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ROBERT WALSER, PAUL CÉLAN et allie… d’après AVELINO SÁ

« No princípio foi o mito. Assim como o grande Deus inspirava as almas dos índios, gregos e
germanos, ansiosos por se expressarem, também agora volta a inspirar diariamente a alma de cada
criança.
Eu não sabia ainda como se chamavam os lagos, las montanhas e as correntes da minha terra natal, mas
já contemplava, ensimesmado, a superfície das águas, de cor azul verdoso onde reverberava a de quando
em quando um raio temeroso de sol.“ 1

A focagem incide em ideias e conceitos que considero pertinentes na análise da obra


de Avelino Sá que acompanho há cerca de 15 anos. Proponho uma caminhada iconográfica,
trajeto entre obras emblemáticas que são denotativas da linguagem estética e poiética que
veio consolidando, em minha opinião. Acresce, agora a imposição de uma caminhada estética -
Walkscape (Francesco Carreri dixit)…um sentido de marcha, longe de afinidades regradas ou
militares, antes a marcha dos dias, da persistência, da convicção no que antecede, permanece
durante a produção da obra e nela perdura, depois em estado de disponibilidade à
dependência de outrem que não somente o seu autor. Para, com os seus poetas e filósofos
diletos aceder a um espaço redondo, onde o ser reside na depurada aceção conciliadora entre
a palavra e a imagem.

“La marche est le moyen analogique d’atteindre à cette simplicité du langage et de l’être.” 2

Nas obras de Avelino Sá destaca-se:


• Escrita e imagem: caligrafia indecifrável, compulsiva e existencial;

1HESSE, H. (1904) Peter Camezind. Berlin: Fischer Verlag, p.1


2LÉVY, B. (2007) “La promenade” de Robert Walser in Marche et paysage. Les chemins de la géopoétique. Genève:
Metropólis
• Silêncio: imagem escrita na incerteza, na solidão, na perda dos outros, quiçá mesmo
de si;
• Paisagem: caminhadas estéticas (para que a alma sobreviva) – entre o passeante, o
Flâneur e o Wanderer.

Ainda, entre os autores de “cabeceira”, eis uma aproximação porventura mais


dolorosamente “erudita”, onde se plasma as verdades de Robert Walser:
• a ekfrasis em espelho revertido, até às residências do termo silentium, situando
• a ordem e a sua consignação antropológica-filosófica e simbólica: não existência,
tranquila e quieta, de sentido vide significado até
• à presença versus palimpsesto de referencialidades: perceptos autorais da pintura,
desenho e poesia…
E, ainda, uma leitura mais subjetivada que apenas a receção estética, pelo exercício da sua
fruição e extrapolações significantes (abertas), disponível para o espetador-leitor de Avelino
Sá. No mais, o resto é paisagem, é não representativo, pois tudo o resto é silêncio. O vazio
absorve tanta realidade que se exaure em linhas e pensa numa ausência extremada de cor, na
dissolução pintada de existir singularmente. Avelino Sá apela ao silêncio, trata-o, fortalece-o. É
capaz de ultrapassar as restrições que Henri-Jacques Stiker assinalou: que é uma tarefa quase
contraditória que se empreende, quando se pretende dissertar sobre o silêncio, entendendo-
se este como estado onde domina a ausência de palavras ou mesmo a sua abolição total.3

“O caminhante é, em muitos aspetos, um homem primitivo, do mesmo modo que o nómada é


mais primitivo do que o camponês. Mas vencer o sedentarismo e desprezar as fronteiras
converte as pessoas da minha classe em postes indicadores do futuro.”4

Caminhar agrega, nas suas díspares instâncias e funções, a dimensão lúdica, o enxuto
prazer de caminhar, promulgado enquanto dimensão artística. Por um lado, caminhar hoje
capacita à “construção” da paisagem, em velocidade lenta5, contrariando as caraterísticas do
contemporâneo. Implica, por outro lado, a acumulação dos sentidos capitais, subjacentes às
argumentações dos autores anteriormente citados, entre outros. Perspetiva-se, hoje, a
caminhada na aceção do artista que em pleno ato introspetivo, operacionaliza vidência
desconstrutiva (e edificativa), no contexto de uma estética qualificadora da vida humana na
cidade que o absorve.
O ato de caminhar ajusta-se à responsabilidade pessoal individuada, ao exercício comunitário
numa aceção societária. É decidido sob condições racionalizadoras e/ou define-se por razões,
mais estritamente instintivas ou pulsionais, assumindo caraterísticas exortadas por quem
interprende a caminhada. Ao evocar o ato de caminhar, este é localizado, quase de imediato a
uma visão idealizada, no seio da natureza, ainda que tal ato se desenhe amiúde em cenários
urbanos ou campestres díspares.
A Paisagem, com ou sem imagens deliberadas em obra ou palavra de autor, carrega e
aprisiona sempre alguma imagem de paisagem em modo pretérito imperfeito do subjuntivo:
se a paisagem tivesse imagem…se a viagem entrasse dentro da paisagem…se a memória
agarrasse a paisagem fluída, fugaz da viagem, se o pensamento quisesse imagem duradoira da
paisagem… Enunciam-se incertezas comuns; listam-se desejos; quase se afirmam

3 STIKER, H. J. « SILENCE », Encyclopædia Universalis [en ligne], consulté le 9 décembre 2016.


URL: http://www.universalis.fr/encyclopedie/silence/
4 HESSE, H. (1978) El caminhante. BCN: Brugera Libro Amigo, p.9
5 Cf. SOICHET, H. (2013) Photographie & Mobilité – pratiques artistiques contemporaines en déplacement. Paris:

L’Harmattan
probabilidades singulares, manifestam- se sentimentos e razões; formulam-se convicções que
são, muito por certo, incredulidades; confessam-se dúvidas: eis os reinos do modo pretérito
imperfeito do subjuntivo.
A duração da caminhada, o ritmo desregulador da marcha (que acompanha o ritmo
cardíaco, tanto quanto o da alma) obriga ao estado de uma vivência distinta do que seja
“ficar”; é lentidão e quietude. O que o corpo diz de é e está (em devir e mudança?),
pertencendo de forma distendida a cada segmento de espaço onde se move, onde
normalmente, se respiraria em aceleração e trânsito. Todavia, a efemeridade resiste à demora
e à duração, esvaindo-se inexoravelmente numa pertença que se redime apenas caso o sujeito
seja capaz de se instaurar. O vento, as nuvens ou o céu parado em cor, enxotam o efémero,
celebrando-o pois se assumem os elementos primordiais (que estão e são na paisagem) como
matéria consubstanciada e identitária de sua natureza.

“O tempo ali pertencia-me, não eternidades de espera.”6

Em registo gráfico, pintado, fotográfico ou videográfico, no cinema como na prosa e na


poesia, presentificam-se as imagens de existências, encenações e/ou simulacros com tópicos
de genuinidade. Assim se demonstram subjetividades de autores nos territórios estéticos que
os rodeiam – esporádica ou mais duradoiramente. Seja um passeante, deambulador, flâneur,
Wanderer, peregrino, caminhante… et allie… uma qualquer, entre as distintas tipologias de
viajantes…os filósofos e os artistas – que são pessoas – asseguram-nos a autenticidade, tanto
quanto nos asseguram uma ilusão gestante. Marcam, estipulam ou estabelecem com rigor –
que pode oscilar entre o topográfico e o metafísico - lugares e territórios específicos, onde as

6
RUBEN A. (1992) O mundo à minha procura. vol.I, Lisboa: Assírio & Alvim, p.62
confluências de imaginário e real definem o humano, onde paisagem e natureza entrelaçam
vidas.
“Desenho a casa no meu caderno de apontamentos e, os meus olhos despedem-se do telhado
alemão, das vigas e fachadas alemãs, de muitas coisas íntimas e familiares. Uma vez mais sinto
um amor intensificado por tudo o pátrio, porque se trata de uma despedida. Amanhã amarei
outros telhados, outras cabanas. Não deixarei aquí o meu coração, como se diz nas cartas de
amor.”7

“Verifica-se uma suspensão, constata-se uma interrupção, preenchida por um suposto


“vazio”. Não se trata de uma manifestação do intrínseco singular, não é uma afloração de um
qualquer dimensionamento interior, autognósico. Tampouco é apenas um silêncio, no que seja
a aceção mais logística ou pragmática do termo. Poder-se-á comentar a existência – em
termos iconográficos – de certos retratos que nos silenciam, que por um ou outro motivo nos
calam. A força imagética do silencia tomaria assim formato antropomórfico, recolando
diretamente o sujeito no objeto silente.
As imagens, a ponderar, integram-se numa obra artística que Avelino Sá desenvolve
desde há 2 décadas, sob formato de Séries, onde se evidenciam ilações e evidências subtis
subsumidas – também - ao Silentio. Fale-se de Séries que integram desenhos, pinturas e/ou
encausticas, entre uma espessura que se volumetriza subtilmente, outras plasmando-se numa
fluidez gráfica mais imanente. Quer em uns, como em outros casos, nas suas criações
transparecem substâncias em conceitos, harmonizadas numa abstração e ausência de
ornamentos e atributos que parafraseia – exatamente – a representação psicoafetiva do
silêncio.
As obras de Avelino Sá são reflexões, excertos de um pensamento e discurso crítico
que o artista consolidou ao longo dos anos. Nesse pensamento, fundado nos seus escritores,
poetas, filósofos e místicos que escolheu, imagino que motivado pelas suas afinidades eletivas,
identificam-se denominadores comuns, presenças invisíveis – quando não visibilizadas nos
nomes, muito em particular de Paul Célan e Matsuo Bashô. Sob auspícios e cronologias
diferentes, todos eles convocam o silêncio, o repúdio pelo excessivo, a concentração no
essencial, residindo no âmago substantivo.
As mãos são instrumentos silenciosos que conduzem os instrumentos de escrita, de
desenho ou pintura sobre as superfícies que escolhem pela leviandade da superfície tocada
pelo tato. Ao desenhar, ao escrever, ao pintar - ao dominar a técnica da encaustica -
produzem-se sons breves, silentes, meditados pela densidade visual que geram. Os ruídos
insinuados são uma escrita. Os aromas que se dispersam são uma escrita. Os sinais visuais são
uma escrita. Escreveu Paul Valéry que “o silêncio é o tempo perfumado por ruídos.” E Marc de
Smedt: “O silêncio é a cor dos acontecimentos.” Então, sobressai quanto os sentidos são
chamados para que se distingam, na representação interna que se dobra dentro de cada
pessoa, as provas do silêncio. Assinala-se o seu esplendor, expandido ou contraído em linhas,
traços, manchas, caligrafias destacadas ou rasuradas, simulando palimpsestos. As evidências
do silêncio visibilizado são inúmeras, correspondendo bastante ao que sejam os ritmos
anímicos e pulsáteis de quem se autorize cativá-lo numa poética decidida.
Na obra de Avelino Sá coincidem ambas perspetivas. Por um lado, o domínio de um
fazer, que não mais, obviamente, procura o mimetismo visual, antes a coerência intrínseca
entre a sua visão interior, e mental, e a lisibilidade externalizada no desenho ou pintura
transposta em consonância, em uníssono – mimesis numa assunção primordial do termo que

7
HESSE, H. (1978) p. 10
se revia no ato e na ação de teor performático. Por outro lado, a atuação surge conduzida por
seres invisíveis que se desprendem e alastram no ambiente dos caminhos, nos passeios, no
ateliê, instaurando suspensões do real.

…Pelas imagens
entramos em diálogo
com o indizível 8

Nos desenhos e encausticas vêm-se as imagens exteriores permitidas, depois de


transporem a sua condição de internalizadas, depois de resultarem, de advirem em
constructos visíveis. São, efetivamente, visões iniciadas no interior que cumprem um círculo
estético. Nas obras de Avelino Sá persiste essa aceção/assunção, convertendo cada uma das
peças em relíquias exíguas do fundamental. Com uma noção rigorosa do essencial, as suas
composições são compensadas e cumprindo a proporção justa de elementos celebrados.

O teu silêncio recolhe-o e guarda-o, partido, a um canto…


Minha ideia de ti é um cadáver que o mar traz à praia…e entanto
Tu és a tela irreal em que erro em cor a minha arte…9

O conceito de silêncio pode ser definido em múltiplas aceções, garantindo a diversidade


de conhecimentos científicos que o abordam, ao longo da história da cultura e da tecnologia.
Quando uma avaria acontece, num qualquer dispositivo audiovisual, designa-se por uma
suspensão técnica ou tecnológica, isto é, acontece um silêncio, assinalou David le Breton.
Verifica-se uma suspensão, constata-se uma interrupção preenchida por um suposto “vazio”…

8
HATHERLY, A. (2007) “O que é o espaço?”, O Pavão Negro- Lisboa: Assírio & Alvim, p.37
9 PESSOA, F. (1942) “Hora Absurda”, Poesias. Lisboa:Ática (15ª ed. 1995), p. 21.
Não se trata de uma manifestação do intrínseco singular, não é uma afloração de um qualquer
dimensionamento interior, autognósico. Tampouco é apenas um silêncio, no que seja a aceção
mais logística ou pragmática do termo. Confunde-se, todavia, a ausência/suspensão de
realidade com a situação de silêncio extremo, compulsivo, radicado nos territórios do
imaginário, povoados por interpretações sobreponíveis, abraçando a consignação do silêncio.
Na realidade, os desenhos, as pinturas, as fotografias são sempre “mudas” e insonoras na
maioria dos casos. O que não significa ausência de conteúdos que sistematizem “conversas” ou
pensamentos que se “ouçam”. Os sinais, os símbolos, os ícones são calados mas não tácitos:

Cada coisa está isolada ante os meus sentidos,


que a aceita impassível: um ciclo de silêncio.
Cada coisa na escuridão posso sabê-la,
como sei que o meu sangue circula nas veias. 10

Segundo Michel Maffesoli, Heidegger considerava que na necessidade de pensar


residia “o destino do Ser no seu silêncio” ou ainda “a concretização eficaz daquilo que é
entendido como silêncio.”11 Ao pensar o silêncio enquanto imagem/ na imagem corresponde-
se ao desejo – involuntário e consequente – de materializar ainda que sub-repticiamente
aquilo que é invisível, imaterial. Fica-se mais tranquilo, talvez. O tempo silencia a ação, torna-a
memória ou musealiza-a, se assim for caso. O espaço, como o tempo, é o grande continente
do silêncio; sabe-se ser um propagador maior de emissão, de reverberação de sons, ruídos e
outras existências, de teor quer sonoro, quer visual, quer olfativo, quer táctil, quer de
paladar...assim se reencarnando variações sobre os tópicos antagónicos, mas todavia
suscetíveis de serem comunicantes.
Ao pensar os caminhos solitários, as paisagens enxutas e sem ornamentos acessórios,
emerge a ideia dos sons, da música no entendimento de aceções diferenciadas de silêncio de
natureza voluntária ou pulsional. O silentium situa-se na ordem, na consignação semiológica:

Le silence uni de l’hiver


Est remplacé par l’air
Par un silence à ramage ;
Chaque voix qui accourt
Y ajoute un contour,
Y parfait une image.12

Maria de Fátima Lambert

Centro Cultural Adães Bermudes


Avito - 2019

10 PAVESE, C. (1997) “Mania da solidão”, Trabalhar cansa. Lisboa: Ed. Cotovia, p.73
11 MAFFESOLI, M. (2016) La parole du silence, Paris: Les Éditions du Cerf, p.52
12 RILKE, R.M. (1978) “Le silence uni de l’hiver”, Verger – suivis d’autres poèmes français. Paris: Gallimard, p.71

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