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As fontes patrísticas

Importância e atualidade para a Igreja

Paulo César Barros, SJ

Introdução

O período em que viveram os Padres da Igreja – a assim chamada Patrística – pode ser
definido, com propriedade, como um tempo áureo da era cristã. Sucede ao tempo dos
Apóstolos, e tem características singulares e marcantes. A palavra “Padres” – ou “Pais”
(que seria um melhor vocábulo em português) – tem raízes já no Antigo Testamento (cf.
Eclo 44-50 e Lc 1,54-55) e traduz a relação que tais personagens tiveram com a Igreja:
deram uma enorme contribuição na organização eclesial e na elaboração da doutrina
cristã justo nos primeiros tempos – vale dizer, na “infância” – da Igreja. Como pais
devotados, cuidaram da Igreja nos seus primeiros passos, ajudando-a a se firmar nos
diversos contextos em que ela se inculturou.

Como se trata de um período relativamente longo, os estudiosos da patrística dividem-


na em algumas fases, a saber: a fase dos Padres apostólicos (Clemente Romano, Inácio
de Antioquia, Policarpo de Esmirna, …); aquela dos Padres apologistas (Justino, Ireneu
de Lião, Clemente de Alexandria, Orígenes, …); em seguida, a fase de “maturidade” da
patrística (no Oriente: Basílio, Teodoreto de Ciro, …; no Ocidente, no fim do séc. IV e
no início do séc. V: Agostinho, Jerônimo, …). Costuma-se classificar os personagens
destes tempos iniciais da Igreja em dois grandes grupos: os “Padres da Igreja”
propriamente ditos, e os “escritores eclesiásticos”. Os Padres da Igreja são aqueles que
se distinguem por três características: ortodoxia da doutrina, santidade pessoal e
comunhão com a Igreja. A partir desta diferenciação, figuras importantes como
Tertuliano e Orígenes, por exemplo, muito embora tenham composto obras de valor,
que constituem referência para a reflexão teológica e para a vida da Igreja, são
reconhecidos apenas como “escritores eclesiásticos”.

Há controvérsias quanto ao término do período patrístico. Comumente se admite que o


tempo dos Padres se conclui, no Ocidente, com Isidoro de Sevilha († 636), e, no
Oriente, com João Damasceno († em torno de 750), mas há quem estenda o tempo dos
Padres, no Ocidente, até Bernardo de Claraval († 1153).

Grande parte da literatura patrística foi composta em grego e latim; porém, há textos
patrísticos também em siríaco (por exemplo, Efrém de Nísibe, do séc. IV), copta (é o
caso de Pacômio, do séc. IV) e armênio.

Os Padres e a Bíblia

Herdeiros da tradição bíblica, os Padres foram grandes freqüentadores das Escrituras


sagradas. Os famosos comentários patrísticos dos textos bíblicos, por exemplo, deixam
transparecer o assíduo contato dos Padres com os livros sagrados. Recordemos aqui o
exemplo de Ambrósio de Milão, que se consagrou ao estudo sistemático da Bíblia, ao
início como preparação para sua ordenação episcopal, e que se prolongou por toda a sua
vida (cf. o testemunho de Agostinho, no livro das Confissões, VI, 3, 3).

Antes de comentar os textos bíblicos, os Padres “ruminavam-nos” nos âmbitos da


oração pessoal e da liturgia. Entendiam que não é possível falar de Deus sem antes falar
com Deus; para tanto, usavam a Bíblia como instrumento de comunicação com Deus. E
mais. Os textos sagrados ocupavam lugar de destaque, quer nas polêmicas, quer nos
escritos dogmáticos e de moral, sobretudo para fundamentar posições assumidas pelos
Padres nas controvérsias com os que não aceitavam o cristianismo, ou mesmo com
cristãos que tinham comportamento e/ou idéias contrários à doutrina da assim chamada
“grande Igreja”. Vale a pena mencionar o testemunho de Agostinho de Hipona, ao dizer
que se baseia nas Escrituras para “explicar” a Trindade: “No livro primeiro [da obra A
Trindade], apoiando-me nas Escrituras sagradas, mostrei a unidade e a igualdade
daquela suprema Trindade” (A Trindade, XV, 3, 5).

Ainda a propósito desta questão, tenha-se presente que nos séculos I e II a leitura cristã
do Antigo Testamento foi rejeitada pelos gnósticos (que estabeleciam contraste entre o
Deus justo do AT e o Deus bondoso do NT) e pelos marcionitas (seguidores de
Marcião). Os Padres viram-se, então, diante de um grave problema: como relacionar
mutuamente o Antigo Testamento e o Novo Testamento? Responde por eles Agostinho
de Hipona, ao dizer: “o Novo Testamento está oculto no Antigo, e o Antigo é desvelado
no Novo” (Questões sobre o Heptateuco, II, 73). Por sua vez, Ireneu de Lião, entre a
segunda metade do séc. II e a primeira metade do séc. III, chama a atenção para o
progresso entre o AT e o NT, contra as posições que supunham a ruptura entre ambos.

Os Padres liam a Escritura em sua totalidade e a situavam no amplo panorama da


história da salvação, reconhecendo que a interpretação mais acertada da Escritura dá-se
no interior dela mesma. Convém recordar que nesta leitura da Escritura integral, os
Padres da Igreja faziam amplo uso da tipologia, aliás, já presente nas cartas de São
Paulo: os “tipos” no AT, sobretudo personagens, são antevisões do que se realizará
plenamente em Cristo, no NT. Apenas um exemplo: Abel é tipo do Cristo Bom Pastor,
na medida em que este personagem do AT fora pastor (cf. Agostinho, Contra Fausto,
12,9-10). Tendo sido morto por seu irmão Caim, Abel também é imagem do sacrifício
eucarístico (cf. Ambrósio, Gregório Nazianzeno, João Crisóstomo, Cirilo de
Alexandria, Melitão de Sardes) e representação antecipada do mártir (Cipriano,
Ambrósio), enquanto inocente que teve o seu sangue derramado. Abel é “o primeiro
justo”, dirá Agostinho (Sermões, 87, 4, 5; 294, 15; 341, 9, 11). Ainda Agostinho, em A
Cidade de Deus, relaciona Caim à cidade do demônio, e Abel, à cidade de Deus (A
Cidade de Deus, XV, 1). E ainda, no mesmo livro de Agostinho, Abel é imagem da
Igreja, peregrina e perseguida pelo mundo e consolada por Deus (A Cidade de Deus,
XV, 18, 2; XVIII, 51,2).

Já que os Padres da Igreja tinham formação clássica, aplicavam na leitura dos textos
sagrados procedimentos interpretativos próprios dos gramáticos antigos. A respeito
disto, recorde-se a influência que teve Fílon de Alexandria, judeu helenizado, sobre os
Padres, no que respeita ao método alegórico de interpretação das Escrituras, bem como
nos campos da teologia e da espiritualidade. Clemente, Orígenes, Gregório de Nissa e
Ambrósio receberam muito desta influência de Fílon. Fazendo uso de tais ferramentas
de interpretação dos escritos sagrados, os Padres experimentavam aqui uma tensão nada
fácil, se recordarmos a advertência de Paulo quanto ao risco de se utilizar, na
compreensão da fé, a “sabedoria segundo a carne” e não a “sabedoria proveniente de
Deus” (cf. 1Cor 1,17-31), ou ainda: “Que ninguém vos faça prisioneiros de teorias e
conversas sem fundamento, conforme tradições humanas, segundo os elementos do
cosmo, e não segundo Cristo” (Col 2,8). Todavia, os Padres empregavam tais
ferramentas de leitura das Escrituras tendo Cristo e a Igreja como insubstituíveis
referências de interpretação delas. Assim sendo, a confissão de Cristo e a fé vivida em
Igreja eram, para os Padres, de um significado extremamente importante. Isto porque a
orientação soteriológica da revelação bíblica era-lhes decisiva. Em Cristo, a história da
salvação chega a seu ponto alto, e a acolhida da oferta de salvação não pode acontecer
fora da Igreja. No mundo da patrística, não se entende Cristo sem a Igreja, e nem a
Igreja sem Cristo, como não se entende que alguém possa ser salvo sem pertencer à
Igreja. Desta forma, os instrumentos “profanos” de interpretação dos textos sagrados
eram usados numa etapa prévia, de acesso ao texto enquanto texto, mas que, graças à
ação do Espírito Santo na comunhão eclesial – graças Àquele que nos conduz a toda a
verdade (cf. Jo 16,13) –, evoluía para uma compreensão profunda e transformadora de
tais textos. O mesmo se diga da filosofia, utilizada pelos Padres como etapa preparatória
na reflexão e na pregação da fé cristã.

Os Padres e a Igreja

Muito embora os Padres da Igreja tenham sido, cada qual a seu modo, figuras
importantes na explicitação do mistério cristão, tal tarefa não se realizava sem a
experiência da comunhão eclesial, sem o rico e profundo “sentido da fé” (sensus fidei),
vivido por todos os membros do Povo de Deus. Desta forma, os Padres entendiam que a
teologia deve ser a “explicação” da experiência pessoal e comunitária do mistério de
Deus. Resulta, daqui, a importância que os Padres atribuíam à liturgia e à catequese
mistagógica. A catequese mistagógica (ou seja, a explicação dos mistérios da fé cristã)
era praticada com freqüência e naturalidade nas comunidades eclesiais nos tempos da
patrística. A explicação dos ritos litúrgicos era meio privilegiado de se iniciar, na fé
cristã, os que aspiravam pertencer à Igreja. E ainda no contexto litúrgico, a homilia,
derivada da liturgia sinagogal, gozava de lugar privilegiado. Aprendemos dos Padres
que a homilia deve levar os fiéis a perceberem a unidade que há entre a Palavra
proclamada e o sacramento celebrado. Ou seja, na celebração dos sacramentos, a
liturgia da Palavra não é uma “preparação” para o que vem depois: é já celebração, é já
experiência de comunhão dos homens com o Deus Trindade que fala a seu Povo e ouve
seus clamores.

Os Padres experimentavam grande amor à Igreja. Entendiam-na como a Esposa de


Cristo (cf. Ap 19,7; 21,9) e, portanto, merecedora de atenção e afeto. Agostinho de
Hipona, por exemplo, gostava de dizer que a missão do bispo é ser como João Batista:
“amigo do esposo” (cf. Jo 3,29). Desta forma, a missão do bispo é zelar pelo bem e pela
unidade da Igreja, e fazê-lo como demonstração de fidelidade ao Esposo. O ministério
pastoral era para eles o grande compromisso de vida em Igreja. Na sua maioria, os
Padres eram pastores: bispos e presbíteros. Sua atuação pastoral desenvolvia-se como
resposta a problemas concretos das comunidades eclesiais, no contato direto com os
fiéis. Daí o lugar de destaque que os sermões, as catequeses e as cartas, assim como as
obras ascéticas e morais, ocupam na literatura patrística, justo em razão de sua
finalidade pastoral. São textos mais de natureza prática que especulativa. Nos Padres, a
articulação entre teologia e pastoral era espontânea: eles não se colocavam o problema
da necessidade ou da conveniência de uma “teologia pastoral”. Para eles, a reflexão
teológica tinha finalidade pastoral, pura e simplesmente.

O compromisso com a Igreja se manifestava também no empenho pela organização


eclesiástica, com a configuração dos ministérios de governo para o bem de toda a Igreja.
Como exemplo desta atenção, basta recordar as famosas cartas de Inácio de Antioquia,
escritas a caminho de seu martírio em Roma, por volta do ano 107, sob o imperador
Trajano. Ressalte-se também a grande atenção dos Padres com relação à unidade da
Igreja. São freqüentes em homilias e catequeses dos Padres as exortações à manutenção
da integridade do Corpo eclesial de Cristo. Desta forma, nada lhes repugnava mais do
que cismas e heresias. Mencione-se aqui, por exemplo, a polêmica de Agostinho de
Hipona com os cismáticos donatistas, no norte da África, nos séculos IV e V. Ainda que
nos pareça duro e intransigente o modo como Agostinho se dirigia aos separatistas, não
se pode negar sua preocupação sincera com a integridade do corpo eclesial, ameaçado
de dilaceração pelas tendências cismáticas.

Ainda no que diz respeito à vida de Igreja, era muito significativo para os Padres o
sentido de “tradição” (que nada tem a ver com “tradicionalismo”!). Ao tempo dos
Padres, torna-se sólida a consciência de que a Igreja é lugar de transmissão e recepção
da fé cristã. Os Padres souberam falar do Evangelho, e o fizeram bem, porque antes
souberam escutá-lo de outros. Como exemplo, mencionemos a figura de Policarpo de
Esmirna, que tendo ouvido Inácio de Antioquia, foi escutado por Ireneu de Lião. Este
sentido de tradição – de transmissão da fé cristã por palavras e testemunhos –, que,
aliás, se confunde com o sentido de Igreja, será decisivo, para os Padres, na preservação
das quatro clássicas propriedades da Igreja, a saber: a unidade, a santidade, a
catolicidade e a apostolicidade.

Os Padres e a liturgia

Para os Padres da Igreja, a liturgia é a “escola da fé” por excelência. Deste modo, não
por acaso o batismo tem lugar de destaque na liturgia patrística. Se Tertuliano é tido
como o autor do primeiro tratado sobre este sacramento (O batismo), Ireneu de Lião e
Orígenes trabalham mais detalhadamente a teologia do mesmo. Não nos esqueçamos
ainda o valor que têm aqui as catequeses sobre o batismo, em Padres como Ambrósio,
Agostinho, Cirilo de Jerusalém, João Crisóstomo e Teodoro de Mopsuéstia. Mencione-
se ainda uma simples nota histórica a respeito das controvérsias antigas em torno a este
sacramento. Cipriano de Cartago não considerava válido o batismo celebrado por
heréticos e cismáticos. Agostinho de Hipona esclarecerá esta difícil questão, ao associar
a validade do batismo não à retidão moral do ministro, mas ao fato de que é Cristo
quem, em última instância, “preside” à celebração do sacramento: “Ainda que Pedro
batize, Cristo é quem batiza; ainda que Paulo batize, Cristo é quem batiza; ainda que
Judas batize, Cristo é quem batiza” (Comentário ao evangelho de João, tr. 6,7).

A relação entre eucaristia e Igreja era natural e óbvia nos tempos da patrística. A
expressão emblemática de Henri de Lubac – “A Igreja faz a eucaristia, e a eucaristia faz
a Igreja” – traduz magnificamente este dado da patrística. Encontramos nos Padres uma
vigorosa eclesiologia eucarística, que torna evidente o caráter sacramental da Igreja. Ao
tempo dos Padres, percebia-se com clareza que a celebração eucarística era a principal
manifestação da Igreja, local e universal ao mesmo tempo. Além disso, era-lhes muito
claro o compromisso ético que a eucaristia traz em si mesma. Recordem-se, a propósito,
as homilias eucarísticas de João Crisóstomo, como grande motivação ao compromisso
social inerente ao sacramento da eucaristia. Homens de síntese, os Padres sabiam aliar,
com grande lucidez, fé e compromisso social, o louvor a Deus e a vida humana feliz,
como Ireneu de Lião deixou transparecer nesta bela e conhecida frase: “A glória de
Deus é o homem que vive, e a vida do homem é a visão de Deus” (Contra as heresias,
IV, 20, 7).

Os Padres e a teologia
“Explicar” o mistério de Deus era um enorme desafio para os Padres. Buscavam fazê-lo
cientes da limitação da linguagem humana. Os Padres da Igreja foram os primeiros
elaboradores da doutrina cristã, e neste sentido, do vocabulário específico desta mesma
doutrina. Não por acaso os Padres foram contemporâneos dos primeiros concílios
ecumênicos da história da Igreja, a saber, Nicéia (no ano 325), Constantinopla (381),
Éfeso (431), Calcedônia (451), Constantinopla II (553), Constantinopla III (681) e
Nicéia II (787). Os primeiros concílios da Igreja foram eventos únicos e de grande
importância, nos quais se lançaram as bases da doutrina cristã, indispensável para
organizar a vida interna da Igreja e para dinamizar a sua missão. Cabe aqui mencionar
também os sínodos locais da Antigüidade, que também contaram com a significativa
participação dos Padres, e nos quais se discutiam questões importantes para a vida das
Igrejas locais, ou de determinadas regiões, com repercussões em todo o corpo eclesial.
Neste particular, foi grande o mérito dos Padres na articulação entre fé e razão. Ou seja,
o entendimento e a exposição da fé cristã através das categorias intelectuais de que
dispunham na época. É o que entendemos por “intelecção da fé” (intellectus fidei). Os
Padres praticaram, desta forma, um significativo e louvável exercício de inculturação da
fé cristã, num ambiente complexo como era o Império romano, marcado por
inquietações que afligiam as consciências, tais como a morte e o destino, a redenção do
mal, a purificação espiritual e a união com Deus, num ambiente de pluralidade de cultos
pagãos e sincretismo religioso característicos da Antigüidade.

Os Padres e as resistências iniciais ao cristianismo

Sobretudo nos primeiros séculos da Igreja, os Padres passaram por dificuldades


especiais. É o tempo do florescimento da apologética, precisamente nos séculos II e III,
que teve duas tendências mais destacadas. Uma, interessada em estabelecer diálogo com
o diferente (representante desta corrente é, por exemplo, Melitão de Sardes). A outra,
que assume pura e simplesmente uma posição crítica frente ao paganismo (é o caso de
Tertuliano). Apologista famoso é Justino, nascido na Palestina e convertido ao
cristianismo: é o autor do Diálogo com o Judeu Trifão, obra mediante a qual responde
às dificuldades postas ao cristianismo pelo judaísmo. Os cristãos eram vítimas de
preconceitos os mais diversos, tais como a acusação de professarem uma religião atéia.
Para exemplificar isto, basta mencionar esta provocação do filósofo pagão Celso: “Por
que vós, cristãos, não tendes altares, nem estátuas, nem templos?” (Orígenes, Contra
Celso, 8, 17). Evoquemos também as objeções de outros filósofos, tais como Luciano de
Samósata e os sofistas (aos quais responde Clemente de Alexandria com a obra
Stromata), e Frontão de Cirta. Em meio a estes desafios, os Padres explicitaram a fé
cristã com categorias das escolas filosóficas então correntes, entre as quais se
destacavam o platonismo, o estoicismo e o neoplatonismo. Além destas perseguições
difusas e de natureza ideológica, recordemos aquelas oficiais, do Império romano, que
se deram ora de modo severo, ora de modo brando, às quais alguns Padres responderam
com a aceitação do martírio, como Cipriano de Cartago e Inácio de Antioquia.

Os Padres e o Concílio Vaticano II

Nas décadas anteriores ao Concílio Vaticano II, os estudos em patrística ofereceram rico
e profundo conteúdo doutrinário ao mesmo Concílio, na medida em que
proporcionaram grande incremento às pesquisas em liturgia, Bíblia, teologia
sistemática, ecumenismo etc. A renovação teológica que então se deu neste tempo é
devedora, em grande parte, à redescoberta dos Padres da Igreja por teólogos tais como
Yves Congar, Josef Ratzinger e Karl Rahner. Muitos destes teólogos, cujos nomes
citados são apenas alguns exemplos, na qualidade de peritos no Concílio, deram valiosa
contribuição na reflexão e nas decisões dos Padres conciliares. Convém mencionar,
nesta perspectiva, a Nova Teologia (Nouvelle Théologie), na França, como programa
teológico que se alimentou muito da revisitação dos Padres da Igreja.

Ao lermos os documentos do Vaticano II, encontramos muitas notas de rodapé com


citações dos Padres da Igreja. Deu-se, neste importante sínodo, decisivo resgate deste
formidável patrimônio eclesial. Quando falamos de recepção do Concílio Vaticano II,
devemos nos ater não exclusivamente ao conteúdo doutrinal deste sínodo; devemos
aprender do Concílio que teologia se faz, a rigor, como releitura das fontes da Tradição
eclesial. E releitura quer dizer reinterpretação. Não podemos ler os Padres da Igreja
como quem faz arqueologia, mas como quem busca, nas grandes referências do
passado, inspiração na solução dos problemas de hoje. Com efeito, assim fizeram os
Padres conciliares no Vaticano II.

Os Padres e sua atualidade

Com relação à leitura das Escrituras, cabe-nos aliar o método de interpretação bíblica
dos Padres ao moderno método exegético histórico-crítico. O primeiro método dá-nos
uma visão do “todo” da revelação. Ademais, os Padres da Igreja tinham consciência de
que o Espírito é quem nos faz entender os textos sacros: o método patrístico de leitura
da Escritura implica a experiência da docilidade ao Espírito Santo na comunhão
eclesial. O segundo método, por seu lado, ajuda-nos a conhecer a formação histórica
dos textos, a composição gradativa da Bíblia, os diversos gêneros literários. Os dois
métodos não são incompatíveis, nem mutuamente excludentes; antes, se complementam
em vista de uma melhor compreensão e assimilação da história da salvação
“concentrada” nos escritos sagrados.

O modo segundo o qual os Padres concebiam a liturgia nos ajuda, hoje, a melhor
celebrar os sacramentos: não como protagonismo dos clérigos, mas como ação de todo
o Povo de Deus. Isto implica em equilíbrio entre as funções da presidência e a
participação de todos, como única Igreja celebrante. Aprendemos dos Padres que a
liturgia deve ser vivida não como show a que se assiste, mas como humilde e agradecida
contemplação do mistério de Deus numa atmosfera de oração em comunidade.
Mencionemos Ambrósio de Milão e Cirilo de Jerusalém, para citar dois exemplos
notáveis de Padres que reconheciam a centralidade da liturgia na vida cristã. O
conhecimento das obras dos Padres, sem dúvida, há de nos ajudar a reencontrar o
autêntico valor da celebração dos sacramentos, de modo particular enquanto atitude de
respeitosa acolhida do Deus que fala a seu povo, o purifica e o alimenta. Aqui tem
grande significado a compreensão dos ritos e dos sinais litúrgicos, de como foram sendo
assimilados aos poucos pelos cristãos em suas celebrações nos tempos iniciais da Igreja.
Esta consciência histórica da formação dos ritos litúrgicos por certo há de favorecer
uma sadia criatividade na liturgia, muito diversamente da mera invenção de gestos
vazios e estranhos à tradição litúrgica da Igreja.

Em face do afã de exterioridade que se percebe hoje na liturgia católica, é necessário


resgatar o valor da interioridade, tão prezado pelos Padres da Igreja. Os exemplos neste
particular são muitos, mas contentemo-nos em mencionar Agostinho de Hipona, com
sua experiência de que o homem é autenticamente livre quando busca repousar em
Deus; quando não se deixa mover pelo amor a si mesmo, mas pelo amor de Deus. Cabe,
neste contexto, mencionar brevemente a analogia que Agostinho vê entre o homem e a
Trindade Santa, na medida em que memória, inteligência e vontade, as três “operações”
do espírito humano, fazem lembrar respectivamente o Pai, o Filho e o Espírito Santo.
Assim diz Santo Agostinho: “… descobri que o espírito não pode nunca existir sem
recordar-se de si, sem compreender-se, sem amar-se, […] deixei para mais tarde o
estudo sobre a Trindade, da qual o espírito é imagem” (A Trindade, XV, 3, 5).

Os Padres têm muito a nos ensinar sobre a sadia diversidade de teologias, enquanto
sínteses imperfeitas brotadas do esforço humano de dizer aquilo que é indizível: o
mistério de Deus. Tais elaborações teológicas, porque imperfeitas, são complementares
no empenho humano por “entender” o mistério de Deus. Lembremo-nos de que, no
tempo dos Padres, conviviam grandes escolas teológicas, tais como a alexandrina, a
antioquena e a asiática. A primeira teve em Orígenes um de seus expoentes, com seu
rigoroso método de pesquisa demonstrado no Comentário ao Cântico dos Cânticos. A
segunda, por sua vez, iniciada por Diodoro de Tarso na segunda metade do século IV,
teve em Teodoro de Mopsuéstia seu representante máximo. Por certo, tais escolas
teológicas coexistiam não em total harmonia, mas “rivalizavam” no propósito comum
de pronunciar alguma palavra sobre o mistério de Deus, e que fosse útil ao fiel na
acolhida do dom da salvação. A diversidade de posições era de se esperar, na medida
em que nenhum discurso que queira dizer Deus pode pretender ser exaustivo e único.

Os Padres são de valor inestimável para o movimento ecumênico. O seu amor pela
unidade da Igreja de Cristo (cuja imagem eles reconhecem na túnica sem costura do
Crucificado [cf. Jo 19,23]), por si só, justifica o atual empenho ecumênico. Nada lhes
era mais repugnante que provocar cismas na Igreja. Ademais, os Padres são um
patrimônio comum às grandes tradições cristãs de hoje – catolicismo, ortodoxia e
protestantismo –, resultantes de processos históricos complexos quer por ocasião da
separação entre Ocidente e Oriente (ano de 1054), quer por ocasião da Reforma
protestante (1517). A revisitação dos Padres feita em comum por estas diversas
tradições cristãs tem alimentado o movimento ecumênico. Para nos convencermos disto,
é suficiente ler os documentos conclusivos do diálogo teológico ecumênico.

Uma palavra ainda quanto aos ganhos que uma releitura dos Padres proporcionaria à
pastoral, ou mais precisamente, à homilética. Caber-nos-ia aqui explorar o potencial
poético da linguagem dos Padres, com suas ricas e sugestivas imagens, metáforas e
analogias. Referem-se a Cristo como pastor, médico etc.; à Igreja como barco, lua,
personagens bíblicas femininas etc. A Trindade é representada metaforicamente pelo
curso d’água, que tem nascente, corrente e queda. Com certeza, o emprego destas
analogias e metáforas proporcionaria enriquecimento também para a teologia, enquanto
elaboração teórica do mistério de Deus que fosse menos “cerebral” e mais “cordial”.

Conclusão

Não é justo “idolatrar” os Padres da Igreja. Eles foram homens comuns, com
fragilidades e pecados, mas que experimentaram, na Igreja e através da Igreja, a força
libertadora e transformadora da Ressurreição de Cristo. Não podemos recorrer a eles
como se fossem a solução mágica para todas as indagações e dúvidas que tenhamos
hoje. Aliás, certas opiniões por eles formuladas não foram inseridas no grande
patrimônio dogmático da Igreja. Citemos alguns exemplos. A idéia de Ambrósio de
Milão, segundo o qual a paixão e a morte de Cristo foram o preço pago ao demônio pela
salvação dos homens (Explicação do evangelho de Lucas, IV, 11-12; VII, 114-117;
Cartas, 72). Ou a opinião da apocatástase, de Orígenes, segundo a qual no fim dos
tempos ocorrerá o restabelecimento de todas as almas, inclusive as dos anjos decaídos e
as dos pecadores condenados, na condição de felicidade paradisíaca. Os Padres são
figuras importantes e respeitáveis, grandes referências para se pensar a fé cristã e vivê-
la; todavia, suas obras devem ser lidas criteriosamente, com discernimento e bom senso.
Levando-se em conta estas premissas, eles serão, hoje e sempre, como foram no
passado, grandes luzeiros a indicar à Igreja caminhos de rejuvenescimento.

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