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O MENINO DO DEDO VERDE

Texto: Maurice Duron


Adaptação: Giuseppe Cavatti, Irene Sonegheti e Wellington Fernandes
Realização: Grupo Paz de Teatro - Movimento Paz-ES

Narrador 1 - Tistu é um nome esquisito. Você não acha em qualquer lista de nomes. Não existe
um São Tistu.

Narrador 2 - Mas havia um menino a quem todos chamavam Tistu... Um dia, quando ainda era
um bebezinho, fora levado à igreja para ser batizado. Seus padrinhos declararam ao padre que
ele iria se chamar João Batista.

Narrador 1 - Neste dia – como quase todos os bebês que estavam lá – o coitadinho protestou,
gritou, ficou vermelho de chorar. Mas as pessoas grandes, que não compreendem os protestos
dos recém-nascidos, e teimam em sustentar suas ideias pré-fabricadas, garantiram com a
maior firmeza que o menino se chamava mesmo João Batista.

Narrador 2 - Mas, em seguida, deu-se um fato curioso: as pessoas grandes já não conseguiam
pronunciar o nome que lhe haviam dado, e puseram-se a chamá-lo de Tistu: “Tistu, coloca esse
chinelo, menino. Não vai ficar resfriado”; “Tistu, não desce escorregando o corrimão, meu
filho”.

Narrador 1- O fato, aliás, não é tão raro assim. Quantos meninos e meninas foram registrados
com os nomes de José, Maria ou Antônio, e só são chamados de Jucá, Cotinha ou Tunico!

Narrador 2 - Isto prova simplesmente que as idéias pré-fabricadas são idéias mal fabricadas, e
que as pessoas grandes não sabem mesmo o nosso nome, como também não sabem, por mais
que queiram, de onde foi que viemos, por que estamos aqui e o que devemos fazer neste
mundo.

Narrador 1 - Tistu morava na casa que brilha: uma casa bem grande, de muitos andares, que
tinha esse nome porque tudo lá brilhava.

Dona Mamãe - Senhor Papai, é preciso dizer ao nosso criado para polir o corrimão da escada,
está começando a perder o brilho.

Senhor Papai - Sim Dona Mamãe, logo que ele terminar de polir nossos carros e trançar o
cabelo dos cavalos com papel prateado. Meus cavalos precisam estar como joias!

Narrador 1 - Entre os cavalos do Senhor Papai havia um muito especial, que era um grande
amigo de Tistu, para quem ele contava todos os seus segredos. Era ginástico, um pônei. Talvez
o mais sábio de todos os pôneis que já existiram.

Narrador 2 - Na casa que brilha tudo brilhava: maçanetas, janelas, lustres, castiçais, talheres,
até o açucareiro, até os cabelos do senhor papai.

Narrador 1 - A cidade de Mirapólvora, onde Tistu morava, era uma cidade assim como as
outras: tinha escola, igreja, cadeia, mercado. A não ser por um fato especial: Mirapólvora era
conhecida no mundo inteiro, pois era lá que ficava a fábrica do Senhor Papai. A famosa fábrica
de canhões que tinha o mesmo nome da cidade, e da qual todos se orgulhavam. Senhor Papai
sempre dizia:

Senhor Papai- Tistu, meu filho, nosso negócio é excelente. Canhão não é como guarda-chuva,
que ninguém quer comprar quando faz sol. Ou como chapéu de palha, que fica na vitrina
quando chove. Canhão sempre se vende, seja qual for o tempo!

Narrador 2- E quando Tistu não queria comer dona mamãe o levava até a janela da casa-que-
brilha, de onde dava pra ver a fábrica, e dizia:

Dona Mamãe- Tome sua sopa, Tistu. Porque você precisa crescer. Um dia você será o dono de
Mirapólvora. Fabricar canhões é muito cansativo.

Narrador 2- Até os oito anos de idade, Tistu não sabia o que era escola. Dona mamãe o
ensinou em casa. Primeiro Tistu aprendeu as letras:

Tistu- A de andorinha, águia, asno. B de bota, bola e balão.

Narrador 2- Com as andorinhas pousadas nos fios ele aprendeu a somar, dividir e até subtrair.

Dona Mamãe - Tistu, se há sete andorinhas e dois fios, quantas andorinhas terão em cada fio?

Tistu- Três e meia, em cada fio. Como essa meia andorinha pode se equilibrar no fio? Eis um
problema que nenhum cálculo do mundo será capaz de responder!

Narrador 1- A partir daí, dona mamãe resolveu confiar Tistu a um professor de verdade, e o
levou então à escola de Mirapólvora.

Narrador 2- Todo mundo esperava que Tistu fosse um prodígio nas aulas, mas que decepção!
A escola produziu em Tistu um resultado imprevisível, logo que começava o lento desfile de
palavras pelo quadro negro, Tistu caia no sono, não que ele fosse preguiçoso ou estivesse
cansado, ele lutava pra se manter acordado, mas, a voz do professor ia se transformando
numa canção de ninar. Já no terceiro dia de aula, o professor de Tistu enviou uma carta ao
senhor papai.

Senhor Papai - Prezado senhor o seu filho não é como todo mundo, não é possível conservá-lo
na escola. Pois bem! Já que Tistu não é como todo mundo, aprenderá as coisas vendo-as com
os próprios olhos, a vida afinal, é a melhor escola!

Narrador 1- No outro dia bem cedo, Tistu já estava na porta da casa que brilha com seu
caderninho debaixo do braço esperando pela sua primeira lição.

Senhor Bigode – Olá, Tistu. Meu nome é Senhor Bigode! Sua primeira lição será de jardinagem.
Você aprenderá sobre a terra que é a origem de tudo. É nela que crescem os legumes e frutos
que nos alimentam.

Tistu - Tomara que o sono não venha!


Senhor Bigode - Vamos começar colocando a mão na massa. Pegue aquele vaso e prepare a
terra. Coloque seu polegar bem no meio do vaso e é ai que colocaremos a semente. (Tistu
assovia) Tudo pronto Tistu?

Tistu- Tudo pronto, senhor Bigode. Pode me passar a semente.

Sr Bigode - Tistu, não é possível! É necessário pelo menos dois meses para ter uma margarida
desse tamanho.

Tistu - Mas eu nem coloquei a semente...

Sr Bigode – Mistério! Dê-me aqui sua mão. (analisa) Tistu, ocorre com você uma coisa
extraordinária. Você tem o polegar verde.

Tistu - Que verde nada, ele é cor-de-rosa e ta é bem sujo!

Senhor Bigode - Você não pode ver, é um dom oculto. Não se preocupe. Isso é uma qualidade
maravilhosa. Há sementes por toda parte, nos muros, nas ruas, nas cercas. Você com apenas
um toque pode despertá-las, e em minutos fazer nascer um jardim inteiro.

Tistu - Já vão dizer de novo que eu não sou como todo mundo....

Senhor Bigode - Será um segredo nosso. As pessoas não estão preparadas para tão precioso
dom. (Pensa alto) Esse menino revela boas disposições para jardinagem.

Narrador1- No dia seguinte Tistu fora levado a sua segunda lição, a lição de ordem. Seu
professor era o Senhor Trovões. Um antigo funcionário da fábrica de canhões, e antigo militar
que tinha o comportamento mais explosivo que qualquer canhão produzido em Mirapólvora.
Tistu não entendia, mas todo mundo dizia que ele era o “homem da ordem”.

Senhor Trovões- Tistu, uma cidade tem ruas, praças, casas e monumentos. Na sua opinião, o
que é mais importante em uma cidade?

Tistu - O jardim!

Senhor Trovões- Não, a ordem! Sem a ordem uma cidade não passa de um sopro. E para
manter a ordem é preciso castigar a desordem. Tistu, o que é a ordem pra você?

Tistu- Eu acho que a ordem é quando todo mundo está feliz. Por exemplo, quando Ginástico
está limpo e com a crina trançada com papel prateado, ele fica feliz e tudo parece em ordem.

Senhor Trovões – Não, Tistu! E é por isso que vamos agora para o edifício onde se mantém a
ordem.

Tistu - O Senhor Trovões pode ter toda a razão, mas pra que gritar desse jeito, que voz de
trovão! Será preciso fazer tanto barulho para manter a ordem?

Narrador 2 - Senhor Trovões achava que a cadeia era o lugar que garantia a ordem da cidade,
mas, quando Tistu chegou lá, ele viu paredes tristes cercadas por grades pretas e pontiagudas,
tudo lá era muito feio.

Tistu - Porque os pedreiros colocaram essas grades feias e pontiagudas?


Senhor Trovões - Para impedir a fuga dos prisioneiros.

Tistu - Se essa cadeia não fosse tão feia, talvez tivessem menos vontade de fugir.

Senhor Trovões - Que menino esquisito, toda a sua educação está por ser feita. Você devia
saber que um prisioneiro é um homem mau.

Tistu - E colocam o prisioneiro aqui para curar sua maldade?

Senhor Trovões - Tentam ensiná-los a viver sem roubar e matar.

Tistu - Mas eles aprenderiam bem mais rápido se o lugar não fosse tão feio. Olha para aqueles
prisioneiros de cabeça baixa e sem dizer nenhuma palavra, eles parecem terrivelmente
infelizes. O que eles estão fazendo?

Senhor Trovões - Estão em recreio

Tistu- Imagine, se o recreio deles é assim, o que serão as horas de aula. Essa prisão é mesmo
muito triste.

Senhor Trovões- (escrevendo no caderno) É preciso vigiar de perto este menino, ele pensa
demais!

Narrador 1- Tistu não conseguiu dormir aquela noite e resolveu pensar em uma forma dos
prisioneiros se sentirem melhores.

Tistu- E seu eu fizesse nascer flores para eles? A ordem ficaria menos feia e os prisioneiros
talvez mais comportados. Bem que eu podia usar meu polegar verde. Vou falar com o Senhor
Trovões. Mas o Senhor Bigode disse pra eu não contar para ninguém... Então, é preciso que eu
faça tudo isso sozinho sem ninguém saber.

Narrador 2 - No outro dia não precisou de muito tempo para conhecer o resultado de todo o
seu trabalho. Não havia uma só grade ou janela da cadeia que não tivesse recebido flores.
Trouxeram até especialistas, mas ninguém podia explicar o milagre.

Narrador 1- Os prisioneiros estavam deslumbrados com o acontecimento, as grades nem


fechavam mais, mas eles não queriam mais fugir, tomaram gosto pela jardinagem e a cadeia
de mirapólvora se tornou exemplo para o mundo todo. Senhor Bigode ficou muito orgulhoso,
e a partir desse dia ele se tornou o conselheiro secreto de Tistu.

Música

Narrador 2- Uma cadeia que floresce desperta sem dúvida uma grande surpresa, mas a gente
logo se habitua. Então a educação de Tistu voltou a ser em breve a principal preocupação do
Sr. Papai e de Dona Mamãe.

Narrador 1 - Eles pensaram que seria bom agora mostrar a Tistu um pouco do que era a
miséria, confiando essa lição também ao Sr Trovões, e em seguida, do que era a doença, para
que ele cuidasse bem da saúde.

Senhor Trovões - As favelas ficam nas margens da cidade e elas são também um flagelo.
Tistu - E o que é um flagelo?

Senhor Trovões - Um flagelo é uma grande infelicidade que atinge muita gente ao mesmo
tempo.

Narrador 1 - Tistu já sentia o dedo coçando, mas o que o esperava era pior que uma cadeia.
Caminhos apertados, lamacentos, fedidos, se abriam entre tábuas apodrecidas, juntadas de
qualquer jeito. Essas tábuas pareciam formar casebres, mas tão esburacados e fracos ao vento
que a gente custava a acreditar que conseguissem ficar em pé. Ao lado da cidade limpa, de
cimento e tijolos, varrida cada manhã, a favela era como se fosse uma outra cidade, repelente,
que envergonhava a primeira. Nada de postes, calçadas, vitrinas e caminhões de limpeza
urbana.

Tistu - Senhor Trovões, mas por que toda essa gente mora em casinhas de coelho?

Sr. Trovões - Por que eles não tem outro lugar.

Tistu - Por que é que eles não têm outro lugar?

Sr. Trovões - Porque eles não tem condições melhores de trabalho.

Tistu - E por que é que eles não têm melhores condições?

Sr. Trovões – Ora! Porque não têm sorte.

Tistu - Então, quer dizer que eles não têm coisa alguma?

Sr. Trovões - Sim, e a miséria é isto.

Tistu - Pois amanhã eles terão ao menos algumas flores. Um pouco de graminha beberia essa
água lamacenta e tornaria os caminhos mais agradáveis, e algumas extensões de cipó
reforçariam os pobres barracos.

A miséria torna os homens ruins?

Sr. Trovões - Quase sempre. A miséria é como um horrível e enorme gigante, de olhos ferozes
e de braços tão grandes quanto o mundo, abraçando seus terríveis filhos. Entre eles há o filho-
roubo, o filho-vício, e o filho-revolução, sem dúvida o pior de todos... (dá um tapa na mão de
Tistu porque ele estava encostando-se no chão da favela) O que é preciso para lutar contra a
miséria e suas terríveis consequências? Pense um pouco... É preciso uma coisa que começa
com a letra o.

Tistu- Ouro?

Sr. Trovões- Não. É preciso ordem!

Tistu- Esta sua ordem, Sr. Trovões, o senhor tem certeza de que ela existe? Porque se a ordem
existisse não haveria miséria, e se não houvesse miséria, não haveria homens maus. E se não
houvesse homens maus, não haveria a cadeia.

Senhor Trovões - AH, Tistu. Os seus sentimentos generosos te privam do senso da realidade.
Cuidado para não se tornar em um filho-revolução...
Narrador 1 - Mas no dia seguinte... Vocês já adivinharam. Os quarteirões abandonados, que
eram evitados de tão horríveis de se ver, haviam-se tornado os mais belos da cidade. As
pessoas iam visitá-las como se visita um museu. Seus habitantes resolveram, então, aproveitar
as circunstâncias. Puseram uma roleta bem à entrada e cobravam cinco cruzeiros.

Narrador 2 - Apareceram assim vários empregos: de guia, de guarda, de fotógrafo. Juntaram


uma fortuna. Para empregar esse dinheiro, resolveram construir entre as árvores um grande
edifício onde os antigos moradores da favela pudessem viver confortavelmente. E, como era
preciso muita gente para construí-lo, ninguém ficou sem trabalho.

Narrador 1 - A próxima lição de Tistu era a lição de doença. O hospital de Mirapólvora era um
belo hospital. Muito grande, muito limpo, e provido de tudo que fosse preciso em um hospital,
graças à generosidade do Sr. Papai, e foi lá que Tistu ficou conhecendo a menina doente. Tistu
não achou que o hospital fosse feio; pelo contrário. No entanto ele sentiu... como explicá-lo...
ele sentiu que alguma coisa muito triste estava escondida ali. O Dr. Milmales, diretor do
hospital, foi o encarregado da lição do dia.

Dr. Milmales- Ser médico é travar uma batalha ininterrupta. De um lado a doença, sempre a
entrar no corpo das pessoas; do outro a saúde, sempre querendo ir embora. E existem
também, mil espécies de doença e uma única saúde. A doença usa todo tipo de máscara para
que não a possam reconhecer: um verdadeiro carnaval, é preciso desmascará-la, desanimá-la,
pô-la para fora, e ao mesmo tempo atrair a saúde, segurá-la, impedi-la de fugir. Tistu, você já
esteve doente?

Tistu- Nunca, Doutor.

Dr. Milmales- Nunca mesmo? Eis um garoto que desde o nascimento não saiba o que é
varicela, anemia ou resfriado... Um caso raro de saúde perfeita!

Narrador 1 - O Dr. Milmales mostrou a Tistu a sala onde se preparavam pequenas pílulas cor-
de-rosa contra tosse, pomada amarela contra bolhas e pós branquicentos contra febre.
Mostrou-lhe a sala onde a gente pode olhar através do corpo de uma pessoa como através de
uma janela, para ver onde a doença se escondeu. E mostrou-lhe também a sala com teto de
espelho, onde se cura apendicite e tanta coisa que ameaça a vida.

Tistu- Se aqui impedem o mal de ir adiante, tudo devia parecer alegre e feliz. Onde estará
escondida a tristeza que estou sentindo?

(Tistu chega ao quarto da menina doente que é um fantoche)

Tistu- Bom dia

Menina- Bom dia

Tistu- O Dr. Milmales me disse que as suas pernas não andavam. Será que já melhorou no
hospital?

Menina- Não, mas isso não tem importância.

Tistu- Por quê?


Menina- Porque não tenho lugar nenhum para ir.

Tistu- Pois eu tenho um jardim

Menina- Você tem muita sorte. Se eu tivesse um jardim, talvez eu sentisse vontade de sarar
para passear entre as flores.

Tistu- (Olhando o polegar) Se o problema é esse... Você não se aborrece muito nessa cama?

Menina- Não muito. Fico olhando o teto. Conto os buraquinhos.

Tistu- Flores seria muito melhor. Papoulas, papoulas!... Botões-de-ouro, margaridas!

Mas, em todo caso, você não se sente infeliz?

Menina- Para a gente saber se é infeliz, é preciso primeiro ter sido feliz. Eu já nasci doente.

Narrador 1- Tistu compreendeu que a tristeza do hospital estava escondida nesse quarto, na
cabeça da menina. Ele também estava ficando muito triste.

Tistu- Você recebe visitas?

Menina- Muitas. De manhã, antes do almoço, a Irmã Termômetro. Depois vem o Dr. Milmales;
ele é muito bonzinho, conversa comigo e me faz um agrado. À hora do almoço, chega a Irmã
Pílula. Depois, com a merenda, entra a Irmã Injeção Que Dói. E, por fim, vem um moço de
branco, que acha que as minhas pernas estão melhores. Amarra uma cordinha em cada uma
para que elas possam mover-se. Todos eles dizem que eu vou sarar. Mas eu prefiro ficar
olhando o teto, que não me prega mentiras.

Tistu - Pois eu acho que você vai sarar — disse ele.

Menina- Você também acha?

Tistu- Acho sim. Tenho certeza. Até logo!

Menina- Até logo! Você tem tanta sorte de ter um jardim...

Tistu - Para esta menina sarar, é preciso que ela deseje ver o dia seguinte. Uma flor, com sua
maneira de abrir-se, de improvisar surpresas, poderia talvez ajudá-la. Um dia ela entreabre um
botão, num outro desfralda uma folha mais verde que uma rã, num outro desenrola uma
pétala... Talvez esta menina esqueça a doença, esperando cada dia uma surpresa.

Dr. Milmales - Então, Tistu, o que foi que você aprendeu? Que sabe de medicina?

Tistu - Aprendi que a medicina não pode quase nada contra um coração muito triste. Aprendi
que para a gente sarar é preciso ter vontade de viver. Doutor, será que não existem pílulas de
esperança?

Dr. Milmales - Você aprendeu sozinho a primeira coisa que um médico deve saber.

Tistu - E qual é a segunda, Doutor?

Dr Milmales - É que para cuidar direito dos homens é preciso amá-los bastante.
Narrador 1 - No outro dia de manhã quando o doutor entrou no quarto da menina, ela sorria:
tinha despertado em pleno campo. Flores brancas brotavam em torno da mesa de cabeceira,
os cobertores eram um edredom de ervas, a grama crescia no tapete.

Narrador 2 - E finalmente a flor, a flor em que Tistu se desvelara. Uma esplêndida rosa que não
parava de se transformar, de abrir uma folha ou um botão, e que subia pela cabeceira da
cama, ao longo do travesseiro. A menina já não olhava o teto: ela contemplava a flor. De noite
suas pernas começaram a mover-se. A vida era boa

Narrador 1 - A lição de fábrica foi, aparentemente, a última lição de Tistu. O Sr Trovões, por
motivos óbvios, fora mais uma vez o encarregado de orientá-lo. Assim, de manhã bem cedo,
ao toque da primeira sirene, Tistu estava lá, pronto para observar, minuciosamente, um dia de
trabalho na fábrica de canhões.

Tistu - Senhor Trovões, o senhor parece tão ocupado, é sempre assim?

Senhor Trovões - Não Tistu, a fábrica está trabalhando hoje a todo vapor.

Tistu - E há algum motivo para isso?

Senhor Trovões - Claro Tistu, estamos produzindo armamento para a guerra.

Tistu - Guerra? E onde foi que esta guerra estourou?

Senhor Trovões - Exatamente na metade do caminho entre Mirapólvora e a outra metade da


terra!

Tistu - Tão longe né. E porque estão em guerra?

Senhor Trovões - Estão lutando por terras! Terras que ficam bem no meio entre as nações dos
Voulás e dos Vaitimboras.

Tistu - E lá tem jardins?

Senhor Trovões - Não Tistu, lá é um deserto. Só tem pedras!

Tistu - E estão brigando por pedras?

Senhor Trovões - Não, eles querem o que está por baixo das pedras, o petróleo!

Tistu - e para que eles querem essa coisa chamada petróleo?

Senhor Trovões - eles o querem para que os outros não o tenham, o petróleo é indispensável
em uma guerra.

Tistu - Se eu compreendi direito, os Voulás e os Vaitimboras estão em guerra por causa do


petróleo, por que o petróleo é indispensável para a guerra. Mas isso é uma tolice! Não seria
mais fácil não fazer guerra? Assim não precisariam de petróleo!

Senhor Trovões - Tistu olhe como fala! Você quer um zero?

Tistu – Não. O que eu queria é que os Voulás e os Vaitimboras não entrassem em combate!
Senhor Trovões - ai ai..

Tistu - Senhor Trovões, o senhor é a favor de quem nessa guerra?

Senhor Trovões - Dos Voulás!

Tistu - E papai?

Senhor Trovões - Também!

Tistu - Por que?

Senhor Trovões - Ora, porque são nossos amigos há muito tempo.

Tistu - Faz sentido, se a gente tem amigos que são atacados devemos ajudá-los a se
defenderem. Então esses canhões vão pros Voulás?

Senhor Trovões - Só os da direita, os da esquerda vão pros Vaitimboras. Pois também são bons
fregueses.

Tistu - Assim um canhão de Mirapólvora vai atirar contra um outro canhão de Mirapólvora e
demolir os jardins dos dois lados?

Senhor Trovões - É o comércio!

Tistu - Pois eu acho abominável seu comércio, porque...

(Senhor Trovões dá um beliscão em tistu)

Tsitu - Eis o que é a guerra, a gente pede uma explicação, diz o que pensa e logo leva um
beliscão. Eu podia fazer brotar um espinheiro bem no fundo das suas calças, eu queria ver o
que você faria. Mas agora eu tenho coisas mais importantes pra pensar.

Narrador 2 - Naquele dia mais tarde Senhor papai viu Tistu caminhando lentamente por entre
as caixas de fuzis, subindo nos caminhões, debruçando sobre motores e se esquivando entre
os imensos canhões e pensava que Tistu era fantástico, que estava se esforçando para
recuperar os pontos perdidos na sua lição daquele dia.

Narrador 1 - Mas vocês já sabem o que aconteceu. No outro dia todos os jornais diziam em
letras maiúsculas EIS O FIM DA GUERRA ENTRE OS VOULÁS E OS VAITIMBORAS. E o motivo não
é difícil descobrir.

Tistu - (lendo um jornal com Senhor bigode) Uma chuva de flores invadiu o campo de batalha e
impediu o avanço das tropas. Eras e cipós formaram um emaranhado em volta das caixas de
armamento, os caminhões tinham espinhos que saltavam dos bancos. Haviam plantas por
todos os lados: plantas teimosas e ativas como de tivessem vontade própria. Nem um só
aparelho fora poupado. Os canhões de Mirapólvora tinham atirado, certamente. Mas atiravam
uma chuva de pétalas de flores! Um general teve o boné arrebatado por um buquê de violetas.

Senhor Bigode - Em matéria de trabalho bem feito não podia ter sido melhor, nunca teria
imaginado que fosse dar tão certo. Já não tenho mais nada a te ensinar, você sabe mais do que
eu e anda mais rápido!
Narrador 1 - Senhor Papai e o Senhor Trovões não gostaram nada da notícia.

Senhor Papai - Uma ruína, uma desonra, só resta fechar. Conspiração, sabotagem, atentado
pacifista. Ah meus canhões, meus lindos canhões. Se eu apanhasse o miserável que foi semear
flores nos meus canhões... mas talvez não haja nenhum responsável, forças superiores.. é
preciso abrir um inquérito, é um caso de alta traição.

Tistu - Fui eu. Eu que semeei flores nos canhões. Eu acabo de impedir uma guerra, o senhor
deveria estar contente em vez de se zangar! (Senhor papai cai boquiaberto)

A cadeia, a favela, o hospital, tudinho. Fui eu quem fiz! (silêncio)

Você pensa que eu estou me gabando eu vou lhe provar a verdade!

(Faz sair flores da caixinha e em seguida Tistu fecha os olhos como quem espera apanhar. Ao
perceber que Senhor Papai não faria nada abre novamente os olhos.)

Acho que fazer brotar flores dentro dos canhões perturba profundamente a vida das pessoas!
Pelo menos ninguém brigou comigo. Bem que o Senhor Bigode dizia que a coragem é sempre
recompensada!

Narrador 2 - Naquele mesmo dia Senhor Papai se reuniu com Senhor Trovões e vários
engenheiros e especialistas para decidir o Futuro da famosa fábrica!

Especialista 1 - Temos uma solução, trancar Tistu na cadeia, porque ele semeia a desordem. E
comunicar pela imprensa que o malfeitor não está mais em condições de agir. E avisar aos
compradores que a fabrica voltaria a funcionar normalmente.

Especialista 2 - Não se levanta assim de uma queda como essa, ninguém mais confiará na
qualidade dos nossos produtos, e, além disso, fechar Tistu na cadeia não adianta de nada. Ele
fará brotar carvalhos cujas raízes derrubarão as paredes permitindo-lhe a fuga, a gente não se
pode opor às forças da natureza.

Senhor Trovões - E, além disso, eu não suportaria imaginar Tistu em um uniforme de


presidiário andando em roda mesmo que numa cadeia florida! A prisão é dessas coisas que a
gente encara tranquilamente para as pessoas que não conhecemos, mas logo que se trate de
um menino de quem a gente gosta, é tudo diferente.

Senhor Papai - Faremos mal de nos zangarmos, aliás, é sempre perigoso zangar-se com aquilo
que não se compreende. Arrancar as flores? Quem pode garantir que elas não brotem
novamente? Por outro lado, somos forçados a reconhecer que essas florações são mais úteis
que nocivas. Já nenhum prisioneiro tenta fugir da cadeia, as favelas se transformaram num
prospero bairro, as crianças do hospital estão todas sarando, por que nos irritarmos? Eis minha
decisão! Nós vamos transformar a fábrica de canhões em fábrica de flores e vamos mudar o
nome da cidade. Passaremos a chamá-la de agora em diante de Miraflores. Com semelhante
nome quem poderá se espantar com o fato de brotar flor por toda parte? É claro que nada
podemos contra essas forças, mas podemos pô-las ao nosso serviço.

Narrador 2 - Os grandes homens de negócio tem o segredo dessas viravoltas repentinas. O


sucesso foi fulminante. A fábrica ia a mil maravilhas. Fabricavam tapetes e cortinas de flores
para as casas, jardins inteiros eram despachados em vagões. E eram vários os pedidos
personalizados que chegavam para Tistu.

Ginástico - Tistu, está contente agora?

Tistu - Sim, muito contente. Hoje pediram um tapa-arranha-céu. Disseram que algumas
pessoas são tomadas por uma espécie de febre, que as leva a se jogarem pela janela do
centésimo trigésimo andar. Por viverem tão distante da terra, é compreensível que não se
sintam muito normais. As flores podem ajudar a passar essas tonturas.

Ginástico - Você não se aborrece? Não sente vontade de nos deixar? Vai ficar conosco?

Tistu - Mas é claro. Que ideia de jerico! O que você quer dizer com isso? Minha história ainda
não acabou?

Ginástico - Vamos ver.. Vamos ver...

Narrador 1 - Alguns dias depois, uma notícia correu na casa que brilha, deixando todos muito
tristes. O jardineiro Bigode não despertara.

Dona mamãe - Bigode resolveu descansar para sempre!

Tistu - Posso ir vê-lo?

Dona Mamãe - Não, não pode. Você não pode mais vê-lo. Ele partiu para uma viagem muito
longa, muito longa, e nunca mais voltará.

Tistu - Não se viaja de olhos fechados. E se ele está dormindo poderia ao menos ter me dado
boa noite. E se partiu, podia ter me dito adeus. Isso não está nada claro, estão me escondendo
alguma coisa.

Dona Mamãe - O coitado do Bigode está no céu, agora está mais feliz que nós.

Tistu - Se é feliz, por que dizer que ele é coitado? Se é coitado, como poderá ser feliz?

Dona Mamãe - Ele está debaixo da terra, lá no cemitério.

Tistu - Debaixo da terra, ou no céu? É preciso decidir, ele não pode estar em todos os lugares
ao mesmo tempo.

Ginástico - Eu sei

Tistu - Sabe?

Ginástico - Sim. O Sr Bigode morreu.

Tistu - Morreu? Mas não houve guerras.

Ginástico - Não é preciso guerras pra morrer. O Sr Bigode já era velhinho. (Tistu chora) Chora
Tistu, chorar é bom. As pessoas grandes não querem chorar, e isso não é certo. As lágrimas
gelam dentro delas e o coração fica duro.

Música “Flor do Campo”


Tistu – Ginástico, tive uma ideia!

Ginástico - Sinto que algo triste há de acontecer.

Tistu - Farei uma escada. Uma escada bem grande, com árvores grandes e fortes.

Ginástico - E pra que essa escada, Tisu?

Tistu - Se o Senhor Bigode está mesmo lá em cima, poderá descer, ao menos um pouquinho.

Narrador 2 - E Tistu se pôs a construir a grande escada de flores. O trabalho não foi fácil, dias e
dias de trabalho, mas ele parecia incansável.

Tistu - Já faz três dias que a escada está pronta e nada do Senhor Bigode aparecer, já sei o que
devo fazer.

Ginástico - Não vá tistu!

Tistu - Não se preocupe Ginástico, eu vou subir, conversar um pouco com bigode e antes do
papai acordar já estarei de volta.

Narrador 1 - Tistu se pôs a subir a escada. Subia, subia, subia até desaparecer entre as nuvens,
e quando percebeu já não havia mais escada, e ele continuava a subir. Nas suas costas
surgiram duas imensas asas brancas, e ele foi envolvido por uma grande nuvem, que parecia
com os bigodes do Senhor Bigode, só que imensamente maiores. E foi assim que ele
desapareceu na imensidão do céu.

Narrador 2 - Ginástico roía com pressa a grama em torno da escada, e onde ele roia nasciam
margaridas amarelas como flores de ouro. Quando os moradores da Casa que Brilha saíram
naquela manhã procurando Tistu, encontraram próximo à grande escada dois chinelinhos e
uma frase escrita em belas margaridas douradas:

Todos - Tistu era um anjo.

Música “Tá Caindo Fulô”

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