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AMBIENTAL
2016.2
INFORMAÇÕES
Prof. Tagore Trajano
Aluno: Átila Martins de Oliveira
Socrative.com/student
Room: Direito Ambiental UFBA
1ª prova: 25/01/2017. Questões discursivas, uma questão por assunto que der em aula.
2ª prova: 22/03/2017. Questões discursivas, uma questão por assunto que der em aula.
2ª chamada unificada: 27/03/2017
Olimpíadas ambientais (summer break): Tema- desenho animado
Critério de avaliação: figurino, cenário e apresentação
Data: 13 e 15/02/2017
O que é o meio ambiente? Antes de iniciar a análise de certos temas, fenômenos, objetos
precisamos delimita-los, conceitua-los, defini-los. Então, a pergunta que se faz precisar ser
respondida. Antes da compreensão do Direito Ambiental.
Para o Dicionário Aurélio da língua portuguesa, meio ambiente é o “que cerca ou
envolve os seres vivos ou as coisas, por todos os lados”. Por isso, alguns entendem que a
expressão meio ambiente é redundante, podendo se referir à ambiente. A definição legal do
meio ambiente se encontra insculpida no artigo 3.º, I, da Lei 6.938/1981, que pontifica que o
meio ambiente é “o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física,
química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”. Este conceito,
dito normativo, implica: a) as circunvizinhanças de um organismo, incluindo as plantas e
animais e os micro-organismos com os quais ele interage; b) o mundo biótico (de seres vivos)
e abiótico (de coisas sem vida); c) o meio físico, químico e biológico de qualquer organismo
vivo; e d) o conjunto de todas as condições e influências externas que afetam a vida e o
desenvolvimento de um organismo”.
Na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente celebrada em Estocolmo,
em 1972, definiu-se o meio ambiente da seguinte forma: “O meio ambiente é o conjunto de
componentes físicos, químicos, biológicos e sociais capazes de causar efeitos diretos ou
indiretos, em um prazo curto ou longo, sobre os seres vivos e as atividades humanas”.
Fica evidente que a ideia de meio ambiente e de natureza passou por diversas
transformações durante a evolução humana. Por muito tempo, a natureza se caracterizou como
um ambiente generoso, relacionando-se com aqueles que dela fazem parte de forma a dar um
meio de subsistência e sobrevivência no Planeta Terra. Havia no inconsciente coletivo a noção
de que os recursos naturais seriam inesgotáveis: “a terra que tudo dá”. Todas as formas de vida
se relacionavam da forma mais próxima possível, pois a natureza é indiferente, não é boa nem
ruim, não dá espaço para antagonismos. Na medida do possível, a própria natureza busca sua
sobrevivência, fazendo trocas. Ou seja, enquanto usávamos a natureza de forma ordenada,
víamos nela a figura de uma grande mãe, generosa, de braços abertos, concedendo instrumentos
para o trabalho e frutos para a vida. Essa é uma visão que vemos muito na literatura.
O homem primitivo não agredia a natureza de maneira indiscriminada. Apenas
procurava extrair do meio aquilo que era necessário ao seu sustento. Suas necessidades básicas
eram poucas. Não se falava, até então, em agressão à natureza. Já na Idade Média e na Moderna,
especialmente no período da Revolução Industrial, “começaram efetivamente as agressões à
natureza, cuja extensão, ainda hoje, em uma gradação quanto aos seus efeitos nocivos, é
bastante variável, podendo atingir tão só o meio local, o regional ou até comprometer o
equilíbrio biológico do próprio planeta. Estas agressões podem se constituir em simples
emanações de fumaças nauseabundas das fábricas de produtos químicos, ou das nuvens de pó
produzidas numa fábrica de cimento, ou, ainda, da difusão de substâncias radioativas lançadas
tanto no oceano como na atmosfera”.
A história nos mostra, que o meio ambiente primeiramente era visto como meio de
obtenção de recursos inesgotáveis/abundantes; em seguida passou a ser visto como um
instrumento de poder, de garantir o poder, daqueles que tinham acesso aos recursos naturais.
Mais recentemente, os povos de todo o mundo tiveram os olhos voltados ao meio ambiente.
Tanto é verdade que existem várias organizações não governamentais defendendo o meio em
que vivemos contra atos lesivos praticados por quem quer que seja. Elas têm representantes
praticamente em todos os países do globo e pretendem alertar o Poder Público, em especial, e
a comunidade, de modo geral, quanto à necessidade de proteger o nosso sistema ecológico de
agentes nocivos à saúde e à qualidade de vida desta e da futura geração. As pessoas acordaram
e passaram a levantar a bandeira protetiva ao meio ambiente, pois é dele que o homem tira o
sustento para sua sobrevivência. Apesar das dificuldades na solução dos problemas ambientais
mundiais, devemos resolver os nossos por meio de medidas adequadas, realizando campanhas
de conscientização de que o planeta Terra é nossa casa, por isso devemos protegê-lo e preservá-
lo para as presentes e futuras gerações. O futuro da humanidade está intimamente ligado à
preservação do meio em que vivemos.
O senso comum diz que meio ambiente é tudo aquilo que está ao redor do homem (e
que garanta ao homem um bem-estar, qualidade de vida, equilíbrio). A natureza é indiferente,
imperfeita, plural, caótica, incongruente, complexa, plástica, conflituosa e passa por momentos
de crise. Todos os elementos da natureza, mesmo diferentes, convivem no mesmo ambiente em
busca de uma mesma finalidade: sua sobrevivência. Então o ser humano começa a perceber que
a natureza sai de um estado em que tudo era inesgotável para um estágio em que as coisas
começam a se esgotar. Não temos recursos suficientes para tanta artificialidade.
As guerras do início do século XX, mostram que a gente começa a fazer guerras e os
territórios começam a se modificar. Tínhamos recursos, mas agora é do país vizinho. O recurso
deixa de ser inesgotável para ser esgotável; passa a ser um bem precioso que é preciso guardar,
estocar.
Em 1972 houve uma reunião em Estocolmo e fez-se uma conferência para discutir
políticas ambientais. Meio ambiente é importante? Sim. Meio ambiente é para todo mundo?
Sim. Devemos protege-lo? Sim. Devemos proteger para o homem? Essas políticas são para os
humanos e para as próximas gerações. Em Estocolmo, percebeu-se que existem outras gerações
que merecem respeito e merecem o ambiente em que vivemos. Isso representou uma ruptura.
Pois, se acreditava que o meio ambiente era uma fonte inesgotável e a relação homem com a
natureza era desigual. De um lado os seres humanos gananciosos tentando satisfazer seus
desejos de conforto e consumo; do outro, a natureza com toda a sua riqueza e exuberância,
sendo a fonte principal para as ações dos homens. O que torna isso um problema é o
desenvolvimento sem limites realizado pelo homem em prol de seus objetivos, gerando
prejuízos para o meio ambiente. Com a conferência de Estocolmo, esse pensamento foi
modificado e problemas como secas de rios e lagos, ilhas de calor e efeito da inversão térmica,
causou alerta mundial. Visando sanar as questões discutidas durante Conferência de Estocolmo,
foram votados setes pontos, referentes às responsabilidades e comportamentos ideais para guiar
as questões relativas ao meio ambiente, que compõem o preâmbulo da Declaração das Nações
Unidas sobre o Meio Ambiente, também conhecida como Declaração de Estocolmo: Nos itens
1 e 2 da Declaração de Estocolmo fica consagrado que: o homem é responsável pelo meio
ambiente, e este lhe oferece o sustento material e a possibilidade de evoluir de forma moral,
social e espiritual. Ao longo da evolução humana, o homem se tornou capaz de transformar o
meio ambiente da maneira que achar conveniente, e por isso a manutenção dos meios ambientes
naturais e artificiais é essencial para a real fruição dos direitos humanos fundamentais, bem
como o desenvolvimento econômico de todos os povos. Já o item 3 diz que: a capacidade do
ser humano em transformar o que o cerca carrega consigo a responsabilidade de saber usá-la,
visto que quaisquer transformações podem trazer benefícios e desenvolvimentos, ou causar
danos ao próprio ser humano e ao meio ambiente. Quando esses danos ocorrem, o seu rastro de
destruição é visível, como a degradação das fontes de recursos naturais, a poluição do ar e da
água, os desequilíbrios ambientais, e todos estes afetam a saúde física, mental e social do
homem. O quarto item convenciona que: para ocorrer um desenvolvimento socioeconômico,
nos países em desenvolvimento, são necessárias medidas que amenizem as discrepâncias
sociais, sem deixar de se preocupar com as questões ambientais. Enquanto que os países
industrializados têm por responsabilidade diminuir as diferenças com os países
subdesenvolvidos e em desenvolvimento. Este ponto também afirma que nesses países os
problemas ambientais estão ligados ao desenvolvimento de novas tecnologias a aos processos
de industrialização. O quinto item trata que: o crescimento populacional gera problemas ao
meio ambiente, e por isso devem-se criar medidas a fim de evitar tais problemas ou que ocorram
em menor gravidade. Dentre tudo existente no planeta, os seres humanos são os mais valiosos,
pois são capazes de progredir socialmente, criar riqueza social, desenvolver a ciência e
tecnologia, assim transformando o meio ambiente. Por fim, os dois últimos itens, sexto e sétimo,
dizem que: o homem deve ter atenção às consequências de seus atos no meio ambiente. O ser
humano é capaz de causar danos imensos e irreversíveis ao meio ambiente, mas também é capaz
de criar condições sadias de vida. Por isso o homem deve estar em harmonia com a natureza,
para que possa se desenvolver socioeconomicamente e de maneira que mantenha o bem estar e
a qualidade de vida. Diz ainda que: a responsabilidade pelas mudanças e pela manutenção de
um meio ambiente saudável é de todos, agindo em um esforço comum. Cabe aos poderes do
Estado a criação de leis e normas para a preservação e o melhoramento do meio ambiente
humano, mas cabe a todos os deveres de que estas leis e normas sejam exercidas.
CAPITULO SINGULAR
O debate que aqui se inicia faz com que a CF/88 sirva como parâmetro axiológico para
as demais normas, porém em um capítulo exclusivamente dedicado ao meio ambiente. O
objetivo é mostrar que é um direito fundamental, além de ser um valor a ser defendido pelo
Estado Brasileiro. Defenderam isso com objetivo de demonstrar uma preocupação com o meio
ambiente. Além disso, há a criação da obrigação, para o legislador infraconstitucional, de
regulamentar a matéria. Não tem como ignorar um bem jurídico a que um capítulo se dedica
exclusivamente! Representa um compromisso de transformação do Estado. É também um
mandamento para a coletividade. Ela vai dizer: eu vivo em um estado capitalista que a livre
iniciativa é a nossa bandeira, mas a livre iniciativa tem que respeitar as matérias ambientais.
A referida Carta Magna aborda a matéria em apreço em diversos títulos e capítulos, seja
mediante referências explícitas ou implícitas. Contudo, é em capítulo específico, o de número
VI, em seu artigo 225, que se encontra todo o arcabouço norteador do direito ambiental
brasileiro.
Hoje se fala muito em economia verde, onde há a transição do atual estado econômico
para uma economia verde, ou seja, de baixo carbono. Todo o esforço internacional está voltado
para essa economia mais eficiente no que tange aos usos dos recursos naturais. O mundo vem
discutindo questões importantes sobre a escassez desses recursos, no sentido de encontrar novas
formas de energias, o controle das emissões, a falta e o desperdício da água, o aumento
demográfico, a inovação tecnológica, a biodiversidade, a produção sustentável, o consumo
consciente etc. A expressão possui diversos significados e se transformou num guarda-chuva
que abriga várias teorias. Vejamos algumas delas: a) Ambiental Neoclássica — é a incorporação
de questões ambientais pela economia clássica. Esta teoria acredita no avanço tecnológico como
solução dos principais problemas ambientais. Não questiona o “dogma” do crescimento
econômico medido pelo PIB (David Pearce); b) Economia Ecológica — integra ciências
econômicas e ciências naturais. Esta teoria vê a economia como parte de um ecossistema global.
Não se opõe ao uso dos recursos naturais, mas recrimina o uso irresponsável desses recursos
(Nicholas Georgescu-Roegen); c) Estado Estacionário — esta teoria propõe estabilização da
produção e da população. PIB varia pouco, ficando próximo a zero. Economia estável, sem
crescimento quantitativo. Os países ricos devem buscar o estado estacionário para que os países
pobres cresçam até atingir a prosperidade (Herman Daly); d) Decrescimento — prega o
crescimento econômico contínuo, medido pelo PIB, não pode ser sustentado pelos ecossistemas
terrestres. Esta teoria propõe que os países parem de crescer. Melhores condições de vida devem
ocorrer sem aumento do consumo (Serge Latouche).
Portanto, a tendência é a criação de barreiras verdes no mundo globalizado como
fórmula para obrigar os países a adotar medidas nesse sentido. A mudança climática, a perda
de biodiversidade e a degradação do solo, por exemplo, são diariamente confirmadas e devem
ser adotadas medidas para evitá-las. Por outro lado, é possível abrir um novo mundo de
oportunidades; uns se fecham com a economia marrom, mas outros se abrem com a economia
verde. Enquanto acordos globais que estimulem a transação da economia para um modelo de
desenvolvimento sustentável não saem do papel, cidades e regiões autônomas de várias partes
do mundo vêm se antecipando e criando agendas próprias de sustentabilidade. Parte delas adota
medida por meio de regulamentações e legislações que extrapolam as paredes de secretarias e
ministérios do ambiente.
Assim, compatibilizar “meio ambiente e desenvolvimento significa considerar os
problemas ambientais dentro de um processo contínuo de planejamento, atendendo-se
adequadamente às exigências de ambos e observando-se as suas inter-relações particulares a
cada contexto sociocultural, político, econômico e ecológico, dentro de uma dimensão
tempo/espaço. Em outras palavras, isto implica dizer que a política ambiental não se deve erigir
em obstáculo ao desenvolvimento, mas sim em um de seus instrumentos, ao propiciar a gestão
racional dos recursos naturais, os quais constituem a sua base material”. O equilíbrio ecológico
não significa a inalterabilidade das condições naturais. Busca-se, no entanto, a harmonia ou a
proporção e a sanidade entre os vários bens que compõem a ecologia (populações,
comunidades, ecossistemas e biosfera).
5. ARTIGO 225 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
Art. 225 Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso
comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à
coletividade o dever de defende-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
Esse dispositivo pode ser dividido em quatro partes: a) o meio ambiente ecologicamente
equilibrado é um direito fundamental da pessoa humana (direito à vida com qualidade); b) o
meio ambiente é um bem de uso comum do povo — bem difuso, portanto, indisponível; c) o
meio ambiente é um bem difuso e essencial à sadia qualidade de vida do homem; e d) o meio
ambiente deve ser protegido e defendido pelo Poder Público e pela coletividade para as
presentes e futuras gerações.
CONCEITO DE TODOS
Qual o conceito de TODOS? Essa discussão foi feita na ECO 92, no Rio de Janeiro. Que
se tornou a capital internacional do meio ambiente, por ser belo, desenvolvido e pela existência
de problemas. Conseguir ver beleza nos problemas é uma proeza. “Todos” tem o direito ao
meio ambiente equilibrado. Cabe-nos neste momento questionar: a quem o direito ambiental
serve? Seria somente ao homem ou a toda e qualquer outra forma de vida? O tema pode ser
desenvolvido a partir de duas ideias fundamentais: a) a de que o destinatário do direito
ambiental seria a pessoa humana; e b) a de que seu destinatário seria a vida em todas as suas
formas.
Entende-se por todos o conjunto de pessoas integrado pelos brasileiros e estrangeiros
residentes no país, nos termos do art. 5º da CF, pois esta, em regra, aplica-se somente no
território brasileiro. Cuida-se, como já vimos, de uma visão eminentemente antropocêntrica.
Questiona Antônio Herman V. Benjamin (ministro do Superior Tribunal de Justiça) se os
estrangeiros não residentes no Brasil não teriam o direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado. E vai mais além ao dizer que “a interpretação da norma reflete muito do que se
colhe da realidade cultural, incubadora dos nossos valores éticos; quem sabe um dia se verá no
todo do art. 225, caput, uma categoria mais ampla e menos solitária do que apenas os próprios
seres humanos”. Também é oportuno salientar que “a negação de titularidade de direito a outros
seres vivos não implica, automática e inevitavelmente, negação de reconhecimento de seu valor
intrínseco”.
VISÃO ANTROPOCÊNTRICA, EGOCÊNTRICA E BIOCÊNTRICA DO MEIO
AMBIENTE
Antropocentrismo, egocentrismo e biocentrismo são concepções genéricas atribuídas
pelos cientistas em face da posição do homem no meio ambiente. Antropocentrismo coloca o
homem no centro das preocupações ambientais, ou seja, no centro do universo. Egocentrismo,
ao revés, posiciona o meio ambiente no centro do universo. Biocentrismo, por sua vez, procura
conciliar as duas posições extremas, colocando o meio ambiente e o homem no centro do
universo. É importante ressaltar que não só o homem é o destinatário da proteção ambiental,
mas todas as formas de vida (art. 3º, I, da Lei n. 6.938/81). Assim, “antropocentrismo e
egocentrismo, passando-se pelo biocentrismo, são diferentes cosmovisões. Cientistas e
pensadores debruçaram-se sobre estes temas, não importa se direta ou indiretamente. É
instigante verificar como vários ilustres cientistas (físicos, matemáticos, biólogos, antropólogos
e vários outros) buscaram na filosofia um complemento de que necessitam para o avanço em
suas respectivas áreas de saber. Se não foram todos filósofos profissionais, foram ao menos
amadores”. Por tudo isso, há a necessidade de construir nova base ética normativa da proteção
do meio ambiente. Todos os recursos naturais são considerados coisas e apropriáveis do ponto
de vista econômico, incluindo aí a flora, a fauna e os minérios. Essa apropriação é possível pelo
fato de o homem ser o centro das preocupações ambientais — antropocentrismo. Cristiane
Derani afirma que o conceito de meio ambiente deriva do homem e a ele está jungido, porém o
homem não o integra; conquanto “o tratamento legal destinado ao meio ambiente permanece
necessariamente numa visão antropocêntrica porque esta visão está no cerne do conceito de
meio ambiente”. Há, no entanto, quem entenda que a flora, a fauna e a biodiversidade também
são sujeitos de direito, devendo ser protegidos pelo direito — biocentrismo (Antônio Herman
V. Benjamin, Édis Milaré, José Renato Nalini etc.). Portanto, quem não for capaz de valorizar
e preservar a vida de seus semelhantes está surdo à voz da razão que grita pela proteção das
outras formas de vida e das bases ecológicas de que fazemos parte. Vê-se, pois, que todos os
seres vivos têm o direito de viver. Partindo de uma visão moderna do meio ambiente, faz-se
necessário analisar a natureza dos pontos de vista filosófico, econômico e jurídico.
Como podemos ver, a natureza deve ser protegida para as presentes e futuras gerações
por ser sujeito de direito (biocentrismo ou não antropocentrismo) ou para a utilização humana
(antropocentrismo — puro, intergeracional, mitigado ou reformado). Já não é mais possível
considerar a proteção da natureza como um objetivo decretado pelo homem em benefício
exclusivo do próprio homem. A natureza tem que ser protegida também em função dela mesma,
como valor em si, e não apenas como um objeto útil ao homem. (...) A natureza carece de uma
proteção pelos valores que ela representa em si mesma, proteção que, muitas vezes, terá de ser
dirigida contra o próprio homem”.
1. PRINCÍPIOS AMBIENTAIS
Os princípios servem para facilitar o estudo e a análise de certos fundamentos estanques
do direito. Prestam-se para balizar o procedimento do legislador, do magistrado e do operador
do direito. O princípio pode ser utilizado em várias ciências, como na matemática, na geometria,
na biologia etc., e traz consigo a noção de início de alguma coisa. Em outras palavras, princípio
é o valor fundamental de uma questão jurídica. É um ponto indiscutível e aceito pela sociedade.
Trata-se de uma verdade incontestável para o momento histórico. O princípio, além disso, pode
ser modificado com o evolver dos tempos. Nada é absoluto. A verdade também não é absoluta.
Ela deve ser analisada do ponto de vista de cada momento histórico. Os princípios são extraídos
do ordenamento jurídico. A doutrina, contudo, arrola uma multiplicidade de concepções de
princípios. Para alguns, eles têm força normativa; para outros, são meras regras de pensamento.
Registre-se, ainda, que os princípios podem ser implícitos, explícitos, inferiores, superiores etc.
Pode-se, assim, conceituar princípio como “uma regra geral e abstrata que se obtém
indutivamente, extraindo o essencial de normas particulares, ou como uma regra geral
preexistente”. Em outras palavras, princípios “são normas que exigem a realização de algo, da
melhor forma possível, de acordo com as possibilidades fáticas e jurídicas. Os princípios não
proíbem, permitem ou exigem algo em termos de tudo ou nada; impõem a optimização de um
direito ou de um bem jurídico, tendo em conta a reserva do possível, fática ou jurídica”. Suas
principais características são a simplicidade (fácil compreensão) e a hierarquia superior
(fundada no direito natural ou na história do instituto). Princípio é a base, o alicerce, o início de
alguma coisa. É a regra fundamental de uma ciência. Há quem entenda que o princípio é fonte
normativa. Há muitos princípios no ordenamento jurídico, mas nem todos têm força normativa.
Esta é extraída dos princípios oriundos da Constituição ou de leis infraconstitucionais. No
entanto, não é fácil identificar, entre os inúmeros princípios, aquele que tem força normativa.
“Princípio” é, aqui, utilizado como alicerce ou fundamento do Direito. Como ensina
Gomes Canotilho, “os princípios são normas jurídicas impositivas de uma optimização,
compatíveis com vários graus de concretização, consoante os condicionalismos fáticos e
jurídicos. Permitem o balanceamento de valores e interesses (não obedecem, como as regras, à
lógica do tudo ou nada’), consoante o seu peso e ponderação de outros princípios eventualmente
conflitantes”. São padrões “juridicamente vinculantes radicados nas exigências de “justiça”
(Dworkin) ou na “ideia de direito” (Larenz).
2. IMPORTÂNCIA DOS PRINCÍPIOS
A força normativa dos princípios tem por fundamento o art. 4º da LINDB. Assim, na
omissão da lei, o juiz decidirá com base nos princípios gerais do direito. Há inúmeros princípios
constitucionais expressos e implícitos. Muitos deles têm força normativa e muitos outros são
meros enunciados sem força normativa. Na esfera ambiental, contudo, eles devem ser aplicados
em favor do meio ambiente. Os princípios, por seu turno, não podem ser aplicados diretamente
ao caso em espécie como uma regra jurídica. Deve-se estabelecer uma relação com as normas
constitucionais e infraconstitucionais. No entanto, é por meio dos princípios que se estabelecerá
o seu conteúdo valorativo. “Este conteúdo é estabelecido mediante um juízo de ponderação com
outros princípios. Ponderar é estabelecer comparações, estabelecer o peso de cada um e aplicar
o maior no caso concreto”. Os princípios são complementados pelas regras jurídicas. Além
disso, eles são normas fundamentais, pois se alicerçam nas normas gerais do direito. Exercem
as seguintes funções: a) integradora — porque preenchem lacunas do direito; b) interpretativa
— porque orientam o intérprete na aplicação da norma; c) delimitadora — porque limitam a
atuação legislativa, judicial e negocial; e d) fundante — porque fundamentam o ordenamento
jurídico.
Art. 225 Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso
comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à
coletividade o dever de defende-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
PRINCÍPIO DA UBIQUIDADE
Ubiquidade significa estar presente ao mesmo tempo em todos os lugares. É a
propriedade ou estado do que é ubíquo, que é a capacidade de estar ao mesmo tempo em
diversos lugares.
Esse princípio é consubstanciado na ideia de que o meio ambiente é ubíquo, ou seja,
está presente em toda parte, em todo o globo, e que, portanto, toda e qualquer lesão ocorrida
em sua estrutura, independentemente do local onde ocorra, tem reflexos, diretos ou indiretos,
em toda a natureza. Dessa forma o que se quer ressaltar é que os bens ambientais naturais se
colocam numa posição soberana a qualquer limitação espacial ou geográfica. Em consequência,
dado o caráter onipresente dos bens ambientais, o princípio da ubiquidade exige que em matéria
de meio ambiente exista uma estreita relação de cooperação entre os povos, fazendo com que
se estabeleça uma política mundial ou global para sua proteção e preservação.
Esse princípio é um dos mais importantes, pois, enxergar a natureza de forma global,
onde impactos e catástrofes ambientais pode gerar consequências em todo o globo. Como no
acidente nuclear de Chernobyl, este evento verdadeiramente global teve seus maiores impactos
nas três antigas repúblicas soviéticas vizinhas – hoje países independentes da Ucrânia, Bielo-
Rússia e Rússia. Os impactos, contudo, se expandiram de forma muito mais ampla. Mais de
metade do Césio-137 emitido como resultado da explosão foi carregado, pela atmosfera, a
outros países europeus. Pelo menos 14 outros países na Europa (Áustria, Suécia, Finlândia,
Noruega, Eslovênia, Polônia, Romênia, Hungria, Suíça, República Tcheca, Itália, Bulgária,
República da Moldova e Grécia) foram contaminados por níveis elevados de radiação.
O dano ambiental pelas suas próprias características não encontra fronteiras. Assim,
como se dessume pela lógica, os incidentes ambientais ocorridos em determinada localidade,
geram prejuízos aos ecossistemas por todo o globo. Assim, esta preocupação transfronteiriça
exige a notificação imediata sobre os desastres naturais ocorridos em determinado Estado que
possam produzir efeitos nocivos ao meio ambiente de outros Estados. Desta forma, os Estados
devem cooperar efetivamente para desestimular ou evitar o deslocamento e a transferência a
outros Estados de quaisquer atividades e substâncias que causem degradação ambiental grave
ou se considerem nocivas à saúde humana. Por outro lado, os Estados onde ocorrerem os danos
ambientais deverão proporcionar as informações pertinentes e notificar previamente e de forma
oportuna os Estados que possam se ver afetados por atividades passíveis de ter consideráveis
efeitos ambientais nocivos.
O princípio da ubiquidade possui uma relação com a Teoria de Gaia, elaborada pelo
cientista inglês James Lovelock no ano de 1979, onde o Planeta Terra é um imenso organismo
vivo, capaz de obter energia para seu funcionamento, regular seu clima e temperatura, eliminar
seus detritos e combater suas próprias doenças, ou seja, assim como os outros seres vivos, é um
organismo capaz de se autorregular. De acordo com a teoria de Gaia, os organismos bióticos
controlam os organismos abióticos, de forma que a Terra se mantém em equilíbrio e em
condições propicias para sustentar a vida. A Teoria de Gaia sugere também que os seres vivos
são capazes de modificar o ambiente em que vivem, tornando-o mais adequado para sua
sobrevivência. Dessa forma, a Terra seria um planeta cuja vida controlaria a manutenção da
própria vida através de mecanismos de feedback e de interações diversas.
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
Tem previsão implícita no artigo 225, combinado com o artigo 170, VI, ambos da
Constituição Federal e expressa no Princípio 04 da Declaração do Rio: “Para se alcançar um
desenvolvimento sustentável, a proteção ambiental deve constituir parte integrante do processo
de desenvolvimento e não pode ser considerada separadamente”, tendo sido plantada a sua
semente mundial na Conferência de Estocolmo de 1972.
Segundo Michel Prieur, “o desenvolvimento sustentável exprime a ideia de que os
recursos vivos não devem ser puncionados a um ponto tal que eles não possam, a médio e longo
prazo, renovar-se. É preciso garantir a perenidade dos recursos. Por extensão, toda a política de
desenvolvimento atual deve garantir que não acarretará prejuízo nem às gerações futuras, nem
aos recursos comuns (água, ar, solos, espécies e diversidade biológica). Se bem que de
dimensão jurídica fraca, mas crescente, o desenvolvimento sustentado exprime a vontade
política de integrar a preocupação do meio ambiente no longo prazo”.
Já Gerd Winter, afirma que o “desenvolvimento sustentável é o termo genérico para um
extenso número de preocupações que, todavia, podem ser resumidas em três conceitos globais:
bem-estar social, economia e meio ambiente”. Na versão dos três pilares, o termo “sustentável
significa que estes três aspectos devem coexistir como entidades equivalentes. No caso de
conflitos, eles devem ser balanceados, considerações mútuas tomadas e compromissos
estabelecidos”.
Constata-se com toda essa preocupação normativa e doutrinaria que os recursos
ambientais não são inesgotáveis, tornando-se inadmissível que as atividades econômicas se
desenvolvam alheias a esse fato. Busca-se com isso a coexistência harmônica entre economia
e meio ambiente. Permite-se o desenvolvimento, mas de forma sustentável, planejada, para que
os recursos hoje existentes não se esgotem ou tornem-se inócuos. Dessa forma, o princípio do
desenvolvimento sustentável tem por conteúdo a manutenção das bases vitais da produção e
reprodução do homem e de suas atividades, garantindo igualmente uma relação satisfatória
entre os homens e destes com o seu ambiente, para que as futuras gerações também tenham
oportunidade de desfrutar os mesmos recursos que temos hoje à nossa disposição.
Precisas são as palavras de Paulo Affonso Leme Machado ao dizer que o
desenvolvimento, novo nome do progresso, não realiza, por si só, a felicidade dos seres
humanos. Para atingir-se uma situação de bem-estar da humanidade é preciso que haja um
processo de desenvolvimento. Necessário reiterar que “o direito ambiental e o direito ao
desenvolvimento existem não como alternativas, mas como mútuo reforço, sendo conceitos que
se integram, exigindo que, quando o desenvolvimento possa causar significativo prejuízo para
o meio ambiente, haja o dever de prevenir ou, pelo menos, de reduzir esse prejuízo”. A
integração meio ambiente e desenvolvimento não é um favor ao meio ambiente. Alguns
políticos e empresários, e até meios de comunicação, em numerosos países, entendem que se
devem reservar somente as migalhas ou as sobras para o meio ambiente, não enxergando que,
agindo contra a natureza, o fracasso do empreendimento se não é imediato, virá a médio ou a
longo prazo.
Quando falamos em ecologia, sustentabilidade e meio ambiente, temas tão atuais e
importantes para nosso tempo. Torna-se importante a compreensão da Teia da Vida do físico
austríaco Fritjof Capra. A Teia da Vida, livro de 1996, apresenta novas e estimulantes
perspectivas sobre a natureza da vida e abre caminho para a autêntica interdisciplinaridade. As
descobertas citadas por Capra confrontam os paradigmas mecanicistas e darwinistas aceitos e
proporcionam uma nova base para políticas ecológicas que nos permitam pensar em construir
e sustentar comunidades sem colocar em risco as oportunidades para futuras gerações. A idéia
de teia da vida, que fundamenta o livro do físico Fritjof Capra (1939), que uso como uma das
fontes principais de pesquisa para essa reflexão, é muito antiga e atribuída a uma famosa carta
escrita em 1854 pelo chefe Seatle ao presidente dos EUA, Franklin Pierce, quando este propôs
comprar as terras dessa tribo, concedendo-lhes uma outra reserva. Em tal discurso Chefe Seatle
dá grande enfoque à idéia de que tudo na natureza está ligado. Podemos encarar então, os
sistemas vivos como redes que interagem com outros sistemas vivos, dentro dessa teia. Cada
organismo nesse contexto representaria um nó e cada nó, visto de perto, seria também uma rede,
e assim sucessivamente. Segundo Capra a teia da vida consiste em redes dentro de redes. Em
cada escala, sob estreito e minucioso exame, os nodos da rede se revelam como redes menores.
Tendemos a arranjar esses sistemas, todos eles aninhados dentro de sistemas maiores, num
sistema hierárquico colocando os maiores acima dos menores, á maneira de uma pirâmide. Mas
isso é uma projeção humana. Na natureza, não há “acima” ou “abaixo”, e não há hierarquias.
Há somente redes aninhadas dentro de outras redes. Às vezes, ou quase sempre, nos esquecemos
de que havia um todo, a parte parece tornar-se algo enorme e que existe fora de qualquer
conjunto ou contexto, mas nada está fora de nada, tudo está relacionado, tudo está em um
contexto que se liga a outro nessa teia da vida.
SOLIDARIEDADE
Por este Princípio, que inspirou a parte final do caput do artigo 225 da Constituição
Federal, as presentes gerações devem preservar o meio ambiente e adotar políticas ambientais
para a presente e as futuras gerações, não podendo utilizar os recursos ambientais de maneira
irracional de modo que prive seus descendentes do seu desfrute. Não é justo utilizar recursos
naturais que devem ser reservados aos que ainda não existem. Na realidade, o Princípio do
Desenvolvimento Sustentável busca a realização deste. Há um pacto fictício com as gerações
futuras, que devem também ter acesso aos recursos ambientais para ter uma vida digna, razão
pela qual as nações devem tutelar com maior intensidade os animais e vegetais ameaçados de
extinção. Sob essa perspectiva, informa o Princípio 03, da Declaração do RIO: “O direito ao
desenvolvimento deve ser exercido de modo a permitir que sejam atendidas equitativamente as
necessidades de desenvolvimento e de meio ambiente das gerações presentes e futuras”
Paulo Affonso Leme Machado arguir que a reserva dos bens ambientais, com a sua não
utilização atual, passaria a ser equitativa se fosse demonstrado que ela estaria sendo feita para
evitar o esgotamento dos recursos, com a guarda desses bens para as gerações futuras. A
equidade no acesso aos recursos ambientais deve ser enfocada não só com relação à localização
espacial dos usuários atuais, como em relação aos usuários potenciais das gerações vindouras.
Um posicionamento equânime não é fácil de ser encontrado, exigindo considerações de ordem
ética, científica e econômica das gerações atuais e uma avaliação prospectiva das necessidades
futuras, nem sempre possíveis de serem conhecidas e medidas no presente.
PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO
O princípio da precaução (vorsorgeprinzip) está presente no Direito alemão desde os
anos 70, ao lado do princípio da cooperação e do princípio poluidor-pagador. Eckard Rehbinder
acentua que “a Política Ambiental não se limita à eliminação ou redução da poluição já existente
ou iminente (proteção contra o perigo), mas faz com que a poluição seja combatida desde o
início (proteção contra o simples risco) e que o recurso natural seja desfrutado sobre a base de
um rendimento duradouro”.
Gerd Winter diferencia perigo ambiental de risco ambiental. Diz que, “se os perigos são
geralmente proibidos, o mesmo não acontece com os riscos. Os riscos não podem ser excluídos,
porque sempre permanece a probabilidade de um dano menor. Os riscos podem ser
minimizados. Se a legislação proíbe ações perigosas, mas possibilita a mitigação dos riscos,
aplica-se o ‘princípio da precaução’, o qual requer a redução da extensão, da frequência ou da
incerteza do dano”. Os riscos são “reais e irreais ao mesmo tempo. De um lado, existem ameaças
e destruições que são já bem reais: a poluição ou a morte das águas, a desaparição de florestas,
a existência de novas doenças etc. Do outro lado, a verdadeira força social do argumento do
risco reside justamente nos perigos que se projetam para o futuro. Na sociedade do risco, o
passado perde sua função determinante para o presente. É o futuro que vem substituí-lo e é,
então, alguma coisa de inexistente, de construído, que se torna a ‘causa’ da experiência e da
ação no presente” – assinala Úlrich Beck. “O princípio da precaução é atualmente uma
referência indispensável em todos as abordagens relativas aos riscos” – afirma Michel Prieur.
A implementação do princípio da precaução não tem por finalidade imobilizar as atividades
humanas. Não se trata da precaução que tudo impede ou que em tudo vê catástrofes ou males.
O princípio da precaução visa à durabilidade da sadia qualidade de vida das gerações humanas
e à continuidade da natureza existente no planeta.
Esse princípio é previsto na Declaração do Rio (ECO/1992), no Princípio 15: “De modo
a proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deve ser amplamente observado pelos
Estados, de acordo com suas capacidades. Quando houver ameaça de danos sérios ou
irreversíveis, a ausência de absoluta certeza científica não deve ser utilizada como razão para
postergar medidas eficazes e economicamente viáveis para precaver a degradação ambiental”.
Ou seja, se determinado empreendimento puder causar danos ambientais sérios ou
irreversíveis, contudo inexiste certeza científica quanto aos efetivos danos e a sua extensão,
mas há base científica razoável fundada em juízo de probabilidade não remoto da sua potencial
ocorrência, o empreendedor deverá ser compelido a adotar medidas de precaução para elidir ou
reduzir os riscos ambientais para a população. Outrossim, em casos extremos (perigo
ambiental), será recomendável que o Poder Público não libere a atividade supostamente
impactante até que haja uma evolução científica a fim de melhor analisar a natureza e a extensão
dos potenciais males ambientais, pois é possível que não seja prudente arriscar.
Assim, a incerteza científica milita em favor do meio ambiente e da saúde (in dubio pro
natura ou salute). A precaução caracteriza-se pela ação antecipada diante do risco desconhecido.
Enquanto a prevenção trabalha com o risco certo, a precaução vai além e se preocupa com o
risco incerto. Prevenção se dá em relação ao perigo concreto, ao passo que a precaução envolve
perigo abstrato ou potencial. De grande felicidade é a afirmação de Jean-Marc Lavieille,
brilhantemente citado por Paulo Affonso Leme Machado, para quem “o princípio da precaução
consiste em dizer que não somente somos responsáveis sobre o que nós sabemos, sobre o que
nós deveríamos ter sabido, mas, também, sobre o de que nós deveríamos duvidar”.
Quanto as medidas adotadas com base na precaução, ela deverá ser proporcional (se em
casos de risco muito elevado poderá ser decidida a interdição da atividade, já em casos de risco
reduzido a informação do público poderá ser suficiente), coerente (a medida deve ser de âmbito
e natureza comparáveis às medidas já tomadas em domínio equivalentes) e precária (as medidas
precaucionais devem ser revistas periodicamente à luz do progresso científico e, sempre que
necessário, alteradas).
PRINCÍPIO DA PREVENÇÃO
Trata-se de um dos princípios mais importantes que norteiam o direito ambiental. De
fato, a prevenção é preceito fundamental, uma vez que os danos ambientais, na maioria das
vezes, são irreversíveis e irreparáveis. Para tanto, basta pensar: como recuperar uma espécie
extinta? Como erradicar os efeitos de Chernobyl? Ou, de que forma restituir uma floresta
milenar que fora devastada e abrigava milhares de ecossistemas diferentes, cada um com o seu
essencial papel na natureza? Diante da impotência do sistema jurídico, incapaz de restabelecer,
em igualdades de condições, uma situação idêntica à anterior, adota-se o princípio da prevenção
do dano ao meio ambiente como sustentáculo do direito ambiental, consubstanciando-se como
seu objetivo fundamental.
A Convenção da Diversidade Biológica164 diz em seu “Preâmbulo” que “é vital prever,
prevenir e combater na origem as causas da sensível redução ou perda da diversidade
biológica”.
Segundo Paulo Affonso Leme Machado, sem informação organizada e sem pesquisa
não há prevenção. A aplicação do princípio da prevenção comporta, pelo menos, doze itens: 1)
identificação e inventário das espécies animais e vegetais de um território, quanto à conservação
da natureza; 2) identificação das fontes contaminantes das águas e do ar, quanto ao controle da
poluição; 3) identificação e inventário dos ecossistemas, com a elaboração de um mapa
ecológico; 4) planejamento ambiental e econômico integrados; 5) ordenamento territorial
ambiental para a valorização das áreas de acordo com a sua aptidão; 6) Estudo de Impacto
Ambiental; 7) prestação de informações contínuas e completas; 8) emprego de novas
tecnologias; 9) autorização ou licenciamento ambiental; 10) monitoramento; 11) inspeção e
auditoria ambientais; 12) sanções administrativas ou judiciais. Os meios a serem utilizados na
prevenção podem variar conforme o desenvolvimento de um País ou das opções tecnológicas.
O Princípio 8 da Declaração do Rio de Janeiro/1992 diz: “A fim de conseguir-se um
desenvolvimento sustentado e uma qualidade de vida mais elevada para todos os povos, os
Estados devem reduzir e eliminar os modos de produção e de consumo não viáveis e promover
políticas demográficas apropriadas”. A prevenção empregada no sentido de previdência é “uma
chance para a sobrevivência”. A prevenção não é estática; e, assim, tem-se que atualizar e fazer
reavaliações, para poder influenciar a formulação das novas políticas ambientais, das ações dos
empreendedores e das atividades da Administração Pública, dos legisladores e do Judiciário.
Qual a diferença de prevenção para precaução? A precaução lida com algo novo, incerto,
duvidoso, por ex, uma nova tecnologia que é lançada e aplicada. Criam-se medidas de
precaução, como informação e participação. Isso porque, entre ganhos e perdas, os ganhos
seriam maiores. Integra-se à produção o custo profilático/preventivo de uma possível
desestruturação ambiental. Já no caso da prevenção, a atividade já é sabida, notória, e sabe-se
que terá um custo ambiental elevado, um impacto significativo; então, para estruturar essa
atividade, criam-se medidas preventivas para evitar e minimizar o direito cirúrgico
(responsabilização civil, penal e administrativa), ou seja, minimizar uma intervenção jurídica
no futuro.
PRINCÍPIO DA REPARAÇÃO
O princípio da reparação dano ambiental é adotado pelo Brasil e também pela maioria
dos demais Estados. No ordenamento jurídico brasileiro, o dever de reparar os danos causados
ao meio ambiente está expresso no: Art. 225, §3, CF/88 - “As condutas e atividades lesivas ao
meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas e jurídicas, a sanções penais e
administrativas, independentemente de reparar os danos causados”. E no artigo, 4, VII da Lei
6938/81 - “A política nacional do meio ambiente visará.) VI- à imposição, ao poluidor e ao
predador da obrigação de recuperar e/ ou indenizar os danos causados e, ao usuário, da
contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos.
Depreende-se dos dispositivos citados que existindo um dano ambiental, há o dever de
repará-lo integralmente. Neste sentido, a legislação ambiental prevê duas formas de
ressarcimento de dano ambiental: em primeiro plano, a reparação ou substituição do bem
ambiental lesado; em segundo plano, a pela indenização pecuniária, que funciona como uma
compensação ecológica. Convém pontuar, que as formas de reparação do dano ambiental
obedecem a uma ordem hierárquica. Primeiramente, busca-se a recuperação do bem lesado;
posteriormente, de forma subsidiária, a indenização pecuniária, nos casos em que a
repristinação não é possível. Portanto, a principal opção da responsabilidade civil ambiental
não é a justa compensação monetária da vítima, mas a prevenção do dano ecológico e a
reintegração dos bens ambientais lesados. Neste sentido, a indenização é uma das formas de
compor o prejuízo resultante do dano ambiental, porém, esta não pode ser elevada à principal
função do Princípio do Polidor-Pagador e nem do sistema de reparação. “Não obstante o seu
caráter subsidiário, a indenização em dinheiro não é a mais freqüente, dada às dificuldades
postas, na prática, à reparação natural pelas circunstâncias e, notadamente, em face do dano,
pela impossibilidade de restabelecer, a rigor, a situação anterior ao evento danoso”.
Verifica-se, pois, que nem todo dano ecológico pode ser reparado, porque (regra geral)
esses são irreparáveis e infungíveis. É justamente em razão deste fato, que se prioriza a
prevenção dos danos ambientais, porque se há possibilidade de ser quantificado os custos do
dano ecológico, dificilmente se conseguirá restitui-lo ao estado primitivo. “A opção pela
conservação do equilíbrio ecológico parece ser o último fim do direito do ambiente, a sua
orientação fundamental, uma síntese do seu fundamento dogmático”. Torna-se evidente,
portanto, que há uma preferência pela recuperação ecológica sobre a indenização pecuniária,
pois a tutela ambiental tem como fundamento à conservação e manutenção status quo do
ambiente. Por isso, é necessário saber quando a restauração do bem ambiental lesado é cabível
e adequado. Assim, o primeiro critério é verificar se após a aplicação da medida de restauração,
o dano ambiental ainda subsiste, porque o princípio da reparação tem como função principal à
supressão do dano. Para que a reparação seja satisfatória é necessária a observância de três
requisitos: a capacidade de auto regeneração, capacidade de auto-regulamentação e capacidade
funcional.
Desta forma, se presente os três requisitos anteriormente mencionados, efetiva-se a
reparação do dano ambiental, seja por meio da recuperação ecológica, seja por meio da
compensação ecológica. Acrescenta-se, ainda que a reparação do dano ao meio ambiente deve
ser integral, não a dificuldade da avaliação e quantificação econômica do bem ambiental lesado.
PRINCÍPIO DA INFORMAÇÃO
Conquanto não se trate de uma norma jurídica exclusiva do Direito Ambiental, podendo
também ser encontrado em outros ramos, a exemplo do Direito do Consumidor. Ele mantém
íntimo contato com o Princípio da Participação Comunitária e da Publicidade, que informa a
atuação da Administração Pública, notadamente no que concerne aos órgãos e entidades
ambientais, que ficam obrigados a permitir o acesso público aos documentos, expedientes e
processos administrativos que tratem de matéria ambiental e a fornecer todas as informações
ambientais que estejam sob sua guarda, em meio escrito, visual, sonoro ou eletrônico.
O acesso às informações ambientais é imprescindível à formação do bom
convencimento da população, que precisa inicialmente conhecer para participar da decisão
política ambiental, a exemplo das consultas e audiências públicas. Por isso, os órgãos e
entidades ambientais deverão publicar em Diário Oficial e disponibilizar em 30 dias, em local
de fácil acesso: os pedidos de licenciamento, sua renovação e a respectiva concessão; pedidos
e licenças para supressão de vegetação; autos de infrações e respectivas penalidades impostas
pelos órgãos ambientais; lavratura de termos de compromisso de ajustamento de conduta;
reincidências em infrações ambientais; recursos interpostos em processo administrativo
ambiental e respectivas decisões; registro de apresentação de estudos de impacto ambiental e
sua aprovação ou rejeição.
A Declaração do Rio de Janeiro/l992, em seu Princípio 10, afirma que, “no nível
nacional, cada indivíduo deve ter acesso adequado a informações relativas ao meio ambiente
de que disponham as autoridades públicas, inclusive informações sobre materiais e atividades
perigosas em suas comunidades”.
PRINCÍPIO DA PARTICIPAÇÃO
A Constituição Federal de 1988, em seu art. 225, caput, consagrou na defesa do meio
ambiente a atuação presente do Estado e da sociedade civil na proteção e preservação do meio
ambiente, ao impor à coletividade e ao Poder Público tais deveres. Disso retira-se uma atuação
conjunta entre organizações ambientalistas, sindicatos, indústrias, comércio, agricultura e
tantos outros organismos sociais comprometidos nessa defesa e preservação. Com isso,
observa-se, comumente, em ações civis públicas, determinada ONG, ingressando como autora,
sustentar caber à pessoa jurídica de direito público o dever de tutelar o meio ambiente. O ente
público, por sua vez, ao responder à demanda, propõe reconvenção, alegando, corretamente,
que o dever de tutela do meio ambiente cabe não apenas a ele, mas também àquela ONG, na
medida em que esta recebe dotação orçamentária e há a previsão constitucional do art. 225,
caput, que estrutura toda a sociedade na defesa do meio ambiente, de que todos (pessoas físicas
e jurídicas) obrigam-se a tutelá-lo. Atente-se que não se trata de um aconselhamento, mas sim
de um dever da coletividade.
Outrossim, oportuno considerar que o resultado dessa omissão participativa é um
prejuízo a ser suportado pela própria coletividade, porquanto o direito ao meio ambiente possui
natureza difusa. Além disso, o fato de a administração desse bem ficar sob a custódia do Poder
Público não elide o dever de o povo atuar na conservação e preservação do direito do qual é
titular. O princípio da participação constitui ainda um dos elementos do Estado Social de Direito
(que também poderia ser denominado Estado Ambiental de Direito), porquanto todos os direitos
sociais são a estrutura essencial de uma saudável qualidade de vida, que, como sabemos, é um
dos pontos cardeais da tutela ambiental. Nessa perspectiva, denotam-se presentes dois
elementos fundamentais para a efetivação dessa ação em conjunto: a informação e a educação
ambiental, mecanismos de atuação, numa relação de complementaridade.
Nesse sentido, Hans Jonas defende uma dignidade da natureza que seria alcançada com
a substituição dos antigos imperativos éticos, dentre os quais o imperativo kantiano. Deve-se
passar do imperativo kantiano que determina um agir individual “[...] de modo que o princípio
da tua ação se transforme em uma lei universal”, para um novo imperativo, fundado na
responsabilidade que atribui ao homem um agir responsável de maneira que “os efeitos de sua
ação sejam compatíveis com a permanência da vida.
O constituinte brasileiro evidenciou a situação a qual os não-humanos eram submetidos,
restando ciente de que diferentemente do homem, os demais animais são incapazes de tomar
posição nas relações às quais estão envolvidos, não podendo defender seus interesses perante a
humanidade. Construiu-se o mandamento constitucional da não-crueldade como uma forma de
mudança de paradigma para lembrar à raça humana do dever de tratar os outros seres com
dignidade, não como instrumentos, nem como escravos.
Nesse sentido, ser cruel é tomado como uma violação da própria dignidade,
cristalizando progressivamente uma fórmula da personalidade desses seres a informar que
existe uma proibição direta ao tratamento insuficiente ou excessivo dirigido aos animais.
Evidencia-se que os seres humanos partilham uma relação moral comum com os demais seres
do planeta, tendo deveres morais com eles, uma vez que conscientes de sua dignidade e de sua
consideração, têm a obrigação de tratar os outros seres através do mesmo status que almejam.
Este giro kantiano representa uma extensão da regra de ouro (“não devamos fazer com o outro
aquilo que não queremos que nos façam na mesma situação” ou mesmo na tradição judaico-
cristã: ”Amai o vosso próximo como a vós mesmos”) através de uma representação jurídica
constitucional, impondo que todos sejam tratados igualmente, independentemente das muitas
diferenças, inclusive a biológica. O estabelecimento desta cláusula geral como um parâmetro
ético-jurídico a orientar o direito permite estabelecer uma dignidade animal como valor-fonte
da experiência axiológica do Direito Animal. A diferença e constatação de que os não-humanos
têm um valor e não meramente é algo valorado molda a Carta de 1988 como um documento
ímpar no cenário mundial, a figurar como um verdadeiro Estatuto Jurídico em favor de direitos
para os animais.
Este encontro entre o direito e uma nova ética pós-humanista ocupa local de destaque
na Constituição, em que os valores morais se convertem em princípios jurídicos, irradiando
pelo sistema normativo como um todo, condicionando a interpretação e a aplicação de todo o
direito infraconstitucional. A dignidade animal renova a relação entre o sistema de normas e o
sistema de valores sociais, direcionando uma obrigação moral direta para com os animais, um
dever de pós-humanidade, em que aqueles que o sentem não são os principais responsáveis por
tal sofrimento, não sendo certo tratá-los indignamente, visto terem direitos, um crédito moral
de não serem tratados de tal modo. Há um verdadeiro reconhecimento do valor inerente dos
animais não-humanos, asseverando seu status de sujeito-de-uma-vida.
PRINCÍPIO DO ANTIESPECISMO
Em 1935, Sobral Pinto utilizou as leis de proteção aos animais da época para livrar Luiz
Carlos Prestes e Harry Berger de condições subumanas as quais estavam submetidos na prisão
pela ditadura de Getúlio Vargas. Alegava, em sua defesa, que seus clientes deveriam ser
tratados em igualdade de condições àquelas impostas aos animais. A proposta agora se inverte.
A Constituição brasileira indica haver uma extensão do princípio de igualdade para além da
espécie humana sob fortes bases ético-filosóficas.
Richard Ryder foi o responsável por estabelecer um paralelo da relação à qual se
encontram submetidos os animais com as diversas outras formas de discriminação visualizadas
na sociedade. Para Ryder, não se pode utilizar critérios relacionados com a aparência física, a
raça, a religião, o gênero ou mesmo a espécie, para formular categorizações entre interesses
humanos e não-humanos. Há um paralelismo moral entre especismo, racismo, sexismo e outros
“-ismos” sociais.
O princípio constitucional do antiespecismo implica dizer que a preocupação com os
outros não deve depender de como são ou das aptidões que possuem. O fato de algumas pessoas
não serem membros da espécie humana não dá o direito de explorá-los, nem significa que se
possa deixar de levá-los em consideração.
Peter Singer pontua a dificuldade na compreensão deste entendimento, ao dizer ainda
no início do movimento pela libertação animal que: “É provável que o leitor seja cético.
‘Libertação Animal’ soa mais como uma paródia dos movimentos de libertação do que como
um objetivo sério. O leitor pode pensar: Nós apoiamos as reivindicações de negros e mulheres
pela igualdade, porque os negros e as mulheres realmente são iguais aos brancos e machos,
iguais em inteligência e em suas habilidades, capacidade de liderança, a racionalidade, e assim
por diante. Os seres humanos e não-humanos, obviamente, não são iguais nestes aspectos. Uma
vez que a justiça exige apenas que tratar iguais de forma igual, o tratamento desigual dos seres
humanos e não-humanos não pode ser uma injustiça”.
A célebre citação de Bentham na defesa da libertação animal ensina que: “Chegará o
dia em que o restante da criação animal venha a adquirir os direitos que nunca poderiam ter
sido negados aos animais, a não ser pela mão da tirania.
O princípio antiespecista garante uma igualdade perante a lei, sem discriminações ou
favoritismos interespécies, bem como combate formas de desigualdade na própria lei, a ser
observado no momento de valoração de todos os atos normativos que submetam os não-
humanos à crueldade, sintoma que macula a norma com o sinal de inconstitucionalidade.
PRINCÍPIO DA NÃO-VIOLÊNCIA
O Brasil é um dos maiores exportadores de produtos derivados de origem animal, sendo
também, junto com os Estados Unidos, Japão e China, um dos maiores consumidores mundiais
de carne. Nos estabelecimentos destinados a este tipo de comércio, segundo o IBGE, o país tem
registrado recordes históricos de abate de animais com mais de 50 milhões de bois, porcos,
ovelhas e bodes criados e abatidos, por ano, sendo, no caso das aves de produção, como as
galinhas, mais de cinco bilhões no mesmo período. Em geral, a população desconhece o que
acontece na indústria alimentícia. A forma violenta com que os animais são tratados, seus
métodos a reduzir os custos e aumentar a produção, as linhas de montagem de criação industrial;
todos a tratar os animais como objetos e números para o consumo humano. A indiferença
artificialmente produzida em supermercados, restaurantes e açougues produz uma espécie de
“banalização do mal” na relação entre humanos e não-humanos, gerando uma incapacidade de
pensar e julgar que o alimento consumido é resultado da dor e sofrimento do animal. Não é por
outro motivo que se substitui a imagem da criação de animais em locais inapropriados e de
forma intensiva por imagens de galinhas alegres e cantantes, bois felizes ao serem mortos, além
de ovelhas contentes esperando o abate. Isso configura uma postura especista eivada de
inconstitucionalidade a interpretação que despreza a necessidade do tratamento não cruel a
ignorar a dignidade dos seres dentro de centros industriais de produção animal, onde são
submetidos ao confinamento intensivo, instrumentalizando a vida destes seres.
Historicamente, a sociedade ocidental vem sendo construída através de episódios
fisicamente destrutivos, onde conflitos violentos e guerras surgem como principal base para o
nascimento de novas realidades sociais, sistemas políticos e relacionamentos entre cidadãos. A
prática da não-violência é um fator importante no nascimento de um novo sistema social que
busque a redistribuição de poder junto com uma reconstrução política e jurídica do Estado.
A ação não-violenta é uma técnica usada para combater poderes institucionalizados que
dificilmente seriam depostos, pois se encontram completamente enraizados na comunidade.
Diversas são as técnicas utilizadas, bastando que não cause dor ou dano físico a outrem como,
por exemplo: cantar, marchar, pintura como forma de protesto, dar às costas, vaiar, recusar-se
a fazer algo, protestos, boicotes, não-cooperação, deixar-se prender e intervenções de espaços
são as mais utilizadas.
Estes procedimentos utilizados em grandes mudanças sociais, apesar de pacíficos, são
vistos distorcidamente pelas autoridades como forma de agressão às instituições democráticas
as quais são governadas pelas mais diversas formas de poder social. Com efeito, ao desenvolver
o ideal da satyagraha, Mohandas Karamchand Gandhi (Mahatma Gandhi) ensinou que a luta
pelos direitos civis se fundamenta sob duas bandeiras: a busca da verdade e a prática da não-
violência (ahimsa). Esta concepção é incorporada pelo Constitucionalismo brasileiro, no artigo
225, §1º, inciso VII, como uma forma de direito de resistência a garantir que todos os seres
vivos têm certos direitos irrevogáveis e inalienáveis, que lhes são inerentes, não podendo sofrer
opressão, além de pontuar a necessidade de defesa destes direitos pelo Estado, não permitindo
violação institucional ou de particulares.
A compreensão do princípio da não-violência corrobora com a filosofia que busca
direitos para os animais, porquanto deixa claro uma postura de pacificação interespécies. O
objetivo é esclarecer a população do mal que se causa aos animais, possibilitando, a cada
indivíduo, uma tomada de posição. Esta atitude evita qualquer erro de interpretação ao
relacionar as diversas formas de manifestação popular com violência, ou até mesmo terrorismo.
A utilização de ações diretas em defesa do ideal, direito ou filosofia não pode significar
sinônimo de ilegitimidade.
Como em toda mudança de perspectiva, ações mais enérgicas, às vezes são inevitáveis,
contudo não se pode iniciar um processo de conscientização pela dignidade de humanos e não-
humanos com violência, abusos ou agressões sob pena de deslegitimação social e
marginalização do movimento. A radicalização tem que ser pacífica, com ideias e educação
constante (satyagraha). Pode ser que demore, mas o ideal ahimsa é de acordo com a história, o
mais eficaz para uma reviravolta definitiva dos valores sociais, pois possibilita uma tomada de
atitude por todos os membros da sociedade na busca de paz e equilíbrio interespécies.
O princípio da não-violência fundamenta o Direito Animal por apontar na direção de
um respeito entre humanos e não-humanos, estabelecendo um entendimento mútuo direcionado
à justiça social. Esta somente será atingida através de mudanças positivas na percepção pública
dos animais não-humanos, reconhecendo os direitos destes seres e, sobretudo não os
concebendo como objetos de prazer, pesquisa, entretenimento, ou seja, exploração por parte do
homem. A transformação de comportamento produzida pela conduta pacifista indica o caminho
para ações cotidianas dirigidas em prol dos não-humanos. Junto com outras preocupações éticas
relacionadas a saúde, estética, religião e bem-estar dos indivíduos, a não exploração dos não-
humanos tornar-se-á um valor social a ser também considerado pelo sistema jurídico.
PRINCÍPIO DO VEGANISMO
O princípio do veganismo evidencia que o reconhecimento do Direito Animal possibilita
uma mudança de atitudes globais e individuais em favor do planeta. Em âmbito individual,
estabelece-se uma nova agenda a defender uma mudança substancial de atitude em defesa dos
não-humanos como uma forma de compromisso político e ético a ser incorporado pela ciência
jurídica. No plano global, há um evidente direcionamento para uma real mudança de paradigma,
a avançar além de posturas benestaristas em direção a uma perceptiva abolicionista de defesa
dos animais. Existe uma rejeição à condição instrumental do animal, reconhecendo o seu valor
inerente. Em geral, ao se falar em veganismo, estabelece-se uma relação com uma dieta
alimentar rígida, sem a manipulação de animais, esquecendo de ser este comportamento
fundamental para a proteção dos não-humanos de conjunturas aviltantes. Durante muitos anos,
afirmou-se que a exportação e a prática de criação intensiva de animais em cativeiro tinham
como objetivo alimentar a população crescente do planeta, prevenindo males como os da fome
e da desnutrição das comunidades mais pobres. Criou-se uma fábula no sentido de que a
sobrevivência dos seres humanos depende do consumo de outros animais, fornecedores de
proteínas, acobertando formas de dor e opressão causadas aos não-humanos.
O papel, portanto, do princípio do veganismo é esclarecer, informar a todos o respeito
para com os demais animais.
COMPETÊNCIA NO DIREITO AMBIENTAL
2. FORMA DE ESTADO
A forma de Estado é o modo pelo qual será exercido esse poder, visando à aplicação dos
seus fins sobre a população. Se o exercício desse poder de império não se encontra ramificado,
estamos diante de um Estado Unitário, enquanto um Estado Federal caracteriza-se pela união
de vários Estados, que cederam sua soberania a um ente central, mantendo somente poderes de
auto constituição, auto-organização, autogoverno e autoadministração.
O federalismo significa uma forma de Estado, denominada Estado Federal ou
Federação, caracterizada pela união de Estados-membros, dotados de autonomia político-
constitucional. Essa forma de Estado nasceu nos Estados Unidos da América, em 1787, com a
Constituição norte-americana. No nosso país foi introduzida em 1889, com a proclamação da
República. O Estado Federal é dotado de personalidade jurídica de direito público internacional,
enquanto a União é a entidade federal com personalidade jurídica de direito público interno,
autônoma em relação aos Estados-membros e a quem cabe o exercício das prerrogativas de
soberania do Estado brasileiro.
No federalismo deve-se frisar que o titular da soberania é o Estado Federal, enquanto os
Estados-membros são detentores de autonomia. Como titular da soberania, o Estado Federal
exerce-a no aspecto externo, pelo fato de ser pessoa jurídica de direito público externo. Já no
âmbito interno, vê-se representado pela União, detentora do exercício desse poder. Com relação
à autonomia, esta é formada por dois elementos essenciais: a) existência de órgãos
governamentais próprios; e b) posse de competências exclusivas. Em relação à posse de
competências exclusivas, ela será maior ou menor de acordo com a formação histórica do
Estado federado.
No Brasil, o sistema federativo concebido por nossa Constituição Federal prevê três
níveis de repartição de competência para o exercício e o desenvolvimento de suas atividades
normativas. Seu ponto crucial é a descentralização do poder entre as entidades federadas. A
doutrina dividiu essa repartição em enumeração taxativa das competências da União,
competência residual ou remanescente dos Estados e do Distrito Federal e competência dos
Municípios no que se refere ao seu interesse local, além de subdividir em competência material
(exclusiva ou comum) e competência legislativa (exclusiva, privativa, concorrente e
suplementar).
FEDERALISMO COOPERATIVO
O Brasil adota na Lei Maior vigente um federalismo de cooperação tricotômico, na
forma do seu artigo 18, núcleo intangível, que prevê, além de competências materiais exclusivas
e privativas, as concorrentes (legislativas) e comuns (materiais) entre as entidades políticas, à
luz do Princípio da Preponderância do Interesse, incluindo os municípios, que pioneiramente
no Brasil foram elevados à condição de entidades políticas, não sendo simples entes
administrativos. Historicamente, em razão de a federação brasileira ter nascido por
desagregação, ao contrário dos Estados Unidos da América, nota-se que o ente central, a União,
detém uma posição privilegiada ao concentrar em suas mãos a maioria das competências
legiferantes e administrativas, em que pese inexistir hierarquia política entre os entes federados,
pois todos gozam de autonomia. Em regra, a técnica utilizada pelo constituinte consistiu na
enumeração dos poderes da União e dos Municípios, com os remanescentes aos Estados e ao
Distrito Federal, consoante bem detalhado pela doutrina constitucional de DIRLEY DA
CUNHA JÚNIOR: “A Constituição brasileira, à semelhança do sistema alemão, adota um
‘sistema complexo que busca realizar o equilíbrio federativo, por meio de uma repartição de
competências que se fundamenta na técnica da enumeração dos poderes da União (artigos 21 e
22), com poderes remanescentes para os Estados (artigo 25, § 1.º) e poderes definidos
indicativamente para os Municípios (artigo 30), mas combina com essa reserva de campos
específicos (nem sempre exclusivos, mas apenas privativos), possibilidades de delegação
(artigo 22, parágrafo único), áreas comuns em que se preveem atuações paralelas da União,
Estados, Distrito Federal e Municípios (artigo 23), e setores concorrentes entre União e Estados,
em que a competência para estabelecer políticas, diretrizes gerais ou normas gerais cabe à
União, enquanto que se defere aos Estados e até aos Municípios a competência suplementar’.
Vale dizer, estruturou-se no Brasil um sistema complexo de partilha de competência em que
coexistem competências privativas, repartidas horizontalmente, com competências
concorrentes, repartidas verticalmente, além das competências comuns, possibilitando-se,
ademais, a participação dos Estados-membros nas competências próprias da União, mediante
delegação”.
Na área ambiental, o federalismo cooperativo vai dizer que, se a proteção ambiental é
dever de todos, todos devem participar da defesa desse interesse transindividual. Ou seja, qual
a melhor postura na área ambiental? Modifica-se a forma de federalismo justamente em
consideração à concepção transindividual de responsabilidade ambiental. É preciso colaborar
com o outro, sendo o mais cooperativo o possível. Se é dever de todos, todos devem atuar e
participar na defesa desse direito transindividual. O ideal de federalismo cooperativo seria cada
um fazer sua parte, porém, no plano da realidade, nem sempre isso é possível. Logo, é preciso
que se faça, ainda que aquilo não seja “a sua parte”. É como pensar em uma pia cheia de pratos
que precisam ser lavados; cada um deveria lavar o que sujou, mas como dificilmente isso
acontece, muito provavelmente alguns vão ter que lavar os pratos que outros sujaram, o mais
importante é que os pratos continuem limpos.
4. FORMAS DE COMPETÊNCIA
Competência “é a faculdade jurídica atribuída a uma entidade ou a um órgão ou agente
do Poder Público para emitir decisões. Competências são as diversas modalidades de poder de
que se servem os órgãos ou entidades estatais para realizarem suas funções”. Há duas espécies
de competência na Constituição Federal: legislativa (formal) e administrativa (material). A
competência formal tem conotação verticalizada ou piramidal, consubstanciada no princípio da
predominância do interesse (interesse geral, regional e local). E a competência material tem
feição horizontalizada, também chamada paralela ou cumulativa, pois, na maioria dos casos, a
atuação de um ente não exclui a de outro, ou seja, soma-se (cooperação). Em outras palavras, o
legislador constituinte repartiu as competências ambientais (materiais e formais) na forma
horizontal (técnica da repartição horizontal) e na forma vertical (técnica da repartição vertical).
Logo as normas de competência são as que atribuem aos entes federados (União,
Estados, Distrito Federal e Municípios) matérias gerais e específicas para melhor administrar
suas unidades federativas e proporcionar bem-estar à população. Essa repartição de
competência decorre do sistema federativo.
VERTICAL HORIZONTAL
INTERESSE COMPETÊNCIA
Nacional / regional
União União Geral
+ de 1 estado
Estados Regional Estados Plena / suplementar
COMPETÊNCIA LEGISLATIVA
A competência legislativa, que se refere ao poder para efetivamente elaborar leis, pode
ser: exclusiva, privativa, concorrente e suplementar.
Em matéria ambiental, a União tem competência legislativa privativa e exclusiva,
conforme artigos 22, parágrafo único, e 25, parágrafos 1º e 2, º respectivamente. Por exemplo,
a União pode legislar privativamente sobre as populações indígenas; sobre jazidas, minas e
outros recursos minerais; e sobre atividades nucleares de qualquer natureza. Nenhum outro ente
federativo pode legislar sobre estas matérias, a não ser que haja delegação ou suplementação
da competência.
A competência legislativa concorrente está prevista no artigo 24 e incisos da
Constituição Federal. Segundo ele, União, Estados e Distrito Federal podem legislar sobre a
mesma matéria, mas a União sempre deve editar as normas gerais. Por exemplo: União, Estados
e Distritos Federal têm competência legislativa concorrente quanto à proteção do patrimônio
histórico, cultural, artístico e paisagístico (inciso VII, artigo 24), mas os parâmetros gerais a
serem observados pelos demais entes federativos na elaboração das leis devem partir da União
inicialmente.
Por fim, a competência legislativa suplementar está prevista nos artigos 24, parágrafo
2º e 30, inciso II. Esta competência é atribuída aos Estados, Distrito Federal e Municípios para
que possam editar leis suplementares às leis gerais existentes, ou que suprem a ausência ou
omissão das mesmas. Por exemplo, a edição de uma lei, pelo Município, de implantação da
coleta seletiva do lixo.
Na prática, o que predomina em relação à competência legislativa em matéria ambiental
é a competência concorrente entre a União e os Estados e o Distrito Federal, cabendo à União
a competência para legislar sobre normas gerais, e aos Estados e ao Distrito Federal a
competência para suplementar as normas gerais editadas pela União. No caso de vácuo
legislativo por parte da União, os Estados e o Distrito Federal podem editar as normas gerais.
Os Municípios podem legislar sobre os temas ambientais de interesse predominantemente local,
desde que respeitando as normas gerais que tiverem sido editadas pela União ou pelo Estado.
Sendo assim, a competência concorrente entre União e Estados e Distrito Federal merece ser
observada com mais atenção, devendo ser discutida em um primeiro momento a questão da
competência da União para editar normas gerais e em um segundo momento a questão da
competência suplementar dos Estados e do Distrito Federal. Em tese, as normas gerais são
aquelas diretrizes essenciais que deverão ser suplementadas ou especificadas pela legislação
estadual ou distrital, e, caso desçam a detalhes, elas deverão ser consideradas inconstitucionais
por invadirem a competência dos Estados e do Distrito Federal. Paulo Affonso Leme Machado
entende não ser necessário que a norma geral abarque todo o território brasileiro, podendo
abranger apenas um único ecossistema, uma única bacia hidrográfica ou uma única espécie
animal ou vegetal. Esse autor também afirma que a União deve inserir nas normas gerais os
tratados e convenções internacionais ratificados, como também guardar fidelidade à
Constituição.
COMPETÊNCIA ADMINISTRATIVA
A competência administrativa (exclusiva) não confere poder para legislar sobre matérias
por ela abrangidas, mas somente o poder de execução (executiva ou administrativa) em
observância à disciplina contida na competência legislativa. Tal fato pode ser identificado pelos
verbos utilizados em todo o rol do art. 21 da CF, tais como: “prover”, “editar”, “autorizar”,
“promover”, “administrar”, “organizar” etc. Assim, a União poderá elaborar e executar planos
de ordenação do território e de desenvolvimento socioeconômico, instituir o sistema nacional
de recursos hídricos e as diretrizes de desenvolvimento urbano, incluindo habitação,
saneamento básico e transportes urbanos, explorar os serviços e instalações nucleares de
qualquer natureza e estabelecer as áreas e as condições para o exercício da atividade de
garimpagem (art. 21, IX, XIX, XX, XXIII, a, b, c e d, e XXV, da CF). Essa competência permite
à União “desempenhar certas atividades de cunho político, administrativo, econômico ou social,
que, por sua natureza, inserem-se na órbita do Poder Executivo, pressupondo o seu exercício a
tomada de decisões governamentais e a utilização da máquina administrativa. Em alguns casos,
o desempenho dessas atividades e serviços pressupõe ainda a participação do Poder Legislativo,
que deve autorizar previamente ou aprovar a posteriori os atos do Poder Executivo. É o que se
dá, por exemplo, com a declaração de guerra e celebração da paz ou com a decretação do estado
de sítio, que dependem de autorização do Congresso Nacional (art. 49, II e IV), ou ainda com
os atos de decretação de intervenção federal e do estado de defesa, que, depois de editados,
deverão ser submetidos à apreciação do Congresso Nacional (art. 49, IV) ”.
A competência administrativa ou executiva atribuída aos entes da Federação possibilita-
lhes o desempenho de diversas tarefas e serviços na esfera política, administrativa, econômica
e social. Vê-se, pois, que a Constituição Federal inovou em relação às Constituições anteriores,
“tratou em artigos diferentes a competência legislativa e a competência executiva, e,
relativamente a esta última, adotou técnica de repartição semelhante à utilizada para a divisão
de competências legislativas, conferindo à União competência exclusiva para atuar em relação
às matérias enumeradas no art. 21, aos Municípios, competência exclusiva quanto aos temas
previstos nos incisos III e IX do art. 30, bem como competência para atuar quando houver
interesse local predominante, e aos Estados-membros competência exclusiva para agir sobre
tudo o que não for de competência exclusiva da União ou dos Municípios, em outras palavras,
competência remanescente”. Em matéria ambiental, foi atribuída à União, aos Estados, ao
Distrito Federal e aos Municípios (competência comum) a responsabilidade de proteger os
documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as
paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos; impedir a destruição desses bens;
promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de
saneamento básico; proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas
formas, preservar as florestas, a flora e a fauna, registrar, acompanhar e fiscalizar a concessão
de direitos de pesquisa e exploração de recursos hídricos e minerais em seus territórios. Não se
trata de competência legislativa, mas de mera cooperação administrativa. Trata-se de
competência administrativa ou de implementação entre os entes da Federação para atuar em
cooperação recíproca comum (art. 23, III, IV, VI, VII, IX e XI, da CF).
A Constituição Federal, além das competências materiais exclusivos, enumera no art.
23 as matérias de competência executiva atribuídas à União, Estados, Distrito Federal e
Municípios. Trata-se de competência material comum repartida entre os entes da Federação
para o cumprimento das tarefas em forma de cooperação. Essa competência não envolve o
poder de legislar, devendo, no entanto, observar as leis já editadas para a implementação das
políticas públicas ambientais. É importante ressaltar que a cooperação entre os entes federados
está prevista no parágrafo único do art. 23 e será disciplinada por leis complementares. Tais leis
têm por finalidade estabelecer o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito
nacional. Acresça-se ainda que “o Estado-membro tem competência material para agir
administrativamente, mesmo nos casos em que a legislação seja da União ou do município.
Sobre isso merece referência precedente do Superior Tribunal de Justiça. O caso envolvia
imposição de multa administrativa por vazamento. A peculiaridade é que a sanção foi aplicada
pela Fazenda do Estado de São Paulo, mas baseada na Lei da Política Nacional do Meio
Ambiente, ou seja, a de n. 6.938, de 31.8.1981”.
Para dar efetividade às matérias repartidas entre os entes da Federação basta o
exercício do poder de polícia ambiental, inerente a cada uma das entidades públicas, sem o qual
seria inviável fazer valer a competência material. Havendo interesse local, a entidade pública
municipal terá competência exclusiva desde que não haja previsão nos dispositivos
constitucionais atribuídos às demais entidades. Isso não implica, em hipótese alguma, a
inobservância das normas de caráter geral da União nem das normas específicas dos Estados.
Adotam-se as mesmas regras em relação à competência legislativa concorrente. A autonomia
municipal não deve ser levantada como fundamento para a sobreposição de normas de interesse
local sobre as normas gerais da União e as específicas dos Estados. Compete aos Municípios
suplementar a legislação federal e estadual no que couber, não podendo legislar plenamente,
mas respeitar a hierarquia das normas.
OBJETO
O objeto da política nacional do meio ambiente é a qualidade ambiental propícia à vida
das presentes e futuras gerações. Qualidade ambiental é o estado do meio ambiente
ecologicamente equilibrado (art. 225, caput, da CF). Esse desiderato só poderá ser alcançado
com o cumprimento dos objetivos arrolados no art. 4º da Lei n. 6.938/81, os quais têm por
escopo a preservação, a melhoria e a recuperação da natureza e dos ecossistemas. É pelo estudo
desse objeto (qualidade ambiental) que o direito ambiental vai traçar sua política nas diversas
esferas da Federação (art. 2º da Lei n. 6.938/81). Assim, preservar é impedir a intervenção
humana na região, procurando manter o estado natural dos recursos ambientais. Melhorar é
permitir a intervenção humana no ambiente com o objetivo de melhorar a qualidade dos
recursos ambientais, realizando o manejo adequado das espécies animais e vegetais. Recuperar,
por fim, é permitir a intervenção humana, buscando a reconstituição da área degradada e fazer
com que ela volte a ter as mesmas características da área original.
OBJETIVOS
A política nacional do meio ambiente tem por objetivo a harmonização do meio
ambiente com o desenvolvimento socioeconômico (desenvolvimento sustentável). Essa
harmonização consiste na conciliação da proteção do meio ambiente, de um lado, com a
garantia do desenvolvimento socioeconômico, de outro, objetivando assegurar condições
necessárias ao progresso industrial, aos interesses da segurança nacional e à proteção da
dignidade da vida humana (art. 2º da Lei n. 6.938/81).
Esse desiderato só poderá ser alcançado mediante o cumprimento dos objetivos
arrolados no art. 4º dessa lei, quais sejam: I — a compatibilização do desenvolvimento
socioeconômico com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico;
II — a definição de áreas prioritárias da ação governamental relativa à qualidade e ao equilíbrio
ecológico, atendendo aos interesses da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios; III — o estabelecimento de critérios e padrões da qualidade ambiental e de normas
relativas ao uso e manejo de recursos ambientais; IV — o desenvolvimento de pesquisas e de
tecnologias nacionais orientadas para o uso racional de recursos ambientais; V — a difusão de
tecnologias de manejo do meio ambiente, a divulgação de dados e informações ambientais e a
formação de uma consciência pública sobre a necessidade de preservação da qualidade
ambiental e do equilíbrio ecológico; VI — a preservação e restauração dos recursos ambientais
com vistas à sua utilização racional e disponibilidade permanente, concorrendo para
manutenção do equilíbrio ecológico propício à vida; VII — a imposição, ao poluidor e ao
predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário, da
contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos.
Tais objetivos têm por escopo dar efetividade ao desenvolvimento sustentável previsto
constitucionalmente, garantir o desenvolvimento socioeconômico e os interesses da segurança
nacional e proteger a dignidade da vida humana previstos na lei infraconstitucional.
DIRETRIZES
As diretrizes da política nacional do meio ambiente serão elaboradas em normas e
planos destinados a orientar a ação dos governos da União, dos Estados, do Distrito Federal e
dos Municípios no que se relaciona com a preservação da qualidade ambiental e a manutenção
do equilíbrio ecológico, observando-se os princípios estabelecidos no art. 2º da Lei n. 6.938/81
(art. 5º da Lei n. 6.938/81). O governo federal poderá estabelecer diretrizes específicas
destinadas à proteção ambiental em uma macrorregião ou diretrizes gerais para a proteção de
uma microrregião (art. 21, IX, c/c o art. 43 da CF).
O SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE (SISNAMA)
Por sua vez, o Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA, criado pelo artigo 6.º,
da Lei 6.938/1981, que detém a competência para realizar a Política Nacional do Meio
Ambiente, é composto por todas as entidades políticas, autarquias e fundações previstas que
desempenhem função administrativa na seara ambiental, especificamente a proteção e melhoria
da qualidade do meio ambiente, da União, dos estados, do Distrito Federal e dos Municípios,
tendo a seguinte estrutura: I – Órgão superior: o Conselho de Governo (CG); II – Órgão
consultivo e deliberativo: o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA); III – Órgão
central: o Ministério do Meio Ambiente; IV – Órgão executor: o Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) e o Instituto Chico Mendes de
Conservação de Biodiversidade; V – Órgãos Seccionais: os órgãos ou entidades estaduais
responsáveis pela execução de programas, projetos e pelo controle e fiscalização de atividades
capazes de provocar a degradação ambiental; VI – Órgãos Locais: os órgãos ou entidades
municipais, responsáveis pelo controle e fiscalização dessas atividades, nas suas respectivas
jurisdições.
O Conselho de Governo, presidido pelo Presidente da República ou, por sua
determinação, pelo Ministro de Estado Chefe da Casa Civil, é o órgão superior, com função de
assessorar diretamente o Presidente da República na formulação de diretrizes de ação
governamental, integrado pelos Ministros de Estado e pelo titular do Gabinete Pessoal do
Presidente da República.
O CONAMA é o órgão consultivo e deliberativo, integrante da estrutura do Ministério
do Meio Ambiente, com poder normativo de amplitude muito controversa, com a finalidade de
assessorar, estudar e propor ao Conselho de Governo diretrizes de políticas governamentais
para o meio ambiente e os recursos naturais e deliberar, no âmbito de sua competência, sobre
normas e padrões compatíveis com o meio ambiente ecologicamente equilibrado e essencial à
sadia qualidade de vida, presidido pelo Ministro do Meio Ambiente, com as seguintes
competências, nos moldes do artigo 8.º da Lei 6.938/1981. Compete ao CONAMA, mediante
proposta do IBAMA, normatizar o licenciamento ambiental, fazendo-o por intermédio de
inúmeras resoluções, principalmente a 237/1997, assim como homologar acordos visando à
transformação de penalidades pecuniárias na obrigação de executar medidas de interesse para
a proteção ambiental. O CONAMA poderá punir os infratores da legislação ambiental, após o
devido processo legal administrativo, através da perda ou restrição de benefícios fiscais
concedidos pelo Poder Público, em caráter geral ou condicional, e a perda ou suspensão de
participação em linhas de financiamento em estabelecimentos oficiais de crédito. De resto, o
CONAMA tem competência para instituir padrões nacionais de controle de poluição dos
veículos automotores, embarcações e aeronaves, o que vem sendo concretizado especialmente
através do PROCONVE – Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores,
bem como estabelecer normas, critérios e padrões relativos ao controle e à manutenção da
qualidade do meio ambiente com vistas ao uso racional dos recursos ambientais, principalmente
os hídricos.
O órgão central do SISNAMA é o Ministério do Meio Ambiente – MMA, antiga
Secretaria do Meio Ambiente da Presidência da República, que planeja, coordena, supervisiona
e controla a execução da PNMA e as diretrizes governamentais fixadas para o meio ambiente.
O órgão executor é o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis – IBAMA, autarquia federal em regime especial, criado pela Lei 7.735/1989,
vinculado ao MMA, a quem compete exercer o poder de polícia ambiental federal, executar
ações da Política Nacional do Meio Ambiente na esfera federal e ações supletivas.
Os órgãos seccionais serão definidos pelos Estados-membros e Distrito Federal, a
exemplo da Secretaria do Meio Ambiente – SEMA, do Conselho Estadual do Meio Ambiente
– CEPRAM e do Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos – INEMA, no Estado da
Bahia. São compostos pelos órgãos ou entidades estaduais (e por analogia do Distrito Federal)
responsáveis pela execução de programas, projetos e pelo controle e fiscalização de atividades
capazes de provocar a degradação ambiental. Deveras, nos termos do artigo 8.º, da LC
140/2011, compete aos Estados executar e fazer cumprir, em âmbito estadual, a Política
Nacional do Meio Ambiente e demais políticas nacionais relacionadas à proteção ambiental,
bem como exercer a gestão dos recursos ambientais no âmbito de suas atribuições. Aliás, os
Estados deverão aprovar e executar a sua Política Estadual do Meio Ambiente, a exemplo do
Estado da Bahia, que o fez através da lei estadual 10.431/2006, promovendo, no âmbito
estadual, a integração de programas e ações de órgãos e entidades da Administração Pública da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, relacionados à proteção e à gestão
ambiental.
Os órgãos locais terão natureza municipal, responsáveis pelo controle e fiscalização de
atividades capazes de provocar a degradação ambiental, não sendo comum a sua criação na
maioria dos municípios brasileiros, mormente os mais pobres e menos populosos, ante a
precária estrutura administrativa que assola grande parte dos entes locais neste país. Nos moldes
do artigo 9.º, da LC 140/2011, é competência administrativa dos Municípios executar e fazer
cumprir, em âmbito municipal, as Políticas Nacional e Estadual de Meio Ambiente e demais
políticas nacionais e estaduais relacionadas à proteção do meio ambiente, exercendo a gestão
dos recursos ambientais no âmbito de suas atribuições. Além disso, deverão formular, executar
e fazer cumprir a Política Municipal de Meio Ambiente, promovendo no seu âmbito a
integração de programas e ações de órgãos e entidades da administração pública federal,
estadual e municipal, relacionados à proteção e à gestão ambiental. Com base no artigo 6.º, da
Lei 6.938/1981, é importante aduzir que existem na atualidade entidades federais ligadas à área
ambiental que legalmente não estão formalmente inseridos no SISNAMA, a exemplo da
Agência Nacional de Águas – ANA.
1. HISTÓRICO
A relação entre ser humano e animal existe há milhares de anos e acompanha a própria
evolução humana. Desde sempre os animais são utilizados pelos humanos de diversas formas,
começando com a caça, a domesticação para subsistência, o uso na agricultura, como símbolos
religiosos, no comércio, dentre outras. Entre os primeiros grandes filósofos já se discutia o valor
e o real direito no sentido de os animais receberem tratamento adequado e não cruel. Algumas
escolas da filosofia antiga privilegiavam o poder do ser humano e a completa submissão de
todas as outras formas de vida. Entretanto, os filósofos que não partilhavam dessa opinião
aliados à filosofia moderna e ao conceito de ética em relação aos animais, conseguiram
significativo progresso no sentido do reconhecimento de direitos de proteção dos animais.
Atualmente essa temática é tratada em um nível de importância jurídica jamais imaginada.
Estatutos, leis e resoluções vêm sendo criados como recursos na tentativa legal de minimizar
séculos de tratamento inadequado e cruel dispensado pelos seres humanos aos animais.
Essa relação de co-dependência também contribuiu para a formação de vínculos
afetivos, onde um animal torna-se mesmo um membro da família, e para a evolução do sentido
de ética em relação a esses seres. Assim, desde a Antiguidade os animais têm encontrado seus
defensores e hoje muitas pessoas entendem que, independentemente do destino reservado a
eles, estes seres devem receber tratamento adequado e não cruel. Atualmente, diversos
segmentos sociais lutam para mudar a inaceitável realidade ainda presente em todas as
sociedades e entre todas as classes sociais, que é o maltrato animal, em suas diversas nuances,
seja em locais como criadouros, laboratórios de pesquisa, espetáculos ou mesmo dentro de casa
como animal de estimação.
VESTUÁRIO
Os animais são criados também por sua pele, usada geralmente para a vestimenta e
adornos. Essa pele, no entanto, não se refere apenas a animais com pelagem espessa, geralmente
criados nos países de inverno rigoroso para produzir casacos de luxo como arminhos, martas,
castores, guaxinins, coelhos, raposas e chinchilas. Na China, também cães são criados pela sua
pelagem, muito usada para fabricar animais de pelúcia. Algumas dessas espécies de animais
são esfoladas vivas. Também o couro, altamente difundido no Brasil, nada mais é que a pele de
bois e vacas, e existem algumas espécies de bovinos que são destinados exclusivamente a este
mercado. Também podemos destacar a lã, que é o pelo do carneiro. O carneiro criado para a lã
tem a mesma vida miserável que outros animais da pecuária, sujeitos a mutilações e castrações
sem anestesia, manipulação genética para produzir uma quantidade excessiva de pelo, o que
acarreta danos ao animal, ferimentos provocados pela tosquia e, em última instância, o abate
para o consumo da carne. Cabe ressaltar que também a criação comercial de chinchilas, visando
ao uso de sua pele, está se expandindo no Brasil, nas regiões serranas e na região Sul. Outro
uso de animal comum na indústria da vestimenta é a seda, tecido fabricado pelo bicho-da-seda,
uma espécie de inseto. Para produzi-la, um grande número de casulos do bicho-da-seda é
fervido com as larvas dentro, para se obter o montante de tecido necessário.
ALIMENTO
Com certeza a forma de exploração animal mais difundida e socialmente aceita é a
pecuária, com a criação de animais para a indústria alimentícia, seja por meio de sua carcaça,
seja por meio de subprodutos (ovos, leite), e que também gera subprodutos para outros tipos de
indústria (como o couro para a indústria do vestuário). As principais espécies de animais criados
para estes fins são bovinos, suínos, ovinos, caprinos, coelhos e aves, especialmente galináceos,
patos e perus. No Brasil, por questões culturais, históricas e geográficas, as principais espécies
usadas na pecuária são os bovinos, os suínos, os caprinos e os galináceos. Existe, em nosso país,
atualmente, mais bovino que seres humanos. A pecuária é responsável por uma série de abusos
e violações de interesses básicos dos animais a elas submetidos. Os animais criados para
alimentação vivem apenas uma fração da idade que poderiam viver em liberdade. Para se ter
uma idéia, uma vaca pode viver mais de 20 anos em liberdade, mas em cativeiro, é abatida antes
dos 5 anos. Bois vivem ainda menos, sendo abatidos entre 2 e 3 anos de idade. Com a
manipulação genética e a eugenia, e diante da crescente demanda por carne, tem-se buscado
criar bois que cheguem cada vez mais cedo à idade de abate, uma forma de criação conhecida
como “novilho precoce”. Galinhas podem viver mais de 10 anos, e em cativeiro o abate se dá
entre 2 e 3 meses. No Brasil ainda predomina a pecuária bovina extensiva (em pastos, em vez
de confinamento), em geral livre de hormônios. Isso não quer dizer que as condições de vida
do rebanho brasileiro sejam boas ou aceitáveis, e é, de todo modo, uma situação que tende a se
transformar nos anos vindouros, diante da pressão por “modernização” da pecuária e da
demanda crescente pela carne brasileira (no país e no exterior, sendo o Brasil um dos maiores
exportadores de carne do mundo). De modo geral, estes animais estão expostos a uma série de
maus-tratos: mutilações sem anestesia (castração pela retirada dos testículos, corte de chifres),
deformações causadas pela manipulação genética (as vacas, por exemplo, produzem 12 vezes
mais leite do que o normal, muito em função da manipulação genética; esse leite excessivo
causa dor, infecções e pode matá-la, se solidificando no organismo do animal), marcação a
ferro. Certos tipos de doenças, mesmo que não sejam fatais, resultam no abate do animal, pois
é economicamente mais interessante matá-lo que administrar um tratamento de saúde caro.
Deve-se ressaltar, por fim, o impacto ambiental causado pela pecuária. Milhões de
dejetos produzidos por animais multiplicados artificialmente são fatores de poluição do solo e
das águas. A quantidade de água usada na criação desses animais, não só em seu consumo
direto, mas também em toda a cadeia produtiva (usadas na limpeza, nas máquinas, no
tratamento da carcaça, etc.) representam grande desperdício. A pecuária é, em todo o mundo, o
principal fator de derrubada de florestas, para a criação de novos pastos, e no Brasil não é
diferente, estando grande parte do rebanho bovino do país situado na fronteira da Amazônia.
As emissões de gases gerados pela digestão de bois e vacas foram apontados, por relatório da
FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação), como uma
contribuição maior para o efeito estufa que as emissões do setor automotor.
ENTRETENIMENTO
Animais são usados para entretenimento em uma série de atividades: equitação, corridas
de cavalos, corridas de cães, rinhas de cães, rinhas de galos, rodeios, vaquejadas, circos com
animais como elefantes, leões, tigres. Além da violação básica da liberdade desses animais,
diversas outras violações derivam dessas atividades. Os cavalos são objeto de eugenia (seleção
genética para “melhoria da raça”), criados em baias e submetidos a treinamentos que não
atendem às suas necessidades, mas ao interesse exclusivo do ser humano. Além disso, se são
usados em competições, estão expostos a ferimentos, muitas vezes fatais, ao doping e outras
formas de abuso. Bois, touros e cavalos usados em touradas, rodeios, vaquejadas, estão
igualmente expostos a ferimentos, ao estresse da competição e a maus-tratos por parte de seus
criadores (como o uso do “sedenho”, que é amarrado no tronco do animal, desde o lombo até a
parte de baixo, incluindo o pênis). No Brasil existia a “farra do boi”, festa popular típica do
estado de Santa Catarina, na qual bois são perseguidos pelas ruas das cidades, sofrendo castigos
pelo caminho. Cães e galos criados para brigas são forçados a lutar até a morte. Cães de corrida
sofrem abusos semelhantes aos de cavalos criados para os mesmos fins. Além disso, eles
dificilmente vivem mais de 2 anos, quando poderiam viver mais de 10. O esforço excessivo
causado pelas corridas pode provocar problemas nas articulações. Nos circos, os animais são
submetidos a diversos castigos físicos pelos domadores e são obrigados a aprender “truques”
que servem apenas para divertir os espectadores. Têm suas presas retiradas, vivem enjaulados,
frequentemente subnutridos e isolados, o que causa sérios danos a animais sociais, como
elefantes. Além disso, não podemos ignorar o fato de que os animais carnívoros criados em
circos geram uma demanda a mais de carne de animais de corte. Existe em andamento uma
campanha para a proibição do uso de animais em circos, no Brasil, o que é fundamental para
encerrar com esta série de abusos. Animais são expostos em zoológicos para saciar a
curiosidade – leiga e científica – do ser humano. Frequentemente se usa a ciência como
justificativa para a continuação deste tipo de abuso, alegando a necessidade de conhecimento
ou mesmo no interesse do animal enjaulado – em função da continuação de uma espécie que
esteja ameaçada de extinção.
EXPERIMENTAÇÃO CIENTIFICA
É o uso de animais em experimentos científicos, testes da indústria de cosméticos e
outras indústrias e na educação, para estudos médicos e biológicos. Também conhecida como
“vivissecção”.
ANIMAIS NA FILOSOFIA
Os pensadores da Antiguidade nunca separavam sentimento e conhecimento. Eles
concebiam o cosmos como uma força viva exprimindo-se de igual modo em cada criatura.
Portanto, homens e animais compartilhavam qualidades que posteriormente passaram a ser
atribuídas exclusivamente aos homens tais como inteligência, razão, sensibilidade. Para o
homem antigo, os animais possuíam não apenas qualidades estéticas superiores, mas também
faculdades cognitivas e sensitivas extremamente aguçadas como por exemplo uma capacidade
de observação e de previsão que nós homens estamos longe de possuir. Muitos pensadores
antigos davam uma igual dignidade ontológica a todos os seres vivos.
Inaugurado o humanismo grego, a vida do animal passa a ter uma única finalidade: a de
servir o homem. Apesar da ferrenha crítica ao relativismo sofista, os filósofos socráticos
caminharam em sentindo semelhando no que diz respeito à importância do humanismo,
afirmando Sócrates que a questão fundamental da filosofia não corresponderia à compreensão
da natureza e de seus fenômenos, mas se relacionava com o estudo do homem em sociedade.
É a famosa máxima do “conhece-te a ti mesmo”, que difunde inquestionavelmente a concepção
de conhecimento a partir do próprio homem. Neste contexto, o homem passa a ser objeto de si
mesmo, reconhecendo-se livre, o que não aconteceria com os animais que não podem exercitar
esse autoconhecimento. Não se sabendo livres, os animais se colocariam na posição de
escravos, contentando-se com a escravidão, uma vez que são incapazes de pensar como um
“eu”, podendo ser controlados através do medo e da dor. Mais do que isso, os homens se
diferenciariam dos animais por seu espírito. Segundo a concepção socrática, todos os animais
possuiriam alma, mas apenas o homem teria um espírito. Além disso, acreditava-se que no
corpo dos animais teria abrigo a alma de homens não virtuosos.
Já na concepção aristotélica, os animais possuiriam alma sensitiva, uma vez que
possuem sentimentos, mas não possuiriam alma imaginativa, a inteligência, pertencente
exclusivamente ao homem, único capaz de elaborar um discurso e de viver na polis. Sendo
assim, a superioridade do homem em relação ao animal se daria, sobretudo, pelo dom da
palavra, sendo natural, portanto, o domínio do homem sobre o animal, da mesma forma que
também seria natural o domínio do de um homem que só tem força física por aquele que tem
ideias. Nesse contexto de dominação, o animal se inclui na sociedade de forma equiparada ao
escravo. Em suas próprias palavras: “A família se formou da mulher e do boi feito para lavra.
O boi serve de escravo aos pobres”.
A grande cadeia dos seres criada com base nessa lógica de dominação faz o homem
grego aparecer logo após os deuses, que estariam em seu topo, seguindo da mulher, das
crianças, dos loucos e dos escravos, em ordem decrescente de parcela de espirito racional. Por
fim, na base da pirâmide, encontram-se os animais, que não possuiriam espírito. Neste contexto,
os seres que se posicionam na base da cadeia existiriam para servir aos que se encontram nos
degraus mais elevados. Dessa forma, a posição dada aos animais é ainda mais penosa, uma vez
que, embora reconheça que eles sintam dor e prazer, aprendam e experimentem os fenômenos,
Aristóteles defende que eles são privados de um mundo espiritual, sendo incapazes de distinguir
um ato de justiça e um ato de injustiça, não merecendo qualquer consideração moral.
Os estoicos, defensores da ideia de que todos os seres vivos são parte integrante da ratio
universal, estando sujeitos ao mesmo Deus e à mesma lei, fizeram a ressalva de que a justiça
estaria reservada apenas aos seres racionais, excluindo os animais desse universo. Neste
contexto, “como o que distingue os seres humanos dos animais e os fazem participar da natureza
divina é a razão, toda vida natural é sempre vida irracional e por isso os animais não podem ser
incluídos na esfera da moralidade”.
Agostinho de Hipona e Tomás de Aquino, retomando a teoria helênica da grande
cadeia da vida, voltam a ressaltar que o pensamento é um atributo espiritual exclusivo do
homem, que corresponde à diferença fundamental entre o ser humano e os demais seres
animados. Sendo os animais seres imperfeitos, destituídos de espírito, deveriam estar a serviço
do ser perfeito e racional. Não possuindo capacidade de pensar, os animais não poderiam,
através do livre arbítrio, participar do acordo político. Para Agostinho, não existe pecado em
matar um animal, pois a providência divina permite o uso dos demais seres pelo homem, uma
vez que a Lei estabeleceria uma necessária hierarquia entre as criaturas. Tal concepção encontra
respaldo no dogma cristão de que Deus outorgou ao homem o domínio sobre todas as criaturas
vivas. Segundo o Livro Gênesis: “E disse Deus: Façamos o homem à nossa imagem, conforme
a nossa semelhança; e domine sobre os peixes do mar, e sobre as aves dos céus, e sobre o gado,
e sobre toda a terra, e sobre todo o réptil que se move sobre a terra. E criou Deus o homem à
sua imagem: à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou. E Deus os abençoou, e
Deus lhes disse: Frutificai e multiplicai-vos, e enchei a terra, e sujeitai-a; e dominai sobre os
peixes do mar e sobre as aves dos céus, e sobre todo o animal que se move sobre a terra. E
disse Deus: Eis que vos tenho dado toda a erva que dê semente, que está sobre a face de toda
a terra; e toda a árvore, em que há fruto que dê semente, ser-vos-á para mantimento. E a todo
o animal da terra, e a toda a ave dos céus, e a todo o réptil da terra, em que há alma vivente,
toda a erva verde será para mantimento; e assim foi”.
Tomás de Aquino, em seu “Tratado de justiça”, afirmou que “ninguém peca por usar
uma coisa para o fim a que foi feita. As plantas vivem em função dos animais e os animais das
plantas”. Analisando a tese de Agostinho sobre a não aplicabilidade do mandamento do 5º
mandamento (não matarás) aos animais, Tomás de Aquino concorda com seu antecessor,
invocando para tanto a “ordem das coisas”, que faz dos animais meros sujeitos mecânicos de
leis causais, naturalmente escravizados aos interesses do homem.
Já na Idade Moderna, com a reafirmação do humanismo pela Renascença, enfatiza-se a
livre intervenção do homem na natureza. No seio das revoluções econômica e social da Europa
do século XVI, ocorria também uma inovadora revolução epistemológica, ressaltando a
autonomia da razão natural humana, afirmando a própria autonomia ontológica do homem e do
mundo. Neste contexto, a filosofia moderna também defende a centralidade do homem no
interior da natureza, embora tenha partido de outros pressupostos, que romperam com o
paradigma teológico. A tradição humanista europeia, portanto, conferiu ao conceito de
racionalidade uma forma muito específica, ao mesmo tempo em que ocultou a especificidade
desta forma mediante a obviedade de uma tradição que não admitia outra possibilidade de
pensamento. O fundamento desta tradição está na ideia de que a razão pertenceria à natureza
do homem distinguindo-o do animal, pensando o conceito de natureza com um componente
normativo.
Tal modelo de racionalidade leva a um cientificismo, que entende o conhecimento como
derivado dos dados da experiência. Dever-se-ia abandonar as falsas noções para tornar possível
um entendimento correto da natureza, afim de nela poder intervir. Utilizando-se dessa
racionalidade normativa, Francis Bacon foi o primeiro teórico a enfatizar a capacidade de
intervenção humana na natureza, explicitando, de maneira forte, a íntima relação entre saber e
poder. Instaura-se, portanto, outra maneira de se visualizar a relação do homem com a natureza,
cabendo-lhe dominá-la e utilizá-la em seu proveito. Bacon defendeu uma atitude
experimentalista face aos animais e a filosofia de dominação e manipulação da natureza. Bacon
propõe o abandono da tradição, seja ela científica ou filosófica, para construção de uma nova
ciência, permitindo-se viver um presente puro, liberto de historicidade.
Descartes defendeu que os animais seriam incapazes de sentimento, não passando de
simples autômatos. Advogou, ainda, que os animais seriam destituídos de qualquer dimensão
espiritual, e que, embora dotados de visão, audição e tato, seriam insensíveis à dor, incapazes
de pensamento e de consciência de si. A teoria do animal-máquina de Descartes serviu para
justificar inúmeras práticas cruéis em prejuízo destes, inclusive a vivissecção. Descartes não
negou a existência de semelhanças entre o corpo do homem e do animal, comparando ambos a
máquinas, havendo, contudo, diferenças fundamentais, consistente, por exemplo, na
impossibilidade da “máquina” animal fazer uso das palavras ou de outros sinais compondo-os
para exprimir seus sentimento ou pensamento. A máquina animal, diferentemente do homem,
não agiria com conhecimento, mas unicamente pela disposição de seus órgãos, como
autômatos.
Os primeiros teóricos que propuseram uma nova forma de seleção acerca do direito dos
animais também faziam parte do movimento humanista moderno, dentre eles, Voltaire, criticou
a opressão praticada contra os animais, afirmando que se tratava de uma extrema pobreza de
espírito equiparar seres vivos a máquinas utilitárias, nas suas palavras: “É preciso, penso eu, ter
renunciado à luz natural, para ousar afirmar que os animais são somente máquinas. Há uma
contradição manifesta em admitir que Deus deu aos animais todos os órgãos do sentimento e
em sustentar que não lhes deu sentimento. Parece-me também que é preciso não ter jamais
observado os animais para não distinguir neles as diferentes vozes da necessidade, da alegria,
do temor, do amor, da cólera, e de todos os seus afetos; seria muito estranho que exprimissem
tão bem o que não sentem”.
Rousseau também criticou o uso de animais em experimentos, afirmando que,
desprovidos de razão, os animais realmente não podem reconhecer a lei natural, mas, unidos
que estão, de alguma forma, à natureza humana pela sensibilidade de que são dotados, é de se
entender que também devam participar do direito natural e o homem estaria obrigado, para com
eles a certas espécies de deveres. Argumenta, ainda, que se a lei natural obriga a não fazer
nenhum mal ao semelhante é menos porque ele é um ser racional do que porque é um ser
sensível, qualidade que, sendo comum ao animal e ao homem, “deve ao menos dar a um o
direito de não ser maltratado inutilmente pelo outro”.
Também Montaigne propunha tolerância no trato dos animais, afirmando que aos
homens se deve justiça, mas não poderíamos nos esquecer das demais criaturas às quais
deveríamos solicitude e benevolência. Retomando Plutarco, Montaigne ressaltou, por sua vez,
que haveria mais diferenças entre dois homens do que entre um homem e um animal.
Espinosa, por sua vez, propôs uma ética baseada na identidade entre Deus e Natureza.
Ora, sendo Deus e natureza uma só coisa, poder-se-ia concluir que a natureza é o ser fundante
de todos os seres. Deduz-se, portanto, que todos os seres estão interligados, embora cada um
mantenha sua individualidade. Dito de outra forma, cada realidade individual seria
manifestação do todo, que “se individualiza e concretiza em unidades autônomas, como os
homens, os animais e o meio ambiente”. Afirmando que o homem não é a causa nem o centro
do mundo, mas apenas uma parte de uma rede composta por infinitas outras coisas que
estabelecem entre si uma relação de interdependência, o pensamento de Espinosa tem sido
utilizado como “fundamentação da ética ambiental”.
Também Leonardo da Vinci, teorizou em prol dos animais, afirmando que “chegará o
dia em que os homens conhecerão o íntimo dos animais e, então, um crime contra qualquer um
deles será considerado um crime contra a Humanidade”. Jeremy Bethan, Thomas Regan, Arthur
Schopenhauer, dentre outros, também contrariaram as correntes antropocêntricas, recebendo
grande reforço com as teorias de Alexandre Humboldt e Ernst Haeckel, considerado pai da
ecologia moderna. Contudo, nenhuma contribuição somou mais importância para formação de
uma nova comunicação acerca dos direitos dos animas que a teoria evolucionista de Charles
Darwin, demonstrando que todos os seres vivos integram a mesma escala evolutiva, o que
possibilitou as primeiras discussões acadêmicas sobre o direito dos animais.
No âmbito acadêmico brasileiro, a mudança de comunicação no que diz ao trato com os
animais teve como fomentador o abolicionista José do Patrocínio, que comentou em sua
coluna jornalística intitulada “A notícia” que teria um respeito egípcio pelos animais,
acreditando que estes teriam alma, ainda que rudimentar, sofrendo conscientemente as revoltas
contra a injustiça humana. Em suas palavras: “Já vi um burro suspirar como um justo depois de
brutalmente esbordoado por um carroceiro que atestara o carro com carga para uma quadriga e
queria que o mísero animal o arrancasse do atoleiro”. Olavo Bilac reafirmou o amor à vida,
“amor a tudo quanto vibra e sente, de tudo quanto rasteja e voa, de tudo quando nasce e morre”.
3. ABOLICIONISMO X BEMESTARISMO
BENESTARISMO – Inicialmente, a preocupação que se constata com o direito dos
animais, limita-se em assegura-lhes tratamento humanitário, a fim de evitar sofrimentos
“desnecessários”. Somente, após a década de setenta eis que surge uma nova filosofia
reivindicando uma posição mais avançada em relação aos animais. Peter Singer foi o precursor
desse movimento quando lançou o livro “Libertação Animal”. Neste livro ele denuncia os
abusos em que os animais são submetidos em suas diferentes formas, além de demonstrar que
essas atividades violam o princípio fundamental de justiça, haja vista sua teoria de igual
consideração de interesses. Singer defende a extensão do princípio da igualdade a animais não
humanos. Peter Singer baseia sua argumentação de defesa dos animais no Princípio da Igual
Consideração de Interesses, no qual se fundamenta a igualdade de todos os seres humanos. Este
princípio inclui todos os seres numa moralidade universal, que por sua vez, não se baseia em
característica como raça, sexo ou grau de inteligência dos envolvidos. Neste compasso, todos
os seres, a propósito deste trabalho, receberiam o atributo igualdade, e consequentemente se
efetivariam como sujeitos de direitos. Mas nota-se, utilizar esse princípio em prol dos animais
não significa que animais e seres humanos devam ser considerados iguais e, por isso, merecem
tratamento igual. Até porque, os próprios seres humanos não são iguais. Significa, sim,
comparar seus interesses. O artefato basilar desse princípio é levar em conta os interesses de
cada ser, sejam quais forem, os quais devem receber o mesmo peso dos interesses iguais de
qualquer outro ser, e os interesses de seres humanos e animais igualam-se na aversão que ambos
têm ao sofrimento. Singer considera a morte de um animal menos importante do que a morte
de homem, isso porque a existência humana é mais valiosa do que a dos animais. Para ele, a
morte de um animal pode ser justificada, desde que seja respeitado seu interesse de não sentir
dor. Desta forma, não há nada de errado em matar os animais. Singer peca quando defende
apenas o bem estar animal em razão do princípio da igual consideração de interesses, que está
fundamentalmente apoiada no respeito, bem estar, no valor intrínseco, na compaixão, na
sensibilidade ao sofrimento. Ou seja: trata-se mais de uma questão ética que de Direito. Nesta
linha de raciocínio, defende-se o bem estar dos Animais, o que não impede totalmente sua
exploração, vez que são considerados meios para se chegar aos fins humanos. Assim, continuam
sendo considerados objetos e apropriados pelo homem o que permite sua exploração para
experimentos científicos, na medida em que certas precauções fossem a eles relacionadas
ABOLICIONISMO – Tomas Reagan traz nova concepção do homem integrado à
natureza. A dignidade estaria fundada no reconhecimento entre pessoas e demais seres. A
dignidade apresentaria uma relação estreita com o respeito entre as espécies. Com efeito, essa
relação seria síntese dos direitos fundamentais (à vida, à integridade física e à liberdade)
pensada também para incluir os animais. O filósofo esclarece que como se tem direitos iguais,
enquanto sujeitos-de-uma-vida, e pelo fato de alguns animais serem como o ser humano, já que
são igualmente sujeitos-de-uma vida, deve-se concluir que esses animais, também, têm direitos,
incluindo o direito a serem tratados com respeito. Aqueles que se enquadram nestes critérios
estabelecidos, possuem valor próprio, o que não permite utilizá-los como recurso para outros
seres. Por essa razão, não podem excluí-los da esfera moral e, consequentemente, de sujeitos
de direitos. O reconhecimento destes direitos, no caso dos animais, implica no reconhecimento,
por parte da comunidade moral, de deveres diretos para com eles e isso só é possível se essa
comunidade afirma direitos morais básicos aos seres humanos que, pelo princípio da coerência,
possam ser expandidos a esses animais. Portanto, a declaração de direito, no decorrer dos
séculos tem-se aprimorado nas relações entre seres humanos em condições desfavorecidas do
ponto de vista fatual (biológico), levando em conta a consideração moral, o que indica que se
pode fazer o mesmo para avalizar respeito aos animais. Sua tática é mostrar que se todos os
seres humanos são amparados do mesmo modo, direitos morais básicos (direito à vida, à
integridade corporal e à liberdade), e não se apresenta justificativa qualquer para defender este
atributo, e se a nenhum desses direitos faz-se corresponder uma habilidade qualquer quando se
trata de seres humanos, então, não se pode, a fim de que seja mantida a coerência ética, exigir-
se dos animais performances que eles não podem demonstrar para que possuam tais direitos.
Se isto ocorrer, muitos seres humanos que também não apresentam a performance considerada
necessária para merecê-los, deverão ser deixados de fora da comunidade moral. Reagan defende
a abolição de toda e qualquer forma de exploração institucionalizada dos animais, tendo como
ponto de partida a ideia que os animais possuem um valor inerente, pois não há como atribuir
direito aos animais caso não se imponha aos humanos o abandono de hábitos arraigados de
exploração animal.
4. DE RES NULLIUS A BEM DO ESTADO
Segundo Paulo Affonso Leme Machado, o Direito Romano fazia distinção entre res
nullius, res derelictae e communes omnium. Res nullius são as coisas sem dono e que nunca
foram apropriadas, res derelictae são as que o proprietário abandonou ou renúncia e res
communes omnium são “aquelas coisas comuns que são suscetíveis de apropriação parcial,
como quando alguém apanha um pouco d’água de um rio público”. As espécies animais em
relação ao homem tinham, no passado, repercussão jurídica não preponderante no que concerne
à conservação e defesa das espécies e de seus habitats, mas nos aspectos referentes aos modos
pelos quais o homem poderia tornar-se proprietário ou como viria a perder a propriedade dos
animais.
Os animais, durante nossa história civilizatória, serviram para diversas formas de
interesse. Durante muito tempo, o homem ia a floresta para caçar, buscar sua alimentação e
formas de sobrevivência. Nessa perspectiva, começamos a contar com a ajuda de animais para
enviar mensagens, auxiliar nas trilhas e caças, servir de alimento, farejar algo procurado. Essas
modificações são impulsionadas principalmente quando das plantações, as quais possibilitavam
ao ser humano não ser nômade. O animal começa a ter uma utilidade diferente.
Livres no mundo, os animais poderiam buscar sua sobrevivência da melhor forma
possível. Nessa época de animal como coisa de ninguém, nesse momento, o animal começou
a despertar um certo tipo de interesse humano e, consequentemente, jurídico. Os animais
passaram a ser chamados de animais bravios (aqueles animais que estavam na natureza e não
tinham contato com ninguém, hoje são chamados de animais silvestres). Na mente humana, o
animal é um ser conflituoso, pois quer ocupar o espaço que é do homem. Até quando alguém
resolve dar determinado interesse em certo animal e transforma aquele animal bravio, que não
era coisa de ninguém, em um animal domesticado. Como domesticado, ele começou a ter valor.
O direito diz que, se é coisa de ninguém, quem achar é o primeiro proprietário. Os
animais se tornaram particularizados, domesticados. O homem começa a buscar na natureza
bravia, feroz, alguns animais, domesticando-os. Começa-se a perceber o animal não como ser
livre, mas um ser que se tem interesse. Precisa marcar o animal para saber de quem é; o animal
passa então a ter um fim privado, passando a ter um dono, que é aquele que o doméstica. Assim,
o animal passou a ser protegido pelo direito privado. De que forma? Vai dar proteção. Mas a
proteção dos animais domesticados vai ser diferente dos animais bravios.
No século XIX, esse conceito de animal domesticado começa a ficar bem amplo. A
revolução industrial vem impulsionar isso ainda mais: além de o animal domesticado oferecer
matéria prima, alimentação, transporte, a revolução industrial vai impulsionar o surgimento do
vapor, do aço. E o surgimento de uma cidade mais industrializada vai gerar alguns problemas:
doenças, superpopulação nas cidades. Nessas cidades, a gente começa a desenvolver todas as
formas de ciência, dentre elas a medicina, a biologia, a genética. E a gente começa a perceber
que algumas condutas realizadas com o próximo não estavam mais sendo permitidas. Como a
jornada de trabalho extensa, testes de remédios em idosos etc.
PAN
HOMO
GORILA CHIMPANZÉ ORANGOTANGO HOMEM BONOBO
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso
comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à
coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:
VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em
risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais à
crueldade.