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Tribunal de Justiça de Minas Gerais

Número do 1.0702.09.567849-7/002 Númeração 5678497-


Relator: Des.(a) Vanessa Verdolim Hudson Andrade
Relator do Acordão: Des.(a) Vanessa Verdolim Hudson Andrade
Data do Julgamento: 15/04/2014
Data da Publicação: 23/04/2014

EMENTA: AÇÃO CIVIL PÚBLICA - I. ADOÇÃO - GUARDA PROVISÓRIA -


DESISTÊNCIA DA ADOÇÃO DE FORMA IMPRUDENTE -
DESCUMPRIMENTO DAS DISPOSIÇÕES DO ART. 33 DO ECA -
REVITIMIZAÇÃO DA CRIANÇA - REJEIÇÃO - SEGREGAÇÃO - DANOS
MORAIS CONSTATADOS - ART. 186 C/C ART. 927 DO CÓDIGO CIVIL -
REPARAÇÃO DEVIDA - AÇÃO PROCEDENTE - II. QUANTUM
INDENIZATÓRIO - RECURSOS PARCOS DOS REQUERIDOS -
CONDENAÇÃO INEXEQUÍVEL - MINORAÇÃO - SENTENÇA
PARCIALMENTE REFORMADA.

- A inovadora pretensão do Ministério Público, de buscar o ressarcimento civil


com a condenação por danos morais daqueles que desistiram do processo
de adoção, que estava em fase de guarda, de forma abrupta e causando
sérios prejuízos à criança, encontra guarida em nosso direito pátrio,
precisamente nos art. 186 c/c arts. 187 e 927 do Código Civil.

- O ilícito que gerou a reparação não foi o ato em si de desistir da adoção da


criança, mas o modus operandi, a forma irresponsável que os requeridos
realizaram o ato, em clara afronta aos direitos fundamentais da criança, bem
como ao que está disposto no art. 33 do Estatuto da Criança e do
Adolescente. Assim, pode haver outra situação em que a desistência da
adoção não gere danos morais à criança, no entanto, não é este o caso dos
autos.

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0702.09.567849-7/002 - COMARCA DE


UBERLÂNDIA - APELANTE(S): M.C.B.S., D.A.S. E OUTRO(A)(S) -
APELADO(A)(S): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS -
INTERESSADO: N.G.S.

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ACÓRDÃO

(SEGREDO DE JUSTIÇA)

Vistos etc., acorda, em Turma, a 1ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de


Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos
em DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO, VENCIDO O VOGAL.

DESA. VANESSA VERDOLIM HUDSON ANDRADE

RELATORA.

DESA. VANESSA VERDOLIM HUDSON ANDRADE (RELATORA)

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto às fls. 565/596 por


D.A.S. e M.C.B.S. nos autos da ação civil pública movida pelo Ministério
Público de Minas Gerais em desfavor destes, demonstrando inconformismo
perante a sentença proferida às fls. 523/556, que julgou parcialmente
procedente a pretensão do demandante e, por conseguinte, condenou os
demandados a reparar os danos morais causados à favorecida N.G.S. a
quantia de R$15.000,00 (quinze mil reais), acrescida de: I) juros, no
percentual de 1% a partir da data do evento danoso, no caso a data da
efetiva "devolução" da favorecida com seu retorno à Instituição de
Acolhimento, qual seja, 17/10/2008 e II) correção monetária conforme índices
da Corregedoria Geral de Justiça de Minas Gerais, a partir da publicação
desta decisão. Indeferiu os pedidos dos requeridos de reembolso da quantia
descontada a título de alimentos ressarcitórios, a qual, após o transito em
julgado, deverá ser revertida em favor da beneficiária N.G.S. Deferiu o
pedido de justiça gratuita formulado pelos requeridos, suspendendo a
exigibilidade de tal verba por litigarem sob pálio da Gratuidade Judiciária.

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Em suas razões recursais, os apelantes insurgem-se quanto à


condenação ao pagamento de danos morais, alegando que não agiram com
má fé ou com irresponsabilidade, que tiveram um cuidado muito grande com
a criança enquanto estavam com ela. Colocam que durante o estágio de
convivência não houve apatia, afinidade entre eles e a criança,
principalmente no tangente à raça, visto que a criança é branca e os
apelantes são negros. Sustentam que a criança começou a apresentar
comportamentos contrários aos valores que possuíam. Salientam que não
foram apresentados nos autos os relatórios mensais que comprovariam que
os apelantes vinham dando sinal ao setor técnico de que não estavam se
adaptando com a criança e nem a criança com eles e que isso foi ignorado
pelo juízo. Explanam que estavam com a guarda provisória e que, portanto,
tinham o direito de devolver a menor ao Estado, pois não tinham efetivado a
adoção. Colocam que não foram devidamente preparados para serem pais
adotivos e que não passaram pelo estudo psicossocial antes do deferimento
da guarda provisória. Explanam que o estudo psicossocial do casal só foi
realizado após ser concedida a guarda provisória. Frisam que não houve
preparação da criança para a receptividade da adoção ou guarda provisória

Completam que não conseguiram se afeiçoar à criança, que


sentiam dó dela, mas não amor. Salientam que a criança estava realizando
pequenos furtos na escola e que isso assustou muito o casal, que tinham
medo da pessoa que ela iria se tornar. Trazem que a criança foi adotada um
ano após a devolução, o que demonstra que os danos foram reversíveis, pois
caso contrário a criança não estaria apta para passar novamente por um
estágio de convivência e posteriormente ser adotada. Assim, defendem a
licitude do comportamento e pugnam pela reforma da sentença, para que
seja extirpada a condenação a título de danos morais. Sucessivamente,
pleiteiam a minoração do valor fixado a título de danos morais, por alegarem
que não possuem condições financeiras de arcar com o valor da condenação
e que são apenas contratados pelo Estado de Minas Gerais e não
concursados, pelo que podem ter seu contrato rescindido a qualquer
momento. Assim, em caso de eventual condenação, pleiteiam a minoração
do valor fixado a título de danos morais.

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Ainda na hipótese de eventual condenação, pleiteiam que os juros


de mora sejam fixados a partir da data da decisão e não a partir do evento
danoso. Por fim, pleiteiam que os alimentos ressarcitórios pagos sejam
reembolsados ou que sejam descontados do valor da condenação por danos
morais. Por fim, pugnam pelo provimento do recurso aviado.

Contrarrazões às fls. 598/609, na qual o apelado aduz que o caso


tratado é pioneiro na justiça brasileira e causou grande repercussão na
imprensa e no meio jurídico, servindo de paradigma para que outras ações
fossem ajuizadas. Assim, coloca que a confirmação do provimento
jurisdicional recorrido terá forte impacto positivo no meio social, com
benefícios diretos para crianças e adolescentes em situação de abandono
familiar ou de acolhimento institucional. Alega que no relatório psicossocial
de fls. 50/51 os requeridos nada apresentaram que pudesse justificar
legitimamente o inesperado desprezo, bem como abandono material, moral,
emocional e psicológico da criança em causa. Assevera que podem decorrer
vários distúrbios do abandono afetivo da criança. Frisa que o chamado
estágio de convivência previsto no art. 46 do ECA foi instituído em benefício
do adotando e não dos adotantes, que não podem utilizar desse pretexto
para revitimizar crianças e adolescentes debilitados pelo abandono da família
originária, vigorando o melhor interesse da criança.

O apelado acrescenta que a sustentação de que não havia empatia


entre a criança e os adotandos devido ao fato de serem negros e a criança
ser branca é extremamente preconceituosa. Informam que a despeito da
alegação de que não ter curso preparatório para pais adotivos em
Uberlâncdia, não exige obrigação

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legal para tanto, mormente necessidade. Traz que o Código Civil prevê que o
dever de reparação do dano causado a outrem não resulta apenas de
condutas dolosas, mas também de imprudência e negligência, nos termos do
art. 186 187 e 927 do Código Civil. Apresentam que não é pelo fato de a
guarda ser revogável que os guardiões possam, de forma irresponsável,
devolver a criança à justiça, que tal atitude enseja a coisificação da criança.
Arrematam que a adoção superveniente de N. não eliminou do seu mundo
psíquico o registro indelével resultante da conduta danosa dos apelantes.
Assim, o Ministério Público pugna pela manutenção da sentença primeva.

À fl. 616 a Procuradoria Geral de Justiça colocou que por ser o


Ministério Público recorrido, descabe à PGJ emitir parecer.

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso


aviado.

Inexistindo preliminares, passo ao exame do mérito.

Trata-se de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público de


Minas Gerais em face do casal D.A.S. e M.C.B., objetivando a condenação
dos requeridos na obrigação de indenizar os danos morais e materiais
causados à criança N.G.S., bem como a fixação liminar dos alimentos
provisórios em favor da criança.

Foi colacionada à petição inicial cópia do processo de adoção


ajuizado outrora pelos ora requeridos, fls. 13/31, do qual

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podemos extrair que:

- Os genitores da criança N.G.S. foram destituídos do Poder


Familiar em 02 de Agosto de 2007.

- Em 31 de Janeiro de 2008 os ora requeridos ajuizaram ação de


adoção da criança N.G.S., alegando estarem inscritos no programa de
adoção sobre o processo nº 702.07.407.253-0 e "já conhecerem a criança no
abrigo Missão Esperança, onde a mesma se encontra, avistando-se com ela
há cerca de 6 meses, encontro que se dá semanalmente". Os ora requeridos,
acrescentaram no processo de adoção que "surge a necessidade da
aproximação na família substituta, principalmente pelos laços afetivos já
construídos" (fl. 14 - Grifo nosso). Assim, pugnaram pela concessão da
guarda provisória da criança, explanando que seria para regularizar uma
situação de fato no âmbito familiar já existente, acrescentando que
proporcionariam à criança proteção integral ao seu desenvolvimento.

Insta salientar, ainda, que os ora requeridos declararam na petição


inicial do processo de adoção que "a criança vem sendo esperada pelo casal
há algum tempo, tendo-se formado não só identidade fraternal em relação ao
casal, como, também, há adaptação familiar suficiente o bastante para a
formação de uma família devidamente estruturada" e ainda que "o casal está
seguro quanto ao pedido de adoção, informando que tudo tem feito para que
a adotanda passe a agregar a família, na qualidade de filha, assegurando-lhe
um desenvolvimento afeito, emocional e psicológico necessários."

- À fl. 20, em 1º de Fevereiro de 2008, o Magistrado Edison Magno


de Macêdo deferiu a guarda provisória da menor N.G.S. ao

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casal D.A.S. e M.C.B.S., conforme fl. 20. À fl. 21 o casal assinou o termo de
compromisso de bem e fielmente desempenhar o múnus na forma do art. 33
e seguintes do ECA.

- O estudo psicossocial da Inscrição para a Adoção foi colacionado


às fls. 488/501, no qual ficou constatado que o casal demonstrou capacidade
de assistir afetivamente uma criança. Assim, em 12 de Março de 2008, o
parecer foi favorável para a inscrição para a adoção do casal em tela.

- Foi realizado Estudo Psicossocial em 23 de junho de 2008, fls.


22/24, no qual a Psicóloga e a Assistente Social Judicial explanaram, em
síntese, que houve cerca de 02 (dois) procedimentos mensais de abordagem
junto à família substituta. Colocaram que o casal sugeriu à criança a
mudança de seu prenome e, com a concordância desta, passaram a chamar
a criança por outro nome. Citaram que o casal teve preocupações quanto à
escolha da forma adequada para educar a filha e procuravam conter os
primeiros comportamentos dela que consideravam inadequados. No entanto,
durante os últimos procedimentos, informam que o casal trouxe relatos de
maior tranquilidade na educação da criança. O estudo ressaltou aspectos
positivos da guarda, e, por fim, concluiu que:

"durante a convivência com a criança, o casal se mostrou satisfeito e


empenhado no exercício da maternidade e paternidade. Revelaram
capacidade de assimilar as orientações ministradas, refletir sobre seus
comportamentos e adaptarem-nos na perspectiva do bem estar as criança e
da bom convivência em família. N. demonstra sentimentos de pertencimento
à está família, percebendo-se como filha dos requerentes. Seus
comportamentos revelam bom desenvolvimento, inclusive no que tange ao
processo de adoção (...) a adaptação da

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família vem ocorrendo de forma tranquila e satisfatória, apontando para a


pertinência do deferimento da ação ora pleiteada." (Grifamos)

- Aproximadamente 03 meses após realização do estudo


psicossocial que foi pelo deferimento da ação de adoção, o casal, ora
requerido, desistiu do processo de adoção da criança, em 29 de setembro de
2008 (fl. 502). No relatório de fls. 27/28, que buscou verificar a causa da
desistência, a psicóloga e a assistente social judicial entrevistaram o casal,
que narrou que a criança estava realizando pequenos furtos, bem como:

"admitiu o despreparo dele e da esposa para enfrentar tais situações


adversas no que diz respeito à adoção dessa criança. Além disso, acredita
que ambos não dispunham de tempo suficiente junto à criança para conhecer
na realidade, quem era N. (...) Sobre a disponibilidade sempre anunciada por
este setor durante os atendimentos ao casal quanto a atendê-los, em
quaisquer circunstâncias de enfrentamento de dificuldades no que tange ao
processo de adoção, D. alegou que eles preferiram resolver as questões
enquanto uma família, sem interferências." (Grifamos)

- Após receber a inicial desta ação civil pública o magistrado


primevo concedeu a tutela pleiteada pelo Ministério Público, condenando os
réus ao pagamento de 15% de seus rendimentos líquidos a título de
alimentos ressarcitórios. Os requeridos interpuseram agravo de instrumento
da decisão que fixou os alimentos ressarcitórios. Conforme acórdão
reproduzido às fls. 332/343, no qual fui relatora, fiquei vencida e foi dado
provimento ao recurso, para que fosse anulada a decisão que concedeu ao
agravado a antecipação dos efeitos da tutela e impôs aos agravantes a
obrigação combatida.

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- Às fls. 388/391 foi realizado Estudo Psicossocial nos autos da


ação civil pública, no qual restou evidenciado, quanto aos danos sofridos
pela criança que "foi possível perceber o sofrimento emocional vivenciado
por ela, expressos em angústia, sentimento de rejeição e culpa, contundente
negação quanto origem consanguínea, confusão quanto à própria identidade
e identidade familiar (...) as expressões concretas de rejeição do casal pela
criança no cotidiano, acabou (sic) por intensificar seu sofrimento, indicando a
necessidade de efetivação de seu retorno ao abrigo e imediata intervenção
psicoterápica."

Outro fator a ser sopesado, lançado no citado estudo psicossocial,


foi o de o Setor de Psicologia e de Serviço Social do Fórum Abelardo Penna
não realizou nenhum procedimento antes do encaminhamento da criança ao
casal, que os estudos psicossociais só foram realizados após 01 de fevereiro
de 2008, data em que o magistrado primevo concedeu a guarda provisória da
criança ao casal.

- Às fls. 422/426 foi realizada a audiência de instrução e julgamento,


na qual foram ouvidos os requeridos, uma testemunha que foi coordenador
da instituição de acolhimento Missão Esperança, e a instrutora educacional
do abrigo.

- Em 16 de outubro de 2008, novo relatório psicológico indica os


traumas e sofrimentos emocionais que N. experimenta desde que o casal
desistiu do processo de adoção.

- Às fls. 505/507, parecer do setor de serviço social e

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psicologia, 03 de dezembro de 2008, colocando que a adoção de N. qualquer


outro interessado mostra-se inviável em face do sofrimento que vem tendo
em decorrência do processo de adoção frustrada. Relatórios posteriores em
06 de abril de 2009 (fls. 508/510) e 07 de maio de 2008 (fls. 511/512)
indicaram a permanência da difícil situação emocional que a criança se
encontra em face do ocorrido.

- Em 10 de Julho de 2009, novo relatório produzido pela psicóloga


da instituição, no qual foi atestado que embora a criança já estivesse se
mostrando mais espontânea e menos isolada que anteriormente, ainda
persistia seu discurso com aspectos depreciativos quando se refere a si
mesma, demonstrando baixa-estima.

- Por fim, foi proferida a sentença, pelo parcial provimento do


pedido.

O relatório se fez necessário para elucidar as questões


controvertidas que iremos analisar. Após minuciosa análise do bojo
probatório, vejamos:

É importante ressaltar que embora a intenção dos ora requeridos


fosse a de adotar a criança, a adoção ainda não tinha se concretizado, havia
apenas a guarda da criança, que havia sido deferida liminarmente em um
processo de adoção. Quanto à adoção, o §1º do art. 39 dispõe
expressamente que se trata de medida irrevogável. Portando, se os
pretensos pais adotivos já tivessem adotado a menor e caso comprovado os
danos morais sofridos pela criança a hipótese de o Ministério Público buscar
a reparação civil para ela seria mais aceita. Nesse sentido:

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AÇÃO CIVIL PÚBLICA - INDENIZAÇÃO - DANOS MORAIS E MATERIAIS -


ADOÇÃO - DEVOLUÇÃO DO MENOR - RESPONSABILIDADE CIVIL DOS
PAIS ADOTIVOS CONFIGURADA. Tendo os pais adotivos abandonado o
menor, devolvendo-o ao abrigo, não tendo demonstrado sequer um mínimo
de esforço para reaproximarem da criança, patente o dever de indenizar, não
só porque o filho foi privado do convívio de seus pais mas, primordialmente,
de sua irmã de sangue de quem sente muita saudade. Negligenciando os
requeridos na criação e educação do adotado, mormente, por terem ciência
de que a adoção somente foi concedida, para possibilitar o convívio irmãos,
ferindo, assim, o princípio constitucionalmente assegurado, da dignidade da
pessoa humana, cabe-lhes indenizar a criança pelos danos sofridos.
(Apelação Cível 1.0702.09.568648-2/002, Relator(a): Des.(a) Teresa Cristina
da Cunha Peixoto , 8ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 10/11/2011,
publicação da súmula em 16/12/2011) (Grifamos)

No entanto, no presente caso, como já exposto, os ora requeridos


detinham apenas a guarda da criança. Sobre o instituto da guarda, pertinente
transcrever o trecho de um folheto explicativo de uma campanha da
Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), "Adoção Passo a Passo",
anexado pelos próprios requeridos, às fls. 218/239:

"A guarda é uma medida que visa proteger crianças e adolescentes que não
podem ficar com seus pais, provisoriamente, ou em definitivo." (Grifamos)

O instituto da guarda, embora não haja adoção formalizada, não é


mera detenção de algo como parecem entender os apelantes, ele implica
obrigações dos pretensos pais adotivos e tem ampla repercussão na vida
das crianças e adolescentes, principalmente no campo emocional. Sobre o
tema, o Estatuto da Criança e do Adolescente dispõe:

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"Art. 33. A guarda obriga a prestação de assistência material, moral e


educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de
opor-se a terceiros, inclusive aos pais.

(...)

§ 3º A guarda confere à criança ou adolescente a condição de dependente,


para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários." (Grifamos)

O caput do art. 33 demonstra algumas das obrigações a que os


pretensos pais adotivos estão sujeitos. Obrigações essas que foram
devidamente aceitas pelos ora requeridos na assinatura do termo de
compromisso de bem e fielmente desempenhar o múnus na forma do art. 33
e seguintes do ECA, conforme fl. 21. O §3º, por sua vez, apenas a título
elucidativo, dentre as várias outras implicações que a guarda possui,
demonstra a seriedade do instituto, que torna as crianças dependentes para
todos os fins de direito, inclusive previdenciário.

Lado outro, o art. 35 do ECA prevê que a "guarda poderá ser


revogada a qualquer tempo, mediante ato judicial fundamentado, ouvido o
Ministério Público". No entanto, tendo em vista que o Estatuto da Criança e
do Adolescente é uma Lei que dispõe sobre a proteção integral da criança e
do adolescente, corroborado por todos os artigos referentes tanto à adoção
quanto à guarda (Subseção IV e Subseção II respectivamente, da Seção III -
Da Família Substituta), forçoso concluir que a previsão de revogação da
guarda a qualquer tempo é medida que visa a proteger e resguardar os
interesses da criança, para livrá-la de eventuais maus tratos ou falta de
adaptação com a família, por exemplo, mas não para proteger aqueles pais,
maiores e capazes, que, por um ato de vontade decidiram adotar uma
criança e depois se arrependeram.

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Nesta seara, cabe destacar que comumente essas crianças que


vão para os abrigos esperando uma adoção já sofreram muito para tão tenra
idade, muitas foram abandonadas por sua família de origem, ou até mesmo
não sabem sequer de onde vem. No caso dos autos a criança N. já foi para o
abrigo em decorrência do abandono de seus pais biológicos, houve a
Destituição do Poder Familiar destes. Assim, a desistência dos pretensos
pais adotivos, ora requeridos, revitimizou uma criança que já tinha a estrutura
familiar abalada, fazendo com que ela passasse por novo processo de
rejeição.

De fato, não há a vedação legal para que os pretensos pais


adotivos desistam da adoção quando estiverem apenas com a guarda da
criança. No entanto, cada caso deverá ser analisado com suas
particularidades e após detida análise de todas as provas presentes nesse
farto acervo, a conclusão inarredável a que se chega é a de que os ora
requeridos foram irresponsáveis e acarretaram sérios prejuízos à menor.
Ora, o Estatuto da Criança e do Adolescente não iria prever a revogação da
guarda se não fosse para beneficiar a criança, não merece guarida a
colocação dos apelantes de que a previsão da revogação é feita para
beneficiar os pais que desistem de adotar. Se assim fosse, o ECA estaria
justamente deixando de cumprir seu fim de proteção para ter o objetivo de
revitimizar as crianças, o que, definitivamente, não podemos concluir.

Cumpre destacar uma consideração feita à fl. 571 pelos apelados


que denota claramente o descaso bem como a coisificação que os
recorrentes pretendem fazer crer que seja o processo de guarda, in verbis:

"(...) somente tinha a guarda provisória da criança, a qual pode ser revogável
a qualquer momento, ou seja, eles estavam em pleno

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direito, no exercício regular do seu direito de devolver a menor ao Estado,


pois não havia efetivado a adoção" (Grifamos)

Ora, com a devida venia, a colocação não possui qualquer


pertinência. O Instituto da adoção, bem como da guarda, estão previstos no
Estatuto da Criança e do Adolescente, e não no Código de Defesa do
Consumidor. Não estamos falando de um consumidor que se sentiu
insatisfeito, que comprou um produto defeituoso e foi assegurado por Lei de
seu direito de troca/ ressarcimento deste, mas sim de uma criança, que
possui direitos fundamentais a ser resguardados, pelo que não podemos
falar em "direito de devolução ao Estado".

Visando justamente a proteção da criança, nenhum magistrado ou o


Ministério Público pretende forçar uma família que não demonstrou afeto pela
criança a permanecer com ela, no entanto, o que causa mais espanto no
presente caso foi a forma como a desistência da adoção se deu. Como já
colocamos no relatório feito neste acórdão, o estudo psicossocial de fls.
22/24 que ocorreu em 23 de junho de 2008 não constatou a existência de
problemas graves, mas sim de coisas corriqueiras, adversidades comuns que
os pais podem enfrentar na criação de um filho e que não podem ensejar que
esse filho seja abandonado ou, no caso, devolvido.

Os apelados relataram na audiência de instrução e julgamento


deste processo que tiveram problemas com a criança por serem negros e ela
ser branca, bem como por ela estar fazendo pequenos furtos na escola e ter
sumido uma quantia em dinheiro de uma pessoa da família dos detentores
da guarda. Quanto à questão racial, evidente que os recorrentes já sabiam
desde o momento em que resolveram adotar a criança que ela era mais clara
que eles. Ademais, não há qualquer óbice a um casal negro ter uma criança
branca ou vice e versa, o aborrecimento do casal com o fato da criança

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perguntar por que eles eram de cores diferentes demonstra tão somente o
claro despreparo dos pretensos pais. Caberia aos pretensos pais orientar a
criança quanto às diferenças raciais e não recriminá-la por ter uma
característica inerente à maioria das crianças, a curiosidade.

No tangente ao relato de que a criança estava fazendo pequenos


furtos na escola, cumpre destacar inicialmente que o relatório juntado pelos
próprios requeridos na contestação, fl. 138, assinado pela pedagoga, pela
diretora e pela professora da Escola Municipal Professora Gláucia Santos
Monteiro, demonstra que N. "era uma aluna tranquila e não apresentava
nenhum problema de disciplina". Apesar de o fato de a criança estar
realizando pequenos furtos na escola não justificar a sua "devolução", de
forma abrupta, ao abrigo temos que as colocações dos apelados não foram
sequer confirmadas pela escola da qual os recorrentes diziam que a criança
estava levando coisinhas para casa.

Ademais, a adoção inclui a obrigação de educar, a condução tanto


da questão racial como dos alegados desvios de conduta da criança
deveriam ser resolvidos pelos pretensos pais, pois nos termos do art. 33 do
ECA, a guarda obriga a assistência material, moral e educacional da criança
e adolescente. Assim, instruir a criança quanto a tais questões faz parte do
múnus que os ora requeridos resolveram assumir quanto decidiram adotar a
criança.

Os ora requeridos poderiam ter procurado as psicólogas e


assistentes sociais da vara judicial e ter tentado resolver a situação causando
menos danos à criança, podiam ter pedido ajuda, buscado amenizar o
sofrimento da menor. No entanto, além de não relatarem que estavam tendo
problemas e dificuldades na criação da criança e

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buscarem ajuda, os pretensos pais acharam mais conveniente tomar a


atitude sozinhos, como disse o requerido na audiência de instrução e
julgamento, "Sobre a disponibilidade sempre anunciada por este setor
durante os atendimentos ao casal quanto a atendê-los, em quaisquer
circunstâncias de enfrentamento de dificuldades no que tange ao processo
de adoção, D. alegou que eles preferiram resolver as questões enquanto
uma família, sem interferências".

O situação foi agravada, pois o que podemos extrair dos autos é


que quando os requeridos decidiram desistir da adoção eles não
asseguraram que a criança pudesse ter uma psicóloga do juízo para auxiliá-
la, eles não levaram a situação ao conhecimento de quem poderia auxiliar de
forma imediata à criança, mas tomaram a decisão de desistir e ainda ficaram
com a criança um tempo em sua casa. Conforme fls. 388/391, as expressões
de rejeição da criança pelo casal foram concretas, intensificando o sofrimento
da menor. Cumpre transcrever marcante trecho do relatório de fl. 505:

"N. nutre expectativas de permanência na família, não obstante verbalizar


claramente que sua convivência com o casal tem lhe trazido sofrimento, pois
desde que foi informada sobre a decisão de retorno ao abrigo ela não recebe
amor e carinho, perdeu o contato com os familiares do casal e não lhe é
permitido brincar e utilizar todo o espaço da casa" (Grifamos)

O trecho reproduzido acima demonstra que os requeridos fizeram


séria segregação com a criança quando desistiram do processo de adoção.
Tal atitude não condiz com o ônus que possuíam e fere o que dispõe o art.
33 do ECA.

Os danos morais que a menor sofreu com a atitude dos

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requeridos estão devidamente atestados nos relatórios acostados a esse


processo e foram comprovados por profissionais do meio, psicólogas e
assistentes sociais, fls. 388/391, 422/426, 508/510, 505/507, 511/512, dos
quais inclusive já ressaltamos alguns trechos no corpo deste voto. Com a
leitura de tais relatórios, restou patente que a conduta dos apelados causou
sérios prejuízos à menor, fazendo com que ela enfrentasse nova perda, novo
processo de rejeição e acarretasse na perda de sua auto-estima e elevada
confusão emocional, até sobre a pessoa que era.

Outro ponto a ser sopesado é o de que os apelantes iludiram a


menor, inseriram ela em seu meio religioso e familiar e depois privaram-na
de tudo isso, por decisão unilateral. Os apelantes inclusive alteraram o
prenome da menor, sem que houvesse qualquer autorização legal para tanto.
A conduta de alterar o prenome da menor enquanto estavam com aguarda
desta, que foi por cerca de 8 (oito) meses, intensificou o sofrimento da menor
quando houve a desistência da devolução, culminando em verdadeira crise
de identidade desta.

Diante de todo o exposto, podemos concluir que a inovadora


pretensão do Ministério Público, de buscar o ressarcimento civil com a
condenação por danos morais daqueles que desistiram do processo de
adoção, que estava em fase de guarda, de forma abrupta e causando sérios
prejuízos à criança, encontra guarida em nosso direito pátrio, precisamente
nos art. 186 c/c arts. 187 e 927 do Código Civil. In verbis:

"Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou


imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente
moral, comete ato ilícito."

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Assim, nos termos do art. 186 do CC, podemos considerar a


conduta dos requeridos, ora apelados, ilícita, visto que violaram direitos
fundamentais da criança que estava sobre sua guarda, previstos no art. 15
do Estatuto da Criança e do Adolescente, tais como o respeito, que consiste
na inviolabilidade da integridade psíquica e moral da criança, bem como a
dignidade da criança, pois a expuseram a tratamento constrangedor. Nesta
seara, ainda que a violação dos direitos da criança, que lhe causou sérios
danos, possa não ter sido realizada de forma dolosa, a conduta dos
requeridos foi no mínimo negligente e imprudente, a uma porque
negligenciaram na procura imediata do serviço social antes de tomar a
decisão de desistir da adoção e segregar a criança no convívio familiar e a
duas porque foram imprudentes em ter assumido um compromisso, fl.21, que
não cumpriram.

É importante destacar que a atual conduta dos apelados, em dizer


que estavam em seu "direito de devolver a criança" ao Estado, difere muito
da postura que estes tiveram na inicial da ação de adoção, quando
pleiteavam a guarda da menor. Destaque-se trecho citado pelos próprios
apelados à fl. 15:

"O fundamental é que a adoção é uma medida de proteção aos direitos da


criança e do adolescente, e não um mecanismo de satisfação de interesses
dos adultos."

Em referida peça processual, os requeridos foram veementes em


dizer que estavam seguros sobre a adoção, que já conheciam a criança há
seis meses e nutriam afeto fraternal por ela, havendo adaptação familiar
suficiente. Portanto, ao mudarem completamente a postura e decidirem pela
"devolução" da menor ao abrigo, restou evidenciada a imprudência dos
apelados em assumirem a obrigação firmada às fls. 21, nos termos do art.
33.

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Já o art. 187 dispõe:

Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo,
excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou
social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

Neste particular, também se entende que os requeridos cometeram


ato ilícito pois tinham o direito à guarda da criança e excederam os limites
impostos pelo seu fim social e pela boa fé, pois utilizaram-se do
procedimento preparatório para a adoção para, ainda que na modalidade
culposa, revitimizar uma criança que já tinha sido abandonada pelos pais.

O art. 927 coloca:

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem,
fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente


de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade
normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza,
risco para os direitos de outrem.

Por fim, com fulcro no art. 927 do Código Civil, configurado o ato
ilícito nos termos dos art. 186 e 187, independentemente de culpa, resta
configurada a obrigação de reparar os danos, que no caso foram morais.

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Destaque-se que o ato ilícito que gerou a reparação não foi o ato
em si de desistir da adoção da criança, mas o modus operandi, a forma
abrupta e irresponsável que os requeridos realizaram o ato, em clara afronta
aos direitos fundamentais da criança. Assim, pode haver outro caso e que a
desistência da adoção não gere danos morais à criança, no entanto, não é
este o caso dos autos.

Em que pesem as alegações do apelante de que não foi feito


relatório psicossocial antes do deferimento da guarda, cumpre elucidar que
não há no Estatuto da Criança e do Adolescente exigência a que se faça
prévio estudo psicossocial ao deferimento da guarda, mas sim antes da
concretização da adoção. Ademais, destaque-se que ainda que não conste
nos autos um relatório escrito anterior a guarda, o depoimento do Sr. D.J.S,
que era o coordenador da instituição de acolhimento missão esperança à
época, na audiência de instrução e julgamento à fl. 424, relata que os ora
requeridos faziam parte do programa de apadrinhamento e frequentavam a
instituição, que eram padrinhos da criança N. e a levavam para passar
alguns finais de semana com eles, bem como o fim de ano. O depoente
coloca que havia afeto recíproco entre a criança e os pretensos pais e que
ela recebeu com muita alegria o pedido de adoção. D. frisa ainda que ele e a
J., que era assistente social na instituição, acompanharam o casal no Fórum
na ocasião em que estes pediram a guarda da criança.

Quanto à colocação dos apelantes de que não houve um curso


preparatório para pais adotivos, novamente sem razão. Conforme se extrai
dos depoimentos de fls. 424/426 o procedimento na instituição era o
agendamento do casal com o coordenador e após a entrevista os pretensos
pais passavam a ter contado com a criança. No presente caso, extrai-se dos
autos que antes da concessão da guarda houve o convívio dos requeridos
com as crianças por 06 (seis)

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meses. Lado outro, também não há no ECA referida exigência de que seja
feito um curso preparatório para pais adotivos e após o deferimento da
guarda foram feitos diversos estudos psicossociais, visando investigar a vida
do casal e a que eles estavam levando com a criança.

Noutro norte, também não merece guarida a explanação dos


apelantes de que devido ao fato da criança ter sido adotada um ano após ao
ocorrido os danos morais foram anulados. A uma porque os danos morais
não precisam gerar prejuízos perpétuos para serem indenizáveis, a duas
porque o fato da criança ter sido adotada novamente após um ano não
apaga o sofrimento emocional que esta, de forma amplamente constatada,
teve com a conduta dos apelados. Frise-se que a desistência dos apelados
ocorreu em setembro de 2008 e o último relatório psicossocial que consta
nestes autos, em junho de 2009, ou seja, 10 (dez) meses após o ocorrido,
evidencia que a criança ainda estava muito abalada e que não tinha
superado a rejeição dos requeridos. Portanto, o fato da criança ter sido
adotada no final do ano de 2009 não obsta o presente dever de reparação.

Por todo o exposto, a manutenção da condenação dos requeridos


ao pagamento de danos morais à criança N. é medida que se impõe. O douto
juiz sentenciante condenou os requeridos ao pagamento da quantia de
R$15.000,00 (quinze mil reais) a título de danos morais. Os apelados, por
sua vez, pleiteiam a minoração do valor fixado, caso a sentença não fosse
reformada para julgar a sentença improcedente.

Assim, quanto à fixação do quantum indenizatório dos danos


morais, temos que a jurisprudência e a doutrina mais balizada têm adotado
elementos como: situação financeira da vítima, gravidade

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do dano e duração do sofrimento.

Também deve ser sopesado que os réus são pessoas simples, que
não possuem muitos recursos. Ambos são agentes penitenciários, contrato
administrativo, e percebem juntos, em média, a quantia de R$3.000,00 (três
mil reais).

Aplicando estes elementos ao caso concreto, tenho por bem


minorar o valor da condenação, não pela ausência de gravidade do dano,
pelo contrário, mas tão somente para que o valor seja adequado ao padrão
de vida e rendimentos mensais dos requeridos e não se torne inexequível.

Portanto, entende-se que a fixação do valor de R$5.000,00 a título


de danos morais, atende melhor aos critérios de proporcionalidade e
razoabilidade, tendo em vista que as condições financeiras dos requeridos
são paupérrimas.

Quanto ao marco inicial para contagem dos juros de mora, também


não assiste razão aos apelantes, visto que a correção monetária é devida
desde a data do arbitramento, mas os juros de mora são devidos desde o
evento danoso, momento em que o sofrimento foi imputado à criança,
desistência da adoção. O cabimento dos juros de mora desde o evento
danoso justifica-se, pois eles são decorrentes de responsabilidade civil
extracontratual, nos termos da Súmula nº 54 do STJ, visto que os requeridos
causaram dano à criança em face do descumprimento do dever legal que
assumiram à fl. 21, art. 33 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

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Por fim, não há que se falar na devolução do valor pago à título de


alimentos ressarcitórios, visto que por sua própria natureza alimentar não
podem ser repetidos, pois não seria razoável que uma criança tivesse que
ressarcir os "alimentantes" por sua pensão. Ainda que o agravo de
instrumento tenha reformado a decisão que condenou os requeridos ao
pagamento de alimentos ressarcitórios, não cabe a repetição daqueles que já
foram pagos, em face do fim a que se destinam.

Em conclusão, dou parcial provimento ao recurso, apenas para


minorar o quantum indenizatório para R$5.000,00 (cinco mil reais), a fim de
que não se torne inexequível para os requeridos. No restante, mantenho in
totum o julgado na sentença primeva.

DES. ARMANDO FREIRE (REVISOR) - De acordo com o(a) Relator(a).

DES. ALBERTO VILAS BOAS

Solicitei vista dos autos e data venia do entendimento da Relatora,


não há como conceder indenização por danos morais em virtude da
inexistência de ato ilícito na atitude dos recorrentes de devolução da menor
durante o período de convivência.

Ora, sabe-se que a responsabilidade civil, consubstanciada no


dever de indenizar o dano sofrido por outrem, advém necessariamente do ato
ilícito, resultante da violação de direito alheio e lesão ao respectivo titular,
nos termos dos arts. 186 e 927 do Código Civil.

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Sendo assim, considerando que, na espécie em julgamento, os


recorrentes detinham tão somente a guarda provisória da criança e
externaram, durante o estágio de convivência, o desinteresse na
consumação da adoção, não praticaram ato ilícito que pudesse embasar o
pedido indenizatória formulado pelo Ministério Público em favor da criança.

Sim, porque, conforme prevê o art. 33 da Lei nº 8.069/90, a(s)


parte(s) interessada(s), quando no exercício da guarda, possue(m) a
obrigação de prestar assistência material, moral e educacional à criança,
sendo certo que se trata, ainda, de medida revogável a qualquer tempo, nos
termos do art. 35 da mesma lei.

Neste particular, os recorrentes parecem ter cumprido as


responsabilidades que lhes foram impostas durante os oito meses em que a
criança permaneceu sob guarda, sobretudo considerando o teor do relatório
psicossocial realizado antes da desistência da adoção pelos requeridos (f.
22/24), segundo o qual a adaptação da família vinha ocorrendo de forma
tranquila e satisfatória e apontava para o deferimento da ação de adoção.

Por conseguinte, ao devolverem a criança durante o período de


convivência, os recorrentes estavam no exercício regular do direito e, por
terem cumprido os deveres de guardiões, não parecem ter praticado
qualquer ato ilícito que pudesse ocasionar a responsabilidade de indenizar a
criança em razão de não ter sido exitosa a tentativa de colocá-la, de forma
definitiva, em uma família substituta.

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Com efeito, não se pode desprezar que o procedimento da adoção


foi criado objetivando conceder aos interessados um lapso de tempo
razoável para saber se dispõem, de forma efetiva, das condições
psicológicas e afetivas indispensáveis para ter uma criança ou adolescente
como filho.

De igual modo, a lei não concederia a necessária segurança


jurídica àqueles que têm por intuito iniciar o processo de adoção, na medida
em que ela não contempla objetivamente nenhuma forma de sanção pela
desistência da guarda. Em outras palavras, seria pouco produtivo e
estimulante, para os fins da adoção, que alguém se dispusesse a conviver
temporariamente com um criança ou adolescente sob o regime da guarda,
sabedor de que, uma vez iniciada a colocação, ainda que de forma
provisória, em família substituta, a desistência seria sancionada civilmente
com o pagamento de uma indenização por dano moral.

Neste particular, pode-se concluir que a devolução da criança ou do


adolescente durante o período de convivência é, no caso em espécie, lícita, e
indica, tanto o despreparo dos requeridos para lidar com o procedimento de
adoção, quanto a falha do próprio Estado, que concedeu a guarda provisória
aos requeridos sem antes prepará-los de forma gradativa, tal como exige o §
5º do art. 28 do ECA.

Desse modo, embora não se desconheça que as decisões judiciais


devem se pautar no princípio do melhor interesse da criança e que a
devolução da menor fato possa ter repercutido negativamente sobre a esfera
intima da menor, a meu ver, mostrou-se providência

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mais benéfica do que a concretização da adoção, notadamente considerando


seu caráter irrevogável e excepcional (art. 39,§1º ECA), bem como o fato de
que a criança foi adotada posteriormente por outra família (f. 442 v.)

Ora, os requeridos, em audiência (f. 422/423), admitiram não sentir


amor pela criança (f. 422/423), e, assim, o deferimento da adoção poderia lhe
ocasionar danos contínuos por estar em uma família incapaz de lhe dar afeto
e contribuir para seu desenvolvimento psicossocial.

Outrossim, conquanto o tema estimule um interessante debate e


continua reflexão, pode gerar efeito inverso e desestimular a busca pelo
Poder Judiciário para adoção, o que, por certo, ocasionaria prejuízos para
inúmeras crianças que aguardam colocação em família substituta.

É preciso enfatizar, por fim, que não há evidência probatória alguma


de que os réus, ora apelantes, tenham praticado qualquer espécie de
conduta que molestasse a integridade física ou psíquica da criança. Refiro-
me, especificamente, a possível agressão à integridade corporal ou prática
de atos que ofendessem sua integridade sexual, o que não restou
evidenciado no processo.

Fundado nessas considerações, dou provimento ao recurso para


reformar a sentença e julgar improcedente o pedido, data venia da Relatora e
do Revisor.

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SÚMULA: "DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO,


VENCIDO O VOGAL"

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