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Falar uma língua nào significa apenas expressar figurada, nunca seu sentido é literal. É uma mensagem
nossos pensamentos mais interiores e originais; cifrada que condensa, de forma simbólica, valores do
que Carl Gustav Jung chamou de inconsciente coletivo.
significa também ativar a imensa gama de
Os mitos estariam todos nessa região da mente
significados que já estão embutidos em nossa língua humana, que é a da experiência coletiva.
e em nossos sistemas culturais. Segundo Durand (1979), "o mito já é um
Stuart Hall esboço de racionalização, pois utiliza o fio do discurso,
Caminhando e cantando (com) a nação no qual os símbolos se resolvem em palavras e os
A sociedade brasileira, com seu passado arquétipos em idéias". Poderíamos, no entanto, dizer
colonial, absorveu, em pouco mais de 500 anos de que não há linha demarcatória possível entre as duas
história, elementos sociais, psicológicos, étnicos, "atitudes", pois o real só significa pelas formas
éticos e estéticos de outras civilizações, incorporando- simbólicas e pela construção lógica com base na práxis.
os aos elementos nativos e desenvolvendo nas Por outro lado, o mito não é uma construção acabada,
gerações que se sucederam uma identidade composta pois é fruto do imaginário que está em contínuo
de "multifaces", "multilinguagens" e "multimitos". processo de desconstrução e reconstrução, justamente
Interpretar esses "multidiscursos" para identificar os por meio das formulações racionais. Cabe para nosso
mitos2 socialmente representativos da nacionalidade estudo considerar a característica de circularidade do
brasileira, sua representação ontológica e sua mito, descrita por Ramalho3 :
importância nos processos de construção de uma idéia Semiologicamente falando, entendo, portanto, o
de nação é o que propicia o estudo comparado das Mito como uma potência de discurso oriunda da
letras poéticas que se seguirá a estas iniciais reflexões. necessidade humano-existencial de atribuir sentidos a
Para interpretar a mitologia de um sistema suas experiências existenciais particulares e coletivas
literário, é preciso observá-lo transversalmente, já que que, transferida para o âmbito da manifestação
é pelo registro mítico, que é o do imaginário, que uma discursiva 3A as imagens míticas VA, torna-se
sociedade se expressa, discute consigo mesma e se independente de sua origem e passa a referenciar tanto
revela. A reflexão ocidental sempre teve duas atitudes o canal de expressão, que supostamente teria tomado o
diante do mito: a desmitificação, ou seja, a entronização Mito como uma estrutura passível de representação
do logos como a única possibilidade de afirmação e discursiva, como o canal de recepção, que, na
explicação do real, contra qualquer valorização do continuidade do processo de circularidade cultural das
simbólico ou, por outro lado, a atitude de imagens míticas, assumirá a função de reproduzi-lo.
ressignificação do mito. Assim é que o textual, em qualquer arte, é a
A noção mais ampla que se pode dar de mito, um só tempo o contextual, o intertextual, e o que está
veiculada primeiramente por Aristóteles, na Poética, é "além dele" - a sua possibilidade de ressonância -, o
a de uma narrativa especial, uma forma de alegoria que transtextual4, que devem ser entendidos como um
tem como base um fato natural, histórico ou filosófico.
3
Assim sendo, se o mito é uma expressão da linguagem RAMALHO, Christina. O mito em tempos de hibridismo. In
Revista Cerrados. N.16, ano 13, UnB, 2003.
4
2
Transtextual - o que é percebido a partir dos índices de
Mito - usaremos aqui a palavra segundo o conceito de contextualização do texto; que tem existência no espaço
Gilbert Durand, que tem mito como uma representação simbólica, "entre" da tessitura de seus elementos; na intertextualidade
ou seja, expressão (aqui poética) de pensamentos, culturas e visões latente de seus componentes; que se projeta para "além" dos
de mundo. Projeção do imaginário coletivo no universo limites literários formais, na identificação dos outros discursos
218 simbólico e vice-versa. afins que ressoam a partir do texto.
Cerrados: Revista do Programa de Pós-Graduação em Literatura, n. 22, ano 15, 2006, p. 209 - 226
LITERATURA F. CANÇÃO BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA: A RESSEMIOT1ZAÇÃO DO IDEÁRIO NACIONALISTA
conjunto mítico-simbólico adensado para onde operis), tiver a função de confirmar estes últimos, ou
convergem e são ressignificadas, desde tempos seja, deve ser aprovada pelo complexo do texto como
imemoriais, as significações (aí latentes) do que é "ser" um todo orgânico.
humano. Trabalhar com a letra das canções significa
A expressão poética da nação encontra-se inserir-se em um estudo de poética histórica,
ligada - via mitos - à tradição cultural que cria sua considerando para tanto os novos paradigmas do
identidade. Os estudos contemporâneos em psicologia estudo da História neste início de século. De acordo
comprovam que diferentes culturas produziram imagens com o paradigma tradicional, a História diz respeito à
e figuras míticas muito semelhantes, pois é na política. Embora outros tipos de história (como a
interioridade psíquica que se originam e são ora "história da arte", por exemplo) não fossem totalmente
reiteradas, ora transformadas de acordo com as excluídos do antigo modelo, eram marginalizados,
peculiaridades do contexto espaço-temporal em que sendo considerados menos importantes e periféricos.
transita o ser criador da espécie. A chamada nova História tem se interessado, no
Alguns compositores da canção brasileira pós- entanto, por toda atividade humana. O conceito de
1960, por sua vez, podem ser alçados - eles próprios - relativismo cultural passa a ser a base desse novo
a condição de mitos porque, além de cantar a história paradigma, cuja premissa é de que a realidade é sempre
da nação, sào a representação de uma convergência culturalmente constituída. E mais, o que era
ideológica. Impossível separar os signos estéticos considerado imutável é agora encarado como uma
produzidos por artistas como Chico Buarque, Caetano construção cultural, sujeita a variações tanto no tempo
Veloso, Gilberto Gil e Zé Ramalho (para falar apenas como no espaço. Isso é possível pelo enfoque básico
de alguns compositores já clássicos da MPB) da da análise das estruturas, ou seja, as mudanças
persona cultural destes poetas. A forte e explícita ocorridas em nível social, econômico, geográfico e
ligação de cada um deles com diversas referências antropológico de longo prazo.
culturais da recente história política, brasileira, Outro ponto-chave da rejeição da História
identificadas como posturas libertárias e tradicional refere-se ao fato de que oferece uma visão
transgressoras, faz com que a análise de sua obra dos "vencedores", concentrada nos feitos dos grandes
remeta eventualmente à sua persona - em si um sistema homens, desconsiderando o enfoque coletivo, baseado
semiológico a ser considerado - para que se possa nas vivências populares. Hoje, vê-se a necessidade
estabelecer as relações de equivalência e/ou de se alargarem as fontes narrativas, não mais somente
superposição entre o intentio autoris e as intendo as advindas do discurso dos dominadores ou dos
operis e intentio lectoris de que fala Umberto Eco5. documentos oficiais, mas as que se pode conseguir
Ressalte-se que a incorporação da "fala mítica" da perscrutando as mentalidades coletivas e as chamadas
persona dos poetas só terá valor interpretativo se, no "minorias". Dessa forma, a história da cultura popular
cruzamento com os signos estéticos textuais {intentio tem recebido bastante atenção, e é a busca de um
conhecimento mais aprofundado dessa cultura que
vem alargando o horizonte de compreensão do tempo
Y.CO, Umberto. Os limites da interpretação. São Paulo:
e do espaço no qual é produzida e do próprio momento
Editora Perspectiva, 1995. 219
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LITERATURA E CANÇÃO BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA: A RESSEMIOTIZAÇÃO DO IDEÁRIO NACIONALISTA
Cerrados: Revista do Programa de Pós-Graduação em Literatura, n. 22, ano 15, 2006, p. 209 - 226
LITERATURA E CANÇÃO BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA: A RESSEMIOTIZAÇÀO DO IDEÁRIO NACIONALISTA
manifesto 7 compondo um mosaico nacional do melodia de Caetano livra a música brasileira de seu
momento histórico, bem datado, fazendo referência ao sistema fechado e a abre para a experimentação (as
atual, por contraposição ao passado ("Viva Iracema/ guitarras elétricas misturam-se aos berimbaus na
viva Ipanema; eu oriento o carnaval/eu inauguro o performance melódica), enquanto a letra se constrói
monumento no planalto central/do país/viva a bossa/ sobre o fragmentário e a dispersão da realidade urbana,
viva a palhoça (...); viva a Banda-da-da/Carmem em um grande caldeirão trans-nacional e, portanto,
Miranda-da-da-da...". Neste texto, em que Caetano trans-cultural, que é o "coração do Brasil"
tematiza o próprio movimento da Tropicália e o espaço (mencionado na letra), nutrindo-se de elementos
histórico em que ele se dá, pode-se notar uma certa externos (norte-americanos, italianos, franceses) ao
diferença em relação a "Alegria, Alegria", outra país: "espaçonaves/ Cardinales; bomba/Brigitte Bardot;
composição-manifesto do movimento. coca-cola; telefone, televisão".
"Alegria, Alegria" apresenta uma montagem Observe-se que, enquanto "Alegria, Alegria" 8
diversificada de imagens, em associações inusitadas de apresenta a referida dispersão da realidade urbana, em
ícones diferenciados da pós-modernidade mundial. A "Tropicália" os termos combinados são claramente
contraditórios entre si: o que é multiplicidade e diferença
h
"Tropicália" no primeiro é contraste gritante no segundo ("papel
Sobre a cabeça os aviões / sob os meus pés os caminhões / crepom", que é um objeto de consumo ordinário, e
aponta contra os chapadões / meu nariz / eu organizo o "prata"; na "entrada" há "uma criança sorridente feia e
m o v i m e n t o / eu o r i e n t o o carnaval / eu i n a u g u r o o
monumento / no planalto central / do país / viva a bossa- morta" e "no pátio interno há uma piscina).
sa-sa / viva a palho-ça-ça-ça / o monumento é de papel Outro exemplo de letra em que o compositor
crepom / e prata / os olhos verdes da mulata / a cabeleira Caetano Veloso propõe uma ressignificação da
esconde atrás / da v e r d e mata / o luar do sertão / o
monumento não tem porta / a entrada é uma rua antiga / identidade cultural, remetendo-nos a mitos nacionais
estreita e torta / e no joelho uma criança / sorridente feia e
morta / estende a mão / viva a mata-ta-ta / viva a mulata- 8
ta-ta-ta-ta / o pátio interno há uma piscina / com água azul "Alegria, Alegria"
de amaralina / coqueiro brisa e fala nordestina / e faróis / na Caminhando contra o vento / sem lenço sem documento / no
mão direita tem uma roseira / autenticando eterna primavera sol de quase dezembro / eu vou. / O sol se reparte em crimes
/ e nos jardins os urubus passeiam / a tarde inteira entre os / espaçonaves guerrilhas / em Cardinales bonitas / eu vou.
girassóis / viva maria-ia-ia / viva a bahia-ia-ia-ia-ia / no / Em caras de presidentes / em grandes beijos de amor / em
pulso esquerdo um bang-bang / em suas veias corre muito / dentes pernas bandeiras / bomba e Brigitte Bardot. / O sol
pouco sangue / mas seu coração balança a um / samba de nas bancas de revista / me enche de alegria e preguiça /
tamborim / emite acordes dissonantes / pelos cinco mil alto- quem lê tanta notícia? / eu vou. / Por entre fotos e nomes /
falantes / senhoras e senhores ele põe os / olhos grandes os olhos cheios de cores / o peito cheio de amores vãos / eu
sobre mim / viva iracema-ma-ma / viva ipanema-ma-ma- vou. / Por que não? Por que não? / Ela pensa em casamento
ma-ma / domingo é o fino da bossa / segunda-feira está na / e eu nunca mais fui à escola / sem lenço sem documento /
fossa / terça-feira vai à roça / porém / o monumento é bem eu vou. / Eu tomo uma coca-cola / ela pensa em casamento
moderno / não disse nada do modelo / do meu terno / que / uma canção me consola / eu vou. / Por entre fotos e nomes
tudo mais vá pro inferno / meu bem / que tudo mais vá pro / sem livros e sem fuzil / sem fome sem telefone / no coração
inferno / meu bem / viva a banda-da-da / Carmem Miranda- do Brasil. / Ela nem sabe até pensei / em cantar na televisão
da-da-da-da . / o sol é tão bonito / eu vou. / Sem lenço sem documento /
nada no bolso e ou nas mãos / eu quero seguir vivendo amor
Uso aqui "manifesto" no sentido loto de "declaração de
/ eu vou. / Por que não? Por que não?
idéias", 'divulgação", bem como de "programa estético" 221
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e mundiais, é a letra da canção "Um índio" 9: ressonância, sobre a qual falaremos mais detidamente
O índio Peri, personagem do romance O na seqüência.
guarani, de José de Alencar , será uma das referências
de Caetano numa projeção de futuro de uma nação não Recortes híbridos
nomeada, mas que podemos inferir ser o Brasil: "(...) Vejamos, primeiramente, como os dois
coração do hemisfério sul na América". cancionistas nordestinos, Belchior e Zé Ramalho,
As características deste índio "impávido/ trabalham com os signos mitopoetizados da nação.
apaixonado/tranqüilo/infalível" são ressignificadas Belchior e Zé Ramalho derivaram suas
pelas figuras legendárias de Muhammed Ali, Bruce Lee composições da poesia oral popular do nordeste
e... Peri. Dos três, Peri é o único personagem de brasileiro. As referências do regional, no entanto,
ficção, mas aqui retratado, pela aproximação com os embora situem e enriqueçam suas letras, a ele não se
dois outros, como ser real. E este índio que "virá" e limitam. Ambos os cancionistas dão o salto mítico e
"surpreenderá a todos não por ser exótico", mas pelo conseguem narrar a nação superpondo fragmentos,
fato de ter guardado uma força física e espiritual em restaurando a tradição, transcendendo espaço e tempo
"estado oculto", não percebida em seu tempo (...) "terá e condensando num simbolismo imagético sua visão
sido o óbvio", já que este ser tão especial, "mais de Brasil.
avançado que a mais avançada das tecnologias", só É essa canção lírica de raízes regionais, com
"virá" depois de "exterminada a última nação implicações problematizantes do "ser" no espaço e no
indígena". tempo, que adentra os anos de 1970 com a força icônica
Caetano Veloso retoma o mito indígena da da heterorreferenciação, pois Belchior faz citações
nacionalidade brasileira, Peri, e o coloca ao lado dos diretas dos poetas do cânone, ou bem incorpora em
maiores ícones da "luta" no século XX. No entanto, o seus textos os versos de muitos deles. Ele próprio se
texto de Caetano não reitera simplesmente um ufanismo considera um "cancioneiro", um fabricante de canções
nacionalista, mas o atualiza, quando "denuncia" o no sentido medieval. Belchior considera a letra o mais
massacre das nações indígenas e a sua inutilidade, já
10
que o índio sobreviverá, seja por sua mística ou por "Divina comédia humana"
sua cultura para sempre incorporada, já que dela Estava mais angustiado que um goleiro na hora do gol,/
fundadora, à identidade brasileira: "Um índio Quando você entrou em mim como o sol num quintal/Aí,
um analista amigo meu disse que, desse jeito,/Não vou ser
preservado em pleno corpo físico/ Em todo sólido todo feliz direito,/Porque o amor é uma coisa mais profunda/
gás e todo líquido/ Em átomos palavras cor em gesto Que um encontro casual/Aí, um analista amigo meu disse
em cheiro em sombra em luz em som magnífico." que, desse jeito/Não vou viver satisfeito,/Porque o amor é
uma coisa mais p r o f u n d a / Q u e uma transa sensual./
O Tropicalismo - embora breve no tempo Deixando a profundidade de lado,/Eu quero é ficar colado à
enquanto programa estético - teve pouso no nordeste pele dela, noite e dia,/Fazendo tudo e, de novo, dizendo Sim!
À paixão,/Morando na filosofia/. Quero gozar no seu
brasileiro, abrindo espaço decisivo para a c é u : / P o d e ser no seu inferno./Viver a divina comédia
descentralização midiática. A extensão cultural com o humana,/Onde nada é eterno./ "Ora (direis!) ouvir estrelas.
movimento Mangue beat , de origem recifense, que Certo,/perdeste o senso! E eu vos direi, no entanto," /enquanto
houver espaço, corpo, tempo/ e algum modo de dizer Não!
vem à cena nos anos de 1990, vem comprovar essa
222 Eu canto.
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importante componente de suas canções, e fala da entanto, enquanto houver espaço, corpo, tempo/ e
música como uma intensificação exclusivamente do algum modo de dizer Não! Eu canto".
escrito. Temos nos versos acima um posicionamento
O título do poema "Divina comédia humana"10 que rompe o individualismo pressuposto pelo "outro":
"Estava mais angustiado que um goleiro na hora do "ora, direis, ouvir estrelas (...) e eu vos direi, no
gol,/Quando você entrou em mim como o sol num entanto". A expressão no entanto significa, aí, ao
quintal/Aí, um analista amigo meu disse que, desse contrário. "Ouvir estrelas" é o modo do eu-lírico estar
jeito/Não vou ser feliz direito,/Porque o amor é uma vivo, é a marca de sua mais profunda lucidez; da
coisa mais profunda/Que um encontro casual/Aí, um consciência de que há um papel essencial a cumprir
analista amigo meu disse que, desse jeito/,Não vou como personagem da "divina comédia humana". Esse
viver satisfeito,/Porque o amor é uma coisa mais "papel" é o da voz que não quer nunca se calar e que
profunda/Que uma transa sensual./Deixando a buscará sempre os meios para se fazer ouvir: "enquanto
profundidade de lado,/Eu quero é ficar colado à pele houver espaço, corpo, tempo/ e algum modo de dizer
dela, noite e dia,/Fazendo tudo e, de novo, dizendo Sim! Não/ Eu canto".
A paixão,/Morando na filosofia/. Quero gozar no seu
céu:/Pode ser no seu inferno./Viver a divina comédia
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humana,/Onde nada é eterno./ Ora (direis!) ouvir "Apenas um rapaz latino-americano"
estrelas. Certo,/perdeste o senso! E eu vos direi, no Eu sou apenas um rapaz latino-americano sem dinheiro no
entanto, / enquanto houver espaço, corpo, tempo/ e banco/Sem parentes importantes e vindo do interior/Mas
trago de cabeça uma canção do rádio/Em que um antigo
algum modo de dizer Não! Eu canto." é formado pelos compositor baiano me d i z i a : / " T u d o é divino. Tudo é
títulos dos clássicos de Dante e de Balzac, e os versos maravilhoso!" / T e n h o ouvido muitos discos,/Conversado
finais incorporam a "Via Láctea" de Olavo Bilac. Em com pessoas,/Caminhado o meu caminho.../Papo, o som
dentro da noite/E não tenho um amigo sequer que ainda
contraste com esse eruditismo, a primeira estrofe é acredite nisso, não./ (Tudo muda. E com toda razão.) /Eu
aberta com uma imagem prosaica, na analogia sou apenas um rapaz latino-americano,/Sem dinheiro no
representativa da angústia: "Estava mais angustiado banco, sem parentes importantes e vindo do interior/Mas sei
que tudo é p r o i b i d o . / A l i á s , eu queria dizer que tudo é
que um goleiro na hora do gol". Na segunda estrofe, permitido./Até beijar você no escuro do cinema, (quando
retorna à referenciação da Divina comédia, de Dante: ninguém nos vê...) / N ã o me peça que eu lhe faça uma canção
"Quero gozar no seu céu:/ pode ser no seu inferno/ como se deve:/Correta, branca, suave, muito limpa, muito
leve./Sons p a l a v r a s / s ã o navalhas/E eu não posso cantar
viver a divina comédia humana/ onde nada é eterno". como c o n v é m , / S e m q u e r e r ferir n i n g u é m : / M a s não se
A dicotomia céu x inferno é neutralizada pela disposição preocupe, meu amigo,/Como os horrores que eu lhe digo./
Isto é somente uma canção/A vida, realmente, é diferente./
anímica do eu-lírico de viver o que a vida a ele Quer dizer: ao vivo é muito pior!/Eu sou apenas um rapaz
apresentar: "Deixando a profundidade de lado (...) / latino-americano, sem dinheiro no banco/Por favor, não saque
dizendo Sim! À paixão,/ morando na filosofia". A quarta a arma no saloon. Eu sou apenas o cantor./Mas se depois de
cantor você ainda quiser me atirar/Mate-me logo à tarde, às
e última estrofe, que referencia o poema parnasiano "Via três,/Que à noite eu tenho compromisso/E não posso faltar
Láctea", de Olavo Bilac, é a justificativa ao por causa de v o c ê s . / E u sou a p e n a s um rapaz latino-
"interlocutor" de sua escolha: "Ora (direis!), ouvir americano, sem dinheiro no banco/Sem parentes importantes
e vindo do interior./Mas sei que nada é d i v i n o / N a d a é
estrelas. Certo,/ perdeste o senso/ E eu vos direi, no maravilhoso/Nada é secreto./Nada é misterioso. Não. 223
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Outra letra poética na qual a ideológicas brasileiras que existiram entre os anos de
heterorreferenciação se faz presente é "Apenas um 1964 e 1974, datas que situam os "anos de chumbo"
rapaz latino-americano" " . O eu-lírico referencia (referência aos anos mais repressivos e violentos da
Caetano Veloso pela incorporação de duas letras: ditadura militar no Brasil) para a arte brasileira. Não
"Divino, maravilhoso" e "E proibido proibir", podem ser identificados, no entanto, como
reformando-lhes o sentido. Na primeira estrofe há a pertencentes à geração de 1980, quando há a ascensão
valorização da composição referenciada: "Eu sou das bandas de rock - como a "Legião Urbana", de
apenas um rapaz latino-americano (...) / mas trago de Renato Russo - e as letras das canções expõem o
cabeça uma canção do rádio/ em que um antigo desencanto de uma geração herdeira da ação predatória
compositor baiano me dizia: Tudo é divino. Tudo é do autoritarismo sobre os sistemas cultural e
maravilhoso". No entanto, o eu-lírico diz na segunda educacional no país, nas décadas anteriores.
estrofe que "não [tem] um amigo sequer que ainda Belchior e Zé Ramalho não cederam ao
acredite nisso, não/ (" Tudo muda. E com toda razão".); desencanto e ao niilismo. O fato de estarem inicialmente
este desencanto é reafirmado pelo próprio eu-lírico na no cenário artístico em meados dos anos de 1970 os
sétima e última estrofe, quando, de novo, menciona sua colocou como receptores imediatos dos cancionistas
condição: "sou apenas um rapaz latino-americano, sem da geração de 1960, sobretudo Chico Buarque e
dinheiro no banco, sem parentes importantes e vindo Caetano Veloso, incorporando as lições de vanguarda
do interior" (índices de exclusão que explicitam a própria e a elas acrescentando sua singularidade.
condição social do compositor). Para exemplificar o hibridismo de sua obra, e
Apesar dessa condição, o eu-lírico "sabe" para comprovar sua inserção na corrente mitogênica
mostrar-se consciente da situação contextual presente, que sublinha a linha de reflexão social de cunho
quando revela: "Mas sei que nada é divino/ Nada é nacionalista da poesia brasileira, destacam-se as letras
maravilhoso/ Nada é secreto/ Nada é misterioso. Não". de "Admirável gado novo" l2
É esta condição de "quem sabe" que lhe dá o poder
de agradar e de ferir: "Não me peça que eu lhe faça "Admirável gado novo"
uma canção como se deve: / correta, branca/ suave, Vocês que fazem parte dessa massa/ Que passa nos
muito limpa, muito leve./ Sons palavras são navalhas/ projetos do futuro/ É duro ter que caminhar/ E dar
E eu não posso cantar como convém,/ sem querer ferir
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ninguém". Está aí a marca de compromisso da poesia "Admirável gado novo"
com o real ("mas sei que nada é divino") x o ideal ("tudo Vocês que fazem parte dessa massa/ Que passa nos projetos
do futuro/ É duro ter que caminhar/ E dar muito mais do
é divino [...]),condensada na antítese estabelecida que receber/ E ter que demonstrar sua coragem/ À margem
pelos pronomes indefinidos nada e tudo. do que possa parecer/ E ver que toda essa engrenagem/ Já
Já libertos pelo tempo (outro) e pelas sente a ferrugem lhe comer/ Êh, ôh, ôh, vida de gado/ povo
marcado/ Êh povo feliz/ Lá fora faz um tempo
mudanças político-sociais que se sucederam no final confortável/ A vigilância cuida do normal/ Os automóveis
dos anos de 1970, mas ainda receptores dos estilhaços ouvem a notícia/ Os homens a publicam no jornal/ E correm
do pós-golpe militar de 1964, Belchior e Zé Ramalho através da m a d r u g a d a / A única velhice que c h e g o u /
Demoram-se na beira da estrada/ E passam a contar o que
desenvolveram uma poética mais livre das polarizações
224 sobrou
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muito mais do que receber/ E ter que demonstrar Ambas apresentam as percepções do eu-lírico
sua coragem/ À margem do que possa parecer/ E frente ao contexto sociohistórico. No primeiro verso
ver que toda essa engrenagem/ Já sente a ferrugem de "Admirável gado novo", o eu-lírico dirige-se ao
lhe comer/ Êh, ôh, ôh, vida de gado/ povo marcado/ "outro" de forma exclusiva: "Vocês que fazem parte
Êh povo feliz/ Lá fora faz um tempo dessa massa", evidenciando a não-aceitação em fazer
confortável/ A vigilância cuida do normal/ Os parte de uma "engrenagem" - já corrompida pela
automóveis ouvem a notícia/ Os homens a publicam "ferrugem": "E ver que toda essa engrenagem/ Já sente
no jornal/ E correm através da madrugada/ A única a ferrugem lhe comer."
velhice que chegou/ Demoram-se na beira da estrada/ No título há a referência à obra do escritor
E passam a contar o que sobrou e "A terceira lâmina' inglês Aldous Huxley, Admirável mundo novo, que
relata a experiência de nosso mundo no futuro, quando
"A terceira lâmina" a ciência faria nascer seres programados para
É aquela que fere/ Que virá mais tranqüila/ Com a determinadas funções e que, por isso, estariam sempre
fome do povo/ Com pedaços da vida/ Com a dura satisfeitos, pois não teriam como se frustrar. Seres
semente/ Que se prende no fogo/ De toda multidão/ tratados como gado, marcados e controlados, sem
Acho bem mais do que pedras na mão/ Dos que individualizações. "Êh, ôh, ôh, vida de gado povo
vivem calados /Pendurados no tempo/ Esquecendo marcado/ Êh povo feliz". No entanto, o eu-lírico não
os momentos /Na fundura do poço/ Na garganta do fala deste povo no futuro. Seu tempo é presentifícado
fosso/ Na voz de um cantador/ E virá como ("faz, cuida, ouvem, publicam, correm, demoram"); o
guerra/ A terceira mensagem/ Na cabeça do homem/ "controle" se dá agora: "Lá fora faz um tempo
Aflição e coragem/ Afastado da terra/Ele pensa na confortável/ A vigilância cuida do normal". Os versos
fera/ Que começa a devorar/ Acho que os anos irão finais remetem às conseqüências de uma atitude
se passar/ Com aquela certeza/ Que teremos no olho/ passiva: "E correm através da madrugada/ A única
Novamente a idéia/ De sairmos do poço/ Da velhice que chegou/ Demoram-se na beira da estrada/
garganta do fosso/ Na voz do cantador/13. E passam a contar o que sobrou".
A letra de "A terceira lâmina" aparece como
uma solução que não permita as conseqüências
" "A terceira lâmina" enunciadas em "Admirável gado novo", ou seja, a
É aquele que fere/ Que virá mais tranqüila/ Com a fome do felicidade pasteurizada, fruto da acomodação e da
povo/ Com pedaços da vida/ Com a dura semente/ Que se negação dos problemas da coletividade. Em "A terceira
prende no fogo/ De toda multidão/ Acho bem mais do que lâmina", o movimento semântico é de inclusão do eu-
pedras na mão/ Dos que vivem calados /Pendurados no
tempo/ Esquecendo os momentos /Na fundura do poço/ lírico no contexto que o cerca. As imagens do eu
Na garganta do fosso/ Na voz de um cantador/ E inserido na "multidão" vão se sucedendo, numa
virá como guerra/ A terceira mensagem/ Na cabeça do primeira instância de leitura, por meio de enxurrada
homem/ Aflição e coragem/ Afastado da terra/Ele pensa na
fera/ Que começa a devorar/ Acho que os anos irão se lingüística de associações herméticas: "virá como
passar/ Com aquela certeza/ Que teremos no olho/ guerra/ a terceira mensagem/ na cabeça do homem/
Novamente a idéia/ De sairmos do poço/ Da garganta do aflição e coragem". O ritmo ágil imprimido pelas
fosso/ Na voz do cantador/ 225
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redondilhas menores confirma em nível estrutural esta poetas, estes seres que são, a um só tempo, antena e
"aflição" do eu-lírico. prisma, construtores e desconstrutores, pela arte, da
Numa segunda instância de leitura, as imagens história nacional, atuando assim, também, como atores
se concentram nas referências coletivas ("povo", dos processos sociais.
"multidão", "os que vivem calados") e o caos coletivo Embora a totalidade de sentidos de uma letra
encontra a redenção na voz do cantador: "Acho que poética só seja apreensível pela melodia que a
os anos irão passar/ com aquela certeza/ que teremos acompanha, a intenção de uma análise textual de
no olho/ novamente a idéia/ de sairmos do poço/ na voz canções não é mesmo a de buscar a totalidade, já que
do cantador. Na expressão metafórica "sairmos do o próprio texto poético abre-se a interpretações que
poço", com verbo na primeira pessoa do plural, o eu- nunca serão exclusivas ou conclusivas, dependente
lírico inclui-se, indicando que há esperança e saída para que é da recepção e de seu percurso histórico, ou, em
o povo sofrido, pela via da arte. outras palavras, das aderências inevitáveis que,
A canção é, portanto, o salto da transcendência embora reguladas pela imanência lingüisticamente
do momentâneo, do particular, para a reflexão existencial configurada, poderão sempre sugerir um novo olhar
mtersubjetiva sobre a função da arte: "Acho bem mais semântico ao texto sob o foro da análise.
do que pedras na mão/ dos que vivem calados/ No Brasil, o artista-compositor, que trabalha
pendurados no tempo/ esquecendo os momentos/ na simultaneamente com a palavra e a melodia, teve e tem
fundura do poço/ na garganta do fosso/ na voz de um papel fundamental nos processos de construção
cantador. O "cantador" é a voz que fala pelos que não cultural, já que a canção ocupou legitimamente um
conseguem ou não podem falar ("dos que vivem espaço muito amplo, pois se tornou o veículo artístico
calados"). No encadeamento dos versos aparece a idéia por excelência da expressão do imaginário popular. O
do homem "afastado da terra", uma das fontes de seu cancionista produz um discurso que é sempre a
sofrimento - "afastado da terra/ ele pensa na fera/ que dialética das práxis sociais, na confluência de suas
começa a devorar". O conflito deste "ser", que é o conflito inspirações subjetivas. Buscar nas letras poéticas o ser
do homem do povo na busca de saídas para uma situação social e suas reflexões existenciais significa identificar
momentaneamente desalentadora, é condensado no texto as estruturas de poder sinalizadas em sua semântica,
em vocábulos com forte carga semântica indicativa de já que, se a palavra é o fenômeno ideológico por
dor: fere, fome, pedras, guerra, aflição, devorar, excelência, os signos emergem do processo de
compondo uma imagética de disjunção e dilaceramento interação entre uma consciência individual e outra, e o
existencial: "É aquela que fere/ que virá mais tranqüila/ desvelamento da estrutura sígnica do objeto poético
com a fome do povo/ com pedaços da vida". expõe a verdade (real ou imaginária) do sujeito e do
As letras de Belchior e Zé Ramalho mostram um grupo.
pano de fundo que retoma e questiona os valores da Assim, o que esta inserção parcial no mundo
tradição do interior brasileiro e as transcende pela da canção visa é a circunscrever, pelo texto, e a mostrar
incorporação de uma visão poética contemporânea a recorrência, pelos contextos em que se inserem, de
essencialmente urbana. Como foi demonstrado, a leitura um poderoso universo simbólico de lastro social que
226 textual comparada faz emergir a visão de sujeito dos deles tem emergido pela via mitogênica.
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LITERATURA E CANÇÃO BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA-. A RESSEMIOTIZAÇÃO DO IDEÁRSO NACIONALISTA
Cerrados: Revista do Programa de Pós-Graduação em Literatura, n. 22, ano 15, 2006, p. 209 - 22é
LITERATURA E CANCÁO BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA: A RESSEMIOTIZAÇÃO DO IDEÁRIO NACIONALISTA
que publicam em revistas eletrônicas, como a www.pd- de crítica aguda à realidade, temos a canção "Corpo
literatura.com.br16, cadastrada pela Unesco, para citar de lama" l9, de Chico Science. Há a remissão a uma
apenas uma que venho acompanhando nos últimos realidade que ilusoriamente parece "longe", mas que
anos. A coexistência de vários estilos e diferentes em verdade é simultaneamente nossa - os "outros"-
registros - poemas longos, breves, prosa poética, também, como explicitam os versos que se seguem
sonetos, hai-kais, poemas que seguem a sintaxe (note-se a proximidade da linguagem à oralidade, opção
convencional ou aqueles que apresentam ostensiva estética que evita o vocabulário do colonizador):
ruptura gramatical - se aliam à diversificação dos temas "fiquei apenas lembrando que há muitas garotas
poéticos, e uma antologia de poemas dos anos de 1990, perdidas em ruas distantes/ há muitos meninos
como a que Heloísa Buarque de Hollanda17 lançou em correndo em mangues distantes/ essa rua de longe que
1998, ou a de Helena Parente Cunha18, publicada em tu vê/ é apenas a imagem que sou/ esse mangue de
2004, pode conter versos de crítica social, questões longe que tu vê é apenas a imagem que é tu" (grifos
existenciais-metafísicas, o feminismo-feminino, o meus).
homoerótico masculino, a memória, o urbano, o A partir de imagens que sugerem um reflexo de
bucólico, o erotismo, a auto e a heterorreferenciação, espelho, "Corpo de Lama" convida ao exercício da
entre tantos outros, emersos da diversidade cultural alteridade, em que o leitor-ouvinte é levado ao universo
brasileira e mundial, neste momento de tantos do habitante do mangue e é remetido ao próprio eu,
estilhaços, desconstrutor e integrador a um só tempo. transmutado e identificado com a lama. "Corpo de
Como exemplo desse trabalho de construção Lama" - reiteramos ainda - nos aproxima da fala
de um sujeito cuja representação é composta por popular das classes menos favorecidas, aqui
elementos da tradição ressignificada pelo presente, no representada pelo homem simples dos manguezais:
âmbito do universo globalizado e sob uma perspectiva "Este corpo de lama que tu vê/ É apena^ a imagem que
sou/ Este corpo de lama que tu vê / É apenas a imagem
17
Esses poetas - Uma antologia dos anos 90. RJ: que é tu"Em outra canção, "Etnia"20.
Aeroplano,1998.
18
Além do Cânone. RJ: Tempo Brasileiro, 2004. Somos todos juntos uma miscigenação. E não
Iv
"Corpo de Lama" podemos fugir da nossa etnia/ índios, brancos,
Este corpo de lama que tu vê / É apenas a imagem que sou/
Este corpo de lama que tu vê / É apenas a imagem que é tu/ 20
"Etnia"
Que o sol não segue os pensamentos/ Mas a chuva mude os
sentimentos/Se o asfalto é meu amigo eu caminho/ Com Somos todos juntos uma miscigenação. E não podemos fugir
aquele grupo de caranguejos/ Ouvindo a música dos trovões/ da nossa etnia/ índios, brancos, negros e mestiços/ Nada de
Essa chuva de longe que tu vê/ É apenas a imagem que sou/ errado em seus princípios/ O seu e o meu são iguais/ Corre
Esse sol bem de longe que tu vê/ E apenas a imagem que é nas veias sem p a r a r / Costumes, é folclore, é tradição/
tu/ Fiquei apenas pensando que seu rosto parece com as Capoeira que rasga o chão/ Samba que sai da favela acabada/
minhas idéias/ Fiquei apenas lembrando que há muitas É hip hop na minha embolada/ É o povo na arte/É arte no
garotas perdidas em ruas d i s t a n t e s / Há muitos meninos povo/ E não o povo na arte/ De quem faz arte com o povo/
correndo em mangues distantes/ Essa rua de longe que tu Maracatu psicodélico/ Capoeira da p e s a d a / Bumba meu
vê/ É apenas a imagem que sou/ Esse mangue de longe que rádio/ Berimbau elétrico /Frevo,samba e cores/ Cores unidas
tu vê é apenas a imaeem que é tu. e alegria/ Nada de errado em nossa etnia.
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Cerrados: Revista do Programa de Pós-Graduacão em Literatura, n. 22, ano 15, 21)06, p. 209 - 226
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