Sunteți pe pagina 1din 40

24

módulo
gramática professor
Abaurre • Pontara • Avelar

FIGURAS DE LINGUAGEM

FABIO COLOMBINI
Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Que tipo de emoção você experimentaria se estivesse diante das cataratas do Iguaçu, retratadas nesta imagem? Como
a sua emoção poderia ser descrita? Que recursos linguísticos você empregaria em sua descrição para apresentar
o que vê e expressar o que sente?

1
CAPÍTULOs

Figuras sonoras e de palavra


2 Figuras de sintaxe e de pensamento

1 • 2 • 3 • 4 • 5 • 6 • 7 • 8 • 9 • 10 • 11 • 12 • 13 • 14 • 15 • 16 • 17 • 18 • 19 • 20 • 21 • 22 • 23 • 24 1
FONDATION GALA - SALVADOR DALÍ, SONO, ANO 1937 OBRA, LICENCIADO POR AUTVIS, BRASIL, 2009

Óleo sobre tela, 51 x 78 cm.


Sono, 1937, de Salvador Dalí.
A linguagem e seus
“efeitos especiais”
As figuras de linguagem, que você vai estudar nos dois
capítulos deste módulo, envolvem recursos relacionados
a diferentes níveis gramaticais (fonológico, lexical,
morfossintático, semântico). Por meio desses recursos, é
possível criar efeitos estilísticos diversos e, com isso, conferir
maior valor expressivo à linguagem.

Professor: Consulte o Plano de Aulas. As orientações pedagógicas e sugestões


Objetivos didáticas facilitarão seu trabalho com os alunos.

Ao final deste módulo, você deverá ser capaz de:


■ saber o que são figuras de linguagem;

■ reconhecer quais são as figuras sonoras, de palavra,


de sintaxe e de pensamento;
■ explicar o modo como essas figuras atuam na
criação de efeitos que determinam o sentido de um
texto.

Capítulo


1 Figuras sonoras
e de palavra

1 Introdução
Observe a imagem e leia o texto que a acompanha para responder às questões
de 1 a 7.

Reprodução

Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.


Figura 1.

(...) Até há pouco a vila tinha apenas uma rua. Chamavam-lhe, por ironia,
a Rua do Meio. Agora, outros caminhos de areia solta se abriram num emara-
nhado. Mas a vila é ainda demasiado rural, falta-lhe a geometria dos espaços
arrumados. Lá estão os coqueiros, os corvos, as lentas fogueiras que começam
a despontar. As casas de cimento estão em ruína, exaustas de tanto abandono.
Não são apenas casas destroçadas: é o próprio tempo desmoronado. (...)
Dói-me a ilha como está, a decadência das casas, a miséria derramada
pelas ruas. Mesmo a natureza parece sofrer de mau-olhado. Os capinzais se
estendem secos, parece que empalharam o horizonte. À primeira vista, tudo
definha. No entanto, mais além, à mão de um olhar, a vida reverbera, chei-
rosa como um fruto em verão: enxames de crianças atravessam os caminhos,
mulheres dançam e cantam, homens falam alto, donos do tempo.
COUTO, Mia. Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra.
São Paulo: Companhia das Letras, 2003. p. 27-28.

4
Aureliano Biancarelli/AE
Mia Couto (António Emílio Leite Couto) nasceu na cidade de Beira, Moçambique, em
1955. Jornalista de formação, dedicou-se à literatura. Poeta, contista e romancista, já foi
comparado a Guimarães Rosa devido à recriação da língua que faz ao escrever. Seu livro
Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra foi filmado pelo cineasta português José
Carlos Oliveira.

1 Mariano (o narrador em 1a pessoa) volta à ilha onde nasceu, Luar-do-Chão, para Figura 2 • Mia Couto.
acompanhar o funeral do avô. Para Mariano, Rua do Meio é um nome irônico.
Explique essa ironia.
Como, durante muito tempo, só existiu uma rua em Luar-do-Chão, é irônico que

ela se chamasse “Rua do Meio”, uma vez que esse nome parece sugerir que haveria

pelo menos outras duas ruas.

2 Releia.
Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

As casas de cimento estão em ruína, exaustas de tanto abandono. Não


são apenas casas destroçadas: é o próprio tempo desmoronado.

a) O narrador usa duas imagens no trecho acima. Identifique-as.


As imagens são: “as casas de cimento estão (...) exaustas de tanto abandono” e

“é o próprio tempo desmoronado”.

b) Que tipo de impressão sobre a vila descrita essas imagens provocam no lei-
tor?
Espera-se que os alunos percebam que a ideia das casas “exaustas” e do tempo

“desmoronado” sugere decadência, abandono. O narrador transmite, por meio

dessas imagens, a sua reação ao constatar o estado das casas de Luar-do-Chão.

3 Os termos exaustas e desmoronado são adjetivos. A que termos eles se referem,


no texto?
O adjetivo exaustas refere-se ao substantivo casas; o adjetivo desmoronado

refere-se ao substantivo tempo.

a) Os dois adjetivos aparecem, no trecho, em um contexto inesperado. Explique


por quê.
Os dois adjetivos explicitam atributos estranhos aos termos a que se referem.

Exaustas é um adjetivo geralmente aplicado a seres animados. Casas,

portanto, não ficam exaustas. O mesmo raciocínio vale para o uso do adjetivo

desmoronado, associado ao substantivo tempo. Para que algo “desmorone”,

deve ter uma existência sólida, materialidade. O tempo não apresenta

essa característica, daí ser inusitada a ideia de o tempo ter desmoronado.

5
Professor: Caso os alu- b) De que modo esse uso dos adjetivos ajuda o narrador a tornar mais subjetiva
nos não consigam per-
ceber o deslocamento
a sua descrição de Luar-do-Chão?
de atributos apontado
A escolha desses adjetivos revela o sentimento provocado em Mariano pela
na resposta, explique-
-lhes o processo. Esse
mesmo recurso tornará visão das casas em ruína e pela miséria geral ao seu redor. A decadência de
a ser explorado por Mia
Couto no trecho citado, Luar-do-Chão produz forte impacto sobre a percepção do narrador, que acaba
exatamente como uma
forma de “traduzir”, pa­ por associar um atributo não físico (a exaustão) a algo material como as casas,
ra o leitor, o impacto que
a visão de Luar-do-Chão e um atributo físico (o processo de desmoronamento) a algo imaterial como
tem sobre Mariano.
o tempo.

Uma descrição subjetiva diz respeito a uma percepção particular, individual, de uma
dada situação. O que é dito não é necessariamente reconhecido por todas as pessoas
que observam a mesma situação. Trata-se da expressão das emoções e dos sentimentos
de quem faz a descrição.

Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.


4 O trecho transcrito a seguir confirma a visão do narrador de que Luar-do-Chão
passa por um processo de decadência generalizada.

Dói-me a ilha como está, a decadência das casas, a miséria derramada


pelas ruas. Mesmo a natureza parece sofrer de mau-olhado. Os capinzais
se estendem secos, parece que empalharam o horizonte. À primeira vista,
tudo se definha.

a) Que adjetivo, no trecho, é utilizado de modo semelhante a desmoronado?


Explique.
Derramada. Em “a miséria derramada pelas ruas”, observa-se o mesmo

deslocamento de um adjetivo. Miséria é uma condição mais geral, um estado

provocado por um conjunto de fatores (falta de emprego, escassez de recursos

etc.). Normalmente, o adjetivo derramado refere-se a uma substância em

estado líquido, o que não é o caso.

b) Também podemos identificar um uso pouco comum de um verbo. Identifi-


que-o e explique por que ele ajuda o narrador a construir a imagem de uma
natureza “amaldiçoada”.
O verbo é empalharam. Na passagem em que é usado, a miséria, a decadência,

o “mau-olhado” criam uma imagem de morte. O verbo empalhar, com o sentido

que aparece no texto, é usado para fazer referência a um processo de preserva-

ção de animais mortos: as vísceras do animal são retiradas e substituídas por

palha seca. No texto, o horizonte é que parece ter sido “empalhado”,

confirmando a conclusão de Mariano: “À primeira vista, tudo definha”.

6
5 “Dói-me a ilha como está”. A escolha do verbo nessa passagem revela, mais uma
vez, o desejo do narrador de expressar emoções claramente particulares. O que
ele pode ter pretendido dizer com essa afirmação?
A visão de uma ilha não dói fisicamente. A dor a que o narrador faz alusão, portanto,

é psicológica. Podemos imaginar que ele sofra (“dói”) por ver o estado atual de

Luar-do-Chão, mas também por constatar que o tempo passou e a ilha que ele

conheceu na infância não existe mais.

6 No último parágrafo, uma expressão revela ao leitor que a imagem da decadên-


cia pode ser algo percebido somente pelo narrador. Que expressão é essa?
A expressão é No entanto.

a) A qual outra expressão do texto ela se vincula, para quebrar a expectativa


criada? Justifique.
A partir do uso da expressão No entanto, o que Mariano narra sugere
Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

exatamente o contrário do que vinha narrando até então: a presença da vida

em Luar-do-Chão. Como ele descreve acontecimentos reais e faz referência à

vida que “reverbera”, somos forçados a rever o que disse antes e atribuir ao olhar

do narrador a percepção de decadência, que se opõe, provavelmente, ao modo

como os habitantes atuais da ilha reconhecem o espaço em que vivem.

b) Identifique, no texto, a passagem que comprova a presença de uma vida exu-


berante em Luar-do-Chão.
“a vida reverbera, cheirosa como um fruto em verão: enxames de crianças

atravessam os caminhos, mulheres dançam e cantam, homens falam alto,

donos do tempo”

7 Considerando o que você analisou até agora, que sentido pode ser atribuído ao
título Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra?
Espera-se que o aluno perceba o uso metafórico dos substantivos tempo e terra.

A ideia da passagem do tempo é associada ao fluxo do rio; a casa, assim como a terra,

é o que permanece, o que não se desloca. Essas duas interpretações podem ser

associadas também ao olhar de Mariano para Luar-do-Chão. Ele saiu da ilha onde

nasceu e, após muito tempo, volta a ela para acompanhar o funeral do avô. Como

as águas de um rio que flui, o tempo levou-o para longe de sua terra, de sua casa.

7
A linguagem, por ser uma atividade humana, não tem uma existência desvin-
culada do seu uso. Por esse motivo, podemos manipulá-la em função de objetivos
específicos: comunicar-nos, expressar emoções, impressionar, persuadir etc. Para
que esses objetivos possam ser alcançados, empregamos recursos que criam efeitos
de sentidos variados. Na produção de alguns desses efeitos, utilizamos o que se
convencionou chamar de figuras de linguagem.

Isto é essencial!

Figuras de linguagem são recursos estilísticos utilizados no nível dos sons (figuras
sonoras), das palavras (figuras de palavra), das estruturas sintáticas (figuras de sinta-
xe ou de construção) ou do significado (figuras de pensamento) para conferir maior
valor expressivo à linguagem.

2 Figuras sonoras
Em determinadas situações, os falantes sentem a necessidade de explorar
sons para produzir efeitos de sentido. O uso mais frequente de alguns desses

Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.


efeitos sonoros acaba por fazer com que tais efeitos passem a designar figuras
de linguagem específicas: as chamadas figuras sonoras. Veremos, a seguir,
algumas delas.

2.1 Onomatopeia
Chamamos de onomatopeia as palavras especiais criadas para representar sons
específicos (“vozes” de animais, ruídos associados a determinadas emoções e com-
portamentos humanos, barulhos da natureza etc.). Observe.
2006 King Features/Intercontinental Press

Figura 3. SCOTT, Jerry; KIRKMAN, Rick. Zoé & Zezé. O Globo, Rio de Janeiro, 16 jun. 2001.

Todo o trabalho de humor, na tira, parte da representação dos sons feitos


pelos chinelos das crianças enquanto o pai, ainda sonolento, toma seu café da
manhã. Para atender à solicitação da filha (“Adivinha o que estamos usando?”),
o pai recorre a uma onomatopeia que reproduz o som das sandálias de borra-
cha (flip-flop).
No último quadrinho, a menina pergunta ao irmão de onde o pai tira “essas
palavras”. A “palavra” em questão é justamente a onomatopeia criada para repre-
sentar o som, aparentemente insuportável, que as sandálias de borracha faziam
enquanto os dois andavam pela casa.

8
2.2 Aliteração
Você já deve ter observado que um dos recursos utilizados em poemas ou letras
de música é a repetição de um mesmo som consonantal.

Segue o seco
A boiada seca
Na enxurrada seca
A trovoada seca
Na enxada seca

Segue o seco sem sacar que o caminho é seco


Sem sacar que o espinho é seco
Sem sacar que seco é o Ser Sol
Sem sacar que algum espinho seco secará
E a água que sacar será um tiro seco
E secará o seu destino secará (...)
Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

BROWN, Carlinhos; MONTE, Marisa. Segue o seco.


Disponível em: <http://marisa-monte.letras.terra.com.br/letras/47294/>.
Acesso em: 14 jan. 2009.

O texto é construído a partir da repetição dos fonemas consonantais /s/ e


/k/, presentes em seca, o que ajuda a (re)produzir uma sensação de aridez. A
reiteração desses fonemas surdos reproduz, no plano sonoro, esse aspecto te-
matizado no texto.
A repetição de fonemas consonantais com a intenção de criar um efeito sen-
sorial é chamada de aliteração.

2.3 Assonância Professor: Se achar ne-


cessário, destaque que
o título da canção de
É possível também criar um efeito semelhante ao da aliteração através da repe- Caetano Veloso alude
tição de sons vocálicos. a outra famosa canção,
anterior, dos Beatles,
chamada Strawberry
Sugar cane fields forever fields forever (Para
sempre campos de
(...) Sou um mulato nato morangos). Ao trocar
Strawberry por Sugar
No sentido lato cane (Para sempre cana-
viais), Caetano enfatiza
Mulato democrático do litoral (...) o longo período em que
VELOSO, Caetano. Sugar cane fields forever. o Brasil (e tantas colô-
Disponível em: <www.caetanoveloso.com.br>. nias latino-americanas)
foi dependente da mo-
Acesso em: 14 jan. 2009. nocultura da cana para
suprir de açúcar as me-
trópoles europeias.
A assonância é a repetição de sons vocálicos em sílabas acentuadas. No texto,
a assonância do /a/, associada à aliteração do /t/ e do /l/, reforça a ideia de miscige-
nação presente na palavra mulato e no sentido dos três versos.

9
2.4 Paronomásia
lembre-se!

Parônimos são palavras de significados diferentes que apresentam grafia e pro-


núncia muito semelhantes. Exemplo: eminente (superior) / iminente (prestes a
acontecer, próximo).

Em alguns casos, os textos exploram uma semelhança sonora entre palavras de


grafia e significados distintos (parônimos). Observe o exemplo.
Professor: O uso das
vírgulas no texto foi
uniformizado, em re-
Menina, amanhã de manhã
lação ao original, para (o sonho voltou)
que a leitura ficasse
mais fluente.
(...) Menina, a felicidade
é cheia de graça
é cheia de lata
é cheia de praça

Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.


é cheia de traça.
Menina, a felicidade
é cheia de pano
é cheia de pena
é cheia de sino
é cheia de sono.
Menina, a felicidade
é cheia de ano
é cheia de Eno
é cheia de hino
é cheia de ONU. (...)
TOM ZÉ; PERNA. Menina, amanhã de manhã (o sonho voltou).
Em: ___ et al. Aquela canção: 12 contos para 12 músicas.
São Paulo: Publifolha, 2005. p. 154. (Adaptado.)

Quando essa semelhança sonora é intencionalmente utilizada no texto para res-


saltar as diferenças de sentido, ocorre uma figura sonora chamada paronomásia.

3 Figuras de palavra
Quando usamos uma palavra em um contexto pouco esperado, ela pode ad-
quirir um novo sentido. Alguns deslocamentos de contexto são tão frequentes na
língua, que passaram a ser reconhecidos como recursos de estilo chamados de
figuras de palavra.

3.1 Metonímia
A metonímia ocorre quando uma palavra é utilizada em lugar de outra, para
designar algo que mantém uma relação de “proximidade” (contiguidade) com o
referente da palavra substituída.

10
Há várias situações em que isso pode ocorrer. Algumas das relações que levam
a um uso metonímico de alguma palavra ou expressão são observadas, por exem-
plo, quando se toma:
■■ a parte pelo todo: Ele tem duzentas cabeças de gado em sua fazenda.
■■ o continente pelo conteúdo: Ainda não escutei meus CDs novos.
■■ o autor pela obra: Picasso vai ficar em exposição até o final do mês.
■■ a marca pelo produto: Qual é a melhor marca de bombril que você conhece?
O texto da peça publicitária ao lado é

Reprodução
construído a partir de uma metonímia. Ao
anunciar uma marca de produtos esporti-
vos, o enunciado faz referência a “time de
futebol” por meio de um dos elementos
mais característicos de um time: a cami-
sa do seu uniforme. “Ter amor à camisa”
significa, portanto, “ter amor ao clube, ao
time pelo qual se torce”.
Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Figura 4.

Superinteressante.
São Paulo, p. 33,
nov. 2008.

Antonomásia
A antonomásia pode ser entendida como um tipo de metonímia que consiste
na identificação de uma pessoa não por seu nome, mas por uma característica
ou atributo que a distingue das demais. Castro Alves, o famoso poeta romântico,
costuma ser chamado de Poeta dos Escravos por ter escrito muitos poemas que
denunciavam o sofrimento dos escravos no Brasil do século XIX.

Sinédoque
Um outro tipo de metonímia é a sinédoque. Ela ocorre quando a substituição
de uma palavra por outra promove uma redução ou uma ampliação no sentido da
palavra substituída. Um conhecido exemplo de sinédoque ocorre no capítulo “Das
negativas”, do romance Memórias póstumas de Brás Cubas (Machado de Assis). Após
fazer uma série de ponderações sobre sua vida, o narrador afirma:

Verdade é que, ao lado dessas faltas, coube-me a boa fortuna de não com-
prar o pão com o suor do meu rosto.
MACHADO DE ASSIS. Memórias póstumas de Brás Cubas. 18. ed.
São Paulo: Ática, 1992. p. 176. (Série Bom Livro.)

Nesse trecho, o sentido dos termos pão e suor está sendo ampliado. No contex-
to, pão refere-se a alimento, e suor, a trabalho. Para enfatizar o fato de a personagem
nunca ter trabalhado na vida, Machado de Assis recorre a uma sinédoque.

11
3.2 Comparação (símile)
A comparação (ou símile) ocorre quando elementos de universos diferentes
são aproximados por meio de um conectivo (como, feito, tal qual, qual, assim como,
tal etc.). Observe a última fala de Snoopy nos quadrinhos a seguir.
2006 United Media Syndicate/
Intercontinental Press

Figura 5. SCHULZ, Charles. Ser cachorro é um trabalho de tempo integral. São Paulo: Conrad/Editora do Brasil, 2004. p. 24.

O que leva Snoopy a estabelecer essa estranha comparação é o fato de o pássaro


Woodstock ter se apaixonado por seu alimento. Os pássaros normalmente se ali-
mentam de minhocas, e o esperado é que não se apaixonem por elas.

Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.


3.3 Metáfora
A metáfora baseia-se na transferência (a palavra grega metaphorá significa
“transporte”) de um termo para um contexto de significação que não lhe é próprio.
As metáforas são criadas a partir de uma relação de semelhança que pressupõe um
processo anterior de comparação. Pode-se dizer, portanto, que a comparação está
na base da formação das metáforas.
Jornais e revistas costumam usar metáforas em manchetes e títulos de reportagens
para resumir a essência do que será dito ou para chamar a atenção dos leitores.
Editora Confiança

Figura 6.

BEAUMONT, Peter;
VULLIAMY, Ed.
O pit bull está à solta.
CartaCapital,
São Paulo, p. 48,
20 fev. 2002.
Reprodução

Figura 7. Folha de S.Paulo, São Paulo, 26 nov. 2005.

Tanto a identificação do ex-presidente americano George W. Bush com uma raça de


cães (pit bulls), conhecida pela agressividade, como a aproximação entre sentimentos apa-
rentemente opostos, como alegria e tristeza (vizinhas), são feitas por meio de metáforas.

12
Veja um outro exemplo de metáfora no texto a seguir, utilizado em uma peça
publicitária veiculada por ocasião das Olimpíadas de Pequim de 2008.

Mark Baker/Ap Photo/Image Plus


Figura 8 • Delegação do
Brasil na abertura dos Jo­
“Eles não são atletas por acaso. gos Olímpicos de Pequim,
Levar um país inteiro nas costas China, em 2008, com Robert
Scheidt carregando a ban-
não é pra qualquer um.”
Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

deira do Brasil.
Veja, São Paulo, p. 38, 13 ago. 2008.

A ideia de “levar algo nas costas” é, por si só, uma metáfora, normalmente empre-
gada para dizer que alguém assume toda a responsabilidade pela existência de algo ou
para que alguma coisa funcione ou dê certo. “Levar um país inteiro nas costas” é uma
metáfora, portanto, para descrever figurativamente a expectativa dos brasileiros em tor-
no do desempenho dos atletas que representaram o Brasil nas Olimpíadas de 2008.

3.4 Catacrese
Caco Galhardo

Figura 9. GALHARDO, Caco. Os pescoçudos. Folha de S.Paulo, São Paulo, 3 jan. 2002.

Como se chama a parte da caneta que se projeta para baixo a partir da tampa?
Na tira acima, essa parte é chamada de “bracinho”. Poderíamos, também, pensar
em “perninha”. Nos dois casos, reconhecemos alguma semelhança entre a parte
que desejamos nomear e os conceitos de braço e perna.
A catacrese ocorre quando, na falta de uma palavra específica para designar deter-
minado objeto (ou parte dele), ou determinadas ações, utiliza-se uma outra a partir de
alguma semelhança conceitual. “Bracinho”, portanto, é um exemplo de catacrese.
Muitos casos de catacrese acabam por ser integrados ao léxico da língua. Isso
acontece quando os falantes não mais se dão conta dos mecanismos semânticos
que originaram essas soluções: pé da mesa, embarcar em avião, dente de alho, bar-
riga da perna, bico da chaleira etc.

13
3.5 Sinestesia
A sinestesia ocorre pela associação, em uma mesma expressão, de sensações
percebidas por diferentes órgãos dos sentidos. Ela pode ser vista como uma forma
específica de metáfora, na qual são relacionados diferentes elementos sensoriais.
Na chamada abaixo, a sinestesia é usada para evocar, no leitor, uma caracterís-
tica da cantora Elza Soares, conhecida por sua “voz rouca”.

(...) UMA E a história de que você tem uma corda vocal a mais, é verdade?
ELZA Não tenho uma corda a mais, tenho uma corda meio torrrrrta [risos].
Uma. São Paulo, ano 3, n. 23, ago. 2002.

A chamada da matéria e a resposta de Elza fazem alusão à voz (audição) torta


(visão) da cantora, provocando a associação entre percepções sensoriais distintas.
Divulgação/Revista Uma

Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.


Figura 10.

O uso literário das sinestesias

Pelo seu grau de expressividade e pela força de evocação de diferentes sensações, a


sinestesia é um recurso expressivo importante para a literatura, particularmente para
a poesia. Observe, nos versos de Ferreira Gullar, como a associação entre uma cor
(branco) e um termo referente ao paladar (sabor) contribui para definir poeticamente
o gosto do pão fresco feito em casa.

Bicho urbano
Se disser que prefiro morar em Pirapemas
ou em outra qualquer pequena cidade do país
estou mentindo
ainda que lá se possa de manhã
lavar o rosto no orvalho
e o pão preserve aquele branco
sabor de alvorada
(...).
GULLAR, Ferreira. Toda poesia. Rio de Janeiro: José Olympio, 1991.

14
Exercícios dos conceitos
Observe atentamente a propaganda abaixo para responder às questões 1 e 2.
Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

O Estado de S. Paulo,
São Paulo, Caderno
Cidades, C3, 12 nov. 2003.

1 A propaganda acima utiliza uma figura de linguagem para anunciar o produto


oferecido. Que figura é essa? Justifique.
Uma onomatopeia, que reproduz o som de um telefone tocando (“trim!”).

2 Nessa propaganda, a figura de linguagem foi utilizada com uma função argu-
mentativa. Explique por quê.
O objetivo da propaganda é convencer o seu público-alvo de que anunciar nos

classificados do Estadão é garantia de sucesso, isto é, de que o produto ou serviço

oferecido por quem anuncia será muito procurado. Sendo assim, a propaganda se

vale da onomatopeia para demonstrar ao interlocutor que seu telefone não parará

de tocar ao escolher anunciar qualquer produto no jornal.

Leia o texto abaixo para responder às questões 3 e 4.

Gera, degenera
Gera
Degenera
Já era
Regenera
Gera
ANTUNES, Arnaldo; SCANDURRA, Edgard. Em: SCANDURRA, Edgard. Benzina.
São Paulo: EMI, 1996. Disponível em: <http://www.arnaldoantunes.com.br/
sec_discografia_obra.php?id=161>. Acesso em: 3 jan. 2009.

15
3 O trabalho poético do texto anterior tem como base o uso de uma figura de
linguagem.
a) Qual é essa figura?
A figura presente no texto é a paronomásia.

b) De que maneira essa figura é utilizada no texto?


Os autores da canção utilizam as expressões gera, degenera, já era e regenera,

que possuem sons semelhantes, mas significados diferentes.

4 Considerando o título da canção e o significado das expressões que a compõem,


é possível identificar o tema dessa composição.
a) Qual é ele? Justifique.
Poderíamos dizer que o tema da canção é o ciclo da vida: o surgimento de uma

forma (gera), a sua deterioração ou envelhecimento (degenera), seu fim ou

morte (já era), sua transformação ou ressurgimento (regenera) e o início de um

Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.


novo ciclo (gera).

b) Explique de que forma o uso dessa figura de linguagem contribui para a cons-
trução do sentido da canção.
Os termos derivados do vocábulo gera (degenera e regenera) e da expressão

já era (que possuem sons semelhantes, mas significados diferentes) foram

dispostos de tal forma que indicam o ciclo da vida: contribuem, dessa forma,

para demonstrar o processo pelo qual passam todas as coisas vivas.

Para responder às questões 5 e 6, observe atentamente a tira a seguir.


2006 United Media Syndicate/
Intercontinental Press

SCHULZ. Minduim. Folha de S.Paulo, São Paulo, 22. fev. 2003.

5 No segundo quadrinho, a personagem apresenta uma série de metáforas para


caracterizar a vida.
a) Transcreva-as.
As metáforas são: “sol e chuva”, “dias e noites”, “picos e vales”.

16
b) Qual é o sentido dessas metáforas?
Todas as metáforas se referem ao fato de que a vida tem bons e maus

momentos. “Sol”, “dias” e “picos”, nesse caso, indicariam as situações

agradáveis e as alegrias da vida de cada um; “chuva”, “noite” e “vales” sugerem

os problemas, os obstáculos e os momentos desagradáveis da existência.

c) Explique por que a personagem utilizou tais metáforas, considerando a situa-


ção apresentada no primeiro quadrinho.
A personagem está tentando consolar a colega que acaba de receber uma

(outra) nota baixa em uma prova. Por isso a garota fala dos momentos bons e

ruins de que a vida é feita, sugerindo que a amiga vive um momento ruim, mas

que virão outros melhores.

6 Explique de que maneira a última fala contribui para a construção do efeito de


humor da tira.
Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Na fala do último quadrinho (“Esta noite está chovendo no meu vale”), a garota

usa, na mesma frase, todas as expressões metafóricas que sugerem as situações

ou momentos desagradáveis da vida (noite, chuva e vale) que foram citadas pela

colega. Dessa forma, intensifica o valor negativo da nota vermelha que recebeu e

enfatiza o momento ruim que vive, criando assim o efeito de humor da tira.

Professor: Consulte o Banco de Questões e incentive


os alunos a usar o Simulador de Testes. Retomada dos conceitos
Para responder às questões 1 e 2, observe atentamente a tira a seguir.
Fernando Gonsales

GONSALES, Fernando. Níquel Náusea. Folha de S.Paulo, São Paulo, 2 jun. 2003.

1 O humor da tira é construído pelo uso de duas figuras de linguagem. Qual é a


figura presente no primeiro quadrinho? Explique.
Uma metáfora. Os filhotes, ao perceberem a chegada da mãe, referem-se a ela como

o seu “lanche”, evidenciando, com essa analogia, o fato de que ela representa,

para eles, uma fonte de alimento.

17
2 No segundo quadrinho, qual é a figura utilizada pela mãe dos ratinhos para
demonstrar como se sente? Justifique.
A mãe dos filhotes faz uso de uma comparação: “eu me sinto como uma simples

embalagem de leite”. Nesse caso, a relação de semelhança entre a mãe e uma

embalagem de leite (que teriam em comum a função de alimentar os filhotes)

é explicitada pelo termo como.

3 (Enem) Nesta tirinha, a personagem faz referência a uma das mais conhecidas
figuras de linguagem para:
2009 United Media/IPress

Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.


A definição do ato a) condenar a prática de exercícios físicos.
de pedalar uma bici-
cleta ergométrica e b) valorizar aspectos da vida moderna.
nunca chegar a lugar
nenhum como “uma
c) desestimular o uso das bicicletas.
metáfora da existên- d) caracterizar o diálogo entre gerações.
cia” revela a crítica
do garoto à falta de e) criticar a falta de perspectiva do pai.
perspectiva do pai.
4 (Ufal)

A onda anda ainda anda


aonde anda aonde?
a onda? aonde?
A onda ainda a onda anda.
(Manuel Bandeira. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1977)

a) Identifique a figura de linguagem empregada nos versos de Manuel Bandeira.


A figura de linguagem empregada no poema é a assonância.

b) Justifique sua resposta.


Há uma repetição enfática dos fonemas vocálicos /a/ e /o/.

Verifica-se a catacre- 5 (Unifenas-MG)


se em “costas da ca-
deira” e “manga da
camisa”. “Ninguém coça as costas da cadeira.
Ninguém chupa a manga da camisa.” (...)
(José Paulo Paes)

18
Na composição do excerto, o poeta emprega termos figurados por falta de pa-
lavras mais apropriadas. A figura de linguagem em questão é a:
a) catacrese. c) metáfora. e) perífrase.
b) sinestesia. d) metonímia.

6 (Unicamp-SP, adaptada) Frequentemente, a propaganda explora semelhanças


explícitas entre segmentos (palavras, partes de palavras, etc.), para sugerir a exis-
tência de relações de sentido entre esses segmentos. A estratégia é visível em
algumas propagandas que mantiveram a sua eficácia por muito tempo, como
“Melhoral, Melhoral, é melhor e não faz mal” e “Tomou doril, a dor sumiu”.

1. Vista seu filho como ele gostaria de ser visto.


(Propaganda da Petystil, cadeia de lojas de roupas infantis)

2. Igual a todos os outros de sua categoria. Juntos.


(Propaganda do carro Chrysler Neon LE)

3. Philips Energy Saver. A iluminação inteligente.


4. O mercado evolui, a Xerox revoluciona.
Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

a) Transcreva, dentre os slogans acima (de 1 a 4), aqueles em que esse procedi-
mento é utilizado.
“Vista seu filho como ele gostaria de ser visto.”

“O mercado evolui, a Xerox revoluciona.”

b) Analise um dos slogans que você terá apontado na resposta à questão a, explici-
tando o tipo de relação que se estabelece através do processo acima descrito.
A semelhança entre as formas vista (vestir) e visto (ver) leva-nos a uma

comparação de sentidos, procurando sugerir a ideia de que o usuário se vestiria

pensando no efeito que a roupa causaria nos outros e não para sua proteção

ou conforto. O fato de a forma evoluciona estar contida quase que inteiramente

em revoluciona cria uma relação de intensificação semântica; revoluciona traz

a ideia de que a Xerox está muito à frente de seus concorrentes, pois, mais que

evoluir, a Xerox modifica o mercado em um ritmo muito mais acelerado.

7 (Fuvest-SP) A catacrese, figura que se observa na frase “Montou a cavalo no burro Trata-se de uma cata-
crese porque o termo
bravo”, ocorre em: embarcar, original-
mente, referia-se
a) Os tempos mudaram, no devagar depressa do tempo. apenas à entrada das
b) Última flor do Lácio, inculta e bela, és a um tempo esplendor e sepultura. pessoas em barcos.
Como, no exemplo,
c) Apressadamente, todos embarcaram no trem. as pessoas estão en-
d) Ó mar salgado, quanto do teu sal são lágrimas de Portugal. trando em um trem,
temos a ocorrência
e) Amanheceu, a luz tem cheiro. de uma catacrese.

19

Capítulo


2 Figuras de sintaxe
e de pensamento

1 Introdução
Observe as tiras abaixo e responda às questões de 1 a 3.
2006 King features Syndicate/
Intercontinental Press

Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.


Figura 1. BROWNE, Dik. Hagar. Comissão Permanente para os Vestibulares da Unicamp. 15 anos de vestibular Unicamp.
língua portuguesa e literaturas de língua portuguesa; coletânea; 2a fase. Campinas: Editora da Unicamp, 2001. p. 41.
2006 King features Syndicate/
Intercontinental Press

Figura 2. CULLUM, Mark. Gente como a gente. O Globo, Rio de Janeiro, 3 jan. 1997.

1
Gulache. Prato húngaro
feito de carne de boi enso-
1 As duas tiras começam de modo semelhante. Explique.
pada com cebolas, batata-
-inglesa e páprica. Nas duas tiras, uma personagem pergunta à outra se “tem algo para dor”

(de estômago ou de cabeça).

2 O que há de surpreendente no modo como as perguntas feitas são interpretadas?


Nos dois casos, a pergunta feita é entendida de modo contrário ao esperado e, em

lugar de oferecer algo para resolver o problema, as personagens oferecem algo

que pode desencadeá-lo.

20
3 Há, na segunda tira, uma fala que explicita a razão do mal-entendido.
a) Transcreva-a.
A fala é “... ou queria dizer curar uma?”.

b) Considerando essa fala, explique como foi criado o humor das tiras.
Nos dois casos, omite-se, na pergunta, o verbo que define o que as personagens

esperam em relação à dor que sentem (desejam curá-la). Essa omissão permite

que as perguntas feitas sejam interpretadas de outro modo: como se essas

personagens desejassem algo para provocar dor de estômago ou de cabeça.

É essa ambiguidade que cria o efeito de humor.


Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

As duas tiras exploram uma situação muito comum: alguém que sente uma dor
procura um remédio para curá-la. O fato de o verbo curar não aparecer na fala das
personagens revela a possibilidade de, na produção dos enunciados, omitirmos
alguns termos, quando o contexto permite identificá-los sem problema. Em situa­
ções como essas, não se imagina que alguém deseje uma dor de estômago ou de
cabeça. Os autores das tiras exploram justamente a interpretação menos provável
para provocar o efeito de humor.
A análise de fatos linguísticos dessa natureza deixa evidente que nem sempre os
textos apresentam frases estruturadas do modo esperado. É frequente ocorrerem
inversões, omissões e repetições que levam a uma maior expressividade. As alte-
rações intencionais das estruturas sintáticas são chamadas de figuras de sintaxe,
que serão abordadas neste capítulo.
Além das figuras de sintaxe, você também irá estudar as figuras de pensamen-
to, criadas na situação em que procuramos manipular intencionalmente o sentido
de palavras e expressões.

2 Figuras de sintaxe
lembre-se!

Sintaxe é a parte da gramática que se ocupa do modo como as palavras são combi-
nadas na organização dos enunciados.

2.1 Elipse
No caso das duas tiras analisadas, observamos que a omissão de um verbo
(curar) criou a ambiguidade que desencadeou o efeito de humor. Sempre que o
termo omitido puder ser identificado a partir do contexto criado pelo texto, tem-se
uma figura de sintaxe denominada elipse.

21
Zeugma
Existe uma forma particular de elipse, chamada zeugma, que ocorre quando
o termo omitido em um enunciado foi utilizado anteriormente. Observe a peça
publicitária a seguir.

Reprodução

Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.


Figura 3. Veja, São Paulo, p. 10-11, 6 abr. 2005.

No enunciado em destaque, que é um período composto por subordinação,


vemos um caso de zeugma: o adjetivo completo, que ocorre na oração principal
como predicativo do sujeito, precisa ser interpretado (no feminino) com a mesma
função dentro da oração subordinada adverbial final.
Período composto por subordinação

“Um banco tem que ser completo para a sua tranquilidade também ser (completa).”

oração oração
principal subordinada
adverbial final

Professor: A figura de
sintaxe chamada de
anacoluto, apresenta-
da no próximo subitem,
também pode envolver
mudança na ordem na-
tural dos enunciados. A 2.2 Hipérbato
diferença entre o anaco-
luto e o hipérbato está Na língua portuguesa, a ordem típica das orações é Sujeito  Verbo 
na expectativa criada
sobre a forma da estru- Complemento(s)  Adjunto(s):
tura: no anacoluto, mas
não no hipérbato, a for- Os alunos fizeram a prova na semana passada.
ma como a construção
sintática é iniciada leva
à expectativa de que a Quando produzimos alguns tipos de inversão nessa ordem (por exemplo, no
sua estrutura seguiria
um rumo diferente do enunciado A prova, os alunos, na semana passada, fizeram.), criamos figuras de sin-
que acaba seguindo. taxe denominadas, genericamente, hipérbatos.

22
Sínquise Professor: Alguns gra-
máticos, como Celso
Cunha, identificam
Algumas inversões são tão radicais que chegam a provocar ambiguidade ou a um tipo particular de
dificultar a compreensão do que está sendo dito. Nesse caso, a figura de sintaxe re- hipérbato – a anástro-
cebe o nome de sínquise. O escritor Raymond Queneau, em um de seus exercícios fe –, constituído pela
inversão entre um ter-
de estilo, escreve um texto inteiramente constituído por sínquises. mo da oração e seu
adjunto. Um exemplo
clássico são os dois pri-
Sínquises meiros versos do Hino
Nacional: “Ouviram do
Ridículo raparigo, que eu me vendo lotado um dia em ônibus da linha S, por Ipiranga as margens
plácidas / De um povo
tração talvez o esticado pescoço, no chapéu cordão eu um percebi. Arrogante e heroico o brado re-
em lacrimejante tom, que contra o senhor ele ao seu lado protesta, encontra-se. tumbante”. Se julgar
interessante, apresente
Encontrões lhe pois daria este, vez gente cada que desce. Vago senta sobre e se se essa forma particular
um lugar dito precipita, isto. Paço no de Roma, dou mais com ele ouvindo tarde, de inversão aos seus
duas horas que no seu sobretudo outro botar, aconselha-o um amigo botão. alunos.

QUENEAU, Raymond. Exercícios de estilo. Trad. Luiz Rezende.


Rio de Janeiro: Imago, 1995. p. 27.
Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

2.3 Anacoluto
Às vezes observamos uma mudança abrupta na estrutura esperada de uma
construção sintática. Esse recurso é chamado de anacoluto. Observe a peça
publicitária.

Reprodução

Figura 4.

National Geographic
Brasil. São Paulo,
p. 20-21, abr. 2008.

Na faixa que aparece sobre o carro, vemos dois enunciados. Um deles mostra
a estrutura canônica do português (SUJEITO + predicado, com o predicado
sendo formado de VERBO DE LIGAÇÃO + PREDICATIVO): “O design ficou muito
esportivo”. O outro enunciado, ao contrário, não segue a estrutura canônica, com
o objeto de decidir (o câmbio) ocorrendo no início do período, e não após o verbo,
como seria esperado: “Já o câmbio, você é quem decide”.

23
Sendo realizado em posição inicial, a função esperada para o termo o câmbio
seria a de sujeito, e não a de complemento. Essa expectativa é criada porque, no
enunciado anterior, o termo com o qual se inicia a oração (“o design”) exerce a fun-
ção de sujeito. O efeito dessa alteração sobre a interpretação do enunciado é claro:
embora não corresponda ao sujeito da oração a que pertence, o câmbio é interpre-
tado como o tópico de todo o período. Fatos desse tipo são tratados como casos
de anacoluto, em que a construção do enunciado segue um caminho diferente
daquele que seria o esperado a partir da forma como é iniciado.

Topicalização e anacoluto
As chamadas estruturas de topicalização são aquelas em que um termo, realizado no
início do enunciado, é o tema de todo o conteúdo expresso na oração. Veja alguns exem-
plos: A viagem para Nordeste, o Pedro disse que está pensando em fazer só no final do pró-
ximo ano. / Os pais dos alunos que foram aprovados, os professores falaram que ficaram
bastante orgulhosos com o sucesso dos filhos.
Lembre-se de que a topicalização só deve ser analisada como um caso de anacoluto
quando ocorre a quebra da expectativa criada, sobre a estrutura, a partir da forma
como se inicia a oração. Saber se essa quebra ocorreu ou não depende, na maioria das
vezes, das condições contextuais em que o enunciado é produzido. Nos casos em que

Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.


não se cria qualquer expectativa dessa natureza, a topicalização consistirá numa estraté-
gia sintática como outra qualquer, bastante comum na fala, para dar destaque ao tema
daquilo que será apresentado no enunciado.

2.4 Anáfora
A repetição de palavras ou termos no início de enunciados cria uma figura de
sintaxe chamada de anáfora. Essa figura é observada no texto do anúncio a seguir,
em que a conjunção se, com valor condicional, ocorre no início de várias orações
subordinadas em sequência.

Reprodução
Se a passagem para a
China está cara demais,
se você odeia Rolinho
Primavera, se o biscoito
da sorte disse para
você não viajar, se você
não tem com quem
deixar o cachorro,
se você tem medo de
se perder em Pequim,
relaxe.
O melhor jeito de
torcer pelos nossos
atletas é com o pé
fincado no Brasil.

Figura 5. Veja, São Paulo, p. 84-85, 13 ago. 2008.

No texto do anúncio, a anáfora permite enumerar uma série de situações que


hipoteticamente impediriam uma viagem à China para assistir aos jogos olímpicos
em Pequim. Diante dessas situações, ficar no Brasil seria a melhor solução, ideia
que é explorada para valorizar o produto anunciado (uma famosa marca de sandá-
lias): “O melhor jeito de torcer pelos nossos atletas é com o pé fincado no Brasil”.

24
2.5 Polissíndeto
A coordenação de vários termos da oração por meio de conjunções, especial-
mente as aditivas (e, nem), dá origem à figura de sintaxe chamada polissíndeto.
Um exemplo de polissíndeto ocorre em um belo conto de Clarice Lispector em
que pessoas comuns repartem os alimentos de uma ceia.

A repartição dos pães


(...) Em nome de nada era hora de comer. Em nome de ninguém,
era bom. Sem nenhum sonho. E nós pouco a pouco a par do dia,
pouco a pouco anonimizados, crescendo, maiores, à altura da vida
possível. Então, como fidalgos camponeses, aceitamos a mesa.
(...) Comíamos. Como uma horda de seres vivos, cobríamos
gradualmente a terra. Ocupados como quem lavra a existência, e
planta, e colhe, e mata, e vive, e morre, e come. Comi com a hones-
tidade de quem não engana o que come: comi aquela comida e não
o seu nome.
LISPECTOR, Clarice. A repartição dos pães.
Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Felicidade clandestina. Rio de Janeiro: Rocco, 1998. p. 90.

A repetição da conjunção e chama a atenção do leitor para o trabalho da criação


literária, porque enfatiza os verbos utilizados para identificar as ações básicas rela-
cionadas à alimentação (plantar, colher, matar, viver, morrer, comer).

2.6 Pleonasmo
Em alguns casos, o desejo de enfatizar uma ideia leva à utilização de palavras
ou expressões que, à primeira vista, pareceriam desnecessárias. Observe os versos
de Camões.

XVIII
137 Vi, claramente visto, o lume vivo
Que a marítima gente tem por santo,
Em tempo de tormenta e vento esquivo,
De tempestade escura e triste pranto.
CAMÕES, Luís Vaz de. Canto quinto. Os lusíadas.
Belo Horizonte: Itatiaia, 1990. p. 193.

Nessa passagem, Vasco da Gama relata, ao Rei de Melinde, a visão de um fe-


nômeno natural produzido pela eletricidade da atmosfera: uma pequena chama
aparece na extremidade dos mastros dos navios ou nos filamentos dos cabos. Esse
fenômeno é conhecido como fogo-de-santelmo ou lume vivo. O espanto de Gama
diante da visão de um fenômeno raro é traduzido, nos versos, pela utilização pleo­
nástica do particípio do verbo ver (visto).

Alguns pleonasmos são considerados vícios de linguagem. Eles ocorrem sempre que a
ideia repetida informa uma obviedade e não desempenha qualquer função expressiva no
enunciado. Veja alguns exemplos: subir para cima, descer para baixo, entrar para dentro,
sair para fora, ser o principal protagonista etc.

25
3 Figuras de pensamento
Além do trabalho com a linguagem nos níveis sonoro, lexical e sintático, tam-
bém temos a possibilidade de provocar alterações no plano semântico (que diz
respeito ao significado). Quando manipulamos intencionalmente o sentido das
palavras e expressões, criamos figuras de pensamento, algumas das quais são
apresentadas a seguir.

3.1 Hipérbole
2006 King features Syndicate/
Intercontinental Press

Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.


Figura 6. WALKER, Mort. Recruta Zero. O Estado de S. Paulo, São Paulo, 26 fev. 2003.

No diálogo entre o Recruta Zero e o sargento Tainha, os dois falam de milhões


de erros. Trata-se, evidentemente, de um exagero. Todas as vezes que nos referi-
mos a algo de modo exagerado, criamos uma hipérbole.
A graça da tira está no fato de que o sargento Tainha “amplifica” sua já hiperbó-
lica fala repetida pelo Recruta Zero, somando as hipérboles do milhão de erros.

3.2 Eufemismo
2006 Wiley Miller/Dist. by
Atlantic Syndication

Figura 7.

Non Sequitur Panel,


21 fev. 2004.
Disponível em:
<http://www.
amureprints.com/>.
Acesso em: 17 jan. 2006.

26
Quando desejamos evitar o uso de palavras ou expressões consideradas desa-
gradáveis ou inadequadas em uma determinada situação, podemos substituir esses
termos por outros que atenuam a ideia original. Sempre que fazemos isso, criamos
um eufemismo. Observe a placa no cartum da página ao lado.
A placa aconselha os caminhantes a tomar cuidado com o que podem encontrar
em um campo onde pastam bois e vacas. A referência óbvia aos excrementos bovinos
é evitada. Em seu lugar, aparece o eufemismo “material relacionado a bovinos”.

3.3 Prosopopeia
Em textos literários, histórias em quadrinhos e cartuns, é frequente observar-
mos a atribuição de características humanas a animais e objetos inanimados. Esse
processo é denominado prosopopeia ou personificação.
Na tira, atribui-se ao chapéu um sentimento próprio de um ser humano: a ca-
pacidade de ficar desapontado.
Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

2006 United Media Syndicate/


Intercontinental press

Figura 8.

SCHULZ, Charles.
Minduim. Jornal da
Tarde, São Paulo,
11 fev. 2003.

3.4 Antítese
A associação de ideias contrárias, por meio de palavras ou enunciados de sen-
tido oposto, dá origem à figura de pensamento conhecida como antítese. O uso
de antíteses é muito comum em textos literários. Para expressar a dificuldade de
traduzir em palavras a inspiração que toma conta do poeta, Olavo Bilac recorre à
associação de opostos.

(...) O Pensamento ferve, e é um turbilhão de lava: Nos versos, turbilhão


de lava/sepulcro de
A Forma, fria e espessa, é um sepulcro de neve... neve e Palavra pesada/
Ideia leve são antíteses
E a Palavra pesada abafa a Ideia leve, utilizadas para criar
Que, perfume e clarão, refulgia e voava. (...) imagens que melhor
traduzam a dificuldade
BILAC, Olavo. Inania verba. Poesias. de encontrar palavras
São Paulo: Martins Fontes, 1997. para dar expressão ao
pensamento.
p. 145. (Col. Poetas do Brasil.)

27
Também é possível criar efeitos de humor pela oposição de ideias. Nesse caso, é
o contexto que define a associação de contrários e permite reconhecer as antíteses.
Observe as tiras a seguir.

Carlos Henrique Iotti

Figura 9. IOTTI. Mixórdia; o menos pior do Radicci. Porto Alegre: L&PM, 2001. p. 101.
Carlos Henrique Iotti

Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.


Figura 10. IOTTI. Mixórdia; o menos pior do Radicci. Porto Alegre: L&PM, 2001. p. 102.

Para a esposa frustrada, o marido é a “Torre de Pisa” por oposição ao “Colosso


de Rodes”; é a “pintura rupestre” por oposição à “escultura grega”. São as caracte-
rísticas atribuídas às personagens que conferem o sentido contrário a essas ideias.

3.5 Paradoxo
Em alguns casos, observamos a associação de termos contraditórios, inconci-
liáveis. Essa figura de pensamento é denominada paradoxo. A diferença entre a
antítese e o paradoxo é pequena, mas pode ser detectada quando observamos que
os termos contraditórios, no paradoxo, referem-se a uma mesma ideia. No caso
da antítese, temos duas ideias que se opõem. Na tira abaixo, ocorre um paradoxo
quando Hagar fala em “fingir sinceramente”.
2006 King Features Syndicate/
Intercontinental Press

Figura 11. BROWNE, Dik. Hagar. Folha de S.Paulo, São Paulo, 12 dez. 2003.

28
3.6 Gradação
Quando recorremos a uma sequência de palavras ou expressões para criar uma
ideia de progressão (ascendente ou descendente), surge a figura de pensamento
chamada gradação.

Luis Fernando Verissimo


Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Figura 12.

VERISSIMO, Luis
Fernando. As cobras
em: se Deus existe
que eu seja atingido por
um raio. Porto Alegre:
L&PM, 1997. p. 47.

Na tira As cobras, observamos uma gradação entre os termos terra  sistema


solar  bilhões de outros sistemas  galáxia  trilhões de outras galáxias.

3.7 Apóstrofe
Na poesia, um recurso muito utilizado é a interpelação de uma pessoa (real ou
imaginária), presente ou ausente, como forma de enfatizar uma ideia ou expressão.
Vemos esse recurso, chamado de apóstrofe, no texto a seguir.

Deus! ó Deus! onde estás que não respondes?


Em que mundo, em qu’estrela tu t’escondes
Embuçado1 nos céus? 1
Embuçado. Encoberto,
oculto.
Há dois mil anos te mandei meu grito, 2
Embalde. Inutilmente,
em vão.
Que embalde2 desde então corre o infinito...
Onde estás, Senhor Deus?...
ALVES, Castro. Obra completa.
Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1986. p. 290-293.

Nos conhecidos versos de “Vozes d’África”, o eu lírico é o continente africano,


que, indignado pelo destino de seus filhos, capturados e vendidos como escravos,
dirige-se a Deus por meio de apóstrofes.

29
Exercícios dos conceitos
Leia o texto abaixo para responder às questões de 1 a 4.

Sermão da planície (para não ser escutado)


Bem-aventurados os que não entendem nem aspiram a entender de fute-
bol, pois deles é o reino da tranquilidade.
Bem-aventurados os que, por entenderem de futebol, não se expõem ao
risco de assistir às partidas, pois não voltam com decepção ou enfarte.
Bem-aventurados os que não têm paixão clubista, pois não sofrem de ja-
neiro a janeiro, com apenas umas colherinhas de alegria a título de bálsamo,
ou nem isto.
Bem-aventurados os que não escalam, pois não terão suas mães agravadas,
seu sexo contestado e sua integridade física ameaçada, ao saírem do estádio.

Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.


Bem-aventurados os que não são escalados, pois escapam das vaias, pro-
jéteis, contusões, fraturas, e mesmo da glória precária de um dia.
Bem-aventurados os que não são cronistas esportivos, pois não carecem
de explicar o inexplicável e racionalizar a loucura. (...)
Bem-aventurados os que nasceram, viveram e se foram antes de 1863,
quando se codificaram as leis do futebol, pois escaparam dos tormentos da
torcida, inclusive dos ataques cardíacos infligidos tanto pela derrota como
pela vitória do time bem-amado. (...)
Bem-aventurados os que, depois de escutar este sermão, aplicarem todo o
ardor infantil no peito maduro para desejar a vitória do selecionado brasileiro
nesta e em todas as futuras Copas do Mundo, como faz o velho sermoneiro
desencantado, mas torcedor assim mesmo, pois para o diabo vá a razão quan-
Glossário
do o futebol invade o coração.
Sermoneiro. No
ANDRADE, Carlos Drummond de.
contexto, refere-
-se àquele que As palavras que ninguém diz. Seleção Luzia de Maria.
faz o sermão. Rio de Janeiro: Record, 2004. p. 87-90.

1 A crônica transcrita faz alusão ao Sermão da montanha, em que Cristo fala aos
seus discípulos sobre as bem-aventuranças. Veja um trecho desse sermão.

Sermão da montanha: bem-aventuranças


(...) Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o reino
dos céus.
Bem-aventurados os mansos, porque possuirão a terra.
Bem-aventurados os que choram, porque serão consolados. (...)
MATEUS. Bíblia sagrada; novo testamento. 15. ed.
São Paulo: Paulinas, 1962. cap. 5, vers. 1-11, p. 1.181.

30
Que elementos do sermão bíblico são recuperados pela crônica? Justifique sua
resposta, mostrando as semelhanças e as diferenças entre os elementos identi-
ficados nos dois textos.
Em primeiro lugar, podemos destacar o título da crônica, que recupera, com

alterações, o do sermão cristão: o Sermão da montanha transforma-se, no texto de

Drummond, em Sermão da planície (para não ser escutado). Também a expressão

bem-aventurados é retomada na crônica, mas para tratar das “bem-aventuranças”

relacionadas ao futebol e à torcida pela Copa do Mundo. Além disso, a primeira

frase da crônica (“Bem-aventurados os que não entendem nem aspiram a entender

de futebol, pois deles é o reino da tranquilidade.”) mantém a mesma estrutura da

primeira frase do sermão (“Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles

é o reino dos céus.”), mas com as alterações necessárias para tratar do assunto

escolhido pelo cronista para o seu “sermão”.


Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

2 O Sermão da planície trata das “bem-aventuranças” relacionadas ao futebol.


a) Explique brevemente quem seriam os bem-aventurados segundo o texto.
O texto de Drummond começa definindo como bem-aventurados todos os que

não entendem ou não desejam entender de futebol, pois terão sempre

tranquilidade. A partir daí, o sermão passa a tratar daqueles que, mesmo

entendendo esse esporte, não serão tomados pela paixão pelo futebol ou

com ele não terão uma relação profissional, além dos que não conheceram

esse esporte, pois nasceram, viveram e morreram antes da sua regulamentação.

Todos esses são bem-aventurados porque não sofrem emocional ou fisicamente

os efeitos do esporte (não correm risco de enfarto, não são xingados, não têm

sua integridade física ameaçada).

b) O último parágrafo do texto contradiz todas as afirmações anteriores do “ser-


moneiro desencantado”. Por quê?
Porque, mesmo afirmando que sejam bem-aventurados os que não amam o

futebol e não sofrem pelas emoções provocadas pela paixão pelo esporte, o

autor afirma, de forma contraditória, que são bem-aventurados aqueles que,

depois de escutarem o sermão, torcerem fervorosamente pela vitória da seleção

brasileira em todas as Copas do Mundo, como faz o “próprio sermoneiro”, já

que a razão não deve prevalecer “quando o futebol invade o coração”.

31
c) O que, no texto, explica a expressão entre parênteses apresentada no título?
A expressão “para não ser escutado” se explica porque, embora o autor

apresente vários motivos para considerar bem-aventurados os que não sofrem

torcendo por futebol e, especialmente, pela seleção brasileira, deixa evidente

que a paixão de um torcedor, como a dele própria, não pode ser explicada pela

razão. Por isso, esse sermão foi feito “para não ser escutado”, já que ele mesmo,

embora desencantado, continuará um torcedor apaixonado.

3 Todos os parágrafos do texto são iniciados por uma mesma expressão.


a) Transcreva-a, identificando a figura de linguagem caracterizada pelo uso des-
se recurso.
“Bem-aventurados (os que)”. A figura de linguagem que se caracteriza por essa

Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.


repetição sistemática de uma mesma expressão é a anáfora.

b) De que maneira o uso dessa figura de linguagem contribui para a estrutura do


texto?
A repetição da expressão chama a atenção do leitor para o fato de que não

ser um torcedor apaixonado deve ser considerado uma bem-aventurança.

Essa perspectiva, porém, é negada pela última afirmação do texto, que sugere

exatamente o contrário: bem-aventurados são justamente os torcedores

apaixonados pela seleção brasileira.

4 No título de seu “sermão”, Drummond cria, em diferentes momentos, uma rela-


ção de oposição com o texto no qual se inspirou. Explique por quê.
A primeira oposição se dá entre as referências geográficas: sermão da montanha

e sermão da planície. No caso do texto bíblico, a referência à montanha diz

respeito ao local onde Cristo teria feito esse sermão. Na crônica de Drummond,

o termo planície refere-se ao campo de futebol, onde serão disputadas as partidas

desse esporte. A maior oposição, porém, está no fato de que o sermão bíblico foi

feito para ser seguido, enquanto o de Drummond já explicita, no título, que o

sermão não deve ser escutado. Na verdade, é como se as bem-aventuranças ali

enumeradas não pudessem ser alcançadas, porque exigiriam que o brasileiro

deixasse de torcer pelo futebol, um esporte considerado a paixão nacional.

32
2006 creators Syndicate/
Para responder às questões 5 e 6, observe a tira a seguir.
Intercontinental Press

FHART, A. C. Jornal da Tarde, São Paulo, 18 jan. 2003.

5 A tira acima faz referência ao uso de um eufemismo.


a) Identifique-o.
“Silhueta mais generosa”

b) Por que a expressão identificada é um eufemismo?


Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Porque a expressão “silhueta mais generosa” atenua, suaviza o fato de alguém

(no caso da tira, a personagem que ganhou o prêmio) estar acima do peso.

6 Considerando o contexto da tira, explique por que “um pequeno eufemismo faz
milagres”.
O eufemismo utilizado, por suavizar o fato de a personagem estar acima do peso, é

visto como um elogio e não como uma crítica à forma física da moça que recebeu

o prêmio. Em lugar de se sentir mal com sua aparência, a personagem se alegra

com o fato ter sido premiada.

Observe atentamente a propaganda abaixo para responder às questões 7 e 8.


Agência Talent

As duas coisas que


você mais quer: que
seu filho cresça muito e
que não cresça nunca.

Parmalat Crescimento.
O leite para quem
cresce rapidinho.

Veja, São Paulo, ano 36, n. 34, 27 ago. 2003.

33
7 O primeiro enunciado da propaganda apresenta duas expressões que, utilizadas
simultaneamente, constituem um paradoxo.
a) Quais são elas?
“que seu filho cresça muito” e “que não cresça nunca”.

b) Por que seu uso simultâneo constitui um paradoxo?


Porque o que é dito em cada uma das expressões invalida a afirmação feita na

outra. A princípio, o desejo de que o “filho cresça muito” não pode coexistir

com o de que ele “não cresça nunca”.

8 Como cada uma dessas expressões deve ser entendida para que se aceite a pos-
sibilidade de coexistirem os “desejos” paradoxais?
A primeira expressão deve ser entendida como a preocupação de toda mãe

(ou pai) de que seu filho tenha um bom desenvolvimento físico, um crescimento

Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.


saudável. A segunda deve ser entendida como o desejo dos pais de que seus

filhos permaneçam crianças, não se transformem em adultos. A partir dessas

interpretações das expressões, é possível aceitar que os dois desejos coexistam.

Retomada dos conceitos Professor: Consulte o Banco de Questões e incentive


os alunos a usar o Simulador de Testes.

1 (ITA-SP) Assinale a opção em que a frase apresenta figura de linguagem seme-


lhante à da fala de Helga no primeiro quadrinho.
2004 by King Features Syndicate

BROWNE, Dik. Hagar. Folha de S.Paulo, São Paulo, 21 mar. 2005.


Helga, em sua fala, faz uso de um eufemismo para se re-
a) O país está coalhado de pobreza. ferir ao lixo (“excesso de alimentos de nossa casa”) que
deseja que Hagar coloque para fora de casa. A mesma
b) Pobre homem rico! figura é utilizada em “pessoas com poucos recursos fi-
c) Tudo, para ele, é nada! nanceiros”, em que se pretende atenuar o sentido do
termo pobre.
d) O curso destina-se a pessoas com poucos recursos financeiros.
e) Não tenho tudo que amo, mas amo tudo que tenho.

34
2 (Vunesp)

E existe um povo que a bandeira empresta


P’ra cobrir tanta infâmia e cobardia!...
E deixa-a transformar-se nessa festa
Em manto impuro de bacante fria!...
Meu Deus! meu Deus! Mas que bandeira é esta.
Que impudente na gávea tripudia?!...
Silêncio!... Musa! Chora, chora tanto
Que o pavilhão se lave no seu pranto...

Auriverde pendão de minha terra,


Que a brisa do Brasil beija e balança,
Estandarte que a luz do sol encerra,
E as promessas divinas da esperança...
Tu, que da liberdade após a guerra,
Foste hasteado dos heróis na lança,
Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Antes te houvessem roto na batalha,


Que servires a um povo de mortalha!...

Fatalidade atroz que a mente esmaga!


Extingue nesta hora o brigue imundo
O trilho que Colombo abriu na vaga,
Como um íris no pélago profundo!...
... Mas é infâmia demais... Da etérea plaga
Levantai-vos, heróis do Novo Mundo...
Andrada! Arranca este pendão dos ares!
Colombo! Fecha a porta de teus mares!
(Castro Alves, Navio negreiro.)

Na 2a estrofe, o enunciador do texto identifica o povo a quem pertence a ban-


deira que está hasteada na gávea (mastro real) do navio. Tomando por base essa
2a estrofe:
a) Identifique dois sinônimos empregados pelo enunciador em substituição ao
vocábulo “bandeira”. Identifique ainda um terceiro termo, em sentido metafó-
rico, empregado para designar e qualificar a mesma bandeira.
O enunciador, para substituir o termo bandeira, emprega os sinônimos pendão

e estandarte. O termo mortalha, no texto, é usado metaforicamente para

designar e qualificar a palavra bandeira.

b) Que figura de linguagem é utilizada pelo poeta no 2o verso dessa estrofe? Em


que consiste essa figura?
O poeta faz uso da prosopopeia ou personificação ao dizer que a brisa beija

a bandeira. Essa figura de linguagem consiste em atribuir a seres inanimados

ações, atitudes e sentimentos humanos.

35
3 (ESPM-SP) Leia o poema:

1 “Ó minha amada 9 Ó minha amada


2 Que os olhos teus 10 Que olhos os teus
3 São cais noturnos 11 Quanto mistério
4 Cheios de adeus 12 Nos olhos teus
5 São docas mansas 13 Quantos saveiros
6 Trilhando luzes 14 Quantos navios
7 Que brilham longe 15 Quantos naufrágios
8 Longe nos breus… 16 Nos olhos teus…”
(Poema dos Olhos da Amada, Vinicius de Moraes)

As características de A invocação da amada (v. 1), a associação dos olhos com o cais (v. 2 e 3), a qua-
cada uma das figuras
de linguagem enu- lidade atribuída às docas (v. 5) e a repetição do vocábulo “quantos” (v. 13, 14 e
meradas na alternati- 15) compõem respectivamente as seguintes figuras de linguagem:
va correta está apre-
sentada no enuncia- a) apóstrofe; metáfora; prosopopeia; anáfora.
do da questão.
b) paradoxo; catacrese; metonímia; polissíndeto.

Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.


c) eufemismo; metáfora, personificação; aliteração.
d) apóstrofe; comparação; personificação; pleonasmo.
e) aliteração; hipérbole; prosopopeia; anáfora.

O oxímoro ocorre 4 (Enem) Oxímoro (ou paradoxo) é uma construção textual que agrupa signifi-
pela presença simul-
tânea das palavras cados que se excluem mutuamente. Para Garfield, a frase de saudação de Jon
liberdade/escravidão (tirinha abaixo) expressa o maior de todos os oxímoros.
que possuem signifi-
cados opostos e são

1999 Paws, inc. All Rights Reserved/Dist. by


Atlantic Syndication/Universal Press/Syndicate
aqui aproximadas na
atividade do operário
de construir a casa.

Nas alternativas abaixo, estão transcritos versos retirados do poema “O operário


em construção”. Pode-se afirmar que ocorre um oxímoro em:
a) “Era ele que erguia casas d) “... o operário faz a coisa
Onde antes só havia chão.” E a coisa faz o operário.”
b) “... a casa que ele fazia e) “Ele, um humilde operário
Sendo a sua liberdade Um operário que sabia
Era a sua escravidão.” Exercer a profissão.”
c) “Naquela casa vazia
Que ele mesmo levantara
Um mundo novo nascia
De que sequer suspeitava.”
MORAES, Vinicius de. Antologia Poética. São Paulo: Companhia das Letras, 1992.

36
5 (Fuvest-SP) Leia o seguinte texto:

Os irmãos Villas Bôas não conseguiram criar, como queriam, outros


parques indígenas em outras áreas. Mas o que criaram dura até hoje,
neste país juncado de ruínas novas.

a) Identifique o recurso expressivo de natureza semântica presente na expres-


são “ruínas novas”.
O recurso expressivo presente em “ruínas novas” é a figura de linguagem

chamada paradoxo, já que o sentido do substantivo é oposto ao do adjetivo

que o determina, negando-o.

b) Que prática brasileira é criticada no trecho “país juncado (= coberto) de ruínas


novas”?
O que se critica, nesse caso, é o fato de, no Brasil, as iniciativas governamentais
Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

em andamento serem frequentemente abandonadas, às vezes antes mesmo de

sua conclusão ou amadurecimento.

6 (FGV-SP) Prosopopeia: “passar


(...) samba popular”,
“paralelepípedo (...)
Vai passar arrepiar” – atribui-
ção de características
Nessa avenida um samba popular de seres humanos a
Cada paralelepípedo objetos inanimados;
metonímia: “sambas
Da velha cidade imortais” e “sambas
Essa noite vai populares” represen-
tando os sambistas.
Se arrepiar
Ao lembrar
Que aqui passaram sambas imortais
(...)
(Francis Hime e Chico Buarque)

Nesses versos iniciais do samba Vai passar, é possível identificar duas figuras de
estilo. Assinale a alternativa correta.
a) Metáfora e anáfora.
b) Ironia e hipérbole.
c) Gradação e eufemismo.
d) Antítese e anacoluto.
e) Prosopopeia e metonímia.

7 (UFMT) A palavra Chiclets é marca de uma goma de mascar. Com o tempo, chiclets Esse tipo de metoní-
mia ocorre quando
passou a designar qualquer goma de mascar, processo que ocorreu também com se toma a marca pelo
a marca BomBril. Esse recurso de alteração de sentido denomina-se produto.

a) metáfora. c) antítese. e) ironia.


b) metonímia. d) eufemismo.

37
Para saber mais
Usos das metáforas
É frequente que vejamos comparações e metáforas sendo utilizadas em textos
mais subjetivos, de natureza reflexiva. Isso ocorre porque essas figuras de lingua-
gem ajudam o autor a traduzir, por meio das imagens criadas, aquilo que ele pre-
tende transmitir aos seus leitores sobre o assunto tratado. Observe como Arnaldo
Jabor, para caracterizar o sexo feminino (e, por oposição, o masculino) investiu
principalmente na força das metáforas ao produzir essa “crônica afetiva”, como ele
próprio denomina o conjunto de textos reunido no livro de onde foi extraído o
trecho a seguir.

O mundo de hoje é travesti


(...) A mulher é poesia. O homem é prosa. Isso não quer dizer que
mulher seja do bem e o homem, do mal. Não. Muita vez, seus abismos são

Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.


venenosos, seu mistério nos mata. (...) O homem é pornográfico; a mulher é
amorosa. (...) A mulher quer ser possuída em sua abstração, em sua geogra-
fia mutante, a mulher quer ser descoberta pelo homem para ela se conhecer.
Ela é uma paisagem que quer ser decifrada pelas mãos e bocas dos explora-
dores. Querem descobrir a beleza que cabe a nós revelar-lhes. As mulheres
não sabem o que querem; o homem acha que sabe. O masculino é certo; o
feminino é insolúvel. O homem é espiritual e a mulher corporal. A mulher
é metafísica; homem é engenharia. A mulher deseja o impossível; desejar
o impossível é a sua grande beleza. Ela vive buscando atingir a plenitude e
essa luta contra o vazio justifica sua missão de entrega. (...) O amor exige
coragem. E o homem... é mais covarde. O homem, quando conquista, acha
que não tem mais de se esforçar e aí, dança...
A mulher é muito mais exilada das certezas da vida que o homem. Ela é
mais profunda que nós. Ela vive mais desamparada e, no entanto, mais se-
gura. A vida e a morte saem de seu ventre. Ela faz parte do grande mistério
que nós vemos de fora. (...)
As mulheres sofrem mais com o mal do mundo. Carregam o fardo da
dor social, por serem mais sensíveis e fracas. Os homens (...) escamoteiam
a depressão e a consciência da morte com obsessões bélicas, financeiras. O
mundo está tão indeterminado que está ficando feminino, como uma mu-
lher perdida: nunca está onde pensa estar. O mundo determinista se fracio-
nou globalmente, como a mulher. Mas não é o mundo delicado, romântico
e fértil da mulher; é um mundo feminino comandado por homens boçais.
Talvez seja melhor dizer um mundo-travesti. O mundo hoje é travesti.
JABOR, Arnaldo. Amor é prosa, sexo é poesia – crônicas afetivas.
Rio de Janeiro: Objetiva, 2004. p. 15-18.

metáfora comparação

38
Professor: O objetivo
A primeira metáfora utilizada por Jabor aparece já no título: o mundo é traves- desta atividade é per-
ti. Esse título tem por objetivo sintetizar a reflexão do autor sobre a questão trata- mitir que os alunos se-
da a partir de uma comparação: “o mundo está tão indeterminado que está ficando jam capazes de, em pri-
meiro lugar, selecionar
feminino, como uma mulher perdida”. Embora o mundo possa ser comparado à e identificar um texto
mulher, não preservou suas características (delicadeza, romantismo, fertilidade). É em que metáforas e
comparações tenham
um “mundo feminino comandado por homens boçais”. Por isso, Jabor afirma que sido utilizadas para
“o mundo de hoje é travesti”. definir/caracterizar a
Para que o leitor acompanhe a reflexão feita por ele e concorde com sua con- mulher e/ou o univer-
so feminino. Depois de
clusão a respeito do mundo de hoje, Arnaldo Jabor investe em metáforas que cumprida essa parte da
demonstrem a oposição entre o homem e a mulher desde o início de seu texto: tarefa, esperamos que
eles se deem conta,
a mulher é poesia, o homem é prosa; ela é paisagem a ser descoberta, ele é a partir da análise do
explorador que irá decifrá-la; ela é metafísica, ele é engenharia. Todas essas texto selecionado, de
metáforas são utilizadas para demonstrar que o homem é mais racional, cheio de como essas figuras de
linguagem participam
certezas (ou pelo menos acredita nisso), enquanto a mulher é mais sensível, “mais da construção de tex-
exilada das certezas da vida que o homem”. E “mais profunda” que ele. Em sua tos. No momento de
Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

avaliar o resultado da
percepção mais subjetiva do mundo que a cerca está, segundo o que sugere o au- análise, é importante
tor, a força da mulher. discutir como o uso de
É justamente essa oposição entre os dois sexos que sustenta a reflexão do au- metáforas e compa-
rações contribui para
tor: o mundo hoje está mais frágil, sofrendo com o “mal” que o assola. Enquanto que a caracterização
a mulher fica aflita com o “mal do mundo”, carrega o “fardo da dor social” (já que da mulher seja mais
interessante e rica do
essa é sua natureza), o homem se furta à depressão e (também de acordo com sua que, por exemplo, uma
natureza racional e objetiva) “escamoteia” esse sentimento “com obsessões bélicas, caracterização feita de
financeiras”. É essa indeterminação do mundo, marcado pela dicotomia, que leva modo mais objetivo.
Acreditamos que os
o autor a concluir que o mundo hoje é travesti. alunos não terão difi-
culdades em selecionar
textos em que a mu-
Da teoria à prática lher seja apresentada
de modo metafórico,
Como você viu no texto analisado, as metáforas e as comparações podem con- mas, se isso ocorrer,
pode-se sugerir que
tribuir muito para a construção do sentido de uma determinada reflexão e tornam eles pesquisem poe-
o texto mais rico. Alguns temas em particular, como a caracterização da mulher, mas de Adélia Prado ou
de Camões, contos de
são muito explorados nesse sentido. É frequente, na literatura e no cancioneiro Lygia Fagundes Telles,
popular, que a mulher e seus mistérios sejam apresentados por meio de compara- crônicas de Martha
Medeiros, entre outras
ções e metáforas. possibilidades. Há, na
Sua tarefa será a de selecionar um texto (em prosa ou em verso) ou uma canção MPB, as composições
que apresente uma definição ou caracterização da mulher a partir dessas figuras de de Chico Buarque (que
tem extrema sensi -
linguagem. Depois de selecionar o texto/canção, você deverá analisá-lo e destacar, bilidade para descre-
como fizemos com o texto de Arnaldo Jabor, as metáforas e comparações nele uti- ver o sexo feminino),
de Gilberto Gil e de
lizadas, explicando o sentido que elas têm no texto escolhido. Caetano Veloso (um
bom exemplo é a can-
ção “Você é linda”, em
que várias metáforas
são utilizadas para ca-
racterizar a beleza da
mulher amada).

39
Navegando no módulo

FIGURAS DE LINGUAGEM

SONORAS DE PALAVRA DE SINTAXE DE PENSAMENTO

Reprodução proibida. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.


ONOMATOPEIA METONÍMIA ELIPSE HIPÉRBOLE

ALITERAÇÃO COMPARAÇÃO ANACOLUTO EUFEMISMO

Marcela Pontara • Juanito Avelar


GRAMÁTICA
ASSONÂNCIA METÁFORA ANÁFORA PROSOPOPEIA

Maria Luiza M. Abaurre •


PARONOMÁSIA CATACRESE HIPÉRBATO ANTÍTESE

SINESTESIA POLISSÍNDETO GRADAÇÃO

PLEONASMO APÓSTROFE

40

S-ar putea să vă placă și