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Eletricidade é um processo natural em nosso organismo e está envolvida na função específica de certas células
especiais no cérebro e nos músculos estriados e lisos. Cada padrão de luz, som, calor, dor, cada piscar de
olhos, estalar de dedos, cada pensamento, se traduz em uma sequência de pulsos elétricos. Como isso
acontece?
As células nervosas possuem propriedades similares às outras células em muitos aspectos: elas se alimentam,
respiram, passam por processos de difusão e osmose em suas membranas, etc., mas diferem em um aspecto
importante: elas processam informação. A habilidade das células nervosas processarem informação depende de
propriedades especiais da membrana do neurônio, a qual controla o fluxo de substâncias ao lado interno da
célula (íons sódio, cálcio, potássio, etc).
Os neurônios não existem isoladamente: eles também se conectam uns aos outros formando as chamadas
cadeias neuronais, as quais transmitem informações a outros neurônios ou músculos. Por essas cadeias
caminham os impulsos nervosos. Dois tipos de fenômenos estão envolvidos no processamento do impulso
nervoso: elétrico e químico. Os eventos elétricos propagam um sinal dentro de um neurônio, e o químico
transmite o sinal de um neurônio a outro ou a uma célula muscular. O "engate" ou junção entre um neurônio e
outro, é denominado sinapse, assunto que veremos em edições posteriores.
O Impulso Nervoso
Um impulso nervoso é a transmissão de uma alteração elétrica ao longo da membrana do neurônio a partir do
ponto em que ele foi estimulado. A direção normal do impulso no organismo é do corpo celular para o axônio
(veja o artigo sobre a estrutura do neurônio na edição no. 8 da Revista Cérebro & Mente).
Esse impulso nervoso, ou potencial de ação, é uma alteração brusca e rápida da diferença de potencial
transmembrana. Normalmente, como vimos no artigo anterior desta série, a membrana do neurônio é polarizada
em repouso, sendo que o potencial é negativo ( -70 mV). O potencial de ação consiste de uma redução rápida da
negatividade da membrana até 0mV e inversão deste potencial até valores de cerca de +30mV, seguido de um
retorno também rápido até valores um pouco mais negativos que o potencial de repouso de -70mV.
Em virtude do gradiente de
concentração e carga negativa do
fluido extracelular, os íons entram na
fibra através destes canais. A entrada
de sódio (em amarelo) despolariza a
membrana, isto é, a face da
membrana imersa no fluído
extracelular das fibras se torna menos
negativo em relação ao interior. Se
esta despolarização, chamada
potencial gerador, alcança o nível
crítico, a membrana irá gerar um
potencial de ação. O nível crítico de
despolarização que deve ser
atravessado a fim de desencadear um
potencial de ação é chamado limiar.
Os potenciais de ação são causados
pela despolarização da membrana
além do limiar.
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21/09/2019 Como Funcionam as Células Nervosas
Como é possível que o potencial de repouso possa ser perturbado até o ponto de surgir um potencial de ação?
Quando um estímulo é aplicado a essa membrana, ocorre um desiquilíbrio temporário entre as cargas elétricas
da membrana e as concentrações de vários íons de um lado e de outro da mesma, que é chamado de potencial
local. Sempre que a membrana, partindo do potencial de repouso, é despolarizada a cerca de -50 mV, formam-se
potenciais de ação. O potencial em que se inicia o potencial de ação é denominado limiar (veja figura acima).
Nesse potencial limiar, a membrana é instável. Ela diminui espontaneamente sua polaridade, com grande
rapidez, chegando geralmente a inverter a sua polaridade: segue-se a brusca elevação ("traço ascendente") do
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potencial de ação, que ultrapasso o potencial 0 e atinge o "excedente". Esse estado de diminuição da carga,
desencadeado no "limiar", espontâneo e progressivo, também é chamado de excitação. A excitação é de curta
duração, normalmente menos de 1 ms (milisegundo), sendo comparável a uma explosão que rapidamente se
dissipa.
Um estímulo que tende a diminuir a polaridade natural da membrana é chamado de despolarizante. Um estímulo
que tende a aumentar a polaridade natural é chamado de hiperpolarizante. Os potenciais locais não se
propagam, ou seja, ficam restritos unicamente na membrana vizinha ao local de aplicação do estímulo.
O que o neurônio faz então é uma "conta de somar" de todos os potenciais locais. Se o resultado for no sentido
da despolarização grande, vai ocorrer um fenômeno muito marcante, que é o potencial de ação, a partir de uma
certa amplitude. Vamos ver agora porque e como ele ocorre.
Os Passos Iniciais
Quando um estímulo atinge a membrana do neurônio ocorre uma pequena despolarização local. Esse estímulo
pode ser fótico, químico, físico ou farmacológico, dependendo da sensibilidade da célula. A despolarização faz
com que canais de Na+ e K+ dependentes de voltagem se abram e permitam um fluxo de correntes iônicas de
um lado para o outro da célula. Simultaneamente ocorre um fluxo de fora para dentro de Na+ (pois, como vimos
no capítulo anterior, existe uma maior concentração de sódio fora), o que tende a despolarizar ainda mais a
membrana; e um fluxo de dentro para fora de K+, que tende a repolarizá-la.
"Tudo ou Nada"
Existe, contudo, uma diferença importante entre os canais de Na+ e K+: os canais de Na+ se abrem mais
rapidamente do que os canais de K+. Com isso, a despolarização provoca um efeito auto-alimentador: quanto
mais sódio passa pelo canal, mais ele fica permeável. É uma avalancha de despolarização, que leva a um ponto
em que a corrente despolarizante de Na+ é muito maior que a corrente repolarizante de K+; a esse ponto dá-se o
nome de POTENCIAL LIMIAR. A partir do momento em que ele é atingido, o processo não pode mais ser
revertido e ocorre uma abrupta inversão da polarização da membrana, ou seja, o potencial de ação. Na maioria
dos neurônios, o valor do potencial limiar é de cerca de -30mV.
Uma vez atingido o limiar, o potencial de ação ocorre com uma amplitude e duração fixas. Se o limiar não for
atingido, ou seja, a despolarização ou o influxo de sódio não forem suficientemente fortes, não ocorre o
potencial de ação. Por isso os cientistas o denominam de um "fenômeno tudo ou nada", muito parecido com um
mecanismo digital (0 ou 1)
Voltando ao Normal
A fase de despolarização do potencial de ação é abrupta e muito rápida: ocorre em menos de um milissegundo.
Logo depois dele ter atingido o pico máximo de despolarização (que inverte o potencial de membrana em cerca
de 10 a 20 mV positivos), ele começa a voltar ao normal, ou seja, em direção ao valor de repouso. A esse
fenômeno denominamos repolarização, e nele acontece uma coisa muito importante: enquanto durar essa
recuperação o neurônio fica insensível a novos estímulos (é o período refratário).
Porque acontece isso? Para entendermos, temos que conhecer outra diferença importante entre os canais de
Na+ e K+: o primeiro sofre inativação e o segundo não.
Após ter ocorrido o potencial de ação, os canais de Na+ passam para um estado inativo no qual não são
capazes de responder a um novo estímulo, ou seja, ficam fechados a novos influxos de sódio. Enquanto isso, os
canais de K+, que ainda estão se abrindo, devido à sua lentidão caracteristica, permanecem ativos e permitem
uma grande saída de íons K+. Isso leva à repolarização da membrana, de qua falamos acima. Ela chega a ser
"exagerada" na sua fase final, provocando inclusive uma pequena e transitória hiperpolarização.
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Os canais de Na+ somente voltam a poder ser estimulados apenas depois que a membrana estiver totalmente
repolarizada. Enquando não houver um número suficiente de canais de Na+ nessa condição, é possível
estimular o neurônio, mas ele responderá somente se a intensidade for bem maior. É o que denominamos de
período refratário relativo. Quando os canais estão totalmente fechados e é impossível estimular o neurônio, por
maior que seja a intensidade do estímulo, dizemos que o período refratário é absoluto.
Próximo: A Propagação do Potencial de Ação pela Fibra Nervosa (fibras mielínicas e amielínicas, condução
contínua e saltatoria) Potencial de ação composto (fibras). Velocidade do potencial de ação e como pode ser
medido. Relevância para a clínica.
Os Autores
Silvia Helena Cardoso, PhD. Luciana Christante Renato M.E. Sabbatini, André Malavazzi
Psicobióloga, mestre e doutora em de Mello, MSc, PhD. Diretor do Núcleo Designer
Ciências. Fundadora e editora- MSc. Farmacêutica, de Informática
chefe da revista Cérebro & Mente. Biomédica, Universidade
Universidade Estadual de Estadual de Campinas.
Campinas.
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