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A Democracia Racial Reabilitada*

Kleber Chagas Cerqueira, Professor de História e Consultor Legislativo da Câmara Legislativa do


DF

kleberch@gmail.com

A edição da “revista Veja” de 6 de junho traz, como matéria de capa, um virulento ataque às
políticas afirmativas, em especial às cotas para negros nas universidades. Como gancho a
história dos gêmeos Alex e Alan, um aceito, outro rejeitado na cota racial estabelecida pela
Universidade de Brasília para inscrição para seu vestibular. A indignação contra o erro da
banca examinadora da UnB serviu para reforçar o combate feroz, a verdadeira cruzada que
vem mobilizando setores conservadores contra as ações afirmativas e suas políticas de
inclusão social.
A comparação que a revista faz dessas políticas com o nazismo e o apartheid é de um cinismo
e de um mau-caratismo sem limites: iguala políticas de discriminação odiosas com ações
afirmativas; políticas feitas para afastar e impedir acesso a direitos com outras voltadas à
inclusão social, a assegurar direitos historicamente negados.
Os democratas raciais anti-cotas estão muito preocupados com a “barbárie segregacionista”
que as políticas afirmativas podem provocar. Mas eles se preocupam à toa: a barbárie
segregacionista já existe em nosso país há séculos, e é deprimentemente confirmada a cada
nova pesquisa do IBGE. Ela está escancaradamente estampada nos indicadores do mercado de
trabalho, da violência urbana, do acesso à saúde e à educação.
Afirmam também os democratas raciais que a ciência já provou que raças humanas não
existem, como se racismo precisasse de apoio científico para acontecer.
Preocupam-se também com as consequências legais de ações afirmativas, que, ao tratarem
desigualmente brancos e negros, estariam ferindo nossa Constituição. Mas, como diz um de
nossos maiores juristas, “como as leis nada mais fazem senão discriminar situações para
submetê-las à regência de tais ou quais regras (...) é preciso indagar quais as discriminações
juridicamente intoleráveis”.
A prova dos nove das reais intenções dos que combatem as políticas de cotas são as sugestões
que comumente oferecem como alternativa à “barbárie segregacionista”. A principal delas,
uma educação pública de qualidade, que promova “oportunidades iguais para todos”. Sem
perder tempo com o fato de que nenhum dos proponentes desse caminho coloque seus filhos
na escola pública, dispondo-se a batalhar concretamente pela sua melhoria, vamos apenas
citar um belo manifesto em defesa da educação pública de qualidade:
“A educação nova, alargando a sua finalidade para além dos limites das classes, assume, com
uma feição mais humana, a sua verdadeira função social, preparando-se para formar ‘a
hierarquia democrática’ pela ‘hierarquia das capacidades’, recrutadas em todos os grupos
sociais, a que se abrem as mesmas oportunidades de educação. (...) montada, na sua estrutura
tradicional, para a classe média (burguesia), enquanto a escola primária servia à classe
popular, como se tivesse uma finalidade em si mesma, a escola secundária ou do 3º grau não
forma apenas o reduto dos interesses de classe, que criaram e mantêm o dualismo dos
sistemas escolares”.
Trata-se do “Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova”, de 1932, assinado, entre outros, por
Anísio Teixeira, Roquette Pinto e Fernando de Azevedo. Como se vê, a preocupação com a
melhoria da educação pública e com a igualdade de oportunidades em nosso país tem, pelo
menos, setenta e cinco anos (na verdade mais que isso), e a “democracia racial” e a “igualdade
de oportunidades” estão como estão em nosso belo país mestiço de universidades brancas,
tribunais brancos, generalato branco, cardeais brancos e executivos brancos.
Talvez a esperança dos nossos democratas raciais anti-cotas seja que em mais setenta e cinco
anos as coisas andem mais um pouquinho e eles possam escrever um novo manifesto em
defesa da escola pública com algumas propostas diferentes das escritas em 1932.
A novidade hoje é que os ideólogos da democracia racial, que já foram mais comedidos e
circunspetos entre nós, agora são militantes engajados. Escrevem livros, artigos em profusão e
condenam essa “mania de macaquear os Estados Unidos”, querendo importar de lá políticas
que têm a ver com a realidade deles (escravidão violenta, segregação explícita, etc.) não com a
nossa que, como sabemos desde Gilberto Freyre, foi de uma escravidão patriarcal, quase
boazinha, que produziu um carnaval racial do qual todos nos orgulhamos. Sem perder tempo
em mostrar o quanto a visão freyreana do Brasil é pra inglês ver, registra-se apenas que, por
esse argumento de não macaquear, podemos acabar condenando o sindicalismo e outras
formas de luta de classes, achando que isso é coisa de europeu.
O que toda ideologia faz é, a partir de elementos da realidade, conformar uma visão de mundo
convincente, capaz de justificar aquela realidade. Com o mito da democracia racial brasileira
não é diferente. O maior furo desta ideologia, porém, é que ela se baseia quase que
exclusivamente em opiniões e teorias, faltando-lhe sempre os elementos de realidade. Os
poucos que sempre aparecem são as exceções, quase caricaturais, inevitavelmente soterrados
pelas estatísticas de nossa sociedade.
Mas seu maior perigo é onde tal ideologia nos leva: na desmobilização de questões
substantivas da democracia contemporânea e no apego a jargões iluministas, do tipo “todos
são iguais perante a lei”, que se encontra em quase todas as Constituições do mundo desde o
século XIX, sem que os verdadeiros democratas tivessem podido abaixar suas bandeiras um
segundo sequer, julgando estar tudo resolvido.
Em tempo; o artigo 179, inciso XIII, da Constituição de 1824, do Império brasileiro, tinha a
seguinte redação: “a lei será igual para todos, quer proteja, quer castigue, e recompensará em
proporção dos merecimentos de cada um”. Só que uns eram mais iguais do que outros, coisa
que, felizmente, graças aos militantes da democracia racial anti-cotista, não existe mais em
nosso país.

*A inspiração deste artigo é o livro do historiador baiano Jacob Gorender, “A Escravidão


Reabilitada”, cuja leitura é indispensável para compreender a fundo o que se esconde sob a
ideologia da “democracia racial brasileira”. O artigo é uma homenagem a um dos maiores
estudiosos do “escravismo colonial” brasileiro, título de sua obra magna, um clássico da
historiografia nacional.

**Ver o pequenino e monumental “Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade”, de Celso


Antonio Bandeira de Mello.

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