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All content following this page was uploaded by Carlos D. Pereira on 15 December 2013.
Ministério da Agricultura
do Desenvolvimento
Rural e das Pescas
Manual de
Conservação
e Transformação
curso de
Auxiliar de de Produtos de
Pecuária
origem Animal
Ficha Técnica
Título:
Manual de Conservação e Transformação de Produtos de Origem Animal
autores:
Ana Brites, André Oliveira e Silva, Carlos Dias Pereira, David Gomes,
João Noronha, Jorge Viegas, Liliana Costa, Maria Antónia Conceição,
Renato Alves, Sara Carvalheiro, Susana Dias, Vanessa Patrício.
Diagramas:
Erika de Souza
Fotografias:
Ana Brites, Carlos Dias Pereira, Liliana Costa, Vanessa Patrício
Gestão de projecto:
SINFIC, SA.
Rua Kwame Nkrumah, nº10 - 3º, Maianga, Luanda - Angola
ESAC - Escola Superior Agrária de Coimbra
Bencanta, Coimbra - Portugal
Editor:
Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas
Execução Gráfica:
OMLET DESIGN
revisão:
SINFIC, SA.
data:
Maio 2012
5. Pescado 236
5.1 Os produtos da pesca 236
8. bibliografia 292
Alguns processos de degradação apenas afectam as características nutricionais e sensoriais do produto (sabor, aroma,
cor, textura, características nutritivas) enquanto outros, afectando ou não aquelas características, poderão beneficiar o
desenvolvimento de microrganismos patogénicos ou a produção de toxinas, transformando-os em produtos perigosos
para a saúde. Também, a presença de resíduos químicos (p. ex. pesticidas ou resíduos medicamentosos) ou de materiais
físicos (p. ex. restos de metal) poderão colocar em causa a saúde dos consumidores.
ESTREPTOCOCO
ESPIROQUETA
bacilos
espirilo
Figura 1.1
Diferentes formas
apresentadas por
bactérias
Tabela 1.2
Grupos fisiológicos de
lados mantêm as suas características por longos períodos de tempo. Também microrganismos em função
das condições óptimas de
percebeu que o aquecimento elimina os microrganismos e que, embalando os atmosfera de crescimento
alimentos tratados pelo calor eles se degradam mais lentamente. Verificou tam-
bém que, alguns alimentos quando são mantidos à temperatura ambiente modi-
ficam as suas características organolépticas (relacionadas com o seu sabor) mas
mantém-se estáveis e, inclusivamente, melhoram a sua capacidade de conserva-
ção e o seu sabor. Esta observação deu origem a diversos alimentos e bebidas
fermentadas, a maioria de origem étnica e característicos de algumas regiões
(p.ex.: leite azedo, cerveja de massambala). Uma grande variedade de produtos
fermentados é, hoje em dia, encontrada nos mercados e se, nalguns casos, es-
ses produtos beneficiaram com a aplicação dos princípios científicos actuais, na
maioria dos casos permanecem idênticos aos produtos originais. Este é o caso de
bebidas alcoólicas como o vinho e a cerveja, variados queijos e leites fermentados
ou mesmo produtos cárnicos, como algumas salsichas.
1.3.3 Temperatura
A temperatura é provavelmente o mais importante factor ambiental que afecta
o crescimento e a viabilidade dos microrganismos. Embora algumas espécies de
microrganismos possam crescer a temperaturas de -8 ºC ou a +90 ºC, a gama de
temperaturas que permite o crescimento de microrganismos, incluindo os pa-
Tabela 1.3
Limites de temperatura (ºC)
de crescimento de quatro
grupos fisiológicos de bactérias
e de Stumbo (1973)
1,8-4,0 Reacções Químicas
8,0-12,0 Inactivação de Esporos Bacterianos
10,0-20,0 Inactivação de Microrganismos
10,0-100,0 Desnaturção de Proteínas
Tabela 1.4
Valores de Q10
de diversas reacções
togénicos, raramente ultrapassa os +35 ºC. A tabela 1.3 apresenta os limites de
crescimento de quatro grupos fisiológicos de bactérias.
Tabela 1.5
Tempos de redução decimal
(valores D) para alguns
enlatados esterilizados, o microrganismo de referência é o agente do botulismo microrganismos
(Clostridium botulinum) que é produtor de uma das mais perigosas toxinas co-
nhecidas. No caso dos produtos pasteurizados (p. ex. leite) o microrganismo de
referência é o agente da tuberculose (Mycobacterium tuberculosis).
aw= p/po
Tabela 1.6
Tempos de redução decimal
(valores D) para alguns esporos
a determinadas temperaturas
A actividade da água está pois relacionada com diversas propriedades dos ali-
mentos como sejam, a sua pressão osmótica, os seus pontos de ebulição e de
congelação e a sua humidade relativa de equilíbrio (HRE).
HRE % = aw x 100
1.3.5 pH/acidez
Há milhares de anos que o aumento da acidez dos alimentos, quer de forma
natural, através de um processo de fermentação (p. ex. iogurte, leites fermenta-
LEVEDURAS
Debaryomyces hansenii 0,83
Tabela 1.7
Saccharomyces bailii 0,80 Valores mínimos de actividade da
água que permitem o crescimento
Saccharomyces cerevisiae 0,90
de microrganismos
aw
Adaptado de ICMSF (1980) e de Jay, (1992)
ALIMENTOS aw ALIMENTOS
dos ou pickles) quer artificialmente, através da adição de ácidos fracos, tem sido
usada para aumentar a estabilidade microbiológica dos alimentos e para garantir
a sua conservação.
A acidez é o principal factor que garante a conservação dos alimentos fermen-
tados e este factor pode ser combinado com outros que também promovam a
sua conservação, como sejam, o calor, a adição de conservantes e, a redução da
actividade da água.
O grau de acidez de um alimento pode ser medido por titulação química ou, mais
vulgarmente, por determinação do seu pH. O pH é medido numa escala entre 0 e
14, sendo o valor de 7 o indicador da neutralidade. Valores superiores a 7 indicam
Tabela 1.9
Classes de alimentos condições básicas e, inferiores a esse valor indicam condições ácidas.
em função do seu pH
Em termos práticos, os alimentos que são submetidos a tratamentos térmicos
para a sua conservação são normalmente divididos em dois grupos, consoante o
seu pH: alimentos pouco ácidos, com um valor de pH superior a 4,5 e, alimentos
ácidos, com valores de pH mais baixos.
A tabela 1.10 apresenta os valores de pH mínimos que permitem o crescimento
de vários microrganismos. As bactérias que não produzem esporos são as mais
comuns entre os responsáveis pela deterioração dos alimentos em todos os va-
lores de pH. Felizmente as bactérias patogénicas são sensíveis à acidez.
Tabela 1.11
Ácidos orgânicos de uso mais
comum em alimentos e exemplos
de aplicações
bios mas podem encorajar o crescimento de microrganismos anaeróbios (Ente-
robactérias e Clostrídios). Os vegetais têm elevados valores de Eh (+300 a +400
mV) que previnem o crescimento de microrganismos anaeróbios, daí que sejam
normalmente deteriorados por bactérias aeróbias.
1.3.10 Fumo
O fumo é um componente importante dos processos de conservação de muitos
produtos à base de carne e de pescado. Hoje em dia é apenas fundamental para
a conservação de alguns, sendo sobretudo usado para melhorar o seu aroma e
cor. Contudo, em países pouco desenvolvidos e em sociedades rurais ainda tem
um papel muito importante como elemento chave para a conservação de ali-
mentos. Pode também ser usado como agente desinfectante como seja o caso
da sua utilização para desinfectar cabaças destinadas à produção de leite azedo.
O fumo contém uma grande variedade de compostos orgânicos, alguns deles
com acção antimicrobiana comprovada, como sejam compostos fenólicos e o
formaldeído.
24 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 2. Água e alimentos como fontes de toxi-infecções
ambiente
alimentos
irrigação
água
fertilização
perdas
oceanos • rios ruminantes • aves
ribeiros pescado • suínos
água de consumo
saúde humana
esgotos manuseamento
transformação
consumo
IMUNOCOMPROMETIDOS
idosos • crianças
Figura 2.1
Relação entre a saúde
humana e as infecções
2.2 Principais agentes patogénicos associados à água alimentares com origem
na água e nos alimentos
A água é um factor indispensável à sobrevivência dos seres vivos, essencial na
produção agrícola e na indústria de transformação alimentar.
2. Água e alimentos como fontes de toxi-infecções Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 25
A principal origem dos microrganismos patogénicos presentes na água é a fecal.
2.2.1 Bactérias
Escherichia coli
É um organismo de origem fecal, capaz de fermentar a lactose com produção de ácido e gás a 35 - 37 ºC e 44 ºC, em menos
de 48 horas
Pode estar associada a infecções urinárias, genitais, meningites de recém nascidos e septicemias
Os serotipos O - 55, O - 111 e O - 127 são frequentemente associados à diarreia infantil. Esta espécie é susceptível de produzir
toxinas, que estão na base da ocorrência de diarreias
A estirpe O157:H7 causa diarreias sanguinolentas severas acompanhadas de fortes dores abdominais. É um dos agentes
responsáveis pela denominada diarreia dos viajantes
A ocorrência destas situações está ligada a práticas de higiene deficientes, uso de água poluída na preparação de alimentos
ou rega com águas contaminadas e posterior lavagem ou preparação deficiente dos alimentos
Pseudomonas aeruginosa
Incluída no grupo das bactérias aeróbias Gram-negativas em forma de bastonete. A sua mobilidade é assegurada por um
ou vários flagelos polares
É responsável por um elevado número de infecções no Homem, nomeadamente nos olhos, nos ouvidos, e nos tractos uriná-
rio ou digestivo. Pode desenvolver-se em feridas ou queimaduras
26 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 2. Água e alimentos como fontes de toxi-infecções
Figura 2.2 Figura 2.3 Figura 2.4
Vibrio cholerae Pseudomonas aeruginosa Clostridium perfringens
Salmonella spp.
Pertence à família Enterobacteriaceae, bastonete Gram-negativo, anaeróbio facultativo. Faz parte do grupo de microrganis-
mos patogénicos capazes de se desenvolver na água
As espécies S. tythi e S. paratyphy e respectivos serótipos são responsáveis pela ocorrência de febre tifóide
Estas bactérias estão associadas ainda a toxi-infecções alimentares, e a infecções mais raras tais como meningites, problemas
osteoarticulares, hepatites ou alterações pulmonares
Clostridium perfringens
Bactéria anaeróbia e formadora de esporos. É de origem fecal podendo encontrar-se também em lamas e no solo, em
contacto com águas residuais ou estrume. A sua transmissão faz-se através de alimentos contaminados com águas onde a
bactéria se encontra, produzindo toxinas que dão lugar ao aparecimento de gastroenterites. O tipo A é responsável pela
gangrena gasosa do Homem e o tipo C provoca formas graves de enterite necrótica no Homem e em alguns animais
2.2.2 Protozoários
Giardia lamblia
Protozoário flagelado associado à giardíase, que é uma doença intestinal muito comum, também denominada “doença dos
viajantes”. A principal causa de contaminação humana é através da água contaminada por material fecal
Criptosporidium parvum
Este protozoário provoca enterocolites agudas especialmente em pacientes imunocomprometidos
Amibas
Constituem um grupo menos desenvolvido morfologicamente dos protozoários, conhecendo-se duas espécies que afectam
o Homem: a Entamoeba díspar, que não é patogénica e a disentérica, muito abundante em zonas quentes e/ou onde as con-
dições sanitárias são deficientes. É responsável pela amibiase disentérica
A E. hystolitica pode provocar lesões no fígado. Pode conduzir a diarreias sanguinolentas, apendicites e abcessos no fígado,
pulmões e cérebro
2. Água e alimentos como fontes de toxi-infecções Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 27
2.2.3. Vírus
Bacteriófagos fecais
São vírus específicos das bactérias. Os bacteriófagos fecais estão presentes na
generalidade das matérias fecais, humanas ou de animais de sangue quen-
te, podendo constituir indicadores da presença destas substâncias na água.
Os bacteriófagos específicos de determinadas bactérias patogénicas, podem
constituir um índice de contaminação das águas pelas bactérias corresponden-
tes. A sua presença pode ser tomada como significativa de uma contaminação
antiga ou intermitente, por essas bactérias patogénicas.
Enterovirus
No conjunto de vírus que podem ser detectados nas águas de consumo, po-
dem ser referidos os responsáveis por miocardites, meningites, erupções cutâ-
neas, infecções respiratórias, e ainda polivirus responsáveis pela poliemielite.
28 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 2. Água e alimentos como fontes de toxi-infecções
as de reprodução (cistos) são muito resistentes, pelo que a sua eliminação pode
obrigar a tratamentos complementares, nomeadamente por filtração, através
de filtros de areia, eventualmente complementada recorrendo a outros mate-
riais mais eficientes (por exemplo carvão activado).
A eliminação de vermes e ovos de vermes, que não são destruídos pela desin-
fecção, pode ser facilmente conseguida por processos de filtração.
Estima-se que os agentes causadores de doenças de origem alimentar responsáveis pela maior frequência de casos sejam, por ordem decrescen-
te: Norovirus, Salmonella spp., Clostridium perfringens, Campylobacter spp. e Staphylococcus aureus.
Os norovirus, pertencentes à família Calciviridae são responsáveis por 95% dos surtos de origem viral e por cerca de 50% da totalidade dos surtos
de doenças de origem alimentar.
Uma higiene insuficiente durante a colheita ou o abate, o armazenamento e principalmente a preparação dos alimentos, aumenta a carga bacte-
riana e a diversidade das espécies, tal como o risco acrescido de neles se encontrarem estirpes patogénicas. É o caso dos alimentos contaminados
por matérias fecais humanas ou animais. Este tipo de contaminação é a causa mais frequente da presença de agentes patogénicos.
A permanência dos alimentos em condições propícias ao desenvolvimento de microrganismos patogénicos provoca uma proliferação por vezes
explosiva da sua população e, consequentemente, atinge-se o patamar de intolerância para o organismo humano. Vários alimentos mostram
uma elevação muito rápida da sua carga microbiana contaminante durante uma permanência de algum tempo à temperatura ambiente.
Uma cocção insuficiente ou medidas de saneamento inadequadas permitem a sobrevivência de um determinado número de microrganismos
patogénicos ou de parasitas presentes nos alimentos. Note-se que a grande maioria deles são facilmente destruídos durante a cocção completa
de um alimento ou após a aplicação de medidas de saneamento, tal como a pasteurização.
Relativamente aos alimentos em causa verifica-se que a grande percentagem dos casos de doenças de origem alimentar deve-se aos alimentos
de origem animal, tal como carne, ovos e produtos lácteos.
2. Água e alimentos como fontes de toxi-infecções Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 29
2.3.1 Bactérias
2.3.1.1 Salmonelose
As salmoneloses são toxinfecções muito frequentes e de gravidade elevada. São
causadas por bactérias do género Salmonella, que se adquirem sobretudo atra-
vés do consumo de alimentos de origem animal contaminados. A salmonelose
constitui um dos mais comuns problemas de saúde pública. Milhões de casos
humanos são reportados anualmente no mundo, originando milhares de mor-
tos. Entre os alimentos mais relacionados com o aparecimento de surtos de sal-
monelose destacam-se as carnes de vaca, de aves e de porco logo seguidas por
produtos lácteos e ovos ou derivados.
A incidência desta infecção é muitas vezes cíclica, isto porque é máxima durante
os meses quentes. Isto pode ser explicado por uma temperatura ambiente mais
propícia à multiplicação de bactérias nos alimentos. Embora a maioria dos doen-
tes infectados por esta bactéria recuperem após alguns dias de diarreia e febre,
existem outras pessoas que necessitam de tratamento médico, podendo até os
indivíduos mais vulneráveis falecer. A infecção declara-se após a ingestão de um
grande número de bactérias vivas que varia conforme a virulência da estirpe de
Salmonella e o grau de resistência do indivíduo hospedeiro. A dose infecciosa
mínima capaz de desencadear a doença poderá variar de alguns milhares a vá-
rios milhões de bactérias por grama de alimento contaminado.
30 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 2. Água e alimentos como fontes de toxi-infecções
tiplicarem, criando assim lesões e focos inflamatórios. São as endotoxinas liberta-
das que estão na origem dos sintomas.
2.3.1.2 Campilobacteriose
Trata-se de uma zoonose com distribuição mundial, existindo várias espécies pa-
togénicas para os seres humanos, sendo o Campylobacter jejuni e o Campylobac-
ter coli as espécies mais frequentes. Encontram-se disseminadas na natureza e no
tracto gastrointestinal de animas domésticos e selvagens.
2. Água e alimentos como fontes de toxi-infecções Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 31
Os mecanismos da infecção iniciam-se com a fixação da bactéria à mucosa in-
testinal. Esta invade depois a mucosa e provoca danos, inflamação e por vezes
ulcerações.
32 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 2. Água e alimentos como fontes de toxi-infecções
2.3.1.4 Yersiniose
O agente zoonótico da yersiniose transmitido pelos alimentos é a Yersinia entero-
colitica. Estas bactérias podem-se encontrar na natureza, na carne (sendo o suíno
o veiculo mais habitual). A yersiniose é uma gastroenterite cuja sintomatologia
pode sugerir uma crise de apendicite, razão pela qual não é de fácil identificação.
É uma doença grave que pode levar a complicações, devendo ser tratada com
antibióticos, contrariamente à maioria das outras infecções alimentares.
2.3.1.5 Listeriose
Esta doença é originada por bactérias do género Listeria. Dados os intervalos de
tempo significativos entre a ingestão do alimento e o aparecimento dos primei-
ros sintomas da doença, é muito difícil encontrar a pista do veículo do germe. A
ingestão de Listeria monocytogenes com os alimentos não suscita manifestações
clínicas na maioria dos indivíduos de boa saúde. Estes tornam-se no máximo por-
tadores transitórios do germe – estima-se que cerca de 1% das pessoas pode
excretar esta bactéria nas fezes, sem ter sinais de infecção. Nas faixas etárias mais
sensíveis (crianças e idosos), tal como os doentes crónicos, a bactéria pode gerar
uma infecção grave, muitas vezes mortal.
2. Água e alimentos como fontes de toxi-infecções Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 33
2.3.1.6 Leptospirose
A leptospirose é uma doença infecciosa febril, aguda, de carácter sistémico, po-
tencialmente grave, causada por uma bactéria – Leptospira spp. – normalmente
transmitida pela urina dos ratos. Em seres humanos, atinge pessoas de todas as
idades, mas em 90% dos casos o desenvolvimento da leptospirose é benigno.
Esta doença atinge roedores, mamíferos silvestres, animais domésticos (cães
e gatos) e animais ligados à pecuária (bovinos, suínos, caprinos e ovinos). Es-
tes animais podem tornar-se portadores assintomáticos e eliminar a Leptospira
através da urina, sendo portanto responsabilizados pela difusão da doença.
A infecção humana na maioria das vezes está associada ao contacto com água,
alimentos ou solo contaminados pela urina de animais portadores de Leptos-
pira spp.. A doença é classicamente descrita como sendo dividida em duas
fases distintas. Após um período médio de 2 semanas desde a contamina-
ção surgem os primeiros sintomas (incubação) e, quando se parecem verificar
melhoras, piora a disseminação da doença, desta vez com envolvimento de
vários órgãos e do sistema vascular. Surgem novos e importantes sintomas e
hemorragia que dão nome à própria bactéria. A morte dá-se frequentemente
por insuficiência renal.
2.3.1.7 Tuberculose
A tuberculose é causada pelo agente Mycobacterium tuberculosis. Conhecem-
-se três tipos de micobactérias (humano, bovino e avícola). As micobactérias
são bastante resistentes às condições do ambiente. Os alimentos que mais fre-
quentemente estão contaminados são a carne e o leite e representam pois
o maior risco. Os meios de luta mais eficazes consistem em diagnosticar os
animais doentes e impedir o seu consumo ou o consumo dos seus produtos
(leite). O tratamento térmico do leite (pasteurização) garante a eliminação des-
ta bactéria.
34 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 2. Água e alimentos como fontes de toxi-infecções
2.3.1.8 Brucelose
A brucelose é uma doença causada pelo agente Brucella spp. Conhecem-se três
espécies: Brucella abortus, Brucella melitensis e Brucella suis sendo a espécie B. meli-
tensis a mais perigosa para o Homem. Estes agentes sobrevivem no leite cru e nos
lacticínios frescos por algumas semanas sendo estes os alimentos de maior risco.
O controlo da doença passa pela vigilância dos animais e eliminação dos afecta-
dos. O tratamento térmico do leite (pasteurização) e a fermentação eliminam este
perigo. A congelação da carne também contribui para a sua eliminação.
2.3.1.10 Botulismo
O botulismo é causado pelo agente Clostridium botulinum que é um microrganis-
mo esporolado anaeróbio que se encontra no solo e na água. O microrganismo,
salvo raras excepções, não é patogénico por si próprio. Produz contudo uma das
toxinas mais mortais que se conhecem. Os esporos suportam bem baixas tem-
peraturas e são muito resistentes à acção do calor (são necessários pelo menos 3
minutos a 121 ºC para os eliminar, isto é, para se garantirem 12 reduções decimais
na população presente no alimento). Este microrganismo pode ser encontrado na
carne, no peixe e nos crustáceos. As conservas caseiras mal esterilizadas e alguns
pratos pré confeccionados são os meios mais comuns de infecção.
2. Água e alimentos como fontes de toxi-infecções Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 35
2.3.2 Intoxicações devidas a fungos (micotoxicoses)
Chamam-se micotoxinas aos metabolitos tóxicos elaborados por determinados
fungos durante a sua multiplicação nos alimentos. A composição química das
micotoxinas varia consideravelmente, mas a maioria é termoestável e não volátil,
não sendo fácil a sua destruição pelos vulgares tratamentos culinários. Uma vez
absorvidas pelo organismo, é difícil eliminar as micotoxinas podendo haver um
efeito cumulativo, pelo que a ingestão repetida de pequenas doses pode ter
repercussões dramáticas a médio e longo prazo.
Aflatoxinas
São produzidas pelos bolores Aspergillus flavus, Aspergillus parasiticus e Aspergillus nomius
Em fortes doses constituem venenos mortais. Temperatura não inferior a 15 ºC e uma humidade relativa acima de 75% são condições
mais propícias à sua síntese. Têm elevado poder carcinogénico para o fígado e elevada toxicidade que é agravada por dietas pobres em
proteína
Animais alimentados com forragem ou grão contaminado podem apresentar sintomas de toxicidade aguda ou crónica, podendo a sua
carne ou leite conter aflatoxina
O principal veículo de disseminação dos esporos dos bolores produtores desta toxina é o ar, ocasionando frequentemente a contami-
nação dos alimentos
Os cereais (milho especialmente), os grãos de oleaginosas (amendoins e nozes) e as leguminosas (grãos de soja) são substratos favoráveis
quando armazenados alguns dias a temperaturas próximas dos 25 ºC e com uma humidade relativa superior a 70%
Estas toxinas embora não sejam passíveis de destruição pelos tratamentos térmicos de cozedura são muito sensíveis às radiações ultra-
violetas
Citrinina
É uma micotoxina segregada por Penicillium citrinum. O desenvolvimento do bolor no arroz armazenado é acompanhado pela formação
de um pigmento amarelo. A citrinina provoca danos renais graves
Fumonisinas
Produzidas por Fusarium moniliforme e Fusarium proliferatum. Estão associadas ao cancro do esófago no Homem
Zearalenona
Produzida pela Fusarium graminearum, origina efeitos de infertilidade e abortos e, tem sido detectada no milho e em produtos à base
de milho
36 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 2. Água e alimentos como fontes de toxi-infecções
Ocratoxina A
Segregada por Penicillium verrucosum. Considerada nefrotóxica e carcinogénica (associada a tumores do tracto urinário). Pode ser en-
contrada nos cereais (milho e cevada) e frutos secos como amendoins, grãos de café e leguminosas. Foi também, detectada em bebidas
como café, vinho e cerveja
Patulina
Micotoxina produzida por bolores que pertencem aos géneros Penicillium, Aspergillus e Byssochlamys, encontram-se sobretudo nos
cereais (trigo), batatas e frutos, sobretudo na maçã e derivados. Pode assim, aparecer nos sumos de maçã, caso não sejam eliminadas as
peças de fruta podres
Os efeitos agudos que ocasiona são de natureza gastrointestinal como náuseas, vómitos e problemas renais. Os crónicos situam-se ao
nível da actividade mutagénica e cancerígena
2.3.3 Parasitas
Os alimentos podem veicular formas parasitárias com diferentes origens, de acor-
do com o tipo de ciclo de vida e adaptação entre parasita, meio ambiente e
hospedeiro(s).
2. Água e alimentos como fontes de toxi-infecções Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 37
Grupo Forma Localização da forma Fonte
Parasita
taxonómico parasitária parasitária infectante de infecção
ÁGUA, ALIMENTOS e utensílios
Cryptosporidium spp. Protozoários Ooquisto Fezes contaminados com fezes via
fecal-oral
ÁGUA, ALIMENTOS e utensílios
Protozoário
Entamoeba histolytica Fezes contaminados com fezes via
(ameba)
fecal-oral
Ooquisto Músculo de bovino,
carne crua ou mal
(fezes do gato) ovino, porco, aves
cozinhada
Toxoplasma gondii Protozoário Bradizoíto Rato
carne de caça selvagem
(quisto tecidular) Músculo de
no músculo fezes de gato
herbívoros selvagens
contaminação ambiental
ingestão de hospedeiros
Toxocara canis Nemátodo Larva (L1) Fezes de cão
paraténicos (coelho)
via fecal-oral
carne de porco, javali,
suínos selvagens
Trichinella spp. Nemátodo Larva Músculo
enchidos
carne de cavalo
contaminação ambiental
Echinococcus granulosus Céstodo Ovo Fezes de cão
via fecal-oral
Fezes de carnívoros contaminação ambiental
Echinococcus multilocularis Céstodo Ovo
selvagens via fecal-oral
Larva carne crua ou mal
Taenia saginata Céstodo Músculo de bovino
Cysticercus bovis cozinhada
Agriões selvagens,
Fasciola hepatica Tremátodo Metacercária arroz e outras plantas em salada
plantas
Vísceras e músculo peixe cru ou mal
Anisakis spp. Nemátodo Larva (L3/L4)
do peixe cozinhado
Salmonídeos e outros
Diphyllobothrium latum Céstodo Larva músculo e fígado
peixes
Carne
Clonorchis spp.; Opistorchis spp. Tremátodos Metacercária músculo
Peixe
tabela 2.1
Parasitas de origem alimentar que
podem afectar o Homem (infecção por via oral).
38 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 2. Água e alimentos como fontes de toxi-infecções
parasitárias – ovos, ooquistos ou larvas que, por contaminação ambiental (água,
ar, poeiras), a designada via indirecta de transmissão, podem chegar ao Homem,
veiculadas pelos alimentos. Sobretudo alimentos crus, mal lavados, como saladas
ou, através do uso da água nas suas diferentes aplicações ligadas aos alimentos.
A água de bebida também pode estar implicada como veículo de infecção para-
sitária potencial, sobretudo para protozoários, tais como Toxoplasma gondii, En-
tamoeba spp., Giardia lamblia e, ainda Cryptosporidium spp. Esta contaminação
ocorre, na maior parte das vezes, por efluentes, quer de origem humana quer de
origem animal.
No que respeita ao risco de infecção por parasitas e como a prevenir, deve ter-
-se em consideração que, muitos deles estão dependentes de práticas de risco
que se prendem com condições de vida dos animais e do Homem, tais como
saneamento básico, maus hábitos de higiene das populações e, ainda deficientes
práticas agrícolas.
2. Água e alimentos como fontes de toxi-infecções Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 39
c d e a ooquisto
j a b
b esporozoíto
c trofozoíto
f g macrogâmeta
h microgâmeta
g i zigoto
j ooquisto esporulado
ciclo sexuado de cabeça espessa
h k ooquisto esporulado
i de cabeça fina
Figura 2.5
Cryptosporidium spp.
Ciclo de vida
O Cryptosporidium é um protozoário unicelular, parasita obrigatório, que infecta
as células epiteliais do intestino e/ou do aparelho respiratório dos vertebrados
– Homem, mamíferos, aves, peixes e répteis. Até há algum tempo atrás conside-
rava-se que desenvolvia doença apenas em indivíduos imunocomprometidos
(especialmente SIDA), contudo hoje aceita-se como patogénico para os huma-
nos imunocompetentes.
Conhecem-se 13 espécies, sendo que duas são reconhecidas como as mais fre-
quentes em surtos no Homem – C. homini e C. parvum, ainda que C. meleagridis,
C. felis, C. canis, C. suis e C. muris tenham sido identificadas como tal.
Criptosporidiose
A criptosporidiose caracteriza-se por diarreia que é persistente em pessoas com
imunodeficiência. A transmissão fecal-oral pode ocorrer directamente pessoa-
-pessoa e animal-pessoa ou indirectamente, através de veículos, que incluem a
água e os alimentos. É uma infecção importante a nível dos animais, sendo os
bovinos e as aves as espécies animais de maior importância como reservatório
para o Homem.
40 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 2. Água e alimentos como fontes de toxi-infecções
Adaptado de CDC (Centers for Disease Control and Prevention)
1 trofozoíto e quisto nas fezes
2 quistos ingeridos na
água e nos alimentos
i estádio infectivo
d estádio de diagnóstico
trofozoítos
cisto
Figura 2.6
Giardia lamblia
ciclo de vida
A infecção ocorre pela ingestão de quistos em água e alimentos contaminados, ou por infecção fecal-oral (mãos e fómitos). Estes quistos podem
sobreviver vários meses na água, ainda que não sejam tão resistentes como os de Cryptosporidium spp. No intestino delgado, cada quisto liberta dois
trofozoítos que se multiplicam por divisão binária. Seguidamente, podem aderir à mucosa através da ventosa ventral ou transitarem para o intestino
grosso onde formam os quistos que vêm para o exterior com as fezes. Os animais podem ser reservatórios para o Homem.
Giardiose
Giardia duodenalis é o protozoário mais comum como causa de diarreia, causando
diarreia a mais de 200 milhões de pessoas em todo o mundo. A maior parte das
infecções por G. duodenalis são assintomáticas, tendo nos países industrializados
uma prevalência de 2 a 5%.
2. Água e alimentos como fontes de toxi-infecções Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 41
infecção intestinal e extra intestinal. Pode afectar qualquer pessoa, embora seja
mais comum nas populações que vivem em zonas tropicais com pobres condi-
ções sanitárias.
O Homem elimina o parasita nas fezes quer sob a forma de trofozoíto quer sob a forma de ooquisto, sendo que a primeira forma aparece nas fezes
diarreicas e a segunda nas fezes normais. A infecção por Entamoeba histolytica ocorre através da contaminação da água, mãos e alimentos por ooquis-
tos maduros. Os trofozoítos são libertados a partir do ooquisto a nível do intestino delgado e por multiplicação binária originam ooquistos e ambas
as formas eliminam-se nas fezes. Os quistos são muito resistentes e podem permanecer livres e viáveis, durante semanas no ambiente. A forma não
invasiva significa que os trofozoítos (E. dispar) passam para as fezes e permanecem apenas no lúmen intestinal. Em alguns pacientes os trofozoítos inva-
dem a mucosa intestinal (doença intestinal) e, noutros casos, invadem a corrente sanguínea (E. histolytica) e localizam-se no fígado, cérebro e pulmões
(doença extra intestinal) com sintomatologia variada.
Amebiase
A amebiase, de acordo com a espécie de Entamoeba tem sintomatologia variável,
sendo que a forma invasiva intestinal conduz a sintomas de disenteria, colite ou
apendicite. A forma extra intestinal (Entamoeba histolytica) apresenta abcessos
no fígado, peritonite, abcessos pleuropulmonares e lesões cutâneas e genitais.
A disenteria por ameba ocorre em todo o mundo com maior incidência nas regi-
ões tropicais e subtropicais mas também nas temperadas, sendo que para cima
de 500 milhões de pessoas estão infectadas com aproximadamente 100.000
mortes por ano. A encefalite amebiana parece ser rara.
42 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 2. Água e alimentos como fontes de toxi-infecções
Adaptado de CDC (Centers for Disease Control and Prevention)
1a 1b
2
2
ooquistos fecais
alimentos
5
3 tranquizoitos
6b
4 4
6a
cistos nos tecidos
8
7
transmissão
transplacentária 9
transfusões
Figura 2.7
Esquema do ciclo de
vida do protozoário
O Homem pode infectar-se por várias vias, sendo a mais comum a ingestão de Toxoplasma gondii
2. Água e alimentos como fontes de toxi-infecções Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 43
Toxoplasmose
A toxoplasmose é provocada pelo T. gondii. Sabe-se que um grande número de
pessoas já contactaram com o parasita mas que não demonstraram sintomas
ou estes confundiram-se com uma gripe normal, ou apresentaram linfadenite
passageira, dos gânglios linfáticos cervicais.
Lavar as mãos com água e sabão após contacto com fezes de gato ou após jardinagem
Se estiver grávida ou imunocomprometido não deve fazer a limpeza da caixa de areia do gato e não deixar os gatos saírem à rua
Não comer carne mal cozinhada
Não dar a comer carne mal cozinhada aos gatos
O Homem, particularmente as crianças, podem ingerir ovos embrionados pelo contacto com o solo ou contaminação alimentar ou, pela ingestão
do hospedeiro paraténico. Após ingestão os ovos eclodem e as larvas penetram a parede do intestino e, pela circulação sanguínea atingem vários
tecidos – fígado, coração, pulmão, cérebro, músculo, olhos. Apesar de as larvas não evoluírem para parasita adulto, provocam nos tecidos reacções
inflamatórias locais que estão na base da toxocarose – larva migrans visceralis e larva migrans ocular. O diagnóstico é feito por serologia, ou seja, pela
pesquisa de anticorpos específicos circulantes.
44 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 2. Água e alimentos como fontes de toxi-infecções
Adaptado de CDC (Centers for Disease Control and Prevention)
1 larvas enquistadas nos tecidos
i estádio infectivo
d estádio de diagnóstico
carnivorismo
larvas libertadas
no intestino
roedores
larvas enquistadas
no músculo estriado
adultos no intestino
circulação
delgado
larvas depositadas
na mucosa
Figura 2.8
Trichinella spp.
2.3.3.6. Trichinella spp. ciclo de vida
O nemátodo Trichinella inclui várias espécies que infectam uma larga gama de
hospedeiros, desde mamíferos, aves e répteis e está distribuído mundialmente.
Hoje em dia, estão reconhecidos oito genótipos de Trichinella. Para além da es-
pécie T. spiralis, mais comum em muitos carnívoros e omnívoros, conhece-se pre-
sentemente a T. pseuspiralis, em mamíferos e aves, a T. nativa, do urso do Ártico, a
T. nelsoni, dos predadores africanos e necrófagos e a T. britovi, dos carnívoros da
Europa e do Oeste Asiático.
A Trichinella spp. estabelece o seu ciclo de vida quer em animais selvagens (javali, porco selvagem, raposa, urso, coiote e outros) quer em animais
domésticos em que o porco é o principal hospedeiro, quer em cavalo.
A triquinelose é adquirida pelo consumo de carne mal passada com larvas enquistadas ou alimentos contaminados com esta carne. Os músculos
de predilecção são os másseteres, a língua e o diafragma, em quase todas as espécies animais. As larvas ao serem ingeridas desenvolvem o parasita
adulto no intestino e, após uma semana as larvas atravessam a parede intestinal e migram para o músculo estriado onde enquistam (excepção para a
T. pseudospiralis que não enquista), permanecendo viáveis por vários anos. Os ratos e os roedores são reservatórios da doença para os outros animais
que se infectam por carnivorismo.
2. Água e alimentos como fontes de toxi-infecções Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 45
Triquinelose
A aparente emergência de triquinelose em humanos, com a declaração de vários
focos a nível mundial, deve-se provavelmente a um melhor diagnóstico, uma vez
que a triquinelose não apresenta sintomas característicos. Os pacientes apresen-
tam febre, fadiga e mialgia e, ainda edema facial (alergia medicamentosa). Os
sintomas específicos são a eosinofilia, juntamente com um aumento dos enzi-
mas musculares no sangue. Em alguns focos têm surgido casos mortais.
Os factores de risco associados à triquinelose têm a ver com novos hábitos culi-
nários de carne menos cozinhada e com o consumo de enchidos, nomeadamen-
te enchidos de caça.
46 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 2. Água e alimentos como fontes de toxi-infecções
Adaptado de CDC (Centers for Disease Control and Prevention)
escólex adere
1 forma adulta no
ao intestino
duodeno do cão
2 ovo
3 oncosfera
4 quisto hidático
no hospedeiro adulto no intestino delgado
intermediário protoscólice HD
5 protoscólice
6 escólice desevaginado
que se fixa ao intestino ingestão de quistos nos orgãos
do cão
i estádio infectivo
Ovo embrionário
ingestão de ovos nas fezes nas fezes
d estádio de diagnóstico
HD hospedeiro
definitivo HI
(ovelha, porco)
HI hospedeiro
intermediário
oncosfera penetra a
parede do intestino
quisto hidático no fígado,
pulmões, etc.
O cão alberga no duodeno, a forma adulta do E. granulosus (Figura 2.9) sendo Figura 2.9
Echinococcus granulosus
que os ovos são eliminados para o exterior com as fezes deste animal. O hospe- ciclo de vida
deiro definitivo pode ainda ser o lobo, a raposa e outros canídeos selvagens. Os
ovos são muito resistentes no exterior, têm pequenas dimensões e facilmente
são transportados pela água e poeiras, contaminando as pastagens do gado e
outros alimentos, dos animais e do Homem. Ao serem ingeridos, os ovos libertam
o embrião no intestino dos ruminantes, porco e Homem, atravessam a parede do
intestino, entram na grande circulação e na pequena circulação podendo instalar-
-se no fígado, pulmão, rim ou ainda, em outros órgãos e tecidos.
Hidatidose
O E. granulosus apresenta 10 genótipos que se traduzem em características feno-
típicas e epidemiológicas distintas, com especificidades de hospedeiro distintas.
Assim, o genótipo G1 é o mais infectante para o Homem, estando adaptado aos
pequenos ruminantes, por isso, a hidatidose humana é mais coincidente com
zonas geográficas em que estes animais são mais numerosos. O G7 adaptado
ao porco já foi encontrado no Homem. Na hidatidose humana, a ocorrência de
quistos (hidátides) no fígado e pulmão perfazem mais de oitenta por cento dos
casos (WHO, 2001).
2. Água e alimentos como fontes de toxi-infecções Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 47
Adaptado de CDC (Centers for Disease Control and Prevention)
oncosferas originam
1 ovo de T. solium e T. saginata
oncosferas incubadas cisticercos no músculo
e respectivos anéis ovígeros
penetram parede ingestão de carne
intestinal e circulam mal cozinhada 2 HI (porco e vaca)
para os músculos
escólex fixa-se 3 oncosfera
ao intestino
4 ingestão de Cysticercus
T. saginata T. solium no músculo
i estádio infectivo
T. saginata T. solium d estádio de diagnóstico
ovos e proglótides
eliminados pelas fezes
Figura 2.10
Taenia solium e Taenia saginata As medidas profiláticas incluem a desparasitação do cão, com queima das fezes,
ciclos de vida
o reforço das medidas de higiene em crianças sempre que há contacto com o
cão; não deixar o cão ter acesso à horta (vedar a horta); lavagem eficaz das frutas
e legumes; destruição das vísceras com quistos.
O Homem infecta-se ingerindo carne de vaca com quistos (Cysticercus bovis) ou comendo carne de porco com quistos (Cysticercus celullosae), quando a
carne não está bem cozida ou, no caso do porco, pelo consumo de produtos cárnicos fumados. As formas neste último caso aparentam bagos de arroz
entre as fibras musculares e mantém viabilidade por 2 anos, sendo destruídas a baixas temperaturas, pela cozedura, 15 a 20 minutos a 45 - 50 ºC, pela
salmoura a 5%, mas não pelo fumeiro.
48 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 2. Água e alimentos como fontes de toxi-infecções
A chamada cisticercose humana refere-se à formação de cisticercos no Homem,
no cérebro (neurocisticercose) e globo ocular, maioritariamente, devido à inges-
tão de ovos de T. solium. Segundo alguns autores, a presença de T. solium no
intestino dos pacientes relaciona-se positivamente com a presença de cisticercos
no cérebro, o que indicia uma auto-infecção, na maioria dos casos. Este complexo
teniase/cisticercose deve-se pois, a contaminação fecal-oral (alimentos) e a infec-
ção cruzada pelo vento, água e moscas.
2.3.3.10 Anisakídeos
Os nemátodos da família Anisakidae ocorrem em centenas de espécies de peixe,
sendo de realçar o Anisakis simplex e o Pseudoterranova decipiens como os de
maior importância em saúde pública.
2. Água e alimentos como fontes de toxi-infecções Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 49
Anisakiase
No Homem, aquando da ingestão de formas larvares pelo consumo de peixe
cru, o ciclo dos parasitas Anisakidae não se completa, sendo que as larvas L3
provocam ulcerações na mucosa do aparelho gastro-intestinal, onde se fixam,
originam lesão e morrem, conduzindo à manifestação de dor e cólica abdominal
e, eventualmente vómito.
50 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 2. Água e alimentos como fontes de toxi-infecções
em alguns países onde oficialmente está legislada, em muitos casos, não é efec-
tiva nem a nível humano nem a nível veterinário e tem impacto reduzido em
termos epidemiológicos.
Outro aspecto relevante neste contexto e não menos importante, prende-se com
a informação da população para aspectos básicos de higiene pessoal e higiene
em geral, quer na relação com o cão (hidatidose), na forma como cuida deste ani-
mal e na forma como manipula alimentos. Essa educação passa pela informação
às populações, sobretudo aos mais jovens e crianças, que estão mais despertos,
dispostos a aprender e com a capacidade de introduzir mudanças nas famílias
onde se inserem.
2. Água e alimentos como fontes de toxi-infecções Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 51
3. Leite e Produtos Lácteos
3.1 Leite: definição, características e composição
Desde o momento da domesticação de animais e do início da prática da pas-
torícia que o leite de diversas espécies animais se transformou num importante
alimento para o Homem. É também a mais versátil matéria-prima de origem ani-
mal e, apresenta-se como um componente da dieta em diferentes formas físicas;
líquida para o leite em natureza e semi-sólida ou sólida para diversos produtos
derivados como sejam o iogurte, a manteiga, e diversos tipos de queijo.
Propriedades Físicas
densidade relativa 1,032 -1,036
pH 6,5-6,7
acidez 15-18 *
ponto de congelação -0,510 a -0,550 **
* graus Dornic ** graus Celsius
Tabela 3.1
Algumas características
físico-químicas do leite de vaca
O leite deve ser produzido de uma forma adequada isento de substâncias es-
tranhas e não conter colostro. A composição do leite varia com a raça, o peso, a
alimentação e a idade, entre outros factores. Os vários constituintes sólidos do
leite são: proteínas, lactose, gordura, sais minerais, vitaminas (hidrossolúveis e li-
possolúveis), enzimas, oligoelementos e outros compostos em doses vestigiais.
* Nota: Um leite normal apresenta uma reacção ligeiramente ácida. A acidez natural dos leites deve-se em parti-
cular à sua composição em fosfatos ácidos, citratos e substâncias proteicas. O aumento da acidez do leite após a
ordenha deve-se à transformação progressiva da lactose em ácido láctico.
Os valores normais variam de 15 a 18 °D para leites de vaca, de 12 a 18 °D para leites de cabra e de 18 a 22 °D para
leites de ovelha.
Entende-se por acidez dum leite o volume gasto de uma solução alcalina normal, expresso em mililitros para neu-
tralizar um decímetro cúbico de leite. No entanto existem várias unidades para apresentar os valores da acidez de
um leite (% de ácido láctico, ° Dornic, ° Soxhlet, º Thorner), todos eles convertíveis entre si.
Princípio: NaOH (P.M. 40 Da); ácido láctico (P.M. 90 D); 1 litro de solução normal de soda cáustica (40g NaOH/L)
neutraliza 1L de solução normal de ácido láctico (90 g/L). Com solução decinormal (0,1N) de soda tem-se: 4g de soda
em 1.000 mL que neutralizam 9 g de ácido donde, X mL de soda (= X g NaOH) neutralizam Y g de ácido contidos em
10mL de leite. Em 100 mL de leite estarão 10* Y g de ácido (= % ácido láctico p/p).
Técnica: Medem-se 10 mL da amostra para um copo de precipitação ou um tubo de ensaio, na qual se juntam 6
gotas do indicador (fenolftaleína) e titula-se com hidróxido de sódio, contido na bureta de precisão até a viragem
do indicador. A viragem do indicador é observada pelo aparecimento de uma cor rosada no leite durante a titulação.
Resultados: Sendo o volume de hidróxido de sódio 0,1 N gasto na titulação, segundo a técnica o resultado é 10 x V
mL de NaOH por dm3 de leite (° Thorner). É frequente utilizarem-se graus Dornic pela facilidade de conversão destes
em % de ácido láctico (basta dividir o resultado por 100). Para o efeito a solução de NaOH em vez de ser decinormal
(0,1N - 4g NaOH/L), será noninormal (0,11 N - 4.4 g NaOH/L).
Proteínas
As proteínas do leite são as substâncias mais representativas da chamada fracção
azotada do leite. Esta fracção é constituída por dois grupos, do qual o principal
é o das proteínas sendo o outro formado por matéria azotada não proteica. As
proteínas representam (95%), quase a totalidade desta matéria azotada, repre-
sentando as substâncias azotadas não proteicas menos de 5%.
As proteínas do leite são constituídas pelas proteínas insolúveis (caseínas) que
representam cerca de 27 g/L e pelas proteínas solúveis (5 g/L) que se encon-
tram no lactosoro e se dividem em albuminas, globulinas e enzimas. As maté-
rias azotadas não proteicas (ANP), constituem um conjunto de substâncias sem
efeito tecnológico e cujo teor em azoto não deve ser tomado em conta para a
determinação do teor proteico do leite. É de notar que a grande diferença exis-
Tabela 3.3
Principais ácidos gordos
componentes da gordura dos
leites de vaca, ovelha e cabra
tente entre a fracção da caseína e as proteínas solúveis (ou proteínas do soro), é
o facto da primeira coagular pelo coalho animal ou pelas enzimas coagulantes,
não coagulando pelo calor, enquanto as segundas coagulam pelo calor e não
coagulam por acção do coalho. Refira-se no entanto que a coagulação das pro-
teínas solúveis provocada pelo calor só é completa quando estas se encontram
em desequilíbrio ou seja, quando deixam de estar protegidas pela caseína após a
precipitação enzimática ou ácida destas.
Gordura
A gordura ou, mais correctamente, a chamada fracção lipídica do leite é de cons-
tituição muito complexa. A gordura encontra-se no leite sob a forma de uma
emulsão de pequenos glóbulos esféricos ou ligeiramente ovóides, cujo diâmetro
varia entre 2 a 10μm (0,002 a 0,01mm) consoante a raça da espécie.
Sais minerais
No leite encontram-se vários sais minerais em dissolução (moléculas ou iões)
ou no estado coloidal. O cálcio e o fósforo (Ca e P) são dois elementos funda-
mentais da estrutura da micela das caseínas, condicionam a estabilidade da
fase coloidal, sendo também de grande importância no plano biológico. O
magnésio (Mg) é um elemento também muito importante. O potássio (K), só-
dio (Na) e o cloro (Cl) permitem realizar, juntamente com a lactose, o equilíbrio
de pressão osmótica do leite na glândula mamária com a pressão osmótica do
sangue.
Para além destes macro elementos existem muitos oligoelementos mas que
estão presentes em quantidades vestigiais sendo eles: zinco, ferro, cobre, iodo,
flúor, cobalto, manganésio. Fisiologicamente servem para a formação e manu-
tenção do esqueleto, bem como para o equilíbrio de muitas funções orgânicas.
As acções por elas desempenhadas são complexas mas, a maior parte delas
têm uma acção preponderante sobre determinados aspectos do metabolismo.
O teor do leite em vitaminas lipossolúveis está directamente relacionado com
a quantidade de gordura. O leite inteiro pode conter quantidades significativas
destas vitaminas, enquanto o leite desnatado pode apenas conter vestígios.
Normalmente são necessários 500 volumes de sangue para fornecer os precursores de 1 volume de leite.
A glândula mamária pode secretar cerca de 2g de leite por 1g de tecido, por dia. Um grama de tecido
mamário contêm cerca de duzentos milhões de células.
Proteínas
As diversas proteínas do leite são sintetizadas na glândula mamária. Apenas a
albumina do soro (ASB) é transferida directamente da circulação sanguínea. As
proteínas podem ser divididas em dois grandes grupos: as caseínas, que repre-
sentam cerca de 82% da totalidade das matérias azotadas do leite e as proteínas
do soro, que representam cerca de 13,5 %. A fracção não considerada como pro-
teína verdadeira, representada pela proteose peptona e pelo azoto não proteico
representa os restantes 4 a 5%.
Este grupo de proteínas é composto pelas caseínas alfa (α) (15-19 g/L), beta (β)
(9-11 g/L), gama (γ) (1-2 g/L) e, kapa (k) (3-4g/L). Na sua totalidade as caseínas
representam cerca de 27-28 g por litro de leite.
Figura 3.1
ESTRUTURA BIDIMENSIONAL
DA micela de caseína
Para se ter uma ideia das dimensões das partículas do leite, um glóbulo de gordura de dimensão média
é cerca de 30 a 40 vezes maior que uma micela de caseína, cerca de 1.000 vezes maior que uma prote-
ína do soro e, cerca de 100.000 vezes maior que uma molécula de lactose. Por seu lado, uma micela de
caseína é cerca de 30 a 60 vezes maior que uma proteína do soro.
IgG
ASB
α lactalbumina
β lactalbumina
0 2 4 6 8 10 12 14
figura 3.2
Percentagem individual
dos principais componentes
azotados do leite
O teor de proteína do leite aumenta (mas as proporções entre os componentes proteicos mantêm-se cons-
tantes) quando os animais são submetidos a dietas ricas em concentrados. O excesso de proteína na alimen-
tação do animal, não altera o teor ou a proporção relativa de proteínas do leite, mas origina um aumento do
teor de azoto não proteico no mesmo.
Lípidos
Os ácidos gordos do leite podem ser originários de 3 fontes:
Ácidos gordos pré formados da gordura alimentar, transferidos para a glândula mamária via sangue e linfa, na forma de triglicerídeos
1 e ácidos gordos livres. Na sua maior parte são ácidos com 16 ou mais átomos de carbono
Ácidos gordos sintetizados pela glândula mamária a partir do acetato e hidroxibutirato produzidos pelas bactérias do rúmen
2 Os ácidos gordos produzidos por esta via têm cadeias curtas e médias (C4-C14 e parte do C16)
3 Ácidos gordos sintetizados a partir da glucose por via glicolítica. Esta não é uma fonte de ácidos gordos com significado nos ruminantes
Dietas pobres em forragens diminuem a produção de acetato e incrementam a produção de propionato como resultado das fermentações do rú-
men. O leite produzido por animais nestas condições contém um teor de matéria gorda significativamente mais baixo (p. ex. até cerca de metade
em vacas) do que o de animais submetidos a dietas ricas em forragens.
Note-se que a flora intestinal satura os ácidos gordos ingeridos e, consequentemente, os lípidos de depósito e na circulação sanguínea são alta-
mente saturados. A célula mamária dos ruminantes tem uma elevada capacidade de insaturar o ácido esteárico (C18:0) para ácido oleico (C18:1).
Citrato
O citrato, produzido ao nível das mitocôndrias, é importante na química do leite,
porque forma um complexo solúvel com o cálcio reduzindo assim a actividade
do ião Ca2+, sendo por outro lado o precursor de componentes aromáticos pro-
duzidos por algumas bactérias.
10
9
Proteínas do soro 8
% do componente
7
Lactose
6
Caseína 5
4
Gordura 3
Minerais 2
1
0
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
dias de lactação
figura 3.3
Evolução da composição
do leite no início da lactação
O leite é isotónico com o sangue (isto é, tem a mesma pressão osmótica). Os componentes que mais contribuem para a pressão osmótica
do sangue são iões Na+ e Cl-, enquanto no leite, a lactose, K+, Na+, e Cl- contribuem em conjunto. As variações da concentração de lactose
1 são pequenas, e as que ocorrem, são directamente correlacionadas com as do K+ e inversamente com as de Na+ e Cl-. A osmolaridade
(e, por consequência, o ponto de congelação: -0.570 ºC para o leite de ovelha e -0,540 ºC para o leite de vaca) é mantida entre limites
muito estreitos
A segunda limitação na composição do leite é a solubilidade do fosfato e do citrato de cálcio. O cálcio e o fosfato, de grande valor nutri-
2 tivo para o lactente, são veiculados sob a forma de complexo coloidal juntamente com a caseína. No caso do cálcio, 2/3 encontram-se
em solução enquanto o restante 1/3 se encontra intimamente associado às caseínas na micela
O ponto de fusão da gordura do leite não deverá ser superior à temperatura do corpo, uma vez que as gorduras líquidas a essa tempera-
3 tura são mais facilmente digeridas. Os ruminantes controlam o ponto de fusão da gordura do leite sintetizando ácidos gordos de cadeia
curta, e insaturando o ácido esteárico (C18:0), transformando-o em ácido oleico (C18:1)
2 Hidrólise de moléculas de ß caseína pela plasmina, e consequente formação de γ caseína e fragmentos peptídicos
3 Eventual lipólise da gordura do leite embora a probabilidade seja baixa, já que a membrana do glóbulo protege
4 Glóbulos de gordura retidos nos ductos, o que implica que o teor de gordura aumente ao longo da ordenha
6 Contaminação bacteriana
14
12
10
8
6
4
2
0
1 30 60 90 120 150 180 210 240 270
Dias de lactação
figura 3.4
Curva de lactação típica para é constituída por imunoglobulinas (anticorpos) que garantem a transferência de
vaca com um volume de lactação
de cerca de 4.000L em 270 dias resistências para a cria. O leite nos primeiros dias de lactação deverá ser utilizado
apenas para amamentação da cria e, só após esta fase, a fêmea produtora pode-
rá ser submetida a ordenha.
Os teores de proteína e gordura tendem por outro lado a ser mais elevados no
final da lactação, de forma indirectamente proporcional ao volume de leite pro-
duzido. Assim, para um dado animal, a composição do leite não é constante ao
longo de toda a lactação.
Pela observação da figura 3.5 pode inferir-se que as duas componentes queijeiras principais do leite, a gordura (G) e a proteína
(P) evidenciam uma progressão que não é constante. Como a evolução de cada um destes grupos não é paralela, a relação
gordura/proteína (G/P) varia ao longo do período de lactação, o que implica uma variabilidade importante nas características
da matéria-prima utilizada no fabrico de queijo.
3,00
P/g p/l
1 6 12 18 24 30 36 42 48
Semanas de lactação
P mg L
figura 3.5
Evolução dos principais componentes sólidos do
leite ao longo da lactação; variação dos rácios
proteína/gordura e proteína/lactose
tabela 3.4
Composição do leite
de diferentes espécies
produtoras (% m/v)
contram em suspensão coloidal no leite e, as proteínas do soro, que se encontram
em solução. De notar os baixos teores de proteína e elevados teores de lactose
dos leites de burra e de égua. A composição do leite destas duas espécies é muito
semelhante à do leite de mulher. A figura 3.6 representa graficamente as diferen-
ças na composição do leite das diferentes espécies. De notar o elevado extracto
seco do leite de ovelha quando comparado com o das restantes espécies. Devido
aos elevados teores de proteína e gordura do leite de ovelha, os rendimentos
queijeiros desta espécie são naturalmente superiores.
%
20,0
18,0 1,0
16,0 4,6
14,0
0,8 0,8 0,8 1,0
12,0 0,8
0,5 0,5 4,5 4,8 4,3
10,0 4,9 4,6
8,0 0,9 0,7 0,6
6,7 6,0 0,6
6,0 2,7 3,6 3,0
figura 3.6
2,6
4,0 1,2 7,5 Componentes sólidos
1,0
2,0 1,0 1,3 4,5 3,6 3,6 4,5 do leite. Comparação
1,5 1,7 entre espécies
0,0
Burra Égua Camela Vaca Búfala Cabra Ovelha
Quando o leite não é refrigerado a flora dominante é composta por bactérias lác-
ticas (lactococos e lactobacilos) que, ao transformarem a lactose em ácido láctico,
originam a sua coagulação por acidificação. Em muitos casos, uma acidificação
controlada do leite é, ela própria, um meio de o conservar e de garantir a sua
segurança. Se as condições de higiene na ordenha não forem boas há sempre
contaminação do leite por microrganismos de origem fecal e, muitas vezes, com
microrganismos patogénicos.
*A utilização de água oxigenada, também designada por peróxido de hidrogénio (H2O2) poderá ser autorizada, sobretudo em países tropicais e,
nos quais não existe um sistema de recolha de leite em condições de refrigeração. A FAO recomenda a utilização deste produto em concentrações
da ordem de 8,5 mg/L calculado com base em H2O2 (a água oxigenada disponível para este fim tem concentrações que oscilam entre 35 e 40%). A
quantidade a adicionar ao leite depende de vários factores tais como o tempo de transporte antes do tratamento final ou a temperatura do leite.
Quando se trate de garantir o não desenvolvimento de microrganismos durante a recolha e o transporte, sendo o leite submetido a um tratamento
térmico posterior, a concentração a usar deverá ser o mais baixa possível. À chegada á fábrica o leite deve ser tratado com catalase, um enzima
que elimina o peróxido. Este processo permite que o leite cru não se altere durante um período de 7 a 8 horas a temperaturas de 30 ºC (FAO, 2005).
Como regra, o leite usado para consumo directo deverá ser sempre sujeito a um tratamento térmico capaz de inactivar os microrganismos causa-
dores de doenças. Nas indústrias lácteas, o leite é normalmente submetido a um tratamento de 72 ºC por, pelo menos, 15 segundos usando per-
mutadores de calor. Em pequenas indústrias e fazendas, o leite é normalmente aquecido em tanques a 65 ºC por 30 minutos. Nos casos em que se
torne difícil controlar a temperatura, uma boa prática a usar deverá ser deixar que o leite levante fervura, desligando de imediato a fonte de calor.
O uso de leite cru deverá apenas ser tolerado para a produção de produtos lácteos fermentados como sejam queijos curados ou iogurtes, nos
quais, outros factores (acidez/pH, aw, flora microbiana), isoladamente ou em conjunto, inibem o crescimento de bactérias patogénicas.
Tabela 3.5
Exemplo de critérios usados
para classificação de leite
CRITÉRIOS TECNOLÓGICOS
Tabela 3.6
Exemplo de aplicação de critérios
de classificação do leite
Naturalmente que os critérios de classificação do leite estabelecidos deverão sempre ter em conta a realidade da produção
numa determinada região ou país. O objectivo será sempre, por via da maior valorização do leite de melhor qualidade, estimular
os produtores a produzirem um produto melhor.
121
95,3
80
75
0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100% 43,5
38
31
vaca búfala cabra ovelha 22
18,3
10
figura 3.8
Produção de leite por américa europa américa ásia áfrica
espécie e percentagem do do norte do sul
total do leite produzido
efectivo (milhões de cabeças)
produção (milhões de toneladas)
figura 3.9
Efectivos bovinos e
produções leiteiras por
continente
3.4 Produção de leite a nível mundial
A produção de leite a nível mundial encontra-se representada na figura 3.8. A pro-
dução de leite de vaca representa mais de 87% da produção mundial. Seguem-se
os valores das produções de leite de búfala, cabra e ovelha. Outras fêmeas (p. ex.
camelas) são também utilizadas pelo Homem para a produção de leite. Contudo,
a produção destas espécies representa uma fracção muito pequena (menos de
0,25%) da produção global de leite.
Na figura 3.9 poderá observar-se a distribuição dos efectivos e das produções de
leite de vaca por continente. Serão de realçar as diferenças significativas observa-
das nos efectivos e nas produções dos diferentes continentes.
Os dados referentes a 2010 indicam uma produção global de leite de vaca na ordem dos 600 milhões de toneladas, destacando-se a Europa
com mais de 200 milhões, seguindo-se a Ásia com cerca de 150 milhões, a América do Norte com 96 milhões e a América do Sul com cerca
de 80 milhões. A produção atingida em África situou-se em cerca de 32 milhões.
8.000
7.000
6.000
5.000
4.000
3.000
2.000
1.000
0
américa europa américa ásia áfrica
do norte do sul
figura 3.10
Produção individual
de leite por continente claramente as diferenças atrás mencionadas. Note-se que as produções individu-
ais na Europa e na América são superiores em mais de dez vezes às produções
observadas em África.
Nos países menos desenvolvidos torna-se por vezes muito difícil garantir as con-
dições para a refrigeração imediata do leite, quer por falta de energia eléctrica
nas fazendas, quer por os equipamentos de refrigeração serem bastante caros.
Por outro lado, em muitos casos, as condições de transporte não são as melhores
(más vias de comunicação, longas distâncias a percorrer e veículos pouco pró-
prios para o transporte de leite) e, na maioria dos casos, o leite é transportado
em bilhas sem ser refrigerado. Nestas condições é fundamental garantir uma boa
higienização das bilhas e, fazer uso de conservantes como seja a água oxigenada.
A representação de um
permutador de placas
Figura 3.11
IMAGEM E DIAGRAMAS
DE UM PASTEURIZADOR
DE PLACAS
Por outro lado, muitas explorações afastadas de zonas urbanas, têm dificuldades
de acesso a água potável, o que mais dificulta as condições de recolha. Assim,
em muitos casos, a qualidade higiénica do leite é bastante baixa e, o número de
microrganismos presentes pode ultrapassar os vários milhões por mililitro.
3.5.2 Pasteurização
A pasteurização é um tratamento térmico que visa destruir os microrganismos
patogénicos não esporolados e reduzir a flora microbiana presente no leite, com
o objectivo de aumentar a sua vida útil e garantir a sua segurança. Note-se que
o leite pasteurizado terá de ser mantido em condições de refrigeração de for-
ma a manter a sua vida útil. Isto é, a pasteurização destrói os microrganismos
patogénicos não esporolados (p.ex.: Mycobacterium tuberculosis, Brucella spp.,
Salmonella spp., Staphylococcus aureos, Listeria monocytogenes), mas não elimina
microrganismos esporolados (p.ex.: Bacillus cereus, Clostridium botulinum, Clos-
67 ºC 74 ºC
arrefe- regeneração aqueci-
cimento 4 ºC mento
0 ºC 6 ºC
B3 B1
Figura 3.12
Diagrama de um permutador
de placas com 3 secções
Uma das grandes vantagens deste tipo de equipamentos é que se pode usar o
calor do leite pasteurizado para aquecer o leite cru que entra no pasteurizador
o que permite poupar até 95% da energia que se gasta num processo de aque-
cimento em tanque. Naturalmente que as placas têm que ser estanques para
evitar a mistura dos dois produtos.
Neste tipo de equipamentos, o leite não tarda mais que dois minutos entre o
momento da entrada do leite cru e o momento da sua saída, já pasteurizado e
refrigerado.
50
40 10
30
20
10 11 1
4 4
0
0 15 30 45 60 75
tempo (s) 0,1
Figura 3.13
Evolução da temperatura do
leite durante o processo de 0,01
pasteurização 70 72 74 76 78 80 82 84 86 88 90 92 94 96 98
temperatura (ºC)
Nota: a seta indica o valor mínimo de referência (72 ºC por 15 s)
Figura 3.14
Binómios tempo/temperatura
equivalentes ao mínimo para
garantia de uma destruição
satisfatória de microrganismos
durante o processo de
pasteurização (Kessler, 1981)
74 ºC para 11 ºC. Após a etapa de regeneração o leite é aquecido a 74 ºC por água
quente que arrefece de 85 ºC para 78 ºC. O leite é mantido a 74 ºC por, pelo menos,
15 segundos antes de voltar a entrar na zona de regeneração para arrefecer até 11 ºC
perdendo calor para o leite cru que está a entrar. Finalmente o leite pasteurizado a
11 ºC é arrefecido até 4 ºC por água gelada que entra a 0 ºC e sai a 6 ºC. Neste mo-
mento, o leite pasteurizado poderá ser embalado e enviado para uma câmara de
refrigeração até ao momento do consumo.
A figura 3.14 indica a linha de valores que poderão ser usados como mínimo. A título
de exemplo, se a 72 ºC são necessários pelo menos 15 segundos para pasteurizar o
leite, a 80 ºC obtêm-se o mesmo efeito em apenas 1,5 segundos. Para a pasteuriza-
ção do leite, por forma a ter-se uma margem de segurança, normalmente são usados
valores entre 74 e 76 ºC por 30 ou mais segundos.
115 ºC
80 ºC
20 ºC
enchimento e selagem
de embalagens
arrefecimento
Figura 3.15
Diagrama de uma torre
hidrostática para
esterilização de leite
Para a pasteurização de natas são usadas temperaturas da ordem de 80-100 ºC
por 30 segundos a 2 minutos.
3.5.3 Esterilização
O processo de esterilização visa eliminar todos os microrganismos não esporo-
lados e esporolados. Isto é, para além dos microrganismos que são eliminados
no processo de pasteurização, este tratamento elimina também esporos termor-
resistentes. Um leite submetido a este tratamento não necessita de refrigeração
e conserva-se por mais de 3 meses desde que a embalagem não seja aberta.
Note-se que, desde que seja mantida a inviolabilidade da embalagem, os facto-
res que determinam o prazo de validade não se relacionam com o crescimento
de microrganismos, mas sim com reacções químicas que reduzem a qualidade
do produto (p. ex. rancificação da gordura). Para o fabrico deste produto, o leite
Outro método para produzir leite esterilizado faz uso de torres hidrostáticas, nas
quais uma coluna de água de vários metros garante as condições de pressão
suficientes para se manter uma câmara com vapor a mais de 115 ºC. O produto
a tratar, embalado em garrafas entra pelo topo da coluna de água começando a
aquecer gradualmente. A pressão da água garante que, na câmara interna da tor-
re, as temperaturas atinjam valores elevados sem que a água evapore. O produto
circula no interior desta câmara e sai pela segunda coluna de água, arrefecendo
gradualmente. A grande vantagem deste método é que o modo de operação é
contínuo e, portanto, a cadência de processamento é bastante superior à que se
obtém com uma autoclave que tem de ser carregada, tendo que se esperar que o
produto aqueça e seja mantido pelo tempo estipulado, seguido de arrefecimento
gradual antes de se proceder à sua descarga para que se inicie a produção de
outro lote. Na figura 3.15, poderá observar-se um diagrama deste equipamento.
saída
1ª válvula
entrada
Figura 3.16
Corte esquemático de um
homogeneizador (Rannie™)
e representação esquemática
do processo
Este é hoje o processo mais comum para produção de leite de longa duração e,
o seu sucesso está relacionado com a grande vantagem de não ser necessário
manter o leite no frigorífico enquanto a embalagem não for aberta. É contudo
um processo bastante caro e, os custos de embalagem são muito significativos
em relação ao valor do produto. Naturalmente que estes processos apenas são
usados em grandes indústrias que processam muitos milhares de litros por dia.
Para se ter uma ideia, o equipamento de embalagem de menor capacidade co-
mercializado pela Tetra Pak™, embala 6.000 litros por hora (Bylund, 2003).
140
Temperatura (ºC)
120
100
80
60
40
20
0
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 110
Tempo (s)
Figura 3.17 densa fazendo subir a temperatura de imediato. Porém ao condensar no leite, o
Exemplo de perfis de evolução
da temperatura do leite em processos vapor acaba por diluí-lo numa proporção relativamente elevada (cerca de 8%).
UHT directo e indirecto, comparados
com o do processo de pasteurização Nestas condições essa água terá de ser retirada. Para o fazer, o leite é colocado
numa câmara de vácuo onde entra em ebulição, o que permite que a água adi-
cionada evapore ao mesmo tempo que se eliminam também os odores indese-
jáveis. Assim, o leite aquece num permutador de placas até uma temperatura de
cerca de 86 ºC sendo em seguida injectado o vapor que faz subir a temperatura
para 135 - 145 ºC. Após 5 a 10 segundos, o leite quente é enviado para a câmara
de vácuo onde evapora e arrefece até cerca de 88 ºC. Posteriormente, este leite
poderá ser usado como fluído de aquecimento na zona do permutador onde o
leite aquece ao entrar, o que permite recuperar algum calor.
10
Tempo (s)
1
0,1
0,01
120 130 140 150 160
Temperatura (ºC)
Figura 3.18
Binómios tempo/temperatura
mínimos para o processo de
produção de leite UHT
exemplifica os perfis de aquecimento e de arrefecimento dos dois processos de
esterilização UHT e, compara-os com o perfil do processo de pasteurização.
Na figura 3.18, de acordo com Kessler (1981), são apresentados os binómios tem-
peratura/tempo considerados mínimos para garantir uma destruição satisfatória
de esporos no leite.
60,93
sais 1,54
proteína 5,48
33,04
lactose 8,40
3,28 2,14 0,60
gordura 84,57
Água gordura lactose proteína sais
90,55
gordura 1,18
sais 9,88
proteína 35,15
5,09 3,32 0,93 0,11
lactose 53,82
Água lactose proteína sais gordura
a b Composição da nata
menos natas
densos leite magro
b disco da centrífuga
mais
densos
leite gordo
d centrífuga DESNATADORA
Figura 3.20
a) aspecto de uma
desnatadeira em
funcionamento;
A desnatadeira é composta por uma turbina de aço inoxidável, com a frequência b) pormenor de um
de 6.000 a 8.000 rotações por minuto. No seu interior, existem uma série de dis- disco de centrifuga;
c) separação dos
cos cónicos. componentes;
d) corte transversal de
Como o leite é formado por vários elementos, resulta que, quando em camadas uma desnatadeira
O processo de desnatagem visa separar a nata do leite inteiro. Normalmente, após a recepção do leite, o produto é imediatamente
desnatado sendo armazenados o leite magro e as natas em tanques separados. De acordo com as necessidades de produção, o
leite é depois normalizado, ajustando-se o seu teor de gordura com adição de quantidades diferentes de nata, consoante o teor de
gordura pretendido. Para calcular as quantidades de leite e de nata a misturar para o acerto do teor de gordura, usa-se um processo
bastante comum e de fácil aplicação.
O método denomina-se quadrado de Pearson. Nos ângulos superior e inferior esquerdos colocam-se respectivamente, os teores
de gordura do leite magro e da nata existentes. No centro do quadrado coloca-se o teor de gordura desejado. Subtraem-se, na
diagonal, os valores dos ângulos ao valor central. Os valores obtidos correspondem às proporções de leite magro e de nata a uti-
lizar. Tendo em atenção o volume de leite normalizado pretendido bastará juntar ambos os ingredientes nas proporções obtidas.
Problema:
pretende obter-se 1.000 kg
de leite com 3,0% de matéria
gorda a partir de natas com
20,0% de gordura e de leite
magro com 0,1% de gordura.
Solução:
Leite magro (0,1%) (0,1%) 17,0 partes os 1.000 kg representam
19,9 partes; o leite magro
Leite normalizado (3,0%) representará 17 partes
e a nata, 2,9 partes.
Nata (20,0%) 2,9 partes Assim, para obter 1.000 kg
de leite normalizado deverão
TOTAL ser usados 145,72 kg de nata
19,9 partes (2,9*1.000)/19,9) e 845,27 kg
de leite magro (17*1.000)/19,9).
Tratamento térmico
A manteiga é um produto de consumo em fresco e como tal obriga ao trata-
mento térmico da nata (pasteurização). De um modo geral as temperaturas de
pasteurização da nata oscilam entre 85-105 ºC. Tratamentos mais brandos como,
por exemplo, 87 ºC por 15 segundos podem ser empregados mas, a pasteuriza-
ção é mais eficiente quando realizada a temperaturas que variam entre 95-105 ºC
por 15 segundos. Estes tratamentos térmicos, mais elevados do que os que são
aplicados ao leite, justificam-se porque o teor de gordura da nata protege os
microrganismos em relação à acção do calor.
Cristalização da gordura
A cristalização constitui a passagem de uma substância da fase líquida para a fase
sólida como, por exemplo, a transformação de água em gelo ou neve e, no caso
da nata, a solidificação da matéria gorda.
A formação de cristais, de uma forma geral, é espontânea, mas pode ser induzida
pelo arrefecimento e pela agitação. A sua importância na produção de manteiga
reside no facto de que o processo de cristalização interfere significativamente no
rendimento de fabricação e na consistência da manteiga.
Uma refrigeração rápida tem como resultado uma rápida cristalização, com forma-
ção de muitos cristais de tamanho pequeno e com uma área de superfície grande;
por outro lado, uma refrigeração mais lenta e com temperaturas mais elevadas
origina a formação de cristais grandes e com menor área de superfície.
Neste período, o ciclo térmico normalmente empregado respeita sequência de temperatura de 8 - 19 - 16 ºC. Neste esquema,
imediatamente após a pasteurização, a nata é rapidamente refrigerada a 8 ºC e mantida a esta temperatura por cerca de 2 horas
Ciclo para para que ocorra a cristalização rápida com formação de pequenos cristais. Em seguida a nata deve ser aquecida a 19 - 21 ºC e,
após estabilização da temperatura, adicionada de culturas lácticas. Nesta etapa, um cuidado especial deve ser tomado para não
o inverno exceder os 21 ºC, temperatura considerada limite para evitar o aparecimento de textura arenosa e uma consistência oleosa no
produto final. Após incubação por um período de 6 a 8 horas ou obtenção de um pH de aproximadamente 5,10 – 5,20 a nata
é refrigerada a 16 ºC. A obtenção de cristais pequenos contraria assim a tendência para que a textura da manteiga seja dura.
Neste período, exactamente ao contrário do período invernal, o objectivo é diminuir ao máximo o tamanho da fase contínua
com o propósito de produzir uma manteiga de consistência firme. O ciclo normalmente aplicado obedece a sequência de
temperatura de 19 - 16 -8 ºC. Da mesma forma, após a temperatura de pasteurização, refrigera-se a nata a 19 ºC de modo a que
Ciclo para ocorra a formação de cristais grandes. Estabilizada a temperatura, adiciona-se a cultura láctica para a maturação biológica cuja
o verão duração varia entre 5-8 horas ou até que a nata atinja um pH de 5,10 - 5,20. Terminada a maturação, a nata é refrigerada a 16 ºC,
sendo mantida a esta temperatura por mais ou menos 5 horas ou até atingir o pH de 4,80. De seguida, é novamente arrefecida
à temperatura de 6 - 9 ºC. Obtém-se assim uma cristalização, com formação de vários cristais de maior tamanho, com uma área
superficial pequena.
glóbulo de gordura
com gordura cristalizada
glóbulo de gordura
com gordura líquida
micela de caseína
Figura 3.21
Sequência de fenómenos
físico-químicos que ocorrem
durante a batedura da nata
e produção de manteiga
Fabrico de manteiga
A nata é uma emulsão de óleo em água (O/A). De uma forma simplificada poderá considerar-se que a nata tem a mesma composi-
ção que o leite, exceptuando o facto de ter cerca de 10 vezes mais gordura. Durante a batedura da nata ocorre uma sequência de
processos físico químicos que se encontra esquematizada na figura 3.21. Inicialmente, o processo de batedura origina a incorpo-
ração de grandes quantidades de ar na nata. Os glóbulos de gordura e a água colocam-se na periferia das bolhas de ar. Durante
o processo de batedura as membranas dos glóbulos de gordura vão-se rompendo permitindo a saída de alguma gordura que
se encontra na fase líquida (não cristalizada). Esta gordura vai-se espalhando pela superfície das bolhas de ar o que origina, em
determinada altura e de forma repentina, o colapso das mesmas. Este colapso origina a agregação dos grânulos de gordura, que é
facilitada pela presença da gordura líquida. Ocorre também a separação da fase líquida da nata, denominada leitelho.
O processo continua com a separação do leitelho e com a compressão dos grânulos durante a malaxagem, de forma a criar a fase
contínua da manteiga. Nesta fase a emulsão inverte-se. A gordura forma a fase contínua e a água encontra-se dispersa em peque-
nas gotículas de dimensões de cerca de 0,001mm. Trata-se pois de uma emulsão de água em óleo (A/O). É esta inversão que origina
a estabilidade microbiológica da manteiga. Como a água se encontra dispersa na fase gorda, a actividade da água da manteiga é
baixa (entre 0,85 e 0,92).
Independente do método, o primeiro passo é o ajuste da temperatura de batedura. Essa é uma etapa importante que
interfere na vazão de equipamentos contínuos, na perda de gordura no leitelho, na consistência, na cor e no gosto da
Ajuste da temperatura
manteiga. A temperatura de batedura deve ser ajustada através de uma relação de períodos de inverno e verão e com
da nata
o teor de gordura na nata. Na prática, enquanto no período de verão as temperaturas mais apropriadas de batedura
variam entre 6 e 10 ºC, recomenda-se no inverno o uso de temperaturas mais elevadas, com variação entre 10 e 14 ºC.
A função mais relevante da lavagem é remoção dos resíduos de leitelho da superfície dos grãos. Este facto tem como
efeito a melhoria directa da qualidade do produto final, uma vez que diminui a quantidade de nutrientes capazes de
promover o desenvolvimento de bactérias. A operação contribui ainda para a redução de 15-25% da actividade de
lipases, para o controle do teor de humidade e, para a regulação da firmeza da manteiga.
O volume de água normalmente empregado corresponde à quantidade de leitelho retirada e a lavagem pode ser
Lavagem dos grânulos
realizada de uma só ou por várias vezes. Entretanto, é importante saber que a água de lavagem arrasta consigo sólidos
não gordos e diacetil, diminuindo o rendimento e reduzindo o sabor da manteiga.
No que diz respeito à água propriamente dita, além de ser exigida uma excelente qualidade microbiológica, os seus
teores em ferro e manganês não devem ultrapassar a 0,5 e 0,02 mg/L respectivamente, uma vez que estes metais são
catalisadoras de vários processos de oxidação.
A malaxagem pode ser definida como um tratamento da manteiga com a finalidade de cumprir os seguintes objec-
tivos:
A manteiga produzida pode ser embalada em blocos ou fraccionada, com peso variável. O material de embalagem
é bastante variado, mas de um modo geral, para blocos emprega-se filme de polietileno, caixas de papelão e latas
galvanizadas. Para a manteiga fraccionada, usa-se o complexo alumínio/cera/papel ou potes plásticos termoformados,
Embalamento à base de PVC, poliestireno ou polipropileno.
e Armazenagem Independentemente da obrigatoriedade de um armazenamento mais longo, logo após a embalagem, manteiga deve
ser mantida a 5 ºC por 2 ou 3 dias. Neste período ocorrerá uma pós-cristalização da gordura com formação de uma
estrutura de cristais capaz de melhorar ainda mais a qualidade geral da manteiga e, em particular, a sua aparência e
consistência. Se a comercialização não ocorrer de imediato, o armazenamento prolongado pode ser realizado a tem-
peraturas de congelação (-18 ºC), mantendo a manteiga a sua qualidade por mais de 6 meses.
recepção
leite desnatado
filtração
pré-aquecimento
desnatagem
nata
fermento
Figura 3.23
Aspecto geral
pasteurização de uma batedeira
de natas
tratamento físico
e biológico
leitelho
água
batedura
salga
embalamento
Para que a manteiga dure por mais tempo deve-se evitar o uso de vasilhas, co-
refrigeração lheres ou facas de ferro ou cobre. A quantidade de sal a ser usada depende do
gosto pessoal. Por lei não pode ultrapassar os 2% (para cada quilo de manteiga
manteiga maturada menos de 20 gramas de sal comum fino). A manteiga deve ser bem misturada
com o sal, usando uma colher ou a batedeira.
Figura 3.22
Diagrama do processo
de fabrico de manteiga
3.6.2 Queijo
O queijo é o mais complexo dos produtos lácteos e, a sua produção envolve
processos químicos, bioquímicos e microbiológicos. Os passos do processo de
produção de queijo envolvem a coagulação do leite, a remoção do soro, a
maturação (que pode ser opcional) a embalagem e o armazenamento. O con-
trolo gradual destas etapas foi fundamental para a transformação do processo
de produção de uma arte ou de um processo artesanal para uma operação
tecnológica em larga escala, que depende de um controlo apertado de todos
os parâmetros de fabrico e que, acomoda pequenas alterações no sentido de
acompanhar as variações que a matéria-prima apresenta. Por outro lado, este
controlo tecnológico permitiu aumentar a variedade de queijos produzidos.
7,2%
3,5% 3,2%
4,9% 0,9% 25,6% 39,2%
87,5%
28,0%
2,9%
24,3% 40,0% 4,8% 3,9%
40,5%
50,8%
2,4%
30,5%
Comparação entre os teores de componentes do leite com os teores dos mesmos componentes num queijo com 60% de sólidos.
Em alguns países (p.ex.: Itália, Espanha, Portugal) o soro resultante do fabrico de Figura 3.28
Comparação entre os
queijo é processado termicamente (90 - 100 ºC por 15-30 minutos) no sentido de teores de componentes
do leite E DO QUEIJO
permitir a obtenção de um coágulo de proteínas do soro. Este produto tem a
designação de Ricotta em Itália e de Requeijão em Portugal.
Massa obtida por fusão: obtida pela acção do calor com os sais fundentes,
como os queijos fundidos;
Massa semi-cozida: são os queijos cuja massa sofre um aquecimento até uma
temperatura máxima de 45 ºC;
Massa cozida: são aqueles queijos cuja massa sofre um aquecimento superior
a 55 ºC.
Preparação do leite
O leite é colocado no recipiente próprio (p. ex. cuba) e enquanto se processa o
enchimento ou após este, pode-se adicionar uma série de coadjuvantes, espe-
cíficos para cada tipo de queijo. A seguir descrevem-se os mais usuais. Note-se
porém que, em muitos casos, o seu uso é opcional.
Conferir ao leite uma flora bacteriana acidificante que irá desempenhar uma acção importante na maturação do queijo, bem como também irá contri-
buir com as suas características sensoriais
Produzir ácido de uma maneira eficiente e controlada, elevando a acidez do leite, a fim de proporcionar uma melhor actuação do coalho, tornando a
coagulação rápida e perfeita
Dificultar o crescimento de microrganismos prejudiciais; o leite pasteurizado tem uma flora bacteriana reduzida; assim, com a adição de fermento
láctico, haverá predominância de bactérias que integram o fermento, e promove-se o aumento da acidez que torna o meio impróprio para os demais
microrganismos
Diminuir o tempo de acidificação do queijo, evitando que outros microrganismos decomponham a lactose, formando CO2 e H2
Facilitar o dessoramento, uma vez que o ácido láctico produzido facilita a expulsão do soro da massa, fazendo com que essa se contraia
A quantidade a adicionar, 20 a 30g para 100 litros de leite (0,02 a 0,03%) deverá
ser incorporada antes da adição do coagulante. Comercialmente existe em so-
lução aquosa a 50%. Nesta solução, 1 litro contém 500g de cálcio. Assim, para
A etapa de salga, na produção industrial de queijo curado fica na, maioria dos
casos, reduzida ao uso de salmoura após a operação de prensagem (etapa des-
crita mais à frente). A dosagem de sal no queijo não tem limites legais, assistin-
do-se a queijos com percentagens superiores a 3% de NaCl (m/m). As mais usuais
variam entre 1 e 2,5%.
Lizosima
A lisozima é uma enzima utilizada na tecnologia de queijo com o intuito de inibir
o crescimento do Clostridium tyrobutiricum. Esta enzima é específica no combate
desta bactéria que origina o chamado “inchaço tardio” (formação de grandes
orifícios com formação de CO2). O Clostridium tyrobutiricum é um microrganismo
esporolado, resistente ao tratamento térmico e que surge fundamentalmente
em leite de vaca oriundo de animais alimentados com silagem. A dosagem desta
enzima deverá ser de 20 a 25g de pó por 1.000 litros de leite, 20 a 30 minutos
antes da adição do coalho.
100 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 3. Leite e Produtos Lácteos
na sua utilização duplo interesse, uma vez que controlam também os micror-
ganismos coliaerógenos (coliformes); ou seja evitam não só o “inchaço tardio”
como também inibem o “inchaço precoce”. Este último deve-se ao aparecimen-
to de pequenos orifícios promovidos pelos microrganismos coliformes na decom-
posição da lactose através da fermentação. Embora o seu uso seja condicionado
legalmente, devido ao seu preço muito menor que a lisozima, os nitratos são um
coadjuvante de recurso frequente na indústria queijeira.
3. Leite e Produtos Lácteos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 101
Adição de lipase
Durante a maturação existem alterações dos constituintes do leite/massa que
vêm a originar outros compostos de grande importância no desenvolvimento
do aroma e do sabor do queijo. As lipases são, enzimas de origem animal, que
catalisam a hidrólise da matéria gorda libertando ácidos gordos livres, que por
transformação posterior em metil-cetonas e outros componentes fortemente
aromáticos, originam o aparecimento de odores característicos. Estas degrada-
ções são aceleradas com a inclusão de lipases, originando, em períodos meno-
res, o que aconteceria só ao fim de longos períodos de maturação.
Estas enzimas podem ser retiradas das glândulas da epiglote de diferentes es-
pécies: cabrito – sabores mais picantes; bezerro – sabores mais doces; cordeiro
- sabores intermédios. A dose recomendada varia de 2 a 15g por 100 litros leite,
e deve ser dissolvida em 10 partes de água fria deixando-se repousar 10 a 30
minutos, sendo adicionada antes, ou em conjunto com o coalho.
Adição de coalho
Após a adição de todos os demais ingredientes, adiciona-se o coalho, nas devi-
das proporções, em função de sua actividade e do tempo de coagulação preten-
102 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 3. Leite e Produtos Lácteos
dido. Este deverá ser diluído em água destilada para evitar formação de coágulos
no primeiro contacto com o leite. Aconselha-se adicionar 1 a 2% de sal na água
de diluição quando se utilizar coalho em pó numa diluição de (1:50 a 1:100). Adi-
ciona-se aos poucos com agitação do leite, porém não mais do que 2 a 3 minutos.
Depois, deixa-se em repouso absoluto para evitar a redução na consistência e
elasticidade do coágulo. Controla-se a temperatura durante todo o processo de
coagulação. Actualmente são encontrados no comércio coalhos de várias origens,
sendo os mais usuais:
• animais (estômago de bezerro recém-nascido a bovino adulto ou de outra
espécie);
• microbianos (Endothia parasitica, Mucor pusillus, Mucor miehei);
• genéticos (quimosina genética);
• vegetais (flor de cardo - Cynara cardunculos).
Outros coadjuvantes
Existem mais coadjuvantes permitidos e possíveis de se adicionar ao leite com
vista à produção de queijo, o que o torna, também por isso, num produto de
grande variabilidade (p.ex.: leite em pó; leite concentrado; condimentos e espe-
ciarias; sais fundentes; ácidos orgânicos de grau alimentício - láctico, cítrico, acé-
tico ou tartárico; proteases; frutas em forma de pedaços, polpa, suco e outros
preparados à base de frutas; outras substâncias alimentícias como: mel, cereais,
vegetais, frutas secas, chocolate, especiarias, vegetais e legumes; açúcares; gelati-
na; estabilizantes; edulcorantes; espessantes).
3. Leite e Produtos Lácteos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 103
Processo de coagulação
Depois de adicionados os ingredientes, o leite é agitado no tanque de coagula-
ção durante dois ou três minutos, para perfeita distribuição dos mesmos, obser-
vando a temperatura de coagulação, que varia para cada categoria de queijo e,
de acordo com a consistência que se pretende para a massa.
A temperatura
Se a temperatura de coagulação for baixa, dará tendencialmente (já que não é a
única condição) origem a um queijo mole ou macio, ao passo que se a mesma
for alta, resultará, tendencialmente, em queijo semi-duro ou duro. As tempera-
turas adoptadas mais comuns variam entre os 29 ºC e os 34 ºC. Como a tempera-
tura ambiente influi nas características da coalhada e nos processos de fermen-
tação, é importante manter a temperatura pretendida durante todo o tempo
de coagulação, sobretudo na superfície do leite que estará mais exposta a estas
alterações.
O tempo de coagulação
Varia em função do tipo de queijo, sendo inversamente proporcional à tempera-
tura (com temperaturas elevadas o tempo de coagulação é menor).
O ponto da coalhada
O corte da massa (ou coalhada) deve ser feito no momento exacto. Um corte
antes da altura certa (chamado “ponto”) origina perdas de gordura e de caseína
104 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 3. Leite e Produtos Lácteos
no soro (visível por transmitir ao soro que deverá ser translúcido e esverdeado,
uma maior opacidade e uma cor mais esbranquiçada ou leitosa). O corte depois
do ponto promove queijo mais seco e excessivamente duro, com consistência de
borracha.
• Introduzindo a mão ou um dedo na coalhada e puxando-a para cima e para diante, de modo a rompê-la. O coágulo deve
ter aspecto de gel e contornos nítidos. A mão ou dedo deve sair livre de fragmentos
• Introduzindo uma espátula, na superfície do coágulo, no sentido inclinado e, forçá-la para cima. O rompimento do gel
deverá ocorrer com uma única fenda rectilínea, sem fragmentação do coágulo; se isso ocorrer, este será o ponto de corte,
caso contrario, se é quebradiço, desfragmentando, se rompe em várias direcções, o ponto de corte ainda não foi atingido
• Pressionando a coalhada nas proximidades do tanque com as costas da mão. No ponto, a coalhada estará não aderente
às paredes do tanque e no espaço haverá soro de cor esverdeada, exsudado da massa
Corte
O objectivo é aumentar a superfície da mesma, acelerando a eliminação do soro.
Esta operação torna mais fácil a contracção dos grânulos.
O corte é feito com liras metálicas com fios ou lâminas paralelas e equidistantes,
horizontais e verticais ou, artesanalmente, com uma espátula ou com a própria
mão. As liras são horizontais e verticais com o objectivo de cortar a massa em
cubos. O corte deve ser vagaroso, aumentando de intensidade à medida que a
granulação se vai tornando mais firme. Do corte dependerá o tamanho dos grãos,
os quais devem ser bem homogéneos desde o início.
3. Leite e Produtos Lácteos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 105
Agitação
Antes da agitação, após a obtenção dos grãos pelo corte, a massa deve repousar
de 3 a 5 minutos. Após este repouso, em que massa fica a decantar no fundo do
tanque, submersa no soro, procede-se à agitação.
O tempo de agitação varia em função do queijo e esta operação pode ser inter-
rompida para outras acções com outros fins.
Aquecimento da massa
Uma segunda agitação inicia-se com o aquecimento de 1 °C por minuto e pode
durar até 50 minutos. O aquecimento intensifica o dessoramento porque au-
menta a acidez e a temperatura, determinando a contracção dos grânulos.
O aquecimento violento causa a formação de uma película impermeável na par-
te externa dos grãos, retendo soro no seu interior, tornando os queijos com
excesso de soro, manchados e com maturação pouco uniforme.
Nos chamados queijos de pasta cozida o aquecimento da massa (quer por intro-
dução de água quente, quer por aquecimento das paredes da cuba) pode atingir
valores acima dos 55 – 60 ºC.
Ponto da massa
Após a agitação inicial deve-se verificar o ponto da coalhada, ou seja a determi-
nação da consistência ideal para cada queijo. Para isso apanha-se um punhado
de massa e comprime-se entre os dedos. Deverá verificar-se também a acidez
do soro. Nos queijos mais comuns estará entre 17 e 18 ºThorner. Estando a massa
no ponto, cessa-se a agitação e deixa-se a mesma em descanso 1 a 2 minutos.
106 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 3. Leite e Produtos Lácteos
Eliminação do soro
A eliminação do soro ou o chamado 2º dessoramento, pode ser feita por vários
processos:
retirar o soro e deixar a massa no tanque. O soro é extraído ou pela torneira ou
por sifão;
retirar a massa deixando o soro no tanque. Nesse caso, a massa pode ser retirada
em formas e colocada em mesas inox para o escoamento do soro;
retirar o soro e a massa (por gravidade ou por sifão) para o chamado tanque de
pré-prensagem; neste, o soro é separado por uma ou várias redes permanecendo
apenas a massa que se concentra num dos lados.
Pré-prensagem
A pré-prensagem (no próprio tanque ou na tina de pré-prensagem) permite que
a massa se agregue e que posteriormente seja cortada em blocos, sendo colo-
cada em formas para posterior prensagem. Esta prensagem da massa no tanque
tem duração de 10 a 15 minutos, usando-se grelhas metálicas permitem agregar
e pressionar a massa originando uma maior expulsão de soro.
Moldagem
Nesta fase são utilizados moldes onde é colocada a coalhada. O formato do quei-
jo depende da forma do molde. A massa é dividida em tamanhos variáveis, sendo
acomodada em formas compatíveis com o queijo que se deseja obter, recebendo
prensagem ou não. Essa operação deve ser rápida para que a massa não esfrie,
caso tenha sido aquecida.
Quanto ao formato as formas podem ser cilíndricas, cúbicas, esféricas paralelepi-
pédicas, e feitas com diversos materiais, sendo mais comum o plástico.
O uso de panos empregados na prensagem de queijos tem como finalidades, aju-
dar a manter a temperatura, facilitar a saída do soro, ajudar na formação de uma
casca lisa e completamente fechada. Os panos podem ser de algodão ou nylon.
Os panos de nylon tem tido grande aceitação por diminuir o tempo de prensa-
gem e não saturarem com o soro, mas apresentam a desvantagem de poderem
cortar o queijo.
3. Leite e Produtos Lácteos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 107
Prensagem
Com esta operação pretende-se finalizar o dessoramento da massa e obter a
forma final do queijo. A textura do queijo está também dependente desta fase;
quanto mais intensa for a prensagem, tendencialmente mais dura será a pasta
do queijo. Esta fase pode ser suprimida em alguns queijos. Para além de promo-
ver a união dos grãos, tornando a massa mais homogénea, também contribui
para iniciar a formação da casca (crosta).
Sempre que possível a prensagem deverá ser inicialmente menos forte a fim de
evitar uma pseudo casca na periferia do queijo que dificultará a dessoragem. Os
queijos devem ser virados durante a prensagem para posteriormente haver ma-
turação homogénea e para não haver retenção localizada de soro. O tempo e a
intensidade (pressão) da prensagem variam com o tipo de queijo e pode ser de 3
a 40 horas. É feita com prensas individuais ou colectivas, horizontais ou verticais,
pneumáticas ou gravíticas.
Salga
Varia de acordo com o tipo de queijo. Esta etapa, como já foi referido anterior-
mente, não é obrigatória (queijos frescos muitas vezes são produzidos sem sal).
No queijo ela melhora o sabor, aumenta a conservação, concorre para a forma-
ção da casca, controla o crescimento de alguns microrganismos e propicia a
dessoragem. Pode ser feita de diversos modos:
Feita antes da adição do coalho. É mais comum em queijos artesanais ou em pequenas produções. Utilizada também em
produção industrial complementada por outro qualquer dos processos referidos a seguir. Diminui a acidez causando um
Salga no leite
tempo maior na coagulação. Vantajosa por facilidade de doseamento, mas com os inconvenientes de se perder parte do
sal no soro.
Também denominada superficial. Consiste em cobrir o queijo com uma camada de sal, em ambos os lados. É feita logo
após a prensagem, sendo mais aconselhável para os queijos macios. Para esse tipo de salga usa-se sal de granulação
Salga a seco
média, por ser menos solúvel que o sal fino, perdendo-se menor quantidade com a exsudação do soro. Os queijos nesse
tipo de salga devem ser virados ao fim de 24 horas, cobrindo-se de novo a parte que ficar em contacto com a prateleira.
É o tipo de salga é a mais usada em fábricas porque é mais económica, homogénea e regular. Consiste em mergulhar os
queijos numa solução de 17 a 22% de sal, com acidez entre 20 e 50 °T e temperatura de 5 a 12 °C. Os queijos devem ficar
totalmente submersos, podendo aplicar-se sobre eles placas de metal perfuradas, a fim de forçá-los a submergir. Pode
Salga em salmoura
também recircular-se a salmoura aspergindo-a sobre os queijos, como se pode observar na figura 3.36. O tempo de per-
manência dos queijos na salmoura depende da percentagem de sal pretendida nestes, do tamanho, forma dos queijos
e, da concentração da salmoura.
Geralmente é feita nos grãos antes destes se unirem ou quando a massa já foi cortada e se encontra em blocos, após
Salga na massa
serem cortados.
108 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 3. Leite e Produtos Lácteos
Maturação
Após a salga, os queijos vão para câmaras de maturação, onde permanecem
a temperaturas e com teor de humidade e ventilação adequados, até atingir o
ponto ideal, que varia conforme cada queijo. A maturação é muito importante
na definição da aparência, da textura e do sabor do queijo.
A maturação visa dar oportunidade à ocorrência de combinações e transformações nos componentes do produto,
resultando numa melhoria de sabor, palatabilidade e, capacidade de conservação. Em queijos, poder-se-ia dizer que
qualquer actividade microbiológica do fermento láctico adicionado, ocorrida durante as etapas de fabricação, seria já
uma cura. Entretanto em termos práticos, um queijo só é tido como curado quando é armazenado por algum tempo
após a salga, visando promover alterações no sabor, textura, consistência, cor, tornando-se diferente do queijo fresco
(que não sofre a maturação). A cura pode variar de 15 dias a 15 meses, dependendo do tipo de queijo.
As enzimas catalisam as reacções de decomposição dos três principais componentes do leite que ficam retidos no queijo,
Enzimas que são: lactose, proteína e gordura. Dessa decomposição resultam as diferentes variedades de queijos. Para ela contribuem
também as enzimas naturalmente presentes no leite cru, e o coalho ou renina com a sua acção proteolítica.
A temperatura também influencia primordialmente a cura, pois controla a velocidade com que os microrganismos envolvidos
se vão multiplicar. Temperaturas próximas a 0 ºC retardam ou até paralisam a cura. Temperaturas elevadas aceleram excessi-
Temperatura
vamente as actividades, provocando sabores fortes e desagradáveis nos queijos. A temperatura normalmente utilizada está
entre 10 a 15 ºC.
O controlo de HR visa evitar perda de peso dos queijos devido à evaporação, quando curados sem invólucros plásticos. Por
Humidade relativa outro lado, a humidade relativa irá também condicionar a actividade dos microrganismos responsáveis pela alterações ao
longo da maturação.
3. Leite e Produtos Lácteos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 109
leite cru
filtração do leite
pré-aquecimento
desnatagem nata
coadjuvantes
mistura / normalização a desnatagem
visa apenas
acertar o teor
de gordura
pasteurização do leite
normalização da temperatura
coagulação
Armazenamento
corte da coalhada
Seja qual for o tipo de queijo, logo após o término da cura deve-se proceder
repouso
ao armazenamento em câmaras frias com temperaturas ao redor de 0 a 5 ºC,
sendo mantidos nessas câmaras até o momento do consumo. Estas exigências
podem ser menores se os queijos forem duros.
soro
agitação
água
1º dessoramento
Embalagem
aquecimento As embalagens visam proteger a crosta contra ataque de bolores e reduzir as
soro, água
prensagem
Soro de queijaria
salga
A porção aquosa do leite que se separa do coágulo ou da caseína durante a
maturação fabricação de queijos é o chamado soro de queijo, que é um fluido opaco e de
cor amarelo-esverdeada.
queijo curado
Aproximadamente 85 a 95% do volume do leite usado em fabricação dos quei-
Figura 3.29
jos resulta em soro, que contém cerca de metade dos sólidos totais do leite
Diagrama geral processo representados por proteínas hidrossolúveis, principalmente albuminas, globu-
de fabrico de queijo
de pasta lavada linas, sais, gorduras e lactose.
110 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 3. Leite e Produtos Lácteos
Figura 3.30 Figura 3.31
Avaliação do ponto de corte da coalhada Corte da coalhada com liras verticais
Figura 3.32
Corte da coalhada
com liras horizontais
e trabalho da massa
3. Leite e Produtos Lácteos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 111
Fonte: Tetra Laval Dairy Processing Handbook, 2003
2
1
1 cuba de coagulação
3
2 filtro de dessoramento
4
6
3 bomba de soro
5 7
4 grelha de pré-prensagem
5 AGITADORES
3.37
Equipamentos utilizados
durante o processo
de coagulação e corte
da coalhada
O soro concentrado ou seco pode ser usado como aditivo em vários géneros
alimentícios destinados ao consumo humano.
112 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 3. Leite e Produtos Lácteos
Figura 3.38
câmaras de
maturação de queijo
Utilizações do soro
Produção de requeijão; incorporação nas rações para animais (soro líquido); pro-
dução de soro lácteo em pó; utilização na alimentação humana e animal; produ-
ção de produtos químicos, farmacêuticos e cosméticos.
Uso continuado dos mesmos recipientes ou a adição de leite fresco a uma fermentação em curso, baseada sobretudo na flora
indígena do leite
Aquecimento do leite sobre o fogo para o concentrar ligeiramente para que o coágulo final adquirisse uma viscosidade adequada
Inoculação do leite aquecido com leite ácido de um fabrico anterior, permitindo assim que as bactérias lácticas se tornassem
predominantes
Selecção gradual de bactérias lácticas capazes de tolerarem temperaturas relativamente altas e elevados níveis de ácido láctico
bem como de conferirem ao produto o aroma e sabor adequado
3. Leite e Produtos Lácteos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 113
a b c
Figura 3.39
A) micelas de caseína intactas
B) rede tridimensional com micelas
descalcificadas
C) imagem da estrutura interna do gel
do iogurte obtida por microscopia
electrónica
A proporção de cocos para bacilos normalmente usada é de 1:1. Podem ser usa-
das também as proporções 1:2, 1:3 ou 2:3. É importante que a cultura contenha
um número maior de cocos do que de bacilos. Esta proporção na cultura é fun-
damental na produção de sabor e outras características no produto final.
Nesta última década, houve uma expansão muito grande na produção de iogur-
te líquido e de bebidas lácteas, as quais são produzidas a custo baixo, a partir
do aproveitamento do soro que apresenta alto valor nutricional. A tendência de
consumo para os próximos anos é de crescimento, devido à sua imagem positiva
de alimento saudável e nutritivo e também às variações que ele vem apresen-
tando, tais como iogurte congelado tipo sorvete, ou em forma de bebidas com
os mais diversos sabores.
114 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 3. Leite e Produtos Lácteos
Existem hoje no mercado vários tipos de iogurte classificados de acordo com
o processo de elaboração, adição de ingredientes, composição, consistência e
textura:
O açúcar adicionado ao leite na mistura básica não deve ultrapassar os 10% pois
prejudica o desenvolvimento dos microrganismos da cultura devido à pressão
osmótica.
3. Leite e Produtos Lácteos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 115
Técnica de fabrico do iogurte
Preparação da matéria-prima
O leite utilizado para o fabrico de iogurte deve apresentar boa qualidade físico-
-química a fim de evitar defeitos na textura do produto.
No caso de se utilizar açúcar, este deve ser adicionado ao leite antes do aqueci-
mento, normalmente entre 6 a 10%.
Se o leite for tratado a mais de 85 ºC por mais de 10 minutos, as proteínas do soro irão coagular juntamente com as caseínas du-
rante o processo de acidificação. Ao coagularem junto com as caseínas irão contribuir para a rede tridimensional de proteína que
aprisiona todos os outros componentes do leite e garante a estabilidade do gel. Este aspecto melhora a textura do iogurte e reduz
o seu dessoramento.
116 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 3. Leite e Produtos Lácteos
sua estrutura. No segundo passo, as cadeias de proteína ligam-se por pontes de
hidrogénio e por interacções hidrofóbicas criando uma rede tridimensional que
engloba os restantes componentes do leite. Para evitar o dessoramento, deve-se
evitar quebrar esta rede. No caso do iogurte sólido não se pode agitar a massa
inoculada após o início da formação desta rede tridimensional (30 minutos após
a inoculação).
Redução da temperatura
Após o tratamento térmico do leite, deve-se baixar a temperatura para 42-43 °C.
Em sistemas artesanais de processamento isso pode ser feito pela substituição da
água quente do banho-maria por água fria. Para não haver contaminação nessa
fase, o recipiente do leite deve estar sempre fechado, abrindo apenas para con-
trolar a temperatura.
Inoculação do fermento
Após o leite ser arrefecido (42 - 43 °C) adiciona-se entre 1 a 2% de fermento lácti-
co preparado previamente. O fermento deve ser homogeneizado, de forma que
todos os grumos sejam quebrados. Hoje em dia é preferível o uso dos chamados
DVS (Direct Vat Set – uso directo no tanque), pela facilidade de utilização e de
menor possibilidade de contaminação. Após a adição do fermento ao leite, o
conjunto deve ser novamente agitado por cerca de 2 minutos.
Fermentação (incubação)
Após a adição do fermento, o leite deve permanecer em completo repouso por
aproximadamente 3 a 4 horas, a uma temperatura de 41 a 45 °C. No final da fer-
mentação, o coágulo deve apresentar pH ente 4,5 e 4,7 ou acidez de 70° a 72°D;
o gel deve ser liso, brilhante, sem desprendimento de soro ou gases.
3. Leite e Produtos Lácteos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 117
No iogurte batido, em que a massa é quebrada após o arrefecimento, a incu-
bação é realizada no tanque de fermentação. Devido à necessidade de quebra
do gel (massa) para embalar, o produto terá uma textura menos firme que o
anterior. Poderá ou não conter pedaços de frutas.
Arrefecimento
Após a incubação, segue-se o arrefecimento que é um dos pontos críticos na
produção do iogurte. A sua função é reduzir a actividade metabólica da cultu-
ra inicial, controlando assim a acidez do produto. É recomendado que se faça
em duas etapas para evitar o choque térmico que provoca uma contracção da
massa que provocaria dessoramento. O arrefecimento deve ocorrer no prazo
de uma hora.
118 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 3. Leite e Produtos Lácteos
mais rápidos e eficientes. No entanto, convencionalmente, são dois os métodos
de arrefecimento:
• O produto numa câmara é submetido a uma corrente de ar frio até que a temperatura caia para
aproximadamente 20 ºC
• Finalmente, o produto é deslocado para câmara de refrigeração com temperatura entre 5 ºC e 10 ºC; este
processo é mais demorado do que o processo que utiliza água fria
No iogurte batido o gel só deverá ser quebrado após a massa ter sido arrefecida
em torno de 10 ºC. Quando se adicionam aroma, sabores e pedaços de frutas,
este é o momento ideal para adição. O produto final deverá ter uma aparência
lisa, sem grumos, e a quebra da massa a frio permite que as micelas de caseína
reabsorvam o soro, evitando a sinérese.
3. Leite e Produtos Lácteos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 119
leite cru
recepção
coadjuvantes
filtração
pré-aquecimento
mistura/normalização
homogeneização
fermento
pasteurização
normalização da temperatura
INOCULAÇÃO
Embalamento e armazenamento
embalamento
No caso do iogurte batido, a fermentação é feita num tanque com posterior
embalamento, sendo depois de arrefecido, mantido sob refrigeração por um
embalagens
incubação
período superior a 24 horas antes de ser comercializado.
arrefecimento
A embalagem deve seguir alguns critérios como: ser impermeável aos sabores,
corantes, odores do ambiente, oxigénio e contaminações externas; resistir à aci-
refrigeração
dez do iogurte, e à humidade, e não permitir exposição do produto à luz. Uma
boa opção para produção em pequena escala é a embalagem de polietileno
iogurte sólido
que apresenta também facilidade para a selagem térmica. Poderão também ser
Figura 3.40
Diagrama de fluxo utilizadas embalagens de vidro com tampas de rosca.
da produção
de iogurte sólido
A temperatura de armazenamento deve ser de 2 º a 5 °C para conservar e me-
lhorar a consistência do iogurte, que deve ser consumido à temperatura de 10
a 12 °C.
O transporte da fábrica até ao ponto de comércio deve ser o mais rápido possí-
vel, principalmente no verão e deve ser feito em veículos refrigerados.
Um método muito simples para a produção de iogurte pode ser baseado em leite adicionado, ou não, de leite em pó (40g por litro de
leite). Esta mistura é aquecida num banho de água a ferver durante 30 minutos. De seguida deixa-se o leite arrefecer à temperatura de
45ºC e, neste momento, adiciona-se um iogurte de uma fabricação anterior, ou um iogurte adquirido no comércio, por cada litro de
leite misturando-se bem durante dois minutos. Posteriormente a mistura é colocada em frascos bem lavados e com tampa. Quando a
temperatura ambiente é elevada o produto deverá coagular entre 3 e 10 horas. Se a temperatura ambiente for baixa, os copos devem
ser colocados junto de uma fonte de calor, para que a temperatura seja de cerca de 42ºC. Após a coagulação o produto deve ser refri-
gerado e, um dos copos deverá ser conservado no frigorífico para ser usado noutro fabrico.
120 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 3. Leite e Produtos Lácteos
Figura 3.41 Figura 3.42
Adição de fermentos liofilizados Enchimento de embalagens de
(DVS) à mistura destinada ao iogurte antes da incubação
fabrico de iogurte
a Edulcorantes
O edulcorante mais utilizado é o açúcar, que pode ser refinado ou em cristal, isento de impurezas. Para produtos dietéticos,
são utilizados outros edulcorantes como a sacarina e o aspartame.
b Aromas e corantes
Existem aromas naturais e artificiais que permitem obter o sabor desejado e devem ser adicionados ao leite após a pasteuri-
zação. O corante tem a finalidade de lembrar o sabor escolhido, relacionando-o com a fruta.
Os corantes naturais mais utilizados são originados da beterraba, carmim de cochonilha, carotenóides e urucum e, os artifi-
ciais, são o amarelo crepúsculo, bordeaux, laranja GGN e vermelho 40. Devem ser utilizados, na proporção de 0,02 a 0,15%.
c Polpas de frutas
Devem possuir pH e viscosidade próximos ao do iogurte, e ser usados na proporção de 0,5 a 5,0%. Podem ser aproveitadas
também as geleias de frutas, tomando-se cuidado, pois estas já possuem açúcar.
d Conservantes
O seu uso não é, normalmente, permitido pela legislação, restringindo-se à preparação de polpas, e de pastas de frutas em-
pregados como ingredientes na elaboração do iogurte, num limite máximo de 0,1% de ácido sórbico.
e Espessantes
Têm o objectivo de melhorar a consistência, viscosidade e aparência do produto final, além de prevenir a sinérese, que é a
separação do soro. Como exemplo de espessantes temos o amido modificado, carragenato, agar, alginatos, goma xantana,
entre outros e devem ter sabor neutro, fácil solubilidade em água e leite, estabilidade em pH ácido e não apresentar cor. A
sua adição pode ser feita ao leite frio ou morno antes da pasteurização, ao leite quente logo após a pasteurização ou, no leite
inoculado antes da incubação.
3. Leite e Produtos Lácteos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 121
Figura 3.44
aspecto geral de
grãos de Kefir
Figura 3.43
ASPEcTO GERAL E DO INTERIOR
DE uma câmara de incubação
de iogurtes
3.6.3.2.2 Kefir
122 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 3. Leite e Produtos Lácteos
Figura 3.45
Mulher Himba agitando cabaça
com leite fermentado para
3.6.3.2.3 Outros produtos lácteos tradicionais produzir manteiga
O processo de fermentação láctica afecta não apenas o prazo de vida útil dos
produtos mas contribui também para a sua qualidade, segurança e características
organolépticas.
3. Leite e Produtos Lácteos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 123
mente fumado colocando-se de seguida este recipiente numa zona aquecida
até que o leite acidifique e coagule. Novas quantidades de leite recém ordenha-
do podem ser adicionadas diariamente com ou sem remoção prévia do soro
resultante da coalhada anterior. O produto pode ser consumido como tal ou,
na maioria dos casos, é batido numa cabaça para a produção de manteiga. O
leitelho resultante da produção da manteiga pode ser consumido directamente
ou vendido.
Normalmente estes processos são utilizados em países que têm excesso de pro-
dução de leite em relação às suas necessidades de consumo.
124 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 3. Leite e Produtos Lácteos
água fria
vapor
água do leite
eliminada
VÁCUO
leite evaporado
Figura 3.46
Diagrama de um evaporador
de duplo efeito
custos variam de acordo com a sua eficiência energética. Normalmente são usa-
dos evaporadores de duplo ou triplo efeito e de filme descendente. Isto é, são
usados permutadores de calor tubulares, nos quais o leite é introduzido em con-
dições de vácuo e submetido ao processo de ebulição.
3. Leite e Produtos Lácteos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 125
composição do leite evaporado composição do leite evaporado
com 27% de sólidos totais com 45% de sólidos totais
Água gordura lactose proteína sais Água gordura lactose proteína sais
m1 * ST1 = m2 * ST2
1.000 * 12,5 = m2 * 27
m2 = 462,96
126 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 3. Leite e Produtos Lácteos
composição do leite condensado
Figura 3.49
Composição do leite
condensado
3.6.5 Leite em pó
A produção de leite em pó é o processo que garante maior prazo de vida útil ao
leite. Normalmente o leite em pó gordo tem um prazo de validade de 6 meses,
enquanto o leite em pó magro tem um prazo de validade de cerca de 2 anos.
O processo de desidratação consiste em retirar praticamente toda a água pre-
sente no leite transformando-o num pó com cerca de 97% de sólidos totais e
3% de humidade. A actividade da água deste produto é tão baixa que não é
3. Leite e Produtos Lácteos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 127
ar seco
(200ºC) entrada de leite
filtro
aquecimento
do ar
atomizador ciclones ar húmido
(95ºC)
filtro câmara
de secagem
entrada de ar
recuperação de
particulas de pó
leito
fluidizado
80 ºC 60 ºC 20 ºC leite em pó
ar seco
Figura 3.50
Diagrama geral de um atomizador
equipado com secador de leito
fluidizado para aglomeração
de partículas
128 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 3. Leite e Produtos Lácteos
a Entrada de produto a
b Dispersão de ar seco b
c atomizador rotativo
c
f
d tubagem de ligação
d g
e controlo de entrada de ar
f ciclone de recuperação de pó h
Figura 3.51
Aspecto geral e diagrama de um secador de escala
laboratorial (Niro Atomizer™)
Água gordura lactose proteína sais Água gordura lactose proteína sais
3. Leite e Produtos Lácteos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 129
4. Carne e produtos cárnicos
4.1 Composição da carne
4.1.1 Classificação dos músculos
A carne resulta do processo de transformação do músculo que ocorre após o
abate. Os músculos, responsáveis pelo movimento (músculo estriado), podem
ser classificados de várias maneiras, sendo a mais simples aquela que os divide
entre vermelho ou branco. Esta divisão é feita com base no seu conteúdo em
mioglobina. A mioglobina é uma molécula complexa que contém ferro e que
tem como principal função efectuar o transporte do oxigénio. Exerce ao nível do
músculo a mesma função que é exercida pela hemoglobina ao nível da circula-
ção em geral.
130 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
mação da glucose em ácido láctico em condições de anaerobiose. São músculos
adaptados para exercerem uma actividade esporádica e intensa.
Note-se que, para além do músculo estriado cuja actividade depende da vontade,
existem outros dois tipos de músculo cujo funcionamento é regulado de forma
autónoma: o músculo liso que se encontra predominantemente ao nível da pare-
de intestinal e que é responsável pelos movimentos peristálticos desse órgão e,
o músculo cardíaco.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 131
4.1.2 Caracterização da fibra muscular
Na figura 4.1 pode observar-se a organização de um músculo estriado esquelé-
tico. Cada músculo é rodeado por uma película de tecido conjuntivo (epimísio)
que se encontra ligada aos tendões que, por sua vez, se encontram ligados a
ossos. O músculo é dividido em feixes de fibras recobertas também por tecido
conjuntivo (perimísio). Este tecido é ainda subdividido por camadas mais finas
de tecido conjuntivo que recobrem feixes de fibras musculares com cerca de 1
mm de diâmetro. As fibras musculares individualizadas têm diâmetros entre 0,01
e 0,1 mm e um comprimento que pode variar entre alguns milímetros e 30 cm.
Dentro de cada feixe as fibras musculares estão também separadas por tecido
conjuntivo (endomísio). Os capilares sanguíneos e as fibras nervosas, necessários
para o funcionamento do músculo, estão englobados no endomísio. A superfície
das fibras musculares é denominada sarcolema.
O sarcolema é composto por três camadas. Uma rede de colagéneo externa, uma
camada intermédia amorfa e uma membrana plasmática interna. Esta membra-
na garante a transmissão dos impulsos nervosos ao interior da célula muscular.
As fibras musculares são compostas por miofibrilhas que formam feixes com-
pactos. Estas miofibrilhas correspondem a cerca de 80% do volume da célula. As
miofibrilhas, constituídas por diversas proteínas, são de facto o sistema contráctil
do músculo. São estruturas com cerca de 0,001 a 0,002 mm de diâmetro.
132 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
Cada filamento grosso, com cerca de 1,6 μm de comprimento, é composto por
cerca de 300 moléculas de miosina. A molécula de miosina é composta por duas
sub-unidades com um peso molecular elevado (cadeias pesadas) e por quatro
sub-unidades com um peso molecular cerca de 10 vezes inferior. As cadeias pesa-
das organizam-se em hélice e, a sua porção terminal liga-se a duas sub-unidades
leves. Desta forma as cabeças da miosina são capazes de se ligar a outras proteí-
nas que formam os filamentos finos.
Os filamentos finos são essencialmente constituídos por actina, uma proteína glo-
bular (actina G) que forma feixes constituídos pela agregação de cerca de 400
moléculas (actina F). Estes feixes dispõem-se de forma helicoidal, e em determi-
nados locais, estas hélices são capazes de se ligar às cabeças da miosina.
De modo muito simplista poderá dizer-se que o músculo resulta da organização de feixes de proteína que se
dispõem de forma muito complexa e organizada formando filamentos grossos e finos. Estes feixes são capazes
de deslizar entre si, permitindo a contracção e distensão do músculo.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 133
periósteo relaxado
a c
1/2 banda I banda A 1/2 banda I
tendão
filamento de miosina
m
fáscia profunda
músculo estriado
perimísio filamento de
actina
epimísio z banda h z
feixe muscular
endomísio
fibra muscular (célula)
miofibrilha contraído
mitocôndria b
sarcolema MIOFILAMENTOS a Organização do músculo estriado
b Fibra muscular
c Sarcómero relaxado e contraído
linha z linha z
MIOFI- banda a
FRILHAS banda i banda i
figura 4.1
Representação esquemática
da organização do músculo
cada miofibrilha. O RS liberta o cálcio necessário para o processo de contracção
muscular em função de um estímulo nervoso e, reabsorve-o após a contracção,
permitindo o relaxamento. Os elementos transversos do RS são paralelos à linha
Z e cobrem grande parte da banda I.
134 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
4.1.3 O tecido conjuntivo
4.13.1 Colagéneo
O tecido conjuntivo engloba e suporta o músculo ligando-o aos tendões através
do epimísio, perimísio e endomísio. Existe pois uma íntima relação entre o tecido
conjuntivo e as células musculares. O tecido conjuntivo consiste em várias fibras
envolvidas numa estrutura amorfa. Vários tipos de células estão também incluí-
das no tecido conjuntivo (fibroblastos, macrófagos e células gordas). A estabilida-
de da estrutura pela qual o tecido conjuntivo é responsável, depende em grande
parte das propriedades das fibras de colagénio, embora outra proteína, a elastina,
contribua também.
O colagéneo é um elemento determinante na textura da carne e, mais do que a sua quantidade, a sua qualidade, isto
é, a quantidade de ligações cruzadas entre as fibras de colagéneo é o factor determinante. Normalmente, a quantidade
de colagéneo decresce ao longo da vida mas, devido ao aumento do número de ligações cruzadas entre fibras, tende
a dar origem a uma carne mais dura.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 135
a composição da carne em várias espécies
50
40
30
20
10
0
água proteína lípidos minerais
90 b Base seca
80
70
60
50
40
30
20
10
0
carne de vaca carne de porco carne de ovelha carne de frango
figura 4.2
Composição da carne
em várias espécies
4.1.3.2 Elastina
A elastina é um componente do tecido conjuntivo que representa menos de 5%
do teor de colagéneo. Normalmente está associada ao sistema de vasos capila-
res responsáveis pelo transporte de oxigénio para o músculo. Contudo, alguns
músculos (p.ex.: Longissimus dorsi) contêm maiores quantidades de elastina (até
30% do teor de colagéneo) e, muito provavelmente, nestes casos, é um fac-
tor determinante da textura (Varnan & Sutherland, 1995). A elastina tem uma
composição muito semelhante à do colagéneo embora apresente uma estrutura
mais amorfa.
136 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
principais ácidos gordos da carne (%)
% do ácido gordo
35
30
25
20
15
10
5
0
C14:0 C16:0 C18:0 C18:1 C18:2 C18:3 C20:0 C20:1
figura 4.3
Percentagem dos principais
ácidos gordos da carne
de diferentes espécies
A cor é determinante na selecção inicial da carne. Nas carnes vermelhas, uma cor
vermelho brilhante associada à presença de oximioglobina é um factor positivo.
Pelo contrário, a presença de metamioglobina cujo teor aumenta ao longo do
tempo de conservação da carne, origina uma coloração acastanhada que tende
a depreciar o produto.
Nas figuras 4.1 e 4.2 é apresentada a composição média da carne de várias es-
pécies. Como se pode verificar, a água é o componente principal. Dos compo-
nentes sólidos, destaca-se naturalmente a proteína que representa cerca de 20%
da carne. O teor de lípidos apresenta variações significativas entre as diferentes
espécies destacando-se a carne de porco em relação ao seu valor total.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 137
a b
ácidos gordos INSATURADOS/ valor do índice de iodo da gordura
SATURADOS da carne de diferentes espécies
0,8
índice de iodo
100
0,6
50
I/S
0,4
0
0,2 carne carne carne carne
de vaca de porco de ovelha de frango
0
carne carne carne carne
de vaca de porco de ovelha de frango
figura 4.4
Rácio de ácidos gordos
insaturados/ácidos
gordos saturados (a)
e índice de iodo (b)
da gordura da carne
de diferentes espécies
138 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
evolução do pH
7,2
7
6,8
6,6
6,4
pH
6,2
6
5,8
5,6
5,4
Figura 4.5
0 2 4 6 8 10
Evolução do pH da carne
durante a instalação do Horas após o abate
rigor mortis
e adenosina difosfato (ADP) em ATP pela via glicolítica. Esta situação origina a
utilização de glucose, proveniente do glicogénio, em condições de anaerobiose o
que origina a formação de ácido láctico e a consequente descida do pH. Na figura
4.5 pode observar-se a evolução do pH da carne após o abate.
Se os músculos forem separados dos ossos antes da instalação do rigor ou se, por
acção térmica se tiver aumentado o seu grau de contracção (p. ex. frio intenso)
irão entrar em rigor muito contraídos o que irá afectar negativamente a tenrura
da carne. Isto é, tanto quanto possível, deverá esperar-se que a entrada em rigor
ocorra de forma gradual sem que o músculo se contraia para além do normal, e
que o abaixamento do pH seja também pouco brusco, acompanhando a descida
gradual da temperatura da carcaça.
Depois deste período pode dizer-se que a carne entra em estado de maturação.
A partir deste momento a carne estará em condições de ser consumida. Ao longo
do tempo, por acção das enzimas presentes na carne, irão ocorrer transformações
químicas que tendem a melhorar a sua tenrura e sabor.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 139
extensibilidade do músculo
100
80
extensibilidade (%)
60
40
20
0
Figura 4.6
0 2 4 6 8 10
Evolução da extensibilidade
Horas após o abate do músculo durante
o rigor mortis
65
60
55
50
45
40 Figura 4.7
0 2 4 6 8 10 12 Evolução da capacidade
de retenção de água
Dias após o abate da carne durante
a maturação
140 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
evolução do pH
pH
6,4
6,2
6
5,8
5,6
5,4
0 2 4 6 8 10
Horas após o abate
Figura 4.8
Evolução do pH da carne
durante a instalação do
rigor mortis em carnes
provocar a sua putrefacção. Há que ter em conta que, no momento do abate, normais, DFD e PSE
Existem duas situações de tipo metabólico que frequentemente afectam a qualidade da carne. A primeira resulta de situações de fadiga ou de
deficiente alimentação dos animais e, nestes casos, não existem reservas de glicogénio a nível sanguíneo. Não havendo glucose disponível, não
existe reposição da reserva de ATP por via glicolítica. Nestas condições, não há produção de ácido láctico e o pH da carne mantém-se elevado.
Esta situação favorece o desenvolvimento de microrganismos. A carne apresenta uma cor escura ao corte, tem uma elevada capacidade de
retenção de água e, poderá entrar em putrefacção rapidamente. Esta situação é frequente em carnes de bovino designadas por carnes DFD
(dark firm dry - escuras, firmes e secas). Na figura 4.8 pode observar-se que o pH destas carnes ao fim de 10 horas é praticamente igual ao pH
no momento do abate.
Outra situação, bastante frequente em carnes de suíno, resulta do stress a que os animais são sujeitos durante o transporte até ao matadouro
e, no momento do abate. Nestes casos existe uma queda brusca do pH enquanto a carcaça se encontra a temperaturas elevadas. O pH atinge
o valor final cerca de 1 hora após o abate. Nestas condições, as proteínas solúveis perdem a sua capacidade de retenção de água. A carne fica
pálida, mole e não retém água. Estas carnes são denominadas PSE (pale soft and exsudative - pálidas, moles e exsudativas). A ocorrência
deste tipo de carnes é muito comum em raças de suínos seleccionadas e com elevada capacidade de crescimento. Estas carnes apresentam
um aspecto pouco agradável e originam muitos problemas na fabricação de enchidos nos quais a capacidade de retenção de água é um factor
importante (enchidos cozidos).
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 141
produção mundial de carne (milhões de toneladas)
120
100
80
60
40
20
0
ia
a
a
rte
a
Su
ra
r ic
op
nt
ni
Ás
nt
No
ea
ie
Áf
do
r
Ce
Eu
Or
Oc
do
ic a
ic a
io
ic a
ér
éd
ér
Am
ér
Am
Am
60
50
40
30
20
10
0
a
ia
a
EUA
il
ha
lia
ico
in
as
di
nç
nh
ss
It á
an
Ch
Ín
éx
Br
Rú
a
pa
Fr
em
M
Es
Al
Figura 4.9
Produção mundial de carne
4.5 Operações de abate e desmancha de carcaças
4.5.1 Matadouro
Abegoaria
A recepção dos animais é efectuada na abegoaria, tendo acesso pelo exterior
através do denominado circuito sujo. A abegoaria é constituída por parques in-
dividuais e cercas para bovinos, cercas para as espécies ovina, caprina e suína,
tendo os animais acesso a água potável.
142 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
Sala de abate
A sala de abate dispõe de linhas de abate, uma por cada espécie animal. Esta pos-
sui zonas de insensibilização e de sangria diferenciadas e câmaras de refrigeração
para carcaças suspeitas e para carcaças rejeitadas. Em anexo à sala de abate exis-
tem alguns sectores de apoio, tal como a triparia, câmaras de refrigeração para as
vísceras e sala de tratamento de sangue.
Triparia
A triparia é o sector do matadouro anexo à nave de abate, onde são preparados
os estômagos, intestinos e patas. Consideram-se duas zonas de laboração distin-
tas, a zona de recepção, separação e esvaziamento – zona suja e, a zona de lava-
gem e acabamento – zona limpa. Os estômagos e intestinos ao chegarem à zona
de recepção são separados, sendo que dos intestinos, apenas são aproveitados
para consumo os dos suínos (produção de tripa natural para enchidos), pois os in-
testinos das restantes espécies animais são retirados do consumo e aproveitados
como subprodutos (p. ex. farinha de carne). Neste sector, as patas são preparadas
em máquinas rotativas e com água quente.
Cadeia de frio
No seguimento das linhas de abate, após as carcaças deixarem a sala de abate,
segue-se a zona de frio. Esta poderá ser constituída por câmaras de duplo regime
(para refrigeração rápida e para conservação) e uma zona refrigerada destinada à
expedição do produto final.
Sala de desmancha
No final das instalações, e após o corredor das câmaras de refrigeração encontra-
-se a sala de desmancha. Esta sala dispõe também de câmaras para a armazena-
gem separada da carne embalada e da carne exposta, existindo ainda no corredor
de frio uma câmara de apoio à desmancha, onde é armazenada a carne enquanto
aguarda a entrada na sala de desmancha, à medida que vai sendo necessária.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 143
Estruturas de apoio
No exterior do edifício deverão existir várias infra-estruturas de apoio às activi-
dades que aqui são efectuadas tais como:
pH
disponibilidade em água (aw)
nutrientes disponíveis
144 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
Estes factores conseguem proporcionar aos microrganismos patogénicos as con-
dições óptimas para o seu desenvolvimento, uma vez que, na carne, os valores
dos seus parâmetros encontram-se dentro da gama óptima ao desenvolvimento
microbiano. No caso concreto do pH, na carne, ele pode variar entre 5,1 e 6,4
estando o pH óptimo de desenvolvimento da grande generalidade dos micror-
ganismos situado entre 4 e 7,5. No caso da actividade da água, este parâmetro na
carne ronda os 0,98 - 0,99 sendo o valor mínimo para o desenvolvimento micro-
biano cerca de 0,75. Logo o valor do aw da carne é favorável ao desenvolvimento
de microrganismos. Relativamente aos nutrientes disponíveis, a carne é rica em
proteínas e lípidos e pobre em glícidos, sendo em primeiro lugar um terreno
propício ao desenvolvimento das espécies proteolíticas (capazes de hidrolisar as
proteínas em aminoácidos).
temperatura
humidade do ar ambiente
composição da atmosfera
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 145
Desenvolvimento de perigos durante o processo de produção e abate
Os músculos de um animal vivo, em bom estado de saúde, são normalmente
isentos de microrganismos. Apesar de, no animal vivo e de boa saúde, existi-
rem mecanismos de defesa que impedem a propagação destes microrganismos
nos tecidos internos, de forma que a carne seja originalmente estéril, podem-se
verificar casos em que os tecidos sofram de doenças infecciosas e contenham
germes patogénicos, podendo desta forma transmitir zoonoses, ou seja a sua
doença aos seres humanos, sendo a carne consumida o veiculo transmissor. As-
sim, a inspecção veterinária levada a cabo por pessoal treinado é essencial para
a garantia da segurança.
O nível de higiene em todas etapas da preparação das carnes terá uma influên-
cia primordial sobre a carga microbiana final. Embora a carne constitua um bom
meio de cultura para os microrganismos, determinadas características retardam
a invasão das carcaças pelos microrganismos, tais como a presença de numero-
sas barreiras físicas (tecido conjuntivo, camadas de gordura), a dessecação das
zonas superficiais (abaixamento da aw à superfície) e o abaixamento do pH da
massa muscular durante a armazenagem.
146 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
Perigos biológicos Bactérias, fungos, priões, vírus e parasitas
Perigos químicos Pesticidas, medicamentos (antibióticos, promotores de crescimento), agentes de limpeza/desinfecção, metais pesados
Perigos físicos Vestígios de ossos, cerdas, vidros, metais, objectos de uso pessoal
A carne possui um conjunto de factores propícios ao desenvolvimento microbiano, sendo por isso um produto facilmente
Perigos biológicos
atacado por diversos microrganismos patogénicos.
Bactérias
Entre os microrganismos responsáveis por doenças alimentares, as bactérias es-
tão de longe mais frequentemente em causa. Entre as características óptimas de
desenvolvimento destes microrganismos, destacam-se uma aw óptima de desen-
volvimento entre 0,75 e 1, pH óptimo de 7 e a temperatura que varia consoante
as preferências térmicas (descritas anteriormente). Algumas bactérias estão a ter
uma incidência cada vez menos frequente, e outras estão a emergir rapidamente.
Mudanças nos métodos de criação, nos modos de preparação e de conservação
dos alimentos, assim como nos hábitos alimentares podem explicar este fenóme-
no, tal como as modificações nas próprias estirpes bacterianas ou das técnicas
de detecção microbiológica. Das principais bactérias que afectam, contaminam e
alteram a carne, destacam-se as apresentadas na tabela 4.1.
tabela 4.1
Flora patogénica bacteriana
mais relevante na carne
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 147
Fungos
Alguns fungos são agentes de intoxicação alimentar devido às micotoxinas que
produzem. As micotoxinas são os metabolitos tóxicos elaborados por determi-
nados fungos durante o seu crescimento sobre os alimentos. Algumas são mu-
tagénicas e cancerígenas, outras danificam órgãos específicos, principalmente
o fígado, os rins e o sistema nervoso, outras ainda agem sobre a reprodução
(aborto, esterilidade). Entre as características óptimas de desenvolvimento des-
tes microrganismos, destacam-se uma aw óptima de desenvolvimento entre 0,61
e 0,95, temperaturas entre os 12 ºC e os 38 ºC e um pH que varia entre 5,6 e 7,
bem como, a presença de oxigénio.
Priões
O prião é um agente infeccioso proteico. É portanto, uma proteína com capaci-
dade de modificar outras proteínas tornando-as cópias de si própria. Os priões
não possuem ácidos nucleicos (DNA ou RNA). São conhecidas treze espécies de
priões, das quais três atacam fungos e dez afectam mamíferos. A sua prolifera-
ção é extremamente rápida e causa as denominadas Encefalopatias Espongifor-
mes Transmissíveis (EET), doenças cujo sintoma mais comum é a demência. Os
priões são os agentes patogénicos de menor dimensão conhecidos, podendo
apenas ser observados recorrendo aos mais potentes microscópios electrónicos.
148 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
Os priões foram identificados como causadores de várias doenças neurológicas
letais, geralmente com períodos de incubação prolongados, que antes eram atri-
buídas a vírus de lenta proliferação.
A infecção pelas proteínas patogénicas pode ocorrer essencialmente, por três for-
mas: hereditariedade, uso de material cirúrgico contaminado ou por consumo
de carne de animais infectados. Deve-se destacar o perigo que as infecções por
priões representam, já que estes agentes são mais resistentes à destruição que
qualquer outro agente patogénico conhecido. Estes são duradouros e estáveis e
não podem ser neutralizados por radiação e, para além disso, não existem proce-
dimentos de rotina que visem detectá-los.
Os priões são responsáveis pelas doenças classificadas como encefalopatias espongiformes transmissíveis, que re-
cebem este nome devido ao aspecto de esponja adquirido pelo tecido nervoso cerebral atingido pelas doenças. Nos
humanos, a doença que se suspeita ser de origem alimentar é a variante da doença de Creutzfeld-Jacobs. Esta variante
assim como a doença dos bovinos BSE: Bovine Spongiform Encephalopathy (Encefalopatia Espongiforme Bovina), também
conhecida por “doença das vacas loucas”, parecem ser causadas pelo mesmo agente. Após um período de incubação de
alguns anos, esta doença resulta numa neurodegenerescência irreversível que se torna na causa da morte.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 149
Vírus
Determinadas infecções virais podem ser transmitidas pela água e pelos alimen-
tos como sejam os casos da hepatite infecciosa (hepatite A), da poliomielite e
vários tipos de gastroenterites viróticas. Os vírus, ao contrário das bactérias e
dos fungos, não podem multiplicar-se nos alimentos, apenas os usam como
transporte. O número de partículas virais infecciosas tem tendência a diminuir
durante a armazenagem ou durante o tratamento da água e dos alimentos. Em
contrapartida, a dose necessária para provocar doença é frequentemente muito
mais baixa do que no caso das bactérias.
Para provocar uma infecção alimentar, o vírus deve ser relativamente estável em
relação às condições ambientais, resistir à acidez do estômago e às enzimas di-
gestivas. É por isso que os tipos de vírus em causa são em número relativamente
restrito. Os vírus entéricos propagam-se por via oral e fecal pois as pessoas infec-
tadas emitem grandes quantidades de partículas virais nas fezes.
Parasitas
Parasita é todo o ser que vive à custa de outro, prejudicando-o. O hospedeiro é
o locus ecológico imediato do parasita. Relativamente à localização do parasita,
podem-se considerar dois tipos de parasitas: ectoparasita e endoparasita.
150 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
• Ectoparasita é um parasita exterior, sobretudo da pele, de que são exem-
plo as pulgas e a carraças;
• Endoparasita é um parasita que se localiza interiormente no hospedei-
ro. Dentro desta classificação existem os parasitas intestinais, que como o
nome indica se instalam no intestino do hospedeiro, os parasitas do san-
gue que vivem no sangue como os hematozoários e, os parasitas dos ór-
gãos e tecidos que têm localizações específicas e podem ser encontrados
em quase todo o organismo.
Os parasitas podem ter acesso ao organismo de várias formas. Por via bucal, cutâ-
nea, aérea, auditiva, ocular, rectal e por via genital. Os parasitas potencialmente
perigosos para o Homem, são de três grupos de organismos: protozoários, os
vermes redondos (nematelmintes) e os vermes chatos (platelmintes). Tal como
os vírus, os parasitas presentes nos alimentos não podem multiplicar-se neles,
contudo a dose infecciosa é extremamente reduzida podendo uma única larva
provocar uma parasitose. O efeito sobre a saúde varia consideravelmente confor-
me o tipo e o número de parasitas ingeridos.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 151
Os perigos químicos são responsáveis por problemas de saúde. No entanto, estes não apresentam um risco tão elevado
como os perigos biológicos. Nesta categoria de perigos inclui-se um vasto conjunto de perigos de origens diversas, des-
de perigos associados directamente às características das próprias matérias-primas, até perigos introduzidos durante os
Perigos químicos
processos. Destacam-se pesticidas químicos, medicamentos veterinários (antibióticos, promotores de crescimento), metais
pesados e agentes de limpeza/desinfecção. Estas substâncias, quando ingeridas pelo consumidor podem provocar doenças
de gravidade variável, consoante a substância em questão, e a quantidade presente no alimento.
Pesticidas químicos
Este parâmetro, tal como qualquer outro que possa acarretar perigos para o
consumidor, deve ser controlado. Os pesticidas químicos utilizados podem ser
classificados de acordo com a praga que se pretende que o mesmo destrua.
Existem portanto, acaricidas (ácaros), bactericidas (bactérias), fungicidas (fungos),
herbicidas (ervas daninhas), insecticidas (insectos), nematicidas (nematelmintes),
raticidas (ratos e outros roedores).
Medicamentos veterinários
A presença destes produtos nos alimentos pode causar diversos problemas para
a saúde do consumidor, tais como desenvolvimento de reacções alérgicas vio-
lentas, redução da eficácia dos antibióticos no tratamento de infecções, ou até
desenvolvimento de doenças associadas à toxicidade do produto e mutações
que podem ocorrer, conduzindo eventualmente a doenças de natureza cance-
rígena.
Relativamente aos antibióticos, a longo prazo, o consumo de carne com resíduos
destas substâncias, mesmo em concentrações baixas, pode prejudicar a saúde
humana, com a possibilidade de desenvolvimento de reacções tóxicas ou alérgi-
cas em indivíduos susceptíveis. Para além do risco toxicológico, a exposição do
consumidor aos resíduos de antibióticos pode gerar um aumento da resistência
das bactérias, daí a importância dos registos dos medicamentos aplicados e do
respeito pelos intervalos de segurança dos fármacos em causa.
Os promotores de crescimento tiveram durante muito tempo grande importân-
cia na produção de proteína animal, devido às inúmeras vantagens que ofe-
reciam. Destacam-se os anabolizantes, que são produtos à base de hormonas
152 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
(naturais ou sintéticas), que actuam directamente nas células musculares, provo-
cando um maior aproveitamento das proteínas dos alimentos através da reten-
ção de nitrogénio e eliminação de gordura. Este processo acaba por favorecer o
crescimento dos músculos. O uso destes produtos está, actualmente, proibido.
Entre os perigos físicos mais frequentes é possível enumerar materiais de natureza diversa. No caso concreto do matadouro
os perigos mais relevantes são cerdas, esquírolas ósseas, pedras, metal e objectos vários de uso pessoal. A contaminação com
Perigos físicos
objectos estranhos é introduzida no decurso das actividades exercidas. No entanto, o risco que advém destes perigos não é,
normalmente, considerado como muito relevante apesar de ter de ser considerado para avaliação do processo.
Metais pesados
A contaminação por metais pesados pode constituir um grave risco para a saúde
do consumidor, na medida em que o organismo humano tem dificuldade em
eliminar estes elementos, que tendem a acumular-se em determinados órgãos do
corpo. Alguns dos metais pesados para os quais os teores máximos admissíveis
estão definidos são: chumbo, cádmio e o mercúrio.
Esta contaminação era anteriormente mais frequente devido ao contacto dos
alimentos com materiais do equipamento como o cobre, com o chumbo de ca-
nalizações, com os materiais de embalagem e ainda por utilização de água con-
taminada por metais pesados. No entanto, a evolução do conhecimento técnico-
-científico e as alterações ao nível da legislação conduziram a uma redução de
contaminações por metais pesados.
Agentes de limpeza/desinfecção
A limpeza e desinfecção são etapas muito importantes, sendo para isso necessá-
rio que todas as instalações, equipamentos e utensílios sejam devidamente higie-
nizados, utilizando os meios de limpeza e desinfecção que permitam assegurar
a conservação, preparação e confecção em condições adequadas de higiene. No
entanto resíduos destes produtos nos alimentos podem originar problemas para
a saúde do consumidor. Daí a importância de elaborar planos de higienização
adequados aos processos e equipamentos e de os respeitar.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 153
É de grande relevância um conhecimento detalhado das linhas de abate, assim como de todas as tarefas efectuadas em cada ope-
ração, de forma a analisar e avaliar os perigos que daí decorrem.
Seguidamente são explicadas todas as operações que fazem parte de linhas de abate de bovinos, de suínos e de aves, fazendo-se
a descrição de todas as tarefas efectuadas nessas operações.
Recepção
A recepção dos animais dos vivos é efectuada na abegoaria, tendo os animais
obrigatoriamente em todas, acesso a água potável em livre arbítrio. Deve existir
também local para estabulação de ovinos/caprinos, suínos e bovinos suspeitos.
Atordoamento
Nesta fase, o animal é conduzido da abegoaria para o local de atordoamento,
através de uma manga compartimentada. O atordoamento ao provocar no ani-
mal um estado de inconsciência e ausência de dor, facilita o manuseamento
por parte dos operadores, salvaguarda a qualidade da carne e permite a morte
do animal sem dor nem sofrimento. Consoante a espécie, utilizam-se diferentes
processos de atordoamento:
• o tiro na cabeça, aplicado nos bovinos, onde é usada uma pistola de êm-
bolo perfurante e retráctil, aplicado num ponto especifico na região fron-
tal, de modo a destruir parte do córtex cerebral;
• a electronarcose, nos suínos e pequenos ruminantes (por vezes também
em bovinos de pequeno porte), que consiste na aplicação de uma corren-
te eléctrica alterna, através de equipamentos adequados, aplicados em
dois pontos específicos do crânio do animal.
154 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
• no caso dos suínos, usa-se também a insensibilização com dióxido de car-
bono (CO2). As vantagens invocadas pelos utilizadores deste método rela-
cionam-se com menores probabilidades de lesões dos animais durante o
processo e, na menor incidência de carnes PSE.
Sangria
É nesta operação que o animal efectivamente morre, por esgotamento sanguí-
neo, após o corte dos vasos do pescoço, nomeadamente a veia cava anterior.
Existem duas técnicas para efectuar esta tarefa, podendo ser vertical ou horizon-
tal, onde respectivamente o animal está suspenso na via aérea ou deitado sobre
uma superfície. Em todas as espécies, idealmente, efectua-se a sangria vertical. O
sangue proveniente desta operação cai no sangradouro, a partir do qual é con-
duzido para um depósito de recolha, sendo posteriormente encaminhado para
subprodutos.
No caso do sangue para consumo humano, é feito o golpe com a faca vampiro,
sendo o sangue sugado por um sistema de bomba pneumática para dois depó-
sitos. São feitos lotes de um determinado número de animais e, após aprovação
da totalidade dos animais pertencentes ao lote, o lote de sangue é aprovado para
consumo. Em seguida e após aprovação, o sangue é transferido para recipientes
devidamente lavados e desinfectados aprovados para uso alimentar.
Escaldão
Depois de o suíno ser adequadamente lavado, é submetido ao escaldão, sendo
efectuado num túnel de escaldão com água quente a uma temperatura de 62 ºC.
Esta operação tem como objectivos facilitar a remoção dos pêlos e da primeira
camada da pele, contribuindo também para inibir a proliferação microbiana.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 155
Depilação
Logo de seguida o suíno entra na depiladora, composta por pás de borracha.
No seu batimento, as pás de borracha retiram do corpo do animal a camada
superficial da pele, bem como os pêlos (cerdas). Após esta operação, o suíno
é lançado para cima de uma superfície (mesa de recepção), onde o operador
efectua a remoção das unhas e aplica o gancho de suspensão.
Secagem
Após a depilação, o animal é submetido a um processo de secagem, para re-
moção da água, a fim de facilitar o chamusco.
Chamusco
Esta operação é feita pela acção de bicos de gás, que atingem entre 450 ºC a
700 ºC, sendo estes activados através de uma célula sensível à passagem do
animal. A superfície do corpo do suíno é chamejada, para eliminar as cerdas
restantes, promover a assepsia e valorizar o aspecto comercial da carcaça. O
processo de chamusco também pode ser efectuado com o auxílio de uma
botija de gás e de um maçarico (processo manual).
Lavagem
Após as operações anteriores e antes da evisceração, o suíno é submetido a
uma última lavagem, num túnel de lavagem com água a cerca de 40 - 50 ºC,
com o objectivo de minimizar contaminações.
Esfola
Esta operação consiste na remoção completa da pele do animal, por processos
mecânicos e é efectuada nas espécies bovina, ovina e caprina. Processa-se em
plataformas estrategicamente colocadas ao longo das linhas e inicia-se após o
corte dos cornos, extremidades podais anteriores e cabeça, sendo esta manipu-
lada separadamente e evitando qualquer contaminação da carne. O corpo do
animal está suspenso, ou seja trata-se de um processo de esfola vertical. Duran-
te a esfola são também retirados os órgãos uro-genitais externos e o úbere, que
são posteriormente enviados para os materiais rejeitados. Em matadouros de
pequenas dimensões pode ser efectuada em plataformas horizontais (figura
4.13).
156 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
Evisceração
É o processo de remoção das vísceras das cavidades pélvica, abdominal e toráci-
ca. Inicia-se com a incisão abdominal ao longo da linha branca (corte longitudinal
ao longo da barriga) e exteriorização da bexiga e útero (no caso das fêmeas),
intestinos, pâncreas, estômago, fígado e baço, seguida da sua separação do cor-
po do animal. No caso dos suínos a evisceração inicia-se com o isolamento do
ânus por corte circular dos tecidos vizinhos; nos machos, são retirados os órgãos
sexuais externos, por incisão das bolsas e remoção dos testículos, assim como do
pénis, sendo depois efectuado o mesmo procedimento de incisão abdominal.
Numa operação posterior é realizada e evisceração torácica, por exteriorização e
separação do corpo do animal dos pulmões, coração, traqueia e esófago.
As vísceras abdominais (estômago, pâncreas e intestinos) são conduzidas ao local
de inspecção, através de equipamentos com um movimento sincronizado, com o
movimento da cadeia que transporta as carcaças. As vísceras torácicas (pulmões,
esófago e traqueia) bem como algumas miudezas (coração, língua, baço e fígado)
são suspensas numa plataforma acompanhando a carcaça e as vísceras abdomi-
nais correspondentes para posterior inspecção (figura 4.35).
Consoante o resultado da inspecção, as carcaças, os dois tipos de vísceras e as
miudezas seguem diferentes circuitos e destinos.
Corte da carcaça
Nos suínos (adultos) e bovinos é feita a divisão longitudinal da carcaça com o
auxílio de uma serra mecânica, sendo posteriormente feita a sua lavagem para
remover resíduos de sangue e esquírolas ósseas. No caso dos suínos esta divisão
inclui também a cabeça.
Acabamento
Esta operação consiste num conjunto de tarefas, cujos objectivos passam por
melhorar a higiene da carcaça e valorizar o aspecto comercial da mesma. Existem
dois processos de limpeza efectuada nesta fase:
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 157
No caso dos suínos é feita a limpeza da ferida de sangria, onde são removidos
partes de tecido que apresentem um aspecto demasiado dilacerado. Nesta
operação é tido em conta além do aspecto visual da carcaça, a extensão da
possível contaminação provocada pela operação de sangria.
Refrigeração
Após a preparação da carcaça, a temperatura no interior das suas massas mus-
culares é de cerca de 38 °C (35 °C a 40 °C), dependendo da espécie animal. As
carcaças aprovadas para consumo, são conduzidas imediatamente para as câ-
maras frigoríficas, onde a temperatura é reduzida, para limitar o desenvolvi-
mento microbiano.
Expedição
Esta operação consiste na distribuição das carcaças/vísceras pelos pontos de
destino correspondentes. As carcaças são encaminhadas para a zona de expe-
dição, onde são cortadas e posteriormente colocadas em veículos com caixa
de transporte fechada e refrigerada (carros frigoríficos) para serem distribuídas
pelos vários pontos de destino.
158 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
bovino vivo
recepção
atordoamento
sangria sangue
esfola couro
refrigeração
expedição
carne de bovino
refrigerada
figura 4.10
Fluxograma do processo de
abate de bovinos
Inspecção veterinária
A inspecção veterinária dos animais em vida e durante as operações de abate é um processo fundamental para a garantia da segurança da
carne. A inspecção veterinária permite detectar a presença de doenças infecciosas de origem bacteriana e parasitária, garantindo um controlo
efectivo antes de a carne abandonar o matadouro. Esta operação deverá ser efectuada por veterinários com experiência, auxiliados por pesso-
al ligado à linha de abate que tenha recebido treino específico. Nos casos em que não é possível dispor de um veterinário para a efectuar (p. ex.
abates caseiros em zonas rurais) deverá haver um cuidado especial em observar o estado de saúde do animal em vida e, observar atentamente
se aparece algum indicador de doença na carcaça (p. ex. gânglios linfáticos inflamados ou com pus - ver localização na figura 4.16).
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 159
figura 4.11 figura 4.12
Zona contenção de animais (abegoaria) Zona de abate: electronarcose e sangria horizontal
isquiático
inguinal
superficial
sagrados
ilíaco externo
ilíaco interno
figura 4.15 lombares
Meias carcaças de bovino e vísceras separadas
renal
intercostais
esternal
pré-peitoral
cervicais
figura 4.17
Sangria e esfola verticais
160 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
figura 4.18
Abertura do peito e evisceração vertical
figura 4.19
Corte de carcaças com serra eléctrica e
entrada para o túnel de refrigeração
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 161
etapa
tabela 4.2
Identificação dos perigos
e suas origens
162 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
Etapa Medidas preventivas
• Separação dos animais considerados suspeitos ou que apresentem sintomas de doença
• Formação dos operadores no cumprimento das tarefas
Recepção
• Registos sanitários do animal
• Cumprimento do disposto nos pré-requisitos (pré-requisitos relativos à produção primária)
• Formação dos operadores
Sangria • Existência de esterilizadores de facas bem localizados
• Esterilização adequada das facas entre cada sangria
• Formação dos operadores
• Utilização de equipamentos adequados
Esfola
• Esterilização das facas entre cada animal
• Existência de esterilizadores de utensílios bem localizados
• Execução adequada da tarefa
Evisceração • Remoção das vísceras de forma adequada, evitando que ocorra a ruptura destas e consequentemente
a conspurcação da carcaça
• Esterilização da serra de corte antes de cada utilização
Corte da carcaça
• Lavagem adequada da carcaça removendo as esquírolas ósseas
• Formação dos operadores
• Refrigeração imediata da carcaça
Acabamento
• Limpeza da conspurcação que exista na carcaça
• Retirada da gordura da base do peito que tem contacto com as plataformas
• Medições diárias das temperaturas das câmaras
• Calibração periódica dos termómetros
Refrigeração • Câmaras específicas para cada espécie
• Cumprimento do plano de higienização
• Lavagem adequada das câmaras, removendo todos os resíduos de agentes de limpeza/desinfecção
tabela 4.3
Medidas
• Controlo das temperaturas do transporte
preventivas Expedição • Manter as portas das caixas transportadoras abertas durante o tempo estritamente necessário
aplicáveis a
cada perigo
• Cumprimento do plano de higienização
70
60
% dos componentes
50
40
30
20
10
0
% de músculo % de gordura
figura 4.20
Relação músculo/gordura
em carcaças
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 163
relação aproximada entre osso e gordura em carcaças
bovino e suíno
50
40
% do componente
30
> 25% 21% 18%
20
10
0
% de osso % de gordura
15% 7.5% 5%
3 O grau de marmoreado da carne, ou seja, a quantidade de gordura intramuscular nos principais músculos
164 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
menor que dá um aspecto mais firme à carne. Normalmente, este tipo de gra-
nulado é sinónimo de carne mais tenra.
Categoria Observações
Presença de cartilagem na parte dorsal do processo espinhoso, vasos sanguíneos claramente
1 reconhecíveis
Início do processo de ossificação com a presença de depósitos punctiformes; os vasos sanguíneos ainda perma-
2 nencem visíveis
3 Processo de ossificação em desenvolvimento
tabela 4.4
Grupos de 4 Processo de ossificação em estágio avançado
maturidade, conforme a
ossificação da carcaça 5 Completa ossificação da cartilagem da parte dorsal do processo espinhoso
Categoria Observações
JR Macho ou fêmea ainda em fase de crescimento, com carcaças pesando mais de 150 kg
Macho inteiro com desenvolvimento completo, onde já pode ser observado o começo
A da ossificação dos processos espinhosos nas quatro primeiras vértebras torácicas,
e já é claro o processo de ossificação entre a 5ª e a 9ª vértebra torácica
B Macho inteiro com desenvolvimento completo – touro
C Macho castrado com desenvolvimento completo – novilho
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 165
Categoria Descrição Observações
1 Deficiente Nenhuma ou pouca gordura; sem depósito de gordura dentro da cavidade torácica
2 Abaixo da média Gordura escassa; musculatura visível na carcaça inteira; os músculos intercostais estão visíveis
Somente os músculos da perna e da paleta visíveis; carcaça coberta com gordura; pouca gordura interna;
3 Média
os músculos intercostais permanecem visíveis
Maior cobertura de gordura; alguns depósitos de gordura interna; faixa de gordura cobre a perna; os mús-
4 Acima da média
culos intercostais podem estar cobertos por faixas de gordura
Total cobertura com gordura; grandes depósitos de gordura interna; perna coberta com fina camada de
5 Excessivo
gordura, músculos intercostais cobertos de gordura
tabela 4.6
Categorias de acabamento
do sistema EUROP
tabela 4.7
Padrões de qualidade
do sistema EUROP
Finalmente, as carcaças bovinas são classificadas de acordo com a conforma-
ção utilizando as letras da palavra EUROP, como apresentado na Tabela 4.7.
166 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
yield grade % de carne dos cortes principais
1 52,6-54,6
2 50,3-52,3
3 48,0-50,0
4 45,7-47,7
5 43,3-45,4
Fêmea com desenvolvimento
E completo – novilha
tabela 4.8
Relação entre yield grade e
rendimento em carne dos cortes principais:
(traseiro, lombo, costela e paleta)
A relação entre o yield grade e o rendimento de carne nos cortes principais (tra-
seiro, lombo, costela e paleta) está apresentada na tabela 4.8.
Apesar destes cortes representarem apenas 80% da carne da carcaça, eles re-
presentam 95% do seu valor, portanto são utilizados como índice do rendimen-
to económico da mesma.
A 9 a 30 meses
b 30 a 42 meses
c 42 a 72 meses
d 72 a 96 meses
e acima de 96 meses
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 167
Adaptado de Boggs & Merkel,1990
GRAU DE MATURIDADE a b c d e
GRAU DE MARMOREADO
ABUNDANTE
MODERADAMENTE ABUNDANTE
LIGEIRAMENTE ABUNDANTE PRIME
MODERADO COMMERCIAL
MODESTO
BAIXO CHOICE
LIGEIRO SELECT
TRAÇOS UTILITY
AUSENTE STANDARD CUTTER
Nota: as carcaças que se situem nas células cinzentas poderão ser classificadas na classe superior ou inferior,
dependendo do seu grau de marmoreado.
figura 4.23
Matriz de classificação
de carcaças adoptado nos EUA
168 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
Bos taurus Bos indicus (zebú)
2 8 12 21 5
1 9 2
13 15 13 1
8 3 4 20
3 10 15
14 7 9 11
4 11 16 10
5
17 18
6 6
6
19 12 14 19
7
Figura 4.24
Denominações comuns em
língua portuguesa das peças de
talho de origem bovina
As peças que são constituídas essencialmente por músculo (p.ex.: lombo, vazia,
contrafilé, filé mignon, alcatra, pojadouro, lagarto) são normalmente utilizadas
para grelhar, fritar ou assar. Isto é, são peças cozinhadas com calor seco. Nes-
tas peças são muito importantes factores de apreciação organoléptica como a
tenrura e a suculência. Estas características serão tanto melhores quanto mais
jovem for o animal e quanto maior for o teor de gordura intramuscular (marmo-
reado). As peças que têm maiores quantidades de tendão e tecido conjuntivo
(colagéneo) (p.ex.: peito, chambão ou músculo) são normalmente cozinhadas
em presença de água (cozidas ou estufadas). Em muitos casos, as peças deste
tipo que contenham quantidades de gordura elevadas, podem também ser as-
sadas. Assim, independentemente do seu valor comercial original, as diferentes
peças apresentam diferentes aptidões culinárias e, da adequada confecção das
mesmas, depende, em última análise, a sua qualidade organoléptica.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 169
4.5.5 Abate e características da carne de suínos
atordoamento
sangria
escaldão
depilação
chamusco
brancas
visceras
vísceras
a b
gorduras
lavagem
evisceração
corte da carcaça
refrigeração
a manual b mecânica
Figura 4.25
Fluxograma do processo
de abate de suínos
170 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
a b
a b
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 171
Figura 4.36
Transportadores de vísceras
(vísceras brancas)
172 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
Figura 4.41 Figura 4.42
Pernas Vãos e lombadas
Figura 4.43
Toucinho e entremeada
continua
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 173
nº Descrição Perigo Origem
• Contaminação da carcaça
12 Acabamento Biológico • Contaminação da carcaça pela pistola de classificação
• Encaminhamento demorado para a refrigeração
• temperatura inadequada das câmaras
Biológico • Contaminações entre carcaças
13 Refrigeração
• Higienização inadequada das câmaras
Químico • Resíduos de agentes de limpeza/desinfecção
14 Expedição Biológico • Temperatura das viaturas de transporte inadequada
tabela 4.9
Identificação dos perigos
e suas origens
continua
174 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
Etapa Medidas preventivas
• Esterilização diária da pistola de classificação
• Formação dos operadores
Acabamento
• Refrigeração imediata da carcaça
• Limpeza da conspurcação que exista na carcaça
• Medições diárias das temperaturas das câmaras
• Calibração periódica dos termómetros
Refrigeração • Câmaras específicas para cada espécie
• Cumprimento do plano de higienização
• Lavagem adequada das câmaras, removendo todos os resíduos de agentes de limpeza/desinfecção
• Controlo das temperaturas do transporte
Expedição • Manter as portas das caixas transportadoras abertas durante o tempo estritamente necessário
• Cumprimento do plano de higienização
tabela 4.10
Medidas preventivas
aplicáveis a cada perigo
União Europeia
Na União Europeia os animais são classificados, no momento da pesagem, por
inspectores treinados, de acordo com análises subjectivas que visam estimar o
rendimento em carne magra. Na tabela 4.11 são apresentadas as classes defini-
das em função do rendimento em carne magra. Para este efeito, são medidos o
grau de musculatura ao nível dos músculos lombares e é determinada a espes-
sura da gordura dorsal.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 175
CLASSE % DE CARNE MAGRA 1 2 3 4
S > 60
E 55-60
U 50-55
R 45-50 figura 4.45
Padrões de espessura da cobertura
O 40-45 de gordura adoptados pela USDA
P < 40
tabela 4.11
Classes do sistema europeu
de classificação de suínos
CATEGORIA % DE RENDIMENTO
1 > 60,4
2 57,4-60,3
3 54,4-57,3
4 < 54,4
tabela 4.12
Classes de rendimento
do peso da carcaça fria
usados pelo USDA
Estados Unidos
A cobertura de gordura é classificada de 1 a 4 de acordo com padrões (figura
4.45), sendo mais valorizada aquela que tiver menor proporção de gordura/
carne. A musculatura é também avaliada de 1 a 3 (fina, média e grossa). Para
o cálculo da categoria usa-se uma equação que usa o valor da espessura (em
cm) da gordura na última costela (EGUC) e a avaliação da musculatura (AM):
Categoria = (1,576 * EGUC) - AM
Para cada categoria existe uma expectativa de rendimento que pode ser ob-
servada na tabela 4.12. Ainda nos EUA é também usado um outro sistema, mais
moderno, que utiliza instrumentos para a determinação do rendimento e que,
também usa métodos instrumentais para a avaliação da cor da carne e padrões
para avaliação do grau de marmoreado.
176 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
3
2
4
5
6 1
figura 4.46
Principais peças de corte de
carcaças de suíno
Captura
Esta operação é feita, geralmente, no período nocturno, por equipas especiali-
zadas, utilizando uma luz azul que as aves não conseguem ver. Nesta primeira
operação visa-se minimizar o número de aves feridas, pois as contusões ocasio-
nam um mau aspecto dos cortes, principalmente com evidência de coágulos.
É uma etapa importante e interfere directamente na qualidade da carcaça e no
valor final do frango. A captura manual prevalece como forma de apanha e é a
mais utilizada na produção de frango de carne. As aves devem estar em jejum
de 6 a 10 horas antes do abate e deve existir uma preocupação com a lotação
das gaiolas (10 a 12 aves/gaiola) para se evitar stress (embora em jejum, é fun-
damental garantir o acesso das aves à água).
Transporte
Após o carregamento, adopta-se uma prática fundamental, com o objectivo
de reduzir os efeitos do stress nas aves, que é a pulverização com água no
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 177
momento da saída do veículo para o matadouro. Isso causa não só o aumento
do conforto das aves, mas também a redução das perdas por mortalidade e
melhorias na qualidade da carne, com diminuição do stress pré-abate.
Recepção
Ao chegar, a carga é pesada, recebe um duche com água à temperatura am-
biente por aproximadamente dez minutos em período de clima quente e, em
seguida, é descarregada manualmente ou mecanicamente na plataforma de
recepção dotada de ventilação natural ou artificial.
178 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
figura 4.47
Insensibilizador para
utilização a seco
figura 4.48
Exemplo de cone de sangria
e mesa de sangria manual
Insensibilização
Para pequenos matadouros, em que é realizado o abate de 500 a 1.000 aves/
dia é utilizada a electronarcose a seco (figura 4.47). Neste método os eléctrodos
são aplicados na cabeça, por isso é usado geralmente para atordoar as aves de
capoeira nas quintas e, como recurso, em matadouros industriais que utilizam
sistemas de atordoamento eléctricos em tanques de água. O atordoamento
eléctrico é realizado em aves que estão contidas nos cones (figura 4.48).
Sangria
Se o atordoamento foi realizado adequadamente, as aves chegam quietas ao lo-
cal de sangria, assegurando um melhor corte. A operação de sangria consiste
basicamente no corte dos grandes vasos de circulação de sangue (artéria carótida
e veia jugular). O corte deve ser realizado através de movimento rápido e ininter-
rupto, e deverá ser iniciado logo após a operação de insensibilização dos animais,
de modo a provocar um rápido e completo escoamento do sangue, antes que o
animal recupere a consciência.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 179
figura 4.49
Pequeno tanque A sangria deve ser realizada durante o intervalo de tempo suficiente para que
de escaldão
as aves fiquem bem sangradas antes de entrarem no tanque de escaldão, para
evitar a conspurcação da água do escaldão com sangue e a entrada da água
para os pulmões.
As aves deverão ser colocadas nos cones de sangria (que evitam que se deba-
tam) (figura 4.48) e é realizado um corte manual na artéria carótida e veia jugular,
deixando-as sangrar por um período de 3 minutos, muito embora se reconheça
que nos primeiros 40 segundos, 80% do sangue é libertado e, no intervalo, entre
1 a 2 minutos e meio, o sangramento estará completo.
Escaldão
O escaldão consiste na imersão num tanque (figura 4.49) de água quente agi-
tada e tem como finalidade facilitar a etapa de remoção das penas. Quando se
deseja uma ave com uma pigmentação de pele mais amarelada, o escaldão é
feito de forma branda (52 ºC durante 2,5 minutos).
180 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
figura 4.50
Depenadora
de pequena dimensão
Os tanques de escaldão devem estar localizados numa divisão própria, junta-
mente com as máquinas de depena, completamente separados por paredes das
demais áreas operacionais.
A temperatura da água, por razões de apresentação dos frangos, deve ser man-
tida abaixo dos 55 ºC, uma vez que temperaturas mais elevadas ocasionam um
ligeiro cozimento superficial dos músculos peitorais que conduz à rejeição total
das carcaças. Além disso, temperaturas elevadas, provocam o desprendimento
da epiderme durante a depena e a inutilização da gordura subcutânea, o que
origina a adesão entre a pele e o músculo subjacente durante a refrigeração em
ar, conferindo à carcaça um aspecto manchado ou esfolado.
Depena
O processo de depena é feito pela acção mecânica de “dedos” de borracha que
são presos a tambores rotativos (figura 4.50). Nesta etapa deve-se evitar a quebra
de ossos e o rompimento da pele da ave (que ocorre principalmente quando a
temperatura de escaldão for muito alta). No caso de aproveitamento de pés para
comercialização com a carcaça limpa são realizados o escaldão e a limpeza dos
pés. A depenadora retira, além das penas, a película amarela dos pés das aves.
Esta operação deverá ser executada com muito cuidado para diminuir os riscos
de introdução de microflora externa na musculatura.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 181
figura 4.51
Mesa de evisceração Apesar das preocupações higiénicas, as contagens microbianas geralmente au-
manual
mentam nesta fase, como resultado da contaminação cruzada sendo este um
facto inevitável, mesmo usando uma tecnologia mais moderna.
Evisceração
A evisceração é constituída por uma série de etapas:
• corte e remoção da traqueia;
• extracção da cloaca e evacuação do intestino grosso;
• abertura do abdómen e exposição de vísceras para inspecção veterinária.
A evisceração pode ser feita manualmente numa mesa específica para a fina-
lidade (figura 4.51), que contém torneiras para facilitar as lavagens. A primeira
operadora faz o corte da traqueia, retira a cloaca e o abdómen. A segunda
retira a traqueia e as vísceras. Em seguida encaminha-se a carcaça para o lado
oposto da mesa e as vísceras para a terceira operadora, que separa os miúdos.
Neste ponto, deve-se impedir que a carcaça entre novamente em contacto
com as vísceras, evitando a contaminação cruzada.
182 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
O coração, o fígado e a moela removidos são separados e sofrem processos de
limpeza, refrigeração e embalagem para posterior reincorporação à carcaça, ou
são embalados para comercialização em separado. Seguindo a linha de evisce-
ração, removem-se os pulmões, papo, esófago e traqueia, que são remetidos
para a secção de tratamento de resíduos. Estes últimos, poderão ser recolhidos e
enviados a empresas que promovam o seu tratamento e comercialização (p. ex.
farinhas), ou incinerados em crematório próprio para a finalidade.
Inspecção
A inspecção post mortem é efectuada, em todas as carcaças e vísceras das aves
e tem como objectivo retirar da linha os casos anormais e/ou suspeitos. O mé-
todo de exame é visual, feito por meio de palpação e cortes.
Com as vísceras fora da carcaça, é feita a inspecção. Durante a inspecção são
eliminadas as aves condenadas por doenças e, é efectuada a remoção de partes
com injúrias e ossos partidos.
Lavagem
A lavagem deve ser efectuada por meio de equipamento destinado a lavar efi-
cazmente as superfícies internas e externas. As carcaças são lavadas interna-
mente com equipamento de jacto manual, ou similar, com pressão de água
adequada. A localização do equipamento para lavagem das carcaças deverá
ser após a evisceração e imediatamente antes do sistema de refrigeração, não
se permitindo qualquer manipulação das carcaças após o procedimento de la-
vagem.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 183
Refrigeração
Terminadas as operações de abate, as carcaças de ave e as miudezas comes-
tíveis devem ser submetidas sem demora à acção do frio, até que seja alcan-
çada a temperatura de 4 ºC no centro térmico da carne. Após a inspecção e
a evisceração, os animais abatidos devem ser refrigerados até atingirem uma
temperatura não superior a 4 ºC assim que possível.
O arrefecimento pode ser feito por duas técnicas, água fria ou ar frio. A técnica
que utiliza água fria pode ser feita por imersão ou pulverização. Nos Estados
Unidos da América o arrefecimento por imersão em água fria é utilizado tanto
para carcaças de frango que vão ser refrigeradas como para as que vão ser
congeladas. Pelo contrário, na Europa é mais comum as carcaças com destino à
refrigeração serem arrefecidas em ar frio, enquanto as que vão ser congeladas
serem arrefecidas por imersão em água fria.
As carcaças são mergulhadas manualmente nos tanques com água tratada e refrigerada, cuja tem-
peratura se encontra entre 10 e 18 ºC para se evitar o encolhimento do músculo (endurecimento do
Pré-refrigeração músculo peitoral), e também uma redução (lavagem) da contaminação superficial das carcaças. Para se
evitar o risco de contaminação das carcaças a água deve ser hipoclorada em torno de 2 a 5 mg/L e re-
novada ao longo do processo. É recomendada uma quantidade de água de cerca de 1,5 L por carcaça.
Após serem pré-refrigeradas, as carcaças são encaminhadas para a câmara de refrigeração com uma
Refrigeração temperatura de aproximadamente 0 ºC e uma velocidade do ar de cerca de 1-2 m/s. Após esta etapa
as carcaças saem com temperatura de cerca de 4 ºC.
Pendura
As aves são suspensas, permanecendo penduradas por um tempo de 2,5 a 4
minutos, o que visa reduzir o excesso de água absorvida na etapa de refrigera-
184 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
ção, para um máximo de 8% de absorção de água. Este escorrimento pode ser
realizado fora da área de abate. Esta etapa aplica-se apenas no caso da refrige-
ração por imersão.
Congelação
A congelação é feita por meio de congelamento rápido, o que evita a formação
de grandes cristais de gelo nos produtos. É utilizada uma câmara com tempera-
tura de -35 ° a -40 °C. O tempo de retenção da maioria dos produtos é de quatro
horas, para que o produto atinja a temperatura de -18 °C.
Armazenamento
O armazenamento das carnes de ave refrigeradas é feito em refrigeradores in-
dustriais e o de carne congelada é feito em câmaras de congelados. A armaze-
nagem de aves congeladas deverá ser feita em câmaras próprias, com tempera-
tura nunca superior a -18 °C.
Expedição
O transporte deve ser compatível com a natureza dos produtos, de modo a
preservar sempre suas condições tecnológicas e, consequentemente, a manu-
tenção da qualidade.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 185
água clorada
ave viva
captura
transporte
recepção
sangue
cabeça
água a 52 ºc
insensibilização
Os veículos utilizados no transporte de carcaças e miúdos deverão possuir car-
corte/sangria roçarias construídas com materiais adequados, a par do isolamento apropriado
e revestimento interno de material inoxidável, impermeável e de fácil higie-
penas
depena
De acordo com o processamento descrito é apresentado na figura 4.52 um
água
lavagem
água
pré-refrigeração
água gelada
pendura
refrigeração
embalamento
sacos de plástico
caixas de pvc
carne de ave
refrigerada
Figura 4.53 Figura 4.54
Cais de recepção de frango vivo Pormenor de ganchos de pendura e insensibili-
zador por choque eléctrico
Figura 4.52
Fluxograma do processo
de abate de aves
186 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
Figura 4.57 Figura 4.58
Depenadora (pormenor elementos de Pormenores dos ganchos de suspensão, e vista
depena em movimento) parcial de refrigerador por água gelada
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 187
Figura 4.63 Figura 4.64
Evisceração mecânica Embalagem
188 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
Adaptado de Norman & Corte,
1985 e de FAO 1990
Categoria Actividade da água/pH Temperatura Exemplos
de armazenamento
carne fresca
MUITO PERECÍVEIS aw > 0,95 ou pH > 5,2 + 5 ºC
fiambre cozido
salsichas semi secas
PERECÍVEIS aw < 0,95 ou pH < 5,2 + 10 ºC
carne de sol
carne seca
ESTÁVEIS aw < 0,95 e pH < 5,2 ou apenas aw < 0,91 Não requerem refrigeração presunto
charque
tabela 4.13
Categorias de produtos
cárnicos de acordo com a
sua estabilidade
Os produtos podem ser secos (aw < 0,90), meio-secos (aw < 0,95) ou frescos (aw
> 0,95). O uso de sais de cura (nitratos e nitritos) é comum nos produtos secos e
semi-secos. O mais famoso destes produtos é o salame italiano.
Carne magra
A mistura contém entre 50 e 70% de carne magra de porco, vaca ou por vezes de
peru. Na Alemanha os enchidos contêm normalmente carne de porco ou de vaca,
enquanto na maioria dos outros países Europeus apenas é utilizada a carne de por-
co. Mais recentemente encontram-se vários enchidos com base em carne de aves.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 189
Adaptado de Lücke, 1998
Categoria Tempo de maturação aw final Fumo Exemplos
Seca com bolores > 4 semanas < 0,90 não salame Italiano
Seca com bolores > 4 semanas < 0,90 sim salame Húngaro
dauerwurst
Seca sem bolores > 4 semanas < 0,90 sim ou não
chouriço de carne
variadas salsichas
Meio seca com bolores < 4 semanas 0,90 – 0,95 não
França/Espanha
maioria das salsichas
Meio seca sem bolores < 4 semanas 0,90 – 0,95 sim
fermentadas (USA)
Não seca < 2 semanas 0,94 – 0,96 sim ou não sobrasada
tabela 4.14
Classificação de enchidos
fermentados
Gordura
É desejável que a gordura adicionada à mistura, em proporções superiores a
20% tenha um ponto de fusão elevado. Usa-se normalmente toucinho dorsal
de porco.
Açúcares
Para a maioria dos enchidos fermentados meio secos e fumados, o pH depois
da fermentação deverá situar-se entre 4,8 e 5,0 de forma a garantir a estabili-
dade microbiológica e um rápido incremento na firmeza do produto. Para tal
usam-se 0,4 a 0,8% de açúcares rapidamente fermentáveis. Valores mais bai-
xos (0.2-0.3%) são recomendados quando se usam nitratos em vez de nitritos
como agente de cura e, quando o pH desejado seja de 5,3 como no caso do
salame. Em alguns países (p. ex. EUA) usa-se até 2% de açúcares baixando o
pH até 4,5.
Se são usadas grandes quantidades de açúcares rapidamente fermentáveis, a
descida do pH da mistura pode ser muito rápida o que poderá provocar que
algumas propriedades resultantes da actividade metabólica da flora não lácti-
ca sejam suprimidas o que não é desejável. Por outro lado, um baixo conteúdo
de açúcar pode dar origem ao crescimento de microrganismos indesejáveis.
Agentes de cura
Normalmente adicionam-se 2,4 a 3% de sal (NaCl) à mistura para que a aw
inicial se situe em torno de 0,965-0,955. Este valor da actividade da água inibe
190 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
o crescimento de microrganismos indesejáveis e facilita o desenvolvimento de
lactobacilos, estafilococos e micrococos. Para além disso, o sal solubiliza as pro-
teínas e, naturalmente, contribui de forma significativa para o gosto.
Processo de fabrico
Podem distinguir-se três fases claramente diferenciadas no fabrico de enchidos:
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 191
O processo de elaboração começa com a picagem das principais matérias-
-primas (carne e gordura). A obtenção de um corte limpo é essencial para evi-
tar a aparição de empastamento resultante do facto de a gordura poder criar
uma película sobre a carne magra e reduzir a perda de humidade. Além disso,
o corte deve permitir uma clara distinção entre as partículas de carne e de
gordura. A carne deve picar-se fria (0-2 ºC) e a gordura congelada (-6 a -8 ºC).
Posteriormente, a carne e a gordura misturam-se com os restantes ingredien-
tes numa misturadora.
Pepperoni e as salsichas de Verão nos EUA são representativos deste tipo; a temperatura de fer-
1 Fermentação a alta temperatura
mentação é de 40 ºC por 15-20 horas seguida de um tratamento térmico até 60 ºC
Os limites de temperaturas usadas situam-se em torno de 20-24 ºC, seguindo-se um período de
secagem entre 15 e 18 ºC; para estes produtos, os starters usados são culturas mistas de bactérias
2 Fermentação Europeia tradicional lácticas (Lactobacillus e Pediococcus) e Micrococcaceae (Staphylococcus ou Micrococcus); a maioria
das estirpes pertencem ao grupo mesofílico mas nos últimos anos começaram a comercializar-se
culturas psicrotróficas
Na Europa de Leste e do Sul, na maioria dos casos a fermentação faz-se em condições naturais a
3 Fermentação a baixas temperaturas
baixas temperaturas (10-15 ºC); neste caso podem ser usadas culturas psicrotróficas
192 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
Grupo microbiano Espécies disponíveis Actividades metabólicas desejadas Benefícios na maturação
Bactérias lácticas Lactobacillus plantarum • formação de ácido láctico • inibição de microrganismos patogénicos
Lactobacillus pentosus • aceleração da formação da cor e da secagem
Lactobacillus sake
Lactobacillus curvatus
Pediococcus pentosaceus
Pediococcus acidilactis
Micrococos Staphylococcus carnosus • redução de nitratos • inibição de microrganismos patogénicos
Staphylococcus xylosus • consumo de oxigénio • aceleração da formação da cor e da secagem
Micrococcus varians • destruição de peróxidos
• formação de carbonilos e ésteres
Leveduras Debaryomyces hansenii • consumo de oxigénio • retardam a oxidação
Candida famata • Aroma e sabor
• estabilização da cor
Fungos Penicillium nalgiovense • crescimento superficial • suprimem fungos indesejáveis
Penicillium chrysogenum • consumo de oxigénio • retardam a oxidação
• oxidação de lactato • aroma e sabor
• degradação de proteínas • estabilização da cor
tabela 4.15
Culturas microbianas usadas para
fermentação de enchidos
Adaptado de Cortecero s.d.
Característica BACTÉRIAS
Modo de acção MICROCOCOS LEVEDURAS FUNGOS
de qualidade LÁCTICAS
tabela 4.16
Finalidade dos fermentos
nos enchidos secos
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 193
Adaptado de Lücke, 1998
Medidas Preventivas
Tipo de Enchido
Aditivos
Fluxo MEIO SECO SECO COM BOLORES SECO TRADICIONAL etapa
Ingredientes
temperatura < 7 ºC Idem Idem 1
Recepção
pH < 5,8 Idem Idem 2
de carcaças
fornecedor certificado idem idem 3
temperatura < 7 ºC Idem Idem 4
Corte da carne
magra e da sem contaminação Idem Idem 5
gordura
limpeza e desinfecção idem idem 6
Refrigeração temperatura < 2 ºC idem idem 7
limpeza e preparação
Enchimento tripas idem idem 12
de tripas
Inoculação
cultura
superficial 13
certificada
(opcional)
Tabela 4.17
Medidas preventivas para controlar
o desenvolvimento de Salmonella spp.,
Staphylococcus aureus e Listeria monocytogenes
durante a manufactura de enchidos fermentados
194 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
Transformações físico-químicas e bioquímicas durante a maturação.
Durante a fase de fermentação ocorrem, simultaneamente, duas reacções distintas, ambas resultantes da acção
dos microrganismos:
1 A redução dos nitratos e dos nitritos da qual resulta a formação de 2 A fermentação dos açúcares e a formação de ácido láctico que
nitrosomioglobina que é o pigmento responsável pela cor caracte- origina o abaixamento do pH. Esta acidificação é de grande im-
rística destes produtos. Esta redução deve-se aos sistemas enzimá- portância nestes produtos pois governa o desenvolvimento da
ticos das Microccoccaceae. flora microbiana presente e reduz a capacidade de retenção de
água por parte da carne. Este aspecto favorece a desidratação que
ocorre durante a fase de maturação.
Durante a maturação ocorre a degradação de lípidos e de proteínas originando a produção de diversos compostos que são responsáveis pelo aroma
e pelo sabor típicos destes produtos. Adaptado de Leistner, 1994
aw
pH
f.c.
eh
NO3
figura 4.65
Sequência de barreiras
ao desenvolvimento de
Exemplo de produção de produto cru curado. Chouriço fumado. microrganismos patogéni-
cos que ocorrem durante
a produção de produtos
Como exemplo de produção de um produto cru/curado de elevada aceitação em cárnicos fermentados
Angola, apresenta-se de seguida o diagrama do processo de fabrico de chouriço
de carne fumado enlatado. A produção deste produto é, em tudo, semelhante
à dos produtos crus/curados por acção do fumo, com a única excepção de que,
após a fumagem, os chouriços são embalados em latas e cobertos com banha de
porco fundida ou com outro óleo alimentar. A vantagem deste processo reside
na protecção que a embalagem e que a banha conferem ao produto. A baixa
actividade da água da banha garante a estabilidade de um produto que, não
sendo estéril, tem um prazo de validade bastante alargado. Por outro lado, a
cobertura do chouriço com banha quente cria, durante a cravação da lata, con-
dições de vácuo que inibem processos de oxidação.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 195
carne de suíno
sal/alho/louro
colorau/vinho
selecção da carne
e da gordura
tinto
corte
condimentação
tripas
maturação
5 dias a 5 ºC figura 4.67
Aspecto geral e diagrama
banha fundida
defumação
fumo
enlatamento
rotulagem
chouriço fumado
enlatado
figura 4.66
Diagrama de produção
de chouriço fumado enlatado
figura 4.68
Mistura para enchido em carro
de transporte e tipos de especiarias usados
figura 4.69
Misturadora de carne
e respectivo diagrama
196 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
figura 4.70
Enchedora de chouriços e
respectivo diagrama
figura 4.71
Preparação de enchidos para o fumeiro
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 197
4.7 Produtos cárnicos cozidos
No caso dos produtos cárnicos cozidos, a sua estabilidade depende sobretudo
dos tratamentos térmicos aplicados. Embora em alguns casos sejam também
usados conservantes como o nitrito de sódio, os produtos sofrem um trata-
mento térmico de pasteurização (p. ex. fiambre) ou de esterilização (p. ex. sal-
sichas tipo Frankfurt).
6 Produtos feitos com base em enchidos crus/curados que se submetem a cozedura (p. ex. chouriço cozido)
7 Produtos fabricados com fígado como componente caracterizador (p. ex. pasta ou patê de fígado)
8 Produtos fabricados com sangue como elemento caracterizador (p. ex. morcela)
9 Produtos fabricados com vísceras, patas, orelhas como elementos caracterizadores (p. ex. orelha cozida)
Existem muitos tipos de enchidos baseados numa emulsão e pode haver uma
considerável variação no seu tamanho e aparência. Grande parte deles carac-
terizam-se por um intenso grau de picagem que determina que, na maioria
dos casos, a gordura se encontre livre sendo a emulsão estabilizada pela mis-
tura intensa entre a carne magra e o sal.
198 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
quantidade de gordura é bastante elevada e, parte dela, separa-se formando
uma capa de gordura sobre a sua superfície (Plockwurst). Porém, na maioria dos
casos, a separação da gordura é um defeito a evitar.
Ingredientes
A carne de porco é a mais habitualmente usada nos enchidos que se baseiam
numa emulsão. Nos últimos anos, também a carne de peru tem vindo a ser
usada em salsichas tipo Frankfurt.
Processamento
1 Elaboração da mistura e picagem
Os procedimentos tradicionais incluem uma pré-salga da carne submetendo-a a um corte grosso com sal e mantendo-a pelo menos 2 dias a
2-4 ºC. Depois disso a carne é picada de forma mais intensa sendo adicionada água ou gelo, gordura e outros ingredientes, continuando-se a
picagem até que se forme uma massa pastosa.
2 Enchimento
Depois da picagem, a massa é enchida em tripas naturais ou sintéticas. Nas salsichas tipo Frankfurt, usam-se tripas não comestíveis de celulose que
se retiram mecanicamente depois da cozedura. Na maioria dos casos, as tripas permanecem no enchido até ao momento do consumo.
3 Cocção
Os banhos de água quente são pouco usados para a cozedura pois, neste caso, será necessário usar tripas plásticas. A cozedura com ar húmido é
mais comum e, pode ser combinada com a fumagem. Os enchidos devem ser cozidos de modo a que a temperatura no interior da peça atinja os
80 ºC. Por vezes utilizam-se temperaturas mais baixas (69 - 77 ºC).
4 Arrefecimento
Depois da cozedura, os enchidos devem refrigerar-se o mais rapidamente possível.
5 Embalagem
A embalagem de enchidos pequenos em vácuo ou em atmosfera modificada é, hoje em dia, uma prática comum. Em muitos casos, a embalagem
é efectuada antes da cozedura de forma a evitar contaminações durante o processo de embalamento.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 199
4.7.1 Produtos cárnicos cozidos para barrar
Os principais são enchidos de fígado, os patês e alguns tipos de pastas de
carne. Um requisito comum é o conteúdo mínimo de carne de 50% para os
enchidos com base em fígado, e 70% noutros.
No caso dos enchidos de fígado, este representa cerca de 50% do total usan-
do-se também papadas, couratos e outros ingredientes com uma grande
quantidade de tecido conjuntivo. Estes ingredientes proporcionam gelatina ao
produto final o que contribui para a sua textura. No caso dos patês, na grande
maioria dos casos, o conteúdo em fígado não ultrapassa os 25%.
Processamento
O procedimento habitual para a preparação destes produtos baseia-se em co-
zer completamente os couratos e ligeiramente os outros componentes cárni-
cos, incluindo o fígado. Depois de cozida a carne é submetida a uma picagem
fina. O fígado também pode ser picado até que se incorpore algum ar, adqui-
rindo uma textura espumosa. De seguida misturam-se a carne, a gordura e os
restantes ingredientes, excepto o sal e outras substâncias que contribuem para
a ligação, que são adicionados na fase final.
200 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
sistência está relacionada com a concentração de proteína por unidade de área
(Ordoñez et al.,1998). A água envolvente fica englobada na estrutura ou fica
ligada às cargas negativas da proteína.
A área superficial crítica é a área limite para que exista resistência da película
proteica.
A água e o sal formam uma salmoura que contribui para a dissolução das pro-
teínas. A quantidade de proteína extraída depende do tempo de picagem e da
temperatura.
Temperatura
A temperatura à qual se prepara a emulsão é extremamente importante. Se a
temperatura for superior a 15-20 ºC é fácil que se produza a rotura da mistura
porque: diminui a viscosidade da mesma; a gordura funde-se e tende a aumen-
tar a área superficial das gotas, exigindo-se mais proteína para as estabilizar; a
reagregação das gotículas de gordura fica favorecida.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 201
ser aumentada em cerca de 50% se for adicionado sal antes da instalação do
rigor (Rust, 1994). Esta maior capacidade emulsionante deve-se ao facto de a
actina e da miosina se encontrarem livres.
Pré-mistura
A pré-mistura dos ingredientes (sal, agentes de cura e especiarias) tem tam-
bém um efeito positivo porque facilita a sua dissolução.
Viscosidade
A viscosidade das emulsões cárnicas reduz-se ao aumentar a quantidade de
agua adicionada. A adição de sal aumenta a viscosidade enquanto, o abaixa-
mento do pH a reduz.
pH
O valor do pH afecta a emulsificação devido ao seu efeito sobre as proteí-
nas. As proteínas miofibrilhares têm a sua máxima capacidade emulsionante
a valores de pH perto da neutralidade (7,0). Com os valores de pH normais
nos produtos cárnicos (5,8-6,0), embora a capacidade emulsionante seja mais
reduzida, pode ser aumentada com a adição de sal.
202 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
figura 4.75
Aspecto de uma picadora de carne
tipo “cutter” e de uma pasta resultan-
te de uma picagem correcta
Tratamento térmico
Com o tratamento térmico conseguem-se uma série de efeitos tecnológicos
como sejam:
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 203
A aplicação do calor realiza-se mediante a imersão das peças em banhos de
água quente ou por acção de ar húmido, dependendo os tempos de cozedura
da dimensão da peça. Em todos os casos, o tratamento deve garantir que no
interior da peça seja atingida, pelo menos, uma temperatura de 72 ºC.
A carne deverá ser de boa qualidade e, uma vez que as características deste
produto dependem muito da capacidade de retenção de água da carne, é muito
importante evitar o uso de carnes pálidas moles e exsudativas (PSE). Para o caso
do fiambre da perna pode também ser usada uma fatia fina de courato que re-
cobrirá uma das superfícies do produto. As peças a usar deverão ser desprovidas
de gordura, tendões e coágulos de sangue.
204 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
fosfatos/carragenina
carne de suíno
sal/nitrito de sódio
ácido ascórbico
selecção da carne
corte
injecção de salmoura
de polietileno
tenderização
Figura 4.77
Injecção de salmoura e tenderização da carne destinada ao fabrico de fiambre
sacos
massagem
ensacamento a vácuo
cozedura
vapor ou
banho
arrefecimento
desmoldagem
fiambre cozido
Figura 4.79
Enchimento de formas de prensagem para cozedura de fiambre
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 205
a b
Figura 4.81
Aspecto do fiambre da per-
a estufa na após desenformagem
b de imersão
Figura 4.80
Cozedores de fiambre
As formas são colocadas numa estufa de vapor e cozidas, devendo ser garan-
tida a temperatura necessária. A temperatura interna da estufa deve rondar os
76 ºC. O cozimento poderá ser terminado dez a quinze minutos depois de o
centro térmico da carne atingir 68 ºC. Se a carne atingir apenas 65 ºC deve, ser
mantida a essa temperatura por, pelo menos, 30 minutos. A temperatura da
carne não deverá exceder os 71 ºC de modo a não afectar a cor do produto.
206 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
Embora as condições de manuseamento, armazenagem e consumo da carne pos-
sam diferir entre locais, os factores que limitam a sua vida útil são os mesmos.
Como já se disse, de forma genérica, a vida útil da carne e dos produtos cár-
nicos será tanto mais longa quanto mais baixos forem o pH e, ou, a actividade
da água. Ambos os factores têm uma influência decisiva sobre o crescimento
de microrganismos. Contudo, para a maioria dos produtos cárnicos, por razões
organolépticas, existem limites relativamente à redução destes dois parâmetros.
Com excepção de alguns produtos em especial, os consumidores não apreciam
produtos cárnicos muito secos ou ácidos.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 207
Figura 4.82
Exemplos de especiarias
em pó
Os nitratos e nitritos afectam também o sabor dos produtos pois actuam como
anti-oxidantes e, para além disso, têm propriedades bacteriostáticas. Usam-se
normalmente em concentrações inferiores a 150 mg por kg de produto. Nor-
malmente é aconselhada a sua dissolução em água antes da adição ao produto.
O termo tempero é usado para uma série de ingredientes que melhoram o sabor
e o aroma dos produtos cárnicos. O sal e a pimenta são normalmente a base
para todos os temperos. Outros ingredientes como sejam uma série de especia-
rias (p. ex.: colorau, caril, canela, mostarda), ervas aromáticas e outros agentes ve-
getais são também usados e conferem aos produtos o seu gosto característico.
Abate caseiro
As operações de abate caseiro de animais pequenos podem ser efectuadas com
o animal pendurado. No caso dos animais de grande porte, a sangria, o corte das
patas e a abertura da pele pode ser executada no chão. Contudo, é altamente
recomendado que a carcaça seja suspensa em estruturas simples (que podem
ser de madeira) para que se completem as operações de esfola e evisceração.
Manuseamento da carcaça
A refrigeração da carne é fundamental para o seu processamento. Contudo, em áreas rurais de países em desenvolvimento, o acesso a
unidades de refrigeração é escasso e, as distâncias das zonas rurais para as zonas onde elas existem são, normalmente, bastante grandes.
Tal situação obriga a que a carne seja processada sem refrigeração. Nestas circunstâncias, a carne é normalmente submetida a um processo
de secagem ou é utilizada para consumo imediato.
208 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
Figura 4.83
Venda de carne fresca
não refrigerada
Quando se trabalha com carcaças não refrigeradas as suas peças deverão ser consumidas ou secas no dia do abate. Nestas condições a
higiene durante o abate e as operações de corte é fundamental para a qualidade do produto final. Quanto maior for a contaminação inicial
mais rápida será a deterioração da carne. É muito importante também ter em atenção a qualidade da água usada nas operações de abate
e de desmancha.
Um outro processo de conservação deste tipo de carnes é a utilização de ácidos orgânicos. A superfície da carne pode ser tratada com ácido
acético, cítrico, láctico ou ascórbico. O sorbato de sódio também poderá ser empregue como conservante. Estes compostos podem ser
usados isoladamente ou em combinação, em spray ou mergulhando as peças na solução conservante. O tratamento das carcaças com estes
produtos tem dado bons resultados nas condições em que a cadeia de refrigeração é quase inexistente, como acontece nas áreas rurais de
países em vias de desenvolvimento. Soluções aquosas de sorbato de sódio (20%) ou a 5% de acetato ou de cloreto de sódio pulverizadas
sobre carcaças quentes, permitem duplicar o tempo de conservação da carne a temperaturas entre 25 e 35 ºC (FAO,1990)
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 209
Ar quente e seco, isto é, com baixa humidade relativa (entre 40 e 60 %) e peque-
nas variações de temperatura entre o dia e a noite são condições ideais para a
secagem da carne. A secagem será tanto mais rápida quanto mais elevada for a
temperatura, mais baixa a humidade do ar e, mais intensa a sua circulação.
A evaporação de água da carne é relativamente elevada durante o primeiro dia
de secagem decrescendo depois de modo gradual. Após um período de seca-
gem de três a quatro dias a carne perde entre 60 e 70% do seu peso.
A perda de peso durante a secagem causa alterações da forma da carne devido
ao encurtamento do músculo e do tecido conjuntivo. As peças de carne tornam-
-se mais pequenas mais finas enrugadas. Naturalmente que a sua consistência
aumenta consideravelmente.
Para além destas alterações físicas, ocorrem também reacções bioquímicas espe-
cíficas com um forte impacto sobre as características organolépticas do produto.
Em carnes resultantes de carcaças não refrigeradas, as reacções que caracteri-
zam a maturação ocorrem muito rapidamente pelo facto de a temperatura da
carne se manter elevada. Isto dá origem a claras diferenças no aroma e sabor
da carne seca. A carne seca tem um sabor ligeiramente rançoso, que resulta da
rápida oxidação da gordura.
Algumas alterações indesejáveis podem resultar quando a carne tem um teor re-
lativamente elevado de gordura. Em carnes gordas o desenvolvimento do sabor
e cheiro a ranço podem ser muito rápidos.
Deverá haver um cuidado especial para que a superfície de carne não fique de-
masiado seca enquanto houver uma quantidade de humidade elevada no seu
interior. Se a superfície estiver demasiado seca, a eliminação de água das zonas
mais profundas será dificultada e, deste facto poderão resultar carnes secas de
modo não uniforme, iniciando-se a deterioração nas zonas onde o teor de humi-
dade se mantém muito elevado.
Seguidamente, descreve-se a tecnologia básica da secagem de carne na qual
se inclui uma operação de pré-salga antes da desidratação. Esta pré-salga não
é absolutamente necessária mas tem algumas vantagens sobretudo quando se
pretende salgar peças de carne relativamente grandes.
210 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
Selecção da carne para a secagem
Como regra geral, apenas a carne magra deverá ser seleccionada para secagem.
A gordura visível aderente às peças de carne deverá ser removida uma vez que
tem um efeito negativo sobre a qualidade do produto final.
As tiras de músculo podem ser cortadas sobre uma mesa limpa ou mantendo o
músculo em suspensão. Em ambos os casos, o corte das tiras deverá ser feito ao
longo das fibras musculares. A espessura das tiras deverá ser tão uniforme quanto
possível. O comprimento das tiras também deverá ser uniforme, não inferior a 20
cm nem superior a 70 cm (FAO, 1990).
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 211
Uma camada fina de sal cristalizado forma-se na superfície da carne durante a
secagem. Os cristais de sal são higroscópicos e absorvem parte da água liberta-
da da carne mantendo a sua superfície seca. Para além de inibir as bactérias, esta
camada de sal impede o ataque de bolores.
As tiras de carne deverão ser mergulhadas na salmoura por cinco a dez minutos
sendo de seguida escorridas. A salmoura poderá também conter ácido acético
(vinagre) numa proporção de 50%, ou seja, metade salmoura e metade vinagre.
212 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
1-2 m
1,80 m
3,80 m
metro. Poderão ainda ser colocadas coberturas simples e a estrutura poderá ser
envolvida com rede mosquiteira para impedir o acesso a insectos. Deverá haver
particular cuidado no sentido de impedir o acesso de animais de maior porte
(p. ex. cães) à carne pendurada. Quer o tecto quer as protecções laterais, pode-
rão ser feitas com chapas de zinco ou alumínio. As chapas laterais deverão ter
uma altura de 1,20 m e deve haver o cuidado de haver uma adequada abertura
superior para a circulação do ar.
O número de peças suspensas por ripa deverá ser sempre o mesmo (p. ex. 30) para se garantir uma boa circulação do ar
A distância entre as tiras também deve ser igual e deve permitir a boa circulação do ar
As tiras mais longas e mais pesadas deverão ser colocadas nas extremidades das ripas enquanto as mais pequenas deverão ficar no
meio, de forma a permitir o contacto das peças maiores com maior massa de ar que circula na zona externa do secador
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 213
A cor da superfície bem como a cor dos pedaços cortados, deverá ser uniforme
e vermelho acastanhada escura. Uma zona escura externa e uma cor vermelha
brilhante no interior, indicam uma secagem deficiente. Isto é, indica que ocor-
reu uma desidratação superficial muito intensa que impediu a evaporação de
água das zonas mais profundas da carne. Esta zona central fica com mais hu-
midade, sendo por isso mais brilhante e é mais sensível à deterioração quando
embalada e armazenada. Estas peças deverão ser mantidas a secar até se obter
uma cor uniforme;
A consistência de uma carne bem seca deverá ser semelhante à da carne con-
gelada;
Embalagem e armazenamento
Durante a armazenagem deverá ser prestada especial atenção à humidade do
armazém de forma a evitar que a carne humedeça o que iria permitir o rápido
crescimento de bactérias e de bolores. Em boas condições de armazenagem a
carne seca deverá durar mais de seis meses.
214 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
a b c
d e f
Figura 4.86
Etapas do processo de
produção de carne seca
Figura 4.87
Carne seca com especiarias
embalada em vácuo
Carne-de-sol
A carne de sol é ligeiramente salgada e parcialmente desidratada tendo uma vida
útil limitada a 3-4 dias. É um produto consumido em grandes quantidades no Nor-
deste Brasileiro. É tradicionalmente produzida a partir de carne de vaca ou de cabra.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 215
Figura 4.88
Carne-de-sol. Aspecto geral
das típicas mantas.
Note-se a presença de gordura
e de tendões nas peças de carne
O nome carne-de-sol não é exactamente correcto, uma vez que raramente esta
carne é seca directamente ao sol. A secagem é normalmente efectuada em zo-
nas cobertas e bem ventiladas o que permite uma dessecação gradual e contro-
lada dos tecidos superficiais. Em tempos usou-se o termo carne-de-vento o que,
na realidade, é uma descrição mais apropriada (Norman & Corte, 1985).
Charque
O charque é obtido através da salga de carne de vaca desossada em condições
que permitem a sua conservação à temperatura ambiente por períodos mais
longos.
216 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
Figura 4.89
Charque produzido industrialmente
embalado em vácuo (Jerked Beef)
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 217
sentérica, pélvica e renal) obtidos após o abate dos animais. Quando as carca-
ças são desmanchadas os ossos são também aproveitados. No caso das aves,
também as penas são aproveitadas para o fabrico de farinha de carne.
Do ponto de vista biológico, a maior parte do material animal que não forma a
carne pode ser comestível depois de adequado tratamento de limpeza e pre-
paração. Sem dúvida, devido aos costumes, religião, palatabilidade e reputação
dos produtos, em alguns países, só se consideram comestíveis, o fígado, o co-
ração, a língua, os rins, o cérebro e as tripas usadas na confecção de enchidos.
Existem outros subprodutos que são comestíveis dependendo da cultura local.
Orgãos
Pulmões
Trata-se de um órgão muito procurado pelos laboratórios para extracção de
heparina, que é um possante anticoagulante empregado em numerosos casos
cirúrgicos. Há algum tempo era extraída do fígado, sendo actualmente retirada
do pulmão. Os pulmões têm sido utilizados na alimentação humana em alguns
países, quando obtidos de forma higiénica. No caso dos pulmões dos suínos,
como ficam conspurcados durante o escaldão, são destinados à alimentação
animal.
Coração
O coração é eviscerado na sala de abate, juntamente com o pulmão, e no acto
de sua inspecção é retirado do saco pericárdico. Este órgão é pouco utilizado
pelos laboratórios, apesar da sua riqueza em ferro e fósforo.
218 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
Na alimentação humana, o coração tem sido utilizado na composição de patês,
assado no forno e/ou churrasqueira e na confecção de enchidos.
Fígado
É obtido no acto da evisceração, onde depois de inspeccionado é conduzido
por meios adequados à secção de miúdos. É constituído por vesícula biliar, va-
sos sanguíneos, canal biliar, canal colédoco, cístico e pancreático, além dos nó-
dulos linfáticos regionais.
Nódulos linfáticos
Pâncreas
Trata-se de um órgão muito procurado pelos laboratórios, sobretudo para a
preparação da insulina e pancreatina. É consumido pelo Homem em alguns
países.
Ainda do pâncreas, pode ser isolada a tripsina, enzima proteolítica que é utiliza-
da para digerir tecidos necrosados.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 219
Timo
É um órgão glandular muito procurado por alguns consumidores para fins ali-
mentares. Raramente é empregado para uso farmacêutico. O pó de timo, a ti-
mosina, entra também em um pequeno número de preparações farmacêuticas
contra o bócio e para problemas de crescimento.
Rins
Os rins são isolados da gordura peri-renal e a cápsula renal é destacada na sala
de abate. Depois de inspeccionado é enviado à secção de miúdos.
É um órgão muito procurado para consumo humano, sendo normalmente pre-
parado cozido, frito, assado e utilizado na confecção de patês e enchidos.
Baço
A sua colheita e preparação são fáceis. É normalmente utilizado na alimentação
animal (cães e gatos) e na indústria farmacêutica.
Testículos
O testículo secreta várias hormonas, e entre as mais conhecidas estão a testos-
terona e a androsterona.
Os testículos têm sido utilizados na alimentação humana, sendo preparados
através da fritura e assados em forno.
Vísceras
Esófago
Depois de destacado e inspeccionado, é lançado para a secção de miúdos, onde
é então lavado, limpo e seco ao sol por 5 a 12 horas sendo posteriormente leva-
do à estufa por mais 12 horas.
Este órgão é destinado basicamente a alimentação animal (rações para cães e
gatos). No entanto, em alguns países também serve para a alimentação humana.
220 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
Estômago
Intestinos
O intestino delgado de ovinos é utilizado para fazer categute (linha cirúrgica),
usado em cirurgia. Do intestino delgado, especificamente do duodeno, extraem-
-se certos produtos que entram na composição de vários medicamentos empre-
gados contra as afecções intestinais.
Do intestino delgado de suínos são obtidas as tripas, que são normalmente utili-
zadas como envoltórios para enchidos.
Outros subprodutos
Os subprodutos a serem descritos neste item, referem-se basicamente ao sangue
e às gorduras.
Sangue
O sangue é composto por uma parte líquida, o plasma e de elementos celulares.
O plasma concentra a água, sais de sódio, gorduras, glicose, proteínas e diferentes
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 221
produtos do metabolismo. Os elementos celulares são representados pelos gló-
bulos vermelhos, glóbulos brancos e as globulinas ou plaquetas.
A fibrina pode ser empregada para a preparação das peptonas, que são usadas
para convalescentes e debilitados.
Gorduras
Na maioria dos casos as gorduras são aproveitadas para o fabrico de farinhas de
carne, em conjunto com outros subprodutos. Contudo, no caso dos suínos, uma
parte substancial é aproveitada para o fabrico de banha que pode ser utilizada
como uma excelente gordura de origem animal. Noutras situações, as gorduras
de origem animal são também usadas no fabrico de margarinas. Finalmente,
podem ser utilizadas pela indústria química, para o fabrico de sabões e de outros
produtos de higiene.
222 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
Figura 4.90
Processo artesanal de curtimenta
de peles e aspecto de pele curtida
de bovino da raça Nguni
4.5.1 Couros/peles
Curtir couros e peles é uma das actividades mais antigas da Humanidade. Os nos-
sos antecessores pré-históricos utilizavam os couros e as peles de grandes mamí-
feros para produzir roupas que os protegiam das condições climatéricas adversas.
Outra invenção que teve muito sucesso foi a curtimenta vegetal. Esta começou
provavelmente quando as peles eram colocadas numa poça de água rodeada
por árvores. Bocados de madeira, casca e folhas flutuavam na poça, que continha
“agentes” naturais ou químicos que curtiam a pele. Este tipo de tratamento do-
minou a indústria de curtumes até ao século XIX, quando surgiu o processo de
curtimenta do couro com crómio.
Desde a Idade Média até aos finais do século XVII, não se verificaram grandes
alterações na indústria de curtumes. Mas, desenvolvimentos na área da química
no século XIX foram vitais para o desenvolvimento da indústria, particularmente
a curtimenta ao crómio, que utiliza sais de crómio para curtir as peles e couros de
animais, bem como a utilização de enzimas e muitas outras descobertas.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 223
2 1
flor 3
7
4 5 1 epiderme 6 veia
6 8
10
carnaz 9
Figura 4.91
Estrutura da pele
Grande parte das propriedades estéticas e utilitárias deste material derivam des-
ta estrutura.
Cada espécie animal possui uma estrutura e um padrão de cruzamento das fi-
bras bastante próprio, o qual é influenciado pela idade, sexo, raça e alimentação,
bem como pelo meio onde o animal se movimenta.
Para cada espécie existem proporções características entre a flor e o corium, es-
pessuras diferentes, arranjos distintos dos poros, bem como disposições e den-
sidades típicas das fibras de colagénio que não são homogéneas na pele. Estes
factores influenciam o aspecto da superfície e as propriedades físicas dos cabe-
224 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
dais. As peles dos ovinos, por exemplo produzem cabedais mais macios, flexíveis
e menos densos que as peles dos bovinos. Estas últimas e as de caprinos são mais
rígidas e resistentes à abrasão.
preparação por processos químicos e mecânicos da fase de curtimenta a que se segue a curtimenta pro-
Ribeira e curtume
priamente dita e que origina, quando utilizado o crómio, um produto de cor azulada
regularização mecânica da espessura, neutralização e recurtume, tingimento, engorduramento, seca-
Recurtume
gem, amaciamento
preparação final, essencialmente mecânica, que visa conferir as características pretendidas de aspecto,
Acabamento
elasticidade, toque e macieza
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 225
Os animais durante a sua vida sofrem diversas doenças, como qualquer ser de
estrutura biológica, muitas das quais têm influência na estrutura da pele. Dos
defeitos que aparecem ao curtidor, os mais comuns são a carraça e o verme.
Outros tipos de defeitos são os causados pelo clima e pelo meio onde o animal
é criado, nomeadamente estruturas de pele mais ou menos abertas, ou mais ou
menos compactas. A alimentação também pode afectar a qualidade da pele.
A idade do animal, o seu sexo e a sua raça, também nos dão estruturas de pele
diferentes; por tudo isto as peles, resíduo da indústria de carnes e matéria-prima
da indústria de curtumes, devem ser previamente seleccionadas.
Selecção
normalmente após a esfola as peles são submetidas a um processo de salga com
aspersão de sal sobre a superfície interna (cerca de 30% do peso da pele), o que
garante a sua conservação por tempo limitado. Nesta fase os defeitos de flor são
difíceis de avaliar, mas para evitar muitos defeitos de produção, as peles devem
ser seleccionadas. Essa selecção pode ser feita segundo vários critérios.
Nas peles bovinas pode ser por pesos (tamanho/idade) animal novo (vitelas ou
novilhos), animais de peso intermédio (machos e fêmeas, e animais pesados)
vacas e bois ou touros ou ainda segundo a cor do pêlo. Nas peles de cabra e
ovelha os critérios de selecção poderão ser os mesmos apesar de existirem ou-
tros factores, como são a lã e a gordura natural desses animais. Após a selecção
as peles entram em produção.
Remolho e calagem
Esta fase da fabricação tem como objectivo principal devolver à pele o aspecto e
humidade semelhantes ao do momento após a esfola, o qual se perdeu durante
os processos de conservação por tempo limitado. Nesta fase são utilizadas gran-
des quantidades de água e de produtos humectantes, bactericidas e fungicidas.
226 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
Figura 4.92
Aspectos da recolha e
armazenagem de peles
1 armazenagem e seleção
1 2 remolha e calagem
2 11
3 descarna
12
4 remoção de pêlos
2 7 5 desencalagem e lixo
6 escorrer
7 divisão e seleção
3 8 13
8 rebaixar
10 repouso e secagem
4 9 14
11 acamurçar
12 acabamento
13 controlo
5 10
14 seleção medição e empacotamento
Figura 4.93
Diagrama de fluxo das
operações de curtimenta
Descarna
Processo mecânico, feito na máquina de descarnar, que tem por objectivo elimi-
nar o excesso de carnes e gorduras que a pele contém (tecido subcutâneo) os
quais dificultariam as operações seguintes.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 227
Figura 4.94
Diferentes processos
de remolho e calagem
Serragem ou divisão
Processo mecânico, feito na máquina de serrar ou de dividir, que tem por objecti-
vo igualizar minimamente a pele em espessura, a qual deve ser adaptada ao fim
pretendido, tendo como subproduto o crute, o qual nesta fase será crute em tripa.
Desencalagem e lixo
Estas operações têm como finalidade eliminar o excesso de cal (desencalagem),
remover os restos de raízes de cabelo e epiderme bem como abrir a estrutura da
pele (lixo ou purga). Para tal utilizam-se produtos neutralizantes ácidos, chama-
dos desencalantes e enzimas para o chamado lixo.
Desengorduramento
Alguns tipos de pele, como as de ovinos e de suínos, contêm grandes quantida-
des de gordura natural, que causaria graves problemas, pelo que devem ser sub-
metidas a um tratamento especial para eliminar esse excesso de gordura, usan-
do-se para isso, produtos tensioactivos específicos, chamados desengordurantes.
Piquelagem
As peles são tratadas com ácidos, preparando-as para a curtimenta. Utiliza-se
sal para evitar e controlar os inchamentos da pele. Os ácidos mais usuais são o
sulfúrico e o fórmico, por serem mais económicos.
Curtimenta
Tem como finalidade estabilizar a fibra da pele, evitando a sua putrefacção. Exis-
tem diversos tipos de agentes curtientes e várias formas de curtimenta, depen-
228 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
dendo sempre do produto que se utiliza e a forma, assim como do artigo final
pretendido.
Como nos últimos anos tem aumentado a preocupação pelos problemas ecológi-
cos, hoje estão a ser desenvolvidas curtimentas alternativas ao crómio, baseadas
noutros minerais.
Após a curtimenta ter sido efectuada, as peles repousam e são submetidas a nova
selecção.
A divisão só é efectuada nesta fase, caso não tenha sido feito em tripa, após o
pelame e caleiro. Na curtimenta vegetal, a operação de divisão é sempre efectu-
ada em tripa.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 229
Figura 4.95
Rebaixamento
Rebaixar
Como a operação de divisão não regulariza a espessura da pele de uma forma
completamente eficaz, nesta operação igualiza-se a espessura da pele, sendo
esta rebaixada à espessura que realmente pretendemos para trabalhar e que
equivale praticamente à espessura final da pele.
Por norma, nesta fase já está definido o artigo final que se pretende, de que vão
depender as operações posteriores.
Peles para vestuário e forros têm espessuras baixas, para calçado de senhora e
criança as espessuras são médias-baixas (1,2 a 1,6 mm) e para calçado de homem
e calçado desportivo, as espessuras são médias-altas (1,8 a 2,3 mm).
Neutralização e recurtume
A neutralização tem como objectivo eliminar a acidez da pele, enquanto o re-
curtume tem como objectivo modificar as características da pele dadas pela
curtimenta, dependendo do artigo a fabricar.
Estes processos podem ser muito elaborados ou não, dependendo de vários fac-
tores, tais como a origem da pele, tipo de pele e qualidade desta, da espessura
de trabalho, do toque e macieza pretendidos e da compacidade desejada.
230 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
técnicos muito específicos, sendo os mais usados os sais, por serem os mais
baratos e entre eles o bicarbonato de sódio e o formiato de sódio.
Engorduramento
Esta operação visa a incorporação de substâncias gordas na pele, (as quais são
diferentes da gordura natural da pele), lubrificando a flor e a estrutura interna
da pele, para que ao secar não fique dura, dando maleabilidade e flexibilidade,
assim como um toque determinado, ao mesmo tempo que lhe confere resis-
tência mecânica.
Por norma, estas gorduras necessitam de ser fixadas à pele, o que é feito com
adição de ácidos, geralmente o ácido fórmico.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 231
Figura 4.96
Aspectos da secagem
de peles
Secagem
Esta operação serve, como o nome indica, para secar a pele preparando-a para
a chamada fase seca, onde são efectuados a cabo os acabamentos.
Hoje em dia, na maioria dos casos, inicia-se esta operação com uma pré-seca-
gem em vácuo, numa máquina chamada secador a vazio, no qual por meio de
temperatura e efeito de vácuo, se retira à pele a maior quantidade de água que
esta contém, após o que se segue a secagem aérea, na qual as peles são pendu-
radas em varas fixas ou móveis, deixando-as terminar de secar.
Por vezes para acelerar este processo, as peles são introduzidas em túneis de
secagem, em que por meio de ventilação e calor, se acelera o processo de se-
cagem.
Hoje em dia, todas as peles com espessuras superiores a 1,5 mm não são pre-
gadas, excepto nalguns casos de artigos muito particulares. Peles de espessura
inferior a 1,5 mm por vezes também não são pregadas, sobretudo se forem des-
tinadas a calçado. A operação de pregar dá mais rendimento em superfície, já
que as peles são esticadas, mas prejudica fortemente a pele no que diz respeito
a tacto e quebra da flor, pelo que esta operação é só para artigos específicos.
232 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
Figura 4.97
Acamurçar da pele
(acima descrito) e a terceira, quando as peles já estão prontas, com o único fim de
melhorar a apresentação das peles ao cliente.
Acamurçar
Operação em que as peles são passadas por uma máquina com o mesmo nome,
a qual possui um rolo com papel de lixa, sendo retirada a camada superficial da
flor da pele.
Acabamento
Após as operações anteriores, a pele entra na fase propriamente dita de acaba-
mento. Neste momento os lotes já vêm com um fim conhecido, ao qual se cha-
ma “artigo”. Os artigos mais usuais são: semi-anilina, anilina, corrigidos, nobuck,
pull-up, forro, napas, estofos, vestuário, etc. Todos estes artigos têm formas de
acabamento diferentes e específicas, apesar de cada artigo ter diversas variantes
parecidas.
O top final tem como finalidade a fixação de todo o sistema, onde se podem
incorporar diversos tactos e aspectos de maior ou menor brilho, que dá a carac-
terística específica do artigo à pele.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 233
Figura 4.98
Pormenor do acabamento
das peles
234 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 4. Carne e produtos cárnicos
As novas tecnologias também foram desenvolvidas para transformar retalhos de
couros e peles não curtidos em subprodutos orgânicos como gelatina, cola e
outros produtos proteicos.
4. Carne e produtos cárnicos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 235
5. Pescado
5.1 Os produtos da pesca
A pesca é uma actividade antiquíssima que, tal como a caça e a agricultura, é
praticada pelo Homem desde a pré-história tendo em vista conseguir obter os
meios necessários à sua subsistência a partir do meio aquático.
9,0% 1,8%
6,7%
82,4%
Figura 5.3
Evolução previsível da
quantidade de produtos
da pesca usada pelo
homem
2
Peixes diádromos são peixes que vivem quer em Na figura 5.4 podem observar-se as espécies que mais contribuíram para as
água doce quer em água salgada; dividem-se em
anádromos, que vivem no mar mas reproduzem- capturas em 2005. As espécies de água doce estão representadas por barras
-se em água doce (p. ex. salmão); catádromos, que
vivem em água doce e se reproduzem no mar (p. azuis e, as de água salgada por barras castanhas. Note-se a grande importância
ex. enguia); anfídromos que durante a vida vivem
quer em água doce quer em água salgada mas
de espécies como a sardinha, a anchova e o arenque que, em conjunto, contri-
não por razões reprodutivas. buem com cerca de 22 milhões de toneladas.
A zona pelágica ou “mar aberto” é a região oceânica onde vivem normalmente seres vivos que não dependem dos fundos marinhos. O domínio
pelágico não abrange apenas o alto mar, mas também as águas que cobrem a plataforma continental.
Os organismos que vivem nesta região, também conhecidos como seres pelágicos, dependem apenas das características das massas de água
que são mais adequadas para o seu ciclo de vida. Fazem parte deste grupo as baleias, várias espécies de crustáceos (como o krill e os camarões),
muitos cefalópodes e espécies de peixes que vivem geralmente em cardumes, como as sardinhas, as anchovas, os atuns e muitos tubarões.
Pelo contrário, existem outros organismos aquáticos (demersais) que vivem a maior parte do tempo em associação com um substrato, quer
em fundos arenosos (p. ex. linguados) ou rochosos (p. ex.: garoupas e moreias). Os seres demersais têm capacidade de natação e, deverão ser
distinguidos dos bentónicos que não a têm, ou a têm muito reduzida.
O grau de rigor mortis varia com a espécie e, é afectado pela temperatura, manu-
seamento, tamanho e condição física do peixe. Com a continuação da autólise,
os músculos do pescado tornam-se moles e sem elasticidade.
Devido aos elevados teores em ácidos gordos polinsaturados nos lípidos do pei-
xe, estes são muito susceptíveis a reacções de auto-oxidação na presença de oxi-
3
Autólise: processo pelo qual uma célula se auto-
génio (inclusivamente a 0 ºC). Na primeira etapa desta oxidação química, após
-destrói espontaneamente. Ocorre normalmente a reacção do oxigénio com as duplas ligações, formam-se hidroperóxidos que,
em células danificadas ou tecido morto.
Durante a congelação, o pescado passa por três fases. Na primeira fase de refri-
geração a temperatura diminui rapidamente até um pouco abaixo de 0 ºC, (pon-
to de congelação da água livre). Durante a segunda fase (com maior duração,
e associada à remoção de uma maior quantidade de calor do pescado), a tem-
peratura decresce um pouco, sendo este período conhecido como a etapa de
paragem térmica. Nesta fase, quando cerca de 55% da água for convertida em
gelo, a temperatura começa a descer rapidamente, iniciando-se então a terceira
fase (na qual a totalidade da água líquida é então congelada).
c d
Figura 5.5
Aspectos do processo de
produção de postas de pescado
horas) para evitar a perda de qualidade do pescado. De facto, velocidades lentas congelado higienizado
Vidragem
Na preparação do pescado congelado pode recorrer-se à vidragem (manual ou
mecânica).
Com uma vidragem deficiente, o pescado não fica bem protegido, podendo ser
também sinal de que esteve armazenado tempo demais ou que, sofreu variações
térmicas significativas durante o seu transporte até ao consumidor. Pelo contrá-
Por definição, uma conserva deverá ser inócua e estável à temperatura ambiente.
Para que haja certeza quanto à sua inocuidade, é necessário que o tratamento
térmico de esterilização satisfaça um valor letal suficiente para que se verifique a
destruição de toda a flora patogénica que tenha a possibilidade de se desenvol-
ver na conserva.
Para conservas de peixe que apresentem um pH superior a 4,5 o valor letal míni-
mo a considerar, deve ser igual ou superior a 3 em termos de valor F0 (valor refe-
rido a 121,1 ºC). Isto é, independentemente da temperatura e do tempo utilizados
no processo de esterilização, o mesmo deverá ser equivalente a um tratamento
de, pelo menos 3 minutos, a partir do momento em que a temperatura no centro
térmico do produto atingir os 121,1 º C.
Para conservar a qualidade do peixe, este deve ser enlatado e esterilizado o mais
rapidamente possível depois de ser tirado do congelador ou da câmara frigorífica
ou, se for fresco, quando entra na linha de produção.
Em geral, podem referir-se dois métodos de tratamento com calor para conservas
de peixe: por vapor saturado ou por uso de água quente a uma certa pressão de
modo a que esta fique no ponto de ebulição.
Pequenos peixes, como por exemplo as sardinhas, são muitas vezes cozidos em
óleo quente ou fumadas para lhes dar sabores e texturas diferentes. Nalguns ca-
sos o cozimento traz alguns problemas no manuseamento posterior do produto
para enlatar.
Geralmente o ar destas latas é logo excluído quando se faz a sua cravação. Assim
será difícil que estas latas se deformem em condições atmosféricas adversas. O
vácuo pode ser criado através de um pré-aquecimento do conteúdo antes da cra-
Se as latas de conserva de peixe não forem arrefecidas com água fria então de-
vem ser colocadas de modo a que haja uma boa circulação de ar e não deverão
ser rotuladas nem encaixotadas até estarem quase frias.
Dado que nas conservas de peixe pode existir Clostridium sporogenes, que não
sendo patogénico é mais termoresistente do que o Clostridium botulinum e
Matéria-prima principal
Peixe (p. ex. Sardina pilchardus), ou outras legalmente definidas como do tipo,
inteiro ou preparado, que não tenha sofrido qualquer tratamento destinado à
sua conservação, excepto a refrigeração.
Matérias-primas subsidiárias
Meio de cobertura
Produto líquido, oleoso ou pastoso incorporado durante o fabrico de conservas
e semiconservas de pescado e presente no produto acabado, constituído por
azeite, outros óleos vegetais refinados, incluindo o óleo de bagaço de azeitona,
utilizados isoladamente ou misturados, molho de tomate, líquido de exsudação
do peixe aquando da cozedura, solução salina ou água, marinadas com ou sem
vinho ou qualquer outro produto do mesmo tipo dos precedentes e que deles
se distinga claramente, podendo ser misturados entre si, excepto no caso do
azeite com outros óleos.
Ingredientes vegetais
Cenoura, cebola, pepino, limão, salsa, ou outros, utilizados no fabrico.
captura
água suja
água
evisceração
latas
lavagem
enlatamento
vapor cozimento
óleo
adição de óleo excesso
azeite
de óleo
cravação
tampas
esterilização
Operações e equipamentos
vapor
arrefecimento
Operações prévias (todas as operações que não são de esterilização):
água
fria
armazenagem
Vácuo
Eliminação de gases das latas antes da selagem para prevenir o aumento da
Figura 5.6
Diagrama do processo pressão durante esterilização e para reduzir a oxidação do conteúdo e a corro-
de fabrico de conservas
de pescado são interna da lata.
2 Selagem
Esterilização
O modo mais frequente para o tratamento térmico dos produtos é usando
vapor saturado sob pressão, em autoclaves – por carga, horizontal ou vertical,
ou em contínuo.
Figura 5.15
Sequência de operações durante
o processo de cravação de latas
Figura 5.14
Cravação
A salga em barril remove muita humidade do peixe e cria um ambiente desfavorável para o cres-
1 cimento de microrganismos (p. ex. anchovas)
A defumação do peixe em presença de fumo seco também remove a humidade do peixe limitando
2 o crescimento microbiano
A secagem ao sol, com ou sem adição de sal também reduz a actividade da água para valores que
3 permitem um aumento da vida útil do produto até vários meses
A salga a seco ou em salmoura, seguida da secagem com ar seco também permite conservar o
4 peixe por longos períodos. Neste caso, o produto final tem uma concentração de sal superior a 17%
e, naturalmente, tem de ser demolhado antes de ser cozinhado (p. ex. bacalhau salgado)
Posteriormente, pode ser de novo lavado com água limpa e, colocado noutra
salmoura com a mesma concentração de sal. A salmoura deverá ter uma con-
centração de sal que obrigue o peixe a flutuar. Esta salmoura deverá ser coberta
e o peixe aí deverá permanecer por mais seis horas. Finalmente, o peixe deverá
ser colocado a secar em secadores solares.
Outro método para conservar o peixe resulta da salga seca. Neste caso são usa-
dos cestos ou caixas de madeira. Depois da limpeza e lavagem, alguns peixes são
colocados no fundo do recipiente e cobertos com sal. Faz-se nova camada de
peixe e cobre-se com sal. Colocam-se camadas sucessivas de peixe e sal até que
o recipiente esteja cheio (figura 5.17). Deverá ser usada uma proporção de uma
parte de sal para três partes de peixe. O peixe pequeno poderá ser removido
após 7 a 10 dias. Depois, é lavado numa salmoura ligeira e colocado a secar ao sol.
Os peixes grandes podem ser filetados sendo a pele removida. Todas as suas
superfícies poderão ser cobertas com sal (1 kg de sal por 2 kg de peixe). Poderão
ser colocadas até doze camadas de peixe (com a carne voltada para a superfí-
cie). Ao longo do processo de secagem, as pilhas de peixe deverão ser voltadas
(tombamento) de modo a garantir uma secagem uniforme de todas as camadas
(figura 5.18). Este processo permite equalizar a pressão das camadas, uniformizar
a distribuição do sal e evita o aparecimento da vermelhidão (rouge) causada por
bactérias halófilas (p. ex. Micrococcus roseus).
4
5
3 2
1
a salga húmida b salga seca
O peixe deverá ser mantido a secar até que não seja possível marcá-lo por pres-
são do dedo. O processo pode demorar uma ou duas semanas. Depois desta fase,
o peixe pode ser embalado em plástico e armazenado num local fresco e seco. O
peixe produzido nestas condições deverá ser demolhado em água fria por cerca
de duas horas antes de ser cozinhado.
Diversos materiais podem ser usados para o suporte e para o tabuleiro de seca-
gem (p. ex.: paus de bambú, folhas de palmeira, e rede de pesca de malha fina).
Defumação
A defumação deverá ter surgido de forma acidental. Só mais tarde se reconhe-
ceram os efeitos bactericidas e antioxidantes do fumo. Antes disso, a defumação
era usada como processo de melhorar o sabor do pescado. Outra utilização des-
ta técnica, que é contestada por muitos, é a de recuperar pescado de deficiente
qualidade (que não se vende depois de ter sido exposto). A conservação (a mé-
dio ou longo prazo) é, todavia, o objectivo principal da defumação.
No ovo de galinha, a clara representa cerca de 58% do peso total, a gema 31%
e a casca 11.%. A clara deve ser límpida, translúcida, consistente, densa e isenta
de qualquer corpo estranho.
A gema contém cerca de 50% de sólidos. Deve ser lisa, redonda, consistente,
saliente e centrada no meio da clara. A gema bem amarela depende da alimen-
tação fornecida às galinhas. As gemas dos ovos velhos são achatadas, flácidas e
a membrana rompe-se com facilidade.
albumina membrana
calaza densa blastoderma gema exterior
câmara
casca de ar
membrana
interior
albumina
leve
figura 6.1
Representação dos
componentes do ovo
A casca é uma matriz cálcica, porosa, separada da clara por uma membrana. En-
tre os seus componentes minerais o cálcio é o mais importante. O cálcio presen-
te na casca (39%) encontra-se na forma de CaCO3 (carbonato de cálcio). Na su-
perfície exterior da casca existe uma camada protectora, a cutícula, que protege
os poros distribuídos ao longo da superfície, preservando o ovo e constituindo a
primeira barreira contra a contaminação bacteriana.
A casca deve ser vista como uma embalagem natural que envolve o conteúdo
do ovo e o protege contra perdas e agressões do meio. No entanto, como é
porosa significa que existe troca de substâncias entre este e o meio exterior. A
casca e cutícula devem estar limpas, intactas e isentas de cheiros. A casca dos
ovos frescos é opaca e, ao envelhecer, torna-se brilhante.
A gema pode ser considerada como uma dispersão contendo uma grande
variedade de partículas dispersas uniformemente numa solução de proteína
(plasma), que contém livetina (66%) e lipoproteínas (11%). Os grânulos são com-
postos pelas seguintes proteínas: lipovitelinas (70%), fosfovitina (16%) e lipopro-
teínas de baixa densidade (12%) (Powrie & Nakai, 1985).
Altura não superior a seis milímetros, imóvel; no entanto, no caso dos ovos comercializados com a menção “extra”,
Câmara de ar
a câmara-de-ar não deve exceder quatro milímetros
Clara Translúcida, límpida, de consistência gelatinosa, isenta de corpos estranhos de qualquer natureza
Visível à miragem somente sob a forma de sombra, sem contorno aparente, não se desviando sensivelmente da
Gema
posição central em caso de rotação do ovo; isenta de corpos estranhos de qualquer natureza
tabela 6.2
Características principais
dos ovos da categoria A
O ovoscópio é um aparelho que permite detectar eventuais anomalias, na casca ou no interior do ovo. Trata-se de um
equipamento provido de uma luz forte que permite avaliar a estrutura interna do ovo.
No centro de classificação, tal como o nome indica, os ovos são classificados por
classes de peso. Depois de passarem no ovoscópio e depois de serem classifica-
dos por classe de peso, os ovos são acondicionados e embalados.
L – grande 63 a 72 gramas
M – médio 53 a 62 gramas
S – pequeno < de 53 gramas
tabela 6.3
a
Classes de peso
dos ovos da categoria A
figura 6.3
Padrões para ovos partidos
2] Os ovos da categoria A não devem ser lavados nem limpos por qualquer
processo, quer antes, quer depois da classificação.
3] Os ovos da categoria A não devem ser submetidos a qualquer tratamento
de conservação nem ser refrigerados em locais ou instalações onde a
temperatura seja mantida artificialmente abaixo de + 5 ºC.
aa Na classe AA os ovos deverão ser altos, a gema firme e a área coberta pela clara pequena. Existe uma proporção elevada de clara grossa
para clara fina;
a Na classe A, os ovos cobrem uma área relativamente pequena, a gema é redonda e proeminente e a área coberta pela clara grossa é
grande em relação à da clara fina contornando a gema;
b Na classe B, os ovos quando partidos ocupam uma área maior, a gema é baixa e a quantidade de clara grossa é semelhante à da clara fina.
6.3.1 Refrigeração
O departamento de agricultura dos EUA (USDA) recomenda o armazenamento
de ovos no frigorífico a cerca de 4,5 ºC, principalmente para reduzir as proba-
bilidades de que as bactérias na casca se multipliquem e possam causar risco
de doença. Quando produzidos e armazenados em boas condições estes ovos
poderão ser mantidos por 4 a 5 semanas.
Entende-se por ovoprodutos, “os produtos obtidos a partir do ovo, dos seus diferentes componentes e
suas misturas, após eliminação da casca e das membranas, e que se destinam ao consumo humano ainda
que parcialmente completos com outros géneros alimentícios ou aditivos.”
figura 6.4
Ovoprodutos pasteurizados
O ovo pasteurizado também poderá ser congelado, embora este processo alte-
re algumas das propriedades do produto original. Os ovos inteiros e as gemas
poderão ficar com uma consistência grumosa como resultado da agregação de
algumas proteínas.
O ovo pasteurizado poderá ainda ser desidratado, embora no caso das claras,
a glucose tenha de ser removida para evitar o seu acastanhamento. É também
aconselhável manter o ovo desidratado a temperaturas inferiores a 10 ºC.
A clara de ovo não se comporta da mesma maneira e pode ser congelada indivi-
dualmente, colocando-a, por exemplo, nas formas de cubos de gelo.
Os ovos podem ser conservados através do seu revestimento com banha de por-
co ou de qualquer outra gordura limpa, (óleo de coco, ou sebo) e, em seguida,
devem ser acondicionados em farelo.
Para a preservação de ovos não lavados, é sugerida a refrigeração dos ovos fres-
cos em sacos de plástico até 2 meses. No entanto, se houver acesso à cave, fria e
húmida, os ovos podem ser armazenados em farinha de aveia ou serradura, com
a extremidade mais pequena para baixo, num recipiente de plástico ou de barro.
Como já foi referido, não se devem lavar os ovos. Os ovos têm uma barreira na-
tural (a cutícula), que protege a superfície porosa. A lavagem irá remover essa
rede de segurança. Cozinhar os ovos à temperatura correcta (pelo menos 71ºC)
protege o consumidor de bactérias nocivas.
Uma outra maneira de conservar é revestir os ovos inteiros com uma espessa
camada de sal, terra, cinza e folhas de chá. Estes são armazenados a uma tempe-
ratura de cerca de 18 a 20 ºC. Podem ser conservados durante trinta dias ou mais.
Na altura do consumo os revestimentos devem ser removidos e os ovos cozidos.
Dentro de cada ovo existe um espaço de ar que se expande quando o conteúdo começa a ficar mais velho e a secar. Esta é a chave
para determinar a frescura dos ovos. A maneira mais fácil de testar a frescura é colocar o ovo dentro de um recipiente com água
fria. Caso se mantenha deitado no fundo está bastante fresco; se ficar ao alto tem uma frescura intermédia; se flutuar, é porque
já não está fresco.
A iluminação do ovo é também um método alternativo para verificar a frescura. O ovo deve ser seguro pela parte mais pequena
colocando a outra extremidade contra a luz, deve-se então olhar para o espaço aéreo que não deve ser maior do que 6 mm. A
gema não deve ser claramente visível e o movimento não deve ser facilmente detectado quando se inverte rapidamente o ovo.
Num ovo que não esteja fresco o espaço aéreo será maior e a gema mover-se-á livremente quando o ovo é manipulado. Além
disso, quando abrimos o ovo, uma gema firme e alta é um bom sinal de frescura, ao contrário de uma gema achatada e pálida.
Desta forma, qualquer colaborador, deverá manter uma higiene cuidada, de acor-
do com as indicações que seguidamente se apresentam, para reduzir/evitar a
contaminação de alimentos, aumentando a segurança dos produtos alimentares.
7. Boas práticas de fabrico na produção de alimentos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 269
Objectivo
270 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 7. Boas práticas de fabrico na produção de alimentos
da garganta, do nariz, dos ouvidos ou dos olhos, não pode trabalhar e, deve
apresentar a situação ao seu responsável hierárquico.
Motivos de Alerta
Febre
Diarreia
Vómitos
Inflamação na garganta, do nariz e dos olhos
Doença de pele
Contacto com pessoas com doenças contagiosas
Cortes e queimaduras
Lesões
Os cortes e queimaduras constituem pontos de lesões da pele, onde os micror-
ganismos se desenvolvem com facilidade, pelo que devem ser encarados como
situações de particular perigosidade e de alerta para quem manipule alimentos.
Em caso de lesão, os colaboradores devem seguir o fluxograma de acção/comu-
nicação apresentado na Fig 7.1.
Introdução
O conjunto de regras, condições e práticas que asseguram uma adequada hi-
giene pessoal constituem as boas práticas de higiene pessoal.
7. Boas práticas de fabrico na produção de alimentos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 271
lesão
colaborador
queimadura corte
identificação
da causa
colaborador
colaborador
alertar alertar
imediatamente imediatamente
superior superior
hierárquico hierárquico
responsável responsável
de higiéne avaliação avaliação de higiéne
e segurança da situação da situação e segurança
no trabalho no trabalho
possibilidade
de continuar
a exercer a sua
actividade?
cobrir a ferida com
penso de cor e usar luvas sim não o lesado é imediatamente
descartáveis,
encaminhado para
estando permanentemente
tratamento médico
atento ao possível
agravamento da lesão
figura 7.1
Fluxograma de acção/comunicação
que o colaborador deve seguir em
caso de queimadura ou corte
Manter um nível adequado de limpeza pessoal ao nível Comportar-se de modo apropriado, seguindo todas as
do corpo, uniforme, roupa e calçado regras de higiene adoptadas na empresa
272 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 7. Boas práticas de fabrico na produção de alimentos
Higiene das mãos
As mãos dos trabalhadores, mesmo sem sinal de doença, são os principais trans-
missores de contaminações para os alimentos. Tal facto advém das mãos estarem
em contacto com o ar, serem utilizadas para usar os equipamentos e utensílios,
poderem contactar com partes do corpo ou superfícies que se encontrem sujas e
poderem assim ser facilmente contaminadas.
Depois de vestir o uniforme, antes de iniciar o trabalho e após cada Após tocar no cabelo, olhos, boca, ouvidos ou nariz
intervalo
Sempre que se utilizar os sanitários Depois de manipular produtos químicos ou equipamentos de limpeza
Após manipular ou tocar em equipamentos sujos Depois de se assoar, tossir ou espirrar
Após manipular sacos e/ou caixotes de lixo, restos de produtos alimen- Depois de fumar, comer ou beber
tares, embalagens
Sempre que iniciar o manuseamento de alimentos ou se mude de tare- Depois de tocar no dinheiro ou cumprimentar o colaborador ou cliente
fa e/ou preparação ou categoria do produto
Antes de colocar ou mudar luvas Sempre que ocorra uma situação diferente das enunciadas acima, em
que o trabalhador não tenha a certeza se tem que lavar as mãos, adop-
tando o princípio da precaução, deve proceder à sua lavagem
7. Boas práticas de fabrico na produção de alimentos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 273
figura 7.2
Lava mãos accionado
por pedal
Molhar as mãos com água e remover os resíduos sólidos Secar as mãos com papel descartável
Ensaboar bem as mãos com sabão líquido Aplicar solução desinfectante
Lavar cuidadosamente os espaços interdigitais, costas das mãos, polegar e unhas. Deixar secar naturalmente e não limpar as mãos às batas
Deve utilizar-se uma escova própria de unhas para maior facilidade na remoção dos
detritos
Passar com água corrente para retirar todo o sabão
A existência de lavatórios em número suficiente e localizados junto dos A disponibilidade de sabonete líquido desinfectante e de toalhetes de
locais onde é necessário que os operadores procedam frequentemente papel nos respectivos dispensadores
à higienização das mãos
A disponibilização de água quente quando necessário para uma ade- Uma adequada concentração do sabonete líquido com acção desinfec-
quada higienização das mãos tante/bactericida no dispensador
A manutenção em adequadas condições de uso dos lavatórios A monitorização da adequabilidade das práticas de higienização das
mãos por parte dos manipuladores e o desencadeamento de acções
correctivas quando se constate a existência de falhas e insuficiências no
cumprimento no programa de higienização de mãos
Luvas
Caso seja necessário usar luvas descartáveis, os trabalhadores devem lavar cor-
rectamente as mãos antes de calçarem as luvas. De seguida, devem desinfectar
as luvas com uma solução desinfectante alcoólica. As tarefas que necessitem de
luvas para serem realizadas devem ser efectuadas sem interrupção, caso contrá-
rio, as mãos devem ser novamente lavadas e usadas novas luvas desinfectadas
ou as mesmas devidamente higienizadas. Em determinadas situações e de acor-
do com os procedimentos, as luvas poderão ter uma frequência de mudança.
274 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 7. Boas práticas de fabrico na produção de alimentos
COMO LAVAR AS MÃOS?
0 1 2
molhe as mãos com água aplique sabão para cobrir esfregue as palmas das mãos,
todas as superfícies das mãos uma na outra
3 4 5
palma da mão direita no dorso palma com palma com os parte detrás dos dedos nas
da esquerda, com os dedos dedos entrelaçados palmas opostas com os dedos
entrelaçados e vice-versa entrelaçados
6 7 8
9 10 11
seque as mãos com utilize o toalhete para fechar agora as suas mãos estão
toalhete descartável a torneira, se esta for de comando manual limpas e seguras
figura 7.3
Procedimentos para lavagem correcta das mãos
7. Boas práticas de fabrico na produção de alimentos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 275
Uniforme
A roupa e outro material usado fora do local de laboração deve ser deixada no
vestiário. Este deve ser mantido sempre devidamente limpo nos cacifos individu-
ais. No local de laboração todo o pessoal tem de usar uniforme adequado, que
é fornecido pela empresa, o qual deve ser mantido limpo, e como tal mudado
sempre que se apresente sujo.
O uniforme utilizado obedece às seguintes regras:
É de cor clara, confortável e adequado à tarefa a desempenhar Não possui bolsos exteriores ou botões
É de uso exclusivo ao local de laboração Os bolsos interiores estão posicionados abaixo da cintura para que, em caso
dos objectos saltarem dos bolsos, caiam directamente no pavimento
É constituído por touca/boné, calça, pólo, calçado apropriado e avental São de material resistente a lavagens frequentes
O boné/touca deve ser usado de modo a cobrir todo o cabelo, não dei- Se for necessário usar meias, estas são brancas e de algodão
xando pontas de fora. Para segurar o boné não se podem usar ganchos e
molas. Este deve ser preso com a ajuda do elástico que deve fazer parte da
sua estrutura
É importante evitar:
Calçado
O calçado é de uso exclusivo no local de laboração, de cor clara, antiderrapante,
confortável, fechado e com protecção contra queda de objectos. O colaborador
quando descalça o calçado que traz do exterior deve evitar o contacto com o
276 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 7. Boas práticas de fabrico na produção de alimentos
calçado da laboração. Esta barreira pode ser uma simples elevação onde o traba-
lhador se senta para se descalçar, roda o corpo para passar os pés para o outro
lado, onde calça o calçado de laboração. Deste modo, o calçado de laboração
nunca se encontrará do lado do local do calçado que o trabalhador traz de casa
e vice-versa.
Adornos pessoais
Não é permitida a utilização de qualquer tipo de adornos (p.ex.: jóias, relógios,
pulseiras, brincos), dada a possibilidade de poderem soltar-se e ir para os alimen-
tos. Pode ser permitido o uso de aliança se esta for lisa e não constituir perigo
para o trabalhador, como por exemplo, ficar presa em alguma máquina ou uten-
sílio. No caso de se usar aliança, esta deve ser lavada cada vez que se lavem as
mãos, pois constitui um local onde a sujidade se pode alojar, criando condições
para o desenvolvimento de microrganismos.
Poderá ser permitida a utilização de fios com placas com inscrições de alertas
médicos (p.ex.: grupo sanguíneo, indicação de diabetes), mas estes devem ser
resistentes, usados por dentro da roupa e lavados regularmente. A necessidade
de uso de fios nestas circunstâncias deve ser comunicada previamente ao res-
pectivo superior hierárquico ou ao departamento de recursos humanos.
7. Boas práticas de fabrico na produção de alimentos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 277
partir desta fonte, os cabelos são lavados regularmente e devem ser utilizadas
toucas/bonés de modo a cobrir todo o cabelo, não deixando pontas de fora. Os
cabelos devem apresentar-se lavados e penteados. A colocação do boné ou o
rearranjo da sua posição deve ser exclusivamente efectuado nos vestiários.
É obrigatória a utilização de máscaras naso-bocais, que devem ser colocadas tapando simultaneamente a boca
e o nariz dos colaboradores quando estes se encontram na área da cozinha e na preparação e manipulação de
produtos prontos-a-consumir.
Não tocar na boca, nariz, cabelo e no rosto durante a manipulação dos Avisar sempre o responsável do sector em caso de feridas ou doenças infec-
alimentos to-contagiosas (p.ex.: diarreia, hepatite, infecções)
Não fumar, comer (incluindo pastilhas, rebuçados e doces), beber nas áre- Os manipuladores de alimentos não devem carregar canetas ou qualquer ou-
as de manipulação de alimentos tro objecto, excepto em bolsos fechados abaixo da linha da cintura. Quem
usar óculos, deve ter o cuidado de os manter presos por um cordão atrás do
pescoço, de modo a que não caiam no produto alimentar
Não se deve espirrar ou tossir nas áreas de manipulação e armazenamen- Guardar alimentos nos cacifos dos vestiários deve ser evitado, para evitar a
to de alimentos. Antes de tossir ou espirrar, o manipulador deve afastar- atracção de insectos e roedores ao local. O uso dos cacifos deve ser exclusiva-
-se, cobrir a boca e o nariz com um lenço de papel e depois lavar as mãos mente para guardar roupas e objectos de uso pessoal
antes de voltar ao seu posto de trabalho
Não usar objectos pessoais como jóias, relógios, brincos e outros na área A colocação de avisos, tais como os de “proibido comer, beber, fumar”, “obri-
de manipulação dos alimentos. Estes pertences devem ficar guardados gatório o uso de uniforme adequado”, “obrigatório lavar as mãos”, bem como
em cacifos localizados nos vestiários de outros, nos locais em que se consiga relembrar os colaboradores
278 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 7. Boas práticas de fabrico na produção de alimentos
Iniciar o trabalho sem antes lavar e desinfectar as mãos, ou após utiliza- É importante a identificação dos trabalhadores responsáveis/supervisores em
ção dos sanitários ou então após a manipulação de resíduos ou produtos cada linha/tarefa, para que possam rapidamente ser informados de qualquer
químicos, são comportamentos que podem causar contaminação dos situação que necessite da sua intervenção
alimentos e devem ser evitados. A lavagem das mãos deve ser feita regu-
larmente durante o dia, antes do início do trabalho ou antes do manuse-
amento de um outro alimento diferente daquele que estava a manipular
Deve-se manter sempre o vestuário limpo (incluindo as luvas, aventais e É importante a lavagem dos dentes após cada refeição
botas)
O uso do vestuário de trabalho fora da área fabril não é permitido, de É fundamental a disponibilização de caixas de primeiros socorros, em local
modo a evitar contaminações, sendo apenas permitido num raio de 2 bem visível para os trabalhadores. A caixa de primeiros socorros deve ser
metros da área circundante inspeccionada pelo responsável de higiene e segurança no trabalho, e deve
conter: algodão hidrófilo, água oxigenada, fita adesiva, álcool etílico, pensos
coloridos e impermeáveis, solução desinfectante, gaze, pomada para quei-
maduras, luvas descartáveis, máscaras.
Nunca esquecer de usar touca para proteger o cabelo Manipular alimentos com cortes ou feridas expostas no corpo do manipula-
dor não é permitido
Visitantes
Os visitantes e fornecedores só devem ter acesso às áreas de manipulação e ar-
mazenamento quando devidamente autorizados e equipados (fardados) e acom-
panhados. Os visitantes devem respeitar as mesmas regras de boa conduta esta-
belecidas para os colaboradores.
7. Boas práticas de fabrico na produção de alimentos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 279
Materiais
Os materiais de interiores (paredes, pavimentos, tectos, portas) deverão ser se-
leccionados e instalados tendo em consideração o uso pretendido e os princí-
pios de desenho higiénico.
Paredes
As paredes externas e as fundações das instalações são impermeáveis à água e constituem uma barreira eficaz a insectos
e roedores
No interior das instalações, as paredes e divisórias são construídas com materiais impermeáveis, não absorventes, lavá-
veis e não tóxicos, sendo lisas de forma a facilitar as operações de limpeza
São pintadas com tinta lavável, de cor clara de forma a facilitar a visualização da sujidade
Paredes exteriores revestidas de material cerâmico, liso
Todos os ângulos e cantos nas paredes, chão e tecto são convenientemente selados e arredondados para facilitar a
limpeza
Janelas
Constituídas de modo a evitar a acumulação de sujidade e deverão estar equipadas com redes de protecção contra
insectos (rede mosquiteira)
Durante a laboração as janelas são permanentemente fechadas e apenas estão abertas as que possuem rede de protec-
ção (rede mosquiteira)
Os caixilhos das janelas deverão ser resistentes à corrosão
Portas
280 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 7. Boas práticas de fabrico na produção de alimentos
Tectos
Os tectos e outros equipamentos nele suspensos devem ser con- Os tectos possuem reboco liso e são pintados com tinta lavável
cebidos e construídos de modo a não acumular sujidade, reduzir
a condensação e o desenvolvimento de bolores indesejáveis
Pavimentos
Os pavimentos devem ser planeados e construídos de modo a possuírem deter-
minadas características:
Nas zonas de laboração, existem lavatórios espalhados em nú- De forma a assegurar a segurança e salubridade dos géneros
mero suficiente para a lavagem das mãos, equipados com água alimentícios, os lavatórios deverão estar devidamente separados
corrente quente e fria, materiais para limpeza e dispositivos de dos que se destinam à lavagem de equipamentos e equipados
secagem higiénica (porta-rolos de papel descartável) com torneiras de comando não manual, doseador de produtos
de lavagem, toalhas descartáveis em papel para secagem das
mãos e escova de apoio à remoção de sujidades
Iluminação
Uma boa iluminação é fundamental para garantir boas condições de trabalho e
uma boa higiene do local.
A iluminação artificial existente nas instalações deve ser com- As lâmpadas devem estar instaladas de maneira a evitar a acu-
posta por lâmpadas fluorescentes anti-estilhaços de forma a evi- mulação de poeiras e o acesso a insectos, bem como devem
tar a contaminação dos alimentos ou equipamentos por vidros permitir uma fácil limpeza e manutenção
no caso de rebentamento
Sanitários
7. Boas práticas de fabrico na produção de alimentos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 281
Vestiários
O tamanho dos vestiários deve ser planeado tendo em conta o As paredes devem ser revestidas com azulejos de cor clara e impermeável,
número de utilizadores enquanto o tecto deve ser pintado com cor clara e lavável
Deve existir cabine de banho com chuveiros fisicamente sepa- Os armários serão construídos em aço inoxidável e mantidos em boas con-
rados das instalações sanitárias com água quente e fria dições de higiene e conservação, existindo um espaço físico que reduz
contaminações cruzadas entre a roupa de trabalho e roupa proveniente do
meio externo
Instalações de frio
As instalações de refrigeração para a conservação dos alimentos são projectadas e construídas de forma a permitir a exposição/manutenção
da superfície ou do centro térmico do alimento, conforme o apropriado, para reduzir ou manter a temperatura adequada dos alimentos e do
processo de acordo com a categoria do produto, sendo de 0 ºC a 3 ºC para produtos frescos refrigerados
A temperatura das câmaras de refrigeração deve ser monitorizada através de equipamentos calibrados de registo automático de temperaturas
Os materiais do tecto, paredes devem ser construídos com painéis aptos, de fácil limpeza, sendo o chão revestido com resina epóxi, ou outro
material que impeça as contaminações e facilite a higiene
As câmaras de congelação deverão ser bem projectadas e cons- A temperatura das câmaras de congelação deve ser monitoriza-
truídas e a funcionar correctamente para que garantam que os da por equipamentos calibrados que, preferencialmente, permi-
alimentos congelados se mantenham a uma temperatura infe- tam o registo automático de temperaturas
rior a -18 ºC durante a sua armazenagem
Em todas as zonas de preparação e confecção de alimentos deve haver circuitos limpos e circuitos semi-limpos, pelo que conceito
“marcha-em-frente” entre eles é sempre em paralelo e sem que ocorra cruzamento entre eles, impedindo assim que os alimentos
prontos a servir se cruzem com os alimentos que estão a chegar para serem lavados, preparados, etc
282 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 7. Boas práticas de fabrico na produção de alimentos
Requisitos levados em consideração
As superfícies de trabalho que estão em contacto com os ali- Quando aplicável, os equipamentos estão dotados de meios de controlo e
mentos devem ser de materiais sólidos, lisos, não absorventes, monitorização (p.ex. sondas de temperatura nas câmaras)
não tóxicos, inertes aos alimentos e aos detergentes, duráveis,
de fácil limpeza, manutenção e desinfecção, geralmente em
inox
Os equipamentos e os recipientes a entrar em contacto com os Os contentores de resíduos alimentares devem estar identificados e ade-
alimentos devem ser projectados e construídos com material quadamente construídos com materiais impermeáveis e lisos, de forma a
não tóxico, duráveis, movíveis e/ou desmontáveis de modo a assegurar uma correcta limpeza e desinfecção
assegurar a limpeza e desinfecção adequadas
Equipamento
Frequência da actividade
Breve descrição da acção de manutenção
Responsáveis
Registo
7. Boas práticas de fabrico na produção de alimentos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 283
todo mais adequado para a sua remoção, assim como o método mais indicado
para avaliar a eficácia do processo utilizado (Carvalheiro, 2009).
(L+D)
284 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 7. Boas práticas de fabrico na produção de alimentos
Os métodos de higienização (p. ex.: tempo/temperatura/concentração dos pro-
dutos de higienização) terão de ser validados de forma a garantir a sua eficácia (p.
ex.: eliminação da carga microbiana numa superfície de trabalho, ou a ausência
de resíduos de produtos de higienização). Esta eficácia é verificada periodica-
mente através da recolha de amostras (para controlo analítico) em superfícies
de trabalho ou por inspecção visual, para determinar o grau de implementação
e adaptabilidade do método de higienização. Da análise dos resultados da veri-
ficação podem resultar, sempre que necessário, a alteração do processo ou do
produto de higienização ou a formação/sensibilização do pessoal.
Da autorização da utilização do produto para o uso pretendido Dos meios disponíveis para o enxaguamento das superfícies
Do tipo de contaminação/sujidade presente na superfície Do equipamento de limpeza utilizado nas operações de limpeza
Do nível da contaminação/sujidade presente na superfície Do tipo de superfície a ser limpa/desinfectada
Do tempo disponível para as operações de limpeza e desinfecção Da compatibilidade do agente de desinfecção com o agente de limpeza
Da natureza das superfícies a limpar Do efeito de corrosão do produto
Das características da água (pH, dureza) Do tipo de microrganismos potencialmente presentes
7. Boas práticas de fabrico na produção de alimentos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 285
Carvalheiro, 2009
água potável
enxaguamentos
fria ou morna
pressão água,
remoção de sólidos
rodos, etc.
alcalinos
aplicação de espuma
cáusticos
clorada ou detergente
ou emulsionantes
pressão água,
enxaguamentos
rodos, etc.
quarternários
aplicação de substância
de amónio
desinfectante
e biocida clorado
verificação e análise
da eficácia
figura 7.4
Regras a implementar para
uma adequada higienização
dos estabelecimentos
continua
Usar vestuário adequado e exclusivo sempre que se manipule detergentes Higienizar tectos, paredes, exaustores, extractores e tectos ventilados ape-
e/ou desinfectantes na realização de operações de limpeza e desinfecção nas quando estes não estiverem a ser manipulados
Nunca manipular alimentos do decorrer das operações de limpeza e/ou Assegurar sempre que os ralos de escoamento se apresentam limpos, sem
desinfecção gordura e desentupidos
Manter todos os produtos de limpeza e detsinfecção nas embalagens origi- Desmontar, lavar e desinfectar todos os equipamentos que contactem di-
nais e garantir que o rótulo não é danificado recta ou indirectamente com alimentos após cada utilização
Antes de utilizar qualquer detergente ou desinfectante, consultar sempre as Proteger devidamente os equipamentos sempre que estes não estejam a
respectivas fichas técnicas ou os rótulos ser utilizados
Caso não seja possível identificar o produto, os colaboradores devem infor- Durante a lavagem, colocar o conteúdo do equipamento de frio (câmaras
mar imediatamente o responsável de conservação de refrigerados ou de conservação de congelados) em
equipamento alternativo; caso não seja possível, o conteúdo das câmaras
deverá ser retirado devendo a sua higienização ser realizada o mais rápido
possível
Nunca misturar diferentes produtos de limpeza ou desinfecção, a não ser Na higienização do equipamento de frio deve dar-se especial atenção às
em situações devidamente indicadas borrachas de isolamento e puxadores das portas, prateleiras e paredes
286 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 7. Boas práticas de fabrico na produção de alimentos
Todos os operadores/manipuladores de alimentos são responsáveis pela Lavar e desinfectar os recipientes de lixo sempre que se proceder ao seu
higienização das superfícies, equipamentos e utensílios por eles usados. despejo
Logo são obrigados a cumprir escrupulosamente os planos de higienização
pré-estabelecidos
Respeitar as indicações de dosagem (um desinfectante nunca deve ser usa- Remover todos os restos de alimentos antes de colocar a louça na maquina
do em excesso), de tempo de contacto e modo de aplicação do desinfec- de lavar
tante
Nunca utilizar vassouras para varrer a seco o pavimento das cozinhas e das No final de cada operação de higienização, assinar a folha de controlo de
salas de refeições operações sempre que isso seja exigido
Exemplos
A embalagem secundária, cartonada ou plástica das embalagens deve ficar na área técnica e o material (p.ex. filme,
plásticos de carne), deve transitar apenas com a embalagem primária para as áreas de manipulação
As quebras de produtos cárneos obtidos durante a etapa da transformação são colocadas num contentor e, ao fim de
duas horas a três horas são despejadas no contentor de resíduos que diariamente é recolhido
7. Boas práticas de fabrico na produção de alimentos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 287
De modo a evitar contaminações cruzadas, provocadas pelos utensílios de corte, deve proceder-se à utilização
de códigos de cores, para as placas de corte, facas e outros utensílios.
Carvalheiro, 2009
Cor Tipo de Produto
tabela 7.1
Exemplos de códigos
de cor para facas
tabela 7.2
Limites de temperatura de
trabalho para diversos
produtos
7.5 Programa de controlo de pragas
As pragas (roedores, insectos, rastejantes, etc.) são portadores de microrganis-
mos patogénicos que podem vir a colocar em risco a salubridade dos géne-
ros alimentícios e consequentemente a saúde do consumidor final (Carvalheiro,
2009).
288 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 7. Boas práticas de fabrico na produção de alimentos
Prevenção de acesso
As infestações por pragas ocorrem em locais que possam servir como ninho Ao caminhar pelo exterior do estabelecimento, todos os responsáveis pela
e onde haja disponibilidade de alimento. As instalações devem ser man- qualidade e supervisão devem observar se as portas e as janelas estão fe-
tidas em boas condições de conservação para evitar o acesso de pragas chadas e vedadas de forma apropriada, ou se têm telas, que devem estar
e eliminar locais potenciais para sua procriação. Orifícios, drenos e outros intactas e ser de tamanho suficiente para prevenir a entrada das pragas.
lugares onde as pragas possam ter acesso devem ser mantidos fechados.
As redes de arame colocadas em janelas, portas e ventiladores, reduzem Deve garantir-se que os sistemas de drenagem estejam devidamente
a probabilidade de entrada. Os animais devem, sempre que possível, ser limpos e que não haja nenhum obstáculo que impeça o desaguamento
excluídos da área envolvente e devem ser tapados quaisquer buracos que apropriado ou permita o refúgio ou entrada de pragas. Os obstáculos do
possam vir a ser atravessados. desaguamento podem manter pragas como baratas ou moscas. Também é
importante garantir que as tampas de desaguamento estejam limpas e em
boas condições. Essas observações sobre desagues e tampas referem-se
tanto à parte externa como à interna do estabelecimento e, fazem parte do
plano de higienização da unidade.
Numa planta das instalações, ao se estabelecer e implementar o programa Os roedores e a maioria das outras pragas não exigem uma grande abertura
de controlo de pragas, existem várias áreas de preocupação, incluindo, mas para entrar. Qualquer abertura identificada deve ser vedada com material
não se limitando a: planta e terreno; estrutura e projecto; equipamentos e adequado, como fibra metálica ou preenchimento para evitar uma entrada
utensílios; manipulação; disposição de resíduos; uso de pesticidas; outras potencial. Às vezes, é útil procurar na parte interna do estabelecimento, sob
medidas de controlo. iluminação ténue, por áreas onde a luz do dia possa mostrar uma abertura
de tamanho que permita a entrada de pragas.
As inspecções e manutenções exteriores devem garantir que os terrenos Os dispositivos, insecto-coladores especializados são, geralmente, utiliza-
estejam limpos de arbustos altos, matagais e montes de resíduos que po- dos para controlar pragas nomeadamente aéreas. Deve-se ter cuidado para
dem estimular as pragas a aproximar-se e, possivelmente, entrar na área garantir que esses dispositivos sejam instalados e mantidos de acordo com
de processamento e armazenamento. Os roedores e a maioria das outras as recomendações do fabricante.
pragas não se sentem seguros em espaços abertos, preferindo a segurança
propiciada por agrupamentos de plantas ou vegetação mal cuidada.
As inspecções também devem incluir a identificação de locais potenciais As práticas eficientes de higiene podem reduzir significativamente o pro-
para repouso ou formação de ninhos de pássaros, que representam uma blema de pragas. Caso não se mantenham as normas de higiene implemen-
fonte comum de patogénicos. tadas, há um aumento de lixo, resíduos e desordem, atraindo roedores e
outras pragas, que podem entrar nas instalações. Quando isso ocorre, criam
um problema de difícil resolução.
7. Boas práticas de fabrico na produção de alimentos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 289
Infestação e refúgios
A disponibilidade de comida e água incentiva a infestação e refúgio das pragas. As fontes de ali-
mentação potenciais devem ser hermeticamente armazenadas, em recipientes à prova de pragas
e/ou empilhadas acima do piso e longe das paredes. As partes internas e externas dos locais de-
vem ser mantidas limpas e, o lixo deve ser guardado em recipientes fechados e transportado para
o contentor de acordo com a especificidade dos resíduos e o plano de movimentação e recolha
de resíduos da unidade
Inspecção e monitorização
290 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 7. Boas práticas de fabrico na produção de alimentos
Mapa com a localização das armadilhas para roedores, localização da isca e dos insecto-coladores
Programa de manutenção das armadilhas para roedores, das iscas, e dos insecto-coladores
Relação de todos os pesticidas usados no programa, inclusive uma cópia das informações técnicas sobre eles
Procedimentos operacionais padrão para aplicação de pesticida pelos funcionários do estabelecimento
Registar formação de técnicas de controlo de pragas dos trabalhadores que prestam serviço na unidade
Cópias de todos os relatórios emitidos por um operador externo de controlo de pragas, indicando todos os insectos e/ou roedores encontrados,
as áreas de actividade das pragas, a aplicação de qualquer pesticida (o nome da substância química e a quantidade aplicada)
Relatórios de auditorias de todas as inspecções internas para controlo de pragas, com as acções correctivas enumeradas
Relatórios de todos os problemas referentes à parte física do estabelecimento ou aos equipamentos que não estejam de acordo com o programa
de higienização das instalações, detalhando explicitamente as acções correctivas tomadas e quem as tomou
As instalações devem ser convenientemente ventiladas de modo a prevenir a acumulação de humidade e calor excessivo e para mini-
mizar a condensação no interior do edifício, no equipamento e no produto
Os sistemas de ventilação devem ser projectados e construídos de modo a minimizar a contaminação dos alimentos por via do ar
Esses sistemas têm como objectivo controlar a temperatura e humidade, por remoção de calor em excesso
Exaustão
Os sistemas de exaustão são capazes de assegurar a remoção de fumos e de vapor que se produzem nos processos, evitando assim
que estes retornem à unidade e se espalhem por esta, transmitindo odores estranhos e humidade a outros produtos
Os filtros fazem parte do plano de manutenção preventivo
Os sistemas de exaustão estão equipados com ventilação compensada para que em áreas onde exista entrada de ar, exista uma reti-
rada e uma entrada equilibrada
7. Boas práticas de fabrico na produção de alimentos Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal 291
292 Manual de Conservação e Transformação de Produtos de origem Animal
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