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Heloisa Moura
Doutora em Design – Institute of Design, Illinois Institute of Technology
Centro Universitário Ritter dos Reis
heloisa_moura@uniritter.edu.br
Fabiane Wolff
Doutora em Engenharia de Produção - PPGEP/UFRGS
Mestrado em Design UniRitter
fabiane_wolff@uniritter.edu.br
1 Introdução
A profissão de designer tem como uma de suas funções projetar soluções que
atendam às necessidades dos seres humanos. Na vida em sociedade, no entanto, os
indivíduos não são todos iguais, e, por isso, as pessoas são freqüentemente classificadas
pela média, onde inexiste dificuldades de comunicação, visão, audição ou olfato. Tal
categorização é tanto falha como excludente, dado que aqueles que saem desse parâmetro
acabam sendo prejudicados e limitados em seu convívio social.
De acordo com o Censo Demográfico de 2012 do Instituto Brasileiro Geográfico e
Estatístico (IBGE, 2012), 24% da população brasileira possui alguma deficiência
permanente, ou seja, são portadores de deficiência visual, auditiva, motora, mental ou
intelectual. Somando, assim, em julho daquele ano, aproximadamente 46 e 1/2 milhões de
cidadãos, tal fatia representa um público-alvo significativo, o qual não pode ficar excluído da
sociedade, e, muitos menos, fora do mercado.
X Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-graduação
SEPesq – 20 a 24 de outubro de 2014
X Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-graduação - SEPesq
Centro Universitário Ritter dos Reis
Destaca-se que, nesse dado, apenas são contabilizadas as pessoas com deficiência
permanente, sem incluir aquelas que possuem alguma deficiência considerada não
definitiva, ou seja, todos os indivíduos que, em alguma etapa da vida, possuem alguma
dificuldade passageira, como crianças, idosos, e pessoas com alguma lesão momentânea,
dentre outras. Em conseqüência, surge a preocupação com respeito à acessibilidade e
inclusão social desse amplo grupo de cidadãos na sociedade moderna.
Da ótica da inovação, especificamente no campo de atividade do Design, surgem,
assim, os novos desafios de: como contribuir com essa parcela da população e prover
inclusão social aos indivíduos com necessidades especiais diversas, assegurando sua
autonomia no uso de produtos de comum acesso a todas as pessoas. O Design Universal,
entendido como uma nova forma de projetar produtos e serviços que possam ser utilizados
por todos (CAMBIAGHI, 2007), propõe-se a atender tal lacuna e oportunidade. Nessa
perspectiva, o designer torna-se um possível colaborador na construção de uma sociedade
mais justa e inclusiva.
Este artigo tem como objetivo principal examinar a contribuição do Design Universal,
segundo a ótica da inovação, no contexto da inclusão social. Para esse fim, conduz
levantamento bibliográfico, explorando os conceitos dos temas Inovação, Design, Design
Universal e Inclusão social, e analisa suas relações.
2 Inovação e Design
Segundo o Manual de Oslo, guia de referência para as atividades de inovação na
indústria brasileira e mundial, a inovação é a “implementação de um novo ou melhorado
produto (bem ou serviço), ou processo, ou um novo método de marketing, ou um novo
método organizacional nas práticas de negócio, na organização do local de trabalho ou nas
relações externas” (OECD, 2005, p.46).
A inovação tem como ponto de partida a criatividade, que serve como ferramenta de
conhecimento para se criar algo inusitado, podendo ser um novo processo, produto, ou uma
nova tecnologia, entre outros. No entanto, de acordo com Fagerberg, Mowery e Nelson
(2007), ter uma boa ideia não é suficiente, pois a inovação para existir deve ser colocada
em prática, caso contrário será vista como uma invenção. Von Stamm (2008) compartilha da
mesma opinião, acrescentando, ainda, a importância do valor comercial. Ou seja, segundo o
mesmo, para o produto ou serviço ser considerado inovador, além da criatividade e
implementação, deve gerar um valor econômico para empresa.
A ação de ter ideias é uma característica intrínseca do ser humano, não existindo
limites para a sua criatividade. A inovação é a ação de criar algo novo, seja ele um método,
objeto ou mesmo uma ideia nova que se difere do que já existe. Contudo, para que essa
novidade criada passe de uma invenção para uma inovação, esta tem que ter uma
aplicação real, de utilidade, como também criar valor para o consumidor, a fim de que este
queira comprá-la, gerando, em conseqüência, lucro para empresa. Essas são
características fundamentais para que uma boa ideia se transforme em uma inovação, e
não em uma simples invenção.
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De acordo com Lastres e Albagli (1999), existem dois tipos de impacto da inovação:
radical e incremental. A inovação radical representa o desenvolvimento e inserção de um
novo produto, processo ou produção totalmente novo. Esse tipo de inovação pode causar
um impacto na economia e na sociedade como um todo, visto que pode representar uma
quebra estrutural com o padrão tecnológico anterior, acarretando no surgimento de novas
indústrias, setores e mercados (LASTRES; ALBAGLI, 1999).
A inovação radical representa uma mudança significativa em um produto, serviço ou
processo, abrindo oportunidades de novos mercados e a chance de maiores resultados,
porém com maiores riscos. Um exemplo deste tipo de inovação é criação, em 1954, do
vídeo cassete, criado pela empresa Ampex Tranverse Recorder (EUA), onde a marca Sony
foi a primeira a fabricar o VCR para consumo. Esse produto inovador, nos anos 80,
representou 50% das vendas anuais na indústria de produtos de consumo eletrônico, além
de proporcionar um novo mercado para tal indústria, trouxe uma nova forma de escutar e
gravar músicas (YUKIMURA, 2009).
A inovação incremental é entendia como a implementação de uma melhoria
significativa em um produto, processo ou organização da produção dentro de uma empresa,
sem modificar a indústria, podendo trazer o crescimento da eficiência técnica, aumento da
produtividade, diminuição de custos, aumento de qualidade e modificações que possibilitem
a ampliação das aplicações de um produto ou processo (LASTRES E ALBAGLI, 1999). A
mudança desse tipo de inovação pode ser tão pequena que muitas vezes não é percebida
pelo consumidor. Diferente da inovação radical, a inovação incremental não altera de forma
relevante a forma como o produto é consumido ou o modelo de negócio da empresa. Por
exemplo, a evolução do corretivo líquido vendido em um potinho com pincel para uma
caneta liquid paper, ou papel líquido, pode ser um exemplo da inovação incremental, pois a
mudança do potinho para caneta apenas incrementou o produto já existente, o liquid paper.
Conforme Mozota (2011, p.59),
“toda inovação, seja ela radical ou incremental, exige a contribuição do
design [...] a maioria dos produtos de design é baseada em invenções
passadas e em inovações incrementais: na verdade, 90% do design de
produtos pode ser considerado um processo de inovação incremental”.
O design sempre esteve relacionado com o planejamento e concepção de novos
produtos e serviços, por meio da determinação das qualidades técnicas, formais,
semânticas e simbólicas dos objetos. Essa atividade foi fruto da Revolução Industrial,
marcada por uma economia capitalista, onde o design surgiu para atender as necessidades
da nova produção industrial (LÖBACH, 2001).
Conforme Borja de Mozota (2011), a terminologia “design” supõe tanto um plano ou
ato de projetar algo (projeto), na fase analítica e criativa da atividade, quanto o desenho ou
resultado desse plano (o produto), na fase de execução. O design assume papel de
importância para as empresas, tornando-se uma atividade fundamental para o
desenvolvimento de novos produtos/serviços, uma vez que o design não é mais visto como
apenas o resultado da forma e função, mas sim como uma atividade de projeto, de cunho
criativo, mas também de gestão.
Desse ponto de vista, o uso do design torna-se sinônimo de abordagem estruturada
para a inovação e um elemento chave para a empresa que deseja alcançar vantagem
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através de um modelo de massa que iguala o que não é igual – os seres humanos?
(CARLETTO; CABIAGHI, 2008).
Nessa época, a produção em grande escala era o que importava, por isso não havia
preocupação com o perfil do indivíduo, não sendo avaliadas questões como altura,
agilidade, força, idade e outras particularidades das pessoas na hora de desenvolver os
produtos. Existia o chamado “homem padrão”, modelo comum a todos, sem a preocupação
com as peculiaridades pessoais ligados ao conforto.
Foi pensando nesses fatores pessoais, que, em 1961, países como o Japão, EUA e
nações européias resolveram se unir em um evento internacional na Suécia com o intuito de
reestruturar o velho conceito do homem padrão, que não representava o homem real.
Surgiu então, em 1963, em Washington, a Barrier Free Design (design livre de barreiras),
uma comissão que tinha como objetivo debater sobre desenhos de equipamentos, edifícios
e espaços urbanos para serem utilizados por pessoas com deficiências ou mobilidade
reduzida (CARLETTO; CABIAGHI, 2008).
Mais tarde, o conceito expandiu-se nos EUA, onde, em 1987, o arquiteto Ron Mace,
usuário de cadeira de rodas e respirador artificial, criou a terminologia Universal Design ou
Design Universal (ou D.U.), com um novo foco de atender todas as pessoas, de modo
realmente universal. Esse conceito significou uma influente transformação nas áreas da
Arquitetura e do Design. Segundo Carletto e Cabiaghi (2008, p.7), ‘‘Mace acreditava que
esse era o surgimento não de uma nova ciência ou estilo, mas a percepção da necessidade
de aproximarmos as coisas que projetamos e produzimos, tornando-as utilizáveis por todas
as pessoas’’.
No Brasil, com o debate mundial promovido pela Organização das Nações Unidas
(ONU), o qual deu origem ao Ano Internacional de Atenção às Pessoas com Deficiência, em
1981, o assunto Desenho Universal ganhou peso no país. E em 1985, surgiu a primeira
norma técnica brasileira relativa à acessibilidade, “Acessibilidade a edificações, mobiliários,
espaços e equipamentos urbanos à pessoa portadora de deficiência’’, a qual passou por
modificações, e, no dia 2 de dezembro de 2004, foi assinado o Decreto Lei 5296, o qual é
válido até hoje para regulamentar todos os aspectos da acessibilidade no Brasil. Essa lei
define a acessibilidade como:
‘‘Condição para utilização, com segurança e autonomia, total ou
assistida, dos espaços, mobiliários e equipamentos urbanos, das
edificações, dos serviços de transporte e dos dispositivos, sistemas e
meios de comunicação e informação, por pessoa portadora de
deficiência ou com mobilidade reduzida’’ (ACESSIBILIDADE BRASIL,
2004).
O público desse design é a sociedade em geral; porém, por seu caráter de criação
inclusiva, muitas vezes é visto de maneira errônea como concepção de projetos específicos
para pessoas portadoras de alguma deficiência. Essa visão é equivocada, uma vez que o
Design Universal tem como objetivo conceber produtos ou ambientes que possam ser
utilizados por todas as pessoas, não um grupo determinado de pessoas, sem que haja a
necessidade de qualquer adaptação específica para o seu uso, em uma prática profissional
que visa à inclusão social. Segundo Carletto e Cambiaghi (2008, p. 7), ‘‘A ideia do D.U é,
justamente, evitar a necessidade de ambientes e produtos especiais para pessoas com
deficiências, assegurando que todos possam utilizar com segurança e autonomia os
diversos espaços construídos e objetos’’.
Porém, isso não quer dizer que para se projetar um produto universal não se deve
levar em consideração as necessidades ou dificuldades das pessoas com deficiência, pois
estudar pessoas as quais não se tenha o costume de se relacionar, permite enxergar novas
oportunidades e tornar o objeto melhor para todos, não excluindo o universo dos utilizadores
em geral. Uma equipe de arquitetos, engenheiros e pesquisadores do centro de pesquisa,
informação, e desenvolvimento tecnológico da Universidade Estadual da Carolina do Norte
(EUA), Center for Universal Design, a fim de avaliar, desenvolver e promover iniciativas que
tenham o Design Universal como foco, elaborou um conjunto de princípios norteadores do
D.U. para pesquisa técnica e conhecimento, a fim de servir como referência para projetos
urbanos, de edificações e de interiores (SECRETARIA DE ESTADO DE HABITAÇÃO,
2010). Esses princípios são:
1. Uso Equitativo
O design universal é útil a todos os seus utilizadores de forma acessível, segura e
atrativa, não excluindo as pessoas com dificuldades ou deficiências. Exemplo: Porta
automática com sensor do elevador ou da janela do carro.
2. Uso Flexível
O Design Universal permite um vasto leque de preferências para sua utilização
adequada e capacidades individuais. Permitindo modificações e transformações em seu
projeto, quando necessário. Exemplo: Tesoura para destros e canhotos.
3. Uso Simples e Intuitivo
O Design Universal tem como objetivo ser simples, de fácil compreensão,
independentemente da experiência, capacidades ou do conhecimento do utilizador.
Deixando as informações ao alcance dos seus utilizadores em ordem de importância.
Exemplo: Placas de sinalização de trânsito, banheiro, sinaleira, símbolos de liga e desliga
do controle remoto ou celular.
4. Informação Perceptível
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4 Inclusão Social
Segundo Coelho (2005), o ato de projetar objetos não se refere apenas a usabilidade,
sendo possível criar objetos utilizados como elo entre as pessoas, como, por exemplo, o
celular ou a ferramenta online Skype, que permitem a comunicação e troca de informações
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5 Considerações Finais
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Referências
COELHO, Anna Paula de Mello Rocha. Design & inclusão social: o estudo e o
desenvolvimento de material didático para crianças cegas e videntes na educação
infantil. 2005. Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica do Rio de
Janeiro, Departamento de Artes e Design.
BORJA DE MOZOTA, Brigitte. Gestão do design: usando o design para construir valor
de marca e inovação corporativa. Porto Alegre: Bookmann, 2011.
VON STAMM, Bettina. Managing innovation, design and creativity. 2. ed. Reino
Unido: John Wiley & Sons, 2008.