19. Como Edgar Lee Masters, E Richard Cory, numa bela noite de
é conhecido por seus curtos e verão,
irônicos estudos de per­sonalidade Foi para casa e deu um tiro na cabeça.
de pessoas comuns. Mas Robinson,
diferentemente de Masters, usa a Willa Cather “Richard Cory” ocupa seu lugar
métrica tradicional. A cidade ima­ ao lado de Martin Eden,An American
ginária de Tilbury Town [Cidade Tragedy e The Great Gatsby, como
do Tílburi], criada por Robinson, é poderoso aviso contra os perigos do
semelhante à cidade de Spoon River mito em torno do su­cesso exagera­
de Masters,em que as pessoas vivem do que atormentou os americanos
um desespero contido. que viveram na era dos milionários.
Alguns dos monólogos dramáti­
cos mais conhecidos de Edwin DUAS ROMANCISTAS
Robinson são “Luke Havergal” REGIONALISTAS

A
(1896), sobre um aman­te aban­ s romancistas Ellen Glasgow
donado; “Miniver Cheevy” (1910), (1873-1945) e Willa Cather
retrato de um so­nhador romântico; (1873-1947) exploraram a
Foto, cortesia OWI
e “Richard Cory” (1896), retrato vida das mulheres, colocando-as
59
em cenários regionais brilhante­ para o Arcebispo] (1927), evoca o
mente evocados.Nenhuma das duas ide­a­lismo de dois padres do século
buscou abordar temas femi­nistas 16 que levam a igreja católica ao
especificamente; seus pri­mei­ros deserto do Novo México. As obras
trabalhos geralmente gira­vam em de Cather comemoram aspectos im­
torno de protagonistas mas­culinos. portantes da experiência  americana
Só quando adquiriram confiança fora da corrente literária principal
e maturidade artística é que passa­ — o pioneirismo, o estabelecimento
ram a retratar a vida de mulheres. da religião e a vida independente de
Glasgow e Cather só po­dem ser tidas mulheres.
como ‘escritoras fe­mininas’ num
sentido descritivo, pois suas obras ASCENSÃO DA LITERATURA
são difíceis de cate­gorizar. AMERICANA NEGRA

A
Glasgow era de Richmond, concretização do potencial
Virgínia, a velha capital dos Estados literário afro-americano foi
Confederados do Sul. Seus romances um dos fenômenos mais mar­
realistas examinam a transformação cantes do período que se se­guiu à
do Sul de uma economia rural para Guerra Civil. Nas obras de Booker T.
uma industrializada. As obras da Washington, W.E.B. Du Bois, James
maturidade, como Virginia (1912), Weldon Johnson, Charles Waddell
enfocam a experiência su­lis­ta, en­ Chesnutt, Paul Laurence Dunbar e
quanto os romances posteriores, outros, vemos a consolidação das
como Barren Ground [Ter­ra Estéril] raízes da lite­ratura americana negra,
(1925), — reconhecidamente seu sobretudo na forma de autobio­
melhor tra­ba­lho — dramatizam a grafias, textos de protesto, sermões,
tentativa, por parte de mulheres ta­ poesia e cânticos.
lentosas, de romper o claustrofóbico
código sulista tradicional, que impõe Booker T.Washington
à mu­lher a vida doméstica,a devoção (1856 - 1915)
religiosa e a dependência. Booker T. Washington,educador e
Cather, também da Virgínia, foi líder negro mais importante de sua
criada nas planícies de Nebrasca, Booker época, filho de um pai branco se­
T. Washington
entre imigrantes pioneiros — mais nhor de escravos e de uma es­cra­va,
tarde imortalizados em O Pioneers! foi criado como escravo em Franklin
[Pioneiros!] (1913), My Antonia [Mi­ County,no Estado de Vir­gínia.Sua be­
nha Antonia] (1918) e seu conhe­ la e simples auto­biografia, Up From
cido conto “Neighbour Rosicky” [O Slavery [Saindo da Es­c ra­v idão]
Vizinho Rosicky] (1928). Ao longo (1901), narra sua bem-sucedida
de sua vida,  sen­tiu-se cada vez mais luta para vencer na vida. Tornou-se
alienada do materialismo da vida conhecido por seus esforços em
moderna e escreveu sobre visões prol de uma vida melhor para os
alternativas no Sudoeste americano afro-americanos. Sua política de
e no pas­sado.Seu livro, Death Comes conciliação com os brancos — ten­
Foto, cortesia Brown Brothers
for the Archbishop [A Morte Chega tativa de integrar os ame­ricanos ne­
60
gros recém-libertos à sociedade ame­ricana — foi Bards” [O! Bardos Negros e Desco­nhecidos]
esboçada em seu famoso Atlanta Exposition (1917) faz a seguinte pergunta:
Address [Discurso na Exposição de Atlanta]
(1895). O coração de qual escravo derramou melodia
Como a de “Steal Away to Jesus”? Em seus acordes
W.E.B. du Bois (1868 - 1963) Seu espírito deve ter flutuado livre à noite,
Nascido na Nova Inglaterra e formado pelas Ainda que sentisse as correntes em seu pulso.
universidades de Harvard e de Berlim (Alema­
nha),W.E.B. Du Bois foi o autor de “Of Mr. Boo­ker Com antepassados brancos e negros,  Johnson
T.Washington and Others”[Sobre o Sr. Booker T. explorou a questão complexa da raça em
Washington e Outros], ensaio depois incluído seu Autobiography of an Ex-Colored Man
naquele livro que viria a ser um marco em [Autobiografia de um Ex-Negro] (1912), obra de
sua vida, The Souls of Black Folk [As Almas de ficção sobre um mestiço que“passa”por (é aceito
Pessoas Negras](1903). DuBois demonstra com como) bran­co. O livro transmite de forma muito
todo o cuidado que, apesar de suas inúme­ras vívida a preocupação do negro americano com
realizações, Washington havia, efetivamen­te, a questão da identidade na América.
aceito a segregação — isto é, o tratamento
separado e desigual de americanos negros — e Charles Waddell Chesnutt (1858 - 1932)
que tal segregação resultaria inevitavel­mente Charles Waddell Chesnutt, autor de duas
na inferiorização dos negros, sobretudo em coletâneas de contos, The Conjure Woman [A
termos educacionais. Du Bois, um dos fun­da­ Mulher Feiticeira] (1899) e The Wife of His Youth
do­res da Associação Nacional para a Promo­ [A Mulher de Sua Juventude] (1899), e de vários
ção de Povos Negros (National Association for romances, inclusive The Marrow of Tradition [A
the Advancement of Colored People - NAACP), Essência da Tradição] (1901) e uma biografia
tam­bém escreveu textos que revelam sua sensi­ de Frederick Douglass, estava à frente de seu
bi­lidade em relação às tradições e às culturas tempo. Suas histórias lidam com temas raciais,
afro-americanas. Seu trabalho ajudou os inte­lec­ mas evitam finais previsíveis e o sentimento
tuais negros a redescobrirem a riqueza de sua generalizado; suas personagens são indivíduos
literatura e música popular. distintos, com atitudes com­plexas em relação
a uma série de coisas, inclusive raça. Chesnutt
James Weldon Johnson (1871 - 1938) frequentemente revela a força da comunidade
Assim como Du Bois, o poeta James Weldon negra e afirma valores éticos e a solidariedade
Johnson inspirou-se na música dos spirituals afro- racial. 
americanos. Seu poema “O Black and Unknown

61
CAPÍTULO
americanos estudavam em cursos su­periores —
nos anos 20, dupli­ca­ram as ma­trí­­culas em univer­
sidades.A classe média pros­pe­­rou; os ameri­canos

6
co­me­ça­ram a ter a renda média na­cio­nal mais alta
do mundo nessa era e muitos adquiriram o maior
símbolo de status — o automóvel. O típico lar ur­
bano ameri­cano bri­lha­va com lâmpadas elétricas
e se ga­bava do rádio, que ligava a casa ao mundo
MODERNISMO E exterior, e até de um tele­fone, máquina foto­gráfica,
EXPERIMENTAÇÃO: de datilo­grafia ou de costura. Como o empresá­rio
1914-1945 protagonista de Babbitt (1922),ro­mance de Sinclair
Lewis, o americano médio apro­vava essas máqui­

M
uitos historiadores caracterizam os anos nas porque eram moder­nas, mas prin­cipalmente
entre as duas grandes guerras como o porque a maioria foi inventada e produzida nos
período“traumático”em que os Estados Estados Unidos.
Unidos atingiram a maio­ridade, ape­­sar do Os americanos dos incríveis anos 20 se apai­
envolvimento relativamente breve (1917-1918) xonaram por outras diversões modernas.A maio­
e baixas muito menores que a dos aliados e ria ia ao cinema uma vez por semana. Em­bora a
inimigos europeus. John Dos Pas­sos ex­pres­sou Lei Seca — o bani­mento nacional da produção,
a desi­lusão pós-guerra da Amé­rica no ro­man­ce trans­por­te e ven­da de álcool instituí­da pela 18ª
Three Soldiers [Três Sol­da­­dos] (1921), em que Emen­da à Consti­tuição ame­ricana — tenha inicia­
dizia que a civiliza­ção era “vasto edi­fício de hi­ do em 1919, prolife­ravam os bares clandes­tinos e
pocrisia e a guer­ra, em vez de sua ruí­­­na, era sua as boates apre­sen­tando jazz,coquetéis e ousados
expres­­são mais plena e de­fi­niti­va”. Cho­cados e modis­mos de roupa e dança.  Dan­çar,ir ao cinema,
muda­dos para sem­pre, os ame­ri­canos voltaram passear de auto­móvel e ouvir rádio torna­ram-se
para casa, sem ja­mais recupe­rar a inocência. manias nacio­nais. As mulhe­res ameri­canas, em
Nem soldados da América rural po­diam voltar par­ticular, sentiam-se libe­radas. Mui­tas haviam
às suas raízes com facilidade.  De­pois de co­nhe­­cer deixado fa­zendas e vilas para cola­borar no esfor­
o mundo, muitos ansiavam pela vida moderna, ço de guer­ra nas cidades ame­ri­canas,na I Guerra,
urbana. Novas máquinas a­grí­co­las como seme­ e estavam decididas a serem mo­der­nas.Cortavam
adoras, colheitadeiras e enfarda­dei­ras haviam os ca­be­los curtos, vestiam-se de me­lindrosas e
reduzido a procura por mão-de-obra no campo. exultavam com o direito ao voto garantido pela
Mas, apesar de produ­zirem mais, os fazendeiros 19ª Emenda à Constituição, a­pro­vada em 1920.
estavam pobres.Os preços das safras,como os salá­ Expressavam com coragem suas opiniões e as­su­
rios de ope­rários ur­banos, dependiam das for­ças miam papéis públicos na sociedade.
desen­freadas do mercado, sujeitas aos inte­res­­ses Os jovens ocidentais se rebelavam, furiosos e
em­presa­riais: sub­­sídios do go­ver­no para agri­culto­ desilu­didos com a guerra cruel,responsa­bi­lizando
res e sindicatos efici­en­tes ainda não ti­nham sido a geração mais velha pelo conflito e a di­fícil situ­
cri­ados.“O principal negócio do po­vo ame­ricano ação econômica pós-guerra, que, iro­ni­camente,
são os negócios”,proclamou,em 1925,  o Presi­dente permitia a americanos com dólares —como os
Calvin Coolidge e a maio­ria concor­dou. escritores F. Scott Fitzgerald, Ernest Hemingway,
No“Big Boom”do pós-guerra,os negócios flores­ Gertrude Stein e Ezra Pound—vi­ver no exterior
ceram e os bem-sucedidos enriqueceram mais do elegantemente com pouco di­nheiro.Correntes in­
que poderiam imaginar. Pela pri­meira vez, muitos telectuais,  sobretudo a psi­cologia freudiana e,até

62
certo ponto, o mar­xis­mo (como a anterior teoria The Grapes of Wrath [As Vinhas da Ira] (1939) de
darwiniana da evo­lução),envolviam uma visão do John Steinbeck.  No au­ge da De­pressão, um ter­ço
mun­do sem Deus e,desse modo,con­tri­buíram pa­ dos america­nos es­tava sem emprego. A distri­bui­
ra o des­mo­ronamento dos valores tradicionais.Os ção de sopa, fa­­ve­las e exércitos de vaga­bun­dos
ame­ricanos no exterior absorveram essas ideias e (hobos) – de­sem­­­pre­gados viajando clandes­tinos
as trouxeram para a América,onde cri­a­­ram raí­zes, em trens de carga – torna­ram-se parte da vida
inflamando a ima­ginação de jo­vens escrito­res e nacional.Muitos viram a Depres­são como cas­tigo
artistas.  William Faulkner, por exemplo, ro­man­ pelos pe­ca­dos do ma­te­­rialismo excessivo e vida
cista ameri­ca­no,empregou ele­mentos freu­dia­nos desre­grada. As tem­pestades de areia que escu­
em todas as obras, co­mo o fize­ram prati­camente reciam o céu do Meio-Oeste, acre­ditavam, era
todos os escritores ameri­canos ficcio­nis­tas sérios julga­mento do Ve­lho Testamento:“redemoi­nhos
após a I Guer­ra Mundial. de dia e escuri­dão ao meio-dia.”
Apesar da alegria exterior, modernidade A Depressão virou o mundo de cabeça para
e pros­­pe­ridade material sem par, os jovens baixo. Os Estados Unidos haviam pregado um
ameri­canos dos anos 20 foram “a geração perdi­ evan­­­­gelho dos negócios nos anos 20. Ago­ra,
da”– assim chamados pela retratista literária vá­rios americanos apoiavam um papel mais
Ger­trude Stein. Sem estrutura tra­dicional está­vel atu­an­te do governo nos programas do New Deal
de valores, o indivíduo per­deu o sentido de sua do Presidente Franklin D. Roosevelt. Re­cursos
identidade. A vida fami­liar protetora e se­gu­­ra; a federais criaram empregos em obras pú­bli­cas,
comunidade estável; os ritmos naturais eternos serviços de conservação e ele­trificação ru­ral.
da natureza que guiam plantio e colhei­ta na Ar­­tistas e intelectuais foram pagos para cri­ar mu­
fazenda; o sentido confortador de patrio­tis­mo; rais e compêndios estaduais.Tais ações aju­da­ram,
valores mo­rais incutidos por cren­ças religiosas mas só o de­sen­­­volvimento industrial da Segunda
e observa­ções – tudo foi mi­na­do pela I Guerra Guerra Mun­dial renovou a pros­peridade. Depois
Mundial e seus desdobramen­tos. que o Japão atacou os EUA em Pearl Harbor, em
Vários romances, como The Sun Also Rises [O 7 de dezem­bro de 1941, estaleiros e fábricas oci­o­
Sol Também Se Levanta] (1926) de Heming­way sos ganharam vida,produ­zindo em mas­sa bar­cos,
e This Side of Paradise [Este Lado do Pa­­raíso] avi­ões, jipes e su­pri­mentos. A produção e expe­ri­
(1920) de Fitzgerald, evocam a extra­va­gân­cia men­tação béli­cas levaram às novas tec­nolo­gias,
e desilusão da geração per­dida. No longo e inclusive a da bomba nu­clear. Teste­munha da
influente poema de T.S.Eliot, The Waste Land [A pri­meira ex­plosão nu­clear, Robert Oppen­hei­
Terra Devastada] (1922),a civilização ociden­tal é mer, chefe da equi­pe in­ter­na­­cional de cien­tistas
simbolizada por um deserto árido em de­ses­pe­ro nuclea­res,citou pro­fetica­mente um poe­ma hin­du:
por chuva (renovação espi­ritual). “Tornei-me Morte, o destruidor de mun­dos.”
A Depressão mundial dos anos 30 afetou a
mai­oria da população americana.Trabalhado­res MODERNISMO

A
perderam empregos e fá­bri­cas fecha­ram; em­ grande onda cultural do modernismo que
presas e bancos faliram; agricultores, sem po­der emergiu gradualmente na Europa e nos
colher, trans­portar ou ven­der seus pro­dutos, não Estados Unidos no início do sécu­lo 20
puderam pagar suas dívidas e perde­ram as terras. expressou o sentido da vida moderna atra­vés da
As secas do Meio-Oeste transfor­­maram o“celeiro” arte como rompimento brusco com o pas­sado e
da Amé­rica num mon­te de areia.  Fazendeiros dei­ as tradições clás­sicas da civilização ocidental.  A
xaram o Meio-Oeste para a Califórnia em busca vida moderna parecia radicalmente diversa da
de empregos, como vivi­damente descrito em tradi­cional — mais científica,rápida,tecnológica

63
e mecanizada. O modernismo abra­çou essas tradições ultrapassadas.
mu­­danças. A fotografia passou a assumir status de uma das
Na literatura, Gertrude Stein (1874-1946) de­ belas artes, aliada aos desenvolvimentos científi­
senvolveu um análogo à arte moderna.  Re­si­dente cos da época.O fotógrafo Alfred Stieglitz abriu um
em Paris e colecionadora de arte (ela e o ir­mão salão em Nova York e, em 1908, estava expondo
Leo compraram obras de Cézanne, Gau­­­guin, os trabalhos mais recentes da Europa, incluindo
Renoir, Picasso e muitos outros), Stein expli­cou peças de Picasso e outros ami­gos eu­ropeus de
que ela e Picasso faziam a mes­ma coi­sa, ele na Gertrude Stein. O salão de Stieglitz influenciou
arte e ela na li­te­ratura. Usan­do pala­vras simples vários escritores e artistas,inclu­­­sive William Carlos
e concretas como contrafortes, de­sen­volveu Williams,um dos poetas americanos mais influen­
uma poesia em prosa experimental e abstrata. tes do século 20. Williams cultivou uma clareza
A qualidade infantil do vocabu­lário simples de fotográfica da ima­gem. Seu slogan estético era:
Stein lembra as bri­lhantes cores primárias da “nenhuma ideia a não ser nas coisas”.

A
arte moderna, en­quan­to suas repetições ecoam visão e o ponto de vista tornaram-se
as formas repe­tidas das composições visuais aspectos essenciais também no romance
abstratas.  Ao deslocar a pon­tuação e a gramática, modernista. Não bastava mais escrever
conquistou novos sig­ni­ficados“abstratos”, como uma narrativa objetiva na terceira pessoa ou
na in­flu­ente co­le­tânea Tender Buttons [Botões (pior ainda) usar um inútil narrador intruso. A
Tenros](1914), que vê objetos por ângulos dife­ maneira como a história era contada tornou-se
rentes, como num quadro cubista: tão importante quanto a pró­pria história.
Henry James, William Faulkner e muitos ou­
Uma mesa Uma Mesa significa não é minha tros escritores americanos fizeram experiên­cias
querida significa toda uma firmeza. com pontos de vista fictícios (alguns ainda o
Será que é provável que uma mudança. Uma mesa fazem hoje). James frequentemente limitava a
significa mais que um copo de vidro informação no romance àquela que uma única
até um espelho é alto. personagem teria sabido.The Sound and the Fury
[O Som e a Fúria] (1929), ro­mance de Faulkner,
Significado,na obra de Stein,estava muitas vezes divide a narrativa em qua­tro seções,cada qual ex­
subordinado à técnica,assim como o tema era me­ pressando o ponto de vista de uma personagem
nos importante que a for­ma na arte visual abstrata. diferente (in­cluindo um menino mentalmente
Tema e técnica tornaram-se inse­paráveis tanto na retardado).
arte visual como na literatura,nessa época.O concei­ Para analisar romances e poesias moder­nistas
to da forma como equiva­lente do conteúdo, pedra desse tipo, surgiu nos Estados Unidos a escola
angular da arte e da literatura depois da Segunda conhecida como “New Criticism” [Crítica Nova],
Guerra Mundial, cris­talizou-se nesse período. com um novo vocabulário crítico. Os New Critics
Inovações tecnológicas no mundo das fá­bri­ buscavam a“epifania”(momento em que a perso­
cas e máquinas inspiraram um novo interesse nagem re­pentinamente compreen­de a verdade
pela técnica nas artes. Por exemplo: A luz, so­bre­ trans­cen­dente da situação, termo deri­vado da
tudo a elétrica, fascinava os artistas e escri­tores aparição de santos aos mortais); “examinavam”
modernos. Cartazes e anúncios da época estão e“esclare­ciam”uma obra,na esperança de“trazer
repletos de imagens de ar­ranha-céus iluminados luz” ao trabalho através de suas “percepções”.
e raios de luz que emanam de faróis de carros,
cinemas,e torres de vigia e iluminam a escuridão
externa ame­açadora, sugerindo ignorância e

64
im­p erfeitas, traduções intro­d u­
POESIA 1919- 1945: ziram novas possibilidades li­te­rárias
EXPERIÊNCIAS NA FORMA de mui­­­tas culturas aos escri­tores
Ezra Pound (1885 - 1972) mo­d ernos. Sua obra maior, The
Ezra Pound foi um dos poetas ameri­ Can­tos [Os Cantos], ele escre­veu
canos mais influentes do século 20. e publi­­cou até a morte. Ela possui
De 1908 a 1920, viveu em Londres, tre­chos brilhantes, mas a­lu­sões a
onde conviveu com mui­tos escri­ o­bras li­terárias e artís­ticas de eras
tores, inclusive William Butler Yeats, e cultu­ras di­ferentes a tor­na difí­cil.
para quem trabalhou como secre­ A poe­­sia de Pound é fa­mosa pe­las
tário, e T.S. Eliot, cujo Waste Land ima­gens visuais cla­ras, ritmo no­vo,
revisou e melhorou dras­ticamente. li­nhas muscu­­­lares, in­te­­li­gen­tes e
Foi um elo entre os Estados Unidos in­co­muns, como no Can­­to LXXXI:
e a Grã-Breta­nha, trabalhando como “A formiga é um cen­tau­ro em seu
editor colabo­rador da importante mun­do de dra­gão”, ou em poemas
revista Poetry, editada em Chicago inspirados no haicai japo­nês, como
por Harriet Monroe, e encabeçando “In a Station of the Me­tro” [Numa
a nova es­cola poética conhecida Estação do Metrô] (1916):
como Ima­gismo, que advogava uma
apresen­tação clara e altamente visu­ A aparição desses rostos na multidão;
al.  Após o Imagismo,  defendeu várias Pétalas num galho molhado, negro.
ou­tras abordagens poéticas.  Acabou
mu­dando-se para a Itália, onde foi T.S. Eliot (1888 - 1965)
apanhado pelo fascismo italiano. Thomas Stearns Eliot nasceu em St.

P
ound promoveu o Imagismo Louis,Mis­sou­ri,numa fa­mília próspera
por meio de cartas, ensaios e com raízes no nor­des­te dos Estados
uma antologia. Nu­ma carta Unidos. Dos prin­cipais escri­tores
a Monroe, em 1915, de­fen­de uma americanos de sua geração,foi quem
poesia visual, que soe mo­der­na e recebeu a melhor edu­cação:estudou
evite “chavões e frases feitas”. Em “A T.S. Eliot em Harvard College, Sorbonne e
Few Don’t’s of an Ima­­giste” [Alguns Mer­ton College da Universidade de
Nãos de um Ima­gista] (1913), ele Oxford. Estu­dou sânscrito e filosofia
definiu “ima­gem” como algo que ori­ental, que influenciaram sua poe­­
“apresenta um com­plexo intelectual sia. Como seu amigo Pound, foi cedo
e emocional num único instante”. para a Ingla­ter­ra e tor­­­nou-se figura de
Sua antologia de 1914 de 10 poetas, proa no mun­do literário inglês. Um
Des Imagis­tes [Dos Imagistas], ofe­ dos mais respeitados poetas de sua
recia exem­­plos da poesia imagista é­po­ca, sua poesia mo­dernista, ico­
de poetas extraordinários, inclusive noclasta, aparen­te­mente ilógica ou
William Carlos Williams, H.D. (Hilda abstrata teve im­pacto revo­lucionário.
Doo­little) e Amy Lowell. Também es­cre­­veu ensaios e dramas
Os interesses e leituras de Pound influentes e defendeu a importância
eram universais. Suas adap­tações das tra­dições literárias e sociais para
e brilhantes, ain­da que às ve­zes Foto, cortesia Acme Photos o poeta moderno.

65
Como crítico, Eliot é melhor lem­ The Waste Land (1922) está im­
brado pela sua formulação do “ob­ pregnada de imagens semelhan­tes.
jective correlative”, descrito em The O autor, ao evocar as ruas con­
Sacred Wood [O Bosque Sa­grado] gestionadas de Londres na época
como sendo um meio de expressar da Primeira Guerra Mundial, ecoa o
emoções por inter­médio de “um Inferno de Dante :
conjunto de objetos, uma situação,
uma série de even­tos” que seriam Cidade Irreal,
a “fórmula” daquela e­mo­ção em Sob a neblina marrom de um amanhe­
particular. Poemas como “The Love cer invernal,
Song of J. Alfred Pru­frock” [A Canção Uma multidão fluiu por cima da Ponte
de Amor de J.Alfred Prufrock] (1915) de Londres, tantos
incorpo­ram es­sa abordagem, como Não pensei que a morte tivesse levado
quando o ve­lho e infrutífero Prufrock tantos... (I, 60-63)
pensa consigo mesmo que tinha“me­
dido sua vi­da com colheres de café”, The Waste Land é, em última
u­san­do colheres de café para refletir instância, apocalíptico e universal:
uma existência banal e perdida.
O famoso início de “Prufrock”, de Rachaduras e reformas e explosões
Eliot, convida o leitor a entrar por no ar violeta
ruelas vistosas, que, como a vi­da Torres que caem
moderna, não têm respostas pa­ra Jerusalém, Atenas, Alexandria
as perguntas que a vida faz: Viena Londres
Irreal (V, 373-377)

O
Vamos então, eu e você,
Quando o entardecer se espalha utros poemas principais de
contra o céu Eliot incluem “Gerontion”
Como um paciente anestesiado sobre (1920), que usa um homem
uma mesa; idoso para simbolizar a decre­
Vamos, passando por certas ruas pitude da sociedade ocidental;
semidesertas, “The Hollow Men” [Os Homens
Recônditos murmurantes Ocos] (1925), tocante réquiem pela
De noites agitadas em hotéis baratos morte do espírito da humanidade
de alta rotatividade Robert Frost contem­p orânea; Ash-Wednesday
E restaurantes de serragem com con­ [Quar­ta-Feira de Cinzas] (1930),
chas de ostras: em que se volta explicitamente
Ruas que se prolongam como uma para a Igreja An­glicana em busca de
discussão tediosa sentido para a vida humana; e Four
De intenção insidiosa Quartets [Quatro Quartetos] (1943),
Pa ra l ev á - l o a u m a p e rg u n t a medita­ção experimental complexa
avassaladora e alta­mente subjetiva sobre temas
Oh!, não pergunte “O que é?” trans­cendentes como o tempo, a
Vamos e façamos nossa visita. na­­tu­reza do ser e a consciência
Foto © Kosti Ruohamaa,
Black Star espi­ritual.Sua poesia,especialmente

66
seu trabalho mais audacioso dos Para ver sua floresta cobrir-se de neve.
primeiros anos, influenciou várias
gerações. Meu pequeno cavalo deve achar
estranho
Robert Frost (1874 - 1963) Fazer uma parada longe de qualquer
Robert Lee Frost nasceu na Ca­li­ fazenda
fórnia, mas foi criado numa fazen­da Entre a floresta e o lago gelado
no nordeste dos Estados Uni­dos até Na noite mais escura do ano.
os dez anos de idade. Como Eliot e
Pound, foi para a Inglaterra, atraído Ele sacode seu arreio, fazendo soar
pelos novos movimentos póeticos os guizos
que estavam surgindo na­q uele Perguntando se não há qualquer
país. Declamador carismá­tico, era engano.
famoso por suas turnês. Na posse O único outro som é o varrer
do Presidente John F. Kennedy, em Do vento suave e do floco de neve
1961, recitou um trabalho original,
A floresta está linda, escura e
que ajudou a des­pertar um interesse
profunda,
nacional pela poesia. Sua populari­
Mas tenho promessas a cumprir,
dade é fa­cilmente explicável: ele
E muitas milhas a percorrer antes de
escreveu sobre a vida tradicional no
poder dormir,
campo, apelando para a nostalgia
E muitas milhas a percorrer antes de
dos ve­lhos tempos. Seus temas são
poder dormir.
uni­versais — colheitas de maçãs,
mu­ros de pedra, cercas, estradas no Wallace Stevens (1879 - 1955)
campo. Sua abordagem era lúcida Nascido no Estado da Pensilvâ­nia,
e acessível: raramente em­pre­gava Wallace Stevens estudou em Har­­vard
alusões pedan­tes ou elipses.  Seu uso College e na Faculdade de Di­reito da
frequente da rima tam­bém agradava Universidade de Nova York, cidade
ao grande público. em que exerceu a ad­vocacia de 1904
Muitas vezes, a obra de Frost é a 1916,quando fer­vilhava de atividade
enganosamente simples. Numero­sos artística e poética. Ao mudar-se, em
poemas sugerem um signifi­cado mais 1916,  para Hartford, em Connecticut,
profundo. Por exemplo, graças a uma para tornar-se executivo numa com­
estrutura de rimas quase hipnótica, Wallace Stevens panhia de seguros, continuou escre­
uma noite tran­quila,  com a neve cain­ vendo poesia. Sua vida é no­tável
do lá fora,pode sugerir a aproximação por sua compar­ti­mentaliza­ção: seus
não totalmente indesejável da morte. asso­ciados na com­panhia de se­
Como em “Stopping By Woods on a guros nem sabiam que ele era um
Snowy Evening”[Parando no Bos­que poeta importante.Em sua pri­vacidade,
Numa Noite de Neve] (1923): continuou a desenvolver ideias ex­tre­
mamente complexas sobre or­dem
Creio saber de quem são estes bosques. estética em livros com títulos muito
Contudo, ele mora na aldeia; signi­f i­c ativos, como Harmo­n ium
Não me verá parando por aqui Foto © The Bettmann Archive (edi­ção ampliada, 1931), Ideas of

67
E
Order [Ideias de Ordem] (1935) e Parts of a World sse poema parece queixar-se de vidas
[Partes de um Mundo] (1942).Alguns dos poemas enfadonhas (camisolas brancas e lisas),
mais conhecidos são “Sunday Morning” [Manhã mas está, de fato, evocando na men­te do
de Domingo],“Peter Quince at the Clavier” [Peter leitor imagens bem vívidas. No fim, um ma­rujo
Quince ao Te­cla­do],“The Emperor of Ice-Cream”[O bêbado, ignorando todas as convenções,“pega
Imperador do Sorvete],“Thirteen Ways of Looking at tigres”— pelo menos em sonho.O poe­ma mostra
a Blackbird”[Treze Modos de se Olhar um Mel­ro] e que a imaginação humana — do leitor ou do
“The Idea of Order at Key West” [A Ideia de Ordem marujo — sempre encontrará uma saída criativa.
em Key West].
A poesia de Stevens trata de temas da imagi­ William Carlos Williams (1883 - 1963)
nação, necessidade de forma estética e cren­ça William Carlos Williams foi pediatra por toda a
de que a ordem da arte corresponde à or­dem na vida; fez o parto de mais de 2.000 bebês e es­­­crevia
natureza. Seu vocabulário é rico e va­riado: pinta poemas nos blocos de receita.Williams foi colega
cenas tropicais luxuriantes, mas também cria dís­ dos poetas Ezra Pound e Hilda Doolittle e seus pri­
ticos enxutos, humorísticos e irônicos. meiros poemas revelam a in­fluência do Imagismo.
Alguns de seus poemas se inspiram na cul­tura Mais tarde, passou a defender o uso da linguagem
po­pular, enquanto outros zombam da so­cie­dade coloquial; seu ou­vido para os ritmos naturais do
sofisticada ou nos elevam a um paraíso intelec­ inglês ame­ricano ajudou a libertar nossa poesia
tual. Ele é conhecido por seu exuberante jogo da métrica iâmbica, que dominara os versos in­
de palavras:“Logo, como ao som de tam­borins / gleses desde a Renascença. Sua simpatia pelos
Veio sua criada Byzantines”. trabalhado­res comuns, pelas crianças e eventos
A obra de Stevens é plena de percepções corriquei­ros da vida urbana moderna tornam sua
sur­preendentes. Às vezes, ele prega peças no poesia atraente e acessível.“The Red Wheelbarrow”
leitor, como em “Disillusionment of Ten O’Clock” [O Carrinho de Mão Vermelho] (1923),como uma
[Desilusão das Dez Horas] (1931): natureza morta holandesa, encontra interesse e
beleza nos objetos do dia a dia:
As casas são assombradas
Por camisolas brancas. Tanto depende
Nenhuma delas é verde, de
Ou roxa com círculos verdes
Ou verde com círculos amarelos, um carrinho de mão
Ou amarela com círculos azuis. vermelho
Nenhuma delas é estranha,
Com meias de renda brilhando com água
E cinturas bordadas com contas. da chuva
As pessoas não vão
Sonhar com babuínos e pervincas. ao lado das galinhas
Apenas, aqui e ali, um velho marujo, brancas.
Bêbado e dormindo em suas botas,
Pega tigres Williams cultivou uma poesia natural e descon­
Em tempo vermelho. traída. Em suas mãos, o poema não era suposto
tornar-se um objeto de arte perfeito, como em
Stevens, nem tampouco a cuidadosa recriação
do incidente de Wordsworth, como em Frost. Em

68
vez disso, o poema devia captar um público mais amplo.Em­bora tenha es­
momento no tempo, como uma foto tudado no exterior,escolheu viver nos
instan­tânea — conceito que absorveu Estados Unidos. Seu épico, Paterson
dos fotó­­gra­fos e artistas que conhe­ (cinco vols., 1946-58), celebra sua
cera em galerias co­mo a de Stieglitz, cidade natal de Paterson, New Jersey,
em Nova York. Co­­mo fotografias, co­mo vista pelo autobiográfico “Dr.
seus poemas muitas vezes insinuam Paterson”. Nele, Williams jus­­tapõe
possibili­dades ou atrações secretas, passagens líricas, prosa, cartas, auto­
como em “The Young Housewife” [A biografia, relatos jorna­lís­ticos e fatos
Jovem Dona de Ca­sa] (1917): históricos. A disposi­ção grá­fica do
livro,com amplos espaços em branco,
Às dez da manhã a jovem dona de sugere o tema do ca­minho aberto da
casa circula de negligé por trás das literatura ame­ricana e dá um sentido
paredes de madeira da casa de novos horizontes até mesmo para
de seu marido. as pes­soas mais pobres, que fazem
Passo solitário em meu carro. pi­quenique no parque aos domingos.
Como a persona de Whitman, em
Então novamente ela vem até o Leaves of Grass [Folhas de Relva], Dr.
meio-fio Paterson tem trânsito livre entre os
para chamar o sorveteiro, o peixeiro, trabalhadores:
e fica
tímida, sem espartilho, ajeitando - final da primavera,
fios soltos de seus cabelos, e eu uma tarde de domingo!
a comparo
A uma folha caída. - e vai pela trilha até os rochedos
(contando: a prova)
As rodas silenciosas de meu carro
correm com um som crepitante sobre ele mesmo entre outros
folhas secas enquanto a cumprimento - pisa ali as mesmas pedras
e passo sorrindo. em que seus pés escorregam
quando sobem,
Rovinson Jeffers
Ele chamou sua obra de “obje­ acompanhados por seus cães!
tivista”, para sugerir a importância
de objetos visuais concretos. Seus rindo, gritando uns pelos outros -
tra­balhos frequentemente cap­ta­vam
o padrão emotivo e espon­tâneo Esperem por mim!
da experiência e influenciaram os (II, i, 14 -23)
textos “Beat” do início dos anos 50.
Como Eliot e Pound, Williams ENTRE AS GUERRAS
também tentou o gênero épico, mas, Robinson Jeffers (1887 - 1962)

N
enquanto seus épicos empre­gam o período entre as duas guer­
alusões literárias dirigidas ape­nas a ras surgiram diversos poe­
um grupo reduzido de lei­tores muito Foto © UPI/ tas americanos de esta­tu­ra e
The Bettmann Archive
cultos, Williams escre­ve para um verdadeira visão; entre eles, poe­tas

69
da Costa Oeste, mulheres e afro­ Justo em –
-americanos. Como o roman­cis­ta Primavera quando o mundo é lama-
John Steinbeck, Robinson Jeffers vi­ delicioso o pequeno
veu na Califórnia e es­creveu sobre os homem do balão manco
rancheiros espa­nhóis,os índios e suas assobia longe e baixinho
tradições mis­tas e a obsessiva beleza e eddieebill vêm
da ter­ra.Treinado nos clássicos e bom correndo das bolinhas de gude e
conhecedor de Freud, ele recriou piratarias e é
temas da tragédia grega, tendo como primavera....
cenário aquele litoral aci­dentado. Ele
é melhor conhecido por suas narrati­ Hart Crane (1899 - 1932)
vas trágicas,como Tamar (1924),Roan Hart Crane foi um jovem poeta
Stallion [O Garanhão Ruão](1925), atormentado, que cometeu suicídio
The Tower Beyond Tragedy [A Torre aos 33 anos, lançando-se ao mar.
Além da Tragédia](1924) — recriação Deixou poemas admiráveis, inclu­
de Agamemnon, de Ésquilo — e Me­ in­do um épico, The Bridge [A Pon­
dea (1946), recriação da tragédia de te] (1930), inspirado na Ponte de
Eurípedes. Brooklyn, em que ele ambicionou
abarcar toda a experiência cultural
Edward Estlin Cummings americana e recolocá-la em termos
(1894 - 1962) afirmativos. Seu estilo exuberante,
Edward Estlin Cummings, mais superaquecido, consegue melhores
conhecido como e. e. cummings, resultados em poemas curtos, como
criou versos inovadores e atraen­tes, “Voyages” [Viagens] (1923, 1926) e
notabilizados pelo humor, gra­ça, “At Melville’s Tomb” [No Túmulo de
celebração do amor e do erotis­mo Melville] (1926),cujo fi­m serviria co­
e experimentação com a pon­tua­ção mo epitáfio digno do próprio Crane:
e o formato visual da página. Pintor,
foi o primeiro poeta ameri­cano a monodia não irá despertar o marujo.
reconhecer que a poesia se havia Esta fabulosa sombra apenas o mar
tornado uma arte mais visual que guarda.
oral. Seus poemas usaram es­pa­
çamentos e tabulações insólitos, Marianne Moore (1887 - 1972)
bem como eliminaram maiúsculas. Langston Hughes Marianne Moore certa vez escre­

C
ummings, como Williams, veu que poemas eram “jardins
também usou linguagem imaginários com sapos de verda­de”.
coloquial, imagens nítidas e Seus poemas têm tom de con­versa,
palavras da cultura popular. Ainda mas usam uma versi­ficação silábica
como Williams, tomou muitas li­ber­ apurada e sutil,baseando-se em des­
dades com a apresentação gráfi­ca. crições extremamente minuciosas
Seu poema “in Just -” [Justo em -] e em fatos históricos e científicos.
(1920) convida o leitor a preencher Uma “poeta de poe­tas”, ela influen­
as ideias que faltam: ciou poetas poste­riores como sua
Foto, cortesia Knopf, Inc. jovem amiga Eliza­beth Bishop.

70
Construí minha cabana perto do
Langston Hughes Congo e ele me ninou até eu dormir.
(1902 - 1967) Olhei para o Nilo e
Um dos vários poetas de talento ergui as pirâmides acima dele.
surgidos na Renascença do Har­lem, Ouvi o canto do
na década de 20 — na com­panhia Mississipi quando Abe Lincoln
de James Weldon Johnson, Claude desceu até New Orleans,
McKay, Countee Cullen e outros — e vi seu enlameado
foi Langston Hughes. Ele abraçou seio ficar dourado ao
ritmos do jazz afro-americano e foi cair do sol
um dos pri­meiros escritores negros
a ten­tar trans­for­­mar sua arte em uma Conheci rios
car­reira ren­­tável.Hughes in­cor­porou Antigos, crepusculares rios.
em suas poesias os blues,os spirituals,
a lin­guagem colo­quial e o fol­clore. Minh’alma se tornou profunda
Influente organizador cultural, como os rios.
Hughes publicou numerosas anto­
logias de negros e criou grupos tea­ ESCRITA EM PROSA,
trais negros em Los Angeles, Chi­cago 1914 - 1945: REALISMO
e Nova York. Tam­bém escre­veu um AMERICANO

E
jornalismo eficiente, crian­do a per­ mbora a prosa americana
sonagem Jesse B.Semple (‘sim­ples’), entre as guerras tenha experi­
para expressar comen­tários sociais. mentado com pontos de vista
Um de seus poemas mais queridos, e formas,os americanos es­creveram
“The Negro Speaks of Ri­vers”[O Negro com maior realismo,de uma maneira
Fala de Rios] (1921,1925), abraça geral,que os eu­ropeus.O romancista
sua heran­ça afri­cana — e universal Ernest He­ming­­way escreveu sobre
— num grande catálogo épico. O a guerra, caça e outras atividades
poema sugere que, como os grandes masculinas num estilo despojado
rios do mundo, a cul­tura africana irá e simples; William Faulkner situou
permanecer e aprofundar-se: seus po­derosos romances sulistas,
abran­gendo gerações e culturas, no
Conheci rios: calor e poeira do Mississipi e Sinclair
Conheci rios antigos como o F. Scott Fitzgerald Lewis delineou a vida burguesa com
mundo e mais velhos que o clareza irônica.
fluir do sangue humano A importância de se enfrentar
em veias humanas. a realidade tornou-se tema domi­
nante nas décadas de 1920 e 1930:
Minh’alma se tornou profunda Escritores como F. Scott Fitzgerald
como os rios. e o dramaturgo Eugene O’Neill des­
Banhei-me no Eufrates quando creveram repetidamente a tragédia
as auroras eram jovens. que aguardava aqueles que viviam
Foto, cortesia
em sonhos frágeis.
Culver Pictures, Inc.

71
F. Scott Fitzgerald arruinada por seu casa­mento com
(1896 - 1940) uma mulher instável, e algu­m as
A vida de Francis Scott Key histórias das coletâneas Flappers
Fitzgerald parece um conto de fa­das. and Philosophers [Melindro­sas e
Durante a I Guerra Mundial,Fitzgerald Filósofos] (1920), Tales of the Jazz
alistou-se no exército,e apaixonou-se Age [Contos da Era do Jazz] (1922),
por Zelda Sayre, mo­ça rica e bonita, e All the Sad Young Men [Todos os
que morava per­­to de Montgomery, Jovens Tristes] (1926). Mais que
no Alabama, onde ele servia. Zelda qualquer autor, Fitz­ge­rald captou a
rompeu o noivado porque ele era vida reluzente e de­ses­perada dos
relativa­mente pobre. Depois de ser anos 20. This Side of Paradise [Este
desmo­bilizado, no fim da guerra, ele Lado do Paraíso] foi anunciado
foi para NovaYork,tentar fazer fortuna como a voz do jovem americano
literária e poder casar com a moça. moderno. Seu segundo romance,
Seu primeiro romance, This Side The Beautiful and the Damned [Os
of Paradise [Este Lado do Pa­raíso] Belos e os Condena­dos] (1922),
(1920), tornou-se um best-seller e, continuou explo­rando a extrava­
aos 24 anos,se casaram.Nenhum dos gância autodes­tru­tiva de sua época.
dois foi capaz de su­portar as pressões As qualidades especiais de Fitz­
do sucesso e da fama e dilapidaram gerald incluem um estilo deslum­
seus recursos. Em 1924, mudaram-se brante, perfeitamente adequado ao
para a Fran­­ça, para tentar economi­ tema do encanto sedutor. Um tre­cho
zar.Voltaram sete anos depois. Zelda famoso de The Great Gatsby resume
tornou-se mentalmente instável e magistralmente uma longa passagem
teve de ser internada. O próprio de tempo: “Havia música da casa do
Fitzgerald tornou-se alcoólatra e meu vizinho ao longo das noites de
morreu jovem trabalhando como verão. Em seus jar­dins azuis, homens
roteirista de cinema. e garotas iam e vi­nham, como mari­

F
itzgerald detém lugar garan­ posas,entre os co­chichos,o champa­
tido na literatura americana nhe e as estre­las.”
graças sobretudo a seu ro­
mance The Great Gatsby [O Gran­ Ernest Hemingway
de Gatsby] (1925), uma história (1899 - 1961)
Ernest Hemingway Poucos escritores tiveram vida tão
brilhantemente escrita e economi­
camente estruturada, sobre o so­ colorida como Ernest Heming­way,
nho americano do homem que cuja carreira bem poderia ter saído
enriquece por seus próprios meios. de um de seus romances de aventura.
O protagonista, o misterioso Jay Como Fitzgerald,  Dreiser e muitos ou­
Gatsby, descobre que sucesso traz tros ótimos romancistas do século 20,
um custo devastador em termos de Hemingway veio do Meio-Oeste dos
realização pessoal e amor. Outras Estados Unidos. Nascido em Illinois,
ótimas obras incluem Tender is the Hemingway passou suas férias de
Night [Suave é a Noite] (1934), so­ Foto, cortesia verão em Michigan,em excursões de
bre um jovem psiquiatra cuja vida é Pix Publishing, Inc. caça e pesca. Foi voluntário, numa

72
uni­dade de ambulâncias militares na gosas para poder revelar sua natu­reza
França, na I Guerra Mundial, mas foi interior; em suas obras mais tardias,o
ferido e hospitalizado por seis meses. perigo às vezes se torna oportunidade
Depois da guerra, como correspon­ para a afirmação da masculinidade.
dente sediado em Paris, conheceu Como Fitzgerald, Hemingway
escritores americanos expatriados tornou-se porta-voz de sua gera­ção.
como Sherwood An­derson, Ezra Mas, em vez de pintar seu fas­cínio
Pound, F. Scott Fitz­gerald e Gertrude fatal, como fez Fitz­gerald, que nunca
Stein. Esta, em especial, influenciou lutou na I Guerra Mun­dial,  Hemingway
seu estilo despojado. escreveu sobre a guer­ra, a morte e a
Depois de seu romance The Sun “geração perdi­da” de sobreviventes
Also Rises [O Sol Também se Le­vanta] cínicos. Suas per­sonagens não são
(1926) trazer-lhe a fama, cobriu a sonha­doras,  mas toureiros,  sol­dados e
Guerra Civil Espanhola, a Segunda atletas du­rões.  Se intelec­tuais,  são pro­
Guerra Mundial e a luta na China nos fun­damente marca­das e desi­lu­didas.
anos 40. Num safári na África, ficou Sua marca é um estilo limpo,li­­vre
gravemente ferido quando seu peque­ de palavras inúteis. Usa fre­­quen­
no avião caiu; ainda assim continuou te­mente declarações atenuadas.
a apreciar a caça e pesca esportiva, Em A Farewell to Arms [Adeus às
ativi­dades que inspiraram alguns de Armas] (1929), a heroí­na morre no
seus me­lhores trabalhos.The Old Man parto dizendo “Não es­tou nem um
and the Sea [O Velho e o Mar] (1952), pouco com medo. Tu­do não passa
um curto romance poé­tico sobre um de um truque sujo”. Uma vez, com­­­
pobre e velho pescador que he­roi­ pa­rou suas o­bras a icebergs:“Há sete
camente pesca um peixe enorme oitavos de­les de­baixo d’água para
que é devorado por  tubarões,  deu-lhe cada parte visí­vel.”
o Prêmio Pulitzer em 1953; no ano O ótimo ouvido para diálo­gos
seguinte, recebeu o Prêmio Nobel. e descrições precisas de He­ming­
Desencorajado por sua vida familiar way aparece em excelentes contos,
problemática, doença, e a crença co­mo “The Snows of Kilimanjaro”
de que estivesse perdendo o dom [As Ne­ves do Kilimanjaro] e “The
de escrever, Hemingway suicidou-se Short Happy Life of Francis Ma­
com um tiro em 1961. Robert Forst com­­ber” [A Vida Curta e Feliz de

H
emingway talvez seja o roman­ Fran­cis Ma­comber]. A crítica, de
cista americano mais popular fa­­t o, geral­m ente consi­d era seus
deste sécu­lo. Suas simpatias con­tos tão bons, ou até melho­res
são basicamente apolíticas e huma­ que os ro­man­­ces. Seus prin­ci­pais
nistas e, nesse sentido, ele é universal. romances in­cluem The Sun Al­so
Seu estilo simples torna seus roman­ Rises [O Sol Também se Le­van­­­ta],
ces fáceis de entender e geralmente sobre a vida desalentadora dos
se pas­sam em cenários exóticos. expatriados a­pós a I Guerra Mun­­
Adepto do “culto à experiência”, dial; A Farewell to Arms [A­deus às
Heming­way frequentemente envolvia Foto © UPI/The Bettmann Armas], so­bre o trágico ro­mance
suas personagens em situações peri­ Archive entre um sol­dado ameri­cano e uma

73
enfer­mei­ra ingle­sa durante a guerra; talvez seu melhor trabalho, sobre a
For Whom the Bell Tolls [Por Quem ascenção de um fazendeiro pe­los
os Sinos Do­bram] (1940), passado seus próprios méritos e sua trágica
durante a Guerra Civil Espanhola e decadência pelo precon­ceito racial
The Old Man and the Sea [O Velho e in­ca­pa­cidade de amar.
e o Mar]. A maioria desses romances usa
personagens diferentes para con­tar
William Faulkner (1897-1962) partes da história e de­mons­trar que
Nascido numa velha família su­lista, o significado reside tanto na forma
William Harrison Faulkner foi criado de con­tar, como no pró­prio ob­jeto.
em Oxford, Mississipi, onde passou a O uso de diversos pon­tos de vista
maior parte de sua vida. Criou todo torna Faulkner mais autorreferen­
um cenário imagi­nativo, o Condado cial ou “reflexivo” que He­ming­way
de Yoknapa­taw­pha, mencionado em ou Fitzgerald; cada ro­man­ce reflete
vários roman­ces, além de várias famí­ sobre si mesmo,en­quanto desdobra
lias com liga­ções entre si há várias ge­ uma história de in­teresse universal.
rações.O Condado deYoknapatawpha, Os temas de Faul­kner são as tradi­
com sua capital,“Jefferson”, se pa­re­ce ções do Sul, família, comunidade,
muito com Oxford, Missis­sipi e seus a terra, his­tória e o passado, raça e
arre­dores. Faulkner re­cria a história as pai­xões da ambição e do amor.
da terra e das várias ra­ças — in­dígena, Tam­bém cri­ou três romances cen­
afro-americana, euro-ame­ricana e trados na as­censão de uma família
várias misturas — que já viveram nela. degenerada, o clã dos Snopes: The
Escritor ino­vador,  Faulkner experimen­ Hamlet [A Aldeia] (1940), The Town
tou brilhantemente com a cronologia [A Ci­da­de] (1957) e The Mansion
narrativa, diferentes pontos de vis­ta [A Man­são] (1959).
e vozes (incluindo as de margi­nais,
crianças e analfabetos) e um estilo bar­ ROMANCES DE
roco rico e exi­gente, cons­truído com CONSCIÊNCIA SOCIAL

D
sentenças ex­tre­ma­men­te longas e esde a década de1890, uma
repletas de subor­dinadas complicadas. tendência latente de protesto
Os melhores romances de Faul­ Sinclair Lewis social fluiu na litera­tu­ra ame­
kner incluem The Sound and the ricana, vertendo no natu­ra­lismo de
Fury [O Som e a Fúria] (1929) e Stephen Crane e Theo­dore Dreiser e
As I Lay Dying [Deitado Mor­ren­do] nas mensagens cla­ras dos romancistas
(1930), duas obras moder­n is­tas muck­racking. Os autores socialmente
experimentando com pontos de en­ga­jados que vieram depois in­
vista e vozes para perscrutar famí­lias cluem Sinclair Lewis, John Stein­beck,
sulistas sob a tensão de perder um John Dos Passos, Richard Wright e o
membro da família; Light in August drama­turgo Clifford Odets. Estavam
[Luz em Agosto] (1932), sobre rela­ liga­dos aos anos 30 em sua preocu­
ções complexas e violen­tas entre pação com o bem-estar do cidadão
uma mulher branca e um ho­mem Foto, cortesia comum e enfoque em grupos de
negro e Absalom, Absa­lom! (1936), Pix Publishing, Inc.
pes­soas — as profissões, como nos

74
arquétipos Arrowsmith (um médi­co) desi­lu­dido por um caso com uma
e Babbitt (um empresário local) de mu­lher boê­mia, volta para a esposa
Sinclair Lewis; famílias,como em The e aceita seu des­tino. O romance
Gra­pes of Wrath [As Vinhas da Ira] de adi­cionou uma nova palavra ao
Steinbeck; ou massas urbanas, como voca­bu­­lário americano – “Babbittry”,
consegue John Dos Passos, por seus sig­ni­fi­cando mentalidade tacanha,
onze principais per­sonagens em sua com­pla­­cência e modos burgueses.
trilogia U.S.A. El­mer Gantry (1927) expõe a religião
avivada nos Esta­dos Unidos,en­quanto
Sinclair Lewis (1885 - 1951) Cass Timber­la­ne (1945) estuda as ten­
Harry Sinclair Lewis nasceu em sões que crescem no casamento entre
Sauk Centre, Minnesota, e formou-se um juiz já maduro e sua jovem es­posa.
pela Universidade de Yale. Inter­
rompeu seus estu­dos para traba­lhar John Dos Passos (1896 - 1970)
numa comu­nidade  socialista,  Helicon Como Lewis, John Dos Passos
Home Colony, financiada pelo ro­ começou como radical de esquer­
mancista muckraking Up­ton Sinclair. da, mas, com a idade, mo­veu-se
Main Street [Rua Prin­cipal] (1920) para a direita. Dos Passos escreveu
de Lewis satiri­zou a vi­da monótona e realisticamente, alinhado à doutri­na
hipócrita da cidadezinha de Gopher do realismo so­cia­lista.Seus me­lhores
Prairie, Minnesota. Sua apre­sentação trabalhos atin­­gem um obje­ti­vismo
inci­si­va da vida ame­ricana e a crí­ científico e o efeito de um quase
tica ao materia­lismo, menta­lidade documen­tário. Dos Passos de­­sen­
tacanha e hipo­crisia do americano volveu uma técnica experimental de
rendeu-lhe reco­nheci­mento nacio­ colagem para sua obra-pri­ma, U.S.A.,
nal e inter­na­cio­nal. Em 1926, ofe­ formada por 42nd Parallel [Para­lelo
receram-lhe, mas ele declinou, o Prê­ 42] (1930), 1919 (1932), e The Big
mio Pulitzer por Arrowsmith (1925), Money [O Di­nheiro Gran­de] (1936).
romance descrevendo os esfor­ços A lon­ga coletâ­nea cobre a história
de um mé­dico para man­ter sua ética social dos Estados Unidos de 1900 a
médica em meio à ga­nân­­cia e cor­ 1930 e expõe a cor­rupção moral da
rupção.Em 1930,tor­nou-se o pri­meiro John Steinbeck sociedade ame­­ricana materia­lista
americano a ga­nhar o Prê­mio Nobel pelas vidas de suas persona­gens.
de Lite­ratura. As novas técnicas de Dos Passos

O
s principais romances de incluíam segmentos de “newsreel”
Lewis incluem Babbitt (1922). [noticiário cinematográfico] tira­dos
George Babbitt é um empre­ de manchetes contemporâ­n eas,
sário comum que vive e trabalha canções populares e anún­cios, além
em Zenith, uma cidade americana de “biografias” resu­mindo a vida de
comum. Babbitt é em­preendedor, de americanos impor­tantes na época,
princí­pios morais, que crê nos negó­ como o inventor Thomas Edison, o
cios como a nova abordagem cien­ organi­zador sin­dical Eugene Debs,
tífica para a vi­da mo­derna.Tornando- Foto, cortesia o astro de cine­ma Rodolfo Valen­tino,
se inquie­to, busca rea­lização mas é Pinney & Beecher o financista J.P.Morgan e o sociólogo

75
Thorstein Veblen. Os newsreels e as a sofrer em épocas de instabilidade
biogra­fias dão aos seus romances política e depressão econômica.
um valor de documentário; uma
ter­cei­ra técnica, o “olho da câmera”, A RENASCENÇA DE HARLEM

D
con­sis­te de poemas em prosa de urante a exuberante década
flu­xo de consciência que oferecem de 1920, o Harlem, a co­
uma resposta subjetiva aos eventos mu­nidade negra ao nor­te
descritos nos livros. da cidade de Nova York, brilhava
com entusiasmo e criatividade. Os
John Steibeck (1902 - 1968) sons de seu jazz negro americano
Como Sinclair Lewis, John varreram os Estados Unidos e mú­
Steinbeck é hoje mais admirado si­­cos e compositores de jazz, como
pela crítica fora dos Estados Unidos, Duke Ellington, tornaram-se as­tros
em grande medida,porque re­ce­beu dentro e fora dos Estados Uni­dos.
o Prêmio Nobel de Literatura em Bessie Smith e outras cantoras do
1963 e a fama interna­cional que blues apresentavam letras francas,
o mesmo confere. Em ambos os sensuais e tortuosas,  transbor­dando
casos, o Comitê Nobel es­colheu de emoção.  Os spirituals dos negros
americanos liberais conhe­cidos por passaram a ser apre­ciados como
sua crítica social. música religiosa de excepcional
Steinbeck, califórniano, situou beleza. Ethel Waters, a atriz negra,
muitas de suas histórias no Vale de venceu no palco,  e a dança e a arte
Salinas, perto de São Francisco. Seu negra america­na floresceram com
romance mais conhecido é The música e drama.
Grapes of Wrath [As Vinhas da Ira] Em meio à rica variedade de ta­
(1939),ganhador do Prêmio Pulit­zer, lentos do Harlem coexistiam di­ver­sas
que acompanha a labuta de uma fa­ visões.O romance de CarlVanVechten
mília pobre de Oklahoma que perde de 1926,simpático ao Harlem,dá uma
suas terras na Depres­são e vai para ideia da vida com­plexa e sofrida da
a Califórnia em busca de trabalho.A América Negra face à desigualdade
famí­lia é submetida a condições de eco­nômica e social.
opressão feudais pelos ricos donos O poeta Countee Cullen (1903 -
de terras. Outras histórias passa­das 1946), nascido no Harlem e casado
Jean Toomer
na Califórnia incluem Tortilla Flat por pouco tempo com a filha de
(1935), Of Mice and Men [So­bre W.E.B Du Bois,  criou poesias rima­das
Ratos e Homens] (1937), Cannery de alta qualidade, dentro das formas
Row (1945) e East of Eden [A Leste então aceitas, que foram muito elo­
do Éden] (1952). giadas por brancos. Ele acreditava
Steinbeck une realismo a um ro­ que um poeta não deveria permitir
mantismo primitivo que acha virtude que a raça ditasse o tema ou o estilo
em pobres agricultores próximos à de seus versos.  No outro lado do es­
terra. Sua ficção demonstra a vulnera­ pectro estavam afro-americanos,que
Foto © UPI/The Bettmann
bilidade dessas pessoas, que podem Archive
rejeitavam os Estados Unidos, em fa­
ser ex­pul­­­sas pela seca e as primeiras vor do movi­mento de Marcus Garvey,
76
chamado “Back to Africa” [De Volta Richard Wright (1908 - 1960)
para a Á­fri­ca].Jean Toomer fica entre Richard Wright nasceu nu­
essas duas posições divergentes. ma família pobre de meeiros do
Mississipi que o pai abandonou
Jean Toomer (1894 - 1967) quando ele tinha 5 anos. Wright
Como Cullen,o poeta e escritor de foi o primeiro romancista afro­
ficção afro-americano Jean Toomer -americano a alcançar o grande
vislumbrava uma iden­tidade ame­ público, embora só tenha frequen­
ricana que transcen­deria a raça. tado a escola até a nona série. Sua
Talvez por isso,tenha empregado com infância difícil é descrita em um
brilhantismo tra­dições poéticas de de seus melhores livros, o autobio­
rima e métrica e não tenha buscado gráfico Black Boy [Menino Negro]
novas formas “negras” de poesia. Sua (1945). Ele disse mais tarde que
principal obra, Cane [Cana] (1923), sua sentido de privação, devido ao
é, contu­do, ambiciosa e inovadora. racismo, era tão grande, que ape­nas
Como Paterson, de Williams, Cane a leitura o manteve vivo.
incor­pora versos, vinhetas em prosa, Wright foi fortemente inspirado
histórias e notas autobiográficas.Nela, pela crítica social e pelo realismo
um afro-americano luta para desco­ de Sherwood Anderson, Theodore
brir sua identidade dentro e além Dreiser e sobretudo de Sinclair
das comunidades negras da Georgia Lewis. Durante a década de 30,
rural,de Washington D.C., de Chicago, afiliou-se ao partido comunista. Nos
Illinois e também como professor anos 40, foi viver na França, onde já
negro no sul. Em Cane, os negros da conhecia Gertrude Stein e Jean-Paul
Georgia rural são vistos por Toomer Sartre, e lá tor­nou-se anticomunista.
como natural­mente artísticos: Seus textos muito francos abriram
caminho para os romancistas afro-
Suas vozes se elevam.... os pinheiros
ameri­canos que vieram depois.
são violões,
Sua obra inclui Uncle Tom’s
Dedilhando, folhas de pinheiro caem Richard Wright Children [Os Filhos do Pai Tomás]
como lençóis de chuva...
(1938),um livro de contos,e o pode­
Suas vozes se elevam.... o coro
ro­so e inexorável romance Native
da cana
Son [Filho Nativo] (1940), em que
Canta as vésperas para as estrelas....
Bigger Thomas, jovem negro sem
(I, 21-24)
instrução,mata sem querer a filha de
Cane contrasta o ritmo acelera­ seu patrão bran­co,queima de forma
do da vida dos afro-americanos na horrível o corpo, e finalmente mata
cidade de Wa­shington, D.C.: sua na­mo­rada negra — receioso
de que ela o traia. Embora alguns
O dinheiro queima o bolso, bolso dói, afro-americanos tenham criticado
Contrabandistas em camisas de seda, Foto, cortesia Wright por retratar uma persona­gem
Howard University
Imensos Cadilacs vibrando, negra que é assassina, o romance
Passando zunindo pelos trilhos de Wright foi uma expres­são, de
do bonde. (II, 1-4) há muito devida, da desi­gualdade
77
racial que tem sido objeto de tanta casamentos. O romance evoca vivi­
polêmica nos Estados Unidos. da­mente a vida dos afro-america­nos
que trabalham a terra no sul rural.
Zora Neale Hurston Precursora do movimento feminis­
(1903 - 1960) ta, Hurston inspirou e in­fluenciou
Nascida em Eatonville, pequena escritoras contemporâ­neas,como Toni
ci­da­de da Flórida, Zora Neale Hurs­­ Morrison e Alice Walker,  graças a livros
ton é conhecida como uma das luzes como sua autobiografia,  DustTracks on
da Renascença do Har­lem. Aos 16 a Road [Trilhas de Poeira numa Es­tra­
anos,veio pela primei­ra vez à cidade da] (1942)
de NovaYork,como mem­bro de uma
troupe teatral itine­ran­te. Contadora CORRENTES LITERÁRIAS:
de histórias excepcionalmente ta­ OS FUGITIVOS
lentosa, que cativava seus ouvintes, E A NOVA CRÍTICA

D
frequentou o Barnard College, onde esde a Guerra Civil, o sul
estudou com o antropólogo Franz dos Estados Unidos havia
Boaz e pas­­sou a compreender a et­ permanecido atrasado po­lí­
nicidade a partir de uma perspectiva tica e economicamente, dominado
cien­tífica. Boaz incentivou-a a reco­ pelo racismo e pela superstição,mas,
lher o folclore de sua Flórida nativa. ao mesmo tempo, abençoado por
O eminente folclorista Alan Lomax um folclore rico e um forte sentido
descreveu Mules and Men [Mu­­las e de orgulho e tradição. Ti­nha a fama
Homens] (1935) como “o livro mais imerecida de ser um deserto cultural
cativante, genuíno e bem es­cri­to no de provincianismo e ignorância.
campo do folclore”. É irônico que o movimento lite­
Hurston também passou algum rário regional mais significativo no
tempo no Haiti estudando vodu e século 20 tenha sido o dos Fugi­tivos
recolhendo o folclore do Caribe, — liderados pelo poeta, crí­tico e
que resultou em Tell My Horse teórico John Crowe Ransom,o poeta
[Di­­­ga ao Meu Cavalo] (1938). Seu Allen Tate e o romancista,poeta e en­
domínio natural do inglês coloquial saísta Robert Penn Warren.Essa esco­
a in­sere na grande tradição de Mark la literária do Sul re­jei­tava os valores
Twain. Seus textos brilham com Zora Neale Hurston urbanos e comer­ciais“do Norte”,que
uma linguagem colorida e his­tó­rias sentiam que havia dominado toda a
cômicas – ou trágicas – da tradição América.Os Fugitivos clamavam pela
oral afro-americana. volta à ter­ra e às tradições america­
Hurston era uma romancista nas que podiam ser encontradas no
im­pressionante. Sua obra mais im­ Sul. O movimento tomou seu nome
portante, Their Eyes Were Watching de uma revista literária, The Fugitive
God [Seus Olhos Observavam a [O Fugitivo],que circulou entre 1922
Deus] (1937), é um relato tocante Foto © Carl Van Vechten, e 1925 na Universidade de Vanderbilt
cortesia Yale University
e inovador do amadu­recimento e em Nashville, Tennessee, e com a
da redescoberta da felicidade de qual Ransom,Tate e War­ren estavam
uma linda mulata ao longo de três associados.
78
Esses três principais escritores da Estados Uni­dos.Além disso, as peças
escola dos Fugitivos eram tam­bém importa­das, como o vinho importa­
associados ao New Criticism [Nova do, des­fru­tavam de mais prestígio
Crítica],que buscava a compreen­são que as produções domésticas.
da literatura com base em lei­turas Durante o século 19, foram po­
meticulosas e atenção aos pa­drões pulares os melodramas com figu­ras
formais (de imagens, metá­foras, democráticas exemplares e cla­ros
métrica,sons e símbolos) e seus signi­ contrastes entre o bem e o mal.Peças
ficados sugeridos. Ransom, principal sobre problemas sociais, co­mo a
teórico da renas­cença sulista entre as escravidão, também atra­íam grandes
duas guer­ras, publicou um livro, The plateias. Às vezes, es­sas peças eram
New Criticism [A Nova Crítica] (1941), adaptações de roman­ces,como Uncle
sobre esse método,que oferecia uma Tom’s Cabin.Não foi senão no século
alternativa aos métodos ante­riores 20 que a peças sérias buscaram a
extra-literários,baseados na história e inovação esté­tica. A cultura popular,
na biografia.A Nova Crítica tornou-se contudo,apresentava desenvolvimen­
a abordagem crí­tica dominante na tos vi­tais,especialmen­te no vaudeville
América entre os anos 40 e 50 porque (espetáculo de variedades, com es­
pro­vou ser adequada à análise de quetes satíricos, palhaçadas, músi­ca,
es­cri­tores modernistas, como Eliot, etc.). Apresentações de menes­tréis
e capaz de absorver a teoria freu­ baseadas em música e folclore afro­
diana (especialmente suas ca­te­go­rias -americano — interpretadas por
estruturais como id, ego e superego) personagens brancas usando ma­
e abordagens inspiradas em padrões quiagem “blackface” (rosto pin­tado
míticos. de preto) — também desen­volveram
formas e expressões ori­ginais.
DRAMA AMERICANO
NO SÉCULO 20 Eugene O’Neill (1888 - 1935)

A
dramaturgia americana conti­ Eugene O’Neill é a grande figura
nuou imitando o teatro inglês do teatro americano. Suas nume­
europeu, durante boa parte rosas peças reúnem enorme origi­
do sé­culo 20. Frequentemente, as nalidade técnica, visão inovadora
peças da Inglaterra ou traduzidas e profundidade emocional. Suas
de lín­guas europeias dominavam as
Eugene O’Neil
pri­meiras peças tratam da classe
tem­poradas teatrais. Uma legislação trabalhadora e dos pobres; traba­
ina­dequada de direitos autorais, lhos posteriores exploram áreas
que não protegia nem promovia os subjetivas, como as ob­sessões e o
autores americanos, prejudicou a sexo, e destacam suas lei­tu­ras de
dramaturgia autêntica.Assim o fez o Freud,bem como sua ten­tativa deses­
“star system” [sistema de estre­lato], perada se reconciliar com sua mãe
em que os atores e atrizes, e não as morta,  seu pai e seu irmão. Sua peça
peças propriamente ditas,eram acla­ Desire Under the Elms [Desejo sob
mados.Os americanos acor­riam para os Olmos] (1924) recria as paixões
Foto © The Bettmann Archive
ver artistas euro­peus em turnês pelos latentes numa família; The Great God
79
Brown [O Grande Deus Brown] (1926) revela a Thornton Wilder (1897 - 1975)
inconsciência de um rico empresário e Stran­ge Thornton Wilder é conhecido por suas peças
Interlude [Estranho Interlúdio] (1928),  ganhador Our Town [Nossa Cidade] (1938) e The Skin of
do Prêmio Pulitzer,narra os amo­res emaranhados Our Teeth [Por Um Triz] (1942) e por seu ro­mance
de uma mulher.Essas pe­ças po­derosas revelam di­ The Bridge of San Luis Rey [A Ponte de San Luis
ferentes personalidades re­vertendo para emoções Rey] (1927).
primitivas ou confu­são sob intensa pressão. Our Town evoca valores americanos positi­vos.
O’Neill continuou a explorar as tensões freu­ Tem todos os elementos do sentimenta­lismo e da
dianas do amor e do domínio dentro de famílias nostalgia — o arquétipo da cidadezi­nha rural
numa trilogia de peças coletivamente intitula­das tradicional, os pais bondosos e crian­ças traves­
Mourning Becomes Electra [Electra Fica Bem sas, os jovens amantes. Ainda assim, elementos
de Luto] (1931), baseada na trilogia clás­sica de inovadores, como fantasmas, vozes na plateia
Édipo,de Sófocles. Suas peças posterio­res incluem e ousados deslocamentos no tempo a mantêm
reconhecidas obras-primas: The Iceman Cometh atraente. É, na realidade, uma peça sobre vida e
[A Vinda do Homem do Gelo] (1946), obra severa morte, em que os mortos renascem, pelo menos
sobre o tema da morte, e Long Day’s Journey Into naquele momento.
Night [A Longa Viagem para Dentro da Noite]
(1956),poderosa e extensa autobiografia em forma Clifford Odets (1906 - 1963)
dramática, que enfoca sua própria família e sua Clifford Odets, mestre do drama social, veio
deterio­ração física e psicológica, testemunhada de uma família judia emigrada da Europa
no decorrer de uma noite. Esta última faz parte oriental. Criado em Nova York, foi um dos atores
de um conjunto de peças em que O’Neill estava fundadores do Group Theater,diri­gido por Harold
trabalhando quando morreu. Clurman, Lee Stras­berg e Cheryl Crawford, cujo
O’Neill redefiniu o teatro ao abandonar as divi­ compromisso era produ­zir apenas peças de
sões tradicionais de atos e cenas (Strange Inter­lude autores ameri­canos.
tem nove atos, e Mourning Becomes Elec­tra leva Sua peça mais conhecida é Waiting for Lefty
nove horas para ser encenada); ao usar máscaras, [Esperando por Lefty] (1935), obra experimen­
como as que são encontradas no teatro da Ásia e tal de um ato que advoga fervorosa­mente o
da Grécia antiga; ao introduzir monólogos shakes­ sindicalismo. Seu Awake and Sing! [Acor­de e
pearianos e coros gregos; e ao produzir efeitos Cante!], drama familiar nostálgico, tornou-se
especiais por meio de luz e som.Ele é geralmente outro sucesso, seguido de Golden Boy [Menino
reconhecido co­mo o dramaturgo mais importante Dourado], história de um jovem imigrante
da Améri­ca.Em 1936, recebeu o Prêmio Nobel de ita­liano que arruina seu talento musical (ele
Lite­ra­tura — o primeiro dramaturgo americano a é violinista) quando, seduzido pelo dinheiro,
receber tal distinção. acei­ta ser boxeador e fere suas mãos. Como
The Great Gatsby de Fitzgerald e An American
Tra­gedy de Dreiser, a peça alerta para os perigos
do excesso de ambição e materialismo. 

80
CAPÍTULO
socie­dade americana, po­rém, foi o adven­to da
mídia e da cultura de massa. Pri­mei­ro o rádio,
o cinema e depois a presen­ça de uma televisão

7
ubíqua e to­da poderosa mu­daram radicalmente a
vida americana.De uma cultura elitizada,privada
e instruída,ba­seada no livro e na leitura,os Estados
Unidos se tornaram uma cultura de mídia, liga­da
à voz no radio, à música dos CDs e dos cassetes,
POESIA AMERICANA aos filmes e às imagens da tela da televisão.
1945 - 1999: A poesia americana foi diretamente influen­
A ANTITRADIÇÃO ciada pela mídia de massa e tecnologia eletrô­
nica. Filmes, videoteipes e gravações em fita

F
ormas e ideias tradicionais não pareciam de declamações de poesia e entrevistas com
prover mais sentido a muitos poetas ameri­ poe­tasse tornaram disponíveis e novos méto­
canos na segunda metade do século 20. Os dos fo­to­­gráficos de impressão mais accessíveis
eventos após a Segunda Guerra Mundial geraram estimularam jovens poetas a publicarem suas
um sentido de história descon­tínua: cada ato, pró­prias obras e jovens editores a fundarem
emoção e momento era visto como único. Estilo revis­tas literárias — das quais existiam mais de
e forma ago­ra pareciam provisó­rios,improvisados, 2.000 em torno de 1990.
refle­xos do processo de composição e autocons­ Ao mesmo tempo, os americanos se tornaram
ciên­cia do escritor. Ca­tegorias familiares de desconfortavelmente conscientes de que a
expres­são eram sus­peitas; a originalidade tornava­ tecnologia, tão útil como ferramenta, poderia
-se uma nova tradição. ser usada para manipular a cultura. Para os
A quebra com a tradição ganhou impulso du­ ame­ricanos em busca de alter­nativas, a poesia
rante o julgamento por obscenidade do poema pa­recia mais relevante do que nun­­ca: oferecia às
Howl [Uivo] de Allen Ginsberg,em 1957.Quando pessoas um modo de ex­pres­sar a vida subje­tiva e
a alfândega de São Francisco apreendeu o livro, articular o impacto da tecnologia e da so­cie­dade
sua editora,a City Lights,de Laurence Ferlinghetti, de massa sobre o indivíduo.
moveu uma ação. Durante aquele notório julga­ Vários estilos, alguns regionais, ou­tros asso­
mento, críticos famosos defenderam a crítica cia­dos a escolas ou poetas fa­mosos, dis­­putavam
social apaixonada de Howl com base em seu atenção; a poesia ameri­cana após a Segunda
mérito literário redentor. O triunfo de Howl sobre Guerra Mundial era descen­tralizada, rica­men­
os censores ajudou a empulsionar os poetas Beat te variada e impossível de se resumir. Para
rebeldes – especialmente Ginsberg e seus amigos fins de discussão, porém, pode ser disposta ao
Jack Kerouac e William Burroughs — para a fama. longo de um espectro pro­duzindo três campos
Não é difícil achar causas históricas para essa sobre­postos — num ex­tre­mo, o tradi­cional; no
sensibilidade desassociada nos Estados Uni­dos. meio, o idios­sincrático e; no outro ex­tre­mo, o
A própria Segunda Guerra Mundial, a elevação ex­pe­rimental. Poetas tra­dicionais têm man­­tido
do anonimato e consumismo numa socieda­de ou revita­lizado tra­dições poé­ticas. Os poe­tas
urbana de massa, os movimentos de protesto idios­sincráticos recor­rem tanto a téc­nicas tradi­
nos anos 60, o conflito de uma década no Viet­nã, cio­nais quanto inovadoras para produzir vozes
a Guerra Fria, ameaças ambientais — a coleção singulares. Os experi­men­tais buscam no­vos
de choques sofridos pela cultura ame­ricana é estilos culturais.
extensa e variada. O que mais transfor­mou a

81
enfim,em Deus.”Allen Tate (1899 -1979) terminou um
TRADICIONALISMO poema assim: “Senti­nela do tú­mu­lo, que a nós todos

O
s escritores tradicionais incluem os reco­ con­ta!”Poetas tradicio­nais também gostam de usar às
nhecidos mestres das formas e da dicção vezes uma dic­ção retórica,de palavras obsoletas ou
tradicionais, que escrevem com des­treza estra­nhas,e muitos adjetivos (ex.:“coruja sepul­cral”)
facilmente iden­tificável, usando, em ge­ral­, rimas e inversões, em que a ordem natural das pala­vras
ou padrão métrico pre­esta­be­lecido. Costumam no inglês falado é alterada de forma pouco natural.
ser da cos­ta leste ou do sul do país e lecionam Às ve­zes o efeito é no­bre,como na linha de Warren;
em faculdades e universi­dades. Richard Eberhart em outras, a poesia parece afetada, sem qualquer
e Richard Wilbur; os poetas Fu­gitivos mais velhos relação com emoções reais, como na linha de Tate:
John Crowe Ransom, Allen Tate e Robert Penn “Presunçosamente tocou as orlas dos hierofantes.”
Warren; jovens poetas talentosos como John Ocasionalmente, como em Hollander,  How­
Hollander e Richard Howard e o iniciante Robert ard e James Merrill (1926-1995), a dicção
Lowell, são exem­plos. Estão estabelecidos e suas autocons­ciente se combina com chiste, troca­
obras são com fre­quência incluídas em antologias. di­lhos e alusões literárias. Merrill, que é muito
O capítulo anterior discutiu o refinamento, inova­dor por seus temas urbanos,versos bran­cos,
o respeito pela na­­tu­reza e os valores profun­ temas pessoais e tom de conversa leve, compar­
da­mente conser­vadores dos Fugitivos. Essas tilha com os tradicionais o hábito do chiste em
qua­lidades enfeitam muitas obras poéticas “The Broken Heart” [Coração Partido] (1966),
guiadas pelos moldes tradicionais. Os poetas escrevendo sobre o casamento como se fosse
tradi­cio­na­is são em geral precisos, rea­lis­tas e um coquetel:
espirituo­­sos; como Richard Wilbur (1921­- ), são
mui­tas vezes influenciados nessas direções por Sempre aquela velha história -
poetas metafísicos ingleses dos séculos 15 e Pai Tempo e Mãe Terra,
16, reva­lorizados por T.  S.  Eliot. No poema mais Um casamento com gelo.
famoso de Wilbur, “A World Without Objects Is a

A
Sensible Emptiness” [Um Mun­do Sem Objetos é fluência óbvia e a pirotecnia verbal de al­guns
Um Vazio Sensorial] (1950) o tí­tulo foi em­pres­ poetas, como Merrill e John Ashbery, os tor­
tado de Thomas Tra­herne, poeta metafí­sico. A nam bem sucedidos, em termos tradicionais,
abertura vívida ilustra a clareza encon­trada por embora sua poesia redefina a arte poética de forma
alguns poetas na rima e regula­ridade formal: radicalmente inovadora. A elegância esti­lística faz
alguns poetas parecerem mais tradi­cio­nais do que
Os altos camelos do espírito são, como no caso de Randall Jarrell (1914-1965) e
Dirigem-se para seus desertos, passando ruidosa­ A.R. Ammons (1926-2001). Ammons cria diálogos
mente os últimos arvoredos intensos entre a huma­nidade e a natureza; Jarrell
Com o estridular de serraria do gafanhoto, para o entra na consciên­cia encurralada dos expropriados
mel pleno do árido — mulheres,crianças,soldados condenados,como
Sol. São lentos, orgulhosos... em “The Death of the Ball Turret Gunner” [A Morte
do Artilheiro da Torre de Tiro] (1945):
Os poetas tradicionais,ao contrário de muitos ex­
perimentais que desconfiam da dicção“muito poé­ Do sono de minha mãe caí no Estado,
tica”, apre­ciam linhas poéticas resso­nan­tes. Robert E curvei-me em seu ventre até meu pelo molhado
Penn Warren (1905-1989) concluiu um poema com: congelar.
“Para amar tão bem o mundo que possamos crer, Seis milhas da terra, livre de seu sonho de vida,

82
Acordei para um fogo antiaéreo negro e relacionado no meio polí­ti­co e social.
lutadores de pesadelo. Descendia de uma res­pei­tável família
Quando morri lavaram-me para fora da ‘Brâmane’ de Boston que incluía o
torre com uma mangueira. famoso poeta Ja­mes Russell Lowell,
do século 19,e um presidente recente
Embora muitos poetas tradicionais da Univer­sidade de Harvard. Robert
usem ri­ma,nem toda poesia rimada é Lowell,  porém, encontrou uma iden­
tradicional em tema ou tom.A poeta tidade fora de seu meio elitista.
Gwendolyn Brooks (1917-2000) fala Não estu­dou em Harvard, mas em
da dificuldade de viver — sem fa­lar Kenyon College, Ohio, onde rejeitou
de escrever — em favelas urbanas. sua ori­gem puritana e converteu-se
Seu “Kitchenette Building” [Prédio ao catolicismo. Preso por um ano
Kitchenette] (1945) pergunta como: co­mo opositor cons­ciente à Segunda
Guerra Mundial,mais tarde protestou
Poderia um sonho subir através do em pú­blico contra a Guerra doViet­­nã.
cheiro de cebola Seus primeiros livros, Land of
Seu branco e violeta, lutar com ba­ Un­likeness [Terra da Desseme­lhan­­
tatas fritas ça] (1944) e Lord Weary’s Cas­tle
E o lixo de ontem amadurecendo no [O Castelo de Lorde Weary] (1946),
corredor... ganhador do Prêmio Pulit­zer, reve­
laram grande controle de for­mas e
Muitos poetas, inclusive Brooks, estilos tradicionais, forte sentimento
Adri­enne Rich, Richard Wilbur, Ro­ e visão inten­samen­­te pes­­soal ainda
bert Lowell e Robert Penn Warren,es­ que histó­rica. A vio­lên­cia e espe­
creveram no início tradicio­­­nalmente, cificidade de suas pri­meiras obras
com rima e métrica, mas as abando­ são esmaga­doras em poemas como
naram nos anos 60, sob pressão dos “Children of Light” [Crianças da Luz]
eventos pú­blicos e da tendência (1946),conde­na­ção severa dos Puri­
gradual para formas abertas. tanos que ma­ta­ram índios e cujos
descenden­tes queimavam cereais
Robert Lowell (1917 - 1977) ex­ce­den­tes em vez de enviá-los aos

O
mais influente dos poetas famin­tos. Lowell escreve: “Nos­sos
recentes, Robert Lowell co­
Robert Lowell
pais extra­í­ram seu pão do tron­co e
meçou tradicio­n almente, das pe­dras / E cerca­ram seus jar­dins
mas foi influenciado por cor­rentes com ossos de peles-verme­lhas.”
experimen­tais.Como sua vida e obra Seu livro seguinte, The Mills of
abrangem o período entre mes­tres the Kavanaughs [Os Moinhos de
mo­­dernistas mais velhos, co­mo Ezra Kavanaughs] (1951), tem mo­nólo­
Pound,e escritores con­tem­­­porâneos, gos tocantes e dramáticos em que
sua carreira põe os experimentais membros da família reve­lam suas
posteriores num contexto maior. ternuras e falhas. Como sem­pre, seu
Lowell se encaixa no molde do estilo combina o hu­ma­­no e o ma­
escritor acadêmico: branco, ho­mem, jestoso. Usa muito a rima tradi­cional,
nacido protestante, ins­truí­do e bem Foto © Nancy Crampton mas seu colo­quia­lismo a dis­farça até

83
que pareça melodia de fundo. Foi a nal,novo modo em que des­nudava os
poesia experimental,porém,que deu problemas pessoais mais que mais o
a Lowell a ruptura para um idioma afligiam com grande honestidade e
cria­tivo individual. intensidade.Em es­sência,não apenas
Numa turnê de declamação nos descobriu sua individualidade como
anos 50, Lowell ou­viu pela pri­meira celebrou nela suas manifestações
vez as novas poesias expe­rimentais. mais pessoais e difíceis.Transfor­mou-
Howl [Uivo] de Allen Ginsberg e se num con­tem­porâneo, à vontade
Myths and Texts [Mitos e Textos] de com o ser, o fragmentado e a forma
Gary Snyder,  ain­da por publicar,esta­ en­quan­to processo.
vam sendo lidos e can­tados,  às vezes A transformação de Lowell, um
acompanhados de jazz, em cafés de divisor de águas para a poesia do pós­
North Beach, São Francisco. Lowell -guerra, abriu o caminho para outros
sentiu que, comparados a estes, seus jovens escritores. Em For the Union
poemas de reconhecido valor eram Dead [Para os Mortos da União]
muito formais, re­tóricos e presos a (1964), Notebook 1967-69 [Livro
con­ven­ções; ao lê-los em voz alta,foi Notas 1967-69] (1970) e livros subse­
intro­du­zindo revisões espontâ­neas, quentes,continuou suas explorações
em direção a uma dic­ção co­lo­quial. autobiográficas e inovações técnicas,
“Meus pró­prios poemas pa­reciam inspirando-se na experiência com a
mons­tros pré-históricos, ar­ras­tados psicanálise. A poesia confessional
brejo abaixo e mortos pela pesa­da de Lowell tem sido particularmente
ar­ma­dura”. Escre­veu de­pois, “Reci­ influente.As obras de John Berryman,
tava o que não mais sentia.” Anne Sexton, Sylvia Plath (as duas
Nessa altura, Lowell, como mui­tos úl­timas,suas alunas) e muitos ou­tros,
poetas depois dele, aceitou o de­safio seriam inimagináveis sem Lowell.
de aprender com a tradição rival na
América — a escola de William Carlos POETAS IDIOSSINCRÁTICOS

O
Williams. Em 1962, es­creveu:“É como s poetas que desenvolveram
se apenas Williams tivesse realmente estilos ímpares a partir da
enxergado a América ou ouvido tradição, estendendo-a po­rém
sua lingua­gem”. Desde então, Lowell para novos campos, com um sabor
mu­d ou radicalmente seu estilo, Sylvia Plath distintamente contem­po­râ­neo, além
incorpo­rando “as mudan­ças rápidas de Plath e Sexton, in­cluem John
de tom, atmosfera e ritmo” que tanto Berryman,Theodore Roethke,Richard
apreciava em Williams. Hugo, Philip Levine, James Dickey,
Lowell largou muitas de suas alu­ Elizabeth Bishop e Adrienne Rich.
sões obscuras;suas rimas tor­na­ram-se
integrantes da experi­ência poética, Sylvia Plath (1932 - 1963)
em vez de sobre­pos­tas.A estrutura de Sylvia Plath teve uma vida apa­ren­
estrofes tam­bém en­trou em colapso; temente exemplar: tendo cur­sado o
surgiram novas formas de improvisa­ Smith College como bolsista,  se forma­
ção.Em Life Studies [Estudos daVida] Foto © UPI/The Bettmann do em primeiro lugar em sua turma,
Archive
(1959),introduziu a poesia confessio­ e ganho uma bolsa Fulbright para

84
cursar a Universidade de Cambridge,na Inglaterra. com ela.
Lá co­nheceu seu carismático futuro marido, o Plath ousa usar linguagem de cantiga de roda e
poeta Ted Hughes, com quem teve dois filhos e se franqueza brutal. Ela tem um jei­to especial de usar
fixou nu­ma casa no campo da Inglaterra. Por trás imagens audaciosas da cultura popular. Sobre um
do aparente conto de fadas,fervilhavam problemas bebê,  ela escreveu certa vez:  “O amor te fez come­
psicoló­gicos evocados em The Bell Jar [O Pote em çar a funcionar,como um baita relógio de ouro.” Em
Forma de Sino] (1963), roman­ce agradabilíssimo. “Daddy”[Papai],ela imagina seu pai como o Drácula
Alguns desses problemas eram pessoais enquanto do cinema:“Há uma estaca em seu gordo coração
outros, de­correntes de atitudes repressoras para negro / E os aldeões jamais gostaram de você.”
com as mu­lheres nos anos 50. Entre estas, estava
a cren­ça — compartilhada pela maioria das mu­ Anne Sexton (1928 - 1974)
lheres — de que elas não deve­riam demons­trar Como Plath, Anne Sexton era uma mulher
raiva ou perseguir uma car­reira ambicio­samente, passional, que tentou ser esposa, mãe e poeta, às
ao invés disso,  deveriam contentar-se em cuidar do vésperas do movimento feminista nos Esta­dos
marido e filhos.  Mu­lheres bem sucedidas, como Unidos. Como Plath, sofria de doença mental e
Plath, viviam uma contradição. acabou se suicidando.
O conto de fadas de Plath desmoronou quan­ A poesia confessio­nal de Sexton é mais au­
do ela e Hughes se separaram e ela cuidou das tobiográfica que a de Plath e não apresenta a
crianças pequenas num apartamento em Lon­dres apurada qualidade dos primeiros poemas de Plath.
durante um inverno de frio extremo. Doen­te, iso­ Seus versos, contu­do, suscitam fortes emoções.
lada e em desespero, Plath tra­balhou sem parar Lançam temas tabus como sexo, culpa e suicídio.
para criar uma série de poemas marcan­tes, antes Introduzem, audaciosamente, temas femininos
de suicidar-se com gás, na cozinha. Es­ses poemas como par­to, o corpo feminino ou casamento, visto
foram reunidos no volume Ariel (1965) dois anos do ponto de vista da mulher. Em poemas como
após sua morte. Robert Lowell, que escreveu a “Her Kind” [Seu Tipo] (1960), Sexton se identifica
introdu­ção, destacou o rápido desenvolvimento com uma bruxa queimada viva na fogueira:
de sua poesia, desde o tempo em que ela e Anne
Sexton eram suas alunas de poesia em 1958. Já andei em sua carroça, condutor,
A poesia inicial de Plath é bem trabalhada acenei meus braços nus às aldeias que passavam,
e tradi­cional, mas seus últimos poemas exibem aprendendo as últimas rotas brilhantes, sobrevivente
uma bravura desesperada, um grito de angústia onde suas chamas ainda mordem minha coxa
pro­to-feminista. Em “The Applicant” [A Candi­data] e minhas costelas estalam onde suas rodas passam.
(1966), Plath expõe o vazio de seu atual papel de Uma mulher assim não tem vergonha de morrer.
esposa (reduzida a um “aquilo” inani­mado): Eu já fui de seu tipo.

Uma boneca viva, onde quer que você olhe. Os títulos de suas obras indicam sua preo­cupação
Pode costurar, pode cozinhar. com a loucura e a morte. Incluem To Bedlam and
Pode falar, falar, falar. Part Way Back [A Ida e a Volta Par­­cial Ao Hospício]
(1960), Live or Die [Viva ou Morra] (1966) e o livro
Trabalha, não há nada de errado com aquilo. póstumo The Awful Rowing Toward God [O Terrível
Você tem um buraco, é um cataplasma. Remar em Dire­ção a Deus] (1975).
Você tem um olho, é uma imagem.
Meu filho, é seu último recurso. John Berryman (1914 - 1972)
Será que você casa com ela, casa com ela, casa A vida de John Berryman assemelha-se à de

85
Robert Lowell em alguns aspectos. mas pa­re­cem taquigrafia da natureza
Nascido em Oklahoma, estudou no ou enig­mas antigos: “Quem aturdiu o
Nordeste — na escola preparatória pó em barulho? / Pergunte à tou­pei­ra,
e na Universidade de Columbia, ela sabe.”
depois foi bolsista na Universidade
de Prince­ton. Especializado em Richard Hugo (1923 - 1982)
métrica e formas tradi­cio­nais, foi Richard Hugo, natural de Seattle,
inspirado pelo início da história Washington, estudou com Theo­
ame­ricana e escreveu em seu Dream do­re Roethke. Cresceu pobre, em
Songs [Can­ções de Sonhos] (1969) am­bientes urbanos sombrios, e se
poemas confessio­nais, autocríticos, des­tacou ao comunicar as es­pe­­ran­
que apresentam uma perso­nagem ças, temores e frustrações dos tra­
autobiográfica grotesca, Henry, e balhadores contra o pano de fundo
reflexões sobre sua pró­pria rotina de do Noroeste dos Esta­dos U­nidos.
ensino,alcoo­lis­mo crônico e ambição. Hugo escreveu poemas con­fessio­
Como Theodore Roethke,  seu con­­ nais nostálgicos em ousados versos
temporâneo, Berryman desen­vol­­veu iâmbicos sobre pequenos vi­larejos
um estilo maleável, diver­tido, mas esquecidos em sua parte dos Esta­dos
profundo, enriquecido por fra­ses do Unidos; falou da vergo­nha, fracasso
folclore, cantigas de roda, chavões e e os raros momentos de aceitação
gíria. Sobre sua per­­so­nagem Henry, nos relacionamentos hu­manos. Cha­
Berryman es­cre­veu: “Ele encarou a ma­va a atenção do lei­tor a deta­
ruína.A ruí­na devolveu seu olhar.”Em lhes minuciosos, apa­ren­t e­m en­t e
outro tre­cho, escreveu espirituosa­ inconsequentes, para ressaltar ideias
mente, “Oh, ai de mim, ai de mim mais significativas. O poema“What
/ Quando é que a indiferença vai Thou Lovest Well, Remains American”
chegar, eu gemo e rujo.” [O Que Você Mui­to Ama Continua
Americano] (1975) termina com uma
Theodore Roethke pessoa car­­regando lembranças de
(1908 - 1963) sua ve­lha cidade natal,como comida:
Filho do proprietário de viveiro
James Dickey
de plantas, Theodore Roethke de­ caso você fique encalhado em alguma
sen­­vol­veu uma linguagem especial estranha cidade vazia
evo­cando o “mundo da estufa” de e precise de amantes famintos como
in­setos mi­núsculos e raízes ocul­tas: amigos, e precise sentir-se
Minho­ca, fique comigo. / Este é meu bem-vindo no clube de rua
tem­po de prova.” Seus poe­mas de que eles formaram.
a­mor em Words for the Wind [Pala­vras
ao Vento] (1958), celebram a beleza Philip Levine (1928 - )
e o desejo com paixão ino­cente. Um Philip Levine, nascido em Detroit,
poema come­ça: “Conhe­ci uma mu­ Michigan, lida diretamente com os
lher,linda em seus ossos / Quando os sofrimentos econômicos dos trabalha­
passarinhos suspira­vam,ela suspirava dores, através da obser­vação incisiva,
de volta para eles.”Às vezes,  seus poe­ Foto © Nancy Crampton raiva e ironia doloro­sa. Como Hugo,

86
sua origem é urba­na e pobre.Tem sido o que é preci­so.”
a voz do indi­ví­duo solitário a mercê Elizabeth Bishop (1911-1979) e
da América industrial. Muitos de Adrienne Rich (1929- )
seus versos são sombrios e refletem Entre as poetas do grupo idios­­
uma ten­dên­cia anárquica em meio sincrático, Elizabeth Bishop e
à reali­zação de que sempre existirão Adrienne Rich foram as que gran­
os sistemas de governo. jearam mais respeito nos últimos anos.
Em um poema,  Levine se com­para A inteligência cristalina e in­teresse por
a uma raposa que sobrevive num paisagens longín­quas e metáforas de
mundo perigoso de caçadores graças viagem de Bishop agradam os leitores
à coragem e esperteza. Em termos de por sua exati­dão e sutileza.Como sua
seu padrão rítmi­co, percorreu o cami­ mentora, Marianne Moo­re, Bishop
nho da métrica tradicional em suas escreveu poemas de grande destreza
obras iniciais, para versos mais livres, num estilo descritivo, que contém
abertos em seus trabalhos recentes ao profun­dida­des filosóficas ocultas. A
expres­sar seu protesto solitário contra descrição do Atlântico Norte gelado
os males do mundo contemporâneo. em “At the Fishhouses” [Nas peixarias]
po­de­ria aplicar-se também à sua
James Dickey (1923 - 1997) própria poesia:“É como imagina­mos
James Dickey, romancista e en­ que seja o conhecimento:/ es­cu­ro,  sal­
saísta, além de poeta, é natural da gado, claro, tocante, to­tal­mente livre.”
Georgia. Em suas próprias refle­xões, Com Moore, Bishop pode ser co­
cria que o principal tema de seus lo­cada na tradição de poetas “frias”,
trabalhos era a continuidade que remontando a Emily Dickin­­son, em
existe — ou precisa existir — en­tre comparação com a poesia“quente”de
o ser e o mundo. Boa parte de sua Plath, Sexton e Adrienne Rich.Embora
obra tem raízes na natureza — rios Rich te­nha iniciado com versos em
e montanhas, padrões cli­máticos e for­ma e métrica tradicionais, suas
os perigos à espreita na natureza. obras,  sobretudo as escritas após ter se
No fim da década de 60,co­me­çou tornado feminista ardorosa na década
a trabalhar num romance,  Deliverance de 1980,  incorporam fortes emoções.
[Libertação], sobre o lado sombrio Seu talento especial é para metáfo­
do relacionamento entre homens, Elizabeth Bishop ras,  como em “Diving Into the Wreck”
que, quando publi­cado e posterior­ [Mergulhando no Naufrágio] (1973),
mente filma­do, aumentou se reco­ trabalho extra­or­dinário que evoca a
nhecimento.Suas recentes coletâneas busca de uma mulher por sua iden­
de versos lidam com temas variados, tidade em termos de um mergulho
como a paisagem do Sul (Jericho:The num navio naufragado. Os destroços
South Beheld [Jericó: A Visão do Sul], são como a ruína da perso­nalidade
1974) e a influência da Bíblia sobre da mu­lher,  sugere o narrador; as mu­
sua vida (God’s Images [Ima­gens de lheres precisam encontrar seu cami­
Deus], 1977). Dickey com frequência nho por entre domínios mas­culinos.
preo­cupava-se com o es­for­ço:“Su­pe­ Foto © UPI/The Bettmann “The Roofwalker” [Quem Anda no
rando,  desespera­da­mente/Supe­rando Archive Telhado] (1961), dedi­cado à poeta

87
Denise Levertov, ima­gina a criação poética, para proje­tivos”,  que insistia no uso de formas abertas,
mulheres, co­mo ofício perigoso. Como ho­mens baseadas na espontaneidade da pausa de respi­
ergendo um te­lha­do, ela se sente “exposta, maior ração na fala e na extensão da linha produzida
que a vida, / fadada a quebrar o pescoço.” pela máquina de escrever no papel.
Robert Creeley (1926-2005),  que escreve com
POESIA EXPERIMENTAL um estilo lapidar, minimalista, foi um dos prin­

A
força por traz da realização madura de cipais poetas da Escola de Black Mountain. Em
Lowell de boa parte da poesia contempo­ “The Warning” [O Alerta] (1955),Creeley imagina
rânea reside na experimentação ini­cia­da a violenta e amorosa imaginação:
nos anos 50 por uma série de poetas.Estes podem
ser divididos em cinco escolas livres identificadas Por amor .... eu iria
por Donald Allen em The New American Poetry abrir sua cabeça e colocar
[A No­va Poesia Americana] (1960), a primeira uma vela por
an­tologia a apresentar o trabalho de poetas até trás dos olhos.
então relegados pelos críticos e aca­dêmicos.
Inspirada pelo jazz e a pintura expressionista O amor está morto em nós
abstrata, a maioria dos escritores experimentais se esquecemos
são uma geração mais moça que Lowell.Ten­diam as virtudes de um amuleto
a ser boêmios, intelectuais da contra­cultura que e da rápida surpresa
se desassociaram das univer­si­dades e cri­ticavam
abertamente a sociedade ame­rica­na “burguesa”. A Escola de São Francisco
Sua poesia é ousada,  ori­ginal e,  às vezes,  chocante. A obra da Escola de São Francisco — que inclui
Em sua busca de novos valores,  alega afinidade a maioria dos poetas da Costa Oeste em geral
com o mundo arcaico de mitos, lendas e socie­ — deve muito às filosofias e religiões ori­en­tais,
dades tradicionais co­mo a dos indios americanos. bem como à poesia japonesa e chinesa. Isto não
As formas são mais livres,  espontâneas,  orgânicas; é surpreendente, já que a influência do Oriente
brotam do pró­prio tema,  do sentimento do poeta sempre foi forte no Oeste dos Esta­dos Unidos. A
no momento de criação e das pausas naturais da região em torno de São Francis­co — as Montanhas
linguagem falada.Como Allen Ginsberg comentou de Sierra Nevada e a cos­ta acidentada — é linda e
em “Improvised Poetics”, “o primeiro pensamento majestosa e os poe­tas da região costumam ter um
é o melhor pensamento”. profundo sen­timento pela natureza. Muitos dos
poemas situam-se nas montanhas ou transcorrem
A Escola de Black Mountain durante caminhadas pela região. A poesia olha
A Escola de Black Mountain centrava-se em para a natureza, e não para a tradição literária,
torno do Black Mountain College,  faculdade expe­ como fonte de inspiração.
rimental liberal de ciências humanas em Asheville, Os poetas de São Francisco incluem Jack Spicer,
Carolina do Norte,  onde os poetas Charles Olson, Lawrence Ferlinghetti,Robert Duncan,Phil Whalen,
Robert Duncan e Robert Creeley lecionavam,  no Lew Welch, Gary Snyder, Kenneth Rexroth, Joanne
início dos anos 50. Ed Dorn, Joel Oppenheimer e Kyger e Diane diPrima.Muitos destes se identificam
Jonathan Williams estu­daram lá e Paul Blackburn, com a classe tra­balhadora. Suas poesias são, em
Larry Eigner e De­nise Levertov publicaram geral, simples, acessíveis e otimistas.
trabalhos nas revis­tas da escola, Origin e Black Em seus melhores momentos, como na obra de
Mountain Review.A Escola de Black Mountain está Gary Snyder (1930 - ), a poesia de São Fran­cisco
associa­da à teoria de Charles Olson de “versos evoca o delicado equilíbrio entre o indivíduo e o

88
cosmos.Em “Above PateValley” [Acima men­to na­cio­nal inicial na Califórnia.
doVale de Pate] (1955),o poeta descre­ O carismático Allen Ginsberg (1926-
ve o trabalho dos que abrem trilhas na 1997) tornou-se o principal porta-voz
montanha e encontram pontas de fle­ do grupo. Filho de pai poeta e uma
chas de obsidiana, de tribos indígenas mãe excêntrica, comprometida
desaparecidas: com o comunismo, Ginsberg cur­
sou a Universidade de Columbia,
Numa colina nevada exceto no verão, onde se tornou grande amigo dos
Uma terra de veados gordos do verão, colegas Kerouac (1922-1969) e
Eles vieram acampar. Em suas Willam Burroughs (1914-1997),cujos
Próprias trilhas. Segui minha própria romances violentos e apavorantes
Trilha aqui. Peguei a furadeira, sobre o submundo do vício da he­
Picareta, marreta e saco roína incluem The Naked Lunch [O
De dinamite. Almoço Nu] (1959). Esses três eram
Dez mil anos. o núcleo do movimento Beat.
Outros destaques incluiam o editor
Poetas Beat Lawrence Ferlinghetti (1919 - ), cuja
A Escola de São Francisco se mes­ livraria, City Lights, estabelecida em
cla ao grupo seguinte — os poe­tas North Beach, São Francisco, em 1951,
“Beat”, que surgiram nos anos 50. O tornou-se ponto de encontro. Um dos
termo “Beat” sugere variadamente poetas mais instruídos de meados do
batidas musicais, como no jazz; bea­ século 20 (ele obteve um doutorado
titude angelical ou bênçãos e “beat- na Sorbonne), a poesia cuidadosa,
up” — cansado ou ferido. Os Beats humorística e política de Ferlinghetti
(beatniks) se inspiravam no jazz, na incluiu A Coney Island of the Mind
religião ocidental e na vida itinerante. [Uma Coney Island da Mente] (1958).
Esses foram todos descritos em On the Endless Life [Vida sem Fim] (1981) é
Road [Na Estrada], famoso romance o título de seus poemas selecionados.
de Jack Kerouac,uma sensação quan­ Gregory Corso (1930-2001), um cri­
do foi publicado em 1957. Um relato minoso insignificante cujo talento foi
de uma viagem de carro através do nutrido pelos “Beats”, é lembrado por
país em 1947,o romance foi escrito em Allen Ginsberg volumes de poemas bem-humorados,
três semanas agitadas,num único rolo como “Marriage” [Casamento], fre­
de papel,no que Kerouac chamava de quentemente incluído em antologias.
“prosa bop espontânea”. O estilo irre­ Um poeta talentoso, tradutor e crítico
freado, improvisado, os personagens original, como visto em seu criterioso
alienados-místicos e a rejeição da American Poetry in the Twentieth
autoridade e convenção incendiou Century [A Poesia Americana no
a imaginação dos jovens leitores e SéculoVinte] (1971),Kenneth Rexroth
ajudou a prenunciar a contracultura (1005-1982) desempenhou o papel
independente dos anos 1960. de estadista para a antitradição. Um
A maioria dos Beats importantes organizador trabalhista de Indiana,
migrou para São Francisco vindo da ele viu os Beats como uma alternativa
Costa Leste e obteve seu reconheci­ Foto © The Bettmann Archive na Costa Oeste ao padrão literário da

89
costa Leste. Ele encorajou os Beats Frank O’Hara e Kenneth Koch — se
com seu exemplo e influência. conheceram quando cursavam a
A poe­sia Beat é oral, repetitiva e Universidade de Harvard. São fun­
muito eficaz quando declamada, damentalmente urbanos, frios, não­
especial­mente porque deriva das -religiosos, espirituosos com uma
declama­ções em clubes underground. sofisticação ao mesmo tempo tocante
Al­guns po­dem considerá-la corre­ e delicada. Os versos primam pela
ta­mente a bi­savó do rap, ritmo pre­ ação, pelos detalhes urbanos, pelas
dominante na década de 1990. A incongruências e por uma sensação
poesia beat foi a forma literária mais quase palpável de incredulidade.
anti-estabelecimento nos Estados A cidade de Nova York é o centro
Uni­dos. Mas, por trás das pala­vras de belas artes na América e o berço
chocantes, existe o amor à pátria. A do Expressionismo Abstrato, uma
poesia é um grito de dor e raiva pelo im­por­tante fonte de inspiração para
que os poetas consideram a perda da esse tipo de poesia. A maioria dos
inocência da América e o trágico des­ poetas trabalhou como crítico de arte,
perdício de seus recur­sos humanos e curador de museu ou colaborou com
materiais. pintores. Talvez devido a seu senti­
Poemas como Howl [Uivo] mento com rela­ção à arte abstrata,
(1956) de Allen Ginsberg, revolu­ que desconfia das formas figurativas
cio­na­ram a poesia tradicional: e dos senti­dos óbvios, suas obras são
frequen­temente de difícil compreen­
Vi as melhores mentes de minha geração são,como nos trabalhos mais recentes
destruídas pela de John Ashbery (1927 - ), talvez o
loucura,  esfomeadas histéricas poeta mais estimado pela crítica do
nuas, fim do século 20.
se arrastando pelas ruas Os poemas fluidos de Ashbery
negras na aurora registram pensamentos e emoções
procurando uma dose excitante, como se passassem pela mente
alienados de cabeças angelicais, depressa demais para a articula­
ardendo pela antiga ligação John Ashbery ção direta. Seu profundo e longo
celestial com os dínamos estrelados na poe­m a Self-Portrait in a Convex
maquinária da noite... Mirror [Autorretrato num Espe­lho
Convexo] (1975), ganhador de
A Escola de Nova York três importantes prêmios, desliza
Diferentemente dos poetas Beat de pensamento em pensamento,
e dos de São Francisco, os poetas fre­quentemente refletindo de volta
da Escola de Nova York não se inte­ sobre si mesmo:
ressavam por questões claramente
mo­rais e, em geral,  ficavam longe de Um navio
temas políticos.De todos,  eram os que Desfraldando cores desconhecidas
tinham a melhor educação formal. entrou no porto.
Os principais expoentes da Es­ Você está deixando questões
co­la de Nova York — John Ashbery, Foto © Nancy Crampton

90
extemporâneas deuses são aquilo em que falhamos
Interromperem seu dia.... em nos tornar / Se você a­char que
não crê mais, aumente o templo.”
Surrealismo e Existencialismo O surrealismo político de Bly
Em sua antologia definindo as no­ criticava severamente os valores
vas escolas, Donald Allen inclui um americanos e a política externa na
quin­to grupo, que ele não con­se­gue época do Vietnã, em poemas como:
definir por falta de uma base geo­ “The Teeth Mother Naked at Last” [A
gráfica clara. Esse grupo vago inclui Mãe dos Dentes Nua Enfim]:
diversos movimentos e expe­riências
recentes. Liderando tais correntes, É porque temos novas
estão o surrealismo, que expressa o embalagens para ostras
inconsciente através de imagens vívi­ defumadas
das, como que de so­nhos, e diversos que buracos de bomba surgem nos
trabalhos de mu­lheres e minorias arrozais
étnicas que flo­res­ceram nos últimos
anos. Em­b ora superficialmente A influência surrealista mais
distin­tos, surrealistas, feministas e difusa tem sido mais calma e con­
minorias parecem compartilhar um templativa, como o poema descrito
sentido de alienação com respeito à por Charles Wright em “The New
litera­tura dominante.

E
Poem” [O Novo Poema] (1973):
mbora T.S.  Eliot,  Wallace Stevens
e Ezra Pound já tivessem intro­ Isto não vai amenizar nossa tristeza.
duzido técnicas do simbo­lismo Isto não vai consolar nossos filhos.
na poesia americana, ainda na déca­ Isto não vai poder nos ajudar.
da de 1920, o surrealismo, a principal
força na poesia e no pensamento O surrealismo de Mark Strand,
europeu durante e depois da Segunda como o de Merwin, costuma ser
Guerra Mundial, não criou raízes nos desolador; fala de uma carência
Estados Unidos. Somente nos anos extrema.Agora,que tradições,valores
1960,o surrea­lismo (juntamente com e crenças o decepcionaram, o poeta
o existen­cialismo) foi domesticado Amy Clampitt nada tem senão sua alma cavernosa:
na Amé­rica, sob o impacto da guerra
do Vietnã. Eu tenho uma chave
Nos anos 1960, muitos escrito­res Então eu abro a porta e entro.
americanos — W.S.Merwin,Robert Bly, Está escuro e eu entro.
Charles Simic, Charles Wright e Mark Está mais escuro e eu entro.
Strand,entre outros — se voltaram pa­
ra o surrea­lismo francês e o espa­nhol, AS POETAS E O FEMINISMO
em especial,  por suas emo­ções puras, A literatura nos Estados Unidos,
ima­gens de arquétipos e mo­delos de como na maioria dos países, fora
inquie­tação existencial antirracio­nal. sempre avaliada com base em pa­
Surrealistas como Merwin ten­dem drões que frequentemente descon­
a ser epigramatistas, como em: “Os Foto © Nancy Crampton sideravam a contribuição feminina.

91
Ainda as­sim, há muitas poetas de Showalter identificou uma impor­
valor na literatura americana. Nem tante tradição de autoras britânicas
todas são feministas, nem só de e americanas. The Madwoman in
questões femininas falam seus temas. the Attic [A Louca no Sótão] (1979)
As diferenças regionais, políticas e de Sandra Gilbert e Susan Gubar
raciais também deram forma à sua traçou a misoginia nos clássicos
obra. As poetas mais conhecidas ingleses, como em Jane Eyre de
incluem Amy Clampitt, Rita Dove, Charlotte Brontë. Nesse romance,
Louise Gluck, Jorie Graham, Carolyn uma esposa é levada à loucura pelo
Kizer, Maxine Kumin, Denise mal tratamento que seu marido lhe
Levertov, Audre Lorde, Gjertrud dispensa e é trancada no sótão;
Schnackenberg, May Swenson e Gilbert e Gubar comparam as vozes
Mona Van Duyn. abafadas das mulheres na literatura
Antes dos anos 1960, a maioria à essa figura feminina oprimida.
das poetas havia aderido a um ideal As críticas feministas da segunda
andrógino,acreditando que o gênero onda desafiavam os cânones aceitos
não interferia na excelência artística. das grandes obras argumentando
Essa posição alheia ao gênero foi, que os padrões estéticos não eram
com efeito, uma forma inicial de atemporais e universais, mas um
feminismo que permitiu às mulheres tanto arbitrários, presos à cultura e
argumentarem por direitos iguais.  Ao patriarcais. O feminismo tornou-se
fim da década de 1960, as mulheres nos anos 1970 a força motriz pela
americanas — muitas ativas na luta igualdade de direitos, não apenas na
por direitos civis e protestos contra o literatura, mas na cultura mais ampla
conflito no Vietnã, ou influenciadas também. The Norton Anthology of
pela contracultura — começaram Literature by Women [A Antologia
a reconhecer sua própria margi­ Norton de Literatura Feminina] (1985)
nalização. The Feminine Mystique de Gilbert e Gubar facilitou o estudo
[A Mística Feminina] (1963), obra da literatura feminina entrou em foco.
franca de Betty Friedan, publicada Nikki Giovanni Outras poetas influentes antes de
no ano do suicídio de Sylvia Plath, Sylvia Plath e Anne Sexton incluem
censurou publicamente o baixo Amy Lowell (1874-1925), cuja obra
status da mulher. Outro marco, o tem grande beleza sensual.Ela editou
livro Sexual Politics [Política Sexual] antologias Imagísticas influentes e
(1969) de Kate Millett, defendeu a introduziu a poesia moderna fran­
posição de que os textos masculinos cesa e a poesia chinesa em tradução
revelavam uma misoginia penetrante, para o mundo literário de língua
ou um desprezo pelas mulheres. inglesa. Sua obra celebrava o amor,
Nos anos 1970, uma segunda o desejo e o as­pec­to espiritual da
onda de crítica feminista emergiu beleza humana e da natureza. H.D.
após a fundação da Organização (1886-1961), amiga de Ezra Pound
Nacional das Mulheres (NOW) em e William Carlos Williams que havia
1966. A Literature of Their Own [Uma sido analisada por Freud, escreveu
Literatura Própria] (1977) de Elaine Foto © Nancy Crampton poemas cristalinos inspirados pela

92
s
natureza e pelos clássicos gregos e (LeRoi Jones), Michael S. Harper,
o drama experimental. Sua poesia Rita Dove, Maya Angelou e Nikki
m í s t i c a c e l e b r a d e u s a s .  Giovanni e de ásio-americanos
As contribuições de Lowell e como Cathy Song, Lawson Inada e
H.D., além de outras poetas do urgiram Janice Mirikitani.
início do século 20, como Edna St. diversos
Vincent Millay,  só agora estão sendo Poesia Chicana/Latina
periódicos A poesia de influência hispânica
totalmente reconhecidas.
aca­dê­micos, abrange obras de diversos grupos.
Poetas Multiétnicos organizações Entre eles está o dos americanos de
A segunda metade do século 20 profissio­nais origem mexicana,conhecidos desde
testemunhou um renascimento da e revistas a década de 50 como chica­nos, que
literatura multiétnica que se esten­ literárias têm vivido há muitas ge­ra­ções no
deu até o século 21. Nos anos 1960, Sudoeste dos Estados Uni­dos tomado
dedicadas
os escritores étni­cos nos Estados do México na Guer­ra Mexicano-
Unidos, seguindo a liderança dos à causa Americana que aca­bou em 1848.
afro-americanos, começaram a multiétnica. As Entre as popula­ções do Caribe
coman­dar a atenção do público. conferências hispânico, os cubano-americanos
Os anos 1970 viram o surgimento voltadas ao e os porto-riquenhos são os que
dos programas de estu­dos étnicos estudo de mantêm tradições lite­rá­rias vitais e
nas universidades. literaturas distintas. Por exem­plo, o talento do
Na década de 1980, surgiram cubano-ameri­cano para a comédia
étnicas
diversos periódicos aca­dê­micos, o distin­gue do lirismo elegíaco dos
organizações profissio­nais e revistas
específicas escritores chicanos, como Rudolfo
literárias dedicadas à causa multi­ apareceram e Anaya. Os novos imigrantes vindos
-étnica. As conferências volta­das ao o cânone dos do México, América Central, do Sul
estudo de literaturas étnicas espe­ “clássi­cos” foi e Espanha estão constantemente
cíficas apareceram e o cânone dos expandido para enriquecendo e ampliando esta
“clássi­cos”foi expandido para incluir incluir escritores seara literária.
escritores étnicos nas antologias e étnicos nas A poesia chicana, ou mexicano-
listas de cursos. Os temas importan­ americana, tem rica tradição oral,
antologias
tes incluíam raça e etnicidade, vida na forma de balada, ou o corrido. As
espiritual, papéis familiares e de
e listas de obras originais salientam os tradicio­
gênero e linguagem. cursos. nais aspectos fortes da comunidade

A
poesia dos grupos minori­ mexicana e a discri­minação que às
tários compartilha a diver­ vezes sofre entre brancos. Às vezes,
sidade e, às vezes, a ira da os poetas mes­clam palavras em
literatura femi­nina. Floresceu em espanhol e in­glês, como na fusão
obras de latinos e chicanos como poética de Alurista e Gloria An­zal­
Ga­r y Soto,Alberto Rios e Lorna Dee dúa.Sua poesia é muito influen­ciada
Cervantes; de americanos nativos pela tradição oral e é muito poderosa
como Leslie Marmon Silko, Simon quando declama­da em voz alta.
Ortiz e Louise Erdrich; de afro­ Alguns poetas escrevem sobre­
-americanos como Amiri Baraka tudo em espanhol, numa tradição

93
que remonta ao primeiro épico es­ Foto © Nancy Crampton vital em sua herança cultural. Seus
crito em solo americano — Historia traba­lhos primam pela evocação
de la Nueva México,de Gas­par Pérez vívida e di­­nâ­­mica do mundo natural,
de Villagrá, que cele­bra a batalha de que se torna quase místico, às vezes.
1598 entre os in­va­­sores espanhóis e Os poetas indígenas também expres­
os índios Pue­blo de Acoma, Novo sam o sentido trágico da per­da irrever­
México. sível de seu rico patrimônio cultural.
I Am Joaquin [Sou Joaquin] Gary Soto Simon Ortiz (1941 - ), um pue­
(1972),de Rodolfo Gonzales (1928 - ), blo de Acoma, baseia muitos de
tex­to central da nova poesia chicana, seus poemas na his­tória, explo­
evoca a aculturação: o narrador está rando as contra­dições ineren­tes à
“Perdido num mundo de confusão/ vida de um índio americano nos
Preso na roda-viva da sociedade Estados Unidos de hoje. Em “Family
gringa/Confuso pelas regras...” Reunion” Em “Family Reunion”Sua
Muitos escritores chicanos encon­ poesia desafia os leitores anglo-
tram sustento em suas antigas raízes americanos, porque frequen­
mexicanas.Pensan­do na grandeza do temente os faz lembrar as injus­tiças
antigo México, Lorna Dee Cervantes e violências cometidas contra os
(1954 - ) escreve que “um corrido ame­ricanos nativos. Seus poemas
épico” canta em suas veias, já Luis pressentem uma harmonia racial
Omar Salinas (1937 - ) se sente “um baseada numa com­pre­ensão mais
anjo asteca”. profunda.
Boa parte da poe­sia chicana é alta­ Em Star Quilt [Colcha de Es­tre­las],
mente pessoal e aborda sentimentos Roberta Hill Whiteman (1947 - ), da
ou pessoas da família ou da comuni­ tribo Oneida,imagina um futuro mul­
dade.Gary Soto (1952 - ) se inspira na ti­cultural seme­lhante a uma “colcha
antiga tradição de honrar os antepas­ de es­trelas, costurada com a luz
sa­dos, mas os versos a seguir, escritos da aurora”, já Leslie Marmon Silko
em 1981,descrevem a atual con­dição (1948 - ), que é parte pueblo de
multicultural de todos os americanos: Laguna, usa a lin­gua­­gem coloquial
Uma vela é acesa para os mortos
e histórias tradi­cionais para criar
Dois mundos diante de todos nós
poemas líricos muito tocantes. Em
“In Cold Storm Light” [À Luz da
Nos anos 1980, a poesia chicana Tempes­tade Fria] (1981), Silko cria
alcançou nova proeminência e as uma ressonância como a do haicai:
Leslie Marmon Silko
obras de Cervantes, Soto e Alberto
Rios foram cada vez mais incluídas do céu de gelo espesso
em antologias. correndo velozmente
batendo
Poesia Americana Nativa revolvendo sobre a copa das árvores
Os americanos nativos têm pro­ Vêm os alces da neve,
du­­zido versos excelentes, provavel­ Correndo, correndo
mente porque a tradição do canto canto branco
Foto © Nancy Crampton
xamanístico desempenha um papel vento de tempestade nos galhos.
94
Louise Erdrich (1954 - ), roman­­cista Foto © David Ash / 1970, também escreve peças teatrais
como Silko, cria pode­rosos monó­ CORBIS OUTLINE e participa da polí­tica. Os textos de
logos dra­má­ticos que têm o efeito Maya Angelou (1928 - ) englobam
de peças dramáticas condensadas. formas literárias diver­sas,inclusive po­
Mostram cruelmente famílias lidan­ esia, peças dramáticas,e seu famoso
do com o alcoo­lismo, o desemprego, livro de memórias,  I Know Why the
e a po­breza na reserva Chippewa. Caged Bird Sings [Eu Sei Porque o
Em “Family Reunion” [Reu­nião Louise Errich Pássaro Engaiolado Can­ta] (1969).
de Família] (1984), um tio bêbado Rita Do­ve (1952 - ), foi aclamada
e grosseiro volta, depois de vários poeta lau­reada dos Estados Unidos
anos na cidade. Como ele sofre do em 1993. Dove, também autora de
coração,a sobrinha mal­tra­­tada,que é fic­ção e drama, ganhou o Prêmio
a narradora, se lembra de como esse Pulit­zer de 1987 por Thomas and
tio, anos antes, Em “Family Reunion” Beulah (1986), em que home­­­na­geia
havia matado uma grande tartaruga seus avós por meio de uma série de
ao colocar fogos de artifí­cio em seu poe­mas líricos. Ela disse que escre­
interior.  Em “Family Reunion”.  O fim veu es­ses versos para re­ve­lar a rica
do poema liga o Tio Ray à tarta­ruga vida interior das pes­soas pobres.
que ele vitimou. Michael Harper (1938 - ) tam­bém
escreve poemas que revelam a vida
De algum modo achamos o caminho
complexa de afro-ameri­ca­nos frente
de volta, Tio Ray,
à discriminação e violên­cia. Seus
canta uma velha canção para o corpo
que o puxa
poemas densos e cheios de alusões,
para casa.As barbatanas cinzas em que
tratam frequen­temente de cenas
suas mãos se tornaram amontoadas,dramá­ticas de guerra ou
Apertam seus ossos contra o vida ur­bana.Usam imagens cirúr­gicas,
painel. Seu rosto numa tentativa de curar. Seu poe­ma
tem a estranha,calma paciência de uma “Clan Meeting: Births and Nations: A
criança que sempre Blood Song” [Encontro de um Clã:
deixou as grandes feridas de lado, Nascimentos e Nações: U­ma Canção
ou uma de Sangue] (1971], que compara o
criatura que viveu cozinhar à cirurgia (“unindo as car­nes
muito tempo debaixo d’água. com fluidos”), começa:  “re­cons­tru­
E os anjos vêm imos vidas na unidade / de terapia
baixando suas tipoias e macas. Maya Angelou inten­siva,de pedaços colocados jun­tos
num bufê...” O poema ter­mina jun­
Poesia Afro-Americana tando imagens de hospital, racismo
Os negros americanos têm produ­ num antigo filme ame­rica­no,  Birth of
zido muitos poemas de grande beleza a Nation [Nascimento de uma Nação],
e diver­sidade de temas e tons. É a a Ku Klux Klan,a edi­ção de filmes e a
mais desenvolvida das literatu­ras étni­ tecnologia de raio-x:
cas na América e bem diversificada.
Amiri Baraka (1934 - ),o mais famoso Recarregamos nossos cérebros como
Foto © Nancy Crampton
poeta afro-ameri­cano dos anos 1960 e câmeras,
95
o filme superexposto A literatura ásio-americana tem
à luz do raio-X, evo­luído no sentido de dar ênfase
trancado com nossos fotômetros de aos es­tu­dos voltados para a Orla do
porta dupla: raça e sexo Pacífico e às obras femi­ninas. Os
rebobinados e apertados como hobby; ásio-ameri­canos normalmente resis­
pegamos nossa trouxa e vamos tem ao estereótipo ra­cial de uma
para casa. minoria“exó­tica”ou“boa”.  Esteti­cistas
começam a com­pa­rar tradições lite­
A história, o jazz e a cultura po­ rárias ocidentais e orientais como,  por
pular inspiraram muitos afro-ameri­ exemplo, os conceitos de tao e logos.
canos, de Harper (professor uni­ Os poetas ásio-americanos se
versitário) ao poeta e editor da Costa ins­pi­ram em muitas fontes, da ópe­
Oeste, Ishmael Reed (1938 - ), conhe­ ra chinesa ao zen, e as tra­­­dições
cido por liderar a literatura multicul­ literárias asiáticas, particularmente
tu­ral através da Before Columbus o zen, têm inspirado muitos poetas
Foundation e de várias revistas como não-asiá­ticos, como pode ser visto
Yardbird, Quilt e Konch. na antologia Beneath a Single Moon:
Mui­tos poetas afro-ame­ricanos, Buddhism in Contemporary American
como Audre Lorde (1934-1992), têm Poetry [Debaixo de uma Única Lua:
se nutrido do Afrocentrismo, que vê a o Budismo na Poesia Americana
África como centro de civilização des­ Contempo­rânea], de 1991. Os poetas
de a antiguidade.Em poemas sensuais ásio-americanos cobrem o espectro da
como “The Wo­men of Dan Dance with postura iconoclasta ado­tada por  Frank
Swords inTheir Hands to Mark theTime Chin (1940- ), co-editor da Aiiieeeee!
When They Were Warriors” [Mu­­lheres (uma das primeiras antologias da
de Dan Dançam com Es­pa­das Nas literatura ásio-americana), ao uso
Mãos para Marcar o Tem­­po em que generoso da tradição por autores
Eram Guerreiras] (1978),ela fala como como a romancista Maxine Hong
guerreira do antigo Dao­mé,“armando Kingston (1940- ). Janice Mirikitani
tudo que toco” e “con­sumindo” só “O (1942- ), sansei (terceira geração
que já está morto”. de nipo-america­nos), evo­ca a his­
Rita Dove tória nip-americana e pu­blicou di­
Poesia Ásio-Americana versas antologias, como Third World
Como a poesia dos chicanos e lati­ Women [Mu­lheres do Terceiro Mundo]
nos,  a poesia ásio-ameri­cana também (1973), Time to Greez! Incantations
é extremamente va­riada.  Americanos From the Third World [Hora de Greez!
de origem japo­nesa,chinesa e filipina Encantamentos do Terceiro Mundo]
po­dem estar vivendo nos Estados (1975) e Ayumi: A Japanese American
Unidos há oito gerações, enquanto Anthology [Ayumi: Uma Antologia
os de ori­gem corea­na, tai­lan­desa e Nipo-Americana] (1980).
vietnamita provavelmente são imi­ A lírica Picture Bride [Retrato de
gran­tes recentes. Cada grupo cresce Noiva],da poeta sino-americana Cathy
a partir de uma tradição linguís­tica, Song (1955- ), tam­bém dramatiza a
Foto © Christopher Felver /
histórica e cultural distinta. CORBIS história através da vida de sua familia.

96
Muitos poetas ásio-ameri­canos explo­ O “Chronic Meanings” [Sentidos
ram a diversidade cultural. Em “The Crônicos], de Bob Perelman, assim
Vegetable Air”[O Ar Vegetal] (1988), começa:
de Song,  uma cidade­zinha dilapidada,
com vacas na praça, um res­tau­rante O fato único é matéria.
chinês e uma placa da Coca-Cola pen­ Cinco palavras podem dizer apenas.
durada torta se tornam emblemáticos Céu negro à noite, razoavelmente.
da vida contemporânea multicultural Eu sou, o resíduo irracional...
e sem raízes, su­por­tável apenas pela
arte, neste caso uma ópera gravada Vendo a crítica artística e literária
em cassete: como ine­ren­temente ideológica,
eles se opõem às formas fechadas
então, a ária familiar, do modernismo, hierarquias, noções
subindo como a lua, de epifania e transcendência, cate­
O eleva acima de si mesmo, gorias de gêneros e textos canônicos
transportando-o para outro país ou obras literárias acei­tas. Em vez
onde,por um momento,você viaja leve. disso, propõem for­mas abertas e
textos multiculturais. Apro­priam-se
A ESCOLA DA LINGUAGEM,
de ima­gens da cultura popular e
EXPERIMENTAÇÃO E NOVO
da mídia e as remodelam. Como a
FORMALISMO
poe­sia-performance, os poemas de
No fim do século 20,os rumos toma­
linguagem em geral resistem à inter­
dos pela poesia americana incluiu o
pretação e convi­dam à participação.
dos “language poets” [poetas da lin­
Poesia orientada à performance
gua­gem],vagamente associados com
— conjuntos de operações ca­suais
a revis­ta Temblor e Douglas Messerli,
como as do compositor John Cage,
editor de “Language” Poetries: An
improvisações de jazz,tra­ba­lhos com
Anthology [Poesias da Lin­guagem:
meios mistos e o sur­rea­lismo europeu
Uma Antolo­gia] (1987). Entre eles
— têm influenciado muitos poetas
Bruce Andrews, Lyn Hejinian, Bob
americanos.Entre as figuras famosas,
Perelman e Barret Watten, autor de
temos Laurie Anderson (1947- ), au­
Total Syntax [Sintaxe Total] (1985), Maxine Hong Kingston
tora do suces­so internacional United
uma coletânea de ensaios. Esses
States [Es­ta­dos Unidos] (1984), que
poetas estendem a linguagem para
usa filme, vídeo, acústica e música,
revelar seu poten­cial de ambigui­dade,
co­reo­grafia e tecnologia espa­cial.
fragmen­tação e autoafir­ma­­ção em
A poe­sia do som, enfatizando a voz
meio ao caos. Irôni­cos e pós-moder­
e os instrumentos, é praticada por
nos, rejeitam as “metanar­rativas”
poetas como David Antin (que faz
— ideologias, dog­mas, con­venções
apresentações improvisa­das) e os
— e questionam a exis­tência de
no­va-iorquinos George Quasha (edi­
realidade transcendente. Michael
tor da Station Hill Press), o falecido
Palmer escreve:
Armand Schwerner e Jackson Mac
Este é o Paraíso, um livro embolorado Low. Este também escreveu poesia
deixado na casa por tempo demais
Foto © Nancy Crampton visual ou con­cre­ta, que faz uma

97
decla­ração visual com base em posicio­namento está asso­ciada a Story Line Press; Dana Gioia
e tipografia. (poeta-empresário); Philip Dacey e David
A poesia-performance étnica alcançou populari­ Jauss, poetas e editores de Strong Measures:
dade com a música rap, enquanto, em todos os Contemporary American Poetry in Traditional
Estados Unidos, as ‘mara­tonas poéticas’ [“poetry Forms [Medidas For­tes: Poesia Americana
slams”] — competições de poesia abertas, em Contem­p orânea em Formas Tradicio­n ais]
galerias de arte alternativa e em livrarias literárias (1986); Brad Leithauser; e Gjertrud
— tornaram-se um passatempo barato,participa­tivo Schnackenberg. The Direction of Poetr y:
e bem-humorado. Rhymed and Metered Verse Written in English
No outro extremo do espectro teórico estão Since 1977 [Os Rumos da Poesia: Versos com
os “Novos Forma­listas”, que defendem a volta à Rima e Métrica, Escri­tos em Inglês a Partir de
forma, rima e métrica.Todos os gru­pos estão re­ 1977], de Robert Richman, constitui uma das
agindo ao mesmo pro­ble­ma — a complacência antologias mais recentes. Em­bora esses poetas
do mundo convencional para com o status quo, tenham sido acu­sados de estar recuando no
um som cuidadoso e exces­sivamente polido, tempo e tratando de temas do século 19,  frequen­
(muitas vezes produto de oficinas poéticas), temente adotam posições e imagens con­tem­po­
e uma ênfase excessiva no lirismo pessoal, em râneas, além da linguagem musical e das formas
detrimento do gesto público. A escola formal fechadas, tradicionais. 

98
CAPÍTULO
O LEGADO REALISTA E O
FIM DA DÉCADA DE 1940

C
8
omo na primeira metade do século 20,
a ficção da segunda metade refletia o
espírito de cada déca­da. O fim dos anos
1940 viu as consequên­cias da Segunda Guerra
Mun­dial e o início da Guerra Fria.
PROSA AMERICANA A Segunda Guerra ofereceu material de pri­
1945-1990: meira: Norman Mailer (The Naked and the Dead
REALISMO E [Os Nus e Os Mortos] 1948) e James Jones (From
Here to Eternity [Daqui para a Eterni­dade] 1951)
EXPERIMENTAÇÃO
foram os que melhor fizeram uso dele. Ambos
utilizaram rea­lismo beirando o natura­lismo cruel

A
narrativa, nas décadas que se seguiram e se esfor­çaram para não enaltecer o comba­te. O
à Segunda Guerra Mundial, resistiu à mesmo se deu com The Young Lions [Os Jovens
generalização: era extremamente variada Leões] (1948) de Irwin Shaw. Her­man Wouk, em
e multifacetada. Foi revi­talizada por correntes The Caine Mutiny [O Motim de Caim] (1951),tam­
internacionais como o exis­tencialismo europeu bém mostrou as fra­quezas humanas,tão evidentes
e o realismo mágico la­­tino-americano enquanto nos tempos de guerra quanto nos de paz.
a era eletrônica trouxe a aldeia global.A palavra Mais tarde, Joseph Heller retratou a Segunda
falada na televisão trouxe vida nova à tradição Guerra em termos satíricos e ab­surdos (Catch-22
oral.Os gêneros orais,a mídia e a cultura popular [Beco Sem Saída] 1961),ar­gu­­men­tando que a guer­
influenciaram cada vez mais a narrativa. ra está impregnada de loucura. Thomas Pynchon
No passado, a cultura de elite influenciava apresentou um caso intrincado e brilhante que
a cultura popular por seu status e exemplo; o parodia e desloca diferentes ver­sões da reali­dade
processo inverso parece ter ocorrido nos Esta­dos (Gravity’s Rain­bow [Arco-Íris da Gravi­dade] 1973).
Unidos dos anos pós-guerra. Romancistas sérios Kurt Vonnegut Jr. tornou-se um dos expoentes da
como Thomas Pynchon, Joyce Carol Oates, Kurt con­tracul­tura do início dos anos 1970 com a pu­­­
Vonnegut Jr., Alice Walker e E.L. Doctorow se ins­ bli­cação de Slaughterhouse-Five; or The Chil­­dren’s
piraram e comentaram historias em quadrinhos, Crusade [Mata­dou­ro-Cinco ou A Cru­­za­da das Cri­
filmes, moda, música e história oral. an­­­ças] (1969), romance antibé­lico sobre bombas
Dizer isso não é trivializar esta literatura: os incen­diá­rias lançadas pelos Alia­dos em Dresden,
escritores nos Estados Unidos estão fazendo Ale­ma­nha, na Segunda Guerra (que presenciou
perguntas importantes, muitas de natureza em terra, como pri­sio­neiro de guerra).
metafísica. Eles se tornaram muito inovadores A década de 1940 viu florescer um novo con­
e autoconscientes, ou “reflexivos”. Geralmente tin­gente de escritores, com o poeta-roman­cista-
achavam as formas tradicionais ineficazes e ensaísta Robert Penn Warren, os drama­tur­gos
bus­cavam vitalidade no material mais popular. Arthur Miller e Tennessee Williams e as contistas
Ou seja: os escritores americanos desenvol­veram, Kathe­rine Anne Porter e Eudora Welty. Todos,
nas décadas pós-guerra, uma sensibilidade menos Miller, eram do Sul. Todos exploraram o
pós-moderna. A reestruturação modernista de destino do indivíduo na família ou comunidade e
pontos de vista já não os satisfazia: era o contexto enfocaram o equilíbrio entre crescimento pessoal
da visão que precisava ser reformulado. e responsabilidade para com o grupo.

99
Robert Penn Warren águas, ainda assim, é apenas um dos
(1905 - 1989) vá­rios dramas es­critos por Miller, ao
Robert Penn Warren, um dos longo de várias décadas, inclu­índo
“Fugitivos” do Sul, desfrutou de car­ All My Sons [Todos os Meus Fi­lhos]
reira profícua por todo o sé­cu­lo 20. (1947) e The Crucible [O Ca­dinho]
Re­ve­lou,ao longo de sua vida,preocu­ (1953). Ambos são políti­cos — um
pação com os valores demo­cráticos contemporâneo,o ou­tro ambientado
dentro de seus contextos históri­cos. na era colonial. O primeiro trata de
Seu ro­man­­ce mais permanente, All um industrial que,durante a Segunda
the King’s Men [To­dos os Ho­mens do Guerra, permite a entrega de peças
Rei] (1946), enfoca as implica­ções sabida­mente defeituosas pa­ra fá­bri­
mais sombrias do so­­nho ameri­cano cas de aviões, causando a morte de
— como visto no relato leve­men­­te vários pilotos americanos. The Cru­
camuflado da car­rei­ra de Huey Long, ci­ble retrata o julgamento de bru­xas
exuberante e sinis­tro político do Sul. em Salem (em Massachusetts), no
século 17, quando colo­nos pu­­ri­ta­nos
Arthur Miller (1915 -2005)

O
foram injus­ta­mente conde­nados por
dramaturgo Arthur Miller, bruxaria. Sua men­­­sa­gem, porém —
natural de Nova York, teve de que “caças às bruxas” dirigidas
seu auge em 1949 com Death a inocentes são aná­­­te­­mas numa
of a Salesman [Morte de um Caixeiro- democracia — era rele­vante na era
Viajante], estudo sobre a busca de em que foi en­ce­nada, no início dos
um homem por mérito e valor em anos 1950, quan­do a cruzada an­ti­co­­
sua vi­­da e a realização de que o fra­ mu­nista liderada pelo Sena­dor Joseph
cas­so está sempre à espreita.Passa­do McCarthy e outros ar­rui­nou a vida de
na famí­lia da personagem principal, muitos inocen­tes.Em parte em respos­
Willy Lo­man,a peça gira em torno de ta a The Crucible, Miller foi chamado
relaciona­men­­­tos tu­mul­­­­tu­a­dos entre perante a Comissão de Atividades
pai e fi­lhos, mari­do e mu­lher. É um Antiamericanas do Congresso em
espe­lho das ati­tudes literá­rias dos 1956 e foi solicitado a fornecer os
anos 1940,com sua rica com­binação nomes de pessoas que pudessem se
de realis­mo tinto de na­tu­ralis­mo; simpatizantes do comunismo.Devido
Robert Penn Warren
perso­nagens cuida­do­­sa­mente traça­ à sua recusa em fazê-lo,foi acusado de
das e bem acaba­das e a insis­tência no desrespeitar o Congresso, acusação
valor do indi­víduo,apesar do fra­casso que foi retirada em apelação.
e do erro. O romance é u­m peã ao Uma peça sua posterior,  Incident at
ho­mem comum — a quem, co­mo Vichy [Incidente em Vichy] (1964),tra­
elogia a viúva de Willy Loman, “se tava do holocausto — a destruição de
deve dar atenção”.  Tocante e sombria, muitos dos judeus europeus nas mãos
é tam­­­­­bém uma história de sonhos. dos nazistas e seus colaboradores.Em
Como uma per­sonagem co­menta The Price [O Preço] (1968), dois ir­
com ironia: “um ven­de­dor tem que mãos lutam para se libertar dos fardos
so­nhar,  me­nino.  Faz parte do negó­cio.” do passado. Um dos dramas de Miller
Death of a Salesman,um divisor de Foto © Nancy Crampton incluía duas peças de um ato, Fame

100
[Fama] (1970) e The Reason Why [O ela e Hammett foram colocados na
Porquê] (1970). Seus ensaios estão lista negra (impedidos de trabalhar
colecionados em Echoes Down the na indústria de entretenimento
Corridor [Ecos ao Longo do Corredor] americana) por certo tempo. Estes
(2000) e sua autobiografia,Timebends: eventos são recontados nas memó­
A Life [Dobras do Tempo: Uma Vida], rias de Hellman, Scoundrel Time
foi lançada em 1987. [Tempo de um Salafrário] (1976).

Lillian Hellman (1906 - 1984) Tennessee Williams


Como Robert Penn Warren, a visão (1911 - 1983)
moral de Lillian Hellman foi moldada Tennessee Williams, natural do
pelo Sul. Sua infância foi passada, na Mississipi, foi dos indivíduos mais
maior parte, em Nova Orleans. Suas complexos da cena literária ameri­
peças constrangedoras exploram as ca­na em meados do século 20. Sua
muitas formas e abusos do poder. obra enfocava emo­­ções pertur­ba­
Em The Children’s Hour [A Hora das das den­­­tro das famí­lias — a maioria
Crianças] (1934) uma garota mani­ sulista. Era famoso pelas repe­ti­­ções
puladora destrói as vidas de duas de en­can­tamento, dic­ção poé­ti­ca
professoras ao dizer a todos que elas sulis­ta, cenários gó­ti­cos estra­nhos e
eram lésbicas. Em The Little Foxes exploração freu­dia­na da emoção
[As Raposinhas] (1939), uma antiga humana. Um dos pri­meiros au­to­res
e rica família sulista luta por uma americanos a assumir sua homosse­
herança. Sua obra antifacista Watch xua­lidade, Williams expli­cou que os
on the Rhine [Sentinela no Reno] desejos de suas per­so­nagens ator­
(1941) cresceu de suas viagens à mentadas ex­pres­sa­vam sua soli­dão.
Europa nos anos 1930. Suas memó­ Suas persona­gens vivem e so­frem
rias incluem An Unfinished Woman inten­sa­mente.
[Uma Mulher Inacabada] (1969) e Escreveu mais de 20 dra­­­mas, mui­
Pentimento (1973). tos dos quais auto­bio­gráficos.Che­gou
Por muitos anos, Hellman se ao auge cedo na carreira – nos anos
relacio­nou intimamente com o escri­ 1940 – com The Glass Me­­­na­gerie [Co­
tor de scripts Dashiell Mannett, cuja leção de Bi­­chos de Cris­tal] (1944) e
Tennessee Williams
persona­gem, o detetive experiente A Street­car Named Desi­re [Um Bon­de
Sam Spade, fascinou os americanos Cha­ma­do De­sejo] (1949). Ne­­nhuma
durante a Depressão. Hammett in­ o­bra posterior, ao longo de mais de
ventou o ro­man­ce de detetive durão duas décadas, chegou ao su­cesso e
fundamen­talmente americano: The rique­za destas duas.
Maltese Falcon [O Falcão Maltês]
(1930) e The Thin Man [O Homem Katherine Anne Porter
Magro] (1934). (1890 - 1980)
Hellman, como Arthur Miller,  A carreira de Katherine Anne Por­
recusou-se a fornecer nomes ter abrangeu vá­rias eras.Seu pri­meiro
à C o m i s s ã o d e A t iv i d a d e s su­ces­so, o conto “Flowering Judas”
Antiamericanas do Congresso e Foto © Nancy Crampton [O Des­­pontar de Judas] (1929), se

101
passava no México, na re­vo­lu­ção. Os Welty inspirou a obra ma­ti­zada em
contos maes­tral­mente escritos que Porter, mas a jovem se inte­­ressou
lhe de­ram no­to­rie­dade desven­dam pelo cômico e o gro­­­­­tes­co. Como o
com sutil­eza vidas pes­­soais. “The colega sullista Fla­nnery O’Connor,
Jilting of Granny Wea­therall”[O Fim do Welty muitas vezes usa­va perso­
Noi­­­va­do de Gran­ny Weathe­rall], por na­gens anor­mais,   ex­cên­­tri­cas ou
exemplo,transmite gran­des emo­ções excep­cio­nais como tema.
com pre­cisão.  Ela re­ve­la,muitas ve­zes, Apesar da violência em sua obra,
ex­­pe­ri­ências inte­riores das mu­lhe­res seu espírito é essencialmente hu­­mano
e sua de­pen­­dência dos ho­mens. e afirma­tivo, como no con­to muito
Os matizes de Porter se devem co­men­tado “Why I Work at the P. O.”
mui­­­to às histórias da neozelan­de­sa [Por­que Traba­lho nos Cor­reios],  sobre
Katherine Mansfield.As coletâ­neas de a fi­lha teimo­sa e inde­pen­dente que sai
contos de Porter in­cluem Flowering de casa para viver numa minúscula
Judas (1930), Noon Wine [Vinho do agência dos cor­reios. As coletâ­neas de
Meio-Dia] (1937), Pale Horse, Pale con­tos in­clu­em The Wide Net [A Rede
Rider [Cavalo Pá­lido,Cavaleiro Pá­lido] Am­pla] (1943),The Golden Apples [As
(1939), The Leaning Tower [A Tor­­re Maças Doura­das] (1949),The Bride of
Inclinada] (1944) e Collected Stories the Innisfa­llen [A Noi­­va de Innis­fallen]
[Coletâ­nea de His­tórias] (1965). No (1955) e Moon Lake [La­go da Lua]
início dos anos 1960,escre­veu um lon­ (1980). Tam­bém escre­veu ro­­man­ces
go romance alegórico com um tema como Del­ta Wedding [Casa­men­­­to
atem­po­ral — a respon­sa­bi­lidade dos no Del­­ta] (1946), sobre uma fa­mí­lia
ho­mens uns pelos ou­tros. Inti­tu­lado de fa­zen­deiros na atu­a­li­dade, e The
Ship of Fools [Navio de To­los] (1962), Optimist’s Daughter [A Filha do Oti­
se passava no fim da década de 1930 mista] (1972).
a bordo de um transa­tlân­ti­co le­vando
mem­bros da elite e refu­gia­dos ale­ OS ANOS 1950
mães da nação na­zista. A década de 1950 viveu o impac­

N
ão muito prolífica, Porter to retardado da moder­nização e
ain­da assim in­fluen­ciou gera­ tec­nologia na vida diária. Não só a
ções de escritores,dentre eles Segunda Guer­ra Mundial derrotou
Eudora Welty
suas colegas sulistas, Eudora Welty e o fascismo, mas tirou a América da
Flannery O’Connor. Depres­­são, e os anos 1950 per­mi­­
tiram aos ameri­canos tempo para
Eudora Welty (1909 - 2001)

N
usu­fruir da pros­pe­­ri­dade há mui­to
ascida no Mississipi, de fa- ansiada. Os ne­gó­cios, sobre­tudo no
mília abastada do Norte, mundo das cor­po­rações, pare­ciam
Eudora Welty foi gui­ada por oferecer a boa vida (em geral, nos
Robert Penn Warren e Katherine subúr­bios), com suas mar­cas reais e
Ann Porter. Por­ter, de fa­to, es­cre­veu simbólicas de su­cesso — casa, car­ro,
o prefácio à pri­meira coletâ­nea de tele­visão e ele­tro­domésticos.
contos de Welty,  A Cur­tain of Green Porém,a solidão nas altas esferas era
[Uma Cortina de Verde] (1941). Foto © Nancy Crampton tema dominante para muitos escritores;

102
A
o empresário sem rosto tor­nou-se que fracas­sam na luta pelo sucesso,
este­reó­tipo cultu­ral em The Man in the como em Death of a Salesman [Mor­
Gray Flannel Suit [O Homem de Terno te de um Caixeiro Viajante] de Arthur
de Fla­ne­la Cinza] (1955), best-seller Miller e Seize the Day [Apro­veite o
de Sloan Wilson. A alienação genera­ década Dia] (1956),no­vela de Saul Bellow.  A
lizada na Amé­rica foi examinada de 1950 foi, em afro-americana Lorraine Hansberry
pelo sociólogo Da­vid Riesman em (1930-1965) re­ve­­lou o racismo como
termos literários,
The Lonely Crowd [A Mul­tidão Soli­ uma ten­dên­cia contínua em sua pe­
tá­­ria] (1950). na realida­de, de ça tocante A Raisin in the Sun [Uma
Ou­tros estu­dos popu­la­res, mais ou tensão sutil e Passa ao Sol], de 1959, na qual uma
menos científicos,  se segui­ram,de The difusa. Roman­ família negra se encontra com um
Hidden Per­sua­­­­ders [Os Per­­sua­­sores ces de John ameaçador “comitê de boas-vindas”
Ocul­tos] (1957) e The Status Seekers O’Hara, John quando tenta se mudar para uma
[Os Per­seguidores de Status] (1959) Chee­­­ver e John vizinhança branca.
deVance Packard ao The Organization Alguns escrito­res fo­ram além
Updike exploram
Man [O Homem da Orga­ni­za­ção] ao enfocar personagens que fica­
(1956) de William Whyte e às formu­
a tensão à ram pelo caminho, como fez J.D.
lações mais in­telec­tuais de C. Wright espreita nas Salinger em The Catcher in the Rye
Mills — Whi­te Collar [Co­la­rinho sombras da [O Apanha­dor no Campo Centeio]
Branco] (1951) e The Power Elite [A satisfação (1951), Ralph Ellison em Invisible
Elite do Poder] (1956). O economista aparente. Man [Homem Invisível] (1952) e
e acadêmico John K. Galbraith con­ Jack Ke­rouac em On the Road [Na
tri­buiu com The Affluent Society [A Es­­tra­da] (1957). Em 1959, Phi­lip
Sociedade da O­­pu­­lência] (1958). Roth che­­gou com uma série de con­

A
maioria des­sas obras apoiava tos re­­fle­tindo sua pró­pria alie­na­ção
a pre­sunção dos anos 1950 de de sua heran­ça judaica (Good­­bye,
que todo america­no des­frutava Columbus [A­deus,Columbus]).Suas
um es­ti­lo de vida co­mum. Os estu­ ru­mi­nações psicológi­cas ainda ins­
dos fala­vam em ter­mos genéricos, piram a ficção e até autobio­grafia
critican­do cida­dãos por terem per­ em plena novo milênio.
dido o individua­lismo de fronteira A ficção dos escritores judeus ame­
e se torna­do muito confor­mistas ricanos Bellow, Bernard Malamud e
(Riesman e Mills, por exem­plo); ou Isaac Bashevis Singer — entre outros
aconselhan­do as pes­soas a se tor­ proeminentes na década de 1950
narem parte da “Nova Classe” cria­da e anos posteriores — também são
pela tecno­logia e o la­zer (co­mo nas adições valiosas e fascinantes ao
obras de Galbraith). compêndio da lite­ratura americana.
A década de 1950 foi, em termos A produção des­ses autores é notável
literários,na realida­de,de tensão sutil por seu humor, preocu­pação éti­ca e
e difusa. Roman­ces de John O’Hara, retrato das comuni­dades judai­cas no
John Chee­­­ver e John Updike explo­ Velho e no Novo Mundo.
ram a tensão à espreita nas sombras
da satisfação aparente. Algumas das
melhores obras retratam ho­mens

103
John O’Hara (1905 - 1970) enquanto se de­bate com ques­­tões
Formado em jornalismo, John de con­versão cris­tã numa igreja
O’Hara foi um autor prolífico de atrás de um ar­ma­zém. Ou­tras obras
peças teatrais, contos e romances. importan­tes incluem Another Country
Era mestre do de­ta­lhe cuidadoso [Um Outro País] (1962) e Nobody
e revelador e é mais lembrado por Knows My Name [Nin­guém Sabe
vários roman­ces rea­listas escritos, Meu Nome] (1961), cole­tânea de
em sua maio­ria, nos anos 1950, so­ ensaios pessoais apaixo­nados so­bre
bre pes­soas aparen­temente bem- ra­cis­mo,o papel do artista e lite­ratu­ra.
sucedi­das cu­jas fa­lhas internas e
frustrações deixam-nas vulnerá­veis. Ralph Ellison (1914 - 1994)
Estes romances incluem  Appointment Ralph Ellison nasceu em Oklahoma,
in Samarra [Encontro em Samarra] no Meio-Oeste, e estudou no Instituto
(1934),Ten North Frederick [Fre­de­rick Tuskegee, no Sul dos Estados Unidos.
Norte, Dez] (1955) e From the Terrace Teve uma das car­reiras mais estranhas
[Do Terraço] (1958). na literatura americana — um livro
muito acla­mado e nada mais.
James Baldwin (1924 - 1987) O romance é In­­visible Man [Ho­
James Baldwin e Ralph Ellison mem Invisível] (1952),história de um
refletem a experiência afro- negro que vi­ve uma existência sub­
ameri­cana nos anos 1950. Suas per­ terrânea, numa adega feericamente
sona­gens sofrem de falta de identi­ ilu­mi­nada com eletricidade roubada
dade em vez de excesso de ambi­ção. da concessionária elétrica. O livro
Baldwin, o mais velho de nove relata suas experiências grotescas de
irmãos, nascido no Harlem, Nova desencanto. Quando ele ganha uma
York, foi criado por um prega­ bolsa para estudar numa fa­cul­dade
dor. Ainda jo­vem, Baldwin pregou negra, é humilhado pelos brancos;
al­gu­mas ve­zes na igreja.Isso o ajudou quando chega à faculda­de,vê o reitor
a mol­dar a fasci­nan­te qua­lidade oral negro despre­zando os anseios dos
de sua prosa, claramen­te notada em americanos ne­gros. A vida fora da
ensaios excelentes como“Letter from James Baldwin faculdade também é corrupta. Nem
a Re­gion of My Mind” [Carta de uma sequer a religião serve de consolo:
Re­gião de Mi­nha Mente”] da cole­tâ­ o prega­dor acaba se revelando um
nea The Fi­re Next Time [O Fogo da crimi­noso. O romance culpa a so­
Pró­xi­ma Vez] (1963).Nesta,de­fendeu ciedade por não dar aos cidadãos
ar­dorosamente o fim da se­gregação — negros e brancos — ideais viáveis
racial. e as instituições ne­cessárias para

O
p r i m e i ro ro m a n c e d e realizá-los. Encarna um tema racial
Baldwin, o autobiográfico poderoso, pois o “ho­mem invisível”
Go Tell It On the Mountain não é invisível por si, mas porque os
[Vá Dizer à Montanha] (1953), é outros,cega­dos pelo preconceito,não
talvez o mais fa­moso. É a história conse­guem enxergá-lo como ele é.
de um jovem de 14 anos que busca
autoconheci­mento e fé religiosa Foto © Nancy Crampton

104
Flannery O’Connor Contos Completos] saiu em 1971.
(1925 - 1964)
Flannery O’Connor nasceu na Saul Bellow (1915 -2005)
Georgia e teve sua vida abreviada Nascido no Canadá e criado em
pelo lúpus, doen­ça fatal do san­ Chi­cago, Saul Bellow é de origem
gue. Ainda assim, re­jei­tou o senti­ russa-judaica. Es­tu­dou antropolo­gia
mentalismo, como provam suas e sociologia, mar­cantes em seus
histórias bem joco­sas, ainda que trabalhos. Declarou-se uma vez pro­
soturnas e des­com­promissa­das. fundamen­te gra­­to a Theodore Drei­ser
Ao contrá­rio de Anne Porter, pela aber­tu­ra para uma ampla gama
Eudora Welty e Zora Neale Hurston, de experiên­cias e seu comprome­
O’Connor guardava,na marioria das timento emo­cional com isto. Mui­to
vezes, distância das perso­na­gens, respeitado, recebeu o Prêmio No­bel
reve­lan­do suas ina­­de­qua­ções e to­ de Litera­tu­ra em 1976.
li­ces. Per­sona­gens sulis­tas in­cul­­tas Seus primeiros romances, existen­
geram vio­lên­cia por su­pers­­tição ou cialistas e meio sotur­nos, inclu­em
re­ligião,co­mo vemos em Wi­se Blood Dangling Man [O Ho­mem De­pendu­
[San­gue Sábio] (1952), romance rado] (1944), es­tudo Kaf­ka­­niano de
sobre um fanático religioso que um homem aguar­dando a convoca­
funda sua própria igreja. ção pelo E­xér­cito, e The Victim [A
Às vezes a violência vem do pre­­­ Vítima] (1947),  so­bre as re­la­ções entre
conceito, como em “The Dis­pla­­ced judeus e gen­tios. Nos anos 1950, sua
Person” [A Pessoa Desloca­da], so­bre visão fi­­cou mais cômica: usou vários
um imigrante assas­si­nado pela po­ nar­­ra­dores vi­gorosos e aven­­tu­rei­ros na
pulação rural ig­no­­rante, amea­ça­da primeira pessoa em The Adventures
por seu tra­balho duro e dife­ren­tes of Augie March [As Aventuras de
costumes.  Muitas vezes,even­tos cruéis Augie March] (1953) — estudo de
simples­men­te acon­te­cem com as um empresário urba­no, do gênero
per­sona­gens,como em“Good Coun­try ‘Huck Finn’, envolvi­do no mer­­cado
People”[Bom Povo Rural], his­tória de negro europeu — e em Hender­son
uma me­nina seduzida pelo ho­mem Ralph Ellison the Rain King [Hen­der­son, o Rei da
que rouba sua perna artificial. Chuva] (1959),ro­man­ce sério-cômico
O humor negro de O’Connor a bri­lhante e exuberan­te so­bre um mi­
liga a Nathanael West e Joseph He­ller. lio­nário de meia-idade cujas ambi­ções
Produziu as cole­tâneas de contos A frustra­das o levam à África.
Good Man is Hard to Find [É Di­fícil Seus trabalhos pos­teriores incluem
Achar um Homem Bom] (1955) e Herzog (1964),um professor de in­glês
Everything that Rises Must Converge neu­ró­­tico es­pe­cializa­do na ideia do
[Tudo que Sobe Tem de Con­ver­gir] ser Ro­mân­ti­co; Mr. Samm­ler’s Planet
(1965); o romance The Violent Bear [O Pla­neta do Sr. Samm­ler] (1970);
It Away [Os Violentos Aguen­tam] Hum­­boldt’s Gift [O Presente de Hum­
(1960) e um volume de car­­tas, The boldt] (1975) e o autobiográfi­co The
Habit of Being [O Hábi­to de Ser] Dean’s December [O Dezem­bro do
(1979). The Complete Stories [Os Foto © Nancy Crampton Rei­tor] (1982).

105
Ao fim dos anos 1980,  Bellow escre­ [O Negocis­ta] (1966), Pictures of
veu dois novelas em que protago­nistas Fidelman [Retra­tos de Fidelman]
idosos buscam as verdades su­pre­mas, (1969) e The Te­nants [Os Inquilinos]
Something to Remember [Algo para se (1971).
Lembrar] (1991) e The Actual [O Real] Tam­bém era um mestre pro­lífico
(1997).Seu romance Ravelstein (2000) dos con­tos. Através de suas histó­
é um relato velado da vida de Alan rias, em coletâneas como The Ma­gic
Bloom,amigo de Bellow,  autor do best- Bar­rel [O Barril Mágico] (1958),
sellerThe Closing of the American Mind Idiots First [Idiotas Primeiro] (1963)
[O Fechamento da Mente Americana] e Rembrandt’s Hat [O Cha­péu de
(1987), um ataque conservador à Rembrandt] (1973), trans­mitiu —
academia pela erosão percebida dos mais do que qualquer ou­tro escritor
padrões na vida cultural americana. nascido nos Estados Unidos — um
Seize the Day [Aproveite o Dia] sentido do presente e do passado
de Bellow é uma novela brilhante judeus, do real e do sur­realista, fato
centrada num em­pre­sá­rio fracassado, e lenda.
Tommy Wil­helm, tão consumido por A obra monumental de Mala­mud
sen­­ti­­mentos de inadequação, que se — ganhadora do Prêmio Pulitzer e
torna totalmente inadequado — um do National Book Award — é The
fracasso com as mulheres, empregos, Fixer. Passada na Rússia da vi­rada
máquinas e o mercado de commodi­ do século 20, é uma pálida amostra
ties, onde perde toda a sua fortuna. de um caso real de calúnia racial
Wil­helm é exem­plo do schlemiel do — o julgamento infa­me de Mendel
folclore judaico — vítima ine­vi­tável Bliss, em 1913, tris­te mancha antisse­
de toda espécie de má sorte. mítica na histó­ria moderna. Como
em muitas de suas o­bras, Malamud
Bernard Malamud destaca os sofri­mentos do herói,
(1914 - 1986) Yakov Bok, e sua luta para sobrevi­
Bernard Malamud nasceu em Nova ver contra to­das as dificuldades.
York, filho de imigrantes russos-
ju­deus. Em seu se­gun­­do roman­ Isaac Bashevis Singer
ce, The Assistant [O As­s istente] Bernard Malamud (1904- 1991)
(1957), Malamud achou seus temas O romancista ganhador do Prê­
caracterís­ticos — a luta do homem mio Nobel e mestre dos contos Isaac
para so­breviver, ape­sar das dificul­ Bashevis Singer — polonês emi­gra­do
dades, e os fundamentos éti­cos dos para os Estados Uni­dos em 1935 — era
imi­gran­tes judeus recen­tes. filho de um proe­mi­­nente líder de um

S
ua primeira obra publicada tribu­nal rabí­nico emVar­sóvia.Escreveu
foi The Natural [O Natural] em iídi­che durante toda a vida e tratou,
(1952), com­­binação de rea­ em termos míticos e rea­lis­tas, de dois
lismo e fan­ta­sia no mundo mítico grupos específicos de judeus — os
do beise­bol pro­­fis­­sional. Outros mora­dores das shtetls, pequenas al­
romances in­cluem A New Life deias doVelho Mundo,e os emigrantes
[Uma Nova Vi­da] (1961), The Fixer Foto © Nancy Crampton que atra­ves­saram o oceano no século

106
20, antes e depois da Segunda Guerra. te assu­mem vida própria.
As obras de Singer foram su­por­ Nabokov é um escritor impor­tan­te
tes de livros sobre o Holocausto. De por sua sutileza estilís­tica,habilidade
um la­­do, descre­veu — em romances satírica e engenhosas inovações na
co­­­mo The Ma­nor [A Mansão] (1967) forma, que inspira­ram romancistas
e The Estate [A Propriedade] (1969),  como John Barth. Nabokov estava
pas­sados na Rússia do século 19, ciente de seu papel de mediador
e The Family Moskat [O Mos­kat da entre os mundos lite­rá­rios america­
Família] (1950), falando sobre uma no e russo; escreveu um livro sobre
fa­mília polonesa-judaica vivendo Gogol e traduziu o Eugene Onegin,
entre as duas guerras — o mundo já de Pushkin. Seus te­mas ousados,
desa­pa­recido dos ju­deus europeus. um tanto expres­sio­nistas, como o
Com­ple­mentando essa visão,havia os estranho amor em Lolita, ajudaram a
textos passa­dos após a guer­ra, co­mo introduzir as correntes expressionistas
Enemies, A Love Story [Ini­migos,Uma euro­peias do século 20 na tradição
His­tó­ria de Amor] (1972),cujos prota­ es­sen­cialmente realista da ficção
gonistas,sobre­viventes do Holo­caus­to, ame­­ri­cana. Seu tom, em parte satí­
procura­vam reconstruir suas vidas. ri­co e em parte nostálgico, também
sugeria novo registro sério-cô­mico
Vladimir Nabokov (1889 - 1977)

C
emocional usado por auto­res como
omo Singer,Vladimir Nabokov Pynchon,que combina notas opos­tas
era imigrante da Europa Ori­ de humor e medo.
ental.De família rica na Rússia
czarista,veio para a América em 1940 John Cheever (1912 - 1982)
e ob­teve a cidadania america­na John Cheever tem sido muitas vezes
cinco anos depois. De 1948 a 1959, chamado de “romancista de manei­
le­­cionou literatura na Uni­versidade ras”. É conhecido por seus contos
de Cornell,no norte de NovaYork; em elegantes e sugestivos,que perscrutam
1960,transferiu-se permanen­temente o mundo dos negó­cios de Nova York,
para a Suíça. por seus efeitos sobre os empresários,
É fa­moso por seus roman­ces, que suas espo­sas, filhos e amigos.
inclu­em o au­to­bio­grá­fico Pnin (1957), John Cheever Uma estranha melancolia e um de­
sobre um professor russo emigrado sejo jamais plena­mente saciado ainda
ineficaz, e Lolita (edição america­na, que aparente­mente inútil de paixões
1958), sobre um europeu instruído e certezas metafísicas se esgueira nas
de meia-idade que se apaixona por som­bras dos magistralmente escritos
uma america­na de ape­nas 12 anos. contos Chekovianos, reunidos em
Seu romance pasti­che,  Pale Fire [F­ogo The Way Some People Live [O Mo­do
Pálido] (1962),  outro empreen­di­men­ Como Algumas PessoasVivem] (1943),
to bem-sucedido, enfoca um lon­go The Housebreaker of Shady Hill [O
poema escrito por um fale­ci­do poeta Arrombador de Shady Hill] (1958),
imaginário e os comen­tá­rios sobre o Some People, Places and Things That
mesmo de um crítico cujos escritos Will Not Appear in My Next Novel
dominam o poema e inesperadamen­ Foto © Nancy Crampton [Algumas Pessoas, Coisas e Lugares

107
que Não Aparecerão em Meu Próximo anos 1980. Na novela de 1995 Rabbit
Romance] (1961), The Brigadier and Remembered [Rabbit Lembrado], os
the Golf Widow [O Brigadeiro e a filhos adultos de lembram de Rabbit.
Viúva do Golfe] (1964),e The World of Outros romances de Up­dike in­
Apples [O Mundo das Maçãs] (1973). cluem The Centaur [O Centauro]
Seus títulos revelam sua característica (1963), Couples [Ca­sais] (1968),
despreocupação, espírito jocoso e A Month of Sundays [Um Mês de
irreverência e insi­nuam seu tema. Domingos] (1975), Roger’s Version [A
Cheever pu­blicou também vários Versão de Roger] (1986) e S. (1988).
romances — The Wap­shot Scandal Updike cria um alter ego — um es­cri­tor
[O Escândalo Wap­shot] (1964),Bullet cuja fama ironicamente ame­aça cala­
Park (1969) e Falconer (1977) — o -lo — noutra série de romances: Bech:
último, bem autobiográfico. A Book [Bech:Um Livro] (1970),  Bech
is Back [Bech Está de Volta] (1982) e
John Updike (1932 - )

C
Bech at Bay [Beck ao Largo] (1988).

U
omo Cheever, John Up­dike é pdike possui estilo mais bri­
também considerado um es­ lhan­te que qualquer dos au­
critor de maneiras, pelos cená­ tores de hoje e seus contos
rios  suburba­nos,  temas do­més­ticos, ofere­cem exem­plos cintilantes de
reflexões sobre tédio e me­lancolia e, sua va­riedade e cria­tividade. Suas
em especial,  seus ce­nários fictícios cole­tâneas in­cluem The Same Door
no litoral leste, em Massachusetts e [A Mesma Porta] (1959), The Music
Pensil­vânia. School [A Escola de Música] (1966),
É mais famoso pelos cinco livros Museums and Wo­men [Museus e
Rabbit, descrições da vida de um Mu­lheres] (1972), Too Far To Go
ho­­­mem — Harry “Rabbit” Angs­trom [Lon­ge De­mais] (1979) e Problems
— nos altos e baixos de sua e­xis­ [Problemas] (1979). Também escre­
tência por qua­tro dé­cadas da história veu vários vo­lu­mes de poesias e
sócio-política americana. Rabbit, ensaios.
Run [Ra­bbit, Corra] (1960) é um
espe­lho dos anos 50, com Angstrom J.D. Salinger (1919 - )
co­mo um jo­vem marido sem rumo John Updike Precursor do que viria nos anos
e ali­enado. Rabbit Re­dux (1971) — 60, J.D. Salinger tem re­tratado ten­
sa­li­entando a con­tra­cultura dos anos tativas de se desistir da socieda­­de.
1960 — encon­tra Angstrom ainda Nascido em Nova York, obte­v e
sem propósito, ob­je­tivo claro ou rota sucesso literá­rio com a pu­bli­cação
de fuga da roti­na. Em Ra­bbit Is Rich do roman­c e The Catcher in the
[Rabbit É Ri­­co] (1981),Harry torna-se Rye [O Apa­nha­­dor no Campo de
prós­­pe­ro empresário nos anos 1970, Centeio] (1951), que fala de Hol­den
no fim da guerra do Viet­nã. Rabbit at Caul­field,  jovem de 16 anos sen­­sí­­vel
Rest [Rab­bit Des­­can­sa] (1990), vis­­­ que foge do colégio interno de elite
lumbra a re­con­­ci­liação de Angstrom para buscar a vida adulta no mun­
com a vida,antes da morte por ataque do exterior e se desilude com seu
cardíaco,contra o pano de fundo dos Foto © Nancy Crampton materialismo e sua falsi­dade.

108
A
Quando inquirido sobre o que Vagabundos de Dharma] (1958)
gos­­taria de ser,  Caulfield diz: “um apa­ en­fo­­ca intelectuais peripa­té­ticos
nhador no campo de cen­teio”, mal da contra­cultura e seu fascínio pelo
citando um poema de Robert Burns. Zen Budismo. Kerouac também es­
A seu ver, ele é a ver­são mo­der­na do cre­veu um livro de poesias,  Mexico
cavaleiro branco, úni­co defensor da City Blues [Tris­teza na Ci­dade do
alienação e
ino­cên­cia. Imagina um cam­po de Méxi­co] (1959),e obras sobre a vi­da
tensão latentes
cen­teio tão al­to que crianças não po­ com beatniks como o romancista
na década
dem ver pa­ra onde cor­rem quando ali experimental William Burroughs e
de 1950
brin­cam.Ele é o único adulto.“Es­tou à o poeta Allen Ginsberg.
encontraram
beira de um preci­pício louco. O que
expressão, nos OS TURBULENTOS PORÉM
tenho a fa­zer é pe­­gar todos que cor­­
anos 1960, nos CRIATIVOS ANOS 60
ram pa­ra ele.”A que­da no precipício
equiva­le à per­da da ino­cência infantil
Estados Unidos, A alienação e tensão latentes
— tema fre­­quente na época. na dé­c ada de 1950 foram ex­
no movimento
Ou­tras o­bras do escri­tor re­cluso pres­sas nos anos 1960, nos
de direitos civis, Es­tados Unidos,no movimento pe­los
e frugal inclu­em Ni­ne Stories [No­ve
feminismo,
His­tórias] (1953), Franny and Zooey di­reitos civis, feminismo, protestos
protestos contra contra a guer­ra,ativismo de minorias
(1961) e Raise High the Roof-Beam,
a guerra, ativismo e na chegada da contra­cultura cujos
Carpenters [Er­gam Bem Alto a Cume­
de minorias e na efeitos ainda estão sendo ab­sor­vidos
eira, Car­pin­tei­ros] (1963), coletânea
de his­tórias da revis­ta The NewYorker.
chegada de uma pela sociedade americana. O­bras
Desde sua úl­tima história em 1965,
contracultura po­lí­ticas e sociais notáveis da época
Salin­ger — que vive em New Hamp­ inclu­em os dis­­cursos do líder dos di­
cujos efeitos
shi­re — mantem-se ausente da cena reitos civis,Dr.Mar­tin Lu­ther King,Jr.,os
literária americana. ainta estão sendo textos iniciais da líder fe­mi­nista Betty
absorvidos Friedan (The Femini­ne Mystique [A
Jack Kerouac (1922 - 1969) pela sociedade Mística Feminina],1963) e The Armies
De origem franco-canadense americana. of the Night [Os Exércitos da Noite]
pobre, Jack Ke­rouac também ques­ (1968),de Norman Mai­­ler,sobre uma
tionou os valores da classe media. marcha contra a guerra, em 1967.
Encontrou-se com membros do Os anos 1960 foram marcados
sub­mun­do lite­rá­rio “beat” quando por menor niti­dez na distinção entre
estudante na Univer­si­dade de Co­ ficção e fato,romance e re­­portagem,
lum­bia, em Nova York. Sua ficção foi tendência mantida até hoje.Tru­man
influ­en­­ciada pela obra levemen­te Capote — romancista que havia
autobiográfica do sulista Thomas des­lum­bra­do leitores como enfant
Wolfe.

S
terrible, no fim dos anos 1940 e 1950,
eu romance mais famoso, On em obras como Breakfast at Ti­ffa­ny’s
the Road [Na Estrada] (1957), [Bonequinha de Luxo] (1958) —
descreve os “beatniks” pe­ram­ ator­do­ou-os com In Cold Blood [A
bu­­lando pela América em busca do Sangue Frio] (1965), aná­­li­se eletri­
sonho idea­lis­ta de vida comunitária zante de um assassinato em massa
e beleza. The Dharma Bums [Os brutal no coração da América com

109
ares de romance po­licial. personagens redondas, uma trama crível que
Ao mesmo tempo, surgiu o No­vo Jorna­lis­mo permita o desenvolvimento de uma personagem
— volumes de não-fic­ção que uniam jornalis­mo e ambientes apropriados.  Na metaficção,  o estilo
e téc­ni­cas de ficção ou que frequen­temente do escritor atrai a atenção do leitor.  O verdadeiro
brin­ca­vam com os fatos, moldando-os para sujeito não é a personagem, mas a própria cons­
aumentar a drama­ti­ci­dade e imediatis­mo da ciência do autor.
história. Em The Electric Kool-Aid Acid Test [O Críticos dessa época geralmente agrupavam
Teste do Ácido do Refresco Elétri­co] (1968),Tom Pynchon, Barth e Barthelme como metaficcio­
Wolfe (1931- ) festejava os esga­res do ro­man­­cista nais, juntamente com William Gaddis (1922-
Ken Kesey (1935-2001) e sua sede de via­gens 1998), cujo longo romance JR (1975), sobre um
na con­tracul­tura; Radical Chic and Mau-Mauing rapaz que constrói um falso império de negócios
the Flak Catchers [Ra­di­cal-Chic e o Terror dos com base em títulos de sucata,  prevê de forma
RPS] (1970) ridicularizava mui­tos aspectos do sinistra os excessos futuros de Wall Street. Seu
ativis­mo de esquerda.Wolfe, mais tarde, escreveu romance mais curto e acessível, Carpenter’s
uma his­tória exu­berante e pers­pi­caz do início do Gothic [O Gótico de Carpenter] (1985), combina
pro­grama espacial americano, The Right Stuff [Os romance com ameaça. Gaddis é muitas vezes
Eleitos] (1979), e um ro­mance, The Bon­fi­re of the associada ao filósofo e romancista do Meio-
Vanities [A Fogueira das Vaidades] (1987), retrato Oeste, William Gass (1924 - ), mais conhecido
panorâmi­co da so­ciedade ame­ricana na década por sua cuidadosa obra inicial, Omensetter’s
de 1980. Luck [A Sorte de Omensetter] (1966), e por seus
No correr dos anos 1960, a literatura fluiu com contos na coletânea In the Heart of the Heart of
a turbu­lên­cia da época.  Surgiu uma visão irô­nica, the Country [No Coração do Coração do País]
cô­mica,refletida na fabulação de vários escritores. (1968).
Exemplos incluem o soturno e cômico One Flew Robert Coover (1932 - ) é outro escritor de
Over the Cuckoo’s Nest [O Estranho no Ninho] me­ta­fic­ção. Sua coletânea de contos Pricksongs &
(1962) de Ken Kensey, romance sobre a vida num Descants [ Pontos & Contrapontos] (1969) brinca
hos­pício,onde enfer­mei­ros são mais per­tur­bados com enredo familiares de lendas e cultura popular,
que inter­nos, e o ex­tra­va­gante e fantasis­ta Trout enquanto seu romance The Public Burning [A
Fishing in Ameri­ca [A Pesca de Tru­tas na América] Queima Pública] (1977) desconstrói a execução
(1967), de Richard Brau­tigan. de Julius e Ethel Rosenberg, condenados por
O cômico e o fan­tás­tico geraram um novo espionagem.
gênero, meio cômico e meta­físico,  nos paranóicos
e bri­lhan­tes V (1963) e The Crying of Lot 49 [O Thomas Pynchon (1937 - )
Cho­ro do Lote 49] (1966), de Thomas Pyn­chon, Thomas Pynchon, autor misterioso e avesso à
Giles Goat-Boy [Giles, O Pastor de Cabras] (1966) pu­bli­cidade, nasceu em Nova York e formou-se,
de John Barth e os contos grotes­cos de Donald em 1958, pela Univer­sidade de Cornell, onde
Barthelme (1931-1989), cuja pri­mei­ra coletâ­nea, pode ter sido influenciado por Vladimir Na­bokov.
Come Back, Dr. Cali­gari [Vol­te, Dr. Caligari] foi pu­ Certamente, suas fantasias inovadoras usam
blica­da em 1964. temas de dicas de tradução, jogos e códigos que
Esse novo gênero passou a ser chamado de pode­riam deri­var de Nabokov. O tom flexível de
Pynchon pode modular paranóia em poesia.

T
metaficção — ficção consciente ou reflexiva
que chama atenção para a sua própria técnica. oda a ficção de Pynchon tem estrutura
Tal“ficção sobre ficção”enfatiza a linguagem e o semelhante.Uma ampla trama é desconhe­
estilo e deixa as convenções do realismos, como cida de pelo me­nos uma das personagens

110
N
prin­ci­pais, cuja tarefa passa a ser “ que encontaremos todos os Tiranos
criar ordem em meio ao caos e deci­ e Escravos do Mundo?”Apesar de sua
frar o mundo. Este projeto, função abrangência, violência, comédia e
do ar­tista tradicional, tam­­­bém é talento para a inovação, fazem dos
pas­sado ao leitor, que de­ve seguir o ão trabalhos de Pynchon um pro­duto
de­senrolar dos fatos e buscar pis­tas bem característico dos anos 1960.
importa aonde...
e significados. Esta visão para­nóica John Barth (1930 - )
se estende por con­tinen­tes e eras
formos, será que John Barth,natural de Maryland,é
diversas, já que Pyn­chon usa a me­ encontaremos mais inte­res­sado em como a história
táfora da entropia, a desarti­cu­lação todos os Tiranos é con­tada do que na his­tó­ria em si,
gra­dual do univer­so.O gran­de domí­ e Escravos mas onde Pyn­chon ilu­de o leitor
nio da cultura popular—sobretudo do Mundo?” com pistas falsas e dicas de roman­
a ficção cien­tífica e policial — é Apesar de sua ces poli­ciais,  Barth atrai seus leitores
visível em suas obras. abrangência, a um parque de diver­sões cheio de
Seu V é levemente estrutu­rado espe­lhos distorcidos que exage­ram
violência,
em tor­no de Benny Profane — um al­guns traços e mi­nimizam outros.
fra­­cassado que insiste em peram­bu­­ comédia e Re­alismo é o ini­mi­go para Barth,
lações sem sentido e vá­rias em­prei­­ta­ talento para a au­tor de Lost in the Funhouse [Per­­di­
das estra­nhas — e seu opos­to, o letra­ inovação fazem do no Parque de Diversões] (1968),
do Herbert Stencil, que pro­­cura uma dos trabalhos 14 histórias que constantemente se
espiã mis­­­te­riosa, V (al­ter­­nativamente de Pynchon um refe­rem aos processos de escrita e
Vê­­nus,Virgem,Va­zio).The Crying of Lot pro­duto bem lei­tura. A intenção de Barth é a­ler­tar
49, obra curta, tra­ta de um sistema se­ o leitor para a natureza artifi­cial da
característico
creto associado ao serviço de cor­reio leitura e da escrita e impedí-lo de ser
americano. Gra­vi­ty’s Rainbow [Arco-
dos anos 1960. tragado pela história como se fosse
Iris da Gravi­dade] (1973) se passa em verdadeira. Barth usa uma panóplia
Lon­dres,  na Segunda Guer­ra Mundial, de elemen­tos reflexivos para lembrar
quan­do bombas caíam na cidade, seus lei­to­res que es­tão lendo.
e con­ta a busca farsante, ainda que As obras iniciais de Barth, como
sim­bólica, de nazistas e outras figuras as de Saul Bellow,  são inquisido­ras
dis­far­çadas. e existenciais, com te­mas dos anos
Em Vineland [Vinhedo] (1990), 1950 de fuga e pe­ram­bulação. Em
obra cômica de Pynchon ambien­ The Floa­ting O­pe­ra [A Ópera Flutuan­
tada no norte da Califórnia, for­ te] (1956), um ho­mem pen­sa em
ças sombrias dentro de agências suicídio. The End of the Road [O Fim
federais põem indivíduos em perigo. da Estrada] (1958) é sobre um caso
Em Mason & Dixon (1997), parcial­ amoroso comple­xo. Nos anos 1960,
mente ambientado em terras ermas suas obras tor­naram-se mais cômicas
em 1765, dois exploradores ingleses e menos realistas.The Sot-Weed Factor
pesquisam a linha que iria dividir [O Fa­tor da Erva-do-Ébrio] (1960)
o Norte do Sul dos Estados Unidos. paro­dia o es­tilo picaresco do século
Novamente, Pynchon vê o po­der 18 en­quan­to Giles Goat-Boy [Gi­les,
exercido de forma injusta.  Dixon diz: Guar­dador de Cabras] (1966) é a
“Não importa aonde... formos, será paródia do mundo visto como uma

111
univer­si­dade. chauvinista). O irreprimível Mailer
Chimera [Qui­me­ra] (1972) reconta casou-se seis vezes e foi candidato a
lendas mi­to­lógicas gre­gas e Letters prefeito de Nova York.
[Cartas] (1979) usa Barth como per­ Mailer é o inver­so do autor como
so­na­gem, como fez Norman Mailer Barth, para quem o tema não é tão
em The Ar­mies of the Night [O Exército crucial quanto a forma como é aborda­
da Noi­te]. Em Sabbatical: A Roman­ce do.Ao contrário do invisível Pynchon,
[Sabático: Um Romance] (1982), sem­pre corteja e requer atenção.
Barth usa o te­ma popular do es­pião; Ro­man­­cista, ensaísta, às vezes polí­
é a his­tó­ria de uma pro­fes­sora univer­ ti­co, ativista literário e ator eventual,
sitária e seu marido, agen­te secreto está sem­pre em cena. De exer­cícios
apo­sentado que vira romancista.Obras de Novo Jornalismo co­mo Mia­mi
posteriores — The Tidewater Tales and the Siege of Chicago [Mia­mi e o
[As Lendas das Marés] (1979), The Cerco de Chicago](1968),aná­lise das
Last Voyage of Somebody the Sailor con­venções presiden­ciais americanas
[A Última de Viagem de Alguém o de 1968, e seu fasci­nan­­­te estudo da
Marinheiro] (1991) e Once Upon a execução de um as­­sas­­sino condena­
Time: A Floating Opera [Era Uma Vez: do, The Execu­tio­ner’s Song [Canção
A Ópera Flutuante] (1994) revelam o do Carras­co] (1979), Mailer passou
“virtuosismo passional” de Barth (sua a escrever romances ambiciosos,
própria frase) ao negociar o mundo ainda que imperfeitos, como Ancient
caótico, oceânico com o cordame Evenings [Noites Antigas] (1983),
brilhante da linguagem. passado no Egito da antiguidade, e
Harlot’s Ghost [Fantasma de Harlot]
Norman Mailer (1923 - ) (1992), em torno da Agên­cia Central
Norman Mailer tornou-se o mais de Inte­ligência (CIA).
visível romancista das décadas de 1960
e 1970. Co-fundador de The Village Philip Roth (1933 - )
Voyce, semanário novaiorquino anti- Como Norman Mailer,  Philip Roth
estabelecimento,  Mailer divulgava a si tem provocado controvérsias ao mi­
mesmo e seus pontos de vista políticos. Norman Mailer nar sua vida com a ficção.No caso de
Em seu apetite por experiên­cias,estilo Roth, seu tratamento de temas sexu­
vigo­roso e pes­soa públi­ca dramática, ais e análises irônicas da vida judaica
segue a tradição de Ernest He­ming­way. têm atraído a atenção popular e da
Para ocupar uma posição vantajosa crítica, além de desaprovação.
sobre o assassinato do presidente O primeiro livro de Roth, Goodbye,
John F. Kennedy, os protestos contra Columbus [Adeus,Columbus] (1959),
a guerra do Vietnã, a liberação dos satirizava os subúrbios judai­c os
negros, e o movimento feminista, ele provincianos. Em seu romance
construiu uma personalidade pública mais famoso, o ultrajante best-seller
de machão sofisticado, existencialista Portnoy’s Complaint [A Reclamação
(em seu livro Sexual Politics [Políticas de Portnoy] (1969), um administra­
Sexuais] Kate Millett identificava dor da cidade de Nova York deleita
Mailer como o arquétipo do macho Foto © Nancy Crampton seu analista taciturno com histórias

112
impróprias de sua juventude. carreira é arruinada por um mal-en­
Embora The Great American Novel tendido racial com base no idioma.
[O Grande Romance Americano] Roth é um profundo analista das
(1973) sonde o mundo do beisebol, forças e fraquezas dos judeus. Suas
mui­tos dos romances de Roth perma­ caracterizações são ri­cas em mati­
necem resolutamente, ou mesmo de zes; seus protagonistas complexos,
forma desafiadora, autobiográficos. individualizados e profundamente
Em My Life As a Man [Minha Vida humanos. A série de romances
Como um Homem] (1974), sob o autobiográficos de Roth sobre um
stress do divórcio,  um homem vale-se escritor relembra a série Beck re­
da criação de um alter-ego, Nathan cente de John Updike e é com o
Zuckerman,cujas histórias constituem mestre estilista Updike que Roth
um polo da narrativa, o outro sendo — amplamente admirado por seu
os diversos tipos de respostas dos estilo flexível e engenhoso — é mais
leitores. Zuckerman aparentemente frequentemente comparado.
toma posse de uma série de romances Apesar de seu brilhantismo e inte­
subsequentes. O mais bem-sucedido ligência,alguns leitores acham a obra
é provavelmente o primeiro, The de Roth muito absorvida.Ainda assim,
Ghost Writer (1979). É contado por suas conquistas vigorosas ao longo
Zuckerman,como jovem escritor criti­ de quase 50 anos deu a ele um lugar
cado pelos anciãos judeus por atiçar entre os mais estimados romancistas
o antisemitismo.Em Zuckerman Bound americanos.
[Zuckerman Constrangido] (1985),  um
romance tornou Zuckerman rico, po­ ESCRITORES SULISTAS
rém notório. Em The Counterlife [A A literatura sulista da década de
Contravida] (1986),o quinto romance 1960 tendia, como a então ainda
de Zuckerman, histórias competem bem agrária Região Sul, a aderir
com histórias,  enquanto a suposta vida às tradições consagradas pelo
de Nathan é comparada com outras vi­ tempo. Ela continuou enraizada no
das imaginárias.  As memórias de Roth, realismo e numa visão ética, senão
The Facts (1988) apertam o parafuso Philip Roth religiosa, durante essa década de
ainda mais; nelas Zuckerman critica o mudanças radicais. Os temas sulis­
próprio estilo narrativo de Roth. tas recorrentes incluem a família,

R
oth continua oscilando na o lar familiar, a história, a terra, a
fronteira entre fato e ficção religão a culpa,a identidade a morte
em Patrimony: A True Story e a busca pelo significado redentor
[Patrimônio: Uma história Real] da vida. Como William Faulkner e
(1991), um memorial sobre a morte Thomas Wolfe (Look Homeward,
de seu pai. Seus romances recentes Angel [Olhe para Casa,Anjo], 1929),
incluem American Pastoral [Pastoral que inspiraram a “renascença su­
Americana] (1997), em que o radi­ lista” na literatura, muitos outros
calismo dos anos 1960 da filha fere escritores sulistas nos anos 1960
seu pai,e The Human Stain [A Nódoa eram acadêmicos e estilistas ela­
Humana, sobre um professor cuja Foto © Nancy Crampton borados, reverenciando a palavra

113
escrita como um elo com tradições enraizadas za­dores e satíricos — revelam sua consciência
no mundo clássico. social e conversão ao Catolicismo. Seu melhor ro­
Muitos foram professores influentes. Caroline man­ce é seu primeiro, The Moviegoer [O Cinéfilo]
Gordon (1895-1981), natural do Kentucky, casada (1961). A história de um operador da bolsa de Nova
com o poeta sulista Allen Tate, foi uma respeitável Orleans charmoso, porém sem objetivo, mostra a
professora de composição literária.Ela ambientava influência do existencialismo fran­cês transplan­
seus romances em seu Kentucky natal. Truman tado para o Novo Sul impetuoso e em plena
Capote nasceu em Nova Orleans e passou parte expansão,que floresceu depois da Segunda Guerra
de sua infância em cidadezinhas da Louisiana e Mundial.
do Alabama,cenários de muitos de seus primeiros
trabalhos no estilo sulista elegante, decadente e OS ANOS 1970 E 1980: CONSOLIDAÇÃO
gótico. Em meados dos anos 1970, teve iní­cio uma era
O professor afro-americano de com­posição de consolidação. O conflito do Vietnã ter­mi­nara,
literária Ernest Gaines (1933 - ), também natural se­­­guido do reco­nhe­cimen­to da Re­pú­blica Popular
de Nova Orleans,ambientou muitas de suas obras da China pelos Es­ta­dos Unidos e da celebra­ção
co­mo­ventes e cuidadosas na zona rural bayou do Bicentenário da A­mé­rica.  Se­guiram-se os anos
predominantemente negra da Lousiana. Talvez 1980 — a “Dé­cada do Eu” — em que in­divíduos
sua obra mais co­nhecida, The Autobiography of pas­saram a enfocar mais questões pes­soais que
Miss Jane Pittman [A Autobiografia da Sta.  Jane so­ciais mais amplas.
Pittman] (1971), faz reflexões sobre o espaço de Na literatura, velhas corren­tes permaneceram,
tempo entre o fim da Guerra Civil em 1865 até mas a força da ex­pe­ri­men­ta­ção foi diminuindo.
1960. Preocupado com questões humanas mais No­vos au­tores como John Gard­ner, John Irving
profundas que a cor da pele, Gaines trata das (The World According to Garp [O Mun­do Segundo
relações raciais com sutileza. Garp], 1978), Paul The­roux (The Mos­qui­to Coast
Reynolds Price (1933 - ), professor por longo [A Costa do Mosqui­to], 1982), William Ken­ne­
tempo na Duke University, nasceu na Carolina do dy (Ironweed, 1983) e Alice Wal­ker (The Co­lor
Norte, que serve de cenário para cenas de muitos Pur­­ple [A Cor Púrpu­ra], 1982) emer­gi­ram com
de seus trabalhos, como A Long and Happy Life romances estilisticamente bri­­­lhan­tes a retratar
[Uma Vida Longa e Feliz] (1961). Como William dra­mas hu­­­­ma­nos comoventes.Voltou o in­te­­res­­se
Faulkner e Robert Penn Warren, povoa seu solo por cenário, per­sona­gem e te­­mas asso­ciados ao
sulista com famílias in­­ter­ligadas próximas a suas realis­mo, além de um renovado interesse pela
raízes e preocupa-se com a passagem do tempo História, como nos romances de E.L. Doctorow.

O
e o imperativo de expiar faltas passadas. Seu estilo re­a­­lismo, abandonado por autores expe­
meditativo e poético re­lembra a tradição literária rimenta­listas dos anos 1960, retornou aos
clássica do antigo Sul.Par­cialmente paralisado pelo poucos,mes­­­cla­do mui­tas vezes a ele­men­
câncer, Price explora o sofrimento físico em The tos originais ou­sados — a es­tru­tu­ra ousada do
Promise of Rest [A Promessa de Descanço] (1995), ro­­man­­ce den­tro do romance, como em October
sobre um pai que cuida do filho que está morrendo Light [Luz de Ou­tubro] (1976) de John Gardner,
de AIDS.  Seu romance bem-conceituado KateVaiden ou o diale­to negro ame­ricano em The Color Pur­­
(1986) revela sua habilidade em evocar a vida de ple [A Cor Púrpura], de Ali­­ce Walker. A li­­teratura
uma mulher. de mi­no­rias começou a florescer.O teatro pas­sou
Walker Percy (1916-1990),residente na Louisiana, do rea­lis­mo para técnicas mais cinemato­gráficas,
era membro da aristocracia sulista.  Seus romances cinéticas.Simul­ta­nea­mente porém,a “Década do
de leitura fácil — por vezes cômicos,  líricos,  morali­ Eu” se refletiu em novos talentos ousa­­dos como

114
Jay McInerny (Bright Lights, Big City [Luzes Bri­ autores metaficcionais, como Thomas Pynchon
lhantes, Cidade Gran­de], 1984), Bret Easton Ellis e John Barth, mas seus romances permanecem
(Less Than Zero [Me­nos que Ze­­ro], 1985), e Tama enraizados no realismo e na história. Seu uso de
Jano­witz (Sla­ves of New York [Escra­vos de No­va pessoas e eventos reais o associa com o Novo
York], 1986). Jornalismo dos anos 1960 e com Norman Mailer,
Thruman Capote e Tom Wolfe, enquanto seu uso
E.L. Doctorow (1931 - ) de memórias fictícias, como em World’s Fair, o
Os romances de E. L. Doctorow demonstram a aproxima de autores como Maxine Hong Kingston
transição da metaficção para uma sensibilidade e o florescimento das memórias nos anos 1990.
nova e mais humana. Seu romance sobre o alto
custo humano da guerra fria, The Book of Daniel William Styron (1925 - )

D
[O Livro de Daniel] (1971),aclamado pela crítica,é a região de Tidewater, na Virgínia, o sulista
baseado na execução de Julius e Ethel Rosenberg William Styron escreve romances ambicio­
por espionagem,contado pela voz de seu desolado sos que colocam indivíduos em lugares e
filho. The Public Burning [A Queima Pública], de épocas que desafiam os limites de sua humani­
Robert Coover, trata do mesmo tema, mas o livro dade. Suas primeiras obras incluem o aclamado
de Doctorow traz mais calor e emoção. Lie Down in Darkness [Deitar-se na Escuridão]
Ragtime [Nos Tempos do Rag] (1975) é uma (1951), que começa com o suicídio de uma linda
colagem rica e caleidoscópica dos Estados Unidos sulista — que salta de arranha-céu de Nova York
começando em 1906.Como fez John Dos Passos vá­ — e volta atrás no tempo para explorar as forças
rias décadas antes em sua trilogia U.S.A., Doctorow negras dentro de sua família que a levaram à morte.
mistura personagens fictícios e reais para capturar O tratamento falkneriano, incluindo os temas
o sabor e a complexidade da era.A história fictícia góticos sombrios sulistas, flashbacks e o fluxo de
de Doctorow sobre os Estados Unidos continua em monólogos da consciência, trouxeram fama a
Loon Lake [Lago Loon] (1979),sobre um capitalista Styron que se tornou controversa com a publicação
cru­el que domina e destrói pessoas idealistas nos de The confessions of Nat Turner [As Confissões de
anos 1930. Nat Turner] (1967), vencedor do Prêmio Pulitzer.
Os romances posteriores são os autobiográ­ O ro­mance recria a mais violenta revolta escrava da
ficos World’s Fair [Feira Mundial] (1985), sobre história dos EUA,vista pelos olhos de seu líder.  O livro
um menino de oito anos durante a Depressão foi lançado no auge do movimento “black power”
dos anos 1930; Billy Bathgate (1989), sobre Dutch e a descrição de Nat Tuner atraiu fortes críticas — o
Schultz, um verdadeiro gansgter de Nova York; e que não surpreende — de muitos observadores
The Waterworks [O Chafariz] (1994), ambientado afro-americanos, embora alguns tenham defendido
em Nova York, na década de 1870. City of God Styron.
[Cidade de Deus] (2000) — o título se refere a O fascínio de Styron por ações humanas indi­
Saint Augustine — volta-se à NovaYork no presente. viduais ambientadas contra panos de fundo de
A consciência de um clérigo cristão entremeia a injustiça racial mais ampla continua em Sophie’s
pobreza generalizada,o crime e a solidão da cidade Choice [A Escolha de Sofia] (1979),outro esforço
com histórias de pessoas cujas vidas tocam a sua. sobre o destino de uma linda mulher — temas
O livro alude à crença permanente de Doctorow que Edgar Allan Poe, espírito dominante dos
de que escrever — um modo de testemunhar — é autores sulistas, achava o mais comovente de
uma forma de sobrevivência humana. todos. Neste romance, uma linda polonesa que
Suas técnicas são ecléticas. Sua exuberância sobreviveu a Auschwitz é derrotada pelas agonias
estilística e inventividade formal o associam ao recordadas, cujo ápice é o momento em que

115
foi forçada a escolher qual de seus de pes­soas comuns) e o estilo colori­
filhos viveria e qual morreria. O livro do.Suas principais obras in­cluem The
traça paralelos complexos entre o Resurrection [A Res­sur­reição] (1966),
racismo do Sul e o Holocausto. The Sunlight Dialogues [Os Diálogos
Recentemente, Styron, como mui­ ao Sol] (1972),Nickel Moun­tain [Mon­
tos autores, partiu para a forma de ta­nha de Ní­quel] (1973),October Light
memórias. O breve relato de sua [Luz de Ou­tubro] (1976) e Mickelson’s
depressão quase-suicida,  Darkness Ghosts [Os Fan­tasmas de Mickelson]
Visible:   A Memoir of Madness (1982).
[Escuridão Visível: Memórias de Seus padrões de ficção sugerem os
Loucura] (1990), recorda a terrível poderes curativos do compa­nhei­rismo,
contracorrente que suas próprias dever e obrigações fa­mi­liares e, nesse
personagens condenadas devem ter sentido, Gardner foi profundamente
sentido. Nas ficções autobiográficas tradi­cional e conservador.Tentou mos­
de A Tidewater Morning [Uma Manhã trar que certos valores e ações le­vam
em Tidewater] (1993),a tremeluzente a uma vida plena. Seu livro On Mo­ral
e calorenta costa da Virgínia em que Fiction [So­bre a Ficção Moral] (1978),
cresceu espelha e estende a consci­ clama por roman­ces que incorporem
ência inconstante do narrador. valores éticos em vez de deslumbra­
rem com ino­vações técnicas vazias.
John Gardner (1933-1982) O li­vro criou um furor ,em grande
John Gardner, da área rural do parte porque Gardner criticou aberta­
Estado de Nova York, foi o principal mente im­portantes escritores vivos —
porta-voz de sua era para valores éti­ especialmente au­tores de metaficção
cos na literatura até sua morte, num — por não transmitirem preocupações
aci­dente de moto­cicleta.Foi pro­fes­sor éticas. Gardner defendia uma ficção
de in­glês, especializado em lite­ratura mais calorosa, humana e, acima de
medieval; seu romance mais famoso, tudo, mais realista e socialmente en­
Grendel (1971),reconta o velho épico gajada, como a de Joyce Carol Oates
in­glês, Beo­wulf, do pon­to de vista e Toni Morrison.
existencialista do monstro.O ro­mance Toni Morrison
curto, vivaz e muitas vezes cômico é Joyce Carol Oates (1938 - )
uma crítica su­til­ao existencialismo Joyce Carol Oates e a romancista
que enche o protagonista de deses­ mais prolífica e séria das últimas
pero e ci­nis­­mo autodestru­tivos. décadas, tendo publicado romances,
Romancista prolífico e popular, contos, poesia, não-ficção, peças, es­
Gardner usou uma abordagem rea­ tudos críticos e ensaios. Ela usa o que
lista,mas empregou técnicas ino­va­do­ chama de“realismo psicológico”numa
ras — flashbacks,  histó­rias den­tro de séria panorâmica de temas e formas.
histórias,mitos recontados e histórias Oates escreveu uma trilogia gótica
contrastantes — para revelar a verda­ composta de Bellefleur (1980), A
de de situações humanas.  Seus pon­ Bloodsmoor Romance [Um Romance
tos fortes são a caracterização (par­ti­­ de Bloodsmoor] (1982) e Mysteries of
cu­lar­mente seus retratos simpá­ti­­cos Foto © Nancy Crampton Winterthurn [Mistérios de Winterthurn]

116
A
(1984); um livro de não-ficção, On nidade. Tar Baby [Bebê de Piche]
Boxing [Sobre Boxing] (1987) e (1981) lida com as rela­ções entre
um estudo sobre Marilyn Monroe brancos e negros. Beloved [A Bem-
(Blonde [Loura], 2000). Seus enredos Amada] (1987) é a história angustiante
são sombrios e em geral giram so­ ficção rica­ de uma mulher que mata seus filhos
bre a violência, que considera estar men­te tramada para impedir que vivam como es­cra­­
profundamente enraizada na psique vos. Emprega técnicas de so­nho do
de Morrison
americana. rea­lis­mo mágico ao retratar uma figura
propiciou-lhe misteriosa, Beloved, que vol­ta a viver
Toni Morrison (1931 - ) aclamação com a mãe que cor­tou sua garganta.
A romancista afro-americana To­ internacional. Jazz (1992), ambientado no
ni Morrison nasceu em Ohio, nu­­­­­ma Em roman­ces Harlem dos anos 1920,é uma história
família muito espiritualizada. Cursou fas­ci­nan­tes e de de amor a assassinato; em Paradise
a Howard University, em Washington, grande abertura, [Paraíso] (1998), homens de Ruby,
e tem tra­ba­­lhado como edi­to­ra sê­nior cidade negra de Oklahoma, matam
tra­ta a identidade
de u­ma grande editora de Washington vizinhas de um assentamento só
e professora eminente em vá­rias
complexa dos de mulheres. Morrison revela que a
universidades. ne­gros de forma exclusão, quer seja por sexo ou raça,
A ficção rica­men­te tramada de universal. enquanto que aparentemente atraen­
Morrison propiciou-lhe aclamação te, leva, enfim, não ao paraíso, mas a
internacional. Em roman­ces fas­ci­ um inferno inventado pelo homem.
nan­tes e de grande abertura, tra­ta a Em Playing in the Dark: Whiteness
identidade complexa dos ne­gros de and the Literary Imagination [Brin­
forma universal.Em The Bluest Eye [O can­do no Escuro: a Brancura e a
Olho Mais Azul](1970), uma de suas I­ma­gi­nação Literária] (1992), livro
pri­meiras obras, uma jovem negra de não-ficção accessível, Morrison
obs­ti­nada conta a his­tória de Peco­la discerne uma corrente definível de
Breedlove,é levada à loucura por um consciência racial na literatura ame­
pai mo­lestador. Pecola acredita que ricana. Morrison sugere que, embora
seus olhos es­cu­ros se tor­naram azuis seus romances sejam obras de arte
magicamente e farão com que fique consumadas,contêm sen­­tido polí­ti­co:
amável. Mor­rison disse que estava “Não estou inte­res­­sada em en­tre­gar-
criando sua própria identidade como me a um exercício privado de minha
es­critora através deste romance: “Eu ima­ginação... sim, a obra tem que ser
era Pe­cola, Claudia, to­do mundo.” política.”Em 1993, Morrison ganhou o
Sula (1973) descreve a grande ami­ Prêmio Nobel de Literatura.
zade entre duas mulheres. Mor­­rison
pinta as mulheres afro-americanas Alice Walker (1944 - )
como persona­gens ple­nas, únicas e Alice Walker,  afro-americana,  fi­lha
não es­te­reótipos.Seu Song of Solomon de meeiros da Georgia rural,for­­­mou-
[Cânticos de Sa­lo­mão] (1977),  ga­ se pelo Sarah Lawrence Col­­lege,
nhou vários prê­mios. Segue a vida do onde uma de suas profes­so­ras foi a
negro Milk­­man Dead e suas relações poeta politicamente en­ga­­ja­da Muriel
comple­xas com a família e a comu­ Rukeyser. Outras in­fluências em sua

117
obra são Flan­nery O’Connor e Zora Neale Hurs­­ton. Mailer foram os primeiros,desde os abolicionistas
Escritora “mulherista”, como Walker chama a si do século 19 e dos afro-americanos de narrativas
própria, está há muitos anos associada ao fe­mi­­nis­ es­cravas a tratar do preconceito étni­co e da
mo,  apresentando a existên­cia ne­gra da perspectiva con­dição de estrangeiro. Eles exploraram novos
fe­mi­nina. Como Toni Morrison, Jamaica Kin­caid, a meios de projetar uma consciência que era tanto
falecida Toni Cade Bambara e outros ro­man­cistas americana e específica a uma subcultura. Nisto,
negros contemporâ­neos de sucesso, Walker usa o abriram as portas para o florescimento da litera­
rea­lismo lírico intensificado para se centrar nos tura multiétnica nas décadas futuras.
sonhos e fracassos das pes­­soas comuns com credi­ O fim dos anos 1980 e o início da década 1990
bilidade.Seu tra­balho ressalta a busca de dig­nidade viu a literatura de minorias tornar-se parte inte­
na vida humana.Refinada estilista,  particular­mente grante do cenário literário americano. Isso se deu
em seu ro­mance dialético epistolar The Color Purple com a dramaturgia assim como a pro­sa.O falecido
[A Cor Púrpura],  sua obra pro­cu­ra educar. Nisto, se Au­gust Wilson (1945-2005) escreveu um aclamado
parece com o ro­man­cista americano Ish­mael Reed, ciclo de peças sobre a expe­riência negra no século
cujas sátiras expõem problemas so­ciais e questões 20 que fica lado a lado com a obra de roman­cistas
raciais. co­mo Ali­ce Walker, John Edgar Wideman e Toni
The Color Purple de Walker é a história do amor Morrison.Acadêmicos como Lawrence Levine (The
entre duas irmãs negras pobres que sub­sis­te à Opening of the American Mind: Canons,Culture and
separação de muitos anos, entrelaçada à história History [A Abertura da Mente Americana: Cânones,
de como,durante esse pe­ríodo,  a irmã tímida,  feia Cultura e História], 1996) e Ronald Takaki (A
e sem instru­ção descobre sua força interior,  graças Different Mirror: A History of Multicultural America
ao apoio de uma amiga. O tema do apoio das [Um Espelho Diferente: Uma História da América
mulheres umas às outras relembra a autobiografia Multicultural], 1993) fornecem um contexto sem
de Maya Angelou,I Know Why the Caged Bird Sings par para o entendimento da literatura multiétnica
[Sei Porque o Pássaro En­gaio­lado Canta] (1970), e seus significados.
que exalta a ligação mãe-filha,e a obra de feminis­ Os ásio-americanos também assumiram seu lu­
tas brancas,como Adri­enne Rich.The Color Purple gar em cena.Maxine Hong Kingston (The Woman
mostra os homens como basicamente alheios às Warrior [A Mulher Guerreira] 1976) abriu o ca­
necessidades e rea­lidades da mulher. minho para seus companheiros ásio-americanos.
Embora muitos críticos consi­derem a obra de Entre eles está Amy Tan (1952 - ), cujos roman­ces
Walker muito di­dá­tica ou ideológica, uma grande luminosos sobre a vida chinesa transposta para
parcela de leitores aprecia suas audaciosas ex­ a América do pós-guerra (The Joy Luck Club [O
plorações da fe­mi­nilidade afro-americana. Seus Clube da Sorte da Alegria], 1989, e The Kitchen
romances lançaram luz sobre temas inflamados God’s Wife [A Esposa do Deus da Cozinha], 1991)
como o duro legado do trabalho de meeiro (The têm cativado os leitores. David Henry Hwang
third Life of Grange Copeland [A Terceira Vida de (1957 - ), um californiano filho de imigrantes chi­
Grange Copeland],1970) e a circuncisão feminina neses, já deixou sua marca no teatro, com peças
(Possessing the Secret Joy [Possuindo a Alegria como F.O.B. (1981) e M. Butterfly (1986).
Secreta], 1992). Um grupo relativamente novo no horizonte
literário era o dos escritores latino-americanos,
A ASCENÇÃO DA FICÇÃO MULTIÉTNICA incluindo o ganhador do Prêmio Pulitzer ro­man­

E
scritores judeus-americanos como Saul cista Oscar Hijuelos, nascido em Cuba, au­tor de
Bellow, Bernard Malamud, Isaac Bashevis The Mambo Kings Play Songs of Love [Os Reis
Singer, Arthur Miller, Philip Roth e Norman do Mambo Tocam Canções de Amor] (1989).Os

118
principais escritores de ascendên­ emaranhadas das famílias disfun­
cia mexicano-americana incluem cionais da reserva com uma mistura
Sandra Cisneros (Women Hollering tocante de estoicismo e humor.
Creek and Other Stories [O Córrego
das Mulheres que Gritam e Outras O TEATRO AMERICANO

A
Histórias],1991) e Rudolfo Anaya, pós a Primeira Guerra Mundial,
autor do romance poético Bless Me, os mu­sicais populares e lucrati­
Ultima [Abençoe-Me,Ultima] (1972). vos do­minavam cada vez mais o
A ficção indígena floresceu.  Muitas cenário teatral da Broadway.  O teatro
vezes, os autores evocavam a perda sério retraiu-se para salas meno­
da vida tradicional baseada na na­ res, menos dispendiosas “fora da
tureza, a tentativa estressante de se Broadway” ou fora da cidade de
adaptar à vida moderna e suas lutas Nova York.
contra a pobreza, o desemprego e Essa situação se repetiu após a
o alcoolismo. A obra vencedora Segunda Guerra Mundial. O teatro
do Prêmio Pulitzer, House Made of americano definhou nos anos 1950,
Dawn [Casa Feita de Aurora] (1968), reprimido pela Guerra Fria e o
de N. Scott Momaday (1934 - ) e seu Macarthismo. A energia dos anos
poético The Way to Rainy Mountain [O 1960 o revitalizou. O movimento
Caminho para a Montanha Chuvosa] off-off-Broadway apresentou uma
(1969) evocam a be­leza e desespero alternativa inovadora para o teatro
da vida dos índios Kiowa. De ascen­ popular comercializado.
dência parcialmente pueblo, Leslie Muitos dos principais dramatur­
Marmon Silko escreveu o romance gos, após os anos 1960, produziram
Ceremony [Cerimônia] (1977), esti­ suas peças em pequenas salas.
mado pela crítica,que conquistou um Livres da necessidade de ganhar di­
grande público.Como os trabalhos de nheiro suficiente para manter casas
Momaday, sua obra é um “romance de espetáculos caras, foram nova­
cantado” estruturado sobre os rituais mente inspirados pelo existencialis­
de cura indígenas. mo europeu e o cha­mado Teatro do
O poeta e romancista blackfoot Edward Albee Absurdo, associado a dramaturgos
James Welch (1940-2003) detalhou europeus como Samuel Beckett,
as lutas dos indígenas em seus ro­ Jean Genet e Eugene Ionesco, além
mances leves,quase perfeitos Winter de Harold Pinter. Os melhores dra­
in the Blood [Inverno no Sangue] maturgos tornaram-se inovadores
(1974), The Death of Jim Loney [A e mesmo surrealistas, rejeitando o
Morte de Jim Loney] (1979), Fools teatro realista para atacar as con­
Crow [Canto dos Tolos] (1986) e venções sociais superficiais.
The Indian Lawyer [O Advogado
Indígena] (1990). Louise Erdrich, Edward Albee (1928- )
parte chippewa,escreveu uma pode­ O dramaturgo mais influente do
rosa série de romances, inaugurada início dos anos 1960 foi Edward Albee,
por Love Medicine [Remédio de filho adotivo de uma família abastada
Foto Scott Gries /
Amor] (1984), que captura as vidas Getty Images que tinha sido proprietária de teatros

119
de variedades e contava com inúmeros identidade como negro americano.
atores entre seus amigos. Ajudando a Quando jovem, Baraka explorou
produzir o teatro do absurdo europeu, vários rumos na vida, abandonou a
Albee levou ativamente novas correntes Universidade de Howard e foi afastado
europeias para o teatro americano. com desonra da Força Aérea dos EUA
Em The American Dream [O Sonho sob suposta ligação com o comunismo.
Americano],1960, figuras caricatas da Nesses anos, sua verdadeira vocação
mãe, do pai e da avó recitam chavões para escritor aflorou.
que representam de forma grotesca Nos anos 1960, viveu em Green­
uma família convencional sem amor. wich Village na cidade de Nova York,
A perda de identidade e a conse­ onde conheceu muitos artistas e
quente luta pelo poder de preencher escritores, incluindo Frank O’Hara e
o vazio impulsionam as peças de Allen Ginsberg.
Albee, como em Who’s Afraid of Em 1965, Baraka iniciou o Black
Virginia Woolf [Quem Tem Medo de Arts Repertory Theater, no Harlem,
Virgínia Wolf] (1962). Nessa peça bairro negro da cidade de Nova York.
controversa, transformada em filme Retratou visões nacionalistas dos ne­
estrelado por Elizabeth Taylor e gros sobre racismo em peças inquie­
Richard Burton, a fantasia compar­ tantes como Dutchman [Holandês]
tilhada por um casal infeliz — de (1964), na qual uma mulher branca
que tinham um filho, que suas vidas flerta e,por fim,mata um jovem negro
tinham significado — é intensamente no metrô da cidade de Nova York. A
exposta como mentira. primeira metade da peça é realista e
Albee continuou a produzir obras espirituosa, com diálogos engenho­
notáveis por várias décadas, incluin­ sos e caracterizações sutis. O final
do Tiny Alice [Pequena Alice] (1964); chocante beira o melodrama para
A Delicate Balance [Um Equilíbrio dramatizar a incompreensão racial e
Delicado] (1966); S e a s c a p e a vitimização do protagonista negro.
[Paisagem Marinha] (1975);  Marriage
Play [Jogo do Casamento] (1987); e Sam Shepard (1943- )
Three Tall Women [Três Mulheres Amiri Baraka Ator e dramaturgo, Sam Shepard
Altas] (1991), que acompanha a passou a infância mudando com a
personagem principal, que lembra família de base em base do Exército,
a dominadora mãe adotiva de Albee seguindo seu pai, que tinha sido
por três fases da vida. piloto na Segunda Guerra Mundial.
Passou sua adolescência num ran­
Amiri Baraka (1934- ) cho no árido deserto a leste de Los
O poeta Amiri Baraka, conhecido Angeles,  Califórnia.  No ensino médio,
por sua poesia vivaz orientada para a Shepard encontrou conforto nos
fala e afinidade com o jazz de improvi­ poetas Beat; aprendeu a tocar jazz
sação,voltou-se para o teatro nos anos na bateria e mais tarde tocou em
1960. Sempre buscando encontrar a uma banda de rock. Produziu suas
si mesmo, Baraka mudou seu nome primeiras peças,Cowboys e The Rock
várias vezes, ao procurar definir sua Foto © Nancy Crampton Garden [O Jardim de Pedra], em

120
1964. Elas são indicativas de seu Foto Sara Krulwich / dirigirem sua escrita,em vez de come­
trabalho maduro com seus motivos The New York Times çar com um enredo pré-planejado, e
do Oeste e tema de competição suas peças são modernas e naturais.
masculina. Seu talento surrealista e experimen­
Das quase 50 obras de Shepard talismo ligam-no a Edward Albee,
para teatro e cinema, as mais queri­ mas suas obras são mais mundanas e
das são três peças inter-relacionadas, engraçadas e suas personagens,mais
abordando amor e violência em realistas. Elas carregam uma consci­
família: Curse of the Starving Class [A ência ousada da Costa Oeste e fazem
Maldição da Classe Faminta] (1976), Sam Sheppard comentários sobre os Estados Unidos
Buried Child [Criança Enterrada] em seu uso de motivos paisagísticos
(1978) e True West [Oeste Verdadeiro] e cenários e contextos específicos.
(1980), sua obra mais conhecida. Em
True West, dois irmãos de meia-idade, David Mamet (1947- )
um roteirista culto e um ladrão erran­te, Igualmente importante é David
competem para escrever uma peça so­ Mamet, criado em Chicago, cuja
bre a verda­deira história do Oeste para escrita foi influenciada pelo método
um ri­co produtor ci­ne­ma­tográfico Stanislavsky de atuar que lhe revelou
urbano. Cada um deles acredita pre­ a maneira como “a linguagem que
cisar do que o outro tem — sucesso e usamos...determina a maneira como
liberdade — os dois trocam de lugar nos comportamos,e não o contrário.”
num clima de violência crescente ali­ Sua ênfase na linguagem, não como
mentada pelo álcool.  A peça registra a comunicação, mas como arma, eva­
preocupação de Shepard com a perda são e manipulação da realidade,
da li­ber­dade, autenticidade e autono­ deu a Mamet uma sensibilidade
mia na vida americana. Ela dramatiza contemporânea pós-moderna.
a fronteira que desaparece (o errante) As obras de maior importância
e a imaginação americana (o escritor), de Mamet incluem American Buffalo
seduzidas pelo dinheiro, a mídia e as [Búfalo Americano] (1975), peça em
forças comerciais personificadas no dois atos com linguagem de violência
produtor. crescente envolvendo um drogado,
Ao escrever, Shepard tenta recriar uma loja de quinquilharias e uma
uma zona de liberdade ao permitir tentativa de furto; e Speed-the-Plow
que suas personagens ajam de forma [Apresse o Arado] (1987).O aclamado
imprevisível, espontânea e muitas e muitas vezes incluído em antolo­
vezes ilógica. O exemplo mais conhe­ gias Glengarry Glen Ross [Sucesso
cido está em True West. Num gesto David Mamet a Qualquer Preço] (1982), sobre
cujo significado sugere liberdade sem corretores de imóveis, deu origem a
lei, o confuso escritor rouba várias um excelente filme em 1992 com um
torradeiras. Totalmente irreal, ainda elenco de estrelas. Esta peça, como
que estranhamente crível em um nível muitas das obras de Mamet, revela
emocional, a cena funciona como seu intenso comprometimento com
comédia, teatro do absurdo e ironia. Foto © Robin Holland / algumas das questões não resolvidas
Shepard deixa suas personagens CORBIS OUTLINE dos EUA — aqui,como numa atualiza­

121
ção de Death of a Salesman [Morte de [Esquinas] (1998) sobre o conceito
um CaixeiroViajante] de Arthur Miller, de honra na Máfia.
vê-se a necessidade de recobrar a
dignidade e a segurança no emprego, August Wilson (1945-2005)
especialmente para os trabalhadores O renomado dramaturgo afro-
mais velhos; competição entre as americano August Wilson, nas­
gerações mais velha e mais jovem nos cido Frederick August Kittel, era
locais de trabalho; foco intenso nos filho de um imigrante alemão que
lucros em detrimento do bem-estar nunca se preocupou com a família.
dos trabalhadores e — englobando Wilson enfrentou a pobreza e o
tudo — o ambiente corrosivo de racismo e adotou o sobrenome da
competição levado a níveis abusivos. mãe afro-americana, na adolescên­
Oleanna (1991), de Mamet, cia. Influenciado pelo movimento
faz uma análise minuciosa do artístico negro do fim dos anos 1960,
assédio sexual em um contexto Wilson foi co-fundador do Black
universitário. The Cryptogram [O Horizons Theater de Pittsburgh.
Criptograma] (1994) imagina uma As obras de Wilson exploram a
visão horrorosa de uma criança experiência afro-americana, orga­
sobre a vida familiar. Obras recentes nizada por décadas. Ma Rainey’s
incluem The Old Neighborhood Black Bottom [O Fundo Negro de
[Velha Vizinhança] (1991) e Boston Ma Rainey] (1984) se passa na
Marriage [Casamento de Boston] Chicago de 1927 e retrata a famosa
(1999). cantora de blues.Sua aclamada peça
Fences [Cercas] (1985),ambientada
David Rabe (1940- ) nos anos 1950, dramatiza o conflito
Outro dramaturgo de destaque é entre pai e filho, tocando em temas
David Rabe, veterano da Guerra do totalmente americanos, como o
Vietnã e um dos primeiros a explo­ beisebol e o sonho americano de
rar a revolta e a violência daquela sucesso. Joe Turner’s Come and Gone
guerra em The Basic Training of Pavlo [Idas e Vindas de Joe Turner] (1986)
Hummel [Treinamento Básico de August Wilson trata dos moradores de uma pensão
Pavlo Hummel] (1971) e Sticks and em 1911. The Piano Lesson [A Aula
Bones [Gravetos e Ossos],1969.Peças de Piano] (1987) desenrola-se nos
subsequentes incluem The Orphan [O anos 1930 e cristaliza a dinâmica
Órfão] (1973), baseada em Oresteia, de uma família, ao concentrar-se
de Ésquilo; In the Boom Boom Room no piano que é sua relíquia. Two
[No Quarto de Boom Boom] (1973), Trains Running [Dois Trens em
sobre o estupro de uma dançarina; e Movimento] (1990) tem lugar em
Hurlyburly (1984) e Those the River um café nos anos 1960, ao passo
Keeps [Aqueles que o Rio Guarda] que Seven Guitars [Sete Guitarras],
(1990) ambas sobre a desilusão de 1995, explora os anos 1940. 
Hollywood. As obras mais recentes
de Rabe incluem The Crossing Guard Foto © Cori Wells Braun /
[Acerto Final] (1994) e Corners CORBIS OUTLINE

122
CAPÍTULO
universidades, revistas e autores empreendedores
criam websites.A poesia americana atual é um vas­
to território de livre imaginação, um caldeirão em

9
ebulição,  um trabalho dinâmico em andamento.
A efervescência da poesia americana desde
1990 torna o campo descentralizado e de difícil
definição.A maioria das antologias apresenta uma
POESIA só dimensão da poesia, como textos femininos —
ou grupos de escritores étnicos ou poesias de ins­
CONTEMPORÂNEA
piração comum — poesia do jazz, poesia cowboy,
AMERICANA
poemas com influência budista e hip-hop.
Os poucos antologistas que aspiram representar

A
o conjunto da poesia americana contemporânea
poesia americana, desde 1990, está em começam com negações copiosas e discorrem
meio a um renascimento caleidoscópico. longamente sobre seus diferentes impulsos: o
Na última metade do século 20, havia, se pós-modernismo, a expansão do cânone, etnias,
não consenso, pelo menos um formato discerní­ imigração (com menção especial às novas vozes
vel no campo poético, completo, com posições do sul e sudeste asiático e do Oriente Médio), o
bem defendidas. Escolas bem-definidas domina­ surgimento da literatura global, a elaboração das
vam a cena e as discussões críticas tendiam ao contínuas contribuições das mulheres, a ascensão
binário: formalismo versus verso livre,acadêmico da tecnologia da internet,  a influência de professores
versus experimental. específicos,de programas de redação ou de impul­
Em retrospectiva, algumas pessoas viram os sos regionais,a mídia onipresente e o papel do poeta
anos que se seguiram à Segunda Guerra Mundial como voz individual e solitária que se ergue contra
como uma era heróica,em que a poesia america­ o comercialismo e o conformismo exacerbados.
na libertou-se de limitações como rima e métrica Os próprios poetas lutam para dar sentido à
e mergulhou de cabeça em novas dimensões, inundação de poesias. É possível vislumbrar um
junto com os expressionistas abstratos na pintura con­tinuum, tendo de um lado a poesia da fala, o
americana. Outros — experimentalistas, autores eu subjetivo, de outro a poesia do mundo e, no
multiétnicos e globais e escritoras feministas entre meio, uma ampla faixa em que o eu e o mundo
eles — relembram a cegueira da época para com se fundem.
questões como raça e gênero.Esses autores viven­ A poesia do eu que fala tende a enfocar
ciam a diversidade como bênção do presente ex­pres­sões vívidas e a exploração de emoções
e anseiam por liberdades ainda inimagináveis. profundas geralmente enterradas.É psicológica e
Sua contribuição fez da poesia atual uma rica intensa e os cenários são secundários. Na última
cornucópia de base genuinamente popular. metade do século 20, o poeta mais influente
Entre o público em geral,o interesse por poesia dessa linha foi Robert Lowell, cujo mergulho na
atingiu o nível mais elevado de todos os tempos. própria psique e no histórico conturbado de sua
Os concursos de poesia geram uma camaradagem família inspirou textos confessionais.
competitiva entre escritores iniciantes, grupos A poesia do mundo, por sua vez, tende a cons­
informais de redação fornecem apoio e críticas truir significado a partir do impulso narrativo, do
e os clubes de leitura proliferam. Programas de detalhe e do contexto. Cria cenas de forma cuida­
redação florescem em todos os níveis, intercâm­ dosa. Uma das poetas mais influentes do mundo
bios poéticos ligeiros circulam pela internet e as foi Elizabeth Bishop, considerada a melhor poeta

123
americana do fim do século 20. ...sob o discurso está
Robert Lowell e Elizabeth Bishop foram amigos O que se move e o que não quer ser movido, o solto
da vida toda; ambos lecionaram na Universidade Significado, desordenado e simples como uma eira
de Harvard. Assim como Walt Whitman e Emily de debulho.
Dickinson no século 19, Lowell e Bishop reinam
como espíritos geradores de futuros poetas.E,em­ O enigmático W.S. Merwin (1927- ), de forma­
bora tivessem uma visão comum,  suas abordagens ção clássica, continua a produzir farta poesia
eram diametralmente opostas.  A poesia complexa, subjetiva e obsessiva. Seu poema “The River of
subjetiva e retórica de Lowell extrai significado Bees” [O Rio de Abelhas] (1967) termina:
da autoapresentação e linguagem elevada, ao
Na porta está escrito o que fazer para sobreviver
passo que Bishop, ao contrário, oferece paisagens
detalhadas em estilo aparentemente simples e Mas não nascemos para sobreviver
prosaico. Somente com a releitura percebe-se Só para viver
sua precisão e profundidade.
O termo “só” destaca ironicamente o quanto é
Muitos dos poetas pairam em algum ponto
difícil viver plenamente como ser humano, uma
entre os dois pólos. Em última instância, a grande
busca mais nobre do que a mera sobrevivência.
poesia — seja do eu ou do mundo — supera essas
Tanto Ashbery quanto Merwin,  precursores da atu­
divisões; o eu e o mundo tornam-se espelho um do
al geração de poetas do eu,  caracteristicamente
outro.  Contudo,  para fins de discussão,  pode-se fazer
escrevem monólogos descolados de contextos
provisoriamente uma distinção entre elas.
ou narrativas explícitas. As líricas existenciais
atormentadas de Merwin sondam profundezas
A POESIA DO EU

A
psicológicas, enquanto em Ashbery, o uso inespe­
poesia do eu tende ao discurso direto ou
ao monólogo. Em sua intensidade máxima, rado de palavras de vários registros da diligência
expressa um estado de alma. Os cenários, humana — psicologia, agricultura, filosofia —
ainda que presentes, não desempenham papéis anseia pela Escola da Linguagem.
definitivos. Essa poesia pode ser psicológica ou Os poetas recentes do eu foram mais a fundo
espiritual, aspirando a um estado atemporal. Mas na ciência fenomenológica da consciência exer­
pode também solapar a certeza espiritual ao referir cida à exaustão momento a momento. Para Ann
todo significado de volta à linguagem.Dentro desse Lauterbach (1942- ), o poema é uma extensão da
grande grupo, portanto, pode-se encontrar poesia mente em ação; para ela, sua poesia é “um ato de
um tanto romântica e expressiva, mas também autoconstrução e a voz,  seu limiar”. A poeta da lin­
poemas baseados na linguagem que questionam guagem Lyn Hejinian (1941- ) expressa o movimento
os próprios conceitos de identidade e significado, da consciência em seu poema-prosa autobiográfico
ao vê-los como imagens sintetizadas. My Life [Minha Vida] (1987) que usa disjunção,
Ao equilibrar essas questões, John Ashbery saltos inesperados e interseções for­tuitas: “Visualizo
disse estar interessado “na experiência da expe­ uma ideia no momento em que a tenho, nossa co­
riência” ou no que é filtrado por sua consciência, lisão.” Rae Armantrout (1947- ) recorre a silêncios e
em vez do que realmente aconteceu. Seu poema grupos de associações sutis e indiretos, o poema
“Soonest Mended” [Logo Passará] (1970) mostra título de seu livro Necromance (1991) alerta que
uma realidade “lá fora”, solta e aparentemente “enfática / precisão / é revelada como / hostilidade”.
simples,  mas letal como a eira sobre a qual o trigo Outra poeta experimental,  Leslie Scalapino (1947- ),
e joio (como vidas humanas ou as folhas da relva escreve poemas como um“exame da mente durante
de Walt Whitman) são separados: o processo do que quer que esteja criando”.
124
Grande parte da poesia experi­ Poemas Selecionados 1974-1994]
mental do eu é elíptica, não-linear, (1995) fala dessa história complexa
não-narrativa e não-objetiva; em sua em transformação. O poe­ma reúne
melhor expressão, contudo, é não­ elementos díspares em livres associa­
-solipsística,mas gira em vez disso em ções de gestos largos — o caminho
torno de um“centro ausente”.  A poe­ percorrido pela poeta entre peque­
sia do eu geralmente envolve uma nos flocos brancos de uma tempes­
apresentação em público. No caso tade de neve para devolver a malha
de mulheres poetas, as exclusões, as de balé preta de uma amiga, um
noções de silêncio e as disjunções bando de estorninhos pretos (aves
são geralmente associadas à Julia que expulsam as espécies nativas) e
Kristeva e a outras teóricas feminis­ um único corvo negro (protagonista
tas francesas. A poeta Susan Howe da tradição oral nativo-americana)
(1937- ), que desenvolveu uma poé­ evocado como “uma mancha de
tica visual complexa para interligar tinta na cena emoldurada pela neve
o histórico e o pessoal, ressaltou a que caía ao anoitecer”.
dificuldade de recuperar as linhas Essas impressões sensoriais recu­
femininas em arquivos e genealogias, peram lembranças da infância da
bem como a exclusão das mulheres poeta na Europa e de sua professora
na história cultural. Para ela, como de dança em malha de balé preta,
mulher, “nas lacunas e no silêncio e se estendem na história do Novo
são onde você pode se encontrar”. Mundo. O contato de Cristóvão
Colombo com os índios americanos
Jorie Graham (1950- ) em uma praia de areias brancas é
Uma das mais talentosas poetas como a tempestade de neve branca
do eu subjetivo é Jorie Graham. da poeta: “Ele pensou ter visto ín­
Nascida em Nova York, cresceu na dios fugindo pelo branco na frente
Itália e estudou na Sorbonne na do navio” e,“No torvelinho branco,
França, na Universidade de Nova fincou uma grande cruz”.
York (especializando-se em cine­ Todos esses elementos estão su­
ma, que continua a influenciar sua bordinados à mente em movimento
Jorie Graham
obra) e no Workshop de Escritores que as contém e que constante­
de Iowa, onde mais tarde lecio­ mente se questiona. Essa mente, ou
nou. Desde então, é professora na “campo unificado” (conjunto de
Universidade de Harvard. teorias da física que tenta relacionar
A obra de Graham é carregada de todas as forças do universo),é como
referências cosmopolitas e ela vê a a tempestade de neve do início:
história dos EUA como parte de um
compromisso internacional maior Nada verdadeiro ou falso em si mesmo.
ao longo do tempo. O poema que Apenas movimento.Muitas faixas de
dá título à sua coletânea vencedora movimento. Filamentos de queda
do Prêmio Pulitzer The Dream of the marcados
Unified Field: Selected Poems 1974- Foto: Estate of por minúsculas certezas de flocos.
Thomas Victor
1994 [O Sonho do Campo Unificado:
125
Graham enfoca a mente como no início do século 20, eles fugiram
um portal de significado e distorção, da pobreza e do racismo da zona
tanto uma parte do mundo quanto rural do sul dos Estados Unidos para
um ponto privilegiado separado. trabalhar no Norte urbanizado. Dove
Como na montagem de um filme, confere dignidade à vida humilde
sua voz costura visões e experiên­ de seus avós. O primeiro emprego de
cias discrepantes. Swarm [Enxame] Thomas,como trabalhador de terceiro
(2000) intensifica a tendência meta­ turno, exigiu que ele morasse em um
física de Graham, sua profundidade alojamento e dividisse o colchão com
emocional e seu sentimento de dois homens com os quais nunca se
urgência. encontra. Seu trabalho é “uma dor in­
tensa”, mas a música anima sua alma
A POESIA DA VOZ como uma bela mulher (antecipando

E
m seu extremo, a poesia do Beulah,que ele ainda não conhecia).
eu elimina o eu se faltar uma Quando Thomas canta,
sensibilidade que sirva de
contrapeso. A próxima fase pode ser ele fecha os olhos.
a poesia de várias vozes ou de eus fic­ Nunca sabe quando ela virá
cionais,quebrando a ideia monolítica mas quando ela parte, sempre
do eu em fragmentos e personagens. tira o chapéu.
Os monólogos dramáticos de Robert
Browning são seus precursores do Louise Gluck (1943- )
século 19. O“eu”fictício é sólido, mas Entre os poetas da voz, uma das
não envolve o verdadeiro autor, cujo mais impressionantes é Louise Gluck.
eu se mantém fora de cena. Nascida na cidade de Nova York,
Esse tipo de poesia costuma bus­ Gluck, poeta americana premiada
car seus temas nos mitos e na cultura em 2003 e 2004, cresceu com perma­
popular, vendo os relacionamentos nente sentimento de culpa devido à
modernos tipicamente como rede­ morte de uma irmã nascida antes
finições ou versões de padrões mais dela. Na Faculdade Sarah Lawrence
antigos.Entre os poetas contemporâ­ ..
Louise Gluck e na Universidade de Colúmbia,estu­
neos da voz ou do monólogo estão dou com os poetas Leonie Adams e
Brigit Pegeen Kelly, Alberto Rios e a Stanley Kunitz,e atribuiu sua sobrevi­
poeta canadense Margaret Atwood. vência psíquica à psicanálise e a seus
Geralmente, a poesia da voz é estudos de poesia. Grande parte de
escrita na primeira pessoa, mas a suas poesias fala de perdas trágicas.
terceira pessoa pode causar impacto Cada livro de Gluck é um experi­
semelhante se o ponto de vista for mento em novas técnicas, tornando
claramente o dos personagens,como difícil uma síntese de sua obra. Em
em Thomas and Beulah [Thomas seus primeiros livros,como The House
e Beulah] de Rita Dove. Nesse livro, on Marshland [A Casa em Marshland]
Dove entrelaça biografia e história (l975) e The Triumph of Achilles [O
para dramatizar a vida de seus avós. Foto: Associated / Triunfo de Aquiles] (1985) trata o ma­
Assim como vários afro-americanos Library of Congress terial autobiográfico a uma distância

126
psíquica, ao passo que nos últimos A POESIA DO LUGAR

V
é mais direta. Em Meadowlands ários poetas — não grupos,
[Pradarias] (1996) usa de ironia e mas tendências nacionais —
referências cômicas à Odisseia para encontram forte inspiração
descrever um casamento fracassado. em paisagens específicas. Alguns
Em seu memorável The Wild Iris exemplos são as evocações líricas do
[A Íris Selvagem] (1992) diferentes norte da Califórnia de Robert Hass,
tipos de flores declamam monólogos os litorais e as memórias do surf no
metafísicos.O poema que dá título ao sul da Califórnia de Mark Jarman, os
livro,uma exploração da ressurreição, poemas de Tess Gallagher ambien­
poderia ser uma epígrafe para o tados no noroeste do Pacífico e os
conjunto de sua obra.A íris selvagem, poemas de Simon Ortiz e Jimmy
uma flor linda de cor azul profundo Santiago Baca que emanam das
que ao brotar de um botão que ficou pai­sagens do sudoeste. Cada sub-re­
adormecido durante todo o inverno, gião inspirou poesia: o extremo sul
diz: “É terrível sobreviver / como marginal de C.D. (Carolyn) Wright
consciência / enterrada na terra está distante do úmido Golfo da
escura.” Assim como a visão de Jorie Louisiana de Yusef Komunyakaa.
Graham do eu fundido com a tem­ A poesia do lugar não se baseia
pestade de neve, o poema de Gluck na descrição da paisagem; mais
termina com uma visão de fusão exatamente,a terra,e sua história,é a
entre o mundo e o eu — dessa vez na força geradora com implicações na
água da vida, azul sobre azul: maneira como seu povo, inclusive o
poeta, vive e pensa. A terra é perce­
Você que não se lembra bi­da como o que D.H. Lawrence
da passagem do outro mundo chamou de o “espírito do lugar”.
Digo-lhe que poderia falar de novo: Seja
o que for que Charles Wright (1935- )
volte do esquecimento volta Um dos poetas do lugar mais co­
para encontrar uma voz; moventes é Charles Wright. Criado no
Tennessee,Wright é um sulista cosmo­
do centro da minha vida surgiu Charles Wright polita.O poeta tem sua base na poética
uma grande fonte, sombras de azul italiana e da China antiga e infunde em
profundo sobre água do mar azul. sua obra temas sulistas como o ônus
de um passado trágico, retratado em
À maneira de Graham,Gluck funde sua série de poemas “Appalachian
o eu e o mundo por meio de imagens Book of the Dead” [Livro dos Mortos
fluidas de água.Se de um lado a água dos Apalaches], baseado no anti­
congelada — neve — de Graham go Livro dos Mortos dos Egípcios.
pa­rece areia ou a terra encontrada Suas obras incluem Country Music:
à beira mar, em Gluck a água fresca Selected Early Poems [Música Country:
e azul — significando seu coração Primeiros Poemas Selecionados]
— funde-se com a água salgada do (l982);Chickamauga (1995) e Negative
mundo. Foto © Nancy Crampton Blue: Selected Later Poems [Azul

127
Negativo: Últimos Poemas Selecionados] (2000). _____
A intensa poesia de Wright oferece momentos A história trata nosso passado como fruta podre.
de revelações espirituais resgatadas,  ou melhor, Meio da manhã, luz de fim de século
construídas a partir dos estragos do tempo e circuns­ vestidos de algodão sob os pessegueiros.
tância.Uma inabilidade proposital — vista em suas Toque-nos aqui. Toque-nos aqui e aqui.
voltas inesperadas de frase coloquial e preferência ______
por linhas longas,quebradas com números ímpares O poema é um código sem mensagem:
de sílabas — conferem a seus poemas uma graça O que importa na máscara não é a máscara mas o
lustrosa, como a de antigos implementos agrícolas rosto por baixo dela,
polidos pelo uso das mãos.Essa qualidade singular, Absoluta, incomunicável,
trabalhada e às vezes irônica faz os poemas de desabrigada e peregrina.
Wright soarem contemporâneos e impede que _____
pareçam pretensiosos. A rede de peixes da história nos arrancará em breve
A disparidade entre visão transcendente e fragi­ Das águas frias da autossatisfação em que nos deixa­
lidade humana está no âmago da visão de Wright. mos levar
Ele é atraído por temas grandiosos — estrelas, Um a um
constelações, história — de um lado, e pequenos em sua luz e seu ar sufocantes.
elementos táteis — dedos,cabelos — de outro.  Seu _____
poema“Chickamauga”conta com o conhecimento A estrutura se torna elemento da crença, a sintaxe
do leitor: Chickamauga, na Geórgia, em 19 e 20 E a gramática um catequista,
de setembro de 1862 foi cenário de uma batalha Suas palavras o que dizem o rosário,
decisiva da Guerra Civil Americana entre o Norte palavras desfiadas do nosso descon­tentamento.
e o Sul. O Sul não conseguiu destruir o exército da
União (Norte) e abriu caminho para a devastadora O poema vê a história como conceito, um “có­
invasão do Sul a partir de Atlanta, na Geórgia. digo sem mensagem”. Cada indivíduo existe em
“Chickamauga”pode ser lido como uma medita­ si mesmo, impossível de se conhecer fora de seus
ção sobre a paisagem, mas é também um lamento próprios termos e tempo,“não é a máscara mas o
elegíaco e a ars poetica do poeta. Começa com rosto por baixo dela”. A morte é inevitável para
uma simples observação: “Revoada de pombos nós como para os soldados caídos,o Velho Sul e os
na relva alta.” Esse idílio aparente é o momento peixes pescados.  Não obstante,a poesia oferece um
que antecede os tiros do caçador; os soldados as­ consolo parcial:  Nosso descontentamento manifes­
sas­sinados, jamais mencionados no poema, foram to pode produzir uma dimensão de imortalidade.
esquecidos, triturados como pombas ou relva. A
“árvore de magnólia golpeada”destrói o estereótipo A POESIA DA FAMÍLIA

U
“meia-noite e magnólia”das plantações pré-guerra m tipo de poesia ainda mais arraigada
no Sul. O poema funde presente e passado em um coloca o objeto poético em uma matriz
poderoso epitáfio a mundos e ideais perdidos. de pertencimento — à família, à comuni­
dade e a tradições em mudança. Geralmente as
Revoada de pombos na relva alta. tradições evocadas são étnicas ou internacionais.
Brilho de fim de verão aqui ao lado Poucos poetas, como Sharon Olds (1942- ),
Sobre as luvas e as pontas fendidas da árvore magnólia expõem suas feridas abertas recorrendo ao
golpeada. modo confessional, mas a maioria dos poetas
Sons de lida: buzina traseira de caminhão, martelo contemporâneos escreve com um sentimento,
de estanho e madeira, cigarra, sirene de incêndio. que embora de lamento é, não obstante, genuíno.

128
Stephen Dunn (1939- ) é um exemplo: EUA, onde seu pai tornou-se pastor
Em seus poemas,os relacionamentos protestante na Pensilvânia. Lee foi
são um meio de conhecimento. Em aclamado por seus livros Rose [Rosa]
alguns poetas, o respeito pela família (1986) e The City in Which I Love You
e pela comunidade carrega consigo [A Cidade Onde Eu Te Amo] (1990).
um sentido de afirmação,  se não uma Lee mostra-se sensível e filial — ele
sensibilidade explicitamente devota. descreve sua família e a decadência
Esse tipo de poesia não é conservado­ de seu pai de forma emocionante
ra; geralmente confronta a mudança — e é sincero em seu compromisso
e a perda, assim como luta com os com as dimensões espirituais da
poderes da tradição literária étnica poesia. Seu poema de maior influên­
ou não-ocidental. cia, “Persimmons” [Caquis] (1986)
Lucille Clifton (1936- ) encontra do livro Rose, evoca sua origem
conforto na comunidade negra. Sua asiática por meio do caqui, fruta
linguagem coloquial e sua grande fé pouco conhecida nos EUA. Frutos
formam uma combinação poderosa. e flores são objetos tradicionais da
As emocionantes elegias feitas por arte e da poesia chinesa, mas raros
Agha Shahid Ali (1949-2001) à sua no Ocidente. O poema contém uma
mãe são baseadas em uma fascinante crítica afiada,mas bem-humorada de
gama de formas poéticas clássicas uma professora provinciana que Lee
do Oriente Médio, entrelaçando a encontrou nos Estados Unidos e que
vida de sua mãe ao sofrimento da tinha a pretensão de conhecer caquis
Caxemira, país nativo de sua família. e linguagem.
A americana malásio-chinesa Seu poema “Irises” [Íris] (1986)
Shirley Geok-lin Lim (1944- ) faz do mesmo livro, sugere que nos
uma comparação pungente entre deixamos levar em um “sonho de
sua complicada família na Malásia vida” mas, como a íris, “desperta
e sua nova família na Califórnia. A morrendo — violeta ficando azul,
poeta mexicano-americana Lorna crescendo / negra, negra”. O poema
Dee Cervantes imortaliza a vida dura e seu tratamento das cores ecoam a
e precária de sua família na Califórnia; íris selvagem de Gluck.
Louise Erdrich traz de volta à vida a Li-Young Lee O poema-título de The City inWhich
energia vigorosa de sua imprevisível e I Love You anuncia o in­gres­so afirma­
tragicômica família indígena. tivo de Lee numa comunidade maior
de poetas.Assim termina o poema:
Li-Young Lee (1957- )
Uma história trágica paira sobre minha terra nativa desapareceu, minha
Li-Young Lee, cujo pai chinês, que foi cidadania conquistei,
médico de Mao Tse-tung,é mais tarde em liga com pedras da terra, eu
encarcerado na Indonésia. Nascido entro, sem abrigo ou ajuda
em Jacarta, Indonésia, Lee viveu uma da história,
vida de refugiado, mudando-se com os dias de dia nenhum, minha terra
a família para Hong Kong, Macau e de terra nenhuma, eu re-entro
Japão antes de conseguir abrigo nos Foto © Dorothy Alexander na cidade onde eu te amo.

129
E nunca acreditei que a multidão Grass”[“Coelhinho Morto na Grama”]
de sonhos e muitas palavras fossem tirado de Source [Fonte] (2001) um
em vão. coelho morto inspira uma meditação
filosófica. Este coelho em particular,
A POESIA DO BELO como um poema, é importante em si

O
utra vertente da poesia inten­ mesmo e como texto, “algo elaborado
samente lírica, impulsionada com arte” em cuja fronte “um traço
por imagens, celebra a beleza / de pensamento parece escrito”. O
apesar da vida moderna, ou em meio poema seguinte em Source, “Fish R Us”
a ela, com tudo que isso implica de [“ Aquário”], compara a comunidade
sofrimento e confusão. Muitos poetas humana a um saco de peixes num tan­
poderiam ser incluídos aqui — Joy que de loja de animais, “cada peixinho
Harjo (1951- ), Sandra McPherson / mais ou menos do tamanho dessa
(1943- ) e Henri Cole (1965- ) — já linha”. Como pessoas ou ideias, os
que essas tendências são em par­ peixes querem liberdade:  Eles“querem
te sobrepostas, e não mutuamente nadar para frente”, mas por ora “pul­
excludentes. sam em seu globo dourado”.O sentido
Alguns dos mais destacados de conexão orgânica compartilhado
poetas contemporâneos usam a com outros está presente em todo o
imaginação não como elemento livro. O terceiro poema, “At the Gym”
decorativo, mas para explorar novos [Na Academia] imagina a impressão
temas e domínios. Harjo vê nos de cabeças suadas em equipamentos
cavalos uma forma de recuperar para exercícios como “uma auréola /
sua herança nativo-americana, ao que os vivos fizeram juntos”.
passo que McPherson e Cole criam Doty encontra em Walt Whitman
imagens que parecem ganhar vida. um guia pessoal e poético. O poeta
americano também tem escrito
Mark Doty (l953- ) de forma memorável sobre a tra­
Desde o fim dos anos 1980, Mark gédia da epidemia de Aids. Suas
Doty tem publicado meditações po­ obras incluem My Alexandria
éticas belas, maleáveis, sobre a arte e [Minha Alexandria] (1993), Atlantis
as relações — com amantes, amigos Mark Doty [Atlântida] (l995) e suas vívidas
e vários tipos de comunidades. Sua memórias,Firebird [Pássaro de Fogo]
imaginação vívida,exata e sensorial é (1999). Still Life With Oysters and
muitas vezes uma forma de conhecer, Lemon [Natureza Morta com Ostras
sentir e se aproximar. Por meio de e Limão] (2001) é uma coletânea
imagens,Doty nos leva a descobrir afi­ recente.
nidades com animais,com estranhos Os poemas de Doty são ao mesmo
e com a obra de criação artística, o tempo reflexivos (referindo-se a si
que implica, segundo ele, uma nova mesmos como arte) e receptivos ao
maneira de ver as coisas. mundo exterior. Ele vê o corpo im­
É possível apreciar Doty seguindo perfeito,  todavia vital,  como a margem
sua evolução da ideia de comuni­ — um tipo de texto — onde o interior
dade. Em “A Little Rabbit Dead in the Foto © Dorothy Alexander e o exterior se encontram, como em

130
seu pequeno poema, também tirado Entre os poetas americanos
de Source, sobre o ato de fazer uma contemporâneos espiritualmente
tatuagem, “To the Engraver of My Skin” afinados, destaca-se Arthur Sze
[Ao Tatuador da Minha Pele]. (1950- ), considerado possuidor de
uma sensibilidade zen.Seus poemas
Sei que o pacto é mortal, oferecem observações literais apa­
aceito arcar com essa permanência. rentemente simples que também são
meditações, tais como estas linhas
Eu contrato com restrição; digo tiradas de “Throwing Salt on a Path”
não e não,  então sim a você, e assino [“Jogando Sal no Caminho”] (1987):
“Defumando camarões sobre o fogo.
— aqui,  na linha pontilhada — Ah,/a luz de uma estrela nunca pára,
para o que vier,  assino: nosso tempo, só viaja”. Removendo a neve, ele ob­
serva:“O sal abre caminho na neve,
nosso perfil,  o preenchimento de nossos expande as margens do universo”.
detalhes
(é a densidade que machuca,  sempre, Jane Hirshfield (l953-)
Jane Hirshfield não faz quase
não o plano original).  Estou aqui nenhuma referência explícita ao
para revisão, descoloração; aqui para budismo em seus poemas;  no entanto,
desvanecer eles respiram o espírito de seus muitos
anos de meditação zen e de suas
e durar, indelével, azul.  Escreva em mim! tra­duções da antiga poesia cortesã
Esta tinta dura mais que eu. de duas autoras japonesas, Ono no
Komachi e Izumi Shikibu. Hirshfield
A POESIA DO ESPÍRITO editou a antologia, Women in Praise

O
utra vertente da poesia of the Sacred: 43 Centuries of Spiritual
americana contemporânea Poetry byWomen [Mulheres em Louvor
busca trazer um enfoque ao Sagrado: 43 Séculos de Poesia
espiritual. Nessas obras, a relação Espiritual Feita por Mulheres] (1994).
mais profunda é aquela entre o A poesia de Hirshfield manifesta
Jane Hirshfield
indivíduo e a essência eterna que o que ela chama de “pensamento
existe além da beleza artística, em­ indireto”em seu livro sobre a arte de
bora ligada a ela. Entre os poetas escrever poesia,  Nine Gates: Entering
mais antigos que anunciaram uma the Mind of Poetry [Nove Portões:
consciência espiritual destacam- Entrando no Pensamento Poético]
se Gary Snyder, que ajudou a intro­ (1997). Essa orientação traz consigo
duzir o zen na poesia americana, e o a veneração à natureza,economia de
poeta-tradutor Robert Bly,  que trouxe linguagem e o sentido de imperma­
à poesia dos EUA o conhecimento nência budista. Sua própria “poesia
do surrealismo latino-americano.Nos indireta”segue nuances,associações
últimos tempos, Coleman Barks tem (muitas vezes com as estações e as
traduzido muitos livros de Rumi,  po­ condições do tempo, evocando vi­
eta místico do século 13. Foto © Jerry Bauer sões do mundo e estados de espírito)

131
O
e imagens da natureza . Novo Mundo atraiu a atenção
O poema de Hirshfield, “Mule dos americanos durante o pe­
Heart” [“Coração de Mula”] da sua ríodo revolucionário no final
coletâ­nea de poesia The Lives of the dos anos 1700,quando Philip Freneau
Heart [As Vidas do Coração] (1997) considerou importante celebrar a
evoca vivamente uma mula sem flora e a fauna nativas das Américas
jamais mencioná-la. Para escrever o como forma de forjar uma identidade
poema, que ela mesma considerou americana. O transcendentalismo e
uma receita para superar tempos o agrarianismo enfocaram a relação
difíceis, Hirshfield baseou-se em dos Estados Unidos com a natureza
suas lembranças de uma mula usada no século 19 e início do século 20.
para transportar cargas por encostas As preocupações ambientais de
íngremes na ilha grega de Santorini.O hoje refletem-se em uma poderosa
poema instiga o leitor a ganhar cora­ vertente da poesia dos EUA voltada
gem.A humilde mula tem sua própria para questões ecológicas. O falecido
beleza (guizos da cabeçada) e força. A.R. Ammons foi um precursor mo­
derno e poetas nativo-americanos,tais
Nos dias quando o descanso como o falecido James Welch e Leslie
lhe é negado, Marmon Silko, nunca deixaram de
deixe que isso seja o seu — reverenciar a natureza. Exemplos de
moscas, pó, um odor indescritível, poetas contemporâneos com raízes
as duas cestas que esperam: em uma visão natural são Pattiann
uma para os limões e a paixão, Rogers (1940- ) e Maxine Kumin
a outra para tudo o que lhe tiraram. (1925- ). Rogers coloca a história na­
Ambas vazias, tural no centro das atenções,  ao passo
ela virá ao seu ombro, que Kumin escreve com sentimento
respirará lentamente em seu braço nu. sobre sua vida na fazenda e seu traba­
Se lhe ofereceres feno, ela comerá. lho como criadora de cavalos.
Se nada lhe ofereceres,
lá quedará pelo tempo que pedir. Mary Oliver (1935- )
Os pequenos guizos da cabeçada Uma das mais celebradas poe­
Mary Oliver
penderão tas da natureza é Mary Oliver. Essa
ao seu lado em silêncio, poeta formidável e acessível evoca
no calor e na precária sombra da árvore. plantas e animais com intensidade
Não deixe sua crina esparsa visionária. Oliver nasceu em Ohio,
lhe enganar, mas viveu na Nova Inglaterra durante
ou o modo como move a orelha esquer­ anos, e seus poemas, como os de
da no sonho. Robert Frost, inspiram-se em suas
Isso também é presente dos deuses, diferentes paisagens e mudanças de
calmo e completo. estação. Oliver encontra significado
em seus contatos com a natureza,
A POESIA DA NATUREZA mantendo a tradição transcendental
de Henry David Thoreau e Ralph
Foto © Nancy Crampton Waldo Emerson, e sua obra tem forte

132
dimensão ética.É autora,entre outros,de American a razão queima um fogo mais brilhante,que os ossos
Primitive [Primitivo Americano] (1983), New and sempre preferiram.
Selected Poems [Novos Poemas Selecionados] É a história da boa fortuna eterna.
(l992), White Pine [Pinheiro Branco] (1994), Blue E diz ao olvido: não eu!
Pastures [Pastagens Azuis] (1995) e os ensaios em
The Leaf and the Cloud [A Folha e a Nuvem] (2000). É a luz no centro de cada célula.
Para Oliver, não há fato natural, por mais É o que induz a serpente a espiralar e seguir em frente
simples que seja, que não possa trazer novos feliz por toda a primavera entre as folhas verdes,
conhecimentos ou o que Emerson chamou de antes de chegar à estrada.
“fatos espirituais”,como em seu poema“The Black
Os poemas de Oliver encontram inúmeras
Snake” [A Serpente Negra] (1979). Embora a nar­
formas de celebrar o simples, mas transcendental
radora, uma motorista de carro, esteja implicada
fato de estar vivo.  No poema “Hummingbird Pauses
na morte da serpente, ela pára e remove o corpo
at the TrumpetVine”[Beija-Flor pausa no Jasmim-da-
do animal em sinal de respeito. Ela reconhece na
Virgínia] (1992) ela nos lembra que quase toda a
serpente, vítima frequente de difamação pelas
existência consiste em “esperar ou recordar”, já
associações negativas com o livro Gênesis da
que na maior parte do tempo do mundo nós “não
Bíblia e com a morte,um“irmão morto”,e aprecia
estamos aqui, / não nascemos ainda, ou já morre­
sua beleza cintilante.A serpente lhe ensina sobre
mos”. Uma intensidade que relembra o falecido
a morte, mas também sobre uma nova gênese e a
poeta James Wright arde em muitos poemas de
alegria de viver, e segue adiante, pensando na“luz
Oliver, como “Poppies” [Papoulas] (1991-1992).
no centro de cada célula”que incita toda criatura
Esse poema começa com uma descrição das
viva “a seguir em frente / alegremente por toda a
“chamas alaranjadas; balançando / ao vento, sua
primavera”— sem saber nunca onde encontrare­
congregação é uma levitação”. Ele termina com
mos nosso fim. Esse carpe diem é o convite a uma
uma provocação à morte: “que pode fazer / a
percepção mais profunda e festiva.
respeito — profunda noite azul”?
Quando a negra serpente
A POESIA DA ARGÚCIA

N
irrompeu na estrada da manhã,
e o caminhão não pôde desviar — o espectro da poesia do eu à poesia do
morte, como sempre acontece. mundo, a poesia da argúcia — incluindo
o humor, o senso do absurdo e os vôos da
Agora ela jaz enrolada e sem valia imaginação — está mais perto da poesia do mundo.
como velho pneu de bicicleta. A argúcia depende da interseção de duas ou mais
Eu paro o carro estruturas de referência e de agudo discernimento;
e a carrego para o matagal. é uma poesia mundana.
A poesia da argúcia encontra o momento poé­
Ela está tão fria e cintilante tico na rotina da vida diária, conferindo a ela um
como um chicote trançado,e está tão bela e tranquila elevado tom humorístico, surrealista e alegórico.
como um irmão morto. Em geral a linguagem é coloquial, de forma que
Eu a deixo sob as folhas as situações fantásticas têm a força da realidade.
Os mais antigos mestres desse estilo são Charles
e sigo adiante, pensando
Simic e Mark Strand; entre os poetas mais jovens
na morte: Sua subitaneidade,
destacam-se Stephen Dobyns e Mark Halliday.
seu peso terrível,
A linguagem do dia-a-dia, o humor, a ação sur­
sua vinda certa.  Não obstante, sob

133
preendente e o exagero dessa poesia Foto © Nancy Crampton
Os mortos estão sempre a nos desde­
acaba por torná-la extremamente nhar, dizem,
acessível, embora o melhor dessa enquanto calçamos nossos sapatos ou
obra só revele seus segredos se lida preparamos um sanduíche,
repetidas vezes. eles nos olham com desdém de seus
barcos de fundo de vidro, lá no céu,
Billy Collins (1941- ) em seu lento remar pela eternidade.
Billy Collins é hoje o mais influente
Eles observam o topo de nossas
poeta da razão O autor,que foi o poeta
cabeças se movendo aqui na terra,
laureado dos EUA em 2001-2003, é
refrescante e estimulante,como Frank Billy Collins e quando nos deitamos no campo ou
no sofá,
O’Hara na geração anterior. Como
drogados talvez pelo zunir da tarde
O’Hara, Collins usa a linguagem
quente,
cor­rente para registrar milhares de
pensam que também estamos a olhá-los,
detalhes da vida diária, combinando
livremente eventos do co­tidiano o que os fazem levantar os remos e
(comer,  realizar tarefas, es­cre­ver) ficar em silêncio
com referências culturais. Seu humor a esperar, como pais, que fechemos
e originalidade fizeram com que atra­ nossos olhos.
ísse o grande público. Embora alguns
tenham acusado Collins de acessível A POESIA DA HISTÓRIA

A
demais, seus imprevisíveis vôos de poesia inspirada pela história
imaginação mergulham no mistério. é de certa forma a mais difícil
A obra de Collins é uma forma e ambiciosa de todas. Nesse
domesticada de surrealismo. Seus espírito, os poetas se aventuram
melhores poemas,  muito longos para no mundo com um “eu” em letras
reproduzir aqui, catapultam de ime­ minúsculas, aberto a tudo que os
diato a imaginação a uma série de moldou. Esses poetas acreditam no
situações cada vez mais surrealistas, valor da experiência.
oferecendo no fim uma aterrissa­ Michael Harper, poeta mais velho
gem emocional, uma disposição de dessa vertente de poesia, reflete esse
ânimo em que podemos nos apoiar, espírito ao entrelaçar a história afro­
mesmo que brevemente, como uma -americana com as experiências de
Robert Pinsky
modulação final na música.O peque­ sua família em forma de montagem.
no poema “The Dead” [“Os Mortos”], De maneira semelhante, Frank Bidart
de Sailing Alone Around the Room: tem fundido eventos políticos como o
New and Selected Poems [Velejando assassinato do presidente americano,
Sozinho em Volta do Quarto: Novos John F. Kennedy, com a vida pessoal.
Poemas Selecionados] (2001), dá Ed Hirsch, Gjertrud Schnackenberg e
uma ideia do voo imaginativo e Rita Dove impregnam alguns de seus
suave aterrizar de Collins, como o mais belos poemas com lembranças
de uma ave em busca de repouso. igualmente irredutíveis de seu passa­
Foto © Christopher Felver /
do pessoal e centram sua atenção em
CORBIS momentos decisivos.

134
Robert Pinsky (1940- ) O osso não saboreava nada e não sentia cheiro de nada,
Robert Pinsky está entre os mais completos Uma harpa escaldada e desdentada, oprimida e
poetas da história. Poeta laureado dos EUA de 1997 fatigada.
a 2000, Pinsky vincula fala coloquial à virtuosidade Os arcos unidos assumiram a forma do nascimento e do
técnica.A cor local e pessoal é um dos seus traços desejo veemente
característicos, mas seus poemas também atingem E a bocarra soldada,aberta,parecia a letra O.
contextos históricos e nacionais. Como as obras de
Elizabeth Bishop, sua poesia coloquial combina Cordas ossificadas mantinham os cantos juntos
aparente simplicidade com arte sutil. Em espirais com arestas pregueadas como um vestido
O influente livro de crítica de Pinsky, The de verão.
Situation of Poetry [A Situação da Poesia] (1976) Mas onde estava o dócil sorriso largo,o corte do prazer?
recomendava uma poesia com as virtudes da Bocas infinitesimais a carregaram,
prosa,e ele colocou isso em prática em seu poema
do tamanho de um livro An Explanation of America A praia o esfregou e gravou e o conservou limpo.
[Uma Explicação dos Estados Unidos](1979) e Mas ainda canta O te amo minha pequena minha terra
History of My Heart [História do Meu Coração] Meu alimento meu pai meu filho quero-o todo para mim
(l984), embora os livros publicados depois, inclu­ Minha flor minha nadadeira minha vida minha
sive The Want Bone [O Osso do Desejo] (l990) leveza meu O.
desencadeiem um lirismo também visto em sua
A POESIA DO MUNDO

N
impressionante coletânea de poemas The Figured
Wheel [A Roda Figurada] (1996). o extremo mais distante do espectro po­
O poema do título de The Figured Wheel é um ético encontra-se a poesia do mundo, na
dos mais belos trabalhos de Pinsky, mas é difícil qual reina o espírito de Elizabeth Bishop.
selecionar algum trecho. O pequeno poema “The É uma poesia pessimista ou pária que parece
Want Bone”, sugerido pela mandíbula de um tu­ antipoética na primeira leitura. Ela pode parecer
barão visto no console da lareira de um amigo,de­ prosaica demais, muito envolvida com meras
monstra o brilhantismo técnico de Pinsky (rimas eventualidades, para realizar algo transcendente.
internas como “limber grin” [dócil sorriso largo], A exposição hesitante é o oposto da oracular, e o
rimas inclinadas como em “together” [juntos] e tema a princípio parece perdido ou meramente
“pleasure” [prazer] e polissílabos tamborilados descritivo. Apesar disso, o melhor dessa poesia
levemente contra uma linha iâmbica firme como abre múltiplas perspectivas, questiona a própria
um tambor). O poema inicia com a descrição noção de identidade pessoal e entende o sofri­
do tubarão como a “língua das ondas” e termina mento do ponto de vista ético.
com seu canto — do reino dos mortos — peã do Pertencem a essa vertente poetas mais ve­
desejo eterno. O ego ou o eu pode ser criticado lhos como Richard Hugo, Gwendolyn Brooks e
aqui: É uma ânsia sem sentido,um O ou zero,e sua Phil Levine.Vozes contemporâneas,tais como Ellen
satisfação uma ilusão sem esperança. Bryant Voight e Yusef Komunyakaa foram influen­
ciados por sua visão quase naturalista, e eles são
A língua das ondas tangeu o sino da terra. atraídos para a violência e sua sombra de longo
O azul encrespou-se e impregnou-se no fogo do azul. alcance.
A mandíbula seca do tubarão no pântano quente
Escancarada sem nada mais que areia dos dois lados. Yusef Komunyakaa (1947- )
Criado na Luisiana,Yusef Komunyakaa, nascido
James Willie Brown Jr.,  serviu no Vietnã,logo depois

135
de se formar na escola de nível médio, assim—a pedra me larga.
ganhando a Estrela de Bronze. Foi Viro de novo—Estou dentro
jornalista do jornal militar, Southern do Memorial dos Veteranos do
Cross, e escreveu muitos poemas Vietnã,dependendo da luz
tendo a guerra como cenário. Muitas para ter importância.
vezes, como na antologia de po­ Recorro aos 58.022 nomes,
esia, “Camouflaging the Chimera” quase esperando encontrar
o meu em letras como fumaça.
[“Disfarçando a Quimera”] (1988) há
Toco o nome de Andrew Johnson;
um elemento de suspense, perigo e
Vejo o lampejo branco da armadilha
emboscada.  Komunyakaa tem falado
explosiva.
sobre a necessidade de a poesia
Os nomes tremeluzem sobre uma blusa
propiciar uma “série de surpresas”.
de mulher
Como o poeta Michael S. Harper, ele
mas quando ela vai embora
usa frequentemente técnicas de jazz os nomes continuam na parede.
e tem escrito sobre a importância da As pinceladas chamejam, as asas de um
livre improvisação e da abertura para pássaro vermelho atravessam minha visão.
outras vozes, como fazem os músicos O céu.Um avião no céu.
em uma “jam session”. Ele co-editou A imagem branca de um veterano flutua
The Jazz Poetry Anthology [A Antologia pra mais perto de mim,então seus olhos
da Poesia do Jazz] (1991-1996) e publi­ pálidos
cou um volume de ensaios intitulado olham através dos meus.Sou uma janela.
Blue Notes [Notas de Blues] (2000) Ele perdeu seu braço direito
embora seu reconhecimento inicial dentro da pedra.No negro espelho
se deva à coletânea Neon Vernacular uma mulher tenta apagar os nomes:
[Vernáculo Néon] (1993). Não,ela escova o cabelo de um menino.
Um dos temas recorrentes de
CIBERPOESIA

N
Komunyakaa diz respeito à identi­
dade. Seu poema“Facing It”[Há que o outro extremo do espectro
Enfrentá-lo] (1988) ambientado no poético, a ciberpoesia é uma
Memorial dos Veteranos do Vietnã nova poesia do mundo. Para
Yusef Komunyakaa muitos jovens adultos americanos,o li­
em Washington, D.C., começa com
um riff (uma frase típica do jazz) vro ocupa um segundo plano perante
que junta sua própria face às me­ o monitor do computador e a leitura
mórias e rostos refletidos: em língua humana falada vem depois
da exposição a códigos binários.
Meu negro rosto se desvanece, A literatura gerada por computador
escondendo-se dentro do negro granito. começou a ganhar forma a partir do
Disse que não o faria, início dos anos 1990; com o advento
maldito seja: Sem lágrimas. da Rede Mundial de Computadores,
Sou pedra.  Sou carne. parte da poesia experimental transfe­
Meu reflexo anuviado olha pra mim riu o seu foco para uma esfera global,
como uma ave de rapina,o perfil da noite virtual e sem papel.
inclinado contra a manhã.Viro Foto © Nancy Crampton Motivos recorrentes na ciberpo­

136
esia incluem autorreflexões críticas sobre a obra influente compilação de manifestações poéticas
impulsionada pela tecnologia; ícones de compu­ acompanhadas de uma coletânea de poemas
tadores,  gráficos e links de hipertextos festoam editada por Juliana Spahr e Peter Gizzi, ajudou
vastas redes de relacionamento,enquanto camadas a estimular a poesia experimental na era da
dimensionais — animação, tecnologia do som, comunicação eletrônica. O volume celebra
textos hiperligados — multiplicam-se em várias a multiplicidade irredutível e a primazia do
direções, algumas vezes criadas por vários autores contexto histórico, atacando as próprias noções
desconhecidos. de identidade e universalidade como conceitos
Os meios de expressão para essa obra vão e burgueses repressivos.
vêm; entre muitos outros, podem ser menciona­ Jorie Graham e outros poetas experimentais
das as revistas de poesia em CD-ROM, The Little do eu chegaram a pontos de vista semelhantes,
Magazine, Cyberpoetry, Java Poetry, New River e partindo de direções opostas. Fundamentais ou
Parallel. Writing From the New Coast: Technique contingentes,os poemas existem no cruzamento
[Escrevendo da Nova Costa: Técnica] (1993) da palavra com o mundo. 

137
CAPÍTULO
redator da revista The NewYorker,Malcolm Gladwell
e relatos sobre reabilitação de uso de drogas e cri­
mes. Na última categoria estava uma reedição do

10
inovador In Cold Blood [A Sangue Frio] de Truman
Capote,“não-ficção”de 1965 que obscurece a distin­
ção entre literatura de alta qualidade e jornalismo e
que recentemente deu origem a um filme.
Livros de autores não-americanos sobre temas
LITERATURA internacionais também ocupavam lugar de des­
CONTEMPORÂNEA taque na lista. O fascinante romance do afegão­
AMERICANA -americano Khaled Hosseini, The Kite Runner [O
Caçador de Pipas] fala da infância de dois amigos

O
s Estados Unidos são uma das mais diversifi­ em Cabul separados pelo governo do Taleban,
cadas nações do mundo. Sua dinâmica po­ enquanto o livro de memórias de Azar Nafisi,
pulação de quase 300 milhões de habitantes Reading Lolita in Teheran [Lendo Lolita em Teerã],
vangloria-se de mais de 30 milhões de indivíduos relembra de forma pungente o ensino de grandes
nascidos em outros países que falam vários idiomas obras da literatura ocidental para jovens iranianas.
e dialetos.Cerca de um milhão de imigrantes chega Um terceiro romance, de Arthur Golden, Memoirs
a cada ano, muitos da Ásia e América Latina. of a Geisha [Memórias de uma Gueixa], que deu
A literatura atual nos EUA é também fascinan­ origem a um filme, conta a vida de uma japonesa
temente diversificada, instigante e em evolução. durante a Segunda Guerra Mundial.
Novas vozes surgiram de vários cantos,desafiando Além disso, a lista de best-sellers revela a popu­
velhas ideias e adaptando tradições literárias para laridade dos temas religiosos. Segundo a revista
se ajustar às condições de mudança da vida na­ Publishers Weekly,  2001 foi o primeiro ano em que
cional. Avanços socioeconômicos possibilitaram livros sobre temas ligados ao cristianismo encabe­
a grupos antes sub-representados se expressarem çaram a lista dos mais vendidos, tanto no gênero
mais plenamente enquanto inovações tecno­lógi­ ficção como não-ficção. Entre os livros de capa
cas criaram um fórum público em rápida transfor­ dura mais vendidos desse exemplar de domingo
mação.  Clubes de leitura proliferam,  feiras de livros, em 2006, encontramos o romance de Dan Brown,
festivais literários e“concursos de poesia”(eventos The DaVinci Code[O Código Da Vinci] e o conto
em que novos poetas concorrem com a apresenta­ de Anne Rice, Christ the Lord: Out of Egypt [Cristo
ção de sua poesia) atraem públicos entusiasmados. Senhor: a Saída do Egito].
A escolha de uma nova obra para um clube do livro Além da lista best-sellers do Times, redes de
pode lançar um escritor desconhecido dando-lhe livrarias oferecem seções distintas para as princi­
destaque da noite para o dia. pais religiões, entre elas: cristianismo, islamismo,
Em um domingo típico, a lista de livros mais judaísmo, budismo e, às vezes, hinduísmo.
vendidos no NewYorkTimes Book Review comprova Na seção de literatura feminina de livrarias encon­
a extraordinária diversidade da cena literária ameri­ tramos obras de uma“Terceira Onda”de feministas,
cana atual. Em janeiro de 2006, por exemplo, a lista movimento geralmente dirigido a mulheres de 20
de livros brochura mais vendidos incluía o gênero a 30 anos de idade que cresceram em uma era de
ficção — romances excitantes de Nora Roberts,um igualdade social de grande aceitação nos EUA. As
novo suspense de John Grisham,assassinatos miste­ feministas da Terceira Onda sentem-se suficiente­
riosos — junto a livros científicos de não-ficção do mente capacitadas para enfatizar a individualidade
antropólogo Jared Diamond,sociologia popular do de escolhas feitas pelas mulheres. Frequentemente

138
associado na mente popular a uma A literatura multi-étnica continua a mi­

O
volta à tradição e aos estilos de educa­ nerar ricos veios e,  à medida que cada
dora de crianças, mulher de batom e literatura étnica amadurece, ela cria
“feminina”,essas jovens recuperaram a suas próprias tradições. A não-ficção
expressão“garota”— algumas recusam criativa e a autobiografia proliferaram.
o rótulo de feministas.O que geralmen­ O gênero “conto” ganhou destaque e
te é chamado de“chick lit”(literatura de s autores o conto “curto” se firmou. Uma nova
garotas) é um ramo em prosperidade. pós-modernos geração de dramaturgos continua a tra­
Bridget Jones’s Diary [Diário de Bridget questionam dição americana de explorar questões
Jones] da inglesa Helen Fielding e Sex as estruturas sociais atuais no palco.Não há espaço
and the City de Candace Bushnell,que externas, sejam nesta breve pesquisa para fazer justiça
retratam a mulher urbana solteira e à fascinante diversidade da literatura
elas políticas,
romântica,deram origem a um gênero americana contemporânea. Em vez
popular entre as jovens.
filosóficas disso, é preciso considerar desenvolvi­
Escritores de não-ficção também ou artísticas. mentos gerais e figuras representativas.
analisam o fenômeno do pós-femi­ Tendem a
nismo. The Mommy Myth [O Mito da desacreditar as PÓS-MODERNISMO, CULTURA
Mamãe] (2004), de Susan Douglas e narativas-mestre E IDENTIDADE
Meredith Michaels, analisa o papel do pensamento “Pós-modernismo”sugere fragmen­
da mídia nas “guerras das mães”, modernista, as tação: colagem, hibridismo e uso de
ao passo que o intenso ManifestA: várias vozes, cenas e identidades. Os
quais julgam
Young Women, Feminism, and the autores pós-modernos questionam as
Future [ManifestA: Jovens Mulheres,
politicamente estruturas externas, sejam elas políti­
Feminismo e o Futuro] (2000) de suspeitas. cas, filosóficas ou artísticas. Tendem
Jennifer Baumgardner e Amy Richards, a desacreditar as narativas-mestre do
discute o ati­vis­mo da mulher na era da pensamento modernista,as quais jul­
internet. Caitlin Flanagan, redatora de gam politicamente suspeitas. Em seu
revista que se diz“antifeminista”explo­ lugar, exploram gêneros da cultura
ra os conflitos entre a vida doméstica popular, em especial a ficção cien­
e a vida profissional das mulheres.  Seu tífica, a espionagem e as histórias de
ensaio de 2004 na revista The Atlantic, detetives, tornando-se, efetivamente,
“How Serfdom Saved the Women’s arqueólogos da cultura popular.
Movement”[Como a Servidão Salvou o White Noise [Ruído Branco], de
Movimento de Mulheres],  relato sobre Don DeLillo, obra estruturada em 40
como as mulheres que trabalham fora seções como videoclipes, ressalta os
dependem das imigrantes de classe dilemas da representação: “As pessoas
inferior para cuidar de seus filhos, eram tolas assim antes da televisão?”,
desencadeou grande debate. pergunta-se um personagem.  O sensa­
É claro que a literatura americana cional Infinite Jest [Gracejo Infinito],
no início do século 21 tornou-se demo­ de David Foster Wallace, com mil
crática e heterogênea. O regionalismo páginas e novecentas notas de rodapé
floresceu e escritores internacionais ou mistura terroristas cadeirantes,droga­
“globais”refletem a cultura dos Estados dos e descrições futuristas de um país
Unidos sob perspectivas estrangeiras. como os Estados Unidos.  Em Galatea

139
2.2, Richard Powers junta tecnologia sofisticada Angela’s Ashes [As Cinzas de Ângela] (1996), do
com vidas privadas. irlandês-americano Frank McCourt, recorda sua
Influenciados por Thomas Pynchon, os autores infância de pobreza, de alcoolismo familiar e a
pós-modernos produzem tramas complexas que intolerância na Irlanda com surpreendente afeto
exigem saltos de imaginação. Quase sempre nive­ e humor. Hand to Mouth [Existência Precária] de
lam a profundidade histórica a uma única dimen­ Paul Auster,publicado em 1997,fala da pobreza que
são; os romances de William Vollmann deslizam tolheu sua escrita e envenenou sua alma.
por tempos e espaços extremamente diferentes
com a mesma facilidade com que um mouse de O Conto: Novos Rumos
computador se movimenta entre textos. O gênero “romance” perdeu um pouco do seu
brilho no final dos anos 1970.  Donald Barthelme,
Não-ficção Criativa: Memórias e Robert Coover, John Barth e William Gass escreve­
Autobiografias ram obras de metaficção experimentais,  mas elas já

V
ários escritores anseiam por gêneros livres não eram consideradas as mais modernas.  Revistas
e menos canônicos como veículos para semanais de grande circulação que publicavam
suas visões pós-modernas. A ascensão da contos de ficção, como a Saturday Evening Post,
literatura global, multiétnica e feminina — obras faliram.
nas quais escritores refletem sobre experiências Coube a um forasteiro do Noroeste do
moldadas por cultura, cor e gênero — deram às Pacífico — corajoso realista na tradição de Ernest
autobiografias e memórias um fascínio especial. Hemingway — revitalizar o gênero. Raymond
Embora as fronteiras terminológicas sejam deba­ Carver (l938-l988) estudou com o falecido escri­
tidas,um livro de memórias em geral é mais curto tor John Gardner, absorvendo sua paixão pela
ou limitado em seu escopo, ao passo que uma arte acessível mesclada com visão moral. Carver
autobiografia tenta passar um panorama mais cresceu em meio ao alcoolismo e pobreza extre­
abrangente sobre a vida do autor. ma para se tornar o escritor de contos de maior
A fragmentação pós-moderna tornou problemáti­ influência nos EUA. Em suas coletâneas Will You
ca para muitos escritores a ideia de um eu acabado Please Be Quiet, Please? [Fique Quieta, por Favor]
que pode ser revelado com sucesso de uma única (l976), What We Talk About When We Talk About
vez.Vários escritores recorrem ao gênero memórias Love [Sobre o Quê Falamos Quando Falamos de
em suas batalhas para fundamentar um eu autêntico. Amor] (1981),Cathedral [Catedral] (l983) e Where
O que constitui autenticidade e até que ponto pode I’m Calling From [De Onde Estou Ligando] (1988),
o autor florear as experiências registradas na memó­ acompanha trabalhadores confusos em empregos
ria em obras de não-ficção são temas discutidos sem perspectivas, farras alcoólicas e quartos alu­
acaloradamente em conferências de escritores. gados num estilo minimalista sutil de escrever de
Os próprios escritores têm contribuído com grande impacto.
considerações perspicazes acerca dessas questões Junto com Carver está a romancista e contista
em livros sobre o ato de escrever,como The Writing Ann Beattie (1947- ) cujos personagens de classe
Life [Vida de Escritor] de Annie Dillard, publicado média frequentemente levam a vida de modo
em 1989. Obras notáveis no gênero memórias inconsequente. Seus contos fazem referência a
incluem The Stolen Light [Luz Roubada] de Ved eventos políticos e canções populares e oferecem
Mehta,editado em 1989.De origem indiana,Mehta vislumbres extraídos da vida, década a década,
ficou cego aos três anos de idade.  Seu relato sobre durante a transformação dos Estados Unidos. Suas
a viagem de avião que fez sozinho para estudar nos obras mais recentes são Park City [Cidade-Parque]
Estados Unidos é algo inesquecível. O fascinante (1998),e Perfect Recall [Lembrança Perfeita] (2001).

140
Inspirados por Carver e Beattie,em central: ocorre uma crise e o esboço
meados dos anos 1980 escritores pro­ de um personagem simplesmente
duziram coletâneas de contos neorre­ tem de reagir. Os autores empregam
alistas fascinantes,entre eles:  Reasons uma narrativa inteligente ou padrões
to Live [Razões para Viver] (1985) de linguísticos; em alguns casos o conto
Amy Hempel,Family Dancing [Dança curto lembra um poema em prosa.
em Família] (1984) de David Leavitt, Seus defensores dizem que as“ge­
Rock Springs de Richard Ford (1987), ografias reduzidas” do conto curto
Shiloh and Other Stories [Shiloh e refletem condições pós-modernas
Outras Histórias] (1982) e Self-Help nas quais os limites parecem mais
[Autoajuda] (1985) de Lorrie Moore. próximos.  Eles encontram simplici­
Outras figuras notáveis incluem o fa­ dade elegante nessas ficções curtas.
lecido Andre Dubus,autor de Dancing Detratores consideram o conto cur­
After Hours [Dança pela Madrugada] to um sinal de decadência cultural,
(1996) e o produtivo John Updike,cuja uma perda geral da habilidade de
recente coletânea de contos inclui leitura e um déficit de atenção. De
The Afterlife and Other Stories [Após a qualquer forma, contos curtos en­
Morte e Outras Histórias] (1994). contraram certo nicho: são fáceis de
Hoje, como discutido mais adiante enviar em um e-mail e se prestam à
neste capítulo, escritores com raízes distribuição eletrônica. São de fácil
étnicas e globais estão informando manejo em aulas de leitura e bons
o gênero do conto com abordagens modelos redações
não-ocidentais e tribais, e a narrativa
tem comandado a atenção da crítica Teatro
e do público.O conto versátil primitivo O teatro contemporâneo com­
é a base de várias formas híbridas: bina realismo e fantasia em obras
romances construídos a partir do pós-modernas que misturam os
encadeamento de contos ou vinhetas universos pessoal e político.  O exu­
e não-ficções criativas que entrelaçam berante Tony Kushner (l956- ) é acla­
história e história pessoal com ficção. mado por suas premiadas Angels in
America [Anjos na América], que
Conto Curto: Raymond Carver representam de modo vívido a epi­
Ficção Rápida ou Breve demia da Aids e os custos psíquicos
O conto curto é uma história muito da homossexualidade remprimida
pequena, em geral, com apenas uma nos anos 1980 e 1990. Part One:
ou duas páginas.Por vezes é chamado Millennium Approaches [Parte I: o
de “flash fiction” (ficção breve) ou Milênio se Aproxima] (1991) e seu
“sudden fiction” (ficção rápida), de com­ple­mento, Part Two: Perestroika
acordo com a antologia Sudden Fiction [Parte II: Perestroika] (1992) têm
de 1986,editada por Robert Shapard e juntas a duração de sete horas.
James Thomas. Combinando comédia, melodrama,
No conto curto há pouco espaço análise política e efeitos especiais,
para desenvolver um personagem. Foto © Marion Ettlinger /
elas entrelaçam diversas tramas e
Em vez disso, o elemento da trama é CORBIS OUTLINE personagens marginalizados.

141
Mulheres dramaturgas têm alcançado especial REGIONALISMO

U
sucesso nos últimos anos. Entre elas, destacam-se ma sensibilidade regionalista generalizada
Beth Henley (1952- ), do Mississippi, conhecida por ganhou força na literatura americana nas
seus retratos de mulheres do Sul. Henley ganhou últimas duas décadas. A descentralização
reconhecimento nacional por Crimes of the Heart expressa a condição pós-moderna americana,
[Crimes do Coração] (1978) que originou um filme tendência mais evidente na literatura de ficção;não
em 1986. Trata-se de uma peça atraente sobre três existe mais um ponto de vista ou código capaz de
irmãs excêntricas cujo afeto mútuo as ajuda a sobre­ expressar com sucesso a nação. Nenhuma cidade
viver à desilusão e ao desespero. Peças posteriores, define os movimentos artísticos como o fez a cidade
como The Miss Firecracker Contest [O Concurso de NovaYork em outros tempos.Comunidades de ar­
Miss Firecracker] (1980), The Wake of Jamey Foster tes vitais surgiram em muitas cidades e a tecnologia
[O Despertar de Jamey Foster] (l982),  The Debutante eletrônica descentralizou a vida literária.
Ball [Baile de Debutante] (l985) e The Lucky Spot À medida que as mudanças econômicas e
[Lugar da Sorte] (l986) exploram formas de sociali­ sociais redefinem os Estados Unidos, instaura-se
zação do Sul — concursos de beleza,  funerais,  bailes um anseio por tradição.Os mitos mais sustentáveis
de debutantes e salões de baile. e nitidamente americanos fazem parte do país, e
Wendy Wasserstein (1950-2006), de Nova York, escritores recorrem ao Sul da Guerra Civil,  ao Oeste
começou escrevendo comédias, como When Selvagem do rancheiro,  à vida arraigada do agricul­
Dinah Shore Ruled the Earth [Quando Dinah Shore tor do Meio Oeste,  à terra natal tribal do Sudoeste e
Dominou a Terra] (l975), uma paródia dos concur­ a outras esferas localizadas onde o real e o mítico
sos de beleza. Ela é mais conhecida por The Heidi se misturam. Naturalmente, mais de uma região
Chronicles [As Crônicas de Heidi] (l988) sobre uma inspirou muitos autores; elas estão incluídas aqui
professora bem-sucedida que confessa sua profunda em regiões que formaram a visão desses autores
infelicidade e adota uma criança.Wasserstein con­ ou as características de seus trabalhos maduros.
tinuou explorando as aspirações femininas em The
Sisters Rosensweig [As Irmãs Rosensweig] (l991),  An O Nordeste
American Daughter [Uma Filha Americana] (1997) O Nordeste pitoresco,  região de invernos longos,
e Old Money [Dinheiro Velho] (2000). florestas decíduas densas e cadeias de montanhas
Jovens dramaturgas como a afro-americana acidentadas baixas,  foi a primeira área ocupada por
Suzan-Lori Parks (1964- ) dão continuidade ao colonizadores de língua inglesa e conserva um ar de
sucesso de suas predecessoras. Parks, criada em Inglaterra. Boston, em Massachusetts, é o motor de
várias bases militares nos EUA e Alemanha, aborda sua cultura e ostenta instituições de pesquisa e várias
questões políticas em obras experimentais cuja universidades.  Diversos escritores da Nova Inglaterra
atemporalidade e ritualismo lembram o escritor retratam personagens que dão continuidade ao
de origem irlandesa Samuel Beckett. Sua obra mais legado puritano, incorporando a ética do trabalho
conhecida, The America Play [A Peça da América] da classe média protestante e o compromisso
(1991) gira em torno do assassinato de Abraham progressivo com a reforma social. Nas áreas rurais,
Lincoln por John Wilkes Booth.Ela retorna ao tema pequenos agricultores independentes lutam para
em Topdog/Underdog [Vencedor/Perdedor], 2001, sobreviver no mundo do marketing global.
que conta a história de dois irmãos afro-americanos, A romancista Joyce Carol Oates usa o norte do
Lincoln e Booth, e a rivalidade entre eles. Estado de Nova York como cenário para muitos
de seus trabalhos góticos. Richard Russo (1949- ),
em seu sedutor Empire Falls (2001), evoca a vida
em uma cidade fabril em decadência no Maine,

142
estado em que Stephen King (1947- ) ambienta Nobodies, and Underrated Scoundrels [Oh, Albany!
seus populares romances de terror. Cidade Improvável de Magos Políticos, Etnias
Romances agridoces de Sue Miller (1943- ) situ­ Intrépidas,  Aristocratas Espetaculares,“Zé-ninguéns”
ados em Massachusetts,como The Good Mother [O Esplêndidos e Canalhas Subestimados], 1983.
Preço da Paixão] (1986), analisam estilos de vida Kennedy também foi aclamado como estadista mais
de contraculturas em Cambridge, cidade conhe­ velho de um pequeno movimento literário irlandês­
cida pela diversidade cultural e social, vitalidade -americano que inclui Mary McCarthy, já falecida,
intelectual e inovações tecnológicas. Também de Mary Gordon, Alice McDermott e Frank McCourt.
Massachusetts, Anita Diamant (1951- ), recebeu Três escritores que estudaram na Universidade de
aclamação popular com The Red Tent [A Tenda Brown, em Rhode Island, quase na mesma época e
Vermelha] (1997), romance histórico feminista foram alunos da escritora britânica Angela Carter
baseado na história bíblica de Dinah. são,com frequência,  mencionados como núcleo de
Russell Banks (1940- ), de New Hampshire, uma“próxima geração”.Donald Antrim (1959- ) sati­
estado pobre e rural, afastou-se da literatura expe­ riza a vida acadêmica em The Hundred Brothers [Os
rimental e adotou em suas obras um estilo mais Cem Irmãos] (1997),que se passa em uma enorme
realista, como Affliction [Aflição] (1989), romance biblioteca de onde se podem ver pessoas desabri­
sobre personagens da classe trabalhadora de New gadas. Rick Moody (1961- ) é mais conhecido por
Hampshire. Para Banks, reconhecer suas raízes seu romance The Ice Storm [Tempestade de Gelo]
é parte fundamental da identidade. Em Aflição, (1994). Entre os romances de Jeffrey Eugenides
o narrador despreza pessoas que “foram para a (1960- ), estão Middlesex ( 2002), que narra as expe­
Flórida, o Arizona e a Califórnia, compraram um riências de um hermafrodita. Escritores admiráveis
trailer ou condo,ficaram com a pele áspera de jogar com visões incomuns,chegando ao absurdo,  Antrim,
shuffleboard o dia inteiro e esperaram a morte”. As Moody e Eugenides, levam adiante as tradições
recentes obras de Banks incluem Cloudsplitter [O opostas de John Updike e Thomas Pynchon.  Muitas
Divisor de Nuvens] (1998), romance histórico do vezes ligado a esses três jovens romancistas, está
século 19 sobre o abolicionista John Brown. o exuberante pós-moderno David Foster Wallace
A surpreendente escritora Annie Proulx (1935- ) (1962- ).Wallace, de Ithaca, Nova York, foi aclamado
cria histórias sobre os batalhadores habitantes do por seu complicado romance sério-cômico The
norte da Nova Inglaterra em Heart Songs [Canções Broom of the System [AVassoura do Sistema] (1987)
do Coração] (1988). Seu melhor romance, The e histórias saturadas de cultura pop em Girl With
Shipping News [Notícias sobre Navegação] Curious Hair [A Garota com Cabelos Estranhos]
(1993) é ambientado mais para o norte, em (1989).
Newfoundland, Canadá. Proulx também passou
anos no Oeste e um de seus contos originou o O Meio Atlântico
filme “Brokeback Mountain,” em 2006. Os estados férteis do Meio Atlântico, dominados
William Kennedy (1928- ) escreveu um ciclo pela cidade de Nova York com seu grande porto,
de romances densos e entrelaçados situados em permanecem uma porta de entrada para ondas
Albany, no norte do estado de Nova York, incluindo de imigrantes. Hoje a economia diversificada da
o aclamado Ironweed [Vermônia]. O título de sua região engloba finanças, comércio e transporte,
história como conhecedor profundo de Albany dá bem como publicidade e moda.  A cidade de Nova
uma ideia de seu estilo firme,coloquial e do número York é o reduto da indústria de editoração, bem
exagerado de personagens muitas vezes inescrupu­ como de galerias de arte e museus prestigiados.
losos:  O Albany! Improbable City of Political Wizards, Don DeLillo (1936- ), de Nova York, começou
Fearless Ethnics, Spectacular Aristocrats, Splendid como redator publicitário e seus romances ex­

143
ploram o consumismo, entre mui­ realidade e ilusão. A trilogia de Auster,
tos outros temas. Americana (1971) na verdade, autodesconstrói-se. Do
conclui: “Consumir nos EUA não é mesmo modo,  Kathy Acker (1948-1997)
comprar,é sonhar.”Os protagonistas de justapôs trechos das obras de Cervantes
DeLillo procuram identidades basea­ e Charles Dickens com ficção científica
das em imagens. White Noise [Ruído em pastiches pós-modernos, como
Branco] (1985) é sobre Jack Gladney e Empire of the Senseless [Império da
sua família,cujas experiências são me­ Insensatez] (1988), uma busca, no
diadas por vários textos,especialmente tempo e no espaço,  por voz individual.
anúncios de publicidade. O trecho a A cidade de NovaYork abriga muitos
seguir indica o estilo de DeLillo:  “...o grupos de escritores com interesses em
vazio,  o sentido de escuridão cósmica. comum. Entre as mulheres judias há a
Mastercard, Visa, American Express”. célebre ensaísta Cynthia Ozick (1928- ),
Fragmentos de anúncios soltos pelo originária do Bronx, cenário de seu
livro surgem do subconsciente de romance The Puttermesser Papers [Os
Gladney proveniente do papagaiar Papéis de Puttermesser] (1997). Seu
da mídia, gerando o ruído branco impressionante The Shawl [O Xale]
subliminar do título. Os últimos ro­ (1989), apresenta o ponto de vista de
mances de DeLillo incluem figuras uma jovem mãe sobre o Holocausto.
políticas e históricas: Libra (1988), A divertida e informal Collected Stories
imagina o assassinato do presidente [Coletânea de Contos],  publicada em
John F. Kennedy como uma explosão 1994, de Grace Paley (1922- ), capta os
de consumismo frustrado;Underworld ritmos sincopados da cidade.
[Submundo] (1997) tece uma teia Entre os jovens escritores associa­
de interconexões entre um jogo de dos a uma vida em ritmo acelerado
beisebol e uma bomba nuclear no estão Jay McInerney (1955- ),  cuja Story
Cazaquistão. of My Life [História da Minha Vida]
Numa Nova York multidimensional (1988) retrata a cultura jovem movida
e poliglota,obras de ficção mostrando a drogas do boom dos anos de 1980,
uma cidade obscura pós-moderna e a satirista Tama Janowitz (1957- ). O
são abundantes. Um exemplo é a retrato desses escritores sobre a solidão
labiríntica trilogia de Nova York City Don DeLillo e a dependência química na cidade
of Glass [Cidade de Vidro] (1985), anônima e efervescente lembra as
Ghosts [Fantasmas] (1986) e The obras de John Cheever.
Locked Room [O Quarto Trancado] Os subúrbios próximos são res­
(1986) de Paul Auster (1947- ). Nessa ponsáveis pela criatividade de outros
obra,inspirada em Samuel Beckett e no escritores. Mary Gordon (1949- )
romance policial, um escritor isolado ambienta muitas de suas obras cen­
trabalhando numa história policial tradas no universo feminino no local
aborda Paul Auster, que está escreven­ onde nasceu,Long Island,como o faz
do sobre Cervantes. A trilogia sugere Alice McDermott (1953- ), cujo ro­
que a “realidade” é apenas um texto mance Charming Billy [O Charmoso
construído via ficção, desse modo, Billy] (1998) disseca a promessa não
apagando a fronteira tradicional entre Foto © Nancy Crampton cumprida de um alcoólatra.

144
Realistas do Meio Atlântico incluem Homewood, bairro negro de Pitts­
Richard Bausch (1945- ),de Baltimore, burgh, Pensilvânia. Em sua trilogia
autor de In the Night Season [Na faulk­neriana de Homewood — Hiding
Estação da Noite],1998,e de contos em Place [Esconderijo],1981,  Damballah
Someone to Watch Over Me [Alguém (1981) e Sent for You Yesterday [Fui
Para Me Proteger],publicado em 1999. Buscar Você Ontem] (1983) — usa
Bausch escreve sobre famílias frag­ pontos de vista mutáveis e jogos lin­
mentadas, como Anne Tyler (1941- ), guísticos para expressar a experiência
também de Baltimore, cujos persona­ negra. Seu conto mais conhecido,
gens excêntricos tentam resolver seu “Brothers and Keepers” [Acaso Sou
tipo de vida isolada e desorganizada. o Guarda do Meu Irmão?] (1984)
Mestra do detalhe e senso de humor é sobre seu relacionamento com
sóbrio, Tyler escreve em linguagem seu irmão presidiário. Em The Cattle
simples e calma. Entre seus romances Killing [A Matança do Gado] (1996),
mais conhecidos estão Dinner at Wideman retorna a sua famosa histó­
the Homesick Restaurant [Jantar no ria inicial “Fever” [Febre] (1989). Seu
Restaurante da Saudade] (1982) e The romance Two Cities [Duas Cidades]
AccidentalTourist [O Turista Acidental] (1998) desenrola-se em Pittsburgh e
(1985), transformado em filme em na Filadélfia.
1988. The Amateur Marriage [Michael David Bradley (1950- ),  também da
e Pauline: Um Casamento Amador] Pensilvânia, ambienta seu romance
(2004) situa o divórcio em um pano­ histórico The Chaneysville Incident
rama da vida americana durante 60 [O Incidente de Chaneysville] (1981)
anos. no movimento abolicionista, rede de
Os afro-americanos deram con­ cidadãos que oferecia oportunidades
tribuições especiais. A autobiografia e ajuda a escravos sulistas negros para
Zami: A New Spelling of My Name que encontrassem a liberdade no
[Zami: uma Nova Grafia do Meu Norte na Guerra Civil dos EUA.
Nome] (1982) da ensaísta, feminista Trey Ellis (1962- ) escreveu os ro­
e poeta Audre Lorde é um relato mances Platitudes [Trivialidades],1988,
honesto das experiências de uma Home Repairs [Consertos Caseiros]
mulher negra nos Estados Unidos. Anne Tyler (1993) e Right Here, Right Now [Aqui,
Bebe Moore Campbell (1950- ), da Agora] (1999) e roteiros,entre os quais
Filadélfia,  escreve romances regionais “TheTuskegee Airmen”[Prova de Fogo]
cheios de energia, entre eles Your (1995) e, em 1989, um ensaio “The
Blues Ain’t Like Mine [Seu Blues Não New Black Aesthetic”[A Nova Estética
É Como o Meu], publicado em 1992. Negra] revelando nova sensibilidade
Gloria Naylor (1950- ), da cidade de multiétnica na geração mais jovem.
Nova York, explora vidas de diferentes Escritores de Washington, D.C.,
mulheres em The Women of Brewster a quatro horas de carro ao sul da
Place [As Mulheres de Brewster] cidade de Nova York, incluem Ann
(1982),  romance que a tor­nou famosa. Beattie (1947- ), cujos contos foram
Aclamado pela crítica, John Ed­ Foto © Diana Walker / mencionados anteriormente. Seus
gar Wideman (1941- ) cresceu em Getty Images romances sobre a vida cotidiana

145
incluem Picturing Will [Descrevendo parte do que é chamado o Cinturão
Will] (1989), Another You [Seu Outro do Sol, região dos Estados Unidos
Lado] (1995) e My Life, Starring Dara que cresce mais rapidamente.

O
Falcon [Minha Vida, Estrelando Dara Sul, com sua rica tradição
Falcon] (1997). oral, tem nutrido muitas con­
A capital dos EUA é reduto de mui­ tadoras de história. Na parte
tos romancistas políticos. Ward Just superior do Sul, Bobbie Ann Mason
(1935- ) ambienta seus romances nos (1940- ), de Kentucky, escreve sobre
vertiginosos círculos militares, polí­ as mudanças infligidas pela cultura
ticos e intelectuais de Washington. de massa. Em sua história mais
Christopher Buckley (1952- ) in­ famosa, “Shiloh” [Shiloh e Outras
crementa sua sátira humorística Histórias] (1982), um casal deve
política com detalhes locais; seu modificar seu relacionamento ou
Little Green Men [Pequenos Homens se separar quando as subdivisões de
Verdes] (1999) é uma paródia sobre habitações se espalham pelo “oeste
respostas oficiais sobre alienígenas do Kentucky como uma mancha
do espaço sideral. Michael Chabon de petróleo”. O conto aclamado de
(1963- ), que cresceu nos subúrbios Mason, In Country [No País] (1985),
de Washington, mas mais tarde se mostra os efeitos da Guerra do Vietnã
mudou para a Califórnia, retrata focalizando uma jovem inocente
jovens no limiar fascinante da idade cujo pai morreu no conflito.
adulta em The Mysteries of Pittsburgh Lee Smith (1944- ) coloca o povo
[Usina de Sonhos – Os Mistérios de dos Montes Apalaches em foco pun­
Pittsburgh] (1988); seu romance gente, recorrendo à fonte de música
inspirado em gibi, The Amazing folclórica americana em seu romance
Adventures of Kavalier and Clay The Devil’s Dream [O Sonho do Diabo]
[Incríveis Aventuras de Kavalier e (1992). Jayne Anne Phillips (1952- )
Clay] (2000), mistura glamour e arte escreve contos sobre a falta de adapta­
à maneira de F. Scott Fitzgerald. ção – Black Tickets [Ingressos Negros]
(1979) – e um romance Machine
O Sul Dreams [Sonhos de Máquina] (1984)
O Sul é composto de regiões dís­ Bobbie Ann Mason
ambientado nas montanhas inóspitas
pares no sudeste dos Estados Unidos, da Virgínia Ocidental.
desde a fria cordilheira dos Montes Os romances de Jill McCorkle
Apalaches e o extenso vale do Rio (1958- ) abordam seu passado na
Mississippi até os úmidos pântanos Carolina do Norte.Sua história de amor
de ciprestes da Costa do Golfo. A envolta em mistério Carolina Moon
cultura do algodão e as plantações [A Lua de Carolina] (1996) explora
cultivadas por escravos transformou um suicídio ocorrido há anos em um
o Sul na região mais rica do país vilarejo litorâneo onde implacáveis on­
antes da Guerra Civil dos EUA (1860 das destroem as fundações das casas
– 1865). Mas após a guerra, a região de praia abandonadas. A Carolina do
mergulhou em pobreza e em isola­ Sul exuberante, terra natal de Dorothy
Foto © Jymi Bolden /
mento por um século. Hoje, o Sul é CitiBeat Allison (1949- ), aparece em seu

146
romance autobiográfico Bastard Out Geórgia, com The Great Santini [O
of Carolina [A Bastarda da Carolina] Grande Santini] (1976) e Beach Music
(1992) visto pelos olhos de uma [Canção da Praia](1995); além do
menina levada de 12 anos, de origem romancista Barry Hannah (1942- ),
bastarda, suja e muito pobre, apelida­ do Mississippi, conhecido por seus
da de Osso.  Ellen Gilchrist (1935- ), do enredos violentos e estilo ousado.
Mississippi,ambienta a maior parte de Um escritor muito diferente
sua Collected Stories [Coletânea de oriundo do Mississippi é Richard
Contos] (2000) em pe­quenos vilarejos Ford (1944- ), que começou a es­
ao longo do Rio Mississippi e em Nova crever no estilo faulkneriano, po­
Orleans, Louisiana. rém, é mais conhecido por seu ro­
Entre os romancistas com experi­ mance sutil ambientado em Nova
ência na realidade das minas sulistas, Jersey, The Sportswriter [O Cronista
pode-se citar o renomado Cormac Esportivo] (1986) e sua continuação,
McCarthy (1993- ), cujos primeiros Independence Day [Independência]
romances, como Suttree (1979) são (1995). Esse romance é sobre Frank
relatos na maneira arquetípica do Bascombe, um vagabundo sonhador,
Sul de evocar emoções obscuras ambíguo, que perde todas as coisas
e profundas, ignorância e pobreza que dão sentido a sua vida – um
ambientados nos vales e montanhas filho, seu sonho de escrever ficção,
verdes do Leste do Tennessee. Em seu casamento, amantes, amigos e
1974,  McCarthy mudou-se para El Paso, emprego.Bascombe é sensível e inteli­
Texas,e começou a tentar entender as gente – suas escolhas,  diz ele,  são feitas
paisagens e tradições do Oeste.  Blood “para desviar a dor de arrependimento
Meridian: Or the Evening of Redness terrível” – e seu vazio, junto com os
in the West [Meridiano de Sangue ou anônimos shopping centers e novos
o Crepúsculo Vermelho no Oeste] empreendimentos imobiliários áridos,
(1985) é uma visão dura de The os quais percorre continuamente em
Kid, garoto de 14 anos, originário do silêncio para comprovar a visão de
Tennessee que se torna um matador Ford de uma doença nacional.
a sangue frio no México nos anos Muitos escritores afro-americanos
1840. A Trilogia da Fronteira, épico Richard Ford são do Sul, como Ernest Gaines da
mais vendido de McCarthy — All the Louisiana, Alice Walker da Geórgia e
Pretty Horses [Todos os Belos Cavalos] Zora Neale Hurston da Flórida, cuja
(1992), The Crossing [A Travessia] obra de 1937,  Their EyesWereWatching
(1994) e Cities of the Plain [Cidades da God,[Seus Olhos Observavam Deus],é
Planície] (1998) — confere grandeza considerada o primeiro romance femi­
mítica ao deserto entre o Texas e o nista escrito por uma afro-americana.
México. Hurston,que morreu nos anos de 1960,
Outros autores célebres são passou por um ressurgimento crucial
Charles Frazier (1950- ),da Carolina do nos anos de 1990. Ishmael Reed, do
Norte,com o romance sobre a Guerra Tennessee,ambientou Mumbo Jumbo
Civil, Cold Mountain [Montanha Foto © Don MacLellan / (1972), em Nova Orleans. Margaret
Fria] (1997); Pat Conroy (1945- ), da CORBIS SYGMA Walker (1915-1998),do Alabama,escre­

147
veu o romance Jubilee [Jubileu] (1966) e os ensaios Kenan (1963- ), nasceu em Nova York e cresceu
On Being Female,Black,and Free [Ser Mulher,Negra na Carolina do Norte, cenário de seu romance A
e Livre] (1997). Visitation of Spirits [Visitação dos Espíritos],1989,e
O escritor James Alan McPherson (1943- ), da de seus contos Let the Dead Bury Their Dead [Deixai
Geórgia, retrata trabalhadores em Elbow Room os Mortos Enterrar os seus Mortos] (1992). Seu
[Espaço para Manobra] (1977);O livro A Region Not romance Walking on Water: Black American Lives
Home: Reflections From Exile [Uma Região Longe at the Turn of the Twenty-First Century [Caminhando
de Casa: Reflexões do Exílio], (2000), cujo título Sobre as Águas: Vida dos Negros Americanos Na
reflete sua mudança para Iowa, é uma autobiogra­ Virada do Século 21] (1999) é não-ficção.
fia. ZZ Packer (1973- ), nascida em Chicago, aluna
de McPherson no Workshop de Escritores de Iowa, O Meio Oeste
criada no Sul, estudou no Meio Atlântico e hoje As vastas planícies do Meio Oeste dos EUA –
vive na Califórnia. Sua primeira obra, o volume de grande parte dele entre as Montanhas Rochosas e o
contos Drinking Coffee Elsewhere [Tomar Café em Rio Mississippi – queimam no verão e congelam nas
Outro Lugar] (2003), transformou-a em estrela em tempestades cortantes de inverno.  A área foi aberta
ascensão. Escritora feminina prolífica, bell hooks com o término do Canal Erie em 1825, atraindo
(nascida Gloria Watkins, no Kentucky, 1952) ficou colonizadores da Europa Setentrional ávidos por
famosa pelas análises críticas culturais incluindo terra. Entre escritores do início do século 20 com
Black Looks: Race and Representation [Aparências raízes no Meio Oeste estão Ernest Hemingway, F.
Negras: Raça e Representação] (1992) e autobio­ Scott Fitzgerald, Sinclair Lewis e Theodore Dreiser.
grafias iniciando com Bone Black: Memories of a A ficção do Meio Oeste está calcada no rea­
Girlhood [Osso Negro: Memórias de Tempos de lismo. O romance regional floresceu nos últimos
Garota], 1996. anos, retratando redes de relacionamentos entre
Poeta experimental e estudiosa de narrativas parentes, a comunidade local e o meio ambiente.
sobre escravos (Freeing the Soul, 1999),[Libertando a O agronegócio e o desenvolvimento ameaçam
Alma],Harryette Mullen (1953- ) escreve coletâneas fazendas familiares em algumas partes da região
de poesia multivocais,como Muse & Drudge [Musa & e alguns romances prenunciam a morte da agricul­
Mula] (1995).  Romancista e contista Percival Everett tura como um modo de vida.
(1956 - ) da Geórgia,escreve ficção sutil,passível de Entre os romancistas regionais,encontra-se Jane
amplas interpretações;  suas obras mais recentes são Smiley (1949- ), cujo romance A Thousand Acres
Frenzy (Frenesi), 1997, e Glyph [Glifo], 1999. [Mil Acres] (1991) é uma versão contemporânea
Muitos escritores afro-americanos cujas famílias feminista da história do Rei Lear. O reino perdido
seguiram padrões de migração interna nasceram é uma grande propriedade rural familiar mantida
longe do Sul; porém,  para lá retornaram em busca há quatro gerações e as forças que a minam são
de inspiração.Famosa romancista de ficção científi­ a concatenação do nível pessoal e político. Kent
ca,Octavia Butler (1947 - ),da Califórnia,recorre ao Haruf (1943- ) cria personagens mais fortes em
tema da escravidão e à tradição de narrativas dos seu romance radical sobre a pradaria, Plainsong
escravos em Wild Seed [Semente Selvagem] (1980); [Canção Simples] (1999).
sua Parable of the Sower [Parábola do Semeador] Michael Cunningham (1952- ), de Ohio, co­
(1993) aborda a dependência química. Sherley meçou como romancista regional em A Home
Anne Williams (1944- ), também da Califórnia, at the End of the World [Uma Casa no Fim do
escreve sobre amizades inter-raciais entre mulheres Mundo] (1990). The Hours [As Horas] (1998),
do Sul durante a escravidão em seu romance histó­ transformado em filme, entrelaça brilhantemente
rico de 1986,baseado em fatos,  Dessa Rose. Randall a vida da Sra. Dalloway de Virginia Woolf com a de

148
duas mulheres de diferentes épocas.  Stuart Dybek em A Good Scent From a Strange Mountain [Um
(1942- ) escreveu coletâneas de contos fulgurantes, Bom Aroma de Uma Montanha Desconhecida]
inclusive I Sailed With Magellan [Eu Naveguei Com (1992). Seus contos em Tabloid Dreams [Sonhos
Magalhães] (2003) sobre sua infância no sul de de Tablóide], 1996 — inspirados em manchetes
Chicago. jocosas — foram transformados no romance hu­
Entre romancistas urbanos mais jovens, encon­ morístico Mr. Spaceman [Sr. Homem do Espaço]
tram-se Jonathan Franzen (1959- ), nascido em (2000), em que um alienígena aprende inglês
Missouri e criado em Illinois. O romance panorâ­ assistindo televisão e abduz um ônibus cheio de
mico mais vendido de Franzen,The Corrections [As turistas para entrevistá-los em sua espaçonave.
Correções] (2001) — assim intitulado por causa Entre os autores indígenas americanos da
de uma queda na bolsa de valores — evoca a vida região estão Louise Erdrich, descendente em
familiar no Meio Oeste durante várias gerações.O ro­ parte dos chippewas, que lançou uma série de
mance registra a deterioração física e mental de um romances em sua terra natal, Dakota do Norte.
patriarca que sofre do mal de Parkinson;como em A Gerald Vizenor (1935- ) oferece um retrato cô­
Thousand Acres de Smiley,  a família toda é afetada. mico,  pós-moderno da vida americana indígena
Franzen usa pessoas físicas contra grandes conspira­ contemporânea em Darkness at Saint Louis
ções em TheTwenty-Seventh City [AVigésima Sétima Bearheart [Escuridão em Saint Louis Coração de
Cidade] (1988) e Strong Motion [Movimento Forte] Urso] (1978) e Griever: An American Monkey King
(1992).Alguns críticos ligam Franzen a Don DeLillo, in China [Griever: Um Rei Macaco Americano
Thomas Pynchon e David Foster Wallace como na China] (1987). Chancers [Ressuscitados] de
escritor de romances de conspiração. Vizenor (2000), aborda esqueletos enterrados
O Meio Oeste produziu ampla variedade de longe da terra natal.
obras escritas, a maioria com influências interna­ A romancista popular sírio-americana Mona
cionais. Richard Powers (1957- ), de Illinois, viveu Simpson (1957- ), de Wisconsin, é autora de
na Tailândia e na Holanda. Seus desafiadores ro­ Anywhere But Here [Em Qualquer Lugar Menos
mances pós-modernos entrelaçam vidas pessoais Aqui] (1986),uma análise sobre relações mãe-filha.
com tecnologia.Galatea 2.2 (1995) atualiza o tema
do cientista louco; nesse caso, os cientistas são os O Oeste montanhoso
programadores de computador. O interior do oeste dos Estados Unidos é uma

O
romancista afro-americano Charles área em grande parte selvagem que se estende ao
Johnson (1948- ), ex-cartunista nascido longo das majestosas Montanhas Rochosas desde
em Illinois e se mudou para Seattle, Montana, na fronteira com o Canadá, indo em di­
Washington, recorre a tradições díspares, como reção oblíqua até as colinas do Texas, na fronteira
o zen-budismo e as narrativas sobre escravos em dos EUA com o México.  Agropecuária e mineração
romances como Oxherding Tale [O Conto do durante muito tempo constituíram a espinha dorsal
Rebanho de Gados] (1982).O romance picaresco da economia da região, e a tradição inglesa nessa
e talentoso de Johnson Middle Passage [Passagem área reforça o espírito independente da fronteira.
do Meio] (1990) mistura a história internacional A literatura do faroeste geralmente envolve
sobre a escravidão com um conto sobre o mar que conflitos. No Oeste do século 19 contrapõem-se
lembra Moby-Dick. Dreamer [Sonhador](1998) como inimigos o cowboy e o índio, o agricultor/
recria o assassinato do Dr. Martin Luther King, Jr. colonizador e o forasteiro, o pecuarista e o ladrão
Robert Olen Butler (1945- ),nascido em Illinois e de gado.  Entre os adversários atuais estão os homens
veterano da Guerra do Vietnã, escreve sob o ponto do petróleo contra os ecologistas,os incorporadores
de vista de refugiados vietnamitas na Louisiana contra os arqueólogos e os cidadãos ativistas contra

149
os representantes de instalações nu­ amorosa.O entusiasmo de McGuane
cleares e militares, muitos dos quais por caça e pesca levou os críticos a
moradores do Oeste pouco povoado. compará-lo com Ernest Hemingway.
Um escritor dominou grande Jim Harrison (1937- ), nascido em
parte da produção literária sobre Michigan como McGuane, morou
o faroeste, da mesma forma como muitos anos numa fazenda. Em
William Faulkner fez com relação seu primeiro romance, Wolf: A False
ao Sul. Wallace Stegner (1909-1993) Memoir [Lobo: uma Memória Falsa]
registra o fim da vida selvagem no (1971), um homem tenta ver um
Oeste. Em sua obra-prima Angle of lobo no deserto na esperança de
Repose [Ângulo de Repouso] (1971), mudar sua vida. Entre suas obras
um historiador imagina a mudança de ficção posteriores e mais pes­
de seus avós de educação refinada simistas, estão: Legends of the Fall
para o Oeste “selvagem”. Seu último [Lendas do Outono] (1979) e The
livro aborda sua vida no Oeste como Road Home [O Caminho para Casa]
escritor: Where the Bluebird Sings (1998).
to the Lemonade Springs [Onde o No romance Wildlife [Vida Selva­
Pássaro Azul Canta para Fontes de gem] (1990) de Richard Ford sobre
Limonada] (1992). Durante um quar­ Montana,a paisagem desolada serve
to de século,  Stegner dirigiu o progra­ de contraponto à desintegração de
ma de redação da Universidade de uma família. O escritor de contos,
Stanford; sua lista de alunos parece crítico da ecologia e ensaísta sobre
a relação dos autores mais impor­ a natureza Rick Bass (1958- ),nascido
tantes da produção literária sobre no Texas e educado como geólogo
o Oeste: Raymond Carver, Ken Kesey, especializado em petróleo, escreve
Thomas McGuane, Larry McMurtry, N. sobre confrontações elementares
Scott Momaday, Tillie Olsen e Robert entre a natureza e os homens que
Stone. Stegner também influenciou a vivem ao ar livre em sua coletânea
escola contemporânea de escritores de contos In the Loyal Mountains
de Montana ligada a McGuane, Jim [Nas Montanhas Fiéis] (1995) e no
Harrison e algumas obras de Richard romance Where the Sea Used To Be
Ford, bem como escritores texanos Larry McMurtry [Onde Ficava o Mar] (1998).
como McMurtry. O texano Larry McMurtry (1936- )

O
escritor Thomas McGuane descreve sua infância numa fazenda
(1939- ) em geral retrata o ho­ em Horseman,Pass By [Cavaleiro,Siga
mem só em uma área selva­ em Frente] (1961), obra que deu
gem, onde se envolve em cres­cente origem ao filme Hud [O Indomado]
conflito. Entre suas obras, estão: The em 1963, retrato pouco romântico
Sporting Club [O Clube Esportivo], do mundo rural. Leaving Cheyenne
(1968) e The Bushwacked Piano [Deixando Cheyenne] (1963) e seu ro­
[O Piano Atacado por uma mance seguinte,The Last Picture Show
Emboscada] (1971), em que o [A Última Sessão de Cinema] (1966),
herói viaja de Michigan a Montana transformado também em filme,  evoca
numa louca missão de conquista Foto © Richard Robinson o desaparecimento de certo modo de

150
vida em cidades pequenas do Texas. de índios chickasaws,reflete sobre as
A obra mais conhecida de McMurtry índias americanas e a natureza em
é Lonesome Dove [Pomba Solitária] romances como Mean Spirit [Espírito
(1985),romance épico arquetípico de Mau] (1990), que aborda a corrida
faroeste sobre a jornada de uma boia­ ao petróleo em terras indígenas na
da nos anos de 1870, que se tornou década de 1920, e Power [Poder]
minissérie de sucesso na TV.  Entre suas (1998), em que uma índia descobre
obras mais recentes está Comanche seus recursos internos naturais.
Moon [Lua Comanche] (1997).
O Oeste de escritores de várias O Sudoeste
etnias é menos heróico e com frequên­ Por séculos, o Sudoeste deserto
cia mais voltado para o futuro.Uma das desenvolveu-se sob o domínio espa­
escritoras chicanas mais conhecidas é nhol, onde grande parte da popula­
Sandra Cisneros (1954- ). Nascida em ção continua a falar esse idioma e
Chicago, Cisneros morou no México algumas tribos de índios vivem em
e no Texas; ela aborda a grande fron­ terras de seus ancestrais. As chuvas
teira cultural entre o México e os EUA são inconstantes e a agricultura
como zona criativa e contraditória em sempre foi precária na região. Hoje
que mulheres mexicano-americanas grandes projetos de irrigação impul­
precisam se reinventar. Seu best-seller sionam a produção agrícola e o ar
The House on Mango Street [A Casa condicionado atrai um número cada
da Rua Mango] (1984), uma série de vez maior de pessoas para cidades
descrições interligadas sob o ponto em expansão como Salt Lake City,em
de vista de uma garota, serviu de Utah, e Phoenix, no Arizona.
guia para outros escritores latinos e Numa região onde a ecologia
apresentou o barrio vital de Chicago do deserto é tão frágil, não é de sur­
aos leitores. Cisneros continuou a preender que haja tantos escritores
retratar a vida das mulheres chicanas voltados para o meio ambiente. O
em Woman Hollering Creek [Riacho ativista Edward Abbey (1927-1989)
da Mulher que Chora] (1991).Pat Mora celebrou a vida selvagem do deserto
(1942- ) oferece uma visão chicana em de Utah em Desert Solitaire:A Season
Nepantla: Essays from the Land in the
Sandra Cisneros in the Wilderness [Deserto Solitário:
Middle [Nepantla: Ensaios da Terra do uma Temporada em Território
Meio] (1993),  que trata de questões de Selvagem] (1968).
conservação cultural. Barbara Kingsolver (1955- ), bió­
Entre os índios americanos da loga de formação, oferece o ponto
região está o falecido James Welch, de vista feminino sobre o Sudoeste
cujo livro The Heartsong of Charging em sua popular trilogia passada no
Elk [A Canção de Amor de Charging Arizona: The Bean Trees [As Árvores
Elk] (2000), retrata um jovem sioux de Feijão] (1988), sobre Taylor Greer,
que sobrevive à batalha de Little jovem aventureira que adota uma
Bighorn e constrói uma nova vida criança cheroqui; Animal Dreams
na França. Linda Hogan (1947- ), Foto Associated Press / [Sonhos de Animais] (1990); e Pigs
nascida no Colorado e descendente Wide World Photos in Heaven [Porcos no Céu] (1993).

151
The Poisonwood Bible [A Bíblia Borderlands/La Frontera: The New
Envenenada] (1998) é uma narrativa Mestiza [Fronteiras: a Nova Mestiça]
sobre uma família missionária na (1987), de Gloria Anzaldúa (1942- ),
África. Kingsolver aborda temas imagina de forma apaixonada uma
políticos em tom não apologético e consciência feminina híbrida da
admite:“Eu quero mudar o mundo”. fronteira formada por vertentes das
O Sudoeste abriga o maior número culturas mexicana,ameríndia e inglesa.
de escritores ameríndios, cujas obras Também digna de destaque é a
revelam ricas narrativas míticas, abor­ escritora do Novo México, Denise
dagem espiritual da natureza e profun­ Chavez (1948- ),autora da coleção de
do respeito pela palavra na forma oral. contos The Last of the Menu Girls [A
O tema de ficção mais importante é a Última das Garotas do Menu] (1986).
cura, entendida como restauração da Sua Face of an Angel [Face de um
harmonia. Entre outros temas estão Anjo] (1994), sobre uma garçonete
pobreza, desemprego, alcoolismo e que prepara um manual para suas
crimes de brancos contra índios. colegas de profissão há 30 anos, foi
A produção literária indígena é considerado um romance autentica­
mais filosófica que colérica, contudo, mente latino escrito em inglês.
e projeta forte visão ecológica.  Autores
importantes incluem o notável N.  Scott Literatura da Califórnia
Momaday, que marcou o início do A Califórnia poderia ser um país
romance contemporâneo ameríndio à parte com sua enorme população
com House Made of Dawn [Casa Feita multiétnica e economia poderosa. O
de Aurora]; seus trabalhos recentes estado é conhecido por gerar experi­
incluem The Man Made of Words [O ências sociais, movimentos de jovens
Homem Feito de Palavras] (1997). A (beats, hippies, tecnólogos) e novas
romancista Leslie Marmon Silko, em tecnologias (os “pontocom” do Vale
parte descendente de índios lagunas e do Silício) que podem ter consequ­
autora de Ceremony [Cerimônia],tam­ ências inesperadas.
bém publicou Gardens in the Dunes O norte da Califórnia, cujo centro
[Jardins nas Dunas] (1999),  retratando é São Francisco, desfruta de tradição
Indigo, órfão criado por uma mulher
Amy Tan literária liberal,até mesmo utópica,co­
branca na virada do século 20. mo em Jack London e John Steinbeck.
Muitos escritores mexicano- Têm raízes nessa região centenas
americanos vivem no Sudoeste há sé­ de escritores, inclusive o ameríndio
culos.Entre os assuntos característicos Gerald Vizenor,  a chicana Lorna Dee
encontram-se: o idioma espanhol, a Cervantes e os afro-americanos Alice
tradição católica,  as formas folclóricas Walker e Ishmael Reed, além de escri­
e, recentemente, desigualdade entre tores com mentalidade internacional
raças e gêneros,conflitos de gerações como Norman Rush (1933- ), cujo ro­
e ativismo político. A cultura é acen­ mance Mating [Acasalamento] (1991)
tuadamente patriarcal, mas surgiram aborda os anos que passou na África.
novas vozes femininas chicanas. Foto Associated Press /
O Norte da Califórnia abriga rica
O livro poético de não-ficção Graylock tradição literária ásio-americana,

152
cujos temas característicos incluem família e pa­ Gina Berriault (1926-1999), cujos personagens so­
péis dos gêneros, conflito de gerações e busca de brevivem precariamente em quartos alugados em
identidade.Maxine Hong Kingston ajudou a inspi­ Women in Their Beds [Mulheres em Suas Camas]
rar o renascimento da literatura ásio-americana, (1996).Joan Didion (1934- ) evoca o anseio de des­
além de popularizar o gênero de autobiografia compromisso da Califórnia em seus brilhantes en­
fictícia. saios Slouching Towards Bethlehem [Arrastando-se
O grupo de escritores ásio-americanos da até Belém] (1968).  Em 2003,  Didion escreveu Where
Califórnia inclui a romancista Amy Tan, cujo best- IWas From [De Onde EuVim],narrativa de como sua
seller The Joy Luck Club [Clube da Felicidade e da família se mudou para o Oeste juntamente com a
Sorte] tornou-se filme de sucesso em 1993.Seus capí­ fronteira e se estabeleceu na Califórnia.Outro escri­
tulos interligados como contos delineiam as diferen­ tor natural de Los Angeles, Dennis Cooper (1953- ),
tes sortes de quatro pares de mães e filhas. Entre os escreve bons romances sobre um submundo de
romances de Tan que abarcam a China histórica e os homens entorpecidos e alienados.
Estados Unidos de hoje,encontram-se The Hundred Thomas Pynchon foi quem conseguiu captar
Secret Senses [Os Cem Sentidos Secretos] (1995), melhor a estranha combinação de tranquilidade
sobre meias irmãs e The Bonesetter’s Daughter [A e inquietação que reina em Los Angeles em
Filha do Restaurador de Ossos] (2001) sobre os seu romance sobre uma vasta conspiração de
cuidados de uma filha com sua mãe.A espirituosa marginais, The Crying of Lot 49 [O Leilão do Lote
Gish Jen (1955- ), cujos pais emigraram de Xangai, 49]. Pynchon inspirou o prolífico pós-modernista
surpreendeu com os romances interessantes Typical William Vollmann (1959- ), que se tornou popular
American [Americano Típico] (1991) e Mona in the entre leitores jovens da contracultura devido a suas
Promised Land [Mona na Terra Prometida] (1996). meta-narrativas extensas e surrealistas como as da
No grupo de escritores nipo-americanos está coletânea “Seven Dreams: A Book of North American
Karen Tei Yamashita (1951- ), nascida e criada na Landscapes” [Sete Sonhos: um Livro de Paisagens
Califórnia, cujos nove anos no Brasil inspiraram Norte-Americanas], iniciado com The Ice-Shirt [A
Through the Arc of the Rain Forest [Através do Arco Camisa de Gelo] (1990) sobre vikings, e fantasias
da Floresta Tropical] (1990) e Brazil-Maru (1992).  Seu como You Bright and Risen Angels: A Cartoon [Vós,
Tropic of Orange [Trópico da Laranja] (1997) evoca Anjos Brilhantes e Elevados: uma Charge] (1987)
a Los Angeles poliglota.Escritores nipo-americanos sobre uma guerra entre humanos virtuais e insetos.
de ficção criam a partir da obra anterior de Toshio Outro romancista ambicioso que vive no sul
Mori, Hisaye Yamamoto e Janice Mikitani. da Califórnia é o brilhante T. Coraghessan Boyle
A literatura do sul da Califórnia tem tradição (1948- ), conhecido por seus inúmeros romances
muito diferente associada com a cidade mais exuberantes,entre eles,World’s End [Fim do Mundo],
nova de Los Angeles,  feita por ivestidores e agentes 1987, e The Road to Wellville [Dr. Kellogg e a Guerra
imobiliários,  apesar do problema óbvio de recursos dos Sucrilhos] (1993) sobre John Harvey Kellogg,
hídricos.Los Angeles foi,desde o início,um empreen­ inventor americano do cereal para café da manhã.
dimento comercial;não surpreende que Hollywood Escritores mexicano-americanos em Los
e a Disneylândia sejam alguns dos seus mais conhe­ Angeles às vezes focalizam a tensão racial
cidos legados. Como que para contrabalançar sua moderada. Richard Rodriguez (1944- ), autor
fachada brilhante,um estilo distópico de produção de Hunger of Memory:The Education of Richard
literária floresceu no sul da Califórnia, inaugurado Rodriguez [Ânsia por Recordações: a Educação
pelo romance de Nathanael West, The Day of the de Richard Rodriguez] (1982) opina contra a
Locust [O Dia do Gafanhoto] (1939). educação bilíngue e a ação afirmativa em Days of
Solidão e alienação permeiam as criações de Obligation:An Argument With My Mexican Father

153
[Dias de Obrigação: uma Discussão (1999),um cirurgião cardiologista que
com meu Pai Mexicano] (1992). está morrendo de câncer volta à terra
Always Running [Sempre Correndo] de sua juventude para se suicidar,mas
(1993), memórias sobre a vida de descobre razões para viver.O comoven­
uma gangue de chicanos em Los te romance Housekeeping [Trabalhos
Angeles, de Luis Rodriguez (1954- ), Domésticos] (1980) de Marilynne
fala sobre o submundo obscuro da Robinson (1944- ) observa esse terri­
cidade. tório selvagem e escarpado através
A diáspora latino-americana in­ de olhos femininos.Em seu brilhante e
fluenciou Helena Maria Viramontes bastante aguardado segundo romance,
(1954- ),nascida e criada no barrio do Gilead [Ao Meu Filho] (2004),um pre­
leste de Los Angeles.  Suas obras retra­ gador idoso e íntegro,prestes a morrer,
tam essa cidade como um ímã para escreve para seu filho caçula a história
uma quantidade cada vez maior de da família que remonta à Guerra Civil.
imigrantes hispânicos, especialmente Embora tenha vivido em muitas
mexicanos e centro-americanos que regiões, Annie Dillard (1945- ) fez do
fogem da pobreza e da guerra. Em Noroeste o tema de suas obras cristali­
contos vibrantes como “The Cariboo nas,  como o fascinante ensaio poético
Café” [O Café Cariboo], 1984,  combi­ intitulado “Holy the Firm” [Benditos os
na nativos de língua inglesa,refugiados Perseverantes] (1994) inspirado pelas
de esquadrões da morte com imigran­ queimaduras sofridas por uma criança
tes clandestinos que vêm para os EUA vizinha.  Sua descrição do Noroeste do
em busca de trabalho. Pacífico evoca um cenário ao mesmo
tempo real e espiritual.“Vim para cá
O Noroeste estudar coisas palpáveis — montanhas
Nas últimas décadas, o Noroeste rochosas e mar salgado — e abran­
montanhoso com densas florestas em dar meu espírito em suas margens”.
torno de Seattle, Washington, surgiu Da mesma forma que Henry David
como centro cultural conhecido Thoreau e Ralph Waldo Emerson,
por pontos de vista liberais e um Dillard busca a sabedoria na natureza.
apaixonado apreço pela natureza. Pilgrim at Tinker Creek [Peregrino em
Seu mais influente e recente escritor Sherman Alexie Tinker Creek] (1974) é uma admirável
foi Raymond Carver. coleção de ensaios de Dillard. Seu
David Guterson (1956- ), de Seattle, único romance, The Living [Os Vivos]
conquistou muitos leitores quando (1992), exalta as primeiras famílias
seu romance Snow Falling on Cedars pioneiras atacadas por doenças, afo­
[Neve Sobre os Cedros] (1994) foi fil­ gamentos, gases venenosos, queda de
mado. Passado nas remotas e nevoen­ árvores gigantes e incêndios em casas
tas Ilhas de San Juan, em Washington, de madeira à medida que se integram
após a Segunda Guerra Mundial,conta com tribos indígenas,  imigrantes chine­
a história de um nipo-americano acu­ ses e recém-chegados do Leste.
sado de assassinato. No emocionante Sherman Alexie (1966- ), índio da
romance de Guterson East of the Foto Associated Press / reserva de Spokane, da tribo Coeur
Mountains [A Leste das Montanhas] Wide World Photos d’Alene, é o mais jovem romancista

154
indígena a alcançar fama nacional. de Barbados no Brooklyn em Brown
Alexie faz relatos humorísticos e Girl, Brownstones [Garota Parda,
pouco românticos da vida indígena, Arenito Pardo] (1959).  A romancista
abordando misturas incoerentes de da República Dominicana Jean Rhys
tradição e cultura popular.Fazem parte (1894-1979) escreveu Wide Sargasso
de seus ciclos de contos Reservation Sea [Grande Mar de Sargaço] (1966),
Blues [O Blues da Reserva] (1995) e uma recriação assombrosa e poética
The Lone Ranger and Tonto Fistfight do romance Jane Eyre de Charlotte
in Heaven [A Luta de Zorro e Tonto Brontë. Rhys viveu a maior parte da
no Céu] (1993), que inspirou o ótimo vida na Europa, mas seu livro foi de­
filme sobre a vida em reservas Smoke fendido por feministas americanas,
Signals [Sinais de Fumaça] (1998), para quem “a louca no sótão” havia
com roteiro do próprio Alexie. Smoke se tornado um ícone da individuali­
Signals é um dos poucos filmes feitos dade feminina reprimida.
por índios americanos e não sobre O trabalho de Rhys abriu ca­
eles. A coletânea recente de contos minho para a voz colérica de
de Alexie é The Toughest Indian in the Jamaica Kincaid (1949- ), de
World [O Índio Mais Forte do Mundo] Antigua, cujas inúmeras obras au­
(2000) enquanto seu pungente roman­ tobiográficas incluem os romances
ce Indian Killer [Índio Matador] (1996) Annie John (1985), Lucy (1990) e
lembra Native Son [Filho Nativo], de The Autobiography of My Mother
Richard Wright. [A Autobiografia de Minha Mãe]
(1996).Nascida no Haiti,mas criada
AUTORES INTERNACIONAIS: nos EUA, Edwidge Danticat (1969 - )
VOZES DA AMÉRICA LATINA E chamou a atenção com seu livro
DO CARIBE Krik? Krak! (1995), cujo título foi

E
scritores de língua inglesa do tirado de uma frase usada por
Caribe receberam sua forma­ contadores de histórias da tradição
ção do currículo literário bri­ oral haitiana. Danticat lembra o
tânico e segundo normas coloniais, passado trágico de seu país no ro­
mas ultimamente seu foco mudou mance histórico The Farming of the
de Londres para Nova York e Toronto.
Jamaica Kincaid Bones [A Colheita de Ossos] (1998).
Entre os temas abordados, estão a Muitos escritores latino-americanos
beleza das ilhas, a sabedoria inata discordam das opiniões comuns
de seu povo e aspectos da imigração entre escritores chicanos com
e do exílio — dissolução familiar, raízes no México que tendem a ser
choque de culturas, mudança nos românticos,nativistas e esquerdistas
papéis dos gêneros e assimilação. na política.  A produção literária dos
Duas precursoras merecem men­ cubano-americanos, ao contrário,
ção. Paule Marshall (1929– ), do tende a ser cosmopolita, cômica e
Brooklyn, não é escritora interna­ politicamente conservadora. A au­
cional sob o ponto de vista técnico, tobiografia de Gustavo Pérez Firmat,
mas relembra com nitidez suas ex­ Next Year in Cuba: A Chronicle of
periências como filha de imigrantes Foto Nacy Crampton Coming of Age in America [O Ano

155
que Vem em Cuba: uma Crônica A escritora mais conhecida com
Sobre o Amadurecimento na raízes na República Dominicana
América] (1995), exalta o beisebol é Julia Alvarez (1950- ). Em How
tanto quanto Havana. O título é the García Girls Lost Their Accents
irônico: “O Ano Que Vem em Cuba” [Como as Meninas Garcia Perderam
é uma frase dos exilados cubanos o Sotaque] (1991), dominicanas da
aferrando-se à visão de um retorno classe alta lutam para se adaptar
triunfante.  The Pérez Family [A a Nova York. ¡Yo! (1997) retoma o
Família Perez], 1990, de Christine tema das irmãs Garcia, explorando a
Bell (1951- ), traça o retrato caloroso identidade por meio de histórias de
do tumulto existente entre famílias 16 personagens. Junot Diaz (1948- )
cubanas — metade delas, pelo me­ oferece uma visão bem mais impie­
nos, de nome Perez — exiladas em dosa na coletânea de contos Drown
Miami. Entre as obras recentes do [Afogado] (1996) sobre jovens das fa­
romancista Oscar Hijuelos (1951– ) velas de Nova Jersey e da República
encontramos The Fourteen Sisters of Dominicana.
Emilio Montez O’Brien [As Catorze Importantes escritores latino-ame­
Irmãs de Emilio Montez O’Brien] ricanos que primeiro se tornaram
(1993), sobre americanos descen­ conhecidos nos EUA nos anos 1960 –
dentes de cubanos e irlandeses,e Mr. Jorge Luis Borges,da Argentina,Gabriel
Ives’ Christmas [O Natal do Sr. Ives] García Márquez, da Colômbia, Pablo
(1995), história de um homem cujo Neruda, do Chile, e Jorge Amado, do
filho morreu. Brasil – apresentaram aos autores
Os escritores com raízes em americanos o realismo mágico,  o surre­
Porto Rico incluem Nicholasa Mohr alismo,uma sensibilidade hemisférica
(1938- ), cujo Rituals of Survival: e o amor às culturas nativas. Desde
A Woman’s Portfolio [Rituais de essa primeira onda de popularidade,
Sobrevivência: o Portfólio de uma mulheres e escritores negros acharam
Mulher] (1985), apresenta a vida de seu público, entre eles, a romancista
seis porto-riquenhas,e Rosario Ferré chilena Isabel Allende (1942- ). Isabel
(1938- ), autora de The Youngest Doll Allende,sobrinha do presidente chile­
Bharati Mukherjee
[A Boneca Mais Nova] (1991). Entre no, Salvador Allende, assassinado em
os mais jovens, destaca-se Judith 1973, registrou a história sangrenta de
Ortiz Cofer (1952- ), autora de Silent seu país em La Casa De Los Espiritus,
Dancing: A Partial Remembrance of (1982), traduzido para o inglês co­
a Puerto Rican Childhood [Dança mo The House of the Spirits (1985).
em Silêncio: Lembrança Parcial de Romances posteriores (escritos e
uma Infância em Porto Rico] (1990) publicados primeiro em espanhol)
e The Latin Deli [A Delicatessen incluem Eva Luna (1987) e Daughter
Latina] (1993), que combina poesia of Fortune [Filha da Fortuna] (1999),
e contos. A poeta e ensaísta Aurora passado na corrida do ouro de 1849
Levins Morales (1954- ) escreve so­ na Califórnia. O estilo evocativo de
bre Porto Rico sob o ponto de vista Allende e visão centralizada na mulher
judeu cosmopolita. Foto © Miriam Berkley atraíram muitos leitores nos EUA.

156
Erros Desconhecidos de Nossa Vida]
AUTORES INTERNACIONAIS: (2001).
VOZES DA ÁSIA E DO ORIENTE Jhumpa Lahiri (1967- ) focaliza
MÉDIO conflitos e assimilação das gera­

M
uitos escritores do subcon­ ções mais jovens em Interpreter of
tinente indiano passaram a Maladies: Stories of Bengal, Boston,
residir nos EUA nos últimos and Beyond [Intérprete de Males:
anos. Bharati Mukherjee (1940- ) Histórias de Begala, Boston e Outros
escreveu aclamada coletânea de Lugares] (1999) e o romance The
contos, The Middleman and Other Namesake [O Homônimo] (2003).
Stories [O Intermediário e Outros Lahiri se baseia em sua experiência:
Contos] (1988);  seu romance Jasmine seus pais, de Bengala, foram criados
[Jasmim] (1989) conta a história de na Índia e ela nasceu em Londres
uma imigrante ilegal. Mukherjee foi mas foi educada nos EUA.
criada em Calcutá; seu romance The Autores americanos com raízes
Holder of the World [O Detentor do no sudeste da Ásia, especialmente
Mundo] (1993) imagina aventuras da Coreia e das Filipinas, ganha­
emocionantes na Índia do século 17 ram vozes poderosas na última
para personagens do livro The Scarlet década. Entre os escritores coreano­
Letter [A Letra Escarlate] de Nathaniel -americanos recentes, destaca-se
Hawthorne. Leave It to Me [Deixa Chang-rae Lee (1965-). Nascido em
Comigo] (1997) acompanha a luta Seul, na Coreia, o notável romance
errante de uma menina abandonada de Lee, Native Speaker [Falante de
na Índia em busca de suas raízes. O Língua Nativa](1995), entrelaça
inquietante conto “The Management ideais públicos, traição e desespero
of Grief” [O Tratamento da Dor] pessoal. Seu emocionante segundo
(1988), sobre as consequências de romance, A Gesture Life [Uma Vida
um atentado à bomba a um avião, Gestual] (1999), explora a longa
ganhou nova ressonância desde o sombra de uma atrocidade do tempo
dia 11 de setembro de 2001. da guerra – o uso de coreanas como
Meena Alexander (1951- ),natural “objeto de conforto”pelos japoneses.
da Índia e de ascendência síria, foi Chang-rae Lee Theresa Hak Kyung Cha (1951-
criada no norte da África; ela reflete 1982), nascida na Coreia, combina
sobre suas experiências na autobio­ fotos, vídeos e documentos históri­
grafia Fault Lines [Linhas Imperfeitas] cos em sua obra experimental Dictee
(1993). A poeta e contista Chitra [Ditado] (1982) para registrar o
Banerjee Divakaruni (1956- ), nasci­ sofrimento de coreanos sob as forças
da na Índia, escreveu os romances de ocupação japonesas.  A poeta ma­
sensuais centrados nas mulheres: lásio-americana Shirley Geok-lin Lim,
The Mistress of Spices [A Senhora de origem étnica chinesa,é autora de
dos Temperos] (1997), e Sister of My um livro de memórias provocador,
Heart [Irmã do Meu Coração] (1999), Among the White Moon Faces [Entre
além de coletâneas de contos,como Foto © Marion Ettlinger / as Faces Brancas da Lua] (1996).Seu
The Unknown Errors of Our Lives [Os CORBIS OUTLINE romance autobiográfico é Joss and

157
Gold [Joss e Ouro] (2001) e seus contos foram no Líbano, situa suas narrativas de Through and
recompilados em Two Dreams [Dois Sonhos] Through [Completamente] (1990) em Toledo,
(1997). Ohio; a jordaniano-americana Diana Abu-Jaber
Entre os escritores nascidos nas Filipinas, po­ (1959- ), nascida em Nova York, escreveu o ro­
demos citar Bienvenido Santos (1911-1996),autor mance Arabian Jazz [Jazz Árabe] (1993).
do romance poético Scent of Apples [Aroma de A poetisa e dramaturga Elmaz Abinader
Maçãs] (1979), e Jessica Hagedorn (1949- ), cujos (1954-) é autora de uma autobiografia, Children
romances surrealistas de cultura popular são of the Roojme: A Family’s Journey From Lebanon
Dogeaters [Comedores de Cães] (1990) e The [Crianças de Roojme: a Viagem de uma Família
Gangster of Love [O Bandido do Amor] (1996).De do Líbano] (1991). Em “Just Off Main Street”
modos diferentes,respondem ao mordaz romance [Apenas Fora da Rua Principal] (2002),  Abinader
autobiográfico do trabalhador imigrante filipino­ escreveu sobre sua infância bicultural numa
-americano Carlos Bulosan (1913-1956) America cidadezinha da Pensilvânia na década de 1960:
Is in the Heart [A América Está no Coração], 1946. “...as cenas familiares enchiam-me de alegria e
A extraordinária cineasta vietnamita-america­ sensação de estar no lugar apropriado, mas eu
na e teórica social Trinh Minh-Ha (1952-) combina sabia que nada daquilo poderia ser compartilha­
narrativas e teoria em sua obra feminista Woman, do do lado de fora da porta”.
Native, Other [Mulher, Nativa, Outra] (1989). Da A literatura americana percorreu um caminho
China,Ha Jin (1956- ) escreveu o romance Waiting longo e tortuoso desde os dias pré-coloniais até
[À Espera] (1999), triste narrativa sobre a separa­ os tempos contemporâneos. Sociedade, história,
ção de 18 anos,cujo estilo realista,típico da ficção tecnologia, tudo isso teve impacto eloquente
chinesa,chega aos ouvidos americanos como algo sobre ela. Em última análise, no entanto, existe
novo e original. uma constante — humanidade, com todo o seu
As vozes mais recentes vêm da comunidade brilho e sua malevolência, sua tradição e sua
árabe-americana. Joseph Geha (1944- ), nascido promessa.

158
GLOSSÁRIO
Abolicionismo: Movimento destinado a acabar com a Épico-cômico (Mock-epic): Paródia que adota a forma
escravidão no norte dos Estados Unidos, muito atuante do épico (também conhecido como heróico-cômico).
antes da Guerra Civil da década de 1860.
Era McCarthy: Período da Guerra Fria (final da década
Alusão: Referência implícita ou indireta a um outro de 1940 e princípios da década de 1950) durante o
texto, contida num texto literário. qual o Senador americano Joseph McCarthy processou
cidadãos americanos que ele e seus seguidores suspei­
tavam de serem membros, ou ex-membros, ou simpati­
Beatnik: Rebelião artística e literária contra a so­
zantes do Partido Comunista. Seus esforços incluíram a
ciedade estabelecida, nas décadas de 1950 e 1960, e
criação de “listas negras”, em várias profissões — listas
muito ligada a Jack Kerouac, Allen Ginsberg e outros.
de pessoas que eram proibidas de trabalhar naqueles
“Beat” sugere santidade (“beatificação”) e sofrimento
empregos. McCarthy acabou sendo denunciado pelos
(“abatido”).
seus colegas do Senado.

Brâmanes de Boston [Brahmins]: Escritores influen­


Existencialismo: Movimento filosófico segundo o
tes e respeitados do século 19, provenientes da Nova
qual o indivíduo sofredor tem de criar sentido num
Inglaterra, e que mantinham a“tradição cavalheiresca”
universo incognoscível,caótico e aparentemente vazio.
dos valores da elite.

Expressionismo: Movimento artístico surgido após


Calvinismo: Doutrina teológica rigorosa do reforma­
a Primeira Guerra Mundial, de origem alemã, que
dor protestante francês João Calvino (1509-1564), e
distorcia as aparências para comunicar estados emo­
base da sociedade puritana. Calvino mantinha que
cionais interiores.
todos os seres humanos nasciam pecadores e que só
a graça de Deus (e não a igreja) poderia salvar uma
pessoa do inferno. Fabulista: Criador ou escritor de fábulas (narrativas
curtas com uma moral, tipicamente apresentando
animais como personagens) ou contos sobrenaturais
Cânone: Um corpo de obras literárias aceito ou
incorporando elementos de mitos e lendas.
sancionado considerado como permanentemente
estabelecido e de alta qualidade.
Faulkneriano: Num estilo reminiscente de William
Faulkner (1897-1962), um dos maiores romancistas
Canto visionário: Canto poético criado por membros
do século 20 nos EUA, que escreveu sobre o declínio
de algumas tribos de americanos nativos para as ce­
e decadência do Sul aristocrático. Diferentemente de
rimônias em que se purificavam por meio de jejum e
regionalistas anteriores que escrevia sobre a cor local,
meditação solitários.
Faulkner criou obras literárias complexas na forma e
muitas vezes violentas e trágicas no conteúdo.
Chekhoviano: Estilo similar às obras do autor russo
Anton Pavlovitch Chekhov. Chekhov (1860-1904), um
Fausto: Personagem literário que vende sua alma ao
dos maiores contistas e dramaturgos da era moderna,
diabo para tornar-se onisciente, ou semelhante a um
é conhecido tanto por suas peças humorísticas de um
deus; protagonista de peças do dramaturgo Christopher
ato como por suas longas tragédias.
Marlowe (1564-1593), da renascença inglesa, e de
Johan Wolfgang von Goethe (1749-1832), escritor
Conceit: Metáfora ampliada. Expressão usada para romântico alemão.
descrever a poesia metafísica da renascença, na
Inglaterra, e da época colonial americana, como a de
Anne Bradstreet.

159
GLOSSÁRIO
Feminismo: O ponto de vista, articulado no século 19, Iâmbico: Pé de verso consistindo de uma sílaba curta
de que as mulheres são inerentemente iguais aos ho­ seguida de uma longa, ou de uma sílaba átona seguida
mens e merecem os mesmos direitos e oportunidades. de uma tônica.
Mais recentemente,movimento social e político que se
espalhou pelos Estados Unidos no final da década de Iluminismo: Movimento do século 18 centrado nos
1960 e depois se espalhou pelo mundo afora. ideais do bom senso e da benevolência, bem como
na crença de que liberdade, justiça e igualdade cons­
Fugitivos: Poetas que colaboraram em The Fugitive, tituem direitos inalienáveis do homem.
revista publicada entre 1922 e 1928 em Nashville,
Tennessee. Os colaboradores, inclusive alguns eruditos Imagem: Representação concreta de um objeto ou
como John Crowe Ransom,Robert Penn Warren e Allen de algo que é visto.
Tate,rejeitaram os valores urbano,comerciais do“norte”,
que achavam que havia dominado os Estados Unidos,e
clamavam por um retorno à terra e às tradições ameri­ Imagistas: Grupo de poetas,sobretudo americanos,em
canas que podiam ser encontradas no Sul. que se incluíam Ezra Pound e Amy Lowell, que usavam
imagens visuais e linguagem coloquial penetrantes.
Atuantes de 1912 a 1914.
Gênero: Uma das categorias de forma literária (ro­
mance, poema lírico, épico, por exemplo)
Ironia: Sentido (frequentemente contraditório)
encoberto por trás do significado aparente de uma
Guerra Civil: A guerra (1861-1865) entre os estados palavra ou frase.
do Norte dos Estados Unidos , que permaneceram na
União,e os estados do Sul,que se separaram e formaram
a Confederação. A vitória do norte levou ao fim da Julgamento de bruxas em Salem: Julgamento de
escravidão e preservou a União. pessoas acusadas de bruxaria, ocorrido em 1692, na
cidade de Salem,em Massachusetts. Dezenove pessoas
foram enforcadas e muitas outras foram constrangidas
Guerra Revolucionária: A Guerra da Independência, a confessar atos de bruxaria ou a acusar outras de
de 1775 a 1783, entre as colônias americanas e a praticar a bruxaria.
Grã-Bretanha.

Kafkaniano: Reminiscente do estilo do romancista e


Hartford Wits: Circulo literário patriótico, mas conser­ contista tcheco Franz Kafka (1883-1924). As obras de
vador, do final do século 18, centrado na Universidade Kafka retratam a opressão da vida moderna e seus per­
de Yale, no Estado de Connecticut (também conhecido sonagens frequentemente se encontram em situações
como Connecticut Wits). de perigo para as quais não há explicação e das quais
não há escapatória.
História exagerada (tall tale): História popular,
contada na região de fronteira dos Estados Unidos,
geralmente exagerada e humorística, e envolvendo Knickerbocker School: Escritores do início do século
casos de força sobre-humana. 19, centrados na cidade de Nova York, que imitavam as
modas literárias inglesas e europeias.

Hudibras: Sátira heróico-cômica do escritor inglês


Samuel Butler (1612-1680). Hudibras foi imitado pelos Literatura de Criação de Personagem: Gênero lite­
satiristas do início da era revolucionária. rário popular, nos séculos 17 e 18, em que se esboçava
o perfil de uma personagem que representava um
grupo ou um tipo.

160
GLOSSÁRIO
Literatura Global: Textos contemporâneos de muitas Muckrakers: Jornalistas e romancistas americanos
culturas do mundo. Seleções incluem literatura atribu­ (1900-1912) cujos textos sobre corrupção nas empre­
ída a vários grupos religiosos, ideológicos e étnicos sas e no governo desencadearam um processo de
dentro e além de fronteiras geográficas. reforma social.

Literatura regional: A literatura que explora os costu­ Multicultural - Intercâmbio criativo de várias subcul­
mes e a paisagem de uma região dos Estados Unidos. turas étnicas e raciais.

Livro de autoajuda: Livro que diz aos leitores como Mito - Narrativa lendária, geralmente sobre deuses
melhorar sua vida,com base em seus próprios esforços. e heróis, ou um tema que expressa a ideologia de
Gênero popular na América, desde meados do século uma cultura.
19 até os dias de hoje.
Narrativa de cativeiro - Relato do cativeiro nas mãos
Maratona poética (Poetry Slam): Competição de de tribos americanas nativas, como o dos escritores
poesia oral. Mary Rowlandson e John Williams, na época colonial.

Metaficção: Ficção que enfatiza a natureza da ficção, Narrativa escrava - Primeiro gênero literário de prosa
as técnicas e convenções usadas para escrevê-la e o escrita por negros nos Estados Unidos. Relata a vida
papel do autor. dos afro-americanos no tempo da escravidão.

“Middle Colonies” (Colônias do Meio): Estados do Naturalismo - Enfoque literário surgido na França,
litoral leste ou atlântico dos Estados Unidos de hoje. no final do século 19 e princípio do século 20, que
Na era colonial, correspondia a Nova York, Nova Jersey, retratava com grande intensidade os problemas sociais,
Pensilvânia e, às vezes, Delaware — conhecidos por e encarava os seres humanos como vítimas impotentes
suas atividades comerciais centradas na cidades de diante de forças sociais econômicas mais poderosas.
Nova York e Filadélfia.
Neoclassicismo - Movimento artístico do século
Meio Oeste: A área central dos Estados Unidos, desde 18, associado ao Iluminismo, que se baseava em
o Rio Ohio até as Montanhas Rochosas, incluindo as modelos clássicos e enfatizava a razão, a harmonia
Pradarias e a região das Grandes Planícies (também e a moderação.
conhecida como o Meio-Oeste).
Neojornalismo: Um estilo literário popularizado nos
Minimalismo: Estilo literário exemplificado nas obras Estados Unidos nos anos 1960 por Tom Wolfe, Truman
de Raymond Carver, caracterizada por frugalidade e Capote e Norman Mailer, que usavam as técnicas de
simplicidade. contar histórias e a caracterização de escritores de
ficção ao criar obras não-ficcionais.
Modernismo: Movimento cultural internacional que
se seguiu à Primeira Guerra Mundial e que expressava Nova Inglaterra: Região dos Estados Unidos com­
a desilusão com a tradição e o interesse pelas novas preendendo os atuais Estados de Maine,Vermont, New
visões e tecnologias. Hampshire,Massachusetts,Rhode Island e Connecticut
conhecida por sua precoce industrialização e vida inte­
lectual.Tradicionalmente,terra do astuto,independente
Motivo (Motif): Elemento recorrente, como uma ima­
e parcimonioso comerciante “Yankee”.
gem, um tema ou um tipo de incidente.

161
GLOSSÁRIO
Objetivista: Movimento poético de meados do século Pós-Modernismo: sensibilidade estética influenciada
20,associado com William Carlos Williams,que enfatiza pelos meios de comunicação, no final do século 20,
as imagens e a fala coloquial. e caracterizada pela abertura e pela ‘colagem’. O
movimento questiona os fundamentos das formas
culturais e artísticas, servindo-se, para tanto, da ironia
Oficina de Escritores de Iowa (Iowa Writers’Workshop):
autorreferencial e da justaposição de elementos da
Um programa de graduação em redação criativa na
cultura popular e da tecnologia eletrônica.
Universidade de Iowa em que escritores talentosos,
e geralmente jovens, trabalham com manuscritos e
trocam ideias sobre redação entre si e com poetas e Pradarias: A região agrícola plana, sem florestas, do
escritores estabelecidos. Meio-Oeste americano.

Old Norse: A velha língua norueguesa das sagas, Primitivismo: Crença de que a natureza oferece
praticamente idêntica ao moderno islandês. modelos mais verdadeiros e mais saudáveis que a
cultura.Tem como exemplo o mito do“bom selvagem”.
Poesia cowboy: Verso baseado na tradição oral e
geralmente rimado ou métrico que celebra as tradições Puritanos: Reformadores religiosos e políticos ingle­
da cultura de gado do Oeste dos EUA. Seus temas ses que fugiram de seu país em busca de liberdade
incluem a natureza, história, folclore, família, amizade religiosa e que assentaram e colonizaram a Nova
e trabalho. A poesia cowboy tem sua origem no estilo Inglaterra do século 17.
das baladas da Inglaterra e do Sul apalache.
Reforma: Movimento político e religioso da Europa do
Poesia hip-hop: Poesia que é escrita numa página,mas Norte, entre os séculos 15 e 17, que tentou reformar o
apresentada a uma plateia. A poesia hip-hop, com suas catolicismo e acabou dando origem ao protestantismo.
raízes na tradição retórica afro-americana, enfatiza o
ritmo, a improvisação, a livre-associação, rimas e o uso Reflexivo: autorreferencial. Uma obra literária é
de linguagem híbrida. reflexiva quando refere-se a si mesma.

Poesia da linguagem: Poesia que estica a linguagem Região das Planícies: A região central dos Estados
para revelar seu potencial para a ambiguidade, frag­ Unidos, que desce das Montanhas Rochosas em dire­
mentação e autoafirmação dentro do caos. Os poetas ção ao leste, até chegar às Pradarias.
da linguagem favorecem as formas abertas e textos
multiculturais; se apropriam de imagens da cultura
popular e da mídia e as remodelam. Romance: Romances americanos simbólicos,dotados
de alta intensidade emocional, associados ao período
romântico.
Poesia metafísica: Tipo intricado de poesia inglesa
do século 17 que empregava agudeza e imagens
inesperadas. Romance doméstico: Um romance sobre a vida
doméstica e familiar que em geral dá ênfase às per­
sonalidades e atributos de seus personagens sobre
Poeta laureado: Indivíduo indicado como consul­ o enredo. Muitos romances domésticos do século
tor em poesia na Biblioteca do Congresso dos EUA 19 e do início do século 20 empregaram certo grau
geralmente por um mandato de um ano. Durante seu de sentimentalismo — geralmente uma mistura de
mandato, busca aumentar a conscientização nacional compaixão e humor.
para uma maior apreciação da poesia.

162
GLOSSÁRIO
Romantismo: Reação contra o neoclassicismo. Este Tema: Ideia abstrata incorporada numa obra literária.
movimento,do início do século 19,exaltava o indivíduo,
as paixões e a vida interior. Enfatizava as emoções for­ Tory: Facção de homens ricos e favoráveis aos ingleses,
tes, a imaginação e a liberdade em relação à correção na América do tempo da Guerra Revolucionária, no
clássica, nas formas artísticas, bem como a rebelião final do século 18.
contra as convenções sociais.

Tradição oral: Transmissão de boca em boca,tradição


Saga: Uma antiga narrativa escandinava que fala de que é passada de uma geração para outra; tradição
eventos históricos ou míticos. verbal folclórica.

Separatistas: Seita puritana muito rígida que, nos sé­ Transcendentalismo: Movimento filosófico de largo
culos 16 e 17, preferiu separar-se da Igreja da Inglaterra alcance,na Nova Inglaterra do período romântico (com
a tentar reformá-la. Muitos dos primeiros colonos da seu ápice entre 1835 e 1845). Enfatizava o papel da
América eram separatistas. divindade na natureza,bem como a intuição individual,
e sobrepunha os sentimentos à razão.
Síntese: Mistura de dois sentidos, técnica usada por
Edgar Allan Poe e outros para sugerir correspondências Trapaceiro (trixter): Personagem esperto das narrati­
ocultas e criar efeitos exóticos. vas tribais folclóricas (sobretudo dos afro-americanos e
dos americanos nativos), que rompe os códigos cultu­
Sul: Região dos Estados Unidos que inclui os estados rais de comportamento; em geral,é um herói da cultura.
de Maryland, Virginia, Carolina do Norte, Carolina do
Sul, Georgia, Kentucky, Tennessee, Louisiana, Mississipi, Versificação silábica: Métrica poética baseada no
Alabama, Missouri, Arkansas, Florida, West Virginia e o número de sílabas de uma linha (um verso).
leste do Texas.

Surrealismo: Movimento artístico e literário europeu


que usa imagens e eventos ilógicos, semelhantes a
sonhos, para tentar transmitir o inconsciente.

163
ÍNDICE
Abbey, Edward 152 Ammons, A.R. 82, 132
Abinader, Elmaz, 158 Among the White Moon Faces (Shirley Geok-lin Lim) 158
“Above Pate Valley” (Gary Snider) 88 Anaya, Rudolfo 93,  119
“Abraham Lincoln Walks at Midnight” (Vachel Lindsay) 59 Ancient Evenings (Norman Mailer) 112
Absalom, Absalom! (William Faulkner) 74 Anderson, Laurie 97
Abu-Jaber, Diana 158 Anderson, Sherwood 58, 73,  77
Accidental Tourist,The (Anne Tyler) 145 Andrews, Bruce 97
Acker, Kathy 144 Angela’s Ashes (Frank McCourt) 140
Actual,The (Saul Bellow) 106 Angelou, Maya 93,  95,  118
Adams, Abgail 27 Angels in America: Part One: Millennium Approaches
Adams, Henry 55 (Tony Kushner) 141
Address to the Negroes of the State of New York, An Angels in America: Part Two: Perestroika ( Tony Kushner) 141
(Jupiter Hammon) 15 Angle of Repose (Wallace Stegner) 150
Adventures of Augie March,The (Saul Bellow) 105 Animal Dreams (Barbara Kingsolver) 152
Adventures of Huckleberry Finn (Mark Twain) 42,  50 Annie John (Jamaica Kincaid) 156
Affliction (Russell Banks) 143 Another Country (James Baldwin) 104
Affluent Society,The (John Kenneth Galbraith) 103 Another You (Ann Beattie) 146
Afterlife and Other Stories,The (John Updike) 141 Antin, David 97
Age of Innocence,The (Edith Wharton) 55 Antrim, Donald 143
Aiiieeeee! (Frank Chin, ed.) 96 Anywhere But Here (Mona Simpson) 149
Albee, Edward 119, 121 Anzaldúa, Gloria 152
Alcott, Bronson 29,  30 “Appalachian Book of the Dead” (Charles Wright) 127
Alcott, Louisa May 29 Appeal in Favor of that Class of Americans Called Africans, An
Alexander, Meena 157 (Lydia Child) 45
Alexie, Sherman 154, 155 “Applicant, The” (Sylvia Plath) 85
Ali, Agha Shahid 129 Appointment in Samarra (John O’Hara) 104
Allen , Donald 88, 90 Arabian Jazz (Daina Abu-Jaber) 158
Allende, Isabel 157 Ariel (Sylvia Plath) 85
Allison, Dorothy 147 Armantrout, Rae 124
All My Sons (Arthur Miller) 100 Armies of the Night,The (Norman Mailer) 109, 111
All the King’s Men (Robert Penn Warren) 100 Arrowsmith (Sinclair Lewis) 74,  75
All the Pretty Horses (Cormac McCarthy) 147 Arthur Mervyn (Charles Brockden Brown) 24
All the Sad Young Men (F. Scott Fitzgerald) 72 Ashbery, John 82, 90, 124
Alurista 93 Ash-Wednesday (T.S. Eliot) 66
Alvarez, Julia 156 As I Lay Dying (William Faulkner) 74
Always Running (Luis Rodriguez) 154 Assistant,The (Bernard Malamud) 106
Amateur Marriage,The (Anne Tyler) 145 Atlantis (Mark Doty) 130
Amazing Advantures of Kavalier and Clay,The (Michael Chabon) 146 “At Melville’s Tomb” (Hart Crane) 70
Ambassadors,The (Henry James) 54 “At the Fishhouses” (Elizabeth Bishop) 87
America is in the Heart (Carlos Bulosan) 158 “At the Gym” (Mark Doty 130
American,The (Henry James) 54 Atwood, Margaret 126
Americana (Don DeLillo) 144 Auster, Paul 140, 144
American Buffalo (David Mamet) 121 Autobiography (Benjamin Franklin) 18,  20
American Daughter, An (Wendy Wasserstein) 142 Autobiography of an Ex-Colored Man (James Weldon Johnson) 61
American Dream,The (Edward Albee) 120 Autobiography of Miss Jane Pittman,The (Ernest Gaines) 114
American Geography (Jedidiah Morse) 23 Autobiography of My Mother,The (Jamaica Kincaid) 156
“American Liberty” (Philip Freneau) 23 Autocrat of the Breakfast-Table,The (Oliver Wendell Holmes) 35
American Pastoral (Philip Roth) 113 Awake and Sing! (Cllifford Odets) 80
American Poetry in the Twentieth Century (Kenneth Rexroth) 89 Awakening,The (Kate Chopin) 52, 53
American Primitive (Mary Oliver) 133 Awful Rowing Toward God,The (Anne Sexton) 85
American Tragedy, An (Theodore Dreiser) 49, 56-57, 59, 80 Ayumi: A Japanese American Anthology (Janice Mirikitani, ed.) 96
The America Play (Suzan-Lori Parks) 142

165
ÍNDICE
Babbitt (Sinclair Lewis) 62, 74,  75 Blue Notes (Yusef Komunyakaa) 136
Baca, Jimmy Santiago 127 Blue Pastures (Mary Oliver) 133
Baldwin, James 48,  104 Bluest Eye,The (Toni Morrison) 117
Baldwin, Joseph 51 Bly, Robert 91, 131
Bambara, Toni Cade 118 Bone Black (bell hooks) 148
Banks, Russell 143 Bonesetter’s Daughter,The (Amy Tan) 153
Baraka, Amiri (LeRoi Jones) 93, 95, 120 Bonfire of the Vanities,The (Tom Wolfe) 110
Barren Ground (Ellen Glasgow) 60 Book of Daniel,The (E.L. Doctorow) 115
Barth, John 107,  110-111, 115, 140 Borderlands/La Frontera: The New Mestiza
Barthelme, Donald 110, 140 (Gloria Anzaldúa) 152
Basic Training of Pavlo Hummel,The (David Rabe) 122 Bostonians,The (Henry James) 54
Bass, Rick 150 Boston Marriage (David Mamet) 122
Bastard Out of Carolina (Dorothy Allison) 147 Boyle, T.Coraghessan 154
Baumgardner, Jennifer 139 Brackenridge, Hugh Henry 22
Bausch, Richard 145 Bradford,William 8-9,  11
Beach Music (Pat Conroy) 147 Bradley, David 145
Bean Trees, The (Barbara Kingsolver) 152 Bradstreet, Anne 9,  27, 35, 159
Bear,The (William Faulkner) 50 “Brahma” (Ralph Waldo Emerson) 30
Beattie, Ann 140, 146 Brautigan, Richard 110
Beautiful and the Damned,The (F. Scott Fitzgerald ) 72 Brazil-Maru (Karen Tei Yamashita) 153
Bech: A Book (John Updike) 108 Breakfast at Tiffany’s (Truman Capote) 109
Bech at Bay (John Updike) 108 Brent, Linda (see Jacobs, Harriet)
Bech Is Back (John Updike) 108 “Bride Comes to Yellow Sky, The” (Stephen Crane) 56
Bell, Christine 156 Bride of the Innisfallen,The (Eudora Welty) 102
Bellefleur (Joyce Carol Oates) 116 Bridge,The (Hart Crane) 70
Bell Jar,The (Sylvia Plath) 85 Bridge of San Luis Rey,The (Thornton Wilder) 80
Bellow, Saul 103,  105, 111, 118 Bridget Jones’s Diary (Helen Fielding) 139
Beloved (Toni Morrison) 117 Brief and True Report of the New-Found Land of Virginia, A
Beneath a Single Moon 97 (Thomas Hariot) 7
Berriault, Gina 153 Brigadier and the Golf Widow,The (John Cheever) 108
Berryman, John 84,  85 Bright Lights, Big City (Jay McInerny) 114
Beverley, Robert 15 “British Prison Ship, The” (Philip Freneau) 22
Bidart, Frank 134 “Broken Heart, The” (James Merril) 82
Biglow Papers, First Series (James Russel Lowell) 35 Brooks, Gwendolyn 83
Big Money,The (John Dos Passos) 75 Broom of the System,The (David Foster Wallace) 143
Billy Bathgate (E.L. Doctorow) 115 “Brothers and Keepers” (John Edgar Wideman) 145
Bishop, Elizabeth 70, 84,  87, 124, 135 Brown, Charles Brockden 17  23,  24
Black Boy (Richard Wright) 77 Brown, Dan 138
Blackburn, Paul 88 Brown, James Willie, Jr. (see Komunyakaa,Yusef)
“Black Cat, The ” (Edgar Allan Poe) 44 Brown Girl, Brownstones (Paule Marshall) 155
Black Looks (bell hooks) 148 Brownson, Orestes 29
“Black Snake, The” (Mary Oliver) 133 Bryant,William Cullen 23
Black Tickets (Jaye Anne Phillips) 146 Buckley, Christopher 146
Bless Me, Ultima (Rudolfo Anaya) 119 Bullet Park (John Cheever) 108
Blithedale Romance,The (Nathaniel Hawthorne) 29,  40 Bulosan, Carlos 158
Blonde (Joyce Carol Oates) 117 Buried Child (Sam Sheppard) 121
Blood Meridian (Cormac McCarthy) 147 Burroughs,William 81, 109
Bloodsmoor Romance, A (Joyce Carol Oates) 116 Bushnell, Candace 139
Bloom, Alan 106 Bushwacked Piano,The (Thomas McGuane) 150
Bloody Tenent of Persecution for Cause of Conscience,The Butler, Octavia 148
(Roger Williams) 13 Butler, Robert Olen 149
“Blue Hotel, The” (Stephen Crane) 56 Byrd,William 14

166
ÍNDICE
Cable, George Washington 52 “Clan Meeting: Births and Nations: A Blood Song”
Caine Mutiny (Herman Wouk) 99 (Michael Harper) 95
Call of the Wild,The (Jack London) 56 Clemens, Samuel (see Twain, Mark)
“Camouflaging the Chimera” (Yusef Komunyakaa) 136 Clifton, Lucille 129
Campbell, Bebe Moore 145 Closing of the American Mind,The (Alan Bloom) 106
Cane (Jean Toomer) 77 Cloudsplitter (Russell Banks) 143
Cannery Row (John Steinbeck) 76 Cofer, Judith Ortiz 156
Cantos,The (Ezra Pound) 65 Cold Mountain (Charles Frazier) 147
Capote, Truman 109, 114, 138 Cole, Henry 130
“Cariboo Café, The” (Helena Maria Viramontes) 154 Collected Stories (Ellen Gilchrist) 147
Carolina Moon (Jill McCorkle) 147 Collected Stories (Grace Paley) 144
Carpenter’s Gothic (William Gaddis) 110 Collected Stories (Katherine Anne Porter) 102
Carver, Raymond 140, 141, 150, 154 Collins, Billy 134
Casas, Bartolomé de las 6 Color Purple,The (Alice Walker) 114, 118
“Cask of Amontillado, The” (Edgar Allan Poe) 43 Comanche Moon (Larry McMurtry) 151
Cass Timberlane (Sinclair Lewis) 75 Come Back, Dr. Caligari (Donald Barthelme) 110
Catcher in the Rye,The (J.D. Salinger) 103  108 Common Sense (Thomas Paine) 21
Catch-22 (Joseph Heller) 99 Complete Stories,The (Flannery O’Connor) 105
Cathedral (Raymond Carver) 140 “Concord Hymn” (Ralph Waldo Emerson) 29
Cather,Willa 59 Coney Island of the Mind, A (Lawrence Ferlinghetti) 89
Cattle Killing,The (John Edgar Wideman) 145 Confessions of Nat Turner,The (William Styron) 115
Centaur,The (John Updike) 108 “Congo, The” (Vachel Lindsay) 59
Ceremony (Leslie Marmon Silko) 119, 152 Conjure Woman,The (Charles Waddell) 61
Cervantes, Lorna Dee 93,  94, 129, 153 Conquest of Canaan,The (Timothy Dwight) 22
Cha, Theresa Hak Kyung 158 Conroy, Pat 147
Chabon, Michael 146 Contrast,The (Royal Tyler) 22
“Chambered Nautilus, The” (Oliver Wendell Holmes) 35 Cooper, Dennis 153
Chancers (Gerald Vizenor) 149 Cooper, James Fenimore 16,  17,  23, 25,  38, 50
Chandler, Raymond 44 Coover, Robert 110, 115, 140
Chaneysville Incident,The (David Bradley) 145 Coquette,The (Hanna Foster) 27
Channing,William Ellery 29 Corners (David Rabe) 122
Charlotte Temple (Susanna Rowson) 27 Corrections,The (Jonathan Franzen) 149
Charming Billy (Alice McDermott) 145 Corso, Gregory 89
Chavez, Denise 152 Cotton, Ann 27
Cheever, John 103, 107, 144 Counterlife,The (Philip Roth) 113
Chesnutt, Charles Waddell 61 Country Music (Charles Wright) 127
“Chicago” (Carl Sandburg) 58 Country of the Pointed Firs (Sarah Orne Jewett) 52
Chickamauga (Charles Wright) 128 Couples (John Updike) 108
Child, Lydia 45, 47 “Courtship of Miles Standish, The”
“Children of Light” (Robert Lowell) 83 (Henry Wadsworth Longfellow) 35
Children of the Roojme (Elmaz Abinader) 158 Cowboys (Sam Shepard) 120
Children’s Hour,The (Lillian Hellman) 101 Crane, Hart 31,  70
Chimera (John Barth) 111 Crane, Stephen 49, 55, 56,  74
Chin, Frank 96 Creeley, Robert 88
Chopin, Kate 52 Crèvecoeur, Hector St. John de 20
Christ the Lord: Out of Egypt (Anne Rice) 138 Crimes of the Heart (Beth Henley) 142
“Chronic Meanings” (Bob Perelman) 97 Crossing,The (Cormac McCarthy) 147
Cisneros, Sandra 119, 151 “Crossing Brooklyn Ferry” (Walt Whitman) 33
Cities of the Plain (Cormac McCarthy) 149 Crossing Guard,The (David Rabe) 122
City in Which I Love You,The (Li-Young Lee) 129 Crucible,The (Arthur Miller) 100
City of Glass (Paul Auster) 144 Crying of Lot 49,The (Thomas Pynchon) 110, 111, 153
City of God (E.L. Doctorow) 115 Cryptogram,The (David Mamet) 122
Civil Disobedience (Henry David Thoreau) 13, 32 Cullen, Countee 71,  76
Clampitt, Amy 91 Cummings, Edward Estlin (e.e. cummings) 70

167
ÍNDICE
Cunningham, Michael 149 “Disillusionment of Ten O’Clock” (Wallace Stevens) 68
Curse of the Starving Class (Sam Shepard) 121 “Displaced Person, The” (Flannery O’Connor) 105
Curtain of Green, A (Eudora Welty) 102 Divakaruni, Chitra Banerjee 157
Custom of the Country,The (Edith Wharton) 55 “Diving Into the Wreck” (Adrienne Rich) 87
Doctorow, E.L. 99, 114-115
Dacey, Philip 98 Dogeaters (Jessica Hagedorn) 158
“Daddy” (Sylvia Plath) 85 Doolittle, Hilda (H.D.) 65,  68
Daisy Miller (Henry James) 54 Dorn, Ed 88
Damballah (John Edgar Wideman) 145 Dos Passos, John 62, 74, 75, 115
Dancing After Hours (Andre Dubus) 141 Doty, Mark 130-131
Dangling Man (Saul Bellow) 105 Douglas, Susan 139
Danticat, Edwidge 156 Douglass, Frederick 47,  48, 61
Darkness Visible (William Styron) 116 Dove, Rita 91, 93, 95, 126, 134
Daughter of Fortune (Isabel Allende) 157 Dreamer (Charles Johnson) 149
DaVinci Code,The (Dan Brown) 138 Dream of the Unified Field, The (Jorie Graham) 125
Day of Doom,The (Michael Wogglesworth) 10 Dream Songs (John Berryman) 86
Day of the Locust,The (Nathanael West) 153 Dreiser, Theodore 49, 55,  56-57,  74,  77, 105, 148
Days of Obligation (Richard Rodriguez) 154 Drinking Coffee Elsewhere (ZZ Packer) 148
“Deacon’s Masterpiece, or,The Wonderful One-Hoss Shay” Drown (Junot Diaz) 157
(Oliver Wendell Holmes) 35 Du Bois,W.E.B. 60, 61, 76
“Dead,The” (Billy Collins) 134 Dubus, Andre 141
Dean’s December,The (Saul Bellow) 106 Dunbar, Paul Lawrence 60
Death Comes for the Archbishop (Willa Cather) 60 Duncan, Robert 88
Death of a Salesman (Arthur Miller) 100,  103, 122 Dunn, Stephen 129
Death of Jim Loney,The (James Welch) 119 Dust Tracks on a Road (Zora Neale Hurston) 78
“Death of the Ball Turret Gunner, The” (Randall Jarrell) 82 Dutchman (Amiri Baraka) 120
Debutante Ball,The (Beth Henley) 142 Dwight, Timothy 21
Declaration of Sentiments (Elizabeth Cady Stanton) 45 Dybek, Stuart 149
Delicate Balance, A (Edward Albee) 120
DeLillo, Don 139, 144, 149 East of Eden The (John Steinbeck) 76
Deliverance (James Dickey) 87 East of the Mountain (David Guterson) 154
Delta Wedding (Eudora Welty) 102 Eberhart, Richard 82
“Democratic Vistas” (Walt Whitman) 33 Echoes Down the Corridor (Arthur Miller) 101
Desert Solitaire (Edward Abbey) 152 Edgar Huntley (Charles Brockden Brown) 24
Des Imagistes (Ezra Pound) 65 Edwards, Jonathan 13-14
Desire Under the Elms (Eugene O’Neill) 79 Eigner, Larry 88
Dessa Rose (Sherley Anne Williams) 148 Elbow Room (James Alan McPherson) 148
Devil’s Dream,The (Lee Smith) 146 Electric Kool-Aid Acid Test,The (Ken Kesey) 110
Dharma Bums,The (Jack Kerouac) 109 Eliot, T.S. 63, 65-66, 67,  69,  79, 82,  91
Diamant, Anita 143 Ellis, Bret Easton 115
Diamond, Jared 138 Ellis, Trey 145
Diary (Samuel Sewall) 11 Ellison, Ralph 48,  103, 104, 105
Diaz, Junot 156 Elmer Gantry (Sinclair Lewis) 75
Dickey, James 84,  86, 87 Elsie Venner (Oliver Wendell Holmes) 33
Dickinson, Emily 16,  31,  36,  38,  87, 124 Emerson, Ralph Waldo 5, 16, 20, 28, 29, 30, 31,32, 33, 34, 39,
Dictee (Theresa Hak Kyung Cha) 158 41, 133, 155
Dictionary (Noah Webster) 23 “Emperor of Ice-Cream, The” (Wallace Stevens) 68
Didion, Joan 153 Empire Falls (Richard Russo) 143
Different Mirror, A (Ronald Takaki) 118 Empire of the Senseless (Kathy Acker) 144
Dillard, Annie 140, 154 Endless Life (Lawrence Ferlinghetti) 89
Dinner at the Homesick Restaurant (Anne Tyler) 145 End of the Road,The (John Barth) 111
diPrima, Diane 88 Enemies, A Love Story (Isaac Bashevis Singer) 1075
Direction of Poetry (Robert Richman, ed.) 98 Equiano, Olaudah 15, 47

168
ÍNDICE
Erdrich, Louise 93, 94-95, 119, 129, 149 For Whom the Bell Tolls (Ernest Hemingway) 73
Estate,The (Isaac Bashevis Singer) 107 Foster, Hanna 27
Ethan Frome (Edith Wharton) 55 Four Quartets (T.S. Eliot) 66
Eugenides, Jeffrey 143 Fourteen Sisters of Emilio Montez O’Brien,The
“Eutaw Springs” (Phillip Freneau) 22 (Oscar Hijuelos) 156
Eva Luna (Isabel Allende) 155 Franklin, Benjamin 17,  18-20,  24,  35
“Evangeline” (Henry Wadsworth Longfellow) 35 Franny and Zooey (J.D. Sallinger) 109
“Evening Thought, An” (Jupiter Hammon) 15 Franzen, Jonathan 149
Everett, Percival 148 Frazier, Charles 147
Everything that Rises Must Converge Freeing the Soul (Haryette Mullen) 148
(Flannery O’Connor) 105 Freeman, Mary Wilkins 52
Executioner’s Song,The (Norman Mailer) 112 Freneau, Philip 22-23,27, 35, 132
Explanation of America, An (Robert Pinsky) 135 Frenzy (Percival Everett) 148
Friedan, Betty 92, 109
Fable for Critics, A (James Russell Lowell) 35 From Here to Eternity (James Jones) 99
Face of an Angel (Denise Chavez) 152 From the Terrace (John O’Hara) 104
“Facing It” (Yusef Komunyakaa) 136 Frost, Robert 31, 66, 67, 132
Facts,The (Phlip Roth) 113 Fuller, Margaret 29,  35,  36,  45
Falconer (John Cheever) 108
“Fall of the House of Usher, The” (Edgar Allan Poe) 43 Gaddis,William 110
Fame (Arthur Miller) 101 Gaines, Ernest 114, 147
Family Dancing (David Leavitt) 141 Galatea 2.2 (Richard Powers) 140, 149
Family Moskat,The (Isaac Bashevis Singer) 107 Galbraith, John Kenneth 103
“Family Reunion” (Louise Erdrich) 95 Gallagher, Tess 127
Farewell to Arms, A (Ernest Hemingway) 73 Gangster of Love,The (JessicaHagedorn) 158
Farming of the Bones,The (Edwidge Danticat) 156 Gardens in the Dunes (Leslie Marmon Silko) 152
Faulkner,William 10,  50,  51, 63, 64,  71,  74,  113, 114, 150, 159 Gardner, John 114, 116, 140
Fault Lines (Meena Alexander) 157 Garland, Hamlin 57
Federalist Papers,The 21 Garrison,William Lloyd 23, 48
Feminine Mystique,The (Betty Friedan) 92, 109 Gass, william 110, 140
Fences (August Wilson) 122 Geha, Joseph 158
Ferlinghetti, Lawrence 81, 88, 89 “George the Third’s Soliloquy” (Philip Freneau) 23
Ferré, Rosario 156 “Gerontion” (T.S. Eliot) 66
“Fever” (John Rdgar Wideman) 145 Gesture Life, A (Chang-rae Lee) 158
“Few Don’t’s of an Imagiste, A” (Ezra Pound) 65 Ghosts (Paul Auster) 144
Fielding, Helen 139 Ghost Writer,The (Phlip Roth) 113
Figured Wheel,The (Robert Pinsky) 135 Gilead (Marilynne Robinson) 154
Firebird (Mark Doty) 130 Gilbert, Sandra 92
Fire Next Time,The (James Baldwin) 104 Gilchrist, Ellen 147
Firmat, Gustavo Pérez 156 Giles Goat-Boy (John Barth) 110, 111
“Fish R Us” (Mark Doty) 130 Gilman, Charlotte Perkins 53
Fitzgerald, F. Scott 56, 62, 63, 71-72, 73, 74, 80, 146, 148 Ginsberg, Allen 81, 84, 88,  89, 90, 109, 120, 159
Fixer,The (Bernard Malamud) 106 Gioia, Dana 98
Flanagan, Caitlin 139 Giovanni, Nikki 92, 93
Flappers and Philosophers (F. Scott Fitzgerald) 72 Girl with Curious Hair (David Foster Walllace) 143
Floating Opera,The (John Barth) 111 Gizzi, Peter 137
“Flowering Judas” (Katherine Anne Porter) 101 Gladwell, Malcolm 138
Flowering Judas (Katherine Anne Porter) 102 Glasgow, Ellen 60
F.O.B. (David Henry Hwang) 118 Glass Menagerie,The (Tennessee Williams) 101
Fools Crow (James Welch) 119 Glengarry Glen Ross (David Mamet) 121
Ford, Richard 141, 147, 150 Gluck, Louise 91, 126-127, 129
For the Union Dead (Robert Lowell) 84 Glyph (Percival Everett) 148
42nd Parallel,The (John dos Passos) 75 “Gold Bug, The” (Edgar Alan Poe) 44

169
ÍNDICE
Golden, Arthur 138 Heartsong of Charging Elk,The (James Welch) 151
Golden Apples,The (Eudora Welty) 102 Heart Songs (Annie Proulx) 143
Golden Bowl,The (Henry James) 54 Heidi Chronicles, The (Wendy Wasserstein) 142
Golden Boy (Cllifford Odets) 80 Hejinian, Lyn 97, 124
Gonzales, Rodolfo 94 Heller, Joseph 99,  105
Goodbye, Columbus (Philip Roth) 103, 112 Hellman, Lillian 101
“Good Country People” (Flannery O’Connor) 105 Hemingway, Ernest 50, 62, 63, 71,  72-73, 74,  112, 140, 148, 150
Good Man is Hard to Find, A (Flannery O’Connor) 105 Hempel, Amy 141
Good Mother,The (Sue Miller) 143 Henderson the Rain King (Saul Bellow) 105
Good Scent From a Strange Mountain, A Henley, Beth 142
(Robert Olen Butler) 149 “Her Kind” (Anne Sexton) 85
Gordon, Caroline 114 Herzog (Saul Bellow) 105
Gordon, Mary 143, 145 Hidden Persuaders,The (Vance Packard) 103
Go Tell It on the Mountain (James Baldwin) 104 Hiding Place (John Edgar Wideman) 145
Graham, Jorie 91, 125, 127, 137 Hijuelos, Oscar 118, 156
Grandissimes,The (George Washington Cable) 52 Hirsch, Ed 134
Grapes of Wrath,The (John Steinbeck) 63, 74,  76 Hirshfield, Jane 131-132
Gravity’s Rainbow (Thomas Pynchon) 99,  111 Historia de la Nueva México (Gaspar Pérez de Villagrá) 93
Great American Novel,The (Philip Roth) 112 History and Present State of Virginia,The (Robert Beverley) 15
Great Gatsby,The (F. Scott Fitzgerald) 56,  59, 72,  80 History of My Heart (Robert Pinsky) 135
Great God Brown,The (Eugene O’Neill) 80 History of New York (Washington Irving) 25
Great Santini,The (Pat Conroy) 147 History of the Condition of Women in Various Ages and Nations
Grendel (John Gardner) 116 (Lydia Child) 45
Griever (Gerald Vizenor) 149 History of the Dividing Line (William Byrd) 14
Grimké, Angelina 45 History of the Indians (Bartolomé de las Casas) 6
Grimké, Sarah 45 History of the Standard Oil Company (Ida M. Tarbell) 57
Grisham, John 138 History of Woman Suffrage (Elizabeth Cady Stanton) 45
Gubar, Susan 92 Hobomok (Lydia Child) 45
Guterson, David 154 Hogan, Linda 151
Guy Domville (Henry James) 54 Holder of the World,The (Bharati Mukherjee) 157
Hollander, John 82
Habit of Being,The (Flannery O’Connor) 105 “Hollow Men, The” (T.S. Eliot) 66
Hagedorn, Jessica 158 Holmes, Oliver Wendell 34,  35
Halliday, Mark 133 “Holy the Firm” (Anni Dillard) 155
Hamlet,The (William Faulkner) 74 Home of the End of the World, A (Michael Cunningham) 149
Hammett, Dashiell 44, 101 Home Repairs (Trey Ellis) 145
Hammon, Jupiter 15 Hooks, Bell (bell hooks) 148
Hand to Mouth (Paul Auster) 140 Hooper, Johnson 51
Hannah, Barry 147 Horseman Pass By (Larry McMurtry) 151
Hansberry, Lorraine 103 Hosseini, Khaled 138
Hariot, Thomas 7 Hours,The (Michael Cunningham) 149
Harjo, Joy 130 Housebreaker of Shady Hill,The (John Cheever) 107
Harlot’s Ghost (Norman Mailer) 112 Housekeeping (Marilynne Robinson) 154
Harmonium (Wallace Stevens) 67 House Made of Dawn (N. Scott Momaday) 119, 152
Harper, Michael 93,  95, 96, 134, 136 House of Mirth,The (Edith Wharton) 55
Harris, George Washington 51 House of the Seven Gables,The (Nathaniel Hawthorne) 39
Harrison, Jim 149 House of the Spirits,The (Isabel Allende) 157
Harte, Bret 52,  53 House on Mango Street,The (Sandra Cisneros) 151
Haruf, Kent 149 House on Marshland,The (Louise Gluck) 126
Hass, Robert 127 Howard, Richard 82
Hawthorne, Nathaniel 10, 16, 24,  29,  38,  39-40, 52, 157 Howe, Susan 125
Hazard of New Fortunes (William Dean Howells) 53 Howells,William Dean 53, 57
H.D. (Hilda Doolittle) 65, 92 Howl (Allen Ginsberg) 81, 84,  90

170
ÍNDICE
“How Serfdom Saved the Women’s Movement” Jacobs, Harriet 47, 48
(Caitlin Flanagan) 139 James, Henry 53-54, 55,  64
How the Garcia Girls Lost Their Accents (Julia Alvarez) 156 Janowitz, Tama 115, 144
Hughes, Langston 70-71 Jarman, Mark 127
Hugo, Richard 84,  86, 135 Jarrell, Randall 82
Human Stain,The (Philip Roth) 113 Jasmine (Bharati Mukherjee) 157
Humboldt’s Gift (Saul Bellow) 105 Jauss, David 98
“Hummingbird Pauses at the Trumphet Vine”(Mary Oliver) 133 Jazz (Toni Morrison) 117
Hundred Brothers,The (Donald Antrim) 143 Jazz Poetry Anthology,The (Yusef Komunyakaa, ed.) 136
Hundred Secret Senses,The (Amy Tan) 153 Jeffers, Robinson 69-70
Hunger of Memory (Richard Rodriguez) 154 Jefferson, Thomas 20, 21, 23, 25
Hurlyburly (David Rabe) 122 Jen, Gish 153
Hurston, Zora Neale 78,  105, 117, 148 Jewett, Sarah Orne 52
Hutchinson, Anne 27 “Jewish Cemetery at Newport, The”
Hwang, David Henry 118 (Henry Wadsworth Longfellow) 35
“Jilting of Granny Weatherall, The”
I Am Joaquin (Rodolfo Gonzalez) 94 (Katherine Anne Porter) 102
Iceman Cometh,The (Eugene O’Neill) 80 Jin, Ha 158
Ice-Shirt,The (William Vollmann) 153 Joe Turner’s Come and Gone (August Wilson) 122
“Ichabod” (John Greenleaf Whittier) 36 “Johnny Appleseed” (Vachel Lindsay) 59
“Idea of Order at Key West, The” (Wallace Stevens) 68 Johnson, Charles 149
Ideas of Order (Wallace Stevens) 67 Johnson, James Weldon 61,  71
Idiots First (Bernard Malamud) 106 Jones, James 99
I Know Why the Caged Bird Sings (Maya Angelou) 95, 118 Jones, LeRoi (see Baraka, Amiri)
“Improvised Poetics” (Allen Ginsberg) 88 Journal (John Winthorp) 11
Inada, Lawson 93 Journal (John Woolman) 13
“In a Station of the Metro” (Ezra Pound) 65 Journal (Sarah Kemble Knight) 11
Incident at Vichy (Arthur MIller) 100 Joy Luck Club,The (Amy Tan) 118, 153
Incidents in the Life of a Slave Girl (Harriet Jacobs) 47 JR (William Gaddis) 110
In Cold Blood (Truman Capote) 109, 138 Jubilee (Margaret Walker) 148
“In Cold Storm Light” (Leslie Mamon Silko) 94 “Jug of Rum, The” (Philip Freneau) 23
In Country (Bobbie Ann Mason) 146 Jungle,The (Upton Sinclair) 57
Independence Day (Richard Ford) 147 Just,Ward 146
Indian Killer (Sherman Alexie) 155 “Just Off Main Street” (Elmaz Abinader) 158
Indian Lawyer,The (James Welch) 119
Infinite Jest (David Foster Wallace) 139 Kate Vaiden (Reynolds Price) 114
“in Just -” (Edward Estlin Cummings) 70 Kelly, Brigit Pegeen 126
Interesting Narrative of the Life of Olaudah Equano, or Kenan, Randall 148
Gustavas Vassa, the African,The (Olaudah Equiano) 15 Kennedy,William 114, 143
Interpreter of Maladies (Jhumpa Lahiri) 157 Kerouac, Jack 50, 81, 89,  103, 109, 159
In the Boom Boom Room (David Rabe) 122 Kesey, Ken 110, 150
In the Heart of the Heart of the Country (William Gass) 110 Key Into the Languages of America, A (Roger Williams) 12
In the Loyal Mountains (Rick Bass) 151 Kincaid, Jamaica 118, 155, 156
In the Night Season (Richard Bausch) 145 King, Martin Luther, Jr. 32, 109, 149
Invisible Man (Ralph Ellison) 103, 104 King, Stephen 44,  143
“Irises” (Li-Young Lee) 129 Kingsolver, Barbara 152
Iron Heel,The (Jack London) 57 Kingston, Maxine Hong 96, 97,  115, 118, 153
Ironweed (William Kennedy) 114  143 “Kitchenette Building” (Gwendolyn Brooks) 83
Irving, John 114 Kitchen God’s Wife,The (Amy Tan) 118
Irving,Washington 16,  17, 23,  24-25, 26, 35 Kite Runner,The (Khaled Hosseini) 138
I Sailed With Magellan (Stuart Dybek) 149 Kizer, Carolyn 92
Knight, Sarah Kemble 11, 27
Koch, Kenneth 90

171
ÍNDICE
Komunyakaa,Yusef 127, 135-136 Locked Room, The (Paul Auster) 144
Krik? Krak! (Edwidge Danticat) 156 Lolita (Vladimir Nabokov) 107
Kumin, Maxine 92, 132 London, Jack 49,  55,  56, 57, 153
Kushner, Tony 141 Lonely Crowd,The (David Riesman) 103
Kyger, Joanne 88 Lone Ranger and Tonto Firstfight in Heaven,The
(Sherman Alexie) 155
La Casa de los Espíritus (Isabel Allende) 157 Lonesome Dove (Larry McMurtry) 151
Lahiri, Jhumpa 157 Long and Happy Life, A (Reynolds Price) 114
Land of Unlikeness (Robert Lowell) 83 Long Day’s Journey Into Night (Eugene O’Neill) 80
“Language” Poetries: An Anthology (Douglas Messerli, ed.) 97 Longfellow, Henry Wadworth 34-35
Last of the Menu Girls,The (Denise Chavez) 152 Longstreet, Augustus 51
Last Picture Show,The (Larry McMurtry) 151 Look Homeward, Angel (Thomas Wolfe) 113
Last Voyage of Somebody the Sailor,The (John Barth) 112 Loon Lake (E.L. Doctorow) 115
Latin Deli,The (Judith Ortiz Cofer) 156 Lorde, Audre 92,  96, 145
Lauterbach, Ann 124 Lord Weary’s Castle (Robert Lowell) 83
Leaf and the Cloud,The (Mary Oliver) 133 Lost in the Funhouse (John Barth) 111
Leaning Tower,The (Katherine Anne Porter) 102 Lovecraft, H.P. 44
Leather-Stocking Tales (James Fenimore Cooper) 26, 38 Love Medicine (Thomas McGuane) 119
Leave It to Me (Bharati Mukherjee) 157 “Love Song of J. Alfred Prufrock, The” (T.S. Eliot) 66
Leaves of Grass (Walt Whitman) 32, 33, 69 Lowell, Amy 65
Leaving Cheyenne (Larry MCMurtry) 151 Lowell, James Russell 34,  35,  52
Leavitt, David 141 Lowell, Robert 82,  83-84,  85, 88, 92, 123, 124, 160
Lee, Chang-rae 157, 158 “Luck of Roaring Camp, The” (Bret Harte) 52
Lee, Li-Young 129-130 Lucky Spot,The (Beth Henley) 142
“Legend of Sleepy Hollow, The” (Washington Irving) 24 Lucy (Jamaica Kincaid) 156
Legends of the Fall (Jim Harrison) 150 “Luke Havergal” (Edwin Arlington Robinson) 59
Leithauser; Brad 98
Less Than Zero (Bret Easton Ellis) 115 MacDonald, John D. 44
“Letter from a Region of My Mind” (James Baldwin) 104 Macdonald, Ross 44
Letters (John Barth) 111 Machine Dreams (Jayne Anne Phillips) 146
Letters from an American Farmer Madwoman in the Attic,The
(Hector St. John de Crèvecoeur) 20 (Sandra Gilbert andsusan Gubbar) 92
Let the Dead Bury Their Dead (Randall Kenan) 148 Maggie: A Girl of the Streets (Stephen Crane) 49,  56
Levertov, Denise 88, 92 Magic Barrel,The (Bernard Malamud) 106
Levine, Lawrence 118 Magnalia Christi Americana (Cotton Mather) 12
Levine, Philip 84,  86-87, 135 Mailer, Norman 99, 109, 111, 112, 115, 118, 161
Lewis, Meriwether 23 Main Street (Sinclair Lewis) 75
Lewis, Sinclair 62, 71,  74,  75,  76, 77, 148 Main-Travelled Roads (Hamlin Garland) 57, 58
Libra (Don DeLillo) 144 Malamud, Bernard 103, 106, 118
Lie Down in Darkness (William Styron) 115 Maltese Falcon,The (Hammett, Dashiell) 101
Life on the Mississippi (Mark Twain) 51 Mambo Kings Play Songs of Love,The (Oscar Hijuelos) 118
Life Studies (Robert Lowell) 84 Mamet, David 121-122
“Ligeia” (Edgar Allan Poe) 43 “Management of Grief, The” (Bharati Mukherjee) 157
Light in August (William Faulkner) 74 ManifestA (Jennifer Baumgardner and Amy Richards) 139
Lim, Shirley Geok-lin 129, 158 Man in the Gray Flannel Suit,The (Sloan Wilson) 103
Lindsay,Vachel 58-59 Man Made of Words,The (N. Scott Momaday) 152
Literature of Their Own, A (Elaine Showalter) 92 Manor,The (Isaac Bashevis Singer) 107
Little Foxes,The (Lillian Hellman) 101 Mansion,The (William Faulkner) 74
Little Green Men (Christopher Buckley) 146 Ma Rainey’s Black Bottom (August Wilson) 122
“Little Rabbit Dead in the Grass, A” (Mark Doty) 130 Marble Faun,The (Nathaniel Hawthorne) 40
Live or Die (Anne Sexton) 85 “Marriage” (Gregory Corso) 89
Lives of the Heart,The (Jane Hirshfield) 132 Marrow of Tradition,The (Charles Waddell Chesnutt) 61
Living,The (Annie Dillard) 155 Marshall, Paule 155

172
ÍNDICE
Martin Eden (Jack London) 49, 56, 59 Momaday, N. Scott 116, 147, 149
Mason, Bobbie Ann 138, 146 Mommy Myth,The (Susan Douglas and Meredith Michaels) 139
Mason & Dixon (Thomas Pynchon) 111 Mona in the Promised Land (Gish Jen) 153
Masters, Edgar Lee 58, 59 Month of Sundays, A (John Updike) 108
Mather, Cotton 11, 12 Moody, Rick 143
Mating (Norman Rush) 153 Moon Lake (Eudora Welty) 102
M. Butterfly (David Henry Hwang) 118 Moore, Lorrie 141
McCarthy, Cormac 147 Moore, Marianne 70,  87
McCarthy, Mary 143 Mora, Pat 151
McCorkle, Jill 147 Morales, Aurora Levins 156
McCourt, Frank 140, 143 Mori, Toshio 153
McDermott, Alice 143,145 Morrison, Toni 48,  78  116-117, 118
McGuane, Thomas 150 Morse, Jedediah 23
McInerney, Jay 112, 144 Mosquito Coast,The (Paulo Theroux) 114
McKay, Claude 71 Mourning Becomes Electra (Eugene O’Neill) 80
McMurtry, Larry 150, 151 Moviegoer,The (Walker Percy) 114
McPherson, James Alan 148 Mr. Ives’ Christmas (Oscar Hijuelos) 156
McPherson, Sandra 130 Mr. Sammler’s Planet (Saul Bellow) 105
Meadowlands (Louise Gluck) 127 Mr. Spaceman (Robert Olen Butler) 149
Medea (Robinson Jeffers) 70 Mukherjee, Bharati 156-157
Mehta,Ved 140 “Mule Heart” (Jane Hirshfield) 131
Melville, Herman 10, 16, 24, 25, 26, 29, 34, 38, 39, 40-42, 43, 51 Mules and Men (Zora Neale Hurston) 78
Memoirs of a Geisha (Arthur Golden) 138 Mullen, Harryette 148
Mencken, H.L. 23 Mumbo Jumbo (Ishmael Reed) 147
Merrill, James 82 Murray, Judith Sargent 27
Merwin,W.S. 91, 124 Muse & Drudge (Harryette Mullen) 148
Messerli, Douglas 97 Museums and Women (John Updike) 108
Metrical History of Christianity (Edward Taylor) 10 Music School,The (John Updike) 108
Mexico City Blues (Jack Kerouac) 109 My Alexandria (Mark Doty) 130
M’Fingal (John Ttumbull) 22 My Antonia (Willa Cather) 60
Miami and the Siege of Chicago (Norman Mailer) 112 My Kinsman, Major Molineux (Nathaniel Hawthorne) 40
Michaels, Meredith 139 My Life (Lyn Hejinian) 124
Mickelson’s Ghosts (John Gardner) 116 My Life As a Man (Philip Roth) 112
Middleman and Other Stories,The (Bharati Mukherjee) 157 “My Lost Youth” (Henry Wadsworth Longfellow) 35
Middle Passage (Charles Johnson) 149 Mysteries of Pittsburgh,The (Michael Chabon) 146
Middlesex (Jeffrey Eugenides) 143 Misteries of Winterhurn (Joyce Carol Oates) 116
“Midnight Consultation, A” (Philip Freneau) 23 Myths and Texts (Gary Snyder) 84
Millay, Edna St.Vincent 92
Miller, Arthur 99,  100-101, 103, 118, 122 Nabokov,Vladimir 107, 110
Miller, sue 143 Nafisi, Azar 138
Millett, Kate 92, 112 Naked and the Dead,The (Norman Mailer) 99
Mills, C.Wright 103 Naked Lunch,The (William Burroughs) 89
Mills of the Kavanaughs,The (Robert Lowell) 83 Namesake,The (Jhumpa Lahiri) 157
Minh-Ha, Trinh 158 Narrative of Arthur Gordon Pym (Edgar Allan Poe) 38
Minister’s Black Veil,The (Nathaniel Hawthorne) 40 Narrative of Sojourner Truth (Olive Gilbert, ed.) 45
“Miniver Cheevy” (Edwin Arlington Robinson) 59 Narrative of the Life of Frederick Douglass, An American Slave
Mirikitani, Janice 93, 96 (Frederick Douglass) 48
Miss Firecracker Contest,The (Beth Henley) 142 Native Son (Richard Wright) 77 155
Mistress of Spices,The (Chitra Banerjee Divakaruni) 157 Native Speaker (Chang-rae Lee) 157
Moby-Dick; or The Whale (Herman Melville) 8, 36, 37, 38-40, 146 Natural,The (Bernard Malamud) 106
Modern Chivalry (Hugh Henry Brackenridge) 20 Nature (Ralph Waldo Emerson) 30
Modern Instance, A (William Dean Howells) 51 Naylor, Gloria 145
Mohr, Nicholasa 153 Necromance (Rae Armantrout) 124

173
ÍNDICE
Negative Blue (Charles Wright) 127 O’Neill, Eugene 71, 79-80
“Negro Speaks of Rivers, The” (Langston Hughes) 71 On Moral Fiction (John Gardner) 116
“Neighbour Rosicky” (Willa Cather) 60 On the Road (Kack Kerouac) 50, 103, 109
Neon Vernacular (Yusef Komunyakaa) 136 “Open Boat, The” (Stephen Crane) 56
Nepantla: Essays From the Land in the Middle Opening of the American Mind,The (Lawrence Levine) 118
(Sandra Cisneros) 151 O Pioneers! (Willa Cather) 60
New American Poetry,The (Donald Allen) 88 Oppenheimer, Joel 88
New and Selected Poems (Mary Oliver) 132 Optimist’s Daughter,The (Eudora Welty) 102
“New Black Aesthetic, The” (Trey Ellis) 145 Organization Man,The (William Whyte) 103
New Criticism,The (John Crowe Ransom) 79 Ormond (Charles Brockden Brown) 24
New Life, A (Bernard Malamud) 106 Orphan,The (David Rabe) 121
“New Poem, The” (Charles Wright) 91 Ortiz, Simon 93, 94, 127
Next Year in Cuba (Gustavo Pérez Firmat) 155 Orwell, George 57
Nickel Mountain (John Gardner) 116 Our Nig (Harriet Wilson) 47-48
Nine Gates: Entering the Mind of Poetry (Jane Hirshfield) 131 Our Town (Thornton Wilder) 80
Nine Stories (J.D. Sallinger) 109 “Outcasts of Poker Flat, The” (Bret Harte) 52
1984 (George Orwell) 57 “Out of the Cradle Endlessly Rocking” (Walt Whitma 33
1919 (John Dos Passos) 75 Outre-Mer (Henry Wadsworth Longfellow) 35
Nobody Knows My Name (James Baldwin) 104 Oxherding Tale (Charles Johnson) 149
Noon Wine (Katherine Anne Porter) 102 Ozick, Cynthia 144
Norris, Frank 55, 57
Norton Anthology of Literature by Women,The Packard,Vance 103
(Sandra Gilbert and Susan Gubar) 92 Packer, ZZ 147
Notebook, 1967-68 (Robert Lowell) 84 Paine, Thomas 21
Pale Fire (Vladimir Nabokov) 107
O Albany! (William Kennedy) 143 Pale Horse, Pale Rider (Katherine Anne Porter) 102
Oates, Joyce Carol 99,116, 142 Paley, Grace 144
“O Black and Unknown Bards” (James Weldon Johnson) 61 Palmer, Michael 97
O’Connor, Flannery 102, 104-105,  117 Papers on Art and Literature (Margaret Fulller) 36
October Light (John Gardner) 114, 116 Parable of the Sower (Octavia Butler) 148
Octopus,The (Frank Norris) 57 Paradise (Toni Morrison) 117
Odets, Clifford 74,  80 Park City (Ann Beattie) 140
Of Mice and Men (John Steinbeck) 76 Parks, Suzan-Lori 142
“Of Mr. Booker T.Washington and Others” (W.E.B. Du Bois) 61 Parts of a World (Wallace Stevens) 67
Of Plymouth Plantation (William Bradford) 8 Paterson (William Carlos Williams) 69, 77
O’Hara, Frank 90, 120,134 Patrimony: A True Story (Philip Roth) 113
O’Hara, John 103-104 Pearl of Orr’s Island,The (Harriet Beecher Stowe) 52
“Old Ironsides” (Oliver Wendell Holmes) 35 Pentimento (Lillian Hellman) 101
Old Man and the Sea,The (Ernest Hemingway) 73, 74 Percy,Walker 114
Old Money (Wendy Wasserstein) 142 Perelman, Bob 97
Old Neighborhood,The (David Mamet) 121 Pérez Family,The (Christine Bell) 155
Olds, Sharon 128 Perfect Recall (Ann Beattie) 140
Oleanna (David Mamet) 121 “Persimmons” (Li-Young Lee) 129
Oliver, Mary 132-133 “Peter Quince at the Clavier” (Wallace Stevens) 68
Olsen, Tillie 150 Phillips, Jayne Anne 146
Olson, Charles 88 Piano Lesson,The (August Wilson) 122
Omensetter’s Luck (William Gass) 110 Picture Bride (Cathy Song) 96
“On Being Brought from Africa to America” Pictures of Fidelman (Bernard Malamud) 106
(Phillis Wheatley) 27 Picturing Will (Ann Beattie) 145
On Being Female, Black and Free (Margaret Walker) 147 Pigs in Heaven (Barbara Kingsolver) 151
On Boxing (Joyce Carol Oates) 116 Pike, Zebulon 23
Once Upon a Time: A Floating Opera (John Barth) 111 Pilgrim at Tinker Creek (Annie Dillard) 154
One Flew Over the Cuckoo’s Nest (Ken Kesey) 110 “Pilot of Hatteras, The” (Philip Freneau) 23

174
ÍNDICE
Pinsky, Robert 134-135 Red Badge of Courage,The (Stephen Crane) 56
Pioneers,The (James Fenimore Cooper) 25 Redeemed Captive,The (John Williams) 11
Plainsong (Kent Haruf) 148 Red Tent, The (Anita Diamant) 143
Plath, Sylvia 84-85,  87, 92 “Red Wheelbarrow, The” (William Carlos Williams) 68
Platitudes (Trey Ellis) 145 Reed, Ishmael 96, 117, 147, 152
Playing in the Dark (Toni Morrison) 117 Region Not Home, A (James Alan McPherson) 147
Pnin (Vladimir Nabokov) 107 Rembrandt’s Hat (Bernard Malamud) 106
Poe, Edgar Allan 16, 24, 29,  34,  38, 42-44, 115 Reservation Blues (Sherman Alexie) 154
“Poet, The” (Ralph Waldo Emerson) 28, 33 Resurrection,The (John Gardner) 116
Poisonwood Bible,The (Barbara Kingsolver) 151 Rexroth, Kenneth 88, 89
“Political Litany, A” (Philip Freneau) 22 Rhys, Jean 155
Poor Richard’s Almanack (Benjamin Franklin) 18 Rice, Anne 138
“Poppies” (Mary Oliver) 133 Rich, Adrienne 83,  84,  87-88, 118
Porter, Katherine Anne 99,  101-102, 105 “Richard Cory” (Edwin Arlington Robinson) 59
Portnoy’s Complaint (Philip Roth) 112 Richards, Amy 139
Portrait of a Lady,The (Henry James) 54 Richman, Robert 98
Possessing the Secret Joy (Alice Walker) 118 Riesman, David 103
Pound, Ezra 62, 65,  68, 73, 83, 91, 92 Right Here, Right Now (Trey Ellis) 145
Power (Linda Hogan) 151 Right Stuff,The (Tom Wolfe) 110
Power Elite,The (C.Wright Mills) 103 Rios, Alberto 93, 94, 126
Powers, Richard 140, 149 “Rip Van Winkle” (Washington Irving) 24
“Premature Burial, The” (Edgar Allan Poe) 43 Rise of Silas Lapham,The (William Dean Howells) 53
Price, Reynolds 114 Rituals of Survival (Nicholasa Mohr) 156
Price,The (Arthur Miller) 100 “River of Bees, The” (W.S. Merwin) 124
Pricksongs & Descants (Robert Coover) 110 Road Home,The (Jim Harrison) 150
Princess Sasamassima,The (Henry James) 54 Road to Wellville,The (T. Coraghessan Boyle) 153
Problems (John Updike) 108 Roan Stallion (Robinson Jeffers) 70
Promise of Rest,The (Reynolds Price ) 114 Roberts, Nora 138
Proulx, Annie 143 Robinson, Edwin Arlington 31, 59
Public Burning,The (Robert Coover) 110, 114 Robinson, Marilynne 154
“Purloined Letter, The” (Edgar Allan Poe) 43 Rock Garden,The (Sam Shepard) 120
Puttermesser Papers,The (Cynthia Ozick) 144 Rock Springs (Richard Ford) 141
Pynchon,Thomas 99,  107,  110-111, 112, 115, 140, 143, 149, 153 Rodriguez, Luis 153
Rodriguez, Richard 153
Quasha, George 97 Roethke, Theodore 84,  86
Rogers, Pattiann 132
Rabbit, Run (John Updike) 108 Roger’s Version (John Updike) 108
Rabbit at Rest (John Updike) 108 “Roofwalker, The” (Adrienne Rich) 87
Rabbit Is Rich (John Updike) 108 Rose (Li-Young Lee) 129
Rabbit Redux (John Updike) 108 Roth, Philip 103, 112-113, 118
Rabbit Remembered (John Updike) 108 Rowlandson, Mary 11-12
Rabe, David 121-122 Rowson, Susanna 27
Radical Chic & Mau-Mauing the Flak Catchers (Tom Wolfe) 110 Rush, Norman 152
Ragtime (E.L. Doctorow) 114 Russo, Richard 142
Raise High the Roof-Beam, Carpenters (J.D. Sallinger) 109
Raisin in the Sun, A (Lorraine Hansberry) 103 S. (John Updike) 108
Ralph Waldo Emerson (Oliver Wendell Holmes) 35 Sabbatical: A Romance (John Barth) 111
Ransom, John Crowe 78,  79 82 Sacred Wood,The (T.S. Eliot) 66
Ravelstein (Saul Bellow) 105 Sailing Alone Around the Room (Billy Collins) 134
“Raven, The” (Edgar Allan Poe) 43 Salinas, Luis Omar 94
Reading Lolita in Teheran (Azar Nafisi) 138 Salinger, J.D. 103, 108-109
Reasons to Live (Amy Hempel) 141 Same Door,The (John Updike) 108
Reason Why,The (Arthur Miller) 101 Sandburg, Carl 58

175
ÍNDICE
Santos, Bienvenido 157 “Snows of Kilimanjaro, The” (Ernest Hemingway) 73
Scalapino, Leslie 124 Snyder, Gary 84, 88, 131
Scarlet Letter,The (Nathaniel Hawthorne) 10, 38, 39 “Some Considerations on the Keeping of Negroes”
Scent of Apples (Bienvenido Santos) 157 (John Woolman) 13
Schnackenberg, Gjertrud 92, 98, 134 Some People, Places, and Things That Will Not Appear in
Schwerner, Armand 97 My Next Novel (John Cheever) 107
Scoundrel Time (Lillian Hellman) 101 Something To Remember Me By (Saul Bellow) 105
Seascape (Edward Albee) 119 Song, Cathy 93, 96
Sea-Wolf,The (Jack London) 50, 56 “Song of Hiawatha, The” (Henry Wadsworth Longfellow) 35
Seize the Day (Saul Bellow) 103,  106 “Song of Myself” (Walt Whitman) 33
Self-Help (Lorrie Moore) 141 Song of Solomon (Toni Morrison) 117
Self-Portrait in a Convex Mirror (John Ashbery) 90 Son of the Wolf,The (Jack London) 56
“Self-Reliance” (Ralph Waldo Emerson) 30 “Soonest Mended” (John Ashberry) 124
Sent for You Yesterday (John Edgar Wideman) 145 Sophie’s Choice (William Styron) 115
“Seven Dreams: A Book of North American Landscapes” Soto, Gary 93, 94
(William Vollmann) 153 Sot-Weed Factor,The (John Barth) 111
Seven Guitars (August Wilson) 122 Souls of Black Folk,The (W.E.B. Du Bois) 61
Sewall, Samuel 11 Sound and the Fury,The (William Faulkner) 64,  74
Sex and the City (Candace Bushnell) 139 Source (Mark Doty) 130
Sexton, Anne 84,  85,  92 Spahr, Juliana 137
Sexual Politics (Kate Millett) 92, 112 Speed-the-Plow (David Mamet) 121
Shame of the Cities,The (Lincoln Steffens) 57 Spelling Book (Noah Webster) 23
Shapard, Robert 141 Spicer, Jack 88
Shaw, Irwin 99 Spoon River Anthology (Edgar Lee Masters) 58
Shawl,The (Cynthia Ozick) 144 Sporting Club,The (Thomas McGuane) 150
Shepard, Sam 120-121 Sportswriter,The (Richard Ford) 147
“Shiloh”(Bobbie Ann Mason) 146 Spy,The (James Fenimore Cooper) 17
Shiloh and Other Stories (Bobbie Ann Mason) 141 Stanton, Elizabeth Cady 45
Ship of Fools (Katherine Anne Porter) 102 “Star Quilt” (Roberta Hill Whiteman) 94
Shipping News,The (Annie Proulx) 143 Status Seekers,The (Vance Packard) 103
“Short Happy Life of Francis Macomber, The” Steffens, Lincoln 57
(Ernest Hemingway) 73 Stegner,Wallace 149
Showalter, Elaine 92 Stein, Gertrude 62, 63, 64,  73,  77
Silent Dancing (Judith Ortiz Cofer) 156 Steinbeck, John 63, 69,  74,  75, 152
Silko, Leslie Marmon 93 94, 118, 132, 152 Stevens,Wallace 31,  67-68,  91
Simic, Charles 91, 133 Sticks and Bones (David Rabe) 121
Simpson, Mona 149 Still Life With Oysters and Lemon (Mark Doty) 130
Sinclair, Upton 55, 57, 75 Stolen Light,The (Ved Mehta) 140
Singer, Isaac Bashevis 103, 106-107, 118 Stone, Robert 150
“Sinners in the Hands of an Angry God”(Jonathan Edwards) 14 “Stopping By Woods on a Snowy Evening” (Robert Frost) 67
Sister of My Heart (Chitra Banerjee Divakaruni) 157 Story of My Life (Jay McInerney) 144
Sisters Rosensweig,The (Wendy Wasserstein) 142 Stowe, Harriet Beecher 44,  46-47,  52
Situation of Poetry,The (Robert Pinsky) 135 Strand, Mark 91, 133
Sketch Book of Geoffrye Crayon (Washington Irving) 24 Strange Interlude (Eugene O’Neill) 79, 80
Skin of Our Teeth,The (Thornton Wilder) 80 Streetcar Named Desire, A (Tennessee Williams) 101
Slaughterhouse-Five (Kurt Vonnegut, Jr.) 99 Strong Measures (Philip Dacey and David Jauss, eds.) 98
Slaves of New York (Tama Janowitz) 114 Strong Motion (Jonathan Franzen) 149
Slouching Towards Bethlehem (Joan Didion) 153 Styron,William 115
Smiley, Jane 148 Sudden Fiction (Robert Shapard and James Thomas, eds.) 141
Smith, Lee 146 Sula (Toni Morrison) 117
Smoke Signals (Sherman Alexie) 154 Summer (Edith Wharton) 55
“Snow Bound” (John Greenleaf Whittier) 36 Sun Also Rises,The (Ernest Hemingway) 63, 73
Snow Falling on Cedars (David Guterson) 154 “Sunday Morning” (Wallace Stevens) 68

176
ÍNDICE
Sunlight Dialogues,The (John Gardner) 116 Topdog/Underdog (Suzan-Lori Parks) 142
Suttree (Cormac McCarthy) 147 Tortilla Flat (John Steinbeck) 76
Swarm (Jorie Graham) 126 “To S.M., a Young African Painter, on Seeing His Works”
Swenson, May 92 (Phillis Wheatley) 27
Sze, Arthur 131 Total Syntax (Barret Watten) 97
“To the Engraver of My Skin” (Mark Doty) 130
Tabloid Dreams (Robert Olen Butler) 149 Toughest Indian in the World, The (Sherman Alexie) 154
Takaki, Ronald 118 Tower Beyond Tragedy,The (Robinson Jeffers) 70
Tales of the Grotesque and Arabesque (Edgar Allan Poe) 44 Town,The (William Faulkner) 74
Tales of the Jazz Age (F. Scott Fitzgerald) 72 Transatlantic Sketches (Henry James) 53-54
Tamar (Robinson Jeffers) 70 Triumph of Achilles,The (Louise Gluck) 126
Tan, Amy 118, 152 Tropic of Orange (Karen Tei Yamashita) 153
Tar Baby (Toni Morrison) 117 Trout Fishing in America (Richard Brautigan) 110
Tarbell, Ida M. 57 True and Historical Narrative of the Colony of Georgia, A 15
Tate, Allen 78,  82, 113 True West (Sam Shepard) 120, 121
Taylor, Edward 9-10 Trumbull, John 22
“Teeth Mother Naked at Last, The” (Robert Bly) 91 Truth, Sojourner 45-46
Tell My Horse (Zora Neale Hurston) 78 “Tuskegee Airmen, The” (Trey Ellis) 145
Tenants,The (Bernard Malamud) 106 Twain, Mark (Samuel Clemens) 25,  29,  35,  50-51,  53, 78
Tender Buttons (Gertrude Stein) 64 Twenty-Seventh City,The (Jonathan Franzen) 149
Tender is the Night (F. Scott Fitzgerald) 72 Two Cities (John Edgar Wideman) 145
Ten North Frederick (John O’Hara) 104 Two Dreams (Shirley Geok-lin Lim) 157
Tenth Muse Lately Sprung Up in America,The Two Trains Running (August Wilson) 122
(Anne Bradstreet) 9 Tyler, Anne 144-145
Their Eyes Were Watching God (Zora Neale Hurston) 79, 147 Tyler, Royall 22
Theroux, Paul 114 Typee (Herman Melville) 38,  40, 42
Thin Man,The (Dashiell Hammett) 101 Typical American (Gish Jen) 153
Third Life of Grange Copeland,The (Alice Walker) 118
Third World Women (Janice Mirikitani) 96 Uncle Tom’s Cabin (Harriet Beecher Stowe) 44, 46-47, 79
“Thirteen Ways of Looking at a Blackbird” (Wallace Stevens) 68 Uncle Tom’s Children (Richard Wright) 77
This Side of Paradise (F. Scott Fitzgerald) 63,72 Underworld (Don DeLillo) 144
Thomas, James 141 Unfinished Woman, An (Lillian Hellman) 101
Thomas and Beulah (Rita Dove) 95, 126 United States (Laurie Anderson) 97
Thoreau, Henry David 13, 16,  28,  29,  31-32,  34,  37,  52, 132, 154 Unknown Errors of Our Lives, The
Thorpe, Thomas Bangs 51 (Chitra Banerjee Divakaruni) 157
Those the River Keeps (David Rabe) 122 Updike, John 103,  108, 113, 141, 143
Thousand Acres, A (Jane Smiley) 148, 149 Up From Slavery (Booker T.Washington) 60
Three Soldiers (John Dos Passos) 62 U.S.A. (John Dos Passos) 75, 114
Three Tall Women (Edward Albee) 119
Through and Through (Joseph Geha) 158 V (Thomas Pynchon) 110-111
Through the Arc of the Rain Forest (Karen Tei Yamashita) 153 Van Duyn, Mona 92
“Throwing Salt on a Path” (Arthur Sze) 131 Van Vechten, Carl 76
“Tide Rises,The Tide Falls,The” Van Wagener, Isabella (see Truth, Sojorner)
(Henry Wadsworth Longfellow) 35 Vassa, Gustavus (see Equiano, Olaudah)
Tidewater Morning,A (William Styron) 115 “Vegetable Air, The” (Cathy Song) 96
Tidewater Tales,The (John Barth) 111 Victim,The (Saul Bellow) 105
Timebends: A Life (Arthur Miller) 101 Villagrá, Gaspar Pérez de 93
Time to Greez (Janice Mirikitani, ed.) 96 Vineland (Thomas Pynchon) 111
Tiny Alice (Edward Albee) 119 Violent Bear It Away,The (Flannery O’Connor) 105
To Bedlam and Part Way Back (Anne Sexton) 85 Viramontes, Helena Maria 153
“To My Dear and Loving Husband” (Anne Bradstreet) 9 Virginia (Ellen Glasgow) 60
Too Far To Go (John Updike) 108 “Virtue of Tobacco, The” (Philip Freneau) 23
Toomer, Jean 76-77 Visitation of Spirits, A (Randall Kenan) 148

177
ÍNDICE
Vizenor, Gerald 149, 152 White Pine (Mary Oliver) 132
Voight, Ellen Bryant 135 Whitman,Walt 16, 32-33, 35, 50, 58, 124, 130
Vollmann,William 140, 153 Whittier, John Greenleaf 35-36, 52
Vonnegut Jr., Kurt 99 Who’s Afraid of Virginia Woolf? (Edward Albee) 119
“Voyages” (Hart Crane) 70 “Why I Work at the P. O.” (Eudora Welty) 102
Whyte,William 103
Waiting (Ha Jin) 155 Wideman, John Edgar 118, 145
Waiting for Lefty (Cllifford Odets) 78 Wide Net,The (Eudora Welty) 102
Wake of Janey Foster,The (Beth Henley) 142 Wide Sargasso Sea (Jean Rhys) 155
Walden, or, Life in the Woods (Henry David Thoreau) 31, 32, 40 Wieland (Charles Brockden Brown) 24
Walker, Alice 78, 99, 114, 117-118, 152 Wife of His Youth,The (Charles Waddell Chesnutt) 61
Walker, Margaret 147 Wogglesworth, Michael 10
Walking on Water (Randall Kenan) 148 Wilbur, Richard 82,  83
Wallace, David Foster 139, 143, 149 Wilder, Thornton 80
Want Bone,The (Robert Pinsky) 135 “Wild Honey Suckle, The” (Philip Freneau) 23
Wapshot Scandal,The (John Cheever) 108 Wild Iris,The ( Louise Gluck) 127
“Warning, The” (Robert Creeley) 88 Wildlife (Richard Ford) 150
Warren, Mercy Otis 27 Wild Seed (Octavia Butler) 148
Warren, Robert Penn 78,  82,  83,  99,  100, 101, 102, 114 Williams, John 11
Washington, Booker T. 60-61 Williams, Jonathan 88
Wasserstein,Wendy 142 Williams, Roger 12
Waste Land,The (T.S. Eliot) 63,  66 Williams, Sherley Anne 148
Watch on the Rhine (Lillian Hellman) 101 Williams, Tennessee 99,  101
Waterworks,The (E. L. Doctorow) 115 Williams,William Carlos 64, 65, 68-69, 84, 92
Watkins, Gloria (see Hooks, Bell) Will You Please Be Quiet, Please? (Raymond Carver) 140
Watten, Barret 97 Wilson, August 118, 122
Way Some People Live,The (John Cheever) 107 Wilson, Harriet 47
Way to Rainy Mountain,The (N. Scott Momaday) 118 Wilson, Sloan 103
“Way to Wealth, The” (Benjamin Franklin) 18 Winesburg, Ohio (Sherwood Anderson) 57-78
Webster, Noah 17,  23 Wings of the Dove,The (Henry James) 54
Welch, James 119, 132, 151 Winter in the Blood (James Welch) 119
Welch, Lew 88 Winthrop, John 12
Welty, Eudora 99, 102, 105 Wise Blood (Flannery O’Connor) 105
West, Nathanael 105, 153 Wolf: A False Memoir (Jim Harrison) 150
Whalen, Phil 88 Wolfe, Thomas 109, 113
Wharton, Edith 54-55 Wolfe, Tom 115
“What Thou Lovest Well, Remains American” Woman, Native, Other (Trinh Minh-Ha) 158
(Richard Hugo) 86 Woman Hollering Creek and Other Stories
What We Talk About When We Talk About Love (Sandra Cisneros) 151
(Raymond Carver) 140 Woman in the Nineteenth Century (Margaret Fuller) 36
Wheatley, Phillis 26, 27 Woman’s Bible,The (Elizabeth Cady Stanton) 45
When Dinah Shore Ruled the Earth (Wendy Wasserstein) 142 Woman Warrior,The (Maxine Hong Kingston) 118
“When Lilacs Last in the Dooryard Bloom’d” Women in Praise of the Sacred (Jane Hirshfield, ed.) 131
(Walt Whitman) 33 Women in Their Beds (Gina Berriault) 153
Where I’m Calling From (Raymond Carver) 140 Women of Brewster Place,The (Gloria Naylor) 145
Where I Was From (Joan Didion) 153 “Women of Dan Dance with Swords in Their Hands to Mark the
Where the Bluebird Sings to the Lemonade Springs Time When They Were Warriors,The” (Audre Lorde) 96
(Wallace Stegner) 149-150 Woolman, John 13
Where the Sea Used To Be (Rick Bass) 150 Words for the Wind (Theodore Roethke) 86
White Collar,The (C.Wright Mills) 103 World According to Garp,The (John Irving) 114
”White Heron, The” (Sarah Orne Jewett) 52 World of Apples,The (John Cheever) 107
Whiteman, Roberta Hill 94 “World Without Objects Is a Sensible Emptiness, A”
White Noise (Don DeLillo) 139, 143 (Richard Wilbur) 82

178
ÍNDICE
Wouk, Herman 99 “Yellow Wallpaper, The” (Charlotte Perkins Gilman) 53
Wright, C.D. 127 ¡Yo! (Julia Alvarez) 156
Wright, Charles 91, 127-128 You Bright and Risen Angels: A Cartoon (Willaim Vollmann) 153
Wright, James 133 Youngest Doll (Rosario Ferré) 156
Wright, Richard 48, 74, 77, 155 “Young Goodman Brown” (Nathaniel Hawthorne) 38, 40
Writing From the New Coast: Technique “Young Housewife, The” (William Carlos Williams) 69
(Juliana Spahr and Peter Gizzi, eds.) 137 Young Lions,The (Irwin Shaw) 99
Writing Life, The (Annie Dillard) 140 Your Blues Ain’t Like Mine (Bebe Moore Campbell) 145

Yamamoto, Hisaye 153 Zami: A New Spelling of My Name (Andre Lorde) 145
Yamashita, Karen Tei 153 Zuckerman Bound (Philip Roth) 113

179
DEPARTAMENTO DE ESTADOS DOS EUA/
ESCRITÓRIO DE PROGRAMAS DE INFORMAÇÕES INTERNACIONAIS
http://www.america.gov

REVISED
EDITION
(book spine)
PERFIL DA LITERATURA AMERICANA

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