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O corpo e a mente

João Pereira dos Santos

Resumo: neste ensaio, procuramos evidenciar, primeiramente, as dificuldades suscitadas pelo


dualismo cartesiano acerca da mente e do corpo. De seguida, apresentamos o behaviourismo
enfraquecido de Gilbert Ryle, como uma proposta de resolução desta dicotomia. Depois, expomos a
perspectiva de Anthony Kenny que defende uma posição intermédia entre o dualismo e o
behaviourismo, recuperando a argumentação de Wittgenstein. Em jeito de conclusão, mostramos a
nossa perspectiva acerca das teses expostas.

Palavras-chave: corpo, mente, Descartes, Ryle, Kenny, Wittgenstein.

Depois de ter empreendido o projecto de uma dúvida metódica e hiperbólica, que passasse
pela eliminação de todas as opiniões que não são absolutamente certas e indubitáveis, e daquelas
que são manifestamente falsas, a fim de encontrar algo que fosse «firme e constante» 1 nas ciências,
Descartes verifica que é uma «coisa pensante» ou uma «res cogitans». De acordo com o filósofo, se
o eu não fosse uma substância cujo atributo identificativo é pensar, não teria sido possível de
empreender aquele projecto cartesiano. Assim, Descartes considera que o eu enquanto «res
cogitans» é a primeira evidência, após ter sido instaurada a dúvida, e constata que esta evidência é o
fundamento de todo o conhecimento possível. Ora, a «coisa pensante» é a mente, embora Descartes
reduza os estados e os processos mentais às faculdades da consciência, como o entendimento, a
vontade, a imaginação e o sentimento. A consciência, por sua vez, é identificada com a consciência
de si2. Como conclui o filósofo: «Mas, então, que sou eu? Uma coisa que pensa. E o que é uma
coisa que pensa? É uma coisa que duvida, que concebe, que afirma, que nega, que quer, que não
quer, que imagina e que sente.»3
Nesta linha de pensamento, percebemos que existe uma primazia da mente, relativamente às
«coisas» materiais, como o próprio corpo e os outros objectos físicos, em termos ontológicos 4 e
epistemológicos. O que dá origem a uma concepção de ser humano enquanto uma realidade
dividida entre a mente e o corpo. Ou seja, a partir do momento em que Descartes verifica que o eu é
uma «coisa pensante», a mente é entendida como uma substância distinta do corpo. Nas palavras de

1
Descartes, Meditações Metafísicas, pág. 9.
2
«(...) he identified consciousness with self-consciousness.». (Kenny, «Descartes' Myth» in The Metaphysics of Mind,
pág. 9).
3
Descartes, Meditações Metafísicas, pág. 28.
4
«(...) sou apenas uma coisa que pensa, (...). Não sou este conjunto de membros a que se chama o corpo humano (...)»
(Idem, pág. 27).
Ryle: «Uma pessoa vive portanto através de duas histórias colaterais, uma que consiste no que
acontece no e ao seu corpo, outra que consiste no que acontece na e à sua mente.5»
Uma das diferenças, entre mente e corpo, é a crença de que a mente é um conjunto de
eventos e processos privados que ocorrem apenas numa dimensão temporal, enquanto que o corpo é
uma coisa pública cujos fenómenos estão situados no espaço e no tempo 6. Contrariamente à
natureza imaterial da «res cogitans», o corpo é pensado como parte integrante da matéria, ou seja,
como extensão em movimento7. Donde se segue que podemos conhecer os corpos pelas leis da
mecânica8, ao passo que somos informados dos nossos conteúdos mentais pela nossa capacidade
introspectiva. Assim, estes conteúdos são entendidos, por oposição aos fenómenos físicos, como
processos não-mecânicos. Por isso, podemos encontrar uma relação causal e directa entre os corpos,
mas não entre as mentes9. Uma vez que as leis do mecanicismo podem explicar os movimentos
espaciais enquanto efeitos de outros movimentos espaciais, supõe-se a existência de outras leis que
expliquem as operações não-espaciais das mentes como efeitos de outras operações não-espaciais
das mentes10.
Se quisermos explicar mecanicamente as relações entre as mentes, é necessário que
utilizemos o espaço físico como meio11. O que significa que, para que uma pessoa presuma a
existência de estados mentais de outra, é necessário que ela estabeleça uma analogia problemática
entre as suas vivências psico-somáticas e os comportamentos observados noutra pessoa. Deste
modo, ela poderá pensar que, uma vez que os seus comportamentos se seguem a determinados
conteúdos mentais, os comportamentos da outra pessoa também deverão corresponder ao seu estado
mental. Donde se segue que, para além do eu enquanto «coisa pensante», não é evidente que
existam outras mentes. Ora, o carácter problemático desta inferência tem origem na pressuposição
de que o eu tem um acesso imediato à sua mente, e um acesso mediato ao mundo exterior. O que
desemboca no solipsismo. Ou seja, mesmo que haja a crença de que existem outras mentes, não é
possível referir, sem inferências problemáticas, as suas qualidades intrínsecas e/ou descrever os seus

5
«A person therefore lives through two collateral histories, one consisting of what happens in and to his body, the
other consisting of what happens in and to his mind. (Ryle, «Descartes' Myth» in The Concept of Mind, pág. 11;
tradução minha.)
6
«It is a necessary feature of what has physical existence that it is in space amd time; it is a necessary feature of
what has mental existence that it is in time.» (Ryle, «Descartes' Myth» in The Concept of Mind, pág. 12).
7
«If you wanted to put Descartes' main ideas on the back of a postcard you would need just two sentences: man is a
thinking mind; matter is extension in motion.» (Kenny, «Descartes' Myth» in The Metaphysics of Mind, pág. 1).
8
«(...) por corpo, entendo tudo o que pode ser circunscrito por qualquer figura; que pode ser compreendido num
qualquer lugar e encher um espaço (...); que pode ser movido de várias maneiras, não por si próprio, mas por
qualquer coisa que lhe toque e de que ele receba a impressão.» (Descartes, Meditações Metafísicas, pág. 26).
9
«Material objects are situated in a common field, known as 'space', and what happens to one body in one part of
space is mechanically connected with what happpens to other bodies in other parts of space. But mental happenings
occure in insulated fields, known as 'minds', and there is, apart maybe from telepathy, no direct causal connection
between what happens in one mind and what happens in another..» (Ryle, «Descartes' Myth» in The Concept of
Mind, pág. 12).
10
Cf. Ryle, «Descartes' Myth» in The Concept of Mind, pág. 15.
11
Cf. Ryle, «Descartes' Myth» in The Concept of Mind, pág. 15.
processos12. Se a existência da mente do eu é a única certeza indubitável, torna-se possível pensar
na realidade exterior como uma projecção mental do eu.
Além disso, segundo Descartes, a mente tem um estatuto diferente da existência corporal 13,
na medida em que é pensada como a essência do sujeito cognoscente, e aquilo a que ele tem um
acesso priveligiado, contrariamente ao corpo que assume um carácter secundário, incerto e até
mesmo insignificante, como tudo aquilo que não é intrínseco à «coisa pensante». Por isso,
Descartes pergunta: «Poderei ainda estar certo de ter a mais insignificante das características que
atribuí, acima, à natureza corpórea?14». As relações entre o corpo e a mente permanecem, portanto,
obscuras15. Ou melhor, a única relação entre a componente física e a mental é aquela que transcende
as regras da causalidade e da evidência 16. O que contribui para que seja acentuada a dicotomia entre
a mente e o corpo.
Tendo em vista uma proposta de resolução deste dualismo, Ryle encontra aquilo a que
chama «erro categorial». Segundo este filósofo, Descartes estaria a considerar a mente e o corpo
como pertencendo a uma mesma categoria. O que teria originado a tendência para estabelecer, em
termos lógicos, conjunções e disjunções entre a «res cogitans» e a «res extensa». Na verdade, diz-
nos Ryle, as dimensões corporal e mental pertencem a diferentes categorias. Logo, não será
razoável considerar uma dicotomia entre ambas. Como afirma o autor de The Concept of Mind,
«(...) a frase "ocorrem processos mentais" não significa a mesma espécie de coisa que "ocorrem
processos físicos", e portanto não faz sentido fazer uma conjunção ou uma disjunção das duas 17.».
Assim, Ryle propõe que pensemos o corpo como uma unidade complexa e organizada, à
semelhança da mente, embora esta última como uma substância e estrutura de espécie diferente18.
A consequência mais imediata do «erro categorial», segundo Ryle, é a representação da «(...)
pessoa enquanto um fantasma misteriosamente escondido numa máquina (...) 19». Ou seja, a pessoa é
entendida como uma «res cogitans» enigmática e oculta num corpo mecânico. Contrariamente ao
corpo, a mente não existe no espaço, não mostra ter movimentos, nem modificações materiais. A
mente é descrita em termos negativos em relação ao corpo: a mente é, para Descartes, um não-
corpo. A isso se deve a constatação de Ryle de que, na filosofia cartesiana, existe um carácter
12
Cf. Ryle, «Descartes' Myth» in The Concept of Mind, pág. 13.
13
«It is assumed that there are two different kinds of existence or status. What exists or happens may have the status of
physical existence, or it may have the status of mental existence.» (Ibidem)
14
Descartes, Meditações Metafísicas, pág. 26.
15
Cf. Ryle, «Descartes' Myth» in The Concept of Mind, pág. 11.
16
«According to dualism the two separate realms of mental and physical realities interact, if at all, only in a
mysterious manner that transcends the normal rules of causality and evidence.» (Kenny, «Descartes' Myth» in The
Metaphysics of Mind, pág. 1).
17
«(...) the phrase 'there occur mental process' does not mean the same sort of thing as 'there occur physical processes',
and, therefore, that makes no sense to conjoin or disjoin the two.» (Ryle, «Descartes' Myth» in The Concept of Mind,
pág. 17; tadução minha.)
18
Cf. Ryle, «Descartes' Myth» in The Concept of Mind, pág. 17.
19
«The representation of a person as a ghost mysteriously ensconsed in a machine (...)» (Idem, pág. 15; tadução
minha.)
inefável das regras que explicam a mente, e uma grande dificuldade teórica em explicar como
mentes podiam influenciar os corpos e ser influenciadas por eles20.
Ora, uma vez que Ryle considera que a mente e o corpo não pertencem a uma única
cartegoria, assim como critica que os processos mentais sejam pensados enquanto processos
ocultos, o filósofo admite a possibilidade de haver uma expressão dos conteúdos mentais pelo
corpo. Ou seja, na sua perspectiva, os conteúdos mentais tornam-se susceptíveis de pertencerem ao
domínio público. O que resulta numa atitude behaviourista ou comportamentalista, na medida em
que se procura defender que os conteúdos mentais são expressos pelo comportamento físico. No
entanto, podemos dizer que é um comportamentalismo enfraquecido, porque, como dissemos
acima, os processos mentais podem ser manifestados publicamente, mas não são redutíveis a estas
manifestações.
Mas, nalguns casos, a ênfase na expressão corporal pode dar origem à negação dos
conteúdos mentais, a ponto de alguns behaviouristas considerarem que qualquer referência à mente
é, na realidade, uma referência ao comportamento corporal. Como afirma Kenny, o behavourismo
mais extremo procura dizer que não temos pensamentos e sentimentos privados, e que a consciência
deles é uma inferência retorcida, elaborada a partir da observação das nossas manifestações
externas. Quanto ao dualismo, diz-nos o filósofo, podemos verificar que ele nos conduz a um
cepticismo acerca da existência de outras mentes para além da nossa. Resumindo: o behavourismo
questiona aquilo que sabemos sobre as nossas mentes; o dualismo põe em causa aquilo que sabemos
sobre outras mentes21.
Em The Metaphysics of Mind, Kenny afirma que «Wittgenstein pensou que, tanto os
dualistas como os behaviouristas, foram vítimas de uma confusão 22.». Segundo Kenny, Wittgenstein
permaneceu numa situação intermédia entre o dualismo e o behaviourismo. Este filósofo terá
considerado que, nem os estados e eventos mentais são redutíveis às expressões corporais, nem são
totalmente separados delas. Assim, mesmo nos nossos pensamentos mais privados, utilizamos o
meio da linguagem, que está essencialmente ligada à expressão corporal.
Afastando-se de uma perspectiva behaviourista, Wittgenstein não negou a possibilidade de
haver pensamentos privados, embora tenha também demonstrado a incoerência do dualismo
cartesiano23. Contra este dualismo, Wittgenstein desenvolve o argumento da linguagem privada, em
que procura mostrar a inviabilidade de uma linguagem em que apenas o eu entenderia os seus
signos e aquilo que eles referem, na medida em que esses conteúdos poderiam ser manifestados

20
«(...) the problem how a person's mind and body influence one another is notoriously charged with theoretical
difficulties.» (Ryle, «Descartes' Myth» in The Concept of Mind, pág. 12).
21
Cf. Kenny, The Metaphysics of Mind, pág. 3
22
«(...) Wittgenstein thought that both dualists and behaviourists were victims of confusion.» (The Metaphysics of
Mind, pág. 4; tadução minha).
23
Cf. Kenny, The Metaphysics of Mind, pág. 4.
publicamente24. Por isso, este argumento mostra a falta de sentido de uma atitude solipsista, como
aquela que deriva da primazia cartesiana do eu enquanto «coisa pensante». Para que seja
estabelecida a significação de uma linguagem, é necessário um critério público 25. O mesmo será
dizer que uma linguagem solipsista seria desprovida de sentido. Portanto, argumenta Wittgenstein,
não é viável elaborar uma linguagem privada.
Contrariamente ao sistema cartesiano, Wittgenstein não encontra dificuldade em explicar as
relações entre a mente e o corpo. Segundo Kenny, aquele filósofo não verifica uma conexão causal
entre mente e corpo, como noutras relações causais onde encontramos uma concomitância entre
diferentes géneros de fenómenos. Wittgenstein afirma que podemos entender a expressão física
como um critério do processo mental. É parte constituinte do conceito de um determinado processo
mental corresponder uma determinada manifestação cujas características lhe são inerentes. Assim,
para compreender o sentido de algumas palavras que denotam estados mentais, é necessário
compreender a sua relação com expressões particulares do corpo. Mas esta relação não é
estabelecida pela observação da co-ocorrência de dois conjuntos de coisas indentificáveis
independentemente um do outro26. Pelo contrário, conseguimos estabelecer uma relação entre a
mente e o corpo, na medida em que sabemos identificar a relação entre estas duas componentes do
ser humano. Assim, podemos conceber o homem como uma unidade.
Na nossa perspectiva, a tese de Wittgenstein, tal como foi exposta por Kenny, é aquela que
melhor satisfaz a exigência de sensatez e razoabilidade. De facto, o senso comum diz-nos que o
homem não é redutível à sua componente mental, nem aos seus comportamentos físicos.
Diariamente, cremos numa unidade entre o corpo e a mente. Além disso, retiramos consequências
éticas, a partir da concepção filosófica do homem como um ser uno. Não cremos que seja possível
respeitar o homem pelos seus conteúdos mentais ou pelos comportamentos físicos, reduzindo-o a
uma destas componentes. Acreditamos que o respeito pelo homem pode começar por considerá-lo
como uma totalidade integral.

24
Cf. Wittgenstein, Investigações filosóficas, § 256, pág. 341.
25
Cf. Wittgenstein, Investigações filosóficas, § 269, pp. 346 e 347.
26
Cf. Kenny, The Metaphysics of Mind, pág. 4 e 5.
Bibliografia

DESCARTES, René, Meditações Metafísicas, Porto, Rés-Editora, 2003.


KENNY, Anthony, The Metaphysics of Mind, Oxford/ New York, Oxford University Press, s/d.
RYLE, Gilbert, The Concept of Mind, Chicago, The University of Chicago Press, 2003.
WITTGENSTEIN, Ludwig, Tratado Lógico-Filosófico, Investigações filosóficas, tradução e
prefácio de M.S. Lourenço, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 2011.

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