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SUMÁRIO

1. DIREITO CIVIL E CONSTITUIÇÃO ....................................................................................................... 3


2. DIVISÃO DA PARTE GERAL ................................................................................................................ 4
3. PESSOAS NATURAIS .......................................................................................................................... 5
4. TUTELA E CURATELA....................................................................................................................... 23
AÇÃO DE TUTELA ................................................................................................................................... 28
AÇÃO DE INTERDIÇÃO E NOMEAÇÃO DE CURADOR ............................................................................ 35
5. DIREITOS DA PERSONALIDADE ....................................................................................................... 39
6. AUSÊNCIA ....................................................................................................................................... 62
7. PESSOAS JURÍDICAS ........................................................................................................................ 63
8. DOMICÍLIO ...................................................................................................................................... 77
9. BENS JURÍDICOS ............................................................................................................................. 81
10. FATOS JURÍDICOS ..................................................................................................................... 96
11. NEGÓCIO JURÍDICO ................................................................................................................. 106
AÇÃO DE ANULAÇÃO DE NEGÓCIO JURÍDICO .................................................................................... 151
AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO ........................................................... 154
AÇÃO REVOCATÓRIA OU AÇÃO PAULIANA ........................................................................................ 157
12. ATO ILÍCITO ............................................................................................................................. 174
13. PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA .................................................................................................. 189

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01 1. DIREITO CIVIL E CONSTITUIÇÃO

Apesar de o Direito Civil ser ramo do direito privado, em razão de ter utilidade
particular, deve ser interpretado a luz das normas constitucionais. Os ramos do Direito
não podem ser interpretados de forma isolada e estanque. Há, nesse sentido, a
chamada constitucionalização do direito privado ou do direito civil. Este processo
refere-se a aplicação das normas constitucionais na interpretação do direito privado.
Então, se houver a interpretação das leis civis de acordo com a Constituição e
os direitos fundamentais haverá a possibilidade da permanente evolução do Direito
Civil, adaptando-se, dessa maneira, à evolução da sociedade.
No direito brasileiro, este processo ocorreu, especialmente, a partir da
Constituição Federal de 1988, quando as normas garantidoras de direitos e garantias
fundamentais passaram a ser aplicados e respeitados no âmbito civil. Com isto, o
direito civil está, permanentemente sob a tutela constitucional e os direitos
fundamentais, que já eram respeitados por parte do Estado, passam a ser, também,
no âmbito privado, nas relações entre particulares. Exemplo disto são os direitos
fundamentais da igualdade, liberdade, dignidade, devido processo legal, etc.

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022. DIVISÃO DA PARTE GERAL

O Código Civil divide a parte geral em três partes. A teoria das pessoas, que
trabalha com os sujeitos de direitos (pessoas naturais e jurídicas); a teoria dos bens,
que se destina a estudar os objetos de direitos; e a teoria dos fatos, que são os
eventos que criam, modificam, conservam, transferem ou extinguem direitos
(negócios jurídicos, atos jurídicos – lícitos e ilícitos, prescrição e decadência, prova).
Existe, portanto, uma lógica de estudo. 1) estudam-se as pessoas; 2) estudam-
se os bens, que são os objetos dos direitos; 3) estuda-se os fatos jurídicos, ou seja, o
meio pelo qual nascem, modificam-se e extinguem-se os direitos.

pessoas naturais

DAS PESSOAS pessoas jurídicas


PARTE GERAL

domicílio

DOS BENS negócios jurídicos

atos jurídicos lícitos

DOS FATOS
atos ilícitos
JURÍDICOS

prescrição e decadência

prova

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033. PESSOAS NATURAIS

A função do Direito é regular a sociedade e esta última é formada de pessoas. A


todo direito, corresponde um sujeito, que é, então, o titular.
É nesse sentido o art. 1.º, CC: “Toda pessoa é capaz de direitos e deveres na
ordem civil”.
Somente as pessoas podem ser sujeitos de Direito, sejam elas naturais ou
jurídicas. Animais e coisas são objetos do Direito, mas não podem ser sujeitos dele.
A questão, agora, é saber a partir de quando a pessoa pode ser considerada
sujeito de Direito, ou seja, basta que uma pessoa nasça para que seja assim
considerada e, dessa forma, adquira personalidade.

3.1. Personalidade/ Aquisição da personalidade jurídica


Personalidade jurídica é a “aptidão genérica para titularizar direitos e contrair
obrigações, ou, em outras palavras, é o atributo necessário para ser sujeito de
direito”1. A partir do momento em que o sujeito tem personalidade, que ele se torna
sujeito de direito, podendo praticar atos e negócios jurídicos.
O art. 2.º, CC afirma que a personalidade civil começa com o nascimento com
vida, mas traz a ressalva de que a lei protege os direitos do nascituro desde a
concepção:

Art. 2.º A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas
a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.

Dessa maneira, o marco inicial da personalidade é o nascimento com vida. O


nascimento ocorre quando a criança é separada do ventre materno, seja por parto
natural, seja por cesárea. O importante é que a unidade biológica seja desfeita, de
forma que mãe e filho sejam dois corpos, cada um com uma vida biológica e orgânica
própria.
Mas como saber se houve nascimento com vida? Basta que a criança tenha
respirado. Se respirou, viveu, mesmo que tenha morrido em seguida. Neste caso,

1GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil: parte geral.
18.ed. v.1. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 132.
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lavra-se o assento de nascimento e o de óbito (art. 53, § 2.º, Lei de Registros
Públicos).
Qual o motivo de toda essa importância dada ao nascimento com vida, a saber
se a criança respirou ou não? Traga-se um exemplo para clarificar.
Ex.: casal João e Maria, casados pelo regime da separação de bens. João falece
e Maria está grávida. Se o filho de Maria e João nascer com vida, respirar, tornar-se-
á herdeiro do patrimônio junto com Maria. Assim, se ele falecer em seguida, Maria
receberá todo o patrimônio, pois é herdeira do filho. Contudo, se a criança não tiver
respirado, o patrimônio de João será transmitido a Maria e aos pais de João.
Como é feita a constatação do nascimento com vida? Através de um exame
chamado docimasia hidrostática de Galeno, que se baseia no princípio de que se o
feto respirou, inflou de ar seus pulmões. Assim, retirando-se os pulmões do feto que
veio a falecer, colocando-se em um recipiente com água, se tiver havido respiração,
o pulmão flutuará. Caso não tenha havido respiração, o pulmão, não tendo recebido
ar, estando com as paredes alveolares unidas, afundará. Atualmente já existem outras
formas de verificar a respiração, pois é possível, através de exame microscópio de
fragmentos do pulmão verificar se possui bolhas de ar ou não.

3.1.1. Nascituro
Há discussões, com relação aos direitos do nascituro, sobre o fato de que se o
Brasil adotou a teoria natalista ou concepcionista.
Nascituro é aquele que está por nascer, ou seja, aquele que está se
desenvolvendo no ventre materno, que foi concebido, mas não nasceu ainda.
O art. 2.º, CC protege os direitos do nascituro desde sua concepção.
Assim, pela teoria natalista, quando a personalidade só é adquirida com o
nascimento com vida, o nascituro só teria expectativa de direito. Contudo, isto não
está pacificado na doutrina.
Há defensores da teoria da personalidade condicional, que entendem que o
nascituro tem direitos em condição suspensiva, ou seja, possui uma personalidade
condicional, que surge, com o nascimento com vida. ADEPTOS: Arnold Wald, Serpa
Lopes, Sílvio Rodrigues, Caio Mario.
Há, ainda, a teoria concepcionista, que entende que a aquisição da
personalidade ocorre desde a concepção e, a partir de então, o feto já é sujeito de

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direitos. Admite-se, neste caso, a fixação de direitos patrimoniais, como o direito a
alimentos, p.ex. ADEPTOS: Teixeira de Freitas, Clóvis Beviláqua, Limongi França.
Também não se pode deixar de considerar que existem autores, como Maria
Helena Diniz e Carlos Roberto Gonçalves, que defendem que a personalidade do
nascituro confere aptidão unicamente para titularizar direitos personalíssimos (sem
qualquer conteúdo patrimonial), como, por exemplo, o direito à vida, a uma gestação
saudável. Os direitos patrimoniais só estariam sujeitos àqueles que tivessem
nascimento com vida.
Tradicionalmente, o Brasil adota a teoria natalista, ainda que a teoria
concepcionista venha ganhando força, especialmente na jurisprudência do STJ:

DIREITO CIVIL. ACIDENTE AUTOMOBILÍSTICO. ABORTO. AÇÃO DE


COBRANÇA. SEGURO OBRIGATÓRIO. DPVAT. PROCEDÊNCIA DO
PEDIDO. ENQUADRAMENTO JURÍDICO DO NASCITURO. ART. 2º DO
CÓDIGO CIVIL DE 2002. EXEGESE SISTEMÁTICA. ORDENAMENTO
JURÍDICO QUE ACENTUA A CONDIÇÃO DE PESSOA DO NASCITURO.
VIDA INTRAUTERINA. PERECIMENTO. INDENIZAÇÃO DEVIDA.
ART. 3º, INCISO I, DA LEI N. 6.194/1974. INCIDÊNCIA.
1. A despeito da literalidade do art. 2º do Código Civil - que condiciona a
aquisição de personalidade jurídica ao nascimento -, o ordenamento jurídico
pátrio aponta sinais de que não há essa indissolúvel vinculação entre o
nascimento com vida e o conceito de pessoa, de personalidade jurídica e de
titularização de direitos, como pode aparentar a leitura mais simplificada da
lei.
2. Entre outros, registram-se como indicativos de que o direito brasileiro
confere ao nascituro a condição de pessoa, titular de direitos: exegese
sistemática dos arts. 1º, 2º, 6º e 45, caput, do Código Civil; direito do nascituro
de receber doação, herança e de ser curatelado (arts. 542, 1.779 e 1.798 do
Código Civil); a especial proteção conferida à gestante, assegurando-se-lhe
atendimento pré-natal (art. 8º do ECA, o qual, ao fim e ao cabo, visa a garantir
o direito à vida e à saúde do nascituro); alimentos gravídicos, cuja titularidade
é, na verdade, do nascituro e não da mãe (Lei n. 11.804/2008); no direito
penal a condição de pessoa viva do nascituro - embora não nascida - é
afirmada sem a menor cerimônia, pois o crime de aborto (arts. 124 a 127 do
CP) sempre esteve alocado no título referente a "crimes contra a pessoa" e
especificamente no capítulo "dos crimes contra a vida" - tutela da vida
humana em formação, a chamada vida intrauterina (MIRABETE, Julio
Fabbrini. Manual de direito penal, volume II. 25 ed. São Paulo: Atlas, 2007, p.
62-63; NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal. 8 ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p.
658).
3. As teorias mais restritivas dos direitos do nascituro - natalista e da
personalidade condicional - fincam raízes na ordem jurídica superada pela
Constituição Federal de 1988 e pelo Código Civil de 2002. O paradigma no
qual foram edificadas transitava, essencialmente, dentro da órbita dos direitos
patrimoniais. Porém, atualmente isso não mais se sustenta. Reconhecem-se,
corriqueiramente, amplos catálogos de direitos não patrimoniais ou de bens
imateriais da pessoa - como a honra, o nome, imagem, integridade moral e
psíquica, entre outros.
4. Ademais, hoje, mesmo que se adote qualquer das outras duas teorias
restritivas, há de se reconhecer a titularidade de direitos da personalidade ao
nascituro, dos quais o direito à vida é o mais importante. Garantir ao nascituro
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expectativas de direitos, ou mesmo direitos condicionados ao nascimento, só
faz sentido se lhe for garantido também o direito de nascer, o direito à vida,
que é direito pressuposto a todos os demais.
5. Portanto, é procedente o pedido de indenização referente ao seguro
DPVAT, com base no que dispõe o art. 3º da Lei n.
6.194/1974.
Se o preceito legal garante indenização por morte, o aborto causado pelo
acidente subsume-se à perfeição ao comando normativo, haja vista que outra
coisa não ocorreu, senão a morte do nascituro, ou o perecimento de uma vida
intrauterina.
6. Recurso especial provido.
(REsp 1415727/SC, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA
TURMA, julgado em 04/09/2014, DJe 29/09/2014)

RECURSO ESPECIAL. DIREITO SECURITÁRIO. SEGURO DPVAT.


ATROPELAMENTO DE MULHER GRÁVIDA. MORTE DO FETO. DIREITO À
INDENIZAÇÃO. INTERPRETAÇÃO DA LEI Nº 6194/74. 1 - Atropelamento de
mulher grávida, quando trafegava de bicicleta por via pública, acarretando a
morte do feto quatro dias depois com trinta e cinco semanas de gestação. 2
- Reconhecimento do direito dos pais de receberem a indenização por danos
pessoais, prevista na legislação regulamentadora do seguro DPVAT, em face
da morte do feto. 3 - Proteção conferida pelo sistema jurídico à vida intra-
uterina, desde a concepção, com fundamento no princípio da dignidade da
pessoa humana. 4 - Interpretação sistemático-teleológica do conceito de
danos pessoais previsto na Lei nº 6.194/74 (arts. 3º e 4º). 5 - Recurso especial
provido, vencido o relator, julgando-se procedente o pedido. (STJ, REsp
1120676/SC, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, Rel. p/ Acórdão Ministro
PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em
07/12/2010, DJe 04/02/2011)

Na decisão acima, verifica-se que foi reconhecia a aptidão para ser sujeito de
direitos do nascituro, independentemente de ter personalidade ou de ser pessoa.
Reconhecido, neste caso, o direito ao recebimento de seguro DPVAT por morte do
nascituro.

DIREITO CIVIL. DANOS MORAIS. MORTE. ATROPELAMENTO.


COMPOSIÇÃO FÉRREA. AÇÃO AJUIZADA 23 ANOS APÓS O EVENTO.
PRESCRIÇÃO INEXISTENTE. INFLUÊNCIA NA QUANTIFICAÇÃO DO
QUANTUM. PRECEDENTES DA TURMA. NASCITURO. DIREITO AOS
DANOS MORAIS. DOUTRINA. ATENUAÇÃO. FIXAÇÃO NESTA
INSTÂNCIA. POSSIBILIDADE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I -
Nos termos da orientação da Turma, o direito à indenização por dano moral
não desaparece com o decurso de tempo (desde que não transcorrido o lapso
prescricional), mas é fato a ser considerado na fixação do quantum. II - O
nascituro também tem direito aos danos morais pela morte do pai, mas a
circunstância de não tê-lo conhecido em vida tem influência na fixação do
quantum. III - Recomenda-se que o valor do dano moral seja fixado desde
logo, inclusive nesta instância, buscando dar solução definitiva ao caso e
evitando inconvenientes e retardamento da solução jurisdicional. (STJ, REsp
399028/SP, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA
TURMA, julgado em 26/02/2002, DJ 15/04/2002, p. 232)

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O STF não tem posição formada. Ora segue a teoria natalista, ora a
concecpionista (VER JULGAMENTO ADPF 54 – QUAL O ENTENDIMENTO QUE
TIVERAM?) No julgamento da ADIn 3510 o STF entendeu, pelo relator, Min. Carlos
Ayres Britto que o nascituro só tem proteção com a implantação do embrião no útero
materno, permitindo, assim, a pesquisa com células tronco embrionárias.
O certo é que ao nascituro são reconhecidos certos direitos, desde que
reconhecida sua personalidade e, posteriormente, sua capacidade. Sendo assim,
possui capacidade reduzida.
Mas o art. 2.º, CC também protege os direitos do natimorto, ou seja, aquele que
não chegou a nascer com vida (não chegou a respirar). Nesse aspecto, o enunciado
1 das Jornadas de Direito Civil prevê que há a proteção do nome, da imagem e da
sepultura:

A proteção que o Código defere ao nascituro alcança o natimorto no que


concerne aos direitos da personalidade, tais como: nome, imagem e
sepultura.

3.2. Capacidade de fato e Capacidade de direito


As pessoas naturais possuem dois tipos de capacidade: capacidade de direito e
capacidade de fato.
Adquirida a personalidade jurídica, toda pessoa passa a ser capaz de direitos e
obrigações. Dessa forma, passa a ter a capacidade de direito, ou seja, a aptidão que
as pessoas têm, conferida pelo ordenamento jurídico, para serem titulares de uma
situação jurídica.
Assim, toda pessoa tem capacidade de direito. Contudo, nem todos podem
exercer seus direitos pessoalmente, pois pode faltar a consciência para o exercício de
atos de natureza privada, em razão de determinadas limitações (orgânicas – idade,
p.ex. – ou psicológicas – viciados em tóxicos). Estes detêm apenas a capacidade de
direito.
Aqueles que puderem atuar pessoalmente no exercício de seus direitos terão,
além da capacidade de direito, a capacidade de fato.
Assim, aqueles que tiverem as duas capacidades – de fato e de direito – terão a
capacidade civil plena.

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comum a toda pessoa.

inerente a personalidade

CAPACIDADE CIVIL PLENA


Capacidade de Direito
toda pessoa é capaz de
direitos e deveres

termina com a morte

relacionada com o exercício


dos atos da vida civil

nem todas as pessoas


Capacidade de Fato
possuem capacidade de fato

adquire-se com a maioridade


civil ou emancipação

Contudo, capacidade é diferente de legitimidade/legitimação. Muitas vezes, uma


pessoa capaz não é legitimada a praticar determinados atos.
Ex.: art. 1521, IV, CC – dois irmãos, ainda que capazes, não poderão casar entre
si, pois não há legitimação. Se não for respeitado esse impedimento, haverá nulidade
do matrimônio.
Ex.: art. 1.647, I – atos de alienação, praticados por pessoa casada. Há a
necessidade de autorização do cônjuge. Se não for respeitada essa legitimação e a
alienação for feita sem a autorização do cônjuge, o negócio será anulável, dentro do
prazo de 2 anos, a contar do fim da sociedade conjugal (art. 1.649, CC).

3.3. Incapacidades
As pessoas que não possuem a capacidade de fato têm capacidade limitada
e são chamadas de incapazes. Não existe incapacidade de direito, já que, conforme
o art. 2.º, CC todos que nascem com vida adquirem a capacidade de direito (mas não
a de fato). Dessa maneira, as incapacidades são restrições impostas às pessoas, em
condições peculiares, que necessitam, em razão dessa condição, de proteção
especial.
Deve-se destacar que o Estatuto da Pessoa com Deficiência, Lei
13.246/2015, alterou significativamente a teoria das incapacidades.

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3.3.1. Pessoas Absolutamente Incapazes

Art. 3º São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da


vida civil os menores de 16 (dezesseis) anos.

A incapacidade absoluta impede que a pessoa exerça por si só o direito. Dessa


forma, o ato só poderá ser praticado pelo representante legal do absolutamente
incapaz.
O absolutamente incapaz possui direito. Porém, não pode exercê-lo por si
próprio. São as pessoas que não tem aptidão para praticarem, sozinhas ou por si
próprias, os atos da vida civil. Significa dizer que possuem capacidade de direito, mas
não possuem a capacidade de fato ou exercício.
Nestes casos, o ato jurídico é praticado por outra pessoa (o representante legal),
em nome do incapaz. Trata-se da REPRESENTAÇÃO. Dessa maneira, o ato é
praticado pelo incapaz, representado pelo pai ou responsável legal.
Ex.: Fulano de tal, menor absolutamente incapaz, representado por seus pais,
Beltrano e Beltrana de Tal.
A inobservância dessa regra gera a nulidade do ato, nos termos do art. 166, I,
CC.
Como já mencionado, o Estatuto da pessoa com deficiência alterou a teoria das
incapacidades. Atualmente, não há outra hipótese de incapacidade absoluta que não
seja em razão da idade (menor de 16 anos). Antes dessa alteração, as pessoas com
deficiência eram absolutamente incapazes. Agora, não são. As pessoas com
deficiência são, via de regra, plenamente capazes de exercer atos da vida civil. Não
há mais, portanto, interdição absoluta. Poderá ocorrer alguma situação de
incapacidade relativa (art. 4.º, CC).
O art. 6.º do Estatuto da pessoa com deficiência (lei 13.146/2015) determina que
a deficiência não afeta a plena capacidade para gestão do plano familiar e existencial
do indivíduo:
Art. 6º A deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa, inclusive
para:
I - casar-se e constituir união estável;
II - exercer direitos sexuais e reprodutivos;
III - exercer o direito de decidir sobre o número de filhos e de ter acesso a
informações adequadas sobre reprodução e planejamento familiar;
IV - conservar sua fertilidade, sendo vedada a esterilização compulsória;
V - exercer o direito à família e à convivência familiar e comunitária; e
VI - exercer o direito à guarda, à tutela, à curatela e à adoção, como adotante
ou adotando, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas.
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Além disto, às pessoas com deficiência é permitida a adoção da tomada de
decisão apoiada ou o estabelecimento da curatela, conforme art. 84 do Estatuto da
pessoa com deficiência.
Art. 84. A pessoa com deficiência tem assegurado o direito ao exercício de
sua capacidade legal em igualdade de condições com as demais pessoas.
§ 1o Quando necessário, a pessoa com deficiência será submetida à
curatela, conforme a lei.
§ 2o É facultado à pessoa com deficiência a adoção de processo de tomada
de decisão apoiada.
§ 3o A definição de curatela de pessoa com deficiência constitui medida
protetiva extraordinária, proporcional às necessidades e às circunstâncias de
cada caso, e durará o menor tempo possível.
§ 4o Os curadores são obrigados a prestar, anualmente, contas de sua
administração ao juiz, apresentando o balanço do respectivo ano.

A tomada de decisão apoiada está prevista, também, no art. 1.783-A, CC. Trata-
se de um processo pelo qual o deficiente pode escolher duas pessoas idôneas e de
sua confiança para auxiliar nas decisões de atos da vida civil.

3.3.2. Pessoas Relativamente Incapazes


Art. 4º São incapazes, relativamente a certos atos ou à maneira de os
exercer:
I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;
II - os ébrios habituais e os viciados em tóxico;
III - aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir
sua vontade;
IV - os pródigos.
Parágrafo único. A capacidade dos indígenas será regulada por legislação
especial.

A incapacidade relativa permite que o incapaz realize o ato, desde que esteja
assistido pelo representante legal. Nesses casos, o próprio indivíduo, relativamente
incapaz, pratica o ato, sendo assistido pelo representante legal. Trata-se da
ASSISTÊNCIA.
Maiores de 16 anos e menores de 18 anos.
Aqueles indivíduos que estejam entre os 16 e os 18 anos de vida podem praticar
atos da vida civil, mas assistidos pelos representantes legais, sob pena de ser anulado
o ato.
Caso seja praticado o ato, poderá ser anulado (art. 171, I, CC), desde que a
ação seja proposta no prazo de 4 anos a contar do momento em que cessar a
incapacidade (art. 178, CC).

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Contudo, existem atos que podem ser praticados pelo relativamente incapaz,
mesmo sem a assistência do seu representante legal, como p. ex., ser testemunha
(art. 228, I, CC), aceitar mandato (art. 666, CC), fazer testamento (art. 1.860, § único,
CC), casar (art. 1.517, CC – necessita de autorização dos genitores).
Havendo conflito de interesses entre o pai/representante legal e o relativamente
incapaz, o juiz deverá nomear curador especial (art. 1.692, CC).
Deve-se observar que o objetivo do Código Civil é estabelecer uma proteção
diferenciada para os maiores de 16 e menores de 18 anos.
Dessa forma, caso o relativamente incapaz pratique um ato ocultando sua idade,
não poderá invocar a idade para eximir-se de obrigação, pois o Código não protege a
má-fé. Nesse sentido é a disposição do art. 180, CC:

Art. 180. O menor, entre dezesseis e dezoito anos, não pode, para eximir-se
de uma obrigação, invocar a sua idade se dolosamente a ocultou quando
inquirido pela outra parte, ou se, no ato de obrigar-se, declarou-se maior.

Se, contudo, não houver malícia por parte do relativamente incapaz, o ato será
anulável, nos termos do art. 171, I, CC:

Art. 171. Além dos casos expressamente declarados na lei, é anulável o


negócio jurídico:
I - por incapacidade relativa do agente;

Mas essa incapacidade, por se tratar de exceção pessoal, só pode ser arguida
pelo próprio incapaz ou pelo representante legal. Nesses termos, o art. 105, CC:

Art. 105. A incapacidade relativa de uma das partes não pode ser invocada
pela outra em benefício próprio, nem aproveita aos co-interessados capazes,
salvo se, neste caso, for indivisível o objeto do direito ou da obrigação comum.

Deve-se observar que esse ato pode ser convalidado:


Art. 172. O negócio anulável pode ser confirmado pelas partes, salvo direito
de terceiro.

Ébrios habituais e viciados em tóxicos


Aqueles que sejam viciados em álcool ou tóxicos serão considerados
relativamente incapazes. Situações de uso de tóxicos ou álcool que seja habitual e
reduza a capacidade de discernimento. Os que forem usuários eventuais e que,
temporariamente não puderem exprimir sua vontade, serão enquadrados o inciso III,
do mesmo dispositivo.
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Deverá haver um processo de interdição relativa, com a instituição da curatela,
analisando se é caso de incapacidade ou não. Neste caso, o processo de interdição
e curatela está disposto no CPC/2015, no art. 747 e seguintes.
Especificamente, o art. 753, § 2.º, CPC/2015 dispõe que a perícia a ser realizada
no processo de interdição, definirá a extensão da mesma, ou seja, para quais atos o
interditado estará impedido.

Aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir


a vontade
Aqui enquadram-se todas as pessoas que não possam exprimir sua vontade,
seja por situação permanente ou transitória. Nesse quadro estão os surdos-mudos,
desde que não tenham recebido educação adequada e permaneçam isolados. Se
tiverem recebido educação e puderem, por qualquer forma, exprimir sua vontade,
serão capazes.
Também se encaixam os portadores de mal de Alzheimer.
Em todos os casos, necessária a interdição, conforme já mencionado.
Alguns, mais desavisados, podem questionar: e os portadores de síndrome de
down, são enquadrados como? Em razão do Estatuto da pessoa com deficiência que,
sabiamente, alterou a teoria das incapacidades, estes indivíduos – até por questões
de desenvolvimento e estímulo – são, via de regra, plenamente capazes.
Eventualmente, pode ser caso de tomada de decisão apoiada ou, então, enquadrados
como relativamente incapazes por força do inciso III, do art. 4.º, CC. Contudo, é
situação excepcional. A regra é a capacidade plena.

Pródigos
Pródigo é aquele que dissipa seu patrimônio desvairadamente, aquele que gasta
imoderadamente, colocando seu patrimônio em risco. Contudo, o pródigo só passará
a ser considerado relativamente incapaz com a sentença de interdição que lhe
qualifique como tal.
A justificativa da interdição do pródigo é o fato de que está permanentemente
em risco de se submeter a miséria, colocando todo seu patrimônio fora. Sua interdição
refere-se tão somente quanto a atos de disposição e oneração do patrimônio. Pode

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administrar seu patrimônio, mas não poderá praticar atos que venham a desfalca-lo.
Os demais atos (votar, ser jurado, testemunha, etc) poderá praticar.

Situação dos índios


O art. 4.º, no seu § único traz a normatização com relação aos índios, deixando
para lei especial a apreciação. O Estatuto do Índio (lei 6.001/73), deixa a
responsabilidade, quanto a sua proteção, a cargo da FUNAI (Fundação Nacional do
Índio). A Lei 6.001/73 (Estatuto do Índio) considera que o índio que não estiver
integrado ficará sob tutela, reputando-se nulos todos os atos praticados por eles sem
a devida assistência do órgão responsável (art. 8.º). Contudo, se o índio demonstrar
discernimento, aliado à inexistência de prejuízo pelo ato praticado, será considerado
plenamente capaz para os atos da vida civil.
Sabe-se que os índios estão constantemente sendo integrados na sociedade
brasileira, de forma que não há mais justificativa para que sejam considerados
incapazes. Assim, os índios somente poderão ser considerados incapazes quando
restar comprovado que não são civilizados e que não possuam discernimento sobre
os atos a serem praticados.

3.4. Modos de suprimento das incapacidades (representação e assistência)


A incapacidade absoluta é suprida através da representação pelos pais ou
representantes legais. Se o absolutamente incapaz praticar atos sem a devida
representação o ato será nulo. Dessa forma, no caso da representação, é o
representante quem pratica o ato, no interesse do incapaz.
A representação (legal ou voluntária) está disciplinada nos arts. 115 a 120 do
CC. Contudo, deve-se ter em mente que existem dois tipos de representação
diferentes: a representação legal e a representação voluntária (aquela que ocorre
através de mandato – procuração) – art. 115, CC. A representação voluntária –
mandato – será tratada nos negócios jurídicos.
O suprimento da incapacidade relativa, por sua vez, se dá pela assistência, ou
seja, o relativamente incapaz pratica o ato jurídico em conjunto com o assistente, sob
pena de nulidade.

15
3.5. Cessação da incapacidade
A incapacidade cessa quando desaparecem os motivos que a determinam.
Quando a causa da incapacidade é a idade, desaparece pela maioridade ou pela
emancipação.

3.5.1. Maioridade
Nos termos do art. 5.º, CC, a incapacidade cessa aos 18 anos, quando a pessoa
passa a estar habilitada para praticar todos os atos da vida civil. A menoridade cessa,
dessa forma, no primeiro momento do dia em que o indivíduo perfaz os 18 anos, ou
seja, se o nascimento ocorreu em 29 de fevereiro de ano bissexto, completa a
maioridade no dia 1.º de março. Ex.: nasceu em 05/10. Completa a maioridade em
05/10.
O critério é etário e não há diferença entre o homem e a mulher. Contudo, essa
capacidade civil não pode ser confundida com a capacidade eleitoral ou a capacidade
para o casamento, previstas em dispositivos especiais, nem mesmo com a maioridade
penal.
Com a maioridade, os jovens passam a responder civilmente pelos danos
causados a terceiros, ficando autorizados a praticar todos os atos da vida civil, sem a
necessidade de assistência de seu representante legal.

3.5.2. Emancipação
Mas a capacidade plena também pode ser antecipada, em razão da autorização
dos representantes legais do menor ou do juiz ou, ainda, pela ocorrência de fato que
a lei atribui força para tanto. Trata-se dos casos de emancipação.
A emancipação é, portanto, uma forma de aquisição da capacidade civil antes
da idade legal. É a antecipação da aquisição da capacidade de fato (exercício da
capacidade civil por si próprio).
Nos termos do art. 5.º, § único, a incapacidade cessará:

I - pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante


instrumento público, independentemente de homologação judicial, ou por
sentença do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver dezesseis anos completos;
II - pelo casamento;
III - pelo exercício de emprego público efetivo;
IV - pela colação de grau em curso de ensino superior;
V - pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de
emprego, desde que, em função deles, o menor com dezesseis anos
completos tenha economia própria.
16
Deve-se observar que se trata de aquisição de capacidade para fins civis. Mas
o indivíduo não deixa de ser menor, ou seja, segue sendo aplicado o Estatuto da
Criança e do Adolescente. Nesse sentido, o enunciado 530 da Jornada de Direito Civil:

A emancipação, por si só, não elide a incidência do Estatuto da Criança e do


Adolescente.

Sendo assim, mesmo emancipado, não pode retirar carteira de motorista, ou


entrar em locais proibidos ou, então, ingerir bebida alcóolica.
A emancipação, uma vez realizada, é definitiva, irretratável e irrevogável, salvo
por ocorrência de vício de vontade (todos os negócios jurídicos ou atos praticados
podem ser anulados em razão de vício de vontade). Neste sentido, o enunciado 397
das Jornadas de Direito Civil:
A emancipação por concessão dos pais ou por sentença do juiz está sujeita
à desconstituição por vício de vontade.

Pela redação do § único do art. 5.º,CC, a emancipação, conforme a causa ou


origem, pode ser de três espécies: voluntária, judicial e legal.

a) Emancipação voluntária: Ocorre pela concessão dos pais, quando estes, em


conjunto (ou, um deles, na falta do outro), concedem, mediante escritura pública,
independentemente de homologação judicial, a emancipação para o filho que tenha
completado 16 anos. A emancipação é ato irrevogável, de forma que os pais não
podem, a posteriori, arrependerem-se de ter emancipado o filho. Contudo, respondem
pelos danos causados pelo filho que emanciparam. Deve ser registrada no Cartório
do Registro Civil, nos termos do art. 107, § 1.º, Lei 6.015/73.

b) Emancipação judicial: A emancipação judicial é aquela concedida pelo juiz, nos


casos em que o menor está sob tutela, sendo ouvido o tutor, se o menor contar com
16 anos completos. Pode ser, também, nos casos em que um dos genitores concordar
e o outro não com a emancipação. Deve ser registrada no Cartório do Registro Civil,
nos termos do art. 107, § 1.º, Lei 6.015/73.

c) Emancipação legal: A emancipação legal é aquela que advém da disposição legal.


Trata-se dos casos previstos nos incisos II, III, IV e V, CC, ou seja, em razão de
17
casamento, emprego público, constituição de empresa ou colação de grau em curso
superior. Dispensa o registro no Cartório de Registro Civil, produzindo efeitos
independentemente desse registro.
CASAMENTO: O homem e a mulher podem casar a partir dos 16 anos de idade,
desde que autorizados pelos pais ou representantes legais, nos termos do art. 1.517,
CC. Dessa forma, caso haja o casamento de menor de 18 anos, adquire, este
indivíduo, a capacidade civil plena, pois não faria sentido que, após casados, os
cônjuges permanecessem sob o poder familiar, já que constituíram um novo núcleo
familiar. Nesses casos, mesmo que haja a dissolução do casamento pelo divórcio, o
emancipado não retorna a situação anterior de incapacidade civil. No caso de
anulação ou nulidade do casamento, caso tenha sido contraído de boa-fé (casamento
putativo), persiste a maioridade. Se tiver sido contraído de má-fé, retorna a situação
de incapacidade (anulação retroage a data da celebração e é como se o casamento
jamais tivesse existido).
EXERCÍCIO DE EMPREGO PÚBLICO EFETIVO: Havendo a nomeação de
caráter efetivo em cargo ou emprego público efetivo (independentemente se celetista
ou estatutário, desde que não seja cargo em comissão), o agente adquire plena
capacidade civil, emancipando-se. Contudo, essa disposição está esvaziada de
conteúdo, já que é difícil algum cargo ou emprego público efetivo antes dos 18 anos
de idade.
COLAÇÃO DE GRAU EM CURSO SUPERIOR: Essa hipótese também é
bastante rara de ocorrer, pois o próprio período de estudo anterior (1.º e 2.º grau) é
extenso. Normalmente, quando o estudante cola grau, já é maior de idade.
ESTABELECIMENTO CIVIL OU COMERCIAL, OU EMPREGO QUE O MENOR
TENHA ECONOMIA PRÓPRIA: Trata-se, também, de uma hipótese remota, pois é
difícil que alguém com 16 anos estabelecer-se comercialmente.

18
EMANCIPAÇÃO Natural 18 anos

Parental vontade dos pais - escritura pública

Judicial sentença

casamento, exercício de emprego


público efetivo, colação de grau em
Legal
curso superior, independência
econômica

3.6. Personalidade/Extinção da personalidade/Morte


O art. 6.º, CC define que a extinção da personalidade natural se dá com a morte,
presumindo-se esta quanto aos ausentes, quando autorizada a abertura da sucessão
definitiva. O art. 7.º, CC, por sua vez, estabelece os casos de declaração da morte
sem decretação da ausência:

Art. 6º A existência da pessoa natural termina com a morte; presume-se esta,


quanto aos ausentes, nos casos em que a lei autoriza a abertura de sucessão
definitiva.
Art. 7o Pode ser declarada a morte presumida, sem decretação de ausência:
I - se for extremamente provável a morte de quem estava em perigo de vida;
II - se alguém, desaparecido em campanha ou feito prisioneiro, não for
encontrado até dois anos após o término da guerra.
Parágrafo único. A declaração da morte presumida, nesses casos, somente
poderá ser requerida depois de esgotadas as buscas e averiguações,
devendo a sentença fixar a data provável do falecimento.

A morte divide-se, portanto em (o aprofundamento dessas situações será feito


no direito sucessório):

19
art. 7.º, CC

provável a morte de
sem decretação de quem estava em perigo
ausência de vida;

Real desaparecido ou
prisioneiro de guerra não
encontrado até dois anos
após o término da guerra.
Presumida
art. 6.º + art. 22, CC
MORTE

alguém que desaparece


com decretação de sem dar notícias
ausência
três fases: curadoria dos bens
do ausente + sucessão
art. 8.º, CC provisória + sucessão definitiva
(neste momento considera-se a
Comoriência morte)
morte simultânea

3.7 Registro Civil - Pessoa natural


Registro Civil é o local onde se encontra a história da vida de uma pessoa. É a
perpetuação de seus dados pessoais. Trata-se de anotação feita por pessoa
autorizada (Registrador Civil) de dados pessoais e fatos jurídicos de maior relevância
na vida de alguém. Sua função é dar autenticidade, segurança, eficácia e publicidade
a tais dados.
O Registro Civil está disciplinado no Código Civil e na Lei dos Registros Públicos.
O art. 9.º, CC determina os atos que serão registrados no Registro Público:

Art. 9º Serão registrados em registro público:


I - os nascimentos, casamentos e óbitos;
II - a emancipação por outorga dos pais ou por sentença do juiz;
III - a interdição por incapacidade absoluta ou relativa;
IV - a sentença declaratória de ausência e de morte presumida.

Por sua vez, o art. 10, CC trata das averbações em registros públicos:

Art. 10. Far-se-á averbação em registro público:


I - das sentenças que decretarem a nulidade ou anulação do casamento, o
divórcio, a separação judicial e o restabelecimento da sociedade conjugal;
II - dos atos judiciais ou extrajudiciais que declararem ou reconhecerem a
filiação;

20
Averbação é anotação feita à margem do registro para informar sobre alguma
alteração ocorrida no estado jurídico do registrado. Nesse sentido, o casamento é
registrado e o divórcio, averbado.
Todo nascimento deve ser levado a registro no local onde ocorreu o parto ou no
lugar da residência dos pais, no prazo de 15 dias ou, no prazo de até 3 meses quando
o local do parto ou da residência for distante mais de 30 km da sede do cartório.

Art. 50. Todo nascimento que ocorrer no território nacional deverá ser dado a
registro, no lugar em que tiver ocorrido o parto ou no lugar da residência dos
pais, dentro do prazo de quinze dias, que será ampliado em até três meses
para os lugares distantes mais de trinta quilômetros da sede do cartório.
§ 1º Quando for diverso o lugar da residência dos pais, observar-se-á a ordem
contida nos itens 1º e 2º do art. 52.
§ 2º Os índios, enquanto não integrados, não estão obrigados a inscrição do
nascimento. Este poderá ser feito em livro próprio do órgão federal de
assistência aos índios.
§ 3º Os menores de vinte e um (21) anos e maiores de dezoito (18) anos
poderão, pessoalmente e isentos de multa, requerer o registro de seu
nascimento.
§ 4° É facultado aos nascidos anteriormente à obrigatoriedade do registro civil
requerer, isentos de multa, a inscrição de seu nascimento.
§ 5º Aos brasileiros nascidos no estrangeiro se aplicará o disposto neste
artigo, ressalvadas as prescrições legais relativas aos consulados.

O registro de nascimento do indivíduo compete, pela ordem legal (art. 52, LRP):

Art. 52. São obrigados a fazer declaração de nascimento:


1o) o pai ou a mãe, isoladamente ou em conjunto, observado o disposto no §
2o do art. 54;
2º) no caso de falta ou de impedimento de um dos indicados no item 1o, outro
indicado, que terá o prazo para declaração prorrogado por 45 (quarenta e
cinco) dias;
3º) no impedimento de ambos, o parente mais próximo, sendo maior
achando-se presente;
4º) em falta ou impedimento do parente referido no número anterior os
administradores de hospitais ou os médicos e parteiras, que tiverem assistido
o parto;
5º) pessoa idônea da casa em que ocorrer, sendo fora da residência da mãe;
6º) finalmente, as pessoas (VETADO) encarregadas da guarda do menor.
§ 1° Quando o oficial tiver motivo para duvidar da declaração, poderá ir à casa
do recém-nascido verificar a sua existência, ou exigir a atestação do médico
ou parteira que tiver assistido o parto, ou o testemunho de duas pessoas que
não forem os pais e tiverem visto o recém-nascido.
§ 2º Tratando-se de registro fora do prazo legal o oficial, em caso de dúvida,
poderá requerer ao Juiz as providências que forem cabíveis para
esclarecimento do fato.

21
Deve-se observar que a Lei nº 13.484, de 2017 prevê, uma alteração no art. 54
da lei dos registros públicos, no que diz respeito ao local da naturalidade do indivíduo,
que será o município do nascimento ou o de residência de sua genitora:

§ 4º A naturalidade poderá ser do Município em que ocorreu o nascimento


ou do Município de residência da mãe do registrando na data do nascimento,
desde que localizado em território nacional, e a opção caberá ao declarante
no ato de registro do nascimento.

22
044. TUTELA E CURATELA

A tutela, assim como a curatela, faz parte do chamado “direito assistencial”, no


estudo das relações familiares. A base de sustentação destes dois institutos é a
solidariedade familiar.
4.1 Conceito: TUTELA X CURATELA
Apesar de as vezes serem tratados como sinônimos, tutela e curatela são
institutos jurídicos diferentes e autônomos, mas que possuem uma finalidade comum:
proporcionar a representação legal e a administração de sujeitos incapazes de
praticar atos jurídicos.
A diferença fundamental entre ambas é a de que, enquanto a TUTELA refere-
se à menoridade legal (indivíduos menores de 18 anos não emancipados, não sujeitos
ao poder familiar), a CURATELA destina-se àquelas pessoas que são incapazes de
gerir sua vida, pessoas estas, devidamente interditadas. Conceitos baseados nas
alterações trazidas pelo CPC/2015 e pelo Estatuto da Pessoa Portadora de
Deficiência, Lei 13.146/2015.

4.2 Tutela – art. 1.728 e ss., CC e art. 759 e ss. CPC/2015


A tutela é a representação legal de indivíduo menor de idade, seja
absolutamente ou relativamente incapaz, em razão da falta de seus pais (falecimento,
ausência ou perda do poder familiar). Art. 1.728, CC.
Seu grande objetivo é a administração dos bens patrimoniais do menor.

4.2.1 Tutores
O art. 1.729, CC estabelece que os pais têm o direito de nomear tutor, através
de testamento ou outro documento público. Isto porque, o tutor será a pessoa
responsável pela formação e pela administração do patrimônio dos infantes cujos pais
não mais existem.
Se o testamento contiver a nomeação de mais de um tutor, entende-se haver
uma ordem de preferência, de forma que a tutela será deferida àquela pessoa primeiro
nomeada, sendo que os demais serão substitutos. Art. 1.733, §1.º, CC.

23
Se, contudo, os pais não tiverem feito a nomeação, o art. 1.731 estabelece a
ordem de preferência na indicação dos tutores:

Art. 1.731. Em falta de tutor nomeado pelos pais incumbe a tutela aos
parentes consangüíneos do menor, por esta ordem:
I - aos ascendentes, preferindo o de grau mais próximo ao mais remoto;
II - aos colaterais até o terceiro grau, preferindo os mais próximos aos mais
remotos, e, no mesmo grau, os mais velhos aos mais moços; em qualquer
dos casos, o juiz escolherá entre eles o mais apto a exercer a tutela em
benefício do menor.

Este rol não é absoluto, cabendo ao juiz analisar a situação que maior benefício
trará para a criança ou adolescente.
Além disto, aos irmãos, será nomeado um só tutor e, no caso de não haver tutor
indicado pelos pais e, ainda, não sendo possível nomear tutor que seja parente
consanguíneo da criança ou adolescente, o tutor nomeado deve residir no mesmo
local em que os tutelados.

4.2.2 Espécies

São três as formas de tutela:


a) Testamentária: regulada pelos arts. 1.729 e 1.730, CC, quando o tutor será
nomeado pelos pais, em conjunto. Enquanto vivos os pais podem – no exercício do
poder familiar – deixarem testamento nomeando tutor aos filhos menores de idade.
Esta nomeação pode ser feita através de testamento ou de qualquer outro documento
público ou particular – qualquer documento, desde que as assinaturas dos pais
estejam com firma reconhecida pelo Tabelionato.
b) Legítima: é a tutela que se estabelece quando não há a nomeação de tutor
por parte dos pais. Está indicada no art. 1.731, CC, sendo estabelecida a ordem de
preferência – esta ordem não é absoluta, devendo ser observado o melhor interesse
da criança e do adolescente.
c) Dativa: esta é a tutela que ocorre quando não há a nomeação de tutor pelos
pais e não há a possibilidade de ser nomeado nenhum dos parentes do menor de
idade indicados pelo art. 1.731 (ou porque não existem ou porque são inidôneos). Está
prevista no art. 1.732, CC.

24
4.2.3 Incapacidade para o exercício da tutela

Não é qualquer pessoa que pode exercer a tutela. Assim, em razão da grande
responsabilidade a ser assumida, além da capacidade civil (maioridade), também é
exigida capacidade especial, de forma que o art. 1.735, CC estabelece os casos
daqueles que não poderão ser tutores, sendo, portanto, excluídos da tutela:

Art. 1.735. Não podem ser tutores e serão exonerados da tutela, caso a
exerçam:
I - aqueles que não tiverem a livre administração de seus bens;
II - aqueles que, no momento de lhes ser deferida a tutela, se acharem
constituídos em obrigação para com o menor, ou tiverem que fazer valer
direitos contra este, e aqueles cujos pais, filhos ou cônjuges tiverem demanda
contra o menor;
III - os inimigos do menor, ou de seus pais, ou que tiverem sido por estes
expressamente excluídos da tutela;
IV - os condenados por crime de furto, roubo, estelionato, falsidade, contra a
família ou os costumes, tenham ou não cumprido pena;
V - as pessoas de mau procedimento, ou falhas em probidade, e as culpadas
de abuso em tutorias anteriores;
VI - aqueles que exercerem função pública incompatível com a boa
administração da tutela.

4.2.4 Escusa da tutela


Em se tratando de um múnus público, via de regra, a tutela não pode ser
recusada, especialmente nos casos do art. 1.731, quando há parentesco com o
tutelado. Contudo, toda regra admite exceções e, neste caso, o art. 1.736 traz
elencadas sete situações que podem, em razão da natureza, atrapalhar o exercício
da tutela.

Art. 1.736. Podem escusar-se da tutela:


I - mulheres casadas;
II - maiores de sessenta anos;
III - aqueles que tiverem sob sua autoridade mais de três filhos;
IV - os impossibilitados por enfermidade;
V - aqueles que habitarem longe do lugar onde se haja de exercer a tutela;
VI - aqueles que já exercerem tutela ou curatela;
VII - militares em serviço.

Em regra, quem é parente do menor não pode se escusar, exceto se preencher


alguma dessas situações elencadas.
Se, porém, não houver parentesco com o menor, há a possibilidade de recusa,
se houver algum parente em condições de exercê-la, nos termos do art. 1.737,CC.
O procedimento para a escusa é através de simples petição ao magistrado que
o nomeou, no prazo de 5 dias, nos termos do art. 760, CPC/2015. O prazo inicia antes
25
de aceitar o encargo, da data da intimação para prestar compromisso e, depois de
entrar no exercício do encargo, da data em que sobrevier o motivo da escusa.

4.2.5 Exercício da tutela

O exercício da tutela importa em uma responsabilidade grande por parte do


tutor, que ultrapassa os atos de mera administração de bens. O tutor assume toda a
responsabilidade com relação a educação, alimentação e criação do tutelado. Nesse
sentido, os arts. 1.740 e 1.747 do Código Civil estabelecem os atos que o tutor pode
praticar, com relação ao tutelado, independentemente de autorização judicial:

Art. 1.740. Incumbe ao tutor, quanto à pessoa do menor:


I - dirigir-lhe a educação, defendê-lo e prestar-lhe alimentos, conforme os
seus haveres e condição;
II - reclamar do juiz que providencie, como houver por bem, quando o menor
haja mister correção;
III - adimplir os demais deveres que normalmente cabem aos pais, ouvida a
opinião do menor, se este já contar doze anos de idade.

Art. 1.747. Compete mais ao tutor:


I - representar o menor, até os dezesseis anos, nos atos da vida civil, e assisti-
lo, após essa idade, nos atos em que for parte;
II - receber as rendas e pensões do menor, e as quantias a ele devidas;
III - fazer-lhe as despesas de subsistência e educação, bem como as de
administração, conservação e melhoramentos de seus bens;
IV - alienar os bens do menor destinados a venda;
V - promover-lhe, mediante preço conveniente, o arrendamento de bens de
raiz.

Deve-se atentar, contudo, para o fato de que o tutor não é pai. É certo que o
tutelado deve obediência ao tutor, mas este último não tem a possibilidade de
disciplinar o menor de idade. Neste caso, há a necessidade de atuação judicial, pois
o tutor não exerce o poder familiar.
O tutor também não tem a obrigação de sustentar o menor. Seu sustento sairá
de parte de seus bens, devendo o juiz fixar as quantias que lhe pareçam suficientes e
necessárias. Art. 1.746, CC.
Existem outros atos que exigem para sua concretização, a
atuação/interferência do juiz. São aqueles que, normalmente, envolvem o patrimônio
do tutelado:

Art. 1.748. Compete também ao tutor, com autorização do juiz:


I - pagar as dívidas do menor;
II - aceitar por ele heranças, legados ou doações, ainda que com encargos;
26
III - transigir;
IV - vender-lhe os bens móveis, cuja conservação não convier, e os imóveis
nos casos em que for permitido;
V - propor em juízo as ações, ou nelas assistir o menor, e promover todas as
diligências a bem deste, assim como defendê-lo nos pleitos contra ele
movidos.
Parágrafo único. No caso de falta de autorização, a eficácia de ato do tutor
depende da aprovação ulterior do juiz.

4.2.6 Responsabilidade e prestação de contas


O tutor assume uma grande responsabilidade no exercício da tutela. Em razão
disso, há um rigor na fiscalização de suas atividades, nos termos do art. 1.752 e, mais
do que isto, há a exigência de prestação de contas do exercício da tutela. Esta
prestação de contas não poderá ser dispensada sequer pelos pais que eventualmente
tenham instituído a tutela.

Art. 1.755. Os tutores, embora o contrário tivessem disposto os pais dos


tutelados, são obrigados a prestar contas da sua administração.
Art. 1.756. No fim de cada ano de administração, os tutores submeterão ao
juiz o balanço respectivo, que, depois de aprovado, se anexará aos autos do
inventário.
Art. 1.757. Os tutores prestarão contas de dois em dois anos, e também
quando, por qualquer motivo, deixarem o exercício da tutela ou toda vez que
o juiz achar conveniente.
Parágrafo único. As contas serão prestadas em juízo, e julgadas depois da
audiência dos interessados, recolhendo o tutor imediatamente a
estabelecimento bancário oficial os saldos, ou adquirindo bens imóveis, ou
títulos, obrigações ou letras, na forma do § 1o do art. 1.753.

4.2.7 Cessação
A tutela terminará com o término da incapacidade. Nestes termos, o art. 1.763:

Art. 1.763. Cessa a condição de tutelado:


I - com a maioridade ou a emancipação do menor;
II - ao cair o menor sob o poder familiar, no caso de reconhecimento ou
adoção.

Art. 1.764. Cessam as funções do tutor:


I - ao expirar o termo, em que era obrigado a servir;
II - ao sobrevir escusa legítima;
III - ao ser removido.

27
AÇÃO DE TUTELA
ATENÇAO: a peça estruturada abaixo é um modelo básico de ação de tutela. Destaca-se que cada ação deve ser
estruturada de acordo com o caso apresentado e os dados devem ser adaptados ao enunciado fornecido pela
banca examinadora.

28
29
30
4.3 Curatela – art. 1.767 e ss., CC e art. 747 e ss. CPC/2015

A curatela visa a proteção de uma pessoa maior, mas que padeça de alguma
incapacidade ou de alguma circunstância que impeça a sua livre e consciente
manifestação de vontade.
Em razão do Estatuto da Pessoa com Deficiência – lei 13.146/2015 –, a curatela
só incide para os maiores relativamente incapazes, que são os ébrios habituais
(alcoólatras), viciados em tóxicos, pessoas que por causa transitória ou definitiva não
puderem exprimir sua vontade e os pródigos.

4.3.1 Curador
Para ser curador de alguém é necessário que a pessoa tenha capacidade para
os atos da vida civil. Assim, em tese, qualquer cidadão pode ser curador de outrem.
Contudo, não é admissível que qualquer indivíduo, aleatoriamente, seja nomeado
curador. Há uma previsão de ordem legal no art. 1.775, CC:

Art. 1.775. O cônjuge ou companheiro, não separado judicialmente ou de fato,


é, de direito, curador do outro, quando interdito.
§1º Na falta do cônjuge ou companheiro, é curador legítimo o pai ou a mãe;
na falta destes, o descendente que se demonstrar mais apto.
§ 2º Entre os descendentes, os mais próximos precedem aos mais remotos.
§ 3º Na falta das pessoas mencionadas neste artigo, compete ao juiz a
escolha do curador.

Esse rol, contudo, não é vinculativo do juiz, ou seja, ele poderá escolher o
curador atentando para o melhor interesse do curatelado.
Pode, ainda, haver a nomeação de dois curadores, nos termos do art. 1.775-A,
CC, nos casos de pessoa com deficiência.

4.3.2 Pessoas sujeitas à curatela


Estão sujeitas a curatela as pessoas que não possuem capacidade civil, com
exceção dos menores de idade, que estão sujeitos à tutela. Nestes termos, o art.
1.767, CC, dispõe:

Art. 1.767. Estão sujeitos a curatela:


I - aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir
sua vontade;
II - (Revogado);
III - os ébrios habituais e os viciados em tóxico;
IV - (Revogado);

31
V - os pródigos.

A curatela será deferida durante o curso do processo de interdição (arts. 747 e


ss., CPC/2015), que terá natureza declaratória, com eficácia ex tunc, de forma que o
magistrado apenas declarará uma situação já existente.

4.3.3 Prestação de contas


O art. 1.783, CC estabelece que quando o curador for o cônjuge e o regime de
bens do casamento for o da comunhão universal de bens não haverá a
obrigatoriedade de prestação de contas, salvo por determinação judicial.
Dessa forma, o curador deve periodicamente prestar contas ou todas as vezes
em que for instado a tal mister, assim como o tutor.

4.3.4 Cessação da curatela


Ao contrário da tutela que é temporária, a curatela tem um ânimo definitivo.
Todavia, ocorrerá o término da curatela por impossibilidade material da continuidade
por parte do curador (por exemplo, se estiver doente) ou na hipótese de negligência,
prevaricação ou incapacidade superveniente (aplicação analógica do art. 1.766, CC).
Também cessa a curatela pelo falecimento do curador ou do curatelado.

4.4 Processo de interdição


Para que alguém seja posto sob curatela, precisa passar por um processo de
interdição, cujo procedimento está previsto no art. 747 e ss. do CPC/2015.
A interdição pode ser promovida por:

Art. 747. A interdição pode ser promovida:


I - pelo cônjuge ou companheiro;
II - pelos parentes ou tutores;
III - pelo representante da entidade em que se encontra abrigado o
interditando;
IV - pelo Ministério Público.
Parágrafo único. A legitimidade deverá ser comprovada por documentação
que acompanhe a petição inicial.

Na inicial deve estar especificado o motivo e os fatos que demonstrem a


incapacidade do interditando para administrar seus bens (art. 749, CPC/2015).
Havendo necessidade, o juiz pode nomear curador provisório (art. 749, § único,

32
CPC/2015), contudo, deverá haver laudo médico para provar as alegações do autor
(art. 750, CPC/2015).
O juiz ouvirá o interditando em audiência ou, na impossibilidade de
deslocamento, no local onde se encontrar (art. 751, § 1.º, CPC/2015), utilizando-se
dos meios tecnológicos necessários para a entrevista.
O interditando pode (e deve) defender-se, no prazo de 15 dias (art. 752,
CPC/2015).
Haverá intervenção do MP como fiscal da lei (art. 752, § 1.º, CPC/2015).
Após este prazo de defesa, haverá a produção de prova, com perícia no
interditando (art. 753, CPC/2015). O laudo deve indicar os atos para os quais há
incapacidade. Trata-se, portanto, de uma interdição relativa, já que os interditandos
são sempre relativamente incapazes.
Uma vez que se tenha o laudo e todas as provas, o juiz sentenciará. Na
sentença, o juiz obedecerá alguns requisitos:

Art. 755. Na sentença que decretar a interdição, o juiz:


I - nomeará curador, que poderá ser o requerente da interdição, e fixará os
limites da curatela, segundo o estado e o desenvolvimento mental do
interdito;
II - considerará as características pessoais do interdito, observando suas
potencialidades, habilidades, vontades e preferências.
§ 1o A curatela deve ser atribuída a quem melhor possa atender aos
interesses do curatelado.
§ 2o Havendo, ao tempo da interdição, pessoa incapaz sob a guarda e a
responsabilidade do interdito, o juiz atribuirá a curatela a quem melhor puder
atender aos interesses do interdito e do incapaz.
§ 3o A sentença de interdição será inscrita no registro de pessoas naturais e
imediatamente publicada na rede mundial de computadores, no sítio do
tribunal a que estiver vinculado o juízo e na plataforma de editais do Conselho
Nacional de Justiça, onde permanecerá por 6 (seis) meses, na imprensa
local, 1 (uma) vez, e no órgão oficial, por 3 (três) vezes, com intervalo de 10
(dez) dias, constando do edital os nomes do interdito e do curador, a causa
da interdição, os limites da curatela e, não sendo total a interdição, os atos
que o interdito poderá praticar autonomamente.

Se o interdito se recuperar, poderá levantar a interdição e a curatela, nos termos


do art. 756, CPC/2015.

4.5 Tomada de decisão apoiada


O art. 1.783-A prevê a tomada de decisão apoiada:

Art. 1.783-A. A tomada de decisão apoiada é o processo pelo qual a pessoa


com deficiência elege pelo menos 2 (duas) pessoas idôneas, com as quais
mantenha vínculos e que gozem de sua confiança, para prestar-lhe apoio na
33
tomada de decisão sobre atos da vida civil, fornecendo-lhes os elementos e
informações necessários para que possa exercer sua
capacidade. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
§ 1o Para formular pedido de tomada de decisão apoiada, a pessoa com
deficiência e os apoiadores devem apresentar termo em que constem os
limites do apoio a ser oferecido e os compromissos dos apoiadores, inclusive
o prazo de vigência do acordo e o respeito à vontade, aos direitos e aos
interesses da pessoa que devem apoiar. (Incluído pela Lei nº 13.146,
de 2015) (Vigência)
§ 2o O pedido de tomada de decisão apoiada será requerido pela pessoa a
ser apoiada, com indicação expressa das pessoas aptas a prestarem o apoio
previsto no caput deste artigo. (Incluído pela Lei nº 13.146, de
2015) (Vigência)
§ 3o Antes de se pronunciar sobre o pedido de tomada de decisão apoiada,
o juiz, assistido por equipe multidisciplinar, após oitiva do Ministério Público,
ouvirá pessoalmente o requerente e as pessoas que lhe prestarão apoio.
(Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
§ 4o A decisão tomada por pessoa apoiada terá validade e efeitos sobre
terceiros, sem restrições, desde que esteja inserida nos limites do apoio
acordado. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
§ 5o Terceiro com quem a pessoa apoiada mantenha relação negocial pode
solicitar que os apoiadores contra-assinem o contrato ou acordo,
especificando, por escrito, sua função em relação ao apoiado. (Incluído
pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
§ 6o Em caso de negócio jurídico que possa trazer risco ou prejuízo
relevante, havendo divergência de opiniões entre a pessoa apoiada e um dos
apoiadores, deverá o juiz, ouvido o Ministério Público, decidir sobre a
questão. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
§ 7o Se o apoiador agir com negligência, exercer pressão indevida ou não
adimplir as obrigações assumidas, poderá a pessoa apoiada ou qualquer
pessoa apresentar denúncia ao Ministério Público ou ao juiz. (Incluído
pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
§ 8o Se procedente a denúncia, o juiz destituirá o apoiador e nomeará,
ouvida a pessoa apoiada e se for de seu interesse, outra pessoa para
prestação de apoio. (Incluído pela Lei nº 13.146, de
2015) (Vigência)
§ 9o A pessoa apoiada pode, a qualquer tempo, solicitar o término de acordo
firmado em processo de tomada de decisão apoiada. (Incluído pela Lei
nº 13.146, de 2015) (Vigência)
§ 10. O apoiador pode solicitar ao juiz a exclusão de sua participação do
processo de tomada de decisão apoiada, sendo seu desligamento
condicionado à manifestação do juiz sobre a matéria. (Incluído pela Lei
nº 13.146, de 2015) (Vigência)
§ 11. Aplicam-se à tomada de decisão apoiada, no que couber, as
disposições referentes à prestação de contas na curatela. (Incluído
pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)

A tomada de decisão apoiada visa o auxílio da pessoa com deficiência para a


celebração de atos mais complexos – casos dos contratos. Trata-se de um processo
judicial no qual a pessoa com deficiência elege duas pessoas, de sua confiança, para
lhe auxiliar nos atos da vida civil. Com a nomeação dos apoiadores, toda decisão
tomada por pessoa portadora de deficiência será válida e produzirá efeitos, nos limites
do apoio acordado (art. 1.783-A, § 4.º, CC).

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AÇÃO DE INTERDIÇÃO E NOMEAÇÃO DE CURADOR
ATENÇAO: a peça estruturada abaixo é um modelo básico de ação de interdição e nomeação de curador.
Destaca-se que cada ação deve ser estruturada de acordo com o caso apresentado e os dados devem ser
adaptados ao enunciado fornecido pela banca examinadora.

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05
5. DIREITOS DA PERSONALIDADE

Ao lado dos direitos patrimoniais, existem direitos, não menos importantes, que
estão fora do comércio e encontram-se inseridos na personalidade do indivíduo. Os
direitos da personalidade, também chamados de liberdades públicas têm proteção
especial por parte do Estado. São tutelados tanto pelo Direito Público, como também,
pelo Direito Privado. São direitos inerentes e ligados à pessoa humana e a sua
dignidade, de forma perpétua e permanente. Dentre estes direitos destacam-se a vida,
liberdade, nome, próprio corpo, imagem e honra.
O enunciado 274 das Jornadas de Direito Civil prevê que:

Os direitos da personalidade, regulados de maneira não-exaustiva pelo


Código Civil, são expressões da cláusula geral de tutela da pessoa humana,
contida no art. 1º, inc. III, da Constituição (princípio da dignidade da pessoa
humana). Em caso de colisão entre eles, como nenhum pode sobrelevar os
demais, deve-se aplicar a técnica da ponderação.

Pode-se dizer que são direitos da personalidade: vida e integridade físico-


psíquica, nome da pessoa (natural ou jurídica), imagem (imagem-retrato e imagem-
atributo), honra (subjetiva e objetiva) e intimidade. Essa proteção dos direitos da
personalidade encontra-se, tanto no Código Civil, como, também, na Constituição
Federal de 1988, que prevê, no seu art. 5. º, X:
“X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das
pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral
decorrente de sua violação”.

O Código Civil destinou um capítulo especial para a proteção dos direitos da


personalidade – art. 11 a art. 21, CC. Esse rol, contudo, é exemplificativo, conforme
dispõe o enunciado 274 das Jornadas de Direito Civil.
Esses direitos tratam-se, portanto, de direitos que “têm por objeto os atributos
físicos, psíquicos e morais da pessoa em si e em suas projeções sociais” (GAGLIANO
e PAMPLONA FILHO, p. 184).

5.1 Natureza
Quanto a natureza jurídica desses direitos, a maior parte da doutrina entende
que, por se tratarem de direitos inatos ao ser humano, cabe ao Estado apenas

39
reconhecê-los e sancioná-los no âmbito do direito positivo, de forma que o indivíduo
possa proteger tais direitos contra arbítrios do poder público ou de particulares.
No caso do Brasil, esses direitos, além de serem protegidos no âmbito do Direito
Civil, também tem uma proteção constitucional, conforme visto (art. 5.º, X, CF), o que
lhes confere um status diferenciado – direito subjetivo (possibilidade de exigir respeito)
+ direito objetivo (vinculação a todos, dever de não infringir).

5.2 Titularidade
Os direitos da personalidade são próprios dos seres humanos. Contudo, como
já discutido, também protege o nascituro que, embora não tenha personalidade
jurídica, detém proteção, desde a concepção, dos seus direitos da personalidade (art.
2.º, CC).
Não se pode excluir, contudo, as pessoas jurídicas desta proteção, pois, nos
termos do art. 52, CC, aplica-se “às pessoas jurídicas, no que couber, a proteção dos
direitos da personalidade”. Dessa forma, as pessoas jurídicas também têm a
faculdade de exigir respeito e proteção quanto à sua imagem (intimidade, vida privada
e honra, não é possível em razão das particularidades de tais direitos), podendo ser
requerida indenização pela violação a tal direito. Este entendimento consubstancia-se
na redação da súmula 227 do STJ, que diz que: “A pessoa jurídica pode sofrer
dano moral.” Tenham cuidado com o enunciado 268 das Jornadas de Direito Civil,
que diz que não pode a pessoa jurídica ser titular de direitos da personalidade. Este
enunciado contraria o que determina a súmula 227 do STJ. Esta súmula é que poderá
ser cobrada no Exame da OAB, por ser a posição majoritária.

5.3 Características
Os direitos da personalidade são ligados à pessoa humana, representando seus
direitos íntimos e fundamentais. São qualidades que se agregam ao homem e,
portanto, intransmissíveis e irrenunciáveis. art. 11, CC traz algumas das
características dos direitos da personalidade: Contudo, existem outras características:
• Inato: inerente, pertencente desde o nascimento.
• Absolutos: os autores falam que os direitos da personalidade são
absolutos, sendo uma forma de materialização da oponibilidade erga
omnes.

40
Apesar dessa característica, deve-se ressaltar que os direitos da
personalidade podem ser restringidos, dependendo da situação.
Os enunciados das Jornadas de Direito Civil dispõe sobre essa
possibilidade de relativização ou limitação voluntária dos direitos da
personalidade.
Enunciado n.º 4: “O exercício dos direitos da personalidade pode sofrer
limitação voluntária, desde que não seja permanente nem geral”.
Significa dizer, portanto, que em cada caso concreto deverá ser feito um
sopesamento a fim de verificar se é ou não necessária a relativização do
direito da personalidade.
Ex.: biografias não autorizadas. Podem ser publicadas, embora sem
autorização, referente a pessoas públicas. Relativização dos direitos da
personalidade em nome a vedação da censura.
Enunciado n.º 139: “Os direitos da personalidade podem sofrer limitações,
ainda que não especificamente previstas em lei, não podendo ser
exercidos com abuso de direito de seu titular, contrariamente à boa-fé
objetiva e aos bons costumes”.
Ex.: proteção da intimidade e vida privada é relativizada quando há uma
exposição desse direito. Top less em praia pública – relativização da
intimidade.
Ex.: art. 15, CC. Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco
de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica. Um paciente, a
beira da morte, necessita de cirurgia. A intervenção trará alto risco,
gerando dúvidas se o médico deve ou não realizar o procedimento. Isso
gera uma série de discussões, pois há resoluções do Conselho Federal
de Medicina que autorizam o médico a suspender o tratamento de
pacientes terminais, de doenças incuráveis quando assim for de sua
vontade (ortotanásia). Contudo, decisões judiciais já foram contrárias a
essa prática.
Há, ainda, o Enunciado 528, das Jornadas de Direito Civil, que autoriza o
chamado testamento vital ou biológico, que nada mais é do que uma
autorização para a prática da suspensão do tratamento médico:

41
“É válida a declaração de vontade expressa em documento autêntico,
também chamado "testamento vital", em que a pessoa estabelece
disposições sobre o tipo de tratamento de saúde, ou não tratamento, que
deseja no caso de se encontrar sem condições de manifestar a sua
vontade”.
De igual modo, há, também a situação de paciente que, em razão de sua
crença religiosa, não permita submissão a tratamento médico. No caso de
este paciente estar sob risco real e iminente de morte, pode ser
dispensada a autorização para a realização de cirurgia. Significa dizer,
então que, nestes casos, o médico pode salvar a vida, mesmo sem a
autorização do paciente ou familiar. Trata-se de um conflito entre o direito
a vida e o direito a liberdade religiosa. Deve-se utilizar a técnica da
ponderação, neste caso. Há quem diga que, pela ponderação, deve
prevalecer a vida. Outros dirão que a vontade do paciente deve ser
respeitada. Neste sentido, o enunciado 403 das Jornadas de Direito Civil:
“O Direito à inviolabilidade de consciência e de crença, previsto no art. 5º,
VI, da Constituição Federal, aplica-se também à pessoa que se nega a
tratamento médico, inclusive transfusão de sangue, com ou sem risco de
morte, em razão do tratamento ou da falta dele, desde que observados os
seguintes critérios: a) capacidade civil plena, excluído o suprimento pelo
representante ou assistente; b) manifestação de vontade livre, consciente
e informada; e c) oposição que diga respeito exclusivamente à própria
pessoa do declarante.”
• Generalidade: são outorgados a todas as pessoas, pelo simples fato de
existirem.
• Extrapatrimonialidade: ausência de conteúdo patrimonial direto, ou seja,
os direitos, em si, não possuem valor patrimonial, ainda que, havendo
lesão, possa haver indenização pecuniária (mas, neste caso, em razão do
dano causado).
• Indisponibilidade: significa que tais direitos não podem, por vontade do
indivíduo, mudar de titular. Abrange tanto a intransmissibilidade
(impossibilidade de modificação de titular gratuita ou onerosa, ou seja,
não é possível ceder tal direito a outrem), como a inalienabilidade (não

42
podem ser alienados), a inacessibilidade (não podem ser objeto de
cessão), e a intransacionabilidade (não podem sofrer transação ou
compromisso de arbitragem). É permitida, contudo, a cessão de uso da
imagem, por exemplo, (famoso que autoriza a utilização de sua imagem
em outdoors). Isso significa que há uma parcela dos direitos da
personalidade, que se relaciona a direitos patrimoniais, que pode ser
passível de disposição (direitos de imagem, direitos autorais, cessão de
partes do corpo para fins científicos ou altruísticos – art. 14, CC).
• Irrenunciabilidade: trata-se da impossibilidade voluntária do abandono,
de abdicar, de forma que ninguém pode renunciar direitos da
personalidade.
Exemplo: contrato de namoro. Este contrato é nulo, pois seria uma forma
de pessoas que vivem em união estável renunciarem aos direitos dela
decorrentes. A união estável envolve direitos existenciais de
personalidade. Ademais, é uma espécie de fraude a lei imperativa, o que
conduz a nulidade absoluta do documento firmado (art. 166, VI, CC).
Outro exemplo seriam os reality shows (Big Brother Brasil), onde o
participante renuncia a qualquer direito de buscar indenização por danos
morais em decorrência da exibição de sua imagem. Tal contrato também
é nulo, pois não é possível a renúncia a direitos da personalidade, a teor
dos arts. 11 e 166, VI, CC. Nestes casos é possível, inclusive, que se
utilize das medidas previstas no art. 12, CC para fazer cessar a exibição
das imagens que violem a moral do participante.
• Imprescritibilidade: não se extinguem pelo não uso, de forma que não
há prazo para o seu exercício. Salienta-se que esta imprescritibilidade é
quanto ao direito em si, não quanto ao exercício do direito de reparação
quanto a dano moral pela violação do direito da personalidade (honra,
p.ex.).
O exercício do direito a reparação de danos se sujeita a prazos
prescricionais – 3 anos, no caso, nos termos do art. 206, § 3.º, V, CC.
Contudo, existem decisões do STJ que reconhecem a imprescritibilidade
do pleito de reparação de danos: “É pacífico o entendimento no Superior
Tribunal de Justiça segundo o qual as ações de indenização por danos

43
morais e materiais decorrentes de atos de violência ocorridos durante o
Regime Militar são consideradas imprescritíveis, independentemente dos
legitimados ad causam.”
“Como é cediço, a prescritibilidade é a regra, só havendo falar em
imprescritibilidade em hipóteses excepcionalíssimas, como no tocante às
ações referentes ao estado das pessoas. Somente alguns direitos
subjetivos, observada sua envergadura e especial proteção, não estão
sujeitos a prazos prescricionais, como na hipótese de ações declaratórias
de nulidades absolutas, pretensões relativas a direitos da personalidade
e ao patrimônio público”. (EDcl no AgRg no REsp 1229068/RJ, Rel.
Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em
06/10/2015, DJe 16/10/2015)
• Impenhorabilidade: em razão de serem inerentes à pessoa e dela
inseparáveis, não podem ser penhoráveis, pois a função da penhora é a
venda judicial para satisfação de um crédito. Contudo, esta
indisponibilidade é quanto ao direito em si (vedação da penhora do direito
à imagem), mas não se refere a penhora dos direitos patrimoniais
resultantes do exercício deste direito (a cessão de uso da imagem gera
um ressarcimento patrimonial e, este, pode ser penhorado). O art. 832,
CPC/2015 determina que estão a salvo da execução os bens que a lei
considere impenhoráveis ou inalienáveis. Neste caso, enquadram-se os
direitos da personalidade.
• Vitaliciedade: são adquiridos no momento da concepção e acompanham
a pessoa até sua morte, ainda que alguns desses direitos sejam
resguardados mesmo após a morte da pessoa (honra, memória, direito
de autor, p. ex.). Ex.: não é porque o Chico Anísio faleceu que sua imagem
caiu no domínio público. Há o direito de indenização pelo uso indevido da
imagem do humorista. Neste sentido, o art. 12 define que a legitimação
para requerer a indenização é do cônjuge sobrevivente ou qualquer
parente em linha reta (filho, neto, pais, avós) ou colateral até quarto grau
(primos).

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5.4 Classificação
Apesar de haver um rol de direitos da personalidade previsto no Código Civil,
este rol não é taxativo (enunciado 274, Jornada de Direito Civil). São direitos inatos
ao ser humano, qualidades que se agregam ao homem. O texto protege a vida, nome
integridade físico-psíquica, honra, imagem, intimidade e produção intelectual.
Contudo, não tutela questões de liberdade sexual, por exemplo. A proteção quanto
aos direitos da personalidade divide-se em:
a) CORPO – Vida e integridade física (corpo vivo, cadáver, voz).
b) MENTE – integridade psíquica e criações intelectuais (liberdade, criações
intelectuais, privacidade, segredo).
c) ESPÍRITO – integridade moral (honra, imagem, identidade pessoal).

5.5 Proteção dos direitos da personalidade


A proteção aos direitos da personalidade está prevista tanto na Constituição
Federal quanto no Código Civil.
Considerando que visa resguardar a dignidade humana através de medidas
judiciais, esta proteção pode ser: preventiva ou tutela inibitória; repressiva ou tutela
reparatória.
PREVENTIVA – objetivando suspender atos que ameacem ofender a
integridade do indivíduo
REPRESSIVA ou TUTELA REPARATÓRIA – ação indenizatória, que visa uma
reparação patrimonial pelo dano causado. A reparação pode ser por DANO MORAL,
quando a agressão for contra um direito da personalidade e não houver conteúdo
econômico dessa lesão. Poderá ser, também por DANO MATERIAL, quando houver
perda ou prejuízo por lesão a bem patrimonial. Esses danos podem ser danos
emergentes (o que a pessoa perdeu) e lucros cessantes (o que a pessoa deixou de
ganhar). A jurisprudência do STJ vem admitindo a possibilidade cumulação de danos
materiais, morais e, ainda, danos estéticos, conforme súmula 387, STJ: “é lícita a
cumulação das indenizações de dano estético e dano moral”.

5.5.1 Direito à vida


Sem a vida, não há nenhum outro direito à pessoa jurídica. Esse direito é
protegido desde a concepção, de forma que é vedado o aborto. O direito à vida

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compreende tanto o manter-se vivo, quanto o viver de forma digna. Dessa forma,
alimentos transgênicos estão relacionados ao direito à vida, pois violam o direito à
saúde (diretamente relacionado com a vida).
Aborto: interrupção criminosa da vida em formação. É crime previsto nos arts.
124 a 227, CP. Contudo, há a exclusão do crime em diferentes hipóteses:
Aborto terapêutico – não houver outro meio de salvar a vida da Mãe. Art. 128,I,
CP
Aborto sentimental (ético) – consentido pela gestante, quando a gravidez resultar
de estupro. Art. 128,II, CP
Aborto de feto anencefálico – feto que, comprovadamente, não possui atividade
cerebral – decisão do STF na ADPF 54 (2012).
Aborto dentro do primeiro trimestre de gestação – “... 3. Em segundo lugar, é
preciso conferir interpretação conforme a Constituição aos próprios arts. 124 a 126 do
Código Penal – que tipificam o crime de aborto – para excluir do seu âmbito de
incidência a interrupção voluntária da gestação efetivada no primeiro trimestre.
A criminalização, nessa hipótese, viola diversos direitos fundamentais da
mulher, bem como o princípio da proporcionalidade. 4. A criminalização é
incompatível com os seguintes direitos fundamentais: os direitos sexuais e
reprodutivos da mulher, que não pode ser obrigada pelo Estado a manter uma
gestação indesejada; a autonomia da mulher, que deve conservar o direito de fazer
suas escolhas existenciais; a integridade física e psíquica da gestante, que é quem
sofre, no seu corpo e no seu psiquismo, os efeitos da gravidez; e a igualdade da
mulher, já que homens não engravidam e, portanto, a equiparação plena de gênero
depende de se respeitar a vontade da mulher nessa matéria”. (HC 124306,
Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. ROBERTO
BARROSO, Primeira Turma, julgado em 09/08/2016, PROCESSO ELETRÔNICO
DJe-052 DIVULG 16-03-2017 PUBLIC 17-03-2017)
Fertilização in vitro: nos casos de fertilização in vitro, mesmo havendo o
descarte dos embriões que tenham sido fecundados, o STF decidiu, no julgamento da
Lei de Biossegurança (ADI 3510), que não há aborto neste caso, pois não houve a
gravidez ainda, sendo, portanto, permitida a realização de pesquisa em células tronco
embrionárias.

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Eutanásia: configura eutanásia a suspensão do tratamento ordinário a que está
submetido o paciente ou a interrupção da alimentação do paciente, mesmo que por
via intravenosa, a fim de provocar a morte por inanição. Também configura a
eutanásia a suspensão do auxílio externo para respiração.
Com isso, em razão da proteção de uma vida digna, há a discussão sobre a
questão do fim da vida através da eutanásia (proibida no Brasil). Ex.: filme “A menina
de ouro”. No exemplo do filme, haveria uma vida digna após o acidente?
Portanto, mesmo que a eutanásia seja praticada com o consentimento do
paciente é contrária ao ordenamento jurídico, por ferir o direito à vida.
Ortotanásia = eutanásia passiva – suspensão de medicamentos – morte digna.
Distanásia = prorrogar a vida com medicamentos.

5.5.2 Direito ao próprio corpo – integridade física


Os arts. 13 a 15, CC tratam do direito ao próprio corpo. Prevê o art. 13 do CC a
proteção a integridade física do indivíduo:

Art. 13. Salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio
corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou
contrariar os bons costumes.
Parágrafo único. O ato previsto neste artigo será admitido para fins de
transplante, na forma estabelecida em lei especial.

Este artigo refere-se a possíveis mutilações a que os indivíduos possam se


submeter. Autoriza, contudo a realização de um transplante. Mas a doação só é
permitida de partes duplas do corpo (rins) ou regeneráveis (fígado) ou tecidos
(medula, pele), desde que não prejudique, nem mutile o doador.
O § único do art. 13, CC permite, contudo, a realização de transplantes de partes
do corpo humano, conforme disposição em lei especial. A lei que rege os transplantes
é a 9.434/97, com as alterações da lei 10.211/01. Referidas leis permitem a retirada
de partes do corpo (tecidos, órgãos e partes do corpo vivo), desde que gratuitamente
e desde que não representem risco para a sua integridade física e mental. O
enunciado 532 das Jornadas de Direito Civil é claro nesse sentido:

É permitida a disposição gratuita do próprio corpo com objetivos


exclusivamente científicos, nos termos dos arts. 11 e 13 do Código Civil.

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Pode haver, também, cessão de direitos de uso de material biológico, para fins
de pesquisa, nos termos do enunciado 401 das Jornadas de Direito Civil:

Não contraria os bons costumes a cessão gratuita de direitos de uso de


material biológico para fins de pesquisa científica, desde que a manifestação
de vontade tenha sido livre, esclarecida e puder ser revogada a qualquer
tempo, conforme as normas éticas que regem a pesquisa científica e o
respeito aos direitos fundamentais.

Não se enquadra, nesta situação, conforme diversas decisões judiciais, os casos


de transexualidade. Muito se discutiu sobre a cirurgia de adequação sexual, se seria
mutiladora ou não. Restou pacificado pela jurisprudência que não se trata de
mutilação, mas sim de uma adequação da realidade biológica à realidade psicológica,
já que o contrário não é possível, eis que o transexual não aceita. O Conselho Federal
de Medicina, através de resolução, considera lícita a intervenção cirúrgica.
Nesse sentido, o enunciado 276, das Jornadas de Direito Civil:

O art. 13 do Código Civil, ao permitir a disposição do próprio corpo por


exigência médica, autoriza as cirurgias de transgenitalização, em
conformidade com os procedimentos estabelecidos pelo Conselho Federal de
Medicina, e a consequente alteração do prenome e do sexo no Registro Civil.

O corpo é a expressão da individualidade da pessoa, sendo, em razão disso,


inalienável, tanto em vida, quanto após a morte.
O art. 14, por sua vez, dispõe sobre a disposição post mortem do próprio corpo:

Art. 14. É válida, com objetivo científico, ou altruístico, a disposição gratuita


do próprio corpo, no todo ou em parte, para depois da morte.
Parágrafo único. O ato de disposição pode ser livremente revogado a
qualquer tempo.

Para tanto, é preciso que seja diagnosticada a morte encefálica. Assim, se o


indivíduo pretende ser doador, deverá deixar declaração escrita. Se nada dispuser a
respeito, a família deverá anuir expressamente para que seja feita a doação. Nesse
sentido, o enunciado 277 das Jornadas de Direito Civil:

O art. 14 do Código Civil, ao afirmar a validade da disposição gratuita do


próprio corpo, com objetivo científico ou altruístico, para depois da morte,
determinou que a manifestação expressa do doador de órgãos em vida
prevalece sobre a vontade dos familiares, portanto, a aplicação do art. 4º da
Lei n. 9.434/97 ficou restrita à hipótese de silêncio do potencial doador.

Não poderá haver remoção de órgãos de pessoa não identificada.

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Após a retirada dos órgãos o corpo deve ser recomposto e entregue à família
para que realize o sepultamento.
É VEDADA A COMERCIALIZAÇÃO DOS ÓRGÃOS DO CORPO HUMANO.
Permite-se, apenas, o transplante gratuito. Art. 199, § 4.º, CF:

§ 4º - A lei disporá sobre as condições e os requisitos que facilitem a remoção


de órgãos, tecidos e substâncias humanas para fins de transplante, pesquisa
e tratamento, bem como a coleta, processamento e transfusão de sangue e
seus derivados, sendo vedado todo tipo de comercialização.

Segundo o art. 15, CC, ninguém pode ser obrigado a submeter-se a tratamento
médico ou cirúrgico que importe risco de vida.

Art. 15. Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a
tratamento médico ou a intervenção cirúrgica.

Não significa que tratamentos de risco sejam vedados, mas o indivíduo deve
estar ciente, antes de se submeter a tal tratamento, dos riscos dele provenientes.
Cabe, portanto, ao médico, informar ao paciente, devendo registrar tal fato por escrito,
para evitar responsabilidades futuras.
O doente pode, portanto, negar-se a tratamento de risco. Nesse aspecto, o
enunciado 403 das Jornadas de Direito Civil prevê:

O Direito à inviolabilidade de consciência e de crença, previsto no art. 5º, VI,


da Constituição Federal, aplica-se também à pessoa que se nega a
tratamento médico, inclusive transfusão de sangue, com ou sem risco de
morte, em razão do tratamento ou da falta dele, desde que observados os
seguintes critérios: a) capacidade civil plena, excluído o suprimento pelo
representante ou assistente; b) manifestação de vontade livre, consciente e
informada; e c) oposição que diga respeito exclusivamente à própria pessoa
do declarante.

Também o enunciado 533 das Jornadas de Direito Civil dispõe:

O paciente plenamente capaz poderá deliberar sobre todos os aspectos


concernentes a tratamento médico que possa lhe causar risco de vida, seja
imediato ou mediato, salvo as situações de emergência ou no curso de
procedimentos médicos cirúrgicos que não possam ser interrompidos.

Caso esteja impossibilitado de decidir, caberá a seu representante legal. A


autorização, caso o paciente não tenha condições de fornecê-la deve ser requerida a
qualquer parente maior, em linha reta ou colateral até 2.º grau (irmão) ou cônjuge.

49
Se, contudo, não houver tempo hábil para consultar o paciente ou o
representante legal, o médico tem o dever de realizar o tratamento (ex. emergência
de parada cardíaca).

5.5.3 Direito ao nome


A proteção ao nome é prevista nos arts. 16 a 19, CC. O art. 16 prevê:

Art. 16. Toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e
o sobrenome.

Nome é a designação jurídica pela qual a pessoa é conhecida no mundo. Assim,


envolve o sentido completo do termo → nome + sobrenome. Esse elemento serve
para individualizar a pessoa, tanto durante a vida, quanto durante a morte, passando
a integrar a personalidade do indivíduo (tanto que é protegido o nome enquanto direito
da personalidade).
O nome é um código identificador de cada pessoa. É uma designação pela qual
a pessoa identifica-se na família e na sociedade. É uma característica marcante da
personalidade, sendo inalienável e imprescritível da individualidade da pessoa. Dessa
forma, todo ser humano deve portar um nome.
Dessa forma, nome é o nome completo. Ex.: Maitê Damé Teixeira Lemos.
Constitui-se de prenome e sobrenome. Ex:

Maitê – prenome (nome próprio)


Damé Teixeira Lemos – sobrenome, apelido familiar, nome de família (nome).

No Brasil, os pais podem escolher livremente o prenome dos filhos, desde que
não o exponham ao ridículo. Ex.: FACEBOOKSSON.
Nesse sentido, o § único, do art. 55 da Lei dos Registros Públicos dispõe que:

Os oficiais do registro civil não registrarão prenomes suscetíveis de expor ao


ridículo os seus portadores. Quando os pais não se conformarem com a
recusa do oficial, este submeterá por escrito o caso, independente da
cobrança de quaisquer emolumentos, à decisão do Juiz competente.

O sobrenome (ou nome) é o sinal identificativo da origem da pessoa, de forma a


indicar sua filiação. Trata-se de uma característica da família, transmissível por

50
sucessão. É o apelido familiar. O prenome pode ser escolhido. O sobrenome é
herdado dos pais.
NÃO HÁ UMA ORDEM OBRIGATÓRIA DE APOSIÇÃO DOS SOBRENOMES.
Via de regra, em razão dos costumes, se utiliza, primeiro o último sobrenome da Mãe
e, depois, o último sobrenome do Pai. Contudo, não há lei que disponha nesse sentido.
Dessa maneira, é possível que se faça requerimento ao registrador de forma diferente.
Exemplo: Vinicius Damé Teixeira Lemos. Também poderia ser: Vinicius Lemos Damé
Teixeira.
Nesse sentido, a Lei dos Registros Públicos, assim como a Consolidação
Normativa Notarial e Registral determinam que, se não for indicado o sobrenome
pelos pais, o registrador lançará o sobrenome do pai e, na sua falta, o da mãe.
Contudo, isto não se justifica em razão da igualdade constitucional.

ALCUNHA – apelido depreciativo, normalmente relacionado com a


característica física ou moral. Ex.: o bandido “Seco”.
COGNOME – designação dada a alguém em razão de uma característica
especial. Ex.: Tiradentes.
EPÍTETO – designação qualificativa. Ex.: Dom Pedro, o Justiceiro.
HIPOCORÍSTICO – diminuitivo do nome, usado na intimidade familiar,
normalmente. Ex.: João (Joãozinho), Sebastião (Tião), José (Zé ou Zezinho), etc.
AGNOME – sinal distintivo de pessoas que, em uma mesma família, possuem o
mesmo nome. Trata-se das expressões Júnior, Filho, Neto, Sobrinho, Segundo, etc.
Ex.: Roberto Carlos Braga e Roberto Carlos Braga Segundo (filho do cantor).
AXIÔNIMO – forma de tratamento, como p. ex., Vossa Santidade, Conde,
Comendador, etc., que passam a integrar o nome para todos os efeitos.

O nome, enquanto característica pessoal e individual de cada pessoa, via de


regra, é imutável. Contudo, é admissível sua alteração em alguns casos, quando
houver motivo relevante: erro gráfico, expor o portador ao ridículo. Dessa forma, não
é qualquer capricho pessoal que autoriza a modificação do nome.
Aquele que completar a maioridade civil (18 anos ou emancipação) poderá, no
prazo de 1 ano, alterar, de forma administrativa (art. 56, LRP), seu nome (completo),

51
desde que não prejudique os apelidos de família. Assim, alguém registrado apenas
com o sobrenome do Pai poderá incluir o da Mãe, por exemplo.
Art. 56. O interessado, no primeiro ano após ter atingido a maioridade civil,
poderá, pessoalmente ou por procurador bastante, alterar o nome, desde que
não prejudique os apelidos de família, averbando-se a alteração que será
publicada pela imprensa.

Depois de passado esse prazo de 1 ano a alteração poderá ser feita mas, neste
caso, dependerá de ordem judicial, nos termos do art. 57, LRP.
O art. 57 da Lei dos Registros Públicas autoriza a alteração quando houver
evidente erro gráfico, a alteração poderá ser feita, nos termos do art. 57, Lei dos
Registros Públicos, através do procedimento previsto no art. 110, da mesma Lei:

Art. 57. A alteração posterior de nome, somente por exceção e


motivadamente, após audiência do Ministério Público, será permitida por
sentença do juiz a que estiver sujeito o registro, arquivando-se o mandado e
publicando-se a alteração pela imprensa, ressalvada a hipótese do art. 110
desta Lei.

Art. 110. Os erros que não exijam qualquer indagação para a constatação
imediata de necessidade de sua correção poderão ser corrigidos de ofício
pelo oficial de registro no próprio cartório onde se encontrar o assentamento,
mediante petição assinada pelo interessado, representante legal ou
procurador, independentemente de pagamento de selos e taxas, após
manifestação conclusiva do Ministério Público.
§ 1º Recebido o requerimento instruído com os documentos que
comprovem o erro, o oficial submetê-lo-á ao órgão do Ministério Público que
o despachará em 5 (cinco) dias.
§ 2º Quando a prova depender de dados existentes no próprio cartório,
poderá o oficial certificá-lo nos autos.
§ 3º Entendendo o órgão do Ministério Público que o pedido exige maior
indagação, requererá ao juiz a distribuição dos autos a um dos cartórios da
circunscrição, caso em que se processará a retificação, com assistência de
advogado, observado o rito sumaríssimo.
§ 4º Deferido o pedido, o oficial averbará a retificação à margem do
registro, mencionando o número do protocolo e a data da sentença e seu
trânsito em julgado, quando for o caso.

Quando a mudança for necessária em razão de expor seu portador ao ridículo,


assim como outras alterações, dependerá de procedimento judicial de retificação de
nome, nos termos do art. 109, LRP:

Art. 109. Quem pretender que se restaure, supra ou retifique assentamento


no Registro Civil, requererá, em petição fundamentada e instruída com
documentos ou com indicação de testemunhas, que o Juiz o ordene, ouvido
o órgão do Ministério Público e os interessados, no prazo de cinco dias, que
correrá em cartório.
§ 1° Se qualquer interessado ou o órgão do Ministério Público impugnar
o pedido, o Juiz determinará a produção da prova, dentro do prazo de dez

52
dias e ouvidos, sucessivamente, em três dias, os interessados e o órgão do
Ministério Público, decidirá em cinco dias.
§ 2° Se não houver impugnação ou necessidade de mais provas, o Juiz
decidirá no prazo de cinco dias.
§ 3º Da decisão do Juiz, caberá o recurso de apelação com ambos os
efeitos.
§ 4º Julgado procedente o pedido, o Juiz ordenará que se expeça
mandado para que seja lavrado, restaurado e retificado o assentamento,
indicando, com precisão, os fatos ou circunstâncias que devam ser
retificados, e em que sentido, ou os que devam ser objeto do novo
assentamento.
§ 5º Se houver de ser cumprido em jurisdição diversa, o mandado será
remetido, por ofício, ao Juiz sob cuja jurisdição estiver o cartório do Registro
Civil e, com o seu "cumpra-se", executar-se-á.
§ 6º As retificações serão feitas à margem do registro, com as indicações
necessárias, ou, quando for o caso, com a trasladação do mandado, que
ficará arquivado. Se não houver espaço, far-se-á o transporte do assento,
com as remissões à margem do registro original.

Esta hipótese serve para os casos de pessoas do sexo masculino registradas


com nome feminino. Ex.: Arlete, Salete, etc.
Também é possível a alteração do prenome registral pelo prenome de uso.
Essa autorização está contida no art. 58 da Lei dos Registros Públicos:

Art. 58. O prenome será definitivo, admitindo-se, todavia, a sua substituição


por apelidos públicos notórios.
Parágrafo único. A substituição do prenome será ainda admitida em razão de
fundada coação ou ameaça decorrente da colaboração com a apuração de
crime, por determinação, em sentença, de juiz competente, ouvido o
Ministério Público.

Isto porque, a função da imutabilidade do prenome é pelo fato de que a pessoa


é conhecida por aquele signo distintivo. Contudo, se a notoriedade é em razão de
outro prenome, este é que passa a ser imutável. Ex.: Pelé = Edson Arantes do
Nascimento. A notoriedade do prenome Pelé é muito maior do que Arantes. Neste
caso, é possível que, caso ele tenha interesse, faça requerimento para alterar o
prenome para “Pelé Arantes do Nascimento” ou “Zezé de Camargo” = Welson David
de Camargo.
Também há a possibilidade de alteração em razão da situação de transexual
operado, quando o registro civil passa a não corresponder com a realidade física, não
correspondendo, portanto, a verdade. Nesse sentido, essa alteração tem sido
autorizada, tanto do registro do nome, quanto do sexo. Deve-se observar que a ADI
4275, julgada em março de 2018 autorizou a alteração do prenome dos transexuais,
independentemente de alteração do sexo e de autorização judicial:

53
... julgou procedente a ação para dar à lei dos registros interpretação
conforme a Constituição Federal e pactos internacionais que tratam dos
direitos fundamentais, a fim de reconhecer aos transgêneros que desejarem
o direito à alteração de nome e gênero no assento de registro civil,
independentemente da cirurgia. Para ela, são desnecessários a autorização
judicial e os requisitos propostos.
(http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=371085)

Também pode haver a mudança do prenome em razão de adoção. Segundo o


ECA, no seu art. 47, § 5.º, a sentença que define a adoção poderá autorizar, a
requerimento do adotante, a alteração do prenome do adotado.

É possível, também, acrescentar os apelidos notórios, sem que prejudique o


prenome. Ex.; Lula: Luiz Inácio “Lula” da Silva.
Também se pode acrescentar ouro nome para solucionar problemas de
homonímia. Ex.: existência de 500 Maria da Silva. É possível que se acrescente Maria
“de Fátima” da Silva.
O acréscimo de outros nomes (sobrenomes) poderá ocorrer também em casos
de casamento (art. 1.565, § 1.º, CC prevê que qualquer dos nubentes poderá assumir
o sobrenome do outro). No caso da união estável a inclusão do nome do outro só é
autorizada quando um deles tiver impedimento para casar, nos termos do art. 57, §
2.º, CC.
Também o reconhecimento de paternidade é motivo para a alteração do nome
do indivíduo, a fim de acrescentar o patronímico paterno.
Com relação ao registro dos filhos fora do matrimônio, os arts. 59 e 60 da Lei
dos Registros Públicos dispõe:

Art. 59. Quando se tratar de filho ilegítimo, não será declarado o nome do pai
sem que este expressamente o autorize e compareça, por si ou por
procurador especial, para, reconhecendo-o, assinar, ou não sabendo ou não
podendo, mandar assinar a seu rogo o respectivo assento com duas
testemunhas.

Art. 60. O registro conterá o nome do pai ou da mãe, ainda que ilegítimos,
quando qualquer deles for o declarante.

Trata-se de forma de reconhecimento de filiação. A regra é que os filhos havidos


durante a relação matrimonial tem a paternidade presumida (art. 1.597, CC).

Art. 1.597. Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos:


I - nascidos cento e oitenta dias, pelo menos, depois de estabelecida a
convivência conjugal;

54
II - nascidos nos trezentos dias subsequentes à dissolução da sociedade
conjugal, por morte, separação judicial, nulidade e anulação do casamento;
III - havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido;
IV - havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários,
decorrentes de concepção artificial homóloga;
V - havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia
autorização do marido.

Nestes casos, para que haja o registro dos filhos, basta que compareça a mulher
portando a certidão de casamento. Neste caso, o filho será registrado como filho do
casal. Contudo, se o filho não for advindo de relação matrimonial, dependerá da
presença do pai para que faça o registro, quando, então, estará reconhecendo
voluntariamente o filho.
O nome tem uma importância tanto pública quanto individual. A importância
pública do nome se dá em razão de que o Estado tem interesse na identificação
correta e precisa dos indivíduos, determinado, assim, que seja procedido seu registro
(nos termos da Lei dos Registros Públicos), vedando sua alteração (somente em
casos excepcionais é admitida). A importância individual está no direito ao nome,
que cada indivíduo tenha direito a portar um signo identificador e, mais do que isto, de
exigir o respeito e proteção a este signo identificador, podendo reprimir abuso por
parte de terceiros. A proteção ao nome é feita através de ações (dano moral, p.ex.).
Através dessas ações podem ser exigidos, por exemplo, que seja divulgado o nome
verdadeiro: ex.: sai uma foto publicada no jornal, de dois amigos (João e Carlos). Logo
em seguida a descrição: Joãozinho e sua namorada. Cabe, neste caso, uma ação
para contestar o nome publicado, exigindo a retificação, a fim de que conste o nome
correto.
Nesse sentido, os arts. 17 e 18, CC preveem:

Art. 17. O nome da pessoa não pode ser empregado por outrem em
publicações ou representações que a exponham ao desprezo público, ainda
quando não haja intenção difamatória.
Art. 18. Sem autorização, não se pode usar o nome alheio em propaganda
comercial.

Havendo violação ao direito ao nome é cabível a reparação por danos. Ex.:


Luciano Huck entrou com processo de indenização por danos contra um
empreendimento imobiliário que, para vender maior número de imóveis, veiculou que
seria um atrativo o fato de que Huck seria um dos moradores.

55
Nesse sentido, há a súmula 403, STJ que determina que “Independe de prova
do prejuízo a indenização pela publicação não autorizada de imagem de pessoa com
fins econômicos ou comerciais”.
Os responsáveis pelo ressarcimento serão tanto o autor da publicação quanto o
veículo de divulgação. É o que prevê a súmula 221, STJ: “São civilmente responsáveis
pelo ressarcimento de dano, decorrente de publicação pela imprensa, tanto o autor do
escrito quanto o proprietário do veículo de divulgação”.
Além disso, também não se pode esquecer que há a utilização dos chamados
pseudônimos, ou seja, nomes figurativos ou codinomes, nomes fictícios que servem
para identificar o autor do escrito, normalmente artistas. Ex.: Fafá de Belém (Maria de
Fátima Palha de Figueiredo); Cazuza (Agenor de Miranda Araújo Neto); Lima Duarte
(Ariclenes Venâncio Martins); Xuxa (Maria da Graça Meneguel). Esses pseudônimos,
quando usados licitamente, gozam da mesma proteção que se dá ao nome (art. 19,
CC):

Art. 19. O pseudônimo adotado para atividades lícitas goza da proteção que
se dá ao nome.

Assim, o mau uso do pseudônimo de alguém também gera o dever de indenizar.

5.5.4 Proteção à palavra e à imagem


O art. 20, CC faz a previsão da proteção à palavra e à imagem:

Art. 20. Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça


ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão
da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma
pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da
indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a
respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais.
Parágrafo único. Em se tratando de morto ou de ausente, são partes legítimas
para requerer essa proteção o cônjuge, os ascendentes ou os descendentes.

O enunciado 275 das Jornadas de Direito Civil incluiu o companheiro também


como legitimado:
O rol dos legitimados de que tratam os arts. 12, parágrafo único, e 20,
parágrafo único, do Código Civil também compreende o companheiro.

Trata-se da tutela da voz, também protegida pelo art. 5.º, XXVIII, a, CF. Neste
caso se enquadra o caso de Galvão Bueno, por exemplo.

56
XXVIII - são assegurados, nos termos da lei:
a) a proteção às participações individuais em obras coletivas e à reprodução
da imagem e voz humanas, inclusive nas atividades desportivas;

A pessoa que tiver sua imagem ou voz utilizadas de forma indevida, sem
autorização, poderá acionar a justiça para impedir o uso e, ainda, receber indenização
pelo uso indevido.
Contudo, o STJ julgou a ADIn 4815, que dá ao art. 20, CC interpretação
conforme a Constituição. Nesta ação, foi autorizada a publicação das “biografias não
autorizadas”, ou seja, a possibilidade de publicação de obras biográficas literárias ou
audiovisuais, independentemente do consentimento do biografado. O Presidente do
STF a época (Ricardo Lewandowski) afirmou que “não é possível que haja censura
ou se exija autorização prévia para a produção e publicação de biografias”, de forma
que “a censura prévia está afastada, com plena liberdade de expressão artística,
científica, histórica e literária, desde que não se ofendam os direitos constitucionais
dos biografados”.
Trata-se de uma forma de limitação dos direitos da personalidade, que acaba
ocorrendo através da ponderação ou aplicação do princípio da proporcionalidade.
Nesse sentido é a redação do enunciado 279 das Jornadas de Direito Civil:

Trata-se de uma forma de limitação dos direitos da personalidade, que acaba


ocorrendo através da ponderação ou aplicação do princípio da
proporcionalidade.

a) Proteção à intimidade
O art. 5.º, X, da CF prevê:

X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das


pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral
decorrente de sua violação;

De início, é preciso que se diferencie privacidade e intimidade, pois são


diferentes. Contudo, a linha divisória é muito tênue, quase imperceptível.
Privacidade ou vida privada = comportamentos e acontecimentos atinentes
aos relacionamentos pessoais em geral, relações comerciais e profissionais que o
indivíduo não deseja que se espalhem ao conhecimento público. Se refere àquilo que
a pessoa deseja excluir do conhecimento pelos outros. É o controle das informações

57
sobre si mesmo. É o direito do indivíduo não ter seus assuntos pessoais e profissionais
expostos a terceiros.
Intimidade = conversações, episódios mais íntimos, envolvendo relações
familiares e amizades mais próximas. A intimidade, como atributo da personalidade,
é a vida familiar, pessoal, a vida interior da pessoa; é aquela vivida entre quatro
paredes, em sua residência, incluindo-se na esfera mais íntima.
Deve-se destacar que há interesse público sobre acontecimentos que ocorram
com determinadas pessoas, por serem públicas. É o que acontece com as
celebridades, artistas, quando fatos relativos a sua privacidade são expostos para o
público, para satisfazer o interesse geral. Assim, existem fatos da privacidade de
alguém que, levados a público, podem ser tidos como admissíveis ou como abusivos,
tudo dependendo da maneira como o indivíduo que está sendo exposto vive.
Os direitos fundamentais, como vimos, podem ser objeto de restrições, no limite
da dignidade da pessoa humana. Nesse sentido, é possível que alguém, por ocasião
da morte de um ente querido, dê entrevista a respeito. Ex.: caso da morte de Rafael
Mascarenhas, filho da atriz Cissa Guimarães. O caso teve maior publicização em
razão da mãe do rapaz ser pessoa pública. A atriz limitou sua intimidade e expôs o
caso para a imprensa, dando entrevistas e falando sobre a dor da perda do filho.
Nesse sentido, é de se verificar até que ponto houve a autorização para a
publicação da imagem da pessoa, invadindo sua intimidade. Por isso, deve-se levar
em conta a forma como a pessoa leva a vida, ou seja, seu modo de agir. Como
exemplo, tem-se o fato de uma mulher, fazendo “top-less” ser fotografada em uma
praia pública. O seu agir está a expor sua intimidade. Dessa forma, não há como
querer impedir a publicação de uma foto na qual ela apareça.
Nesse sentido é o julgado do STJ:

DIREITO CIVIL. DIREITO DE IMAGEM. TOPLESS PRATICADO EM


CENÁRIO PÚBLICO.
Não se pode cometer o delírio de, em nome do direito de privacidade,
estabelecer-se uma redoma protetora em torno de uma pessoa para torná-la
imune de qualquer veiculação atinente a sua imagem.
Se a demandante expõe sua imagem em cenário público, não é ilícita ou
indevida sua reprodução pela imprensa, uma vez que a proteção à
privacidade encontra limite na própria exposição realizada.
Recurso especial não conhecido.
(REsp 595600/SC, Rel. Ministro CESAR ASFOR ROCHA, QUARTA TURMA,
julgado em 18/03/2004)

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Contudo, a questão do interesse público não deve ser confundida com o
interesse do público. Isso porque, por óbvio, a revelação de algum hábito sexual
heterodoxo de um político não possui o mesmo coeficiente de interesse relevante que
teria o noticiário de igual comportamento praticado por um cidadão comum. Assim,
não deve-se confundir o interesse público com o interesse do público, de maneira a
expor a vida de pessoas pública apenas para satisfazer as curiosidades do público,
sem qualquer relevância pública.
Dessa forma, deve haver uma ponderação entre o interesse público da notícia e
a privacidade do indivíduo, a fim de verificar qual dos dois direitos fundamentais será
mais importante se proteger no caso concreto.
Isso não quer dizer que todo homem público, por assim o ser, terá seu direito à
privacidade sempre preterido em razão do interesse público. Pelo contrário, ele possui
igual proteção desse direito, como se sujeito comum fosse. Contudo, existem casos,
que sua conduta, em razão da exposição pública, gera o interesse público, de maneira
que possa haver a limitação do seu direito à intimidade.
E mais, para que haja a exposição da privacidade do homem público, deve haver
o interesse público, no sentido de constituir um elemento útil a que o indivíduo que vai
receber a informação se oriente melhor na sociedade em que vive, ou seja, não basta
só o interesse do público, mas o interesse público, a utilidade da informação veiculada.
Não se inclui, portanto, os hábitos sexuais ou alimentares do homem público, pois isso
em nada traz utilidade da informação para a sociedade.
O mesmo ocorre com quem deixou de ser homem público e volta ao anonimato.
Essa pessoa deve ser “deixada de lado”, de maneira a ser respeitada sua intimidade
e sua vida privada, pois deixou de ser de interesse público. Também no mesmo
sentido é a proteção daqueles que deixam a penitenciária e precisam se reajustar à
sociedade. Eles possuem o direito de não ter expostos os motivos que o levaram à
prisão, pois já cumpriram com sua pena e, agora, tem o direito de recomeçar, de
maneira a não terem sua vida privada exposta novamente. Esta é a tutela do chamado
“direito ao esquecimento”, conforme previsão dos enunciados abaixo:

Enunciado 531: A tutela da dignidade da pessoa humana na sociedade da


informação inclui o direito ao esquecimento.
Enunciado 576: O direito ao esquecimento pode ser assegurado por tutela
judicial inibitória.

59
Verifica-se, pois, que cabe se utilizar de tutela inibitória para evitar a lesão e
reparação de danos para a vítima, a fim de reparar o dano sofrido.
O direito ao esquecimento deve ser reconhecido, portanto, como direito da
personalidade.
Na verdade, como resumo, para verificação da proteção à intimidade e à vida
privada, em conflito com o direito à liberdade de informação, deve-se levar em conta
o princípio da proporcionalidade e suas máximas (necessidade, adequação e
proporcionalidade em sentido estrito). Trata-se da utilização da técnica de ponderação
que se encontra tipificada no Código de Processo Civil. Essa técnica, embora possa
sofrer críticas é utilizada pelo STJ:

RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E


MATERIAIS DECORRENTES DA REALIZAÇÃO DE EXAME DE HIV NÃO
SOLICITADO, POR MEIO DO QUAL O PACIENTE OBTEVE A
INFORMAÇÃO DE SER SOROPOSITIVO - VIOLAÇÃO AO DIREITO À
INTIMIDADE - NÃO OCORRÊNCIA - INFORMAÇÃO CORRETA E
SIGILOSA SOBRE SEU ESTADO DE SAÚDE - FATO QUE PROPORCIONA
AO PACIENTE A PROTEÇÃO A UM DIREITO MAIOR, SOB O ENFOQUE
INDIVIDUAL E PÚBLICO - RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO.
I - O direito à intimidade, não é absoluto, aliás, como todo e qualquer direito
individual. Na verdade, é de se admitir, excepcionalmente, a tangibilidade ao
direito à intimidade, em hipóteses em que esta se revele necessária à
preservação de um direito maior, seja sob o prisma individual, seja sob o
enfoque do interesse público. Tal exame, é certo, não prescinde, em hipótese
alguma, da adoção do princípio da dignidade da pessoa humana, como
princípio basilar e norteador do Estado Democrático de Direito, e da
razoabilidade, como critério axiológico;
II - Sob o prisma individual, o direito de o indivíduo não saber que é portador
do vírus HIV (caso se entenda que este seja um direito seu, decorrente da
sua intimidade), sucumbe, é suplantado por um direito maior, qual seja, o
direito à vida, o direito à vida com mais saúde, o direito à vida mais longeva
e saudável;
III - Mesmo que o indivíduo não tenha interesse ou não queira ter
conhecimento sobre a enfermidade que lhe acomete (seja qual for a razão),
a informação correta e sigilosa sobre seu estado de saúde dada pelo Hospital
ou Laboratório, ainda que de forma involuntária, tal como ocorrera na
hipótese dos autos, não tem o condão de afrontar sua intimidade, na medida
em que lhe proporciona a proteção a um direito maior;
IV - Não se afigura permitido, tão-pouco razoável que o indivíduo, com o
desiderato inequívoco de resguardar sua saúde, após recorrer ao seu
médico, que lhe determinou a realização de uma série de exames, vir à juízo
aduzir justamente que tinha o direito de não saber que é portador de
determinada doença, ainda que o conhecimento desta tenha se dado de
forma involuntária. Tal proceder aproxima-se, em muito, da defesa em juízo
da própria torpeza, não merecendo, por isso, guarida do Poder Judiciário;
V - No caso dos autos, o exame efetuado pelo Hospital não contém equívoco,
o que permite concluir que o abalo psíquico suportado pelo ora recorrente
não decorre da conduta do Hospital, mas sim do fato de o recorrente ser
portador do vírus HIV, no que o Hospital-recorrido, é certo, não possui
qualquer responsabilidade;

60
VI - Sob o enfoque do interesse público, assinala-se que a opção de o
paciente se submeter ou não a um tratamento de combate ao vírus HIV, que,
ressalte-se, somente se tornou possível e, certamente, mais eficaz graças ao
conhecimento da doença, dado por ato involuntário do Hospital, é de seu
exclusivo arbítrio. Entretanto, o comportamento destinado a omitir-se sobre o
conhecimento da doença, que, em última análise, gera condutas igualmente
omissivas quanto à prevenção e disseminação do vírus HIV, vai de encontro
aos anseios sociais;
VII - Num momento em que o Poder Público, por meio de exaustivas
campanhas de saúde, incentiva a feitura do exame anti HIV como uma das
principais formas de prevenção e controle da disseminação do vírus HIV, tem-
se que o comando emanado desta augusta Corte, de repercussão e
abrangência nacional, no sentido de que o cidadão teria o direito subjetivo de
não saber que é soropositivo, configuraria indevida sobreposição de um
direito individual (que, em si não se sustenta, tal como demonstrado) sobre o
interesse público, o que, data maxima venia, não se afigura escorreito;
VII - Recurso Especial improvido.
(REsp 1195995/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Rel. p/ Acórdão
Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/03/2011,
DJe 06/04/2011)

61
066. AUSÊNCIA

Os arts. 22 a 39 serão trabalhados no direito sucessório, assim como a questão


do fim da personalidade, que se opera com a morte.

ANOTAÇÕES:
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62
7.
078. PESSOAS JURÍDICAS

As pessoas jurídicas são o resultado da associação humana, ou seja, a criação


da pessoa jurídica se dá por um ser humano, mas não há confusão entre a pessoa
jurídica e a pessoa física. A existência e o patrimônio são distintos. Em razão disso, o
direito passou a reger essas entidades e conceder personalidade jurídica, de forma a
viabilizar sua atuação funcional e realização de seus objetivos.

7.1 Pressupostos existenciais


Para a existência da pessoa jurídica, necessária a configuração de três
pressupostos:
Vontade humana criadora: a manifestação da vontade dos indivíduos que
compõe a pessoa jurídica é indispensável para sua existência. Não há como
se compreender a formação de uma pessoa jurídica por determinação estatal,
por exemplo.
Observância das condições legais para a instituição: devem ser cumpridas
as exigências legais para que a pessoa jurídica passe a existir e ser dotada de
personalidade jurídica. Assim, há a necessidade de que os atos constitutivos
da pessoa jurídica (estatuto social ou contrato social) sejam registrados no
registro peculiar (registro das pessoas jurídicas). Dependendo do tipo de
atividade, há, também, a necessidade de autorização do governo para o
funcionamento (ex.: companhias de seguro).
Licitude do objeto: o objeto da pessoa jurídica (a atividade a ser desenvolvida)
deve ser lícito e não ser proibido pelo sistema jurídico, ou seja, não é possível
uma pessoa jurídica criada para comercialização de drogas ilícitas.

7.2 Surgimento da pessoa jurídica – início da personalidade


A pessoa jurídica, por sua vez, surge por obra humana (atos bilaterais – criação
por contrato ou unilaterais – criação por testamento) e com a inscrição dos atos
constitutivos no registro competente. É nesse sentido a determinação do art. 45, CC:

Art. 45. Começa a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado
com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro, precedida, quando

63
necessário, de autorização ou aprovação do Poder Executivo, averbando-se
no registro todas as alterações por que passar o ato constitutivo.
Parágrafo único. Decai em três anos o direito de anular a constituição das
pessoas jurídicas de direito privado, por defeito do ato respectivo, contado o
prazo da publicação de sua inscrição no registro.

Dessa forma, o registro da pessoa jurídica tem caráter constitutivo, atribuindo-


lhe personalidade. Referido registro deverá ser feito no registro civil das pessoas
jurídicas ou na junta comercial (para as sociedades mercantis).

Registro Civil das


REGISTRO

pessoas jurídicas não empresárias


Pessoas Jurídicas

Junta Comercial pessoas jurídicas empresárias.

O registro deverá declarar, nos termos do art. 46, CC:

Art. 46. O registro declarará:


I - a denominação, os fins, a sede, o tempo de duração e o fundo social,
quando houver;
II - o nome e a individualização dos fundadores ou instituidores, e dos
diretores;
III - o modo por que se administra e representa, ativa e passivamente, judicial
e extrajudicialmente;
IV - se o ato constitutivo é reformável no tocante à administração, e de que
modo;
V - se os membros respondem, ou não, subsidiariamente, pelas obrigações
sociais;
VI - as condições de extinção da pessoa jurídica e o destino do seu
patrimônio, nesse caso.

A pessoa jurídica só surge no momento do seu registro. Antes disso, não se fala
em pessoa jurídica enquanto sujeito de direito. Assim, antes de realizado o registro
civil da pessoa jurídica, só se pode falar em sociedade irregular ou de fato, que é
a pessoa jurídica desprovida de personalidade jurídica, mas com capacidade para se
obrigar perante terceiros. A disciplina desse tipo societário é trazida pelo livro referente
ao Direito de Empresa, no Código Civil, no art. 986, CC:

Art. 986. Enquanto não inscritos os atos constitutivos, reger-se-á a sociedade,


exceto por ações em organização, pelo disposto neste Capítulo, observadas,
subsidiariamente e no que com ele forem compatíveis, as normas da
sociedade simples.

64
Assim, se a sociedade é irregular, a responsabilidade dos sócios é ilimitada
e subsidiária, ou seja, só após de exaurir os bens da empresa é que o sócio poderá
ser demandado (art. 989, CC + art. 1.024, CC):

Art. 990. Todos os sócios respondem solidária e ilimitadamente pelas


obrigações sociais, excluído do benefício de ordem, previsto no art. 1.024,
aquele que contratou pela sociedade.

Assim, existe o benefício de ordem (executar primeiro os bens da sociedade


para, depois, os do sócio), mas não para o sócio que contratou pela sociedade (sócio
representante).
Uma questão se impõe: uma sociedade foi criada em 01/06/2011, mas só foi
registrada em 03/04/2012. Durante este período realizou negócios jurídicos. Como
ficará esta situação? Durante o período em que não houve o registro a sociedade é
irregular e, com isso, há a responsabilidade ilimitada dos sócios. Após o registro,
passará a existir a personalidade jurídica da sociedade e, em razão disso, será diferida
da personalidade de seus sócios.
Contudo, a constituição irregular da sociedade/pessoa jurídica não é justificativa
para que os contratantes se neguem a pagar o valor devido à pessoa jurídica.

7.3 Extinção das pessoas jurídicas – fim da personalidade


A dissolução da pessoa jurídica poderá ocorrer de forma convencional,
administrativa ou judicial.
Convencional: os integrantes da pessoa jurídica deliberam e resolvem colocar
fim nas suas atividades. Deve respeitar o estatuto social ou contrato social.
Administrativa: há a dissolução administrativa quando houver a cassação da
autorização de funcionamento que possa ser exigida para determinadas sociedades
funcionarem.
Judicial: o juiz, por sentença, determina sua extinção, a requerimento de
qualquer dos sócios.
O art. 51, CC, define a forma de dissolução da pessoa jurídica:

Art. 51. Nos casos de dissolução da pessoa jurídica ou cassada a autorização


para seu funcionamento, ela subsistirá para os fins de liquidação, até que
esta se conclua.
§ 1o Far-se-á, no registro onde a pessoa jurídica estiver inscrita, a averbação
de sua dissolução.

65
§ 2o As disposições para a liquidação das sociedades aplicam-se, no que
couber, às demais pessoas jurídicas de direito privado.
§ 3o Encerrada a liquidação, promover-se-á o cancelamento da inscrição da
pessoa jurídica.

A “morte” da pessoa jurídica só ocorre com a liquidação. Havendo dissolução


da sociedade, o patrimônio que sobrar após a liquidação, pagamento de eventuais
débitos, etc, deverá ser partilhado entre os sócios, conforme a participação de cada
um, exceto no caso das associações, conforme determina o art. 61,CC. Após a
liquidação poderá haver o cancelamento do registro da pessoa jurídica
(correspondendo ao registro do óbito na pessoa natural).

7.4 Classificação ou categorias das pessoas jurídicas


O art. 40, CC afirma existirem pessoas jurídicas de direito público (interno ou
externo) e de direito privado.
União
Estados
Distrito Federal
Direito Público - art. Territórios
41 Municípios
autarquias
Pessoa Jurídica

associações públicas
demais entidades de caráter público criadas por lei
associações
sociedades
fundações
Direito Privado - art.
44 partidos políticos
organizações religiosas
empresas individuais de responsabilidade limitada

São pessoas jurídicas de direito público interno a União, Estados, Distrito


Federal, Territórios, Municípios, autarquias e demais entidades de caráter público.
São pessoas jurídicas de direito público externo as organizações internacionais
(ONU, OIT, etc) e a Santa Sé ou outras entidades congêneres.
Para o direito civil interessam apenas as associações, sociedades e fundações.

66
a) Associações
Nos termos do art. 53, CC, as associações são entidades, formadas pela união
de indivíduos, que tem como objetivo fim não econômico. Não são, portanto,
empresas. Não visam lucro. Podem ter lucro, mas não podem ter fins lucrativos. Seus
lucros devem ser revertidos para a própria associação. O que não há, neste caso é a
partilha de dividendos advindos da sociedade. A receita obtida serve para reverter em
benefício da própria associação, visando a melhoria das atividades.
Não existem direitos e obrigações recíprocos entre a associação e os associados
(art. 53, §único, CC). Dessa forma, o associado constitui-se de uma individualidade,
com seu patrimônio, direitos e obrigações próprios e, a associação, outra
individualidade, com seus bens, obrigações e direitos, sem que haja reciprocidade.
Sua criação se dá através de estatuto, nos termos do art. 54, CC, que faz a
previsão do que é necessário conter no estatuto das associações, no mínimo:

Art. 54. Sob pena de nulidade, o estatuto das associações conterá:


I - a denominação, os fins e a sede da associação;
II - os requisitos para a admissão, demissão e exclusão dos associados;
III - os direitos e deveres dos associados;
IV - as fontes de recursos para sua manutenção;
V – o modo de constituição e de funcionamento dos órgãos deliberativos;
VI - as condições para a alteração das disposições estatutárias e para a
dissolução.
VII – a forma de gestão administrativa e de aprovação das respectivas
contas.

A aquisição da personalidade pela associação só ocorre quando, após elaborado


o estatuto este for registrado.
O art. 55, CC afirma que os associados devem ter iguais direitos, mas o estatuto
poderá instituir categorias com vantagens especiais como, por exemplo, as categorias
de “sócio”, “sócio-proprietário”, “sócio torcedor”, enfim.
O art. 56, CC determina que salvo disposição expressa no estatuto, a qualidade
de associado é intransmissível.
A exclusão só pode ocorrer nos termos previstos no estatuto, sendo assegurado
o contraditório e a ampla defesa (art. 57, CC).
A Assembleia Geral é o órgão máximo da associação, ainda que, no geral, o
estatuto autorize a composição de um Conselho Administrativo (Diretoria) e do
Conselho Fiscal. Compete à Assembleia Geral destituir os administradores e alterar o
estatuto (art. 59, CC). A Assembleia com esse fim deve ser convocada especialmente
67
para tanto, conforme o quórum estabelecido no estatuto. Há a garantia de convocação
da Assembleia Geral por 1/5 dos associados (art. 60, CC), não podendo o estatuto
estabelecer quórum maior.
Ninguém é obrigado a manter-se preso à associação, de forma que o associado
pode, a qualquer tempo, desligar-se da corporação. Nestes termos, o art. 5.º, XX, CF.
Mas o direito de retirado não exime o associado das obrigações assumidas.
No caso de dissolução da sociedade, o patrimônio líquido deverá ser transferido
para outra entidade sem fins lucrativos, estabelecida no estatuto (art. 61). Caso não
haja previsão no estatuto, caberá aos associados deliberarem uma entidade, de fins
semelhantes ou idênticos para a qual será destinado o patrimônio.

b) Sociedades
O Código Civil de 2002 revogou a parte inicial do Código Comercial, passando,
dessa forma, a disciplinar a matéria relativa ao direito societário. No Direito Civil
trabalha-se apenas com noções gerais a respeito do direito societário, já que existe
matéria específica com este fim.
De qualquer forma, sociedade pode ser conceituada como sendo uma
agregação de pessoas com mesmos objetivos e fins econômicos – pretende ganhar
dinheiro. Ex.: floricultura, empresa de ônibus, etc.
O objetivo da sociedade é exercer uma atividade econômica e partilhar os lucros.
Constitui-se via contrato social, através da união de duas ou mais pessoas, nos termos
do art. 981, CC:
Art. 981. Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se
obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade
econômica e a partilha, entre si, dos resultados.
Parágrafo único. A atividade pode restringir-se à realização de um ou mais
negócios determinados.

As sociedades podem ser empresárias ou simples. Empresárias, que são as


que exploram empresa, desenvolvem atividade econômica de circulação de bens ou
serviços. Empresário, por sua vez, é aquela pessoa que desenvolve profissionalmente
a atividade econômica organizada (art. 966, CC). Simples são as que exploram
atividades econômicas específicas. (art. 982, CC). As sociedades simples foram
introduzidas pelo novo Código Civil em substituição às sociedades civis, abrangendo
aquelas sociedades que não exercem atividade própria de empresário sujeito a

68
registro (art. 982), isto é, atividades não empresariais ou atividade de empresário rural.
Ex.: sociedade de advogados.
A sociedade só adquire personalidade com o registro de seus atos constitutivos
no Registro Público de Empresas Mercantis – Junta Comercial dos Estados (se
empresária) ou no Registro Civil das Pessoas Jurídicas 9se não empresárias).

c) Fundações
As fundações são patrimônios personalizados, pois não são compostas, não
resultam da união de pessoas, mas sim da afetação de um patrimônio. A finalidade
da fundação está determinada na lei, não podendo ser criadas fundações para fins
diferentes daqueles previstos no art. 62, CC:
Art. 62. Para criar uma fundação, o seu instituidor fará, por escritura pública
ou testamento, dotação especial de bens livres, especificando o fim a que se
destina, e declarando, se quiser, a maneira de administrá-la.
Parágrafo único. A fundação somente poderá constituir-se para fins de:
I – assistência social;
II – cultura, defesa e conservação do patrimônio histórico e artístico;
III – educação;
IV – saúde;
V – segurança alimentar e nutricional;
VI – defesa, preservação e conservação do meio ambiente e promoção do
desenvolvimento sustentável;
VII – pesquisa científica, desenvolvimento de tecnologias alternativas,
modernização de sistemas de gestão, produção e divulgação de informações
e conhecimentos técnicos e científicos;
VIII – promoção da ética, da cidadania, da democracia e dos direitos
humanos;
IX – atividades religiosas;

Para a criação da fundação, o instituidor determina que seu patrimônio (e os


frutos dele) seja empregado na concretização dos fins por ele escolhidos (dentre o rol
do parágrafo único do art. 62, CC. O instituidor via testamento ou escritura pública,
afeta seu patrimônio, definindo o fim para o qual se destina.
Para a criação de uma fundação devem ser seguidas algumas etapas:
1) Afetação de bens livres por meio de ato de dotação patrimonial: deve ser
destacada uma parcela do patrimônio pessoal do instituidor, composta por
bens móveis e/ou imóveis.
2) Instituição por escritura pública ou testamento: não é possível por escrito
particular, apenas nestas formas.
3) Elaboração dos estatutos: o próprio instituidor pode elaborar o estatuto da
fundação (forma direta) ou determinar que alguém o faça.
69
4) Aprovação dos estatutos: o MP tem o dever de aprovar os estatutos da
fundação, com recurso ao juiz, em caso de discordância.
5) Realização do registro civil: deve ser feito o registro dos atos constitutivos no
Cartório do Registro Civil das Pessoas Jurídicas.

Se os bens destinados forem insuficientes para constituir a fundação, se nada


dispor o instituidor, serão incorporados em outra fundação que tenha fim igual ou
semelhante (art. 63, CC).
Com relação ao estatuto social da fundação, poderá ser alterado, desde que o
art. 67, CC seja observado:
Art. 67. Para que se possa alterar o estatuto da fundação é mister que a
reforma:
I - seja deliberada por dois terços dos competentes para gerir e representar a
fundação;
II - não contrarie ou desvirtue o fim desta;
III – seja aprovada pelo órgão do Ministério Público no prazo máximo de 45
(quarenta e cinco) dias, findo o qual ou no caso de o Ministério Público a
denegar, poderá o juiz supri-la, a requerimento do interessado.

Não havendo aprovação unânime, o art. 68, CC prevê que os administradores


da fundação deverão submeter o estatuto ao MP, sendo dado vista a parte vencida
para impugnação.
Caso houver desvirtuamento da finalidade da função ou, caso o prazo da
existência tenha se expirado, define o art. 69, CC que o MP promoverá a extinção da
fundação e seu patrimônio será incorporado em outra fundação com fim semelhante
ou igual, designada pelo juiz, salvo se houver disposição contrário no ato constitutivo.

Art. 69. Tornando-se ilícita, impossível ou inútil a finalidade a que visa a


fundação, ou vencido o prazo de sua existência, o órgão do Ministério
Público, ou qualquer interessado, lhe promoverá a extinção, incorporando-se
o seu patrimônio, salvo disposição em contrário no ato constitutivo, ou no
estatuto, em outra fundação, designada pelo juiz, que se proponha a fim igual
ou semelhante.

A extinção da fundação também faz cessar a personalidade jurídica da fundação,


necessitando a liquidação do passivo e do ativo, quando, só então, o restante do
patrimônio poderá ser destinado a outra fundação com fim igual ou semelhante.

70
d) Organizações religiosas
Organizações religiosas são os agrupamentos de pessoas, cujo propósito é o
culto da fé, possuindo doutrina e rituais próprios. Enquadram-se Igrejas, seitas,
confrarias ou irmandades. Visam a manifestação da espiritualidade humana. É livre a
criação de organizações religiosas, por força do art. 44, § 1.º, CC, bem como do art.
19, I, da CF.

e) Partidos políticos
Partidos políticos são associações de pessoas, unidas por uma ideologia ou
interesses comuns, que, organizadas estavelmente, influenciam a opinião popular e a
orientação política do país2.
É livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos, tendo como
limitações a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo e os
direitos fundamentais da pessoa humana.
O art. 17, CF, prevê, ainda, alguns preceitos que devem ser observados:
• Caráter nacional: aquele que tiver repercussão no Brasil inteiro, não
sendo possível partido que atue em apenas uma região. Serve para evitar
que interesses de grupos minoritários e que não representem toda a
sociedade venham a ter legitimidade.
• Proibição de recebimento de recursos financeiros de entidade ou
governo estrangeiros ou de subordinação a estes: controle financeiro
que se embasa na soberania nacional – evita que o Brasil fique
subordinado a capital estrangeiro.
• Prestação de contas à Justiça Eleitoral: trata-se de regra que, contudo,
sabe-se não é cumprido, pois, se fosse, não haveria “caixas dois” ou
“recursos não contabilizados”.
• Funcionamento parlamentar de acordo com a lei: a lei é que define os
critérios aferidores do status de nacional.

Autonomia dos partidos políticos – os partidos possuem autonomia para


definir sobre sua organização interna, estatuto, forma de escolha dos candidatos,
critérios de filiação, etc., devendo, contudo, obedecer às normas de fidelidade e

2 BULOS, Uadi Lâmmego. Curso de direito constitucional. 5.ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 882.
71
disciplina partidárias. Assim, o Estado não pode intervir nos partidos políticos que,
devem estar de acordo com as diretrizes legais.
Registro partidário – os partidos só adquirem personalidade jurídica depois de
efetuarem o registro de seus estatutos na forma da lei civil e no TSE (art. 17, § 2.º,
CF).

f) Empresas individuais de responsabilidade limitada


São pessoas jurídicas constituídas por apenas uma pessoa. Essa modalidade
de pessoa jurídica possui responsabilidade limitada ao capital integralizado (art. 980-
A, CC).

7.5 Capacidade e representação da pessoa jurídica


A personalidade jurídica da pessoa jurídica é adquirida com o registro dos atos
constitutivos.
Deve-se considerar, ainda, o art. 52, CC estabelece que, no que couber, serão
estendidos às pessoas jurídicas os direitos da personalidade das pessoas naturais
(integridade moral, imagem, segredo, etc).
A capacidade da pessoa jurídica é especial, de forma que seu campo de atuação
está delimitado no contrato social, estatuto ou na própria lei. Não pode, portanto,
praticar negócios jurídicos que extrapolem sua finalidade social.
Além disso, para o exercício da capacidade, por não ser pessoa física, a pessoa
jurídica demanda a existência de órgãos de representação. Assim, são as pessoas
físicas que compõe o órgão de representação ou conselho deliberativo que irão atuar
em nome da pessoa jurídica. Nesse sentido:

Art. 47. Obrigam a pessoa jurídica os atos dos administradores, exercidos nos
limites de seus poderes definidos no ato constitutivo.

Art. 48. Se a pessoa jurídica tiver administração coletiva, as decisões se


tomarão pela maioria de votos dos presentes, salvo se o ato constitutivo
dispuser de modo diverso.
Parágrafo único. Decai em três anos o direito de anular as decisões a que se
refere este artigo, quando violarem a lei ou estatuto, ou forem eivadas de erro,
dolo, simulação ou fraude.

Art. 49. Se a administração da pessoa jurídica vier a faltar, o juiz, a


requerimento de qualquer interessado, nomear-lhe-á administrador
provisório.

72
7.6 Responsabilidade civil e penal das pessoas jurídicas
O exercício das atividades da pessoa jurídica está sujeito, como em qualquer
atividade humana, ao cometimento de atos ilícitos. No que se refere às atividades
empresariais, essa possibilidade torna-se aumentada, pelo fato de que seu objetivo é
o lucro. Esse crescimento da criminalidade empresarial vem sendo relacionado ao
surgimento das grandes sociedades multinacionais. Além disso, a maior parte dos
ilícitos ocorre no âmbito econômico e ambiental. A penalização, contudo, será no
âmbito da imposição de multas e penas restritivas de direitos (art. 21, Lei 9.605/98).
Todos os atos ilícitos praticados pelos representantes legais da pessoa jurídica,
esta última responderá, com seu patrimônio.
Com relação a responsabilidade civil, independentemente da natureza da
pessoa jurídica (direito público ou privado), haverá a responsabilidade de
cumprimento da obrigação contraída, respondendo, a pessoa jurídica, pelo
inadimplemento contratual, nos termos do art. 389, CC.

7.7 Desconsideração da personalidade jurídica


A pessoa física e a jurídica são separadas. Possuem patrimônios e
responsabilidades separados. Contudo, podem haver casos de desvio de finalidade
(atividades realizadas por meio da pessoa jurídica não são relacionadas com a
atividade-fim dela, visando beneficiar seus integrantes) ou de confusão patrimonial
(não se consegue distinguir o patrimônio particular e o patrimônio da pessoa jurídica).
Para essas situações, ou seja, para os casos de desvio de finalidade e confusão
patrimonial, o sistema jurídico, em razão da potencial lesividade das ações, criou a
possibilidade da desconsideração da personalidade jurídica.
O objetivo da teoria da desconsideração da personalidade jurídica (disregard
doctrine) é coibir a fraude, sem que, com isso, o instituto da autonomia da pessoa
jurídica seja comprometido. Significa dizer que a desconsideração da personalidade
jurídica não coloca em xeque a personalidade jurídica da empresa, mas tão somente,
em certos casos, visando, coibir fraudes ou abuso de poder, desconsidera a
personalidade jurídica da empresa, para atingir o patrimônio pessoal dos sócios.

73
A previsão da desconsideração da personalidade jurídica está no art. 50, CC3:

Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo


desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a
requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no
processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações
sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da
pessoa jurídica.

Essa doutrina visa, em certos casos, desconsiderar a personalidade jurídica, a


fim de atingir o patrimônio pessoal dos sócios, reconhecendo sua responsabilidade
ilimitada.
• Desvio de finalidade
§1º Para fins do disposto neste artigo, desvio de finalidade é a utilização dolosa
da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores e para a prática de atos
ilícitos de qualquer natureza.
§ 5º Não constitui desvio de finalidade a mera expansão ou a alteração da
finalidade original da atividade econômica específica da pessoa jurídica.

• Confusão patrimonial
§ 2º Entende-se por confusão patrimonial a ausência de separação de fato entre
os patrimônios, caracterizada por:
I - cumprimento repetitivo pela sociedade de obrigações do sócio ou do
administrador ou vice-versa;
II - transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações, exceto
o de valor proporcionalmente insignificante; e
III - outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial.

Não se trata de declarar nula a personalidade, mas sim de tornar a personalidade


jurídica ineficaz em certos casos. Assim, desconsiderando-se a personalidade jurídica
das empresas, nos casos concretos, pode-se evitar o abuso de direito ou as fraudes
praticadas por meio de pessoas jurídicas. Contudo, a desconsideração não importa
em desfazimento do ato constitutivo da empresa, não o invalida, nem mesmo importa

3 A redação originária do art. 50 do Código Civil é: “Em caso de abuso da personalidade jurídica,
caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a
requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos
de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos
administradores ou sócios da pessoa jurídica”.
74
na dissolução da empresa. Significa dizer que a desconsideração se aplica
exclusivamente ao caso em julgamento, permanecendo a autonomia patrimonial para
todo o restante dos negócios (ineficácia episódica).
Existem teorias sobre a desconsideração da personalidade jurídica: teoria maior
(objetiva e subjetiva), teoria menor e teoria inversa.
A teoria objetiva dispensa a intenção de lesar, aplicando-se nos casos de
confusão patrimonial, por má administração, mesmo que não haja necessária intenção
de fraudar. Significa dizer que, se a sociedade paga dívidas do sócio ou se o sócio
recebe créditos da sociedade ou, ainda, se existem bens do sócio registrados em
nome da empresa ou vice-versa; nestes casos, há confusão patrimonial, indicativa de
intuito fraudulento. Assim, a formulação objetiva facilita a prova em juízo do intuito
fraudulento, já que, muitas vezes, o pressuposto subjetivo (intuito fraudulento) é quase
que impossível de ser demonstrado.
A teoria subjetiva exige o pressuposto intenção de lesar, aplicando-se nos
casos de desvio de finalidade. Neste caso há a intenção de fraudar os credores.
A teoria menor aceita a desconsideração em outros casos, além dos de abuso
da personalidade jurídica da pessoa jurídica. É a utilizada pelo CDC, por exemplo (art.
28, CDC).
A teoria inversa serve para os casos em que se busca responsabilizar a pessoa
jurídica por obrigações de seus sócios, nas situações em que ele abusa da pessoa
jurídica, transferindo bens, visando ocultá-los. Assim, essa desconsideração inversa
visa coibir a fraude do desvio de bens, quando o sócio desvia patrimônio particular
para a empresa na qual detém o controle absoluto. Dessa forma, seus credores
pessoais não podem executar tais bens por dívidas da pessoa física. Os casos mais
típicos de desconsideração inversa são os de família (alimentos e partilha de bens do
casal). Se um dos cônjuges adquire bens de maior valor e os registra em nome da
pessoa jurídica, estes bens não são partilhados.

7.8 Grupos despersonalizados ou entes de capacidade reduzida


Existem entidades que não podem ser consideradas pessoas jurídicas por lhe
faltarem requisitos para subjetivação. São entres que se formam independentemente
da vontade dos seus membros, sem que exista o affectio societatis.

75
São sujeitos de direitos, de forma que gozem de personalidade, embora não
possam ser classificados como pessoas jurídicas, nem como pessoas naturais.
Possuem a capacidade de direito reduzida, se comparado com outras categorias.
Possuem capacidade de atuar em juízo.
Dentre os grupos despersonalizados, pode-se destacar:
a) Família: o agrupamento familiar, constituído pelo conjunto de pessoas que a
compõe (Mãe, Pai e filhos, p.ex.) e a massa comum de bens, não possui
personalidade jurídica. Não há responsabilidade da família por eventuais
débitos, mas só de seus membros.
b) Massa falida: trata-se do acervo de bens deixados pelo falido após a
sentença declaratória de falência. A massa falida exerce os direitos do falido,
podendo agir, inclusive, contra ele. É representada pelo síndico.
c) Herança jacente e vacante: art. 1.819 a 1.823, CC: conjunto de bens
deixados pelo de cujus enquanto não entregues para o sucessor
devidamente habilitado. Quando abre-se a sucessão (com a morte do
indivíduo), sem que deixe testamento conhecido ou herdeiros conhecidos,
diz-se que a herança é jacente. É um acervo de bens administrado por um
curador até a habilitação dos herdeiros. A herança é considerada vacante
após a declaração de jacência, arrecadação e praticadas todas as exigências
legais, caso não apareçam herdeiros.
d) Espólio: complexo de direitos e obrigações do falecido (bens de toda a
natureza). Surge com a abertura da sucessão (morte), sendo representada
pelo administrador provisório até a nomeação do inventariante. Após o
julgamento da partilha desaparece o espólio, sendo substituído pelo herdeiro
a quem coube o direito ou a coisa.
e) Condomínio: duas pessoas são co-proprietárias de um mesmo bem. Cada
co-proprietário tem direito sobre o todo e cada uma das partes. É
administrado pelo síndico, que é eleito e age em nome dos condôminos. O
condomínio é registrado e possui CNPJ. Não é pessoa jurídica, mas possui
personalidade, podendo atuar, efetuar contratos.

76
08 9. DOMICÍLIO

Domicílio tem a ver com morada, residência, local onde se localiza. Pode ser civil
(local de residência) ou político (local de votação). Os arts. 70 a 78 tratam do domicílio,
tanto da pessoa natural, quanto da pessoa jurídica.

8.1 Domicílio da pessoa natural


Domicílio é o lugar onde a pessoa natural estabelece sua residência com ânimo
definitivo, bem como o centro de suas atividades. Como o Direito vive de obrigações,
para que se possa dar cumprimento às obrigações é necessário que as pessoas
tenham um local no qual possam ser encontradas. Trata-se do domicílio civil das
pessoas naturais.
O domicílio tem uma importância ímpar no direito brasileiro, pois é a partir dele
que se definem as competências para a proposição das ações (o foro comum é o do
domicílio do réu – art. 46, CPC/2015; o domicílio do autor da herança é o competente
para o inventário e a partilha – art. 48, CPC/2015, etc).
Mas, afinal, o que pode ser considerado domicílio da pessoa natural? O lugar
onde ela estabelece sua residência de modo definitivo ou o centro da sua atividade
laboral.
Segundo Gagliano e Pamplona Filho (p. 291), o domicílio da pessoa natural é “o
lugar onde estabelece residência com ânimo definitivo, convertendo-o, em regra, em
centro principal de seus negócios jurídicos ou de sua atividade profissional”.
Nesse sentido, os arts. 70 e 72, CC definem o domicílio da pessoa natural:
Art. 70. O domicílio da pessoa natural é o lugar onde ela estabelece a sua
residência com ânimo definitivo.
Art. 72. É também domicílio da pessoa natural, quanto às relações
concernentes à profissão, o lugar onde esta é exercida.

ânimo definitivo
Domicílio

residência

centro de suas atividades

Então, DOMICÍLIO ≠ MORADA ≠ RESIDÊNCIA.

77
MORADA = lugar onde a pessoa se estabelece provisoriamente. Ex.; aluno
contemplado com uma bolsa de estudos no exterior. Permanece lá por 6 meses ou 1
ano. Trata-se de morada e não de domicílio.
RESIDÊNCIA = há uma estabilidade maior, sendo considerado como local onde
ela se estabelece habitualmente. Ex.: sujeito que mora em uma cidade, sendo ali
encontrado habitualmente. É a residência do indivíduo.
DOMICÍLIO = é mais complexo. Abrange a noção de residência (e, por
consequência, de morada), adicionando o propósito de ali permanecer com âmbito
definitivo.

Assim, para que se configure o domicílio, necessária a presença de dois


elementos: o objetivo (residência) e o subjetivo (ânimo definitivo, de fixar-se
permanentemente). É a conjunção desses elementos que forma o domicílio.
Nesse sentido, a residência é um dos elementos do domicílio, mas não é o
reflexo dele. Residência indica a radicação do indivíduo em determinado lugar. O
domicílio, por sua vez, estabelece uma situação jurídica.
Uma mesma pessoa pode ter um só domicílio, mas mais de uma residência
(domiciliada em Santa Cruz do Sul, mas com casa na praia), mas também pode ter
mais de um domicílio. Dessa forma, o Direito Civil admite a pluralidade de
domicílios, quando o indivíduo tenha diversas residências, vivendo nelas de forma
alternada (art. 71, CC):

Art. 71. Se, porém, a pessoa natural tiver diversas residências, onde,
alternadamente, viva, considerar-se-á domicílio seu qualquer delas.

Ou, ainda, prevê o § único do art. 72 que havendo diversos locais de trabalho,
também haverá a pluralidade de domicílios:

Parágrafo único. Se a pessoa exercitar profissão em lugares diversos, cada


um deles constituirá domicílio para as relações que lhe corresponderem.

Ex.: João mora com a família em Santa Cruz do Sul. Tem escritório profissional
em Santa Cruz, Venâncio e Rio Pardo, comparecendo neles em dias alternados.
Qualquer um desses locais será considerado domicílio de João, podendo ser citado
em qualquer deles (art. 46, § 1.º, CPC/2015).

78
Art. 46. A ação fundada em direito pessoal ou em direito real sobre bens
móveis será proposta, em regra, no foro de domicílio do réu.
§ 1o Tendo mais de um domicílio, o réu será demandado no foro de qualquer
deles.

Se, contudo, a pessoa não tem residência habitual, será considerado seu
domicílio o local onde for encontrada (art. 73, CC). Ex.: ciganos, viajantes.

Art. 73. Ter-se-á por domicílio da pessoa natural, que não tenha residência
habitual, o lugar onde for encontrada.

As pessoas podem mudar de domicílio e, para tanto, não basta alterar o


endereço, mas deve haver a intenção manifesta de mudar – art. 74, CC

Art. 74. Muda-se o domicílio, transferindo a residência, com a intenção


manifesta de o mudar.
Parágrafo único. A prova da intenção resultará do que declarar a pessoa às
municipalidades dos lugares, que deixa, e para onde vai, ou, se tais
declarações não fizer, da própria mudança, com as circunstâncias que a
acompanharem.

8.2 Domicílio das pessoas jurídicas


O domicílio da pessoa jurídica de direito privado é a sua sede, que está indicada
no ato constitutivo. Trata-se do domicílio especial da pessoa jurídica. Não havendo tal
fixação, será domicílio da pessoa jurídica onde funcionarem as diretorias ou
administrações. Caso a pessoa jurídica possua filiais em diferentes localidades, cada
um deles será o domicílio da pessoa jurídica, para os atos nele praticados (art. 75, IV
e § 1.º, CC).

Art. 75. Quanto às pessoas jurídicas, o domicílio é:


I - da União, o Distrito Federal;
II - dos Estados e Territórios, as respectivas capitais;
III - do Município, o lugar onde funcione a administração municipal;
IV - das demais pessoas jurídicas, o lugar onde funcionarem as respectivas
diretorias e administrações, ou onde elegerem domicílio especial no seu
estatuto ou atos constitutivos.
§ 1o Tendo a pessoa jurídica diversos estabelecimentos em lugares
diferentes, cada um deles será considerado domicílio para os atos nele
praticados.
§ 2o Se a administração, ou diretoria, tiver a sede no estrangeiro, haver-se-á
por domicílio da pessoa jurídica, no tocante às obrigações contraídas por
cada uma das suas agências, o lugar do estabelecimento, sito no Brasil, a
que ela corresponder.

79
Nesse sentido, o STF sumulou (súmula 363), a questão do domicílio da pessoa
jurídica: “a pessoa jurídica de direito privado pode ser demandada no domicílio da
agência ou do estabelecimento em que se praticou o ato”.
Se a administração for no exterior, o domicílio será o lugar do estabelecimento
situado no Brasil (§ 2.º).

8.3 Espécies de domicílio


O domicílio é classificado em voluntário e necessário.
O domicílio voluntário divide-se em: geral e de eleição.
O domicílio voluntário é aquele que depende da vontade exclusiva do
interessado (local onde se escolhe para ser a residência com ânimo definitivo).
O domicílio geral é o relativamente aos atos praticados pela pessoa em geral.
O domicílio de eleição é o derivado de contrato (art. 78, CC) – foro de eleição
escolhido pelas partes para propor ações relativas a obrigações (art. 62, CPC/2015).
CC, Art. 78. Nos contratos escritos, poderão os contratantes especificar
domicílio onde se exercitem e cumpram os direitos e obrigações deles
resultantes.

Art. 62. A competência determinada em razão da matéria, da pessoa ou da


função é inderrogável por convenção das partes.

O domicílio necessário divide-se em: de origem e legal.


O primeiro domicílio das pessoas – domicílio de origem – é o de seus pais, à
época do seu nascimento.
O domicílio necessário ou legal é o decorrente de determinação normativa,
como, por exemplo, o domicílio do servidor público (art. 76, CC):

Art. 76. Têm domicílio necessário o incapaz, o servidor público, o militar, o


marítimo e o preso.
Parágrafo único. O domicílio do incapaz é o do seu representante ou
assistente; o do servidor público, o lugar em que exercer permanentemente
suas funções; o do militar, onde servir, e, sendo da Marinha ou da
Aeronáutica, a sede do comando a que se encontrar imediatamente
subordinado; o do marítimo, onde o navio estiver matriculado; e o do preso,
o lugar em que cumprir a sentença.

Por fim, há o domicílio do agente diplomático do Brasil. Havendo citação do


agente diplomático no exterior, se alegar a extraterritorialidade, deverá indicar seu
domicílio no Brasil. Em não indicando, poderá ser acionado tanto no Distrito Federal,
quanto no último lugar onde teve domicílio no Brasil.
80
09
10. BENS JURÍDICOS

Bem é tudo aquilo que possa corresponder às solicitações de nossos desejos.


Assim, na relação jurídica, o bem é o objeto sobre o qual desenvolve-se o poder de
fruição da pessoa.
Assim, bem jurídico, segundo Gagliano e Pamplona Filho (p. 301) podem ser
conceituados como “toda a utilidade física ou ideal, que seja objeto de um direito
subjetivo”.
Dessa forma, todo bem econômico é jurídico, mas nem todo bem jurídico é
econômico (personalidade – direito à imagem, por exemplo). Isto porque, existem
bens jurídicos que não podem ser avaliados pecuniariamente.

9.1 Bem x coisa


Não há consenso na doutrina para diferenciar coisas e bens. Para alguns coisas
são gêneros e bens, espécies. Para outros, bens são gênero e coisas, espécie. Para
outros, ainda, tratam-se de sinônimos, havendo coincidência na significação.
Entende-se, com base em Gagliano e Pamplona Filho (p. 304) que coisas são
os bens corpóreos, materiais e, portanto, suscetíveis de valoração econômica. Ex.:
casa, carro. Os bens, por sua vez, são tanto os objetos corpóreos e materiais (coisas)
quanto os ideais e imateriais, de forma a justificar que a liberdade, a honra, a imagem,
a vida de alguém possa ser considerado como bem jurídico (ainda que não seja uma
coisa).

9.2 Patrimônio jurídico


Patrimônio é o conjunto de bens, dívidas e obrigações pertencentes a um titular,
ou seja, o complexo de relações jurídicas de uma pessoa que tenham valor
econômico. Ficam, dessa forma, excluídos os chamados “direitos extrapatrimoniais”,
ou seja, aqueles que, por não terem valor pecuniário, não podem ser cedidos.
A ideia de patrimônio envolve toda a gama de relações jurídicas, ou seja, tanto
os direitos, quanto as obrigações (crédito e débito).

81
9.3 Classificação dos bens jurídicos
A classificação dos bens jurídicos é feita a partir de critérios de importância. O
Código Civil de 2002 traz uma classificação diferente da que existia no CC/1916.
Dessa forma, o bem de família, por exemplo, foi deslocado da Parte Geral, para a
parte relativa ao direito de família.

Móveis e Imóveis

Fungíveis e Infungíveis

Considerados em si mesmos Consumíveis e Inconsumíveis

Divisíveis e Indivisíveis

Singulares e Coletivos

Frutos

Principal
BENS
Reciprocamente considerados Produtos

Acessório

Públicos e Particulares Rendimentos

Benfeitorias (úteis, necessárias e


Bem de família
voluptuárias)

Bens fora do comércio

9.4 Dos Bens Considerados em si mesmos – art. 79 a 91, CC

a) CORPÓREOS E INCORPÓREOS
Embora esta classificação não esteja prevista, é de grande utilidade. Dessa
forma, existem bens com existência material (corpóreos), quando são perceptíveis aos
nossos sentidos – bens móveis (livros, joias) e imóveis (terrenos, casas). Existem
outros bens – os incorpóreos – que são bens abstratos, não tangíveis, de forma que
possuem apenas existência jurídicas, mas não corpórea (física) – ex.: os direitos sobre

82
o produto do intelecto (direitos autorais), que possuem valor econômico, mas não são
palpáveis.
A diferença mais marcante entre eles, enquanto relações jurídicas, é que, no
caso dos primeiros – corpóreos – a transmissão se dá via compra e venda e, no caso
dos segundos – incorpóreos – através da cessão.

b) BENS MÓVEIS E IMÓVEIS


BENS IMÓVEIS são aqueles que não podem ser transportados de um lugar para
outro, sem que sua substância se altere. Ex.: terreno urbano. Há a necessidade de
uma solenidade para sua transmissão/tradição (contrato), que se perfectibiliza com o
registro.
BENS MÓVEIS são passíveis de deslocamento, quebra, fratura. Ex.: livros,
computador. Há, ainda, os bens que possuem movimento próprio. Neste caso, ainda
que se enquadrem na classificação de bens móveis, são chamados de semoventes
(animais – bovinos, equinos, ovinos, caprinos, etc). Não há necessidade de
solenidade para sua transferência, bastando a tradição.

Imóveis Móveis
TRANSMISSÃO Escritura pública – art. 108 + registro – art. Tradição – art. 1.226
1227
AQUISIÇÃO Acessão, usucapião e direito hereditário – Usucapião, ocupação, achado de tesouro,
arts. 1.238 a 1.244, 1.248 e 1.784 especificação, confusão, etc – arts. 1.260
a 1.274
ALIENAÇÃO/ Anuência do cônjuge, exceto no regime de Independem de autorização/anuência.
HIPOTECA Separação Absoluta (convencional) – art.
1.647, I
USUCAPIÃO Prazos mais dilatados – de 5 a 15 anos. Prazos mais exíguos – 3 e 5 anos.
Art. 183, 191, CF; arts. 1.238 a 1.242, CC. Art. 1.260 e 1.261, CC
GARANTIA Hipoteca – art. 1.473 Penhor – art. 1.431
EMPRÉSTIMO/ Concessão de superfície – art. 1.369 Apenas contrato de mútuo – art. 586
CONCESSÃO
TRIBUTÁRIO ITBI ou ITCMD ICM – Imposto sobre circulação de
mercadorias – produtos industrializados
DIREITO PENAL Não são objeto de furto ou roubo São objeto de furto ou roubo.

83
Os BENS IMÓVEIS classificam-se em:
• Imóveis por sua própria natureza – art. 79, CC, 1.ª parte + art. 2.229,
CC
A rigor, apenas o solo, com sua superfície, subsolo e espaço aéreo é imóvel por
natureza, pois o que a ele adere será imóvel, mas por acessão.

• Imóveis por acessão natural, artificial ou industrial – art. 79, CC, 2.ª
parte, CC
Acessão significa aderência a outra coisa.
Trata-se da hipótese em que árvores e todas as adjacências naturais se
integrarem ao solo, como pedras, fontes, cursos de água, que corram naturalmente.
Deve-se considerar, contudo, que, quando as árvores são plantadas para corte
(acácia e eucalipto, por exemplo) são consideradas móveis por antecipação e
independem, para alienação, de outorga uxória ou marital.
Há também a possibilidade de formação de ilhas, quando a natureza faz
acréscimos ao solo, de forma que insto se incorpora ao patrimônio do proprietário (art.
1.248, CC), de forma que predomina a ideia de que o acessório segue o principal.
Além disso, o homem pode fazer com que móveis (materiais de construção,
sementes) se integrem ao solo, dando origem às acessões artificiais ou industriais.
São acessões artificiais porque dependem do trabalho humano. Ainda assim, integram
o patrimônio do proprietário, pois presume-se que toda plantação existente sobre o
terreno foi feita pelo proprietário (art. 1.253, CC).
O art. 81 ainda faz a previsão de que as edificações, ainda que separadas do
solo, mas considerando sua unidade, se forem removidas para outro local, conservam
o caráter de imóveis (ex.: chalé/casa pré-fabricada, que pode ser transportada de um
terreno para outro).

• Imóveis por determinação legal – art. 80, CC


Os direitos reais sobre imóveis (garantia, penhor, hipoteca, servidão, usufruto,
etc) e as ações que os asseguram, assim como o direito à sucessão aberta são
considerados bens imóveis por determinação legal.

84
Em ambas as situações previstas no art. 80 se tratam de bens imateriais
(direitos, apenas), que a lei lhe atribui condição de imóveis em razão de terem um
caráter especial.
Dessa maneira, quando se trata de direitos reais, se houver qualquer transação
quanto a usufruto, p. ex., exige o registro competente – art. 1.227, CC, assim como a
autorização do cônjuge (art. 1.747, I, CC).
Quanto ao direito à sucessão aberta, ainda que os bens deixados pelo de cujus
sejam todos móveis (carros, tratores, caminhões, p.ex.), a sucessão em si, é
considerada bem imóvel. Isto porque, em primeiro lugar, o direito à sucessão é a ela
como um todo e não quanto a determinado (ou determinados) bem. Somente depois
de realizada a partilha é se fala em bens individualizados. Antes dela, a herança é um
todo unitário. Nesse sentido, renúncia à herança ou cessão de direitos hereditários
deve ser feita através de escritura pública, não admitindo a forma particular.

Classificação dos BENS MÓVEIS:


Os arts. 82 a 84, CC trazem a referencia sobre os bens móveis.
• Móveis por sua própria natureza – art. 82, CC
Aqueles que podem ser transportados, através da força alheia, de um lugar para
outro sem que se altere sua substância – livro, carteira, bolsa, etc.
Aqui inclui-se a casa pré-fabricada antes de ser incorporada a algum terreno
(enquanto esteja a venda). Após ser assentada sobre o terreno, passará a ser imóvel.
Também são considerados móveis os materiais de construção, enquanto não
forem empregados na construção, enquanto estiverem a venda. Contudo, ainda que
retirados da construção, se houver a pretensão de reempregá-los, serão considerados
como imóveis – ex.: retirada de telhas para reforma das tesouras/madeiramento
interno do telhado.

• Semoventes – art. 82, CC


Aqueles que se movimentam de forma própria – animais.

85
• Móveis por antecipação
São aqueles que, embora incorporados ao solo, não são considerados imóveis
por se destinarem a retirada, como, por exemplo, o caso das árvores destinadas a
corte (mato de acácia e eucalipto).

• Móveis por determinação legal – art. 83, CC


São bens imateriais que acabam por adquirir essa qualidade jurídica em razão
da lei. Podem ser cedidos independentemente de outorga uxória ou marital.
Neste caso incluem-se o fundo de comércio, quotas e ações de sociedades,
direitos do autor, créditos em geral.

c) BENS FUNGÍVEIS E INFUNGÍVEIS


Esta classificação está prevista no art. 85 do CC.
BENS FUNGÍVEIS são os que podem ser substituídos por outros de mesma
espécie, qualidade e quantidade. É uma classificação de bens móveis. Ex.: sofá,
carteira, soja, dinheiro, gêneros alimentícios.
BENS INFUNGÍVEIS são aqueles que em razão de sua natureza são
insubstituíveis. Ex.: quadro de um pintor famoso, escultura famosa, etc.
Normalmente a fungibilidade resulta da natureza do bem, que pode ser
substituído por outra de mesma espécie, quantidade e qualidade. Mas isto não é regra.
A fungibilidade também pode advir da vontade das partes, que poderão tornar um bem
fungível em infungível.
Ex.: o dinheiro é um bem fungível, mas pode se tornar infungível para um
colecionador.
Ex.: um boi é fungível, mas, emprestado ao vizinho para a lavoura, passa a ser
infungível, devendo ser devolvido, sem ser substituído por outro.
A importância da diferenciação entre bens fungíveis e infungíveis ocorre em
razão dos contratos de mútuo e comodato. O mútuo é o contrato para empréstimo de
bens fungíveis. O comodato, por sua vez, de bens infungíveis.
Empréstimo de dinheiro – mútuo – art. 586, CC – mútuo para a construção da
casa própria, p.ex. – Caixa Federal.
Empréstimo de aparelho de celular – comodato – art. 579, CC.

86
d) BENS CONSUMÍVEIS E INCONSUMÍVEIS
O art. 86 traz a diferenciação dos bens consumíveis e dos inconsumíveis.
BENS CONSUMÍVEIS são aqueles bens móveis cujo uso importa na destruição
imediata da coisa. Se destrói no primeiro uso. Ex.: alimentos.
BENS INCONSUMÍVEIS são aqueles que suportam o uso continuado, sem
prejuízo do perecimento natural e progressivo. Ex.: automóvel, roupa. (há o desgaste
natural, mas não a destruição no primeiro uso).
Interessante é a situação dos livros. Se estiverem nas prateleiras de uma livraria
– para serem vendidos – serão bens consumíveis. Já, se estiverem nas prateleiras de
uma biblioteca – apenas para serem usados, lidos e devolvidos – serão
inconsumíveis.
Existem determinados direitos que não podem recair sobre bens consumíveis. É
o caso do usufruto (direito de uso), pois, neste caso, com o uso, haveria o perecimento
do objeto e o próprio usufruto desapareceria.

e) BENS DIVISÍVEIS E INDIVISÍVEIS


BENS DIVISÍVEIS são aqueles que podem ser fracionados, sem alteração na
sua substância, diminuição de valor ou prejuízo do uso, nos termos do art. 87, CC.
Podem, portanto, ser partidos em porções reais e distintas, formando, cada uma delas,
um todo perfeito.
BENS INDIVISÍVEIS são aqueles que não podem ser fracionados, sob pena de
se perder sua substância e ter seu uso alterado. Ex.: relógio. Se for desmanchado,
suas partes existirão, mas não mais como um relógio.
Assim, podem ser indivisíveis:
- por sua natureza: os que não podem fracionar sem alteração na sua
substancia, diminuição de valor ou prejuízo do uso. Ex.: o animal, o relógio, um
quadro, um brilhante.
- por determinação legal: a lei impede o fracionamento – servidões prediais
(art. 1.386, CC), hipoteca (art. 1.421), direito dos coerdeiros quanto à propriedade e
posse da herança, até a partilha (art. 1.791).
- por vontade das partes: o acordo entre as partes torna indivisa a coisa, por
prazo não maior que 5 anos, suscetível de prorrogação posterior (art. 1.320, § 1.º).

87
Se o bem for divisível, o proprietário pode alienar a terceiro, sem dar preferência
aos demais comunheiros. Se, contudo, o bem for indivisível, deverá dar preferência
aos comunheiros.
Ex.: área de terras em condomínio – deve dar preferência aos demais.
Ex.: apartamento em um edifício – não precisa dar preferência aos demais.

f) BENS SINGULARES E COLETIVOS


BENS SINGULARES são coisas consideradas em sua individualidade,
representadas por uma unidade autônoma e, por isto, distinta das outras. Podem ser
simples, quando os componentes (partes) estão ligadas naturalmente (cavalo, árvore)
ou compostas, quando as partes são ligadas em razão da ação humana (avião,
relógio). Art. 89, CC
BENS COLETIVOS são os compostos de várias coisas singulares, mas
considerados em conjunto, como um todo homogêneo. Ex.: floresta, biblioteca.
Compreende a universalidade de fato, quando o agrupamento se dá pela vontade
da pessoa (rebanho ou biblioteca) – art. 90, CC – e a universalidade de direito,
quando o agrupamento se dá pela lei (herança, massa falida) – art. 91.

9.5 Dos Bens reciprocamente considerados


Leva em conta o liame jurídico entre o bem jurídico principal e o acessório.
Art. 92, CC.
a) Bem principal
É o que possui autonomia estrutural, que existe por si próprio, de forma
autônoma. Ex.: solo.
b) Bens acessórios
Pressupõe a existência do principal. Não existe por si próprio. Ex.: árvore (só
existe se houver o solo onde foi plantada).
A regra é o que a natureza do principal é a mesma do acessório. Ex.: se o
principal é imóvel (solo), o acessório também será (árvore). O acessório sempre segue
o principal em seu destino. Ex.: se for extinta a obrigação principal, a cláusula penal
(acessória) também o será. O proprietário do principal também o é do acessório.

88
Os bens acessórios classificam-se em: frutos, produtos, rendimentos e
benfeitorias.

FRUTOS – são utilidades que a coisa principal produz periodicamente, cuja


percepção (uso) não diminui a sua substância. Nascem e renascem da coisa, sem
acarretar-lhe a destruição no todo ou em parte. Ex.: soja, maçã, terneiro, juros,
aluguel. Se o uso/percepção inutilizar a coisa principal, não há que se falar em frutos.
Caracterizam-se pela a) periodicidade; b) inalterabilidade da substância da coisa
principal; c) separabilidade desta.
A percepção dos frutos é importante, especialmente, quanto aos direitos reais,
pois o possuidor de boa fé (aquele que detém a posse de algo de boa fé) tem direito
aos frutos colhidos e percebidos, devendo restituir os pendentes ao tempo em que
cessar a boa fé.
Os frutos podem ser:
Naturais: gerados pelo bem principal, sem a necessidade da intervenção
humana direta. Decorrem do desenvolvimento orgânico vegetal ou animal. Ex.:
laranja, soja, crias de um rebanho
Industriais: são decorrentes da atividade humana, surgem em razão da atuação
ou indústria do homem sobre a natureza. Ex.: produção de uma fábrica.
Civis: rendimentos produzidos pela coisa em virtude de sua utilização por outra
pessoa que não seja o proprietário. Ex.: juros ou aluguel.
Os frutos ainda podem ser: colhidos ou percebidos (se já foram retirados da
coisa, mais ainda existentes); pendentes (ainda estão ligados à coisa); percipiendos
(deveriam ter sido colhidos e não o foram); estantes (já destacados, mas que estão
armazenados para a venda); consumidos (não mais existem).

PRODUTOS – são utilidades que se retiram da coisa, diminuindo-lhe a


quantidade, porque não se reproduzem periodicamente. Ex.: pedras e metais que são
extraídos das pedreiras e minas. O que diferencia frutos e produtos é a alterabilidade
da substancia principal.

RENDIMENTOS – tratam-se dos frutos civis. Ex.: alugueis e juros.

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PERTENÇAS – são coisas acessórias que se destinam a conservar ou facilitar
o uso das coisas principais, sem que delas sejam parte integrante. Ex.,: máquinas
utilizadas na fábrica, implementos agrícolas, aparelhos de ar condicionado. Art. 93,
CC.

BENFEITORIAS – são obras artificiais, realizadas pelo homem, na estrutura da


coisa principal – já existente – com o propósito de conservá-la, melhorá-la ou
embelezá-la. Ex.: cercas, açudes, galpões, etc. Art. 96, CC.
São necessárias as benfeitorias realizadas para evitar um estrago iminente ou
deterioração da coisa principal (reparos realizados na viga; troca do telhado). São
úteis aquelas realizadas com o objetivo de facilitar a utilização da coisa (abertura de
uma nova entrada para servir de garagem para a casa). São voluptuárias aquelas
feitas para o mero prazer, sem aumento da utilidade da coisa (decoração do jardim).
Art. 96, CC.
O problema das benfeitorias é que sua natureza não é de fácil percepção. Uma
piscina pode ser uma benfeitoria voluptuária em uma mansão; útil em uma escola ou
necessária em uma escola de natação.
O possuidor de boa-fé pode levantar as benfeitorias voluptuárias (se houver
condições, sem diminuir a coisa principal), e de ser indenizado pelas úteis e
necessárias. Arts. 1.219 e 1.220, CC.

9.6 Dos Bens Públicos e Particulares


Referem-se a titularidade do domínio.
São PARTICULARES os bens que são da iniciativa privada, cuja disciplina
interessa ao direito civil.
São PÚBLICOS são os pertencentes à União, Estados ou Municípios (art. 98,
CC).
- Bens de uso comum do povo: bens públicos cuja utilização não se submete a
qualquer tipo de discriminação. São inalienáveis. O povo só tem direito de usar, mas
não tem seu domínio. Ex.: praias, ruas, estradas, praças.
- Bens de uso especial: bens públicos cuja fruição, por título especial, e na forma
da lei é atribuída a determinada pessoa. Normalmente destinam-se a

90
prestação/execução de serviços públicos (repartições públicas, secretarias, escolas,
etc). São utilizados exclusivamente pelo Poder Público.
- Bens dominicais: constituem-se do patrimônio das pessoas jurídicas de direito
público, como objeto de direito pessoal ou real de cada entidade. O Poder Público é o
proprietário. Ex.: terras devolutas, estradas de ferro, fazendas pertencentes ao
Estado, etc. Caso não estejam afetados a finalidade pública, poderão ser alienados
(compra e venda, por exemplo).

9.7 Das Coisas que estão fora do comércio


Os bens que estão fora do comércio são todos aqueles que não podem ser
vendidos, trocados, doados, alugados, ou seja, que não podem ser objeto de relações
jurídicas. Nesse sentido, estão fora do comércio:
a) por serem naturalmente inapropriáveis, a luz solar, o ar atmosférico, a
água do mar, etc.
b) aqueles que a lei prevê como inalienáveis: bens público de uso comum e
especial, bens de incapazes, bens das fundações, bem de família, bens
tombados, terras ocupadas pelos indígenas, etc.
c) aqueles indisponíveis pela vontade humana: deixados em testamento ou
doados, com cláusula de inalienabilidade (arts. 1.848, 1.911).
d) os valores e direitos da personalidade – honra, liberdade, vida, órgãos do
corpo humano, etc.

9.8 Do Bem de Família


O direito à moradia é um direito fundamental social, garantido
constitucionalmente, através do art. 6.º, CF. A instituição de bem de família visa afetar
bens para o destino especial de abrigar a família, protegendo-os. Depois de instituído,
o bem torna-se impenhorável por dívidas posteriores a sua constituição, salvo as
relativas aos impostos devidos pelo próprio prédio (IPTU e ITR, p.ex.).

Tem por objetivo assegurar um lar à família, pondo-a ao abrigo de penhoras


por débitos posteriores a sua instituição, salvo os que provierem de tributos relativos
ao próprio prédio ou de despesas condominiais (IPTU, ITR, etc).

91
9.8.1 Espécies
Existem duas espécies de bem de família: voluntário (decorre da vontade do
instituidor, devendo obedecer certos requisitos) e o legal (independe da vontade do
instituidor, de forma que a lei torna impenhorável o imóvel simplesmente pelo fato de
o devedor residir nele).

9.8.2 Bem de família convencional/voluntário


A instituição do bem de família voluntário pode ser feita pelo proprietário ou
pela entidade familiar (art. 1.711, CC). Uma vez que seja instituído um imóvel como
bem de família, não responde mais por dívidas futuras (mas responde pelas
pretéritas), pois a impenhorabilidade não possui efeito retroativo (1.715, CC).

O bem de família poderá ser instituído pelos cônjuges, companheiros,


integrante-chefe da família monoparental ou por terceiro, por ato inter vivos ou causa
mortis (testamento), desde que ambos os cônjuges beneficiados ou membros da
família contemplada aceitem expressamente a liberalidade (art. 1.711, parágrafo
único). Deve haver o assento no Registro de imóveis (art. 1.714), para que tenha
oponibilidade erga omnes.

92
O bem de família pode constituir de prédio urbano ou rural, bem como suas
pertenças (mobília), que a família destina para ser o abrigo ou domicílio familiar (art.
1.712).

Existem limites à instituição do bem de família: só pode usar 1/3 do patrimônio


líquido do instituidor, existente ao tempo da instituição. Dessa forma, o proprietário,
para poder instituir o bem de família, deve ter, no mínimo 3 imóveis (art. 1.711). Trata-
se de uma medida legal protetiva dos credores, ante a possibilidade de má-fé do
instituidor. Além disto, apenas pessoas mais abastadas podem se utilizar deste
instrumento, tornando-o de pouco uso.

Essa isenção dura enquanto viverem os cônjuges (ou companheiros) ou


enquanto os filhos forem menores de idade. Somente depois de finda a cláusula é que
o bem ficará sujeito ao pagamento dos credores e o prédio será levado a inventário.
Ademais, deve ser lembrado que o bem não fica isento de responsabilidade quanto
aos débitos de condomínio e IPTU, por exemplo.

Só pode haver alienação do prédio no qual foi instituído o bem de família se


houver a concordância do interessado (instituidor ou filhos menores) e ouvido o MP
(art. 1.717). No caso de falecerem os cônjuges e deixarem filhos menores, o tutor é
que será responsável por gerir o bem de família. Se houver necessidade de vendê-lo,
poderá fazê-lo desde que com autorização judicial e ouvido o MP.

Se restar comprovada a impossibilidade de manter o bem de família, como por


exemplo, para pagar despesas com UTI, poderá haver requerimento ao juiz que
extinga o bem de família, ouvido o MP e o interessado (instituidor ou filhos menores).
Neste caso poderá haver a sub-rogação de outro bem no lugar, quando ficará gravado

93
como bem de família ou o produto da venda será depositado judicialmente, sendo o
valor liberado para o pagamento da UTI, por exemplo (art. 1.719).

A administração do bem de família caberá a ambos os cônjuges, em igualdade


de condições (art. 1.720). Se ambos os cônjuges falecerem, a administração passa
ao filho mais velho ou ao seu tutor, se menor.

A cláusula de bem de família só poderá ser levantada por mandado judicial.

Só haverá a partilha quando for eliminada a cláusula que o institui, pela morte
dos cônjuges e maioridade de todos os filhos, por exemplo.

9.8.3 Bem de família legal


A lei 8.009/90 institui o bem de família legal, impedindo a penhora do único bem
imóvel rural ou urbano da família, destinado a moradia permanente, excluindo casas
na praia ou casas de campo. Tais bens não responderão pelos débitos contraídos
pela entidade familiar. Contudo, se o devedor oferecer este bem à penhora, não
poderá, depois, pleitear a exclusão.
O bem de família legal não responde por qualquer tipo de dívida (civil,
comercial, fiscal, previdenciária, ou qualquer natureza) (art. 1.º, lei 8.009/90), podendo
ser oposta a impenhorabilidade em qualquer tempo ou grau de jurisdição. A lei
13.144/2015, alterou o art. 3.º, III da lei 8.009/90, de forma que pode ocorrer a penhora
do bem de família para pagamento de débito alimentar, resguardado o direito do
coproprietário.

Para que essa impenhorabilidade seja reconhecida, o único imóvel do devedor


deve estar sendo habitado por ele e sua família. O fato de o devedor possuir mais
bens não impede que seja declarada a impenhorabilidade sobre o imóvel de
residência da família.

A execução da dívida alimentar afasta a impenhorabilidade do bem de família.

TESES E SÚMULAS DO STJ SOBRE BEM DE FAMÍLIA


BEM DE FAMÍLIA
Súmula 449 - A vaga de garagem que possui matrícula própria no registro de
imóveis não constitui bem de família para efeito de penhora. (Súmula 449, CORTE
ESPECIAL, julgado em 02/06/2010, DJe 21/06/2010)

94
Súmula 549 - É válida a penhora de bem de família pertencente a fiador de
contrato de locação.(Súmula 549, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 14/10/2015, DJe
19/10/2015)
• Os integrantes da entidade familiar residentes no imóvel protegido pela Lei n.
8.009/90 possuem legitimidade para se insurgirem contra a penhora do bem de
família.
• A proteção contida na Lei n. 8.009/1990 alcança não apenas o imóvel da
família, mas também os bens móveis indispensáveis à habitabilidade de uma
residência e os usualmente mantidos em um lar comum.
• É impenhorável o único imóvel residencial do devedor que esteja locado a
terceiros, desde que a renda obtida com a locação seja revertida para a subsistência
ou a moradia da sua família (Súmula n. 486/STJ).
• A vaga de garagem que possui matrícula própria no registro de imóveis não
constitui bem de família para efeito de penhora. (Súmula n. 449/STJ)
• O conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel
pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas. (Súmula n. 364/STJ)
• É possível a penhora do bem de família para assegurar o pagamento de
dívidas oriundas de despesas condominiais do próprio bem.
• O fato do terreno encontrar-se desocupado ou não edificado são circunstâncias
que sozinhas não obstam a qualificação do imóvel como bem de família, devendo ser
perquirida, caso a caso, a finalidade a este atribuída.
• A impenhorabilidade do bem de família hipotecado não pode ser oposta nos
casos em que a dívida garantida se reverteu em proveito da entidade familiar.
• É legítima a penhora de apontado bem de família pertencente a fiador de
contrato de locação, ante o que dispõe o art. 3º, inciso VII, da Lei n. 8.009/1990 (Tese
julgada sob o rito do art. 543-C do CPC/1973 - TEMA 708)(Súmula n. 549/STJ)
• A impenhorabilidade do bem de família pode ser alegada em qualquer
momento processual até a sua arrematação, ainda que por meio de simples petição
nos autos.

95
1011. FATOS JURÍDICOS

fato jurídico em ordinário


sentido estrito
(ação natural) extraordinário
FATO JURÍDICO EM SENTIDO

ato-fato jurídico Teorias


explicativas
AMPLO

Classificação

ato jurídico em Interpretação


sentido estrito
lícita (ato jurídico (não negocial) Planos de
em sentido amplo) existência, validade
negócio jurídico e eficácia
ação humana
Representação
ilícita ato ilícito
Defeitos

Invalidade

Prova

As relações jurídicas são baseadas em fatos, atos e negócios jurídicos. Sendo


assim, necessário, para que se compreenda o direito civil como um todo, a
compreensão e diferenciação desses conceitos.
Fato é um acontecimento. É qualquer ocorrência que interesse ou não ao direito.
Existem fatos que não importam ao meio jurídico. A chuva, por exemplo. Trata-se de
um fato que ocorre e segue ocorrendo seguidamente, mas que não possui qualquer
efeito jurídico. Não importa para o direito.
Existem também atos ou ações humanas, que são comportamentos e condutas,
como, por exemplo o vestir-se, o alimentar-se, etc., que também não importam para o
direito.
Interessam para o direito todos aqueles fatos que produzam efeitos.

Fatos não jurídicos


FATO

Fatos jurídicos

96
Só se considera fato jurídico aquele acontecimento que produz efeitos jurídicos.
Daí chamarmos de fatos jurídicos em sentido amplo.

10.1 Conceito de fatos jurídicos em sentido amplo


Sendo assim, considera-se como fato jurídico todo acontecimento ou evento
que de forma direta ou indireta acarrete efeitos jurídicos.

ordinário
fato jurídico em
sentido estrito
(ação natural)
extraordinário

FATO JURÍDICO EM ato-fato


ato jurídico em
SENTIDO AMPLO jurídico
lícita (ato sentido estrito
jurídico em (não negocial)
sentido amplo)
negócio jurídico
ação humana

ilícita ato ilícito

Considera-se fato jurídico em sentido amplo todo acontecimento, natural ou


humano, que gere efeitos constitutivos, modificativos ou extintivos de obrigações no
âmbito do direito4. Estes são relevantes para o campo do direito. Então, o fato, para
ser jurídico, deve passar por um juízo de valoração, ou seja, deve provocar a
aquisição, perda ou modificação de um direito.

10.2 Efeitos aquisitivos, modificativos, conservativos e extintivos do fato


jurídico
Antes de se verificar a classificação dos fatos jurídicos em sentido amplo,
considerando que sua conceituação leva em conta atos ou ações que geram efeitos
constitutivos, modificativos ou extintivos de obrigações das relações jurídicas,
necessária a compreensão destes efeitos de criação, modificação, conservação e
extinção.

4GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral. v.1.
18.ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 368.
97
Aquisição de direitos
Adquire-se direitos quando há sua incorporação ao patrimônio e à personalidade
do titular.
A forma de aquisição de direitos pode ser:
a) Originária: não há qualquer interferência de anterior titular. Ex.: art. 1.251 –
avulsão (quando uma porção de terras se solta de um terreno e une-se a
outro, por ação natural).
b) Derivada: quando há interferência do titular anterior, que transfere o direito.
Nestes casos, o direito é adquirido nas mesmas condições que o antecessor
possuía. Estabelece-se uma relação entre sucessor e sucedido. A
transferência ocorre com todos os vícios e ônus que existem. Ex.: contrato
de compra e venda.

A aquisição pode, ainda, envolver contraprestação ou não:


a) Gratuita: só o adquirente obtém vantagem. Ex.: sucessão hereditária.
b) Onerosa: quando o adquirente efetua uma contraprestação ao outro
contratante. Ex.: compra e venda, locação.

No que se refere à extensão, a aquisição pode ser:


a) A título singular: ocorre no tocante a bens determinados. Ex.: legado,
compra e venda de imóvel.
b) A título universal: quando o sucessor sucede na totalidade dos direitos. Ex.:
herdeiro, que recebe do falecido a herança como um todo unitário e indivisível
(sucede em direitos e deveres).

A aquisição de direitos pode ser:


a) Atual: direito subjetivo já formado e incorporado ao patrimônio do titular e
possível de ser exercido.
b) Futuro: ainda não se constituiu. Pode ser deferido, quando a aquisição
depende apenas da vontade do sujeito (ex.: registro da compra e venda) ou
não deferido, quando a aquisição depender de fatos ou condições falíveis
(ex.: doação que dependa do casamento do donatário ou de produção em
uma safra).

98
Existem situações em que há expectativa de que o direito seja adquirido. Nestas
situações, chama-se de expectativa de direito, que consiste na mera possibilidade
de se adquirir um direito. Ex.: os filhos têm expectativa de sucederem aos pais quando
de seu óbito. Enquanto os pais forem vivos os filhos não possuem qualquer direito.
Contudo, quando já está parcialmente cumprido, ou seja, quando o interesse do
titular não está completo, têm-se o direito eventual, pois não foram realizados todos
os elementos básicos exigidos pela norma. Trata-se de um direito concebido, mas
ainda não concretizado, pois depende, para efetivação, do interesse do adquirente.
Ex.: aceitação de proposta de compra e venda ou exercício do direito de preferência.
Há, ainda, o direito condicional, que é aquele que se completa ou perfectibiliza
se ocorrer fato ou acontecimento futuro e incerto. Ex.: cessão de direitos autorais se
o livro chegar à 10.ª edição.
Venosa5 destaca a diferença entre direito eventual e direito condicional:

Tanto nos direitos eventuais como nos condicionais existe subordinação a


evento futuro e incerto. Há numerosas coincidências nessas duas categorias.
Os direitos eventuais, contudo, trazem elemento futuro e incerto inerente e
essencial ao próprio negócio jurídico, enquanto nos direitos condicionais o
fato dito condicional é externo ao ato. Nem todo elemento futuro e incerto
deve ser considerado condição. O negócio jurídico eventual é negócio jurídico
ainda incompleto que necessita que algo ocorra para completar-se. É de
índole interna. Quem vende, por exemplo, coisa que ainda não tem, depende
de obtê-la para poder transmiti-la.
Nos direitos condicionais o direito já se perfez. Apenas se agregou um
elemento externo, uma condição, para ser exercido, uma vez que sua
existência jurídica depende desse elemento condicional. A condição aposta
a um direito é acessório.

Modificação de direitos
As relações jurídicas podem ser modificadas, tanto no conteúdo ou no objeto,
em razão da manifestação da vontade das partes.
A modificação dos direitos pode ser:
a) Objetiva: quanto ao objeto.
a. Qualitativa: quando o conteúdo do direito se converte em outra
espécie, sem aumentar ou diminuir as faculdades do sujeito. Ex.:
credor de dívida em dinheiro que aceita receber objeto em pagamento.
b. Quantitativa: quando há a modificação do objeto, que aumenta ou
diminui de volume ou extensão, sem alterar a qualidade do direito. Ex.:

5 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: parte geral. 12.ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 341.
99
quando há a aquisição de 30 hectares de terras, através de escritura
pública e, na medição, verifica-se existir apenas 28 hectares.
b) Subjetiva: quanto aos titulares. Ex.: assunção de dívida (João assume dívida
do filho Pedro, responsabilizando-se em seu lugar). Alguns direitos (os de
personalidade, p. ex.) não admitem modificação subjetiva, como, por
exemplo, os relativos ao direito de família.

Conservação de direitos
Os atos jurídicos podem ser destinados ao resguardo ou defesa de direitos, caso
sejam ameaçados por quem quer que seja. Nestes casos, o titular do direito pode
necessitar tomar providências preventivas ou repressivas, judiciais ou extrajudiciais.
As medidas podem ser classificadas da seguinte forma:
a) Atos de conservação: praticados pelo titular para evitar o perecimento,
turbação ou esbulho. ex.: tutela de urgência de arresto (art. 301, CPC/2015).
b) Atos de defesa do direito lesado: ajuizamento de ações cognitivas ou
executivas, quando houver violação a direito.

Extinção de direitos
Os direitos também podem extinguir-se. São razão de extinção o perecimento
do objeto, a alienação, a renúncia, o abandono, o falecimento do titular do direito
personalíssimo, etc.
As causas de extinção podem ser:
a) Subjetivas: quando o direito é personalíssimo e morre o titular.
b) Objetivas: quando perece o objeto sobre o qual recaem.
A extinção pode ocorrer por fatos humanos ou forças da natureza.

10.3 Classificação dos fatos jurídicos em sentido amplo


O fatos jurídicos em sentido amplo dividem-se em:
a) Fato jurídico em sentido estrito ou Fatos naturais (também denominados
de fatos jurídicos em sentido estrito) – independem da atuação humana.
Também podem ser chamados de fato jurídico em stricto sensu. Ocorre pela
simples manifestação da natureza e produzem efeitos jurídicos com o
objetivo de criação, alteração ou extinção de direitos e deveres. Subdividem-
se em:

100
a. Ordinários – trata-se de evento natural, previsível e comum de
ocorrer. Sofre influência do elemento tempo. Ex.: nascimento, morte,
maioridade, decurso do tempo, etc.
b. Extraordinários – evento decorrente da natureza. Ex.: caso fortuito e
força maior: tempestade, raio, terremoto, etc. O caso fortuito e a força
maior são fatos cujos efeitos não era possível evitar ou impedir.
b) Fatos humanos (também denominados de atos jurídicos em sentido amplo)
– decorrem da atividade humana. Dividem-se em:
a. Lícitos – atos humanos que a lei autoriza a praticar. Produzem efeitos
jurídicos voluntários. Dividem-se em:
i. Ato jurídico em sentido estrito ou meramente lícito: o efeito
da manifestação da vontade está predeterminado na lei. Não
exige vontade qualificada, mas simples intenção. Ex.:
notificação, que constitui em mora o devedor; reconhecimento
de filho; tradição; percepção dos frutos; intimação; fixação de
domicílio; pagamento de uma obrigação; etc.
ii. Negócio jurídico: deve haver uma vontade qualificada, sem
vício, ou seja, a ação humana objetiva um fim permitido na lei.
Diante de uma composição de vontade das partes,
estabelecendo a existência de efeitos, cria-se um instituto
jurídico próprio, visando a regulação dos direitos e deveres. O
negócio jurídico “constitui o principal exercício da autonomia
privada, da liberdade negocial”6. Ex.: contrato de compra e
venda, testamento.
b. Ilícitos – atos praticados em desacordo com o ordenamento jurídico.
Produzem efeitos jurídicos involuntários. Criam deveres e obrigações
(ao invés de direitos). Ex.: dever de reparar o dano. Art. 186, CC.

10.4 Fato jurídico em sentido estrito


Fato jurídico em sentido estrito é o acontecimento da natureza ou natural que
gere efeitos jurídicos. Nem todos os fatos naturais serão considerados fatos jurídicos

6TARTUCE, Flávio. Direito civil: lei de introdução e parte geral. v.1. 12.ed. Rio de Janeiro: Forense,
2016, p. 339.
101
em sentido estrito. Apenas os que gerarem efeitos jurídicos. Ex.: uma tempestade. Via
de regra, não é fato jurídico. Contudo, será um caso ela cause danos ao imóvel de
alguém que tenha seguro. Nestes casos, a tempestade deixa de ser um fato natural
para ser um fato jurídico, visto que gera uma relação obrigacional entre o proprietário
do imóvel e a seguradora (que terá de indenizar os danos cobertos pelo seguro).

ordinário
fato jurídico em
sentido estrito
(ação natural)
extraordinário

FATO JURÍDICO EM ato-fato


ato jurídico em
SENTIDO AMPLO jurídico
lícita (ato sentido estrito
jurídico em (não negocial)
sentido amplo)
negócio jurídico
ação humana

ilícita ato ilícito

Os fatos jurídicos em sentido estrito podem ser:


a) Ordinários: fatos de ocorrência comum: nascimento, morte, decurso do
tempo.
b) Extraordinários: são imprevisíveis: terremoto, enchente.

10.5 Ato - Fato jurídico


Os atos-fatos jurídicos são uma categoria especial e que possui características
inconfundíveis. Não existe previsão legal para esta categoria, mas não se pode deixar
de reconhecer sua existência e efeitos jurídicos.

fato jurídico em ordinário


sentido estrito
(ação natural) extraordinário
FATO JURÍDICO
EM SENTIDO ato-fato
jurídico ato jurídico em sentido
AMPLO lícita (ato jurídico estrito (não negocial)
em sentido
ação amplo)
negócio jurídico
humana
ilícita ato ilícito

É uma categoria intermediária, porque está entre o fato da natureza e a ação


humana.

102
A categoria do ato-fato refere-se a aquele comportamento que, embora derive
do homem, é desprovido de vontade consciente em face do resultado jurídico
produzido.
Trata-se de um fato jurídico qualificado pela atuação humana7, pois a atuação é
substancia deste fato jurídico. Contudo, não importa para a norma se existiu ou não a
intenção da prática da conduta.
Importa a consequência do ato, o fato resultante, sem se levar em consideração
a vontade de praticá-lo. O efeito pode não ser o buscado pelo agente, mas decorre de
conduta e é previsto pela lei. A vontade está presente, mas o direito a desconsidera e
apenas atribui juridicidade ao fato resultante – existe ação humana, mas é valorado o
resultado prático.
Ex.: pessoa que encontra um tesouro. A lei, neste caso, determina que caberá
àquele que encontrou o tesouro, a metade dele (art. 1.264, CC).
Para ficar mais claro, utilize-se o exemplo da união estável. Trata-se de um ato-
fato jurídico. Não importa a vontade das partes, pois o fato humano é que gera
importância jurídica e social. Significa dizer que o fato de viverem juntos, de forma
pública, contínua, duradoura e com o intuito de constituir família basta para a
qualificação da união estável. Não importa se o casal quer ou se não quer o
reconhecimento ou a configuração da união. Basta que estejam presentes os
requisitos legais.
Outro exemplo, utilizado pela doutrina é a compra e venda feita por crianças. Se
uma criança compra um chocolate em um boteco, ela não tem a vontade direcionada
a contratar formalmente. Não pode ser considerado um negócio jurídico porque falta
o elemento da capacidade do agente. Assim, melhor enquadrar como um ato-fato
jurídico, aceito socialmente.
O enunciado 138 do CJF dispõe que: “A vontade dos absolutamente incapazes,
na hipótese do inc. I do art. 3º é juridicamente relevante na concretização de situações
existenciais a eles concernentes, desde que demonstrem discernimento bastante para
tanto”.
Os atos-fatos jurídico podem ser classificados em:

7GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral. v.1.
18.ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 375.
103
a) Atos reais: denominados de atos materiais. Decorrem de certos
acontecimentos em que importa o fato resultante, independentemente da
existência ou não de vontade de obtê-lo. Ex.: a criança que descobre um
tesouro enterrado adquire a propriedade, independentemente de intencionar
achá-lo.
b) Atos-fatos indenizativos: casos de indenização sem que haja ilicitude, ou
seja, as situações em que um ato humano, não contrário ao direito, cause
prejuízo a outrem e o dever de indenizar. Ex.: casos de estado de
necessidade – para salvar uma pessoa de um incêndio, alguém quebra a
porta da casa onde está a pessoa.
c) Atos-fatos caducificantes: situações que, independentemente do ato
humano, trazem efeito que seja a extinção de determinado direito e, com isto,
da pretensão, da ação e da exceção decorrente. Ex.: prescrição e
decadência.

10.6 Ato jurídico em sentido estrito


No ato jurídico em sentido estrito o efeito da manifestação da vontade está
previsto na lei, não havendo escolha da categoria jurídica. A ação humana baseia-se
na intenção.

ordinário
fato jurídico em
sentido estrito
(ação natural)
extraordinário

FATO JURÍDICO EM ato-fato


ato jurídico em
SENTIDO AMPLO jurídico
lícita (ato sentido estrito
jurídico em (não negocial)
sentido amplo)
negócio jurídico
ação humana

ilícita ato ilícito

Talvez o melhor exemplo para explicar o ato jurídico em sentido estrito é o


reconhecimento do filho. Isto porque não há escolha da “modalidade” de filiação ou
dos direitos daí decorrentes. O fato do reconhecimento surgem efeitos legais: direito
de usar o nome do pai, dever de prestar alimentos, direitos sucessórios, dever de
apoio moral, etc. Os efeitos não dependem da vontade daquele que reconhece, mas
sim da própria lei.
104
Ex.: uma criança torna-se proprietário dos peixes pelo fato de pescar (instituto
da ocupação), de forma que a incapacidade não torna nulo o ato.
Ex.: fixação de domicílio (quando a pessoa fixa residência em determinado local
estabelece seu domicílio, independentemente de emitir manifestação de vontade
neste sentido).
O ato jurídico em sentido estrito trata-se de um simples comportamento humano
voluntário e consciente, cujo efeitos estão previamente determinados na lei. Vale
dizer, no ato em sentido estrito não existe autonomia privada e liberdade na escolha
dos efeitos jurídicos produzidos, ou seja, o ato em sentido estrito é uma simples ação
humana prevista em lei.
Trata-se, pois, de “simples manifestação de vontade, sem conteúdo negocial,
que determina a produção de efeitos legalmente previstos”8.
No ato jurídico em sentido estrito o agente não tem a liberdade de escolha na
determinação dos efeitos resultantes do seu comportamento. Deve haver a
manifestação da vontade, mas ela não é qualificada. Ex.: confissão de dívida.
Os efeitos jurídicos derivados da praticado do ato não têm como determinar os
efeitos, porque este vem determinado em lei, uma vez que os atos jurídicos em sentido
estrito são desprovidos em escolha dos efeitos. Ex.: a percepção de um fruto, a caça,
a pesca, o reconhecimento de filho, a fixação do domicílio voluntário.
Estão previstos no art. 185, CC: Aos atos jurídicos lícitos, que não sejam
negócios jurídicos, aplicam-se, no que couber, as disposições do Título anterior.
Classificam-se em:
a) Atos materiais (reais): simples atuação humana, baseada em uma vontade
consciente, tendente a produzir efeitos jurídicos previstos em lei 9. Embora
haja vontade, ela não é voltada ao alcance dos efeitos. Eles se produzem
independentemente do “querer produzi-los”. Ex.: ocupação, percepção de
frutos, fixação de domicílio, etc.
b) Participações: trata-se de ato de comunicação, dirigidos a alguém e sem
conteúdo de negócio. Ex.: notificação, oposição, aviso, intimação.

8 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral. v.1.
18.ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 377
9 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral. v.1.

18.ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 379.


105
1112. NEGÓCIO JURÍDICO

O negócio jurídico envolve uma declaração de vontade que objetiva a produção


de certos efeitos jurídicos admitidos pela lei.

ordinário
fato jurídico em
sentido estrito
(ação natural)
extraordinário

FATO JURÍDICO EM ato-fato


ato jurídico em
SENTIDO AMPLO jurídico
lícita (ato sentido estrito
jurídico em (não negocial)
sentido amplo)
negócio jurídico
ação humana

ilícita ato ilícito

Trata-se de uma declaração de vontade, emitida segundo o ditame da autonomia


privada, nos limites da função social e da boa-fé objetiva, pela qual a parte
autodisciplina os efeitos jurídicos que escolheu, ou seja, quando se celebra um
negócio sempre há uma margem de autonomia privada e liberdade na escolha dos
possíveis efeitos jurídicos. Caso contrário, não existe negócio jurídico. Exemplos:
contrato, testamento, etc.
Pode-se dizer que o negócio jurídico é uma manifestação de vontade unilateral
ou bilateral, ou seja, um ato jurídico pelo qual uma ou mais pessoas, em virtude de
uma declaração de vontade, instauram uma relação jurídica, cujos efeitos, quanto a
elas e às demais, se subordina à vontade declarada, nos limites consentidos pela lei.
O negócio jurídico é o principal instrumento que as pessoas possuem para
realizar seus interesses, sendo relevante para a concepção de contrato. O estudo dos
negócios jurídicos também é um estudo sobre os contratos, envolvendo os elementos,
vícios, casos de nulidade e anulação10. Também é um negócio jurídico o casamento,
o testamento.

10TARTUCE, Flávio. Direito civil: lei de introdução e parte geral. v.1. 12.ed. Rio de Janeiro: Forense,
2016, p. 342.
106
11.1 Teorias explicativas do negócio jurídico
O direito brasileiro adota a teoria voluntarista, conforme se verifica do art. 112
CC:

Art. 112. Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas


consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem.

Significa dizer que vale mais a intenção das partes ou a vontade real dirigida
a determinado fim permitido em lei.
Contudo, existe, também a teoria objetivista ou da declaração, segundo a qual
a vontade declarada é essencial para o negócio jurídico, ou seja, o negócio jurídico
é o meio para a produção de efeitos jurídicos.

VOLUNTARISTA OU TEORIA DA TEORIA DA DECLARAÇÃO


VONTADE
Para esta teoria, o núcleo essencial Para esta teoria, o núcleo essencial
do negócio jurídico seria a vontade do negócio não seria a intenção do
interna ou a intenção do declarante. declarante, mas sim, própria
vontade externa ou declarada.

Não há razão prática para a diferenciação entre vontade interna (intenção) e


vontade declarada, pois negócio jurídico seria a “declaração de vontade, emitida em
obediência aos seus pressupostos de existência, validade e eficácia, com o propósito
de produzir efeitos admitidos pelo ordenamento jurídico pretendidos pelo agente”11.

11.2 Classificação do negócio jurídico


Quanto ao número de declarantes:
a) Unilaterais: apenas a manifestação da vontade de uma pessoa (testamento,
renúncia, etc)
a. Receptícios: a declaração de vontade deve se tornar conhecida do
destinatário para produzir efeitos. Ex.: revogação de mandato.
b. Não receptícios: o conhecimento, por parte de outras pessoas, é
irrelevante. Ex.: testamento, confissão de dívida.
b) Bilaterais: manifestação de vontade de duas partes, formadoras do
consenso (compra e venda, locação, prestação de serviços, etc).

11GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral. v.1.
18.ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 389.
107
a. Bilaterais simples: somente uma das partes percebe vantagem e a
outra detém o ônus. Ex.: doação, comodato.
b. Sinalagmático: há a reciprocidade de direitos e obrigações, ou seja,
existem ônus e vantagens recíprocos. Ex.: locação, compra e venda.
c) Plurilaterais: envolvem mais de duas partes, quando, então, as deliberações
não decorrem de um intercâmbio de declarações convergentes, mas sim, por
decisões de maioria (contrato de uma sociedade, etc).

Quanto ao exercício de direitos:


a) Negócios de disposição: autorizam o exercício de amplos direitos,
inclusive a alienação. Geralmente, negócios translativos. Ex.: doação.
b) Negócios de administração: autorizam apenas a administração e uso do
objeto. Ex.: comodato.

Quanto às vantagens patrimoniais:


a) Gratuitos: atos de liberalidade, onde apenas uma das partes é beneficiada.
Não há contraprestação. Ex.: doação pura (sem encargo), testamento.
b) Onerosos: ambas as partes recebem benefícios e sacrifícios patrimoniais.
Ex.: empreitada, compra e venda, etc.
a. Comutativos: há um equilíbrio subjetivo entre as prestações
pactuadas, de forma que as vantagens equivalem-se entre si (locação,
p. ex.)
b. Aleatórios: a prestação de uma das partes está condicionada a um
acontecimento exterior, não havendo equilíbrio subjetivo. Ex.: compra
e venda de coisa futura (safra de soja, p. ex. – pode não colher ou
colher pouco, etc, mas o preço ajustado deve ser pago).
c) Neutro: destituídos de atribuição patrimonial específica. Ex.: instituição do
bem de família, imposição das cláusulas de inalienabilidade ou
impenhorabilidade – não é nem gratuito, nem oneroso.
d) Bifrontes: negócios que tanto podem ser gratuitos, quanto onerosos. Tudo
depende da intenção das partes. Ex.: contrato de depósito (geralmente
gratuito, podendo ser oneroso).

108
Quanto à forma:
a) Formais ou solenes: exigem a observância de formas legais para
aperfeiçoamento. Ex.: casamento e testamento.
b) Não formais ou forma livre: a forma é livre, sem interferência legal. Podem
ser até verbais. Ex.: doação de um móvel. Trata-se da regra geral (art. 107,
CC).

Quanto ao momento da produção de efeitos:


a) Inter vivos: produzem efeitos desde logo, estando as partes ainda em vida.
Ex.: compra e venda.
b) Causa mortis: os efeitos serão produzidos após a morte do declarante. Ex.:
testamento.

Quanto à existência:
a) Principais: existem por si mesmos (compra e venda), não dependendo de
qualquer outro para que tenham existência e validade. Ex.: contrato de
locação.
b) Acessórios: a existência pressupõe a do principal. Ex.: contrato de fiança
que se relaciona com o contrato principal (financiamento, locação).

Quanto ao conteúdo:
a) Patrimoniais: relacionados com bens ou direitos aferíveis pecuniariamente
(negócios reais, obrigacionais, etc).
b) Extrapatrimoniais: referentes a direitos sem conteúdo econômico (direitos de
família, personalidade, etc).

Quanto às condições pessoais dos negociantes:


a) Impessoais: não dependem de qualquer condição especial dos envolvidos. A
obrigação pode ser cumprida por qualquer pessoa. Ex.: compra e venda.
b) Personalíssimos ou intuito personae: dependem da condição pessoal de um
dos negociantes, onde apenas a própria pessoa pode cumprir com o contrato.
Ex.: fiança, contratação de um pintor famoso.

109
Quanto à eficácia do negócio jurídico:
a) Constitutivos: eficácia opera-se ex nunc, ou seja, a partir do momento da
celebração. Ex.: compra e venda
b) Declaratórios: os efeitos retroagem ao momento da ocorrência fática a que
se vincula a declaração de vontade. Ex.: reconhecimento de paternidade →
retroage ao nascimento.

11.3 Interpretação do negócio jurídico


Muitas vezes o contrato necessita de interpretação, em razão de uma redação
obscura e ambígua. Interpretar é dar sentido para a declaração de vontade, ou seja,
busca-se a real vontade das partes. Em razão disto, a regra da interpretação é a
transcrita no art. 112, CC:
Art. 112. Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas
consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem.

Significa dizer que a noção de que a manifestação da vontade é o elemento mais


importante na interpretação dos negócios jurídicos, inclusive, sendo superior à forma.
Ex.: um cliente, em uma barraca de pastel, faz o seguinte pedido: “três queijos,
para levar, por favor”. A atendente providencia um pastel com 3 queijos e entrega o
pedido. ESTA ERA A INTENÇÃO? Ou seriam 3 pasteis de queijo????
Leva-se em conta, então, a boa-fé objetiva na interpretação de qualquer negócio
jurídico (art. 113, CC). Deve-se presumir que os contratantes agiram de boa-fé. A má-
fé deve ser provada. Além disto, o enunciado 409 das Jornadas de Direito Civil
determina que:

Enunciado 409. Art. 113. Os negócios jurídicos devem ser interpretados não
só conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração, mas também de
acordo com as práticas habitualmente adotadas entre as partes.

Ex.: arrendamento de pastagem para engorda do gado. Precisa-se verificar o


que é costumeiro e usual no lugar – contrato (geralmente) verbal, por 100 dias.
Além disto, prescreve o art. 114, CC que os negócios benéficos e a renúncia
devem ser interpretados estritamente. Benéficos ou gratuitos são os que envolvem
uma liberalidade: doação, por exemplo.

110
11.4 Planos de existência, validade e eficácia do negócio jurídico
O negócio jurídico deve ser analisado sob três planos: existência, validade e
eficácia (tricotomia existência-validade-eficácia ou “escala Ponteana”)

a) Existência: o negócio jurídico, para ser considerado como tal, deve cumprir
certos requisitos mínimos. Os elementos estruturais estão presentes. São o
suporte fático do negócio jurídico. Existem apenas substantivos, s/em
qualquer qualificação. Esses substantivos são: partes (ou agentes), vontade,
objeto e forma. Na falta de algum desses elementos estruturais ou
pressupostos, o negócio é inexistente.
b) Validade: o fato de existir, não significa que seja considerado perfeito, ou
seja, com condições legais para produzir efeitos. Uma vez que o negócio seja
existente, deve-se analisar se está perfeito ou se contém algum vício ou
defeito inviabilizante. Os requisitos devem estar presentes. Na escala da
validade, os substantivos são qualificados, ou seja, ganham adjetivos, ou
seja: partes ou agentes capazes; vontade livre e não viciada; objeto lícito,
possível, determinado ou determinável; forma prescrita ou não defesa em lei
(art. 104, CC).
c) Eficácia: o fato de existir e ser válido não significa que esteja apto a produzir
efeitos imediatos, pois a produção de efeitos pode estar limitada por
elementos acidentais. O negócio pode produzir efeitos só a partir do momento
em que for implementada uma condição. São os efeitos gerados entre as
partes e em ralação a terceiros.

Plano da eficácia
•Condição
•Termo
Plano da validade •Modo ou encargo
•Vontade = livre + boa-fé •Consequências do
•Agente = capaz + legitimado inadimplemento negocial
Plano da existência (juros, multas, perdas e
•Objeto = lícito + possível +
danos)
•Vontade determinado
•Agente •Forma = livre ou prescrita em
lei
•Objeto
•Forma

111
Chama-se de Escala Ponteana e pode ser representada através de degraus,
onde o plano da existência representa o primeiro degrau, o plano da validade, o
segundo e, o plano da eficácia, o terceiro degrau da Escala Ponteana.
Pela representação do esquema, percebe-se que, para que um negócio jurídico
seja válido, precisa existir. Para que produza efeitos, precisa ser válido. Contudo, nem
sempre isto ocorre, pois pode ocorrer de um negócio ser existente, inválido e eficaz.
Então, antes de se analisar cada um dos planos, deve-se destacar que um negócio
jurídico pode ser:
a) existente, válido e eficaz. Ex.: casamento - capazes, sem impedimentos,
realizado por autoridade competente.
b) existente, válido e ineficaz. Ex.: testamento de pessoa capaz, formalmente
legal, antes da morte do testador. Ex.: contrato celebrado sob condição suspensiva e
que não esteja, ainda, gerando efeitos jurídicos e práticos.
c) existente, inválido e eficaz. Ex.: casamento putativo - negócio jurídico
anulável, antes da decretação da anulabilidade. Da celebração até a anulação produz
todos os efeitos.
d) existente, inválido e ineficaz. Ex.: doação feita pessoalmente por pessoas
absolutamente incapazes (menor de 16 anos).
e) existente e eficaz. Ex.: nascimento com vida, pintura, dano causado a bem
alheio.
f) inexistente. Neste caso, não se analisa os demais planos, pois todos
dependem da existência do negócio jurídico. Ex.: casamento celebrado sem a
manifestação da vontade.

11.4.1 Plano da existência do negócio jurídico


O negócio jurídico, para que seja válido e eficaz, precisa existir. Para tanto,
alguns requisitos (ou elementos essenciais ou elementos constitutivos) precisam estar
presentes. Se não estiverem, o negócio não existe e, portanto, sequer se questiona
ser válido e eficaz.
Mas quais seriam, então, os elementos constitutivos ou essenciais dos negócios
jurídicos? Sãos os seguintes: a) agente emissor da vontade; b) manifestação de
vontade; c) objeto; d) forma.

112
Agente emissor da vontade
Para que exista um negócio jurídico deve haver um agente, ou seja, um sujeito.
Sem ele, não há ato, mas tão somente um fato jurídico em sentido estrito. A
participação do sujeito é indispensável para a configuração/existência do negócio
jurídico.

Manifestação (ou declaração) da vontade


A vontade é pressuposto do negócio jurídico. Esta vontade deve ser
exteriorizada para que o negócio exista.
A vontade é um elemento subjetivo, que se configura através de uma declaração.
Princípio da autonomia da vontade. Em razão deste princípio, as pessoas têm
liberdade de celebrar negócios jurídicos de acordo com a lei. Contudo, esse princípio
tem limitações em razão da supremacia da ordem pública, ou seja, situações em
que, em nome da ordem pública e do interesse social, o Estado interfere na
manifestação da vontade da pessoa, especialmente para evitar que o indivíduo seja
economicamente oprimido pelo mais forte.
Princípio da obrigatoriedade dos contratos (pacta sunt servanda). Segundo
este princípio, uma vez manifestada a vontade, esta torna-se de obrigatório
cumprimento e faz lei entre as partes. Trata-se de uma forma de estabelecer
segurança aos negócios. A este princípio (pacta sunt servanda) opõe-se o princípio
da revisão dos contratos ou da onerosidade excessiva, que se baseiam na
cláusula rebus sic stantibus e na teoria da imprevisão. Estes princípios autorizam o
Judiciário a revisar contratos em casos extraordinários e em razão da ocorrência de
fatos imprevisíveis.
A manifestação da vontade pode ser: tácita, expressa ou presumida.
a) Expressa. A manifestação expressa é a manifestada através da palavra
falada ou escrita ou, ainda, através de gestos, sinais ou mímicas. Significa
dizer que é manifestada de forma expressa, possibilitando o conhecimento
imediato da intenção do agente. Ex.: contratos verbais ou expressos,
emissão de título de crédito, etc.
b) Tácita. Verifica-se pelo comportamento do agente, ou seja, deduz-se da
conduta do indivíduo sua intenção. Ex.: aceitação da herança através de uma

113
cessão de direitos hereditários. Contudo, nos contratos, a manifestação tácita
só é admitida quando a lei não exigir forma expressa.
c) Presumida. É estabelecida pela lei. Quando a lei deduz a manifestação
através de certos comportamentos do agente. Ex.: aceitação presumida da
herança (a lei determina que, caso o herdeiro não se manifeste dentro de
certo tempo – 30 dias – entender-se-á pela aceitação da herança).

As declarações de vontade devem ser receptícias, ou seja, as que se dirigem a


uma pessoa determinada, com o objetivo de levar ao conhecimento do agente a
intenção do declarante, sob pena de ineficácia. Só tem eficácia se o outro tiver
conhecimento. Ex.: revogação de mandato. Declarações não receptícias são as que
se efetivam independentemente do conhecimento do destinatário. Ex.: promessa de
recompensa, revogação do testamento, etc.
Silêncio como manifestação da vontade. Via de regra, quem cala, não diz
coisa nenhuma. O silêncio nada significa, por ausência de manifestação da vontade.
Excepcionalmente, admite-se o silêncio como manifestação da vontade (art. 111, CC):
“o silêncio importa anuência, quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem, e
não for necessária a declaração de vontade expressa”. Assim, admite-se o silêncio
como manifestação da vontade quando a lei autorizar. Ex.: doação, quando o doador
fixa prazo para o donatário se manifestar. Caso não se manifesta dentro do prazo,
entende-se pela aceitação (art. 539, CC).
Reserva mental. Situações em que um dos declarantes oculta sua verdadeira
intenção, ou seja, quando não quer um efeito jurídico que declara querer. Trata-se de
uma enganação ao outro contratante. Se o outro declarante, no entanto, não souber
da reserva, o ato subsiste e produz efeitos que o declarante não desejava. Art. 110,
CC: “a manifestação de vontade subsiste ainda que o seu autor haja feito a reserva
mental de não querer o que manifestou, salvo se dela o destinatário tinha
conhecimento”. A reserva mental desconhecida do outro contratante não importa para
o direito, pois a vontade produzirá todos os efeitos. Ex.: promessa de emprestar
dinheiro a amigo que pretende se matar em razão de dívidas.

Objeto
Todo negócio pressupõe a existência de um objeto.

114
Se o contrato é de mútuo, o objeto deve ser coisa fungível (coisa que pode ser
substituída por outra). Se for contrato de comodato, a coisa deve ser infungível (não
pode ser substituída). Para a constituição de uma hipoteca, deve ser um imóvel a
garantia.

Forma
Forma é o meio pelo qual a declaração de vontade é exteriorizada, ou seja, se
oral, escrita, silêncio, sinais, etc. A vontade sempre deve ser manifestada de alguma
forma.
Não se deve confundir a forma (elemento existencial) com a forma legalmente
prescrita (pressuposto de validade). Ex.: João compra 30ha de terras de Pedro. Paga
a quantia e recebe de Pedro um recibo. Não fazem escritura pública de compra e
venda. Neste caso, apesar de não ser válido o negócio jurídico por não se revestir da
formalidade legal, é necessário reconhecer que o ato negocial de compra e venda
existiu, pois Pedro, inclusive, passou recibo. Neste caso temos os elementos
existenciais: manifestação da vontade (vender e comprar), agentes (sujeitos de
direitos), objeto (bem imóvel) e forma (escrita).

11.4.2 Plano da validade do negócio jurídico


Uma vez que o plano da existência esteja completo, deve-se verificar o plano da
validade. Os pressupostos de validade (ou a inexistência deles) conduz às causas de
nulidade e anulabilidade.
O art. 104, CC prevê os requisitos ou pressupostos de validade dos negócios
jurídicos: agente capaz; objeto lícito, possível, determinado ou determinável; forma
prescrita ou não defesa em lei.
Gagliano e Pamplona Filho12 adicionam um quarto pressuposto, que é a
manifestação de vontade livre e de boa-fé. Além disto, defendem que o agente
emissor da vontade deve ser capaz e legitimado para o negócio. Afirmam que
sabendo-se os elementos constitutivos do negócio jurídico, basta qualificá-los para
que se saiba os pressupostos de validade. Pois bem, passa-se a análise de cada um
deles.

12GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral. v.1.
18.ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 406.
115
Manifestação da vontade livre e de boa-fé
A manifestação da vontade deve ser livre e de boa-fé (não impregnada de
malícia). Os vícios do negócio jurídico atacam a liberdade de manifestação da vontade
ou a boa-fé, de forma que o ordenamento jurídico tende a reagir, anulando ou
declarando nulos tais negócios. (Os defeitos dos negócios jurídicos serão tratados
adiante).
Para que a manifestação da vontade seja válida, dois princípios surgem: a
autonomia da vontade e a boa-fé.
Princípio da autonomia da vontade. Trata-se da liberdade negocial, que,
contudo, não é plena, pois sofre limitações da lei, da moral e da ordem pública.
Princípio da boa-fé. Trata-se de princípio ético formador da vontade negocial
válida. Assim, se uma das partes conseguiu a manifestação da vontade da outra
através da coação, há a violação deste princípio. A boa-fé deve ser tanto a subjetiva
(estado psicológico, subjetivo do indivíduo), quanto a objetiva (que as partes
comportem-se segundo um padrão ético objetivo de confiança recíproca).

Agente emissor da vontade capaz e legitimado para o negócio


O agente emissor da vontade deve ser capaz e detentor de legitimidade para o
negócio.
Agente capaz = pessoa física/natural plenamente capaz para prática dos atos da
vida civil.
São absolutamente incapazes os menores de 16 anos (art. 3.º, CC, com redação
dada pelo Estatuto da pessoa portadora de deficiência).
Art. 3.º São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da
vida civil os menores de 16 (dezesseis) anos.
São relativamente incapazes:
Art. 4.º São incapazes, relativamente a certos atos ou à maneira de os
exercer:
I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;
II - os ébrios habituais e os viciados em tóxico;
III - aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir
sua vontade;
IV - os pródigos.

Os absolutamente incapazes devem ser representados e os relativamente


incapazes, assistidos. Contudo, há negócios que o relativamente incapaz pode
celebrar: fazer testamento, aceitar mandato e ser testemunha. O negócio celebrado

116
pelo absolutamente incapaz sem a devida representação é nulo (art. 166, I, CC). O
negócio celebrado pelo relativamente incapaz sem a devida assistência é anulável
(art. 171, I, CC).
Além da capacidade, o agente deve ser legitimado. Assim, embora plenamente
capaz, não podem dois irmãos contraírem matrimônio entre si. Também não podem
suceder aquele que tiver sido excluído da sucessão. A pessoa maior e casada também
não pode vender imóvel sem a outorga conjugal. Tudo isto indica a falta de
legitimidade destas pessoas.
Este agente emissor da vontade, capaz e legitimado, pode praticar o ato por si
próprio ou através de representante. O Código Civil estabelece um capítulo próprio
para a representação, o que será abordado mais adiante. Pode, nestes casos, ocorrer
o chamado autocontrato, situações em que o representante (procurador) celebra
negócio consigo mesmo. Ex.: João outorga procuração para Carlos, para que este
venda o bem X a quem quer que seja. Neste caso, se a procuração prever
expressamente (art. 117, CC), pode Carlos vender o bem X para si próprio. Assinará
a escritura como comprador e como representante do vendedor.

Objeto lícito, possível, determinado ou determinável


Objeto lícito é aquele que não é proibido pelo direito e pela moral. Ex.: contrato
de prestação de serviços advocatícios. É ilícito, contudo, um contrato de prestação de
serviços para o cometimento de um crime. Também é ilícito o contrato de prestação
de serviços sexuais, com a cobrança judicial pelo inadimplemento da prestação
pecuniária, em razão da imoralidade do objeto. Também é ilícito a compra e venda de
uma praça (bem de uso comum do povo).
Objeto fisicamente possível é aquele naturalmente possível de se realizar.
Significa dizer que o objeto é impossível quando o contrato visa a compra e venda de
um imóvel na lua.
Objeto determinável ou determinado, ou seja, deve haver a descrição mínima do
objeto, individualizações que permitam caracterizar o objeto. Ex.: compra e venda do
bem x (determinado) ou compra e venda de x soja (determinável).

117
Forma adequada
Por fim, o negócio deve ser revestido da forma prescrita ou não proibida pela lei.
Via de regra, os negócios não dependem de forma especial, de forma que o direito
brasileiro adota a liberdade da forma (art. 107, CC). Contudo, existem situações em
que a lei prevê a forma e, para a validade do negócio, esta deverá ser obedecida.
Ex.13: o humilde camponês, por meio de uma compra e venda, adquire alguns
hectares de terras do vizinho e, sem saber que a aquisição da propriedade imobiliária
exige a lavratura da escritura de compra e venda e o registro imobiliário, aceita,
apenas, a documentação do ato em recibo simples, firmado pelo vendedor. Neste
caso, não se discute que o negócio existe (elemento constitutivo presente), mas não
será válido o negócio, por não respeitar a forma prevista na lei (art. 108 c/c art. 166,
CC).

11.4.3 Plano da eficácia do negócio jurídico


Analisados os planos da existência e da validade, necessário se faz considerar
sobre a eficácia do negócio jurídico.
Eficácia é a potencialidade, ou seja, a capacidade dos negócios jurídicos
gerarem efeitos.
É eficaz o negócio jurídico quando repercute juridicamente no plano social, ou
seja, se não depender de nenhum acontecimento futuro para ser exigível. Ex.: compra
e venda. Uma vez celebrada e registrada, produz efeitos.
Este acontecimento futuro é tratado pela doutrina como “elementos acidentais
do negócio jurídico”, que são: condição, termo e modo ou encargo. Nestas situações,
a produção de efeitos do negócio só se perfectibiliza com a ocorrência do elemento
acidental.

Condição
É um elemento acidental que consiste em um evento futuro e incerto, por meio
do qual subordina-se ou resolve a produção de efeitos jurídicos.
Ex.: indivíduo que se obriga a doar o imóvel X para João quando ele se casar. O
casamento, no caso, é uma condição acessória suspensiva.

13GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral. v.1.
18.ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 418.
118
Ex.: indivíduo que adquire o usufruto do bem X, para auferir renda, até que cole
grau no ensino superior. No momento da colação, extingue-se o usufruto, tratando-
se, neste caso, de uma condição resolutiva.
A condição é caracterizada pela incerteza e futuridade. Art. 121, CC.

a) Incerteza
Se o fato que subordina a vontade for certo, estaremos diante de um termo. A
condição é sempre incerta.
A incerteza é com relação a própria ocorrência do fato e não com relação ao
tempo de sua ocorrência. A morte, neste sentido, é sempre certa. O que não se sabe
é quando irá acontecer. Trata-se, portanto, de um termo incerto.
b) Futuridade
Acontecimento já ocorrido não pode caracterizar condição. A condição deve ser
futura. Ex.: prometo doar 10mil reais se meu bilhete de loteria for premiado.
As condições podem ser suspensivas ou resolutivas.
a) Condição suspensiva
Subordina a produção de efeitos (aquisição de direitos) à ocorrência de fato
futuro e incerto (art. 125, CC). Enquanto elas não se verificarem, não produz efeitos o
negócio jurídico.
Ex.: doarei um terreno a João se ele formar-se em Direito.
b) Condição resolutiva
Neste caso, enquanto não se realizar a condição vigorará o negócio jurídico.
Assim que se operar a condição ocorrerá a conclusão do negócio extinguindo-se o
direito (art. 127, CC).
Ex.: enquanto João cursar a faculdade de Direito poderá utilizar o valor dos
alugueis do imóvel X para custear suas despesas. Com a conclusão do curso,
extingue-se o direito de uso dos alugueis.
Art. 128. Sobrevindo a condição resolutiva, extingue-se, para todos os efeitos,
o direito a que ela se opõe; mas, se aposta a um negócio de execução
continuada ou periódica, a sua realização, salvo disposição em contrário, não
tem eficácia quanto aos atos já praticados, desde que compatíveis com a
natureza da condição pendente e conforme aos ditames de boa-fé.

O art. 128 refere-se a negócios continuados. Ex.: concedo o usufruto sobre


imóvel a João enquanto cursar Direito, beneficiando-se de toda a renda proveniente
da venda de gado até a colação de grau. Neste caso, se João tiver pactuado venda
119
de gado a terceiro e, neste meio tempo, tiver colado grau, a condição resolutiva não
prejudicará a venda já pactuada. Deverá ser concluída e João receberá o dinheiro do
pagamento.
As condições podem ser positivas (verificação de um fato – auferir renda até
colação de grau) ou negativas (inocorrência de um fato – empréstimo da casa até que
a enchente deixe de assolar sua cidade).
As condições devem ser lícitas, pois as ilícitas invalidam o negócio jurídico,
eivando-o de nulidade absoluta (art. 123, II e 166, VII, CC).
O art. 122, CC repudia as condições perplexas (incompreensíveis ou
contraditórias – são aquelas que privam de efeitos o negócio jurídico. Ex.: empresto o
imóvel, desde que você não more e não o alugue) e as puramente potestativas (são
as que derivam do arbítrio de uma das partes. Ex.: se eu quiser, caso seja do meu
interesse, etc).
No que diz respeito à possibilidade, as condições devem ser física e
juridicamente possíveis. São ilícitas as condições fisicamente impossíveis, que são
aquelas irrealizáveis, em razão de exigência de esforço sobrenatural. Ex.: dar a volta
no Beira Rio em 2 segundos (impossível! O Beira Rio é Giganteeeeee). Se a condição
fisicamente impossível tiver natureza suspensiva, invalida o negócio (nulidade
absoluta). Se tiver natureza resolutiva, será reputada inexistente. Também são ilícitas
as condições juridicamente impossíveis, pois contrariam o direito (ex.: doação
condicionada à alienação de bem de uso comum do povo – praça). Neste caso,
existindo uma condição dessa natureza, será inválido o negócio jurídico.

Termo
O termo é o “acontecimento futuro e certo que subordina o início ou o término da
eficácia jurídica de determinado ato negocial”14. As características, são, então, a
certeza e a futuridade.
O termo pode ser inicial ou final. Ex.: contrato de arrendamento que se inicia em
05 de janeiro de 2017. Trata-se do termo inicial da produção de efeitos do contrato.
Antes desta data, não produz efeitos. Ex.: arrendamento com término em 05 de janeiro
de 2017. Até esta data produz efeitos. A partir dela, não mais.

14GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral. v.1.
18.ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 489.
120
Mesmo quando se tem termo inicial, apesar da exigibilidade do negócio ser só a
partir da data acordada, já há a aquisição de direitos (art. 131, CC). A exigibilidade
está suspensa até a ocorrência do termo inicial, mas os direitos e deveres decorrentes
do ato são adquiridos de imediato. No exemplo do contrato de arrendamento, cujo
termo inicial é 05 de janeiro de 2017, desde logo estão as partes ligadas pelo vínculo
contratual. Contudo, a exigibilidade das obrigações definidas no contrato só serão
exigíveis a partir de 05 de janeiro de 2017. Mas, se o arrendatário, por exemplo, quiser
efetuar o pagamento pactuado antes desta data, não há impedimento. Contudo, o que
não pode é o arrendante/arrendador exigir tal pagamento antes do termo inicial
previsto.
O termo pode ser certo ou incerto. Será certo quando a data estiver estipulada
(05 de janeiro de 2017). Será incerto quando, apesar de ser certa a ocorrência, não
se puder precisar a data (quando João morrer).
O período de tempo entre o termo inicial e o final é denominado de prazo (art.
132, CC). O prazo é contado excluindo-se o dia do começo e incluindo-se o dia do
vencimento. Ex.: contrato de 30 dias15. Termo inicial: 24/08/2016. O prazo será =
23/08/2016.
Art. 132. Salvo disposição legal ou convencional em contrário, computam-se
os prazos, excluído o dia do começo, e incluído o do vencimento.
§ 1o Se o dia do vencimento cair em feriado, considerar-se-á prorrogado o
prazo até o seguinte dia útil.
§ 2o Meado considera-se, em qualquer mês, o seu décimo quinto dia.
§ 3o Os prazos de meses e anos expiram no dia de igual número do de início,
ou no imediato, se faltar exata correspondência.
§ 4o Os prazos fixados por hora contar-se-ão de minuto a minuto.

Quando no negócio jurídico não houver a fixação de prazo, entende-se exigíveis


de imediato (art. 134, CC).
O termo classifica-se em:
a) Convencional: fixado pelas partes.
b) Legal: determinado pela lei.
c) De graça: fixado por decisão judicial (prazo determinado pelo juiz para que
o devedor de boa-fé cumpra sua obrigação

15 A contagem de prazos processuais é diferente. Verificar art. 219, CPC/2015.


121
Modo ou encargo
O encargo é uma determinação acessória ao negócio jurídico principal, que
impõe um dever ou ônus ao beneficiário, que deverá cumpri-lo em prol de uma
liberalidade maior. Trata-se de uma espécie de restrição imposta ao beneficiário no
momento da liberalidade, ou um “peso atrelado a uma vantagem”16. Ex.: doação de
um terreno com o encargo de cuidar do doador.
O encargo não suspende a aquisição ou o exercício do direito, salvo se o
encargo for condição suspensiva (art. 136, CC).
Identifica-se o encargo pelas expressões “com a obrigação de”, “com o encargo
de”, “para que”.
Se o encargo não for cumprido, não há a invalidação do negócio jurídico. O que
ocorre é que poderá ser cobrado judicialmente este encargo ou, então, poderá ser
revogado o negócio, como no caso da doação (art. 562, CC) ou do legado (art. 1.938,
CC).
O encargo ilícito ou impossível é considerado como não escrito (art. 137, CC).
Ex.: doação que estabelecesse como encargo uma viagem turística a Saturno. Por
ser impossível o encargo, entende-se como não escrito. Contudo, se o encargo ilícito
ou impossível for motivo determinante da liberalidade, torna o negócio jurídico
inválido. Ex.: doação de um valioso imóvel com a condição de que o donatário utilize-
o para implantar nele uma casa de prostituição (encargo ilícito). Neste caso, inválido
todo o negócio jurídico.

11.5 Representação
A manifestação da vontade pode se dar por si próprio ou por representante. O
Código Civil disciplina a representação nos arts. 115 a 120. Assim, a manifestação da
vontade através da representação produz todos os efeitos.
Se o negócio jurídico é praticado por representação, quem o pratica é o
representante, que o faz em nome do representado.
Assim, representação é a atuação jurídica em nome de outra pessoa, que pode
ocorrer em razão da vontade ou da lei.

16GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral. v.1.
18.ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 493.
122
11.5.1 Espécies de representação
A representação pode ser legal (pais, tutores, curadores, administradores,
síndicos) ou convencional/voluntária (em razão de mandato).
a) Legal: trata-se de um múnus. O representante exerce uma atividade
obrigatória, determinada pela lei. Se institui em razão da necessidade de se
atribuir a alguém a função de cuidar dos interesses de pessoas incapazes.
Supre a falta de capacidade do representado. Tem caráter personalíssimo.
Não pode ser delegado seu exercício. Não pode ser revogada pelo
representado. Também pode ocorrer em caso de pessoas capazes:
sindicatos, para a celebração de acordos coletivos; síndico de condomínio;
inventariante, etc.
b) Voluntária: trata-se de uma espécie de cooperação, em que alguém nomeia
outrem como seu representante, a fim de atuar em seu nome. Se
perfectibiliza através de acordo de vontades, representado pela procuração,
que é instrumento do mandato – art. 653. Através dela, uma pessoa investe
outra de poderes para agir em seu nome. Pode ser revogada a qualquer
tempo pelo representado. A procuração deve ser feita por instrumento público
ou particular, assinado pelo mandante (art. 654).

11.5.2 Espécies de representantes


O representante deve ter capacidade de fato para praticar atos em nome do
representado. O maior de 16 anos pode ser mandatário, mas o mandante só pode
reclamar contra menor na medida do seu enriquecimento (art. 666, CC).
Representante legal é o que decorre da lei. Pais que administram os interesses
dos filhos menores de idade, por exemplo (art. 115, CC).
Representante judicial é o nomeado pelo juiz para representar no processo.
Ex.: inventariante.
Representante convencional é o que recebe mandato, com poderes para atuar
em nome de outrem. Ex.: advogado, procurador para compra e venda, etc.

11.5.3 Regras da representação


O mandato leva à substituição de uma pessoa por outra na realização de
negócios jurídicos. Nestes casos, o que for assumido pelo representante deve ser

123
cumprido pelo representado (arts. 116 e 675, CC). Ex.: se João outorgou procuração
para Carlos vender o imóvel “X” e este o fez, João deverá cumprir com o contrato de
compra e venda. Pode ocorrer, contudo, que, se o mandatário não observar as
instruções do mandante (quanto ao preço, por exemplo), o mandante terá direito a
ação cobrando as perdas e danos. Assim, o representante deve provar às pessoas
com quem contrata, sua qualidade e extensão de seus poderes, sob pena de
responder pelos atos que praticar excedendo tais poderes (art. 118, CC).
a) Os efeitos do negócio jurídico praticado pelo representante se produzem
entre o representado e a outra parte.
b) O representante é estranho ao negócio jurídico.
c) O representante deve assumir obrigações dentro dos limites permitidos pelo
mandato.
d) Quem deve cumprir com as obrigações é o representado (salvo se o
representante assumiu responsabilidades não autorizadas pelo mandato).
e) Se o representante praticou negócio em conflito de interesses com o
representado e o terceiro com quem negociou sabia de tal fato, há prazo de
180 dias para anulação do negócio (art. 119, CC). Se, contudo, estiver de
boa-fé o terceiro, não haverá anulação.

11.5.4 Autocontratação
Pode ocorrer situações em que o representante seja a outra parte no negócio
jurídico. A isto chama-se de autocontratação. Para que isto seja lícito e possível,
deverá haver a previsão no mandato desta cláusula (mandato em causa própria). Ex.:
“podendo alienar tal bem a terceiro ou a si próprio”.
Neste sentido, o art. 117, CC, determina que a autocontratação deve estar
prevista no instrumento de mandato.

11.6 Defeitos do negócio jurídico


A manifestação da vontade, nos negócios jurídicos deve ser livre e de boa-fé. Os
negócios jurídicos podem, contudo, sofrer com vícios de consentimento, ou seja,
aqueles que impedem que a vontade seja manifestada de forma pura e de boa fé.
Estes vícios atingem o segundo degrau da Escala Ponteana, ou seja, o plano da

124
validade, pois maculam a manifestação da vontade. E, ainda, com vícios sociais, que
são a simulação e a fraude contra credores.

Vícios de consentimento: erro, dolo, coação, lesão, estado de perigo.


Vícios sociais: simulação e fraude contra credores.

10.6.1 Erro ou ignorância


O erro é uma falsa representação da realidade. Trata-se de um engano fático,
ou uma falsa noção sobre a pessoa, objeto do negócio ou a um direito. Significa dizer
que o agente atua de modo que não seria sua vontade, se conhecesse a verdade.
Ex.: Homem que reconhece o filho da esposa, acreditando ser seu (se soubesse que
o filho não era seu, não o reconheceria).
Erro e ignorância são coisas distintas, mas levam à anulabilidade do negócio
jurídico.
Erro = ideia falsa da realidade.
Ignorância = total desconhecimento da realidade.
Para que o erro seja passível de anulação, deve ser essencial (substancial) e
escusável (perdoável).
Art. 138. São anuláveis os negócios jurídicos, quando as declarações de
vontade emanarem de erro substancial que poderia ser percebido por pessoa
de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio.

Essencial é o erro que incide sobre a essência ou substância do ato praticado.


Se tal erro não estivesse presente, o ato não seria realizado. Ex.: colecionador que,
pretendendo comprar uma peça de marfim, compra uma de material sintético.
Contudo, o enunciado 12 do CJF determina que:

Na sistemática do art. 138, é irrelevante ser ou não escusável o erro, porque


o dispositivo adota o princípio da confiança.

Neste aspecto, o art. 139, CC enumera as hipóteses de erro substancial:

Art. 139. O erro é substancial quando:


I - interessa à natureza do negócio, ao objeto principal da declaração, ou a
alguma das qualidades a ele essenciais;
II - concerne à identidade ou à qualidade essencial da pessoa a quem se
refira a declaração de vontade, desde que tenha influído nesta de modo
relevante;
III - sendo de direito e não implicando recusa à aplicação da lei, for o motivo
único ou principal do negócio jurídico.
125
Tanto no erro quanto na ignorância, a pessoa engana-se sozinha, de forma que
o erro pode incidir, então, sobre:
a) A natureza do negócio = art. 139, I, CC. Ocorre quando se troca a natureza
do negócio, trocando-se uma causa jurídica por outra. Ex.: comodato com
doação.
b) A identidade da pessoa = art. 139, II, CC. O que diz respeito a qualidade ou
características de determinada pessoa. Ex.: erro essencial sobre a pessoa
do outro cônjuge (arts. 1.556 e 1.557, CC).
c) A identidade do objeto = art. 139, I, CC. Quando se declara querer comprar
o cavalo “X” e acaba levando o cavalo “y”, sem querer.
d) A essência do objeto = art. 139, I, CC. Erro sobre as propriedades
essenciais do objeto. Erro quanto a qualidade. Ex.: compra um anel,
imaginando ser de ouro, não sabendo que se trata de cobre. Ex.: comprar
bijuteria ao invés de ouro. Ex.: comprar um modelo intermediário achando
tratar-se de um luxuoso.
Neste aspecto, no que diz respeito ao erro quanto a essência do objeto, tem-
se decisão do STJ que envolve a possibilidade de anulação de negócio
jurídico de compra e venda de veículo automotor onde a parte adquire carro
de modelo intermediário pensando tratar-se de modelo luxuoso.

Processo civil. Direito do consumidor. Aquisição de veículo automotor.


Alegação do consumidor de que comprou determinado modelo, pensando ser
o mais luxuoso, e de posterior constatação de que se tratava do modelo
intermediário. Ação proposta um ano após a aquisição. Decadência.
Desnecessidade de se aguardar o término do prazo de garantia. Alegado
inadimplemento do dever de informação, pelo vendedor, que se insere no
âmbito do contrato de compra e venda.
- O início da contagem do prazo de decadência para a reclamação de vícios
do produto (art. 26 do CDC) se dá após o encerramento da garantia
contratual. Precedentes.
- A postergação do início da contagem desse prazo, contudo, justifica-se pela
possibilidade, contratualmente estabelecida, de que seja sanado o defeito
apresentado durante a garantia.
- Na hipótese em que o consumidor não adquire bem propriamente
defeituoso, mas alega ter se enganado quanto ao objeto adquirido,
comprando o automóvel intermediário em vez do mais luxuoso, não há,
necessariamente, qualquer defeito a ser corrigido durante o prazo de
garantia. A decadência para pleitear a devolução da mercadoria, a troca do
produto ou o abatimento do preço, portanto, conta-se, sendo aparente a
diferença entre os modelos, da data da compra.
- A inversão do ônus da prova pressupõe hipossuficiência (técnica, jurídica
ou econômica) ou verossimilhança das alegações feitas pelo consumidor. Os
costumes comerciais indicam que a parte interessada na aquisição de um
126
automóvel de luxo costuma buscar, ao menos, as informações quanto aos
modelos existentes. A prática também indica que todos os modelos
disponíveis, notadamente os mais caros, sejam apresentados ao comprador.
Não há, portanto, verossimilhança na alegação de que a concessionária
omitiu do consumidor a informação sobre o modelo luxuoso. Também não há
hipossuficiência do consumidor uma vez que: (i) não é economicamente fraca
a parte que adquire automóvel de luxo; (ii) não há desequilíbrio técnico ou
jurídico se o comprador adquire o automóvel pelo convênio mantido entre a
montadora e Associação de Magistrados. Recurso especial conhecido e
improvido. (REsp 1021261/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA
TURMA, julgado em 20/04/2010, DJe 06/05/2010)

O erro deve, ainda, ser escusável, ou seja, perdoável, dentro do que se espera
do homem médio. Assim, não se admite erro daquele que agiu com acentuado grau
de displicência e negligência. Ex.: a compra de uma joia falsa, pelo homem médio, é
um erro escusável. Contudo, por um especialista, não é.
O Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul têm anulado negócios
jurídicos inquinados de vício de consentimento, no que diz respeito ao erro:

RESPONSABILIDADE CIVIL. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. INDENIZAÇÃO.


No caso, houve a contratação entre as partes mediante vício de
consentimento. Presente motivo para desfazer o negócio jurídico e conceder
o pedido de repetição simples do indébito. Ausente o dever de indenização
por danos morais, por não configurados na espécie. Sucumbência
modificada. Sentença reformada. Apelação provida em parte. (Apelação
Cível Nº 70069163442, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS,
Relator: Marcelo Cezar Muller, Julgado em 01/09/2016)

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO


DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÍVIDA. GOLPE DA LISTA
TELEFÔNICA. INEXISTÊNCIA DE CONTRATAÇÃO VÁLIDA. O funcionário
que efetivou a negociação não possuía autorização, para fins de celebração
desse tipo contratual; assim, a violação ocorreu, quanto à limitação de se
obrigar da pessoa jurídica, nos termos dos artigos 47, combinado com 104, I,
ambos do Código Civil, para fins de invalidar o presente contrato de prestação
de serviços. Ademais, nota-se a existência de inumeráveis situações afins
neste Tribunal (denominadas como "golpe da lista telefônica"), das quais se
depreende a verdadeira intenção da presente pretensão; nessa seara,
entende que a parte apelante veio a ser induzida ao erro, tendo em vista,
também, a inexistência de prova por parte da apelada, para fins de
demonstrar que a parte apelante se beneficiou pela contratação. DERAM
PROVIMENTO AO APELO. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70063180640,
Vigésima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Glênio José
Wasserstein Hekman, Julgado em 29/07/2015)

Trata-se de situação em que a parte foi induzida em erro, sendo-lhe apresentado


uma suposta atualização cadastral que, na verdade, era um contrato de prestação de
serviços telefônicos.
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO NEGATÓRIA DE PATERNIDADE. PRESUNÇÃO
PATER IS EST. VÍCIO DE CONSENTIMENTO ORIGINÁRIO. ERRO DO PAI
REGISTRAL. ROMPIMENTO DA RELAÇÃO AFETIVA APÓS A CIÊNCIA DA
127
AUSÊNCIA DE PATERNIDADE BIOLÓGICA. O reconhecimento do filho no
registro de nascimento é irrevogável, a teor do disposto no art. 1.609 do
Código Civil. A anulação do ato somente é admitida quando demonstrada a
existência de coação, erro, dolo, simulação ou fraude. Verificado que o pai
registral realizou o registro da criança porque acreditava ser o pai biológico,
deve ser reconhecido o vício de consentimento. A relação de afeto
estabelecida entre o apelante e apelado nos primeiros anos de vida está
consubstanciada no vício de consentimento originário e foi rompida após a
ciência da ausência de paternidade biológica, o que afasta o reconhecimento
da filiação socioafetiva. Precedente do STJ. Apelação desprovida. (Apelação
Cível Nº 70069259463, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS,
Relator: Jorge Luís Dall'Agnol, Julgado em 31/08/2016)

Também pode ocorrer nos casos de registro de nascimento, no qual o pai é


induzido a erro pela Mãe da criança e acaba registrando filho que não é seu.
Admite-se, ainda, o erro de direito, desde que não traduza oposição ou recusa
à aplicação da lei, o que não se confunde com ignorância da lei. Ex.: alguém que
contratou a importação de determinado produto, sem saber que foi, recentemente,
proibida por decreto a entrada de tal produto no país. Neste caso, deve-se admitir o
erro de direito e permitir a anulação do contrato.
O art. 140, CC trata do falso motivo, o que, em regra, não invalida o negócio.
Motivo é de ordem pessoal: bom preço, boa localização, presentear alguém. Assim
tem-se o exemplo do pai que compra veículo para presentear a filha que está de
aniversário. Contudo, ao chegar na data, o pai se dá conta de que, em verdade, é o
filho quem está de aniversário. Esse erro não é capaz de anular o negócio de compra
e venda do veículo.
Deve-se destacar que o erro deve ser substancial, pois o erro acidental não
pode ser objeto de anulabilidade do negócio jurídico. O erro, neste caso, pode ser
suprido pelas circunstâncias. Nestes casos, convalece o ato.

Art. 142. O erro de indicação da pessoa ou da coisa, a que se referir a


declaração de vontade, não viciará o negócio quando, por seu contexto e
pelas circunstâncias, se puder identificar a coisa ou pessoa cogitada.

Também é erro acidental convalidável, o caso de a pessoa a quem a


manifestação de vontade se dirige, se oferecer para executá-la de acordo com a
vontade real. Assim, toma-se como exemplo a pessoa que pensa ter comprado o lote
4, da quadra X, quando, em verdade, está comprando o lote 4, da quadra Y. Se o
vendedor vier a entregar-lhe o lote 4, da quadra X, não haverá invalidade do negócio
jurídico.

128
Art. 144. O erro não prejudica a validade do negócio jurídico quando a pessoa,
a quem a manifestação de vontade se dirige, se oferecer para executá-la na
conformidade da vontade real do manifestante.

Erro ≠ vício redibitório.


O erro atinge a vontade da pessoa, que se engana sozinha. O vício redibitório
atinge o objeto do contrato, onde a pessoa toma conhecimento do vício após a
celebração do negócio.

Erro Vício redibitório


Equivocada representação da realidade Atinge o objeto do negócio jurídico, ao
ou opinião não verdadeira sobre o passo que a coisa negociada é entregue,
negócio, objeto ou pessoa com quem se mas com algum vício ou defeito oculto
efetiva. que lhe diminua o valor.
Ex.: pretendia comprar o cavalo X, mas Ex.: comprou o cavalo X, mas, ao chegar
acabou, por erro de objeto, levando para em casa, verificou que o mesmo estava
casa o cavalo Y com a mão machucada gravemente.
Estão no plano da validade Estão no plano da eficácia

O prazo para buscar a anulação do negócio jurídico eivado de erro é de 4 nos,


a contar da celebração do negócio, nos termos do art. 178, II, CC.

11.6.2 Dolo
O dolo é erro provocado por terceiro e não pelo sujeito enganado. Trata-se de
um artifício malicioso pelo qual uma das partes, visando prejudicar o outro, induz-lhe
a celebração de negócio jurídico. Ex.: vender caneta de cobre como se fosse de ouro.
Neste caso, caberá anulação do negócio.
Trata-se de dolo essencial, onde “uma das partes do negócio utiliza artifícios
maliciosos, para levar a outra a praticar um ato que não praticaria normalmente,
visando a obter vantagem, geralmente com vistas ao enriquecimento sem causa”17. É
a arma do estelionatário.

17TARTUCE, Flávio. Direito civil: lei de introdução e parte geral. v.1. 12.ed. Rio de Janeiro: Forense,
2016, p. 391.
129
Este dolo é maligno, ou seja, visa enganar o outro. É diferente do dolus bonus,
onde alguém realça demais as vantagens e qualidades do produto, induzindo o outro
a contratar.
O dolo deve ser provado por quem alega, independendo de prova de efetivo
prejuízo para sua caracterização, ou seja, basta que indivíduo tenha sido induzido a
efetuar negócio jurídico.
APELAÇÃO CÍVEL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. AÇÃO
ANULATÓRIA DE NEGÓCIO JURÍDICO. DOLO. CONFIGURAÇÃO.
NEGOCIAÇÃO COM DUAS PESSOAS DIFERENTES, SOBRE O MESMO
IMÓVEL, MEDIANTE PROCURAÇÃO FALSA. O dolo é artifício malicioso
empregado com propósito de enganar a outra parte do negócio, existindo,
nesta hipótese de defeito do negócio jurídico, carga de má-fé, pois há indução
em erro. No caso concreto, configurou-se dolo do tipo malus e principal, nos
termos do art. 145 do Código Civil. Comprovado foi que os demandados
negociaram com o autor, mediante procuração falsa, porque o outorgante era
pessoa já falecida, imóvel que, aproximadamente um mês antes, já havia sido
negociado com terceira pessoa, também vítima do conluio engendrado pelos
demandados. Sentença mantida. RECURSO DESPROVIDO À
UNANIMIDADE. (Apelação Cível Nº 70065148561, Décima Sétima Câmara
Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Liege Puricelli Pires, Julgado em
26/11/2015)

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO


ANULATÓRIA DE NEGÓCIO JURÍDICO. DOLO. Alegação de que o réu agiu
com dolo ao propor ao autor que cedesse os créditos que possuía em ação
de complementação acionária. Prova de que o réu adquiriu os créditos
sabendo que seu valor era muito superior ao que foi pago e que não havia
risco de o autor ser vencido na demanda, enquanto a oferta era
evidentemente lesiva ao autor. Dolo reconhecido. Reconhecido o dolo, a
consequência é a anulação do negócio jurídico, como previsto no art. 145 do
CCB. Manutenção da verba honorária, fixada na sentença com base nos
critérios do art. 20, §§ 3º e 4º, CPC. APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação
Cível Nº 70059647180, Décima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça
do RS, Relator: Luiz Roberto Imperatore de Assis Brasil, Julgado em
24/09/2014)

Não é só o dolo do negociante que gera a anulabilidade. O dolo de terceiro


também tem o condão de anular o negócio jurídico. Nesse sentido, o art. 148, CC
prevê que:

Art. 148. Pode também ser anulado o negócio jurídico por dolo de terceiro, se
a parte a quem aproveite dele tivesse ou devesse ter conhecimento; em caso
contrário, ainda que subsista o negócio jurídico, o terceiro responderá por
todas as perdas e danos da parte a quem ludibriou.

Neste sentido, se o terceiro, a quem beneficia o negócio jurídico tinha


conhecimento, haverá dolo essencial e anulará o negócio. Não havendo
conhecimento, o dolo é acidental, respondendo, então, o terceiro, por perdas e danos
da parte a quem ludibriou.
130
No dolo de terceiro, se Tinha ciência... ... o negócio é anulável
a parte a quem aproveite Não tinha ciência... ... o negócio não é
dele anulável, mas o lesado
pode pedir perdas e
danos ao autor do dolo.

O art. 149, CC trata do dolo do representante da parte, de forma que o dolo do


representante legal obriga o representado a responder civilmente até a importância
do proveito que teve. Se o dolo for do representante convencional, caberá a ambos
(representante e representado) a obrigatoriedade de devolver aquilo que
indevidamente receberam e, ainda, responderão solidariamente por perdas e danos.
Se o representante atuou extrapolando os poderes do mandato, neste caso, a
responsabilidade será apenas sua.
Por fim, cabe classificar o dolo. Quanto à extensão, o dolo pode ser:
a) Principal – essencial, determinante ou causal – ataca a causa do negócio
em si. Invalida o negócio. O negócio, sem a presença do dolo, não seria
praticado.
b) Acidental – não invalida o negócio, mas só dá direito a eventual perdas e
danos a favor do prejudicado. Nestes casos, o negócio seria praticado do
mesmo jeito, havendo ou não a presença do dolo. Art. 146, CC. Ex.: os
promitentes compradores afirmam que a promitente compradora entrará na
posse do imóvel dentro de 30 dias, mesmo sabedores de que o atual inquilino
só desocupará o imóvel dentro de 60 dias.
Neste sentido, Tartuce18 traz o seguinte quadro comparativo:
DOLO – responsabilidade civil DOLO – vício do negócio
Não está relacionado com um Está relacionado com um negócio
negócio jurídico, não gerando jurídico, sendo a única causa da
qualquer anulabilidade. sua celebração (dolo essencial).
Se eventualmente atingir um Sendo o dolo essencial ao ato,
negócio, gera somente o dever de causará a sua anulabilidade, nos
pagar perdas e danos, devendo ser termos do art. 171, II, CC, desde
tratado como dolo acidental (art. que proposta ação no prazo de 4
146, CC). anos da celebração do negócio,
pelo interessado (art. 178, CC).
Plano da eficácia Plano da validade

18TARTUCE, Flávio. Direito civil: lei de introdução e parte geral. v.1. 12.ed. Rio de Janeiro: Forense,
2016, p. 392.
131
Quanto ao conteúdo, o dolo pode ser:
a) Dolus bonus (dolo bom) – é o dolo tolerável. Trata-se de exageros do
comerciante ou vendedor sobre o produto a ser vendido, mas sem a
finalidade de prejudicar o comprador. O negócio não é passível de anulação.
Ex.: compra e venda de um carro. Dizer que o carro é o melhor da categoria,
que faz 17 km/L, quando, em verdade, faz 13 a 14km/L. Todavia, se o
vendedor se utilizar de artifícios de má-fé para enganar o consumidor o dolo
se transforma em mau e poderá haver a anulação.
b) Dolus malus (dolo mau) – trata-se de ações malignas que visam enganar
ao consumidor, trazendo-lhe prejuízo. Ex.: compra e venda de veículo. Dizer
que o veículo nunca foi batido, quando sabe que foi. Dizer que o veículo faz
15km/L, quando faz, em verdade, 7km/L.

Quanto à conduta das partes, o dolo pode ser:


a) Dolo positivo (ou comissivo) – dolo praticado por ação. Ex.: publicidade
enganosa por ação. Vendo carro completo: ar condicionado, direção
hidráulica, pneus zero. Após a aquisição o comprador verifica que não tem ar
condicionado e os pneus estão carecas.
b) Dolo negativo (ou omissivo) – praticado por omissão. Ex.: venda de
apartamento decorado, em que não se revela ao comprador que os móveis
são feitos sob medida, induzindo-o a erro. Art. 147, CC. O prejudicado deve
provar que se soubesse não celebraria o negócio.
c) Dolo recíproco (ou bilateral) – ambas as partes agem dolosamente, um
tentando prejudicar o outro. Via de regra, há compensação dos dolos, não
havendo a anulação do negócio jurídico.
Art. 150. Se ambas as partes procederem com dolo, nenhuma pode alegá-lo
para anular o negócio, ou reclamar indenização.

11.6.3 Coação
A coação é uma pressão física ou moral exercida sobre o negociante, obrigando-
o a assumir uma obrigação que não quer.
Coator – quem coage
Coacto, coagido ou paciente – quem sofre a coação.

132
Segundo o art. 151, CC, para que a coação seja capaz de invalidar o negócio
jurídico, deverá ser relevante, fundada em temor de dano iminente e considerável ao
paciente, seus familiares ou seus bens.
Classifica-se a coação em:
a) Coação física – constrangimento corporal capaz de retirar totalmente o
consentimento da pessoa. Em razão disto, é causa de nulidade. Ex.: venda
celebrada a pessoa hipnotizada. São de pouca aplicabilidade prática!!!
b) Coação moral ou psicológica – esta é a mais utilizada. Quando alguém
obriga outrem a realizar negócio jurídico sob a ameaça fundada de dano a si
próprio, sua família ou seus bens. Gera a anulabilidade do ato. Art. 151, CC.

A análise da coação deve ocorrer caso a caso, pois a idade, sexo e condição do
paciente influencia na configuração ou não desde defeito do negócio jurídico. Art. 152,
CC.
RESPONSABILIDADE CIVIL. DOAÇÃO. COAÇÃO MORAL EXERCIDA POR
DISCURSO RELIGIOSO. AMEAÇA DE MAL INJUSTO. PROMESSA DE
GRAÇAS DIVINAS. CONDIÇAO PSIQUIÁTRICA PRÉ-EXISTENTE. DANO
MORAL CONFIGURADO. Trata-se de pedido de indenização por danos
materiais e morais cuja causa de pedir baseia-se na alegação de coação
moral exercida pela Igreja Universal do Reino de Deus contra um de seus
fiéis, aproveitando-se de sua fragilidade emocional e psicológica, sob ameaça
de mal injusto, que acabou resultando na doação de R$ 41.255,00. Desafio
do Estado, na figura do Poder Judiciário, de identificar quando condutas
individuais - praticadas no interior dos núcleos religiosos - se transformam em
efetiva violação de outras garantias jurídico-constitucionais. Proteção de
pessoas vulneráveis que decidem desfazer-se de seu patrimônio, ao arrepio
das restrições legais, acreditando na promessa de mal injusto e de bênçãos
sagradas. Incapacidade do autor demonstrada nos autos. APELAÇÃO CÍVEL
E RECURSO ADESIVO DESPROVIDOS. (Apelação Cível Nº 70067994970,
Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Túlio de Oliveira
Martins, Julgado em 05/05/2016)

APELAÇÃO CÍVEL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. AÇÃO


ANULATÓRIA. VÍCIO DE CONSENTIMENTO. COAÇÃO DEMONSTRADA.
CONTRATO ANULADO. Demonstrados os pressupostos do art. 151 do
Código Civil, impositivo o julgamento de procedência da demanda, com
anulação do contrato viciado. Hipótese em que restou suficientemente
demonstrado o fundado temor de mal resultante de ameaça grave sofrida
pela autora, grávida, ameaçada de morte por seu ex-cônjuge, para que
concedesse anuência a contrato de compra e venda do imóvel do casal.
Testemunhas que presenciaram o ato, comprovando, modo uníssono, a
ocorrência da ameaça e o fundado medo dela resultante. Contrato, ademais,
assinado na mesma data em que ocorreu a ameaça. Vicio de consentimento
demonstrado. Sentença reformada. RECURSO DE APELAÇÃO PROVIDO.
UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70017164583, Décima Oitava Câmara Cível,
Tribunal de Justiça do RS, Relator: Pedro Celso Dal Pra, Julgado em
14/12/2006)

133
O prazo para pleitear a anulação é de 4 aos, a contar de quando cessar a coação
(art. 178, I, CC).
O art. 154, CC prevê que a coação praticada por terceiro também gera a
anulabilidade do negócio jurídico, se o beneficiado pela coação dela tinha
conhecimento. Permanece válido, se o beneficiado não tinha conhecimento da coação
(art. 155, CC).
O art. 153, CC, por sua vez, prevê situações que não configuram coação:
Art. 153. Não se considera coação a ameaça do exercício normal de um
direito, nem o simples temor reverencial.

Assim, não constitui coação:


a) A ameaça relacionada com o exercício regular de um direito reconhecido.
Ex.: ameaça de protesto de um título em cartório.
b) Mero temor reverencial ou receio de desagradar de pessoa queria ou a quem
se deve obediência. Ex.: casar-se com alguém com medo de desapontar seu
pai.

11.6.4 Estado de perigo


O estado de perigo configura-se “quando o agente, diante de situação de perigo
conhecido pela outra parte, emite declaração de vontade para salvaguardar direito
seu, ou de pessoa próxima, assumindo obrigação excessivamente onerosa”19.
O negociante, temeroso por sua vida ou de alguém próximo a si, efetua o
negócio, mediante uma prestação exorbitante. Está presente, neste caso, a
onerosidade excessiva (elemento objetivo). Ex.: João tem sua família sequestrada.
De resgate, pedem o valor de R$10.000,00. Sabendo da situação, Carlos propõe-se
a comprar um valioso anel que João possui pelos R$10.000,00. Contudo, tal anel vale
R$50.000,00. Temeroso pela situação de sua família, João celebra o negócio.
Para que esteja presente o defeito, a outra parte deve ter conhecimento da
situação de risco que atinge o primeiro (elemento subjetivo).
Sendo assim, a coação é diferente do estado de perigo, pois:

19GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral. v.1.
18.ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 442.
134
ESTADO DE PERIGO = situação de perigo conhecida da outra parte
(elemento subjetivo) + onerosidade excessiva (elemento objetivo).

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS C/C REPETIÇÃO DO


INDÉBITO E ANULAÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO. CONSUMIDOR.
NEGATIVA DE COBERTURA DO PLANO DE SAÚDE. ASSINATURA DE
TERMO DE RESPONSABILIDADE PELO CONSUMIDOR JUNTO AO
HOSPITAL. COBRANÇA DE MATERIAIS UTILIZADOS EM
PROCEDIMENTO CIRÚRGICO. COBRANÇA LEGÍTIMA. NULIDADE DO
TERMO AFASTADA. RESPONSABILIDADE DA OPERADORA DO PLANO
DE SAÚDE PELAS DESPESAS. DEVOLUÇÃO DO VALOR PELO PLANO
DE SAÚDE, DE FORMA SIMPLES. DANOS MORAIS NÃO
CONFIGURADOS. PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE FUNDAMENTO DAS
RAZÕES RECURSAIS AFASTADA. SENTENÇA PARCIALMENTE
REFORMADA. As razões recursais possuem estreita relação com a decisão
impugnada, possibilitando revolver toda a matéria nesta instâcia recursal.
Inaplicabilidade do art. 514, II, do CPC. Preliminar de razões dissociadas que
vai afastada. A cobrança realizada pelo hospital demandado mostra-se lícita,
uma vez que inconteste nos autos que houve a utilização dos materiais pelo
paciente e que a operadora do plano de saúde negou a cobertura. Não restou
configurado o vício de vontade da autora pelo estado de perigo, já que
ausente a onerosidade excessiva na cobrança realizada pelo prestador dos
serviços de saúde. Inteligência do art. 156 do Código Civil. Validade do
contrato de prestação de serviços e do termo de compromisso. Devida a
repetição do indébito, mas na forma simples, pois a dívida era devida e não
foi demonstrada a má-fé. Interpretação do art. 42 do CDC. Cabia à segunda
requerida (Unimed) comprovar que o contrato entabulado entre as partes
previa, expressamente, a exclusão de cobertura dos materiais indicados pelo
médico responsável pelo procedimento cirúrgico a que foi submetido o
consumidor. Aplicação do art. 6º, III, do CDC. Inteligência do art. 333, I, do
CPC e do princípio da carga dinâmica da prova. Omisso o contrato, ele deve
ser interpretado da maneira mais favorável ao consumidor. Com isso, há
responsabilização da segunda requerida pela cobertura total das despesas
cobradas pelo hospital demandado. Ausente agir ilícito do hospital, não há
que se falar em danos morais. Quanto à operadora do plano de saúde, a
cobrança gerada pela negativa de cobertura configura descumprimento
contratual, que somente em casos excepcionais autoriza a fixação de
indenização por abalo extrapatrimonial. Parcela indevida no caso concreto.
RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (Recurso Cível Nº 71004849253,
Segunda Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Ana Cláudia
Cachapuz Silva Raabe, Julgado em 09/04/2014)

Trata-se de ato anulável (art. 171, II + art. 178, II, CC), que pode ser pleiteada
em 4 anos a contar da celebração.
O negócio jurídico pode ser mantido, no caso do estado de perigo, desde que
possa ser revisado pelo juiz. Art. 156 + art. 157, CC. É o que dispõe o enunciado 148
do CJF/STJ (Conselho da Justiça Federal e Superior Tribunal de Justiça): “Ao ‘estado
de perigo’ (art. 156) aplica-se, por analogia, o disposto no § 2.º do art. 157”.

135
11.6.5 Lesão
A lesão está prevista no art. 157 e pode ser conceituada como sendo “o prejuízo
resultante da desproporção existente entre as prestações de um determinado negócio
jurídico, em face do abuso da inexperiência, necessidade econômica ou leviandade
de um dos declarantes”.
Art. 157. Ocorre a lesão quando uma pessoa, sob premente necessidade, ou
por inexperiência, se obriga a prestação manifestamente desproporcional ao
valor da prestação oposta.
§ 1o Aprecia-se a desproporção das prestações segundo os valores vigentes
ao tempo em que foi celebrado o negócio jurídico.
§ 2o Não se decretará a anulação do negócio, se for oferecido suplemento
suficiente, ou se a parte favorecida concordar com a redução do proveito.

Sendo assim, lesão é:


LESÃO = premente necessidade ou inexperiência (elemento subjetivo) +
onerosidade excessiva (elemento objetivo).

APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. AÇÃO EXECUTIVA.


COBRANÇA DE HONORÁRIOS CONTRATUAIS. Contrato de prestação de
serviços de advogado. Pacto de pagamento quota litis. Reconhecida a
incidência do artigo 157, caput e parágrafo 2º., do Código Civil. Lesão a
contratante inexperiente que se obrigou a prestação manifestamente
desproporcional ao valor da prestação. Cobrança do equivalente a 50% do
valor do êxito. Pensionamento do INSS. Crédito de natureza alimentar. Artigo
100, parágrafo 1º., da Constituição Federal. Revisão de cláusula. Redução
do valor devido. Redimensionamento da sucumbência. APELAÇÃO
PROVIDA. (Apelação Cível Nº 70047946520, Décima Sexta Câmara Cível,
Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ana Maria Nedel Scalzilli, Julgado em
30/07/2015)

a) Necessidade premente = precisar de algo, que leva a inevitável celebração


do negócio prejudicial (aquisição da casa própria x financiamento habitacional,
necessidade de dinheiro x financiamento bancário, etc).
b) Inexperiência = pode ser econômica, financeira, política, social ou técnica, no
momento da intepretação, constituindo a hipossuficiência do consumidor.
Neste aspecto o enunciado 410, CJF/STJ: A inexperiência a que se refere o
art. 157 não deve necessariamente significar imaturidade ou desconhecimento
em relação à prática de negócios jurídicos em geral, podendo ocorrer também
quando o lesado, ainda que estipule contratos costumeiramente, não tenha
conhecimento específico sobre o negócio em causa.

136
Destaca-se, ainda, que a base estrutural do vício é o fato de que essa
onerosidade excessiva atinge a vontade, enquanto elemento subjetivo.
Segundo o § 2.º do art. 157, não haverá anulação do negócio se as partes
fizerem acerto e houver um aumento da prestação ou diminuição do preço, conforme
o caso de onerosidade excessiva.

11.6.6 Fraude contra credores


Fraude contra credores é um vício social que se configura na “atuação maliciosa
do devedor, em estado de insolvência ou na iminência de assim tornar-se, ou dispõe
de maneira gratuita ou onerosa o seu patrimônio, para afastar a possibilidade de
responderem os seus bens por obrigações assumidas em momento anterior à
transmissão”20.
Exemplo: João, na iminência do vencimento de uma dívida que não terá
condições de pagar, vende a Maria imóvel de seu patrimônio. Maria sabe deste estado
de insolvência.
Configura-se, assim, o vício social que pode levar à anulação do negócio jurídico
(art. 158, CC), desde que proposta ação anulatória, pelo credor, no prazo de 4 anos a
contar da celebração do negócio fraudulento (art. 178, II, CC). Esta ação é
denominada de ação revocatória ou ação pauliana. Somente os credores que já o
eram no momento da disposição fraudulenta terão legitimidade para propor a ação
pauliana (art. 158, § 2.º, CC). No polo passivo devem figurar o devedor fraudulento e
o terceiro que haja atuado de má-fé (art. 161, CC).
Os fundamentos da ação pauliana são:
a) Negócios de transmissão gratuita de bens – art. 158, CC (doação);
b) Remissão de dívidas – art. 158, CC (devedor insolvente perdoa dívida de
terceiro);
c) Contratos onerosos do devedor insolvente:
a. Quando a insolvência for notória
b. Quando houver motivo para ser conhecida do outro contratante (a
pessoa que adquire o bem do devedor é um parente próximo, que
deveria presumir o seu estado de insolvência);

20TARTUCE, Flávio. Direito civil: lei de introdução e parte geral. v.1. 12.ed. Rio de Janeiro: Forense,
2016, p. 406.
137
d) Antecipação de pagamento feita a um dos credores em detrimento dos
demais – art. 162, CC (neste caso, a ação é proposta também contra o
beneficiário do pagamento da dívida não vencida, que deverá repor aquilo
que recebeu);
e) Outorga de garantia de dívida dada a um dos credores, em detrimento dos
demais – art. 163, CC (presunção de fraude. Caso da constituição de
hipoteca sobre bem do devedor insolvente, em benefício de um dos
credores).
Anulado o negócio fraudulento, a vantagem resultante reverterá em proveito do
acervo sobre que se tenha de efetuar o concurso de credores (art. 165, CC).
Art. 165. Anulados os negócios fraudulentos, a vantagem resultante reverterá
em proveito do acervo sobre que se tenha de efetuar o concurso de credores.
Parágrafo único. Se esses negócios tinham por único objeto atribuir direitos
preferenciais, mediante hipoteca, penhor ou anticrese, sua invalidade
importará somente na anulação da preferência ajustada.

Na fraude contra credores há um elemento objetivo, ou seja, a atuação


prejudicial do devedor e de terceiro, bem como um elemento subjetivo, ou seja, a
vontade, a intenção de prejudicar os credores.
FRAUDE CONTRA CREDORES = intenção de prejudicar credores (elemento
subjetivo) + atuação em prejuízo aos credores (elemento objetivo).

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO.


AÇÃO ANULATÓRIA DE NEGÓCIO JURÍDICO. LEGITIMIDADE PASSIVA
DA EMPRESA DEMANDADA. EVIDÊNCIAS DE FRAUDE E SIMULAÇÃO
DE NEGÓCIO JURÍDICO COM A FINALIDADE DE DIMINUIR O
PATRIMÔNIO DA SOCIEDADE. A legitimidade passiva da agravante é
latente e independe da discussão sobre a transferência de cotas dos sócios,
vem resguardada pelos supostos negócios simulados pelas empresas, o que
implica na diminuição do patrimônio e, consequentemente, no quinhão que a
autora tem direito, hipótese que deverá ser averiguada no mérito da ação
anulatória. PERÍCIA CONTÁBIL. PERTINÊNCIA. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO
À EMPRESA DEMANDADA. Considerando que o juiz é o destinatário da
prova, cabendo a ele decidir sobre a pertinência destas, a realização do
exame em nada prejudicará a parte agravante, além de propiciar maior
substrato probatório para o julgador, especialmente no que tange à situação
financeira da empresa antes e depois do divórcio dos envolvidos. À
UNANIMIDADE, NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. (Agravo de
Instrumento Nº 70057153017, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do
RS, Relator: Luís Augusto Coelho Braga, Julgado em 07/04/2016)

Para que possa haver a anulação, deve haver a colusão, ou seja, atuação
fraudulenta entre aquele que dispõe do bem e quem adquire, além do prejuízo
causado ao credor. Não havendo tais requisitos, não há que se falar em anulação.
138
Quando houver disposição gratuita de bens ou remissão de dívidas, há a
dispensa do elemento subjetivo (art. 158, CC). Assim:

Disposição onerosa de bens com Conluio fraudulento + evento danoso


intuito de fraude
Disposição gratuita de bens ou Basta o evento danoso
remissão de dívida

Deve-se destacar que a fraude contra credores é diferente da fraude à execução.


A fraude à execução está prevista no art. 792, CPC/2015:

Art. 792. A alienação ou a oneração de bem é considerada fraude à


execução:
I - quando sobre o bem pender ação fundada em direito real ou com pretensão
reipersecutória, desde que a pendência do processo tenha sido averbada no
respectivo registro público, se houver;
II - quando tiver sido averbada, no registro do bem, a pendência do processo
de execução, na forma do art. 828;
III - quando tiver sido averbado, no registro do bem, hipoteca judiciária ou
outro ato de constrição judicial originário do processo onde foi arguida a
fraude;
IV - quando, ao tempo da alienação ou da oneração, tramitava contra o
devedor ação capaz de reduzi-lo à insolvência;
V - nos demais casos expressos em lei.
§ 1o A alienação em fraude à execução é ineficaz em relação ao exequente.
§ 2o No caso de aquisição de bem não sujeito a registro, o terceiro adquirente
tem o ônus de provar que adotou as cautelas necessárias para a aquisição,
mediante a exibição das certidões pertinentes, obtidas no domicílio do
vendedor e no local onde se encontra o bem.
§ 3o Nos casos de desconsideração da personalidade jurídica, a fraude à
execução verifica-se a partir da citação da parte cuja personalidade se
pretende desconsiderar.
§ 4o Antes de declarar a fraude à execução, o juiz deverá intimar o terceiro
adquirente, que, se quiser, poderá opor embargos de terceiro, no prazo de 15
(quinze) dias.

O momento de ocorrência de ambas é diferente. Na fraude contra credores o


devedor aliena bens antecipadamente, em detrimento de seus credores, antes que
estes ingressem com qualquer ação. Na fraude à execução já há ação e, neste caso,
o devedor atua fraudulentamente e aliena bens, fraudando os credores e a execução.
Embora fale-se em fraude à execução, deve-se destacar que o ato ilícito ocorre
mesmo quando a alienação de patrimônio ocorre após ajuizamento e citação de ação
ordinária que visa gerar o título executivo judicial.

139
FRAUDE À EXECUÇÃO FRAUDE A CREDORES
Instituto de direito processual Instituto de direito material
O executado já citado em ação de execução O devedor tem várias obrigações
ou condenatória aliena bens. Ainda, aliena assumidas perante credores e aliena
bem constrito, com o registro da demanda ou de forma gratuita ou onerosa seus
de hipoteca judiciária na matrícula do imóvel, bens, visando prejudicar tais
nos termos do art. 792, CPC/2015. credores.
Má-fé presumida Ônus da prova do credor
Interesse do credor e do Estado, sendo Interesse somente do credor, como
considerados atos atentatórios à dignidade particular prejudicado
da Justiça (art. 774, I, CPC/2015)
Atos declarados ineficazes Atos anuláveis
Declarável incidentalmente Objeto de ação anulatória, autônoma
e específica
Tipifica ilícito penal (CP, art. 179) Interesse puramente particular

11.6.7 Simulação
Simulação é uma declaração enganosa, que visa produzir efeito diverso daquele
indicado. Segundo Gagliano e Pamplona Filho21, “na simulação celebra-se um
negócio jurídico que tem aparência normal, mas que, na verdade, não pretende atingir
o efeito que juridicamente deveria produzir”.
Não é vício de vontade, mas sim um vício social.
Na simulação há um desacordo entre a vontade declarada e a vontade interna,
ou seja, uma discrepância entre a vontade real e a declarada, entre a essência e a
aparência. As duas partes negociantes estão mancomunadas e objetivam iludir a
terceiros.
A simulação pode ser:
a) Absoluta: o negócio forma-se a partir de uma declaração de vontade ou
confissão de dívidas emitida para não gerar efeito jurídico algum. É criada
uma situação jurídica irreal, lesiva ao interesse de terceiro.

21GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral. v.1.
18.ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 445.
140
Ex.: para livrar bens da partilha imposta pelo regime, um dos cônjuge simula
negócio com amigo, contraindo falsa dívida, visando transferir bens para
efetivar o pagamento e prejudicar o outro cônjuge.
Neste caso, o negócio foi praticado para não produzir qualquer efeito. É,
portanto, uma simulação.
b) Relativa: também chamada de dissimulação. Há uma emissão de declaração
volitiva ou confissão falsa visando encobrir ato de natureza diversa, cujos
efeitos são proibidos por lei. Também ocorre quando a declaração de vontade
é emitida aparentando conferir direitos a uma pessoa, mas transferindo-os,
em verdade, para terceiro, não integrante da relação jurídica. Aqui, diferente
da simulação absoluta, as partes pretendem atingir o resultado ou efeitos
jurídicos concretos, embora vedados por lei.
Ex.: homem casado que pretende doar bem à concubina. Como a lei veda
essa doação, o homem simula uma compra e venda que, em seu bojo,
encobre o ato que efetivamente se quer praticar: doação de bem à concubina.
Ex.: na mesma situação, o homem transfere a um terceiro o bem, que, em
seguida, doa o mesmo à concubina do homem casado.
Ex.: quando as partes de um negócio pós-datam ou antedatam documento,
objetivando situá-lo cronologicamente em período de tempo diverso do qual
realmente foi celebrado.

A simulação gera a nulidade do negócio praticado. Sendo simulação absoluta, é


nulo todo o ato. Caso seja simulação relativa, será nulo o negócio, mas subsistirá o
que se dissimulou se for válido na substância e na forma.
Ex.: um proprietário cede um imóvel a outrem celebrando contrato de comodato.
Contudo, por detrás dos panos é cobrado aluguel. O comodato, neste caso é inválido,
mas a locação é válida, desde que não ofenda a lei ou direitos de terceiros.
Ex.: alguém que faz contrato de prestação de serviços pelo CC. Contudo, estão
previstos todos os requisitos de contrato de trabalho regido pela CLT. Neste caso,
será nulo o contrato de prestação de servidos, mas válido o contrato regido pela CLT.
É o que prevê o art. 167, CC:

Art. 167. É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se


dissimulou, se válido for na substância e na forma.

141
A alegação da simulação pode ser feita por terceiro, alheio ao negócio e,
também, pelos próprios negociantes, um contra o outro. Neste aspecto o enunciado
294, CJF/STJ: “Sendo a simulação uma causa de nulidade do negócio jurídico, pode
ser alegada por uma das partes contra a outra”. Não há necessidade de ação
específica para a nulidade do negócio simulado. Pode haver o reconhecimento
incidental e de ofício pelo juiz em demanda que tenha outro objeto.
A simulação pode ocorrer em três hipóteses, previstas no art. 167, § 1.º, CC.
Trata-se de rol exemplificativo, podendo ocorrer outros casos de simulação, sempre
que houver uma disparidade entre a vontade manifestada e a oculta.
a) De negócios jurídicos que visem conferir ou transmitir direitos a pessoas
diversas daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem
(simulação subjetiva);
b) De negócios jurídicos que contiverem declaração, confissão, condição ou
cláusula não verdadeira (simulação objetiva);
c) De negócios jurídicos cujos instrumentos particulares forem antedatados, ou
pós-datados (simulação objetiva).

É inoponível a terceiros de boa-fé os negócios jurídicos simulados.


§ 2º Ressalvam-se os direitos de terceiros de boa-fé em face dos contraentes
do negócio jurídico simulado.

Para encerrar, deve-se considerar a questão da reserva mental, que está


prevista no art. 110, CC e quando ilícita e conhecida do destinatário é vício social
capaz de gerar a nulidade do negócio jurídico. A reserva mental constitui-se de
situações em que um dos declarantes oculta sua verdadeira intenção, ou seja, quando
não quer um efeito jurídico que declara querer. Trata-se de uma enganação ao outro
contratante. Se o outro negociante souber da reserva mental, o negócio é nulo. Se o
outro declarante, no entanto, não souber da reserva, o ato subsiste e produz efeitos
que o declarante não desejava.
- se a outra parte não tem conhecimento da reserva mental ➔ negócio válido.
- se a outra parte sabe da reserva metal ➔ negócio nulo, pois similar à simulação.
Exemplos de reserva mental:
a) Declaração de uma obra literária que anuncia que o produto da venda de
seus livros será destinado a uma instituição de caridade, quando, em

142
verdade, não pretende nada dito. Seu único objetivo é aumentar a venda dos
livros. Caso os compradores tenham conhecimento da reserva, a venda pode
ser nulificada.
b) Declaração do testador que, com o objetivo de prejudicar herdeiro, faz
disposição em benefício de quem se diz devedor, o que não é verdade.
c) Homem que, visando relação sexual com uma mulher, promete toma-la como
esposa.

11.7 Invalidade do negócio jurídico


A expressão invalidade é utilizada para definir o negócio que não produz os
efeitos desejados pelas partes envolvidas. A invalidade do negócio jurídico abrange:
a) a inexistência do negócio; b) a nulidade absoluta (negócio nulo); a nulidade relativa
ou anulabilidade (negócio anulável).
O art. 183, CC prevê que a invalidade do instrumento não induz a invalidade do
negócio jurídico celebrado, desde que possa ser provada a celebração do mesmo por
outra forma. Ex.: contrato preliminar não pode ser anulado, se puder ser provado pelas
testemunhas (a forma é dispensada nos contratos preliminares – art. 462, CC).
Além disto, a invalidação de parte de um negócio jurídico não impede a validade
da outra parte, se esta for separável (art. 184, CC). Ocorrerá, neste caso, a redução
do negócio jurídico para a parte válida. Ex.: negócio jurídico cuja multa ou cláusula
penal tenha sido celebrada com lesão (art. 157, CC). Neste caso, somente a multa é
anulável, permanecendo o restante como válido.

11.8 Inexistência do negócio jurídico


Negócio inexistente é aquele que não produz efeitos porque lhe faltam requisitos
mínimos, no plano da existência, ou seja, partes, vontade, objeto e forma.
Não há, nestes casos, necessidade de uma declaração judicial, pois o ato
inexistente é um nada jurídico. Eventualmente, pode ser necessária a propositura de
uma ação para a declaração de inexistência de um negócio celebrado (ex., um
casamento). Nestes casos, aplicam-se as regras previstas para a nulidade absoluta.

143
11.9 Nulidade
Nulidade é a sanção imposta pela lei aos negócios jurídicos, através da privação
de efeitos jurídicos, em razão de desobediência à prescrição da norma jurídica. Trata-
se da consequência imposta aos negócios jurídicos quando não estiverem
preenchidos os requisitos básicos para a existência válida do negócio.
A nulidade pode ser: absoluta (trata-se da nulidade propriamente dita) ou
relativa (trata-se das questões de anulabilidade do negócio). Neste tópico será tratada
a nulidade absoluta. A nulidade relativa será abordada em tópico próprio.
Na nulidade, o negócio não produz efeitos pois faltam a ele os requisitos de
validade previstos no art. 104, CC. Há uma ofensa às normas de ordem pública, sendo
o negócio absolutamente inválido.
O art. 166, CC estabelece as hipóteses de nulidade:
a) Negócio celebrado por absolutamente incapaz, sem representação (art. 3.º,
CC);
b) Objeto ilícito, impossível, indeterminado ou indeterminável.
c) Motivo determinante do negócio for ilícito (intenção das partes). O objeto em
si não é ilícito, mas houve conluio entre as partes para alcançar fim ilegítimo
ou criminoso (ex.: venda de automóvel para utilizar num sequestro; aluguel
de casa para abertura de uma casa de prostituição – a venda e o aluguel não
são ilícitos, mas o motivo determinante dela sim).
d) Quando o negócio não obedecer a forma prevista na lei ou alguma solenidade
exigida não for obedecida (incisos IV e V). Ex.: compra e venda de imóvel de
valor superior a 30 salários mínimos celebrado por escritura particular (art.
108, CC) (salário de 880,00 = R$26.400,00).
e) Negócio que tiver como objetivo fraudar a lei imperativa. Ex.: retrovenda cujo
objetivo é dar aparência de legalidade a um contrato de mútuo em que foram
cobrados juros abusivos. “Trata-se de manobra engendrada pelo fraudador
para violar dispositivo expresso de lei, objetivando esquivar-se de obrigação
legal ou obter proveito ilícito. As legislações fiscal e trabalhista
costumeiramente são atingidas por esta espécie de fraude, realizada sob
diferentes formas”22.

22GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral. v.1.
18.ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 463.
144
f) Quando a lei expressamente o declarar nulo ou proibir a prática, sem cominar
sanção. Ex.: vedação de doação de todos os bens sem reserva de mínimo
para sobrevivência do doador (art. 548, CC). Ex.: é nulo o contrato que tenha
por objeto herança de pessoa viva.
Além dessas hipóteses, também é nulo o negócio simulado, subsistindo, apenas
o que se dissimulou (art. 167, CC).
Também é nulo o negócio jurídico viciado em razão de coação física, em razão
da ausência de vontade livre e de boa-fé.

Procedimento da nulidade: para a declaração da nulidade, necessária a


proposição de ação declaratória de nulidade. Esta ação é imprescritível, por envolver
preceitos de ordem pública (art. 169, CC).

Efeitos da nulidade: em razão de envolverem preceitos de ordem pública e


interesse de todos, podem ser alegadas por qualquer interessado ou pelo Ministério
Público (quando lhe couber intervir) (art. 168, CC).
As nulidades devem ser pronunciados pelo juiz, quando conhecer do negócio ou
de seus efeitos – declarada de ofício (art. 168, § único).
O art. 169, CC prevê que a nulidade não pode ser confirmada pelas partes, nem
convalesce em razão do decurso do tempo (imprescritibilidade da ação declaratória
de nulidade).
Via de regra, a nulidade liquida totalmente o negócio jurídico. Contudo, prevê o
art. 170, CC que, se o negócio jurídico contiver requisitos de outro, subsiste o negócio
quando o fim a que visavam as partes permitir supor que teriam querido este outro
negócio se soubessem da nulidade. Assim, poderá o juiz fazer a conversão a este
novo negócio, sem decretar a nulidade. Ex.: compra e venda de imóvel de valor
superior a 30 salários mínimos celebrado por escritura particular. É nulo o negócio.
Contudo, pode ser convertido em compromisso de compra e venda (que pode ser feito
por escrito particular). Para que isto ocorra, o negócio nulo deve conter todos os
requisitos do negócio a ser convertido.
A sentença que declara a nulidade tem efeitos erga omnes (contra todos). Os
efeitos declaratórios têm efeitos ex tunc, ou seja, retroagem ao momento da
celebração do negócio. Contudo, os interesses de terceiros de boa-fé devem ser

145
preservados. Neste sentido, o enunciado 537, CFJ/STJ, determina: “A previsão
contida no art. 169 não impossibilita que, excepcionalmente, negócios jurídicos nulos
produzam efeitos a serem reservados quando justificados por interesses merecedores
de tutela”. Ex.: casamento entre irmãos. Produz todos os efeitos até a declaração de
nulidade. Os efeitos retroagem à data da celebração, sendo o casamento considerado
como se jamais tivesse existido. Contudo, os efeitos são aproveitados às partes que
estiverem de boa-fé.

11.10 Anulabilidade
A nulidade relativa ou anulabilidade envolve preceitos de ordem privada, de
interesse das partes.
As hipóteses de anulabilidade constam no art. 171, CC:
a) Negócio celebrado por relativamente incapaz, sem a devida assistência (art.
4.º, CC);
b) Existência de vício no negócio jurídico: erro, dolo, coação moral ou
psicológica, lesão, estado de perigo ou fraude a credores.
c) Casos especificados pela lei como de anulabilidade. Ex.: venda de imóvel
exige outorga conjugal (art. 1.647 e 1.649). Se não houver tal outorga, o
negócio jurídico celebrado é anulável.

Procedimento da anulabilidade: Para que um negócio seja anulado, deve


haver a propositura de ação anulatória. Esta ação tem natureza constitutiva negativa,
o que significa dizer que possui prazos decadenciais, os quais estão previstos nos
arts. 178 e 179, CC:

Art. 178. É de quatro anos o prazo de decadência para pleitear-se a anulação


do negócio jurídico, contado:
I - no caso de coação, do dia em que ela cessar;
II - no de erro, dolo, fraude contra credores, estado de perigo ou lesão, do dia
em que se realizou o negócio jurídico;
III - no de atos de incapazes, do dia em que cessar a incapacidade.
Art. 179. Quando a lei dispuser que determinado ato é anulável, sem
estabelecer prazo para pleitear-se a anulação, será este de dois anos, a
contar da data da conclusão do ato.

No caso da coação, o prazo de 4 anos inicia do momento em que cessa a


coação.

146
Nas situações de erro, dolo, fraude a credores, estado de perigo ou lesão, o
prazo de 4 anos inicia da celebração do negócio jurídico.
Nos atos praticados por incapazes, os 4 anos iniciam no momento em que cessar
a incapacidade.
Quando não houver prazo especificado na legislação, o prazo para pleitear a
anulação é de 2 anos, a contar da conclusão do negócio.
Estes prazos, previstos nos arts. 178 e 179 valem para as partes celebrantes.
Quanto a terceiros interessados (ou prejudicados) com o negócio celebrado, a
contagem do prazo inicia-se da sua ciência. É a previsão do enunciado 538, CJF/STJ:
“No que diz respeito a terceiros eventualmente prejudicados, o prazo decadencial de
que trata o art. 179 do Código Civil não se conta da celebração do negócio jurídico,
mas da ciência que dele tiveram”.
Neste sentido a decisão do STJ:

Direito civil. Agravo no recurso especial. Ação pauliana. Prazo Decadencial.


Termo inicial. Registro Imobiliário. - A decadência é causa extintiva de direito
pelo seu não exercício no prazo estipulado em lei, cujo termo inicial deve
coincidir com o conhecimento do fato gerador do direito a ser pleiteado. - O
termo inicial do prazo decadencial de quatro anos para propositura da ação
pauliana é o da data do registro do título aquisitivo no Cartório Imobiliário,
ocasião em que o ato registrado passa a ter validade contra terceiros.
Precedentes. Agravo no recurso especial não provido. (AgRg no REsp
743.890/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado
em 20/09/2005, DJ 03/10/2005, p. 250)

Direito civil. Agravo no recurso especial. Ação pauliana. Prazo Decadencial.


Termo inicial. Registro Imobiliário. - A decadência é causa extintiva de direito
pelo seu não exercício no prazo estipulado em lei, cujo termo inicial deve
coincidir com o conhecimento do fato gerador do direito a ser pleiteado. - O
termo inicial do prazo decadencial de quatro anos para propositura da ação
pauliana é o da data do registro do título aquisitivo no Cartório Imobiliário,
ocasião em que o ato registrado passa a ter validade contra terceiros.
Precedentes. Agravo no recurso especial não provido. (AgRg no REsp
743.890/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado
em 20/09/2005, DJ 03/10/2005, p. 250)

Efeitos da anulabilidade: A anulabilidade não pode ser reconhecida de ofício


pelo juiz. Deve ser alegada pelo interessado, através da ação de anulação (arts 177
e 178, CC). Também não cabe ao Ministério Público propor a ação.
O art. 172, CC prevê que o negócio jurídico anulável pode ser confirmado
(convalidado) pelas partes, salvo o direito de terceiro. Trata-se da valorização a boa-
fé. A convalidação deve conter uma confirmação expressa do negócio jurídico, com
manifestação expressa da vontade (art. 173, CC). Se o negócio já tiver sido cumprido
147
em parte pelo devedor, mesmo ciente do vício, há a dispensa da convalidação
expressa (art. 174, CC). Neste caso, trata-se de uma convalidação tácita. O art. 175,
CC prevê que uma vez tendo sido confirmado o negócio, não há mais como revogar
o negócio, não cabendo qualquer requerimento de anulação posterior.
O art. 176, CC prevê que: “quando a anulabilidade do ato resultar da falta de
autorização de terceiro, será validado se este a der posteriormente”. Assim, o negócio
celebrado por menor púbere (16 a 18 anos) pode ser validado se houver autorização
do pai ou tutor posteriormente.
O menor púbere (16 a 18 anos) não pode se valer da própria torpeza,
beneficiando-se de ato malicioso. Assim, não cabe a alegação da idade, para eximir-
se da obrigação, quando, na celebração do negócio, omitiu a informação de ser
relativamente incapaz. Neste caso, reputa-se válido o negócio (art. 180, CC).
Além disto, o art. 181, CC prevê que “Ninguém pode reclamar o que, por uma
obrigação anulada, pagou a um incapaz, se não provar que reverteu em proveito dele
a importância paga”. Em razão da vedação do enriquecimento sem causa, permite-se
que, havendo prova de que o menor se beneficiou, a pessoa reveja o dinheiro pago.
A sentença anulatória produz efeitos inter partes. Os efeitos são ex nunc (não
retroagem), ou seja, só produz efeitos a sentença a partir do seu trânsito em julgado
(art. 177, CC). Contudo, há o desfazimento do negócio, voltando ao estado anterior.
Ex.: casamento anulável (volta ao status de solteiro).

148
- Coisa
Erro (falsa noção ou
- Objeto Se essencial, gera anulabilidade
desconhecimento)
- Direito

Dolus bônus Não anula

Dolo (artifício ardiloso) Dolus malus Anula

- Positivo (ação) Gera anulabilidade se essencial e


- Negativo (omissão) mau

Vontade

Coação física Negócio nulo


Defeitos do negócio jurídico

Coação (pressão)

Coação moral Negócio anulável

Perigo que acomete o


negociante/pessoa de sua
Estado de perigo Negócio anulável
família/amigo (conhecido da outra
parte)

Premente necessidade ou
Lesão subjetiva inexperiência + desproporção (lesão Negócio anulável
objetiva)

- Vontade interna x vontade


manifestada Negócio nulo (sempre, mesmo a
Simulação
- Absoluta ou relativa inocente)
- Subjetiva ou objetiva
Sociais
Alienações gratuitas ou onerosas
com intuito de prejudicar credores Anulabilidade por meio de ação
Fraude contra credores
(não se confunde com a fraude à pauliana
execução)

Nulidade e anulabilidade. Quadro comparativo.


Negócio nulo (ordem pública) Negócio anulável (ordem privada)
• Negócio celebrado por • Negócio celebrado por
absolutamente incapaz, sem a relativamente incapaz, sem a
devida representação (art. 3.º, devida assistência (art. 4.º, CC)
CC) • Quando houver vício acometendo
• Objeto ilícito, impossível, o negócio jurídico: erro, dolo,
indeterminado ou indeterminável coação moral/psicológica, estado
• Motivo a ambas as partes for de perigo, lesão e fraude contra
ilícito credores
• Desrespeito à forma ou preterida • Lei prevê a anulabilidade
alguma solenidade
• Objetivo do negócio de fraude à
lei imperativa
• Lei prevê a nulidade absoluta
(nulidade textual) ou proibir o ato
sem cominar sanção (nulidade
virtual)
• Negócio simulado, incluída a
reserva mental
• Presença de coação física
• Nulidade absoluta (nulidade) • Nulidade relativa (anulabilidade)
• Ação declaratória de nulidade – • Ação anulatória, com previsão de
imprescritível prazos decadenciais
• Não pode ser suprida nem • Pode ser suprida, sanada,
sanada, inclusive pelo juiz. inclusive pelas partes
(convalidação livre)

149
Exceção: conversão do negócio • Ministério Público não pode intervir
jurídico (art. 170, CC) na ação anulatória
• Ministério Público pode intervir • Não cabe decretação de ofício
na ação de nulidade absoluta. pelo juiz.
• Cabe decretação de ofício pelo • Sentença da ação anulatória tem
juiz. efeitos inter partes (entre as
• Sentença da ação declaratória partes).
tem efeitos erga omnes (contra • Sentença da ação anulatória tem
todos). efeitos ex nunc – não retroagem
• Sentença tem efeitos ex tunc -
retroativos

150
AÇÃO DE ANULAÇÃO DE NEGÓCIO JURÍDICO
ATENÇÃO: a peça estruturada abaixo é um modelo básico de ação de anulação de negócio jurídico. Destaca-se
que cada ação deve ser estruturada de acordo com o caso apresentado e os dados devem ser adaptados ao
enunciado fornecido pela banca examinadora.

OBSERVAÇÃO: COMPETÊNCIA = Havendo foro de eleição no negócio jurídico, utiliza-se este. Não
havendo, utiliza-se a regra do art. 46, CPC/2015 (domicílio do réu). Em se tratando de relação de
consumo o autor pode ajuizar no seu domicílio (art. 101, I, CDC).

151
152
153
AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO
ATENÇÃO: a peça estruturada abaixo é um modelo básico de ação de suprimento de idade para casamento.
Destaca-se que cada ação deve ser estruturada de acordo com o caso apresentado e os dados devem ser
adaptados ao enunciado fornecido pela banca examinadora.

OBSERVAÇÃO: COMPETÊNCIA = Havendo foro de eleição no negócio jurídico, utiliza-se este. Não
havendo, utiliza-se a regra do art. 46, CPC/2015 (domicílio do réu). Em se tratando de relação de
consumo o autor pode ajuizar no seu domicílio (art. 101, I, CDC).

154
155
156
AÇÃO REVOCATÓRIA OU AÇÃO PAULIANA
ATENÇÃO: a peça estruturada abaixo é um modelo básico de ação revocatória / ação pauliana. Destaca-se que
cada ação deve ser estruturada de acordo com o caso apresentado e os dados devem ser adaptados ao enunciado
fornecido pela banca examinadora.

157
158
159
160
161
162
11.11 Prova do negócio jurídico
Uma vez que o negócio jurídico tenha sido aperfeiçoado, pode necessitar, por
algum motivo, de prova. A prova é, então, o meio empregado para demonstrar e
comprovar a existência de negócios jurídicos.
Via de regra, a prova encontra-se no terceiro degrau da escala ponteana, ou
seja, no plano da eficácia, pois mantém relação com as consequências do negócio.
As provas são tratadas tanto pelo Código Civil quanto pelo Código de Processo
Civil.

11.11.1 Meios de prova previstos no Código Civil


O art. 212, CC prevê as formas de provas (salvo casos em que a lei prever forma
especial): confissão, documento, testemunha, presunção e perícia.
Art. 212. Salvo o negócio a que se impõe forma especial, o fato jurídico pode
ser provado mediante:
I - confissão;
II - documento;
III - testemunha;
IV - presunção;
V - perícia.

Esse rol é exemplificativo, pois existindo outras formas, elas não serão excluídas.
Neste aspecto, o art. 369, CPC/2015, dispõe:

Art. 369. As partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem
como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código,
para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e
influir eficazmente na convicção do juiz.

163
Sendo assim, cabe, por exemplo, provas obtidas através de meio eletrônico. A
prova digital, obtida pela internet, não pode ser classificada como documento. Os
Enunciados 297 e 298, CJF/STJ já previam:

297 – Art. 212. O documento eletrônico tem valor probante, desde que seja
apto a conservar a integridade de seu conteúdo e idôneo a apontar sua
autoria, independentemente da tecnologia empregada.

298 – Arts. 212 e 225. Os arquivos eletrônicos incluem -se no conceito de


“reproduções eletrônicas de fatos ou de coisas”, do art. 225 do Código Civil,
aos quais deve ser aplicado o regime jurídico da prova documental.

O CPC/2015 prevê a possibilidade de utilização desse meio de prova. O art. 422


faz essa previsão.
Art. 422. Qualquer reprodução mecânica, como a fotográfica, a
cinematográfica, a fonográfica ou de outra espécie, tem aptidão para fazer
prova dos fatos ou das coisas representadas, se a sua conformidade com o
documento original não for impugnada por aquele contra quem foi produzida.
§ 1o As fotografias digitais e as extraídas da rede mundial de computadores
fazem prova das imagens que reproduzem, devendo, se impugnadas, ser
apresentada a respectiva autenticação eletrônica ou, não sendo possível,
realizada perícia.
§ 2o Se se tratar de fotografia publicada em jornal ou revista, será exigido um
exemplar original do periódico, caso impugnada a veracidade pela outra
parte.
§ 3o Aplica-se o disposto neste artigo à forma impressa de mensagem
eletrônica.

Outros dispositivos, também do CPC/2015 fazem a previsão da possibilidade de


utilização dos meios eletrônicos como prova:
Art. 439. A utilização de documentos eletrônicos no processo convencional
dependerá de sua conversão à forma impressa e da verificação de sua
autenticidade, na forma da lei.
Art. 440. O juiz apreciará o valor probante do documento eletrônico não
convertido, assegurado às partes o acesso ao seu teor.
Art. 441. Serão admitidos documentos eletrônicos produzidos e conservados
com a observância da legislação específica.

As publicações em redes sociais também vem sendo admitidas como meio de


prova.
Neste aspecto, decisão que aceita a qualificação de “casada” na rede social
como meio de prova, embora não defira a exoneração dos alimentos:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXONERAÇÃO LIMINAR DE ALIMENTOS.


INDEFERIMENTO. ADEQUAÇÃO. A maioridade da filha/alimentada, por si
só, não enseja a automática exoneração dos alimentos devidos pelo
pai/alimentante. Aliás, a exoneração dos alimentos exige a instauração de
prévio contraditório (súmula n.º 358, do STJ). Por outro lado, o fato da
164
filha/alimentada ter se qualificado como "casada" em página de rede social
("Facebook"), não é elemento suficiente para justificar por si só o deferimento
liminar e "inaudita altera parte" dos alimentos devidos pelo pai/alimentante.
Isso porque, em se tratando de alimentos em prol de filho (e não de ex-
cônjuge ou ex-companheiro), o casamento ou união estável da parte
alimentada não opera extinção automática e de pleno direito dos alimentos.
Precedente jurisprudencial, fundamentado em lição doutrinária. Para além
disso, não é incomum entre os jovens que não são efetivamente casados e
nem mantém real união estável, que ainda assim se qualifiquem como
"casados" em redes sociais, qualificação que denota mais a estabilidade do
namoro que mantém, e menos alguma alteração concreta em estado civil
considerado em seu sentido estrito. NEGARAM PROVIMENTO. (Agravo de
Instrumento Nº 70069883171, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do
RS, Relator: Rui Portanova, Julgado em 25/08/2016)

Decisão que aceita conversa no facebook como prova da verossimilhança da


paternidade, na pretensão de fixação de alimentos provisórios:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. A


prova segura da paternidade é essencial para o julgamento de procedência
da ação de investigação de paternidade e fixação dos alimentos definitivos.
Contudo, para fixação dos provisórios é suficiente a verossimilhança da
alegação. E, na situação em exame, diante das fotografias juntadas e diálogo
mantido em rede social entre o agravado e a genitora do agravante,
verossímil a alegação de paternidade. A genitora do ora agravante já havia
ajuizado ação de alimentos gravídicos contra o agravado, tendo sido fixados
alimentos provisórios de 30% do salário mínimo. Desta forma, a teor do
disposto no parágrafo único do art. 6º da Lei 11.804, não necessitaria nem
sequer ter sido deduzido pedido de alimentos provisórios na ação de
investigação de paternidade, visto que, após o nascimento, os alimentos
gravídicos ficam automaticamente convertidos em pensão alimentícia em
favor do menor. DERAM PROVIMENTO. UNÂNIME. (Agravo de Instrumento
Nº 70066135195, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator:
Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em 29/10/2015)

A partir daí, necessário que se analise cada um dos meios de prova contidos no
art. 212, CC: confissão, documento, testemunha, presunção e perícia.

Confissão
A confissão é uma declaração feita por alguém, contra quem se pretende provar
fato ou negócio jurídico. Neste aspecto é a previsão do art. 389, CPC/2015:
Art. 389. Há confissão, judicial ou extrajudicial, quando a parte admite a
verdade de fato contrário ao seu interesse e favorável ao do adversário.

Assim, a confissão é ato pelo qual a parte, espontaneamente ou não, judicial ou


extrajudicialmente, admite a verdade de um fato contrário ao seu interesse e favorável
ao adversário.

165
A confissão também pode ser tácita ou expressa. Expressa é quando há
manifestação. Tácita é a confissão quando há o silêncio. Ex.: os fatos contidos na
inicial e não contestados serão presumidos como verdadeiros (art. 341, CPC/2015)
(Art. 341. Incumbe também ao réu manifestar-se precisamente sobre as alegações
de fato constantes da petição inicial, presumindo-se verdadeiras as não impugnadas).
A confissão não tem eficácia se provém de alguém que não tem capacidade de
dispor do direito a que se referem os fatos confessados (art. 213, CC; 392, § 1.º,
CPC/2015).
Também não é eficaz a confissão feita por absolutamente incapaz.
Não servem de prova a confissão de fatos relativos a direitos indisponíveis. Ex.:
Art. 1.600. Não basta o adultério da mulher, ainda que confessado, para ilidir a
presunção legal da paternidade.
A confissão pode ser feita por mandatário (representante) (art. 213, § único).
Assim, a confissão é ato não personalíssimo e impessoal. Contudo, sua eficácia limita-
se aos poderes da representação. Os poderes para tanto devem ser especiais, ou
seja, deve contar no instrumento de mandato os poderes para confessar.
A confissão é irrevogável e irretratável. Contudo, poderá ser anulada se for
produzida com base em erro ou coação (art. 214, CC; art. 393, CPC/2015).

Documentos
Representam um fato, destinando-se a conservá-lo para prová-lo no futuro.
Os documentos podem ser: públicos e particulares.
Particulares – feitos mediante atividade privada, ou seja, documentos firmados
por particulares. Ex.: cartas, telegramas.
Públicos – documentos elaborados por autoridade pública no exercício de suas
funções. Ex.: escritura pública, certidões, traslados, etc.
O art. 215, CC dispõe que a escritura púbica é documento dotado de fé pública.
Assim, não cabe provar com testemunhas contra a escritura, pois ela é documento
fidedigno, em razão da fé púbica do tabelião.
O art. 215, § 1.º, CC estabelece os requisitos que devem constar na escritura
pública:
§ 1º Salvo quando exigidos por lei outros requisitos, a escritura pública deve
conter:
I - data e local de sua realização;

166
II - reconhecimento da identidade e capacidade das partes e de quantos
hajam comparecido ao ato, por si, como representantes, intervenientes ou
testemunhas;
III - nome, nacionalidade, estado civil, profissão, domicílio e residência das
partes e demais comparecentes, com a indicação, quando necessário, do
regime de bens do casamento, nome do outro cônjuge e filiação;
IV - manifestação clara da vontade das partes e dos intervenientes;
V - referência ao cumprimento das exigências legais e fiscais inerentes à
legitimidade do ato;
VI - declaração de ter sido lida na presença das partes e demais
comparecentes, ou de que todos a leram;
VII - assinatura das partes e dos demais comparecentes, bem como a do
tabelião ou seu substituto legal, encerrando o ato.

Se esses requisitos não forem observados pelo Tabelião de Notas, fará com que
a escritura pública seja nula.
A escritura pode ser lavrada em qualquer Tabelionato de Notas do território
nacional. Não é obrigatório lavrar a escritura no local onde se reside ou onde está
localizado o imóvel. Contudo, o registro imobiliário deve ser feito no local onde está
localizado o bem. Segundo o art. 108, CC, só se exige escritura pública para lavratura
de atos de disposição de imóveis acima de 30 salários mínimos.
O § 2.º do art. 215, CC prevê que se algum comparecente não puder ou não
souber escrever, outra pessoa capaz assinará por ele, a seu rogo. O ato, ainda assim,
será válido.
A escritura é redigida em língua nacional (§ 3.º). Se não o for, será nula.
(§ 4.º) Se qualquer dos comparecentes não souber a língua nacional e o tabelião
não entender o idioma em que se expressa, deverá comparecer tradutor público para
servir de intérprete, ou, não o havendo na localidade, outra pessoa capaz que, a juízo
do tabelião, tenha idoneidade e conhecimento bastantes.
(§ 5.º) Se algum dos comparecentes não for conhecido do tabelião, nem puder
identificar-se por documento, deverão participar do ato pelo menos duas testemunhas
que o conheçam e atestem sua identidade. Sendo assim, primeiro o Tabelião deve
identificar os comparecentes documentalmente (documento com foto).
Assim, quando a lei exigir instrumento público, nenhuma outra prova, por mais
especial que seja, pode substituir sua falta (art. 406, CPC/2015).

O documento deve ser exibido, como prova, no formato original. Contudo,


também servirão de prova, as certidões judiciais. Art. 216, CC:

167
Art. 216. Farão a mesma prova que os originais as certidões textuais de
qualquer peça judicial, do protocolo das audiências, ou de outro qualquer livro
a cargo do escrivão, sendo extraídas por ele, ou sob a sua vigilância, e por
ele subscritas, assim como os traslados de autos, quando por outro escrivão
consertados.

Também servem de prova os traslados e certidões do tabelião. Art. 217, CC:


Art. 217. Terão a mesma força probante os traslados e as certidões, extraídos
por tabelião ou oficial de registro, de instrumentos ou documentos lançados
em suas notas.

Neste mesmo sentido é o art. 425, CPC/2015:

Art. 425. Fazem a mesma prova que os originais:


I - as certidões textuais de qualquer peça dos autos, do protocolo das
audiências ou de outro livro a cargo do escrivão ou do chefe de secretaria, se
extraídas por ele ou sob sua vigilância e por ele subscritas;
II - os traslados e as certidões extraídas por oficial público de instrumentos
ou documentos lançados em suas notas;
III - as reproduções dos documentos públicos, desde que autenticadas por
oficial público ou conferidas em cartório com os respectivos originais;
IV - as cópias reprográficas de peças do próprio processo judicial declaradas
autênticas pelo advogado, sob sua responsabilidade pessoal, se não lhes for
impugnada a autenticidade;
V - os extratos digitais de bancos de dados públicos e privados, desde que
atestado pelo seu emitente, sob as penas da lei, que as informações
conferem com o que consta na origem;
VI - as reproduções digitalizadas de qualquer documento público ou
particular, quando juntadas aos autos pelos órgãos da justiça e seus
auxiliares, pelo Ministério Público e seus auxiliares, pela Defensoria Pública
e seus auxiliares, pelas procuradorias, pelas repartições públicas em geral e
por advogados, ressalvada a alegação motivada e fundamentada de
adulteração.
§ 1o Os originais dos documentos digitalizados mencionados no inciso VI
deverão ser preservados pelo seu detentor até o final do prazo para
propositura de ação rescisória.
§ 2o Tratando-se de cópia digital de título executivo extrajudicial ou de
documento relevante à instrução do processo, o juiz poderá determinar seu
depósito em cartório ou secretaria.

Certidão é reprodução do que se encontra expresso em livro ou documento.


Traslado é cópia do que está lançado no livro ou nos autos.
Ainda sobre documentos, o art. 219 dispõe:

Art. 219. As declarações constantes de documentos assinados presumem-se


verdadeiras em relação aos signatários.
Parágrafo único. Não tendo relação direta, porém, com as disposições
principais ou com a legitimidade das partes, as declarações enunciativas não
eximem os interessados em sua veracidade do ônus de prová-las.

Significa dizer que os documentos assinados, públicos ou particulares, tem


eficácia (são verdadeiros) entre as partes que neles lançaram suas assinaturas (art.
168
408, CPC/2015). Trata-se de presunção relativa, podendo ser afastada por outro meio
de prova. Ex.: cartão ponto no direito do trabalho faz prova da jornada de trabalho.
Cabe, contudo, ao trabalhador fazer prova, por outros meios da existência de horas
extras não registradas e não pagas.
Declarações enunciativa – qualificação das partes, por exemplo.
Existem situações que a lei determina que o cônjuge outorgue anuência ao outro,
para que possa celebrar negócio jurídico (ex.: art. 1.647, CC). Nestes casos, o art. 220
dispõe que:
Art. 220. A anuência ou a autorização de outrem, necessária à validade de
um ato, provar-se-á do mesmo modo que este, e constará, sempre que se
possa, do próprio instrumento.

Assim, só por instrumento público poderá ser a procuração outorgada pelos


cônjuges, um ao outro, para a outorga marital, para a venda de bens imóveis,
essencial a validade da escritura pública.

Com relação aos instrumentos particulares, o art. 221, CC dispõe que:

Art. 221. O instrumento particular, feito e assinado, ou somente assinado por


quem esteja na livre disposição e administração de seus bens, prova as
obrigações convencionais de qualquer valor; mas os seus efeitos, bem como
os da cessão, não se operam, a respeito de terceiros, antes de registrado no
registro público.
Parágrafo único. A prova do instrumento particular pode suprir-se pelas
outras de caráter legal.
Diferente do instrumento público, o particular não tem força probante absoluta.
O que consta em instrumento particular pode ser provado de outra forma
(testemunhas, por exemplo). O instrumento particular gera efeitos apenas entre as
partes que o firmaram. Para valer contra terceiros, deve ser registrado no Cartório de
Títulos e Documentos.
O art. 222, CC trata do telegrama, prevendo que quando houver contestação de
sua autenticidade, a prova poderá ser feita mediante conferencia com o original
assinado.

Art. 222. O telegrama, quando lhe for contestada a autenticidade, faz prova
mediante conferência com o original assinado.

Com relação ao correio eletrônico (e-mail), o Enunciado 18, CJF/STJ, dispõe:

A "quitação regular" referida no art. 319 do novo Código Civil engloba a


quitação dada por meios eletrônicos ou por quaisquer formas de
169
"comunicação a distância", assim entendida aquela que permite ajustar
negócios jurídicos e praticar atos jurídicos sem a presença corpórea
simultânea das partes ou de seus representantes.

A cópia fotográfica de documento, conferida por tabelião de notas, valerá como


prova da declaração de vontade, mas, impugnada sua autenticidade, deverá ser
exibido o original (art. 223, CC). Trata-se das cópias autenticadas.
O art. 225 dispõe:

Art. 225. As reproduções fotográficas, cinematográficas, os registros


fonográficos e, em geral, quaisquer outras reproduções mecânicas ou
eletrônicas de fatos ou de coisas fazem prova plena destes, se a parte, contra
quem forem exibidos, não lhes impugnar a exatidão.

Em termos de fotografia digital, publicada na internet, deve-se comprovar sua


veracidade através de sua autenticação eletrônica ou através de perícia que lhe prove
a veracidade. Em se tratando de foto publicada em jornal, deve ser apresentado
exemplar do jornal para efetivar a prova. Art. 422, CPC/2015.

Art. 422. Qualquer reprodução mecânica, como a fotográfica, a


cinematográfica, a fonográfica ou de outra espécie, tem aptidão para fazer
prova dos fatos ou das coisas representadas, se a sua conformidade com o
documento original não for impugnada por aquele contra quem foi produzida.
§ 1º As fotografias digitais e as extraídas da rede mundial de computadores
fazem prova das imagens que reproduzem, devendo, se impugnadas, ser
apresentada a respectiva autenticação eletrônica ou, não sendo possível,
realizada perícia.
§ 2º Se se tratar de fotografia publicada em jornal ou revista, será exigido um
exemplar original do periódico, caso impugnada a veracidade pela outra
parte.
§ 3º Aplica-se o disposto neste artigo à forma impressa de mensagem
eletrônica.

Por fim, o art. 226, determina:

Art. 226. Os livros e fichas dos empresários e sociedades provam contra as


pessoas a que pertencem, e, em seu favor, quando, escriturados sem vício
extrínseco ou intrínseco, forem confirmados por outros subsídios.
Parágrafo único. A prova resultante dos livros e fichas não é bastante nos
casos em que a lei exige escritura pública, ou escrito particular revestido de
requisitos especiais, e pode ser ilidida pela comprovação da falsidade ou
inexatidão dos lançamentos.

Não se trata de prova absoluta, pois pode ser afastada a presunção de


veracidade, através da comprovação da falsidade, por perícia técnica.

170
Testemunhas
Testemunhas são pessoas chamadas a depor sobre determinados fatos,
visando a comprovação ou elucidação dos mesmos. As testemunhas podem ser:
Judiciárias. Aquelas convocadas para depor em juízo.
Instrumentárias. São as que se pronunciam extrajudicialmente, sobre
determinado documento.
A prova testemunhal é sempre admissível, desde que a lei não exija prova de
modo diverso (art. 442, CPC/2015).
As pessoas que depuserem em juízo como testemunhas deverão prestar
compromisso de dizer a verdade. Caso não digam a verdade, poderão incorrer no
crime de falso testemunho. O juiz esclarece isto às testemunhas e, se aceitarem,
estarão compromissadas com o juízo.
Contudo, não podem ser testemunhas (art. 228, CC + art. 447, CPC/2015):

Art. 228. Não podem ser admitidos como testemunhas:


I - os menores de dezesseis anos;
II - (Revogado);
III - (Revogado);
IV - o interessado no litígio, o amigo íntimo ou o inimigo capital das partes;
V - os cônjuges, os ascendentes, os descendentes e os colaterais, até o
terceiro grau de alguma das partes, por consanguinidade, ou afinidade.
§ 1º Para a prova de fatos que só elas conheçam, pode o juiz admitir o
depoimento das pessoas a que se refere este artigo.
§ 2º A pessoa com deficiência poderá testemunhar em igualdade de
condições com as demais pessoas, sendo-lhe assegurados todos os recursos
de tecnologia assistiva.

Tecnologia assistiva – recursos ou sistemas computadorizados especiais,


capazes de contemplar a acessibilidade, uso de roupas adaptadas, enfim, tudo o que
possa auxiliar a pessoa com deficiência, promovendo sua inclusão social.
O art. 447, CPC/2015 dispõe que qualquer pessoa pode ser testemunha, salvo
as incapazes, impedidas ou suspeitas, definindo quem são elas:

Art. 447. Podem depor como testemunhas todas as pessoas, exceto as


incapazes, impedidas ou suspeitas.
§ 1o São incapazes:
I - o interdito por enfermidade ou deficiência mental;
II - o que, acometido por enfermidade ou retardamento mental, ao tempo em
que ocorreram os fatos, não podia discerni-los, ou, ao tempo em que deve
depor, não está habilitado a transmitir as percepções;
III - o que tiver menos de 16 (dezesseis) anos;
IV - o cego e o surdo, quando a ciência do fato depender dos sentidos que
lhes faltam.
§ 2o São impedidos:

171
I - o cônjuge, o companheiro, o ascendente e o descendente em qualquer
grau e o colateral, até o terceiro grau, de alguma das partes, por
consanguinidade ou afinidade, salvo se o exigir o interesse público ou,
tratando-se de causa relativa ao estado da pessoa, não se puder obter de
outro modo a prova que o juiz repute necessária ao julgamento do mérito;
II - o que é parte na causa;
III - o que intervém em nome de uma parte, como o tutor, o representante
legal da pessoa jurídica, o juiz, o advogado e outros que assistam ou tenham
assistido as partes.
§ 3º São suspeitos:
I - o inimigo da parte ou o seu amigo íntimo;
II - o que tiver interesse no litígio.
§ 4º Sendo necessário, pode o juiz admitir o depoimento das testemunhas
menores, impedidas ou suspeitas.
§ 5º Os depoimentos referidos no § 4o serão prestados independentemente
de compromisso, e o juiz lhes atribuirá o valor que possam merecer.

Pode, excepcionalmente o juiz permitir o depoimento de pessoas incapazes,


impedidas ou suspeitas. Contudo, serão ouvidas como informantes do juízo e não
como testemunhas. Neste caso, não prestarão compromisso de dizer a verdade.
Por fim, ninguém será obrigado a depor sobre fato – art. 448, CPC/2015:

Art. 448. A testemunha não é obrigada a depor sobre fatos:


I - que lhe acarretem grave dano, bem como ao seu cônjuge ou companheiro
e aos seus parentes consanguíneos ou afins, em linha reta ou colateral, até
o terceiro grau;
II - a cujo respeito, por estado ou profissão, deva guardar sigilo.

Trata-se do sigilo profissional e proteção aos interesses pessoais da


testemunha.

Presunção
É a dedução de um fato conhecido para demonstrar outro desconhecido.
Consequência que tem como ponto de partida um fato conhecido para chegar ao
ignorado.
Exemplo de presunção: como é conhecido o fato de que o credor só entrega o
título (promissória) ao devedor com o pagamento, presume-se que se o devedor está
de posse da promissória, houve pagamento.
As presunções podem ser: legais (decorrentes da lei. Ex.: presunção de
paternidade) ou comuns (que se baseiam no que ordinariamente ocorre, na
experiência da vida. Ex.: presume-se que as dívidas do marido sejam contraídas em
benefício da família).
Neste aspecto, deve-se destacar os arts. 231 e 232, CC:
172
Art. 231. Aquele que se nega a submeter-se a exame médico necessário não
poderá aproveitar-se de sua recusa.
Art. 232. A recusa à perícia médica ordenada pelo juiz poderá suprir a prova
que se pretendia obter com o exame.

Situação mais comum é nos casos de investigações de paternidade em que o


suposto pai nega-se a fazer o exame de DNA. Neste caso, cabe a presunção de
paternidade, não sendo mais necessária a prova da paternidade através do exame,
em razão da recusa. No mesmo sentido é a previsão da súmula 301, STJ:

“Em ação investigatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de


DNA induz presunção juris tantum de paternidade.”

Trata-se de uma presunção relativa, pois pode ser afastada através da


realização posterior do exame de DNA.
Aliás, as presunções podem ser: absolutas (que não admitem prova em
contrário. Ex.: vulnerabilidade do consumidor) ou relativas (que admitem prova em
contrário. Ex.: presunção de paternidade).

Perícias
Perícia é o exame ou vistoria.
Exame é a apreciação de alguma coisa, por peritos, para auxiliar o juiz a formar
sua convicção. Ex.: exame grafotécnico, exame de sangue
Vistoria é uma perícia restrita à inspeção ocular. É diligencia frequente nas ações
imobiliárias, possessórias ou demarcatórias.
Também é prova pericial a avaliação, ou seja, atribuição de valor de mercado a
algum bem.

173
12
13. ATO ILÍCITO

O ato jurídico em sentido amplo é toda ação humana lícita que crie, modifique
ou extinga direitos e obrigações. Contudo, nem todo ato jurídico é lícito, pois é possível
que a pessoa atue em contrariedade ao direito, violando normas jurídicas e causando
prejuízo a alguém. Nestas situações, tem-se os atos ilícitos. Assim, ato ilícito é todo
ato praticado com infração ao dever legal de não lesar a outra pessoa.

ordinário
fato jurídico em
sentido estrito
(ação natural)
extraordinário

FATO JURÍDICO EM ato-fato


ato jurídico em
SENTIDO AMPLO jurídico
lícita (ato sentido estrito
jurídico em (não negocial)
sentido amplo)
negócio jurídico
ação humana

ilícita ato ilícito

São elementos componentes do ato ilícito:


a) Ação humana (positiva ou negativa)
b) Contrariedade ao direito ou ilicitude (violação de dever jurídico preexistente)
c) Prejuízo (material ou moral)

O ato ilícito é um só, mas pode atingir várias esferas do direito: civil,
administrativo e penal. Ex.: um homem atravessa o sinal vermelho, bate de carro em
outra pessoa, causando prejuízos financeiros (danos ao veículo) e danos físicos na
pessoa que está no carro. Neste caso, as três esferas foram violadas. Haverá multa
de trânsito, por passar o sinal vermelho; indenização por danos materiais, por ter
estragado o carro; e privação da liberdade, em razão do crime cometido.
O ato ilícito é, portanto, um ato consciente e voluntário do ser humano que
transgride dever jurídico.
Neste aspecto é a previsão do art. 186, CC:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou


imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente
moral, comete ato ilícito.

174
Sendo assim, havendo o dano, causado pelo ato ilícito, haverá a
responsabilidade.
Mas para que exista a responsabilidade, deve haver a presença de três
elementos:
a) Fato lesivo voluntário, causado pelo agente, por ação ou omissão voluntária,
negligência ou imprudência;
b) Ocorrência de um dano patrimonial ou moral;
c) Nexo de causalidade entre o dano e o comportamento do agente.

Neste aspecto, a decisão do TJ/RS:

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. RESPONSABILIDADE


CIVIL. COBRANÇA VEXATÓRIA. OFENSAS PROFERIDAS EM
ESTABELECIMENTO COMERCIAL. DANOS MORAIS. OCORRÊNCIA.
REDUÇÃO. I. Nos termos do art. 14, do CPC/2015, a norma processual não
retroagirá, respeitados os atos processuais praticados e as situações
jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada. Dessa forma,
aplicam-se ao presente processo as disposições constantes do CPC/1973,
em vigor quando do ajuizamento da ação, da prolação da sentença e da
interposição deste recurso. II. Documentos novos. Não conhecimento.
Deixam de ser conhecidos os documentos juntados com as razões de
apelação, pois não se tratam de documentos novos, a teor do art. 397, do
CPC/1973, uma vez que foram produzidos e poderiam ter sido juntados antes
de ser prolatada a sentença neste feito. III. No caso, a autora alega que o réu
compareceu no estabelecimento comercial em que ela trabalha cobrando
dívidas vencidas do proprietário do estabelecimento, e, embora as dívidas
não fossem suas, o réu proferiu ofensas contra sua pessoa. IV. Para
caracterizar a responsabilidade civil subjetiva, nos termos dos arts. 186 e 927,
do Código Civil, é necessária a comprovação da conduta ilícita, da culpa
do agente, da existência de dano, bem como do nexo de causalidade
entre a conduta e o dano. V. Na hipótese, a prova coligida aos autos
demonstra que o réu exaltou-se e chamou a autora de "negadora de contas",
em razão de dívidas que nem sequer eram suas, chamando a atenção de
clientes e colegas que se encontravam no estabelecimento comercial. VI.
Portanto, está configurado o dano moral in re ipsa, ou dano moral puro, uma
vez que o aborrecimento e o abalo psicológico causados à autora são
evidentes, conferindo o direito à reparação sem a necessidade de produção
de provas sobre a ocorrência do prejuízo. VII. Redução do quantum
indenizatório, tendo em vista a condição social da autora e do réu, a gravidade
do fato, o caráter punitivo-pedagógico da reparação e os parâmetros
adotados por esta câmara em casos semelhantes. A correção monetária pelo
IGP-M incide a partir da presente decisão, na forma da Súmula 362, do STJ.
Os juros moratórios de 1% ao mês, decorrendo de relação extracontratual,
devem fluir a partir do evento danoso, na forma da Súmula 54, do STJ.
APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. (Apelação Cível Nº 70066451741,
Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge André Pereira
Gailhard, Julgado em 25/05/2016)

APELAÇÃO CIVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DESCUMPRIMENTO DE


ACORDO. DIREITO A REPARAÇÃO. INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE
PROVA. IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. Da norma processual aplicável ao
175
feito 1. No caso em exame a decisão recorrida foi publicada em período
compreendido até 17/03/2016. Assim, segundo os enunciados do Superior
Tribunal de Justiça sobre a aplicação do novel Código de Processo Civil, há
a incidência da legislação anterior, de acordo com o posicionamento jurídico
uniforme daquela Corte, que tem a competência para regular a forma de
aplicação da lei federal. 2. A interpretação precitada coaduna com os
princípios conformadores da atual legislação processual civil, que dizem
respeito a não ocasionar prejuízo à parte ou gerar surpresa a esta com a
modificação do procedimento em relação aos atos já efetivados, consoante
estabelece o art. 9º, caput, e art. 10, ambos do novel Código Processo Civil.
Mérito do recurso em exame 3. A parte autora não comprovou a prática de
qualquer ato levado a efeito pela ré que desse azo à reparação de
eventuais danos morais por ventura ocasionados, ônus que lhe cabia e
do qual não se desincumbiu, a teor do que estabelece o art. 333, inc. I,
do CPC, com correspondência no art. 373 da novel legislação
processual. 4. Em se tratando de descumprimento de acordo homologado
em ação anterior, não cabe deduzir fatos a partir dos parcos elementos
probatórios carreados ao feito. Se a parte postulante não comprovou, clara e
precisamente, a desobediência do acordado pelo demandado, a pretensão
indenizatória daquela não merece êxito. 5. No que tange à indenização por
danos morais, somente os fatos e acontecimentos capazes de romper com o
equilíbrio psicológico do indivíduo devem ser considerados para tanto, sob
pena de ocorrer uma banalização deste instituto. 6. Assim, sem a
demonstração do ato ilícito, o nexo causal de forma insofismável, nem
o prejuízo específico decorrente daquele, restaram desatendidas as
condições para o sucesso da demanda, previstas no art. 186 do CC. Dos
honorários recursais 7. Nos termos do disposto no artigo 85, §11, do novel
Código de Processo Civil, o Colegiado da Corte de Justiça arbitrará
honorários advocatícios pelo trabalho adicional prestado pelo causídico neste
grau de jurisdição, sendo vedado ultrapassar os respectivos limites
estabelecidos nos §§2º e 3º para a fase de conhecimento. 8. Portanto, deveria
a parte vencida arcar com honorários recursais da parte vencedora, em
atenção à norma processual supracitada, que seriam acrescidos à
sucumbência fixada na sentença em primeiro grau a título de verba
sucumbencial. 9. No entanto, em razão da aplicação dos enunciados do
Superior Tribunal de Justiça sobre a incidência do novel Código de Processo
Civil ao caso em análise, descabe a utilização das normas precitadas que
tratam do ônus da sucumbência neste diploma legal. Negado provimento ao
apelo. (Apelação Cível Nº 70068603281, Quinta Câma Luiz Lopes do Canto,
Julgado em 25/05/2016)

11.1 Responsabilidade contratual e extracontratual


Quando o prejuízo causado a outrem se der em razão de contrato, fala-se em
responsabilidade contratual. Ex.: ator que não comparece para dar o espetáculo
contratado. Significa dizer que o inadimplemento contratual gera o dever de indenizar
em perdas e danos (art. 389, CC).
Quando a responsabilidade não deriva de contrato, mas de infração ao dever de
conduta (dever legal), diz-se que a responsabilidade é extracontratual ou
aquiliana.
Existem algumas diferenças entre os dois tipos de responsabilidade:

176
Responsabilidade contratual Responsabilidade
extracontratual
Ônus da O inadimplemento presume-se Cabe ao lesado o ônus de provar
prova culposo. O credor está em posição a culpa ou o dolo do causador do
mais favorável, devendo demonstrar dano. Ex.: pedestre que é
apenas que a prestação foi atropelado pelo ônibus. Tem que
descumprida. Presume-se a culpa provar que o condutor do ônibus
do inadimplente. agiu com imprudência.
Ex.: acidente de ônibus. A empresa
tem de indenizar o passageiro ferido,
pois comprometeu-se a entrega-lo
são e salvo no destino.
Origem No descumprimento da convenção Na inobservância do dever
genérico de não lesar a outrem
Capacidade Sofre limitações (apenas pessoas É mais ampla (qualquer pessoa,
capazes podem contratar e ter inclusive os incapazes podem ter
responsabilidade contratual) responsabilidade em razão de
danos praticados).

APELAÇÕES CÍVEIS. SEGUROS. PLANO DE SAÚDE. AÇÃO DE


OBRIGAÇÃO DE FAZER. PROCEDIMENTO CIRÚRGICO. AUSÊNCIA DE
CLÁUSULA DE EXCLUSÃO. DEVER DE INFORMAR. COBERTURA
DEVIDA. DANOS MORAIS. OCORRÊNCIA. QUANTUM MANTIDO. Da
norma processual aplicada ao feito 1. No caso em exame, trata-se de decisão
recorrida publicada até 17 de março de 2016. Assim, segundo os enunciados
do Superior Tribunal de Justiça sobre a aplicação do novel Código de
Processo Civil, há a incidência da legislação anterior, de acordo o
posicionamento jurídico uniforme daquela Egrégia Corte que tem a
competência para regular a forma de aplicação da lei federal. 2. A
interpretação precitada coaduna com os princípios conformadores da atual
legislação processual civil, que dizem respeito a não ocasionar prejuízo à
parte ou gerar surpresa a esta com a modificação do procedimento em
relação aos atos já efetivados, consoante estabelece o art. 9º, caput, e art.
10, ambos do novel Código Processo Civil. Mérito dos recursos em exame 3.
O contrato em análise foi avençado entre as partes com o objetivo de garantir
o pagamento das despesas médicas e hospitalares para a hipótese de
ocorrer a condição suspensiva prevista naquele pacto, consubstanciada no
evento danoso à saúde. Outro elemento essencial desta espécie contratual é
a boa-fé, na forma do art. 422 do Código Civil, caracterizada pela lealdade e
clareza das informações prestadas pelas partes. 4. Os planos ou seguros de
saúde estão submetidos às disposições do Código de Defesa do Consumidor,
enquanto relação de consumo atinente ao mercado de prestação de serviços
médicos. Isto é o que se extrai da interpretação literal do art. 35 da Lei
9.656/98. Súmula n. 469 do STJ. 5. Aplicáveis ao caso em exame as

177
exigências mínimas previstas no plano-referência de que trata os artigos 10
e 12 da legislação dos planos de saúde. 6. Não cabe à demandada
determinar o tipo de tratamento que será realizado pela parte autora, uma vez
que esta decisão cabe ao médico que a acompanha. A interpretação mais
adequada ao referido pacto, sob o ponto de vista teleológico, deve levar em
conta a natureza do exame a ser realizado, a fim de se preservar a vida, valor
maior a ser resguardado. 7. A omissão no contrato quanto à exclusão de
cobertura deve ser interpretada de forma favorável ao consumidor, uma vez
que a negativa do apelante não se pautou em determinação contratual.
Inteligência do art. 47 do Código de Defesa do Consumidor. 8. O
descumprimento do contrato, sem razão jurídica plausível, ou mesmo o
atendimento do pacto de forma negligente, sequer atentando para a garantia
dada e o bem a ser preservado, importa no dever de reparar o mal causado.
9. Assim, a demandada deve ressarcir os danos morais reconhecidos, na
forma do art. 186 do novo Código Civil, cuja incidência decorre da prática de
conduta ilícita, a qual se configurou no caso em tela. 10. O valor a ser
arbitrado a título de indenização por dano moral deve l proporcionalidade,
bem como a reprovabilidade da conduta ilícita praticada e, por fim, que o
ressarcimento do dano não se transforme em ganho desmesurado,
importando em enriquecimento ilícito. Quantum mantido. Negado provimento
aos apelos. (Apelação Cível Nº 70069105815, Quinta Câmara Cível, Tribunal
de Justiça do RS, Relator: Jorge Luiz Lopes do Canto, Julgado em
25/05/2016)

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO


POR DANOS MORAIS. AUSÊNCIA DE CONTRATAÇÃO.
RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MORAL CARACTERIZADO.
QUANTUM INDENIZATÓRIO MANTIDO. JUROS MORATÓRIOS.
DISPOSIÇÃO DE OFÍCIO. Da norma processual aplicada ao feito 1. No caso
em exame a decisão recorrida foi publicada em período compreendido até
17/03/2016. Assim, segundo os enunciados do Superior Tribunal de Justiça
sobre a aplicação do novel Código de Processo Civil, há a incidência da
legislação anterior, de acordo com o posicionamento jurídico uniforme
daquela Corte, que tem a competência para regular a forma de aplicação da
lei federal. 2. A interpretação precitada coaduna com os princípios
conformadores da atual legislação processual civil, que dizem respeito a não
ocasionar prejuízo à parte ou gerar surpresa a esta com a modificação do
procedimento em relação aos atos já efetivados, consoante estabelece o art.
9º, caput, e art. 10, ambos do novel Código Processo Civil. Mérito do recurso
em exame 3. A parte autora logrou comprovar os fatos articulados na exordial,
no sentido de que foi inscrita indevidamente nos cadastros de proteção ao
crédito por contrato que não celebrou. Inteligência do art. 186 do CC. 4.
Comprovada a falha na prestação do serviço, deve ser responsabilizada a ré
pela indevida inscrição do nome do autor. Conduta abusiva da apelante na
qual assumiu o risco de causar lesão à postulante, mesmo os de ordem
extrapatrimonial, daí ensejando o dever de indenizar. 5. No que tange à prova
do dano moral, por se tratar de lesão imaterial, desnecessária a
demonstração do prejuízo, na medida em que possui natureza
compensatória, minimizando de forma indireta as conseqüências da conduta
da ré, decorrendo aquele do próprio fato. Conduta ilícita da demandada que
faz presumir os prejuízos alegados pela parte autora, é o denominado dano
moral puro. 6. A postulante é pessoa jurídica, Igreja Evangélica. Portanto, a
negativação gera prejuízos de monta, em especial, quanto ao nome e
imagem perante à sociedade, na medida em que pode depender de crédito
para manter suas atividades. 7. O valor a ser arbitrado a título de indenização
por dano imaterial deve levar em conta o princípio da proporcionalidade, bem
como as condições da ofendida, a capacidade econômica do ofensor, além
da reprovabilidade da conduta ilícita praticada. Por fim, há que se ter presente
que o ressarcimento do dano não se transforme em ganho desmesurado,
importando em enriquecimento ilícito. Quantum mantido diante da ausência
178
de recurso da parte autora. 8. Juros moratórios devidos desde a data do
evento danoso, de acordo com a Súmula n. 54 do Superior Tribunal de
Justiça, a base de 1% ao mês, na forma do artigo 406, do Código Civil, em
consonância com o disposto no artigo 161, § 1º, do Código Tributário
Nacional. Disposição de ofício. Dos honorários recursais 9. Nos termos do
disposto no artigo 85, §11, do novel Códi de Justiça arbitrará honorários
advocatícios pelo trabalho adicional prestado pelo causídico neste grau de
jurisdição, sendo vedado ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos
§§2º e 3º para a fase de conhecimento. 10. Portanto, deveria a parte vencida
arcar com honorários recursais da parte vencedora, em atenção à norma
processual supracitada, que seriam acrescidos à sucumbência fixada na
sentença em primeiro grau a título de verba sucumbencial. 11. No entanto,
em razão da aplicação dos enunciados do Superior Tribunal de Justiça sobre
a incidência do novel Código de Processo Civil ao caso em análise, descabe
a utilização das normas precitadas que tratam do ônus da sucumbência neste
diploma legal. Negado provimento ao recurso da parte ré e, de ofício, alterar
o termo inicial dos juros de mora. (Apelação Cível Nº 70067931964, Quinta
Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Luiz Lopes do Canto,
Julgado em 25/05/2016)

12.2 Responsabilidade civil e penal


A responsabilidade será civil ou penal em razão da norma jurídica que tenha sido
violada pelo agente.
Na responsabilidade penal é norma penal que é violada, o interesse da
sociedade, direito público. A responsabilidade é pessoal e intransferível. O réu
responde com a privação de sua liberdade. A pena não pode ultrapassar a pessoa do
condenado (família não responde pela responsabilidade penal de alguém). A
tipicidade é característica do crime. A culpa tem de ter certo grau ou intensidade.
Apenas os maiores de 18 anos têm responsabilidade penal.
Na responsabilidade civil, a norma violada é de natureza civil, interesse
privado, direito privado. A responsabilidade é patrimonial. O requerido responde
através de seu patrimônio. Não haverá prisão civil por dívida (salvo a de alimentos).
Há hipóteses em que alguém pode ser responsabilizado por ato de outrem (art. 932,
CC – os pais são responsáveis por atos praticados pelos filhos menores de idade).
Qualquer ação ou omissão pode gerar responsabilidade, desde que viole direitos de
outrem. A culpa é mais ampla (mesmo que levíssima, há a obrigação de indenizar).
Mesmo os menores de 18 anos têm responsabilidade civil.

12.3 Responsabilidade subjetiva e objetiva


Existem duas teorias sobre a culpa: teoria subjetiva e teoria objetiva.
A teoria da culpa ou teoria subjetiva pressupõe a culpa como fundamento da
responsabilidade civil. Para que exista responsabilidade, tem de haver a comprovação
179
da culpa. Ex.: acidente de trânsito entre dois veículos. Deve-se comprovar a culpa de
quem “cortou a preferencial”, para que seja possível a indenização.
A teoria do risco ou teoria objetiva não pressupõe comprovação de culpa para
a reparação do dano. Há casos em que a lei impõe a certas pessoas, em determinadas
situações, responsabilidade, com indenização do dano, independentemente de
demonstração de culpa. A teoria do risco entende que todo dano é indenizável,
devendo haver reparação por quem a ele se liga por um nexo de causalidade,
independentemente de culpa. Ex.: acidente de trânsito com um meio de transporte
coletivo. Os passageiros que se machucarem podem exigir indenização da empresa
de ônibus, independentemente de comprovação de culpa do motorista do ônibus, pois
a empresa compromete-se a transportar se riscos para a pessoa.
O Código Civil prevê ambas as teorias. Filiou-se à teoria subjetiva, conforme o
art. 186, CC. Contudo, não significa que a teoria da responsabilidade objetiva seja
deixada de lado. Existem várias previsões que a adotam (art. 927, CC).

APELAÇÕES CÍVEIS. RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MÉDICO. AÇÃO


DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. RELAÇÃO DE
CONSUMO. RESPONSABILIDADE PELO FATO DO SERVIÇO. ART. 14 DO
CDC. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA DA ASSOCIAÇÃO DOS
FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL,
MANTENEDORA DO HOSPITAL ERNESTO DORNELLES, ACOLHIDA. A
responsabilidade civil dos hospitais pelos danos causados ao paciente por
ato de seus prepostos é objetiva, prescindindo da demonstração da culpa do
estabelecimento. Entretanto, deve estar demonstrada a existência de vínculo
empregatício do médico com o hospital, ou, quando ausente, caracterizada
falha na prestação do serviço hospitalar relativo exclusivamente à instalação,
hotelaria e serviço de enfermagem ofertados pelo nosocômio, o que não
restou evidenciado. PROCEDIMENTO CIRÚRGICO COM FINALIDADE
ESTÉTICA. ABDOMINOPLASTIA SEGUIDA DE LIPOASPIRAÇÃO.
PROCESSO INFLAMATÓRIO NA REGIÃO OPERADA. SURGIMENTO DE
"SEROMA". INSATISFAÇÃO COM O RESULTADO. DESCASO NO PÓS-
OPERATÓRIO INDEMONSTRADO. PROVA PERICIAL CONCLUSIVA
QUANTO A INEXISTÊNCIA DE FALHA NO ATENDIMENTO MÉDICO
PRESTADO À PACIENTE. ERRO MÉDICO NÃO EVIDENCIADO. A
responsabilidade civil do médico é subjetiva, a teor do que preceitua o § 4º
do art. 14 do CDC, porquanto, de regra, sua obrigação é de meio e não de
resultado. Elementos fático-probatórios encartados nos autos que não
evidenciam falha no atendimento prestado pelo facultativo demandado,
tampouco pelas codemandadas a ele relacionadas. Hipótese dos autos em
que não se comprovou a ocorrência de qualquer conduta negligente,
imprudente ou imperita do facultativo ou das demais rés, intermediadoras da
cirurgia, pois o médico que atendeu a autora empregou o tratamento
adequado e agiu consoante exigiam as circunstâncias. Prova pericial que
demonstra episódio de seroma, intercorrência indesejada, mas passível de
advir de procedimentos como os da espécie. Ausência de elementos
probatórios aptos a infirmar as conclusões da prova pericial. Dever de
indenizar não caracterizado. Sentença de improcedência da ação confirmada
pelos seus próprios fundamentos. RECONVENÇÃO. ADMISSIBILIDADE.
PROCEDÊNCIA PARCIAL DO PEDIDO RECONVENCIONAL.
180
COMPROVADO NOS AUTOS O CUMPRIMENTO INTEGRAL DO
CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS MÉDICOS. O conjunto
probatório e as circunstâncias declinadas pelas partes indicam que houve
adequado cumprimento do contrato de prestação de serviços médicos, sendo
devida a contrapartida pela realização da lipoabdominoplastia. Cabível,
contudo, a dedução da primeira parcela, já quitada pela autora. APELO
PRINCIPAL PARCIALMENTE PROVIDO. APELO ADESIVO PROVIDO.
(Apelação Cível Nº 70064584121, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do
RS, Relator: Miguel Ângelo da Silva, Julgado em 25/05/2016)

APELAÇÕES CÍVEIS. RESPONSABILIDADE CIVIL EM ACIDENTE DE


TRÂNSITO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. PEDIDO DE AFASTAMENTO DA
INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. AUSÊNCIA DE
FUNDAMENTAÇÃO. NÃO CONHECIMENTO. RESPONSABILIDADE
SUBJETIVA. NECESSÁRIO A PROVA DO ATO, DO DANO, DO NEXO
CAUSAL E DA CULPA PELO ACIDENTE. CULPA EXCLUSIVA DO
MOTORISTA QUE INGRESSOU EM VIA PREFERENCIAL SEM TOMAR AS
CAUTELAS DEVIDAS PARA REALIZAÇÃO DA MANOBRA. DESPESAS
COM FISIOTERAPIA. COMPROVADA A VINCULAÇÃO DO TRATAMENTO
AO ACIDENTE E A EXPRESSA PRESCRIÇÃO MÉDICA SEGUIDA DO
DISPÊNDIO DE VALORES, É DEVIDA A REPARAÇÃO. LUCROS
CESSANTES. AUSÊNCIA DE PROVA DE QUE A RESCISÃO DO
CONTRATO DE ESTÁGIO DA AUTORA TENHA SIDO MOTIVADA PELO
ACIDENTE. SENTENÇA MANTIDA NO PONTO. DANOS MORAIS E
ESTÉTICOS. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO. DANO MORAL
CARACTERIZADO. VIOLAÇÃO À INTEGRIDADE FÍSICA. QUANTUM
INDENIZATÓRIO MANTIDO. JUROS DE MORA QUE INCIDEM A CONTAR
DO EVENTO DANOSO, NOS TERMOS DA SÚMULA 54 DO STJ.
ALTERAÇÃO DE OFÍCIO. DANOS ESTÉTICOS. POSSIBILIDADE DE
CUMULAÇÃO COM A INDENIZAÇÃO POR DANOS DE ORDEM MORAL.
INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 387 DO STJ. AUTORA QUE TEVE FRATURA
EXPOSTA APRESENTANDO DIVERSAS CICATRIZES ALÉM DE
ENCURTAMENTO DO MEMBRO INFERIOR DIREITO E PREJUÍZO NA
MARCHA. DANO CONFIGURADO. INDENIZAÇÃO ARBITRADA.
DISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS INALTERADA. UNÂNIME.
CONHECERAM PARCIALMENTE DO APELO DO RÉU E, NA PARTE
CONHECIDA, NEGARAM-LHE PROVIMENTO E DERAM PARCIAL
PROVIMENTO AO RECURSO DA AUTORA. (Apelação Cível Nº
70069156255, Décima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS,
Relator: Katia Elenise Oliveira da Silva, Julgado em 25/05/2016)

12.4 Pressupostos da responsabilidade extracontratual


Segundo o art. 186, CC são quatro os elementos essenciais da responsabilidade
extracontratual:
a) Ação ou omissão
b) Culpa ou dolo do agente
c) Relação de causalidade
d) Dano

Ação ou omissão
➢ A responsabilidade pode derivar de:

181
➢ Ato próprio
➢ Ato de terceiro que esteja sob a guarda do agente
➢ Danos causados por coisa ou animal que lhe pertença

ATO PRÓPRIO:
APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA.
LIGAÇÕES E MENSAGENS DE COBRANÇA DE DÍVIDA DE TERCEIRO.
DANO MORAL. INOCORRENTE. CASO CONCRETO NO QUAL NAO
EVIDENCIADO EXCESSO POR PARTE DA RÉ APELANTE, EMPRESA DE
ASSESSORIA DE COBRANÇA CESSIONÁRIA DE CRÉDITO. - Afastada a
preliminar de ilegitimidade passiva, na medida em que a empresa de
cobrança está sendo demandada por ato próprio, consistente em sua
sistemática de cobrança, e não em relação à existência de dívida cujo titular
seria banco que não integra a lide, para o que desimporta na verificação em
tese de excesso em sua conduta se agiu ou não no exercício de um mandato.
- Não há dano moral pelo mero encaminhamento reiterado de mensagens de
texto e ligações, por celular, visando à cobrança de dívida de terceiro (cliente
do autor, que é advogado), porquanto transtorno que, no caso específico, não
pode ser presumido, cabendo ao autor demonstrar minimamente que o fato
ultrapassou a barreira do aceitável e gerou transtorno efetivo em seu
cotidiano doméstico e profissional. - Sentença reformada, em parte, para
reconhecer a improcedência da demanda em relação à ré Paschoalotto,
impondo-se o redimensionamento do ônus da sucumbência em relação à co-
ré apelante. PREFACIAL AFASTADA. APELAÇÃO PROVIDA. (Apelação
Cível Nº 70065501595, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS,
Relator: Carlos Eduardo Richinitti, Julgado em 11/11/2015)

ATO DE TERCEIRO – aqui não houve responsabilidade em razão de faltar o


nexo causal
CONSUMIDOR. TELEFONIA MÓVEL. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE
SINAL. FATO PÚBLICO E NOTÓRIO, JÁ RECONHECIDO EM OUTROS
PROCESSOS JULGADOS PELAS TURMAS RECURSAIS. DANOS À
ANTENA. INDISPONIBILIDADE DO SERVIÇO CAUSADA POR ATO DE
TERCEIRO. VANDALISMO. AUSENTE RESPONSABILIDADE OBJETIVA
DIANTE DA EXCLUDENTE. RECURSO PROVIDO. (Recurso Cível Nº
71005654199, Terceira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator:
Cleber Augusto Tonial, Julgado em 10/09/2015)

FATO DA COISA – dano causado pela coisa

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS.


RESPONSABILIDADE CIVIL. QUEDA DE GALHO DE ÁRVORE NAS
DEPENDÊNCIAS DO CLUBE SOCIAL. FATO DA COISA.
RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANOS MORAIS. OCORRÊNCIA.
REDUÇÃO DO VALOR INDENIZATÓRIO. DANOS ESTÉTICOS,
SEQUELAS NEUROLÓGICAS E DANOS MATERIAIS. AUSÊNCIA DE
COMPROVAÇÃO. I. É incontroverso nos autos que a autora sofreu lesão na
cabeça em decorrência da queda de um galho de árvore quando desfrutava
de momentos de lazer nas dependências do clube requerido. II. Incidência da
responsabilidade pelo fato da coisa, por meio da qual o proprietário responde,
de forma objetiva, pelos danos que a mesma possa causar. Aplicação do art.
938, do Código Civil. III. Configuração do dano moral in re ipsa, ou dano moral
182
puro, uma vez que as lesões são evidentes, conferindo o direito à reparação
sem a necessidade de produção de provas sobre a ocorrência do prejuízo.
IV. Redução do quantum indenizatório, tendo em vista a condição social da
autora, o potencial econômico do réu, a gravidade do fato, o caráter punitivo-
pedagógico da reparação e os parâmetros adotados por esta câmara em
casos semelhantes. A correção monetária pelo IGP-M incide a partir da
presente decisão, na forma da Súmula 362, do STJ, e os juros moratórios
contam-se do evento danoso, na forma da Súmula 54, do STJ. V. Embora
seja possível a cumulação das indenizações por danos morais e estéticos,
por força da Súmula 387, do STJ, no presente caso o dano estético não está
evidenciado no caso concreto, mormente porque a autora desistiu da perícia
médica designada pelo juízo de origem. Da mesma forma, não há prova de
eventuais seqüelas neurológicas, ônus que incumbia à autora, nos termos do
art. 333, I, do CPC, face à desistência da prova pericial. VI. Descabe a
pretensão quanto aos danos materiais, consubstanciados nas perdas e danos
e nos lucros cessantes, tendo em vista que a autora não produziu a mínima
prova do alegado prejuízo alegado, ou seja, dos gastos que teve e do que
deixou de auferir por conta do acidente. APELAÇÃO DA AUTORA
DESPROVIDA. APELAÇÃO DO RÉU PARCIALMENTE PROVIDA.
(Apelação Cível Nº 70064049778, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça
do RS, Relator: Jorge André Pereira Gailhard, Julgado em 16/12/2015)

FATO DO ANIMAL

RECURSO INOMINADO. ACIDENTE DE TRÂNSITO. FATO DO ANIMAL


(ART. 936 DO CÓDIGO CIVIL). COLISÃO DE AUTOMÓVEL COM EQUINO
SOLTO NA VIA PÚBLICA. RESPONSABILIDADE DO PROPRIETÁRIO DO
ANIMAL. DEVER DE REPARAR OS DANOS MATERIAIS. - SENTENÇA
MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. (Recurso Cível Nº 71005916093,
Terceira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Lusmary Fatima
Turelly da Silva, Julgado em 19/05/2016)

Culpa ou dolo do agente


Culpa em sentido estrito
a) Imprudência, negligência e imperícia;
b) Grave, leve e levíssima.

Imprudência, negligência e imperícia:


RESPONSABILIDADE CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO
DE DANOS MORAIS E MATERIAIS. ERRO MÉDICO. PROCEDIMENTO DE
HISTERECTOMIA. CULPA NÃO COMPROVADA. INTELIGÊNCIA DO
ARTIGO 14, § 4º DO CDC E ARTIGO 951 DO CC. AUSÊNCIA DO DEVER
DE INDENIZAR. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. 1. O caso
diz com pedido de indenização por danos morais e materiais, decorrente de
suposto erro médico, praticado pelo demandado, quando realizada a cirurgia
de histerectomia. Especificando o caso, tem-se pelo relato da demandante
que foi submetida a uma cirurgia de retirada do útero (histerectomia), e que
após o ato cirúrgico - que acusa ter sido desnecessário - teve diversas
internações hospitalares decorrentes de dores abdominais, aderências
cirúrgicas, limpeza de ovários, e infecção hospitalar, em razão da suposta
falta de higiene empregada pelo demandado quando da realização do
procedimento cirúrgico de histerectomia. 2. A responsabilidade do médico é
183
apurada mediante a verificação da culpa, nas modalidades de negligência,
imperícia e imprudência, na esteira do artigo 14, § 4º, do Código de Defesa
do Consumidor, bem como do artigo 951 do Código Civil. 3. Nenhuma
evidência na prova trazida aos autos no sentido de que houve complicações
pós-operatórias advindas do procedimento realizado pelo réu, na mesma
linha de que a autora não foi aposentada por invalidez em decorrência do
citado procedimento, mas de um quadro psiquiátrico grave estendido ao
longo dos anos e que em nada se relaciona com a cirurgia, porquanto de
origem bem anterior. 4. A prova pericial é a de maior aptidão para elidir as
questões técnicas aqui debatidas, e esta revelou a ausência de erro médico
na cirurgia prestada à demandante pelo médico réu. Por conseguinte, não
restou demonstrado qualquer conduta negligente, imperita ou imprudente do
médico, bem como não comprovado o nexo de causalidade entre as
ocorrências posteriores vivenciadas pela autora e o suposto erro médico, por
isso, não prospera a pretensão indenizatória devendo ser mantida a sentença
de improcedência. APELO DESPROVIDO. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº
70062716691, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Iris
Helena Medeiros Nogueira, Julgado em 17/12/2014)

Relação de causalidade
É o nexo causal entre a ação ou omissão do agente e o dano. Vem expressa
no verbo “causar” empregado no art. 186. Sem ela não existe a obrigação de
indenizar.

Dano
É pressuposto inafastável, sem o qual ninguém pode ser responsabilizado
civilmente. Pode ser: patrimonial (material) ou extrapatrimonial (moral)

a. Abuso de direito
O art. 187, CC reconhece a teoria do abuso de direito:

Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo,
excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social,
pela boa-fé ou pelos bons costumes.

O abuso de direito são situações em que alguém abusa de seu direito e prejudica
outrem. Não há que se provar a culpa para que surja o dever de indenizar os danos
causados.
RESPONSBILIDADE CIVIL. EXERCÍCIO ABUSIVO DO DIREITO DE
COBRANÇA. CHEQUE DECLARADO PRESCRITO MEDIANTE DECISÃO
JUDICIAL. CESSÃO DO TÍTULO PARA TERCEIRO. PROTESTO
INDEVIDO. DANO MORAL CONFIGURADO. 1. Preliminar de ilegitimidade
passiva rejeitada. 2. A apelante cedeu à empresa de recuperação de crédito
um cheque declarado prescrito pelo Poder Judiciário em demanda anterior,
que tramitou junto aos Juizados Especiais. De posse do cheque, a empresa
de recuperação de crédito lançou letra de câmbio e efetuou novo protesto do

184
título. Considerando que a prescrição do cheque foi reconhecida mediante
decisão judicial, a cessão do crédito e a reedição dos atos de cobrança são
visivelmente abusivos. Incidência do artigo 187, Código Civil de 2002, e art.
42 do Código de Defesa do Consumidor. Logo, devem ser mantidos os danos
morais reconhecidos em sentença, bem como o valor de R$5.100,00 (cinco
mil e cem reais) arbitrado em primeira instância. PRELIMINAR REJEITADA.
RECURSO DESPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70041036757, Nona Câmara
Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Iris Helena Medeiros Nogueira,
Julgado em 23/03/2011)

b. Causas excludentes de ilicitude


O direito prevê como causas de exclusão da ilicitude o exercício regular do
direito, a legítima defesa e o estado de necessidade.
Neste sentido, prevê o art. 188, CC:

Art. 188. Não constituem atos ilícitos:


I - os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito
reconhecido;
II - a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim
de remover perigo iminente.
Parágrafo único. No caso do inciso II, o ato será legítimo somente quando as
circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os
limites do indispensável para a remoção do perigo.

Assim, a legítima defesa constitui-se de reação proporcional a uma injusta


agressão, atual ou iminente, utilizando-se moderadamente dos meios de defesa
postos à disposição do ofendido. Se os meios forem desnecessários ou imoderados
pode caracterizar o excesso, proibido pelo direito. Se o ato foi praticado contra o
próprio agressor, e em legítima defesa, não há que se falar em responsabilidade civil
pelos danos causados. Contudo, se terceira pessoa tiver sido atingida, por engano,
haverá o dever de reparar o dano, mas existirá, também, o direito de ação regressiva
contra o agressor (art. 930, § único, CC).

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO POR


DANOS MORAIS E MATERIAIS. MORTE. LEGÍTIMA DEFESA. SENTENÇA
DE IMPROCEDÊNCIA CONFIRMADA. 1. PRELIMINARES. 1.1.
PRESCRIÇÃO. Não corre a prescrição quando a questão estava pendente
de solução na esfera criminal, ainda que no âmbito de investigação policial.
1.2. COISA JULGADA. A decisão que determina o arquivamento do inquérito
policial não faz coisa julgada, ainda que tenha sido fundada em causa de
exclusão da ilicitude. A responsabilidade civil é independente da criminal,
como expressamente prevê o art. 935 do CC ("A responsabilidade civil é
independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência
do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem
decididas no juízo criminal"). Tal independência é relativa, tanto que o próprio
art. 935 estabelece exceções, que são ampliadas por outros dispositivos, tais
como os arts 63 a 67 do CPP (e, dentre esses, especialmente o art. 65, que
185
reza: "Faz coisa julgada no cível a sentença penal que reconhecer ter sido o
ato praticado em estado de necessidade, em legítima defesa, em estrito
cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito"); art. art. 91, I,
do CP ("São efeitos da condenação: I - tornar certa a obrigação de indenizar
o dano causado pelo crime."); e art. 475-N do CPC ("São títulos executivos
judiciais: II- a sentença penal condenatória transitada em julgado"). Diante do
conjunto desses dispositivos legais, a doutrina e a jurisprudência são
uníssonas ao afirmar que não possuem efeito na esfera cível, decisões
adotadas na esfera criminal que importem: absolvição por ausência de culpa,
absolvição por insuficiência de provas, absolvição por inexistência de crime,
decisões de pronúncia, impronúncia e desclassificação, decretação de
extinção de punibilidade (salvo prescrição in concreto), reconhecimento de
causa excludente de culpabilidade (dirimentes - coação irresistível,
obediência hierárquica...), absolvição por legítima defesa putativa,
arquivamento do Inquérito Policial - sendo esse o caso em tela. 1.3.
LEGITIMIDADE ATIVA DOS IRMÃOS DA VÍTIMA. Tratando-se de ação de
indenização por dano morte, havendo, no pólo ativo, irmãos da vítima, a
relação de afeto é presumida, permitindo visualizar-se, prima facie, a hipótese
de dano por ricochete e, portanto, a sua legitimidade ativa. 1.4. FALTA DE
INTERESSE PROCESSUAL. O dano moral constitui pressuposto da
responsabilidade e, naturalmente, a sua ocorrência ou não é questão de
mérito a ensejar, ao término da instrução, a procedência ou improcedência
da pretensão indenizatória. Preliminares rejeitadas. 2. MÉRITO. Dentre os
pressupostos/requisitos/elementos da responsabilidade civil, constam a
conduta (comissiva ou omissiva) de alguém, um dano, um nexo de
causalidade entre um e outro, além do nexo de imputação ( subjetiva, ou o
risco ou a idéia de garantia, quando se tratar de responsabilidade objetiva).
Ou seja, não basta a presença de um dano para que automaticamente surja
o dever de repará-lo. É mister que tal dano possa ser imputado a uma conduta
do réu. 3. No caso, não obstante o dano sofrido pelos autores seja inegável -
morte de um ente querido -, e a conduta possa ser imputável aos réus, a
prova produzida demonstrou que o agir do preposto destes estava
acobertado por uma das excludentes da ilicitude previstas no art. 188, I, do
Código Civil, qual seja, legítima defesa. 4. Sentença de improcedência
confirmada. PRELIMINARES REJEITADAS E APELO DESPROVIDO.
(Apelação Cível Nº 70056924145, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do
RS, Relator: Eugênio Facchini Neto, Julgado em 16/07/2014)

O exercício regular do direito significa que se alguém, no uso normal de um


direito lesar outrem, não terá qualquer responsabilidade pelo dano, por não ser um
procedimento ilícito.
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. APELAÇÃO CÍVEL.
RESPONSABILIDADE CIVIL. DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE
RELAÇÃO JURÍDICA CUMULADA COM OBRIGAÇÃO DE FAZER.
INSCRIÇÃO EM CADASTRO RESTRITIVO DE CRÉDITO. CESSÃO DE
CRÉDITO. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO. ART. 290 DO CÓDIGO CIVIL.
DÉBITO ORIGINÁRIO EXISTENTE. EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO.
ILÍCITO NÃO CARACTERIZADO. Hipótese em que restou devidamente
comprovado nos autos, por prova documental idônea e não impugnada, a
existência da dívida contraída pela parte autora com a instituição financeira
cedente do crédito a terceiro. Evidenciada a existência do crédito que foi
objeto de cessão, verificou-se a substituição do pólo ativo da relação jurídica
obrigacional, assumindo o cessionário a posição do credor originário, com
todos os seus direitos, inclusive o de praticar atos visando à conservação do
crédito cedido. Desse modo, conclui-se que a inscrição levada a efeito em
cadastro restritivo de crédito ocorreu no exercício regular de um direito
outorgado ao credor cessionário (art. 188, inc. I, do Código Civil). A
186
notificação do devedor (art. 290 do Código Civil) a respeito da cessão de
crédito não é condição de existência ou de validade do ato de cessão, tendo
por finalidade apenas permitir que o devedor quite a dívida regularmente. No
caso concreto não há qualquer prova do adimplemento da obrigação cedida,
razão pela qual a ação intentada é improcedente. RECURSO
ACLARATÓRIO. REDISCUSSÃO DE QUESTÕES JÁ DECIDIDAS PELO
ARESTO EMBARGADO. INVIABILIDADE NOS ESTREITOS LIMITES DO
RECURSO ELEITO. FINALIDADE PRECÍPUA DE
PREQUESTIONAMENTO. Aresto que apreciou todas as questões
controvertidas e se pronunciou acerca dos dispositivos legais aplicáveis à
espécie. Enfrentamento de matéria já examinada pelo Colegiado.
Inviabilidade nos estreitos limites da via recursal eleita. Ausência dos
pressupostos do art. 1.022 do CPC/2015. Mesmo visando os aclaratórios o
prequestionamento da matéria neles suscitada devem estar presentes os
requisitos elencados nos incisos do art. 1.022 do CPC/2015, para que o
recurso possa ser acolhido. Omissão, obscuridade, contradição interna ou
erro material indemonstrados. EMBARGOS DECLARATÓRIOS
DESACOLHIDOS. (Embargos de Declaração Nº 70068888247, Nona
Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Miguel Ângelo da Silva,
Julgado em 25/05/2016)

O inciso II, do art. 188, CC, trata do estado de necessidade e prevê que se
alguém, para remover perigo iminente destruir alguma coisa alheia ou agredir a
outrem, deverá indenizar o outro, cabendo ação regressiva contra o verdadeiro
agressor (arts. 929 e 930, CC). O estado de necessidade consiste, então, em situação
de agressão a um direito alheio, de valor jurídico igual ou inferior àquele que se
pretende proteger, para remover perigo iminente, quando as circunstâncias do fato
não autorizarem outra forma de atuação. Só será legítimo o estado de necessidade
quando as circunstâncias o torarem absolutamente necessário.

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL EM ACIDENTE DE


TRÂNSITO. COLISÃO FRONTAL ENTRE CAMINHÃO E AUTOMÓVEL.
ESTADO DE NECESSIDADE. DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO
NOS TERMOS DO ART. 929, CC. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA
REFORMADA. RUBRICAS CONDENATÓRIAS. PRECEDENTES DO STJ E
DESTA CORTE. Embora o preposto da empresa ré tenha invadido a pista
contrária ao desviar de obstáculo na pista de rolamento, e, assim, agir sob a
excludente do estado de necessidade, colidiu com o veículo dos autores,
causando danos materiais e extrapatrimoniais, e, assim, responde civilmente
pela sua reparação. Quem sofre os danos deve ser indenizado em que pese
nenhuma culpa tenha quem gerou a colisão, ou seja, o ato em estado de
necessidade, embora lícito (art. 188, II, do Código Civil), obriga o causador a
indenizar (art. 929 do Código Civil). Indenização pelas despesas médicas,
hospitalares, medicamentos e afins deferida ao efeito de que os valores
postulados sejam apurados em liquidação de sentença por arbitramento (art.
475-D do Código de Processo Civil), a partir do exame da documentação já
acostada aos autos. Incabível o deferimento do pedido de indenização devido
à depreciação do veículo dos autores, bem como o reembolso dos encargos
atinentes ao empréstimo pessoal, pois ausente prova das alegações autorais.
Dano moral in re ipsa configurado, porquanto detectada a potencial gravidade
das lesões e sua repercussão na vida da vítima, com seqüelas motoras e
articulares irreversíveis. Adequado ao contexto a fixação de 45 (quarenta e
187
cinco) salários mínimos nacionais atuais. Dano estético comprovado
consoante demonstrado nas fotografias acostadas aos autos, estipulada a
rubrica no mesmo montante dos danos morais. Encargos sucumbenciais
readequados. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.. (Apelação Cível Nº
70067709030, Décima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS,
Relator: Guinther Spode, Julgado em 25/02/2016)

Estado de necessidade e legítima defesa são distintos, pois no primeiro, o agente


não reage a uma situação injusta, mas age ara subtrair um direito seu ou de outrem
de uma situação de perigo concreto. Ex.: alguém que desvia o carro do bebê, para
não atropelá-lo, mas atinge o muro da casa, causando danos materiais. Agiu em
estado de necessidade. Terá o dever de indenizar os prejuízos materiais causados,
embora não seja ato ilícito.
Sendo assim, em situações excepcionais, os atos lícitos poderão impor a
obrigação de indenizar. Ex.: art. 1.285, CC.

188
13
14. PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA

O exercício de um direito não pode ficar pendente, indefinidamente, no tempo.


O titular do direito deve exercê-lo dentro do prazo.
Sendo assim, com base na certeza e na segurança da ordem jurídica, surge a
matéria da prescrição e da decadência, pois não é razoável que sejam estabelecidas
relações jurídicas perpétuas, capazes de obrigar sem limitação temporal.

13.1 O tempo como fato jurídico


O tempo não para e é, justamente, os efeitos jurídicos do decurso do tempo, que
trata a prescrição e a decadência.
O tempo é um fato jurídico natural e traz repercussões no nascimento, exercício
e extinção de direitos.
O decurso de tempo pode ser fato gerador de aquisição de direitos. Ex.:
usucapião, onde a posse mansa e pacífica por certo período de tempo possibilita a
aquisição da propriedade de imóvel.
O tempo tem força modificativa. Ex.: situação das capacidades. Alguém com 15
anos é incapaz, mas com o decurso do tempo deixará de sê-lo.
O tempo também pode, também determinar a morte de certos direitos ou
pretensões decorrentes de sua violação, que é o caso da prescrição e da decadência.

13.2 Prescrição
A prescrição é a perda da pretensão de reparação do direito violado, em razão
da inércia do titular, dentro do prazo previsto pela lei. Neste aspecto, o art. 189, CC,
determina:
Art. 189. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue,
pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206.

Assim, se o titular permanecer inerte, a pena será a perda da pretensão judicial


de cobrança que teria.
A prescrição, é, com isto, um benefício para o devedor, pela regra de que o
direito não socorre àqueles que dormem.
A prescrição pode ser:

189
a) Extintiva: é a perda da pretensão.
b) Aquisitiva: relativa ao direito das coisas – usucapião.
c) Intercorrente: quando o autor de processo já iniciado permanece inerte, de
forma continuada e ininterrupta, durante lapso temporal suficiente para a
perda da pretensão. Interrompida a prescrição o prazo voltará a fluir do último
ato do processo que a interrompeu.

A prescrição extintiva é um fato jurídico stricto sensu, relacionado ao decurso do


tempo e, portanto, a fatos naturais.
Na prescrição, o que ocorre é a extinção da pretensão. O direito, contudo,
permanece incólume, mas sem a proteção jurídica para solucioná-lo.

Pretensões imprescritíveis
Apesar de a prescrição ser a regra, existem pretensões que são imprescritíveis
(exceção):
a) Que protegem os direitos da personalidade: vida, honra, liberdade,
integridade física ou moral, imagem, nome, obras literárias, artísticas ou
científicas.
b) As que se prendam ao estado das pessoas: filiação (prescreve, contudo, a
ação de petição de herança – 10 anos a contar do óbito), qualidade de
cidadania (interdição), condição conjugal (separação, divórcio)
c) As de exercício facultativo ou potestativo: não existe direito violado, como as
destinadas a extinguir o condomínio (ação de divisão – Art. 1.320, CC), pedir
a meação no muro do vizinho;
d) As referentes a bens públicos de qualquer natureza;
e) As que protegem o direito de propriedade, que é perpétuo;
f) As pretensões de reaver bens confiados à guarda de outrem, a título de
depósito, penhor ou mandato.
g) As destinadas a anular inscrição do nome empresarial feita com violação de
lei ou contrato (Art. 1.167, CC).
h) Pretensões de ressarcimento do erário por danos decorrentes de atos de
improbidade administrativa (segundo o STJ)

190
Prescrição e institutos afins
Alguns institutos, por também sofrerem a ação do tempo, são semelhantes à
prescrição, mas com ela não se confundem:
Preclusão – perda de uma faculdade processual, por não ter sido exercida no
tempo certo. Ex.: não juntou documentos com a inicial, precluiu o prazo para juntar.
Perempção – também de natureza processual, consiste na perda do direito de
ação pelo autor contumaz, que tenha dado causa a três arquivamentos sucessivos.
Passa a poder alegar o direito apenas como matéria de defesa (não pode ingressar
com nova ação).

Disposições gerais sobre prescrição


A prescrição é a perda ou extinção da pretensão, por relacionar-se com um
direito subjetivo.
Os arts. 205 e 206, CC tratam dos prazos de prescrição.
O prazo de prescrição inicia sua contagem, segundo o enunciado 14 do
CJF/STJ, do surgimento da pretensão – violação do direito subjetivo:

Enunciado 14: Art. 189: 1) O início do prazo prescricional ocorre com o


surgimento da pretensão, que decorre da exigibilidade do direito subjetivo; 2)
o art. 189 diz respeito a casos em que a pretensão nasce imediatamente após
a violação do direito absoluto ou da obrigação de não fazer.

Assim, no caso de uma dívida, a prescrição começa a correr no momento em


que não há o pagamento (vencimento + inadimplemento). No caso de um ato ilícito,
inicia a prescrição com a ocorrência do evento danoso.
Em havendo uma condição ou prazo, a contagem da prescrição inicia com a
implementação
Mas para que se configure a prescrição, necessária a presença de três
elementos:
a) Existência de uma pretensão exercitável;
b) Inércia do titular pelo seu não exercício;
c) Decurso de tempo fixado em lei.

O art. 190 estabelece que a exceção prescreve no mesmo prazo em que a


pretensão. A exceção é a alegação de uma pretensão como defesa.

191
Renúncia da prescrição.
Art. 191 – não cabe renúncia prévia da prescrição. Só é cabível quando já
consumada a prescrição. Assim, são dois os requisitos para a validade da renúncia à
prescrição: a) que já tenha sido consumada; b) que não prejudique terceiros (credores
que poderão ser prejudicados com a renúncia da prescrição).
A renúncia pode ser:
a) Expressa – manifestação taxativa, inequívoca, escrita ou verbal, por parte do
devedor, de que não pretende se utilizar da prescrição.
b) Tácita – art. 191, CC, é a que se presume de fatos do interessado,
incompatíveis com a prescrição. Ex.: uma vez consumada a prescrição, ato
de reconhecimento da dívida por parte do devedor, como, por exemplo, o
pagamento parcial da dívida ou composição visando a solução futura do
débito.
Sendo assim, mesmo havendo dívida prescrita, não há óbice ao fato de o
devedor quitar tal dívida. Contudo, o art. 882, CC determina que não cabe repetição
do indébito quando feito pagamento para quitar dívida prescrita.

Prazos de prescrição não podem ser alterados por acordo entre as partes
Art. 192 – os prazos prescricionais não podem ser alterados por acordo entre as
partes.

Prescrição pode ser alegada em qualquer grau de jurisdição


Art. 193 – a parte a quem aproveite a prescrição pode ser alegada em qualquer
fase ou estado da causa, em primeira ou segunda instância, ou seja, em qualquer fase
do processo de conhecimento (mesmo que não tenha sido alegada em contestação).
Não cabe alegar prescrição em fase de cumprimento de sentença, salvo a
superveniente, ou seja, aquela que surja após a sentença.
Se a prescrição não foi arguida na primeira ou segunda instância, não cabe sua
alegação perante os Tribunais Superiores (STJ ou STF), por falta de
prequestionamento.

192
Prescrição pode ser alegada pela parte a quem aproveita
Art. 193 – A alegação da prescrição não cabe apenas ao devedor, mas a quem
possa interessar seu reconhecimento. Ex.: credores do devedor (ou prescribente)
insolvente.
Também pode alegar a prescrição o representante do Ministério Público.

A prescrição pode ser suprida de ofício pelo juiz.


Com a revogação do art. 194, CC, verifica-se da possibilidade de que o juiz, de
ofício, reconheça a prescrição, até mesmo em razão da celeridade processual.
Contudo, o reconhecimento, de ofício, pelo juiz, da prescrição, não retira a
possibilidade de renúncia da prescrição por parte do devedor (enunciado 295,
CJF/STJ).

Cabe ação contra os representantes que deram causa à prescrição


Art. 195 – Segundo o art. 195, CC, os relativamente incapazes e as pessoas
jurídicas têm ação contra os seus assistentes ou representantes legais, que derem
causa à prescrição, ou não a alegarem oportunamente. Cabe, portanto, indenização
pelos prejuízos sofridos. Ex.: tutelado tem direito a receber indenização do tutor que
tiver lhe causado prejuízo em razão da prescrição.

Prescrição iniciada contra uma pessoa continua a correr contra o sucessor


Art. 196 – Uma vez que se inicie a correr a prescrição, segue a contagem contra
o herdeiro, de forma que o sucessor terá apenas o prazo faltante para exercer a
pretensão, quando do óbito do autor da herança. Tanto o prazo contra, como o a favor
do sucessor não inicia nova contagem (prossegue, mesmo com o óbito).

Causas que impedem ou suspendem a prescrição


Os arts. 197 a 201, CC tratam das causas que impedem ou suspendem a
prescrição, de acordo com o momento em que surgem.
Quando se fala em suspensão da prescrição, se trata de situações em que o
prazo iniciou a contagem e, por algum fato previsto em lei, há a suspensão. Cessada
a causa de suspensão, o prazo volta a correr de onde tinha parado, ou seja, apenas
pelo tempo restante.

193
Não corre prescrição (suspende ou impede):

Art. 197. Não corre a prescrição:


I - entre os cônjuges, na constância da sociedade conjugal;

Aqui incluem-se, não só os cônjuges, durante o matrimônio, mas também os


conviventes, durante a união estável (enunciado 296, CJF/STJ).

II - entre ascendentes e descendentes, durante o poder familiar;

O poder familiar cessa quando o filho completar 18 anos.

III - entre tutelados ou curatelados e seus tutores ou curadores, durante a


tutela ou curatela.

Art. 198. Também não corre a prescrição:


I - contra os incapazes de que trata o art. 3o;
II - contra os ausentes do País em serviço público da União, dos Estados ou
dos Municípios;
III - contra os que se acharem servindo nas Forças Armadas, em tempo de
guerra.

Quanto a situação dos arts. 197, II e art. 198, I, CC, deve-se destacar a questão
dos alimentos. Em se tratando de suspensão ou impedimento de início da contagem
do prazo prescricional, deve-se considerar que, no caso de alguém com 17 anos não
corre prescrição, podendo cobrar todo o débito alimentar (de 1999 até 2014, por
exemplo). Contudo, mesmo que complete 18 anos, só a partir dali é que começa a
correr o prazo prescricional de 2 anos. Significa dizer que até os 20 anos cabe cobrar
todo o período devido.
Relativamente incapazes Corre contra ou a favor
PRESCRIÇÃO Absolutamente incapazes Se contra: a prescrição não corre
Se a favor: a prescrição corre

É o que entende a jurisprudência do TJ/RS:


AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS.
PRESCRIÇÃO. MAIORIDADE. Considerando que o prazo prescricional
somente começa a correr após o implemento a maioridade, por conta do
disposto nos arts. 197, II e 206, § 2º, ambos do Código Civil, e a ação de
execução foi ajuizada menos de dois meses após a exequente completar 18
anos (fls. 08 e 19), não há falar em prescrição das parcelas alimentares.
NEGARAM PROVIMENTO. UNÃNIME. (Agravo de Instrumento Nº

194
70063651467, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz
Felipe Brasil Santos, Julgado em 23/04/2015)

... INTEIRO TEOR.....


Keller M. R. ingressou com ação de execução de alimentos pelo rito da
constrição patrimonial contra o genitor Leonardo, objetivando o pagamento
dos alimentos devidos e não pagos durante o período de outubro de 1999 a
junho de 2014 (fls. 09/11). A demanda foi ajuizada em 13/10/2014, ou seja,
pouco menos de dois meses depois de a autora atingir a maioridade civil (fl.
19).
Nesse sentido, a teor do que dispõem os artigos 197, II e 206, § 2º, ambos
do Código Civil, não corre a prescrição entre ascendentes e descendentes
durante o poder familiar, bem como prescreve em dois anos as prestações
alimentares, a partir da data que se vencerem.
Ou seja, tendo a agravada completado a maioridade civil e tão logo
ingressado em juízo, não há falar em prescrição. À similitude:
APELAÇÃO. EMBARGOS À EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. PRESCRIÇÃO.
INOCORRÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE DÉBITO. RECONHECIMENTO. Não
há prescrição no ajuizamento da execução de alimentos, quando a ação
executiva foi ajuizada menos de 02 anos depois da alimentada ter
implementado a maioridade. Caso em que a alimentada, agora maior de
idade, cobra do pai alimentos fixados em título executivo que previa
pagamento na conta bancária da genitora da alimentada. Se o título executivo
previa pagamento mediante depósito em conta da genitora, então a
maioridade da alimentada, por si só, não provocou alteração imediata e
automática na forma de pagamento dos alimentos. (...). DERAM PARCIAL
PROVIMENTO. (Apelação Cível Nº 70061291522, Oitava Câmara Cível,
Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Pedro de Oliveira Eckert, Julgado
em 12/02/2015) – grifos apostos.
Destarte, de ser integralmente mantida a decisão agravada.
Assim, considerando que o prazo prescricional somente começa a correr
após o implemento a maioridade e a ação de execução foi ajuizada menos
de dois meses após a exeqüente completar 18 anos (fls. 08 e 19), não há
falar em prescrição das parcelas alimentares.

Aqui, cabe mencionar a situação do art. 198, II, enquadrando-se os


representantes diplomáticos do Brasil junto aos países estrangeiros, os agentes
consulares brasileiros no exterior, os que estiverem a serviço do governo federal,
estadual ou municipal, para estudos técnicos em países estrangeiros, militar em
missão de paz fora do Brasil, etc.

Art. 199. Não corre igualmente a prescrição:


I - pendendo condição suspensiva;
II - não estando vencido o prazo;
III - pendendo ação de evicção.

Nas duas primeiras situações, o direito ainda não se tornou exigível, não sendo
possível, portanto, falar-se em prescrição. Se terceiro propor ação de evicção, a
prescrição só corre após o desfecho final.

195
Art. 200. Quando a ação se originar de fato que deva ser apurado no juízo
criminal, não correrá a prescrição antes da respectiva sentença definitiva.

No caso de reparação civil, só inicia a contagem do prazo quando houver


sentença penal condenatória definitiva.

Art. 201. Suspensa a prescrição em favor de um dos credores solidários, só


aproveitam os outros se a obrigação for indivisível.

A prescrição é benefício pessoal e só aproveita as pessoas mencionadas,


mesmo em caso de solidariedade. Para que a suspensão da prescrição que favoreça
um dos credores solidários beneficie aos demais, a obrigação deve ser indivisível.
Ex.: a obrigação de entrega de animal é indivisível. Se forem três credores de
devedor comum. Um dos credores é absolutamente incapaz. Contra ele não corre
prescrição. Como a obrigação é indivisível, beneficia a todos a prescrição. neste caso,
só iniciaria o prazo de contagem a partir do momento em que fizesse 16 anos.
Ex.: obrigação de pagar importância em dinheiro. Se forem três credores de
devedor comum. Um dos credores é absolutamente incapaz. Contra ele não corre
prescrição. Como a obrigação é divisível, não haverá benefício aos demais.

Causas que interrompem a prescrição


A interrupção depende de um comportamento ativo do credor. Diferentemente
da suspensão, que decorre de fatos previstos em lei, a interrupção demanda um ato
de exercício ou proteção do direito. Nestes casos, extingue o tempo já decorrido, que
volta a correr por inteiro (diferente da suspensão, quando o prazo volta a fluir pelo
tempo restante).
O efeito da interrupção é instantâneo, pois, segundo o art. 202, § único, CC, a
prescrição interrompida começa a correr da data do ato que a interrompeu.
Contudo, a interrupção só pode ocorrer uma vez (art. 202, CC)
As causas que interrompem a prescrição são:

Art. 202. A interrupção da prescrição, que somente poderá ocorrer uma vez,
dar-se-á:
I - por despacho do juiz, mesmo incompetente, que ordenar a citação, se o
interessado a promover no prazo e na forma da lei processual;

Esse despacho deve ser seguido da citação válida. Uma vez operada a citação,
a interrupção retroage a data da propositura da ação (art. 240, § 1.º, CPC/2015). Com
isto, mesmo que a citação demore, não haverá a prescrição.
196
II - por protesto, nas condições do inciso antecedente;
III - por protesto cambial;

Estes dois incisos tratam de protesto (judicial e cambiário).

IV - pela apresentação do título de crédito em juízo de inventário ou em


concurso de credores;
V - por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor;

A notificação extrajudicial, feita pelo Cartório de Títulos e Documentos não é


capaz de interromper a prescrição.

VI - por qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial, que importe


reconhecimento do direito pelo devedor.

Ex.: pagamento parcial da dívida, envio de carta reconhecendo a dívida, etc.

A prescrição pode ser interrompida por qualquer interessado (art. 203, CC)
Os efeitos da prescrição são pessoais. O efeito da interrupção da prescrição por
um credor não aproveita aos demais, assim como aquela promovida contra um
devedor ou seu herdeiro, não prejudica aos demais coobrigados (art. 204, CC). Esta
regra, contudo, admite exceção: a interrupção por um dos credores solidários
aproveita aos demais.

Prazos prescricionais
Os prazos prescricionais podem ser:
a) Ordinários: quando não houver prazo especial, o prazo prescricional é de 10
anos, tanto para ações reais, quanto para pessoais (art. 205, CC).
Art. 205. A prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado
prazo menor.

b) Especiais: são prazos mais exíguos, previstos especificiamente no art. 206,


CC e podem ser de 1, 2, 3, 4 ou 5 anos.
Art. 206. Prescreve:
§ 1o Em um ano:
I - a pretensão dos hospedeiros ou fornecedores de víveres destinados a
consumo no próprio estabelecimento, para o pagamento da hospedagem ou
dos alimentos;
II - a pretensão do segurado contra o segurador, ou a deste contra aquele,
contado o prazo:

197
a) para o segurado, no caso de seguro de responsabilidade civil, da data em
que é citado para responder à ação de indenização proposta pelo terceiro
prejudicado, ou da data que a este indeniza, com a anuência do segurador;
b) quanto aos demais seguros, da ciência do fato gerador da pretensão;
III - a pretensão dos tabeliães, auxiliares da justiça, serventuários judiciais,
árbitros e peritos, pela percepção de emolumentos, custas e honorários;
IV - a pretensão contra os peritos, pela avaliação dos bens que entraram para
a formação do capital de sociedade anônima, contado da publicação da ata
da assembléia que aprovar o laudo;
V - a pretensão dos credores não pagos contra os sócios ou acionistas e os
liquidantes, contado o prazo da publicação da ata de encerramento da
liquidação da sociedade.
§ 2o Em dois anos, a pretensão para haver prestações alimentares, a partir
da data em que se vencerem.
§ 3o Em três anos:
I - a pretensão relativa a aluguéis de prédios urbanos ou rústicos;
II - a pretensão para receber prestações vencidas de rendas temporárias ou
vitalícias;
III - a pretensão para haver juros, dividendos ou quaisquer prestações
acessórias, pagáveis, em períodos não maiores de um ano, com
capitalização ou sem ela;
IV - a pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa;
V - a pretensão de reparação civil;
VI - a pretensão de restituição dos lucros ou dividendos recebidos de má-fé,
correndo o prazo da data em que foi deliberada a distribuição;
VII - a pretensão contra as pessoas em seguida indicadas por violação da lei
ou do estatuto, contado o prazo:
a) para os fundadores, da publicação dos atos constitutivos da sociedade
anônima;
b) para os administradores, ou fiscais, da apresentação, aos sócios, do
balanço referente ao exercício em que a violação tenha sido praticada, ou da
reunião ou assembléia geral que dela deva tomar conhecimento;
c) para os liquidantes, da primeira assembléia semestral posterior à violação;
VIII - a pretensão para haver o pagamento de título de crédito, a contar do
vencimento, ressalvadas as disposições de lei especial;
IX - a pretensão do beneficiário contra o segurador, e a do terceiro
prejudicado, no caso de seguro de responsabilidade civil obrigatório.
§ 4o Em quatro anos, a pretensão relativa à tutela, a contar da data da
aprovação das contas.
§ 5o Em cinco anos:
I - a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento
público ou particular;
II - a pretensão dos profissionais liberais em geral, procuradores judiciais,
curadores e professores pelos seus honorários, contado o prazo da
conclusão dos serviços, da cessação dos respectivos contratos ou mandato;
III - a pretensão do vencedor para haver do vencido o que despendeu em
juízo.

13.3 Decadência
Decadência é a perda do direito potestativo pela inércia de seu titular no período
determinado pela lei. O objeto são os direitos potestativos de qualquer espécie,
disponíveis ou indisponíveis, direitos que conferem ao titular o poder de influir ou
determinar mudanças na esfera jurídica de outrem, por ato unilateral, sem que haja
dever correspondente, apenas uma sujeição.

198
Na decadência o prazo começa a correr no momento em que o direito nasce. O
prazo prescricional, por sua vez, inicia no momento em que há a violação do direito.
A decadência pode resultar e lei, do testamento ou do contrato. A prescrição
deriva apenas da lei.
Os prazos de prescrição são taxativos (apenas as hipóteses dos arts. 205 e 206,
CC). Os demais prazos são decadenciais.
Na decadência há a perda de um direito previsto em lei. A lei estabelece que
determinado ato deva ser exercido dentro de um prazo determinado. Em não o sendo,
não mais poderá efetivar-se, pois seu titular decaiu do direito. A decadência é o não
exercício de um direito potestativo dentro do prazo. Ex.: direito de pleitear a anulação
de um negócio jurídico (prazo de 180 dias a contar da celebração).
A decadência pode ser legal ou convencional. No caso da decadência
convencional, estabelece o art. 211, CC, que a parte a quem aproveita pode alega-la
em qualquer grau de jurisdição, mas o juiz não pode suprir a alegação. O juiz deve,
de ofício, reconhecer a decadência, quando for legal (art. 210, CC).
Em princípio, os prazos decadenciais são fatais e peremptórios, o que significa
dizer que não se aplica à decadência as situações de interrupção e suspensão da
prescrição (art. 207, CC) (salvo disposição em contrário).
Aplica-se à decadência as situações dos arts. 195 e 198, I, CC (art. 208, CC),
que dizem respeito a incapazes. Assim, não flui o prazo de decadência contra
absolutamente incapazes, sendo uma exceção ao disposto no art. 207.
Segundo o art. 209, CC, a decadência legal é irrenunciável. Isto ocorre em razão
do interesse geral. Contudo, os prazos decadenciais convencionais podem ser
renunciados.

Prazos de decadência
Os prazos decadenciais estão previstos em locais esparsos na legislação. Tem-
se como alguns exemplos:
- 30 dias: para o comprador propor ação em que pretenda rescindir o contrato e
reaver o preço pago pela coisa móvel (art. 445, CC)
- 60 dias: para o exercício do direito de preferência, caso inexista prazo
estipulado, na coisa imóvel, contado da data em que o comprador tiver notificado o
vendedor (art. 516, CC).

199
- 180 dias: para o exercício do direito de preferência do condômino a quem não
tenha sido dado tal direito e o imóvel tenha sido vendido a terceiro.
- 1 ano: para revogação da doação por ingratidão ou diante da inexecução do
encargo.
- 1 ano e 1 dia: para desfazer janela, sacada, terraço ou goteira sobre o seu
prédio, em face do vizinho. Prazo conta-se da conclusão da obra (art. 1.302, CC).
- 3 anos: anulação de casamento celebrado com erro essencial quanto à pessoa
do outro, contado da data da celebração
- 4 anos: para anular negócio jurídico celebrado com vício do consentimento
- 5 anos: para impugnar a validade de testamento, contado da data do seu
registro.

200
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