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PROPOSTAS PARA UM ESTUDO SOBRE A CONFORMAÇÃO DA

HISTORIOGRAFIA CHILENA, SÉCULO XIX.


VANESSA MORAES PACHECO1

Após a independência das colônias americanas, quando os novos países passaram a se


constituir como nação, começou-se a escrever sua própria história, desvinculada dos laços
com a metrópole. Ambiguamente, o passado nacional desses novos Estados só pôde ser
construído a partir da herança colonial, porque era ela que explicava a existência do Estado e
justificava seus caminhos para o futuro (ZERMEÑO, 2009:82). Desse modo, as histórias
pátrias surgiram já divididas em duas partes: uma delas referia-se ao descobrimento, à
conquista e aos séculos de colonização; a outra, posterior à emancipação, constituía-se como
um período de libertação e conformação do Estado independente. Diante dessa situação, os
intelectuais americanos do século XIX tiveram que começar se perguntando sobre como
apropriar-se do passado colonial, atrelado à história metropolitana, para construir um sentido
nacional e independente para o novo Estado que tratamos de construir?
O desafio de responder a esta pergunta foi compartilhado por todas as ex-colônias
americanas (incluindo Haiti, Estados Unidos e Brasil), uma vez que em todas se produziram
tradições históricas nas quais se narraram, descreveram e defenderam o novo Estado (MEJÍA,
2009: 247). Do esforço conjunto, surgiu uma rede de referências cruzadas2, por meio da qual
foram compartilhados documentos, informações e discussões teórico-metodológicas3 sobre a
história, principalmente a partir da segunda metade do século XIX.

1
É doutoranda da Universidade de São Paulo. Essa apresentação é parte de um estudo de doutorado, iniciado em
outubro de 2012, no qual pretendo estabelecer uma interpretação sobre as relações entre o contexto intelectual e
a conjuntura política em meados do século XIX no Chile, a partir da análise das principais obras da historiografia
chilena deste período. O objetivo é definir, empírica e precisamente, as principais características das diferentes
agendas políticas e, também, entender mais profundamente o processo de conformação da historiografia nacional
chilena. Desse modo, com este artículo e com a realização da tese, espero contribuir com os estudos da História
política e da cultura do Chile.
2
No Brasil, os intercâmbios se deram entre as regiões e o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) e,
entre o Brasil e as academias europeias de História (GUIMARÃES, 1988). Apesar do diálogo com os Estados
vizinhos ser mais problemático, porque a monarquia brasileira via-os como uma ameaça, o IHGB estabeleceu
relações com eles, conforme: “Abreu e Lima: uma leitura sobre Brasil, Historiografia, Memória, Poder e
Identidade”, disponível em: http://www.institutoabreuelima.com.br/.
3
“Bartolomé Mitre não só manteve uma rica correspondência com seus colegas chilenos (dividiu cela em um
cárcere de Santiago com dom Benjamín Vicuña Mackenna), mas também dom Diego Barros Arana lhe fazia
chegar um exemplar da obra do colombiano José Manuel Restrepo, que serviria para contrastar o processo
revolucionário de seu país com o da Grande Colômbia. (...) Gabriel René Moreno não só foi discípulo dos
chilenos, mas também em sua obra sobre Bolívia se percebe a presença silenciosa de Miguel Luis Amunátegui.
Amunátegui, por sua vez, tinha formulado as ideias essenciais que seu condiscípulo e amigo Diego Barros Arana
[...] ia desenvolver na minuciosa narrativa de sua Historia Jeneral de Chile. O peruano Paz Soldrán citava
2
À medida que as investigações avançaram e os autores amadureceram seus argumentos
e afinaram seus instrumentos teórico-metodológicos, foi se desenvolvendo um discurso
histórico nacional complexo, que esteve na base da construção da cultura nacional desses
novos países. Nesse sentido, irei expor sobre o período inicial da consolidação da
historiográfica chilena durante a segunda metade do século XIX, por meio da discussão sobre
como compreender algumas obras representativas desse processo, a saber:
1. Sociabilidad Chilena, de Francisco Bilbao (1843-1844: 57-90);
2. Investigaciones sobre la influencia social de la conquista y del sistema colonial de los
españoles en Chile (LASTARRIA, 1844) e Bosquejo histórico de la constitución del gobierno
de Chile durante el primer período de la revolución, desde 1810 hasta 1814, de José
Victorino Lastarria (1847);
3. Los Precursores de la Independencia de Chile, de Miguel Luís Amunategui (1870-72);
4. Los Oríjenes de la Iglesia chilena, de Crescente Errazuriz (1873);
Por meio desse corpus documental, pretendo apontar de que maneira é possível estudar
criticamente o pensamento histórico-político dos principais autores do período, com o
objetivo de compreender as possíveis concepções de cada autor sobre como deveria ser escrita
e interpretada a história nacional, bem como analisar os temas políticos presentes nessas obras
– por meio das quais os historiadores tentaram intervir no debate público de sua época –, por
exemplo: representação política, liberdades individuais, soberania popular, educação popular.

1. A “história dos modelos históricos” na América Latina

Convenciones contra la cultura, do historiador colombiano Germán Colmenares, é o


estudo mais completo sobre a historiografia americana. Nele, o autor revela o esforço comum
a diversos países sul-americanos de criar uma tradição escrita sobre o passado nacional, a
partir dos discursos históricos importados da Europa. Fato que predispôs a cultura local a
“conflitos entre as formas de representação do passado e os conteúdos culturais inscritos nesse
passado” (COLMENARES, 1997:14-15). Consequentemente, para ele, as primeiras histórias
nacionais teriam se mostrado incapazes de representar, em linguagem própria, a história e a
configuração de suas sociedades. Daí, o titulo do livro e razão pela qual o autor se limita a

largamente a Mitre, a Vicuña Mackenna e ainda aos antigos artículos que Juan García del Río”
(COLMENARES, 1997:XXXI).
3
rastrear os desdobramentos metodológicos do discurso histórico europeu na América, sem
avançar no debate sobre a relação entre política, contexto sociocultural e história.
Indo em outra direção, o historiador colombiano Sergio Mejía sugere que as ideias
europeias sobre história tiveram, na América, sua própria trajetória e jugaram um papel
relevante, ao fortalecer as convicções sobre o valor do passado (MEJÍA, 2007: 440). Mas,
para ele, no momento de escrever a revolução hispano-americana, mais importante que os
referenciais europeus, foram a interpretação do período colonial, os problemas da realidade
decorrentes da independência e os projetos políticos para o futuro nacional. Isso porque, os
homens do século XIX estariam interessados em ler nas obras históricas as interpretações
sobre a história do seu país e não as refutações contra Herder, Vico ou qualquer outra teoria
europeia em voga (MEJÍA, [no prelo]). Sendo assim, Mejía advoga que “a natureza e o
significado das histórias compostas desde México até Chile, entre 1810 e 1910, só podem ser
compreendidas com a história cultural” (MEJÍA, 2007:440) de cada país.
Estou de acordo com esta proposta, pois acredito que houve processos de adaptação e
criação de ideias historiográficas, nos contextos específicos de recepção4 e, que tais processos
devam ser considerados, na análise do discurso histórico, para que possamos pensar a
historiográfica americana com a “dignidade de experiência passível de ser pensada por si
mesma” (ODALIA, 1997:13). Para isso, é preciso considerar as histórias nacionais como
artefatos históricos e, para tanto, os contextos de elaboração e recepção dessas obras precisam
ser avaliados tanto quanto seus conteúdos.

2. O contexto de conformação da Historiografia Chilena

Após a formação da Primeira Junta de Governo, em 1810, o Chile iniciou um período –


definido pela historiografia – de “ensaio e erro” (Jocelyn-Holt, 2009:291)5, em razão tanto dos
diversos choque políticos e bélicos entre seus grupos políticos quanto das mudanças de
constituições, que se sucederam sem oferecer maior estabilidade institucional ao país.

4
Para uma instigante visão desse processo, consultar: PALTI (2007: 259-308).
5
Esse período foi inicialmente denominado de “Anarquia Constituicional”, para tanto, recomenda-se o texto
clássico de Edwards (2005). Outros autores utilizam o termo “ensaios constitucionais”, como é o caso de Heise
(1978). Sobre esse período também é possível considerar a interpretação mais recente de Salazar (2007).
4
Ao início da década de 1830, iniciou-se um novo período. A mudança ocorreu com a
vitória dos conservadores na Batalha de Lircay no ano de 18306 e, com a promulgação da
Constituição Conservadora em 18337. Nesses anos, o líder político deste grupo, Diego
Portales, resolveu assumir para si a missão de orientar os rumos da nova organização
constitucional do Chile. Para tanto, ele instituiu (por meio de sua influencia política e social)
um modelo republicano presidencialista bastante centralizado e autoritário8.
A década 1840 foi decisiva para a consolidação desse novo grupo no poder e, isso
aconteceu, em especial, porque conseguiu atribuir a si mesmo o papel de consolidador da
estabilidade institucional do Chile independente. Nesses anos, o presidente Manuel Bulnes
(1841-51), sempre respeitando o marco ideológico da ordem institucional, iniciou uma era de
liberalização, crescimento econômico e desenvolvimento institucional9. Buscou também
estimular a participação de pessoas ilustradas e capazes de desenvolver civilizacional e
economicamente o país e, com frequência, alentou projetos educacionais e culturais10. O mais
importante destes foi, sem dúvida, a fundação da Universidad de Chile (UCH), em 184211.
Instituição que, aos poucos, se tornou a principal responsável pelo desenvolvimento do estudo
da história nacional, graças aos esforços de seu primeiro reitor, Andrés Bello12, quem se
preocupou em garantir que a universidade estimulasse tanto a organização dos arquivos13
quanto a realização de estudos históricos.
Desse modo, a historiografia chilena surgiu, em meados do século XIX, a partir dos
incentivos fornecidos pela Universidade, como parte das estratégias do Estado e da elite

6
Para una visão detalhada da historia política e econômica chilena nestes anos, COLLIER & SATER (1998).
7
Sobre a Constituição de 1833, ver: COLLIER (2008).
8
Sobre esse tema, consultar Jocelyn-Holt (1997; 2009).
9
Isso foi possível, graças ao clima interno de apaziguamento político decorrente do afrouxamento da repressão
política, resultado da superação da crise política vivenciada após o assassinato de Diego Portales – mentor do
governo conservador –, e do clima de otimismo causado pela vitória chilena na guerra contra a Confederação
Peru-Boliviana (1836-1839). Sobre este último episódio, ver: CID (2011).
10
Foram criadas também a Escuela Normal de Preceptores, a Escuela de Artes y Oficios, Escuela de Agricultura
e o Conservatório Nacional de Música (BOCAZ, 2000:194). O ambiente era propício ao desenvolvimento
cultural, em grande medida, por causa da geração de 1842, isto é, um grupo de jovens que fizeram, neste ano,
suas premeras intervenções públicas no campo cultural, ao criar a Sociedad Literaria (BOCAZ, 2000:195) e,
consultar também: PINILLA (1943) e SUBERCASEAUX (2010).
11
Sobre a fundação da Universidad de Chile, ver: SERRANO & JAKSIC (1990) e SERRANO (1994).
12
Andrés Bello é considerado um dos grandes intelectuais hispano-americanos do século XIX. Venezuelano, era
poeta, filólogo, educador, jurista e, durante sua vida no Chile, foi um dos responsáveis pela fundação da
Universidad de Chile (instituição na qual foi reitor por 22 anos). Sobre Bello, consultar: JAKSIC (2010).
13
Não por acaso, vários historiadores chilenos publicaram suas mais importantes coleções de documentos sobre
a história do país no final do século XIX, o mais importantes deles foi José Toríbio Medina (1852-1930).
Atualmente, seu legado está disponível na Biblioteca Nacional do Chile, no salão que leva o seu nome e cujo
acesso é aberto ao público.
5
dirigente de criar um ambiente público favorável à ordem instituída em 1830. Isso porque a
história pareceu ser uma ferramenta capaz de assegurar a continuidade do seu poder e da
própria sociedade tal como a conheciam (POCOCK, 2001:157-167).

3. Conhecimento Histórico a serviço do Governo: a obra de Claudio Gay.

Antes mesmo da fundação da UCH, já em 1839, o governo buscou incentivar os estudos


históricos, ao contratar o naturalista francês radicado no Chile Claudio Gay14, para redigir a
primeira história pátria. A intenção era que a narrativa histórica representasse a elite dirigente
como protagonista e responsável pela unidade e estabilidade da política nacional15, para
legitimar o modelo constitucional de 1833 e prolongar-se no poder. Consequentemente, o
papel de Claudio Gay foi o de preencher o vazio deixado pela emancipação, tentando
contornar a crise de legitimidade resultante desse processo de liberalização política.
Sobre essa característica, corretamente, o historiador chileno Rafael Sagredo avaliou
que o trabalho de Gay foi “criado sob medida, como historia nacional”. Fato que, para ele,
demonstraria a “falta de autonomia da história”, naquele momento, em relação à política e ao
poder (SAGREDO,2009: 56)16. Diferentemente, considero que não existiu tal dependência, o
que existiu (e, ainda existe) são os usos políticos que o estudo do passado pode adquirir, pois,
distinto do que insinua Sagredo, a história continua até hoje entrelaçada à política, uma vez
que a reflexão sobre as preocupações do tempo presente forma parte do ofício do historiador.
Assim, é mister compreender os possíveis sentidos políticos dos textos de história.
O trabalho de Claudio Gay foi importante também pelo método utilizado para escrever a
história – “história narrativa” ou ad narrandum –, pautado na pesquisa documental, crítica dos
documentos, narrativa desapaixonada dos fatos, descarte de fatos inverossímeis e na correção
14
Em 1830, Claudio Gay já estava contratado, para realizar um estudo sobre o território e a população chilena.
Na ocasião, obteve permissão, apoio político e financiamento do Estado, para desenvolver conhecimentos que
poderiam facilitar a administração do país. Para um esclarecedor estudo sobre o trabalho científico de Gay:
(SAGREDO, 2008).
15
Nas sugestivas palavras de Rafael Sagredo (2009:58-59): “[Gay] Organizou seu material de tal modo que o
passado, sempre comparado com o presente dirigido por o setor dominante, resultava desvalorizado diante a obra
realizada pela elite, uma vez concretizada a independência e organizada a república (...). [Assim,] a história da
independência e os primeiros anos da vida republicana...foram apreciados pela elite chilena praticamente como
uma crônica de seu passado, muitos de seus membros ofereceram seu testemunho como protagonistas”.
16
“Sua história [de Gay] seria a legitimadora da ação da elite, assim como o cimento da coesão social (...) A
situação, ademais, deve ser apreciada como consequência da falta de autonomia da história em relação à política
e ao poder; própria de uma época em que a investigação histórica era uma tarefa privada”. Assim, o autor sugere
que, atualmente, a relação entre história e política estivesse eliminada da realidade historiográfica e que, por
tanto, o conhecimento atual fosse superior ao do século XIX (SAGREDO, 2009:56).
6
das interpretações duvidosas. Essa metodologia pretendia responder às novas exigências do
ofício do historiador, que cobrava maior cientificidade nessa área e, era também uma
requisição do governo, desejoso de dotar o Chile de uma história moderna, representativa de
seu momento histórico de vitórias militares e de estabilidade política. Por essas razões, a UCH
atuou na mesma linha17, quando definiu que anualmente se pronunciasse e premiasse um
discurso sobre algum evento relevante do passado nacional, “apoiando os pormenores
históricos em documentos autênticos e desenvolvendo seu carácter e consequências com
imparcialidade e verdade” (ANALES, 1843-44:9).
Assim, a história narrativa foi estabelecida no Chile e, para estudiosos, como Sergio
Villalobos – seguindo a linha interpretativa aberta pelo historiador Féliu Cruz (FELIÚ CRUZ,
1958-1959; 1965) –, esse método foi tão importante que teria assinalado “uma orientação
metodológica para o cultivo da história” (VILLALOBOS, 1980:11).
Contudo, como veremos no próximo tópico, essa frase é imprecisa. O respaldo
académico não foi suficiente para garantir a preeminência do método narrativo, uma vez que o
conteúdo da obra de Gay e o método ad narrandum foram continuamente desafiados. Isso
ocorreu porque as “lembranças do passado” e os projetos para o futuro (derivados de tais
lembranças) são plurais18, isto é, diferentes grupos sociais podem reivindicar versões
divergentes da oficial e criar novas visões da história nacional. O resultado desse processo é
que o conhecimento histórico se converte, rapidamente, em um importante meio de ação e,
passa a ter capacidade de absorver os temas dos debates políticos e ideológicos e reflexionar
sobre eles.

4. As primeiras interpretações históricas divergentes da História Oficial

Um mês antes da publicação do livro de Claudio Gay, em julho de 1844, um jovem


chamado Francisco Bilbao (1832-1865) publicou o artigo “Sociabilidad Chilena”, no
periódico El Crepusculo. Desde sua divulgação, o texto suscitou muitas polémicas e seu autor
foi condenado por blasfêmia19. Poucos meses depois, um dos editores do jornal e professor de

17
Sobre as memórias históricas apoiadas pela UCH, ver: GAZMURI (2006).
18
“Cada um tem uma imagem muito concreta do passado que se projeta através da continuidade a que está
associado e, tem uma ideia muito particular da continuidade no presente e futuro” (POCOCK, 2001:161).
19
Bilbao, após a publicação dessa obra, também foi expulso do Instituto Nacional (instituição de ensino
secundário público chileno. Para mais informações: FELIÚ CRUZ (1950), pois o consideraram um inimigo
público da ordem instituída.
7
Bilbao, José Victorino Lastarria (1817-1888)20, apresentou, diante o Comitê Universitário, sua
própria interpretação histórica: Investigaciones sobre la influencia social de la conquista y del
sistema colonial de los españoles en Chile. A obra recebeu muitas críticas, tanto por seu
conteúdo quanto pela sua forma de abordar a história. Motivado pela polêmica, Lastarria
escreveu De la constitución del gobierno de Chile durante el primer período de la revolución,
desde 1810 hasta 1814, que gerou debates mais intensos pelos mesmos motivos.
Por um lado, a simples existência desses textos dissonantes corrobora a perspectiva de
que a história narrativa não conseguiu empreender uma “orientação” aos estudos históricos,
mas deu lugar a debates tanto sobre as premissas do método histórico quanto a respeito das
próprias interpretações do passado nacional. Por outro lado, a publicação destas mesmas obras
deve ser entendida como sinal do ressurgimento da oposição no espaço público, graças ao
período de concórdia proporcionado pelo governo do presidente Manuel Bulnes, que
arrefeceu as perseguições políticas dos primeiros anos da ordem portaliana.
Sem considerar esse contexto, os estudos (que são a maioria) acabam perdendo parte
relevante da explicação sobre essas obras. Por isso, frequentemente tentam explicar as
posições políticas dos dois autores a partir de processos históricos externos, por exemplo,
definindo a Bilbao como expoente do liberalismo radical (OCARANZA, 2007: 110-111) ou
como socialista utópico21 e, tentando ligar Lastarria ao positivismo. Essa estratégia,
infelizmente, não consegue capturar o objetivo central desses autores, isto é, a realidade
chilena de sua época.
Para tentar preencher essa lacuna presente nas interpretações, é importante perceber que
“Sociabilidad Chilena” foi a primeira tentativa pública de se utilizar a história (apesar do seu
caráter ensaístico), para refletir sobre um tema central à sociedade de sua época – a herança
colonial no Chile republicano – e, para encontrar soluções para esse problema. Esse é um feito
relevante, dado o incipiente desenvolvimento da atividade histórica no Chile, em 1844. Além
disso, o tema abordado nessa obra foi retomado por vários outros autores, a começar pelo
próprio Lastarria. Nesse sentido, resumidamente, se pode afirmar que ambos trataram

20
José Victorino Lastarria foi um famoso intelectual chileno, liberal, advogado por formação, professor e
político. Esteve à frente da luta pela reforma da Constituição conservadora de 1833, defendendo a ampliação dos
direitos individuais, da representatividade eleitoral e da diminuição das prerrogativas presidencialistas. Para
consultar o estudo mais aceito sobre a vida e obra deste personagem: FUENZALIDA (1983).
21
RAMA, Carlo. “Utopismo socialista en América Latina”. In: Utopismo socialista (1830-1893). Disponível em:
<http://www.bibliotecayacucho.gob.ve/fba/index.php?id=97&no_cache=1&download=Utopismo_sociali
sta.pdf&catalogUid=26&filetype=ayaDigit>. Acessado em 06-03-2011.
8
igualmente de criticar o centralismo e autoritarismo da Constituição de 1833, questionar o
catolicismo, denunciar as práticas eleitorais fraudulentas, criticar o legado colonial, defender
maior participação dos cidadãos e uma ampla reforma de costumes.
Após considerar essa questão, é possível discutir qual foi a compreensão de Bilbao a
respeito da sociedade e dos costumes chilenos; como elaborou sua crítica ao modelo de
república vigente; e quais soluções encontrou para o futuro do país. De igual modo, para
entender a obra de Lastarria, devemos responder às mesmas perguntas, pois acredito que o
mérito de ambos foi ter suscitado a reflexão sobre o futuro (a partir, do passado), discutindo a
urgente questão sobre a construção de uma república mais democrática.

5. Conformando um “novo” método para escrever história?

A metodologia histórica utilizada por Lastarria – “história filosofia” ou ad probandum–,


em suas obras, causou tanta comoção quanto sua posição política. Em poucas palavras, seu
método consistia em compreender a história do Chile integrada à história do desenvolvimento
da Liberdade e do Progresso civilizacional. Para ele, o país havia se integrado à História
Universal, após a obtenção da liberdade política, em 1810. Sendo assim, tocaria a intelectuais,
como ele, compreender por meio dos estudos históricos o sentido imanente da própria
História, descobrindo em qual direção o Chile deveria caminhar, para alcançar cada vez mais
liberdade e progresso. Sabe-se que tal premissa corresponde aos postulados da Filosofia da
História, oriunda da Ilustração, razão pela qual seu método é denominado de “filosófico”.
Por defender essa visão, as memórias de Lastarria geraram muita polêmica, que motivou
a publicação de numerosos artigos nos jornais da época. Os mais expressivos continham as
imputações teóricas de Andrés Bello22 e a manifestação de apoio de Jacinto Chácon (1820-
1893), advogado e membro do partido liberal. Entretanto, é preciso observar que, em nenhum
dos seus trabalhos, Lastarria desestimou a relevância da “história narrativa” ou, ainda, a
pertinência da pesquisa documental. Ao contrário, nas introduções de suas obras, alega que
há, a priori, uma ideia que o orienta no estudo histórico, mas que há também uma
preocupação erudita no uso das fontes23.

22
Para consultar Modo de escribir la historia e Modo de estudiar la historia: Obras Completas de Don Andrés
Bello: Opúsculos literarios y Críticos II, citados no ítem: Fontes Primárias da Bibliografia.
23
Atualmente, podemos avaliar que seu trabalho com as fontes foi feito de uma maneira imperfeita e bastante
recortada por seus posicionamentos políticos e ideológicos. Mas isso não é novidade, pois ele está fazendo o
9
Resgato o debate sobre os diferentes modos de escrever a história, no Chile, com o
objetivo de descobrir se as obras de Lastarria e as respostas por elas provocadas
representaram de fato modos distintos de fazer a história nacional, de acordo ao afirmado pela
historiografia a respeito desse tema. Para avançar nessa discussão, devemos analisar as obras
subseqüentes, tentando compreender como a historiografia chilena avançou, constituindo-se
como um campo de saber instituído academicamente.
Posterior à publicação da última obra de Lastarria, em 1847, apareceram outras
memórias históricas, oriundas dos concursos financiados pela UCH. Essas obras formaram
geralmente uma sucessão de textos díspares em qualidade, desconectados entre si e dedicados
ao estudo de uma matéria ou um período muito curto24. Apesar dessa particularidade,
representaram um aporte significativo à cultura chilena. Por meio das memórias, a escrita da
história amadureceu e ganhou complexidade, uma vez que os autores puderam aprimorar suas
estratégias narrativas e ferramentas de investigação. A heterogeneidade dos textos, tanto em
sua qualidade literária quanto filiações políticas, deixa claro, para nós, que as obras de história
se tornaram realmente um campo de batalha, no qual os conflitos políticos e históricos se
fixaram e, aguardam para serem analisados.
Desse modo, para compreender adequadamente como avançou o processo de
conformação da historiografia chilena, é necessário estudar obras que mostraram maior
solidez e amadurecimento, como as de Miguel Luís Amunátegui e Crescente Errázuriz. Isso
porque o trabalho destes autores permite abordar, em profundidade, o conflito metodológico
entre história narrativa e filosófica e o embate político entre liberais e conservadores, uma vez
que se propuseram a dialogar diretamente (WOLL, 1977: 484).
Por um lado, Amunátegui criticou o período colonial e a herança espanhola, questionou
o papel histórico da Igreja Católica, denunciou o centralismo e o autoritarismo do regime
portaliano, defendeu os direitos individuais, a educação pública e a maior participação
individual na esfera pública. Por outro lado, Errázuriz respondeu a essas críticas, defendeu a

mesmo que vários outros historiadores fizeram e continuam fazendo, uma vez que é impossível eliminar a
subjetividade de dentro do trabalho científico. Mais ainda, qualquer das histórias do século XIX pode ser tachada
de “imperfeita” no manejo da documentação, pois os intelectuais daquela época se propuseram a fazer algo novo
e muitas vezes trabalharam a partir de materiais incompletos.
24
Dando-se conta dessas irregularidades e do valor que carregavam aquelas obras, alguns anos após o início dos
concursos, o historiador chileno Benjamín Vicuña Mackenna reuniu, em cinco volumes, as memórias anteriores
à 1866, em: Historia General de la República de Chile desde su Independencia hasta nuestros días. Consultar o
ítem: Fontes Primárias da Bibliografia.
10
visão oficial da história e argumentou a favor da Igreja Católica contra esses ataques – que
foram atribuídos não à “verdade histórica” mas às ideias liberais de seus adversários.
Mesmo sustentando posições políticas tão marcantes, ambos não abriram mão de
utilizar um rigoroso empirismo, utilizando grande quantidade de fontes primárias e uma
rigorosa crítica dos textos. Então, como poderíamos classificá-los, eram narrativos ou
filosóficos? Porque os especialistas associam Amunátegui com a história narrativa? Que
características permitem a Amunátegui ser considerado um historiador clássico, mas não a
Errázuriz e Lastarria? Que critérios direcionam o cânone historiográfico, no Chile?
Com essas perguntas é possível se discutir o diálogo político e histórico entre estes
autores, pois parece sugestivo considerar que o cerne dos debates poderia não ser realmente a
metodologia histórica mas, sim, o teor político dos textos. Minha hipótese é que o debate
entre história narrativa e filosófica dizia respeito a quem detinha a voz de autoridade sobre a
interpretação do passado e sobre os prognósticos do futuro decorrentes da análise histórica –
por exemplo, proceder ou não a secularização do Estado. A tentativa de padronização
acadêmica, decorrente da história narrativa, parece ter servido não só para forçar a
normatização da disciplina mas também para atacar os trabalhos/autores/ideias contrários à
versão oficial da história do Chile. Assim, a metodologia serviu para tentar invalidar as
críticas de autores dissonantes e, para desqualificá-las previamente, ao acusá-las de sacrificar
a cientificidade em detrimento dos preceitos políticos.
Em suma, proponho uma nova interpretação para a querela metodológica entre história
narrativa e filosófica. Para tanto, se faz importante estudar as histórias nacionais oitocentistas
conectadas ao seu contexto político e social, considerando que elas podem aportar uma visão
privilegiada sobre a política, sociedade e a escrita da história da época em que foram
produzidas. Tenho em vista que a historiografia atual privilegia apenas os debates
metodológicos, sem se aprofundar nas motivações e possíveis desdobramentos deste tema e,
por isso, deixam de lado as questões levantadas neste projeto.

6. Reformulando o debate metodológico sobre a escrita da história


11
Apesar das ressalvas contra se fazer um debate centrado na disjuntiva entre história
narrativa e filosófica25 ou destinado a encontrar as origens europeias e os desvios dos modelos
históricos, os estudos acerca a historiografia chilena têm se debruçado exaustivamente sobre
esses aspectos. Por essa razão, não é incomum que muitos destes estudos se aproximem da
História das Ideias, em sua forma tradicional. Este é o caso, por exemplo, de Bernardo
Subercauseaux (1997), em sua obra sobre Lastarria. Também há aqueles autores que optam
por compilar biografias e recontar a produção histórica dos historiadores mais importantes,
como Cristian Gazmuri em Historia de la Historiografia (2006). Diferentemente, desejo
demostrar como centrar a análise nas diferenças entre história narrativa e filosófica impede
uma interpretação adequada do problema, porque se bem o tema nos remete a uma disputa
metodológica, ele tem também outros aspectos.
Talvez Lastarria tenha sido o primeiro em apontar essa questão, na década de 1870,
quando escreveu Recuerdos Literários (LASTARRIA, 1855). Nessa ocasião, se queixava que
sua obra era considerada de “menor” qualidade, pelo público letrado de sua época, que o
acusavam-no de advogar historicamente em nome de seus ideais políticos. Para explicar sua
queixa e reivindicar sua obra, ele denunciou a divisão entre os métodos narrativo e filosófico.
Considerando esse fato, deveríamos nos perguntar que ideais e metodologia utilizadas por
Lastarria causaram tanto desconforto; quais as outras finalidades tinha Lastarria, ao apelar
para esta questão; como sua análise sobre a historiografia chilena impactou seus
contemporâneos?
Minha hipótese é que os métodos historiográficos foram utilizados como uma
ferramenta, para respaldar as conclusões dos trabalhos enquadrados dentro da historia
narrativa (considerada mais científica, objetiva e, portanto, confiável) e, assim, determinar de
antemão quem detinha a voz de autoridade sobre as interpretações do passado e também sobre
os possíveis desdobramentos políticos de tais análises. Os demais textos eram desqualificados
por serem considerados politicamente direcionados e historicamente falseados. Acredito que
esta foi uma maneira eficaz e simples de evitar debates complexos sobre as discrepâncias
históricas e políticas, como em que sentido os conteúdos políticos discrepavam, que tipos de
conteúdos políticos podiam ser aceitos, sob o argumento de serem “verdades históricas” e,
que projetos de futuro estavam sendo respaldadas.

25
Na Argentina, se discute as diferenças de metodologia entre Bartolomé Mitre e Vicente Fidel López e, no
México, entre os historiados José María Lacunza (1809-1869) e José Justo Gómez de la Cortina (1799-1860).
12
Ao final, o que Lastarria fez foi iniciar um debate e, aparentemente, a historiografia
especializada tem mal interpretado esse gesto, ao se pautar na identificação da origem teórica
do discurso histórico, na identificação dos autores com o liberalismo ou conservadorismo ou
na classificação canônica entre historia narrativa e filosófica. Para tentar avançar nesta área,
proponho entender como ocorreram e quais foram as confluências entre história e política e,
como esta relação atuou favoravelmente tanto para a conformação da historiografia quanto
para a consolidação republicana no Chile. Isto é, pretendo resgatar os usos pragmáticos26 dos
textos. Para alcançar meu objetivo, tomo em conta um contexto cultural mais amplo, o qual
não tem sido considerado adequadamente, pois alguns dados são subestimados.
Quando o jornal El Crepúsculo publicou “Socibilidad Chilena”, André Bello era seu
coeditor. Posteriormente, na qualidade de reitor da UCH, solicitou que Lastarria escrevesse a
primeira memória histórica da instituição. Ademais, Francisco Bilbao, Lastarria e Amunátegui
foram alunos de Bello e, frequentavam os mesmos ambientes de trabalho, nos ministérios e
escritórios do governo e, mesmos círculos sociais. De tal modo que os supostos “oponentes”
ideológicos e historiográficos estavam conectados ao mesmo grupo sociocultural. Esses fatos
me levam a crer que é mais acertado pensar que estes homens partilhavam um propósito
político e intelectual comum: a construção do Estado. Questão que se perde de vista, quando
se o problema da historiográfica apenas em seu viés metodológico.
Centrar-se na divisão metodológica faz perder de vista também o importante e
imbricado que é a relação entre história e política, correndo o risco de chegar a conclusões
errôneas, como afirmar a falta de autonomia da disciplina histórica27 em relação ao poder.
Para evitar esses riscos, precisamos considerar que, embora os historiadores oitocentistas
tenham declarado preferir a objetividade e os documentos em detrimento dos embates
ideológicos, estes foram também importantes homens públicos que geralmente não resistiram
a combinar seu pensamento político com o histórico28. Ademais, dado o grau incipiente dos
estudos históricos, trabalhar com as fontes primaria era uma necessidade prática urgente. Sem

26
Com o termo “pragmático”, Allen Woll define que os historiadores chilenos conferiram à narração histórica do
país um uso político e ideológico, tornando-a tão útil às novas nações, sobretudo quando descobertos os usos
cívico-morais, na transformação de jovens em cidadãos patrióticos. Guarnecidos do conjunto de conhecimentos
históricos, os intelectuais poderiam também usar a história para revelar as leis gerais que governam as ações
humanas e para planejar o futuro da sociedade chilena (WOLL, 1982:4).
27
Como faz Rafael Sagredo (2009:56).
28
Isso porque, historiadores como José Victorino Lastarria e Miguel Luis Amunátegui foram também políticos,
que participaram ativamente em projetos políticos e culturais de transformação da sociedade e do Estado. Por sua
vez, Crescente Errázuriz foi estimulado a realizar seus primeiros estudos históricos por seu tio, o arcebispo
Rafael Valentín Valdivieso, cargo ele próprio desempenhou entre 1919 e 1931.
13
contar que as fontes (quando existiam e eram acessíveis) respondiam às necessidades e
realidade colonial, tornado necessário encontrar, reunir e dar lhes novo sentido, o do Estado
independente e republicano. Missão esta que é tanto política quanto erudita. Por essas razões,
apontadas em Functional Past, o historiador Allen Woll questiona a supremacia da história
narrativa. Conclusão com a qual estou de acordo, mas discordo, quando Woll sustenta que
houve realmente uma separação radical entre os métodos históricos.
Minha hipótese é que, para o século XIX, não é acertado considerar a primazia de um
modelo historiográfico pronto, definitivo e utilizável para se escrever sobre o passado das
novas repúblicas, uma vez que o fim do sistema colonial havia sido um feito sem precedentes
e, muito recente. Assim, muitos intelectuais tentaram encontrar soluções para o desafio de
compreender o novo horizonte de expectativas criado após 1810 e de dar sentido às
experiências coloniais29. O resultado, segundo desejo comprovar, dependeu do contexto
cultural e ideológico em que cada autor estava submerso, uma vez que coube a cada um
encontrar nos pretérito um sentido para as ações humanas e um desenvolvimento racionado
para o futuro e, assim, realizar suas intervenções políticas e intelectuais.
Se as histórias nacionais surgiram imbuídas desse propósito, então, seus conteúdos e
reflexões tinham de ter caráter iminentemente político e, tal dado não pode ser descartado.
Além do mais, crer na vitória do método narrativo equivale a subestimar as complexidades,
ignorar os emaranhados metodológicos e ideológicos entre os autores e desestimar as distintas
maneiras de estabelecer conhecimento sobre o passado. Distintamente, caberia tentar
descobrir de que modo, apesar das diferenças intelectuais e políticas, os intelectuais chilenos
cooperaram na troca de documentos, na criação de um ambiente de discussão académica e no
fortalecimento da opinião pública, por meio de suas obras sobre a história nacional.
Por esses motivos, concordo com o historiador Sergio Mejía, quando este sugere que a
“famosa polémica [foi] um intercambio geracional, político sem dúvida, mas em nenhum
momento uma separação nem epistemológica nem radical entre métodos contrários para se
escrever a história”, pois isso era algo que “não podia ocorrer no campo da escrita da história
tradicional e em uma história cultivada por cidadãos novos de um estado nascente” (MEJÍA,
em prelo). O historiador mexicano Guillermo Padilla aponta outra razão para que a separação
metodológica não fosse profunda. Para ele, o ambiente historiográfico era compartilhado tanto

29
Utilizo neste texto os conceitos “horizonte de expectativas” e “espaço de experiência” de acordo com:
KOSELLECK (2006).
14
por conservadores quanto por liberais (ou, simplesmente, por historiadores), porque ambos
depositavam suas esperanças no fato de que o passado poderia ajudar fundá-los a criar os
alicerces da legitimidade de que carecia a república recém-independente e, compartilhavam a
crença de que o saber histórico objetivo era uma das bases para o progresso do país e, por
isso, até podiam diferir “na valoração dos personagens e processos históricos”, mas
“compartilham, essencialmente, modos similares de cozinhar a história” (ZERMEÑO, 2009:
96).
Considerando todo o apresentado acima, percebemos que o gênero histórico se
transferiu à América para dar conta da realidade pós-emancipação, em um momento em que
as formas de representação e legitimidade do Antigo Regime estavam em franca decadência.
De tal modo que os relatos históricos oitocentistas contribuíram para criar o próprio Estado
Nacional e, nesse processo, se constituíram como uma parte importante das sociedades
americanas, pois formaram parte importante da sua cultura. Sendo assim, a divisão
metodológica deve ser vista, antes, como uma questão cultural e política, posto que os textos
históricos serviram para dar vazão aos embates ideológicos de diversos autores que
entenderam de diferentes modos o legado colonial, a formação dos cidadãos, a participação
política e outros aspectos constitutivos do republicanismo. A história, então, se tornou um
lugar privilegiado para essas discussões, possivelmente, porque dentro da academia os autores
estivessem mais abrigados contra as intempéries sociais e, este fosse um ambiente mais
susceptível ao controle (por causa dos parâmetros científicos do ofício histórico).

7. Considerações finais

Nesse artigo, tentei mostrar que os textos devem ser vistos, como um elemento de
diálogo entre pessoas e ideias, pois funciona como uma ferramenta de expressão política e
intelectual do seu autor. A partir dessa proposta, se poderá realizar uma nova leitura das
histórias chilenas do século XIX, mais atenta aos seus conteúdos; mais preocupada em traçar
relações entre a escrita do passado nacional e o contexto político e cultural; e, mais sensível
ao esforço subjacente dos intelectuais de projetar um futuro para o Estado. Esse tipo de
análise é importante por três motivos. Primeiro, porque permite superar os estudos da
historiografia chilena devedores da História das Ideias, os quais consideram a história
narrativa e filosófica como “tipos ideias” que foram emulados pelos historiadores
15
americanos30. Razão pela qual, estudam a incapacidade da correta incorporação das teorias
europeias, operando sempre na chave modelo e desvios. Segundo, nos permite superar as
análises que acusam as primeiras histórias nacionais de ter sido incapaz de figurar a realidade
local e, ignoram que elas foram constitutivas da própria cultura nacional e seguem sendo
influentes até hoje – nos sistemas educacionais, meios de comunicação e, continuam
direcionando os temas e problemas das investigações históricas. Terceiro, porque esse marco
teórico fornece as ferramentas necessárias para a análise do discurso histórico oitocentista
chileno, tal como desejamos compreendê-lo, isto é, como um evento histórico.
Ao adoptar a perspectiva de análise, passamos a ver a historiografia oitocentista como
um campo de batalha utilizado pelos autores para defender suas proposições políticas e
expressar suas visões de mundo. Sem dúvida, isso nos permite fazer perguntas que ainda estão
sem respostas, como: para quais propósitos serviu a separação entre história narrativa e
filosófica? Quais as visões de mundo estavam em debate? Qual visão tentava se impor sobre
as outras, mediante os esforços da história narrativa? Que tipo de intervenções (persuadir,
incitar, apoiar, condenar, proibir...) cada historiador desejava realizar no contexto do debate?
Como foram recebidas e respondidas suas intervenções?
Essas perguntas, certamente, permitirão encontrar uma compreensão mais satisfatória a
respeito dos diversos pensamentos políticos e historiográficos que estavam na base dos
esforços dos intelectuais chilenos em conformar o conhecimento histórico no Chile durante a
segunda metade do século XIX.

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V, VI, VII e VIII. Santiago de Chile: Cámara Chilena de la Construcción: Pontificia
Universidad Católica de Chile: Dirección de Bibliotecas Archivos y Museos, 2008.

30
Esse é, por exemplo, a visão de WOOD (1993).
16
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sistema colonial de los españoles en Chile”. Miscelánea Histórica i Literaria. Tomo
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