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INTRODUÇÃO
O presente estudo tem como ponto de partida a análise dos entraves e desafios
enfrentados por travestis e transexuais na inserção no mercado de trabalho formal,
levando-se em consideração a perspectiva do corpo acessório trazida por David Le Breton
em sua obra Adeus ao corpo: Antropologia e sociedade (2003).
Dada a sociedade em que vivemos, bem como o sistema econômico ao qual estamos
sujeitos, pode-se afirmar que o trabalho, em seu fundamento principal, tornou-se um dos
mais relevantes aspectos que compõem o sentido de viver dignamente.
Ainda no Título dos Direitos e Garantias Fundamentais, ao tratar dos direitos sociais,
a Constituição Federal aduz, em seu artigo 6º:
Com isso, não pode-se olvidar em afirmar que negar esse direito a qualquer pessoa,
baseado em suas condições pessoais, sejam de raça, religião ou sexualidade, configura-se
em uma forte violação ao desenvolvimento pleno e digno da vida humana, bem como de
sua participação na sociedade.
Entretanto, mesmo com todas essas garantias, as minorias sociais são vítimas de
uma violência tida como estrutural, das quais são espécies a omissão dos poderes públicos,
o estigma social e a invisibilidade de suas demandas, muitas vezes consideradas como
desnecessárias ou tratadas como formas de conseguir privilégios.
O que se percebe é uma forte repressão a essa parcela da população, fortemente
marcada por questões religiosas, culturais e ideológicas. Dessa forma, o discurso
homogêneo de titularidade da classe dominante, extremamente conservador e pautado em
uma ótica cristã, reforça o estigma sobre essas determinadas classes, fazendo com que elas
tenham maior dificuldade em se inserir em diversos âmbitos sociais, dentre os quais, o
mercado de trabalho.
Esta é uma marcação que se inicia certamente na escola, cujas portas se fecham na
violência dos modelos binários e hierarquizados apresentados como modelos de
exercício profissional para homens e mulheres. A escola expulsa a performance
que perturba, o mercado de trabalho reitera esta exclusão.
Ultrapassada a fase que antecede a procura por empregos, Medeiros (2007, p.83),
estabelece que a discriminação contra trabalhadores homossexuais pode ocorrer em 4
momentos: a. fase pré-contratual, por meio de questionamentos e investigações sobre a
vida privada do empregado, buscando saber se o trabalhador é ou não homossexual; b. Fase
contratual, nos casos em que a sexualidade do empregado é descoberta durante o vigência
do contrato, passando, por vezes, a ser submetido a situações de exclusão pelos outros
trabalhadores até serem vítimas de assédio moral, piadas, ofensas; c. Durante o
desligamento do empregado, quando a homofobia se apresenta como causa única para
exclusão de seu posto de trabalho; d. Pós-contrato, extrapolando a relação contratual
extinta, quando os empregadores elaboram listas discriminatórias visando a
não-contratação de determinados trabalhadores.
Conforme Menezes et al. (2018), no que tange especificamente à fase
pré-contratual, apesar dessa realidade se fazer muito presente na vida de todo que
pertencem ao grupo LBGT, em relação aos transexuais e travestis a situação é ainda mais
complicada, uma vez que a identidade de gênero desses sujeitos não é omitida, mas
apresentam-se de forma expressa, tanto no comportamento, quanto na aparência física.
Nesse sentido, Louro (2001, p. 551) apregoa que esse espaço cada vez marcado
pela exclusão acentua-se em relação aos transgêneros, tendo em vista ostentarem em seus
corpos marcas que incomodam a sociedade heteronormatizada. Assim, as possibilidades
(...) de inserção no mercado de trabalho para as transgêneros são mínimas; mesmo
nas situações em que estas executem atividades tidas como femininas, não são
consideradas mulheres e pela ambiguidade são alvos de preconceitos por parte da
sociedade. Considera-se que a questão da diversidade é colocada a dupla
dificuldade enfrentada pelas transgêneros, pois é difícil para a mulher entrar no
mercado de trabalho, e ter as mesmas condições trabalhistas e salariais do
homem, o desafio aumenta para a travesti. (NASCIMENTO, 2003, p.37).
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Uma das formas de violência que aflige a esses grupos, em especial às travestis e
transexuais, diz respeito a falta de oportunidade de colocar-se no mercado de trabalho
formal. A sociedade, pautada em uma ótica cristã, conservadora e heteronormativa, reage
fortemente a todos que ameacem a construção social da identidade sexual e de gênero.
Dessa forma, desde o convívio escolar, até a efetiva procura por postos de
trabalho, as travestis e transexuais, por ostentarem marcas visíveis e claras da transgressão
às normas heterossexuais, por utilizarem seus corpos como acessórios representativos de
sua interioridade, são excluídas diariamente do mercado formal, sendo obrigadas a verem
suas práticas laborativas a trabalhos informais, prostituição e, em muitos casos, o
desemprego.
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